o sentido de aprender matemática acerca da fórmula de baskara

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA MESTRADO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA JOSÉ ALDON GARÇÃO SANTOS O SENTIDO DE APRENDER MATEMÁTICA ACERCA DA FÓRMULA DE BHASKARA São Cristóvão/SE 2011

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Aprender matemática

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E PESQUISA

    NCLEO DE PS-GRADUAO EM ENSINO DE CINCIAS NATURAIS E MATEMTICA

    MESTRADO EM ENSINO DE CINCIAS NATURAIS E MATEMTICA

    JOS ALDON GARO SANTOS

    O SENTIDO DE APRENDER MATEMTICA ACERCA DA FRMULA DE BHASKARA

    So Cristvo/SE 2011

  • FICHA CATALOGRFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

    S237s

    Santos, Jos Aldon Garo O sentido de aprender matemtica acerca da frmula de Bhaskara / Jos Aldon Garo Santos. So Cristvo, 2011. 128 f. : il.

    Dissertao (Mestrado em Ensino de Cincias Naturais e Matemtica) - Universidade Federal de Sergipe, Pr-Reitoria de Ps-Graduao e Pesquisa, Programa de Ps-Graduao em Cincias Naturais e Matemtica, 2011.

    Orientador: Prof. Dr. Bernard Charlot Co-Orientador. Prof. Dr. Rita de Cssia Pistia Mariani

    1. Ensino de matemtica. 2. Equaes. 3. Frmula de Bhaskara. 4. Ensino Aprendizagem. I. Ttulo.

    CDU 51:37.091.3

  • JOS ALDON GARO SANTOS

    O SENTIDO DE APRENDER MATEMTICA ACERCA DA FRMULA DE BHASKARA

    Dissertao de Mestrado submetida ao Ncleo de Ps-Graduao em Ensino de Cincias Naturais e Matemtica da Universidade Federal de Sergipe, como requisito para a obteno do ttulo de Mestre em Ensino de Cincias Naturais e Matemtica.

    Orientador: Prof. Dr. Bernard Charlot C-Orientadora: Profa. Dra. Rita de Cssia Pistia Mariani

    So Cristvo/SE 2011

  • O SENTIDO DE APRENDER MATEMTICA ACERCA DA FRMULA DE BHASKARA

    Dissertao apresentada pelo mestrando JOS ALDON GARO SANTOS ao curso de Mestrado em Ensino de Cincias Naturais e Matemtica/NPGECIMA/UFS em 20 de junho de 2011 sob a avaliao da Banca Examinadora composta por:

    ________________________________________________________________

    Prof. Dr. Bernard Charlot Orientador

    _________________________________________________________________

    Profa. Dra. Veleida Anah da Silva Convidada

    _________________________________________________________________

    Prof. Dr.Mricles Thadeu Moretti Convidado

  • Dedicatria A minha famlia:

    Pai, me, esposa, filhos e irmos. Fonte de minha existncia.

    Denize da Silva Souza, Professora e amiga, responsvel pelo meu ingresso no mundo da pesquisa, alm de sua

    disponibilidade constante na realizao dos trabalhos. Cristina Melo,

    Amiga, colega de curso e importante colaboradora na realizao dos trabalhos. Aos professores Bernard Charlot e Rita de Cssia Pistia Mariani,

    Que me orientaram com compreenso, dedicao, pacincia e sabedoria. Professora Veleida Anah da Silva,

    Esta me apresentou oficialmente ao universo da pesquisa cientfica.

  • AGRADECIMENTOS

    Deus que atravs de seus ensinamentos deixados aos homens me fez compreender o motivo de cada obstculo encontrado nos caminhos.

    Pai e Me que com amor, sabedoria e generosidade, me ensinaram os valores em que um ser humano necessita para ser uma pessoa melhor.

    Esposa, por sua dedicao, pacincia, carinho, zelo e amor.

    Filhos e Filhas, fonte de inspirao, luta e esperana.

    Colegas de curso, pelo apoio, ensinamentos, companheirismo, solidariedade e amizade.

    Professores do NPGECIMA, que com sabedoria, contriburam diretamente com meu desenvolvimento intelectual, abrindo os caminhos em direo ao universo da pesquisa e do saber cientfico.

    Funcionrios do NPGECIMA, que contriburam com a realizao dos trabalhos ao decorrer do curso.

    Ex-professores, que com sua sabedoria ensinaram-me a caminhar em busca do saber.

    Aos meus alunos e ex-alunos, por tudo que aprendi com eles.

    Aos alunos, professores, diretores, coordenadores e funcionrios, das escolas escolhidas como universo da pesquisa.

    Aos amigos verdadeiros, que se fizeram presentes nos momentos que mais precisei. Tambm queles que mesmo distantes, estavam torcendo pela realizao da pesquisa.

    Por fim, a todos que direto ou indiretamente contriburam para a realizao desse trabalho.

  • AGRADECIMENTOS ESPECIAIS

    DEUS - O mais sbio arquiteto do universo. Agradeo pelo dom da vida e por ter colocado em meu caminho muitas pessoas especiais que contriburam diretamente com a construo desse projeto.

    Aos meus Pais - que me conceberam a vida. E, me ensinaram os primeiros passos a uma vida digna e justa atravs de sua simplicidade, cuidados e o amor incondicional.

    A Esposa e Filhos - que incentivaram e apoiaram direto e indiretamente todos os momentos dedicados construo do saber.

    A todos os Professores com quem estudei - meu eterno agradecimento, por terem se dedicado com verdadeira devoo para que eu pudesse aprender um pouco de vossa riqussima sabedoria.

    A professora Denize da silva Souza querida professora e amiga, que contribuiu diretamente com a construo desse trabalho disponibilizando sabedoria, tempo e dedicao.

    A professora Cristina Melo Amiga e colega de turma que disponibilizou seus saberes, tempo e trabalho.

    Ao Professor Bernard Charlot Que alm de dispor, tempo, dedicao e sabedoria nas orientaes necessrias construo da pesquisa, tambm foi inspirao ao tema do projeto e da Dissertao, aps ter me encantado com sua teoria relao com o saber.

    A Professora Rita de Cssia pistia Mariani - Que orientou junto a Charlot, toda a construo dessa pesquisa com extrema dedicao e sapincia.

    A professora Veleida Anah da Silva Por ter sido a primeira professora da disciplina isolada, meio pela qual, ingressei no mundo da pesquisa cientfica.

  • A professora Ivanete Batista Santos Por suas sbias consideraes sobre minhas atuaes em suas aulas e, tambm, por aceitar participar da Banca de Qualificao desta pesquisa.

    Ao Grupo de Pesquisa EDUCON O primeiro grupo de pesquisa em que participei. Este abriu espaos para um leigo no mundo da pesquisa.

    A Secretaria da Educao dos Municpios Nossa Senhora das Dores e Itabaiana que incentivaram moralmente e financeiramente para realizao da pesquisa.

    A Famlia ISAAC MNEZES, Professores, diretora, coordenadora, pessoal de servios gerais e alunos Escola onde leciono Matemtica, desde o ano de 2005. Nesta constru verdadeiros laos de amizade. Meus sinceros agradecimentos pelo incentivo e apoio de sempre.

    E em Especialssima Condio Aos Autores com quem dialoguei durante a construo da pesquisa - Os mais sinceros agradecimentos, pois sem esses trabalhos que fundamentaram a investigao, seria muito mais difcil alcanar o objetivo final.

    A Universidade Federal de Sergipe UFS que disponibilizou alm de seu nome, todas as condies necessrias para a concretizao da pesquisa.

  • Os desejos, conquanto desejos e no apenas necessidades biolgicas, advm e

    transformam-se em determinadas relaes do ser humano com o mundo, com os outros e

    consigo mesmo. Bernard Charlot

  • RESUMO

    Pautada nas experincias dos alunos do nono ano do Ensino Fundamental, quando estudam a equao de segundo grau e a frmula de Bhaskara, esta pesquisa analisa qual o sentido de aprender Matemtica para esses alunos de escolas pblicas do municpio de Itabaiana/SE. De carter qualitativo, a pesquisa tem por objetivo verificar como o aluno se mobiliza para aprender os contedos matemticos, tendo como foco a equao de 2 grau e a frmula de Bhaskara, e busca compreender a relao com o saber nesta fase de aprendizagem. O aporte terico encontra subsdio nas teorias de Bernard Charlot (2007, 2005), Silva (2009), Boyer (2004) dentre outros. Os dados foram coletados por observao das aulas, com a aplicao de questionrios bem como por entrevistas, cujos resultados revelam que o aprendizado matemtico, especificamente a equao do segundo grau e a frmula de Bhaskara, influenciado diretamente pela presena do livro didtico, o qual, juntamente com as prticas docentes, vem contribuindo para que este contedo seja visto como sem relevncia para o futuro do aluno, prevalecendo memorizao momentnea (decorar) e no o aprendizado efetivo.

    Palavras-chave: Matemtica; Relao com o saber; Equao do 2 grau; Bhaskara e Livro didtico.

  • ABSTRACT

    Regarding the experiences of the ninth graders students from primary school, when they study both quadratic equation and Bhaskaras formula, this research examines what the sense of the Mathematics learning for public schools students from Itabaiana/SE. This is a both qualitative research, and it intends verifying how a student mobilized himself to learn those math subjects, focusing on the quadratic equation and Bhaskaras formula, it seeks understanding the relation with the knowledge at this stage of learning. The theoretical contribution comes from the theories of Bernard Charlot (2007, 2005), Silva (2009), Boyer (2004) among others. The data collected through observation of classes, with the use of questionnaires and interviews reveal that the mathematics learning, specifically the quadratic equation and Bhaskaras formula, is directly influenced by the presence of the didactical textbook which, along with the teaching practices, has contributed to this content to be viewed as irrelevant to the student future, giving the prevail to the momentary memory (learn by heart) and not to the effective learning.

    Key-words: Mathematics; Relation with the knowledge; Quadratic equation; Bhaskara and Didactical textbook.

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 - Particularidades dos Livros Didticos de Matemtica, quanto forma de abordagem sobre a resoluo da equao de 2 grau, usando a frmula de Bhaskara (Livro 1 - A Conquista da Matemtica).......................................................................... 27

    Quadro 2 - Particularidades dos Livros Didticos de Matemtica, quanto forma de abordagem sobre a resoluo da equao de 2 grau, usando a frmula de Bhaskara (Livro 2 Tudo Matemtica)....................................................................................... 29

  • LISTA DE TABELAS

    TABELA 01: Distribuio da escola por turmas ............................................................ 45 TABELA 02: Organizao funcional da escola .............................................................. 46 TABELA 03: Distribuio da escola por turmas ............................................................ 46 TABELA 04: Organizao funcional da Escola.............................................................. 47 TABELA 05: Distribuio dos alunos por idade ............................................................ 49 TABELA 06: Distribuio dos alunos por sexo em valores absolutos e relativos .......... 49 TABELA 07: Periodicidade da observao das aulas ..................................................... 52 TABELA 08: Periodicidade da aplicao dos questionrios........................................... 54 TABELA 09: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 70 TABELA 10: Anlise das respostas da entrevista ........................................................... 77 TABELA 11: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 79 TABELA 12: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 82 TABELA 13: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 85 TABELA 14: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 86 TABELA 15: Periodicidade da observao das aulas ..................................................... 88 TABELA 16: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 99 TABELA 17: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 91 TABELA 18: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 92 TABELA 19: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 94 TABELA 20: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 95 TABELA 21: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 97 TABELA 22: Anlise das respostas dos questionrios ................................................... 98 TABELA 23: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 100 TABELA 24: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 102 TABELA 25: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 103 TABELA 26: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 104 TABELA 27: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 105 TABELA 28: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 106 TABELA 29: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 107 TABELA 30: Anlise das respostas dos questionrios ................................................. 108

  • SUMRIO

    INTRODUO ............................................................................................................... 14 CAPTULO 1 FUNDAMENTAO TERICA ........................................................ 18 1.1 A lgebra e as equaes de 2 grau: um breve histrico ....................................... 18 1.1.1 Um breve histrico a respeito da lgebra .............................................................. 19 1.1.2 A Frmula de Bhaskara segundo Livros Didticos de Matemtica ....................... 24 1.2 A relao com o saber e as interaes com o sentido de aprender Matemtica ..... 32 1.3 O sentido da Matemtica: caractersticas e desafios .............................................. 37 CAPTULO 2 PERCURSO METODOLGICO DA PESQUISA .............................. 44 2.1 O Contexto da pesquisa ......................................................................................... 44 2.2 Sujeitos da pesquisa ............................................................................................... 48 2.3 Tcnicas e instrumentos utilizados na pesquisa ..................................................... 50 CAPTULO 3 APRESENTAO E ANLISE DE DADOS .................................... 59 3.1 O sentido da aprendizagem da equao de 2 grau na perspectiva do aluno ......... 59 3.2 Aspectos observados em sala de aula: abordagens e perspectivas ......................... 62 3.3 Perspectivas dos alunos sobre a Matemtica: Mobilizaes e estratgias para aprender ....................................................................................................................... 68 3.3.1 O sentido de aprender a Matemtica para os sujeitos da pesquisa ......................... 68 3.3.2 Equao do 2 grau e a Frmula de Bhaskara na concepo dos alunos ............... 84 CAPTULO 4 O SENTIDO DA APRENDIZAGEM MATEMTICA SEGUNDO A PESQUISA .................................................................................................................... 110 4.1 O sentido de aprender a equao de 2 grau na segundo dados da pesquisa........ 110 CONSIDERAES ...................................................................................................... 115 REFERNCIAS ............................................................................................................ 122 APENDICE ................................................................................................................... 125 1 Questionrio ............................................................................................................... 125 2 Entrevista .................................................................................................................... 128

  • 14

    INTRODUO

    Na lgebra o estudo das expresses e das equaes, bem como da frmula de Bhaskara, apresenta grande importncia para a construo dos saberes matemticos dos alunos na Educao Bsica, tanto para estudos passados, como para estudos contemporneos.

    Durante nossa atuao nos anos finais do Ensino Fundamental, lecionando Matemtica, fortes indcios identificaram as dificuldades enfrentadas pelos alunos ao estudarem o contedo matemtico em pauta a equao do 2 grau. Isto nos instigou a pesquisar sobre a problemtica: Qual o sentido do aprender Matemtica para alunos do 9 ano do Ensino Fundamental de escolas pblicas localizadas no municpio de Itabaiana/SE.

    Na fase do Ensino Fundamental, que corresponde ao ltimo ciclo, segundo os Parmetros Curriculares Nacionais PCN (BRASIL, 1998, p.155), o estudo da lgebra constitui um espao bastante significativo de abstrao e generalizao, alm de lhe possibilitar a aquisio de uma poderosa ferramenta para resolver problemas, dessa forma, apresenta-se para o aluno com caractersticas prprias e bem definidas, tornando-se mais desafiante por exigir maior abstrao na compreenso dos conceitos matemticos que lhes so peculiares.

    A opo por ter como objeto de estudo a equao de 2 grau, sob a resoluo da frmula de Bhaskara resultou de motivos especiais, dentre os quais, a necessidade de compreender que dificuldades os alunos enfrentam quando estudam esse contedo e como o livro didtico de Matemtica, que o professor utiliza e/ou adota para planejar e organizar suas aulas nessas turmas influencia o aluno do 9 ano do Ensino Fundamental a aprender a equao do 2 grau sob a frmula resolutiva, tambm chamada de Frmula de Bhaskara.

    Essa motivao remete ao estudo da relao com o saber, pautando-se em Charlot (2000 e 2005), autor da prpria teoria, e como decorrncia o debruar em outros estudos correlacionados a essa noo terica, a exemplo de Silva (2009) quando busca

  • 15

    verificar como os alunos do Ensino Fundamental se mobilizam para aprender Matemtica, investigando a questo do sentido e da atividade intelectual.

    Charlot (2009, p. 09), ao prefaciar a obra de Silva (2009)1, comenta que para mobilizar-se intelectualmente, preciso achar sentido nesta atividade intelectual; quem no entende de que se trata no faz esforo algum para pensar e aprender. Nessa reflexo, muitas questes apontam o interesse na pesquisa com alunos do 9 ano, visando analisar a relao que esses tm com o sentido de aprender o contedo equao de 2 grau. Pois concordamos com a ideia de que pesquisar a relao com o saber uma exigncia ainda mais valiosa quando se trata de ensinar e aprender uma matria que carrega tantos preconceitos e esteretipos como a Matemtica (SILVA, 2009, p. 17).

    Na tentativa de responder a questo central de nosso estudo, procuramos organizar a coleta de dados a partir das seguintes questes: durante as aulas de Matemtica que relao identifica-se entre alunos e o sentido de aprender essa disciplina? Na relao do aluno com a equao do 2 grau acerca da frmula de Bhaskara, como se d o processo de desenvolvimento para a construo desse saber? Como o livro didtico de Matemtica utilizado pelo aluno, quando ele est aprendendo a equao de 2 grau na escola? Como a frmula de Bhaskara apresentada nos livros didticos de Matemtica mais utilizados pelos professores que trabalham nas escolas de rede pblica, em particular, no municpio de Itabaiana/SE?

    Para obter dados que respondessem a essas questes, procuramos realizar a pesquisa em duas escolas pblicas nesse municpio do agreste sergipano. Uma delas da rede municipal aqui denominada de Alfa, com oferta apenas para o Ensino Fundamental. Nessa escola foi escolhida uma turma de 9 ano denominada de turma urea, sob a regncia da professora, aqui nomeada por Amanda. A turma contava com 32 alunos participantes da pesquisa, sendo 14 do sexo masculino e 18 do sexo feminino.

    A outra escola escolhida pertence rede estadual A qual ser chamada de Delta. Nela realizamos a pesquisa com duas turmas (as quais sero tratadas neste texto como turma Brisa e turma Beta, respectivamente). A turma Brisa, de 9 ano 1A obra Por que e para que aprender matemtica? (SILVA, 2009) resultado de uma pesquisa realizada no municpio So Cristvo/SE em um espao de tempo compreendido entre dois anos (2004 -2006) com alunos de 1 a 5 sries (pela nova nomenclatura, do 1 ao 6 ano). Ver referncias.

  • 16

    do Ensino Fundamental, formada por 42 alunos, sendo 20 do sexo masculino e 22 do sexo feminino. A turma Beta, de 1 ano do Ensino Mdio, composta por 35 alunos 11 do sexo masculino e 24 do sexo feminino. Ambas as turmas regidas pela professora, aqui nomeada de Brenda.

    Criou-se nomenclatura para as escolas, turmas e professoras regentes com intuito

    de preservar suas identidades para que estejam livres de qualquer tipo de julgamento.

    A opo por turmas distintas permitiu uma anlise mais cuidadosa no sentido de poder comparar alunos de escolas, tambm distintas, e de nveis diferentes de escolarizao. A ideia foi verificar como ocorre o ensino e aprendizagem da equao de 2 grau a partir da frmula resolutiva, denominada no Brasil, como frmula de Bhaskara. Por outro lado, verificar como o contedo abordado quanto s metodologias e ao uso do livro didtico e qual sentido o aluno atribui a essa aprendizagem.

    Dentre esses objetivos, prevaleceram outros com a tentativa de identificar se os alunos do 9 ano do Ensino Fundamental sentem dificuldades para aprenderem o contedo em questo e se o sentido de aprender, para eles, tem ou no ponto de convergncia, tanto naqueles que estudam na escola estadual, como para os que estudam na escola municipal. Quanto aos alunos do 1 ano do Ensino Mdio, buscou-se averiguar o nvel de aprendizagem desse contedo, considerando a necessidade deles demonstrarem, nessa srie, o domnio sobre a equao de 2 grau e, por conseguinte, da frmula de Bhaskara.

    Alm da anlise dos livros didticos de Matemtica que so utilizados pelos alunos e professores nessas duas escolas, tambm aplicamos questionrios, realizamos observao das aulas nessas turmas quando o contedo foi abordado no ano 2010. Analisamos os cadernos dos alunos e registros na caderneta dos respectivos professores para identificar como o contedo abordado nessas escolas e como influenciam na mobilizao, no desejo, no gozo e no sentido do aprender a Matemtica. Com o objetivo de complementar as informaes obtidas e tambm de sanar quaisquer dvidas que por ventura pudessem existir no que diz respeito s aes dos sujeitos envolvidos, foram feitas entrevistas de explicitao individuais, balizadas nas anotaes das observaes de sala de aula e nas respostas dos alunos encontradas durante a anlise dos questionrios.

  • 17

    Neste texto dissertativo, organizamos os captulos, partindo de uma abordagem histrica delineando a fundamentao terica do objeto de estudo, em sequncia apresentamos o percurso metodolgico e a anlise dos resultados.

    No captulo I, h um relato que destaca o desenvolvimento histrico da lgebra e da equao de 2 grau ao transcorrer dos sculos, dialoga-se com autores como Kieran (2004), Domingues, (2000), Boyer (2006), Eves (2004), Ponte (2009) e outros. Os quais destacam o trabalho de importantes matemticos responsveis pelas grandes descobertas e criaes no campo algbrico, perpassando pela equao de 2 grau e a frmula de Bhaskara.

    Aps esse relato, buscamos destacar fundamentos que nos ajudam a compreender a noo da relao com o saber e as interaes com o sentido do aprender Matemtica, com base nos pressupostos tericos de Charlot (2000; 2005) e Silva (2009), respectivamente, alm de outros.

    No captulo seguinte, a abordagem refere-se metodologia da pesquisa, descrevendo o processo de coleta de dados, o contexto da pesquisa, quem foram os sujeitos e quais as tcnicas e instrumentos utilizados para realizao desta pesquisa. O terceiro captulo trata da apresentao e anlise dos resultados.

    No quarto captulo aborda-se o sentido atribudo pelos alunos a aprendizagem da Matemtica quando estudam a equao de 2 grau, resolvida atravs da frmula resolutiva (frmula de Bhaskara), alm de especificar pontos cruciais da construo desse sentido.

    Nas consideraes finais retoma as questes da pesquisa apontando as respostas encontradas pelo pesquisador. O sentido de aprender Matemtica para alunos das sries finais do Ensino Fundamental torna-se possvel de ser compreendido quando perguntamos acerca da frmula de Bhaskara2.

    2 Ressalta-se que, no texto far-se- mudanas na nomenclatura da frmula em questo hora a chamar-se-

    frmula resolutiva, hora chamar-se- frmula de Bhaskara.

  • 18

    CAPTULO 1 FUNDAMENTAO TERICA

    A fundamentao terica desta pesquisa est subdivida em trs sees. A primeira inicia com um sucinto histrico da lgebra e, mais precisamente, da equao do 2 grau, quanto ao seu desenvolvimento, sua presena no livro didtico e as dificuldades que os alunos apresentam em sua aprendizagem. A segunda trata da relao com o saber e a Matemtica, especificamente com a equao de 2 grau, a partir da resoluo pela frmula de Bhaskara. A terceira trata do sentido de aprender a Matemtica, quais as caractersticas da mesma e quais os desafios do aluno para chegar a esse saber.

    Para apresentar as preposies descritas a respeito do desenvolvimento histrico optou-se pelos estudos de Boyer (1996); Domingues (2000); Eves (2004); Branco e Matos (2009) e outros. Quanto aos pressupostos sobre a teoria da relao com o saber, o presente estudo baseou-se em Charlot (2000; 2005) e Silva (2009), dentre outros.

    1.1 A lgebra e as equaes de 2 grau: um breve relato histrico

    Nesta seo aborda-se o desenvolvimento da lgebra no decorrer da histria das civilizaes, perpassando por perodos marcantes sobre o processo de construo para a resoluo da equao de 2 grau que, de acordo com Eves (2004), decorrente de estudos dos problemas aritmticos, os quais se tornaram mais complexos, suscitando novas tcnicas de resoluo com o passar dos tempos.

    Em seguida, apresenta-se uma breve anlise crtica sobre a forma como a equao de 2 grau encontra-se presente atualmente nos livros didticos de Matemtica adotados para o 9 ano do Ensino Fundamental nas escolas selecionadas para a pesquisa. Tais instrumentos, muitas vezes, se tornam o recurso didtico mais utilizado em sala de aula e essa anlise restringe-se comparao entre os livros que so

  • 19

    adotados nas escolas campo (referidas no captulo de metodologia), quanto abordagem do contedo em pauta, visto sob a frmula resolutiva, tambm chamada de frmula de Bhaskara. Como tambm, uma sucinta abordagem sobre a relao com saber (CHARLOT, 2000 e 2005), teoria que fundamenta o tema da pesquisa: O sentido de aprender Matemtica acerca da frmula de Bhaskara. E por fim, apresenta-se o sentido da Matemtica, as dificuldades e desafios enfrentados pelos alunos para aprender o contedo em pauta.

    Quando olhamos para os distintos tipos de caracterizao da atividade algbrica, encontramos desde a rigidez das caracterizaes puras por contedos at uma certa despreocupao em identificar, do ponto de vista do contedo, que tipo de atividade matemtica particular est acontecendo: basta que seja atividade matemtica, rica e flexvel. (LINS, 2005, p. 112).

    1.1.1 Um breve histrico a respeito da lgebra

    A histria da Matemtica ilustrada por civilizaes do passado que se destacaram, a exemplo dos egpcios, babilnicos, gregos, entre outros. Esses deixaram registros de procedimentos para resoluo de problemas envolvendo equaes de 2 grau.

    Segundo Domingues (2000, p. 09), mesmo antes do termo lgebra ser criado, h cerca de 3500 a.C., antigas civilizaes j resolviam problemas que podem ser, hoje, considerados como equaes do 2 grau. Eram problemas resolvidos atravs de receitas estereotipadas. Somente por volta de 2000 a.C., os babilnicos desenvolveram a partir da geometria clculos na forma de equaes quadrticas e sistemas de equaes simultneas. a chamada evoluo da aritmtica babilnica para lgebra.

    De acordo com Boyer (1996), os babilnicos, h aproximadamente 4.000 anos, tambm j resolviam problemas algbricos contendo elementos que indicavam equaes do 2 grau, fato que confirma o conhecimento das equaes do 2 grau h 2000 a.C, mesmo sem a existncia do termo.

  • 20

    Nessa poca, j existia a necessidade de ampliar os conhecimentos matemticos para solucionar problemas aritmticos. Surge ento a lgebra e, como consequncia do aprofundamento desses estudos, a equao de 2 grau, sendo um novo recurso para solucion-los, tornando-se aos poucos marco principal do desenvolvimento de um novo campo da Matemtica, dado a expanso dos conhecimentos egpcios e babilnicos.

    A marca principal da geometria babilnica seu carter algbrico. Os problemas mais intrincados expressos em terminologia geomtrica so essencialmente problemas de lgebra no-triviais. [...] Perto do ano 2000 a.C. a aritmtica babilnica j havia evoludo para uma lgebra retrica bem desenvolvida. (EVES, 2004, p. 61).

    Com o declnio dos egpcios e babilnicos nos ltimos sculos do segundo milnio a.C., a lgebra comea a ter seu primeiro momento de expanso, uma vez que se encontram traos caractersticos de sua existncia nos estudos de outras civilizaes como os gregos, hebreus, assrios, fencios.

    Os matemticos gregos concentravam-se na lgebra babilnica herdada pela Escola Pitagrica3. Foram seguidores das criaes algbricas dos babilnios, utilizando-se do mtodo de aplicao de reas, tambm considerada equaes quadrticas, descrito por Euclides em Os elementos4.

    Uma lgebra geomtrica tomara o lugar da antiga lgebra aritmtica e nessa nova lgebra no podia haver somas de seguimentos com reas ou reas de volumes. De agora em diante devia haver estrita homogeneidade dos termos de uma equao e as formas normais mesopotmicas, , deviam ser interpretadas geometricamente. [...] Dessa forma os gregos construam a soluo de equaes quadrticas pelo processo conhecido como a aplicao de reas, uma parte da lgebra geomtrica completamente estudada em Os elementos de Euclides. (BOYER, 1996, p.53).

    O processo algbrico que os gregos desenvolveram para resolver os problemas geomtricos e tambm equaes era fabuloso, a lgebra aritmtica que substituda pela lgebra geomtrica foi um marco de fundamental importncia para o

    3Entende-se por Escola Pitagrica, uma seita secreta, de carter religioso, que reuniu cerca de 300 jovens homens que se dedicavam ao estudo da Matemtica e da Filosofia. Eles participavam ativamente da poltica local, apesar de no se misturarem com os outros cidados, e usavam essas duas disciplinas para a formao moral dos participantes, que viviam juntos no Centro em Crotona (cidade da pennsula itlica) em regime de comunho de bens. (Disponvel no site:http://www.adorofisica.com.br/trabalhos/ alkimia/mat2. Acesso em 27 de mar de 2011). 4Os elementos constituem-se em uma obra composta de 465 proposies distribudas em treze livros, nos quais so abordados a geometria, teoria dos nmeros e lgebra elementar. (EVES, 2004, p. 69).

  • 21

    desenvolvimento de toda essa construo. Atribui-se aos pitagricos parte considervel dessa lgebra geomtrica que se acha espalhada por vrios captulos do livro Os elementos de Euclides. So contribuies importantes que continuaram com outros matemticos criando mtodos para resolver equaes quadrticas derivadas da lgebra babilnica.

    De acordo com Boyer (1996), no sculo VII, viveu na ndia Central um importante matemtico chamado Brahmagupta (598 a 670 d. C.), em 628 d. C., publicou seu mais importante livro intitulado de Brahmasphutasiddhnta, no qual fez vrias contribuies ao desenvolvimento algbrico como as resolues gerais de equaes quadrticas.

    Nessa obra, encontra-se a Frmula de Brahmagupta para a rea do quadriltero, apresentada na forma:

    que deu pela primeira vez a soluo geral para equaes lineares de Diofanto5:

    , Sendo, nmeros inteiros.

    Brahmagupta criou, tambm, a equao quadrtica, , hoje chamada frmula de Pell6 em honra ao matemtico John Pell (1611 a 1685, d. C.). As contribuies de Brahmagupta, para a resoluo da equao de 2 grau, no se deram por acaso, j que em seus trabalhos percebe-se sua desenvoltura nas questes sobre quadrilteros. As contribuies de Brahmagupta lgebra so de ordem mais alta que suas regras de mensurao, pois aqui achamos solues gerais de equaes quadrticas, inclusive

    duas razes mesmo quando uma delas negativa. Segundo (BOYER, 1996, p. 150).

    5Diofanto de Alexandria viveu na Grcia antiga contribuindo significativamente para o desenvolvimento da lgebra. Sua influncia sobre os europeus permitiu que esses povos posteriormente se dedicassem teoria dos nmeros (EVES, 2004, p. 205). Ele escreveu trs trabalhos, sendo Aritmtica o mais importante deles. O destaque para sua criao dado pelo sinal especial que utilizava para a incgnita de uma equao. Este sinal assemelha-se ao que conhecemos hoje como sinal de igualdade (DOMINGUES, 2000, p.91). 6 O matemtico ingls John Pell uma figura significativa na histria intelectual do sculo XVII, devido

    suas atividades, contatos e correspondncia. Suas poucas publicaes demonstram trabalhos na teoria da lgebra e de nmero como continuidade dos estudos de Brahmagupta e Bhaskara. Disponvel no site: http://www.gap-system.org/~history/Biographies/Pell.html. Acesso em 27 de mar de 2011.

  • 22

    certo que com seus estudos Brahmagupta criou diversas possibilidades que concretizaram bases para o progresso das solues de problemas da lgebra, alm de contribuir diretamente com os estudos de outros matemticos que lhe sucederam. A exemplo de Al-Khowarizmi (790 a 840 d. C.), o mais conhecido no campo da lgebra, cuja obra Al-jbrwalmuqabalah trata o termo lgebra para designar a operao de transposio de termos, essencial na resoluo de uma equao. (BOYER, 1996).

    A obra de Al-Khowarizmi ilustra operaes elementares, equaes lineares e quadrticas. Sua forma de soluo era expressa em palavras e no utilizava nmeros ou smbolos, alm de apresentar como soluo, razes sempre positivas. Segundo Boyer (1996, p. 156), o Al-jabr chegou a ns em duas verses: latina e rabe. Foram essas tradues que tornaram a lgebra de Al-Khowarizmi conhecida em vrios pases.

    Apesar de Brahmagupta, Al-Khowarizmi e outros matemticos terem realizado estudos importantes para a evoluo do conhecimento algbrico, no so encontrados registros da existncia de uma frmula geral que resolvesse equaes de 2 grau at o sculo XI. Os estudos histricos apontam registros sobre o processo de resoluo de equaes de 2 grau atravs da frmula geral a partir do sculo seguinte.

    Segundo Boyer (1996, p. 150), o matemtico mais importante do sculo XII foi Bhaskara (1114 a 1185), por ter apresentado vrias observaes nos problemas de Brahmagupta e preencher lacunas na obra desse matemtico quanto resoluo de equaes lineares e quadrticas. Bhaskara e Brahmagupta aceitavam os nmeros negativos e irracionais e isto contribuiu para a construo de duas importantes identidades algbricas (RIBEIRO, 1999):

    = )

    Essas foram usadas para encontrar a raiz quadrada de um nmero racional. Utilizando-se dos conhecimentos deixados por matemticos hindus, principalmente Brahmagupta, Bhaskara chegou a unificao dessas identidades, tendo ento:

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    Essa frmula o mais conhecido exemplo de demonstraes que resolve equaes quadrticas na sua forma geral:

    A importncia de Bhaskara entre os matemticos indianos foi tanta que criaram em 1207, na ndia, um instituto que estudava especificamente as suas obras. Segundo Boyer (2004), no mesmo perodo em que viveu Bhaskara, o matemtico Gerardo de Cremona (1114 a 1187) traduziu para o latim a lgebra de Al-Khowarizmi. Isso no perodo de transio entre o saber grego e o muulmano. Nessa transio, os italianos foram os primeiros a entrar em contato com os rabes, de quem conseguiram captar conhecimentos matemticos em Aritmtica e lgebra7.

    Outro destaque tambm dado para a Frana, com as obras Vite (1540 a 1603), constituindo-se em uma participao incontestvel na produo da lgebra. Segundo Ponte (2009), foi Franois Vite que iniciou a nova era algbrica com seu trabalho intitulado de lgebra Simblica. Na publicao In Arten Analytican Isagoge (1591) consta o mtodo do simbolismo para solucionar equaes.

    Vite foi o primeiro matemtico algebrista a utilizar as letras do alfabeto: as vogais para representar incgnitas e consoantes para representar as constantes. Vite

    no tinha um sinal que representasse igualdade, ele utilizava a palavra aequatur. As obras de Vite, de acordo com Kieran (1992), apresentam influncias da lgebra Diofantina, que foi traduzida para o latim no sculo XVI e circulou em verso impressa entre os matemticos europeus, inclusive Vite. A obra de Vite foi de suma importncia para se construir o mtodo que resolve as equaes de segundo grau hoje (EVES, 2004).

    A inteno em retratar um esboo histrico sobre a lgebra em diferentes perodos histricos remete primeiramente a compreender o seu processo de

    7 Na lgebra italiana destaca-se Leonardo Fibonacci (1175 a 1250) que publicou seu famoso trabalho no

    ano de 1202, intitulada de Liber abaci, a obra tratava de Aritmtica e lgebra. O livro mostra influncias da lgebra de Al-Khowarizmi e AbKmil e explica o mtodo de resolues de equaes lineares e quadrticas dentre outros. Fibonacci desenvolveu seu trabalho algbrico com base na lgebra de Al-Khowarizmi. Foi o mais brilhante matemtico italiano, seus trabalhos contriburam significantemente para as novas descobertas no campo algbrico, a iniciar pela China que produziu importantes trabalhos no campo algbrico (EVES, 2004).

  • 24

    desenvolvimento, para ento entender como surgiu o processo de resoluo da equao de 2 grau, como tambm da frmula resolutiva.

    A seguir, o texto ter como foco a anlise dos livros didticos (apresentado em quadros) sobre a forma como a frmula de Bhaskara abordada para a resoluo da equao de 2 grau e como desenvolvido o contedo na concepo dos autores para atingir o saber dos alunos.

    1.1.2 A Frmula de Bhaskara segundo Livros Didticos de Matemtica

    Ao longo da histria da educao brasileira, o livro didtico se tornou um produto cultural sempre presente nas aulas de todas as disciplinas. Dessa forma, pode ser observado que no funciona apenas como instrumento auxiliar de ensino e transmisso de conhecimento, mas, como um instrumento modelo a ser seguido. Tal concepo registra-o como um material didtico histrico e cultural, que se tornou autoridade entre os recursos didticos, dado seu uso e complexidade.

    A dependncia de um curso de matemtica aos livros didticos, portanto, ocorreu desde as primeiras aulas que deram origem matemtica hoje ensinada na escola bsica. Desde os seus primrdios, ficou assim caracterizada, para a matemtica escolar, a ligao direta entre compndios didticos e desenvolvimento de seu ensino no pas. Talvez seja possvel dizer que a matemtica se constitua na disciplina que mais tem a sua trajetria histrica atrelada aos livros didticos. Das origens de seu ensino como saber tcnico-militar, passando por sua ascendncia ao saber de cultura geral escolar, a trajetria histrica de constituio e desenvolvimento da matemtica escolar no Brasil pode ser lida nos livros didticos. (VALENTE, 2008, p. 141).

    Dada sua importncia, faz-se necessrio compreender como a frmula de Bhaskara apresentada nos livros didticos de Matemtica adotados nas salas de aulas do 9 ano do Ensino Fundamental, onde se encontram os alunos sujeitos da pesquisa, a fim de entender melhor como o estudante nessa srie se mobiliza para aprender a equao de 2 grau resolvida atravs da frmula resolutiva (frmula de Bhaskara), quando dispe do livro didtico adotado na respectiva escola.

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    Com o objetivo de apresentar como a frmula de Bhaskara desenvolvida nos livros didticos utilizados pelos professores de Matemtica nas escolas pblicas universo desta pesquisa foram escolhidos apenas os que foram adotados, pelo fato dos alunos utilizarem. Vale ressaltar que no h nesta pesquisa a inteno de classificar como melhor ou pior as obras em questo, mas de melhor analisar qual o sentido de aprender Matemtica no 9 ano do Ensino Fundamental quando o contedo matemtico equao do 2 grau resolvida pela frmula de Bhaskara. Tambm destacar a contribuio do material para a construo de saberes em sala de aula, enfatizando as prticas de seguir-se esse material didtico cegamente, como se ele, fosse o nico material didtico, absoluto e dono da verdade. De acordo com Lins, (2005, p. 106), preciso perguntar, ento, por que essa prtica to popular e o , pois de outra forma no seriam vendidos tantos livros que a adotam.

    As obras analisadas fazem parte do Programa Nacional do Livro Didtico (PNDL)8, Tudo Matemtica (8 srie9, Dante, 2002), adotado pelo Colgio Delta e A Conquista da Matemtica. (8 srie, Giovanni, Castrucci e Giovanni Jr., 2002), adotado pela Escola Municipal Alfa. Conforme informaes da direo da referida escola e da professora de Matemtica da turma urea. Esta ainda no tinha repassado o livro para os alunos.

    A Conquista da Matemtica. 8 srie, Jos Ruy Giovanni, Benedicto Castrucci e Jos Ruy Giovanni Jr., 2002.

    Tudo Matemtica. 8 srie, Luiz Roberto Dante, 2002.

    A partir da anlise dos livros e das informaes disponibilizadas pelo prprio PNDL, observam-se as particularidades de cada uma das obras adotadas para estudo no que diz respeito forma de introduzir e desenvolver a resoluo da equao de 2 grau, com o uso da frmula de Bhaskara. Estas anlises so apresentadas nos quadros a seguir, nos quais ressaltado como os autores desenvolvem a referida frmula e a

    8 O Programa Nacional do Livro Didtico foi criado pelo Decreto N 91.542, de 19 de agosto de 1985, ao

    longo de sua histria passa por diversas modificaes e hoje, com recursos federais, distribui livros didticos aos alunos da rede pblica de educao dos Ensinos Fundamental e Mdio. Estes so constantemente analisados por rgos do prprio Ministrio da Educao, bem como passam pela avaliao e escolha dos professores em cada escola. Informaes disponveis em www.mec.org.br 9Os livros analisados ainda denomina de 8 srie o 9 ano porque as colees selecionadas ainda usam a nomenclatura antiga.

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    contextualizao deste contedo. Destacar essas particularidades suscita compreender melhor a proposta de cada autor e, por conseguinte, apresentar comparaes quanto s formas de abordagem do contedo em questo.

    Considera-se ser importante entender melhor as caractersticas de cada livro, as quais esto ressaltadas nos resultados da pesquisa. Assim, a proposta analisar o livro de Matemtica especificamente ao captulo em que abordada a equao de 2 grau sob a frmula resolutiva (frmula de Bhaskara). Tentar entender a proposta de cada autor para a sala de aula quando ministrada aulas de Matemtica, no nosso caso, a equao de 2 grau, sob a frmula resolutiva. Para Lins (2005), As propostas para sala de aula, resultam sempre de vises do que seja aquilo que queremos promover por meio do ensino.

    Uma forma de dizer isso dizer que propostas para sala de aula no so nunca neutras ou ingnuas em relao a pressupostos de toda ordem: relativos natureza de processos cognitivos, relativo natureza dos objetos que ali so apresentados, ou relativos a concepes de conhecimento. (LINS, 2005, p. 105).

    Em toda proposta didtica, (seja um livro, um projeto, um plano de aula), ficam evidentes as caractersticas do autor, j que ao construir esse material, existe um objetivo claro. Da mesma forma, evidenciam-se as ideias do executor. No caso do livro didtico, o professor, um dos agravantes que o executor, quase sempre, segue as caractersticas do autor, esquecendo as riquezas dos conhecimentos que pode construir usando esse material como guia e no como recurso nico na construo de saberes.

    A questo saber por que se pratica essa forma to constantemente nas aulas de Matemtica? Porque o livro no visto simplesmente como mais um recurso didtico a servio do ensino e da aprendizagem e no como o senhor das prticas escolares? Porque no se usa o livro para incentivar a investigao e a pesquisa e no a reproduo de informaes. So perguntas que nos levam a refletir sobre o papel do livro didtico nas aulas de Matemtica, especialmente quando abordada o contedo em questo.

    O que , talvez, at pior que essa prtica no se baseia em investigao ou reflexo de qualquer natureza ou profundidade, apenas em tradio, tradio essa que estudos e projetos de todos os tipos e por todo o mundo inclusive no Brasil j mostraram ser ineficaz e mesmo perniciosa a aprendizagem. (LINS, 2005, p. 106).

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    O livro didtico de Matemtica adotado pela Escola Municipal Alfa faz parte da coleo A Conquista da Matemtica a + nova Giovanni Castrucci e Giovanni Jr. (2002). Observou-se:

    Quadro N 01: Particularidades dos Livros Didticos de Matemtica, quanto forma de

    abordagem sobre a resoluo da equao de 2 grau, usando a frmula resolutiva, tambm conhecida como frmula de Bhaskara.

    (Livro 01) Livro 01: A Conquista da

    Matemtica Autor: Giovanni

    Castrucci e Giovanni Jr. Ano de edio: 2002

    DETALHAMENTO

    INTRODUO DO CONTEDO

    Introduz o contedo de forma ldica, apresenta gravuras e um resumo sobre o matemtico Bhaskara, em seguida apresenta o processo de desenvolvimento da frmula resolutiva, tambm chamada de Frmula de Bhaskara, iniciando da frmula geral:

    at chegar frmula resolutiva:

    Enfatiza o descriminante delta (), o qual substitui:

    na frmula de Bhaskara apresentada acima. Eainda apresenta os trs casos possveis em que o delta pode ser estudado:

    , quando forem Nmeros reais, sendo . Chama ateno para os coeficientes a e b e para a constante c.

    CONTEXTUALIZAO O contexto uma mescla de explicaes da teoria com gravuras e textos, problemas representando situaes do cotidiano, como por exemplo: (reas geomtricas) e equaes j prontas de abordagem mais abstratas.

    DESENVOLVIMENTO DO CONTEDO

    So apresentados sete exemplos resolvidos, explica todos os passos para se chegar s razes da equao, os exemplos representam vrias situaes de equaes completas e incompletas, nos quais so explorados todos os casos em que o se apresenta. Existe ainda uma relao de onze questes, divididas em problemas e exerccios diretos. So seis pginas dedicadas s explicaes da Frmula de Bhaskara e mais uma pgina contendo problemas envolvendo equao de 2 grau, mais trinta e duas questes apresentadas em diversas situaes. Aps a abordagem da frmula de Bhaskara, a mesma usada para resolver todos os itens.

    PROPOSTA DE AVALIAO

    A avaliao proposta em duas sees: 1) Lista de exerccios logo aps o trmino do contedo; 2) Revendo o que aprendeu no final da unidade.

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    A anlise que apresentamos sobre o livro a Conquista da Matemtica (2002) especificamente sobre a equao de 2 grau resolvida atravs da frmula resolutiva (frmula de Bhaskara) exposta no captulo III, pginas 87 a 93, quando abordo o subttulo: A frmula resolutiva, tambm chamada de frmula de Bhaskara. Quanto equao de 2 grau resolvida atravs da frmula de Bhaskara, o autor faz uma abordagem ldica, com gravuras e um pequeno texto sobre o matemtico. Tambm apresenta o desenvolvimento que o levou a descoberta da frmula em questo, partindo da frmula geral:

    .

    Demonstrando todo o processo de desenvolvimento at chegar construo da frmula resolutiva:

    Destaca o delta () que substitui a frmula:

    .

    Na frmula resolutiva, alm de fazer menes sobre < 0; < 0 e = 0 e abordar os coeficientes, apresenta o contexto com gravuras, textos e problemas do cotidiano, alm de vrios exemplos com equaes prontas para serem resolvidas mediante a frmula de Bhaskara.

    O contedo desenvolve-se mediante apresentao de vrios exemplos resolvidos, com varias situaes, mostrando todos os passos para encontrar as razes da equao do 2 grau resolvida atravs da frmula de Bhaskara. Nesses exemplos exploram-se todos os elementos que compem a frmula em questo: delta, coeficientes, sinais positivos e negativos e o porqu de sua troca de membro, entre outros. Aps a abordagem do contedo so apresentados sesses de exerccios de fixao. A proposta de avaliao distribuda em duas sesses: a) Relao de exerccios; b) revendo o que aprendeu.

    Quanto ao segundo livro de Matemtica adotado pelo colgio estadual Delta, trata-se da coleo Tudo Matemtica Dante (2002). Neste observou-se:

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    Quadro N 02: Particularidades dos Livros Didticos de Matemtica, quanto forma de abordagem sobre a resoluo da equao de 2 grau, usando a frmula de

    Bhaskara.

    (Livro 02) Livro 02: Tudo Matemtica

    Autor: Luis Roberto Dante Ano de edio: 2002

    DETALHAMENTO

    INTRODUO DO CONTEDO

    Aborda o contedo de maneira concreta, explicando a ideia do complemento de quadrados partindo da frmula geral: at chegar frmula resolutiva da equao de 2 grau chamada tambm de Frmula de Bhaskara:

    Com relao ao delta, faz meno ao demonstrar a expresso:

    igual , dando uma nova estrutura a frmula:

    Apresenta uma gravura para explicar que essa frmula resolve qualquer equao de 2 grau, utilizando os coeficientes a e b, como tambm a constante c.

    CONTEXTUALIZAO O contexto a mistura de problemas com situaes cotidianas (reas geomtricas e outras) com figuras. Os exerccios so base deequaes prontas e problemas envolvendo reas.

    DESENVOLVIMENTO DO CONTEDO

    O contedo desenvolvido base de exerccios com equaes prontas e alguns exemplos respondidos, gravuras explicam os casos em que o delta se apresenta. usada a gravura para dar dicas de como se coloca a equao na forma geral. Explica o fato de multiplicar os dois membros da equao por (-1), caso o primeiro membro esteja negativo. E quando todos os membros forem mltiplos entre se, dividi-los por um mesmo nmero para facilitar os clculos. Para cada uma dessas dicas apresentada uma equao correspondente a tal observao. Em seguida, apresenta-se um quadro com equaes resolvidas pela fatorao de quadrados e pela frmula de Bhaskara, mostrando que qualquer equao pode ser resolvida por qualquer um dos mtodos. So 05 pginas dedicadas a frmula de Bhaskara, 01 com a introduo e abordagem e texto sobre Bhaskara, 01 com explicaes sobre equaes de 2 grau completas e incompletas usando a frmula e 03 dedicadas a exerccios.

    PROPOSTA DE AVALIAO A avaliao proposta mediante resoluo de uma atividade em dupla, uma seo de exerccios denominada Revendo o que aprendemos. Existem ainda as sesses: Reviso Cumulativa e Para ler, Pensar e divertir-se.

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    Nesse outro recurso didtico, quando analisado na unidade que trata da equao do 2 grau, especificamente o subttulo que aborda a frmula resolutiva (frmula de Bhaskara), encontra-se uma proposta pautada no contedo de forma concreta, quando aborda o tema apresentando a quadratura de uma figura geomtrica, partindo da equao de 2 grau na forma:

    .

    Mostra todo o processo resolutivo at a construo da expresso algbrica:

    Denominada frmula resolutiva ou como comumente conhecida no Brasil, inclusive a nomenclatura usada pelo livro, a frmula de Bhaskara. Nesta abordagem o autor apresenta gravuras que chamam a ateno, deixando o aspecto do livro mais interessante. Traz observaes ao decorrer desse processo sobre a frmula:

    E sua substituio pela letra grega delta (), sobre os coeficientes, a e b e sobre a constante c. E trs explicaes com exemplos provando que a frmula de Bhaskara resolve qualquer tipo de equao do 2 grau.

    No contexto esto inseridas situaes do cotidiano representadas atravs de problemas, gravuras e exemplos abstratos, como equaes do 2 grau j prontas para serem aplicadas frmula resolutiva. Dessa forma mescla o contexto abstrato com o contexto concreto, dentre os problemas que envolvem o cotidiano, os mais comuns so aqueles sobre reas geomtricas.

    O contedo desenvolvido com apresentao de exemplos resolvidos, alguns representando situaes do cotidiano, como tambm propostas de exerccios para o aluno resolver com equaes e problemas. Todo o contedo apresentado mediante figuras que ilustram as situaes. A avaliao proposta mediante as sesses: Revendo o que aprendemos - composta por uma srie de problemas do cotidiano e equaes prontas; Reviso Cumulativa e Para ler, Pensar e divertir-se.

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    Sendo o livro didtico, na maioria das salas de aulas de Matemtica, o nico recurso utilizado, (fato confirmado durante as observaes das aulas) tende-se a seguir esse instrumento didtico, trabalhando-se fidedignamente todos os seus procedimentos. O fato de o livro didtico ser usado como manual de ensino prejudica a abordagem de outras ideias propostas por outro tipo de material, j que geralmente fica-se habituado aos procedimentos do material adotado. certo que o livro didtico no foi criado com objetivo de ser guia absoluto, ele apenas mais um instrumento didtico que objetiva auxiliar na construo de saberes.

    Culturalmente o livro didtico ainda exerce forte influncia nas prticas pedaggicas, ento, tambm pode ser considerado corresponsvel pelas dificuldades encontradas pelos alunos para aprender as equaes, j que o professor o tem como principal manual de ensino. Essa concepo pode ser considerada uma construo histrica dada mediante processo de ensino e aprendizagem nos cursos de formao de professores que adotam prticas conteudistas e mecanizadas para ensinar os contedos matemticos. Assim, o livro didtico o material quase que perfeito para abordagens de ensino centradas em tcnicas conteudistas para passar informaes sobre equaes de 2 grau.

    Dessa maneira, pensado como produto cultural complexo, o livro didtico de matemtica dever ser compreendido para alm do contedo de matemtica que encerra. A anlise conteudista, por si s, no capaz de servir aos propsitos de elaborao de uma histria da educao matemtica. (Valente, 2008, p.158).

    Considerando a importncia de se entender a evoluo histrica de um dado contedo matemtico e a forma em que ele se apresenta atualmente nos livros didticos adotados pelo sistema de ensino pblico brasileiro, de modo particular, no Estado de Sergipe, entende-se que tambm seja relevante aglutinar no mesmo captulo, os pressupostos sobre a relao com o saber. Portanto, para melhor consubstanciar a compreenso aos resultados da pesquisa, o texto a seguir apresenta aspectos tericos sobre a noo da relao com o saber, baseando-se em Charlot (2000, 2005), Silva (2009) e outros autores, trazendo aspectos que abordem tema o sentido de aprender Matemtica, em particular, a equao de 2 grau, resolvida atravs da frmula de Bhaskara, de forma que se entenda com maior preciso os processos cognitivos dos alunos ao estudarem o objeto de pesquisa, aqui especificado, os quais devero ser demonstrados durante, a coleta e anlise dos dados.

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    1.2 A relao com o saber e as interaes com o sentido do aprender Matemtica

    Como evidenciado pela anlise dos livros didticos, que confirma a experincia de quem ensina Matemtica, muitas vezes a aprendizagem da Equao de 2 grau sob a frmula de Bhaskara reduzida a fazer ou usar lgebra, calcular com letras (LINS, 2005). Talvez seja essa a questo pedaggica fundamental: para o aluno, qual o sentido desse saber, dessa atividade que chamamos de equao de 2 grau? Portanto, devemos nos interessar nessa pesquisa, pela problematizaro da situao pedaggica em termos de relao com o saber, que foi desenvolvida em vrios pases, sobretudo com base nas pesquisas e publicaes de Bernard Charlot.

    Para Charlot (2005), essa temtica tratada por Bachelard em A Formao do Esprito Cientfico, ainda que este no use a expresso relao com o saber cientfico, isto pode ser observado nos conceitos apresentados para corte epistemolgico e obstculo epistemolgico.

    Os conceitos bachelardianos de corte epistemolgico e de obstculo epistemolgico continuam sendo fundamentais para se pensar a relao com o saber cientfico. Poder-se-ia, alis, considerar que o que faz a unidade do Bachelard epistemlogo e do Bachelard que desenvolve o que chama de psicanlises (do fogo, da terra, etc.) a prpria questo da relao com o saber de um sujeito envolvido em relaes mltiplas no mundo. (CHARLOT, 2005, p.35 - 36).

    A relao com o saber discutida com mais nfase, e clareza no final do sculo XX at os nossos dias. Nas dcadas de 60 e 70 deste sculo, foi fonte de pesquisa de socilogos, psicanalistas, didatas e filsofos da educao, entre os quais se destaca Bernard Charlot que inicia suas pesquisas nos anos 80 do sculo passado. Seu trabalho ganha destaque internacional a partir dos anos 2000, atravs das obras: Da relao com o saber: elementos para uma teoria (1997, traduzido para o portugus em 2000), Os jovens e o saber (organizado em 2001 e traduzido em portugus no mesmo ano), Relao com o saber, formao de professores e globalizao (publicado diretamente em portugus, em 2005) - alm de publicar diversos trabalhos e divulgar os resultados de suas pesquisas em fruns, seminrios, congressos e captulos de livros.

  • 33

    Silva (2008) assinala que a expresso foi utilizada pela primeira vez por Lacan, em 1966, e usada tambm por socilogos:

    Encontram-se no livro La reproduction, de Bourdieu e Passeron, de 1970, expresses prximas: relao com a cultura, relao com a linguagem e o saber. Entretanto, Bernard Charlot que na dcada de 1980, introduz a expresso e o conceito na rea da educao e, na dcada de 1990, elabora elementos para uma teoria da relao com o saber, Charlot, 2000 traduo de um livro publicado em francs em 1997. A sua questo fundamental a do fracasso escolar, a mesma nossa aqui. (SILVA, 2008, p.151).

    De acordo com a autora, a relao com o saber comea a ser pesquisada com maior objetividade a partir da dcada de 60 do sculo XX, por diversos estudiosos da educao, mas so as pesquisas do Francs Bernard Charlot que definem a teoria de forma precisa. O autor tornou-se referncia mundial quando se fala da relao com o saber e do sentido de aprender no campo da educao. Ele define a relao com o saber como:

    [...] o conjunto de imagens, de expectativas e de juzos que concernem ao mesmo tempo ao sentido e funo social do saber e da escola, disciplina ensinada, situao de aprendizado e a ns mesmos. [...] A relao com o saber a relao com o mundo, com o outro e com ele mesmo, de um sujeito confrontado com a necessidade de aprender. [...] o conjunto (organizado) das relaes que um sujeito mantm com tudo quanto estiver relacionado com 'o aprender' e o saber. (CHARLOT, 2000, p. 80).

    So definies que nos levam compreenso de que o cerne da questo est no pensamento da relao do sujeito com o objeto de estudo e na compreenso do sentido do aprender, em determinada sociedade. Faz-se ainda indispensvel o entendimento de que as relaes de aprendizagem vo bem alm dos saberes ditos escolares. nesses conceitos que se entende a importncia da teoria para o desenvolvimento intelectual do aluno como sujeito de sua aprendizagem. Charlot (2005) prope uma reflexo a respeito das questes que precisam ser exploradas no transcorrer das prticas pedaggicas: o sentido do aprender, gozo e prazer e a atividade intelectual, encontrados em atividades ligadas ou no ao cotidiano do aluno. Assim define

    A relao com o saber o conjunto das relaes que um sujeito estabelece com um objeto, um contedo de pensamento, uma atividade, uma relao interpessoal, um lugar, uma pessoa, uma situao, uma ocasio, uma obrigao, etc., relacionados de alguma forma ao aprender e ao saber conseqentemente, tambm relao

  • 34

    com a linguagem, relao com o tempo, relao com a atividade no mundo e sobre o mundo, relao com os outros e relao consigo mesmo, como mais ou menos capaz de aprender tal coisa, em tal situao. (CHARLOT, 2005, p.45).

    A relao com o saber levanta a questo da relao do sujeito consigo mesmo, sem esquecer que este est inserido em um contexto cultural e social, no qual ele constri sua singularidade. O sentido do aprender um dos conceitos principais dessa investigao. Ele tem relao com a atividade intelectual dos alunos no tocante ao do fazer matemtico e nas interaes de espao e tempo. Segundo Charlot (2005, p. 54), No centro da questo do sucesso ou fracasso escolar preciso, portanto, colocar a questo da atividade intelectual. Por que o aluno estuda ou no estuda? Por que o aluno se mobiliza ou no intelectualmente?

    Questiona-se, ainda, se as atividades realizadas pelos alunos na escola desprendem desejo, prazer e sentido necessrios mobilizao de sua atividade intelectual para querer aprender a Matemtica. Compreender os desejos dos educandos, no que diz respeito a sua aprendizagem, pode direcionar o desenvolvimento de sua formao intelectual de modo diferenciado e suscitar o sentido para novas descobertas. No ensino de Matemtica no deve ser diferente, a relao responsvel pelo desenvolvimento intelectual carece apresentar uma cumplicidade comum entre os elementos: professor, aluno e saber, chamado por Houssauye (1988), de tringulo pedaggico.

    Pode ser mais interessante perceber como a questo do prazer se coloca no funcionamento pedaggico, mesmo. Para fazer isto, vamos examinar um modelo de compreenso da situao pedaggica, entendendo por modelo uma representao simplificada de um sistema e no uma exemplariedade saturante. [...] Partamos da base seguinte: a situao pedaggica pode ser definida como um tringulo composto de trs elementos o saber, o professor e os alunos. [...] Vamos ter como modelo o do tringulo pedaggico, que se esfora para precisar as modalidades de ao educativa, tanto em sua construo como em sua efetivao. (HOUSSAUYE, 1998, p. 72).

    A importncia desses elementos se constitui na agregao da compreenso do contedo mediante o prazer de aprender do aluno. Quando o professor o mediador e agente dessa significao, propicia a relao do aluno consigo mesmo, com o outro, com o mundo e com o saber, o torna capaz de lidar com a Matemtica no apenas como

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    entendimento necessrio, mas como um saber derivado do desejo, do gozo, do prazer e da satisfao de aprender.

    Figura 01: Tringulo Pedaggico (HOUSSAUYE, 1998).

    Dessa forma, suscita-se aqui uma reflexo no que tange as prticas comuns no

    ensino da lgebra, designadamente, a equao de 2 grau sob a frmula resolutiva. Metodologias descontextualizadas com foco no contedo? Ou metodologias contextualizadas que mobilizam o aluno na qual se encontram prazer, desejo e sentido de aprender, sem perder o foco do contedo? Se o primeiro questionamento predomina sobre o segundo e o aluno aprende satisfatoriamente, nada precisa ser feito, apenas continuar com o mtodo. Mas se os alunos apresentam dificuldades para desenvolver sua atividade intelectual e apropriar-se dos conhecimentos matemticos, ser necessrio repensar os mtodos pedaggicos dominantes no ensino desse importante campo do saber.

    Esse pensar convergente com o pensar de que o ensino de Matemtica no deve ser apenas informao, mesmo porque, conforme Charlot (2005, p. 85), Informao no saber, ela se torna saber quando contribui para o esclarecimento do sujeito sobre o sentido do mundo, da vida, de suas relaes com os outros e consigo mesmo. Eis a razo de se construir conhecimentos matemticos pautados na compreenso, num contexto que ative a atividade intelectual do aluno despertando nele curiosidade, para que questione, investigue, pesquise e descubra o prazer de aprender.

    Saber (Contedo da formao)

    Processo de ensinar Didtica - Metodologia

    (Professor)

    Processo de aprender Estratgias de aprendizagem

    (aluno) (Aluno)

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    , antes de qualquer outra coisa, as prticas metodolgicas, a responsvel, pela descoberta do sentido do aprender por parte do aluno.

    O incentivo pesquisa, ao questionamento, ao debate e ao dilogo nas salas onde so ensinados contedos algbricos (equao de 2 grau sob a frmula resolutiva) exacerba o prazer, ativa o gozo, mobiliza e desenvolve a atividade intelectual, possibilita o confronto com os saberes estudados, transformando o aluno em um sujeito indissociavelmente humano, social e singular.

    Essas pesquisas podem estar situadas em vrios nveis e tomar diversas formas. Pode-se tratar de uma reflexo antropolgica sobre o homem confrontado com o saber e, mais amplamente, com a necessidade de aprender. As pesquisas sobre a relao com o saber apresentam, de fato, problemas de antropologia filosfica. O que est em causa, como vimos, a natureza do desejo no homem, o fato de que o sujeito humano indissociavelmente social e singular, , de uma forma mais geral, a questo da humana condio. (CHARLOT, 2005, p. 41- 42).

    Compreender a existncia do conjunto de elementos responsveis pela construo de saberes como resultantes de pesquisas, vivncias culturais, sociais e das relaes humanas contribuir com o desenvolvimento natural dos desejos de homens e mulheres nas suas aes individuais ou coletivas. A relao com saber matemtico, desenvolvido mediante a temtica aqui tratada, objetiva descobrir a relao do estudante com esse saber e como ele se mobiliza para encontrar prazer, desejo e sentido para aprender.

    A compreenso sobre a aprendizagem de Matemtica na viso do aluno no mais pode ser ignorada, j que a construo das relaes com o saber que se forma no contexto educacional apresenta responsabilidades no apenas dos alunos, mas dos diversos agentes que participam desse processo. Dessa forma, necessrio entender como o aluno se mobiliza para processar o saber durante as aulas de Matemtica, como passa do desejo de saber para o gozo de aprender ou se ele passa por esse processo de mutao do desejo.

    A questo compreender, portanto, como se passa do desejo de saber (como busca de gozo) vontade de saber, ao desejo de aprender, e, alm disso, ao desejo de aprender e saber isso ou aquilo. Compreender o desejo compreender os avatares e as mutaes do desejo at os atos e as obras que saem dele. (CHARLOT, 2005, p. 37).

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    Conhecer o funcionamento da transio do desejo de saber vontade de aprender no algo simples, mesmo porque a relao com o saber est intimamente ligada ao sujeito singular e ao mesmo tempo social, j que ele se relaciona com ele mesmo, com os outros e com o mundo. Assim, importante verificar em que nvel explorado essa relao na escola.

    Realizar pesquisa sobre a relao com o saber buscar compreender como o sujeito aprende o mundo e, com isso, como se constri e transforma a si prprio: Um sujeito indissociavelmente humano, social e singular. [...] A relao com o saber a relao com o mundo, com o outro e consigo mesmo de um sujeito confrontado com a necessidade de aprender. (CHARLOT, 2005, p. 41-45).

    O ser humano, no tocante ao conjunto de conhecimentos, um ser inacabado, portanto sempre disposto a novos saberes. Resta descobrir quais so as relaes mais eficazes nessa construo e se na viso do aluno as prticas metodolgicas atuais correspondem s perspectivas do mesmo.

    1.3 O sentido da Matemtica: caractersticas e desafios

    O sentido que o ensino de Matemtica tem para o aluno no pode ser separado da representao social da Matemtica e das formas como ela ensinada. A equao de 2 grau resolvida pela frmula de Bhaskara, caso especfico desta pesquisa, precisa ser despida da armadura que a protege para deixar de ser uma rea de conhecimentos de alguns predestinados e se tornar campo de saberes acessvel a todos.

    A Matemtica tem uma conotao de infalibilidade, de rigor, de preciso e de ser um instrumento essencial e poderoso no mundo moderno, o que torna a sua presena excludente de outras formas de conhecimento. (DAMBROSIO, 1990, p.75).

    O que suscita o seguinte questionamento acerca do seu ensino: Ser que se ensina a equao de 2 grau de forma assistemtica, sublimemente, como uma arte vislumbrada por quem a estuda ou segue-se a linha letrista e a sistematizao da transmisso de informaes, considerando que o ensino desse contedo, no passa de calculo literal? Conhecer as diferenas existentes entre transmitir informaes e

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    compreender tal conhecimento um fator importante para o ensino e, consequentemente, para a aprendizagem das equaes de 2 grau sob a frmula resolutiva.

    Eliminar a concepo de que as equaes de 2 grau, aqui representantes da lgebra, no so apenas clculos com letras, certamente ser um grande desafio, tendo em vista que esse pensamento tornou-se cultura ao decorrer da construo da histria do desenvolvimento do ensino da Matemtica.

    H dois pontos importantes que queremos enfatizar. [...] Primeiro, que seria ingenuidade pensar que a enorme aceitao dessas prticas letristas ocorre apenas por resignao dos professores: preciso entender que eles correspondem bem a uma certa viso da atividade algbrica, caso contrrio, no sobreviveriam. Em segundo lugar e at como consequncia do primeiro ponto, preciso ter conscincia de que qualquer proposta de mudana vai ter que passar por convencer muita gente de que a atividade algbrica no clculo literal, e falamos aqui de fazer bem mais do que pression-los a mudarem a rotina. (LINS, 2005, p. 106).

    Para o aluno, esse contedo causa certa estranheza por conta de sua estrutura no se adequar especificamente aos conceitos matemticos adquiridos at ento, so essencialmente nmeros, clculos e contas, a chamada aritmtica.

    Uma vez que tudo que ensinado passa por uma interpretao do aluno. Se esse trabalho da atividade intelectual parecer muito rduo, ele desiste das coisas que consideram difceis, optando por aprender apenas aquilo que lhe faa sentido, no caso, aquilo que tem relao direta com os conceitos aprendidos anteriormente. Se tratando da equao de 2 grau, por possuir estrutura mais complexa que os demais contedos estudados, a substituio da construo de saberes pelo mtodo da reproduo de informaes sem o esforo de um trabalho intelectual a forma mais simples e usada pelo aluno.

    A educao uma forma sistemtica de planejar, executar e avaliar todo o processo de aprendizagem envolto a objetivos especficos focados na investigao, participao e pesquisa. Neste contexto, a comunicao a facilitadora de um conjunto de combinaes que despertem a atividade intelectual do sujeito de forma que possibilite as condies necessrias ao ensinar e ao aprender. O desejo, o prazer, o gozo e o sentido para aprender no devem ficar de fora dessa relao.

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    A educao abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivncia humana, no trabalho, nas instituies de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizaes da sociedade civil e nas manifestaes culturais. (CARNEIRO, 1996, p. 01).

    A dinmica do ensino para a compreenso da equao de 2 grau, sob a frmula de Bhaskara deve ser o princpio para descentralizar contextos conteudistas usados em abundncia por educadores que ainda desprezam a formao como um todo. A dinamicidade do envolvimento do ensino com as necessidades dos alunos permitem a transformao de informaes no entendimento dos saberes propostos.

    Questes como erros cometidos pelos alunos no decorrer de seus estudos so totalmente ignorados, a sistematizao do currculo seguido pelo livro didtico e copiado pelos professores no permite reflexes sobre as atividades do aluno. Passa-se o contedo estabelecido por este instrumento didtico, fazem-se atividades em forma de exerccios repetitivos, aplica-se a provas e, conforme acertos e erros atribuem-se a nota. Na prxima aula, pouco comentado sobre o assunto anterior.

    Ignoram-se as causas que contriburam para o fracasso ou sucesso do aluno. Pois a grade10 extensa e precisa ser cumprida evitando o risco de passar o estudante para a srie seguinte sem ter visto determinado contedo. Resta saber o que mais importante: seguir a grade curricular rigorosamente, mesmo que o aluno nada entenda ou contribuir para que ele aprenda o pouco que estudou? importante saber a diferena existente entre o contedo estudado e o contedo aprendido. O fato de esta disciplina ser campe em reprovao no pas11, ser to temida e rejeitada pelos alunos deveria servir de base para mudanas de atitude nas prticas metodolgicas do ensino da Matemtica.

    Praticar uma leitura positiva no apenas, nem fundamentalmente, perceber conhecimentos adquiridos ao lado das carncias, ler de outra maneira o que lido como falta pela leitura negativa. Assim, ante um aluno que fracassa num aprendizado, uma leitura negativa fala em deficincias, carncias, lacunas (...), enquanto que uma leitura positiva se pergunta "o que est ocorrendo", qual a atividade implementada pelo aluno, qual o sentido da situao para ele (...), etc.

    10

    Entenda-se grade como os contedos determinados a serem ensinados em cada srie/ano 11

    Este dado encontra suporte nas anlises fornecidas pelo Ministrio da Educao e Cultura- MEC no que diz respeito Educao Bsica nos anos de 2000 a 2009, disponveis em www.mec.gov.br

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    A leitura positiva busca compreender como se constri a situao de um aluno que fracassa em um aprendizado e, no, "o que falta" para essa situao ser uma situao de aluno bem sucedido. (CHARLOT, 2000, p.30).

    A relao entre aprendizagem e ensino eminente, ambas esto intimamente ligadas, se h dificuldades na aprendizagem, provavelmente h problemas com o ensino. Dessa forma, h ocorrncias que precisam ser revistas nessa relao. certo que a aprendizagem existe em funo do ensino e sua eficincia ou deficincia resultado concreto da prtica desenvolvida. Cabe, primeiramente ao professor, identificar e procurar os meios (recursos, tecnologias e tambm metodologias) para sanar as deficincias de seus alunos. No se descarta aqui a responsabilidade de gestores e governantes, no entanto, pela proximidade professor aluno, o papel do professor assume importncia mpar.

    O argumento de que a Matemtica uma disciplina para quem tem aptido, talentos especiais com os nmeros, ou para aqueles que possuem dom matemtico falsa cultura usada para maquiar os problemas existentes no ensino e aprendizagem da mesma. O mesmo procede no aprendizado da equao de 2 grau, quando apenas apresentada ao aluno a resoluo pela resoluo, sem que haja contextualizao, desmembramento dos elementos que d sentido para o querer aprender.

    Existe uma imagem especfica da Matemtica e, portanto, a nosso ver, uma relao particular com essa disciplina. considerada uma matria em que difcil ser bem-sucedido, logo uma disciplina elitista e seletiva: nem todos podem entrar no universo matemtico, muitos alunos reprovam e s alguns conseguem. Pesquisar a relao dos alunos com o saber uma exigncia ainda mais valiosa quando se trata de ensinar e aprender uma matria que carrega tantos preconceitos e esteretipos como a Matemtica. (SILVA, 2009, p. 16-17).

    O fato de a Matemtica apresentar tais caractersticas leva-nos a crer que mudanas sero necessrias no sistema de ensino, a comear pela investigao da relao social e pessoal do aluno com esse saber especfico. importante que o aluno sinta-se sujeito ativo do processo ensino e aprendizagem, no qual o professor utilize estratgias para que esse aluno seja capaz de construir conhecimentos transformando informaes em saberes.

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    Nesse processo, compreender a linguagem matemtica fator primordial, haja vista que a presena de nmeros no ser sua nica indicao, mas agregado a isso as ideias prprias de operaes, abstrao, lgica, deduo, smbolos prprios etc. (NASCIMENTO, 2010, p.48).

    A abordagem da equao de 2 grau requer o uso da linguagem matemtica com suas propriedades, de maneira que o aluno enfrente as situaes que lhe sejam propostas, possa compreender que determinados contedos exigem resolues e assim operacionalize os clculos atravs de regras e frmulas relacionadas com suas literais. A frmula resolutiva ou frmula de Bhaskara, por exemplo, um mecanismo que, de certa forma, simplifica os clculos para resolver a equao de 2 grau. Mas, o aluno precisa entender a leitura de todo esse contexto que para ele ainda novo, para ento, desenvolver o processo intelectual de agregao desse novo saber.

    Quando o professor opta por utilizar outras formas de abordagem desse contedo, propondo atividades nas quais os alunos aprendam a resolver equaes de 2 grau sob outras regras, alm da frmula de Bhaskara, permite-lhes compreender a importncia do uso da frmula e entender a lgica e uso de determinados smbolos, como tambm comparar diferentes formas de resoluo de uma mesma equao.

    Compreender a situao do estudante e sua produo intelectual valorizar hipteses, exemplos e contra exemplos, anlises, acertos e desacertos criados durante a aula. O ensino e aprendizagem da equao de 2 grau pela frmula de Bhaskara devem se revelar desafiadores. Ao mesmo tempo, em que h o desenvolvimento da frmula por meio dos clculos, operaes numricas, e trocas de sinais no desenrolar da resoluo de uma equao, paralelamente surgem e so exploradas vrias outras possibilidades de aprendizagem.

    Independente da classe social, raa, cultura, poder econmico, do sistema regente ou da inteligncia do aluno, ele tem o direito de aprender Matemtica na ntegra e na totalidade, essa a funo da escola e a responsabilidade do professor. As dificuldades do aluno no podem ser ignoradas por nenhum dos responsveis pela sua educao (seja o poder pblico, a escola ou a famlia). Investir em metodologias que atendam a todos os estudantes, especialmente aos que apresentam dificuldades na aprendizagem matemtica, independente de qualquer outra coisa, no mais que o

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    dever dos envolvidos diretos no processo de ensino e aprendizagem da Matemtica, nesse caso, a escola e o professor.

    Concordo quando se diz que a responsabilidade est na desigualdade social, na globalizao, mas no por essa razo que tenho o direito de deixar o meu aluno sem entender nada do que estou ensinando. Temos que considerar que nossas prticas so importantes. (CHARLOT, 2005, p.64).

    Compreender determinado saber bem mais que passar informaes. fazer que tais informaes circulem e passem pelo processo de desenvolvimento intelectual do aluno, para tanto, estas devem ser aceitas pelo mesmo para ento serem trabalhadas e selecionadas intelectualmente, podendo ser transformadas em conhecimentos. Mesmo porque o aluno no aprende o que o professor ensina, mas o que ele pensa ser importante aprender, ou seja, o que apresente algum sentido para ele.

    Decorar regras, frmulas e responder exerccios so maneiras mais eficazes de provar a todos, inclusive a si mesmo, que as informaes foram aprendidas, j que a aprendizagem medida, geralmente, por uma prova. Assim, ele aprende o que acha interessante - na maioria das vezes o mnimo possvel - decora outra parte e ainda se vale da cola12 para garantir uma boa nota, vista como objetivo final do processo de ensino.

    A escola precisa deixar de ser meramente uma agncia transmissora de informao e transforma-se num lugar de anlises crticas e produo de informao, onde o conhecimento possibilita a atribuio de significado informao. (LIBANEO, 2007, p. 23).

    O processo formador deve ser pautado na confirmao da pesquisa, na lgica das hipteses, na reciprocidade entre educador, educando e disciplina, na ousadia do questionamento e na construo de respostas que apresentem sentido. A dinamicidade nas tcnicas e recursos de ensino, tanto da equao de 2 grau sob a frmula de Bhaskara, quanto de outro contedo matemtico qualquer, pode transformar a Matemtica e torn-la uma disciplina menos chata para o aluno. A interao com este saber fortifica a capacidade de formular e reformular conceitos. Dessa forma, a escola assume o papel de agente ativo da construo de saberes e apresenta maiores oportunidades ao desenvolvimento intelectual, social e humano de seus alunos.

    12

    No Brasil, quando os alunos usam formas de resolver as questes de uma prova utilizando meios escusos, se diz que est colando (tocheat, em ingls).

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    No prximo captulo ser abordada a metodologia da pesquisa, a escolha adequada dos procedimentos garante ao pesquisador correlacionar teoria e prtica cientfica. Assim, descreve-se o processo de coleta de dados, o contexto da pesquisa e quem foram os sujeitos.

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    CAPTULO 2 PERCURSO METODOLGICO DA PESQUISA

    Neste captulo, aborda-se a descrio do estudo, considerando o contexto no qual a pesquisa foi realizada, quem so os sujeitos que contriburam para esta pesquisa tornar-se realidade e quais tcnicas e instrumentos foram utilizados para a coleta e sistematizao dos dados.

    2.1 O Contexto da pesquisa

    A fim de buscar dados que possibilitem alcanar os objetivos delineados nesta dissertao, foi selecionada como populao da pesquisa alunos do 9 ano do Ensino Fundamental de escolas pblicas de Itabaiana13, escolhidas por corresponderem ao nvel de escolarizao em que o contedo matemtico em pauta equaes de 2 grau objeto de estudo14. A opo em fazer a pesquisa nesse municpio sergipano passou a ser mais forte por duas razes. A primeira por considerar que o sentido do aprender Matemtica poderia ser tratado em qualquer Estado ou municpio da Federao Brasileira, j que as dificuldades encontradas em sua aprendizagem uma questo nacional. A segunda, de ordem pessoal do pesquisador, pelo fato de ter sido professor de Matemtica pela Secretaria de Educao Municipal, criando vnculos no apenas profissionais, mas tambm afetivos com o povo dessa cidade. Por isso, ter o municpio de Itabaiana como universo de pesquisa justifica tanto a razo cientfica, quanto a pessoal.

    13

    O municpio de Itabaiana localiza-se na regio Centro Sul do estado de Sergipe, distante a 44 quilmetros da capital, ocupa uma rea de aproximadamente 364 quilmetros quadrados e tem uma populao estimada (em 2009) de 86.564 habitantes. No tocante a educao, apresenta62 escolas de Ensino Infantil (3.546 alunos), 80 de Ensino Fundamental (16.474 alunos), 06 de Ensino Mdio (2.581 alunos) e duas Universidades, sendo uma particular (UNIT) e outra Federal (UFS), alm de contar comprogramas de diversas universidades particulares que oferecem cursos de ps - graduao presencial e distncia. Dados fornecidos pela Prefeitura Municipal de Itabaiana baseados no censo do IBGE 2009. Disponveis em http://www.itabaiana.se.gov.br/. 14

    Alm de se adequarem ao perfil exigido para a pesquisa, a opo por uma cidade interiorana se deu tambm por motivao pessoal, uma vez que o pesquisador oriundo desta regio, como explicitado na introduo.

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    As escolas escolhidas recebem alunos oriundos tanto da zona rural, quanto da zona urbana do municpio e cidades circunvizinhas. Eles pertencem a grupos sociais e culturais distintos, com a faixa etria varivel entre 13 e 18 anos de idade, formando classes heterogneas, fato que enriqueceu a significantemente os dados da pesquisa.

    Primeiramente, tentou-se identificar escolas pblicas estaduais e municipais, no com a inteno de comparar o sistema de ensino ou qualquer outra coisa, mas, para enriquecer as informaes da pesquisa vindas de instituies com administrao e pontos de vista diferentes15. Uma das caractersticas que as escolas deveriam apresentar era ter em sua matrcula turmas de 9 ano do Ensino Fundamental, considerando a srie em que se estuda a equao de 2 grau pela primeira vez. Foram selecionadas a Escola Municipal Alfa e o Colgio Estadual Delta. Em um primeiro contato com as escolas, para a seleo das turmas a serem pesquisadas, levou-se em considerao a formao dos respectivos professores de Matemtica bem como o fato de no manter com os mesmos, nem com seus respectivos alunos, relaes interpessoais at aquele

    momento.

    A Escola Municipal Alfa est localizada na periferia da cidade de Itabaiana/SE. Foi fundada no ano de 1985, funciona nos turnos matutino, vespertino e noturno. As modalidades de ensino oferecidas so: Educao Infantil, Ensino Fundamental na modalidade regular, e Educao de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental. Veja a tabela

    Tabela: 01

    Organizao da escola por turmas Escola Municipal Alfa Modalidades de Ensino

    Educao Infantil

    Ensino Fundamental Menor

    Ensino Fundamental Maior

    Ed. de Jov. e Adultos

    Total de

    turmas Educao Infantil

    1 ano

    2 ano

    3 ano

    4 ano

    5 ano

    6 ano

    7 ano

    8 ano

    9 ano

    Jovens e Adultos

    05 02 02 02 01 02 03 02 02 01 04 26 Total geral de alunos 862

    Fonte: Ata de matrcula 2010, fornecida pela diretoria da escola.

    15

    Os dados iniciais foram coletados junto a Diretoria Regional de Educao DRE 03 e a Secretaria Municipal de Educao do Municpio.

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    As informaes da tabela acima foram construdas no intuito de demonstrar a dimenso e caractersticas quanto organizao e funcionamento da escola no que tange a sua composio por turmas.

    Nesta escola, o pblico-alvo da pesquisa so os alunos do 9 ano do Ensino Fundamental do turno vespertino, denominados doravante de turma urea e a professora da turma, Amanda, desta forma, espera-se preservar a identidade dos sujeitos envolvidos. Esta unidade escolar apresenta a seguinte situao funcional.

    Tabela: 02

    Organizao funcional da escola

    Fonte: Quadro de funcionrios 2010 da Secretaria Municipal da Educao de Itabaiana/SE.

    As informaes acima ajudam a compreender melhor as condies em que esta desempenha suas funes. J que todas as suas atividades dependem exclusivamente de seu quadro funcional.

    A outra instituio escolar selecionada foi o Colgio Estadual Delta, situado no centro, de Itabaiana/SE. Funciona nos turnos matutino, vespertino e noturno. As modalidades de ensino oferecidas so: Ensino Fundamental maior (6 ao 9) Ensino Mdio e Educao de Jovens e Adultos, tanto do nvel Fundamental, quanto do nvel Mdio.

    Tabela: 03

    Distribuio da escola por turmas Colgio Estadual Delta Modalidades de Ensino

    Ensino Fundamental Maior Ensino Mdio

    Educao de Jovens e Adultos

    Total de turmas

    6 ano

    7 ano

    8 ano

    9 ano

    1 ano

    2 ano

    3 ano

    Ensino Fundamental

    Ensino Mdio

    05 05 05 04 04 03 02 02 02 33 Total geral de alunos 1205

    Fonte: Ata de matrcula 2010, fornecida pela diretoria da escola.

    Escola Municipal Alfa Funcionabilidade

    Administrativo Pedaggico Servios Gerais Total Dir. Sec. Docncia Coord. Merendeira Servente Vigilante 01 02 32 01 03 05 03 47

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    O objetivo dessa tabela demonstrar caractersticas da escola quanto ao pblico que a mesma atende, para melhor compreender o universo em que a pesquisa se realiza. Conhecendo dados organizacionais e funcionais pode-se ter uma viso mais ampla ao investigar determinadas respostas dadas pelos alunos. Como tambm, analisar melhor os acontecimentos vistos durante as observaes possibilitando maior clareza na construo dos resultados.

    Nessa escola, mesmo tendo quatro turmas do 9 ano do Ensino Fundamental, escolhemos apenas 01 como pblico alvo da pesquisa, a turma do 9 ano A, agora denominada urea. A escolha foi feita mediante sorteio com a participao do lder de cada turma.

    No intuito de verificar se o aluno oriundo do Ensino Fundamental preserva, e em que medida preserva os conhecimentos adquiridos quando estudou a equao de 2 grau resolvida atravs da frmula resolutiva, (frmula de Bhaskara) ao se encontrar no Ensino Mdio, tambm se optou pela participao de alunos do 1 ano do Ensino Mdio, uma vez que eles utilizam a frmula de Bhaskara para solucionar equaes de segundo grau. Esta turma ser denominada de Beta, cuja professora regente a mesma da turma Brisa. Esta escola apresenta o seguinte quadro funcional.

    Tabela: 04

    Organizao funcional da escola

    Fonte: Quadro de funcionrios 2010. Secretaria Municipal da Educao de Itabaiana/SE.

    Nesta escola, o pblico-alvo tambm formado por alunos do 9 ano do Ensino Fundamental, do turno vespertino, denominada turma Brisa e a professora regente licenciada em Matemtica pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), doravante denominada de Brenda. Como tambm a turma Beta escolhida para participar da pesquisa com objetivo de averiguar os conhecimentos sobre o contedo aqui tratado aps algum tempo de t-lo estudado. importante entendermos o que o aluno aprendeu sobre equao de 2 grau estudada anteriormente. Dessa forma, analisando a

    Colgio Estadual Delta Funcionabilidade

    Administrativo Pedaggico Servios Gerais Total Dir. V. dir. Sec. Coord. Docncia Merendeira Servente Vigilante 01 01 03 01 38 05 06 03 55

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    aprend