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OS DESAFIOS DO CONTROLE DE RESULTADOS NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL DE INTERESSE PÚBLICO (OSCIP): UM ESTUDO DO CASO DE MINAS GERAIS Frederico de Morais Andrade Coutinho Gerlainne Cristine Diniz Romero Íria Pereira de Melo

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OS DESAFIOS DO CONTROLE DE RESULTADOS

NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL DE

INTERESSE PÚBLICO (OSCIP): UM ESTUDO DO

CASO DE MINAS GERAIS

Frederico de Morais Andrade Coutinho Gerlainne Cristine Diniz Romero

Íria Pereira de Melo

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II Congresso Consad de Gestão Pública – Painel 45: Parcerias com a sociedade: a experiência das OS e OSCIP

OS DESAFIOS DO CONTROLE DE RESULTADOS NAS ORGANIZAÇÕES DA

SOCIEDADE CIVIL DE INTERESSE PÚBLICO (OSCIP): UM ESTUDO DO CASO

DE MINAS GERAIS

Frederico de Morais Andrade Coutinho Gerlainne Cristine Diniz Romero

Íria Pereira de Melo

RESUMO O objetivo deste artigo é investigar os desafios do controle de resultados das parcerias com Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), por meio da análise da evolução de quatro anos na execução, acompanhamento e avaliação do modelo no Estado de Minas Gerais, que combina os paradigmas da Nova Gestão Pública com a Governança. Primeiramente desenvolve-se a noção de parceria de resultados no contexto internacional, passando pela experiência brasileira, até se chegar à iniciativa de Minas Gerais. Em uma segunda seção faz-se uma indagação quanto à suficiência do controle de resultados, apresentando-se a possibilidade da assimetria informacional se configurar em risco moral com comportamentos patrimonialistas. Em um terceiro momento apresentam-se as os novos institutos que Minas Gerais adotou para agregar valor ao controle de resultados, além de se fazer uma análise crítica dessa evolução, embasando-se em uma avaliação efetuada com todas as OSCIPs e representantes de Órgãos Estatais que possuem parcerias em vigência, apresentada em uma quarta seção. Por final, espera-se argumentar acerca da importância em se promover a accountability das parcerias por meio da combinação entre controle de resultados, social e de procedimentos.

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SUMÁRIO

1 PARCERIAS DE RESULTADOS............................................................................ 03

1.1 Contexto internacional......................................................................................... 03

1.2 Visão nacional...................................................................................................... 05

1.3 Iniciativa mineira.................................................................................................. 06

2 DESAFIOS DO CONTROLE DE RESULTADOS................................................... 08

3 EVOLUÇÃO DA APLICAÇÃO DO MODELO DE PARCERIAS DE RESULTADOS EM MINAS GERAIS.........................................................................

10

3.1 Panorama geral 2003-2009................................................................................. 11

3.2 Refinamento do modelo....................................................................................... 12

4 AVALIAÇÃO DA EVOLUÇÃO DO MODELO MINEIRO DE PARCERIA................ 18

4.1 Controle social..................................................................................................... 19

4.2 Gestão do Modelo pela SEPLAG......................................................................... 20

5 CONCLUSÃO......................................................................................................... 22

6 REFERÊNCIAS....................................................................................................... 23

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1 PARCERIAS DE RESULTADOS

1.1 Contexto internacional

Em meados da década de 70, o modelo de Estado de Bem Estar Social

entrou em crise, haja vista o abalo econômico mundial diretamente ligado à crise do

petróleo, à crise fiscal (déficits governamentais), à ingovernabilidade e aos

problemas advindos da globalização (ABRUCIO, 2006). O modelo burocrático

weberiano, tido como ineficiente, moroso, e apegado aos procedimentos, cujo

controle administrativo estava voltado para o controle dos processos e dos

procedimentos, sofreu diretamente com a crise. Surgiram, portanto, reformas

estatais visando diminuir o tamanho do Estado, ligando-o diretamente às suas áreas

estratégicas. Essa geração de reformas teve como resultados, entre outros, o

estabelecimento de parcerias entre o governo e a iniciativa privada. O Estado passa

de executor para indutor de políticas públicas, sendo que, novas técnicas de gestão,

utilizadas pelo setor privado, entraram em cena como uma espécie de remédio

infalível para os problemas da administração pública. Entre os países pioneiros no

processo de modernização da Administração pública, no que tange à introdução de

novos modelos de gestão, cita-se Inglaterra, Nova Zelândia, Austrália e EUA.

Brevemente se contextualizará as duas primeiras experiências.

Margareth Thatcher elegeu-se na Grã Bretanha apresentando um modelo

de governo ligado à reforma, com ênfase na implantação do modelo gerencial puro1.

Como saída aos problemas do modelo burocrático inglês, esse governo propôs que

as responsabilidades dos funcionários, dentro das agências governamentais, fossem

claramente definidas; que os objetivos organizacionais fossem analisados quanto à

substância, e não enquanto processo administrativo; e que os recursos públicos

fossem mais valorizados, maximizando a relação financeira entre os recursos iniciais

e os gastos realizados com políticas públicas. Para cumprir os objetivos deste novo

modelo, quais sejam introduzir a visão empresarial na administração pública,

buscando sanar os problemas ligados ao modelo burocrático, novos instrumentos

gerenciais foram incorporados ao modus operandi da administração pública, como

1 O modelo Gerencial Puro possui seu foco no aumento da produtividade e na eficiência do serviço público, com o objetivo de sanar problemas ligados ao modelo burocrático (JENKINS, 2006).

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técnicas de avaliação de desempenho, de resultados, além do controle orçamentário

(ABRUCIO, 2006).

A administração por objetivos (Management by objectivies) foi adotada

com o intuito de desenhar mais claramente as ações desenvolvidas pelas

agências governamentais, possibilitando instituir uma avaliação de desempenho

baseada na comparação dos resultados obtidos com aquilo que foi pactuado. Da

evolução deste modelo surgiu um modelo gerencial marcado pela ênfase nas

preferências dos consumidores, o Consumerism. As demandas dos consumidores

passaram a ser priorizadas, e estes ansiavam cada vez mais por serviços de

qualidade, sendo introduzida a lógica da qualidade total (Total Quality

Management) no setor público. Um novo modelo contratual foi introduzido no

setor público, modelo este que possibilitou a extensão das relações contratuais

no fornecimento de serviços entre o setor público, o privado e o voluntariado/não

lucrativo (CLARKE apud ABRUCIO, 2006)

Na Nova Zelândia, a situação do setor público era semelhante à da

Inglaterra, com problemas advindos da aplicação do modelo burocrático. Os

objetivos da reforma eram, então, melhorar a eficiência na produção de bens e

serviços, tornar o setor público mais atento ás necessidade dos consumidores,

estimular o controle social e constituir uma política fiscal responsável

(RICHARDSON, 2006). A reforma na Nova Zelândia se pautou, também, na corrente

teórica do managerialism, que enfatiza os princípios da administração privada.

Buscou-se o aumento da eficiência dos departamentos, por meio da instituição de

um regime baseado no desempenho e na accountability, sendo que a remuneração

dos funcionários passou a refletir o desempenho alcançado. No que tange à

execução de atividades rotineiras, tendo em vista o pressuposto de que o setor

privado é mais eficiente, houve uma grande difusão da tendência da terceirização no

núcleo do setor estatal. Já as atividades comerciais do Estado foram retiradas por

completo do campo institucional e dos departamentos e reconstituídas como

Empresas Estatais.

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1.2 Visão nacional

O tema reforma do Estado foi reavivado no Brasil no Governo

Fernando Henrique Cardoso, em 1995. Na esfera da União, os objetivos desta

reforma eram, em curto prazo, facilitar o ajuste fiscal. Em médio prazo, tornar

mais eficiente a administração pública, que deveria se voltar ao atendimento das

necessidades dos cidadãos.

Nesse Governo, foi elaborado pelo então criado e já extinto Ministério da

Administração Federal e Reforma do Estado (MARE), o Plano Diretor de Reforma do

Aparelho do Estado (PDRAE). A reforma partiu da identificação de quatro setores

dentro do Estado, sendo eles: o núcleo estratégico, onde são definidas as leis e a

política; as atividades exclusivas do Estado, em que é exercido o poder de Estado,

como fiscalização e polícia; os serviços não exclusivos ou competitivos, tais como

educação, saúde e cultura, que deveriam ser realizados por organizações privadas

de interesse público, e; a produção de bens e serviços para o mercado, que deveria

ser afeta ao setor privado lucrativo.

A reforma deveria se pautar na celebração de contratos de gestão2 com

o setor privado lucrativo e com o setor das entidades de interesse social,

concedendo-lhes maior autonomia gerencial, em troca de compromissos com

resultados (PACHECO, 2004). O objetivo destes contratos é conceder

flexibilidades aos procedimentos administrativos amarrados pela burocracia

pública. O PDRAE introduziu, então, o conceito de Organizações Sociais (OSs)3,

que são entidades de direito privado, não lucrativas, qualificadas mediante juízo de

conveniência e oportunidade do poder público, para celebrar contratos de gestão,

absorvendo atividades antes executadas pelo Estado nas áreas de ensino,

pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio

ambiente, cultura e saúde.

2 Segundo Lima (1998), Contrato de Gestão seria uma forma de relacionamento entre Governo e sua administração, por intermédio de um contrato formal, com o intuito de fixar objetivos, metas e indicadores de desempenho. 3 As Organizações Sociais foram introduzidas no ordenamento jurídico nacional pela Lei Federal n° 9.637/98.

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Em perspectiva diversa das OSs, mas de matriz relacionada, foi se

desenvolvendo o papel exercido pela sociedade civil propriamente dita, num espaço

de intensificação democrática. Liderado pela antropóloga Ruth Cardoso, o Conselho

da Comunidade Solidária, iniciou discussão acerca do marco legal que regia as

organizações de interesse social, culminando com a publicação em 1999 da lei n°

9.790, que introduzia a figura das Organizações da Sociedade Civil de Interesse

Público (OSCIP), com o objetivo de articular a ação do Estado junto às instituições

do Terceiro Setor. Estas instituições teriam condições de atuação mais flexíveis e

legítimas, devido ao maior controle social. O instrumento através do qual se institui

vínculo de cooperação entre o poder público e as OSCIPs é chamado de Termo de

Parceria.

1.3 Iniciativa mineira

Em 2002, de acordo com diagnóstico apresentado pelo Banco de

Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), o panorama mineiro era de uma grave

crise fiscal, com uma máquina estatal quase obsoleta, bastante morosa e com

políticas públicas que não apresentavam resultados (CUNHA JR, 2004).

Para lidar com essa situação, o governo então empossado apresentou

uma estratégia de reforma de Estado denominada “Choque de Gestão”. Este

incorporou e incrementou algumas inovações e iniciativas de modernização da

gestão iniciadas pelo governo federal. Buscou-se avançar na elaboração de um

novo marco legal para a construção de uma administração voltada para resultados,

com ênfase no fortalecimento do capital social e no conceito de governança4. Novos

arranjos institucionais foram concebidos, entre eles o Acordo de Resultados5 e os

Termos de Parcerias com as OSCIPs. A Lei Estadual n° 14.870/03 dispõe sobre a

qualificação de entidades de direito privado sem fins lucrativos como OSCIP e

disciplina o Termo de Parceria em âmbito estadual.

4 De acordo com Eli Diniz apud Justino (2008, p. 26), governança é definida como “conjunto dos mecanismos e procedimentos para lidar com a dimensão participativa e plural da sociedade, o que implica expandir e aperfeiçoar os meios de interlocução e de administração do jogo de interesses”. Para Guy Peters (2005), a lógica que subjaz o enfoque da governança é a de que maior participação cidadã trará consigo maior qualidade na tarefa de governar. 5 Instrumento de pactuação de resultados, mediante negociação entre órgãos do executivo e as autoridades que sobre eles tenham poder hierárquico.

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O Governo de Minas instituiu essa forma de contratualização por

resultados com o intuito de conferir maior eficiência, eficácia e efetividade às

políticas públicas do Estado, além de induzir um aumento da participação numa

arena de governança. A justificativa para o desenvolvimento desse tipo de parceria

se deve ao fato de o poder público ter perdido, em parte, sua capacidade de dar

respostas às crescentes demandas da sociedade por si próprio, e ainda, devido ao

entendimento de que o trabalho intersetorial gera externalidades positivas. Verifica-

se que o Terceiro Setor possui uma expertise não disponível no setor público, maior

autonomia operacional, além de estar em contato direto com o público-alvo, sendo

que este diferencial pode proporcionar ganhos de eficiência e de escala no

provimento de soluções em iniciativas de interesse público.

Desse modo, a iniciativa mineira busca no modelo de parcerias as suas

potencialidades, combinando eficiência com participação, transparência com

flexibilidade, accountability com adaptabilidade (COUTINHO; BERNARDO;

SILVA, 2008).

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2 DESAFIOS DO CONTROLE DE RESULTADOS

O novo paradigma da gestão, denominado de New Public Management

(NPM) introduziu na administração pública novos arranjos de gestão, que foram

disseminados por todo o mundo. Esse modelo ganhou fôlego num momento de

recessão da economia, ingovernabilidade e crise fiscal, apontando para uma

possível falência do modelo weberiano.

Modelos de avaliação de desempenho, novas formas de controlar o

orçamento e serviços públicos direcionados às preferências do público-alvo são

parâmetros fundamentais desse novo paradigma. Dentre os objetivos propostos pela

NPM, o que interessa ao presente trabalho é o que indica a necessidade de se

retirar o foco do controle de processos e procedimentos, transferindo-o para os

resultados a serem alcançados (HOOD apud NICKSON, 2002).

O modelo de controle por resultados implica na redução dos controles

formais, enfatizando a eficiência. O controle das políticas públicas é realizado

através de indicadores de resultados, construídos em conjunto pelos signatários do

instrumento de gestão.

Necessário é relembrar que além da flexibilização administrativa proposta

pelo NPM, sua outra base de sustentação está na accountability, esta entendida

como a obrigação de prestar contas. Em que pese os dois pilares, flexibilização e

accountability, verifica-se pela experiência que o primeiro tem avançado em

descompasso ao segundo, que permanece menos explorado.

Nesse contexto, o controle de resultados pode não responder totalmente

aos anseios da sociedade levando a utilizações distorcidas dos novos arranjos de

gestão. Primeiramente cabe atentar que em qualquer processo de contratualização

há determinados graus de assimetria informacional. No que tange ao provimento de

políticas públicas de cunho social, somente muito recentemente iniciou-se o

processo de mensuração do custo dessas políticas, de modo que a sua execução

por meio de uma parceria, caso seja acompanhada somente pelo viés do resultado

poderia induzir a comportamentos oportunistas induzidos pelo risco moral. Não se

trata aqui de uma cultura do medo patrimonialista, como Martins (2002) afirmaria,

trata-se apenas de uma constatação de que, por exemplo, uma política de

protagonização juvenil pode não ter paralelos ou precificação no mercado, e dessa

forma, o controle de resultados não poderia ser a única forma de accountability para

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se repousar. Concorda-se com Willianson (1985), segundo o qual é possível atenuar

o risco moral com um incremento do um monitoramento da execução dos contratos.

Outro aspecto a relevar é sobre o real desenvolvimento do controle social,

outra possibilidade importantíssima do conceito de responsabilização. Diz-se

possibilidade, pois o que se vê é a dificuldade de acesso a informações básicas

sobre cada instrumento de contratualização e seus resultados. Como verificam Sano

e Abrucio (2008), ao estudar as diversas experiências de contratualização de

resultados em nível estadual e do Governo Federal, quando informações são

publicadas, o veículo mais utilizado são os diários oficiais, que há muito deixaram de

ser (se alguma vez o foram) um canal de comunicação e transparência acessado

pela população. Ou seja, há falta de incentivo à participação dos cidadãos, tornando

fraca a possibilidade de complementar o controle de resultados somente com o

controle social.

O argumento que aqui se expõe, embasa-se fortemente no aspecto do

aprendizado organizacional, para que se seja cauteloso com as novas formas de

arranjos reformistas, mesmo porque, devido ao seu baixo enraizamento na

sociedade, um descuido pode desacreditar estes instrumentos de gestão, que são

tão valiosos, na medida em que podem traduzir reais ganhos de eficiência,

efetividade e participação para a gestão da res publica. Na seqüência ver-se-á como

o Estado de Minas Gerais tem enfrentado estes questionamentos.

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3 EVOLUÇÃO DA APLICAÇÃO DO MODELO DE PARCERIAS DE RESULTADOS EM MINAS GERAIS

O modelo de Termo de Parceria no Estado de Minas Gerais foi instituído

com o intuito de se criar um vínculo de cooperação entre o poder público e as

OSCIPs, haja vista que o Terceiro Setor consolida um “espaço de articulação e

participação social” (SALOMON & ANHEIER apud COSTA E DAVOLI, 2002), sendo

constituído de entidades que transcendem seus papéis de executora de atividades

para auxiliar a comunidade, passando a atuar como formuladoras e

implementadoras de políticas públicas. Além desta perspectiva de incremento da

Governança, os modelos de parceirização com OSCIPs também expressariam maior

agilidade e ganhos de eficiência para o provimento de políticas públicas, alinhando-

se com o NPM.

Busca-se, nas OSCIPs, a “expertise” do setor privado, culminando na

excelência na gestão dos recursos e na operacionalização das atividades. Salienta-

se que quando da elaboração do modelo, em 2003, a preocupação estatal era

desenvolver indicadores que pudessem mensurar os resultados, sem se ater aos

processos e procedimentos, caracterizando-se a aplicação do modelo gerencial com

o controle resultados. Entretanto, com a execução dos primeiros Termos de

Parceria, percebeu-se certa carência por parte das entidades qualificadas como

OSCIPs no que tange a conhecimentos das normas e dos princípios da

administração pública, até mesmo falta de mecanismos consolidados de controle de

recursos, o que afeta a transparência da gestão dos mesmos, além de incipiência de

conhecimento sobre assuntos trabalhistas, de prestação de contas e gestão

organizacional. Isso se explica em face da heterogeneidade do Terceiro Setor, com

instituições de todos os portes e especialidades, que muitas vezes mantiveram foco

exclusivo em sua atividade fim, de atendimento à comunidade, em detrimento de

uma gestão profissional da área meio.

Dessa forma, o modelo de parcerias de resultados no Estado de Minas

Gerais tendeu a evoluir no sentido de se perquirir um equilíbrio entre a busca

contínua dos resultados para a sociedade e a observância das normas privadas e

dos princípios ético-administrativos pelas OSCIPs, além de tentativas de minimizar o

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risco moral envolvido na contratualização, justificando-se, nesse sentido, a

introdução de novos mecanismos de apoio às entidades, como o Comitê de Apoio à

Gestão dos Termos de Parceria (CGTP), o fortalecimento do papel da Auditoria-

Geral do Estado (AUGE) e a introdução de nova normatização (Decreto Estadual n°

44.914/08).

3.1 Panorama geral 2003-20096

Nesta seção dar-se-á tratamento a alguns dados numéricos para

evidenciar o porte da experiência de Minas Gerais.

Em relação à qualificação de entidades como OSCIP em Minas Gerais,

ressalta-se que é ato vinculado aos requisitos da Lei Estadual n° 14.870/03, ou seja,

uma vez observados os dispositivos legais, o administrador público fica obrigado a

proceder à qualificação, não cabendo nenhum juízo de valor ou de conveniência

(TORRES, 2007).

A entidade que pleiteia o título deve verificar se seu estatuto está

adequado às exigências legais e, após esta verificação, deverá enviar os

documentos arrolados no art. 7o da referida lei para a Secretaria de Estado de

Planejamento e Gestão (SEPLAG-MG).

De dezembro de 2003 a março de 2009 foram qualificadas 145 entidades

da sociedade civil, sejam associações ou fundações, sem fins lucrativos, com o título

de OSCIP, nas diversas áreas descritas no art. 4o da citada lei.

Nesses últimos quatro anos já foram formalizados 25 Termos de Parceria,

em praticamente todas as áreas de políticas públicas sociais, como educação,

cultura, esporte, meio ambiente, defesa dos direitos estabelecidos, assistência

social, prevenção à criminalidade e saúde, estando 14 em vigência. Em termos de

recursos totais, desde 2003 foram destinadas a tais parcerias R$ 135.977.580,76

para a realização de diversos projetos estratégicos com o Estado, como Fica Vivo!

(prevenção à criminalidade), Minas Sem Lixões, gestão do canal de televisão Rede

6 Todas as informações desta seção estão disponíveis no sítio eletrônico: www.planejamento.mg.gov.br/governo/ choque/oscip/oscip.asp.

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Minas7, gestão da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, Jogos Escolares de

Minas Gerais (JEMG), entre outros. Quanto ao número de beneficiários e

distribuição regional de municípios atendidos com estas políticas, há que se perquirir

caso a caso, pois as atividades em parceria distinguem-se enormemente em escopo

e objetivo.

3.2 Refinamento do modelo

A prática vivenciada pela parceirização entre Estado e OSCIPs faz com

que mecanismos de aprimoramento sejam elaborados, de forma a possibilitar a

evolução dos Termos de Parceria em consonância com a transparência da

execução do que fora pactuado, bem como pela busca da efetividade nos seus

resultados. A Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (SEPLAG-MG) possui

esta obrigação, de coordenar o modelo e uniformizar os avanços setoriais.

O modelo pensado inicialmente para a implementação de Termos de

Parceria tem no resultado o grande vetor favorável para a sua utilização. No entanto,

este não é o único interesse do Estado. Deve-se cogitar o uso dessa modalidade de

gestão a partir do senso legal e principiológico que permeia a administração pública

de um modo geral.

Não se pode permitir a evolução de um modus operandi sem favorecer o

mesmo alcance no que tange à transparência, controle e efetividade. A eficácia não

pode suprir a ausência da legalidade e do controle.

Assim, parece claro que no sistema administrativo brasileiro a eficiência não configura um fim em si mesma, assim como a atividade da Administração Pública não pode ser dividida tão somente em razão dos resultados alcançados. (JUSTINO, 2008. p. 182)

Contudo, as inovações contratuais estabelecidas dentro do contexto da

administração pública não podem ser repelidas pelo receio da flexibilização de seus

princípios, pois eles não o serão. Nesse sentido, manifesta-se o Professor Canotilho

da seguinte forma:

7 Esta parceria completará quatro anos ao final de 2009.

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Ao reconhecer-se (...) à administração, um papel criativo de modo a adaptar-se a evoluções inesperadas, impõem-se, como corolário do Estado de Direito, o reforço, relativamente a esta administração, do controlo político e jurídico. Trata-se, portanto, de conciliar o princípio da legalidade da administração como o princípio da oportunidade ou optimidade, de forma a administração poder assegurar com eficiência a realização do bem comum sem comprometer as garantias do Estado de Direito. O princípio da eficiência da administração ergue-se a princípio constitutivo do princípio da legalidade, desde que isso não signifique preterição das dimensões garantísticas básicas de um Estado de direitos. Estas garantias ficariam, por exemplo, comprometidas se as tarefas atribuídas à administração se transformassem em ‘cheque em branco’ a uma burocracia ou tecnocracia sem transparência democrática (...) e isentas de quaisquer mecanismos de controlo da natureza política ou jurisdicional. (CANOTILHO apud JUSTINO, 2008, p.183)

Transparência, efetividade e controle, formam a tríade de sustentação do

modelo de OSCIP em Minas Gerais. A partir desse raciocínio alguns mecanismos de

aprimoramento já se encontram em uso, como os que se destaca na seqüência.

Ressalta-se que não serão mencionados no escopo deste trabalho mecanismos já

consolidados de controle de resultados, como as Comissões de Avaliação, devido

ao foco que se pretende dar8.

3.2.1 Comitê de Apoio à Gestão dos Termos de Parceria (CGTP)

A partir da Resolução SEPLAG No. 037, de 02 de outubro de 2007,

instituiu-se o CGTP, cuja formação se dá por servidores responsáveis pela

coordenação central do modelo de parcerias, integrantes da Secretaria de Estado de

Planejamento e Gestão, que também estão engajados nas Comissões de Avaliação

de cada Termo de Parceria.

Como finalidades do Comitê se elencam a promoção da efetividade no

alcance dos resultados com a replicação de boas práticas, o apoio e a orientação

aos supervisores dos Órgãos Estatais Parceiros, o aprimoramento do controle e

monitoramento das parcerias, e a promoção de orientações acerca da racionalidade

da aplicação dos recursos públicos.

Para tanto, o Comitê se propõe a realizar visitas bimestrais na sede da

OSCIP ou local de desenvolvimento de suas atividades, com a participação

obrigatória do supervisor do Termo de Parceria, representante do Órgão Estatal

Parceiro (OEP), o órgão finalístico da parceria. Nestas visitas se estabelece uma 8 A orientação para resultados já está se consolidando por uma importante mudança cultural nos órgãos e instituições parceiras de Minas Gerais, como pode ser visto em Peci e colaboradores (2008).

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relação de confiança entre os atores, pois se discutem aspectos que possam

aprimorar cada parceria, num esforço contínuo de aprendizado organizacional.

Quando possível elaboram-se planos de ação para atacar determinada oportunidade

de melhoria, sendo feito o monitoramento de sua execução em uma visita posterior.

Todas as visitas são estruturadas com temas pré-definidos, mas não se

impede que outras matérias sejam discutidas, só se garante que aquele tópico da

rodada será analisado por todos. Como assuntos de destaque que já foram tratados

ao longo de 2008 e 2009, pode-se identificar:

� transparência das ações da parceria como forma de incentivar o

controle social;

� discussão acerca do regulamento de compras e contratações,

enfatizando-se a razoabilidade na instituição de tais procedimentos,

mas também a imperatividade de sua observância após publicados;

� orientação sobre aspectos trabalhistas inerentes às entidades privadas

de interesse social;

� necessidade de obtenção e manutenção de fontes de comprovação

fidedignas dos resultados alcançados;

� orientação sobre administração de patrimônio de forma segura e

eficiente;

� orientação sobre a necessidade de aplicação dos recursos ainda não

despendidos no mercado financeiro de forma responsável, além da

identificação de possibilidades de economia em transações bancárias.

Ainda que a genealogia dos Termos de Parceria defenda a política por

resultados e o controle destes, a experiência vivenciada pelas parcerias pactuadas

em Minas Gerais trouxe à voga a necessidade de o Estado acompanhar a gestão

das OSCIPs, cuja finalidade é a de maximizar o potencial das parcerias, garantindo

o melhor alcance dos resultados pactuados, bem como o gerenciamento ideal dos

recursos públicos.

Ademais, “a noção de regime jurídico-administrativo brasileiro, cujas

bases encontram-se solidamente fixadas em nossa Constituição, exige a conciliação

da eficiência com os demais valores e princípios que desse regime fazem parte”

(JUSTINO, 2008. p. 182).

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Ressalte-se, porém, que o CGTP não possui caráter fiscalizador e é

desprovido de qualquer poder de intervenção nessas entidades. O Comitê está

direcionando aos OEPs e às OSCIPs na construção de soluções para as

oportunidades de melhoria identificadas, num processo de aprendizado contínuo.

Fomentar a confiança entre OSCIP e Estado, embora pareça pressuposto

para a relação de parceria, não surge concomitantemente à celebração do Termo.

Das visitas pelo CGTP foi possível difundir e fomentar a idéia da

transparência pelas OSCIPs e OEPs, fazendo, por exemplo, com que o parceiro

privado disponibilizasse em seu sítio eletrônico os Termos de Parceria e seus

aditivos, relatórios gerenciais da entidade, estatuto social, divulgação das vagas de

emprego e estágio, divulgação de editais de compra ou seleção de fornecedores9.

Portanto, a principal função do CGTP é oferecer apoio aos dirigentes das

OSCIPs e aos supervisores dos Termos, a fim de que as parcerias sejam mais

transparentes e efetivas. O CGTP não possui cunho punitivo, mas informativo e

educativo, em que a confiança entre os parceiros é entendida como sendo a rocha

estrutural da parceria.

3.2.2 Grupo de checagem amostral

Dentre as obrigações dos Órgãos Estatais Parceiros (OEP), como

constam do parágrafo único do art. 23 do Decreto n° 44.914/08, é a indicação pelo

seu dirigente máximo de um representante da sua Assessoria Jurídica e outro da

área de Contabilidade e Finanças para auxiliarem o supervisor do Termo de

Parceria, no que tange às suas áreas de atuação.

Ressalta-se a obrigação específica, consignada no art. 42, parágrafo 4o

deste Decreto, referente à necessidade do grupo realizar visitas com periodicidade

trimestral para checar amostras de documentos fiscais, trabalhistas e

previdenciários da OSCIP, assim como de contratos e extratos bancários,

observando o cumprimento do regulamento de compras e contratações e a

adequação das despesas.

9 Já pode ser identificado que 70% das OSCIPs que possuem Termos de Parceria com o Estado divulgam em seus sítios eletrônicos institucionais um conjunto mínimo de documentos, como o instrumento de contratualização, o regulamento de compras da entidade e seus relatórios de resultados. Espera-se ampliar essa ação com a criação de um ranking de transparência no sítio da SEPLAG/MG.

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Trata-se de verdadeiro controle de procedimentos, rechaçado pelos

doutrinadores mais enfáticos no abandono do modelo de administração burocrático

weberiano, mas visto com bons olhos na experiência mineira. A peculiaridade desta

verificação é a sua característica amostral, esta permite um controle que não

desgasta nem exaure a OSCIP, mas que também evita possíveis comportamentos

patrimonialistas, pois a entidade sabe que estará sob controle constante, não

sabendo a amostra a ser pesquisada. A partir dessa situação de aparente

permanência do controle, espera-se gerar comportamentos embasados nos

princípios norteadores do interesse público, diminuindo o risco moral.

Além desse ganho subjetivo, as visitas trimestrais também geram mais

espaço para o aprendizado contínuo da parceria, circularização de informações,

crescimento e colaboração mútua, pois a finalidade da parceria mantém-se no

atendimento ao objeto social pactuado, mas não é possível fechar os olhos para a

escorreita utilização dos recursos públicos.

Por se tratar de um grupo de servidores do Órgão Estatal Parceiro, há a

possibilidade de se aplicarem sanções à indevida utilização do recurso público,

como a solicitação de um estorno de um gasto que não se coadune como objeto do

Termo de Parceria. Em última análise, esse grupo pode subsidiar a autoridade

máxima do OEP nas suas decisões de manter ou finalizar a parceria.

3.2.3 Fortalecimento do papel da Auditoria-Geral do Estado (AUGE)

A Auditoria-Geral do Estado é o órgão que desempenha a função de

controle do executivo estadual mineiro. No que tange às parcerias com OSCIPs, a

AUGE atua em dois momentos, prévio e concomitante à execução. Para essa

execução, a Auditoria criou unidade específica10 para se especializar nos Contratos

de Gestão de Minas Gerais, quais sejam, os Acordos de Resultados11 e os Termos

de Parceria com OSCIPs.

O controle prévio12 se baseia na análise de documentos anteriores à

assinatura da parceria, como minuta do Termo e Programa de Trabalho, planilhas

financeiras, justificativa de escolha da OSCIP e certidões de regularidade fiscal, 10 Esta unidade se denomina Diretoria Central de Auditoria em Contratos de Gestão – DCACG. 11 Contratualização de metas baseado em indicadores de desempenho com o objetivo de alinhar os resultados do planejamento estratégico do governo com os órgãos melhorando o desempenho global da Administração Pública. 12 Está detalhado nos artigos 15 e 17 do Decreto n° 44.914/08.

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trabalhista e previdenciária. Mais do que um controle formal, a prática tem mostrado

a grande valia da análise da Auditoria, uma vez que o parecer produzido por seus

técnicos geralmente conduz a um refinamento dos indicadores do Programa de

Trabalho, e a uma melhor atenção do OEP no momento de definir a OSCIP parceira

com base em critérios técnicos explicitados em sua justificativa de escolha, quando

discricionária.

O controle concomitante à execução do Termo de Parceria se

desenvolve em duas vertentes, a auditoria de gestão e a auditoria operacional. A

auditoria de gestão se preocupa em avaliar o desempenho da OSCIP em termos

da eficiência, eficácia e efetividade no alcance dos resultados pactuados.

Beneficiários são entrevistados, as fontes de comprovação de metas são

checadas, assim como a entrega dos produtos esperados. Já a auditoria

operacional faz um trabalho de análise de contas e procedimentos, verificando a

pertinência do gasto e a adequada observância do regulamento de compras e

contratações publicado pela própria OSCIP.

Este controle concomitante, de resultados e de procedimentos, gera

relatórios que são entregues aos Órgãos Estatais Parceiros e às OSCIPs com

recomendações para se elevar o patamar de qualidade da parceria. Novamente

trata-se de espaço para aprendizado e crescimento organizacional, que ao ver deste

artigo, corrobora para o incremento da accountability do modelo.

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4 AVALIAÇÃO DA EVOLUÇÃO DO MODELO MINEIRO DE PARCERIA

A Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais

possui a atribuição de coordenar a política de parcerias com as OSCIPs de forma

central, erigindo as principais normatizações acerca do tema, e avaliando de

maneira sistemática a política como um todo para garantir a sua boa utilização, ou

seja, a sua aplicação em consonância com a estratégia de resultados do Estado e

balizada pelos princípios éticos reinantes na Administração Pública.

Para produzir um conhecimento efetivo acerca do modelo que lhe cabe

aprimorar, a SEPLAG realizou ao final de 2007 uma avaliação das experiências de

contratualização com as OSCIPs por meio da customização de uma metodologia

genérica de avaliação de experiências contratuais13. Ao final de 2008, esta

avaliação foi novamente aplicada, sendo possível estabelecer uma relevante base

para análises.

O diagnóstico foi obtido por meio de entrevistas com grupos de pessoas

dos Órgãos Estatais Parceiros e das OSCIPs, em momento separados, pois cada

parceiro, necessariamente, possui uma referencial distinto, não se devendo

confrontar diretamente essas óticas para não se perder a riqueza das

considerações de cada um.

O instrumento de avaliação continha 25 quesitos agrupados em cinco

categorias de condições: metas, meios, controle, incentivos e outros fatores

intervenientes. Cada quesito deveria suscitar um julgamento que oscilaria entre, num

pólo, “condições totalmente insatisfatórias” (que corresponde à pontuação um),

ilustrada por uma descrição desta situação, e, noutro pólo, “condições totalmente

satisfatórias”, (que corresponde à pontuação cinco), ilustrada por uma descrição

desta situação. O modelo conceitual subjacente está ilustrado na figura abaixo.

13 A metodologia que a SEPLAG tomou por base para customizar foi apresentada pelo pesquisador Humberto Falcão Martins no VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Lisboa, Portugal, 8-11 Oct. 2002.

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Para fins deste artigo, serão aqui apresentados os resultados sobre duas

das vinte e cinco variáveis analisadas.

4.1 Controle social

A variável ”Controle Social” se articula com o restante do trabalho uma

vez que um modelo de contratualização de resultados deve manter estreita relação

com o controle social para garantir a inocorrência de eventuais desvios na execução,

como apropriações patrimonialistas.

Nas entrevistas tentou-se identificar o grau de conhecimento, interferência

e principalmente questionamentos que a sociedade civil estaria exercendo em cada

parceria. O resultado revelou uma média de 47% sobre a possibilidade de

pontuação máxima, que corresponderia a uma sociedade civil atuante,

questionadora e participativa.

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O desempenho fraco desta variável corrobora a posição adotada pelo

modelo mineiro de fortalecer outros tipos de controles (CGTP, grupos de controle

amostral), que não estritamente o de resultados puro. Além disso, incentiva-se a

adoção de medidas de transparência nas parcerias mineiras, como forma de

possibilitar à sociedade civil, quando de sua participação, que tenha à sua

disposição informações qualificadas sobre a execução e avaliação de cada política.

4.2 Gestão do Modelo pela SEPLAG

A variável “Gestão do Modelo” tenta captar a percepção dos parceiros em

relação à coordenação central da política de parcerias exercida pela SEPLAG.

Relevante mencionar que no ano de 2008 foram implementadas mudanças

estruturais nessa condução, qual seja a publicação do Decreto 44.914/08 e a

introdução da rotina de visitas do CGTP.

Em um modelo de controle de resultados puro, no limite, não haveria

espaço para uma área de coordenação central, pois cada órgão finalístico poderia

controlar os resultados de suas parcerias de forma direta e descentralizada.

No entanto, já em 2007 a avaliação desse quesito era positiva, atingindo

uma média de 70% da nota máxima, que corresponderia a uma situação em que os

parceiros percebem que a SEPLAG proporciona a devida assistência na

implantação do Termo de Parceria (da formulação ao monitoramento e avaliação) e

zela pela manutenção e aperfeiçoamentos (incluindo revisão e ajustes) da parceria,

promovendo iniciativas inovadoras e necessárias para o bom desenvolvimento do

modelo de parceirização.

Ao final de 2008, a nota média deste quesito é elevada para 77%, girando

os comentários, principalmente, em torno das inovações estabelecidas naquele ano.

Fazendo-se um corte na análise, verifica-se que os Órgãos Estatais Parceiros se

sentiram majoritariamente melhor guarnecidos pelas novas diretrizes. Ao se analisar

o pólo das OSCIPs, percebe-se uma divisão, em que um segmento identifica que o

modelo de parcerias estaria perdendo seus pressupostos iniciais de foco em

resultados, resultando num retrocesso, e outro segmento, o majoritário, que

percebeu as iniciativas de 2008 como necessárias e positivas para um

aprimoramento dos resultados.

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Em suma, esta variável denotou o apoio dos Órgãos Estatais Parceiros e

das OSCIPs às inovações capitaneadas pela SEPLAG, em que pese a doutrina

majoritariamente reformista provavelmente venha a questionar tais institutos recém

implementados.

Ressalta-se que esta avaliação foi feita para tentar compreender os

aspectos subjetivos do modelo de parceria, uma vez que a análise dos resultados

pactuados não evidenciaria a riqueza de informações obtidas por meio deste

instrumento de pesquisa.

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5 CONCLUSÃO

Ao longo deste artigo tentou-se desmistificar a idéia de que o controle de

resultados é incompatível com certo grau de controle de procedimentos em um

modelo de parcerias com o Terceiro Setor patrocinado por um Estado gerencial. A

estratégia adotada por Minas Gerais para as parcerias com OSCIPs envida esforços

para manter um ambiente de aprendizado organizacional que incentiva as práticas

de accountability, balanceando controle de resultados, de procedimentos e

incentivando o controle social.

Argumenta-se que a utilização única do controle de resultados pode levar

a comportamentos oportunistas, de risco moral, em virtude da assimetria de

informações entre os parceiros. Dessa forma, o monitoramento mais próximo, o

controle de procedimentos amostral, assim como o fortalecimento da transparência,

pode minorar as chances de que vicissitudes patrimonialistas venham a ganhar

espaço.

Ainda assim, acredita-se no foco que deve ser dado ao controle de

resultados, grande contribuição da última onda das reformas na Administração

Pública, preocupando-se verdadeiramente com as entregas ao cidadão. No entanto,

rechaça-se a idéia de que o modelo burocrático weberiano deve ser abandonado por

completo. Os estágios da Administração Pública (patrimonialista, burocrática e

gerencial) não são estanques, a todo o momento eles se interpenetram e se

combinam, devendo o gestor ser hábil a conceber um arranjo institucional que esteja

apto a lidar com o contexto em que suas experiências são vivenciadas.

A matriz teórica adotada pelo modelo mineiro recupera tanto elementos

da Nova Gestão Pública quanto da Governança, num escopo que combina

eficiência, flexibilidade, transparência e participação. Por meio dessas

considerações, não descuidando da accountability, espera-se que haja uma

institucionalização das parcerias no seio da sociedade, sua verdadeira legitimação,

de modo a perenizar esta experiência e a atingir cada vez mais e melhores

resultados para os cidadãos.

Ressalta-se que as mudanças empreendidas no modelo estadual

estudado ainda são extremamente recentes, sendo necessário aguardar o seu

maturamento para se confirmar mais veementemente as assertivas deste trabalho.

Importante é a avaliação contínua das experiências, de modo a gerar um

aprendizado que culmine em um aggiornamento dos arranjos institucionais, mais

adequados à realidade vivenciada, e como conseqüência, melhores parcerias.

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AUTORIA

Frederico de Morais Andrade Coutinho – graduado em administração pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro – Belo Horizonte/Minas Gerais (2005), em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG (2008). É servidor da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (SEPLAG/MG). Atualmente ocupa a função de diretor central de parcerias com OSCIPs da SEPLAG. Filiação institucional: Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (SEPLAG/MG). Endereço eletrônico: [email protected] Gerlainne Cristine Diniz Romero – graduada em administração pública pela Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro – Belo Horizonte/Minas Gerais (2008), e bacharelanda em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. É servidora da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (SEPLAG/MG). Atualmente é setorialista da diretoria central de parcerias com OSCIPs da SEPLAG. Filiação institucional: Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (SEPLAG/MG).

Endereço eletrônico: [email protected] Íria Pereira de Melo – graduada em direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2006), especialista em direito do trabalho pela Universidade Cândido Mendes – RJ/Praetorium – Instituto de Ensino, Pesquisa e Atividade de Extensão em Direito (2007), aluna da disciplina de atualidades do direito administrativo no mestrado da PUC/MG. Atualmente é setorialista da diretoria central de parcerias com OSCIPs da SEPLAG e professora de direito do trabalho, instituições de direito público e privado, mediação e arbitragem da Faculdade Novos Horizontes – BH. Filiação institucional: Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais (SEPLAG/MG).

Endereço eletrônico: [email protected]