museu: um campo de atuaÇÃo profissional do...

11
5216 MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO PEDAGOGO? Nilzilene Imaculada LUCINDO, MHNJB/UFMG Eixo Temático Formação inicial de professores de educação básica [email protected] 1. Introdução O Museu de História Natural e Jardim Botânico (MHNJB) é um órgão suplementar da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que desenvolve atividades de ensino, pesquisa e extensão nas áreas das ciências naturais, sendo uma das ações educativas mais tradicionais a visita mediada, voltada, para o atendimento de grupos diversos que visitam a instituição, principalmente, o público escolar. Em 2012 foi implementada a Oficina “O Professor no Museu”, uma ação de extensão cujo público alvo se constitui de professores que pretendem visitar a instituição com suas turmas e que tem por finalidade apresentar o museu aos professores, evidenciando seus espaços expositivos e suas potencialidades educativas. Com a implementação dessa ação, o museu buscava colaborar com o planejamento e melhor aproveitamento da visita, pois foi diagnosticado que muitos dos professores que a visitavam não detinham conhecimento prévio da mesma. No ano de 2014, além de professores, participou dessa ação uma quantidade significativa de acadêmicos do curso de Pedagogia. Diante desse fato, o MHNJB foi levado a repensar sua proposta de trabalho com vistas a atender especificamente esse público: os estudantes de Pedagogia e também os pedagogos no exercício da profissão. Os estudos de Libâneo (2001, 2010) discutem as especificidades da formação e do campo de atuação do pedagogo. Para esse autor, a sociedade contemporânea está repleta de práticas educativas e o trabalho do pedagogo não está restrito ao campo escolar. O entendimento de Libâneo pode justificar o interesse dos licenciandos em conhecer esses outros espaços que, além da escola, também se caracterizam como espaços educativos. A disposição dos acadêmicos ainda pode ser explicada pelas atuais diretrizes curriculares nacionais (DCN) do curso de Pedagogia (BRASIL, 2006) que põe em evidência outros possíveis espaços de atuação para esse profissional. Mediante a demanda apresentada e considerando as possibilidades de contribuir com a formação inicial dos licenciandos e a formação continuada dos profissionais de Pedagogia foi instituído em 2015 no MHNJB o Encontro de Formação de Pedagogos - O Pedagogo no Museu. Esta ação de extensão tem por finalidade ampliar o conhecimento dos licenciandos e dos pedagogos que atuam nas escolas sobre as ações educativas do MHNJB. Como objetivos específicos, busca expandir o conhecimento sobre os museus;

Upload: doanque

Post on 02-Feb-2019

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5216

MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO PEDAGOGO?

Nilzilene Imaculada LUCINDO, MHNJB/UFMGEixo Temático Formação inicial de professores de educação básica

[email protected]

1. Introdução

O Museu de História Natural e Jardim Botânico (MHNJB) é um órgão suplementar

da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que desenvolve atividades de ensino,

pesquisa e extensão nas áreas das ciências naturais, sendo uma das ações educativas

mais tradicionais a visita mediada, voltada, para o atendimento de grupos diversos que

visitam a instituição, principalmente, o público escolar.

Em 2012 foi implementada a Oficina “O Professor no Museu”, uma ação de

extensão cujo público alvo se constitui de professores que pretendem visitar a instituição

com suas turmas e que tem por finalidade apresentar o museu aos professores,

evidenciando seus espaços expositivos e suas potencialidades educativas. Com a

implementação dessa ação, o museu buscava colaborar com o planejamento e melhor

aproveitamento da visita, pois foi diagnosticado que muitos dos professores que a

visitavam não detinham conhecimento prévio da mesma. No ano de 2014, além de

professores, participou dessa ação uma quantidade significativa de acadêmicos do curso

de Pedagogia. Diante desse fato, o MHNJB foi levado a repensar sua proposta de

trabalho com vistas a atender especificamente esse público: os estudantes de Pedagogia

e também os pedagogos no exercício da profissão.

Os estudos de Libâneo (2001, 2010) discutem as especificidades da formação e

do campo de atuação do pedagogo. Para esse autor, a sociedade contemporânea está

repleta de práticas educativas e o trabalho do pedagogo não está restrito ao campo

escolar. O entendimento de Libâneo pode justificar o interesse dos licenciandos em

conhecer esses outros espaços que, além da escola, também se caracterizam como

espaços educativos. A disposição dos acadêmicos ainda pode ser explicada pelas atuais

diretrizes curriculares nacionais (DCN) do curso de Pedagogia (BRASIL, 2006) que põe

em evidência outros possíveis espaços de atuação para esse profissional.

Mediante a demanda apresentada e considerando as possibilidades de contribuir

com a formação inicial dos licenciandos e a formação continuada dos profissionais de

Pedagogia foi instituído em 2015 no MHNJB o Encontro de Formação de Pedagogos - O

Pedagogo no Museu. Esta ação de extensão tem por finalidade ampliar o conhecimento

dos licenciandos e dos pedagogos que atuam nas escolas sobre as ações educativas do

MHNJB. Como objetivos específicos, busca expandir o conhecimento sobre os museus;

Page 2: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5217

apresentar o MHNJB como um possível locus de atuação do pedagogo; diversificar as

atividades científico-culturais das quais os alunos devem participar; proporcionar aos

pedagogos em exercício conhecimento sobre as potencialidades do MHNJB visando

auxiliá-los na proposição de atividades junto aos docentes; estimular a produção do

conhecimento sobre a temática. Em seu primeiro ano de realização foram realizados três

encontros e desses participaram um total de 185 pessoas, dentre pedagogos,

licenciandos de Pedagogia e alunos do curso de Magistério.

Este relato de pesquisa apresenta a percepção de licenciandos de Pedagogia

sobre o conceito de museu; se o museu constitui um espaço de atuação do pedagogo;

qual atividade esse profissional poderia desenvolver na instituição e a relevância de

terem participado desse encontro para sua formação.

2. Referencial Teórico

O curso de Pedagogia foi criado no Brasil em 1939 e sua história foi marcada por

discussões acerca do currículo proposto, do profissional a ser formado e do campo de

atuação dos egressos. Essas discussões influenciaram a constituição do curso levando-

o, após a sua criação, a ser reconfigurado em três momentos distintos pelos Pareceres

do Conselho Federal de Educação (CFE) nº 251/62 e nº 252/69 e pela Resolução do

Conselho Nacional de Educação (CNE) nº 01/2006.

O Decreto-Lei 1.190/39 (BRASIL, 1939) foi o responsável pela criação do curso

que surgiu como uma das cinco seções (Filosofia, Ciências, Letras, Pedagogia e

Didática) que compunha a Faculdade Nacional de Filosofia. Com duração de três anos, o

curso conferia aos seus concluintes o diploma de Bacharel em Pedagogia, porém,

aqueles que além do Bacharelado também tivessem concluído o curso de Didática, que

tinha a duração de um ano, era conferido o diploma de Licenciado em Pedagogia. Assim,

o curso se incumbiu de diplomar o Bacharel em Pedagogia, profissional formado para

atuar como Técnico/Especialista de Educação e o Licenciado em Pedagogia, profissional

formado para atuar como professor no ensino secundário e nas Escolas Normais, com a

formação dos professores do ensino primário.

O Parecer do CFE nº 251/62 (BRASIL, 1963) fixou o currículo mínimo que

consistia em sete matérias (Psicologia da Educação, Sociologia Geral e da Educação,

História da Educação, Filosofia da Educação, Administração Escolar e duas matérias a

serem escolhidas pela IES) e a duração do curso que passou a ser de quatro anos para o

Bacharelado e Licenciatura. Para a Licenciatura, as disciplinas de Didática e Prática de

Ensino eram obrigatórias.

O Parecer do CFE nº 252/69 (BRASIL, 1969), manteve a formação de professores

Page 3: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5218

para atuar no Ensino Normal e instituiu as habilitações para a formação de especialistas

em Orientação Educacional, Administração Escolar, Supervisão Escolar e Inspeção

Escolar. O currículo do curso passou a ter uma parte comum a todas as modalidades e

uma específica em função da habilitação adquirida, além disso, a experiência de

Magistério passou a ser exigida para as habilitações de Orientação Educacional,

Administração e Supervisão Escolar e Didática tornou-se disciplina obrigatória do curso. A

partir da vigência deste Parecer, o bacharelado foi extinto e o curso passou a conferir

apenas o título de Licenciado em Pedagogia.

A Resolução CNE nº 01/2006 (BRASIL, 2006) ao definir a docência como base da

formação do pedagogo, extinguiu as antigas habilitações do curso e esse passou a

destinar-se

à formação de professores para exercer funções de magistério naEducação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursosde Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional naárea de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejamprevistos conhecimentos pedagógicos (BRASIL, 2006, p.2).

De acordo com essa resolução também se constitui atribuição do pedagogo o

planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação deprojetos e experiências educativas não-escolares; na produção e difusãodo conhecimento científico tecnológico do campo educacional, emcontextos escolares e não escolares (BRASIL, 2006, p.2).

A atual diretriz do curso de Licenciatura em Pedagogia evidenciou outros

possíveis espaços de atuação do pedagogo já que o conceito de docência enfatizado nas

diretrizes apresenta um sentido alargado, indicando que a atuação do Licenciado em

Pedagogia extrapola o contexto da sala de aula. Para tanto, se faz necessário que os

cursos de graduação propiciem ao egresso uma formação em que ele esteja apto para

trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção daaprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimentohumano [...]; participar da gestão das instituições planejando,executando, acompanhando e avaliando projetos e programaseducacionais, em ambientes escolares e não-escolares (BRASIL, 2006,p. 2).

Conforme ressalta a DCN proposta, no Projeto Político Pedagógico do curso, a

instituição deve propiciar a integralização dos estudos favorecendo a participação dos

licenciandos em

[...] atividades de monitoria, de iniciação científica e de extensão,diretamente orientadas por membro do corpo docente da instituição deeducação superior decorrentes ou articuladas às disciplinas, áreas deconhecimentos, seminários, eventos científico-culturais, estudos

Page 4: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5219

curriculares, de modo a propiciar vivências em algumas modalidades eexperiências, entre outras, e opcionalmente, a educação de pessoascom necessidades especiais, a educação do campo, a educaçãoindígena, a educação em remanescentes de quilombos, emorganizações não-governamentais, escolares e não-escolares públicas eprivadas (BRASIL, 2006, p.4-5).

Além de desenvolver o estágio, possibilitando aos licenciandos vivenciar

experiências em ambiente escolares e não escolares.

3. Procedimentos Metodológicos

A metodologia utilizada neste trabalho contemplou a abordagem qualitativa que

privilegiou a pesquisa documental, bibliográfica e de campo. A pesquisa documental foi

embasada nos documentos oficiais que tratam do curso de Pedagogia e a pesquisa

bibliográfica recorreu a autores que discutem a formação do pedagogo. A pesquisa de

campo fez uso de um questionário que foi aplicado para os licenciandos de Pedagogia

que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos – “O Pedagogo no Museu”

realizado no dia 14/11/2015.

O questionário continha questões abertas e fechadas para serem respondidas

antes e após o término do encontro. Essas questões buscavam identificar o perfil dos

participantes do encontro; a concepção deles em relação ao conceito de museu; se este

se constitui um espaço educativo e de atuação do pedagogo; quais atribuições um

profissional de Pedagogia poderia desempenhar; o que seria necessário em sua

formação para habilitá-lo a trabalhar neste locus; o que essa experiência representava

para a formação deles, dentre outras questões. Os dados foram analisados a partir dos

relatos de 29 licenciandos que devolveram o instrumento de coleta de dados, tendo por

base a metodologia proposta por Bardin (2011).

O encontro teve a duração de 8 horas e contemplou uma palestra intitulada “O

Pedagogo no Museu” que abordou sobre a constituição do curso de Pedagogia no Brasil

e a formação do Pedagogo, os conceitos da educação formal, não formal e informal, os

pressupostos de pensadores como Comenius que, em sua obra Didática Magna

preconiza a necessidade da educação para todos e trata do ensino de ciências e de

Celéstin Freinet, idealizador das Aulas Passeio. Na sequência, esses pressupostos foram

relacionados à educação em museus e apresentadas algumas das atividades educativas

desenvolvidas no MHNJB. Além da palestra, os participantes visitaram os espaços

expositivos da instituição, participaram de oficinas que contemplaram o contato com o

acervo e trabalhos de grupos com vistas as discutir as questões que norteavam a

proposta.

Page 5: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5220

4. Resultados e Discussões

O perfil dos sujeitos da pesquisa: os licenciandos de Pedagogia

Dos 29 acadêmicos que participaram do encontro, 86,2% são do sexo feminino e

13,8% do sexo masculino. A idade dos licenciandos é variável, sendo que a maior

porcentagem, 48,4% se concentra na faixa etária entre 21 e 30 anos; 17,2% possuem

idade acima de 45 anos; 13,8% possuem entre 18 a 20 anos; 10,3% possuem idade

entre 31 a 35 anos; 6,9% têm entre 36 a 40 anos e 3,4% entre 41 a 45 anos.

Esses acadêmicos, em sua maioria, 93,2%, pertencem a uma instituição de

ensino superior privada, contudo, entre os participantes estiveram presentes 3,4% de

uma instituição de ensino superior pública estadual e 3,4% de instituição de ensino

superior pública federal. Com relação ao período em que se encontram matriculados, os

acadêmicos da instituição privada estão cursando o segundo período do curso de

Pedagogia; o acadêmico da rede pública estadual encontra-se no primeiro período e o da

rede pública federal no sétimo período.

O conceito de museu para os licenciandos de Pedagogia

Ao tratar do conceito de museu, identificou-se primeiro qual era a visão de museu

que os licenciandos traziam consigo.

L05- Um lugar onde guarda a história de vida, arte, costumes, comvalores históricos de várias gerações resguardando a cultura eaprendizagem, pesquisas e curiosidades.L07- Um lugar cheio de coisas antigas e velhas.L10- Espaço de preservação da história.L15- Museu é um ambiente onde se guardam coisas, objetos de valor.L29- Museu é um espaço em que são expostos diversos tipos demateriais históricos e contemporâneos, a fim de relatar fatos e costumesde diversas culturas e tempos.

Mediante as respostas dadas observa-se que os sujeitos da pesquisa

relacionaram o museu a um espaço de guarda que tem a função de guardar a história por

meio de acervos diversos, visando preservar a cultura que emana dessa história. Santos

(2001) e Marandino (2005) registram que é comum a concepção de museu como espaço

de guarda de coisas velhas e antigas.

Após as experiências vivenciadas durante o encontro, buscou-se novamente

identificar qual conceito de museu eles construíram. Neste sentido, na percepção dos

sujeitos o museu passa a ser caracterizado como:

Page 6: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5221

L05- Um lugar que deve ser mais visitado a fim de gerar maisconhecimentos.L06- Descobri que museu não é lugar onde se guarda “coisas velhas” esim riquezas novas a nosso conhecimento e aprendizado.L23- Não só como dizem um lugar para guardar coisas velhas, masabrange várias possibilidades.L25- Museu é um lugar de interação do visitante com o ambiente, com oacervo e seu espaço, um espaço educativo, com muitas possibilidadesde ensino.L26- Criador de novas oportunidades pedagógicas.

Ao mencionarem a concepção de museu que construíram após o encontro é

possível perceber que o conceito de “museu como espaço de guarda” já não se faz tão

presente nos relatos. Verifica-se que essa visão foi extrapolada, visto que a instituição

museológica passa a se apresentar como um espaço repleto de outras possibilidades

além da “guarda”.

A partir das respostas dadas foi possível elaborar uma tabela com as palavras

mais frequentes utilizadas na definição de museu pelos licenciandos.

Tabela 1- Palavras mais freqüentes na definição de museu

Antes da experiência vivenciada Freqüência Depois da experiência vivenciada Freqüência

História 7 Ensino 2

Conhecimento 5 Conhecimento 7

Guarda e preservação 8 Guarda e conservação 2

Cultura 4 Educativo 2

Aprendizagem 4 Aprendizagem 4

- - Informação 2

- - Espaço multidisciplinar 2

Fonte: Questionário

A tabela explicita que “conhecimento, guarda, preservação/conservação,

aprendizagem” são palavras que os licenciandos repetiram ao tratarem do conceito de

museu, antes e após o encontro. Outras palavras como “história e cultura” só aparecem

na definição antes da experiência vivenciada. Essas últimas palavras se enquadram na

definição de Pereira at al (2007, p. 11) que ao fazer referência ao museu, afirma se tratar

de uma “instituição social, cultural e histórica”.

Ao caracterizarem novamente o que seria um museu, as palavras “ensino,

educativo, informação e espaço multidisciplinar” são evidenciadas, sinalizando outros

atributos e funções que um museu possui que vai além de uma instituição responsável

pela guarda de objetos antigos. Pelas palavras apresentadas na segunda coluna, pode-

se dizer que os licenciandos evidenciaram o caráter educativo que os museus possuem.

Page 7: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5222

De acordo com Desvallées e Mairesse, o conceito de museu mais conhecido é o

de 2007 que se encontra nos estatutos do Conselho Internacional de Museus (ICOM):

o museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço dasociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire,conserva, estuda, expõe e transmite o patrimônio material e imaterial dahumanidade e do seu meio, com fins de estudo, educação e deleite(DESVALLÉES; MAIRESSE, 2013, p.64).

No Brasil, consideram-se museus

as instituições sem fins lucrativos que conservam, investigam,comunicam, interpretam e expõem, para fins de preservação, estudo,pesquisa, educação, contemplação e turismo, conjuntos e coleções devalor histórico, artístico, científico, técnico ou de qualquer outra naturezacultural, abertas ao público, a serviço da sociedade e de seudesenvolvimento (BRASIL, 2009, p.1).

Nas palavras de Cury (2013, p.23), “em sua essência, museu é o espaço para

conservação e, simultaneamente, comunicação do patrimônio cultural musealizado [...]”.

Museu: um campo de atuação profissional do Pedagogo?

Para Libâneo (2001, p.3), “um dos fenômenos mais significativos dos processos

sociais contemporâneos é a ampliação do conceito de educação e a diversificação das

atividades educativas”. Segundo esse autor, as práticas educativas se fazem presentes

em múltiplos espaços extrapolando o ambiente formal de educação. Falcão (2009) ao

discutir o caráter educativo dos museus, registra que desde a sua origem, os museus

apresentam um caráter educacional, pois se tratavam de espaços destinados ao ensino e

pesquisa, concepção que também é ressaltada por Pereira et al (2007, p.11) ao afirmar

que os museus são “ambientes culturais e educativos. Pretendem educar por meio da

sensibilização e cultivam a comunicação e produção de significados a partir de

seus objetos, exposições, propostas educativas e outras”.

Na concepção de 100% dos licenciandos participantes do Encontro de

Pedagogos, o museu se constitui um espaço educativo. Ao justificarem, os licenciandos

registraram que:

L05- Sim. Aprende-se cultura, arte, história e promove a interação entreo museu e os visitantes.L13- Sim. Pois ele pode nos trazer inúmeras possibilidades de trabalhoseducacionais.L15- Sim. O museu como espaço educativo nos ensina a lidar com opresente, utilizando fatos históricos.L25- Sim, pois no museu aprendemos com objetos e seu acervo, que aoser exposto para o público revela o modo de viver, a cultura de outraspessoas ou épocas.

Page 8: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5223

L29- Sim. Além de ampliar os conhecimentos, incentiva a criatividadedos indivíduos, motivando-os a preservar os valores e costumes dassociedades, da natureza e as pessoas.

No entendimento de Libâneo e Pimenta (2011, p.36) “os profissionais de

educação formados pelo curso de Pedagogia atuarão nos vários campos sociais da

educação [...]” e os museus, na percepção de Marandino (2009), se caracterizam como

espaços de educação não formal. A educação que se desenvolve nos museus, a

educação museal, “pode ser definida como um conjunto de valores, de conceitos, de

saberes e de práticas que têm como fim o desenvolvimento do visitante [...]”

(DESVALLÉES; MAIRESSE, 2013, p.38).

Libâneo concebe o pedagogo como

o profissional que atua em várias instâncias da prática educativa, diretaou indiretamente ligadas à organização e aos processos de transmissãoe assimilação de saberes e modos de ação, tendo em vista objetivos deformação humana previamente definidos em sua contextualizaçãohistórica (2001, p. 11).

Se o museu é um espaço de educação e o pedagogo é aquele que cuida da

formação humana, logo, há espaço de trabalho para o pedagogo o museu. Essa

conclusão de que há espaço para o profissional de Pedagogia na instituição museológica

foi unânime e apontada por 100% dos acadêmicos.

Dentre as atividades que um pedagogo poderia desempenhar no museu,

apresenta-se abaixo, uma síntese daquelas elencadas pelos licenciandos:

Planejar, organizar, acompanhar e avaliar as práticas educativasdesenvolvidas no museu; coordenar e supervisionar monitores/educador;preparar material didático; elaborar projetos; acompanhar as visitasatuando como monitor/educador; desenvolver pesquisas; promoverdinâmicas, atividades lúdicas, oficinas e jogos.

É relevante registrar que as práticas educativas que se desenvolvem em um

museu têm o seu acervo como centro e o trabalho educativo desenvolvido pela instituição

envolve vários profissionais e setores que trabalharão de forma integrada. Assim, o

pedagogo irá fazer parte dessa equipe multidisciplinar, atuando em interação com os

demais profissionais que trabalham no museu.

A relevância do Encontro de Pedagogos para a formação dos licenciandos

Embora o curso de Pedagogia no Brasil tenha surgido com a finalidade de formar

professores para atuar no Curso Normal e em funções específicas na escola e no

Page 9: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5224

sistema escolar (LIBÂNEO; PIMENTA, 2011), as atuais DCN, destacam que a formação

oferecida no curso de Pedagogia destina-se também para atuar em “outras áreas nas

quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos” (BRASIL, 2006, p. 1).

Mediante o exposto nessa DCN e ainda tomando por base o pressuposto de

Libâneo (2001; 2010) de que vivemos em uma sociedade pedagógica, pode-se afirmar

que há espaços distintos do ambiente escolar para serem explorados pelos pedagogos,

sendo que esses se tornarão também um campo de atuação profissional para esses

profissionais. Não obstante, cabe às instituições formadoras proporcionar o contato e

experiências dos licenciandos com os espaços não escolares a fim de compreendam

suas especificidades e aprofundem o conhecimento sobre essas realidades. No caso

desta pesquisa, o contato com o espaço não escolar, o museu, se deu a partir de uma

ação de extensão que é uma das exigências das instituições de ensino superior

associada ao ensino e à pesquisa.

Para os licenciandos que participaram do encontro, essa ação é relevante para

sua formação por possibilitar o conhecimento acerca de outros possíveis campos de

atuação do pedagogo e também por propiciar a construção de um novo olhar acerca da

instituição museológica. Dessa forma, os relatos abaixo ilustram a relevância desse

encontro para os licenciandos:

L06- Sim, muito relevante. Enriquecimento de nossa aprendizagem. Saiohoje com outra visão do espaço museu.L11- Foi de uma importância absoluta, aprendemos muito e no futuro,saberemos que é um lugar interessante para nossos alunos.L16- De extrema importância, pois aborda cultura, conhecimentos einteração social, a dinâmica de grupos colabora com a socialização edesenvoltura do conhecimento absolvido.L17- Contribuição para abrir uma visão de outras possibilidades naminha atuação.L23- Contribuição no meu conhecimento e para passar o aprendizadoaos alunos.L25- Foi muito relevante, pois ampliou nossa visão do que é um museu.

5. Conclusões

O Encontro de Formação de Pedagogos “O Pedagogo no Museu” constitui uma

forma de ampliar a visão dos licenciandos a respeito dos possíveis campos de atuação

do pedagogo e demonstra que esse não está restrito as escolas, sendo o museu um

desses locus. Ademais, promoveu a construção de um novo olhar sobre o museu, o

contato dos licenciandos com seu campo de atuação profissional e colaborou com as

instituições formadoras ao diversificar as atividades científico-culturais das quais os

alunos devem participar. Permitiu ainda a compreensão acerca do papel educacional do

Page 10: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5225

museu, possibilitando aos licenciandos vislumbrar formas de explorar mais esse espaço

com professores e alunos, favorecendo o desenvolvimento da educação formal. Enfim,

essa ação extensionista reafirma o papel da universidade com o ensino, a pesquisa e a

extensão e evidencia que a extensão também se constitui uma via de formação

profissional.

Referências Bibliográficas

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BRASIL. Conselho Federal de Educação. Parecer n° 251/62. Fixa o currículo mínimo e aduração do Curso de Pedagogia. Relator: Valnir Chagas. In: Documenta. nº 11. Jan.-Fev.1963. 59-66p.

______. Conselho Federal de Educação. Parecer n° 252/69. Fixa os mínimos deconteúdo e duração a serem observados na organização do curso de Pedagogia. Relator:Valnir Chagas. In: Documenta. nº 100. Abr. 1969. 101-139 p.

______. Conselho Nacional de Educação. Resolução nº 1/2006 de 15 de maio de 2006.Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia,licenciatura. Diário Oficial da União, Brasília, 16 maio 2006, Seção 1, p. 11. Disponívelem: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf>. Acesso em: 21 dez. 2013.

______. Decreto-Lei nº 1190 de 04 de abril de 1939. Dá organização à FaculdadeNacional de Filosofia. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, RJ, 06 abr. 1939. Disponívelem: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-1190-4-abril-1939-349241-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 08 set. 2013.

______. Lei nº 11904 de 14 de janeiro de 2009. Institui o Estatuto de Museus e dá outrasprovidências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15 jan. 2009. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2009/lei-11904-14-janeiro-2009-585365-normaatualizada-pl.pdf >. Acesso em: 28 dez. 2015.

CURY, M. X. Educação em Museus: Panoramas, Dilemas e Algumas Ponderações. In:Ensino Em Re-Vista, v.20, n.1, p.13-28, jan./jun. 2013. Disponível em:<http://www.seer.ufu.br/index.php/emrevista/article/viewFile/23206/12747>. Acesso em 22dez. 2015.

DESVALLÉES, A.; MAIRESSE, F. (dir.). Conceitos-chave de Museologia. São Paulo:Comitê Brasileiro do ICOM, Pinacoteca do Estado, Secretaria de Estado da Cultura,2013.

FALCÃO, A. Museu como lugar de memória. In: Salto para o Futuro. Museu e escola:educação formal e não-formal. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação aDistância, Ano XIX – Nº 3 – Maio/2009. Disponível em:<portaldoprofessor.mec.gov.br/storage/materiais/0000012191.pdf>. Acesso em: 10 ago.2015.

LIBÂNEO, J. C. Pedagogia e Pedagogos: inquietações e buscas. Educar. Curitiba:Editora da UFPR, n. 17, p. 153-176. 2001. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/er/n17/n17a12.pdf>. Acesso em: 09 out. 2011.

Page 11: MUSEU: UM CAMPO DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO …200.145.6.217/proceedings_arquivos/ArtigosCongressoEducadores/5791.pdf · que participaram do Encontro de Formação de Pedagogos –

5226

______. Pedagogia e pedagogos, para que? 12 ed. - São Paulo: Cortez, 2010.

______.; PIMENTA, S. G. Formação de profissionais da educação: visão crítica eperspectiva de mudança. In: PIMENTA, S. G. (Org.) Pedagogia e Pedagogos: caminhos eperspectivas. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2011. cap. 1, p. 15-61.

MARANDINO, M. Museus de Ciências como Espaços de Educação. In: Museus:dos Gabinetes de Curiosidades à Museologia Moderna. Belo Horizonte:Argumentum, 2005, p.165-176.

______.; Museu como lugar de cidadania. In: Salto para o Futuro. Museu e escola:educação formal e não-formal. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação aDistância, Ano XIX – Nº 3 – Maio/2009.

PEREIRA, J. S. et al. Escola e Museus: diálogos e práticas. Belo Horizonte: Secretaria deEstado de Cultura / Superintendência de Museus; Pontifícia Universidade Católica deMinas Gerais / Cefor, 2007.

SANTOS, M. C. T. M. Museu e Educação: conceitos e métodos. In: AulaInaugural – 2001, do Curso de Especialização em Museologia do Museu deArqueologia e Etnologia da USP / Simpósio Internacional “Museu e Educação:conceitos e métodos”, 20 a 25 de agosto de 2001. Disponível em:<https://bibliotextos.files.wordpress.com/2011/12/museu-e-educac3a7c3a3o.pdf>. Acesso em: 28 dez. 2015.