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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHARELADO
O USO DE CONTRATOS DERIVATIVOS COMO
INSTRUMENTO DE GESTÃO DE RISCO NA
INDÚSTRIA DE ENERGIA ELÉTRICA
PAULO FERNANDES MONTANO
matrícula nº: 098136390
ORIENTADOR: Prof. Ronaldo Bicalho
DEZEMBRO 2004
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA
MONOGRAFIA DE BACHARELADO
O USO DE CONTRATOS DERIVATIVOS COMO
INSTRUMENTO DE GESTÃO DE RISCO NA
INDÚSTRIA DE ENERGIA ELÉTRICA
________________________________________________
PAULO FERNANDES MONTANO
matrícula nº: 098136390
ORIENTADOR: Prof. Ronaldo Bicalho
DEZEMBRO 2004
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à minha família, minha mãe, meu pai e meu irmão por todo apoio que me deram até hoje e ainda darão por muito tempo. Agradeço, também, à minha namorada, Ana Carolina, que teve um papel fundamental nos momentos mais importantes da minha vida.
Gostaria de explicitar minha gratidão pela ajuda financeira concedida pela ANP através das bolsas oferecidas a mim, assim como a outros estudantes que optaram por pesquisas ligadas ao tema de energia.
Finalmente, sou grato ao Grupo de Economia da Energia da UFRJ e, especialmente, ao meu orientador, Prof. Ronaldo Bicalho, pela grande contribuição para a minha formação acadêmica, profissional e pessoal.
RESUMO
Esta monografia tem como objetivo, a observação da trajetória dos contratos derivativos relacionados com a indústria de energia elétrica e como foram, são e podem ser usados na sua gestão de risco. Para isso é necessária a reunião de vários conceitos sobre risco, juntamente com os devidos métodos de proteção contra eles. Além disso, é mister a análise e o conhecimento da eletricidade como forma de energia e como mercadoria. Nela, podemos observar também o funcionamento do seu mercado à vista, juntamente com todos os seus processos de geração, transmissão, distribuição e consumo.
ÍNDICE
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................6 CAPÍTULO I - GESTÃO DE RISCO E O USO DE DERIVATIVOS NA INDÚSTRIA DE ENERGIA .....8
I.1 - Gestão de risco sem derivativos ................................................................................................................11 I.2 - Os contratos derivativos ............................................................................................................................12
I.2.1 - Contratos a termo ................................................................................................................................14 I.2.2 - Contratos Futuros ................................................................................................................................16 I.2.3 - Opções.................................................................................................................................................20 I.2.4 - Swaps ..................................................................................................................................................25
CAPÍTULO II - O MERCADO DE ENERGIA ELÉTRICA E SUAS ESPECIFICIDADES ......................27 II.1 - Características da eletricidade ................................................................................................................27
II.1.1 - Geração de eletricidade......................................................................................................................29 II.1.2 - Transmissão .......................................................................................................................................30 II.1.3 - Distribuição........................................................................................................................................31
II.2 - O mercado de energia elétrica e sua evolução........................................................................................31 II.3 - O caso norte americano...........................................................................................................................36
CAPÍTULO III - OS DERIVATIVOS UTILIZADOS NA INDÚSTRIA DE ENERGIA ELÉTRICA E AS
BARREIRAS ENCONTRADAS PARA A SUA NEGOCIAÇÃO...................................................................40 III.1 - Contratos derivativos de eletricidade .....................................................................................................40
III.1.1 - Forward price contracts ...................................................................................................................40 III.1.2 - Contratos futuros ..............................................................................................................................40 III.1.3 - Electricity price swaps......................................................................................................................41 III.1.4 - Opções ..............................................................................................................................................42 III.1.5 - Spark spreads ...................................................................................................................................42
III.2 - Outros contratos derivativos utilizados na indústria de eletricidade ....................................................43 III.2.1 - Emissions trading .............................................................................................................................43 III.2.2 - Weather hedges.................................................................................................................................44 III.2.3 - Contratos de seguro ..........................................................................................................................44
III.3 - Barreiras encontradas no desenvolvimento do mercado de derivativos de eletricidade ......................45 III.3.1 - Complexidade do mercado spot........................................................................................................45 III.3.2 - Falta de transparência do preço ........................................................................................................46 III.3.3 - Natureza da eletricidade enquanto commodity .................................................................................46 III.3.4 - Extrema volatilidade do preço à vista da eletricidade.......................................................................47
CONCLUSÃO......................................................................................................................................................48
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INTRODUÇÃO
Até o ano de 1978, quando foram dados os primeiros passos na direção da
liberalização, o mercado de energia elétrica, nos Estados Unidos, era fortemente regulado.
Sua estrutura monopolista era definida de tal forma que o fornecimento e, conseqüentemente,
o consumo eram divididos em áreas determinadas. Algumas empresas receberam a concessão
para atender a cada área, responsabilizando-se por seus clientes exclusivos. Com esse sistema
vigente, os preços eram definidos em tarifas fixas de acordo com os interesses e necessidades
de cada área individualmente e, desta forma, não variavam livremente.
Com a abertura do mercado de eletricidade, todos os seus participantes passaram a se
confrontar com um risco inexistente até o momento. Empresas geradoras, transmissoras e
distribuidoras de energia, além dos consumidores, ganharam uma nova preocupação, a
variação do preço da eletricidade determinada pelas livres forças do mercado.
Esse fenômeno não é um privilégio da indústria de energia elétrica, muito menos dos
Estados Unidos. O mesmo também aconteceu com o mercado das outras commodities de
energia, como o petróleo e o gás natural, em diversos países que optaram pelo caminho da
desregulamentação.
Além do risco de mercado (ou risco de preço) atribuído à volatilidade do preço, a
indústria de energia elétrica, assim como a maioria das indústrias, enfrenta vários outros tipos
de risco. Dentre eles podemos destacar os seguintes riscos: político, operacional, de liquidez e
de crédito. Para mitigar esses riscos foram criados mecanismos operacionais e financeiros.
Nesse contexto, destacam-se os contratos derivativos, que são ferramentas financeiras
utilizadas pelas indústrias, inclusive a de energia elétrica, na gestão de risco de mercado. Sua
principal função é a redução dos prejuízos causados pela variação repentina ou inesperada dos
preços de suas mercadorias e insumos.
Por outro lado, a eletricidade é uma forma de energia singular, que possui
características próprias muito específicas tanto na sua natureza quanto na sua forma de ser
produzida, estocada, comercializada e utilizada.
O objetivo desta monografia é observar a trajetória dos contratos derivativos
relacionados com a indústria de energia elétrica e como foram, são e podem ser usados na sua
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gestão de risco. Para isso é necessária a reunião de vários conceitos sobre risco, juntamente
com os devidos métodos de proteção contra eles. Além disso, é mister a análise e o
conhecimento da eletricidade como forma de energia e como mercadoria.
No capítulo 1, serão apresentados todos os conceitos de risco e os mecanismos para a
sua gestão, com uma maior atenção para o risco de mercado. Ademais, será dada a
oportunidade de conhecimento dos principais contratos derivativos utilizados na indústria de
energia como um todo.
No capítulo 2, observar-se-ão as principais características da energia elétrica que a
tornam a mais nobre das formas de energia e tão diferente das demais. Serão apresentados os
diversos processos pelos quais ela passa até o momento do seu consumo, como geração,
transmissão e distribuição. Será contada também, de forma breve e sintética, a história do
desenvolvimento do mercado de eletricidade e, paralelamente, do mercado de derivativos
relativos a essa indústria. Foi escolhida a economia norte americana simplesmente pela maior
quantidade de bibliografia relacionada com o tema e pelo fato que sua experiência ilustra bem
os fenômenos, da mesma natureza, ocorridos nos demais países.
Finalmente, no capítulo 3, serão apresentados os contratos derivativos utilizados
especificamente na indústria de eletricidade, bem como as principais barreiras encontradas no
desenvolvimento do mercado destes contratos.
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CAPÍTULO I - GESTÃO DE RISCO E O USO DE DERIVATIVOS NA INDÚSTRIA
DE ENERGIA
A idéia de risco está presente em quase todas as situações que se possa imaginar,
desde uma viagem aeroespacial até o simples ato de atravessar a rua. Na economia, também
são encontrados diversos tipos de risco, e as empresas devem reconhecê-los nas suas áreas de
atuação, mensurá-los e, quando possível, eliminá-los. Segundo Motta e Calôba (2002, p.246),
“O risco origina-se de nossa incapacidade de prever o futuro, indicando um grau de incerteza
que é bastante significativo para se tomar consciência dele.”
Com o objetivo de se ter uma idéia maior do que se entende como risco ou incerteza,
foi pesquisado o significado das palavras em diversos dicionários:
• Risco é “a possibilidade de danos físicos, ou materiais, a perda, a probabilidade de
perda, o valor da perda possível.” (Webster´s Unabridged New Universal Dictionary).
• Risco: “1. Perigo ou possibilidade de perigo. 2. Possibilidade de perda ou de
responsabilidade pelo dano.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo
Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1975).
• Incerteza é “a qualidade ou estado de ser incerto, falta de certeza, dúvida.” (Webster´s
Unabridged New Universal Dictionary).
Os tipos de risco que, geralmente, são enfrentados por todo empreendimento podem
ser agrupados nas seguintes categorias:
a) Risco político: que se apresenta na criação de novas regulamentações impostas
pelo governo ou até mesmo na possibilidade de eventuais expropriações.
b) Risco operacional: que leva em consideração o comprometimento do
andamento normal da produção devido a falhas nos equipamentos, incidentes e
acidentes em geral ou qualquer forma de insucesso na operação.
c) Risco de liquidez: que compreende a incapacidade da firma em pagar suas
contas ou de comprar e vender commodities no preço de mercado.
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d) Risco de crédito: que é o risco de não receber as obrigações financeiras devidas
por outros.
e) Risco de mercado: que se caracteriza por mudanças inesperadas na taxa de
juros, na taxa de câmbio ou no preço dos ativos em geral, como ações ou commodities.
Além disso, o futuro financeiro de um empreendimento pode ser radicalmente alterado
por conseqüência do surgimento de eventos imprevisíveis como uma grande recessão,
guerras, ou saltos tecnológicos, cuja probabilidade de ocorrência é impossível de ser
razoavelmente quantificada (mensurada) através dos dados históricos.
As empresas que operam no mercado de petróleo, gás natural e eletricidade são,
particularmente, suscetíveis ao risco de mercado, ou, mais especificamente, ao risco de preço.
Isso se deve à enorme volatilidade dos preços das commodities de energia. De modo geral, os
investidores e gestores de companhias de energia podem calcular a probabilidade de sucesso
na exploração de um campo de petróleo, de fracasso na construção de uma refinaria ou
estimar a performance de geradores elétricos. Existem ferramentas bastante eficazes que
podem ser usadas na gestão desses tipos de risco, como: diversificação dos negócios,
contratos de longo prazo, manutenção de estoque e seguro. Contudo, esses métodos não são
muito apropriados para a gestão de risco de preço.
Quando há uma queda nos preços de energia, os lucros das companhias seguem o
mesmo caminho descendente, fazendo com que aumente sensivelmente a probabilidade e o
risco dos contratos de compra e venda não serem honrados. Sendo assim, o risco de preço das
commodities representa um papel fundamental na indústria de energia e, por isso, o uso de
derivativos vem ocorrendo com uma freqüência cada vez maior e vem se tornando comum no
sentido de auxiliar as empresas de energia, os investidores e consumidores na gestão dos
riscos que ocorrem devido às grandes volatilidades dos preços da energia.
O uso de derivativos1 na industria de energia não representa nenhuma surpresa já que
eles vêm sendo usados com grande sucesso na gestão de risco da agricultura por mais de um
século. Os contratos de derivativos permitem a transferência dos riscos para aqueles
indivíduos ou firmas que possam ou queiram lucrar com esses riscos. Eles se tornaram uma
boa forma dos investidores isolarem seus fluxos de caixa das bruscas flutuações nos preços.
1Derivativos são contratos financeiros baseados em diversos tipos de ativos ou derivados de outros contratos. Eles serão apresentados detalhadamente mais adiante.
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Os participantes que costumam atuar no mercado de derivativos são geralmente
conhecidos como hedgers, especuladores, e arbitradores. Aquele que se protege utilizando um
ou mais tipos de contratos de derivativos com o objetivo de reduzir os seus riscos e,
consequentemente, estabilizar o seu fluxo de caixa é chamado de hedger, e o ato de proteção
em si denomina-se hedge. Um exemplo de hedger seria uma suposta empresa produtora de
petróleo que, com o objetivo de se proteger das oscilações do preço da sua mercadoria,
assumiria uma posição vendida no mercado futuro de petróleo. Em situação contrária, uma
refinaria deveria assumir uma posição comprada no mercado futuro, pois o seu risco é de
elevação do preço (HULL, 1996).
Já o objetivo das operações de especulação é a aposta na variação dos preços. Ao
contrário dos hedgers, os especuladores aceitam correr riscos e ficar expostos a prejuízos,
atuando nas duas posições, comprando ou vendendo contratos futuros. Apesar de serem
considerados “vilões” por determinados segmentos da sociedade, eles possuem uma
importante função, que é a de proporcionar liquidez ao mercado.
Outro participante deste mercado é o arbitrador, que surge nos momentos em que os
preços estão desequilibrados. As operações de arbitragem consistem em obter um lucro sem
risco, através da realização simultânea em dois ou mais mercados. Geralmente a sua atuação
faz com que os preços retornem à sua formação normal, pois ele opera tanto num mercado
quanto no outro, vendendo uma modalidade mais cara e comprando uma mais barata, assim
equilibrando as forças de oferta e demanda nos respectivos mercados. Mais adiante, serão
apresentados os tipos de contratos de derivativos mais utilizados e exemplos de casos mais
específicos, especialmente relacionados com a indústria de energia.
Os mercados de derivativos possuem uma função econômica importantíssima na
medida em que podem ser usados como instrumento de hedge aos diversos agentes
econômicos que podem utilizá-los para administrar os riscos de flutuações de preços. Uma
empresa que conseguir reduzir seus riscos terá mais incentivo para investir mais e,
conseqüentemente, aumentar sua produção e o seu quadro de funcionários. Além disso, num
cenário de risco de prejuízo menor, a tendência dos preços é de se manterem em patamares
mais baixos.
O risco de preço da energia apresenta conseqüências de interesse geral, pois pode
afetar drasticamente todo tipo de investimento feito na indústria de energia. O montante
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investido, atualmente, numa usina elétrica varia de 200 milhões a mais de 1 bilhão de dólares,
enquanto sua construção pode levar de 2 até 7 anos para ser finalizada.
I.1 - Gestão de risco sem derivativos
Existem várias estratégias de redução de risco, que podem ser utilizadas pelos diversos
investidores ou gestores de empresas que são avessos a ele. O primeiro método, que pode ser
aplicado para administrar o risco gerado pela flutuação dos preços, é o uso de contratos de
longo prazo com preços fixados. Com isso, uma firma que investe numa planta de ciclo-
combinado de gás natural poderia simplesmente assinar um contrato de longo prazo com um
fornecedor de gás. Ela fixaria um preço X para comprar o gás natural um ano depois.
Entretanto, ainda existe algum risco nessa estratégia, pois, se o preço da mercadoria no
período da transação, fosse menor que X, essa firma se tornaria pouco competitiva no
mercado na medida em que uma outra firma concorrente poderia comprar o mesmo gás
natural no mercado à vista por um preço mais baixo e, consequentemente, apresentar menores
custos. Por outro lado, o preço de mercado no momento da transação poderia ser maior que X,
beneficiando a firma que fez o contrato. Porém, neste caso, existe o risco do fornecedor não
honrar com sua obrigação e quebrar o contrato de fornecimento da mercadoria ao preço
preestabelecido.
Outra estratégia, que pode ser tomada na gestão de risco, é a diversificação dos
negócios, que, como o nome já indica, consiste em investir numa grande variedade de
empreendimentos que possuam pouca ou nenhuma correlação, podendo ser, até mesmo, em
diferentes localidades. Ela permite que a firma reduza bastante a sua dependência da
performance de uma única indústria ou de um projeto em particular. Em teoria, existem
diversos modelos de diversificação de portfolio que se propõem a indicar uma carteira ótima2
de ativos (MOTTA; CALÔBA, 2002), entretanto, na prática, a diversificação é muito cara, e
falha com freqüência devido ao alto grau de complexidade de gestão de diversos
empreendimentos. De qualquer maneira, é notória a forte influência3 do estado geral da
economia no sucesso da maioria dos projetos industriais, o que torna os diversos projetos e
empreendimentos dependentes de um mesmo fator e sigam juntos pela mesma estrada.
2 Proporciona um retorno esperado máximo para um determinado nível de risco que possa ser suportado pelo investidor ou apresenta um risco mínimo para um retorno esperado desejado. 3 Essa influência pode se dar através da taxa de juros, da taxa de câmbio ou de outras variáveis macroeconômicas, além de inúmeras condições (políticas, institucionais, etc.) presentes na economia.
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Normalmente, a diversificação dos negócios não se mostra uma boa reação ao risco no mundo
real.
Também podemos observar, como uma ferramenta de gestão de risco, o uso de
contratos de seguro. Por exemplo, existe a probabilidade de qualquer uma das máquinas de
uma usina de energia apresentar algum tipo de defeito ou mau funcionamento que possa
inutilizá-la e afastá-la da produção. Essa empresa poderia assinar um contrato de seguro que a
compensaria pelo prejuízo provocado pela redução ou, até mesmo, pela suspensão da
produção causada pela suposta quebra da máquina. Esse tipo de contrato transfere o risco de
quem o “compra”, no caso, a usina de energia, para a seguradora que, por sua vez, aceita o
risco, já que possui uma grande habilidade em pulverizá-lo ou, pelo menos, é menos avessa ao
risco que o seu cliente.
O último método de gestão de risco sem o uso de derivativos apresentado é a
utilização de estoques como uma forma de proteção às bruscas variações nos preços das
commodities em geral e, mais especificamente, as de energia. O consumidor, supostamente
aquela mesma planta de ciclo-combinado de gás natural, poderia comprar o combustível no
período corrente ao preço de mercado e estocá-lo. No caso de uma queda do preço, a usina
poderia continuar comprando o seu insumo no mercado, porém, com uma alta no preço, ela
poderia consumir a quantidade que havia estocado. O problema é que esta estratégia
representa uma forma muito cara de administrar os riscos, pois os custos de estocagem podem
ser consideravelmente altos.
I.2 - Os contratos derivativos
Derivativos são contratos, instrumentos financeiros cuja formação dos preços está
sujeita à variação de preços de outros ativos, mais precisamente, dos seus respectivos “ativos
objeto”. Diferentemente de uma ação, o contrato de derivativo não representa um direito de
posse. Quando alguém compra uma call (opção de compra, que será apresentada
detalhadamente mais adiante) de petróleo, por exemplo, possui o direito de comprar, num
determinado momento futuro, uma certa quantidade da commodity, a um preço
predeterminado que é conhecido como “preço de exercício” ou, do inglês, strike price.
Este contrato de opção não representa o direito de posse sobre o petróleo, mas, apenas
garante, que o seu portador possa comprá-lo a um dado preço, ou seja, o direito é sobre o
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preço de compra. Suponhamos um caso hipotético, no qual o barril de petróleo esteja sendo
negociado no mercado ao preço à vista de $26. Uma opção de compra com um preço de
exercício de $20 dará ao seu detentor o direito de comprar uma determinada quantidade da
commodity pelo preço de $20 por barril. Imediatamente após o exercício do contrato, ele
poderá vender o petróleo por $26 que é o valor à vista de mercado e, neste caso, auferir um
lucro de $6 por barril.
Os ativos que servem como base para os derivativos podem ser commotities físicas
(por exemplo, petróleo e agropecuários, tais como café, boi, milho, trigo, soja, etc.), taxas de
câmbio, ações, índices de ações, taxa de juros, taxas de inflação, ou até mesmo commodities
intangíveis, como os índices relacionados ao clima (por exemplo, índice pluviométrico ou
temperatura ambiente).
As operações com derivativos são amparadas sempre por contratos que assegurem aos
participantes, exercer todos os seus direitos, bem como, lhes impõem certas obrigações. A
data da operação, data do vencimento, data da liquidação, preço, tamanho do contrato, forma
de correção, que estão entre todas as características e condições sob as quais determinada
operação é efetuada, deverão estar previstas no contrato.
Entretanto, não é comum a entrega de um contrato formal, para os participantes do
mercado, contendo as regras de negociação ou descrevendo todos os seus direitos e deveres,
em cada operação fechada por ele. Quando as operações são realizadas em Bolsas, são
entregues notas de corretagem (no caso de operações realizadas através de corretoras) ou
notas de negociação. Estes documentos mostram a adesão dos participantes a um contrato
padrão, que pode ser elaborado pela própria Bolsa ou por outras instituições, onde constam
todas as características e condições da operação. Além dos negócios em bolsa, existe a
possibilidade das partes negociarem diretamente entre si, neste caso, através de contratos
particulares. Alguns desses títulos derivativos são semelhantes aos contratos futuros e de
opções negociados em bolsa, já outros são bem mais complexos.
As Bolsas são instituições privadas sem fins lucrativos que têm como principal
finalidade promover um local adequado às negociações dos diversos ativos previstos de serem
negociados nas mesmas. É através das corretoras, que possuem títulos e são sócias das Bolsas,
que as operações devem ser efetuadas. Estas são concluídas no pregão, onde as corretoras
compram e vendem em viva-voz, ou no pregão eletrônico, no qual as ofertas são apregoadas
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através de um sistema de computador. As operações realizadas fora das Bolsas compreendem
o chamado Mercado de Balcão, no qual as partes podem fechar negócios sem a intermediação
de corretoras (HULL, 1996).
A liquidação das operações pode ser física ou financeira. A primeira ocorre quando o
negócio é liquidado mediante a entrega física da commodity, enquanto a outra é feita através
de um acerto financeiro, pelo diferencial de preço entre compra e venda, sem haver a entrega
física da commodity. A liquidação física consiste na entrega do ativo em negociação na data
do vencimento do contrato. Em muitos casos, especialmente para os especuladores, a
liquidação física pode ser muito dispendiosa ou ainda indesejável, pois o participante pode
não ter nenhum interesse no ativo objeto, sendo o seu único intuito a obtenção do valor do
diferencial entre compra e venda desse ativo. Nesse caso, opta-se pela liquidação financeira
que consiste em um acerto financeiro em relação ao preço à vista do ativo. Se este se
movimentou favoravelmente, o participante receberá um valor correspondente ao saldo
positivo obtido do diferencial entre compra e venda. Caso contrário, o participante pagará o
saldo negativo à sua contraparte.
A seguir, serão apresentados os tipos gerais de contratos derivativos, que são os mais
negociados.
I.2.1 - Contratos a termo
Os Contratos a termo (forward contracts) regulamentam operações de compra e de
venda de um ativo objeto, entre um comprador e um vendedor, para a liquidação física ou
financeira em determinado prazo. O comprador utiliza essa ferramenta para se proteger contra
o risco de uma elevação brusca no preço da commodity, enquanto o vendedor assume a
contraparte da operação com o objetivo de eliminar os riscos relacionados com uma possível
queda no preço de sua mercadoria. Por exemplo, na industria energética, uma suposta
refinaria de petróleo poderia utilizar um contrato a termo para garantir o seu fornecimento de
petróleo cru que seria utilizado em futuras operações. Assim, ao mesmo tempo em que estaria
contornando o problema da alta volatilidade dos preços do petróleo no mercado à vista, ela
evitaria o grande incômodo de estocar a mercadoria por um longo período.
O comprador é aquele que tem posição comprada. Nos contratos onde é prevista a
entrega do ativo-objeto, o comprador tem o direito de recebê-lo, assim como tem a obrigação
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de entregar o dinheiro referente ao preço estipulado, no vencimento do contrato. Ao ingressar
no mercado comprando um contrato, o participante estará abrindo uma posição compradora e
passará a ser conhecido como comprado. Por outro lado, o vendedor é aquele que assume uma
posição vendida. Nos contratos onde é prevista a entrega do ativo-objeto, o vendedor tem a
obrigação de entregá-lo, assim como tem o direito de receber o dinheiro referente ao preço
estipulado, no vencimento do contrato. Ao ingressar no mercado vendendo um contrato, o
participante estará abrindo uma posição vendedora e passará a ser conhecido como vendido.
As posições, tanto compradas quanto vendidas, poderão ser encerradas somente através do
acerto do participante com a sua respectiva contraparte.
No mercado a termo, uma vez efetuada uma operação, não poderá ser transferida para
terceiros, o que torna os contratos a termo intransferíveis. Contudo, existem três modalidades
do contrato que determinam a possibilidade de as operações serem liquidadas antes do seu
tempo, são elas: Contrato a Termo Vontade do Comprador, Contrato a termo Vontade do
Vendedor e Contrato a Termo por Acordo Mútuo. Na primeira, o comprador tem o direito de
liquidar a compra antes do vencimento pagando o preço a termo acertado para a data do
vencimento, podendo haver um deságio proporcional ao prazo restante até o vencimento, um
detalhe que deverá estar devidamente especificado no contrato. Ao contrário, na segunda
modalidade, é o vendedor quem tem o direito de liquidar a venda antes do vencimento. Neste
caso é comum que haja a previsão de deságio já que os vendedores teriam vantagem em
antecipar uma receita prefixada. No último caso, as duas partes deverão concordar em liquidar
a operação antecipadamente, de acordo com as condições por eles estabelecidas.
Podem-se encontrar inúmeras variações nos forwards contracts, no entanto, existem
determinadas características que são comuns a todas elas. Cada contrato a termo especifica o
tipo, a qualidade e a quantidade da commodity, assim como a data e o local nos quais deverá
ser efetuada a entrega. Além disso, deve definir um preço ou uma fórmula que determine o
valor que será pago (ou recebido) pelo comprador (ou vendedor) no momento da liquidação.
Os contratos mais simples costumam apresentar preços fixos predeterminados, enquanto nos
mais elaborados podem ser observados mecanismos de formação de preço que incluem pisos,
tetos e indexadores de inflação. Definindo um preço, vendedor e comprador podem eliminar a
incerteza que envolve o nível de preços da commodity no futuro. Com os preços previamente
conhecidos, fica muito mais fácil para as empresas, que fazem uso dessa ferramenta, o
planejamento estratégico das ações relacionadas com os seus próprios negócios.
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Os contratos a termo têm a vantagem de serem ajustáveis às vontades dos
compradores e dos vendedores que terão a flexibilidade de determinar o prazo e o tamanho
dos contratos, bem como outras condições que julguem ser de seus interesses. Uma delas
pode ser, por exemplo, o estabelecimento das responsabilidades de ambas as partes no caso de
uma delas não cumprir corretamente o combinado, atrasando a entrega, apresentando uma
mercadoria de qualidade inferior, ou agindo de qualquer outra forma não correspondente ao
acordo. Esta flexibilidade é facilitada pelo fato dos contratos serem intransferíveis e é um
forte atrativo para que os players do mercado tenham interesse em utilizá-los.
Por outro lado, os contratos a termo também apresentam alguns problemas. O primeiro
é o fato de que compradores e vendedores precisam encontrar uns aos outros. É evidente a
grande dificuldade de se encontrar contrapartes precisamente com os mesmos interesses,
coincidindo nos mínimos detalhes. Além disso, como os mercados a termo são negociações
particulares, os demais participantes do mercado não têm informações em relação a este
negócio. Os preços praticados não são divulgados formalmente e, com isso, não se sabe
exatamente como está se dando a formação de preços no mercado como um todo. Existe,
também, um grande risco de inadimplência e de não cumprimento do contrato, que estão
relacionados com a ausência de um sistema adequado de garantias. Por fim, se alguma das
partes mudar os seus planos e quiser encerrar sua posição não terá êxito, pois será obrigada a
permanecer no mercado até o vencimento, a não ser que ela esteja disposta a renegociar o
contato e sofrer as devidas penalidades descritas nele.
I.2.2 - Contratos Futuros
Apesar de serem muito parecidos, os contratos futuros podem ser considerados como
uma evolução dos contratos a termo, ou uma adaptação a eles, que foram criados com o
objetivo de sanar os problemas citados anteriormente. Os mercados futuros podem ser
definidos como sendo uma operação de compra e venda de uma determinada quantidade de
um ativo padronizado, por um preço pré-determinado, para liquidação numa data futura.
Diferentemente do contrato a termo, os compradores e vendedores do contrato futuro fecham
negócio com uma Bolsa e não entre eles. Por exemplo, um produtor que deseja vender
petróleo cru em dezembro de 2004, pode vender um contrato futuro de 1.000 barris de WTI
(West Texas Intermediate) para a Bolsa Mercantil de Nova York (NIMEX4) e, por outro lado,
4 New York Mercantile Exchange
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uma refinaria pode comprar dela um contrato futuro de petróleo para dezembro de 2004
(ENERGY INFORMATION ADMINISTRATION, 2002).
As informações dos negócios realizados no pregão são divulgadas publicamente a
todos os participantes do mercado, o que lhes confere total transparência na formação dos
preços, além de informá-los o volume total negociado.
Como as operações no mercado futuro são realizadas nos pregões das Bolsas, o
comprador e o vendedor não ficam presos um ao outro. Uma vez efetuada uma operação, ela
poderá ser transferida para terceiros, o que torna os contratos futuros transferíveis. Desta
forma, é possível que as posições compradas e vendidas sejam encerradas antes do seu
vencimento, através da realização de operações inversas, ou seja, quando um participante que
já esteja em uma posição comprada (ou vendida) realiza uma operação de venda (ou compra),
sua posição é zerada. A possibilidade de transferência das posições entre os participantes faz
com que o mercado de futuros seja muito mais líquido (FORBES, 1986).
Com o objetivo de tornar os contratos intercambiáveis, é feita uma padronização de
suas variáveis, ficando livres para serem apregoadas apenas o preço e a quantidade de
contratos. A padronização começa com ativo-objeto e está relacionada com a qualidade (tipo,
marca, teor de pureza, etc.), o peso, volume, tamanho, o local da entrega, entre outros. Além
dessas variáveis também são padronizadas, a forma de cotação, a variação mínima de
apregoação, os meses de vencimento do contrato, a data e as condições de liquidação, o
último dia de negociação, os ajustes diários, a margem de garantia, os ativos aceitos como
margem e os custos de transação.
Para que o mercado de futuros tenha um bom funcionamento e os seus contratos sejam
negociados com sucesso, é necessária a reunião de certas condições. O mercado a vista deve
ser forte e atomizado, isto é, o ativo objeto deve ter uma grande pulverização tanto para
compradores quanto para vendedores. É importante que não haja monopólio e que exista
bastante liquidez, permitindo a formação correta dos preços. Além disso, para que ocorra uma
boa aceitação pelo mercado, não deve haver controle governamental sobre o preço do ativo, o
que reduziria a confiança na estrutura dos preços e, principalmente, a volatilidade. Sem
oscilação no preço do ativo-objeto, o contrato derivativo perde sua principal função. Por fim,
o ativo deve ser de fácil padronização e é necessário que os participantes do mercado físico
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também atuem nos mercados futuros propiciando uma maior realidade aos preços à vista e
futuro.
Ainda existem outras características importantes que devem ser salientadas.
Primeiramente, o participante do mercado que preferir segurar o contrato até o fim garante o
preço pago no momento da compra, já que, na data de sua liquidação, o preço futuro se iguala
ao preço do ativo no mercado spot. Esta idéia ficará mais clara com a observação do exemplo
adiante. Em segundo lugar, um contrato futuro pode ser vendido mesmo que não se tenha a
posse do ativo e, da mesma forma, pode-se assumir uma posição comprada mesmo que não se
tenha interesse no ativo. Esse comportamento é típico dos especuladores, que costumam
encerrar suas posições antes da liquidação do contrato. No mercado de petróleo, assim como
nos demais, eles proporcionam liquidez e assumem os riscos rejeitados por produtores e
refinarias. Por último, mas certamente não menos importante, há o fato de que utilizando o
contrato futuro, pode-se assumir um compromisso de compra ou venda de grandes
quantidades de petróleo, ou outra commodity, com um capital muito pequeno que é a margem
de garantia.
A margem de garantia é uma determinada quantia exigida pela Bolsa, que os
participantes do mercado de derivativos devem depositar em uma conta através de suas
corretoras. Dependendo da bolsa e do tipo de contrato, podem ser aceitos além de depósitos
em dinheiro, ativos menos líquidos como: moeda estrangeira, ações, ouro, títulos, etc. Ela é
calculada de forma que seja suficiente para cobrir prejuízos previstos para um ou dois dias de
flutuação de preços. Para isso são levadas em consideração variáveis como: o comportamento
histórico do ativo-objeto, cenários macroeconômicos analisados e a taxa de juros. No caso de
perda, esta será paga com a quantia necessária que será retirada da margem. Se o participante
quiser continuar posicionado, terá que efetuar um novo depósito de forma que mantenha uma
margem mínima em sua conta. Se não o fizer, a corretora encerrará automaticamente a sua
posição. Em todos os casos (perda ou ganho) nos quais restar uma parte ou toda a margem de
garantia, esta poderá ser devolvida no encerramento da posição.
Uma diferença fundamental em relação aos mercados a termo, é a existência de ajustes
diários nos mercados futuros. Devido ao grande potencial de variação de preços desde a
abertura até a data de vencimento de um contrato futuro, a Bolsa adota o procedimento de
ajustar diariamente o preço futuro ao qual os participantes estão posicionados, cobrando as
perdas e pagando os ganhos. No fim de cada variação diária, os ganhadores recebem os seus
19
lucros e os perdedores pagam o prejuízo, de forma que as posições sejam ajustadas
diariamente. No dia seguinte ao ajuste todos os participantes estarão posicionados com o
mesmo preço (SILVA NETO, 1997).
Para ter uma idéia mais clara do funcionamento do mercado de futuros observe o
exemplo5 que, apesar de simplificado, ilustra com bastante eficiência os mecanismos e
operações feitas com este instrumento.
A tabela 1 ilustra como os contratos futuros podem ser usados para fixar um preço no
futuro e, conseqüentemente, para garantir a performance do negócio. Suponha que em janeiro,
uma refinaria possa garantir o seu lucro por adquirir 10.000 barris de petróleo cru WTI em
dezembro ao preço futuro, referente ao mês de dezembro, de US$ 28 por barril. Uma forma de
fazer isso é comprar 10 contratos futuros de WTI referentes a dezembro (cada contrato
equivale a 1.000 barris). A refinaria não paga nada pelo contrato, mas precisa fazer um
depósito (margem de garantia) na conta de sua corretora. A NYMEX exige uma margem
inicial de US$ 2.200 por contrato. No decorrer do ano, o preço futuro irá variar de acordo com
novas informações a respeito da demanda e oferta de petróleo.
No exemplo, o preço futuro permanece constante até o mês de maio, quando cai para
US$ 26 por barril. Então, a Bolsa paga o ganho de todos aqueles que venderam contratos
futuros e cobra as perdas dos que compraram. O dinheiro pago por ela vem da margem
depositada pela refinaria e pelos outros compradores. Sendo assim a refinaria é convocada
pela corretora para recompor sua margem, depositando o valor perdido de US$ 20.000. Essa
operação é chamada de “margin call”. As corretoras encerram a posição de seus clientes que
não podem responder a essa chamada de margem vendendo os seus contratos futuros.
Geralmente, a margem inicial é suficiente para cobrir as perdas, mas se não for, quem o faz
são as próprias corretoras. No caso extremo da corretora não ter condições de cobrir a perda
de seu(s) cliente(s), o pagamento é feito pela Bolsa com o dinheiro de fundos criados
especialmente com este propósito.
Após o ajuste, todos os participantes ficam posicionados, comprados ou vendidos, no
novo preço. Isso acontecerá sempre a cada nova mudança de preço no mercado futuro. Em
setembro, o preço do contrato futuro referente a dezembro se eleva para US$ 29 por barril e,
diferentemente da última variação, a refinaria aufere um lucro financeiro de US$ 30.000. No
5 Exemplo retirado do artigo da EIA (2002).
20
mês de outubro o preço sobe para US$ 35 por barril e a refinaria ganha novamente, só que
desta vez uma a quantia de US$ 60.000.
Tabela 1 - Exemplo de operação feita com contrato futuro de petróleo
Preços por barril Situação do Fluxo de Data WTI Spot Futuro contrato caixa
Janeiro $ 26 $ 28 Paga-se a margem inicial na compra
($ 22.000)
Maio $ 20 $ 26 Ajuste: (26 - 28) x 10.000
($ 20.000)
Setembro $ 20 $ 29 Ajuste: (29 - 26) x 10.000
$ 30.000
Outubro $ 27 $ 35 Ajuste: (35 - 29) x 10.000
$ 60.000
Novembro (final)
$35 $ 35 Vencimento $ 22.000
Fonte: EIA (2002, p.7)
No fim do mês de novembro, os preços à vista e futuro (referente a dezembro) do
petróleo tipo WTI, necessariamente, serão idênticos. Desta forma, a refinaria possui duas
opções: pode requerer a entrega física da mercadoria e pagar o preço à vista por ela ou vender
o seu contrato futuro. Nos dois casos, a margem de garantia é devolvida. Se a refinaria optar
pela primeira opção, pagará US$ 35 por barril, ou US$ 350.000. Contudo, considerando o
lucro financeiro de US$ 70.000 (US$ 30.000 + US$ 60.000 – US$ 20.000) recebido pelas
transações no mercado futuro, efetivamente, ela acabará pagando US$ 28 por barril [(US$
350.000 – US$ 70.000) / US$ 10.000]. Este é exatamente o preço futuro referente a dezembro
pago em janeiro. Se a refinaria desistir da mercadoria e apenas vender o contrato futuro, ficará
com o lucro de US$ 70.000.
I.2.3 - Opções
No mercado de opções, é negociado o direito de compra ou venda de um ativo numa
data futura, por um preço pré-determinado. Uma importante característica desse contrato é
que ele permite que o seu detentor tenha um direito sobre algo, mas, diferentemente dos
outros contratos, não o prende a nenhuma obrigação. O titular da opção é quem compra o
contrato e, com isso, adquire um direito. Já o participante que vende uma opção é conhecido
como lançador da opção e, ao fazê-lo, assume uma obrigação. Para obter essa vantagem sobre
o lançador, o titular deve pagar-lhe o prêmio da opção, que é o preço negociado entre as
21
partes. No caso de não exercer o seu direito, o titular perde apenas o prêmio que pagou pela
opção.
Outra diferença deste em relação ao mercado futuro é que, no caso do titular, as
margens de garantia e os ajustes diários que desestimulam muitos participantes, são
substituídas por um único pagamento inicial, que representa sua perda máxima. A margem de
garantia deve ser depositada apenas pelo lançador, pois é o único que oferece risco de não
cumprimento do contrato (HULL, 1996).
Esses contratos são divididos em duas categorias: opção de compra e opção de venda.
A primeira, também chamada de call, é o contrato que dá o direito ao titular de comprar o
ativo objeto numa data futura a um preço pré-determinado. Neste caso o lançador assume a
obrigação de vendê-lo nas mesmas condições. Inversamente, a segunda, também conhecida
como put, é o contrato que dá o direito ao titular de vender o ativo-objeto numa data futura a
um preço pré-determinado. De forma análoga à primeira, o lançador assume o dever da
compra. O preço definido no contrato, pelo qual será transacionado o ativo-objeto, é
conhecido como strike price ou preço de exercício.
Por exemplo, suponha que a opção de compra de 1.000 pés cúbicos de gás natural a
um preço de US$ 3,40 no próximo mês de dezembro esteja custando, hoje, US$ 0,14. Quando
chegar o dia do vencimento do contrato, poderão ocorrer três situações:
Se a mercadoria custar exatamente US$ 3,40, ou seja, se o preço no mercado spot for
igual ao strike price, será indiferente para o titular exercer ou não o seu direito. De qualquer
forma, seu gasto total será de US$ 3,54 exercendo seu direito ou não exercendo e comprando
a mercadoria à vista. Neste caso, pode-se dizer que é uma opção at the money, ou no dinheiro.
Se a mercadoria custar menos de US$ 3,40, ou seja, se o preço no mercado spot for
menor que o preço de exercício, o titular vai preferir não exercer o seu direito, pois poderá
comprar o ativo no mercado à vista por um preço mais barato. Ao desistir, o titular perde
apenas o que pagou como prêmio, no exemplo, US$ 0,14. Esta opção é chamada de out of the
money, ou fora do dinheiro.
Se a mercadoria custar mais de US$ 3,40, ou seja, se o preço no mercado spot for
maior que o strike price, o titular exercerá o seu direito, pois poderá comprar o ativo por um
preço mais barato que o à vista. Esta opção é chamada de in the money, ou dentro do dinheiro.
22
Apesar do titular optar por exercer o seu direito, ele só auferirá um lucro positivo quando o
preço à vista da mercadoria for maior que a soma do prêmio da opção com o preço de
exercício. No exemplo, se o preço à vista for igual a US$ 3,64, o lucro será de US$ 0,10. Já
no caso da mercadoria custar US$ 3,54, o lucro será nulo, pois seu gasto com o prêmio de
US$ 0,14 mais o exercício de US$ 3,40 será igual ao preço à vista. O detentor dessa call terá
prejuízo se o preço à vista do ativo estiver entre o preço de exercício e a soma deste com o
prêmio da opção. O ganho financeiro recebido pela diferença entre os preços é suficiente para
compensar apenas uma parte do dinheiro gasto com o prêmio.
Com a ajuda do exemplo é possível ver claramente que o titular de uma call, assim
como de uma put, pode limitar a sua perda ao prêmio da opção. Estes contratos são utilizados
com bastante sucesso na definição pisos e tetos para os preços. Contudo, em determinadas
situações o custo pode ser bem alto.
As opções podem ainda ser dos tipos americano ou europeu. As opções americanas
permitem que o titular exerça o seu direito em qualquer data até o vencimento do exercício.
De forma mais rígida, as opções européias dão ao titular o direito de exercício apenas na data
de vencimento.
Além disso, pode-se classificar esses contratos quanto ao seu objeto. Podem ser
opções sobre disponível, que têm como objeto do contrato o próprio ativo-objeto (ações, taxa
de juros, câmbio, commodities, etc.) ou opções sobre futuro, cujo objeto é um contrato futuro
de um determinado ativo-objeto.
Para finalizar este tópico, apresentar-se-á as diversas variáveis cujo comportamento
influencia a determinação do prêmio de uma opção. No caso que está sendo estudado, o
mercado de derivativos relacionados com a industria de energia, existem 5 importantes: a) o
preço de exercício; b) o preço do ativo-objeto no mercado à vista; c) a volatilidade do preço
do ativo-objeto; d) o prazo até o vencimento; e) a taxa de juros. Elas são as mesmas que
influenciam os prêmios, tanto da call tanto da put (HULL, 1996).
Observemos, primeiramente, o que acontece no caso de uma opção de compra:
a) Preço de exercício (strike price): Por representar uma possível despesa para o
titular da opção e, inversamente, uma possível receita para o lançador, o primeiro
participante demandará mais e, conseqüentemente, estará mais disposto a pagar mais
23
caro por uma opção que tenha um preço de exercício menor. Ou seja, ele pagará mais
no presente para ter o direito de comprar no futuro por menos. Já o segundo exigirá
receber um prêmio maior no presente em troca de assumir a obrigação de vender a
mercadoria no futuro por um preço mais baixo, um menor preço de exercício. Visto
isso, pode-se chegar à conclusão de que numa call, quanto menor o preço de exercício,
maior será o prêmio da opção.
b) Preço do ativo objeto no mercado à vista: Conforme o preço à vista da
mercadoria se eleva, maiores são as chances da opção permanecer in the money
(dentro do dinheiro) e, com isso, maior a probabilidade do titular exercer o seu direito
com ganho e do lançador ser exercido com perda. Nesse caso o titular estará disposto a
pagar mais por isso enquanto que o lançador exigirá um prêmio maior. Assim, o
prêmio da opção será maior quanto maior for o preço à vista do ativo-objeto. Num
período de alta do preço do petróleo, por exemplo, haverá um acompanhamento desse
movimento também por parte dos preços das opções de compra da commodity.
c) Volatilidade do preço do ativo objeto: a existência da volatilidade dos preços
das mercadorias é a principal motivadora da criação dos contratos de derivativos,
devido ao alto grau de incerteza gerado por ela. Costuma-se dizer que o titular de uma
call compra volatilidade, pois quanto mais volátil for o preço do ativo-objeto, maior
tenderá ser o ganho esperado pelo exercício desta opção. Isto ocorre devido ao fato de
que quanto mais alto for o valor atingido pelo ativo, maiores serão os ganhos do
detentor da opção de compra. Por outro lado, a sua perda não aumenta com a queda do
preço à vista da mercadoria, limitando-se apenas ao prêmio pago pela call que, na pior
das hipóteses, não será exercida. Por exemplo, suponha uma opção de compra cujo
preço de exercício seja $50 e que seu ativo-objeto possua um valor esperado à vista de
$80 na data do vencimento. Consideremos duas hipóteses:
i) Se a volatilidade do preço do ativo for nula, concluímos que a call valerá $306
no seu vencimento.
ii) Se houver 50% de probabilidade do preço à vista do ativo-objeto ser $120 ou
$40 (note que o ativo-objeto continua tendo um valor esperado à vista de $80),
existirá uma chance de 50% de a opção valer $70 e a mesma chance dela virar pó,
6 valor esperado da call = Max [preço à vista - preço de exercício ; 0] = Max [80 - 50 ; 0] = 30.
24
ou seja, não ser exercida. Neste caso, o valor esperado da call na data do seu
vencimento será $357 e, portanto, maior que no caso anterior.
Pode-se concluir então que quanto maior a volatilidade do ativo-objeto, maior será o
prêmio da opção.
d) Prazo até o vencimento: a matemática financeira nos mostra que quanto maior for o
prazo até a data de vencimento da opção, menor será o valor presente do preço de
exercício. Por representar uma possível despesa para o titular no futuro, quanto maior
o prazo, melhor será sua posição. Inversamente, pelo fato do preço de exercício da call
representar uma possível receita para o lançador no futuro, sua posição será pior na
medida em que o prazo for maior. Além disso, um prazo maior até o vencimento
favorece a existência de uma volatilidade maior, favorecendo ainda mais a situação do
titular. Podemos concluir então que quanto maior for o prazo até o vencimento, maior
será o prêmio da opção, pois o titular estará disposto a pagar um preço maior por ela e
o lançador exigirá um valor mais elevado.
e) Taxa de juros: igualmente, neste caso, a matemática financeira nos mostra que quanto
maior for a taxa de juros até o vencimento, menor será o valor presente do preço de
exercício da opção de compra. De forma análoga ao item anterior, o titular da call
estará mais disposto a pagar um prêmio alto por ela, da mesma forma que o lançador
cobrará um valor maior. Conclui-se então, que quanto maior a taxa de juros, maior
será o prêmio da opção.
No caso de uma opção de venda, essas variáveis atuam de forma inversa, com exceção
da volatilidade, que continua atuando numa relação direta com o prêmio da opção, exatamente
como ocorre com uma call. Agora, o titular é o vendedor do ativo-objeto e,
conseqüentemente, terá como possível receita, o preço de exercício.
Quando este aumenta, o prêmio da opção fica mais caro. Já, se o preço à vista do ativo
objeto for baixo, haverá uma maior chance de exercício da put, aumentando a disposição do
titular pagar mais por ela e a exigência por parte do lançador de um prêmio maior. Portanto,
quanto menor for o preço à vista do ativo-objeto, maior será o prêmio de uma opção de venda.
7 valor esperado da call = 0,5 x Max [preço à vista1 - preço de exercício ; 0] + 0,5 x Max [preço à vista2 - preço de exercício ; 0] = 0,5 x Max [120 - 50 ; 0] + 0,5 x Max [40 – 50 ; 0] = 0,5 x (70 + 0) = 35.
25
Em relação à taxa de juros, quando ela aumenta, diminui o valor presente do preço de
exercício, piorando a situação do titular, incentivando-o a pagar menos pela opção.
O prazo de vencimento, em relação a uma opção de venda, apresenta uma
peculiaridade. Ele gera dois efeitos contrários sobre o prêmio da opção: em primeiro lugar,
quanto maior o prazo até o vencimento, maior será a volatilidade do ativo, o que faz com que
o prêmio da opção seja mais alto. Por outro lado, um prazo maior diminui o valor presente do
preço de exercício, reduzindo também o valor da put. Portanto, o efeito final desta variável é,
a priori, desconhecido, pois dependerá da intensidade de cada tipo de influência que faz sobre
o prêmio de uma opção de venda.
A tabela 2 apresenta de forma resumida o efeito de cada variável sobre o prêmio das
opções de compra e venda.
Tabela 2 - Relação entre as variáveis e o prêmio das opções
PE PA σ t i call - + + + + put + - + ? -
Observações: Preço de exercício (PE); Preço à vista do ativo-objeto (PA); Volatilidade (σ); Prazo até a data de
vencimento (t); Taxa de juros (i).
Fonte: Elaboração própria.
I.2.4 - Swaps
Em sua forma mais comum, o swap é um contrato no qual os participantes do mercado
combinam uma troca de fluxos de caixa entre eles, de acordo com uma fórmula de cálculo
definida previamente que depende de uma ou mais variáveis objeto. Existem vários tipos de
swaps, sendo os mais comuns, e mais utilizados, os swaps de taxas de juros, swaps de
moedas, swaps de commodities, entre outros.
Os swaps podem ser prorrogáveis, no qual uma das partes tem o direito de prorrogá-lo
além do prazo predeterminado, ou canceláveis, neste caso, existe a opção para uma das partes
de encerrar o contrato a qualquer momento antes do prazo previsto. As possibilidades para a
criação de diferentes tipos de swaps são ilimitadas, pois podem ser criados exatamente de
26
acordo com as necessidades das contrapartes. Essa flexibilidade se dá pelo fato destes
contratos serem negociados no mercado de balcão.
Da mesma forma que em relação aos demais contratos derivativos, o nosso maior
interesse está nos swaps de commodities, mais precisamente, nos relacionados com a indústria
de energia. Em Bush e Johnston (1998), é apresentado um exemplo muito bom sobre este
assunto, que trata de um swap de petróleo. Este contrato é, geralmente, negociado por
produtores e consumidores de petróleo através de uma instituição financeira, que funciona
como intermediária, permitindo desta forma, que as contrapartes permaneçam anônimas.
Quando um produtor de petróleo espera uma queda no preço de seu produto, ele pode pagar
um preço flutuante, por barril, para o intermediário e, em troca, receber um preço pré-fixado.
Na outra ponta, o consumidor, que pode ser uma refinaria, temendo um aumento do preço do
insumo, pagará um preço fixo e receberá um preço flutuante, também, do intermediário, que
pode ser um banco. Desta forma, o produtor poderá fixar o seu ganho com a venda do
petróleo, protegendo-se de uma possível queda do preço no mercado spot, enquanto a
refinaria poderá, da mesma forma, fixar o seu gasto, protegendo-se de um possível aumento
do preço à vista do petróleo. As duas pontas do contrato abrem mão da possibilidade de
obterem um lucro extraordinário com a variação do preço da commodity em troca da
oportunidade de minimizarem o risco de preço do petróleo.
Suponha que Pt seja o preço à vista do petróleo no período t. Se o produtor e a
refinaria tiverem interesse em fixar, respectivamente, seu ganho e seu custo em $40, por
exemplo, o produtor trocará Pt por $40 enquanto a refinaria trocará $40 por Pt. Para qualquer
valor que Pt possa assumir, ambos atingirão os seus objetivos. Se Pt > 40 o lucro
extraordinário que seria auferido pelo produtor será compensado, exatamente, pela perda
financeira do swap e o prejuízo da refinaria será coberto pelo lucro obtido com o derivativo.
Inversamente, no caso de se ter um Pt < 40, o resultado da operação com o swap, compensará,
respectivamente, o prejuízo e o lucro do produtor e da refinaria de petróleo.
27
CAPÍTULO II - O MERCADO DE ENERGIA ELÉTRICA E SUAS
ESPECIFICIDADES
II.1 - Características da eletricidade
Na busca de uma melhor compreensão do mercado de energia elétrica e de todas as
transações que possam envolvê-la, é necessário, em primeiro lugar, conhecermos um pouco
melhor as características dessa commodity tão especial. Devemos observar suas
especificidades que fazem com que ela seja considerada uma fonte nobre de energia.
A eletricidade é uma forma de energia, assim como as energias química, nuclear,
hidráulica, além do calor, do trabalho e da iluminação. As diversas formas de energia podem
ser classificadas como sendo um potencial a ser realizado ou um potencial que já foi (ou está
sendo) realizado.
As primeiras podem ser consideradas como estoques de uma energia que ainda se
encontra contida nos combustíveis (fósseis, nucleares e biomassa). A energia elétrica, assim
como todas as outras pertencentes ao segundo grupo, é um fluxo de energia, ou seja, é a
realização (ou atualização) dos estoques. Essa energia real (ou atual) é grada através da
conversão das energias potenciais. Pode-se dizer que estas formas de energia se encontram em
um estágio mais avançado na cadeia energética.
As formas de energia apresentadas possuem características muito parecidas, contudo,
existe uma boa forma de diferenciá-las e selecioná-las através de sua qualidade. Toda forma
de energia pode ser dividida em duas partes: exergia e anergia. A parcela que pode ser
completamente transformada em trabalho é a exergia, enquanto que a outra é a parcela que
não pode sofrer tal transformação. Quanto maior for a proporção de exergia (e menor a de
anergia) numa forma de energia, maior será sua qualidade. É justamente isso que torna a
energia elétrica a mais qualificada dentre todas as outras, já que ela é constituída totalmente
por exergia (BICALHO, 2003).
A energia elétrica é uma forma (ou fonte) de energia muito especial porque, ao mesmo
tempo em que pode ser transformada facilmente em outras formas de energia, com maior
limpeza e eficiência, ela apresenta uma grande dificuldade em ser estocada, não havendo nos
dias de hoje, uma forma economicamente viável de fazê-lo em grande quantidade.
28
Por ser um fluxo, algo que se movimenta no tempo e no espaço, a eletricidade
apresenta atributos temporais e espaciais. Devido à impossibilidade de estocagem da
eletricidade, além da intensidade e do tempo de duração, o momento no qual a energia é
gerada é determinado pelo consumo. Isso quer dizer que o uso e a geração da energia elétrica
ocorrem simultaneamente (simultaneidade). Desta forma, qualquer fenômeno que ocorra com
o consumo produz um efeito imediato (instantaneidade) na geração e vice-versa, pois uma
queda repentina na capacidade geradora certamente causará a interrupção do uso de energia
de algum consumidor. Esta forte interdependência técnica entre os participantes do mercado é
causadora de importantes efeitos econômicos que serão apresentados mais adiante.
Além de serem simultâneos e de apresentarem uma forte interdependência e
instantaneidade, o consumo e, conseqüentemente, a geração possuem outros atributos
temporais, tais como:
• Temporaneidade: O consumo de energia elétrica não ocorre em pontos discretos no
tempo ou instantaneamente. Seu uso é feito de forma contínua e possui uma certa
duração dependendo da necessidade do consumidor. Por serem simultâneos os
processos, a geração de eletricidade também é contínua e possui uma duração no
tempo.
• Temporalidade: Além da duração, a geração e o consumo apresentam uma localização
no tempo. Isto é importante na medida em que se pode, mais que isso, deve-se
observar os períodos em que ocorrem os picos ou as bases no consumo de energia
elétrica.
• Intensidade temporal: A intensidade do fluxo de energia elétrica é medida pela
potência (expressa em Watts) gerada ou utilizada num determinado período de tempo.
Ela sua unidade de medida é o Watt-hora (Wh) e seus múltiplos8: KWh, GWh ou
TWh.
• Regularidade temporal: Ela diz respeito ao comportamento da intensidade no tempo,
que por sua vez, é determinada pela forma da qual se usa a eletricidade. O consumo
residencial, por exemplo, apresenta uma variação de intensidade muito grande ao
8 1 KWh = 1000 Wh; 1 MWh = 1000 KWh; 1 GWh = 1000 MWh; 1 TWh = 1000 GWh.
29
longo do dia, com alguns horários de pico. Já o uso industrial apresenta uma boa
regularidade na intensidade da energia consumida, que ocorre diariamente no período
de operação da empresa, e da sua duração.
Diferentemente do tempo, no qual a geração e o uso da energia elétrica são idênticos,
estes processos ocorrem em diferentes locais no espaço, isto é, cada um possui uma
localização distinta. Para que isso ocorra, já que são dependentes um do outro, é necessário
que exista uma interconexão entre eles, ou seja, deve haver um determinado espaço ligando as
duas pontas. Esta distância entre a geração da eletricidade e sua utilização é medida pela sua
extensão (BICALHO, 2003).
Da mesma forma que o fluxo de energia se dá com certa intensidade e regularidade no
tempo, isso também ocorre em relação ao espaço. Estes atributos são conhecidos,
respectivamente, como densidade (ou intensidade espacial) e homogeneidade (ou regularidade
espacial).
Em suma, os atributos que caracterizam bem a relação entre geração e consumo, e que
determinam toda a dinâmica do mercado de eletricidade, são a simultaneidade a
instataneidade e a continuidade espacial. Sua estrutura técnica, política e econômica é
construída integralmente baseada na forte interdependência gerada pelo fato de que a geração
de energia elétrica ocorre no mesmo instante do seu consumo, além destes processos
causarem efeitos imediatos um no outro e serem espacialmente integrados.
Antes do seu consumo, que é quando se transforma em outros tipos de energia (calor,
trabalho, iluminação, etc.), com o objetivo de suprir as diversas necessidades de seus usuários,
a energia elétrica passa por mais três processos diferentes: geração, transmissão e distribuição.
II.1.1 - Geração de eletricidade
A geração da eletricidade é feita através da conversão de energia mecânica para
energia elétrica. O gerador elétrico é o responsável por realizar esta transformação e, para tal
finalidade, faz uso da relação existente entre magnetismo e eletricidade. Através deste
processo, a energia elétrica é gerada nas centrais elétricas.
30
A energia mecânica que será utilizada na conversão pode ser criada de diversas
formas, sendo as turbinas os dispositivos mais importantes para isso. Tais aparelhos atuam na
conversão para energia mecânica, da energia cinética contida no movimento de determinado
fluido (gás, vapor, água líquida). De acordo com o tipo de fluído utilizado, elas podem ser
classificadas como turbina hidráulica, a gás, a vapor, etc.
A geração feita no mundo de hoje, em maior escala, pode ser dividida, basicamente,
em três tipos:
• Geração térmica: Quando se utiliza a turbina a vapor, a água é aquecida pelo calor
gerado com a queima de diversos tipos de combustíveis (carvão, derivados de
petróleo, biomassa, gás natural, etc), passando do estado líquido para o vapor. Este
último, então, será usado na turbina para girar o eixo conectado ao gerador. No caso
de uma turbina a gás, o ar é previamente comprimido para que seja aquecido
posteriormente por um combustível nobre (gás natural ou destilados leves). Isso gera
um gás de combustão que passará pela turbina gerando eletricidade.
• Geração termo-nuclear: Apesar de também utilizar turbinas a vapor, este processo de
geração é tratado de forma separada, devido à alta complexidade de sua construção e
operação. Nela, o que aquece a água para transformá-la em vapor é um reator nuclear.
• Geração hidráulica: Neste caso a energia mecânica que será convertida em eletricidade
é retirada de um fluxo de água. Apesar da possibilidade de se estocar uma certa
quantidade de água nas represas, o poder de decisão existe apenas no momento da
saída da água do estoque. A entrada no estoque depende da natureza, que apresenta
um comportamento aleatório e é justamente por isso que o insumo da energia
hidrelétrica é considerado um fluxo que depende de períodos favoráveis ou
desfavoráveis em termos pluviométricos.
II.1.2 - Transmissão
A eletricidade é levada em grande quantidade dos geradores, para serem distribuídas
nas diversas áreas de consumo, através do sistema de transmissão. Ela é transmitida a uma
voltagem muito alta, pois dessa forma, maiores distâncias podem ser percorridas e as perdas
31
reduzidas. Os centros de controle gerenciam os fluxos e suas interconexões, garantindo sua
operacionalidade e segurança.
II.1.3 - Distribuição
Depois de passar pelo sistema de transmissão, a eletricidade é distribuída para todos os
seus usuários. O sistema de distribuição não se resume apenas à “entrega” da mercadoria,
sendo constituído por: subestações que alimentam os circuitos primários, além dos próprios;
transformadores de distribuição; circuitos secundários, incluindo os serviços aos
consumidores; e os dispositivos de segurança e controle adequados à continuidade do serviço.
II.2 - O mercado de energia elétrica e sua evolução
A estratégia e os mecanismos de gestão de risco são uma das áreas que mais se
desenvolveram na indústria de energia após a liberalização do mercado de eletricidade. Isso
pode ser constatado, não apenas como um fenômeno isolado que ocorrera nos Estados
Unidos, mas também como um acontecimento global. Em diversos países ao redor do mundo,
nos quais houve uma “abertura” do comércio de energia elétrica, se deu um considerável
crescimento na criação e implantação de instrumentos de gestão de risco.
Em um mercado regulado pelo governo, não há necessidade alguma do uso de
ferramentas de gestão de risco de preço. Este fato é observado por Sioshansi (2002, p.450) ao
informar que “[...] risk management, tend to be relatively unimportant functions in regulated
markets with fixed prices and captive customers.”
Só faz sentido cogitar a idéia da comercialização (trading) de eletricidade e do uso de
instrumentos de gestão de risco, em um ambiente no qual o preço do ativo negociado seja
definido pelas livres forças de mercado, isto é, pelo comportamento da oferta e da demanda
ou, até mesmo, pela expectativa de sua atuação no futuro.
O surgimento da possibilidade do consumidor passar a escolher com quem irá
negociar, ou de quem comprará a eletricidade de que necessita, é um grande incentivo para a
introdução dos mecanismos já citados. Porém, o mais importante fator determinante para a
32
aplicação de tais instrumentos de gestão de risco é a alta volatilidade do preço das
commodities de energia, que pode ser observada historicamente.
O artigo da EIA (2002) nos mostra que os preços de energia apresentam uma
volatilidade maior do que os preços de outras commodities. Para chegar a esta conclusão, foi
observado o comportamento dos preços à vista de diversas mercadorias como açúcar, ouro e
petróleo, além do S&P 500, um índice de preços de ações negociadas nos EUA. O período
escolhido para a análise foi o de janeiro de 1989 até dezembro de 2001. Enquanto os demais
seguiram alguma tendência, o preço do petróleo apresentou uma flutuação por demais
aleatória.
A energia elétrica, especialmente, está sujeita a grandes variações no seu preço devido
a grandes transformações na demanda causadas por variações nas condições climáticas. Sua
situação se torna ainda mais grave devido à impossibilidade de sua estocagem, o que faz com
que a negociação da mercadoria seja virtual e a entrega ocorra apenas no momento do uso.
Junto com sua forte interdependência, essa diferença temporal entre a compra e a entrega
torna o mercado mais influenciado por expectativas, aumentando desta forma o grau de
incerteza e, conseqüentemente, a sua volatilidade. Ademais, a geração de eletricidade em
casos de emergência também é muito limitada e, quando possível, se apresenta como uma
opção bem cara.
Isso explica a observação de grandes picos nos preços da eletricidade, desde 1999, em
diversas regiões dos Estados Unidos tais como midwest, Pennsylvania-Maryland-New Jersey,
o litoral de Califórnia-Oregon e Pablo Verde. Também foi observada uma grande volatilidade
no preço da eletricidade na região da Costa Oeste, no inverno e na primavera de 2001
(ENERGY INFORMATION ADMINISTRATION, 2002). Todavia, estes não são casos
isolados da economia norte americana. Existem muitos registros de variações similares nos
preços da energia elétrica em diversas partes do planeta, dentre as quais podemos citar
Austrália, Reino Unido e Canadá (SIOSHANSI, 2002).
A volatilidade diária do preço é obtida a partir de uma base de dados com uma série
histórica dos preços do ativo. Depois de encontrada a variação percentual do preço, calcula-se
o desvio padrão, que é uma medida de dispersão cujo objetivo é medir o quanto esta variação
atinge valores diferentes e afastados da variação percentual média diária do preço. No caso de
uma variável aleatória que tenha distribuição normal, aproximadamente 68% das variações
33
percentuais do preço apresentarão um valor entre µ-σ e µ+σ (onde µ e σ representam,
respectivamente, a média e o desvio padrão). Caminhando na direção das extremidades da
distribuição, aproximadamente 95% e 99% alcançarão valores entre µ-2σ e µ-2σ, no primeiro
caso, e entre µ-3σ e µ-3σ no segundo (HILL; GRIFFITHS; JUDGE, 1999). A volatilidade é,
normalmente expressa numa base anual de 252 dias úteis, portanto a volatilidade anual é
calculada multiplicando-se a volatilidade diária por 12,87 (que é igual a 252 ).
A reestruturação do mercado de eletricidade, na passagem de uma situação baseada na
regulação para uma estrutura de concorrência, deve ser feita com muito cuidado devido às
suas singulares características e às especificidades de sua mercadoria. Além dos econômicos,
a oferta e o uso da energia elétrica envolvem grandes interesses políticos e sociais que, junto
com a forte interdependência presente nesse mercado, fazem com que a reestruturação não
seja uma tarefa fácil de ser realizada.
Inicialmente, deve-se observar o que significa um mercado competitivo. De acordo
com o seu conceito mais puro, a concorrência perfeita é caracterizada por um mercado
atomizado e homogêneo, ou seja, uma estrutura composta por um grande numero de pequenos
participantes que não possuam nenhum poder de influência individual e que compartilhem das
mesmas condições. Nesta situação, não há barreiras à entrada nem à saída e as firmas atuam
com o único objetivo de garantirem a própria sobrevivência (VARIAN, 1999).
Contudo, este cenário ideal apresentado pela teoria microeconômica, com exceção do
mercado financeiro e das feiras livres, apresenta uma dificuldade (em maior ou menor escala)
de ser aplicado ou encontrado na prática. No mundo real, as relações comerciais e os
interesses individuais e coletivos são muito mais complexos, principalmente no mercado de
eletricidade, já que este apresenta uma forte interdependência sistêmica.
Com o objetivo de se realizar uma boa transição de uma mercado regulado para uma
situação concorrencial, é preciso rever o conceito de concorrência de uma forma mais realista
e factível. Devido às suas características bem peculiares, “em um mercado elétrico vão estar
sempre presentes doses de mercado, enfrentamento e autonomia, assim como de instituições,
cooperação e centralização” (BICALHO, 2003, p.3).
Um mercado como o de eletricidade não pode constituir-se apenas de um somatório de
relações bilaterais movidas por interesses unicamente individuais dos participantes. Nele,
34
devem existir ações coordenadas, decisões conjuntas que transcendem as individualidades.
Para isso, as instituições assumem um papel fundamental na questão de como deve ser
configurado o contrato coletivo que irá reger a dinâmica desse mercado.
Um grande gerador de risco nesse mercado é a existência de uma lacuna temporal
entre a negociação do contrato de fornecimento e o uso efetivo da energia. Isso causa uma
enorme incerteza nos agentes e, ainda, levanta as questões de quem deve arcar com o ônus
desse risco e se ele deve ser gerenciado individualmente ou em conjunto.
Em teoria, as empresas apresentam melhores condições de lidarem com este tipo de
situação do que os consumidores, portanto esta responsabilidade deveria ficar a cargo delas.
Entretanto, devido às singulares características do mercado de eletricidade, isso não se dá na
prática e, no caso de falha no controle do risco pelas empresas, todo o sistema fica exposto,
inclusive os consumidores.
Diferente do que ocorre com outras mercadorias, o mercado à vista da eletricidade
funciona como um mercado futuro. Como essa energia não pode ser estocada e é produzida
no instante do seu consumo, sua negociação é feita antes de sua geração, baseada numa
demanda prevista e numa oferta estimada. Pode-se dizer que o que é vendido não é o produto
em si, mas uma parte da capacidade produtiva em determinado momento, por um certo
período de tempo.
Um mercado à vista convencional é constituído pela negociação de uma mercadoria, já
produzida, que é oferecida e demandada naquele momento. Por sua vez, em um mercado
futuro, são negociadas quantidades exatas, pré-definidas no contrato futuro, a um preço
combinado.
A comercialização de eletricidade é feita virtualmente através de contratos, pois de
acordo com as suas características de simultaneidade e instantaneidade, sua produção e sua
entrega ocorrerão somente no momento do consumo. Sua principal diferença em relação aos
contratos futuros é que no mercado spot de energia elétrica, a quantidade comprada não é fixa,
ela depende da demanda efetiva (ex-post).
O mercado de eletricidade é formado por uma grande rede à qual estão conectados
todos os seus participantes. Isso gera uma forte interdependência entre os agentes na medida
35
em que as decisões tomadas por alguns deles afetam o sistema como um todo. Daí surge a
necessidade de coordenação aliada à competição.
Como exemplo de interdependência, suponha uma rede com cinco pontos de
interconexão (A,B,C,D e E). Se o participante que está no ponto A decidir comprar
eletricidade de outro que está no ponto D, não é possível, tecnicamente, que o montante de
energia gerado seja direcionado do ponto D para o A. Ele será “injetado” no sistema pelo
ponto D (que neste caso é o ponto de entrada), poderá percorrer qualquer trajetória podendo
passar, inclusive, por todos os outros pontos, até chegar ao ponto D (ponto de saída), onde
será retirada da rede e utilizada.
Este exemplo nos mostra de forma ilustrada o que acontece no caso de apenas uma
transação bilateral de eletricidade. Quando ocorrem várias delas, toda energia gerada entra ao
mesmo tempo no sistema, da mesma forma que toda a energia utilizada é retirada dele. Nessa
ação conjunta, não há nenhuma distinção entre a eletricidade gerada por A, B ou C, então, no
momento da transação real da mercadoria, os negócios bilaterais tornam-se coletivos.
Para um sistema elétrico funcionar com perfeição, ele deve apresentar um equilíbrio
estático, no qual toda a carga ofertada de forma agregada seja idêntica ao somatório do que
for consumido naquele momento (desconsiderando a fração perdida na transmissão). Porém,
somente este tipo de equilíbrio não é suficiente. Além de combinar exatamente o montante
ofertado e demandado em cada período, o sistema deve estar preparado para acompanhar as
mudanças da demanda ao longo do tempo. Isto se faz necessário porque as linhas de
transmissão possuem um limite de capacidade que, ao ser atingido, pode causar um problema
no sistema como um todo. Não é possível que haja um sistema baseado na simples soma de
várias decisões bilaterais. As ações devem ser coordenadas no sentido de se garantir a sua
integridade.
O fato do transporte de energia apresentar um limite e de que este existe para todos, ao
mesmo tempo devido à interconexão de todo o sistema, a decisão de se gerar e consumir certa
carga de energia afeta a situação dos demais participantes, na medida em que se torna,
também, um fator limitante desta mesma decisão.
Um sistema bem preparado para reduzir este problema de risco de sobrecarga é aquele
que possui uma maior capacidade ociosa. Da mesma forma que se deve haver uma capacidade
geradora de energia que seja capaz de atender a um pico de demanda, é imprescindível para o
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bom funcionamento do sistema, que exista uma “folga” na transmissão. Assim, surgindo
qualquer necessidade, será possível a injeção de liquidez no mercado.
Apesar da indispensabilidade das instituições no mercado de eletricidade, é bom
lembrar que o objetivo da reforma é a implementação de uma estrutura de concorrência, cujos
participantes tenham certa autonomia. E o grau desta autonomia está diretamente relacionado
com a capacidade instalada excedente, tanto na geração quanto na transmissão.
II.3 - O caso norte americano
Foi na década de 1880 que o mercado norte americano de energia elétrica começou
com um conjunto de algumas centenas de geradores de energia. No período da grande
depressão, junto com o crash da bolsa de valores em 1929, muitas destas companhias
fornecedoras de energia faliram, o que fez com que uma reforma deste mercado se mostrasse
extremamente necessária. A partir dessa situação foram criados pelo Congresso o Public
Utilities Holding Company Act (PUHCA) e o Federal Power Act. Estas leis definiram o papel
dos estados na regulação dos mercados locais e o papel do governo federal na regulação do
comércio interestadual e das estruturas corporativas.
Algumas empresas receberam, das autoridades estaduais, exclusividade no
atendimento de um mercado consumidor varejista, numa determinada área geográfica
escolhida previamente. Tais empresas detinham a propriedade das instalações, tanto de
geração quanto de distribuição, necessárias para o fornecimento de energia elétrica. O preço
era fixado a partir de uma análise que determinava um valor aceitável para a tarifa paga pelos
usuários e que, ao mesmo tempo, pudesse proporcionar uma taxa de retorno justa para
recompensar os investimentos feitos pelos fornecedores.
Isso foi suficiente para permitir a construção feita pelas firmas de uma estrutura
suficiente para atender a demanda local. Ao passo em que esse instrumento regulatório
proporcionou um grande investimento local para a oferta de energia baseada numa estrutura
monopolista, gerando um grande desenvolvimento físico, houve pouco incentivo para a
construção de conexões entre as diversas áreas. Como cada estado definia a tarifa mais
conveniente para a sua própria realidade, passaram a vigorar valores diferentes em cada área.
A abertura do mercado de eletricidade norte americano teve o seu primeiro passo com
o Pubic Utilities Regulatory Police Act (PURPA), de 1978. Ele permitiu que o mercado se
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abrisse para os produtores de energia independentes (IPPs9). Porém, não foi definido como
esta energia, que tinha um custo menor, entraria na grande rede de distribuição de outras
empresas para alcançar o grande mercado consumidor. Foi estipulado pelo PURPA apenas
que estas empresas deveriam comprar a energia mais barata dos IPPs e misturar com a sua
para venderem aos seus consumidores.
Esta situação, que não atendia às verdadeiras expectativas do PURPA, por não
incentivar nem aumentar efetivamente a competição na oferta de energia para os
consumidores, durou até 1992. Neste ano foi feito o Energy Policy Act (EPAct), que eliminou
a maior parte das barreiras enfrentadas pelos IPPs, permitindo uma maior competição entre os
produtores. Isso foi possível com a abertura da rede de distribuição para os produtores
independentes e outros intermediários, além do apoio indispensável da Federal Energy
Regulatory Commission (FERC).
Em 1996, a FERC deu um enorme passo na direção de uma maior liberalização do
mercado de atacado de energia elétrica quando ordenou a separação, por parte dos
fornecedores, de suas atividades de geração, transmissão e distribuição. Foi determinada
também como a abertura da rede de distribuição funcionaria na prática. Ademais, a FERC
criou um novo mecanismo para a determinação das tarifas de transmissão, o Open Access
Same-time Information System (OASIS).
A competição no mercado de varejo de eletricidade também foi promovida por alguns
estados que tiveram uma atuação bem ativa em relação a este propósito. Desde 1999, 24
estados e o distrito de Colúmbia promoveram uma legislação voltada para este objetivo.
California e Pennsylvania são exemplos de estados que responderam à iniciativa da FERC e
promoveram reformas nos seus mercados. Entretanto, na metade de 2000 e no ano de 2001, o
mercado da Califórnia entrou em colapso, causando uma onda de grandes perdas financeiras e
falências entre as empresas de energia.
A FERC também tem feito grande esforço para promover uma melhor integração do
mercado de energia. Depois de esperar pacientemente, em dezembro de 1999 a agência
convocou os participantes do mercado atacado de eletricidade para ingressarem em
organizações regionais de transmissão (RTOs10) com o objetivo de implantar uma gestão
regional de transmissão. Já em julho de 2002 a FERC prosseguiu com um Standard Market 9 Independent power producers
38
Design (SMD) que seria aplicado dentro e através das RTOs. As regras de operação e
negociação seriam as mesmas para todos os participantes de cada RTO e todas elas também
seriam encorajadas a adotar um mesmo padrão. Assim, as regras básicas de cada região
seriam as mesmas para cada RTO. A idéia é criar um mercado comum de eletricidade.
Após a liberalização do mercado de energia, o número de negócios realizados
envolvendo a eletricidade superou imensamente a quantidade física gerada ou utilizada no
período. Isso correu devido ao fato de muitos traders ou marketers de energia não serem
empresas geradores ou não possuírem nenhuma ligação física com a commodity, dentre as
quais se encaixariam geração, transmissão ou distribuição. Eles atuam apenas como
intermediários, negociando contratos (que podem ser relativos a transações que ocorrerão
somente em 2 ou mais anos no futuro) com um ou mais produtores e quantos consumidores
puder ou quiser, além de negociarem muitas vezes entre si. Os consumidores podem ser
grandes indústrias ou empresas comerciais individuais, um grupo de consumidores associados
na compra, cidades ou empresas municipais, companhias de distribuição de energia, entre
outros (SIOSHANSI, 2002).
O mercado de derivativos de energia elétrica acompanhou a evolução do mercado à
vista de seu ativo-objeto, mas diferentemente das outras commodities de energia (como
petróleo e gás natural), não obteve um grande sucesso. Em março de 1996, a NYMEX
começou a negociar contratos derivativos de eletricidade, seguida posteriormente pelas
Chicago Board of Trade (CBOT) e Minneapolis Grain Exchange (MGE). A NYMEX atingiu
o auge de suas negociações com este tipo de contrato no momento em que oferecia seis tipos
diferentes de contratos futuros de eletricidade em 1998, quando as opções de eletricidade
também estavam no seu pico histórico. Até o início do ano 2000 as coisas iam bem, mas no
último trimestre do mesmo ano, o mercado de opções e futuros de eletricidade negociados em
bolsa entrou em colapso nos Estados Unidos. Desde fevereiro de 2002, a NYMEX suspendeu
a negociação de todos os seus contratos futuros de eletricidade. Agiram da mesma forma a
CBOT e a MGE.
O colapso da Enron chamou a atenção para os risco de crédito e de inadimplência e
aumentou o cuidado dos participantes do mercado que passaram a utilizar métodos que
possam reduzir tais riscos. Dentre eles podemos citar a formação de alianças, o aumento da
confiança em fornecedores e consumidores mais tradicionais e que possuam ativos físicos
10 Regional transmission organizations
39
conhecidos, além de reduzirem o escopo de contratos derivativos, bem como seus prazos. O
mercado de balcão de derivativos de eletricidade também sofreu uma grande baixa,
principalmente com a saída de dois grandes participantes como Áquila e Dynegy.
Apesar disso, alguns contratos continuaram a ser negociados no mercado de balcão.
Entre eles podemos encontrar contratos a termo, swaps e opções. Os boletins e os próprios
participantes do mercado indicam evidências de que persiste um grande interesse no uso e na
negociação desses contratos. Ademais, existem outros tipos de contratos derivativos sendo
utilizados pela indústria de energia elétrica objetivando a gestão de seus riscos. Os mais
comuns são os: emissions trading, weather derivatives e outage derivatives.
A aparente falha do mercado de contratos negociados em bolsa e a considerável
contração do mercado de balcão foram causadas, aparentemente, por problemas no mercado
da própria eletricidade. Isso ocorreu de certo porque o mercado de derivativos apresentará um
bom desenvolvimento somente quando o mercado da commodity, ou seja, de seu ativo-objeto,
estiver funcionando muito bem.
40
CAPÍTULO III - OS DERIVATIVOS UTILIZADOS NA INDÚSTRIA DE ENERGIA
ELÉTRICA E AS BARREIRAS ENCONTRADAS PARA A SUA NEGOCIAÇÃO
III.1 - Contratos derivativos de eletricidade
Entre os derivativos de eletricidade mais negociados no mercado de balcão estão os:
contratos futuros de preço (forward price contracts), swaps, opções e spark spreads. Ainda
existem os contratos futuros de eletricidade, que eram negociados nas bolsas, mas que por
enquanto estão suspensos.
III.1.1 - Forward price contracts
Os contratos a termo foram os primeiros derivativos a serem usados com o objetivo de
minimizar os riscos de preço da energia elétrica. Possuem a estrutura de um contrato a termo
básico, são bastante flexíveis e personalizados, podendo ser construídos de forma a atenderem
exatamente as necessidades de seus usuários. Suas características negativas também são as
mesmas, inclusive sua falta de liquidez o fato serem intransferíveis. Eles são negociados entre
compradores e vendedores, representando um fornecimento futuro de eletricidade.
Este tipo de contrato funciona da seguinte maneira: Em uma data previamente
estabelecida, o comprador é obrigado a pagar um preço predefinido pela mercadoria que tem
o direito de receber. Em contrapartida, o vendedor do contrato tem o dever de entregar uma
quantidade fixa de energia elétrica, na data prevista, em troca do seu devido pagamento.
Diferentemente do contrato futuro, o pagamento é efetuado totalmente no período da entrega
do ativo.
III.1.2 - Contratos futuros
Os contratos futuros diferem dos contratos a termo, principalmente, devido à sua alta
padronização. Ela consiste em quantidade e preço fixos, além de estabelecer um período num
determinado horário (normalmente um horário de pico por um período de um mês) para a
entrega (ou recebimento) da energia. Para atender às necessidades e estratégias de hedging
dos consumidores, os negociantes de energia combinavam os diversos meses dos contratos
futuros de uma maneira que se formasse uma faixa de entregas no tempo.
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Como exemplo temos um dos contratos que eram negociados na NYMEX. O Mid-
Columbia future definia a entrega de 432 MWh de eletricidade para a região central de Pablo
Verde, a uma taxa de 1 MW por hora, por 16 horas diárias no horário de pico, durante o mês
de entrega.
III.1.3 - Electricity price swaps
Os swaps de eletricidade, normalmente, definem uma quantidade de eletricidade
referente ao preço variável do ativo no mercado spot da região do fornecedor ou do
consumidor. Estes contratos são usados com o objetivo de fixar o lucro auferido com a venda
de energia (no caso do fornecedor) ou fixar o custo com a compra (no caso do consumidor)
em relação ao preço à vista da eletricidade relativo à sua própria região. Se o participante for
um fornecedor de energia com medo de uma queda repentina no preço do seu produto, poderá
utilizar um swap para fixar o seu preço. Para isso basta negociar um contrato com o qual ele
troque uma certa quantidade ao preço à vista, variável, pela mesma quantidade a um
determinado preço fixo. O seu ganho estará fixado no caso de qualquer trajetória que o preço
à vista possa percorrer.
Além disso, os swaps de eletricidade também servem para fixar o preço da energia em
uma região diferente daquela definida nos contratos futuros. Neste caso, o detentor do swap
de eletricidade se compromete em pagar ou receber a diferença entre o preço estabelecido no
contrato futuro e o preço à vista da eletricidade na região escolhida, no período da transação.
Por exemplo, se um fornecedor de energia pretende fixar o seu preço à vista, ele pode vender
um contrato futuro de eletricidade relativo ao preço que lhe interesse. Um problema que
poderia ocorrer nessa transação seria o fato do preço à vista da mercadoria gerada pela
empresa ser de uma região diferente da sua ou da região onde a eletricidade será realmente
vendida. Neste caso, para fixar o preço nesta região, o fornecedor de energia deverá, além de
vender o contrato futuro, adquirir um swap com o qual ele possa trocar uma determinada
quantidade de eletricidade ao preço à vista nesta região pela mesma quantidade ao preço
estabelecido no contrato futuro. É necessário observar que o número de contratos negociados,
tanto os futuros quanto os swaps, deva ser escolhido de tal forma que as quantidades sejam
iguais.
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III.1.4 - Opções
As opções de eletricidade são bem parecidas com as demais, dividindo-se em calls e
puts. Os lançadores das opções de compra têm o dever de entregar eletricidade por um preço
fixo em troca do pagamento de um prêmio, enquanto os detentores desta possuem o direito de
receber a energia. No caso de uma opção de venda de eletricidade, os titulares possuem o
direito de vender a energia enquanto os lançadores são obrigados a comprá-la.
Muitos consumidores de eletricidade preferem fazer um contrato com termos de
consumo flexíveis, ou seja, eles desejam pagar uma taxa fixa por KWh independente da
quantidade de energia consumida. Isso pode representar um risco para o fornecedor que
detenha um contrato futuro de eletricidade com capacidade de cobrir uma quantidade fixa de
energia. Para cobrir uma quantidade maior, no caso de um possível aumento no consumo, o
fornecedor poderia comprar mais contratos futuros, mas no caso de um consumo menor que o
esperado, isso também acarretaria um prejuízo. Diante deste dilema, a solução é a aquisição
de uma opção de compra de eletricidade que lhe garanta o direito, mas não o dever, de
comprar a energia adicional a um preço fixo.
III.1.5 - Spark spreads
Estes contratos são utilizados para minimizar as diferenças entre o preço da
eletricidade vendida e o preço pago para adquiri-la. Uma usina geradora de energia, uma
termelétrica por exemplo, pode não estar preocupada com o preço à vista da energia elétrica
que será vendida por ela. Seu único interesse pode estar direcionado exclusivamente para o
seu lucro, que depende principalmente da diferença entre o preço do combustível utilizado na
geração de energia elétrica e o preço da própria eletricidade.
Um único contrato de spark spreads utiliza mecanismos dos contratos futuros ou de
opções, para fixar ou definir pisos e tetos para as variações dos preços pagos pelos insumos e
cobrados pelos produtos. Isso permite a fixação ou a minimização da diferença entre os
ganhos e os gastos.
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III.2 - Outros contratos derivativos utilizados na indústria de eletricidade
Apesar da maioria dos contratos derivativos se concentrarem no preço da energia
elétrica, existem outros que também demonstram grande eficiência na gestão de risco para a
indústria de energia elétrica. Os mais utilizados nesta indústria são os: emission trading,
weather derivatives e contratos de seguro.
III.2.1 - Emissions trading
Nos últimos tempos, vem aumentando cada vez mais a preocupação com o meio
ambiente e seguindo este rumo estão surgindo leis, tratados internacionais e convenções com
o objetivo de se reduzir a emissão de gases tóxicos na atmosfera. As usinas geradoras de
eletricidade que operam com a queima de combustíveis fósseis são grandes emissoras de
gases como dióxido de enxofre (SO2) e óxidos de nitrogênio (NOx), gases extremamente
nocivos para o meio ambiente.
Nos Estados Unidos, os Clean Air Act Amendments de 1990 estabeleceram tetos para
as emissões desses gases e definiram um sistema de negociação de permissões que podem ser
compradas por empresas geradoras de energia, liberando a emissão de determinada
quantidade de gás. As normas de emissão podem fazer com que as usinas tenham que reduzir
a sua operação ou comprar permissões ao preço de mercado (que podem aumentar bastante de
acordo com a procura e a oferta), para continuarem emitindo ou passarem a emitir mais gases
na atmosfera.
Como o objetivo de se protegerem contra o risco gerado por essa situação, as
termelétricas ou empresas possuidoras de usinas deste tipo, podem comprar ou negociar
permissões de emissão de SO2 e NOx, protegendo-se contra o aumento do preço destes
contratos e continuando com o mesmo nível de operação.
Segundo a U.S. Environmental Protection Agency, tanto o valor quanto o volume dos
contratos negociados de ambos os gases vêm aumentando a cada ano. Além disso, com o
desenvolvimento desses mercados, diversas e complexas estruturas financeiras foram criadas
para atenderem à necessidade de gestão de risco dos participantes.
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III.2.2 - Weather hedges
Uma das variáveis mais importantes e, possivelmente, a que mais afeta o preço
negociado no mercado de eletricidade é o clima. Sua influência na utilização da energia se dá
pelas necessidades de aquecimento e resfriamento de objetos, alimentos, máquinas ou
ambientes. Já a geração de energia e o seu fornecimento são afetados, no caso de uma usina
hidrelétrica, pelo volume e periodicidade das chuvas.
Um verão mais quente que o esperado e um inverno mais frio que o normal podem
fazer com que o a demanda por eletricidade aumente drasticamente, levando a uma forte
elevação do preço. Inversamente, um verão mais brando ou um inverno que apresente uma
temperatura mais amena causariam uma redução na demanda e, conseqüentemente, uma
queda no preço da eletricidade.
A intensidade dos fluxos pluviométricos pode afetar o preço de energia elétrica na
medida em que uma escassez de chuvas pode causar uma diminuição imediata na geração de
energia ou uma expectativa de falta de energia no futuro. Isso certamente causaria o aumento
do preço da eletricidade, sendo este um efeito inverso ao causado por uma abundância pluvial.
Com o objetivo de controlar este tipo de risco, tanto as grandes empresas quanto as
menores possuem algumas estratégias, cada uma ajustada às suas necessidades e realidades.
Grandes companhias e comerciantes de energia elétrica, para se protegerem das variações
climáticas, utilizam contratos, especialmente desenvolvidos para cada situação específica, que
são negociados no mercado de balcão. Estes contratos são baseados em estatísticas climáticas,
como índices pluviométricos e graus de temperatura. Os derivativos climáticos incluem swaps
e opções de temperatura.
III.2.3 - Contratos de seguro
Além dos acontecimentos citados até este momento, como a flutuação do preço de
mercado da eletricidade, que possuem uma probabilidade razoável de acontecer e causar
algum tipo de prejuízo, também existem eventos cuja chance de ocorrem é mínima, mas
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quando ocorrem podem causar grandes perdas. Eles podem afetar a capacidade de uma
empresa em fornecer a quantidade necessária de energia ou de um consumidor recebê-la.
Com o objetivo de mitigar este tipo de risco pouco provável, os participantes do
mercado costumam utilizar contratos de seguro, que se mostram bastante eficientes. Uma
empresa geradora de energia pode fazer um seguro contra a quebra de um gerador, ou
qualquer defeito que possa ocorrer e impedir a sua plena operação. Desta forma ela poderá,
com o prêmio do seguro cobrir o prejuízo causado por tal acontecimento. Analogamente,
qualquer empresa que se encontre no caminho percorrido pela energia elétrica e que dependa
dela para o funcionamento do seu negócio, tanto para o seu fornecimento quanto para o seu
consumo, pode fazer uso dessa importante ferramenta de gestão de risco.
III.3 - Barreiras encontradas no desenvolvimento do mercado de derivativos de eletricidade
Como vimos, para que haja um bom desenvolvimento do mercado de derivativos de
eletricidade, é preciso que o mercado à vista da commodity apresente um bom funcionamento.
Algumas barreiras encontradas nesse desenvolvimento são realmente causadas por problemas
estruturais do mercado à vista e pela falta de transparência do preço negociado nele, mas
outras existem, simplesmente, devido às peculiaridades da energia elétrica, como sua natureza
enquanto commodity e a intensa volatilidade apresentada pelo seu preço.
III.3.1 - Complexidade do mercado spot
A existência de um sistema de transmissão de eletricidade que possa transportar uma
grande quantidade de energia barata para regiões nas quais o seu preço é alto, é extremamente
necessária para o funcionamento de um mercado realmente competitivo. Além disso, as taxas
de transmissão em mercados competitivos devem representar o custo marginal de “transporte”
da eletricidade, porém, essas taxas são comumente definidas arbitrariamente.
Um grande problema encontrado no estabelecimento de um sistema de transmissão
competitivo é o conflito de interesses gerado por ele, pois seria muito desagradável para os
fornecedores de determinada região que empresas de outras áreas, que tivessem a
possibilidade de gerar energia a custos mais baixos, entrassem no seu mercado oferecendo
eletricidade mais barata que a sua.
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Mesmo assim, para que haja um mercado competitivo, é necessário que exista uma
grande capacidade ociosa, tanto na geração quanto na transmissão de energia. Pois, somente
desta forma, será possível o deslocamento de eletricidade mais barata para regiões nas quais o
seu preço esteja elevado.
III.3.2 - Falta de transparência do preço
A informação sobre o preço negociado é primordial no desenvolvimento de um
mercado competitivo, pois permite a negociação entre participantes localizados a longas
distâncias, além de ajudar na previsão dos movimentos futuros e facilitar a criação de um
ambiente propício para a formulação de estratégias.
Apesar dessa grande importância, em muitos centros de comercialização de
eletricidade, não existe tal transparência. Para se ter uma idéia, enquanto mais de cem não
fornecem os preços correntes negociados nos seus mercados, apenas dez grandes centros
possuem um mercado spot líquido e apresentam dados de preços transparentes (ENERGY
INFORMATION ADMINISTRATION, 2002).
III.3.3 - Natureza da eletricidade enquanto commodity
Como já foi observado anteriormente, a eletricidade é difícil de ser estocada e, quando
possível, é uma operação muito custosa. Além disso, ela deve ser consumida completamente
no instante em que for gerada.
Contudo, apesar da impossibilidade de uma aplicação direta da teoria financeira no
mercado de eletricidade devido às suas singulares características, se estas forem levadas em
conta e tais teorias forem devidamente ajustadas com o desenvolvimento de modelos
específicos para cada caso, elas serão extremamente úteis no desenvolvimento de estratégias
de gestão de risco para a indústria de energia elétrica (KEPPO; VEHVILÄINEN, 2003).
47
III.3.4 - Extrema volatilidade do preço à vista da eletricidade
A alta volatilidade dos preços no mercado de atacado de eletricidade é causada pela
estreita capacidade operacional da geração de energia combinada com o grande potencial de
variação na demanda.
Apesar de haver uma grande variação da demanda em relação, principalmente, às
condições térmicas do ambiente, sua elasticidade-preço é muito pequena. Isso significa que
qualquer deslocamento na curva de oferta dessa indústria provocará, instantaneamente, um
forte impacto no preço da eletricidade, enquanto que a quantidade demandada sofrerá uma
variação mínima (VARIAN, 1999). Diferentemente de outras fontes de energia, como os
combustíveis (gás natural, derivados de petróleo, carvão, etc.), a eletricidade não pode ser
substituída por outra quando o seu preço sofre uma grande elevação. Além de ser uma energia
insubstituível, ela também é quase indispensável.
Da mesma forma como ocorre em qualquer mercado competitivo, quando há pouca
oferta no mercado de eletricidade, o preço no atacado se eleva ou, caso contrário, o preço cai.
Entretanto, um aumento no preço não interfere consideravelmente na demanda, ou seja, uma
baixa oferta não levaria a um equilíbrio no qual a quantidade de energia produzida e
consumida seria menor. Neste caso, ocorreria falta de energia devido ao excesso de demanda.
É exatamente por isso que os fornecedores de energia são obrigados por lei a manter uma
determinada capacidade ociosa que, apesar de bastante onerosa, serve para atender a possíveis
picos de consumo.
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CONCLUSÃO
A indústria de eletricidade, assim como a indústria de energia em geral, é super
intensiva em capital e isso faz com que qualquer variação mais brusca no fluxo de caixa de
uma empresa inviabilize financeiramente um projeto de construção ou expansão de sua
capacidade.
Esta variação é causada principalmente por oscilações no preço à vista da eletricidade,
que pode exercer o papel de mercadoria vendida por uma empresa fornecedora, de insumo
utilizado por um consumidor, ou das duas coisas para a mesma empresa cujo negócio pode ser
a transmissão ou distribuição de energia. O termo insumo, no caso do consumidor, é aceitável
tanto para a empresa que utiliza a eletricidade no seu negócio quanto para o consumidor
residencial, pois mesmo assim, ela não será consumida diretamente, será utilizada no
funcionamento de aparelhos que a transformarão em outra forma de energia como calor,
trabalho, iluminação, etc.
O preço da eletricidade no mercado spot apresenta uma alta volatilidade, o que acaba
gerando um considerável risco de mercado para aqueles que se encontram no caminho
percorrido por ela. Isso faz com que o uso de contratos derivativos, que são utilizados com
muita intensidade em outras indústrias e com muita eficiência, seja, no mínimo, cogitado
como instrumento de gestão de risco na indústria de energia elétrica.
Como nas demais indústrias da economia que os utilizam, e também, da mesma forma
que no mercado das outras commodities de energia (gás natural e petróleo), os contratos
derivativos usados na indústria de eletricidade mostraram-se extremamente capazes na
proteção de seus usuários contra potenciais perdas financeiras.
Os maiores contratempos corridos no mercado de derivativos de eletricidade, que
culminaram na suspensão dos negócios destes contratos nas bolsas norte americanas, foram
causados, não por deficiência própria, mas por um mau funcionamento do mercado spot.
A eletricidade é uma forma de energia bastante especial, considerada a mais nobre
devido à sua grande capacidade em ser convertida em outra, com notável versatilidade e de
forma limpa e eficiente. Além disso, por ser um fluxo, ela é muito difícil de ser estocada e
transportada. Ademais, a sua oferta e a demanda por ela (e, conseqüentemente, seu preço) são
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fortemente determinadas pelas condições climáticas, como a temperatura ambiente e a
intensidade das chuvas.
De acordo com o que foi observado nesta monografia, podemos concluir que os
contratos derivativos são instrumentos de gestão de risco muito eficientes, que podem ser
construídos e utilizados das mais diversas formas, conforme as necessidades dos seus
usuários. Seu uso é recomendado tanto na indústria de eletricidade, quanto nas demais
indústrias de energia, sendo que nestas ele vem aumentando a cada ano. As teorias financeiras
podem ser muito úteis no mercado de eletricidade, desde que este apresente um bom
funcionamento e que sejam feitos as devidas adaptações relativas às características dessa
forma de energia.
Em relação às especificidades da eletricidade e do seu mercado, é importante frisar
que, de acordo com o que foi mostrado neste trabalho, as dificuldades no desenvolvimento de
um mercado competitivo ainda são muito grandes. Por isso, e exatamente por ser derivado
deste, o mercado de derivativos de energia elétrica ainda apresenta grandes problemas na sua
formação.
Essa é uma questão que, no momento, está sendo intensamente discutida, tanto pela
comunidade científica quanto pelos players do mercado em todo o mundo. Para termos uma
idéia da magnitude dessa discussão, enquanto as negociações destes contratos foram
suspensas na NYMEX (nos Estados Unidos), existe um projeto para a criação destes na Bolsa
de Mercadorias & Futuros (no Brasil).
De qualquer forma, quanto mais próximo de uma situação de concorrência estiver o
mercado à vista de eletricidade, maiores serão as chances de sucesso do mercado de
derivativos e, conseqüentemente, do uso desses contratos como instrumentos de gestão de
risco na indústria de energia elétrica.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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