os desafios da escola pÚblica paranaense na … · comunicação entre as pessoas ... receita...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
A CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS NO CONTEXTO ESCOLAR
Antonio Cláudio Brites de Oliveira1
RESUMO: Este artigo tem por objetivo apresentar um trabalho realizado durante o Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) sobre o gênero Conto Maravilhoso. Este gênero oral, introduzido no contexto escolar, desenvolve no educando e, também, nas pessoas que fazem uso dele (no nosso caso, o leitor), muitas habilidades para desenvolver com mais facilidade e prazer a leitura e a escrita. Quando trabalhado de formas diferentes, o Conto Maravilhoso coopera para o desenvolvimento emocional, psicológico, reflexivo e crítico. Se o conto, num passado distante, serviu como veículo de comunicação entre as pessoas, durante a aplicação do projeto se pode perceber que houve a socialização do conhecimento através da prática de contação de histórias e da interdisciplinaridade. Conclui-se que a leitura de contos em sala de aula, ou mesmo em qualquer outra parte, onde o gênero é usado com finalidade didática, constrói no leitor, não só o simples ler por prazer, mas também o indivíduo que enxerga na leitura a necessidade de compartilhar, socializar, recriar a realidade por meio de situações apresentadas na ficção. Este trabalho foi direcionado aos alunos do 6º Ano do Colégio Estadual “Rocha Pombo,” na cidade de Antonina, estado do Paraná, e implementado no ano de 2014.
Palavras-chave: Contação de histórias, contos maravilhosos, leitura, projeto de intervenção.
1. Apresentação
Este artigo é a apresentação da etapa final do resultado das propostas
desenvolvidas no Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), nos anos
de 2013 e 2014. No primeiro ano foi construído, num primeiro momento, o
Projeto de Intervenção Pedagógica que determinou, depois, a construção de
um Caderno Pedagógico. No segundo ano do Programa, participamos do GTR
em dois momentos distintos: como participantes, onde havia um tutor que nos
orientava sobre a realização das atividades em rede; e, no segundo momento,
como tutores, orientando os participantes no desenvolvimento das atividades
que compunham cada módulo. Também trabalhamos na Implementação do
1 Professor da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná. Participante do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) – turma 2013/2014. Orientadora: Profª. Ms. Cristian Pagoto (UNESPAR – campus de Paranaguá).E-mail: [email protected]
Projeto na Escola desenvolvendo várias atividades propostas no Caderno
Pedagógico com os alunos do 6º Ano. A etapa final do Programa compreende
a elaboração deste Artigo Científico.
2. Gênero textual
Este trabalho realizado com a oralidade buscou resgatar por meio de
leituras múltiplas, reflexões e análises a contação de histórias que inseridas no
contexto escolar podem servir de mecanismo de incentivo a leitura.
A linha pedagógica, adotada neste trabalho, enfatizou a importância da
interação social e da formação dos alunos por meio da contação de histórias,
com ênfase na construção de conhecimento a partir de uma visão social.
Também se fundamentou na prática educativa crítico-progressista de Paulo
Freire, na qual “o educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua
prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade,
sua insubmissão” (FREIRE, 2005, p. 26).
As diferentes culturas ajudaram a formar o ser humano dando referências
ao modo de educá-lo, portanto a socialização deste repositório cultural se faz
importante para que o conhecimento se realize de forma coletiva.
A socialização é uma tarefa historicamente atribuída à escola, mas só
acontece quando toda a sociedade consegue trabalhar em conjunto,
respeitando as eventuais diferenças do sujeito. A escola, depois do ambiente
familiar, é o lugar onde o ser humano começa a experimentar as relações
sociais de forma mais amplas e, assim, muitos dos valores que virá a assumir
podem depender dessa inteiração iniciada nos bancos escolares.
Para Bortoni (2004, p. 23) “os papéis sociais são construídos no próprio
processo de interação humana. Quando usamos a linguagem para nos
comunicar, também estamos construindo e reforçando os papéis sociais
próprios de cada domínio”.
Pensando na valorização da oralidade no ambiente escolar, é possível
refletir sobre novas práticas pedagógicas e sobre a contação de histórias, que
possibilitarão o desenvolvimento da criatividade, da expressividade e da
socialização. Através da interação leitor-texto variadas possibilidades de leitura
poderão surgir. Incentivar um trabalho diversificado com textos literários, a fim
de que o aluno possa refletir e interagir com o mundo, e ainda capacitá-lo para
leitura em todos os seus aspectos, é contribuir para que o aluno desenvolva o
gosto pela literatura. Partilhamos, neste projeto, da concepção de que a leitura
de textos não se limita a uma simples “decodificação de palavras”, mas uma
visão interna e externa do texto, ou seja, das linhas e entrelinhas.
Para Marisa Lojolo (1982, p. 59):
Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido do texto. É a partir do texto, ser capaz de atribuir-lhe significação, conseguir relacioná-lo a todos os outros textos significativos para cada um, reconhecer nele o tipo de leitura que seu autor pretendia e, dono da própria vontade, entregar-se a leitura ou rebelar-se contra e la, propondo outra não prevista.
Pensando nas possibilidades infinitas de leituras, pode-se pensar,
também, nas várias manifestações textuais. Para Marcuschi (2002, p. 22-23),
todo gênero textual está pronto e à disposição de quem quer fazer uso deles.
Os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. Se os tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros são inúmeros. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurantes.
Ao percebermos a importância do gênero, e a presença dele nas várias
situações de comunicação entre os seres humanos, chegamos a conclusão de
que a questão não é falar certo ou errado, mas saber adequar o registro ao
contexto onde a presença do gênero é importante no ato comunicativo.
A questão não é falar certo ou errado, mas saber qual forma de fala utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. E saber coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa. E saber, portanto, quais variedades e registros da língua oral são pertinentes em função da intenção comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar adequadamente, é produzir efeito pretendido (PCN, 1997, p. 34).
Visto que cada gênero tem sua característica que o determina na prática
do uso, ou seja, apresenta sua especificidade e sua finalidade no processo de
comunicação, cabe ao professor direcionar o trabalho para que este possa
cumprir o seu papel pedagógico, cujo objetivo principal é o ensino-
aprendizagem. Dentro das práticas pedagógicas, o gênero textual desempenha
um papel muito importante, apontando caminhos de como utilizá-lo nas
relações humanas, pois o texto está a todo momento sendo usado no processo
comunicativo. Através das possibilidades que o texto pode oferecer ao
educando, e também ao educador, as atividades planejadas com textos podem
apresentar resultados favoráveis nas práticas educativas.
Do ponto de vista pedagógico, não se trata de ter horizonte a leitura do professor ou a leitura historicamente privilegiada como parâmetro de ação; importa, diante de uma leitura ao aluno, recuperar sua caminhada interpretativa, ou seja, que pistas do texto o fizeram acionar outros conhecimentos para que ele produzisse o sentido que produziu, é na recuperação desta caminhada que cabe ao professor mostrar que alguns dos mecanismos acionados pelo aluno podem ser irrelevantes para o texto que se lê, e , portanto sua “ inadequada leitura” é consequência deste processo e não porque coaduna com a leitura desejada pelo professor (GERALDI, 1997, p. 188).
No que concerne à Literatura oral, valoriza-se a potência do texto
literário como arte, que desperta oportunidades de considerar seu estatuto
específico, sua dimensão estética e sua força política particular, apontando
traços singulares e subjetivos para criação e recriação da história. Neste tipo
de literatura, o texto não é visto como uma simples reprodução, mas busca no
narrador um grande aliado para que este trabalho artesanal seja recriado e
transmitido por meio da oralidade aos seus ouvintes.
Ainda completando o pensamento de Marcuschi, outros teóricos
reafirmam que os gêneros textuais são necessários para que se estabeleça a
comunicação. Eles têm alto poder nas ações humanas, atuando como
instrumentos importantíssimos no ato comunicativo, e que se materializam a
partir do uso dos mesmos no processo comunicativo que se dá quando ocorre
a interlocução.
contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia- a dia. São entidades sócio-discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer situação comunicativa. No entanto, mesmo apresentando alto poder preditivo e interpretativo das ações humanas em qualquer contexto discursivo, os gêneros não são instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa. Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis,
dinâmicos e plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades sócio-culturais, bem como na relação de inovações tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes em relação a sociedades anteriores a comunicação escrita (MARCUCHI, 2005, p. 19).
Bronckart (1999, p. 137) afirma que os gêneros não mudam, já os textos
que os materializam são variados e flexíveis. Ele expõe que o texto é produto
da linguagem em funcionamento permanente nas formações sociais. Segundo
o autor, em função de seus objetivos, interesses e questões específicas,
elaboram diferentes espécies de textos, que apresentam características
relativamente constantes e ficam disponíveis no intertexto como modelos
indexados para os contemporâneos e as gerações posteriores. Essa
mobilidade, disponibilizada pelo uso do gênero pelo leitor e pelo produtor do
texto, é que torna dinâmica a atividade e necessária a partir do momento em o
texto funcionará como elemento de interlocução.
3. A contação de histórias
Gêneros textuais são textos que circulam pela sociedade e estão à
disposição para uso de quem deles necessita para estabelecer comunicação.
Todo texto tem finalidades específicas e, na escola, sua função principal é
meramente didática. O gênero textual, conto, também apresenta sua
especificidade ao atrair o ouvinte para sua leitura, que se concretiza por meio
da oralidade. De acordo com Silva (1997, p. 11):
A força da história é tamanha que narrador e ouvintes caminham juntos na trilha do enredo e ocorre uma vibração recíproca de sensibilidades a ponto de dilui-se o ambiente real ante a magia da palavra que comove e enleva. As ações e desenvolve e nós participamos dela, ficando magicamente envolvidos com os personagens; mas sem perder o senso crítico, que é estimulado pelo enredo.
Patrini (2005, p.18), referindo-se ao conto como parte integrante do
gênero oral, afirma que este gênero é um resgate da memória. Nele, os
personagens, sejam eles protagonistas ou mesmo antagonistas, estão
integrados ao enredo e apontam ao ouvinte valores e maneiras diversas de ver
o mundo, além de determinar, muitas vezes, o porquê de “vilões e mocinhos”
terem finais diferentes. Como resgate da memória, no conto as histórias se
entrelaçam e aquilo que aconteceu há muito tempo volta a compor outra
história, ou seja, textos e personagens conversam entre si. É nesse construir e
reconstruir que o gênero mostra sua riqueza. Contar histórias é provocar no
leitor determinadas emoções que provocam diferentes reações. A procura de
respostas relacionadas à fantasia e à realidade faz com que os leitores
descubram seus medos e anseios.
As apresentações de situações diversificadas e os enfoques direcionados
pedagogicamente durante a apresentação das histórias é que tentará despertar
o gosto pela leitura e, consequentemente, cativar o leitor. Caberá ao professor
criar em sua sala de aula essa atração, ou seja, promover a vontade de ler,
estimular o espírito crítico e imaginativo, possibilitar que o aluno seja capaz de
ler, reler, analisar. A leitura, sem sombras de dúvidas, é um meio importante
para se chegar ao reconhecimento (RAMOS, 2003).
A idade da criança é o que determinará o tipo de história que será
oferecida a ela. A busca de um referencial para a compreensão do gênero
também está relacionado ao conhecimento de mundo. Caruso (2003) explica
em sua teoria que os pais, muitas vezes, estão mais preocupados em educar e
muitas vezes esquecem um ato simples: a contação de histórias, pois acham
que isto é perder tempo. Porém, nos momentos que se esquecem de educar e
vão contando histórias, a fantasia é instaurada e as crianças percebem que
eles também sabem brincar. Para Sisto (2001) a imaginação das crianças é
ilimitada, principalmente quando ela encontra meios para criar e recriar
histórias. O autor explica que para penetrar no universo infantil é preciso que o
adulto tenha muito tato, deixando espaço para que a criança possa criar. O
modo como o contador apresentará o texto ao leitor (falas, gestos, tonalidade
da voz das personagens, cenários...) será o suporte para criação e recriação e,
desta forma, o ouvinte poderá recriar o mundo por meio de brincadeiras e de
fantasias. Para Buzatto (2003), contar histórias ajuda a formar leitores, mantém
viva a fantasia, contribui para a valorização das raças, crenças, desperta o
leitor para o imaginário. Conhecer o público ouvinte também é muito
importante, pois a história se concretizará a partir do conhecimento da pessoa
ou do grupo para quem ela será contada. O envolvimento do narrador com a
história deve ser um dos traços marcantes do contador, pois é dando vida aos
personagens, o modo como o fato e os lugares são apresentados, “o contar
com o coração”, a identificação do narrador com a obra narrada, esse
dinamismo todo, é que prenderá a criança para que ela comece a viver essa
experiência de ouvir, viver e recriar a sua própria história.
O contador exerce sobre o conto um papel preponderante, pois ele
procura convencer o leitor que aquilo que está narrando é a “pura verdade”. Ele
reafirma que esse jogo precisa ser feito, pois é preciso despertar no leitor o
desejo de envolvê-lo na história. Dessa maneira o leitor chegará ao final da
contação enredado nos fatos.
O contador é uma testemunha para mim de algo que vai acontecer. É um jogo que é preciso aceitar. Aceitar nos deixar levar pela mentira. A arte do contador consiste de tudo em produzir em uma versão pessoal dos fatos que ele conta, é uma arte testemunhal. (HINDÉNOCH apud PATRINI, 2005, p. 74).
A criatividade que cada autor demonstra ao escrever o conto é
concretizada pelo contador de histórias. Este, por meio do enredo e dos fios
narrativos, prende a atenção do ouvinte que quer ouvir e descobrir o final da
história. Tudo consiste em técnicas para mostrar por meio da ficção uma
representação do real. Essa arte de contar depende da criatividade de cada
contista.
Máteo, citado por Patrini (2005, p. 76), considera que a narração é uma
prática artística e o narrador:
É alguém que atua na prática da narração, o que não significa atuar especialmente em uma prática artística que supõe forçosamente a representação. O contador pode se adaptar a diferentes espaços, diferentes atividades, diferentes experiências para recontar uma história. É alguém que pode intervir de diferentes formas sendo seu próprio repertório.
O conto ultrapassa espaços, experiências, para muitas vezes, por meio
da contação se transformar em outras histórias. Os causos e os contos
maravilhosos caracterizam-se pelo dinamismo que ele possui.
Segundo Coutinho e Souza (2001), o conto é flexível, com infinitas
possibilidades, não obedecendo a regras fixas. Para os autores, esse gênero
liga-se a cenas e episódios de complexidade reduzida, ações isoladas, cortes
de vidas menores, estudo de caracteres ou situações, acontecimentos
cotidianos aparentemente banais, mas representativos de ações ou
personagens, encontros, conversações e fantasias. Essa diversidade de
possibilidades é apresentada ao leitor por meio das personagens, dos fatos e
dos cenários onde a história se desenvolve; é nessa mistura de realidade e
fantasia que o leitor é mergulhado na história e consegue interagir.
Conforme Todorov (1980), no maravilhoso puro, a presença dos
elementos sobrenaturais não ocasiona nenhuma reação particular nos
personagens nem no leitor implícito. Para o autor, o que caracteriza o
maravilhoso puro é a própria natureza dos acontecimentos narrados, e não
uma atitude frente a esses acontecimentos. Isso quer dizer que as coisas
acontecem de forma natural, mesmo em se tratando de fatos sobrenaturais,
não existe um compromisso direto dos personagens, ou mesmo do leitor com
os fatos ocorridos.
Na mesma linha de pensamento, Marçal (2009, p. 2) afirma que esse
gênero narra acontecimentos impossíveis de se revelar dentro de uma visão
empírica da realidade e instala seu universo irreal sem causar qualquer
questionamento, estranhamento ou espanto no leitor, pois não estabelece
nenhuma via de conexão entre o universo real e irreal. Ao ler um conto
maravilhoso, o leitor deverá estar pronto para receber fatos que são
apresentados que não têm compromisso direto com a realidade. Esse gênero
tem por objetivo levar o leitor a fugir da realidade e penetrar no imaginário, e
depois retornar à realidade com uma visão mais reflexiva e humana. O leitor é
convidado a viver outras histórias dentro da sua.
Durante um período de sua história o conto teve uma circulação
constante. Ele penetrava nos lares e demais segmentos da sociedade. Exercia
um papel relevante, porém com o surgimento de outros contadores de histórias
mais tecnológicos, como o aparecimento do cinema, da televisão, da internet,
esse gênero caiu em desuso, chegando quase ao seu desaparecimento. Sobre
isso, Patrini (2005, p. 31) pondera:
Além disso essa outra prática dos novos contadores de histórias aponta para um movimento de resistência à padronização da linguagem e ao silenciamento das pessoas imposto pelos meios de comunicação de massa à medida que busca recuperar o saber popular. Acresce a esse fato a legitimação da autoria do discurso do ouvinte, já que a oralidade implica na proximidade e exige um ambiente convival que mescla o tecnológico com o artesanal.
Benjamin (1994) afirma que a arte de narrar está desaparecendo. Para
ele isto se deve, entre outros fatores, ao aparecimento do gênero romance
escrito, que por ser um gênero que não prima pela rapidez como o conto,
acaba sendo responsável pelo declínio da atividade artesanal de narrar. O
narrador, para o autor, é um homem que sabe dar conselhos, que narra e faz
com que outras pessoas, motivadas por essa prática, recriem histórias. Contar
histórias sempre partiu da ideia de recriação, do poder artesanal do narrador
que conta e que motiva o ouvinte a recontar.
Mesmo diante de tantas tecnologias como a internet, os contos orais
sobrevivem e as histórias, causos e contos maravilhosos, são importantes para
promover a socialização, a interação social e estimular a imaginação e a
criação.
Este projeto teve por alvo o resgate da oralidade por meio da contação
de histórias e, através de práticas docentes, demonstrar que os causos e os
contos maravilhosos continuam seduzindo seu público.
4. Desenvolvimento
Com objetivo de resgatar a oralidade por meio da contação de histórias,
os alunos do 6º Ano A do Colégio Estadual “Rocha Pombo”, da cidade de
Antonina-PR, tiveram oportunidade de participar do Projeto de Intervenção
Pedagógica na escola. Na realização deste trabalho os alunos puderam ouvir,
ler, contar, discutir, analisar e recontar histórias. O desenvolvimento deste
trabalho de resgate da oralidade compreendeu os meses de fevereiro a julho de
2014.
O trabalho desenvolvido na implementação do projeto teve como material
de apoio o caderno pedagógico desenvolvido no ano de 2013. Esse material foi
dividido em unidades e determinou marcos e alvos para possíveis avaliações.
Na primeira unidade as histórias foram inseridas no contexto escolar por
meio da contação, seguida da apresentação de filmes que puderam dar apoio
pedagógico na construção da aprendizagem. Esse recurso visual e auditivo
teve por objetivo principal instigar o aluno por meio da visualização dos
cenários, da análise do comportamento de personagens e enredo e, por fim,
foram motivados à criação de novas histórias. Os alunos, em determinado
momento, foram convidados a responder algumas questões relevantes para
levá-los à uma reflexão sobre a importância da história como construtora de um
modo de agir e pensar de um povo. Também puderam realizar trabalhos
desenhando quadros representativos do enredo, por meio da ilustração, e
apresentaram suas próprias opiniões, logo após a discussão dirigida.
Baseando-se nas propostas de atividades da segunda unidade, que
compreendeu 4 aulas, o objetivo principal foi o desenvolvimento de habilidades
de leitura. As aulas discorreram num clima agradável, pois os alunos foram
convidados a colocarem suas carteiras em forma de círculo de modo que um
pudesse visualizar o outro colega. Logo em seguida, alguns textos foram
distribuídos para que pudessem ler, refletir, e analisar diálogos das
personagens e identificar comportamentos. Também foi feita uma explanação
do conteúdo explicando sobre o veículo de circulação desse tipo de texto e sua
respectiva finalidade. Os alunos puderam refletir sobre o significado da
contextualização. Nas fichas foi observado que quase toda turma participou
ativamente e conseguiu atingir o objetivo principal proposto na unidade.
Na terceira unidade, o objetivo geral foi reconhecer características
básicas do gênero conto. Determinamos a análise de elementos estruturais dos
textos e um estudo comparativo de enredos e de situações que ocorreram no
passado e no presente. Num primeiro momento, os alunos foram convidados a
montar equipes para que o trabalho de análise, reflexão, recorte e colagem dos
textos acontecessem. Em seguida, receberam textos para que num primeiro
momento fossem lidos por eles e selecionados aqueles que despertassem
interesse. Num outro momento distinto, puderam, com o lápis de cor, identificar
elementos estruturais dos textos. Em seguida iniciaram as colagens nas
cartolinas e, mais tarde, o recorte dos textos. Logo após a elaboração dos
quebra- cabeças, ocorreram as trocas dos materiais, com objetivo de que essas
trocas despertassem o desejo, não apenas de colar o material, mas também da
leitura dos mesmos. Com esta atividade os alunos puderam ler, discutir,
estabelecer comparativos entre os textos e identificar situações problemáticas
situadas no passado e presente.
Na quarta unidade foi apresentado como objetivo geral a análise de
recursos para construção de textos narrativos: contos maravilhosos. Sua
abertura foi marcada pela apresentação do conto: “As fadas”, de Charles
Perrault. Esse tipo de atividade direcionou o trabalho para possíveis leituras
dinâmicas, nas quais foi possível explorar a oralidade, a leitura silenciosa, as
leituras individual e coletiva. Os alunos em determinados momentos foram
convidados a refletir sobre os elementos estruturais dos textos e a analisarem
traços característicos dos contos maravilhosos. Puderam também construir
textos orais usando conhecimentos básicos. Nestas seis aulas, os alunos
receberam os textos “Gata Borralheira”, “Maria das Cinzas” e “As Fadas”, e
realizaram múltiplas leituras, estabelecendo comparações e analisando
elementos estruturais compositores dos mesmos. Com lápis de cor e
marcadores identificaram estruturas. Os critérios estabelecidos nas avaliações
apontaram resultados positivos, pois os alunos demonstraram ter habilidades
na leitura e nas observações.
Na quinta unidade, o objetivo geral foi determinado pelo conhecimento de
histórias (contos) que fazem parte da cultura de nossa cidade: Antonina. Nessa
etapa a atividade foi direcionada para a identificação de pessoas no bairro ou
em outros pontos da cidade que conhecessem histórias populares, e que
também tivessem disposição para relatá-las no Colégio para que, através deste
processo de contação de histórias (ou causos populares), os alunos ficassem
conhecendo o repositório das narrativas populares e locais. Para que as aulas
tivessem êxito, os alunos foram convidados a realizar, juntamente com os
professores, uma aula passeio. Nesta aula, com alguns materiais didáticos à
mão, direcionamos os alunos aos locais onde viviam as pessoas que contariam
as histórias e além de ouvi-las eles deveriam, também, entrevistá-las. Os
alunos realizaram a coleta do material e, aos poucos, percebemos como
ficaram envolvidos na magia de ouvir histórias e saber alguma coisa a respeito
dos contadores. As avaliações seguiram os critérios apontados de perguntas e
respostas, seleção e registro de determinadas histórias e pode-se concluir que
o resultado foi positivo, pois houve muito envolvimento entre professor- aluno e
os contadores.
Na sexta unidade, o objetivo geral determinou o desenvolvimento de
habilidades para a produção de textos, reestruturação, seleção e confecção de
uma coletânea. Após selecionarem alguns textos e identificarem aqueles que
mais lhe agradaram, os alunos foram convidados a produzirem seus próprios
textos usando alguns recursos para a produção textual. A intertextualidade e a
reestruturação fizeram parte efetiva deste trabalho com histórias que foram
selecionadas a partir da coleta da aula passeio. Após realizarem as produções
e encaminharem para a reestruturação, os textos foram organizados para a
confecção da coletânea, que seguiu padrões pré-estabelecidos e determinados
pelo uso da língua padrão, pois posteriormente seriam encaminhadas para
exposição. As avaliações obedeceram aos critérios determinados para
identificar produções, elaboração, seleção e utilização dos recursos que
serviriam de apoio pedagógico. Pela análise do trabalho realizado, podemos
perceber que os alunos tiveram um bom aproveitamento.
A sétima unidade determinou a exposição de uma coletânea de contos
maravilhosos, organização e distribuição dos livretos ao público. Logo após a
conclusão do trabalho de confecção dos livretos, organizamo-nos para
montarmos os convites e a divulgação do nosso trabalho dentro e fora da
escola, em datas e local certo. No dia da exposição organizamos os livretos
numa sala onde pudemos explicar o objetivo norteador do projeto, as fases de
construção dele e a aceitação pelos alunos. Também foram apresentados
trechos de filmes que fizeram parte do material pedagógico que apoiaram
algumas atividades. Houve um determinado momento em que os contadores,
pessoas que foram convidadas para contar histórias do conhecimento delas,
compartilharam experiências vividas por elas e pelo público que as ouvia. No
término desta atividade o público presente foi convidado a participar de um
pequeno coquetel e levar um livreto para casa.
5. Considerações sobre o GTR
Uma tecnologia inovadora que, sem sombra de dúvidas, é muito
importante no desenvolvimento do PDE e que, também, serve como material de
apoio pedagógico é o Grupo de Trabalho em Rede (GTR).
O GTR faz parte de um dos módulos do PDE e permite que os
professores participantes do Programa interajam utilizando as mídias. Nestas
atividades, os participantes se comunicam por meio da troca de experiências
que são relatadas por meio de diários e de fóruns mediados pelos tutores. No
primeiro momento do GTR atuamos como participante e dentro da plataforma
“MOODLE” participamos de fóruns de discussões com outros participantes do
PDE. O professor (tutor) insere um assunto relevante ao tema e, logo em
seguida, nos fóruns, o professor participante é convidado a interagir com mais
duas ou três pessoas, propiciando, assim, muitas trocas de experiências. Essa
dinâmica leva o participante a compartilhar ideias a respeito do assunto que
está em pauta e a novas reflexões. Além dos fóruns, sempre é postado pelo
tutor um tema para cada professor escrever um número determinado de linhas,
consultando o material e buscando apoio pedagógico em pesquisas científicas.
No segundo momento do GTR o professor PDE é convocado a dar
suporte pedagógico aos participantes que são convidados a refletirem sobre as
temáticas que fazem parte de cada módulo. Os módulos são apresentados em
três temas: o projeto de intervenção pedagógica, o caderno pedagógico
(unidades didáticas) e a implementação do projeto na escola. Ao abrir o
primeiro módulo, os participantes começam a participar do fórum e interagem
entre eles e, também, são mediados pelo tutor, que apresenta considerações
relevantes ao tema proposto. Dentro do mesmo módulo, é apresentado, ainda,
o diário, no qual além de refletir sobre o tema, o participante deve escrever um
número de linhas consideráveis, cooperando na fundamentação teórica. O
segundo módulo apresenta o mesmo tipo de atividade. No terceiro módulo o
professor/participante não tem o diário para escrever, porém deverá vivenciar
uma de suas práticas educativas.
Tais atividades enriquecem muito nossas práticas educativas, porque
além das interações que ocorreram entre tutores e participantes, foi possível
compartilhar práticas vivenciadas e trocas de experiências, promovendo o
crescimento de todos.
6. Resultados e considerações finais
Ouvir histórias, simplesmente por ouvir, implica enxergar a realidade de
forma objetiva e mecânica. A partir do momento em que a imaginação, a
capacidade criadora é apresentada por meio da fantasia, neste momento o
aluno começa a ver o mundo de outra maneira. Inicia-se um processo de
transformação, estimulando a capacidade criadora e o ato de ler torna-se muito
mais atrativo.
Ler e contar uma história para um aluno são atividades que embora
pareçam às mesmas, apresentam muitas diferenças. Contar exige muito mais
envolvimento do contador com a história. A história se torna mais viva, as falas
não representam uma mera leitura e, sim, o personagem falando por meio do
contador. O enredo consegue prender o leitor que deseja saber o que vai
acontecer com o protagonista e com o antagonista. Contar exige do contador
um envolvimento sério, no qual a comunicação se estabeleça, ou seja, locutor-
mensagem-locatário estão dentro deste processo de comunicação.
O contador, valendo-se dos recursos que dispõe, como linguagem
gestual, entonação da voz, a presença física, consegue dar vida aos
personagens, ao ambiente em que os fatos estão acontecendo e a história
consegue envolver o ouvinte. Vale lembrar que o despertamento da criança
para leitura de Contos Maravilhosos vai depender muito de como ouviram as
histórias. A criatividade em contar pode ajudar muito na formação de um bom
leitor. O aluno tem grandes chances de se tornar um bom leitor a partir do
momento em que sentir a importância do texto na sociedade.
O planejamento de leituras de contos maravilhosos, tomando como
referência a idade, a aceitação da turma, o contexto local, etc., pode ser uma
atividade enriquecedora. Ler e ouvir por prazer pode representar muito, e
conduzir o aluno ao amadurecimento e concretização do leitor que aprende a
analisar, discutir, refletir nas histórias, e consegue ser crítico dentro do mundo
em que está inserido e muito mais humano.
O resultado esperado aconteceu a partir da aplicação do projeto na
escola, onde alunos, o corpo docente, a comunidade local foram envolvidos na
mesma prática educativa. O envolvimento de todos foi muito importante. O
trabalho com o gênero oral acrescentou muito para escola e o resultado foi
extremamente positivo para os alunos e para mim, professor, pois todos nós
experimentamos algo inovador e atrativo.
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