monografia o mito heroico no filme tropa de elite

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Uni- ANHANGÜERA Centro Universitário de Goiás Curso de Publicidade e Propaganda A Construção do Mito Heróico no Filme Tropa de Elite José Francisco Braz Muniz Goiânia, dezembro de 2009

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Uni- ANHANGÜERA Centro Universitário de Goiás

Curso de Publicidade e Propaganda

A Construção do Mito Heróico no Filme Tropa de Elite

José Francisco Braz Muniz

Goiânia, dezembro de 2009

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José Francisco Braz Muniz

A Construção do Mito Heróico no Filme Tropa de Elite

Monografia apresentada à professora Camila Craveiro do Curso de Publicidade e Propaganda do Uni –ANHANGÜERA - Centro Universitário de Goiás, como trabalho de conclusão de curso, requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Publicidade e Propaganda.

Orientador: Profª. Ms Camila Craveiro

Goiânia, dezembro de 2009

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Monografia “A Construção do Mito Heróico no Filme Tropa de Elite” apresentada à professora Camila Craveiro, do Curso de Publicidade e Propaganda do Uni-Anhanguera - Centro Universitário de Goiás, pelo Bacharelando José Francisco Braz Muniz como trabalho de conclusão de Curso, requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Publicidade e Propaganda aprovada pela banca examinadora formada pelos professores:

Orientador Prof. Ms.Camila Craveiro Assinatura: Co- orientador Prof. Ms.Luiz Serenini Assinatura: Examinador convidado Sr. Bruno Lopes Assinatura:

Goiânia, dezembro de 2009

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Este trabalho acadêmico é dedicado a todos os homens e mulheres que arriscam a própria vida em defesa da vida.

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Agradeço o Uni-ANHANGÜERA-Centro Universitário de Goiás por ter me acolhido com respeito e carinho e ter proporcionado esta oportunidade de engrandecimento. Aos meus professores orientadores, Profª. Ms Camila Craveiro e Luiz Antônio Serenini e ao Coordenador do curso de Publicidade e Propaganda, Prof.Ms.Claudomilson F. Braga.

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RESUMO

A comunicação através do uso da imagem no contexto da humanidade é uma das mais comuns e indispensáveis formas de se emitir os significados dos povos desde as antigas eras. Sua importância é de tal forma que é difícil ou quase impossível mensurar um diálogo que não perpasse pelo uso de alegorias nos discursos. A partir dessa indagação, a abordagem deste trabalho de cunho científico, pretende discutir a figura simbólica do mito heróico, seus aspectos representativos e sua forma de transmissão de valores como exemplo atuante no íntimo humano. Ao final deste, mensurar a possível presença deste arquétipo no filme Tropa de Elite, Missão Dada é Missão Cumprida, e se foi presumidamente, o ponto decisivo que permitiu os méritos alcançados pela obra cinematográfica.

Palavras chaves: Comunicação, Símbolos, Mito Heróico, Cinema.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO _____________________________________________________08 1. O CINEMA BRASILEIRO __________________________________________11 1.1. A História do Cinema Brasileiro ____________________________________11 1.1.1 Os Primórdios do Cinema no Brasil _______________________________12 1.1.2 O Cinema Industrial dos Anos 30 _________________________________ 12 1.1.3 O cinema Brasileiro dos Anos 50__________________________________14 1.1.4 O Cinema Novo _______________________________________________16 1.1.5 O Cinema Marginal de Nelson Rodrigues ___________________________18 1.1.6 O Cinema da Boca do Lixo_______________________________________19 1.1.7 A retomada do cinema brasileiro nas décadas de 80 e 90_______________22 1.2 O Gênero Policial no Cinema Brasileiro ________________________24 2. O CINEMA POLICIAL E A CONSTRUÇÃO DE MITOS NO BRASIL _________34 2.1 A Conceitualização de Mito ___________________________________34 2.1.1 Os Heróis e os Super-Heróis _____________________________________37 2.1.2 A Figura Mítica do Herói e o Policial________________________________38 2.1.3 Os Heróis policiais Inspetor Almeida e Capitão Nascimento ____________ 41 3. A ANÁLISE DOS DISCURSOS DO FILME TROPA DE ELITE ____________44 3.1 O Discurso ___________________________________________________44 3.1.1 O Discurso Simbólico __________________________________________ 48 3.1.2 A Análise dos símbolos no Filme Tropa de Elite _____________________ 50 3.1.3 O Discurso Mítico Heróico do Capitão Nascimento ___________________52 CONSIDERAÇÕES FINAIS___________________________________________00 REFERÊNCIAS ____________________________________________________70 SITES CONSULTADOS______________________________________________72 ANEXOS _________________________________________________________73

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INTRODUÇÃO

Há milhares de anos a humanidade vem buscando se desenvolver em termos

de construções de linguagem, com o intuito de formar estruturas de comunicação

que permitam diminuir e compreender as distâncias ideológicas existentes em cada

sociedade. Com a finalidade de se determinar um estado de coexistência produtiva e

harmoniosa, tal processo de edificação dos meios de informação sempre trouxe

dificuldades de assimilação das linguagens devido ao fato deste ter se formado e

existir em uma variante lingüística de grandes proporções.

Dentro deste quadro heterogêneo, elementos significativamente singulares e

comuns a todos os povos nos unem desde os primórdios da formação humana. Tais

elementos antecessores à escrita possuem um poder de síntese e de significados

que, independentemente dos tratados gramaticais, ortográficos e fonéticos de cada

povo, historicamente e na atualidade, são capazes de transmitir um conjunto de

valores que é reconhecido por todos.

O processo de comunicação simbólica vem se desenvolvendo a milhares de

anos no seio da humanidade, isto se deve ao fato de o homem ter aprendido e

apreendido os vários estímulos visuais sígnicos presentes no seu universo exterior e

interior, a não só observá-los, mas, construindo um sistema de sinais e códigos

visuais que adiante se tornariam elementos de referência na compreensão e

aceitação dos significados de fenômenos e objetos em comum na maioria das

culturas primitivas.

Quanto mais a humanidade avançava na construção da linguagem como

meio de produção de comunicação, absorvendo, nomeando e dando significados

lingüísticos verbais a todo o intricado universo de objetos e fenômenos, mais a

produção e reprodução de códigos visuais, como formas de representação deste

conjunto de significados lingüísticos, crescia paralelamente, determinando as

diferenças de sua empregabilidade para um sentido ou outro.

Dependendo do contexto sócio-historico-cultural de uma comunidade

específica, ou das várias contidas em uma sociedade, o emprego dos elementos

simbólico-visuais como comunicações variam perante os valores, os indicativos e os

meios técnicos de produção. Neste processo de construção imagética, surge a

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presença dos mitos na humanidade, tais seres, outrora considerados como

semidivindades, estão presentes em todas as culturas e em todas as sociedades

desde os primórdios das civilizações, diferenciando-se de uma expressão visual

qualquer, pelo fato deste possuir uma bagagem de valores que o qualifica como

sendo uma personalidade discursiva.

Dentre todos os mitos gerados pela humanidade, o mito heróico atravessou

os milênios que somam a história humana como sendo o mais discutido e

perpetuado, a princípio pelo mecanismo da oralidade dos antigos e através das artes

literárias, teatrais e, mais recentemente, pela indústria cinematográfica, ícone basilar

da indústria cultural.

O presente trabalho acadêmico tem como proposta abordar a possibilidade da

ocorrência da construção do mito heróico no filme Tropa de Elite. Missão Dada é

Missão Cumprida através do personagem principal da trama, Capitão Nascimento.

Para tanto, serão reunidos autores de ciências ligadas à comunicação e ao tema em

específico que permitam com suas contribuições científicas, a estruturação de um

ambiente teórico que faculte levar a contento à apreciação sugerida.

Portanto, o conteudo da obra em tese será construído em três capítulos,

sendo o primeiro de caráter histórico, buscando na bibliografia que trata da

historiografia do cinema nacional e do gênero filmográfico policial subsídios que

indiquem um contexto cultural que corrobore com o filme em análise ter recebido

pronunciadas menções meritórias por parte de publico e crítica na época de sua

exposição nas salas de cinema do país.

No segundo capítulo, os argumentos buscarão nas ciências que tratam da

subjetividade humana, os princípios que possam trazer clareza ao entendimento do

tema proposto, ou seja, discutir o conceito a respeito do mito, seus fundamentos

teóricos e sua influência na formação do homem e da sociedade, tendo como

referência estudos que tratam da estrutura mítica do herói. Analisar dentro do

contexto da filmografia policial brasileira, através da confrontação dos personagens

Inspetor Almeida de O Vigilante Rodoviário e o Capitão Nascimento de Tropa de

Elite. Missão Dada é Missão Cumprida, as características míticas particulares de

cada personagem, suas oposições, sobreposições e os contextos nos quais

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inseridos, elegeram-nos como possíveis figuras heróicas do cinema policial

brasileiro.

Por fim, no capítulo que conclui as observações teóricas sobre o tema, serão

analisados os discursos que compõem a obra de cinema em análise, buscando

através da narrativa da trama, elementos discursivos que edifiquem a sustentação

em tese de que o personagem Capitão Nascimento não só é uma figura mítica-

heróica, mas também o ponto crucial que possibilitou ao filme Tropa de Elite. Missão

Dada é Missão Cumprida ter alcançado notoriedade expressiva dentro da sociedade

brasileira.

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1. O CINEMA BRASILEIRO

O presente capítulo introdutório tem o intuito de situar o tema deste trabalho

acadêmico através do estudo do cinema no Brasil, apresentando dados que

permitam entender como o cinema brasileiro desenvolveu-se historicamente até aos

dias atuais, em específico, o gênero de filme policial.

1.1 A história do cinema brasileiro

1.1.1 Os Primórdios do Cinema no Brasil

A história do cinema brasileiro inicia-se com o cinematógrafo Affonso

Segretto, imigrante italiano que a partir de filmagens realizadas por ele a bordo do

paquete Frances brésil no porto da cidade do Rio de Janeiro, o consagra como o

primeiro cineasta a produzir um filme no Brasil; com o titulo: Fortalezas e navios de

guerra na Baia da Guanabara (1898), a obra citada inicia a bela época do cinema no

Brasil, “nela veremos como o cinema engatinha, desde a tomada das primeiras

vistas até o seu grande período, (1908-1911), com inúmeros filmes posados,

dramatizados.” (MORENO, 1994, p.15).

Contudo, segundo dados do web cine1, alguns anos transcorrem para a

possibilidade de uma continuidade das produções cinematográficas brasileiras,

ocorrência esta na época gerada pela deficiência da infra-estrutura elétrica do

Estado do Rio de Janeiro, que não atendia a demanda de energia necessária para

projeção das películas nas salas de cinema, portanto, apenas a partir da instalação

da usina de Ribeirão das Lages, em 1907, dezenas de salas de cinemas foram

estabelecidas nas cidade do Rio de Janeiro e São Paulo. O período inicial do cinema 1 A história do cinema brasileiro. Disponível em: < www.webcine.com.br/historia.htm> acesso em 30 de ago.2009.

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brasileiro chega ao seu ápice com a produção de Os Estranguladores (1908), de

Giuseppe Lablanca e Antonio Leal, que além de ser o primeiro filme em longa

metragem produzido no país, é o primeiro filme do gênero policial.

1.1.2 O Cinema Industrial dos Anos 30

Nos anos 30, o cinema brasileiro se torna falado e apresenta um avanço nas

produções de longas-metragens, segundo Rocha (1963) o filme a ser destacado

neste período é a Ganga Bruta (1933) de Humberto Mauro, filme com qualidade em

termos de linguagem cinematográfica onde o cineasta apesar de uma concepção

com várias falhas, “foi capaz de expressar um sentimento de mundo, ser autêntico.

Diante da paisagem social mineira, ele teve, dentro de si, a sensibilidade, a coragem

de representá-la de forma despojada” (ROCHA, 1963, p.11).

Rocha (1963) acrescenta em ressalva que Humberto Mauro e a sua obra em

destaque, apesar de confusa na sua concepção, é considerado o prenúncio do

discurso que mais adiante seria a base da expressão do cinema novo, ou seja, o

cineasta em questão é avaliado como sendo ele o precursor inconsciente de um

movimento que teria forma 40 anos à frente, pois “o cinema novo não começa do

zero, tem seu precursor; por sua vez, o processo que se inicia com Mauro não ficará

represado. (ROCHA, 1963, p.12).

Outra característica do cinema brasileiro nos anos 30 foi o crescente

envolvimento das platéias por produções cinematográficas com a finalidade de

entretenimento, no caso, as chanchadas, gênero de comédias produzidas pela

Cinédia Filmes que eram essencialmente produções que contavam com atrizes e

atores oriundos do teatro de revista e cantores famosos do rádio brasileiro. Neste

período, filmes consagrados pelo público como Alô, Alô Brasil (1935) e Alô, Alô

Carnaval (1936) revelaram para o mundo do entretenimento, por exemplo, as

cantoras Carmem Miranda e Aurora Miranda. (MORENO, 1994).

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Segundo a Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema (2000), o salto

qualitativo do cinema nacional nos anos 30 e 40 se da por uma orientação de

governo que abrangeu todos os setores da sociedade através da força e presença

do Estado, na figura do Presidente Getúlio Vargas (1930-1945). Tais rumos foram

decisivos para o incremento do cinema nacional, pois de um modo geral, todo o

sistema de comunicação cultural do país na época recebeu subsídios para a

implantação da estética do Estado Novo em 1937; para tal objetivo ser alcançado,

ocorreu a “criação da indústria da cultura, com a expansão dos meios de divulgação,

nomeadamente o rádio, a indústria fonográfica e o cinema falado, que

desempenharam um papel central na construção de um mito de “unidade nacional”

(SOCINE, 2000, p.105).

Um resultado particular da política de comunicação gerada pelo governo

Vargas é que naturalmente aproximou a música popular através do rádio e do

cinema, resultando no aparecimento de uma indústria do cinema que se caracterizou

por produções cinematográficas tipicamente aos moldes estéticos do cinema norte-

americano com a missão de difundir entre a população o projeto de “Identidade

Nacional”. O resultado dessa ação é o lançamento das primeiras obras do gênero

produzidas com resultados comerciais expressivos, a primeira, o talkie2 Coisas

nossas (1931), produção inspirada no filme-musical original americano Broadway

Melody (1929). O filme era uma composição de pequenas cenas com músicos

renomados do samba, tais como Noel Rosa e o Bando de Tangarás, interpretando

canções populares e a segunda, o filme musical Favela dos meus amores (1935),

estrelado pela cantora Carmem Mauro que abordava o ambiente dos morros na

cidade do Rio de Janeiro. Tal obra já prenunciava no roteiro o distanciamento e o

preconceito mútuo que crescia entre as classes burguesa branca e as comunidades

negras dos morros cariocas (SOCINE, 2000).

2 Talkie: palavra inglesa que traduzida literalmente significa: filme falado.

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1.1.3 O cinema Brasileiro dos Anos 50

Nas décadas de 40 e 50, o cinema brasileiro continua a crescer em termos de

qualidade e sofisticação técnica com o aparecimento do estúdio Vera Cruz que,

apesar de sua curta história, produziu filmes de reconhecimento de público e crítica.

Um deles, o filme O cangaceiro (1953), de Lima Barreto, conquistou naquele ano o

prêmio de melhor filme de aventura no renomado Festival de Cannes3. E a Atlântida

Filmes, que produziu dezenas de chanchadas de sucesso, entre elas o clássico Nem

Sansão Nem Dalila (1954), contracenado por Oscarito e Grande Otelo, comédia que

satirizava o original americano estrelado pelo ator Victor Mature, (MORENO, 1994).

Neste momento é importante tecer algumas considerações sobre a

historiografia da produção cinematográfica brasileira antes de apreendermos as

informações a respeito do movimento do cinema novo nas décadas de 60 e 70,

observando um aspecto importante em conformidade com o aqui já explanado, que

é primeiramente, o visível e lento distanciamento entre a idéia de um cinema

conceitual por parte de alguns cineastas e outro com objetivos voltados para a idéia

de uma indústria do cinema de massa aos moldes do cinema norte-americano com

fins de entretenimento e lucro.

Em concordância com a afirmação acima, Rocha (1963) ao explanar as

potencialidades do cinema na década de 50 em termos de cineastas e ideais,

explica que esta fase do cinema nacional contemplava explicitamente duas vertentes

envolvidas distintamente na produção cinematográfica, uma que buscava o

compromisso com uma construção estética independente, onde as liberdades da

construção dos roteiros passassem por crivos que não necessariamente aqueles em

ressonância com um mercado formal, e outra que possuía o ideário edificado a partir

da produção em massa de filmes com finalidades econômicas. A título de ilustrar

essas vertentes e as dificuldades por elas encontradas em seus processos de

3Festival de cinema de Cannes: O mais antigo e renomado festival do cinema mundial. Criado em 1939 com o nome. Festival Internacional de Filme, apenas após a 2ª Guerra Mundial em 1946, o festival retorna com o nome que o designa atualmente. Disponível em: < www.festival-cannes.com> acesso em 16 de set. 2009.

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desenvolvimento nesta fase da cinematografia nacional, cineastas respeitáveis,

porém inexperientes administrativamente, lidaram de forma equivocada quanto ao

tratamento das relações de suas obras e concepções individuais com o público e

crítica, ou seja, “se mauro é à hora e a vez do céu estrelado, instância de uma

felicidade que, embora frágil, é inspiradora, Mario Peixoto, Alberto Cavalcanti e Lima

Barreto encarnam experiências trágicas” (ROCHA, 1963, p.13).

Mario Peixoto drasticamente teria sido asfixiado pela mitologia criada em

torno do seu nome e as críticas elogiosas da imprensa especializada, enquanto que

Alberto Cavalcanti apresentaria o equívoco de não ter absorvido a experiência de

cineastas predominantes, tais como Humberto Mauro, Alex Viany, José Carlos Burne

e Nelson Pereira, concebendo as suas obras a partir da estética convencional do

cinema inglês em contraposição da estética literária nordestina. Na prática,

“Cavalcanti, teria contaminado seus filmes de academismo. Há o melhor de Simão, o

caolho (1952), “filme injustiçado”. Mas O Canto do Mar (1953) desperdiça tema

essencial” (ROCHA, 1963, p.13).

Lima Barreto, foi um caso em que a competência e a visão de um cineasta

que percebia a riqueza estética à disposição, proporcionaram a si mesmo, embora

considerado o que havia de melhor no estúdio Vera Cruz, uma situação de

desmedido descontrole sobre as suas vaidades na execução de O Cangaceiro, em

que a produção da obra em questão foi uma experiência desequilibrante em termos

de orçamento pelos excessos cometidos pelo cineasta. Por outro lado, no que

concerne à questão da indústria do cinema de massa dentro deste contexto

histórico, no caso, a Cinédia Filmes e a Atlântida Filmes recebem a interpretação de

que acima de tudo procuravam uma concepção estética mimética em face da

influência do cinema norte-americano, que ofuscava a busca por parte dos cineastas

de uma estética do cinema brasileiro (ROCHA, 1963).

Em suma, é consistente a argüição de que a questão do cinema conceitual e

a indústria do cinema de massa no Brasil dos anos 50 culminaram em uma

dissociação causada pelo desaparecimento dos estúdios Cinédia Filmes e Atlântida

Filmes, conforme anteriormente citado, que adotavam a ideologia da indústria do

cinema e o estúdio Vera Cruz que buscou produzir obras cinematográficas sob outro

ângulo, que não as da indústria do cinema do entretenimento.

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1.1.4 O Cinema Novo

Com o surgimento do Cinema Novo as propostas dos discursos defendem um

posicionamento heterogêneo em relação ao contexto histórico do cinema brasileiro,

até então voltados para uma difusão estética de estado e da indústria cultural do

cinema. Por este motivo, o movimento em discussão tem como marco inicial o filme

Os Cafajestes (1962), de Ruy Guerra. Tal obra atingiu e envolveu o grande público

no Brasil, sendo considerado o primeiro sucesso comercial de um filme que possuía

baixo orçamento e era integralmente distante do sistema de produção característico

das chanchadas e de filmes de grandes estúdios como a Vera Cruz (FIGUEIRÔA,

2004).

O filme que determina o início da era do cinema novo brasileiro é Rio 40

Graus (1955) de Nelson Pereira dos Santos, a obra em discussão possuía como

temática o retrato das posições políticas dentro da realidade sob a ótica da

dependência econômica do país pelo capital privado internacional. Por esta razão,

de certa forma, o movimento do cinema novo brasileiro “atraiu mais facilmente a

atenção para si dos outros novos cinemas, pois foi o primeiro proveniente de um

país que poderia responder aos problemas culturais da crítica cinematográfica”

(FIGUEIRÔA, 2004, p.21).

O filme Rio 40 Graus (1955) de Nelson Pereira foi antes de tudo uma

proposta diferente das produções formuladas pelo estúdio Vera Cruz e das

chanchadas, o discurso da peça cinematográfica em questão assumia um papel de

conduzir a platéia a encarar a realidade do dia a dia, seus problemas sociais,

econômicos, políticos e as lutas de classes envolvidas no contexto (ROCHA, 1980).

Rocha (1963) acrescenta que o movimento do Cinema Novo, iniciado com

Nelson Pereira dos Santos, recebeu valorosa contribuição de outros cineastas que

construíram o início de um cinema renovado no Brasil. A título de exemplificação

temos os filmes, Expressão da Cultura Brasileira na Idade do Cinema (1961), de

Saraceni e Ruy Guerra, Cinco vezes favela (1962), de Walter da Silveira, Aruanda

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(1959), de Linduarte Noronha e Os Cafajestes (1962), de Ruy Guerra. Todos estes

documentários que seguiam a definição estética por excelência do ideal libertário

proposto pelo Cinema Novo que era essencialmente desnudar a sociedade através

de uma visão autêntica e realista.

Sobre a autenticidade do discurso cinematográfico em face da realidade dos

fatos, Xavier (1983) entende que comentar o cinema novo nos anos 60 é sem duvida

alguma mencionar a estética da fome e da miséria na visão de Glauber Rocha. Por

se tratar de uma metáfora estética, a discussão do seu estilo de filmar perpassava

pela limitação de recursos, onde a composição dos filmes acompanhava esta

orientação como um todo, assim, freqüentemente os recursos disponibilizados para

as produções das peças cinematográficas eram parcos. Em referência ao ideário

estabelecido pelo movimento do cinema novo, Glauber Rocha deliberadamente

invertia os processos de concepção e construção de suas obras em oposição à

estética do cinema moldado a partir do ideológico cinematográfico industrial, pois

assim sendo, “a carência deixa de ser obstáculo e passa a ser assumida como fator

constituinte da obra, elemento que informa a sua estrutura e do qual se extrai a força

da expressão” (XAVIER, 1983, p.13).

Xavier (1983) entende em acréscimo a discussão que Glauber Rocha,

entendia que a estética da fome na sua visão indubitavelmente permitia transformar

uma fraqueza em uma potência, para tanto, todo o processo de construção da

linguagem estética do subdesenvolvimento em seus filmes, exigia a própria

experiência das limitações materiais como forma de apreender os recursos

emocionais e mentais necessários para a produção de seus filmes, em específico,

os atores envolvidos. A partir deste estilo de se fazer filme, a reprodução de uma

realidade onde a base do discurso é a miséria, deveria ser retratado de tal forma que

pudesse ser percebida pela platéia como uma experiência próxima da realidade.

Para compreendermos esta característica estética empregada, é imprescindível

analisar e interpretar duas obras fundamentais do cinema novo assinadas por

Glauber Rocha, que são Barravento (1961- 62) e Deus e o diabo na terra do sol

(1963-64) (XAVIER, 1983).

No filme Barravento, Glauber construiu um discurso onde o tema central é

intrínseco a questão da miséria social a partir da alienação da população pobre e

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negra, o roteiro critica a postura do homem negro brasileiro como um gênero diante

de suas tradições culturais e sua ineficiência em não mudar essa realidade vista

como um retrato histórico escravizante, assim sendo, “desejei um filme de ruptura

formal como objeto de um discurso crítico sobre a miséria dos pescadores negros e

sua passividade mística.” (XAVIER apud ROCHA, 1983, p.24).

Em Deus e o diabo na terra do sol, Xavier (1983) comenta que a

complexidade da situação de escravidão do povo brasileiro pela alienação religiosa

é debatida através do discurso humanista em que Glauber Rocha enaltece a

questão da idéia de destino ainda que metafísico, ser de responsabilidade dos atos

humanos e não divinos. De um modo geral, o filme discute a situação do povo pobre

nordestino inserido em um contexto formado pela opressão por parte da classe

detentora do poder, da rebeldia messiânica e da violência do cangaço. Na moral da

estória de Deus e o diabo, estas questões são esclarecidas e sintetiza a essência do

cinema de Glauber Rocha através do personagem do cancioneiro quando o mesmo

diz que “contada a minha história, verdade, imaginação, espero que o sinhô tenha

tirado uma lição: Que assim mal dividido, esse mundo anda errado. Que a terra é o

do homem. não é de Deus nem do diabo.” (XAVIER, 1983, p.89).

1.1.5 O Cinema Marginal de Nelson Rodrigues

De acordo com a SOCINE (2000), paralelamente ao cinema novo e sua

proposta, o cinema brasileiro rendeu à bibliografia de Nelson Rodrigues a produção

de dezessete filmes baseados em peças, romances e crônicas do autor. Produzidos

entre os anos de 1952 e 1990, a filmografia foi dividida em três fases. A primeira de

1962 a 1966 com os filmes A Boca de ouro (1962), Bonitinha, mas ordinária (1963),

Asfalto selvagem (1964), A falecida (1965), O beijo (1966) e Engraçadinha depois

dos trinta (1966). A segunda fase apresenta dois filmes rodrigueanos sob a tutela do

diretor Arnaldo Jabor: Toda nudez será castigada (1973) e O casamento (1975). A

terceira fase compreende os filmes lançados entre 1978 e 1983: A dama do lotação

(1978), Os sete gatinhos (1980), O beijo no asfalto (1980), Bonitinha, mas ordinária

(1980), Engraçadinha (1981) e Perdoa-me por me traíres (1983) além de Meu

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destino é pecar (1952) e Boca de ouro (1990), ambos os filmes que não surtiram o

impacto que corresponde à obra literária do autor.

Sobre a filmografia de Nelson Rodrigues, Rocha (1963) menciona que tanto

diretores de teatro como os de cinema, consideraram-no como pornográfico ou

expressionista, porém, a definição mais relevante e minuciosa a despeito de suas

obras adaptadas para o cinema seria a de peças cinematográficas com doses de

“sexo desenfreado e abjeção, ambientados na pequena e alta burguesia, essas são

as principais características que chamaram a atenção dos produtores

cinematográficos.” (BERNARDET, 1967, p.130).

As obras de Nelson Rodrigues tanto na literatura como no cinema seriam

diálogos a respeito das relações das camadas sociais a partir do poder do prazer

sexual sem culpa e do controle da sociedade através da força do dinheiro da classe

burguesa, onde os indivíduos que compõem a maioria da população brasileira são

seres servis com o qual o dinheiro pode tirar qualquer traço de dignidade

(BERNADET, 1967).

1.1.6 O Cinema da Boca do Lixo

Nascido no então quadrilátero do Bairro da Luz, constituído pelas ruas do

triunfo e Vitória, adjacentes das estações de metrô da luz e da antiga rodoviária no

centro de São Paulo, no então ponto de referência cinematográfico no Brasil naquela

época, o Cinema da Boca do Lixo foi sem dúvida o mais eficiente na história da

cinematografia do cinema brasileiro em termos de produções com expressivos

resultados em lucratividade sem a participação de verbas da Embrafilme.

Organizada Com uma estrutura formal de produtores, distribuidores e exibidores, o

Cinema da Boca do Lixo surgiu ainda nos anos 50 através da crônica policial

paulista, mas foi consagrado como tal por meio de uma declaração poética em um

trecho do filme O Bandido da Luz Vermelha (1968) de Rogério Sganzerla (RAMOS e

MIRANDA, 2000).

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Ramos (1995) sobre a eficiência da indústria do Cinema da Boca do Lixo

comenta que entre 1970 – 1980, a indústria do cinema em discussão produziu

material cinematográfico que em arrecadação apresentou uma média variável entre

62,1% (menor índice apresentado no ano de 1978) e 89,1% (maior índice alcançado

em participação no ano de 1973), somente no ano de 1979, 96 filmes foram

lançados no mercado, 56 longas metragens paulistas e 34 cariocas, sendo que

“apenas 8 dos paulistas (1,43%) tiveram apoio da Embraflme, enquanto 30% dos

cariocas contaram com a participação da empresa pública” ( RAMOS, 1995, p.18).

Ramos e Miranda (2000) concordam e acrescentam que além da produção

em média de 60 a 90 filmes anualmente, O Cinema da Boca do Lixo tinha como

diferencial o alto investimento em filmes da chamada produção média que se

caracterizavam por produtos com um acabamento artesanal, mas com um nível de

qualidade que trazia um retorno médio satisfatório em termos de lucro, assegurando

uma base empresarial estável. Tal singularidade de mercado permite apesar de

dividido entre várias produtoras, considerar O Cinema da Boca do Lixo como o que

mais se aproximou conceitualmente de uma indústria cinematográfica brasileira.

A indústria do Cinema da Boca do Lixo como iniciativa puramente comercial

se preocupava exclusivamente em manter uma produção de material que estivesse

em constante ressonância com o gosto popular, sendo que as adequações às

necessidades do público eram baseadas nos números financeiros gerados pelas

bilheterias nos cinemas, se o filme não alcançava o retorno comercial esperado,

adaptavam-se os temas das peças cinematográficas para alcançar os objetivos de

mercado. Esta forma de trabalhar um filme como um produto de consumo por um

mercado, infligia aos profissionais envolvidos, principalmente aos diretores, a

impossibilidade de investir em um cinema autoral, haja vista ser uma indústria de

entretenimento que se preocupava em “adaptar-se as relações de mercado como

uma fornecedora de produtos” (RAMOS e MIRANDA, 2000, p.59).

Conceitualmente os filmes eram conforme a orientação do mercado, voltados

para gêneros de apelo popular ou cinematografia de massa, o principal era a

pornochanchada, gênero que abrigava uma gama de subgêneros e tendências do

cinema erótico tais como, comédias, dramas, horror, policial, suspense e westerns

Page 21: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

21

que possibilitaram, por exemplo, a criação de um Star System4 não muito eficiente,

mas com resultados compensatórios. Proeminentes atrizes da televisão brasileira

tais como Vera Fischer, Helena Ramos, Aldine Miller, Matilde Mastrangi e Zaira

Bueno e atrizes consagradas como Sandra Bréa e Kate Lyra contribuíram em prol

de bilheterias significantemente lucrativas para o mercado da pornochanchada

nacional e elevou o status do Cinema da Boca do Lixo de tal forma que este foi

considerado a Hollywood brasileira do cinema nacional (RAMOS e MIRANDA, 2000).

Segundo dados do Portal do Cinema Brasileiro5, os maiores sucessos da

boca do lixo foram os filmes Independência ou morte (1972), de Carlos Coimbra com

2,974 milhões de espectadores e Coisas eróticas (1982), de Raffaele Rossi e Laente

Calicchio com 4, 525 milhões, além dos filmes A ilha dos prazeres proibidos (1978),

de Carlos Reichenbach, Convite ao prazer (1980), de Walter Hugo Khouri e A filha

de Emmanuelle (1980), de Osvaldo de Oliveira que alcançaram números

expressivos em público e bilheteria. Sobre a filmografia da Boca do Lixo com elenco

de atores e atrizes da televisão temos os filmes Mulher de Todos (1969) de Rogério

Sganzerla. Elenco: Helena Ignez, Stênio Garcia, Jô Soares, Paulo Villaça, Antonio

Pitanga, Abraão Farc, Renato Corrêa e Castro e Thelma Reston. Lúcia MacCartney,

uma Garota de Programa (1971) de David Neves. Elenco: Adriana Pietro, Paulo

Villaça, Isabela, Albino Pinheiro, Nelson Dantas, Márcia Rodrigues, Odete Lara,

Maria Gladys e Rodolfo Arena. Flor da Pele (1976) de Francisco Ramalho Jr. Elenco:

Juca de Oliveira, Denise Bandeira, Beatriz Segall, Ewerton de Castro, Sergio Hingst,

Maria de Castro e Sergio Mamberti e Convite ao Prazer (1980) de Walter Hugo

Khouri. Elenco: Roberto Maya, Sandra Brea, Serafim Gonzales, Helena Ramos,

Aldine Muller, Kate Lyra, Nicole Puzzi, Patrícia Scalvi e Rossana Ghessa.

Como qualquer estrutura comercial, a indústria do Cinema da Boca do Lixo

após surgir, se desenvolver e manter-se no mercado por uma década, entrou em

processo de decadência no final da década de 80 por dois motivos, primeiramente o

desinteresse do público e conseqüentemente o esvaziamento das salas de cinema e

4 Star system: Sistema de "fabricação" de estrelas (atores e atrizes) com o objetivo de encantar as platéias. O ídolo é chamado a encarnar papéis fixos e repetir atuações que o tenham consagrado. Disponível em: < www.webcine.com.br/historia1.htm> acesso em 04 de out. 2009.

5 Portal do Cinema Brasileiro. Disponível em: <www.heco.com.br/index2.php> acesso em 05 de out. 2009.

Page 22: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

22

em segundo a chegada ao Brasil do gênero de sexo explícito da indústria de cinema

Norte Americana (RAMOS e MIRANDA, 2000).

1.1.7 A retomada do cinema brasileiro nas décadas de 80 e 90

O cinema brasileiro na década de 80 foi marcado como um todo por uma

conjuntura de descontinuidade e uma crise de identidade plena. Ab´Sáber (2003)

comenta que analisar e interpretar o movimento cinematográfico deste período é

antes de tudo uma tarefa penosa e com grandes dificuldades, pois segundo a sua

visão foi “ o último dos momentos significativos do cinema brasileiro antes do fim”

(AB´SÁBER, 2003, p.14).

Ramos (1995) esclarece acrescentando que a questão da descontinuidade

histórica da cinematografia brasileira em termos de produção foi o fator

preponderante que culminou no panorama do cinema nacional nos anos 80. Tal fato

foi gerado por um processo de desconstrução do cinema brasileiro que se iniciou na

década de 50 e se concretizou nos final dos anos 70 com o desmantelamento das

companhias de cinema tais como a Atlântida Filmes no Rio de Janeiro, a Vera Cruz,

a Maristela Filmes e a Multifilmes no Estado de São Paulo e o encerramento das

atividades das redes de televisão TV Tupi e TV Excelsior, ambas, redes de

televisões que possuíam um posicionamento nacionalista e modernizador a respeito

da produção do cinema brasileiro. Outro fato importante que colaborou com a

derrocada do cinema nacional foi o aparecimento de sistemas de redes de televisão

associados a agências de publicidade e propaganda que, orientados por um

posicionamento puramente comercial, propiciaram a migração do que restava dos

aparatos técnicos, humanos e estruturais do cinema brasileiro industrial para o

cinema publicitário. (RAMOS, 1995)

Portanto, devido a este processo de desconstrução, a revitalização da

produção de filmes no Brasil nos anos 80 permaneceu praticamente nas mãos de

um mercado regional. Batizado de cinema paulista ou jovem cinema paulista. Este

movimento emergiu no frágil panorama do cinema brasileiro buscando

Page 23: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

23

essencialmente afirmar-se através de procedimentos de renovação, vitalização e

competência técnica, onde a promessa era na prática, uma inserção qualitativa de

material cinematográfico visando o cinema comercial brasileiro (AB´SÁBER, 2003).

O panorama geral do movimento do cinema em discussão era a princípio a

esperança de uma nova vida cinematográfica por parte dos cineastas emergentes

onde a ideologia que os orientava era a de um cinema com uma comunicação fácil,

sem rodeios ou tensões culturais, porém, tal processo não se desenvolveu como

esperado e sob o impacto do contexto do país naquele momento histórico, o

movimento em tese decaiu antes mesmo de alcançar uma plenitude. Tal evento se

deve a um “padrão descontínuo da cinematografia, que indica a nunca recuperável

distância entre a atividade cinematográfica geral e seu possível imaginário e as

condições reais de um público culturalmente frágil” (AB´SÁBER, 2003, p.15).

Ab´Sáber (2003) em sua visão, ressalta que em termos de equilíbrio entre a

finalidade de alta penetração na cultura urbana com qualidade técnica que o

movimento do cinema dos anos 80 buscava manter, os filmes a receberem destaque

são, Cidade Oculta (1986) de Chico Botelho, A Dama do Cine Xangai (1987) de

Guilherme de Almeida Prado, Noites Paraguayas (1982) de Aluízio Raulino, A

Marvada Carne (1985) de Andre Klotzel, Anjos da Noite (1987) de Wilson Barros, A

Hora da Estrela (1986) de Suzana Amaral, Vera (1986) de Sergio Toledo e Feliz Ano

Velho (1988) de Roberto Gervitz.

Assim sendo, o cinema brasileiro dos anos 80 ficou marcado por uma estética

que buscou por excelência afastar-se dos extremos ideológicos dos movimentos das

décadas passadas, principalmente o cinema novo e a indústria do cinema dos anos

50, pois “ao contrario do que Adorno anotou a respeito da música nova de

Schoenberg e Stravínski, só o caminho do meio nos leva a algum lugar. Esse desejo

de redução do impacto dos extremos, que configurou um conjunto de obras”

(AB´SÁBER, 2003, p.16).

O cinema da retomada de acordo com Nagib (2002) acontece realmente na

década de 90, especificamente nos anos de 1994 e 1995 quando peças híbridas

ainda dependentes de mecanismos do Estado, tal como a lei de incentivo Rouanet,

surgem no cenário do cinema nacional com certas características singulares, a

primeira de ordem estética, onde na maioria não se convencionava a um gênero

Page 24: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

24

específico e em segundo a questão de se tratar de um cinema onde a questão da

autoria era um ponto relevante no pensamento dos cineastas envolvidos na

construção da cinematografia nacional brasileira desta fase. Filmes como A terceira

Margem do Rio (1994) de Nelson Pereira dos Santos, Alma Corsária (1994) de

Carlos Reichenbach, Capitalismo Selvagem (1994) de André Klotzel, Veja Esta

Canção (1994) de Cacá Diegues, Carlota Joaquina, Princesa do Brasil (1995) de

Carla Camurati e Terra Estrangeira (1995) de Walter Salles e Daniela Thomas,

buscaram essencialmente retratar um novo Brasil, de um país que precisava ser

redescoberto como pátria, haja vista o filme Central do Brasil (1998) de Walter Salles

que é considerado como o ícone da retomada do cinema neste período, ter

convergido o seu discurso em um sentido de abraçar os vários discursos que

somaram e construíram o contexto heterogêneo cultural da sociedade brasileira.

Desta maneira de discutir as relações da sociedade, uma característica

surgiu e se tornou recorrente até aos dias atuais que é o de cineastas oriundos da

classe dominante desenvolver peças cinematográficas a partir de um olhar

antropológico em relação às classes sociais principalmente as pobres e suas

culturas (NAGIB, 2002).

1.2 O Gênero Policial no Cinema Brasileiro

Para se compreender o fenômeno cinematográfico Tropa de Elite, a

discussão deste capítulo buscará ilustrar o conceito do gênero e levantar a biografia

do gênero do cinema policial brasileiro com o intuito de se apresentar uma imagem

concisa a respeito do assunto. Desta discussão, esclarecer se este gênero de

cinema através do seu contexto histórico contribuiu para os resultados alcançados

em mídia e público pelo filme Tropa de Elite.

Ramos (1995) define o conceito de gênero policial como sendo um produto

da arte do cinema que envolve o espectador com narrativas arquitetadas a partir da

união de ação eletrizante, atmosfera enigmática e correlações de conflitos com o

objetivo estratégico de deslumbrar e seduzir a platéia. O gênero de cinema em tese

Page 25: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

25

possui presença significante na história das produções cinematográficas e da

teledramaturgia nacional, mesmo não possuindo uma tradição com continuidades e

serializações que correspondam adequadamente à idéia de uma indústria cultural

integralmente formal.

Almeida (2006) concorda quanto à questão da falta de historicidade da

produção cinematográfica policial brasileira que a justifique como uma indústria de

cultura de massa, acrescentando ao tema que os gêneros ficcionais, tanto na

literatura como no cinema, possuem um espaço relativamente aberto e flexível, onde

muitas vezes os limites não estão claramente demarcados, porém, mais que um

histórico cinematográfico consistente, o autor em questão argumenta que o cinema

policial brasileiro carece, sim, é de uma urgência conceitual que o posicione de

forma adequada.

Almeida (2006) entende que é arriscada uma conceituação do gênero policial

brasileiro, haja vista, a existência de definições a respeito do gênero em que as

óticas do cinema Americano e Francês sobrepõem o conceito do gênero

mundialmente. A questão pontual a ser observada é de que existe uma

multiplicidade de rótulos, gêneros e subgêneros tais como thriller6, filme policial, film

noir7, filme de gângster, filme de detetive, filme de suspense e filme de mistério que

dificultam uma visão integral sobre o gênero, por outro lado, Torna-se proveitoso,

portanto, voltar ao conceito largamente compreendido de thriller como estância

global e enquanto supergênero capaz de acolher em seus procedimentos

excepcionalmente flexíveis, numerosas manifestações de caráter mais ou menos

familiares. Dentro de suas coordenadas, abre-se passagem para a aparição, a

formalização progressiva e o aumento de um movimento multiforme com raízes

históricas capazes de conceber em sua essência, uma visão singular do gênero,

este seria “um antecedente germinativo (o cinema de gângster dos anos trinta), uma

6 Thriller: palavra inglesa derivada de thrill (calafrio, estremecimento). Narrativa ficcional, peça de teatro ou filme caracterizado por uma atmosfera de suspense geralmente assente numa intriga de crime, mistério ou espionagem; Disponível em: < http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa> acesso em 29 de set. 2009. 7 Film Noir: Termo que Traduzido literalmente significa: Filme Preto. Movimento do cinema influenciado pelo Expressionismo alemão, pelo Realismo Poético francês e pelo Romance policial. Disponível em: < www.interrogacaofilmes.com/textos.asp?texto=11> acesso em 29 de set.2009.

Page 26: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

26

derivação transitiva (o cinema de denúncia social) um gênero nuclear de pertinência

restringida e estrita delimitação temporal”. (ALMEIDA, 2002, p.128).

O cinema policial brasileiro inclui-se na definição de cinematografia de

denúncia social através da primeira obra brasileira do gênero. Os estranguladores,

de Giuseppe Lablanca e Antonio Leal estreou em 1908, sendo que “no cinema

brasileiro, ele marca a criação do gênero policial, na época sempre baseado em

crimes reais, de grande repercussão”. (MORENO, 1994, p.28).

O filme narra a reconstituição do assassinato de dois meninos por uma

quadrilha de marginais na cidade do Rio de Janeiro em 1906, sendo que a partir

desta obra, outras produções do gênero neste período da historia do cinema

brasileiro foram apresentadas ao público, tais como: O crime da mala, (1908) de

Alberto Botelho. A mala sinistra, (1908) de Júlio Ferrez. Assaltos e roubos, um crime

sensacional (1913) e o caso dos caixotes, (1914) ambos dos irmãos Botelho.

(ALMEIDA, 2006).

Apenas na década de 50 é que o gênero de filme policial no Brasil volta a

produzir peças cinematográficas, onde a busca neste momento é o da

industrialização do cinema. O gênero em questão evolui neste ambiente através das

chanchadas com filmes como Amei um Bicheiro (1952), A Senda do Crime (1954) e

Quem Matou Anabela (1956) que possuíam a estrutura de roteiro baseados na

figura central do jornalista como herói substituindo a do detetive envolto em

situações de lenocínio, seqüestro, extorsão e traição (ALMEIDA,2006).

Almeida (2002) comenta que o cinema policial brasileiro apos anos de

estagnação, é retomado nos anos 60 mantendo a característica de se basear em

fatos jornalísticos da época. Os filmes que marcam esta volta do gênero são: Cidade

Ameaçada (1960) e o Assalto ao Trem Pagador (1962), ambos de Roberto Farias,

mas são os filmes autobiográficos envolvendo policiais e bandidos tais como:

Paraíba, Vida e Morte de um Bandido (1966), de Vitor Lima, Mineirinho, Vivo ou

Morto (1967) de Aurélio Teixeira, Perpétuo Contra o Esquadrão da Morte (1967) de

Miguel Borges e Lúcio Flávio, O Passageiro da Agonia (1977) de Hector Babenco é

que se tornam uma oportunidade real de sucesso para os seus idealizadores.

Page 27: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

27

Sobre o discurso do cinema policial dos anos 60 e 70, Lúcio Flávio, O

Passageiro da Agonia de Hector Babenco é a matriz referencial para a compreensão

desta narrativa, onde o bandido é o herói do filme em uma trama montada com

personagens icônicos e corriqueiros, ou seja, “a princesa, os antagonistas (policiais

corruptos e transgressores da lei), o velho protetor do herói que inclusive dá a ele

um objeto mágico, no caso, um colar de umbanda” (RAMOS, 1995, p.156).

Outra propriedade do filme policial na década de 60 e 70 é a manutenção da

presença da figura do jornalista na narrativa dos filmes. Em Lúcio Flávio, O

Passageiro da Agonia, por exemplo, a presença deste profissional é inserida no

contexto do filme como uma espécie de testemunha ocular da história e em muitas

situações, o mesmo se torna uma versão genérica de um detetive, fato é que no

início da obra de cinema em tese, a apresentação começa “com um letreiro

explicando a atuação do Esquadrão da Morte nos anos 60 e que Lúcio Flávio pouco

antes de sua morte, contou esta história ao repórter” (RAMOS, 1995, p.159).

Na contramão da estética de filmes como Lúcio Flávio, O Passageiro da

Agonia, Ramos (1995), menciona que nos anos 60, a cinematografia nacional

audaciosamente empreendeu a primeira e única serialização de gênero policial. O

Vigilante Rodoviário (1960 - 1962) e A Volta do Vigilante Rodoviário (1978) de Ary

Fernandes surgiram em um cenário em que as produções de séries para a televisão

estavam sob domínio das empresas de cinema estrangeiras, sendo considerado um

projeto heróico devido às condições da produção do cinema e da televisão brasileira

na época.

Page 28: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

28

Figura 1: Cartaz promocional de lançamento da série Vigilante Rodoviário.

(1960-1962)

O Vigilante Rodoviário foi um projeto idealizado por dois profissionais de

cinema oriundos da extinta Maristela Filmes, o produtor Alfredo Palacios e o diretor

Ary Fernandes, ambos atuavam em produções publicitárias e influenciados pelo

segmento de séries de ação e aventura estrangeiras inseridas na programação da

televisão brasileira, tais como Rin Tin Tin e Patrulha Rodoviária, idealizam um

projeto piloto. A idéia central era nacionalizar os seriados, apesar de que na visão de

Palacios, a idéia de nacionalização não era a razão principal do projeto e sim

demonstrar a capacidade do cineasta brasileiro em produzir filmes com a mesma

qualidade das séries policiais americanas (RAMOS, 1995).

De acordo com dados do Novo Milênio8 a série Vigilante Rodoviário estreou

na televisão brasileira com o episódio O Roubo do Diamante Gran Mongol (1961), as

20 h da noite de março de 1961 pela TV Tupi após o telejornal Repórter Esso.

Centrada na figura do herói policial rodoviário, o personagem Inspetor Carlos e seu

companheiro de aventura, um cão policial batizado de “lobo” percorria as estradas

8 Histórias e lendas de Santos. O vigilante Rodoviário começou em Santos. Disponível em< www.novomilenio.inf.br/santos/h0247.htm> acesso em 06 de out. 2009.

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29

do Estado de São Paulo em um Simca Chambord9 nas cores preto e amarelo e uma

moto Harley-Davison10 combatendo as atividades criminosas ocorridas nas estradas.

O Vigilante Rodoviário foi para as telas de cinema em três oportunidades, a trilogia é

constituída dos filmes O Vigilante Rodoviário (1962), O Vigilante Contra o Crime

(1963), e O Vigilante e os Cinco Valentes (1964). Em O Retorno do Vigilante

Rodoviário (1978), com a presença do ator do SBT11, Antonio Fonzar vivendo o

papel do vigilante Carlos, não passou do filme piloto devido ao encerramento das

atividades da Embrafilme, não estreando nas telas dos cinemas no Brasil daquele

ano.12

Figura 2: Cena da versão de 1978 da série Vigilante Rodoviário.

Sobre a proposta dos filmes do Vigilante Rodoviário, o cineasta Ary

Fernandes argumenta que a idéia de um herói brasileiro lhe vinha à mente quando

ainda garoto ia ao cinema assistir filmes do gênero e não entendia o porquê da

inexistência de um herói nacional, passados anos na vida adulta, durante as várias

9 Simca Chambord: Automóvel de Origem francesa importado para o Brasil na década de 60 dotado de um motor V8 de 2.531 cc de potência deixou de ser fabricado em 1967. Disponível em: <www.quatrorodas.abril.com.br/classicos/brasileiros/conteudo_143501.shtml> acesso em 06 de out.2009. 10 Harley Davidson: Motocicleta de origem Norte Americana. Fábrica fundada em 1903 pelos sócios Bill Harley e Willian Davidson na cidade Milwauke. Estado de Wisconsin. Disponível em: www.harleydavidson.com.br acesso em 06 de out. 2009. 11 SBT: Sistema Brasileiro de Televisão. Empresa Privada de Comunicação de Massa. 12 O Vigilante Rodoviário. Site Oficial da Série: Disponível em: www.vigilanterodoviario.com acesso em 06 de out.2009.

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filmagens que produzia viajando pelas estradas, convivia freqüentemente com os

policiais Rodoviários, deste relacionamento surgiu à idéia de criar um herói que na

época seria bem visto pela platéia, no caso, a figura do Policial Rodoviário. 13

O sucesso de O vigilante Rodoviário foi tal que na década de 80 quando da

estréia nas televisões brasileira da série policial Norte Americana Chips14, baseada

também em heróis policiais rodoviários, na ocasião da promoção da série no Brasil,

os atores principais do seriado, Larry Wilcox e Erik Strada fizeram questão de

conhecer o então patrulheiro rodoviário Carlos Miranda e a corporação da Polícia

Rodoviária do Estado de São Paulo.15

Figura 3: Carlos Miranda (à direita, atrás) e a ator Larry Wilcox (ajoelhado a frente) da série Chips.

Porém a empreitada de O vigilante Rodoviário bem como a do cinema dos

anos 60 e70 e seus gêneros chegariam ao fim devido à descontinuidade histórica do

cinema brasileiro onde neste momento, a telenovela e os seriados Norte-Americanos 13 O Vigilante Rodoviário. Site Oficial da Série: Disponível em: www.vigilanterodoviario.com acesso em 06 de out.2009 14 Chips: Abreviação de Califórnia Highway Patrol: Polícia Rodoviária da Califórnia. Disponível em: < http://www.chp.ca.gov/> acesso em 06 de out. 2009. 15 O Vigilante Rodoviário – parte 1: disponível em: www.tvsinopse.kinghost.net/v/vigilante.htm acesso em 06 de out. 2009.

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31

concorreriam de forma contundente pelos espaços fragilizados de uma indústria de

cinema delibitada e historicamente desorganizada. No caso das telenovelas, a

concorrência era extremamente forte pelo fato da população brasileira ter

apreendido o hábito de assisti-las diariamente, porém, para a produção

cinematográfica brasileira as atitudes corajosas dos produtores de O Vigilante

Rodoviário deixaram através de suas experiências uma lição a ser colocada em

evidência, a de que a produção do cinema brasileiro deveria somar-se a televisão e

a publicidade, fortalecendo a capacidade de influenciação sobre o público,

transformando o filme em um produto de consumo (RAMOS, 1995).

A retomada do cinema policial brasileiro só viria acontecer a partir do final da

década de 90 e na 1ª década do 3º milênio com os filmes Cidade de Deus, Ônibus

174 e Tropa de Elite. A pesquisadora de cinema e professora da UFRJ, Ivanna

Bentes defende que parte do contexto do cinema policial brasileiro atual é um reflexo

da abordagem social executada pelo cinema dos anos 60 tendo como referência o

subúrbio, a favela e o sertão nordestino, a mesma afirma que a questão da estética

ou da cosmética da fome é um assunto que foi abordado nos filmes Vidas secas, Rio

Zona Norte e Rio 40 graus, de Nelson Pereira dos Santos; Deus e o diabo na terra

do sol, Câncer e O dragão da maldade contra o santo guerreiro, de Glauber Rocha;

Cinco vezes favela; Os fuzis, de Ruy Guerra; A hora e a vez de Augusto Matraga, de

Roberto Santos e A grande cidade, de Cacá Diegues, onde a favela e o sertão

nordestino cruzam-se em suas similaridades históricas com os personagens comuns

a ambos os territórios e suas características preservadas, ou seja, o misticismo, a

miséria e o folclore típico desta comunidades que somadas, formaram um cartão

postal histórico de perversidade.16

Contudo é da opinião da crítica de cinema Neusa Barbosa que é necessário

investigar intimamente se o filme Cidade de Deus é legitimamente uma obra que

retrata de forma correta ou não a questão da miséria, se o filme O Invasor realmente

16CINEMA Brasileiro em debate. Revista BRAVO. São Paulo, ano 1. Jan.2008 Disponível em: <bravonline. abril.com. br/conteudo/assunto/assuntos_291145.shtml> acesso em 27 de set. 2009.

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concentra-se no tema do foco do poder e se Orfeu é um filme verdadeiro em face da

realidade do narcotráfico.17

Sobre o filme Tropa de Elite, Fernando Meirelles (2007), diretor de Cidade de

Deus enfatiza de que o filme foi impactante dentro da sociedade onde o retorno de

mídia conquistado pela obra de José Padilha alcançou um patamar jamais visto por

um filme brasileiro. O diretor ainda acrescenta que Tropa de Elite teve mais

repercussão do que Glauber Rocha sendo este heterogêneo a tudo que representa

o cinema novo, pois ao contrário dos filmes de Glauber Rocha, o filme Tropa de Elite

é discutido em todos os lugares.

“Vou a um casamento no Morumbi, e os bacanas estão comentando o filme. Vou tomar um café no boteco, e lá está o jardineiro conversando com a empregada sobre o filme. Acho que o Glauber nunca fez nada com essa dimensão.” (MEIRELLES apud ANJOS, 2007)

Assim sendo, é possível através dos elementos teóricos arregimentados e

discutidos até este ponto chegar à conclusão de que diante da face historiográfica

do cinema policial brasileiro, este não contribuiu teoricamente com os resultados de

mídia e público alcançados pelo filme Tropa de Elite. Tal conclusão se baseou no

fato aqui verificado de que o gênero de cinema policial em tese bem como o cinema

brasileiro como um todo, passaram por um grande e permanente processo de

descontinuidade histórica, seja nos movimentos de cinema em suas respectivas

fases, seja nas tentativas de industrialização e profissionalização do segmento e por

situações geradas pelo contexto sócio histórico do país que em certos momentos

contribuíram para a derrocada da cinematografia nacional.

17 CINEMA Brasileiro em debate. Revista BRAVO. São Paulo, ano 1. Jan.2008 Disponível em: <bravonline. abril.com. br/conteudo/assunto/assuntos_291145.shtml> acesso em 27 de set. 2009.

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33

Portanto, a discussão do tema do cinema policial brasileiro no capítulo

posterior, buscará esmiuçar o fato relevante da figura icônica do herói presente na

narrativa das peças do gênero em questão. Através desta discussão, expor se a

presença mítica de um personagem heróico, no caso em específico, o da figura

dramática do Capitão Nascimento, foi o fator singular que permitiu ao filme Tropa de

Elite, ter alcançado os relevantes resultados de mídia e público

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34

2. O CINEMA POLICIAL E A CONSTRUÇÃO DE MITOS NO BRASIL

2.1 A Conceitualização de Mito

Sejam pelas características particulares, suas oposições, sobreposições e

contextos nos quais estes foram introduzidos, a questão é se o Inspetor Almeida de

O Vigilante Rodoviário e o Capitão Nascimento de Tropa de Elite. Missão Dada é

Missão Cumprida, supostamente são figuras heróicas do cinema policial brasileiro e

a referência teórica que abraça esta tese é o conceito de mito.

De acordo com Rocha (1999), mesmo este considerando o assunto algo de

difícil explanação, permanecer primordialmente na idéia central de um discurso ou

fala de ordem reflexiva, espelhando as contradições, os paradoxos, as dúvidas e

inquietações da alma humana em relação à existência do ser no mundo e suas

relações com o universo tangível e intangível. Este é um conceito que abre enormes

variáveis, pois o mito é parte de um “conjunto de fenômenos cujo sentido é difusa,

pouco nítida e múltipla. Serve para significar muitas coisas, representar varias

idéias, ser usado em vários contextos” (ROCHA, 1999, p. 2).

De fato, a questão da compreensão do mito trata-se do raciocínio sobre um

objeto identificado como tal inconscientemente por parte de um indivíduo e/ou uma

coletividade, em que as finalidades são paradoxalmente ausentes de

racionalizações, projetando na imagem simbólica cultuada, disposições, anseios e

medos emergentes em um período histórico qualquer (ECO, 2006).

Campbell (1990) entende que a dificuldade em se compreender o mito e seu

poder influenciador por parte do homem está no distanciamento provocado pelo

comportamento imediatista presente na vida moderna. As instituições de ensino

superior, por exemplo, mantinham-se distantes das influências dos discursos de

senso comum da vida externa e dos conflitos que estas provocavam, concentrando-

se em manter o desenvolvimento de elocuções que permitiam aos alunos se

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35

voltarem mais para o mundo interior através da leitura de obras de “Platão, Confúcio,

o Buda, Goethe e outros, que falam dos valores eternos, que têm a ver com o centro

de nossas vidas” (CAMPBELL, 1990, p.14).

Com a desvinculação contínua que edificamos em relação a literaturas

consagradas tais como as Gregas, as Latinas e a Bíblica, uma gama enorme de

informações mitológicas ocidentais perderam-se no esquecimento. Tais estruturas

informativas outrora se mantinham presentes na memória dos indivíduos, lhes

concedendo uma visão relevante dos fatos que ocorriam no dia a dia, em que a

descoberta de uma correspondência entre o mitológico e a realidade o sujeito

encontrava sentido a sua existência. Com o abandono desta relação analógica entre

mito, realidade e sujeito, perdeu-se algo essencial, e com essa perda, não tínhamos

nada idêntico para colocar no lugar (CAMPBELL, 1990).

Jung (1993) acrescenta que o cerne da ruptura do simbólico por parte do

homem moderno estruturou-se com base no desenvolvimento da racionalidade

humana através dos tempos, em que pensamentos e ações o elevaram a um grau

de relação com o mundo de tal forma que rituais primitivos perderam os sentidos,

seja pelos cânticos, evocados com o auxílio de instrumentos de ritmos percussivos,

ou pela oração, ambos, diálogos proferidos em busca dos deuses e da proteção

divina. O fato é que o homem civilizado adquiriu uma potencialidade inversa à

dependência da divindade que é à força da vontade em suas ações de trabalho,

dispensando gradativamente a comunicação com o divino como meio de ampará-lo

em seus intentos, ao contrário do “homem primitivo que parece estar a cada passo,

tolhido por medos, superstições e outras barreiras invisíveis.” (JUNG, 1993, p.8).

A conseqüência de uma relação distanciada do mítico simbólico foi a nossa

insustentável inabilidade atual para a introspecção, pois apesar de toda a

capacidade de racionalização e eficácia adquirida pelo homem contemporâneo, este

continuou em seu íntimo, envolvido por presenças subjetivas fora do seu controle,

ou seja, simplesmente os deuses e demônios que outrora o conduziam ou o

perturbavam não se esvaeceram, de fato estes se conservaram profundamente na

alma humana na forma de “inquietude, com apreensões vagas, com complicações

psicológicas, com uma insaciável necessidade de pílulas, álcool, fumo, alimento e,

acima de tudo, com uma enorme coleção de neuroses” (JUNG, 1993, p.8).

Page 36: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

36

Segundo Rocha (1993) o mito, pela visão antropológica, é um fenômeno

narrativo que remonta às origens da humanidade. Tal raciocínio fez surgir à grande

dificuldade da mitologia que é o da correspondência entre a realidade factual

histórica e a veracidade das informações mitológicas encontradas em várias

culturas, pois surge “o problema da localização do mito no tempo. Quando surgem

os mitos? Quando aconteceram os fatos sobre os quais eles falam? Estas questões

foram o pretexto para várias polêmicas, análises e estudos” (ROCHA, 1999, p. 3).

Em termos de interpretações analíticas, Rocha (1999) argumenta que a

mitologia examinada a partir do ponto de vista da antropologia propiciou uma leitura

mais clara das sociedades antigas, visto que as narrativas mitológicas dos povos

antigos forneciam material valoroso para a compreensão, por exemplo, de suas

estruturas sociais. O mito possui a capacidade de revelar o modo de pensar, a

concepção de existência e a forma de relações que os homens mantinham entre si e

o mundo ao seu redor, este processo de análise é de clara compreensão quando se

investiga “um único mito ou grupos de mitos e até mesmo da mitologia completa de

uma sociedade” (ROCHA, 1999, p.4).

Jung (1993) afirma que, do ponto de vista da psicanálise, os mitos surgiram

através dos arquétipos construídos durante os primórdios da humanidade que

somados constituíram a estrutura do inconsciente coletivo humano, assim sendo, as

figuras mitológicas se tornaram o meio com o qual os arquétipos na forma de

símbolos ou de sonhos se revelam na consciência, servindo de mediador entre o

inconsciente coletivo e a própria consciência. Supõe-se, freqüentemente, que em

certo momento do período pré-histórico, as imagens mitológicas primárias foram

idealizadas por algum sábio, filósofo ou profeta e, posteriormente, ditas como

verdadeiras por um povo simplório e desprovido de senso crítico. Outro fato

importante é que os arquétipos são estruturas psíquicas presentes em toda a

humanidade e independem dos modelos culturais de uma sociedade ou outra. Tais

estruturas formaram-se com o apoio das experiências humanas vivenciadas

repetidamente por milhares de anos, sendo que as imagens arquetípicas com maior

influência sobre o ser humano são as do “inocente, o órfão, o mártir, o nômade, o

guerreiro e o mago” (LIMA, 2005, p.58).

Page 37: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

37

2.1.1 Os Heróis e os Super-Heróis

Ao contrário do que comumente se imagina, a definição do mítico heróico

perpassa por uma sobreposição simbólica atualmente que está intrinsecamente

centrada na figura do super-herói. Para uma melhor compreensão da diferenciação

dos modelos mítico-heróicos, Viana (2005) explica que a distinção entre o herói e o

super-herói repousa basicamente em um ponto preciso; no herói, a

excepcionalidade de suas ações é derivada de um conjunto de habilidades humanas

possíveis, ou seja, de ordem física, mental e moral. O herói pode constituir-se assim

em um indivíduo que, desenvolvendo tais habilidades, torna-o algo concreto,

tangível ao ponto de ser redimensionado para outros níveis de discussão, seja

através das artes literárias, cinematográficas e/ou televisivas.

No Super-Herói, a característica principal é o elemento sobre-humano, ou

seja, capacidades especiais que foram herdadas ou geradas por situações

extraordinárias que resultaram em um estado além das aptidões desenvolvidas

naturalmente pelos heróis; o ícone que corresponde e simboliza este nível de

capacidade além do humanamente possível é a figura do Super-Homem sendo que,

“a palavra inglesa “super” tem como correspondente em português a palavra “sobre”,

e isto quer dizer que Super-Homem significa sobre-homem” (VIANA, 2005, p.38).

Eco (2006) acrescenta que ao contrario do herói, a presença do Super-

Homem na sociedade contemporânea se deve ao fato desta se encontrar em um

estado de nivelamento acentuado, em que alterações psicológicas, desilusões de

ordem existencial e sentimentos de inferioridade, estão cada vez mais presentes nas

relações humanas, exigindo um modelo de herói que possua poderes além do

convencional e que abasteça as necessidades de poder do cidadão comum.

Segundo Viana (2005) outra capacidade que diferencia o herói do super-

herói, além das físicas e mentais, é a de ordem tecnológica, esta singularidade nos

heróis contemporâneos são derivadas do acréscimo de vestuário e equipamentos

especiais, que possibilitam feitos além das capacidades humanas comuns. Um

exemplo claro de sobre humanidade de ordem tecnológica esta presente nos heróis

Batman e Homem de Ferro, o primeiro além das habilidades marcias, possui

Page 38: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

38

aparatos de alta tecnologia como armadura de kevlar18, asa voadora, automóvel

blindado e armamento oriundo da arte marcial ninjutsu19·, no caso do Homem de

Ferro, este é revestido de armadura blindada e armamento pesado.

2.1.2 A Figura Mítica do Herói e o Policial

Por estar presente em todas as civilizações e culturas, em várias épocas da

humanidade e em povos que jamais mantiveram relações de trocas culturais, o

arquétipo do guerreiro se consagra como uma forma universal de representação

simbólica. Jung (1993) afirma que o mito do herói é o mais conhecido e exaltado

pela humanidade em todos os tempos, sendo encontrado na mitologia clássica

grega, na Idade Média, no Oriente e nas tribos primitivas contemporâneas, dotado

de um forte poder influenciador e que possui alta importância em termos

psicológicos.

Lima (2005) concorda que a figura mitológica do herói é a encarnação do

arquétipo do guerreiro e acrescenta a discussão do tema que é característica

principal deste arquétipo, conduzir a nossa subjetividade latente a um estado de

expressividade do poder pessoal e assegurar a nossa identidade perante o mundo,

resultando na capacidade intrínseca da autodefesa. Em um nível psicológico, o

indivíduo potencializa a configuração de delimitações salutares entre a ação pessoal

e às ações dos indivíduos, além da disposição de defender os seus direitos.

Intelectualmente, o arquétipo do guerreiro contribui para a capacidade de

aprendizado e discernimento, permitindo escolhas pragmáticas de idéias e valores,

contribuindo para o desenvolvimento pessoal em detrimento de outros. Do ponto de

vista da espiritualidade, o sujeito aprende a diferenciar as energias espirituais,

18 Kevlar: Fibra de alta resistência utilizada para a confecção de coletes a prova de balas e aplicação no revestimento interno de blindagens automotivas. Disponível em: < www2. dupont.com> acesso em 25 de out 2009.

19 Ninjutsu: Arte marcial japonesa que a princípio foi usada para que guerreiros com habilidades especiais pudessem se infiltrar atrás das linhas inimigas e efetuarem serviços de espionagem, posteriormente foi anexado a esta modalidade de guerreiro, as missões de infiltração e assassinato. Disponível em: <www.ninjutsu.com.br/ninjutsu.html> acesso em 25 de out 2009.

Page 39: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

39

separando-as entre forças e teologias, ou seja, as que “trazem mais vida e as que

matam ou mutilam a força vital dentro de nós” (LIMA, 2005, p.59).

Campbell (1990) esclarece que as proezas do herói convencionalmente se

iniciam através da usurpação de algo de valor pessoal ou de ordem coletiva,

forçando o indivíduo a programar uma jornada em que este será inexoravelmente

enredado em situações incomuns, envolvendo o herói em um movimento cíclico

dinâmico de início e retorno. Espiritualmente, o significado da saga do herói abarca o

rito de passagem da criança para o mundo adulto, este caminho a ser percorrido

contempla um ciclo de morte e ressurreição em que o jovem deve morrer para o

mundo infanto-juvenil imaturo e dependente para ressurgir como um homem adulto

auto-responsável e confiante na suas próprias capacidades.

Contudo, para que o arquétipo do guerreiro na figura do mito heróico surja e

corresponda integralmente à psique humana, é preciso que o ego do indivíduo

evolua e se materialize. O intento ocorre quando é acionada a função específica da

figura heróica, que é a da estimulação da consciência do ego humano no sujeito,

dotando-o da capacidade de auto-reconhecimento de suas forças e fraquezas e

preparando-o para as atribulações da vida sensível, ao passo que, conquistado o

nível de amadurecimento típico da vida adulta, “o mito do herói perde a relevância. A

morte simbólica do herói assinala, por assim dizer, a conquista daquela maturidade”

(JUNG, 1993, p.112).

Lima (2005) acrescenta advertindo que o sujeito só tem consciência de seu

teor psíquico quando este se relaciona com o ego, opostamente a relação será em

nível de subconsciência. A relevância da questão reside na importância de se

conhecer os aspectos da inconsciência do indivíduo, pois é nessa relação que se

desenvolve a qualidade das ações dos arquétipos, ou seja, o inconsciente na sua

camada mais aparente engloba conteúdos que já fizeram parte da consciência, mas

que, em certo ponto, são repreendidos por não terem sentido ou serem

incompatíveis com os valores da consciência. A transmissão destes conteúdos se dá

por processo hereditário, no entanto, devido ao fato de vivermos em sociedade,

somos compelidos a nos adaptarmos às convenções e regras impostas pela mesma,

desempenhando freqüentemente papéis que atendam às diretrizes de

comportamento do grupo social em detrimento do que somos realmente.

Page 40: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

40

Tal comportamento diante do grupo social foi nomeado de persona, termo

latino que significa máscara, a função da persona é desempenhar o papel de

intermediador das relações do ego com o mundo exterior do sujeito. A peculiaridade

dessa relação é que quando o ego identifica-se com a persona, este entende que se

trata de uma representação teatral construída pelo indivíduo, neste contexto se

ampara a relação do policial e sua postura diante das convenções sociais que o

orientam, suas representações são moldadas pela sua persona a partir dos

fragmentos da psique coletiva, portanto “a identificação ocorre quando há a fusão

entre o indivíduo e sua profissão. Esta identificação com a persona leva a uma forma

de rigidez ou fragilidade psicológica” (LIMA, 2005, p. 59).

De um modo geral, a força policial é orientada a cumprir disciplinada e

ordenadamente o modelo no qual foram doutrinados, este modelo ampara-se no

cumprimento do dever como prioridade através do sacrifício do policial em favor da

coletividade, sendo exigido que, no cumprimento das missões, o militar em questão

subjugue as emoções, levando em conta sempre o cumprimento dos seus deveres

operacionais baseados nas leis e na justiça, desta forma “o policial, assim como o

guerreiro, lutam pelo bem coletivo. Ele é o herói que vai superar desafios por um

ideal” (LIMA, 2005, p.60).

Conseqüentemente, se o policial se identifica com o arquétipo do guerreiro na

figura do herói, o mesmo há de se relacionar com a sua característica primária que é

simbolicamente a busca da destruição do dragão, ou seja, assim como o herói, o

policial não enxerga o delinqüente como alguém a ser exterminado, mas como uma

pessoa que deve ser reconduzida aos padrões convencionados como civilizados

pela sociedade. No entanto, o policial sob a influência de um estado traumático,

dependendo do nível deste, pode não alcançar o patamar esperado pelo arquétipo,

deixando que a sua sombra o domine e encare o marginal “como o inimigo a ser

destruído, transformando o lado bom do arquétipo do guerreiro em exterminador,

sempre acreditando estar fazendo o melhor para a sociedade” (LIMA, 2005, p.61).

Page 41: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

41

2.1.3 Os Heróis policiais Inspetor Almeida e Capitão Nascimento

Com base nas discussões teóricas arregimentadas neste capítulo serão

investigadas as singularidades entre os modelos heróicos dos personagens policiais

com maior relevância na historiografia do cinema policial brasileiro. A análise em

questão tem o objetivo específico de traçar o possível perfil heróico da figura

dramática do Capitão Nascimento do filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão

Cumprida, contrapondo-o com o personagem Inspetor Almeida de O vigilante

Rodoviário conforme mencionado no capitulo 1.

Segundo o diretor e produtor de cinema Ary Fernandes (2009), o personagem

Inspetor Almeida, de O Vigilante Rodoviário, possui em sua estrutura simbólica o

perfil do herói caracterizado pela envergadura moral irrepreensível, com princípios

ideológicos solidificados no combate ao crime através do cumprimento do dever.

Trata-se aqui do modelo clássico de herói, em que as características básicas são a

defesa dos direitos civis dos cidadãos em detrimento próprio se necessário, a

repreensão da delinqüência e a condução dos criminosos para a sentença da justiça

através da aplicação das leis. O arquétipo heróico construído para O Vigilante

Rodoviário segue a construção de um modelo de policial que é equilibrado e cônscio

de suas responsabilidades sem traumas, ou da presença de uma sombra em sua

personalidade que o influencie de forma destrutiva no cumprimento do dever.

No personagem Capitão Nascimento, de Tropa de Elite, Missão Dada é

Missão Cumprida. Ocorre a inversão destes valores devido ao mesmo se encontrar,

de acordo com a narrativa do filme, em uma situação de stress emocional devido a

três fatores: primeiro, no capítulo 2 o personagem encontra-se desiludido

ideologicamente devido ao fato do nível de corrupção entre a polícia e os traficantes

da cidade do Rio de Janeiro evoluir a cada dia; segundo, a esposa grávida que o

pressiona a abandonar o serviço tático do Batalhão de Operações Especiais em

favor do filho que está para nascer e um terceiro fato construído no Capítulo 3 da

narrativa do filme que irá hiperdimensionar os fatores citados anteriormente, que é a

chegada da autoridade papal na cidade do Rio de Janeiro que permanecerá

hospedada na casa da autoridade estadual da Igreja Católica, localizada nas

imediações da favela do Morro do Turano. A partir deste ponto da narrativa, inicia-se

Page 42: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

42

arquetipicamente a jornada do herói policial, em que a busca de um substituto que

ocupe o seu lugar no BOPE lhe proporcionará o direito a uma existência humana

equilibrada, saudável e feliz com a sua família. Sob essas condições psicológicas, o

comportamento do Capitão Nascimento na história sugestiona um estado traumático

em que seus valores como defensor da justiça são tomado pela sua sombra. Nesse

sentido, as suas ações se tornam de caráter destrutivas, punindo policiais corruptos

e traficantes através do uso da tortura e do assassinato para o cumprimento de sua

missão.

Figura 4: Capitão Nascimento (Wagner Moura).

Outro ponto interessante a ser comentado sobre a montagem arquetípica do

herói Capitão Nascimento é o simbolismo implícito do seu nome em relação à

narrativa do filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão Cumprida. Nascimento

segundo a definição do Aurélio online (2009) significa: Ato de nascer; vinda ao

mundo. Procedência pelo sangue. Estirpe, origem. Pois bem, se a conquista da

maturidade psicológica por parte do indivíduo, no rito de passagem da fase infanto-

juvenil para a fase adulta, implica na morte simbólica do herói, a estória narrada na

película em debate sugestiona subjetivamente este processo por meio do

nascimento do filho do personagem, que o impele a uma busca em que ele, o herói,

deve morrer arquetipicamente para assumir um novo papel, em uma nova forma de

representação social.

Page 43: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

43

O diretor do filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão Cumprida, José

Padilha concorda com a situação psicológica do personagem, afirmando que o

Capitão Nascimento sofre de síndrome de pânico, não consegue conciliar o seu

trabalho com a vida familiar e sente-se angustiado com o fato de que a forma dele

combater o crime é insustentável com o conceito de civilização, porém, o diretor em

questão não o considera um herói (PADILHA apud CALIL, 2007).

Em suma, a imagem simbólica projetada através do personagem Capitão

Nascimento no filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão Cumprida, possivelmente

desencadeou o alto retorno em apreciações e discussões por parte do público e da

mídia, por meio da construção arquetípica do guerreiro na figura do herói.

Conseqüentemente este se tornou um objeto que encontrou, por parte da

coletividade, notória correspondência, sejam nas suas disposições, nos seus

anseios e nos medos emergentes presentes no período histórico da exibição da

película em questão.

Em conformidade com o tema aqui discutido, o capítulo subseqüente reunirá

através dos discursos que auxiliaram a construção da narrativa do filme Tropa de

Elite. Missão Dada é Missão Cumprida, dados que permitam em tese, sustentar a

idéia de uma construção mítico-heróica do personagem Capitão Nascimento.

Page 44: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

44

3. A ANÁLISE DOS DISCURSOS DO FILME TROPA DE ELITE

3.1 O Discurso

Ao nos referirmos a processos de comunicação sejam eles quais forem, é

plausível admitirmos a interconexão de vários discursos. Tal conceito, de acordo

com Mussalim e Bentes (2003), se ampara na idéia de que ao empreendermos a

análise do discurso nos processos de linguagem, nos permite a compreensão que

esta pode ser produzida por meio de muitas formas, assim sendo, “toda produção de

linguagem pode ser considerada discurso” (MUSSALIM e BENTES, 2003, p 101).

Hobbes (2002) conceitualiza que a essência do discurso é algo que deva ser

conduzido sempre pelo princípio da aquisição da ciência, seja ele na definição de se

alcançar algo, ou alguma coisa, ou no significado de evitá-los. Em linhas gerais, o

discurso categoriza-se sob duas vertentes, a primeira em nível de plano mental,

onde este, constituídos de pensamentos, nos propõe a possibilidade de algo ou

alguma coisa que venha ser ou não, assim sendo, trata-se de objeto especulativo

que leva em conta a relatividade das coisas em busca da verdade, haja vista a

ciência em seu juízo não ser absolutista, mas sim condicionante quanto à análise

dos fatos. Porém, quando o discurso é expresso por meio da linguagem, este se

caracteriza pela “definição das palavras e procede mediante a conexão destas em

afirmações gerais, e posteriormente em silogismos. O ponto fim ou soma total é

chamado de conclusão” (HOBBES, 2002, p.56).

A idéia de se conceber uma análise sobre o discurso teve o seu princípio nas

personalidades de Jean Dubois e Michel Pêcheux. Dubois, lingüista e lexicólogo

que em sua época, atuou em ações ligadas à área da lingüística e Pêcheux, filósofo

que era envolvido em debates a respeito das obras marxistas, da psicanálise e da

epistemologia, possuíam em comum a ampla ocupação em favor do ideário de Karl

Marx, da política e de suas convicções partilhadas a respeito da luta de classes, da

história e dos movimentos sociais (MUSSALIM e BENTES apud MALDIDIER, 2003).

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45

O projeto da Análise do Discurso nasce em meio a uma influência de ordem

política, haja vista, ser o objetivo desta inicialmente. Porém apenas em Ideologia e

Aparelhos Ideológicos do Estado (1970) de Loius Althusser é que surge a proposta

de releitura das idéias de Marx, diferenciando a teoria das ideologias particulares, ou

seja, daquelas que revelam as disposições das classes sociais, da teoria da

ideologia geral, que possibilita a compreensão do organismo responsável pela

reprodução das relações de produção comum a todas as ideologias particulares.

(MUSSALIM e BENTES, 2003).

A proposta de Althusser era inicialmente mensurar as qualidades que

determinam o processo de reprodução social a partir da hipótese de que as

ideologias possuem um caráter tangível, ou seja, de que um sistema de idéias possa

ser estudado de forma a concebê-lo como um aparelho que causa as relações de

produção através do seu caráter material; o materialismo como forma de

compreensão dos discursos sugere que o objeto de estudo, ou seja, as ideologias e

suas produções discursivas permaneçam conhecidas, isto é, “independentemente

da produção ou não produção do objeto do conhecimento que lhe corresponde”

(MUSSALIM e BENTES apud PÊCHEUX, 2003, p.103).

Althusser (1985) concebe, através do estudo das obras de Karl Marx com

foco na concepção materialista, que uma sociedade é essencialmente a composição

de infra-estrutura e superestrutura. Tal composição é representada através da

metáfora do edifício, onde as infra-estruturas concebidas pelas classes pertencentes

às forças de produção e relações de produções ocupam a base do edifício social, e

em contraposição a esta, à superestrutura, representada por dois níveis constituídos

pelo poder jurídico-político do Estado e do Direito e as ideológicas, de ordem

religiosa, moral, jurídica e/ou política, ocupando os andares acima. Genericamente,

o Estado é o mecanismo reprimidor do Estado sendo que os objetivos da lutas

classistas objetivam o alcance do poder Estatal e, conseqüentemente, da utilização

da superestrutura em beneficio próprio desta e/ou de outras categorias de classes

associadas ou não em prol da manutenção do poder. Em conformidade com o

assunto em questão, Hobbes (2002) predizia que a função do Estado é, acima de

tudo, proporcionar aos homens, amantes da liberdade, o controle sobre os outros,

introduzindo limitações em prol da conservação destes para uma vida mais

producente e feliz. Do contrário surge a infelicidade das guerras, sendo estas o

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46

resultado da ausência de um Estado que, por meio de um “poder visível capaz de

mantê-los em respeito, forçando-os, por medo do castigo, ao cumprimento de seus

pactos e ao respeito” (HOBBES, 2002, p. 127).

Porém, Viana (2005) concebe as relações de poder entre as classes

dominantes e as classes pertencentes à infra-estrutura através da compreensão e a

aplicação da axiologia. Na axiologia, os valores sociais são produzidos e

disseminados pela classe dominante, em específico os da classe burguesa em favor

dos seus interesses e padrões sociais, as outras classes produzem valores, mas o

que difere é o poder de imposição do discurso axiológico da classe dominante ser

mais eficaz em detrimento das outras, “assim, a axiologia é o padrão dominante de

valores e dizer que algo é axiológico significa dizer que é algo fundado em tais

valores” (VIANA, 2005, p. 43).

O Estado, ou aparelho de Estado, é, segundo a teoria Marxista, um

mecanismo repressivo, constituído de um Governo, estruturas administrativas, forças

militares, tribunais de justiça e presídios, ou seja, tais estruturas aqui mencionadas

funcionam com o uso freqüente da violência de forma ideológica em várias formas e

níveis, por outro lado, temos os aparelhos ideológicos do Estado que funcionam

como matrizes formadoras de discursos ideológicos sejam eles de forma ostensiva,

velada e/ou simbólica. Os aparelhos ideológicos do Estado (AIE) são categorizados

da seguinte forma; AIE Religiosos ou sistemas das várias e diferentes igrejas; AIE

Escolar ou sistemas de ensino público ou privado; AIE Familiar; AIE Jurídico; AIE

Político ou sistema de vários partidos políticos; AIE Sindical; AIE de Informação ou

sistemas de rádio, TV, imprensa falada e escrita e AIE Cultural, ou sistema de

produção cultural, letras, belas artes e esportes (ALTHUSSER, 1985).

O fato singular que pertence aos aparelhos ideológicos de Estado é que estes

operam através da ideologia exclusivamente, mesmo se apresentando

disfarçadamente dispersos, estão unificados pela característica de fazerem parte da

classe dominante e serem os agentes da ideologia dominante. Desta forma, a classe

predominante detém o poder do Estado majoritariamente ou através de alianças

com outras classes. Conseqüentemente, tais grupos assumem o poder sobre os

outros aparelhos ideológicos e aparelhos repressores de Estado, porém observa-se

que “nenhuma classe pode, de forma duradoura, deter o poder do Estado sem

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47

exercer ao mesmo tempo sua hegemonia sobre e nos aparelhos ideológicos do

Estado” (ALTHUSSER, 1985, p.71).

Do ponto de vista da psicanálise lacaniana, o discurso é encarado como fruto

de situações lingüísticas sob a tutela da inconsciência humana. Em tese, os

significantes, ou seja, o conjunto formado por significante e significado de forma

dissimulada, interferem no discurso real, aquele assumido conscientemente pelo

sujeito. Desta forma, o discurso efetivo é desestruturado, inconsistente, por meio da

interferência do discurso inconsciente. Este processo de linguagem funciona através

dos discursos disseminados por fatores que não são controlados pelo indivíduo, ou

seja, a construção do discurso lacaniano pressupõe que a formação do sujeito é

fruto dos vários discursos introduzidos pelo contexto no inconsciente deste, seja

através da família e de outros aparelhos ideológicos que participem ou participaram

do processo de desenvolvimento formativo do indivíduo, assim sendo, a linguagem é

um fato condicionado da inconsciência (MUSSALIM e BENTES apud LACAN, 2003).

É importante efetuar-se uma ressalva de caráter elucidativo quanto à

importância dos levantamentos teóricos até este ponto arregimentados e suas

correlações com o que foi elucidado no capítulo anterior desta obra. Tal observação

diz respeito à correspondência entre o discurso e suas formas de atuação na

formação do sujeito e a construção mítica heróica na sociedade, pois de acordo com

os autores e suas conjecturas, sejam de ordem filosófica, sociológica e psicanalítica,

a construção do mito do herói sustenta-se na consistência teórica deste também

possuir a característica de um discurso. Assim sendo, é plausível considerarmos que

a formação do discurso mítico nas sociedades é construída a partir e sob a égide da

estrutura inconsciente do indivíduo e da coletividade que o influencia e o constrói

como sujeito. Assim sendo, a figura mítica heróica é possivelmente um vigoroso e

contundente condicionador de valores que independe das características discursivas

contextuais de uma sociedade, e quando se faz presente em uma estrutura

narrativa, em que nível for, sobrepõem-se substancialmente sobre os outros

discursos.

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48

3.1.1 O Discurso Simbólico

Se toda produção de linguagem em tese é uma variável discursiva, a

comunicação imagética serve de premissa para o sentido de identificarmos e

indagarmos as estruturas não-verbais que permitiram dar sustentação ao discurso

mítico do personagem Capitão Nascimento no filme Tropa de Elite. Missão Dada é

Missão Cumprida.

Etimologicamente a idéia de símbolo segundo Kast (1997), perpassa pela

compreensão deste enquadrar-se em algo que é composto, ou seja, uma expressão

simbólica que representa algo ou alguma coisa. O fenômeno de comunicar-se

simbolicamente necessita impreterivelmente de um duplo, de uma via entre partes

que se compartilham, pois para que exista uma alegoria, de fato ou de uma idéia a

ser manifestada, é necessário que o elemento simbólico exprima o objeto de

referência. No campo prático, a simbologia expressa o que se encontra em sua

essência velada ou intangível, assim sendo, “na interpretação, procuramos a

realidade invisível por trás deste algo visível e sua conexão” (KAST, 1997, p.19).

Outra característica do símbolo é a sua heterogeneidade funcional em relação

ao sinal. No símbolo, a sua relação com o objeto o qual ele representa, portanto

significa, constitui-se de caráter permanente, indissolúvel e inseparável, ao contrário

do sinal que é uma estrutura mutável devido a este ser o resultado das convenções

humanas. Portanto o sinal é algo que sinaliza alguma coisa, seja de ordem e/ou de

uma espécie quaisquer, ampara-se por meio de uma escala e de um conjunto de

valores variáveis que dependem da sociedade e do contexto sócio-histórico e

cultural que esta se encontre. (KAST, 1997).

Do ponto de vista de Cassirer (2003), o símbolo é interpretado de forma

racionalizada, calcada em idealismos onde é possível mensurar as limitações do

intelectualismo humano frente ao poder do símbolo, de fato, a compreensão

proposta pelo autor em debate sugere a substituição das imagens por estruturas

simbólicas, pois segundo o seu entendimento da matéria, a humanidade passou a

ser simbólica, afastando-se da racionalidade. No símbolo, Cassirer descobriu as

bases que permitem elucidar a simbolização como uma condição universalmente

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49

humana demonstrando que, ao constituir-se uma identidade alegórica em um objeto,

este se converte em formas simbólicas e não mais em objetos pertencentes a uma

realidade tangível (PÁDUA e MAGALHÂES apud CASSIRER, 2003).

Porém, Santaella (2000) adverte em acréscimo ao tema, que o símbolo é um

signo cuja virtude é este ser encontrado nas regras gerais da lei, costumes ou

pactos sociais, onde o mesmo é portador e a sua função como signo dependerá

precisamente dessa lei ou regra que determinara seu interpretante. Desse modo, o

símbolo é um elemento sígnico representativo completo, pois possui uma

iconicidade e um índice de qualidade singular indicando a presença de algo, alguém

ou algum objeto de forma integral e fidedigna. Um símbolo é um signo por

excelência, pelo fato de comunicar uma mensagem visual clara, singular e

qualitativa. Para tanto, este símbolo deve possuir uma composição visual com

elementos definidos e harmonicamente compostos, ou seja, um desenho que

permita ao receptor compreender claramente a mensagem visual direcionada a este.

É importante, contudo, que a teorização da ordem e das características do

signo seja levada em conta para que interpretações que não aquelas que justifiquem

esta obra desmereçam o esforço das elucidações pertinentes.

Peirce (2000) explica que um signo é a representação de algo que significa

alguma coisa. Representa um objeto que foi determinado pelo receptor

(interpretante) como tendo um significado de importância que mereça ou necessita

de uma reprodução de ordem simbólica. Ou, de que um signo, ou representamem, é

aquilo que, sob certa aparência ou caráter, representa algo para alguém, ou seja,

dirige-se a alguma pessoa, isto é, cria na mente dessa pessoa, um símbolo análogo,

ou talvez, um signo mais evoluído (PEIRCE, 2000).

A questão da representatividade sígnica do símbolo, tendo como objeto de

atenção a expressão de elementos invisíveis através de um desenho, é que

qualquer processo de construção visual simbólico ou reprodução de elementos

tangíveis constitui-se um ato de significação, ou seja, de comunicação visual de um

conceito correspondente a um objeto (ECO, 1991).

Page 50: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

50

3.1.2 A Análise dos símbolos no Filme Tropa de Elite

No filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão Cumprida os elementos

simbólicos que representam a estrutura visual que chamam a atenção,

seguramente, repousam em três elementos sígnicos, o símbolo do Batalhão de

Operações Especiais, a cor institucional do batalhão e a música tema do batalhão no

filme.

Sobre o símbolo do BOPE, este é constituído por uma estrutura de símbolos

que, somados, comunicam uma mensagem visual em concordância com a ideologia

da instituição, que é a repressão ao crime através da força. A estrutura simbólica é

composta no primeiro plano por uma reprodução artística de um crânio humano com

uma faca enterrada pela parte superior e guarnecida em segundo plano e acima por

elementos simbólicos monárquicos, ou seja, uma coroa e duas pistolas da época do

Império e, no terceiro plano, um escudo na cor preta e vermelha.

Figura 5: símbolo institucional do BOPE

Analisando o símbolo do BOPE, é perceptível a presença de elementos

sígnicos que emitem a imagem de belicosidade, força, poder e morte. O primeiro e

mais notório é o símbolo da caveira, que sustenta a idéia de destruição. Tal símbolo

que historicamente é retratado como um ícone ligado à pirataria, dentro do contexto

Page 51: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

51

alegórico do BOPE, assume um caráter de violência simbólica, ou intimidação

psicológica, aliado aos elementos armamentistas que sugerem que a instituição

possui um caráter em que o sentimento de temor por ela é o índice.

A cor dos uniformes e viaturas utilizadas pelo BOPE, preta, sugerem a idéia

de furtividade, de sombras, poder e autoridade, haja vista ser de costume carros

oficiais de Estado usar esta cor como forma de representação do poder ideológico

investido.

Figura 6: versão resumida do símbolo

Figura 7: O símbolo do BOPE inserido no contexto do filme

A música tema escolhida pelo diretor do filme José Padilha foi à da banda de

rock nacional tihuana. A composição musical em questão, possui em sua estética

musical, ritmo, melodia e harmonia condizente com a proposta do filme bem como

simbolicamente com o BOPE, de caráter denso, violento e mortalmente rápido como

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52

uma tropa de elite deve se comportar diante da guerra urbana. segue abaixo a

transcrição da letra da musica em questão.

Tihuana Musica: Tropa de Elite Composição: Egypcio / Pg / Román / Baía / Leo / Jonny

E agora o bicho vai pegar!" Tô chegando é de bicho Tô chegando e é de bicho Pode parar com essa história De se fazer de difícil Eu tô! Que eu tô chegando Tô chegando e é de bicho Pode parar com essa marra Pode parando tudo isso... Não dá bobeira não Cê tá na minha mão Segunda-feira É só história prá contar Não vem com idéia não Não quero confusão Mas vamo junto Que hoje o bicho vai pegar Chegou!... Tropa de Elite Osso duro de roer Pega um pega geral Também vai pegar você...(4x) Chega prá lá! Chega prá lá! Chega prá lá! Tô chegando e vou passar Cheguei de repente Vai ser diferente Sai da minha frente Sai da minha frente meu irmão Não! Não vem com isso não Tô chegando é de ladrão Porque quando eu pego Eu levo pela mão Não mando recado Eu vou na contramão... Nao dá bobeira não Cê tá na minha mão Segunda-feira

É só história prá contar Não vem com idéia não Não quero confusão Mas vamo junto que hoje O bicho vai pegar... Tem dia que a criança chora Mas a mãe não escuta E você nada prá fora Mas a vala te puxa Hoje pode ser meu dia Pode até ser o seu A diferença É que eu vou embora Mas eu levo o que é meu... Tropa de Elite Osso duro de roer Pega um pega geral Também vai pegar você...(4x) Muro de concreto Bom de derrubar É Tihuana Pau vai quebrar Tropa de Elite Osso duro de roer Pega um pega geral Também vai pegar você...(4x)

Page 53: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

53

3.1.3 O Discurso Mítico Heróico do Capitão Nascimento

O filme Tropa de Elite. Missão Dada é Missão Cumprida é ambientado em

um cenário onde o herói da película em discussão, o personagem Capitão

Nascimento, se encontra envolvido numa trama em que os aparelhos tanto

repressores e ideológicos de Estado, são os agentes promotores das situações que

envolveram o herói em sua jornada.

Conforme já enunciado no capítulo dois desta obra monográfica, as razões

que levam o personagem a mudar a sua visão, ou seja, a sua ideologia quanto a sua

relação com o aparelho repressor de Estado, ao qual ele pertence e foi doutrinado,

no caso o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Estado do Rio de

Janeiro, é, a princípio, pela presença influente e crescente do aparelho ideológico

familiar, sendo que, com o advento do nascimento do seu filho, a esposa o

pressiona a abandonar as operações táticas do Batalhão em favor de uma vida

familiar segundo os valores que orientam o aparelho em questão. No capitulo 2 do

filme se inicia tal processo de conflito de interesses, segundo o diálogo dos

personagens transcrito abaixo :

Capitão nascimento: Bom dia.

Esposa: Bom dia meu amor. (tom carinhoso, servindo o café da manhã)

Capitão nascimento: deixa eu pegar aqui.(tenso, apressado)

Esposa: peraí meu amor, eu botei a mesa pra você ali, senta lá.

Capitão nascimento: eu vou ter que sair agora amor, vou ter que chegar mais cedo

no batalhão. (voz baixa, intimista)

Esposa: Pô Roberto, você chegou tarde ontem e tá saindo correndo agora (clima

tenso, stress)

Capitão nascimento: (se mantêm em silencio)

Esposa: dormi muito mal essa noite.

Capitão nascimento: tudo bem? O neném tá bem?

Esposa: não tá bem, fico sempre te esperando, fico nervosa e ele acaba sentindo, já

não ganhou peso da ultima vez! (clima tenso)

Capitão nascimento: cê quer que eu faça o quê? Que eu pare de trabalhar? (tenso

stress)

Page 54: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

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Esposa: se eu soubesse que você não ia sair eu não tinha engravidado. (tom sério,

incisivo)

Capitão nascimento: de cabeça baixa e em silêncio

Capitão nascimento: tchau. (seco e sério)

Esposa: Peraí amor! Come um pãozinho, pô, Beto!

Capitão nascimento (narrativa em off): A guerra sempre cobra seu preço. E quando

o preço é alto demais, é hora de pular fora.

Figura 8: O Aparelho Ideológico Familiar.

No capítulo 3 do filme, o fato que o impulsiona definitivamente a percorrer a

saga do herói é a presença do Aparelho ideológico Católico, representado pela

figura da autoridade Papal, que é também o representante de um Aparelho

repressor de Estado, ou seja, o Estado do Vaticano, em visita ao país. Justifica-se

esta observação, pois é de domínio público que se trata de uma instituição que,

dentro do seu contexto sócio-histórico e cultural, promoveu através dos séculos,

empreitadas bélicas de ordem repressora em relação a outras ideologias religiosas,

povos que não comungavam com a mesma ideologia do Estado aqui em discussão,

bem como a própria estrutura de valores da instituição em tese ser, em muitos

momentos, de ordem e princípios sexistas e sectarista.

Sobre este ponto narrado do filme é interessante observar que a autoridade

Papal, representante de um Estado de poder estrangeiro, transparece mesmo que

subjetivamente na narrativa uma relação de medida de poder, pois, mesmo ciente

dos perigos que envolvem a sua presença em uma área de conflito como é o Morro

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do Turano, a autoridade de Estado em questão impõe a sua vontade de permanecer

instalado em um local que representa o poder religioso do Estado do Vaticano no

Brasil, ou seja, na residência do Arcebispo do Estado do Rio de Janeiro como forma

de, hipoteticamente primeiro, demonstrar a força da fé nos preceitos ideológicos da

religião cristã em oposição à pobreza e à criminalidade da comunidade local

desfavorecida ou, segundo, politicamente colocando o aparelho repressor de Estado

local, suas estruturas e os aparelhos ideológicos em uma situação de desconforto

através do poder do julgamento moral católico-cristão.

Tal evento na narrativa da História obriga ao Batalhão de Operações

Especiais (BOPE) viabilizar a Operação Papa João Paulo II no Morro do Turano e é

assim compreendida pelo personagem heróico no capitulo 3:

Capitão Carvalho: Esse cidadão que tá vindo visitar o Rio, acho que vocês sabem

quem é também,só que vocês não sabem é que ele vai dormir na casa do arcebispo

que fica aqui, no Morro do Turano, e a gente é que vai garantir o sonhos dos anjos

dele.

Capitão Nascimento: Carvalho! Carvalho! c ta de sacanagem! O Turano em guerra e

o Papa vai dormir em cima do morro! Porra! Eu pago um hotel em Copacabana pra

ele Coronel!

Coronel: Fiquei um mês tentando convencer o secretário de segurança, mas nem

Deus muda o cronograma do Papa! Ele vai dormir aí e ponto final!

Coronel: e tem outra coisa, nós temos três meses para tentar apaziguar o Turano, o

que nós vamos fazer é incursão diária.

Capitão Nascimento: Não coronel, o senhor me desculpe, mas o senhor concorda

com incursão diária?

Coronel: Nascimento

Capitão Nascimento: É isso mesmo? Nós vamos subir a noite, vamos subir

perdendo efeito surpresa, vamo subir debaixo de tiro!

Coronel: Nascimento (em tom de voz mais sério e incisivo)

Capitão Nascimento: Vai morrer gente, coronel!

Coronel: NASCIMENTO! (irritado) É isso que vai ser feito e a operação começa

amanhã. Fui claro? (tom calmo em voz baixa)

Capitão Nascimento: Sim senhor. (tom de voz baixo e obediente)

Coronel: Dispensados

Page 56: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

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Capitão Nascimento: (narrativa em off, reflexivo, musica incidental em background,

clima de tensão): Eu sei que o papa não tem culpa dos meus problemas, mas ele

tinha vindo ao Rio de Janeiro duas vezes, será que ele não dava pra saber como é

que a banda toca por aqui? . É claro que político nenhum quer ver o Papa baleado

em na sua cidade. Se o Papa quer ficar perto de uma favela, que que ceis acham

que o Governador vai fazer? Correr o risco de uma bala perdida acertar a cabeça de

sua santidade? (tom irônico) É claro que não parceiro! Ele vai ligar pro BOPE.

Figura 9: Os aparelhos de estado e os conflitos de interesse.

Outro ponto que motiva a busca do Capitão Nascimento em uma mudança

em sua vida está na desilusão ideológica que ele sente por causa da relação

perniciosa crescente entre dois poderes repressores, de um ladoas Polícias Militares

do Rio de Janeiro, ou convencionais, como são chamados pelo personagem e, de

outro, os traficantes dos morros da cidade do Rio de Janeiro. Essa desilusão é

expressa claramente no capitulo 2 quando ao autorizar o seu atirador de elite

disparar a sua arma e assassinar um policial militar corrupto e um traficante, o

mesmo trava o seguinte dialogo:

Capitão Nascimento: caralho, que vontade de meter tiro nesses filhos da puta.

Atirador de elite: qual deles meu capitão? É só falar.

Capitão Nascimento: esses filhos da puta da PM.

Atirador de elite: 01, dá pra matar dois coelhos com uma porrada só aqui, hein!

Capitão Nascimento: é 100 por cento 14?

Page 57: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

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Atirador de elite: caveira, meu capitão!

Capitão Nascimento: então senta o dedo nessa porra!

Capitão Nascimento: (narrativa em off): pra mim quem ajuda traficante a se armar,

também é inimigo.

Figura 10: Capitão Nascimento, corrupção policial e desilusão ideológica.

Assim sendo, é possível mensurar que a partir destas três situações

construídas inicialmente pela narrativa do filme tendo como referência a presença de

vários aparelhos ideológicos de Estado, sejam eles repressores e ideológicos, o

discurso mítico heróico torna-se o foco principal na narrativa da película em

discussão. Outros elementos discursivos compõem a trama, mas com o intuito de

não distanciar-se do tema deste trabalho acadêmico, as análises discursivas serão

mantidas a partir da visão do personagem central do filme, o Capitão Nascimento.

Conforme já mencionado neste trabalho acadêmico, o arquétipo do guerreiro,

do ponto de vista da psicologia, manifesta-se no policial de forma salutar. No

contrário, este é tomado pela sombra de seus medos e traumas instigando-o à

violência e à destruição. Pois bem, se visualizamos a saga do personagem heróico

Capitão Nascimento na trama do filme, este remonta em parte à busca de um

substituto à altura de suas pretensões que, conseqüentemente, permita-o abandonar

as operações táticas do BOPE.

Tal substituto deveria ter qualidades que, segundo o personagem em

discussão, considera o modelo primordial para assumir o seu lugar, ou seja, um

guerreiro que possua inteligência e coração. Os personagens Neto e Matias foram

Page 58: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

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inseridos na trama do filme por se enquadrarem nesta visão do Capitão Nascimento.

Na saga heróica desenvolvida no filme Tropa de Elite, é possível enxergar o modelo

ideal do arquétipo do guerreiro na figura policial contida nestes dois personagens:

seus espíritos se encontram equilibrados e orientados no cumprimento do dever

através das leis e da justiça, com o sacrifício da própria vida se necessário em

defesa do cidadão.

No capitulo 2 da película, são apresentados ao público estes dois

personagens considerados inicialmente tolos e ingênuos quanto à realidade com o

qual estavam prestes a serem submetidos, ou seja, das paredes e da teoria da

Academia da Polícia para a vida difícil dentro de um batalhão, onde os valores

morais e éticos há muito tempo foram corrompidos. Desta forma, a cena em questão

se passa na apresentação dos recém-formados da Academia de Polícia Militar do

Estado do Rio de Janeiro, aspirantes a oficial Neto e Matias ao comando do

batalhão o qual iriam servir.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): e foi aí que o Neto e o Matias entraram na

minha história. Eles começaram como eu, aspirantes de oficial num batalhão

convencional. Eu lembro que no meu primeiro dia de trabalho, pô! Me impressionou

pra caralho! E o neto e o Matias acreditaram na mesma conversa mole de sempre!

Anh! Eram uns anjinhos! Mas era de caras assim que eu precisava, bem, na

verdade, eu precisava da inteligência de um e do coração do outro, se eu pudesse

ter juntado os dois... A minha história não teria sido difícil... Mas quem disse que a

vida é fácil?

Figura 10: Neto e Matias. Modelo de arquetípico heróico ideal

Page 59: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

59

Na operação Morro do Turano, capitulo 4 o personagem Capitão Nascimento

inicia na prática a sua jornada de morte e ressurreição típica do mito heróico, os

vários discursos que formam o contexto do personagem aumentam o conflito dentro

do âmago da personalidade teatral em questão. Pois se de um lado ele tem a

obrigação do dever a cumprir, sob todos os riscos táticos operacionais que esta

operação militar acarreta, por outro, cada vez mais o instinto de sobrevivência em

prol da responsabilidade do estado de paternidade que este irá assumir, emergem

em detrimento dos seus ideais.

O ponto Máximo da narrativa deste capítulo é no momento do interrogatório

que um dos consumidores de drogas sofre nas mãos do Capitão Nascimento em

uma boca de fumo no Morro do Turano, sendo que é bem possível que o público,

apesar da truculência dramatizada, tenha enxergado a figura heróica no

personagem chave da trama pelo uso da força empregada e da personalidade

poderosa construída na cena em análise.

Outro fato da narrativa deste capítulo que pode ter contribuído com a

formação de uma personalidade heróica pelo público esta no discurso expresso pelo

capitão nascimento no momento dos interrogatórios responsabilizando os

consumidores de drogas pela presença do crime organizado nas favelas do Rio de

Janeiro, assim sendo, o personagem em um momento de fúria expressa todos os

discursos que o construíram guiados pela presença cada vez mais atenuada de sua

sombra. A cena assim é transcrita:

Capitão Nascimento: Eu vou perguntar uma vez só! Quem tava com a carga!

(imponente, forte, irritado)

Usuário de drogas: tem ninguém aqui não senhor. (tom baixo, submisso, medo)

Capitão Nascimento: Quem tava com a carga! (tom violento)

Usuário de drogas: eu não sei não. Eu sou estudante

Capitão Nascimento: Quem tava com a carga! Você é o que?!

Usuário de drogas: Eu sou estudante

Capitão Nascimento: você é estudante?! (agarra o usuário de drogas pelo cabelo e o

leva para perto do traficante morto)

Capitão Nascimento: vem aqui estudante, bota a cara aqui! Bota a cara aqui!

Capitão Nascimento: Ta vendo isso aqui! (apontando para o cadáver do traficante)

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Capitão Nascimento: Ta vendo esse buraco aqui! (apontando para o ferimento do

cadáver);

Capitão Nascimento: quem matou esse cara aqui! Quem matou esse cara aqui!

Usuário de drogas: eu não vi! (tom baixo, submisso, pânico);

Capitão Nascimento: você não viu?! Você viu! Quem matou! Pode falar! (tom

incisivo, ira)

Capitão Nascimento: pode falar! Fala! Fala! Quem matou?! (violência física, ódio)

Usuário de drogas: foi um de vocês! (tom baixo, submisso, pânico)

Capitão Nascimento: um de vocês o caralho! Um de vocês é o caralho! Quem

matou esse cara aqui foi você! Seu viado! É você que financia essa merda aqui! Seu

maconheiro! Seu merda!. A gente vem aqui pra desfazer a merda que você faz! É

você quem financia essa merda! Seu viado! (violência física, ódio).

Figura 11: O comércio das drogas e a repreensão policial.

De acordo com o enunciado na revisão teórica a despeito do mito heróico

onde foram discutidas as características do herói contemporâneo, estas se

manifestam no personagem Capitão Nascimento e nos demais componentes do

BOPE. Tais pontos singulares estão presentes primeiramente no alto nível de

treinamento e execução tática de combate, ou seja, capacidades físicas e mentais

acima da média, no vestuário diferenciando e no uso de armamento pesado e

viaturas preparadas para as ações especiais do BOPE, estes últimos,

caracterizando teoricamente poder de ordem tecnológica.

Page 61: Monografia o Mito Heroico No Filme Tropa de Elite

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Tal fato se manifesta no capitulo 1 e em reprise por outra perspectiva no

capítulo 9 da narrativa do filme onde policiais ditos convencionais, estão cercados e

efetuando uma intensa troca de tiros com traficantes de uma favela vizinha ao do

Morro do Turano. A particularidade da narrativa em tese encontra-se na causa do

tiroteio iniciado devido a uma má interpretação do até então aspirante a oficial, o

personagem tenente Neto que efetuou o disparo que culminou no combate aqui

descrito. Certos diálogos bem como a ação desenvolvida, exprimem notoriamente os

poderes sobre-humanos e de ordem tecnológica do BOPE e em específico a da

figura ímpar do personagem Capitão Nascimento. A ação se inicia com a chegada

do pelotão comandado pelo próprio na Favela Babilônia, ele se dirige aos policiais

convencionais que já se encontravam no local e impondo a sua presença, determina

a cadeia de comando. Assim é transcrita a narrativa em questão:

Capítulo 1. (02 minutos e 28 segundos) - confronto armado entre a polícia e

traficantes na Favela Babilônia. Contexto pela perspectiva narrativa do Capitão

Nascimento.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): A minha cidade tem mais 700 favelas, quase

todas dominadas por traficantes armados até os dentes. É só nego de R15, Uzzi, HK

e aí vai. No resto do mundo esse tipo de equipamento é usado na guerra; aqui são

as armas do crime.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Um tiro de 762 atravessa um carro como se

fosse papel e é burrice pensar que numa cidade assim que os policiais vão subir

favela só para fazer valer a lei. Policial tem família amigo, policial também tem medo

de morrer.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): O que aconteceu no Rio de Janeiro era

inevitável, o trafico e a polícia desenvolveram formas pacíficas de convivência, afinal

ninguém quer morrer a toa.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): A verdade é que a paz nessa cidade

depende de um equilíbrio delicado entre a munição dos bandidos e a corrupção dos

policiais. Honestidade não faz parte do jogo.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Quando um convencional honesto sobe

favela parceiro, geralmente dá merda. No rio de janeiro quem quer ser policial tem

que escolher, ou se corrompe, ou se omite ou vai pra guerra e naquela noite o Neto

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e o Matias fizeram a mesma escolha que eu fiz dez anos antes. Eles foram pra

guerra.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Eu não sou um policial convencional, eu sou

do BOPE, da Tropa de Elite da Polícia Militar. Na teoria a gente faz parte da Polícia

Militar, na prática, o BOPE é outra polícia, o nosso símbolo mostra o que acontece

quando a gente entra na favela, e a nossa farda não é azul companheiro, é preta!

Capitão Nascimento: Não vai subir ninguém! Não vai subir ninguém! Vai subir

ninguém! Vai subir ninguém! Vai ficar todo mundo quietinho aí! Não vai subir

ninguém (tom austero, poderoso, firme).

Capitão Nascimento: (narrativa em off): O BOPE foi criado para intervir quando a

polícia convencional não consegue dar jeito. E no Rio de Janeiro, isso acontece o

tempo todo.

Policial convencional: Faca na caveira e nada na carteira!

Policiais convencionais: É isso aí meu irmão! É isso aí cumpade! (comentários

afirmativos em grupo).

Figura 12: Eu não sou um policial convencional, eu sou do BOPE.

Os aparelhos ideológicos e repressores de Estado são peças que parte do

plano de fundo da narrativa, influencia de forma respeitável a jornada do herói

empreendida pelo personagem chave da trama. Assim sendo, o processo de

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construção ideológico de o Capitão Nascimento é resultado em parte do processo de

iniciação no curso de formação do BOPE os quais definem qualitativamente os

valores do ideário do guerreiro presente no discurso do personagem principal. No

capítulo 10 (01hora10minutos e 32segundos), a cena que comunica ao público tal

estrutura de valores define que o policial que pretende pertencer ao Batalhão de

Operações Especiais, deverá passar por um caminho de provações, onde será

medida a capacidade do elemento policial em suportar a dor, a fome, o medo e todo

tipo de intempéries.

A sabatina em questão é assim transcrita:

Capitão Nascimento: (narrativa em off): O neto decidiu entrar para o BOPE porque

ele gostava de guerra, Matias veio junto porque era um policial que acreditava na lei.

O corrupto veio com eles (capitão Fábio), se o Fábio ficasse no Batalhão, o coronel

matava ele... Coitado, o cara não sabia que perto de mim, o coronel era uma moça.

(tom irônico, leviano).

Coronel: Os senhores chegaram aqui pelas suas próprias pernas, ninguém!

Absolutamente ninguém! Os convidou! E nenhum! Nenhum dos senhores é bem

vindo aqui! Preparem suas almas! Porque seus corpos já nos pertencem! eu declaro

aberto o nono curso de operações especiais. (tom austero).

Policiais do BOPE: Nunca serão!

Coronel: Caveiras avançar! (os policiais do BOPE avançam sobre os participantes

do curso e iniciam violência psicológica e física).

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Eu reconheço que pra quem não é iniciado,

o BOPE parece uma seita, mas é assim mesmo que a gente tem que ser.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Os nossos homens são formados na base

da porrada. Pra entrar aqui, o cara tem que provar que agüenta a pressão.

Capitão Nascimento: Você acha que aqui ninguém sabe que você recebe dinheiro

do trafico! Você acha que ninguém sabe que você recebe dinheiro do jogo do bicho!

O senhor sabe por que o seu numero é o zero um? É porque o senhor vai ser o

primeiro a desistir! E eu vou fazer o senhor desistir! (cusparada no rosto do policial

corrupto, tom agressivo)

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Capitão Nascimento: Pede pra sair! Pede pra sair!

Policial corrupto: Não senhor! Não senhor!

Capitão Nascimento: Pede pra sair! Pede pra sair debaixo de porrada!

Policial corrupto: eu desisto! Eu desisto!

Capitão Nascimento: Zero um desistiu!

Capitão Nascimento: (narrativa em off): De cada cem PMS que tentam fazer o

nosso curso, cinco chegam ao fim e quando eu fiz o curso parceiro, foram só três.

Nem o exército de Israel treina soldados como a gente.

Figura 13: Pede pra sair! Pede pra sair!

O ideário baseado nos fortes de alma e coração.

Em formação os policias que passaram pelo primeiro teste moral marcham

rumo ao acampamento aonde será ministrado o Curso de Operações Especiais do

BOPE, cantando o hino belicoso da instituição:

Recrutas (uníssono):

O BOPE tem guerreiros que matam guerrilheiros

Com a faca entre os dentes e esfolam-nos inteiros

Mata! Esfola! Usando sempre o seu! Fuzil!

No BOPE tem guerreiros que acreditam no Brasil!

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Figura 14: Nem o exército de Israel treina soldados como a gente.

Capitão Nascimento: (narrativa em off): Para lutar na guerra contra o tráfico, o cara

tem que ser capaz de agüentar tudo.

No capítulo 16 (01hora 39minutos e 34segundos), a trama chega ao ponto de

intersecção que culminará na materialização da tarefa heróica do Capitão

Nascimento que é de colocar um substituto em seu lugar de comando no BOPE.

Inicialmente a sua preferência era pelo tenente Neto devido a sua

personalidade aguerrida, Com a morte deste, o personagem em análise se vê em

uma situação de consternamento e stress profundo, pois seu plano esta

perigosamente sob o risco de não se concretizar. O ponto a ser observado nos

discursos da cena em questão se encontra na expressão não verbal, ou seja, no ato

simbólico que o Capitão Nascimento efetua ao se dirigir ao caixão do tenente morto

e bruscamente sobrepor sobre a bandeira nacional à bandeira do BOPE. Tal ato

sugere a significação de um sentimento de total descrença nas estruturas

ideológicas e de Estado que compõem a sociedade brasileira, ou seja, a justiça, as

leis, o governo, a família e a religião. Na mente do personagem heróico, estes

aparelhos traíram a sua confiança, desta forma, ele enxerga que a instituição que

consegue e resolve o problema da criminalidade e que possui os ideais imaculados

para o cumprimento deste dever é o Batalhão de Operações Especiais. Outro fato

observável na cena em questão é que devido ao estado emocional que se encontra

o tenente Matias, este pode ser através do aprimoramento da sombra em sua

psique, se tornar o substituto do capitão. Assim o fato da narrativa é transcrito:

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Capitão Nascimento: (narrativa em off): A morte do Neto foi uma tragédia pro

Matias, eles eram amigos de infância, e eu percebi que eu podia usar aquele

sentimento, eu ainda tinha a minha missão pra cumprir.

Figura 14: A morte das estruturas ideológicas e de Estado.

No capitulo 17 do Filme Tropa de Elite, Missão Dada é Missão Cumprida, a

saga do herói caminha para a sua conclusão. Determinado, o herói da trama

empreende a sua última missão que é punir o chefe do tráfico no Morro do Turano

de apelido baiano, responsável pela morte do tenente Neto. Em acréscimo a missão

de caça ao bandido, o Capitão Nascimento tem o objetivo pessoal de efetuar a

conclusão do rito de passagem do tenente Matias que irá propiciar a mudança

definitiva do estado arquetípico salutar do guerreiro para um em que movido pelo

medo e a pela dor, será tomado definitivamente pela sombra, ou seja, assim como o

Capitão Nascimento, o Tenente Matias não só assumira a função de líder do BOPE,

mas também um posicionamento destrutivo tomado pelo lado escuro do arquétipo

heróico.

Capítulo 17 (01hora 45minutos e 01segundos). Capitão Nascimento:

(narrativa em off): A minha missão não era mais garantir o sono do Papa, essa

missão o Neto havia cumprido, o que eu precisava era voltar pra minha família e

colocar um substituto digno em meu lugar, mas pra fazer isso, eu tinha que pegar o

Baiano.

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67

Capitão Nascimento: (narrativa em off): O que eu tava fazendo não era certo,

eu não podia esculachar os moradores para encontrar um bandido, mas na aquela

altura do campeonato amigo, pra mim tava valendo tudo, nada nesse mundo ia me

fazer parar.

Figura 15: Tenente Matias a um passo da sombra de sua psique.

Na cena que conclui definitivamente a jornada heróica do personagem

Capitão Nascimento, este em companhia do tenente Matias cerca e fere o chefe do

trafico do Morro do Turano. No diálogo abaixo, a personalidade em questão admite

que só é possível alcançar o seu objetivo se colocar a responsabilidade de matar o

marginal nas mãos do tenente Matias, concluindo assim então o rito de passagem

do herói para o lado “obscuro” de sua personalidade.

A conclusão da narrativa é assim transcrita:

Baiano: Me leva pro hospital aí meu chefe!

Capitão Nascimento: você já perdeu seu filho da puta! Você já perdeu, você vai

morrer!

Baiano: Na cara não chefe para não estragar o velório

Capitão Nascimento: O que?

Baiano: Na cara não chefe para não estragar o velório

Capitão Nascimento: Na cara não? ( indignado)

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Capitão Nascimento: (narrativa em off): O Baiano já era meu, agora só faltava o

coração do Matias, aí a minha missão ia tá cumprida. Aí eu ia voltar para minha

família sabendo que tinha deixado alguém digno no meu lugar.

Capitão Nascimento: André, passa que é teu. (entrega a arma de alto calibre a

Matias)

Baiano: Pô!Na cara não!

Figura 15: O Baiano já era meu, agora só faltava o coração do Matias.

Assim sendo, este trabalho acadêmico após os levantamentos teóricos e

informações arregimentadas a partir da narrativa do Filme Tropa de Elite, Missão

Dada é Missão Cumprida conclui que o personagem principal apresentou indícios

fundamentados em tese de elementos de ordem comportamental em que os

respectivos discursos simbólicos atuaram de forma pronunciada e efetiva

apresentando informações suficientes em prol da possibilidade deste ter sido

construído com foco a partir da ideologia heróica.

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CONSIDERAÇOES FINAIS

No presente trabalho acadêmico cuja proposta foi o de analisar a

potencialidade de ter ocorrido à construção do mito heróico no filme Tropa de Elite.

Missão Dada é Missão Cumprida foi possível antes de tudo, mensurar a

complexidade que é a comunicação através do uso da imagem como fator gerador

de informações.

Diante da historiografia do cinema brasileiro, o fato que chamou mais a

atenção foi o paradoxo percebido nos levantamentos teóricos sobre essa forma de

expressão artística no Brasil, pois, mesmo possuindo vasto acervo de obras

cinematográficas e uma variada gama de estilos, não edificou uma indústria cultural

promissora, devido a instabilidades sociais, econômicas, políticas e de diferenças de

ordem ideológica por parte de cineastas e instituições públicas e/ou privadas. A

inconsistência foi a marca identificada com o movimento artístico em questão, não

oferecendo assim, subsídios que pudessem efetivamente afirmar nesta obra

acadêmica que tenha colaborado como agente de formação discursiva,

incapacitando-o a ter colaborado com o mito heróico gerado no filme Tropa de

Elite, Missão Dada é Missão Cumprida.

No capítulo subseqüente, as discussões em torno do tema do mito heróico

propiciaram informações que fundamentaram mais precisamente o intento desta

obra. Através das considerações de autores de alta estima, foi possível mensurar o

grau de complexidade e influenciação que o mito heróico possui sob a mentalidade

humana, desvelando as particularidades envolvidas quanto à formação do homem e

este ser um elemento de convergência de várias formas de comunicação por meio

dos discursos simbólicos.

No capítulo que concluiu os estudos propostos por esta monografia através

da análise dos discursos no filme Tropa de Elite, a questão em destaque esta na

variedade de sujeitos e estruturas que, combinadas, moldam o cidadão dentro da

sociedade e efetivamente influenciam o contexto, através de direcionamentos que

estejam de acordo com o poder do aparelho ideológico ou de Estado constituído.

Destes embates, o personagem principal buscou trilhar uma jornada onde lhe fosse

permitido conviver o mais íntegro possível entre tantos discursos.

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