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AS PREGAS NO PESCOÇO: DO SÉC. XVI ÀS PASSARELAS DO SPFW Priscila Couto da Silveira RESUMO: A pretensão deste estudo é analisar e demonstrar um pouco da história da indumentária, o status do vestuário, em especial a gola no século XVI, e como o mesmo é visto nos dias atuais. Suas semelhanças, diferenças e significados que ainda se preservam ou foram esquecidos no tempo. O desenvolvimento e o retrocesso do rufo e como ele é revelado e utilizado nas coleções da estilista Gloria Coelho. PALAVRAS-CHAVE: Barroco; Era Elisabetana; Gloria Coelho; Gola; Rufo. Na moda sempre há elementos de poder. Os homens que caçavam e enfrentavam os mais fortes e grandes animais na Pré- História, gabavam seu feito exibindo o couro do animal sobre seu corpo, assim como as tonalidades e cores se tornaram parâmetro social na Antiguidade Clássica. No Barroco, o poder encontra-se em torno do colo e pescoço e o chamamos de gola. A gola é "parte da roupa que contorna o pescoço e que tem apresentado inúmeros modelos através dos tempos."¹ Esses modelos podem ser muitas

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Page 1: Modelo de Artigo

AS PREGAS NO PESCOÇO: DO SÉC. XVI ÀS PASSARELAS DO SPFW

Priscila Couto da Silveira

RESUMO: A pretensão deste estudo é analisar e demonstrar um pouco da história da

indumentária, o status do vestuário, em especial a gola no século XVI, e como o mesmo é visto

nos dias atuais. Suas semelhanças, diferenças e significados que ainda se preservam ou foram

esquecidos no tempo. O desenvolvimento e o retrocesso do rufo e como ele é revelado e utilizado

nas coleções da estilista Gloria Coelho.

PALAVRAS-CHAVE: Barroco; Era Elisabetana; Gloria Coelho; Gola; Rufo.

Na moda sempre há elementos de poder. Os homens que caçavam e enfrentavam

os mais fortes e grandes animais na Pré-História, gabavam seu feito exibindo o couro do animal

sobre seu corpo, assim como as tonalidades e cores se tornaram parâmetro social na Antiguidade

Clássica. No Barroco, o poder encontra-se em torno do colo e pescoço e o chamamos de gola. A

gola é "parte da roupa que contorna o pescoço e que tem apresentado inúmeros modelos através

dos tempos."¹ Esses modelos podem ser muitas vezes conferidos nas coleções da estilista

brasileira Gloria Coelho, que faz bom uso da peça e tantas vezes nos remete ao reinado da rainha

virgem Elizabeth I, com a reprodução de seus rufos.

A gola encontra-se presente desde os tempos antigos, mas foi somente em meados do

século XVI, com o surgimento e predomínio do rufo, que ela, enfim, chegou ao apogeu. O

aparecimento do rufo aconteceu de forma tímida, no decote do vestuário masculino do século

XVI quando um cordão passava pela sua extremidade e que, quando apertado, ficava levemente

pregueado. Em 1570, o rufo revela-se sobre a gola alta do gibão e, então, torna-se exemplo de

status e privilégio aristocrático.

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“O rufo (...) era um tipo de gola redonda, firme e trabalhada e podia ter uma ou mais camadas de tecido ou renda. Ajustada ao pescoço, requeria grande habilidade em sua confecção e técnica apurada para sua passagem e assentamento. (...) chegou às suas maiores dimensões durante a época de Henrique III (1551-1589), quando ficou conhecida como roda de carroça e chegava a utilizar três a quatros metros de tecido em sua confecção.”²

No vestuário feminino, porém o rufo não representava apenas o elemento hierárquico

que era. Ele era também considerado um princípio de sedução. “As mulheres desejavam usar um

rufo para mostrar seu status na sociedade: queriam também ser atraentes como mulheres.”³ Esse

era o compromisso elisabetano, abrir o rufo na frente deixando o colo amostra e, assim, elevando

as asas de gaze atrás da cabeça, como pode ser observado na figura 1.

Figura 1 – elizabethi.jpgDisponível em: <http://bonecasebonecas.files.wordpress.com/2009/05/elizabethi.jpg>

Acessado em: 13 junho 2009

O Barroco foi um período marcado pelas aparências e pela falsa nobreza que ostentava

uma imagem que não lhe convinha. Nele o uso das formas era deveras exagerado. O vestuário era

rígido e amplo, as mangas eram acolchoadas e volumosas, enquanto um espartilho firmava e

apertava o corpo, em especial a cintura, que era bem marcada. O rufo, então, servia como

elemento de prestígio e representava muito bem essa exibição barroca.

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Page 3: Modelo de Artigo

Assim como as outras peças de vestuário desse período, o rufo era muitas vezes

incômodo. Muitos homens na hora da refeição usavam suas barbas divididas, para melhor

acomodá-las.

No século XVII, então, o rufo cedeu lugar a gola caída. Porém seu uso foi continuado na

Holanda, onde ficou cada vez maior até que se transformou, literalmente, em uma roda de carroça

de linho pregueado, como observado na figura 2.

Figura 2 – Frans_Hals_025.jpgDisponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/1b/Frans_Hals_025.jpg>

Acesso em: 14 junho 2009

No século XVIII, o rufo voltou a aparecer em ocasiões especiais e em cerimônias mais

formais, como demonstração de apego às tradições e aos costumes do passado.

O rufo pode não ostentar mais os valores que possuía na Era Elisabetana, mas ainda nos

dias atuais aparece e reaparece nas passarelas e coleções, seja como uma modesta gola pregueada

ou em variadas camadas de tecido. A estilista Gloria Coelho exibiu no SPFW em sua coleção de

Inverno do ano 2008 as mais variadas golas.

Essa coleção da estilista foi levemente influenciada pela rainha Elizabeth I. Nela, além

das golas, pode-se observar o uso de peles e bordados – que eram muito usados no período

Barroco. O vestuário masculino da coleção também é composto por exuberantes e altas golas.

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“Elizabeth I serve como inspiração para dar o ar majestoso às garotas de Gloria Coelho, tanto nos bordados de brilho paetizado quanto nas peles. Elas são nobres contemporâneas, porém, e por isso o ar de princesinha de pedestal não existe, e a garota logo coloca uma legging por baixo do vestido para trabalhar, passear, ser dona do próprio nariz.”4

Uma das golas de Gloria, em forma de saco, lembra vagamente o decote masculino com

cordão, que quando pressionado pregueava, do início do século XVI. Porém a gola da coleção é

de maior proporção e evidência do que esse singelo rufo, como mostra a figura 3.

Figura 3 – gloriacoelhoi08_f_050.jpgDisponível em: < http://es.i.uol.com.br/moda/album//gloriacoelhoi08_f_050.jpg>

Acesso em: 14 junho 2009

Sobreposta de camadas e mais camadas outras golas da coleção lembram o formato do

rufo. Algumas chegam a cobrir por completo o pescoço, sem deixar de serem delicadas devido ao

tecido, conforme observado na figura 4.

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Figura 4 – gloriacoelhoi08_f_074.jpgDisponível em: <http://es.i.uol.com.br/moda/album//gloriacoelhoi08_f_074.jpg>

Acesso em: 14 junho 2009

Na coleção de Gloria, a gola não é mais a insígnia de poder e status das eras passadas,

mas um complemento de luxo às peças da estilista. Esse complemento dá ares sofisticados e

clássicos às composições da coleção, mas sem deixar se tornar o vestuário pesado, exagerado e

nada prático dos séculos passados.

NOTAS:

1. SABINO, Marco. Dicionário da moda. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2007, p.298.

2. SABINO, Marco. Dicionário da moda. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2007, p.533.

3. LAVER, James. A roupa e a moda: uma história concisa. Tradução de Glória M. M.

Carvalho. São Paulo: Editora Shwarcz Ltda., 2001, p.93.

4. VASONE, Caroline. Gloria Coelho brinca com universo infantil, peles ecológicas e

Elizabeth 1ª. UOL Estilo: Moda. São Paulo: 21 janeiro 2008. Disponível em:

<http://estilo.uol.com.br/moda/spfw/2008/inverno/>. Acesso em: 17 junho 2009.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KÖHLER, Carl. História do vestuário. Tradução de Jefferson L. Camargo. São Paulo: Martins

Fontes, 2005.

LAVER, James. A roupa e a moda: uma história concisa. Tradução de Glória M. M. Carvalho.

São Paulo: Editora Shwarcz Ltda., 2001.

RACINET, Albert. Historia del vestido. Madrid: Editora Libras, 2004.

SABINO, Marco. Dicionário da moda. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2007.

VASONE, Caroline. Gloria Coelho brinca com universo infantil, peles ecológicas e Elizabeth

1ª. UOL Estilo: Moda. São Paulo: 21 janeiro 2008. Disponível em:

<http://estilo.uol.com.br/moda/spfw/2008/inverno/>. Acesso em: 17 junho 2009.

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