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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
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FOMENTO DE LEITORES NA EJA- FASE II
BORGES, Luiz1 GONÇALVES, Lidia Maria2
RESUMO O presente artigo busca demonstrar o resultado do projeto de intervenção pedagógica realizado no primeiro semestre de 2014, no Colégio Estadual Padre Ângelo Casagrande, na cidade de Marilândia do Sul-Paraná. A implementação ocorreu por meio da unidade temática, tendo como alvo os alunos da Educação de Jovens e Adultos Fase II, na modalidade de Ensino Fundamental. O projeto nasceu devido ao distanciamento que estes alunos têm da leitura em relação aos demais que estão frequentando regularmente o ensino comum. Diante deste contexto, surgiu a necessidade de propor momentos de leitura prazerosa. Tal prática é permeada pela reflexão sobre a atual situação destes alunos que, em sua grande maioria, não demonstravam nenhuma intimidade com a leitura. Desta forma, a implementação foi se desenvolvendo de acordo com a perspectiva de interesse destes discentes. Eles estão estudando por cronograma, fazendo apenas as disciplinas que lhes interessam, dificultando assim um trabalho mais homogêneo, onde todos pudessem estar nas aulas todos os dias. Paralelamente à aplicação da unidade temática, este projeto foi aberto aos outros professores da rede estadual de educação por intermédio do GTR (Grupo de Trabalho em Rede) para que pudesse contribuir nas práticas de outras escolas, assim como receber contribuições para seu melhoramento. Foi um momento muito rico de troca de experiências com outros docentes, e pude observar que todos os participantes do meu curso já desenvolvem um ou outro projeto de leitura em sala, mas não tive nenhum relato desse trabalho com alunos da Educação de Jovens e Adultos, isto vem reforçar a minha tese de que eles estão realmente mais excluídos de vivências de leitura.
PALAVRA-CHAVE: Leitura; EJA; literatura; mídia impressa; criticidade autonomia.
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1Graduado em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Jandaia do Sul (FAFIJAN).
Pós- Graduado na mesma Instituição em Educação Especial – Deficiência Mental. Atualmente é professor de Língua Portuguesa, no Colégio Estadual Padre Ângelo Casagrande, em Marilândia do Sul-Paraná. Contato: [email protected] 2Docente do Departamento de Letras Vernáculas e Clássicas da Universidade Estadual de Londrina,
com pós- doutorado na área de Linguística Aplicada. Contato: [email protected]
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1 INTRODUÇÃO A elaboração deste artigo resulta da realização do trabalho de intervenção
pedagógica na área de leitura com alunos de Educação de Jovens e Adultos EJA
Fase II, na modalidade do Ensino Fundamental, desenvolvido no Colégio Estadual
Padre Ângelo Casagrande, em Marilândia do Sul-PR, instituição pertencente ao
Núcleo Regional de Ensino de Apucarana, sendo o presente texto acadêmico
requisito do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), turma 2013/2014.
Desde o início, pensei em desenvolver um trabalho que, de fato, viesse ao encontro
da necessidade de oferecer uma alternativa aos alunos desta modalidade de
educação que, mesmo frequentando a sala de aula, estão afastados do mundo da
leitura. Ao refletir sobre esta realidade em que se encontra a grande maioria deste
alunado coloco-me como um mediador interessado. E como lembra Silva (2002),
estes alunos estão inseridos num sistema educacional que, em tese, precisa pautar
as suas ações na liberdade do homem para estruturar o seu projeto de existência,
para viver os diferentes horizontes da cultura.
(...) a educação é a transformação do homem e do mundo. Para que essa transformação se estabeleça, é necessário que o homem se movimente de um lugar significado para outro, isto é, pratique em sua vida o exercício dialético da libertação. No ato de libertar-se, isto é, de tomar consciência da sua necessidade é que o ato de ler passa a ganhar a sua significação maior e primeira (SILVA, 2002, p.77).
As estratégias utilizadas tiveram como o objetivo despertar nos alunos o
gosto pela leitura, independente do gênero proposto, não deixando de levar em
consideração que estávamos lidando com pessoas que estão fora da faixa etária
padrão de idade escolar, quase sempre oriundos da zona rural e/ou trabalhadores
da construção civil. Estes, por sua vez, sempre voltam para a escola amparados por
lei e visam apenas concluírem o ensino fundamental ou médio, conforme prescrição
da LDB - Lei nº 9394/96, no seu art. 37.
Aqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio, na idade própria, deverão ter oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características próprias, interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. Nesse mesmo artigo, propõe que a Educação de Jovens e Adultos deverá articular- se, preferencialmente, com a educação profissional (PROEJA, 2010, p.5).
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É dentro deste contexto que procuramos intermediar as ações de leituras em
sala de aula, lembrando sempre da heterogeneidade e a herança histórico-social de
nossos alunos, para valorizarmos o que já sabem e ampliarmos o universo cultural
deles. Há entre eles os que já trazem de casa um histórico de leitor, como
exemplifica Zulim (2011, p.19). A autora diz que mesmo sendo filha de agricultores
com pouca escolaridade, tinha em seu pai um apaixonado por leitura, pois a cada
compra de mercadorias que fazia na cidade sempre arrumava um jeito de comprar
um livro. No entanto, este comportamento é a exceção, principalmente, em se
tratando do alunado de escolas públicas, onde os pais são trabalhadores rurais, da
construção civil ou da informalidade e que, geralmente, não tiveram cultivado este
hábito citado por Zulim.
Diante de tais constatações este artigo procurará demonstrar os resultados
da realidade vivida por estes alunos durante a implementação do projeto de leitura
“Fomento de leitores na EJA Fase II”; nele registramos o que foi possível
desenvolver em termos de leitura em âmbito escolar e os resultados obtidos diante
das expectativas iniciais e após as práticas desenvolvidas.
O presente trabalho teve por objetivo desenvolver estratégias de leitura para
motivar os alunos a superarem as dificuldades e o desinteresse por ler. Formamos
parcerias com professores, alunos e comunidade escolar para adquirirmos materiais
de leituras (como jornais, livros, revistas e áudio visual) e extraímos maior e melhor
proveito dos mesmos, otimizando seu uso. A partir daí, instigamos o compromisso
dos participantes com a mudança de seu pouco hábito de leitura e desenvolvemos
habilidades para que os alunos passassem a ler e a interpretar o que estavam lendo.
A prática de leitura dos participantes foi sendo encaminhada de maneira
suave e prazerosa, deste modo pudemos gradativamente promover a
transformação de perfis, formando leitores que assumem essa prática além dos
muros da escola. Este processo de formação de leitores desenvolveu-se sem que
haja nenhum prejuízo do essencial no currículo escolar. Afinal, a organização desta
ação envolve múltiplas finalidades, ou seja, orientamos nossos alunos a ler para
estudar, para se atualizar e por prazer, ao passo que os levamos a se envolverem,
de forma pessoal, gradativa e prazerosa com os mais variados gêneros discursivos.
O ler por prazer também é atividade essencial para o projeto de formação de
leitores.
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A leitura é uma questão pessoal, que só pode estar sujeita a si mesma. Neste caso, o leitor poderá reler um parágrafo ou mesmo um livro inteiro tantas vezes quanto for necessário; poderá saltear capítulos e voltar a eles mais tarde; o que importa, quando se trata deste objetivo, é a experiência emocional desencadeada pela leitura. É fundamental que o leitor possa ir elaborando critérios próprios para selecionar os textos que lê, assim como para avaliá-los e criticá-los (SOLÉ, 1998, p.96).
2 METODOLOGIA
Para o bom andamento deste processo de intervenção pedagógica a ser
desenvolvido em uma turma do ensino fundamental na modalidade de Educação de
Jovens e Adultos, Fase II, é necessário que, desde o primeiro momento, crie-se em
sala uma relação recíproca de amizade, confiança e abertura para que o alunado
sinta-se à vontade para também assumir a postura de criticidade diante dos textos.
(...) o desenvolvimento e o aprimoramento das competências em leitura crítica estão condicionadas ao tipo de atmosfera que prevalece nos contextos escolares. Caso o professor não construa em sala de aula uma atmosfera de confiança, que alimente a discussão e o debate, muito dificilmente aquelas competências serão praticadas pelo coletivo dos estudantes (SILVA, 1998, p.29).
Esse ambiente deve necessariamente ser cultivado por meio do diálogo
entre professor e alunos, lembrando de que este relacionamento é perfeitamente
possível, uma vez que na EJA não trabalhamos com turmas numerosas e em um
recinto infantilizado. A partir da instalação deste clima favorável, reservamos um
momento de duas hora/aula semanas em sala de aula para a leitura e, na medida do
possível, eles foram lendo em casa.
Disponibilizamos os livros, revistas, jornais e outros tipos de materiais de
leituras, expostos em um determinado local da sala de aula, para que os alunos se
sentissem motivados pelo contato visual com todos estes materiais e fossem
manuseá-los. Preparamos um ambiente propício para este tipo de atividade e a sala
utilizada para as leituras eram as mesmas disponibilizadas para outros estudos,
porém procuramos modificar as disposições das carteiras para quebrar a rigorismo
das filas. Esta sala era ampla e bem arejada, mas não pudemos ter almofadas pelo
chão, todavia sempre quando íamos ler eu procurava colocar um som ambiente.
Tudo isso foi útil para desmistificar a rigidez das aulas de leitura e levar o alunado a
sentir-se incentivado para desenvolver esta atividade confortavelmente. O primeiro
contato deles com estes objetos de leitura foi para observarem a coletânea, folharem
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aquilo que os interessasse, sem a preocupação de se aterem em um texto
específico. Sentiram-se livres para “explorarem” estes materiais, por isso, não houve
qualquer tipo de interferência deste professor. Importava vivenciarem que:
Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que precede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro (BAKHTIN, 1992, p.113).
Afinal, ambicionava levá-los a se envolverem, de forma pessoal, gradativa e
prazerosa com os mais variados gêneros discursivos, a ler por prazer, porque o mais
importante para a formação de um perfil leitor é estar em contato com este mundo
da leitura viva, realizada em ambientes mais letrados. Assim, contribui para que
meus alunos sejam cidadãos críticos e autônomos, que consigam perceber no texto
as informações explícitas e implícitas, aquilo que Silva (1998, p.34) classifica como,
ler as linhas, o ler nas entrelinhas e o ler para além das entrelinhas. Segundo este
mesmo autor, ir além significa adentrar um texto com o objetivo de refletir sobre os
aspectos da situação social que esse texto remete e chegar ao cerne do projeto de
escrita do autor. As leituras foram apresentadas como caminhos para transformar as
informações lidas em conhecimentos, tornando-os mais reflexivos, desenvolvendo
raciocínios analíticos e críticos, o que corrobora para serem capazes de gerenciar
suas próprias vidas e tomadas de decisão. Para tanto, desenvolver o perfil de leitor
foi essencial e isso se deu lendo muito e não apenas decodificando.
Num segundo momento, oportunizei aos alunos alguns exemplares literários
abaixo discriminados e constantes na biblioteca da escola de implantação do
projeto. Nesta ocasião é importante ressaltar que não se tratou de uma leitura
anárquica, onde cada um leu o que conviesse sem direcionamento, pois esta foi a
primeira fase do projeto, mas agora houve um momento em que aos leitores foi
possibilitada a escolha de algumas obras que, em sua maioria, fazem parte do
universo infanto-juvenil, mas que se adequavam a nossa realidade escolar, pois
este grupo de alunos não teve a oportunidade de lê-las nos anos vistos como mais
“apropriados”, obras essas como: Marca de uma lágrima (Pedro Bandeira), Em
busca de mim (Isabel Vieira), Pássaro contra a vidraça (Giselda Laporta Nicolelis),
Irmão Negro (Walcir Carrasco), O mistério da fábrica de livros (Pedro Bandeira),
Canção para Débora (Luci Guimaraes Watanabe), Sozinha no mundo (Marcos Rey),
O vampiro que descobriu o Brasil (Ivan Jaf), entre outras.
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O papel deste docente foi o de ir partilhando com o grupo de alunos a leitura
de cada obra, ora este professor expunha as impressões emanadas do texto ora
cada aluno toma a palavra e, ao final, sempre promovíamos uma discussão coletiva
em torno da análise dos sentidos imanentes do texto, buscávamos extrair de forma
oral e/ou escrita algumas marcas, como o tema, o enredo, o comportamento das
personagens, assim como as pistas que evidenciam o gênero, a análise do
comportamento das personagens, a escolha do vocabulário e dados sobre o
contexto social, observando também aquilo que está implícito nas entrelinhas. Enfim,
instigamos o grupo a adotar um olhar mais crítico, reflexivo e menos passivo diante
da obra e, consequentemente, da vida.
A execução desta unidade temática em sala teve duração de um trimestre;
contou com aproximadamente, trinta e duas horas de execução e, estas foram
distribuídas em conformidade com o horário disponível do laboratório de informática
do colégio em questão. Por meio da inclusão digital, promovi o contato com jornais
online disponíveis para o acesso. Não resta dúvida de que a internet é ainda um
grande desafio para as escolas, principalmente as públicas que nem sempre estão
adequadas às demandas e necessidades de nossos alunos. Por isso, o papel de
toda a instituição de ensino é o de oferecer condições favoráveis para que todos os
discentes possam ter acesso a um computador, principalmente aqueles mais
carentes que estão fora deste universo.
Numa democracia com justiça social, espera-se que todos os indivíduos sejam devidamente preparados para a compreensão e o manejo de todas as linguagens que servem para dinamizar ou fazer circular a cultura. O problema é que, num país tão desigual como o Brasil, aqueles oceanos informacionais da internet vão sofrendo restrições cada vez maiores em termos de presença e de utilização na vida concreta das pessoas (SILVA, 2003, p.14).
Nesta prática interatividade virtual, ativemo-nos aos gêneros notícia e
editorial, por eles serem gêneros característicos da esfera jornalística.
Oportunizamos a leitura de textos virtuais oriundos de distintos veículos de
comunicação. Os alunos perceberam e expuseram, ora na modalidade oral e ora de
forma escrita, a intencionalidade presente por trás da informação, e compreenderam
as marcas ideológicas intrínsecas do texto ao passo que iam sendo provocados a se
posicionarem de forma clara e consciente diante daquilo que estavam lendo.
Embora a prática de leitura em sala de aula costuma ser caracterizada como
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metódica, consideramos que o encaminhamento metodológico previsto para esta
unidade temática alcançou o objetivo de fomentar este momento de interação entre
professor e aluno, fazendo a leitura ser vivenciada como um ato dialógico, o que
possibilitou ao aluno transpor a barreira de ledor para desenvolver um perfil leitor
(GONÇALVES, 2004). Para tanto, usamos todos os meios e recursos disponíveis,
tanto os impressos como também os que são de domínio virtual.
3 RELATOS DAS EXPERIÊNCIAS DE LEITURA LITERÁRIA EM SALA DE AULA
O primeiro contato com o projeto ocorreu na primeira semana de
implementação pedagógica da proposta. Deu-se com os alunos das disciplinas de
Língua Portuguesa e Arte, pois estas eram as únicas que estavam começando a ano
letivo. Neste momento, procurei ouvi-los sobre suas experiências de vida, claro que
apenas alguns se sentiram a vontade para partilhar conosco suas vidas e partilhar
questões ligadas ao trabalho e suas famílias. Destacaram as dificuldades para
trabalhar, estudar e cuidar da família, pois ali, havia alguns discentes casados.
O primeiro contato com os alunos foi destinado à apresentação pessoal.
Voltei, em um outro momento, para a apresentação do material. Neste dia arrumei
um saco, como o de Papai Noel; nele, coloquei vários exemplares literários, criei
uma expectativa, uma surpresa. Passei a expor o meu projeto, colocando o porquê
de ter escolhido implantar na EJA Fase II, no ensino fundamental. A partir deste
momento procurei extrair dos alunos os relatos de suas experiências como leitores,
se tinham o hábito de ler e quando liam era com que frequência que o faziam. O que
pude colher através dos seus depoimentos confirmava as minhas expectativas de
que estes praticamente tinham pouco ou quase nenhum contato com o mundo da
leitura. Os relatos eram, geralmente, sobre a falta de tempo devido ao trabalho,
quando referido pelos homens, e as correrias e afazeres domésticos, no caso das
meninas ou senhoras casadas. Na sala havia alunos de variadas faixas etárias,
inclusive uma senhora de setenta e dois anos de idade. Ouvi respostas curtas de
alguns alunos, diziam que não gostavam de ler e achavam desnecessária esta
prática.
Sei que muitas são as dificuldades que nós professores da escola pública
enfrentamos no nosso dia a dia, mas não podemos deixar que esses problemas nos
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impeçam de desenvolver um bom trabalho. Cabe a nós, cumprirmos o nosso papel,
proporcionando aos nossos alunos uma nova visão de mundo e um caminho
possível para a realização desta jornada intelectual é através da viagem mágica das
palavras. Somos sabedores de que as práticas de leitura não podem ser encaradas
como um fardo e sim um momento de lazer, distração e aprendizado. Por isso, o
cuidado em ficar atento à realidade destes discentes para ir lançando esta ideia num
ambiente tranquilo e sem nenhuma espécie de crítica ou puritanismo pelo fato de
estar diante pessoas desprovidas de qualquer envolvimento com os livros e outros
bens culturais, como revistas e jornais.
Ressalto que a realidade de funcionamento das turmas da EJA Fase II
diferiu daquilo que no projeto foi idealizado, primeiro que era apenas uma turma de
quinze alunos para dois cronogramas de Língua Portuguesa e Arte. A princípio
achava que eu mesmo poderia estar ministrando aulas nesta turma, mas isso não foi
possível, pois as aulas destas duas turmas do ensino fundamental foram distribuídas
a outro professor que tinha seu padrão de aula fixo no estabelecimento e que,
portanto tinha o direito de escolher as aulas antes de mim. Diante desta nova
realidade, procurei juntamente com o professor regente de sala propor a eles
momentos em que pudéssemos nos dedicar às leituras das obras que previamente
tinham sido selecionadas e outras que por ventura pudessem também ser incluídas.
Aproveitei para também lançar a ideias de leituras midiáticas, disse que faríamos
isto em um segundo momento, dependendo do aparato técnico do laboratório de
informática do Colégio onde estávamos implantando o referido projeto.
Como havia planejado, no primeiro contato com os alunos, não expus a eles
nenhuma obra, ficamos apenas dialogando, foi o momento de “reconhecimento de
território”, era para saber com quem iríamos trabalhar e, assim, fazermos as
adaptações necessárias. Procurei deixá-los bem à vontade, sem nenhum
constrangimento em expor o que pensavam de estarem de volta à escola. Lembro-
me do relato de uma senhora de setenta e dois anos de idade, ela disse que ficou
viúva pela segunda vez, e que diante da triste realidade de perder o esposo, e como
morava sozinha, tinha que encontrar uma maneira de preencher os espaços vazios
em sua vida, pois a solidão poderia levá-la à depressão. Desta forma, resolveu voltar
a estudar, pois era um modo de se sentir útil e esta nos dizia que seu grande sonho
era o de escrever um livro de sua vida.
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Como o cronograma de aplicação do projeto previa onze encontros, num
total de trinta e duas horas, ficamos acertados com os professores e alunos que eu
retornaria nos dias seguintes e que iríamos intercalando nossos momentos de leitura
juntamente com as aulas de Língua Portuguesa e Arte.
A implementação foi estendida para outra turma do Ensino Médio que estava
cursando a disciplina de História. De acordo com o cronograma de oferta do colégio
para as disciplinas da EJA, havia apenas uma turma do Ensino Médio, todavia a
disciplina que estavam cursando era História e não tinham previsão para iniciar
Língua Portuguesa, por isso que estendi a eles também o projeto de leitura. A minha
decisão de agraciá-los foi porque constatei que o nível de leitura desta turma estava
muito aquém dos outros alunos que também estão frequentando o Ensino Médio, ou
seja, as suas condições eram quase as mesmas dos demais alunos do Ensino
Fundamental, pois sempre estudaram na modalidade da EJA, não tinham nenhuma
proficiência em leitura, e seu contato com o universo literário praticamente estava
reduzido a nada. Este levantamento me levou a ofertar a esta turma aquilo que a
princípio era planejado apenas aos que estavam frequentando o nível fundamental.
Aqui ressalto que a participação da professora regente da disciplina de História foi
fundamental para que acontecesse toda a ação também com estes discentes. Eu
propus que, na medida do possível, eles lessem a obra “O vampiro que descobriu o
Brasil”, de Ivan Jaf, pois dava para fazer um paralelo com sua disciplina, uma vez
que retratava a História do Brasil desde o seu descobrimento até o governo do
Fernando Henrique Cardoso. Nesta turma, tive a grata surpresa de conseguir que
alguns lessem esta obra e quisessem partilhá-la com os demais alunos da sala. Foi
nesta turma que deparei com a senhora de setenta e dois anos, que pretende
escrever um livro contanto a história de sua vida. Ela e a professora foram as
grandes incentivadoras do projeto na sala.
No próximo encontro, novamente com o saco de Papai Noel cheio de livros e
revistas procurei fazer um momento de descontração com os alunos e o professor
da turma do fundamental. Comecei então a apresentar os exemplares das obras
literárias e as revistas, deixando claro que eles podiam foliar o material sem a
preocupação de ter que lê-lo já de imediato. Percebi que os meninos se
interessaram pelas revistas, principalmente as Placar, que traziam reportagens
sobre futebol, diante deste interesse disse que poderiam ler a revista em sala e até
levá-las para casa e que depois poderíamos compartilhar as reportagens que mais
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gostaram. Teve uns três alunos que as levaram, mas outros não, apenas realizaram
uma leitura superficial na sala. Quanto às obras, estes começaram a olhar não
mostrando muita vontade em ler, diziam que não tinham paciência, mas que iriam
tentar. Começamos então a leitura silenciosa de determinados livros com alguns
alunos, enquanto outros estavam lendo as revistas que se encontravam sobre a
mesa. Os exemplares distribuídos entre eles foram: Marca de uma lágrima (Pedro
Bandeira), Em busca de mim (Isabel Vieira), Pássaro contra a vidraça (Giselda
Laporta Nicolelis), Irmão Negro (Walcir Carrasco), O mistério da fábrica de livros
(Pedro Bandeira), Canção para Débora (Luci Guimaraes Watanabe), Sozinha no
mundo (Marcos Rey) e O vampiro que descobriu o Brasil (Ivan Jaf).Ao final deste
encontro, deixei-os livre para continuar a leitura em casa, pois estes não têm aulas
regularmente durante a semana e, para a minha surpresa, teve alguns alunos que
aceitaram a proposta feita por mim. Quanto aos que estavam com as revistas, não
quiseram levá-las, alegando que não tinham tempo para ler.
No decorrer dos próximos encontros, fomos fazendo a leitura em sala e, na
medida em que a leitura ia se desenvolvendo, fomos extraindo informações do texto,
quanto às personagens, enredo, ou seja, para que conseguissem perceber no texto
informações explícitas e implícitas, aquilo que Silva (1998, p.34) classifica como ler
as linhas, o ler nas entrelinhas e o ler para além das entrelinhas. Avalio que atingi a
grande maioria do alunado, pude constatar que o hábito de leitura é criado a partir
de estímulos e a forma como se trabalha colabora muito para se criar uma geração
habituada a ler. Porém, a pouca experiência com a leitura, afasta o sujeito deste
mundo letrado, deixando-o à margem da sociedade culta jovens e adultos que
deveriam desde cedo ter sido estimulado a ler, pois têm o direito de ser
apresentados à leitura prazerosa, àquela que liberta. Entretanto, através de um
trabalho que considerou o conhecimento prévio do aluno, deixando que a
compreensão textual fosse guiada e construída por ele próprio, relacionamos os
textos lidos com os problemas sociais vivenciados por eles no seu cotidiano e os
resultados obtidos foram muito mais satisfatórios. Sendo assim, esta produção
didática pedagógica tornou-se um instrumento valioso para guiá-los nesse caminho
que é contínuo, mas que estamos percorrendo.
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4 RELATO DAS EXPERIÊNCIAS DE LEITURA MIDIÁTICA EM SALA DE AULA
Paralelamente ao desenvolvimento das leituras das obras literárias em sala
de aula, fomos algumas vezes no laboratório de informática do colégio da
implementação desse projeto para entrar em contato com os textos midiáticos. Com
esta proposta, pude colocá-los em contatos com textos que estavam circulando nos
meios de comunicação naquele momento, além de ajudá-los a perceber algumas
marcas que são próprias dos gêneros textuais da esfera jornalística. Se até então
estávamos centrados nas leituras ficcionais, passamos a ver também outro tipo de
leitura. Aqui confesso que alcançar o resultado foi mais difícil do que o esperado,
pois a primeira barreira que encontrei foi a dificuldade demonstrada por eles para
acessar a internet, percebi que tinham muita dificuldade em navegar pela rede de
computador. Nos dias atuais, de um modo geral, as pessoas são muito ligadas à
internet, principalmente a acessível no celular, e os alunos da EJA não são
diferentes, mas em particular esses têm maior dificuldade em manusear as
ferramentas eletrônicas justamente por falta de habilidade, uma vez que são
pessoas com mais idade, trabalham o dia todo e não tem tempo para ficar
navegando. A outra dificuldade foi que os alunos não mostraram interesse em ler as
reportagens e editoriais propostos nos sites de notícias.
Entretanto, durante a realização da implantação do projeto, notei que houve
um ligeiro crescimento do interesse dos discentes em relação às leituras midiáticas,
pois fui também me adaptando à realidade deles, percebi que gostavam de ver
manchetes jornalísticas e curiosidades, por isso sempre usava o site da UOL.COM.
BR para que eles tomassem conhecimentos das matérias que estavam em pauta
naquele dia. Desta forma, fui os deixando livres para ler o que lhes interessava,
apenas fazia algumas interferências individuais quanto à intencionalidade das
notícias, isso de forma bem simples, com atendimento individualizado. Procurei
deixar claro para os alunos as diferenças de gêneros entre os livros que alguns
estavam lendo e as leituras midiáticas. O ideal seria um trabalho mais aprofundado
nesta questão do plano textual e também no que se refere às marcas implícitas
deixadas pelo autor do texto. Para um leitor maduro esta prática é mais fácil de ser
acionada, mas não para os meus alunos da EJA, pois precisariam de uma maior
leitura de mundo, saber se situar criticamente dentro da realidade que estamos
inseridos no campo social, econômico e político. Isso é muito difícil, não só para
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eles, como também para a grande maioria de nossa população. Justamente por isso
o trabalho voltado para a leitura crítica da mídia é tão valioso.
Segundo Prata (2002), é preciso considerar que, hoje, ter acesso ou não à
informação pode gerar um elemento de discriminação na sociedade tecnológica que
se organiza e que interfere em nosso cotidiano, portanto o analfabetismo digital é
problema relevante. Entretanto, essa questão pode ser superada pelo
desenvolvimento de habilidades, de competências, de obtenção e utilização de
informações por meio da tecnologia, da sensibilização de professores e alunos para
obtenção das novas tecnologias midiáticas em seu dia a dia.
Ressalto que, quando idealizei esta implementação, eu pensava em poder
contar com a assiduidade dos alunos em sala de aula, mas a realidade foi bem
diferente, uma vez que havia uma grande rotatividade deles no curso. Durante a
realização do projeto nem sempre contava com todos em sala, principalmente
porque estes faziam mais de uma matéria por semana. Por exemplo, às vezes
vinham na segunda-feira, porém na quarta não tinham aula de uma determinada
disciplina que estavam fazendo e, desta forma, não compareciam à escola. Também
não pude realizar a execução do projeto apenas em uma turma como a princípio foi
idealizado por mim, tive que trabalhar com alguns alunos do Ensino Médio que
estavam cursando as aulas de História, entre outros motivos, como já exposto,
porque eram poucos os que frequentavam o Ensino Fundamental. Mas apesar
destes contratempos, acredito que uma pequena semente foi plantada e esses
alunos que na maioria saem e voltam para escola de forma tão inesperada, puderam
ter contatos com uma modalidade de texto que até então nunca tinham visto, e isto
já fez valer a pena todo nosso esforço de poder levar até eles um canal novo de
leitura, valorizando as tecnologias que nos são disponíveis.
5 IMPRESSÃO DE ALGUNS ALUNOS E PROFESSORES ACERCA DO PROJETO
A seguir, transcrevo a avaliação feita por um dos alunos envolvidos neste
projeto de fomento de leitores.
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Na sequência, compartilho o depoimento de outra estudante.
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Apresento também o diagnóstico de uma educadora que nos acompanhou
durante o desenvolvimento do trabalho.
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Transcrevo o parecer de outra educadora, testemunha e parceira na
implementação do projeto.
6 RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PROJETO ESTENDIDO AOS ALUNOS DO ENSINO REGULAR
Gostaria de aproveitar a oportunidade para compartilhar aqui a experiência
que vivi com os alunos do 8º ano do ensino comum do Colégio Estadual Padre
Ângelo Casagrande, em Marilândia do Sul, onde leciono a disciplina de Língua
Portuguesa. Lá, tive a oportunidade de estender a execução desta atividade que a
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princípio estava proposta apenas aos alunos da EJA (Educação de Jovens e
Adultos). Penso que a experiência foi muito mais gratificante para mim como
professor do que para os próprios alunos, pois compreendi que a leitura deve
envolver um processo de muita cumplicidade entre as partes envolvidas. Quando
iniciei o ano letivo, fui informado que aquela seria uma das piores turmas, pois seu
grau de aprendizagem era baixíssimo devido a diversos fatores, e um deles era a
indisciplina. Confesso que pensei apenas em passar os conteúdos, se conseguisse
tudo bem, caso contrário, eram fracos mesmos, com certeza já era esperado que
muitos iriam reprovar. Porém, como estava implantando o projeto na EJA, comecei a
fazer um trabalho para “salvar aquela turma”, assumi-os como minha
responsabilidade, passei primeiro a tomar medidas mais enérgicas quanto à
disciplina, fiz reunião com os pais e, com o apoio da direção da escola, expus o que
pretendia com aquela turma. Desta forma, fui criando um laço de reciprocidade com
eles, fomentando um ambiente mais letrado, onde pudessem se respeitar e, com
esse clima mais favorável, propus que lêssemos em sala algumas obras da literatura
infanto-juvenil. A experiência foi ótima, pois já conseguimos ler três obras (O portão
do paraíso, Bisa Bia e Dom Quixote), todas com a participação de todos os alunos.
Destaco que não tive nenhuma intenção de avaliá-los com notas pelas leituras
feitas, mas nem por isso deixei de trabalhar algumas marcas de cada obra, como a
linguagem empregada, a intencionalidade implícita e explícita no texto, além dos
aspectos ligados à narração, tais como enredo, espaços, tempo, personagens,
conflito, clímax e outras análises pertinentes nas leituras de obras literárias. Esta
experiência revelou-se de grande relevância no aprendizado dos alunos, percebi já
os primeiros resultados no comportamento e respeito entre eles. Quanto às leituras,
já estão me perguntando quando vamos ler outro livro, isso deixa claro que temos
que ir por este caminho, que é o da conquista do alunado, e esta tarefa está
diretamente ligada comprometimento do professor, a mim coube a condução deste
processo. Inseri-los neste mundo mágico da leitura não é tarefa impossível, nem é
ato realizável como um passe de mágica, é trabalho de oportunizar o acesso e de
promover o interesse. É necessário o plantio da semente e o cultivo do terreno para
que alguma produção gere frutos.
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7 RESULTADO DAS LEITURAS EM SALA: Conclusão
Esta proposta pedagógica poderia ser estendida para todas as unidades de
ensino, desde fosse assumida por todo o corpo docente, cada um na sua área de
atuação (português, história, geografia, etc.), pois os alunos sentiriam mais interesse
ao utilizarem jornais, revistas e livros como meio de leitura do seu cotidiano. Nesta
trajetória, pude contar com a colaboração de duas professoras, uma de Língua
Portuguesa, do Ensino Fundamental, e a outra de História, do nível médio. Com o
apoio delas, conseguimos fazer com que os alunos se envolvessem na proposta de
leitura. Era preciso criar um ambiente propício, aquilo que Silva (1998) nos alerta
quando diz que o momento tem que estar condicionado ao tipo de atmosfera que
desejamos que prevaleça nos contextos escolares. Saliento que usamos as mesmas
estratégias para as duas turmas, em dias alternados e com os mesmos objetivos,
porém foi no fundamental que obtivemos melhores resultados. Em ambas as turmas
marcamos um momento para a roda de contação das histórias das obras. Nos dois
casos tivemos algumas dificuldades, tendo em vista que alguns alunos tinham
vergonha de falar para os demais, isso foi uma barreira que aos poucos foi sendo
sanada, à medida que a conversa ia se desenvolvendo.
Dentre os relatos feitos pelos alunos, gostaria de citar a experiência de uma
aluna que havia lido o livro “Irmão Negro”, de Walcir Carrasco, ela nos relatou que
encontrou no livro sua própria historia de família, pois tem um irmão adotivo de cor
negra, disse que leu a obra para sua mãe que não sabe ler. Diante deste relato,
aproveitei o momento para instigá-la a encontrar no texto as marcas implícitas que o
autor deixa a respeito das questões raciais, interroguei se era fácil perceber esta
ideologia nas atitudes das personagens. Fiquei surpreso quanto ao seu relato, pois a
aluna realmente identificou-se com a história e até nos disse que leria novamente a
mesma obra. Assim, diagnostiquei que a leitura não pode ser encarada como um
fardo e sim como um momento de lazer, distração e aprendizado. Usamos a
realidade apresentada nos textos lidos para questionar o nosso contexto e este
caminho revelou-se como um bom meio para desenvolver o gosto em ler e
impulsionar o hábito necessário para se tornar um bom leitor. Aluno questionador e
com opinião própria aprenderá cada vez mais.
Durante a implementação do projeto, notei que, naquelas turmas específicas
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a maior dificuldade de obtermos novos leitores estava entre os meninos, a grande
maioria deles queria apenas folear as revistas que eu levava para a sala de aula.
Com o grupo do fundamental, presenciei a realidade de um aluno que vinha à aula
com sintomas de ter ingerido bebidas alcoólicas, um deles me disse que se levasse
as revistas para casa iria botar fogo nelas. São situações que fogem do esperado,
mas que temos que saber contornar para evitar um maior confronto em sala de aula.
Todavia o resultado foi satisfatório, também por ter tido a oportunidade de estender
o projeto aos alunos do Ensino Médio. Lá, tivemos a grata surpresa vinda de uma
senhora já mencionada de mais de setenta anos que voltou a estudar, sente-se
muito entusiasmada e está se tornando uma grande leitora. Esta leu neste período
de um bimestre quatro livros e fez a contação da obra aos demais alunos. Ela é um
exemplo de que não há limites nem tempo para recomeçar.
Por fim, para finalizar este momento com esta turma da EJA Fase II do
Ensino Fundamental trabalhamos uma leitura coletiva somente em sala e com a
participação de todos os alunos, até mesmo àqueles que até então não haviam lido
nenhum livro. A obra escolhida foi “O jardim secreto”, de Frances Hodgson Burnet. A
escolha do livro para leitura coletiva em sala foi uma sugestão da professora de
Língua Portuguesa e regente da turma, Solange Nogueira, pois, de acordo com a
docente, era preciso ler uma história curta e que despertasse o interesse de todos e
também pelo fato de ser uma leitura de fácil compreensão. Desta forma, acatei a sua
sugestão, tendo em vista que eu iria precisar de sua ajuda para a leitura da obra.
Primeiramente, retomei a importância da leitura na vida das pessoas e depois
fizemos uma roda onde todos expuseram as suas maiores dificuldades e/ou as
alegrias em ler algo mais demorado como um livro de várias páginas. Então,
começamos a trabalhar. O primeiro passo foi apresentar a obra selecionada. Neste
momento, conversamos sobre a história que iríamos ler, que contava a vida de um
menino que aparentemente era doente, mas com a chegada de sua prima que era
muito esperta e a descoberta de um jardim no quintal da casa, tudo muda em sua
vida e também na sua família.
Em outra ocasião, iniciamos a leitura, sempre parando para esclarecer
alguns tópicos ou dúvidas de algumas palavras desconhecidas dos alunos. A cada
aula ou quando terminava um capítulo, fazíamos um momento de troca de
experiência das impressões daquilo que tínhamos lido. Eram relatos e comentários
que os alunos colocavam para todos da sala, também eu e a professora fazíamos
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algumas interferências quando ao uso da linguagem, atitudes das personagens,
principalmente da criadagem da casa que tinha a missão de cuidar das crianças.
Quando terminamos de ler o livro, fizemos a roda da conversa, onde todos
colocaram seus pontos de vista, o que mais apreciaram ou não na obra. Quais eram
os fatos que poderiam ser comparados a nossa realidade. Testemunhei que a
prática da leitura em sala de aula é mesmo um benefício para o processo ensino-
aprendizagem. Isso é essencial para nos manter “vivos”, pessoal e
profissionalmente, sem falar nos benefícios ao aluno.
O trabalho com a leitura na escola desenvolveu-se de modo prazeroso,
também por ser encaminhado a partir de textos que atraiam a atenção dos alunos,
por conterem significativos e serem desvinculados da nota. Assim, estes não liam
somente por obrigação ou para “ganhar” nota. Nosso alunado se sente, muitas
vezes, à margem da sociedade, e, portanto, não se identifica com as produções
literárias que estão à disposição de todos, bem como de qualquer publicação escrita
que retrate, respalde ou mesmo critique essa sociedade. São necessárias novas e
incansáveis tentativas de incluir esse alunado nas práticas de leitura, para que ele
volte a se sentir capaz de interagir com o material escrito ao qual este possa ter
acesso. Desta forma, a estratégia que utilizei foi assistir ao filme da obra lida e
pudemos fazer um paralelo a respeito das diferenças entre o livro e o filme. A ação
foi muito boa, marcamos como a noite do cinema, com uma sala preparada para
este fim, com reprodução em tela grande e com direito à pipoca de micro-ondas.
Apesar de produtiva, esta atividade de leitura compartilhada não foi muito
fácil, pois sempre havia alguns alunos que faltavam nas aulas, perdendo assim a
sequência da leitura. Como foi o caso de uma aluna, mãe de dois filhos e que estava
separada, quando voltou com o marido, abandonou a escola. Realidades como esta
fomos constatando ao longo da implementação do projeto, são dificuldades que nós
professores do ensino público enfrentamos no nosso cotidiano, mas elas não podem
nos impedir de desenvolver um bom trabalho, porque é possível ir muito além da
alfabetização e da decodificação para que os alunos sejam capazes de refletir sobre
a realidade, sendo mais críticos e ativos no contexto em que estiverem inseridos.
Assim, como afirmam as DCE (2008, p.48): “Se a escola desconsiderar esse papel,
o sujeito ficará à margem dos novos letramentos, não conseguindo se constituir no
âmbito de uma sociedade letrada”.
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