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O princípio da duração razoável do processo e a responsabilidade do Estado Janaina Helena de Freitas RESUMO: Este artigo discute se o Poder Judiciário está comprometimento em solucionar sua própria burocracia e quais as medidas tomadas pelo Conselho Nacional de Justiça para tanto. Realizou- se um estudo bibliográfico de importantes autores sobre o princípio da duração razoável do processo e possível responsabilização do Estado. Palavras-chave: morosidade, Poder Judiciário, burocracia. RESUMEN: El principio de duración razonable del proceso y la responsabilidad del Estado. Este artículo es el resultado de un estudio para analizar el compromiso del Poder Judicial para la solución de su propia burocracia y las medidas adoptadas por el Consejo Nacional de Justicia para hacerlo. Se realizó un estudio bibliográfico de los autores principales en el principio de duración razonable del proceso y la posible responsabilidad del Estado. Palabras llaves : lento, el poder judicial, la burocracia. ABSTRACT: The principle of reasonable duration of proceedings and State responsibility. This article is the result of a study to analize the Judiciary’s

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O princípio da duração razoável do processoe a responsabilidade do Estado

Janaina Helena de Freitas

RESUMO: Este artigo discute se o Poder Judiciárioestá comprometimento em solucionar sua própriaburocracia e quais as medidas tomadas peloConselho Nacional de Justiça para tanto. Realizou-se um estudo bibliográfico de importantes autoressobre o princípio da duração razoável do processo epossível responsabilização do Estado.Palavras-chave: morosidade, Poder Judiciário,burocracia.

RESUMEN: El principio de duración razonabledel proceso y la responsabilidad del Estado. Esteartículo es el resultado de un estudio para analizarel compromiso del Poder Judicial para la soluciónde su propia burocracia y las medidas adoptadas porel Consejo Nacional de Justicia para hacerlo. Serealizó un estudio bibliográfico de los autoresprincipales en el principio de duración razonable delproceso y la posible responsabilidad del Estado.Palabras llaves: lento, el poder judicial, laburocracia.

ABSTRACT: The principle of reasonable durationof proceedings and State responsibility. This articleis the result of a study to analize the Judiciary’s

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commitment to solving their own bureaucracy andthe measures taken by the National Council of Justiceto do so. We performed a bibliographic study ofmajor authors on the principle of reasonable durationof proceedings and possible liability of the State.Keywords: slow, judiciary, bureaucracy.

Introdução

O respeito aos direitos fundamentais devem pautar todas as condutaspúblicas e privadas. No que tange ao poder público, há que se fazer uso detodos os meios possíveis para implementação de todos os direitos garantidospela Carta de 1988, principalmente no que tange aos direitos fundamentais dohomem.

Um dos aspectos de concretização dos direitos fundamentais é oacesso à justiça e, diante das dificuldades encontradas pelo cidadão,principalmente os mais carentes de recursos financeiros, há que se refletir sobrea maneira que este direito é tratado pelo poder público no Brasil. O acesso àjustiça passa por vários campos e, entre eles, há a garantia a um processo justoe célere, celeridade esta que falta ao andamento processual no Brasil.

Tem-se, pois, como objetivo geral deste trabalho, identificar a atuaçãodo poder público na efetivação da celeridade processual e as causas do retardono julgamento dos feitos no Brasil, retratando, em primeira análise, as dificuldadesencontradas no acesso do jurisdicionado ao Poder Judiciário, apontando algumassoluções para facilitá-lo. No que concerne aos objetivos específicos, foi analisadaa atuação do Conselho Nacional de Justiça. Para tanto, importantes são osrelatórios das correições e inspeções realizadas em Tribunais de Justiça e JustiçaFederal, onde há um panorama do andamento dos processos e dos problemasenfrentados por diversos estados no Brasil. Por último, foi analisada a chamada“meta dois” do Judiciário, que tem o propósito de finalizar todos os processosdistribuídos até dezembro de 2005 e suas conseqüências para a concretizaçãoda celeridade e qualidade na prestação jurisdicional.

I – Direitos fundamentais e o processo justo

1.1 – Direitos fundamentais: uma breve incursão sobre sua evolução

Os direitos fundamentais são conquistas da humanidade ligadasprecipuamente à noção de dignidade humana. Não há como materializar a datade seu surgimento, vez que é entendido como algo intrínseco ao homem.

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Correto então seria falar em seu reconhecimento e respeito por parte do Estado.Sob este enfoque, verificam-se em alguns importantes movimentos

traços dos direitos fundamentais, como em revoluções ocorridas na Inglaterrano século XVII que influenciaram a Declaração de Virgínia em 1776 e aDeclaração Francesa de 1789, fruto da revolução burguesa que derrubou oabsolutismo que reinava na França. A Revolução Francesa resumia entre seuspropósitos três ideais universalmente conhecidos: liberdade, igualdade efraternidade. A partir deste lema e dos três ideais que ele traz é que surge aconcepção das gerações de direitos fundamentais.

Os direitos fundamentais de primeira geração (liberdade) sãoreconhecidamente direitos civis e políticos, onde se reivindicava uma menorinterferência do Estado, ou seja, são as chamadas “liberdades negativas”, sãodireitos de resistência ou de oposição perante o Estado.

Sobre tal tema, dissertou Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e PauloGustavo Branco:

A primeira delas abrange os direitos referidos nas revoluçõesamericanas e francesas. São os primeiros a ser positivados,daí serem ditos de primeira geração. Pretendia-se,sobretudo, fixar uma esfera de autonomia pessoal refratáriaàs expansões do Poder. Daí esses direitos traduzirem-seem postulados de abstenção dos governantes, criandoobrigações de não fazer, de não intervir sobre aspectos davida pessoal de cada indivíduo. São consideradosindispensáveis a todos os homens, ostentando, pois,pretensão universalista [...]. O paradigma de titular dessesdireitos é o homem individualmente considerado. Por isso,a liberdade sindical e o direito de greve – considerados,então, fatores desarticuladores do livre encontro deindivíduos autônomos – não eram tolerados no Estado deDireito liberal. A preocupação em manter a propriedadeservia de parâmetro e de limite para a identificação dosdireitos fundamentais, notando-se pouca tolerância para aspretensões que lhes fossem colidentes (2008, p. 233).

Já os direitos fundamentais de segunda geração (igualdade), pregavamas “liberdades positivas”, onde se pedia a interferência do Estado na sociedade.Tal fato se deu em virtude do colapso provocado pelo liberalismo desenfreado.Os abusos que surgiram em virtude do capital desregulado provocaram situaçõesde exploração do homem pelo homem, como o trabalho infantil e as longas

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jornadas de trabalho (com posterior Revolução Industrial). Neste momento, ospublicistas alemães, como Carl Schmitt, descobriram o aspecto objetivo da garantiade valores que visavam à proteção das instituições. Logo os direitos fundamentaisnão deveriam ser vistos apenas como direito a liberdade e até mesmo igualdadede forma individual, deveriam ser encarados com um novo sentido, onde asociedade como um todo seria protegida dos arbítrios do Estado. Sobre tal fato,lembra Paulo Bonavides acerca da cautela com que deve ser lidado o tema:

Essa concepção de direitos fundamentais que contémgarantias institucionais [...] deve ser recebida com algumacautela, pois a liberdade, ao contrário do que acontececom a propriedade, não é suscetível de “institucionalizar-se” como garantia. Se isto ocorresse, destruída ficarianatureza mesma desse direito, sem dúvida o mais clássicoa que o homem aspira (1999, p. 519).

Já com um enfoque mais coletivo do que individual, surge oreconhecimentos dos direitos de “terceira geração”, ligados ao valor“fraternidade”, reconhecidos nos séculos XX e XXI. Não bastava apenas garantirdireitos ao indivíduo; não há como se viver em coletividade se os direitos detoda sociedade não forem protegidos. Não se fala apenas na coletividade emum sentido local, há neste momento a necessidade da diminuição entre asdesigualdades entre as nações ricas e pobres1.

Importante conquista no tocante aos direitos fundamentais foi aconcretização dos direitos sociais. Podem-se apontar como principais momentoshistóricos onde se pôde visualizar tal acontecimento: a Revolução Russa de1917; a promulgação da “Constituição de Weimar”, no ano de 1919 (importantedocumento histórico de consolidação da social-democracia); e a “ConstituiçãoMexicana”, de 1917, são, sem sombra de dúvida, importantes marcos históricosna consolidação dos direitos sociais até então não respeitados.

A evolução dos direitos individuais e dos direitos sociais, apesar dedivididos em momentos históricos, deve ser compreendida como uma unidade,

1. Tal idéia é principalmente desenvolvida por Paulo Bonavides, que dizia que “aconsciência de um mundo partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidasou em fase de precário desenvolvimento deu lugar em seguida a que se buscasseoutra dimensão dos direitos fundamentais, até então desconhecida” In: DireitoConstitucional. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 522.

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de forma a ligar cada geração com a seguinte. Tal fato pode ser verificado noque tange ao surgimento de novas fases, gerações ou, como preferem alguns,autores “dimensões” como o direito a manipulações genéticas ou a informática,direitos estes que são manifestações sobre o tempo atual da humanidade.

1.2 – Direito fundamental ao acesso à justiça e seus obstáculos

O Judiciário desempenha um papel fundamental na concretizaçãodos direitos fundamentais, visto que em diversos momentos não são prestigiadospelo Poder Público, mormente o Executivo. É de suma importância oreconhecimento da deficiência na prestação jurisdicional, principalmenterelacionada às questões acerca da dificuldade encontrada no acesso a justiça.

As chamadas “ondas renovatórias de direito processual”preconizadas por Mauro Capelletti (1998, p. 31-35) identificaram algunsobstáculos ao acesso à justiça.

O primeiro deles é ligado à questão econômica, não somente emrelação ao custo do processo para a parte, mas também aos meios para seajuizar uma ação. Em relação ao custo do processo, a Lei n. 1.060/50 estabeleceem seu art. 2°, parágrafo único que “gozarão dos benefícios desta Lei os nacionaisou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal,civil, militar ou do trabalho. Parágrafo único – considera-se necessitado, para osfins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custasdo processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ouda família”.

A implementação real da Defensoria Pública foi um grande avançopara proporcionar meios para que a população hipossuficiente consiga ver seusdireitos tutelados judicialmente. Todavia, infelizmente ainda não foramproporcionados à instituição da Defensoria Pública os recursos necessários parauma prestação jurisdicional a contento, ainda há grande discrepância em relaçãoaos recursos, à quantidade de vagas oferecidas em concursos públicos e tambémem relação ao salário pagos a Defensores Públicos em comparação a magistradose promotores.

Somente com uma Defensoria Pública forte os direitos doshipossuficientes serão devidamente tutelados; ao contrário, a marginalizaçãoprocessual continuará prevalecendo no meio jurídico. Sobre tal sentimento,disserta Paulo Galliez

A Defensoria Pública é considerada instituição essencial aoEstado de Direito Democrático. No entanto, a sua evoluçãovem sendo desproporcional à sua relevância diante dosobstáculos opostos pelos mais variados segmentos da

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sociedade, especialmente de instituições jurídicasinconformadas com a possibilidade de que suas prerrogativasfuncionais venham ser estendidas por semelhança àDefensoria Pública [...]. O desenvolvimento do progressotecnológico, propagado por esse poder econômico, trazem seu bojo a deterioração da cultura e, com isso,princípios básicos da cidadania são ameaçados evilipendiados (2007, p.1-3).

Ainda ligado ao aspecto econômico, há a falta de informação sobreos direitos dos cidadãos e o acesso ao Judiciário. Isso inclui campanhasinformativas em veículo de comunicação com maior “penetração” nas casasdos brasileiros, principalmente os hipossuficientes.

Um outro obstáculo apontado é de natureza organizacional, que serelaciona com os interesses de grupos de titularidade difusa que merecem umaproteção especial e diferenciada. Em relação a tal fato, é importante ressaltarque o Brasil tem uma legislação bem avançada no que tange direitos difusos ecoletivos, como a Lei do Código de Defesa do Consumidor, Ação Popular, AçãoCivil Pública. Mas o entrave está na necessidade de organização entre oslegitimados, vez que muitos nem sabem que possuem o direito a ser tutelado.

Por último, há a necessidade de se incentivar meios alternativos paraa solução de conflitos como a mediação (meio pacífico de solução de conflitoscom auxílio de um mediador), arbitragem (as partes indicam conjuntamenteum árbitro de confiança para resolução do problema), e autocomposição (tambémchamada de negociação, aqui as partes entram em acordo voluntariamente,elas próprias negociam e chegam a um acordo).

Sobre a importância dos meios alternativos para o acesso à Justiçaleciona Lília Sales e Emanuela Alencar

É importante destacar dois pontos. Primeiro, a experiênciaestrangeira demonstra a relevância desses meios comofacilitadores do acesso à justiça, como procedimentos célerese como importantes instrumentos de desobstrução dostribunais, vez que resolvem conflitos sem que estesnecessitem de uma decisão de juiz togado. Em seguida éimprescindível salientar que os meios consensuais deresolução de controvérsias não existem para substituir oPoder Judiciário nem para com este concorrer. AConstituição Federal garante como direito fundamental quequalquer lesão ou ameaça a direito será apreciada pelo

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Poder Judiciário (CF, art. 5°, XXXV). Ocorre que existemdireitos, como os disponíveis, ou seja, aqueles passíveis detransação, que quando objetos de conflitos podem sersolucionados, pelo meio consensual mais adequado, se estafor a vontade das partes (2004, p.18-19).

Todos estes fatores (e outros mais) dificultam e por muitas vezesafastam principalmente os hipossuficientes do Judiciário e da prestaçãojurisdicional. Alterar tal quadro é um desafio para toda a sociedade conjuntamentecom o Poder Público. Somente quando o acesso for facilitado e os entravessupra apontados solucionados é que a justiça será verdadeiramente distribuída.

1.3 – Celeridade versus qualidade na prestação jurisdicional

Apesar da defesa da celeridade processual, é fato que a sua buscadesenfreada não deve ultrapassar alguns limites impostos pelo garantismoprocessual como o contraditório, ampla defesa e a produção de provas. Buscarapenas um processo rápido é contribuir para que injustiças aconteçamordinariamente, transformando a celeridade apenas em números, estatística.Há que se ponderar que um processo justo somente é alcançado quando aspartes não são privadas dos meios necessários para comprovarem o direitoalegado.

Há uma tentativa de se misturar os conceitos de demora natural doprocesso àquela causada por formalismos desnecessários. Justificam a necessidadede se garantir a segurança jurídica para desprestigiar a celeridade processual enão eliminarem os entraves causados pelo formalismo exacerbado. Nesse sentido,disserta Carlos Henrique Ramos:

É preciso ressaltar que, se de um lado, a demora dos feitosé algo a ser combatido, por outro, representa umaconsequência advinda de um regime processual que sebusca assegurar um patamar mínimo de inviolabilidade àsgarantias processuais. Há que se distinguir a demora natural,fisiológica, advinda do tempo normal para a prática dosatos processuais (dilação razoável), daquela injustificada,patológica, seja por falhas na organização judiciária, sejapor comportamento abusivos e indesejados das partes, dosadvogados ou dos agentes judiciários. [...] A preocupaçãoprincipal deve ser voltada para a eliminação de formalismosinúteis, demoras injustificáveis e protelações abusivas, em

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suma, das dilações indevidas, somente entendidas comoaquelas que correspondem à inatividade, dolosa ounegligente do órgão jurisdicional, pouco importando sehouve sobrecarga de trabalho (2008, p. 52).

O princípio do devido processo legal impede um processo “acelerado”,onde o contraditório e a ampla defesa sejam prejudicados. Todavia, um processodemasiadamente lento traz dificuldade para as partes em virtude de umcomponente que caminha junto com a morosidade – a “incerteza jurídica”,transformando o feito em um processo kafkiano. Importante lembrar os danosdesnecessários que a morosidade causa nas partes, que já são atingidaspsicologicamente por estarem nesta condição. São elas obrigadas a permaneceremassim por tempo indeterminado.

Ainda não há no Supremo Tribunal Federal uma posição firme definindoo que seria um processo lento, quais suas características e parâmetros. A Cortese nega a analisar o tema hora sob o argumento de que em sede de recursoextraordinária não é possível o reexame de provas ou que a questão éinfraconstitucional, não cabendo ao Supremo Tribunal Federal sua análise2. ACorte apenas se pronunciou timidamente sobre o tema no Habeas Corpus n.80.379, de lavra do ministro Celso de Melo no sentido de que o julgamentosem dilações indevidas constitui projeção do princípio do devido processo legal.

Sobre a postura da Corte, dissertou Samuel Miranda Arruda:

Isto se deve em parte ao fato de em variadas decisões oSTF ter compreendido que a alegação de violação ao devidoprocesso legal constituía lesão “reflexa” ou indireta àConstituição, cuja comprovação exige o reexame do corpoprobatório, refugindo-se, assim, ao âmbito de incidênciado Recurso Extraordinário. Diz-se também, por vezes, quea lesão atingiu norma infraconstitucional, muito emboraesta seja uma projeção direta de um postuladoconstitucional. Este entendimento tem o claro objetivo de

2 Este último argumento não é nada razoável, principalmente a partir da EmendaConstitucional n. 45/04, que estabeleceu expressamente o princípio da duraçãorazoável do processo.

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limitar a interposição destes recursos, embora enfraqueçaa cláusula do processo devido. Recorde-se que é estranhoao ordenamento constitucional brasileiro a existênciade um instrumento de seleção processual cível e cujorestabelecimento é esporadicamente aventado quandodas sucessivas reformas processuais e constitucionais(2006, p. 90).

Não somente o Poder Judiciário é o responsável pela demora dosprocessos no Brasil; partes e advogados também contribuem para o problema.Alguns de forma dolosa (vez que a demora no julgamento é favorável), outrosde forma negligente. Mas o Judiciário detém a responsabilidade da fiscalizaçãodesta demora, aplicando as penalidades cabíveis quando for dolosa.

O Conselho Nacional de Justiça desenvolve um trabalho no sentidode eliminar alguns entraves no tocante à morosidade do sistema brasileiro,materialmente e processualmente falando. Algumas dessas medidas são bastanteúteis, outras são mais polêmicas, pois levam a um julgamento “a qualquercusto” (meta 2).

II – Responsabilidade do Estado pela não duração razoáveldo processo

2.1 – Parâmetro geral da responsabilidade civil no Brasil

A responsabilidade civil, espécie de responsabilidade jurídica, derivada transgressão de uma norma civil pré-existente, com a conseqüente imposiçãoao causador do dano do dever de indenizar. É correto dizer, no âmbito daresponsabilidade civil extracontratual, que a sua matriz (regra geral) encontra-seno art. 186 do CC, que define ato ilícito. A ninguém é dado causar prejuízo aoutrem (neminem laedere). Além do art. 186, integram também o sistema jurídicode responsabilidade civil artigos que consagram formas de ilicitude objetiva (art.187 e 927 do CC).

O nosso Código Civil consagra duas formas de responsabilidade: aresponsabilidade subjetiva baseada na culpa e a responsabilidade subjetivabaseada no risco. O art. 927 do CCB, em conjunto com os artigos 186 e 187,forma um sistema que consagra as duas formas de responsabilidade. A primeiralei que consagrou a responsabilidade objetiva foi o Decreto n. 2681/1912 –acidentes ferroviários.

Os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade civil deforma geral são amplamente conhecidos: conduta humana, nexo de causalidade

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e dano ou prejuízo. A conduta humana para efeito de responsabilidade civil pressupõevoluntariedade na sua atuação omissiva ou comissiva, o nexo causal trata-se doliame ou vínculo que une o agente ao resultado danoso e o dano ou prejuízotraduz a lesão a um interesse jurídico tutelado material ou moralmente e, para queeste dano seja indenizável, ele deve observar três requisitos – violação de interessejurídico material ou moral, subsistência do dano e certeza do dano.

2. 2 – Evolução histórica da responsabilidade civil do Estado

A atuação estatal é imposta à sociedade, logo, a vítima deve ter maiorproteção do que em relação à particulares, o Estado deve ter responsabilidademais rigorosa. Em relação aos pressupostos da responsabilidade Estatal, há quese ressaltar os fundamentos teóricos do dever de indenizar que são os princípiosda legalidade e da isonomia – repartição dos danos.

Inicialmente prevalecia no sistema a “teoria da irresponsabilidade doEstado”, onde o monarca, representante de Deus na terra, não errava e, porconseguinte, não era responsável por seus atos. Com o Estado Liberal não eratão diferente, vez que raramente intervinha nas relações entre particulares, é oque leciona José dos Santos Carvalho Filho

Na metade do século XIX, a idéia que prevaleceu nomundo ocidental era a de que o Estado não tinha qualquerresponsabilidade pelos atos praticados por seus agentes. Asolução era muito rigorosa para com os particulares emgeral, mas obedecia às reais condições políticas da época.O denominado Estado Liberal tinha limitada atuação,raramente intervindo nas relações entre particulares, demodo que a doutrina de sua irresponsabilidade constituíamero corolário da figuração política de afastamento e daequivocada isenção que o Poder Público assumia àquelaépoca. Essa teoria não prevaleceu por muito tempo emvários países. A noção de que o Estado era o ente todo-poderoso, confundida com a velha teoria da intangibilidadedo soberano e que o tornava insuscetível de causar danose ser responsável, foi substituída pela do Estado de Direito,segundo a qual deveriam ser a ele atribuídos os direitos edeveres comuns às pessoas jurídicas (2009, p. 488).

Posteriormente, o Estado foi sendo considerado sujeito responsávelem situações pontuais, específicas, surgindo a partir desta noção a “teoria da

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responsabilidade subjetiva”, sendo necessária a conduta ilícita, dano (não havendocaracteriza enriquecimento ilícito), nexo de causalidade, culpa ou dolo.Especificamente em relação à culpa, havia as seguintes teorias: 1) a culpa doagente, onde a vítima deveria apontar qual o agente responsável pelo danoocorrido; 2) “Faute du service” ou culpa anônima, onde a vítima não precisavaapontar o agente responsável, bastando demonstrar que o serviço não foi prestadoou se foi de forma ineficiente ou atrasada. Faltando algum dos elementos supradescritos, a responsabilidade subjetiva era afastada.

Com o amadurecimento do tema, “responsabilidade civil estatal”passou a ser considerada a responsabilidade objetiva do Estado, onde eleresponderia objetivamente por determinadas condutas ilícitas ou lícitas quandofossem demonstrados os elementos gerais da responsabilidade civil: conduta,dano e nexo de causalidade. A Constituição da República de 1988 adotou ateoria do risco integral, não admitindo qualquer excludente. O Estado, nestecaso, tem sempre o dever de indenizar nos seguintes casos: dano ambiental,substância nuclear e material bélico. No caso de a culpa da vítima ser concorrente,não há exclusão da responsabilidade, o Estado responde, mas de forma reduzidano montante de sua participação.

Em relação aos pressupostos específicos da responsabilidade civil doEstado, há algumas observações necessárias. O sujeito ativo da relação é qualquercidadão, e o sujeito passivo são os entes estatais e as pessoas jurídicas prestadorasde serviços públicos, nos casos do art. 37,§ 6° da CF (As pessoas jurídicas dedireito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicosresponderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem aterceiros, assegurados o direito de regresso contra o responsável nos casos dedolo ou culpa). O “agente” mencionado pelo art. 37, §6°, da CF diz respeito atoda e qualquer pessoa que esteja exercendo atividade pública, podendo aresponsabilidade ser primária ou subsidiária. Na responsabilidade primária, apessoa jurídica responde por ato de agente seu; na responsabilidade subsidiária,o Estado responde por ato de agente de outra pessoa, devendo-se obedecer auma ordem de preferência.

Já no tocante à conduta, se ela for comissiva, aplica-se a teoria daresponsabilidade objetiva como regra, seja na conduta lícita ou ilícita. Já se aconduta for omissiva, aplica-se como regra a responsabilidade subjetiva naconduta ilícita e, além dos elementos comuns, deve haver o não fazer comodescumprimento de um dever legal.

Sobre a responsabilidade civil do Estado e suas particularidades,dissertou Danielle Annoni:

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Uma vez que foi a conduta culposa do agente queocasionou o dano, o nexo de imputação configurar-se-ápela comprovação desta culpa, nas suas mais distintas eamplas acepções. Se, todavia, existindo, ou não a culpa doagente, houver um risco envolvido na atividade, serviço,resultado do proveito de determinada prática, conduta oucomportamento, ou mesmo uma imposição legal ounegocial de cuidado, segurança ou controle, o nexo deimputação se configurará pela comprovação deste risco,indicando não apenas a responsabilidade do causador diretodo dano, mas também da pessoa por ele responsável. Noprimeiro caso, tem-se a responsabilidade subjetiva; a regrageral da responsabilidade civil e cuja origem remonta aoséculo III a.C. No segundo, tem-se a responsabilidadeobjetiva, fruto da coletivização dos danos, da ampliaçãodos sujeitos e do reconhecimento de novos direitos. Odiferenciador é, portanto, um elemento subjetivo – culpa– de que se prescinde na responsabilidade objetiva(2009, p. 26).

O risco citado pela autora diz respeito principalmente à atividadeestatal em determinadas áreas, como no que tange à energia nuclear ou meioambiente. Nestes casos, o legislador entendendo a gravidade da atividade nucleare a importância do meio ambiente equilibrado e preservado agiu de formacautelosa ao dispensar o elemento culpa para caracterização da responsabilidadecivil.

Em relação ao dano, ele deve ser necessariamente jurídico, ou seja,caracterizar lesão a um direito. Deve também ser certo (determinado oudeterminável). O dano oriundo de uma conduta lícita deve ser anormal, fugindodos padrões normais aceitáveis. Por último, o dano deve ser particularizado e avítima certa.

2.3 – O Poder Judiciário como prestador de serviço público e suaresponsabilização pela demora excessiva do processo

Há no Brasil muita controvérsia acerca do conceito de serviço público.A doutrina trata de forma diversa a respeito, sendo que alguns doutrinadoresalargam o conceito e outros o restringem. Mário Masagão (1968, p. 252),adotando um conceito mais abrangente de serviço público, entende que seria

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“toda atividade que o Estado exerce para cumprir seus fins”, incluem-se, dessaforma, as atividades legislativas e judiciais.

Hely Lopes Meirelles (2002, p. 316), apresentando um conceito maisrestritivo, retira as atividades legislativa e judiciária do Estado, conceituando oserviço público como “todo aquele prestado pela Administração ou por seusdelegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciaisou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado3”. Já CelsoAntônio Bandeira de Mello (2004) restringe ainda mais o conceito de serviçopúblico, excluindo dela a atividade usufruída indiretamente pelo administrado.

O conceito de serviço público pode ser visto sob três óticas. Pelocritério subjetivo ou orgânico, é analisada a concepção do organismo, pelo qualos agentes exercem a atividade estatal. Já sob o critério objetivo ou material seassenta em verificar a função exercida para a necessidade do interesse público.Por último, há o critério formal pautado na exclusão do regime de direito privado.

Na doutrina predomina o critério formal, onde o serviço público éentendido sob a ótica da função exercida pelo Estado para buscar seu fim, queé o interesse da coletividade. Nesse sentido, define Leon Duguit que serviçopúblico seria “toda atividade cujo cumprimento deve ser regulado, asseguradoe fiscalizado pelos governantes, por ser indispensável à realização e aodesenvolvimento da interdependência social” (2009, p. 83).

Entendendo como Duguit4 , não há como se excluir que as atividadesdo Poder Executivo, Legislativo e Judiciário devem ser consideradas como serviçopúblico. E, ao exercer tais atividades, o Estado pode vir a provocar danos aoparticular, obrigando-se (quando presentes os pressupostos já exposto) a indenizá-lo. Negar ao Poder Judiciário o status de prestador de serviço público é permitirque a atividade seja prestada por particulares ou que seja feita pelas partes“justiça pelas próprias mãos”, o que é vedado.

No Supremo Tribunal Federal ainda prevalece a orientação no sentidoda irresponsabilidade do Estado pelos atos perpetrados pelo Poder Judiciário(Recurso Ordinário n. 111.609-AM). Apesar de tal decisão não corresponder aomelhor entendimento ela ainda foi exarada antes da EC 45/04 que consagrouexplicitamente o princípio da duração razoável do processo.

3 Não seria a atividade judiciária uma forma de satisfazer as necessidades essenciaisda coletividade?

4 Alguns doutrinadores ainda divergem acerca da inserção das atividades legislativase judiciárias no campo do serviço público e das reparações indenizatórias. Difícilentão falar em doutrina majoritária neste ou em outro sentido.

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Muitos justificam a não responsabilização dos atos do Poder Judiciáriona independência dos magistrados. Afirmam os defensores desta teoria quetolher essa independência comprometeria o resultado dos processos. Não sequestiona que a independência do magistrado é essencial para a suaimparcialidade nos julgamentos e na distribuição da justiça em todos seus graus.Mas deve-se entender que esta independência não é absoluta, não há maispoderes absolutos no sistema constitucional vigente. O que leva verdadeiramenteà distribuição da justiça e a concretização do bem comum é a fiscalização dospoderes (pelos próprios poderes e por órgãos externos).

Acerca da responsabilização do Poder Judiciário bem dissertou MauroCappelletti.

Se de um lado impõe-se preservado intenso grau deautonomia dos juízes, esta autonomia não deve ser“fechada”, mas sim “aberta” às instâncias da sociedade.Para esse fim, muitos instrumentos, muitas “antenas”podem ser adotadas [...] incluídas aí várias formas deresponsabilidade de prestação de contas, políticas, sociaise jurídicas, indevidamente atrofiadas. [...] Justamente pararemediar o risco da clausura corporativa, particularmenteameaçador numa magistratura de carreira, deve-se adotar,por isso, os instrumentos normativos, organizativos eestruturais que possam tornar a autonomia dos juízes abertaao corpo social e, assim às solicitações dos “consumidores”do supremo bem que é a Justiça (1989, p. 92-93).

Cappelletti utiliza o termo “consumidores” para tratar dosjurisdicionados. Tecnicamente não há relação de consumo entre autor/réu e oEstado, como prestador de serviço público no tocante à atividade jurisdicional.Todavia, a palavra descreve bem como devem ser tratadas as partes perante oEstado, deve-se pautar por uma boa prestação jurisdicional, que passanecessariamente por um processo em tempo razoável. A autonomia dosmagistrados não será talhada com a fiscalização do tempo do processo, não háque se falar em perda de prerrogativas com isso. A fiscalização do Judiciário éalgo que a sociedade vem requerendo ao decorrer do tempo e tal vem sendofeito pelo Conselho Nacional de Justiça.

A Constituição Federal garante, em seu art. 5°, XXXV, que “a lei nãoexcluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Umainterpretação restritiva de tal dispositivo diria que ele dispõe o direito à petiçãonos órgãos jurisdicionais. Todavia, uma interpretação ampliativa e mais correta

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não apenas estabelece a garantia do direito de petição, mas também agarantia de que a lesão e a ameaça a direito será garantida em temporazoável, com um processo sem dilações indevidas e suspensões semjustificação.

A doutrina (especificamente Danielle Annoni) estabelece como marcodo direito à razoável duração do processo a Convenção Européia para Salvaguardados Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que dispõe: “Todapessoa tem direito a que sua causa seja examinada equitativa e publicamentenum prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial instituído porlei, que decidirá sobre seus direitos e obrigações civis ou sobre o fundamentode qualquer acusação em matéria pena a ela dirigida”. Este diploma garantiu aodireito a razoável duração do processo a qualidade de direito fundamental atodo cidadão.

Danielle Annoni, ao dissertar sobre o tema, estabelece a possibilidadede ação regressiva do Estado contra o agente causador da demora excessiva:

Assim, dada a complexidade em se fixar uma regraespecífica, determinante das violações ao direito à tutelajurisdicional dentro de um prazo razoável, a CorteEuropéia dos Direitos do Homem firmou entendimentode que, respeitadas as circunstâncias de casa caso,devem ser observados três critérios para se determinara duração razoável do processo, assim seja: a) acomplexidade do assunto; b) o comportamento doslitigantes e de seus procuradores ou da acusação e dadefesa do processo; c) a atuação do órgão jurisdicional.[...] Por certo há de se convir que a demora, para serreputada, realmente inaceitável, há de decorrer deinércia, pura e simples, do órgão judicante, ou ainda,de dolo ou culpa do magistrado, caso em que ao Estadocaberá ação regressiva nos termos do art. 37, § 6° daConstituição Federal (2009, p. 125).

Para que haja a responsabilização do Estado pela demora excessivado processo é necessário que seja causada por agentes públicos: juízes,promotores, oficiais de justiça, escreventes, escrivãos... Se a demora for deresponsabilidade das partes não há o dever de indenizar. Ademais, importantesalientar que uma vez identificado o causador da morosidade é plenamentepossível o ingresso de ação de regresso em face do agente público com base noart.37, §6° da CRFB/88.

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III – O papel do poder público

3.1 – O princípio da duração razoável do processo e as medidasprocessuais adotadas

Influenciado pelo direito europeu, especialmente pelo de Portugal, oBrasil não trazia expressamente a garantia a uma tramitação processual em umtempo razoável. Já do direito norte-americano copiou-se (apesar de recente) anoção do “due processo of law”, ou seja, a garantia de que ninguém será privadoda liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (art. 5°, LIV,CF). Esteprincípio assegura que as relações sejam igualitárias, que as regras estejampreviamente estabelecidas, não havendo espaço para um processo Kafkiano.Um processo justo passa certamente pela noção de celeridade e de sua duraçãorazoável.

A Constituição de 1934 trouxe dispositivo no rol dos direitos e garantiasindividuais (art. 113, 35) que dizia:

A lei assegurará o rápido andamento dos processos nasrepartições públicas, a comunicação aos interessados dosdespachos proferidos, assim como das informações a queestes se refiram, a expedição de certidões requeridas paraa defesa de direitos individuais, ou para o esclarecimentodos cidadãos acerca dos negócios públicos, ressalvados,quanto às últimas, os casos em que o interesse públicoimponha segredo, ou reserva.

Este dispositivo mostrava uma preocupação do constituinte de que osprocessos judiciais e administrativos tivessem uma duração razoável, tendo comoprincipal destinatário o Poder Público. É o que nos traz a lição de Samuel MirandaArruda:

Desta forma, embora de curtíssima vigência e com certosmatizes autoritário-corporativos, a Constituição Federal de1934 é de transcendente relevância como fonte históricade enunciação de um direito ao “rápido andamento dosprocessos” no constitucionalismo brasileiro. O dispositivotratava desta matéria, artigo 113,35, primeira parte [...].Destaque-se, por relevante, que esta cláusula se achavainserida justamente no título consagrado à “Declaração deDireitos”, mais especificamente no capítulo relativo aos

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direitos e garantias individuais. Vê-se portanto, que oconstituinte de então já compreendia a importância e anecessidade de dar estatuto jus-fundamental à garantia deadequada temporalidade processual, não se limitando aconstitucionaliza-la. É necessário também realçar que anorma tem como destinatário principal o legislador,parecendo claro que à lei caberia regular e tornar efetiva agarantia. Registre-se que o dispositivo não demarca umaampla concepção de razoabilidade temporal, estando aindavinculado à noção americana de “speedy trial”, que a julgarpelo elemento literal parece ter tido decisiva ascendênciasobre o constituinte brasileiro (2006, p. 43).

As constituições seguintes não previram expressamente o princípioda duração razoável do processo. A Constituição de 1988 originalmente tambémnão; somente com a Emenda Constitucional n. 45/2004 tornou explícito oprincípio da duração razoável do processo (art. 5°, LXXVIII), importante ressaltarque também consta do rol de garantias fundamentais do cidadão, assim comoem 1934.

A chamada “Reforma do Judiciário” – EC n. 45/04 – foi fruto deintensas discussões e tentativas de acordo acerca dos temas propostos, entreeles a necessidade de se propiciar maior celeridade ao processo no Brasil. Atarefa implicava um comprometimento das três esferas de poder no Brasil:Legislativo, Executivo e Judiciário. O Poder Legislativo deveria proporcionar atravésde reformas na legislação um acesso mais abrangente às tutelas jurisdicionais,fortalecendo a Defensoria Pública, a gratuidade das custas processuais e aindatutelando de forma efetiva os direitos humanos, especialmente os direitos sociais.O Poder Executivo é o encarregado da parte física, estrutural e material dasreformas, dando real efetividade às reformas legislativas e aos tratados ao qualo Brasil é signatário. Por último, compete ao Poder Judiciário o bom uso dosmecanismos de resolução dos conflitos, a eliminação da burocracia por elemesmo criada (ANNONI, 2009, p. 138).

Aferir a eficiência de um sistema judicial é tarefa árdua e difícil, poisnão é somente olhar as estatísticas de forma bruta. É necessário se aferir acercada complexidade dos feitos, dos motivos que levaram a demora e seusresponsáveis (partes, advogados, juízes, Ministério Público ou serventuários doJudiciário). Há uma tentativa de dar maior celeridade ao processo, especialmenteaos recursos interpostos, dificultando-os. As reformas que foram implementadascolocaram barreiras para que o recurso seja examinado pelos Tribunais. A chamada“repercussão geral” prevista no art. 102, §3° é um exemplo de tal barreira.

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Estabelece o referido artigo que: no recurso extraordinário o recorrente deverádemonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidasno caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão dorecurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços deseus membros (grifo nosso). O legislador trouxe um conceito amplo, abertoa ser preenchido e interpretado pelo Supremo Tribunal Federal, deixando ojurisdicionado à mercê das mudanças de composição do Tribunal e das intençõesde seu presidente.

Outra medida implementada para diminuir o número de recursosnos Tribunais Superiores foi a súmula vinculante. A justificativa apontada foi anecessidade de proporcionar segurança jurídica às partes, evitando que assuntosiguais tenham tratamento diferentes.

Estabeleceu o art. 103-A da CRFB/88 que:

O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou porprovocação, mediante decisão de dois terços dos seusmembros, após reiteradas decisões sobre a matériaconstitucional, aprovar súmula que, a partir de suapublicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante emrelação aos demais órgãos do Poder Judiciário e àadministração pública direta e indireta, nas esferas federal,estadual e municipal, bem como proceder a sua revisão oucancelamento na forma estabelecida em lei.

O instrumento da súmula realmente diminui a quantidade de recursosnos Tribunais Superiores, proporcionando um processo mais célere. Todavia, aproblemática está em seu mau uso pelo Supremo Tribunal Federal, que deveriaeditá-las somente quando houvesse (como o dispositivo constitucional determina)reiteradas decisões sobre a matéria constitucional, onde os ministros debatessemamplamente o assunto para então se chegar a um resultado que melhorrepresentasse os ditames da Justiça. Não é o que ocorre na Corte, podendo seexemplificar com a súmula vinculante n. 115, fruto de apenas uma decisão.

5 Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fugaou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou deterceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidadedisciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão oudo ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil doEstado.

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Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundadoreceio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte dopreso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena deresponsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidadeda prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidadecivil do Estado.

O objetivo da súmula vinculante foi estabelecido pelo §1° do art.103-A que estabelece que:

A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e aeficácia de normas determinadas, acerca das quais hajacontrovérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses ea administração pública que acarrete grave insegurançajurídica e relevante multiplicação de processos sobrequestão idêntica.

Outro instrumento utilizado para filtragem de recursos é osobrestamento de recursos repetitivos6. Neste caso, quando houvermultiplicidade de recursos com fundamentação idêntica, ficam sobrestados nostribunais de origem até que um ou alguns deles sejam julgados pelo SuperiorTribunal de Justiça.

A súmula vinculante e o julgamento de recursos repetitivos sãoimportantes instrumentos (principalmente no que tange aos recursos de massa),evitando que processos fadados à improcedência cheguem aos TribunaisSuperiores. Críticas à parte, há que se ressaltar a grande importância da previsãodo direito à razoável duração do processo na Constituição e, mormente, no roldos direitos e garantias fundamentais, vez que se torna mais clara a possibilidadede se buscar judicialmente a reparação por um processo demasiadamente

6 Sobre o tema, Hélio Rios Ferreira: “Não se trata de requisito de admissibilidadedo recurso especial, pois não é a parte que deve provar que há inúmeros recursosespeciais interpostos no mesmo Tribunal com o mesmo fundamento de direito;o recorrente apenas interpõe seu recurso, competindo ao Tribunal de origem ouao próprio Superior Tribunal de Justiça sobrestar os demais recursos quandoperceberem que há mesmo direito controvertido em vários recursos especiais. InO processamento dos múltiplos recursos com fundamento em idênticacontrovérsia (Repercussão Geral) e com fundamento em Idêntica Questão deDireito (Recurso Especial Repetitivo)”. Revista IOB de Direito Civil e ProcessualCivil, n. 62, nov./dez. 2009. p. 87.

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demorado. É possível, ainda, se cobrar a implementação de mecanismos reaispara a garantia a uma tramitação célere. Por fim, há também a consagração detal direito como cláusula pétrea, garantia que não pode ser suprimida por governose reformas posteriores.

3.2 – O Conselho Nacional de Justiça e o panorama de Estadosbrasileiros

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foi criado em 31 de dezembrode 2004 e instalado em 14 de junho de 2005. Trata-se de órgão vinculado aoPoder Judiciário com sede em Brasília e atuação em todo o território nacional.Tem como missão principal “contribuir para que a prestação jurisdicional sejarealizada com moralidade, eficiência e efetividade, em benefício de toda asociedade”. Suas principais diretrizes compreendem: 1) o planejamentoestratégico e proposição de políticas judiciárias; 2) modernização tecnológicado Poder Judiciário; 3) ampliação do acesso à justiça, pacificação e responsabilidadesocial; 4) garantia de efetivo respeito às liberdades públicas e execuções penais7.

As competências do Conselho Nacional de Justiça estão previstas noEstatuto da Magistratura e no art. 103-B, §4° da Constituição Federal. Entretodas se destacam:

1- Zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento doEstatuto da Magistratura, expedindo atos normativos erecomendações.

2- Definir o planejamento estratégico de atuação do Poder Judiciário.3- Receber reclamações e representações contra membros ou órgãos

do Judiciário, incluindo auxiliares, serventias e órgãos prestadoresde serviços notariais.

4- Julgar processos disciplinares, podendo determinar a remoção, adisponibilidade ou a aposentadoria, além de aplicar outras sançõesadministrativas.

5- Dar maior celeridade ao Poder Judiciário, elaborando e publicandosemestralmente relatório sobre a movimentação processual daatividade jurisdicional no país.

6- Representar ao Ministério Público em caso de crime ou abuso deautoridade.

7 Informações retiradas no site do Conselho Nacional de Justiça (www.cnj.jus.br),acessado em: 07 fev. 2010.

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No CNJ há vários programas8 com o objetivo de melhorar a prestaçãojurisdicional no Brasil, destacando-se entre eles o Bacen Jud, que é um sistemade solicitação de informações acerca da existência de contas, saldos, endereçoson line, possibilitando maior agilidade no que tange ao recebimento de débitos,execução judicial e extrajudicial. Atualmente, há o sistema Bacen Jud 2.0, queé uma atualização do inicialmente implantado com a possibilidade detransferência do valor bloqueado para conta de depósito judicial, sendo essatransferência executada de imediato. Na versão 2.0, há ainda a possibilidade decomunicação entre o Poder Judiciário e as instituições bancárias, pois conta nosistema a identificação da Vara, os nomes e telefones das instituições financeiras.

Muito parecido com o sistema Bacen Jud, o programa InfoJUD é umserviço à disposição dos magistrados, objetivando agilizar as solicitações deinformações junto à Receita Federal. Com essa ferramenta é possível um acessomais amplo e rápido aos bens das partes. Importante destacar o programaMovimento pela Conciliação, implantado em 23 e agosto de 2006, e a instituiçãodo Dia Nacional pela Conciliação, onde as comarcas do país se dedicaram aaudiências objetivando acordos judiciais e assim solucionando com maior rapidezos litígios.

Os programas supracitados são uma amostra do que vem sendodesenvolvido pelo CNJ para agilizar as movimentações processuais. Importante,ainda, destacar as correições que estão sendo realizadas em diversos estadosbrasileiros, onde pode ser verificado o atraso nos feitos e a falta de estrutura demuitos locais.

Nessas inspeções preventivas foram verificados problemas graves emalguns tribunais. No estado do Pará9, há registro de comarcas com alta rotatividadede juízes substitutos, onde não há um magistrado titular há mais de um ano, oque leva a ausência de planejamento para as varas e prejuízo para a movimentaçãoprocessual. Outro problema encontrado foi a escassez e falta de distribuiçãoequânime dos funcionários, o que leva à paralisação dos processos emovimentação apenas quando há pedido das partes/advogados (não há impulsooficial). A escassez é tão latente que chega ao ponto dos próprios servidorescontratarem um terceiro para prestar serviços nos cartórios, fato constatado na1ª Vara de Icoraci.

8 Informações retiradas no site do Conselho Nacional de Justiça (www.cnj.jus.br),acessado em: 13 fev. 2010.

9 Relatório de inspeção n. 04, retirado do site do CNJ (www.cnj.jus.br), acessadoem: 17 dez. 2009.

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No Estado do Piauí10, foram constatadas diversas irregularidades, comoo acúmulo de processos prontos para serem remetidos ao Ministério Público hávários anos, atrasando os andamentos dos feitos e ocasionando, na esfera penal,a ocorrência de prescrição em massa. Há ainda, em várias comarcas do Estado,centenas de processos para serem conclusos aos magistrados, sendo contatadona 2ª Vara da Comarca de Picos mais de mil processos para serem conclusos eo acúmulo de audiências a serem realizadas.

Em Alagoas11, há constatação de permuta de desembargadores epromoção de juízes com processo conclusos sem justificativa, ferindo o dispostono art. 93, II, da CRFB/88. Foram encontrados ainda em diversas comarcasmuitos processos conclusos além do prazo legal e a estranha norma depossibilidade de envio de processos ao arquivo somente por um mês durante oano, ocasionando o acúmulo de feitos nos cartórios e inviabilizando uma melhororganização.

Inspeção realizada na Justiça Federal de Minas Gerais, maisespecificamente em Belo Horizonte12, demonstrou que os problemas noJudiciário brasileiro não é “privilégio” apenas da Justiça Estadual. Verificou-setambém a desigualdade na distribuição de funcionários nas Varas dos JuizadosFederais inspecionadas em comparação com as Varas Federais. Nos Juizados háem média por vara cerca de 28.000 processos e nas Varas Federais Cíveis cercade 2.000 processos, o que não se coaduna com os preceitos de celeridade dosJuizados Especiais. Nas Turmas Recursais foi verificado o acúmulo de 21.000processos aguardando pauta para julgamento e apenas 9 juízes compondo asTurmas.

Nos relatórios das inspeções feitas pelo Conselho Nacional de Justiçahá diversas recomendações e ordens a serem tomadas pelos Tribunais de Justiçae pela Justiça Federal para o andamento dos feitos. Os problemas encontradossão, em sua maior parte, de ordem material: ausência de estrutura adequada,de informatização, de servidores e de juízes. Todavia, há que se efetuar umcontrole maior sobre o andamento do trabalho dos magistrados, evitando assim,o quadro de desídia que muito se encontrou.

10 Relatório de inspeção n. 08, retirado do site do CNJ (www.cnj.jus.br), acessadoem: 17 dez. 2009.

11 Relatório final de inspeção em Alagoas, retirado do site do CNJ (www.cnj.jus.br),acessado em: 17 dez. 2009.

12 Relatório 20 da inspeção realizada na Justiça Federal instalada em Belo Horizonte,retirado do site do CNJ (www.cnj.jus.br), acessado em: 17 dez. 2009.

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3.3 – A meta dois: celeridade a qualquer custo?

Com o intuito de propiciar maior agilidade e eficiência ao andamentodos processos, os Tribunais brasileiros estabeleceram dez metas para o Judiciáriono ano de 2009. De forma geral, são metas que visam melhorar o aparelhamentotécnico e humano do judiciário, entre elas: meta 3 – informatizar todas asunidades judiciárias; meta 6 – capacitar o administrador de cada unidade judiciáriaem gestão de pessoas e de processos de trabalho para imediata implantação demétodos de gerenciamento de rotinas; meta 8 – cadastrar todos os magistradoscomo usuários dos sistemas eletrônicos de acesso a informações sobre pessoase bens; e meta 10 – implantar o processo eletrônico em parcela de suas unidadesjudiciárias.

Tais objetivos, de fato, se bem implantados irão propiciar maior agilidadeao andamento processual, diminuindo o seu tempo de trâmite. Todavia, há quese ater a meta 2: “identificar os processos judiciais mais antigos e adotar medidasconcretas para o julgamento de todos os distribuídos até 31.12.2005 (em 1°, 2°grau ou tribunais superiores)”. Justifica o Conselho Nacional de Justiça: “Oobjetivo é assegurar o direito constitucional à razoável duração do processojudicial, o fortalecimento da democracia, além de eliminar os estoques deprocessos responsáveis pelas altas taxas de congestionamento”.

A rigor, a meta 2 é algo que de fato propiciaria, mesmo que de formapaliativa, a concretização do princípio da razoável duração do processo, poisseriam adotadas medidas para o julgamento dos feitos mais antigos. Mas de queforma esses feitos seriam julgados? Quais medidas seriam tomadas para queestejam prontos e maduros para julgamento? Haverá mutirões de juízes,promotores e servidores?

Responder a tais indagações é algo que levaria a avaliar de formaprecisa o funcionamento da medida. Julgar os efeitos mais antigos significamuitas vezes deixar de lado os processos com distribuição mais recentes,semeando nestes um atraso semelhante. Outra questão a merecer preocupaçãoé a extinção de processos a qualquer custo, utilizando de forma errada osmecanismos do art. 267 do Código de Processo Civil, extinguindo processosparados sem abrir vista à parte contrária, ou verificar após anos falta de condiçãoda ação ou inépcia da inicial.

A celeridade processual deve caminhar lado a lado com os princípiosdemocráticos do direito; é necessário garantir às partes acesso a um julgamentojusto, com um processo maduro. Acelerar o julgamento dos feitos em busca denúmeros ou como diz o slogan do Conselho Nacional de Justiça “bater recordese garantir direitos” é não observar os princípios que regem o sistema jurídicobrasileiro consagrado principalmente na Constituição da República.

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Nesse sentido leciona o professor José Miguel Garcia Medina

Para mim, o que mais preocupa é que a ênfase da Meta 2está na quantidade, está em resolver um problema denúmeros. Quando alguém fala em qualidade, é para dizerque para se alcançar a Meta 2 não poderá esperar que asdecisões judiciais sejam tão boas. [...] Claro que algo deveser feito, para se reduzir a quantidade muito grande deprocessos que tramitam no Poder Judiciário, mas ficoincomodado em perceber que, ao invés de se dar primaziaa aspectos qualitativos, nós estejamos nos contentando comelementos exteriores. Certamente ao final, serão divulgadosos números (sempre eles...) alcançados com a Meta 2, etodos comemorarão. Mas a vida das pessoas não é apenasnúmero. Quando alguém vai ao Poder Judiciário, não esperaapenas uma decisão proferida rapidamente – qualquer queseja o resultado. Ao se “resolver” tudo com a Meta 2,esquece-se (ou pelo menos, deixa-se de lado) de investigara causa da morosidade dos processo (2010).

Dessa forma, o maior problema dos atrasos processuais está na faltade estrutura experimentada pelo Poder Judiciário. Mais do que “bater recordes”de forma paliativa, há que apresentar um estudo mais profundo dos problemasda morosidade dos processos no Brasil, se está na falta de funcionários, demagistrados, na ausência de modernização tecnológica ou todos estes fatorese, a partir de então, desenvolver políticas reais que resolvam o problema deforma definitiva e não criar metas temporárias.

IV – Considerações finais

Como foi verificado no presente trabalho, o trâmite dos processos noBrasil é demasiadamente lento e necessita de análise para que haja uma respostaà sociedade que clama pela celeridade no julgamento dos seus feitos. Hoje, noBrasil, há um verdadeiro processo Kafkiano; não há qualquer perspectiva dosjurisdicionados para a solução de seus feitos.

A Emenda Constitucional n. 45/04 consagrou, agora de forma explícita,o princípio da razoável duração do processo, trazendo assim a possibilidade deresponsabilização do Poder Público quando a demora excessiva no trâmite ejulgamento dos feitos são de sua responsabilidade, seja ela em virtude da ausência

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de servidores, da desídia de magistrados ou da falta de estrutura física etecnológica.

Há que se ressaltar a importância de um controle sobre o andamentodo processo no Brasil e o trabalho desenvolvido pelo Conselho Nacional deJustiça, que vem atuando para identificar os estados onde o processo édemasiadamente lento e, então, determinar a implantação de medidas parasolucionar tal problema.

Não pode ser negado ao jurisdicionado o direito a um processo céleree justo, mas há que se respeitarem os princípios democráticos do direitoconsagrados na Constituição de 1988. Todavia, celeridade não pode serconfundida com aceleração processual, onde processos não maduros são julgadosa qualquer custo. Por tal motivo a chamada “meta 2” do Conselho Nacional deJustiça deve ser avaliada mais cuidadosamente antes de se comemorar os“recordes” batidos pelo Poder Judiciário.

Nessa esteira, o Poder Judiciário deve sofrer reformas não somenteestruturais, mas também na conduta dos magistrados, para somente assimpropiciar a “justiça” consistente em um processo justo, que respeite os princípiosdo direito e célere.

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