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Ano XXVI Nº 317 janeiro de 2016 Q uando Getúlio Vargas deu o golpe em 1937, fechando a Câmara e o Sena do, antes já havia encarcerado os parlamentares que tiveram a coragem de pro- testar contra a ameaça à democracia, com o governo empastelando os jornais, prendendo jornalistas, estudantes e sindicalistas, fechando as entidades, que não rezavam pela sua cartilha, como a ANL – Aliança Nacional Libertadora. Abguar Bastos, João Mangabeira, Domin- gos Velasco, Otávio da Silveira e Café Filho, fo- ram as cinco vozes, corajosas vozes, erguidas na Câmara dos Deputados, contra o Golpe. No Senado a única voz foi a do paraense Abel Chermont. Vivíamos a ditadura, estávamos pres- tes a viver a Segunda Grande Guerra Mundial, o nazismo alemão, comandado por Adolfo Hitler, ameaçava incendiar o mundo. Mais tarde, adolescente, no Recife, acom- panhava o desenrolar das batalhas da Guerra pelo rádio. O Brasil não havia mandado a FEB – Força Expedicionária Brasileira, para os cam- pos de batalha. Em 1945, com a redemocratização do país, logo após as eleições de dois de dezembro, e o término da Segunda Grande Guerra Mundial, com a derrota dos exércitos nazistas de Hitler, fascistas de Musoline e do Império Japonês, chegou-me às mãos um exemplar do livro “Pres- tes e a revolução social”, editado pela Calvino, eu já tinha lido ‘A vida de Luís Carlos Prestes’, de autoria de Jorge Amado. A obra de Abguar deu- me conhecimento mais profundo de Prestes e dos problemas do Brasil. Abguar me ganhou com o seu livro. Em São Paulo o conheci, ele era executivo do Colégio Alfredo Pucca e presidente da ABDE – Associação Brasileira de Escritores, cuja sede ficava na Rua Conselheiro Crispiniano, e era de propriedade de Caio Prado Júnior. O movimento na ABDE era grande, em todos os fins de tarde. Numa época de ‘vacas magras’, junto com o sergipano Clóvis Meira, morávamos na sede da Entidade, em troca lhe prestávamos algum tra- balho. Ficamos amigos do peito, irmãos, cama- radas, o ideal socialista nos unia. Fazíamos a correspondência, despachava no correio, cobra- va as mensalidades, daqueles associados, prin- cipalmente dos que estavam em atraso. O ve- reador Jânio Quadros era o campeão, como ele nos enrolava! ABGUAR BASTOS – UM INTELECTUAL ADMIRÁVEL, UMA SAUDADE MERECIDA! Geraldo Pereira Geraldo Pereira é escritor, jornalista e conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa. Foi Clóvis Meira, que me apresentou ao Abguar, que grande honra conhecer o deputado corajoso, que ergueu a sua voz, quando o Getú- lio deu o Golpe em 1937. Conheci o autor de ‘Prestes e a Revolução Social’, falei-lhe do seu livro, o tinha lido no Recife, falei com certo co- nhecimento, e lamentei tê-lo deixado lá. De ime- diato, Abguar, disse-me: “Aparece lá em casa, vou presenteá-lo com um exemplar.” No outro dia, eu estava em sua casa, um apartamento simples, modesto, nas Rua dos Andradas, apre- sento-me à esposa, vi os filhos do casal. Era julho de 1952, a dedicatória do livro não me per- mite engano. Na ABDE desfilava sempre o poeta Rossine Camargo Guarnieri, Afonso Schimidt, Eduardo Sucupira, a poetisa Antonieta Dias de Moraes e Silva, Gracita Miranda, Rômulo Argentiere, Jor- ge Rizzini, Paulo Dantas, Walter Sampaio, mais tarde Aluíysio, seu irmão, Arthur Neves, mais al- guns nomes que a memória não me ajuda, quem dava as caras também por lá, eram os comu- nistas, o arquiteto Vilanova Artigas, os médicos José Fernandes, João Belline Burza, o advoga- do Rivadávia, o jornalista Jaime Martins, muito educado, sua dedicação à causa socialista me causava admiração. Abguar, era um intelectual sempre solici- tado, fazendo palestras, debatendo problemas de São Paulo e do Brasil. Participando ativa- mente dos movimentos nacionalistas, foi o grande orador, do comício em que as forças populares elegeram Lino de Mattos e Wladimir Toledo Piza, prefeito e vice de São Paulo. Sacudiu a multidão no Vale do Anhangabaú, com o discurso tendo como terma ‘A panela vazia’. Mais tarde elegeu-se Deputado Federal Quando Jorge Amado regressou à Pátria, depois de alguns anos na Europa exilado, a ABDE o homenageou com um jantar no Clu- be Homs, na Av. Paulista, o trabalho de Abguar para o êxito total dessa homenagem, foi admi- rável. Fomos esperar Jorge e Zélia, que esta- vam vindo do Rio de Janeiro de ônibus, mais de cem pessoas na Avenida Ipiranga, próximo à São João. Era lá o ponto final da Viação Co- meta. Os anos passam Abguar sempre o mes- mo, socialista convicto, participante ativo, das lutas em defesa das boas causas. O vejo na luta contra a guerra da Coreia, a guerra do Vietnam, em defesa do ‘Movimento da Paz’ con- tra a guerra. Falando nos comícios, fazendo pa- lestras e conferencias. Uma cultura a serviço da Pátria! Há pouco, lembrei-me que tomei o depoi- mento de Abguar, em sua casa na Alameda San- tos. A fita da filmagem procurei por mais de vinte anos, dava como perdida, encontrei-a, recente- mente, graças a um profissional amigo, competentíssimo, recuperei-a, acabo de vê-la. Dois assuntos se fizeram presentes Literatura e Política. Assuntos que abordaremos brevemen- te, a fim de resgatar a memória de um idealista, de um grande intelectual, sempre sintonizado com a defesa da sua Pátria e do seu povo. Esse depoimento data de 31 de dezembro de 1993. Abguar foi deputado em 1934, eleito pelo seu Estado natal, o Pará, e em 1956 pelo Esta- do de São Paulo. Nessa eleição participei ativa- mente. Como parlamentar Abguar ganhou pro- jeção Nacional, foi o criador da Frente Parlamen- tar Nacionalista, composta de 121 parlamenta- res. Abguar Bastos, uma saudade merecida! Geraldo Pereira e Abguar Bastos divulgação

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Ano XXVI Nº 317 janeiro de 2016

Quando Getúlio Vargas deu o golpe em1937, fechando a Câmara e o Senado, antes já havia encarcerado os

parlamentares que tiveram a coragem de pro-testar contra a ameaça à democracia, com ogoverno empastelando os jornais, prendendojornalistas, estudantes e sindicalistas, fechandoas entidades, que não rezavam pela sua cartilha,como a ANL – Aliança Nacional Libertadora.

Abguar Bastos, João Mangabeira, Domin-gos Velasco, Otávio da Silveira e Café Filho, fo-ram as cinco vozes, corajosas vozes, erguidasna Câmara dos Deputados, contra o Golpe. NoSenado a única voz foi a do paraense AbelChermont. Vivíamos a ditadura, estávamos pres-tes a viver a Segunda Grande Guerra Mundial, onazismo alemão, comandado por Adolfo Hitler,ameaçava incendiar o mundo.

Mais tarde, adolescente, no Recife, acom-panhava o desenrolar das batalhas da Guerrapelo rádio. O Brasil não havia mandado a FEB –Força Expedicionária Brasileira, para os cam-pos de batalha.

Em 1945, com a redemocratização do país,logo após as eleições de dois de dezembro, e otérmino da Segunda Grande Guerra Mundial,com a derrota dos exércitos nazistas de Hitler,fascistas de Musoline e do Império Japonês,chegou-me às mãos um exemplar do livro “Pres-tes e a revolução social”, editado pela Calvino,eu já tinha lido ‘A vida de Luís Carlos Prestes’,de autoria de Jorge Amado. A obra de Abguar deu-me conhecimento mais profundo de Prestes edos problemas do Brasil. Abguar me ganhou como seu livro.

Em São Paulo o conheci, ele era executivodo Colégio Alfredo Pucca e presidente da ABDE– Associação Brasileira de Escritores, cuja sedeficava na Rua Conselheiro Crispiniano, e era depropriedade de Caio Prado Júnior. O movimentona ABDE era grande, em todos os fins de tarde.Numa época de ‘vacas magras’, junto com osergipano Clóvis Meira, morávamos na sede daEntidade, em troca lhe prestávamos algum tra-balho. Ficamos amigos do peito, irmãos, cama-radas, o ideal socialista nos unia. Fazíamos acorrespondência, despachava no correio, cobra-va as mensalidades, daqueles associados, prin-cipalmente dos que estavam em atraso. O ve-reador Jânio Quadros era o campeão, como elenos enrolava!

ABGUAR BASTOS – UM INTELECTUAL ADMIRÁVEL,UMA SAUDADE MERECIDA!

Geraldo Pereira

Geraldo Pereira é escritor,jornalista e conselheiro da

Associação Brasileira de Imprensa.

Foi Clóvis Meira, que me apresentou aoAbguar, que grande honra conhecer o deputadocorajoso, que ergueu a sua voz, quando o Getú-lio deu o Golpe em 1937. Conheci o autor de‘Prestes e a Revolução Social’, falei-lhe do seulivro, o tinha lido no Recife, falei com certo co-nhecimento, e lamentei tê-lo deixado lá. De ime-diato, Abguar, disse-me: “Aparece lá em casa,vou presenteá-lo com um exemplar.” No outrodia, eu estava em sua casa, um apartamentosimples, modesto, nas Rua dos Andradas, apre-sento-me à esposa, vi os filhos do casal. Erajulho de 1952, a dedicatória do livro não me per-mite engano.

Na ABDE desfilava sempre o poeta RossineCamargo Guarnieri, Afonso Schimidt, EduardoSucupira, a poetisa Antonieta Dias de Moraes eSilva, Gracita Miranda, Rômulo Argentiere, Jor-ge Rizzini, Paulo Dantas, Walter Sampaio, maistarde Aluíysio, seu irmão, Arthur Neves, mais al-guns nomes que a memória não me ajuda, quemdava as caras também por lá, eram os comu-nistas, o arquiteto Vilanova Artigas, os médicosJosé Fernandes, João Belline Burza, o advoga-do Rivadávia, o jornalista Jaime Martins, muitoeducado, sua dedicação à causa socialista mecausava admiração.

Abguar, era um intelectual sempre solici-tado, fazendo palestras, debatendo problemasde São Paulo e do Brasil. Participando ativa-mente dos movimentos nacionalistas, foi ogrande orador, do comício em que as forçaspopulares elegeram Lino de Mattos e WladimirToledo Piza, prefeito e vice de São Paulo.

Sacudiu a multidão no Vale doAnhangabaú, com o discurso tendo comoterma ‘A panela vazia’. Mais tarde elegeu-seDeputado Federal

Quando Jorge Amado regressou à Pátria,depois de alguns anos na Europa exilado, aABDE o homenageou com um jantar no Clu-be Homs, na Av. Paulista, o trabalho de Abguarpara o êxito total dessa homenagem, foi admi-rável.

Fomos esperar Jorge e Zélia, que esta-vam vindo do Rio de Janeiro de ônibus, maisde cem pessoas na Avenida Ipiranga, próximoà São João. Era lá o ponto final da Viação Co-meta.

Os anos passam Abguar sempre o mes-mo, socialista convicto, participante ativo, daslutas em defesa das boas causas. O vejo naluta contra a guerra da Coreia, a guerra doVietnam, em defesa do ‘Movimento da Paz’ con-

tra a guerra. Falando nos comícios, fazendo pa-lestras e conferencias. Uma cultura a serviço daPátria!

Há pouco, lembrei-me que tomei o depoi-mento de Abguar, em sua casa na Alameda San-tos. A fita da filmagem procurei por mais de vinteanos, dava como perdida, encontrei-a, recente-mente, graças a um profissional amigo,competentíssimo, recuperei-a, acabo de vê-la.Dois assuntos se fizeram presentes Literatura ePolítica. Assuntos que abordaremos brevemen-te, a fim de resgatar a memória de um idealista,de um grande intelectual, sempre sintonizadocom a defesa da sua Pátria e do seu povo. Essedepoimento data de 31 de dezembro de 1993.

Abguar foi deputado em 1934, eleito peloseu Estado natal, o Pará, e em 1956 pelo Esta-do de São Paulo. Nessa eleição participei ativa-mente. Como parlamentar Abguar ganhou pro-jeção Nacional, foi o criador da Frente Parlamen-tar Nacionalista, composta de 121 parlamenta-res.

Abguar Bastos, uma saudade merecida!

Geraldo Pereira e Abguar Bastos

divulgação

Página 2 - janeiro de 2016

Periodicidade: mensal - www.linguagemviva.com.brEditores: Adriano Nogueira (1928 - 2004) e Rosani Abou Adal

Rua Herval, 902 - São Paulo - SP - 03062-000Tels.: (11) 2693-0392 - 97358-6255

Distribuição: Encarte em A Tribuna Piracicabana, distribuído aassinantes, bibliotecas, livrarias, entidades, escritores e faculdades.

Impresso em A Tribuna Piracicabana -Rua Tiradentes, 647 - Piracicaba - SP - 13400-760

Selos e logo de Xavier - www.xavierdelima1.wix.com/xaviArtigos e poemas assinados são de responsabilidade dos autoresO conteúdo dos anúncios é de responsabilidade das empresas.

Rosani Abou Adal

Dia amanheceu, sol entre nuvens. Café damanhã e trocas solidárias com a vizinhade casas geminadas. Meditação poética matinal, banho, café.

Ainda bem amigo dourado surgiu. Caminhei rumo ao Clube ADPMpara compartilhar confidências com o amante solar.

Passagem pela comunidade escuto gemidos. Cão de porte grandecom uma pequena criatura de São Francisco. Quando der cria, talveznão sobreviva devido ao tamanho dos filhotes.

Pena não seja castrada. Dono irresponsável não tomou providênci-as. Mais oito virão e a cabala canina se multiplicará. Ficarão pelas ruas eparque que rodeia a comunidade. Mais uma matilha que viverá sem dono.

Respirei fundo, gritei. Ninguém deu ouvidos. Olhar do homem quejogava água nos bichinhos me calou. As pessoas ao redor me silencia-ram. Sem poder fazer nada, continuei a caminhada. Se fosse dona po-deria mudar o quadro das criaturinhas.

Fui apagando imagens que fotografei em minha mente, mas os ui-vos da pequenina ainda ecoam na alma.

Sol não permaneceu por muito tempo e tudo voltou a ser cinza den-tro de mim. Voltei para casa tentar conquistar a paz e a serenidade.

Café fresquinho para terminar a leitura do jornal do dia. As notícias,como de costume, não servem de alento para ninguém. Uma me cha-mou a atenção devido ao aumento do número de furtos de água em SãoPaulo pelos motéis, bares, empresas e casas de luxo.

Luxo? Isto é um verdadeiro lixo. Enquanto a maioria economiza efecha as torneiras, outros furtam, alguns compram água para encherpiscinas que nem se quer usam.

Demais manchetes e notícias não me abalam mais, porque se tor-naram rotina nos matutinos e em nossas vidas. O que realmente meabala é a mesquinhez, a ganância dos homens pelo poder e o sonhopelos direitos iguais que fica cada vez mais distante. Infelizmente conti-nuará sendo enquanto houver seres humanos que comem restos doque sobrou na feira e outros, de barrigas fartas, a comer caviar. Enquan-to muitos não têm água para beber, alguns ficam com as torneiras aber-tas para encher piscinas, banheiras e hidromassagens.

É impossível se pensar em direitos iguais enquanto existirem crian-ças raquíticas, abandonadas como animais sarnentos. Pena a ganânciatenha olhos miseráveis e não consegue enxergá-las.

Trovejou e relampeou. Dentro de mim uma tempestade sem fim.

Meditação Matinal

Realizei um sonho deconsumo: morar ao ladode uma padaria. Imagi-

no todos os dias o processo do fei-tio do pão: a farinha de trigo branca,vinda de antigos moinhos; a águamorna; a pitada de sal; o fermentolevedando a massa elástica, poro-sa e macia, sovada em cilindros deprata. Broas, pães recheados de fru-tas secas e nozes, assados em pe-dras e chapas quentes. O aromadelicioso se desprende dos fornose se espalha pelo ar. É o cheiro dapoesia, pois, o “poeta nasce da pazcomo o pão nasce da farinha”, ensi-nou Pablo Neruda.

Na porta da padariasou como uma daquelascrianças do conto “Joãoe Maria”, dos irmãosGrimm, que se perde-ram pelo mundo, pela flo-resta escura, cheia deperigos e, finalmente,encontraram uma casafeita de pão, telhado debolo de chocolate, jane-las de açúcar cristalizado, paredesenfeitadas de balas de goma colori-das. A casa do pão, toda iluminadae suculenta.

As primeiras padarias surgiramhá milhares de anos em Jerusalém.Após o contato com os egípcios, oshebreus aprenderam técnicas defabricar o pão (que bem fazem àhumanidade os que inventam recei-tas). Roma possuía padarias públi-cas. Os imperadores sabiam que opovo se vendia facilmente por pão ecirco. A França do século XVIII des-tacou-se pela fabricação de pães.Quando explicaram à alienada rai-nha Maria Antonieta que o povo es-tava revoltado por causa da falta de

PADARIA

Assinatura anual: R$ 84,00semestral: R$ 42,00

Tels.: (11) 2693-0392 - [email protected]

Rua Herval, 902 - São Paulo - SP - 03062-000

Raquel Naveira

Rosani Abou Adal é escritora, jornalista e Vice-Presidentedo Sindicato dos Escritores no Estado de São Paulo.

pão, ela perguntou estarrecida: “_Não têm pão? Comam brioche.” Tal-vez isso tenha custado sua cabeçana guilhotina.

É o trabalho que nos dá o pão,sustento essencial. Mas é a alegriaque lhe dá o sabor, a satisfação, ocontentamento. Nem só de pão viveo homem, mas o próprio Cristo sefez pão da vida, partiu o pão, parti-lhou, multiplicou, distribuiu em ces-tos. Alimento para os que queriamjustiça, para os aflitos na privação.A mesa do pão é memória de nos-sas origens, dos pequenos mistéri-os e dos sacrifícios.

Lembrei-me de uma comédiaromântica americana, o filme “Me-lhor é Impossível” com Jack

Nicholson no pa-pel de um escritorgrosseiro, sarcás-tico, cheio de ma-nias e Helen Huntcomo uma garço-nete sofrida, mãesolteira de filhoasmático. Só elatolerava o compor-tamento neuróticodo intelectual soli-

tário. Linda a cena em que aguar-dam a padaria abrir de madrugada.Numa Nova York alucinada, o cheirodo pão quente e do café anuncia mu-danças de comportamento, compai-xão, solidariedade, união das tribos.

Moro agora ao lado de uma pa-daria. Que sonho. É verdade quenão vivo só de pão, mas também depalavras. Tenho tanta fome e paixão.

Raquel Naveira é escritora,poeta e membro da Academia

Sul-Mato-Grossense de Letrase do Pen Clube do Brasil e

Doutora em LiteraturaPortuguesa pela USP.

divulgação

Página 3 - janeiro de 2016

A crítica, ensaísta e professora Moema de Castro eSilva Olival marcou uma

forte presença com A Literatura Bra-sileira e a Cultura Árabe (Goiânia: Ed.Kelps, 2015). Com excelente prefá-cio de Fábio Lucas, seu livro abriuuma nova senda importante em nos-sos estudos literários , pesquisandoa contribuição de escritores descen-dentes de árabes à ficção no Brasil.

Em seu livro, examinou algumasobras de seis deles.

Os árabes no BrasilA ACNUR, agência para refugia-

dos, da Organização das NaçõesUnidas, registrou 1.100.000 delessírios recentemente no Líbano, sen-do que a população libanesa nativapouco excede quatro milhões de ha-bitantes.

O total de libaneses e descen-dentes que vivem no Brasil superaesses números. Há mais deles emnosso país que no Líbano. Em se-gundo lugar, vem a presença dossírios. Rara é a cidade brasileira demédio e de grande porte que não te-nha um clube social ou recreativo,vários tipos de associação , um hos-pital, etc., com a designação “SírioLibanês(a)”.

Registros indicam a emigraçãolibanesa para o Brasil especialmenteentre 1850 e 1880, havendo casosanteriores. Após a viagem de D.Pedro II ao Líbano em 1880, aumen-tou sempre, regularmente, em espe-cial até os anos trinta do século XX.

Sem dúvida, é a libanesa a mai-or representante da etnia e da cultu-ra árabes em nosso país. O que ex-plica porque a Profª Moema de Cas-tro e Silva Olival analisou neste seulivro seis autores, entre os quais umnatural do Líbano que chegou a nos-so país com 3 anos (Salim Miguel),além de cinco descendentes de liba-neses.

Breve HistóriaDesde o alvorecer da História, o

atual território do Líbano e parte dohoje litoral de Israel e da Síria foramocupados pela Fenícia. Esse povo foio primeiro grande mercador maríti-mo. Em torno de 1.500 A.C., já havi-am conseguido os fenícios grandeêxito em seu intenso comércio porterra e por mar. Ergueram várias ci-dades como Arad, Biblos, Tiro, Sidon

A LITERATURA BRASILEIRA E A CULTURA ÁRABEAricy Curvello

e Ugarit. Construíram portos comer-ciais e colônias em regiões distan-tes, como Cartago (no norte da Áfri-ca) e Cádiz (no norte da Espanha).De Cádiz eles entravam na antigaInglaterra para comprar dos bretõesestanho e couro.

O Império Romano absorveuesse bem sucedido sistema de co-mércio marítimo, que lhe sobrevi-veu por séculos.

Essa intensa atividade levou osfenícios a tentar criar uma escritacomercial que fosse ágil, o que re-dundou na criação de um alfabetofonético (consonantal, com 22 si-nais) por volta do século X A.C., oprimeiro na História, o qual influen-ciou inclusive os gregos na criaçãode um próprio acrescido de vogaiscerca do século VIII A.C. E o alfabe-to grego é o ponto de partida da ci-vilização ocidental.

Este passado explica a acen-tuada vocação libanesa para o co-mércio. No Brasil, foram eles quemais auxiliaram na criação de umsistema de comércio em nosso ter-ritório, das mais variadas formas,desde o mascate ambulante a pé ouem lombo de cavalo ou de carroçaa pequenas, médias e grandes em-presas do gênero.

A literatura árabe e os nossosautores

A cultura árabe chegou à re-gião do atual Líbano durante a ex-pansão do islamismo, nos séculosVII e VIII. Em seguida à difusão doCorão, a literatura árabe de As Mil eUma Noites e outras expressões seexpandiram conjuntamente.

Todos esses aspectos de al-guma forma estão presentes na fic-ção dos autores estudados pelaProfª Moema. Também neles sesobressaltam as características dafamília libanesa somadas aos donovo ambiente, como o choque dasgerações (pai versus filho), a pre-ponderância da figura masculina,os interditos, etc., que se compõemcom os do velho patriarcalismo bra-sileiro.

Quem são eles e suas obrasanalisadas no livro da Profª Moema

RADUAN NASSAR (Pindorama/SP, 1935) – Considerado tão impor-tante para a literatura brasileiraquanto Guimarães Rosa e ClariceLispector, apesar de autor de ape-nas três obras. Em seu livro, a ProfªMoema analisou as duas mais im-portantes:

- Lavoura Arcaica, 3ª. ed. (ro-mance). Copyright 1975, 1982,1984. São Paulo: Companhia dasLetras, 1989.

- Um copo de cólera (roman-ce) - 1ª. ed. Copyright 1978, 1984,5ª. ed. São Paulo: Companhia dasLetras, 1992.

SALIM MIGUEL (Líbano, 1924;radicado em Santa Catarina desdeos 3 anos) – Autor consagrado decerca de quarenta obraspublicadas:

- Nur na Escuridão (romance).Copyright do autor 1999. Rio:Topbooks Editora e Distrib.

- Eu e as Corruíras (crônicas,não só). Florianópolis: Ed. Insular,2001.

MILTON HATOUM (Manaus/AM, 1952) - Autor detentor de vári-os Prêmios Jabuti:

- Dois Irmãos (romance). SãoPaulo: Companhia das Letras,2000. (Prêmio Jabuti 2001).

- Cinzas do Norte (romance).São Paulo: Companhia das Letras,

2010 –(Companhia de olso. Copyrightdo texto: 2005 by Milton Hatoum).

CARLOS NEJAR (Porto Alegre/RS, 1939), membro da Academia Bra-sileira de Letras, poeta notável eficcionista de renome (agradeço-lhea gentileza da remessa de seu maisnovo romance, O Feroz Círculo dosHomens (Taubaté/SP: Letra Selva-gem, 2015):

- Carta aos Loucos (romance).São Paulo: Ed. Record, 2008.Copyright 1998 y Carlos Nejar.

- Riopampa - O Moinho das Tri-bulações (romance). Rio: BertrandBrasil, 2004. Copyright 2000, 2004 byCarlos Nejar.

MIGUEL JORGE (Campo Gran-de/MS, 1933) – Muito cedo aclimatadono Estado de Goiás onde é muito ben-quisto autor e jornalista de renome:

- Nos Ombros do Cão (roman-ce). São Paulo: Siciliano, 1991.

- Pão Cozido Debaixo de Brasa(romance). Porto Alegre: MercadoAberto, 1997. Prêmio Machado deAssis, da Biblioteca Nacional, 1997.

- O Deus da Hora e da Noite (ro-mance). Goiânia: Ed. Kelps, 2008.

WILLIAM AGEL DE MELLO(Catalão/GO, 1937):

- Obras Completas. Goiânia: AGPProduções, 2004. Volume I- Ficção. –Górgicas.- Estórias da Terra (Contos).Prêmio Caixa Econômica, julgado pelaABL. Prefácio de Junito de SouzaBrandão.

- Conto “Baalbek”. ApudGeórgicas – Estórias da Terra. Vol. I-Ficção . Goiânia: Ed. Kelps, 2008, p.195.

- Epopéia do Sertão (romance).Obras Completas. Vol. I- Ficção. (No-tas de Junito de Souza Brandão).Goiânia : Ed. Kelps, 2008, p. 13.

Indicador Profissional

Aricy Curvello é escritor,poeta, ensaísta e tradutor.

Página 4 - janeiro de 2016

no instante em que decidimos por uma opinião

renascemossomos mais uma estrelinha na árvore

– plantamos para um ano novoa sorte de sermos o que somos

pela pura emoçãodas circunstâncias que decidimos

saber quem somos é uma doaçãod´humanidade – um desejo que dividimos

amor e oração

Sobre a mãe, que após o fale-cimento do marido, se suicida, nãose sabe a causa que a levou a pra-ticar tal ato, mas talvez a sua indis-posição e deslocamento perante avida, porque vivia em função do es-poso. Como um personagem do fil-me “Um sonho de liberdade”, ao terconcedida a liberdade, se matou,pois não aprendeu a ser livre.

Os irmãos são simbolicamen-te separados por capítulos. Nota-seque o Livro I (sem nome) predomi-na, sendo a representação de umEu dominante, que possui maior

discurso sobre um ou-tro “Livro do Miguel”. Épreciso atribuir ao ou-tro uma identidade en-quanto o “Eu” se defi-ne e dispensa apresen-tações.

O espaço da nar-rativa é fundamentalpara a construção dasvidas opostas, afinal“Aquela cidade era umtúmulo para os meusanseios. Eu estava ro-deado de coveiros”.Em um registro de lu-tos e lutas, num ambi-ente marcado poridiossincrasias eprovincianismo, as his-

tórias se confrontam e defrontam,se esbarrando nas diferenças e se-melhanças.

Além disso, Eltânia demonstradomínio do discurso indireto livrepara que assim se crie uma atmos-fera que entrelaça a fala dos narra-dores e das personagens.

Outro recurso atraente é o darepetição, que provoca uma espé-cie de esquizofrenia em que as per-sonagens se ouvem a si mesmas(elas por elas) como uma implosãode reflexões tardias. Nem todosestão em dia com suas escolhas;estão desconfortáveis em si mes-mos. Ensimesmados.

A referência a vários autores daliteratura nacional e internacionalreafirma que a leitura é um subter-fúgio para fugirmos dos vivos e as-sim podermos continuar a viver. Éa navalha que fere o bloqueio daincomunicabilidade com nós mes-mos.

Para voltar a viverLeo Barbosa

Leo Barbosa é professore escritor.

Na espiral heterogenia da vidaonde vasculho e me determino.

Não invento inspirações,nem ensaio sentimentos.

Sou um par de punhosdo incomensurável coletivo,

martelando, martelandona bigorna da Historia,

moldando, forjandoum mundo novo.

NOVO MUNDOCarlos Frydman

Carlos Frydman, escritor,poeta, romancista, tradutor,professor e locutor, nasceu

em Varsóvia, Polônia, em15 de novembro de 1924.

Sem VidaRosani Abou Adal

PiracemaPeixeRio

Vida

Sem rioPiracema

PeixeSem Vida

Rosani Abou Adal é escritora,poeta, jornalista, editora e

Vice-Presidente do Sindicatodos Escritores no

Estado de São Paulo.

Ano NovoJoão Barcellos

João Barcellos é poeta, escritor, historiador e romancista.Foi agraciado com o Prêmio Clio de História.

“Para alguns a vida sepultamais que a morte.” (Mia Couto)

Laços de sangue não são ga-rantia de nada. Não raro, eles po-dem ser o maior desenlace quepodemos ter na vida. E é nessecaminho que se constrói o roman-ce “Para fugir dos vivos”, de EltâniaAndré (Editora Patuá, 2015). Dividi-do em duas partes, Livro I e Livrodo Miguel, a obra põe em evidênciaa incomunicabilidade humana numtom memorialístico,sem, no entanto, ser pi-egas. O sequestro dasubjetividade escorrenas entrelinhas paranos lembrar de que to-dos estamos vulnerá-veis a perder o norte denossas vidas a partir deum outro.

Na narrativa, as fi-guras do pai, da mãe,dos filhos e de seuscônjuges revelam quetodos estes são dota-dos de umamisantropia a qual elesnão a têm por escolha,tampouco por individu-alismo; mas por repulsa. Eles divi-dem o mesmo teto, mas não asmesmas histórias. Todos são estra-nhos no ninho.

O pai é representado como umhomem alto, no auge dopatriarcalismo. Era um serintocável, como sugere o objeto daredoma e as constantes defesas desua esposa. Sua estatura física re-presenta o próprio agigantamentodiante da família. Era opressor, to-lhia a todos e a tudo. Em certo mo-mento, após a sua morte, os filhosestavam tomados pela fome e, àsescondidas, comeram um sanduí-che de mortadela. Pode-se ler que,só após a morte do pai é que elessentiram fome. Estavam insaciá-veis com sua presença. Sem que-rer abusar do trocadilho, mas nãoera a mortadela o alimento, mas amorte dele, a do senhor, que os im-pedia de serem famintos pela vida.Semelhante clima (inconfesso) po-demos ler nas entrelinhas do conto“Peru de Natal”, de Mário deAndrade.

Página 5 - janeiro de 2016

Poemas: II Antologia - 2008 - CANTO DO POETA

Trovas: II Antologia - 2008 - ESPIRAL DE TROVAS

Haicais: II Antologia - 2008 - HAICAIS AO SOL

Débora Novaes de Castro

Opções de compra: Livraria virtual TodaCultura: www.todacultura.com.brvia telefax: (11)5031-5463 - E-mail:[email protected] - Correio:

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Poemas: GOTAS DE SOL - SONHO AZUL - MOMENTOS- CATAVENTO - SINFONIA DO INFINITO –

COLETÂNEA PRIMAVERA - AMARELINHA - MARES AFORA...

Antologias:

Haicais: SOPRAR DAS AREIAS - ALJÒFARES - SEMENTES- CHÃO DE PITANGAS -100 HAICAIS BRASILEIROS

Poemas Devocionais: UM VASO NOVO...

Trovas: DAS ÁGUAS DO MEU TELHADO

Caio Porfírio Carneiro

OLIVEIRA RIBEIRO NETO - Invejável intelectual

Pedro Antônio de OliveiraRibeiro Neto assumiu apresidência da União

Brasileira de Escritores num mo-mento difícil da entidade. O entãopresidente Afonso Schmidt falece-ra com poucas semanas de man-dato, o 1º vice-presidente, LuizToledo Machado, viajava pelo Egito,a convite do governo daquele país,e vários diretores, nos idos de 1964,perseguidos pela ditadura recém-instalada no Brasil, foram forçadosa “desaparecer”. A UBE ficou prati-camente acéfala. Fez-se uma reu-nião de emergência com os direto-res remanescentes, o escritorIbiapaba Martins à frente, (tambémcom o DOPS no seu encalço), e,por sugestão do diretor HélioSilveira, convidou-se o Dr. PedroAntônio de Oliveira Ribeiro Neto,Pedrinho para os amigos, para as-sumir a direção da entidade. Con-vocou-se uma assembléia geralextraordinária a toque de caixa,remanejaram os cargos de direto-res existentes, outros sócios foramconvidados para preencherem asvagas, e o Dr. Pedro assumiu a pre-sidência no dia 20 de maio de 1964.

Lembro-me de quando ele en-trou na sede pela primeira vez.Cordato, bem posto, bem vestido,calvo e elegante, cumprimentou-nos a todos, um por um.

Assinava-se, literalmente, Oli-veira Ribeiro Neto. Exercia alto car-go na Secretaria Estadual de Cul-tura e fazia parte da diretoria, e de-pois foi presidente, da AcademiaPaulista de Letras.

Paulista de velhaestirpe, família tradicio-nal, viajado, solteiro. Umcavalheiro no sentido to-tal da palavra. Poeta devalor, tradutor de obrasde Shakespeare,ensaísta excelente, ro-mancista, conferencistamuito solicitado, na ca-pital e no interior, parapalestras sobre os maisdiversos assuntos cultu-rais e literários.

Nunca vi, nos trêsanos em que esteve àfrente da entidade, mu-dar em nada a sua con-duta e a sua lhaneza detrato com qualquer um,diretor ou não. Foi umanteparo valioso às ame-aças que pairavam so-bre a UBE, consideradaantro de comunistas e subversivos.Visitou presídios políticos, procuran-do libertar associados presos. Es-teve, mais de uma vez, no presídiodo Hipódromo, o mais famoso dacapital paulista, porque muito escri-tor “esquerdista” e inimigo da “re-volução redentora” fora levado paralá. Discutiu com o diretor e, com asua autoridade mansa e o seu nomemuito respeitado, conseguiu abre-viar os dias de prisão do escritorOsório Alves de Castro, autor doromance Porto Calendário. Mas nãovisitou quartéis e nem procuroumandões fardados. Guardava, porformação, aquela postura civilista eera ferrenho defensor das liberda-

des democráticas, da mesma es-cola da família Mesquita, de O Es-tado de S.Paulo, que nunca cedeuum milímetro em favor da ditadura.

Um dia, eu lhe avisei, aflito:- Dr. Pedro, o Exército vem vas-

culhar a UBE.Não alterou sua calma:- Deixe que venha. Me avise.Nos seus três anos de manda-

to, a não ser curtas e ligeiras visi-tas do DOPS, à procura de endere-ços de alguns escritores, que nun-ca demos, nada aconteceu à enti-dade. A vigilância do Dr. Pedro sefazia apenas com o seu nome e oseu prestígio pessoal.

Simples, comunicativo, gosta-va de uma boa piada. Comentou, naimprensa, livros meus e eu comen-tei trabalhos dele. Eu tinha por elegrande afeição e creio que a reci-procidade era verdadeira. Mais ve-lho do que eu vinte anos, pois nas-cera em 1908, só começou a de-cair e perder aquele ar de elegân-cia perto dos oitenta, avizinhando-se de sua morte, mas conservou adistinção, a fineza de trato que atodos nós encantava e seduzia.

Já visivelmente doente, encon-trei-o um dia numa solenidade naAcademia Paulista de Letras e con-versamos longamente. Tinha parti-cular predileção pelo meu romanceO Sal da Terra, que aborda o “mun-do cão” dos tarefeiros de salinas doNordeste.

- É puro cinema, Caio. Precisafilmá-lo.

- De que jeito, Dr. Pedro?Que eu saiba, só deixou ami-

gos, admiração e respeito entre osque o conheceram (ganhou o Tro-féu Juca Pato de 1970), e o que maisme fascinava era ouvir suas confe-rências. Não improvisava. Lia a con-ferência do começo ao fim, mas deforma tão brilhante que arrebatavae prendia a atenção de qualquerouvinte.

Durante uma palestra do Dr.Pedro não se ouvia, no auditório, umzumbido de mosca. Uma beleza.

Saiu da vida com mais de oi-tenta anos, em 1989.

Caio Porfírio Carneiro éescritor, contista, romancista emembro do Instituto Histórico e

Geográfico de São Paulo.

Oliveira Ribeiro Neto

divulgação

Página 6 - janeiro de 2016

Você não me embalou o berço,mas construiu o meu leito;não me amamentou,mas escolhe e prepara,com cuidado, o meu alimento;não viu meu primeiro sorriso,mas enxuga os meus prantos;não me cuidou da catapora,mas vigia, com desvelo,minhas dores maiores.Você não me ensinou o bê-á-bá,mas escavou com paciênciao curso de minha palavra;não me deu castigos,mas apara os golpesque o Destino me desfere;não foi minha mãe de sangue,mas o é pelo coração;não foi quem me deu à luz,mas é quem me dá a Luz.

Um livro de Paulo Coelho, intitulado O demônio e a Srta. Prym está

repleto de cacofonias, redundân-cias, disparates, lugares-comuns,afirmativas absurdas, deficiênciaslinguísticas, frases mal construídase erros de regência verbal e colo-cação pronominal. Além disso, oescritor carioca não sabe inserir asvírgulas nos seus devidos lugares.Não sabe virgular. Também ignoraque não se separa por vírgula overbo do sujeito.

Mais do que o enredo anêmi-co, fragilíssimo, o que impressio-na no livro é a enorme quantidadede solecismos, de erros de portu-guês. Examinemos alguns desseserros, apenas uma pequena par-te. Já na página 35 encontrei este:

“... começou a rezar para suaavó, morta há algum tempoatrás...”

Eis aí uma expressão redun-dante. A ideia de passado está bempresente no verbo haver, não sen-do necessário, portanto, o uso doadvérbio atrás. Paulo Coelho repe-te o erro em outras páginas do li-vro:

“Há muitos anos atrás...” (pá-gina 36) – “Há três anos atrás...”(página 49) – “Há quatro diasatrás...” (página 58) – “... há milê-nios atrás” (página 60) – “Há trêsdias atrás...” (página 67).

Paulo não sabe usar a com-binação da preposição em com opronome demonstrativo aquele, nasua forma feminina, como se vêna página 37 de O demônio e aSrta. Prym:

“De modo que resolveu matá-lo aquela mesma noite...”

A noite decidiu matar alguém,era uma criminosa? Se pudesseser claro, correto, Paulo teria es-crito assim:

“De modo que resolveu matá-lo naquela mesma noite...”

Monumental erro de concor-dância resplandece na página 121:

“Nada de apostas: aquele

UM LIVRO REPLETO DEERROS DE PORTUGUÊS

Fernando Jorge

povo não merecia a fortuna que qua-se tiveram ao alcance das mãos.”

O verbo concorda com o su-jeito em número e pessoa. É a re-gra geral, acima violada. Convido oamigo leitor para corrigir, junto demim, a frase do Paulo Coelho:

“Nada de apostas: aquele povonão merecia a fortuna que quaseteve ao alcance das mãos.”

Paulo Coelho não conhece asregras básicas de colocação pro-nominal, é incapaz de meter o pro-nome se no seu devido lugar:

“.. .desconhecendo que namaior parte das vezes comportam-se. . .” (página 23).

Eu e você, amigo leitor, vamosagora corrigir o autor de “O alqui-mista”:

“...desconhecendo que na mai-or parte das vezes se compor-tam...”.

Mas Coelho é teimoso, insis-tente e reincidente. Para ele o quenão atrai pronome se:

“... o que mais temia transfor-mou-se em realidade” (página 98)– “...há um momento em que umhomem importante aproxima-se deJesus” (página 138) – “E que, du-rante todos estes anos, tornou-se...”(página 160) – “... de modo que nin-guém ali descobrisse que, em suacurta viagem até a cidade, transfor-mara-se numa mulher rica”. (pági-na 211).

Observem o cacófato da últi-ma frase: “numa mulher”. Aliás, napágina 40 há este cacófato medo-nho: “uma maneira macabra”... Émamar demais, sem ter muito lei-te!

Aconselho a editora do PauloCoelho a contratar um professor donosso idioma para corrigir osgravíssimos erros de portuguêsdesse escritor. Tais erros ensinamos seus leitores a falar errado, fa-zem a propaganda da ignorância.

Fernando Jorge é escritor,historiador, biógrafo, crítico

literário, dicionarista,enciclopedista e jornalista.

A QUE NÃO FOIAmaryllis Schloenbach

Amaryllis Schloenbach é escritora, poeta e advogada.

Não nos perdoemos que nascerão

amanhã

Deixamos como herança abusca inesperada que

fomos

neste chão

batido de passos incertosonde cabeças se abaixam

sem resposta

Ainda esperamos aquelesque hão de

nascercom as veias sangrando de

angústia e um gritocontido na boca

Não nos perdoem

(In O chão batido, incluído em Poesia Reunida, Pantemporâneo, 2012)

O CHÃO BATIDOEunice Arruda

Eunice Arruda é escritora, poeta e pós-graduada emComunicação e Semiótica pela PUC-SP.

Página 7 - janeiro de 2016

LivrosConcursos

Profa. Sonia Adal da CostaRevisão - Aulas Particulares

Tel.: (11) 2796-5716 - [email protected]

Prêmio SESC de Literatura, promovido peloSESC – Serviço Social do Comércio, está cominscrições abertas até 12 de fevereiro, para originaisinéditos que nunca foram publicados, nas categoriasConto e Romance. Os interessados poderãoinscrever textos digitados em fonte Times NewRoman, tamanho 12, estilo normal, cor preta,parágrafo justificado, espaço entrelinhas duplo, com margens de 2,5 cm.,no formato Word 2007 em diante (.docx). Os contos e os capítulos doromance deverão ser iniciados em uma nova página. A obra na categoriaConto deverá ter entre 140 mil e 400 mil caracteres, incluindo espaços; ena categoria Romance de 180 mil a 600 mil caracteres. Premiação: Ediçãodo livro com contrato de publicação com a Editora Record, que éresponsável pela distribuição comercial das obras, com tiragem inicialmínima de 2.000 exemplares. O processo seletivo será inteiramenterealizado via internet. Edital e Inscrições: www.sesc.com.br/premiosesc.Informações: [email protected].

I PRÊMIO APOLINÁRIO PORTO ALEGRE DE LITERATURA RIOGRANDE-RS, promovido pela Secretaria de Município da Cultura daPrefeitura Municipal do Rio Grande e pelo Programa de Pós-Graduação emLetras – Mestrado e Doutorado em História da Literatura da UniversidadeFederal do Rio Grande (FURG), está com inscrições abertas até o dia 29de fevereiro. É destinado a autores, residentes no Brasil, que não tenhampublicado obra individual de cunho literário (romance, conto, crônica, poesia,teatro). Os interessados poderão inscrever um conto inédito, com temalivre, com no máximo vinte páginas, em três vias, digitado em fonte Arial,tamanho 12, espaçamento 1,5 cm., parágrafo de 1,25 cm. e margens de2,5 cm. É obrigatório uso de pseudônimo. Premiação: 1º lugar: R$ 2.000,00e troféu O Vaqueano; 2º lugar: R$ 1.000,00; 3º lugar: R$ 500,00; do 4º ao10º lugares: Menção Honrosa. Os trabalhos do 1º ao 10º lugares serãoeditados em antologia que será organizada pela Secretaria de Município daCultura e pelo Programa de Pós-Graduação em Letras. Edital: http://media.wix.com/ugd/8eeb18_69d383993308471b8817a5e9fcf5a783.pdf

Prêmio Literário Livraria Asabeça, promovido pela Livraria Asabeça,com o apoio da Scortecci Editora, informa o autor vencedor de 2015, nacategoria Livro de Poesia: Ricardo Lacava Bailone, São Carlos/SP com aobra O canto do Urutau (A lenda do mãe-da-lua). A obra será lançada emagosto, no estande da editora, durante a 24ª Bienal Internacional do Livro deSão Paulo, no Anhembi. 

Foram agraciados com Menção Honrosa A Ilha Naufragada (NatanilsonPereira Campos); Balsa (Marcos Mariani Casadore); Breguices de Platãoou Poemas de Tardes Invernais (Reinaldo Alexander FrancoZaruvni); Emoções em Trânsito (Ricardo Mainieri); MemóriasFósseis (Weslley Moreira de Almeida); Mínima Mente (Terezinha de JesusMiranda Carvalho); O Despertar do Poema (José AngeloPotiens); Pragmatismo das Flores (Airton Souza de Oliveira); Prazer Cupido!(Kleber Elian Auad); Prosaico (Flávio Rubens Machado de Queiroz); VersoMugido (José Valni Cordeiro Lima Júnior).

R. Quinze de Novembro, 1123Piracicaba - SP - Tel.: (19) 3433-2095

O ChocolatãoBombonieri

Xavi

er

XV Prêmio Cultura Nacional Real, Real Aca-demia de Letras, Porto Alegre, RS, 200 páginas.ISBN: 978-85-64372-20-7. A obra reúne textos e po-emas dos laureados em 2015 de Alceu SebastiãoCosta, Bernadete Dias, Benedita Silva de Azevedo,Patrick Raymundo de Moraes, Odenir Ferro, DomMoysés Barbosa, Zênia de Leon, Cesar AugustoPierezan, Hazel de São Francisco, Eliana WissmannAlyanak, Abilio Kac, Iva da Silva, Ângela Pastana, JoãoRiél Manuel Nunes Vieira De Oliveira Brito, NenitaMadeiro Campos, Ivan Pessoa Moreira, Ruy AlbertoAlves de Carvalho, Eliseu Oro, Aury Pinheiro de Sou-za, Neide Lopes Ciarlariello (Sabichi), Cláudio Antô-nio Jucá Santos, Alexandre Brancoh, Nivaldo José “Brejeiro”, ValdemarAlves Júnior, Alcir dos Anjos, Rosa Izabel Spanuolo da Costa, GilvadarMonteiro, Paulo Dias Neme, Modesto Egomet e Hertha Costa Scherer.Também presta homenagens aos autores agraciados de 2001 a 2014.

Real Academia de Letras: [email protected]

Contemporânea A. F. L., revista da AcademiaFortalezense de Letras, volume 4, Expressão Grá-fica e Editora, Fundação Waldemar Alcântara, For-taleza, CE, 100 páginas, 200 páginas, 2015.

ISSN: 2316-8501.Editora: Beatriz Alcântara.A capa é de Napoleão Torquato Maia e as ilus-

trações são de Côca Torquato.A revista abriga trabalhos de acadêmicos e

convidados, conversa com perguntas dos acadê-micos para o presidente Cid Carvalho.

Beatriz Alcântara: [email protected]

Raiz de um Negro Brasileiro - EsboçoAutobiográfico, Oswaldo de Camargo, CicloContínuo Editorial, 120 páginas, São Paulo, SP.

ISBN: 978-85-68660-09-8-9.As fotos são do acervo do autor. O livro con-

tou com o apoio financeiro do Programa VAI daSecretaria de Cultura do Município de São Paulo.

Segundo Ligia Fonseca Ferreira, “Camargoescreve olho no olho com o leitor, dedo em risteperante um país do qual aguardava generosida-de semelhante à que sempre derramou fartamen-te ao redor de si, e em especial à literatura negrada qual é frondosa e protetora árvore, fincada noséculo XX, e que continua a nos nutrir.”

Oswaldo de Camargo:[email protected]

Página 8 - janeiro de 2016

Notícias

The Literary Man é um HotelLiterário, localizado em Óbidos, ci-dade medieval do interior de Portu-gal, que tem livros em vários ambi-entes. Um castelo no alto de ummorro abriga 30 quartos, restauran-te, Gin Bar, Biblioterapia & Relax, bi-blioteca com um acervo de 45 milobras e livraria. O LiteraryRestaurant tem um cardápio comcomida tradicional portuguesa, Ta-pas da Terra e do Mar, Menus Lite-rários, pratos vegetarianos e cartade vinhos raros. O The Literary GinBar serve cocktails literários, umacoleção de gins superiores com tô-nica Fever-Tree® e cubos de gelooriginais feitos com aromas bios dah o r t a . http://www.theliteraryman.pt

A Biblioteca Nacional Digital,da Fundação Biblioteca Nacional,reúne obras em domínio público,abrangendo um período que vai doséculo XV ao início do século XX. OAcervo digital abriga documentoscartográficos, iconográficos, ma-nuscritos, bibliográficos, periódicose sonoros. bndigital.bn.br

A 1ª Mostra de Livros de Po-emas Aldravias está em cartaz atéo dia 3 de fevereiro, de segunda asexta, das 10 às 13 horas e das 14às 18 horas, na Casa de ArteAldravista, Rua Dom Frei José, 22,Chácara, em Mariana (MG).

O 14º Salão de NegóciosABDL, promovido pela AssociaçãoBrasileira de Difusão do Livro, serárealizado de 21 a 26 de fevereiro,no Hotel Wish Serrano, Av. dasHortênsias, 1480, Gramado (RS).www.abdl.com.br

A CASA EDUCAÇÃO realizacursos, workshops, seminários,palestras e debates, presenciais evirtuais, nas áreas de Gestão e Li-derança, Moda e Beleza e Editorial.www.casaeducacao.com.br

Anna Maria Martins foi agra-ciada com o Prêmio Paul DannovanKigar, instituído pela Associaçãodos Moradores e Amigos da Reser-va da Biosfera do Cinturão Verde daCidade de São Paulo (AMAR). Aentrega da láurea foi realizada nodia 8 de dezembro, no Museu Bra-sileiro de Escultura, em São Paulo.

Marília Soares MarzulloPêra: Fotobiografia, obra organi-zada por Nélida Piñon, escrita porMarília Pêra, durante seu último anode vida, e por sua irmã Sandra Pêra,será lançada pela Editora Arte En-saio, na Livraria Travessa doShopping Leblon, no dia 25 de ja-neiro, segunda-feira, a partir das 19horas.

Acervos Especiais: memóri-as e diálogos, Cultura AcadêmicaEditora, livro organizado por BrunnoV. G. Vieira e Ana Paula Menezes. Aobra, que integra a Coleção Memó-ria da Faculdade de Ciências e Le-tras da Unesp de Araraquara, estádisponível para download em http://w w w. f c l a r . u n e s p . b r / H o m e /I n s t i t u i c a o / A d m i n i s t r a c a o /D i v i s a o Te c n i c a A c a d e m i c a /ApoioaoEnsino/LaboratorioEditorial/colecao-memoria-da-fcl-n9.pdf

Lygia Fagundes Telles foiagraciada com o Prêmio FCW2015, promovido pela FundaçãoConrado Wessel, na categoria Cul-tura. O oftalmologista RubensBelfort Mattos Jr foi laureado na ca-tegoria Medicina. A data da entregada láurea ainda não foi marcada.Ruth Rocha, Fábio Lucas e JoseGoldemberg, membros da Acade-mia Paulista de Letras, também fo-ram agraciados com o PrêmioFCW.

A Biblioteca Waldemar Lopesda Academia Pernambucana deLetras, aberta ao público no dia 11de janeiro, reúne um acervo commais de 30 mil livros dos séculos17 ao 20, de literatura brasileira efrancesa. Funciona das 9 às 14 ho-ras, na Avenida Rui Barbosa, 1596,Graças, bairro da Zona Norte doRecife (PE).

A Geográfica Editora lançaráa Bíblia Wiersbe, que será comen-tada por Warren W. Wiersbe, e li-vros que complementarão a cole-ção do best-seller Bíblia em Ação.www.geograficaeditora.com.br/

O Novo Acordo Ortográficoda Língua Portuguesa entrou emvigor no dia 1 de janeiro. As novasregras, que estão em uso desde2009, incluem o fim do trema e no-vas normas para o uso do hífen ede acentos diferenciais.

A Câmara Municipal deMatosinhos, de Portugal, criará oCais - Museu da Diáspora e da Lín-gua Portuguesa -, com sede numarua do Concelho, que terá o nomede Rua dos Museus. O projeto serádirigido pela antiga ministra IsabelPires de Lima e terá um orçamentoinicial de cerca de dois milhões.

A Unesp completa 40 anos em30 de janeiro. As comemoraçõesterão início no dia 29 de janeiro, às9h30, com ações locais nas Reito-rias das 34 unidades universitáriasque estão localizadas em 24 cida-des do Estado de São Paulo. Oevento de encerramento será reali-zado no dia 22 de agosto, na SalaSão Paulo, às 19 horas, com umaSessão Solene do Conselho Univer-sitário. A Unesp abriga Faculdadese Institutos, Colégios Técnicos, Ins-titutos Especiais, CentrosInterunidades, Agência Unesp deInovação, Centro de Documentaçãoe Memória, Centro de Rádio e TV,Instituto Confúcio na Unesp, Núcleode Computação Científica e as Fun-dações (FEU - Fundação da Edito-ra Unesp, Fundunesp - Fundaçãopara o Desenvolvimento da Unespe Vunesp - Fundação para o Vesti-bular da Unesp). O calendário deeventos, textos, podcasts e fotogra-fias para celebrar a data estão dis-poníveis em www.unesp.br/40anos.

Domício Proença Filho, pro-fessor, crítico literário, poeta,ficcionista, pesquisador, filólogo eroteirista, tomou posse, no dia 17de dezembro, para ocupar o cargode Presidente da Academia Brasi-leira de Letras para o exercício de2016. O acadêmico, poeta,ensaísta, tradutor e crítico literárioGeraldo Holanda Cavalcanti ocupouo cargo nas duas últimas gestões.

A Lei nº 13.146, de 6 de julhode 2015, que estabelece o Estatutoda Pessoa com Deficiência, temcomo objetivo “assegurar e promo-ver, em condições de igualdade, oexercício dos direitos e das liberda-des fundamentais por pessoa comdeficiência, visando sua inclusãosocial e cidadania”. Conforme oArtigo 68, “O poder público deveadotar mecanismos de incentivo àprodução, à edição, à difusão, à dis-tribuição e à comercialização de li-vros em formatos acessíveis; inclu-sive em publicações da administra-ção pública ou financiadas com re-cursos públicos, com vistas a ga-rantir à pessoa com deficiência odireito de acesso à leitura, à infor-mação e à comunicação.” As edi-toras serão obrigadas a publicar li-vros acessíveis para participaremde compras públicas.

diivulgação

Hotel The Literary Man