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Os ANA no Diagnóstico Laboratorial das Doenças Autoimunes Maria José Rego de Sousa

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Os ana no Diagnóstico Laboratorial das Doenças autoimunesMaria José Rego de Sousa

nota editorial

Valendo-se das mais sofisticadas ferramentas laboratoriais e de sólidos conhe-

cimentos fisiopatológicos a Medicina Laboratorial vem ocupando gradual-

mente um lugar cada vez mais essencial na previsão, diagnóstico, prognóstico

e monitorização das mais diversas patologias. Porém, sem existir uma exce-

lente relação entre a clínica e o laboratório as potencialidades da Patologia

Clínica perdem-se ou não são suficientemente aproveitadas, não se assegu-

rando ao doente a plenitude dos cuidados de saúde a que tem direito. Sem

essa conexão o diagnóstico será mais pobre, a terapêutica menos adequada e

o prognóstico mais incerto.

Da importância da interface clínico-laboratorial são exemplo maior as Do-

enças Autoimunes. A autora, a Dra. Maria José Rego de Sousa, tem dedicado

grande parte do seu múnus de especialista em Patologia Clínica ao estudo

dos achados laboratoriais próprios deste tipo de patologia e à sua interpreta-

ção e aplicação à clínica, designadamente frequentando laboratórios centros

europeus de referência em Imunopatologia Laboratorial. Condensa agora a

sua experiência neste manual que pela forma prática e de fácil consulta

como é apresentado vai, por certo, contribuir grandemente para uma melhor

interpretação dos dados do laboratório e uma eficiente relação entre este e

a clínica.

Muita da experiência agora vertida foi resultado da actividade da autora no

Centro de Medicina Laboratorial que fundei e dirijo e que desde o seu início

tem como missão colocar-se ao serviço dos doentes e dos médicos. Neste

sentido entendemos editar este manual que esperamos possa ser útil a todos

os colegas na sua prática clínica diária.

Germano de Sousadirector clínico do centro de medicina

laboratorial dr. germano de sousa

capítulo 1

Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

capítulo 2

Nota histórica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

capítulo 3

Princípio do teste de imunofluorescência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

capítulo 4

Prevalência dos aNa nas doenças autoimunes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

capítulo 5

Nomenclatura dos autoanticorpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

capítulo 6

autoanticorpos e padrões HEp-2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

capítulo 7Caracterização antigénica dos padrões de fluorescência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

capítulo 8

Quadros para interpretação dos resultados aNa positivo . . . . . . . . . . 40

capítulo 9Como proceder depois de um resultado aNa positivo? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

capítulo 10

Métodos para seguimento do aNa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47

Padrões de fluorescência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

indice

10 os ana no diagnóstico laboratorial das doenças autoimunes 11princípio do teste de imunofluorescência

3.2. Células HEp-2. O que são ?O conhecimento da estrutura da célula eucariótica e do seu ciclo celular

é fundamental para a compreensão dos padrões observados no substra-

to de células HEp-2.

3.2.1. Estrutura das células HEp-2

3. princípio do teste de imunofluorescência

O teste de imunofluorescência indirecta é baseado na ligação do auto-

anticorpo presente no soro do doente, com o antigénio das células HEp-2.

Conforme o local de ligação do autoanticorpo, são expressos vários padrões

de ANA, que podem ser nucleares, nucleolares, citoplasmáticos, do aparelho

mitótico ou mistos. Após a ligação do anticorpo ao substrato, a reacção será

revelada por uma imunoglobulina da classe IgG, conjugada com fluoresceí-

na. A lâmina de vidro, coberta pela cultura de células HEp-2, será, depois de

processada, observada ao microscópio de fluorescência.

3.1. Condições pré-analíticasDevem ser utilizadas amostras de soro, ou colhidas no próprio dia, ou arma-

zenadas a 4ºC, no máximo por um período de uma semana. Se se pretende

armazenar durante mais tempo, as amostras devem ser acondicionadas a

-20ºC, sendo recomendado a adição de azida de sódio, para estabilizar a acti-

vidade dos anticorpos que eventualmente estarão presentes na amostra.

Congelar e descongelar uma amostra, frequentemente, diminui a actividade

dos anticorpos.

fitc fitcap golgi

ribosomas

r. e. liso

mitocôndrias centríolo núcleo membrana nuclear

12 os ana no diagnóstico laboratorial das doenças autoimunes 13

3.4. O ciclo celular

A interfase está dividida em 3 períodos sucessivos: G1 (“gap”1), S (síntese) e

G2 (“gap”2). A fase G1 é preparatória para a biosíntese do DNA, que ocorre na

fase S. Quando a célula atinge a fase G2 a síntese de DNA está completa e os

pares de cromossomas estão unidos no centrómero.

Na fase M (Mitose), a célula divide-se e a quantidade de DNA divide-se em

dois. O ciclo celular das células HEp-2 é de 36 horas.

3.3. Porquê as células HEp-2 ?

São células de carcinoma laríngeo humano, que:

Podem-se propagar indefinidamente, em cultura de células, •

e como tal o substrato pode ser mais facilmente padronizado;

Permitem disponibilizar todo um espectro de antigénios humanos •

e estão mais próximo da especificidade contra os quais os anticorpos

são produzidos, possibilitando que um maior número de anticorpos

seja detectado e facultando uma maior taxa de detecção;

Possuem elevada sensibilidade, possibilitando que anticorpos contra •

diversos tipos de antigénios possam ser detectados, em simultâneo,

num único substrato;

Têm um núcleo maior, em que os diferentes anticorpos antinucleares •

podem ser mais facilmente diferenciados pelos seus padrões de

fluorescência;

Têm um grande número de mitoses. Os anticorpos anti-estruturas •

específicas das mitoses e os anticorpos anti- centrómeros são

diagnosticados com mais segurança.

A elevada sensibilidade, presente nas técnicas de IFI em substrato de células

HEp-2, contrasta com a sua baixa especificidade: apenas alguns padrões são

específicos de alguns antigénios e muitas especificidades diferentes, dão

origem a padrões semelhantes. Para além disso, muito doentes apresentam

diferentes autoanticorpos que resultam em padrões mistos.

As características acima referidas, fazem das técnicas de IFI em substrato

de HEp-2, uma excelente técnica para o rastreio dos ANA.

As células HEp-2 constituem um substrato de elevada sensibilidade que

permite, preliminarmente, aceder a informação qualitativa (positivo ou ne-

gativo), ou semi-qualitativa (positivo com padrão e título associado) que pode

ser, posteriormente, identificada e quantificada.

princípio do teste de imunofluorescência

g1

g2

sm

14 os ana no diagnóstico laboratorial das doenças autoimunes 15prevalência dos ana nas doenças autoimunes

4. prevalência dos ana nas doenças autoimunesOs ANA, presentes no soro dos doentes, são característicos de muitas doenças.

tabela 1.

Doenças autoimunes Prevalência do ANA

Doenças em que o ANA é muito útil para o diagnóstico

Lúpus Eritematoso SistémicoActivo 95-100%

Inactivo 80-100%

Sindroma do Lúpus Neonatal < 90%

Esclerose Sistémica ou Esclerodermia 60-80%

Cirrose Biliar Primária 95-100%

Doenças em que o ANA é moderadamente útil para o diagnóstico

Sindroma de Sjörgen 40-70%

Poliomiosite e Dermatomiosite 30-80%

Doenças em que o ANA é útil para a monitorização ou prognóstico

Artrite Juvenil Crónica com Uveitis 20-50%

Fenómeno de Raynaud 20-60%

Condições em o ANA é critério diagnóstico

Lúpus Eritematoso Medicamentoso ≈100%

Hepatite Autoimune ≈100%

Doenças Mista Tecido Conjuntivo ≈100%

Doenças para as quais o ANA não é útil para o diagnóstico

Artrite Reumatóide 30-50%

Outras doenças reumáticas 20-50%

Esclerose Múltipla 25%

Púrpura Trombocitopénica Idiopática 10-30%

Colite Ulcerosa 26%

Lúpus Discoide Crónico 5-25%

Tiroidite 30-50%

3.5. Divisão celular

A Mitose corresponde a cerca de 15% do ciclo celular e está dividida em 5

fases sucessivas: Profase, Prometafase, Metafase, anafase e Telofase.

Os padrões característicos da células em Mitose, só aparecerão nessa fase

do ciclo. A maior parte dos padrões associados a patologias, ocorrem durante

a Interfase, pelo que as células HEp-2 escolhidas para serem o substrato utili-

zado, devem estar maioritariamente nessa fase, mas não todas.

interfase

metafase

profase

anafase

prometafase

telofase