o tempo de estudo autónomo na aprendizagem da língua...

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38 ESCOLA MODERNA Nº 27•5ª série•2006 A acção educativa centra-se no trabalho diferen- ciado de aprendizagem dos alunos e não no ensino simultâneo do professor. Sérgio Niza (Princípios Estratégicos da Intervenção Educativa do Modelo Pedagógico do MEM) O trabalho diferenciado de aprendizagem concretiza-se na sala de aula fundamen- talmente no tempo de estudo autónomo, ou seja, no tempo em que os alunos desenvolvem individualmente, a pares ou em pequenos gru- pos, um conjunto de actividades por eles selec- cionadas de acordo com as suas necessidades, dificuldades e interesses. (Figura 1, 2, 3). Ainda que fazendo parte de um todo cons- tituído por tempos de aula diferenciados, numa perspectiva de organização social das aprendizagens (tempo de comunicação do pro- fessor, tempo de trabalho nos projectos dos alunos, tempo de comunicação dos alunos, tempo de estudo autónomo), este texto centra- se essencialmente na descrição de práticas de estudo autónomo nas aulas de Inglês, com alu- nos do 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Se- cundário. Tanto num ciclo como noutro, o objectivo é facilitar e consolidar a aprendizagem da Língua Estrangeira, num espaço onde os alunos po- dem contar com a ajuda do professor e com a dos restantes colegas da turma, e facilitar o de- senvolvimento da autonomia na planificação, gestão e avaliação do seu trabalho e da sua aprendizagem (processo e produto). A opção de pôr em prática um modelo que inclui tempos de aula para estudo autónomo resulta da minha reflexão sobre diversos fac- tores: – O conhecimento resulta de um processo de construção individual e de interacção com os pares. – A construção do conhecimento faz-se à base do trabalho pessoal e das experiências de aprendizagem com que o aluno é confrontado, mais do que através dos saberes transmitidos pelo professor. – As aprendizagens só são efectivas e dura- douras se o professor tiver em conta o ponto de partida dos alunos e, a partir dele, apoiá-los na sua progressão. O Tempo de Estudo Autónomo na Aprendizagem da Língua Estrangeira: Treinar, Consolidar, Aprofundar Conhecimentos e Competências Maria Dulce Abreu* 3.º Ciclo do Ensino Básico. Figura 1 – Momento de cooperação entre pares REVISTA N.º 27 09/07/07 19:52 Page 38

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A acção educativa centra-se no trabalho diferen-

ciado de aprendizagem dos alunos e não no ensino

simultâneo do professor.Sérgio Niza

(Princípios Estratégicos da Intervenção Educativado Modelo Pedagógico do MEM)

Otrabalho diferenciado de aprendizagemconcretiza-se na sala de aula fundamen-

talmente no tempo de estudo autónomo, ouseja, no tempo em que os alunos desenvolvemindividualmente, a pares ou em pequenos gru-pos, um conjunto de actividades por eles selec-cionadas de acordo com as suas necessidades,dificuldades e interesses. (Figura 1, 2, 3).

Ainda que fazendo parte de um todo cons-tituído por tempos de aula diferenciados,numa perspectiva de organização social dasaprendizagens (tempo de comunicação do pro-fessor, tempo de trabalho nos projectos dosalunos, tempo de comunicação dos alunos,tempo de estudo autónomo), este texto centra-se essencialmente na descrição de práticas deestudo autónomo nas aulas de Inglês, com alu-nos do 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Se-cundário.

Tanto num ciclo como noutro, o objectivo éfacilitar e consolidar a aprendizagem da LínguaEstrangeira, num espaço onde os alunos po-

dem contar com a ajuda do professor e com ados restantes colegas da turma, e facilitar o de-senvolvimento da autonomia na planificação,gestão e avaliação do seu trabalho e da suaaprendizagem (processo e produto).

A opção de pôr em prática um modelo queinclui tempos de aula para estudo autónomoresulta da minha reflexão sobre diversos fac-tores:

– O conhecimento resulta de um processode construção individual e de interacção comos pares.

– A construção do conhecimento faz-se àbase do trabalho pessoal e das experiências deaprendizagem com que o aluno é confrontado,mais do que através dos saberes transmitidospelo professor.

– As aprendizagens só são efectivas e dura-douras se o professor tiver em conta o pontode partida dos alunos e, a partir dele, apoiá-losna sua progressão.

O Tempo de Estudo Autónomo naAprendizagem da Língua Estrangeira:

Treinar, Consolidar, AprofundarConhecimentos e Competências

Maria Dulce Abreu*

3.º Ciclo do Ensino Básico. Figura 1 – Momento de cooperação entre pares

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– A progressão dos alunos no currículopassa inevitavelmente pela tomada de cons-ciência das dificuldades que sentem e da selec-ção dos métodos e estratégias de aprendiza-gem que melhor se adequam à sua forma pró-pria de aprender.

– O trabalho de aprendizagem desenvolvidopelos alunos consolida conhecimentos essen-ciais para outras aquisições mais complexas.

– A disponibilização de um tempo de aulapara o desenvolvimento de estudo autónomomotiva os alunos para a aprendizagem e au-menta a sua auto-estima.

– O trabalho realizado pelos alunos me-lhora significativamente, tanto em quantidadecomo em qualidade.

– O apoio individual do professor (Fig. 4)é fundamental na superação de algumas difi-culdades.

– Os alunos normalmente expressam ver-balmente ou por escrito (aquando da sua auto-avaliação) apetência para desenvolver trabalhoindividual em aulas de estudo autónomo e fa-zem uma avaliação bastante positiva destetipo de aulas.

No que respeita à aprendizagem da LínguaEstrangeira, e de acordo com o Currículo Na-cional do Ensino Básico (Competências Essen-ciais – Línguas Estrangeiras, 2001), é funda-mental que o professor crie «condições para queo aprendente possa ir construindo uma competênciaque, progressivamente, o estimula a implicar-se,com renovada confiança» e, para isso, é precisoque tenha oportunidade para:

– tomar consciência do sistema da língua, que elepoderá ir descobrindo a partir da reflexão dosseus usos;

– estabelecer e desenvolver uma relação afectivacom a língua estrangeira, dispondo-se a reagirde forma construtiva face aos problemas ine-rentes à aprendizagem;

– regular a qualidade dos seus desempenhos eutilizar recursos para a superação de dificul-dades.

Também a legislação em vigor, tanto no En-sino Básico como no Ensino Secundário, re-mete para a necessidade de práticas diferencia-das e diferenciadoras na sala de aula e para aimportância do desenvolvimento da autono-mia do aluno enquanto aprendente.

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Figura 4 – Momento de apoio do professor

Figuras 2 e 3 – Momento de trabalho individual

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No final da escolaridade básica o aluno

deve ser capaz de:

(…)

– Adoptar metodologias personalizadas

de trabalho e de aprendizagem adequadas a

objectivos visados;

– Adoptar estratégias adequadas à reso-

lução de problemas e à tomada de decisões;

– Realizar actividades de forma autó-

noma, responsável e criativa;

– Cooperar com os outros em tarefas e

projectos comuns;

(…)

Currículo Nacional do Ensino Básico, Compe-tências Essenciais, 2001

Princípios Orientadores para organização

e gestão do currículo:

(…)

b) Flexibilidade na construção de percur-

sos formativos;

(…)

h) Alargamento da duração dos tempos

lectivos, de forma a permitir maior diversi-

dade de metodologias de ensino e melhor con-

solidação das aprendizagens.

Decreto-Lei n.º 74/2004 (Decreto-Lei n.º 24//2006)

Esta necessidade de diferenciar o trabalho eas aprendizagens dos alunos fundamenta-secom o facto de revelarem diferentes tipos decompetências, diferentes ritmos de aprendiza-gem, diferentes tipos e níveis de conhecimen-tos já adquiridos, diferentes estilos de aprendi-zagem e diferentes experiências de aprendiza-gem anteriores. Na prática, «a adequação e a

diferenciação curricular [são] necessárias para que

todos tenham acesso ao mesmo a que têm direito,

através dos caminhos diversos que lhes permitam

chegar lá» (Roldão, 1999).Durante as aulas de estudo autónomo, os

alunos realizam actividades por eles planifica-

das de acordo com as suas necessidades. Estasactividades são essenciais para:

– treino e aprofundamento de aprendiza-gens realizadas no colectivo, que ainda não fo-ram devidamente concretizadas;

– consolidação de aprendizagens já realiza-das no colectivo, mas que exigem algum traba-lho suplementar;

– superação de dificuldades reveladas emtestes e outros trabalhos de avaliação;

– preparação para testes e outros trabalhospara avaliação;

– aperfeiçoamento de textos elaborados;– produção de textos no âmbito dos projec-

tos dos alunos;– produção de fichas de leitura sobre livros

da biblioteca de turma que são lidos.

Seja qual for o ciclo ou o ano de escolari-dade em que se encontrem, o desenvolvi-mento das actividades de aprendizagem porparte dos alunos implica a diferenciação de:

– conteúdos – para treino de assuntos já lec-cionados e para superação de dificuldades econsolidação de novas aprendizagens;

– processos – para adequação de métodosde trabalho e de estudo às necessidades dosalunos;

– produtos – para consecução dos objecti-vos definidos para as tarefas propostas e paravisibilidade das aprendizagens realizadas pelosalunos.

Todo este trabalho implica ainda a defini-ção e explicitação de papéis diferenciados nasala de aula, tanto para o professor como paraos alunos.

Resta acrescentar que a avaliação é um ele-mento fundamental neste processo, não sópara diagnosticar as necessidades dos alunos epara que os próprios alunos tomem consciên-cia das suas dificuldades, mas também para re-gular todo o trabalho por eles desenvolvido.Neste contexto, a avaliação regula o grau deconsecução das aprendizagens e a eficácia dosmétodos e estratégias utilizados pelo professor

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e pelos alunos, tornando-se assim um «acto in-tencional que agindo sobre mecanismos de aprendi-zagem [contribui] directamente para a progressãoe/ou redimensionamento dessa aprendizagem» (De-partamento da Educação Básica, 2001).

A avaliação também tem a função de dar aoprofessor a possibilidade de disponibilizar aoaluno o feedback indispensável que lhe permitair ajustando as suas estratégias e o apoie na to-mada de decisões em relação à melhor formade conduzir a sua aprendizagem. A avaliaçãoassume assim um papel essencialmente forma-tivo «por um lado, como instrumento para adapta-ção constante das formas de ensino às característicase às necessidades dos alunos; por outro, como ins-trumento para facilitar a assunção cada vez maiordo controlo e responsabilidade por parte do aluno so-bre o seu próprio processo de aprendizagem» (Mor-gado, 2001).

Assim, a avaliação deve:– ser contínua e sistemática;– incidir sobre o ensino do professor e as

aprendizagens dos alunos;

– permitir a reformulação constante dosmétodos de ensino e das estratégias deaprendizagem;

– dar indicações aos alunos que lhes permi-tam progredir no currículo;

– basear-se na recolha de informações atra-vés de instrumentos diversificados;

– permitir a intervenção atempada do pro-fessor junto dos alunos com mais dificul-dades;

– reforçar os aspectos positivos do desem-penho dos alunos.

1. Práticas na Sala de Aula

No tempo de estudo autónomo, os alunos guiam--se por um plano individual (Fig. 5) onde consta aprevisão das actividades de estudo, de treino ou deprodução de textos, por exemplo, escolhidas porcada aluno tendo em conta as suas necessidades e asorientações inscritas pelo professor na ficha do planoanterior. Enquanto decorrem estas actividades de

Professor

– organiza o espaço da sala de aula de forma a favorecer o trabalho dos alunos;– constrói e organiza materiais que contemplem os diversos domínios de aprendizagem;– apoia e orienta os alunos na resolução das suas dificuldades individuais;– faz balanços periódicos do trabalho desenvolvido pelos alunos;– faz os ajustes necessários para optimização das aprendizagens dos alunos;– dá feedback aos alunos em relação aos seus desempenhos.

Alunos

– desenvolvem actividades de treino, consolidação e/ou aprofundamento dos conteúdos jáaprendidos, orientados por um plano individual de trabalho;

– desenvolvem actividades dirigidas à superação das suas dificuldades;– recorrem a materiais diversificados como suporte das aprendizagens;– responsabilizam-se pelo desempenho de tarefas que asseguram o bom funcionamento

das aulas e a manutenção do espaço e dos materiais de trabalho;– recebem apoio mais individualizado do professor;– cooperam com os outros colegas na concretização das tarefas;– regulam e auto-avaliam o seu percurso de aprendizagem e definem novos percursos.

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Figura 5 – Plano Individual de Trabalho

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estudo e de treino planeadas, o professor individua-

liza o seu trabalho de ensino para os alunos com ne-

cessidade de apoio específico.

Niza, 2000

1.1. O Plano Individual de Trabalho (PIT)

O trabalho que o aluno desenvolve nas au-las de estudo autónomo é regulado por um PIT(Figura 5), cuja utilização lhe permite:

– envolver-se e responsabilizar-se pelo seupercurso de aprendizagem;

– desenvolver o conhecimento de si próprioenquanto aprendente;

– tomar consciência das suas dificuldadesreais;

– tomar decisões em relação à sua aprendi-zagem;

– definir percursos para aprender;– desenvolver determinadas competências,

nomeadamente:– a capacidade de planificar/gerir o tempo

em função das actividades seleccionadas;– a capacidade de seleccionar as actividades

que melhor se adequam às suas necessi-dades;

– a capacidade de seleccionar os modos detrabalhar mais adequados ao seu modo deaprender;

– a capacidade de assumir e cumprir com-promissos;

– a capacidade de se auto-avaliar e melho-rar/optimizar o seu desempenho.

Levar o aluno a construir o seu plano individual

de trabalho (e a cumpri-lo) é transmitir-lhe a impor-

tância de saber sempre o que há a fazer, quando o

fazer e também o tempo de que dispõe para outras

actividades (…) respeitando os seus compromissos e

adquirindo autonomia (…). O aluno aprende a ge-

rir o seu tempo, a organizar o seu trabalho, a ser res-

ponsável.

Pais e Monteiro, 2002

A selecção das actividades é feita com baseno conhecimento que, gradualmente, o alunovai adquirindo sobre o estado das suas apren-dizagens. Este conhecimento resulta do seuconfronto com as dificuldades que vai sen-tindo na realização das tarefas, com os resulta-dos dos testes e outros trabalhos, com o feed-back regular do professor.

Os alunos fazem a previsão do tipo e nú-mero de tarefas a desenvolver num determi-nado período de tempo e procedem ao seu re-gisto no PIT (Figura 5: Practising Activities –I’m going to do…), estabelecendo assim umcontrato didáctico com o professor. Findo o pe-ríodo de execução do plano, os alunos regis-tam as actividades que efectivamente fizeram(Figura 5: Practising Activities – I’ve done…) ecomparam estes dados com as suas previsõesiniciais. Esta reflexão permite ao aluno tomarconsciência do que é capaz de fazer e das ra-zões que o levaram a cumprir ou não o seuplano. É também solicitado ao aluno que de-fina as alterações a introduzir no plano subse-quente. Assim, com o PIT, o aluno aprende aestabelecer metas e a definir objectivos indivi-duais, a estabelecer prioridades e a definir es-tratégias para as atingir. O feedback do profes-sor apoia-o ao longo de todo o processo e in-centiva-o a continuar a trabalhar.

Além das actividades para treino, consoli-dação ou aprofundamento das aprendizagens,

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Figura 6 – Momento de produção de texto para projecto

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o PIT também inclui o registo do trabalho rea-lizado no âmbito dos projectos dos alunos edas actividades de oralidade.

No Ensino Secundário, o PIT é semelhanteao representado na Figura 5, mas os alunostambém aproveitam o tempo de estudo autó-nomo para realizar tarefas relacionadas com osseus projectos (produção e melhoramento detextos, preparação de comunicações à turma,etc.).

A concretização de um currículo pressupõe que se

estabeleçam diferentes caminhos para que as apren-

dizagens sejam bem sucedidas e para que se atin-

jam os principais objectivos.

Departamento de Educação Básica, 2001

1.2. Os Recursos Materiais

A organização de aulas de estudo autó-nomo passa obrigatoriamente por um trabalhoprévio do professor para preparação e recolhade materiais que servirão de suporte às apren-dizagens dos alunos. Estes materiais têm de serdiversificados, tanto ao nível das competênciasa desenvolver, como dos conhecimentos aconstruir pelo aluno. O objectivo é confrontaros alunos com diferentes tipologias de activi-dades, que abranjam diferentes competênciasespecíficas da disciplina e diferentes modos emétodos de trabalhar.

Por outro lado, estes recursos devem permi-tir que todos os alunos encontrem tarefas ade-quadas à superação das suas dificuldades indi-viduais e devem ainda permitir a realização detarefas diferenciadas na mesma aula (os alunosnão estão todos a realizar a mesma tarefa, aomesmo tempo, sobre o mesmo conteúdo).

Nas aulas de Inglês, estes recursos incluemo manual e o livro de exercícios do aluno, fi-cheiros auto-correctivos (Fig. 7), dicionários,gramáticas, outros manuais do mesmo ano deescolaridade, livros diversos para consulta so-bre os tópicos em estudo, etc. Os ficheirosauto-correctivos são elaborados de forma a

cumprirem o programa e os objectivos da dis-ciplina, incidindo sobre os diferentes domíniose tipos de aprendizagem. São fichas construí-das a partir de outros manuais, de informaçãorecolhida de sites específicos da Internet e deoutros livros. As fichas são devidamente iden-tificadas com um código composto por uma le-tra (relacionada com a natureza das propostasde trabalho: produção escrita, gramática, lei-tura e compreensão de textos, etc.) e um nú-mero, de forma a facilitar o preenchimento doPIT, aquando do balanço final (Fig. 8).

Esta diversidade de recursos possibilita que,gradualmente, os alunos se tornem mais autó-nomos e consigam seguir um percurso pelo«seu próprio pé», deixando o professor mais dis-ponível para apoiar aqueles que realmente pre-cisam de ajuda, ou seja, criando-se um espaçode aula para um ensino mais individualizado.

A esta primeira grande recolha de materiaisde trabalho são posteriormente acrescentadosoutros recursos que os próprios alunos trazempara as aulas (dicionários, livros para a biblio-teca de turma, etc.). Os ficheiros auto-correcti-vos, por exemplo, também são enriquecidoscom novas fichas produzidas pelos alunos.

1.3. O Trabalho na Aula e em Casa

As aulas de estudo autónomo são por exce-lência os momentos em que o trabalho de

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Figura 8 – Fichas dos Ficheiros Auto-Correctivos

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aprendizagem é diferenciado. Ainda que emrelação às aulas no colectivo (tempo de comu-nicação do professor), o professor tente que te-nham um carácter o mais interactivo e práticopossível, as actividades são normalmenteiguais para todos os alunos e, na maior partedas vezes, envolvem a participação da turmana sua globalidade (para actividades de orali-dade, para exposição ou sistematização deconteúdos, para a realização de exercícios deaplicação de conhecimentos, etc.). É nas aulasde estudo autónomo que os alunos têm opor-tunidade de estar todos a trabalhar, ao mesmotempo, mas não estão todos a trabalhar sobreo mesmo conteúdo ou a resolver a mesma ac-tividade.

Apesar de por hábito não marcar trabalhosde casa, os alunos realizam regularmente tra-balho em casa relacionado com a disciplina,mesmo sabendo que o trabalho feito em casa

não substitui aquele que tem de ser feito emsala de aula. (Fig. 9).

O número de alunos que realizam tarefasextra em casa e o número de actividades reali-zadas fora da aula aumentam significativa-mente, e este facto constitui um indicador damotivação que os alunos sentem para o estudoe aprendizagem da Língua Estrangeira.

Constata-se assim que estes trabalhos feitosem casa são facilmente assumidos pelos alunosjá que partem de uma necessidade por elessentida e reconhecida e, por isso, os efeitos queproduzem na melhoria das suas aprendizagenssão mais positivos. No entanto, é preciso que oaluno esteja na posse das ferramentas necessá-rias para realizar as tarefas de forma autó-noma, uma vez que em casa não pode contarnem com o apoio do professor nem com aajuda de colegas mais competentes.

Todos os produtos do trabalho dos alunossão organizados numa capa individual (junta-

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Figura 9 – Trabalho de aula e de casa

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mente com o PIT), constituindo um «portfolio»de aprendizagem, através do qual os alunospodem perceber o percurso que fizeram e asaprendizagens que realizaram.

1.4. A Organização da Turma

A organização e funcionamento da turma ea gestão do espaço da sala de aula e dos recur-sos materiais são da responsabilidade dos alu-nos, que assumem rotativamente tarefas es-senciais para a criação de um bom ambiente detrabalho. Estas tarefas incluem a manutençãoda limpeza e arrumação do espaço da sala deaula, a organização dos recursos materiais e asua arrumação no armário da sala de aula, a re-quisição e entrega das fichas para trabalho decasa e dos livros da biblioteca de turma, a dis-tribuição e recolha das capas dos alunos que fi-cam no armário, etc. (Figs. 10, 11, 12). Natural-mente, os alunos reconhecem a necessidade ea importância destas tarefas na utilização e op-timização de um espaço que é de todos.

O desempenho destas tarefas pelos alunossatisfaz também um outro objectivo da escolaactual, a educação para a cidadania, enquantoconstrução da identidade e desenvolvimentoda consciência cívica dos alunos e formação decidadãos responsáveis, críticos, activos e inter-venientes, com recurso, nomeadamente, ao in-tercâmbio de experiências vividas e à sua par-ticipação, individual e colectiva, na vida daturma, da escola e da comunidade (Decreto-Lein.º 6/2001).

A vida da turma, dentro do grande grupoque é a escola, é assegurada pela divisão de ta-refas e pela responsabilização pelo bem-estarde todos. (Fig. 13).

A perspectiva de desenvolvimento social,intelectual e moral dos alunos inerente ao mo-delo pedagógico do MEM não se esgota, ob-viamente, na organização e gestão do espaçoda sala de aula e do funcionamento da turma,mas estas actividades representam com cer-

teza um contributo para o desenvolvimentoglobal dos alunos.

Os alunos aprendem que têm direitos, mastambém têm deveres, organizando-se numaexperiência de exercício de cidadania, reveladaatravés da demonstração de respeito pelos ou-tros e pelos bens comuns, do cumprimento deregras de convivência e da interiorização denormas de conduta social adequadas a diferen-

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tes contextos, participando num processo quenão pode ser ensinado pelas palavras do pro-fessor, mas precisa de ser vivido e construídopor cada um deles.

Se educa na acção (…); nos formamos para a

polivalência do saber-fazer, vamo-nos iniciando,

construindo na cidadania, o que implica solidarie-

dade social, mas igualmente que na escola o aluno

seja tratado por medida, como pessoa, e não massi-

ficando.

António Sérgio, 1984

2. A Regulação e Avaliação das Aprendizagens

A avaliação formativa aparece como uma com-

ponente necessária de um dispositivo de individua-

lização das aprendizagens e de diferenciação das

intervenções e dos meios pedagógicos, e mesmo dos

passos de aprendizagem ou dos ritmos de progres-

são, ou ainda dos próprios objectivos.

Perrenoud, 1991, cit por Perrenoud, 1999

A avaliação está presente em todos os mo-mentos em que ocorre o ensino e em que ocor-rem as aprendizagens, seja para diagnosticarnecessidades e dificuldades, seja para fazer ba-lanços do que se ensinou e do que se aprendeue de como se ensinou e se aprendeu.

O carácter regulador da avaliação permiteque os alunos desenvolvam um melhor conhe-cimento de si próprios que lhes permite identi-ficar dificuldades e potencialidades e definirpercursos de trabalho e de aprendizagem ajus-tados aos objectivos previamente definidos.

O PIT engloba todo o percurso feito peloaluno, desde a planificação até à regulação dosprocessos e avaliação dos produtos e dasaprendizagens realizadas, e a reflexão que oaluno faz sobre a sua consecução é extrema-mente importante (Fig. 14), pois só assim tomaconsciência do que realmente é capaz de fazere do trabalho que precisa de desenvolver paraprogredir no currículo proposto. Também oscomentários (feedback) dados pelo professorapoiam essa tomada de consciência e orientamas decisões a tomar para definição de percur-sos individuais para aprender.

O objectivo da avaliação é confrontar o queo aluno tinha inicialmente planeado fazer eaquilo que efectivamente conseguiu realizar,aferir da pertinência das actividades e tarefasseleccionadas em função das necessidades sen-tidas e avaliar os produtos que materializam oprocesso de superação dessas necessidades.

A tomada de consciência do percurso reali-zado e das aprendizagens bem sucedidas (Fi-

gura 14 – With this plan I’ve learnt…) implicatambém a responsabilização por um processoque tem obrigatoriamente de ir produzindoefeitos positivos e apoia a definição de estraté-gias para melhoria de futuros desempenhos(Figura 14 – To improve my learning I will…).

Só através da prática de uma avaliação ade-quada e dos dados que dela se recolhem é pos-sível ao professor organizar e desenvolver umtipo de ensino que permita diferenciar asaprendizagens, os métodos e modos de traba-lhar e os recursos materiais, e ao aluno saber o

Fig. 13 – Mapa de Tarefas

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que tem de fazer e como o fazer para aprendermais e melhor.

(…)2 – A avaliação diagnóstica realiza-se no iní-cio de cada ano de escolaridade, devendo ar-ticular-se com estratégias de diferenciação pe-dagógica, de superação de eventuais dificul-dades dos alunos.(…)3 – A avaliação formativa assume caráctercontínuo e sistemático, recorre a uma varie-dade de instrumentos de recolha de informa-ção, adequados à diversidade das aprendiza-gens e dos contextos em que ocorrem, tendocomo uma das funções principais a regulaçãodo ensino e da aprendizagem.

Decreto-Lei n.º 6/2001

1 – A avaliação consiste no processo regula-dor das aprendizagens (…).(…)2 – A avaliação formativa é contínua e siste-mática e tem função diagnóstica (…) comvista ao ajustamento de processos e estraté-gias.(…)2 – A avaliação formativa determina a adop-ção de medidas de diferenciação pedagógicaadequadas às características dos alunos e àsaprendizagens a desenvolver.

Decreto-Lei n.º 74/2004

A avaliação é assim um processo de «regula-ção tanto no sentido da adequação dos procedimen-tos utilizados pelo magistério às necessidades e pro-

Fig. 14 – Plano Individual de Trabalho (verso)

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Competências Essenciais:� Adoptar metodologias personalizadas de trabalho e de aprendizagem adequadas

a objectivos visados.� Realizar actividades de forma autónoma, responsável e criativa.� Cooperar com os outros em projectos e tarefas comuns.

Estratégias Gerais de Intervenção

Organizar o ensino prevendo a experimentação de técnicas, instrumentos e formasde trabalho diversificadas.Promover intencionalmente actividades dirigidas à expressão e ao esclarecimentode dúvidas.Organizar o ensino com base em materiais e recursos diversificados, adequadosàs diferentes formas de aprendizagem, à natureza das necessidades e dificuldadesdos alunos e de forma a desenvolver a sua autonomia enquanto aprendentes.Apoiar o aluno na descoberta das diversas formas de organização da suaaprendizagem.Organizar o ensino prevendo a realização de actividades por iniciativa do aluno.Organizar actividades cooperativas de aprendizagem rentabilizadoras daautonomia e responsabilização.

Práticas na aulade Inglês

� *

* � = verificado.

gressos dos alunos, quanto de regulação para per-mitir que os alunos possam ir construindo um sis-tema pessoal de aprendizado e adquiram a maiorautonomia possível».

Jorba e Sanmarti, 2003

3. Considerações Finais

O tempo de aula aqui descrito faz, como járeferi, parte de um todo e é enquanto parte in-tegrante desse modelo pedagógico global, queo trabalho realizado para, com e pelos alunosganha sentido e coerência.

Salienta-se o facto de os alunos não só ad-quirirem e construírem conhecimento e treina-rem as aprendizagens realizadas, mas tambémdesenvolverem competências integradoras deconhecimentos, capacidades e atitudes, enten-didas como o saber em acção ou em uso (Currí-culo Nacional do Ensino Básico, 2001). (Fig. 15).

Se observarmos o quadro que se segue, ve-rificamos que a prática de estudo autónomo nasala de aula vai ao encontro das orientaçõesnormativas no que respeita ao desenvolvi-mento de competências nos alunos.

Estas práticas pressupõem a existência deprofessores que desempenham um papel muito

Fig. 15 – Currículo Nacional do Ensino Básico, 2001.

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mais complexo do que simplesmente transmi-tir «matérias», pressupõem que ensinar é fazeros outros aprender e pressupõem também aexistência de alunos cujo ofício mudou.

Na planificação do ensino a oferecer aosalunos, não podemos esquecer que não vale apena continuar a ensinar para um aluno médioque não existe, tentando que todos aprendamo mesmo e ao mesmo tempo, pois com isso es-taremos a contribuir para o insucesso da maio-ria dos alunos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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