metodologia do ensino da lÍngua portuguesa...

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METODOLOGIA DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA Prezado Aluno. O material que apresentamos foi produzido por professores atuantes no Sis- tema Universidade Aberta do Brasil e cedido por sua respectiva Universida- de à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior – CA- PES, que o disponibilizou para uso das Universidades integradas ao sistema. Coordenação UAB/UESC O módulo a seguir foi reproduzido para o uso na disciplina Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura, referente ao semestre 2012.2 Coordenação de Letras UAB/UESC

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METODOLOGIA DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA

Prezado Aluno.

O material que apresentamos foi produzido por professores atuantes no Sis-tema Universidade Aberta do Brasil e cedido por sua respectiva Universida-de à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior – CA-PES, que o disponibilizou para uso das Universidades integradas ao sistema.

Coordenação UAB/UESC

O módulo a seguir foi reproduzido para o uso na disciplina Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura, referente ao semestre 2012.2

Coordenação de Letras UAB/UESC

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Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura

Florianópolis - 2011

Nilcéa Lemos PelandréNelita BortolottoIsabel de Oliveira e Silva MonguilhottEliane Santana Dias Debus

6ºPeríodo

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Governo FederalPresidente da República: Dilma Vana RousseffMinistro da Educação: Fernando HaddadSecretário de Educação a Distância: Carlos Eduardo BielschowskyCoordenador da Universidade Aberta do Brasil: Celso José da Costa

Universidade Federal de Santa CatarinaReitor: Alvaro Toubes PrataVice-Reitor: Carlos Alberto Justo da SilvaSecretário de Educação a Distância: Cícero BarbosaPró-Reitora de Ensino de Graduação: Yara Maria Rauh MüllerPró-Reitora de Pesquisa e Extensão: Débora Peres MenezesPró-Reitor de Pós-Graduação: Maria Lúcia de Barros CamargoPró-Reitor de Desenvolvimento Humano e Social: Luiz Henrique Vieira da SilvaPró-Reitor de Infra-Estrutura: João Batista FurtuosoPró-Reitor de Assuntos Estudantis: Cláudio José AmanteCentro de Ciências da Educação: Wilson Schmidt

Curso de Licenciatura Letras-Português na Modalidade a DistânciaDiretora Unidade de Ensino: Felício Wessling MargottiChefe do Departamento: Zilma Gesser NunesCoordenadoras de Curso: Roberta Pires de Oliveira e Zilma Gesser NunesCoordenador de Tutoria: Renato Miguel BassoCoordenação Pedagógica: LANTEC/CEDCoordenação de Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem: Hiperlab/CCE

Comissão EditorialTânia Regina Oliveira RamosIzete Lehmkuhl CoelhoMary Elizabeth Cerutti Rizzati

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Equipe de Desenvolvimento de Materiais

Laboratório de Novas Tecnologias - LANTEC/CEDCoordenação Geral: Andrea LapaCoordenação Pedagógica: Roseli Zen Cerny

Produção Gráfica e HipermídiaDesign Gráfico e Editorial: Ana Clara Miranda Gern; Kelly Cristine SuzukiCoordenação: Thiago Rocha Oliveira, Laura Martins RodriguesAdaptação do Projeto Gráfico: Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha OliveiraDiagramação: Karina Silveira, Talita NunesCapa: Gustavo Barbosa Apocalypse de MelloTratamento de Imagem: Karina Silveira, Talita Nunes, Thiago Rocha OliveiraRevisão gramatical: Daniela Piantola, Hellen Melo Pereira, Mirna Saidy

Design InstrucionalCoordenação: Vanessa Gonzaga NunesDesigner Instrucional: Maria Luiza Rosa Barbosa

Copyright © 2011, Universidade Federal de Santa Catarina/LLV/CCE/UFSCNenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Coordena-ção Acadêmica do Curso de Licenciatura em Letras-Português na Modalidade a Distância.

Catalogação na fonte elaborada na DECTI da Biblioteca Universitária da Universidade Federal de Santa Catarina.

Ficha Catalográfica

M593 Metodologia do ensino de língua portuguesa e literatura / Nilcéa Lemos Pelandré ...[et al.]. - Florianópolis : LLV/CCE/UFSC, 2011.194 p. : il.

Inclui bibliografiaLicenciatura em Letras Português na Modalidade a Distância.ISBN 978-85-61482-29-9

1. Língua portuguesa – Estudo e ensino – Metodologia. 2. Litera-tura – Estudo e ensino – Metodologia. I. Pelandré, Nilcéa Lemos.

CDD 806.90:37

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Sumário

Apresentação ...................................................................................... 9

Unidade A - A formação do professor e a constituição da disciplina língua portuguesa e literatura ................................13

A constituição da profissionalidade docente e da disciplina 1 Língua Portuguesa e Literatura .............................................................15

A organização das escolas e as linhas de pensamento 2 pedagógico no contexto do desenvolvimento das políticas educacionais vigentes ..............................................................25

2.1 Linhas do pensamento pedagógico no contexto do desenvolvimento das políticas educacionais vigentes .......................27

Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e 3 Literatura .........................................................................................................33

3.1 Metodologia do ensino da Língua Portuguesa e Literatura .............43

3.2 A avaliação .........................................................................................................49

Considerações finais da Unidade A ............................................................52

Unidade B - A leitura na escola ...................................................53O que é ser leitor?4 ........................................................................................55

O papel da escola na formação de leitores5 .........................................61

5.1 O papel do professor de Língua Portuguesa na formação de leitores ............................................................................................................62

Concepções de leitura6 ................................................................................69

6.1 O ensino da leitura ...........................................................................................70

Considerações finais da Unidade B.............................................................79

Unidade C - A leitura literária no espaço escolar .................81A literatura e a sua função 7 .......................................................................83

7.1 O leitor de literatura .........................................................................................87

O ensino da literatura na escola: para além do que dizem 8 os documentos .............................................................................................93

8.1 Da biblioteca escolar a outros espaços de leitura literária...............102

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O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio: 9 estratégias metodológicas ....................................................................109

Poesia .........................................................................................................................109

Varal literário ............................................................................................................110

Exercício Dadaísta ..................................................................................................110

Limeriques ................................................................................................................111

Poesia visual .............................................................................................................112

Narrativa ....................................................................................................................112

O Romance ...............................................................................................................113

O Conto .....................................................................................................................114

O Miniconto .............................................................................................................114

Outras possibilidades ...........................................................................................115

Considerações finais da Unidade C .........................................................118

Unidade D - O processo da escrita na escola ..................... 119O processo da escrita na escola10 .........................................................121

10.1 O texto e o envolvimento do aluno-escritor ......................................122

10.2 Aprendizagem e desenvolvimento da linguagem escrita e autoria ..........................................................................................................125

10.3 Modelos de ensino na pedagogia da língua escrita: pontos de referência em discussão .......................................................132

10.4 Atos de ensino para quem se põe como aprendiz do ensinar.....145

10.5 Práticas discursivas no trabalho com textos na escola: as relações de interação no ensino e na aprendizagem ...............148

10.6 Voltando ao ponto inicial: locutor e interlocutor, partes integrantes do enunciado ........................................................................153

Considerações finais da Unidade D .........................................................157

Unidade E - Análise linguística e ensino de gramática ... 159Análise linguística 11 ..................................................................................161

O ensino da gramática12 ..........................................................................173

Considerações finais da Unidade E .........................................................177

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Referências ...................................................................................... 179

Crédito das imagens ................................................................... 188

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Apresentação

Caro estudante,

É com imenso prazer que o recebemos na disciplina Metodologia do Ensino

de Língua Portuguesa e Literatura. Escolhemos para iniciar o diálogo dos con-

teúdos referentes a esta disciplina o poema “O menino que carregava água na

peneira”, do poeta mato-grossense Manoel de Barros.

Convidamos você à leitura do poema:

O menino que carregava água na peneira

Tenho um livro sobre águas e meninos.

Gostei mais de um menino

que carregava água na peneira.

A mãe disse que carregar água na peneira

era o mesmo que roubar um vento e sair

correndo com ele para mostrar aos irmãos.

A mãe disse que era o mesmo que

catar espinhos na água

O mesmo que criar peixes no bolso.

O menino era ligado em despropósitos.

Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino

gostava mais do vazio

do que do cheio.

Falava que os vazios são maiores

e até infinitos.

Com o tempo aquele menino

que era cismado e esquisito

porque gostava de carregar água na peneira

Com o tempo descobriu que escrever seria

o mesmo que carregar água na peneira.

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Como todo texto literário, este se apresenta ao leitor aberto a múltiplas leitu-

ras. Gostaríamos de aqui refletir sobre algumas imagens desencadeadas pelo

poema e que, sob o nosso ponto de vista, dizem respeito diretamente à disci-

plina que agora iniciamos.

No escrever o menino viu

que era capaz de ser

noviça, monge ou mendigo

tudo ao mesmo tempo

O menino aprendeu a usar as palavras.

Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.

E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro

botando ponto final na frase.

Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.

O menino fazia prodígios.

Até fez uma pedra dar flor!

A mãe reparava o menino com ternura.

A mãe falou:

Meu filho você vai ser poeta.

Você vai carregar água na peneira a vida toda.

Você vai encher os

vazios com as suas

peraltagens

e algumas pessoas

vão te amar por seus

despropósitos.

(BARROS, Manoel de. O menino que carregava água na peneira. In: ______.

Exercícios de ser criança. São Paulo: Global, 2002.)

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O exercício da palavra escrita, do ato de produzir a escrita, configura-se na

descoberta desse personagem menino-poeta de que as palavras estão abertas

para o brincar e de que com elas é permitido dizer o indizível, realizar o inusi-

tado, como pode-se constatar no verso: “Foi capaz de modificar a tarde botan-

do uma chuva nela”. O ato da escrita literária, do ser e se fazer poeta, artífice

da palavra, assim se anuncia pela metáfora da peneira que nunca se completa

com seu conteúdo.

A imagem poética da peneira, que deixa escorregar por suas fissuras o líquido,

implicitamente traz à cena outro personagem: o leitor. Não carregaria tam-

bém o leitor uma peneira impreenchível? Como podemos dar por encerrada

a nossa cota de leitura? Assim como a escrita, a leitura é um ato de autoria, de

criação e, podemos dizer, de recriação. Não exige o ato da leitura igualmente

um exercício de despropósitos e “peraltagens”?

Às duas imagens – a do escritor e a do leitor – aproximamos a do professor e

seu exercício docente: a sensação de incompletude muitas vezes gerada pelo

ato de ensinar. Por outro lado, os despropósitos e as “peraltagens”, acolhidas

pelo ato de escrever e de ler, deveriam ser acolhidas também pelo ato de ensi-

nar, pensando que o professor pode buscar outras formas de (re)apresentar o

mundo aos alunos. Assim, o exercício de escrever, o exercício de ler e o exer-

cício de ensinar se entrelaçam e se anunciam como imprescindíveis no ato de

pensar o ensino da língua portuguesa e da literatura.

Esta disciplina tem por objetivo discutir questões pedagógicas da profissiona-

lidade docente de forma que você obtenha conhecimentos teórico-metodoló-

gicos sobre aspectos que envolvem o processo de ensino e de aprendizagem da

Língua Portuguesa no Ensino Fundamental e Médio e, assim, sinta-se capaci-

tado para atuar profissionalmente de modo competente e efetivo na escola.

Cabe, todavia, questionarmos: afinal, no espaço escolar, sendo estudantes de

Curso de Licenciatura em Letras, como alcançamos o domínio desse conhe-

cimento? E, na função de professores, como nos tornamos competentes na

mediação pedagógica do que se ensina e do que é aprendido?

Para responder a essas questões, este livro está organizado em cinco unidades

que centralizam a discussão do nosso objeto de ensino, a linguagem verbal.

Nessa direção, a Unidade A trata da formação do professor e da constitui-

ção da disciplina Língua Portuguesa e Literatura, isto é, apresenta um breve

histórico da constituição da profissionalidade docente e do ensino da Língua

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Portuguesa e Literatura e suas implicações no processo do ensinar e aprender.

Referimo-nos, ainda nesta unidade, aos documentos oficiais que orientam a

definição de objetivos, metodologias e avaliação.

Na Unidade B, trazemos a discussão sobre o papel da escola e do professor de

Língua Portuguesa na formação de leitores. Na Unidade C, ainda tematizando

a leitura, continuamos a reflexão sobre a especificidade que está na leitura do

texto literário e sua inserção no espaço de sala de aula do Ensino Fundamental

e Médio. Na Unidade D, tratamos de questões que envolvem o processo de

escrita e seu ensino na escola. E a Unidade E complementa este livro com re-

flexões sobre a atividade de análise linguística e o ensino de gramática.

Não foi nosso objetivo esgotar todas as questões relativas à Metodologia do En-

sino de Língua Portuguesa e Literatura, mas sim abordar pontos que considera-

mos fundamentais no exercício da docência que ensina a linguagem verbal.

O diálogo continua! Seja crítico na sua leitura, relacionando suas vivências

pessoais e docentes ao conteúdo exposto ao longo deste livro.

As autoras.

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Unidade AA formação do professor e a constituição da disciplina língua portuguesa e literatura

Interação professora e aluna

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Metodologia do Ensino

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Nesta Unidade, refletimos sobre alguns aspectos da história da for-mação docente e da constituição da disciplina de Língua Portuguesa e suas implicações no processo de ensino e de aprendizagem. Apresenta-mos, em síntese, as linhas de pensamento pedagógico no contexto do de-senvolvimento das políticas educacionais em curso e as orientações dos documentos oficiais que norteiam a prática pedagógica na definição do objeto de estudo, dos objetivos da disciplina e da orientação metodológi-ca e da avaliação. Tendo isso em vista, os objetivos desta unidade são:

Refletir sobre fatores que intervêm no processo de formação do Ӳprofessor de Língua Portuguesa e Literatura.

Compreender as relações entre a organização dos espaços esco- Ӳlares e o desenvolvimento de práticas sociais de linguagem.

Pensar o processo de ensino e aprendizagem de Língua Por- Ӳtuguesa e Literatura considerando os documentos oficiais de referência e as teorias e os estudos científico-pedagógicos em circulação.

Refletir sobre possibilidades de elaboração didática dos conhe- Ӳcimentos científicos referentes aos processos de ensino e de aprendizagem da linguagem verbal.

A Unidade está organizada em três capítulos: um capítulo sobre a constituição da profissionalidade docente e da disciplina (um breve histórico); outro capítulo sobre a organização do espaço escolar e as li-nhas do pensamento pedagógico no desenvolvimento das políticas edu-cacionais contemporâneas; e um terceiro capítulo sobre os processos de ensino de Língua Portuguesa e Literatura (os documentos oficiais de referência e a sistematização teórico-metodológica do ensino de Língua Portuguesa e Literatura, incluindo a avaliação).

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Capítulo 01A constituição da profissionalidade docente...

15

A constituição da profissionalidade docente e da disciplina Língua Portuguesa e Literatura

Quando eu comecei na faculdade, eu tinha uma visão, trabalhava obser-

vando o livro didático, era o meu limite. E a faculdade me fez enxergar

além, assim oh!, pesquisar mais, ir à biblioteca, Internet, a questão dos

textos reais, eu trabalhava muito com textos assim... qualquer texto para

mim... quanto mais fáceis... Antigamente se tinha essa visão, por exem-

plo, quando tu falaste da letra T [referindo-se a uma outra professora],

procurava textos que tinha um monte de T, aquela coisa... eram textos de

cartilha mesmo e eu comecei a enxergar outros. (S-br, Entrev. 3: 162-169.

In: AGUIAR; PELANDRÉ, 2009, p. 132).

Vivemos, ao final dos anos de 1970 e início da década de 1980, um forte movimento de democratização da sociedade, em que a luta dos educadores trouxe contribuições significativas para a educação e para o modo de se compreender a escola e o trabalho pedagógico. Essa luta colocou “em evidência as relações de determinação existentes entre a educação e a sociedade e a estreita vinculação entre a forma de organi-zação da sociedade, os objetivos da educação e a forma como a escola se organiza”, escreve a pesquisadora em educação, Professora Helena Costa de Lopes Freitas, em seu trabalho Formação de professores no Brasil: 10 anos de embate entre projetos de formação (FREITAS, 2002, p. 138).

Os anos de 1980 marcaram, por sua vez, a ruptura com o pensa-mento mecanicista, que predominava até então, e novas concepções so-bre a formação do educador passaram a ser consideradas, ancoradas em perspectiva sócio-histórica (FREITAS, 2002).

Pensamento mecanicista No pensamento mecanicista, herdado dos filósofos da Revolução Científica do século XVII, como Descartes, Bacon e Newton, “[…] o valor do novo homem que surge se encontra não mais na família ou linhagem, mas no prestígio resultante do seu esforço e capacidade de trabalho [...] e a ciência deixa de ser um saber contemplativo, formal e finalista para que, indissoluvelmente ligada à técni-ca, possa servir à nova classe [ao novo modo de produção – o capitalismo]”. A natureza e o próprio homem são comparados a uma máquina. As considerações a respeito do valor, da perfeição, do sentido e do fim são excluídas da ciência. (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 148).

Discutiam-se, naquela época, as relações en-tre escola e sociedade, mais especificamente sobre como as formas de organização da sociedade tinham implicações na organização dos espaços escolares e no processo educacional desenvolvido.

1

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Metodologia do Ensino

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A perspectiva sócio-histórica ancora-se, dentre outras, na teoria de Vygotsky que aponta novos paradigmas para a compreensão do desen-volvimento humano. Essa teoria, fundamentada no materialismo histó-rico-dialético, contrapõe-se aos reducionismos das concepções empiris-ta, tecnicista e idealista, indicando perspectivas de superá-los. Vygotsky, em sua teoria social do desenvolvimento humano, compreende o sujeito como constituído e construído nas relações sociais, via linguagem. Ele afirma também que, na ontogênese, deve ser considerada não só a linha natural, biológica, mas também a linha cultural, social, histórica. Segun-do Vygotsky, o indivíduo, na condição de ser biológico e de ser sócio-his-tórico humano, por meio das relações sociais, pela mediação semiótica, constitui suas formas de ação e sua consciência (FREITAS, 1994).

A publicação do livro Pedagogia do oprimido (2005), do grande educador brasileiro Paulo Freire, escrito nos anos de 1967 e 1968, quan-do de seu exílio no Chile, constitui também esse momento histórico de construção de novos olhares sobre a formação do professor. Frei-re discute uma nova concepção de educação, a partir da compreensão da realidade social e econômica dos educandos, e denuncia a educação bancária, caracterizada pelo aluno que chega à escola e recebe do pro-fessor o conteúdo como se fosse uma mercadoria.

Figura 1 - Paulo Freire

Paulo Freire (1921-1997) desenvolveu o conceito de “educação bancária” em

seu livro Pedagogia do oprimido, publicado pela primeira vez no Brasil em

1970. Ele referia-se ao modelo tradicional de prática pedagógica em que o

professor é tido como aquele que supostamente tudo sabe e o aluno nada

sabe. Os conteúdos escolares são transmitidos passivamente aos alunos, ou

seja, o professor deposita na cabeça “vazia” de seus alunos o conteúdo que

eles não possuem, como alguém que deposita dinheiro em um banco.

Essas concepções em que o professor não mais é visto como mero transmissor de conteúdo enfatizam, então, “[...] a necessidade de um profissional de caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da re-alidade de seu tempo, com desenvolvimento da consciência crítica que lhe permita interferir e transformar as condições da escola, da educação e da sociedade” (FREITAS, 2002, p. 139), corroborando a importância dos processos de formação de professores nessa perspectiva.

Há uma nova tradução da obra de Vygotsky feita por

Paulo Bezerra (2001), a partir da edição em russo

(VIGOTSKI, L.V. A cons-trução do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001), no entanto para a produção

deste livro nos utilizamos da versão anterior, a de

1989.

Ontogênese Ontogênese refere-se ao

desenvolvimento do indi-víduo desde a fecundação

até a maturidade para a reprodução (FERREIRA,

1988).

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Capítulo 01A constituição da profissionalidade docente...

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As transformações concretas no campo da escola também se de-ram “[…] no sentido de buscar superar as dicotomias entre professores e especialistas, pedagogia e licenciaturas, especialistas e generalistas, pois a escola avançava para a democratização das relações de poder em seu interior e para a construção de novos projetos coletivos”; construindo, assim, “a concepção de profissional de educação que tem na docência e no trabalho pedagógico a sua particularidade e especificidade” (FREI-TAS, 2002, p. 139, grifos da autora).

Com relação à formação do professor de Língua Portuguesa e Li-teratura, para os anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio, a Lei no. 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional) reafirma a obrigatoriedade da formação em nível superior, razão pela qual se organizam, dentre outros programas de formação, os cursos na modalidade de EaD, dada a impossibilidade de oferta de cursos presen-ciais em todos os municípios brasileiros.

No que diz respeito ao ensino da Língua Portuguesa, até os anos 1970 os estudos e pesquisas se faziam na área de conhecimento denomi-nada Didática, que se subdividia em Didática Geral e Didática Especial, que, por sua vez, desmembrava-se em Didática do Português. A propos-ta dessa disciplina apontava para um ensino normativo, prescritivo, “um conjunto de normas, recursos e procedimentos que deveriam informar e orientar a prática dos professores”, de forma a poderem prescrever com mais eficácia as normas da língua, diz a professora, doutora e livre-docente em Educação Magda Becker Soares (1997, p. X).

Figura 2 - Magda Soares

Considerada uma das maiores pesquisadoras do ensino da Língua Portu-

guesa de nosso país, é Professora Titular Emérita da Faculdade de Educação

da Universidade Federal de Minas Gerais e pesquisadora do Centro de Alfa-

betização, Leitura e Escrita – CEALE – da referida Faculdade. Ela é autora de

várias obras de referência para o ensino da Língua Portuguesa. Destacamos

aquelas que são consideradas clássicas: Linguagem e escola: uma perspectiva

social, da Editora Ática; Letramento: um tema em três gêneros, da Editora Au-

têntica; e Alfabetização e Letramento, da Editora Contexto.

Lei no. 9394/1996: “Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal”.

Os cursos de pedagogia formavam o professor para a sala de aula, orien-tadores educacionais, supervisores e adminis-tradores escolares; esses últimos nomeados de especialistas em educa-ção. Hoje, nos cursos de formação, essa divisão não existe mais. Os cursos de pedagogia formam profissionais para atuar na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

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Metodologia do Ensino

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Assim como nos cursos de formação regular, Curso Normal e Cur-so de Letras, a disciplina de Língua Portuguesa foi tendo seu nome alte-rado também no Ensino Fundamental e Médio ao longo do tempo. Na década de 1960, época do antigo curso ginasial, era denominada Portu-guês, subdividida em Estudos de Língua e Estudos de Literatura, minis-trados inclusive por professores diferentes. Na década de 1970, passou a chamar-se Comunicação e Expressão, e dela não fazia parte a literatura, que passou a integrar o currículo do segundo grau, como estudo de his-tória literária e de autores e obras visando aos concursos vestibulares.

Nos currículos atuais temos, no Ensino Fundamental, a disciplina de Língua Portuguesa, e a Literatura faz parte dela. Porém, persiste a tendência de se considerarem distintas a língua e a literatura e de o texto literário ser utilizado em sala de aula apenas como pretexto para aulas de leitura, interpretação e estudos gramaticais. Ainda há forte tendência em considerar a gramática normativa e prescritiva como conteúdo cen-tral das aulas de língua e compreender o ensino da literatura, quando objetivado, como o estudo para a caracterização de obras e autores.

No Ensino Médio, no entanto, embora continue fazendo parte da disciplina de Língua Portuguesa, a “[...] literatura possui alguma auto-nomia de disciplina”, como afirmam Ramos e Corso (2010, p. 29). Es-tudar a língua é também estudar literatura e vice-versa, pois o objeto do ensino de Língua Portuguesa e Literatura é a linguagem verbal (a palavra, o texto, a linguagem em uso) nas suas múltiplas formas de ma-nifestação, incluindo a literária, nas diferentes esferas sociais.

O processo de democratização da sociedade trouxe também a de-mocratização do acesso à escola. O número de alunos dobrou no ensino primário e triplicou no ensino secundário (SOARES, 1997, p. IX apud BATISTA, 1997, p. IX). A Lei nº. 5692/1971 (Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional – LDB) estendeu o ensino obrigatório de qua-tro para oito anos e ampliou o Ensino Médio, criando os cursos médios profissionalizantes. Até o advento da Lei nº. 5692/1971, denominava-se ensino primário o correspondente aos primeiros quatro anos do ensi-no formal; ensino ginasial ou secundário, os quatro anos seguintes, do primeiro ao quarto ano ginasial, considerado ensino secundário. Atual-

As professoras Tânia Regina Oliveira Ramos e Gizelle Kaminsky Corso

(2010), responsáveis pela disciplina Literatura e Ensi-no deste curso de Letras a distância, no livro que es-

creveram sobre esse tema, discutem com clareza o modo como a literatura

vem sendo ensinada e qual a compreensão que

dela se tem. Retomaremos essa discussão na Unidade

C deste livro.

O processo de democra-tização da sociedade na

área educacional, que acompanha os aconteci-

mentos nacionais, trouxe igualmente a discussão

das relações de poder no interior da escola,

apontando para a cons-trução de novos projetos

coletivos, tais como a elaboração de propostas curriculares de estados e municípios. Essas discus-

sões provocaram avanços no sentido da democra-tização desses projetos

educacionais, principal-mente em estados cujos

governantes eleitos eram considerados de perfil

centro-esquerda.

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Capítulo 01A constituição da profissionalidade docente...

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mente, o ensino obrigatório é de nove anos, ampliado pela Lei 9394/1996 (nova LDB), que substituiu, entre outras, a Lei nº. 5692/1971.

A escola, que até então servia quase que exclusivamente às camadas economicamente mais privilegiadas da sociedade, não consegue atender de forma adequada a esse novo contingente de alunos que a ela chega, pois os professores não foram preparados para esse trabalho. Começa-se a falar da crise da educação e do fracasso escolar. E os indicadores desse fracasso revelam-se principalmente no ensino de Português, pelo alto índice de repetência nos primeiros anos e a constatação de graves problemas de expressão escrita nas avaliações a que são submetidos os alunos concluintes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio nos exa-mes vestibulares e em concursos, nas provas de Língua Portuguesa. Esse primeiro fenômeno, intitulado crise e fracasso no ensino de Português, impulsionou a produção intelectual dos anos de 1970 e início dos anos de 1980, multiplicando-se os estudos, as pesquisas e reflexões sobre a fa-lência desse ensino, que denunciam as deficiências das crianças e jovens na leitura e produção de textos escritos.

Soares (1997) aponta ainda um segundo fenômeno que influenciou a produção intelectual sobre o ensino do Português: a reforma univer-sitária do final dos anos de 1960 extinguiu a disciplina Didática Espe-cial do Português, substituindo-a por Prática de Ensino de Português, passando a ser esta última uma área de conhecimento específico e in-dependente, cuja produção intelectual começou a ser definida por seus próprios princípios e pressupostos. A esse fenômeno, a referida autora acrescenta um terceiro, a chegada dos conhecimentos construídos no campo da Linguística, disciplina introduzida nos cursos de Letras nos anos de 1960, cujos efeitos no ensino da Língua Portuguesa começaram a se fazer sentir somente nos anos de 1980.

A partir de então, inúmeras têm sido as publicações direcionadas a questões do ensino da Língua Portuguesa e Literatura e com essas obras e outras que julgamos representativas deste momento atual é que vimos dialogando, no intuito de trazer à reflexão propostas e alternativas me-todológicas sobre o que se ensina quando se ensina Língua Portuguesa e Literatura. A seguir, destacamos alguns exemplos de obras que tratam do ensino de português:

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Metodologia do Ensino

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GERALDI, J. W. (Org.). O texto na sala de aula. Cascavel: Assoeste,

1984

GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes,

1991.

GNERRE, M. Linguagem, escrita e poder. 2. ed. São Paulo, Martins

Fontes, 1987.

KLEIMAN, A. Os significados do letramento: uma nova perspec-

tiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras,

1985.

KATO, M. No mundo da escrita: uma perspectiva psicolingüística.

São Paulo: Ática, 1986.

ROJO, R. (Org.). A prática de linguagem na sala de aula: pratican-

do os PCNs. São Paulo-Campinas: EDUC; Mercado de Letras, 2000.

SOARES, M. B. Linguagem e escola: uma perspectiva social. São

Paulo: Ática, 1986.

____. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Au-

têntica, 1998.

____. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2003.

Na década de 1990, as políticas educacionais tomam rumos um pouco diferentes daqueles em que se enfatizavam as relações de deter-minação entre a organização da sociedade e a da escola. Os debates não mais se fazem sobre as relações da escola com a sociedade, mas sim sobre os conteúdos escolares do ponto de vista das competências e habilidades a serem desenvolvidas na escola. Aos ideais dos educadores da década de 1980, de uma formação humana multilateral, sobrepõem-se políticas públicas neoliberais em que a qualidade da instrução e do conteúdo é condição para a melhoria do processo de acumulação do capital.

Essas políticas traduzem-se, por exemplo, na criação de sistemas de avaliação, tais como SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educa-ção Básica; ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio; Provão – Exa-me Nacional de Cursos de Graduação; ANRESC – Avaliação Nacional

Você pode ter acesso a to-das as avaliações via Portal

do MEC <www.mec.gov.br>; pode, inclusive, verifi-car os resultados da escola

onde atua ou pretende atuar como estagiário.

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Capítulo 01A constituição da profissionalidade docente...

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do Rendimento Escolar, Prova Brasil, Provinha Brasil; IDEB – Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico; FUNDEF – Fundo de Manu-tenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, dentre outras medidas “que objetivam adequar o Brasil à nova ordem, bases para a reforma educativa que tem na avaliação a chave-mestra que abre caminho para todas as políticas: de formação, de financiamento, de descentralização e de gestão de recursos” (FREITAS, 2002, p. 142).

Se por um lado as concepções que subjazem às políticas públicas reduzem o trabalho pedagógico a uma dimensão puramente racional, atribuindo valor excessivo aos dados estatísticos; por outro, impõem ao professor reflexões sobre o sentido da docência e sobre a importância de se manter em constante relação com a sociedade em que se insere. Assim, os professores muitas vezes são responsabilizados pelos baixos índices de desempenho de seus alunos e dos resultados gerais da insti-tuição escolar. Em decorrência, são impelidos a uma formação contínua com vistas à melhoria da eficácia do ensino.

Figura 3 – Ângela Kleiman

Angela Kleiman é professora e pesquisadora do Instituto de Estudos

da Linguagem (IEL), da Universidade de Campinas (UNICAMP/SP). Tem

se destacado na produção de materiais bibliográficos sobre letramen-

to e ensino da leitura e escrita, na perspectiva da formação docente.

Dentre os livros por ela organizados, destacamos: Os significados do le-

tramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita (1995);

A formação do professor: perspectivas da linguística aplicada (2001); Le-

tramento e formação do professor: práticas discursivas, representações

e construção do saber (2005), publicados pela Mercado de Letras; e O

ensino e a formação do professor: alfabetização de jovens e adultos, pela

Artes Médicas Sul, em 2000.

A formação profissional do professor do modo como vem se estru-turando – e se procurou sintetizar isso nos parágrafos anteriores – não tem conseguido fazer frente à questão da atribuição injusta de valores de desprestígio social à profissão. Como diz a professora Angela B. Klei-

O Instituto Nacional de Es-tudos e Pesquisas Pedagó-gicas (INEP/MEC) criou em 21/05/2010, por meio de portaria, o Exame Nacio-nal de Ingresso na Carreira Docente. Esse exame estabelece padrões de referência para o ingresso de professores na Educa-ção Básica. Diz o texto à página 3: “Esses padrões ressaltam a importância da valorização do pro-fessor como alguém que necessita de conhecimen-tos e habilidades espe-cíficas para seu exercício profissional, os quais não podem ser substituídos por mera boa vontade ou desejo de trabalhar com crianças” (BRASIL, 2010).

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Metodologia do Ensino

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man, docente e pesquisadora do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da UNICAMP/SP:

[...] a representação que a imprensa faz das capacidades de ler e escre-

ver das professoras, geralmente baseada em fatos anedóticos, mostra

suas falhas tanto em relação a práticas cotidianas de leitura e escrita [...]

quanto em relação a práticas especializadas [...]. Além disso, ela é repre-

sentada como não-leitora, não porque não leia, mas porque não tem

familiaridade com a apreciação da literatura legítima (em oposição à li-

teratura para as massas). (KLEIMAN, 2001, p. 43).

Tal crítica fundamenta-se em concepção de língua cuja norma-pa-drão, variedade linguística de prestígio social, é a única aceita e na qual a leitura que se considera é, unicamente, a de textos literários.

Estamos falando de questões de letramento. Assim, destacamos que a pesquisadora Vera Masagão Ribeiro, doutora em Educação pela PUC/SP e coordenadora da ONG Ação Educativa/SP, comprovou, em pesquisa realizada na cidade de São Paulo, que a classe dos professores tem capacidades de uso da escrita superiores aos resultados de outros grupos de profissionais liberais. Esse dado torna-se importante no sen-tido de contribuir para aumentar a confiança dos professores na sua capacidade de desenvolver práticas de letramento que lhe possibilitem melhor compreensão de seu contexto de trabalho e maior controle so-bre suas decisões (RIBEIRO, 1999). Referimo-nos aqui ao conceito de letramento como “[...] um conjunto de práticas sociais que usam a es-crita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos” (KLEIMAN, 1999, p. 19). Vale lembrarmos que esse conceito já foi mencionado no livro Linguística Textual, na página 65.

A formação do profissional docente, quando compreendida como um fenômeno social, reveste-se de muita complexidade, pois a profissão não depende unicamente da vontade de cada ser e de suas experiências na área em que atua. Em vista disso, podemos dizer que o depoimen-to que inicia este capítulo é uma demonstração da atitude positiva da professora frente ao processo de formação e o modo como ele interfere na constituição da profissionalidade docente. Diz a professora: “[...]...

A ONG Ação Educativa foi fundada em 1994 com a missão de promover os direitos educativos e da

juventude, tendo em vista a justiça social, a democra-cia participativa e o desen-

volvimento sustentável no Brasil. Disponível em

<http://www.acaoeduca-tiva.org.br/portal/index.

php?option=com_context&task+section&id+2&Itemid+73 >. Acesso em: 12

ago. 2010.

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Capítulo 01A constituição da profissionalidade docente...

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antigamente se tinha essa visão [...] a faculdade me fez enxergar além... [...] eu passei a enxergar outros [textos]”.

Assim, toda a complexidade de que se reveste a história do ensino da Língua Portuguesa em nosso contexto educacional impõe, por con-seguinte, que os professores estejam em constante formação.

As palavras da professora, postas em epígrafe, mais uma vez cor-roboram o que vimos apresentando. Quando a professora diz: “[...] eu trabalhava muito com textos assim... qualquer texto para mim... quanto mais fáceis... Antigamente se tinha essa visão, por exemplo, quando tu falaste da letra T [referindo-se a uma outra professora], procurava tex-tos que tinha um monte de T, aquela coisa... eram textos de cartilha [...]”, este seu posicionamento em relação ao trabalho com textos, de traba-lhar com “qualquer texto”, e “quanto mais fáceis [melhores]”, expõe que a professora desenvolvia um ensino em que os conteúdos valiam por si mesmos, um ensino marcado pela ênfase dada a aspectos superficiais da linguagem, em que o saber sobre a língua torna-se mais importante do que o domínio de seus usos. Os textos quando objetos de ensino eram de livros didáticos, não importando se eram ou não significativos aos alunos. Mas a situação narrada também aponta mudança. O ingresso no curso superior possibilitou, então, a essa professora “enxergar além”, comprovando a importância da formação continuada.

Leia mais!

Retome o livro de Linguística Textual, Unidade A, em que as autoras apresentam um panorama histórico da Linguística Textual. Releia tam-bém o de Literatura e Ensino, Unidades B e C.

Atividade

Reflita e troque ideias com seus colegas, tutores e professores Ӳsobre as questões propostas a seguir. Anote suas ideias para ir cotejando-as com as leituras dos próximos capítulos. Figura 4 – Reflexão

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Metodologia do Ensino

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O que é ensinar Língua Portuguesa e Literatura?•

Que conhecimentos são necessários ao professor de Língua Por-•

tuguesa e Literatura? Que capacidades lhe são requeridas?

Que fatores intervêm nos modos de organização escolar e na •

prática pedagógica dos professores?

O que dizem os documentos que orientam essa prática de ensi-•

no de Língua Portuguesa e Literatura? de Língua Portuguesa e

Literatura?

Afinal, qual é a função do professor de Língua Portuguesa e Li-•

teratura?

Reflexões sobre essas questões sugeridas serão desenvolvidas nos ca-

pítulos que seguem, pois, como dissemos, a profissionalidade docente

reveste-se de toda a complexidade que permeia a sociedade e, por ser

um fenômeno social, requer que se compreenda o contexto de atua-

ção do professor.

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Capítulo 02A organização das escolas e as linhas de pensamento pedagógico...

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A organização das escolas e as linhas de pensamento pedagógico no contexto do desenvolvimento das políticas educacionais vigentes

Nossas escolas hoje mantêm a organização que apresentavam desde o início de sua existência. Os alunos são agrupados, em geral, por faixa etária, distribuídos em turmas ou séries que por um período de tempo, em média quatro horas, ocupam as denominadas salas de aula, espaços físicos retangulares e com características idênticas (principalmente nas escolas públicas), mesmo tratando-se de comunidades culturais diver-sas. Os prédios escolares são construídos dentro de um mesmo padrão: salas de administração e corredores que dão acesso às salas de aula, as quais se distribuem uma após a outra.

Nas salas de aula, os alunos sentam-se em carteiras, enfileiradas uma atrás da outra. O professor posiciona-se, em geral, à frente dos alu-nos, dirigindo-se a todos ao mesmo tempo, e em algumas situações faz perguntas a alunos em particular e os demais, quando desejam mani-festar-se, levantam o braço – sinal de pedir licença para fazer uso da palavra. São poucos os momentos em que se mudam os padrões de in-teração, o que faz com que a cultura escolar perpetue formas de comu-nicação bastante diferentes daquelas usadas fora da escola. São modos de uso da língua empregados apenas no ambiente escolar.

O desenvolvimento dos meios de comunicação e as mudanças por que passa a sociedade tornam-na cada vez mais grafocêntrica, e o avan-ço dos recursos tecnológicos de comunicação (web, internet) impõem novos modos de uso da linguagem verbal, o que constitui desafio ao tra-balho docente no sentido de possibilitar que os alunos tenham acesso a esse conhecimento e possam assim participar das várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita.

Embora continuem persistindo modos de ensinar como aqueles que Paulo Freire denominava de educação bancária, em que o professor

Sociedade GrafocêntricaDizemos que uma so-ciedade é grafocêntrica quando nela a escrita desempenha papel im-portante; as atividades nas instâncias sociais são centradas na escri-ta, ou seja, a escrita faz parte das situações do cotidiano da maioria das pessoas.

2

Sugerimos, para enrique-cer seus conhecimentos sobre formas de interação em sala de aula, a leitura do seguinte livro: COX, Maria Inês Pagliarini; ASSIS-PETERSON, Ana An-tônia de (Orgs.). Cenas de sala de aula. Campinas: Mercado de Letras, 2001.

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Metodologia de Ensino

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se julga o único conhecedor do assunto e o transmite/entrega aos alunos como se o saber fosse uma mercadoria, há outros em que os professores ousam mudar tal condição, como aqueles em cujas interações em sala de aula o professor se coloca como mediador, no processo de aprendiza-gem, entre o conhecimento que os alunos já possuem e o que precisa ser ensinado. Vygotsky fala da passagem necessária de conceitos cotidia-nos a conceitos científicos, aqueles que a escola necessariamente tem de ensinar, aumentando assim as experiências de linguagem dos alunos, promovendo sempre mais a inclusão social e provocando aprendizagem e desenvolvimento.

Conceitos cotidianos e conceitos científicos – essas expressões são conceitos da teoria de Lev Vygotsky (1896-1934). Vygotsky conce-be o desenvolvimento humano a partir das relações sociais que se esta-belece no decorrer da vida. Ele atribui papel preponderante às relações sociais. A corrente pedagógica que se originou de seu pensamento é chamada de sócio-histórica ou sociocultural. Segundo sua teoria, o pro-cesso de ensino e de aprendizagem constitui-se por meio de interações que vão se dando nos diversos contextos sociais, razão pela qual a sala de aula é lugar privilegiado para a sistematização do conhecimento e o professor passa a ocupar o papel de mediador na construção do saber. São conceitos-chave na teoria de Vygotsky: zona de desenvolvimento proximal e mediação. A zona de desenvolvimento proximal “é a distân-cia entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvol-vimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes” (VYGOTSKY, 1989). Infere-se deste conceito que há ensino quando a criança, através da mediação do professor, atinge um nível de compreensão e habilidade que não dominava completamente, apreen-dendo um novo conhecimento, ampliando suas estruturas cognitivas. Por conseguinte, a intervenção pedagógica provoca avanços que não ocorreriam espontaneamente. O outro conceito-chave, de mediação, diz respeito a toda relação do indivíduo com o mundo que é feita por meio de instrumentos técnicos – por exemplo, as ferramentas agrícolas, que transformam a natureza – e instrumentos simbólicos, como a lingua-

Depois da tradução de 2001 do livro escrito por

Vygotsky A construção do pensamento e da lingua-gem, por recomendação

de Paulo Bezerra, nomeia-se zona de desenvolvimen-

to imediato.

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Capítulo 02A organização das escolas e as linhas de pensamento pedagógico...

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gem – que traz consigo conceitos consolidados da cultura à qual perten-ce o sujeito. Nesse processo de mediação e, portanto, de aprendizagem, tem-se a formação de conceitos científicos. Os conceitos cotidianos, ou espontâneos, são aqueles formados a partir de vivências, da observação do mundo; já os conceitos científicos estão relacionados à instrução in-tencional. Conceitos cotidianos e científicos influenciam-se reciproca-mente. Com relação ao aprendizado da escrita, por exemplo, ao adquirir esse conhecimento, o aluno adquire também capacidades de reflexão e controle do próprio funcionamento psicológico.

Diferentes turmas de alunos terão diferentes modos de reagir a cada uma das formas de interação, o que aumenta a importância de se compreender na formação docente não apenas aspectos do domínio de conteúdos e habilidades específicas, mas também a constituição das in-terlocuções na sala de aula, da organização socioespacial do ambiente educativo.

2.1 Linhas do pensamento pedagógico no contexto do desenvolvimento das políticas educacionais vigentes

A década de 1960 foi marcada por uma educação de perspectiva tecnicista, como já mencionamos. Posteriormente, foi influenciada por correntes teóricas de cunho comportamentalista e comunicacional, época em que prevaleceu a concepção de linguagem como instrumento de comunicação no ensino da Língua Portuguesa. A partir da década de 1970, as discussões e análises da educação brasileira, realizadas por intelectuais de campos do conhecimento como a Filosofia, a Sociolo-gia, a História e a Educação, passaram a incorporar aspectos políticos, econômicos, sociais e pedagógicos, com orientação da teoria socioló-gica dialético-marxista. No bojo dessas discussões, as ideias de Paulo Freire foram também de grande importância para as mudanças ocor-ridas na educação brasileira e de outros países. Além disso, reafirmando o que dissemos no capítulo anterior, outras perspectivas teóricas têm sido consideradas no ensino. São elas: o construtivismo piagetiano e a

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Metodologia de Ensino

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psicogênese da linguagem escrita, desenvolvida por Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1986); a teoria sócio-histórica de Vygotsky e o desen-volvimento da escrita na criança, segundo estudos de Vygotsky, Luria e Leontiev (2001), dentre outros autores; as metodologias de ensino da língua segundo a pedagogia de Celestin Freinet (1997); e outros modos de ensinar, motivados também pelo conjunto de iniciativas estaduais e municipais, tais como a Constituição Brasileira de 1988, a Lei de Dire-trizes e Bases da Educação Nacional (Lei no 9394/96), os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e, em seguida, para o Ensino Médio, documentos relacionados com estudos e pesquisas aca-dêmicas sobre educação, alfabetização e ensino da Língua Portuguesa.

No estado de Santa Catarina, a ancoragem metodológica está fortemente

pautada em Vygotsky, Luria e Leontiev. Em vista disso, houve um processo

de reorientação curricular embasado no pensamento histórico-cultural, e

a partir dele a proposta curricular foi construída de forma democrática,

com a participação de grupos de trabalho e estudos, envolvendo educa-

dores da rede pública de ensino e professores de universidades como con-

sultores. Esse processo resultou na elaboração de uma proposta curricular

para o Estado, cuja primeira versão data de 1991, publicada em forma de

caderno. A segunda edição da Proposta Curricular de Santa Catarina foi

publicada em 1998 e constituiu-se de três volumes: As disciplinas curricu-

lares, Os temas multidisciplinares e As disciplinas de formação para o

magistério. Em 2003, houve outra atualização, e em 2005 foram publica-

dos os Estudos Temáticos. Ressaltamos que processos semelhantes ocor-

reram em outros estados e municípios brasileiros.

Tecidas essas considerações, e tendo em vista a importância dos pensadores anteriormente mencionados, apresentamos uma pequena síntese, no quadro a seguir, com informações relevantes acerca de cada um desses estudiosos citados até aqui.

Vygotsky, Lúria e Leontiev são teóricos da psicologia

histórico-cultural que in-vestigaram o desenvolvi-

mento da mente humana com base nos princípios do materialismo dialéti-co, de tradição filosófica

marxista.

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Capítulo 02A organização das escolas e as linhas de pensamento pedagógico...

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Pensadores relacionados a outras perspectivas teóricas

Figura 5 - Emilia Ferreiro

Emilia Ferreiro, psicolinguista argentina, com base na teoria genética de Piaget, desenvolveu pesquisas sobre como as crianças constroem o conhecimento no processo de aquisição da escrita, estabelecendo um marco no desenvolvimento de estudos sobre o processo de alfabeti-zação, no Brasil. São obras importantes desta autora: Alfabetização em processo (Cortez Editora e Editora Autores Associados, 2. ed., 1986) e Psicogênese da língua escrita, em coautoria com Ana Teberosky, publi-cado pela Artes Médicas, 1986.

Figura 6 - Ana Teberosky

Ana Teberosky, também argentina, doutora em psicologia e docente do Departamento de Psicologia Evolutiva e de Educação da Univer-sidade de Barcelona, é reconhecida por suas pesquisas sobre alfabe-tização. Além de Psicogênese da língua escrita, trabalho realizado em conjunto com Emilia Ferreiro, tem publicadas, dentre outras obras, Psi-copedagogia da linguagem escrita (Trajetória/UNICAMP, 1989), Apren-dendo a escrever (Ática, 1994) e Além da alfabetização, em coautoria com Tolchinsky, L. (Ática, 1995).

Figura 7 - Lev Vygotsky

Lev Vygotsky (1896-1934), como já mencionamos, explicou pela perspectiva do campo da psicologia a constituição histórico-social do desenvolvimento humano no processo de apropriação da cultura mediante a comunicação com outras pessoas, em que na mediação da linguagem os signos adquirem significado e sentido (VYGOTSKY, 1984, p. 59-65). Conheça algumas obras de Vygotsky:

VYGOTSKY, L. V. Pensamento e linguagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fon-tes, 1991; VIGOTSKI, L. V. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001; VYGOTSKY, L. V. A formação social da mente. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991; VYGOTSKY, L. V.; LÚRIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9. ed. São Paulo: Ícone, 2001.

Figura 8 - Alexander Luria

Alexander Luria (1902-1977) realizou estudos especialmente sobre as relações entre linguagem e desenvolvimento intelectual. Em suas pesquisas, juntamente com Vygotsky e Leontiev, desenvolve a tese de que os processos mentais são histórico-culturais em sua origem e de-monstra haver alterações fundamentais no modo de funcionamento psicológico dos sujeitos em decorrência de processos de alfabetiza-ção e escolarização e de mudanças nas formas de trabalho. Conheça algumas obras de Luria:LURIA, A. R. Desenvolvimento cognitivo: seus fundamentos culturais e so-ciais. São Paulo: Ícone, 1990; LURIA, A. R. Curso de psicologia geral, 4 v., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.

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Metodologia de Ensino

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Pensadores relacionados a outras perspectivas teóricas

Figura 9 - Alexis Leontiev

Alexei Leontiev (1903-1979) desenvolveu o conceito de atividade, pesquisou os vínculos entre os processos da mente e a atividade hu-mana concreta. Explicou que na relação ativa do sujeito com o objeto, a atividade se concretiza por meio de ações, operações e tarefas, sus-citadas por necessidades e motivos. Para ele, uma atividade distingue-se de outra pelo seu objeto e se realiza nas ações dirigidas a este ob-jeto. Desse modo, a atividade humana não pode existir a não ser em forma de ações ou grupos de ações que lhes são correspondentes. A atividade laboral se manifesta em ações laborais, a atividade didática em ações de aprendizagem, a atividade de comunicação em ações de comunicação e assim por diante. (LEONTIEV, 1983). Conheça alguns trabalhos de Leontiev: LEONTIEV, A. N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Hori-zontes, 1978; LEONTIEV, A. N. Uma contribuição à teoria do desenvol-vimento da psique infantil. In: VYGOTSKY, L.V.; LÚRIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 9. ed. São Paulo: Ícone, 2001. Esta última é uma obra clássica dos três autores, Vygotsky, Luria e Leontiev.

Figura 10 - Celestin Freinet

Celestin Freinet (1896 -1966) desenvolveu uma pedagogia que tem como base a aprendizagem através da experiência real do aluno. As práticas de elaboração de jornal escolar, troca de correspondências, trabalhos em grupo, aula-passeio já eram defendidas por ele nos anos de 1920 (século passado). São obras deste autor os três volumes: Mé-todo Natural I: a aprendizagem da língua; Método Natural II: A aprendi-zagem do desenho; Método Natural III: A aprendizagem da escrita, todos publicados pela Editorial Estampa, Lisboa, 1997.

Havemos de considerar, ainda, na história do desenvolvimento do processo educacional brasileiro, que a crescente urbanização da popu-lação brasileira tem trazido à escola número crescente de crianças de classes sociais desprivilegiadas e com cultura e variedades linguísticas distintas daquelas praticadas até então no ambiente escolar. Ademais, a ampliação da obrigatoriedade do ensino para nove anos tem refor-çado essa situação. Esses fatores, aliados à divulgação pela mídia dos resultados das avaliações nacionais de alunos e cursos, sem uma análise das variáveis que interferem nesses dados, continuam perpetuando o fracasso da escola.

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Capítulo 02A organização das escolas e as linhas de pensamento pedagógico...

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Assim como diferentes teorias filosófico-educacionais, as mudan-ças na sociedade têm repercussão na esfera educativa. Isso, evidente-mente, requer dos professores posicionamentos e reflexões diante do que se está atualizando ou mudando. Há sempre uma cobrança de tra-balho de qualidade, por parte da sociedade, e as políticas públicas, como já dissemos, ainda não chegaram em nível de resgatar a valorização do profissional da educação. Os salários continuam aquém do piso salarial de outras profissões e não tem havido estímulos à construção de ambien-tes de trabalho que favoreçam o desenvolvimento de projetos pedagó-gicos com continuidade, capazes de promover mudanças significativas na formação dos alunos. Por outro lado, há larga produção de material bibliográfico, tanto para professores como para alunos, e a maioria das escolas dispõe de internet, o que possibilita acessar a vasta produção de bibliografia digital. O ambiente virtual oferece ainda sites educativos, destinados exclusivamente a professores, portais institucionais, os quais possibilitam a atualização constante.

Pensar no ensino de Língua Portuguesa e Literatura implica, por-tanto, considerar todas as questões mencionadas, levando em conta, so-bremaneira, o avanço tecnológico que vem propiciando novos modos de sentir, de ver e de pensar as realidades vivenciadas. A internet chegou às escolas e temos outro desafio: incorporá-la como ferramenta imprescin-dível de acesso à informação e à produção de conhecimento. Afinal, nesse meio encontram-se instrumentos básicos de trabalho, de desenvolvi-mento social, de participação política, além de possibilitar o domínio de competências capazes de proporcionar práticas de letramento contínuo, entendidas como atividades estruturantes do “pensamento-linguagem” e da cultura (SILVA, 2003, p. 13).

O contexto cultural, econômico, científico e educacional impõe, por conseguinte, que a prática pedagógica incorpore, principalmente no que diz respeito ao ensino de Língua Portuguesa e Literatura, outros conceitos, tais como os de letramento e de gêneros do discurso. Como explicitado anteriormente, entendemos por letramento “[...] o estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita” (SOARES, 1998, p. 47); e por gêneros do discurso, os tipos relativamente estáveis de enunciados (BAKHTIN,

MEC, Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, Universidades e outras instituições.

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Metodologia de Ensino

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2003, p. 262), ou seja, os enunciados orais e escritos, concretos e únicos proferidos pelos falantes de acordo com as condições específicas e as finalidades de cada atividade humana. Esses conceitos reafirmam, então, a palavra em uso, em sua condição concreta de existência.

Leia mais!

A internet na escola − Sobre as mudanças no modo de pensar, de aprender e de se relacionar com o conhecimento nesta era da informação, sugerimos a leitura de:

RAMAL, Andréia Cecília. Educação na cibercultura: hipertextualidade, leitura, escrita e aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2002.

SILVA, Ezequiel Theodoro (Org.). A leitura nos oceanos da Internet. São Paulo: Cortez, 2003.

Atividade

Você conhece a proposta curricular do seu Estado? E a do seu Ӳmunicípio? Investigue o histórico de construção dessas pro-postas e socialize suas descobertas no seu grupo de estudo.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

Neste capítulo vamos tratar dos documentos que têm sido referên-cia para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura em nossas escolas. Eles visam a orientar gestores escolares e professores no planejamento das ações educacionais e atividades de sala de aula.

O ensino público no Brasil, como já vimos, é regido por leis espe-cíficas. A lei mais importante, atualmente, é a Lei No 9.394, de 20 de de-zembro de 1996, denominada de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que estabelece da educação em todos os níveis. Ela institui os dois níveis de educação que temos hoje: a educação básica, formada pela educação infantil e pelo Ensino Fundamental e Médio; e a educação superior.

Para atender aos princípios e objetivos estabelecidos nesta lei, o ar-tigo 9o da LDB estabelece que a União, os Estados e os Municípios devem elaborar, em cooperação, o Plano Nacional de Educação (PNE), para um período de 10 anos, estabelecendo metas para a década em questão. O PNE em vigor foi elaborado em 2001, com prazo até 2010. Destacamos que duas metas do PNE foram alcançadas nesse período: a implantação do Ensino Fundamental de 9 anos e o aprimoramento dos sistemas de informação e avaliação.

No que concerne à avaliação, o MEC tem avaliado todos os sistemas

de ensino, com exceção da Educação Infantil. Diversos estados e mu-

nicípios também têm feito suas aferições. Destacamos o Índice de De-

senvolvimento da Educação Básica (IDEB) que fornece um retrato da

Educação no Brasil. Assim, sugerimos que você verifique os índices da

Educação Básica em seu município, inclusive por escola, consultando o

site <http://ideb.inep.gov.br>.

Para saber mais sobre o PNE em vigor e quais metas foram atingidas ou não, consulte o site <http://www.revistaesco-la.abril.com.br/politicas-publicas/legislacao/pne-plano-nacional-de-educacao-537431.shtml>.

Em 2009, 59% das matrí-culas já foram feitas no novo sistema de seriação. A expectativa é que o índice de 2010 chegue a 100%. Esperam os espe-cialistas que com a garan-tia do ingresso na escola aos 6 anos as chances de a criança chegar aos 7 ou 8 anos sabendo ler e escre-ver sejam maiores do que antes. O grande desafio é garantir a qualidade do ensino.

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Metodologia de Ensino

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Para poder avaliar a qualidade do ensino no Brasil, foram criados a Prova Brasil e o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que são exames complementares. Essas avaliações são diagnósticas e visam a orientar o ensino para que se tenha educação de mais qualidade, por meio de possíveis mudanças das políticas públicas e de paradigmas uti-lizados nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.

A Prova Brasil é aplicada a cada dois anos, para quase todas as crianças e jovens matriculados na quarta e na oitava séries (quinto e nono ano). A primeira aplicação ocorreu em 2005, depois em 2007, e a última foi em 2009. Ela visa a medir as competências relacionadas à leitura e aos conhecimentos de matemática.

Por serem instrumentos de avaliação de amplitude nacional, tanto a Prova Brasil quanto o Saeb exigem a construção de uma matriz de referência, para a elaboração e avaliação dos testes que lhes confiram transparência e legitimidade, informando aos envolvidos, professores e alunos, o que e como o ensino e a aprendizagem serão avaliados. Essas matrizes têm por referência os Parâmetros Curriculares Nacionais e, se-gundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), também foram consultados professores regentes de clas-se de diferentes redes de ensino municipal, estadual e privado.

Hoje, portanto, são documentos de referência para o ensino da Língua Portuguesa o Sistema de Avaliação do Ensino Básico (Saeb), a Prova Brasil, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e os do-cumentos dos estados e municípios, que são as Propostas Curriculares Estaduais e Municipais.

Dentre as Propostas Curriculares de interesse para esta disciplina de Metodologia do Ensino de Português e Literatura, destacamos aque-las cujos estados e municípios estão envolvidos no curso de EaD, Letras/Português: Proposta Curricular de Santa Catarina, Diretrizes Curricula-res da Educação Básica do Paraná e Proposta Curricular – CBC (Con-teúdo Básico Comum) de Minas Gerais. Além das propostas estaduais, alguns municípios e a federação elaboraram seu Plano Municipal de Educação, e Pato Branco, no Paraná, é um deles.

Matrizes são as referên-cias para a elaboração

dos itens dos testes. Cada matriz de referência apre-

senta tópicos ou descri-tores. Veja quais são os

descritores que indicam as habilidades de Língua

Portuguesa e Matemática a serem avaliadas acessan-do o site <http:/portal.mec.

gov.br/dmdocuments/pro-va_brasil_matriz2.pdf>.

A Prova Brasil avalia estu-dantes das escolas públi-cas, localizadas em áreas urbanas, com mais de 20

alunos na série. Para saber mais sobre a Prova Brasil,

consulte o site <http:/portal.mec.gov.br/dmdo-

cuments/prova brasil_ma-triz2.pdf>.

Para ter acesso aos docu-mentos referidos, acesse:

Proposta Curricular de San-ta Catarina <http://www.sed.sc.gov.br/secretaria>;

Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná

<http://www.diaadiaedu cacao.pr.gov.br/diaadia/

diaadia/arquivos/File/diretrizes_2009/out_2009/

lingua_portuguesa.pdf>; Proposta Curricular – CBC

(Conteúdo Básico Comum) de Minas Gerais <http://

crv.educacao.mg.gov.br/sistema_crv/index.

asp?token=0E79FA4E- C91E-4CEF-A2AF-50

A9030C9829&usr> e Plano Municipal de Educação,

de Pato Branco, no Paraná <http://www.patobranco.

pr.gov.br/secretarias 5aspx>.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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No caso dos documentos que orientam o ensino de Língua Portu-guesa e Literatura no Ensino Fundamental e Médio, vamos destacar, de modo genérico, o que estabelecem os documentos com relação a obje-tivos, conteúdos, metodologias e formas de avaliação. Com relação aos objetivos de ensino, os Parâmetros Curriculares Nacionais para os anos finais do Ensino Fundamental estabelecem o seguinte:

No trabalho com os conteúdos previstos nas diferentes práticas, a escola

dever organizar um conjunto de atividades que possibilitem ao aluno

desenvolver o domínio da expressão oral e escrita em situações de uso

público da linguagem, levando em conta a situação de produção social e

material do texto (lugar social do locutor em relação ao(s) destinatário(s);

destinatário(s) e seu lugar social; finalidade ou intenção do autor; tempo

e lugar material da produção e do suporte) e selecionar, a partir disso,

os gêneros adequados para a produção do texto, operando sobre as di-

mensões pragmática, semântica e gramatical. (BRASIL, 1998, p. 49).

Esse objetivo mais amplo orienta, então, o estabelecimento dos ob-jetivos específicos quanto às diferentes modalidades da língua: oralida-de, escuta e leitura, produção oral e escrita de textos e análise linguística, todas considerando a linguagem em uso, ou seja, os diferentes gêneros discursivos que circulam nos diferentes campos da atividade humana.

Esses objetivos sustentam-se na concepção de linguagem como for-ma de interação humana e a de aprendizagem na perspectiva vygotskya-na. Assim,

Ao organizar o ensino, é fundamental que o professor tenha instrumen-

tos para descrever a competência discursiva de seus alunos, no que

diz respeito a: escuta, leitura e produção de textos, de tal forma que

não planeje o trabalho em função de um aluno ideal para o ciclo, mui-

tas vezes padronizado pelos manuais didáticos, sob pena de ensinar o

que os alunos já sabem ou apresentar situações muito aquém de suas

possibilidades e, dessa forma, não contribuir para o avanço necessário.

Nessa perspectiva, pode-se dizer que a boa situação de aprendizagem

é aquela que apresenta conteúdos novos ou possibilidades de aprofun-

damento de conteúdos já tematizados, estando ancorada em conteú-

dos já constituídos. Organizá-la requer que o professor tenha clareza das

finalidades colocadas para o ensino e dos conhecimentos que precisam

ser construídos para alcançá-las. (BRASIL, 1998, p. 48).

Para ter acesso à íntegra dos textos dos PCNs, acesse o site <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/portugues.pdf>.

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Metodologia de Ensino

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Vejamos o que diz a Proposta Curricular de Santa Catarina. A orientação teórica da Proposta Curricular de Santa Catarina tem por fundamento a psicologia histórico-cultural de Vygotsky e a concep-ção de linguagem de Bakhtin. A linguagem – sob o ponto de vista de suas múltiplas funções – é considerada uma prática social, ou seja, é acontecimento social, uma forma de interação. (BAKHTIN, 1990). Da mesma forma que os PCNs, essa proposta orienta-se com base na concepção interacionista da linguagem, portanto, pela teoria do dialo-gismo – Bakhtin (1990).

As Diretrizes da Educação Básica do Paraná seguem a mesma orientação teórica da Proposta Curricular de Santa Catarina; vejamos: “O ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa visa aprimorar os co-nhecimentos lingüísticos e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender os discursos que os cercam e terem condições de interagir com esses discursos” (PARANÁ, 2009, p. 50).

Os documentos, de modo geral, consideram a escola um espaço de promoção do letramento do aluno. Nela, as práticas de uso da lín-gua se dão por meio de diferentes gêneros discursivos, com diferentes funções sociais.

A Proposta Curricular de Minas Gerais, nas suas diretrizes peda-gógicas para o Ensino Fundamental do 6o ao 9o ano, estrutura-se com base nos mesmos fundamentos teóricos das propostas curriculares de Santa Catarina e do Paraná. Desse conjunto de diretrizes, destacamos as razões para ensinarmos Língua Portuguesa na escola expostas na Pro-posta Curricular de Minas Gerais:

[...] ensinamos linguagem, não para “descobrir” o verdadeiro significado

das palavras ou dos textos, nem para conhecer estruturas abstratas e

regras de gramática, mas para construir sentidos, sempre negociados e

compartilhados, em nossas interações. Nosso conceito de natureza e de

sociedade, de realidade e de verdade, nossas teorias científicas e valores,

enfim, a memória coletiva de nossa humanidade está depositada nos

discursos que circulam na sociedade e nos textos que os materializam.

Textos feitos de gestos, de formas, de cores, de sons e, sobretudo, de

palavras de uma língua ou idioma particular. Assim, a primeira razão e

sentido para aprender e ensinar a disciplina está no fato de considerar-

mos a linguagem como constitutiva de nossa identidade como seres

Para ler a Proposta Curri-cular de Santa Catarina,

acesse: <http://www.sed.sc.gov.br/secretaria>.

Leia o texto na íntegra, acessando: <http://www.

diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diaadia/arqui-

vos/File/diretrizes_2009/out_2009/lingua_

portuguesa.pdf>

Para ler a Proposta Cur-ricular de Minas Gerais,

acesse: <http://crv.educacao.mg.gov.br/

sistema_crv/index.asp?id_projeto=27&id_objeto=38877&tipo=ob&cp=000098&c

p=&n1=&r>.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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humanos, e a língua portuguesa como constitutiva de nossa identidade

sociocultural. (MINAS GERAIS, 2006, p. 12).

A linguagem é compreendida, nas propostas curriculares desses Es-tados, como prática social, como atividade discursiva por meio da qual os usuários se constituem sujeitos do discurso, desenvolvendo habilida-des sociocognitivas e apropriando-se de conhecimentos e de culturas necessárias à sua inserção no meio em que vivem. Consta na proposta de Minas Gerais:

Ao se constituir e se realizar no espaço eu-tu-nós, sempre concreto e

contextualizado, a linguagem nos constitui como sujeitos de discurso

e nos posiciona, do ponto de vista político, social, cultural, ético e esté-

tico, frente aos discursos que circulam na sociedade. A língua não é um

todo homogêneo, mas um conjunto heterogêneo, múltiplo e mutável

de variedades, com marcas de classes e posições sociais, de gêneros e

etnias, de ideologias, éticas e estéticas determinadas. Nesse sentido, en-

sinar e aprender linguagem significa defrontar-se com as marcas discur-

sivas das diferentes identidades presentes nas variedades lingüísticas.

Significa tornar essas variedades objeto de compreensão e apreciação,

numa visão despida de preconceitos e atenta ao jogo de poder que

se manifesta na linguagem e pela linguagem. Não podemos deixar de

lembrar aqui as razões que devem nortear nosso papel como mediado-

res das experiências dos alunos com a interlocução literária. O sentido

do ensino e da aprendizagem impõe a ampliação de horizontes, de for-

ma a reconhecer as dimensões estéticas e éticas da atividade humana

de linguagem, só ela é capaz de tornar desejada a leitura de poemas e

narrativas ficcionais. É essencial propiciar aos alunos a interlocução com

o discurso literário que, confessando-se como ficção, nos dá o poder de

experimentar o inusitado, de ver o cotidiano com os olhos da imagina-

ção, proporcionando-nos compreensões mais profundas de nós mes-

mos, dos outros e da vida. (MINAS GERAIS, 2006, p. 12).

Os objetivos de ensino expressos nos diferentes documentos de re-ferência definem como objeto do ensino da Língua Portuguesa aquele por nós já mencionado: a linguagem em uso, ou seja, os textos orais e escritos que nós mesmos produzimos, que são produzidos por outros na sociedade de modo geral, os que circulam em nosso meio, aqueles dos quais fazemos uso para nos informar, para formar e partilhar opiniões, para nos orientar, para lazer, para informar alguém, para emitir opinião, para registrar nossas memórias, para expressar ideias e sentimentos,

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Metodologia de Ensino

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para produzir cultura, enfim todas as formas de linguagem verbal que constituem nossa humanidade.

Elegendo os diferentes textos, os quais materializam gêneros que são pro-

duzidos nos diferentes campos da atividade humana, o conteúdo do ensino

é a própria linguagem verbal, os recursos que ela oferece para que se pro-

duzam esses gêneros, a sua gramática, como ela se estrutura para tornar

possível a interação entre os falantes. Na língua têm-se, então, os estudos

no eixo sintagmático, que tratam da combinação das palavras para for-

mar sentenças; os estudos no eixo paradigmático, que tratam das palavras

enquanto “unidades da língua que apresentam certa autonomia formal”

(MARGOTTI, 2008); os estudos gramaticais de modo geral, conhecimentos

e conceitos que possibilitam a descrição e a análise da língua sob diferentes

abordagens (formal, funcional); os estudos sobre texto, textualidade e pa-

drões de textualidade; os conhecimentos de sociolinguística, que possibili-

tam compreender as relações entre as formas da língua e os diferentes gru-

pos sociais que as utilizam; e conhecimentos sobre a linguagem literária.

Certamente todos esses estudos científicos são importantes para o professor, que, ao deles se apropriar, será capaz de fazer a mediação en-tre os conhecimentos que os alunos já possuem e aqueles de que ainda necessitam ter o domínio para tornarem-se sempre mais capazes de ler e escrever de modo competente e adequado nas mais variadas situações em que a língua é requerida socialmente. Tais conhecimentos propi-ciarão ao professor avaliar o nível de conhecimento dos alunos no que diz respeito às diferentes modalidades da língua (a escuta, a leitura e a produção de textos orais e escritos), de tal forma que o processo de en-sino ancore-se em conteúdos já apreendidos e aprofunde-os ou avance na aprendizagem de novos conteúdos, segundo os objetivos de ensino e aprendizagem para dada situação.

Em se tratando do ensino da linguagem em uso, os conteúdos serão trabalhados não em séries ordenadas por assuntos, mas sim, usando termos dos PCNs, de forma espiralada e progressiva. Podemos, portanto, sintetizar os objetivos do ensino de Língua Portuguesa e Literatura nos anos finais do Ensino Fundamental com o que dizem os PCNs (BRASIL, 1998, p.22):

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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O objeto de ensino e, portanto, de aprendizagem é o conhecimento lin-

guístico e discursivo com o qual o sujeito opera ao participar das práti-

cas sociais mediadas pela linguagem. Organizar situações de aprendiza-

do, nessa perspectiva, supõe: planejar situações de interação nas quais

esses conhecimentos sejam construídos e/ou tematizados; organizar

atividades que procurem recriar na sala de aula situações enunciativas

de outros espaços que não o escolar, considerando-se sua especifici-

dade e a inevitável transposição didática que o conteúdo sofrerá; saber

que a escola é um espaço de interação social onde práticas sociais de

linguagem acontecem e se circunstanciam, assumindo características

bastante específicas em função de sua finalidade: o ensino.

Nessa perspectiva de ensino, na qual o professor é o interlocutor privilegiado nas situações de uso da linguagem, os PCNs enfatizam que o aluno dos anos finais do Ensino Fundamental é o jovem adolescente cujo processo de desenvolvimento caracteriza-se, dentre outros fatores, pela ampliação das formas de raciocínio, organização e representação, de expressão de observações e opiniões. Do mesmo modo, é caracte-rístico o desenvolvimento da capacidade de investigação, levantamento de hipóteses, abstração, análise e síntese na direção de raciocínio cada vez mais formal, o que traz a possibilidade de constituição de conceitos mais próximos dos científicos. É característico ainda dessa fase de de-senvolvimento um tipo de comportamento tomado de valores específi-cos dessa faixa de idade, os quais atuam como forma de identidade em relação ao lugar que esses jovens adolescentes ocupam na sociedade e nas relações que estabelecem com os adultos e seus pares. Tais valores se evidenciam, principalmente, no tipo de linguagem em que há a incor-poração e criação de modismos, uso de vocabulário específico, formas de expressão adotadas em função da atividade exercida – é o caso dos surfistas, esqueitistas, funkeiros, etc. –, caracterizadas como falas típicas de determinados grupos. Por essa razão, o trabalho com a linguagem, esta entendida como constitutiva e constituidora do sujeito, impõe que a reflexão seja uma constante, a fim de permitir o reconhecimento, pelo adolescente, da própria linguagem e de seu lugar no mundo, bem como a percepção das outras formas de organização do discurso, principal-mente daquelas dos textos escritos.

A prática de reflexão sobre a língua – análise linguística –, atividade constante em todo o processo de ensino e aprendizagem, visa, então, ao

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Metodologia de Ensino

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desenvolvimento da capacidade de o aluno produzir e interpretar tex-tos, na participação em práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita, de modo ético, crítico, criativo e democrático. Em se tratando de prática de análise linguística, no ensino dos anos iniciais, por exemplo, priorizamos atividades epilinguísticas em que a reflexão se volta para o uso, para o interior da própria atividade, como tomada de consciência da própria produção e interpretação. Já nos anos finais, em que se es-pera que os alunos tenham se apropriado de conhecimentos que lhes possibilitem produzir discursos orais e escritos, para responder às de-mandas das esferas de comunicação mais próximas de seu cotidiano, atividades metalinguísticas fazem-se necessárias para que o domínio de conhecimentos sobre a linguagem possibilite a expansão dos níveis de letramento escolar dos alunos. As atividades metalinguísticas são aque-las voltadas à descrição, sistematização e categorização dos elementos de que se compõe a língua.

Em relação ao Ensino Médio, a LDB/5692/71 indicava que a língua portuguesa fosse ministrada em duas disciplinas assim nominadas: Lín-gua Portuguesa e Literatura, com ênfase na literatura brasileira. Os Parâ-metros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio PCNEM, apoiados na LDB/9394/2006, em vigor, concebem a organização curricular deste nível de ensino dispostas em três grandes áreas: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias. O ensino da Língua Portuguesa e de Literatura insere-se, por conseguinte, na área de Linguagens, Códi-gos e suas Tecnologias (BRASIL, 2000, p. 17). A natureza social e intera-tiva da linguagem é enfatizada nos PCNEMs e não mais se compreende a literatura separada da língua, pois ela é da mesma forma compreendi-da como representação simbólica das experiências humanas manifestas nas diferentes formas de sentir, pensar e agir na vida social.

A LDB 9394/1996, no artigo 35, estabelece as seguintes finalidades para o Ensino Médio:

Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração de

três anos, terá como finalidades: I - a consolidação e o aprofundamento

dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o

prosseguimento de estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a

cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz

A atividade metalinguís-tica “[...] desenvolve-se no sentido de possibilitar ao aluno o levantamento de

regularidades de aspectos da língua, a sistematização

e a classificação de suas características específi-

cas” (BRASIL, 1997, p. 39). [Ensina-se a falar sobre a

língua.]

Para ler o texto na íntegra, acesse: <http://portal.

mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/14_24.pdf.>.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aper-

feiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa

humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia

intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos

científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria

com a prática, no ensino de cada disciplina. (BRASIL, 1996, não paginado).

Este nível de ensino requer, então, prática pedagógica diferenciada daquela do Ensino Fundamental ao considerar também as competên-cias que se espera sejam desenvolvidas na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, tais como:

• Confrontaropiniõesepontosdevistasobreasdiferenteslinguagens

e suas manifestações específicas.

• Compreendereusarossistemassimbólicosdasdiferenteslinguagens

como meios de organização cognitiva da realidade pela constituição

de significados, expressão, comunicação e informação.

• Analisar,interpretareaplicarosrecursosexpressivosdaslinguagens,

relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, fun-

ção, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as con-

dições de produção e recepção.

• Compreendereusaralínguaportuguesacomolínguamaterna,ge-

radora de significação e integradora da organização do mundo e da

própria identidade. (BRASIL, 2000, p. 8-10).

Em síntese, podemos dizer que no Ensino Médio, como indicam os documentos mencionados, objetiva-se o aprofundamento dos conheci-mentos adquiridos no Ensino Fundamental.

As propostas curriculares estaduais para o Ensino Médio seguem os princípios dos PCNEMs, enfatizando, no entanto, o cuidado em se continuar trabalhando a linguagem como construção de sentidos, ne-gociados e compartilhados em nossas interações verbais. A Proposta Curricular de Minas Gerais representa o que está posto nas de Santa Catarina e do Paraná em outras palavras:

Nosso conceito de natureza e de sociedade, de realidade e de verdade,

nossas teorias científicas e valores, enfim, a memória coletiva de nossa

humanidade está depositada nos discursos que circulam na sociedade e

nos textos que os materializam. Textos feitos de gestos, de formas, de co-

res, de sons e, sobretudo, de palavras de uma língua ou idioma particu-

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Metodologia de Ensino

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lar. Assim, a primeira razão e sentido para aprender e ensinar a disciplina

está no fato de considerarmos a linguagem como constitutiva de nossa

identidade como seres humanos, e a língua portuguesa como constitu-

tiva de nossa identidade sociocultural. (MINAS GERAIS, 2006, p. 12).

A leitura dos PCNs e das propostas curriculares de cada estado, acompanhada de discussões pelos profissionais da educação, é funda-mental para que o exercício da docência se faça em consonância com os objetivos propostos nesses documentos. Para organizar o ensino que se pretende desenvolver faz-se necessário conhecer os documentos oficiais que são referência para esse ensino e ter clareza dos objetivos pedagó-gicos a serem atingidos.

Os PCNs+, por exemplo, pressupondo que ao longo do Ensino Fundamental tenham sido aprendidos conhecimentos básicos sobre o funcionamento da língua portuguesa, estabelece que

[...] cabe ao ensino médio oferecer aos estudantes oportunidades de uma

compreensão mais aguçada dos mecanismos que regulam nossa língua,

tendo como ponto de apoio alguns dos produtos mais caros às culturas

letradas: textos escritos, especialmente os literários. As competências e ha-

bilidades propostas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio (PCNEM) permitem inferir que o ensino de Língua Portuguesa, hoje,

busca desenvolver no aluno seu potencial crítico, sua percepção das múl-

tiplas possibilidades de expressão lingüística, sua capacitação como leitor

efetivo dos mais diversos textos representativos de nossa cultura. Para além

da memorização mecânica de regras gramaticais ou das características de

determinado movimento literário, o aluno deve ter meios para ampliar e

articular conhecimentos e competências que possam ser mobilizadas nas

inúmeras situações de uso da língua com que se depara, na família, entre

amigos, na escola, no mundo do trabalho. (BRASIL, 2002, p. 55).

A ação pedagógica em sala de aula pressupõe, por conseguinte, a mediação do professor no sentido de trazer para a sala de aula textos que materializem os diferentes discursos que circulam socialmente, considerando sempre suas condições de produção e circulação, e esti-mular a produção oral e escrita observando os mesmos critérios. Como salienta Kleiman (2005):

Quanto mais a escola se aproxima das práticas sociais em outras insti-

tuições, [ou de outras práticas de linguagem utilizadas pelos alunos nos

corredores da escola, fora da sala] mais o aluno poderá trazer conheci-

PCNs+ : Orientações edu-cacionais complementares

aos Parâmetros Curricu-lares Nacionais, para os

diferentes níveis e modali-dades de ensino.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

43

mentos relevantes das práticas que já conhece, e mais fáceis serão as

adequações, adaptações e transferências que ele virá a fazer para outras

situações da vida real. (KLEIMAN, 2005, p. 23).

Quanto mais significativas forem as atividades de linguagem para os alunos, melhores serão os resultados do processo de ensino e apren-dizagem de Língua Portuguesa e Literatura.

Leia mais!

Caro aluno, indicamos a releitura dos livros de EaD que fizeram parte de sua formação até esta etapa de curso, pois são elementos importantes na cons-trução de propostas de trabalho para a docência. Dentre eles, destacamos:

Estudos Gramaticais, de Edair Maria Görski e Claúdia Andrea Rost.

Morfologia do Português, de Felício Wessling Margotti.

Sintaxe do português, de Carlos Mioto.

Linguística Textual, de Rosângela Hammes Rodrigues, Nívea Rohling da Silva e Vidomar Silva Filho.

Sociolinguística, de Izete Lehmkuhl Coelho, Edair Maria Görski, Gui-lherme Henrique May e Christiane Maria Nunes de Souza.

3.1 Metodologia do ensino da Língua Portuguesa e Literatura

Os documentos de referência para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura nos anos inicias do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, ainda que apresentem alguma divergência na fundamentação teórica de suas proposições, apontam para o alcance de objetivo comum à educa-ção oficial: a formação do cidadão capaz de dar conta das demandas de uso da linguagem oral e escrita (leitura e escritura) do meio social em que se insere, de forma crítica e criativa. Da mesma forma, os do-cumentos propõem que os conteúdos não sejam ensinados como um fim em si mesmos, porém como “[...] meio para que os alunos desen-volvam capacidades que lhes propiciem produzir e usufruir os bens cul-turais, materiais e econômicos” (BRASIL, 1997a, p. 73). Assim, estarão “[...] ampliando o domínio ativo do discurso nas diferentes situações

PCNs, Saeb, Propostas Curriculares de Estados e Municípios.

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Metodologia de Ensino

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comunicativas [...] de modo a possibilitar sua inserção efetiva no mun-do da escrita, ampliando suas possibilidades de participação social no exercício da cidadania” (BRASIL, 1998, p. 32).

Buscando sintetizar o que dizem os documentos de referência sobre o

ensino de Língua Portuguesa e Literatura e no intuito de orientar a ação

docente, propomos encaminhamentos por meio dos quais julgamos

ser possível contribuir para que a formação desse sujeito, pela e na in-

teração com o outro, mediada pela linguagem, possa exercer de forma

crítica e criativa sua cidadania.

Assim, não faremos distinção entre metodologias para os anos fi-nais do Ensino Fundamental e o Ensino Médio, nem proporemos for-mas de avaliação específicas para um ou outro ensino. Apenas procura-remos traçar certos princípios que orientem a atividade da docência em Língua Portuguesa e Literatura, indicando o que se considera adequado à consecução dos objetivos propostos, frente à produção acadêmico-científica, pedagógica e aos documentos oficiais em circulação na nossa contemporaneidade.

As mudanças na área da educação a partir da década de 1990, oca-sionadas, dentre outros fatores, pelas teorias filosófico-educacionais e linguísticas que passam a sustentar os documentos orientadores do en-sino, conforme já referido em capítulo precedente, vêm acompanhadas também de discussão, iniciada na Europa, mais precisamente na Fran-ça, sobre os conceitos de transposição didática (CHEVALLARD, 1985; 1991) e de elaboração didática (HALTÈ, 1998).

As mudanças no ensino de língua fazem-se sentir principalmente em vir-

tude dos estudos de Bakhtin, que desenvolve a teoria dos gêneros do dis-

curso, baseada em concepção de língua como interação verbal. No ensino

da Língua Portuguesa, em nosso caso, tem-se alteração significativa, tanto

no que se refere ao objeto de ensino, como mencionado anteriormente,

como às metodologias, passando-se do ensino centrado na gramática

para a inserção de atividades de oralidade, escuta e leitura e de produção

textual, oral e escrita e análise linguística.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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Os professores necessitam, portanto, apropriarem-se desses saberes acadêmico-científicos para ensiná-los. Porém, ao convertê-los em obje-tos de ensino, precisam modificá-los, ou seja, convertê-los em conteúdos curriculares. Essa interface entre a produção acadêmico-científica sobre a língua e os conteúdos a serem “didatizados” é o que se denomina trans-posição didática – o saber se transforma em objeto de ensino “ensinável”, em condições de ser aprendido pelo aluno (CHEVALLARD, 1985).

A esse conceito de transposição didática, Haltè (1998) contrapõe o conceito de elaboração didática. Esse autor, tomando como exem-plo o ensino de francês, destaca a complexidade do objeto de ensino da língua, “que coloca em circulação conhecimentos de categorias que se interpenetram, pois envolvem conhecimentos científicos, práticas de referência, conhecimentos especializados e conhecimentos gerais” (RODRIGUES, 2009, p. 135). Para Haltè (1998, p. 191 apud RODRI-GUES, 2009, p. 135), “[...] a noção de transposição didática preconiza o aplicacionismo, a partir de um processo descendente do conhecimento científico para o conhecimento a ser ensinado, purificando os objetos de ensino e provocando uma perda de sentido para os aprendizes”. Já a elaboração didática dos conhecimentos a serem ensinados e aprendi-dos preconiza um ensino que o autor denomina implicacionista, opera-cional e reflexivo; uma didática praxiológica, fundada na pluralidade de saberes de referência e, por isso, na participação do professor e do aluno, pois é preciso selecionar, interagir, operacionalizar e solidarizar, “[...] mais do que transpor conhecimento científico para conhecimento a ser ensinado” (RODRIGUES, 2009, p. 137).

Nesse sentido, o ensino de língua e literatura, ancorado em pers-pectiva histórico-interacionista, como indicam os currículos oficiais, encontra na elaboração didática suporte teórico-metodológico para o seu acontecimento. Segundo Rodrigues (2008, p. 172), “A opção teóri-co-metodológica é [...] sempre construí-la no decurso da própria ela-boração didática (HALTÈ, 1998), por meio das atividades de ensino-aprendizagem de leitura-estudo do texto, produção textual, de produção textual e de análise lingüística”. A autora apresenta proposta de elabora-ção didática, em seis passos, que sintetizaremos a seguir:

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Metodologia de Ensino

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Síntese das etapas de um processo de ELABORAÇÃO DIDÁTICA, se-

gundo RODRIGUES, 2008.

“1º. Busca de conhecimento de referência sobre o gênero do discur-

so: o objetivo é dar sustentação teórica ao professor. [Nesta etapa

o professor procurará obter o maior número possível de conheci-

mentos sobre o gênero ou os gêneros de um determinado campo

de atividade].

2º. Seleção de textos (verbais orais e escritos ou em outro material

semiótico): o objetivo é compor um pequeno banco de dados para

o trabalho com leitura em sala de aula. [Organizando esse banco

de dados, o professor poderá trabalhar com textos diferentes que

representem a relativa estabilidade e a heterogeneidade do gênero

em estudo].

3º. Prática de leitura do texto como enunciado: objetivo é colocar o

aluno na posição de interlocutor do enunciado do gênero em foco.

[A leitura, sempre que possível, será feita observando-se o espaço

material de produção e a recepção desejável àquele gênero – para

um texto de jornal, lê-se o texto no jornal em que se insere ou onli-ne; um capítulo de livro, lê-se no livro em que foi publicado].

4º. Prática de leitura-estudo do texto e do gênero: essa prática ana-

lítica de leitura (prática de análise lingüística 1[a autora denomina

prática de análise linguística 1 a leitura-estudo do texto e do gênero

para o levantamento das características do gênero]) é feita a partir

dos textos do banco de dados, ou seja, de textos não redigidos pelo

aluno.

5º. Prática de produção textual: nessa etapa, o objetivo é, na medida

do possível, colocar o aluno em uma situação de interação o mais

próxima possível do gênero em questão, isto é, o aluno é instado a

assumir a autoria do gênero e a construir o seu projeto discursivo,

levando em conta as condições do gênero e o interlocutor do seu

enunciado.

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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6º. Prática de revisão e reescritura de textos: [nesta etapa é feita] a

revisão, via prática de análise lingüística 2 [a autora denomina práti-

ca de análise linguística 2 o momento em que no processo de rees-

critura dos textos dos alunos são exploradas as características do gê-

nero já vistas nas atividades de leitura e de produção textual], [que]

toma como parâmetro a prática de análise linguística 1 e a atividade

de produção textual proposta”. (RODRIGUES, 2008, p. 172-173).

Para saber mais sobre processo de elaboração didática, sugerimos que

você leia o texto da professora Rosângela Rodrigues, Pesquisa com os

gêneros do discurso na sala de aula: resultados iniciais, publicado na

Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística da UEM,

v. 30, n. 2, jul./dez. 2008, p. 169-175, acessando: http://www.periodicos.

uem.br/ojs/index.php/ActaSciLangCult/article/viewArticle/6004.

Os princípios destacados para a opção por uma metodologia de en-sino de elaboração didática reforçam o pressuposto de que “é preciso planejamento da atividade docente”. Um planejamento bem elaborado possibilita que o professor antecipe situações capazes de propiciar ao alu-no a aprendizagem e o desenvolvimento do domínio de conhecimentos de linguagem e seus usos sociais, evitando principalmente a perda de tempo e de rumo na condução do processo de ensino e aprendizagem.

Roxane Rojo também vem se dedicando à formação de professores, notadamente no que diz respeito à transposição da teoria de Bakhtin para as salas de aula. Em seu texto Modos de transposição dos PCNs às práticas de sala de aula: progressão curricular e projetos (2000), chama a atenção para questões importantes, principalmente face aos princípios organizadores dos conteúdos de Língua Portuguesa e dos critérios para a sequenciação desses conteúdos, e face às organizações didáticas es-peciais, tais como projetos e módulos didáticos, como os apresentados pelos PCNs e “dialogados” com outras propostas de ensino. A autora, com relação aos conteúdos de Língua Portuguesa, apresenta como pos-sibilidade a sua organização sob a forma de dois eixos: o eixo do USO e o da REFLEXÃO sobre a língua, e salienta:

Figura 11 - Roxane Rojo é professora e pesquisadora do IEL/UNICAMP.

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Metodologia de Ensino

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[...] os conteúdos indicados para as práticas do eixo do uso da lingua-

gem são eminentemente enunciativos [...] o texto é visto

como unidade de ensino e os gêneros textuais como objetos de ensino.

[...] os conteúdos [...] do eixo da reflexão sobre a língua e a linguagem

abrangem aspectos ligados à variação lingüística; à organização estru-

tural dos enunciados; aos processos de construção da significação; ao

léxico e às redes semânticas e aos modos de organização dos discursos

(ROJO, 2000, p. 20 e 30).

Nessa perspectiva, os objetivos de ensino estão relacionados às necessidades de aprendizagem. Segundo a autora, nas últimas décadas em nossas escolas, as práticas de uso e de análise da linguagem têm sido substituídas “[...] pela simples adoção de um livro didático, que passa a ditar os objetivos de ensino e a configurar o projeto de ensino-aprendizagem” (ROJO, 2000, p. 33). Rojo se põe a favor da teoria do ensino-aprendizagem de base sócio-histórica vygotskiana e ressalta a importância de o professor ter esse conhecimento para que possa iden-tificar as possibilidades e as necessidades de aprendizagem de seus alu-nos. Ademais, a autora pontua que,

[...] por meio da avaliação do desenvolvimento real de seus alunos, [o

professor determinará] quais serão as possibilidades de aprendizagem

para cada objeto de ensino; e [...] uma reflexão sobre as necessidades

de aprendizagem, de um ponto de vista histórico-cultural [...] o levará

a eleger os objetos histórico-culturais que deverão ser propostos para

a aprendizagem no desenvolvimento potencial do aluno, na criação de

ZPDs – Zonas Potenciais de Desenvolvimento (ROJO, 2000, p. 33).

Essa relação entre aprendizado e desenvolvimento na perspectiva de

Vygotsky, como base para a concepção de ensino, atende aos objetivos

que se deseja alcançar com o ensino de Língua Portuguesa e Litera-

tura na escola; condição que aumenta nossa responsabilidade como

educadores, pois temos como objetivo último do ensino o desenvolvi-

mento de capacidades que levem o aluno a usufruir e a produzir bens

culturais, sociais e econômicos.

Para o ensino da Língua Portuguesa e Literatura nessa perspectiva, os

PCNs dessa área propõem “organizações didáticas especiais” (BRASIL,

1998, p. 87), as quais certamente preveem formas de tratar os conteúdos

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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diferenciadas daquelas que se costumava adotar em décadas passadas.

Dentre as possibilidades para o trabalho da docência, há em circulação

diferentes perspectivas de encaminhamento metodológico, tais como

um ensino por meio de projeto, sequências didáticas, elaboração didá-

tica, transposição didática, etc. Deparamo-nos, pois, com muitos “mo-

dos de ensinar”, e sobre esse tema reservaremos um espaço de discus-

são particular nas disciplinas de Estágio Supervisionado I e II.

3.2 A avaliação

[...] é recomendável que se amplie a noção de avaliação escolar, reven-

do a pertinência de se avaliar exclusivamente um momento específi-

co, como o da prova bimestral, em função da necessidade de se avaliar

todo o processo de aprendizagem vivido pelos alunos ao longo de uma

proposta de trabalho. (BRASIL, 2002, p. 83-84).

As concepções de língua e linguagem e de ensino e aprendizagem, com as quais vimos trabalhando, requerem um novo posicionamento frente às formas de avaliação praticadas em nossas escolas. Se trabalha-mos na perspectiva histórico-cultural, ensinamos com base nos conhe-cimentos reais dos alunos, ou seja, em suas necessidades e possibilidades de aprendizagem. A avaliação se institui no processo do fazer pedagó-gico, portanto ensino e avaliação caminham juntos, são processos for-mativos. Não cabe, no processo de ensino atual, uma avaliação apenas seletiva, ela necessariamente tem de se dar em função do processo de ensino e aprendizagem que se deseja desenvolver. Professor e alunos se avaliam e são avaliados.

O professor realiza a avaliação formativa para saber quais são os sa-

beres já apropriados pelos estudantes e que atitudes já têm inter-

nalizadas para que possa identificar as possibilidades de ensino e

fazer a mediação entre aqueles e os novos conhecimentos (atuar na

zona de desenvolvimento proximal). Ele realiza, no dizer de Antunes

(2003, p. 158), “[...] uma busca dos indícios, dos sinais da trajetória

que o aluno percorreu, o que, por outro lado, serve de sinal [...] de

como ele tem de fazer e por onde tem que continuar”.

Nessa perspectiva, o con-ceito de zona de desenvol-vimento proximal (ZDP) se faz presente no processo de ensino e aprendizagem

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Metodologia de Ensino

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Não há um momento específico para a avaliação; todos os momen-tos são, evidentemente, possíveis de serem avaliados. Uma concepção diferente de avaliação faz dela uma oportunidade de reflexão do próprio aluno sobre suas conquistas e dificuldades, as razões do sucesso e de seus fracassos. Antunes (2003) propõe, por exemplo, a avaliação como exercício de aprendizagem. Assim, o aluno aprende a revisar sua própria produção textual, quer oral ou escrita, ao tempo que vai desenvolvendo também certa autonomia e confiança no uso da linguagem. Os objetivos do ensino balizam os processos de avaliação.

Vale lembrarmos que os PCNs indicam a avaliação

[...] como instrumento que possibilite ao professor analisar criticamente

sua prática educativa; e, por outro lado, como instrumento que apresen-

te ao aluno a possibilidade de saber sobre seus avanços, dificuldades e

possibilidades [...] deve ser compreendida como constitutiva da prática

educativa, dado que é a análise das informações obtidas ao longo do

processo de aprendizagem – o que os alunos sabem e como – que pos-

sibilita ao professor a organização de sua ação de maneira adequada e

com melhor qualidade. (BRASIL, 2002, p. 93-94).

A avaliação é, portanto, dialógica, pois leva em conta quem ensina, aqueles para quem se ensina, as relações intrínsecas que se estabelecem entre todos os participantes do processo, as condições de desenvolvi-mento do trabalho pedagógico e a medida do alcance dos objetivos e de sua intencionalidade.

Na contramão das práticas tradicionais – em que se buscava encontrar

os “erros”, mais do que os “acertos” dos alunos –, o professor de Língua

Portuguesa deve valorizar os ganhos que o estudante obteve ao longo

de seu processo de aprendizagem, baseando-se nas matrizes de com-

petências e habilidades, que exigem um outro olhar sobre o ensino.

(BRASIL, 2002, p. 83-84).

Nessa perspectiva, o professor que, ao receber uma produção es-crita do aluno, devolve-a com apenas um “visto” ou com marcações em vermelho ou com expressões tipo “Muito bem”, “Razoável” ou outras semelhantes, não compreendeu o sentido do ensino que desenvolveu. Como interlocutor privilegiado do aluno, em suas aulas de português, dele é esperada uma resposta coerente, significativa, um procedimento que diga ao aluno o que ele aprendeu ou o que precisa aprender e o que

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Capítulo 03Diretrizes oficiais para o ensino de Língua Portuguesa e Literatura

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precisa fazer para chegar ao alcance dos objetivos propostos para aquela situação específica. Os PCNs (BRASIL, 2002) estabelecem critérios para o processo de avaliação; tais critérios, no entanto, não podem ser toma-dos isoladamente. Eles são considerados na elaboração dos projetos de trabalho segundo a intencionalidade da proposta a ser desenvolvida e visam, sobremaneira, a orientar o processo de avaliação no sentido da progressão do desenvolvimento dos alunos, para que se tenha sempre mais um ensino de qualidade e alunos sempre mais competentes no uso da língua oral e escrita.

Leia mais!

Retome a leitura dos PCNs, PCNEMs e PCNs+ e observe nesses do-cumentos os critérios que orientam a avaliação em aulas de leitura e produção textual.

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Metodologia de Ensino

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Considerações finais da Unidade ANesta unidade, procuramos traçar um breve panorama sobre ques-

tões que envolvem a formação do professor de Língua Portuguesa e o desenvolvimento da disciplina de língua e literatura, mostrando que nessa construção todos nós somos parte, quer como professores, quer como estudantes, nos diferentes níveis de ensino. Procuramos expor possibilidades de um fazer pedagógico no qual alunos e professores sejam interlocutores reais, considerando que não há mais espaço para relações de faz de conta, pois a sociedade centrada na escrita exige dos cidadãos domínio crescente desse sistema simbólico de mediação hu-mana que é a linguagem.

Apresentamos os documentos que são recursos importantes de apoio ao professor em suas aulas, pois eles tratam de objetivos, con-teúdos, metodologias, avaliação e indicam bibliografia atualizada sobre o fazer pedagógico.

Nos capítulos que seguem, serão abordadas questões sobre a leitu-ra, o papel da escola e do professor de Língua Portuguesa na formação de leitores, a especificidade da leitura literária no espaço escolar, o ensi-no da escrita na escola, a análise linguística e o ensino da gramática.

Viremos outras páginas e escutemos novas vozes neste livro e fora dele:

“[...] Quando eu comecei na faculdade, eu tinha uma visão, trabalhava

observando o livro didático, era o meu limite. E a faculdade me fez en-

xergar além, assim oh!”. Esperamos que a voz dessa professora encora-

je-nos a alçar voos nessa trajetória de formação.

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Unidade BA leitura na escola

Crianças lendo

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Nesta unidade, organizada em três capítulos, discutiremos o papel da leitura na disciplina Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Literatura. No primeiro capítulo, apresentaremos uma breve discussão a respeito do que entendemos ser “leitor”. No segundo capítulo, refletire-mos sobre o papel da escola na formação de leitores e, mais especifica-mente, sobre o papel do professor de Língua Portuguesa na formação de leitores. No terceiro capítulo, abordaremos algumas concepções de leitura que existem nesse campo de pesquisa com ênfase na concepção que ado-tamos para a discussão deste material pedagógico e, ainda, discutiremos os objetivos para o trabalho com a leitura, apontando alguns caminhos/estratégias para desenvolver atividades de leitura em sala de aula.

Os objetivos desta unidade são, portanto:

Discutir sobre o que é ser leitor; Ӳ

Refletir sobre o papel da escola e do professor de Língua Portu- Ӳguesa na formação de leitores;

Apresentar algumas concepções de leitura; Ӳ

Identificar os objetivos para o trabalho com a leitura; Ӳ

Apontar caminhos/estratégias para desenvolver atividades de Ӳleitura em sala de aula.

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Capítulo 04O que é ser leitor?

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4 O que é ser leitor?

Você já se perguntou o que é ser leitor? Você é um(a) leitor(a)? Sempre

foi? Quais são suas memórias de leitura? Faça um exercício e tente re-

cuperar suas memórias de leitura: recorde-se das histórias que leu, das

capas e suas cores, do cheiro dos livros...

É sempre interessante, independente da série e da idade dos alunos com quem estamos trabalhando nas aulas de Língua Portuguesa, reto-mar/recordar as suas memórias de leitura, para poder partir do que eles já conhecem e do que precisam conhecer.

Será que nós e nossos alunos passamos a ser leitores apenas quando

conseguimos decifrar os sinais gráficos, ou já somos leitores das ima-

gens, das cores, dos cheiros, do mundo que nos rodeia?

Você se sentiu leitor apenas depois que passou a dominar o código escrito? Parece que não. Se observarmos, a criança desde muito cedo lê o mundo que a rodeia e somente mais tarde consegue atribuir sentido ao código escrito, portanto, neste momento já tem o domínio da leitura de mundo que

[...] precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a con-

tinuidade da leitura daquele [...] este movimento do mundo à palavra

e da palavra ao mundo está sempre presente. Movimento em que a

palavra dita flui do mundo mesmo através da leitura que dele fazemos.

(FREIRE, 2003, p. 20).

O exercício de rememorar as leituras realizadas na infância foi con-cretizado por vários escritores e compositores que trouxeram para as suas palavras inventadas a sua infância reinventada. Caetano Veloso, na letra de sua composição Livros, (re)escreve sobre sua história de leitura e a importância que o livro, tanto seu conteúdo escrito como sua mate-rialidade, teve em sua vida:

Figura 12 – Série Vagalume, da Editora Ática

Acesse: <http://www.caetanoveloso.com.br/sec_busca_obra.php? language=en&id=162 &sec_discogra_todas=1> e cante com Caetano.

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Metodologia do ensino

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Quase não tínhamos livros em casa / E a cidade não tinha livraria / Mas

os livros que em nossa vida entraram / São como a radiação de um cor-

po negro /Apontando pra expansão do Universo / Porque a frase, o con-

ceito, o enredo, o verso / (E, sem dúvida, sobretudo o verso) / É o que

pode lançar mundos no mundo. (VELOSO, 1997).

As dificuldades de acesso ao objeto livro também aparecem no conto “Felicidade Clandestina”, de Clarice Lispector. A menina (porven-tura podemos imaginar Clarice) corre pelas ruas do Recife em busca do tão almejado livro: Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato, que lhe escorrega sistematicamente das mãos pelo não empréstimo da amiga perversa. Quando a protagonista enfim se apodera do livro, a leitura é protelada e temos toda uma descrição de afeto e gesto de amorosidade na relação da menina com o livro: “Às vezes sentava-me na rede, balan-çando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo. Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.” (LISPECTOR, 1996).

Figura 13 – Capa do livro Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector, publicado pela Editora Rocco.

Figura 14 – Capa do livro Reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.

Encontramos na produção poética de Carlos Drummond de Andrade várias incursões pelo seu mundo iniciático da leitura. Podería-mos dizer que ele vai deixando escorregar de seus poemas uma memó-ria de leitura. No poema “Iniciação literária”, observa-se a relação entre a leitura ficcional de Júlio Verne em contraposição ao livro Cultura dos campos, de Assis Brasil:

Sugerimos também que você assista ao belíssimo

curta Clandestina Felicidade, disponível em <http://www.portacurtas.

com.br/pop_160. asp?cod=311&Exib

=2575>, que mostra fragmentos de infância,

amor pelos livros, e descoberta do mundo

pelo olhar curioso, perplexo e profundo da criança-escritora

Clarice Lispector.

Em <http://www.memoriaviva.com.br/

drummond/verso.htm>, você encontra muitos

poemas de Drummond, inclusive alguns

declamados pelo próprio poeta.

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Capítulo 04O que é ser leitor?

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Leituras! Leituras!

Como quem diz: Navios... Sair pelo mundo

Voando na capa vermelha de Júlio Verne.

Mas por que me deram para livro escolar

a Cultura dos Campos de Assis Brasil?

O mundo é só fosfatos – lotes de 25 hectares

– soja – fumo – alfafa – batata doce – mandioca

– pastos de cria – pastos de engorda.

Se algum dia eu for rei, baixarei um decreto

Condenando este Assis a ler a sua obra.

(ANDRADE, 1973, p. 126).

No poema “Assinantes” (ANDRADE, 1973, p. 127), somos apresen-tados a dois meninos assinantes da Revista Tico-tico, o que lhes qualifica e lhes dá um grau de importância na pequena cidade; em “Infância” (ANDRADE, 1999, p. 10-11), o poeta contrapõe seu cotidiano familiar à leitura de Robinson Crusoé; em “Biblioteca verde”, o menino leitor des-cobre, nos 24 exemplares da Biblioteca Internacional de Obras Célebres, a leitura pelos sentidos:

Chega cheirando a papel novo, mata de pinheiros toda verde [...] Antes

de ler, que bom passar a mão / No som da percalina, esse cristal / De

fluida transparência: verde, verde. / Amanhã começo a ler. Agora não.

/ Agora quero ver figuras. Todas [...] Como te devoro, verde pastagem.

(ANDRADE, 1973, p. 129-130).

Olfato, tato, audição, visão e gustação são sentidos que entram em ação na leitura do menino poeta. Como expusemos anteriormente, todos nós carregamos uma memória de leitura, por isso é fundamental que conheçamos a experiência de vida dos nossos alunos, o conhecimento e a leitura de mundo que eles trazem para a sala de aula, já que todo esse sa-ber deverá ser levado em conta no trabalho de leitura que será realizado.

Concordamos, por isso, com Antunes (2009, p. 201) quando afirma que “[...] formar leitores, desenvolver competências em leitura e escrita é uma tarefa que a escola tem que priorizar e não pode sequer protelar”. Entendemos, ainda, que não é só na escola que nos formamos leitores, uma vez que nos formamos leitores “no mundo”, na nossa casa, com a nossa família, com os nossos pares, como vimos anteriormente. Assim,

Figura 15 – Irandé Antunes

É mestre em Linguística pela Universidade Federal de Pernambuco e doutora em Linguística pela Universidade de Lisboa. Aposentada como professora na Universidade Federal de Pernambuco, hoje atua como professora de Linguística na Universidade Estadual do Ceará. Autora de livros e artigos em revistas especializadas na área da Linguística Aplicada, tem contribuído com reflexões acerca de questões da língua e de seu ensino. Dentre sua produção, sugerimos a leitura de Língua, texto e ensino: outra escola possível e Aula de português: encontro & interação.

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Metodologia do ensino

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[...] essa prioridade da escola na formação do leitor não exclui, evidente-

mente, a atuação da família, na ação diuturna dos pais, que devem as-

sumir a iniciação da criança nesse mundo gráfico (e, por vezes, mágico)

das palavras. Não exclui ainda a sociedade, os meios de comunicação

– todos: jornais, revistas, TV, páginas da internet – nem exclui (princi-

palmente essas!) as políticas públicas orientadas para a educação e a

promoção da cultura letrada (ANTUNES, 2009, p. 202).

Como você pode observar, ao longo da nossa discussão defendemos a ideia de que o leitor pode ser leitor do código escrito, pois, necessaria-mente, é leitor do mundo. Vimos também que esse leitor se forma tanto na escola, como na sociedade. É geralmente na escola, a partir de um ensino formal, que o leitor passa a dominar o código escrito, e é também nesse ambiente que ele tem a oportunidade de tornar-se proficiente na leitura dos diversos gêneros que circulam na sociedade. A escola tem de priorizar o trabalho com a leitura. É sobre o papel da escola na formação de leitores que trataremos a seguir.

Vale lembrarmos que nem todo leitor é leitor do código escrito, uma

vez que temos ainda no mundo um grande número de analfabetos.

Conforme Bortoni-Ricardo et al. (2010, p. 12), os dados da Pesquisa

Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2008, conduzida pelo Ins-

tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que temos

no Brasil uma taxa de 10% de analfabetos acima de 15 anos, o que

corresponde a 14,2 milhões da população que não sabe ler e escre-

ver. Já com relação ao analfabetismo funcional, aquele definido como

grau de alfabetização insuficiente para exercer funções básicas da so-

ciedade moderna, há, segundo os mesmos autores, dados fornecidos

pelo Instituto Paulo Montenegro, divulgados em 2009, referentes à

população com idade entre 15 e 64 anos, indicam outros números.

Os dados desse instituto apontam 7% da população brasileira, resi-

dente nas zonas urbana e rural, como analfabeta, 21% alfabetizada

rudimentar, 47% alfabetizada básica, perfazendo um total de 75%

da população considerada analfabeta funcional, com apenas 25% da

população considerada alfabetizada funcionalmente.

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Capítulo 04O que é ser leitor?

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Dados do Pnad (2008) Idade Percentual

Analfabetismo Idade acima de 15 anos 10%

Analfabetismo funcional 75%

Analfabetismo 7%

Alfabetismo rudimentar Idade entre 15 e 64 anos 21%

Alfabetismo básico 47%

Alfabetismo funcional 25%

Leia mais!

O Instituto Paulo Montenegro, em parceria com a ONG Ação Educativa, realizou a sexta edição da pesquisa Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf 2009). Acesse <http://www.ipm.org.br/> e conheça os resultados des-sa pesquisa. Leia sobre o impacto positivo do aumento da escolarização dos brasileiros e sobre o alerta para a melhoria da qualidade do ensino.

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Capítulo 05O papel da escola na formação de leitores

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5 O papel da escola na formação de leitores

Passemos agora a refletir sobre o papel da escola na formação de leito-

res. O que você acha que a escola tem feito para formar leitores? Você

tem memórias de leitura em sala de aula? Você lia apenas nas aulas de

Língua Portuguesa ou em outras disciplinas também?

Embora os professores das outras disciplinas trabalhem com textos e saibam que o aluno-leitor “[...] tem de mobilizar conhecimentos esto-cados nas diversas áreas e disciplinas para dialogar competentemente com o texto” (BORTONI-RICARDO et al., 2010, p. 16), muitos deles acreditam que o trabalho com a leitura é tarefa exclusiva do professor de Língua Portuguesa.

Por outro lado, muitas vezes nem mesmo o professor de Língua Portuguesa atribui importância para as aulas de leitura. Ora porque é cobrado, tanto pela escola quanto pelos pais dos alunos, para centralizar o ensino na gramática, ora porque acredita que a leitura é um saber que o aluno já adquiriu na fase da alfabetização, momento em que passou a dominar os sinais gráficos e, desse processo em diante, tornou-se profi-ciente – não há, portanto, mais o que aprender. Esquece-se o professor que “[...] a leitura é uma atividade de acesso ao conhecimento produzi-do, ao prazer estético e, ainda, uma atividade de acesso às especificida-des da escrita” (ANTUNES, 2003, p. 70) e que o processo de seu ensino e aprendizagem é, portanto, contínuo.

Além disso, existe outra questão levantada para o ensino da leitura que se relaciona à experiência que o aluno traz para a sala de aula. Ob-servamos, por exemplo, que os alunos que têm na família pessoas que leem, ou seja, exemplos de leitores e têm ainda acesso a materiais escri-tos, mais facilmente chegam à escola com alguma bagagem de leitura. Uma vez inseridos em ambiente onde cedo aprendem a ler imagens, imitam os pais/a família na invenção de histórias, aprendem o código

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Metodologia de Ensino

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escrito e passam a atribuir significado para aquele conjunto de rabiscos na página. Mais tarde, na escola, esses alunos vão se formando leitores cada vez mais hábeis, pois já trazem um conhecimento prévio, não fi-cando somente na dependência da escola a sua formação de leitor.

Já para aqueles alunos que não têm acesso a material escrito em casa, que não têm exemplos de leitores na família, a formação do leitor fica restrita à escola. Por isso,

[...] até o momento, aprender a ler, ou melhor, ser leitor, tem sido no Brasil

prerrogativa das classes mais favorecidas. Quer dizer, os meninos po-

bres são levados a se convencerem de que “têm dificuldades de apren-

dizagem” e, portanto, não nasceram pra leitura. Tentam por alguns anos;

cansam-se e acabam desistindo. Grande parte das pessoas acha isso na-

tural; ou seja, ninguém considera absurda a “coincidência” de apenas os

pobres não aprenderem a ler (ANTUNES, 2009, p. 186, grifos da autora).

É importante ressaltarmos que, embora alguns alunos não tenham

acesso a material escrito ou exemplos de leitores em casa, estão, de

qualquer forma, inseridos em uma cultura letrada, mesmo em loca-

lidades mais afastadas. Numa sociedade como a que vivemos, em

todos os lugares há propagandas escritas, letreiros, outdoors, rótu-

los de produtos alimentícios, de remédios, bulas, manuais, enfim, há

escrita por toda parte. Dessa forma, a escola deve considerar esse

contato com a cultura escrita, atentando para o conhecimento que

os alunos trazem a ela, em função de uma vivência maior ou menor

com esse material escrito.

5.1 O papel do professor de Língua Portuguesa na formação de leitores

Como vimos anteriormente, tanto o professor de Língua Portugue-sa como o professor das outras disciplinas trabalham com textos em sala de aula. Vale lembrarmos, no entanto, que enquanto o professor das outras disciplinas utiliza o texto como pretexto para ensinar o conteúdo

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Capítulo 05O papel da escola na formação de leitores

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específico de suas aulas, o professor de Língua Portuguesa tem, neces-sariamente, o texto como objeto do ensino da sua disciplina. Sendo as-sim, iniciamos nossa conversa, neste momento, refletindo sobre como se dá a seleção dos textos que circulam nas aulas de Língua Portuguesa.

Você acredita que esta tarefa cabe ao professor de Língua Portu-guesa? Ou aos autores do livro didático? Talvez seja interessante você, professor, fazer uma primeira pergunta a si mesmo:

• Paraquemeusalunosleemoqueleem?

• Éparalevantaremargumentosparaumaproduçãotextual,para

buscaremcitaçõesparaumtextoqueirãoescrever?

• É para ficarem informados, saberemmais sobre determinados

assuntos?

• Éparaestudaremparaumadisciplinadaescola,dafaculdade?

• Éporprazer,porfruição?

A leitura em sala de aula deve servir para tudo isso. No entanto, como muitos professores não selecionam os textos que entram na sala de aula, nem sempre conseguem dar conta dos objetivos da ampla tarefa a que a leitura se ocupa. Se pensarmos no livro didático, por exemplo, notaremos, como bem o pontua Geraldi (1997, p.168-169), que

[...] toda a lição ou unidade destes livros, organizados em unidades e, em

geral, sem unidade, iniciam-se por um texto para leitura. Como tais lei-

turas não respondem a nenhum interesse mais imediato daqueles que

sobre os textos se debruçam, a relação interlocutiva a ocorrer deverá se

legitimar fora dela própria.

Como resolver essa questão se, em algumas escolas, o livro didático é o único livro a que os alunos têm acesso?

Primeiro temos de pensar na questão da escolha do livro didáti-co. Ela deve ser feita pelo professor que irá trabalhar com o livro, pois mesmo não conhecendo ainda os alunos que receberá no ano seguinte,

João Wanderley Geraldi é doutor em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (1990). Foi Diretor do Instituto de Estudos da Linguagem e Pró-Reitor de Assuntos Comunitários da Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é Professor Colaborador Voluntário da Unicamp. Autor de diversos livros na área do discurso e do ensino da língua, ele é considerado um dos precursores das mudanças no ensino de Língua Portuguesa no Brasil.

Figura 16 – João Wanderley Geraldi

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Metodologia de Ensino

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tendo em vista que a escolha do livro1 se dá no ano anterior, ele já sabe qual material se ajusta melhor ao seu trabalho com leitura. Além disso, o professor já tem algum conhecimento sobre os alunos com os quais irá trabalhar e as possibilidades de ensino e aprendizagem que se lhes apresentam. Esse material deverá ainda se adequar à sua formação, à sua concepção de linguagem, e consequentemente de leitura, aos objetivos das suas aulas e às suas expectativas com relação aos alunos. Afinal, esse material também “precisa se pautar nas capacidades de leitura que se supunha ter o aluno e nas capacidades que se pretenda que ele venha a ter” (PIETRI, 2007, p. 36).

Passada a etapa da escolha do livro didático, o professor deverá ter

em mente que é si atribuída a tarefa de conduzir a disciplina. Assim,

o livro didático é material de apoio, de consulta, de complementação

de suas aulas, de modo que, além de utilizar o livro didático espe-

cificamente para as aulas de leitura, o professor selecionará outros

materiais que possam favorecer o ensino-aprendizagem da leitura.

Como o mesmo assunto pode ser tratado por meio de diferentes gêneros do discurso2, é importante propormos atividades de leitura de textos diversos. Se o livro didático traz, por exemplo, um texto argu-mentativo sobre adolescência, podemos acrescentar uma notícia de jor-nal, uma propaganda ou um conto que trate do mesmo tema. E como são gêneros discursivos distintos, apresentarão diferentes marcas dis-cursivas, seja em função dos objetivos da interação, seja em função do suporte, o que possibilitará atividades de leitura diversificadas e interes-santes. Essas atividades desencadearão outras atividades e, assim, suces-sivamente. Ademais,

[...] não é possível considerar uma aula de leitura que se limite a apresen-

tar um único texto, isoladamente, sem referência a outros textos. Não é

possível considerar uma aula de leitura que se esgote no tempo de uma

aula. Do mesmo modo que a leitura de um texto não se restringe a um

texto, uma aula de leitura não se restringe a uma aula. (PIETRI, 2007, p.

86, grifos do autor).

1 O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)

é o mais antigo dos programas voltados à distribuição de obras

didáticas aos estudantes da rede pública de ensino

brasileira e iniciou-se, com outra denominação,

em 1929. Ao longo desses quase 70 anos, o

programa se aperfeiçoou e teve diferentes nomes

e formas de execução. O PNLD é voltado para o Ensino Fundamental

público, incluindo as classes de alfabetização

infantil. O Programa Nacional do Livro Didático

para o Ensino Médio (PNLEM) foi implantado

em 2004, pela Resolução no 38 do Fundo Nacional

de Desenvolvimento da Educação (FNDE), e prevê a universalização de livros

didáticos para os alunos do Ensino Médio público

de todo o país. Para obter mais informações, acesse:

www.mec.gov.br.

2 O conceito de gêneros discursivos foi abordado no livro-texto Linguística

Aplicada. Retome a discussão, se julgar

necessário.

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Capítulo 05O papel da escola na formação de leitores

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Salientamos que não cabem ao livro/manual do professor as res-postas para as questões de interpretação dos textos com os quais se irá trabalhar. Há normalmente outras respostas possíveis que o livro/ma-nual do professor não contempla. As respostas dependem também do conhecimento prévio e de mundo, determinado pelas diferentes experi-ências que os alunos vivenciaram e que, portanto, provocarão sentidos diferentes para cada aluno. Isso, no entanto, não significa que todas as respostas sejam aceitáveis. Há, de alguma forma, um limite que é impos-to pelo texto escrito. Em outras palavras, todo o texto deve ser entendi-do como uma obra aberta, mas não escancarada.

Para que os alunos mergulhem no mundo das linguagens escritas, há algumas ações que a escola pode realizar, conforme nos sugere An-tunes (2009, p. 205):

Estimular a cultura do livro. Ӳ

Possibilitar fartura de um bom e diversificado material de Ӳleitura.

Permitir acesso fácil e bem orientado a esse material. Ӳ

Diversificar os objetivos de leitura. Ӳ

Promover com frequência atividades de ler e de analisar mate- Ӳriais escritos.

Formar o gosto estético na convivência com a literatura. Ӳ

Ao longo deste capítulo, discutimos sobre o papel da escola na for-mação de leitores e ainda sobre o papel do professor de Língua Portu-guesa nessa formação. No capítulo seguinte, apresentaremos algumas concepções de leitura que circulam nesse campo de pesquisa, eviden-ciando a que adotamos aqui.

Antes de iniciarmos o próximo capítulo, gostaríamos de salientar alguns resultados de uma pesquisa realizada em 2008, na época da publi-cação da segunda edição de Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro – uma organização social de interesse público que tem como objetivo principal o fomento à leitura e à difusão do livro.

Acesse dados desta pesquisa no site: <www.prolivro.org.br/ipl/publier4.0/dados/anexos/48.pdf>.

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Metodologia de Ensino

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Essa pesquisa teve como objetivo principal diagnosticar e medir o comportamento dos indivíduos como leitores que, segundo o docu-mento, apresentam níveis de leitura significativamente inferiores à mé-dia de países industrializados e em desenvolvimento, e levantar junto aos entrevistados suas opiniões relacionadas à leitura.

A pesquisa nos interessa principalmente pelas reflexões que traz para o trabalho da escola e do professor de Língua Portuguesa na for-mação de leitores, assunto foco deste capítulo. Ademais, os resultados da pesquisa reforçam “[...] o papel extraordinariamente poderoso das escolas no desenvolvimento da leitura como também sinaliza os cami-nhos para fomentar sua prática fora dela e pela vida afora dos leitores” (INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 11).

A amostra da pesquisa constituiu-se de 5012 informantes distribu-ídos em todas as unidades da federação. As entrevistas foram realizadas entre 29/11 e 14/12 de 2007. Os resultados gerais apontam que 16% do to-tal de entrevistados são considerados não alfabetizados; 48% declararam-se não leitores, pois não haviam lido um livro nos três meses anteriores à pesquisa. Desses não leitores, 33% são analfabetos e 37% têm até a 4a série, faixa em que as práticas de leitura ainda não estão consolidadas.

A pesquisa informa ainda que a maior parcela de não leitores está entre os adultos e que esse número diminui de acordo com a renda fa-miliar e com a classe social. Não foram encontrados não leitores na clas-se A e há apenas 1% de não leitores na faixa em que a renda da família é superior a 10 salários mínimos.

Os índices apontam também para a importância da escola “na tare-fa de reverter o índice de não-leitores no Brasil, por meio de programas de alfabetização de jovens e adultos, e pelo investimento em curto prazo e maior na valorização social da leitura e do livro e no aperfeiçoamento do processo educacional” (INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 14).

A pesquisa evidencia ainda que a valorização da leitura cresce à medida que avança a escolarização dos entrevistados, que se mostram mais espontaneamente dispostos à leitura. Dentre os entrevistados, 61% gostam muito de ler, 30% gostam um pouco e 9% não gostam.

Embora entendamos que o leitor não se constitui

somente pela leitura de livros, a pesquisa

apresentada aqui adota como critério de

leitura o livro.

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Capítulo 05O papel da escola na formação de leitores

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Entre as dificuldades de leitura, há a indicação de que algumas ha-

bilidades básicas não foram desenvolvidas e, portanto, houve fra-

casso no processo educacional: 17% leem muito devagar, 7% não

compreendem o que leem, 11% não têm paciência para ler e 7% não

têm concentração. Já as alegações para a ausência de leitura variam

entre falta de tempo (54%), outras preferências (34%), desinteresse

(19%), falta de dinheiro (18%) e falta de bibliotecas (15%).

Os dados da pesquisa assinalam que entre os adultos a leitura de-cresce muito, a não ser quando se trata dos entrevistados que fizeram ou fazem curso universitário. Isso é o que faz os analistas da pesquisa suporem que “[...] a escola não tem formado leitores para a vida intei-ra, talvez por práticas pouco sedutoras e obrigatórias, das quais o não estudante procura se livrar assim que ultrapassa os limites da escola” (INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 15).

No documento, aparecem sugestões para que a leitura se vincu-le definitivamente à vida dos alunos e para que os materiais de leitura tornem-se cada vez mais próximos desses alunos. Sugere-se, para tanto, “ultrapassar os muros da escola, visitar de forma planejada, conseqüente e prazerosa ambientes onde se criam jornais, revistas e livros, conversas com os atores de cada uma das cadeias de criação e produção desses materiais, conhecer sites que enfocam a leitura, ir a feiras [...]” (INSTI-TUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 15).

Enfim, a pesquisa do Instituto Pró-Livro evidencia que todos os dados apresentados mostram que a escola tem de necessariamente as-sumir seu papel de formadora de leitores, “intensificando sua ação em todas as direções que se relacionam com o gosto pela leitura” (INSTI-TUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 14).

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Metodologia de Ensino

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Leia mais!

Sugerimos a leitura de algumas publicações de João Wanderley Geraldi, autor que apresentamos a você neste capítulo: O texto na sala de aula, Lin-guagem e ensino: exercícios de militância e divulgação e Portos de passa-gem.

GERALDI, João Wanderley. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação. Campinas, SP: Mercado das Letras, 1996.

_____. (org.) O texto na sala de aula: leitura & produção. 2. ed. Cascavel: Assoeste, 1984.

_____. Portos de Passagem. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

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Capítulo 06Concepções de leitura

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6 Concepções de leitura

Você talvez esteja se perguntando de que concepção de leitura estamos

falando. Estamos falando de uma perspectiva sociointeracionista de lei-

tura, que “[...] compreende a leitura como interlocução entre sujeitos

e, como tal, espaço de construção e circulação de sentidos” (GERALDI,

1996, p. 96). Assim, os alunos interagem com o texto, agem sobre o texto

e são atingidos por ele, estabelecendo relações com o texto e com a lin-

guagem, a partir do exercício da leitura, que previamente não existiam.

Além disso, sob essa perspectiva acredita-se que “[...] o texto sozinho (como o locutor no diálogo) não é responsável pelas significações que faz emergir, o que cria um primeiro problema para os textos que se querem transparentes [...]” (GERALDI, 1996, p. 112); do contrário, os textos te-riam de ser extremamente longos, e por isso a importância de experiên-cias com outros textos, outras linguagens no exercício da leitura.

Acredita-se ainda, diante dessa concepção, que

[...] o leitor não é totalmente livre na construção de significações, já que

um dos instrumentos com que opera nesta construção é precisamente

o texto presente, cujo processo de produção manuseia também as mes-

mas “regras” de interpretação existentes numa “comunidade interpreta-

tiva”, de que o autor é parte. (GERALDI, 1996, p. 113).

Assim, embora consideremos a experiência prévia e de mundo dos nossos alunos, sabemos que existe um limite para as possibilidades de interpretação textual, limite imposto pelo próprio texto, pelos objetivos e intenções do autor, como já dissemos anteriormente referindo-nos às respostas a questões de interpretação textual.

Temos de levar em conta ainda que, nessa concepção, “[...] os senti-dos do texto resultam também dos elementos que compõem a ‘cena’ de sua produção e a outra, não menos pertinente, de sua circulação” (AN-TUNES, 2009, p. 203). Diante disso, além de levar em consideração a questão da autoria na interação com o texto, como já vimos, temos de considerar, nas nossas atividades de leitura, a questão da sua circulação.

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Metodologia de Ensino

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Defendemos aqui que o trabalho de leitura é um trabalho de inte-ração, pois o sujeito-leitor atribui sentido ao que lê, dá vida ao escrito a partir da sua leitura, dialoga com o autor – rejeitando, confirmando, saboreando suas ideias, e sempre reconstruindo o texto à medida que age sobre ele. Assim,

[...] o produto do trabalho de produção se oferece ao leitor, e nele se

realiza a cada leitura, num processo dialógico cuja trama toma as pontas

dos fios do bordado tecido para tecer sempre o mesmo e outro borda-

do, pois as mãos que agora tecem trazem e traçam outra história. Não

são mãos amarradas – se o fossem, a leitura seria reconhecimento de

sentidos e não produção de sentidos; não são mãos livres que produ-

zem o seu bordado apenas com os fios que trazem nas veias de sua

história – se o fossem, a leitura seria um outro bordado que se sobrepõe

ao bordado que se lê, ocultando-o, apagando-o, substituindo-o. Suas

mãos carregadas de fios, que retomam e tomam os fios que no que se

disse pelas estratégias de dizer se oferece para a tecedura do mesmo

e outro bordado [...]. É o encontro destes fios que produz a cadeia de

leituras construindo os sentidos de um texto. E como cadeia, os elos

de ligação são aqueles fornecidos pelos fios das estratégias escolhidas

pela experiência de produção do outro (o autor) com que o leitor se

encontra na relação interlocutiva de leitura. A produção deste, leitor, é

marcada pela experiência do outro, autor, tal como este, na produção

do texto que se oferece à leitura, se marcou pelos leitores que, sempre,

qualquer texto demanda. Se assim não fosse, não seria interlocução, en-

contro, mas passagem de palavras em paralelas, sem escuta, sem con-

trapalavras: reconhecimento ou desconhecimento, sem compreensão.

(GERALDI, 1997, p. 166-167).

Vimos então, ao longo desta seção, que consideramos a concepção sociointeracionista de leitura, aqui assumida, como a mais adequada para orientar o processo de ensino e aprendizagem da leitura na escola. A seguir, destacaremos aspectos mais específicos do ensino da leitura, tais como objetivos e encaminhamentos para o trabalho em sala de aula.

6.1 O ensino da leitura

Partindo da concepção de leitura como forma de interação, vamos discutir os objetivos para o trabalho com a leitura na escola e apontar al-guns caminhos/estratégias para desenvolver atividades em sala de aula.

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Capítulo 06Concepções de leitura

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Quando preparamos atividades de leitura, nossa primeira tarefa é sele-

cionar os textos. Como vimos anteriormente, muitas vezes delegamos

essa tarefa aos autores do livro didático, mas, conforme observamos

também, ainda que tenhamos adotado um livro didático, selecionare-

mos textos para complementar as atividades propostas pelo livro com

o qual iremos trabalhar. De um jeito ou de outro, temos de partir, então,

da seleção dos materiais para nossas aulas de leitura.

Sabemos que há extensa diversidade de gêneros do discurso cor-respondente à diversidade de práticas sociais existentes. Como afirma Bakhtin, “[...] a riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são in-finitas, porque são inesgotáveis as possibilidades da atividade humana” (2003[1920-1924], p. 262). Assim sendo, temos de privilegiar o trabalho com alguns desses gêneros. Os PCNs, por exemplo, indicam uma sele-ção de gêneros feita a partir “[d]aqueles cujo domínio é fundamental à efetiva participação social” (BRASIL, 1998, p. 53).

No documento referido, esses gêneros organizam-se em função de sua circulação social em: gêneros literários (conto, novela, romance, crônica, poema, texto dramático), de imprensa (notícia, editorial, arti-go, reportagem, carta do leitor, entrevista, charge e tira), de divulgação científica (verbete enciclopédico, relatório de experiências, artigo), e de publicidade (propaganda). (BRASIL, 1998, p. 54).

Há gêneros que não estão contemplados nas discussões dos PCNs. É o caso daqueles que circulam na internet, como chat, e-mail, blog, pois pertencem a situações de interação social mais recentes. Eles cons-tituem, evidentemente, material privilegiado para as aulas de leitura, em função de sua presença nas práticas sociais com as quais mais nos envol-vemos atualmente.

Temos, então, diferentes gêneros à disposição para o trabalho com a

leitura, cada um deles gerando textos específicos. Devemos, portanto,

levar em conta o seguinte questionamento: de que forma faremos a

seleção desses gêneros para nossas aulas?

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Metodologia de Ensino

72

Nossa inserção na escola faz com que tenhamos compromisso com o

seu Projeto Político-Pedagógico e, por consequência, com a consecu-

ção dos objetivos educacionais para a série ou séries com que iremos

trabalhar.

Assim, teremos em mente que os gêneros a serem selecionados para o ensino da leitura estarão relacionados ao projeto pedagógico. Projeto que é pensado para uma turma específica, em função dos seus interesses e, como já salientamos anteriormente, das capacidades (linguístico-cog-nitivas, sociointerativas, discursivas, etc.) que queremos que nossos alu-nos desenvolvam naquele momento. O projeto do qual as leituras farão parte terá uma unidade temática, na qual o assunto eleito será abordado sob diferentes enfoques, tratado a partir dos gêneros do discurso e dos textos selecionados como os mais adequados às necessidades de apren-dizagem dos estudantes. Isso ajudará, por certo, a priorizar determina-dos textos e a definir objetivos para as atividades de ensino de leitura.

Esses objetivos estarão também claros para os alunos. A cada ati-vidade de leitura o professor estabelecerá com que finalidade o texto selecionado será lido. Por uma abordagem cognitivista, por exemplo, o aluno poderá apreender as estratégias de leitura, ter consciência destas e valer-se desse conhecimento nas mais diferentes circunstâncias que envolvam atos de leitura.

Antes de iniciar a leitura, é importante o professor, além de expli-citar o objetivo da atividade, procurar ativar os conhecimentos prévios dos alunos acerca do assunto que será tratado. As atitudes responsivas ativas dos alunos são pistas sobre o seu conhecimento, o que ajudará no estímulo para a leitura e ainda favorecerá o trabalho do professor no di-recionamento da atividade, já que este terá condições de atentar para o que os leitores ainda não sabem. Bakhtin (2003[1920-1924]), discorren-do sobre “O enunciado como unidade da comunicação discursiva”, do diálogo, diz que no processo de interlocução os participantes ocupam sempre “posição ativa responsiva”; ou seja:

[...] o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (lingüístico) do

discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele [falante] uma ativa

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Capítulo 06Concepções de leitura

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posição responsiva: concorda, discorda dele (total ou parcialmente),

completa-o, aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc., essa posição responsi-

va do ouvinte se forma ao longo de todo o processo de audição e com-

preensão desde o seu início [...] toda compreensão é prenhe de resposta

[...] o ouvinte se torna falante (BAKHTIN, 2003 [1920-1924], p. 271).

A compreensão é um processo ativo e responsivo; é, portanto, um processo de relação entre locutor e interlocutor. Já está no horizonte do enunciado do locutor a possível reação-resposta daquele a quem esse enunciado está sendo dirigido e lhe orienta sentidos e estrutura (aspec-tos da língua).

Os PCNs sugerem, em vista disso, uma série de conceitos e proce-dimentos subjacentes às práticas de linguagem. Afinal, para o trabalho com a leitura não basta que tenhamos recursos materiais disponíveis, é preciso enfatizar o uso que fazemos desses recursos. Consideramos esses conceitos e procedimentos bastante relevantes e, por isso, repro-duzimos a seguir, a partir dos PCNs (1998), aqueles que se relacionam à leitura de textos escritos:

explicitação de expectativas quanto à forma e ao conteúdo Ӳdo texto em função das características do gênero, do su-porte, do autor, etc.;

seleção de procedimentos de leitura em função dos dife- Ӳrentes objetivos e interesses do sujeito (estudo, formação pessoal, entretenimento, realização de tarefa) e das carac-terísticas do gênero e suporte:

leitura integral: fazer a leitura seqüenciada e extensiva 1) de um texto;

leitura inspecional: utilizar expedientes de escolha de 2) textos para leitura posterior;

leitura tópica: identificar informações pontuais no texto, 3) localizar verbetes em um dicionário ou enciclopédia;

leitura de revisão: identificar e corrigir, num texto dado, 4) determinadas inadequações em relação a um padrão estabelecido;

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Metodologia de Ensino

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leitura item a item: realizar uma tarefa seguindo coman-5) dos que pressupõem uma ordenação necessária;

emprego de estratégias não lineares durante o proces-sa- Ӳmento de leitura:

formular hipóteses a respeito do conteúdo do texto, an-1) tes ou durante a leitura;

validar ou formular as hipóteses levantadas a partir das 2) novas informações obtidas durante o processo da leitura;

avançar ou retroceder durante a leitura em busca de in-3) formações esclarecedoras;

construir sínteses parciais de partes do texto para poder 4) prosseguir na leitura;

inferir o sentido de palavras a partir do contexto;5)

consultar outras fontes em busca de informações com-6) plementares (dicionários, enciclopédias, outro leitor);

articulação entre conhecimentos prévios e informações tex- Ӳtuais, inclusive as que dependem de pressuposições e in-ferências (semânticas, pragmáticas) autorizadas pelo texto, para dar conta de ambigüidades, ironias e expressões figu-radas, opiniões e valores implícitos, bem como das inten-ções do autor;

estabelecimento de relações entre os diversos segmentos Ӳdo próprio texto, entre o texto e outros textos diretamente implicados pelo primeiro, a partir de informações adicio-nais oferecidas pelo professor ou conseqüentes da história de leitura do sujeito;

articulação dos enunciados estabelecendo a progressão Ӳtemática, em função das características das sequências predominantes (narrativa, descritiva, expositiva, argu-mentativa e conversacional) e de suas especificidades no interior do gênero;

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Capítulo 06Concepções de leitura

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estabelecimento da progressão temática em função das Ӳmarcas de segmentação textual, tais como: mudança de capítulo ou de parágrafo, títulos e subtítulos, para textos em prosa; colocação em estrofes e versos, para textos em versos;

estabelecimento das relações necessárias entre o texto e Ӳoutros textos e recursos de natureza suplementar que o acompanham (gráficos, tabelas, desenhos, fotos, boxes) no processo de compreensão e interpretação do texto;

levantamento e análise de indicadores lingüísticos e ex- Ӳtralingüísticos presentes no texto para identificar as várias vozes do discurso e o ponto de vista que determina o trata-mento dado ao conteúdo, com a finalidade de:

confrontá-lo com o de outros textos;1)

confrontá-lo com outras opiniões;2)

posicionar-se criticamente diante dele;3)

reconhecimento dos diferentes recursos expressivos utili- Ӳzados na produção de um texto e seu papel no estabele-cimento do próprio texto ou de seu autor. (BRASIL, 1998, p. 55-57).

Desejamos que nossos alunos, a cada ano da escolarização, ampliem gradativamente sua capacidade de leitura e que, ao final do Ensino Médio, tornem-se leitores proficientes de determinados gêneros. E o que significa ser um leitor proficiente? O leitor proficiente é aquele que sabe selecionar, entre a infinidade de textos de variados gêneros à sua disposição; aquele que melhor lhe convém em determinada situação. É aquele que consegue selecionar as estratégias mais adequadas para tal leitura, pois sabe que não se lê um e-mail da mesma forma que se lê um romance, por exemplo. É aquele que consegue estabelecer diálogo entre as leituras que já fez (seja de texto escrito, de texto oral, de imagens, de mundo). Esse leitor conse-gue fazer uso dos “dez direitos imprescritíveis” que lhe cabem:

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Metodologia de Ensino

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“O direito de não ler. O direito de pular as páginas. O direito de não terminar de ler o livro. O direito de reler. O direito de ler não importa o quê. O direito ao “bovarysmo” (doença textualmente transmissível). O direito de ler não importa onde. O direito de “colher aqui e acolá”. O direito de ler em voz alta. O direito de se calar.” (PENNAC, 1992)

Encontramos nos PCNs algumas sugestões para que a escola favo-reça o trabalho com a leitura:

A escola deve dispor de uma biblioteca em que sejam colo- Ӳcados à disposição dos alunos, inclusive para empréstimo, textos de gêneros variados, materiais de consulta nas di-versas áreas do conhecimento, almanaques, revistas, entre outros.

É desejável que as salas de aula disponham de um acer- Ӳvo de livros e de outros materiais de leitura. Mais do que a quantidade, nesse caso, o importante é a variedade que permitirá a diversificação de situações de leitura por parte dos alunos.

O professor deve organizar momentos de leitura livre em Ӳque também ele próprio leia, criando um circuito de leitu-ra em que se fala sobre o que se leu, trocam-se sugestões, aprende-se com a experiência do outro.

O professor deve planejar atividades regulares de leitura, as- Ӳsegurando que tenham a mesma importância dada às de-mais. Ler por si só já é um trabalho, não é preciso que a cada texto lido se siga um conjunto de tarefas a serem realizadas.

Figura 17 – A leitura.

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Capítulo 06Concepções de leitura

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O professor deve permitir que também os alunos escolham Ӳsuas leituras. Fora da escola, os leitores escolhem o que lêem. É preciso trabalhar o componente livre da leitura, caso contrário, ao sair da escola, os livros ficarão para trás.

A escola deve organizar-se em torno de uma política de for- Ӳmação de leitores, envolvendo toda a comunidade escolar. Mais do que a mobilização para aquisição e preservação do acervo, é fundamental um projeto coerente de todo o tra-balho escolar em torno da leitura. Todo professor, não ape-nas o de Língua Portuguesa, é também professor de leitura. (BRASIL, 1998, p. 71-72).

Uma das sugestões apontadas pelos PCNs (1998, p. 72) ressalta a questão da avaliação da atividade de leitura: “Ler por si só já é um tra-balho, não é preciso que a cada texto lido se siga um conjunto de tarefas a serem realizadas”. Assim, o professor terá em mente que a atividade de leitura não deve ser realizada com intuito único de avaliar o aluno, seja através de fichas, seja através de resumos, resenhas, o que transforma-rá a atividade que poderia ser prazerosa e eficiente no sentido de formar leitores em uma tarefa desinteressante e desmotivadora. De acordo com Kleiman (2008, p. 23), “[...] a insistência no controle diminui a semelhança entre a leitura espontânea, do cotidiano, e a leitura escolar, ajudando na construção de associações desta última com o dever e não com o prazer”.

Além disso, devemos levar em consideração que algumas tarefas avaliativas cabem para determinados gêneros discursivos e não para ou-tros. Os PCNs apontam, por exemplo, que “produzir esquemas e resumos pode ajudar na apreensão de tópicos mais importantes quando se trata de um texto de divulgação científica; no entanto, aplicar tal procedimento a um texto literário é desastroso, pois apagaria o essencial – o tratamento estilístico que o tema recebeu do autor” (BRASIL, 1998, p. 70).

Não podemos esquecer ainda, no encaminhamento das atividades de leitura, as relações que esta estabelece com a escrita, pois

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Metodologia de Ensino

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[...] grande parte do trabalho com leitura é “integrado” à produção em

dois sentidos: de um lado ela incide sobre “o que se tem a dizer”, pela

compreensão responsiva que possibilita, na contrapalavra do leitor à

palavra do texto que se lê; de outro lado, ela incide sobre “as estratégias

do dizer” de vez que, em sendo um texto, supõe um locutor/autor. (GE-

RALDI, 1997, p. 165-166).

Assim, para escrever precisamos “ter o que dizer”; precisamos de argumentos para convencer, precisamos de palavras para encantar, para emocionar, divertir, informar, e para tanto, precisamos de exercícios de leitura.

Leia Mais!

Sugerimos que você leia, para ampliar seus conhecimentos sobre a pers-pectiva sociointeracionista, os seguintes livros:

BAKHTIN, Mikhail [Volochínov, V. N.]. Marxismo e filosofia da linguagem. 12. ed. São Paulo: Hucitec, 2006[1929].

FARACO, Carlos Alberto; TEZZA, Cristóvão; CASTRO, Gilberto de (Orgs.). Vinte ensaios sobre Mikhail Bakhtin. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.

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Considerações finais da Unidade BComo fechamento desta unidade, sugerimos que você elabore uma

proposta prática de atividade de leitura. Para tanto, você escolherá uma turma de Ensino Fundamental ou Médio, preferencialmente uma tur-ma em que você lecione. Inicialmente, você selecionará um gênero que circula no contexto social do aluno, um texto (texto-enunciado) com as configurações desse gênero a ser trabalhado e, em seguida, elaborará um plano para desenvolver em suas aulas, elencando os conteúdos a serem trabalhados, os objetivos a serem alcançados e os procedimentos metodológicos a serem desenvolvidos. Depois execute o planejamento com sua turma, discuta e avalie a sua realização com seus alunos, seus colegas de turma, seus tutores e seus professores. Faça anotações e guar-de-as para socializá-las no transcorrer do Estágio Supervisionado.

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Unidade CA leitura literária no espaço escolar

Livros de literatura infantojuvenil

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Nesta unidade nos propomos a apresentar para você reflexões so-bre o papel da leitura literária na formação leitora do indivíduo, em especial no espaço escolar, apresentando os documentos de referência que norteiam a sua inserção na escola, bem como trazendo discussões sobre as práticas pedagógicas recorrentes, ampliando as possibilidades de trabalho com a literatura com base em propostas para um uso mais efetivo e afetivo da palavra literária. Esta unidade tem como principais objetivos:

Promover reflexões sobre a literatura no espaço escolar; Ӳ

Refletir sobre as práticas sociais de leitura literária; Ӳ

Desenvolver algumas estratégias metodológicas para o ensino Ӳda Literatura no Ensino Fundamental e Médio.

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Capítulo 07A literatura e a sua função

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A literatura e a sua função Para iniciarmos este nosso diálogo sobre a literatura e a sua im-

portância no cenário social e, em particular, na escola, escolhemos este depoimento de uma mãe que, ao ser solicitada, tenta definir a Arte:

Como é mesmo a pergunta? Ah! Quando eu ia dizendo que arte é um

trabalho assim mais maneiro, é que é assim mesmo. Pode até não ser,

mas parece. É aquele trabalho que não é a luta de todo dia. Tá certo

que tem uns que lutam com isso mas... Arte é um que-fazer assim que

inventa uma alegriazinha, a senhora compreende? Quer dizer, trabalho

mesmo não é, que trabalho é como uma dor. E escola também. Pros

pobres é. A gente acostuma porque é a vida e... vai indo, vai indo... Per-

di. Ali, sim: arte eu não sei. Não é isso das festas na escola? Acho que

na escola não carece disso, não. Essa arte, não. Os meninos precisam ir

levando jeito p’ra agüentar o trabalho daqui de fora. Se fica muito ani-

mado, aquela coisa frouxa, eles amolecem e... Aqui fora isso vinga, não.

(LINHARES, 2003, p. 99).

A definição dessa mãe sobre o que seria Arte tem uma abrangência geral e não a especificidade do literário, mas podemos aqui nos aproxi-mar da literatura, arte da palavra, apresentada por ela como: um trabalho “maneiro” capaz de inventar alegrias. Palavras definidoras, carregadas de sentido e coerência: a arte com seu poder de inventividade é capaz de promover festas no cotidiano escolar. Essa mesma mãe nega, no en-tanto, a possibilidade da alegria, inserindo trabalho e escola no mesmo conjunto de atividades que não deleitam, mas se constituem como espa-ço de “dor”. Ela ainda destaca que a escola não precisa de “festa”, pois a animação e a não rigidez do que seria artístico amolece a criança/jovem, não o preparando para a vida fora da escola.

Tal depoimento aproxima em dois polos distintos a escola/utilidade e

a arte/prazer. A literatura, sendo a arte da palavra, constituir-se-ia num

fazer inútil. Esse debate sobre a utilidade ou não da literatura permeia

a sua história. Apresentaremos a você algumas posições para que per-

ceba que este assunto desde cedo gerou debates e polêmicas, cremos

ainda não resolvidos. Na Antiguidade Clássica, por exemplo, vários pen-

sadores, entre eles Aristóteles e Platão, debruçaram-se sobre o tema.

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Metodologia de Ensino

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O filósofo Platão, no século IV a.C., ao construir uma cidade ideal para as novas gerações de Atenas, bane a poesia desse território. O filó-sofo divide a literatura em duas espécies: uma verdadeira e outra falsa. Na literatura falsa inclui primeiramente as fábulas que são ensinadas às crianças, pois, segundo ele, “[...] é sobretudo nessa altura que se é mol-dado, e se enterra a matriz que alguém queira imprimir numa pessoa” (PLATÃO, 1990, p. 87). Ele aconselha, ainda, uma vigilância aos autores desse gênero, porque em seu conjunto contam mais mentiras que verda-des. Nega, assim, a maioria das fábulas contadas nesse período de discus-são, mas propõe que se deva selecionar, acolhendo as que forem boas.

O modelo que o poeta deveria seguir para cumprir e compor bem sua fábula é aquele que apresenta um exemplo correto de moral e reli-giosidade aos guardiões da cidade. A poesia, portanto, não é capaz de educar, trazer conhecimento. Platão expulsa a poesia da República e acolhe a filosofia como forma de conhecimento.

Aristóteles, em seu livro Poética (1973), faz uma defesa ao discurso poético, apresentando uma distinção entre a figura do historiador, aque-le que narra fatos reais e acontecidos, e a do poeta, aquele que narra o que poderia acontecer, o ficcional. Considerando a imitação como con-gênita ao homem, ele focalizará o prazer do homem em ver-se represen-tado, abrindo a possibilidade de aprendizagem através da mimese, reco-nhecendo, desta forma, o lugar da poesia como forma de conhecimento, desde que subordinada à filosofia.

O poeta latino Horácio 65 a.C. a 8 a.C.), em Arte poética, define a poesia como uma atividade doce e útil (docere cum delectare); a pri-

Sugerimos que você releia o livro da disciplina

Estudos Literários I (VAR-GAS, 2008); lá, retomará um pouco da vida desse

poeta e alguns de seus poemas.

Figura 18 - Estátua de Sócrates em Atenas, Grécia.

Figura 19 - Mosaico de Pompeia recria a Academia de Platão: am-biente de aprendizado.

Figura 20 - Busto de Aristóteles, desenho de Peter Paul Rubens (Século XVII).

Em A República, Platão cria uma cidade ima-

ginária e utópica para contrapô-la à decadência

de Atenas do século V a.C. Nesta cidade idealizada, os guardiões devem ser

instruídos desde a infância para exercerem bem o seu ofício. Como serão criados e educados estes homens

é o passo para buscar e investigar as melhores

possibilidades de educa-ção para essa geração.

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Capítulo 07A literatura e a sua função

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meira seria o contraponto ao dever, obrigação, aquilo que poderia ser realizado sem imposição; o útil estaria relacionado ao aproveitamento do tempo, aquilo que é necessário/pragmático. Segundo o poeta latino, essas duas funções estariam em confluência na palavra poética.

Assim, ao longo da história, vão-se tecendo oposições e contraposi-ções referentes à função da poesia (neste caso a literatura). Outro binô-mio que pode aqui ser citado é o real em oposição ao ficcional que jogou a referência para um campo à parte da literatura, no entanto é sabido que um texto literário, em sua trama inventiva, não tem como escapulir da inserção referencial. O discurso literário consegue, evidentemente, ir além da referência e representação de mundo, ao criar um novo mundo, a partir de dados referentes à vivência do leitor. (DEBUS, 1996).

Como destaca Fernando Fraga de Azevedo, professor e pesquisa-dor do ensino da língua materna em Portugal, o texto literário partilha com os leitores, independentemente da idade, valores de natureza social, cultural, histórica e/ou ideológica, por ser uma realização da cultura e estar integrado num processo comunicativo. Assevera, porém, que pelo potencial ficcional “[...] esses valores são dados a ler de forma não explí-cita, através do jogo de negociação de sentidos estabelecido no diálogo leitor/texto” (AZEVEDO, 2006, p. 19).

A literatura tem como elemento constitutivo a palavra; a palavra re-gistrada por meio da escrita. Poderíamos então nos indagar: Todo texto escrito é literatura? Nas palavras de Tavares (1996, p. 27):

Ao lermos ou ouvirmos certas produções como um telegrama, uma cer-

tidão de nascimento, um anúncio, uma poesia, uma passagem de um

romance ou de um conto, notamos logo sensível diferença no modo

de dizer de cada uma. Todas encerram um conjunto de palavras, assim

a matéria prima é a mesma: a palavra. Mas em algumas, como na poe-

sia, nossa atenção é despertada para determinadas características, tais

como a combinação das palavras, o valor significativo e expressivo dos

termos, a gama sonora dos vocábulos, produzindo tudo isso uma im-

pressão bem particular.

Por esse viés, nem toda palavra escrita é literatura; algo a diferencia, portanto, das outras formas escritas. O poeta Manoel de Barros (2010) ao longo de sua produção tem “teorizado” poeticamente sobre o exercí-

De sorriso largo e voz mansa, o poeta mato-grossense de 93 anos, Manoel de Barros, tem apresentado ao público leitor um inusitado fazer poético que se constrói, em grande proporção, a partir de revisitação de sua infância.

Figura 21 – Manoel de Barros.

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Metodologia de Ensino

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cio do fazer poético. Segundo ele, a literatura é um fazer “terápico” que “[...] consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nos-sos mais fundos desejos” (p. 347). O poeta tem como ofício “[...] fazer casamentos incestuosos entre palavras” (p. 399), em contraponto aos textos informativos, que exigem uma “fidelidade” ao fato acontecido. Na literatura “os absurdos enriquecem” a sua construção.

Cabe, todavia, questionarmos: para que nos serviria este (des)arranjo de palavras que nos põe de sobressalto diante a realidade per-cebida? A sensibilidade estética representa a principal função do texto literário: desenvolver no indivíduo um olhar atento e sensível ao que nos rodeia. Isso é, enfim, reconhecer o papel humanizador da literatura, como destacam as palavras de Antonio Candido (2006, p. 62): “A lite-ratura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante”.

No que diz respeito ao papel da escola na formação do leitor literá-rio, Tânia Rösing (2009, p. 136) destaca que

[...] o esforço deve direcionar-se para o convencimento dos docentes

acerca dos benefícios da leitura literária: os textos literários passam a

constituir cenários com os quais se pode refletir sobre o que somos,

sobre o que são os outros, como podemos melhorar nosso vir-a-ser no

mundo, como podemos transformar o mundo a partir de mudanças em

nosso entorno.

É fundamental, no entanto, pensarmos que o leitor, por mais abs-trato e/ou idealizado que seja, está inserido em um contexto, pois é um indivíduo marcadamente histórico; sendo assim, receberá o texto e o lerá dentro dos protocolos estabelecidos/construídos pelas práticas so-ciais do seu tempo.

Se pensarmos que os suportes e instrumentos da e para escrita fo-ram influenciados e adaptados conforme a tecnologia presente na sua criação – dos rolos de papiro, pergaminhos manuscritos, textos em pa-pel à tela do computador –, perceberemos que as práticas de leitura tam-bém foram se metamorfoseando: novas formas de escrever propiciam novas formas de ler.

Na Unidade 1 do livro Literatura e ensino (RA-

MOS; CORSO, 2010), você encontra outros posicio-

namentos de Antonio Candido sobre o tema. Vale a pena consultar!

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Capítulo 07A literatura e a sua função

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Figura 22 - Escrita

cuneiforme em placa de argila.

Figura 23 - Escrita hiero-glífica egípcia: hieróglifos a tinta e vinheta de um Livro dos Mortos

em papiro, da 19ª dinastia.

Figura 24 - Papiro: uma parte do papiro Rhind. Depositado no Museu

Britânico, Londres.

Figura 25 - e-reader*

*Leitor de livros digitais (e-Reader, em inglês) é um pequeno aparelho que tem como função principal mos-

trar em uma tela, para leitura, o conteúdo de livro digitais (e-books) e outros tipos de mídia digital. (www.

wikipédia.org).

Convidamos você para a leitura da próxima seção, que lhe permiti-rá fazer algumas reflexões sobre a constituição do leitor de literatura.

7.1 O leitor de literatura

Personagens que saltam das páginas dos livros e ganham vida, este foi um dos recursos utilizados pela livraria Tcheca Anagram para sua campanha de marketing que tem o slogan “Palavras criam Mundos”. Sem sombra de dúvidas, esta é uma imagem que remete ao poder da palavra literária: conferir ao leitor o deslocamento de um mundo ao outro ou a outros. No entanto, devemos lembrar que este mundo do (im)possível só é vivificado pelas mãos do leitor; isto é, cabe ao leitor instituir vida à narrativa que o livro guarda ao descerrá-lo e abrir as suas páginas.

Contemporaneamente podemos dizer que a leitura li-terária é valorizada socialmente. Provavelmente você não ouviu falar que a leitura de um romance pode lhe fazer mal física e psicologicamente, no entanto até o século XVIII era temerário valorizar a leitura literária, em especial aquela realizada pelo público feminino. Supunha-se que

Outros cartazes criados pela agência de propa-ganda Kaspen/Jung Von Matt podem ser visualiza-dos no site <www.dobras-daleitura.com>.

Figura 26 - Cartaz criado pela agência de propa-ganda Kaspen/Jungv.Matt.

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Metodologia de Ensino

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a identificação com as personagens provocaria reações desautorizadas socialmente, isto é, o devaneio da leitura poderia levar as mulheres a se identificarem com as personagens e atentar contra a moral e os bons costumes (ABREU, 2010).

Na unidade anterior, quando apresentamos a possibilidade de (re)visitar

as memórias de leitura e trouxemos para a cena as memórias de leitura

de alguns escritores, você por acaso lembrou das leituras literárias rea-

lizadas? Você é um leitor de literatura? Poderíamos ir além e perguntar:

o que caracteriza o leitor de literatura? A literatura hoje está presente

no cotidiano dos cidadãos brasileiros? Quais são as formas sociais de

inserção da literatura em nossa sociedade contemporânea?

A leitura literária vinculada à leitura de um público feminino e os gestos de devaneios provocados pelo ato dessa leitura estão registrados em várias pinturas, em especial do século XIX. Martine Poulain, ao se debruçar sobre cenas de leitura, em três formas de registros iconográ-ficos – na pintura, na fotografia e no cartaz – entre os anos de 1881 a 1989, apresenta algumas constatações referentes a representações da leitura. Entre elas está a do objeto livro como sinal de poder social ou de saber intelectual e a leitura desse objeto frequentemente representado pela cena do feminino em devaneio. Segundo ele “[...] mesmo sua leitu-ra sendo efetivada ou interrompida pelo pintor, é sempre muito intenso o sentimento de absorção nessa prática, como testemunham ora o olhar ora a atitude corporal” (POULAIN, 1997, p. 63).

Essa relação entre a leitura literária e o feminino também é repre-sentada na ficção. Em O primo Basílio (1878), de Eça de Queirós, a pro-tagonista Luiza é descrita em seus protocolos de leitura: “E saltando na ponta do pé descalço, foi buscar ao aparador por detrás de uma compo-ta um livro um pouco enxovalhado, veio estender-se na voltaire, quase deitada, e, com o gesto acariciador e amoroso dos dedos sobre a orelha, começou a ler interessada” (QUEIRÓS, 2010). O livro enxovalhado lido pela protagonista é A dama das Camélias, que a leva a cometer adultério, influenciada pela leitura.

Martine Poulain: pesqui-sadora francesa, nascida em 1948. É curadora de

biblioteca e, atualmente, é diretora da Media Dix,

biblioteca da Universidade de Paris X.

Figura 27 - A leitora, de Jean-Honoré Fragonard (1770-1772).

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Capítulo 07A literatura e a sua função

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Machado de Assis, em seus romances considerados românticos como Helena, Diva, Iaiá Garcia e A mão e a Luva, insere suas persona-gens femininas em cenas de leitura, ora silenciosas e individuais, ora em voz alta como prática de sociabilidade.

Márcia Abreu (2010), ao construir uma breve história da leitura de textos em voz alta argumenta:

Durante a primeira metade do século XIX a leitura oral era uma das for-

mas de mobilização cultural e política dos meios urbanos e dos ope-

rários. Depois disso, numerosas formas de lazer, de sociabilidade e de

encontro, antes mantidas pela leitura em voz alta, tornaram-se cada vez

mais restritas. A partir daí as elites passaram a restringir os usos da orali-

zação dos textos. Lia-se em voz alta nas Igrejas e nos tribunais. Lia-se em

voz alta nas escolas para controlar a qualidade de sua leitura silenciosa

– objetivo final da aprendizagem. No passado, a leitura tomava parte

em um conjunto de práticas culturais que passavam pelo livro: a escuta

dos textos, sua memorização, o reconhecimento, nas letras impressas

no papel, do texto repetidas vezes ouvido, sua recitação para si ou para

um grupo. (ABREU, 2010, não paginado).

E o leitor de hoje? Qual a representação que melhor cabe? Provavel-

mente não é da leitura como recolhimento, o leitor sossegado e só,

nem a da leitura linear. Vivemos a era digital em que a linguagem da

hipermídia demanda novas exigências do exercício de ler e escrever.

Maria Zilda Cunha, professora da USP, afirma que “[...] o grande poder

da hipermídia está no confluir das matrizes de linguagem e pensamen-

to, na hibridização de mídias que ela aciona, e, consequentemente, na

mistura de sentidos receptores e na sinestesia reverberante conforme

o receptor interage, co-operando na sua realização” (CUNHA, 2009, p.

181). Assim, ao leitor cabem novas exigências, demandas provenientes

dos novos suportes de leitura (não mais unicamente o papel).

O termo hipertexto, comumente utilizado na contemporaneidade, relacionado ao texto eletrônico, pode também conceitualizar a leitura de muitos livros infantis e juvenis produzidos no formato tradicional impresso. Os projetos gráfico-editoriais de muitos livros propõem tal interação entre imagem e texto verbal que confluem para uma leitura

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Metodologia de Ensino

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dinâmica e não linear. Poderíamos dizer que essas novas propostas ul-trapassam a esfera da restrição etária e contemplam todos os leitores.

Dilvo Ristoff, no prefácio do livro de Wandelli (2003), assim se re-porta ao assunto:

Embora o meio eletrônico encoraje uma escrita mais fluida e facilite a li-

beração do pensamento e das narrativas do jugo das sequencialidades,

por si só ele é insuficiente para garantir a existência de um processo ou

de uma arquitetura hipertextual. Para Wandelli é, pois, falsa a dicotomia

entre livro impresso e o meio eletrônico em termos de oposição biná-

ria entre o velho e o novo. As narrativas contemporâneas mostram que

o livro impresso também mudou e que a mudança iniciada de forma

dramática nas últimas décadas, não só responde às novas tecnologias

da era da informática como de certa forma antecipa algumas das estra-

tégias e possibilidades. (RISTOFF apud WANDELLI, 2003).

O leitor do hipertexto é um leitor imersivo e interativo, a leitura não é mais realizada somente no papel, surge à tela do computador. Santaella (2004, p. 179) classifica o leitor imersivo em três níveis: errante, detetive e previdente, cada nível navega de acordo com suas habilidades. Assim, o leitor imersivo ideal seria aquele capaz de

[...] misturar de modo equilibrado os três níveis de leitura imersiva: o

errante, o detetivesco e o previdente. O ideal é que esse leitor não se

entregue às rotinas sem imaginação do previdente, mas se abra para as

surpresas, entregue-se às errâncias para poder voltar a vestir a roupa-

gem do detetive, farejando pistas. (SANTAELLA, 2004, p. 181).

Um novo sujeito leitor se avizinha não mais leitor só do impresso, mas leitor da tela digital do computador. O Homo Zappiens, categoria à qual pertencem aqueles que sabem que há muitas fontes de informações e que elas apresentam e defendem verdades diferentes; é um sujeito que possui uma grande habilidade icônica, é capaz de lidar com uma mul-tiplicidade de linguagens, executa várias tarefas ao mesmo tempo, lida com diferentes níveis de atenção enquanto navega (MSN, sites, Twitter, blog, Orkut, entre outros), tem um comportamento não linear, e possui habilidades colaborativas.

Cabe à escola saber desenvolver atividades que levem em conta esse novo leitor. Segundo Veen e Vrakking (2009, p. 70):

Nome proposto por Wim Veen e Bem Vrakking

(2009) para aqueles que nasceram a partir do início

da década de 1990 – “pri-meiros seres digitais”.

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Capítulo 07A literatura e a sua função

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Os pensadores digitais, como são as nossas crianças, podem fazer muito

mais do que se espera delas na escola. Podemos desafiá-las, apresen-

tando-lhes problemas complexos para resolver e dar a elas um amplo

controle sobre seus processos de aprendizagem. As crianças gostam de

ser desafiadas, pois elas passaram por experiências semelhantes ao jo-

gar no computador. Elas também gostam de ser desafiadas em tarefas

complexas. A abordagem pedagógica de trabalhar passo a passo não é

o que elas gostam de fazer. Elas são não lineares – o que é mais desafia-

dor. Elas gostam de estar imersas em situação em que não se saber por

onde começar e nem como agir. Gostam de aprendizagem experiencial,

como a dos jogos de computador.

O leitor contemporâneo, ao mesmo tempo em que lê o texto im-presso no formato livro, desloca seu olhar para o e-reader, e ainda mais impressionante é a leitura de alguns títulos pelo iPad. Faça uma expe-riência: acesse o endereço eletrônico <http://www.youtube.com/watch?v=gew68Qj5kxw&feature=player_embedded#at=12> e acompanhe, no Youtube, a leitura de Alice no País das Maravilhas, em um iPad. Certa-mente você ficará surpreso com o movimento das cenas, a ampliação das ilustrações, e os diferentes efeitos da tecnologia.

Assim, pensar experiências de leitura na contemporaneidade im-plica refletir sobre a constituição desse novo leitor que nos indaga, no espaço da escola, sobre novos protocolos de leitura.

Pesquise e socialize com seus colegas, tutores e professores

Convidamos você a pesquisar imagens de leitura literária na foto-

grafia e na ficção e socializá-las com seus colegas.

Você poderá escolher fotografias impressas em revistas, inter-•

net, livros, bem como aquelas de álbum particular (muitos de

nós temos nossa Fotografia Escolar).

Outro caminho pode ser recolher fragmentos de romances que •

tragam imagens de leitura – você pode ir ao encontro de algum

já citado nesta seção.

O iPad é um “iPhone gigante”, mas não tem funções de celular, embo-ra possa ser usado para chamadas por meio da internet (com uso de pro-gramas VoIP). O aparelho navega na internet por meio de conexões sem fio (Wi-Fi e 3G) e também traz conexão Bluetooth para se comunicar com peri-féricos, como teclados e webcams sem fio. (http://tecnologia.ig.com.br).

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Metodologia de Ensino

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Leia mais!

Para saber um pouco mais sobre a história da leitura e do impresso:

CHARTIER, Roger. Do livro à leitura. In: Práticas da leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 1996. p. 77-105.

Neste artigo, o historiador francês constrói uma história do impresso, enten-dida como história de uma prática cultural, a partir dos usos, dos manuseios, das formas de apropriação e da leitura do material impresso.

LAJOLO, Marisa; ZILBERMAN, Regina. A formação da leitura no Bra-sil. São Paulo: Ática, 1996.

O presente livro foi redigido a quatro mãos por Marisa Lajolo e Regina Zil-berman e, dos quatro capítulos que o compõem, sugerimos a leitura atenta do segundo: “Direitos e esquerdas autorais”. Fatiado em nove itens, o texto apresenta, através de depoimentos e relatos ficcionais de escritores brasi-leiros, a árdua tarefa de ver seus textos publicados em fins do século XIX e nas primeiras décadas do XX; as contradições da aceitação da obra como mercadoria e a remuneração do trabalho, entre outras, o que nos faz ampliar o olhar para: uma história da leitura que focaliza o lado da produção.

Acesse o blog Palavra Fiandeira <http://palavrafiandeira.blogspot.com>

Organizado por Marciano Vasques, e leia a entrevista com Peter O´Sagae. Nela você encontrará a opinião desse estudioso sobre a literatura e as novas tecnologias, em especial o seu trabalho no site Dobras da Leitura.

Figura 28 - Peter O’ Sagae

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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O ensino da literatura na escola: para além do que dizem os documentos

Apresentaremos, nesta seção, a orientação dos documentos de refe-

rência para o ensino da literatura no nível Fundamental e no Médio

e de outras obras bibliográficas, cujas teorias que veiculam têm seus

reflexos no processo de ensino. Primeiramente é necessário saber que,

de acordo com os PCNs, no Ensino Fundamental, do 6º ao 9º ano (cor-

respondente ao terceiro e ao quarto ciclo), a literatura não tem foro

de disciplina, ela está inserida no ensino da Língua Portuguesa. Já no

Ensino Médio, embora a literatura continue fazendo parte da disciplina

de Língua Portuguesa, integrante da área de Linguagens e Códigos, há

referência explícita ao seu ensino quando o documento traz como um

dos seus objetivos: “Recuperar, pelo estudo do texto literário, as formas

instituídas de construção do imaginário coletivo, o patrimônio repre-

sentativo da cultura e as classificações preservadas e divulgadas, no

eixo temporal e espacial” (BRASIL, 2000, p. 24).

Os PCNs (BRASIL, 1998) da Língua Portuguesa para o Ensino Fundamental apresentam o texto como unidade de ensino, desenvol-vendo uma reflexão específica sobre a “especificidade do texto literário” considerando-o como uma “forma peculiar de representação e estilo, construção autônoma onde predominam a força criativa da imaginação e a intenção estética” (BRASIL, 1998, p. 26) em que entram em diálogo a realidade e a fantasia:

Pensar sobre a literatura a partir dessa relativa autonomia ante outros

modos de apreensão e interpretação do real corresponde a dizer que

se está diante de um inusitado tipo de diálogo, regido por jogos de

aproximação e afastamento, em que as invenções da linguagem, a ins-

tauração de pontos de vista particulares, a expressão da subjetividade

podem estar misturadas a citações do cotidiano, a referências indiciais e,

mesmo, a procedimentos racionalizantes. Nesse sentido, enraizando-se

na imaginação e construindo novas hipóteses e metáforas explicativas,

o texto literário é outra forma/fonte de produção/apreensão de conhe-

cimento. (BRASIL, 1998, p. 26).

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Metodologia do ensino

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Nesse nível de ensino, embora os gêneros literários apareçam refe-renciados como privilegiados para a prática da escuta e leitura de tex-tos, bem como para a prática e produção de textos orais e escritos, não são apresentados encaminhamentos metodológicos específicos para o trabalho com a literatura. Tal constatação é feita também por Gomes (2010). Esse autor destaca ainda a inexistência de referência à vasta pro-dução literária que circula no mercado editorial brasileiro, cujo público-alvo são os alunos dessa faixa etária; a falta de circulação dessa produ-ção, a partir dos programas de promoção da leitura desenvolvidos pelo governo, assim como a desconsideração para a importância do papel dessa literatura na formação de leitores. Falamos aqui da literatura de recepção infantil e juvenil.

Como você já estudou na disciplina Literatura e ensino, temos hoje

no mercado editorial brasileiro um amplo acervo de títulos à dis-

posição do leitor, com características e temáticas as mais variadas

possíveis. Veremos, na próxima seção, que as políticas públicas de-

senvolvidas nos últimos anos têm contemplado a inserção de títulos

literários no espaço escolar, mas essa chegada dos livros à escola não

tem sido acompanhada de alternativas didáticas que aproximem o

jovem, em especial aquele que cursa o Ensino Médio, da leitura.

Os documentos de 2000 (PCNEM) e 2002 (PCNEM+) referentes ao Ensino Médio destacam que, nesse grau de ensino, deve-se dar “[...] especial atenção à formação de leitores, inclusive das obras clássicas de nossa literatura [...]” (BRASIL, 2002, p. 68), configurando-se assim uma intenção de que a literatura seja incorporada ao ensino da Língua Por-tuguesa, porém, não há políticas claras para a formação de formadores de leitores. Em 2006, no documento sobre As orientações curriculares do Ensino Médio, no item “Conhecimentos de Literatura”, os consultores Neide Luzia de Rezende, Maria Zélia Versiani Machado e Enid Yatsuda Frederico, bem como os leitores críticos Lígia Chiappini Moraes Leite e Haquira Osakabe, buscam integrar a literatura e a sua especificidade como disciplina no Ensino Médio; no entanto ela continua integrando a disciplina de Língua Portuguesa, como já mencionamos.

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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No que diz respeito ao ensino da literatura, os estudiosos citados no parágrafo anterior apontam alguns problemas dos PCNs +, entre eles:

Uma radicalidade no que diz respeito ao critério de juízo do Ӳtexto literário que fica supervalorizado na figura do interlocu-tor, nesse caso o aluno leitor.

“O foco exclusivo na história da literatura” – embora critiquem Ӳa prática viciosa do seu ensino, acabam por privilegiar o eixo temporal e espacial, permanecendo as práticas das escolas/dos movimentos literários, as obras e os respectivos escritores.

A fruição estética – exemplificada somente pelo exercício Ӳcoletivo da leitura literária e não a sua individualização. (BRASIL, 2006, p. 57-58).

Se os documentos apresentam um rompimento com uma visão histo-

riográfica desvinculada do texto no ensino de literatura, por que então

tal prática ainda persiste? Por que ainda persiste no Ensino Médio um

ensino da literatura numa linha diacrônica de movimentos literários, au-

tores e obras? Nossa intenção, aqui, não é polemizar, mas expor as fragi-

lidades que compõem os documentos, pois a posição sobre o ensino da

literatura, em especial no Ensino Médio, não é fato dado, algo resolvido.

É necessário lembrar que, desde o século XIX até os nossos dias, as análises e os estudos literários enveredaram por rumos diversificados que, em síntese, podem ser definidos como se ligando, sucessivamente, aos três elementos que constituem o fato literário: o autor, a obra e o leitor.

Num primeiro momento, concentraram-se na produção da obra, destacando a figura do autor e o seu contexto histórico (críticas biográfi-cas e deterministas); num segundo momento, sobrevalorizaram o texto e o que ele tinha para dizer por si só, confiante na sua autossuficiência, uma visão imanentista que se utilizou da linguística como ciência prio-

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Metodologia do ensino

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ritária (Formalismo Russo, New Criticism e mesmo a Crítica Estilística, para chegar ao Estruturalismo). Dessa forma, as pesquisas voltaram-se para o polo da textualidade, em detrimento do aspecto comunicativo. No terceiro momento, surgem as reflexões sobre a figura ativa do leitor.

Estudos desenvolvidos por Mikhail Bakhtin (1895-1975) e Hans Robert Jauss (1921-1997) ampliam essa discussão e levam em conta, no ensino da literatura, a teoria literária que prioriza o leitor, tornando-o protagonista.

Figura 29 - Mikhail Bakhtin

Bakhtin, começa a publicar suas reflexões na segunda década do sécu-

lo XX, período de grande efervescência cultural, regido pelo futurismo

e por outras vertentes literárias, enquanto os estudos literários vivem

sob a égide do formalismo. No campo político e social, crescentes trans-

formações se processam na Rússia marcada pela Revolução Socialista.

Sua produção científica está vinculada ao espaço da pesquisa docen-

te, como professor no Instituto Pedagógico de Saransk e em colégios

locais de Kímri, até culminar sua carreira na Universidade de Saransk.

Em Problemas da Poética em Dostoiévski (1929), o pensador introduz na

discussão literária termos como polifonia e carnavalização. Suas obras

chegam ao Ocidente a partir da década de 1970. Como você já deve ter

percebido, os estudos de Bakhtin são referências importantes para o de-

senvolvimento do ensino de Língua e de Literatura.

Contemporâneo ao formalismo, não segue essa corrente, concebe o texto como dialógico, discursivo. Já com as teses desenvolvidas por Jauss, no final da década de 1960, começou-se a enfatizar a figura do lei-tor, ao privilegiar a relação autor-obra-público. Ambos marcaram épo-ca e contribuíram, cada qual a sua maneira, para os estudos literários contemporâneos. Entre as ideias e as reflexões desses dois estudiosos, algumas centelhas se cruzam apesar do tempo que os separa. O que nos parece ponto de cruzamento encontra-se no processo de dialogização desenvolvido por ambos: Bakhtin pelo diálogo com a tradição e Jauss pelo diálogo com o leitor. Para o primeiro, o texto deve ser vislumbrado na sua tradição literária e na sua comunicabilidade, pois toda produção

Para o entendimento des-sas questões, vale a pena

retomar os conteúdos estudados na disciplina

Teoria da Literatura V.

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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textual presente incorpora, de forma mais ou menos intensa, a produção passada. Para o segundo, é o leitor que, por meio da leitura, estabelece a relação dialógica com o texto.

Figura 30 - Jauss

Jauss vivencia a revolução de costumes da década de 1960,

a emergência dos movimentos estudantis e as adaptações e

reformas universitárias motivadas por essas transformações.

Autor de alguns ensaios sobre a literatura medieval, suas

ideias tornam-se públicas após a conferência inaugural do

ano letivo de 1967, na Universidade de Constança, em 13 de

abril, denominada de Was ist und zu welchem ende atudiènt man literaturgeschichte? (O que é e com que finalidade se estuda história literária?). Jauss desenvolve sete teses através

das quais se propõe a fundamentar metodologicamente e re-

escrever a história da literatura, pois seu objetivo não consistia

em banir a história dos estudos literários, mas reorganizá-la

sob outro viés.

Jauss (1994) propõe uma história da arte e da literatura fundada em outros princípios: as análises literárias deveriam mudar o enfoque, não mais se centrando no texto ou no autor, e sim no que denominou de “terceiro estado”: o leitor. Tal perspectiva colocaria em foco a figura do sujeito produtor (destinador) interagindo com a do consumidor (re-ceptor). A arte obedeceria, assim, a uma função dialética: formadora e modificadora de percepção (ZILBERMAN, 1989, p. 32).

Na concepção de Bakhtin (1990, 2003), a palavra constitui um elo entre vários discursos. Ela não é estática, mas um signo social dialéti-co, dinâmico e vivo, por isso ativa e mutável; portanto, nunca é neutra e está sempre a serviço de algo, carregando consigo as interpretações e pressões dos contextos que já integrou. Bakhtin vinculou o texto lite-rário à história e à sociedade, vistos como outros “textos” possíveis de leitura. Assim, todo texto comportaria o diálogo de vários discursos: do emissor, do destinatário e do contexto e/ou contextos anteriores.

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Metodologia do ensino

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O escritor já não é o “Adão bíblico” em busca do verbo primeiro, à medida que todo discurso está sempre habitado por outras vozes, por outros discursos.

Percebemos, desse modo, que a essência do princípio dialógico se fundamenta como tal numa relação de alteridade, ou seja, o proces-so de comunicação exige o reconhecimento do outro. Na perspectiva bakhtiniana, o permanente processo de dialogização vai refletir na re-lação dinâmica estabelecida entre o autor, o texto literário e o leitor, pois a palavra, como criação ideológica, vai desenvolver-se de forma diversa das normas estabelecidas. A pluralidade de vozes inseridas no discurso romanesco revela, por conseguinte, ao leitor um horizonte di-verso do habitual.

Ivanda Martins, estudiosa da área de Língua Portuguesa e Litera-tura, no artigo “A literatura no Ensino Médio: quais os desafios do pro-fessor” (2006), destaca que a discussão sobre o ensino nesse nível passa pela reflexão dos subsídios teórico-metodológicos que contribuem com a prática pedagógica. Para ela,

A sistematização de certos conceitos específicos da teoria e crítica li-

terária precisa alcançar maior profundidade, exigindo-se do aluno um

repertório mais amplo de leituras e o conhecimento da organização

estética da obra literária. A carência de noções teóricas e a escassez

de práticas de leituras literárias são fatores que contribuem para que o

aluno encare a literatura como objeto artístico de difícil compreensão.

(MARTINS, 2006, p. 83).

Martins (2006, p. 84) salienta ainda que a leitura literária é pouco valorizada em todos os níveis de ensino da educação Básica (da Educa-ção Infantil ao Ensino Médio) e as contribuições das teorias literárias contemporâneas pouco têm sido contempladas nas escolas, persistindo as abordagens formalistas, estruturalistas, biográficas.

Ela traz para seu discurso as contribuições de Beach e Marshall, que fazem distinção entre leitura da literatura e ensino da literatura, porém enfatiza que tanto a leitura como o ensino da literatura devem estar presentes em todos os níveis de ensino.

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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Leitura da literatura: “Relacionada à compreensão do texto, à expe-

riência literária vivenciada pelo leitor no ato da leitura.”

Ensino da literatura: “O estudo da obra literária, tendo em vista uma

organização estética.”

Esses dois níveis dialogicamente relacionados deveriam conviver na

escola de modo articulado.

(MARTINS, 2006, p. 84-85)

Martins (2006) também destaca que a relação literatura e escola é marcada por mitos e nos apresenta três deles: 1) literatura é muito difí-cil; 2) é preciso ler obras literárias para escrever bem; e 3) a linguagem literária é marcada por especificidade.

O primeiro mito se efetiva pelo incentivo exclusivo de leitura de obras clássicas, uma vez que esses textos “[...] apresentam uma lingua-gem pertencente a contextos espaço-temporais distantes da realidade do aluno” (MARTINS, 2006, p. 92). A autora não é contra o uso de obras clássicas, mas afirma que elas devem ser contextualizadas para que os alunos compreendam “[...] as conexões entre as características estilís-ticas do texto e o contexto em que foi produzido” (MARTINS, 2006, p. 92). Por outro lado, muitas vezes, essas obras são apresentadas em fragmentos no livro didático, provocando um consumo rápido de um trecho do texto, sem haver, por parte do professor, um incentivo para a leitura integral, de forma que o aluno compreenda as relações intertex-tuais provocadas pelo texto literário. No que diz respeito à análise e à interpretação dos textos literários, há um enfoque na intenção do autor durante a sua produção, pois “[...] a literatura torna-se, assim, um objeto impenetrável, indecifrável, e o aluno-leitor não se conscientiza de sua participação como co-enunciador do texto, pois seu papel na recepção textual não é tão privilegiado” (MARTINS, 2006, p. 93).

O segundo mito é o de que a leitura de obras literárias, em espe-cial os clássicos (inclui-se Machado de Assis, José de Alencar, entre outros), facilitaria o acesso ao domínio da norma padrão; mito enfati-zado pelas gramáticas normativas quando as utilizam como exemplo,

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Metodologia do ensino

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[...] desconhecendo que o fazer artístico não se prende a regras, mas

transcende os limites da gramática-padrão. Não é valorizada a intenção

estética que propicia a liberdade criativa do autor, o qual pode fugir da

norma culta se sua intenção é representar o dialeto não-padrão, por

exemplo. (MARTINS, 2006, p. 94).

A leitura do texto literário, por sua vez, na maioria das vezes, é acompanhada da produção de uma redação ou do preenchimento de fichas de leituras. Por esse viés, “[...] a leitura literária está diretamente atrelada ao cumprimento de tarefas escolares” (MARTINS, 2006, p. 95).

O terceiro mito, o de que a linguagem literária é marcada pela es-pecificidade, muito presente nas salas de aula, tem base em enfoques formalistas e estruturalistas, que não levam em conta as relações texto e contexto e leitor e texto, isso é, as condições de produção e recepção. A autora traz, como exemplos, os estudos de Pratt, que desenvolve refle-xões sobre a obra literária como “[...] representação da fala diretamente relacionada ao contexto comunicativo” (MARTINS, 2006, p. 95). Desse modo, a discussão sobre a linguagem literária e não literária deveria re-cair sobre os “[...] pontos de confluência entre a literatura e os discursos que produzimos cotidianamente” (MARTINS, 2006, p. 96).

Tendo isso em vista, cabe questionarmos: No que esses mitos con-tribuiriam para um tratamento inadequado do literário no espaço esco-lar? Segundo Martins (2006, p. 96),

Disseminam perspectivas preconceituosas subjacentes à prática peda-

gógica que precisa ser repensada. Ao perpetuar esses mitos, a escola

contribui para a formação de leitores possivelmente acríticos, com uma

visão reduzida do fenômeno literário e promove a manutenção do status

daqueles que encontram, na leitura literária e nas habilidades intelectu-

ais, uma forma de poder, discriminando aqueles que não percebem a di-

mensão polissêmica, simbólica, transgressora do fazer artístico literário.

Certamente você já ouviu comentários ou leu a expressão “escolari-zação” vinculada à arte como sinônimo de negatividade. Magda Soares, com relação à escolarização da literatura infantil e juvenil, afirma que:

Não há como ter escola sem ter escolarização de conhecimentos, saberes, artes: o surgimento da escola está indissociavelmente ligado à

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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constituição de ‘saberes escolares’, que se corporificam e se formalizam em currículos, matérias e disciplinas, programas, metodologias, tudo isso exigido pela invenção, responsável pela criação da escola, de um espaço de ensino e de um tempo de aprendizagem. (SOARES, 1999, p. 20, grifos da autora).

Soares (1999) assevera que não devemos atribuir conotação pejo-rativa à escolarização, pois ela é inevitável e necessária. Negar a escolari-zação seria negar a própria escola, no entanto existe uma escolarização adequada e outra inadequada no trato com o conhecimento, nesse caso, o literário. A primeira seria

[...] aquela que conduza mais eficazmente às práticas de leitura que

ocorrem no contexto social e às atitudes e valores que correspondem

ao ideal de leitor que se quer formar - e uma escolarização inadequada,

errônea, prejudicial da literatura - aquela que antes afasta que aproxima

de práticas sociais de leitura, aquela que desenvolve resistência ou aver-

são à leitura. (SOARES, 1999, p. 25).

Importa destacarmos que Soares (1999) apresenta ainda as três principais instâncias de escolarização da literatura infantil e juvenil: a biblioteca, a leitura e o estudo de livros de literatura e a leitura e o estudo de textos de literatura.

A biblioteca e as suas estratégias: local escolar onde os livros 1) ficam guardados e disponibilizados; a organização do espaço e do tempo de acesso ao livro e à leitura; estratégia de seleção dos livros que os alunos devem/podem ou não ter acesso e eventos relacionados à biblioteca.

A leitura e o estudo de livros de literatura: a leitura do livro lite-2) rário orientada pelo professor configura-se como tarefa/dever escolar e é sempre avaliada. Há exigência de comprovação do que foi lido.

A leitura e o estudo de textos de literatura: leitura do fragmento 3) do texto literário no livro didático. Em estudo sobre os livros di-dáticos de 1ª a 4ª séries, a autora apresenta a forma inadequada pela qual os textos literários são tratados nos livros didáticos.

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Metodologia do ensino

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8.1 Da biblioteca escolar a outros espaços de leitura literária

A biblioteca escolar é compreendida pelos documentos oficiais de referência como um espaço de fundamental importância para a dis-seminação da leitura, em especial da leitura literária. Veremos a seguir que políticas públicas têm levado em conta este local como espaço irra-diador da leitura, pois não é possível se ter um projeto pedagógico que leve em conta a formação do leitor sem pensar neste ambiente, uma vez que o

[...] projeto pedagógico com vistas à formação do leitor da Literatura

deve incluir a estruturação de um sistema de trocas contínuo, sustenta-

do por uma biblioteca com bom acervo e por outros ambientes de lei-

tura e circulação de livros. A ampliação dos espaços escolares de leitura

resultará, com certeza, na ampliação dos tempos, diga-se de passagem,

exíguos de aulas de Literatura, além de possibilitar trocas menos artifi-

ciais, já que colaboram para a criação de uma comunidade de leitores

tão importante para a permanência da literatura, sobretudo em con-

textos sociais que não dispõem de uma biblioteca pública e/ou livraria.

(BRASIL, 2006, p. 80).

Vários locais, no Brasil e fora dele, possuem espaços de leitura que, num primeiro momento, parecem sui generis, mas acabam sendo fun-damentais para a formação de leitores. Vejamos alguns desses projetos e iniciativas: Barca do livro (Florianópolis), Ônibus biblioteca (São Paulo, Rio Grande, Recife, Uberlândia, Contagem e outras cidades), emprés-timos em terminais de ônibus (Curitiba, Passo Fundo) e metrôs (São Paulo, Belo Horizonte); Burro biblioteca (Etiópia, Colômbia).

Uma das ações necessárias para a educação e a promoção da cultu-

ra escrita é o desenvolvimento e a permanência de políticas públicas.

Como professor de Língua Portuguesa e Literatura, é importante que

você conheça algumas políticas que estão sendo desenvolvidas no País

com o objetivo de promover a leitura. Como cidadãos e profissionais

da Educação, devemos acompanhar a implementação dessas ações e

verificar se estão sendo concretizadas a contento.

A Ethiopia Reads foi criada em 2003 por Yohannes

Gebregeorgis, um etíope residente nos EUA, com o objetivo de promover

o desenvolvimento da Etiópia através da leitura. A

Biblioteca Móvel de Burro surgiu mais tarde, para

servir às crianças das zonas rurais perto de Awassa, a

capital agrícola do país. Os burros são os animais mais

importantes, como meio de transporte, embora

nem sempre sejam trata-dos cuidadosamente.

Figura 31 - Biblioteca Móvel de Burro (Etiópia)

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

103

O Ministério da Educação brasileiro, no que se refere ao livro e à sua circulação no espaço escolar, tem se voltado preferencialmente para o desenvolvimento de políticas de acesso ao livro didático. Das ações que dizem respeito à biblioteca escolar, ao incentivo à eitura e à forma-ção de leitores, podemos mencionar o que segue.

Entre os anos de 1984 e 1996, ocorreu o Programa Nacional Salas de Leitura (PNSL), instituído pela Resolução MEC/FAE nº 14, de 26 de julho de 1984. Esse programa tinha como finalidade a criação de um espaço alternativo nas escolas públicas que fugisse ao formato da biblio-teca tradicional.

Em 1997 foi instituído o Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE (Portaria Ministerial nº 584). Em 2000, o PNBE privilegiou a distribuição de obras voltadas para a formação do professor às escolas de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental. Cabe lembrar que, de 2001 a 2003, o PNBE desenvolveu o projeto Literatura em Minha Casa e Palavra da Gente, focado na distribuição de coleções de literatura diretamente ao aluno, com objetivo de oportunizar ao estudante e seus familiares o acesso ao livro literário. As coleções compunham-se de um conjunto de títulos de gêneros variados.

Em 2001, o projeto Literatura em Minha Casa foi direcionado a alunos de 4ª e 5ª séries. Em 2002, para alunos de 4ª série e em 2003, para alunos de 4ª e 8ª séries e do último segmento de Educação de Jovens e Adultos (EJA). No ano de 2004, com a mudança de governo no País, há uma avaliação do referido projeto anterior e a distribuição particulari-zada ao aluno é revista e se retorna a ações de implementação do acervo coletivo dos espaços de leitura na escola: bibliotecas e salas de leitura.

Segundo a avaliação do MEC, com o projeto Literatura em Minha Casa não houve investimento no acervo coletivo das bibliotecas escolares:

[...] debilitando a biblioteca como espaço próprio de organização e dis-

ponibilização de materiais diversificados – de obras de referência a pe-

riódicos; de livros de literatura a obras de não-ficção; de mapas a novas

tecnologias – lugar em que se promove a sociabilidade, mas principal-

mente a democratização do conhecimento. Considerando a importância

de universalizar o atendimento a todas as instituições públicas de Ensino

Fundamental, independentemente do número de alunos matriculados,

É necessário lembrar que, em paralelo à política de governo, houve o Pro-jeto Ciranda de Livros, realizado pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) em parceria com a Fundação Roberto Marinho e da Hoescht; teve a duração de 4 anos e promoveu o acesso a 15 títulos de literatura infantil ao ano para mais de trinta e cinco mil escolas. Hoje parece pouco, mas na época este acervo era co-memorado pelas crianças e professores das escolas do interior do País.

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Metodologia do ensino

104

bem como ao coletivo da escola e de permitir o acesso de alunos e pro-

fessores às obras em seus formatos e projetos originais, o MEC retomou

a distribuição de acervos coletivos às bibliotecas/salas de leitura das es-

colas. (BERENBLUM; PAIVA, 2009, p. 12).

Foram distribuídos, em 2005, às escolas do primeiro segmento do Ensino Fundamental (do 1º ao 5º ano) livros de literatura no formato disponível no mercado editorial. Em 2006/2007, foram selecionados e distribuídos livros de literatura ao segundo segmento do Ensino Funda-mental (do 6º ao 9º ano). Cabe, ainda, registrarmos que, em 2007/2008, a seleção e distribuição de livros de literatura foram voltadas para alunos da educação infantil e das séries/anos iniciais do Ensino Fundamental.

Constatamos, ainda, que a seleção e a distribuição de livro de li-teratura foram, em 2008/2009, voltadas para alunos do Ensino Funda-mental (do 6º ao 9º ano) e do Ensino Médio. Destacamos que, a partir de 2009/2010, as obras de literatura têm sido voltadas para as crianças da educação infantil (creches e pré-escolas), para os alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e para os alunos da educação de jovens e adultos (Ensino Fundamental e Médio).

Embora não sejam títulos de literatura, neste período também foi

lançado o edital PNBE Professor 2010, com o objetivo de subsidiar

teórica e metodologicamente os docentes no desenvolvimento do

processo de ensino e aprendizagem nos respectivos campos disci-

plinares, áreas do conhecimento e etapas/modalidades da educa-

ção básica. Foram selecionados 154 títulos divididos em cinco cate-

gorias: 53 para os anos iniciais do Ensino Fundamental; 39 para anos

finais do Ensino Fundamental; 45 para o Ensino Médio e educação

de jovens e adultos; e 17 para os anos iniciais e finais do Ensino Fun-

damental da educação de jovens e adultos.

Importa frisarmos que, embora tenhamos essas ações, ainda exis-te carência de bibliotecas escolares. Há, todavia, esperança de que se reverta este quadro, pois foi sancionada a Lei nº 1.244/2010, publicada no Diário Oficial da União, em 25 de maio de 2010, que determina que toda escola pública e privada tenha um acervo mínimo de livros nas bi-

Pela primeira vez um edi-tal para seleção de livros

literários contemplou esse nível de ensino

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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bliotecas escolares, correspondente a um título por aluno matriculado. A referida lei estabelece o prazo de 10 anos para a criação de espaço ex-clusivo para a guarda do acervo e a admissão de profissional habilitado para administrar esse acervo.

Acompanhemos o levantamento sobre o índice de bibliotecas pú-blicas e fiquemos atentos à implementação da Lei nº 1.244/2010, exigin-do de nossos governantes que a executem em prol da melhoria da qua-lidade do ensino em nossas escolas e, consequentemente, da educação no Brasil.

Figura 32 - Retrato de um povo sem livros.

Faz-se necessário destacar que, a partir de 2003, com a Lei nº 10.753, que institui a Política Nacional do Livro, desenvolveu-se um Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e várias ações de promoção da leitura foram desencadeadas.

Leia a matéria sobre os dados do déficit de biblio-tecas escolares em nosso País em http://www.cultu-ra.gov.br/site/2010/06/03/faltam-93-mil-bibliotecas/.

O QUE É O PNLL? O Plano Nacional do Livro e Leitura se constitui de “[...] um conjunto de projetos, programas, atividades e eventos na área do livro, leitura, literatura e biblio-tecas em desenvolvimen-to no país, empreendidos pelo Estado (em âmbito federal, estadual e muni-cipal) e pela sociedade” (BRASIL, 2007). Conheça o PNLL acessando o site http://www.pnll.gov.br.

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Metodologia do ensino

106

Outras instituições não governamentais têm se aliado em prol de reflexões sobre a leitura literária no Brasil, entre elas podemos citar o Movimento por um Brasil literário e a Fundação Nacional do Livro In-fantil e Juvenil (FNLIJ).

O Movimento por um Brasil Literário teve início em 2009, com a publicação do Manifesto por um Brasil Literário, lançado em julho da-quele ano durante a Festa Literária de Paraty (FLIP). O movimento se constitui a partir da iniciativa da união de instituições e pessoas físicas, envolvidas com a temática da literatura no País. O Manifesto procura “[...] ampliar o debate em torno da importância da leitura de livros, aco-lher propostas e engajar o maior número de pessoas em torno desta cau-sa”. Os representantes do Movimento buscam participar de ações que le-vem em conta a leitura literária. Leiamos um fragmento do Manifesto:

A leitura literária é um direito de todos e que ainda não está escrito. O

sujeito anseia por conhecimentos e possui a necessidade de estender

suas intuições criadoras aos espaços em que convive. Compreendendo

a literatura como capaz de abrir um diálogo subjetivo entre o leitor e a

obra, entre o vivido e o sonhado, entre o conhecido e o ainda por conhe-

cer; considerando que este diálogo das diferenças, inerente à literatura,

nos confirma como redes de relações; reconhecendo que a maleabilida-

de do pensamento concorre para a construção de novos desafios para

a sociedade; afirmando que a literatura, pela sua configuração, acolhe a

todos e concorre para o exercício de um pensamento crítico, ágil e in-

ventivo; compreendendo que a metáfora literária abriga as experiências

do leitor e não ignora suas singularidades, que as instituições em pauta

confirmam como essencial para o País a concretização de tal projeto.

(MOVIMENTO POR UM BRASIL LITERÁRIO, 2009, não paginado).

A FNLIJ, por sua vez, é uma instituição sem fins lucrativos. Foi criada em 1968, com os objetivos de promover a leitura literária e divul-gar os livros de qualidade, para crianças e jovens, publicados no Brasil. A instituição desenvolve várias ações para cumprir seus objetivos, entre elas: concurso para promover a leitura e os livros de qualidade; cursos que visam à formação do professor-leitor, leitura e seleção de livros para crianças e jovens, pesquisas sobre a leitura e literatura, publicações e atividades internacionais com a participação no International Board on Books for Young People (IBBY), por meio da seção brasileira.

Você pode saber mais so-bre a FNLIJ no site: http://

www.fnlij.org.br/.

Figura 33 - Logo da FNLIJ.

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Capítulo 08O ensino da literatura na escola

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Em 1974, a FNLIJ inicia a premiação dos melhores livros de recep-ção infantil e juvenil. Esta premiação conta, atualmente, com 18 catego-rias: Melhor livro para a Criança; Jovem; Imagem; Poesia; Informativo; Tradução Criança; Tradução Jovem; Tradução Informativo; Tradução Reconto; Projeto Editorial; Revelação Escritor; Revelação Ilustrador; Melhor Ilustração; Teatro; Livro Brinquedo; Teórico; Reconto; e Litera-tura de Língua Portuguesa. Além disso, ela elenca dez títulos em cada categoria da premiação para receberem o Selo de Altamente Recomen-dável. A lista dos livros premiados pela FNLIJ tem servido de orien-tação para a aquisição e compra de livros, por diferentes organismos públicos e particulares e por leitores em geral.

Em 1994, a FNLIJ criou também o Concurso FNLIJ – Os Melho-res Programas de Incentivo à Leitura junto a Crianças e Jovens, para valorizar o trabalho de pessoas físicas e instituições envolvidas em ini-ciativas de promoção da leitura. A partir de 1999, tem sido realizado anualmente o Salão FNLIJ do Livro para Crianças e Jovens (RJ), com o objetivo de contribuir para a formação de leitores, com foco na lite-ratura infantil e juvenil.

Você conhece os espaços públicos de leitura na sua cidade? Isto é, você

conhece a biblioteca pública de sua cidade? E os projetos de leitura da

Secretaria Municipal de Educação ou de outras instituições públicas ou

privadas? A sua cidade tem livrarias? Feira de livro? Saraus literários?

Círculos de leitura? Ressaltamos, assim, que conhecer quais os locais

e as práticas de promoção da leitura literária se faz necessário para a

realização de parcerias em prol de um trabalho com a literatura.

Pesquise e socialize com seus colegas, tutores e professores

Visite o site do PNLL <www.pnll.gov.br>, escolha um dos seus eixos

de atuação, verifique as ações das linhas e identifique no seu muni-

cípio e/ou Estado se elas estão sendo implementadas, além daque-

las desenvolvidas pelo PNBE.

Você pode acessar a lista dos livros premiados de 2001 a 2010 em: http://www.fnlij.org.br/principal.asp?cod_mat=32&cod_menu=2004.

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Metodologia do ensino

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Leia mais!

Acesse o site http://leituracatarinense.blogspot.com/ :

lá você encontrará os resultados do projeto Clube da leitura: a gente cata-rinense em foco, desenvolvido pela Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis. Esse projeto contempla o trabalho com textos de autores ca-tarinenses, bem como o contato desses escritores com os leitores, por meio de visita às escolas envolvidas com o projeto.

Reflita!

Que possibilidades você vê de desenvolver projeto semelhante na escola em que trabalha ou no seu município?

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Capítulo 09O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio

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O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio: estratégias metodológicas

Poesia

Palavra, palavra (digo exasperado), se me desafias, aceito o combate

(Carlos Drummond de Andrade, 1967)

A luta com a palavra, considerada como a batalha mais vã, é trazi-da para este espaço de reflexão como algo possível e aprazível, pensar a leitura do poema, bem como a sua escrita, como exercício de prazer que deve ganhar espaço na sala de aula. O objetivo do ensino do poema não se constitui em formar escritores/poetas, mas em aproximar e sensibili-zar os alunos, quer do Ensino Fundamental, quer do Ensino Médio, em relação à leitura da palavra poética e, se possível, à escrita.

Gostaríamos de retomar aqui a proposta do poeta catarinense Lindolfo Bell, que, na década de 1960, juntamente com o poeta Rubens Jardim, concretizou o exercício de levar a poesia às ruas, movimento conhecido como Catequese Poética. A poesia ganha as ruas na boca do poeta que recita no Viaduto do Chá (SP); nas camisetas com novas es-tampas: a palavra poética; nos painéis-poema, nos papéis de carta poe-ma; nos poemas escritos no chão das praças. É a poesia livre de amarras, solta no ar.

Essas estratégias de vivificar as palavras construídas pelo poeta podem, evidentemente, ser aplicadas por nós professores. Assim, vale questionarmos: Por que não lançar para os alunos a proposta de reti-rar os poemas dos livros e apresentá-los em outros suportes? Isso pode ser solicitado a qualquer grupo, independentemente da faixa etária ou do nível de ensino. Em 2008, na Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), estudantes do Curso de Letras realizaram, por exemplo, ati-vidade com fim de dar visibilidade à palavra poética. O grupo de alunos emoldurou os poemas de Lindolfo Bell em pequenos quadros e em sa-colas poéticas, conforme podemos constatar na imagem a seguir.

Para conhecer ou (re)ver a leitura pública de poemas por Lindolfo Bell, acesse: a) http://br.youtube.com/watch?v=C_RT6Ex1rZI; b) http://br.youtube.com/watch?v=mIrbP6HDWHg; e c) http://br.youtube.com/watch?v=X8ViouBZwtk&feature=related.

Para saber mais sobre a Catequese Poética, acesse o site: http://versoeprosa.ning.com/profiles/blog/show?id=2138728%3ABlogPost%3A15131.

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Figura 34 - Bell em palavras.

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Metodologia de Ensino

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Varal literário

Outro trabalho interessante a ser realizado com os alunos é a construção do Varal Literário. Os primeiros varais literários começa-ram a circular em Santa Catarina na década de 1970, idealizados pelo poeta Alcides Buss. Atualmente são muito utilizados para divulgar e expor poemas.

O varal literário consiste em pendurar num cordão (como um varal de roupa) as produções literárias dos alunos e também de escritores por escolhidos eles. Os poemas podem, igualmente, ser apresentados em fo-lhas de ofício e/ou cartolinas.

Figura 36 - Varal literário I Figura 37 - Varal literário 2

Exercício Dadaísta

O movimento Dadaísta, como você estudou em Teoria Literária, valorizava o acaso e o absurdo, buscava “libertar a imaginação via des-truição das noções artísticas convencionais”.

O poeta Tristan Tzara deixou uma receita para fazer um poema dadaísta. Vejamos:

Pegue um jornal. Pegue a tesoura. Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema. Recorte o artigo. Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam

Para saber mais sobre varais literários, consulte o blog do escritor: www.

alcidesbuss.com.

Ele originou-se em 1915, na cidade de Zurique. Você pode obter mais

informações sobre o Da-daísmo no seguinte livro: TELES, Gilberto Mendon-ça. Vanguarda européia

e Modernismo brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro:

Record, 1987.

Figura 35 - Alcides Buss

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Capítulo 09O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio

111

esse artigo e meta-as num saco.

Agite suavemente.

Tire em seguida cada pedaço um após o outro.

Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do

saco.

O poema se parecerá com você.

E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade

graciosa, ainda que incompreendido do público.

Você pode realizar essa ativida-de com alunos de diferentes níveis de ensino. Para isso, solicite aos partici-pantes que recortem frases de revistas e jornais aleatoriamente e coloquem em um envelope ou saco. Divida a turma em pequenos grupos e dis-tribua uma frase ou várias palavras para cada participante, daquelas re-colhidas no envelope. Cada pequeno grupo fará um texto/poema somente com as frases recebidas para apresen-tar ao grande grupo.

Limeriques

Limerique é uma construção poética com temática maluca, ab-surda, surreal. Compõe-se de cinco versos e o primeiro, o segundo e o último verso têm de terminar com a mesma rima. O terceiro e quarto versos são mais curtos e apresentam rimas diferentes dos demais versos. Não se sabe ao certo a origem de sua estrutura, mas seu sucesso se deve ao escritor inglês Edward Lear (1812-1888). A seguir, apresentamos um exemplo desse tipo de poema:

Poema traduzido por José Paulo Paes: There was an Old man on whose nose/most birds of the air could repose;/But they all flew away/at the closing of Day,/ Which relieved that Old Man and his nose.

Figura 38 - Poema Dadaísta

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Metodologia de Ensino

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Havia um homem em cujo nariz

A passarada sentava-se, feliz.

Dali só saía

quando terminava o dia,

Para alívio do dono do nariz.

(LEAR, 1992)

No Brasil, Tatiana Belinky tem produzido vários livros constituídos de limeriques, entre eles Limeriques da Coconha (2008), em que descre-ve esta cidade imaginária. Você pode acessar outros Limeriques de Ta-tiana Belinky no site: http://diariosdabi-cicleta.blogspot.com/2008/02/limeriques-da-tatiana.html.

A vida ali é um deleite

Suave tal qual puro azeite —

Na bela Cocanha

O povo se banha

Em rios de mel e de leite.

(BELINKY, 2008)

Poesia visual

Para introduzir as crianças e adolescentes na poesia visual, nada mais interessante do que o livro Poesia Visual, de Sérgio Capparelli e Ana Claudia Gruszynski. Além dos poemas impressos, o leitor poderá brincar com os poemas e interagir com eles no site: www.ciberpoesia.com.br.

Narrativa

No trabalho com a narrativa, apresentaremos, a seguir, algumas su-gestões metodológicas que, acreditamos, podem contribuir para o exercí-

Figura39 - Capa do livro Limeri-ques da Cocanha

Figura 40 - Poema Zigue-zague, de Caparelli e Gruszynski

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Capítulo 09O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio

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cio da leitura literária em prosa na escola. É necessário lembrar que estas atividades não excluem informações básicas e necessárias já estudadas por você durante o curso, explicitando os gêneros literários dentro do estilo narrativo: o romance, o conto, a crônica, a fábula, entre outros; e as categorias da narrativa ação, tempo, espaço, personagens e narrador.

O Romance

Martins (2006) sugere a análise comparativa entre textos por auto-res em tempo e espaço diferentes, o que incentiva o trabalho com os di-ferentes níveis de compreensão de intertextualidade. O quadro a seguir, elaborado pela autora, apresenta sugestão de como trabalhar os diferen-tes níveis de intertextualidade:

Nível de inter- textualidade

Definição[da intertextualidade]

Exemplo[de como fazer]

Homoautoral Relação entre textos produzidos por um mesmo autor.

Na obra machadiana, analisar a representação dos perfis femininos (Capitu, Virgília, etc.) que dialogam constantemente.

Heteroautoral Diálogo entre textos de autores distintos.

Abordar as relações entre a obra machadiana Dom Casmurro e a tragédia shakespeariana Otelo.

EndoliteráriaRelações intertextuais entre tex-tos que fazem parte do sistema literário.

Considerar as relações entre obras literárias como Missa do Galo, de Machado de Assis e Missa do Galo, de Gilvan Lemos.

Exoliterária

Relações intertextuais entre uma obra literária e outro texto que não participa do sistema li-terário.

Relações entre o romance Boca do inferno, de Ana Mi-randa (obra literária), e os documentos históricos que forneceram subsídios para a autora ficcionalizar a bio-grafia de Gregório de Matos (MARTINS, 2006, p. 99).

Outra possibilidade de trabalhar com o romance apresentamos a se-guir. Para introduzir no Ensino Médio a leitura dos romances do escritor português José Saramago, sugerimos, por exemplo, a leitura de um conto do autor publicado em formato de livro infantil, denominado A maior flor do mundo (Ilustração de João Caetano). Nesse conto, o escritor tece considerações sobre as dificuldades das relações humanas e as de escre-ver para a infância. Para completar, você pode assistir ao filme, adaptado e dirigido por Juan Pablo Etcheverry, A flor mais grande do mundo, dis-ponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=-KTL94Rl7CI>.

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Metodologia de Ensino

114

O Conto

O gênero conto é mais facilmente trabalhado em sala de aula devido a sua extensão, pois não exige muito tempo de leitura como o romance. Construído de forma simples, a brevidade é uma de suas características, como destaca Alceu Amoroso Lima (apud GOTLIB, 2003, p. 63-64):

O tamanho representa um dos sinais característicos de sua diferencia-

ção. Podemos mesmo dizer que o elemento quantitativo é o mais ob-

jetivo dos seus caracteres. O romance é uma narrativa longa. A novela é

uma narrativa média e o conto é uma narrativa curta. O critério pode ser

muito empírico, mas é muito verdadeiro. É o único realmente positivo.

O Miniconto

Embora o Miniconto, ou microconto, ou nanoconto – espécie de conto muito pequeno – não seja reconhecido como gênero literário pela Teoria Literária, sua inserção nas produções de muitos escritores tem ganhado cada vez mais força, e muitos são os seus adeptos. Uma das características do miniconto é a sua incompletude, que possibilita ao leitor outras representações para além do texto.

Vale a pena consultar o blog do escritor Silvio Vasconcellos, “Mini-contos cotidianos” . A estratégia do escritor é utilizar-se de manchetes de notícias jornalísticas, bem como de suas fotografias e produzir um mi-niconto com até 300 caracteres. A partir da matéria do jornal El Clarín (Argentina, de 31/08/2007) intitulada “Obligan a cuatro turistas a lim-piar enormes graffitis que pintaron en rocas de Sierra de la Ventana”, Silvio Vasconcellos escreveu: Eram os deuses artistas?

O fiscal do parque viu as pinturas nas pedras e lembrou-se do gru-po de jovens que ia descendo as montanhas. Ainda tentaram alegar que eram figuras rupestres, mas quando o fiscal perguntou por que os pré-históricos escreveriam Fuera Bush, responderam que além de astronau-tas os incas eram videntes.

Leia outros minicontos desse escritor no blog:

http://minicontos.blogs-pot.com/.

Figura 41 - “Obligan a cuatro turistas a limpiar enormes graffitis

que pintaron en rocas de Sierra de la Ventana”.

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Capítulo 09O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio

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Outras possibilidades

Apresentaremos, a seguir, atividades de promoção da leitura lite-rária que têm caráter interdisciplinar. Elas possibilitam o aguçar do ato criativo e a autonomia da leitura e podem ser realizadas nos diversos espaços da escola (sala multimídia, bibliotecas, auditórios) e conjunta-mente com professores de outras disciplinas. Algumas dessas atividades estão presentes no artigo “A leitura literária, escola e biblioteca escolar: inquietações” (DEBUS, 2006).

Saraus literários I – leituras em voz alta de textos temáticos a se-

rem realizadas pela comunidade escolar em períodos extracurricu-

lares. A proposta é que essa atividade não esteja vinculada a deter-

minada disciplina da grade curricular.

Saraus literários II – presença de escritores de literatura infantil

e juvenil na escola para dialogar com os leitores sobre suas obras

e promover a audição de seus textos. Tal momento exige a leitura

antecipada dos títulos do autor convidado.

Feira de Livros – evento que aproxima a comunidade escolar da

leitura. As livrarias e/ou divulgadores editoriais aceitam o convite

para participar, pois é uma maneira de divulgar seus produtos e

também de vendê-los. A escola pode solicitar, como contrapartida

dos expositores, a presença de contadores de histórias, escritores,

ilustradores e mesmo a doação de um acervo mínimo de títulos.

Intercâmbio de leituras – promoção de contato epistolar (tradi-

cional ou eletrônico) dos alunos da instituição na qual você traba-

lha com estudantes de instituições nacionais e internacionais (por

exemplo, entre Brasil e Portugal) para que possam trocar impres-

sões sobre leituras. Primeiro os leitores socializam internamente as

suas leituras, para que ocorra uma permuta de apreciações críticas

ou de opiniões sobre as leituras realizadas, antes de compartilhá-las

com o grupo externo.

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Metodologia de Ensino

116

Sessão Audiovisual I – Sessão de filmes que sejam adaptações de

obras literárias, no intuito de comparar a transposição do texto lite-

rário para outro suporte e as inserções e adaptações realizadas pelos

roteiristas e diretores. No Brasil temos vários títulos de autores espe-

cificamente brasileiros, O menino maluquinho (Ziraldo), Antes que o mundo acabe (Marcelo Carneiro da Cunha), Memórias Póstumas de Brás Cubas (Machado de Assis), O Cortiço (Aluízio de Azevedo),

Clandestina Felicidade (Clarice Lispector). E de estrangeiros, como

Razão e Sensibilidade, de Jane Austin; O leitor, de B. Schlink; Harry Potter e o cálice de fogo, de J.K. Rowling, e tantos outros.

Figura 42 - Antes que o mundo acabe – livro e filme (Editora Projeto, 2000), de Marcelo Carneiro da Cunha, com fotos de Roberto Conte e Ado Henrichs, foi adaptado para o cinema em 2010, dirigido por Ana Luiza Azevedo, com participação de Jorge Furtado no roteiro. Para saber mais, acesse: www.antesqueomundoacabeofilme.com.br.

Sessão Audiovisual II – Sessão de filmes que possuam como tema

a leitura, em especial a literária, e os espaços sociais de leitura, que

provoquem e estimulem a discussão da sua importância: Sociedade dos poetas mortos, Abril despedaçado, Farenheit 451, Nunca te vi, sempre te amei, Mensagem para você, O leitor.

Sessão Audiovisual III – Audição de músicas adaptadas de poe-

sias e CDs de poesias declamadas.

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Capítulo 09O ensino da literatura no Ensino Fundamental e Médio

117

Leia mais!

O livro Os cem melhores contos brasileiros do século, organizado por Ítalo Mo-riconi, é uma referência importante, pois é uma coletânea que reúne nar-rativas curtas produzidas no Brasil, entre os anos de 1900 e fins de 1990. Participam dessa coletânea os mais diversos escritores, como João do Rio, Clarice Lispector, Lima Barreto, Graciliano Ramos, Carlos Drummond de An-drade, Rubem Fonseca, Ana C. César, Fernando Sabino, Hilda Hilst, Dalton Trevisan, Moacyr Scliar, Lygia Fagundes Telles, Victor Giudice, João Antônio, Luiz Fernando Veríssimo, Raduan Nassar e Nélida Piñon.

Para saber mais sobre o poeta Lindolfo Bell, sugerimos a leitura de Quixote catarinense, de Helen Francine (Editora da UFSC, 2005). Nesse livro, a autora conta sobre a trajetória e algumas batalhas desse poeta catarinense.

Para conhecer a produção poética de Manoel de Barros, sugerimos a leitura de títulos como: Poeminhas pescados numa fala de João (2001), Memórias inventadas (A infância) (2003), Ilustrações de Martha Barros, e o já citado neste livro Poesia completa (2010). Você pode conhecer alguns dos poemas do autor no site: http://www.releituras.com/manoeldebarros_bio.asp. E pode conhecer um pouco mais sobre a biografia do poeta assistindo a dois docu-mentários: Língua de brincar – viagem à poesia de Manoel de Barros, da pro-fessora Lúcia Castelo Branco, da Faculdade de Letras (Fale) da UFMG, em parceria com Gabriel Sanna, e Só dez por cento é mentira: a desbiografia oficial de Manoel de Barros, de Pedro Cezar.

Convidamos você a acessar o site: http://bravonline.abril.com.br/conteu-do/literatura/tzvetan-todorov-literatura-nao-teoria-paixao-531493.shtml e ler a interessante entrevista “Literatura não é teoria, é Paixão”, com Todorov. Acesse o site Dobras da Leitura: www.dobrasdaleitura.com. Adentra-se num espaço em que a literatura infantil e juvenil é o foco da atenção. Lá você en-contra links para os sites de escritores e ilustradores brasileiros, como Mon-teiro Lobato, Ana Maria Machado, Ruth Rocha, entre outros. No link “Sala de aula: leitura em construção”, você tem acesso a várias experiências de ensino registradas em formato de plano de aula, bem como a relatos de experiên-cias de atividades exitosas com o texto literário em sala de aula. Visite!

Vale a pena consultar a página do Núcleo de Pesquisas em Informática, Li-teratura e Linguística - NUPILL). Lá você encontra uma biblioteca digital de literatura, há obras integrais do Brasil e Portugal. O banco de dados é com-posto de 63645 obras, de 16321 autores e pode ser acessado em: http://www.nupill.org/.

Núcleo vinculado ao Pro-grama de Pós-Graduação em Literatura e ao De-partamento de Línguas e Literaturas Vernáculas, do Centro de Comunicação e Expressão, da Univer-sidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

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Metodologia de Ensino

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Considerações finais da Unidade C

Acesse a Revista virtual de Poesia Tigre Albino em: www.tigrealbino.com.br. Nela se discute a poesia para crianças e jovens. Está estruturada em cinco seções, e uma delas, “Tigre em movimento”, apresenta relatos práticos de trabalho com a poesia infantil em qualquer nível de ensino. Ali você encontrará várias possibilidades de trabalhar com poesia.

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Unidade DO processo da escrita na escola

Aprendizagem e desenvolvimento da escrita

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Nesta unidade, objetivamos discutir o desenvolvimento do pro-cesso da escrita na escola, observando-o pelos princípios do pensa-mento filosófico-linguístico da linguagem como interação social (te-orias de Mikhail Bakhtin e seu Círculo) e da visão sociointeracional do ensino e da aprendizagem (teorias de Vigotski e discípulos). Não é, pois, nosso objetivo discutir a trajetória histórica das teorias sobre concepções de língua, de linguagem e de texto e implicações desses estudos nas ciências da linguagem e destas na atualidade. Essa ta-refa já se cumpre no conjunto dos materiais publicados no curso de Letras-EaD. Nessa unidade põem-se em foco os principais movimen-tos historicamente ocorridos no espaço acadêmico e escolar na im-plementação dessas teorias, ou em sua aplicação prática, amparados por diferentes visões ou concepções desse objeto de conhecimento. Com essa abordagem esperamos fornecer algumas orientações que possam subsidiar a formação do professor em Letras-Português, na perspectiva teórico-metodológica aqui assumida.

Podemos, então, pontuar algumas especificidades previstas para essa nossa meta, quais sejam:

contextualizar as implicações do princípio dialógico da lin- Ӳguagem e das questões de ensino e aprendizagem pela perspectiva sociointeracionista nas práticas de linguagem da sala de aula;

compreender a relação entre a interação verbal e social na Ӳescola e o ensino e aprendizagem da escrita (produção oral e escrita);

discutir aspectos da relação entre concepção de língua, de Ӳlinguagem e atividade pedagógica.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

121

10 O processo da escrita na escola

No escrever o menino viu

que era capaz de ser

noviça, monge ou mendigo

ao mesmo tempo.

O menino aprendeu a usar as palavras.

Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.

E começou a fazer peraltagens.

(Manuel de Barros, 2002)

Nesta unidade, o convite é para dialogarmos sobre a escrita; sobre o

que envolve esse processo de conhecimento e seu ensino na escola.

Escrever! Ler! “Autorar”! Antes de tudo, você vai conhecer os nossos ob-

jetivos para que, neste trabalho de leitura, estudo, pesquisa e ativida-

des, possa atingi-los a contento. Queremos que você, caro estudante,

obtenha conhecimentos teórico-metodológicos sobre aspectos que

envolvem o processo de ensino e aprendizagem da língua materna no

ensino fundamental e médio e assim, como profissional, sinta-se capa-

citado e possa atuar de modo competente e efetivo na escola.

E, nesse contexto, algumas perguntas iniciais se insinuam:

Afinal, no espaço escolar, sendo estudantes, como alcançamos 1) o domínio desse conhecimento? E, na função de professores, como nos tornamos competentes na mediação pedagógica do que se ensina e do que é aprendido?

Como compor um processo educativo, uma 2) metodologia de ensino direcionada ao ato da escrita, que possibilite a cada um de seus participantes a aquisição (se for esse o caso), o desen-volvimento dos usos da escrita tanto no que diz respeito à ha-bilidade individual como no coletivo?

“Método” é entendido aqui como um sistema de passos a executar fielmente para a realização de uma atividade. O método se apresenta como um discurso externo, legitimado; “metodologia” como “[...] orientação pedagógica geral para o processamento de uma prática congruente, não dissociada daqueles princípios que regem a concepção [...] assumida, com todas as suas implicações. [...] Trata-se, pois, de uma estratégia global prevista para orientar o trabalho, ou seja, dar-lhe sentido, coerência. [...] a metodologia diz respeito à orientação específica a assumir dentro de um campo de trabalho. Ela é [...] subordinada à orientação geral e tem o selo da plasticidade, uma vez que somente a dinâmica das relações no âmbito escolar é que indicará os passos subseqüentes.” (SANTA CATARINA, 1998, p. 68-69, grifos do autor).

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Metodologia de Ensino

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Bem, é disso que trata o convite para a leitura destas nossas próxi-mas páginas: a palavra flertada nos seus propósitos ou despropósitos; importância ou desperdício; no que é dito ou no que é silenciado.

Uso a palavra para compor meus silêncios.

Não gosto das palavras

fatigadas de informar.

(Manuel de Barros, 2003)

Nada melhor, então, do que iniciar escrevendo pelo que está na me-mória de escritos escolares e do que de lá foge; sobre o que percorremos até chegarmos a um curso de Graduação em Letras, cuja proposta é li-cenciar, conferir grau a seus partícipes, legitimar o ofício do ensino da Língua Portuguesa àqueles a quem a palavra não passa impune; àqueles que, assim como o menino que carregava água com a peneira, descobrem que escrever é “como carregar água na peneira”, é ser “capaz de ser noviça, monge ou mendigo ao mesmo tempo”, é aprender a “usar as palavras”, a “fazer peraltagens”, “encher os vazios com as peraltagens”. Assim, a cada palavra dita, nesse instante, estando onde estivermos, – no lugar ou no tempo –, estejamos envolvidos com o apanhar a palavra no seu efeito mais profundo ou na fantasia para não nos fatigarmos da informação, com ela possamos “cirandar” pela nossa unidade de trabalho pedagógico.

10.1 O texto e o envolvimento do aluno-escritor

Frida, nome que dá título a um livro de literatura estrangeira, de Yo-landa Reyes, com tradução de Ruth Rocha e ilustrações de Olga Cuéllar, traz uma história que começa assim:

De volta à escola. Outra vez, o primeiro dia de aula. Faltam três meses,

vinte dias e cinco horas para as próximas férias. O professor não preparou

a aula. Parece que o novo curso o apanhou de surpresa. Para sair desse

impasse, ele ordena, com a voz de sempre: - Peguem os seus cadernos

e escrevam com esferográfica azul e com letra legível uma composição

sobre as férias. No mínimo uma página, de margem a margem, sem pu-

lar nenhuma linha. Cuidado com a ortografia e com a pontuação. Vocês

Figura 43 – Palavras fatigadas de informar

Yolanda Reyes, professora e escritora de Bogotá,

Colômbia. Olga Cuéllar ilustra livros para crianças e também é colombiana.

Ruth Rocha, escritora brasileira de livros para

crianças (Cf. o livro de Literatura e Ensino; Cap. 6).

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

123

têm quarenta e cinco minutos. Alguma pergunta? Não há perguntas. E

nem respostas. O que há é a mão, que não obedece às ordens, porque

está chegando das férias. É um caderno pautado de cem páginas que

estréia hoje com o velho tema de todos os anos: O que fiz nas minhas

férias? (REYES, 1999, p. 5).

Após esse início, todas as demais páginas do livro Frida contam, pela voz do Santiago, a primeira paixão desse menino: uma sueca que veio de férias para a Colômbia visitar os avós e que viveu, com Santiago, esse sentimento. Entre as muitas passagens da narrativa do encantamen-to mútuo, da fase do conhecimento à despedida, há uma que demonstra a intensidade do encontro de ambos e que destacamos:

Agora ela está muito longe. Na maior lonjura do mundo: na Suécia! Eu

nem posso ficar imaginando o que acontece lá, porque não conheço

seu quarto, nem sua casa, nem seus horários. Decerto está dormindo

enquanto eu escrevo esta composição. Para mim, a vida se divide em

duas partes: antes e depois de Frida. Não sei como pude viver estes onze

anos da minha vida sem ela. Não sei como fazer para viver de agora em

diante. (REYES, 1999, p.23-25).

Ao final da narração, Santiago continua desolado: “À noite dormi chorando e acho que chorei dormindo, pois meu travesseiro amanheceu molhado. Essa coisa de se apaixonar é muito difícil [...]” (REYES, 1999, p. 27). Virando a página, a última do livro, lemos:

Levanto a cabeça e descubro os olhos do professor cravados nos meus.

– Vamos, Santiago. Leia em voz alta o que escreveu, tão concentrado.

Eu então começo a ler com a voz de sempre a mesma composição de

todos os anos: “Nas minhas férias não fiz nada de especial. Não fui a lugar

nenhum, fiquei em casa, arrumei meu quarto, joguei futebol, li muitos

livros, andei de bicicleta, etc., etc., etc. ...”. O professor me olha com um

olhar longínquo, descrente e distraído. Será que ele também se apaixo-

nou nessas últimas férias? (REYES, 1999, p. 29).

Como vemos por essa história, as vivências de escolaridade se as-

semelham e, em nosso país, fomos ou somos muitos os “Santiago” com

uma vida cotidiana e uma escolar descoladas – como dois mundos um

à parte do outro – pelas propostas construídas para ler e escrever na sala

Figura 44 – Frida

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Metodologia de Ensino

124

de aula, no tempo e espaço de uma disciplina curricular. Isso supõe que

haja uma lacuna na cultura escolar entre o ensino da leitura e da escrita

na instituição e as práticas sociais de letramento. Supõe também um

possível distanciamento no processo de mediação, no que se refere à

escrita, entre professores e estudantes. Avaliando essas situações, nelas

estão envolvidas questões de ordem teórica e metodológica as quais

têm provocado rumos diferentes do que seria normal se esperar à prá-

tica do ensino da Língua Portuguesa.

Como alunos, muitos de nós vivenciamos a experiência, à seme-lhança de Santiago, de estar diante de uma folha em branco e com pro-fessor com olhos cravados em nós solicitando-nos que escrevêssemos “um texto com base em um título qualquer: uma data festiva; visita à casa de avós etc.”. Habituamo-nos com relações de assimetria: pelo dis-curso pedagógico que ensina basicamente pelo livro didático (conteú-dos); pelas lembranças do que aprendemos com nossos professores e, como alunos, assumindo um papel de “aquele que desconhece neces-sariamente o que lhe é ensinado”. E, alunos e professores, vimos repetin-do ações de submissão à palavra do outro. “Professor, como começo a minha redação/composição/texto?” Lembram desse enunciado? Alguns professores respondiam (ou respondem?) a seus alunos: “Você não sabe? Pense, esforce-se! A ideia está na sua cabeça, é só passar para o papel!” Outros nos “davam” um começo. Vocês recordam de algo semelhante ao que estamos dizendo? É, mas essa é uma longa história, que trata de uma prática pedagógica que ocupou (ainda ocupa?) uma boa fatia dos modelos de ensino. E quanto à correção do que produzíamos? Ou rece-bíamos uma avaliação (nota/conceito) ou observações generalistas (sua redação não está boa, reescreva-a; tente melhorar o final; sua redação não tem começo, meio e fim; falta coesão; melhore a ortografia, reveja a pontuação e a concordância verbal, etc.). Poderíamos nos alongar nessas descrições que habitam as memórias de ensino, mas as trouxemos para começar a falar sobre a aprendizagem de ministrar aulas, cujo objetivo é ensinar a linguagem verbal escrita; não aos moldes das memórias acima resgatadas. Vamos atuar nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, mas acima desse nosso compromisso está o necessário

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

125

entendimento do objeto de ensino da Língua Portuguesa e Literatura. Com essa consideração temos, então, de tocar em questões que dizem respeito ao acesso à cultura da escrita pelo ensino sistematizado e inten-cional desse conhecimento, sem esquecer que isso implica olhar para o ser que escreve, o Ser humano.

Atividade:

Como sugestão, convidamos para que você visite o site: http://www.

youtube.com/watch?v=gWl1gs0dJ. Depois de assistir ao vídeo re-

comendado, escreva, em um documento digital, um pequeno me-

morial de seus primeiros anos escolares. Deposite no fórum de seu

ambiente on-line.

10.2 Aprendizagem e desenvolvimento da linguagem escrita e autoria

Apresentamos abaixo quatro “textos”, dois exemplares retirados de cartilhas brasileiras e dois de alunos da primeira série do Ensino Funda-mental produzidos em meados do segundo semestre letivo.

Textos de cartilhas e de alunos de classes de alfabetização

A) Textos de cartilhas B) Textos de alunos

(1A) Sara come salada.A sola do sapato está furada.Silas socorre Sônia.

[(1) ALMEIDA, Paulo Nunes de. Pi-poca: método lúdico de alfabeti-zação. 6 ed. São Paulo: Saraiva.]

(1B) A camaFernando tem uma cama.Mamãe tem uma cama.Pedro tem uma cama.Rita tem uma cama.brinquedosRita olha a cama.[(8) Lucas* - 1ªsérie(*nome fictício)]

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Metodologia de Ensino

126

(2A)Roque é quieto?Roque comeu o queijo de Quiri-no.Roque jogou o caqui no aquário.Roque queimou o leque.O leque era de Quitéria .- Moleque , eu quero meu leque.

[(2A) ALMEIDA, Doracy de Paula Falheiros de. No reino da alegria. São Paulo: IBEP, sd. ]

(2B) A TeveAna não tinha Teve a Ana temuma saia cor de rosa, um lacinhoverde, e camisa cor de rosa Ana eralouca por uma Teve.Ana disse para o maridovamos compraruma Teve sabado.as semanas foram pasando e finalmente chegou o sabado eveio a Teve.ela ficou tão feliz que se esqueceu de preparar o almoço do/ maridoaí quando o marido chegouele falou: Ana a minha comidaai a Ana disseo marido desculpe é que eu gosteitanto da teve que esqueci da tua comida eu estou muito feliz Fim 1ªsérie

[(2B) Pedro* - 1ª série.(*nome fictício)]

Se partirmos para uma análise comparativa dessas escritas, podemos dizer que na relação entre “textos” de cartilhas e “textos” de alunos há algo que aproxima os textos de cartilhas (1A, 2A) do texto do aluno (1B) e algo que difere dessas três produções em 2B (texto de aluno). Os dois textos da primei-ra coluna (cartilha) trazem uma frase a cada linha, repetição de palavras e concentração de certas síla-bas de “famílias silábicas”. O texto do aluno “1B”, na segunda coluna, traz as marcas de um ensino pela cartilha, aquele que objetivava a ensinar a escrita mediante o uso de texto, isto é, do que se compre-endia ser texto à época e o ensino adequado à al-fabetização escolar: um ensino por modelos, pela repetição de frases criadas com esse fim. Traz uma configuração típica de textos de cartilhas.

Figura 45 – Cartilha. Fotografia: Horton Group, USA - http://www.sxc.hu/photo/510148

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

127

Atividade:

Visite os sites que trazem cartilhas on-line, faça download de no

mínimo três delas e teça um comentário indicando as fontes de con-

sulta. Poste no fórum específico de seu curso. A título de sugestão,

indicamos o site: http://espacoeducar-liza.blogspot.com/2009/02/

download-da-cartilha-caminho-suave.html.

Na produção de Lucas (1B) há marcas evidentes desse modo de en-sino com base em uma linguagem criada exclusivamente para esse fim e que é representativa do que ora expomos: frases simples; justapostas; uma escrita sem elementos coesivos, sem preocupação com a coerência; palavras repetidas; coesão sustentada pela manutenção da palavra que é tema da escrita. Enfim, um modelo de ensino que, apoiado em uma determinada compreensão desse fenômeno que é a linguagem, gradua o conhecimento do fácil ao difícil, do simples ao complexo. Há, portanto, no que o aluno produz as marcas dos processos de ensino.

No caso que ora discutimos – o texto de Lucas –, as evidências põem à

mostra um processo de ensino assumido por um número importante

de professores, que considera pouco (ou desconsidera) a compreensão

que as crianças têm sobre a linguagem verbal quando chegam à es-

cola; e, em nome de uma concepção de linguagem, de organização e

sistematização de conteúdos de linguagem a ensinar, gradua conteú-

dos: do concreto ao abstrato, do simples ao complexo, do particular ao

geral, entre outros procedimentos, como já observamos. Escolariza-se

o conhecimento. E aqui uma ressalva quanto à crítica feita há pouco,

pois não se intenta um ensino sem organização e planejamento, pelo

contrário, sem tais condições, entende-se, não há como interagir para o

desenvolvimento do conhecimento da língua materna de estudantes.

A questão para a qual convocamos a reflexão interroga sobre a concep-

ção de linguagem que traça nossos atos educativos. Voltando nossa

observação para os textos de cartilhas (1A e 1B) e a do aluno Lucas,

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Metodologia de Ensino

128

avalia-se que esse estudante opera com sua escrita ao modo como au-

tores de cartilhas operam com seus textos-exemplares. Há, podemos

dizer, certa homogeneização na escrita de textos de cartilhas que se faz

representar na escrita de alunos (alunos de escolas nas quais se ensina

desse modo; caso do aluno Lucas).

Diferentemente de Lucas, Pedro tenta pôr-se como autor de sua escrita ao escrever sobre uma personagem sua (conhecida ou criada) e com frases e encadeamentos únicos (não reconhecidos). Há muito, certamente, para Pedro aprender sobre a escrita ainda e, mesmo agora, nessa etapa, se lermos com os olhos do rigor da norma escrita, podere-mos não atribuir um valor que o texto do aluno manifesta. Mas, rees-crevendo-o e aproximando-o um pouco mais da norma gramatical da escrita, no texto de Pedro ficam ainda mais evidentes as marcas de um aluno que, mesmo estando ainda em processo inicial de aprendizagem da escrita no seu desenvolvimento dessa aprendizagem, já é autor de seus enunciados. O processo de ensino de Pedro foi certamente outro, e o que produziu tem as marcas dessa diferença.

Vejamos a escrita retomada por nós levando em conta alguns as-pectos da norma da língua:

A Tevê

Ana não tinha tevê. A Ana tem

uma saia cor de rosa, um lacinho

verde e camisa cor de rosa. Ana era

louca por uma tevê. Ana disse para o marido:

- Vamos comprar uma tevê sábado?

A semana foi passando e

finalmente chegou o sábado e veio a tevê.

Ela ficou tão feliz que se esqueceu

de preparar o almoço do marido.

Figura 46 – Escrita

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

129

Aí, quando o marido chegou,

ele falou: Ana, a minha comida?

Aí a Ana disse:

Ô, marido, desculpe! É que eu gostei

tanto da tevê que esqueci da tua

comida! Eu estou muito feliz!

Fim 1ªsérie

Atividade:

Colete textos de alunos e passe-os em modo de apresentação digital

ilustrando essa apresentação. Comente sobre o possível processo de

ensino que motivou a escrita dos textos. Poste no ambiente AVEA.

Diante do que expusemos, podemos perceber que os procedimen-tos para o ensino sistematizado da leitura e da escrita estão ancorados nas concepções de linguagem (língua/linguagem) e de ensino e apren-dizagem que seus proponentes possuem (de modo consciente ou não) e se expressam nas escolhas tanto da ordem das relações sociais como discursivas (processos de interação social e verbal). Tais escolhas pro-vocam uma ou outra modalidade de interação social e verbal. Dessa forma, é imperiosa a observação da constituição das inter-relações, ou seja, a observação dos processos sociais, históricos e ideológicos envol-vidos na singularidade das relações sociais e discursivas nas salas de aula: um ambiente com a finalidade do ensino intencional do português nas suas diferentes modalidades, cuja finalidade põe em perspectiva a responsabilidade social para com a formação do cidadão com vistas a uma sociedade mais justa e solidária. A escola, como instituição social, é parte de uma complexa formação social e preconiza por meio de seus projetos de ensino particulares um determinado modo de educação não desarticulado daqueles que circulam em outras esferas sociais. Como profissionais responsáveis pela ação pedagógica, professores lidam com a memória do que é o ensino, do que é a aprendizagem, constituídos,

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Metodologia de Ensino

130

ambos os processos, ao longo de um tempo e espaço históricos. Nesse tempo e espaço, lida-se, portanto, com a memória dos sentidos que fo-ram sendo construídos sobre o que se compreende como uma aula de língua materna (no caso, o português).

Pelas aulas os estudantes passam a se vincular a essas comunida-des sociodiscursivas e passam também a construir sentidos do processo educativo (do que é ser professor, do que é ser aluno, do que é a leitura (ser leitor), escrita (ser escritor), entre outros). Não passamos, portanto, impunes pelas salas de aula, pelas instituições que se ocupam com a educação formal ou que com elas estabelecem elos sociais. Os textos de cartilhas e de alunos apresentados neste capítulo expõem – ainda que de modo singelo e pontual –, a relação de consequência entre posturas filosóficas, teóricas e metodológicas e a prática pedagógica na sala de aula. Ainda: que mudanças dessas posturas levam a processos e a pro-dutos distintos e nos indicam a necessidade de articulação das pesquisas (conhecimento produzido) com o ensino (conhecimento produzido e socializado) e a aprendizagem e desenvolvimento do conhecimento.

Pensar em metodologias de ensino da escrita ou de quaisquer das modalidades da língua implica considerar que quaisquer desses proces-sos de conhecimento não iniciam necessariamente no espaço da insti-tuição escolar. É, contudo, desse espaço que, como futuros professores, temos a responsabilidade de responder socialmente pelos estudantes que formamos nessa disciplina denominada Língua Portuguesa. E, como diz Bakhtin (2010 [1920-1924]), referindo-se à dimensão ética do agir humano, não temos álibi para escapar dessa responsabilidade. Ainda, nessa direção, a metodologia assumida para essa pedagogia re-quer a definição de uma unidade de fundamento para o ato educativo. Assumir uma determinada concepção de linguagem é configurar uma unidade de fundamento à prática pedagógica e o que dela decorre como possíveis e prováveis relações sociais desencadeadas.

Neste livro de Metodologia, assumimos uma concepção interacionista

de linguagem e, então, se focarmos nosso olhar sobre o ensino da escri-

ta, cabe-nos a pergunta: o que fazer, como fazer, para que fazer quando

Na Unidade A, caros alunos, vocês tiveram a

oportunidade de estudar especificamente sobre

o tema “formação de professores”.

Na composição deste livro, cujas modalidades

da língua apresentam-se, para efeito didático,

em unidades – formação de professores, leitura,

literatura, escrita, reflexões sobre a língua

–, igualmente não as concebemos de forma

estanque, menos ainda trabalhamos alicerçando-

nos na fragmentação da língua ou das próprias

atividades.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

131

ensinamos a escrita ancorados nessa compreensão filosófica, teórico-

linguística da língua? Certamente o comentário mais imediato aponta

que o ensino não pode ser desenvolvido pela fragmentação da lingua-

gem verbal. Ensinar com base em uma didática que fragmente a aula

com o objetivo de obter o domínio da escrita por meio de exercícios-

treino, propondo aulas de leitura, de interpretação de textos, de exercí-

cios gramaticais, de paráfrases textuais, etc., como atividades estanques

que pouco ou jamais se inter-relacionam vai na contramão do que se

compreende sobre a natureza da linguagem verbal.

De outro modo, pelo entendimento de língua como interação, a linguagem é constituída nas atividades humanas ao mesmo tempo em que é constituidora dessas atividades. Nela, os enunciados produzidos pela sua natureza dialógica são tomados no “grande diálogo da comuni-cação discursiva.” (BAKHTIN, 2003, p. 323).

Então, pedagogicamente temos a responsabilidade da compre-ensão da linguagem em toda sua complexidade, e a aprendizagem da escrita é uma delas porque é elo nesse processo. A compreensão da lín-gua, consequentemente, passa pelo entendimento de que se tratarmos de recortes desse fenômeno estes necessitam ser analisados conside-rando-os no contexto da cadeia ininterrupta da linguagem. Se essa é a realidade concreta do fenômeno língua/linguagem, essa é a realidade concreta para seu ensino.

A essa altura vocês poderiam estar se perguntando: mas por que inte-

ressaria a nós que iremos atuar nas séries finais do Ensino Fundamental

e no Ensino Médio discutir questões de alfabetização e não ir direto às

questões do ensino da escrita no nível em que vamos atuar? É por esse

motivo. Necessitamos entender a aquisição desse conhecimento que

é a linguagem verbal no seu percurso histórico de constituição e de

prática pedagógica, bem como sua natureza dialógica, como vimos.

Na concepção dialógica da linguagem, enunciados são unidades reais na cadeia verbal (Bakhtin [Volochínov], 1990, p. 126). Acompanhando as palavras de Bakhtin ([Volochínov], 1990, p.123), “Qualquer enunciação [enunciado], por mais significativa e completa que seja, constitui apenas uma fração de uma corrente de comunicação verbal ininterrupta (corrente à vida cotidiana, à literatura, ao conhecimento, à política, etc.). Mas essa comunicação verbal ininterrupta constitui, por sua vez, apenas um momento da evolução contínua, em todas as direções, de um grupo social determinado”. Para aprofundar esse tema, indicamos a leitura das seguintes obras: BAKHTIN, Mikhail [Volochínov]. Marxismo e filosofia da linguagem. 5. ed. São Paulo: Hucitec, 1990 (especialmente o capítulo 6 – páginas 110 a 127); SOUZA, Geraldo Tadeu. Introdução à teoria do enunciado concreto do círculo de Bakhtin/Volochínov/Medvedev. 2 ed. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 2002 (especialmente a III parte – páginas 85 a 135).

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Metodologia de Ensino

132

10.3 Modelos de ensino na pedagogia da língua escrita: pontos de referência em discussão

Historicamente, com base nas orientações sobre o ensino da escrita nas séries iniciais, por não considerarem que a aprendizagem iniciava antes mesmo de a criança entrar na escola (pensava-se que a criança chegava a zero na escola, era uma “tábula rasa”, isto é, sem nenhum sa-ber), o conhecimento era apresentado de modo gradual e progressivo e, muitas vezes, artificial, não só do ponto de vista linguístico, mas tam-bém por estar desconectado da realidade vivencial da criança. Como decorrência, as experiências escolares com a escrita concentravam-se em atividades mecânicas de reprodução, correspondência entre som e grafia, enfim, basicamente constituíam-se de treino da escrita (mediante cópia mecânica, ditados, exercícios repetitivos que obedeciam rigorosa-mente a uma graduação de dificuldades).

Há um número variado e importante de publicações estrangeiras e

nacionais – e em linhas teórico-filosóficas distintas – que, nos últi-

mos tempos, têm trazido contribuições importantes para as refle-

xões sobre o processo de aprendizagem da escrita antes de as crian-

ças iniciarem a sua escolaridade. Ver, por exemplo: FERREIRO, E.;

TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Ar-

tes Médicas, 1986; VYGOTSKY, Lev S. A formação social da men-te. São Paulo: Martins Fontes, 1984; VYGOTSKY, Lev S. Pensamen-to e linguagem, São Paulo: Martins Fontes, 1988 (VIGOTSKI, L. V.

A construção do pensamento e da linguagem. Tradução de

Paulo Bezerra, São Paulo: Martins Fontes, 2001); SMOLKA, Ana Luiza

B.; GÓES Maria Cecília R. de (Org.) A linguagem e o outro no es-paço escolar. Campinas, SP: Papirus, 1994; SMOLKA, Ana Luiza B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo

discursivo. São Paulo: Cortez. 1988; KATO, Mary. No mundo da es-crita: uma perspectiva psicolinguística. São Paulo: Ática, 1986.

Se fôssemos percorrer o diálogo histórico da teoria

dos modelos e métodos direcionados à pedagogia

da Língua Portuguesa, certamente teríamos

muito a dizer e ainda a investigar. Porém, nos

limites deste Livro e deste capítulo, nosso objetivo

é expor certos princípios de ações de educação, ensino e formação que

tratam do ensino da escrita, com a intenção de

situar tais princípios no contexto da pedagogia

da língua escrita por aceitar também que é

ainda uma necessidade a produção de pesquisas

sobre o percurso histórico do ensino da Língua

Portuguesa no nosso país.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

133

Vejamos em: “Sara come salada./A sola do sapato está furada./Silas socorre Sônia.” (observemos a artificialidade do texto por centra-lizar-se na letra “S”, no momento, o objetivo metodológico e objeto da aprendizagem). O pressuposto é de que os estudantes, por não terem o conhecimento de todas as letras e sons numa determinada etapa, não apresentariam condições de produzirem textos espontâneos, apesar de eles, na oralidade, narrarem histórias, acontecimentos cotidianos que lhes estivessem mais próximos e certamente com uma configuração dis-cursiva muito distinta dessa apresentada pela linguagem do método. As crianças na sua relação com as práticas sociais de escrita, fora de espaços específicos para essa aprendizagem, produzem textos com sentidos, ain-da que não tenham aprendido a convenção alfabética da escrita. Dificil-mente uma criança falaria ou escreveria uma sequência discursiva como a apresentada nesse suposto “texto” de cartilha.

Bortolotto (2001[1998], p. 23), discutindo o processo de ensino para produzir texto escrito no âmbito da sala de aula de alfabetização, alertava sobre o uso, pelo professor, de métodos com passos previstos e predeterminados para esse ensino:

A literatura mostra que muitos professores apoiam o trabalho de alfabe-

tização em métodos específicos, seguindo uma forma de ação que tem

certo caráter de legalidade e segurança por ser o método reconhecido

como um caminho que apresenta alguma garantia de resultado. [...]

Trata-se, na terminologia de Charaudeau (1983), do discurso do método,

que pressupõe um “contrato de fala” propondo um ideal de “como fa-

zer” para demonstrar a “verdade”. O sujeito que o enuncia se constitui,

assim, em “Conselheiro” de um programa que deve ser seguido, e esta

autoridade lhe é assegurada pelo reconhecimento e pela experiência

anterior bem-sucedida – e mais, o programa de “Fazer” é apresentado

de tal modo que pode ser desligado do “Conselheiro” quanto às suas

condições de realização.

[...]

quando o professor seleciona um método, está selecionando juntamente

com ele um discurso delimitador que enquadra o desenvolvimento das

atitudes e atividades escolares. Ali tudo parece estar definido. O professor

fala pela voz memorial de um discurso (legitimado) que não é seu, mas

que passa a assumir como seu. É a voz técnica, a fala prevista para ser dita

por e para qualquer locutor nos limites de uma situação pedagógica.

Figura 47 – Livro: A interlocução na sala de aula

Tais “textos” retratam a concepção de leitura e escrita centrada basicamente no reconhecimento ou percepção de letras, palavras ou frases muitas vezes vazias de sentido para os aprendizes.

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Metodologia de Ensino

134

[...]

O efeito da fala do método no contexto real é uma enunciação circuns-

crita ao preestabelecido. Esta forma de organizar o processo de ensino-

aprendizagem da leitura e da escrita desencadeia uma situação que

dificulta o fluir da interlocução, que fere o princípio discursivo da lin-

guagem como efeito de sentido produzido na relação de interlocução,

privilegiando, em nome de uma fala técnica supostamente eficiente, a

transmissão unilateral de conhecimentos a alunos que supostamente

ignoram. (BORTOLOTTO, 2001 [1998], p. 23-25).

Como consequência disso tudo e por desconsiderarem que a crian-ça quando chega à instituição escolar já manifesta suas leituras e escri-tas (ainda que não pelas convenções da escrita, como já observamos) e, portanto, já produz textos, os professores viam (ou veem?) o texto

apenas como o coroamento do processo de aprendizagem e de produção.

Caso nos ocupemos somente com a adequação do texto às estratégias de alfabetização em sua perspectiva restrita de domínio graduado do sistema gráfico, estaríamos tornando o texto escrito um conteúdo e um pretexto, desconsideran-do, portanto, que há uma relação de interação social e verbal que motiva e origina quaisquer ações com esse objeto que se chama escrita, que se chama linguagem verbal.

Passando agora aos níveis seguintes do ensino escolar, podemos observar que a metodologia adotada é semelhante à da primeira série. Há o uso de manuais didáticos que tam-bém se cercam de objetivos semelhantes aos das produções de cartilhas e guias didáticos para alfabetizadores, determi-nando-lhes atitudes e caracterizando um trabalho mais de reprodução do que de conhecimento em produção.

Vejamos, por exemplo, uma proposta de estudo de texto retirada de um livro da década de 1980 que exemplifica o modo como tais estudos eram encaminhados à época, refor-çando a tendência, no trato da leitura e escrita, a enfatizar aspectos mais periféricos e descritivos do texto em proposta de estudo.Figura 48 – Atividade em livro didático.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

135

Atividade:

Tente ocupar o lugar de aluno e responda às questões propostas

nesse excerto do livro didático. Após essa experiência, posicione-se

escrevendo um breve comentário a um colega de turma, apoiando-

se, para a construção de seus argumentos, nos estudos sobre leitura

feitos até o momento e indicando sua contribuição mediante pro-

posta de trabalho.

Esta é apenas uma representação do modo como a didática da Língua Portuguesa iniciava seus “estudos de textos”. De modo geral, tais publi-cações mantinham um modus operandi para os procedimentos didáticos de apresentação desses estudos. Os passos poderiam ser previstos, pois a cada página a sistemática de apresentação era a mesma ou, quando muito, semelhante. A conduta que se esperava do professor era que seguisse tais passos, agindo desse modo, poderia ele “garantir” êxito a seu processo pe-dagógico (o do livro didático, mas assumido como seu). Conduta, como vimos e agora repisamos, que se assemelha à dos manuais de alfabetização e das propostas para ações dos alfabetizadores. Se observarmos a proposta de estudo do texto (entendimento e análise) que está dirigida para alunos que estão por cinco anos na escola, verificaremos que as respostas espera-das não exigem dos estudantes mais que a decodificação do código escrito (leitura-decodificação), mais que a localização de informações com base no fragmento de um texto literário selecionado para estudo (diga-se, sem mencionar tal situação de produção escrita).

Ademais, o texto é tratado como um conjunto preciso de informa-ções, levando o aluno a possíveis equívocos, como o de ser a leitura um ato de reprodução do sentido do texto (leitura parafrástica), de a garan-tia da leitura passar necessariamente por exercícios de entendimento e análise (respostas excludentes; objetivas – sem espaço para outras posi-ções interpretativas). Esse modo de ensino pode imprimir uma rotina pouco saudável àqueles jovens estudantes partícipes da rica produção humana nos usos e práticas de linguagem na realidade concreta da co-municação discursiva.

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Metodologia de Ensino

136

As propostas de escrita de textos expostas pelos livros didáticos – até sem eles – sustentavam-se nessa “preparação” pela leitura de um dado “texto” (normalmente fragmento de algum gênero de discurso) como momentos de “estudo do texto” para que o aluno exteriorizas-se em momentos subsequentes sua produção escrita, baseando-se no estudo proposto no livro didático; ou ainda que escrevesse um texto com base em “tema livre”, como experimentou Santiago na sua aula de Português.

Essa não é, contudo, uma crítica negativa a estudos de textos que tenham como ponto de partida para escritas “estudos dos textos”, afinal é essa uma das nossas tarefas na profissão, mas tal opção de trabalho alerta para que se pense o que estamos entendendo como leitura, como escrita, como leitura para estudo de um “texto”, leitura para “escrita de textos”. Necessitamos pensar com profundidade sobre os manejos peda-gógicos, buscando a compreensão, mas reagindo reflexivamente e com atitudes, nutridos pela concepção de língua que se assume com essa ou com aquela ação. Mesmo porque também podemos nos deparar com alunos com seus processos de aprendizagem e de desenvolvimento do conhecimento da escrita distante do que é esperado. Então, se temos de compreender a natureza da linguagem e dessa concepção traçar nosso ato pedagógico, se temos de olhar a comunicação discursiva no seu fluxo ininterrupto, também temos de olhar para os interlocutores desse pro-cesso, para o professor (e sobre ele já falamos um pouco, mas destinare-mos um espaço especial neste livro), sobre sua condição de aprendiz do ensinar; sobre suas condições sociais, históricas, ideológicas de trabalho (formação; condições de trabalho), sobre seus alunos, na relação que se estabelece entre professores, alunos e objeto de conhecimento.

Assim, caros alunos, é tempo de falarmos um pouco do ponto de vis-

ta desses estudantes interlocutores da aula, na aula de Língua Por-

tuguesa. Muitas vezes há um distanciamento entre o que se propõe

como ensino e a necessidade concreta do aluno, ou seja, de suas con-

dições de aprender naquele tempo e espaço de sua história pessoal de

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

137

aprendizagem. Vejamos essa situação pelo relato de um evento peda-

gógico de ensino de escrita.

Alunos do sexto ano do Ensino Fundamental (nível que estará sob nossa responsabilidade), após participarem de um projeto de ensino de português em cuja proposta de aprendizagem da escrita estava previs-to um trabalho com o gênero de discurso “comentário” e convites para eventos, escrevem:

Projeto Transpondo da Língua Portuguesa!Eu convido Para um teatro da LínguaPortuguesa Um teatro de um ligarDe omoristas e de culinaria

No projeto “transpondo muro pela Língua Portuguesa é um geito de executar a nossa arte no muro, minha turma 604 ano faz arte na frente da escola no dia 26/06/10. Uma mulher grafiteira vai ajuda nois fazer arte na frente da escola.

Destacamos que esses dados são resultado de um projeto de estágio

supervisionado produzido por alunos do curso de Letras na modalida-

de presencial (primeiro semestre de 2010), com o título “Transpondo

muros pela Língua Portuguesa: a arte no grafite”, desenvolvido pelas

acadêmicas Maria Eduarda Piazza Fazzini e Tânia Maria Britz Soares. O

projeto trazia, pela arte do grafite de muros e a pichação, a discussão

(entre outros pontos) da responsabilidade dos atos pessoais e coletivos

diante daquilo que tornamos público. No trabalho de ensino da escrita

em suas diferentes modalidades (oralidade, escuta, leitura, escrita, refle-

xões sobre a língua) que permeava toda essa discussão, estava prevista

a aprendizagem e o desenvolvimento do conhecimento do gênero do

discurso comentário, a produção de folders e convites para eventos de

arte. O referido projeto desencadeou a produção de uma obra de gra-

fite em uma das paredes da escola na qual o estágio foi desenvolvido.

Essa produção foi realizada a muitas mãos: por alunos, pessoas da co-

munidade escolar (diretores, professores – da escola e da universidade

–, serventes, técnicos da administração escolar), todos acompanhados

por duas grafiteiras. A proposta da escrita que é estampada aqui trata

do convite a ser dirigido à comunidade escolar e circunvizinha à escola

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Metodologia de Ensino

138

para conhecerem a obra que resultou das atividades desencadeadas ao

longo do estágio de docência. Na proposta do convite havia a indica-

ção de os alunos apresentarem um breve comentário sobre o processo

pedagógico que culminou na produção do convite.

Figura 49 – Grafite em parede de escola

Essas duas escritas de alunos demonstram que as reflexões sobre es-crita não podem considerar esse objeto de conhecimento de modo apar-tado, separando alfabetização da disciplina Português que percorre o cur-rículo dos Ensinos Fundamental e Médio, menos ainda, exclusivamente pelo ano de escolaridade em que se encontra o aluno (séries iniciais, finais do Ensino Fundamental; Ensino Médio; Ensino Universitário). Ainda: há também a necessidade de se pensar nas especificidades das escolhas meto-dológicas em razão do grupo de sujeitos aos quais direcionamos o ensino em tempo e espaço históricos determinados. Tratamos de um fenômeno social que é a linguagem escrita e por isso é importante compreender a sua natureza como objeto e do ponto de vista daqueles que se apropriam desse conhecimento (pelo ensino formal ou não). Necessitamos, portan-to, de uma teoria, de uma metodologia da Língua Portuguesa. Daí que precisamos ter também, ainda que de modo amplo, a compreensão do

Na teoria do Círculo de Bakhtin, se falo em

sujeito, já pressuponho dois interlocutores – a

constituição do eu pelo outro.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

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Saiba mais: BAKHTIN, Mikhail [Voloshinov]. Marxismo e filosofia da linguagem. 5. ed. São Paulo: Hucitec, 1990. Especialmente na segunda parte dessa publicação concentra-se a teoria filosófica da linguagem de Bakhtin/Volochínov (“a língua se realiza através da interação verbal social dos locutores.”).

processo de apreensão da linguagem escrita no complexo da cadeia da comunicação discursiva (como já vimos), pois podemos nos deparar com alunos que, mesmo não estando em classes de alfabetização ou frequen-tando outras séries iniciais do Ensino Fundamental, estão sob a nossa res-ponsabilidade e necessitam de conhecimentos de alfabetização, situação para a qual não temos álibi para não considerá-la.

Para traçarmos nossos projetos de ensino de escrita, necessitamos saber

de onde partir e onde pretendemos chegar, portanto, saber o que nos-

sos alunos dominam ou necessitam saber. Esse é também um dos pon-

tos a serem postos em consideração quando falamos de ensino da es-

crita: não perder de vista os sujeitos do processo nas práticas de escrita.

Necessitamos de conhecimentos sobre o objeto do nosso ensino, mas

também sobre a aprendizagem dos sujeitos, sobre nossa mediação na

relação social escolar (porque também somos aprendizes do ensinar).

Isso para ficar nessas relações mais imediatas envolvidas na produção

do conhecimento da escrita em uma instituição especializada para tal

tarefa. Não iremos encontrar turmas homogêneas com pessoas com as

mesmas necessidades de conhecimento, portanto nossos desafios no

ensino da escrita são importantes e instigadores e requerem saber o

que os sujeitos sabem (tanto professores quanto alunos).

Os textos apresentados anteriormente demonstram tal desafio. Te-mos, sim, muito a ensinar e muito a aprender quando a relação social se instaura em uma sala de aula, em uma escola, em uma instituição. Embora esses dois alunos estejam no sexto ano de escolaridade, o que dominam – e aí não precisamos ser especialistas para atingir tal conclu-são – ainda não atende aos objetivos requeridos para um ensino e apren-dizagem daqueles que estão, há seis anos, envolvidos com a linguagem escrita; especialmente, no caso, em razão dos problemas com o padrão normativo da língua ou da textualidade requerida na escrita de um gêne-ro como o comentário. O objetivo precípuo do ensino da escrita é enca-minhar para uma escrita com autoria, o que demanda um longo proces-so de ensino e de aprendizagem. Se no caso das crianças em processo de alfabetização, pelo método com passos previstos e predeterminados da cartilha (casos aqui exemplificados), os textos são praticamente isentos

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Metodologia de Ensino

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de lapsos da norma da língua, distantes de uma escrita espontânea e pró-ximos da escrita dos autores das cartilhas, nesses dois casos da escrita dos dois convites (anteriormente apresentados), os alunos não escreveram pelo rigor da norma porque exercitaram a escrita visando à adequação ao gênero em ensino: convite para evento artístico.

O domínio do código, o domínio da escrita, ficou evidenciado por-

que a força do método não camuflou o processo de aprendizagem,

as marcas do desenvolvimento do conhecimento dos sujeitos em

aprendizagem. Apesar de nos causar surpresa o (pouco) domínio da

escrita desses dois alunos após seis anos de escolaridade, a forma de

encaminhamento do ensino forneceu condições para que a escrita real, concreta, com autoria fosse posta à mostra. A metodologia

para o ensino da escrita foi determinante para um ou para outro re-

sultado. O último caso narrado (das duas escritas) se assemelha à

escrita de Pedro (alfabetização/ “A tevê”).

Em ambos os processos de ensino dos quais esses alunos fizeram

parte, a concepção de linguagem que alicerçava a opção pedagógi-

ca tomava como compreensão a sua natureza social. Essa também é

uma realidade que produz outra realidade: a da inter-relação social,

verbal e ideológica dos atos da linguagem na escola. Com tais con-

siderações e voltando nosso olhar para o que escrevem os alunos

hoje, temos muito a pensar, dizer e fazer. O que pensam sobre isso?

Geraldi (1997), em uma discussão sobre a relação entre escrita na escola e escrita literária, retoma entre outras observações que o princípio fundamental que deveria orientar o trabalho com produção de textos na escola é o de que “[...] um texto é sempre uma versão, a ele devendo-se retornar continuamente até dá-lo como pronto, sabendo-se que sempre será possível uma nova versão”. Trata-se, continua o autor, “[...] de pen-sar a produção de textos não como tarefa, mas como trabalho”. Conside-rando essa premissa, indica o papel do professor, qual seja:

Como leitor privilegiado de escritores iniciantes, seu papel é fundamen-

talmente aquele do co-autor que, aproveitando-se de seu maior conví-

vio com textos escritos, é capaz de formular ao iniciante um conjunto

de questões que lhe permitirão retornar ao seu texto, reelaborá-lo, rees-

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

141

Na teoria de Bakhtin, o termo “exotopia” corresponde ao excedente de visão que cada ser humano tem em relação a seu outro, dado que sempre vemos do outro algo que ele próprio não consegue ver diretamente. Pelas palavras do autor e acrescentando sentidos: “Esse excedente da minha visão, do meu conhecimento, da minha posse – excedente sempre presente em face de qualquer outro indivíduo – é condicionado pela singularidade e pela insubstitutibilidade do meu lugar no mundo: porque nesse momento e nesse lugar, em que sou o único a estar situado em dado conjunto de circunstâncias, todos os outros estão fora de mim.” (BAKHTIN, 2003, p. 21).

crevê-lo não como uma simples higienização superficial de problemas

gramaticais, mas como aquele que, conhecendo as condições de enun-

ciação de seu aluno, pode apontar para enunciados produzidos para

neles fazer emergir tais condições: o sujeito, sua história, seus pontos

de vista, suas articulações com o convívio de outros, fazendo a ponte

de diálogo constante do texto que agora se produz com os textos já

existentes. (GERALDI, 1997, p. 225-226).

As colocações de Geraldi e o que se faz representar na escrita desses dois estudantes do sexto ano nos indicam que a escrita é movimento, é processo e sempre temos a aprender ocupando o lugar do aluno (para olhar de um lugar exotópico) ou de professor. Até porque se escrita é trabalho e trabalho entendido como construção social, este nos exige empenho, mas também sutileza no trato tanto do processo quanto do que é produto, já que lidamos com produção humana. Da mesma for-ma, o necessário cuidado com o sentido construído pelo outro (nosso aluno), pelo que ele disse ou desejou dizer, mas ainda não disse, não apenas em sua relação indivíduo-conhecimento, mas na relação indiví-duo-conhecimento social/coletivo, já que entendemos a aprendizagem da escrita como uma experiência social, isto é, mediada pelo outro (es-critor-leitor), em que ambos compartilham de um universo de sentidos e representações no interior de uma dada coletividade. Ou o cuidado de provocar aprendizagens que não firam a palavra do outro, que não alterem os sentidos trazidos ou que anulem a palavra desse outro (inter-locutor-aluno) pela imposição de sua própria (a de professor), mas antes assuma uma postura de mediação pela contrapalavra (de professor), esse é nosso papel magisterial.

É no curso dessa disciplina Metodologia do Ensino de Português e Lite-

ratura que poderemos desenvolver, aprofundar os conhecimentos, as

experiências necessárias ao nosso futuro desempenho profissional, co-

lhidas durante as mais variadas disciplinas do curso. Nessas diferentes

disciplinas vocês estudaram teorias que discutiam a Língua Portuguesa

e a Literatura. Agora, estamos diante do desafio de pensar a atuação

profissional e provocar-lhes aprendizagens e desenvolvimento de

ContrapalavraTermo usado na te-oria de Bakhtin, cujo sentido é de reação-resposta do interlocu-tor, estabelecida no ato dialógico da lingua-gem entre eu e outro

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Metodologia de Ensino

142

conhecimentos sobre a linguagem escrita. Necessitamos agir, então,

necessitamos saber como agir. Necessitamos, então, de um método?

De uma metodologia? Ou, antes de tudo, de uma concepção de lin-

guagem, de entender o que é linguagem?

A tradição do ensino escolar da escrita já nominou de muitos mo-dos o objeto de seu ensino, como retórica, poética, gramática, gramática histórica, composição, redação, produção textual e, em um tempo his-tórico mais próximo do nosso, perfilam expressões como discurso es-crito, gêneros do texto, gêneros do discurso, tipos de texto e de discurso. Essas diferentes nominações expressam uma dada concepção de escrita, uma dada concepção de texto que, por sua vez, põe em perspectiva uma determinada concepção de linguagem. Enfim, são muitos os quadros conceituais provocadores de desdobramentos importantes para as/nas práticas educacionais. Batista (2001[1997], p. 3-4) retrata essa condição. Diz o autor:

[...] no ensino de Português, o que se ensina é o produto de uma visão,

entre outras coisas, do fenômeno da língua e do papel de seu ensino

numa determinada sociedade. É a alteração do ponto de vista sobre es-

ses e outros fenômenos que pode, em parte, explicar as mudanças que

vem sofrendo o ensino de Português ao longo de sua história, e que se

expressam na alteração de seu nome: Gramática Nacional, Língua Pátria

ou Idioma Nacional, Comunicação e Expressão, Português. É também a

alteração desses pontos de vista – ou, particularmente, a competição

entre eles – que pode explicar, em certa medida, as polêmicas e as ver-

dadeiras lutas que com freqüência se travam para a definição de seu

objeto e objetivos: a gramática? A leitura e a escrita? A língua oral? O

processo de enunciação de textos orais e escritos? O domínio de uma

língua considerada lógica e correta em si mesma? O domínio de uma

variedade lingüística prestigiada socialmente? (1) Dependendo das res-

postas que forem dadas a essas questões, diferentes práticas ensinarão

diferentes objetos, com diferentes objetivos. Todas essas práticas, no en-

tanto, poderão ser identificadas pela mesma designação: “Português”.

(1) Compreender, através dessas polêmicas, o processo pelo qual são pro-

duzidos os objetos de ensino escolares é uma lacuna a ser preenchida no

campo de estudos e investigações sobre o ensino de Português. [...].

Retome a leitura desse tema no Livro Produção

Textual Acadêmica I (1); Linguística Textual (4);

Linguística Aplicada.

Recomendamos a leitura do livro de Antônio

Augusto G. Batista Aula de Português: discursos e

saberes escolares. Como o próprio título indica,

vocês, caros alunos, encontrarão nessa obra a

possibilidade de pensar com o autor sobre “o que se ensina, quando a aula é de Português: quando

se ensina português, o que se ensina?”, como

bem o disse Magda Soares ao comentar a obra de

Batista – BATISTA, Antônio Augusto Gomes. Aula de

Português. São Paulo: Martins Fontes, 2001 [1997]

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

143

Atividade:

Consulte livros da EaD de Produção Textual Acadêmica I (1); Lin-guística Textual (4).

Não apenas nos restringindo ao Português, mas retornando à lin-guagem em seu sentido genérico, amplo, busquemos em Bakhtin [Vo-lochínov] (1990) a explicação histórica para a compreensão desse fe-nômeno que é a linguagem humana. Para ele, Bakhtin [Volochínov] (1990), duas grandes correntes do pensamento filosófico-lingüístico (da filosofia da linguagem e da lingüística geral) tiveram influente assento nessa busca: uma que o autor denominou de subjetivismo individualista e outra denominada objetivismo abstrato. A primeira atribui a constitu-tividade da língua ao “ato de criação individual”, monológico; a segun-da, a um “sistema lingüístico” compartilhado por uma mesma comuni-dade lingüística (“o sistema das formas fonéticas, gramaticais e lexicais da língua”). Bakhtin [Volochínov] (1990), em observação e crítica às “linhas mestras” dessas duas orientações, apresenta tese própria, apon-tando como a verdadeira substância da língua o “fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação, ou das enunciações” (p. 123, grifos do autor). Nas palavras do autor:

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abs-

trato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada,

nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno

social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enun-

ciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da

língua (BAKHTIN [VOLOCHÍNOV], 1990, p. 123).

Atividade:

Retome nos livros Estudos Gramaticais 1 e Linguística Textual 4 o

item que trata de “Concepções de língua(gem)”. Elabore e poste um

resumo no fórum do seu curso.

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Metodologia de Ensino

144

A língua concebida como forma de interação requer uma meto-dologia de estudo de outra ordem. Bakhtin [Volochínov] (1990, p. 124) propõe, então, como “ordem metodológica” estudar:

as formas e os tipos de interação verbal em ligação com as a) con-dições concretas em que se realizam;

as formas das distintas enunciações, dos atos de fala isolados, em b) ligação estreita com a interação de que constituem os elementos, isto é, as categorias de atos de fala na vida e na criação ideológica que se prestam a uma determinação pela interação verbal;

a partir daí, examinar as formas da língua na sua c) interpretação lingüística habitual.

No que concerne a essa questão, o autor ainda afirma:

É nessa mesma ordem que se desenvolve a evolução real da língua: as

relações sociais evoluem (em função das infraestruturas), depois a co-

municação e a interação verbais evoluem no quadro das relações so-

ciais, as formas dos atos de fala evoluem em conseqüência da interação

verbal, e o processo de evolução reflete-se, enfim, na mudança das for-

mas da língua. (Bakhtin [Volochínov], 1990, p. 124).

Segundo Miotello (2006, p. 179), Bakhtin alerta

[...] para que a gente não estude as formas “picando fonemas”, ou “não

conseguindo ultrapassar a segmentação em constituintes imediatos”.

Não dá para separar formas lingüísticas do curso histórico das enun-

ciações. Da mesma forma não dá para separar formas lingüísticas dos

meios extraverbais e da palavra do outro. A estrutura da enunciação é

sempre uma estrutura social. Ela existe no enfrentamento permanente

com a história, com a mudança.

Tais concepções tiveram repercussão na esfera educacional brasilei-ra e, consequentemente, nas propostas que orientam o ensino da Língua Portuguesa. Geraldi (1984), apoiado nas posições teóricas de Bakhtin [Volochínov] (1990), aponta que

[...] quando se fala em ensino uma questão que é prévia – para que ensinamos o que ensinamos? – e sua correlata – para que as crianças aprendem o que aprendem? – é esquecida em benefício de discussões

sobre o como ensinar, o quando ensinar, o que ensinar, etc. (GERALDI,

1984, p. 42, grifos do autor).

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

145

No caso, Geraldi (1984) chama a atenção para a finalidade dos atos do ensino. Se temos de pensar em “o que” ensinar, “como” ensinar, há uma pergunta que antecede porque define as duas primeiras. Responder ao “para quê”, diz o autor, “envolve tanto uma ‘concepção de linguagem’ quanto uma postura relativamente à educação.” (p. 42, grifos do autor). Com base em tais ponderações, Geraldi, em forma de síntese, observa a relação entre concepções de linguagem correntes no interior dos estudos linguísticos e suas evidências no ensino da Língua Portuguesa:

a. a linguagem é a expressão do pensamento: esta concepção ilumi-

na, basicamente, os estudos tradicionais. Se concebemos a linguagem

como tal, somos levados a afirmações – correntes – de que pessoas que

não conseguem se expressar não pensam;

b. a linguagem é instrumento de comunicação: esta concepção está

ligada à teoria da comunicação e vê a língua como código (conjunto de

signos que se combinam segundo regras) capaz de transmitir ao recep-

tor uma certa mensagem. Em livros didáticos, esta é a concepção con-

fessada nas instruções ao professor, nas introduções, nos títulos, embora

em geral seja abandonada nos exercícios gramaticais;

c. a linguagem é uma forma de inter-ação: mais do que possibilitar uma

transmissão de informações de um emissor a um receptor, a linguagem

é vista como um lugar de interação humana: através dela o sujeito que

fala pratica ações que não conseguiria praticar a não ser falando; com

ela o falante age sobre o ouvinte, constituindo compromissos e vínculos

que não pré-existiam antes da fala.

Grosso modo, estas três concepções correspondem às três grandes cor-

rentes dos estudos linguísticos: a) gramática tradicional; b) o estrutura-

lismo e o transformacionismo; c) a lingüística da enunciação. (GERALDI,

1984, p. 43).

10.4 Atos de ensino para quem se põe como aprendiz do ensinar

No âmbito educacional, a consideração a tais pensamentos filosó-fico-linguísticos fornece desdobramentos específicos nas práticas peda-gógicas, como vimos pelas posições de Geraldi. Bakhtin no conjunto de sua obra e os membros do seu Círculo, diga-se, não tratam de questões de ordem pedagógica, contudo a teoria dialógica da linguagem desse

Cf. Círculo de Bakhtin: vede livro Linguística Textual (2008, p.22).

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Metodologia de Ensino

146

Círculo de pensadores, ou seja, a linguagem concebida como produção humana no processo da interação verbal, teve – como tiveram as demais teorias da linguagem – consequências repercutidas no pensamento e nas ações da esfera escolar da mais ampla produção de organização in-teracional à mais específica em salas de aula. Várias são as publicações de estudos e pesquisas que tratam do tema da inserção das teorias fi-losófico-linguísticas no processo de ensino e aprendizagem da língua. E especialmente no final da década de 1970 e início de 1980, quando chega até nós com mais força a teoria do dialogismo, essa situação se avoluma e adquire visibilidade. Apesar de o tema ocupar espaço nas dis-cussões de cunho filosófico, científico-acadêmico e inclusive haver em documentos oficiais de referência para o ensino da Língua Portuguesa (PCNs; PC Estaduais, Municipais e outros) expressiva orientação com base em tais pressupostos teóricos, estampa-se ainda, quando o assunto é a sala de aula, certo desconforto entre o que é dito e o que é feito nas relações sociais escolares entre alunos e professores.

Quanto a mudanças no ensino da escrita, duas obras tiveram im-portância mais particularmente na pedagogia da escrita, o livro orga-nizado por Geraldi O texto na sala de aula (1984) e um outro não tão lembrado por quem se ocupa com resgates históricos de publicações com influência no pensamento sobre o ensino. Falamos do livro O en-sino de Língua Portuguesa no primeiro grau, assinado por Lilian Lopes Martin da Silva, Sarita Maria Affonso Moysés, Raquel Salek Fiad, João Wanderley Geraldi e publicado em 1986.

O ensino de Língua Portuguesa no primeiro grau, está com a sua

publicação esgotada. Neste livro, os autores abrem a apresentação

da obra com a pergunta “O que se pode esperar de um livro sobre

o ensino de Língua Portuguesa?”. A publicação se desenhava à sua

época como crítica ao ensino fragmentado da língua, norteado por

manuais com caráter prescritivo e centrado no ensino da gramática

normativa. A proposta de ruptura era indicada não apenas por tra-

zer esse tema ao público leitor, mas também pelo modo como espe-

cialmente essa publicação foi escrita e organizada. Um livro escrito

de um modo diferente, por um grupo de “diferentes”.

Atualmente, O texto na sala de aula é reeditado

pela Ática.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

147

Indicamos algumas outras leituras para o aprofundamento da história da constituição da disciplina (a atividade pedagógica; percursos, métodos, modelos, etc.) e dos domínios das metodologias propostas em épocas diversas: GNERRE, Maurizzio. Linguagem, escrita e poder. São Paulo: Martins Fontes, 1985.; MURRIE, Zuleica de Felice (Org.). O ensino de português. São Paulo: Contexto, 1992.; PÉCORA, Alcir. Problemas de redação. São Paulo: Martins Fontes, 1983.; SILVA, Ezequiel Theodoro da. Leitura e realidade brasileira. 2.ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985.; SILVA, Lilian Lopes Martin. A escolarização do leitor: a didática da destruição da leitura. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986.

Figura 51 – Livro de Magda SoaresFigura 50 – Livros Figura 52 – Leituras

A irreverência para a qual chamamos a atenção marcou um perío-do histórico. Professores como Sarita Maria A. Moysés, João Wanderley Geraldi, Raquel Salek Fiad, Lilian Lopes Martin da Silva representam um grupo de professores, nesse caso da UNICAMP, que teve influente papel na mudança dos rumos das discussões e encaminhamentos metodológi-cos sobre o ensino da língua, especialmente no nosso país. Tal movimento envolveu, além desses autores, outros e de outras instituições. Magda Soa-res no prefácio que faz ao livro de Batista (2001[1997]) Aula de Português: discurso e saberes escolares, com o cuidado de pesquisadora que é, resgata da produção brasileira obras de autores que tiveram influente destaque no pensamento da pedagogia da Língua Portuguesa. A leitura desse prefácio nos auxilia, então, a compreender os caminhos do pensamento brasileiro sobre o ensino da língua, sobre a aula de Português, pelo olhar de uma au-tora que foi e ainda é parte expressiva dessa história. Um de seus livros da década de 80, Linguagem e escola: uma perspectiva social (SOARES, 1986) teve especial influência para a compreensão da crise no ensino da língua e do fracasso escolar de pessoas pertencentes a extratos sociais menos fa-vorecidos economicamente, ao apresentar a discussão sobre as relações entre linguagem, escola e sociedade.

Atividade:

Marquem com seu tutor e com mais um grupo de colegas um encontro

virtual para escrever no wiki comentários sobre o que foi lido e que você

considera importante nas obras sobre as quais fizemos referência.

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Metodologia de Ensino

148

10.5 Práticas discursivas no trabalho com textos na escola: as relações de interação no ensino e na aprendizagem

Nesta seção, focalizaremos basicamente questões atinentes ao texto como unidade de ensino, com base na concepção dialógica de linguagem.

10.5.1 O texto como conteúdo de ensino

Não há como pensar o ensino da língua sem focar o olhar nas con-cepções de texto e seu ensino, como já indicamos nessa unidade. Desde o processo da alfabetização, seja como ponto de partida, seja como “co-roamento” desse processo, a aprendizagem da escrita de textos já se in-sinua. A proposta de ensino da escrita com base na concepção dialógica de linguagem toma os sujeitos (eu e o outro da interlocução) como inte-rativos, portanto como sujeitos que constituem seus enunciados verbais (nas suas diversas manifestações) e são por eles constituídos, algo que vimos repisando no âmbito de nossas colocações.

Desse modo, os sujeitos, no fluxo da comunicação discursiva, não se valem

de fragmentos de enunciados, mas de enunciados reais concretos, com

sentido. Por que, então, no ensino da escrita de textos, buscar uma mate-

rialidade fragmentada da língua, um ensino fragmentado? Tal atitude com

o objetivo de um ensino gradual e sistemático, ao fragmentar o objeto da

aprendizagem, não estaria dificultando a compreensão desse objeto?

Afinal, nas práticas sociais discursivas – caso como o do processo da produção escrita e da oralidade – “[...] a língua constitui um processo de evolução ininterrupto, que se realiza através da interação verbal so-cial dos locutores”, como nos diz Bakhtin [Volochínov] (1990, p. 127). É certo que temos de cercar nosso olhar investigativo, pontuar o que vamos abordar; é certo também que necessitamos de delimitações para não correr o risco do olhar tudo e nada ao mesmo tempo, mas é certo também que esse algo tem de ter sentido, e para tê-lo não podemos nos

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

149

apoiar na visão parcial, porque será, pela sua própria condição, parcial. Vocês, caros alunos, conhecem a parábola Os cegos e o elefante?

Atividade:

Faça uma analogia entre a parábola Os cegos e o elefante e o comen-

tário anteriormente apresentado; registre-a em documento digital e

poste-a no fórum do nosso curso. Há várias versões que você pode

consultar na internet. Como exemplo, indicamos: http://coachingsp.

wordpress.com/2009/08/12/parabola-hindu-os-cegos-e-elefante

Indo ao encontro do que tal parábola nos permite interpretar como analogia ao processo de conhecimento da escrita de textos na escola e apoiados na concepção da língua como atividade interlocutiva, o texto (oral ou escrito) só pode ser compreendido fundeado no social, pelo lu-gar de encontro de sujeitos historicamente constituídos, pelo encontro de pontos de vista sobre o mundo e não como produção de um sujeito abstrato, homogêneo, que assume a posição de “emissor de mensagens” e, por conseguinte, uma posição discursiva que se subsume à orientação do discurso do outro – interlocutor definido. No horizonte da fala do locutor está o interlocutor de quem o locutor espera uma compreensão ativa do que é enunciado. Essa orientação ao discurso do outro deter-mina a própria estrutura do enunciado proferido. Os textos são, pois, configurados no acontecimento social; são, na condição de enunciados concretos, produtos de atividades humanas, das relações que são estabe-lecidas pelos sujeitos nessas atividades; são, como diz Bakhtin (2003, p. 263), gêneros do discurso, isto é, “tipos relativamente estáveis de enuncia-dos”. Assim, aqui na prática discursiva (oral ou escrita) está implicada a alteridade. A proferição de enunciados verbais busca a compreensão ativa do outro que não é ouvinte passivo, mas participante do projeto do dizer (projeto discursivo).

Bortolotto (2009, p. 108), tratando da relação de inserção da teoria do dialogismo de Bakhtin e seu Círculo, teoria dos gêneros do discurso no campo educacional, expõe que

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Metodologia de Ensino

150

[...] os gêneros do discurso compõem uma arquitetônica, no que se re-

fere à temática, à finalidade e às situações de enunciação que permiti-

riam identificar os mecanismos envolvidos na relação entre linguagem

e atividade laboral.

Os gêneros apontariam matizes das mudanças sociais pelas relações

que se estabelecem entre as atividades discursivas e as práticas culturais

em geral. O estudo dos gêneros do discurso, por esta perspectiva, não

poderia se restringir à materialidade verbal que os expressa em “tipos

relativamente estáveis de enunciados”. Os gêneros demandam o reco-

nhecimento da sua natureza formadora, ou seja, também as dimensões

histórica e social objetivadas na manifestação verbalizada (material ver-

bal) e na realidade concreta ali refratada.

[...]

Pode-se, então, considerar que os gêneros constituem-se como ele-

mentos importantes para a análise e compreensão da própria atividade

pedagógica. A “teoria do gênero” de Bakhtin e autores do Círculo (espe-

cialmente Medvedev e Volochínov) orienta-se para a realidade concreta,

para o real das relações sociais, dos acontecimentos, dos problemas etc.

Os “gêneros”, em qualquer esfera social, encerram o dialogismo da co-

municação social e verbal: eles organizam, orientam ou projetam (pelo

horizonte de expectativas) atividades laborais, de convívio social etc., ou

verbais (da vida e da cultura).

Furlanetto (2009, não paginado), ao rediscutir ideias de Bakhtin (2003) sobre os gêneros do discurso, se posiciona para pensar o ensino da Língua Portuguesa:

Encarado como enunciado – como acontecimento discursivo – o texto

abarca o horizonte social, integrando outras formas de linguagem (a ima-

gem, o som, o gesto). Como unidade complexa, pode ser apresentado

sob vários ângulos: é uma unidade de sentido, com tema específico; é ob-

jeto linguístico, histórico e ideológico; tem autor; relaciona-se com outros

textos e com a memória dos discursos sociais; é produzido numa forma

de gênero, correspondente ao espaço onde se origina: relatório, ofício,

artigo de opinião, artigo científico, resenha, notícia, receita, bula, piada, e

todas as formas mais ou menos conhecidas de produção textual.

Os gêneros, em suas formas concretas textuais, com certo acabamento

(a unidade textual, a coesão de seus elementos, sua coerência semânti-

ca, dando-lhe um tema) emergem, circulam e produzem seus efeitos no

tecido social. Representam os valores sociais.

Para um estudo aprofundado sobre o

tema gêneros do discurso, indicamos a leitura do

capítulo “Os gêneros do discurso” – BAKHTIN,

Mikhail. Estética da criação verbal. Tradução do russo

por Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes,

2003.

O texto completo está disponível em http://forum.ulbratorres.com.

br/2009/palestras_texto/PALESTRA%2016.pdf

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

151

Mais especificamente quanto ao ensino escolar, retrata que

[...] a “redação” ainda é praticada, e às vezes até mesmo sob a nova deno-

minação [a de produção textual], o que significa que ainda pesa a tradi-

ção de escrever na instituição escolar segundo moldes mais antigos, em

que a preocupação maior é escrever corretamente segundo os princípios

normativos atados a certa concepção de gramática. Nesse caso, põe-se

como secundário o propósito de estabelecer “comunicação discursiva”

propriamente dita, que se processa através de gêneros específicos. É ver-

dade que esse procedimento também aparece entrelaçado a um traba-

lho mais cuidadoso de promover a metodologia que é recomendada nas

propostas curriculares elaboradas no País. É, de fato, muito complicado

abandonar valores tradicionais. Ideologicamente nosso comportamento

tem sido orientado para que haja homogeneização, por isso há pressão

para que nos sujeitemos ao que se enraizou na sociedade. E é preciso

compreender como as instituições funcionam se queremos realizar es-

forços para transformar o que acreditamos que não está conduzindo aos

objetivos propostos. (FURLANETTO, 2009, não paginado).

Vale lembrarmos que, quando afirma que “a ‘redação’ ainda é prati-

cada”, Furlanetto (2009) está se referindo àquela produção escolar

tradicional, a qual passaria a ser denominada “produção de textos”,

não só para evitar ressonâncias apreendidas e interiorizadas, mas

também para que realmente se efetue a ultrapassagem desses va-

lores retidos na memória, mediante uma nova compreensão do que

seja textualidade.

A posição da autora vem ao encontro das argumentações aqui de-senvolvidas, ou seja, que nos estudos, na elaboração/criação ou na ava-liação de textos na escola os aspectos formais e periféricos vinham (e ainda vêm) ocupando a centralidade nos encaminhamentos metodoló-gicos. O olhar do professor vai em busca de algum erro no âmbito for-mal da língua, apoiado consciente ou inconscientemente em pressupos-tos teóricos e na memória de trabalho com textos na escola (memória dos discursos sociais).

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Metodologia de Ensino

152

Já os princípios da teoria sociointeracionista do Círculo de Bakhtin

orientam para a observação das condições de produção, para as re-

lações discursivas, para os modos das formulações discursivas, isto

é, para a língua no seu funcionamento (PC/SC, 1998). Tal conduta

decorre de se considerar o texto como enunciado (na sua situação

real de produção: com projeto discursivo; interlocutores definidos;

valoração; relação com outros textos, com a comunicação discursiva

nas esferas de uso da língua); em sua constituição linguístico-textual,

ou seja, os elementos centrais de construção textual, como coesão,

coerência, concatenação de ideias, argumentação, não contradição,

adequação ao tema proposto, fluência verbal, entre outros, e não

como pretexto para o ensino de aspectos normativos da língua –

ortografia, regência, concordância, estudo de vocabulário, para ficar

com alguns. Os aspectos normativos da língua precisam ser avalia-

dos, sim, mas não com a ênfase tradicionalmente dada na escola e

como se mais nada houvesse a avaliar.

Segundo a orientação aqui assumida para o trabalho da docência, a análise linguística é parte da compreensão da produção discursiva (oral ou escrita), mas, como já vimos, essa dimensão integra-se à dimen-são social, histórica e ideológica da comunicação. Como disse Bakhtin (2003, p. 319):

Quando estudamos o homem, procuramos e encontramos signos em

toda parte e nos empenhamos em interpretar o seu significado. Estamos

interessados primordialmente na formas concretas dos textos e nas con-

dições concretas da vida dos textos, na sua inter-relação e interação.

Pensar o texto como unidade de ensino é pensá-lo na sua complexa constituição e levar em conta tal constituição nas pedagogias para ensi-no de linguagem verbal (práticas específicas). Não se trata de substituir nominações (composição, redação, produção textual, gêneros textuais, gêneros do discurso), mas de provocar reflexões e atitudes entre aquilo que permanece, muitas vezes, ressignificado e aberto à criação, porque ainda é uma necessidade, e o que se desloca, é ultrapassado, por não atender às necessidades deste tempo presente.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

153

10.6 Voltando ao ponto inicial: locutor e interlocutor, partes integrantes do enunciado

Retomemos aquela fala que tanto perturbou Santiago, nosso perso-nagem que abriu as páginas desta unidade, proferida pela voz de autori-dade de seu professor e, sabemos, de muitos outros professores toda vez que iniciavam ou reiniciavam mais um etapa escolar. Vozes que certa-mente ainda ecoam nos ouvidos de muitos de nós, alunos que já fomos: – Peguem os seus cadernos e escrevam com esferográfica azul e com letra legível uma composição sobre as férias. No mínimo uma página, de mar-gem a margem, sem pular nenhuma linha. Cuidado com a ortografia e com a pontuação. Vocês têm quarenta e cinco minutos. Alguma pergunta?

Assim, indagamos: será que falas como essa inquietam ainda hoje ouvi-

dos e corações sensíveis (ansiosos para dizerem a sua palavra) como os

de Santiago? E nosso aluno, como fica em situações como essa? Será

que ele entende sua escrita como uma oportunidade de constituir-se

como escritor, autor, interlocutor, ou ainda como produto de interação

entre ele e seu leitor? Mas eis a grande questão: quem é o seu leitor? O

professor? Sempre o professor? Se for apenas este, o aluno, de antemão,

entende, ou poderá entender, pelo que está instituído por tradição que

seu texto servirá apenas como pretexto, um meio de exercitar-se no uso

do “certo”, do “correto” da escrita, na letra, na pontuação; ou, quando mui-

to, no desenvolvimento da criatividade e do raciocínio e, finalmente, um

meio para melhorar a nota (a avaliação). Será este o destino dos textos

escolares? A mesa do professor, as mãos, e finalmente a pasta do profes-

sor? E, diante da natureza dialógica da linguagem, como fica a situação

de interlocução? Onde está o interlocutor do aluno, real ou imaginário,

para que ele possa posicionar-se perante sua escrita, ajustá-la de acor-

do com esse interlocutor; enfim, desencadear a bipolaridade necessária

ao processo de interlocução? Não estaria, em grande parte, na escola a

causa para o fracasso de muitos alunos na produção escrita? Não estaria

nas condições de produção que orientam a produção escrita na escola?

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Metodologia de Ensino

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Certamente, muitos de vocês, sensíveis a esse quadro escolar histo-ricamente constituído, consideram não ser simples revertê-lo. Concor-damos. Entendemos, todavia, que a mudança deve vir primeiramente na postura, no posicionamento do professor, de sua visão de língua, de linguagem. Assim, se comunga do caráter interacionista desses objetos de conhecimento, sua metodologia, seu planejamento, deve ser coerente com esse princípio. Então, ao elaborar seu planejamento, ao decidir tra-balhar com a escrita, com o que escrever (não esquecer, nessa decisão, da importância de compartilhar e discutir a ideia com os alunos), deve-rá já ter em mente tanto o sujeito-escritor (aluno) como o sujeito-leitor (definido pelo grupo – professor e alunos – num processo participativo, interativo). Seu trabalho guiar-se-á, então, por esta questão: a quem os alunos irão destinar o que escrevem? Como já vimos, isso irá determinar

o como escrever. Vamos dar um exemplo que nos toca de perto. Quando nós – o grupo de professores que escreveu este Caderno – esboçamos nossos primeiros planejamen-tos, esse pressuposto tornou-se logo evidente. Seríamos os sujeitos-escritores que iríamos destinar o que escrevês-semos a sujeitos-leitores bem definidos: alunos de Letras a distância. Foi fundamental termos nosso interlocutor previamente definido, pois essa modalidade de ensino re-quer um tipo de texto com características especiais, já que nosso interlocutor, ausente no tempo e no espaço e não presencial em uma sala de aula, necessita logicamente de uma metodologia com estratégias especiais.

Atividade:

Procure comparar este Livro (no que diz respeito à composição grá-

fica, ao conteúdo, à forma de apresentação, à organização textual,

ou em outros itens que lhe chamaram a atenção) com outros ma-

teriais teórico-metodológicos, tais como livros, manuais, cadernos,

etc. destinados a alunos de Letras na modalidade presencial. Em que

diferem? Em que se assemelham? Marque com seu tutor e com mais

um grupo de quatro estudantes um encontro virtual para escrever

no wiki seu comentário crítico a respeito desse assunto.

Figura 53 – Olho nas letras

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

155

Estamos vendo, então, que o que se escreve, a quem se escreve de-termina o como se escreve. Daí a importância de nosso aluno ter seu interlocutor bem definido para que possa determinar o como escrever. Claro está que o como escrever pressupõe também o domínio de um conjunto complexo de habilidades que vão sendo adquiridas ao longo do processo de aprendizagem, que inicia, como vimos, antes mesmo de a criança entrar na escola, passa pelo aprendizado do sistema alfabético, vai amadurecendo e se aprofundando no decorrer dos outros níveis de ensino e pode perdurar ad infinitum, já que somos eternos aprendizes. O que queremos frisar aqui é a importância, no decorrer de toda essa aprendizagem, de o aluno sentir-se, assumir-se como locutor/escritor, sentir-se partícipe de uma ação interpessoal; enfim, autor de seu texto, pelo qual poderá atuar sobre seu interlocutor, e que, para tanto, deverá selecionar um conjunto de estratégias que julgar adequadas para aquele tipo de situação de interlocução. Vejamos como Geraldi (1991) configu-ra isso por meio de um gráfico.

Assumir-se comoLocutor

(d)

RelaçãoInterlocutiva

Ter o que dizer(a)

Razões para dizer(b)

implica

supõe

Escolher estratégias para dizer

(e)

Interlocutores a quem se diz

(c)

implica

supõe

exige

Figura 54 – Gráfico: inter-relações na escrita, que mostra “as condições necessárias à produção de um texto” (cf. GERALDI, 1991, p. 161).

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Metodologia de Ensino

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Claramente estamos aqui constatando que, pela perspectiva que as-sumimos, não há como isolar o aluno de seu contexto sócio-histórico, de sua realidade e pedir-lhe que escreva uma redação. Sabemos que, para que haja discurso (oral ou escrito), é fundamental uma estrutura, uma organização social em que locutores e interlocutores dela se sintam parte integrante. Para Bakhtin (2003), o interlocutor é parte constitutiva do enunciado, pois sem a existência dele não haveria discurso. Dessa forma, o enunciado não pode ser tomado como unidade convencional (como uma abstração), mas como unidade real, em sua construção dialógica.

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Capítulo 10O processo da escrita na escola

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Considerações finais da Unidade DEnfim, considerando tudo o que foi dito ao longo deste texto e se

formos fiéis ao princípio da dialogia, temos de ouvir as múltiplas e dife-rentes vozes que emanam de diferentes textos e a elas nos alinharmos ou nos contrapormos com enunciados próprios, com autoria, produzindo outras e outras vozes; afinal, “[...] a língua passa a integrar a vida atra-vés de enunciados concretos (que a realizam); é igualmente através de enunciados concretos que a vida entra na língua” (BAKHTIN, 2003, p. 265). Nosso desafio é olhar para os textos com olhos de observadores, com atitudes na direção da compreensão ativa (com a possibilidade de resposta), com apreciação (consciente), pelo trabalho na lida da palavra falada, lida, escutada, escrita, analisada nos seus mais diversos e diferen-tes níveis, aprendendo a ser autores e a formar autores; olhando, pers-crutando, procurando conhecer o trabalho da docência, o trabalho na docência com a palavra (o verbo) e de lá aprender a encontrar o outro (as vozes) tecendo a sua própria formação de aprendiz do ensinar. Ten-do isso em vista, destacamos que “A palavra quer ser ouvida, entendida, respondida e mais uma vez responder à resposta, e assim ad infinitum” (BAKHTIN, 2003, p. 334).

Nesta unidade, apresentamos alguns movimentos na tentativa de ensinar e aprender a produzir textos orais e escritos; e, ao nos entrela-çar a muitas dessas vozes, construímos nosso texto para, no aguardo de contrapalavra de vocês, caros alunos, apreendermos a tessitura das atividades humanas, sem álibi quanto a nossa responsabilidade de en-sinar a ler e a escrever àqueles que nos forem destinados neste tempo e espaço históricos, pela proposição de uma comunicação discursiva real, em nada anônima.

Na unidade seguinte, para fechar o quadro das reflexões até aqui efetuadas sobre esse objeto de conhecimento complexo que é a lingua-gem, você encontrará importantes subsídios que poderão nortear seu posicionamento quanto ao ensino da gramática ancorado nos princí-pios sociointeracionistas aqui defendidos.

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Unidade EAnálise linguística e ensino de gramática

Grammatica da lingoagem portuguesa [Fernão de Oliveira] (1536)

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Nesta Unidade objetivamos salientar a importância da prática de análise linguística como atividade escolar de linguagem necessária ao desenvolvimento de conhecimentos sobre as estratégias de discurso, ou seja, as escolhas discursivas que fazemos ao produzir os textos. Traze-mos também à discussão conceitos de gramática visando orientar o en-sino cujos conteúdos referem-se à organização da língua, a sua estrutura e ao conjunto de regras que a tornam inteligível.

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Capítulo 11Análise linguística

161

11 Análise linguística Assim como a criança lê o mundo desde muito cedo, ela também se

apropria da linguagem verbal e opera sobre esta desde muito pequena. Ela percebe as diferentes entonações da linguagem, seja no momento em que ouve uma história contada para ela em que o contador varia o tom de voz de acordo com o personagem, seja no momento em que a mãe se refere a ela com carinho ou com repreensão. Percebe ainda que, dependendo do seu interlocutor, deve reagir de forma diferente: com um parente que se dirige a ela, reagirá de certa forma; com o médico que a examina, reagirá de outra forma; e com uma pessoa estranha, também reagirá de forma diferente.

Esses conhecimentos dos quais a criança vai se apropriando no de-senvolvimento da sua linguagem, por meio da interação com pessoas mais experientes no uso da língua, com os quais ela chega à escola e que lhe possibilitam, além do domínio da língua e do saber usá-la para falar sobre as coisas do mundo, desenvolver reflexões sobre o uso da própria língua; é o que denominamos análise linguística.

Como vimos discutindo ao longo deste material pedagógico, o objeto

de ensino da disciplina Língua Portuguesa é a linguagem em uso. As-

sim sendo, as atividades de análise linguística que se fazem na escola

têm como função refletir sobre essa linguagem em uso, favorecendo

seu domínio, tanto na escuta e na leitura quanto na produção de textos

orais e escritos.

Quando falamos em reflexão sobre a língua em uso, temos claro que a prática de análise linguística “não pode ficar reduzida apenas ao trabalho sistemático com a matéria gramatical” (BRASIL, 1998, p. 27), Ao contrário, temos de

[...] criar situações em que os alunos possam operar sobre a própria lin-

guagem, construindo pouco a pouco, no curso dos vários anos de es-

colaridade, paradigmas próprios da fala de sua comunidade, colocando

atenção sobre similaridades, regularidades e diferenças de formas e de

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Metodologia de Ensino

162

usos lingüísticos, levantando hipóteses sobre as condições contextuais

e estruturais em que se dão. (BRASIL, 1998, p. 28).

Embora estejamos falando de reflexão sobre a língua em uso como se fosse algo intrínseco às aulas de Português, sabemos que, de fato, a tradição da disciplina de Língua Portuguesa é o trabalho com a gramá-tica tradicional. Esse trabalho manteve-se durante muitos anos, e ainda se mantém em algumas salas de aula, na crença de melhorar o desempe-nho linguístico dos alunos, seja na leitura, seja na produção escrita. Ao longo dos anos, tem-se percebido, no entanto, que esse objetivo pouco tem sido alcançado. Como ressalta Geraldi (1996, p.129-130), a sistema-tização dos conteúdos gramaticais

[...] não se dá, na prática de sala de aula, de forma tão sistemática. O

simples manuseio de alguns livros didáticos, ou de materiais alternati-

vos produzidos para substituí-los, nos mostra que a sequência em que

são trabalhados tais conteúdos gramaticais dificilmente permitirá, ao

final de oito anos de estudos, que o aluno tenha um quadro sinóptico

de ao menos uma proposta gramatical. O conteúdo é distribuído, nas

diferentes séries, de uma forma tão irracional que a uma lição sobre o

plural de substantivos compostos pode se seguir uma lição de análise

sintática. Qual é, então, a sistematização que se oferece à reflexão prévia

do estudante? Tratar-se-ia de uma sistematização a cada vez local? Por

conta de quem ficaria, então, a construção de uma visão geral da teoria

gramatical estudada? Por conta do estudante?

Como vimos evidenciando, tomamos o texto como unidade de en-

sino e, assim sendo, os aspectos a serem elencados para as ativida-

des de análise linguística não poderão se referir apenas à dimensão

gramatical. A dimensão discursiva será necessariamente levada em

conta, pois essa prática requer interpretação e produção de texto.

Dessa forma, temos de ter em mente que “[...] prática de análise lin-

güística não é uma nova denominação para ensino de gramática”

(BRASIL, 1998, p. 78).

O modo de ensinar, sugerido pelos PCNs de Língua Portuguesa,

[...] não reproduz a clássica metodologia de definição, classificação e

exercitação, mas corresponde a uma prática que parte da reflexão pro-

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Capítulo 11Análise linguística

163

duzida pelos alunos mediante a utilização de uma terminologia simples

e se aproxima, progressivamente, pela mediação do professor, do co-

nhecimento gramatical produzido. Isso implica, muitas vezes, chegar a

resultados diferentes daqueles obtidos pela gramática tradicional, cuja

descrição, em muitos aspectos, não corresponde aos usos atuais da lin-

guagem, o que coloca a necessidade de busca de apoio em outros ma-

teriais e fontes. (BRASIL, 1998, p. 29).

Tendo como objeto de ensino a linguagem em uso, a prática de aná-lise linguística, tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio, tem de estar articulada às práticas de linguagem. Assim, “Deve-se ter claro, na seleção dos conteúdos de análise linguística, que a referência não pode ser a gramática tradicional. A preocupação não é reconstruir com os alunos o quadro descritivo constante dos manuais de gramática escolar [...]” (BRASIL, 1998, p. 29); ao contrário, temos de selecionar como conteúdos para nossas aulas de análise linguística dificuldades apresentadas pelos nossos alunos nas atividades de produção, leitura e escuta de textos.

Os PCNs apontam que

[...] quando se toma o texto como unidade de ensino, ainda que se con-

sidere a dimensão gramatical, não é possível adotar uma categorização

preestabelecida. Os textos submetem-se às regularidades linguísticas

dos gêneros em que se organizam e às especificidades de suas con-

dições de produção: isto aponta para a necessidade de priorização de

alguns conteúdos e não de outros. Os alunos, por sua vez, ao se relacio-

narem com este ou aquele texto, sempre o farão segundo suas possibili-

dades: isto aponta para a necessidade de trabalhar com alguns desses

conteúdos e não com todos. (BRASIL, 1998, p.78-79).

Reproduzimos, a seguir, alguns procedimentos metodológicos, su-geridos pelos PCNs, para a prática de análise linguística:

isolamento, entre os diversos componentes da expressão oral Ӳou escrita, do fato linguístico a ser estudado, tomando como ponto de partida as capacidades já dominadas pelos alunos: o ensino deve centrar-se na tarefa de instrumentalizar o aluno para o domínio cada vez maior da linguagem;

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Metodologia de Ensino

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construção de um corpus que leve em conta a relevância, a Ӳsimplicidade, bem como a quantidade de dados, para que o aluno possa perceber o que é regular;

análise de corpus, promovendo o agrupamento dos dados a Ӳpartir dos critérios construídos para apontar as regularidades observadas;

organização e registro das conclusões a que os alunos tenham Ӳchegado;

apresentação da metalinguagem, após diversas experiências Ӳde manipulação e exploração do aspecto selecionado, o que, além de apresentar a possibilidade de tratamento mais eco-nômico para os fatos da língua, valida socialmente o conhe-cimento produzido. Para esta passagem, o professor precisa possibilitar ao aluno acesso a diversos textos que abordem os conteúdos estudados;

exercitação sobre os conteúdos estudados, de modo a per- Ӳmitir que o aluno se aproprie efetivamente das descobertas realizadas;

reinvestimento dos diferentes conteúdos exercitados em ati- Ӳvidades mais complexas, na prática de escuta e de leitura ou na prática de produção de textos orais e escritos. (BRASIL, 1998, p. 79).

Para que o aluno possa se apropriar dos conhecimentos gramati-cais evidenciados e fazer uso na sua produção escrita, o que somente o estudo dos tópicos da gramática escolar não garante, os PCNs sugerem a refacção dos textos produzidos pelos alunos, uma prática já testada e que tem dado certo.

Conforme Geraldi (2002, p.73-74), “[...] a análise linguística que se pretende partirá não do texto ‘bem escritinho’, do bom autor selecio-nado pelo ‘fazedor de livros didáticos’. Ao contrário, o ensino gramati-cal somente tem sentido para auxiliar o aluno. Por isso partirá do texto

Você encontra nesta obra de Geraldi, no capítulo

“Prática de Sala de Aula”, algumas atividades

sugeridas pelo autor para o trabalho com análise

linguística em sala de aula no Ensino Fundamental.

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Capítulo 11Análise linguística

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dele”. Assim, o professor seleciona o texto produzido pelo aluno e “[...] pode trabalhar tanto os aspectos relacionados às características estrutu-rais dos diversos tipos textuais como também os aspectos gramaticais que possam instrumentalizar o aluno no domínio da modalidade escri-ta da língua” (BRASIL, 1998, p. 80).

Seguem procedimentos sugeridos pelos PCNs para o encaminha-mento da atividade de refacção textual:

Seleção de um dos textos produzidos pelos alunos, que seja Ӳrepresentativo das dificuldades coletivas e apresente pos-sibilidades para discussão dos aspectos priorizados e enca-minhamento de soluções.

Apresentação do texto para leitura, transcrevendo-a na lou- Ӳsa, reproduzindo-o, usando papel, transparências ou a tela do computador.

Análise e discussão dos problemas selecionados. Em função Ӳda complexidade da tarefa, não é possível explorar todos os aspectos a cada vez. Para que o aluno possa aprender com a experiência, é importante selecionar alguns, propondo ques-tões que orientem o trabalho.

Registro das respostas apresentadas pelos alunos às questões Ӳpropostas e discussão das diferentes possibilidades em fun-ção de critérios de legitimidade e de eficácia comunicativa. Nesta etapa é importante assegurar que os alunos possam ter acesso a materiais de consulta (dicionários, gramáticas de ou-tros textos), para aprofundamento dos temas tratados.

Reelaboração do texto, incorporando as alterações propostas. Ӳ(BRASIL, 1998, p. 80).

Os PCNs apontam alguns aspectos a serem levados em conta pelo professor ao desenvolver a atividade de refacção textual. Vínculos de confiança entre o professor e o grupo são importantes para que os alu-nos não se sintam constrangidos ao ver suas produções expostas para

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Metodologia de Ensino

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a turma. Se o objetivo da atividade não envolver, por exemplo, conte-údos ligados a ortografia, a versão a ser trabalhada pode ter problemas dessa ordem corrigidos, para que a atenção dos alunos se volte para os aspectos que se queira de fato trabalhar. Se o objetivo da atividade en-volver conteúdos dos quais os alunos não tenham domínio, o professor pode assinalar os trechos do texto que quer trabalhar, assim os alunos concentram-se na tarefa de refazer os trechos com problemas, ao invés de investirem na tarefa de encontrar os problemas. Quando o professor tiver como objetivo trabalhar aspectos morfossintáticos, por exemplo, poderá ao invés de reproduzir um texto na íntegra, selecionar trechos de vários textos que apresentem o problema a ser reescrito.

Quando os alunos já dominarem a tarefa de refacção textual, o pro-fessor pode complexificá-la sugerindo trabalho de refacção em duplas ou em grupos e até mesmo em forma de oficinas em que questões mais específicas poderão ser propostas (BRASIL, 1998, p. 81).

As atividades de análise linguística possibilitam ao aluno, além do conhecimento sobre a língua, a apropriação de recursos expressivos que não fazem parte do seu repertório linguístico. Assim, o aluno irá, aos poucos, na escola, adquirindo uma variedade da língua diferente da-quela que adquiriu em casa, com seus pares. De acordo com Geraldi (1997, p. 192-193),

[...] além dos objetivos que tais atividades possam ter em si próprias,

enquanto conhecimento que produzem sobre a língua, acrescente-se o

fato de que elas podem servir e servem para uma outra finalidade: a do

domínio de certos recursos expressivos que não fazem parte daqueles

já usados pelos alunos. Toda reflexão feita deve estar no horizonte: o

confronto entre diferentes formas de expressão e mesmo a aprendiza-

gem de novas formas de expressão, incorporadas àquelas já domina-

das pelos alunos, levam à produção e ao movimento de produção da

variedade padrão contemporânea. Note-se, esta nova variedade não

dispensa o conhecimento da variedade padrão anterior, mas faz deste

conhecimento (que não precisa necessariamente ser total) uma condi-

ção na construção da nova variedade.

Para tanto, há que se ter cuidado para que o aluno não tenha a sensação de que sua variedade linguística deverá ser substituída pela variedade da escola. O trabalho a ser desenvolvido visa somar uma nova variedade àquela que o aluno já domina.

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Capítulo 11Análise linguística

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O livro infantil Uma escola assim eu quero para mim, de Elias José, representa muito bem situações vivenciadas em muitas escolas por alu-nos e professores. Na história, a escola é o espaço central da narrativa. Nela se desenvolve o conflito do menino Rodrigo, que vem do meio rural e tem como expectativa a aprendizagem das letras na cidade, mas não encontra apoio na professora Marisa e nos colegas, os quais satiri-zam o seu modo “caipira” de falar.

Observemos o diálogo:

- Rodrigo, trouxe os exercícios da semana passada? – perguntou ela,

cumprindo a promessa de cobrar.

- Eu truce, mas o di onti eu num consegui...

Nem acabou a frase e dona Marisa berrou:

- Repita: eu trouxe, mas o de ontem não consegui.

Rodrigo repetiu certinho, mas tremendo, vermelho e gaguejando. A

sala morria de rir. Rodrigo queria morrer, sumir, virar inseto e voar. (JOSÉ,

1999, não paginado).

A cena entre o menino Rodrigo e a professora Marisa descrita por Elias José, embora esteja no plano do ficcional, nos possibilita visualizar uma prática comum no espaço escolar: o desrespeito à linguagem colo-quial, ao dialeto que a criança traz do seu cotidiano. Tal discriminação pelos seus pares, crianças como ele, e pelo adulto, a professora, é um dos fatores que muitas vezes leva o aluno à exclusão, ao abandono escolar.

E os problemas se acumulavam, somavam com o ódio da escola, da pro-

fessora e da turma. Ele não conseguia ler, escrever ou entender por que

“Ivo viu a Eva. A Eva viu a uva. Didi deu um dado ao Dodô. A bola bateu

bem na boca do Beto” (JOSÉ, 1999, não paginado).

Assim como os PCNs, alguns autores da área da sociolinguística apon-tam a necessidade de se trabalhar a variação linguística em sala de aula.

A seguir, evidenciaremos algumas propostas, discutidas em Mongui-

lhott (2006), de estudiosos brasileiros que têm se dedicado a aplicar o

conhecimento que a sociolinguística vem elaborando, principalmente

desde a década de 1980, no Brasil, para a sala de aula.

Figura 55 – Capa do livro Uma escola assim eu quero para mim.

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Metodologia de Ensino

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Para Bagno (2002, p. 32), todas as variedades sociolinguísticas de-vem ser objeto de estudo das aulas de português “para que o espaço da sala de aula deixe de ser o local para o estudo exclusivo das variedades de maior prestígio social e se transforme num laboratório vivo de pesquisa do idioma em sua multiplicidade de formas e usos”. O autor ressalta que sua proposta se justifica em função da impossibilidade de se delimitar as diferentes variedades que se organizam em um continuum.

Em relação às propostas de se ensinar na escola a “língua culta”, Bagno (2002, p. 64) sugere que haja, em sala de aula, a investigação da língua viva, falada e escrita, para que o aluno entenda que “[...] existe uma distância muito grande entre a norma-padrão tradicional (que não é uma ‘língua culta’ real e sim uma língua ‘cultuada’, ideal) e as realiza-ções empíricas da língua por parte dos falantes cultos [...]”.

Em sua proposta, Bagno (2002, p. 65) julga primordial que o pro-fessor delimite um corpus de língua culta falada e escrita para analisar a “[...] língua real e não o padrão idealizado e artificial”. Esse corpus ajudará na comprovação e na explicação da variação e mudança que ocorre na língua viva. A explicação, de acordo com o autor, virá a partir do arcabouço teórico que o professor deve buscar.

Bagno (2002, p. 41) evidencia ainda a questão do preconceito lin-guístico que há em função dos valores sociais atribuídos às diferentes variedades linguísticas, valores que, na verdade, são atribuídos aos fa-lantes dessas variedades. O valor que a variedade recebe está diretamen-te relacionado ao valor que o falante dessa variedade recebe no mer-cado social. Quanto mais distante dos usos prestigiados, mais “erros” esse falante será acusado de cometer. Essa crença ainda existe, embora já esteja “mais do que comprovado que, do ponto de vista exclusivamente científico, não existe erro em língua, o que existe é variação e mudança”, ambas constitutivas da língua.

Dessa forma, ao invés de o professor mostrar para o aluno o que está “certo” e o que está “errado” em termos de uso linguístico, poderá

[...] discutir os valores sociais atribuídos a cada variante linguística, enfa-

tizando a carga de discriminação que pesa sobre determinados usos da

língua, de modo a conscientizar o aluno de que sua produção linguísti-

O que o autor entende por língua viva é a língua

de fato usada pelos falantes. Já o conceito

de norma-padrão é visto sob dois aspectos “[...] de um lado, temos a norma-

padrão lusitanizante, ideal de língua abstrato, usado como verdadeiro

instrumento de repressão e policiamento dos

usos lingüísticos; do outro temos as diversas

variedades prestigiadas, usos reais da língua por parte das classes sociais

urbanas com escolaridade superior completa”

(BAGNO, 2003, p. 87).

Norma culta, de acordo com Bagno (2003, p.

51), é “[...] a linguagem concretamente

empregada pelos cidadãos que pertencem

aos segmentos mais favorecidos da nossa

população”.

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Capítulo 11Análise linguística

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ca, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação social, positiva

ou negativa (BAGNO, 2002, p. 75).

Scherre (2005, p. 66) aponta que, para a discussão do preconceito linguístico, pode-se usar resultados de pesquisas sociolinguísticas,

[...] apresentando fatos interessantes, que evidenciam que os políticos

e as autoridades brasileiras – falantes nativos do português brasileiro

– não estão simplesmente “nocauteando a concordância”, “tropeçando”

ou cometendo “gafes”, mas, sim, deixando seu vernáculo emergir [...].

Scherre apresenta uma discussão a respeito do conceito do certo e do errado em português, afirmando que não são conceitos absolu-tos, pois não há usos linguísticos melhores ou superiores a outros, “[...] existem, sim, línguas e dialetos diferentes, igualmente complexos e sis-temáticos, bem como culturas diferentes [...]. A idéia [...] da superiori-dade linguística ou [...] cultural não resiste a qualquer análise científica” (SCHERRE, 2005, p. 128). Ainda sobre a noção de certo e errado, ela evidencia que tendemos a “[...] rotular de erradas predominantemente as formas que fazem correlação estreita com classe social, mesmo que, consciente ou inconscientemente, façamos uso destas mesmas formas na fala espontânea e na escrita revisada” (SCHERRE, 2005, p. 117).

Bortoni-Ricardo (2004, p. 34), assim como Bagno e Scherre, apon-ta como compromisso da escola trabalhar a língua de forma a desfazer qualquer tipo de preconceito linguístico, advindo da noção acientífica do erro. Evidencia que as variedades linguísticas ganham prestígio em função de fatores históricos, políticos ou econômicos, já que “[...] nada têm de intrinsecamente superior às demais”. Ela salienta que a escola de-verá estar atenta às diferenças entre a cultura que os alunos trazem para a escola e a cultura da escola, conscientizando-os dessas diferenças. Res-saltamos, no entanto, que Bortoni-Ricardo reconhece a dificuldade que os professores apresentam em relação a essa questão, pois não sabem se devem corrigir os alunos ou não, que “erros” devem corrigir ou até mes-mo se podem falar em erros (Bortoni-Ricardo, 2004, p. 38). Dessa forma, a autora sugere que “[...] diante da realização de uma regra não-padrão pelo aluno, a estratégia do professor deve incluir dois componentes: a identificação da diferença e a conscientização da diferença” (Bortoni-Ricardo, 2004, p. 42). A conscientização implica que o aluno passe a mo-nitorar seu próprio estilo, para adequá-lo às situações exigidas.

Como os que a autora analisa, especialmente sobre o fenômeno da concordância no português brasileiro e europeu, em textos publicados na mídia impressa.

A autora faz uma reflexão, ao longo de todo o livro, sobre formas linguísticas veiculadas pela mídia impressa que “fogem” do padrão culto (que a própria mídia veicula de forma bastante preconceituosa, como é o caso da jornalista Dad Squarisi no Correio Braziliense, citado por Scherre), no entanto, como não são formas associadas a classes sociais menos privilegiadas, não são vistas como “erradas”.

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Metodologia de Ensino

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Bortoni-Ricardo ressalta que, ainda que cheguem à escola com-petentes em Língua Portuguesa, os alunos irão entrar em contato com novos domínios de interação social, por isso terão de “[...] ampliar a gama de seus recursos comunicativos para poder atender às convenções sociais, que definem o uso lingüístico adequado a cada gênero textual, a cada tarefa comunicativa, a cada tipo de interação” (2004, p. 75). Essa ampliação de recursos comunicativos, de acordo com a autora, deve en-contrar lugar privilegiado na escola.

Silva (2004, p. 27-28) atenta para dois fatos essenciais no ensino de língua: o de que as línguas naturais são fenômenos históricos, por isso estão em contínuo processo de fazer-se e refazer-se e o de que “[...] o en-sino-aprendizagem de língua materna se define em um processo mútuo de intercâmbio linguístico entre senhores da matéria”, ou seja, o aluno também é detentor dos conhecimentos a serem trabalhados na discipli-na de Língua Portuguesa. Ela salienta que a escola desconsidera o saber linguístico diferenciado que os alunos possuem no intuito de levá-los a dominar o padrão culto idealizado, “[...] o que só alcançam, havendo exceções, claro, alguns daqueles que já vêm das camadas sócio-culturais em que esse padrão é a base da comunicação cotidiana, apenas com di-ferenças próprias aos registros de formalidade” (SILVA, 2004, p. 29).

A proposta de Silva é a de que o ensino leve em consideração o todo da língua e não apenas algumas de suas formas, socialmente privilegia-das. Só assim, conforme a autora, o indivíduo desde que começa a re-fletir sobre a língua terá consciência de que “[...] sabe falar a língua que fala todo dia, mas que precisa saber mais sobre ela e que esse saber pode crescer com ele por toda a sua vida” (SILVA, 2004, p. 35). Para que o alu-no perceba que, mesmo antes de iniciar o processo de escolarização, já domina sua língua materna, a autora sugere que o ensino-aprendizagem tenha como ponto de partida a oralidade, “[...] a introdução da escrita e da leitura será integrada ao currículo escolar, mais tarde ou mais cedo, a depender do tipo de população que a escola atenda” (SILVA, 2004, p. 76). Em relação “[...] ao aperfeiçoamento da língua materna para novos usos, a escola deverá ter uma organização curricular diferenciada para melhor atender à diversidade sociocultural e sociolingüística da popu-lação a que serve” (SILVA, 2004, p. 76). Para ela, no momento em que

Bortoni-Ricardo (2004, p. 75-76) associa três

parâmetros à questão da ampliação desses

recursos: grau de dependência contextual,

grau de complexidade do tema abordado e

familiaridade com a tarefa comunicativa.

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Capítulo 11Análise linguística

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o professor trabalhar com as variantes que ocorrem na fala brasileira, distinguindo as “[...] mais salientes e socialmente estigmatizadas, para, sem desprestigiar as segundas, selecionar ambas, a fim de treinar o uso formal falado e os usos escritos de seus alunos” (SILVA, 2004, p. 115), estará contribuindo para “[...] uma efetiva virada no ensino da Língua Portuguesa no Brasil” (SILVA, 2004, p. 115).

Bakhtin também discute a questão da variação linguística. Em “O Discurso no Romance”, tendo como foco a linguagem literária, o au-tor assume que a língua como meio vivo é plural tanto na perspectiva ideológica quanto na social. Admite que há estratificação na língua, de-terminada pelos gêneros, quando afirma que “[...] estes ou outros ele-mentos da língua adquirem o perfume específico dos gêneros dados: eles se adéquam aos pontos de vista específicos, às atitudes, às formas de pensamento, às nuanças e às entonações desses gêneros” (BAKHTIN, 1990 [1920-1924], p. 96).

Os gêneros fazem usos característicos da língua, sendo assim, apre-

sentam estilos diferentes. Para Bakhtin, a variação linguística está

ligada às diferentes esferas da atividade humana. Os usos da língua

serão tão variados quanto as possibilidades de interações humanas.

O autor evidencia a questão da adequação do modo de dizer do fa-

lante ao modo de dizer da situação de interação, ou seja, o gênero

condicionando as escolhas linguísticas.

Bakhtin salienta a influência que a história, a idade, o estrato so-cial, a escolaridade, entre outros fatores, exercem sobre a língua. Nessa perspectiva,

Cada época histórica da vida ideológica e verbal, cada geração, em cada

uma de suas camadas sociais, tem sua linguagem: ademais, cada idade

tem a sua linguagem, seu vocabulário, seu sistema de acentos espe-

cíficos, os quais, por sua vez, variam em função da camada social, do

estabelecimento de ensino (a linguagem do cadete, do ginasiano, do

realista, são linguagens diferentes) e de outros fatores de estratificação

(BAKHTIN, 1990 [1920-1924], p. 97-98).

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Metodologia de Ensino

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Bakhtin ressalta também a importância dos fatores externos na análise do discurso. Segundo ele, “estudar o discurso em si mesmo, ig-norar a sua orientação externa, é algo tão absurdo como estudar o so-frimento psíquico fora da realidade a que está dirigido e pela qual ele é determinado” (BAKHTIN, 1990 [1920-1924], p. 99). Dentre os fatores externos, o autor destaca profissão, gênero, geração, idade, intenção, como podemos constatar quando afirma o seguinte:

Todas as palavras evocam uma profissão, um gênero, uma tendência,

um partido, uma obra determinada, uma pessoa definida, uma geração,

uma idade, um dia, uma hora. Cada palavra evoca um contexto ou con-

textos, nos quais ela viveu sua vida socialmente tensa; todas as palavras e

formas são povoadas de intenções (BAKHTIN, 1990 [1920-1924], p. 100).

Ao longo das discussões de Bakhtin, fica evidente a ênfase dada à variação estilística da língua: de acordo com a situação de interação o mesmo indivíduo vai se utilizar de uma determinada variedade da lín-gua. A citação a seguir parece evidenciar a visão do autor:

Deste modo, o camponês analfabeto, nos confins do mundo, ingenu-

amente mergulhado em uma existência que considerava ainda imóvel

e inabalável, vivia no meio de vários sistemas linguísticos: ele rezava a

Deus em uma língua (o eslavo eclesiástico), cantava suas canções em

outra, falava numa terceira língua no seio familiar, e quando ele come-

çava a ditar ao escrivão uma petição para as autoridades ele o fazia em

uma quarta língua (a língua oficial correta e “cartorial”). Todas elas eram

línguas diferentes, até mesmo do ponto de vista de índices abstratos

sociais e dialetológicos. [...] cada uma delas estava indiscutivelmente no

seu lugar, e o lugar de cada uma não podia ser discutido (BAKHTIN, 1990

[1920-1924], p. 102).

Mobilizar as capacidades e os conhecimentos da língua que o alu-no já possui torna-se imprescindível para que ele se sinta encorajado a novas descobertas e a querer aprender não somente aquilo que é ime-diatamente necessário e importante, mas também o que pode ser útil e importante em outras situações sociais de uso da língua.

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Capítulo 12O ensino da gramática

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12 O ensino da gramática

Certamente você deve estar se perguntando: Ensina-se leitura, produ-

ção textual, a fazer análise linguística; e a gramática, como fica?

Após a conclusão do Ensino Médio, alguns estudantes buscam o in-

gresso em um curso de nível superior e outros a sua inserção no mer-

cado de trabalho. Essa passagem se dá, na maioria das vezes, por meio

de concursos ou processos seletivos que incluem prova de Português.

E esses processos seletivos exigem conhecimentos gramaticais.

A concepção de língua que sustenta os encaminhamentos metodoló-

gicos propostos nesse curso a compreende como forma de interação,

como ação entre interlocutores reais que se constituem na e pela lin-

guagem. Diz-se que se ensina o que é necessário e que vem ao encon-

tro das situações sociais de uso da língua. E o que ensinar de gramática?

E como?

Primeiro é preciso ter clareza sobre o que se entende por gramática.

Um conceito simples e que tem dado conta do que entendemos por gramática é o que a considera um conjunto de regras que especifica o funcionamento de uma língua. Isso significa dizer que toda língua tem uma gramática e que os falantes, de algum modo, dominam as regras da língua que falam. Caso contrário, não haveria entendimento entre as pes-soas por meio da linguagem verbal. Possenti (1996), no entanto, propõe três definições para gramática, a partir desse conceito básico, no sentido de encaminhar uma opção de ensino que contemple o conhecimento que possibilite ao falante, produtor de textos orais e escritos, usar a lingua-gem verbal nas diferentes esferas sociais de modo desejável e adequado.

Esse primeiro conhecimento de regras da língua de que falamos,

aquele que torna as pessoas capazes de se comunicarem com seus

pares e se fazerem entender e serem entendidas, ainda que não

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Metodologia de Ensino

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tenham frequentado a escola, Possenti (1996, p.69) denomina de

gramática internalizada: “[...] refere-se à hipótese sobre os co-

nhecimentos que habilitam o falante a produzir frases ou sequên-

cias de palavras de maneira tal que essas frases e sequências são

compreensíveis e reconhecidas como pertencendo a uma língua”.

Uma segunda definição de gramática apresentada pelo autor, nós a

conhecemos bem, é a de gramática normativa. Ela é comum aos

livros didáticos e às gramáticas pedagógicas. Trata-se do “conjunto

de regras que devem ser seguidas” (POSSENTI, 1996, p. 64, grifos do

autor) cujo objetivo é fazer com que os usuários da língua falem e

escrevam corretamente. A tradição escolar tem privilegiado esse en-

sino sem, no entanto, ter alcançado o êxito desejado, como já discu-

timos em unidade anterior. E uma terceira definição diz respeito ao

“conjunto de regras que são seguidas” (POSSENTI, 1996, p. 65, grifos

do autor), que é a gramática que orienta o trabalho de linguistas

– descrição e explicitação das línguas como elas são faladas –, gra-mática descritiva. Essas definições de gramática são importantes

para orientar o ensino que se deseja desenvolver.

Antunes (2003) salienta outras questões que são igualmente im-portantes. Partindo do princípio de que todo falante tem domínio de regras de funcionamento de sua língua e de que, ao usá-la, ele faz uso de enunciados aos quais subjazem conhecimentos de organização das estruturas linguísticas que são compartilhados pelos interlocutores, a autora afirma que todos têm uma gramática internalizada. Ela reforça sua posição considerando que são múltiplas as situações de uso da lin-guagem verbal e que cada uma delas requer “tipos relativamente estáveis de enunciados”, o que a faz reafirmar: não existe falante sem conhecimen-to de gramática (ANTUNES, 2003, p. 86, grifo da autora). Isso não signi-fica, porém, que os falantes saibam o que são complementos nominais, quais são as desinências verbais e assim por diante. Eles sabem as regras de uso de modo a tornar inteligíveis os textos que produzem. Por isso, diz Antunes, o necessário é ter clareza sobre o que são regras gramati-cais e o que não são regras gramaticais.

Relembrando – conceito de gênero do discurso de

Bakhtin.

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Capítulo 12O ensino da gramática

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As regras gramaticais são as orientações de “[...] como usar as uni-dades da língua, de como combiná-las, para que se produzam determi-nados efeitos, em enunciados funcionalmente inteligíveis, contextual-mente interpretáveis e adequados aos fins pretendidos na interação” (ANTUNES, 2003, p. 86, grifos da autora). São regras gramaticais aque-las referentes às concordâncias nominais e verbais, ao uso e emprego dos pronomes, ao uso das flexões verbais para indicar diferenças de modo e de tempo de ocorrência das ações, ao emprego adequado de palavras que indicam relações semânticas entre partes do texto (relações de cau-sa, de tempo, de oposição, etc.), enfim, são os saberes que garantem, como já enfatizado, que seja dito o que se deseja de forma adequada, considerando a situação de interlocução dada àquela comunicação. Em contraposição à regra gramatical, têm-se as “questões metalinguísticas de definição e classificação das unidades da língua” que “não são re-gras de uso” (ANTUNES, 2003, p. 87, grifos nossos), tais como o nome das conjunções e sua classificação, as denominações para os diferentes tipos de oração; a função sintática das classes de palavras e toda a no-menclatura constante dos compêndios de gramática. Os conhecimentos que não são regras de uso são aqueles que rotulam, dão “nome às coisas da língua” (ANTUNES, 2003, p. 87).

A autora ressalta ainda que a questão não é “[...] ‘ensinar ou não ensinar gramática’ [...] é discernir sobre o objeto de ensino: as regras (mais precisamente as regularidades) de como se usa a língua nos mais variados gêneros de textos orais e escritos” (ANTUNES, 2003, p. 88, grifos da auto-ra). Coloca-se, então, ao professor a tarefa de decidir quais regras ensinar e em que perspectiva esse ensino dar-se-á para que os objetivos de ensino da língua sejam atingidos, na perspectiva da formação de um leitor e pro-dutor de textos, consciente da importância de ampliar sempre mais sua competência discursiva, ampliando suas experiências de letramento. E, se necessário, questões metalinguísticas também serão ensinadas, desde que relevantes, contextualizadas e de algum interesse para os alunos.

Considerada a gramática internalizada do aluno, seu conhecimento implícito pode ser ampliado e enriquecido por um ensino que explicite o funcionamento desse saber internalizado, referente ao léxico, à sinta-xe, à pragmática, à gramática, ao contexto de uso da língua.

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Metodologia de Ensino

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Como mencionado em seção anterior, a atividade de análise lin-guística possibilitará o desenvolvimento do ensino referente a essas questões. Assim,

[...] pode-se dizer que a [análise linguística] é parte das práticas de letra-

mento escolar, consistindo numa reflexão explícita e sistemática sobre a

constituição e o funcionamento da linguagem nas dimensões sistêmica

(ou gramatical), textual, discursiva e também normativa, com o objetivo

de contribuir para o desenvolvimento de habilidades de leitura/escuta,

de produção de textos orais e escritos e de análise e sistematização dos

fenômenos lingüísticos. (MENDONÇA, 2006, p. 208).

Ressaltamos, portanto, que se advoga um ensino de gramática em que o professor selecione conteúdos que sejam relevantes ao desenvolvi-mento da leitura e da produção textual em curso; deve fazer uso, inclusi-ve, da metalinguagem que se fizer necessária ao saber dizer, pois a “[...] escola valoriza não apenas o ‘saber’, mas o ‘saber dizer’, [resultado] de uma prática discursiva privilegiada” cuja consequência é “[...] a maior capacidade para verbalizar o conhecimento e os processos envolvidos em uma tarefa” (KLEIMAN, 1995, p. 27).

Leia mais!

Márcia Mendonça, professora de Língua Portuguesa da Uni- Ӳversidade Federal de Pernambuco, em seu texto Análise lin-guística no Ensino Médio: um novo olhar, um outro objeto – publicado em: BUNZEN, Clécio; MENDONÇA, Márcia (Org.). Português no Ensino Médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 199-226 –, discute com mui-ta clareza questões do ensino da gramática, apresentando as di-ferenças entre a abordagem tradicional do ensino da gramática e a prática de análise linguística e a abordagem dos conteúdos na perspectiva da análise linguística. Vale a pena a leitura!

Sobre a relação entre as práticas sociais de linguagem e o en- Ӳsino e a aprendizagem da Língua Portuguesa na escola, leia o texto Preciso “ensinar” o letramento? Não basta ensinar a ler e a escrever?, de Angela Kleiman, acessando www.iel.unicamp.br/cefiel/alfaletras/biblioteca_professor/.../5710.pdf.

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Capítulo 12O ensino da gramática

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Considerações finais da Unidade E Propomos, para o fechamento desta unidade, uma reflexão sobre

como foi o ensino de gramática vivenciado por você ao longo de sua vida escolar. Discuta com seus colegas se ele foi produtivo e em que medida se relacionou com as atividades de leitura e escritura que eram realizadas em sala de aula e fora dela.

Você tem desenvolvido práticas de análise linguística com seus alunos?

Que efeitos tem observado no processo de ensino e aprendizagem?

O que tem mudado em sua prática docente a partir das questões que

vêm sendo levantadas sobre esse novo olhar para o ensino da Língua

Portuguesa?

As discussões levantadas ao longo desta disciplina de Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura não se esgotam nesta etapa do curso. Assim como anunciamos na apresentação do livro, o exercício de escrever, o exercício de ler e o exercício de ensinar, aqui tratados, entrelaçam-se e se anunciam como imprescindíveis no pensar o ensino da Língua Portuguesa e da Literatura.

Esperamos que os conhecimentos teórico-metodológicos que par-tilhamos com você o motivem a contínuas reflexões e a promover mu-danças, e que possa, em suas aulas, alcançar seus objetivos de ensino de Língua Portuguesa e Literatura de modo que os alunos desenvolvam aprendizagens mais efetivas e eficientes e com mais autonomia.

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Metodologia do ensino

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Figura 28 – Peter O’ SagaeFonte: Disponível em: <www.dobrasdaleitura.com>. Acesso em: 28 jul. 2010.

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Metodologia do ensino

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Figura 33 – Logo da FNLIJFonte: Disponível em: <http://www.fnlij.org.br/>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 34 – Bell em palavrasFonte: Acervo de Eliane Debus

Figura 35 – Alcides BussFonte: Disponível em: <http://www.clicrbs.com.br/rbs/image/4856575.jpg>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 36 – Varal literário IFonte: Disponível em: <www.unibrasil.com.br/fotos/semana_poesia1.jpg>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 37 – Varal literário IIFonte: Acervo de Eliane Debus

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Figura 39 – Capa do livro Limeriques da CocanhaDisponível em: <http://diariosdabicicleta.blogspot.com/2008/02/limeriques-da-tatiana.html>. Acesso em: 28 jul. 2010.

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Figura 41 – “Obligan a cuatro turistas a limpiar enormes graffitis que pintaron en rocas de Sierra de la Ventana” Fonte: Clarín, Argentina, de 31 ago 2007. Disponível em: <http://minicontos.blogspot.com/search/label/Am%C3%A9rica%20Latina>. Acesso em: 28 jul. 2010.

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Figura 43 – Palavras fatigadas de informar Fonte: Disponível em: < http://mamiferas.blogspot.com/2010/05/maternidade-na-midia.html>. Acesso em: 30 jul. 2010.

Figura 44 – FridaFonte: Acervo de Nelita Bortolotto

Figura 45 – CartilhaFonte: Disponível em: <http://www.sxc.hu/photo/510148>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 46 – EscritaFonte: Acervo de Isabel Monguillhott

Figura 47 – Livro: A interlocução na sala de aulaFonte: Arquivo de Nelita Bortolotto

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Metodologia do ensino

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Figura 48 – Atividade em livro didáticoFonte: MESQUITA, R. M.; MARTOS, Cl. R. Pai – Comunicação e Expressão – 5a série, 1o grau. 8. ed. reformulada. São Paulo: Saraiva, 1982.

Figura 49 – Grafite em parede de escola Fonte: Acervo de Nelita Bortolotto

Figura 50 – Livros Fonte: Arquivo pessoal de Nelita Bortolotto

Figura 51 – Livro de Magda SoaresFonte: Disponível em: <http://serfelizeserlivre.blogspot.com/2010/06/resenha-de-linguistica-linguagem-e.html>. Acesso em: 15 nov. 2010.

Figura 52 – LeiturasFonte: Disponível em: <http://sxc.hu>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 53 – Olho nas letrasFonte: Disponível em: <http://www.sxc.hu>. Acesso em: 28 jul. 2010.

Figura 54 – Gráfico: inter-relações na escrita.Fonte: adaptado do gráfico de Geraldi (1991, p.161) sobre “as condições necessárias à produção de um texto”.

Figura 55 – Capa do livro Uma escola assim eu quero para mimFonte: Disponível em: <http://i.s8.com.br/images/books/cover/img2/21495162_4.jpg>. Acesso em: 18 nov. 2010.