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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE O SER HUMANO PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS E A INCLUSÃO Pátria Sant’Anna Teixeira Lima Rio de Janeiro, fevereiro de 2002. UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O SER HUMANO

PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS

E A INCLUSÃO

Pátria Sant’Anna Teixeira Lima

Rio de Janeiro, fevereiro de 2002.

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O SER HUMANO

PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS

E A INCLUSÃO

Pátria Sant’Anna Teixeira Lima

Trabalho monográfico apresentado

como requisito parcial de Especialista

em Psicopedagogia.

Orientadora: Yasmin Maria R. Madeira da Costa

Rio de Janeiro, fevereiro de 2002.

Agradeço à DEUS pela oportunidade,

aos meus filhos pelo incentivo, à Orientadora

Yasmin e à Professora Vera Agarez, cujo apoio

e confiança possibilitaram a realização deste

trabalho

Aos que, dignamente, lutam pela igualdade

e respeito entre todas as pessoas.

“Deixai cada um tornar-se tudo o que for

capaz de ser; expandir, se possível, até seu pleno

florescimento; suportar todas as limitações, rejeitar

tudo o que for estranho, especialmente aspectos

nocivos; mostrar-se em toda a grandeza de sua

dimensão e estatura, ser aquilo que possa.”

( Thomas Carlyle)

5

RESUMO

O ser humano portador de necessidades especiais vem desde a antigüidade

numa luta

permanente buscando a aceitação e o reconhecimento pessoal contra a exclusão. Após milênios

de discriminação, marginalização e até mesmo a eliminação por algumas sociedades, ainda se

busca hoje a anulação das diferenças.

Isso nos leva à inclusão como ajuda à socialização e à aprendizagem, não

compulsoriamente, mas criando espaços inclusivos como o PROJETO CONVIVER, onde

portadores de necessidades especiais são estimulados à participação buscando tornar-se parte

integral de um conjunto que é a comunidade.

É preciso que comecemos a ver um ao outro como um só, com muitas fisionomias e

formas de expressão, pensando e vivendo inclusivamente.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................7

CAPÍTULO I - QUEM É O SER HUMANO

PORTADOR DE

NECESSIDADES

ESPECIAIS...................................................... 9

CAPÍTULO II - DIFICULDADES NA SOCIALIZAÇÃO

E NA

APRENDIZAGEM.................................................................................12

1. Ambiente

Familiar.......................................................................................................12

2. Ambiente

Social.............................................................................................................13

CAPÍTULO III - INCLUSÃO......................................................................................16

CAPÍTULO IV - A INCLUSÃO E O PROJETO CONVIVER.......................21

CONCLUSÃO....................................................................................................................25

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................27

7

INTRODUÇÃO

As pessoas portadoras de deficiências físicas ou sensoriais encontram dificuldades para

participar da dinâmica social, em virtude de uma série de obstáculos que podem interferir em

sua locomoção, no acesso ao meio profissional, ao lazer e aos serviços, o que resulta em sua

exclusão. Atualmente, tudo isto nos leva a um assunto polêmico que é a inclusão.

O trabalho aqui apresentado procura traçar considerações sobre o ser humano portador

de necessidades especiais e sua interação na sociedade.

Ao começar o estágio no PROJETO CONVIVER e observando as pessoas da

comunidade que o freqüentavam, foi surgindo um interesse cada vez maior sobre o portador

de necessidades especiais. Aos poucos fui obtendo respostas para algumas de minhas

indagações. Todos os questionamentos surgidos levaram-me à realização da pesquisa. Numa

sociedade onde se fala tanto em inclusão, tema que ainda causa dúvidas, será que o portador

de necessidades especiais tem realmente o seu espaço e o respeito que merece ?

O desenvolvimento do tema revela a tentativa em provar que, é fundamental, o

reconhecimento do portador de necessidades especiais como ser humano e como parte

integrante de nossa sociedade, devendo nela estar inserido.

O presente trabalho vem confirmar as dificuldades de aprendizagem e socialização

8

encontradas por esses indivíduos e a importância da inclusão.

Baseou-se teoricamente em: Stainback e Stainback, Mantoan e Sassaki .Além disso,nos

documentos : Declaração de Salamanca ( 1994 ) e Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional.

Foi utilizada como metodologia a pesquisa bibliográfica e a experiência referente ao que

foi observado no PROJETO CONVIVER.

No Capítulo I apresentou-se o ser humano portador de necessidades especiais, como era

visto através do tempo, nos diversos grupos sociais.

O Capítulo II enfoca as dificuldades encontradas na socialização e na aprendizagem.

No Capítulo III foi analisado o conceito de inclusão e a sua importância.

E, finalmente, no Capítulo IV foi apresentado o PROJETO CONVIVER como um

exemplo de inclusão.

9

CAPÍTULO I - QUEM É O SER HUMANO PORTADOR DE

NECESSIDADESESPECIAIS ?

Em nossa sociedade constituída de diversos grupos sociais, sendo muitos deles alvos

da discriminação, preconceito e exclusão, iremos encontrar pessoas muito especiais, que com

suas características peculiares são chamadas de portadores de necessidades especiais. Tais

pessoas, na maioria das vezes, têm suas capacidades, sentimentos e direitos esquecidos, sendo

colocados à margem de uma sociedade que se considera normal e que, por conta disso, julga-se

capaz de estabelecer parâmetros. É interessante observar que essa visão excludente, vem se

perpetuando desde tempos bem antigos.

Entre os povos primitivos, as pessoas portadoras de deficiência eram consideradas como

uma degeneração e por este motivo eram abandonadas ou eliminadas pelo incômodo que traziam

ao próprio grupo e à sobrevivência do mesmo. Como exemplo, podemos citar os antigos

habitantes da Bolívia e os nativos da Indonésia. Já os astecas, antigos habitantes do

México,prendiam os deficientes, para que fossem ridicularizados.

Alguns povos antigos, como os hebreus consideravam qualquer tipo de deficiência uma

espécie de punição de Deus. Por isso, os deficientes eram proibidos de dirigir os serviços

religiosos. Na Roma antiga e em Esparta, os deficientes eram mortos.

Ao contrário, os hindus sempre consideraram os cegos e os incentivavam nos serviços

religiosos.

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Na Idade Média, sob a influência da igreja, os portadores de deficiência mereciam a

caridade e a vida, porque estavam pagando os seus pecados passados ou atuais.

Em nosso país, no período colonial, a pessoa portadora de deficiência ficava

exclusivamente sob a responsabilidade da família, suas crenças, possibilidades econômicas,o

que se tornava uma tarefa difícil devido aos mitos, preconceitos e fatalismos vigentes na

sociedade.

A visão quanto à deficiência na primeira metade do século XX, para MARCHESI e

MARTIN ( 1995 ), envolvia características de inatismo cuja causa era essencialmente

orgânica.

Nos Estados Unidos, durante 1930 / 1935, dois odontopediatras agruparam indivíduos

ditos fora dos padrões de normalidade, que apresentavam alterações físicas e/ou mentais, e por

isso impossibilitados de receber tratamento dentário regular. Estes pacientes foram rotulados

de: descapacitados, diminuídos, incapacitados e excepcionais.

Sendo excepcional uma terminologia traduzida em nosso país, foi nele utilizada por

diversas décadas. No entanto, não sendo capaz de abranger outros desvios dos

padrões da normalidade, e não só os decorrentes de deficiências físicas e mentais, foi substituída.

Além disso, o termo excepcional vinha impregnado de uma forte carga pejorativa, restrita e

limitada. Era necessário uma terminologia mais abrangente e, o termo excepcional foi mudado

para especial.

Passou-se, então, a se designar essas pessoas como pacientes especiais e mais

atualmente, portadores de necessidades especiais.

Como a questão da deficiência envolve inúmeras causas e peculiaridades dos diversos

grupos, tornou-se difícil uma conceituação.

A deficiência se apresenta sempre como uma limitação, isto é, perda total ou parcial de

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oportunidades na vida comunitária em condições de desigualdade.

As deficiências se classificam em : congênitas e adquiridas. Congênitas são as que

nascem com a criança. Ex.: a Síndrome de Down.

As deficiências que são contraídas por uma doença ou acidente são chamadas de

adquiridas. Ex.: Meningite, diabete, etc..

As deficiências quanto ao tipo podem ser :

. Deficiência física - é todo comprometimento que envolve a mobilidade, a

coordenação motora geral ou da fala e que tenha sido causado por lesões neuromusculares,

neurológicas e ortopédicas, ou ainda, por má formação; podendo ser congênita ou adquirida.

. Deficiência mental - é a lentidão ou o atraso no desenvolvimento mental, que pode ser

observada no modo de escrever, caminhar, falar. Varia de nível leve a profundo, conforme o

grau de comprometimento.

. Deficiência visual - é a que se caracteriza por uma limitação no campo visual. Pode

variar de uma visão subnormal até a cegueira total.

. Deficiência auditiva - é a perda parcial ou total da capacidade de audição e,

consequentemente, compreensão da fala.

. Autismo - é uma síndrome que se caracteriza sempre pela presença de desvios nas

relações interpessoais, comunicação, linguagem e comportamento.

. Deficiência múltipla - é aquela em que se manifesta mais de uma deficiência.

Os superdotados representam uma categoria que não é caracterizada por deficits, mas

que necessitam de um atendimento especial. Os portadores de altas habilidades, talentosos ou

superdotados possuem habilidades nas áreas cognitivas de aprendizagem, espírito crítico,

criatividade, liderança, senso de humor, etc.

É importante que não se generalizem e se observem as manifestações dos superdotados,

porque podem aparecer dificuldades de adaptação, ao serem discriminados ou rejeitados.

12

CAPÍTULO II - DIFICULDADES ENCONTRADAS NA

SOCIALIZAÇÃO E NA APRENDIZAGEM

A deficiência traz efeitos importantes que se refletem no desenvolvimento da

personalidade e no desenvolvimento social do indivíduo. Numerosos e variados são os

comportamentos que exprimem negação, marginalização e superproteção das pessoas em relação

à deficiência.

1. Ambiente Familiar

Ao nascer uma criança com deficiência, a família se transforma, a carga emocional

aumenta e dependendo de como a notícia é apresentada, determinará a aceitação ou não por seus

familiares.

Os pais geralmente idealizam o filho que vai nascer não só fisicamente, mas também em

relação ao seu comportamento Assim sendo, é difícil conciliar a imagem do filho idealizado

com a imagem real. É quando surgem alguns mecanismos de defesa e que se manifestam em

atitudes de :

- Negação, quando os pais procuram negar o problema, deixando de seguir as prescrições

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médicas e procurar a ajuda necessária nos centros de reabilitação.

- Rejeição, quando os pais se afastam do filho; apesar de se preocuparem com ele,

consideram-se impotentes diante da situação. Como conseqüência dessa atitude dos pais, os

filhos poderão desenvolver sentimentos de inferioridade, insegurança, falta de confiança em si,

falta de iniciativa, tensão e ansiedade.

- Projeção, quando os pais projetam a culpa que sentem em pessoas próximas.

Geralmente essa culpa é transferida para o próprio cônjuge ou aos profissionais envolvidos com

a criança.

- Superproteção, quando não se permite o desenvolvimento do filho, procurando

impedi-lo que sofra frustrações necessárias ao seu crescimento pessoal. Geralmente este

comportamento é mais observado nas mães. É comum, nesses pais, observarmos os sentimentos

de medo, vergonha, culpa, incapacidade e impotência.

Todas essas atitudes e sentimentos são naturais, pois torna-se extremamente difícil, de

imediato, a aceitação da família e dos pais, de um filho portador de deficiência.

2. Ambiente Social

Ao enfocarmos a sociedade, notamos a dificuldade da aceitação de tudo aquilo que é

diferente. Assim, também observamos a mesma atitude quando se trata dos portadores de

deficiência.

Essa influência da sociedade relacionada com a rejeição do diferente é vista no

comportamento de crianças pequenas que se relacionam e brincam, sem quaisquer restrições,

com as crianças diferentes. Só depois de incorporarem o padrão de beleza e perfeição ditados

pela sociedade, é que passam a se divertir com a deficiência dos outros. É a sociedade, através

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de sua atitude, que na maioria das vezes, irá definir a deficiência como incapacidade e rotular

o portador de deficiência de : gaguinho, retardado, “mongo”, lesado,etc.

A partir dos anos 40 e 50, começou-se a levar em consideração, também, as influências

sociais e culturais como determinantes do funcionamento intelectual das pessoas com

deficiência, e que poderia ter surgido pela falta de estimulação adequada ou aprendizagem

incorreta.

A primeira metade do século XX, caracterizou-se no Brasil pelo surgimento de muitas

instituições asilares e de escolas especiais de natureza particular e assistencialista.

Via-se, de um modo geral, a pessoa portadora de deficiência como desnecessária para o

sistema de produção adotado no país, causa de gastos não somente para a família, mas também

para a sociedade, e ameaça para a Saúde Pública. Restava apenas a marginalização social e o

confinamento em asilos e instituições, disfarçados sob um conjunto de idéias científicas,

religiosas e assistenciais. Esta situação continuou até o fim da década de 60.

Os pensadores europeus e norte-americanos influenciaram o Brasil a rever a sua prática

de relações com a população em questão, pois a diminuição do custo social nas políticas públicas

de saúde depois de 64 era fator motivador para a consideração das críticas ao uso da

institucionalização. As críticas indicavam que a experiência da institucionalização era um meio

de alienação da pessoa portadora de deficiência da vida em sociedade, a que sempre teve direito

enquanto cidadão.

O que ocasionou muitos debates, na década de 60, foi o que supunha a existência de uma

“condição normal”, representada, na curva estatística de normalidade, pelo maior percentual e

uma “condição de desvio”, representada por menores percentuais de pessoas, na mesma curva.

Buscou-se a construção do conceito de integração, que defendia o direito e a necessidade

das pessoas consideradas “anormais”, a serem tratadas, de modo a se aproximarem o máximo

possível, dos chamados níveis da normalidade estatística, isto é, que as pessoas ditas diferentes

se assemelhassem à maioria.

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Podemos acrescentar, ainda, que o modelo considerado “normal”, imposto pela nossa

sociedade, desqualifica o diferente. O estabelecimento de um modelo de “ser humano normal”

e as diversas instituições como Família, Escola, Igreja e Estado, trabalham apenas no sentido de

prestar assistência aos diferentes. É necessário por parte das escolas, não só uma especialização,

mas um respeito, um voto de confiança na capacidade de quebrar limites, tão próprios do ser

humano. Esta capacidade é a própria cultura, sendo necessária a compreensão de que uma pessoa

é considerada diferente através de padrões estabelecidos fora dela, pela média, pelo senso

comum, e a média não pode ser o ideal porque não ressalta as diferenças sociais, psicológicas,

econômicas e culturais.

Por outro lado, a dificuldade de integração social da pessoa portadora de deficiência é

incentivada pelo sistema capitalista porque é qualificada como improdutiva.

O Brasil, por estar num processo de democratização de suas instituições, exige que o seu

sistema educacional se reestruture para que possa atender a todos os educandos, respeitando suas

diferenças, de modo que perceba a pessoa com necessidades especiais sob aspectos de suas

potencialidades, capacidades, competência e desempenho.

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CAPÍTULO III - INCLUSÃO

Atualmente vivemos um momento histórico muito importante. Vários grupos sociais

lutam pelos seus direitos na sociedade. É o que acontece com os negros, sem-terra e tantos outros

excluídos. Muitos já avançaram, embora não tenham conseguido totalmente sua inclusão na

sociedade. Como esses, formam um outro grupo de excluídos, as pessoas com deficiência, que

não possuem os direitos que devem pertencer a todos, como : educação, saúde, trabalho,

locomoção, transporte, cultura, lazer e esporte.

Muitas palavras são ditas, leis têm sido criadas para garantir esses direitos, o que já é o

início de um caminho. Mas, apesar disso tudo, percebemos que nós excluímos as pessoas que

consideramos diferentes.

“Seja como for, é sempre importante sublinhar que o DESCONHECIMENTO é a matéria-prima para a perpetuação das atitudes preconceituosas e das leituras

estereotipadas da deficiência - seja esse conhecimento relativo ao fato em si, às emoções geradas ou às reações subseqüentes.”

( AMARAL, 1994, p. 18 )

Torna-se necessário, conhecer melhor a pessoa com deficiência, como vive, quais as suas

expectativas, necessidade e alternativas, desfazendo os mitos.

Quando enfocamos os documentos e direitos adquiridos, pelas pessoas portadoras de

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deficiência, podemos citar :

. Conferência Mundial sobre Educação para Todos - realizada em Jomtien, na Tailândia

em 1990;

. Declaração de Salamanca - realizada em Salamanca, na Espanha, em 1994. Estiveram

presentes nesta reunião mais de 300 representantes de 92 governos e de 25 organizações

internacionais. Ela retrata os princípios, a política e a prática da educação : Educação Continuada

e de adultos, onde “deverão ser também planejados cursos especiais que ajustem às necessidades

e condições de diferentes grupos de adultos com deficiência.”

. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996, chamando atenção para a

necessidade e prioridade de mudanças de paradigmas políticos, sociais, culturais,

relacionando-os com os que têm sido historicamente marginalizados e excluídos.

Se desejamos realmente uma sociedade democrática, devemos criar uma nova ordem

social, através da qual todos sejam incluídos com os seus direitos e os seus deveres.

Esta reflexão nos leva à inúmeras interrogações. Como o que acontece comigo se passa

com o outro que é diferente de mim ? Como é ser pai ou mãe de uma pessoa que tem

deficiência mental ? Como é a vida de uma pessoa deficiente ? Como uma pessoa que tem

deficiência mental aprende ?

Todo este pensamento de se colocar no lugar do outro nos faz pensar sobre as

dificuldades e conquistas dos excluídos e a busca de soluções simples que possam ser

concretizadas, tais como : assistência à saúde, qualificação profissional, emprego, prática de

esportes, sala de aula, lazer e cultura.

Mas, essa realização somente será alcançada se cada um de nós procurar resposta para a

pergunta : o que eu posso fazer para contribuir na inclusão daqueles que são diferentes de

mim ?

É importante voltarmos a nossa atenção também para a educação precoce, para que o

seu desenvolvimento não seja prejudicado por aspectos inadequados. Os estímulos que a criança

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recebe do ambiente onde vive constituem fatores necessários para o seu bom desenvolvimento.

A educação precoce consiste em :

“...uma série de exercícios específicos usados para desenvolver a capacidade daquela criança de acordo com seu grau de comprometimento e com a fase de desenvolvimento em que se encontra.” ( WERNECK, 1995, p. 144 )

Para que isso aconteça é necessário um diagnóstico da criança, com suas dificuldades e

limitações.

Observando as considerações, anteriormente feitas, constatamos que a educação

encerrou o milênio abrindo o caminho para a inclusão. Esta é uma nova luta, para o ser humano

portador de necessidades especiais, e significa a busca de sua permanência no sistema escolar

regular de ensino com a escolaridade igual a dos demais alunos. Esta idéia, vinda a partir da

Declaração de Salamanca, suscita outras idéias relacionadas com a inclusão, como escolas

inclusivas, políticas educacionais inclusivas e sociedades inclusivas.

Há uma tendência de se confundir os termos : inclusão e integração, pois a maioria de

nossas leis, inclusive a Constituição Federal, bem como a maioria dos órgãos públicos, utiliza

o termo integração. Acontece que existe um movimento mundial pela inclusão da pessoa

portadora de necessidades especiais, e não mais uma simples integração.

Integrar significa adaptar-se, incorporar-se, acomodar-se; não é o melhor termo porque

se presume tratar da reunião de grupos diferentes. Reflete a tentativa do portador de deficiência

para incorporar-se, adaptar-se. Já o termo inclusão significa envolver, fazer parte, pertencer.

Mesmo o termo inclusão merece alguns esclarecimentos. A inclusão procura : atender

aos estudantes portadores de necessidades especiais da comunidade; propiciar o acesso destes

alunos às classes comuns e aos professores um suporte técnico; verificar que as crianças podem

aprender juntas apesar, dos processos serem diferentes; levar os professores a desenvolver formas

19

criativas de atuação.

A inclusão não é : levar crianças às classes comuns sem o acompanhamento do

professor especializado; não considerar as necessidades específicas das crianças, fazendo-as

seguirem um processo único de desenvolvimento, não apenas para todas as idades e ao mesmo

tempo; acabar o atendimento da educação especial antes do tempo; esperar que os professores

de classe regular ensinem as crianças sem um suporte técnico.

As crianças e jovens com necessidades especiais deverão se beneficiar dos apoios não

só individuais, mas de todas as ajudas que os auxiliem a se aproximar dos comportamentos

adaptativos comuns à sua idade e ao meio em que se inserem. Deverá ser aplicado um

currículo versátil na sala de aula regular, além de um planejamento compartilhado entre :

escola, família e comunidade. Tais aspectos são essenciais para o desenvolvimento deste

processo. Para SUSAN STAINBACK e WILLIAM STAINBACK, a inclusão é uma consciência

de comunidade, uma aceitação das diferenças e uma corresponsabilização para atender às

necessidades desse grupo.

Não há o que ser adaptado, pois não se adapta o que já faz parte, apenas se oferecem

condições para que não haja a exclusão. Essas condições, começando pela educação

inclusiva, é que devemos cobrar das autoridades e de nós mesmos.

É importante que as escolas de nível médio implementem cursos profissionalizantes

que dêem a qualificação profissional às pessoas portadoras de deficiência., pois as mesmas

encontram inúmeras dificuldades ao tentar arrumar trabalho. Mesmo com a lei que garante a

disposição de vagas, não conseguem trabalho porque não existe fiscalização para o

cumprimento da mesma.

Somente a educação pode estabelecer a ligação entre o empregador e a pessoa

portadora de necessidades especiais, prestando esclarecimentos e dando assistência para ambos.

Para isso, o empregador deverá estar aberto às informações e a educação descerrar o

caminho para a inclusão social.

20

“... uma sociedade inclusiva vai bem além de garantir espaços adequados para todos. Ela fortalece as atitudes das diferenças individuais e a valorização da diversidade humana e enfatiza a importância de perceber, da convivência, da cooperação e da contribuição que todas as pessoas podem dar para construírem vidas comunitárias mais justas, mais saudáveis e mais satisfatórias.” ( SASSAKI, 1997, pp. 164 - 165 )

É importante salientar que as práticas inclusivas não constituem apenas um trabalho

metodológico, mas devem ampliar no campo social o significado de ser diferente.

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CAPÍTULO IV - A INCLUSÃO E O PROJETO

CONVIVER

“ A seletividade do olhar cotidiano é implacável : dois pés descalços não são dois pés descalços. Um é um pé que perdeu o sapato. O outro, simplesmente não existe. Um é o pé de um menino. O outro é o pé de ninguém.” ( PABLO GENTILE, In SILVA e VIZIM, 2001, p. 51 )

A exclusão, ainda atingindo muitos segmentos da nossa sociedade, tem sido vista como

um comportamento normal, natural. Em muitas situações, de maneira acomodada,

acostumamo-nos com a sua presença, que passa a ser apenas mais um dado entre tantas

estatísticas que nos cercam.

Não é admissível que o pensamento descrito anteriormente continue acontecendo, pois

a exclusão é um problema que pertence a todos nós. Não podemos nos silenciar e ficar omissos

diante dessa violência social.

Felizmente, muitas são as iniciativas louváveis de buscar e promover um real processo

de inclusão, no caso dos portadores de necessidades especiais. Um exemplo desse tipo de

iniciativa é o PROJETO CONVIVER.

Mas, para falarmos desse projeto, torna-se necessário reportarmo-nos à Escola Estadual

de Educação Especial Antônio Francisco Lisboa, inaugurada em fevereiro de 1992. Está

situada à Rua Mariz e Barros, 415 - casa 7, na Tijuca.

22

A instituição, desde a sua fundação até os dias atuais, travou inúmeras batalhas e obteve

algumas conquistas, firmando o seu espaço e criando a sua identidade. Procurando fazer um

trabalho de aproximação entre essa escola e a comunidade, criou-se o PROJETO CONVIVER.

O PROJETO CONVIVER, coordenado pela Professora Vera Lucia Vaz Agarez, é

também um espaço que promove o intercâmbio de experiências entre os alunos de

Pós-Graduação da Universidade Cândido Mendes, que lá realizam seus estágios, participando

de atividades pedagógicas e recreativas desenvolvidas com os alunos da escola e outras pessoas

da comunidade local. Esses encontros se dão aos domingos, pela manhã.

O trabalho, anteriormente planejado pelas equipes de estagiários é distribuído,

dependendo do número de alunos, em diversas oficinas, como por exemplo : desenho, pintura,

modelagem, teatro, etc.

Nesses encontros também é desenvolvido um trabalho com as mães dos alunos. Às

vezes, palestras que esclarecem assuntos por elas solicitados, ou oficinas onde aprendem a

realizar trabalhos que podem ajudá-las financeiramente, como : crochê, pintura em tecido,

pintura em vidro, etc.

O PROJETO CONVIVER proporciona um ambiente que favorece a criação e o

desenvolvimento da amizade.

“Se nossas escolas e comunidades não puderem receber e abraçar a diversidade

e apoiar as amizades entre seus membros, não haverá inserção. E sem uma sensação de inserção, não é possível considerar questões de nível menos elevado, como aprender ou trabalhar. Finalmente, desenvolver amizades significa viver e

aprender junto. Significa intencionalidade, participação na comunidade e inclusão.”

( STAINBACK e STAINBACK, 1999, p. 170 )

Observamos, a amizade e a brincadeira surgidas livremente durante a realização das

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atividades entre todos os que nelas estão envolvidos, sejam eles portadores ou não de

deficiências. O que era visto como diferença ou como empecilho no relacionamento passa a

ser encarado com naturalidade.

As propostas de atividades são as mais variadas, contudo é interessante assinalar o

alcance daquelas que estejam voltadas para a musicalização e a expressão corporal.

Dentro do projeto, a música tem sido um excelente canal de aproximação e contato

com os portadores de necessidades especiais. Ela é algo que faz parte de seu cotidiano e, por

conseguinte, estabelece um grande elo com a realidade. A realização de movimentos, a dança

e a utilização de instrumentos musicais dinamiza o trabalho e favorece o desenvolvimento da

coordenação motora e do ritmo.

As artes plásticas também representam um trabalho que procura incentivar a

capacidade criadora. A pintura, explorando uma gama de cores, bem como a criação através

de modelagem, geralmente utilizando argila, estimulam a área psicomotora e beneficiam a

área emocional.

Outra prática que é vista como forma de integração social e cultura, e de grande

importância são as visitas que fazem aos museus, clubes, parques, etc. Nestes momentos, os

portadores de necessidades especiais, além da oportunidade de contato com outras pessoas,

vivenciam situações de aprendizagem, de aquisição de informações e enriquecimento do

vocabulário.

A atuação do PROJETO CONVIVER vai mais além do que foi citado anteriormente.

Ela desperta a conscientização dos que não são portadores de necessidades especiais, os ditos

normais, seja desfazendo “rótulos”, mas também convivendo e encarando de frente a

diversidade como algo natural, que faz parte do ser humano.

Além das atividades desenvolvidas até o momento, o projeto organizou um encontro

modelar, isto é, um evento cujo objetivo foi o de apresentar os seus moldes de trabalho,

divulgando-o, pela rede particular de televisão da Universidade Cândido Mendes, à diversas

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capitais brasileiras. Através da realidade demonstrada, espera-se a sensibilização de outras

pessoas, para que essa mesma iniciativa possa ser implementada em outros locais e outros

contextos.

Ao final do evento, observou-se um resultado extremamente positivo, assim como no

desenvolvimento do PROJETO CONVIVER, onde aprendizagem, afetividade e socialização

são elementos continuamente estimulados e presentes.

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CONCLUSÃO

A inclusão é uma inovação que além de causar polêmica, na maioria das vezes, é vista

de modo distorcido nos diversos meios educacionais.

Nossos desafios são inúmeros. Um deles é o de que as escolas de ensino regular,

geralmente, não estão preparadas para receber o portador de necessidades especiais.

Na maioria das vezes, o que vemos são escolas solicitando aos responsáveis que o

aluno precisa se retirar porque não houve adaptação. Outras fecham suas portas negando até a

matrícula porque, segundo elas, não há vagas; ou o que é pior, o aluno é aceito mas sofre a

exclusão de não ter amigos, ser olhado com escárnio, ter vergonha de ser diferente.

O ser humano precisa ter humildade para entender e aceitar que somos ínfimos dentro

do universo e, orgulho em saber que todos somos importantes e temos um papel a desempenhar.

Precisamos aprender a conviver com as diversidades, a aceitar as diferenças e transformá-las

em benefício para todos. Precisamos fazer a nossa parte, pois somos responsáveis pelas

transformações ocorridas na sociedade.

São necessárias e importantes as escolas especiais. Porém, que se criem espaços, onde

haja a inclusão, como o PROJETO CONVIVER.

Trabalhar a família é fundamental. E o primeiro momento de inclusão é feito com os

pais. A criança deficiente precisa se sentir amada e querida, tendo seu lugar garantido dentro da

família e sendo capaz de fazer o que dela se espera. Precisa confiar, assim como devem confiar

26

nela.

O sucesso dos programas de educação, habilitação e tratamento dependem do

empenho de todos os especialistas envolvidos, assim como da coordenação estreita entre pais e

escola. Acima de tudo, deverá estar sempre presente o respeito pelas diferenças em relação às

potencialidades.

O PROJETO CONVIVER é, também, um processo de inclusão, quando é aberto para a

comunidade, trazendo-a para a escola, promovendo uma grande interação entre alunos,

estagiários, familiares e demais pessoas. Nada é compulsório, tudo se dá com espontaneidade.

Incluir é transformar; é criar espaços onde possamos desfrutar as nossas diferenças,

respeitando e exercendo o direito de sermos diferentes, como seres humanos iguais. Atuar na

construção de uma sociedade para todos é, mais do que tudo, compreender as diferenças não

como meios de segregação e exclusão, mas como fontes de tolerância e solidariedade, afastando

sentimentos de arrogância e indiferença.

A idéia do PROJETO CONVIVER deveria ser divulgada e, espaços semelhantes

deveriam ser criados no maior número possível, implementando verdadeiramente atividades

que promovam a inclusão.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARAL, Lígia Assumpção.Pensar a diferença/deficiência. Brasília, CORDE- Coordenadoria

Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, 1994.

COLL, César; PALACIOS, Jésus; MARCHESI, Álvaro. Desenvolvimento Psicológico e

Educação : necessidades educativas especiais e aprendizagem escolar. V.3, Porto

Alegre : Artes Médicas, 1995.

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA E LINHA DE AÇÃO : SOBRE NECESSIDADES

EDUCATIVAS ESPECIAIS. Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas

Especiais : Acesso e Qualidade. Salamanca, Espanha, 1994.

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