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Avanços e Perspectivas da Gestão Pública nos Estados

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SeminárioAvanços e Perspectivas da

Gestão Pública nos Estados

Realização:

Consad e Fundap 2006

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Créditos

Produção

Conselho Nacionalde Secretários deEstado da Administração (Consad)

Edição e Coordenação

LucianaLima Costa

Revisão

JoelitaAraújo

Projeto Gráfico e Capa

JorgeRibeiro

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Prefácio

Manifesto em defesa da Gestão Pública de quali-dade

Agenda, aprendizado e coalizão

As políticas de Recursos Humanos adotadas pelosgovernos estaduais: um diagnóstico da situaçãoatual e possibilidades de avanços

Gestão das Compras Governamentais: perspecti-vas para a consolidação dos avanços

Governo Eletrônico

Novas Formas de Gestão Pública

Atendimento ao Cidadão nos estados brasileiros:tendências e desafios

Formas de Estruturação do Governo Estadual embusca da boa arquitetura governamental

Sumário

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Pref ácio

O Estado é, de um lado, uma ordem jurídica ou umsistema político e, de outro, um aparelho ou organização.Como sistema político, o Estado moderno nos países maisavançados nasce absoluto, transita no século 19 para li-beral e, no século 20, para democrático. Paralelamente,como organização, nasce patrimonial, passa a burocrá-tico no século 19, e a gerencial no final do século 20. A“administração pública” foi a maneira de administrar oEstado burocrático; a “gestão pública” é a forma de ad-ministrar um Estado que está se tornando gerencial.

Definidas as nossas categorias nesses termos,depreende-se que na história do Estado moderno só hou-ve duas reformas administrativas fundamentais: a refor-ma burocrática que, na segunda metade do século 19,promoveu a transição para o Estado burocrático webe-riano; e a reforma da gestão pública que hoje baliza atransição para o Estado gerencial. Essas duas reformasnão aconteceram ou estão acontecendo de forma arbi-trária. Elas são a mudança necessária da forma de orga-nizar e administrar o Estado como sistema político. En-quanto no Estado Absoluto a administração podia serpatrimonial, já que a necessidade do monarca de sepa-rar o seu patrimônio e o de sua aristocracia do patrimôniopúblico era uma necessidade muito relativa, dado seupoder sobre os súditos, depois das grandes revoluçõesliberais (Gloriosa, Americana e Francesa), essa necessi-dade se tornou imperiosa, porque no Estado Liberal tor-nou-se imperioso distinguir com clareza o patrimônio dos

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governantes do patrimônio dos cidadãos burgueses, quepagam impostos e exigem a garantia de suas liberda-des: a reforma do serviço público e o decorrente Estadoburocrático passaram a ser condições necessárias paraa efetividade da organização estatal. Quando, no século20, o Estado se torna democrático, e os cidadãos deixamde ser apenasos burgueses para serem todo o povo, suasfunções sociais se ampliam enormemente, e a reformada gestão pública, visando a transformar o Estado mera-mente burocrático em gerencial e, portanto, eficiente, tor-na-se inevitável.

O Brasil, ao iniciar em 1995 sua reforma da gestãopública, foi o primeiro país em desenvolvimento que to-mou essa iniciativa, depois que a Inglaterra ou os Esta-dos Unidos iniciassem reforma do mesmo tipo, mas an-tes de países que haviam sido pioneiros na reforma buro-crática, como a Alemanha ou a França, o fizessem. Nofinal dos anos 60, o Decreto 200 havia apontado nessadireção, mas foi só a partir do Plano Diretor da Reformado Aparelho do Estado que o processo de reforma ga-nhou consistência e abrangência.

Desde então, a reforma da gestão pública vem avan-çando no País, como os trabalhos neste livro demonstram.Não há nada surpreendente nesse fato, se considerarmosque essa é uma reforma inevitável para um país cujo Es-tado já adquiriu a dimensão que o Estado brasileiro tem.Como a reforma da gestão pública é historicamente asegunda reforma administrativa relevante do Estado mo-derno, mais cedo ou mais tarde ela ocorrerá em todos ospaíses. E, uma vez iniciada, não há alternativa senão dar-lhe prosseguimento. Os caminhos serão vários porque areforma tem uma amplitude de instituições e de práticasmuito grande. Em alguns momentos ela se acelerará, emoutros, os grupos que se sentem prejudicados a obriga-

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rão a marcar passo, mas o caminho no sentido de tornarmais eficiente e, por isso mesmo, mais legítimo o gastopúblico na área social (inclusive de segurança) e científi-ca, que todas as sociedades democráticas demandam,terá necessariamente de ser percorrido.

A administração pública burocrática era adequadapara tornar efetivo um Estado pequeno como era o Esta-do Liberal; a gestão pública é essencial para tornargerencial o Estado Democrático e, portanto, eficiente. Aadministração pública burocrática podia ser centraliza-da e baseada em regulamentos rígidos; a gestão públicaou administraçãopública gerencial deve necessariamenteser descentralizada e se apoiar no controle por resulta-dos.Na administração pública burocrática,o Estadopodeexecutar diretamente todos os poucos serviços a que seobriga (principalmente serviços de justiça e polícia); nagestãopública, oEstado deve necessariamente terceirizarpara empresas os serviços auxiliares, e para entidadespúblicas não-estatais (as organizações sociais), os servi-ços sociais e científicos; além disso, suas próprias ativi-dades exclusivas devem ser delegadas para agênciasexecutivas e reguladoras.

Lendo os trabalhos que estão publicados neste livro- relatórios das reformas que estão ocorrendo principal-mente em nível estadual - o avanço da Reforma da Ges-tão Pública de 1995 fica claríssimo. É verdade que noâmbito federal, nos últimos três anos e meio, a reformaquase parou por questões ideológicas. Mesmo aí, porém,se ex aminarmos bem o programa mais ambicioso dogoverno, a Bolsa Família, verificaremos que seu êxito sedeve em grande parte à adoção de uma estratégiagerencial de descentralização para os municípios, decaráter estritamente gerencial. No âmbito dos estados,por sua vez, os avanços são impressionantes. Enquanto

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se continua a fortalecer o núcleo estratégico do Estadocom a criação de carreiras de gestores, busca-se descen-tralizar atividades, criar organizações sociais, agênciasexecutivas e controlar por resultados, aprofundar o go-verno eletrônico. Cada trabalho mostra essa tendênciade uma maneira diferente, mas todos indicam a mesmadireção.

Esses avanços nos estados não estão ocorrendo ape-nas porque a reforma da gestão pública é inevitável. Hádois outros motivos mais específicos. Primeiro, porqueentre 1995 e 1998 os secretários de Administração dosestados participaram de forma intensa da formulação dareforma e dos esforços para fazer aprovar a Emenda 19 -a emenda da gestão pública. Segundo, porque os esta-dos (e os municípios) dedicam uma parte muito maior desuas atividades a servir diretamente aos cidadãos-clien-tes do que o governo federal, cujos contatos diretos sãolimitados principalmente aos problemas relativos à pre-vidência, à saúde (SUS) e às bolsas de renda mínima. Osgovernos estaduais e municipais precisam, portanto, dra-maticamente da eficiência que a gestão pública moder-na garante. O governo federal também precisa dessa efi-ciência, mas muitas de suas atividades são ainda maisde formulação de políticas do que de prestação de servi-ços e, por isso mesmo, não têm a eficiência como condi-ção. No governo federal, nos três setores citados, houveprogressos importantes, principalmente nos dois últimos.Na saúde, os avanços já ocorreram a partir de 1996, nasbolsas o avanço acelerou-se mais recentemente; apenasna área da previdência e das universidades e escolastécnicas federais, os avanços não têm ocorrido ou sãomuito pequenos.

O Consad (Conselho Nacional de Secretários deAdministração) tem tido um papel relevante na difusão

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das experiências inovadoras queestão ocorrendo emtodaparte. Este livro representa mais uma contribuição nessesentido. Evelyn Levy, que o organizou, e os demais secre-tários estaduais, assim como os autores deste livro - qua-se todos membros da equipe da Reforma da Gestão Pú-blica de 1995 - mostram que a reforma caminha, que osobstáculos são muitos, que muita inovação e muito espí-rito republicano serão necessários para continuá-la, masque trabalhar nela é trabalhar no sentido da história oudo progresso - um progresso que os críticos sociais põemem dúvida, cumprindo assim sua tarefa, assoberbadospelas incertezas e pelos desafios que os novos proble-mas que estão sempre surgindo apresentam, mas que éinegável.

Luiz Carlos Bresser Pereira

Professor Titular da Escola de Administração de Empresas deSão Paulo (EAESP) da Fundação Getúlio Vargas –FGV

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Manifesto em defesa da gestãopública de qualidade

A aproximação de um novo processo eleitoral nosestados e na União, ao logo do qual a nação deverá de-bater as agendas prioritárias para o desenvolvimento dopaís, faz com que o Conselho Nacional de Secretários deAdministração (Consad) chame a atenção da sociedade,particularmente dos candidatos aos cargos eletivos emdisputa e partidos políticos,para o fato de que a melhoriada gestão pública é fator primordial para alcançarmos oobjetivo de elevar a qualidade de vida da população.

A construção de um serviço público de qualidade éfundamental para o exercício dos direitos de cidadania.De que adianta termos direito à saúde, educação, etc., senão tivermos a garantia do seu exercício? E com que qua-lidade esses direitos serão exercidos?

No mundo de hoje, a criação de um ambiente propí-cio ao desenvolvimento da competitividade do país re-quer também um setor público eficiente.

O debate sobre os desafios da gestão pública temse limitado aos aspectos quantitativos da despesa públi-ca. Realmente o aumento da despesa tem levado os go-vernos a aumentar a carga tributária que já é, hoje, con-siderada um entrave ao desenvolvimento do país pormuitos analistas. Portanto, o controle do gasto é funda-mental e o país tem enfrentado essa questão, como porexemplo com a aprovação da Lei de ResponsabilidadeFiscal. No entanto, outros passos precisam ser dados,

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particularmente na área de previdência social.

Mas consideramos que é preciso adicionar a essedebate a questão da qualidade do gasto público. Qual-quer que seja o volume de recursos disponibilizados aosetorpúblico, ele tem de seraplicado com qualidade.Paragastar com qualidade, o Estado tem de desenvolver com-petência de formulação de políticas, de implantação depolíticas e de gestão de recursos, ou seja, tem de aprimo-rar a gestão pública.

A democracia tem estimulado o aparecimento dedemandas sociais crescentes que precisam ser atendi-das sob pena de estimular o descrédito na própria demo-cracia.

Como atendermos a essas demandas no quadro derestrições fiscais, e sem aumentar a carga tributária?Acre-ditamos que só temos uma saída: investir na melhoria dagestão pública para que possamos aumentar a produtivi-dade do setor público.

As administrações estaduais vêm sabendo respon-der aos desafios que lhes foram impostos pelo ajuste fis-cal e pelas pressões feitas pela sociedade. Iniciativasabsolutamente inovadoras e eficientes são encontradasem todos os quadrantes.

Infelizmente, esses esforços ainda não são ampla-mente reconhecidos pela sociedade. O que se difunde,pela mídia, majoritariamente, são os exemplosnegativos,o que impede a sociedade de ter uma avaliação equili-brada sobre o setor público que tem.

Além disso, a sociedade não dispõe de instrumentospara avaliar o desempenho dos governos, o que tambéma afasta de acompanhar suas realizações.

Os candidatos e os partidos políticos procuram ex-pressar os anseios da sociedade, portanto cabe a ela

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valorizar as propostas dos candidatos para a melhoriada gestão pública, de formaque o tema se torne priorida-de nos programas de governo.

Por tudo isso, o Consad entende ser necessário con-clamar a sociedade, particularmente os candidatos aosprincipais cargos eletivos, no pleito de outubro/2006, acerrar fileiras conosco na defesa de uma política públicade gestão que tenha como objetivo direcionar o setor pú-blico para a promoção do desenvolvimento e da inclusãosocial, com práticas de gestão transparentes, e aberto àparticipação da sociedade.

CONSAD

Conselho Nacionalde Secretários deEstado de Administração

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CONSAD - CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS

DE ESTADO DE ADMINISTRAÇÃO

Presidente: Geraldo de Vitto Junior - Mato Grosso

1º Vice-Presidente: Valter Oliveira Silva - Alagoas

2º Vice-Presidente: Ricardo de Oliveira - Espírito Santo

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Agenda, aprendizado e coalizão

Relatores: Fernando Abrucio - FGV-SP/PUC-SPFrancisco Gaetani - PNUD/Brasil

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Avanços e perspectivas da gestão pública nosestados: agenda, aprendizado e coalizão

Fernando Luiz Abrucio1

Francisco Gaetani2

Introdução

O ciclo de reformas nas políticas de gestão pública,iniciado no governo federal em 1995, desdobrou-se deforma escalonada pelas administrações públicas estadu-ais nos últimos 12 anos. Enquanto alguns estados deraminício a políticas inovadoras simultaneamente às refor-mas implementadas pelo Ministério da Administração eReforma do Estado (Mare) , outros iniciaram ciclosmodernizadores em 1999, ou mesmo em 2003. Sugestiva-mente, os avanços que têm ocorrido no âmbito estadualmuitas vezes não estão relacionados a uma parceria ouindução da União, embora vários deles tenham recebido

1 Doutor em Ciência Política pela USP e coordenador do Programa deMestrado e Doutorado em Administração Pública e Governo da FGV (SP). Au-tor de vários artigos e livros, no Brasil e no estrangeiro, sobre reforma do Esta-do e federalismo.

2 Doutor em Ciência Política pela London Schoolof Economicsand PoliticalScience. Coordenador da área de Governo do Programa das Nações Unidaspara o Desenvolvimento (Pnud).

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a influência das propostas defendidas pelo ministroBresser Pereira no primeiro governo FHC. É como se airrupção das idéias disseminadas a partir do debate emtorno do Plano Diretor da Reforma do Estado constituísseum passo impulsionador, mas com impactos temporais ede intensidade heterogêneos.

Diante desta múltipla realidade, coube um papelespecial ao Conselho Nacional de Secretários de Estadode Administração (Consad). Criado em 2000, ele atuouespecialmentena discussão e disseminação de inovaçõese modelos de modernização administrativa. Para fortale-cer o papel dessa importante instituição, é preciso fazerum balanço das reformas estaduais, analisando o queocorreu, as motivações e os atores vinculados ao proces-so de mudança, os acertos e os erros, além de mostrar aagenda que falta colocar na ordem do dia, definindo quepassos seriam necessários para realizá-la. Esse é o de-safio deste seminário e do presente artigo: decifrar a tra-jetória recente da gestão pública estadual e vislumbrar ocaminho a ser percorrido.

O cenário da gestão pública estadual no período1995-2006 apresenta uma dupla feição. De um lado, di-versos governos estaduais tiveram a vitalidade e a capa-cidade de inovar no âmbito das políticas de gestão pú-blica de forma bastante autônoma em relação à União.Seguindo uma característica do federalismo, as unida-des estaduais brasileiras puderam ser um campo propí-cio à experimentação de reformas.

Nesse sentido, tais avanços verificados no âmbitoestadual sugerem um comportamento mais próximo doidentificado por David Osborne em Laboratórios de De-mocracia, livro que realçava as inovações realizadaspelos governos estaduais norte-americanos e que ante-cederam o debate reformista proposto por Bill Clinton

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para o nível federal. A diferença é que, no Brasil, as mu-danças não se processaram antes das reformas federaisda década de 1990, mas simultaneamente e/ou depois,embora, no geral, sem nenhum tipo de relação de subor-dinação.

Por outro lado, no entanto, há uma desigualdademuito grande entre os estados brasileiros no que se refe-re à capacidade reformista, como mostrou a radiografiamais ampla sobre o assunto. Realizado entre 2003 e 2004,o diagnóstico do Programa Nacional de Apoio à Moder-nização da Gestão e do Planejamento dos Estados e doDistrito Federal, conhecido como Pnage, revelou que tam-bém existem vários governos estaduais atrasados em ter-mos de reforma (Abrucio, 2004). O fato é que as dispa-ridades socioeconômicas e, sobretudo, de qualidade en-tre as elites burocráticas realçam a necessidade de for-ças indutoras de mudança. Dada a natureza essencial-mente democrática do federalismo (Elazar, 1987), auxí-lios ou parcerias com governos devem ser feitos manten-do a autonomia e a independência de cada ente.

Assim, para enfrentar o problema da desigualdadede situações e para potencializar as experiências esta-duais bem sucedidas, é fundamental fortalecer formas decooperação federativa, feitas livremente entre os gover-nos estaduais, ou então com a ajuda do Consad, e mes-mo de forma articulada com o governo federal, contantoque se respeite a peculiaridade de cada estado e a suaautonomia decisória.

Para analisar a trajetória recente e as perspectivasde modernização das administrações públicas estaduais,o texto busca centrar sua atenção em três aspectos dodebate: a agenda de reformas, o aprendizado em cursonos últimos anos e as vicissitudes de uma eventual coali-zão reformista capaz de impulsionar as reformas.

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Em primeiro lugar, a agenda reformista vem sofren-do mudanças desde seu lançamento em 1995. É preciso,portanto, descobrir quais foram as continuidades e asdescontinuidades e, especialmente, as razões que expli-cam as mudanças, se elas se relacionam a um aprendi-zado ou aperfeiçoamento, ou então à falta de uma visãode mais longo prazo sobre a modernização do Estado.

Em segundo lugar, os processos de aprendizados ede transferência de políticas para e entre os governosestaduais que se processaram nos últimos 12 anos nãotiveram uma única fonte inspiradora, vinda de um centroirradiador hegemônico. Nem os estados passaram a co-piar as reformas do governo federal – muitas das quaisdescontinuadas –, tampouco o processo de dissemina-ção de idéias e conceitos inovadores se deu por meio decomunidades ep istêmicas entrincheiradas em redutosacadêmicos consolidados. Lições foram extraídas daUnião, mas, no geral, sem que isso fosse mera clonagem(Rose, 1993) – ao contrário, o resultado conformou umavariedade de experiências. Ocorreram formas de apren-dizado direto e indireto (Levit e March, 1990), como sediscutirá no texto, porém de modo fluido e fragmentado.

Terceiro ponto: a constituição de coalizões reformis-tas, tanto no plano federal como estadual, vem se reve-lando um desafio dinâmico, marcado por marchas econtramarchas. No governo federal, as reformas de 1999-2002 guardam pouca relação com as do ciclo 1995-1999e nenhumadas duas reformasgerenciais de Cardoso tevedesdobramentos no Governo Lula (Gaetani, 2005). Issonão quer dizer que não tenha havido continuidades, in-clusive bem sucedidas; acima de tudo, o que ocorreu foia perda de uma agenda integradora das reformas, talqual havia com o Plano Diretor e com o Mare (Abrucio,2005b). Na maioria dos estados, as alianças reformistassão também frágeis em função do maior grau de descon-

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tinuidade administrativa e de o ponto de partida para asreformas ser mais complicado do que o colocado para aUnião. Destrinchar os elementos constituintes de coali-zões reformistas potencialmente ganhadoras é condiçãopara sua compreensão, construção e fortalecimento.

Além das três questões balizadoras do artigo (agen-da, aprendizado e coalizões), procura-se, inicialmente,entender os vetores impulsionadores das mudanças. Nasseções finais, ademais, há um esforço para a identifica-ção demaiores fragilidades dos governos estaduais e dostemas que constituem uma espécie de “agenda perdida”,isto é, assuntos que volta e meia aparecem na discussão,mas, por alguma razão, retornam a seguir ao campo dos“grandes silêncios”. O texto conclui com um comentáriosobre os dilemas que os próximos governos – federal eestaduais – encontrarão na esfera das políticas de ges-tão pública.

1. Os vetores impulsionadores das reformas

Os governos estaduais passaram por várias modifi-cações nas duas últimas décadas. Primeiramente, ganha-ram maior poder e autonomia com a redemocratização,iniciada pelas eleições para governador em 1982 e con-solidada com a aprovação da Constituição de 1988(Abrucio, 1998). Nessa nova situação, governos coman-dados por políticos vindos da oposição ao regime militartrouxeram inovações para a gestão pública, particular-mente no campo dos programas sociais. O projeto dedescentralização e participação popular no mandato deFranco Montoro (1983-1986) em São Paulo foi um dosmaiores exemplos dessa experimentação bem sucedida.

Entretanto, a redemocratização impulsionou mudan-ças insuficientes no modelo de gestão dos governos es-

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taduais. Ainda permaneceu um quadro clientelista e deuma burocracia defasada na maioriados casos. Para pio-rar, aconteceu uma novidade perversa, que foi a consti-tuição de uma postura predatória por parte dos estados,que aumentaram em demasia o endividamento e criaraminstrumentos para produzir “recursos” sem base orçamen-tária clara, repassando tais custos à União. Não bastas-se isso, acentuaram o conflito entre eles, particularmentepor meio da guerra fiscal, a qual, em nome da busca deinvestimentos e empregos, abdicou de receitas sem obteros resultados esperados – e normalmente tal processo foirealizado contra as normas legais do Confaz, com im-pactos negativos para a cooperação entre os governosestaduais (Abrucio e Ferreira Costa, 1998). Com aimplementação do Plano Real, em 1994, começou umaséria crise financeira nos estados, o que acabou com vá-rios instrumentos predatórios e, como veremos adiante,foi um estímulo forçado ao ajuste fiscal.

Outra modificação recente para os estados foi o novocenário derelações intergovernamentais. Nele,destacam-se dois aspectos. Um é o fortalecimento dos municípios,que ganharam um status constitucional inédito. O resul-tado principal disso foi a municipalização de várias polí-ticas públicas, algo que retirou os governos estaduais daexecução direta de diversos serviços, dando-lhes o papelde coordenação, financiamento suplementar ou de açãoconjunta junto ao poder local – tarefas que ainda não fo-ram completamente digeridas pelos estados.

Além disso, a Constituição de 1988 e o front intergo-vernamental dos últimos 20 anos produziram uma espé-cie de federalismo compartimentalizado (Abrucio, 2005a).Trata-se de uma situação na qual há poucos incentivosao entrelaçamento e compartilhamento de tarefas entreos níveis de governo, dificultando a articulação entre as

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várias competências comuns e concorrentes estabele-cidas pela Carta constitucional. Em outras palavras, acoordenação federativa é frágil no Brasil.

Decerto que algumas áreas têm maior articulaçãointergovernamental do que outras. O melhor exemplo dis-so é o da Saúde, com o SUS, uma política nacional estru-turante que garante a autonomia e a interdependênciados entes segundo os princípios do federalismo demo-crático. Não por acaso, na pesquisa Pnage, supracitada,os integrantes dos governos estaduais disseram que apolítica de Saúde é a mais bem sucedida na coordena-ção federativa e na integração entre formulação eimplementação (Abrucio, 2004). Graças ao Fundef, ummecanismo coordenador de ações entre os níveis de go-verno, embora muito focado no aspecto financeiro, a Edu-cação teve uma razoável avaliação pelos estados. Já aSegurança Pública é o setor com pior avaliação, pois nãotem diretriz federativa clara, dado que não há definiçãodo papel dos entes e da maneira como se deve dar o en-trelaçamento entre os três âmbitos. Nessa linha, poderiaainda ser incluído o Saneamento Básico, bem como cer-tas questões urbano-metropolitanas.

Mesmo nos casos em que a articulação intergover-namental funciona melhor, geralmente o papel dos esta-dos é o mais indefinido, como também o é seu modo dearticulação com os outros níveis de governo em diversaspolíticas. Essa realidade dificulta as reformas da gestãopública estadual, uma vez que a modernização dos meiosnão necessariamente melhora o desempenho das ativi-dades-fim. A articulação entre gestão e políticas, geral-mente complicada na história do Estado brasileiro, é ain-da mais nebulosa no plano estadual.

O quadro heterogêneo das políticas públicas deâmbito estadual contribuiu para que as pressões por trans-

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formações no âmbito das políticas de gestão pública ti-vessem origens muitas vezes distintas das inovaçõessetoriais. Nesse sentido, as políticas de gestão pública –recursos humanos, modelagem organizacional, planeja-mento e orçamento, auditoria e controle, compras gover-namentais, atendimento ao cidadão e governo eletrônico– tiveram modificações cujos impulsos normalmente nãovieram de influências das áreas-fim de governo.

As reformas na gestão pública no âmbito estadualvêm sendo impulsionadas, desde a metade da décadade 1990, por cinco fatores que interagem e se reforçammutuamente:

1) a crise financeira dos governos estaduais e a cons-trução de uma coalizão e de instituições pró-ajuste fiscal;

2) a propagação das idéias da Nova Gestão Públicaapós 1995, com o reforço recente de técnicos com passa-gempelo governo federal,os quais, sobretudo desde 2003,migraram para governos estaduais;

3) disseminação de boas práticas e inovações admi-nistrativas pelo País;

4) fortalecimento de fóruns federativos interesta-duais, como o Conselho Nacional de Secretários de Esta-do de Administração (Consad);

5) o processo de construção de rede entre a União eos estados em prol do Pnage, em termos de diagnóstico,montagem e negociação do programa.

Com a promulgação do Plano Real e a vitória deFernando Henrique Cardoso à Presidência da Repúbli-ca, o governo federal se fortaleceu no front federativo eganhou poder suficiente para atacar os mecanismos fi-nanceiros predatórios que os estados detiveram ao lon-go da redemocratização. O fim da inflação, a falência eposterior privatização da grande maioria dos bancos es-

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taduais, a renegociação das dívidas em termos mais res-tritivos (em 1997), a aprovação da Lei Kandir e, por fim,as legislações que visaram a enquadrar as finançassubnacionais, particularmente no que se refere aos gas-tos com pessoal, foram fatores que obrigaram os estadosa reduzir gastos e a buscar maior eficiência.

Premidos por essa situação, os governos estaduaistiveram, no início, dois tipos de caminho. Um foi o de acei-tar a ajuda da União para diminuir o endividamento eobter algum fôlego fiscal. Nesse quesito, foram muito im-portantes o processo de privatização e os programas dedemissão voluntária, ambos financiados por agênciaspúblicas federais – BNDES e Caixa Econômica Federal,respectivamente. Embora esse padrão de reformas tenhasido essencial para reduzir custos e para diminuir apolitização da burocracia das estatais, seu saldo final foimais o de desmontar o antigo aparato do que o de proporum novo modelo de gestão pública. Para o “dia seguinte”da reforma do Estado, nada se colocava no lugar – e issofoi especialmente perverso na falta de um marcoregulatório para os setores recém-privatizados.

Outra forma deatuação contra a crise fiscal foi a cria-ção de novas tecnologias de gestão para racionalizar osgastos da máquina administrativa, com impactos econô-micos e, em certa medida, de eficiência. Estados pionei-ros, particularmente São Paulo, investiram pesado nainformatização e no governo eletrônico para controlar afolha de pagamento, reduzir o valor das compras gover-namentais e diminuir os desperdícios por toda a admi-nistração pública. As novidades no campo das compraseletrônicas colocaram os governos estaduais na diantei-ra desse processo em relação à União. Além disso, a bu-rocracia do fisco estadual foi reforçada, em termos derecursos e treinamento.

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Esse movimento de fortalecimento da capacidadeburocrática e modernização tecnológica das Secretáriasde Fazenda estaduais ganhou impulso com a criação doProgramaNacional de Apoioà Administração Fiscal paraos Estados Brasileiros (Pnafe), apoiado por recursos doBID e gerenciado pelo governo federal. Participaram doPnafe 84% dos estados, e 65% do total informou à pesqui-sa Pnage que o programa havia sido bem sucedido. Ébem verdade que houve uma diversidade de resultados,mas o fato é que a questão fiscal favoreceu a moderniza-ção das estruturas de gestão pública.

Após os avanços na área fazendária, muitos esta-dos entraram numa nova etapa do ajuste fiscal. Trata-seda adoção do Plano Plurianual (PPA) como instrumentocentral da gestão pública. O fortalecimento do binômioOrçamento-Planejamento fora impulsionado, primeira-mente, pelo governo federal no segundo mandato do pre-sidente Fernando Henrique, depois ganhou força com aincorporação desse tema pelo Fórum de Secretários Es-taduais de Planejamento e Consad, ativando-se aindamais no último quadriênio governamental com a vindade técnicos que ocuparam postos federais para a esferaestadual. Ressalte-se que o avanço foi mais na linha daintegração das políticas com a lógica orçamentária, ha-vendo poucos avanços no que se refere à articulação en-tre políticas por meio da gestão por programas – em resu-mo, tem-se nos estados (bem como na União) mais umOPA (“Orçamento Plurianual”) do que um PPA.

Um segundo vetor de modernização dos estados fo-ram as propostas do Plano Diretor da Reforma do Esta-do, concebido pelo ministro Bresser Pereira. Seus efeitospodem ser constatados em quatro níveis. O primeiro dizrespeito ao apoio que o então ministro dera aos encon-tros de representantes dos governos estaduais, ajudan-do a reforçar os laços interestaduais. É possível dizer, in-

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clusive, que a criação do Consad, em 2000, tenha sido,em boa medida, uma reação à diminuição do ímpeto re-formista no segundo governo FHC, procurando assim vol-tar à dinâmica impulsionada por Bresser.

A adoção de modelos institucionais derivados dareforma Bresser constitui uma segunda demonstração desua importância. Embora os estados não tenham assimi-lado da mesma maneira as propostas, algumas delas sedifundiram em mais de um caso. Um dos maiores exem-plos é o das Organizações Sociais (OSs), que foramadotadas por 12 governos estaduais, perfazendo hoje 67OSs pelo País – São Paulo, com 25, e o Pará, com sete,são as unidades com maior número dessas instituições(Sano e Abrucio, 2006). Não há, ressalte-se, um modeloúnico, do mesmo modo que não houve uma cópia da pro-posta do Plano Diretor, mas sim um estímulo à imagina-ção institucional dos estados, o que gerou adaptações eaperfeiçoamentos.

Mas a maior importância da reforma Bresser advémdas idéias disseminadas para os estados. Trata-se de umnível de difícil mensuração. Na verdade, a partir do de-bateque se instalou durante quatro anos (1995-1998),essaconcepção foi utilizada como pano de fundo das refor-mas, mesmo quando houve o arrefecimento desse mode-lo no plano federal. Desse “caldo de cultura” estabele-ceu-se um referencial geral de modernização, capaz defornecer motivações para a adoção de um novo modelode gestão pública. Num primeiro momento, tais propos-tas eram classificadas como gerenciais e, depois do pri-meiro governo FHC, nem tinham necessariamente esserótulo colado a elas.

E foi nessa última etapa, quando ficaram mais livresdas brigas ideológicas e nomológicas, que as idéias ger-minadas pioneiramente pelo ministro Bresser ganharam

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mais força. As resistências iniciais de políticos e burocra-tas foram paulatinamente reduzidas à medida que aspropostas eram implementadas segundo as condiçõeslocais e começavam a mostrar resultados. Obviamenteque há ainda vetos e pressões contra elas, mas hoje émais difícil abandonar as novas práticas num conjuntosignificativo de estados.

Completando o processo de propagação das idéiaspresentes na reforma Bresser, houve no quadriênio 2003-2006 uma migração de técnicos de alto escalão que ti-nham trabalhado no governo federal, especialmente du-rante o primeiro governo FHC, para os governos esta-duais. Outros deles se tornaram consultores para moder-nização da administração pública dos estados. Em esta-dos com maior presença direta dessas pessoas, comoMinas Gerais e São Paulo, houve avanços significativosem prol da agenda defendida pela Nova Gestão Pública,ancorada em idéias como a contratualização, aflexibilização das estruturas organizacionais e da políti-ca de recursos humanos, além da busca de maior trans-parência e accountability (Clad, 2000). Lugares até entãocom pouca penetração dessas idéias também foram be-neficiados pelo trabalho de consultoria desses especia-listas muito vinculados à Era Bresser. Cabe ressaltar quea experiência deles não só teve de ser adaptada à novarealidade, como incorporou uma série de críticas ao mo-delo do Plano Diretor no que tange a certas propostas e,sobretudo, à forma de implementar as reformas.

O terceiro vetor impulsionador das mudanças nagestão pública estadual é a disseminação pontual deboas práticas em praticamente todas as esferas de go-verno. Os bancos de experiências acumuladas ao longodos últimos 12 anos em premiações como as promovidaspela FGV-SP/Fundação Ford, Enap, Ministério do Plane-jamento, Orçamento e Gestão e BNDES, entre os princi-

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pais, revelam que, se por um lado a agenda da reformado Estado vem enfrentando dificuldades para avançar noplano das macropolíticas, muitas iniciativas bem sucedi-das estão se multip licando no plano micro – local ouorganizacional –, independentemente do equaciona-mento de pendências estruturais ou da adoção de umaagenda integradora no plano nacional.

O fato é que a multiplicação de inovações de diver-sas naturezas no âmbito das políticas de gestão públicatem gerado um ambiente propício para que a esfera es-tadual reflita sobre suas possibilidades de melhoria, mo-dernização e transformação a partir das mudanças emseu entorno e da crescente consciência de que reformasnão são apenas necessárias, como também possíveis efactíveis.

A proliferação de reformas da gestão pública teveimpulso num quarto vetor: o papel dos fóruns federativos.Embora não se tenha a tradição norte-americana de re-lações interestaduais (Zimmerman, 1996), o Brasil avan-çou muito nesse sentido nos últimos 12 anos. Não sãoapenas os encontros de especialistas em planejamento eadministração; houve crescimento e fortalecimento dasreuniões em outras áreas de políticas públicas. Em al-guns casos, o governo federal e/ou políticas nacionaisestruturantes tiveram um peso decisivo, mas noutras ve-zes foi exatamente a falta de diretrizes e/ou de recursosque levou à associação entre os governos estaduais.

Mais especificamente, o modelo do Consad consti-tuiu um híbrido diante destas duas alternativas, ou seja,houve tanto incentivos de ações federais para sua conso-lidação como as idéias de Bresser, a montagem de umacoalizão pró-PPA e recentemente o Pnage, como açõesautônomas interestaduais, impulsionadas por alguns dosestados interessados em multiplicar suas experiências

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bem sucedidas, ou então motivadas pela necessidade depleitear um papel mais sólido por parte do governo fede-ral. Em qualquer uma das hipóteses, teve um papel cen-tral um grupo seleto de lideranças estaduais, compostapor uma elite concomitantemente técnica e política.

Ressalte-se que a gestão pública é tradicionalmenteconsiderada secundária no contexto das chamadas polí-ticas sistêmicas, como a fazendária e o planejamento.São percebidas como residuais e titulares de uma agen-da negativa e pouco atrativa politicamente. Além disso,não possuem a força e a vitalidade das comunidades dossetores vinculados às atividades-fim, organizadas já hádécadas a partir de suas bases acadêmicas e agendasespecíficas, com “constituencies” aguerridas e articula-das – como é o caso típico da Saúde. A criação e institu-cionalização do Consad estão mudando este quadro etrazendo os problemáticos temas da agenda de gestãopública – tradicionalmente implícitos e pouco transparen-tes – para o debate público.

Graças em especial às suas últimas direções, oConsad institucionalizou umaarena interestadual de ges-tão pública, com autonomia em relação aos altos e bai-xos do tratamento do tema no plano federal. Assim sen-do, o Consad transformou em realidade concreta umarede nacional de políticas de gestão pública constituídaa partir da experiência dos governos estaduais, cuja agen-da é distinta da federal, apesar de sabidamente haversobre-posições entre elas.

A periodicidade dos encontros do Consad, ademais,em um contexto de redução do ímpeto da agenda de re-formas do Estado no âmbito federal, possibilitou a manu-tenção do debate sobre os temas constitutivos das políti-cas de gestão pública em um contexto de instabilidadeinstitucional na União. Um indicador dessa volatilidade

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é o fato de o Ministério do Planejamento, Orçamento eGestão ter tido, no período 1999-2006, seis ministros, cin-co secretários executivos e cinco secretários de Gestão.

O quinto elemento propulsor das políticas de gestãopública nos governos estaduais é o Programa Nacionalde Apoio à Modernização da Gestão e do Planejamentodos Estados e do Distrito Federal (Pnage). Ele foi monta-do juntamente com o Programa de Modernização do Con-trole Externo dos Estados e Municíp ios Brasileiros(Promoex), embora ambos fossem autônomos no diag-nóstico e na articulação com o governo federal. Na ver-dade, houve a preocupação de que ocorresse um diálo-go entre os dois programas, procurando integrar a ativi-dade de gestão e execução, a cargo do Executivo, com ade controle externo, desempenhada pelos Tribunais deContas subnacionais. Embora suas primeiras formulaçõestenham sido feitas no segundo governo FHC, a efetivamontagem e implementação do Pnage e do Promoex vêmocorrendo desde 2003, com o início do mandato do presi-dente Lula.

O Pnage e o Promoex não são os primeiros progra-mas de modernização das instituições subnacionais co-mandados pelo governo federal. No mandato do presi-dente Fernando Henrique Cardoso houve o avanço, jácomentado, do Programa Nacional de Apoio à Adminis-tração Fiscal para os EstadosBrasileiros (Pnafe), que teveum caráter pioneiro no auxílio aos governos estaduaisna área financeira. No entanto, os dois programassupracitados são diferentes – e mesmo representam umcorte no projeto de reforma do Estado coordenado pelaUnião – em razão de tratarem basicamente da temáticada gestão pública. Depois de duas décadas de reformasnas quais a redução ou o aumento da eficiência do apa-rato e dos gastos estatais constituíram os fios condutoresdo processo, o Pnage representou uma consciência cada

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vez maior da importância de variáveis vinculadas ao pla-nejamento, aos recursos humanos, à sua interconexãocom as políticas públicas eao atendimento dos cidadãos,neste último em termos de produção de serviços e de cria-ção de mecanismos de accountability.

Em linhas gerais, é possível identificar quatro inova-ções presentes no modelo Pnage/Promoex levado adian-te pelo Governo Lula (Abrucio, 2004a). A primeira diz res-peito à primazia do aspecto da gestão pública dentro dospropósitos do programa, sem desmerecer a questão fis-cal, mas não se subordinando a ela. Nesse sentido, tra-ta-se de uma mudança dialética em relação à trajetóriade reforma do Estado no Brasil, pois se incorporou o ladopositivo da agenda de modernização das finanças pú-blicas e foram agregadas questões de cunho gerencial ede responsabilização da administração pública. Conse-guiu-se, com isso, sair de um dos dilemas da reformaBresser, conforme pesquisa de Flávio Rezende: a tensãoentre o ajuste fiscal e as mudanças institucionais, com aderrota da segunda para a primeira no período FHC(Rezende, 2004).

Além disso, como segunda novidade, o Pnage ba-seou-se num amplo e prévio diagnóstico, indo contra alógica “solução em busca de problemas”, a qual é nortea-da por um blueprint que deve ser mimetizado pelos go-vernos, característica marcante de muitas das reformasna América Latina. O diagnóstico, ademais, envolveu aparticipação dos estados na confecção do modelo depesquisa, bem como no recolhimento e consolidação dosdados. Na realidade, os governos estaduais conhecerammelhor, ao longo do processo, uma série de lacunas edificuldades que não tinham sido tematizadas ou queganharam um novo olhar a partir de então.

O Pnage também representou, em terceiro lugar, o

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primeiro programa efetivamente nacional de moderniza-ção da administração pública estadual, sob coordena-ção, e não imposição verticalizada, da União. Diante daheterogeneidade da Federação brasileira, em termos desituação administrativa e de recursos públicos à disposi-ção, é preciso levar em conta que muitos governos esta-duais não têm conseguido, sozinhos, modernizar a ges-tão pública. Isso só será possível no curto prazo com aajuda do governo federal, por meio da cooperação inte-restadual e, em boa medida, mediante o repasse de fun-dos internacionais – no caso em questão, o dinheiro em-prestado pelo BID é importante como aspecto estabili-zador do impulso reformista nos estados.

Devido à enorme assimetria que caracteriza a Fede-ração brasileira, o governo federal tem de cumprir umafunção essencial em políticas que busquem corrigir asdiversas desigualdades entre estados e regiões do País.Por essa razão, precisa auxiliar os governos subnacionais,em termos financeiros e administrativos, mas deve exer-cer essa tarefa respeitando e levando em consideração aautonomia dos outros entes. Esse é o desafio do federa-lismo brasileiro e que foi enfrentado com bastante suces-so pelo Pnage e pelo Promoex, pois ambos estabelece-ram programas nacionais com ampla e igual participa-ção dos atores subnacionais, em parceria com a União.

A natureza nacional do Pnage responde, portanto,aos ditames da Federação brasileira. Essa característicafica mais evidenciada quando o programa é comparadoao Programa Nacional de Apoio à Administração Fiscalpara os Estados Brasileiros (Pnafe). A principal diferençaentre eles é que o Pnafe não teve abrangência completa,isto é, ocorreu em muitos, mas não em todos os estados,ao passo que o Pnage – como o Promoex, no que se refe-re aos Tribunais de Contas subnacionais – abarcou todo

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o universo estadual. Ressalte-se que tal distinção não serefere apenas a uma variável numérica, e sim a um modode construir a ação reformista. A proposta do Pnage erade, necessariamente, abarcar todos os governos esta-duais, ao contrário do que historicamente tem ocorridonesse tipo de programa, no qual se privilegiam os maisricos e/ou mais preparados e depois se procura incorpo-rar alguma parcela a mais, partindo do pressuposto deque certo contingente de administrações públicas sub-nacionais não está preparado para participar de um pro-cesso de modernização.

Assim, enquanto os modelos anteriores de atuaçãodo governo federal junto às instâncias subnacionais da-vam maior importância ao sucesso dos mais qualifica-dos – pensando em “não desperdiçar recursos e esforçoscom quem não tinha condições” –, o Pnage foi verdadei-ramente o primeiro programa nacional a incluir desde oinício todas as unidades, pois seu ponto de partida era ode que o ataque à desigualdade regional brasileira im-plica tentar incorporar, sobretudo, as que têm piores con-dições.

A mais relevante novidade do Pnage foi o trabalhoem rede entre a União e os estados, e destes entre si. Essetipo de articulação intergovernamental deve ser incenti-vado, seja para disseminar as experiências bem sucedi-das, seja para ajudar os governos estaduais com maiscarências administrativas. A lição desse programa deveir além dos seus resultados intrínsecos. O modelo coope-rativo, vertical e horizontal, precisa estar presente numalógica reformista de longo prazo, para a qual o Consadpode ser um dos atores centrais.

A conjugação desses cinco fatores gerou umarcabouço favorável aos esforços de reformas nos esta-dos, mesmo em um momento em que a agenda da ges-

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tão pública tinha perdido o ímpeto no p lano federal(Gaetani, 2005) – paradoxalmente, o presidente Lula foiincapaz de dar centralidade à modernização da Admi-nistração Federal e teve um papel estratégico para incen-tivar o processo reformista nos governos estaduais, pormeio do Pnage. O desafio é descobrir que variáveis per-mitem dar maior perenidade às mudanças, independen-temente dos governantes eleitos no próximo ciclo eleito-ral. O primeiro passo nesse sentido é diagnosticar o quefoi feito até agora de forma consistente, gerando expe-riências e medidas com força suficiente para convenceros políticos e a sociedade de sua necessidade.

2. A agenda reformista dos estados: temas,inovações e path dependence

Ao contrário do atual quadro de indeterminação, ins-tabilidade e paralisia que marca a área de gestão públi-ca no governo federal, partesignificativa dos estados viveum momento de experimentação e efervescência. Há ummovimento em torno de três objetivos: procurar implantarmedidas inovadoras, construir uma agenda que compati-bilize o ajuste fiscal com políticas gerenciais e melhorara prestação dos serviços públicos. O ponto de partida éheterogêneo, como se ressaltou antes, mas já há atual-mente uma intenção de priorizar a reforma da adminis-tração pública num número substantivo e crescente degovernos estaduais, algo que é evidenciado pelo papelcada vez mais relevante do Consad.

Antes de tudo, o aspecto que salta à vista, dentro danova agenda reformista dos governos estaduais, é a re-levância da questão fiscal. Medidas como governo ele-trônico, compras governamentais, aperfeiçoamento dofisco estadual, maior descentralização e desconcentração,

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todas elas, em suma, visavam à redução de gastos e decustos. Houve um considerável aumento da consciênciafiscale foram produzidos resultados palpáveis. Basta lem-brar que há oito anos apenas quatro estados cumpriamos limites da chamada Lei Camata, referente às despe-sas com pessoal, e hoje, em relação à Lei de Responsabi-lidade Fiscal (LRF), somente dois têm ficado numa linhaperigosa. Não obstante tais avanços, há dilemas finan-ceiros mal resolvidos, particularmente a questãoprevidenciária do funcionalismo público e a existênciaem alguns estados de fundos extra-orçamentários queescondem ou subvertem a verdadeira situação das con-tas públicas.

Em pelos menos três temas, os governos estaduaisforam precursores na administração pública brasileira.O primeiro deles se refere aos Centros de AtendimentoIntegrado. Na década de 1990, Bahia e São Paulo forampioneiros, respectivamente com o SAC e o Poupatempo.Hoje, 23 das 27 unidades – incluindo aí o Distrito Federal– gerenciam algum tipo de Centro de Atendimento Inte-grado. Em alguns casos, o modelo se aperfeiçoou com acriação de mutirões e centros móveis, como há, por exem-plo, em Tocantins e no Maranhão (Vaz, 2006). Ainda sãopoucos os casos em que essa forma de provisão de servi-ços tenha se incorporado à dinâmica cotidiana do res-tante das políticas públicas – quando isso acontece, nor-malmente é na área de Justiça. Mas a existência dos Cen-tros de Atendimento Integrado leva a uma pressão enor-me sobre os outros setores estaduais, criando um movi-mento “bola de neve” em prol de um Estado voltado maisaos cidadãos. Até que ponto esse vetor avançará, nin-guém sabe; todavia, é quase impossível que se retroajanessa questão.

Os estados também estiveram na vanguarda no cha-mado governo eletrônico. São Paulo teve um papel pre-

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cursor, mas governos como Pernambuco, Bahia, Paranáe Minas Gerais deram passos importantes nos últimosanos. A clareza estratégica do governo pernambucanoou a abrangência e a qualidade dos portais de Minas eDistrito Federal são bons exemplos de reformismo bemsucedido (Fernandes, 2006). Sua aplicação se deveu, emparte, ao avanço da área de TI em termos de equipa-mentos e treinamento – embora o planejamento dessapolítica tenha diversas falhas na grande maioria dos es-tados, bem como é frágil sua articulação com os outrossetores governamentais (Abrucio, 2004). Mas a principalmotivação para investir nesta política foi a busca do equi-líbrio fiscal. Nesse sentido, suas ações se concentraramna organização administrativa e, sobretudo, no proces-so de compras eletrônicas, com menor espaço para me-didas de democratização dainformação pública e de seuacesso.

E foi por essa mesma linha em prol do ajuste que aterceira medida vanguardista de gestão foi propiciada.Fala-se aqui das compras governamentais. Como os es-tados precisavam urgentemente reduzir custos e estavamse aperfeiçoando na área de TI e governo eletrônico, omodelo de compras e licitações ganhou terreno fértil paraavançar. A principal característica dessa política, simi-larmente aos Centros de Atendimento Integrado, foi suadisseminação impressionantepara diversos estados, comgrande apoio do Consad – talvez essa tenha sido a polí-tica disseminadora mais bem sucedida deste fórum inte-restadual. Destaque também para a visão de “coordena-ção descentralizada”, propugnada por Pernambuco, epara as licitações sustentáveis, concebidas por São Pau-lo (Marini, 2006). Além dos problemas de legislação, osdesafios para essa área se relacionam à qualidade dosbens comprados, o que mostra o quão difícil é coadunareficiência com eficácia e efetividade.

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A necessidade do ajuste fiscal, sem dúvida alguma,foi o maior propulsor das reformas e inovações nos esta-dos. Uma área como Recursos Humanos preocupou-se,antes de mais nada, com a tarefa de “arrumar a casa”(Marconi, 2006). Mas não se pode dizer que esse tenhasido o único leitmotiv das mudanças. A preocupação coma melhoria da articulação intergovernamental junto aosmunicípios foi a maior obrado último governo catarinense(Martins, 2006). O tema da regionalização também estápresente no Espírito Santo, que criou um Fórum de Secre-tários Municipais de Administração, nos moldes doConsad.

A montagem de uma coalizão pró-PPA, abarcandoum universo enorme de estados, é outro tema que, ape-sar de sua inegável preocupação fiscal, ampliou o hori-zonte reformista. A questão das metas e indicadores paraas políticas públicas tiveram destaque nos PPAs deSergipe e do Ceará. Além disso, há uma preocupaçãogeral em atuar em prol da intersetorialidade, a despeitodessa empreitada não ter tido ainda muito sucesso, poisnormalmente a estrutura organizacional e a posição in-sulada dos setores dificultam a coordenação e a integra-ção intragovernamentais – talvez a grande exceção aquiseja o exemplo bem sucedido de Minas Gerais (Vilhenaet alli, 2006).

A preocupação com a efetividade das políticas pú-blicas foi outra orientadora das ações estaduais. De umlado, isso pode ser captado na preocupação emimplementar a gestão por resultados, por meio de formasde contratualização, como apareceram nos casos dePernambuco, São Paulo e Minas Gerais. Por outro, diver-sos governos estaduais procuraram melhorar a presta-ção dos serviços públicos, até mesmo dando aos cida-dãos meios para avaliar melhor as políticas públicas,

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como foi o caso do Paraná com o Portal da Gestão doDinheiro Público (Pacheco, 2006).

Além dos temas e motivações, vale compreender asreformasestaduais por suacapacidadede se orientar pelaNova Gestão Pública. Mesmo que num número ainda res-trito de estados a contratualização dos serviços apareçacom destaque, principalmente nas ex periências dePernambuco – onde 15 entidades da administração indi-reta e cinco organizações sociais já assinaram contratode resultados –, São Paulo – particularmente com as Or-ganizações Sociais que gerenciam 16 hospitais – e Mi-nas Gerais, com o chamado Acordo de Resultados. Res-salte-se mais uma vez: a maioria dos estados ainda nãotrilhou esse caminho reformista.

Na área de Recursos Humanos, a profissionalizaçãoda burocracia estadual teve alguns avanços. Entre eles,dignas de nota foram as medidas vinculadas à criaçãode carreira de gestores – como ocorreu em Goiás eSergipe, por exemplo –, ao aumento do número de Esco-las de Governo e, sobretudo, à enorme ampliação dosrecursos e programas de capacitação – não obstante es-sas políticas de formação e treinamento nem sempre te-rem o foco adequado. Uma análise incauta considerariatais ações mais próximas do chamado modelo burocráti-co. O erro desse tipo de visão está em pensar de umaforma etapista e completamente separada tais paradig-mas, quando, à luz da experiência internacional, consta-ta-se mais intersecção entre eles do que uma trajetóriameramente evolutiva. No caso dos governos subnacionaisbrasileiros, reformar o Estado é, ao mesmo tempo, com-binar iniciativas meritocráticas relacionadas à burocra-cia clássica e à Nova Gestão Pública.

Segundo a literatura e a experiência internacionais,o que hoje dá um sentido modernizador à área de RH é a

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capacidade de pensar estrategicamente o planejamentoda força de trabalho, isto é, trata-se de definir o perfil daburocracia, com suas atribuições e incentivos. Nessa li-nha, estaria a flexibilização das formas de contrataçãode pessoal. Eaqui apenas um ente, o governo do DF,avan-çou em prol do instrumento do emprego público. De res-to, afora Bahia e Minas Gerais, a maioria dos estadosnão consegue articular a gestão de pessoas com as ou-tras políticas públicas (Marconi, 2006). No campo das ino-vações da Nova Gestão Pública, portanto, o tema dosRecursos Humanos tem um enorme caminho pela frente.

Mas é no campo da democratização e accountabilitydo Poder público que os estados pouco evoluíram em re-lação à Nova Gestão Pública. A governança democráticainterna – junto aos servidores – e externa – em relação àsociedade e aos outros poderes – dos estados não avan-çou muito, o que pode prejudicar o restante das reformas,uma vez que as mudanças dependem decisivamente decoalizões reformistas e da transformação dos valores dosfuncionários públicos e da população. Medidas destina-das a aumentar a transparência da administração públi-ca não receberam a mesma atenção dos reformadoresestaduais. O exemplo das Ouvidorias é paradigmáticonesse sentido: apesar de 59% dos governos estaduaisadotarem esse instrumento, 48% dos ouvidores não têmmandato fixo e são severamente subordinados ao gover-nador. Pior: apenas 30% das Ouvidorias dos estados di-vulgam suas atividades e a avaliação de seu desempe-nho regularmente (Abrucio, 2004: 162-163).

Como contraponto, alvissareira é a percepção dosestados de que devem estabelecer parcerias entre si. Paraalém da vontade, já há uma realidade: segundo a pes-quisa Pnage, 63% dos governos estaduais afirmaram quea participação em fóruns federativos teve papel recente

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na melhoria de sua administração pública (Abrucio, 2004:172). Trata-se, então, de uma situação que, por conta deseus resultados, dificilmente será abandonada pelos fu-turos governantes. Estabelece-se uma forma de pathdependence, ou seja, são criados obstáculos ao retornopara o antigo modelo e, mais do que isso, há fatores queimpulsionam a continuidade de tais políticas, muitas ve-zes tendo um efeito diagonal, pois outras áreas são afe-tadas.

Esse fenômeno de path dependence se rep ete emmedidas da área fiscal, em ações de governo eletrônicoe compras governamentais e, evidentemente, é muitomarcante nos Centros de Atendimento Integrado, bemcomo o aumento da capacitação de pessoal e a criaçãode carreiras e Escolas de Governo favorecem a demandafutura por maior profissionalização. Sucesso tanto em ter-mos de eficiência como de efetividade, os hospitais ad-ministrados por Organizações Sociais em São Paulo têmpoucas chances de serem desativados por um novo go-vernador. Em suma, todos esses exemplos ressaltam ca-sos em que a alteração do que já foi constituído torna-semais custosa do que a continuidade.

Ficam duas dúvidas, entretanto. Primeira: qual é aabrangência, no conjunto dos estados, das reformas comefeito de path dependence? Segunda: qual é a capaci-dade de essas medidas impulsionarem, em cada lugarem que foram instaladas, transformações em outros se-tores da máquina pública? Dada a curta série históricado reformismo no nível dos estados, torna-se difícil ima-ginar um padrão esperado de resultados. Por isso, maisrelevante é entender quais são os atores que podem con-formar uma coalizão de longo prazo, como eles podemaprender com o processo e que temas deveriam entrar napauta dado que estariam, por enquanto, fora do debate.

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Paraseguiressa trilha deperguntas, vale realçar um pontoessencial mostrado por esta seção: os estados já têm umahistória de reformas e, portanto, devem partir do cami-nho construído, com o aprendizado daí retirado.

3. Os atores da reforma: possibilidades edificuldades para a coalizão

Políticas de gestão pública não são neutras em rela-ção a processos políticos e estruturas de poder. Múltiplosatores estão direta ou indiretamente envolvidos com osprocessos de transformação da administração pública.Uma breve análise de como esses grupos se posicionamé útil para a compreensão das potenciais alianças emtorno de coalizões reformistas.

Antes de descrever a estrutura de interesses, valo-res e poder que envolve a questão, vale ressaltar quepolíticas de gestão pública costumam ter menor visibili-dade do que as atividades-fim, além de serem maisdifusas, pois atingem várias áreas. Por essas razões,geralmente não têm tido grande apelo eleitoral e poucomobilizam os potenciais beneficiários, mesmo porqueseus ganhos são “divididos” com outros temas e, sobre-tudo, manifestam-se mais claramente, aos olhos da so-ciedade, do médio para o longo prazo. Não há hoje,ademais, uma comunidade acadêmica no Brasil emnúmero e força suficientes para colocar o assunto notopo da agenda. Por fim, a maior parcela da classe po-lítica ainda não compreendeu a importância das açõesda Nova Gestão Pública, uma vez que seu cálculo elei-toral ainda se move por ações vinculadas à distribui-ção de serviços e recursos aos eleitores, de forma clien-telista ou não, mas com uma preocupação pequena emrelação ao modo de produzir os programas governa-

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mentais e no que tange aos impactos mais amplos eintertemporais da ação política.

Mas quatro aspectos favorecem as políticas de ges-tão no plano dos atores e das alianças. O primeiro rela-ciona-se com a necessidade imperiosa do ajuste fiscal,pelo menos num nível capaz de dar conta dos ditames daLRF e, mais particularmente, da poupança estadualexigida para pagar as obrigações vinculadas àrenegociação das dívidas, efetuada no final da décadade 1990. Desse modo, não há como um novo governadorchegar ao poder e atacar as ações que aumentam aeconomicidade e eficiência da máquina pública – nomáximo, ele pode aperfeiçoar tais medidas. Além disso,já há uma consciência nos formadores de opinião con-trária à “cultura da gastança” sem bases fiscais susten-táveis. E os governos se posicionam num ponto muito dis-tante da visão mediana da opiniãopública ou sofrem umapressão irrefreável, ou então têm de conseguir construirum novo paradigma, convencendo a sociedade dapertinência de seus programas. Não parece haver no ho-rizontealgum modelo,com sustentação teórica e empírica,capaz de se contrapor à responsabilidade fiscal, pelomenos de forma radical.

Conclui-se que a responsabilidade fiscal é o primei-ro – e sólido – pilar das alianças reformistas estaduais.Tão importante quanto são os tipos de path dependencecriados pelos últimos governos estaduais, isto é, as polí-ticas que chegaram a um estágio de “não-retorno”. Paratanto, tais ações devem ter um resultado muito bem ava-liado e, ao mesmo tempo, congregar apoio social em tor-no de si. Do ponto de vista da literatura, trata-se de umpadrão em queas policies geram politics (Couto eAbrucio,2003). Nesse caso, estariam com certeza os Centros deAtendimento Integrado, as compras governamentais, o

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uso do governo eletrônico e a coalizão em prol do PPAvinculando o Orçamento a metas de planejamento. Alémdesses, num conjunto menor de casos e com graus distin-tos de aceitação, poder-se-ia elencar medidas vincula-das à maior profissionalização da administração públi-ca – carreiras de gestores e particularmente Escolas deGoverno geram aliados essenciais –, à contratua-lizaçãobem sucedida de resultados – o maior exemplo são asOrganizações Sociais em certos estados – e outros pro-gramas inovadores específicos de um estado, cujos im-pactos tenham sido bem avaliados política e administra-tivamente, como parece ser o caso da gestãoregionalizada em Santa Catarina.

As coalizões em torno das políticas de gestão públi-ca nos estados são beneficiadas por um terceiro aspecto:a constituição, nos últimos anos, de “policies entre-preneurs”, na linha definida por John Kingdon (1995).Esses “empreendedores de políticas” seriam constituídosatualmente por um grupo formado por funcionários decarreira e, especialmente, por um híbrido de técnico e depolítico, composto pelos líderes no processo de mudançaadministrativa– trata-se daqueles que Aberbach, Putname Rockman (1981) chamam de policy-makers, os quaisaliam o conhecimento especializado com habilidadespolíticas.

Tais lideranças por vezes vêm da burocracia esta-dual, em alguns casos têm experiência no governo fede-ral, enquanto outros tiveram trajetória no setor privado e/ou na academia. O que os unifica são três coisas: umavisão de mundo, isto é, valores compartilhados em ter-mos de gestão pública, a ocupação de uma posição co-mum em termos de problemas a enfrentar e, por fim, autilização de medidas semelhantes para reformar aadministração pública. A percepção dessa situação que

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os agrega tem sido possibilitada pelo Consad e foifortalecida pelo Pnage. Assim, quanto mais houver for-mas de articulação horizontal e vertical, mais chanceshaverá de essa coalizão se tornar mais sólida.

É bem verdade que há, nesse ponto, diferenças ra-zoáveis entre os estados. Com base nas entrevistas e nacomparação do desempenho dos governos estaduaisfornecidas pela pesquisa Pnage, é possível dizer que hálugares em que os “policies entrepreneurs” são fortes osuficiente para manter o processo reformista independen-temente da mudança de governo; noutros eles são capa-zes de, no mínimo, evitar retrocessos; e num conjunto subs-tancial de estados, em razão das reformas terem andadomuito pouco, é possível dizer que não há policy-makerssuficientes com capacidade para pressionar e se articu-lar com os políticos e a sociedade em prol da moderniza-ção da gestão pública.

Para evitar a postura voluntarista, cabe frisar que os“policies entrepreneurs” não podem sozinhos liderar oprocesso reformista. Eles dependem de condições políti-cas para exercer seu papel. Entre essas, destacam-setrês:o padrão de atuaçãoda União, asituação política de cadaestado e a ação do Consad como fórum capaz de fortale-cer os laços interestaduais. No primeiro caso, a incons-tância da política de gestão pública do governo federalnos últimos anos não é um bom alento; contudo, a apro-vação do Pnage, um mérito do Governo Lula, deu ao Exe-cutivo federal o papel de coordenação do programa, oque constitui um forte incentivo à sua participação comoindutor de reformas nos governos estaduais na próximagestão. Esse fator vertical favorável poderá ser poten-cializado quanto mais a articulação horizontal entre osestados se fortalecer, de modo que o sucesso do ciclo emprol da Nova Gestão Pública dependerá da atividade

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política do Consad, de como suas lideranças vão aumen-tar o tamanho da coalizão, tanto entre os agentes públi-cos como junto à sociedade.

O apoio dos governantes e políticos eleitos no esta-do é estratégico para a continuidade das reformas. Esseaspecto poderá ser pressionado pela força que a idéiamobilizadora presente no slogan “Choque de Gestão”começa a adquirir. Aqui está o quarto e último fator ca-paz de potencializar uma coalizão reformista mais sóli-da em prol de reformas da gestão pública estadual. Ofato é que foi aberta uma “janela de oportunidade”, apartir da capacidade de atores políticos centrais, em es-pecial os governadores de Minas Gerais e de São Paulo,colocarem um novo tema na agenda pública, para o qualconquistaram uma aceitação ampla e difusa, baseadanão só na demanda da sociedade, mas em práticas ad-ministrativas já testadas. Essa idéia mobilizadora tendea ganhar a arena eleitoral, mobilizando alianças e con-frontos em torno dessa questão, particularmente entre osformadores de opinião. É possível concluir que nem to-dos os governadores seguirão essa agenda, porém mui-tos deles serão pressionados ou perceberão benefíciospolíticos em fazer o seu “Choque de Gestão”.

Em resumo, os quatro fatores que favorecem as alian-ças e coalizões em torno da política de gestão públicanos estados são: o efeito da questão fiscal, as inovaçõesadministrativas que geraram path dependence, o pesodos “policies entrepreneurs” e a “janela de oportunida-de” aberta pela idéia mobilizadora do “Choque de Ges-tão”. Tais aspectos potencializadores, obviamente, depen-derão da efetiva articulação com os atores que sempreafetam o processo de reforma. Primeiramente, os gover-nadores são atores decisivos. Os chefes do Executivo es-tadual de Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo, Goiás,

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Bahia Ceará e Santa Catarina, entre os que manifesta-ram maior intensidade de preferências, buscaram asso-ciar suas gestões a símbolos e retóricas reformistas. Nes-se sentido, não só apoiaram as reformas como as torna-ram um elemento estratégico em seu cálculo político.

Para juntar a percepção técnica com a estratégiapolítica, esses governadores inovaram ao dar ao temada gestão pública um sentido positivo na agenda gover-namental. Trata-se de uma abordagem mais rara e difí-cil, pois os fracassos da proposta de Bresser Pereira e deoutros projetos de reforma pelo mundo afora relacionam-se intensamente com a dificuldade de mostrar quais seri-am os benefícios contidos nas reformas. Tratava-se, emsuma, de anunciar uma promessa de mundo novo para o“dia seguinte” da reforma doEstado (Nogueira, 2004). Res-salte-se que Bresser fora muito prejudicado no governoFHC pela hegemonia de economistas e tecnocratas cujavisão era meramente desconstrutiva do processo refor-mista – estavam mais para o “ajuste” do que para a “re-construção” do aparelho estatal.

A reforma da gestão pública nos estados também écondicionada pela sua relação com a área econômica,usualmente liderada pelas Secretarias de Fazenda. Aíestá um essencial protagonista no cenário político-admi-nistrativo estadual. Sem o apoio efetivo da burocraciafazendária, ou pelo menos sem a oposição dela, não hácomo realizar grandes mudanças na administração pú-blica. Uma lição depreendida das dificuldades observa-das pelo Mare é que não basta o alinhamento das refor-mas com objetivos de ajuste fiscal e eficiência gerencial.É preciso a compreensão e o comprometimento da áreaeconômica com a implementação das políticas de ges-tão pública, que precisam de suporte financeiro inicialantesde produzir resultadosdo pontode vistaestritamente

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econômico. Os governos estaduais que aparentementetêm produzido modificações e inovações mais duradou-ras e sustentáveis são aqueles em que as esferas econô-mica e administrativa possuem um relacionamento maisharmonioso, cooperativo e sinérgico – ou, pelo menos, comgrau baixo de conflito.

Outro ator estratégico são as secretarias-fim, vincu-ladas às políticas setoriais. Elas condicionam o processoreformista, acima de tudo, porque se as medidas de mo-dernização administrativa não chegarem a elas, diretaou indiretamente, será mais difícil obter apoio dentro efora do governo, uma vez que a capitalização política émaior nos órgãos de linha, que desempenham um papelpotencial de catalisadores de inovações nas administra-ções estaduais. Isso significa que políticas públicas, comoEducação e Saúde, que avaliem a possibilidade de terganhos potenciais com a implementação de reformas,podem ser importantes parceiros na sua formulação, ne-gociação e implementação, com impactos intragoverna-mentais e nos usuários de serviços públicos.

Ademais, a falta de participação ou a oposição dassecretarias-fim é um dos maiores obstáculos às reformasde gestão pública. No primeiro caso, a dependência deum centro irradiador único aumenta os custos políticosdo processo reformista. No segundo, o efeito é ainda pior:o órgão e os policy-makers responsáveis pela política degestão pública ficam isolados, têm grandes dificuldadespara mostrar resultados concretos aos cidadãos e, no li-mite, são “derrubados” pelos setores mais articulados epoderosos. Este último aspecto deve ser ressaltado: exis-tem fortes corporações e “cartórios” nas administraçõespúblicas estaduais e eles devem ser, no mínimo, neutra-lizados.

A relação com os demais poderes é uma condição

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importante para o sucesso das reformas. As AssembléiasLegislativas têm sido um dos atores políticos mais alheios,quando não resistentes, a processos de modernização doEstado – aqui, sobretudo nas questões previdenciáriasdo setor público. No entanto, os Executivos estaduais pos-suem um grau de controle sobre seus Legislativos muitomaior do que o governo federal (Abrucio, 1998), emboraos governos estaduais, em sua maioria, pudessem mexermais no modelo de patronagem se não precisassem mon-tar maiorias parlamentares pela via do fisiologismo.

De qualquer modo, as Assembléias Legislativas nãovêm constituindo obstáculo significativo às mudanças. Sóque o maior envolvimento dos deputados estaduais da-ria maior legitimidade ao processo, seja porque eles mu-dariam o foco de seu cálculo político – que seria menoscentrado na patronagem e no clientelismo –, seja porquepoderiam atuar mais no processo de controle do poderpúblico e da burocracia. E aqui está um dos maioresdéficits das reformas recentes: as inovações administra-tivas incorporam pouco o elemento da accountability emsua lógica. Parte da culpa está na fraqueza institucionaldos Legislativos estaduais.

Os outros órgãos de controle dos governos estaduaisgeralmente não têm a mesma autonomia de atuação e acapacidade de intervençãoque marcam seus congêneresfederais como a Controladoria-Geral da União (CGU), oTribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério PúblicoFederal. O mais fraco deles no plano estadual são os Tri-bunais de Contas. Os TCs estaduais ainda são fortemen-te afetados pela composiçãoextremamente politizada desua cúpula e pela adoção majoritária de padrões forma-listas de fiscalização. Ressalve-se aqui o primeiro gérmende mudança: a realização do Programa de Moderniza-ção do Controle Externo dos Estados e Municípios Brasi-

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leiros (Promoex), com apoio financeiro do BID, poderáalterar parte do quadro descrito, não obstante a variávelpolítica ser o nó górdio dos Tribunais de Contassubnacionais (Arantes, Abrucio e Teixeira, 2005). Até mes-mo os procuradores estaduais, pertencentes ao mais au-tônomo dos três “watchdogs”, não possuem a mesmacapacidade de fiscalização e controle de seus análogosfederais, embora tenham ganhado importância com o usocrescente do Ajustamento de Conduta, forma importantede garantir os direitos dos cidadãos, mas que poderá sermelhorado à medida que as noções da Nova Gestão Pú-blica forem incorporadas ao ideário do Ministério Públi-co estadual, ainda muito formalista em sua visão admi-nistrativa.

A sensibilização desses atores institucionais para osprocessos de reformas da administração pública podefazer a diferença entre se posicionarem como aliados ouopositores de mudanças, mas, acima de tudo, dará outraqualidade ao processo aumentando os pontos de accoun-tability do sistema. As recentes iniciativas do ConselhoNacional de Justiça em relação às questões do nepotismoe do teto salarial no Judiciário sugerem que a pressão daopinião pública, combinada com o esforço de reformis-tas estrategicamente situados, pode dar origem a impor-tantes mudanças.

A sociedade civil vem se fortalecendo no Brasil nasúltimas décadas, desde o processo de redemocratização.Tanto a mídia quanto organizações não governamentaise formadores de opinião vêm recorrentemente abordan-do a questão da reforma do Estado, embora de formasuperficial. A atenção desses atores é, em geral, motiva-da por denúncias de nepotismo, corrupção ou desperdí-cio dos recursos públicos – tradicionais justificativas paraa deflagração de reformas na administração pública

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(Light, 1998). Com poucas exceções, a maioria das lide-ranças sociais não tem se engajado em processos de re-forma da administração pública com conteúdos positivos,sejam eles próximos de uma agenda burocrática ou maisgerencialista.

Nos estados mais desenvolvidos, a vitalidade da so-ciedade civil não tem sido um fator impeditivo de casosdedegradação da administração públicaestadual – comoocorreu no Rio de Janeiro –, tampouco consegue ser umagrandeimpulsionadora de processos modernizadores. Hámuito a ser feito em termos de persuadir a sociedade deque o Estado – aqui, os governos estaduais – pode ter seudesempenho significativamente melhorado à medida queos cidadãos e suas associações se engajarem num de-bate sobre como reconstruir a gestão pública, não fican-do apenas na perspectiva negativa – por vezes privatista,por outras, meramente udenista. Nessa linha, três açõesem prol da ampliação da coalizão reformista devem serfeitas. Uma é a articulação com a universidade, com em-presas privadas ou consultorias, com o intuito de agre-gar conhecimento técnico e experiência de gestão. Issoainda é raro, mas os governos da Bahia, Minas Gerais,São Paulo e Pernambuco já vêm fazendo essa articula-ção de forma mais constante.

A articulação com a sociedade precisa contemplartambém a inclusão das associações civis no debate daagenda de reformas. Isso precisa ser feito de forma maisperene, por meio da criação, em cada estado, de um con-selho de reforma da gestão pública, e precisa ser ativadopor poucas e sintéticas idéias mobilizadoras, capazes decolocar na pauta política esse tema. Daí que a “janela deoportunidades” aberta pelo slogan “Choque de Gestão”deve ser aproveitada para criar a mesma pressão socialque, no final da década de 1990, estabeleceu uma coali-

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zão pró-responsabilidade fiscal, só que agora em prol damodernização da administração pública.

Não se pode esquecer, em hipótese alguma, da ne-cessidade de atrair o cidadão comum, em especial osmais pobres, para o processo de reformas. Ações nessesentido aumentariam a legitimidade social do reformismoestadual. A melhor maneira de fazê-lo é aprimorar oscanais de participação dos usuários de serviços públi-cos, tanto nos conselhos de políticas públicas – impulsio-nados pela Constituição de 1988 –, como principalmentena gestão e avaliação dos equipamentos sociais. Obvia-mente esse processo vai exigir uma maior articulaçãoentre os projetos diagonaisda área de gestão com a lógi-ca das secretárias-fim. Soma-se a isso a necessidade demudar a cultura predominante entre os funcionários pú-blicos, muito ensimesmada e pouco voltada para respon-der à sociedade. E não se pode negar que esta mudançado ethos público depende significativamente do reforçodo Estado nas áreas mais carentes e hoje carcomidaspor umasituação hobbesiana – em outras palavras,o pro-fessor e o médico da periferia precisam de condições pro-fissionais e institucionais para cumprir o seu dever deservir aos cidadãos.

As organizações financeiras internacionais –notadamente o BID e o Banco Mundial – são importantesatores nos processos de formulação, implementação eavaliação de políticas de gestão pública. Ambos vêmatuando com mais ênfase na viabilização de recursos emescala necessária para programas mais ambiciosos demodernização do Estado. Além disso, eles têm contribuí-do também com a realização de diagnósticos e com odesenvolvimento de pesquisas que contribuem para aqualidade das políticas públicas no País. Embora sejamatores secundários nos processos decisórios, o BID e o

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Banco Mundial têm sido parceiros engajados no enfren-tamento dos problemas das administrações públicas fe-deral e estaduais, e seu potencial será mais bem explo-rado se os governos evitarem o mimetismo, utilizando esseauxílio para agregar instrumentos à capacidade da ges-tão estadual de resolver os problemas. Transferências derecursos ou tecnologias somente são boas se estabele-cem alicerces para os governantes e suas sociedades to-marem decisões autônomas e com qualidade.

Há outras organizações estrangeiras, como as Na-ções Unidas, a OCDE e o Clad, que têm influenciado odebate sobre a gestão pública no Brasil. Todas têm sidoimportantes para aumentar a massa crítica relacionadaao tema, mas, sem dúvida, o Clad vem constituindo a prin-cipal delas para os governos estaduais, em função dacrescente participação de dirigentes, acadêmicos e con-sultores brasileiros nos seus congressos anuais. A ausên-cia no campo da administração pública de uma policycommunity brasileira de maior número e força acadêmi-ca fazcom que o debate latino-americano seja ainda maisrelevante como instância aglutinadora da discussão. Res-salte-se que o ganho daí advindo não substitui a lacunaprincipal: é preciso fortalecer e ampliar o número de pes-quisadores e centros de pós-graduação dedicados à ges-tão pública. E os estados poderiam ter um papel impor-tante neste processo de adensamento de conhecimento,pois seriam beneficiários imediatos e de longo prazo des-sa ação.

Feito o mapa dos fatores que favorecem a coalizão edos atores estratégicos no plano estadual, é necessárioentender o que leva ao aprendizado em relação às ino-vações e ao próprio processo de reforma – sua formula-ção e implementação bem sucedidas.

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4. Aprendizado em políticas de gestão pública:formatos e lições do reformismo estadual

Gestão pública é um campo de conhecimento pecu-liar. Trata-se de uma área por definição interdisciplinarque depende de conhecimento advindo da ciência políti-ca, da economia, da administração, da sociologia, dodireito, da história e da cibernética. Acrescente-se aí oforte componente aplicado do aprendizado. A ênfase noaprendizado prático chega até mesmo a gerar descon-fianças em relação às potenciais contribuições de teóri-cos e acadêmicos sem vivência no setor. No Brasil, o nú-mero ínfimo de instituições e pesquisadores dedicadosao assunto, a pouca atenção que as áreas correlatas dãoà questão e a ausência de um espaço de reflexão maissistemático que agregue acadêmicos e administradorespúblicos são aspectos que tornam ainda mais necessá-rio pensar sobre como ativar o aprendizado reformista.

O processo de aprendizado pode se dar de duas for-mas: direta e indireta. No âmbito das experiências esta-duais, as duas formas estão ocorrendo. A forma diretadiz respeito ao aprendizado em primeira mão, isto é, àcapacidade de refletir, elaborar e aprender com a pró-pria experiência. Os estados onde tem se verificado maiorcontinuidade da administração e aqueles onde a mudan-ça de governo não gera descontinuidades administrati-vas são os que mais têm vivenciado essa forma de apren-dizado.

Já o aprendizado indireto é o que se processa me-diante o aproveitamento das experiências de outros. Tra-ta-se de aprender com modelos alheios, o que por umlado elimina os custos do pioneirismo, mas, por outrolado, pode dificultar a internalização dos ganhos doaprendizado direto. Essa modalidade tem sido poten-

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cializada em temas como Centros de Atendimento Inte-grado e Compras Eletrônicas. Vários estados estão sebeneficiando dos acertos, erros e desenvolvimentos deoutros, graças em especial à dinâmica de funcionamen-to em rede possibilitada pelo Consad e, mais recente-mente, com o Pnage, que poderá propiciar um salto demodernização que alguns governos estaduais não da-riam sozinhos.

Cabe um comentário em relação ao fato de as liçõespoderem ser positivas ou negativas. No caso da aprendi-zagem direta, a tendência é que aprendamos mais comnossos fracassos que com nossos acertos. Com a apren-dizagem indireta ocorre o inverso: experiências bem su-cedidas são disseminadas com mais facilidade. Obser-vando as administrações públicas estaduais, ambos osprocessos se verificaram. A circulação das idéias e deprocessos inovadores se deu por meio de dirigentes esta-duais que estão envolvidos com os processos de refor-mas há mais de uma década e por intermédio de pes-soas que participaram dos processos relacionados comas reformas de 1995-1998 e 1999-2002, que depois se des-locaram para posições de direção nos estados e para aárea de consultoria a governos estaduais. Além disso, jáhá impactos do Pnage e do auxílio federal na Era Lulaaos estados mais atrasados em termos de reforma.

O aprendizado nos estados é influenciado por umconjunto de fatores que inclui recursos de poder, acessoa redes de conhecimento, nível de inserção no debateacadêmico nacional e internacional, familiaridade como posicionamento dos especialistas da área, os valoresdos tomadores de decisão (que podem incentivar ou ini-bir o processo de aprendizado e disseminação de boaspráticas) e, por último, mas não menos importante, o graude necessidade imposto pelarealidade – caso de proble-

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mas cujo agravamento força os dirigentes a se posicio-narem, como a questão fiscal e a necessidade de maioreficiência. Ressalte-se o fato de que a recuperação des-sas trajetórias e rotas por onde o debate sobre as políti-cas de gestão pública se manteve ativo, mesmo estandoem declínio no plano federal, é revelador do sentido pro-fundamente prático e aplicado do aprendizado nessaárea.

A experiência dos integrantes do Consad revela umatomada de consciência em relação a uma série de dimen-sões dos processos de políticas públicas. Em primeiro lu-gar, há clareza de que políticas e programas na área degestão são construções institucionais e que este proces-so de formulação não se dá de forma espontânea. Ainda,existe a compreensão de que há experiências, tecnolo-gias, metodologias e conceituações que são transferíveise que outras, não, da mesma forma que se percebeu queelementos não intencionais afetam esses processos. Mui-tos estados também constataram que, ao se buscar trans-plantar experiências de outro contexto e momento, estaapropriação passa por avaliação pragmática das possi-bilidades de transferência. Finalmente, há toda uma va-riedade de formas de se extrair lições de outras iniciati-vas, todas ocorrendo em maior ou menor freqüência noâmbito do Consad3. Essa densidade de interações podee deve ser celebrada como um dos maiores ativos dessarede que percebe no aprendizado mútuo uma importanteferramenta para ação.

3 O planoestadualtem realizado as cinco variantes doprocesso deapren-dizado com base em outras experiências, segundo a definição de Rose (1993:30: cópia, adaptação, construçãode híbridos, geração de sínteses e inspiração.

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5. Por onde o reformismo não avança:fragilidades da gestão estadual e a agenda perdida

O Brasil vem passando por sucessivas reformas daadministração pública desde os anos 1930, com resulta-dos variados, mas sempre deixando a sensação deincom-pletude (Gaetani, 2005). Quase todos os presidentes des-de Vargas assumiram seus mandatos com o propósito dereestruturar, de forma mais ou menos profunda, confor-me o caso, o modo de funcionamento da administraçãopública federal. Sete décadas depois, o País é outro, aslinguagens, as tecnologias e as ferramentas gerenciaismudaram igualmente, bem como a complexidade doPaís.O interessante, no entanto, é entender por que certas coi-sas não se alteraram substancialmente, ou pelo menospor que tem mudado tão lentamente e por que tem sidotão difícil promover essas transformações. E, nesse senti-do, os governos estaduais vêm enfrentando dificuldadessemelhantes, senão maiores, que o governo federal. Acompreensão do reformismo nos estados deve passarpeladescoberta de suas maiores fragilidades e, sobretudo, dasrazões que levam a constituir uma agenda de temas silen-ciados ou retirados do núcleo do debate.

Além dos aperfeiçoamentos que devem ser realiza-dos nos pontos em que os estados já deram, em maior oumenor grau, passos reformistas, é preciso analisar quaissão suas maiores fragilidades, aquelas em que até hou-ve percepção e discussão dos problemas, mas a respeitodas quais pouca coisa foi feita. Tomando como base oDiagnóstico Pnage (Abrucio, 2004), entre as várias ques-tões problematizadas, é possível selecionar, sinteticamen-te, cinco centrais.

A primeira diz respeito às informações que os gover-nos estaduais têm sobre si mesmos. Há uma quantidadeenorme de dados básicos e estratégicos que ou não exis-

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tem, ou então não são atualizados, ou ainda ficam con-centrados num setor e não são conhecidos por policy-makers importantes. É possível imaginar que, neste últi-mo caso, certos “cartórios” ganhem com essa situação,em detrimento do planejamento e do cidadão. Não quenada tenha sido feito até agora, mas, a despeito do avan-ço do governo eletrônico, alguns sistemas de informaçãoainda são bastante precários. Sem uma base sustentávele organizada de informações, não é possível dar solidezàs reformas. Elas, ademais,dependem de subsídios infor-macionaispara que decisõesde melhor qualidade geren-cial sejam tomadas.

Se o Consad quiser impulsionar de forma contínua,consistente e estratégica as reformas da gestão pública,ele terá de construir um banco de dados contendo infor-mações de todos os estados, ajudando-os assim a cons-tituir um alicerce fundamental à modernização do apare-lho estatal. Talvez essa sejauma das medidas mais priori-tárias para tornar o Consad um ator estratégico na refor-ma do Estado brasileiro.

O que mais salta à vista na radiografia dos gover-nos estaduais é a fragmentação e a descoordenação en-tre as partes. Essa segunda fragilidade dificulta a ado-ção de uma visão mais sistêmica, capaz de articular ges-tão e políticas públicas, questão fulcral para a reformado Estado. Trata-se de um problema estrutural que temcomo grande característica a conformação de uma sériede “caixinhas”, que são as secretárias e os órgãos, combaixa capacidade de comunicação entre si. Isso cria umasérie de obstáculos à articulação intersetorial, o que, porsua vez, torna mais difícil a gestão por programas, instru-mento central do PPA.

Produz-se, enfim, um déficit de coordenação nas po-líticas de gestão pública, o que explica, em boa medida,

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o paradoxo dos avanços ocorridos em áreas-meio en-quanto pouca coisa muda nas áreas-fim. É surpreenden-te o descasamento entre umas e outras. Isso não signifi-ca que políticas setoriais não tenham obtido sucesso iso-ladamente. Mostra apenas que os desdobramentos daimplementação de boas ações de gestão pública – comonos diversos estados que têm procurado implementar ini-ciativas como contratualização de resultados ou radicaisinovações nos processos de procurement – ainda não fo-ram capazes de produzir impactos no âmbito das áreasfinalísticas. Há exceções, mas a regra acompanha o pa-radoxal contraste relativo àmodernização dos meios des-colada de avanços nas atividades-fim.

A prestação dos serviços públicos nas três principaisáreas-fim dos governos estaduais deixa muito a desejar.Segurança, Educação e Saúde precisam aprimorar aimplementação de suas políticas. Em certa medida, asOrganizações Sociais resolveram em parte o problemada provisão no campo da Saúde, porém, a maior partedos estados não utiliza ainda este instrumento decontratualização e gestão. Há graves falhas gerenciais ede articulação intergovernamental nos campos educacio-nal e da Segurança, sobretudo nesta última política. Ofato é que a reforma da gestão pública de nada adianta-rá se não atingir essas três políticas, especialmente aSegurança, dado que ela é vista como a atividade maisimportante dos governos estaduais, de maneira que suafragilidade se transforma, assim, num problema de legi-timidade social dos governantes. No cenário otimista, aocontrário, o sucesso nesse setor, por meio da moderniza-ção administrativa, fortaleceria as coalizões reformistasestaduais.

A quarta e maior fragilidade dos estados encontra-se na área de Recursos Humanos. Trata-se de uma variá-

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vel diagonal, ou seja, que afeta a todos os outros setoresda administração pública. Cita-se abaixo trecho da pes-quisa Pnage para mostrar a importância dessa questãopara a reforma do Estado:

Os Recursos Humanos preparam o Estado paraformular e implementar as mudanças colocadas pelapolítica democrática. Se a Segurança Pública se tor-na prioridade nacional número 1, não basta vontadepolítica; é preciso ter funcionários capacitados emotivados. Certas políticas corretamente tornadasprioritárias, como o PPA, falharão caso não haja umquadro de pessoal adequado – serão boas idéiassem os devidos realizadores. Por fim, qualquer mu-dança administrativa passa pelo corpo burocráticoexistente, e a falta de uma política consistente de RHcria cenários entrópicos, em que o “salve-se quempuder” prevalece. De modo que é preciso criar in-centivos necessários para que os servidores sejamconvencidos a se comprometer com a mudança(Abrucio, 2004: 176-177).

A despeito da comprovada importância, os RecursosHumanos constituem a área em que houve menos refle-xão e ação administrativa no campo da Nova GestãoPública em todo o mundo, em particular nas reformas fei-tas na América Latina (Abrucio, 2005b). Diagnosticandoa situação dos estados, constata-se a falta de articula-ção da variável de RH com as outras partes do sistemaadministrativo, a ausência de informações básicas sobreo assunto em quase todos os governos estaduais – mes-mo nos mais reformistas – e, conseqüentemente, a enor-me dificuldade para fazer o planejamento da força detrabalho, definindo um perfil da burocracia que dê contados novos desafios propostos ao Estado contemporâneo.

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É bem verdade que a premência da questão fiscalobrigou os estados a se concentrar muito no problema doexcesso de gastos com pessoal – embora a maior parce-la disso tenha a ver com a Previdência. Contudo, semcolocar essa questão no topo das prioridades, o refor-mismo dos últimos dez anos não se tornará sustentável,especialmente quando se constata a existência de desa-fios, como a necessidade de prestar melhores serviços,de aprimorar a regulação e coordenação das atividadese, como veremos mais adiante, de sepultar o modelo depatronagem construído historicamente no plano subna-cional, ao qual se soma hoje um corporativismo que dis-tancia o Estado da sociedade.

Na seleção aqui proposta, a quinta e última fragili-dade relaciona-se com a gestão da mudança. Fazer re-formas é preparar o terreno para uma nova institucio-nalidade. E esta depende fundamentalmente da disse-minação de valores referentes a um novo ethos público.Nesse sentido, salvo num conjunto pequeno de estados,a atual safra de reformistas não tem criado políticas maisamplas para mudar a lógica dos servidores públicos emotivá-los a se incorporar no novo modelo. Dois exem-plos neste sentido. Primeiro: de acordo com a pesquisaPnage, somente 30% dos estados têm políticas para dis-seminação de valores éticos e um menor número deles,19%,criou Comitêsde Ética, a despeitode 74% terem cons-tatado desvios de conduta ética nos últimos quatro anos(Abrucio,2004: 161). Sem adoção de políticas nessa área,com certeza haverá um confronto entre a cultura orga-nizacional dominante, com fortes traços burocratizantesacopladosà lógica clientelista, e os modelos institucionaisda Nova Gestão Pública. Ademais, como esperar que fun-cionário público responda ao cidadão de forma públicasem garantir instrumentos para o predomínio do republi-canismo dentro do Estado?

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Um segundo exemplo bem interessante é o da gover-nança interna, mais especificamente o da relação comos servidores. Somente 37% dos estados têm uma políti-ca ativa de comunicação com os funcionários públicos e,pior, apenas 22% dos governos têm formas instituciona-lizadas de relacionamento com os sindicatos. A pesqui-sa Pnage mostra, inclusive, que as relações dos gover-nos estaduais com a sociedade têm mais instrumentos eformas de efetivação do que a própria articulação gover-namental junto ao conjunto da burocracia. Nesse cená-rio, a gestão da mudança precisa começar de um pontofundamental: fazendo a “lição de casa”. Está aí uma dasfrentes mais importantes da reforma da gestão públicaestadual nos próximos anos.

Em boa medida, as fragilidades aqui descritas jáforam tematizadas num conjunto de estados, além de nãoconstituírem questões interditadas ao debate. Há um ou-tro leque de assuntos, entretanto, que se transformounuma “agenda perdida”. Esta pode ser definida de duasmaneiras: de um lado há os problemas que alguns esta-dos (a minoria, ressalte-se) vêm até enfrentando, masprocuram retirá-los do centro do debate, pela dificuldadeem realizar reformas aí e/ou para evitar que novos adver-sários ou os costumeiros se coloquem contra o governo;e, de outro, existem “grandes silêncios”, temas que sãotabus ou ainda não foram completamente compreendi-dos em sua importância.

A “agenda perdida” contém, basicamente, cinco pon-tos. O primeiro se relaciona com uma questão histórica eestrutural: a estrutura de patronagem e clientelismo. Sejapela expansão de cargos deconfiança cujo preenchimen-to serve para responder à lógica localista e personalistada classe política, seja por meio de sucessivas manobraspara estender a contratados os direitos de servidores pú-blicos estatutários contratados mediante concurso públi-

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co, a profissionalização dos quadros burocráticos estálonge de ser uma realidade em muitos dos governos es-taduais. Decerto que alguns deles têm se esforçado parafortalecer – por vezes, criar – um núcleo meritocrático durona administração direta, mas os resultados ainda sãoindeterminados tendo-se em vista a magnitude do desa-fio. Trata-se, é bom dizer, de um padrão que ultrapassa aesfera estadual, abarcando os municípios – em pior situa-ção – e o governo federal, que ainda mantém, surpreen-dentemente, mais de 20 mil cargos em comissão, em gran-de parte com provimento completamente livre. Essaestrutura política, portanto, é mais profunda. Para modi-ficá-la, é preciso alterar a visão que orienta a carreira daclasse política brasileira, bem como a percepção queparte da população tem do Estado, que seria “natural-mente” um provedor de empregos, e não o responsávelpela produção de serviços públicos de qualidade, garan-tindo os direitos de cidadania. Talvez esteja aqui a prin-cipal reforma do Estado brasileiro, pois ela daria o senti-do republicano e democrático capaz de impulsionar aNova Gestão Pública.

A patronagem nos estados se combina, de maneiraperversa, com uma profunda assimetria na organizaçãodos recursos humanos. De um lado, funcionários do fiscoe procuradores com remunerações extremamente compe-titivas. De outro, grandes contingentes de mão-de-obraem atividades-fim, como nas esferas de educação e se-gurança, com condições insatisfatórias de trabalho emrelação à importância de suas funções. No meio de tudoisso, há tanto os indicados para responder às necessida-des da classe política quanto um conjunto enorme de fun-cionários da área-meio, muitas vezes sem qualificaçãopara lidar com os desafios do governo contemporâneo.O pior é que um corporativismo ensimesmado e cada vezmais distante da sociedade, principalmente das parce-

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las mais pobres que precisam de serviços públicos, tra-balha pela reivindicação das áreas realmente essenciaise as coloca no mesmo barco, por meio do discurso daisonomia, de outra enorme parcela de servidores quepouco ou quase nada tem a ver com as tarefas estratégi-cas do Estado. Nesse jogo, os princípios do mérito e dofuncionário público – a origem da palavra, tal como defi-nida inicialmente por Robespierre – perdem para lógicasparticularistas de atuação.

Um segundo ponto da “agenda perdida” refere-se àquestão previdenciária. Desde o day after da Constitui-ção de 1988, a massa crítica sobre a Previdência do fun-cionalismo tem aumentado consideravelmente. A admi-nistração federal vem tentando promover mudanças detoda sorte nos últimos 12 anos, de forma a atacar e/oumitigar o problema, seja mediante mudanças constitucio-nais seja por meio de medidas administrativas. Essesesforços têm incluído suporte para que os governos esta-duais se habilitem para produzir diagnósticos, estudostécnicos e desenhos organizacionais para equacionaremseusquadros atuariais. Em várioscasos,a proporção entreativos/inativos/pensionistas nos estados aproxima-se darazão 60%/40%, e a idade média dos primeiros é geral-mente superior a 40 anos. Detalhe: a pesquisa Pnage re-velou a precariedade dos dados da maioria dos gover-nos estaduais sobre o assunto, algo estranho diante damagnitude do problema. E mesmo no conjunto dos quetêm informações bem organizadas, poucos são os quetêm um modelo previdenciário, incluindo um Fundo dePrevidência específico.

Alguns governos estaduais, como do Paraná, daBahia e de Pernambuco, estão buscando equacionar deforma estruturada seus desafios nessa área. Mas a atitu-de dominante tem sido a de procrastinação para além do

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calendário dos mandatos dos atuais governantes. Inte-ressante é que os estados mais desenvolvidos e que têmtido bom desempenho reformista, São Paulo e MinasGerais, estão bem atrasados nessa questão – embora opior caso, entre os estados mais ricos, seja o do Rio Gran-de do Sul, conhecido por ter uma meritocracia acima damédia nacional, mas cujo futuro é bastante incerto casonão se resolva esse problema. É este o “x” da questão: seos governos estaduais não equacionaremadequadamen-te o impasse previdenciário – e eles têm menos saídasfiscais que a União para fugir do tema –, o futuro de suasburocracias e dos cidadãos servidos por elas é sombrio.

A accountability foi o aspecto que menos avançouentre os temas da Nova Gestão Pública que informaramas reformas estaduais recentes. Isso a habilita a entrarno rol dos assuntos da “agenda perdida”. Analisando umdos aspectos da questão, o do controle, constata-se que,no plano interno aos Executivos, a maioria dos órgãos deauditoria encontra-se profundamente atrofiada e, em ge-ral, suscetível à influência política do governo do momen-to. No plano do controle externo, as Assembléias Legisla-tivas exercem muito pouco o papel de fiscalização e con-centram-se mais em construir redes de patronagem quesustentam a carreira da maioria de seus parlamentares.

A situação dos Tribunais de Contas subnacionais ébastante preocupante também. A politização de sua cú-pula, geralmente vinculada aos grupos políticos que do-minam a política local, sua distância em relação à socie-dade – salvo raras exceções, como Pernambuco e SantaCatarina – e o controle de tipo formalista que exerce en-fraquecem seu papelde responsabilização dos governan-tes e representantes da população. Alvissareira é a açãodo Programa de Modernização do Controle Externo dosEstados e Municípios Brasileiros (Promoex), com apoio

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do BID, que poderá melhorar a capacidade de fiscaliza-ção dos TCs. Mas, no quadro atual, é possível dizer quehá, na grande maioria dos casos, uma forte intersecçãoentre o grupo dominante instalado no Executivo, sob ocomando do governador, e os outros poderes. Não neces-sariamente isso gera problemas de desvio de conduta emalversação de recursos públicos. Só que na medida emque a administração pública estadual compartilha a in-formação de que há poucas estruturas zelando pela le-galidade e pela qualidade dogasto,o convite à corrupçãoé uma realidade, que fica menos visível hoje nos estadosdo quena União exatamente por conta da fragilidade dosmecanismos de controle no plano subnacional – trata-se,assim, de um típico círculo vicioso.

Os estados desenvolveram muito pouco suas capa-cidadesregulatórias– eis o quartoponto da “agenda per-dida”. Os governos estaduais têm espaço pararegulaçãoem uma série de atividades privatizadas ou sob conces-são pública. Não obstante, poucos foram os que se bene-ficiaram dos erros cometidos pelo governo federal na con-dução dos processos de privatização e de criação deAgências Reguladoras para os serviços correspondentes,questão, aliás, que continua mal resolvida no nível daUnião.

Se o governo federal tem caminhado lentamente emrelação à regulação, os governos estaduais também nãotêm tirado partido da oportunidade para se posicionarde forma consistente sobre o assunto. Conforme dadosda pesquisa Pnage, há mais estados que fizeramprivatização ou concessão do que aqueles que possuemagência e marco regulatório nítidos. Com a entrada deum tema na agenda como as parcerias público-privadas– as PPPs –, adquire maior relevância o papel reguladordos estados, uma vez que essa iniciativa poderá alavan-

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car positivamente os investimentos, porém isso não ga-rante a qualidade de sua realização e, em alguns casos,da futura provisão de serviços. No fundo, parece que asadministrações estaduais dão maior importância à ne-cessidade de haver regulação do que à construção deinstrumentos para exercer esta função. De forma maisprosaica, pode-se medir esse descompasso: novamentesegundo os dados do Diagnóstico Pnage, todos os esta-dos usam formas de terceirização, mas a maioria não temcontrole sobre esse processo, seja em relação ao quantose gasta, seja em relação à avaliação do desempenhodessas atividades.

Mesmo admitindo os diversos avanços da gestãopública estadual nos últimos anos, um “drama existen-cial” os acompanha: o que cabe aos governos estaduaisfazerem no desenho federativo brasileiro? Essa é a per-gunta mais distante da agenda atual dos estados – ela éo verdadeiro elo perdido. É possível que as administra-ções estaduais estejam fazendo as “coisas certas”, massem que isso tenha o impacto desejado, em razão daindefinição de suas funções. Suas competências geral-mente são fluidas, à exceção da Segurança Pública, exa-tamente a política mais complexa e que envolve profun-do relacionamento com as demais. Mais do que umaheterogeneidade setorial, constata-se que os governosestaduais hoje não possuem um mandato nítido em mui-tas políticas públicas. De resto, o papel das outras ins-tâncias governamentais e da ação que elas têm nas di-versas áreas, como Educação, não se articula adequa-damente com a atuação dos governos estaduais.

As formas de relacionamento dos estados com osmunicípios ainda não foram adaptadas ao novo cenáriodescentralizador. Por muitas vezes, a solução é utilizar ovelho modus operandi da cooptação política de prefeitos

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e líderes locais, com resultados ruins para a prestaçãodos serviços públicos. Interações com modelos consor-ciados de governos locais também não têm avançadosignificativamente. Na verdade, falta aos governos esta-duais descobrir de que maneira devem atuar cooperati-vamente e em prol da coordenação das diversas partesde seu território.

Esse dilema é maior ainda nas regiões metropolita-nas. Trata-se do espaço mais importante da opinião pú-blica brasileira, onde se concentram as maiores riquezase os maiores problemas do País, em intensidade e capa-cidade de expressão. E aqui a confusão, a indefinição, abeligerância entre os governos estaduais e os atores lo-cais – e mesmo o nacional – é enorme. O resultado típicodesse impasse, em muitos estados, é a diminuição do es-paço na agenda de políticas para as questões metropoli-tanas, como forma de evitar um tema de difícil resolução.O problema é que o melhor dos reformismos não podeexistir sem o público a que se destina, o qual, normal-mente, se organiza por dinâmicas especiais. Se estas sãomal resolvidas, nem mesmo amelhor gestão pública podecurá-las.

A desarticulação federativa e a indefinição do papeldos estados são igualmente relevantes para definir a re-lação com a União. Isso vale para diversas políticas pú-blicas, entre as quais a de gestão pública. O fato é queuma maior articulação entre os governos federal e esta-duais para estabelecer uma agenda nacional de refor-mas do Estado encontra um grande obstáculo na formacompartimentalizada e pouco coordenada da Federaçãobrasileira. Entretanto, olhando por um outro ângulo, queprocura trazer à tona o que está fora do debate, é possí-vel que a ampliação da discussão e a implementação dereformas nos governos estaduais possam recolocar, no

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seu devido lugar, o pacto federativo. E, desse modo, odéficit de coordenação que aparece tanto nas várias po-líticas públicas, incluindo a de gestão pública, como en-tre os níveis de governo, poderia ser enfrentado de formamais efetiva e nas suas profundezas.

Conclusão: os grandes desafios adiante

O dinamismo existente no âmbito das políticas degestão pública nos estados contrasta com o declínio des-sa agenda no plano federal. Mas a situação geral daUnião é melhor por conta de seu legado histórico, marca-do por um número maior de reformas ao longo do tempo,incluindo aí as realizações do projeto Bresser. Noutraspalavras, embora os governos estaduais vivam um mo-mento mais reformista, o governo federal ainda conta comum aparato estatal mais efetivo e bem estruturado emcomparação aos estados.

Uma das principais diferenças está na existência deum núcleo de carreiras estratégicas – as chamadas car-reiras do ciclo de gestão –, que dá uma ossatura consis-tente às ações do governo federal. Em contraste, os esta-dos ainda se apóiam excessivamente em estruturas decargos de confiança e nos quadros fazendários, o quenão contribui para a estruturação de administração pú-blica profissionalizada e equilibrada. Em comum, ambasas instâncias federativas enfrentam problemas noequacionamento das necessidades de pessoal e de mo-delos organizacionais adequados nas áreas finalísticas.Uma década depois da publicação do Plano Diretor daReforma do Estado, o resultado geral é de um avançolento, em que pese o fato de ainda perdurar o impulsoque ele produziu.

Há de se dar visibilidade às mudanças em curso nos

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estados para que realimentem as iniciativas em curso emoutras unidades estaduais – e mesmo municipais ou, porque não, como exemplo para a União. A publicização éimportante também para garantir a sustentabilidade des-se processo reformista. O problema da descontinuidadeadministrativa é, no mais das vezes, maior no plano esta-dual do que no federal, de modo que as eleições de 2006sem dúvida serão um teste para muitas das reformas emfase de consolidação. Para tanto, o Consad e os atoresorganizados em torno do Pnage precisam se mobilizarpoliticamente para ampliar a coalizão de apoiadores.

Este debate remete a um outro desafio maior, confor-me mencionado no início do texto: afinal qual será o pa-pel a ser desempenhado pelas administrações públicasestaduais no futuro? Os debates em relação à renego-ciação do pacto federativo têm sido dominados pelas dis-putas em torno de distribuições de recursos, mas semavançar a discussão sobre papéis e atribuições. Nessesentido, a aprovação da nova Lei de Consórcios Públicostem grandes chances de possibilitar a emergência denovos arranjos intermediários envolvendo municípios eestados, bem como entre estes e a União. Mas em ummodelo de competências compartilhadas como o brasi-leiro é importante o País estabelecer consensos mínimossobre a forma como se deve dar a relação entre níveis degoverno e entre estes e a sociedade. E, na maioria daspolíticas públicas, essa questão não foi resolvida, comimpactonegativo maior para os governos estaduais, cujasfunções são as mais indefinidas dentro da Federação.

A clarificação dos novos papéis dos governos esta-duais remete à redefinição do perfil da burocracia esta-dual, à definição de uma estratégia de profissionalizaçãocorrespondente e à valorização da função pública. Es-ses três itens fazem parte de uma agenda positiva que

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passa por um conjunto de medidas combinadas que in-cluem programas de capacitação, estruturas remunera-tórias, introdução de mecanismos de avaliação de de-sempenho e alinhamento de estruturas de carreiras – semconcessões a corporativismos. O desafio de trazer a dis-cussão de recursos humanos para o campo positivo nãoserá trivial.

É preciso insistir no seguinte fato: o aprimoramentodas políticas de gestão pública pode trazer significativosimpactos para o conjunto do governo. Exemplos históri-cos não faltam, como Vargas e Rossevelt nos anos 1930e, mais recentemente, a presidência Clinton-Gore nosEstados Unidos e os sucessivos mandatos de Thatcher,Major e Blair no Reino Unido, além das amplas reformasfeitas recentemente pelos países nórdicos. Esses casostêm em comum o fato de os governantes terem utilizado ofortalecimento dessa agenda reformista como instrumentopara modelar e perseguir políticas setoriais prioritárias,mas sempre articuladas com um centro irradiador esuper-visor das mudanças. Desse modo, a reforma do Estadodeve servir para fortalecer e legitimar uma coalizão vol-tada à melhoria da prestação dos serviços públicos, ga-rantindo assim, de forma eficiente, efetiva, ética e comeqüidade, os direitos de cidadania.

O maior desafio está, porém, no ponto de partida,isto é, nos primeiros passos que levam à construção deuma coalizão reformista capaz de impulsionar e dar sus-tentação às políticas de gestão pública. Em geral, os ga-nhos produzidos pela modernização administrativa sãodifusos e de longo prazo. As reformas precisam, portan-to, de uma articulação política que coordene seus pro-cessos, sua formulação, decisão e implementação, mes-mo quando o tema já está na agenda do governo. Issoexige um trabalho permanente de advocacy, negociaçãoe aprendizado coletivo para viabilizar-se.

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A crise política recente e suas conexões com o graveproblema da corrupção, as enormes deficiências na pro-visão de serviços públicos, o caos das grandes cidades ea perda de autoridade dos governos junto aos cidadãosnos colocam num momento estratégico: ou o País refor-mula o seu Estado, ou o desenvolvimento ficará como umsonho distante. Para mudar essa situação, o conjunto dereformas necessárias é amplo, envolvendo os três níveisde governo e todos os ramos de poder. Por isso, dificil-mente essas transformações se processarão apenas pe-los esforços dos integrantes do sistema político-adminis-trativo. Reside aí o maior desafio para as políticas dagestão pública: serem percebidas e demandadas pelasociedade a ponto de ela lhe dar suporte suficiente parao redesenho das estruturas governamentais do Estadobrasileiro. O conhecimento sobre a trajetória das refor-mas estaduais pode ser um estímulo para que os cida-dãos e os grupos sociais comecem a se mobilizar em prolda Nova Gestão Pública.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

As políticas de Recursos Humanos adotadas pelosgovernos estaduais: um diagnóstico da situação

atual e possibilidades de avanços

Relator: Nelson Marconi

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As políticas de Recursos Humanos adotadas pelosgovernos estaduais: um diagnóstico da situação

atual e possibilidades de avanços

Nelson Marconi

Professor da Fundação Getúlio Vargas e da PUC de SP econsultor na área de Recursos Humanos do setor público

Este trabalho visa a avaliar o estágio atual das polí-ticas de recursos humanos desenvolvidas nos estados daFederação e sugerir medidas que possam implicar avan-ços significativos no futuro. Para tal, está organizado daseguinte forma: em seu início, analisa as experiências dealguns estados, apresentadas no seminário do Consad“Avanços e Perspectivas da Gestão Pública nos Estados”,de 8 a 10 de março de 2006 em São Paulo; depois discuteos três estágios de reformas no âmbito da gestão de re-cursos humanos pelos quais, invariavelmente, passam asorganizações públicas e, por fim, apresenta possíveismedidas para o futuro visando ao alcance dos estágiosmais avançados de reforma,nos quais a contribuição daspolíticas de recursos humanos para a melhoria do resul-tado das organizações é muito significativo.

1. As experiências dos estados

Durante o seminário do Consad, foram apresenta-

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das as atuais experiências na área de recursos humanosno Distrito Federal e em cinco estados: Alagoas, Bahia,Minas Gerais, Piauí e Rio Grande do Norte. Adicional-mente, serão comentadas também as experiências rele-vantes indicadas por outros nove estados, quais sejam,Goiás, Mato Grosso, Paraíba, Paraná, Pernambuco, San-ta Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins. A seguir, sãorelatadas e avaliadas suas principais características(commaior ênfase para os estados que participaram da apre-sentação, o que possibilita uma descrição mais detalha-da), e a análise dos avanços se norteará pelos objetivosmais gerais de uma política de recursos humanos, quaissejam, oalcance do perfil e do quantitativo desejado paraa força de trabalho e a sua atuação de forma motivada eeficiente, de modo a contribuir para os resultados dese-jados pela organização e para o atendimento satisfatórioaos cidadãos.

1.1. A experiência de Alagoas

A área de recursos humanos teria sido muito negli-genciada pelos governos anteriores doestado de Alagoas,sendo suas atividades centradas na produção da folha;não havia uma gestão consistente de recursos humanosquando o atual governo assumiu. O estado passava poruma séria crise fiscal e os salários estavam atrasadosem oito meses. Somente 20% dos servidores eram capa-citados a cada ano.

Com a posse do atual governo, foi necessário fazerum ajuste nas contas públicas e, portanto, a primeira faseda reestruturação da gestão de recursos humanos envol-veu, como de costume e necessário, a redução das des-pesas e o seu maior controle. Primeiramente, a unidadeque trata desse tema assumiu maior relevância na estru-tura organizacional, situando-se apenas um nível hierár-

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quico abaixo do secretário, e depois adotou diversasmedidas, tais como a implantação de um sistema únicode gestão da folha, o aumento dos controles sobre asdespesas e o número de servidores; a disponibilizaçãode um maior volume de informações sobre seu quadro depessoal e os gastos; a realização de um censo geral deservidores; a instituição do subsídio para diversas carrei-ras; a revisão do regime jurídico; a instituição do códigode ética do servidor e o sistema de sorteio para audito-rias de folhas de pagamento.

Essa fase de ajuste está sendo muito bem sucedida,o que representa um mérito muito relevante. E tudo issoocorreu em um cenário no qual aumentou o número deservidores e os salários voltaram a ser pagos na datacorreta.

Também foram adotadas importantes medidas paraatribuir um caráter estratégico à administração de recur-sos humanos no estado, entre as quais se destaca a cria-ção da carreira dos gestores. Esta última é fundamentalpara aumentar a capacidade gerencial do Estado, poissão servidores de carreira (logo, não necessariamentecomissionados) cujo perfil é direcionado à formulação,implementação e avaliação de políticas públicas e à ges-tão das diversas atividades inerentes a uma organiza-ção pública. Adicionalmente, foi criada a escola de go-verno, fortalecida a gestão dos concursos e estruturadaa avaliação de desempenho. Para o futuro, desejam me-lhorar a qualificação técnica do grupo que trabalha naárea de recursos humanos, o que também constitui me-dida acertada.

1.2. A experiência da Bahia

A gestão de recursos humanos no governo do esta-

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do da Bahia se encontra em uma fase de aprimoramentode seus instrumentos estratégicos e tem se destacado porimplementar medidas com tais características. As carrei-ras são estruturadas a partir da gestão por competências,isto é, as regras de progressão estão associadas à aqui-sição de competências, o que constitui uma inovaçãoimportante na gestão pública. O critério para a promo-ção é a certificação ocupacional, que corresponde a uma“ISO 9000” para os servidores; a remuneração inclui com-ponentes fixos - vencimento básico e gratificações - e umvariável, que corresponde a um prêmio por resultados,vinculado ao cumprimento de metas previstas no plane-jamento institucional.

O planejamento e o orçamento de recursos huma-nos são estruturados em conformidade com a finalidadee a estratégia da organização, e o dimensionamento doquadro de pessoal foi feito de acordo com as atividadese os processos de trabalho realizados nas secretarias.Ressalta-se que essas duas medidas são fundamentaispara tornar a gestão de recursos humanos estratégica,isto é, para associá-la aos objetivos gerais da organiza-ção e voltá-la para o seu alcance. O recrutamento temsido organizado com base nesse planejamento da forçade trabalho, e para viabilizar um sistema de gestão porcompetências está sendo criada uma universidadecorporativa. Existe também um sistema de informaçõesgerenciais de recursos humanos já estruturado.

A lógica de todo o sistema de gestão de recursoshumanos é consistente, baseada em aspectos gerenciais,possui visão estratégica e se aproxima muito das carac-terísticas vigentes no setor privado, o que é bastante sau-dável. É uma experiência que deve ser disseminada, e,mantidas as peculiaridades de cada governo, vários as-pectos podem ser adaptados e aproveitados.

Foram apresentados alguns desafios para o futuro,

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que aliás são comuns à gestão de recursos humanos emtodos os órgãos públicos: um elevado contingente de ser-vidores que somente poderá se ajustar ao dimensiona-mento necessário no longo prazo; limitações legais, fi-nanceiras e culturais para implementar mudanças quepossibilitem o aprofundamento da gestão estratégica egerencial de recursos humanos; a necessidade de apri-morar e consolidar as informações cadastrais. De todaforma, o governo do estado da Bahia já se encontra emum estágio mais avançado das reformas nessa área e,por isso, sua experiência deve ser utilizada como umexemplo para outros governos.

1.3. A experiência do Distrito Federal

O governo do DF também implementou uma sériede mudanças importantes na gestão de seus recursoshumanos.

Inicialmente, do ponto de vista das despesas, foiunificada a folha de pagamento para todos os órgãos, oque é fundamental parao controleapropriado dos gastos.

Sob o prisma gerencial, também foi adotada umasérie de medidas relevantes. Foram criadas carreiras comatribuições amplas e cargos multifuncionais, o que au-menta a mobilidade dos servidores e propicia novas opor-tunidades de capacitação e de atividades a serem de-sempenhadas. Foram realinhados os salários das diver-sas carreiras, o que também contribui para aumentar amobilidade e equalizar os salários relativos (isto é, ade-quar o seu patamar a critérios como atribuições, respon-sabilidades, desempenho e competências adquiridas). Acomposição remuneratória foi simplificada, e com issotorna-se mais fácil a gestão da estrutura e hierarquia sa-larial, dada a maior transparência. Os níveis remune-ratórios foram recompostos.

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Foi criada uma gratificação de titulação, a qual écompatível com uma estratégia que visa a fortalecer acapacitação como um importante instrumento de ges-tão de recursos humanos. Também foi estabelecido umfundo para o programa de capacitação, fato que elimi-na o caráter residual e eventual dos recursos destina-dos a esta atividade; tal programa está subdividido emtemas escolhidos como prioritários, o que parece serbastante razoável.

Uma outra medida adotada que foi fundamental enão foi observada nas demais experiências apresenta-das, e, ao que tudo indica, também não vem sendo utili-zada em outros governos, é a criação do emprego públi-co, neste caso, destinado aos Agentes Comunitários deSaúde. Essa modalidade de regime de trabalho, por sermais flexível que o estatutário, possibilita a contrataçãopor prazo determinado para o desenvolvimento de fun-ções que são eventuais, temporais ou sazonais, de formaa solucionar o problema gerado pela incompatibilidadeentre a estabilidade e as oscilações na demanda por ser-viços públicos que ocorre em algumas áreas. O caso doagente comunitário é típico; a demanda por serviços pú-blicos se altera à medida que surgem focos de doença eepidemias, e, por ser muito variável, é fundamental queexista um mecanismo que permita a contratação de ser-vidores apenas durante o período de maior procura. Oregime estatutário não abre essa possibilidade, apenasem situações emergenciais; assim, o emprego públicoserá muito útil para essa situação e, entre as experiên-cias apresentadas, apenas o governo do Distrito Federalo está adotando.

1.4. A experiência de Minas Gerais

O governo do estado de Minas Gerais também imple-

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mentou uma série de medidas que mudaram substan-cialmente a gestão de recursos humanos, vinculando for-temente os seus incentivos ao desempenho dos servido-res e reorganizando as carreiras e a estrutura salarial.

Foram reformuladas todas as carreiras da adminis-tração pública, por meio da agregação de diversas de-las, tornando as suas atribuições mais amplas, e da alte-ração das regras de progressão e promoção, vinculan-do-as ao desempenho e à formação (as carreiras passa-ram a possuir diversos níveis de escolaridade); em algunscasos, é também possível o ingresso em níveis distintosda carreira, de acordo com a escolaridade do servidor, e,ao mesmo tempo, a progressão desde os níveis iniciaisaté os finais (é um mecanismo de entrada “lateral” asso-ciado ao da promoção).

A estrutura remuneratória também foi simplificada,por meio da agregação e redução do número de parce-las que a compõem; diversas tabelas salariais foramunificadas, de forma a tornar a gestão salarial mais ra-cional e transparente; o adicional por tempo de serviçofoi substituído para os futuros servidores, e aqueles queassim optarem, por uma gratificação associada ao de-sempenho; foi criado um bônus de desempenho institu-cional vinculado à economia de despesas ou aumentode receitas.

O processo de avaliação de desempenho individual,importante para definir tanto o grupo de funcionários aser promovido como o pagamento da gratificação e dobônus citado acima, foi desenvolvido e aplicado à gran-de maioria dos servidores do estado de Minas. Essa éuma iniciativa muito relevante e que está passando porum processo de aprimoramento em sua segunda rodadade aplicação.

Assim, a gestão de recursos humanos deixou de se

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pautar por mecanismos que privilegiavam a progressãoe as melhorias salariais associadas ao tempo de serviço,logo praticamente automáticos, e passou a se vincular ainstrumentos que incentivem o desempenho. Essa mudan-ça, do ponto de vista estratégico, é fundamental.

Foi estabelecida umapolítica de desenvolvimento dosservidores, na qual são estabelecidas as diretrizes e prio-ridades do estado na área de capacitação, bem comoespecifica uma fonte estável de recursos para financiaros programas de treinamento. Tal política constitui uminstrumento fundamental para tornar consistente a ava-liação de desempenho (é preciso treinar para avaliar eutilizar a avaliação, em um segundo momento, como umimportante insumo para a capacitação).

A fim de aprimorar a política, estão sendo desenvol-vidos projetos piloto de alinhamento das metas estratégi-cas e das incluídas na avaliação de desempenho, de pla-nejamentoda força de trabalho, que visa a definir o quan-titativo e o perfil desejado de servidores, dadas as fun-ções desempenhadas pelo estado, e de certificaçãoocupacional de servidores, que visa a definir a qualifica-ção necessária para ocupar determinados cargos e ava-liar se os servidores as possuem. Portanto, pode-se afir-mar que a gestão de recursos humanos está inovandoconsideravelmente no governo de Minas Gerais e cami-nhando para um direcionamento estratégico bastanteadequado, objetivo este que vem sendo perseguido pe-los seus gestores, e sua experiência também deve ser umareferência para os demais estados.

1.5. A experiência do Piauí

O governo do estado do Piauí está combinando al-gumas medidas de ajuste na área de recursos humanos

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com outras que visam a definir uma política para o tema.O atual governo reduziu em 50% o número de secretarias(não está claro se também reduziu o número de servido-res); foram criados novos controles sobre a folha de pa-gamento, e as consignações foram restringidas.

Foi definida uma carreira única para todos os servi-dores que desempenham as funções não caracterizadascomo típicas de Estado (em geral, são aquelas relacio-nadas às atividades de apoio administrativo e logístico).Ainda que o nível de agregação possa ter sido demasia-do (tal afirmação é um tanto quanto arbitrária, pois nãofoi apresentado o detalhamento do projeto), essa medi-da é salutar, pois possibilita, conforme já citado, uma fle-xibilidade e mobilidade muito maior para os servidores,e, além disso, a padronização da estrutura e das regrasde progressão da carreira facilita muito a sua gestão econtribui para reduzir os conflitos entre os ocupantes dosdiversos cargos.

Uma outra medida fundamental que foi adotada, eque aliás seria interessante que se disseminasse pelosestados que ainda não o fizeram, foi a criação de umaescola de governo, ou de uma universidade corporativa,como costuma ser denominada atualmente. Qualquergoverno que queira implementar uma boa gestão de re-cursos humanos deve priorizar a capacitação de seusservidores, e, para tal, uma escola de governo é um ins-trumento muito importante.

1.6. A experiência do Rio Grande do Norte

A apresentação da política de recursos humanos dogoverno do Rio Grande do Norte incluiu um destaquemarcante ao seu programa de qualidade de vida e saú-de no trabalho. Ainda que o tópico ressaltado seja muito

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distinto daquele que foi relatado pelos demais estados,não deixa de ser interessante - e talvez por isso mesmo oseja - avaliar uma experiência sobre um assunto tão im-portante que os estados ainda estão relegando a um se-gundo plano.

Para desenhar esse programa de qualidade de vida,foi definido um plano de ação que se iniciou na própriaSecretaria de Administração com uma pesquisa na quala maioria dos servidores (49%) indicou a realização pes-soal nas atividades profissionais como a sua maior moti-vação para o trabalho; em relação à qualidade de vida,os servidores priorizaram, em suas respostas, primeira-mente o ambiente físico e o bom relacionamento paradepois citar a questão salarial. O resultado da pesquisaé muito interessante e deveria ser considerado por todosos gestores de recursos humanos no setor público ou, ain-da melhor, dada a singularidade das respostas, seria in-teressante que todos se preocupassem em realizar pes-quisa semelhante.

Com base nas respostas da pesquisa, os gestoresda política de recursos humanos adotaram uma série demedidas, como a revisão médica laboral periódica, a rea-lização de eventos de convivência, palestras educacio-nais, a criação de espaços para prática de esportes e deum coral. A Secretaria de Administração pretende elabo-rar um plano de saúde no trabalho, um curso de qualida-de de vida e disseminar essa experiência para as demaissecretarias.

O programa parece estar sendo muito bem aceitopelos servidores, que se encontram satisfeitos, e certa-mente deve ser mais bem avaliado pelos demais gover-nos estaduais, pois a adoção de iniciativas semelhantespode constituir um forte incentivo e resultar em melhoriada qualidade de vida para os servidores.

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1.7. As experiências importantes relatadas pelosdemais estados

Apesar de não participarem da apresentação no se-minário, outros estados indicaram experiências na áreaque também serão comentadas neste trabalho. Porém, orelato será mais sucinto, pois, pelo fato de não terem in-tegrado o painel das apresentações, o volume de infor-mações disponíveis é menor. Serão destacadas aquelasexperiências consideradas por este autor como as maisrelevantes entre as apontadas pelos gestores de recursoshumanos de cada estado.

O governo do estado de Goiás desenvolveu umauniversidade corporativa. A iniciativa é importante por-que possibilita a definição de cursos que estejam alinha-dos às necessidades de capacitação do conjunto de ser-vidores, as quais, por seu turno, devem ser definidas apartir do planejamento estratégico do governo estadual.Por conseqüência, a estratégia de desenvolvimento dosservidores fica atrelada aoobjetivo de alcançar o seu perfildesejado, compatível com a missão e metas da organiza-ção. É uma iniciativa muito importante.

No Mato Grosso, está sendo unificada, em etapas, aestrutura de todas as carreiras (no tocante a interstício,númerode classes, critériospara progressão entre asclas-ses e percentual de acréscimo salarial entre as classes eníveis). Essa medida é fundamental para reduzir o enges-samento das carreiras, ampliar a mobilidade dos servi-dores entre as áreas, eliminar diferenças indesejáveisentre as regras de desenvolvimento do servidor (por cons-tituírem incentivos, tais regras não devem ser distintas) efacilitar a gestão das carreiras por parte das unidadesde recursos humanos.

Na Paraíba, foram aprimorados os controles sobre a

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folha de pagamento, inclusive com a introdução de novosistema informatizado, implicando redução das despe-sas. A definição dos programas de treinamento passou aconsiderar as competências requeridas para o exercíciode um cargo e foi criado um banco de talentos. Assim, aomesmo tempo em que o governo se preocupou em reduziras despesas, também atentou para a necessidade decriar instrumentos que possibilitem o desenvolvimento pro-fissional dos servidores.

No Paraná, foi criado um sistema de informaçõesgerenciais com base na interface dos diversos sistemasexistentes de recursos humanos e um Boletim Mensal dasInformações de RH. A iniciativa é importante, pois foi ado-tada com base nos dispersos recursos existentes, e o pro-cesso decisório foi, possivelmente, aprimorado em fun-ção da maior disponibilidade de informações. Foi criadauma escola de governo, a exemplo de outros estados, am-pliada a rede de assistência à saúde - que é um incentivoimportante para os servidores - e há um Fundo de Previ-dência estruturado sob o regime de capitalização. Doponto de vista fiscal, esta última é talvez a medida maisimportante para os governos estaduais e necessita serplanejada e adotada urgentemente por aqueles que ain-da não o fizeram.

Em Pernambuco, foi concebida a carreira dosgestores públicos, a qual se faz fundamental para osurgimento de um quadro de servidores estável com com-petências administrativas e gerenciais e para eliminar aprática, bastante comum nas organizações públicas, dacriação de cargos em comissão para possibilitar o recru-tamento de pessoas com esse perfil. Assim, essa carreiraé muito importante para a consolidaçãoda reformageren-cial. Foi também criada e consolidada a Escola de Go-verno, cuja ênfase está voltada para a disseminação dos

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conceitos da administração pública gerencial. Foramreintroduzidos mecanismos de avaliação de desempenhoe definidas as atividades exclusivas e não-exclusivas deEstado, o que também constitui ponto de partida para oestabelecimento de regimes de trabalho diferenciados eadequados às características de cada atividade.

O governo do estado de Santa Catarina está desen-volvendo um sistema de gestão de recursos humanosmuito interessante, pois, mais que uma ferramenta decontrole cadastral e da folha de pagamento, seus módulosestão estruturados de modo a ofertar diversos instrumen-tos de gerenciamento do desenvolvimento profissional doservidor, o que não é usual na administração pública, taiscomo análise de perfil e avaliações de competências,gerenciamento de carreiras, planos de sucessão, plane-jamento e alocação de pessoal, desenvolvimento decapacitação eavaliação dos treinamentos.Adicionalmen-te, o governo catarinense também instituiu uma políticade capacitação e criou um plano de saúde para os servi-dores, de forma que ambos constituem importantes in-centivos de uma política de recursos humanos.

O governo do estado de São Paulo desenvolveu umaestratégia bastante massiva e bem sucedida de desen-volvimento de seu quadro de servidores. Foram capacita-dos durante 2004 e 2005 aproximadamente 60 mil servi-dores, em cursos voltados para a qualidade do atendi-mento, ao aprendizado da legislação de pessoal, à for-mação de pregoeiros, à gestão de contratos e por meiodos Programas de Desenvolvimento Gerencial e Avança-do em Gestão Pública Contemporânea e do Semináriode Gestão de Pessoas, entre outros eventos. Buscou-se,com essa estratégia, capacitar os grupos de servidoresentre os quais foram identificadas carências relevantesde treinamento e os gerentes, dado que a formação des-

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tes últimos é fundamental para a melhoria da gestão pú-blica, mesmo porque eles exercem uma forte influênciamultiplicadora sobre os demais funcionários das organi-zações.

No âmbito de uma estratégia de planejamento daforça de trabalho, adotou-secomo diretriz o fortalecimentodo chamado núcleo estratégico, composto pelas carrei-ras que desempenham as ações mais essenciais e ca-racterísticas de Estado. Dessa forma, as decisões relati-vas às políticas e ações de RH vêm se pautando por essadiretriz. Nesse sentido, a retomada do desenvolvimento eaprimoramentoda carreira dos executivos públicos (equi-valentes aos gestores públicos em outros estados) consti-tuiu ação muito importante, dado seu impacto sobre aqualidade da gestão das organizações públicas, confor-me já discutido anteriormente.

A fim de subsidiar o processo decisório, duas impor-tantes medidas foram adotadas, quais sejam, a criaçãodo Observatório do Emprego Público, que possui a atri-buição de identificar e acompanhar tendências, desen-volver pesquisas e elaborar cenários e perspectivas so-bre aspectos relativos à gestão de recursos humanos, bemcomo realizar estudos de benchmark como, por exemplo,para o dimensionamento adequado do quadro de servi-dores, e a elaboração do Boletim Estatístico, que traz in-formações importantes sobre o perfil do quadro de servi-dores e a evolução das despesas, o que constitui umaimportante ferramenta para o processo decisório na área.

Adicionalmente, também há uma publicação sobreo perfil da estrutura da administração pública paulistaque constitui um importante documento de consulta paraa elaboração de políticas na área. A Revista Sp.Govainda traz uma série de artigos sobre o tema da gestãopública, tornando-se fonte de disseminação de informa-

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ções para além do âmbito da administração públicapaulista.

Em relação à gestão operacional, foi desenvolvidauma abrangente auditoria de folha de pagamento, e osprocessos de trabalho na área de recursos humanos vêmsendo simplificados. Atualmente está sendo revista e con-solidada a legislação, o que é um iniciativa fundamentalpara o próprio processo decisório, bem como estão sen-do elaborados manuais de procedimentos e formuláriosde utilização.

O governo de Sergipe adotou uma importante inicia-tiva para flexibilizar as formas de regime e contrato detrabalho ao regulamentar o regime de emprego no esta-do. Esta é uma das principais medidas que a administra-ção pública dos diversos níveis de governo no Brasil pos-sui à sua disposição, bastando regulamentá-la para, porexemplo, possibilitar a contratação de pessoas por prazodeterminado quando assim se fizer necessário. Existemdiversas situações que demandam esse tipo de regimede trabalho, as quais dependem das características de-senvolvidas no âmbito de cada governo. A existência deum único regime, característica comum a diversos entesda Federação, enrijece gravemente a gestão de recursoshumanos. As primeiras vagas para emprego público emSergipe foram criadas para os cargos de médico regula-dor, enfermeiro, auxiliar de enfermagem, telefonista econdutor de veículo de urgência.

Foi também estabelecida a rede de gestores de re-cursos humanos de Sergipe, que visa a articulação e in-tercâmbio de experiências, conhecimentos e soluçõesentre os gestores de recursos humanos da administraçãopública estadual. É uma iniciativa simples, que envolveum custo reduzido, mas possui um impacto muito signifi-cativo na gestão da área. A exemplo de outros estados,

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foi também criada a Escola de Administração Pública eGestão Governamental.

Em Tocantins, foi instituído o Fundo de Moderniza-ção da Gestão Pública para financiar projetos direcio-nados à modernização da gestão pública e à valoriza-ção dos servidores públicos. Suas receitas são oriundasdos custos operacionais referentes às consignações emfolha de pagamento repassados pelas entidades conve-niadas com o estado. Essa é uma iniciativa interessante,pois aloca recursos oriundos de uma atividade bastanteoperacional e trabalhosa no desenvolvimento dos servi-dores, destinando dessa forma tais receitas a uma ativi-dademuito relevante. Foramtambém criadas diversascar-reiras das áreas meio e finalísticas, foi implementada aavaliação de desempenho individual e reestruturada aunidade que gera os cursos de capacitação, bem como foiimplementado um programa de educação a distância.

Conformepode se depreender das experiências ana-lisadas, existe uma extensa série de iniciativas bastanterelevantes, em alguns casos muito criativas e implemen-tadas a baixo custo nos estados. Tais ações estão contri-buindo para a melhoria da gestão de recursos humanosnesses entes da Federação e, ainda que sejam necessá-rios muitos avanços, como discutiremos mais adiante, osgovernos estaduais são aqueles que, entre os três níveisde governo, estão realizando as mais significativas refor-mas da gestão de recursos humanos no setor público.

2. Os estágios de uma reforma da gestãode recursos humanos

Conforme pode ser observado, os estados estão emestágios distintos em relação à gestão das políticas derecursos humanos, mas todos os casos apresentados in-

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dicam melhorias e avanços, isto é, todos os governos es-tão se esforçando para aprimorar uma área que foi negli-genciada por muitos anos e é fundamental para o suces-so da gestão pública.

Os estados apresentam características institucionaise culturais distintas, bem como a gestão de seus gover-nos, fato que leva estes últimos a se situarem em diferen-tes estágios no processo de avanço rumo à moderniza-ção. Na verdade, esse processo realmente ocorre me-diante algumas etapas; começa pelo ajuste, que é segui-do pela implementação de políticas mais consistentes masdesarticuladas; por fim, estas últimas se tornam integra-das aos objetivos estratégicos da organização.

A implantação de todo esse ciclo é lenta porque en-volve uma série de decisões políticas e mudanças insti-tucionais que encontram grande resistência por feriremuma série de interesses. Assim, é natural que os estágiosde reforma pelos quais os estados estejam passando se-jam distintos, mas seguem em geral a seqüência descritaa seguir, e é importante que os governos visualizem apossibilidade de atingir as últimas etapas, que corres-pondem àquelas em que a gestão de recursos humanospassa a contribuir primordialmente para o alcance dosresultados desejados pela organização.

A seguir serão discutidos e analisados esses distin-tos estágios das reformas, destacando as medidas maisimportantes apresentadas no seminário, e sugeridos, combase nos estágios descritos abaixo, os próximos passosdas reformas que deveriam ser implementadas pelo se-tor público estadual.

No primeiro estágio, a ordem é realmente “arrumar acasa”, isto é, eliminar os descontroles e distorções preexis-tentes, reduziras despesas, estabelecer uma série de con-troles. Nessa fase, todos os governos se preocupam, em

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geral, em centralizar a folha de pagamento e o cadastrode servidores, estabelecer rígidos controles sobre o lan-çamento de despesas salariais e a ocupação de vagas,restringir os aumentos salariais, realizar auditorias defolha, enfim, uma série de medidas que possibilitem reto-mar de fato a gestão das despesas com pessoal e frear asua evolução, pois, em geral, quando uma situação dedescontrole está caracterizada, as despesas se encon-tram evoluindo significativamente, criandouma forte pres-são sobre as contas públicas.

Nesse estágio, é fundamental que também seja de-senvolvido um sistema de informações gerenciais parasubsidiar adequadamente o processo decisório na áreade recursos humanos.

Assim, em um primeiro momento, as atenções estãovoltadas para a retomada do controle da gestão de re-cursos humanos, antes de torná-la consistente ou buscaraprimorá-la.

No segundo estágio das reformas, à medida que ascontas começam a se equilibrar e os controles são recom-postos, os governos começam a desenhar medidas volta-das ao estabelecimento de uma política de recursos hu-manos mais consistente. A gestão começa a direcionarsua atenção para questões como o recrutamento e a es-trutura de incentivos para o servidor, isto é, para as car-reiras, a remuneração, a capacitação e a avaliação dedesempenho.

Dessa forma, o governo passa a planejar de formamais adequada os seus concursos, direcionando as con-tratações para as áreas que realmente se encontram comum quadro de pessoal insuficiente; os gestores se preo-cupam em criar carreiras com atribuições mais amplas,que flexibilizem a movimentação de servidores, possibi-litem a eles desempenhar uma gama maior de atribui-

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ções e substituam regras de promoção automáticas, as-sociadas à antigüidade, por outrasassociadas aodesem-penho e/ou à capacitação (seja formação escolar ou aqui-sição de habilidades intrínsecas ao trabalho), isto é, osdirigentes visam ao desenho de carreiras que possuamuma estrutura que incentive o servidor a se aprimorar eatingir o seu final em um prazo não muito distante de suaaposentadoria.

A estrutura de remunerações é, em geral, simpli-ficada, isto é, o número de parcelas remuneratórias é re-duzido, a fim de tornar mais transparentes os valores desalário efetivamente pagos,tanto para a sociedade comopara os próprios gestores de recursos humanos; busca-se corrigir as distorções observadas na hierarquia sala-rial (cuja consistência interna está baseada em uma es-cala que segue as atribuições, responsabilidades, com-petências e desempenho e a externa, as remuneraçõespraticadas no mercado de trabalho, seja público ou pri-vado); são criados mecanismos de remuneração variá-vel a fim de premiar o desempenho. Enfim, busca-se or-ganizar a hierarquia salarial para que a remuneração setorne efetivamente um incentivo para os servidores e nãoum desestímulo(que ocorre se houver um grande desequi-líbrio em tal hierarquia) que implique um gasto que nãogera retorno substancial para a sociedade.

Em relação à capacitação, os gestores da política derecursos humanos procuram definir uma estratégia queseja condizente com as demandas e necessidades daorganização e de qualificação para os integrantes decada carreira e para os servidores do ponto de vista indi-vidual (neste último caso, o vínculo com a avaliação dedesempenho é fundamental). Freqüentemente é criadauma escola de governo, hoje intitulada universidadecorporativa, que implemente tal estratégia. Com essasmedidas, as ações de capacitação assumem maior re-

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levância, e o seu caráter eventual, esporádico, e desvin-culado de qualquer planejamento é eliminado.

Por seu turno, no tocante à avaliação de desempe-nho, existe uma grande discussão sobre o modelo maiseficiente e que gera melhores resultados. Enquanto al-guns apregoam a necessidade de avaliar o desempenhoindividual, outros defendem a tese de que um modelo queconcentre a avaliação em metas institucionais ou de gru-pos tende a ser mais eficaz por eliminar o caráterpersonalista da avaliação e possibilitar a cobrança deresultados vinculados às metas da organização. Entre-tanto, sua adoção requer arealização de um planejamen-to e um alinhamento estratégico, com a definição de me-tas para toda a organização e um alinhamento estratégi-co amplo, desde as mais gerais até o seu desdobramen-to para as áreas, equipes e servidores. Assim, este últimomodelo parece ser mais adequado, porém sua implemen-tação também é mais difícil.

Os governos têm entendido, em geral, que a avalia-ção de desempenho é um instrumento muito importante,mas, dadas as questões apresentadas, tendem a ser cau-telosos no momento da escolha de um modelo específi-co. Por conseqüência, há diferentes estágios de imple-mentação de modelos de avaliação de desempenho nosestados. Alguns estão bastante avançados, outros menose alguns adotam modelos para apenas algumas carrei-ras ou áreas específicas, sendo tais modelos, em algunscasos, baseados na avaliação de desempenho individuale outros na institucional. Essa característica não é obser-vada apenas no Brasil, pois no âmbito da própria Orga-nização para a Cooperação e Desenvolvimento Econô-mico (OCDE) há muita controvérsia sobre o tema e seusresultados, apesar de sempre ser reconhecida a sua rele-vância.

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É fundamental que esses modelos de avaliação dedesempenho sejam um insumo para a definição de açõesde capacitação e que, posteriormente, tais ações sejamutilizadas também como um insumo para a própria ava-liação de desempenho, e ambas sejam utilizadas comocritérios para progressão. A adoção dessa sistemáticaconstitui um importante embrião para um modelo de ges-tão de recursos humanos baseado nas competências, istoé, que vincule os incentivos à aquisição de conhecimen-tos, habilidades e atitudes, o que têm se mostrado umaboa prática na gestão de recursos humanos, pois a corre-lação entre qualificação e desempenho é muito estreita.

Dessa forma, esses são os principais componentesdo segundo estágio das reformas na área de recursoshumanos.Apesar de adotaremmedidas distintas, a maio-ria dos estados se encontra nessa etapa. É um estágio jáavançado e que demonstra a disposição e a preocupa-ção com a melhoria da gestão de recursos humanos, po-rém muitas vezes as medidas adotadas são isoladas edesvinculadas dos objetivos organizacionais. O terceiroestágio, mais avançado, ainda não está difundido, masalguns estados já adotam medidas que visam ao seu al-cance, mostrando já terem se conscientizado de sua ne-cessidade.

Nesse terceiro estágio, há uma grande preocupaçãoem alinhar a política de recursos humanos com os objeti-vos da organização, de modo a torná-la mais estratégi-ca. Na verdade, o desenho da política estaria todo volta-do para o alcance do perfil e do quantitativo de servido-res necessário e para estimulá-los a desenvolver suasatividades de forma eficiente, de forma a garantir oalcance dos resultados desejados pela organização.

A definição das metas da organização antecede aescolha dos objetivos da política de recursos humanos e

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os instrumentos adotados (muitos deles jáimplementadosno segundo estágio das reformas) voltam-se para o al-cance das primeiras. Nessa etapa, a política de recursoshumanos encontra-se totalmente articulada com as de-mais áreas da organização e assume um papel que nun-ca deveria ser relevado, qual seja, o de contribuir decisi-vamente para o alcance dos resultados desejados pelaorganização.

Além dos instrumentos tradicionais já citados naanálisesobre o segundo estágio dasreformas, outros tam-bém assumem importância por possuíremum caráter maisestratégico. São eles o planejamento da força de traba-lho, que possibilita definir o quantitativo e o perfil deseja-do de servidores de acordo com as necessidades e obje-tivos das organizações; a definição de um modelo degestão que possibilite articular todos os instrumentos dapolítica de recursos humanos, geralmente baseado naaquisição de competências e na avaliação de desempe-nho; e a constante avaliação dos resultados alcançadospela política.

O alcance desse estágio da política de recursos hu-manos deve ser o objetivo de médio prazo de toda a ges-tão nesta área, e, portanto, seria interessante que os go-vernos direcionassem suas ações, mesmo as atuais, paraesse sentido estratégico.

3. Os estágios das reformas nos estados

A partir das apresentações das unidades de recur-sos humanos dos estados e da discussão na seção ante-rior podemos destacar as ex periências que têm contri-buído para o avanço desse tema, as quais se enquadramem estágios distintos das respectivas reformas. Entre elas,podemos destacar:

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a) os ajustes na folha de pagamento e a parame-trização das rotinas de cálculo, visando a eliminar distor-ções e pagamentos indevidos;

b) a centralização do processamento da folha depagamento e do controle sobre as operações cadastrais,visando a reduzir a possibilidade de ocorrerem irregula-ridades e erros;

c) a criação da carreira de gestor, que é muito impor-tante para viabilizar a constituição de um corpo de admi-nistradores bastante capacitados para implementar aspolíticas públicas e também atuar na gestão das diver-sas áreas das organizações públicas;

d) a reestruturação das carreiras em geral, buscan-do sua agregação, simplificação e alterações na estrutu-ra, e regras de progressão que privilegiem o desempe-nho, a capacitação e a ampliação das atribuições dosservidores;

e) a reorganização da estrutura remuneratória,visan-do a objetivos muito parecidos com os definidos para areestruturação das carreiras e, adicionalmente, o equilí-brio da hierarquia salarial de forma a resgatar o caráterde incentivo dos salários;

f) o desenvolvimento de políticas de capacitação, demodo a eliminar o caráter eventual e esporádico (e, adi-cionalmente, desvinculado dos objetivos estratégicos dasorganizações) de tais ações; em alguns casos, os gran-des grupos de temas de capacitação estão claramentedefinidos;

g) a criação ou fortalecimento das escolas de gover-no, fato que contribui para implantar e aprimorar a políti-ca de capacitação;

h) a criação de mecanismos de remuneração variá-vel, que reforçam os incentivos vinculados ao desempe-

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nho e ao alcance de metas (individuais e institucionais) ereduzem o caráter automático das melhorias salariais;

i) a criação de mecanismos de avaliação de desem-penho, que podem tanto estar vinculados à remuneraçãocomo à progressão; há experiências que vinculam esseprocesso aos resultados individuais e outras aos organi-zacionais, mas todos reconhecem a sua importância, in-dependentemente do modelo adotado;

j) a implantação de modelos de certificação de com-petências ocupacionais, que são muito importantes paraestimular o servidor a se capacitar, pois via de regra re-sultam em algum benefício para ele (por exemplo, casoas nomeações para alguns cargos em comissão exijam aprévia certificação);

k) o planejamento da força de trabalho, apesar deainda incipiente, já começou a ser implementado, e suaadoção deve ser amplamente estimulada, pois constituiinstrumento mais importante para estabelecer o vínculoentre a gestão estratégica da organização e a de recur-sos humanos;

l) a criação de modelos alternativos de contratação,como o emprego público, que permitem flexibilizar o con-trato de trabalho e adequar o quadro de servidores àsnecessidades esporádicas e sazonais em virtude das os-cilações da demanda por serviços públicos e datemporalidade de algumas atividades desenvolvidas noâmbito do estado;

m) o desenvolvimento de programas de qualidadede vida que possibilitam ao servidor sentir-se mais satis-feito e estimulado no ambiente de trabalho e demons-tram que o salário não é o único incentivo, em relaçãoaos servidores, do qual dispõe a empresa.

Os avanços são significativos, mas por outro lado

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também se observa que ainda há muito a fazer. Logo, éimportante que os estados continuem avançando, pois jáobtiveram muitos êxitos e possuem condições para pro-duzir outros maiores. Segueuma relação de medidas quepodem se consubstanciar nos próximos passos a seremadotados pelos gestores de recursos humanos dos esta-dos e que, certamente, contribuiriam para o sucesso dasorganizações e governos em que atuam.

4. Próximos passos para as reformas da gestão derecursos humanos nos estados

A fim de alcançar os estágios mais avançados dareforma da gestão de recursos humanos, sugere-se queos estados concentrem seus esforços nos seguintes as-pectos compreendidos como relevantes e que, ao mesmotempo, são aqueles em que os avanços precisam sermaiores e há possibilidade para tal:

a) a adoção de um maior alinhamento estratégicoentre os objetivos organizacionais e da área de recursoshumanos; ainda são poucas as experiências que retra-tam um desenho sistêmico e articulado de medidas nes-sa área que estejam vinculadas aos objetivos da organi-zação. As seguintes perguntas devem ser formuladas eas políticas devem ser orientadas para o alcance das res-postas a essas questões: Qual é o perfil de funcionáriosque queremos e precisamos? Em que quantidade? Quaisserão os passos necessários para alcançar esse perfil?Como eles serão estimulados a apresentar bom desem-penho e como serão cobrados? Como avaliaremos se aspolíticas e instrumentos que escolhemos estão atingindoos resultados desejados? A definição das respostas e suaposterior implementação praticamente garantem o suces-so da política de recursos humanos em suaintegralidade;

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b) o ponto de partida para a definição das diretrizesda política e dos instrumentos a serem adotados deve sero planejamento da força de trabalho, pois esse já definegrande partedas respostas às perguntas expostas noitemanterior, as quais devem orientar a concepção da açãona área de recursos humanos;

c) a definição de uma política de concursos que pos-sibilite o ingresso constante e planejado de novos servi-dores na administração pública, incluindo a publicaçãode um cronograma com o número de vagas ofertadas acada ano por cargo. Essa política permite a renovaçãode quadros, possibilita às pessoas planejarem a sua par-ticipação em concursos, tornando essa prática comum ereconhecida pela sociedade e estimulando as pessoas aingressar no serviço público, bem como inibe a formaçãode grupos herméticos de servidores. É uma das medidasmais simples entre as que necessitam ser adotadas, poisgera resultados muito satisfatórios em relação ao alcan-ce do perfil desejado para os servidores e, por isso, é al-tamente recomendada;

d) a criação de mecanismos para flexibilizar os regi-mes de trabalho: os problemas hoje enfrentados em rela-ção às regras de contratação, como termos de ajuste deconduta, contratação de temporários por prazo superiorao razoável e excesso de terceirizados, vêm ocorrendoporque não há atualmente uma alternativa bem estrutu-rada de contratação que seja mais flexível que o regimeestatutário e possibilite, ao mesmo tempo, contratar es-poradicamente de acordo com as necessidades da ad-ministração pública, estabelecendo limites temporais edireitos e deveres do contratado. O regime de empregopode suprir essa lacuna, basta regulamentá-lo da formadesejada.

Os governos não o adotam, porém, porque prevêem

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que seus encargos trabalhistas, semelhantes aos do re-gimeceletista, seriam muitoelevados. Mas tal regimedeveser utilizado em situações específicas, naquelas em quea contratação deve ocorrer por prazo determinado, fatoque o regime estatutário permite apenas em casos emer-genciais. Nesse cenário, é fácil demonstrar que o custode contratação, ainda que inclua diversos encargos, émuito inferior ao da manutenção de um servidor que setorna desnecessário, mas que pela regra da estabilidadedeve permanecer nos quadros do governo até sua apo-sentadoria, se ele não se desligar por livre iniciativa outiver cometido alguma falta grave. De toda forma, o regi-me de emprego precisa serregulamentado, e nada impe-de quecada estado oadapte às suaspeculiaridades, res-peitadas as regras definidas para o regime celetista.

e) o ponto destacado acima está vinculado a outraquestão mais geral, qual seja, a possibilidade de conci-liar e compatibilizar a necessidade de flexibilização coma preservação de regras de isonomia importantes no ser-viço público. Por exemplo, é importante premiar de formadistinta os servidores que se destacarem em suas organi-zações, ao mesmo tempo em que é justo e importantemanter uma certa paridade entre as remunerações da-queles que se situam na mesma posição de uma determi-nada carreira e possuam competências semelhantes.

Dessa forma, a maioria das regras relativas à ges-tão de recursos humanos deve propiciar, ao mesmo tem-po, tratamento isonômico aos servidores e a premiaçãoao desempenho diferenciado e prever formas de abordar(ou flexibilizar) situações específicas como a descrita parao regime de emprego. Essa é uma importante orientaçãopara as regras desenhadas no futuro;

f) a reorganização da estrutura remuneratória, prin-cipalmente no que tange ao equilíbrio de sua hierarquia

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e à introdução de mecanismos de premiação vinculadosao resultado organizacional. Os estados ainda dispõemde poucas informações sobre os níveis salariais pratica-dos no mercado privado e em seus pares, bem como nasprefeituras, e só conseguem reorganizar a hierarquia sa-larial aos poucos, dada o impacto fiscal de tal correção;não podem, porém, perdê-la de vista, pois, se assim for, osalário perderá seu caráter de incentivo e o governo esta-rá desperdiçando um volume extraordinário de recursoscom funcionários desmotivados, ainda que a remunera-ção não seja a única forma de estimulá-los;

g) a regulamentação da possibilidade de demissãopor insuficiência de desempenho. A avaliação deve serutilizada como um incentivo positivo, certamente, e essaé sua principal função: estimular o desenvolvimento e odesempenho. Mas também é fundamental que seja pos-sível desligar os servidores que nãopretendem fazer qual-quer esforço para desempenhar suas funções de formaadequada ou melhorá-la. Aausência de regulamentaçãodesse dispositivo constitucional impede que essa medi-da seja adotada, a qual se insere na racionalidade dequalquer sistema de incentivos;

h) os gerentes de todas as áreas têm de estar profun-damente envolvidos na gestão de recursos humanos, prin-cipalmente nos aspectos relacionados à avaliação, pro-gressão e capacitação. Atualmente, predomina a visãode que o gerente não é responsável por esses temas, cujaatribuição pertenceria à área de recursos humanos. Masqualquer modelo simples de gestão, e principalmenteaqueles que privilegiam o trabalho em equipe, define queo papel dos gerentes no desenvolvimento profissional deseus subordinados é fundamental. São eles que estãopróximos dos integrantes de suas equipes e reconhecemas necessidades de capacitação, têm condições de ava-

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liar o desempenho e de escolher aqueles que devem serpromovidos.

A área de recursoshumanos, nesse caso, deve dispo-nibilizar os instrumentos possíveis e necessários paraviabilizar essas ações. Essa posição é pouco difundida esua prática constituium dos principais desafios da gestãodas organizações, pois se os gerentes acharem que nãopossuem nenhuma responsabilidade sobre a definiçãodesses aspectos, não há desenho bem concebido de polí-tica que possibilite o alcance dos resultados desejados.

i) o estreitamento e a melhoria das relações entre asáreas de recursos humanos e de finanças dos diversosgovernos. O gasto com pessoal é um dos principais itens,se não o principal, das despesas dos governos estaduaise recebe atenção especial da área econômica, que quercontrolá-lo e participar de todas as decisões, não semrazão, que lhe digam respeito. A área de recursos huma-nos, por sua vez, possui freqüentemente uma preocupa-ção maior com a melhoria da gestão e menor com a evo-lução das despesas e, por isso, ambas estão constante-mente em conflito. Entretanto, os dois objetivos não sãoinconciliáveis; o controle das despesas faz parte da ges-tão e o aprimoramento desta última, por sua vez, melho-ra o primeiro.

Devem-se buscar o diálogo e uma linguagem maiscomum às duas áreas, bem como fazer compreender queos objetivos não são antagônicos, mas sim complemen-tares. Os profissionais da área de recursos humanos de-vem entender as restrições impostas pela área econômi-ca e apresentar todas as vantagens da melhoria da ges-tão que podem decorrer das medidas desejadas; devempensar mais em custos, enquanto a equipe da área definanças deve se preocupar mais com a modernizaçãoda gestão. Somente assim poderão ser implementadas

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as medidas necessárias para incrementar os resultadosda organização.

j) a questão do financiamento da Previdência do Ser-vidor Público: os representantes dos estados presentesao seminário não falaram praticamente nada sobre otema,talvezpor já existir umfórum específicopara debatê-lo. De toda forma, esse problema constitui uma verdadei-ra bomba-relógio do ponto de vista fiscal e, por conse-qüência, para a própria gestão de recursos humanos emtodo o setor público brasileiro. Atenção especial deve seratribuída a essa questão, buscando regulamentar ade-quadamente as emendas constitucionais sobre o tema ecriar urgentemente, para os que ainda não o fizeram, al-ternativas de capitalização e fundos de pensão quedesonerem as contas públicas.

Por fim, é importante ressaltar que uma palavra bas-tante recorrente na análise aqui apresentada foi “incenti-vos”. Os gestores de uma política de recursos humanosdevem, permanentemente, buscar a criação de incenti-vos ou avaliar quais deles estão sendo gerados pelaspolíticas e instrumentos adotados. Em última análise, odestaque dado a essapalavra decorre do fato de que sãoos incentivos que guiarão a atuação dos servidores, comoaliás o desempenho profissional de qualquer pessoa (aprópria preferência por atuar no serviço público, se exis-tir, já corresponde a um mecanismo de incentivo).

Dessa forma, a política de recursos humanos consti-tui, simplificadamente, uma estrutura de incentivos queimplica tanto estímulos positivos como outros associadosà cobrança de resultados, ambos os quais visam a melho-ria do desempenho das organizações. É fundamentalsem-pre recordar essa definição, pois seu reconhecimento econsideração já são um passo importante para o sucessodas políticas escolhidas e implementadas.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Gestão das compras governamentais:perspectivas para a consolidação dos avanços

Relator: Caio Marini - Professor da Fundação Dom Cabral

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Gestão das compras governamentais:perspectivas para a consolidação dos avanços4

Caio Marini

Professor da Fundação Dom Cabral

1. A necessidade da adoção de um novo padrão paraa gestão das compras governamentais

O movimento contemporâneo de reformas da admi-nistração pública tem destacado, entre outros aspectos,a necessidadede reorientar a gestão para resultados numcontexto que combina crescente elevação das exigênciaspor parteda sociedade coma baixa capacidadedo Esta-do em atender a essas demandas devido à, ainda pre-sente, crise fiscal. Dessa forma, as iniciativas empreendi-das nos diversos âmbitos governamentais, tanto no ce-nário nacional como no internacional, vêm colocando emrelevo questões como o aumento da cobertura da presta-

4 Texto elaboradocom base nas experiências submetidas ao Painel Ges-tão de Compras e Suprimentos no âmbito do seminário Avanços e Perspecti-vas da Gestão Pública realizado em São Paulo durante os dias 8, 9 e 10 demarço de 2006. Foram apresentadas as experiências dos estados: Bahia, Cea-rá, Mato Grosso e São Paulo. Além desses estados, foram encaminhados rela-tos sobre as experiências dos estados: Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás,Paraíba, Paraná, Santa Catarina, Sergipe, Tocantins e Pernambuco e do Dis-trito Federal.

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ção do serviço, a melhoria da qualidade dos serviçosentregues ao cidadão e a busca incessante de incremen-to da eficiência do aparato governamental, ou seja, odesafio é o de fazer mais e melhor com menos. Assim,para enfrentar esse contexto, a questão da qualidade dogasto - incluindo-se aí o investimento e o custeio - torna-se central nas estratégias de modernização adotadas. Éexatamente dentro dessa perspectiva que otema dascom-pras governamentais entra em cena em função do pesoexpressivo que representa na realização de qualquer fun-ção pública. Comprar bem é requisito fundamental paraa qualidade da gestão. Entretanto, o debate e as práticasadotadas nesta importante área da gestão pública vêmsendo influenciados por duas forças, uma impulsionadorae outra restritiva:

• Por um lado, adotar um modelo de gestão orienta-do a resultados com o objetivo de melhorar a eficiênciana prestação dos serviços sociais básicos, como os desaúde, educação, segurança e outros, significa imple-mentar um novo padrão na gestão das compras e supri-mentos de bens e serviços requeridos para a prestaçãoadequada desses serviços à sociedade.

• Por outro, a predominância de uma forte culturaburocrática inibe a inovação e a criatividade nesse cam-po. O pressuposto geral é o de que se forem flexibilizadasas regras a conseqüência será, inevitavelmente, a expan-são de práticas patrimonialistas.

2. O processo de compras governamentais noBrasil: elementos de fundamentação

Segundo Fernandes (2003), os componentes do pro-cesso de compras governamentais no Brasil são os se-guintes:

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Preparação: que compreende a elaboração de do-cumentos técnicos e termos de referência que irão subsi-diar o estabelecimento de especificações para o edital.O órgão está obrigado a designar um dirigente respon-sável por cada processo de compra e é ex igida uma re-serva orçamentária com indicação da respectiva rubri-ca. As ações, nessa etapa, que são realizadas interna-mente no órgão, culminam com o edital que contém adescrição pormenorizada do objeto da compra oucontratação, dos requisitos para participação do forne-cedor na licitação, dos critérios de julgamento das pro-postas e de apresentação de recursos pelos participan-tes, durante o processo.

Convocação: que corresponde à fase de divulgação,por meio da publicação de aviso, obrigatória na impren-sa oficial. A tendência recente é a de obrigatoriedade depublicação, também, na Internet.

Habilitação: que consiste na verificação da capaci-dade do licitante em participar do certame, atendendoaos requisitos estabelecidos no edital. Compreende oexame dos aspectos jurídicos e econômico-financeiros efiscais da empresa.

Competição: que é o evento público em que serãoabertas, examinadas e julgadas as propostas encaminha-das pelos licitantes. O julgamento resulta na classifica-ção das propostas, e a vencedora só terá efetividade se olicitante também cumprir os requisitos de habilitação.

Contratação e execução: que consiste na adjudica-ção - convocação do licitante vencedor para celebraçãodo contrato - e na execução, propriamente dita, do objetocontratado, ou seja, na entrega do bem adquirido ou naprestação do serviço contratado. O gestor de comprasemite um “ateste” de cumprimento do contrato e a res-pectiva ordem de pagamento - denominada empenho -

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para, em seguida, proceder à liquidação, na forma decrédito bancário.

O ordenamento jurídico que disciplina o processo decompras governamentais no País remonta a 1993 com aedição da Lei 8.666, que regulamenta o art. 37, inc. XXI,da Constituição Federal e institui normas para licitaçõese contratos da administração pública. O contexto era deemergência de profunda crise institucional decorrente doimpeachment do então presidente Collor de Melo e oslegisladores temiam qualquer tipo de iniciativa de flexibi-lização na operação e funcionamento da máquina públi-ca, sob o argumento de que poderia implicar o aumentoda corrupção. Como conseqüência, a receita clássica foia de aumentar amarras burocráticas (a Lei 8.666 é exem-plar nesse sentido), o que provocou tentativas de fuga,tanto dentro dos limites da lei (é bastante expressivo onúmero de dispensa de licitação) como fora deles (é tam-bém expressiva a corrupção nesse campo).

As críticas, em especial as relativas ao ordenamentojurídico, que se sucederam ao longo do tempo provoca-ram uma série de iniciativas que culminaram no estabele-cimento de um novo padrão para o processo de compras.Os principais marcos, nesse debate, foram os seguintes:

• A crítica original era a de que a lei, por ser muitodetalhada, impedia a adoção deregulamentos paraapli-cação em realidades específicas. A realidade dos órgãosque compõem a administração direta não é a mesma dosda administração indireta. E com a visão excessivamentedetalhista, o que acabou ocorrendo foi a generalizaçãoda rigidez burocrática para todos os órgãos e entidades,praticamenteeliminando asdiferenças, em termos de grausde autonomia, entre a administração indireta e a direta.

• Em seguida, no contexto da reforma gerencial de1995, o assunto da flexibilização volta à cena. O Plano

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Diretor de Reforma do Aparelho do Estado destacava anecessidade de adoção de um novo modelo de gestãoorientado a resultados num ambiente caracterizado peloagravamento da crise fiscal do Estado. O capítulo “Diag-nóstico”do referido plano apontava três áreas críticas quecontribuíam para o encarecimento do custeio da máqui-na administrativa: a de gestão de recursos humanos, ade gestão orçamentária financeira e a de gestão de com-pras. O argumento dominante, para o caso das compras,era o de que exigências excessivas de controles sacrifi-cam a eficiência e provocam a morosidade. Na práticaforam iniciadas negociações no âmbito interno de gover-no no sentido de alterar a legislação vigente e editadodecreto instituindo o Programa de Racionalização dasUnidades Descentralizadas do Governo Federal.

• Em 1999, outra iniciativa foi tentada, porém combase em uma nova abordagem. A constatação dominan-te era a de que persistiam problemas de perda de efici-ência, não só por problemas de natureza legal, mas tam-bém pelo fato de que o governo não utilizava seu poderde compra na relação com os fornecedores. A ausênciade uma política e a debilidade dos órgãos centrais nor-mativos faziam com que cada órgão agisse ao seu pró-prio modo. E, em que pese o avanço no campo datecnologia da informação, pouco havia sido incorporadona gestão dos processos administrativos (gestão de com-pras incluída). Assim, tomou-se a decisão de adotar umanova estratégia para os serviços administrativos no âm-bito do governo federal. A idéia era a de se criar umaAgência Nacional de Serviços5, que concentraria a presta-

5 GRS – Gerências Regionais de Serviço do Governo Federal, inspiradana experiência norte-americana, sob a liderança da Seap – Secretaria de Es-tado de Administração e do Patrimônio. A iniciativa chegou a constituir formal-mente um dos programas do PPA de então.

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ção de serviços administrativos aos órgãos da adminis-tração direta, numa única agência, com os objetivos deobter ganhos de escala e permitir a focalização dos mi-nistérios em suas atividades finalísticas. A experiêncianão evoluiu e foi descontinuada em 2001.

• Em 2001 foram retomadas as iniciativas de revisãodo ordenamento jurídico. Em janeiro desse ano foi ela-borado o Anteprojeto de Lei Geral de Contratações daAdministração Pública, e durante o ano de 2002 foramrealizadas sessões de Consulta Pública e outros eventoscom a participação de, aproximadamente, 500 pessoas,55 entidades colaboradoras, o que gerou 350 sugestões.

• Ainda em 2001, inicialmente por medida provisó-ria, o governo federal instituiu a modalidade de licitação6

denominada Pregão, mais tarde expandida para uso nasesferas dos estados, do Distrito Federal e dos municípios(Lei 10.520/02). Na nova modalidade, a disputa pelo for-necimento é feita por meio de propostas e lances em ses-são pública (presencial) ou por meio eletrônico.

3. Situação encontrada nas administraçõesestaduais: um ambiente favorável a mudanças

A situação dos estados da Federação não diferemuito da situação da administração pública federal noque se refere ao processo de compras e aquisição. Osprocedimentos careciam de padronização, regras enormatização que regulamentassem a matéria. As com-pras eram pulverizadas pelas diversas unidades da ad-ministração pública estadual. Como conseqüência, o

6 Que veio somar-se às outras modalidades, tais como: conc orrência,tomada de preços, convite, leilão, concursos e registro de preços.

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estado não aproveitava a oportunidade de obtenção deganhos de escala.

Outra característica típica do contexto original era aausência de estatísticas (séries históricas) e sistemas deinformações que permitissem uma maior racionalizaçãodas atividades, já que os procedimentos eram intensivosem mão-de-obra, quase sempre repetitivos e marcadospelo re-trabalho permanente. Como conseqüência,inexistiam práticas de transparência e de controles efeti-vos sobre as necessidades e qualidade das compras,além da perda de oportunidade de desenvolver a capa-cidade de aprendizagem com os erros e acertos ao lon-go do processo.

Por fim, o ambiente de compras era caracterizadopelabaixa profissionalização. Tradicionalmente, asáreasde compras eram depositárias de funcionários de baixaqualificação, desmotivados e sem as condições mínimasrequeridas para o adequado exercício da função. É im-portante ressaltar que uma compra é, antes de tudo, umprocesso de negociação entre as partes que exige eleva-do grau de profissionalização. Comprar aquém das ne-cessidades compromete a qualidade dos serviços e com-prar além da medida eleva os custos. O sucesso desseprocesso pressupõe o estabelecimento de uma relaçãode parceria. A ausência desses atributos acabou por ge-rar, como conseqüência, um cenário, quase caótico, re-sumido da seguinte forma: comprava-se mal, a preçoselevados, sem atender aos requisitos de qualidade esta-belecidos e, além disso, não eram honrados os compro-missos contratuais com os fornecedores. O que contri-buiu para a consolidação de uma cultura (perversa) ba-seada na desconfiança e descompromisso na relaçãocliente-fornecedor, com reflexos nos prazos de entrega,no cumprimento das especificações definidas, na não

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conformidade normativa e no custo dos serviços presta-dos ao cidadão.

Esse cenário foi determinante para promover-se umaverdadeira “guinada nos princípios utilizados para geriras atividades de suprimento no Poder Executivo (...) pas-sando-se de mero comprador de bense serviços para umapostura estratégica de compras” (Villhena et al, 2006).

4. A emergência de um novo padrão de gestão dascompras governamentais: as soluções adotadas nasadministrações estaduais e resultados apresentados

O momento atual tem se caracterizado pela profu-são, em ritmo bastante acelerado, de iniciativas demelhoria da gestão nos níveis estaduais da Federação.Não seria exagero afirmar que o que melhor se produzneste momento, em termos de experiências no campo damodernização do setor público, acontece justamente emalguns estados da Federação. A criação do ConselhoNacional de Secretários de Estado de Administração(Consad) tem contribuído para a disseminação e inter-câmbio dessas experiências e para a consolidação dotema na agenda nacional. Em particular, no que se refereàs compras governamentais, duas diretrizes foram pro-postas durante a realização do LIX Fórum de Secretários:

• Recomendar a necessidade de reestruturar a ges-tão de Compras Governamentais, utilizando mecanismosdisponíveis e eficazes do Poder de Compras dos Estadospara aumentar a economia local, reduzir gastos eotimizaros processos licitatórios.

• Adotar o uso do Pregão Eletrônico como instrumentocapaz de propiciar agilização, transparência, racionali-zação, controle e redução de custos na aquisição de bens

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e serviços, tendo em vista a economia já propiciada de25%, em média, nos estados.

A seguir, serão apresentadas as principais iniciati-vas desenvolvidas no âmbito das administrações públi-cas estaduais agrupadas segundo duas dimensões: doaperfeiçoamento do modelo de gestão, que trata dosavanços realizados na estratégia, política e estrutura defuncionamento, incluindo a adoção de novas ferramen-tas de gestão e do aperfeiçoamento do ordenamento jurí-dico-legal, que trata das medidas orientadas para a revi-são da legislação vigente.

4.1. Dimensão da gestão

A principal iniciativa nesse campo foi a do fortaleci-mento institucional do sistema de compras governamen-tais com base na definição de uma política de comprascontendo as principais diretrizes e na definição clara dospapéis dos órgãos centrais e descentralizados na execu-ção das compras. Como exemplos:

• O estado do Ceará, que definiu um Projeto de Ino-vação em Suprimentos, no bojo do Sistema Integrado deGestão Governamental, contendo: a estratégia (papel eprincípios), os processos (adequação e otimização), aspessoas (papéis e perfil profissional), a tecnologia da in-formação (sistemas de suporte) e o monitoramento (ava-liação do desempenho da organização e do processo). Afase I incluiu medidas nas áreas de telefonia, combustí-veis, medicamentos, limpeza e mão-de-obra administra-tiva. A fase II, em implementação, prevê importantes mu-danças nas rotinas - foco na racionalização e gestão dosgastos - e inclui as áreas de: obras, alimentação, mate-rial de expediente e tecnologia da informação.

• O estado da Bahia, que mudou o foco do Órgão

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Central de Compras de executor para normatizador. Agestão de compras e contratação de serviços atualmenteocorre de forma descentralizada, cabendo às unidadesadministrativas a execução e o gerenciamento de seusrespectivos orçamentos. Compete ao Órgão Centralatuar de forma centralizada apenas na gestão de gastosrelevantes para o estado: veículos, abastecimento, segurode imóveis, bem como na delegação de compras,disponibilização de Registros de Preços para itens deconsumo relevante e freqüente pelas unidades gestoras.

• O estado de Goiás, que mudou a atribuição da Di-retoria de Gestão, Logística e Patrimônio passando defornecimento de materiais de uso comum, para o desen-volvimento de políticas de gestão.

• O estado de São Paulo inovou ao introduzir, comouma das diretrizes, o conceito de licitações sustentáveis:introduzir critérios de ordem socioambiental nos procedi-mentos de aquisição de bens, serviços, obras e serviçosde engenharia, compatíveis com as políticas do governo(Agenda 21). Decreto 50.170/05 - instituiu o selo socio-ambiental.

• O Distrito Federal, que introduziu política orienta-da para a otimização, controle e racionalização dos cus-tos operacionais.

• O estado de Minas Gerais introduziu a prática detreinamento de fornecedores visando a fomentar a partici-pação das micro e pequenas empresas nas compras go-vernamentais. Nesse sentido, foi assinado convênio entrea Secretaria de Planejamento e Gestão com o Sebrae e aCâmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte.

• O estado do Mato Grosso, que decidiu pela cen-tralização dos pregões na Secretaria de Estado de Admi-nistração.

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• O estado de Pernambuco onde a Secretaria de Ad-ministração e Reforma do Estado passou a atuar comoórgão disciplinador dos sistemas de compras, licitaçõese contratos. O modelo administrativo passou a ser carac-terizado como “coordenado descentralizado”.

• O estado de Sergipe criou uma Central de Com-pras que administra os contratos de energia, correios, te-lefonia, água, passagens aéreas, combustíveis, locaçãode veículos, manutenção de veículos, fábrica de software.

Outra importante iniciativa foi a intensificação do usoda tecnologia de informação, tanto na melhoria do pro-cesso de compras (interface com fornecedores, por exem-plo) como no desenvolvimento de sistemas corporativosde gestão das compras governamentais. A tendência temsido a de construção de um Portal de Compras com funcio-nalidades7 nas duas dimensões anteriormente mencio-nadas. Como exemplos:

• O estado de São Paulo instaurou 44.171 pregões,sendo 887 eletrônicos e 43.284 presenciais, dos quais37.187 encontram-se encerrados envolvendo um volumeda ordem de R$ 13,49 bilhões negociados. Também vemutilizando o sistema BEC (www.bec.sp.gov.br), que, naperspectiva do estado, estimula transparência, permite aredução dos custos operacionais e dos preços pagos pe-las unidades compradoras, além de agilizar o processo

7 Estão consagradas várias inovações neste campo, tais como: pregão(modalidade de licitação utilizada para a aquisição de bens e de prestaçãode serviços comuns nas formas presencial e eletrônico); registro de preços (se-gundo Hely Lopes Meirelles, é o sistema de compras pelo qual os interessadosem fornecer materiais, equipamentos ou gêneros ao Poder Público concordamem manter os valores registrados no órgão competente, corrigidos ou não, porum determinado período, e a fornecer as quantidades solicitadas pela Admi-nistração, no prazo previamente estabelecido); Bolsa Eletrônica de Preços –BEC (negociação do preço dos bens adquiridos pelo setor público, por meio deprocedimen tos eletrônicos, c om a garantia, por parte do governo, do paga-mento aos fornecedores na data de seu vencimento ajustada no contrato).

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de aquisição e fornecer informações agregadas e rapi-damente disponíveis para os sistemas de controle inter-no e externo. Para o setor privado, proporciona maiorinteração com a administração estadual e também comos municípios do estado, ampliando as oportunidades denegociação de seus produtos com o governo, via Internet.A sociedade, por sua vez, terá a oportunidade de contro-lar todas as negociações efetuadas pelo portal. Por fim,vale destacar a solução e-negócios públicos que dis-ponibiliza para toda a sociedade, por meio da Internet,as informações completas de todas as modalidades delicitação definidas pelas Leis 8.666/93 (Licitações) e10.520/02 (Pregão) - desde o aviso da licitação até a assi-natura do contrato e o Relógio da Economia (www.relogiodaeconomia.sp .gov.br), uma ferramenta tecnológicaimplementadapela Casa Civil (em parceriacom a Fundape Prodesp) para explicitar - de forma concisa - as econo-mias feitas pelo governo do estado de São Paulo, após aimplementação de inovações no modo de prestação deserviços públicos. Na dimensão interna, o estado imple-mentou o sistema integrado de gestão de frotas.

• O estado do Mato Grosso criou dois portais (docidadão e do servidor). No Portal do Cidadão, é possívelbaixar editais; participar das compras diretas; verificarfornecedores ativos, inativos e suspensos e a agenda delicitações; acompanhar pregão em andamento; e verifi-car resultados de licitações e compras diretas. Já o doservidor contém as funcionalidades de: controle de datasde vencimento; envio de e-mail sobre cadastro vencido;informação sobre como se cadastrar; impressão de certi-ficado via Web; gerenciamento de penalidades; e-mailde solicitação de pesquisa de preço.

• Pernambuco, instituiu o RedeCompras - modernoconceito de negociação eletrônica - que implementa pro-

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cessos de aquisição debens por meio da rede mundial decomputadores Internet. Tem como principais vantagens:maior transparência e rapidez nos processos de negocia-ção; grande alcance na divulgação das oportunidades denegócios; facilidades operacionais para fornecedores ecompradores; padronização dos procedimentos das comis-sões de licitação; estímulo à competitividade do mercado;e obtenção de significativa economia para o estado.

• Santa Catarina, Sistema de Divulgação de Editaisde Licitação.

• Paraná, Portal de Compras voltado para a racio-nalização de custos, transparência e melhoria da quali-dade dos serviços prestados à população, tornando aces-sível a todos as informações sobre as transações dos ór-gãos estaduais com seus fornecedores e prestadores deserviços.

• Paraíba, sistema “on-line” para operacionalizaçãoda Central de Compras em 23 órgãos da administraçãodireta.

4.2. Dimensão legal

A principal ação nesse campo foi a de revisão doordenamento jurídico. Inspirada inicialmente na propos-ta do governofederal de 2001, o estado daBahia tomou ainiciativa de editar lei estadual (9.433/05) que logo foiacolhida pelo Consad, o qual vem negociando com o go-verno federal com vistas à edição de lei federal que subs-titua a atualmente em vigor (8.666). As principais mudan-ças são, entre outras:

• A inversão das fases do procedimento, com a aber-tura das propostas de preço, julgamento e classificaçãoantes da análise da habilitação dos licitantes.

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• Criação de órgão central de controle de contratose convênios, acompanhamento e avaliação financeira doscontratos e convênios.

• Desconsideração da personalidade da pessoa ju-rídica nas hipóteses de fraude na criação de novas enti-dades empresariais.

• Incorporação do pregão, como modalidade de li-citação, nos moldes da Lei Federal 10.520/2002, aprovei-tando a disciplina já existente em sede de decretos esta-duais.

• Disciplina do credenciamento, como hipótese deinexigibilidade de licitação, quando, em razão da natu-reza do serviço, revela-se a impossibilidade prática deconfronto entre interessados, podendo a necessidade daadministração ser mais bem atendida mediante contrata-ção do maior número possível de prestadores de serviço.

• Adequação técnica das sanções administrativas,estendendo as sanções, além dos licitantes e contrata-dos, também aos candidatos ao cadastramento e cadas-trados.

Outros estados também investiram na revisão da le-gislação sobre compras. A seguir alguns exemplos delegislação editada:

No Ceará, foram editados os seguintes decretos:28.086/2006, que regulamenta o Sistema de Compras naAdministração Pública Estadual; 28.087/2006, que regula-menta o uso do Sistema de Registro de Preços (de que tra-tao artigo 15da Lei Federal 8.666 e o artigo 11 da Lei Fede-ral 10.520); 28.088/2006, que dispõe sobre a implantaçãode compras eletrônicas, denominada cotação eletrônica,para aquisição de bens e serviços comuns de pequenovalor; e 28.089/2006, que regulamenta a licitação na mo-dalidade de pregão instituída pela Lei Federal 10.520.

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Em São Paulo, os Decretos 47.297/2002, que dispõesobre o pregão (Lei 10.520); 47.820/2003, que dispõe so-bre a política do patrimônioimobiliário; 47.945/2003, queregulamenta o Sistemade Registro de Preços; 48.999/2004,que fixa competência das autoridades para aplicação dasanção administrativa (artigo 7º da Lei Federal 10.520);49.722, que dispõe sobre o pregão realizado por meio dautilização de recursos de tecnologia da informação;50.170/2005, que institui o selo socioambiental no âmbitoda administração pública.

Ainda sobre a regulamentação do pregão: Pernam-buco (Lei Estadual 12.340/ 2003); Minas Gerais (Decreto42.408/2002); Espírito Santo (Decreto 1178-R/2003); Cea-rá (Decreto 26.972/2003). EmGoiás, o Decreto 5.566/2002,institui o Sistema Eletrônico de Administração de Com-pras e Serviços. Sergipe adotou uma nova lei (5.848, de13 de março de 2006) que dispõe sobre procedimentoslicitatórios no âmbito da administração pública direta eindireta do estado.

4.3. Os principais resultados

O resultado prático da aplicação dessas iniciativas,tanto na dimensão da gestão como na legal, vem produ-zindo enormes economias para os cofres públicos esta-duais. Entretanto, a dificuldade está na medição efetivados ganhos conquistados. A ausência de estatísticasconfiáveis e de procedimentos padronizados demensuração dificulta a precisão dessa importante infor-mação. A seguir, são apresentados alguns dados brutosinformados pelos estados no âmbito do seminário:

O Ceará prevê, na fase I do Projeto de Inovação, eco-nomias entre R$ 20 e R$ 35 milhões, dos quais R$ 15 mi-lhões já foram efetivadas em 2005. Na fase II estima-seuma economia da ordem de R$ 36 milhões ao ano.

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São Paulo estima uma economia global de 18,99%(aproximadamente R$ 3,16 bilhões). Dados complemen-tares:

• 25,32% de economia nas modalidades dispensaconvite e pregão. Somente no pregão, as economias fo-ram: R$ 79 milhões (8,84%) no eletrônico; R$ 3 trilhões(19,57%), totalizando R$ 3,164 trilhões (18,99%);

• a economia na Gestão de Contratos de ServiçosTerceirizados, no período compreendido entre janeiro de1995 a janeiro de 2005, atingiu em termos de valor médioo percentual de 31,7%, o que representa uma economiade R$ 11,49 bilhões.

Pernambuco estima uma economia de 31,94% (R$175,5 milhões) com as modalidades pregão eletrônico epresencial. Além disso, destaca a redução de prazos deconclusão em mais de 60% e o fato de que os processostêm alcançado uma economia média em torno de 18%,em referência ao preço inicialmente estimado.

Minas Geraisprevê uma economia de R$ 233 milhõesem 2005 graças aos pregões e de 14,37%em 2005 devidoà cotação eletrônica; Tocantins, uma economia de até 25%na aquisição de bens e serviços comuns; Sergipe, umaeconomia mensal de R$ 310 mil com gerenciamento decontrole de combustível e frota; e a Paraíba, uma redu-ção de 42% no consumo de combustível, de 30% dos cus-tos de aquisição de suprimentos em 2005, via pregão, euma adesão de 98% dos órgãos da administração diretaao sistema on-line de Compras.

5. Desafios, à guisa de conclusão

Sem dúvida, a cultura emergente de gestão orienta-da a resultados vem produzindo importantes mudanças

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na administração pública brasileira, em especial nas ad-ministrações estaduais. Até aqui, o mote tem sido o danecessidade de promover ajustes em função da crise fi-nanceira do estado, o que vem provocando ondas de ino-vação em diversas áreas como no caso das compras go-vernamentais. Nesse sentido, os desafios apresentadosapontam a adoção de estratégias em duas direções. Emprimeiro lugar, é fundamental avançar mais, aumentan-do a abrangência com relação aos resultados já obtidosvisando a consolidar o processo de mudança em curso.Mas é absolutamente essencial enfrentar problemas de-correntes dos novos tempos que se aproximam e que vãoexigir o desenvolvimento da capacidade do estado emalcançar os resultados de desenvolvimento.

As medidas para o primeiro caso indicam a necessi-dade de aprofundar o debate sobre as limitações legaisainda vigentes e a definição de estratégia conjunta - deestados, municípios e governo federal - junto aos respec-tivos Legislativos para a edição de novo ordenamentojurídico. Alguns dilemas estão colocados: como combi-nar vantagens da centralização (o tamanho, a escala e adiversidade) e os benefícios da descentralização (a flexi-bilidade, a sensibilidade e acriatividade)? Quais os limi-tes da desregulamentação e os riscos decorrentes em ter-mos de perda de controle? Como estimular a compe-titividade e o desenvolvimento de fornecedores locais e,ainda assim, assegurar eficiência operacional nos pro-cessos de compras?

Ainda dentro dos desafios de consolidação dos avan-ços já obtidos está a questão da integração dos proces-sos e sistemas de compras com os demais sistemascorporativos de gestão aproveitando as oportunidadesdecorrentes da revolução tecnológica. É necessária a cria-ção de um ambiente único e confiável de compras para

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facilitar a vida dos diversos agentes envolvidos. Outroaspecto, de natureza normativa, diz respeito à questãoda incidência do ICMS nas compras governamentais.

Com relação ao segundo aspecto, o desafio é o deestabelecer uma estratégia para a gestão das comprasgovernamentais em linha com os pressupostos da novageração de reformas da administração pública queenfatiza a questão do desenvolvimento econômico-socialem bases sustentáveis e a questão da integração dosinstrumentos da política de gestão pública. Nesse senti-do, a questão da avaliação dos resultados é essencial. Éfundamental medir de forma objetiva os resultados de-correntes das inovações realizadas. Não basta avaliar aeficiência dos novos instrumentos propostos (grau de re-dução de custos, economias e outros), nem simplesmen-te ampliar a cobertura na aplicação das inovações (es-tender as inovações a todos os processos de compras, atodos os estados). É fundamental avaliar a efetividadedo processo de compras. Não se trata simplesmente deavaliar se houve economia ou redução de gastos, ou se oprocesso teve conformidade normativa. É preciso avaliaro impacto das compras governamentais (no valor públi-co); quanto elas contribuíram para que o governo alcan-ce seus objetivos, o que significa, em muitos casos, a re-visão sistemática de macroprocessos de gestão. É preci-so alargar o conceito de compras e redefinir o papel daárea de suprimento, passando de (mera) compradora deinsumos para gestora de serviços administrativos, na quala compra é, apenas, um elemento do processo. Significa,em última instância, introduzir o conceito de compras comvalor agregado e fazer do agente de compras umprestador de serviços especializados, que conhece a ana-tomia das funções públicas básicas e suas necessidades.

Finalmente, à guisa de conclusão, e levando em con-sideração os desafios em suas duas dimensões, recomen-

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da-se a necessidade de fortalecer a rede de cooperaçãoque se formou ao longo dos últimos anos simbolizadapelo Consad. Consolidar os avanços e enfrentar os no-vos desafios supõem, cada vez mais, a institucionalizaçãodessa bela prática e exemplo que as administrações pú-blicas estaduais vêm dando ao País.

Referências Bibliográficas

FERNANDES, Ciro (2003). Transformações na gestão decompras da administração pública brasileira - VIIICongreso Internacional del CLAD sobre la Reforma delEstado y de la Administración Pública. Panamá, 28-31,oct/2003.

VILLHENA, Renata et al (2006). O choque de gestão emMinas Gerais: políticas de gestão pública para o desen-volvimento. Belo Horizonte: Editora UFMG.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Governo Eletrônico

Relator: Ciro Campos Christo Fernandes

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Governo Eletrônico

Ciro Campos Christo Fernandes

Especialista em políticapúblicas e gestão governamental

Introdução

Este texto sistematiza e analisa a situação atual e astendências e desafios aos estados em relação às suaspolíticas e projetos em governo eletrônico. Foi elaboradocom base nas informações encaminhadas por 12 admi-nistrações estaduais, na forma de relatórios sintéticos.Desse conjunto, as experiências do Distrito Federal e detrês estados foram selecionadas para apresentação nes-te painel: Paraíba, Paraná e Pernambuco. Não obstante,fazemos referências também a outras experiênciasdestacáveis colhidas dos relatórios. O propósito da aná-lise não é o balanço exaustivo de experiências estaduais,mas a identificação de tendências e desafios com baseem uma amostra limitada, porém representativa e diver-sificada. Todas as informações apresentadas se referema experiências iniciadas no período dos atuais governosestaduais, desde 2003. Assim, deixam de ser considera-dos avanços expressivos que tenham ocorrido anterior-mente a essa data.

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Por governo eletrônico entendem-se, de forma am-pla, a estratégia, política, programas, projetos e ativida-des relacionados com a aplicação da Tecnologia da In-formação (TI) à administração pública. Esse conceito com-porta definições descritivas, quando se refere a graus deassimilação da TI e conseqüente aproveitamento de suaspotencialidades: desde a simples utilização como ferra-menta para o apoio a rotinas administrativas até a suaaplicação intensiva na transformação dos processos detrabalho, estruturas e formas de relacionamento internase externas à administração pública. De particular impor-tância são as possibilidades de integração abertas pelacomunicação intensiva propiciada pela TI, facilitandorelacionamentos de articulação, colaboração e parceriasob múltiplos níveis: entre governos, entre órgãos e enti-dades, entre unidades administrativas e equipes, entregoverno e fornecedores, entidades do terceiro setor e ci-dadãos. Com um sentido prescritivo, o governo eletrôni-co refere-se a uma situação desejável de assimilação daTI na administração pública, potencializando a transfor-mação nas estruturas organizacionais, a transparência edemocratização do processo decisório, a melhoria daqualidade da formulação e do controle das políticas pú-blicase a ofertade serviços ao cidadãosob padrõessubs-tancialmente melhores.

As referências de análise e avaliação adotadas nes-te trabalho consideram os seguintes parâmetros:

• Assimilação do conceito de governo eletrônico naformulação da política de TI;

• Centralidade estratégica e transversalidade deimplementação da política, considerando a estruturaorganizacional adotada para o governo eletrônico;

• Nível de desenvolvimento da oferta de serviços e

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informações por meio eletrônico, considerando em espe-cial a utilização da Internet;

• Nível de aplicação das tecnologias da informaçãonos processos e rotinas da administração pública para oseu desenvolvimento e integração, aproveitando os po-tenciais da TI, e

• Avanço na construção da infra-estrutura do gover-no eletrônico, contemplando o acesso e a utilização deequipamentos e programas e a comunicação entreórgãose entidades por meio de infovias.

O item 1 analisa os aspectos relacionados com a vi-são estratégica e o planejamento do governo eletrônico,indicando que somente alguns estados demonstram umaassimilação mais abrangente desse conceito e das suaspotencialidades de aplicação na gestão pública. O item 2enfoca a estrutura organizacional considerando em espe-cial a existência de instâncias e mecanismos de coorde-nação intra-governamental, de articulação com parceirosfora do governo e de implementação transversal do gover-no eletrônico na administração pública como um todo.Verifica-se quehá experiências positivas de construção decomitês de coordenação e de inserção do governo eletrô-nico no nível estratégico de decisão. A expansão da ofertade serviços eletrônicos e os avanços relatados na dissemi-nação de portais integradores de serviços e informaçõesna Internet sãoanalisados no item 3. A construção da infra-estrutura de comunicações e o desenvolvimento de siste-mas e bancos de dados são objetos do item 4. O fortaleci-mento dos sistemas corporativos de apoio à gestão é umarelevante tendência identificada. O item 5 extrai das ten-dências delineadas um conjunto de desafios a serem en-frentados em futuro próximo, com vistas à consolidaçãodo governo eletrônico como política pública.

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1. Visão estratégica e planejamento

De forma geral, a política de governo eletrônico énovidade ainda incipiente, que se reflete no tratamentoda TI como ferramenta assimilada como simples aquisi-ção de equipamentos e sistemas. Uma visão mais desen-volvida está emergindo em alguns estados, focalizandoo governo eletrônico como prestação de serviços e infor-mações ao cidadão em meio eletrônico, por meio daInternet. Formulações da política mais desenvolvidas sãoencontradas no Distrito Federal, Paraíba, Pernambuco eSão Paulo. São experiências nas quais, ao lado da preo-cupação com serviços, constata-se certo equilíbrio e arti-culação entre as componentes desejáveis em uma políti-ca abrangente: estratégia e planejamento, serviços ele-trônicos, sistemas e bancos de dados e infra-estrutura dogoverno eletrônico.

Vale destacar o avanço de Pernambuco na formula-ção abrangente da política, apoiada em uma estruturaorganizacional para sua implementação. Nesse estado,o governo eletrônico, sob a denominação de governo di-gital, foi objeto de detalhada elaboração, com ênfase naaplicação da TI sobre a gestão e os serviços prestadospela administração pública. As ações estão alinhadas auma visão estratégica voltada para a reforma do estado,combinando informatização de serviços, capacitação dosservidores públicos, aquisição de equipamentos e pro-gramas, integração entre sistemas e construção de umainfovia. O estado estabeleceu o Programa Governo Digi-tal, em sucessivas leis e decretos, desde 2003. Esses atosdefiniram diretrizes, resultados esperados e providên-cias para a criação das instâncias de coordenação eoperacionalização do programa, assegurando alinha-mento estratégico e coerência entre as diversas açõesdesencadeadas (veja item 2).

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A coordenação de projetos e atividades na área deTI sob um planejamento global abrangendo a adminis-tração pública integralmente é um requisito necessáriopara a efetividade da política de governo eletrônico. Asdespesas em equipamentos, sistemas, serviços de rede etreinamento, embora vultosas no seu conjunto, são pla-nejadas e decididas de forma isolada, acarretando dis-persão de esforços, duplicação de infra-estrutura, perdade escala para investimento e aprofundamento dasdisparidades entre os órgãos. Os relatos das experiên-cias estaduais não apresentam nenhum caso de plane-jamento unificado de TI abrangendo todos os órgãos eentidades, apesar do registro de algum avanço inicialnes-sa direção: levantamento recente dá conta de que quatroestados de um total de 21 realizam planejamento de TI(Pnage, 2004). Os relatos deste seminário informam queo Distrito Federal realizou um diagnóstico estruturado,incorporando o conceito de governo eletrônico no plane-jamento das ações em TI e que em Minas Gerais estáprevista a elaboração de um plano diretor de investimen-tos em TI.

Na maioria dos estados, as políticas de TI estão vol-tadas para atender às necessidades de informação e ser-viços internas à administração pública. A evolução dapolítica de governo eletrônico para a exploração maisampla dos nexos com outras políticas públicas é aindacircunscrita ao caso de Pernambuco. Em outros estadoscomo Bahia, Paraná e Roraima essa evolução, por en-quanto, está ocorrendo por meio da incorporação deações de inclusão digital à política de governo eletrôni-co. As iniciativas de governo eletrônico podem se combi-nar com as políticas voltadas para a construção da socie-dade da informação, quando a assimilação da TI pelaadministração pública é articulada com a ampliação doacesso da sociedade a essas novas tecnologias, o de-

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senvolvimento científico e tecnológico, a capacitação dapopulação em TI e a disseminação do comércio eletrôni-co. De forma análoga ao conceito de governo eletrônico,a sociedade da informação refere-se a um estágio de in-tensa assimilação da TI no ambiente social e econômicoque proporcione o acesso aos recursos da informática portodos os segmentos da sociedade.

Em Pernambuco, a política de desenvolvimentotecnológico incorpora o governo digital como componen-te estratégico, ao lado dos componentes economia digi-tal e conhecimento e educação. Trata-se da única expe-riência relatada de inserção da política de governo digi-tal no marco mais abrangente de uma política de desen-volvimento da TI, explorando as complementaridades comas áreas de capacitação e pesquisa científica e tecno-lógica, mobilizando os centros acadêmicos e o segmentoindustrial de empreendedores em informática.

A implementação de políticas ou ações voltadas paraa inclusão digital é um desdobramento constatado emvárias experiências estaduais, conforme mencionado. Aviabilização do acesso do cidadão aos recursos da TI érequisito necessário ao governo eletrônico no contextosócio-econômico brasileiro, marcado por níveis de rendaper capita que dificultam uma disseminação em massade equipamentos, conectividade a redes e capacitaçãonas novas tecnologias. Algumas experiências incorpora-ram a extensão do governo eletrônico para ações de in-clusãodigital, comoé o caso de Bahia, Paraná eRoraima.Mas não há um desenho estratégico claro da inserçãodessa nova componente na política de governo eletrôni-co, particularmente o envolvimento de órgãos e entida-des da área social e educacional.

Na Bahia, as ações de inclusão digital foram estru-turadas em programa com planejamento e metas defini-

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das, voltadas para a criação de telecentros de acessopúblico gratuito, com oferta de programação educativa ede atividades culturais e de socialização. Foram implan-tados 120 telecentros em todo o estado. No Paraná, des-taca-se a implantação de telecentros sob concepção ino-vadora, voltada para o desenvolvimento local de comu-nidades carentes e para a capacitação de agentesmultiplicadores inseridos nas comunidades. Já estão im-plantadas 70 unidades em todo o estado e capacitados1.230 agentes de inclusão digital. Como projeto inovadorao promover a articulação entre níveis de governo, mere-ce atenção também a experiência do Espírito Santo noapoio à disseminação de sítios na Internet criados pelosmunicípios. A hospedagem é oferecida gratuitamentepelaempresa estadual de informática e o apoio inclui osoftware para a construção dos sítios. Essa iniciativa jáatende a cerca de um terço dos municípios do estado.

2. Estrutura organizacional

A incipiência das políticas de governo eletrônico nosestados é acompanhada pela fragmentaçãoinstitucional,com a prevalência nos estados da atuação dispersa dosórgãos e entidades. Nãoobstante, a criação de instânciasde coordenação entre as secretarias é um notável avan-ço registrado em quatro estados: Pernambuco, Roraima,Santa Catarina e São Paulo e o Distrito Federal. De umaforma geral, são comitês que coordenam as secretariasadotando diretrizes e ações de alcance horizontal paraabranger o conjunto da administração estadual.

O modelo organizacional mais completo é o dePernambuco, que insere a política de governo eletrônicono nível de decisão estratégico, cria instâncias de coor-denação intragovernamental e de articulação com a so-

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ciedade e, ainda, assegura a gerência e operaciona-lização das ações em cada órgão e entidade, por meiode unidades setoriais. As estruturas adotadas recentemen-te em São Paulo e em Roraima inovaram ao integrar assuas instâncias de coordenação da política de governoeletrônico com as de gestão, fortalecendo a construçãode uma visão estratégica voltada para o desenvolvimen-to da gestão. Nesses estados foram também implanta-das estruturas de coordenação técnica e decapilarizaçãoda política noâmbito de cada órgão e entidade, por meiode instâncias setoriais.

Assim, em Pernambuco, o governo eletrônico é con-duzido pelo órgão de administração (Secretaria de Ad-ministração e Reforma do Estado), o qual dispõe de umainstância técnica colegiada de coordenação interna dogoverno: o Comitê de Informática. Participam dessecolegiado as secretarias responsáveis pelas áreas deadministração, ciência e tecnologia, planejamento e fa-zenda, além do gabinete do governador e da agênciaprestadora de serviços de informática ao estado. Em ní-vel de decisão estratégica, asdiretrizes, prioridades, pla-nos e avaliação da política são atribuições de um cole-giado de secretários que trata globalmente das políticase assuntos institucionais: a Câmara Político-Institucional.As decisões dessa Câmara são instruídas pela análisetécnica previamente realizada pelo Comitê de Informática.A articulação ampliada entre governo eletrônico, empre-endedores de informática e centros acadêmicos se reali-za por intermédio de um conselho com representação mis-ta estado-sociedade, responsável pela condução do pro-jeto articulador das ações de parceria em TI: o Porto Digi-tal. A coordenação intragovernamental é apoiada pelaRede de Gestão do Governo Digital, que articula as se-cretarias por meio de unidades administrativas setoriaisde TI (denominadas Núcleos Setoriais de Informática -

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NSI), com atribuições de planejamento, gestão e opera-ção dos serviços de apoio informatizado aos seus órgãose entidades.

Em São Paulo, o governo eletrônico ganhou uma es-trutura de coordenação com maior densidade estratégi-ca a partir da incorporação ao comitê de gestão pública,das atribuições relacionadas com a TI. Essa mudançaintegrou as políticas de gestão (recursos humanos, supri-mentos, contratações, atividades administrativas comple-mentares) com as de informática e telecomunicações,anteriormente conduzidas por órgãos específicos. Essaampliação de abrangência possibilita a construção deuma visão capaz de incorporar a abordagem maisabran-gente do governo eletrônico. O comitê está inserido naCasa Civil, o que lhe assegura centralidade e efetiva ca-pacidade de coordenação. Uma estrutura de órgãossetoriais foi implantada, com a disseminação de núcleosde TI em cada órgão ou entidade da administração esta-dual, que se coordenam por meio de reuniões periódicas.

As empresas públicas de informática são componentefundamental da estrutura organizacional do governo ele-trônico, atuando na formulação técnica e implementaçãodos projetos e na prestação de serviços em TI. Os relatosindicam iniciativas de fortalecimento e/ou mudança emprofundidade nessas empresas, embora ainda restrita aum número reduzido de estados. Pioneiras na introduçãoda computação no País, essas empresas públicas em suamaioria ainda mantêm estruturas centralizadas, vertica-lizadas e voltadas para a prestação de serviços de altaespecializaçãodesconectada da participação mais inten-sa do cliente. Esse modelo herdado do paradigma tecno-lógico do processamento centralizado tornou-se defasa-do com as sucessivas ondas de mudança tecnológica naárea de informática: as novas tecnologias da microcom-

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putação pressupõem o relacionamento interativo e coti-diano do usuário com os equipamentos e sistemas de TI.Além disso, a importância assumida pelos investimentosem TI e sua implicação estratégica impõem cada vez maiso alinhamento entre as decisões nessa área e a estraté-gia das organizações.

O modelo institucional das empresas públicas deinformática necessita atualização: não há fórmulas rígi-das a serem seguidas, masuma tendência emergente temsido a adoção de formatos que possibilitem maior proxi-midade com o dia-a-dia dos clientes, alinhamento maisestrito dos investimentos com a construção do governoeletrônico e rápida atualização tecnológica em equipa-mentos, sistemas e infra-estrutura de comunicações. Emmuitos casos, essa atualização pode envolver mudançasjurídico-legais e organizacionais, da qual é exempli-ficativa a experiência de Pernambuco. A conjugação en-tre a mudança institucional e tecnológica nessas empre-sas com a utilização estrategicamente orientada daterceirização é outra experiência a ser considerada, emconexão com o reposicionamento das empresas de TI:novamente Pernambuco, ao lado da Bahia e do EspíritoSanto, apresenta avanços nesse sentido. Por outro lado,o revigoramento e fortalecimento da empresa pública deinformática tem sido o caminho seguido no Paraná. Nes-se estado, a empresa assumiu um papel estratégico nacondução do programa de governo eletrônico e de proje-tos de inclusão digital. De forma similar, na Paraíba foiatribuída à empresa pública de processamento de dadosa condução de uma política unificada de TI para a admi-nistração pública.

Em Pernambuco, a transformação jurídico-legal einstitucional da empresa pública de informática emautarquia resultou na criação da Agência de Tecnologia

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da Informação (ATI). Essa solução procurou atender ànecessidade de revigoramento institucional e de reduçãode despesas, particularmente o ônus tributário que incidesobre a forma jurídica de empresa. A antiga empresa foisucedida pela ATI, e as estruturas e equipes em atuaçãojunto aos diversos órgãos foram absorvidas por estes. Anova agência passou a atuar com estrutura enxuta, orien-tada por planejamento estratégico e contrato de gestãopara controle de resultados com base em metas e indica-dores de desempenho.

A experimentação da terceirização dos serviços deinformática sob novas modalidades que tiram proveitoda conectividade em rede está sendo implementada naBahia, com a implantação de data center pela empresade processamento de dados estadual, para realizar oprocessamento, conexão, hospedagem de sistemas, sí-tios e armazenamento de conteúdo para os órgãos e enti-dades da administração estadual. Essa modalidade pos-sibilita a redução de custos de aquisição e manutençãode equipamentos, com melhor desempenho e padrõessuperiores de segurança. No Espírito Santo, um piloto deterceirização unificada do serviço de apoio em microin-formática para as secretarias estaduais está sendo expe-rimentado. Em Pernambuco, a infovia PE-Multidigital foiimplantada por meio da contratação unificada de aces-so e serviços de rede para tráfego de dados, voz e ima-gem. Além de obter escala e redução de custos, o novomodelo viabilizou o estabelecimento de padrões de de-sempenho e tecnologia mais elevados, para toda a ad-ministração estadual. A PE-Multidigital teve seu contratocelebrado em 2005. Modelo semelhante está em implan-tação nesse estado para a disseminação de equipamen-tos de informática e para os serviços de armazenamentode dados e provisão de aplicativos (data center).

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3. Serviços e informações pela internet

A oferta de serviços e informações ao cidadão é amais evidente materialização do governo eletrônico, per-mitindo uma clara e direta experimentação das suaspotencialidades, de grande valia para a divulgação, ob-tenção de resultados imediatos e conseqüente sustenta-ção para o aprofundamento da implementação da políti-ca. A aplicação da TI possibilita o amplo acesso a infor-mações, a agilização de prazos, com possibilidade deprestação instantânea do serviço, a eliminação ou redu-ção da necessidade de deslocamento físico do cidadãoe a disponibilidade do serviço em tempo integral (24 ho-ras + 7 dias). O desenvolvimento dos serviços oferecidosem meio eletrônico pode se orientar para o atingimentode níveis crescentes de interatividade e de resolutividade.Os relatos dos estados indicam que, de uma forma geral,verificou-se o aumento na oferta de serviços e informa-ções pela Internet e a melhoria da sua apresentação eacesso em sítios eletrônicos. Entretanto, a pobreza emdados quantitativos e levantamentos abrangentes e sis-temáticos sobre o perfil da oferta de serviços é ainda umalimitação para a avaliação dos avanços verificados. Asexceções são o acompanhamento e a avaliação sistemá-ticos dos serviços por meio de indicadores, implantadosem Minas Gerais. A criação de portais únicos é avançoverificado em seis estados. Trata-se de portais que ofere-cem canal de acesso a todos os serviços e informaçõesda administração estadual disponíveis na Internet. A pa-dronização de layout e a fixação de padrões de desem-penho é outra importante tendência emergente.

Implantaram portais únicos integradores dossites deinformações e serviços mantidos pelos órgãos e entida-des: Distrito Federal (www.distritofederal.df.gov.br),MinasGerais (www.mg.gov.br/), Paraíba (www.portal.paraiba.

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pb.gov.br/), Pernambuco (www.p e.gov.br/) , Roraima(www.rr.gov.br/) , São Paulo (www.cidadao.sp.gov.br) eTocantins (www.portaldocidadao.to.gov.br/). A oferta deinformações pela Internet complementarmente aos servi-ços de atendimento ao cidadão (SAC) é inovação relata-da no caso da Bahia (www.sac.ba.gov.br). Outro registrodigno de nota é a implantação de sistemas de pregãoeletrônico e de divulgação das licitações na Internet,ampliando o acesso dos fornecedores às compras gover-namentais. Esse avanço é relatado em Goiás (www.comprasnet.go.gov.br), Paraná (www.pr.gov.br/compraspr),Pernambuco (www.pe.gov.br/) e São Paulo (www.bec.sp.gov.br). A prestação de informações à sociedade sobre aação governamental avançou com a criação de sistemasde informação e de portais na Internet voltados para atransparência, como em Goiás e no Paraná (www.gestaodinheiropublico.p r.gov.br). O portal de transparênciaparanaense oferece informações sobre o orçamento eexecução financeira e sobre resultados dos programas eprojetos, com atualização contínua e design de fácil na-vegação. No Espírito Santo, foi relatado o uso do canaleletrônico na Internet para o encaminhamento de denún-cias à auditoria estadual.

Duas experiências são exemplares na sua abran-gência e qualidade, como referências de criação de por-tais integradores conjugada à padronização do design edos serviços pela Internet: o Distrito Federal e Minas Ge-rais. No Distrito Federal, a integração dos sítiosna Internetfoi apoiada pela padronização de layout, definição deregras para a publicação de conteúdos e criação de ins-tâncias de coordenação com a participação dos órgãosresponsáveis pelos serviços. Os resultadosindicam o cres-cimento do canal eletrônico na prestação de serviços einformações ao cidadão, com a perspectiva futura deampliar o rol de serviços e introduzir mecanismos para

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sua avaliação. Há um canal de acesso geral - o Portal doDistrito Federal - que oferece ao usuário orientação paraa remissão aos demais portais, noticiário de divulgaçãodas ações de governo e documentos de planejamento eorçamento. O Portal do Cidadão é canal de acesso a 79serviços eletrônicos oferecidos pelos órgãos e entidadesde toda a administração estadual. O Portal do Servidoroferece serviços e informações da área de recursos hu-manos, como a consulta ao contracheque (holerite), aatua-lização de dados cadastrais, a divulgação de currículoprofissional, a inscrição em eventos de capacitação e arealização de treinamento a distância. O Portal de Em-presas publica informações de interesse do segmentoprodutivo, industrial e de prestadores de serviço e divul-ga ações no governo nessa área. O Portal de Governopublica informações institucionais sobre a estrutura orga-nizacional da administração estadual, cadastro de diri-gentes oferecendo o acesso à versão eletrônica do Diá-rio Oficial.

Em Minas Gerais, a padronização dos sítios gover-namentais na Internet contemplou a fixação de padrõesde usabilidade, de design e de conteúdos, definida porresolução da Secretaria de Planejamento e Gestão. A fi-xação de padrões foi acompanhada do estabelecimentode parâmetros para a avaliação do desenvolvimento dosserviços. Esses parâmetros estabelecem estágios de de-senvolvimento dos sítios, possibilitando a comparaçãoentre os órgãos e o incentivo à melhoria dos seus servi-ços na Internet. Os resultados obtidos evidenciam o au-mento do percentual dos sítios em estágio avançado dedesenvolvimento, de 35,7% para 49% em 2005. O portalintegrador publica o noticiário governamental, possibili-tando o acesso orientado aos sítios de serviços e infor-mações voltados para as clientelas: cidadãos, empresas,governo e servidores públicos. Há ainda um sítio para

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informações turísticas sobre o estado. Importante novi-dade foi a implantação de um sistema de gestão de con-teúdo para a capacitação do pessoal e atualização per-manente das informações e dos serviços. A atualização érealizada de forma descentralizada pelos órgãos e enti-dades responsáveis pelos serviços, mas obedece a dire-trizes e mecanismos estabelecidos para toda a adminis-tração estadual.

4. Infra-estrutura, sistemas e informações

De uma forma geral, constata-se a carência de in-formações sobre a construção da infra-estrutura do go-verno eletrônico nos estados, o que reflete a dificuldadede obtenção de dados gerenciais e o padrão ainda pre-valecente de fragmentação do orçamento e do planeja-mento de compras e contratações em TI. O crescimentodo acesso a equipamentos (microcomputadores) pelosservidores públicos é relatado por Pernambuco. EmRoraima, há o registro de investimentos na aquisição deequipamentos e na ampliação da comunicação eletrôni-ca no âmbito da administração estadual. Avanços na im-plantação de infra-estrutura de rede interligando os ór-gãos da administração estadual e na oferta de serviçosde rede unificados ocorreram em Pernambuco e Paraíba.Em Pernambuco foi implantada a infovia PE-Multidigital,oferecendo acesso e serviços de rede para tráfego de da-dos, voz e imagem.

A informatização de processos e rotinas avançou namaioria dos estados, indicando um movimento importan-te de integração que é impulsionado pelos sistemascorporativos, em sua maioriavoltada para o apoio às fun-ções administrativas comuns aos órgãos e entidades. Apenetração horizontal desses sistemas e seu uso com-

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pulsório nas rotinas e trâmites da administração geramimpactos sistêmicos com repercussão na eficiência da ad-ministração como um todo. A agilização de procedimen-tos, o fortalecimento de controles automáticos, que nãoacarretam criação de etapas de controle, e a melhoria daqualidade das rotinas de orçamento, planejamento, pes-soal e compras e contratações trazem benefícios ao con-junto da administração pública. Grande parte das inicia-tivas em automação de processos ainda ocorre de formaisolada, permanecendo seus efeitos circunscritos a umórgão ou processo, sem o aproveitamento das facilida-des integradoras proporcionadas pela TI.

Sistemas corporativos de apoio à gestão foram de-senvolvidos para as áreas de recursos humanos no Espí-rito Santo, na Paraíba e em Tocantins; para o apoio àscompras e contratações, na Paraíba, Paraná e SantaCatarina; para o gerenciamento de contratos e convêniose para o apoioà preparação do planejamento plurianual(PPA), na Paraíba. Em Minas Gerais, foi criado um siste-ma de informação institucional para apoiar e controlarmudanças na estrutura organizacional dos órgãos e enti-dades. Em São Paulo, um sistema de apoio ao planeja-mento setorial em projetos de TI. Em Tocantins, foram im-plantados sistemas e sítio na Internet para atendimentoàs rotinas da área de administração tributária.

A ampliação de abrangência dos sistemas corpo-rativos é outra tendência que merece registro porque re-flete seu fortalecimento institucional: na Paraíba, foramincorporados os hospitais estaduais ao sistema de ad-ministração financeira. Esse mesmo sistema incorp orouos processos de empenho e de pagamento ao seu fluxoeletrônico. Outra tendência é a migração de sistemascorp orativos para p lataforma web, que está sendo rea-lizada na Paraíba, Pernambuco e Bahia. Sistemascorp orativos de recursos humanos, de comunicação

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administrativa, de gestão de frotas e de administraçãoorçamentária e financeira estão em implantação no es-tado de Roraima.

Sistemas gerenciais para apoioao processo decisóriorepresentam promissora novidade para o aproveitamen-to dos potenciais de extração e tratamento da informa-ção acumulada nos sistemas corporativos. O uso dessainformação pelos gerentes públicos pode ser viabilizadopor meio da sua organização em relatórios estruturados.No Paraná foi implantado um sistema de geração de bo-letins gerenciais com estatísticas sobre os recursos hu-manos. A Bahia desenvolveu sistemas para a integraçãodos seus canais de relacionamento com o cliente (pes-quisa em formulário, e-mail e call center) e para o moni-toramento da rotina de atendimento no âmbito do Servi-ço de Atendimento ao Cidadão (SAC). Esses sistemaspossibilitam o tratamento global das demandas dos ci-dadãos processadas por esses canais.

Sistemas de controle de despesas correntes são ain-da pouco disseminados, embora representem novidadede baixo custo e elevado potencial de impacto no contro-le gerencial de despesas correntes. No Paraná foi desen-volvido sistema de controle do consumo de serviços defornecimento contínuo (água, luz, telefone) e de manu-tenção de frota automotiva. Sistemas de controle da emis-são de passagens aéreas foram implantados no EspíritoSanto. Sistemas de apoio à gestão de frotas, protocolo eemissão de passagens aéreas estão sendo desenvolvi-dos na Bahia.

Os sistemas de apoio a políticas públicas setoriaisavançaram em algumas áreas de importância críticaparao desempenho dos governos. Na área de segurança pú-blica, um sistema de processamento informatizado doatendimento telefônico da autoridade policial (190) foi

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implantado no Espírito Santo; o sistema de consultas aoSistema Nacional de Segurança Pública (Infoseg) e deregistro nacional de infrações do trânsito (Sistema deRegistro Nacional de Infrações - Renainf) na Paraíba e oboletim de ocorrências eletrônico, em Pernambuco eTocantins. Na área de educação, o sistema eletrônico dematrícula na rede pública de ensino foi implantado emPernambuco e, na área de saúde, nesse mesmo estado, osistema de reserva de leitos hospitalares.

Com relação à segurança da informação, é item ain-da ausente nas políticas da maioria dos estados, o quetambém reflete a fragmentação da ação e o isolamentoentre os órgãos e entidades, muitos dos quais certamen-te já avançaram isoladamente na construçãode sua infra-estrutura de comunicações eletrônicas. Porém, o tema dasegurança nas comunicações requer uma abordagemglobal: os riscos de violação e de falhas de sistemas ouequipamentos representam ponderável obstáculo aoavanço na integração dos sistemas e bancos de dados eda utilização da comunicação eletrônica no cotidiano daadministração pública. Conforme mencionado, o temanão aparece nos relatos dos estados, à exceção de Mi-nas Gerais, que elaborou um modelo de gestão da segu-rança da informação em implantação inicial. Outro as-pecto relacionado à segurança é a certificação digital ea preparação para a realização de trâmites administrati-vos por canal eletrônico. Esse é requisito indispensávelpara a sustentação em longo prazo dos novos formatosorganizacionais e de comunicação emergentes com oavanço do governo eletrônico. Há relato de avanços no-vamente em Minas Gerais, com a informatização de pro-cessos acoplada à sua validação por meio de assinaturadigital, que está sendo implantada para atos normativosde governo e para rotinas de aposentadoria dos servido-res públicos.

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5. Desafios para o futuro

Os desafios delineados nesse item são recomenda-ções para a consolidação da política de governo eletrô-nico, formuladas de forma tentativa, com o propósito deestimular a reflexão a partir das evidências e tendênciasidentificadas nos estados. Na medida do possível, procu-ram refletir os caminhos que vêm sendo trilhados pelasexperiências mais avançadas, sem necessariamente ex-pressar um consenso. Esses desafios referem-se em pri-meiro lugar à formulação e implementação da política:considera-se recomendável a elaboração de uma visãode governo eletrônico convergente com o ideário da re-forma e transformação da administração pública, a in-serção dessa política num marco amplo de construçãoda sociedade da informação e a sua aplicação no forta-lecimento da transparência e da participação do cida-dão nos assuntos de governo. Para uma efetivaimplementação do governo eletrônico, impõe-se a cons-trução de instâncias e mecanismos de coordenação e suacapilarização por toda a estrutura da administração pú-blica. A coordenação dos investimentos em TI, reverten-do a atual pulverização de recursos, é outro desafio denatureza institucional a ser enfrentado. Em segundo lu-gar, o governo eletrônico deve avançar em direção ao de-senvolvimento da resolutividade dos serviços na Internet.Importante barreira a ser transposta é a da transforma-ção de processos e estruturas que estão na retaguardados sítios da Internet. Em terceiro lugar, os desafios daintegração de sistemas e da construção da infra-estrutu-ra do governo eletrônico, na forma de infovias abrangen-do a administração pública como um todo. Esses temassão desenvolvidos nos itens que se seguem.

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5.1. Dotar o governo eletrônico de visão eplanejamento estratégico alinhados com atransformação da administração pública

Trata-se de ultrapassar a visão limitada do governoeletrônico como simples provisão de ferramentas detecnologia da informação, entendendo-o como poten-cializador de muitas das concepções e práticas que têmnorteado as experiências de reforma da administraçãopública. Essaafinidade do governo eletrônico com aagen-da das áreas de gestão está fartamente evidenciada naspróprias experiências relatadas neste seminário: os ser-viços de atendimento integrado ao cidadão, as novasmodalidades de compra e contratação, como o pregão,as metodologias e ferramentas de controle por resulta-dos são apenas alguns dos exemplos em que a aplica-ção da TI proporciona benefícios substanciais. Assim,considera-se fundamental fazer convergir agendas, equi-pes, processos de formulação e de planejamento entreas áreas de modernização administrativa e gestão e asde governo eletrônico.

A construção de uma visão estratégica e, de formasubseqüente, sua tradução em processos de planejamentoe na fixação de metas deve ocorrer em sintonia com avisão e os objetivos prioritários de governo, de forma quesejam oferecidas efetivas soluções que contribuam coma agenda crítica das administrações estaduais. As agen-das do governo eletrônico e da reforma e modernizaçãoda administração pública, em criativa convergência, cer-tamente terão muito a contribuir para a melhoria do de-sempenho sistêmico da máquina administrativa, sobre-tudo de suas áreas-meio, a oferta de formas inovadorasde atendimento ao cidadão, a redução de despesas pormeio de controles inteligentes e eficazes, a viabilizaçãode soluções inovadoras em áreas de política pública de

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alto impacto como educação, segurança e apoio aoempreendedorismo na área empresarial.

Um possível caminho nessa direção seria a elabora-ção de documentos de política, construindo nesse pro-cesso redes de apoio com a mobilização de técnicos edirigentes disseminados por toda a administração públi-ca. O aproveitamento dos relacionamentos e da expe-riência já acumulada no âmbito de iniciativas como a doPnage seria certamente muito positivo. Inserir o governoeletrônico na visão estratégica de governo pressupõe as-segurar a presença de conteúdos estratégicos relativosàs TIs no desenho da visão e dos objetivos do governocomo um todo. De forma específica, incluem a elabora-ção de uma visão setorial do governo eletrônico e de pro-jetos e ações para a reestruturação, realinhamento, atua-lização tecnológica e gestão dessa área.

5.2. Inserir o governo eletrônico em políticas maisamplas voltadas para a sociedade da informação

Há inúmeros caminhos a percorrer no desbordamentoda política de governo eletrônicopara aproveitar sinergiascom outras políticas públicas com alto potencial de apli-cação da TI. As experiências relatadas indicam a abertu-ra para atuação em projetos de inclusão digital em esta-dos como Bahia, Paraná e Roraima, embora sem um cla-ro alinhamento estratégico. Em Pernambuco há uma vi-são mais elaborada dos nexos entre o governo eletrônicoe projetos de desenvolvimento científico e tecnológico ede fortalecimento do segmento empresarial de TI. A arti-culação com outras políticas públicas amplia os impac-tos do governo eletrônico, aumenta sua visibilidade eapoio público e permite construir parcerias interessantespara aportar recursos que sejam escassos na área públi-

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ca. Particularmente promissoras são ações integradas,envolvendo o governo eletrônico na capacitação da po-pulação em TI, nos projetos de inclusão digital, no fo-mento a empresas inovadoras na área de TI e na prepa-ração para o comércio eletrônico, sobretudo entre peque-nas empresas. A interveniência dos projetos de governoeletrônico poderá ocorrer sob diversas formas, entre asquais: o compartilhamento de infovias públicas para ainclusão digital; o uso do poder de compra da adminis-tração pública no estímulo ao comércio eletrônico e amelhoria de serviços públicos que tenha impacto diretosobre esses segmentos, a exemplo da desburocratizaçãode procedimentos de registro de empresas e de cumpri-mento de obrigações fiscais, valendo-se da comunica-ção eletrônica pela Internet.

5.3. Explorar a aplicação do governo eletrônico natransparência e fortalecimento da democracia

Os potenciais da TI na transformação do processodecisório e do relacionamento dos governos com a socie-dade representam um dos horizontes mais ousados deconstrução do governo eletrônico. Porém, envolve ques-tões de grande complexidade que, em última análise,impõem a discussão dos mecanismos da democraciarepresentativa e das instituições que lhe estão historica-mente associadas. O tema emergente da democracia ele-trônica pressupõe que a TI, no seu estágio de desenvolvi-mento atual, abre possibilidades inéditas de acesso àinformação e de interação direta entre cidadão e gover-no que certamente conduzirão, no futuro, a novos forma-tos de governança. De imediato, há dois eixos a seremexplorados: o primeiro é o da ampliação da transparên-cia dos governos, que representa um desafio bastantepalpável porque as possibilidadestecnológicas permitem

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uma ampla abertura do dia-a-dia da administração aoescrutínio público.

Formas relativamente fáceis de avançar nesse senti-do são a criação de portais integradores de informação,que muitos estados já implementaram, e a abertura deinformações dos sistemas corporativos à Internet. Há umaagenda de interesse imediato referente a temas sensíveisgeralmente objeto da atenção da imprensa e de forma-dores de opinião: a abertura de informações sobre orça-mento, ex ecução financeira, convênios, compras e con-tratações, remunerações, agendas de autoridades gover-namentais, auditorias e prestações de contas. Experiên-cia interessante nesse sentido é a do Paraná, conformerelato neste painel. Uma agenda mais sofisticada detransparência refere-se à ampla divulgação de documen-tos, inclusive planos e projetos que dêem conta da açãogovernamental e seus resultados. Embora aparentemen-te simples, a prática da divulgação de documentos mui-tas vezes implica mudança no estilo prevalecente na ad-ministração pública, que é de temor à exposição pública:dirigentes e equipes devem ser persuadidos das vanta-gens da contínua disponibilização de documentos, rela-tórios, boletins e informações que sejam de interesse pú-blico, valendo-se da flexibilidade e rapidez da Internet.Essa abertura traz benefícios consideráveis em constru-ção de apoio, conhecimento de críticas e abertura de no-vos canais de interlocução mais amplos e diversificados.

A participação do cidadão no processo decisório, ti-rando proveito das facilidades da comunicação eletrôni-ca, é outra perspectiva a ser desenvolvida, embora aindaincipiente porque envolve o desenvolvimento de meca-nismos e formatos institucionais que possibilitem a con-sulta e participação. Formas de mais simples operacio-nalização já são freqüentemente praticadas, como é o

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caso das consultas públicas referentes a atos normativosou políticas, que têm na Internet e nos canais eletrônicosuma extraordinária ferramenta.

5.4. Dotar a política de governo eletrônico deestruturas de coordenação e articulação

A criação de instâncias e mecanismos de coordena-ção e articulação em nível estratégico é essencial para aconsolidação do governo eletrônico. Um modelo recomen-dável, que reflete experiências estaduais mais desenvol-vidas, como Pernambuco e São Paulo, é o que prevê ins-tâncias em nível estratégico de decisão, instâncias técni-cas com dirigentes das áreas de TI e gestão e instânciase mecanismos de penetração em cada órgão e entidadepara implementação da política em nível operacional. Ainstância estratégica do governo eletrônico pode assu-mir a forma de colegiado com participação de dirigentesdos órgãos, secundados por comitês técnicos integradospor gerentes e técnicos. Um órgão central, em nível desecretaria, deve receber competências de formulação dapolítica, normatização, fixação de padrões e avaliaçãodo desempenho da política como um todo. As competên-cias desse órgão podem incluir os temas de gestão, in-clusive aqueles relacionados com as políticas de servi-ços gerais e recursos humanos. Trata-se de traduzir, noâmbito organizacional, a inserção do governo eletrônicono campo da gestão pública de forma orgânica, confor-me preconizadono item 5.1. Instâncias de articulação coma sociedade também devem ser construídaspara dar sus-tentação a parcerias com segmentos que tenham um pa-pel crucial na implementação de projetos voltados paraa sociedade da informação.

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5.5. Coordenar os investimentos e projetos em TI

A coordenação de investimentos é importante nãosomente para fazer frente à escassez de recursos comotambém para evitar duplicação, desperdício e desenvol-vimentos incompatíveis com a integração entre os siste-mas. Essa coordenação poderá ocorrer por meio de me-canismos de escrutínio e seleção de projetos, da aplica-ção de critérios para a liberação de recursos, da fixaçãode padrões pactuados de integração de sistemas e daconcentração de recursos orçamentários. Além disso,poderão ser criados incentivos na forma de dotações or-çamentárias adicionais destinadas especificamente aofinanciamento de projetos por órgãos que estejam efeti-vamente engajados na implementação das diretrizes es-tratégicas na área de governo eletrônico. Conforme ana-lisado no item 1, esse é um desafio em relação ao qual aexperiência dos estados pouco avançou.

5.6. Reposicionar estrategicamente as unidades deTI nos órgãos e as empresas públicas de informática

Ao lado da criação das instâncias de coordenação earticulação, indicada no item 5.4, a consolidação do go-verno eletrônico exige capacidade de implementaçãotransversal por toda a administração pública. Estruturasde coordenação acopladas a unidades setoriais repre-sentam o modelo adotado de forma mais acabada emPernambuco e em São Paulo. Essas duas experiênciaspodem servir de referência para o reposicionamento hie-rárquico e a reestruturaçãodas unidades administrativasque atuam na área de TI em cada órgão e entidade. Su-gere-se, entretanto, que essas unidades sejam reorgani-zadas como unidades setoriais voltadas aos assuntos degestão, que poderiam incluir, além da TI, as áreas de re-

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cursos humanos, compras e contratações e moderniza-ção administrativa.

No que se refere especificamente às competênciasem TI, uma nova forma de atuação deveria ser delineadaem conexão com o revigoramento das empresas públi-cas de informática. Assim, as unidades setoriais de ges-tão poderiam atuar na coordenação de projetos de go-verno eletrônico e na especificação e gestão dos contra-tos de prestação de serviços em TI no âmbito dos seusórgãos. Essas unidades, enxutas e dotadas de quadrotécnico qualificado e multifuncional, poderiam ser coman-dadas por dirigente inserido no nível estratégico da or-ganização. O reposicionamento das unidades de TI nosórgãos deve romper com o perfil atualmente predominan-te, voltado para a atuação operacional com limitada ca-pacidade técnica e precária negociação dos contratos deterceirização.

A responsabilidade técnica pela condução dos prin-cipais projetos na área de governo eletrônico continuaráa ser naturalmente assumida pelas empresas públicasde informática, que necessitam de atualização tecnoló-gica e, em muitos casos, de mudanças institucionais, pormeio de processos internos de reestruturação e de melho-ria da sua administração. Essas entidades poderiam pas-sar a uma atuação direcionada para a prospecção detecnologias e a proposição e análise de especificaçõestécnicas e padrões e para a prestação de serviços àadministração pública mediante contratos de gestão, na-quelas atividades em que sejam detentoras de compe-tências competitivas em relação ao mercado, ou que en-volvam requisitos de segurança dos bancos de dados. Éindispensável que sua conformação jurídico-legal semantenha como empresa ou como autarquia, dotada dasnecessárias condições de operação com agilidade, fle-

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xibilidade e autonomia administrativa. Um novo modelode prestação de serviços de informática poderá ser colo-cado em prática, incluindo o relacionamento com o clien-te em moldes que privileg iem a maior aproximação einteração com o usuário, bem como o alinhamento e atua-ção em parceria na implementação das estratégias degoverno eletrônico.

5.7. Transformar em profundidade a prestação deserviços ao cidadão por meio da aplicação da TI

A transformação dos serviços prestados ao cidadão,oferecendo padrões superiores aos dos serviçospresenciais, é uma das mais visíveis promessas do go-verno eletrônico e seu principal impulsionador. Avançosconsistentes ocorreram nos estados com a criação deportais integradores de serviços e informações naInternet.Esses portais interligam os sítios mantidos pelos órgãose entidades, viabilizando um primeiro passo rumo àintegração entre estruturas e processos. Experiênciasexemplares como as do Distrito Federal e de Minas Ge-rais demonstram que o portal pode se converter emimpulsionador da melhoria dos serviços, por meio da fi-xação de padrões e do acompanhamento sistemático doseu desenvolvimento rumo a estágios mais avançados deresolutividade. Esse é um caminho promissor de induçãode melhorias nesse sentido, alcançando toda a adminis-tração pública. A transformação dos serviços em direçãoa estágios mais avançados pode ser impulsionada pelosucesso que se obtenha da unificação e padronizaçãodos portais e sítios. Esse desafio, entretanto, exige a re-moção de obstáculos legais e burocráticos.

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5.8. Oferecer serviços e processos contínuos quepotencializam os efeitos da TI sobre a estruturaorganizacional

As TIs potencializam a adoção de estruturas inova-doras, desenhadas com base em funções ou em perfis decliente. A transformação de estruturas pode adotar comopremissa a revisão de rotinas e processos dirigida ao ci-dadão-usuário de serviços, a ruptura com as divisões tra-dicionais e a reestruturação da administração públicacom base nas demandas por serviços e informações docidadão ou com base em processos ou funções básicas.Não há evidências mais significativas de integração etransformação de serviços e estruturas na experiênciarelatada dos estados. É um avanço que necessariamentese imporá na medida em que sejam aprofundadas duasimportantes experiências que ainda se desenvolvem emparalelo: a primeira é a dos portais integradores de servi-ços e informações a qual, como mencionado, tende a evo-luir em direção à fixação de padrões e de mecanismosde acompanhamento e avaliação dos serviços. A segun-da são os serviços de atendimento ao cidadão, que exer-cem saudável pressão pela melhoria das estruturas e pro-cessos de trabalho nos órgãos e entidades que, na suaretaguarda, são responsáveis últimos pelo serviço ofere-cido ao cidadão.

5.9. Desenvolver e integrar sistemas e bancos dedados combinando definições estratégicas comavanços imediatos

A integração entre sistemas e bancos de dados éum complexo processo de convergência dos acervos deinformação acumulados historicamente sob diferentes for-matos tecnológicos, impondo considerável dificuldade

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para sua operacionalização. Envolve também tensões emtorno do controle sobre a informação, não raro objeto dedisputa entre instituições. Não há avanços relatados nasexperiências estaduais: a integração de sistemas está nohorizonte de planejamento de estados como o Paraná ePernambuco. Para a construção do governo eletrônico,será necessário estabelecer quanto antes parâmetros eoutras definições estratégicas para orientar a progressi-va convergência entre os sistemas. A fixação em 2004,pela administração federal, dos padrões de interopera-bilidade, denominado E-PING, é um importante ponto departida a ser levado em conta pelos estados na defini-ção das suas estratégias. A integração é requisito neces-sário para a oferta, em futuro não muito distante, de ser-viços contínuos ao cidadão, interligando diferentes ór-gãos, ultrapassando barreiras formais, até mesmo entreníveis de governo.

Em curto prazo, a integração poderia avançar combenefícios imediatos impulsionada pelo desenvolvimen-to dos sistemas corporativos, aplicando a TI na transfor-mação em profundidade dos processos das áreas-meioda administração pública. Como se sabe, além dos pro-blemas relacionados a excessos normativos, formalismoe lentidão de procedimentos que afetam de formasistêmica a administração pública, há conhecidas defi-ciências de controle que geram desgaste de imagem: é ocaso sobretudo das despesas com compras e contra-tações, pessoal e convênios. Os sistemas de administra-ção financeira podem servir de base para o desenvolvi-mento dos demais sistemas corporativos - em áreas comopessoal, compras, orçamento e planejamento - integran-do a realização da despesa com os trâmites e rotinas quelhe dão causa, proporcionando níveis de controle e trans-parência da informação que só são possíveis com a utili-zação da TI. Outras possibilidades a serem exploradas

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são o desenvolvimento e a integração entre os sistemascorporativos, adotando como eixos comuns para o inter-câmbio de dados e informações os sistemas de adminis-tração financeira e aestrutura de órgãos e entidades, pos-sibilitando a obtenção de relatórios gerenciais.

5.10.Integrar o governo pela infra-estrutura de redes

A construção da infra-estrutura de comunicação dogoverno eletrônico deverá sematerializar nas infovias queinterligam a administração pública, para as quais con-fluirão todos os fluxos de comunicação, substituindo pro-gressivamente mídias tradicionais como a telefonia, commelhor desempenho e economia de despesas. As infoviassão a plataforma sobre a qual será constituído um novocenário de comunicação intensiva (dados, voz e imagemintegrados) necessário aos avanços na transformação deprocessos e estruturas organizacionais. Em Pernambuco,a construção da infovia é uma das componentes funda-mentais da estratégia e do planejamento de governo ele-trônico. Em Minas Gerais, a introdução da telefonia so-bre IP nas comunicações intragovernamentais é projetoem elaboração. Um primeiro passo necessário é a unifi-cação de projetos e iniciativas de contratação de redes,revertendo a situação ainda prevalecente de pulveriza-ção de ações com perda de escala e custos onerosos. Asestratégias para a construção de infovias deverão consi-derar, além dos aspectos tecnológicos, os modelos decontratação e a perspectiva de utilização otimizada dainfra-estruturainstalada no País. Uma possibilidade a serconsiderada é a articulação entre governos para ocompartilhamento de suas infra-estruturas de rede.

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Referência Bibliográfica

Pesquisa PNAGE (2004). Diagnóstico geral das adminis-trações públicas estaduais. Brasília, Ministério do Plane-jamento, Orçamento e Gestão.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Novas Formas de Gestão Pública

Relator: Regina Silvia Pacheco

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Novas formas de gestão pública

Regina Silvia Pacheco

Professora da Fundação Getúlio Vargasde São Paulo

Introdução

No Seminário Avanços e Perspectivas da Gestão Pú-blica nos Estados, o último tema proposto abrangia umasérie bastante ampla de subtemas: “Coordenação eintersetorialidade. Gestão por resultados e indicadores.Integração entre planejamento, orçamento e gestão.Contratualização. Controle interno. Transparência e éti-ca. Ouvidorias. Política e gestão da qualidade. Desburo-cratização. Ganhos de produtividade. Inovação. Gestãodo conhecimento e memória administrativa”.

O entendimento sobre o tema, por parte dos 14 esta-dos que relataram suas iniciativas, foi bastante variado.Alguns estados compreenderam que deveriam relatarprojetos específicos, enquanto outros consideraram ade-quado relatar experiências abrangentes. Entre as inicia-tivas relatadas, incluíam-se:

• Criação de um prêmio de inovação na gestão pú-blica;

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• Atividades relativas à capacitação de funcionários;

• Melhorias introduzidas nas normas e funcionamen-to dos processos disciplinares;

• Criação e funcionamento de sistemas informati-zados de apoio à gestão;

• Implantação de programa de qualidade;

• Articulação do estado com municípios, com o obje-tivo de promover a melhoria da gestão pública;

• Estabelecimento de parcerias público-privadas(PPPs);

• Criação e funcionamento de organizações sociais;

• Promoção da transparência nos assuntos de go-verno, com a criação de portal;

• Implementação de mecanismos voltados à gestãopor resultados;

• Monitoramento de prioridades de governo e pro-gramas estratégicos; e

• Contratualização de resultados.

Os três últimos tópicos - gestão por resultados, moni-toramento de programas estratégicos e contratualizaçãode resultados - constituíram os aspectos mais relatadospelos estados. Durante o seminário, apresentaram suasexperiências os estados de Espírito Santo, Minas Gerais,Paraná, Pernambuco, Roraima e Sergipe. Nossa síntesedará ênfase à gestão e contratualização de resultados,buscando comentar as experiências relatadas à luz daexperiência internacional sobre o tema. Procuraremosextrair lições da experiência internacional, confrontando-as com as experiências das administrações estaduais.Assim, além de buscar refletir os esforços em curso, nos-so objetivo é tecer comentários e sugestões que sirvam àmelhoria das experiências em andamento.

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1. Experiências estaduais relatadas

1.1. Espírito Santo

Dois projetos foram relatados: o Conselho Estadualde Secretários de Gestão e a iniciativa denominada Ges-tão de Valores. O Conselho de Gestão (Cesg) é umcolegiado, liderado pelo secretário estadual de Gestão eRecursos Humanos, criado por um decreto do governo doestado que estabelece regras para seu funcionamento eprevê a participação de municípios por meio de adesão.Vêm participando regularmente das atividades do con-selho cerca de 40% dos municípios do Espírito Santo. Oobjetivo do conselho é articular os municípios e coorde-nar esforços do governo estadual e municípios em prolda melhoria da gestão pública. Desde sua criação, fo-ram realizadas três reuniões trimestrais para troca deexperiências e aportes conceituais; há também um sitededicado ao conselho.

Com essa iniciativa, o governo do estado promove odesenvolvimento da gestão pública junto aos municípios;incentiva a troca de informações e experiências e disse-mina práticas inovadoras e bem sucedidas. A divulga-ção de iniciativas positivas contribui para mobilizar aopinião pública, buscando contrapor a imagem constan-temente difundida de “inoperância do setor público”.

A iniciativa Gestão de Valores corresponde a um sis-tema de acompanhamento de metas mobilizadoras defi-nidas pelo governo do estado. A partir das metas, sãoidentificadas ações prioritárias, monitoradas por um sis-tema de acompanhamento intensivo, coordenado pelaSecretaria Estadual de Economia e Planejamento (SEP).O andamento das ações é avaliado conjuntamente pelosecretário da área e secretário da SEP. Os resultados são

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acompanhados pelo governador, que realiza pelo menosuma reunião anual com os secretários responsáveis.

1.2. Minas Gerais

Após breve explicação das mudanças efetuadas namacroorganização do estado, foram relatadas duas ini-ciativas: a implantação dos acordos de resultados e asPPPs (parcerias público-privadas).

Entre as mudanças na macroestrutura, foram desta-cadas: a fusão das Secretarias de Planejamento e Admi-nistração, dando origem à Secretaria de Planejamento eGestão, reunindo num só órgão as funções de planeja-mento, orçamento e gestão; a fusão das funções decorregedoria e auditoria; fusão da Procuradoria-Geral doEstado e Procuradoria da Fazenda Estadual; a criaçãode uma única ouvidoria-geral do estado com seis áreasde atuação.

Foram definidos projetos estruturadores que passa-ram a receber gerenciamento intensivo; entre eles, o pro-jeto Choque de Gestão definiu as iniciativas e instrumen-tos para a melhoria da gestão pública.

O acordo de resultados representa um instrumentode negociação entre dirigentes para fixar compromissocom resultados a serem alcançados em troca da amplia-ção de algum grau de autonomia para a entidade queassume o compromisso - iniciando pela definição clarade missão da entidade. Os programas são organizadosem uma matriz de resultados e desdobrados em iniciati-vas a cargo de diferentes secretarias. Os resultados dosprogramas devem apontar paraa visão de futuro - altera-ção positiva do Índice de Desenvolvimento Humano doestado (IDH). Cada secretaria, voluntariamente, podeaderir à celebração de um acordo de resultados, reunin-

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do sua contribuição aos diferentes programas estaduais;há a possibilidade de pagamento de prêmio aos servido-res, em função do atingimento de metas. Até março de2006, haviam sido celebrados 17 acordos de resultados,enquanto outros nove estão em fase de concretização.

A segunda iniciativa relatada foi a implantação dasPPPs. O estado contou com consultoria inglesa (organi-zação Partnership UK), já que a Inglaterra foi pioneira naadoção dessa modalidade de provisão de serviços públi-cos. Minas Gerais foi o primeiro ente federativo, no Bra-sil, a aprovar sua legislação sobre PPPs - antes mesmoda União. Por meio das PPPs, até março de 2006 haviamsido providas 3 mil vagas prisionais, obras de saneamen-to, a construção de estrada e do campus administrativo.

1.3. Paraná

O estado do Paraná também apresentou duas ini-ciativas, ambas apoiadas no uso de tecnologia da infor-mação para promover a transparência na gestão da coi-sa pública. A iniciativa Portal da Gestão do Dinheiro Pú-blico visa a propiciar o controle social das ações do esta-do, ao lado de outras iniciativas em curso - ouvidoria in-terna, controle de metas, controles contratuais formais,auditorias interna e externa, controle judicial, controleadministrativo. O portal www.gestaodinheiropublico.pr.gov.br, de acesso aberto, permite acompanhar em tem-po real toda a movimentação financeira do estado, ospagamentos realizados, precatórios existentes e pagos,repasses aos municípios,Lei de Diretrizes Orçamentárias,Plano Plurianual, Lei do Orçamento Anual, balanço ge-ral do estado.

A outra experiência relatada é o Sistema de Informa-ções para a Educação, com interface com o portal ante-

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rior. Provê informações sobre os gastos de cada escola,com cada item de despesa; freqüência dos professores eservidores em cada unidade; relação de alimentos com-prados pela escola; material de consumo adquirido - epermite extrair relatórios gerenciais.

Assim, o estado do Paranáentende estar fazendo usoda tecnologia da informação para que o cidadão o con-trole e, em um segundo momento, ajude a construir o es-tado fundado e comprometido com a idéia republicana.

1.4. Pernambuco

Nas duas últimas gestões, a partir de 1999, o estadovem implementando a contratualização de resultados,com avanços já bastante expressivos. As iniciativas bus-cam articular dois campos de tecnologia: as tecnologiasde gestão (compromisso e monitoramento de resultados)e as tecnologias de comunicação e informação (informa-tizando o monitoramento de resultados). As experiênciasforam consolidadas em lei, em 2003 (Lei da Reforma doEstado - Lei Complementar nº 49, de 31/1/2003), determi-nando a realização do planejamento estratégico em to-dos os órgãos públicos. A elaboração dos planos estraté-gicos tem o auxílio de servidores estaduais, que volunta-riamente se candidatam a receber capacitação em“tecnologia da gestão” provida pela Escola de Governo,em parceria com aUniversidadeEstadual de Pernambuco.As entidades estão adotandoo BSC - BalancedScorecardpara monitorar seus resultados.

A contratualização de resultados abrange oito me-tas comuns a todas as entidades (entre elas: realizaçãoda auto-avaliação da gestão, pesquisa de satisfação declientes, implantação de ouvidoria, realização de pesqui-sa de clima organizacional), acrescidas de metas espe-

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cíficas. Entre as 27 entidades da administração indiretado estado, 15 já firmaram um contrato de resultados, dezestão em vias de assiná-lo, duas entidades (transportes,universidade) estão aguardando definição sobre suanatureza jurídica. O estado já firmou contratos de resul-tados também com cinco organizações sociais.

Outro aspecto a ressaltar é o desdobramento dessainiciativa até atingir entidades da ponta: entre as 1.111escolas da rede pública de Pernambuco, 940 já firmaramcontratos de gestão - sem dúvida, um recorde no País!

O ciclo de monitoramento e avaliação dos resulta-dos é quadrimestral e envolve também as entidades queainda não formalizaram contratos de gestão. Nos quatrociclos já realizados, é possível perceber uma evoluçãopositiva em termos da porcentagem de atingimento demetas das entidades (contratualizadas ou não) e dasmetas gerais do estado. Os relatórios de avaliação divul-gam os resultados obtidos e fazem recomendações paraa melhoria. O estado estima que a soma das economiasobtidas alcance R$ 22,9 milhões.

No estágio atual, o estado considera como desafio aimplantação dos sistemas de conseqüência - por exem-plo, a adoção da remuneração variável segundo resulta-dos alcançados pela instituição, pelo indivíduo e por suaequipe de trabalho. Também está em discussão a con-cessão de flexibilidade orçamentária para órgãos quecumprirem 100% das metas estipuladas.

1.5. Roraima

O apresentador de Roraima destacou as especifici-dades do estado, criado há apenas 15 anos. Destacou atradição clientelista, a necessidade de recuperar a ima-gem governamental perante a sociedade, a insuficiência

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de infra-estrutura, a existência de sistemas de gestão frá-geis e fragmentados, para situar a amplitude do desafiodo Programa de Reforma da Administração (Proage).Esseprograma iniciou-se via construção de um modeloconceitual, depois transformado em modelo institucional(duas leis publicadas em 2005), em seguida construídocomo modelo organizacional, seguido pela fase demanualização.

Estão sendo articuladas as Secretaria de Planeja-mento (dá o rumo), Fazenda (imprime o ritmo) e GestãoEstratégica (faz acontecer) - via organização das ativi-dades do estado em programas e projetos, articuladosem uma matriz de resultados esperados x entidades res-ponsáveis.

A iniciativa busca articular a administração indiretaà administração direta, com resistência de secretarias,que não querem abrir mão da execução direta de ativi-dades de prestação de serviços - o que seria desejável,visando a concentrar esforços das entidades da adminis-tração direta na formulação de políticas públicas.

Outras iniciativas do estado foram a instituição doprêmio à inovação na gestão, a criação do Instituto deModernização Pública (reunindo Escola de Governo eCentro de Tecnologia da Informação) e a realização deacordos de parcerias entre o estado e municípios.

Finalmente, o relator destacou a importância doPnage como âncora e salvaguarda institucional para acontinuidade dos esforços em curso.

1.6. Sergipe

O estado de Sergipe relatou seus avanços na imple-mentação da gestão por resultados. O planejamento es-

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tratégico do governo colocou como meta mobilizadora aelevação do IDH de forma a atingir0,815 em 2008.A ado-ção do IDH, indicador que se move com lentidão e dificil-mente reflete o impacto das ações, é justificada por seupoder de conferir àsações a dimensão da visão de futuro.

Assim, a partir do PPA elaborado no governo ante-rior, foram selecionados 15 programas estruturantes -aqueles cujo conteúdo permite maior impacto positivono IDH. Os 15 programas foram reagrupados nos trêssetores que compõem o IDH - saúde (abrange seguran-ça pública e energia elétrica), educação (escola públi-ca de qualidade) e geração de renda; somam-se a elesos programas Gestão Pública Empreendedora e Exce-lência na Gestão Fiscal. O estado tem contrato de ges-tão com uma organização social, que apóia desenvolvi-mento de empresas de base tecnológica e mantém duasincubadoras de empresas.

O programa Gestão Pública Empreendedora esta-belece, como nos casos anteriores, uma estruturamatricial para os programas, relacionando suas açõese responsabilidades dos diferentes órgãos públicos; suaimplementação foi apoiada por servidores do estado,formados para atuar como multiplicadores da nova for-ma de gestão. Cada programa dá origem a um contratode gestão, cujos resultados são monitorados pela “Cen-tral de Resultados”, órgão próximo ao Gabinete do go-vernador.

Segundo o relator da experiência, a implementaçãoda gestão por resultados vem sendo acompanhada deuma verdadeira mudança de cultura, voltada à resolu-ção de problemas - o que implica dinamismo, flexibilida-de e nova mentalidade. Entre os fatores críticos de suces-so, foram ressaltados o diálogo franco com todos os ór-

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gãos, a adoção de soluções de baixo custo, o apoioirrestrito do governador e dos secretários e a utilizaçãode “mão-de-obra própria” (servidores), sem utilização deconsultoria externa.

2. Diálogo com as lições da experiência internacional

2.1. Características do contrato de resultados

O acordo de resultados (ou acordo-quadro, contratode gestão) é um instrumento de gestão que relaciona mi-nistérios ou secretarias responsáveis pela formulação depolíticas públicas e entidades prestadoras de serviçospúblicos (genericamente denominadas agências) vincu-ladas aos órgãos formuladores da política. Tem por obje-tivos promover mais flexibilidade, transparência de cus-tos, melhor desempenho, aumento da qualidade, produ-tividade, eficiência e efetividade na prestação de servi-ços públicos. Promove um par de atributos inseparáveis,à luz das reformas gerenciais: autonomia de gestão emtroca de compromisso prévio com resultados.

Por meio de metas pré-acordadas entre as partes, aserem alcançadas pela entidade prestadora do serviçoem troca de algum grau maior de flexibilidade ou ape-nas de previsibilidade, a contratualização de resultadosno setor público substitui o controle clássico político (pelahierarquia) e burocrático (pelo cumprimento de normas)pelo controle baseado em resultados e uma certa compe-tição administrada que dá visibilidade aos resultadosalcançados.

Essa nova forma de relacionamento entre entidadespúblicas emerge no âmbito das reformas em curso des-de os anos 1980, inicialmente nos países anglo-saxões,com inspirações e conteúdos diversos; ainda assim, vem

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contribuindo para a melhoria do desempenho das orga-nizações públicas. Apesar das críticas e de excessos co-metidos nos primeiros esforços de reforma em algunspaíses tidos como paradigmáticos, a utilização de con-tratos de resultados tem sido efetiva contra a indepen-dência autárquica das organizações, facilitando formu-lação, revisão e implementação de prioridades. A expe-riência tem avançado, apesar dos receios freqüentes quetêm algumas agências de perder autonomia, e muitosministérios (ou secretarias), de perder controle (Jann eReichard, 2002).

3. Por que medir resultados no setor público?

Acreditamos ser bastante difundida, entre as admi-nistrações estaduais, a importância de medir resultadosalcançados pelas organizações públicas. A experiênciainternacional tem mostrado que mensurar resultados nãose justifica apenas para avaliar as ações empreendidasem programas e projetos; conforme Behn (2004), há pelomenos sete outras razões para medir resultados: contro-lar, orçamentar, motivar, promover, celebrar, aprender emelhorar.

Outros autores apontam o risco de utilizar a mensu-ração e comparação de resultados apenas como instru-mento de controle - ou para o fato de que assim seja com-preendida pelas entidades que têm seus resultadosmensurados. No Reino Unido, país de sistema centraliza-do degoverno, a mensuração de resultados foi introduzidapelo governo central para monitorar as ações dos gover-nos locais. Segundo Bovair e Halachmi (2001), tal medi-da foi inicialmente vista pelos governos locais como umaforma de controle e punição:

performance measurement under the Best Value re-

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gime8 is reachinga newlevel of maturity. This is partlybecause it is now regardedin a more relaxed light bymany local authorities, as theybecome conscious thatthe use of performance comparisons for 'find andpunish' pur poses by central gover nment is moredifficult, and therefore less of a danger, than they hadoriginally believed.

Por outro lado, são pertinentes as observações deBehn (2004) quanto aos diversos motivos que justificam aintrodução de medidas de desempenho: o autor afirmaque a mensuração de resultados não é um fim em si mes-mo; só tem sentido se utilizada para melhorar o desem-penho organizacional.

Esse nos parece ser o sentido que está sendo dado àmensuração de resultados nas administrações estaduais.Não se trata apenas de uma nova forma de controle, massim de uma mudança substancial quanto aos desafios aenfrentar - o alcance de mais e melhores resultados, ape-sar da limitação de recursos. No Brasil, estamos falandode uma mudança de mentalidades e de cultura vigentesno setor público, que foi sempre marcado pela preocupa-ção com a conformidade dos atos e a formalização deprocedimentos, e não pelo compromisso com resultadosa alcançar.

Às administrações estaduais cabe o desafio da mu-dança cultural, por meio da introdução da mensuraçãode resultados. Para obtê-la, sugerimos aprender com aslições da experiência internacional, aprofundando a vi-

8 Best Value foi o sistema de mensuração de resultados introduzido pelogover no Blair, a partir de 1997, como experiência p iloto e g eneraliza do em2000, em sub stituição ao CCT (Compulsory Competitive Tendering), vigentenos governos Thatcher e Major.

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são de múltiplos objetivos a alcançar, resumidos em tor-no da melhoria de desempenho de organizações públi-cas. As administrações estaduais devem buscar evitar aconcepção da nova iniciativa - mensuração de resulta-dos - exclusivamente como uma nova forma de controle.

4. O que contratar: produtos (outputs) ou impactos(outcomes)?

As experiências estaduais de contratualização têmfocado seus acordos de resultados nos serviços públicosa serem prestados pelas diversas entidades: segundo aliteratura especializada, trata-se da contratação de pro-dutos (outputs). Entre os casos relatados, algumas dasexperiências estão utilizando como indicador final (oumeta mobilizadora) o Índice de Desenvolvimento Huma-no (IDH), um exemplo do que na literatura é chamado decontrato baseado nos impactos a alcançar (outcomes). Autilização de um alvo tão amplo - o IDH - remete ao deba-te que vem sendo travado em vários países, do qual po-demos extrair lições.

Esperar um impacto das ações no IDH do estado éambicioso; ajuda a apontar a finalidade última da açãopública, coloca uma visão de futuro, ajuda a evitar o ris-co de foco exclusivo no curto prazo, restrito ao cumpri-mento das metas preestabelecidas. Mas sabemos que oIDH é um indicador pouco sensível à variação no prazode poucos anos, de um mandato de governo. Há o riscode o impacto das ações não se traduzir em mudançapositiva do IDH, por diversos motivos - entre eles, os queescapam ao controle de uma administração estadual,como queda na atividade econômica, queda no poderde compra dos salários etc. E a não tradução dos esfor-ços em termos de mudança positiva no IDH pode afetar

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o moral das equipes, desmotivando-as em vez de servircomo visão de futuro.

Por outro lado, o foco exclusivo em metas pré-fixa-das para a provisão de serviços pode levar a distorçõesimportantes. Trosa (2001) relata o caso de hospitais naNova Zelândia que, na fase inicial da introdução de con-tratos de resultados, quiseram suspender atendimentosporque haviam atingido suas metas. Trata-se claramentede um desvio da intenção inicial, voltada à melhoria dodesempenho das organizações públicas. O risco é o deutilizar um novo instrumento - o compromisso prévio comresultados a alcançar - com uma mentalidade antigabaseada no cumprimento de obrigações e procedimen-tos formais.

Como evitar, por um lado, que o desafio amplo volta-do aos impactos desejados não provoque desmotivação,caso o impacto não seja mensurável no prazo estipula-do? Por outro lado, como colocar as metas na perspecti-va da melhoria global de desempenho, sem tomá-lascomo um fim em si mesmo? Esse tem sido, na experiên-cia internacional da última década, o debate entre espe-cialistas: o que contratar - a prestação de determinadosserviços previamente especificados (outputs) ou a contri-buição efetiva para a resolução de um problema(outcomes) .

Do ponto de vista do contrato de resultados comoinstrumento de gestão, ambas as opções apresentamvantagens e inconvenientes. Contratar outcomes - im-pactos que venham a alterar significativamente a situa-ção inicial que se quer alterar - traz, entre as dificulda-des, aquela relativa às relações de causalidade: em queas ações realizadas são responsáveis pela alteração dasituação inicial? Como isolar, entre as inúmeras variá-veis que afetam a situação, aquelas diretamente liga-

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das aos serviços prestados por uma determinada orga-nização pública?

Trosa (2001) aponta para um balanço pragmático:ambas as formas de contratação são importantes, atéporque respondem a duas perguntas distintas. O con-trato formulado com base nos outputs permite conhecero que é efetivamente produzido com os recursos públi-cos; já a preocupação com outcomes ou impactos per-mite indagar sobre a eficácia e utilidade daquilo que éproduzido.

A autora sugere uma via pragmática, começandopelos serviços prestados, como primeira etapa do esfor-ço de mensuração do desempenho; ir construindo umarelação de confiança entre contratante e contratado, aomesmo tempo em que ambos buscam tornar menos am-biciosa a visão dos impactos a serem alcançados; aindanessa fase inicial, ambos os parceiros devem buscar cons-truir uma cadeia lógica de execução dos objetivos, rela-cionando impactos, resultados intermediários e ações,além de buscar inscrever serviços prestados e impactosvisados dentro de objetivos claros.

Tomemos como exemplo os nexos causais entre cur-sos de qualificação profissional (outputs) e diminuiçãodo desemprego (outcomes). Asaída pragmática recomen-da mensurar o serviço efetivamente prestado - quantida-de de concluintes em cursos de qualificação profissional-, o que permite conhecer como é utilizado o recurso pú-blico, evolução da produtividade, percentual do público-alvo atendido - os serviços efetivamente prestados sãomensuráveis por indicadores quantitativos. Em paralelo,devem ser também mensurados resultados intermediá-rios - por exemplo, quantidade de desempregadosconcluintes que obtiveram recolocação após o curso, eainda avançar na construção lógica da cadeia de resul-

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tados entre impactos e serviços prestados. Os impactosdevem ser avaliados, mais do que apenas mensurados,explorando relações de causalidade - “o que provocoutal evolução da tax a de desemprego no período anali-sado?”

No caso das administrações estaduais, sugerimosmanter o foco último na alteração positiva do IDH (metade impacto), buscando construir alvos intermediários quepermitam mensurar esforços na direção do alvo-maior per-seguido.

5. Com quem contratar?

Pode ser adotada uma visão abrangente de sucessi-vos contratos de resultados, como vários elos da cadeiaestratégica de valor: um contrato entre o governo e a so-ciedade, estabelecido por meio do Plano Plurianual (PPA);tomando o PPA como matriz estratégica, desdobrar emseguida contratos macros entre o governo e cada secre-taria, por meio da elaboração de sua política pública es-pecífica; na cadeia de valor, segue-se o contrato de re-sultados entre cada secretaria e suas entidades vincula-das da administração indireta e com as organizaçõessociais, para a provisão de serviços que concretizem aspolíticas públicas formuladas.

O desdobramento da cadeia de valor indica o inte-resse em desdobrar a lógica da contratualização de re-sultados até a ponta - como faz Pernambuco com suas940 escolas públicas com contratos firmados em prol deresultados. Dessa forma, o esforço do compromisso comresultados chega até a unidade efetivamente produtorado serviço público, alavancando a melhoria de desem-penho de cada organização pública. O desdobramentoseguinte inclui o compromisso de cada equipe com resul-

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tados a alcançar sob sua responsabilidade. E pode-seainda antever o interessede que cada unidadeprestadorade serviço estabeleça um compromisso de resultados coma comunidade a que serve - na forma de “carta-compro-misso” ou “cartas de serviço”.

6. Contratualização de resultados:controle x aprendizagem

Contratualizar resultados é também uma alternativaconcreta para responder às demandas crescentes deaccountability, entendida como a obrigação permanentede prestar contas sobre o uso de recursos públicos e osresultados alcançados. A concordância em torno daaccountability tem pelo menos duas vertentes diversas:os defensores da eficiência e da diminuição do gastopúblico, os reformadores comprometidos com a elevaçãodo desempenho do setor público.

Segundo Jann e Reichard (2002), tais vertentes estãopor trás da adoção de contratos de resultados no setorpúblico. Sob a primeira vertente, a inspiração vem daescolha racional e da teoria da agência, que vê o contra-to de resultados como um novo instrumento de controleque permite mais eficazmente enfrentar o problema docomportamento maximizador do auto-interesse, caracte-rístico de todo indivíduo em geral e em particular dosagentes públicos. Tal inspiração foi predominante entreos reformadores de primeira geração da Nova Zelândiae do Reino Unido. Já na segunda vertente, representadapela Dinamarca e Suécia, o desafio central não é o con-trole, mas sim o desempenho; o contrato de resultados éinstrumento para proporcionar coordenação, ajuste eaprendizado organizacional. Segundo os mesmos auto-res, a realidade mostra-se mais adaptativa e instigante

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do que pretendem os teóricos da escolha racional:

A gestão por contrato é raramente encontrada noEstado puro, tecnocrata, da l iteratura sobregerenciamento. Existem poucos contratos rígidos,com metas específicas e quantificáveis e sanções -positivas ounegativas - tangíveis, como prega a abor-dagem teórica. Mas há muitos processos contínuos,mais abertos e sistemáticos, de negociação e ajustede objetivos, processos edesempenho, e de contínuoaprendizado mútuo. A gestão por contrato é vistacada vez menos como um jogo de soma zero de au-tonomia e controle, e mais como um processo com-part ilhado de apr endizagem e aj us te. (Jann eReichard, 2002, p.39).

As observações acima indicam o interesse da pru-dência no estabelecimento de punições ou incentivos re-lacionados ao alcance de metas. Recomendamos aosestados brasileiros avançar com cuidado na moneta-rização da gestão por resultados - seja em vincular orça-mento a resultados, ou ainda em vincular parte da remu-neração de servidores ao cumprimento de metas pre-estabelecidas.

Tal recomendação parte do reconhecimento de quea verdadeira adoção da gestão por resultados implicacuidar atentamente da mudança de mentalidaderequerida. Trata-se de uma revolução cultural, que nãoserá produzida apenas por novas normas de controle enovos instrumentos de gestão. Aqui, a aprendizagem éfundamental. E deve-se destacar o importante papel degerentes e dirigentes na promoção dessa aprendizagem.

Gerentes e dirigentes também precisam da novaaprendizagem para que possam promovê-la. Esse deveser o sentido de programas de desenvolvimento gerencial.

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Já os dirigentes devem ter oportunidades de intercambiarentre pares suas experiências, e talvez contar com umcoaching que lhes dê apoio para que ajudem a imple-mentar a mudança cultural desejada.

7. Autonomia x Controle

A partir do avanço das experiências de contratuali-zação de resultados, o debate internacional indaga comoequilibrar, nessa nova visão da gestão, autonomia e con-trole de cada entidade que assume o compromisso pré-vio com resultados.

Aqui, nosso desafio ainda é o de encontrar manei-ras de avançar na concessão de alguma autonomia eflexibilidade - pois aqui impera a mentalidade do con-trole. Isso se deve ao legado repleto de exemplos de abu-so da flexibilidade (como os que sucederam ao Decreto-Lei 200, nos anos 1970/80), combinado com os desafiosdo ajuste fiscal.

Para conseguir algum avanço, teremos de conquis-tar as áreas econômica, jurídica e de controle - portado-ras da bandeira da responsabilidade no uso dos recur-sos públicos, da obediência às normas estatuídas, daproteção contra o mau uso do dinheiro público. Teremosde convencer aquelas áreas de que a concessão de al-gum grau de autonomia e flexibilidade, se combinadacom o forte compromisso com resultados e seu moni-toramento intensivo, contribuirão, em médio prazo, paraa melhoria do gasto público.

Nos três casos - área econômica, jurídica e de con-trole - estamos na maioria das vezes diante de burocra-cias bem constituídas, insuladas e zelosas de seu ethosprofissional. O desafio é trazê-las como aliadas para aimplantação da gestão por resultados. Em vários países,

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isso foi facilitado pelas práticas de mobilidade de altosfuncionários, que devem trabalhar em áreas meio e áreasfinalísticas, quebrando de certa forma a cultura setorial eestabelecendo uma “cultura de Estado” que se colocaacima das identidades setoriais.

8. Estratégias utilizadas

Segundo a experiência internacional, não há umcaminho único para impulsionar a gestão por resultados.Alguns países utilizaram a estratégia top-down, com aformulação da política de gestão e seus instrumentos porum órgão central, geralmente situado no centro do poderde governo, a ser implementada simultaneamente portodos os órgãos públicos. Em outros casos, foi adotada aestratégia da cooperação e aprendizado mútuo, sistema-ticamente baseada no diálogo entre as partes, com ade-são voluntária das organizações.

Também nas experiências analisadas dos estadosbrasileiros há múltiplas estratégias. Foram citadas comoestratégias positivas a adoção de soluções de baixo cus-to - apropriadas ao cenário de recursos escassos - e oenvolvimento de pessoal próprio - por meio da capaci-tação como agentes multiplicadores da gestão por resul-tados, atuando como uma rede de “consultores internos”.

9. Mais algumas recomendações

As lições extraídas da experiência internacional in-dicam a importância de publicizar os compromissos deresultados e os resultados alcançados. A transparênciaajuda a mudar mentalidades, a ganhar adeptos, a pro-mover certa competição saudável pelo prestígio do atin-gimento de bons resultados. Não se trata, como afirma-

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mos anteriormente, de competir por mais recursos finan-ceiros; o aspecto mobilizador de energias é a disputa emtermos de prestígio e reputação profissional - além dasatisfação de contribuir com resultados palpáveis para adiminuição dos problemas sociais, econômicos ou am-bientais do País (Bresser Pereira, 1996/2001).

Assim, recomendamos aos estados dar publicidadeaos resultados sistematicamente - por exemplo, publican-do na Internet todos os contratos/acordos de resultadosfirmados, bem como o acompanhamento do cumprimen-to das metas, ainda que de forma agregada, e das ava-liações realizadas.

Dirigimos ao Consad a última recomendação: orga-nizar um seminário específico sobre contratualização deresultados, para troca de experiências eaprofundamentodos temas relativos aos indicadores utilizados, capaci-tação de agentes públicos, lições aprendidas e outras.Talvez seja possível realizar tal seminário em parceriacom o Conselho dos Secretários Estaduais da Fazenda(Confaz), buscando o objetivo de aproximar as lógicasda gestão e das finanças públicas.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Atendimento ao Cidadão nos estados brasileiros:tendências e desafios

Relator: José Carlos Vaz

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Atendimento ao Cidadão nos estados brasileiros:tendências e desafios

José Carlos Vaz

Professor da Fundação Getúlio Vargas

Introdução

Este artigo aponta de maneira sintética uma carac-terização das iniciativas de atendimento ao cidadão ini-ciadas ou continuadas pelos governos estaduais no perío-do 2003/2006. Além disso, procura refletir sobre as ten-dências que essas realizações indicam e os desafios co-locados à sua frente, do ponto de vista da ampliação dosserviços de atendimento e da ampliação dos direitos decidadania.

A realização da pesquisa baseou-se nos trabalhosinscritos pelos governos estaduais e nas apresentaçõesdos representantes das experiências inscritas no painelAtendimento ao Cidadão do Seminário Avanços e Pers-pectivas da Gestão Pública nos Estados, realizado peloConselho Nacional de Secretários de Estado de Adminis-tração e pela Fundap, em março de 2006 (neste texto, re-ferido apenas como seminário). Foram inscritos trabalhos

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pelas seguintes unidades da Federação: Bahia, Goiás,Maranhão, São Paulo, Tocantins (estados que apresen-taram trabalhos no painel) e Paraíba, Minas Gerais, Dis-trito Federale Espírito Santo (unidades da Federação queapenas enviaram trabalhos).

As conclusões, especialmente sobre a caracteriza-ção das experiências, são apresentadas em caráter sin-tético e generalizadas, com base na análise das infor-mações sobre cada uma das experiências. Com interes-se de tornar a leitura mais fácil, as quantificações foramomitidas na maior parte dos casos, apesar de encontra-rem-se disponíveis.

1. O foco no cidadão e a reorganização dos serviçosde atendimento

Segundo Bresser Pereira (1999), o modelo gerencialresolve uma limitação do modelo burocrático: a falta defocalização nas necessidades dos cidadãos-usuários dosserviços públicos. O modelo burocrático tem um efeitoinibidor sobre o processo decisório, por sua base na re-gulamentação intensiva das ações dos agentes públicoscom vistas à garantia da impessoalidade no acesso aosserviços. Com isso, o aparato estatal assume uma postu-ra auto-referida e perde agilidade para atendimento dasdemandas.

Constitui a inversão de propósitos apontada por Kettl(2000), em que a máquina pública dedica-se a atenderprioritariamente os seus interesses e apenas subsidia-riamente os da população. Ou, dito de outra forma:

O modelo tradicional de atendimento ao públi-co nos órgãos governamentais é marcado pela frag-mentação e pela falta de conexão ágil e racionalentre os diversos serviços e informações. Os vícios

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burocráticose compor-tamentais foram se acumulan-do ao longo dos anos, transformando cada setor damáquina pública em algo com início e fim em simes-mo. Dessa forma, os serviços oferecidosnão seapre-sentam como soluções aos problemas dos cidadãose, sim, como soluções administrativas internas aosprópr ios setores. (Prefeitura Municipal de SantoAndré, 2000).

Segundo Soares (2002, p. 48), a colocação do cida-dão no centro das ações do setor público é a “respostaque o modelo gerencial pretende dar para combater asdistorções da administração auto-referida.” A mesma au-tora prossegue afirmando que, com o deslocamento dofoco da administração pública em direção aos resulta-dos, “o quesito dos padrões de qualidade na provisãodos serviços públicos destacou-se como um aspecto es-sencial para as práticas de administração pública”.

O modelo gerencial, a despeito de suas várias nuan-ces e linhas distintas, consistentemente direciona esfor-ços em termos do atendimento ao cidadão. Cunha-se aexpressão “foco no cidadão” como síntese de princípiosque Soares (2002, p. 47) destaca:

• Velocidade e agilidade de resposta do prestadorde serviços;

• Utilização de sistemas flexíveis de atendimento aocidadão, com maiores condições de atendimento segmen-tado ou personalizado, em substituição à prestação deserviços padronizada;

• Busca da excelência dos serviços com o estabe-lecimento de padrões e metas de qualidade de atendi-mento;

• Manutenção de canais de comunicação com osusuários; e

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• Avaliação da qualidade dos serviços prestados.

A adoção do foco no cidadão situa-se, entre os prin-cípios do modelo gerencial, como um princípio central dereorganização do Estado. Não somente a prestação deserviços em si é reestruturada, mas se pretende que todoo funcionamento do aparelho estatal redirecione-se emude suas prioridades a partir das demandas entendi-das como aquelas prioritárias dos cidadãos.

A orientação para o cidadão levou à disseminaçãode uma série de instrumentos de atendimento. Esses ins-trumentos buscam atender às necessidades de simplifi-cação dos procedimentos, como expresso por Osborne eGaebler (1994, p.210):

(...) um sistema dirigido ao cliente deve serdescom-plicado para o cliente, que não deve ser con-frontado com um fabuloso labirinto de programasfragmentados, (...) e uma infinidade de formuláriosparapreencher. O sistema deve ser transparenteparaque os clientes sejam capazes de transitar por entreas muitas opções disponíveis, sem necessariamenteter que transitar pelas burocracias que se ocultampor trás de cada uma delas.

O desenvolvimento de soluções de atendimento orien-tado ao cidadão pode ocorrer por meio do atendimentosetorial, com o oferecimento de soluções obedecendo àestrutura setorial existente na administração pública (ouuma estrutura já fruto de uma revisão organizacional), in-corporando recursos tecnológicos e redesenho de proces-sos. Nesse modelo, a principal preocupação se encontrana revisão dos processos com foco nas necessidades docidadão. A inovação concentra-se no back-office, ou seja,na realizaçãopelas tarefas pelos órgãos públicos e requermaior nível de integração interna na execução de tarefas

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entre os vários departamentos de um mesmo órgão, masrequer menor grau de integração entre distintos órgãos.

Alternativamente, e de maneira crescente nas expe-riências brasileiras e internacionais, os governos têm re-corrido a práticas de atendimento integrado, valendo-sede recursos únicos para o atendimento ao cidadão, inde-pendentemente da natureza de sua demanda. Nessemodelo, o foco está na redução do deslocamento e dogasto de tempo do cidadão. A inovação concentra-se nomodelo de contato do cidadão com a administração pú-blica, que requer maior integração entre órgãos distintose a implantação de estruturas comuns.

No caso brasileiro, os governos estaduais têm sidoum importante agente de transformação das práticas deatendimento ao cidadão desde meados dos anos 1990,quandoduas experiências emblemáticas foram iniciadas:o Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC), do governodo estado da Bahia, e o Poupatempo, do governo do es-tado de São Paulo. Desde então, esse modelo tem am-pliado sua abrangência, seu nível de integração e a pro-fundidade dos serviços prestados. Além dos governos es-taduais, municípios e a União investiram, ainda que de-sigualmente, em equipamentos e serviços de atendimentoao cidadão, e o movimento atingiu também os demaispoderes.

Passada já uma década daimplantação do SACe doPoupatempo, pode-se observar que o modelo de atendi-mento por meio de centrais de atendimento consolidou-secomo referência entre os governos estaduais e, não semmotivo, foi o principal destaque apontado pelos própriosgovernos em termos de atendimento ao cidadão, na qua-setotalidade dos estadosparticipantes do Seminário Avan-ços e Perspectivas da Gestão Pública nos Estados. Talmodelo, apesar darelativa maturidade atingida, apresen-

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ta largo espaço para inovações e aperfeiçoamentos emvárias dimensões, comoos trabalhos apresentados aolon-go do seminário demonstram e será visto adiante.

2. As práticas de atendimento ao cidadão nosgovernos estaduais brasileiros (2003/2006)

O período 2003/2006 apresentauma consolidação domodelode centrais deatendimento integrado como a prin-cipal referência nas práticas de atendimento ao cidadãopelos governos estaduais no Brasil. Paralelamente, ou-tras práticas foram implantadas total ou parcialmente, emtentativas de atingir públicos específicos ou atender ademandas setoriais.

2.1 Centrais de atendimento integrado

Pode-se afirmar, com base na análise das experiên-cias apresentadas no seminário, que já existe um mode-lo de centrais de atendimento consolidado entre os esta-dos brasileiros. Observa-se que das 23 unidades da Fe-deraçãoparticipantes do seminário,nove delas (39%) ins-creveram trabalhos e manifestaram interesse em apre-sentá-los no tema Atendimento ao Cidadão. Dessas uni-dades da Federação, oito (89%) enviaram trabalhos so-bre centrais de atendimento integrado. No Anexo 1é apre-sentado um quadro que sintetiza as experiências de aten-dimento ao cidadão inscritas.

Nas discussões ocorridas no seminário, foi possívelobservar que o conjunto de experiências significativashoje disseminadas no País (não somente em governosestaduais) constitui uma referência para a implantaçãode novos serviços naqueles estados que ainda não dis-põem de centrais de atendimento integrado ou as têm

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ainda em número reduzido ou oferecendo uma gama pe-quena de serviços.

As experiências de maior destaque (SAC, do estadoda Bahia, e Poupatempo, do estado de São Paulo) alcan-çaram repercussão internacional, até mesmo gerandoiniciativas de replicação do modelo em outros países naÁfrica e na América Latina.

O nível de implantação do modelo predominante,entretanto, não é uniforme. Observa-se que algumas ex-periências, especialmente as mais antigas, apresentamum nível de consolidação maior que outras. Mesmo as-sim, o modelo de centrais de atendimento que atualmen-te constitui referência para os governos estaduais podeter destacadas as características comuns apresentadasa seguir.

a) Avaliação dos serviços pelos cidadãos-usuários

As experiências apresentadas valem-se de recursosde avaliação da satisfação dos usuários quanto aos ser-viços prestados. As avaliações realizadas baseiam-se narealização depesquisas quantitativas (predominantemen-te) e qualitativas e em avaliação de reação (avaliaçãorealizada imediatamente após a prestação do serviço).As avaliações espontâneas por escrito são bastante dis-seminadas. Também são apontados como recursos im-portantes para a avaliação as ouvidorias e outros recur-sos de comunicação direta com os gestores do serviço.

Algumas experiências promovem a divulgação deresultados de avaliação para os cidadãos-usuários, masesta não é uma prática homogeneamente realizada.

As pesquisas de satisfação realizadas apontam umgrande nível de satisfação dos usuários. Observe-se quetratam de pesquisas conduzidas pelas próprias centraisde atendimento e não por entidades independentes.

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b) Práticas de gestão profissionalizadas

As práticas de gestão empregadas apresentam umgrau relativamente alto de profissionalização, ou seja,começa a conformar-se um campo especializado no País,baeado nas experiências dos estados, formado por pro-fissionais e gestores envolvidos na operação dos servi-ços nas centrais de atendimento integrado.

Essa profissionalização pode ser vista na adoção depráticas de gestão comuns aos vários estados, pela cir-culação de informações e profissionais e pela preocupa-ção demonstrada por vários estados em aprimorar suaspráticas de gestão dos serviços, promovendo avanços sig-nificativos como a utilização de sistemas informatizadosde controle e gestão dos serviços, cres-centemente inte-grados ao uso de indicadores de desempenho bastantedesenvolvidos, até mesmo com o emprego da metodologiado Balanced Scorecard (estado de Goiás).

c) Valorização dos recursos humanos

As experiências apresentadas no seminário aponta-ram os recursos humanos como fator de sucesso do aten-dimento oferecido aos cidadãos-usuários. A preocupaçãocom a formação de pessoal capacitado materializa-se naexistência de iniciativas de capacitação em praticamen-te todos os estados que apresentaram experiências, comalguns casos de vultosos programas.

Ex periências de remuneração variável têm sidoimplementadas, mas ainda são em pequeno número enão parece ser possível avaliar seu impacto sobre a qua-lidade dos serviços prestados.

A avaliação de desempenho dos funcionários envol-vidos é apontada como um elemento importante para agarantia do sucesso dos serviços, sendo bastante disse-

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minada entre as centrais de atendimento dos estados,mas as experiências apresentadas ainda não demons-tram a existência de práticas comuns ou compartilhadasde avaliação de desempenho, conformando um padrãoadotado pela maioria das experiências.

É bastante comum a coexistência de funcionáriosterceirizados e servidores públicos nas mesmas centraisde atendimento, como resultado da busca de mecanis-mos mais ágeis de contratação e de tentativas de contor-nar restrições à contratação de servidores públicos paraos serviços. Entretanto, constata-se uma ampliação do usode funcionários terceirizados, que tendem a ter uma cres-cente participação na força de trabalho envolvida com oatendimento ao cidadão.

d) Predomínio da integração física nas centrais deatendimento

Em trabalho anterior, Vaz (2003) chamou a atençãopara o fato de que é preciso levar em conta que, sob orótulo de single window services ou one-stop serviceshops, ou seja, pontos únicos de atendimento ao cida-dão-usuário, podem ser enquadrados serviços com mui-tas diferenças em termos de integração entre os órgãosenvolvidos, de acordo com a seguinte escala:

• Ausência de integração: não são utilizadas cen-trais de atendimento. Cada órgão organiza o atendimen-to em suas instalações, de acordo com seus processos;

• Compartilhamento de instalações e protocolo: comona categoria anterior, as organizações compartilham umespaço, nele reproduzindo uma lógica setorial. Entretan-to, existe um protocolo mínimo de atendimento utilizadopor todas as organizações ou departamentos que com-partilham o equipamento. Esse protocolo pode envolver

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disposição de instalações, organização do atendimentoe fluxo de usuários, papelaria e identidade visual, padro-nização de mobiliário, vestuário de atendentes e proce-dimentos de atendimento;

• Interface única de atendimento: as organizaçõesse relacionam compartilhando os recursos de contato como cidadão. Este recebe um atendimento único, preferen-cialmente por um único funcionário, ficando a cargo daintegração entre os órgãos o encaminhamento da resolu-ção do problema do cidadão para o órgão competente,utilizando cada um seus processos individuais; e

• Integração de atendimento e processos: não so-mente a interface é única, como as organizações com-partilham sistemas e bases de dados, a partir de proces-sos integrados. Assim, não somente o cidadão tem eco-nomia de tempo e deslocamento, como se produzem ga-nhos de eficiência na operação dos processos.

Essa categorização é apresentada de maneira resu-mida no quadro a seguir.

Quadro 1 - Níveis de integração em centrais de aten-dimento integrado

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O modelo predominante apresenta um nível aindaincompleto de integração de serviços prestados pelascentrais de atendimento. Predominam experiências queoferecem soluções para a integração física do atendimen-to e para o compartilhamento de protocolos de atendi-mento, investindo em criações de marcas de referênciado serviço com padrões visuais e arquitetônicos próprios.A criação de interfaces únicas de atendimento vem ga-nhando espaço, enquanto a integração de processos ebases de dados tem poucos avanços a oferecer.

2.2 Outros instrumentos de atendimento

Apesar da hegemonia das centrais de atendimentointegrado como principal prática de melhoria do atendi-mento prestado aos cidadãos, outros instrumentos têmum emprego que merece destaque, pelo volume de aten-dimento gerado, por contribuir de maneira significativapara o atendimento de públicos vulneráveis ou excluídosou por seu caráter inovador para os governos estaduais.

a) Mutirões de atendimento itinerante

Os mutirões de atendimento itinerante caracterizam-se por realizar um conjunto de ações de atendimento con-centradas em uma dada localidade, por um curto perío-do de tempo. Em geral atendem áreas rurais ou periféri-cas com problemasde acessibilidade, distância dosgran-des centros ou carência de infra-estrutura de serviçospúblicos. Ocorre o deslocamento de equipes de diversosórgãos públicos à localidade escolhida para, durante operíodo de mutirão, realizar prestação de serviços de di-versas naturezas como emissão de documentos, atendi-mento social e assistência jurídica, levantar demandasdos cidadãos e realizar contatos com a sociedade local.

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Altos dirigentes estaduais normalmente participam des-ses mutirões, buscando conferir aos eventos a imagemde proximidade entre governo e cidadãos.

Esse instrumento tem sido particularmente emprega-do em articulação com ações de assistência social e deextensão do alcance de outras políticas sociais. É vistocomo instrumento de atendimento para populações priva-das de acesso a direitos básicos de cidadania. Não podeser visto como solução definitiva para o problema dessaspopulações, uma vez que não oferece uma solução per-manente ou sistemática para suas carências, e tambémpelo esforço necessário para organizar os eventos.

Entretanto, é um meio de atender demandas reprimi-das ereduzir níveis de carências básicas nas regiõesaten-didasaté que políticas públicas específicas e estruturadasdêem conta dos problemas de maneira definitiva. A títulode exemplo, Tocantins apresenta um total de 500 mil aten-dimentos em mutirões realizados em nove municíp ios(atendendo à população de 57 municípios), em um perío-do de três anos.

Os mutirões de atendimento itinerante também têma vantagem de gerar condições favoráveis à criação deuma cultura de atendimento ao cidadão com alto nívelde serviço. Sua realização exige preparação dos órgãosenvolvidos, capacitação de servidores e orientação dosgestores para o atendimento ao cidadão. Nesse sentido,são vistos pelos estados que os adotam como instrumen-tos capazes de auxiliar a preparação da implantação decentrais de atendimento.

b) Centrais móveis de atendimento

Além dos mutirões de atendimento, uma outra formade prover atendimento a localidades carentes de estrutu-ras permanentes de atendimento ao cidadão são as cen-

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trais móveis de atendimento. As experiências apresenta-das no seminário apontam para sua utilização não so-mente para atendimento de carências básicas em locali-dades de extrema pobreza ou dificuldadesde acesso aosgrandes centros, mas também para aquelas cujas dimen-sões ainda não justificaram a implantação de estruturaspermanentes de atendimento integrado. As centrais mó-veis de atendimento caracterizam-se por oferecer servi-ços de atendimento ao cidadão de maneira volante, po-rém sistemática e obedecendo a protocolos similares aosdas centrais de atendimento fixas. Dessa maneira, su-prem a falta de capilaridade dos sistemas de atendimen-to que, baseados no emprego de centrais de atendimen-to ao cidadão de grande porte, não conseguem atendera todos os municípios do estado.

Segundo Soares e Vaz (2000), esses serviços am-pliam a capacidade de identificar as demandas da soci-edade, o que, por outro lado, multiplica o volume de de-mandas para a máquina pública, gerando conseqüentepressão para aumento de eficiência nas ações do gover-no. Apontam, ainda, outro impacto importante: a possibi-lidade de melhora na qualidade de atendimento e daimagem do serviço público.

As centrais de atendimento móveis têm utilizado pre-dominantemente o transporte rodoviário para seu deslo-camento,mas registra-se abuscade outros modosde trans-porte adequados à realidade local, como o transporte flu-vial e ferroviário, como no caso do estado do Maranhão.

c) Sistemas setoriais de atendimento ao cidadão

O sucesso das experiências de atendimento ao ci-dadão com alto nível de serviço, capitaneadas pelas cen-trais integradas de atendimento ao cidadão, tem levadoos estados a implantar sistemas de atendimento de cará-

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ter setorial, ou seja, aplicados ou articulados especifica-mente a determinadas políticas públicas.

Esses sistemas setoriais de atendimento ao cidadãoprocuram resolver demandas específicas de setores daadministração pública que necessitam realizar volumesconsideráveis de atendimento e, portanto, requerem umnível de estruturação e sistematização capaz de permitirum nível de serviço elevado, combinando qualidade equantidade de atendimentos realizados.

Pode-se caracterizar esses sistemas setoriais de aten-dimento ao cidadão como voltados a públicos ou setoresespecíficos, dotados de procedimentos e protocolos deatendimento estruturados, infra-estrutura exclusiva paraa realização do atendimento, pessoal especializado erealização do atendimento sob gestão orientada para aobtenção de altos níveis de serviço.

Vários estados implantaram, nos últimos anos, sis-temas setoriais. São Paulo, com base no acúmulo geradopela experiência do Poupatempo, desde 1996, é o estadoque apresentou uma quantidade maior de novos servi-ços implantados recentemente.

Entre os setores que têm recebido atenção dos esta-dos na implantação de sistemas setoriais de atendimen-to, pode-se destacar Saúde, Segurança Pública, Educa-ção, Previdência, Transportes, Assistência Social.

3. Tendências

a) Consolidação de padrões de atendimento

O sucesso das experiências de centrais de atendi-mento ao cidadão nos estados e a configuração de ummodelo de referência com base nessas experiências bemsucedidas, levando à sua adoção generalizada, fortale-

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ce a continuidade dessas experiências e a consolidaçãode padrões de atendimento de alto nível de serviço.

Por outro lado, consolidação de um padrão de qua-lidade dos serviços de atendimento encontra reforço naprópria sociedade: uma vez expostos a um padrão supe-rior de atendimento, os cidadãos não aceitam menos, con-forme relatado por vários gestores participantes do se-minário.

Assim, esses padrões em franco processo de disse-minação consolidam-se crescentemente como referênciaem atendimento ao cidadão pelos órgãos estaduais. Érazoável supor que nos anos seguintes esses padrões ver-se-ão fortalecidos, salvo episódicas situações de reduçãodo padrão de qualidade dos serviços em alguns casosisolados e transitórios, em função da falta de continuida-de administrativa.

b) Ampliação das redes de atendimento

No seminário, os estadosque apresentaram trabalhosforam unânimes em mencionar planos e ações em anda-mento para a ampliaçãodas redes de atendimento. A ex-pansão das redes encontra como maior obstáculo a ne-cessidade de recursos relativamente altos para sua reali-zação, o que tem levado os governos estaduais a buscarparcerias com prefeituras e empresas para a implantaçãode centrais deatendimento e para sua operação, ou seja,imagina-se realizar a expansão por meio do investimentodireto dos estados e também de recursos de terceiros.

c) Terceirização da operação de centrais de atendi-mento

Uma outra tendência, diretamente vinculada à ante-rior, diz respeito ao crescimento da terceirização da ope-

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raçãode centraisde atendimento. Essa terceirização tomadois caminhos, ambos de adoção crescente:

• Ampliação do uso de funcionários terceirizados naoperação de centrais de atendimento.

• Terceirização integral das centrais de atendimen-to, pela via da contratação de empresas para desempe-nhar as atividades ou pela sua realização por prefeiturasmunicipais.

Essa tendência ancora-se tanto nas dificuldades decontratação de pessoal para a realização dos serviçosquanto no entendimento de que a operação direta de re-des de serviços em expansãotraz dificuldades adicionaispara os órgãos estaduais.

A consolidação de padrões de operação das centraisde atendimento, com o acúmulo de experiência na ope-ração e gestão pelos órgãos estaduais diretamente en-volvidos, é um fator facilitador da terceirização, uma vezque esta pode ocorrer obedecendo a padrões estritos derealização dos serviços pelas empresas contratadas. Avisão daqueles que propõem este tipo de operação é ade concentrar-se nas atividades de gestão do atendimen-to, eximindo-se das tarefas de controle e organização donível operacional.

d) Diversificação das formas de atendimento

Observa-se nos governos estaduais, especialmentenaqueles de maior tradição na operação de centrais deatendimento integrado e de outras formas de atendimen-to ao cidadão com alto nível de serviço, uma tendência àdiversificação das formas de atendimento.

Novos instrumentos têm sido experimentados: a am-pliação do uso da prestação de informações e serviçospela Internet explicita uma tendência de crescente articu-

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lação com as práticas de governo eletrônico dos gover-nos estaduais. Além disso, as práticas de auto-atendimen-to, com ou sem articulação com o uso da Internet, sãoapontadas como crescentes em volume. Também o usodo correio como instrumento complementar, normalmen-te encarregado de etapas dos processos de atendimento,tem sido intensificado.

A diversificação das formas de atendimento é parti-cularmente importante para uma outra dimensão da di-versificação, que é a criação de instrumentos de atendi-mento ao cidadão voltados para atingir novos públicos,anteriormente excluídos, ou públicos específicos. De igualdimensão é sua relevância para a ampliação da quanti-dade de serviços prestados, criando-se novas formas deatendimento adequadas às especificidades desses no-vos públicos e serviços.

e) Ampliação do nível de integração nas centrais deatendimento

Como visto acima, o modelo mais difundido de cen-trais de atendimento ao cidadão caracteriza-se por umnível ainda incompleto de integração de serviços presta-dos pelas centrais de atendimento. Não se pode negar,no entanto, que a tendência do modelo de centrais deatendimento integrado de responsabilidade dos gover-nos estaduais é a de ampliar o nível de integração dispo-nível. Observam-se já esforços de implantação deinterfaces únicas de atendimento, o que se percebe pelosavanços na padronização de protocolos de atendimentoe pelas tentativas de constituição de equipes de funcio-nários generalistas, preparados para atender todos ostipos de demandas atendidas pelas centrais, e não so-mente prestar os serviços correspondentes a um órgãoespecífico nelas representado.

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Os esforços de integração de processos e bases dedados utilizados por serviços de atendimento ao cidadãode responsabilidade de órgãos estaduais ainda são in-suficientes para configurar uma tendência de aumentoda integração a esse nível. No entanto, o próprio desen-volvimento da tecnologia da informação deverá levar, nofuturo, à materialização dessa tendência. O ritmo dessaintegração, por sua vez, pode ser bastante lento, em fun-ção dos custos e esforços necessários, da complexidadedos sistemas envolvidos e da interveniência de múltiplosfatores sobre o processo.

f) Aprimoramento das técnicas de gestão

Como fruto do processo de consolidação do modelode centrais de atendimento integrado e da disseminaçãode práticas de atendimento com elevado nível de serviço,pode-se observar que a profissionalização dos serviçosde atendimento levará a esforços significativos de apri-moramento da gestão.

As experiências apresentadas no seminário corrobo-ram esta afirmação e permitem apontar a tendência deaprimoramento das técnicas de gestão dos sistemas deatendimento. Nessas experiências e nos depoimentos dosdirigentes estaduais pode-se constatar a existência deações de implementação de sistemas de gestão maispotentes. Essas ações podem ser observadas no desen-volvimento de técnicas e recursos de avaliação do de-sempenho dos serviços baseadas em sistemas de infor-mações gerenciais; no aperfeiçoamento de técnicas degerenciamento da operação e de gestão da produção dosserviços de atendimento; e nos investimentos em capaci-tação de pessoal para a gestão de serviços.

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4. Desafios

a) Ampliação dos serviços prestados

A ampliação dos serviços prestados surge como de-safio de duas frentes. De um lado, tem-se a demanda porexpansão das redes de centrais de atendimento, o queencontra dificuldades econômicas e orçamentárias porconta dos investimentos exigidos e da ampliação de gas-tos de custeio decorrente. Do ponto de vista econômico,qualquer movimento de expansão das redes de centraisde atendimento (gerais ou setoriais) exige uma reduçãodos custos unitários dos serviços. Além disso, é precisolevar em conta os impactos institucionais dessa expan-são. Os governos estaduais precisam criar soluções quepermitam a ampliação dos serviços sem produzir estrutu-ras grandiosas, situações precárias, questionamentosjurídicos ou riscos para a cidadania.

A outra frente da ampliação dos serviços prestadosdiz respeito à implantação de novos serviços, o atendi-mento de novos públicos ou novas formas de provimentode serviços já existentes. Evidentemente, a ampliaçãodos serviços de atendimento deve ser paralela àdesburocratização, produzindo ganhos de produtividadeao longo dos processos envolvidos, não somente nas suasetapas diretamente envolvidas com o atendimento ao ci-dadão. Voltar-se para esse desafio forçosamente eviden-cia a questão do ritmo adequado para a incorporação denovas tecnologias, como m-gov (uso de dispositivos mó-veis como celulares e PDAs para prestação de serviçospúblicos) e TV digital. Paralelamente, é preciso criar con-dições para superar carências de infra-estrutura de co-municação de dados que, a despeito de ações expressi-vas de alguns estados, ainda se mantêm em pauta.

A ampliação dos serviços prestados, tanto pela ex-

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pansão da rede de atendimento como pela incorporaçãode novos serviços, torna inevitável uma articulação dosserviços de atendimento ao cidadão presenciais com osprogramas de governo eletrônico e com programas deinclusão digital.

Esse desafio também exige transformações no inte-rior dos próprios governos estaduais, uma vez que é pre-ciso garantir que o atendimento ao cidadão ganhe espa-ço na agenda desses governos.

b) Aprofundamento da integração dos serviços

Como dito acima, a integração de processos, siste-mas e bases de dados nos sistemas de atendimento aocidadão ainda possui uma jornada longa a realizar. Tra-ta-se de um desafio que não fica restrito às dificuldadesem termos de desenvolvimento de soluções em tecnologiada informação.É preciso considerar a dimensão de maiorcomplexidade desse desafio, que é a superação das bar-reiras na cultura política que alimentam a fragmentaçãoe isolamento de órgãos públicos e impedem o geren-ciamento compartilhado das informações e a integraçãofísica e lógica de processos, sistemas e bases de dados.

c) Aperfeiçoamento das práticas de avaliação dosserviços

Aperfeiçoar as práticas de avaliação dos serviços éum passo fundamental para a profissionalização da ges-tão dos serviços de atendimento e para criar condiçõespara sua expansão. Superar esse desafiodemanda a uti-lização de sistemas de avaliação de desempenho demaior robustez, notadamente pela utilização de sistemasde indicadores que permitam comparações de desempe-nho e a realização de análises em profundidade. Deman-

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da, ainda, uma atenção maior à participação do cida-dão-usuário na avaliação dos serviços.

Os autores que defendem a orientação ao cidadãorecomendam a utilização de recursos de oitivas de opi-niões e avaliação dos serviços pelos usuários, uma vezque a qualidade dos serviços é vista em função das ex-pectativas destes ede sua satisfação (Parasuraman,1991;Blythe e Marson, 1999; Dinsdale e Marson, 2000).

As experiências mais consolidadas de centrais deatendimento têm utilizado alguma formade avaliação dosserviços pelos cidadãos. De modo geral, essas iniciati-vas se baseiam em pesquisas de avaliação de reação epesquisas quantitativas e qualitativas sem periodicida-de definida. Faz-se necessária, portanto, a efetivação depráticas sistemáticas de avaliação com participação doscidadãos. A experiência internacional (Enap, 2001) des-taca a importância de sistemas de avaliação permanen-te, com emprego de grupos de referência e oficinas dedesenho de processos com participação dos usuários.

d) Ampliação da participação da sociedade civil noatendimento ao cidadão

O risco de a abordagem do provimento de serviçospúblicos com foco no cidadão levar à substituição docidadão pelo cliente já foi explorado amplamente naliteratura. Segundo Politt (1990) , o termo cliente ou con-sumidor parte de um ponto de vista individualizante, queprioriza os direitos individuais e o mercado em detri-mento dos direitos coletivos e da participação na esferapública.

A equiparação (ou redução) de cidadão-usuário acliente é criticada como uma visão frágil, por limitar oalcance do conceito de cidadania. Entender o cidadão-usuário como cliente dos serviços públicos significa, em

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última instância, eleger o mercado como mediador dacidadania. O exercício da cidadania passa, no caso dosserviços públicos, a remeter às práticas, princípios e va-lores de mercado, o que não necessariamente se coadu-na com o princípio da universalidade dos direitos.

Enquanto a relação de consumo é uma relação deatendimento a demandas individualizadas e desconec-tadas entre si, a relação entre o cidadão-usuário dos ser-viços públicos e os órgãos provedores dos serviços ne-cessariamente inclui vinculações que ultrapassam os li-mites do atendimento individualizado, como “justiça, re-presentação,participação e igualdade de oportunidades”(Politt, 1990, p.129).

Não é sem motivo, portanto, que, com base no mode-lo gerencial, tenham surgido novas abordagens que bus-cam retomar a cidadania como categoria relevante naprestação de serviços públicos. Abrucio (2001) indica quea abordagem denominada Public Service Orientationsurge como nova corrente com essa preocupação, vendoo usuário dos serviços públicos como cidadão, portantoportador de direitos, não mais como cliente de serviçosprovidos sob lógica que tentava copiar a de mercado.Segundo o autor, a Public Service Orientation retoma ostemas do republicanismo e democracia baseada navalorização de conceitos como accountability, transpa-rência, participação política, eqüidade e justiça, “ques-tões praticamente ausentes” no modelo gerencial puro.Também valoriza a participação em nível local e adescentra-lização, não somente como meios mais efici-entes de prestar serviços, mas como meios mais eficazespara capacitar os cidadãos para a participação nas de-cisões públicas (Hambleton, 1992, p. 11, citado porAbrucio, 2001, p. 190). Ainda segundo o autor, a visão docidadão na Public Service Orientation tem uma conotação

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coletiva, pensando-se a cidadania como um conjunto decidadãos portadores de direitos e deveres.

Dar conta dessa visão exige que os sistemas de aten-dimento ao cidadão vinculados aos governos estaduaiscoloquem para si o desafio da incorporação da partici-pação dos cidadãos-usuários na avaliação e gestão dosserviços. Esse desafio impõe-se não somente como opor-tunidade dedemocratização da gestão,mas pode ser vistotambém como instrumento de prevenção da desconti-nuidade administrativa. A gestão das centrais de atendi-mento integrado provavelmente seria o espaço mais pro-pício para avançar neste campo, por sua abrangência,pelos ganhos de qualidade de gestão acumulados e porsua visibilidade.

Indo mais além, pode-se enxergar nas dificuldadespara a ampliação dos serviços uma oportunidade paraampliar o envolvimento da sociedade civil na sua própriaoperação. A exemplo do que já acontece em diversos ou-tros campos da administração pública, entidades da so-ciedade civil podem assumir papéis relevantes não so-mente no controle social dos serviços prestados, mas tam-bém no levantamento de demandas e em sua própriaoperação.

Nesse caso, um novo desafio surge: promover a par-ticipação da sociedade civil na gestão, operação e con-trole social dos serviços de atendimento ao cidadão semabrir espaço para relaçõesde dependência que reduzama autonomia das entidades de sociedade civil e atrelem-nas aos movimentos conjunturais das disputas político-partidárias presentes na sociedade.

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AVANÇOS EPERSPECTIVAS DAGESTÃO PÚBLICANOS ESTADOS

Formas de Estruturação do Governo Estadualembusca da boa arquitetura governamental

Relator: Humberto Falcão Martins

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Formas de Estruturação do Governo EstadualEm busca da boa arquitetura governamental

Humberto Falcão Martins9

Introdução

Este capítulo trata das formas de estruturação dogoverno estadual e possui um triplo propósito: a) demar-car o campo conceitual e identificar tendências contem-porâneas (que se encontram de forma fragmentada naliteratura), propondo um referencial paraanálise; b) iden-tificar e descrever sucintamente experiências estaduaisrelevantes e inovadoras; e c) elaborar inferências geraise questões específicas que poderão ser objeto de discus-sões em políticas e avaliações específicas.

O texto está estruturado em quatro segmentos. O pri-meiro está relacionado ao primeiro propósito e busca

9 Doutor em Administração pela EBAPE/FGV e professor da Universida-de de Br asília. Já ocu pou posições g erenciais em empresas privad as e naadministração federal. É associado honorário do Instituto Publix, palestrantena área de gestão pública em eventos acadêmicos e profissionais no Brasil eexterior e autor de publicações sobre gestã o estratégic a, transform ação doEstadoe desenvolvimentogerencial. E-mail:[email protected]; Homepage:http://hfmartins.sites.uol.com.br/.

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elaborar conceitos de partida e identificar tendênciascontemporâneas, propondo a tese de que, em linha como conceito de arquitetura organizacional, a função daestrutura é realizar a estratégia. O segundo segmentotrata de elaborar inferências gerais e identificar, em pers-pectiva macrogovernamental, casos de relevo em rela-ção a três elementos das estruturas governamentais:cúpula, linha intermediária e suporte técnico. O terceirosegmento também está voltado à elaboração de infe-rências gerais e identificação de casos de relevo, masem relação a dois outros elementos das estruturas macro-governamentais: o núcleo operacional e as atividadesde suporte. Um quarto segmento tece, à guisa de con-clusão, considerações finais acerca da racionalidadedos desenhos organizacionais em perspectiva micro emacrogovernamentais.

1. Da estrutura à arquitetura governamental:conceitos de partida e tendências contemporâneas10

A estrutura organizacional é “o conjunto recorrentede relacionamentos entre os membros da organização[....] o que inclui (sem se restringir a isto) os relaciona-mentos de autoridade e de subordinação como represen-tados no organograma, os comportamentos requeridospelos regulamentos da organização e os padrõesadotados na tomada de decisão, como descentralização,padrões de comunicação e outros padrões de compor-

10 Este segmento inclui excertos de Humber to Martins: “A m odelagemmatricial da estrutura organizacional : o caso da Secretaria do Trabalho daPrefeitura de São Paulo”, X Congresso Interamericano do Clad sobre a Refor-ma do Estado e da Administração Pública, Santiago, Chile, outubro de 2005; eGoverno do E sta do de São Pau lo, G uia d e Mod ela gem d e Estrutur asOrganizacionais.

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tamento.”11 Segundo Mintzberg12, as estruturas organiza-cionais possuem cinco elementos ou blocos lógicos: a)cúpula, onde se inclui a estrutura de governança corpo-rativa (as instâncias máximas deliberativas que contro-lam aorganização); b) núcleo operacional, o espaço ondeos processos de trabalho finalísticos são operados paraproduzir os resultados; c) suporte administrativo, onde sesituam os processos de gestão de insumos (recursos hu-manos, financeiros, logísticos, materiais e outros) que se-rão aplicados nos processos finalísticos; d) suporte técni-co-corporativo, onde se incluem os processos de defini-ção de requisitos técnicos, desenvolvimento de produtos,planejamento corporativo e desenvolvimento institucional;e e) linha intermediária, a estrutura de coordenação quedeve proporcionar integração horizontal (entre os proces-sos finalísticos e entre estes e os de suporte) e vertical (en-tre o nível operacional, finalístico e de suporte e a cúpula).A figura 1 ilustra a inter-relação entre esses blocos.

Figura 1. Modelo genérico de estrutura proposto porMintzberg.

11 DONALDSON, Lex., “Teoria da contin gência estrutura l, in: CLE GG,Stewart R., HARDY, Cynthia e NORD, Walter R. (organizadores), Handbook deestudos organizacionais , vol. 1, cap. 3 (p. 105-136), Atlas, 1999, p. 105.

12 MINTZBERG, H., The structuring of organizations: A synthesis of theresearch, New Jersey, Prentice-Hall Inc, 1979.

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As estruturas organizacionais de governos possuem,nesse sentido, uma dimensão macrogovernamental (aestrutura do governo) e uma dimensão microgover-namental (a estrutura das distintas organizações que for-mam o governo como um todo). O quadro 1 ilustra o sig-nificado dos elementos da estrutura nessas duas dimen-sões.

Quadro 1. Elementos da estrutura nas dimensõesmacro e microgovernamentais.

A pergunta seminal por detrás desse modelo genéri-co é: qual o melhor desenho de estrutura governamen-tal? As respostas sucintas assim se desdobram: a) nãohá um único melhor desenho, as opções de desenho sãosempre específicas e contingenciais (distintas configura-ções de blocos estruturais segundo os tipos e contextosdas organizações); b) as estruturas são dinâmicas e mu-dam, em maior ou menor extensão, em função de deter-minantes internos e externos (demandas, tecnologias);c) a escolha dos desenhos organizacionais não é pura-mente racional, há, com efeito, funções simbólicas (mo-dismos, rituais e cerimônias) e limitações à racionalidade

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(jogos de poder, determinantes políticos externos, perfise preferências pessoais etc.); e, sobretudo, c) o melhordesenho é aquele que melhor realiza a estratégia.

Nesse sentido, o conceito de arquitetura organiza-cional proporciona um enquadramento normativo para oconceito de estrutura. A arquitetura governamental é con-junto de princípios e padrões que orientam como as ativi-dades devem se organizar (analogamente à estrutura)para implementar a estratégia organizacional. O concei-to de arquitetura organizacional propõe que a principalfunção da estrutura é realizar a estratégia13, proporcio-nando a integração das unidades/áreas funcionais me-diante o menor custo possível. Dessa forma, a arquitetu-ra governamental deve se posicionar como uma ponteentre a estratégia de governoe as atividades que a trans-formam em realidade. Coerente com o princíp io dacongruência14, um desenho organizacional que promovao alinhamento da estrutura com a estratégia promoveráum melhor desempenho da organização. A figura 2 bus-ca ilustrar esta função ponte (entre estratégia e platafor-ma implementadora) da arquitetura organizacional.

13 Veja-s e HOOGERVORST, J.A.P. , En terp ris e ar chitecture: en ablingintegration, agilityand the abilityto change,Proceedings LandelijkArchitectuurCongres, Nieuwegein, 2003; GHOSHAL, S, BARTLETT, C.A., Theindividualizedcorporation, New York, Harper Business, 1997; HAMEL, G., PRAHALAD, C.K.,Com peting for the futur e, Boston, Harv ard Bus ines s Sc hool Pr ess, 1994;HANNAN, M. e FREEMAN, J. H., Organization al ecology, Harvard UniversityPress, 1989; KAPLAN, R.S. e NORTON, D.P., Thestrategy-focussed organization,Boston, Harvard Business School Press, 2001; KOTTER, J.P., Leading change:why transformation efforts fail, Harvard Business Review, vol. 71, nº. 2, p. 59-67,1995; MALHOTRA, Y., Enterprise architecture: an overview, Brint Institute, 1996;e KANTER, R. Moss, eVolve!, Boston, Harvard Business School Press, 2001.

14 NADLER, D.A. e TUSHMAN, M.L., Competing by design, New York,Oxford University Press, 1997.

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Figura 2. Arquitetura organizacional - com adapta-ções baseadas em Hoogervorst (2003).

Uma arquitetura organizacional adequada, coeren-te, é aquela que proporciona um alinhamento entre a es-tratégia (ou conjunto de propósitos e resultados visados)e a estrutura. A resposta à pergunta seminal (qual o me-lhor desenho de estrutura governamental?) ainda perma-nece, dessa forma, genérica, mas a modelagem organi-zacional ou a análise da arquitetura em casos particula-res pode ser iluminada por alguns balizamentos e movi-mentos contemporâneos.

Assim, estratégias alinhadas com contextos de bai-xa complexidade, caracterizados pela previsibilidade eestabilidade de demandas (baixa variabilidade nas ne-cessidades dos beneficiários e, por conseguinte, nos pro-dutos/serviços) e ofertas tecnológicas (baixo grau de ino-vação do produto e do processo), alinham-se, por sua vez,com arquiteturas mais burocrático-mecanicistas. Há duasvariáveis-chave que devem ser consideradas: porte e in-certeza da tarefa. Organizações de grande porte estãomais sujeitas à burocratização. Por outro lado, ambien-tes estáveis proporcionam baixa incerteza da tarefa, que,nesse caso, impõe, em nome da eficiência (a relação óti-ma entre recursos e produtos), um desenho organizacionalmais rígido e programável. Com efeito, os modelos de

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gestão mecanicistas possuem as seguintes característi-cas: a) a estratégia é mais estável e reativa; b) o conjun-to de produtos (bens ou serviços) é mais padronizado,menos ou pouco diferenciado; c) os processos de traba-lho são mais rotinizados, programáveis, regulamentadose autônomos (circunscritos dentro da organização); d) asestruturas são mais rígidas, verticalizadas e reproduzemuma “separação entre mãos e cérebros” (uns pensam,outros executam; quem pensa não executa; quem execu-ta, não pensa) , demarcando de forma muito contundenteinstâncias de decisão e planejamento/formulação (umacúpula pensante) e instâncias de execução (uma baseoperacional); e) os quadros funcionais são mais fixos(mais empregados do quadro que colaboradores even-tuais),as competências são pré-definíveis e a capacitaçãoé orientada por conhecimentos disponíveis “no merca-do”; f) a cultura organizacional tende a destacar valorestais como disciplina, obediência e impessoalidade; g) aliderança emana mais da autoridade do cargo formal;h) a comunicação é mais formal e tende a seguir a hie-rarquia; e i) os sistemas de informação são centraliza-dos e herméticos (caixa preta). Uma arquitetura com es-sas características proporciona maior eficiência em am-bientes estáveis.

Já estratégias alinhadas com contextos de alta com-plexidade, caracterizados pela incerteza, ambigüidade,pluralidade e instabilidade das demandas (alta variabi-lidade nas necessidades dos beneficiários e, por conse-guinte, nos produtos/serviços) e ofertas tecnológicas (altainovação do produto e do processo), alinham-se, por suavez, com modelos de gestão de feição mais orgânica. Am-bientes instáveis ou turbulentos proporcionam alta incer-tezada tarefa,que, nesse caso, impõe, em nome da efetivi-dade (o impacto necessário, com base nos produtos ne-cessários), um desenho organizacional mais flexível e ca-

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paz de se reprogramar para atender rapidamente às va-riações do contexto. Com efeito, os modelos de gestãoorgânicos possuem as seguintes características: a) a es-tratégia mutante, emergente e proativa, voltada, inclusi-ve, para criação do futuro em bases autopoiéticas (naquala organização passa a modelar o ambiente maisque estemodela a organização); b) o conjunto de produtos (bensou serviços) é mais diversificado, mais ou muito diferen-ciado, podendo, no limite, ser totalmente customizado; c)os processos de trabalho são estruturados, mas menosrotinizados, menos programáveis e menos regulamenta-dos e sujeitos a constantes inovações e integrações late-raiscom organizações parceiras; d) as estruturas sãomaisflexíveis, horizontalizadas (menos níveis hierárquicos eeliminaçãode “intermediários” na média gerência) e bus-cam uma integração entre mãos e cérebros (a cúpula pre-dominantemente pensante se envolve em questõesoperacionais e abase operacional pensa estrategicamen-te e ganha maior autonomia/empowerment); e) os qua-dros funcionais são mais variáveis (menos empregadosdo quadro e mais colaboradores eventuais e parceiros),algumas competências são pré-definíveis, mas há com-petências emergentes e conhecimentos gerados exclusi-vamente dentro da organização; f) a cultura organiza-cional tende a destacar valores tais como iniciativa, ou-sadia e sensibilidade; g) a liderança emana da capaci-dade de resolver problemas e lidar com pessoas e situa-ções difíceis sob pressão; h) a comunicação é mais infor-mal e multidirecional; e i) os sistemas informacionais sãodescentralizados e acessíveis a todos. Uma arquiteturacom essas características proporciona melhor capacida-de de resposta em ambientes instáveis.

Modelos mecanicistas ou orgânicos não são bonsnem maus a priori, sua adequação é sempre contingen-te, embora todas as organizações tenham traços de am-

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bos (é muito usual que áreas como atendimento, produ-ção ou operações e área administrativa sejam maismecanicistas; ao passo que áreas de formulação, pes-quisa e desenvolvimento e comunicação sejam mais or-gânicas) formando, para usar a expressão de Dee Hock15,um conjunto caórdico (com elementos da ordem e contro-le mecanicistas e da anarquia caótica orgânica).

Esses balizamentos se aplicam aos governos emambasas perspectivas, macro e microgovernamentais. Deuma perspectiva ampla, caberia até afirmar que um dosargumentos da Nova Gestão Pública é a necessidade deos governos e suas organizações adotarem uma arquite-tura mais orgânica, em lugar de uma mais burocrático-mecanicista, tendo em vista a emergência de novos cená-rios (a reestruturação produtiva, a globalização, arevitalização da sociedade civil e outras). Em todocaso, épossível identificar tendências mais específicas do designorganizacional/governamental contemporâneo a partirdesses balizamentos, conforme expressos no quadro 2.

Essas tendências apontampara um perfil de dirigen-tes públicos com alta capacidade de pensamentosistêmico, tolerância integradora, foco e capacidade dearticulação e relacionamento.

Essas tendências poderão ser utilizadas comoreferencial para análise de casos concretos - que deman-dariam levantamentos e tratamentos mais sistemáticos,embora seja possível avançar algumas inferências a res-peito, tendo em conta os casos apresentados e a expe-riência. Os próximos segmentos buscam caracterizar ca-sos relevantes e elaborar inferências gerais na perspecti-va macrogovernamental.

15 Veja-se HOCK,Dee, Birth of theChaortic Age,Berrett-Koehler Publishers,Inc., San Francisco, 1999.

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2. Cúpula, linha intermediária e suporte técnico

A cúpula constitui o núcleo estratégico do governo.Em geral, o desenho na cúpula é mais conservador, ba-seado em temas e funções. Os estados possuem umaadministração central formada por governadores e vice-governadores, como executivos principais, secretários deestado (organizados por tema de política pública e fun-ções estatais) e outras posições de primeiro escalão (taiscomo comandantes das forças policiais, controladoria,procuradoria e outras). Regimentalmente, há uma ênfasenas funções de formulação, regulação e supervisão/co-ordenação de políticas, mas há unidades de primeiroescalão envolvidas diretamente no desempenho de fun-ções estatais (polícias e bombeiros, procuradoria, contro-ladoria e outras) e, portanto, dotadas de uma estruturamais operacional. Mas os principais problemas em rela-ção à natureza do trabalho burocrático nas instâncias deprimeiro escalão são: a) a drenagem da agenda dos se-cretários e equivalentes por questões operacionais(usualmente em razão de obstáculos burocráticos naimplementação das políticas, que refluem dos níveisoperacionais), em detrimento de uma maior concentra-ção nas funções de formulação e supervisão; e b) a insta-bilidade (qualitativa e quantitativa) e volatilidade da for-ça de trabalho técnico-formuladora (formada por cargoscomissionados em grande medida) e a conseqüente per-da de memória e aprendizado organizacionais,decorren-tes da alta rotatividade de secretários. A relação entrecúpula e linha intermediária e núcleo operacional éusualmente estabelecida na base do comando e controle,embora esse padrão possa estar combinado com mode-los de gestão por resultados (como se verá adiante).

Em geral, a cúpula é bastante horizontalizada, for-mada por um grande número de unidades de primeiro

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escalão: média de 24 e moda de 27 com mínimo de 16 emáximo de 41. Mesmo admitindo-se que as novastecnologias gerencias logrem expandir significativamenteos limites de amplitude de comando (imaginados porautores clássicos, tais como Fayol, Graicunas e Gulick,entre cinco e sete subordinados no máximo16), o perfil dosdirigentes executivos no Brasil, de corte presidencialista,carrega muito nas funções políticas e gerenciais dos exe-cutivos principais (que, além das funções cerimoniais aque seus cargos obrigam, necessitam, para governar, fa-zer política e exercer a “gerência geral” de seus gover-nos). Em síntese, a sobrecarga de funções torna virtual-mente impossível que um executivo principal coordene,por supervisão direta, duas dúzias de subordinados (to-mando-se, generosamente, a média de secretarias es-taduais). Como resultado, a supervisão direta do gover-nador torna-se cada vez mais focada em algumas se-cretarias nucleares (predominantemente nas áreas dafazenda, desenvolvimento econômico e desenvolvimentosocial), impondo arranjos de coordenação delegada porparte de secretários nucleares e/ou outras posições aele próximas.

Ademais, a macroestrutura é altamente dinâmica,sujeita a reorganizações mais baseadas em determi-nantes políticos (composição da equipe de governo paraviabilizar coalizões políticas) ou fiscais (extinção e/oufusão deórgãos para redução de despesas) quepara ali-nhamento com estratégias degoverno. As reorganizaçõespolíticas, aliadas à ampla horizontalização, constituemum foco com grande potencial de fragmentação (a perda

16 Veja-se Fayol, Gener al princ iples of managem ent, In: PUG H, D.S.,Organization theory, London, Penguin Books 1990; GULICK, L. e URWICK, L(editors), Papers onthe scienceof administration, Columbia University’s Instituteof Public Ad ministration.Gulic k, 1937; e Gr aicu nas, V.A. , Relations hip inorganization. In: GULICK, L. e URWICK, L. (1937: 183-187).

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de referência da estratégia, conflitos entre áreas de go-verno e baixa articulação).

Embora não implique, necessariamente, fragmenta-ção, exige, em todo caso, uma coordenação mais eficaz.As reorganizações fiscais são problemáticas porqueusualmente pioram o desenho macrogovernamental, des-locando-o da estratégia. Embora logrem reduzir despe-sas (com cargos comissionados e outras despesas admi-nistrativas decorrentes de ganhos de escala com fusões)e preservem secretarias nucleares, geram paralisia, con-flito de culturas organizacionais distintas e, não raro,atonia dos servidores (até porque as redefinições de com-petências raramente implicam de forma coerente reorga-nização de processos, redefinindo tarefas e resultadosindividuais). A questão, nesse caso, é permitir ajustes es-truturais, mas num nível tal que não haja, por conta dis-so, instabilidade estrutural, o que gera descontinuidade,perda de memória e fragmentação. O ideal é uma cúpulamais estável e uma base operacional mais flexível e di-nâmica, mas os governos tendem a ser mais instáveis notopo e mais estáveis na base, o que aumenta muito a ne-cessidade de sucessivos realinhamentos da baseoperacional.

Estes problemas podem ser (e vêm sendo em varia-da extensão) mitigados de duas principais maneiras:verticalização da macroestrutura e adoção de modelosintegradores de gestão por resultados.

2.1. A verticalização no Pará, em Alagoas eno Distrito Federal

A verticalização da macroestrutura consiste na cria-ção de um nível hierárquico adicional na cúpula (de de-nominação variada: secretaria especial no Pará, secreta-

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ria celular coordenadora em Alagoas e agência de de-senvolvimento no Distrito Federal) para melhorar a coor-denação por supervisão. A verticalização da macroestru-tura tende a promover o enxugamento da cúpula e a “em-purrar” os outrora escalões superiores para a linha inter-mediária (o que sugeriria,em princípio, um enxugamentoda linha intermediária).

A verticalização é uma alternativa ortodoxa porquese baseia na criação de posições e/ou unidadesorganizacionais para melhorar a coordenação de formahierárquica - principalmente nos casos do Pará e Alagoas;embora no caso do Distrito Federal também tenha havi-do criação de unidades, não houve acréscimo de um ní-vel hierárquico. A alternativa ortodoxa pressupõe umaagenda, quer sob a forma de um plano ou de um conjun-to claro de diretrizes, que, de fato, possui mais chance decoesão dentro de um círculo mais restrito de posições (apartir da verticalização da macroestrutura), quer entredezenas de secretários. A alternativa ortodoxa tambémse apóia num processo mais tradicional de planejamen-to, no qual a definição da estratégia segue os ritos legaisdos planos plurianuais elaborados com base em progra-mas, cujo monitoramento é central mas dependente deuma rede de gerentes de programa. A forma de transmis-são e interlocução estratégica com a linha intermediáriae a base se opera, sobretudo, a partir do comando e docontrole hierárquicos, embora alguns gerentes de progra-ma possam desempenhar uma importante ação inte-gradora. Há três casos emblemáticos de verticalização:Pará, Alagoas e Distrito Federal.

No estado do Pará, a administração direta é forma-da por 34 órgãos e a indireta por 32 entidades. O projeto“Novo Pará” propunha um modelo de gestão cuja cons-trução repousasse fundamentalmente na capacidade de

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promover a integração das políticas governamentais; eestruturação dos grupos de integração de políticas orga-nizadas por afinidades de atribuições, buscando agre-gar esforços e eficiência, por meio de atuação articuladacom outras áreas de governo. Foram, portanto, criadassete Secretarias Especiais de Estado, com a atribuiçãode coordenar e integrar todas as intervenções governa-mentais, e um Colegiado de Gestão Estratégica, atuan-do como instância superior de articulaçãoe de integraçãodas ações e das políticas públicas. O Colegiado de Ges-tão Estratégica é composto por sete secretários espe-ciais de estado. No seu âmbito, operam o Comitê Inter-setorial de Avaliação e Controle de Gastos, para acom-panhar o desempenho dos órgãos da administração di-reta e indireta e propor medidas de controle e racionali-zação dos gastos, e, dentro de cada área, ComitêsSetoriais de Gestão, voltados à deliberação sobre políti-cas públicas setoriais. Às sete Secretarias Especiais (deGoverno, de Integração Regional, de Produção, de Pro-teção Social, de Promoção Social e de Defesa Social)subordinam-se hierarquicamente, por sua vez, tanto se-cretarias (administração direta) quanto entidades (admi-nistração indireta) em sua área de atuação. De acordocom avaliação do estado, a introdução desse modeloproporcionou maior alinhamento e integração, reduçãode gastos e um melhor controle e acompanhamento dasáreas de governo.

No estado de Alagoas, a administração direta é com-posta de 35 órgãos, entre os quais 24 secretarias, todossubordinados diretamente ao governador. Foram criadasnove Secretarias Celulares, assim denominadas paradenotar, tal qual a metáfora da célula orgânica, especia-lizações de função, graus de liberdade, objetivos predefi-nidos e funcionamento harmônico. Assim, a nova arqui-tetura celular seria composta pelo governador e vice, um

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conjunto de órgãos auxiliares (gabinetes e assessoriasdo governador, procuradoria, defensoria, controladoria eoutras) e três categorias de células: estratégicas, instru-mentais e programáticas. Cada célula, dentro de cadaconjunto, é encabeçada por uma Secretaria Celular Co-ordenadora e as entidades da administração indiretaaparecem subordinadas tanto às secretarias quanto àSecretaria Celular Coordenadora em distintos arranjos.O conjunto de Células Estratégicas é formado pela Célu-la de Articulação Governamental (cuja Secretaria Celu-lar Coordenadora possui três secretarias: da ArticulaçãoExterna, da Mulher e de Minorias) e pela Célula de Arti-culação Regional, com as representações por macrorre-giões subordinadas à Secretaria Celular. O conjunto deCélulas Instrumentais é formado pela Célula de Planeja-mento, Gestão e Finanças (na qual estão, além da Se-cretariaCelular Coordenadora, trêssecretarias: da Fazen-da, do Planejamento e da Administração,Recursos Huma-nos e Patrimônio) e pela Célula de Regulação e ControleSocial (na qual estão vinculadas cinco entidades à Secre-tariaCelular). O conjunto das Células Programáticas éfor-mado por cinco Células Finalísticas: Educação e Desen-volvimento Humano, Saúde e Bem-Estar Social, Justiça eDefesa Social, Infra-Estrutura e Desenvolvimento Econô-mico. Subordinadas à Secretaria Celular de Educação eDesenvolvimento Humano estão quatro secretarias (Edu-cação; Cultura,Esportes e Ciência e Tecnologia); à Secre-taria Celular de Saúde e Bem-Estar Social estão três se-cretarias (Saúde, Assistência e Recursos Naturais); à Se-cretaria Celular de Justiça, cinco órgãos (Secretaria de Jus-tiça e as Polícias Civil e Militar e oCorpo deBombeiros); àSecretaria Celular de Infra-Estrutura, as empresas públi-cas prestadoras de serviços de utilidade; e à SecretariaCelular de Desenvolvimento Econômico, cinco secretarias(Indústria e Comércio, Renda, Agricultura e Turismo).

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No Distrito Federal, a administração direta é com-posta por 37 órgãos diretamente subordinados ao gover-nador, entre os quais estão 31 secretarias. Foram criadas,entre os órgãos de staff diretamente subordinados aogovernador, três agências: de Desenvolvimento Econômi-co e Comércio Exterior, de Desenvolvimento Social e deInfraestrutura e de Desenvolvimento Urbano. Essas es-truturas têm o papel de planejar, articular, supervisionare avaliar as diversas ações e programas de governo den-tro de suas áreas em consonância com as diretrizes fixa-das pelos respectivos conselhos (entidades colegiadasformadas por secretários de governo, outras autoridadese representantes da sociedade civil com caráter consulti-vo e deliberativo, responsável pela validação de políti-cas e programas governamentais). Trata-se, portanto,essencialmente, de unidades integradoras no sentidovertical (trazem a estratégia, a formulação de políticasemanada dos conselhos, para a base implementadoranas secretarias de governo) e no horizontal (buscamacompanhar e gerar convergência nas ações de diver-sas secretarias), que exercem uma coordenação delega-da que não constitui, como nos casos anteriores, coorde-nação por supervisão hierárquica, o que torna matricialeste modelo de estrutura, combinando critérios funcionaise programáticos de departamentalização macrogover-namental, propenso ao conflito e dependente de alta le-gitimidade, de proximidade ao governador e capacida-de de negociação dos dirigentes das agências.

A verticalização prova-se válida em circunstânciasfragmentárias, permitindo livrar a agenda das secreta-rias coordenadoras das questões operacionais e possibi-litando que estas se concentrem no seu papel integradorlateral (entre as outras secretarias coordenadoras) e ver-tical (entre suas secretarias vinculadas hierárquica oufuncionalmente), ao mesmo tempo que desonera a carga

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de supervisão direta do executivo principal, liberando-opara suas funções estratégicas e políticas. Em todo caso,o fundamental é a forma como esses modelos são, naprática, operados, principalmente no que concerne à pos-tura do executivo principal - o principal risco é este “fu-rar” a hierarquia e enfraquecer o papel das posições co-ordenadoras (sejam de linha, com subordinação hierár-quica, nos casos do Pará e Alagoas, seja de staff, no casodo Distrito Federal, com vinculação funcional) acessandoas secretarias, na condição de linha intermediária, dire-tamente.

2.2. Modelos integradores e contratuais de gestãopara resultados em Sergipe, Alagoas e Minas Gerais

Já os modelos integradores e contratuais de gestãopara resultados, a exemplo da abordagem denominadaGoverno Matricial17, estão baseados em desdobramen-tos de concepções de gestão por programas, por meio daformação de redes de governança (intra e extragover-namentais) que buscam estabelecer mecanismos de ges-tão de conjuntos específicos de organizações (governa-mentais ou não) envolvidas na geração dos resultadosdos programas prioritários de governo e, ao mesmo tem-po, promover um enquadramento das organizações como conjunto de programas queas perpassam. Patente está,nessas concepções, a insuficiência da gestão por progra-mas (a partir do enunciado de resultados e ações e dasatribuições do gerente de programa) em promover, perse, o devido enquadramento e engajamento das estrutu-

17 Veja-se MARINI, Caio e MARTINS, Humberto, “Um Governo Matricial –estruturas em rede para geração de resultados de desenvolvimento”, IX Con-gresso Interamericano do CLAD sobre a Reforma do Estado e da Administra-ção Pública, realizado em Madrid, em novembro de 2004.

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ras envolvidas na sua implementação. A adoção de mo-delos integradores de gestão por resultados constitui umaalternativa heterodoxa porque prescinde da criação deposições suplementares intermediárias, proporcionandouma nova forma de atuação (baseada no detalhamentoda agenda estratégica de governo sob a forma de metasmobilizadoras e programas prioritários, sem prejuízo deoutros programas do plano plurianual) sobre a estruturaexistente - que poderá ou não sofrer ajustes racionali-zadores, mas não necessitará de ajustes de alinhamentoestratégico. A alternativa heterodoxa também pressupõeuma agenda, mas esta agenda é compartilhada e com-promissada com o conjunto de unidades da estrutura degoverno como um todo responsável pela sua implemen-tação, a partir de dois tipos cruzados de alinhamento, umhorizontal (alinhamento, no âmbito de cada programa,das organizações envolvidas na sua implementação, for-mando-se redes de governança com modelos peculiaresde gestão e sob pactuação de resultados) e outro vertical(alinhamento, no âmbito de cada organização, dos pro-gramas que as perpassam de modo a inserir em suasagendas estratégicas suas contribuições à geração dosresultadosvisados, que tambémsão objeto depactuação),e um sistema de controle central localizado junto ao exe-cutivo principal - alternativa esta que não depende doarranjo hierárquico da linha intermediária, embora algunselementos da linha intermediária possam e devam fazerparte das redes de governança nas quais essa alternati-va se baseia. Há três casos emblemáticos de modelosintegradoresde gestão pararesultados: Sergipe, Alagoase Minas Gerais.

Sergipe foi o berço do Governo Matricial18. A partir

18 Veja-se MEND ES, Gilmar et al, Gestão pública e Desenvolvimento,Banese, 2005.

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de 2003 iniciou-se uma série de ações racionalizadorasna estrutura e cogitações sobre como voltar a administra-ção estadual para a geração de resultados de desenvol-vimento. Seguiu-se uma série de discussões a partir dasquais se foi constatando a necessidade de consolidaçãodo planejamento governamental sob a forma de umaagenda estratégica coerente que exprimauma visão, queesta se traduza em um conjunto reduzido de metasmobilizadoras, que, por sua vez, embasariam a modela-gem de uma carteira de poucos, mas significativos pro-gramas prioritários. Assim é que, a partir da metamobilizadora de ter o maiorIDH do Nordeste em 2008 (ex-pressão da visão política do governador), foram modela-dos 15 programas prioritários, construiu-se um modelorelacional quantitativo que simulava o impacto dos resul-tados dos programas na meta mobilizadora (permitindouma fina calibragem dos indicadores e metas para os 15programas prioritários), gerou-se uma matriz de inter-re-lação programas-organizações (definindo-se as redes deimplementação para cada programa prioritário) e firma-ram-se15 contratos de gestão (denominados transversais,um para cada rede de implementação de programasprioritários, envolvendo os gerentes de programa e osdirigentes das organizações envolvidas, caso a caso).Paralelamente, foi constituída a Central de Resultados(seu dirigente com status de secretário próximo do gover-nador), definida a sistemática de monitoramento e ava-liação e implementadas as plataformas de suporte (ba-seadas em sistemas informatizados).

Em Alagoas, há dois pontos de partida para a im-plantação (ainda em andamento) do Governo Matricial:a consolidação da agenda estratégica de governo e aimplantação do modelo celular de estrutura macrogo-vernamental (já mencionado). A consolidação da agen-da estratégica de governo partiu, por sua vez, de uma

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meta mobilizadora (incluir 1,5 milhão de alagoanos, con-soante a visão do governador), de um vasto conjunto deprogramas do Plano Plurianual e do Plano de Negóciosdo Estado, documento referencial produzido para atra-ção e investimentos privados. Esses referenciais foram,mediante um processo de interlocução com a sociedade,consolidados em 12 programas prioritários, tendo-se de-finido, para cada programa:a) sua cadeia de valor (seuspúblicos de interesse, impactos visados, produtos gera-dos, ações e recursos necessários); b) seus indicadoresde resultado e plano de ação; c) o conjunto de organiza-ções que as implementam (alinhamento horizontal); e d)os termos de pactuação de resultados, sob a forma deum contrato de gestão a ser firmado entre cada gerentede programa e o governador, com a interveniência dasorganizações que as implementam, caso a caso. Com-plementarmente, procedeu-se ao alinhamento (vertical)de cada uma das nove secretarias celulares no sentidode inserir em suas agendas estratégicas as contribuiçõesnecessárias à implementação dos programas que as per-passam, resultando em outro conjunto de pactuações soba forma de contratos de gestão a serem firmados entre ossecretários celulares e o governador. Paralelamente aesses movimentos de alinhamentos horizontal e vertical,tem-se avançado na constituição da Central de Resulta-dos, a instância de gestão dos contratos de gestão res-ponsável pelo gerenciamento intensivo da agenda estra-tégica de governo.

Minas Gerais representa o caso mais abrangente eavançado de alinhamento integrador entre estratégia eestrutura, cúpula e núcleo operacional. Tal alinhamentotem-se estabelecido por meio de quatro dispositivos bá-sicos: a) gestão intensiva de projetos estruturadores deinvestimentos estratégicos, constituindo uma carteira de31 projetos prioritários denominada Geraes (alinhamen-

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to horizontal); b) modelos contratuais de gestão tais comoo Acordo de Resultados (pactuação intragovernamentalentre diferentes níveis hierárquicos, totalizando, até o pre-sente momento, 17 Acordos de Resultados celebrados),Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público(Oscips) (mediante termo de parceria com entidades não-governamentais) e Parceria Público-Privada (PPP) (me-diante contrato de PPP), constituindo todos modalidadesde alinhamento vertical; c) Câmara de Planejamento,Gestão e Finanças, colegiado de secretários que delibe-ra sobre e realiza o acompanhamento estratégico dosprojetos estruturadores e modelos contratuais; e d) Juntade Programação Orçamentária e Financeira (JPOF),colegiado de secretários que delibera sobre a garantiade recursos para geração dos resultados visados. EmMinas, a abordagem do Governo Matricial não estavapresente na concepção desses elementos, mas foi muitoútil para consolidá-los e, sobretudo, contribuir para orde-ná-los e integrá-los. Complementarmente, ressalta-se aimportância e a integração, nesse conjunto de elemen-tos, do processo de planejamento. Minas pôs em práticao conceito de Duplo Planejamento, promovendo um in-tenso diálogo entre dois enfoques, o de “hoje para hoje”(a carteira Geraes) e o “hoje para amanhã” (o Plano Mi-neiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI)), que partede uma visão de futuro, traça opções estratégicas e obje-tivos prioritários, aos quais os 31 projetos estruturadoresse vinculam de forma cruzada).

Embora experimental, complexa e, portanto, sujeitaa inúmeros desafios, a adoção de modelos integradorese contratuais de gestão por resultados constitui uma ini-ciativa muito promissora dado seu caráter pragmático:estabelecer pontes mais firmes (que a concepção de ges-tão por programas stricto sensu) entre a estratégia e aestrutura existente, sem tentar, antes, reorganizá-la. E

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entre os desafios que estes modelos integrados de ges-tão para resultados enfrentam, destacam-se: a) os incen-tivos (a necessidade de manter ganhos reais para osagentes públicos envolvidos na promoção dos resultados);b) a qualidade do monitoramento e avaliação (que deve-rão não apenas gerar informações sobre o andamentode programas e organizações, mas, sobretudo, ações deajustamento); e c) a flexibilidade dos planos (no sentidode incorporar redirecionamentos decorrentes domonitora-mento da implementação e dos cenários cambiantes).

Embora as alternativas da verticalização e dos mo-delos integradores de gestão por resultados sejam váli-das e, em particular, a heterodoxa seja potencialmentemais pragmática e alinhada com as arquiteturas maisorgânicas, destaca-se que, a exemplo de Alagoas, essasalternativas não são mutuamente excludentes e uma com-binação de ambas pode potencializar as vantagens semque haja um acréscimo de seus riscos ou limitações.

3. Núcleo operacional e suporte administrativo

Em geral, a base operacional combina, de forma nemsempre harmônica, estruturas burocráticas estatais defeição mecanicista com estruturas mais orgânicas, sejamentidades não-governamentais envolvidas na implemen-tação de políticas públicas, sejam redes multiinstitu-cionais que se formam a partir de estruturas estaduais,federais e/ou municipais com ou sem o envolvimento deentes não-governamentais, sujeitas a um grau variávelde regulamentação e controle. Ainda assim, de um modogeral, a estrutura do núcleo operacional ainda possui umdesenho mais mecanicista, baseado na ordem e naprevisibilidade, deveras em desacordo com o contextodinâmico e fluido dos problemas e intervenções de políti-

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cas públicas (mais pautados pelo “caos” e pela impre-visibilidade de emergentes redes transversais que nãoobedecem a fronteiras políticas, territoriais ou progra-máticas). Em síntese, o núcleo operacional é, em geral,rígido demais para desempenhar bem sua função de ge-ração de resultados - pois são as organizações e unida-des do núcleo operacional que entregam aos beneficiáriosa prestação de serviços e a implementação das políticaspúblicas.

Na base da relativa rigidez do núcleo operacional(e, por extensão do suporte administrativo, que também éoperacional) está uma plêiade de problemas e limitaçõesà autonomia e à flexibilidade operacionais, decorrentesde limitações dos modelos institucionais, na regulamen-tação administrativa típica do setor público e nas dificul-dades de gestão de parcerias (integração em redes ins-táveis e semi-regulamentáveis). Primeiramente, os mode-los de instituições públicas estatais disponíveis na legis-lação (órgãos da administração direta, autarquias, em-presas públicas, sociedades de economia mista, funda-ções, serviços sociais autônomos etc.) não oferecem maispraticamente nenhuma diferenciação de autonomia ouflexibilidade operacional (oque discrepa até dos cânonesdoutrinários do Direito Administrativo), além de imporemuma padronização que alcança, não raro, o próprio de-senho organizacional (a partir não apenas de tradiçõese modismos, mas da necessidade de existência de certostipos de unidades-padrão, muitas das quais partessetoriais ou seccionais de sistemas administrativos cen-trais). Todo tipo de entidadeestatal (e, de resto, parceirosnão governamentais que recebem dinheiro público) estáindistintamente (com raras exceções, aplicáveis mais àsempresas públicas e sociedades deeconomia mista) abri-gado sob o pesado e incapacitador manto regulamentaradministrativo do setor público. Esse quadro torna secun-

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dário o problema de haver, no núcleo operacional, órgãosda administração direta voltados a prestação de servi-ços porque, na prática, seu grau de autonomia e flexibili-dade é igual aos órgãos da administração indireta quedeveriam estar, por definição, servindo de modelo paratais funções operacionais implemen-tadoras - emborarecentes iniciativas de autarquização de empresas públi-cas, em razão de desoneração tributária, agrave aindamais este quadro.

Não obstante lidarem com diferentes públicos de in-teresse, desempenharem diferentes tipos de atividades,mediante processos e recursos de diferentes naturezas,sujeitos a condições diferenciadas, as organizações esta-tais estão obrigadas a regras únicas para gestãode seusrecursos (mormente compras e contratos, recursos huma-nos, orçamento e finanças), que, ademais, possuem umaconcepção altamente centralizada (em órgãos centrais)que limita ainda mais a capacidade de gestão de recur-sos para a promoção de resultados. Acrescenta-se a estequadro a questão da escassez, da pura e simplesindisponibilidade de recursos, seja por problemas fiscais(mediante contingenciamentos orçamentários), seja pelosubdimensionamento (qualitativo e quantitativo) e dificul-dades deaproveitamento da força de trabalho.

Por outro lado, a questão da autonomia e da flexibi-lidade não pode ser tomada de forma polar, uma vez quepadronizações, regulamentações e centralizações tam-bém atendem a propósitos válidos: eficiência e controle.A questão, portanto, é: como assegurar um maior grau deautonomia e flexibilidade para que as organizações donúcleo operacional possam resgatar sua capacidadeoperacional e melhor produzir, em rede, com outros agen-tes públicos (governamentais e não-governamentais) seusresultados, alcançando-se, ao mesmo tempo, um níveladequado de controle e transparência?

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Mesmo que os resultados de governo estejam cla-ros, essas limitações estruturais acabam por produzir, noplano microorganizacional (em relação às organizações,em particular), o fenômeno da drenagem da agenda dosdirigentes organizacionais por questões operacionaisdiuturnas em detrimento de suas funções estratégicas,podendo levar à desorientação estratégia e descolamentoda estratégia macrogovernamental.

As soluções não excludentes passam por duas linhasbásicas de ação: a) mudar as regras para reverter oengessamento padronizador e restabelecer níveis de au-tonomia e flexibilidade dos modelos institucionais públi-cos e suas formas de vinculação a redes de modo a quealguns processos de implementação possam receber umtratamento regulamentar condizente com sua natureza ecomplexidade; e b) descentralizar intra e extragoverna-mental (parcerias e terceirizações, esta última principal-mente na área de suporte administrativo) e desconcentrarpara aproximar a decisão e o atendimento ao lócus dademanda, do ponto de vista regional e programático. Emlinha com esses direcionamentos, são exemplos de movi-mentos correntes na base operacional a experiência deregionalizaçãoda gestão (via descentralização e descon-centração regional) emSanta Catarina e deparceirizaçãocom o terceirosetor (OSe Oscip) einiciativa privada(PPP),de forma pioneira, em São Paulo e em Minas Gerais.

3.1. A regionalização em Santa Catarina

Em Santa Catarina, em 2003, um diagnóstico da ad-ministração estadual apresentava, entre outros proble-mas, uma estrutura organizacional pesada, burocráticae centralizada como um dos fatores que proporcionavamum péssimo atendimento aosanseios da sociedade catari-

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nense. A primeira etapa da Reforma Administrativa insti-tuída a partir da Lei Complementar nº 243/03 definiu asgrandes linhas orientadoras da descentralização, dadesconcentração do poder eda regionalização do desen-volvimento, buscando transferir as ações de governo parainstâncias mais próximas do cidadão, tais como Conse-lhos de Desenvolvimento Regional, de modo a promovero desenvolvimento sustentável (ambiental, econômico,social e tecnológico), a redução das desigualdades entrecidadãos e entre regiões e a elevação da qualidade devida de sua população. Isso implicou nova estrutura doPoder Executivo, a partir da criação, num primeiro mo-mento, de 29 Secretarias de Desenvolvimento Regional(SDRs) e, num segundo momento, na consolidação deseu modelo de gestão, além da criação da 30ª SDR e res-pectivo Conselho, uma em cada microrregião. Posterior-mente, a Lei Complementar nº 284 aprofundou as refor-mas iniciadas em 2003 desburocratizando, descentrali-zando e desconcentrando os circuitos de decisão.

Essas estruturas estão voltadas, em parceria com asociedade civil, para a realização de diagnóstico da si-tuação de cada região; a identificação das potencia-lidades, vocação e elaboração de planos integrados dedesenvolvimento; a consolidação dos diversos aglome-rados produtivos do estado; e a melhoria do atendimentosocial.

Ainda não há elementos que permitam uma avalia-ção dos resultados da implantação desse modelo, mas éimportante registrar que, de um modelo claramente vol-tado ao desenvolvimento em bases regionais, suas ca-racterísticas indicam um alto potencial de organização ecanalização (do aparente “caos”) das redes locais (multi-institucionais e de distintos graus de estabilidade) dedesenvolvimento nas quais a administração estadual seinsere de várias formas.

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3.2. As organizações da sociedade civil de interessepúblico Oscips em Minas Gerais

As Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico (Oscips) mineiras constituem um híbrido de OS eOscip federais, sendo um título concedido (mediante atovinculado) a organizações de direito privado, sem finslucrativos, que atuam no desenvolvimento de projetos eprogramas sociais (não apenas voltados à prestação deserviços, mas, também, admitindo-se defesa de direitose apoio administrativo) nas mesmas áreas de atuaçãodas Oscips federais (espectro de áreas mais amplo queas OSs) e com ampla possibilidade de cessão de servi-dores e patrimônio (característica intrínseca das OSs, nãodas Oscips federais) mediante firmatura de termo de par-ceria (sob escolha direta ou competição de projetos).

Analogamente ao modelo federal, o termo de parce-ria constitui o instrumento de pactuação de resultados queregula as relações entre Poder Público e Oscip, dispondosobre o objeto, o quadro de indicadores e metas dos re-sultados previstos, o cronograma de desembolso, os cri-térios para avaliação de desempenho e a previsão dereceitas e despesas.

O monitoramento é feito pelo órgão estatal parceirocom o auxílio de uma comissão de avaliação e fiscaliza-ção, sem prejuízo de fiscalização pelo Conselho de Políti-cas Públicas da área correspondente, pelo Ministério Pú-blico, pelo Tribunal de Contas Estadual e pela Advoca-cia-Geral do Estado. Ressalta-se, no caso mineiro, a pre-sença na Oscip de um supervisor do termo de parceriana estrutura de governança interna.

Há, até o presente momento, 65 Oscips qualificadase seis termos de parceria celebrados em áreas diversas(emprego e renda, prevenção da criminalidade, desen-volvimento ambiental, esportes, TV educativa e cultura).

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A incipiência da implementação ainda não permiteavaliações, mas louva-se, no caso mineiro, a concepçãodo modelo, reunindo as vantagens dos dois modelos deparceria federais (OS e Oscip) num só modelo - elimi-nando, ademais, as principais suscetibilidades jurídicasdo modelo OS, na medida em que a qualificação não sefaz mediante ato discricionário, e a celebração de termode parceria pode sujeitar-se à competição.

3.3.As parcerias público-privadas em Minas Gerais

Também em Minas Gerais iniciou-se um programade Parcerias Público-Privadas. Na qualidade de empre-endimento público com recursos públicos e privados, asPPPs mineiras poderão ser materializadas por meio de:a) concessão de um serviço público, para o qual é neces-sário o aporte de uma contribuição pecuniária do estadopara tornar economicamente viável a sua exploração (tra-ta-se, na verdade, de serviços públicos para os quais acobrança de tarifas não é suficiente para cobrir os inves-timentos realizados pelo operador); b) execução compar-tilhada de “atividade” deinteresse público, que será trans-ferida para o parceiro privado, que se tornará responsá-vel pela sua instalação, execução e gestão, segundo ní-veis de desempenho preestabelecidos; e c) comparti-lhamento objetivo de riscos entre os parceiros, na remu-neração do concessionário segundo a sua performanceno contrato, no prazo de vigência dos contratos (nuncasuperior a 30 anos, nem inferior a cinco), e na constitui-ção de garantias que assegurem seu pagamento diantedo risco de inadimplência do Poder Público.

Foram instituídos, nesse sentido, uma lei estadual(nº 14.868/03) que regulamenta o Programa de PPP, umPlano Estadual de Parcerias Público-Privadas (com obje-

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tivos e ações de governo e uma carteira de projetos a se-rem executados), um Conselho Gestor de Parcerias Pú-blico-Privadas (órgão colegiado, presidido pelo governa-dor que aprova o Plano de PPP), uma Unidade Opera-cional de Coordenação do Programa de PPP (no âmbitoda Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico(Sede), responsável pelacompilação e sistematizaçãodasex periências, metodologias e conceitos de PPP, peloassessoramento técnico do CGP, pelo acompanhamentoe análise técnica dos projetos), um Arranjo de Garantias(ativos de alta liquidez e os mecanismos necessários paraa sua liberação automática, na hipótese de se constatareventual inadimplemento do estado para com as obriga-ções assumidas em decorrência de uma PPP, a partir doFundo Estadual de Parcerias Público-Privadas e daCodemig), um Manual de Operações (metodologia deanálise e critérios para nortear a seleção das propostasapresentadas pelas entidades da Administração ao Con-selho Gestor) e uma Rede PPP (conjunto de unidadessetoriais, que, em conjunto com a unidade central, atuapara garantir a criação de vínculos institucionais entreos diversos órgãos e entidades do estado, bem como efe-tivar a transmissão e consolidação das informações econceitos).

Há atualmente um plano de PPP aprovado e cincoprojetos-piloto de PPP em Minas Gerais: recuperação dainfra-estrutura da Rodovia MG-050 (cuja modelagem jáfoi finalizada e aprovada pelo CGP, além da publicaçãode aviso de licitação e edital, passando a integrar o 1ºPlano Estadual de Parcerias Público-Privadas do estado);construção de 3 mil vagas penitenciárias; projeto de sa-neamento básico nas regiões com menores IDH do esta-do; Projeto Estruturador Centro Administrativo Mineiro; econstrução do campus de Belo Horizonte da UEMG.

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3.4. As organizações sociais em São Paulo

A experiência do governo do estado de São Paulocom OS está concentrada nas áreas da saúde e da cultu-ra. Já em 1998, São Paulo implementou um modelo pio-neiro de organizações sociais de saúde, a partir da edi-ção da LC nº 846 e da inauguração de funcionamento deseis hospitais (cujas obras de conclusão se estenderamde 1995 a 1998), sob gerenciamento de organizações so-ciais de saúde por meio de contrato de gestão. A adoçãodo modelo de OS de saúde fundamentou-se na existên-cia de problemas gerenciais sem possibilidade deequacionamento satisfatório no ambiente regulamentarda administração pública, entre os quais se ressaltam:restrições fiscais que impediam a contratação de pessoalpor concursos, baixa remuneração de gerentes, dificul-dades de reposição de pessoal, dificuldade em praticarpagamento por produtividade, rigidez de prazos e con-troles. Enfim, havia a premente necessidade deoperacionalizar hospitais novos em curto prazo (mais de3.500 leitos em 16 hospitais a partir de 1996).

Dessa forma, foram firmados contratos de gestãoapenas com hospitais novos, garantindo-se os princípiosdo SUS, com exclusividade para usuários desse sistema,fiscalizados pela Secretaria da Saúde, e o perfil hospita-lar e as metas pactuadas de acordo com a demanda re-gional. Entre 1998 e 2000, numa primeira fase, havia doisinstrumentos de relação OS-Poder Público, o contratopadrão SUS e o contrato de gestão com metas de produ-ção semelhantes para todos os hospitais. Também nesseperíodo, a forma de pagamento da OS englobava fatu-ramento ao SUS e suplementação para cobertura da di-ferença entre receitas e despesas. No biênio 2000/2001foram elaborados novos contratos de gestão e atualmen-te há 16 hospitais gerenciados por esse tipo de contrato.A partir de 2001, numa segunda fase, a relação OS-Poder

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Público foi unificada no contrato de gestão e a produçãopassou a pautar-se por quantificação prévia com revisõesperiódicas, implantação de sistemas de coleta de dados/divulgação de informações e implantação da Comissãode Acompanhamento para cada hospital. Também a for-ma de pagamento sofreu modificações, passando a com-portar um orçamento prévio, 90% do qual executado em12 parcelas fixas ligado à produção e 10% em 12 parce-las mensais vinculadas a indicadores de qualidade.

No que respeita à governança interna, há em cadaOS um Conselho de Administração (sem nenhuma parti-cipação do Poder Público, o que, além do foco nas áreasde saúde e cultura, constitui praticamente a única dife-rença em relação à OS federal) ao qual cabe aprovar obalanço, demonstrativos financeiros, orçamento; admitire demitir os membros da diretoria do hospital; aprovar oquadro de pessoal eseus salários; e cobraro cumprimentodas obrigações contidas na Lei 846/98. No modelopaulista, o peso maior do controle sobre a OS está depo-sitado no contrato de gestão.

Os mecanismos de governança e transparência ex-terna incluem critérios de escolha da entidade (exige-seexperiência de cinco anos em gestão de serviços de saú-de), Comissão de Avaliação da Execução dos Contratosde Gestão (formada por membros de renomado saber naárea da saúde pública, designados pelo secretário daSaúde), relatórios gerenciais com a composição e custosenviados à Secretaria Estadual de Saúde, Tribunal deContas do Estado de São Paulo (ao qual cabe fiscalizaros contratos de gestão) e publicação anual de seus ba-lanços no Diário Oficial do estado de São Paulo.

Recente avaliação19 mostra que os hospitais OS,

19 COSTA, Nilson do Rosário e RIBEIRO, José Mendes, “Estudo dos Mo-delos das Organizações em Hospitais Públicos”, realizado com financiamentoda Fundação para o DesenvolvimentoCientífico eTecnológico em Saúde (Fiotec)e do Banco Mundial, durante o ano de 2005.

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comparados com hospitais estatais, apresentam muitasevidências de eficiência e qualidade: menor taxa de mor-talidade, menor tempo de permanência em leitos e emcirurgia, maior taxa de ocupação de leitos e maior taxade rotação de leitos. As OSs também provaram ser me-lhor em eficiência técnica (mais altas ano/leitos) e me-nor gasto/leito e gasto/alta. Um ranqueamento pelo Ín-dice de Eficiência Organizacional demonstra que noveentre os dez hosp itais mais eficientes são OSs. O estu-do também demonstra que a variação percentual de 1ponto nos recursos alocados nas OS gera um incrementode 0,47 na quantidade de altas, e a variação percentualde 1 ponto nos recursos alocados nos hospitais tradicio-nais gera um incremento de 0,22 na quantidade de al-tas. Em síntese, a comparação entre hospitais OS e tra-dicionais revela que as OSs possuem um orçamento8,1% maior, mas saída 42,8% maior, ocupação 22,6%maior e custo médio 24,3% menor.

Na área da cultura, a implantação de OS em SãoPaulo é mais recente e motivada por problemas distin-tos, tais como: a) falta de organização e rotinas de traba-lho para a formulação, execução e controle de políticaspúblicas de cultura; b) acúmulo de funções operacionaisno núcleo estratégico; c) falta de controle sobre as ativi-dades realizadas nos equipamentos de cultura; d) termode ajustamento de conduta com o Ministério Público parasubstituição de quadros temporários; e) inadequação re-gulamentar da administração direta para produção deserviços de cultura; e f) dificuldades de contratação dequadros adequados (tendo em conta os perfis específi-cos, não típicos de estado e salários incompatíveis como mercado).

Esse quadro motivou a assinatura de nove contratosde gestão com OS (Associação de Amigos e Fundações)na área da cultura - além de promover a reestruturação

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da Secretaria Estadual. Diferentemente dos hospitais naárea da saúde, cada equipamento cultural possui objetodiferente, o que dificulta a construção de indicadores e afixação de metas de produção, organizacionais esociais. Há, com efeito, cinco OSs em fase adiantada deimplantação operacional (incluindo a Orquestra Sinfô-nica do Estado de São Paulo (Osesp)) e negociação dequatro contratos de gestão com novas OSs (MIS, Paço,MAS e MLP).

3.5. As parcerias público-privadas em São Paulo

O objetivo das parcerias público-privadas em SãoPaulo é apoiar a implementação de projetos públicos li-gados, em grande parte, à melhoria de infra-estrutura.Foram dados quatro passos nessa direção. Primeiramen-te, editou-se uma lei estadual de PPP em maio/2004. Emsegundo lugar, constituiu-se o Conselho Gestor, órgão decoordenação e fiscalização ligado ao Gabinete do go-vernador, integrado por secretários e presidido pelo vice-governador, ao qual cabe garantir que os projetos de PPPestejam em sintonia com as prioridades estabelecidas.Em terceiro lugar, formou-se a Unidade de PPP, vinculadaà Secretaria de Economia e Planejamento com a funçãode proporcionar suporte técnico ao Conselho Gestor eavaliar as propostas e projetos de PPP, analisando asmodelagens de PPP, avaliando os impactos orçamentá-rios e financeiros e divulgando as metodologias. O quar-to passo foi a criação da Companhia Paulista de Parceri-as, empresa estatal não-dependente do Tesouro que ope-rará o fundo garantidor das PPPs estaduais e atuará nacontratação de estudos, na prestação de garantias e nacontratação de empréstimos e emissão de títulos.

No presente momento, há oito principais projetos que

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montam R$ 7,5 bilhões: Metrô - Linha 4, Corredor Noroes-te de Campinas, Corredor deExportação, Sistema de Tra-vessias Litorâneas, Complexo Desportivo Vaz Guimarães,Estação de Tratamento de Água de Taiaçupeba, Expres-so Aeroporto e Trem de Guarulhos, Governo Eletrônico -Intragov e Datacenter.

Dentre as realizações, destacam-se a audiência pú-blica e edital para projeto Metrô - Linha 4 (out/2005) cominvestimento previsto de R$ 3,29 bilhões, com cerca deR$ 890 milhões do setor privado.

Os casos demonstram a emergência de novos pa-drões de estrutura e governança social baseada na for-mação de parcerias e redes - no caso das OSs em saúderepresentando, por exemplo, redes mais estáveis e regu-lamentadas, como o SUS, e no caso da cultura represen-tando redes mais instáveis e menos institucionalizadas.Há, pelo Brasil afora, muitas outras redes multiinstitu-cionais em rápida formação e que se consolidarão se-gundo padrões muito variáveis de forma, abrangência,participação de atores e regulamentação -a exemplo dosprocessos de transferência de renda e outros programasassistenciais com injunções federal, estadual, municipal,comunitária e de organismos internacionais. Merece tam-bém menção a recente possibilidade de formação de con-sórcios intergovernamentais (Lei nº 11.107, de 6 de abrilde 2005, que dispõe sobre normas gerais de contrataçãode consórcios públicos), que podem constituir adequadavestimenta institucional para várias modalidades de re-des intergovernamentais de caráter mais temporário.

Sobretudo, os casos evidenciam iniciativas de com-provado sucesso, tal como as OSs na área da saúde emSão Paulo - que não as credencia como modelo a ser uti-lizado apenas na área de saúde, mas revela sua superio-ridade gerencial diante da administração pública. Toda-

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via, nos demais estados ainda predominam apenas osmodelos (estima-se que 20 estados possuam modelos deOS ou congênere, comportando variações em torno domodelo federal) e tímida implementação - em boa partemotivadas por desconfianças dos dirigentes públicos emrelação à inovação, resistências de setores estatais (aose tratar de transferência de atividades de entes estataispara OS) e barreiras e incompreensões de Tribunais deContas e Ministério Público, tudo isso amparado na pa-ralisia da implementação federal das OSs e na Ação Di-reta de Inconstitucionalidade contra a lei de OS federal,que repousa no Supremo Tribunal Federal há quase umadécada. Por um lado, as experiências de sucesso podemajudar a dissipar as desconfianças. Por outro, comple-mentarmente, é preciso que modelos de parceria (sejamcom a iniciativa privada sob a forma de PPP, sejam comentidades não-governamentais sob a forma de OS, Oscipou congêneres) se tornem instrumentos de políticas pú-blicas com expectativas realistas de implementação (semserem consideradas utop ias gerenciais, fadadas aoinsucesso ou ao engessamento, ou panacéias), não ape-nas de políticas de gestão pública - a exemplo do quevem ocorrendo com as Oscips na gestão de recursoshídricos e em muitos campos específicos de política assis-tencial. Mas, no que concerne ao campo das políticas degestão, é fundamental que a concepção e utilização dosmodelos de parceria, embora possam ser genéricos, sejaprecedida de uma definição das áreas prioritárias ou ti-pos de atividades com maior potencial de ganho e agre-gação de valor público.

Por fim, tanto em relação aos modelos de parceriaquanto de regionalização, ressalta-se que o grande de-safio é colocá-los a serviço da estratégia e, nesse parti-cular, a questão mais crítica é a capacidade do contra-tante ou da administração central (tanto na cúpula quan-

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to, também, no núcleo operacional) de bem gerir relaçõescontratuais (com parceiros públicos ou privados), tendomuito claros os resultados a serem alcançados (o querequer um adequado posicionamento estratégico e cla-rezade políticas públicas)e com capacidade de monitorare avaliar os resultados obtidos.

Conclusões

O trabalho focou na perspectiva macrogovernamen-tal, mas o nível microgovernamental, apesar de muitoespecífico (o que apontaria para análises caso-a-caso),comporta algumas inferências gerais. Primeiramente, nosprocessos de revisão de estrutura das organizações pú-blicas em geral, há uma tendência para desenhos buro-crático-ortodoxos, personalísticos e desequilibrados. Atendência burocrático-ortodoxa se revela nas categoriza-ções padrão (embora nem sempre haja legislação orde-nadora) de nomenclaturas deunidades e posições geren-ciais, uma vez que a estrutura está inexoravelmente vin-culada a cargos comissionados padrão. Por essa razão,os redesenhos estruturais tornam-se excessivamenteformalistas (tanto no sentido de que as estruturas formaisacabam se descolando das estruturas “reais” quanto nosentido da primazia da forma sobre o conteúdo), resul-tando mais na montagem da estrutura com as “peças”(os cargos comissionados existentes) disponíveis segun-do os padrões de nomenclatura burocrática vigentes quenum exercício de alinhamento com as estratégias organi-zacionais segundo critérios técnicos de ajustamento. Nãoraro, os designers organizacionais se baseiam em ana-logias exógenas (reproduzindo padrões de organizaçãode determinadas funções estatais ou organizações deoutros contextos) sem atentar para a funcionalidade des-sas concepções vis-à-vis o contexto local e seus requisi-

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tos peculiares. A ausência de uma metodologia de mode-lagem que busque resgatar a função da estrutura emimplementar a estratégia também possibilita a constru-ção de soluções personalísticas nas quais as posiçõessão definidas, sobretudo para acomodar pessoas. Naausência de método e de um crivo técnico, essas tendên-cias do design microorganizacional acabam promoven-do severas deformações na estrutura, a exemplo do quese verifica no Poder Executivo Federal: enxugamento ex-cessivo da base operacional e inchaço da linha interme-diária (alta gerência) e das unidades de apoio à cúpula.Uma alternativa para melhoria da racionalidade dos de-senhos organizacionais que merece menção é o Guia deModelagem de Estruturas Organizacionais elaboradopelo governo do estado de São Paulo, que deverá servirde orientação metodológica apoiando o processo de re-visão de estruturas.

Tanto na perspectiva macro quanto microgoverna-mental, os problemas de estrutura, além de envolveremquestões políticas e culturais, estão muito intrincados comquestões legais de razoável complexidade, tais como omodelo de dirigentes públicos (entre os quais se incluemos cargos comissionados) e os modelos de instituiçõespúblicas. Em relação ao primeiro, ressalta-se que umaboa concepção estrutural sem a devida integração daspessoas que a animam se prova inútil - e esta questão éparticularmente relevante no que respeita à relação en-tre estilos de liderança executiva e a funcionalidade dodesenho da cúpula. Portanto, a funcionalidade das estru-turas está visceralmente vinculada à capacidade de osmodelos de direção públicaproporcionarem o adequadoprovimento de quadros dirigentes. Poroutro lado, afuncio-nalidade dos desenhos também depende do alargamen-to de algumas limitações decorrentes dos modelos institu-cionais, resgatando-se-lhes a diferenciação e permitindo

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o advento de modelos híbridos (tais como entes intergo-vernamentais e modelos de parcerias entre estado, mer-cado e sociedade civil). Nesse sentido, é necessário quesurja um novo direito administrativo tendo em conta aimensa brecha que se firmou, nesse campo, entre o direi-to (as regras vigentes e a doutrina) e o fato social (muitomais dinâmico em se tratando de gestão no cenário dagovernança social contemporânea). Nesse quadro deintrincados problemas em múltiplas dimensões é naturalque as soluções também tenham de ser múltiplas - o quedesagrada e desconforta os que crêem que apenas umaLei Orgânica da Administração Pública bastará.

Por fim, é necessário que se invista na criação demetodologias e na realização de estudos de avaliaçãoda estrutura e de modelos de parceria, de modo que umquadro mais nítido dos problemas (e suas causas) possaser identificado e tratado.

De ambos os pontos de vista micro e macroorga-nizacional, o propósito deste texto foi contribuir para adesconstrução de alguns mitos muito nocivos à boa mo-delagem organizacional. O primeiro é de que estrutura é“bom senso” à base de analogias (conservadoras) e mé-todos de “corte e colagem” personalistas. O segundo éde que estrutura obedece sobretudo a determinantes po-líticos, seja pela aceitação passiva de composições decoalizões políticas, seja pelas preferências pessoais dosdirigentes nomeados. O terceiro é de que estrutura é ape-nas um custo (fixo), o que justificaria imperativos de cor-tes para ajuste de contas, sem importar com a capacida-de de gerar resultado. Este trabalho buscou, sobretudo,lançar um alento no sentido de sugerir que há soluçõesotimizadoras, que podem levar em conta determinantespolíticos e fiscais de uma forma mais racional e, aindaassim, permitir que as estruturas, mesmo com limitações,possam cumprir sua função de gerar resultados.

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PRESIDÊNCIA

Presidente: Geraldo de Vitto Junior - Mato Grosso1º Vice-Presidente: ValterOliveira Silva - Alagoas

2º Vice-Presidente: Ricardo de Oliveira - Espírito Santo

JUNTA FISCAL

Flora Valladares Coelho- AcreRedomarck Nunes Castelo Branco - Amazonas

Eugênio Pacceli de Freitas Coelho - Tocantins

SECRETÁRIOS DE ADMINISTRAÇÃO

Acre– Flora Valladares CoelhoMembro da Junta Fiscal

Alagoas – ValterOliveira Silva

1º Vice-Presidente do CONSADAmapá – Haroldo Vitor de Azevedo Santos

Secretário de Estado de Administração

Amazonas – Redomarck Nunes Castelo BrancoMembro da Junta Fiscal

Bahia – Ana Lucia Barbosa Castelo Branco

Secretária de Administração do Estado da BahiaCeará – Marcus Augusto Vasconcelos Coelho

Secretário de Administração do Estado do Ceará

Distrito Federal – Maria Cecília LandimSecretária de Estado de Gestão Administrativa

Espírito Santo – Ricardo de Oliveira

2º Vice-Presidente do CONSADGoiás – Manoel Xavier Ferreira Filho

Presidente da Agência Goiana de Administração e NegóciosPúblicos

Conselho Nacional de Secretários de Estado de Administração

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Maranhão – Simão Cirineu Dias

Secretário de Estado de Planejamento, Orçamento e GestãoMato Grosso – Geraldo Aparecido de Vitto Junior

Presidente do ConsadMato Grosso do Sul – Ronaldo de Souza Franco

Secretário de Estado de Gestão PúblicaMinas Gerais – Renata Maria Paesde Vilhena

Secretária de Estado de Planejamento e GestãoPará – Alice Viana SoaresSecretária-Executiva de Estado de Administração

Paraíba – José Aguinaldo Ramos de BritoSecretário de Estado de Administração

Paraná – Maria Marta Renner Weber LunardonSecretária de Estado de Administração e da Previdência

Pernambuco – MaurícioEliseu Costa RomãoSecretário de Administração e Reforma do Estado

Piauí – Lucile de Sousa MouraSecretária de Estado de Administração

Rio de Janeiro – Sheila Luci Abel de MelloSecretária de Administração e Reestruturação do EstadoRio Grande do Norte – Paulo Cézar Medeiros de Oliveira Jr.

Secretário de Administração e Recursos HumanosRio Grande do Sul – Pedro Gabril Kenne da Silva

Secretário de Administração e dos Recursos HumanosRoraima – Luciano Fernandes Moreira

Secretário de Estado de AdministraçãoRondônia – Valdir Alves da Silva

Secretário de Estado de AdministraçãoSanta Catarina – Constâncio AlbertoSalles MacielSecretário de Estado de Administração

São Paulo – Evelyn LevySubsecretária de Gestão e RH do Governo do estado de São Paulo

Sergipe– MarileneSouza AlvesSecretária de Estado de Administração

Tocantins – Eugênio Pacceli de Freitas CoelhoMembro da Junta Fiscal

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