o cuidador familiar de doentes com câncer

Upload: eliaper

Post on 02-Mar-2018

221 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/26/2019 O cuidador familiar de doentes com cncer

    1/5

    Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-622

    ARTIGO ORIGINAL

    Resumo

    Recebido em 05.02.2010

    Aceito em 19.03.2010

    No h conflito de interesse

    Palavras-chave

    Abstract

    O cuidador familiar de doentes com cncerThe family caregiver of patients with cancer

    Aline F. Ribeiro1; Clia A. de Souza2

    1 Acadmica de Enfermagem*; 2 Enfermeira Docente** Faculdade de Medicina de So Jos do Rio Preto FAMERP.

    Introduo: Considerando-se o cncer como uma doena crnica e tratvel e que, em muitos casos pode sercurada, principalmente quando diagnosticada precocemente, ainda uma doena bastante estigmatizada,cheia de mistrios e sofrimento no s para o paciente, mas para sua famlia. Objetivo: Este estudo descritivoteve como objetivo investigar as dificuldades vivenciadas pelos cuidadores familiares de doentes comcncer. Mtodo: A coleta de dados foi realizada no perodo de Agosto de 2008 Fevereiro de 2009 em umacentral de quimioterapia de um hospital de ensino do interior do estado de So Paulo. Utilizamos um questionriocontendo 14 questes fechadas abordando questes do apoio familiar para o cuidado, autoestima do cuidador,

    problemas financeiros, atividades dirias interrompidas pelo cuidador, problemas de sade e desgaste do

    cuidador. Resultado: Verifica-se predominncia de mulheres (60%) que em sua maioria so donas de casae cnjuge do paciente. Dos quinze entrevistados 80% (n=12) responderam interromper suas atividadesdirias para dar ateno ao doente. 60% (n=9) dispem da colaborao da famlia. 66% (n=10) dos entrevistadosresponderam no ter escolhido cuidar, mas tem que cuidar. Concluso: A escolha do cuidador familiar nemsempre dialogada podendo se fazer de maneira espontnea ou por indicao dos membros da famlia,considerando-se os quesitos de laos afetivos, proximidade residencial, suporte financeiro e disponibilidadede tempo.

    Cuidadores; Cncer.

    Introduction: Considering cancer as a chronicle and tractable disease and that in many cases it can be cured,especially when it is diagnosed earlier, cancer is still a very stigmatized disease, full of mysteries and sufferingnot only to the patients, but also to their families. Objective: This descriptive study was to investigateobjectives difficulties experienced by family caregivers of patients with cancer. Method: Data collection wasconducted from August 2008 to February 2009 in a central chemotherapy in a teaching hospital of the stateof So Paulo. We used a questionnaire containing 14 closed questions addressing issues of family supportin caring, the caregivers self-esteem, and financial problems, daily activities disrupted by the caregiver,health problems and burnout of the caregiver. Results: It is verified the predominance of women (60%) thatin their majority are housewives and married to the patients. Of the fifteen interviewed people, 80% (n=12)said to have had interrupted their daily activities to pay attention to the patient. 60% (n=9) have the familycollaboration. 66% (n=10) of the interviewed people said they did not choose to take care of the sick person,

    but they had to. Conclusion: The choice of a familiar caregiver not always is discussed; it can be done ina spontaneous way or by the family members indication considering requirements such as ties of affection,residential proximity, financial support and readiness of time.

    Caregivers; Cancer.Keywords

    Introduo

    Atualmente, o cncer considerado uma doena crnica eabsolutamente tratvel e que, em muitos casos pode ser curada,

    principalmente quando diagnosticada precocemente. Noentanto, ainda uma doena bastante estigmatizada, cheia demistrios e sofrimento. O enfrentamento a esta doena dependede atributos pessoais: sade e energia, sistema de crenas, metasde vida, autoestima, autocontrole, conhecimento, capacidade

    de resoluo de problemas e prticas e apoio sociais. Assim,quando se estuda o processo de enfrentamento de uma pessoaou famlia preciso considerar suas caractersticassocioculturais1.O apoio multidisciplinar no cuidado dessas pessoas h de selevar em considerao o ncleo familiar como unidade cuidadora.A constituio familiar no formada apenas por parentes (pais,filhos, irmos, primos, etc), mas tambm por outros que se junta

  • 7/26/2019 O cuidador familiar de doentes com cncer

    2/5

    Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-6 23

    famlia com vnculo e laos entre si. A esfera familiar umaunidade formada por seres humanos ao longo de sua trajetriade vida, cuidando de si prprios e de outros, sendo que asmaneiras de cuidar variam de acordo com os padres culturaise se relacionam com as necessidades de cada individuo 2.A doena oncolgica tem um impacto negativo na vida das

    pessoas, no s pela sua repercusso social e econmica, mastambm pelo sofrimento do paciente e sua famlia. Sabemos que80% dos casos de neoplasias so diagnosticadas tardiamente,quando os recursos disponveis para o tratamento so s

    paliativos. Esta situao limita a esperana de vida, contribuicom a deteriorao da autoimagem e sustenta o estigma de quecncer uma doena incurvel 3.Abordar a famlia implica examinar o individuo concebendo aindividualidade como processo construdo socialmente a partirde um contexto heterogneo; ou a partir da necessidade dereconhecer a existncia de processos de coordenao dediferentes subjetividades pessoalmente construdas. Tal

    processo, ocorrendo primariamente na famlia, imprime moldes,

    selos e estilos ao longo do desenvolvimento humano,qualificando resultados e contribuindo diretamente para aqualidade de vida do grupo familiar 4.Tomando como base essa preocupao com a famlia, a atenodeve ser voltada para aquele que ser definido como cuidador,que poder ser algum com bases tcnicas e cientficas, definidocomo cuidador formal, ou algum que tenha ou no experincia

    por tentativas de erro e acerto, definido como cuidador informal.O cuidador tambm poder ser classificado de acordo com ocuidado que ir prestar, primrio se assumir as responsabilidadesdiretamente relacionadas aos cuidados mnimos como higienee alimentao. Secundrio aquele que auxiliar em eventuais

    necessidades do paciente caracterizado como no sendoprimordial para a recuperao do paciente5.So diversos os motivos que levam a delegao do cuidador,este pode ter grau de parentesco ou afim, ter relao afetiva,estar mais prximo do ambiente em que se encontra o paciente,

    por falta de outra possibilidade, autodelegao, entre outras.Se o cuidador for informal, com grau de parentesco, alm dafuno de cuidar do doente, seu estado emocional poder ficarmais comprometido, seja pela dor de presenciar o sofrimento doente querido, seja pelo sentimento de incmodo, de se sentirobrigado, entre outros motivos 5.Atualmente, as publicaes tm considerado como cuidadorestodos os que dispensam cuidados a terceiros sendo ento

    utilizada uma classificao para as multi qualificaes dessesindivduos 6 .Segundo a classificao de Wanderley existem vrios tipos decuidadores, listados abaixo com suas particularidades, porm aautora ressalta que no so categorias excludentes, mas simcomplementares, podendo o cuidador apresentar mais de umaclassificao: cuidador remunerado: recebe um rendimento peloexerccio da atividade de cuidar; cuidador voluntrio: no remunerado; cuidador principal: tem a responsabilidade

    permanente da pessoa sob seu cuidado; cuidador secundrio:divide, de alguma forma, a responsabilidade do cuidado comum cuidador principal, auxiliando-o, substituindo-o; cuidador

    leigo: no recebeu qualificao para o exerccio profissional daatividade de cuidar; cuidador profissional: possui qualificaoespecfica para o exerccio da atividade (enfermeiro, terapeuta,etc.); cuidador familiar: tem algum parentesco com a pessoacuidada; cuidador terceiro: no possui qualquer grau de

    parentesco com a pessoa cuidada7.Assim, o cuidador que denominamos formais pode ser entendidonesta classificao como cuidador remunerado, principal, leigo,

    profissional e terceiro uma vez que nesta classificaosobrepem-se grau de parentesco, remunerao e formao6.Isto posto, a questo a ser trabalhada recai sobre essescuidadores informais, qual o perfil desses cuidadores, suasinquietaes e quanto exigem pelo trabalho de cuidador.

    Objetivo

    Investigar as dificuldades vivenciadas pelos cuidadoresfamiliares de doentes com cncer em tratamento quimioterpico.

    Casustica e Mtodo

    Trata-se de uma pesquisa descritiva. O campo de estudo foi emum hospital de ensino de capacidade extra no interior de SoPaulo. A unidade escolhida foi uma central de quimioterapiaonde so atendidos pacientes adultos com cncer. O estudo foisubmetido autorizao formal da instituio e do Comit detica e Pesquisa (parecer n 187/2008) Os dados foram coletadosmediante a aceitao do cuidador por meio do Termo deConsentimento Livre e Esclarecido e aplicao de umquestionrio estruturado contendo 14 questes. Para facilitar autilizao e o posterior entendimento do instrumento de coleta,as questes foram agrupadas por categorias: apoio familiar;

    problemas financei ros; atividades dirias interrompidas;

    problemas de sade/desgaste.Participaram desta pesquisa os indivduos que preencheram oscritrios de incluso: cuidadores de ambos os sexos maiores de18 anos, membro da famlia do paciente com doena oncolgica,sem prejuzo da comunicao verbal.Os dados obtidos nas quinze entrevistas foram analisados pelo

    pesquisador com ajuda do programa Excel 2003 e relacionadossegundo os objetivos desta pesquisa.

    No que se refere ao instrumento de coleta as questes foramagrupadas por categorias, que so:

    Apoio Familiar

    A minha famlia colabora na diviso dos cuidados com ele (a)?

    Minha famlia me deixou sozinho (a) para cuidar dele (a)?Tem dispensado quantas horas por dia no cuidado com ele (a)?

    Autoestima

    Voc, alguma vez, j se sentiu ofendida e com raiva durante ocuidado com ele?Eu escolhi cuidar dele?Cuidar dele (a) me faz sentir bem?Sinto-me capaz de cuidar dele (a) como ele (a) realmente merece?

    Problemas financeiros

    Voc tem tido dificuldades financeiras para cuidar dele (a)?

  • 7/26/2019 O cuidador familiar de doentes com cncer

    3/5

    Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-624

    Tabela 2 - Agrupamento por categorias. So Jos do Rio Preto, SP, 2009.

    CATEGORIAS N %

    ApoioF amili ar

    Colaborao da famlia

    na execuo dos

    cuidados.

    Sim 9 60

    No 4 27

    Parcialmente 2 13

    Total 15 100

    Auto-Estima

    Sentimentos de ofensa

    e raiva durante a

    execuo do c uidado.

    De maneira alguma 8 53

    Algumas vezes 4 27

    Raramente 3 20

    Frequentemente 0 0

    Total 15 100

    Eu escolhi cuidar dele? Sim 4 27No, eu tenho qu e

    cuidar.

    10 66

    No, eu fui esco lhido. 1 7

    Total 15 100

    Capacidade de executar

    o cuidado como o

    doente merece.

    Sim 13 86

    No 1 7

    s vezes 1 7

    Total 15 100

    Ati vidades dir ias interr ompidas

    Atividades dirias

    centradas em torno do

    cuidado

    Sim 9 60

    No 2 13

    Concilio dessas

    atividades co m outras.

    4 27

    Total 15 100

    Horas dispensadas na

    execuo do c uidado.

    Perodo da manh ou da

    tarde.

    3 20

    Somente noite. 1 7

    Um dia todo. 11 73

    Total 15 100

    Pro blemas de Sade/Desgaste.

    Tempo para cuidar de si

    apesar da ateno que

    tem que dar ao

    paci ente.

    Sim 11 74

    No 2 13

    s vezes 2 13

    Total 15 100

    Tabela 1- Caractersticas dos cuidadores estudados. So Jos do Rio Preto, SP, 2009.

    DADOS DE IDENTIFICAO N %

    Sexo

    Masculino 6 40

    Feminino 9 60

    Total 15 100

    Grau de Parentesco

    Marido/Esposa 8 53,3

    Irmo () 2 13,3

    Filho (a) 4 26,7

    Outros 1 6,7

    Total 15 100

    Tempo de dedicao ao cu idado

    Menos de 6 meses 6 40

    De 6 meses a 11 meses 4 26,7

    Um a no a dois anos 5 33,3

    Total 15 100

    Ocupaes

    Do lar/Aposentado 7 46,6

    Ser vi os G erais /Sec re tr ia /Fa xin eir a 3 2 0Pedreiro 1 6,7

    Motorista 2 13,3

    Professor 1 6,7

    Msico 1 6,7

    Total 15 100

    Atividades dirias interrompidas

    Minhas atividades dirias esto centradas em torno de cuidadoscom ele (a)?Algumas vezes tenho que parar no meio das minhas tarefasdirias para dar ateno a ele (a)?Apesar da ateno que tenho que dar a ele sobra tempo paracuidar de mim?

    Problemas de Sade/ Desgaste

    Muitas vezes no me sinto saudvel para cuidar dele (a)?Muitas vezes me sinto cansado (a) para cuidar dele (a)?As minhas foras fsicas esto no cuidado com ele (a)?

    Resultados

    A faixa etria do cuidadores estudados variou de 35 a 74 anos,a caracterizao deles se fez pelo sexo, grau de parentesco,tempo de dedicao ao cuidado e ocupao.

    Dos quinze entrevistados 80% (n=12) responderam interrompersuas atividades dirias para dar ateno ao doente. 60% (n=9)afirmaram no ter tido dificuldade financeira. 67% (n=10) se

    sentem saudveis para cuidar do paciente. 60% (n=9) dosentrevistados no se sentem cansados para exercer o cuidado.67% (n=10) responderam ter suas foras fsicas no cuidado.100% (n=15) dos cuidadores afirmaram se sentir bem cuidando.80% (n=12) responderam no ter sofrido o abandono dosfamiliares para o cuidado com o doente.Para facilitar a anlise dos resultados, perguntas com mais deduas respostas foram tabuladas em suas respectivas categorias.A tabela 2 evidencia que 60% (n=9) dispem da colaborao dafamlia. 53% (n=8) responderam no ter apresentado sentimentosde ofensa e raiva de maneira alguma durante o cuidado. 66%(n=10) dos entrevistados responderam no ter escolhido cuidar,mas tem que cuidar. 86% (n=13) dos cuidadores afirmaramcuidar do doente como ele realmente merece. 60% (n=9)afirmaram ter as atividades dirias centradas em torno docuidado. 73% (n=11) dos entrevistados responderam exercer ocuidado durante um dia inteiro. 74% (n=11) tm disponibilidade

    para o autocuidado.

  • 7/26/2019 O cuidador familiar de doentes com cncer

    4/5

    Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-6 25

    Discusso

    Em relao ao perfil dos cuidadores, verifica-se na tabela 1predominncia de mulheres (60%) que em sua maioria sodonas de casa e cnjuge do paciente. Esse dado corroboradocom um estudo realizado no departamento de oncologia de umgrande hospital escola de Melbourne, na Austrlia8. Dos 51cuidadores que participaram da pesquisa, 56,9% (n=29) erammulheres e 27,5% (n=14) eram esposas do paciente com cnceravanado7. Um estudo realizado no Hospital de Caridade deCarazinho/RS, durante o ano de 2004, tambm evidenciou que89 (76,1%) dos 117 cuidadores eram mulheres9.Cuidar do doente de cncer, em especial, na fase avanada dadoena descrita como tarefa que provoca desequilbrio,sobrecarga fsica, social e econmica 10,11. O estudo realizadono Hospital de Caridade de Carazinho/RS mostra que a principaldificuldade no ato de cuidar o desgaste fsico e emocionalevidenciado por 41 (35%) dos 117 pesquisados e a menordificuldade atribuda s dificuldades financeiras e falta deapoio 9. Porm, no presente estudo, 67% (n=10) dos

    entrevistados afirmaram se sentir saudveis para cuidar dopaciente e 60% (n=9) desses entrevistados alegaram no sentircansao, sendo que 67% (n=10) dos cuidadores tm suas forasfsicas no cuidado. J no trabalho realizado pela UniversidadeEstadual de Cincias da Sade de Alagoas UNCISAL, numaONG com pacientes oncolgicos e seus cuidadores, 87% (n=46) dos entrevistados responderam que a situao econmica

    piorou12. O trabalho de Carazinho/RS corrobora com os 60%(n=9) dos cuidadores desse estudo que afirmaram no ter tidodificuldade financeira e com os 80% (n=12) que responderamno ter sofrido o abandono dos familiares para o cuidado com odoente. As divergncias encontradas no campo financeiro

    provm do paciente ser o responsvel pelo oramento familiar eter seus custos elevados pelo adoecimento, no encontrandooutro parente que assumisse essa responsabilidade 9.O significado da palavra famlia tem se modificado ao longo dotempo de forma mais ou menos intensa. Nos tempos passados,a famlia era vista no contexto da criao dos filhos sendoorganizada de acordo com esta atividade principal e a mulherocupava um papel importante pelas funes de me e esposa 13

    .Atualmente, o interesse de vrias reas do conhecimento peladiscusso sobre a famlia crescente. Segundo Althoff a famlia uma unidade social complexa, e a diversidade dos aspectosque a envolve nos faz reconhecer que conhecemos somente

    parte de sua realidade 2. A enfermagem vem se preocupandocom a famlia no sentido de assisti-la criando instrumentos

    prprios e valorizando as pesquisas nas situaes concretasvivenciadas pela famlia em seu cotidiano, compreendendo assuas relaes com o meio em que vivem e como elas correm narealidade14.Em um estudo de famlias de pacientes dependentes (idosos)mostra que a escolha do cuidador no costuma ser ao acaso eque a opo pelos cuidados nem sempre do cuidador, mas,muitas vezes, expresso de um desejo do paciente, ou falta deoutra opo, podendo, tambm, ocorrer de um modo inesperado

    para um familiar que, ao se sentir responsvel, assume este

    cuidado, mesmo no se reconhecendo como um cuidador 15. comum a pessoa que se torna a cuidadora principal afirmar terassumido essa responsabilidade espontaneamente, sem umquestionamento prvio ou discusso com o restante do grupofamiliar sobre quem desempenharia os cuidados. Nesta decisocostumam ser explicitados fatores como relacionamento afetivo,grau de parentesco, morar junto ou prximo, maiordisponibilidade de tempo ou indisponibilidade dos demais16.Essas afirmaes corroboram com os 10 (66%) entrevistadosque responderam no ter escolhido cuidar, mas tem que cuidar,numa forma de obrigao por motivos no explicitados.A funo de cuidador da famlia concretiza-se atravs de umamisso de proteo e socializao dos indivduos, poisindependente da forma e desenho que a famlia contemporneaapresenta, ela se constitui nos espao de iniciao e aprendizadodos afetos e das relaes sociais17.Aps o aparecimento da doena, as relaes familiares ficamabaladas. Quando a estrutura familiar slida, a unio surge etraz tona sentimentos de carinho, cuidado, ateno, respeito e

    amor, que podem estar esquecidos ou pouco demonstrados.Entretanto, essa forma positiva de influncia familiar pode noestar presente em todos os casos18. No presente estudo, 100%(n=15) dos cuidadores familiares afirmaram se sentir bemcuidando, 53% (n=8) responderam no ter apresentadosentimentos de ofensa e raiva de maneira alguma durante ocuidado e 86% (n=13) dos cuidadores afirmaram cuidar dodoente como ele realmente merece. Esses achados fazem crerque os participantes da pesquisa exerciam o cuidado de maneirarespeitosa e amorosa para com o doente. O estudo realizado

    pela UNCISAL afirma que 83% (n=44) dos cuidadoresinformaram que melhorou a relao com o paciente, estreitando

    os vnculos aps a doena, 13 % (n=7) disseram que no houvealterao e apenas 4% (n=2) disseram que ficou mais difcil serelacionar afetivamente com o familiar doente e que, portanto arelao piorou. No que se refere aos demais membros da famlia,63% (n=33) dos cuidadores afirmaram que a relao afetiva entreeles melhorou 12.H significativos estudos sobre o comportamento e asnecessidades do cuidador no perodo de adoecimento do

    paciente com cncer, desde o diagnstico, passando pelotratamento inicial, recidiva da doena, retratamento, sucessivasinternaes, at o encaminhamento para os cuidados paliativos.Essa etapa final, em geral, rdua e penosa, motivada poresperana de cura, mas tambm com desiluses, sofrimentos e

    importante carga de trabalho dispensada ao paciente, vivnciasque tendem a se intensificar com a evoluo da doena19.O cotidiano do cuidador abordado na literatura abundante,estudos demonstram a sobrecarga que ele tem com sua estafantee estressora atividade de cuidados dirios e ininterruptos.O trabalho realizado com 133 cuidadores de pacientes sem

    possibilidades curativas, internados no Centro de AtenoIntegral Sade da Mulher em Campinas, avaliou a freqnciade ansiedade e depresso desses cuidadores. Observou-se,entre outros fatores, que 84% referiram mudana na rotina pelofato de cuidar. Este dado corrobora com os 80% (n=12) doscuidadores que responderam interromper suas atividades dirias

  • 7/26/2019 O cuidador familiar de doentes com cncer

    5/5

    Arq Cinc Sade 2010 jan-mar; 17(1):22-626

    para dar ateno ao doente e com os 60% (n=9) dos cuidadoresque afirmaram ter as atividades dirias centradas em torno docuidado 20.

    No que se refere, no presente estudo, ao tempo que oscuidadores se dedicavam ao paciente, 73% (n=11) dosentrevistados informaram que passavam o dia inteiro com o

    paciente e 27% (n=4) apenas um perodo. Esses achadoscondizem com o estudo da UNCISAL no qual 77% (n=41) dosentrevistados tambm cuidavam o dia inteiro do paciente e osdemais 23% (n=12) durante um perodo (manh, tarde ou noite)12.

    Concluso

    Diante do exposto, evidencia-se, pela pequena amostra, o papelde cuidadora que a mulher exerce perante a sociedade. A escolhado cuidador familiar nem sempre dialogada podendo se fazerde maneira espontnea ou por indicao dos membros da famlia,considerando-se os quesitos de laos afetivos, proximidaderesidencial, suporte financeiro e disponibilidade de tempo. Oapoio familiar depender de como se desenrola a relao do

    cuidador e do doente com os demais membros da famlia, aafetividade primordial para que haja o apoio.A mudana no cotidiano evidente pelas atividades diriasinterrompidas e pelo tempo dispensado para o cuidado, s vezesa rotina mudada por completo. A fadiga e o desgaste fsico eemocional no foram um fator de destaque relacionado a essenovo cotidiano. Apesar de todas as mudanas, tanto na rotinaquanto no campo financeiro, os cuidadores se sentem satisfeitosem cuidar e o afeto entre cuidador e paciente notado pelaausncia de sentimentos de raiva e ofensa durante o cuidado.

    Referncias Bibliogrficas

    1-Pedrolo FT, Zago MMF. O enfrentamento dos familiares imagem corporal alterada do laringectomizado. Rev Bras deCancerol 2002;1(48):49-56.2-Althoff CR. Delineamento uma abordagem terica sobre o

    processo de conviver em famlia. In: Elsen I, Marcon SS, SilvaMRS. O viver em famlia e sua interface com a sade e a doena.Maring: EDUEM; 2002.3-Zago MMF, Barichello E, Hannickel S, Sawada NO. Oadoecimento pelo cncer de laringe. Rev Esc de Enferm USP2001;35(2):108-14.4-Bastos ACS, Trad LAB. A famlia enquanto contexto dedesenvolvimento humano:implicaes para a investigao emsade. Cinc Sade Coletiva 1998;3(1):106-15.

    5-Santos SMA, Portela CM. O cuidado ao cuidador familiar deportadores de transtornos de humor na rede bsica de ateno sade [dissertao]. Florianpolis: Universidade Federal deSanta Catarina; 2006.6-Kawasaki K, Diogo MJDE. Assistncia domiciliaria ao idoso:

    perfil do cuidador formal. Rev Esc Enferm USP 2001;35(3):257-64.7-Wanderley MB. Publicizao do papel do cuidador domiciliar.So Paulo: IEE/PUC-SP, Braslia, Secretaria de Assistncia Social- MPAS; 1998.8-Milne DJ, Mulder LL, Beelen HCM, Schofield P, Kempen GIJM,Aranda S. Patients self-report and family caregivers perception

    of quality of life in patients with advanced cancer: how do theycompare? Eur J Cancer Care (Engl) 2005;15(2):125-32.9-Zart VB, Rodrigues MS, Kerber CA. Cuidado familiar: desafiosno processo de cuidar. Logos 2006;17(1):21-9.10-Floriani CA, Schramm FR. Cuidador do idoso com cnceravanado: um ator vulnerado. Cad Sade Pblica 2006;22(3):527-34.11-Wanderbroocke ACNS. Perfil do cuidador do paciente idosocom cncer. Psico (Porto Alegre) 2002;33(2):401-12.12-Arajo LZS, Arajo CZS, Souto AKBA, Oliveira MS.Cuidador principal de paciente oncolgico fora de possibilidadede cura, repercusses deste encargo. Rev Bras Enferm2009;62(1):32-7.13-Carter B, Mcgoldric M. As mudanas no ciclo de vida familiar:uma estrutura para a terapia familiar. 2 ed. Porto Alegre: ArtesMdicas; 1995.14-Marcon SS, Waidman MAP. A enfermagem frente a problemasde relacionamento na famlia. Rev Bras Enferm 2003;56(2):248-53.

    15-Wennman-Larsen A, Tishelman C. Advanced home care forcancer patients at the end of life: a qualitative study of hopesand expectations of family caregivers. Scand J Caring Sci2002;16(3):240-7.16-Mendes PBMT. Cuidadores: heris annimos do cotidiano[dissertao]. So Paulo: Pontifcia Universidade Catlica deSo Paulo, 1995 apud Wanderbroocke ACNS. Cuidando de umfamiliar com cncer. Psicol Argumento 2005;23(41):17-23.17-Felcio JL. As famlias de pacientes com doenas crnicas egraves: funcionamentos mais caractersticos. Mundo Sade2003;27(3):426-31.18-Hayashi VD, Chico E, Ferreira NMLA. Enfermagem de famlia:

    um enfoque em oncologia. Rev Enferm UERJ 2006;14(1):13-20.19-Thomas C, Morris SM, Harman JC. Companions throughcancer: the care given by informal carers in cancer contexts.Soc Sci Med 2002;54(4):529-44.20-RezendeV et al. Depresso e ansiedade nos cuidadores demulheres em fase terminal de cncer de mama e ginecolgico.Rev Bras de Ginecol e Obstet 2005;27(12):737-43.

    Correspondncia

    Rua: Atlio Luiz Fazanelli, 385. Ap 22 Jd. Panorama15091-300 So Jos do Rio Preto - SP