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çk- AGORA VAI! Congresso ajuda governo, empresários e trabalhadores na Nova Lei Salarial. íf^M. E AINDA: ATÉ 91, MOÇADA I Mf/ía MASSACRE EM DIADEMA! Natal Novo, Ano Novo, Carnaval Novo, festejados e felizes para todos h % ^ Cantinho ScntúneotaJ O atalho faz parte do caminho Sem atalho não tem caminho O atalho conserta o caminho E MUITO MAIS Patrões se Unem 2 Entendimento 7 Crises do Capital 16 Socialistas Vivos 20 Tudo Mudará 25 África 28

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AGORA VAI!

Congresso ajuda governo, empresários e trabalhadores na Nova Lei Salarial.

íf^M.

E AINDA:

ATÉ 91, MOÇADA I Mf/ía

MASSACRE EM DIADEMA!

Natal Novo, Ano Novo, Carnaval Novo, festejados e felizes para todos

h % ^

Cantinho ScntúneotaJ

O atalho faz parte do caminho Sem atalho não tem caminho O atalho conserta o caminho

E MUITO MAIS

Patrões se Unem 2 Entendimento 7 Crises do Capital 16 Socialistas Vivos 20 Tudo Mudará 25 África 28

Relatório Reservado -18.11.90

Empresas se unem para negociar salário livremente *ss^ ia

Isabel Pacheco

A Confederação Nacional da In- dústria (CNI) está montando rapida- mente o cenário para introduzir a livre negociação salarial entre empresas e trabalhadores. Empresários das áreas têxtil, química, petroquímica, farma- cêutica, alimentícia, metalúrgica, mo- biliária e da construção, coordenados pelo Departamento de Relações do Trabalho da CNI, estão fazendo há um ano encontros setoriais para iden- tificar problemas e traçar estratégias de atuação em futuros acordos coleti- vos de trabalho.

Ainda este ano haverá um encontro nacional desses empresários - todos grandes empregadores - para estabe- lecer pontos comuns de atuação. No primeiro semestre de 1991, será feita nova reunião, desta vez para avaliar concretamente obstáculos e facilida- des no caminho do regime da livre negociação. De acordo com as pro- postas iniciais, só o salário mínimo se- ria fixado pelo governo, como forma de proteger empregados que não têm representação sindical.

Sigilo. Todos os encontros vêm sendo realizados em segredo. Em cada um, a participação tem sido de apro- ximadamente 100 pessoas, entre em- presários e representantes de federa- ções e sindicatos patronais, além do pessoal que está sendo treinado para atuar durante as negociações salariais.

O coordenador do grupo' químico, petroquímico e farmacêutico, José Eduardo Lima, informou ao RR que é ponto comum a todos os segmentos

empresariais evitar ao máximo a in- termediação dos tribunais do trabalho na resolução de impasses entre patrões e empregados.

É também preocupação comum im- pedir a adoção da data-base unificada para reajustes salariais, reivindicação que hoje se tomou presente em todas as discussões e dissídios. No entender dos empregadores, a pluralidade é mais fácil de administrar, pois evita o fortalecimento dos sindicatos e das centrais sindicais.

Preparação. A CNI vem promo- vendo diversas iniciativas para infor- mar e conscientizar os empresários

sobre a importância dos assuntos tra- balhistas. Além destes encontros na- cionais, foi montado recentemente um banco de dados com todas as informa- ções sobre acordos coletivos, dissí- dios e ocorrências trabalhistas em geral.

O sistema de informações traba- lhistas da CNI envia por computador o material de interesse das federações, que o repassa aos sindicatos ou nego- ciadores. A expectativa dos organiza- dores dos encontros é que, se a livre negociação for adotada, haverá apro- ximadamente mil acordos trabalhistas por ano.

-Da era do tacape ao computador- "Houve um tempo em que os em-

pregados levavam computador para as audiências de conciliação. Os em- presários continuavam na era do ta- cape." A ilustração é de um empre- sário da área têxtil e serve para exemplificar o quanto a categoria se sentia atrasada e sem articulação nas questões trabalhistas, até que opta- ram pela organização.

"A cada contato com os sindica- listas durante as negociações, sen- tíamos que eles evoluíam até cultu- ralmente, colocando-se em situação de igualdade com os representantes dos empregadores", diz outro líder patronaí.

Os industriais nunca deram real importância às relações trabalhistas. Ocupados com seus negócios, no máximo dividiam o tempo para cui- dar dos outros assuntos, entre os quais os entendimentos com os em- pregados. Enquanto isso, "os em-

pregados se organizaram, foram treinados no Brasil e no exterior e se tornaram profissionais em sindica- lismo", diz a mesma fonte.

Hoje, a articulação empresarial e o treinamento de negociadores pa- tronais refletem a importância que a questão vem alcançando. José Eduardo Lima lembra que o último encontro do seu setor foi realizado em Porto Alegre, às vésperas de um feriado de outubro, e, ainda assim, teve presença de mais de 100 partici- pantes de todos os estados.

O coordenador do grupo têxtil, Temístocles Pinho, admite que há grande necessidade de informar o empresariado, a fim de derrubar ta- bus e preconceitos. É consensual na categoria, por exemplo, a defesa da livre negociação, que, a seu ver, só poderá existir de fato quando não se referir exclusivamente a salários, mas a toda a economia.

ASSINATURAS: Preços válidos até 31.12.90 Individual Cr$ 1.680,00(6 meses) eCr$ 3.360,00(12 meses) Entidades sindicais e outros Cr$ 2.000,00(6 meses) eCr$ 4.000,00(12 meses) Exterior (via área) US$ 30,00 (6 meses) e US$60.00 (12 meses) O pagamento deverá será feito em nome do CPV - Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro em che- que nominal cruzado, ou vale postal DESDE QUE SEJA ENDEREÇADO PARA A AGÊNCIA DO CORREIO IPIRANGA - CEP 04299 - Código da Agência 401901

QUINZENA - Publicaçáo do CPV - Caixa Postal 42.761 - CEP 04299 - Sáo Paulo - SP Fones (011)571 7726 ou 571 2910

A QUINZENA divulga as questões políticas de fundo em debate no movimento, contudo colo- ca algumas condições para tanto. Publicamos os textos que contenham teses e argumenta- ções estritamente políticas, réplicas que este- jam no mesmo nível de linguagem e compa- nheirismo, evitando-se os ataques pessoais. Nos reservamos o direito de divulgarmos ape- nas as partes significativas dos textos, seja por imposição de espaço, seja por solução de reda- ção.

Quinzena

Idéias via Embratel Todas as Jltimas terças-feiras de

cada mês, das 9b às 1 Ih, federações e sindicatos patronais ocupam o auditó- rio da Embratel, ne Rio de Janeiro, para dar seqüência ao programa de técnicas de treinamento para negocia- dores na área trabalhista.

Tendo como mediador dos debates o locutor da TV Manchete Eliakim Arailjo, o programa é transmitido si- multaneamente para 35 auditórios da Embratel em todo o país, muitos dos quais no interior, e tem uma platéia estimada em 1 mil 800 pessoas. Após a palestra do convidado, são feitas perguntas e o esclarecimento é dado de forma imediata.

Os encontros são gravados em fitas, que são distribuídas a todas as federa-

ções de indústrias. Estas convocam sindicatos filiados e promovem deba- tes sobre o tema tratado. Com isso, multiplica-se de maneira significativa o efeito da iniciativa. A Confederação Nacional da Indústria, responsável pelo programa, estima que cada de- bate alcance até 10 mil pessoas.

Inúmeras empresas têm presença obrigatória no curso de treinamento, destacando para participar o pessoal que está sendo treinado para a função de negociador. São escolhidos, em ge- ral, os casos mais recentes de acordo e dissídios coletivos, nos quais os parti- cipantes relatam sua experiência e a forma de condução das negociações. Com freqüência, são convidados es- pecialistas no assunto. Em breve, o programa de TV Executiva da CNI estará completando um ano.

Nas sugestões, reduzir a força sindical

O RR selecionou alguns dos principais trechos da proposta do grupo têxtil que, no momento, está mais avançado nos estudos sobre negociações coletivas. O setor é o segundo maior empregador do país, por utilizar mão-de-obra intensiva, só perdendo para a construção civil.

Política salarial • Usar a sensibilidade das chefias

para reduzir os efeitos de greves. Tomar decisões firmes e seguras: em caso de greve política, só negociar com retomo ao trabalho ou solução pela Justiça; não pagar os dias parados; defender o pa- trimônio e permitir acesso aos que qui- serem trabalhar.

• Negociar intensamente para conse- guir consenso. Não o conseguindo, pro- vocar o rápido ajuizamento do dissídio.

• Priorizar a contrapropaganda, mos- trando como a situação é difícil para to- dos com as constantes mudanças nas leis salariais.

• Evitar o envio prematuro de diver- gências aos tribunais. A negociação de- ve ser exaustiva, tentando mostrar aos empregados que greve política não se justifica. Intensificar a comunicação com os empregados que resolverem traba- lhar, na tentativa de esvaziar o movi- mento "de dentro para fora".

• Dar passos em direção à livre ne-

gociação, definindo políticas de médio prazo com os sindicatos de trabalhado- res, desde que inexista definição oficial.

• Defender a livre negociação, com legislação que regule apenas o salário mínimo, para garantir os empregados não representados por sindicatos.

• Transformar as comissões nacio- nais de estudos e assessoria em rela- ções trabalhistas e sindicais em uma es- pécie de Dieese patronal.

• Manter a pluralidade de datas- base, pois a unificação provocará acú- mulo de pressões e mobilização na mesma época, fortalecendo as centrais sindicais. A pluralidade é mais adminis- trável e evita o fortalecimento dos sindi- catos.

Justiça do Trabalho e livre'nego- ciação

• Sensibilizar a Justiça do Trabalho para julgar de acordo com a lei, evitan- do interpretações forçadas.

• Levar ao conhecimento dos juizes as informações fundamentais para o julgamento do processo. Subsidiá-los com dados que desconheçam. Criar um lobby positivo. Conversar com os juizes.

• Utilizar-se de lobby positivo iunto ao Tribunal Regional do Trabalho, atra- vés de profissionais competentes, dando aos juizes acesso a dados fundamentais para o julgamento dos processos.

Trabalhadores

Política social • Privilegiar o salário direto, deses-

timulando o pagamento de salário in- direto. 0 Estado deve cumprir suas fun- ções sociais.

• Vincular prioritariamente salários indiretos, quando concedidos, a ques- tões de saúde e educação, que dão tranqüilidade ao trabalhador.

• Estudar mecanismos de distribui- ção, aos empregados, de lucros da empresa, para criar uma relação de parceria.

Nova política industrial • Administrar de forma participativa.

Favorecer a criação de mecanismos adequados para participação dos em- pregados na elaboração de alternativas operacionais e em seus resultados. Não confundir isso com co-gestão. Trata-se de modernizar a gestão, ou seja, esti- mular trabalhos em equipes, como im- plementação de centros de controle de qualidade e outros. Engajar e motivar o empregado no processo produtivo da empresa.

• Manter permanente comunicação entre empregados e empresas, para aumentar a transparência dos dois la- dos. Fortalecer os vínculos.

• Fazer gestão junto à CNI para me- lhorar as condições das escolas técnicas do Senai.

Comissão de negociação • Dotar os membros da comissão de

amplo conhecimento em sua área, com domínio de técnicas de negociação.

• Desenvolver o profissionalismo da negociação. Características pessoais: principalmente bom senso, equilíbrio emocional, perspicácia, tenacidade, po- der de verbalização.

• Promover e patrocinar encontros para profissionalização.

Estratégias de negociação • Em conjuntura de recessão eco-

nômica, envidar esforços na manuten- ção do nível de emprego, divulgando internamente essa proposta. Evitar confronto e desgaste de imagem. Evi- denciar preocupação social.

• Desenvolver o aspecto social e produtivo da empresa, contribuindo para melhorar a qualidade de vida do trabalhador. Essa postura deve ser adotada em períodos de crescimento e de recessão.

OS TRABALHADORES E O MOVIMENTO SINDICAL NO

BRASIL

Este livro, cm linguagem popular, valoriza a experiência histârica e intelectual da classe trabalhadora.

É um iaslrumeatocoletivo para que acUssc trabalhadora rcclaborc sua proposta política de classe. É um desafio para todos os que, durante anos, foram uma vanguarda intelectual, que ajudou a construir o avanço da ciasse trabalhadora. Rever metodologia, conteúdos e linguagem, para que a democracia se torne cnftm realidade para os trabalhadores, vencendo a divisão entre mt clcctuais e operários.

Este 1í\TO coloca em discussão a história da luta de classes ao Brasil e a relação entre os trabalhadores e sua Lideranças ou vanguardas.

A Venda no: • C.P.O Nacional

Av. Pres. Kennedy 1861/08 CEP 25020 - Duque de Caxias - RJ

• CAT Caixa Postal 699 CEP 30.160-Belo Horizonte - MG

• CPV

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Conjuntura - Boletim do Sindicato dos Químicos de São Paulo - boletim n'38-22.11.90

CONJUNTURA, GREVES E PODER ECONÔMICO SETORIAL

O caso das greves dos trabalhadores químicos e farmacêuticos de São Paulo

1. As agruras econômicas do governo Há onze meses a Frente Brasil Popular perdeu as eleições

presidenciais, Surgiu um Indiana Jones que alimentou esperan- ças de grandes setores da sociedade, principalmente dos mais atrasados. Era uma espécie de esperança messiânica. "Os problemas deixarão de existir", diziam uns. "Seremos salvos", diziam famintos, analfabetos e descamisados.

Aqueles que votaram no Lula, embora sem que deixassem de ser felizes, ficaram angustiados e preocupados com o que poderia acontecer. E aconteceu! Na posse do governo, veio um oacotaço que rompeu com inúmeras oromessas de campanha. O dinheiro foi congelado, principalmente dos aplicadores na poupança; uma política fiscal e monetária foi Implantada; salários congelados, etc. Um objetivo central passava a ser teimosa- mente buscado pelo governo, ou seja, reduzir a inflação a qual- quer custo, mesmo que esse custo fosse o social.

Paralelamente ao tecnicismo do pacote econômico, o gover- no montou uma estrutura para combater, de maneira sofisticada, todas as formas organlzativas e contestatórias existentes na sociedade civil. O movimento sindical foi colocado, de certa ma- neira, na defensiva e não conseguia trabalhar na mobilização dos assalariados. Reivindicações históricas do movimento ope- rário e sindical foram demagogicamente cedidas, como por exemplo, a eliminação do imposto sindical. Essa ofensiva do governo burguês de Collor desnorteou, infelizmente, até setores combativos do movimento sindical. Os exemplos estão af, es- tampados nos jornais.

O quadro conjuntural porém foi se modificando. A redução da inflação, que segundo a ministra da economia, cairia para 3% em julho e depois desapareceria, não aconteceu. Isso porque toda tática adotada pelo governo para combater a inflação ba- seou-se numa política monetária com a seguinte estratégia:

- Tira-se o dinheiro do mercado, enxugando a liquidez e com isso força-se o consumo a cair. Com um menor consumo, os preços não são reajustados e a inflação cai.

Esse método para fazer cair a inflação já havia sido aplicado na época do ditador Castelo Branco, e funcionou. Só que na- quele tempo, a ditadura contava com o auxflio das baionetas. Com o governo Collor, que por enquanto não se atreveu a fazer uso das Forças Armadas (num pafs capitalista moderno isso não poderia acontecer), essa teoria não funciona.

Enfim, houve apenas uma diminuição grande no poder de compra dos salários, pois os preços continuam a subir, embora em menor ritmo (veja o esquema ao lado).

No momento há um desespero incontido na área econômica do governo. Para justificar a ineficácia da política econômica pa- ra conter a inflação, começa-se um tiroteio verbal contra os pro- váveis culpados. Segundo o governo, os três principais respon- sáveis pela inflação são: primeiro, os oligopólios e cartéis por não quererem reduzir suas margens de lucro; segundo, os sin- dicatos por quererem reposição salarial; e terceiro, a crise do Golfo Pérsico e os preços agrícolas.

Não vamos nos iludir e achar que o pacote econômico e o 'projeto modernizante" do governo se acabou. Do ponto de vista do tecnicismo econômico, o governo ainda tem alguns trunfos para reverter esse quadro negativo. Existem ainda espaços pa- ra a atuação do Banco Central na área de política monetária, como há chances de reedição de outro pacote com cunho social distributivista, congelando preços.

aco. CENTRAL ENXUGAO MERCADO

i MÍNOS LIQUIDEZ

l

JUROS SOBEM

4 EMPRESAS FATFM EMPRÉSTIMOS COM JUROS AUltS

REPASSAM CUSTOS FINANCEIROS PAKAOS PROOUIXJS

*

MAIS INFLAÇÁO

REDUZEM FROOUÇÀO PARA REDUZIR CUSTOS

^ MAIS DESEMPREGO

\ t « M f 1

FBCESSÀO COM OiFUÇiO

4 ESTAGFUÇÃO

2. A retomada do sindicato-movimento Nessa conjuntura econômico/política, com vários fatores im-

previsíveis, começa a acontecer algo positivo do ponto de vista da classe operária. As camadas assalariadas, mesmo aqueles setores que votaram no Collor, começaram a se mobilizar. As intervenções do governo no controle das instituições democráti- cas via cooptação, pacto, etc. já estão se esgotando. A questão social está falando mais alto do que a demagogia.

O movimento grevista dos trabalhadores químicos e farma- cêuticos de São Paulo, nessa última campanha salarial, é um reflexo dessa retomada. Alguns pontos que podem servir de re- flexão: a) a situação de arrocho salarial implantada pelo pacote Collor é

tão gritante que nem o desemprego, o medo e as ameaças evitaram que greves ocorressem;

b) algumas empresas chegaram a dar reajustes na véspera da greve para conter o ímpeto dos assalariados. Alguns índices de reajuste, no mês de outubro, foram superiores a de meses anteriores, mas mesmo assim aconteceu a prevê:

c) a maioria das greves aconteceu oe dentro para fora das em- presas. Não foram forçadas pelo Sindicato. Os assalariados apenas acataram a decisão da assembléia. Um ponto merece destaque no último movimento grevista, ou

seja, a relação entre a política de formação e organização de

mmmmmmm Quinzena

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Trabalhadores

base adotada pelo Sindicato e as greves. No mês de junho pas- sado, a diretoria do Sindicato iniciou um acompanhamento dos trabalhadores através de cursos de formação sindical. Não fo- ram aqueles tradicionais cursos, tipo "pacote", que acontece uma vez apenas, mas sim cursos com acompanhamento, com visitas às casas, com milítância. Depois de cada cursos os tra- balhadores foram assistidos pela diretoria e assessoria sindicai. Pode-se observar uma nítida relação entre as fábricas em greve e os cursos de formação (veja tabela). Isso fez com que as gre- ves fossem mais ricas do ponto de vista da consciência de classe. È a formação do homem/mulher operário (a) votada para a liderança da ciasse dentro do sindicato movimento.

% de Trabs. Participantes

Fábricas dos Cursos

Abbott 19,1% Aricanduva 3,1% Clrumédica 2,8% Catamaram 6,0% Brasmédica 1,0% Sardalma 2,4% Pulvitec 0,5% Bltelli 3,1% Billi 0,8% Aquatec 1,2% Ciba Geigy 1,6% Farmasa 7,3% Baldacci 9,8% Colombina 2,1% Parker 3,6% Vedat 8,7% Pílot 11,7% Biolab 2,2%

A greve no setor foi altamente prejudicial ao patronato, pois, por um lado, o setor na atual conjuntura, acumula estoques an- tes das férias do fim do ano e dos balanços. Por outro lado, pela estabilidade econômica do setor, segundo informações do IB- GE. Se compararmos o último trimestre (jul/ago/set) com o pri- meiro trimestre do ano, vamos observar uma ligeira vantagem desse último trimestre. O pior período do setor foi aquele que se seguiu ao pacote econômico de março.

EVOLUÇÃO DO SETOR QUÍMICO (Base: média de 1981 iguala 100)

Jun 116,19 Jul 123,92 Ago 117,94 Set 119,24

Jan 118,04 Fev 121,97 Mar 117,87 Abf 92,45 Mal 116,01

Fonte: IBGE

Empresas que fizeram greve: • CIBA GEIGY: Paralisação de 6 dias

Acordo: negociando. • ICI: Paralisação de 3 dias

Acordo: negociando. • AQUATEC: Paralisação de 1 dia

Acordo: funcionários negociaram o não desconto do dia para- do.

• COLOMBINA: Paralisação de 2 dias Acordo: voltaram sem fechar acordo

• PULVITEC: Paralisação de 14 dias Acordo: em negociação.

Hoje, os empresários contam com sofisticados recursos para cooptar e alienar os trabalhadores. As técnicas japonesas e americanas são cada vez mais utilizadas, como por exemplo, CCQ, Kanban/Just-in-Time, TQC, TOC, políticas participativas, etc. O Sindicato, embora contando com escassos recursos, po- de ter um poder de fogo bem maior unificando ciência e tecnolo- gia. Sabemos que os patrões jamais vão poder satisfazer as

necessidades de seus trabalhadores, pois teriam que reduzir significativamente suas margens de lucro. As contradições entre capital e trabalho, entre dominado e dominante, entre o justo e o injusto, etc. Vai ser uma constante. O sindicato-movimento não precisa inicialmente confrontar o poder patronal, expor sua militáncia, mas sim formar e preparar seus trabalhadores para que conscientemente exerçam seu poder a partir da conspira- ção e do exercício coletivo de seus direitos.

3. As greves da Campanha Salarial 1990 Como o Sindicato dos Trabalhadores Químicos e Farmacêu-

ticos de São Paulo engloba vários setores produtivos, o movi- mento grevista foi diferenciado, sendo maior ou menor neste ou naquele setor. A seguir apresentamos uma análise das greves da última campanha salarial por setores econômicos da catego- ria.

a) Setor químico No setor químico aconteceram greves nas seguintes empre-

sas: Giba, ICI, Aquatec, Colombina e Pulvitec. Para um setor que representa 16.500 trabalhadores, 13,9% aderiram ao movi- mento grevista.

b) Setor farmacêutico O setor farmacêutico não depende dos ciclos econômicos

para manter sua margem de rentabilidade. Fala-se, em econo- mia, que o setor é inelástico. O resultado do setor farmacêutico neste ano tem sido só de crescimento. No mês de setembro, o segmento obteve uma alta superior a 7%.

A greve no setor que atingiu mais de 16% de um total de 13,1 mil trabalhadores foi profundamente prejudicial aos patrões. Daí a atitude de empresas como a Abbot, em acionar a polícia para tentar conter a greve. Se a empresa considera a greve como um caso de polícia isso indica que não só ela está atrasada com relação às novas políticas de administração de pessoal, como também sente-se prejudicada na política de acumulação de ca- pital.

EVOLUÇÃO DO SETOR FARMACÊUTICO (Base: média em 1981 igual a 100)

Jan Fev Mar Abr Mai

113,29 Jun 103,42 Jul

105,45 Ago 72,30 Set 94,60

106,64 111,11 117,59 124,37

Fonte: IBGE

Empresas que fizeram greve: • ABBOTT: Paralisação de 6 dias

Acordo: em negociação • BIOLAB: Paralisação de 2 dias

Acordo: piso adm: Cr$ 27.000,00 e ef, Cr$ 30.000,00 - 51% sobre o salário de outubro, reposição de no mínimo 80% das perdas do trimestre a partir de 1.11.90. Os dias parados serão descontados em duas parcelas em novembro e dezembro.

• CIRUMEDICA: Paralisação de 4 dias Acordo: 209% sobre março mais 3,76% sobre novembro para receber em dezembro. Aumento real 10% sobre os salários que em dezembro corresponderem a até 49.594,00 para rece- ber em janeiro. Os dias parados serão descontados em no- vembro e dezembro. Estabilidade 80 dias.

• BILLI: Paralisação de 1 dia Acordo: piso ef. Cr$ 30.000,00. Reajuste acordado pela Fiesp e Sindicato mais 10% e mais inflação de novembro em de- zembro. O dia parado poderá ser compensado.

• FARMASA: Paralisação de 15 dias Acordo: piso ef. Cr$ 25.000,00. Reajuste 170% sobre março mais 3,7% sobre novembro. Dias parados: uma parte será compensada em 4 sábados e o restante será descontado em três vezes - dez, jan e fev. Não serão descontados os domin- gos e feriados.

Quinzena Trabalhadores

• BRASMÉDICA: Paralisação de 7 dias Acordo: piso adm. Cr$ 21.500,00 e ef. Cr$ 23.500,00. Rea- juste de 180% sobre março mais 5,63 sobre novembro. Os dias parados, 4 serão pagos pela empresa e 3 serão compen- sados. Estabilidade 17 dias.

• BALDACCI: Paralisação de 6.11 à 21.11 - última posição 21.11 Acordo: em negociação.

c) Setor de cosmético: O seamento de cosméticoa^niclassiíicâcão do IBGE, abar-

ca perfumaria, sabões e velas. É um segmento que depende dos ciclos econômicos mas de maneira inversa, ou seja, quanto maior for a crise e o processo recessivo, mais ele cresce. Por exemplo, foram os setores de cosmético, de bebidas e fumo, os únicos de março. O segmento sofreu uma pequena queda em abril e depois voltou a crescer.

Uma greve no setor de cosmético, nesse período que ante- cede as férias de verão, seria drástica para a economia das empresas, pois neste momento elas estão em fase de monta- gem de estoques para atender uma maior demanda em dezem- bro e janeiro.

Na categoria químico/farmacêutica de São Paulo, estão 7.500 trabalhadores no setor de cosmético. Nenhuma empresa parou nessa campanha salarial de 1990.

Nas grandes empresas de cosméticos, a ofensiva do patro- nato foi grande, como por exemplo, a Bozzano, Avon, Niassi e Monange.

SETOR DE COSMÉTICOS (Base média de 1981 igual a 100)

Jan Fev Mar Abr Maí

163,37 Jun 159,12 Jul

150,30 Ago 114,73 Set 169,03

173,02 174,36 177,18 171,35

Fonte: IBGE

d) Setor Plástico A produção de material plástico segue a evolução do setor

qufmico/petroqufmico. Esse segmento ocupa uma posição es- tratégica na cadeia produtiva, pois, dele depende parte da pro- dução do setor petroquímico na oferta de matéria prima e na ou- tra ponta um leque amplo de consumidores que vai desde os fa- bricantes de brinquedos até a indústria automobilística e aeroes- pacial.

SEGMENTO PLÁSTICO (Base: média de 1981 Igual a 100)

Jan Fev Mar Abr Mai

131.30 Jun 123,87 Jul

111,16 Ago 76,24 Set

110,46

120,21 131,35 129,75 126,00

Fonte: IBGE

O segmento plástico na categoria químico/farmacêutica de São Paulo é pequeno pois atinge apenas a região de Ta- boão/Embú. São apenas 1.250 trabalhadores. A greve atingiu, parte da Vedat e a Catamaran, o que representou cerca de 9% do setor. Empresas que fizeram greve: • VEDAT: Paralisação foi de apenas uma hora de greve. • CATAMARAN: Paralisação de 2 dias

Acordo: em negociação

e) Tinturarias O IBGE não publica informações separadas para o setor de

tinturarias. Esse setor depende da evolução do setor têxtil, que neste ano de 1990 mantém-se estável. Isso significa também

estabilidade no setor de tinturarias.

SETOR TÊXTIL (Base: média de 1981 igual a 100)

Jan Fev Mar Abr Mal

104,79 Jun 105,18 Jul 98,92 Ago 73,08 Set 99,32

105,66 107,06 105,43 103,84

Fonte: IBGE

Em novembro, a greve de tintureiros foi muito prejudicial aos patrões do setor, principalmente nesse momento que antecede um maior consumo, com a entrada do 139 salário, festas do fim do ano e férias.

Na categoria, a greve atingiu mais de 25% do setor.

Empresas oue fizeram oreve: • CRUZEIRO: Paralisação de 8 dias

Acordo: Reajuste de 160% sobre março mais 7,67% de au- mento real em dezembro.

• TIT: Paralisação de 06.11 à 21.11. Última posição em 21.11 Acordo: em negociação.

• BITELLI: Paralisação de 14 dias Acordo: reajuste de 35% sobre novembro, o que totaliza 208% sobre março. Dias parados: 7 a empresa paga os outros 7 se- rão descontados nas férias.

• FAMOFIL: Paralisação: 3 dias Acordo: em negociação.

• FERNANDES: Paralisação no dia 6.11 apenas 2 horas e dia 7.11 após as 12hs. Acordo: Comissão de funcionários negociou. Acordo desco- nhecido.

• BRASPOOF:Paralisação 4 dias Acordo: em negociação.

• ARICANDUVA: Paralisação de 12 dias Acordo: reajuste de 180% sobre março, 26% de aumento real, o que significa 100,44 sobre o salário de outubro. Dias para- dos: 50% serão compensados os outros 50% serão descon- tados na folha de pagamento ou nas férias

f) Setor de canetas, lápis e material de escritório O setor de canetas, lápis e material de escritório passa por

uma evolução tecnológica com a redução da mão de obra dire- tamente ligada à produção. Hoje, empresas como a Pilot e Par- ker Pen, são mais linha de montagem do que propriamente fa- bricantes de canetas. As diferentes partes das canetas são pro- duzidas por outras pequenas empresas.

Atualmente, a produção dessas "montadoras" encontra-se numa fase de recesso e voltarão a uma maior intensidade em janeiro/fevereiro, período que antecede o início das aulas e tam- bém período de reposição de material de escritórb.

Naturalmente, uma greve no setor, neste final de ano, não se- ria "tão favorável" do ponto de vista dos trabalhadores. Isso nu- ma avaliação técnica, não levando em conta a realidade con- creta de cada empresa. Algumas empresas poderão ter contra- tos de exportação, maiores pedidos em carteira, etc que modifi- cariam completamente a análise acima.

Na categoria químico/farmacêutica de São Paulo estão 1.230 trabalhadores em 'montadoras de canetas" e 60% deles fizeram greve.

Empresas que fizeram greve: • PILOT: Paralisação de 2 dias

Acordo: em negociação. • PARKER PEN: Paralisação de 13 dias

Acordo: piso ef. Cr$ 30.000,00. Reajuste de 200% sobre mar- ço em dezembro. Obsj A fábrica encerrou atividade na se- gunda quinzena de novembro e passou à importação de ca- netas. _k.

Quinzena mmiímmmmmmmmm-mmm

Trabalhadores Conclusão:

Numa avaliação cuidadosa, podemos afirmar que, embora as greves nessa última Campanha Salarial tenha sido restrita a apenas 11,9% da categoria, foram greves surgidas em cima de uma política sindical conscientemente determinada. Tivemos poucas greves, porém com um alto grau de consciência. Não fo- ram greves forçadas e de fora para dentro.

Por isso, a Diretoria do Sindicato e os Trabalhadores sairam

fortalecidos após a participação concreta na vida do "sindicato movimento" contra o "sindicato estrutura". Para os próximos anos não haverá outra saída senão a construção do poder sin- dical em cada fábrica através do trabalho contínuo de formação e organização. O futuro será mais brilhante do que imaginamos.

Subseção do DIEESE São Paulo, 21 de novembro de 1990.

EXIGIMOS "QUE A CUT SAIA DO PACTO JÁ!"

Documento dos membros da direção Nacional Executiva - CUT

que discordam das iniciativas do entendimento nacional

Vivemos um momento decisivo na so- ciedade brasileira. De um lado estão os trabalhadores, amargando mais de 300% de perdas salariais. De outro estão os grandes empresários e o governo, impon- do seu projeto de recessão à ferro e fogo, com arrocho salarial, desemprego, privati- zação de estatais e desmonte dos servi- ços públicos essenciais à população, con- centrando cada vez mais a riqueza nas mãos das grandes empresas.

Nesta situação, existem dois caminhos para a classe trabalhadora: 19) Sentar à mesa do pacto, recuar não enfrentar e legitimar a política de miséria e arrocho do governo e dos patrões ou; 29resistir e enfrentar a política de recessão e arro- cho na luta, no campo e na cidade e não aceitar nenhum compromisso ou pacto com este governo e os patrões, que são os responsáveis pela crise.

Nós, dirigentes sindicais e da Central Única dos Trabalhadores, reafirmamos nossa posição de que a CUT deve se reti- rar imediatamente do Pacto Social. Esta- mos convencidos de que os trabalhadores nada tem a ganhar com isto e que o objeti- vo do governo é frear a resistência e o descontentamento popular contra a sua política.

Basta ver como o governo vem se comportando nas últimas semanas. Ao contrário de dar respostas concretas à pauta de reivindicações que foi entregue pela CUT há mais de 1 mês, o govemo Collor segue aprofundando sua política de arrocho e recessão. É o que se comprova com o anúncio de privatização da Petro- brás com a demissão de 4 mil companhei- ros da Embraer; com as milhares de de- missões e afastamentos de trabalhadores no serviço público; com a inflação beirando os 15% ao mês, num total de 350% desde março; com a quebra de várias empresas nas últimas semanas; com o repasse de 540 milhões de dólares do seguro-desem- prego para as mãos dos empresários que têm dívidas com o BNDES.

Em nenhum momento afirmamos que a CUT não deve negociar com os patrões e o govemo. Acontece que exis- te uma grande diferença entre negocia-

ção e pacto social. O governo sabe disso e se esforça para ter a CUT na mesa do Pacto, prometendo inclusive discutir qual- quer reivindicação dos trabalhadores. Para o governo Collor e os patrões o resultado final deste Pacto não é o mais importante, o que interessa é que a CUT reconheça este Pacto como legitimo e válido. A pre- sença da CUT no pacto social enfraque- ce o poder de negociações dos sindica- tos, das greves e lutas em curso, pas- sando uma nítida impressão para as ba- ses de que daqui em diante todas as questões e demandas importantes para a classe trabalhadora têm que ser nego- ciadas em tomo de um fórum de enten- dimento nacional ou pacto social e não como resultado da luta entre as classes antagônicas.

A resposta dos trabalhadores é clara. Mesmo com todo arrocho, com a ameaça de desemprego, a classe trabalhadora prefere lutar e resistir à política de fome do governo e dos patrões, segundo o DIEESE nas últimas semanas mais de mil categorias entraram em greve. Esta é a resposta concreta contra a política do go- verno Collor e dos grandes empresários.

Por isso propomos: I^Kíue a CUT se retire imediatamente

do pacto social, não só porque isto fere as resoluções do 3fi Congresso, mas também por desarmar o movimento sin- dical para a luta de resistência contra os planos do govemo. Hoje, mais do que nunca, o correto é que a nossa central convoque a classe trabalhadora a en- grossar e unificar as greves e mobiliza- ções no campo e na cidade;

2^) Que todos os dirigentes, ativistas e militantes do movimento operário e sindical exijam da maioria da executiva nacional da CUT, responsável pela ade- são da CUT às negociações sobre o pacto, a saída da mesa do pacto social, construindo uma ampla ação contra es- ta farsa que as classes dominantes chamaram de "entendimento nacional";

S9) Que os 13 pontos da pauta de rei- vindicações, aprovados na plenária de Belo Horizonte, sirvam de alavanca para a unificação das campanhas salariais e greves que estão ocorrendo por todo o país.

Assinam: Antônio Carios de Andrade Cyro Garcia Delman Ferreira Durval Carvalho Gerson Almeida José Geraldo Araújo Martiniano Cavalcante Sebastião Lopes Neto Washington Costa

A CUT e as negociações com empresários e governo Sefe membros efetivos e dois suplentes da Executiva Nacional da CUT assinaram um manifesto público, que foi assumido pela CUT Estadual de Minas Gerais, intitulado "EXIGIMOS QUE A CUT

SAIA DO PACTO JA" e tendo como sub-título 'Documento dos membros da Direção Nacional Executiva-CUT que discordam das iniciativas do Entendimento Nacional"

Apesar das "ilustres assinaturas", trata-se de um documento que falta com a verdade em diversos pontos, o que exige esclarecimentos, e presta um desserviço à classe trabalhadora, o que exige uma rigorosa critica política. Eis os principais objetivos do presente texto, que não se pretende

manifesto mas se destina a uma ampla divulgação entre os militantes do movimento sindical cutista.

Mentiras pre[udicam a classe trabalhadora

Já em seu título o documento é deso- nesto. Em nenhum momento a CUT mos- trou disposição de participar de um "Pacto Social". Ao conlrário, disputando com o governo e travando uma verdadeira batalha de comunicação com a grande im-

prensa impôs a condição de Fórum de Negociações, o que foi inteiramente aca- tado pelas partes na prática. Isso não sig- nifica que eles tenham desistido de fazer prevalecer a conotação de pacto social, no que estão sendo ajudados pelo "manifes- to" dos companheiros.

O documento inicia apresentando uma

Quinzena Trabalhadores

falsa contradição entre sentar à mesa de negociações c enfrentar a política de re- cessão e arrocho. E o que é pior, sem apontar para a classe trabalhadora como objetivamente fazer esse enfrentamento. O que só pode acontecer combinando mobilização com negociação. Se negociar implicasse em legitimar política, os viet- congs jamais se sentariam à mesa em Ge- nebra com os americanos que despejavam napalm sobre suas aldeias e campos.

A CUT repudiou de saída a "trégua entre capital e trabalho" que o ministro Bernardo Cabral tentou impor como pré- requesito das negociações. Exigiu que se iniciassem as negociações a partir das questões emergenciais, cobrando respos- ta aos 13 pontos aprovados na Plenária Nacional de Belo Horizonte. Além disso, ampliou o leque de negociações, ultrapas- sando os limites das reuniões em Brasília e encaminhou discussões paralelas com setores empresariais.

Assim, ao destacar em seu título que a CUT está participando de um PACTO SOCIAL, afirmando ainda que a Central estaria legitimando a política do governo e enfraquecendo o poder de negociação dos sindicatos, os companheiros prestam um serviço aos patrões, ao governo e à imprensa burguesa, reforçando os objeti- vos políticos da classe dominante e agre- dindo os interesses dos trabalhadores

A CUT e o Pacto Social Vamos transcrever a resolução do III

Cuncut sobre Pacto Social, encaminhada pela tese 10 e consensuada com as demais propostas políticas do congresso:

"A CUT entende que não pode haver pacto entre desiguais e que nesse tipo de pacto os trabalhadores só tem a perder. Por isso a CUT se manifesta contra qualquer tentativa de acordo ou pacto que tenha por objetivo retirar conquistas ou restringir a liberdade que a classe trabalhadora deve ter para avançar nas suas conquistas."

Exatamente porque entendemos que os agentes econômicos e sociais são desi- guais, existem problemas de repre- sentatividade das parles e a condução da política econômica está centralizada no governo federal é que insistimos desde o inicio na descaracterização de qualquer "'pacto social".

Nossa participação objetiva nesse pro- cesso é pane integrante da luta contra tentativas de restringir o direito de greve e de impor perdas salariais e retrocessos sociais à classe trabalhadora no processo de "estabilização econômica". O projeto do governo é combater inflação com arro- cho e recessão. Somos contra isso. Esta- mos contrapondo o projeto e as propostas da classe trabalhadora ao projeto e pro- postas do governo. Para isso precisamos de mobilização e de unidade de ação.

Portanto, não é verdade que esteja ocorrendo qualquer desobediência às re-

soluções do III Concut e a confusão que os companheiros fazem com seu "mani- festo" só faz ajudar o projeto Collor. ao tentar enfraquecer publicamente a posi- ção da Central e sabotar sua unidade in- terna.

Quando decidimos, após uma ampla- consulta às bases cutistas, participar da atual negociação tripartite que o governo chama de "entendimento nacional" não alimentamos ilusões; muito menos reco- mendamos desmobilização. Tampouco afirmamos que participaríamos indefini- damente desse fórum. Entrar na discus- são, aceitar propostas ou abandonar o processo tem que envolver as bases. E' assim que estamos trabalhando.

Democracia interna. Unidade e

Proporcionaiidade E' preciso unidade de todos os setores

da CUT para mobilizar a classe trabalha- dora, ampliar e unificar as greves, con- quistar o apoio da opinião pública para nossas reivindicações e derrotar a política recessiva de Collor. Esse combate se dá em iodos os espaços. Daí a inoportunida- de e irresponsabilidade de posicionamen- tos politicamente incorretos e em grande parte falsos, como aqueles que os compa- nheiros divulgaram através de seu "mani- teK)"-

A Central Única dos Trabalhadores nasceu sob o signo da democracia e da participação das bases. Temos a democra- cia direta das assembléias e a repre- sentativa (que é previamente respaldada pela democracia direta) dos congressos e instâncias de nossa entidade. Desse pro- cesso participam as categorias organiza- das em seus sindicatos e as forças políticas que se caracterizam por uma posição mais uniforme em termos programáticos, com penetração em várias categorias. Alguns trabalhadores se sentem representados por forças políticas, outros, apenas pelo sindicato.

A democracia dos trabalhadores passa necessariamente pelos foros sindicais, as instâncias, que no caso da CUT são rep- resentadas pela Executiva, Direção, Ple- nária e Congresso. Para construir uma central pluralista, que lenha ampla parti- cipação em suas instâncias, adotamos o princípio da proporcionalidade. O respei- to às instâncias e a unidade de ação se constituem em pré-requesito para manu- tenção da proporcionalidade.

Se forças políticas se articulam contra as instâncias da Central estão subverten- do a democracia que todos ajudamos a construir e ignorando a amplitude do mo- vimento sindical. Os interesses particula- res de forças políticas não podem sobrepor os interesses das organizações sindicais que são de todos os trabalha- dores. Essa postura põe em risco a pro-

porcionalidade das instâncias da CUT. Co-direção não é compatível com a pos- tura de oposição interna permanente.

A Antártica é fria As teses do 111 Concut mostraram a

existência de diversas forças políticas e temos na Executiva Nacional da CUT representantes da Articulação Sindi- cal(Arsin), Força Socialista(FS), Cut pela Base(CpB), Convergência Socialista(CS) e Partido da Libertação Proletária(PLP).

A maioria dos delegados do III Concut votou na chapa da Articulação Sindical, encabeçada por Jair Meneguelli, cuja tese, de número 10, serviu de guia nas discussões e se constituiu na essência das resoluções daquele congresso. O princípio da propor- cionalidade garantiu a participação das de mais chapas na Executiva. Convém destacar que a Força Socialista garantiu a participa- ção de um membro efetivo e um suplente apoiando as teses da Articulação Sindical e fazendo parte de sua chapa.

Em setembro de 1991 será realizado o 4üConcul, quando se renova a direção da Central e a unificação dos companheiros cm torno de um documento que procura criticar a "maioria da executiva nacional da CUT' tem objetivos eleitorais que conside- raríamos normais se mantidos dentro dos limites da ética, do companheirismo e do respeito à democracia interna.

Não é a primeira vez que esse processo de frente anti-articulação, conhecido como anlártica, acontece. Já na Plenária Nacional de Belo Horizonte, quando ten- tamos redigir um documento a várias mãos, compondo um coletivo de sete companheiros com representação de to- das as correntes, nos surpreendeu uma manobra rasteira.

A Arsin redigiu um texto, procurando contemplar as preocupações apresenta- das nas propostas de documento da CUT pela Base e da Força Socialista, e o entre- gou aos companheiros para que fizessem propostas de acréscimo e discutíssemos conjuntamente a finalização de um só do- cumento. Esperamos até o momento da votação do manifesto por uma respos- ta.Foi quando vários documentos toram defendidos um a um e, em seguida, retira- dos em função de um documento elabo- rado pelo PLP, a partir do nosso texto. Tentava-se, assim, uma manobra de con- fundir o plenário para excluir a maioria e impor uma visão minoritária e estreita como sendo do conjunto da central. Essa manobra foi fragorosamente derrotada.

Demonstramos que tal procedimento, se fosse bem sucedido, implicaria em ne- gar o princípio da proporcionalidade, apontando para uma busca de uniformi- dade ideológica que contraria o pluralis- mo da Central, base de sua construção. E' preciso que os companheiros tenham consciência que, ao tentar formar um blo-

ÍSÍSÍÍÍÍÍÍÍiSííífíííííí:

co comra a maioria, deixando de assumir e encaminhar as resoluções das instân- cias, estão negando na prática o princípio da proporcionalidade cutista.

Do mesmo modo, o processo de discus- são sobre o "entendimento nacional" está sofrendo esse tipo de influência. Um do- cumento interno de um dos setores da Cut pela Base afirmava textualmente que es- ses companheiros se constituíam em al- ternativa de direção da central e que deveriam aproveitar o "grave erro políti- co da articulação" para promover novas referências a partir dos quadros da CpB.

O documento oficial da tendência, pu- blicado no Informativo Sindical n.4 do CAIS, omite essa questão, mas a própria atuação da CpB de, apesar da diversidade de opiniões entre os setores que a com- põe, participar ativamente da formação do bloco Anli-Articulação, centralizada pelo MOSMSP, atesta que o objetivo elei- toral está presente.Lamentamos o fato, uma vez que tal uniformização violenta o pluralismo da CpB, nega a proporcionali- dade e contradiz o discurso democrático e de respeito às instâncias defendido por algumas de suas referências políticas.

A unidade de ação está sendo des truída na tentativa de combater a maioria e uni- ficar a oposição interna. Quem participa da direção não pode ter política de oposi- ção. Deve ter o objetivo de influenciar nas deliberações, contribuir na elaboração política.Portanto, essa postura anti-arti- culação é um grave erro político, que en- fraquece a Central Única dos Trabalhadores, cristalizando divisões e acirrando os ânimos da militância.

Tudo isso num momento em que o governo Collor procura fazer do sindica- lismo de resultados a sua base sindical. Assim, também na implantação da CUT e do sindicalismo classista, o resultado dessa atitude dos companheiros é desas- troso e vai ao encontro dos interesses de Collor e de Luis Antônio Medeiros.

Algumas Conclusões O vanguardismo estreito de algumas

forças políticas já foi inteiramente descar- tado pelos delegados do III Concut, que resolverem implantar a CUT como uma verdadeira organização sindical. O PLP e a CS não estão interessados nisso. A sim- ples leitura de suas teses é prova suficien- te. Esses são os maiores beneficiários de uma política anti-Arsin e no Concut de Belo Horizonte trabalharam para isso.

A maioria da CpB tem adotado uma postura diferente, com um discurso de de- mocracia e participação. Ao se deixar cen- tralizar por seus segmentos mais estreitos, aceitando o PLP como porta-voz, submete- se ao vanguardismo, descaracteriza sua plu- ralidade ideológica e cai na vala comum do oportunismo pré-eleitoral.

A Força Socialista, que participa da Exe-

cutiva da CUT graças à abertura da Arsind, que a incluiu na sua chapa em proporção bastante superior aos delegados que essa força levou ao III Concut, merece uma dis- cussão mais detalhada. A crítica aqui cabe à intransigência e ao oportunismo de uma parte da tendência que procura centralizar setores mais lúcidos, que demonstraram desde o início do processo uma concordân- cia com a negociação.

Essa centralização e o desenvolvimen- to de uma postura anti-articulação, que pede desculpas à CS quando vota com a maioria nas reuniões da Executiva, de- monstra um verdadeiro zig-zag ideológi- co e conduz os companheiros ao isolamento progressivo, lado a lado com os vanguardistas do movimento sindical.

Finalmente, é preciso discutir e avaliar seriamente a atuação da CUT na conjun- tura pós-eleições presidenciais, em que a Central mostrou habilidade e firmeza no enfrentamento do governo Collor e seu projeto autoritário e de corte neoliberal. Até aqui o saldo de nossa ação é basunte

positivo. Essa habilidade contudo não é suficiente para eliminar as dificuldades reais decorrentes da eleição de uma pro- posta política contrária aos interesses da classe trabalhadora

A conjuntura exige mobilização, ela- boração política e discussão ampla com os diversos segmentos políticos e sociais do país. Cabe à Central Única dos Trabalha- dores um papel fundamental nessa con- juntura, que exige unidade de ação, respeito às instância e continuidade no processos de implantação de uma nova estrutura sindical. Conclamamos os com- panheiros à unidade em tomo desses ob- jetivos, que coincidem com os interesses da classe trabalhadora e da maioria da população.

São Paulo, 28 de novembro de 1990

COORDENAÇÃO NACIONAL DA ARTICULAÇÃO SINDICAL

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Contribuição para uma

Política Sindical do PT MTM - Movimento Por Uma Tendência Marxista do PT

Este texto é resultado de um pro- cesso de discussão inicial do Movi- mento por uma Tendência Marxista do PT, preparatório do seu encontro de fundação que deverá ser realizado em fins de março de 1991. É um primeiro documento, ainda indicativo, que foi elaborado em reunião nacional dos sindicalistas do MTM-PT realizada em Cajamar (SP) dias 24 e 25 de novem- bro de 90.

1. O caráter de classe do PT As correntes políticas que enxer-

gam o PT essencialmente como um partido de representação parlamentar tendem a reduzir o movimento prole- tário apenas à sua expressão sindical.

Outras correntes, ao enxergarem a instância sindical como a forma pri- vilegiada de expressão do movimento proletário revolucionário, impedem que esse movimento adquira uma for- ma político partidária. Impedem, por- tanto, que o movimento proletário elabore e dispute um projeto político revolucionário para a sociedade, res- tringindo-se à luta de resistência.

O reconhecimento do Partido dos

Trabalhadores como um partido re- volucionário socialista de massas em construção implica entender que o movimento proletário deve estar orga- nizado nas instâncias do PT, decidin- do lá seus rumos, construindo lá sua estratégia revolucionária.

E que o movimento sindical, abrangente e pluripartidário, deve ser alvo de uma ação petista organizada que tenha a dimensão de amplitude a ser conquistada entre os trabalhadores de diversas posições políticas com o objetivo de alterar a estrutura sindical buscando sua democratização radical, independência em relação ao Estado, transparência administrativa e uma atitude anti-capitalista frente às lutas rei vindicatórias.

Cumpre ao PT, portanto, uma dupla ação no que se refere ao movimento proletário: a organização sindical, tal como está aqui discutido, e a organi- zação proletária petista na forma de núcleos por local de trabalho ou por interesse geopolítico.

Quinzena É particularmente importante en-

tender as especificidades da organiza- ção proletária de partido e a organiza- ção proletária sindical, porque a polí- tica de construção partidária deve ter como uma de suas referências funda- mentais a composição social do PT, que garanta presença massiva da clas- se proletária como fator que compõe as determinações sociais objetivas do seu caráter revolucionário e socialista.

2. A construção do PT Uma análise crítica destes anos de

construção da Central Única dos Tra- balhadores deve começar tomando a bandeira defendida arraigadamente pelos setores combativos do movi- mento sindical e assumida pelo campo CUT Pela Base como divisor de águas entre as propostas revolucionárias e reformistas: o rompimento com a es- trutura sindical de Estado e a constru- ção de uma estrutura alternativa autô- noma e paralela. Esta idéia esteve sempre acoplada ao conceito de inde- pendência de classe, comissões de fá- brica, organização independente ope- rária e outros que se caracterizavam como condicionantes de um caminho socialista para a CUT.

No entanto é falsa a idéia de que somente com a adesão de amplas ca- madas de trabalhadores a uma estrutu- ra sindical alternativa àquela presente na atualidade estaremos no caminho da construção de um movimento sin- dical integrado à disputa da hegemo- nia política.

Significativa parte da vanguarda do movimento cutista tem se colocado como objetivo a organização da classe operária via movimento sindical como princípio de construção de um poder alternativo ao da burguesia.

A origem dessas posições que me- nosprezavam a realidade da constru- ção do PT e sua potencialidade estava na incompreensão do poder de domi- nação dos valores hegemônicos da burguesia na sociedade capitalista moderna, bem como na crença — esse é o termo — da espontaneidade do pro- cesso revolucionário como destino histórico de uma classe social. Estava na incompreensão do poder de disputa da hegemonia política construído pela cultura petista - anticapitalista, radi- calmente democrática e de solidarie- dade entre os trabalhadores - através de um partido legal e de massas.

Foram posições que não se deram conta das profundas transformações que a resistência do movimento con- quistou. Nem se aperceberam que o ato de organizar a CUT e qualquer greve no período da ditadura militar adquiria um sentido revolucionário por resistir e confrontar a ordem e a repressão então vigentes, canalizando as forças da resistência operária e po-

pular para um projeto unificador dos movimentos: a derrota do regime mi- litar.

Não por outra razão a CUT foi vista por algumas correntes de es- querda como um polo revolucionário concorrente do PT enquanto direção política dos trabalhadores. E a greve, mesmo depois da transição conserva- dora, foi a tática central defendida pa- ra o enfrentamento da política econô- mica burguesa, desconhecendo a nova realidade e a necessidade de articula- ção entre essa forma de luta e um projeto político partidário socialista, que sõ seria possível se essas corren- tes estivessem integradas no processo de construção do PT.

3. A organização independente da classe

A questão das diferentes formas de organização independente da classe- Comissões de Empresa, Conselhos Operários, etc — ultrapassa de longe a questão sindical, não sendo, portanto, preocupação apenas para os ativistas sindicais.

Esses embriões de poder operário têm importância estratégica do ponto de vista da revolução e da criação de uma nova hegemonia. São formas de exercício de democracia participativa, estimulando assim o exercício direto da democracia por part» da classe. São também instrumentos de conhe- cimento e domínio da empresa, na perspectiva do controle operário da produção.

Mas são estratégicas também para o período que vai do socialismo até chegarmos ao projeto humano-univer- sal do comunismo, a "associação dos indivíduos livres".

A conquista do socialismo não sig- nifica o fim das diferenças de classes sociais. O que se conquista é uma no- va hegemonia de classe e um Estado com outro conteádo de classe. Mas a luta de classes ainda existe, de for- ma acirrada, no socialismo.

Há um longo caminho que vai da conquista do socialismo até o comu- nismo, até o fim da sociedade de clas- ses, até a extinção dos partidos, até o fim do Estado enquanto "governo dos homens" e sua subsistência apenas para a "administração das coisas".

Essa 6 uma tarefa para milhões de pessoas.

A única garantia que temos de que esse caminho vai ser percorrido é que o proletariado esteja organizado, combatendo as tentativas de restaura- ção do capitalismo e também as ten- dências de burocratização que surgi- rem no Estado, nos partidos, imple- mentando o projeto humano-universal, construindo um novo quadro de valo- res morais que ultrapasse em definiti- vo a pré-história da humanidade.

Trabalhadores

É esse o fundamento com base no qual defendemos que os militantes do movimento proletário, organizados partidariamente nas instâncias do PT, defendam todas as formas de organi- zação independente da classe. Formas que estimulem a iniciativa das massas, o espírito de associação, a disposição de lutar pela direção de seu próprio destino.

4. A organização sindical O movimento sindical e suas ins-

tâncias formais tem um papel específi- co na construção da hegemonia e de- vem ser disputados nas condições históricas atuais, dentro de limites que mantenham sua condição de institui- ções legais reconhecidas por amplos setores dos trabalhadores como repre- sentantes de suas categorias, não co- mo uma representação política alter- nativa àquela representada pelo parti- do.

O PT deve defender que os sindi- catos dirigidos por cutistas assumam com radicalidade a luta por democra- cia nas fábricas e pelo direito de or- ganização dos trabalhadores, além de tomarem em conta que as normas de- mocráticas de funcionamento, garan- tindo transparência, autonomia, plura- lidade política e a afirmação de novos valores morais constituintes da nova hegemonia em todas as suas ativida- des são condição da sua vitória como organizador de amplas massas.

Apresentamos, como premissas pa- ra uma proposta de sindicalismo a ser defendido pelo PT, os seguintes pon- tos:

a) Sindicato livre e democrático • que abarque todos os trabalha- dores de sua base, independen- temente de vinculação partidária ou crença religiosa; • desatrelado de qualquer órgão do Estado, que tenha seus esta- tutos definidos livremente pelos trabalhadores em assembléia; • que, na defesa de democracia operária, tais estatutos devem necessariamente conter os prin- cípios da direção colegiada e da revogabilidade de mandatos, as- sim como a garantia da existên- cia de canais de participação da categoria nos centros de decisão sindicais;

b) Sindicato combativo • que organize os trabalhadores a partir de suas bases, incenti- vando a criação de comissões de empresa, eleitas pelos próprios trabalhadores e organicamente ndependentes do sindicato; • que se relacione politicamente com as comissões de empresa, entendendo que elas devem ser órgãos autônomos, com pers-

;:;::::;;;::;::-:-;-:-:-:-;-:-; mrnm liiii iililiiiliii

Quinzena Trabalhadores pectiva de se constituírem em embriões de poder operário; • que estimule e dirija as lutas dos trabalhadores por melhores salários, melhores condições de trabalho, de segurança e de sa- lubridade nas empresas; • que como instrumento de luta proletária não cabe aos sindica- tos o papel de prestador de as- sistência social, sendo a mesma obrigação do Estado. Que se mantenha a assistência jurídica e a assistência médica somente pa- ra os problemas coletivos e tra- balhistas (insalubridade, doenças profissionais, demissões, etc).

c) Sindicato classista • que a ação sindical seja vista e desenvolvida não só pelo prisma das reivindicações imediatas, mas voltada para os interesses do proletariado como um todo; • que busque a unidade com ou- tros sindicatos e associações pa- ra pressionar o empresariado e o seu Estado no sentido de garantir os direitos dos trabalhadores, estabelecidos ou não em lei (di- reito de greve, estabilidade no emprego, etc); • que explicite a luta de classes que nos envolve e coloque a ne- cessidade de um projeto político alternativo do proletariado, ten- do como perspectiva o socialis- mo; • que a ação sindical deve con- tribuir para politizar a luta;

d) Sindicato autônomo • que represente as suas bases; e

não seja aparelho de nenhuma organização partidária ou reli- giosa; • que seja aberto para todas as correntes de pensamento, fo- mentando o embate de idéias.

5. A CUT pela Base A CUT pela Base é uma corrente

sindical que surgiu no II CONCUT do Rio de Janeiro. Orienta-se pelos "Objetivos e Princípios da CUT', aprovados no Congresso de fundação da Central em 1983. Teve papel fun- damental na defesa da democracia in- terna, na afirmação do perfil socialista e no embate a todas as iniciativas de aceitação do pacto social.

E a corrente sindical que reúne as melhores possibilidades para que a CUT se afirme como Central que, de fato, aglutine pela base e dirija a luta do conjunto dos trabalhadores desse país.

E, portanto, o campo de atuação dos sindicalistas filiados ao PT que se aglutinam no Movimento por uma Tendência Marxista.

Entendemos também que a CUT pela Base não é uma corrente de in- tervenção apenas congressual, tendo importante papel como um polo de es- querda que disputa a hegemonia e tenciona pela manutenção da combati- vidade e independência de classe da CUT, como está ocorrendo agora nes- sa luta para que a Central saia do pacto social.

Rejeitamos categoricamente as pro- postas de dissolução da CUT pela Ba- se, na medida em que essas propostas

obedecem menos a questões de prin- cípios e mais à tentativa de desagregar o polo de esquerda — classista, demo- crático e anti-capitalista — que ela aglutinou.

O que se trata não é dissolver esse polo. Ao contrário, o que se trata é levar para dentro do Partido, na busca de uma Política Sindical do PT, a luta pelos fundamentos em tomo dos quais se estruturou a CUT pela Base:

• o fortalecimento de um sindica- lismo classista e combativo, que seja expressão direta dos trabalha- dores organizados a partir dos lo- cais de trabalho; • a definição de que nossa tarefa é avançar na unidade da classe tra- balhadora e não na cooperação en- tre as classes sociais (explorados e exploradores); • a definição de que o sindicalis- mo, além de ser reivindicatório e de lutar por conquistas imediatas para os trabalhadores, tem como refe- rência o combate à exploração ca- pitalista e a conquista de uma so- ciedade socialista, onde os traba- lhadores tenham ampla liberdade; • a importância estratégica da or- ganização independente dos traba- lhadores, a partir do local de tra- balho; • a defesa da democracia operária em todos os aspectos da prática sindical.

Reunião Nacional do Movimento por uma Tendência Mar- xista - Tendência Interna do PT Cajamar, 24 de novembro de 1990.

Boletim Sindical n^21 do Jornal Frente Operária (posadlsta)

BALANÇO DA CRISE E PERSPECTIVAS

A Oposição Sindical Metalürgica de São Paulo chegou ao estágio de maior desarticulação, isolamento e descrédito da sua história. Isto ocorre na cidade onde há mais metalürgicos na América Latina, ocorre após as eleições de 1987, quando as duas chapas de oposição, juntas, receberam no 1- turno mais votos que a chapa de Luiz Antônio e ocorre depois do cres- cimento enorme das lutas das massas que quase levaram Lula à Presidência da República. Foi nesse contexto que Luiz Antônio conseguiu uma esmaga- dora vitória nas ultimas eleições, com quase 80% dos votos. É realmente surpreendente que a oposição meta- lúrgica consiga a cada eleição desper- diçar as oportunidades de triunfo.

Oposição Metalúrgica - SP

isolando-se cada vez mais e reforçan- do, em conseqüência, a burocracia. Nosso objetivo é analisar a situação atual de metalúrgicos e trazer propos- tas para o futuro. Mas para isto é ne- cessário compreender como essa si- tuação se criou.

Como já analisamos anteriormente (boletim sindical n2 9) a distribuição e a experiência política do proletariado de São Paulo é diferente da de São Bernardo e Diadema. Assemelha-se mais à do Rio. Os metalúrgicos aqui estão divididos por dois fatores: estão fragmentados em milhares de fábricas pequenas e médias e estão divididos por uma experiência sindical e política diferente da de São Bernardo. Aqui cristalizaram-se experiências desi-

guais, feitas em momentos diferentes, e que atraíram setores diferentes do proletariado, dirigidas pelo PCB, PC do B, pelo trotskismo, pela igreja, pelos setores independentes e pela bu- rocracia sindical. Mesmo assim os metalúrgicos de São Paulo sempre compreenderam a necessidade de con- centrar-se para golpear a burocracia e a burguesia. E quando podem tratam de intervir de maneira unificada, ape- sar de suas direções. Nas eleições de 87 os metalúrgicos trataram de apoiar a chapa que representava a experiên- cia de frente única, que vinha respal- dada pela fábrica de maior peso (Ford) e pelas comissões de fábrica. Mas esta necessidade de unificação não foi compreendida pelo conjunto das direções, o que impediu que os (

ÍSHÍ

Quinzena Trabalhadores

metalúrgicos liqüidassem com a buro- cracia. A vanguarda tem sido impedi- da de expressar-se unificada e dirigir- se aos setores mais atrasados. As dire- ções têm impedido a unificação dos metalúrgicos, com sua falta de políti- ca, de tática e de programa. E a falta de unificação tem impedido à van- guarda pesar tanto para liqüidar com a burocracia sindical quanto com o apa- rato de oposição que acabou se for- mando e cristalizando em tomo do MOMSP.

O que ocorreu de 87 para cá? Em primeiro lugar foi impossível promo- ver uma frente única entre as diversas forças de oposição. Durante um pe- ríodo circularam três jornais diferentes falando em nome da CUT entre os metalúrgicos (Ferramenta, MOMSP e Alternativa). As tentativas de reunir- se e fazer um trabalho comum logo degeneraram devido a falta de interes- se por parte do MOMSP em defender objetivamente um plano de trabalho que permitisse o fortalecimento do Departamento Estadual dos Metalúr- gicos da CUT. Entre outras coisas, a centralização no Departamento elimi- nava a possibilidade de circular três jornais em nome da CUT, (o que con- fundia a categoria) dando lugar a ape- nas um intrumento onde todas as cor- rentes de oposição pudessem expres- sar suas idéias, dentro de uma pro- posta mais geral da CUT. Diante des- tas disputas, as propostas políticas e o programa cairam no vazio, e a direção da CUT neste processo interveio de forma muito débil.

O MOMSP, além de não facilitar a política de frente única, manteve sua linha de paralelismo sindical, dedi- cando-se a construir um aparato sindi- cal alternativo em vez de lutar dia a dia para conquistar o sindicato, para convencer, arrastar uma parte da base de Luiz Antônio. O MOMSP ausen- tou-se completamente da vida do sin- dicato, dos congressos, sindicais, das assembléias de categoria, do trabalho de filiação. Não sabe, portanto, inter- vir na vida do instrumento que é o sindicato, diferenciando-se da política da direção do sindicato, e falando em nome de seu próprio programa, de seus próprios objetivos. O MOMSP vê a burocracia tão onipotente que há muito tempo desistiu de lutar e dispu- tar a sua base, e foi perdendo, assim, cada vez mais, o contato com os me- talúrgicos.

Mas não se trata só do erro de dei- xar os metalúrgicos à mercê de Luiz Antônio. A oposição também tem per- dido o contato com as fábricas. Nunca houve uma política de apoio às comis- sões de fábrica, de unificação, gene- ralização de suas experiências, de formação de comissões interfábricas, que funcionaram em outra época em

plena ditadura. As comissões que existem sobrevivem individualmente, por sua conta. A maior prova da perda de contato do MOMSP com o proleta- riado é que a maioria dos seus diri- gentes abandonou as fábricas pelo menos há dez anos e nunca mais re- tomou. Muitos, para concorrer a car- gos parlamentares e trabalhar junto das administrações regionais da Pre- feitura, outros, porque são militantes profissionais, mas não existem qua- dros dirigentes novos vindos das fá- bricas e nem velhos que permaneçam trabalhando. Formou-se uma elite di- rigente satisfeita consigo mesmo, acomodada, que tem sufocado a van- guarda e impedido a renovação e o progresso da oposição. Os outros se- tores, Alternativa e Ferramenta, afeta- dos com as sucessivas derrotas eleito- rais, e com o fracasso das tentativas de unificação, estão totalmente desar- ticulados e tampouco se anima a en- frentar uma discussão ampla sobre a necessidade de reorganizar a oposição e intervir na categoria.

Nas eleições de 90, a oposição já totalmente desarticulada recebeu um golpe decisivo quando Lúcio e os ou- tros companheiros decidiram compor uma chapa com Luiz Antônio, não aceitando a discussão de nenhuma fórmula que permitisse uma frente única da oposição. A atitude de Lúcio acabou aumentando a vantagem de Luiz Antônio, ainda que — uma vez que foi impossível entrar num acordo com ele — Lúcio não tenha apoiado nenhuma das duas chapas. Mas o seu gesto confundiu a vanguarda e deu autoridade a Luiz Antônio.

A vitória de Luiz Antônio é um produto deste processo de desagrega- ção e isolamento da oposição. Trata- se muito mais da fraqueza da oposição do que da força de Luiz Antônio. Este fez sua campanha praticamente sem opositores, a chapa 2 ficou no ar, sem contato, sem autoridade, sem ser co- nhecida pelos metalúrgicos. Por isso é preciso considerar que uma parte im- portante dos votos que Luiz Antônio recebeu não são votos para sua políti- ca pró-Collor, para sua função de "ministro sem pasta" de governo, pa- ra a sua ação divisionista, anti-CUT. Há uma parcela de votos na chapa 1 que foram de centralização no instru- mento que é o sindicato, foram votos contra a burguesia, num órgão de classe, apesar de sua direção ser buro- crática. Uma parte do proletariado nem soube que havia oposição, não viu os dirigentes da oposição intervi- rem, percebeu o estado de desagrega- ção da oposição e votou "no sindica- to" para não votar em branco ou nulo. Assim fazendo, deu um voto que ele sente como contra a burguesia. O ins- tinto de classe deste setor do proleta-

riado é correto, mas politicamente o voto é equivocado, porque a direção de Luiz Antônio não permitirá que a classe faça verdadeiros progressos. Uma parte dos votos de Luiz Antônio vem de setores tradicionais que apoiam a burocracia: os aposentados ou setores privilegiados ou despoliti- zados dos metalúrgicos. Um sindicato de peso como o de São Paulo, através meramente da sua vida inercial, man- tém autoridade sobre uma parte do proletariado, senão há uma oposição combativa. O voto mais politizado e consciente concentrou-se na chapa da CUT, embora este setor tenha ficado isolado.

Após as eleições o pouco de vida interna que ainda havia na oposição desorganizou-se e paralizou-se. Basta ver que até hoje a CUT não se reuniu como organismo para fazer um balan- ço da derrota eleitoral. Mas isto não significa que os metalúrgicos estejam paralisados. As recentes assembléias realizadas pelo sindicato para a cam- panha salarial — a maior delas com mais de 15 mil operários — expressam a decisão da classe de intervir. Luiz Antônio chegou a ameaçar a classe patronal com uma greve geral de me- talúrgicos, para ir depois recuando e terminar fazendo um acordo separa- do de Osasco e Guarulhos (portanto, rompendo a frente entre os três sindi- catos e debilitando a categoria diante da burguesia), e em termos bem piores do que o acordo conseguido em São Bernardo. A mobilização metalúrgica nessa campanha salarial mostra que a classe está disposta a intervir, apesar do esfacelamento da oposição e da bu- rocracia do sindicato. Os metalúrgicos vêem o sindicato como um instru- mento de luta, apesar de sua direção ser conciliadora. Não está excluído que com o aprofundamento da crise econômica haja uma radicalização das lutas em outros centros mais combati- vos e organizados que São Paulo e que isto se reflita na base de Luiz Antônio, obrigando-o a radicalizar num ou noutro aspecto, para não per- der o controle. Entretanto, serão ma- nobras táticas subordinadas estrita- mente ao objetivo central da burocra- cia, que está determinado por sua composição, sua natureza e seus inte- resses: conter os metalúrgicos, sub- meter suas lutas ao objetivo de consi- liar e servir a uma política de acordos, de enlace com a grande burguesia.

Diante dessa situação, propomos que o Departamento Metalúrgico da CUT intervenha para reorganizar a oposição, apoiando-se nos quadros que querem progredir e promovendo uma política que permita a formação de novos quadros. Nós propomos: 1. A convocação de uma reunião pelo

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Quinzena Trabalhadores

Departamento Metalúrgico da CUT para balancear não apenas a derrota eleitoral como também a própria experiência global da oposição nos últimos anos. Traçar perspectivas com base numa política clara.

2. Combater incansavelmente o para- lelismo sindical do MOMSP. Mos- trar que uma verdadeira oposição não pode temer falar para uma as- sembléia metalúrgica, em qualquer circunstância que seja, mesmo que tal assembléia tenha sido convoca- da pela burocracia sindical. Quem não sabe disputar a direção dos metalúrgicos com a burocracia na sua própria base não merece o res- peito dos metalúrgicos. A ridícula votação obtida pela chapa 2 nas úl- timas eleições é a prova mais cabal e contundente do fracasso do para- lelismo sindical, do sectarismo, do isolacionismo em que caiu o MOMSP. Portanto defendemos que uma verdeira oposição metalúrgica intervenha como tal, com fisiono- mia própria, nos congressos, as- sembléias e atividades do dia-a-dia do sindicato, participando também da luta por novas sindicalizações, para reforçar o sindicato como ór- gão e debilitar o aparato da buro- cracia.

3. Todo o apoio à formação de comis- sões de fábrica como órgãos de frente única proletária. Formar co- mandos interfábricas, mesmo que comecem com a representação de poucas comissões. Educar incansa- velmente na importância das comis- sões, informar sobre seu funciona- mento e generalizar a experiência, mesmo que isto em alguns casos te- nha que ser feito semi-clandestina- mente.

4. Desenvolver uma política de frente única entre todas as correntes que se opõem à burocracia sindical e sua política pró-Collor. Mesmo ha- vendo e se mantendo as divergên- cias entre as correntes de oposição, o Departamento Metalúrgico da CUT deve intervir para tratar de garantir a frente em questões deci- sivas, como a campanha salarial, a luta pela implantação de comis- sões de fábrica, a luta por um bole- tim único da CUT, (no qual tam- bém podem ser debatidos pontos de vista divergentes). Deve ser impe- dida a apresentação de mais de uma chapa em nome da oposição. Está provado que a divisão só ajuda a burocracia a se manter.

5. Um ponto central: não devem ocu- par cabeça de chapa e nem posições de responsabilidade na oposição si- nical companheiros que não estejam trabalhando nas fábricas. Pelo fim da elite de oposição que há 10 anos não entra numa fábrica. Só assim

poderá desenvolver-se uma nova geração de dirigentes e os velhos dirigentes poderão reaprender a ou- vir a classe operária.

6. Que a oposição metalúrgica faça uma intensa vida política, não fi- cando restrita à luta corporativa. Manter a aprofundar a luta por melhores salários, melhores condi- ções de trabalho na fábrica, por uma melhoria da condição da mu- lher e do jovem trabalhador, mas

combinar esta luta com a luta glo- bal de todos os trabalhadores pela transformação da sociedade. O elo é feito através do programa; estati- zação com controle operário das fábricas que parem e despeçam os operários, reforma agrária, escala móvel de salários, jornada móvel de horas de trabalho, não pagamento da dívida externa, estatização dos bancos com controle dos trabalha- dores.

Folha de Sáo Paulo - 14.10.90

Justiça Social em São Paulo Luiza Erundina

A proposta orçamentária para a cidade em 91, enviada à Câmara Municipal em fins de setembro, é o resultado de um amplo processo de consulta popular — um dos princípios de nosso governo. Nas audiências públicas realizadas nas 19 Adminis- trações Regionais, a grande maioria dos participantes exigiu que a Pre- feitura disponha de recursos sufi- cientes no ano que vem para garantir, além da manutenção dos serviços pú- blicos existentes, a construção de no- vos equipamentos e obras. A popula- ção exigiu também a melhoria do transporte coletivo e tarifas menores. A proposta de elevação de tributos di- retos recebeu total apoio.

Diante da manifestação da vontade popular, nosso governo decidiu rever a proposta orçamentária para 91 e oferecer uma solução definitiva para o transporte coletivo: o projeto "ta- rifa zero". A Prefeitura quer o fim da cobrança das tarifas de ônibus a par- tir de 1- de julho de 91 e a expansão das frotas em circulação em 50%. Os grandes beneficiados são os 6,5 mi- lhões de passageiros que usam ônibus todos os dias. Também saem ganhan- do milhares de pessoas que hoje em dia são obrigadas a andar a pé por- que não têm dinheiro para pagar a passagem de ônibus.

Para custear essa completa refor- mulação no transporte coletivo da ci- dade, a Prefeitura precisa de uma re- ceita maior. E isso será possível atra- vés de uma ampla reforma tributária. Pretendemos que as grandes empre- sas e as grandes fortunas imobiliárias garantam pleno acesso ao transporte à maioria pobre da população, o atendimento da demanda por vagas no ensino fundamental e aumento substancial de vagas em creches e centro de convivência.

O gasto orçamentário total deverá aumentar 44,4% em 91, em compara-

ção ao de 90. Em função da proposta de tarifa zero, as despesas com trans- porte crescerão 131%, o gasto da Se- cretaria da Educação aumentará 119% e o da Secretaria do Bem-Estar Social, 62%. São as grandes priori- dades para 91.

O objetivo da ampla reforma tri- butária que estamos propondo à Câ- mara é atender, mesmo com limita- ções, as necessidades básicas da po- pulação trabalhadora. As mudanças fiscais permitirão que em 91 a receita tributária atinja Cr$ 125 bilhões, quando o sistema em vigor previa uma receita de apenas Cr$ 22 bi- lhões. No caso do IPTU, a maior parte do aumento deve-se à atualiza- ção da Planta Genérica de Valores e à plena correção monetária das par- celas. O aumento também decorre da elevação de alíquotas sobre as pro- priedades mais valiosas, recaindo so- bre um número reduzido de proprie- tários. As residências, imóveis co- merciais e terrenos de pequeno valor não serão penalizados. E o caso de um apartamento de 97 metros qua- drados na Aclimação, que paga Cr$ 176,01 mensais e passará a desem- bolsar Cr$ 247,33 mensais em 91. Ou de uma casa no Alto da Móoca de 250 metros quadrados que paga Cr$ 761,26 por mês e passará para Cr$ 4.639,44 no ano que vem. Já o dono de um prédio de escritórios na Aveni- da Paulista, com 49.252 metros qua- drados, paga por mês de IPTU Cr$ 2,9 milhões por mês e irá desembol- sar Cr$ 19,2 milhões em 91. Uma mansão de 834 metros quadrados no Morumbi está pagando Cr$ 9.259,31 por mês e em 91 vai pagar Cr$ 54.144,77. Esses exemplos mostram que a tarifa zero é economicamente viável, permitindo uma redistribuição fiscal de renda suportável aos mais ricos e benéfica aos mais pobres.

Luiza Erundina é prefeita da cida- de de São Paulo.

liiiiiii

FERROVIÁRIOS Os ferroviários da CBTU voltam ao

trabalho depois de 24 dias em greve. A categoria aceitou a proposta do TST de 58% de reajuste, sendo 30% em no- vembro e 16% em janeiro. Os ferroviá- rios reivindicavam 266% de reajuste. A aceitação foi devido a ação da Polícia Militar que desmobilizou os piquetes, impossibilitando a continuidade da gre- ve por intimidação.

METALÚRGICOS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP • Os 2.500 metalúrgicos da Cater-

pillar, encerraram a greve em 30.11. Eles conseguindo reajuste de 25,68% em novembro, 20% em dezembro e 12% em janeiro. A reivindicação era de 111%, mas com os índices obtidos, acrescidos aos 41,07% de antecipação dada de junho a novembro, o reajuste acumulado chega a 148%.

• Os metalúrgicos da Engesa deso- cuparam a empresa em 3,12, pois os patrões vão pagar os direitos trabalhis- tas dos 530 demitidos (100% do valor das indenizações) em 19.03 e parte dos salários dos 600 metalúrgicos (70%). Para os 600 metalúrgicos em licença remunerada, o critério será o mesmo.

MARCADOS PARA MORRER DE FOME

• Rio (05.12) - Os ferroviários e os metroviários do Rio paralisaram em 4.12 os trens e metrô em protesto contra a ameaça de demissão de 3.800 trabalhadores da CBTU. Os trabalha- dores cortaram a energia das 17 su- bestações que abastecem os 360 Km da malha ferroviária. Já os metroviá- rios, após semanas de operação tarta- ruga, paralisaram o sistema por pro- blemas na manutenção dos trens.

• Gaspar-SC (30.11) - Cevai Agro Industrial demitiu 960 dos 12 mil tra- balhadores que operavam 68 kilos em 11 indústrias do setor de alimentos em todo país. Os motivos alegados pela empresa são a readequação ao ritmo das operações no setor de soja e a re- dução de custos, ocasionados pela queda da safra, defasagem cambial e os baixos preços.

• SP (04.12) - A indústria de plás- ticos já dispensou 9% de sua mão-de- obra, equivalente a 20 mil trabalhado- res, reduzindo de 230 mil para 210 mil o total de trabalhadores nas 4.500 empresas do setor. A estimativa da Abiplast (Associação Brasileira da In- dústria de Plásticos) é que nos primei- ros meses de 1991 as demissões acompanhem a queda do volume nas vendas, hoje de 10 a 20%. Ao mesmo tempo aumentam as empresas que querem dar férias coletivas aos traba- lhadores antes do natal.

• SP (05.12) - O "patrão modelo", Ricardo Semler, demitiu 90 trabalha- dores da Semco S/A e está descupan- do o prédio utilizado na produção de equipamentos para navios. Com essas demissões, o quadro de trabalhadores de 425 reduziu-se para 260.

• Brasília (06.12) - 238 mil são os servidores demitidos pela Secretaria de Administração Federal, dentro de um universo de 1 milhão e meio de servidores.

• Curitiba (PR) - As demissões na indústria metalúrgica do Paraná cres- ceram 30% desde agosto deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado. As demissões au- mentaram a partir do segundo semes- tre porque começaram a vencer os acordos entre empresas e trabalhado- res de redução de jornada e dos salá-

rios, feitos logo após a edição do Pla- no Collor. Em algumas empresas as demissões chegaram a 50% dos tra- balhadores. Em novembro foram de- mitidos 464 trabalhadores e em outu- bro 690.

• Belo Horizonte-MG (02.12) - 80 mil trabalhadores da construção civil deverão ser demitidos em janeiro se- gundo o Sindicato patronal da Indús- tria da Construção de Estradas, Pavi- mentação e Obras de Terraplanagem em Geral. De acordo com esse sindi- cato, várias empresas estão à beira da falência que só enchergam na frente as demissões como forma de sair da crise em que estão.

• Salvador-BA - (04.12) Desem- prego e a fome já atinge mais de 150 mil trabalhadores em 50 municípios da região cacaueira do sul da Bahia. Vá- rios sindicatos de trabalhadores rurais estão fechando as portas. A crise con- siderada a mais grave do setor de ca- cau nas últimas décadas é conseqüên- cia da falta de liquidez. Quatro das maiores exportadoras pediram concor- data, a produção caiu, os fazendeiros vem demitindo em massa e atrasando o pagamento dos trabalhadores. Com a entresafra de fevereiro, a situação deve piorar. E o que apuraram a Co- missão Executiva do Plano da Lavou- ra Cacaueira e os sindicatos dos tra- balhadores rurais de Ilhéus e Itabuna.

• Manaus-AM - (06.12) Nos últi- mos 45 dias, foram demitidos 1.700 trabalhadores da Zona Franca de Ma- naus. A média dos últimos 15 dias tem sido de 100 trabalhadores demitidos por dia e esse quadro tende a se agra- var. A projeção do Sindicato Metalúr- gico dos patrões indica que em de- zembro as demissões devem atingir 15 mil trabalhadores.

Os Desemprej jadosdosEUA j Agosto da 89 («Agoato de 90{ Diferença ,

p Gerentes, técnicos, pessoal i administrativo e de apoio 1.478000 1.842.000 + 364.000 |

Vendas 658.000 S46000 -12.000 ■ | Serviços 1.104.000 1.105000 + 1.000 |

Construção 317.000 377.000 +60.000 :

,' Mecânica 343.000 395.000 + 52.000 |

* Operaçáo de máquinas 1.490.000 1.467.000 -23.000 1

| Agricultura, pesca | e extração vegetal 218.000 223000 + 5.000 |

1 Outros 744.000 782.000 + 38.000 M

1 Total da detempregadoa «.352.000 6.837.000 +485,000 ^ ;.... i ; ...... ,.,-. ,;—<'„,■•, á

O Estado de São Paulo -2.12.90

■::;-:v:;;|:;:::::::ix::::::::;:;:

Quinzena

Eletrônicos ■ Philips (Holanda): 45 mil, em gran- de parte dos setores administrativo, de vendas e de engenharia; ■ Buli (France): 5 mil, incluindo 1.000 da gerência e pessoal de apoia Já havia cortado 5.500; ■ Siemens-Nixdorf (Alemanha) 3.500, desde a fusão, em setembro, número pode aumentar; ■ Olwtti (Itália): 6.000 cm 1989 e 1990. Planeja cortar mais 7.000 no próximo aço, a maior parte gerentes, pesquisadores e pessoal de desenvol- vimento;

DEMISSÕES ATINGEM O

PRIMEIRO MUNDO

■ Nokit Data Systems (Suécia): i.000; ■ Oc< (Holanda): 250, em produção e gerência; Pttrólao ■ Britis* Pctroleun (Grã-Bretanha): 1 150; Comunicaçòas ■ Brilish Telecom (Grã-Bretanha): 5.000 gerentes; ■ Rtater (Grã-Bretanha): 300; Finanças ■ Midland Baak (Grã-Bretanha): 4.000; ■ Bardays (Grã-Bretanha): 4.300,

■ Gcaerale Baak (Bélgica): 1.500, até o fim de 1991; ■ Corretoras frsscesss (França): 1.000, nos próximos meses; Transporta aérao ■ KLM (Holanda): 500, na área ad- ministrativa: ■ Sabeoa (Bélgica): 3.000; Produtos da consumo ■ Benckiser (Alemanha): 500, depois de adquirir os fabricantes italianos de detergente Mira Lanza e Panigal; ■ Heinekea (Holanda): número não determinado de gerentes e trabalha- dores;

Indústria automobilística ■ Voho (Suéda): número não deter- minado; ■ Reaarit (França): 4.620, em 1991; Pnsus ■ Mkkeüa (França): 2.260; número pode aumentar. Química ■ Hoedst (Alemanh |: 800 gerentes e trabalhadores; Engenharia ■ Nti Panoas (Grã-Bretanha): 650; Equipamentos pesados ■ Caterpillar it Earops (Bélgica): 100 gerentes e 550 trabalhadores de produção.

Jornal do Brasi - 3.12.90

DEMITIDOS DA INDUSTRIA QUÍMICA E METALÚRGICA

^3

' Empr«u

Total tf* funcione rio* (•m março)

OwniuÕM (nwrço)

a novembro do ^1

quêtfro (%) '

Cotap 11 000 600 645

Grupo Elum» 2.700 600 22,22

Anakol 1 800 500 27,77

Pnihps 3700 500 13.61

Otu 1 500 200 13,33

Eaton 600 200 33.33

Maxion 1 800 150 8,33

Conexel 520 130 25,00

Sachs 1.200 100 8.33

Quimbiasii 80 80 100.00

Fefrc tnamel

EMPRESAS DE SÃO PAULO QUE MAIS DEMITIRAM,

DESDE MARÇO/90

12.00

Emprmas domitsÕM Embraer 4000 Rhodia 2000

Cavekol 1.000

Avibiás 900

Kodak 600

General Motott 600

Engesa 500

Anacol 400

Cofona 400

Ford Eletrônica 200-

VDO 150

Cumfrum 150

Conexel 130

SKS 100

' funcionários incentivados a padir damisséo Fonte Sindicatos

O Estado de São Paulo - 2.12.90

OS ASSASSINATOS CONTINUAM

• Vitória-ES (01.12) - Mataram o

sindicalista ruralista Homero Patrício

Reis, 59 anos, a tiros e facadas no município de Panças. A mulher de Homero estava junto quando o crime aconteceu e contou que caminhavam

pela estrada quando dois homens se aproximaram e o mataram. Este é o quarto sindicalista morto na região, li- gado à CUT. Em fevereiro de 1988, assassinaram Francisco Domingos Ramos, do sindicato rural, que defen- dia a reforma agrária. Em 1989, mata- ram Verino Sossai e Paulo Damião.

• Cabrobó-PE (05.12) - O CIMI comunicou oficialmente o assassinato, a bala, no último dia 28.11, do índio truka Antônio Gilvan da Cruza, filho do líder Pedro Florêncio Custódio. De acordo com o CIMI este é o sexto as-

sassinato de indio no ano. No período, foram mortos dois índios makuxi, dois

kaigang e um cinta larga.

SEGURANÇA EMPRESARIAL • Belo Horizonte-MG (04.12) -

General ex-chefe do SNI e ex-diri- gente sindical abriram empresa de se-

gurança empresarial em Minas. A em- presa inclui nos serviços que presta, a contra-espionagem industrial, assesso- rias em política sindical, em econo- mia, em sociologia e em comunicação, além da instalação de aparelhos ele- trônicos contra a grampeação de tele-

fones. O capital da empresa está divi- dido entre o general da brigada Cid Godofredo Fonseca, um segundo só- cio é a ex-dirigente sindical Marli Lu- cas da Fonseca.

MASSACRE EM DIADEMA-SP Os ocupantes da Vila Socialista,

barbaramente massacrados pela tropa de choque da polícia militar, coloca-

ram suas vicias para defenderem o di-

reito elementar de moradia. As mortes

dos sem-teto, as mutilações, espanca-

mentos e pisoteamentos da cavalaria atestam a que ponto os governos utili-

zam sua força militar contra os movi- mentos sociais e a que ponto o Estado brasileiro é policial.

O Comitê de Apoio à Vila Socia- lista, convoca a todos (sindicatos, en- tidades, movimentos sociais e demais trabalhadores) a se manifestarem em repúdio a tal barbárie, enviando cor-

respondências à: • Prefeitura Muncipal de Diadema • Câmara Municipal de Diadema • Governo do Estado de São Paulo Para contatos com o Comitê de

Apoio, escrever para; Caixa Postal 1.171

CEP 01057 - São Paulo - SP.

Teorias da Mais Valia - Kart Man Volume II, Livro 4 de "O Capital" DIFEL

Marx e as crises do capital Reproduzimos abaixo texto de Marx onde investiga as origens das crises e a necessidade de queima de capital, através de debate que trava com as teorias de Adam Smith, Ricardo, Mills e Say, ao mesmo tempo. Parece-nos de extrema importância trazer a público as contribuições de Marx para compreensão da realidade que estamos enfrentando, bem como que perspectivas para os trabalhadores trazem as crises.

Problema das crises (observações preliminares). Destruição de capital pelas crises.

Suposta a produção ampliada do capital constante - isto é, produção maior que a necessária para repor o capital precedente e portanto para produzir a quantidade anterior de meios de subsistência —, não haverá mais dificuldades para a produção ampliada ou acumulação nas esferas que empregam maquinaria, matérias- primas etc. Se está disponível o ne- cessário trabalho adicional, encontrar- se-ão no mercado todos os meios para formar novo capital, para converter o dinheiro suplementar daquelas esferas em novo capital.

Mas, antes de mais nada, o proces- so global da acumulação se reduz a produção ampliada que, por um la- do, corresponde ao crescimento natu- ral da população e, por outro, consti- tui fase imanente dos fenômenos que se manifestam nas crises. O estalão dessa produção excedente é o próprio capital, a escala existente das condi- ções de produção e o afã sem limites do capitalista para enriquecer, para capitalizar, e de modo nenhum o con- sumo que é de início reprimido, uma vez .que a maior parte da população, a população trabalhadora, s<5 pode ex- pandir seu consumo dentro de limites muitos estreitos; ademais, à medida em que se desenvolve o capitalismo, a procura de trabalho decresce relati- vamente, embora com crescimento ab- soluto. Além disso, os ajustamentos são todos casuais e a proporção do emprego dos capitais nos ramos parti- culares se ajusta por meio de um pro- cesso contínuo, mas a própria conti- nuidade desse processo supõe por igual a desproporção constante que ele tem de nivelar de maneira ininter- rupta e muitas vezes violenta.

Aqui só temos de examinar as for- mas por que passa o capital nas fases diversas de seu movimento. Não se analisam portanto as condições efeti- vas nas quais se dá o processo real de produção. Supomos sempre que a mercadoria se vende pelo valor. Não

consideramos a concorrência entre os capitais, nem o sistema de crédito, nem a constituição real da sociedade, que de maneira nenhuma consiste apenas nas classes dos trabalhadores e dos capitalistas industriais, e onde portanto consumidores e produtores deixam de ser idênticos. A primeira categoria, a dos consumidores (cujas rendas, em parte, são secundárias, de- rivadas do lucro e do salário, e não primárias), é bem mais ampla que a segunda, e por isso o modo como des- pende sua renda e o tamanho dela en- gendram modificações muito grandes no orçamento econômico e no proces- so de circulação e de reprodução do capital. Todavia, no estudo sobre o dinheiro, já verificamos que este, tanto* na forma em geral diferente da forma natural da mercadoria, quanto na forma de meio de pagamento, en- cerram a possibilidade de crises; e o estudo da natureza geral do capital evidencia ainda mais essa possibilida- de, mesmo sem se prosseguir na pes- quisa das relações reais que consti- tuem precondições do processo efeti- vo de produção.

O ponto de vista (na verdade de James Mill) que Ricardo tomou de empréstimo ao monótono Say (e a que voltaremos ao tratar dessa figura las- timável), de ser impossível superpro- dução ou pelo menos pletora geral do mercado baseia-se na proposição de se trocarem produtos por produtos ou, como diz Mill, no "equilíbrio metafí- sico entre vendedores e comprado- res", o que levou ao axioma de a pro- cura ser determinada apenas pela pro- dução ou de ser a procura idêntica à oferta. A mesma idéia transparece na expressão predileta de Ricardo, de ser possível o emprego produtivo de qualquer montante de capital em qual- quer país...

Uma vez que Ricardo se apoia em Say, criticaremos mais tarde as propo- sições de Say ao tratar desse próprio impostor.

Agora, de passagem, observamos: na reprodução, como na acumulação de capital, não se trata somente de re-

por a mesma massa de valores de uso que forma o capital, na escala anterior ou em escala ampliada (caso da acu- mulação), mas de repor o valor do ca- pital adiantado com a taxa de lucro normal (mais-valia). Se cairem por- tanto os preços de mercado das mer- cadorias (de todas ou da maioria, tanto faz) muito abaixo dos respecti- vos preços de custo, contrair-se-á o mais possível a reprodução do capital. A acumulação, porém, paralisa-se ainda mais. Mais-valia amontoada na forma de dinheiro (ouro ou bilhetes» só com prejuízo se converteria em ca- pital. Fica por isso ociosa, entesoura- da nos bancos ou na forma de moeda escriturai, o que em nada altera a na- tureza da situação. A mesma paralisa- ção poderá surgir de causas opostas, quando faltarem as precondições reais da reprodução (como no caso do enca- recimento dos cereais, ou porque não se acumulou capital constante físico suficiente). Ocorre paralisação na re- produção e, por isso, no fluxo da cir- culação. Compra e venda se imobili- zam reciprocamente, e capital desocu- pado aparece na forma de dinheiro ocioso. O mesmo fenômeno (e isso em regra precede as crises) pode suceder quando a produção do capital exce- dente se dá com muita rapidez e a re- conversão dele em capital produtivo aumenta tanto a procura de todos os componentes deste, que a produção real não pode acompanhá-la, e daí su- birem os preços de todas as mercado- rias que entram na formação do capi- tal. Nesse caso, a taxa de juro cai muito, por mais que se eleve o lucro, e essa queda da taxa de juro motiva os mais audaciosos empreendimentos lu- crativos. A estagnação da reprodução induz o decréscimo do capital variá- vel, a diminuição do salário e a queda da quantidade do trabalho empregado Isso, por sua vez, reage sobre os pre- ços e os faz cair de novo.

Nunca esquecer que o objetivo di- reto da produção capitalista não é o valor de uso, mas o valor de troca e em especial incremento da mais-valia. Este é o motivo que impulsiona a pro- dução capitalista, e é um primor de concepção a que, para escamotear as contradições da produção capitalista, omite-lhe a base e faz dela uma pro- dução dirigida para o consumo ime- diato dos produtores.

Ademais, o precesso de circulação do capital não se conclui num dia, mas se estende por período que se prolonga até o capital voltar à forma da partida; esse período coincide com o decurso de tempo em que os preços de mercado se nivelam aos preços de custo; durante ele ocorrem grandes transtornos e mudanças no mercado; sucedem variações na produtividade

Quinzena mm*

Economia

de trabalho e em conseqüência no valor real das mercadorias. Conside- rando-se tudo isso, fica bem claro que, do ponto de partida — o capital pressuposto — até à volta dele depois de um desses períodos têm de se dar grandes catástrofes, amontoar-se e de- senvolver-se elementos da crise, que de maneira nenhuma se eliminam com a pobre proposição de se trocarem produtos por produtos. A comparação do valor num período com o valor das mesmas mercadorias em período pos- terior, o que Bailey considera deva- neio escolástico, constitui ao contrário o princípio fundamental do processo de circulação.

Quando se fala de destruição de capital por crises, há duas a distin- guir.

À medida que estagna o processo de reprodução e que o processo de trabalho se restringe ou pára de todo em certos pontos, destrói-se capital real. Não é capital a maquinaria que não se utiliza. O trabalho que não se explora eqüivale a produção perdida. Matérias primas que jazem ociosas não são capital. Edifícios (e também nova maquinaria construída) que para nada servem ou permanecem inacaba- dos, mercadorias que apodrecem em depósito, tudo é destruição de capital. Tudo isso se reduz a paralisação do processo de reprodução e a que as condições de produção existentes não exercem na realidade as funções de condições de produção, não são pos- tas em atividade. Então seu valor de uso e valor de troca vão para o diabo.

Mas, no segundo significado, des- truição de capital por crises é depre- ciação de valores, que os impede de renovarem depois, na mesma escala, o processo de se reproduzirem como ca- pital. É a queda ruinosa dos preços

das mercadorias. Com ela não se des- troem valores de uso. O que um per- de, o outro ganha. Os valores ope- rantes como capital ficam impossibi- litados de se renovar como capital nas mesmas mãos. Os velhos capitalistas quebram. Se o valor das mercadorias que um deles vendia para reproduzir seu capital era de 12 mil libras, in- cluíam 2 mil de lucro, e se elas cairam para 6 mil, não pode esse capitalista, com as 6 mil libras, pagar as dívidas que contraiu, nem recomeçar o mesmo negócio na mesma escala, mesmo que nenhuma dívida tivesse, uma vez que os preços das mercadorias voltam a se elevar aos preços de custo delas. Destrói-se assim capital de 6 mil li- bras, embora o comprador dessas mer- cadorias por tê-las adquirido pela metade do preço de custo, possa com a reanimação dos negócios prosseguir muito bem e ter até obtido lucro. Grande parte do capital nominal da sociedade, isto é, do valor de troca do capital existente, é destruída de uma vez para sempre, embora essa própria destruição, por não atingir o valor de uso, incentive muito a nova reprodu- ção. Este é também o período em que os banqueiros se enriquecem às custas do industrial. A queda do capital me- ramente fictício, dos títulos do gover- no, das ações etc — desde de que não leve o Estado e as sociedades anôni- mas à bancarrota, e não gere, com o abalo do crédito dos capitalistas in- dustriais que detêm aqueles papéis, o estorvo geral da reprodução — resulta em simples transferência de riqueza de uma mão para outra e terá em geral in- fluência favorável na reprodução, se consideramos que os novos-ricos que colhem na baixa tais ações ou papéis, em regra empreendem mais que os antigos detentores.

Gazeta Mercantil - 4.12.90

PIB registra forte retração na economia

Vera Saavedra Durão

Os indicadores do Produto Interno Bruto (PIB) para o terceiro trimestre do ano, divulgados ontem pelo Insti- tuto Brasileiro de Geografia e Esta- tística (IBGE), informaram o apro- fundamento do processo recessivo da economia brasileira.

A taxa acumulada do ano, até se- tembro, registrou uma queda de

3,85%, sinalizando resultado seme- lhante ou "pouco pior" até dezem- bro, na avaliação do diretor de con- tas nacionais do IBGE, Cláudio Con- sidera. "Um número assustador, a segunda maior taxa negativa da dé- cada", disse.

Ele previu, com base nessa esti- mativa, uma retração de 6% na renda per capita do brasileiro, só superada pelos 6,6% negativos de 1981. Esse

número foi calculado com base numa queda de 7,49*70 no produto indus- trial, de menos 4,15% no setor agro- pecuário e de menos 0,12% no setor de serviços.

Em relação ao terceiro trimestre de 1989, o produto real medido entre julho e setembro caiu significativa- mente: menos 4,20% e, no indicador anualizado, pela primeira vez neste ano ficou no vermelho, apresentando retração de 1,23%.

Apenas o índice dessazonalizado (trimestre comparado ao trimestre anterior) revelou crescimento, de 6,72%, desempenho classificado por Considera como "apenas um ajuste" frente ao impacto do Plano Collor sobre o segundo trimestre. "Não in- dica reversão de tendência da ativi- dade econômica", disse o diretor do IBGE.

O decréscimo na produção de bens e serviços do País vem sendo capita- neado pela indústria. Além da retra- ção de 7,49% de janeiro a setembro na taxa anualizada, o produto indus- trial revela queda de 3,38% e recuo maior ainda na comparação do ter- ceiro trimestre deste ano com igual período do ano passado: menos 8,19%.

De acordo com o diretor de contas nacionais do IBGE, as indústrias de transformação e da construção civil vêm sendo as mais atingidas pelo processo recessivo, junto com o co- mércio. Os dois ramos industriais pe- sam 93% no produto industrial. De janeiro a setembro, a indústria de transformação reduziu em menos 8,72% sua produção, enquanto a da construção, em menos 9,25% e o co- mércio, em 5,46%. No comparativo trimestre/1989 ante trimestre/1990, a queda foi mais brutal para a indústria em geral: 8,19%. No período, a in- dústria da construção diminuiu 11,87%.

Na análise do IBGE, a situação da indústria é preocupante, levando em conta a paralisia dos investimentos, sinaliza por uma queda de 13,6% no segmento de bens de capital até se- tembro. Outro agravante neste cená- rio de desaquecimento da atividade produtiva é a queda nas exportações.

Válvula de escape para o setor fa- bril em recessões anteriores, de 1981 a 1983, as vendas externas apresen- taram no acumulado até setembro de 1990, em relação a igual período do ano passado, queda de 10,7%. O PIB brasileiro, nos anos 80, cresceu em média 1,02% e o PIB per capita, 0,78%. Esses indicadores estão abai- xo da taxa média de expansão demo- gráfica no País nos últimos dez anos, de 2%, revelando uma produção de mercadorias e se/viços abaixo das necessidades da sua população.

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Economia

O Estado de São Paulo-27.11.90

Cresce contraste entre preço e salário no País O trabalhador recebe

hoje o menor ganho da história nacional,

diz tese de professor

Clayton Levy

O Brasil, oitava economia do mun- do, exibe um enorme contraste entre preços e salários. Ao mesmo tempo em que apresenta a menor participa- ção do salário no produto industrial, os preços médios das indústrias estão entre as maiores do mundo. Essa constatação é do levantamento feito pelo economista João Eduardo Furta- do, professor da Universidade Esta- dual Paulista (Unesp). O trabalho cor- responde à tese de mestrado que ele apresentará em dezembro na faculdade de Economia da Unicamp.

Furtado esmiuçou dados sobre pre- ços e salários de 40 países, comparan- do-os com as médias nacionais. Ele considera os números "preocupan- tes". No Brasil, os salários represen- tam 17% do produto industrial, menos da metade da média mundial (42%) e igualmente menor que a média lati- no-americana (27%). O País está atrás, por exemplo, de nações como a índia (50%) Zimbábue (41%) e Ban- gladesh (33%). O único que se com- para ao Brasil é o Kuwait, também com 17%.

Quando se analisa preços a situa- ção é inversa. O Brasil surge no topo da lista dos preços mais altos. Para efetuar a pesquisa. Furtado mediu a relação entre o valor da produção e os custos dos insumos e salários (mark- up), que serve de base para a forma- ção de preços. No Brasil, o mark-up é de 52%, um dos maiores entre os 40 países estudados. Em economias mais avançadas, a média é de 28%. Na Alemanha, por exemplo, o mark-up é de 27%, no Japão 30% e nos Estados Unidos 32%. O menor índice está com a Noruega, 15%.

O MENOR SALÁRIO

O economista situou a pesquisa no setor industrial. "Por ser mais homo- gêneo, evita distorções que influem no resultado final", explica. Embora te- nha trabalhado com dados de 1980 (data do último censo industrial). Furtado diz que os números são atuais. "A situação não melhorou de lá para cá", observa. Ao contrário, depois de uma série de planos econô- micos fracassados, segundo ele, a

participação do salário no produto in- dustrial deve ter caído para 15%.

Os números encontrados pelo eco- nomista mostram que os trabalhadores de hoje, na média, recebem os meno- res salários da história nacional. "Caímos muito em relação ao início da década de 60, quando o salário re- presentava 23% do produto, sendo esta nossa maior marca", diz. No final dos anos 50, o salário mínimo era quatro vezes maior que os atuais Cr$ 8.329, 55.

A queda salarial fica evidente quando se observa as despesas opera- cionais das indústrias, que em média são oito vezes maiores que os gastos com salários, nesse aspecto, o Brasil sõ perde para a índia e Cingapura. Na índia, as despesas operacionais são 9,11% maiores que o desembolso com salários e em Cingapura, 9,25% supe- riores. Para Furtado, os contrastes das estrutura industrial brasileira sd po- dem ser expücadas pelo processo de formação de preços. "Se observarmos os ramos industriais que têm o maior salário médio, constataremos que são justamente estes que apresentam a menor participação dos salários no produto", destaca.

A participação dos salários, nestes casos, é menor porque a formação de preços é mais oligopolizada, o que permite fixá-los mais acima", explica o economista. Para ele, em qualquer economia do mundo capitalista é difí- cil evitar o surgimento de oligopólios, "mas isso não significa espoliar a so- ciedade". Em outros países, diz ele, os oligopólios foram capazes de pro- duzir bem-estar e um certo nível de salário. "No Brasil isso ainda está por acontecer", diz. Outro responsável pelos contrastes da economia brasilei- ra, no entender de Furtado, é o prote- cionismo em que a indústria se apoiou durante décadas.

Folha de São Paulo - 05.12.90

Salários e sindicatos "Um proletariado que tenha como obje- tivo os centavos dos salários e a jorna- da de trabalho não será nunca capaz de uma grande realização histórica."

J.C.Mariategui

Aloizio Mercadante

São necessárias duas advertências Ini- ciais. Tenho me negado a discutir pela im- prensa criticas pessoais ou divergências pollhdas do PT. Há outros fóruns, e parte desta polêmica, que vem sendo alimentada recentemente, pouco contribui para a construção partidária. Em segundo lugar, quero com este artigo discutir a questão salarial em nossa sociedade, aproveitando a crítica que me fez o companheiro Flo- restan Fernandes, em sua coluna, publica- da dia 2 de dezembro, que julgo estimu- lante e que creio não se enquadrar no ce- nário acima mencionado. O motivo da críti- ca é que eu teria dito que "os trabalhado- res podem aceitar perdas num contexto mais amplo de negociação". Não disse propriamente isso, a tentativa de resumo de minha Intervenção no seminário do Fó- rum Nacbnal não foi feliz. Mas de qualquer forma há um importante debate a ser feito sobre os sindicatos, a distribuição de ren- da e os salários no Brasil.

Uma parte da sociedade ficou escanda- lizada com os dados da distribuição de renda recém-divulgados pelo IBGE. A ren- da se concentrou ainda mais nos anos 80. Os dados sobre a miséria são alarmantes: em 1968, 44.822 milhões de brasileiros, 32,5% da população, vivia com uma renda individual de 1/4 de salário mínimo, cerca de Cr$ 2 mil por mês. A fome, a miséria, as carências de toda ordem estão espalhadas por toda parte. É só sair de casa.

Porém, quando a CUT coloca na mesa o índice de 493,93%, que é o IPC acumu- lado neste ano, exige que o salário mínimo seja dobrado, que se defina um mecanis-

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f Boletim Semanal de Análise de

Conjuntura Econômica 13 DE MAIO - NEP

Para contribuir com aqueles que desejam estudar a realidade econômica, colocamos à disposição nosso Boletim de Análise de Conjuntura.

30 BTNs. Esta assinatura é válida até o final do ano. 13 de Maio • NEP • Rua Dona Avelina, 55 - Vila Mariana

CEP 04111 - São Paulo • SP

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Quinzena

mo eficaz de defesa dos salários com ga- tilho aos 5%, contraditoriamente, também é um verdadeiro escândalo. O escândalo não está nas aspirações da CUT, mas nos dados que revelam a própria realidade. Não é escandaloso reivindicar pelo menos o que se perdeu, mas muito mais difícil se- rá fazer desta reivindicação realidade.

Os anos 80 foram marcados por uma queda do PIB per capita de 0,78% ao ano. Este grande país está preso a um quadro de estagnação econômica probngada. A política econômica trocou de moeda quatro vezes, entre 1986 e 1990, acrescentou um milhão de zeros ao cruzeiro e a moeda não está estabilizada. O Plano Collor é um pa- ciente terminal. Confiscou 80% dos ativos financeiros, mas já devolveu 94% do que estava bloqueado para as empresas, aqui também os pequenos poupadores pagam a conta. A polãica monetária com uma taxa de juros de 200% ao ano vai sufocando parte das atividades produtivas como du- vidoso instrumento de combate à inflação. O PIB este ano já caiu 3,85%, o PIB por habitante 6% e a queda tende a ser mais acentuada até o final do ano. Milhares de trabalhadores não vão voltar ao trabalho após as férias coletivas de dezembro. O fim do décimo-terceiro salário e o fim das obras públicas eleitoreiras agravará a re- cessão. A safra de alimentos também foi comprometida pela política agrícola do go- verno. A equipe econômica denuncia os cartéis e oligopólios como fontes do pro- cesso inflacionário e contraditoriamente li- bera todos os preços. A insistência nesta política econômica monetarista e recessiva e a tentativa inconsistente de um ajuste estrutural neoliberal terão um custo eco- nômico e social imprevisível para a socie- dade brasileira. E na possibilidade de um desfecho militar na crise do Golfo, o qua- dro será ainda mais difícil.

Como aumentar salários frente a este governo, esta política econômica e em meio a uma crise desta gravidade? É in- questionável que será preciso lutar por salários, que esta luta é mais do que justa e necessária, mas definitivamente não basta. Acho que os anos 80 deixaram uma importante lição. Milhões de trabalhadores fizeram greve, lutaram tudo o que podiam; se não tivessem reivindicado e lutado a situação seria pior, mas a verdade é que a vida não melhorou. A possibilidade de se constituir um padrão de desenvolvimento que de fato promova distribuição de renda exigirá um novo marco de intervenção dos sindicatos e partidos ligados aos interes- ses dos trabalhadores.

Os sindicatos precisam conquistar po- der de decisão, desde a empresa até o ní- vel mais geral da sociedade. As centrais sindicais precisam colocar suas pautas de reivindicação na mesa de negociação, sem aderir a esta política econômica, que seria seu próprio suicídio político, mas exi- gindo mudanças de fundo no conjunto da ação governamental. Não haverá distribui- ção de renda se não houver uma polãica

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agrícola que sustente a produção de ali- mentos para as amplas massas famintas da sociedade; se não tivermos uma política industrial que impulsione a produção de bens de consumo popular; se não deslan- char um programa eficaz de construção de casas populares; se não iniciarmos uma verdadeira revolução no sistema educa- cional do país que assegure banco escolar para mais de oito milhões e meio de crian- ças que estão fora da escola. Não haverá distribuição de renda com inflação elevada, ou com políticas de estabilização que aca- bam por despejar nos setores mais empo- brecidos da sociedade os ônus da crise. Não haverá distribuição de renda se não houver um equacionamento definitivo para o oroblema da dívida externa e um aiuste fiscal duradouro, que alavanque a capa- cidade de investimento do setor público e promova novas políticas sociais. As políti- cas sociais são o principal instrumento de distribuição de renda para uma grande massa de trabalhadores que estão de- sempregados ou sem carteira de trabalho assinada, sem direito aos sindicatos - que correm o risco de se tornar a organização dos "privilegiados"entre os oprimidos.

Para fugir a uma lógica corporativista e dstributivista, teremos que continuar lu- tando pelos salários sim, mas construindo

um projeto político e uma concepção alter- nativa de desenvolvimento para a socie- dade. Está na hora de apoiarmos a luta da CUT e dos sindicatos, dentro ou fora do atual processo de negociação, apresen- tando diretrizes alternativas e emergen- ciais para o combate à inflação, propostas emergenciais de políticas sociais, iniciati- vas para a democratização e reforma do Estado que rompam com o paradigma neoliberal e um caminho para o desenvol- vimento que efetivamente assegure distri- buição de renda, riqueza e poder. Os salá- rios têm que ser o principal objetivo da po- lítica econômica e não um resíduo como tem sido na história recente do país; dentro deste contexto mais amplo, os trabalhado- res estarão dispostos a negociar uma polí- tica progressiva de negociação das per- das, porque estarão convencidos que o futuro lhes será favorável. Quem sabe se poderia ter sido assim com Lula?

Como diz Rubem Alves: "Quem sabe que o tempo está fugindo descobre, subi- tamente, a beleza única do momento que nunca mais será...". Será?

Aloízio Mercadante Oliva, economista, é mem- bro da direção nacional do PT e deputado fe- deral eleito.

Política Nacional

Coluna do Inca

A partir deste número, esta Quinzena trará, a cada duas edições, uma página com artigos sobre temas de formação política, elaborados pela equipe de monitores do Instituto Cajamar. Neste número, esta coluna traz informações sobre o projeto PTMemória, um conjunto de iniciativas tendentes a preservar a memória histórica do Partido dos Trabalhadores.

QUEREM JOGAR 0 PT

NA LATA DO LIXO Lixo! Este tem sido o destino da maior

parte da memória do Partido dos Trabalha- dores. Pensando nisto, o Instituto Cajamar decidiu dar início ao projeto PT*Memóha, que possui os seguintes objetivos:

• preservar a memória do Partido dos Trabalhadores

• estimular estudos políticos, históricos e sociológicos sobre o PT

• constituir um banco de dados sobre o Partido.

O projeto PT*Memória nasceu do tra- balho desenvolvido pela equipe de forma- ção política geral do Instituto Cajamar. O

Inca é uma entidade fundada em 19tí6, que se dedica a elaborar pesquisas, publica- ções, recursos pedagógicos e atividades dversas na área da educação política de ativistas dos movimentos sociais, tais co- mo cursos, seminários e debates.

Tais atividades têm demonstrado elo- qüentemente a importância da preserva- ção da memória de luta dos trabalhadores brasileiros. A deficiente educação escolar no Brasil, a dificuldade de acesso aos bens culturais e a operação de desmemo- rização de nosso povo, levada a cabo com especial afinco durante os anos da ditadu-

Quinzena Política Nacional ra militar, deixaram marcas profundas, principalmente entre as gerações pós-gd- pe de 1964.

Diante disto, o trabalho de educação política tem que se preocupar não apenas em fazer um resgate histórico da luta das classes trabalhadoras, mas também com a necessidade de se preservar a memória recente.

Cada um dos programas de formação do Instituto (a saber, são três os progra- mas: formação sindical, formação popular e formação polMca geral) está buscando desenvolver uma linha de atividades rela- cionadas a preservação dapuela memória.

O programa de formação polítíca geral do Instituto foi criado no final de 1988, com a intenção de tratar de temas político-parti- dários, atendendo a respectiva militância. Suas atividades já foram freqüentadas por militantes do PC do B, PCB, PSB, PDT e sem-paiüdo. Mas a maioria do público atingido pelo programa é constituído por ;^ petistas.

Por isto, o programa de formação políti- co geral decidiu concentrar-se em um i projeto denominado PTMemóría. Esta escolha deveu-se, além disso, a duas ou- j-S iras razões: em primeiro lugar, devido ao ij: fato do PT constituir-se numa inegável no- iij vldade no sistema político brasileiro.

Em segundo lugar, porque, passados jí 10 anos de sua fundação, a memória do Partido está se perdendo - fato detectado petos organizadores do Congresso que o $ PT realizará em 1991, que têm encontrado dificuldades em localizar documentos bá- sicos da agremiação.

O projeto PT'Memór1a inclui duas fren- tes de trabalho. A primeira é a constituição de um acervo documental, que reúna tex- tos, boletins, propagandas eleitorais, notí- cias de jornal acerca do partido, atas de reunião e todo tipo de material que diga respeito a história do Partido dos Traba- lhadores.

Este acervo documental está sendo or- ganizado através de um convênio entre o Instituto Cajamar e o Arquivo Edgard Leuenroth, que é um centro de documen- tação histórica ligado a Universidade de Campinas.

As pessoas que quiserem doar mate- riais para este acervo devem enviá-los pa- ra o Instituto Caiamar. Via Anhanguera km 46,5 - CEP 07750 - Jordanésla - SP, aos cuidados de Rodrigo.

Nessa mesma linha, o Instituto está buscando assinar um convênio com o PT, para que o acervo conte com o incentivo e patrocínio partidário. A outra frente de trabalho do projeto PT*Memória é a criação de um grupo de estudos sobre o PT, que reúna pesquisa- dores, estudiosos do tema, formadores po- líticos e dirigentes partidários.

Este grupo de estudos teria um funcio- namento bastante informal. Suas reuniões visariam informações sobre pesquisas em andamento, trabalhos publicados, expe- riências formativas. fontes disponíveis e

arquivos. O grupo de estudos manteria um ca-

dastro atualizado de pesquisadores e for- madores que trabalham com temas ligados a história do PT, bem como uma relação de fontes documentais e bibliográficas.

O grupo de estudos realizaria ainda palestras, publicações e seminários desti- nados a estimular a preservação da me- mória do PT, seja colalx>rando com o con- vênio Inca/Arquivo, seja orientando a construção de arquivos e memórias de di- retórios e núcleos do PT, seja estimulando o trabalhos e pesquisas sobre o tema.

Para isto, o grupo de estudos buscará obter financiamento junto às entidades in- teressadas no projeto. Também para esti- mular as pesquisas sobre o PT, foi elabo- rado um Dossiê do Projeto PT*Memória, que contém uma descrição de diversos temas cuja pesquisa julgamos ser de inte- resse não apenas intelectual, mas princi-

palmente polliico. A primeira reunião deste grupo de estu-

dos está prevista para acontecer em mar- ço de 1991. As pessoas interessadas em participar devem escrever para o Instituto Cajamar, aos cuidados de Valter Pomar.

Participaram da concepção do Projeto PT*Memória os integrantes do programa de formação política geral do Inca, espe- cialmente os formadores Clarice Copetti e Paulo Fontes. Ranulfo Peloso, do Cepis, é um dos autores de um 'plano de pesqui- sas" sobre o tema, datado de 1988. Os professores Kazumi Munakata, Juarez Guimarães, Márcia Beriel e Rachel Mene- guelli - assim como Cláudio Gurguel - colaboraram com sugestões as mais di- versas.

Folha de Sâo Paulo - 03.12.90

APNAD e a sociedade dos socialistas vivos

Luiz Marcos Gomes

Um dia depois da Folha publicar um importante artigo do historiador Eric Hobsbawm (edição 12.Nov.90) sobre os acontecimentos ocorridos na União Soviética e Leste Europeu do ano passado para cá, o IBGE divulgou os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), relativos a 1989.

Coincidentemente, os dados do IBGE vieram reforçar muitas das ob- servações feitas por Hobsbawm. Ana- lisando a fulminante derrocada do chamado "socialismo real", o nisto- riador inglês indaga quem foram os vencedores dessa enorme crise e res- ponde: não o capitalismo como tal, mas os velhos países desenvolvidos da Organização para Cooperação e o De- senvolvimento Econômico (OCDE), ou seja, os países da Europa Ocidental mais o Japão, o Canadá e os Estados Unidos.

Ele diz que esses países represen- tam parcela cada vez menor da popu- lação mundial — cerca de 15% hoje, em comparação com 33% em 1900. Isto é, Hobsbawm considera, no meio de toda essa polêmica sobre moderni- dade, liberalismo, livre mercado e que tais, que o capitalismo "dá certo" pa- ra apenas 15% da população mundial (que vive nos países da OCDE), ou cerca de 700 milhões de pessoas.

A grande maioria dos demais 4,4 bilhões continua vegetando em níveis de vida que variam da miséria abso- luta à pobreza, sobretudo na Ásia,

África e América Latina, sem que se descortine um horizonte visível para a solução desse problema nos marcos do livre vôo do liberalismo e do livre mercado.

Para reforçar essa constatação estão aí os nümeros frescos da PNAD rela- tivos a 1989. A concentração da ri- queza no Brasil se agrava cada vez mais. Metade da população economi- camente ativa - cerca de 30 milhões de pessoas — ganha até dois salários mínimos. Como bem observou o om- budsman da Folha, Caio Túlio Costa, ao comentar a pesquisa em sua coluna do dia 18 passado, no Brasil somente 658 mil pessoas concentram 17,3% da renda, enquanto 6,8 milhões de tra- balhadores ficam com 0,6% da renda nacional. Os 10% mais pobres têm um ganho médio de 03 salário mínimo por mês, o que eqüivale a US$ 18 no câmbio oaralelo.

É preciso, então, insistir: o que o capitalismo tem a oferecer a esses milhões de trabalhadores marginaliza- dos e superexplorados? Assim, a questão do socialismo não é apenas uma questão intelectual de menor ou maior "appeal", como às vezes certos analistas dão a entender. E, antes de tudo, uma questão objetiva que trata de uma saída possível para resolver a questão da sobrevivência de bilhões de pessoas.

Sem nenhuma duvida, os regimes que caíram no Leste europeu de 1989 para cá (e o que se decompõe rapida-

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Quinzena ® Política Nacional

mente na União Soviética) não repre- sentam o futuro como muitos imagi- navam. Mas daí a riscar simplesmente do mapa da história a perspectiva de uma sociedade socialista vai uma grande diferença.

Devemos, no entanto, reconhecer que talvez seja muito mais difícil con- solidar transformações revolucionárias do que inicialmente se imaginava. Particularmente transformações que dizem respeito à eliminação da explo- ração econômica de uma classe sobre outra e à conquista da liberdade polí- tica sem exploração econômica, assim como da igualdade econômica sem opressão política (exercida por qual- quer aparato estatal que se autodeno- mine não importa por qual nome).

Nesse sentido, a história, nos últi- mos 200 anos, está cheia de desvios e de caminhos sinuosos. Vejamos o próprio exemplo da Revolução Fran- cesa de 1789. Na época, ela chegou com furor, varreu as instituições feu- dais, derrubou a monarquia e se radi- calizou no chamado "período do ter- ror". Mas então veio Napoleão, o Primeiro Império e, em seguida, a restauração monárquica. A situação do povo francês não estava muito melhor do que antes da grande revo- lução e, em 1830, o povo se levantou de novo em armas. A monarquia recua e resiste até ser derrubada em 1848

por outra revolução popular. Vem no- vamente a república, logo substituída pelo Segundo Império, de Luis Bona- parte, até a grande crise provocada pela guerra franco-prussiana e a ten- tativa do povo parisiense de implan- tar, em 1871, quase cem anos depois de 1789, o governo popular com a Comuna de Paris, que acabou sendo derrotada pelos versalheses unidos ao resto da reação européia.

No século atual o vai-e-vem conti- nua. Al2 Guerra Mundial desemboca numa enorme crise econômica, social e política que cria as condições para a revolução socialista de 1917, na Rús- sia, e tentativas revolucionárias em outros níveis, como a Alemanha e a Hungria. Em seguida, há um período de refluxo, o crescimento do nazifas- cismo e a 22 Guerra Mundial. Ao final desta, o campo socialista se expande extraordinariamente, chegando ao apogeu no início dos anos 50, após a vitória da revolução chinesa. Nessa época, pareceu a muitos, erronea- mente, que a perspectiva era o sepul- tamento rápido do capitalismo, pois o campo socialista representava em tor- no de um terço da população mundial, com enorme potencial de crescimento. A partir do final dos anos 50, o campo socialista entra em crise, sofre pro- funda cisão e começa a se dispersar.

Por outro lado, o capitalismo reto- mou a ofensiva e recuperou seu fôle- go, inclusive no terreno das idéias. Atualmente parece que não há lugar senão para a ideologia neoliberal, tida como a única moderna e viável. De modo subjacente a toda essa discus- são, procura-se novamente legitimar a origem e o agravamento das desigual- dades sociais, tais como as reveladas pela PNAD, em virtude da completa impossibilidade de elas serem elimi- nadas nos marcos do capitalismo.

Precisamente daí vem a força do socialismo, ou seja, o socialismo co- mo proposta social, como projeto de uma sociedade sem exploração e sem opressão, como ideologia, não aca- bou, porque a exploração econômica de uma classe por outra (e de um país por outro) e sua irmã gêmea, a opres- são política, não acabaram. Por isso, apesar da morte do chamado "socia- lismo real", que abrange muitos regi- mes que, na verdade, nunca foram so- cialistas, continua existindo a socie- dade dos socialistas vivos.

Luiz Marcos Gomes, econjmista e jor- nalista, foi editor de economia dos semaná- rios "Opinião" e "Movimento" e membro do Conselho Federal de Economia no pe- ríodo 1987-89.

Folha de São Paulo - 05.12.90

Partidos querem estudar proposta do 'pacto' Os líderes dos partidos na Câmara

pediram prazo até o dia 5 de dezem- bro para divulgar suas posições em relação à proposta do "entendimento nacional". O líder do PSDB, Euchdes Scalco, disse que o governo deve "re- ver sua posição" em relação à política salarial, para que se chegue ao enten- dimento. Os líderes vão reunir suas bancadas para discutir a posição de cada partido.

A maioria elogiou a atitude das li- deranças empresariais e sindicais de procurar o Congresso Nacional. Mas o líder do PC do B, Haroldo Lima, disse que o Congresso só foi procurado porque houve um "passe mal dado, como no futebol". Segundo ele, o Congresso foi escolhido para "con- sertar um pacto que não deu certo".

O líder do PT, Gumercindo Milho- men, questionou a representatividade dos documentos assinados ontem entre empresários e trabalhadores, apontan- do a ausência da CUT e de outras en- tidades sindicais. "As ausências não podem prejudicar o entendimento", reagiu o líder do PRN, Arnaldo Faria de Sá. Após o encontro com os líderes partidários da Câmara, os represen-

tantes de trabalhadores e empresários — entre eles Luiz Antônio de Medei- ros, Paulo Francini, Emerson Kapaz e Leo Wallace Cochrane — se reuniram com lideranças do Senado.

"Me agrada muito esse 'mugido' que os senhores estão dando em dire-

ção ao governo, fixando prazos e ba- tendo na mesa", disse o vice-lfder do PDT na Câmara, Miro Teixeira, co- brando a posição de empresários e trabalhadores caso o governo não aceite propostas como a prefixação de preços e salários.

OS PRINCIPAIS PONTOS DA PROPOSTA CONJUNTA

• Juros e câmbio - Também terão me- tas fixadas por consenso. Até 13 de dezembro, governo, empresários e trabalhadores decidirão como o fórum do "entendimento nacional" acompa- nhará as políticas monetária e cam- bial. A intenção é conseguir "juros reiés suportáveis".

• Dívida - Por exigência dos empresá- rios, o governo terá que definir até 31 de dezembro um cronograma de pa- gamento de sua dívida com o setor privado, estimada hoje em mais de US$10 bilhões.

• Agricultura - Até 31 dezembro, serão definidos os investimentos do gover- no em 1991 na área de reforma agrária e o volume de recursos destinado ao custeio da próxima safra.

• Equilíbrio fiscal - O governo com- promete-se a cortar gastos e a rever

a legislação tributária para equilibrar receita e despesa no ano que vem.

• Prefixação - Trabalhadores, empresá- rios e governo definirão, om a partici- pação do Congresso, metas para a re- dução da inflação. As metas serão o limite máximo para reajustes de pre- ços, tarifas públicas e salários. Os mecanismos de prefixação devem ser definidos até 13 de dezembro.

• Salários - Trabalhadores de baixa renda receberão este mês um abono emergencial. O valor e os critérios pra a concessão do abono serão estabe- lecidos por consenso até 15 de de- zembro. Até o final do mês, também por consenso, serão definidos os me- canismos de reposição das perdas posteriores ao Plano Collor para todos os trabalhadores, inclusive servidores públicos.

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Quinzena Política Nacional

A PROPOSTA DA CUT

• Perdas - Reposição das perdas sala- riais acumuladas entre I9 de março e 30 de novembro deste ano. Os índices utilizados para medir as perdas pode- riam ser o IPC do IBGE ou o ICV (índi- ce do Custo de Vida) do Dieese. A re- posição seria feita em até quatro par- celas, a partir desta mês.

• Política salarial - Reajuste dos salá- rios com base num gatilho de 5%. Sempre que a inflação acumulada,

medida pelo IPC do IBGE, atingisse ou superasse os 5%, os salários se- riam automaticamente corrigidos pelo percentual de inflação. Unificação das datas-base para todos os trabalhado- res. • Salário mínimo - Aumento real ime-

diato de 100% para o salário mínimo. Reajuste mensal pelo INPC, acres- cido de um aumento real de 5%. In- dexação das aposentadorias e pen- sões ao salário mínimo.

Folha de Sáo Paulo - 12.12.90

Cartola petista, coelho liberal

WLADIMIR PALMEIRA

A crise do socialismo está mais do que aberta. A tal ponto chegamos que excelentes companheiros, como José Genoíno e Tarso Genro, perdem a cabeça e escrevem artigos lamentáveis como o publicado na Folha do dia 21 de novembro.

Os dois companheiros tratam da mi- séria nacional, do aumento da crimina- lidade e da participação do crime orga- nizado no processo político. Lembram a decadência do Estado e da sociedade civil. Era de se imaginar que, em seguida, mostrariam que o capitalismo brasileiro gera tais misérias e que só um combate resoluto contra as classes do- minantes poderia alterar o roteiro desse filme.

Mas não. Nossos companheiros bran- dem a ameaça do esquerdismo! Claro que combatem-no, não por si, mas por sua contrapartida fascista... Enfim, o que temem é a radicalização. Em vez de tirarem conclusões de oposição à misé- ria capitalista, tentam somente amenizá- -la, com medo dos radicais.

Para evitar a radicalização, defendem a apresentação de um programa de reformas, expressão de uma política positiva e não contingente. Um progra- ma positivo é bom. O PT, aliás, trava, no próximo ano, um grande debate sobre esse tema. Mas os companheiros centralizam a luta programática positiva em um terreno inteiramente desfavorá- vel. Querem mudar o Brasil na reforma

da Constituição, marcada para 1993. Ora, o Congresso eleito é mais à direita do que o atual. Como poderíamos imaginar que um projeto de reformas sociais e políticas pudesse ser aprovado por tal Congresso?

Nossa experiência de Constituinte mostra que podemos obter vitórias par- ciais em um Congresso com maioria de direita. Aí estão as conquistas trabalhis- tas. Mas a Constituição é reacionária e o PT votou contra seu texto. Julgar que o novo Congresso vai fazer algo positi- vo em favor de nosso povo parece ser uma enorme ingenuidade.

Parece, mas não é. Aqui é que vem a mágica. O programa positivo começa com cinco reivindicações, cuja defesa pontual não é necessariamente impossí- vel, mas que, tomadas'em seu conjunto, corporificam um programa meramente liberal.

Em primeiro lugar, democratização do Estado, onde os autores do artigo ficam em generalidades, sobretudo na parte que trata do controle da sociedade civil sobre o aparelho de Estado", ponto onde, aliás, o PT devia ver mais o próprio rabo, analisando como não mu- dou praticamente nada nas prefeituras que administra... Em segundo lugar, reforma do Judiciário, onde o primeiro ponto pede recursos para a reforma... e onde não se fala em democratização desse poder. Em terceiro lugar, tratam de mudanças constitucionais que orien- tam o controle da sociedade sobre as

empresas estatais e enunciam princípios gerais que a direita tem colocado a cada passo. Em quarto lugar, pedem parla- mentarismo. Em quinto, pasmem, o voto distrital misto. Ou seja, retiram do povo o direito de eleger diretamente seu governo e paroquializam as eleições, dificultando a representação das minori- as.

Um programa nesses termos não foge muito do que a direita libera] tem defendido. Um programa desses é um mero programa de defesa das institui- ções e não de sua substituição. É o programa da estabilidade do Estado e não de luta contra ele.

Entendemos agora por que Tarso e Genoíno depositam esperanças no Con- gresso eleito. Aqui está a mágica. Da cartola petista sai o coelho liberal. Coelho afanado, envelhecido, machu- cado por cartolas delfinianas e sandri- nas, coelho que já não cola na velha Europa, mas que no Brasil ainda dá para o gasto da direita.

Não queremos coelho por lebre. Que- remos um programa que, como diz o quinto encontro, conduza ao socialismo, embora não seja diretamente socialista. Para formular esse programa, precisa- mos do brilho de Tarso e Genoíno. De preferência sem mágica. Mas com luta. Sem cartola. Mas com cabeça. No devido lugar. Na esquerda.

WLADIMIR PALMEIRA PT-RJ.

é deputado ftdtnl pdo

Boletim do DIEESE - setembro/1990 - n* 114

TRABALHADORES REORGANIZAM SUAS ENTIDADES NO LESTE EUROPEU

As transformações sociais e econômicas ocorridas no Leste Europeu nestes últimos meses trouxeram como conseqüência para os trabalhadores um novo

questionamento e redefinição dos objetivos e atividades sindicais. Nesses países, especialmente Alemanha Oriental, Bulgária, Tchecoslováquia e Hungria,

as maiores preocupações têm sido com relação à independência frente ao Estado, a modernização das relações de trabalho e a defesa contra o

desemprego.

No primeiro semestre deste ano, vários congressos de trabalhadores do Leste Eu- ropeu tiveram como pauta a reorganização do sindicalismo diante do novo senário po- lítico-econômico, com a queda de estrutu- ras burocráticas e a introdução de meca- nismos de mercado na economia.

Mesmo apresentando traços nacionais distintos, as resoluções dos congressos puderam mostrar preocupações cumuns entre os trabalhadores:

- a afirmação da independência dos sindicatos em relação aos organis- mos de Estado, dos partidos e das organizações políticas;

- o apoio à atualização das legislações do trabalho, a fim de se adaptar às novas condições, preservando ao mesmo tempo o direito dos trabalha- dores, nomeadamente o direito de greve;

- a vontade de defender os trabalhado- res das ameaças de desemprego e contra uma brusca degradação do ní- vel de vida;

- a preocupação de preservar as con- quistas econômicas e sociais dos trabalhadores;

- o desejo de reorganizar e democrati- zar as estruturas sindicais reforçando o papel das organizações de base nas empresas e adaptando os seus programas de ação às novas condi- ções;

- uma redefinição das prioridades no plano das atividades internacionais, esforçando-se para superar os obs- táculos e divergências entre os sindi- catos de várias filiações.

A nova ordem econômica também le- vou os sindicatos a reivindicarem progra- mas de proteção social. O caráter da pro- priedade passou a ter uma importância fundamental, fazendo com que os traba- lhadores se manifestassem contra uma larga privatização das empresas públicas e a entrega dos bens nacionais ao capital estrangeiro.

Alemanha Oriental Na República Democrática da Alema-

nha (RDA), 2.516 delegados, representan- do 8,6 milhões de trabalhadores, estiveram reunidos dias 31 de janeiro e I9 de feverei-

ro no Congresso Extraordinário dos Sindi- catos Nacionais,

Foi feito um balanço do processo de re- novação do movimento sindical e discutiu- se a criação de estruturas sindicais demo- cráticas, pluralistas e independentes.

O congresso decidiu acabar por com- pleto com as antigas estruturas centraliza- das e reduzir em 80% os efetivos do apa- relho sindical. Aprovou-se também, como tarefas dos sindicatos, lutar peto direito ao trabalho e melhorias de condições de vida dos trabalhadores, além de fazer oposição às ideologias autoritárias, como o neofas- cismo.

Os trabalhadores alemães reunidos no congresso manifestaram ainda o interesse de se aproximarem das entidades sindi- cais internacionais, no sentido de desen- volver a cooperação e solidariedade entre os trabalhadores de todo o mundo.

O encontro deliberou que, no final deste ano, os trabalhadores se reunirão nova- mente no I Congresso dos Sindicatos da RDA.

Bulgária Um novo estatuto e uma nova platafor-

ma de ação. Esses foram os pontos acer- tados no final do XI Congresso Extraordi- nário dos Trabalhadores da Bulgária, reali- zado em Sofia, dias 17 e 18 de fevereiro deste ano.

Os congressistas decidiram a partir do encontro formar a Confederação dos Sin- dicatos Independentes da Bulgária, com o objetivo de defender e promover os inte- resses dos trabalhadores, de forma inde- pendente em relação aos partidos políticos e estruturas estatais.

O grande avanço que caracterizou as discussões foi a união das forças sindicais e o entendimento de que somente ações unificadoras e construtivas poderiam dar respostas concretas às reivindicações dos trabalhadores.

Hungria O XXVI Congresso dos Sindicalistas

Húngaros também indicou uma nova pos- tura do movimento sindical frente às mu- danças polflicas ocorridas no país.

O Conselho Central dos Sindicatos Húngaros foi dissolvido e com ele coloca-

ram-se em cheque as práticas sindicais em vigor no país nos últimos 40 anos.

As questões levantadas foram a inde- pendência e o pluralismo sindical, além de um apelo para a união e cooperação no quadro de uma nova Confederação Nacio- nal.

A partir do congresso, realizado de 2 a 4 de março deste ano, fundou-se a Confe- deração Nacional dos Sindicatos Húnga- ros, e adotou-se uma carta e o programa de ação dos novos sindicatos.

Os princípios fundamentais da Confe- deração são o compromisso com a demo- cracia, a solidariedade, a transparência, o consenso e a independência em relação às organizações políticas.

Tchecoslováquia De acordo com os demais países, a

Tchecoslováquia viu-se envolvida em transformações que não podiam deixar de esbarrar em mudanças a nível do movi- mento sindical. Nos dias 2 e 3 de março, realizou-se o Congresso Sindical Extraor- dinário, que culminou na ruptura e questio- namento da atuação do antigo Movimento Sindical Revolucionário (ROH).

O encontro foi dividido em duas partes. A primeira dedicada a dissolução das ve- lhas estruturas sindicais personificadas no ROH e a segunda centrada na criação dos novos estatutos da Confederação Tche- coslovaca dos Sindicatos (CSKOS).

O programa da nova entidade consoli- dou as bases do futuro do sindicalismo tcheco na independência em relação aos poderes públicos, às instituições econômi- cas, organizações sociais e partidos políti- cos.

A Confederação proclamou ainda a in- tenção de basear suas atividades nos princípios da solidariedade internacional, cooperação e na igualdade dos direitos.

Causa Operária n'114- Outubro/90

Trotsky e a Folha de S. Paulo Pièrre Broué

Na segunda-feira posterior ao Sim- pósio Internacional "Trotsky: Passado e Presente do Socialismo", realizado na USP entre 10 e 14 de setembro de 1990, a Folha de S. Paulo publicou uma entrevista de página inteira com dois participantes: o professor Pièrre Broué e Esteban Volkov (neto de León Trotsky, que a Folha rebatizou como "Sedov"). A entrevista foi pu- blicada sob o título "Stálin e Trotsky morrem juntos", de responsabilidade exclusiva da Folha, e reproduzia de maneira deformada as respostas dos entrevistados, em especial uma res- posta do prof. Broué, na qual a "de- mocracia" foi colocada como um va- lor superior à revolução cubana. O prof. Broué, que se encontrava numa tumê de conferências no Nordeste, enviou imediatamente uma carta à Folha, esclarecendo: a) que jamais pensou nem afirmou que Stálin e Trotsky tivessem morrido juntos, mas que, ao contrário, esforçou-se durante toda a sua permanência no Brasil em explicar que as idéias de Trotsky es- tão mais vivas do que nunca, b) que sempre foi um defensor incondicional da revolução cubana contra o impe- rialismo, independentemente de quão "democrático" fosse este. A entre- vista (Folha de S. Paulo, 12/10/90) veio acompanhada de um artigo de Jo- sé Arbex, Editor de Exterior, titulado "Fim de século enterra pólos de auto- ritarismo", onde se afirma notada- mente que "o trotskismo e sua face negra, o stalinismo... combatiam no mesmo terreno, o da sobreposição messiânica do bem coletivo à felicida- de individual. Eram semelhantes, co- mo são semelhantes, necessariamente, dois exércitos que se enfrentam". A respeito, o prof. Pièrre Broué enviou a carta que reproduzimos a seguir.

"Ao professor Osvaldo Coggiola, organizador do Simpósio Internacio- nal "Trotsky: Passado e Presente do Socialismo":

"Já manifestei a minha surpresa e indignação a respeito da maneira com que a Folha de S. Paulo permitiu- se intitular a entrevista que concedi ao Sr. José Sanchetta Ramos, pois escre- vi imediatamente uma carta de pro- testo a esse jornal. A imprensa não deve deformar ou falsificar as opi- niões daqueles que nela se exprimem.

"Mas foi só agora que li o artigo de

José Arbex, quem suponho seja o au- tor do 'título' da minha entrevista, na medida em que esse título resume per- feitamente suas idéias e se opoé às minhas. Quero então, através da pre- sente, me dirigir a todos os que de uma ou de outra maneira participaram do Simpósio organizado pela USP em São Paulo. Com efeito, durante cinco dias pesquisadores e historiadores ex- puseram, discutiram e confrontaram os fatos relativos ao stalinismo, numa re- flexão cientifica que merece, no mí- nimo, ser respeitada.

"Eis então que um jornalista se permite exprimir a esse respeito, sem mencionar um só dos resultados do Simpósio, uma opinião que ele acre- dita ser pessoal, mas que não é mais que o reflexo — apenas encoberto de um verniz de linguagem 'libertária' - da idéia que tentam impor os senhores do mundo, no Leste como no Oeste. Essa idéia, a da equivalência entre Stálin e Trotsky, a de Trotsky inspira- dor de Stálin e autor moral de seus crimes, é aquela que o grande histo- riador soviético V.P. Danilov definiu como sendo inspirada, na URSS, pela maldade criminosa e, no Ocidente, pela ignorância com pretensões. E es- se jornalista, ainda por cima, tenta de- fender essa idéia, através de uma fal- sificação e de um título mentiroso, usando a autoridade de um historia- dor, eu mesmo, que não paro de com- batê-la há várias décadas!

"Sr. Arbex: o que teria o senhor para dizer na minha exposição d abertura do Simpósio, quando mostrei o que estava em jogo na luta entre Stálin e a Oposição de Esquerda? Que stalinistas e opositores estavam de acordo? Então, por que Stálin massa- crou os opositores? Aleksandr Podt- chekoldin mostrou a estruturação de burocracia como camada social privi- legiada, numa operação organizada e realizada por Stálin em 1922. Mas pa- ra o Sr. Arbex, nao há diferenças en- tre o capanga e o escravo: todos eles pertencem à mesma 'cultura'...

"A esse respeito devo dizer que, contudo, o Sr. Arbex, no mínimo, pertence à mesma cultura de Slálin. Como Stálin, não responde aos argu- mentos. Como Stálin, silencia à aqueles que o incomodam ou os de- forma e falsifica. Como Stálin, mente para tentar impor suas oponiões pes-

soais. Admito, porém, que o sr. Arbex ainda não organizou um massacre!

"Todos os participantes do Simpó- sio viveram os seus grandes momen- tos, onde ficou claro que o stalinismo, face negra da história da humanidade no século XX (é necessária muita in- consciência para escrever que o sta- üsmo foi a face negra... do trotskismo, que foi o primeiro a combatê-lo!) está morrendo vergonhosamente, no mes- mo momento em que cresce a cada dia a estatura de León Trotsky, que lutou quase sozinho contra o stalismo numa época em que muitos homens como o sr. Arbex encontravam-se do lado de Stálin."

"Este duplo movimento é uma re- vanche e uma vitória. Vitória da ver- dade histórica, ou da pura e simples verdade. Revanche definitiva contra todos os "assassinos da memória" e contra os seus cúmplices, daqueles que acreditavam, como Trotsky, que a maior feücidade humana não está na exploração do presente mas na prepa- ração do futuro". Mas não é este o campo escolhido pelo sr. Arbex. Todo o mundo tem o direito de expressar uma opinião pessoal. Todo mundo de- ve ter o direito de proferir asneiras sem necessidade de prová-las. Mas é imensa a responsabilidade dos ho- mens da imprensa que tratam a Histó- ria como se ela lhes pertencesse, que escrevem sem saber, que julgam sem compreender, que utilizam e deturpam o trabalho dos outros.

"Desejo que outros opinem e con- denem o método empregado pelo sr. Arbex para fazer prevalecer as suas oponiões. A democracia tem esse pre- ço: é necessário acabar com procedi- mentos semelhantes aos descritos e ensinar a certos jornalistas a necessi- dade da modéstia. O respeito pelo tra- balho e pelas conclusões dos especia- listas serão a primeira manifestação deste aprendizado. Desejo também que outros jornais reproduzam o meu protesto, agradecendo por antecipado. Esta luta não interessa apenas aos historiadores da URSS. O Simpósio o demonstrou. Existem na URSS ho- mens e mulheres para os quais o arti- go do sr. Arbex é uma punhalada pe- las costas. Eles também têm o direito de uma exposição honesta das suas opiniões e não têm necessidade de li- ções.

Terceiro Mundo n» 134/1990

Golfo Pérsico

Nada será como antes As alterações que o conflito no Golfo estáo provocando na economia

regional, e a reformulação de alianças políticas e militares mostram que o status quo que se mantinha quase inalterável desde o pós-guerra está

mudando de forma drática

Beatriz Bissio

À medida em que passa o tempo, ficam mais claras as mudanças no cenário inter- nacional, e na região do Oriente Médio em particular, provocadas pela decisão de Saddan Hussein de invadir o Kuait, e pela reação que essa medida suscitou nos Estados Unidos.

Com o drástico aumento do preço do petróleo, o fantasma do racionamento de energia volta a rondar as economia oci- dentais, que mostram sintomas de estar entrando num ciclo rescessivo. A Situação de agrava pelos efeitos do bloqueio eco- nômico contra o Iraque.

Nos Estados Unidos, por exemplo, os agricultores perderam, com o boicote, um dos seus mais importantes clientes: em 1989, o Iraque comprou cereais no valor de um bilhão de dólares. E se as conse- qüências do bloqueio se fazem sentir nu- ma economia poderosa - ainda que em declfnio -, como a norte-americana, bem pior é a situação dos países do terceiro mundo. Não somente pelos efeitos do choque petrolífero, como pela impossibili- dade de encontrar mercados alternativos a curto prazo para os produtos que exporta- vam para o Iraque e o Kuait

Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), os países mais afetados pela atual crise do petróleo são a índia, Paquistão, Japão e Coréia, que compra- vam a maior parte dos seus derivados de petróleo nas refinarias do Kuait. Isso levou o poderoso Japão a adotar medidas pre- ventivas: está diminuindo o uso dos siste- mas de ar condicionado e a iluminação dos prédios públicos, além de promover cam- panhas exortando o consumidor a poupar energia.

O caso do Sri Lanka é representativo do drama dos países que ficaram, de um dia para outro, sem poder contar nem com o Kuait, nem com o Iraque como parceiros comerciais: Bagdá era o segundo maior comprador (depois do Egito) do famoso chá do Ceilão, o principal produto de ex- portação dessa ilha do oceano Índico, que está com a sua economia arrasada pela guerra civil. São 50 milhões de dólares anuais que o governo de Colombo tem agora que negociar com outros comprado- res potenciais.

A pior situação é a da Jordânia, cujo o único porto, o de Aqba, no mar Vermelho, foi praticamente interditado pelas forças norte-americanas. Essa medida vai oca- sionar aos cofres jordanianos um prejuízo de mais de um bilhão de dólares. E não somente todo o comércio exterior do país está sendo afetado, como o turismo, um dos mais importantes Itens da economia jordaniana, caiu praticamente a zero.

Aliás, os países que vivem do turismo ) uma atividade muito sensível às variações do preço do petróleo - vão ser enorme- mente prejudicados. Só Cingapura estima que perderá 250 mil turistas nos próximos doze meses.

Na África, na Ásia e na América Latina, os governos estão estudando planos de racionamento de energia e revendo as metas de crescimento econômico.

Os paliativos são insuficientes - O presidente George Bush solicitou às insti- tuições multilaterais - como o Banco Mun- dial (BIRD) e o Fundo Monetário - que estudem a forma de compensar os danos que estão sofrendo as economias do Ter- ceiro Mundo com o embargo ao Iraque.

Mas o seu discurso, realizado na reu- nião plenária do encontro anual do FMI, decepcionou os dirigentes dos países subdesenvolvidos que esperavam medi- das concretas por parte dos Estados Uni- dos para ajudar a atenuar a crise. Jogando toda a responsabilidade sobre o FMI, a Casa Branca lavou as mãos. E tanto Bush quanto os dirigentes dos países subde- senvolvidos conhecem bem a inflexibilida- de que o FMI, o BIRD e outras instituições semelhantes têm tido em relação às ne- cessidades de apoio financeiro do Sul.

No máximo, o presidente norte-ameri- cano poderá obter um tratamento especial para aqueles países que são vitais para a estratégia militar de Washington no Golfo, como o Egito e a Turquia, Eles podem ter as suas dívidas "perdoadas" e, possivel- mente, obterão algum empréstimo signifi- cativo como recompensa peto fato de "estarem carregando boa parte do peso das sanções e da alta dos preços do pe- tróleo", segundo palavras do próprio Bush.

Mas, fora isso, é pouco provável que a

comunidade financeira internacional e os organismos multilaterais de crédito mudem a sua estratégia em função da crise no Oriente Médio. Peto menos enquanto ali- mentarem a esperança de poder enqua- drar os governos do Terceiro Mundo nas suas políticas de ajuste, verdadeiras cami- sas de força para as enfraquecidas eco- nomias periféricas.

Caso a crise se alastre, ou comece uma guerra, tudo pode mudar. Até porque, mesmo os govemos que têm mostrado maior empenho em se submeter as políti- cas do FMI e do Banco Mundial, podem ter que chegar à adotar posições de força - como uma moratória das suas dívidas ex- ternas - diante da possibilidade de suas economias chegarem a uma situação limi- te.

O gigante passa o pires - Que o mundo já não é o mesmo de um atrás, to- dos sabem. Os meios de comunicação ocidentais têm se mostrado muito eficazes na cobertura dos acontecimentos no Leste europeu e das mudanças na União Sovié- tica. Porém, a crise no Golfo deixou ainda mais clara essa nova realidade.

Por outro lado, a União Soviética, pela primeira vez, preferiu por ênfase nos pon- tos em comum com os Estados Unidos em relação a um conflito no Terceiro Mundo, do que manter uma posição Isolada, de superpotência com interesses hegemôni- cos na região do Oriente Médio,

A única nuance que fez questão de mostrar foi a sua convicção de que uma solução definitiva para a crise do Golfo não será viável sem levar em conta toda a pro- blemática dessa conturbada região. Ou seja, sem se realizar uma conferência in- ternacional sobre o Oriente Médio.

Uma conferência assim, que sentasse à mesa de negociações todas as partes interessadas, permitiria - na opinião da URSS - conseguir uma solução duradoura não só para a atual crise do Golfo, como para o caso do Líbano e do conflito ára- be-israelense, com a criação do Estado palestino.

Essa foi, aliás, uma das sugestões de Saddan Hussein, rapidamente rejeitada pela Casa Branca e pela primeira-ministra Margareth Thatcher.

Mas não é só a União Soviética que já não é a mesma, O atual conflito mostrou que, se é verdade que os Estados Unidos mantêm as suas aspirações hegemônicas e de liderança mundial, lhe está faltando fôlego. Comentaristas de Washington as- sinalaram que foi evidente o embaraço do secretário de Estado, James Baker, e do Tesouro, Nícholas Brady, dos Estados

Unidos, ao terem que se deslocar ao Ja- pão, à Europa e, até mesmo, aos países produtores de petróleo do Golfo, em busca de apoio financeiro para poder arcar com as despesas da escalada militar no Oriente Médio. "Onde já se viu uma super- potência de pires na mão?", foi o comentá- rio mais ouvido nesses dias nos corredo- res da Casa Branca e do Pentágono.

O mais humilhante foi ter tido que ape- las até mesmo para o Kuait invadido. Isso fez com que alguns legisladores norte- americanos afirmassem que agora os Es- tados Unidos são uma espécie de "merce- nários". Aliás, essa palavra foi amplamente utilizada nos debates no Congresso.

Mas a situação econômica não permite veleidades para um país que está gastan- do 46 milhões de dólares por dia - o custo confessado - nas operações do Golfo, e que até 30 de setembro tinha investido nessa ofensiva 2,5 bilhões de dólares. Se- gundo Washington Post, "os custos do conflito poderiam chegar a 23 bilhões de dólares, no primeiro ano",

Isso, num momento em que a Casa Branca e o Congresso discutem os cortes no orçamento federal para o novo ano fis- cal, que serão da ordem dos cem bilhões de dólares, afetando praticamente todos os setores da atividade do Estado, do funcio- nalismo aos serviços essenciais.

O cenário também muda no Golfo - A invasão do Kuait e a conseqüente queda da dinastia Sabah também estão mudando o mapa pollíico do Oriente Médio. Por um lado, provocou a reconciliação entre o Irã e o Iraque, com o fim do conflito fronteirisso e o intercâmbio de prisioneiros (o regime de Bagdá aceitou as reivindicações de Te- erã em reação ao canal de Shat-al-Arab, onde desembocam os rios Tigre e Eufra- tes, que tinham sido a causa original da guerra entre ambos países).

Dessa forma, o governo dos aiatolás se converteu, de maneira inesperada, em um aliado de Bagdá na denúncia das ambi- ções hegemônicas dos Estados Unidos na região petrolífera do Golfo. Analistas do Golfo explicam que, mais forte que as dis- putas de fronteira, foi a convicção comum da necessidade de se preservar a sobera- nia do Golfo, a qualquer custo, nas mãos dos países da região, evitando a volta dos colonialistas.

Por outro lado, devido à rivalidade pes- soal que existe entre o presidente Hafez Assad, das Síria, e Saddan Hussein, e às divergências ideológicas que dividem as duas facções do partido Baath - no poder nos dois países há várias décadas - Da- masco tomou partido ao lado dos Estados Unidos, apesar de estar na lista negra da Casa Branca, acusado de fomentar o ter- rorismo. Desta forma, Hafez Assad se reaproximou dos países moderados do Golfo, com os quais sempre teve diver- gências políticas profundas.

Mas as mudanças nao je limitam às atitudes adotadas petos governos da re- gião. Talvez mais significativas e profun-

das sejam as alterações que os desdo- bramentos da crise do Golfo estão produ- zindo nas massas árabes. Saddan Hus- sein tem agido com inteligência nesse ter- reno, buscando falar ao coração dessa populações secularmente marginalizadas na hora das decisões e exploradas eco- nomicamente.

O rei Fahd, da Arábia Saudita, e outros governantes dos ricos Estados do Golfo, foram acusados por Hussein de monopoli- zarem as riquezas do petróleo, em benefí- cio pessoal. A família Sabah tinha, de fato, uma fortuna calculada em 60 bilhões de dólares, e o rei Fahd, segundo Bagdá, acumulou 18 bilhões de dólares.

Saddan também fez um apelo aos po- vos árabes, em vários discursos, a se voltarem contra os seus governantes, por terem trazido forças militares estrangeiras paras a região.

As palavras do dirigente iraquiano tive- ram muita repercussão no povo dos paí^ ses mais endividados e pobres da região, como Jordânia, lêmen, Sudão, Tunísia, Mauritânia e Djibuti, que não por acaso fi- caram ao lado de Bagdá nas votações na Liga Árabe.

As nações ricas, reunidas no Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) - formado pela Arábia Saudita^ Kuait, Bahrain, Qatar, Oman e Emirados Árabes -, têm tido tra- dicionalmente, uma política de apoio aos países árabes não-produtores de óleo crú. Em 1988 consederam empréstimos no valor de 27 bilhões de dólares, metade dos quais para os países árabes que não têm petróleo e estão sufocados pela dívida externa.

Mas a cifra diminuiu no ano passado, em função da queda dos preços do petró- leo. (Para se ter uma idéia do volume de perdas que essa queda representou na re- gião, assinale-se que, em 1980, a receita dos países do CCG foi de 212 bilhões de dólares, e em 1989 caiu para 60 bilhões).

Por causa das denúncias de Hussein, e também pelo mal-estar que em amplos setores causou a atitude desses gover- nos, considerada na região extremamente servil aos Estados Unidos, os analistas prevêem surtos de violência e insatisfação nas nações do Golfo, nos próximos me- ses. O mesmo raciocínio é válido para o caso do Egito onde muitos especialistas acham possível que ocorram tentativas de golpe de estado contra Hosni Mubarak.

A invasão do Kuait tocou num outro problema, que agora passa a um primeiro plano: mostrou que as fronteiras e o status quo do pós-guerra não eram imutáveis no Oriente Médio. A tal ponto que os Emira- dos Árabes já estão discutindo a sua própria viabilidade como nação indepen- dente. Pelo sim, pelo não, eles estão for- mando um exército de reserva, numa cor- rida contra o tempo: desejam aumentar em 25 mil os seus 43 mil efetivos atuais. Ou- tros Estados do Golfo também estão con- vocando os homens para se alistarem nas forças armadas.

As mudanças não terminam por aí. Há quem faça uma relação direta entre a de- posição de Benazir Bhutto, no Paquistão, e a crise no Golfo. Após a queda da primei- ra-ministra, as forças ligadas ao ex-ditador Zia ul-Haq estão a cada dia mais fortes no Paquistão, e o seu governo, mais alinhado aos Estados Unidos. Ao ponto de que o Paquistão decidiu enviar uma força militar ao Golfo, se constituindo no primeiro caso de uma nação muçulmana, não-árabe, a acertar partilhar com os Estados Unidos a responsabilidade da operação punitiva contra o Iraque.

Novo quadro - Por tudo isso, pode-se dizer que nada será como antes no Oriente Médio e, possivelmente, a nível mundial, mesmo que não chegue a eclodir uma guerra no Golfo. Estudiosos do fenô- meno do islamismo sentem que a aproxi- mação entre o Irã e o Iraque vai contribuir muito para a diminuição da hostilidade en- tre os árabes nacionalistas, mas partidá- rios da secularização da vida pública, e os fundamentalistas islâmicos. Consideram, também, que pela primeira vez desde a morte de Gamai Abdel Nasser, as massas árabes mais pauperizadas e os refugiados palestinos sentem que há um líder capaz de defender a sua causa e de enfrentar as agressões dos neocolonialistas.

Por isso, apesar de vários Estados da região terem ficado ao lado dos Estados Unidos, rachando a unidade da Liga Árabe, importantes setores da população desses países tomaram partido do Iraque. Isso terminará afetando as lideranças políticas e a sociedade em geral, o que por sua vez poderá trazer conseqüências no plano ins- titucional.

Por outro lado, mais do que nunca ficou claro, perante o mundo árabe, a debilidade dos regimes monárquicos do Golfo, que para se defenderem dependem de tropas estrangeiras.

Os Estados Unidos sentem que, caso tomem a iniciativa contra o Iraque, o sen- timento de revolta das populações islâmi- cas será ainda maior. Interpretariam o gesto simplesmente como uma agressão a um Estado árabe.

Esse foi, também, o recado que o go- verno francês captou através das várias personalidades que enviou ao Terceiro Mundo para explicar a sua posição na cri- se. Pierre Malroy, primeiro secretário do Partido Socialista francês, afirmou, ao voltar da sua missão: "No Terceiro Mundo, e em particular no mundo árabe, existe a impressão de que os Estados Unidos e os países ocidentais estão protagonizando uma guerra de agressão".

Os verdes franceses foram mais longe: "Nem os Estados Unidos, nem a França, ou qualquer país ocidental têm um man- dato da ONU para transformar o Oriente Médio num novo Vietnã", disse um comu- nicado do Partido Verde francês sobre a crise do Golfo.

O conflito se afasta, assim, do fato que provocou, a invasão do Kuait, e se amplia.

transformando-se num confronto Norte- Sul. Isso não ocorre por acaso: é que o Terceiro Mundo entende que falta aos Es- tados Unidos autoridade moral para se ar- rogar o papel que têm assumido na crise, enviando à Arábia Saudita e aos Emirados Arábes o maior contingente militar desde o fim da guerra do Vietnã.

Depois de fecharem os olhos, durante mais de vinte anos, à ocupação dos territó- rios palestinos por parte de Israel, e após terem invadido impunemente o Panamá e

Jornal do Brasi - 1*. 12.90

Granada (para não mencionar outros ante- cedentes históricos), como podem preten- der, agora, levar o mundo a uma guerra contra o Iraque pela invasão ao Kuait? Tu- do para preservar os seus interesses es- tratégicos no petróleo do Golfo?

E o que é pior, os governos do Terceiro Mundo, sufocados e com a sua viabilidade comprometida pela crise da dfvida externa, constatam agora que os Estados Unidos lavam as mãos em relação às brutais con- seqüências econômicas que o bloqueio ao

Uma guerra do petróleo à vista? Moacir Wernech

Resumo da ópera em português: Sad- dan Hussein, alegando razões históricas e geográficas, invadiu e anexou o Kuait; o Conselho de Segurança da ONU conde- nou a ação, como cabia; os Estados Uni- dos mandaram prontamente para a área do Golfo um poderoso contingente militar (na- vios, aviões, tanques, e um total, este mês, de 240 mil homens); outros pafses da Grã-Bretanha à Argentina, se fizeram pre- sentes na área.

O Conselho de Segurança se reuniu anteontem para "implementar" as resolu- ções anteriores. Foi dado um prazo final ao Iraque para se retirar do Kuait: 15 de janei- ro, (Antes, não: repugna a sensibilidade dos novos cruzados derramar sangue, ainda que de infiéis, durante as festas de natal.)

O emprego de força militar irá desenca- dear um conflito de proporções imprevisí- veis. Traz consigo a ameaça de uma guer- ra de fundo religioso e racial, antiislâmica e antiárabe. E isto acontece no mesmo mo- mento em que a Conferência de Seguran- ça e Cooperação na Europa chega a um acordo histórico, que reduz substancial- mente os arsenais bélicos e inaugura "uma nova era de paz, democracia e unidade", como reza a Carta de Paris.

Para a linha dura de Washington, trata- se de fazer prevalecer a lei internacional, seja a que preço for, derrotando militar- mente o ditador Saddan Hussein. Parece existir no entanto - pensam outros -, uma perspectiva de obter por meios pacíficos a retirada das tropas iraquianas do Kuait.

Num e noutro sentido desenvolveu-se nas últimas semanas uma atividade febril. Um dia se contará a história secreta dessa novela de intrigas e espionagem, de fanfar- onadas e blefes de um pôquer a beira de um abismo. Mas, por outro lado, alguns lí- deres se esforçam por alcançar uma solu- ção ampla e duradoura, vinculando a questão do Gdfo ao problema geral do Oriente Médio, no qual se inclui o conflito árabe-israelense. Não foi possível. Per- sistem, contudo, diferenças de comporta- mento entre os Estados que condenaram o Iraque.

Será ainda possível uma solução pacf- fica, por meio de negociações? Ou esta-

de Castro

remos diante de um fracasso histórico da diplomacia mundial? Seria aterrador. Se- não se consegue resolver pacificamente um problema como este do Kuait, nas atuais circunstâncias de fim da guerra fria sob uma "nova ordem internacional", have- rá motivos para acreditar que esta expres- são refinada da convivência dos povos e nações, a diplomacia, simplesmente faliu.

Mas não vamos cair no pessimismo total. Nós mesmos, brasileiros, tivemos uma experiência muito elucidativa. O Ita- maraty enviou à Bagdá uma missão che- fiada por um experiente diplomata, o em- baixador Paulo Tarso Flexa de Lima, para negociar a saída dos nossos patrícios, e ele conseguiu, numa admirável demons- tração de habilidade e competência, trazer todos de volta. Outros países obtiveram bons resultados por via da negociação, oficializada ou não. O ex-chanceler da Alemanha, Willy Brandt, marcou um tento memorável; e, por sinal, detectou "ele- mentos de flexibilidade" em Hussein "pes- soa difícil, mas não desprovida de interes- se pelo diálogo". E ex-premier japonês Nakasone também não perdeu a viagem. A União Soviética conseguiu retirar cerca de mil reféns, graças a presença de um negociador, o conselheiro levgueni Prima- kov. (Se agora Gorbatchev dá um murro na mesa para reclamar a saída dos res- tantes, é lícito atribuir-lhe a impaciência à tensão causada pelos' problemas inter- nos; na realidade, seria desastroso para ele mandar tropas para combater na Ará- bia).

Dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, só dois, os Esta- dos Unidos e a Grã-Bretanha têm uma postura abertamente belicosa; França e URSS apoiam o ultimato contra o Iraque, mais adotam uma atitude moderada; a China se absteve. Ao extremismo anglo- americano se tem oposto a tendência a continuar atuando em favor de uma solu- ção negociada.

Tanto nos Estados Unidos como na In- glaterra, entretanto, há resistência à políti- ca de força. O Congresso norte-americano defende suas prerrogativas: quer ser ouvi- do em caso de recursos às armas. O ex- secretário de Justiça Ramsey Clark, outro

regime de Bagdá - imposto praticamente pela Casa Branca à ONU - está tendo nas debilitadas economias do Sul.

A perplexidade com as atitudes de Wa- shington não se limita, aliás, aos países do Terceiro Mundo. Também na Europa e no Japão se vê com apreensão - e excessiva passividade, talvez - a imponente mobili- zação de forças militares norte-america- nas no Golfo. O mundo não quer ser em- purrado a um beco sem sa/da.

que toi à Bagdá negociar a liberação de reféns, acha que o próprio bloqueio eco- nômico ao Iraque é "uma flagrante violação do Direito Internacional". O ex-primeiro mi- nistro britânico Edward Heath, que também se reuniu com Saddan Hussein, entende que devem ser dadas garantias contra o uso do Kuait como base de uma ofensiva contra o Iraque, depois da eventual retira- da das tropas que ocupam o Kuait.

Da parte Árabe, o presidente do lêmen, país que agora assume a presidência (ro- tativa) do Conselho de Segurança, já faz uma advertência da qual convém tomar nota. Ali Abdullah Salih acha o emprego da força "uma decisão muito perigosa, que ameaça toda a região". O mundo árabe foi contra a invasão do Iraque - declara -, mas a Intervenção estrangeira e as reite- radas ameaças de uma ação militar estão levando os árabes a apoiar Hussein.

É suspeito o zelo pela aplicação a ferro e fogo das decisões da ONU contra o Ira- que. Como explicar, em contraste, que te- nham permanecido letra morta as resolu- ções sobre a questão palestina? Causa estranheza tanto empenho democrático em restituir o Kuait. pela força, ao xeque Sabah, potentado feudal, cuja má fama corre o mundo. Saddan Hussein é chama- do de tirano e comparado a Hitler; mas, ao mesmo tempo, o presidente Bush caí nos braços de Hafez Hassad, da Síria, a quem até outro dia apontava como um dos che- fes do terrorismo internacional. E o mesmo Bush não vacila em concluir uma estreita aliança com o rei Fahd, da Arábia Saudita, sobre qual o Time informa ter juntado uma fortuna de 18 bilhões de dólares, graças à taxa que coora sobre caca barm de pe- tróleo extraído em seu feudo.

Invoca-se, também, na questão do Kuait, um julgamento moral. As pesquisas de opinião dos Estados Unidos, entretanto, indicam a queda de populandade do go- vernante, que chama à guerra por essa causa. E o mundo, afinal, ainda não es- queceu as lições da guerra do Vietnã. Nem a América Latina engoliu as versões faju- tas com que Washington tentou explicar as invasões de Granada e do Panamá.

Se houver uma guerra no Golfo pérsico, não será uma guerra pelo direito e pela moral. Será uma guerra do petróleo e peto petróleo. Uma guerra estúpida, da qual a humanidade só sairá perdendo, e o nosso povo, em particular, terá de pagar o preço do recrudecimento de uma inflação catas- trófica

Quinzena Internacional Terceiro Mundo nu 134/90

Meta: um rápido cessar-fogo 4s negociações entre o governo de Luanda e a Unita

podem conduzir a um acordo de paz

Maria Chinawe

No dia 27 de setembro foi concluída em Sintra, nos arredores de Lisboa, a quarta ro- dada de negociações entre o governo an- golano e a organização contra-revolucionâ- ria Unita, sob os auspícios do governo por- tuguês.

A novidade da última reunião - que, co- mo as anteriores, transcorreu em absoluto sigilo - foi a presença de observadores da URSS e dos EUA.

Os trabalhos correram por conta de duas comissões, uma relativa aos princípios polí- ticos para a instauração da paz em Angola e outra, dedicada à discussão dos assuntos militares e de todos os detalhes relativos ao cessar-fogo.

Nessa comissão ficou acertado que a assinatura do cessar-fogo deveria ser pre- cedida - ou pelo. menos simultânea - de um acordo político global sobre os princípios que irão nortear o período de transição e a própria realização das eleições pluhpartidâ- ríasjâ aprovadas pelo MPLA. Outra delicada questão militar a ser resolvida é a formação de um exército nacional único, com os efeti- vos atuais e os membros dos comandos guerrilheiros da Unita.

A reunião anterior tinha sido realizada em agosto e, naquela ocasião, a delegação do govemo de Luanda propôs que os temas políticos e militares fossem discutidos sepa- radamente. O mesmo critério foi adotado nas negociações de Sintra, onde o chefe da delegação oficial angolana foi o jurista Antô- nio Pira, assessor especial do presidente José Eduardo dos Santos. A representação da Unita foi chefiada por Alicerces Mango.

Muita flexibilidade - Apesar dos avan- ços obtidos em relação aos encontros ante- riores, em Sintra não se chegou a nenhum acordo concreto devido às divergências que subsistiram em relação à exigência da Unita do seu reconhecimento, 'de jure", como partido político.

Nas palavras do primeiro-ministro portu- guês, Aníbal Cavaco e Silva, para superar essa questão 'vai ser necessário, de ambas as partes, muita flexibilidade".

No contexto do diálogo entre as autorida- des angolanas e a Unita, realizou-se uma tele-conferência via satélite entre o presi- dente de Angola, José Eduardo dos Santos, e membros do Congresso dos Estados Uni- dos.

Nessa oportunidade, o presidente Dos Santos solicitou aos congressistas apoio para os esforços que desenvolve o seu go- verno para obter a reconciliação nacional. O chefe de estado angolano afirmou que uma solução negociada e nâo-militar para o con- flito é uma meta na qual ele pessoalmente está empenhado. E citou a aceitação do princípio de eleições gerais em um regime pluripartidârio como uma demonstração de que o seu governo age com flexibilidade. Mas lembrou que uma consulta popular só poderá ser realizada após o cessar-fogo e o fim das hostilidades. A presença de obser- vadores internacionais estará assegurada.

Dos Santos solicitou aos congressistas que levassem em consideração o quanto a guerra dificulta a realização de uma consulta popular: 'Nós não temos censo, a nossa Constituição deve ser revista para formali- zar a nossa transição para um sistema plu- ripartidârio e é necessário estruturar os me- canismos apropriados para a realização de eleições em âmbito nacional", disse ele. Dos Santos citou a sua preocupação com a con- tinuação e eventual aumento da ajuda militar secreta dos Estados Unidos à Unita, "um elemento que perturba as negociações", na sua opinião.

Em contrapartida, o presidente citou as ações empreendidas pelo seu governo a fim de alcançar a paz: a retirada total das tropas cubanas; a negociação com a Unita; a for- mulação de um plano de nove pontos (que conseguiu o apoio parcial da Unita), 'consi- derado unanimemente uma boa base de ne- gociações"; a transição gradual para uma economia de mercado regulada, e a aceita- ção por parte do seu governo da chamada proposta Trpüce zero, apresentada pela URSS.

Essa proposta "envolve o compromisso de não comprar, dos soviéticos ou de tercei- nos, materiais adicionais para o nosso exér- cito, se a Unita cessar todas as atividades de reabastecimento de material bélico e se empenhar na conclusão do acordo de ces- sar-fogo'.

Nesse sentido, Dos Santos assinalou que o governo Bush e a Unita estão real- mente empenhados em conseguir a paz, não há explicação para não aceitarem o pla- no proposto pelos soviéticos.

Terceiro Mundo n» 134/1990

Libéria

Fechar as feridas

Depois de meses de guerra civil, que forçou quase um-terço da população a

, se refugiar nos países vizinhos, o povo Uberiano depende do apoio da comunidade internacional e de um acordo interno para virar a página e começar de novo.

Joseph Oweni

Nunca na sua história o povo da Libéria tinha estado como agora, submetido a um confronto de raízes étnicas, que transformou esse pequeno pafe de pouco mais de cem mil quilômetros quadrados num grande campo de batalha. Nem a queda e morte de Samuel Doe conseguiu pôr fim aos comba- tes entre os grupos armados rivais, agora em luta pela sucessão presidencial.

Os especialistas estão convencidos de que não só uma negociação política, como também a mediação das várias comunida- des religiosas da Libéria, será necessárias para se obter uma reconciliação.

Mas antes, é preciso terminar com os combates, além de se conscientizar a co- munidade internacional da importância de doar alimentos e medicamentos para o povo liberiano. Milhares de habitantes da Libéria está passando fome, não têm mais água nem luz elétrica, e faltam médicos e remé- dios, principalmente para as vítimas da epi- demia de cólera que se alastra por alguns bairros de Monróvia, a capital libenana.

Temendo serem colhidos pelos comba- tes ou caírem vitimados pelas doenças e a fome, grandes quantidades de refugiados liberianos chegam a Serra Leoa, Costa do Marfim e outras nações vizinhas. Diversas organizações de beneficência estão come- çando um trabalho de assistência junto a eles, porém ainda é muito precário, se le- varmos em consideração as necessidades dos exilados.

Samuel Doe tinha tomado o poder em abril de 1980, através de um golpe militar que derrubou o governo de William Tolbert, um fiel aliado dos norte-americanos na Áfri- ca Ocidental. O presidente Tolbert e os seus principais assessores foram fuzilados por Doe, cujo governo se caracterizou, des- de o começo, pelo uso da violência.

Apesar das suas reiteradas promessas de democratizar o país. Doe, um ex-sar- gento do exército, nunca cumpriu a sua pa- lavra. Ao contrário, ele perseguiu os partidos de oposição, especialmente o Partido Po- pular Uberiano, liderado por Amos Sawyer, prestigiado jurista que foi um dos autores de

Quinzena Internacional um projeto de Constituição que Doe tinha se comprometido a submeter a plebiscito. Sawyer foi preso, acusado de conspirar contra o governo, viveu muitos anos no exf- lio, e atualmente é o chefe de Estado desig- nado pela força de paz formada pelos Esta- dos vizinhos da Libéria, que entrou no pafs buscando pôr fim à guerra civil.

A disputa pelo poder vinha sè agravando desde o início deste ano, quando Charles Tayior - ex-colaborador de Doe - entrou na Libéria à frente de um exército guerrilheiro de quase 200 homens, Tayior, um dirigente da etnia g/o,, tinha a intenção de derrubar Doe, que pertencia ao grupo dos Krhan.

Mais de cinco mil pessoas morreram desde então, nos combates entre as forças leais ao ex-presidente e os guerrilheiros de Tayior, que desde agosto controlam a maior parte do país. Quase todas as vitimas per- tenciam aos grupos gio e mano, que habitam

o nordeste da Libêna, onde a rebelião co- meçou. E foram mortas pelas forças arma- das, protagonistas de um verdadeiro mas- sacre denunciado por várias organizações de defesa dos direitos humanos.

Quem governa quem? - Quem acabou por derrubar Doe não foi Tayior, e sim Prin- ce Johnson, o outro líder rebelde que vinha lutando pelo controle do poder na Libéria. Qs seus seguidores capturaram e assassina- ram Doe, depois de duro cerco à sua resi- dência e longos combates.

Pouco conseguiu fazer para evitar mais derramamentos de sangue a força multina- cional de paz formada em agosto por Nigé- ria, Serra Leoa, Gana, Guimé e Gâmbia, to- dos eles países vizinhos da Libéria e mem- bros da Comunidade Econômica da África Ocidental. Mas esses países obtiveram uma vitória no terreno político: promoveram uma reunião de exilados, chamada "Conferência

Nacional Liberiana", que redigiu um progra- ma de transição à democracia e escolheu um governo interino, encabeçado por Amos Sawyer, para ser responsável pela organi- zação de eleições livres.

Q secretário executivo da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Ecowas), Abbas Bundu, afirmou, em fins de setembro, que Prince Johnson - apesar de ter-se declarado presidente da Libéria quan- do Doe foi deposto - aceitou colaborar com o governo de Amos Sawyer.

Agora a prioridade é concretizar um ces- sar-fogo e sensibilizar a comunidade mun- dial sobre a necessidade de apoiar o novo e precário governo liberiano com ajuda huma- nitária de emergência. É a única esperança de evitar a morte por inanição dos segmen- tos mais atingidos pela guerra civil.

Terceiro Mundo n* 134/90 Tunísia

Não à igualdade Depois de adotar uma atitude pioneira no mundo islâmico, reconhecendo na década de 50 a igualdade da mulher e do homem perante a lei, o governo tunisiano começa a ceder diante das pressões dos fundamentalistas.

Essma Ben Hamida

Como em oulros países árabes, o funda- mentalismo islâmico vem ganhando cada vez maior espaço na Tunísia. E um dos pontos onde mais se sente este fenômeno é no retro- cesso em relação aos direitos da mulher.

No caso da Tunísia, o movimento funda- mentalista islâmico tem como um dos seus objetivos imediatos revogar o Código de Igualdade de Direitos da Mulher, instituído em 1956. A aprovação deste código repre- sentou uma espécie de revolução para a so- ciedade islâmica do país, já que ele concedeu às tunisianas direitos mais amplos do que os das mulheres européias da época.

O código foi redigido por um grupo de intelectuais do período de pré-independên- cia, dirigido por Tahar Haddad, e substituiu a lei do Corão pela lei comum. Esta legislação estabeleceu que a mulher passasse a receber um salário igual ao do homem, ao desempe- nhar a mesma função.

Em 1957, as mulheres obtiveram direitos sindicais e políticos e em 1975 foi dado o acesso a cargos de responsabilidade no go- verno. O código émais abrangente: proíbe a poligamia e o "repúdio" duas tradições que ainda persistem na maioria dos países mu- çulmanos.

Ao reconhecer os direitos da mulher, também lhe outorga o recurso do divórcio legal, em igualdade de condições com o ho- mem- "A Tunísia é a única nação islâmica onde a mulher tem o mesmo direito ao divór- cio que o homem", comenta a advogada Bo- chra Belhaj Hamida. Inclusive a lei favorece mais à mulher que ao homem. Em 1961, em uma emenda feita ao código pelo então pre- sidente Habib Bourguiba, se estipulou que quando um homem se divorcia de sua mulher deve lhe dar uma ajuda para mente-la nas mesmas condições em que vivia quando esta- va casada.

A lei também penrute à mulher escolher o seu marido e não submeter-se à decisão de seus pais, como acontece em praticamente todos os demais países islâmicos. Não é per- mitido que uma jovem se case antes dos 17 anos e o matrimônio só pode ser combinado na presença da noiva e com seu consenti- mento.

Eliminar a discriminação - Além desta legislação nacional, o governo ratificou vá- rias convenções internacionais que reiteram a igualdade de direitos para as mulheres. A convenção mais recente, que elimina todas as formas de discriminação contra a mulher, foi adotada em 1979 e abrange os princípios de convenções anteriores. Reitera^ a igualdatle das mulheres em diferentes campos, incluin- do a nacionalidade da esposa e de seus filhos.

"Mesmo quando convenções internacio- nais são ratificadas, a maioria do povo - par- ticularmente as mulheres - e até os juizes as ignoram", comenta Hafidha Chekir, profes- sora de Direito.

Outro problema é que a maioria dos acor- dos não tem sido publicada no Diário Oficiai As leis e regulamentações internas contradi- zem estes acordos, mesmo nos casos em que a legislação internacional se sobrepõe às leis nacionais. Chekir denuncia que há contradi- ções entre a teoria e a prática destas leis.

Ao ratificar a convenção internacional sobre a eliminação de toda forma de discri- minação contra a mulher, o governo ex- pressou suas reservas. Considera que o Islã é a religião nacional e para dar-lhe mais espa- ço, a convenção foi despojada de seus princí- pios inovadores. Também se despojou a mu- lher dos direitos de igualdade contidos no código de família de 1956.

Chekir e Belhaj Hamida afirmam que o fato de não aderir às convenções internacio-

nais ratificadas confirma que a legislação familiar é limitada e tem contradições.

A mulher solteira na Tunísia, ao contrário do homem, que pode reivindicar sua inde- pendência aos 16 anos, deve permanecer com sua família até que se case. Uma vez casada, está sob o jugo de seu marido a quem deve obedecer como chefe da família, segundo a religião islâmica.

O marido está obrigado a manter a sua família e, por sua vez, controla a vida social e particular de sua esposa. A mulher deve soli- citar permissão ao seu marido para tirar um passaporte e aceitar um trabalho. Além do mais, sua carreira está em segundo lugar, pois deve seguir seu marido onde quer que ele vá.

O outro lado do divórcio - "A maioria dos casos de separação legal se dá porque qualquer desobediência da mulher pode ser causa de divórcio", comenta Belhaj Hamida, "O abandono do lar é punido no caso da mulher, mas não no do homem", acrescenta a advogada. Como está estabelecido que o ho- mem que se divorcia deve manter sua mulher para sempre, a ex-esposa permanece depen- dente dele por toda vida, a menos que ela volte a se casar.

Belhaj Hamida - que lida com muitos casos de mulheres divorciadas que não rece- bem nenhuma ajuda de seus maridos - consi- dera, no entanto, que esta é a única ajuda econômica com que conta a mulher divorcia- da para manter seus filhos e ter uma vida de- cente. "Os homens divorciados em nossa so- ciedade são irresponsáveis, não dão nenhuma ajuda econômica a suas famílias, nem sequer as visitam, nem aqueles que vão para a prisão por não cumprir esta lei", acrescenta Hami- da.

Muitas mulheres divorciadas ou abando- nadas de poucos recursos econômicos, can- sadas de tanto trâmite legal e rejeitadas por suas famílias, recorrem à prostituição como único meio para manter suas famílias.

Mesmo quando muitas tunisianas adqui- rem a custódia de seus filhos depois do di- vórcio, o pai continua sendo o guardião legai dos menores. O papel da mulher é cuidar e alimentar os filhos; as decisões importantes, sobre seu estudo e seu futuro, são da res-

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Quinzena mm

Internacional ponsabilidade do homem.

Outro problema sério é que uma mulher divorciada não pode obter um passaporte para seu filho sem o consentimento do pai, pois seu nome não é reconhecido pela escola nem pelo banco. "Freqüentemente, as mu- lheres não podem tomar decisões nem sequer em casos tão urgentes como o de doença de um de seus filhos, quando o marido está au- sente", afirma a advogada.

Adultério: dois pesos, duas medidas - "As leis da Tunísia podem parecer revolu- cionárias para uma sociedade muçulmana, mas na prática há muitas distorções que bur- lam a igualdade entre as mulheres e os ho- mens", acrescenta Hamida.

Segundo a lei, qualquer um, mulher ou homem, acusado de adultério, é condenado a cinco anos de prisão. No entanto, o juiz, em geral, convence as mulheres a retirarem as queixas contra seus maridos, mas não têm a mesma conduta quando acontece ao contrá- rio. Se uma mulher mata seu marido porque o descobre em adultério, a condenam a 20 anos de prisão, mas se o homem comete o mesmo delito só lhe dáo cinco anos. Nas he-

A Classe Operária - 15.11.90

ranças ainda se aplica a lei do Corão, segun- do a qual os homens recebem o dobro do que cabe à mulher.

Finalmente, muitas vezes decisões legais menores passam por cima da legislação esta- belecida. Por exemplo, o ministro da Justiça, desrespeitando o Código da Família e as convenções internacionais e "para surpresa dos profissionais da lei", baixou em 1973 uma circular proibindo o casamento entre uma mulher muçulmana e um homem não- muçuimano, a menos que ele se convertesse à religião muçulmana.

No entanto, no caso dos homens a situa- ção é diferente. Eles podem se casar com uma mulher não-muçulmana sem exigir-lhe que se converta a sua religião. Este tipo de "matrimônio misto" não é proibido pelo có- digo.

Se olharmos para trás, parece que não existe nenhuma contradição fundamenta] entre o código de 1956 e o espírito da reli- gião islâmica. Porém, muitos homens e in- clusive mulheres se opõem a qualquer mu- dança que julgam pôr em risco os princípios do Islã.

A trajetória de Tupac Amaru LejeuneMato Grosso'

Em 4 de novembro de 1780 eclodiu uma das maiores rebeliões contra o domínio espanhol na América, liderada por Tupac Amaru. Be comandou índios, criollos e brancos, defendendo os ideais de justiça e liberdade.

Ao ouvirmos íalar de Tupac Amaru, logo lem- bramos dos Tupamaros, grupo de guerrilha urbana uruguaio. Pouco sabemos sobre a real história deste que foi, com certeza, um dos maiores líderes de re- beliões anticoloniais contra a Espanha. Em nossos livros de história, mesmo o de autores mais progres- sistas, pouco ou quase nada se fala de Tupac Ama- ru.

Nascido provavelmente em 1741, Tupac Amaru era na verdade José Gabnel Condorcanki Noguera, filho de uma desendente direta de Tupac Amam I, um dos 4 Incas de Vilcabamba, que por sua vez des- cendia do grande Húascarlnca. Alguns historiadores tentam contestar a descendência de José Gabriel, aceita amplamente por diversas correntes peruanas, oficiais ou não.

A Grande Rebelião Seu maior feito histórico, após largar a sua vida

particular de pequeno comerciante e transportador na região andina, foi a de organizar os índios perua- nos para a resistência aos colonizadores espanhóis. Essa rebelião era contra "as autoridades do vice-rei- nado: os repatriamentos mercantis: o mau governo dos corregedores; a ineficiência e lentidão da Justi- ça: e fundamentalmente ao direito de governar o Pe- ru'.

Para o levante, Tupac Amaru contou com índios, cnollos, brancos e todos aqueles que defendiam os ideais de liberdade e justiça. Foi assim que em 4 de novembro de 1780, há portanto, 210 anos, eclodea revolução que seria uma das primeiras e mais im- portantes contra a dominação imperialista.

O levante de Yamacea, a três léguas de Tinta, ocorre num sábado, em plena festa que o corregedor local (representante da monarquia espanhola) esta- va dando em comemoração ao aniversário do rei Carlos III. Foi também nesse movimento que pela primeira vez um representante direto da coroa foi justiçado (corregedor Antonio Juan de Arriga).

Condenado à morte, TUPAC AMARU vive

Tupac Amam não viu em vida o seu ideal do Pe- ru libertado. Mas deu, com seu gesto e com sua prá- tica, exemplo para os que o sucederam. Mesmo na sua prisão em abril de 1781, manteve elevada a dig-

nidade Tupac Amam, seus filhos HipóSto (20 anos) e Fernando (13 anos), sua mulher e companheira Mh caela Bastidas (36 anos). Cedba, sua meia-irmá, vá- rios caciques e lideres revolucionários, foram presos e assassinados por decisão do Tribunal de Cuzco, pelo motivo descrito como "do horrendo crime de re- belião e a organização geral dos índios, mestiços e outras castas..." Conta-se que antes de sua conde- nação, a corte tentou que Tupac Amam entregasse companheiros, ao que ele respondeu: "Nós somos os únicos conspiradores. V. Majestade por haver to- mado o país e imposto medidas insuportáveis e eu por querer libertar o povo de semelhante tirania ".

Sua morte, em 18 de maio de 1781, foi trágica, lembrando a do nosso Tiradentes. Suas mãos e pés foram amarrados em 4 cavalos que, montados por bons cavaleiros, foram impelidos a correr em dire- ções opostas, de modo a que seu corpo fosse es- quartejado. Não conseguindo esse feito, o respon- sável pela sua execução determinou que braços e pernas fossem decepados a golpes de grandes fa- cões e sua cabeça posteriormente cortada. Sua lín- gua foi cortada e antes do seu suplício final, ainda presenciou o assassinato dos seus filhos, esposa e correligionários.

Ao final dessa macabra cerimônia, partes de seu corpo foram transportadas para diversas localidades peruanas. A maior parte de seu corpo e de sua com- panheira Mícaeia Bastidas, foi levada a Pichu e queimada, e sua cinzas espalhadas no rio Watanay.

Grandes Exemplos de Homens Os lutaoores pela libertação da América espa-

nhola, precursores de Tupac Amam, como Inácio Torote (1737), Juan Santos Atawalpa (1742), Anto- nio Cabo, Miguel Suríchac e Francisco Inca (1750), José Gran Kispe Tito Inga (1777), Lorenzo Farfán e Bernardo Tambowasco (1780), e tantos outros que o sucederam como San Martin, Simon Bolívar, Fara- bundo Marli e Augusto César Sandino, compõem um conjunto de revolucionários que deixaram importan- tes sementes que ficam para a posteridade, dando exemplos para gerações futuras, nas lutas de liber- tação detodo o continente da exploração e espolia- ção imperialista.

* Lejeune Mato Grosso - sociólogo da UNIMEP e colaborador da "Classe Operária"

XMtíssimos- EUA X CUBA

Os EUA querem que a URSS acelere a redução de sua ajuda econômica à Cuba. Em Iroca, os EUA, ao lado da Alemanha, oferecem aos soviéticos auxí- lio na solução da escassez de alimentos. A URSS vi- ve uma crise de abastecimento dramática, principal- mente nas grandes cidades. (GM)

CAI GOVERNO Uma greve geral de quatro dias contra a política

econômica derrubou, no final de novembro, o ^Mi- nistro da Bulgária, Andrei Lukanov (do PSB - ex- comunista, maioria no parlamento). Na Bulgária há racionamento de energia elétrica, combustíveis e faltam alguns alimentos básicos. (FSP)

PRIVA TIZAÇÃO RUSSA O Congresso dos Deputados do Povo da Fede-

ração Russa, a maior das 15 Repúblicas sociéticas, restaurou a propriedade privada da terra do país. A lei foi aprovada por 602 votos a favor, 369 contra, 40 abstenções. A propnedade pnvada da terra passa a ser de pelo menos 10 anos. Depois deste período seu proprietário só poderá vendê-la ao Estado. (Es- tadão).

PANAMÁ Seja quais tenham sido os propósitos da rebelião

militar no Panamá, dia 5 de dezembro, o povo pa- namenho e o mundo viram mais uma vez os EUA esmagar a soberania de um país latino-amencano.

BOLÍVIA O Exército de Libertação Nacional (ELN) execu-

tou no dia 5 de dezembro o presidente da Coca Co- la, Jorge Lonsdale, depois que a casa onde Lons- dale vinha sendo mantido desde junho loi invadida pelo exército boliviano.

ALBÂNIA Cinqüenta mil pessoas reunidas em um ato pú-

blico dia 12 de dezembro, na Universidade Enver Hoxha, em Tirana, fundou o PD-Partido Democráti- co, de oposição ao governo albanês. Liberdade de manifestação, religião e reunião, economia de mer- cado são pontos do programa do PD, que quer parti- cipar das eleições parlamentares de fevereiro. (Es- tadão)

GREVE GERAL Líderes das três principais centrais italianas de

trabalhadores, CGL, CISL e UIL convocaram uma greve geral de quatro horas para o dia 20 de dezem- bro. A decisão pela greve foi tomada depois do fra- casso nas negociações sobre o contrato coletivo dos metalúrgicos. (GM)

CHILE No máximo até abril serão libertados os cerca de

300 presos políticos existentes no Chile. O Congres- so aprovou reforma que dá ao presidente Patrício Aylwin poder para indultar presos políücos. (Esta- dão).

ÁFRICA DO SUL Oliver Tambo, presidente do Congresso Nacio-

nal Africano - CNA - retomou dia 13 de dezembro ao seu país, após 30 anos de exílio. Tambo tem 73 anos. (GM).

POLÔNIA O presidente eleito da Polônia, Lech Walesa,

nomeou o advogado Jan Olszewski, 60 anos, pri- meiro-ministro de seu governo. Walesa assume o governo dia 22 de dezembro. Jan Olszewski ê mem- bro fundador e consultor jurídico do Solidariedade, foi advogado de dissidentes políticos, é amigo do cardel primaz da Polônia, Josef Glemp. É também um dos fundadores da Aliança de Centro, partido de Walesa. (FSP)