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Revista SÍNTESE Direito Imobiliário ANO VI – Nº 33 – MAIO-JUN 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Saletti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Adalto Quintino da Silva, Álvaro Villaça Azevedo, Chrystiane Domingos, Hermison Ricardo Bioni, Janine Carvalho Bertuol, Pâmella Batista Del Preto, Pedro Camera Pacheco, Riad Fuad Salle, Robson de Oliveira, Rogério Tadeu Romano ISSN 2236-1553

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Revista SÍNTESEDireito Imobiliário

Ano VI – nº 33 – MAIo-Jun 2016

ReposItóRIo AutoRIzAdo

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – Despacho nº TRF2-DES-2013/08087

dIRetoR executIVo

Elton José Donato

GeRente edItoRIAl e de consultoRIA

Eliane Beltramini

cooRdenAdoR edItoRIAl

Cristiano Basaglia

edItoRA

Simone Costa Saletti Oliveira

conselho edItoRIAl

Christiano Cassetari, Luciano Lopes Passarelli, Luiz Antonio Scavone Junior, Luiz Henrique Sormani Barbugiani, Marcelo Manhães de Almeida, Rubens Carmo Elias Filho

colAboRAdoRes destA edIção

Adalto Quintino da Silva, Álvaro Villaça Azevedo, Chrystiane Domingos, Hermison Ricardo Bioni, Janine Carvalho Bertuol, Pâmella Batista Del Preto, Pedro Camera Pacheco, Riad Fuad Salle,

Robson de Oliveira, Rogério Tadeu Romano

ISSN 2236-1553

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2011 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito Imobiliário.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 4.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço: [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista SÍNTESE Direito Imobiliário. – Vol. 1, n. 1 (jan./fev. 2011)- . – São Paulo: IOB, 2011- . v.; 23 cm.

Bimestral. v. 6, n. 33, maio/jun. 2016

ISSN 2236-1553

1. Direito imobiliário.

CDU 347.453 CDD 342.1242

Bibliotecária responsável: Nádia Tanaka – CRB 10/855

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Imobiliário, publicamos como Assunto Especial o tema “Fiança”. Sobre o tema escolhido selecionamos rele-vantes artigos dos ilustres juristas: Riad Fuad Salle, Adalto Quintino da Silva, Pedro Camera Pacheco e Hermison Ricardo Bioni.

Ainda, na Seção Especial “Em Poucas Palavras”, artigo de Pâmella Batista Del Preto intitulado “A Fiança nos Contratos de Locação com Prazo Indetermi-nado” e artigo de Janine Carvalho Bertuol intitulado “Quais os Riscos de Ser Fiador em Contrato de Locação de Imóveis?”.

A fiança, regulada pelos arts. 818 a 839 do Código Civil, consubstancia espécie de garantia de cumprimento de obrigação, em que uma pessoa se obri-ga (fiador) a adimplir perante outra (credor) um débito a esta devido por uma terceira pessoa (devedor/afiançado).

São partes no contrato de fiança o fiador e o credor. O devedor, enquanto afiançado, não integra o contrato de fiança, sendo que esta pode ser formaliza-da ainda que sem seu consentimento, nos termos do art. 820 do Código Civil.

Na Parte Geral selecionamos um vasto conteúdo, para mantermos a qualidade desta Edição, com relevantes temas e doutrinas de grandes nomes do direito, tais como: Marco Álvaro Villaça Azevedo, Robson de Oliveira e Chrystiane Domingos.

E, ainda, na Seção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, artigo de Rogério Tadeu Romano intitulado “A Outorga de Escritura e a Adjudicação Compulsória.

Por fim, na Seção Especial “Acontece”, publicamos o artigo “Confira Cui-dados Que Se Deve Ter ao Comprar ou Vender um Imóvel”.

Aproveite esse rico conteúdo e tenha uma ótima leitura!

Eliane Beltramini

Gerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ....................................................................7

Assunto Especial

Fiança

Doutrinas

1. Fiança LocatíciaRiad Fuad Salle ..........................................................................................9

2. FiançaAdalto Quintino da Silva ..........................................................................20

3. Prorrogação dos Contratos de Locação: a Situação do FiadorPedro Camera Pacheco ............................................................................49

4. Validade da Notificação Via Eletrônica ao Fiador em Casos de Sub-rogação de LocaçãoHermison Ricardo Bioni ...........................................................................51

Em Poucas Palavras

1. A Fiança nos Contratos de Locação com Prazo IndeterminadoPâmella Batista Del Preto .........................................................................66

2. Quais os Riscos de Ser Fiador em Contrato de Locação de Imóveis?Janine Carvalho Bertuol............................................................................68

JurisPruDência

1. Acórdão na Íntegra (STJ) ...........................................................................702. Ementário .................................................................................................76

Parte GeralDoutrinas

1. Crédito de Fiança Locatícia e Direito à MoradiaÁlvaro Villaça Azevedo ............................................................................81

2. Arrendamento Rural e o Direito de Superfície em Face das Restrições Impostas pela Lei nº 5.709/1971 e Demais RegulamentosRobson de Oliveira e Chrystiane Domingos .............................................86

JurisPruDência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça......................................................................932. Superior Tribunal de Justiça....................................................................103

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3. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1174. Tribunal de Justiça do Estado do Ceará ..................................................1215. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ..........................1316. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás ...................................................1477. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais .......................................1538. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná .................................................1599. Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro ...........................................16510. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul ...............................18211. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina .....................................18412. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ............................................187

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência ...................................................................195

Seção Especial

com a Palavra, o ProcuraDor

1. A Outorga de Escritura e a Adjudicação CompulsóriaRogério Tadeu Romano ..........................................................................224

acontEcE

1. Confira Cuidados Que Se Deve Ter ao Comprar ou Vender um Imóvel ....................................................................................................229

Clipping Jurídico ..............................................................................................231

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................235

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Fiança

Fiança Locatícia

RIAD FuAD SALLEAdvogado em Marília/SP, Especialista em Direito Civil e Processual Civil, Pós-Graduado pela Univem.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Da natureza jurídica. Da positivação da forma e interpretação da fiança; 2 Polêmica jurídica. Antinomia (conflito entre normas). Divergência jurisprudencial STJ x Tribunais Estaduais; 3 Solução jurídica da antinomia; 3.1 Aplicação do princípio da especialidade; 3.2 Interpre-tação da antinomia sob o enfoque contratual; 3.3 Interpretação sob o enfoque volitivo stricto sensu. Princípio da razoabilidade; 4 Prestação jurisdicional constitucional.

INtrodução

A Súmula nº 214 do STJ dispõe que o fiador, na locação, não é respon-sável por obrigações decorrentes de prorrogação contratual a qual não anuiu. Várias ementas jurisprudenciais da Corte Superior vêm confirmando o enun-ciado, complementando-o, com o entendimento da ineficácia da cláusula que responsabiliza o fiador até a efetiva entrega das chaves. No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem mantendo o entendimento de que o ga-rantidor que assinou contrato comprometendo sua responsabilidade até a entre-ga definitiva do imóvel responde por obrigações ocorridas após o vencimento expresso, em locação prorrogada tacitamente por prazo indeterminado, caso não tenha se exonerado da obrigação.

O presente artigo visa a demonstrar que a interpretação do STJ é a mais correta à luz da hermenêutica.

1 da Natureza jurídIca. da poSItIvação da forma e INterpretação da fIaNça

Inicialmente, abordaremos, sinteticamente, aspectos da natureza jurídi-ca da fiança, a fim de traçar análise crítica em relação às questões polêmicas no que tange à aplicação do Direito em caso concreto nos contratos de fiança locatícia.

I – Trata-se de contrato unilateral, visto que gera obrigações estrita-mente ao fiador. Não obstante, entretanto, alguns atribuírem natu-

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reza bilateral imperfeita, posto que ao pagar a obrigação, o fiador sub-roga-se nos direitos do credor originário.

II – Caracteriza-se como um contrato benéfico ou gratuito, não auferin-do qualquer vantagem ao fiador. Não obstante, não haver qualquer óbice à fixação de remuneração, como forma de compensação pelo risco assumido, notadamente na fiança mercantil ou comercial.

III – É sempre contrato acessório. Pressupondo a existência de uma obri-gação principal, de ordem legal ou convencional.1

Eis as três características mais proeminentes do contrato de fiança que embasam a integração de forma e interpretação consubstanciada nos arts. 818 a 837 do Código Civil de 2002.

Assim, tendo em vista sua natureza benéfica ou gratuita, o art. 819 do Código Civil só admite a forma escrita, e impõe interpretação restritiva, ao não admitir a extensiva.

Ainda, embasado no caráter benéfico do contrato, o legislador atrelou ao direito do fiador os seguintes benefícios:

a) Benefício de ordem, previsto no art. 827 (CC), fixando-a como ga-rantia subsidiária, admitindo-se a solidariedade somente se houver renúncia expressa do fiador ao benefício;

b) Previsão no direito material (arts. 837 e 838 do Código Civil) da possibilidade de o fiador opor as exceções2 que lhe forem pessoais e as extintivas de obrigação, entre as quais quando a culpa pelo des-cumprimento pelo afiançado ocorreu em decorrência de qualquer favorecimento, omissão ou conduta por parte do credor, incluindo eventual inércia.

Destaque-se, por último, que o art. 818 (CC) atribui ao fiador o dever de garantir a satisfação ao credor somente no caso de descumprimento do afiança-do, em decorrência da natureza acessória do contrato de fiança.

2 polêmIca jurídIca. aNtINomIa (coNflIto eNtre NormaS). dIvergêNcIa jurISprudeNcIal Stj x trIbuNaIS eStaduaIS

A Súmula nº 214 do STJ, publicada no Diário da Justiça em 02.10.1998, p. 250, dispõe que:

O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

1 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 980.2 Facultatividade, de suma importância, pouco utilizada pelos operadores de Direito.

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Via de regra, os contratos de locação (principal) e de fiança (acessório) são formalizados em um só instrumento. Apesar de pactuar prazo determinado, geralmente os instrumentos com cláusulas pré-inseridas (contratos de adesão) textualizam a perpetuidade do vínculo do fiador, renunciando ao vencimen-to do contrato, por meio da frase de que sua responsabilidade, na realidade, encerrar-se-ia somente com a entrega definitiva das chaves.

Observa-se, no caso, a preocupação do credor em convencionar a norma estatutária preconizada no art. 39 da Lei nº 8.245/1991, almejando a perpetua-ção da garantia. A cláusula convencional teria, supostamente, o condão de con-validar a normal legal estatutária.

Dispõe o art. 39 da Lei nº 8.245/1991 que, não havendo disposição con-tratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a entrega definitiva do imóvel. Observe-se que, no caso da fiança locatícia, existe dispo-sição legal em contrário, haja vista que se exige a forma escrita para a validade da efetivação da garantia. Portanto, aplicando os conceitos de hermenêutica ao próprio dispositivo legal, inadmissível que a garantia fidejussória acompanhe a prorrogação tácita da locação.

O § 1º do art. 46 da Lei nº 8.245/1991 preceitua que, findando o prazo pactuado, se o locatário continuar na posse do imóvel alugado por mais de 30 dias sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato.

Verifica-se, pois, a ocorrência do fenômeno de antinomia entre normas.

O art. 39, em conjunto com § 1º do art. 46 da Lei nº 8.245, determina que o contrato de locação e suas garantias ficam tacitamente prorrogados, em razão do silêncio entre locador e locatário decorridos trinta dias do vencimento do contrato.

No entanto, o art. 819 do Código Civil só admite a formalização de fian-ça por escrito, impondo interpretação restritiva.

Cabe ao aplicador de Direito utilizar os conceitos jurídicos inerentes à solução da antinomia entre normas jurídicas, a fim de solucionar o impasse.

A Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem entendimento majoritário, de que prevaleceria a cláusula convencional de que a responsabilidade do fiador perduraria até a entrega das chaves, contra-riando jurisprudência sumulada pelo STJ, a saber:

Fiança. Responsabilidade do fiador. Locação. Fixação até a entrega das chaves. Contrato prorrogado. Exoneração. Ausência. Reconhecimento. Fiador que se obrigou até a entrega real e efetiva do imóvel e não requereu sua exoneração, como permitido pelo art. 1.500 do Código Civil de 1916, continua respondendo pelas obrigações de seu afiançado, mesmo após o vencimento do contrato es-

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crito, exceto por aquelas decorrentes de aditamentos feitos sem a sua anuência. (Ap. c/ Rev. 779.092-00/4, 29ª C., Rel. Des. Dyrceu Cintra, J. 02.03.2005)

Ao contrário, o Superior Tribunal de Justiça interpreta a Súmula nº 214 na integralidade do contexto, ou seja, mesmo que haja a responsabilização contratual do fiador até a efetiva entrega das chaves, o garantidor não seria responsável por obrigações decorrentes de prorrogação legal a qual não anuiu. Segundo o entendimento, cessa a relação jurídica, em relação ao fiador, após o vencimento do contrato, delimitando sua responsabilidade, estritamente, por possível inadimplência do afiançado dentro do prazo de vencimento expresso no contrato com prazo determinado, a saber:

A despeito de o fiador haver-se comprometido com as obrigações do locatário até a devolução do imóvel, tal não deve prevalecer se ele não concordou, ex-pressamente, com a prorrogação do contrato (Súmula nº 214/STJ), ante a natureza benéfica dessa garantia, cuja interpretação deve ser restritiva. 2. O termo inicial da exoneração do fiador, em ação declaratória com esse objetivo, deve coincidir com a data da citação, conforme, aliás, dispôs a sentença. 3. Recurso especial co-nhecido e provido, nos termos do voto do condutor. (STJ, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima, 21.10.2004, votação unânime)

A jurisprudência da Corte vem-se firmando no sentido de não admitir interpreta-ção extensiva ao contrato de fiança, daí não pode ser responsabilizado o fiador por prorrogação de prazo no contrato de locação, a que não deu anuência, mes-mo que exista cláusula de duração da responsabilidade do fiador até a efetiva entrega das chaves. Recurso conhecido e provido. (STJ, REsp 440.110/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU 11.11.2002, p. 284)

Utilizando os instrumentos da hermenêutica e os Princípios Gerais do Direito, notadamente o princípio da razoabilidade, vislumbra-se a posição da Corte Superior como a mais acertada, conforme será demonstrado adiante.

No entanto, apesar do disposto no art. 557, caput e § 1º, que estabelece que o relator deve, de forma monocrática, adequar sua decisão com súmula do Tribunal Superior, o egrégio Tribunal Estadual persiste na interpretação diver-gente à Corte Superior.

Como a Súmula nº 214 do STJ não prevê, literalmente, a ineficácia da renúncia implícita na frase “até a entrega definitiva das chaves”, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo mantém uma interpretação essencialmente gramatical ou literal, a despeito de a jurisprudência da Corte Superior repetir, ininterruptamente, valendo-se de interpretação teleológica, a invalidade abso-luta da cláusula que responsabiliza o fiador até a entrega definitiva do imóvel.

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3 Solução jurídIca da aNtINomIa

A ordem jurídica prevê os seguintes critérios para a solução de antino-mias no direito positivado, a saber:

I – Hierárquico (lex superior derogat legi inferiori), tido como o princi-pal dos critérios;

II – Cronológico (lex posterior derogat legi priori). Quando se tratar de conflito de normas pertencentes ao mesmo escalão;

III – Especialidade (lex specialis derogat legi generali). Critério aplicável para o caso concreto.3

Caso venha a ocorrer impossibilidade de remoção do conflito normativo, não se verificando a prevalência de qualquer um dos enunciados legais, surge o fenômeno da antinomia real ou lacuna de colisão, devendo ser solucionada por meio dos Princípios Gerais de Direito, positivados nos arts. 4º e 5º do Decreto--Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (LICC), robustecidos pelo art. 126 do Código de Processo Civil (Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973). Cabe ao jul-gador norteado pelos Princípios Gerais do Direito buscar a solução que melhor atenda aos anseios sociais à fórmula mais justa.

Tais dispositivos legais têm origem na primeira codificação jurídica pós--Justiniano, o Código Napoleônico, que, em 1804, positivou, pela primeira vez, sistema jurídico francês, com ampla repercussão, produzindo fundamen-tal influência no desenvolvimento do pensamento jurídico moderno e contem-porâneo4.

O art. 4º do Código Napoleônico dispunha:

O juiz que se recusar a julgar sob o pretexto do silêncio, da obscuridade ou da insuficiência da lei poderá ser processado como culpável de justiça denegada.

Utilizando-se qualquer uma das fórmulas expostas acima, evidencia-se a necessidade de que a Súmula nº 214 do STJ venha a ser respeitada e aplicada pelos Tribunais Estaduais, com absoluta primazia, na forma do entendimento reiterado por sucessivas ementas jurisprudenciais emanadas da Corte Superior.

Gildo Santos5, em notas explicativas ao art. 39 da Lei nº 8.245/1991, assevera:

3 DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro – Teoria geral do direito civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 87.

4 BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico. Trad. Márcio Pugliesi. São Paulo: Ícone, 2006. p. 73.5 SANTOS, Gildo dos. Locação e despejo. Comentários à Lei nº 8.245/1991. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2004. p. 250/251.

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A mais recente orientação do Superior Tribunal de Justiça tem estabelecido que “a jurisprudência da Corte vem-se firmando no sentido de não admitir interpreta-ção extensiva ao contrato de fiança, daí não pode ser responsabilizado o fiador por prorrogação de prazo no contrato de locação, a que não deu anuência, mes-mo que exista cláusula de duração da responsabilidade do fiador até a efetiva entrega das chaves. Recurso conhecido e provido” (REsp 440.110/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU 11.11.2002, p. 284). Como essa Corte Superior tem competência recursal para julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribu-nais dos Estados ou do Distrito Federal, quando a decisão contrariar lei federal ou negar-lhe vigência, vale dizer que cabe ao STJ dar a última palavra na interpreta-ção das leis infraconstitucionais, como é o caso da locação.

Ocorre que, infelizmente, o objetivo do legislador constituinte em aper-feiçoar e uniformizar a interpretação das normas infraconstitucionais, por meio do Recurso Especial (CF, art. 105, III), tornou-se inócuo. O Superior Tribunal de Justiça, com apenas duas câmaras de direito privado, assoberbado de deman-das, impõe excessiva e inexplicável exigência formalista para o conhecimento do recurso, estabelecendo barreira intransponível para a análise do mérito. E isso se agrava com a conduta de vários relatores dos Tribunais Estaduais que, agindo com certa aleivosia, procuram, propositadamente, não prequestionar questões nucleares apresentadas pelo jurisdicionado, mesmo em reiteradas oposições de embargos declaratórios.

A Súmula nº 214, publicada há oito anos, não consegue harmonizar o entendimento jurisprudencial dos tribunais estaduais, determinando expressi-vos prejuízos ao jurisdicionado que não obtém a apreciação meritória no re-curso especial interposto ao Tribunal Superior, mesmo com o dispositivo legal encartado no art. 557, caput, e § 1º do Código de Processo Civil. Observa-se flagrante ausência do dever de prestação jurisdicional por parte do Estado-Juiz, com absoluto descaso à pretensão do jurisdicionado.

3.1 AplicAção do princípio dA especiAlidAde

Para a solução da antinomia sob o enfoque do princípio lex specialis derogat legi generali, necessário que, de início, se verifique qual seria a norma especial em relação à outra de ordem genérica.

Indubitavelmente, deve prevalecer a norma estatutária da espécie de contrato acessório estabelecida no Código Civil, que dispõe, no art. 819, que a fiança dar-se-á por escrito, não admitindo interpretação extensiva.

A fim de demonstrar o acerto da opção acima, desenvolvamos um caso análogo. O art. 108 do Código Civil determina que a escritura pública é essen-cial à validade dos negócios jurídicos que visem a constituição, modificação,

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transferência etc. de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no país.

Portanto, ao formalizar um contrato de confissão e assunção de dívidas com garantia hipotecária, de valor superior a 30 vezes o salário-mínimo, exige--se, para a eficácia da garantia hipotecária, que seja pactuado por escritura pública, prevalecendo especialidade legal da garantia em relação ao negócio genérico.

Se formalizado por contrato particular, haverá validade do contrato gené-rico de assunção de dívidas, no entanto sem a eficácia da garantia hipotecária.

Assim, se a norma específica que institui a espécie de garantia exige contrato escrito, não admitindo interpretação extensiva, ineficaz a forma tácita, mesmo que haja previsão legal considerando prorrogado o contrato de locação e suas garantias. É absolutamente nula a presunção de prorrogação tácita do contrato de fiança por força do dispositivo encartado no art. 166, IV, do Código Civil, que determina a nulidade do negócio jurídico que não revestir a forma prevista em lei.

Portanto, no caso da fiança locatícia, com locação prorrogada tacitamen-te por determinação legal em decorrência de decurso de tempo sem manifesta-ção em contrário, não obstante ser incontestável que houve a prorrogação do contrato de locação por prazo indeterminado, não se pode admiti-lo em relação ao contrato de fiança, que, para sua eficácia, só admite a forma escrita.

3.2 interpretAção dA AntinomiA sob o enfoque contrAtuAl

Ainda na vigência do Código Civil de 1916, Orlando Gomes destacava6:

Ao princípio da boa-fé empresta-se ainda outro significado. Para traduzir o in-teresse social das relações jurídicas, diz-se como está expresso no Código Civil alemão, que as partes devem agir com lealdade e confiança recíprocas.

O saudoso Vicente Ráo7, com sua admirável inteligência e concisão, le-cionava a respeito da declaração expressa em contrato:

Considera-se expressa a declaração de vontade produzida com o propósito cons-ciente de torná-la conhecida por outrem, ou, tal seja o caso, para que produza, pura e simplesmente, os efeitos que a lei lhe atribui.

Em regra, o instrumento de locação, com garantia fidejussória, é da es-pécie de contrato de adesão, contendo cláusulas pré-impressas. Observa-se, ainda, que o contrato é complementado com seu vencimento com letras maio-

6 GOMES, Orlando. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Contratos. 24. ed. São Paulo: Forense, p. 42. 7 RÁO, Vicente. Ato jurídico. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 121.

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res que as pré-imprimidas. Assim, o vencimento previsto para o contrato de pra-zo determinado é expresso em letras bem maiores que a cláusula pré-inserida prevendo a responsabilidade do fiador até a entrega definitiva das chaves, su-postamente renunciando à duração da responsabilidade ao termo original do contrato expresso.

É ineficaz a renúncia, por não traduzir com fidelidade a real vontade do fiador.

O Novo Código Civil positivou a posição dos respeitáveis juristas men-cionados acima.

O art. 423 do Código Civil determina que, quando houver cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente; concomitantemente, o art. 424 do mesmo ordenamento jurídico dispõe que “são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”. Os dois dispositivos le-gais mencionados complementam o disposto no art. 422 do Código Civil, que trata da manutenção da boa-fé e da probidade, tanto na conclusão do contrato, como na sua execução.

No caso específico da fiança locatícia, não há como não atender, ainda, ao dispositivo encartado no art. 114 do Código Civil:

Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se restritivamente.

Pelo que foi exposto acima, fica claro que o vencimento expresso, no caso do fiador, sobrepõe-se à cláusula inserida de que sua responsabilidade se prorrogaria até a entrega final das chaves, sem necessidade de desenvolver elasticidade argumentativa adicional.

3.3 interpretAção sob o enfoque volitivo stricto sensu. princípio dA rAzoAbilidAde

Sob os enfoques volitivos e axiológicos, contrapondo-se o real venci-mento do contrato à frase pré-inserida de que a responsabilidade perduraria até a entrega das chaves, não há como prescindir, no exercício da hermenêutica, de atender ao princípio constitucional da razoabilidade, não expresso, porém implícito ao Estado Democrático de Direito.

Utilizando-se os mecanismos da empatia, depreende-se, claramente, que, mesmo que o manifestante estivesse concordando com a frase de que sua obrigação fidejussória, a despeito do vencimento inserido no contrato, abrange-ria o lapso temporal entre o termo final e a efetiva entrega do imóvel, impõe-se interpretar que a vontade real do aderente seria obrigar-se por um tempo razo-ável após o vencimento do contrato, e nunca perpetuamente.

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A frase não tem o sentido de perpetuidade. O § 1º do art. 46 da Lei nº 8.245/1991 prevê a presunção de prorrogação tácita do contrato por prazo indeterminado, somente após haver decorridos 30 dias sem que o locatário e locador ponham termo à relação jurídica. Ora, verifica-se que a norma esta-tutária referente à locação prevê um prazo de tolerância ou carência de trinta dias corridos do termo do contrato para que o locatário permaneça na posse do imóvel, sob a égide do contrato escrito já vencido, sem implicar que haja qualquer presunção de prorrogação do contrato, e sua consequente conversão de prazo determinado para indeterminado. Somente no 31º dia após o venci-mento, considerar-se-á prorrogado o contrato de locação.

Assim, sob o enfoque volitivo do garantidor da obrigação pactuada, a cláusula de que “a responsabilidade perdurará até a entrega das chaves” deve limitar-se ao lapso temporal de 30 dias determinado pela lei, para que o loca-tário permaneça no imóvel sem ocorrer presunção de formalização tácita de prorrogação do pacto locatício.

Não há como entender por que o aspecto volitivo não foi abordado pela doutrina ou jurisprudência, com a identificação da vontade real, atendendo ao princípio jurídico da primazia da realidade e ao princípio constitucional da razoabilidade.

Somente para reforçar o enfoque sob o princípio da razoabilidade, apre-sentamos o seguinte exemplo:

Instrumento consubstanciando contrato principal de locação e acessório de fian-ça, celebrado em 1978, com vencimento previsto para 1981, e cláusula de res-ponsabilização do fiador até a entrega real das chaves. Findo o pacto expresso, o locatário continua na residência, pagando rigorosamente os aluguéis até o ano de 2004. Em 2006, o locador, após despejar o locatário, decide promover a exe-cução do contrato de fiança para receber os valores referentes à inadimplência do locatário, com ocorrência registrada 25 anos após o vencimento do contrato.

Indubitavelmente, não é justo, nem razoável, o entendimento patroci-nado pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado. Contraria a função social da jurisdição e do contrato.

4 prestAção JurisdicionAl constitucionAl

O Estado cria a ordem jurídica, e, ao fazê-lo, atribui a si mesmo a condição de ser um dos centros galvanizadores de direitos e obrigações.8

O juiz e os Tribunais de Justiça são órgãos do Poder Judiciário, confor-me disposto na Constituição Federal e nas Constituições Estaduais. Portanto, o

8 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 4.

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Magistrado, no exercício da jurisdição, desfigura-se de sua subjetividade, de-vendo utilizar o requisito da imperatividade do Poder Público para viabilizar os objetivos sociais fundamentais traçados na Constituição Federal e nas normas infraconstitucionais.

Inadmissível que o próprio Estado, ao julgar caso concreto, desvincule-se de sua função social, emanando ato imperativo contaminado pela contradição aos seus próprios fundamentos e objetivos.

Partindo desse escopo, convence-nos de que a posição do STJ é que melhor atende às exigências de ordem constitucional e legal, no qual o juiz procede a uma leitura menos dogmática da lei, adequando a interpretação aos fins sociais a que ela se destina.

Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exi-gências do bem comum. (Art. 5º da LICC)

Apesar de estabelecer uma relação entre fiador e credor, é cediço que, via de regra, o primeiro nem chega a conhecer o segundo. O afiançado apre-senta ao fiador instrumento já redigido com todas as cláusulas inseridas. Por sua vez, o fiador aceita assinar, porém absolutamente constrangido (desprovido de vontade), haja vista tratar-se de pessoa a que destina grande amizade ou mesmo laços familiares.

Trata-se de contrato benéfico e gratuito. Por isso, o legislador delimitou--o o mais restritivamente possível, positivando interpretação restritiva, confi-gurando a forma escrita como a única com eficácia, possibilitando a oposição de exceções, com previsão no próprio direito material, entre outras garantias processuais previstas no direito material.

Arnaldo Rizzardo9 acrescenta:

A interpretação, nos contratos a título gratuito, é sempre favorável ao devedor, eis que inspirado o ato na intenção da liberalidade.

Ainda no mesmo sentido, o admirável jurista italiano Piero Calamandrei10:

Não basta que os Magistrados conheçam com perfeição as leis tais como são escritas; seria necessário que conhecessem igualmente a sociedade em que essas leis devem viver.

O tradicional aforismo iura novit curia não tem nenhum valor prático se não se acompanhar deste outro: mores novit curia.

É crucial que a posição do STJ venha a ser adotada pelos Tribunais Es-taduais, desobrigando o fiador por obrigações, ocorridas após o vencimento

9 Ob. cit., p. 75.10 CALAMANDREI, Piero. Eles, os juízes, vistos por um advogado. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 183.

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expresso no contrato, decorrentes de prorrogação carentes de sua anuência, mesmo que o instrumento contratual contenha cláusula de que sua responsabi-lidade perduraria até a entrega final das chaves.

Caso contrário, será necessário que o STJ publique nova súmula, substi-tuindo a 214, complementando com seu entendimento de ineficácia do termo que vincula o fiador até a entrega definitiva do imóvel, quando o vencimento da locação vier a ultrapassar o vencimento escrito.

O entendimento jurisprudencial emanado do Tribunal de Justiça do Esta-do de São Paulo é de que o fiador, neste caso, teria que requerer a exoneração da fiança, haja vista a conversão do contrato (de locação) com prazo determi-nado para indeterminado. No entanto, o entendimento pacificado pelo STJ é de que não existe qualquer relação jurídica entre fiador e credor em relação aos compromissos registrados após o vencimento do contrato. Obviamente, não há como requerer desobrigação por obrigação inexistente.

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Assunto Especial – Doutrina

Fiança

Fiança

ADALTO QuInTInO DA SILvAAnalista Judiciário da Justiça Federal, Especialista em Direito e Jurisdição (Escola da Magis-tratura do Distrito Federal).

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceito e natureza jurídica da fiança; 2 Dos sujeitos; 3 Do objeto; 4 Das modalidades; 5 Dos efeitos; 5.1 Dos efeitos decorrentes das relações entre credor e fiador; 5.2 Dos efeitos decorrentes das relações entre afiançado e fiador; 6 Transmissibilidade da obrigação do fia-dor; 7 A fiança e outros institutos de garantia; 8 A impenhorabilidade do bem de família do fiador de obrigação decorrente de contrato de locação; 9 Extinção da fiança; Conclusão; Referências.

INtrodução

Os contratos desempenham papel de fundamental importância, na me-dida em que viabilizam interação dirigida a um interesse comum, regulando a atuação de cada agente, de modo a estabelecer, entre os envolvidos, um vín-culo passível de gerar em um a pretensão de exigir do outro o cumprimento do que pactuado.

O presente trabalho cuida, exatamente, de uma modalidade de contrato típico, qual seja, a fiança, regulada pelos arts. 818 a 839 do Código Civil bra-sileiro. Trata-se de pesquisa dogmática pautada no tripé legislação-doutrina--jurisprudência a respeito do referido instituto jurídico.

Assim, são apresentados, inicialmente, o conceito e a natureza jurídica do contrato de fiança, bem como as características dessa avença que a distingue de outras modalidades de contratos.

Após, são analisados os aspectos subjetivos e objetivos do contrato da fiança, e expostas as suas modalidades, conforme prevê o ordenamento jurídico e admite a doutrina.

Em relação ao aspecto subjetivo da fiança, são definidos os sujeitos, ou seja, as pessoas que podem prestar fiança ou serem afiançadas. Quanto à perspectiva objetiva, são delimitadas as obrigações passíveis de ser objeto do contrato de fiança. Por sua vez, no que se refere às modalidades, analisa-se a classificação da fiança, segundo seu objeto e sua forma.

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Na sequência, aborda-se sobre os efeitos que decorrem de um contrato de fiança, os quais podem ser verificados a partir de duas perspectivas: os efei-tos decorrentes da relação entre credor e fiador e os efeitos oriundos da relação entre afiançado e fiador.

Por sua vez, trata-se da possibilidade de o fiador transmitir sua obrigação, considerada a natureza personalíssima que lhe é inerente, bem como sobre os reflexos dessa transmissão.

A seguir, a fim de tornar clara a identificação da fiança, são traçadas as distinções entre esse instituto e outros contratos de garantia que com ela se assemelham.

D’outra banda, como tópico de elevada importância, objeto de intenso debate e divergência doutrinária e jurisprudencial, e que, por isso, não deve ficar de fora de um estudo sobre a fiança, tem-se a impenhorabilidade do bem de família do fiador de obrigação decorrente de contrato de locação.

E, finalmente, trata-se do modo pelo qual a fiança é extinta, tanto direta-mente, como por via de consequência.

1 coNceIto e Natureza jurídIca da fIaNça

A fiança, regulada pelos arts. 818 a 839 do Código Civil, consubstancia espécie de garantia de cumprimento de obrigação, em que uma pessoa se obri-ga (fiador) a adimplir perante outra (credor) um débito a esta devido por uma terceira pessoa (devedor/afiançado).

É espécie do gênero caução, que comporta as garantias reais ou pigno-ratícias e as garantias fidejussórias ou pessoais1. As garantias reais pressupõem a vinculação de um bem que deverá assegurar o adimplemento do contrato. Já as garantias fidejussórias fundam-se na confiança, na palavra dada ao credor.

São garantias reais o penhor, a hipoteca e a anticrese. São garantias fide-jussórias, entre outras, o aval, o endosso, o abono e a fiança.

Situada a quadra contextual ocupada pelo instituto, facilita a sua com-preensão perquirir a origem do termo. Fiança provém do latim fidere, sugerindo confiar, garantir2. Segundo o mestre Orlando Gomes, “há contrato de fiança quando uma pessoa assume, para com o credor, a obrigação de pagar dívida, se o devedor não o fizer”3.

1 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.3 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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Interessante trazer à baila a citação de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, em que se verifica a incidência da fiança nas Escrituras Sagradas, mais especifi-camente, no Livro de Provérbios:

Filho meu, se ficaste por fiador do teu companheiro, se deste a tua mão ao es-tranho, e te deixaste enredar pelas próprias palavras; e te prendeste nas palavras da tua boca; Faze pois isto agora filho meu, e livra-te, já que caíste nas mãos do teu companheiro: vai, humilha-te, e importuna o teu companheiro. (Provérbios, 6, 1-3)

Quem fica por fiador certamente sofrerá, mas o que aborrece a fiança estará se-guro. (Provérbios, 11, 15)

Ficando alguém por fiador de um estranho, tome-se-lhe a roupa: e por penhor àquele que se obriga pela mulher estranha. (Provérbios, 20, 16)4

Trata-se, pois, de instituto que há muito integra a cultura comercial e jurídica, viabilizando a materialização de operações mercantis na sociedade de modo mais seguro ao credor.

Quanto à natureza jurídica, é consenso na doutrina que a fiança consiste em contrato acessório, unilateral e gratuito ou benéfico, intuitu personae, con-sensual e solene.

A acessoriedade do contrato de fiança justifica-se pelo fato de que, en-quanto garantia da obrigação de outrem, pressupõe sempre a existência desta, denominada obrigação principal. Na lição de Maria Helena Diniz:

Há dois contratos: o contrato principal, entre o credor e o devedor, e o acessório, entre fiador e credor. Como acessório, segue o principal, a fiança seguirá o desti-no do principal; se este for nulo, nula ela será (CC, art. 824). Porém, a recíproca não será verdadeira, isto é, a nulidade da fiança não atingirá o contrato principal (RT, 480:110). Se a obrigação principal extinguir-se, extinta estará a fiança.5

Vigora, pois, o princípio da gravitação jurídica, pelo qual todo acessório segue o principal (accessorium sequitur principale)6.

Na lição de Orlando Gomes, do caráter acessório da fiança tem-se as seguintes consequências: “a) a obrigação fidejussória não sobrevive à obriga-ção principal; b) a obrigação fidejussória tem a mesma natureza e extensão da obrigação principal”7.

4 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

5 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

6 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

7 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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Na fiança, tem-se a responsabilidade, mas não o débito, adotando-se a díade Schuld und Haftung8 ou, ainda, obligatio sem debitum9. Vale dizer, recai sobre o fiador a responsabilidade pelo cumprimento da obrigação, mas não o débito, o qual é atribuído, obviamente, ao devedor, pelo menos a priori.

Cabe destacar, no entanto, posição divergente sustentada por Arnaldo Rizzardo, para quem o fiador detém também obrigação, na medida em que a “responsabilidade do fiador deriva de uma prévia obrigação ou dívida por ele assumida frente ao credor”10.

A Professora Helena Diniz afirma, ainda, a subsidiariedade como, tam-bém, característica da fiança, pois, “devido ao seu caráter acessório, o fiador só se obrigará se o devedor principal ou afiançado não cumprir a prestação devida, a menos que tenha estipulado a solidariedade”11.

É unilateral por implicar obrigações somente para o fiador, vale dizer, não repercute na esfera de liberdade do afiançado. Ressalte-se que há quem sustente ser contrato bilateral imperfeito, ao argumento de que, cumprida a obrigação pelo fiador, este se sub-roga nos direitos do credor, pelo que poderá agir regressivamente contra o devedor.

Ocorre que, como ensina Orlando Gomes, este posicionamento – de que a fiança é contrato bilateral imperfeito – parte da falsa premissa “de que o contrato se realiza entre o fiador e o devedor”. Observa, ainda, o autor que, “cumprida a obrigação do fiador, se extingue o contrato de fiança”12. Insusten-tável, portanto, a natureza bilateral da fiança.

É, ainda, gratuito, pois o fiador, via de regra, não receberá qualquer re-muneração pela assunção da responsabilidade, limitando-se a depositar sua confiança no adimplemento do débito pelo devedor. Como decorrência dessa gratuidade, tem-se a incidência da regra prevista no art. 114 do Código Civil, pela qual os contratos gratuitos devem ser interpretados estritamente, o que, no caso da fiança, significará que o fiador não pode, por qualquer que seja a técnica interpretativa, ter suas obrigações ampliadas. Assim, o fiador somente arcará com o que expressamente anuiu no contrato e nos termos e condições assinalados.

8 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.9 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2010.10 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.11 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São

Paulo: Saraiva, 2012.12 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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No âmbito do inquilinato, como expressão desse atributo da fiança, en-quanto contrato gratuito, eis o que dispõe a Súmula nº 214 do Superior Tribunal de Justiça:

O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

Cabe chamar a atenção, contudo, para as fianças bancárias e as fianças mercantis em geral13, nas quais se estipula remuneração em favor do fiador, ante o risco por ele assumido. Em circunstâncias que tais, concebe-se a fiança como contrato oneroso.

Por se basear, fundamentalmente, na confiança entre os contratantes, decorre a natureza intuitu personae ou personalíssima do contrato de fiança, sendo que o credor não é obrigado a aceitar fiador em que não confie, podendo recusá-lo quando não preenchidos os requisitos previstos no art. 825 do Códi-go Civil. Prevê o art. 826 do CC, inclusive, a possibilidade de o credor exigir a substituição do fiador que se tornar insolvente ou incapaz. Percebe-se, pois, que o personalismo da fiança exige que o fiador mantenha suas características de solvabilidade e capacidade verificadas quando da contratação.

Sendo personalíssimo, não se está afirmando a intransmissibilidade da fiança. Como bem observam Gagliano e Pamplona Filho, uma vez “constituí-do o dever de pagar (pela inadimplência do devedor da obrigação principal), antes do advento da morte do fiador, esta responsabilidade se transmite a seus herdeiros”14.

A fiança é contrato consensual, pois sua perfectibilidade está condiciona-da unicamente ao consentimento dos estipulantes15, vale dizer, não pressupõe conduta positiva das partes no sentido de entregar coisa, característica esta dos contratos reais. Insta observar, no entanto, que a obrigação principal, à qual se reporta a fiança, pode apresentar feição de contrato real, como é o caso do mútuo e do comodato, entre outros.

Excepcionando o princípio geral da liberdade da forma, preconizado no art. 107 do Código Civil, o contrato de fiança, em razão de incidência de regra específica, deve ser escrito, como determina o art. 819 do diploma. Na verdade, essa previsão é corolário da própria vedação de interpretação extensiva, cons-tante deste mesmo dispositivo, na medida em que, ausente a anuência escrita do fiador, este não está vinculado à estipulação, não sendo admitido se recorrer a fontes interpretativas ou integrativas a fim de se obter esse efeito.

13 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.14 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.15 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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Daí ser contrato solene, segundo Arnaldo Rizzardo16, “dada a necessi-dade imperiosa de se revestir de uma forma escrita, devendo obedecer às for-malidades para a celebração de um ato jurídico”. Para Tartuce, adotando o mesmo fundamento, a fiança é contrato formal, e “não solene, pois não se exige escritura pública”17. Nesse sentido, também é a lição de Venosa, segundo a qual fiança não se presume: é contrato escrito18.

2 doS SujeItoS

São partes no contrato de fiança o fiador e o credor. O devedor, enquanto afiançado, não integra o contrato de fiança, sendo que esta pode ser formaliza-da ainda que sem seu consentimento, nos termos do art. 820 do Código Civil.

Embora geralmente participe do ato, indicando a pessoa a figurar como fiadora, o afiançado o faz na condição de interessado, e não de parte propria-mente dita, já que, como dito alhures, a decisão pela admissão ou não do fiador é sempre do credor19. Cabe ao credor aceitar, recusar ou mesmo, em aceitando, exigir posteriormente a substituição do fiador.

No ponto, é expresso o art. 825 do Código Civil ao estabelecer as con-dições mínimas a serem preenchidas pelo fiador, a saber, ser pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança e possuir bens sufi-cientes para cumprir a obrigação. Sob a mesma orientação, dispõe o art. 826 do diploma que o credor poderá exigir a substituição do fiador que se tornar insol-vente ou incapaz. Tais disposições são decorrência do conteúdo dos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, também presentes na fiança.

Exige-se, por óbvio, a capacidade civil das partes para a prática de ne-gócios jurídicos, pois eventual incapacidade pode dar ensejo à exigência de substituição do fiador, como dito acima.

Leciona Arnaldo Rizzardo que os relativamente incapazes, com idade entre dezesseis e dezoito anos, não podem prestar fiança, ainda que assistidos pelos representantes legais, embora se admita a ratificação posterior do ato, com o advento da maioridade.

Quanto aos analfabetos, doutrina o autor:

O analfabeto, por não saber ler e nem escrever, não pode contrair obrigação por instrumento particular, sendo obrigatória a escritura pública. Mesmo que terceira

16 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.17 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2010.18 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.19 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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26 �������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

pessoa assine a rogo do analfabeto, estando este presente e apondo sua impres-são digital, a fiança não adquire validade em razão da forma especial ordenada pelo art. 819 (art. 1483 do Código anterior), e do conteúdo constante no art. 166, IV e V (art. 145, III e IV, do Código pretérito).20

Também pode prestar fiança a pessoa jurídica, desde que autorizada por seus atos constitutivos ou regulamentos.

Do mesmo modo, conforme dispõe o art. 661, § 1º, do Código Civil, os mandatários também podem ser fiadores, contanto que tal poder esteja expresso na procuração.

De outro lado, tendo em vista a limitação quanto à prática de certos atos que não seja de mera administração, tem-se que os pródigos, a despeito de não serem absolutamente incapazes, não podem, sem a intervenção de curador, figurar em contrato como fiador21.

A pessoa casada, exceto se no regime da separação de bens, necessita da anuência do cônjuge para prestar fiança, o que não faz deste também fiador. Assim, o cônjuge anuente não deve figurar em eventual execução do contrato de fiança.

Prestada a fiança sem a autorização do cônjuge, pode este, bem como os herdeiros, pleitear a anulação do contrato no prazo decadencial de dois anos, contados da dissolução da sociedade conjugal, consoante preveem os arts. 1.649 e 1.650 do Código Civil.

No ponto, importante destacar a Súmula nº 332 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual a “fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia”. Flávio Tartuce critica o texto do enuncia-do, pois, segundo o autor, “o certo seria falar em invalidade e não em ineficá-cia22”, já que a ausência da anuência torna a fiança anulável.

O art. 1.648 do Código Civil admite, no entanto, o suprimento judicial da outorga conjugal, de modo a viabilizar a constituição da fiança ainda que sem a anuência de um dos cônjuges.

Arnold Wald destaca a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em relação à fiança prestada pelo marido, sem a anuência da mulher, a empresas das quais é diretor. Nesses casos, a Corte tem assentado entendimento no sen-tido de que se deve presumir a existência de vantagem para o casal, o que faz da fiança (contrato) válido, salvo se a mulher provar que não auferiu benefício

20 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.21 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.22 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2010.

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decorrente do contrato. Trata-se, pois, de presunção juris tantum, que implica a inversão do ônus da prova23.

3 do objeto

Podem ser objeto de fiança qualquer tipo de obrigação, seja ela de fazer, de não fazer ou de dar, atuais ou futuras.

Em se tratando de obrigação de fazer ou não fazer, o fiador – assim como o devedor – não pode ser coagido a cumprir o estipulado, ante o conteúdo do princípio da dignidade humana, bem como da legalidade, pelo qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei. Nesses casos, a garantia prestada é de natureza pecuniária, vale dizer, o fiador responderá pelas perdas e danos experimentados pelo credor.

No caso de obrigação futura, o fiador só poderá ser demandado quando se verificar certa e líquida a obrigação principal do devedor, sendo que, caso esta não venha a surgir, resolve-se a fiança24.

Ainda em relação à fiança de obrigação futura, importante a lição de Arnaldo Rizzardo, no sentido de que o fiador não pode se retratar ou revogar a fiança enquanto não surgir a obrigação principal ou vencer o seu prazo. Explica o autor que isso se deve à afinidade presente entre esse tipo de fiança e a obri-gação condicional, sendo que aquela só passa a ter existência jurídica quando implementada a condição estipulada para esta25.

Como decorrência de sua natureza acessória, o contrato de fiança não pode prever responsabilidade superior à obrigação garantida, pois, nesse caso, ela não valerá “senão até o limite da obrigação afiançada”, nos termos do art. 823 do Código Civil. Observa o mestre Orlando Gomes que o excesso da fiança não implica a sua nulidade, mas apenas dá ensejo ao reajuste26.

Ensinam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona que esse reajuste ou redução da fiança não só pode como deve ser feito pelo juiz, independentemente da manifestação do interessado, “em respeito aos princípios da função social do contrato e da boa-fé objetiva, sob pena de coroar flagrante injustiça27”.

23 WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.24 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed.

São Paulo: Saraiva, 2012.25 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.26 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.27 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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28 �������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Nada impede, por outro lado, que a fiança seja inferior ao valor da obri-gação principal ou que estatui condições menos onerosas. Pode dispor também sobre créditos secundários, como juros, despesas judiciais e multas.

Silvio de Salvo Venosa classifica a fiança, quanto à compreensão, em limitada e ilimitada. Discorre:

A fiança limitada circunscreve-se qualitativa e quantitativamente, podendo não abranger todos os acessórios da obrigação. Fiança ilimitada é a que não apresen-ta restrição, quando, por exemplo, o fiador de contrato de locação se responsabi-liza por todos os encargos presentes e futuros.28

As obrigações nulas não podem ser objeto de fiança, salvo se a nulidade decorrer da incapacidade pessoal do devedor, hipótese em que o Código Civil, em observância ao princípio da boa-fé objetiva, tutelando o interesse do credor, concebe como válido o contrato. Porém, tratando-se de mútuo feito a incapaz em razão da idade, essa exceção é afastada, pelo que prevalecerá a regra, ou seja, nula será a fiança. Visa-se, com isso, a desestimular a realização de ne-gócios jurídicos com menores que não estejam devidamente representados ou assistidos pelos seus representantes ou tutores.

As obrigações naturais, enquanto deveres decorrentes da moral, da hon-ra, da equidade ou da consciência, também não são afiançáveis. É que lhes falta uma característica essencial à eficácia da fiança, a saber, a exigibilidade, consectária da responsabilidade, como vínculo jurídico que torna o patrimônio do devedor sujeito à satisfação do débito, adotando-se, aqui, a teoria da de-composição da obrigação em dois elementos, quais sejam, o débito (schuld) e a responsabilidade (haftung)29, referidos na obra de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald.

Infere-se, pois, que o obstáculo à admissão da fiança nas obrigações na-turais é um aspecto ligado não à fiança, mas à própria obrigação principal, que não dá ensejo à responsabilidade no ordenamento jurídico brasileiro. Existe o débito, mas não a responsabilidade; e, se esta não existe para o devedor, tam-bém para o fiador é inexistente. É o que se extrai do art. 814, § 1º, do Código Civil, que estende à fiança a inexigibilidade característica das dívidas de jogo ou de aposta, referidas no caput, e que consubstanciam típicos exemplos de obrigações naturais, ao lado das dívidas prescritas.

Vale ressaltar, contudo, que essa interpretação não é unânime na dou-trina. Serpa Lopes, fazendo a distinção entre as obrigações naturais com causa lícita e as obrigações naturais com causa ilícita, sustenta que o descabimento

28 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.29 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: obrigações. 6. ed. Salvador:

JusPodivm, 2012.

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da fiança está presente nestas, mas não naquelas30. Assim, defende ser possível o credor exigir do fiador, por exemplo, o cumprimento de uma obrigação pres-crita, a despeito de não poder fazê-lo com relação ao devedor.

Importante trazer à baila o instituto da subfiança, que, embora não pre-visto no atual Código Civil, é sempre lembrado pela doutrina. Com previsão no art. 1.842 do Código Civil de 1916, a subfiança “era o contrato pelo qual alguém afiançava a obrigação do fiador31”, ocupando, portanto, a posição de fiador do fiador. Essa pessoa era designada abonador.

O mestre Orlando Gomes faz referência, ainda, à denominada retrofian-ça, existente quando “o fiador exige do devedor outro fiador para o caso em que venha a exercer seu direito regressivo32”.

4 daS modalIdadeS

A doutrina adota critérios variados para apresentar a classificação das obrigações segundo suas modalidades. Acolhe-se neste trabalho, ante a organi-zação didática, a classificação apresentada por Maria Helena Diniz. Para essa autora, a fiança pode ser: (i) em relação ao objeto: civil ou comercial; (ii) quanto à forma: convencional, legal ou judicial33.

É civil a fiança cuja obrigação garantida não tem natureza mercantil ou não seja o afiançado empresário. Caso contrário, tem-se a fiança mercantil. A principal importância dessa distinção era saber que, na primeira, o fiador tinha a seu favor o benefício de ordem, o que não se verifica na segunda. Porém, com a edição Código Civil vigente, caiu por terra essa relevância, já que ambos os institutos passaram a ter o mesmo regramento. Assim, tem-se que o fiador, quer em fiança civil, quer em fiança mercantil, goza do benefício de ordem, pelo qual tem direito de ver a obrigação ser exigida primeiramente do afiançado.

A fiança convencional ou contratual é “aquela oriunda espontaneamente da vontade das partes (credor e fiador), mesmo sem a anuência do devedor afiançado34”. Esta consiste no tema principal deste trabalho, a ela aplicando-se na íntegra todos os conceitos e características apresentados.

30 LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil. Apud VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

31 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

32 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.33 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed.

São Paulo: Saraiva, 2012.34 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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A fiança legal, como sugere a própria designação, decorre de imposição da lei. Leciona Arnaldo Rizzardo que essa fiança “é firmada antes de iniciar-se um ato jurídico, ou antes de uma pessoa entrar na posse de alguma coisa, como na entrega de bens de ausente ou incapazes a um curador”. Outros exemplos são citados por Maria Helena Diniz, como os previstos nos arts. 1.280 (fiança exigível, por proprietário de prédio, de vizinho que tenha direito de fazer obras), 1.305, parágrafo único (fiança exigível, pelo dono de parede divisória, do vi-zinho que nela pretenda fazer alicerce) e 260, II (fiança prestada, por um dos credores, ao(s) devedor(es) de obrigação indivisível), do Código Civil35.

Por sua vez, a fiança judicial é a determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes. É caracterizada por ser prestada pelo próprio devedor, traduzindo uma “exigência processual”36. Como exemplo, a doutrina indica os arts. 925 e 940 do Código de Processo Civil:

Art. 925. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor provisoriamente man-tido ou reintegrado na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de decair da ação, responder por perdas e danos, o juiz assinar-lhe-á o prazo de 5 (cinco) dias para requerer caução sob pena de ser depositada a coisa litigiosa.

[...]

Art. 940. O nunciado poderá, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdi-ção, requerer o prosseguimento da obra, desde que preste caução e demonstre prejuízo resultante da suspensão dela.

Segundo Silvio de Salvo Venosa, a fiança legal e a fiança judicial, dife-rentemente da convencional, constituem ato unilateral, sem conteúdo contra-tual, muito embora possam valer-se do regramento da fiança convencional em caso de ausência de norma específica37.

O autor aborda, ainda, sobre a fiança criminal, prevista no Código de Processo Penal, afirmando que ela “não é pessoal, mas pecuniária, amoldan-do-se ao conceito de caução real”38. Essa fiança, preconizam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, “garante não o cumprimento de uma prestação patrimonial, mas, sim, o direito à liberdade do acusado, na efetivação da presunção de sua inocência até o trânsito em julgado do processo penal correspondente”39.

35 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

36 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

37 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.38 Idem, ibidem.39 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Arnaldo Rizzardo aponta como modalidades também a fiança fiscal e a fiança bancária, previstas, respectivamente, nos arts. 4º, II, e 9º, II, da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980 (Lei de Execução Fiscal): a primeira, per-mitindo a execução fiscal da dívida contra o fiador; a segunda, possibilitando que o executado ofereça garantia da execução40.

5 doS efeItoS

A fiança, como dito alhures, é contrato firmado entre o credor e o fiador, vale dizer, não tem, como elemento indispensável, a participação do devedor afiançado, podendo, inclusive, ser estabelecido contra a sua vontade. Todavia, no estudo dos efeitos da fiança, o devedor tem posição certa, justificando sua qualificação como interessado no contrato.

Assim, tem-se na sempre atual lição de Orlando Gomes que a fiança produz efeitos de duas ordens, a saber: “a) relações entre o credor e o fiador; b) relações entre o afiançado e o fiador”41.

Passa-se à análise de ambas em tópicos específicos, a seguir.

5.1 dos efeitos decorrentes dAs relAções entre credor e fiAdor

Dessas relações, exsurge como efeito maior, e que mais caracteriza a ideia que se tem de fiança, o denominado benefício de ordem ou de excussão, previsto no art. 827 do Código Civil, segundo o qual o “fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor”. Daí se falar que o fiador é “um sujei-to passivo de segundo grau”42.

Extrai-se, pois, do próprio dispositivo a natureza jurídica desse instituto. Trata-se, materialmente, de direito subjetivo do fiador, corolário da subsidiarie-dade e da acessoriedade da fiança43. No direito processual, pode ser definido como uma exceção44, lato sensu, uma defesa à disposição do fiador, a quem compete invocá-la, já que não se opera pleno iure45.

Para viabilizar o exercício dessa faculdade, o Código de Processo Civil prevê, como modalidade de intervenção de terceiros, o chamamento ao proces-so, regulado nos arts. 77 a 80 do diploma.

40 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.41 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.42 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.43 BITTAR, Carlos Alberto. Contratos civis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.44 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.45 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed.

São Paulo: Saraiva, 2012.

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A invocação do benefício de ordem, contudo, pressupõe a observância de duas condições pelo fiador. A primeira, já referida no dispositivo citado, é de caráter temporal, ou seja, refere-se ao momento em que o fiador deve exercer o direito – “até a contestação da lide”.

A essência dessa condição é apresentada por Arnaldo Rizzardo, citando Clóvis Beviláqua, segundo o qual:

Supõe a lei que o credor, como é de direito seu, vencida a obrigação e não re-cebendo o seu pagamento, aciona o fiador. Este defende-se com a dilatória do benefício de ordem ou de excussão. Mas já não o poderá invocar, utilmente, se a lide estiver contestada, porque, então, entende-se que o pleito está, definitiva-mente, travado e seria injusto gravame imposto ao credor permitir que todo o seu esforço, tempo e dispêndio com o processo resultassem, à última hora, perdidos pelo benefício concedido ao fiador.46

Embora com outras palavras, o ilustre projetista do Código Civil de 1916 refere-se à situação semelhante ao que hodiernamente se denomina estabiliza-ção subjetiva da demanda, que impede a alteração das partes de um processo a partir de determinado momento.

A segunda condição está prevista no parágrafo único do art. 827 do Có-digo Civil vigente, e impõe uma conduta positiva ao fiador, qual seja, “nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito”.

Novamente, convém trazer à baila a mens legis revelada por Clóvis Beviláqua, referido por Arnaldo Rizzardo:

É outra atenuação equitativa dos efeitos, que poderia ter sobre os legítimos inte-resses do devedor, o benefício de ordem. Se a fiança foi prestada para assegurar a solução da dívida, o fiador terá de solvê-la, desde que o devedor principal não possua bens com que se desobrigue. Nisto consiste o benefício de ordem; mas a lei, que o concede, impõe ao fiador a obrigação de demonstrar que o benefício pode ser invocado, pois que o devedor está em condições de pagar, isto é, possui bens em quantidade suficiente para satisfação do débito.47

Esse benefício estabelece, portanto, a regra vigente no contrato de fiança, segundo a qual a responsabilidade do fiador perante o credor é subsidiária, e não solidária. Contudo, o Código Civil, no art. 828, prevê as exceções a essa re-gra, situações em que o fiador não poderá invocar o benefício de ordem. Assim, não gozará do benefício o fiador: a) que dele houver renunciado expressamente

46 BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. Apud RIZZARDO, Arnaldo.Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

47 Idem, ibidem.

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no contrato; b) que houver se obrigado como principal pagador, ou devedor solidário; c) que cair em insolvência ou falência.

Verifica-se que as hipóteses previstas nos itens “a” e “b” decorrem da manifestação do próprio fiador, abdicando de um benefício que é inerente à natureza do contrato. Daí, defende a doutrina de Flávio Tartuce48, embasada no art. 424 do Código Civil e no princípio da função social do contrato, não ser válida essa renúncia no caso de contrato de fiança por adesão.

No mesmo sentido, o Enunciado nº 364 do Conselho da Justiça Federal consigna que “no contrato de fiança é nula a cláusula de renúncia antecipada ao benefício de ordem quando inserida em contrato de adesão”.

Outro efeito decorrente do vínculo existente entre fiador e credor diz respeito à situação em que mais de uma pessoa presta fiança ao mesmo débito, consoante disposto no art. 829 do Código Civil. É a denominada fiança conjun-ta. Nesses casos, tem-se a figura dos cofiadores, os quais, inexistindo previsão quanto à divisão da responsabilidade entre eles pelo débito, serão igualitária (concursu partes fiunt49) e solidariamente50 responsáveis, entre si, pelo adimple-mento da obrigação. Essa divisão de responsabilidade é chamada de benefício da divisão.

Sobre o instituto, leciona Maria Helena Diniz:

O benefício da divisão só existirá se houver estipulação. E, uma vez convencio-nado o benefício da divisão, cada fiador só responderá pro rata pela parte que, em proporção, lhe couber no pagamento. P. ex., se a dívida for de 90 mil, sendo dois fiadores, que estipularam tal benefício, o credor só poderá exigir 45 mil de cada um, havendo inadimplemento do devedor (CC, art. 929, parágrafo único).51

Situação distinta verifica-se quando tais cofiadores pactuam determinado limite da responsabilidade para cada fiador, circunstância em que não haverá a distribuição proporcional da responsabilidade, mas cada um responderá pelo quantum expressamente assumido. É o que consta do art. 830 do Código Civil.

Conforme dito, ausente o benefício da divisão entre os cofiadores, tem-se estes por responsáveis solidários entre si. Em consequência, para evitar o enri-quecimento sem causa, o cofiador que pagar a dívida integralmente tem ação regressiva contra os demais cofiadores, vale dizer, aquele se sub-roga no direito do credor em face destes, os quais serão responsabilizados na medida de suas

48 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

49 Idem, ibidem.50 WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.51 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São

Paulo: Saraiva, 2012.

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34 �������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

respectivas quotas. Trata-se do benefício da sub-rogação, ou tecnicamente, uma hipótese de sub-rogação legal52. E, na qualidade de sub-rogado, pode o fiador, Segundo Arnold Wald:

[...] obter não só a devolução do que pagou como ainda os juros do desembolso pela taxa legal estipulada na obrigação principal e, na falta de estipulação, de acordo com a taxa legal, e, finalmente a indenização de perdas e danos e de tudo que sofreu em virtude da fiança (arts. 831 a 833 do CC).53

Essa pretensão do sub-rogado, com vistas a evitar o enriquecimento sem causa dos demais cofiadores, deve ser exercida no prazo prescricional de três anos, nos termos do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil.

Ressalta Silvio de Salvo Venosa, contudo, que “não há sub-rogação se o pagamento feito pelo fiador foi com ânimo de doação, que depende de exame do caso concreto”54.

Seja na responsabilidade solidária entre os cofiadores, seja na estipu-lação do benefício da divisão, caindo em insolvência um dos fiadores, a sua responsabilidade será distribuída entre os demais, conforme prevê o art. 831, parágrafo único, da lei substantiva.

Maria Helena Diniz relaciona como também efeito da relação jurídica em destaque a circunstância de que “o credor só poderá exigir a fiança no termo fixado para a obrigação principal”55. Como já visto algures, não há óbice a que uma obrigação futura ou mesmo condicional venha constituir objeto de contra-to de fiança. Em tais casos, enquanto não se verificar líquida, certa e exigível a obrigação principal, nada poderá o credor fazer para obrigar o fiador.

Por fim, a título de efeito da relação em análise, tem-se a faculdade de o fiador “opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais, e as extintivas da obrigação que competem ao devedor principal, se não provierem simplesmente de incapacidade pessoal, salvo o caso do mútuo feito a pessoa menor”, nos termos do art. 837 do diploma material.

Deixa-se de traçar maiores considerações quanto à incapacidade pessoal do devedor, posto que já abordada anteriormente. Como exceções pessoais passíveis de alegação pelo fiador, elenca Arnaldo Rizzardo56 “a incapacidade para ser fiador, a nulidade da fiança, a exoneração pela decorrência do prazo, pela moratória etc.”. A título de causa extintiva da fiança, destaca o autor, “a

52 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

53 WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.54 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.55 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São

Paulo: Saraiva, 2012.56 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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prescrição, a compensação, a novação feita sem consenso do fiador com o de-vedor originário”, entre outras.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona indicam, como exceções pessoais, os vícios de consentimento na celebração do contrato principal, a compensação, a confusão e a remissão; e, como exceções impessoais, a incorreção de valores, taxa de juros e a prescrição57.

5.2 dos efeitos decorrentes dAs relAções entre AfiAnçAdo e fiAdor

O primeiro efeito destacado na doutrina de Orlando Gomes é o já referi-do benefício da sub-rogação; no entanto, este é exercido pelo fiador que paga a dívida em face do afiançado, devedor da obrigação principal. São asseguradas a esse fiador as mesmas pretensões já analisadas que tem o cofiador sub-rogado contra os demais cofiadores. São elas, na lição do citado autor:

a) obter o ressarcimento de todas as perdas e danos resultantes do pagamento;

b) ser indenizado dos prejuízos sofridos em razão de fiança;

c) ser reembolsado dos juros correspondentes ao capital que desembolsou para pagar a dívida.58

O benefício da sub-rogação está previsto no art. 831 do Código Civil, ao dispor que “o fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor”. Nada obstante a lei falar em pagamento integral, a doutrina é pacífica no sentido de que “o fiador que pagar somente uma parte da dívida, mesmo que obrigado à totalidade, não fica impedido de receber a cifra desem-bolsada59”. No mesmo sentido, é a lição de Silvio Venosa60 e Carlos Alberto Bittar61. Tem-se, nesse caso, a sub-rogação legal parcial.

Impende registrar que não se aplica a sub-rogação em face do devedor a limitação presente na sub-rogação contra os cofiadores, na medida em que o fiador, no primeiro caso, não tem que observar qualquer quota, já que o deve-dor é titular do débito em sua integralidade, e por todo ele pode ser demandado pelo fiador.

Todavia, a Professora Maria Helena Diniz apresenta situações em que o exercício desse direito de ação regressiva do fiador sub-rogado é flexibilizado, mesmo diante do afiançado. Leciona a mestre da PUC-SP:

57 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

58 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.59 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.60 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.61 BITTAR, Carlos Alberto. Contratos civis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

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[...] não haverá tal direito regressivo se: o fiador, pagando o débito, não comu-nicar o fato ao devedor, que realiza um segundo pagamento ao credor, caso em que a repetio indebiti competirá ao fiador e não ao devedor; o fiador oferecer a garantia animus donandi; o pagamento for efetuado em prejuízos dos direitos do devedor principal, ou seja, no caso de pagamento excessivo, quanto à parte excedente à dívida, no de pagamento antecipado ou no de ser pago o que não era devido. (RJE, 1:518; Bol. AASP, 1.833:8)62

De outro lado, convém destacar a faculdade prevista no art. 834 do Códi-go Civil, enquanto efeito também decorrente do vínculo existente entre o afian-çado e o fiador. Prevê o dispositivo que, “quando o credor, sem justa causa, demorar a execução iniciada contra o devedor, poderá o fiador promover-lhe o andamento”.

Primeiramente, importante frisar que não cabe ao fiador iniciar a exe-cução contra o devedor, mas apenas dar-lhe prosseguimento. Em sentido con-trário, tem-se a lição de Flávio Tartuce63, segundo a qual pode o fiador, ante a inércia do credor, promover a execução contra o devedor, com fundamento no art. 567, II, do Código de Processo Civil.

Doutrina Silvio de Salvo Venosa que “cuida-se de hipótese de substitui-ção processual. Essa intervenção objetiva minorar a situação do fiador. No caso concreto, há que se verificar a ocorrência de retardamento injustificado”64.

Para Arnaldo Rizzardo65, estando vencida a dívida sem que o credor acio-ne o afiançado, cabe ao fiador reclamar, através de notificação, estabelecendo prazo para que o credor providencie as medidas de exigibilidade da obrigação. Nessa ordem de ideias, discorre Rizzardo que, decorrido o prazo sem manifes-tação do credor, surge para o fiador o direito de ação de exoneração da fiança. Consigna o autor que duas são as condições para o exercício dessa pretensão: a) que a dívida já se tenha tornado exigível; b) que tenha ocorrido o vencimento do prazo estabelecido da fiança, após o qual o devedor se obrigou a desonerar o fiador. São requisitos alternativos, bastando a presença de um deles para que se reconheça a legitimidade da pretensão.

A doutrina de Orlando Gomes aponta, ainda, como direito do fiador, a possibilidade de exigir que o devedor satisfaça a obrigação ainda antes de haver pago, bem como de exigir que este o exonere da fiança, desde que tenha decorrido o prazo dentro do qual se obrigou a libertá-lo. Trata-se da redação do

62 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

63 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

64 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.65 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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art. 1.499 do Código Civil de 1916, que não foi reproduzido pelo vigente diplo-ma. Assim, deve o entendimento ser analisado com as devidas cautelas.

Quanto à primeira faculdade – exigir que o devedor satisfaça a obriga-ção –, como bem observam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona66, é plenamente aceitável, consubstanciando “consequência lógica do exercício do benefício de ordem”. Contudo, o mesmo não ocorre em relação ao segundo direito – exigir exoneração da fiança –, pois, como já assentado alhures, “a relação contratual da fiança não é mantida entre fiador e o devedor afiançado, mas, sim, entre o fiador e o credor, pelo que somente este último pode desonerá-lo”. No ponto, assevera Arnaldo Rizzardo ser “inconcebível se vá tentar providência contra o devedor principal”67.

Outro relevante efeito da relação entre afiançado e fiador é o que consta do art. 835 do Código Civil, verbis:

Art. 835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fian-ça, durante sessenta dias após a notificação do credor.

De início, cabe distinguir essa possibilidade de exoneração da que ex-posta por Arnaldo Rizzardo, na lição acima citada. A presente hipótese refere--se, exclusivamente, à fiança fixada por tempo indeterminado e não tem como pressuposto necessário à exigibilidade da obrigação afiançada. Já a ação de exoneração apresentada pelo referido autor tem como premissas a exigibilidade dessa obrigação ou, alternativamente, que tenha decorrido o prazo estabelecido na fiança após o qual o devedor se obrigou a desonerar o fiador, pelo que se denota ser esta fiança de prazo determinado.

O dispositivo legal institui verdadeiro direito potestativo ao fiador, que “pode querer com efeitos sobre a esfera jurídica de outrem [credor], o qual não pode e não deve fazer nada, apenas tem que se sujeitar às consequências”68. Todavia, tais efeitos se projetam para o futuro, quando se terá a liberação do fiador.

Ponto muito discutido nesse tema diz respeito à aplicabilidade do art. 835 do Código Civil ao direito do inquilinato, tendo em vista o que disposto no art. 39 da Lei nº 8.245/1990, o qual estende a responsabilidade do fiador “até a efetiva devolução do imóvel”, simbolizada pela entrega das chaves, não concebendo, portanto, a possibilidade de exoneração através da notificação.

66 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

67 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.68 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

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Trata-se de aparente conflito entre norma geral e norma especial, diante do que, em tese, ter-se-ia por prevalente esta última em detrimento daquela. Assim sendo, o fiador, mesmo diante de contrato de fiança por prazo indetermi-nado, não teria, a priori, a faculdade de notificar o credor para exonerar-se da responsabilidade, pois esta subsistirá até a entrega das chaves.

Vale destacar, como bem lembra Silvio Venosa, que, na vigência do Có-digo Civil de 1916, a exoneração do fiador era ainda mais restrita, limitando-se a apenas duas modalidades, quais sejam, “pelo distrato, com a aquiescência do afiançado e do credor, se fosse o caso, e por sentença judicial”69.

Contudo, após a edição da Lei nº 12.112/2009, que deu nova redação ao art. 40, X, da Lei nº 8.245/1990, tem-se que o fiador, embora não possa se valer do art. 835 do Código Civil em vigor, encontra-se amparado pelo referido primeiro dispositivo.

Essa, inclusive, é a orientação de Maria Helena Diniz70. Ensina a profes-sora que, vencido o prazo da locação, quando então passa a viger por prazo indeterminado, não há a incidência do art. 835 do Código Civil, mas do art. 40, X, da Lei nº 8.245/1991, que faculta ao credor/locador, notificado pelo fiador, exigir do devedor/locatário a apresentação de novo fiador, hipótese em que o fiador originário permanecerá obrigado pelos efeitos da fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação.

A mesma interpretação extrai-se da doutrina de Flávio Tartuce71, segun-do o qual, ante o novo regramento pela lei de locações, não mais se justifica a aplicação do art. 835 do Código Civil.

Impende destacar, no particular, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o fiador permanecerá obrigado caso tenha anuído com a prorrogação do contrato de locação que contenha a cláusula de respon-sabilização até a entrega das chaves. É o que se denota do seguinte julgado:

Agravo regimental em agravo em recurso especial. Locação. Fiança. Exoneração. Prorrogação contratual. Enunciado nº 214/STJ. Inaplicabilidade. Reexame fático--probatório. Súmula nº 7/STJ. Prequestionamento. Ausência. Súmula nº 211/STJ. Decisão mantida por seus próprios fundamentos. 1. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, não sendo hipótese de aditamento, mas de prorrogação de contrato, no qual os fiadores comprometeram-se até a entrega das chaves, tem-se como inaplicável o Enunciado de nº 214/STJ. [...] 5. Agravo regimental não provido.72

69 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.70 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São

Paulo: Saraiva, 2012.71 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2010.72 AgRg-AREsp 143.946/SP, 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 21.06.2012, DJe 28.06.2012.

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D’outra banda, inexistindo anuência do fiador no momento da prorroga-ção do contrato de locação, a previsão de responsabilização até a entrega das chaves estipulada originariamente no contrato não terá o condão de impedir o fiador de exercer o direito de exoneração. É que “ninguém pode renunciar previamente a um direito potestativo”73.

Vale dizer, se, por um lado, o direito não tolera que o fiador, durante o prazo determinado do contrato de locação, exonere-se da fiança, por outro, não permite que seja responsabilizado por obrigações posteriores ao término do contrato, em caso de prorrogação com a qual não anuiu. Nesse caso, plena-mente aplicável a Súmula nº 214 do Superior Tribunal de Justiça.

Superada a controvérsia, passa-se ao próximo efeito inerente à relação entre afiançado e fiador, que é apontado na obra de Maria Helena Diniz74. Tam-bém próprio do direito do inquilinato, encontra-se previsto no art. 12, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.245/1990, com redação da já citada Lei nº 12.112/2009.

Por esse efeito, o fiador tem o direito de ser comunicado por escrito a respeito da sub-rogação da locação, residencial pelo cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel após a separação de fato, divórcio ou dissolução da união estável. A finalidade dessa comunicação é assegurar ao fiador o exercício do direito de exoneração no prazo de 30 (trinta) dias do aviso, hipótese em que ficará responsável pelos efeitos da fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação que apresentar ao locador.

Finalmente, como último aspecto a ser realçado, concernente à relação afiançado e fiador, tem-se que “a interrupção da prescrição produzida contra o devedor prejudicará o fiador, na forma do art. 204, § 3º, do CC/2002 (art. 176, § 3º, do CC/2016)”75.

6 traNSmISSIbIlIdade da obrIgação do fIador

Embora a fiança constitua obrigação de natureza intuitu personae, vale dizer, personalíssima, seus efeitos não se extinguem com o falecimento do fia-dor, pois são transmissíveis aos seus herdeiros, conforme prevê o art. 836 do Código Civil. No entanto, a responsabilidade dos herdeiros pela fiança sofre duas limitações: só garante a obrigação existente até a data do óbito do fiador e não ultrapassa as forças da herança. Nas sempre prestigiadas palavras do sau-

73 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.74 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed.

São Paulo: Saraiva, 2012.75 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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doso Orlando Gomes, “os efeitos da fiança produzidos até a morte do fiador vinculam os herdeiros intra vires hereditates”76.

Essa segunda limitação, relativa à extensão da responsabilidade do her-deiro, aliás, decorre do princípio fundamental do direito das obrigações77, esta-tuído no art. 1.792 da lei, segundo o qual “o herdeiro não responde por encar-gos superiores à força da herança”.

É de se frisar que, falecendo o fiador, tem-se por extinto o contrato de fiança, ocorrendo a cessação contratual78. O que se atribui aos herdeiros é a responsabilidade pelas obrigações vencidas enquanto vivo o fiador79, e não a fiança propriamente dita.

Sobre a transmissibilidade da obrigação do fiador, arrematam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

Em conclusão, podemos afirmar que o credor na fiança poderá habilitar-se no inventário do fiador para haver o montante da dívida não adimplida pelo deve-dor principal, respeitando-se sempre os limites das forças da herança. Em sendo pago, poderá, consequentemente, o inventariante, na qualidade de representante do espólio, e em prol do interesse dos demais herdeiros, ingressar com ação re-gressiva contra o devedor principal.80

Observa Arnaldo Rizzardo que, para a constatação dessa transmissibili-dade, é irrelevante “que a garantia tenha prazo para o seu vencimento, e seu término se verifique após a morte”81.

7 a fIaNça e outroS INStItutoS de garaNtIa

Convém, neste tópico, traçar as distinções existentes entre a fiança e outros institutos afins, tendo em vista a confusão por vezes feita com os respec-tivos conceitos.

Primeiramente, conforme já exposto no início deste trabalho, é de se fri-sar que fiança não é sinônimo de caução, mas espécie desta, cujo sentido, por-tanto, é mais amplo e “abrange tanto a chamada caução real (penhor, hipoteca, alienação fiduciária) como a chamada caução fidejussória”82.

76 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.77 BITTAR, Carlos Alberto. Contratos civis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.78 GOMES, Orlando. Contratos. Apud TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em

espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.79 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2010.80 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie.

3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.81 RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.82 WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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A fiança classifica-se como modalidade de caução fidejussória, ao lado do aval. Aqui, vale destacar as distinções sempre indicadas pela doutrina entre essas duas espécies de caução fidejussória.

No particular, importante a lição de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona:

A fiança é, como visto, uma garantia pessoal contratual de natureza causal.

É, portanto, de um pacto acessório, com finalidade de garantia de cumprimento da prestação do contrato principal, cuja sorte lhe segue.

Assim, nulo o contrato principal, nula será a fiança.

Além disso, a responsabilidade na fiança é, originalmente, subsidiária, somente se tornando solidária quando há a hipótese de inaplicabilidade do benefício de ordem.

Já o aval é uma garantia aposta em título de crédito, de natureza abstrata.

Tem, portanto, existência autônoma, independentemente da sorte do título de crédito avalizado.

Assim, nulo o título de crédito, persiste o aval outorgado.83

A fiança também não se confunde com a denominada cláusula del credere a que se refere o art. 698 do Código Civil, típica dos contratos de comis-são, e que estabelece responsabilidade solidária entre o comissário e as pessoas com quem houver tratado em nome do comitente, quanto à pontualidade e à solvabilidade destas últimas84.

Por sua vez, Arnold Wald difere a fiança da carta de conforto (comfort letter). Doutrina o professor que esse instituto pode traduzir verdadeira obriga-ção de resultado ou limitar-se a uma obrigação de meio, em virtude da qual aquele que assina a carta “se obriga a fazer o melhor esforço (best effort) para que o devedor faça o pagamento ou a tomar providências que venham ou pos-sam facilitar o cumprimento da obrigação principal”85.

Wald distingue a fiança também da obrigação à primeira demanda, “que é uma garantia exigível pelo beneficiário nos termos do instrumento assinado e independentemente dos eventuais litígios que possam existir entre devedor e credor da obrigação”86.

83 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

84 BITTAR, Carlos Alberto. Contratos civis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.85 WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.86 Idem.

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Por fim, sustenta o autor que o seguro de fiança bancária, destinado aos contratos de locação (arts. 37 e 41 da Lei nº 8.245/1990), é, na verdade, um seguro especializado, e não uma modalidade de fiança.

8 a ImpeNHorabIlIdade do bem de famílIa do fIador de obrIgação decorreNte de coNtrato de locação

Sem dúvidas, o presente tópico, atualmente, consiste no aspecto de maior relevo no estudo da fiança, ante o intenso debate corrente em torno das diver-gências doutrinárias e jurisprudenciais. Para compreensão da questão, convém delinear o histórico do dilema.

Como se sabe, a impenhorabilidade legal do bem de família repousa na Lei nº 8.009/1990, cujo art. 1º, caput, dispõe:

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impe-nhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

E as hipóteses que excepcionam a regra da impenhorabilidade são arrola-das no art. 3º da referida lei, sendo que a grande discussão reside em um desses casos, o qual não constava da redação original do diploma. Trata-se do inciso VII, inserido pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) e que prescreve não ser oponível a impenhorabilidade no caso de “obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”.

É que uma minoritária, porém crescente e relevante doutrina, sustenta a inconstitucionalidade desse dispositivo, principalmente em razão da Emenda Constitucional nº 26/2000, que alterou a redação do art. 6º da Carta Magna, erigindo ao nível de direito fundamental o direito à habitação.

Sustenta-se, ademais, que a penhorabilidade do bem de família do fia-dor fere de morte o princípio da dignidade da pessoa humana, insculpido do art. 1º, III, da Constituição República, na medida em que esse princípio matriz tem como uma de suas exteriorizações, exatamente, a proteção ao direito à moradia87.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, à luz do Direito Civil Constitucional, vislumbram ainda a violação do princípio da isonomia, estatuído no art. 5º, caput, da Constituição Federal, uma vez que a admissibilidade dessa penhora

87 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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“trata de forma desigual locatário e fiador, embora as obrigações de ambos te-nham a mesma causa jurídica: o contrato de locação”88.

Ademais, deve-se ressaltar que o contrato de fiança tem natureza aces-sória em relação ao contrato de locação. Daí se tem por infringido também o princípio da proporcionalidade ao se atribuir ao fiador, através da penhora do bem de família, obrigação mais grave à que está sujeito o devedor89.

Para embasar inconstitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei nº 8.245/1991, a doutrina invoca, ainda, os princípios da solidariedade social (art. 3º, I, da CF/1988) e da função social dos contratos, que encontra fundamento na função social da propriedade (arts. 5º, XXII e XXIII, e 170, III, da CF/1988).

Fato é que, ante a nova concepção do direito civil, pautada nos valores sociais e constitucionais – nos quais os argumentos acima se enquadram per-feitamente –, em que se verifica uma flexibilização do direito patrimonial em benefício dos direitos existenciais, não há como admitir a penhorabilidade do bem de família do fiador.

Entre outros autores, filiam-se à tese da inconstitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei nº 8.245/1991 Maria Helena Diniz90, Flávio Tartuce, Pablo Stol-ze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald91 e José Fernando Simão92.

A tese chegou a ser acolhida pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 352940/SP, cujo relator, então Ministro Carlos Veloso, em decisão monocrática, assentou não haver “dúvida de que a ressalva trazida pela Lei nº 8.245, de 1991, inciso VII do art. 3º, feriu de morte o princípio isonômi-co, tratando desigualmente situações iguais [...]”93.

Porém, em 8 de fevereiro de 2006, a Corte, por maioria de votos, firmou entendimento no sentido da constitucionalidade do dispositivo.

Foi no julgamento do paradigmático Recurso Extraordinário nº 407.688, relatado pelo ex-Ministro Cezar Peluzo. O jurista, entre outros argumentos, con-signou em seu voto que a pessoa tem a faculdade de prestar ou não a fiança, sendo que, quando resolve prestá-la, o faz sabendo da possibilidade de perder o

88 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

89 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

90 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

91 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito civil. Teoria geral. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

92 SIMÃO, José Fernando. Legislação Civil Especial. Locação e propriedade fiduciária. Série Leituras Jurídicas. São Paulo: Atlas, 2007.

93 RE 352940/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, J. 25.04.2005.

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bem de família. Afirmou, ainda, que o direito à moradia não é exercido somente em imóvel próprio, mas também em imóvel alugado, sendo que o contrato de locação teria suas garantias enfraquecidas, caso prevalecesse a tese da incons-titucionalidade do dispositivo. Vê-se, portanto, que a decisão foi motivada tam-bém pela proteção de mercado.

Convém conferir a ementa do julgado:

Fiador. Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Res-ponsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel re-sidencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990, com a redação da Lei nº 8.245/1991. Recurso extraordinário des-provido. Votos vencidos. A penhorabilidade do bem de família do fiador do con-trato de locação, objeto do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República.94

Seguindo essa mesma esteira, tem-se a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consoante se denota desse recente aresto:

Agravo regimental em agravo em recurso especial. Penhorabilidade de bem de família do fiador. Ausência de impugnação da decisão agravada. Recurso a que se nega provimento, com aplicação de multa. [...] 2. Conforme entendimento pacificado nesta Corte e no Supremo Tribunal Federal, é válida a penhora sobre bem de família do fiador de contrato de locação. Aplicação do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990. 2. Agravo regimental a que se nega provimento, com aplicação de multa.95

Desse entendimento não destoa a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Território, que assim decidiu recentemente:

Agravo de instrumento. Impugnação ao cumprimento de sentença. Penhora de imóvel de fiador. Alegação de impenhorabilidade. Hipótese que se enquadra na exceção à regra. Decisão mantida. 1. A penhora de bem de família de fiador em contrato de locação é legítima, consoante o entendimento esposado pelo Plená-rio do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 407.688/SP. 2. Recurso desprovido. Unânime.96

Cabe ressalta, por fim, a preocupação razoável exposta por Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, no sentido de que essa corrente firmada pela jurisprudên-cia pode abrir espaço para uma interpretação extensiva dessa penhorabilidade, passando-se a admitir a constrição judicial do bem de família do próprio deve-

94 RE 407688/AC, Rel. Min. Cezar Peluzo, J. 08.02.2006, DJ 06.10.2006.95 AgRg-AREsp 31.070/SP, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 18.10.2011, DJe 25.10.2011.96 AGI 20120020147827, 5ª T.Cív., Rel. Romeu Gonzaga Neiva, J. 08.08.2012, DJ 29.08.2012.

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dor, quando acionado pelo fiador na qualidade de sub-rogado nos direitos do locador, já que a este último é assegurada a possibilidade de penhora97.

9 extINção da fIaNça

Conforme a didática lição de Orlando Gomes, a fiança pode se extinguir por via de consequência ou diretamente98.

Por via de consequência, a fiança será extinta sempre que a obrigação principal se extinguir. Trata-se de decorrência da natureza acessória do contrato de fiança.

Assim, será extinta a fiança, por exemplo, nos seguintes casos: confusão; compensação; novação com o devedor, sem a anuência do fiador; morte do afiançado; cumprimento da obrigação principal; nulidade da obrigação princi-pal, cabendo, neste último caso, atentar-se para a possibilidade de se reconhe-cer válida a fiança quando a nulidade da obrigação referir-se à incapacidade do devedor, salvo se menor de idade, conforme já analisado alhures.

Por sua vez, a fiança se extingue pela via direta quando a causa extintiva atingir a obrigação fidejussória, sem refletir na obrigação principal.

São exemplos de causas extintivas da fiança, entre outros: a expiração do prazo da fiança, ou, inexistindo prazo, a exoneração do fiador que notifica o credor; as exceções pessoais que o fiador tenha contra o credor, em relação às quais se remete à leitura do tópico referente aos efeitos decorrentes da relação entre credor e fiador; a morte do fiador, hipótese já abordada algures.

Demais disso, tem-se as situações peculiares previstas no art. 838 do Código Civil, verbis:

Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:

I – se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor;

II – se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e pre-ferências;

III – se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção.

Verifica-se a primeira causa quando o credor concede ao devedor novo prazo para o cumprimento da obrigação principal, sem que o fiador participe

97 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

98 GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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dessa avença. No ponto, vale conferir a Súmula nº 214 do Superior Tribunal de Justiça.

Como exemplo da segunda causa, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona ci-tam a hipótese do “credor que deu causa à destruição de um objeto valioso do devedor, que lhe fora dado em penhor”99. Nesse caso, resta inviável o exercício dos direitos e preferências de uma eventual sub-rogação do fiador, ante o pe-recimento do objeto dado em penhor. Criticam os autores a expressão “fato do credor”, já que, tecnicamente, trata-se de “ato do credor”.

Por sua vez, a terceira causa refere-se ao instituto da dação em paga-mento, em que o devedor dá ao credor objeto diverso do que inicialmente pactuado, circunstância em que o fiador não responderá pela eventual evicção sofrida pelo credor.

Na lição de Maria Helena Diniz, a evicção, embora faça ressurgir a obri-gação principal, não importa no reaparecimento da fiança, enquanto obrigação acessória. Explica a autora que “tal ocorre porque o credor, apesar de ter o direito de exigir do fiador o pagamento do débito garantido, não poderá agravar a sua situação”100.

E se a coisa evicta for exatamente o objeto originariamente previsto da obrigação principal afiançada, ressurgirá a responsabilidade do fiador? Essa in-teressante indagação é formulada por Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona.

Trata-se de hipótese não prevista no Código Civil, pelo que, a priori, a resposta seria negativa, com fundamento no art. 819 do diploma, segundo o qual a fiança “não admite interpretação extensiva”.

Contudo, os referidos autores respondem positivamente à pergunta, ou seja, a fiança, nesse caso, será restabelecida. Fundamentam o entendimento no fato de que “o pagamento da dívida operou a transferência de algo que não poderia ser alienado, neutralizando completamente os efeitos do suposto adimplemento”101.

Finalmente, dispõe o art. 839 do Código Civil que ficará exonerado o fia-dor, se invocar o benefício de ordem, e se o devedor, retardando-se a execução, vier a cair em insolvência. Exige-se, contudo, que o fiador prove que os bens por ele indicados quando do manejo do benefício de ordem eram, ao tempo da penhora, suficientes para a solução da dívida afiançada.

99 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

100 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

101 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Preconiza Flávio Tartuce que “a norma tende a punir a inoperância do credor, a negligência do mesmo em receber sua dívida”102.

coNcluSão

A fiança trata-se de contrato com grande abrangência no mercado, com-portando como objeto as mais variadas obrigações. E não tinha como ser dife-rente, dado o dinamismo típico da sociedade moderna.

Garantindo o cumprimento de obrigações de dar, fazer, não fazer, pre-sentes e futuras, a fiança pode ser estipulada praticamente em qualquer avença, criando vínculos e gerando efeitos entre fiador, credor e, embora dispensável sua designação no do contrato de fiança, devedor-afiançado.

A responsabilidade oriunda do contrato de fiança, caracterizada por ser desvinculada de um débito, recebe um tratamento bem delimitado pelo orde-namento jurídico, tendo em vista a sua proeminente repercussão nas relações jurídicas presentes na sociedade.

Denota-se, pois, que a fiança tem papel de relevada importância no que diz respeito ao desenvolvimento das atividades comerciais e civis. Enquanto garantia de uma obrigação principal, atua como elemento incentivador, fomen-tando no indivíduo o interesse em se tornar credor naquela obrigação, de modo a promover aquela determinada área de mercado.

Saber que, em caso de inadimplência do devedor, é possível demandar em face de outra pessoa que se dispôs, contratualmente, a assegurar o cumpri-mento da obrigação é, sem dúvida, uma circunstância muito favorável ao cre-dor em uma contratação. O reflexo disso, como dito, é a expansão do mercado, com a maior distribuição de produtos e serviços.

Tal é a relevância da fiança, que o Supremo Tribunal Federal, com o claro propósito de preservar o mercado de locações residenciais, chegou ao ponto de não reconhecer a impenhorabilidade do bem de família do fiador, nada obstante a intensa e razoabilíssima crítica da doutrina. Entrelinhas, disse o Tribunal que a responsabilidade decorrente da fiança nos contratos locacionais é de tamanha gravidade que se impõe, inclusive, sobre o direito de moradia do fiador, o qual se dispôs, livremente, a assumir o encargo.

Nada obstante discordarmos do entendimento assentado pela Corte, é inegável que o acolhimento da tese contrária teria imediato reflexo negativo so-bre as operações de locação. Ocorre que, entre a promoção de um determinado mercado e a preservação da dignidade da pessoa humana, esta última deve

102 TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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sobressair, enquanto fundamento da República Federativa do Brasil e princípio matriz da Constituição Federal.

Isso se torna mais evidente – ou pelo menos deveria – quando se está se referindo a um Tribunal cuja missão precípua é, exatamente, assegurar a obser-vância e cumprimento da Constituição Federal.

O direito civil, bem como qualquer ramo do Direito, não mais pode ser interpretado como regramento absolutamente autônomo do direito constitucio-nal. A nova perspectiva imposta pelo neoconstitucionalismo exige a releitura do direito privado a partir dos valores sociais e constitucionais.

Daí falar-se em Direito Civil Constitucional, que tem como princípio ex-pressivo a solidariedade social. Desse princípio, extrai-se, entre outros consec-tários, que a verdadeira função de um contrato não deve ser o atendimento aos interesses do mercado, mas sim a promoção do desenvolvimento da pessoa humana.

referêNcIaSBEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. Apud RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

BITTAR, Carlos Alberto. Contratos civis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: teoria das obrigações contratuais e extra-contratuais. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito civil. Teoria geral. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

GOMES, Orlando. Contratos. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

______. Contratos. Apud TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil. Apud VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

SIMÃO, José Fernando. Legislação Civil Especial. Locação e propriedade fiduciária. Série Leituras Jurídicas. São Paulo: Atlas, 2007.

TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria geral dos contratos e contratos em espécie. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécie. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Assunto Especial – Doutrina

Fiança

Prorrogação dos Contratos de Locação: a Situação do Fiador

PEDRO CAmERA PAChECOGraduado pela UCSAL, Pós-Graduado em Direito Tributário pelo IBET, Ex-Analista Judiciário, Advogado do Sebrae/BA.

O mais comum nos contratos de locação de imóveis urbanos é que o proprietário exija do locatário um fiador, a fim de ter mais segurança do recebi-mento dos aluguéis. Isso se dá principalmente em razão do que dispõe o art. 3º, VII, da Lei do Bem de Família (Lei nº 8.009/1990):

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

[...]

VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

O bem de família do locatário fica a salvo da execução, mas não se pode dizer o mesmo do bem de família do fiador. Este está sujeito a penhora judicial.

Como se sabe, o contrato de locação prorroga-se mesmo após o fim de seu prazo, caso o locatário continue na posse do bem (arts. 46, § 1º, e 47 da Lei nº 8.245/1991).

A questão que surge é: prorrogado o contrato tacitamente, considera-se prorrogada também a fiança?

No Direito, há a regra de que o acessório segue o principal. Assim, já que a fiança existe em função do contrato de locação, poderia se entender que, em este sendo prorrogado, a fiança também o seria.

Por outro lado, a fiança é ato de disposição de vontade de uma pessoa, e geralmente gratuito. Assim, seria injusto dar interpretação que aumentasse no tempo a obrigação de terceiro que não participou do ato de prorrogação.

Até 2009, a jurisprudência era firme entendendo da segunda forma.

Súmula nº 214/STJ: O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.

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Mas a Lei nº 12.112/2009 modificou o art. 39 da Lei de Locações, que passou a ter o seguinte texto:

Art. 39. Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da lo-cação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta lei.

A partir daquela data, as fianças passaram a se prorrogar junto com o contrato (o acessório segue o principal).

Pensamos que o legislador não foi nada comedido nessa abordagem e estendeu a obrigação do fiador para além do quanto originalmente avençado.

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Assunto Especial – Doutrina

Fiança

Validade da Notificação Via Eletrônica ao Fiador em Casos de Sub-rogação de Locação

hERmISOn RICARDO BIOnIGraduado em Tradução-Interpretação e Letras na Faculdade Ibero Americana de Letras e Ciências Humanas, Pós-Graduado em Administração Estratégica na Universidade Cidade de São Paulo, aluno de Direito da Universidade de Suzano – Uniesp, aluno do curso de Pós--Graduação Lato Sensu de Direito Imobiliário.

RESUMO: Este trabalho tem o objetivo geral de estudar os efeitos da notificação via eletrônica ao fiador em situações de sub-rogação do contrato de locação no caso de dissolução conjugal face às alterações na Lei nº 12.112/2009. Para atingir esse propósito, foram utilizados os seguintes objetivos específicos: analisar os princípios fundamentais contratuais, interpretar as principais nulidades dos negócios jurídicos, conceituar contrato e contrato de locação, analisar a sub-rogação do contrato de locação, expor os tipos de notificações eletrônicas e verificar a validade das notificações via aplica-tivos de mensagens.

ABSTRACT: This paper has the general objective to study the effects of notification by electronic means to the guarantor in situation as subrogation of the lease agreement in the case of matiral dis-solution, concerning the changes at law 12.112/2009. In order to accomplish this goal, the folowing specific objectives had been used: to analyze the mainly contractual principles, to interpret the mainly nullity of legal business, to conceptualize contract and lease, to analyze the subrogation of the lease agreement, to show the different sort of electronic notification and to verify the validity of notification using messaging apps.

PALAVRAS-CHAVE: Princípios; nulidades; contrato; locação; meios eletrônicos; notificação.

KEYWORDS: Principles; nulitty; contract; lease; electronic means; notification.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Princípios fundamentais contratuais; 1.1 Princípio da autonomia da vontade; 1.2 Princípio da obrigatoriedade do consensualismo; 1.3 Princípio da obrigatoriedade da convenção; 1.4 Princípio da relatividade dos efeitos do contrato; 1.5 Princípio da boa-fé; 1.6 Princípio da publici-dade; 1.7 Princípio do dever de informar; 2 Nulidade dos negócios jurídicos; 2.1 Nulidade absoluta; 3 Contrato; 3.1 Conceito; 4 Contrato de locação; 5 Sub-rogação do contrato de locação no caso de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução de união estável; 6 Citação, intimação, notificação; 7 Espécies de notificação; 7.1 E-mail; 7.2 Aplicativos de mensagens; 7.3 Carta com Aviso de Recebimento – AR; 7.4 Telegrama com cópia e Aviso de Recebimento – AR; 7.5 E-mail registrado com assinatura por certificado digital; 7.6 Cartório de títulos e documentos; 7.7 Notificação pessoal direta com recibo; 8 Validade da notificação via aplicativo de mensagens; Conclusão; Referências.

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INtrodução

Este trabalho traz à baila questionamentos importantes sobre a legitimi-dade e eficácia da notificação ao fiador, via meio eletrônico, em casos de sub--rogação locatícia decorrente de dissoluções de casamento e união estável.

O propósito ímpar é o de oferecer um panorama geral sobre o tema, uma vez que haverá apenas a exposição de assuntos pesquisados, sem que haja efe-tivo aprofundamento científico nas questões aqui expostas.

Para facilitar a compreensão, serão inicialmente abordados os princípios e as nulidades contratuais, conceito de contratos, bem como as modalidades de comunicação eletrônica.

No decorrer do trabalho, serão apresentadas algumas considerações im-portantes sobre a legalidade e eficácia da notificação via aplicativos de mensa-gens, à luz de normas jurídicas relativas ao tema.

A Lei nº 12.112/2009 traz alterações significativas concernentes à ne-cessidade de notificação ao fiador em casos de sub-rogação da locação; no entanto, deixa obscura a forma com que esse ato deve ser praticado, uma vez que reza unicamente a necessidade de que essa comunicação seja realizada de forma escrita.

Ao término do artigo, será apresentada uma conclusão sobre a problemá-tica apresentada com base nos preceitos legais pertinentes ao caso.

1 prINcípIoS fuNdameNtaIS coNtratuaIS

1.1 princípio dA AutonomiA dA vontAde

Consiste na liberdade contratual das partes de estipular livremente, como melhor lhes convier, mediante mútuo consentimento, a disciplina de seus in-teresses, gerando efeitos tutelados pela ordem jurídica, envolvendo além da li-berdade de criação do contrato com suas cláusulas peculiares próprias de cada negócio jurídico, limitadas pelas normas de ordem pública.

O princípio da autonomia da vontade se alicerça exatamente na ampla liberda-de contratual, no poder dos contratantes de disciplinar os seus interesses me-diante acordo de vontades, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. (Gonçalves, 2014, p. 40)

A liberdade contratual, no entanto, é reconhecida nos moldes de que seu exercício está condicionado à função social do contrato e requer valores de boa-fé e probidade. Com isso, o princípio da autonomia contratual é o poder dado às partes que estabelecem vínculos obrigacionais, desde que se submetam às normas jurídicas vigentes.

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1.2 princípio dA obrigAtoriedAde do consensuAlismo

De acordo com esse princípio, o simples acordo das partes é suficiente para gerar o contrato válido, uma vez que a maioria dos negócios jurídicos bila-terais é consensual, embora tenham sua validade condicionada ao regramento de formalidades legais.

Conclui-se, então, que o mero consentimento das partes é o requisito para a perfeição e validade dos contratos.

1.3 princípio dA obrigAtoriedAde dA convenção

Por esse princípio, as convenções contratuais deverão ser fielmente cumpridas pelos contratantes, pois o contrato uma vez estipulado gera o efeito obrigacional, autorizando as partes a pedir intervenção estatal para assegurar a execução das obrigações.

Ninguém é obrigado a contratar, porém, uma vez que o fizerem, sendo o contrato válido e eficaz, devem cumpri-lo. Uma vez estipuladas as cláusulas, seu conteúdo não pode ser alterado, mesmo que judicialmente.

Esse princípio é originário do Código francês, estabelecendo que o con-trato faz lei entre as partes, e com isso as propriedades privadas estariam prote-gidas de forma absoluta, não sendo prejudicada sem a manifestação de vontade das partes.

No Brasil, o contrato segue o princípio pactu sunt servanda, porém este não é absoluto, estando vinculado aos limites da supremacia da ordem pública e da moral.

As novas tendências contratuais, em especial a necessidade de observar a função social do contrato, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses transindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana.

O contrato válido e eficaz deve ser cumprido integralmente pelas partes.

Isso posto, fica vedado que uma das partes de forma unilateral altere o conteúdo do contrato, nem mesmo o juiz poderá fazê-lo.

1.4 princípio dA relAtividAde dos efeitos do contrAto

Este princípio vincula exclusivamente as partes que nela interagem, visto que não pode favorecer ou prejudicar terceiros. O contrato, assim, somente produz efeitos nas partes contratantes. Uma vez que o ato negocial deriva do acordo de vontades, não há o que se falar em eficácia em relação a terceiros.

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1.5 princípio dA boA-fé

O princípio da boa-fé exige que os contratantes se comportem de forma correta em todas as fases contratuais. Está estritamente relacionado com o pa-drão ético de conduta, de agir com retidão, ou seja, com probidade, honestida-de e lealdade.

A regra da boa-fé é pressuposta, devendo a má-fé, ao contrário, ser pro-vada por quem alega. Tal princípio impõe uma regra de conduta, tratando-se de um verdadeiro controle das cláusulas e práticas abusivas, assume feição de uma regra ética de conduta.

A boa-fé pode ser entendida como forma de expressar a intenção pura, isenta de dolo ou engano, com que a pessoa realiza um negócio ou executa o ato, certa de que está agindo na conformidade da lei.

Uma vez que a relação contratual é um contato social que vincula pes-soas, não se pode esquecer de desrespeitar os deveres gerais da conduta, respei-tando, assim, os direitos do parceiro contratual.

O Código Civil regula a boa-fé objetiva em três dispositivos principais. Reza o art. 422, relativo aos contratos: “Os contratantes são obrigados a guar-dar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da boa-fé objetiva”. Já o art. 187 observa a boa-fé como critério definidor do limite de exercício de direito subjetivo: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. Finalmente, o art. 113 alude a que “os negócios devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”.

Fica evidenciado, nesses artigos do Código Civil, que o princípio da boa--fé impõe às partes os deveres de cooperação, lealdade, informação e proteção, devendo ser feito com confiança recíproca, a fim de garantir a mútua satisfação de seus interesses.

Assim, a boa-fé objetiva consiste num dever de conduta contratual ativo de ambas as partes contratantes, demonstrando lealdade quanto às cláusulas não constatadas de plano, que, muitas vezes, não ficam expressas no contrato.

1.6 princípio dA publicidAde

De acordo com este princípio, toda informação ou publicidade deve ser suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunica-ção com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obrigando o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integrar o contrato que vier a ser celebrado.

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O princípio da publicidade e informação é imposta expressamente no Código de Defesa do Consumidor, e a exigência da boa-fé objetiva em todas as fases contratuais, inclusive pré-contratuais, se tornou indispensável.

O Código de Defesa do Consumidor proíbe qualquer ato enganoso ou abusivo, conceituando como enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação que venha induzir em erro o consumidor, quer por omissão, quer por qualquer outro modo.

1.7 princípio do dever de informAr

O dever de informar é imperioso em qualquer relação contratual, não se esgotando na fase pré-contratual, sendo aprovado no V Congresso Brasi-leiro de Direito do Consumidor que “os deveres de informação nos contratos de prestação de serviços aplicam-se nas fases pré-contratual, contratual e pós--contratual”.

O dever de esclarecimento obriga o fornecedor do serviço, como por exemplo [...] exclusões da responsabilidade contratual, modificações contratualmente possíveis. Enquanto que o dever de aconselhamento é um dever mais forte... Cumprir ou não o dever de aconselhamento significa aquelas informações neces-sárias para que o consumidor possa escolher entre os vários caminhos a seguir... (Marques, 2005, p. 71)

2 NulIdade doS NegÓcIoS jurídIcoS

É de fundamental importância o estudo da validade e invalidade do negó-cio jurídico, visto que a eficácia deste se justifica na produção dos seus efeitos.

Para que a vontade pactuada ente as partes alcancem seu fim, é indispen-sável a sua existência, validade e eficácia.

2.1 nulidAde AbsolutA

A nulidade absoluta poderá ser arguida a qualquer tempo e sem forma específica, podendo ser alegada por qualquer interessado, inclusive pelo Minis-tério Público.

Ainda é possível que as nulidades absolutas sejam conhecidas de ofício:

As nulidades devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda que a requerimento das partes. (Art. 169 do Código Civil de 2002)

O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convales-ce pelo decurso do tempo, podendo ser alegada a nulidade a qualquer tempo.

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O Código Civil dispõe, em seu art. 166, as causas de nulidade do negócio jurídico.

É nulo o negócio jurídico quando:

I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

III – o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

IV – não revestir a forma prescrita em lei;

V – for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

VI – tiver por objeto fraudar lei imperativa;

VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. (Art. 166 do Código Civil de 2002)

Destacando os incisos IV, V e VI, respectivamente, podemos observar:

– Nulidade do negócio jurídico quando não revestir a forma prescrita em lei – A forma do negócio jurídico em regra é livre, porém excep-cionalmente é definida por lei, sendo que, neste caso, deverá ser observada, sob pena de nulidade do ato;

– Nulidade do negócio jurídico quando for preterida alguma soleni-dade que a lei considere essencial para a sua validade – O legis-lador deixa claro que é caso de nulidade tanto a forma quanto a solenidade do negócio jurídico, sendo que, para a nulidade do ato, é indispensável que a solenidade seja tida como essencial, como, por exemplo, a comunicação ao fiador em caso de sub-rogação de locação por motivo de dissolução da união conjugal;

– Nulidade do negócio jurídico quando tiver por objeto fraudar a lei imperativa – Indispensável se faz que a fraude tenha como objeto lei imperativa, a qual pode ocorrer de forma frontal e direta a lei ou de forma indireta através de negócio lícito e válido.

3 coNtrato

3.1 conceito

O contrato é a forma mais eficaz e costumeira fonte de obrigação, que configura um negócio jurídico, sendo indispensável para seu aperfeiçoamento da participação e concordância de duas ou mais partes. Sendo assim, para que se configure num negócio jurídico perfeito, há de haver mútuo consentimento.

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Outro ponto que merece ressalva é a função social do contrato, que, em primeiro momento, serve para limitar a autonomia da vontade face ao interesse social, impedindo que terceiros, por exemplo, possam ser atingidos direta ou indiretamente.

Nessa esfera, dispõe o art. 421 do Código Civil: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

A função social do contrato tem como escopo possibilitar a aplicação de uma justiça comutativa, evitando que ocorram desigualdades entre as partes contraentes.

Pode-se afirmar, então, que o contrato possui dois aspectos fundamen-tais: o aspecto individual, em relação às partes contratantes, que se valem do instituto para satisfazerem seus próprios interesses, e o aspecto público, cons-tituído pelas limitações legais impostas às partes para que o contrato assuma caráter de equidade e equilíbrio social.

[...] poder-se-á dizer que contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na con-formidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de in-teresses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial. (Diniz, 2014, p. 32)

Torna-se nula, de pleno direito, qualquer alteração contratual realizada de forma unilateral, ou seja, sem que haja o mútuo consentimento, respeitando os preceitos legais consistentes na observância de comportamentos idôneos à satisfação dos interesses das partes.

4 o coNtrato de locação

O contrato de locação é caracterizado pelo fato de um locador, mediante remuneração e durante um determinado período, ceder a posse direta de uma determinada coisa infungível a um locatário, que terá o direito de usar e gozar da coisa.

Como regra, o proprietário de uma coisa é quem pode dá-la em locação, mas não apenas ele. Assim, quem tem a livre disposição de uso e gozo de uma coisa pode juridicamente entregá-la em locação, seja pessoa natural ou física, seja pessoa jurídica.

De acordo com o Código Civil, locador pode ser o proprietário e também outras pessoas, como usufrutuário; comodatário; possuidor; fiduciário; genito-res como administradores legais dos bens dos filhos; mandatário; próprio loca-tário, se consentir o locador; espólio; condomínio edilício, entre outros.

As partes, ao firmarem o contrato, contraem certas obrigações. Por um lado, o locador será obrigado a entregar a coisa locada, responder por vícios

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ocultos da coisa, garantir o seu uso pacífico, ser adimplente com os tributos que recaírem sobre a coisa, fornecer os recibos de alugueres ao locatário, indenizar as benfeitorias úteis e necessárias, conceder direito de preferência em caso de alienação, limitar-se aos valores locatícios avençados no contrato.

De outro lado, o locatário será responsável pelo uso da coisa locada de forma convencionada no contrato, zelando por sua conservação, ser adim-plente aos alugueres, avisar ao locador sobre eventuais turbações de terceiros, restituir a coisa ao término do contrato no estado em que lhe foi entregue, arcar com despesas ordinárias, fornecer garantia locatícia e responder por quaisquer danos a que der causa.

Assim como os demais contratos, todos os princípios devem ser observa-dos, bem como as estipulações legais rigorosamente respeitadas.

5 Sub-rogação do coNtrato de locação No caSo de Separação de fato, Separação judIcIal, dIvÓrcIo ou dISSolução de uNIão eStÁvel

A nova Lei nº 12.112/2009, em caso de sub-rogação de locação por separação de fato, judicial, divórcio ou dissolução de união estável, traz, em seu bojo, significantes alterações em seu art. 12, no que tange à notificação ao locador e ao fiador.

A lei anterior, a saber, Lei nº 8.245/1991, possuía uma redação anterior, nos seguintes moldes:

Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da sociedade concubinária, a locação prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.

Parágrafo único. Nas hipóteses previstas neste artigo, a sub-rogação será comu-nicada por escrito ao locador, o qual terá o direito de exigir, no prazo de 30 (trinta) dias, a substituição do fiador ou o oferecimento de qualquer das garantias previstas nesta lei. (Art. 12 da Lei nº 8.245/1991)

A atual redação da Lei nº 12.112/2009 trouxe à luz a obrigatoriedade de incluir o fiador, na comunicação legal, como requisito indispensável para a realização do feito.

Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução de união estável, a locação residencial prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.

§ 1º Nas hipóteses previstas neste artigo e no art. 11, a sub-rogação será comu-nicada por escrito ao locador e ao fiador, se esta for a modalidade de garantia locatícia.

§ 2º O fiador poderá exonerar-se das suas responsabilidades no prazo de 30 (trin-ta) dias contados do recebimento da comunicação oferecida pelo sub-rogado,

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ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador. (Art. 12 da Lei nº 12.112/2009)

Fica evidenciado que a lei preserva o prosseguimento automático da re-lação locatícia, seja com o cônjuge sobrevivente, seja com o cônjuge separan-do que permanecer no imóvel. Entretanto, a responsabilidade do fiador sofreu alterações consideráveis, uma vez que, na redação da antiga lei, em casos de sub-rogação locatícia, automaticamente a garantia na forma de fiança estaria rompida, salvo entendimentos jurisprudenciais ao contrário. O fiador, à luz da nova norma, poderá exonerar-se da obrigação fidejussória, ficando tão somente responsável pelo prazo de cento e vinte dias após a notificação.

Nos casos de dissolução familiar ou de morte do locatário, será facultado ao fiador exonerar-se de suas responsabilidades, respeitando o prazo legal, após comunicação feita pelo novo responsável do aluguel.

O preceito legal esbarra em uma omissão da lei, uma vez que não estipu-la qual é o devido processo legal para a notificação. Uma vez que descreve ape-nas que a notificação deverá ser por escrito, remete a inúmeras possibilidades ao feito, destacando-se, entre elas, a moderna utilização de meios eletrônicos.

6 cItação, INtImação, NotIfIcação

Reza o art. 213 do Código de Processo Civil que “citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender”.

Portanto, a citação é uma forma de comunicar a alguém que existe uma ação contra ele. Apenas após ser citado, o réu poderá se defender do que lhe é imputado. A citação ocorre de três formas: por meio de correspondência envia-da pelo correio, por um oficial de justiça ou mesmo por edital.

É admitida, no processo civil, a citação na pessoa do réu, de seu repre-sentante legal ou procurador autorizado.

A notificação caracteriza-se como uma medida preventiva que tem por objetivo prevenir responsabilidades e eliminar a possibilidade de alegações fu-turas de desconhecimento. Refere-se ao futuro, a um ato que vai ser praticado. Dessa forma, a notificação está vinculada a uma comunicação ou um aviso, que, uma vez comprovado o recebimento, não poderá o receptor alegar desco-nhecimento da situação.

Notificação, por conseguinte, é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa.

É fundamental destacar que, atualmente, não há mais a distinção entre intimação e notificação de atos processuais.

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O novo Código só conhece a intimação dos atos processuais, que, tecni-camente, tem duplo objetivo: o de cientificar de um ato ou termo processual e o de convocar a parte a fazer ou abster-se de fazer alguma coisa.

Intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa. (Art. 234 do Código de Processo Civil de 1973)

Trata-se da forma de comunicação entre as partes interessadas em uma relação jurídica. Cabe salientar, como já colocado, que não há mais diferencia-ção entre notificação e intimação. Desse modo, a intimação é realizada tanto para dar ciência de algum ato ocorrido no processo, bem como para determinar a prática de um ato.

É de fundamental importância salientar que será mandatório a intimação das partes envolvidas em uma relação jurídica, a fim de se garantir a eficácia constitucional do contraditório e da ampla defesa.

7 eSpÉcIeS de NotIfIcação

A notificação consiste em dar ciência a alguém de que ela deve praticar ou deixar de praticar algum ato. Uma vez aceita pelo notificado, mesmo que seja uma aceitação tácita decorrente de sua inação, pode configurar uma rela-ção obrigacional, um prazo ou uma penalidade em caso de inobservância. Em casos de não recebimento do notificado, ele ficará desobrigado a cumpri-la.

7.1 e-mAil

A notificação via e-mail é muitíssimo rápida, permitindo ao usuário a transmissão de informações em velocidade ímpar. O grande entrave do sistema é o de confirmar se o destinatário efetivamente recebeu a mensagem, pois fica subordinado a uma resposta do receptor. Além disso, a plataforma é vulnerável, uma vez que pode sofrer, por hackers, alterações no conteúdo e autoria das mensagens.

Cada vez mais, pela agilidade e rapidez, e-mails são utilizados no mundo contemporâneo, servindo até como provas em processos judiciais, mas podem ter sua validade questionada por sua alta vulnerabilidade.

7.2 AplicAtivos de mensAgens

Da mesma forma, a notificação via aplicativos e mensagens é pratica-mente instantânea, permitindo o envio de documentos digitalizados anexos e mensagens de teor variado. A vantagem do aplicativo sobre o e-mail é o de possibilitar que o remetente saiba se o destinatário recebeu ou não a mensagem.

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Porém, o sistema, assim como outros meios eletrônicos, corre o risco de sofrer modificações provocadas por hackers, que podem facilmente alterar mensagens e sua autoria. Igualmente, há uma falácia na confirmação de recebimento pelo real destinatário, pois o serviço não oferece nenhuma forma de identificar a pessoa que recebeu de fato a mensagem.

Nessa esfera, a validade da notificação via aplicativo de mensagens tem, como os outros meios eletrônicos, sua validade e eficácia comprometidos.

7.3 cArtA com Aviso de recebimento – Ar

A carta com aviso de recebimento, enviada pelos correios, é uma forma de notificação que garante a identificação do receptor da mensagem, pois ele deverá assinar o aviso de recebimento que será posteriormente devolvido ao remetente. Entretanto, não permite a identificação do teor da mensagem; logo, o remetente é absolutamente incapaz de provar que enviou certa notificação.

7.4 telegrAmA com cópiA e Aviso de recebimento – Ar

O telegrama é uma alternativa para o envio de cartas, com suas pecu-liaridades próprias. O telegrama indica um remetente, mas não garante que o mesmo seja de fato quem enviou a mensagem. O recebedor é, da mesma forma, identificado na carta com AR, pois há um comprovante de recebimento assina-do e devolvido ao remetente original. Vale salientar que não é possível enviar documentos anexos por telegrama.

7.5 e-mAil registrAdo com AssinAturA por certificAdo digitAl

O e-mail registrado e com assinatura digital tem garantidas a autoria e a integridade do conteúdo da mensagem e dos documentos anexos. Uma vez as-sinado com certificado digital, o e-mail fica protegido por criptografia, de sorte que qualquer alteração na mensagem invalida a assinatura digital. Esse tipo de e-mail também permite saber quando foi recebido.

O receptor não precisa usar nenhum serviço ou sistema específico para receber e responder ao e-mail com certificado digital.

Entretanto, a vulnerabilidade de se identificar o receptor ainda continua duvidosa, uma vez que quem abriu o e-mail pode não ser o destinatário.

7.6 cArtório de títulos e documentos

Esse é um tipo de notificação extrajudicial tradicional, possuindo status de notificação mais segura em relação às outras. As notificações são entregues em 3 vias a um cartório de títulos e documentos. O cartório arquiva uma via

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e entrega a outra via ao destinatário. Ao entregar a via ao receptor, o cartório produz uma certidão com fé pública que comprova a entrega do documento ao notificado. A autoria e conteúdo são facilmente comprovados, uma vez que o cartório goza da prerrogativa de fé pública e da possibilidade de serem consul-tados os documentos que ali estão arquivados. Assim, como outras modalidades de envio de mensagens, a notificação via cartório de títulos e documentos apre-sentam controvérsias, como a de levar dias ou até semanas para ser entregues.

7.7 notificAção pessoAl diretA com recibo

A notificação pode se dar pessoalmente, com a entrega da notificação pelo próprio remetente ou portador ao destinatário, que deverá assinar um re-cibo que serve de prova. Entretanto, para ter maior eficácia, além de assinar o recibo de entrega, deverá o receptor assinar uma cópia dos documentos, dando ciência do teor da correspondência.

8 valIdade da NotIfIcação vIa aplIcatIvo de meNSageNS

É inegável afirmar que, seguindo tendências contemporâneas, o uso do meio eletrônico está cada vez mais assumindo uma posição de fundamental importância na comunicação.

Os celulares, por exemplo, são grandes aliados na vida cotidiana das pessoas, por ser um meio rápido e eficaz no envio de mensagens.

Contudo, é muito discutível a eficácia da validade de uma notificação valendo-se desse recurso digital.

À luz da Lei nº 11.419, que dispõe sobre a informatização do processo digital, encontramos aspectos favoráveis e desfavoráveis na efetividade do uso do aplicativo.

Art. 1º O uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comuni-cação de atos e transmissão de peças processuais será admitido nos termos desta lei.

§ 1º Aplica-se o disposto nesta lei, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista, bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição.

§ 2º Para o disposto nesta lei, considera-se:

I – meio eletrônico qualquer forma de armazenamento ou tráfego de documentos e arquivos digitais;

II – transmissão eletrônica toda forma de comunicação a distância com a utili-zação de redes de comunicação, preferencialmente a rede mundial de compu-tadores;

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III – assinatura eletrônica as seguintes formas de identificação inequívoca do sig-natário:

a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade Certi-ficadora credenciada, na forma de lei específica;

b) mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos.

Art. 2º O envio de petições, de recursos e a prática de atos processuais em geral por meio eletrônico serão admitidos mediante uso de assinatura eletrônica, na forma do art. 1º desta lei, sendo obrigatório o credenciamento prévio no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos órgãos respectivos. (Arts. 1º e 2º da Lei nº 11.419/2006)

Isto posto, a Lei nº 11.419/2006 admite o uso de meio eletrônico na tra-mitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças.

Num primeiro momento, seria possível a notificação via aplicativo de mensagens, desde que regularmente houvesse a efetiva comprovação de que foi recebido e lido pelo suposto destinatário da mensagem pelo aviso de leitura, que está simbolizado por dois tiques azuis.

O aplicativo de mensagens preenchem os requisitos dos incisos I e II do § 2º, pois é uma forma de comunicação eletrônica que se utiliza de redes de comunicação a distância, permitindo o tráfego de documentos, além de conter ícones que comprovam o recebimento da mensagem.

Entretanto, a legalidade do ato esbarra no art. 2º, que só admite a prática de atos processuais eletrônicos mediante assinatura eletrônica.

Sendo assim, é certo que a comunicação via aplicativo jamais vai substi-tuir a segurança das transações contratuais que contêm assinatura digital.

É inegável afirmar que a comunicação digital visa à celeridade e à infor-malidade; contudo, fica evidente que a notificação via aplicativo de mensagens, além de não ter previsão legal, acarreta uma série de problemas, inclusive quan-to ao efetivo recebimento da mensagem pelo destinatário.

Ainda que existam recursos que permitam o aviso automático de recebi-mento das mensagens, estes não são seguros.

O objetivo principal da notificação é a de permitir o princípio do con-traditório e da ampla defesa, não sendo admissível pensar em aplicativos como ferramenta de comunicação processual, considerando que não pode garantir certeza e confiabilidade quanto ao tráfego e recebimento da informação.

Outra questão a ser considerada é a de que plataformas de comunicação eletrônica são mantidas por empresas privadas e regidas por termos de uso de-finidos unilateralmente.

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Utilizar meios como esse para a comunicação de atos e informações pode expor a privacidade do cidadão.

O devido processo legal é uma garantia essencial e a formalidade dos atos é condição mister para a sua existência.

coNcluSão

O contrato é o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas, sobre ob-jeto lícito e possível, com o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos.

A relação contratual não se dá de forma descontextualizada, mas deve ser permeada por princípios que assegurem sua validade e eficácia.

Genericamente se pode afirmar que os contratos são regidos pela boa-fé recíproca, sendo validados por princípios de liberdade, autonomia de vontade, gerando, assim, vínculos obrigacionais.

Algumas situações, entretanto, podem gerar a nulidade total ou parcial dos contratos, pela inobservância de preceitos legais que devem ser rigorosa-mente obedecidos.

O contrato de locação, por sua vez, caracteriza-se por um locador que, mediante pagamento e durante um período de tempo, cede a posse direta de um bem para um locatário.

Assim como todos os contratos, para ter sua validade efetivada, deve seguir os princípios e preceitos legais.

Regido pela Lei nº 11.112/2009, o contrato de locação sofreu algumas alterações significativas em sua redação anterior.

Entre elas, destaca-se o art. 12, que trata da sub-rogação da locação em casos de dissolução da sociedade conjugal, em que o cônjuge que permanecer no imóvel dará automático prosseguimento à relação locatícia.

O grande enfoque está centrado na figura do fiador, que, na nova reda-ção da lei, deve ser notificado da situação atual do contrato, para que se exone-re, após 120 dias, da garantia de fiança, se assim o desejar.

Entretanto, há uma falta grave na lei em se tratando da ausência de espe-cificação do processo legal que culmine tal notificação, uma vez que estipula tão somente a necessidade de a comunicação ser realizada por escrito.

Partindo desse pressuposto, discute-se a validade e eficácia de tal notifi-cação se dar por meio eletrônico.

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Como já exposto neste trabalho, entre os meios possíveis de comunica-ção eletrônica, destaca-se, por sua praticidade e rapidez, o aplicativo de men-sagens.

Restou claro que se trata de meio inidôneo de notificação, como bri-lhantemente observa a Lei nº 11.419, em que faz clara exigência de assinatura eletrônica para a validade dos atos processuais.

Em uma última análise, a comunicação via aplicativo de mensagens é incerta, pois, apesar de existir a possibilidade de confirmar o envio, há a falácia na confirmação de recebimento, que, mesmo que ocorra, não serve como meio probatório de assegurar que o receptor da mensagem foi realmente o fiador.

Fica evidenciado que tal arrojo viola os princípios contratuais quanto à manifestação da vontade, boa-fé, liberdade de contratar, publicidade, bem como ao dever de informar.

Isso tudo culminará, indubitavelmente, na nulidade do contrato, por ferir, entre outros preceitos, o art. 166, IV e V, do Código de Processo Civil, quer pelo ato não ser revestido da forma prescrita em lei, quer por inobservar as solenida-des essenciais que a lei considera para a sua validade.

referêNcIaSDINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 3: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

FARIAS, Thélio Queiroz; LOIOLA, Antonio Arneldo Leite de. Nova Lei do Inquilinato comentada – Lei nº 12.112, de 9 de dezembro de 2009. São Paulo: CL Edijur, 2010.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 3: contratos e atos unila-terais. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor – O novo regime das relações contratuais. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

SANTOS, Gildo dos. Locação e despejo: comentários à Lei nº 8.245/1991. 5. ed. rev., atual. e ampl. de acordo com o Código Civil de 2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

SANTOS, Maurício Barbosa dos. Revisional dos contratos imobiliários. São Paulo: RCN, 2013.

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Assunto Especial – Em Poucas Palavras

Fiança

A Fiança nos Contratos de Locação com Prazo Indeterminado

PâmELLA BATISTA DEL PRETO1

Advogada militante nas áreas cíveis, trabalhistas e previdenciárias.

Recentemente, o País desfrutou de um avanço imobiliário considerável, em diversas áreas, tanto em locação residencial e comercial quanto na compra e venda de imóveis. Entre as variadas modalidades de contrato, o de locação merece nosso enfoque, pois foi o mais celebrado, e, no que tange às modalida-des de garantia, a fiança é a que se destaca por ser uma garantia fidejussória, pessoal e acessória da obrigação principal.

O conceito de fiança e a figura do fiador são muito questionados nas relações locatícias, tendo em vista que muita informação difundida é errônea e distorcida, causando insegurança jurídica às partes celebrantes do contrato.

Os contratos de locação, em regra, são celebrados em forma escrita e por prazo determinado; porém, se, no término do contrato o locador não se opuser, prorroga-se a locação por prazo indeterminado, nas mesmas condições já aven-çadas, incluindo as obrigações do fiador e seu cônjuge, se houver. Decorre daí os questionamentos a respeito da prorrogação da fiança e a responsabilidade do fiador até a efetiva devolução do imóvel.

Anteriormente, a Lei do Inquilinato e o Código Civil entendiam que, em caso de prorrogação por tempo indeterminado do contrato de locação, o fiador desobrigava-se da fiança, chegando esse entendimento a ser consubstanciado na Súmula nº 214 do Superior Tribunal de Justiça, que assentou que o fiador não ficaria obrigado à responsabilidade que não anuiu expressamente.

A mudança de entendimento do STJ, primeiramente, ocorreu em um julgamento de um recurso especial, pelo Ministro Luis Felipe Salomão, que entendeu que se no contrato de locação constar que o fiador fica responsável pela obrigação até a efetiva entrega das chaves, prevalecerá, então, esta mani-festação expressa. Ou seja, a responsabilidade solidária não se encerra junta-mente com o fim do contrato, mas, sim, até a devolução efetiva do imóvel e,

1 No ramo jurídico há mais de 11 anos, com vasta experiência profissional. Engajada também em causas sociais e políticas públicas. “Ser advogado é um desafio que abarco com muito zelo e responsabilidade”.

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consequentemente, o fiador fica obrigado a arcar com os encargos principais e acessórios da locação.

Com a sanção da Lei nº 12.112/2009, alterando a Lei do Inquilinato, trouxe, entre outras, uma novidade no caso específico da fiança, no art. 39, que passou a vigorar no sentido de que: salvo disposição ao contrário, qualquer garantia no contrato de locação estende-se até a efetiva devolução do imó-vel, mesmo que tenha sido prorrogado por prazo indeterminado. Portanto, a lei consolida o entendimento que vinha sendo adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Assim, o fiador permanece responsável juntamente com o locatário até a efetiva entrega do imóvel, inclusive no tocante aos débitos principais e acessó-rios da locação, desde que não conste o contrário em cláusula contratual.

Entretanto, a lei trouxe alteração importante quando instituiu que o fiador pode desobrigar-se da fiança, desde que notifique o locador. Essa desobrigação somente é absoluta após 120 dias da ciência do locador. E, a partir de então, esse, por sua vez, notificará o locatário para que em até 30 dias apresente novo fiador ou nova modalidade de garantia, sob pena de descumprimento contratu-al e o consequente desfazimento da locação.

Portanto, no contrato de locação prorrogado por prazo indeterminado, se não existir cláusula expressa ao contrário, persiste a obrigação do fiador até a efetiva entrega das chaves e a devolução do imóvel, devendo ser responsabi-lizados, locatário e fiador, solidariamente, pelos eventuais débitos locatícios e demais acessórios da locação decorrentes do contrato de locação.

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Assunto Especial – Em Poucas Palavras

Fiança

Quais os Riscos de Ser Fiador em Contrato de Locação de Imóveis?

JAnInE CARvALhO BERTuOLAdvogada, Bacharel em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Pós-Graduan-da em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito. Atua na esfera cível, com destaque na área de Direito Imobiliário.

São comuns os casos em que pessoas bem intencionadas firmam contrato de fiança em locações, sem saber ao certo quais os riscos que estão assumindo e quais as possíveis implicações que podem advir de tal conduta – algumas de ex-trema relevância, como a perda do único imóvel residencial familiar do fiador.

Em verdade, a Lei de Locações (Lei nº 8.245/1991), em seu art. 37, prevê quatro modalidades de garantias locatícias, a saber: caução, fiança, seguro de fiança locatícia e quotas de fundo de investimento. Entretanto, a fiança, com certeza, é a modalidade mais largamente utilizada, por ser, entre as garantias, a mais acessível e menos onerosa ao locatário.

A fiança (art. 818 do CC) é uma forma de garantia de cumprimento das obrigações assumidas pelo locatário, caso este se torne inadimplente. Vale des-tacar que a fiança é uma garantia pessoal (fidejussória) e, por isso, o que garante o adimplemento é a universalidade de bens penhoráveis do fiador, e não apenas um determinado bem, como ocorre com as garantias reais.

Importante aqui não confundir fiança com o aval. O aval também é uma garantia pessoal; todavia, aplica-se especificamente aos títulos de crédito (che-ques, notas promissórias, letras de câmbio), enquanto a fiança é forma de ga-rantia em contratos.

Uma questão importante sobre a fiança é a necessidade da outorga con-jugal, também chamada outorga uxória ou marital. A exigência da outorga con-jugal é a forma encontrada pelo legislador para impedir a dilapidação do patri-mônio do casal por um dos cônjuges, tornando obrigatória a sua anuência, sem a qual a fiança é nula e ineficaz.

Ser fiador em um contrato de aluguel envolve riscos financeiros e jurídi-cos, como ter que pagar o aluguel do locador inadimplente ou, em hipóteses mais extremas, ter seu próprio imóvel penhorado.

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A Constituição Federal, com o princípio da dignidade da pessoa humana e por meio da Lei nº 8.009/1990 (impenhorabilidade do bem de família), visa a proteger o único imóvel destinado à moradia da entidade familiar (aqui con-sideradas também entidade familiar as pessoas solteiras, viúvas, divorciadas e as uniões homoafetivas). O imóvel familiar possui proteção, via de regra, mas existem exceções previstas na própria lei, como o caso do art. 3º, VI, que exclui da impenhorabilidade o imóvel quando se tratar de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Em outras palavras, uma vez assumido o encargo de fiador no contrato locatício, não é possível ao fiador alegar a impenhorabilidade de seus bens, até mesmo em se tratando do único imóvel residencial da entidade familiar. A jurisprudência pátria tem confirmado esse entendimento.

É possível atenuar os riscos do fiador nos contratos em que há o chamado benefício de ordem, isto é, a cláusula que permite primeiro exaurir as buscas ao patrimônio do locatário e só então ir em busca do patrimônio do fiador para quitar a dívida. No entanto, o fiador não poderá se aproveitar desse benefício se no contrato de fiança o tiver renunciado expressamente.

O Código Civil admite também a exoneração do fiador, isto é, nos casos de fiança em contratos por prazo indeterminado, o fiador pode exonerar-se do encargo, bastando, para isso, notificar sua intenção ao credor. Vale ressaltar que a exoneração não se opera de forma imediata, e o fiador continuará obri-gado durante 120 dias da notificação. Nesse caso, o locador deverá também notificar o seu locatário a apresentar nova garantia, sob pena de desfazimento da locação.

Além dos casos de exoneração, o locador pode exigir a troca da garantia em caso de morte do fiador, ausência, interdição, falência, insolvência, grava-ção de todos os bens imóveis do fiador ou sua mudança de residência sem co-municação do locador e também ao final de contratos por tempo determinado.

Assim, conclui-se que ser fiador é um encargo que traz riscos financei-ros e jurídicos, especialmente no que se refere à impossibilidade de alegação de impenhorabilidade do bem de família, podendo o fiador ter até mesmo seu único imóvel residencial penhorado e expropriado para saldar os débitos do locatário inadimplente.

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Fiança

2311

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.232.891 – MG (2011/0009720‑3)Relator: Ministro Luis Felipe SalomãoAgravante: Lúcio Flávio Coelho e outrosAdvogado: Belmar Azze Ramos – Defensor PúblicoAgravado: Sílvio SoaresAdvogado: Ebenézer Ribeiro Lomeu

ementA

agravo regImeNtal No recurSo eSpecIal – ação de cobraNça – locação predIal urbaNa – prorrogação, por prazo INdetermINado – fIaNça atÉ efetIva devolução daS cHaveS – expreSSa prevISão coNtratual – recurSo eSpecIal provIdo

1. Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbi-to do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no pacto (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá “até a entrega das chaves”).

2. Todavia, a jurisprudência consolidada apreciou demandas à luz da redação primitiva do art. 39 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991).

Com a nova redação conferida pela Lei nº 12.112/2009, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal de locação por prazo indetermi-nado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando--se, durante esse prazo, a faculdade de o fiador exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória.

3. No caso, a ação de execução foi ajuizada no ano de 2004, por conse-guinte, o contrato de fiança é anterior à vigência da Lei nº 12.112/2009, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a prorrogação da fiança no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório, o que existia.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

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Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente), Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 10 de março de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Luis Felipe Salomão Relator

relAtório

O Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão:

1. Cuida-se de agravo regimental interposto por Lúcio Flávio Coelho e Outros contra decisão de minha lavra, que deu provimento ao recurso especial, para considerar a responsabilidade do fiador até a entrega das chaves.

Nas razões recursais, o recorrente sustenta que o decisum está em desa-cordo com a Súmula nº 214/STJ, pleiteando a reforma da monocrática para que seja desprovido o recurso especial.

É o breve relatório.

ementA

agravo regImeNtal No recurSo eSpecIal – ação de cobraNça – locação predIal urbaNa – prorrogação, por prazo INdetermINado – fIaNça atÉ efetIva devolução daS cHaveS – expreSSa prevISão coNtratual – recurSo eSpecIal provIdo

1. Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbi-to do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no pacto (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá “até a entrega das chaves”).

2. Todavia, a jurisprudência consolidada apreciou demandas à luz da redação primitiva do art. 39 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991).

Com a nova redação conferida pela Lei nº 12.112/2009, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal de locação por prazo indetermi-nado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando-

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-se, durante esse prazo, a faculdade de o fiador exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória.

3. No caso, a ação de execução foi ajuizada no ano de 2004, por conse-guinte, o contrato de fiança é anterior à vigência da Lei nº 12.112/2009, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a prorrogação da fiança no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório, o que existia.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão (Relator):

2. A pretensão recursal não merece prosperar, devendo ser mantida a decisão agravada por seus jurídicos fundamentos, os quais são aqui adotados como razão de decidir:

É o relatório. Decido.

2. O Superior Tribunal de Justiça, com o julgamento do EREsp 566.633/CE, 3ª S., DJe de 12.03.2008, assentou o entendimento de que, em se tratando de locação predial urbana, subsiste a fiança prestada na hipótese de prorrogação da vigência do contrato – inclusive até a entrega das chaves, desde que haja cláusula expres-sa nesse sentido e tenha havido anuência do fiador.

3. Essa jurisprudência foi ratificada após a modificação da competência interna instituída pela Emenda Regimental nº 11, de 2010, nos termos da seguinte emen-ta, de minha relatoria:

FIANÇA EM LOCAÇÃO DE IMÓVEL URBANO – RECURSO ESPECIAL – OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE – INEXISTÊNCIA – PRE-QUESTIONAMENTO – IMPRESCINDIBILIDADE – A MELHOR INTER-PRETAÇÃO DO ART. 39 DA LEI DO INQUILINATO, EM SUA REDAÇÃO PRIMITIVA, É A DE QUE, EM NÃO HAVENDO EXPRESSA PACTUAÇÃO NO CONTRATO DE FIANÇA ACERCA DA PRORROGAÇÃO DESSE PAC-TO ACESSÓRIO, A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO, NÃO IMPLICA A MANUTENÇÃO DO FIADOR COMO GARANTE – JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO ÂMBITO DO STJ – REDAÇÃO ATUAL DO ART. 39 DA LEI DO INQUILINATO, COM A ALTERAÇÃO DE SUA REDAÇÃO PROMOVIDA PELA LEI Nº 12.112/2009 – A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO POR PRAZO INDE-TERMINADO, POR FORÇA DA LEI DO INQUILINATO, RESULTA NA MA-NUTENÇÃO DA FIANÇA, SALVO EXPRESSA DISPOSIÇÃO CONTRATUAL EM CONTRÁRIO

1. Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbito do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios prorrogados

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por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no contrato (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá “até a entrega das chaves”).

2. Todavia, a jurisprudência consolidada apreciou demandas à luz da reda-ção primitiva do art. 39 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991).

Com a nova redação conferida ao dispositivo pela Lei nº 12.112/2009, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição contra-tual em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal do contrato de lo-cação por prazo indeterminado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando-se, durante essa prorrogação, evidentemente, a faculda-de de o fiador de exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória.

3. No caso, a ação de execução foi ajuizada no ano de 2008, por conseguin-te, o contrato de fiança é anterior à vigência da Lei nº 12.112/2009, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a prorrogação da fiança, no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório. Contudo, a Corte local, interpretando as cláusulas contratuais, apurou que não havia previsão contratual de manutenção da recorrida como garante, em caso de prorrogação por prazo indeterminado da locação, de modo que só se concebe a revisão da decisão recorrida por meio de interpretação das cláusulas contratuais – vedada pela Súmula nº 5/STJ.

4. Recurso especial não provido.

(REsp 1326557/PA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 13.11.2012, DJe 03.12.2012)

4. Ademais, para os contratos firmados a partir da vigência da Lei nº 12.112/2009, o art. 39 da Lei do Inquilinato prevê que, em caso de prorrogação legal do con-trato, a fiança também é prorrogada automaticamente (ope legis), independen-temente de cláusula de sua extensão até a entrega das chaves, resguardando-se, durante o prazo do aditamento, a faculdade de o fiador exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória.

5. No caso, a ação de execução foi ajuizada no ano de 2004, por conseguinte, o contrato de fiança é anterior à vigência da Lei nº 12.112/2009, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a prorrogação da fiança no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório.

6. O Tribunal de origem, soberano na apreciação do contexto fático-probatório e das cláusulas contratuais, assim consignou (fl. 200):

Embora exista no contrato firmado entre as partes cláusula que prevê a obri-gação do fiador até a efetiva entrega das chaves, entendo que essa obriga-ção persistiria tão-somente em relação ao prazo originalmente contratado, excluindo-se o período de prorrogação, já que quanto a este, o fiador não se obrigou. Dessa forma, se os fiadores se obrigaram como fiadores no contrato de locação por prazo determinado, respondem pelos encargos inadimplidos até o termo final ajustado na avença. Se a prorrogação ocorreu tacitamente, sem que, para tanto, tenham estes, a ela anuído, ainda que haja previsão

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contratual em sentido contrário, não respondem pelo inadimplemento do lo-catário, já que extinta a garantia fidejussória pactuada.

Como se vê, consta expressamente no contrato de locação a existência de cláusu-la obrigando o fiador até a efetiva devolução das chaves do imóvel.

Entretanto, como visto no trecho acima reproduzido, apesar de previsão expressa no sentido de que a fiança estender-se-ia até a devolução das chaves, o Tribunal de origem entendeu que a prorrogação eximiu o fiador, o que diverge da jurispru-dência deste Superior Tribunal, devendo ser reformado o acórdão.

7. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial, para reconhecer a res-ponsabilidade do fiador até a entrega definitiva das chaves, nos termos da fun-damentação.

Publique-se. Intimem-se.

Ademais, a Súmula nº 214/STJ, aplicável ao caso por ser anterior à men-cionada alteração legislativa, é expressa ao asseverar que o fiador não responde pelas obrigações às quais não anuiu, sendo que, como mencionado, houve, no caso, anuência da garantia até a entrega das chaves, razão pela qual o provi-mento do recurso especial está também alinhado com o disposto no enunciado sumular.

Impositiva, pois, a manutenção da decisão ora agravada.

3. Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É o voto.

certidão de JulgAmento quArtA turmA

Número Registro: 2011/0009720-3

Processo Eletrônico AgRg-REsp 1.232.891/MG

Números Origem: 10223041365899002 223041365899

Em Mesa Julgado: 10.03.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Luis Felipe Salomão

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins

Secretária: Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

AutuAção

Recorrente: Sílvio Soares

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Advogado: Ebenézer Ribeiro Lomeu

Recorrido: Lúcio Flávio Coelho e outros

Advogado: Belmar Azze Ramos – Defensor público

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Fiança

AgrAvo regimentAl

Agravante: Lúcio Flávio Coelho e outros

Advogado: Belmar Azze Ramos – Defensor público

Agravado: Sílvio Soares

Advogado: Ebenézer Ribeiro Lomeu

certidão

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente), Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Assunto Especial – EmentárioFiança

2312 – Fiança – contrato de locação – fiador – prazo de locação – aditamento

“Agravo regimental no recurso especial. Contrato de locação. Fiador. Prazo de locação. Aditamen-to. Anuência do fiador. Ausência de prova. Súmula nº 283/STF. Retirada da sociedade. Notificação do locador. Exoneração. 1. A ausência de impugnação dos fundamentos do acórdão recorrido enseja o não conhecimento do recurso, incidindo o Enunciado da Súmula nº 283 do Supremo Tri-bunal Federal. 2. Segundo a jurisprudência desta Corte, a retirada dos sócios da empresa afiançada pode ensejar a exoneração do fiador, mediante o distrato – que, no caso, consubstanciou-se na comunicação ao credor. 3. Não subsiste a obrigação decorrente da fiança quando há transferência de titularidade da empresa, em razão da quebra da affectio societatis. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.576.006 – (2015/0323637-9) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 17.05.2016 – p. 1201)

2313 – Fiança – devolução das chaves – ação de cobrança – locação predial urbana – prorroga-ção – prazo indeterminado

“Agravo regimental no recurso especial. Ação de cobrança. Locação predial urbana. Prorrogação, por prazo indeterminado. Fiança até efetiva devolução das chaves. Expressa previsão contratual. Recurso especial provido. 1. Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbito do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no pacto (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá ‘até a entrega das chaves’). 2. Todavia, a jurisprudência consolidada apreciou demandas à luz da redação primitiva do art. 39 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991). Com a nova redação conferida pela Lei nº 12.112/2009, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal de locação por prazo indeterminado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando-se, durante esse prazo, a faculdade de o fiador exonerar-se da obrigação mediante notificação resilitória. 3. No caso, a ação de execução foi ajuizada no ano de 2004, por conseguinte, o contrato de fiança é anterior à vigência da Lei nº 12.112/2009, de modo que a prorrogação do contrato de locação só poderia implicar a pror-rogação da fiança no caso de expressa pactuação a respeito no contrato acessório, o que existia. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.232.891 – (2011/0009720-3) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 21.03.2016 – p. 1091)

2314 – Fiança – locação – garantia prestada pela esposa sem a devida outorga conjugal – anula-ção pleiteada pelo herdeiro

“Recurso especial. Contrato de locação. Fiança. Garantia prestada pela esposa sem a devida ou-torga conjugal. Anulação pleiteada pelo herdeiro do cônjuge prejudicado. Prazo decadencial de 2 anos. Art. 1.649 do Código Civil de 2002 (art. 252 do CC/1916). 1. O legislador, projetando as gra-ves consequências patrimoniais do cônjuge prejudicado, fixou o prazo de 2 anos – que será conta-bilizado após o encerramento do matrimônio – para questionar a invalidade da fiança firmada sem a devida outorga conjugal (CC/2002, art. 1.649). 2. A outorga possui significativa relevância para a validade do ato negocial, se realizado com pessoa casada. Até porque o intuito do legislador não é só a tutela patrimonial do casal, mas também busca preservar a convivência entre os cônjuges. Por isso, estende o prazo para 2 anos após o encerramento do vínculo matrimonial, pois se assim não fosse, poderia ocasionar um abalo na affectio maritalis. 3. A codificação civil expressamente prevê que o ajuizamento da ação de anulabilidade da fiança prestada sem a outorga conjugal será deflagrado apenas, e tão somente, pelo outro cônjuge, ou, com o seu falecimento, pelos herdeiros –

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RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO ���������������������������������������������������������������������������������������������������������77

como legitimado sucessivo. 4. Entende-se, portanto, que o prazo decadencial de 2 anos, estipulado inicialmente para o consorte prejudicado, reflete-se também nos herdeiros que, no lugar daquele, buscará a anulabilidade de um ato negocial defectível. 5. Recurso especial a que se nega provi-mento.” (STJ – REsp 1.273.639 – (2011/0133403-3) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 18.04.2016 – p. 1883)

2315 – Fiança – locação de imóvel – contrato prorrogado por prazo indeterminado

“Agravo regimental. Recurso especial. Violação do art. 535 do CPC. Não ocorrência. Locação de imóvel. Fiança. Contrato prorrogado por prazo indeterminado. Súmula nº 214/STJ. Inaplicabilidade. 1. Não viola o art. 535 do CPC o acórdão que, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. Na hipótese de prorrogação contratual de locação e de comprometimento dos fiadores até a devolução do imóvel, é inaplicável a Súmula nº 214/STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.520.064 – (2015/0052038-7) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 19.05.2016 – p. 5054)

2316 – Fiança – locação de imóveis – embargos à execução – exoneração – notificação extraju-dicial

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ausência de prequestionamento. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. Locação de imóveis. Embargos à execução. Exoneração de fiança. Notificação extrajudicial. Efeitos do art. 835 do Novo Código Civil. Divergência jurisprudencial não demonstrada. Agravo improvido. 1. É inadmissível o recurso especial quanto à questão que não foi apreciada pelo Tribunal de origem. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. Nos termos do art. 835 do Código Civil, ‘o fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante ses-senta dias após a notificação do credor’. 3. O dissídio jurisprudencial não foi demonstrado, pois a parte agravante não demonstrou as similitudes fáticas e divergências decisórias entre os casos confrontados. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 825.080 – (2015/0301825-3) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 27.05.2016 – p. 2057)

2317 – Fiança – prorrogação – entrega das chaves

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Fiança. Prorrogação. Entrega das chaves. Viola-ção dos arts. 1.483 do CC/1916, 114 e 819 do CC/2002 e 39 da Lei nº 8.245/1991. Não configura-ção. Divergência jurisprudencial. Afastamento. Súmula nº 83/STJ. Não impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada. Súmula nº 182/STJ. 1. Os fiadores são responsáveis, até a data da entrega das chaves, pelos débitos advindos da prorrogação do contrato de locação se a isso anuíram expressamente e não se exoneraram na forma do art. 1.500 do CC/1916. 2. ‘Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula nº 83/STJ). 3. ‘É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada’ (Súmula nº 182 do STJ). 4. Agravo regimental parcialmente conhecido e desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 207.396 – (2012/0152800-0) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 19.02.2016 – p. 346)

2318 – Fiança locatícia – responsabilidade do fiador – prorrogação – impossibilidade

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Fiança locatícia. Responsabilidade do fiador. Prorrogação. Impossibilidade. Ausência de previsão contratual. Agravo regimental improvido. 1. ‘Com o julgamento dos EREsp 566.633/CE, ficou pacificado no âmbito do STJ a admissão da prorrogação da fiança nos contratos locatícios prorrogados por prazo indeterminado, contanto que expressamente prevista no contrato (v.g., a previsão de que a fiança subsistirá “até a entrega das chaves”)’. Ademais, com a nova redação conferida ao art. 39 da Lei do Inquilinato, pela Lei

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nº 12.112/2009, para contratos de fiança firmados a partir de sua vigência, salvo disposição con-tratual em contrário, a garantia, em caso de prorrogação legal do contrato de locação por prazo indeterminado, também prorroga-se automaticamente (ope legis), resguardando-se, durante essa prorrogação, evidentemente, a faculdade de o fiador de exonerar-se da obrigação mediante notifi-cação resilitória (AgRg-REsp 1222078/RJ, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 15.09.2015, DJe 18.09.2015). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag--REsp 766.876 – (2015/0211126-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 07.03.2016 – p. 3988)

2319 – Fiança locatícia – responsabilidade dos fiadores até a entrega das chaves – possibilidade

“Agravo regimental no recurso especial. Fiança locatícia. Responsabilidade dos fiadores até a en-trega das chaves. Possibilidade. Súmula nº 214. Inaplicabilidade na espécie. Ausência de previsão contratual. Incidência da Súmula nº 83/STJ. Agravo regimental improvido. 1. O Tribunal decidiu em harmonia com a jurisprudência desta Casa no sentido de que os fiadores serão responsabiliza-dos pelos débitos locatícios posteriores à prorrogação do pacto desde que tenham anuído a essa possibilidade na época em que firmaram a avença. Incide, por conseguinte, o óbice disposto no Enunciado nº 83 da Súmula desta Corte Superior. 2. No caso, esclareceu o Colegiado local, no que tange à responsabilização dos fiadores, que não houve anuência com a prorrogação (e-STJ, fl. 132). A inversão do decidido, para efeito de aferir a existência de concordância com a prorrogação, é me-dida vedada no âmbito do especial por força da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.404.784 – (2013/0315827-5) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 04.04.2016 – p. 1179)

2320 – Locação – fiança – garantias – responsabilidade solidária – previsão contratual – prece-dentes

“Recurso especial. Civil e processual civil. Garantias locatícias. Fiança. Prorrogação da locação por prazo indeterminado. Débito do período posterior a prorrogação automática. Expressa previsão contratual da responsabilidade solidária do fiador até a entrega das chaves ou da sua exoneração. Aplicação do art. 39 da Lei nº 8.935/1991. Precedente específico da Terceira Seção do STJ. 1. Os fiadores continuam responsáveis pelos débitos locatícios posteriores à prorrogação legal da locação por prazo indeterminado se concordaram expressamente com essa possibilidade no contrato de fiança adjeto ao de locação e não se exoneraram na forma prevista em Lei (art. 1.500 do CC/1916 e art. 835 do CC/2002). 2. Inteligência do art. 39 da Lei nº 8.935/1991. 3. Precedentes específicos do STJ, inclusive da Terceira Seção (EREsp 566.633-CE, DJe de 12.03.2008). 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.412.372 – (2013/0351751-5) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 15.04.2015)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de recurso especial manejado contra acórdão do TJSC, assim ementado:

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA DE DÉBITOS LOCATÍCIOS – CONTRATO PROR-ROGADO TACITAMENTE E SEM ANUÊNCIA DOS FIADORES – RESPONSABILIDADE DOS FIADORES PREVISTA ATÉ A ENTREGA DAS CHAVES – OBRIGAÇÃO INDETERMINADA – OFENSA À SEGURANÇA JURÍDICA – FIANÇA EXTINTA AO FIM DO CONTRATO ORIGINÁRIO – RECURSO NÃO PROVIDO.”

Trata-se de recurso de apelação cível contra sentença que julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados na inicial de ação de cobrança de débitos locatícios.

A apelante alegou que, embora o contrato locatício tenha sido automaticamente renovado por prazo indeterminado, os respectivos fiadores, ainda que não tenham anuído com a renovação, permaneceram solidariamente responsáveis pelos alugueres e demais encargos não quitados pela respectiva locatária, já que a fiança prestada por eles estender-se-ia até a efetiva entrega das chaves.

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RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – EMENTÁRIO ���������������������������������������������������������������������������������������������������������79

Em suas razões, alegou a parte recorrente violação do art. 39 da Lei nº 8.245/1991, além de dissídio jurisprudencial, sob o fundamento de que, havendo cláusula expressa no contrato de aluguel de que a responsabilidade dos fiadores perdurará até a entrega das chaves do imóvel locado, não há em falar em desobrigação por parte destes, ainda que o contrato tenha se prorrogado por prazo indeterminado.

O STJ votou no sentido de dar provimento ao recurso especial para declarar válida e eficaz a cláusula do contrato de fiança prevendo a subsistência da garantia para o período da pror-rogação da relação locatícia até a entrega das chaves, incluindo-se, assim, os fiadores como devedores solidários da obrigação inadimplida pelo locatário após a prorrogação da locação por prazo indeterminado.

Geraldo Gonçalves da Costa assim disciplina sobre a fiança na locação:

“O contrato de fiança é conceituado pelo art. 818 do Código Civil vigente, nos seguintes termos: ‘Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.’

Verifica-se do conceito que a fiança é uma garantia prestada por uma pessoa (terceiro) ao cre-dor de uma obrigação para a hipótese de o beneficiário desta, o afiançado, não cumprir a sua obrigação. É, portanto, um ato de favor, praticado por um terceiro que não integra a relação contratual existente entre o credor e o devedor.

A fiança, ainda, quanto à sua forma, pode ser convencional, legal e judicial.

Na locação de imóveis dá-se a fiança convencional por se tratar de um contrato secundário ao contrato de locação (contrato principal), que se estabelece entre o locatário (afiançado) e o fiador (terceiro).

Conforme ensina o Professor Caio Mário da Silva Pereira, ‘A fiança conclui-se entre fiador e credor. O contrato principal, entre o credor e afiançado, constitui outra relação jurídica’ (Ins-tituições de direito civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. III, 1997. p. 497). Pode ainda a garantia ser prestada a prazo determinado ou a prazo incerto, isto é, pelo prazo de vigência do contrato de locação (v.g., por um [1] ano) ou até a data da efetiva entrega das chaves do imóvel pelo locatário, no caso de prorrogação do pacto por prazo indeterminado.

O fiador, de acordo com o novo Código Civil (assim também ocorria no Código Civil revogado), goza dos seguintes benefícios:

a) benefício de ordem: por esse benefício, no caso de cobrança de dívida locatícia contra o fiador, poderá este exigir que primeiro sejam executados os bens do devedor principal;

b) benefício de divisão: quando a fiança for dada por mais de um fiador, podem os fiadores reservar o benefício da divisão da obrigação, isto é, estabelecendo a proporção que cabe a cada um;

c) benefício da exoneração da fiança: o fiador poderá exonerar-se (livrar-se) da fiança que prestou sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 60 dias após a notificação do credor, conforme inovação trazida pelo Código Civil de 2002, em seu art. 835.

Ainda de conformidade com o Código Civil em vigor, e como também se dava no Código revo-gado, pode o fiador renunciar, no contrato, todos os benefícios que a lei prevê em seu favor, por se tratar de direito disponível, assumindo, nesse caso, a condição de principal pagador ou devedor solidário, se assim houver se obrigado no contrato.

Questão controvertida surge quando se trata da exoneração da fiança, pelo fiador, mesmo quando o contrato de locação tenha se prorrogado até a data da entrega das chaves do imóvel, ou seja, da efetiva desocupação do imóvel locado.

O Superior Tribunal de Justiça, antes mesmo da vigência do Código Civil de 2002, editou a Súmula nº 214, com o seguinte enunciado: ‘O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu.’

O Código Civil vigente estabelece em seu art. 819, o seguinte: “A fiança dar-se por escrito e não admite interpretação extensiva.”

Em razão disso, alguns tribunais, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, bem como o Tribunal de Justiça de Goiás, em reiteradas decisões, data venia equivocadas, têm entendido que a fiança só será válida se prestada pelo prazo de duração do contrato, tomando por base tais decisões a Súmula nº 214/STJ e a norma do art. 819 do CC/2002.

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Nesse sentido, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, em aresto da lavra do e. Min. José Arnaldo da Fonseca, verbis:

‘A jurisprudência da Corte vem se firmando no sentido de não se admitir interpretação extensi-va ao contrato de fiança, daí não poder ser responsabilizado o fiador por prorrogação de prazo de contrato de locação, a que não deu anuência, mesmo que exista cláusula de duração da res-ponsabilidade do fiador até a efetiva entrega das chaves. Recurso conhecido e provido.’ (Ac. no REsp 440.110/SP, DJU 11.11.2002, p. 284 – Apud Gildo dos Santos (artigo), in O Novo Có-digo Civil: estudos em homenagem ao professor Miguel Reale. São Paulo: LTr, 2003. p. 775)

De igual modo, também decidiu o Tribunal de Justiça de Goiás, em acórdão da relatoria do ilustre Des. Gilberto Marques Filho:

‘APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO – CONTRATO DE LOCAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO – PRORROGAÇÃO – FIANÇA – EXONERAÇÃO – INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA – 1. Vencido o contrato de locação e prorrogado por prazo indeterminado, e não tendo havido expressa anuência do fiador, considera-se este desobrigado da responsabilidade assumida no início do contrato, ainda que neste esteja consignado cláusula contratual que estabeleça sua responsabilidade pela inadimplência do afiançado, até a efetiva e real entrega das chaves. 2. O fiador somente responde por termos que afiança, não se admitindo inter-pretação extensiva, conforme previsto no Código Civil. Apelo conhecido e improvido.’ (Ac. na AC 79603-2/188, de Anápolis, Apelante: Rolando Martins [Espólio] – Apelados: Ângelo Abel Madruga e outros, DJ/GO 14.418, de 22.12.2004 [livro 1.160])

Sempre sustentei, e continuo sustentando, que tal posição a respeito da fiança não é correta, uma vez que se acha em pleno vigor o art. 39 da Lei nº 8.245/1991 (Lei do Inquilinato), que prescreve, in verbis: ‘Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel.’

Tal disposição da Lei de Locações foi recepcionada pelo Código Civil de 2002, já que o novo Diploma, em seu art. 2.036 manteve em vigor por inteiro a Lei do Inquilinato, ao dispor ex-pressamente: ‘A locação de prédio urbano, que esteja sujeita à lei especial, por esta continua a ser regida.’

Portanto, conforme entendo, se o fiador houver se obrigado no contrato até a data da entrega das chaves do imóvel, mesmo que o pacto tenha se prorrogado a prazo indeterminado e por longo tempo após o seu término, ficará ele obrigado pelas dívidas decorrentes da locação até a efetiva restituição do imóvel ao locador, não ocorrendo, em tal hipótese, nem aditamento do contrato (já que este só pode se dar por escrito) e nem interpretação extensiva da fiança, posto que em tal caso há de ser aplicada a regra da lei especial, que se acha em pleno vigor e não a do direito comum, civil, que é lei geral.

Sobre a matéria, o civilista pátrio Sílvio de Salvo Venosa, citado pelo Des. Gildo dos Santos, afirma:

‘Lembre-se de que existe toda uma problemática no direito do inquilinato nesse tema de exoneração do fiador. O art. 39 da Lei nº 8.245/1991 dispõe: ‘salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel’. Portanto, pelo microssistema do inquilinato, em interpretação literal, não há possibilidade de exoneração do fiador antes da entrega do imóvel locado. No entanto, nota-se que o Superior Tribunal de Justiça tem acolhido pretensões nesse sentido, aplicado a regra geral da fiança e não a lei especial, o que motiva uma reviravolta no sentido da lei locatícia e, em princípio, coloca em risco esse seguimento negocial.’ (O Novo Código Civil: estudos em homenagem ao Professor Miguel Reale. São Paulo: LTr, 2003, p. 777)

Felizmente, em recentes decisões, o Superior Tribunal de Justiça, por sua 6ª Turma, primeiro no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 608324/SP, de 09.22.2005, e por último no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial nº 682082/RS, este de 07.03.2006, de que foi Relator o Min. Hélio Quaglia Barbosa, concluiu pela validade da fiança no caso de prorrogação do contrato, até a data da efetiva entrega das chaves do imóvel, ao que parece, abrindo caminho para um novo posicionamento a respeito do tema, naquela Corte Superior.” (Fiança na locação de imóveis. Disponível em: http://online.sintese.com)

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Parte Geral – Doutrina

Crédito de Fiança Locatícia e Direito à Moradia

ÁLvARO vILLAÇA AZEvEDODoutor em Direito, Professor Titular de Direito Civil, Regente de Pós-Graduação e Ex-Diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP, Professor Titular de Direito Romano e de Direito Civil, Ex-Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie (São Paulo), Professor Titular de Direito Romano e Diretor da Faculdade de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado – FAAP (São Paulo), Advogado e Ex-Conselheiro Federal e Esta-dual da Ordem dos Advogados do Brasil, Parecerista e Consultor Jurídico.

crÉdIto de fIaNça locatícIa

Ao art. 3º da Lei nº 8.009, de 1990, foi acrescentado o inciso VII pelo art. 82 da Lei nº 8.245, de 18.10.1991, que regula a locação de imóveis urba-nos, com a seguinte redação: “Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”, não há exceção de impenhorabilidade.

Tal exceção, como posta, poderia parecer verdadeira incongruência; pois, tendo o inquilino como impenhoráveis os bens que guarnecem a sua re-sidência, poderia o seu fiador sofrer execução de seu bem de família, a sua residência.

Assistimos, nesse caso, a execução do patrimônio do fiador, sem possibi-lidade de exercer o benefício de ordem; a execução do acessório sem a possi-bilidade de executar-se o principal.

Acresce, ainda, que tal preceito leva a que seja executado o responsável (fiador), sem a possibilidade de execução do devedor (o locatário, afiançado); e mais, que, sendo executado o primeiro, não possa ele exercer o seu direito de regresso contra o segundo.

Escudado nesse entendimento o então Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, por sua 4ª Câmara, sendo Relator o, em 2002, Juiz Neves Amorim, deci-diu pela possibilidade de penhora do imóvel residencial do fiador, em razão de fiança em contrato locatício.

Tudo parece incrível ante o instituto da fiança, como garantia fidejus-sória, de natureza pessoal, sem vincular bem específico do fiador. Nesse caso, realmente, não poderia existir penhora, a não ser em bem disponível, jamais sobre bem de família.

Todavia, a fiança locatícia apresenta natureza jurídica diversa, pois es-tabelece a vinculação de um bem específico, oferecido em garantia. Esse bem

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fica gravado, por um contrato real de penhor ou de verdadeira hipoteca, pois o art. 38 da Lei do Inquilinato, nº 8.245, de 18.10.1991, exige, em seu § 1º, que “a caução em bens móveis deverá ser registrada em Cartório de Títulos e Documentos; a em bens imóveis deverá ser averbada à margem da respectiva matrícula”.

Com todas essas providências registrais, como visto, não se cuida de mera garantia fidejussória, que vincula, mais, a pessoa do garantidor. Trata-se de direito real sobre coisa alheia. O locador tem direito de executar o bem es-pecífico dado em penhor.

Assim, como existe um contrato em que o bem do fiador se torna penho-rado ou hipotecado, quer se trate, respectivamente, de bem móvel ou imóvel, dado em garantia, esse ato jurídico perfeito, cuja validade se estende a tercei-ros, é erga omnes; não há que se falar em sua desconstituição por ser bem de família.

Aliás, tal exceção existe, também, no caso do oferecimento do imóvel, em hipoteca, pelo próprio casal ou entidade familiar, como previsto no já anali-sado inciso V do art. 3º sob exame. Nesse caso, entretanto, cuida-se do instituto da hipoteca, como vem regulado pelo Código Civil, com todas as formalidades ali exigidas.

No caso específico do inciso VII sob análise, o legislador concedeu be-nefício equivalente ao do direito real de hipoteca, quando o imóvel é dado em garantia da locação; cuida da matéria como se fiança fosse (garantia fidejussó-ria), autoriza registros, para valer contra terceiros, por indicação do bem imóvel pelos fiadores, em garantia de locação, desde que realizada a caução prevista no § 1º do art. 38 da Lei do Inquilinato (nº 8.245, de 18.10.1991).

O mesmo acontece com a fiança mobiliária ofertada, que se transmuda em verdadeiro penhor, quando realizada a caução mencionada no atrás citado § 1º.

Desse modo, não seria lógico e nem jurídico que, por força de contrato real de penhor ou de hipoteca, o bem objeto dessa contratação pudesse ser li-bertado do ônus, por lei, em quebra do direito adquirido do contratante credor da garantia e do ato jurídico perfeito.

Todavia, como visto, não basta que a aludida fiança se mostre somente fidejussória; é preciso que adquira natureza de direito real sobre o bem dado em garantia.

Daí a necessidade de registro do ato de garantia nos apontados Cartório de Títulos e Documentos ou Registro Imobiliário, conforme seja móvel ou imó-vel o objeto onerado.

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RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������������83

Também seria procedimento de alta má-fé que o proprietário de um bem o conferisse em garantia de uma relação jurídica, para não cumprir o avença-do ou já sabendo da impossibilidade de fazê-lo. O direito não pode suportar procedimento de má-fé ou de quem alegue nulidade a que tenha dado causa.

Quem viola a norma não pode invocá-la em seu benefício (Nemo auditur turpitudinem suam allegans).

Enfrentando essa matéria, decidiu a 8ª Câmara do 2º Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, por votação unânime, em 05.11.1992, sendo Re-lator o Juiz Milton Gordo (RT 694/147), que

a ação de execução movida contra o fiador foi ajuizada sob o império da Lei nº 8.245/1991, que acrescentou exceção à impenhorabilidade do bem de família instituída pela Lei nº 8.009/1990, “por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”, o que tornou o bem em questão penhorável. Assim, não se vê, por isso, razão para se negar a penhora cogitada desde que sobre o imóvel não pesa mais a restrição que antes incidia.

Inumeráveis outros julgados ratificam o preceituado nesse inciso VII, sob exame.

É bem verdade que, à época, não se cogitava do direito de moradia que veio a integrar o caput do art. 6º da Constituição Federal após a Emenda Cons-titucional nº 26, de 14.02.2000, causando polêmica ante o confronto desse direito social com a penhorabilidade do bem de família do fiador em matéria de contrato de locação.

Todavia, sempre mantive o meu ponto de vista, como adiante demonstro, de que, no caso, não se aplica esse direito social de moradia à situação do bem de família.

dIreIto à moradIa

A moradia está assegurada pela Constituição no caput de seu art. 6º, como um direito social do cidadão, entre outros, com a redação dada pela EC 26, de 14.02.2000.

Todo cidadão, em princípio, tem o direito subjetivo público de pedir ao Estado um mínimo ético (minimum eticum) para existir, ensina Georg Jellinek. É o direito à vida, que precede todos os demais. Existindo o ser humano, tem a sua dignidade de viver da melhor maneira possível, sob um teto.

O Estado deve, assim, desenvolver projetos de construção de habitações populares, que possam ser adquiridas pelos cidadãos de baixa renda.

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Acontece que o direito à moradia vai muito além do direito de proprie-dade, pois só pequena parcela da população é proprietária de imóveis, como também não tem condição financeira para adquiri-los.

A grande maioria dos cidadãos vive em imóveis alugados, quando tem o privilégio de poder pagar aluguel.

Grande contingente populacional vive em favelas.

A esses não proprietários é que, em geral, destina-se a proteção do direito à moradia, que deve ser sanado pelo Estado, à medida do possível, assegurando esse direito com o tempo.

Quem tem propriedade imóvel já está, em princípio, assegurado, poden-do negociar, nos moldes que entender.

Muito se tem discutido sobre a alegada inconstitucionalidade do inciso VII do art. 3º da Lei nº 8.009, de 1990, nela inserido pela Lei nº 8.245, de 1991, que admite a penhora de bem de família em caso de fiança em contrato locatí-cio. Discutiu-se que poderia prevalecer, nesse caso, o citado direito à moradia; entretanto, como visto, uma coisa é o direito à moradia, outra o bem de família. O primeiro está nas relações do cidadão com o Estado, na área do Direito Públi-co; o segundo nas relações dos cidadãos, entre si, no âmbito do Direito Privado.

Decidiu, então, em 8 de fevereiro de 2006, o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, sendo Relator o Ministro Cezar Peluso (RE 407.688-8/SP, DJ 06.10.2006), pela legitimidade da penhora do bem de família do fiador, sem afronta ao direito de moradia.

Nesse caso, salienta, em seu voto, acompanhando o do Relator, o Minis-tro Joaquim Barbosa, que se confrontam dois direitos fundamentais: de um lado o direito de moradia,

que é direito social constitucionalmente assegurado e, em princípio, exige uma prestação do Estado; de outro, o direito à liberdade, em sua mais pura expressão, ou seja, o da autonomia da vontade, exteriorizada, no caso concreto, na facul-dade que tem cada um de obrigar-se contratualmente e, por consequência, de suportar os ônus dessa livre manifestação de vontade.

São, no meu entender, como visto, duas relações jurídicas distintas: em uma, o direito do cidadão junto ao Estado, de pedir condições de moradia; em outra, o relacionamento de contratantes, de natureza estritamente privada.

Por isso, o exercício da liberdade contratual, prevista na relação de di-reito privado, em nada se incompatibiliza com o direito social do cidadão, re-ferente à moradia, que se mostra na relação de direito público subjetivo dele junto ao Estado.

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Destaque-se, mais, em favor da tese da penhorabilidade do bem de famí-lia do fiador de contrato locatício, sem violação do direito social de moradia, previsto na Constituição, o julgado do Supremo Tribunal Federal, da 1ª Turma, sendo Relator o Ministro Sepúlveda Pertence (e inúmeros outros casos).

Seguindo a mesma tese, outro acórdão, da 6ª Turma, do Superior Tribu-nal de Justiça, sendo Relatora a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, que se baseia em outros julgados, enfatizando a constitucionalidade do inciso VII do art. 3º da Lei nº 8.009, de 1990, e do art. 82 da Lei nº 8.245, de 1991.

Há inúmeros outros julgados com o mesmo entendimento.

Ressalte-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo acolheu essa tese da penhorabilidade do bem de família do fiador, como se nota de vários julgados citados.

Consolidou-se, assim, nesse posicionamento, a jurisprudência.

Analisando, a bem da pesquisa, a jurisprudência, em sentido contrário, reconhecia a impenhorabilidade do bem de família do fiador em contrato de locação.

Há algumas decisões nesse sentido.

Registre-se, nessa oportunidade, que, em 8 de outubro de 2003, o Supe-rior Tribunal de Justiça decidiu, por sua 2ª Seção e por maioria de votos, sendo Relatora a Ministra Nancy Andrighi (REsp 526.460/RS), que

não renuncia à impenhorabilidade prevista na Lei nº 8.009/1990 o devedor que oferta em penhora o bem de família que possui. Se a proteção do bem visa aten-der à família, e não apenas ao devedor, deve-se concluir que este não poderá, por ato processual individual e isolado, renunciar à proteção, outorgada por lei em norma de ordem pública, a toda a entidade familiar.

Essa decisão contrariou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em sentido contrário.

Também, reconhecendo essa impenhorabilidade do bem de família do fiador em locação, é o acórdão do Supremo Tribunal Federal relatado pelo Mi-nistro Carlos Velloso (RE 352.940-4), de 25.04.2005. No mesmo sentido, julgou o Superior Tribunal de Justiça.

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Parte Geral – Doutrina

Arrendamento Rural e o Direito de Superfície em Face das Restrições Impostas pela Lei nº 5�709/1971 e Demais Regulamentos

ROBSOn DE OLIvEIRAAdvogado, Especialista em Direito Imobiliário, Pós-Graduado em Direito Imobiliário, Membro da Comissão de Direito Urbanístico da OAB/SP, Militante na área de Direito Imobiliário do Escritório Demarest, Advogados.

ChRySTIAnE DOmIngOSAdvogada militante na área de Direito Imobiliário do Escritório Demarest, Advogados.

RESUMO: A Lei Federal nº 5.709/1971, regulamentada pelo Decreto nº 74.965/1974, traz limitações à aquisição e ao arrendamento de imóveis rurais por estrangeiros. No Parecer da Advocacia-Geral da União, em 2010, ampliaram-se as restrições previstas na lei de maneira a alcançar, além dos estrangeiros, também as empresas jurídicas brasileiras da qual participem, a qualquer título, pessoas estrangeiras, físicas ou jurídicas, que detenham a maioria de seu capital social, que passou a depen-der de autorização governamental para adquirir ou arrendar imóveis rurais. Em sendo a Lei Federal nº 5.709/1971 restritiva de direito, o presente artigo tem como base apresentar uma breve reflexão sobre se a interpretação extensiva da lei, em que pese a equiparação do arrendamento ao direito de superfície, seria constitucional, dada a ausência de previsão legal que a regule. Defende-se que os institutos referidos supra não guardam semelhanças substanciais e que, ainda que ambos envolvam a entrega de um imóvel a terceiro para a sua exploração, o direito de superfície é considerado um di-reito real e pode constituir-se gratuitamente, enquanto que o arrendamento tem caráter meramente obrigacional e é necessariamente oneroso.

PALAVRAS-CHAVE: Lei Federal nº 5.709/1971; Decreto nº 74.965/1974; arrendamento; direito de superfície.

ABSTRACT: Federal Law nº 5.709/1971, regulated by Decree nº 74.965/1974, imposes limitations on the acquisition and lease of rural property by foreigners. In the Opinion issued by the Office of the General Counsel for the Federal Government, in 2010, more restrictions were introduced to the Law aforesaid, which since then not only applies to foreigners but also to Brazilian companies with foreign capital, which now need governmental authorization to acquire or lease rural property. As Federal Law nº 5.709/1971 is restrictive of right, this article seeks to present a brief reflection on whether the extensive interpretation of the Law – although lease is made equal to surface rights – is consti-tutional, given the lack of a legal provision regulating it. The concepts above are claimed to bear no substantial similarities and, although both of them involve granting real property for someone else to use it, surface rights are considered real right and can be freely established.

KEYWORDS: Federal Law nº 5.709/1971; Decree nº 74.965/1974; rural lease agreement; surface rights.

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INtrodução

A escassez mundial de recursos naturais tem corroborado o interesse cada vez maior de investidores estrangeiros na aquisição e no arrendamento de imóveis rurais no Brasil. Por conta disso, o Governo brasileiro tem aumen-tado, nas últimas décadas, o controle sobre tais aquisições, o que se constata, por exemplo, com a promulgação da Lei Federal nº 5.709/1971. Tal controle, originalmente aplicado somente aos estrangeiros, foi expandido com o tempo às empresas brasileiras da qual participem, com maioria de seu capital social, pessoas estrangeiras.

Nesse contexto, o presente artigo trata da distinção entre os institutos do arrendamento e do direito de superfície, de modo a inviabilizar fundamentada-mente a este as limitações aplicadas àquele, sob pena de violação ao princípio da legalidade.

HIStÓrIco

A aquisição e o arrendamento de imóveis rurais por estrangeiros são dis-ciplinados pela Lei Federal nº 5.709/1971 e pelo Decreto nº 74.965/1974 que a regulamenta e sempre impôs certas limitações para aqueles que desejam ad-quirir ou arrendar imóveis rurais no Brasil, sendo as principais: (i) residência ou autorização para funcionar no Brasil (em se tratando de pessoa física ou jurídica); (ii) efetiva exploração da terra; (iii) limitação de tamanho da área; e (iv) autorização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (“Incra”).

Cumpre esclarecer que a Lei Federal nº 5.709/1971 trata das restrições à aquisição da propriedade rural por estrangeiro (ou pessoa jurídica nacional de capital estrangeiro).

Evidenciando a necessidade do Governo de controlar ainda mais os ne-gócios jurídicos celebrados por estrangeiro (ou pessoa jurídica nacional de ca-pital estrangeiro), foi promulgada a Lei nº 8.629/1993, por meio da qual, entre outros assuntos, as restrições impostas pela Lei nº 5.709/1971 foram estendidas ao instituto do arrendamento (art. 23).

Em contrapartida, em 1995, a Emenda Constitucional nº 6 revogou o art. 171 da Constituição, passando a equiparar a empresa brasileira de capital estrangeiro à empresa brasileira de capital nacional. Por conta disso, revelou--se um entendimento doutrinário, quase que pacífico, no sentido de também ter sido revogado o dispositivo da Lei Federal nº 5.709/1971, que estabele-cia que as restrições também se aplicavam às empresas brasileiras de capital estrangeiro.

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A fim de confirmar o entendimento que vinha sendo adotado pela dou-trina majoritária, a Advocacia-Geral da União (AGU) editou o Parecer AGU/LA nº 1/97, no qual se considerou revogado o referido dispositivo legal.

Diante da promulgação da Emenda Constitucional nº 6 e do Parecer AGU/LA nº 1/97, os investidores estrangeiros passaram a constituir sociedades brasileiras, de forma a adquirir imóveis rurais ou arrendar terras no Brasil, o que era, sem sombra de dúvidas, pouco burocrático quando comparado com as exigências impostas pela Lei Federal nº 5.709/1971.

Em razão de tal flexibilização, os investidores estrangeiros passaram a realizar grandes investimentos no setor agrário brasileiro, seja por meio de aqui-sição ou celebração de contratos de arrendamento, o que implicou em novos questionamentos pelo Governo brasileiro.

Em razão do novo posicionamento adotado pelo Governo brasileiro, em 19 de agosto de 2010 a AGU publicou um novo parecer, contrário ao Parecer nº 1/97, evidenciando que as limitações e restrições impostas pela Lei Federal nº 5.709/1971 são aplicáveis às pessoas jurídicas brasileiras da qual partici-pem, a qualquer título, pessoas estrangeiras, físicas ou jurídicas, que detenham a maioria de seu capital social (“Empresa Brasileira de Capital Estrangeiro”).

Desde então, qualquer Empresa Brasileira de Capital Estrangeiro depende de autorização governamental, do Incra, para a aquisição e/ou o arrendamento de imóveis rurais.

arreNdameNto x dIreIto de SuperfícIe

A Lei nº 4.504/1964 e o Decreto nº 59.566/1966 que a regulamenta de-finem o instituto do arrendamento rural conforme segue:

Art. 3º Arrendamento rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, outros bens, benfeitorias e ou fa-cilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pe cuária, agro-industrial ou mista, mediante certa retribuição ou aluguel, obser-vados os limites percentuais da Lei.

Por outro lado, o direito de superfície é um direito real, listado no art. 1.225, II, do Código Civil brasileiro, e a sua outorga é regulada, especifica-mente, nos arts. 1.369 a 1.377 do mesmo Código Civil.

O art. 1.225 do Código Civil brasileiro enumera, de maneira taxativa, os direitos reais admitidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, entre eles o direito de superfície. Mais adiante, no art. 1.369 do mesmo Código Civil define-se o conceito do referido instituto, da seguinte forma: “O proprietário pode conce-der a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo

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determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis”.

Não se vislumbra no referido conceito, nem tampouco nos demais arti-gos que regulam o direito de superfície (arts. 1.370 a 1.377), qualquer remissão ao instituto do arrendamento rural. O conceito de arrendamento, por sua vez, também não faz qualquer referência ao instituto do direito de superfície.

O fato de o arrendamento rural e o direito de superfície envolver a entre-ga de um imóvel a terceiro, para que este possa explorá-lo, em hipótese alguma poderá se confundir os conceitos de arrendamento rural e direito de superfície, uma vez que este é um direito indiscutivelmente real dotado de oponibilidade erga omnes1, e que traduz uma relação direta do sujeito com a coisa enquanto àquele tem caráter estritamente obrigacional.

Ademais, a onerosidade é caráter essencial do arrendamento rural2, ao passo que a concessão do direito de superfície pode ser gratuita ou onerosa3.

Neste sentido, não restam dúvidas de que o arrendamento e o direito de superfície são institutos totalmente distintos e, como tal, merecem tratamentos distintos.

Este entendimento é confirmado por ilustres estudiosos da matéria, con-forme a seguir descrito:

O direito de superfície, com efeito, não se confunde com o arrendamento. A des-peito de ambos se caracterizarem como uma forma de cessão de coisa para uso por outra pessoa, autorizando-se esta a plantar ou construir no solo de outrem, os dois institutos se diferenciam especialmente a partir de sua natureza jurídica. O direito de superfície é um direito real que confere ao superficiário a propriedade imobiliária, ainda que resolúvel. Contudo, o mesmo não se pode afirmar do ar-rendamento, que tem a natureza de direito obrigacional. Além disso, o pagamen-to de aluguel é elemento indispensável do arrendamento, e da superfície não.4

1 “O superficiário, titular de um direito real, goza, desde a aquisição da superfície, da proteção possessória geral, possuidor que é da superfície do solo. Por isso, cabem-lhe as espécies de manutenção e reintegração da posse, dada a oponibilidade erga omnes que integra o direito real. [...]” (GOMES, Orlando. Direitos reais. 20. ed. Atual. Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 423)

2 “O Decreto nº 59.566, de 14.11.1966, em seu art. 3º, conceituou o arrendamento rural, seguindo o conceito de locação. É a cessão onerosa de uso e gozo de imóvel rural, no todo ou em parte, para o fim de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa ou mista, mediante retribuição ou aluguel, observados os limites percentuais da lei (Estatuto da Terra).” (WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2009. p. 382)

3 Conforme o art. 1.370 do CC e o art. 21, § 2º, da Lei nº 10.257/2001. Nesse sentido: “Ambos os diplomas legais (Código Civil e Estatuto da Cidade) fizeram constar que a concessão pode ser gratuita ou onerosa. Se onerosa, as partes pactuarão o valor, que poderá ser pago de uma única vez ou parceladamente. Deve ter um preço determinado, que pode até ser dividido em parcelas, até a quitação. Se for gratuita, não é afastada a obrigação com o pagamento dos encargos e tributos que incidirem sobre o objeto do contrato.” (GOMES, Orlando. Op. cit., p. 421)

4 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O direito real de superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 61/62.

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Hodiernamente, a locação e o arrendamento não podem mais ser considerados nem sequer institutos assemelhados à superfície. A distinção era relevante no direito romano onde, gradativamente, a superfície desprendeu-se desses contra-tos, ganhando status de direito real, por obra do pretor (cf. supra, nº 4). Nem a circunstância de poder ser levado a registro o contrato de locação serve à apro-ximação dos institutos (cf. art. 8º, Lei nº 8.245; arts. 167 e 169, Lei nº 6.015). O registro do contrato de locação não tem o condão de conferir natureza de direito real à locação porque o direito do locatário é dependente da situação jurídica do locador. Trata-se de direito ad rem, não de direito in re (GOMES, Orlando. Con-tratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 306-307). A superfície também é irredutível à propriedade plena. Domenico Barbero argumenta que a relação sobre o solo não pode ser de propriedade, como a relação sobre a superfície, pois do contrário ter-se-ia uma “propriedade territorial” comum, isto é, do solo mais a superfície, e não haveria razão para distinguir dela a propriedade superficiária.5

Não há que se confundir, ainda, o direito de superfície com o arrendamento. A diferença é manifesta, na medida em que a superfície tem natureza real, podendo constituir-se gratuitamente; enquanto o arrendamento, por sua vez, é figura emi-nentemente contratual, geradora de efeitos obrigacionais.6

Ademais, cumpre mencionar a decisão do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), na qual resta evidente que não basta simplesmente existir afinidades para a realização de equiparação ou analogia, conforme a seguir descrito:

Para o emprego da analogia não basta a existência de afinidades aparentes; exige--se semelhança na essência e nos efeitos das hipóteses comparadas, não podendo haver restrições de quaisquer direitos. (REsp 665.790/SC, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 25.09.2006, DJ 30.10.2006, p. 296)

Sendo assim, fica claramente evidenciada a impossibilidade de se equi-parar os conceitos de direito de superfície e arrendamento rural, razão pela qual não devem ser impostas ao primeiro as restrições aplicadas exclusivamente na aquisição e no arrendamento de imóvel rural por estrangeiro ou empresa brasi-leira de capital estrangeiro, com base na Lei nº 5.709/1971.

Não obstante, tal equiparação estaria ferindo o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da Constituição Federal (“CF”), pelo qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei”, uma vez que, no direito privado, tudo que não é proibido é permitido. Dessa forma, cabe somente à lei estabelecer eventuais restrições aos direitos individuais recomen-dados pela CF.

5 ROCHA, Marco Túlio de Carvalho. Direito de superfície – A superfície no projeto do Código Civil brasileiro, 1999.

6 LEITE, Gisele. Apontamentos acerca do direito de superfície no direito civil brasileiro. Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 5 ago. 2011.

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Dessa forma, por se tratar de norma restritiva de direito, poderia tal nor-ma equiparar o arrendamento ao direito de superfície?

Conforme demonstrado no histórico legislativo contemplado no presente artigo e diante da comprovação da impossibilidade de comparação entre os dois institutos, resta evidente que as restrições impostas pela Lei nº 8.629/1993 ao arrendamento rural somente poderão ser aplicadas ao direito de superfície com a expressa regulamentação legal do assunto, tendo em vista o caráter res-tritivo de direito.

coNcluSão

O presente artigo conferiu diversos elementos comprobatórios de que o direito de superfície é instituto absolutamente distinto do arrendamento rural, de modo que um não se confunde com o outro e tampouco podem ser equipa-rados, uma vez que, em síntese: (a) o arrendamento rural é um direito obriga-cional, enquanto o direito de superfície é um direito real; e (b) o arrendamento rural implica na onerosidade obrigatória do instrumento, enquanto a outorga do direito de superfície pode ser onerosa ou gratuita.

Além disso, o raciocínio jurídico desenvolvido no decorrer do presente artigo deixou evidenciado que, por se tratar de norma restritiva de direito, é evi-dente que tal norma não pode ser ampliada pelo intérprete ao ponto de atingir o direito de superfície. Ainda que se admitisse, por mera argumentação jurídica, a possibilidade de extensão de tal restrição, dever-se-ia adotar o mesmo procedi-mento utilizado no passado para incluir o arrendamento nas restrições impostas à Lei nº 5.709/1971.

referêNcIaS

BRASIL. Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971, que regula a aquisição de imóvel rural por estrangeiro residente no país ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil.

______. Decreto nº 74.965, de 26 de novembro de 1974, que regulamenta a Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971.

______. Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, que dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal.

______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 40. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

______. Parecer AGU-LA-2010. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/atos/deta-lhe/258351>.

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92 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA

______. Diário Oficial da União de 23 de outubro de 2010. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=1&data=23/08/2010>.

GOMES, Orlando. Direitos reais. 20. ed. Atual. Luiz Edson Fachin. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

LEITE, Gisele. Apontamentos acerca do direito de superfície no direito civil brasileiro. Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 5 ago. 2011.

NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado. 7. ed. Rev., ampl. e atual. até 25.08.2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

ROCHA, Marco Túlio de Carvalho. Direito de superfície – A superfície no projeto do Código Civil brasileiro, 1999.

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O direito real de superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

WALD, Arnoldo. Direito civil: contratos em espécie. 18. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2009.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2321

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Agravo em Recurso Especial nº 828.193 – RJ (2015/0316381‑3)Relator: Ministro Marco Aurélio BellizzeAgravante: PDG Realty S/A Empreendimentos e ParticipaçõesAgravante: CHL LXXII Incorporações Ltda.Advogados: Ana Caroline Andrade Cardoso e outro(s)

Bruno Cesar Alves Pinto e outro(s) Maria Rosa Califrer de Lima Yanne Macedo e Silva

Agravado: Wagner Pereira da SilvaAgravado: Mariana Batista de SouzaAdvogado: Pedro Lemos Leite Villas Boas e outro(s)

ementA

agravo regImeNtal No agravo em recurSo eSpecIal – empreeNdImeNto ImobIlIÁrIo – atraSo Na eNtrega do ImÓvel – 1 comISSão de corretagem – orIeNtação adotada Na orIgem em HarmoNIa com a jurISprudêNcIa deSta caSa – SÚmula Nº 83/Stj – 2 fortuIto exterNo – fuNdameNtoS afaStadoS pela corte eStadual – revISão – NeceSSIdade de reexame de fatoS e provaS – ImpoSSIbIlIdade – 3 daNo moral – valor razoÁvel – modIfIcação – INcIdêNcIa do eNuNcIado Nº 7/Stj – 4 agravo ImprovIdo

1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o comprador somente possui obrigação de pagar a comissão de corretagem se é ele quem efetivamente contrata os serviços do corretor. Precedentes. Incidência do Enunciado nº 83 da Súmula do STJ.

2. Ao apreciar as assertivas referentes à ocorrência de fortuito externo, tendo em vista o aquecimento do mercado e a escassez de mão de obra, o Colegiado local assinalou a fragilidade das justificativas expostas, tendo em vista que as aludidas circunstâncias são previsíveis e ínsitas ao risco da atividade desenvolvida. Nesse contexto, a inversão dessas conclusões demandaria a análise das provas do processo. Incidência do Enunciado nº 7/STJ.

3. Relativamente ao montante fixado a título de danos morais, a análise dos precedentes desta Corte revela que o valor arbitrado na origem – R$ 10.000,00 (dez mil reais) – não se distancia dos padrões de razoabili-dade, sendo caso de aplicação do Enunciado nº 7/STJ.

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4. Agravo regimental a que se nega provimento.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Tercei-ra Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimen-tal, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 05 de maio de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Marco Aurélio Bellizze, Relator

relAtório

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze:

Trata-se de agravo regimental interposto por PDG Realty S.A. Empreen-dimentos e Participações e CHL LXXII Incorporações Ltda. contra decisão mo-nocrática de minha lavra que negou provimento ao agravo em recurso especial.

Em suas razões, sustentam as agravantes, de saída, “que realmente há excludente de ilicitude, o caso fortuito que foi explanado pelo juízo de primeiro grau de forma equivocada, onde não considerou o aquecimento do mercado imobiliário como fator determinante para o atraso na entrega da obra” (e-STJ, fl. 603).

Além disso, sublinham que, na espécie, houve a perfeita identificação dos corretores que atuaram na venda do imóvel, sendo evidente a equivocada valoração das provas “e a falta de análise do contrato, pois é claro em seus apontamentos, com expressa previsão do valor do imóvel, excluindo o valor da comissão de corretagem, o que, em tese, poderia ensejar a análise por parte do STJ, de forma que não houvesse a incidência das Súmulas nºs 5 e 7/STJ” (e-STJ, fl. 604).

Ressaltam, ainda, que havendo “motivo plausível para o atraso na entre-ga do imóvel não há se falar em pagamento de lucros cessantes. Não é o atraso puro e simples que garante o pagamento de lucros cessantes, mas sim aquele que ocorre de forma injustificada, o que não ocorreu no processo em exame” (e-STJ, fl. 605).

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Reverberam, outrossim, que o único motivo apontado “para garantir o pagamento de danos morais foi o mero inadimplemento contratual, não se fa-zendo prova alguma dos danos morais sofridos, capazes de configurar o paga-mento de R$ 10.000,00. Segundo o STJ, o mero descumprimento contratual não é capaz de ensejar danos materiais e morais” (e-STJ, fl. 605). De mais a mais, entendem exagerado e contrário à jurisprudência desta Casa o valor arbitrado a título de compensação.

Diante dessas considerações, pedem a reconsideração da decisão mono-crática ou, caso assim não se entenda, seja o presente recurso encaminhado à Terceira Turma desta Casa “de forma a prover integralmente o recurso especial” (e-STJ, fl. 608).

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze (Relator):

Depreende-se dos autos que os pedidos formulados na inicial foram julgados parcialmente procedentes para condenar as ora agravantes, solidaria-mente, à restituição dos valores adimplidos a título de alugueres e de taxa de obra no período compreendido entre maio e outubro de 2013, ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, bem assim das despesas do processo e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor da condenação.

Contra essa decisão insurgiram-se as partes.

O Tribunal de Justiça, para dar parcial provimento ao recurso de apela-ção, apresentou as seguintes justificativas (e-STJ, fls. 409-416):

Registre-se que a relação existente entre as partes litigantes é de cunho consume-rista, vez que presentes os requisitos objetivos e subjetivos insertos nos arts. 2º e 3º, do Código de Defesa do Consumidor, daí serem aplicáveis à espécie as suas normas protetivas, mais especificamente a do caput do seu art. 14, que consagra a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviços, fundada na teoria do risco do empreendimento, bastando somente a demonstração do dano e do nexo causal entre o comportamento do prestador do serviço e a lesão causada, prescindida a demonstração de culpa. Nesse passo, o dever de reparar qualquer dano causado somente será afastado caso se comprove a ocorrência de uma das excludentes da responsabilidade previstas no art. 14, § 3º, e incisos, do Código de Defesa do Consumidor. O mencionado diploma consumerista garante a inversão do ônus da prova nos procedimentos ao reconhecer a vulnerabilidade da parte consumidora, frente a sua comprovada hipossuficiência e a verossimilhança das alegações suscitadas. Preambularmente, no que concerne à arguição de ilegitimi-dade ad causam sustentada pelas rés, não lhes assiste razão, haja vista que ambas

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as empresas cooperaram para a consecução do empreendimento imobiliário em comento, atraindo a aplicação da norma inserta no § 3º do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, abaixo reproduzido:

§ 3º As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obri-gações.

Propício mencionar que inobstante a PDG Realty S.A. Empreendimentos e Parti-cipações não ostente a condição de promitente vendedora do imóvel objeto da lide, certo é que participou da execução do empreendimento imobiliário, tanto que enviou aos autores o instrumento de promessa de compra e venda do imóvel (fl. 158 – i.e. nº 00158), emitiu o “extrato financeiro” indicativo das obrigações adimplidas pelos promitentes compradores (fls. 159 – i.e. nº 00159) e efetuou a entrega das chaves (fl. 92 – i.e. nº 00091), o que impõe o reconhecimento de sua legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. Ultrapassada a questão acima debatida, verifica-se que incontroversos o vínculo jurídico firmado entre as partes, consistente na promessa de compra e venda de unidade imobiliária do empreendimento em apreciação e o inadimplemento contratual das rés, que não efetivaram a entrega do bem, ainda que decorrida a dilação do lapso temporal de 180 dias. Com efeito, inobstante a previsão contratual de conclusão do empreen-dimento para o último dia do mês outubro de 2012, com possibilidade de pror-rogação até abril de 2013, certo é que a entrega das chaves somente ocorreu em 08 de agosto de 2013, portanto, depois de ultrapassado o termo conjecturado. Quanto à “taxa de obras”, constitui encargo financeiro atribuído ao adquirente de unidade autônoma de empreendimento imobiliário, que passa a ser cobrada após a assinatura de contrato de financiamento junto à Caixa Econômica Federal e perdura durante o período de edificação do imóvel. Em realidade, a denomi-nada “taxa de evolução da obra” é composta por juros compensatórios cobrados das construtoras pelas instituições financeiras, em decorrência do contrato de financiamento celebrado, com o fim precípuo de coibir a delonga na entrega da obra. Por oportuno, elucida-se que conquanto não haja a amortização das quan-tias adimplidas pelos adquirentes sob a rubrica em comento no saldo devedor, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça sufraga o entendimento acerca da legalidade da cobrança de juros compensatórios sobre as prestações de imóvel ainda em construção, como é possível inferir da ementa do julgado proferido nos embargos de divergência opostos nos autos do Recurso Especial nº 670.117/PB, da relatoria do Ministro Antonio Carlos Ferreira, a seguir colacionado:

[...]

Todavia, a cobrança da referida taxa após o decurso do prazo previsto para a en-trega do imóvel desvela-se ilegal e abusiva, precipuamente, porque o promitente comprador em nada contribuiu para a delonga injustificada no cumprimento da obrigação contratual assumida pela promitente vendedora. Acresce-se ao sobre-dito que a frágil justificativa das rés de que a morosidade na entrega do imóvel ocorreu em virtude de caso fortuito externo, consubstanciado na carência de ma-teriais de construção e na escassez de mão de obra no mercado, não se sustenta, tendo em vista que as aludidas circunstâncias são previsíveis e ínsitas ao risco da atividade por elas desenvolvidas. Indene de incerteza que a ré deve proceder

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à devolução dos valores adimplidos pelos autores sob a rubrica “taxa de obra”. Todavia, a sentença objurgada merece pequeno reparo quanto ao marco final da restituição, o qual deve ser fixado em junho de 2013, momento em que foi emi-tida certidão de “habite-se” (fls. 330/331 – i.e. nº 00330). Justifica-se o entendi-mento sobredito com o fato de que as instituições financeiras que disponibilizam linha de crédito imobiliário condicionam sua concessão à prévia apresentação da certidão de “habite-se”, que foi emitida na data de 13 de junho de 2013. Assim, a partir deste momento encontrava-se oportunizada aos autores a obtenção de financiamento junto à Caixa Econômica Federal, o que possibilitaria a amortiza-ção das quantias adimplidas no saldo devedor. Urge esclarecer que despicienda para a celebração do contrato de mútuo junto à Caixa Econômica Federal a con-juntura de estar ou não o imóvel em condições de habitabilidade, vez que não constitui requisito para a concessão da linha de crédito imobiliário. Concernente à remuneração do corretor, conquanto seja de praxe que o vendedor do imóvel suporte o ônus decorrente do serviço de corretagem, haja vista que é justamente ele quem possui interesse na venda do bem, não está afastada a possibilidade de convenção diversa pelas partes. Entretanto, tal estipulação deve ser expressa no contrato e cristalina ao consumidor, de forma que este tenha inequívoca ciência do ônus que lhe está sendo imputado, sob pena de violação do dever de infor-mação afeto ao fornecedor, na forma dos arts. 6º, inciso III, 31, 52 e 54, § 3º, todos do Código de Defesa do Consumidor. No caso sub judice, não tendo as rés comprovado de forma clara e inequívoca que restou ajustado que a comissão de corretagem ficaria a cargo dos promitentes compradores, deve a mesma ser cus-teada por quem contratou o corretor para a prestação do serviço. No que tange ao ressarcimento dos valores desembolsados no pagamento de alugueres, este deve ocorrer a partir do mês subsequente ao acordado como o de conclusão do empreendimento imobiliário e prosseguir até outubro de 2013, considerando que a manutenção de tal despesa fundou-se unicamente na procrastinação injustifi-cada das rés em disponibilizar o bem em condições de habitabilidade, na forma da narrativa apresentada na exordial e não impugnada especificamente pelas rés quando da apresentação da peça de bloqueio. Pertinente à justificativa apresen-tada pelas requeridas visando elidir sua responsabilidade pela entrega do bem com pendências relativas à prestação de serviços essenciais trata-se de inovação recursal, vez que os fatos a partir dos quais pretendem incidir determinada con-sequência jurídica, não foram sustentados na fase processual apropriada, sendo defeso ao recorrente alterar o cenário fático-jurídico neste recurso, em atenção ao princípio do devido processo legal. No que respeita à multa pelo atraso na en-trega da unidade imobiliária, inconteste a viabilidade de sua cominação no caso sub judice, nos termos da cláusula 18.6.1, inserta no instrumento particular de promessa de compra e venda (fl. 79 – i.e. nº 00079), equivalente a 0,5% do preço ajustado monetariamente da unidade, por mês ou por fração de mês em atraso, até a data da entrega das chaves. Por derradeiro, ressai-se que os transtornos cau-sados aos autores transcendem aqueles que podem ser considerados como mero aborrecimento, pois o expressivo tempo de espera a que ficaram submetidos sem definição da situação, acarretou a busca do Poder Judiciário para a salvaguarda do direito atingido, evidenciando, assim, a existência de dano imaterial a ser reparado, ressaltando, por oportuno, que desnecessária a comprovação do dano

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moral, pois este ocorre in re ipsa, ou seja, deriva do próprio fato ofensivo, de tal modo que provada a ofensa, demonstrado está o dano, conforme leciona Sérgio Cavalieri Filho:

[...]

Desse modo, tendo em vista a gravidade da conduta do agente causador do dano e a sua respectiva extensão, há que se estabelecer a compensação em patamar razoável e proporcional ao desgaste imposto aos adquirentes, que permaneceram privados do uso do imóvel por lapso temporal aproximado de 06 meses e tiveram suas justas expectativas frustradas, motivo pelo qual se revela adequado o quan-tum reparatório fixado em R$ 10.000,00, restando assim observados os critérios pedagógico, punitivo e preventivo, balizadores da reparação, e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sem caracterizar enriquecimento sem cau-sa. Outrossim, a jurisprudência desta Corte Estadual, esposada no verbete nº 116, do Encontro de Desembargadores com competência em matéria cível e que foi objeto do Aviso nº 55/2012, da Presidência deste Tribunal de Justiça, se inclina para o entendimento de que: “A verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação.” Na mesma toada, são os precedentes desta Corte Estadual e abaixo colacionados:

[...]

Por esses fundamentos, na forma do permissivo inserto no art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, dou parcial provimento aos recursos interpostos, para condenar as rés, solidariamente, ao reembolso dos valores despendidos pelos autores a título de “taxa de obra”, até o mês de junho de 2.013, momento em que foi expedida a certidão de “habite-se”, com os alugueres a partir do mês sub-sequente ao previsto para conclusão do empreendimento até o mês de outubro de 2013, quando o imóvel passou a ostentar condições de habitabilidade, con-cernentes à comissão de corretagem, devendo ser as aludidas verbas corrigidas monetariamente a contar de cada desembolso, com incidência de juros legais desde a citação. Condeno, ainda, as rés ao pagamento de multa moratória no importe correspondente a 0,5% do preço ajustado monetariamente da unidade, por mês ou por fração de mês em atraso, até a data da entrega das chaves, man-tendo a sentença vergastada em seus demais termos, inclusive, no que respeita ao quantum reparatório fixado em R$ 10.000,00.

Na decisão combatida, destaquei, ao apreciar a alegação de afronta aos arts. 724 e 725 do Código Civil, os seguintes trechos do aresto local: “conquan-to seja de praxe que o vendedor do imóvel suporte o ônus decorrente do serviço de corretagem, haja vista que é justamente ele quem possui interesse na venda do bem, não está afastada a possibilidade de convenção diversa pelas partes. Entretanto, tal estipulação deve ser expressa no contrato e cristalina ao consu-midor, de forma que este tenha inequívoca ciência do ônus que lhe está sendo imputado, sob pena de violação do dever de informação afeto ao fornecedor, na forma dos arts. 6º, inciso III, 31, 52 e 54, § 3º, todos do Código de Defesa do

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Consumidor. No caso sub judice, não tendo as rés comprovado de forma clara e inequívoca que restou ajustado que a comissão de corretagem ficaria a cargo dos promitentes compradores, deve a mesma ser custeada por quem contratou o corretor para a prestação do serviço”. Diante disso, esclareci que a conclusão alcançada na origem se alinha à jurisprudência desta Casa no sentido de que o comprador somente possui obrigação de pagar a mencionada comissão se é ele quem efetivamente contrata os serviços do corretor.

Confira-se:

DIREITO CIVIL – AÇÃO ORDINÁRIA – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – CON-TRATO VERBAL DE CORRETAGEM – COMISSÃO – CABIMENTO – OBRIGA-ÇÃO DO COMITENTE – CONTRATAÇÃO DO CORRETOR PELO COMPRA-DOR – 1. Contrato de corretagem é aquele por meio do qual alguém se obriga a obter para outro um ou mais negócios de acordo com as instruções recebidas. 2. A obrigação de pagar a comissão de corretagem é daquele que efetivamente contrata o corretor. 3. É o comitente que busca o auxílio do corretor, visando à aproximação com outrem cuja pretensão, naquele momento, esteja em confor-midade com seus interesses, seja como comprador ou como vendedor. 4. Recur-so especial desprovido (REsp 1.288.450/AM, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 27.02.2015).

Apliquei, portanto, o disposto no Enunciado nº 83 da Súmula desta Corte.

Além disso, ponderei que desconstituir o entendimento exposto pelo Tri-bunal estadual, no sentido da ausência de provas de que foi pactuado que o pagamento em desfile seria de responsabilidade dos compradores, implicaria em reexame de provas e interpretação de cláusula contratual, o que é defeso nesta instância especial – Súmulas nºs 5 e 7 do STJ.

A propósito das afirmações no sentido de que no “regular curso da lide restou configurado que a unidade imobiliária não foi entregue ao adquirente ante o abrupto aquecimento do mercado imobiliário, imprevisível à data da celebração da escritura de promessa de compra e venda, que culminou com a falta de materiais e mão de obra, configurando, sem dúvidas, fortuito exter-no” (e-STJ, fl. 512), o Colegiado local assinalou a fragilidade das justificativas expostas, tendo em vista que as aludidas circunstâncias são previsíveis e ínsitas ao risco da atividade desenvolvida. Nesse contexto, sublinhei que a inversão dessas conclusões demandaria a análise das provas do processo, providência vedada nos termos do Enunciado nº 7/STJ.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – DIREITO CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – ATRASO NA ENTREGA DE UNIDADE IMOBI-LIÁRIA – ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE CHUVAS E DE ESCASSEZ DE MÃO DE OBRA – CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR NÃO CONFIGURADOS – REEXA-

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ME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS – SÚMULA Nº 7/STJ – 1. Concluir que o excesso de chuvas e a escassez de mão de obra configuram fatos extraordinários e imprevisíveis, traduzindo-se como hipótese de caso fortui-to e força maior, demanda o reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg-AREsp 693.255/RS, Relator o Ministro João Otávio de Noronha, DJe de 03.09.2015)

ENTREGA DE IMÓVEL – ATRASO – CASO FORTUITO – CIRCUNSTÂNCIA NÃO RECONHECIDA NA ORIGEM – INVERSÃO DO JULGADO – IMPOSSI-BILIDADE – REEXAME DE PROVAS E DE INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS EM RECURSO ESPECIAL – VEDAÇÃO – LUCROS CESSANTES – PRESUNÇÃO DE PREJUÍZO DO PROMITENTE COMPRADOR – ADMISSIBILI-DADE – PRECEDENTES – INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 83 DA SÚMULA DO STJ – DANO MORAL – AFASTAMENTO OU REDUÇÃO – INCIDÊNCIA DOS ENUNCIADOS NºS 5 E 7 DA SÚMULA DO STJ – [...] 2. O provimento do especial, para reconhecer a ocorrência de caso fortuito, requer nova incursão fático-probatória e de interpretação de cláusulas contratuais, o que é inviável em recurso especial por força das Súmulas nºs 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça. [...]. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg-AREsp 709.516/RJ, Relator o Mi-nistro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 03.11.2015)

Por derradeiro, relativamente à quantificação do dano moral, apesar da omissão da lei civil, esta Casa, com o objetivo de evitar reparações excessi-vas ou meramente simbólicas, instituiu prudente critério bifásico de valoração. “Na primeira etapa deve-se estabelecer um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes jurisprudenciais que apreciaram casos semelhantes. Na segunda etapa, devem ser consideradas as circunstâncias do caso, para a fixação definitiva do valor da indenização, atendendo a determinação legal de arbitramento equitativo pelo juiz” (REsp 1.152.541/RS, Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 21.09.2011).

Na espécie, a análise dos precedentes desta Corte revelou que o valor fixado na origem a título de reparação moral – R$ 10.000,00 (dez mil reais) – respeita os parâmetros acima referidos, não se distanciando dos padrões de razoabilidade, sendo, portanto, caso de aplicação do Enunciado nº 7 da Súmula desta Corte Superior.

Nesse sentido, confira-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓ-VEL – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – EXCLUDENTE DE ILICITUDE NÃO EVIDENCIADA – REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – IMPOS-SIBILIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ – DANO MORAL E MATERIAL CONFIGURA-DO – INVERSÃO DO JULGADO – SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – LUCROS CES-

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SANTES – CABIMENTO – QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO DENTRO DA RAZOABILIDADE – AGRAVO IMPROVIDO

[...]

4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite, excepcionalmente, em recurso especial, o reexame do valor fixado a título de danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Hipótese, todavia, em que a verba reparatória, considera-das as circunstâncias de fato da causa, foi estabelecida pela instância ordinária, em conformidade com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, em R$ 20.000,00, acrescidos de juros e correção monetária. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg-AREsp 684.071/RJ, Relator o Ministro Raul Araújo, DJe de 03.08.2015)

Assim, em face da ausência de qualquer subsídio capaz de alterar os fun-damentos da decisão agravada, subsiste incólume o entendimento nela firmado, não merecendo prosperar o presente recurso.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

certidão de JulgAmento terceirA turmA

AgRg-AREsp 828.193/RJ Número Registro: 2015/0316381-3

Números Origem: 03934168720138190001 201524563987

Pauta: 05.05.2016 Julgado: 05.05.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Lindôra Maria Araújo

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAção

Agravante: PDG Realty S/A Empreendimentos e Participações

Agravante: CHL LXXII Incorporações Ltda.

Advogados: Bruno Cesar Alves Pinto e outro(s) Ana Caroline Andrade Cardoso e outro(s) Maria Rosa Califrer de Lima Yanne Macedo e Silva

Agravado: Wagner Pereira da Silva

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Agravado: Mariana Batista de Souza

Advogado: Pedro Lemos Leite Villas Boas e outro(s)

Assunto: Direito civil – Responsabilidade civil – Indenização por dano moral

AgrAvo regimentAl

Agravante: PDG Realty S/A Empreendimentos e Participações

Agravante: CHL LXXII Incorporações Ltda.

Advogados: Bruno Cesar Alves Pinto e outro(s) Ana Caroline Andrade Cardoso e outro(s) Maria Rosa Califrer de Lima Yanne Macedo e Silva

Agravado: Wagner Pereira da Silva

Agravado: Mariana Batista de Souza

Advogado: Pedro Lemos Leite Villas Boas e outro(s)

certidão

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.570.442 – SP (2015/0286720‑8)Relator: Ministro Moura RibeiroAgravante: Companhia Excelsior de SegurosAdvogado: Victor Jose Petraroli Neto e outro(s)Advogados: Ana Rita dos Reis Petraroli e outro(s)

Maria Emília Gonçalves de Rueda e outro(s) Denis Atanazio e outro(s)

Agravante: Aldecy Pereira CostaAgravante: Rosa Maria dos Santos SouzaAdvogados: Ayrton Mendes Vianna e outro(s)

Thiago Ramos Vianna e outro(s)Agravado: os mesmos

ementA

cIvIl e proceSSual cIvIl – agravo regImeNtal No recurSo eSpecIal – ação INdeNIzatÓrIa por vícIoS de coNStrução – Seguro HabItacIoNal – SfH – competêNcIa da juStIça federal – SÚmula Nº 211 do Stj – cobertura SecurItÁrIa – preScrIção ÂNua – SÚmulaS NºS 5 e 7, ambaS do Stj – IlegItImIdade atIva doS SeguradoS – HoNorÁrIoS perIcIaIS – SÚmula Nº 284 do Stf – HoNorÁrIoS advocatícIoS – INexIStêNcIa de INtereSSe recurSal – auSêNcIa de ImpugNação eSpecífIca aoS fuNdameNtoS da decISão agravada – INcIdêNcIa da SÚmula Nº 182 do Stj – recurSo maNejado Sob a ÉgIde do cpc/1973 – agravo regImeNtal Não coNHecIdo

1. O regimental não impugnou as razões da decisão agravada, pois não refutou, de forma fundamentada, a falta de interesse recursal e a apli-cação das Súmulas nºs 5, 7 e 211, todas do STJ, e 284 do STF, ao caso. Incidência da Súmula nº 182 do STJ.

2. Inaplicabilidade das disposições do NCPC neste julgamento ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo regimental não conhecido.

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Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indica-das, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, em não conhecer do agravo regimental, nos termos do voto do Sr Ministro Relator.

Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 05 de maio de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Moura Ribeiro Relator

relAtório

O Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro (Relator):

Trata-se de agravo regimental interposto por Companhia Excelsior de Se-guros contra decisão monocrática de minha relatoria que não conheceu do recurso especial assim ementada:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO INDENIZATÓRIA POR VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO – SEGURO HABITACIONAL – INTERESSE DA CEF – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – SÚMULA Nº 211 DO STJ – CO-BERTURA SECURITÁRIA – PRESCRIÇÃO ÂNUA – SÚMULAS NºS 5 E 7, AMBAS DO STJ – ILEGITIMIDADE ATIVA DOS SEGURADOS – HONORÁRIOS PERI-CIAIS – SÚMULA Nº 284 DO STF – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – INE-XISTÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO (e-STJ, fl. 927).

Nas razões do regimental (e-STJ, fls. 939/972), a seguradora reitera as razões do apelo nobre, sustentando, em resumo, (1) competência da Justiça Federal, diante da necessidade de intervenção legítima e necessária da CEF; (2) ocorrência da prescrição ânua; (3) inexistência de cobertura securitária para os vícios de construção; (4) ilegitimidade ativa das seguradas em pleitearem o recebimento de indenização; (5) que o contrato firmado com as seguradas não prevê multa contratual; (6) que os honorários do assistente técnico deverão ser suportados pelos autores; e, (7) excessividade dos honorários advocatícios fixa-dos em 20% sobre o valor devido.

Pleiteia, assim, que a decisão monocrática seja reconsiderada por esta Terceira Turma.

A contraminuta não foi apresentada (e-STJ, fl. 979).

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É o relatório.

ementA

cIvIl e proceSSual cIvIl – agravo regImeNtal No recurSo eSpecIal – ação INdeNIzatÓrIa por vícIoS de coNStrução – Seguro HabItacIoNal – SfH – competêNcIa da juStIça federal – SÚmula Nº 211 do Stj – cobertura SecurItÁrIa – preScrIção ÂNua – SÚmulaS NºS 5 e 7, ambaS do Stj – IlegItImIdade atIva doS SeguradoS – HoNorÁrIoS perIcIaIS – SÚmula Nº 284 do Stf – HoNorÁrIoS advocatícIoS – INexIStêNcIa de INtereSSe recurSal – auSêNcIa de ImpugNação eSpecífIca aoS fuNdameNtoS da decISão agravada – INcIdêNcIa da SÚmula Nº 182 do Stj – recurSo maNejado Sob a ÉgIde do cpc/1973 – agravo regImeNtal Não coNHecIdo

1. O regimental não impugnou as razões da decisão agravada, pois não refutou, de forma fundamentada, a falta de interesse recursal e a apli-cação das Súmulas nºs 5, 7 e 211, todas do STJ, e 284 do STF, ao caso. Incidência da Súmula nº 182 do STJ.

2. Inaplicabilidade das disposições do NCPC neste julgamento ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo regimental não conhecido.

voto

O Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro (Relator):

Trata-se de ação de indenização securitária por vícios de construção ajui-zada pelas Seguradas contra a Seguradora.

O Juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido inicial, limitando o valor da multa decendial a 2% do valor da dívida principal.

O Tribunal de origem negou provimento ao recurso interposto pela Segu-radora, em acórdão que recebeu a seguinte ementa:

APELAÇÃO – Sistema Financeiro de Habitação. Cobrança. Indenização secu-ritária. 1. Recurso Principal. 1.1 Ilegitimidade ativa afastada. Mutuários que se sub-rogam nos direitos do segurado. 1.2 Prescrição ânua. Inaplicabilidade. Ví-cios que não possuem data exata de início e se manifestam progressivamente.

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1.3 Dano no imóvel. Prova pericial que demonstra a existência de vícios cons-trutivos. Indenização devida. 1.4 Multa decendial. Caracterizada a obrigação de indenizar, cabível a multa decendial. 2. Recurso Adesivo. 2.1 Multa decendial que deve ficar limitada ao valor da obrigação principal. 2.2 Honorários advocatí-cios bem fixados. Sentença mantida. Aplicação do art. 252 do Regimento Interno do TJSP. Recursos Improvidos. (e-STJ, fl. 756)

Nas razões do recurso especial (e-STJ, fls. 786/815), a Seguradora alegou afronta aos arts. (1) 1º da Lei nº 12.409/2011; 109, I, da CF/1988; 113 do CPC; e, 5º, parágrafo único, da Lei nº 9.469/1997, ante o interesse jurídico da CEF e a competência da Justiça Federal; (2) 206 do CC/2002, por ocorrência da pres-crição ânua; (3) 757 do CC/2002, ante a inexistência de cobertura securitária para os vícios decorrentes de reformas executadas pelos Segurados; (4) 769 do CC/2002, uma vez que não é devida a multa decendial, porque não houve comunicação do sinistro pelos Segurados; e, (5) 20, § 3º, do CPC, por ser exces-sivo os honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor devido, devendo esses serem limitados a 15% do valor líquido da dívida. Além disso, a Segura-dora apontou (a) a ilegitimidade ativa dos segurados; e, (b) que os honorários do assistente técnico deverão ser suportados pelos autores.

Em decisão monocrática, neguei conhecimento ao recurso especial, nos termos da ementa citada no relatório (e-STJ, fls. 927/935).

A irresignação não merece prosperar.

O regimental não impugnou as razões da decisão agravada, pois não in-firmou, de forma fundamentada, a ausência de interesse recursal e a aplicação das Súmulas nºs 5, 7 e 211, todas do STJ e 284 do STF.

Agora, no presente recurso, a Seguradora somente alegou as teses cons-tantes do relatório, sem afastar os óbices acima elencados.

Em obediência ao princípio da dialeticidade, exige-se do agravante o de-senvolvimento de argumentação capaz de demonstrar a incorreção dos motivos nos quais se fundou a decisão agravada, técnica ausente nas razões dessa irre-signação, a atrair a incidência da Súmula nº 182 desta Corte, do seguinte teor: É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada.

Conforme já decidiu o STJ:

À luz do princípio da dialeticidade, que norteia os recursos, deve a parte recor-rente impugnar todos os fundamentos suficientes para manter o acórdão recorri-do, de maneira a demonstrar que o julgamento proferido pelo Tribunal de origem merece ser modificado, ou seja, não basta que faça alegações genéricas em sen-tido contrário às afirmações do julgado contra o qual se insurge.

(AgRg-Ag 1.056.913/SP, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 26.11.2008)

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A propósito, vejam-se precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PUBLICAÇÃO NA IMPRENSA – IM-PUTAÇÃO FALSA DE CRIME – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 182/STJ – AGRAVO NÃO CONHECIDO

1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a parte agravante deve infirmar os fundamentos da decisão impugnada, mostrando-se inadmissível o agravo que não se insurge contra todos eles.

2. Os argumentos apresentados pelo agravante nas razões do agravo regimental não buscaram refutar os fundamentos da decisão monocrática agravada, o que atrai a incidência do Enunciado nº 182 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

3. Agravo regimental não conhecido.

(AgRg-AREsp 756.865/PB, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª T., DJe 10.12.2015 – sem destaques no original)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – NÃO IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA – SÚMULA Nº 182/STJ – 1. “É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada” (Súmula nº 182 do STJ).

2. Agravo regimental não conhecido.

(AgRg-REsp 1.330.374/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., DJe 12.11.2015 – sem destaques no original)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSO-NALIDADE JURÍDICA – DEFERIMENTO NA ORIGEM – DECISÃO MONOCRÁ-TICA QUE APLICOU A SÚMULA Nº 7 DO STJ – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AO FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 182 DO STJ – AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO

1. No presente caso, a decisão agravada consignou que, havendo a instância local entendido existentes os requisitos que ensejaram a desconsideração inver-sa da personalidade jurídica, rever tais premissas encontraria óbice na Súmula nº 7 do STJ, o que não foi objeto de ataque específico nas razões do agravo regimental.

Incidência da Súmula nº 182 do STJ.

2. Agravo regimental não conhecido.

(AgRg-AREsp 757.963/SC, minha relatoria, 3ª T., DJe 10.11.2015 – sem desta-ques no original)

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AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – IMPUGNA-ÇÃO ESPECÍFICA DAS BASES DA DECISÃO AGRAVADA – AUSÊNCIA – INCI-DÊNCIA DA SÚMULA Nº 182/STJ

1. Nos termos da Súmula nº 182 do Superior Tribunal de Justiça, “é inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada”.

2. Agravo regimental não conhecido.

(AgRg-AREsp 531.511/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., DJe 25.08.2015 – sem destaques no original)

Assim, porque os argumentos que trouxe não demonstraram a incorreção do fundamento da decisão atacada, fica prejudicada sua análise em virtude da não admissão do recurso pelo óbice processual já apontado.

Como se não bastasse, ainda que superada a barreira suprarreferida, a linha argumentativa apresentada pela seguradora é incapaz de evidenciar o de-sacerto da decisão agravada.

Nesse contexto, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido pelos seus pró-prios fundamentos:

O presente recurso especial decorre de apelações interpostas perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo contra sentença que, nos autos da ação de indenização securitária por vícios de construção ajuizada pelos segurados contra a Seguradora, julgou procedente o pedido inicial, limitando o valor da multa decendial a 2% do valor da dívida principal.

O Tribunal de origem negou provimento aos apelos manifestados pela segurado-ra e pelos segurados, em acórdão que recebeu a seguinte ementa:

Apelação. Sistema Financeiro de Habitação. Cobrança. Indenização securi-tária. 1. Recurso Principal. 1.1 Ilegitimidade ativa afastada. Mutuários que se sub-rogam nos direitos do segurado. 1.2 Prescrição ânua. Inaplicabilidade. Vícios que não possuem data exata de início e se manifestam progressiva-mente. 1.3 Dano no imóvel. Prova pericial que demonstra a existência de vícios construtivos. Indenização devida. 1.4 Multa decendial. Caracterizada a obrigação de indenizar, cabível a multa decendial. 2. Recurso Adesivo. 2.1 Multa decendial que deve ficar limitada ao valor da obrigação principal. 2.2 Honorários advocatícios bem fixados. Sentença mantida. Aplicação do art. 252 do Regimento Interno do TJSP. Recursos Improvidos. (e-STJ, fl. 756)

Os embargos de declaração opostos pela seguradora foram rejeitados, com apli-cação de multa de 1% sobre o valor da causa (e-STJ, fls. 778/783).

Inconformada, a seguradora interpôs recurso especial.

O apelo nobre veio fundamentado na afronta dos arts. (1) 1º da Lei nº 12.409/2011; 109, I, da CF/1988; 113 do CPC; e, 5º, parágrafo único, da Lei nº 9.469/1997,

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ante o interesse jurídico da CEF e a competência da justiça federal; (2) 206 do CC/2002, por ocorrência da prescrição ânua; (3) 757 do CC/2002, ante a inexis-tência de cobertura securitária para os vícios decorrentes de reformas executadas pelos segurados; (4) 769 do CC/2002, uma vez que não é devida a multa decen-dial, porque não houve comunicação do sinistro pelos segurados; e (5) 20, § 3º, do CPC, por ser excessivo os honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor devido, devendo esses serem limitados a 15% do valor líquido da dívida.

Além disso, a seguradora apontou (a) a ilegitimidade ativa dos segurados; e (b) que os honorários do assistente técnico deverão ser suportados pelos autores.

As contrarrazões foram apresentadas (e-STJ, fls. 839/858).

O recurso foi admitido na origem (e-STJ, fls. 870/872).

É o relatório.

DECIDO.

Como já constou do relatório, a seguradora e os segurados interpuseram apela-ções contra a sentença que julgou procedente o pedido indenizatório para cober-tura dos vícios de construção dos imóveis adquiridos pelos autores, limitando o valor da multa decendial a 2% do valor da dívida principal, tendo o Tribunal de origem negado provimento aos recursos.

O inconformismo da seguradora não merece prosperar.

(1) Da competência da Justiça Federal

A tese relacionada a esse tema não foi objeto de debate pelo Tribunal de origem.

Assim, o conteúdo normativo dos arts. 1º da Lei nº 12.409/2011; 109, I, da CF/1988; 113 do CPC; 5º, parágrafo único, da Lei nº 9.469/1997, carecem do necessário prequestionamento. Dessa forma, há que aplicar a Súmula nº 211 do STJ, uma vez que a seguradora não trouxe argumentos que demonstrassem que o Tribunal de origem foi omisso quanto ao exame do tema, o que resultaria em ofensa ao art. 535 do CPC.

(2) Da prescrição ânua

O Tribunal estadual concluiu que os danos no imóvel evidenciado pela perícia não possuem data exata de início. Ao contrário, transcorreram de forma contínua e permanente. Assim, para configuração do direito à ação vale a data em que a vítima tenha ciência dos nocivos efeitos do dano (e-STJ, fls. 758/759).

A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que na prescrição das ações do segurado/mutuário contra a seguradora, em que se busca a cobertura de sinistro relacionado a contrato de mútuo habitacional celebrado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, deve ser aplicado o prazo ânuo previsto do art. 178, § 6º, II do CC/1916, cujo termo inicial conta-se da ciência ao interessado pela recusa no pagamento da indenização.

Nesse sentido, citam-se os seguintes precedentes:

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CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – SEGURO – SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO – INVALIDEZ DO MU TUÁRIO – PRESCRIÇÃO ANUAL – SÚMULA Nº 83/STJ – DECISÃO MANTIDA

1. É firme o entendimento desta Corte de que se aplica o prazo de prescrição anual do art. 178, § 6º, II, do Código Civil de 1916, às ações do segurado/mutuário contra a seguradora, buscando a cobertura de sinistro relacionado a contrato de mútuo habitacional celebrado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação.

2. O Tribunal de origem, ao concluir pela prescrição ânua da ação de cobran-ça securitária, está em consonância com a orientação do STJ. Incidência da Súmula nº 83/STJ.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg-AREsp 123.250/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª T., DJe 27.08.2013 – sem destaque no original)

RECURSO ESPECIAL – SEGURO HABITACIONAL – SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO – SFH – PRESCRIÇÃO ANUAL – ART. 178, § 6º DO CÓDI-GO CIVIL DE 1916 – INAPLICABILIDADE DO ART. 27 DO CDC

1. Aplica-se o prazo de prescrição anual do art. 178, § 6º, II do Código Civil de 1916 às ações do segurado/mutuário contra a seguradora, buscando a cobertura de sinistro relacionado a contrato de mútuo habitacional celebrado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação.

2. Não incidência da regra do art. 27 do CDC, porquanto restrito às hipóteses de fato do produto ou do serviço. Ressalva de fundamentação de voto vogal no sentido de que tal dispositivo se aplicaria quando buscada cobertura se-curitária por vício de construção, do que não se cogita no caso em exame.

3. Hipótese em que a ação foi ajuizada quando decorrido mais de um ano da negativa de cobertura por sinistro de invalidez.

4. Recurso especial provido.

(REsp 871.983/RS, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, DJe 21.05.2012 – sem destaque no original)

Não tendo o acórdão recorrido fixado um termo inicial para a contagem do prazo prescricional não é possível, em recurso especial, reconhecer o advento da pres-crição, o que atrai a aplicação da Súmula nº 7 do STJ.

(3) Da cobertura securitária

O Tribunal de origem entendeu que os danos apurados pela perícia estão cober-tos pela apólice de seguro com os seguintes fundamentos:

No mais, anote-se que a prova pericial produzida nos autos deixou patente que os danos ocasionados no imóvel não são decorrentes do desgaste natural

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pelo uso, falta de conservação ou sua modificação, mas sim de falhas cons-trutivas (fls. 479/512).

E com relação à abrangência dos danos reclamados pela apólice de seguro, na linha do que vem sendo decidido por esta C. 3ª Câmara de Direito Privado, a seguradora deve mesmo responder pelos danos, ainda que decorrentes de vícios de construção.

Aliás, a própria apólice apresentada indica expressamente a cobertura para riscos de danos físicos que possam afetar o bem segurado (Cláusula 3ª, item I, fl. 52).

Outrossim, descabe a afirmação da seguradora quanto à ausência de responsa-bilidade pela fiscalização da obra uma vez que decorre da obrigação contratual.

A propósito: “SEGURO – Habitacional. Indenização. Defeito de construção. Da-nos parcialmente comprovados. Obrigação da seguradora de indenizar. Hipótese em que a companhia não efetuou a fiscalização da obra para eximir-se de even-tuais danos. Recurso não provido.” Apelação nº 204.498.4/3-00, 4ª Câmara de Direito, Relator Carlos Stroppa.

Dessa forma, estando os danos cobertos pela apólice habitacional, devem estes ser ressarcidos pela seguradora no valor apresentado pelo perito (R$ 2.635,00 fls. 496/497).

Daí a procedência do pedido inicial, não podendo ser acolhido o recurso da empresa ré (e-STJ, fls. 759/760 – sem destaque no original).

Assim, para se chegar à conclusão diversa da que chegou o eg. Tribunal a quo, ou seja, de que os vícios constatados nos imóveis não estão cobertos pela apó-lice do seguro, seria necessário o revolvimento do arcabouço fático-probatório, procedimento sabidamente aqui inviável diante do óbice das Súmulas nºs 5 e 7: a simples interpretação de clausula contratual não enseja recurso especial e a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.

Este, inclusive, é o posicionamento desta Corte:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONTRATO DE SEGURO – PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA – SISTEMA FINANCEIRO DE HABI-TAÇÃO – RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA – VÍCIOS DE CONSTRU-ÇÃO – COBERTURA POR APÓLICE – SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – ACÓRDÃO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONA-MENTO DOS PRECEITOS DITOS INFRINGIDOS – SÚMULAS NºS 282 E 356 DO STF – AGRAVO IMPROVIDO

1. Não se conhece de recurso especial fundado na alínea a se o preceito legal dito violado não foi prequestionado pelo acórdão, ainda que opostos embar-gos de declaração. Súmulas nºs 282 e 356 do STF.

2. A Corte de origem, após analisar as cláusulas contratuais, concluiu que os vícios na construção encontravam-se cobertos pela apólice securitária. Desse modo, a modificação do entendimento firmado nas instâncias ordinárias de-mandaria, no caso, a interpretação de cláusulas contratuais e o reexame de

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provas, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos das Súmulas nºs 5 e 7 do STJ.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgRg-Ag 1.395.381/SC, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe 26.11.2015 – sem destaque no original)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – SEGU-RO HABITACIONAL – COMPETÊNCIA ESTADUAL – ART. 543-C, § 7º, I, DO CPC – QO-AG 1.154.599/SP – NÃO CABIMENTO DE AGRAVO – LEI Nº 12.409/2011 – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL – SÚMULA Nº 284/STF – COBERTURA DE VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO E MUL-TA DECENDIAL – EXCLUSÃO NA APÓLICE – REVISÃO – INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – APLICAÇÃO DO CDC – FALTA DE INTERESSE DE AGIR, IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, PRESCRIÇÃO, DECA-DÊNCIA – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DOS TEMAS – JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – CITAÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL DES-PROVIDO. (AgRg-AREsp 388.822/SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., DJe 12.12.2014 – sem destaque no original)

No caso, não se mostraria plausível nova análise do contexto fático-probatório por parte desta Corte Superior, a qual não pode ser considerada uma terceira instância recursal, ainda que este seja o desejo da seguradora.

(4) Da ilegitimidade ativa dos segurados e da responsabilidade pelos dos hono-rários periciais

O conhecimento do recurso especial exige a indicação de qual dispositivo legal teria sido objeto de afronta ou interpretação divergente, entre o acórdão impug-nado e os paradigmas, sob pena de incidência, por analogia, da Súmula nº 284 do STF, como ocorreu, no caso.

Nesse sentido, vejam-se os seguintes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – RECURSO ES-PECIAL – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE OFENSA A DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL – SÚMULA Nº 284/STF – PLANO DE SAÚDE – NEGATIVA DE COBERTURA – DANO MORAL – NÃO CONFIGURADO – REEXAME DO FÁTICO PROBATÓRIO – SÚMULA Nº 7/STJ

1. Ausência de indicação, nas razões do recurso especial, do artigo de lei que teria sido violado ou a respeito de cuja interpretação divergiu o acórdão recorrido, de modo que incide o óbice da Súmula nº 284 do STF.

2. Inviável o recurso especial cuja análise das razões impõe reexame do con-texto fático-probatório da lide, nos termos da vedação imposta pela Súmula nº 7 do STJ.

3. O inadimplemento motivado pela discussão razoável acerca do descum-primento de obrigação contratual, em regra, não causa, por si só, dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade.

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Precedentes.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg-EDcl-REsp 1.252.552/RS, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., DJe 23.11.2015)

PROCESSO CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – REDIRECIONAMENTO DE EXECUÇÃO FISCAL – DISSÍDIO JU-RISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL EM RELAÇÃO AO QUAL SE APONTA DIVERGÊNCIA – ANÁLISE DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DO REDI-RECIONAMENTO – DESCABIMENTO – SÚMULA Nº 7/STJ – NÃO IMPUG-NAÇÃO DE TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO – SÚMULA Nº 283/STF

1. Inviável análise de recurso especial interposto pela alínea c do permissivo constitucional que não indica, com clareza e precisão, os dispositivos de lei federal em relação aos quais haveria dissídio jurisprudencial. Incidência da Súmula nº 284/STF.

2. Descabe ao STJ se debruçar sobre as provas dos autos para avaliar a pre-sença dos requisitos autorizadores do redirecionamento de execução fiscal, em virtude do óbice da Súmula nº 7/STJ.

[...].

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg-AREsp 244.890/PA, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe 13.11.2013 – sem destaque no original)

(5) Da multa decendial

A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a multa decendial é devida aos mutuários, em função do atraso no pagamento da indenização objeto do seguro obrigatório, nos contratos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, dado o caráter acessório que ostenta em relação à indenização securitária e deve estar limitada ao valor da obrigação principal. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – CONTRATO DE SEGU-RO VINCULADO AO SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL – ALEGA-ÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE COBERTURA SECURITÁRIA NA APÓLICE – IN-CIDÊNCIA DOS ÓBICES DAS SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ – APLICAÇÃO DE MULTA DECENDIAL – POSSIBILIDADE – ATRASO NO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO – SÚMULA Nº 3/STJ – AGRAVO NÃO PROVIDO

1. Inicialmente, quanto ao argumento de inexistência de cobertura securitá-ria, verifica-se que o acórdão recorrido apreciou a matéria citada com fulcro no instrumento contratual firmado entre as partes e nos elementos fático--probatórios constantes dos autos. Dessa forma, nos termos da jurisprudência desta Corte, dissentir do entendimento cristalizado no âmbito da instância

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originária, no caso, se revela inviável, haja vista o teor das Súmulas nºs 5 e 7 do STJ.

2. Quanto à aplicação da multa decendial, faz-se mister ressaltar que a Corte de origem asseverou que, além de devida, é limitada ao valor da obrigação principal. Não se pode olvidar que, ao assim decidir, o Tribunal a quo, no ponto, orientou-se em conformidade com o entendimento promanado por esta Corte Superior, cuja posição é no sentido de que é devida a multa de-cendial em função do atraso no pagamento da indenização, objeto do seguro obrigatório, nos contratos vinculados ao SFH. Incide, na espécie, pois, a Sú-mula nº 83/STJ.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg-REsp 1.433.439/PR, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe 18.12.2015 – sem destaque no original)

RECURSOS ESPECIAIS – PROCESSUAL CIVIL – SEGURO HABITACIONAL – OMISSÕES – INEXISTÊNCIA – PRESCRIÇÃO – INOCORRÊNCIA – MU-TUÁRIOS-SEGURADOS – LEGITIMIDADE ATIVA – MULTA DECENDIAL – LEGALIDADE DE SUA COBRANÇA QUANDO PREVISTA NO CONTRATO – LIMITAÇÃO PELO VALOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL – ART. 920 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – RECURSO PROVIDO. [...] III – Os mutuários-se-gurados são legítimos a pleitearem o recebimento da multa junto com o adim-plemento da obrigação, quando presentes vícios decorrentes da construção. IV – É devida a multa decendial, pactuada entre as partes para o caso de atra-so do pagamento da indenização, limitada ao valor da obrigação principal (art. 920 do Código Civil de 1916). Recurso especial de Sebastião Donizete de Souza e outros provido, em parte, e Recurso especial de Caixa Seguradora S/A não conhecido.

(REsp 1.044.539/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 25.03.2009 – sem destaque no original)

Inafastável, no caso em tela, a incidência da Súmula nº 83 do STJ:

Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida, aplicável ao recursos especiais interpostos pelas alíneas a e c do permissivo constitucional.

(6) Dos honorários advocatícios

O Tribunal de origem manteve a condenação da seguradora nos horários advo-catícios fixados pela sentença em 15% do valor total da dívida. Assim, no ponto, falta interesse recursal à seguradora.

É o que se extrai do voto condutor lançado nestes termos:

Por fim, cumpre observar que os honorários advocatícios foram bem fixados em 15% do valor total da dívida atualizada, não comportando, portanto, a pretendi-da majoração (e-STJ, fl. 761).

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Ademais, de acordo com a orientação jurisprudencial desta Corte Superior, a verba honorária fixada de acordo com a apreciação equitativa do juiz não será suscetível de reexame em sede de recurso especial, a teor da Súmula nº 7 des-ta Corte. (AgRg-AREsp 155.733/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJe 21.08.2013)

Nessas condições, nego conhecimento ao recurso especial.

Dessarte, mantém-se a decisão proferida, por não haver motivos para a sua alteração, já que os óbices que levaram ao não conhecimento do agravo em recurso especial não foram afastados.

Por fim, vale pontuar que as disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são inaplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016:

Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões pu-blicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admis-sibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Nessas condições, pelo meu voto, não conheço do agravo regimental.

certidão de JulgAmento terceirA turmA

AgRg-REsp 1.570.442/SP Número Registro: 2015/0286720-8

Números Origem: 00063235620078260590 5900120070063238 63235620078260590

Pauta: 05.05.2016 Julgado: 05.05.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Lindôra Maria Araújo

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AutuAção

Recorrente: Companhia Excelsior de Seguros

Advogado: Victor Jose Petraroli Neto e outro(s)

Advogados: Ana Rita dos Reis Petraroli e outro(s) Maria Emília Gonçalves de Rueda e outro(s) Denis Atanazio e outro(s)

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Recorrido: Aldecy Pereira Costa

Recorrido: Rosa Maria dos Santos Souza

Advogados: Ayrton Mendes Vianna e outro(s) Thiago Ramos Vianna e outro(s)

Agravante: Aldecy Pereira Costa

Agravante: Rosa Maria dos Santos Souza

Advogados: Ayrton Mendes Vianna e outro(s) Thiago Ramos Vianna e outro(s)

Agravado: Companhia Excelsior de Seguros

Advogado: Victor Jose Petraroli neto e outro(s)

Advogados: Ana Rita dos Reis Petraroli e outro(s) Maria Emília Gonçalves de Rueda e outro(s) Denis Atanazio e outro(s)

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Sistema financeiro da habitação – Seguro

AgrAvo regimentAl

Agravante: Companhia Excelsior de Seguros

Advogados: Victor Jose Petraroli Neto e outro(s) Ana Rita dos Reis Petraroli e outro(s) Maria Emília Gonçalves de Rueda e outro(s) Denis Atanazio e outro(s)

Agravante: Aldecy Pereira Costa

Agravante: Rosa Maria dos Santos Souza

Advogados: Ayrton Mendes Vianna e outro(s) Thiago Ramos Vianna e outro(s)

Agravado: os mesmos

certidão

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígra-fe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, não conheceu do agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presidente), Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2323

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoAgravo de Instrumento – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0000143‑35.2016.4.02.0000 (2016.00.00.000143‑0)Relator: Desembargador Federal Guilherme Calmon Nogueira da GamaAgravante: Conab – Cia. Nacional de AbastecimentoAdvogado: Nei Calderon e outroAgravado: MZ Doces e Salgados Caseiros Ltda.Advogado: Marcelo Vargas Vanderlei LinsOrigem: 29ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00151829119994025101)

ementA

agravo de INStrumeNto – ação de deSpejo c/c ação de cobraNça – faSe de execução – deScoNSIderação da perSoNalIdade jurídIca – ImpoSSIbIlIdade – auSêNcIa de fraude ou mÁ-fÉ – auSêNcIa de beNS da executada Não autorIza a deScoNSIderação – ImprovImeNto

1. Cuida-se de agravo de instrumento objetivando a reforma da decisão que indeferiu o requerimento de desconsideração da personalidade jurí-dica da executada, MZ Doces e Salgados Caseiros Ltda.

2. A desconsideração da personalidade jurídica não se confunde com o pedido de redirecionamento da execução (ou da fase de cumprimento de sentença).

3. É necessária a presença dos pressupostos previstos no art. 50 do Có-digo Civil, sem os quais não há como relativizar a autonomia subjetiva e objetiva para fins de permitir a invasão no patrimônio pessoal dos sócios.

4. No caso concreto, não houve indicação de qualquer abuso ou desvio de personalidade da pessoa jurídica para as obrigações que foram con-traídas.

5. Não sendo encontrados bens da pessoa jurídica para penhora no cum-primento da sentença, apenas, inexiste motivo para a desconsideração.

6. A Súmula nº 435 do STJ não é aplicável para as hipóteses pretendidas pela agravante.

7. Agravo de instrumento conhecido e improvido.

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Acórdão

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.

Rio de Janeiro, 20.04.2016 (data do Julgamento).

Guilherme Calmon Nogueira da Gama Relator

relAtório

1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto pela Companhia Na-cional de Abastecimento– Conab, em ação de despejo cumulada com ação de cobrança de aluguéis, em fase de execução, objetivando a reforma da decisão exarada pelo Juiz da 29ª Vara Federal do Rio de Janeiro, que indeferiu o reque-rimento de desconsideração da personalidade jurídica da executada, MZ Doces e Salgados Caseiros Ltda.

2. Em sede recursal, a Conab narra que se trata de ação de despejo cumu-lada com cobrança diante da existência de dívida no valor de R$ 5.557,32 (cin-co mil, quinhentos e cinquenta e sete reais e trinta e dois centavos), sendo que houve prolação de sentença que julgou procedente o pedido e, assim, extinguiu o contrato de locação, além de condenar a ré ao pagamento do valor da dívida, devidamente acrescida de juros e correção monetária. Relata que, com o trânsi-to em julgado da sentença, requereu a intimação da agravada para pagamento na forma do art. 475-J do CPC de 1973, o que foi deferido.

Sustenta que a recorrida, no entanto, quedou-se inerte, sendo que as ten-tativas de penhora foram infrutíferas. Ao final, requer a reforma da decisão agra-vada para que haja a desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada.

3. Prestadas as informações e decorrido o prazo para a apresentação das contrarrazões, não houve necessidade de se intimar o Ministério Público Fede-ral na qualidade de custos legis.

É o relatório. Peço dia.

Guilherme Calmon Nogueira da Gama Relator

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voto

1. Conheço do agravo de instrumento porque presentes seus pressupos-tos de admissibilidade.

2. A decisão guerreada foi exarada antes da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil.

3. Como relatado, cuida-se de agravo de instrumento interposto pela Co-nab, em ação de despejo cumulada com ação de cobrança de aluguéis, em fase de execução, objetivando a reforma da decisão que indeferiu o requerimento de desconsideração da personalidade jurídica da executada, MZ Doces e Salgados Caseiros Ltda.

4. A decisão combatida foi assim exarada:“[...]

É o breve relatório. Passo a decidir.

Como cediço, a sociedade mercantil tem personalidade distinta da dos seus sócios.

O instituto da desconsideração da personalidade jurídica veio para afastar, mo-mentaneamente, a personalidade jurídica da sociedade em decorrência de atos fraudulentos de seus sócios que tenham o condão de elidir o adimplemento de seus débitos. Não suprime, extingue ou torna nula a sociedade desconsiderada tampouco os atos societários são declarados ineficazes. O instituto assegura ape-nas que a pessoa do sócio sobressaia em relação à da sociedade, posta em segun-do plano, de modo a assegurar a eficácia dos negócios jurídicos fomentados pela pessoa jurídica e fraudulentamente inviabilizados.

Nesta linha de raciocínio, a desconsideração é permitida apenas excepcional-mente, desde que reste comprovada a prática de ato ilícito– fraude que infrinja disposição legal ou viole norma estatutária em prejuízo de terceiros. É imprescin-dível, pois, a caracterização de má fé na gestão dos negócios.

Assim, sua adoção somente é recomendada quando forem atendidos os pressu-postos específicos relacionados com a fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do Código Civil. Somente se forem verificados os requisitos de sua incidência, poderá o juiz, no próprio processo de execução, ‘levantar o véu’ da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa.

Nos presentes autos, a sociedade-ré foi regularmente intimada, pela publicação oficial, para pagar, não tendo apresentado peça de combate.

Ademais, o fato de inexistir patrimônio passível de saldar os débitos contraídos pela empresa, por si só, não comprova a prática de ato fraudulento.

Pelo exposto, indefiro o pedido de desconsideração da personalidade jurídica formulado pela Autora.

[...]“

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5. Esta Corte tem deliberado que apenas em casos de decisão teratoló-gica, com abuso de poder ou em flagrante descompasso com a Constituição, a lei ou com a orientação consolidada de Tribunal Superior ou deste Tribunal justificaria a reforma pelo órgão ad quem, em agravo de instrumento, sendo cer-to que o pronunciamento judicial impugnado não se encontra inserido nessas exceções. Sobre o tema, confira-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – CONTRATO DE CONCESSÃO – SUSPENSÃO DE PROCEDIMENTO ARBITRAL DEFERIDA – PODER GERAL DO JUIZ – INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER – DESPROVIMENTO DO RECURSO1. Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, a fim de reformar decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela, determinando a suspensão do procedimento arbitral instaurado pela parte Ré. 2. Esta Corte tem deliberado que apenas em casos de decisão teratológica, fora da razoabilidade jurídica, ou quando o ato se apresenta flagrantemente ilegal, ilegítimo e abusivo, justificaria a reforma pelo órgão ad quem, em sede de Agravo de Instrumento. Nesse contexto, a ilegalidade da decisão deve ficar clara e inequívoca, pois, do contrário, tudo deve ser resolvido ao final, no bojo da sentença, podendo ser exa-minado pelo Tribunal competente em grau de recurso. 3. O decisum guerreado está fundamentado na presença da verossimilhança das alegações autorais, bem como no receio de dano de difícil reparação, requisitos exigidos para o deferi-mento da tutela antecipada (art. 273 e inciso I, CPC), tendo, ainda, reconhecido a plena reversibilidade da medida, havendo, portanto, razoabilidade suficien-te, que não pode ser caracterizada como teratológica, ilegal ou abusiva, pelo que não resta cabível sua substituição por outra decisão, ainda que prolatada por Órgão Colegiado. 4. Recurso desprovido. (TRF 2ª R., Ag 201400001011767, 8ª T.Esp., Des. Fed. Guilherme Diefenthaeler, e-DJF2R Data: 18.12.2014) Grifei.

6. A decisão merece ser mantida. A desconsideração da personalidade jurídica não se confunde com o pedido de redirecionamento da execução (ou da fase de cumprimento de sentença). É necessária a presença dos pressupostos previstos no art. 50 do Código Civil, sem os quais não há como relativizar a auto-nomia subjetiva e objetiva para fins de permitir a invasão no patrimônio pessoal dos sócios. No caso concreto, não houve indicação de qualquer abuso ou desvio de personalidade da pessoa jurídica para as obrigações que foram contraídas.

7. Não sendo encontrados bens da pessoa jurídica para penhora no cum-primento da sentença, apenas, inexiste motivo para a desconsideração. A Sú-mula nº 435 do STJ não é aplicável para as hipóteses pretendidas pela agravante e, por isso, o recurso deve ser improvido.

8. Assim, conheço do agravo de instrumento, contudo nego-lhe provi-mento.

É o voto.

Guilherme Calmon Nogueira da Gama Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

2324

Tribunal de Justiça do Estado do CearáPoder JudiciárioGabinete Exmo. Sr. Antônio Pádua Silva – Port. 1.356/2015Processo: 0900816‑24.2014.8.06.0001 – ApelaçãoApelante: Maria de Fátima Almeida de PontesApelados: Humberto Peixoto Garrido Aguiar e Edna Maria Maia de Sousa

ementA

dIreIto proceSSual cIvIl – apelação cível em Sede de embargoS de terceIro Que julgou procedeNte o pedIdo, No SeNtIdo de determINar o caNcelameNto de peNHora do ImÓvel Que, aINda Não regIStrado, maS jÁ perteNcIa aoS ora recorrIdoS (autoreS doS embargoS de terceIro) – NeSte SeNtIdo, apreSeNtaram provaS coNtuNdeNteS (coNtrato de promeSSa de compra e veNda e recIboS de pagameNtoS) – prelImINar de NulIdade da cItação – Não ocorrêNcIa, vez Que o art. 1.050, § 3º, do cpc prevê a poSSIbIlIdade de NoS embargoS de terceIro Ser INtImado o cauSídIco do feIto matrIz, aINda maIS QuaNdo o proceSSo (embargoS de terceIro) fora dIStrIbuído por depeNdêNcIa – No mÉrIto – INcIdêNcIa da SÚmula Nº 84, do Stj – apelação cível coNHecIda e deSprovIda

1. A insurgência recursal centra-se em face da sentença prolatada às fls. 26/27, em sede de Embargos de Terceiro, que julgou procedente a pretensão autoral, tornando sem efeito a cláusula de intransferibilidade de imóvel situado na Avenida José Américo, 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba, nesta capital, anulando o auto de penhora procedido sobre o citado imóvel nos autos do cumprimento de sentença (Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001), com a expedição do compe-tente mandado ao Registro Imobiliário da 1ª Zona de Fortaleza, para o cancelamento da constrição.

2. De início cumpre registrar que estes Embargos de Terceiro é resultante da constrição judicial (penhora) em sede de cumprimento de sentença – Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001, em trâmite na 18ª Vara Cível (pedido feito por Maria de Fátima Almeida de Pontes), no imóvel situado na Avenida José Américo, 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba, nesta capital, cujo objeto desta ação, promovida originaria-mente por Mariana Viana Construções Ltda., foi a resolução de contrato de promessa de compra e venda, que, inclusive, em sede de recurso de Apelação Cível, é claro, já transitado em julgado (daí o motivo do cum-

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primento de sentença), determinou a devolução do sinal e demais parce-las já pagas, totalizantes no valor de R$ 129.000,00 (cento e vinte nove mil reais), com a retenção de 20% (vinte por cento) deste valor, referen-tes as despesas administrativas (fls. 501/511, do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001, que tramita na 18ª Vara Cível).

3. Daí que, compulsando os autos do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001, por intermédio de senha requisitada por esta Rela-toria (vide fls. 96/99/100 e 101), é fácil a conclusão de que o objeto do contrato resolvido na Apelação Cível nº 0045316-50.2007.8.06.0001, é o mesmo objeto penhorado na execução/cumprimento de sentença – casa 13, do Condomínio Marianos, no bairro Cambeba, Fortaleza/CE.

4. Da preliminar de nulidade processual (ausência de citação pessoal da embargada, ora recorrente) – Não diviso como prosperar a preliminar suscitada, na medida em que o art. 1.050, § 3º, do CPC somente pre-vê a citação pessoal se o embargado, no presente caso, a ora apelante, não tivesse procurador constituído nos autos originários, o que não é a hipótese destes autos, já que a mesma, a recorrente Maria de Fátima Almeida de Pontes, conforme se depreende do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001 (autos acessado digitalmente por intermédio de se-nha requisitada e disponibilizada/fls. 726 e ss.) tem como causídico o Dr. Maximiliano de Moura Cardoso (OAB/CE 14.805), e mais: o Processo nº 0900816-24.2014.8.06.0001 – Embargos de Terceiro, foi distribuído por dependência aquele – Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001, o que torna, então, desnecessária a citação pessoal, sendo suficiente a inti-mação do causídico. Precedentes. Rejeito, pois, esta preliminar.

5. No mérito – Entendo que melhor sorte não assiste à apelante, pois os Embargos de Terceiro nas lições doutrinárias, sobretudo, de Nelson Nery Junior, além de ser uma ação de procedimento especial sumário, consti-tutiva negativa, tem a finalidade de “[...] livrar o bem ou direito de posse ou propriedade de terceiro da constrição judicial que lhe foi injustamente imposta em processo de que não faz parte. O embargante pretende ou obter a liberação (manutenção ou reintegração na posse), ou evitar a alienação de bem ou direito indevidamente constrito ou ameaçado de o ser”1, o que, inegavelmente, ocorreu nesses autos, porquanto o MM. Juiz de Direito da 18ª Vara Cível, ao atentar para as provas coligidas, a saber: contrato de promessa de compra e venda e recibos do adimplemento obrigacional relativo à compra do imóvel em questão, localizado na Ave-nida José Américo 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambe-

1 NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante. 8. ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2004. p. 1286.

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ba (fls. 14/17 e 65/84), determinou o cancelamento da penhora com a expedição do competente mandado para o cancelamento da constrição.

6. De mais a mais, salutar, aqui, é a incidência da Súmula nº 84, do STJ, que prevê, também, a admissibilidade de Embargos de Terceiro fundada em alegação de posse decorrente de promessa de compra e venda, ainda que o imóvel não esteja registrado. Precedentes.

7. Entendo, então, como acertada a decisão planicial que, atentando-se para as provas documentais acostadas – contrato de promessa de compra e venda e recibos que comprovam o adimplemento obrigacional, deter-minou o cancelamento da penhora e a remessa do competente ofício ao Registro Imobiliário da 1ª Zona de Fortaleza.

8. Por fim, reitero que, no meu sentir, também não seria coerente a pe-nhora de um imóvel na fase de cumprimento de sentença, que fora obje-to da ação principal, ainda mais quando é perceptível que o contrato de promessa de compra e venda foi judicialmente resolvido (fls. 501/511, do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.000), tendo a parte recorrente, ora embargada, meios alternativos legais para satisfazer o seu crédito, inclusive, com o pedido de constrição de outros bens ou até mesmo, se for o caso, o bloqueio de valores via Bacen-Jud.

9. Apelação Cível conhecida, porém, desprovida.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0900816-24.2014.8.06.0001, em que é apelante Maria de Fátima Almeida de Pontes, e apelados Humberto Peixoto Garrido Aguiar e Edna Maria Maia de Sousa.

Acordam os Desembargadores integrantes da 8ª Câmara Cível deste Tri-bunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade votos, em conhecer do recurso, mas para julgar-lhe desprovido, nos termos do voto do eminente Re-lator.

Fortaleza, 1º de março de 2016.

Des. Francisco Darival Beserra Primo Presidente do Órgão Julgador

Dr. Antônio Pádua Silva Relator – Port. 1.356/2015

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relAtório

Vistos, etc.

Cuidam os autos de Apelação Cível interposta por Maria de Fátima Almeida em face da sentença de fls. 26/27, que em sede de Embargos de Ter-ceiro que julgou procedente o pleito pórtico, no sentido de tornar sem efeito cláusula de intransferibilidade de imóvel residencial localizado na Avenida José Américo 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba, nesta capital, anulando, assim, o auto de penhora procedido sobre o citado imóvel nos autos do cumprimento de sentença.

Inicialmente disse que houve a “[...] ausência de citação da Apelante para responder aos termos dos embargos de terceiro opostos em seu desfa-vor. A simples intimação dos advogados, constituídos no processo principal (nº 0045316-50.2007.8.06.0001), não supre tal vício processual, pois o cau-sídico constituído pela Apelante não possui poderes específicos para receber citação, restando afrontadas as normas processuais civis neste aspecto”.

Registrou também que “impende a Vossas Excelências reconhecerem o ardil perpetrado pelos Apelados em conluio com a empresa Mariano Viana Construções Ltda. com o escopo de tentar desconstituir a hipoteca judiciária e a penhora feita regularmente no imóvel destacado”.

Assentou também que “da análise do Contrato de Promessa de Compra e Venda anexo a vestibular (fls. 14-17), tinha-se que a quitação do imóvel ocorre-ria em até 36 (trinta e seis) meses da data da assinatura do ajuste (03.03.2005). Entretanto, não fora anexo qualquer comprovante de pagamento que atestasse o cumprimento real e efetivo das obrigações pecuniárias a cargo dos Apelados para com a empresa Mariano Viana Construções Ltda. que, incompreensivel-mente, atestou quitação sem demonstrar o ingresso dos recursos próprios, atitu-de muito pouco usual para não se utilizar palavra mais forte”. E que, em dado outro momento, “a tentativa de registro da referida escritura já não prosperou por força da anotação regular da hipoteca judiciária em data anterior, conforme documento de fl. 10 do 1º Ofício de Registro de Imóveis. Por fim, tem-se ainda a consulta da Guia de Informação do ITBI com data de 28.11.2013 (fl.13), com avaliação ocorrida somente em 02.12.2013, todas as datas posteriores à hipo-teca judiciária”.

Rogou, então, pelo conhecimento e provimento recursal.

Contrarrazões de Humberto Peixoto Garrido Aguiar e Edna Maria Maia de Sousa, às fls. 57/60, pelo total desprovimento recursal e, consequentemente, a manutenção do ato sentencial guerreado.

Documentação às fls. 61/84.

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Empós, às fls. 89/90, vieram-me conclusos os autos.

É o que importa relatar.

voto

Presentes os requisitos de admissibilidade.

Conheço, então, o recurso.

Como relatado a insurgência recursal centra-se em face da sentença pro-latada às fls. 26/27, em sede de Embargos de Terceiro, que julgou procedente a pretensão autoral, tornando sem efeito a cláusula de intransferibilidade de imóvel situado na Avenida José Américo, 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba, nesta capital, anulando o auto de penhora procedido sobre o citado imóvel nos autos do cumprimento de sentença (Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001), isto, é claro, com a expedição do competente mandado do Registro Imobiliário da 1ª Zona de Fortaleza.

De início cumpre registrar que este Embargo de Terceiro é resultante da constrição judicial (penhora) em sede de cumprimento de sentença (pedido fei-to por Maria de Fátima Almeida de Pontes), no imóvel situado na Avenida José Américo, 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba, nesta capital, decorrente a ação originária promovida por Mariana Viana Construções Ltda. contra a ora apelante, Maria de Fátima Almeida de Pontes, objetivando a reso-lução do contrato de promessa de compra e venda, que, inclusive, em sede de recurso de Apelação Cível, é claro, já transitado em julgado (daí o motivo do cumprimento de sentença), determinou a devolução do sinal e demais parcelas já pagas, totalizantes no valor de R$ 129.000,00 (cento e vinte nove mil reais), com a retenção de 20% (vinte por cento) deste valor, referentes as despesas administrativas (fls. 501/511, do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001, que tramita na 18ª Vara Cível).

Eis, na íntegra, a ementa do acórdão lavrado pela eminente Desembarga-dora Maria Iraneide Moura e Silva, em sede da Apelação Cível interposta contra a sentença proferida nos autos do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – CONSTITUCIONAL, CIVIL E PROCESSUAL CI-VIL – AÇÃO ORDINÁRIA DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RESIDENCIAL – APLICAÇÃO CDC – EXTINÇÃO DO PAC-TO – DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS – ART. 53 CDC – DANO MATERIAL – NÃO COMPROVADO – COMPENSAÇÃO MORAL – INEXISTÊNCIA – RECUR-SO PARCIALMENTE PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE

1. A empresa apelante celebrou contrato de promessa de compra e venda com a apelada referente a imóvel residencial, Casa nº 11, Condomínio Mariano’s, cons-

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tituído de 18 (dezoito) unidades familiares, situado à Av. Ministro José Américo, 881, Bairro Cambeba, nesta Capital.

2. A recorrida, durante a execução da avença, entre sinal e parcelas, efetuou pa-gamento da quantia R$ 129.000,00 (cento e vinte e nove mil reais).

3. In casu, ocorreu inadimplência mútua do pacto, uma vez que a promitente compradora passou a ser inadimplente e a promitente vendedora inobservou ter-mo final de entrega da unidade imobiliária, qual seja, 31.01.2006, restando con-figurada a incidência da cláusula resolutiva expressa constante da avença, bem como da resolutória tácita – exceptio non adimpleti contractus – ambas previstas no art. 476 do Código Civil.

4. Na espécie, em virtude da resolução contratual por inexecução voluntária bilateral, mútua, a empresa apelante deverá devolver à apelada o valor pago a título de sinal e demais parcelas, totalizando R$ 129.000,00 (cento e vinte e nove mil reais), deduzida a retenção de 20% pelas despesas administrativas do negó-cio jurídico, como corretagem, divulgação, dentre outras, perfazendo a quantia de R$ 103.200,00 (cento e três mil e duzentos reais), consoante art. 53 do CDC.

5. Dano material não comprovado. Reparação moral inexistente.

6. Apelação conhecida e parcialmente provida.

Daí que, compulsando os autos do Processo nº 0045316-50.2007. 8.06.0001, por intermédio de senha requisitada por esta Relatoria (vide fls. 96/99/100 e 101), é fácil a conclusão de que o objeto do contrato resolvido na Apelação Cível nº 0045316-50.2007.8.06.0001, é o mesmo objeto penhora-do na execução/cumprimento de sentença – casa 13, do Condomínio Marianos, no bairro Cambeba, Fortaleza/CE.

Feito estas as ligeiras considerações, passo, agora, a necessária análise da preliminar suscitada de nulidade processual, por ausência de citação, sob o argumento de que não foi oportunizado tal evento processual (citação) para a recorrente, não sendo, pois, a simples intimação do advogado suficiente ao cumprimento do comando processual.

Pois bem.

Não diviso como prosperar a preliminar suscitada, na medida em que o art. 1.050, § 3º, do CPC somente prevê a citação pessoal se o embargado, a ora apelante, não tivesse procurador constituído nos autos originários, o que não é esta a hipótese dos autos, já que a mesma, a recorrente Maria de Fátima Almeida de Pontes, conforme se depreende do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.0001 (autos acessado digitalmente por intermédio de senha requisitada e disponibi-lizada/fls. 726 e ss.) tem como causídico o Dr. Maximiliano de Moura Cardoso (OAB/CE 14.805), e mais: o Processo nº 0900816-24.2014.8.06.0001 – Embar-gos de Terceiro, foi distribuído por dependência àquele – Processo nº 0045316-

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50.2007.8.06.0001, o que torna, então, desnecessária a citação pessoal, sendo suficiente a intimação do causídico.

Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EMBARGOS DE TERCEIROS – DESNECESSIDA-DE DE CITAÇÃO PESSOAL DO EMBARGADO – INTIMAÇÃO DO ADVOGADO CONSTITUÍDO NOS AUTOS DA AÇÃO PRINCIPAL – Nos termos do art. 1.050, § 3º, do CPC, “a citação será pessoal, se o embargado não tiver procurador cons-tituído nos autos da ação principal”. Logo, possuindo o embargado procurador constituído nos autos da ação principal, feito ao qual os Embargos de Tercei-ros foram distribuídos por dependência, desnecessária se mostra a sua citação pessoal, bastando a intimação do advogado constituído naqueles autos, ainda que este não tenha poderes específicos para receber citação. V.V. AGRAVO DE INSTRUMENTO – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE TERCEIRO – PROCURAÇÃO – AUSÊNCIA DE PODERES ESPECÍFICOS PARA RECEBER CI-TAÇÃO – NÃO CONFIGURAÇÃO DE COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO – NULIDADE PROCESSUAL – O art. 214 do CPC estabelece que, para a validade do processo, é indispensável a realização da citação do réu, sob pena de se contaminar o processo com nulidade insanável. A intimação do advogado cons-tituído pela parte, ao qual não lhe foi conferido poder específico para receber citação, não configura citação válida. (TJMG, AI 10024122641491001, MG, Rel. João Cancio, Data de Julgamento: 18.02.2014, Câmaras Cíveis/18ª C.Cív., Data de Publicação: 21.02.2014)

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO – CITAÇÃO PES-SOAL DOS EMBARGADOS – ART. 1.050, § 3º, DO CPC – DESNECESSIDADE DE PODERES ESPECIAIS – AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA DEFEN-SORIA PÚBLICA ACERCA DE MERO ATO ORDINATÓRIO – NÃO DEMONS-TRADA A EXISTÊNCIA DE PREJUÍZO A INQUINAR O ATO DE NULIDADE – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO – UNÂNIME. (TJRS, Apelação Cível nº 70060853819, 16ª C.Cív., Rel. Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 04.12.2014). (TJRS, AC 70060853819/RS, Rel. Paulo Sérgio Scarparo, Data de Julgamento: 04.12.2014, 16ª C.Cív., Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 09.12.2014)

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA OBJETIVANDO DECLARAÇÃO DE NU-LIDADE DE CITAÇÃO EM EMBARGOS DE TERCEIRO, APENSADOS A AÇÃO PRINCIPAL – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROCURADOR CONSTITUÍDO, A EXIGIR A CITAÇÃO PESSOAL DO EMBARGADO – PARTE QUE POSSUÍA AD-VOGADOS CONSTITUÍDOS NO PROCESSO, OS QUAIS SUBSTABELECERAM REGULARMENTE PARA PATRONO QUE RECEBEU A CITAÇÃO, NA FORMA DO ART. 1.050, § 3º, DO CPC – PETIÇÃO DE RENÚNCIA PROTOCOLADA PE-LOS PATRONOS SUBSTABELECENTES, QUE APENAS TEM VALIDADE, APÓS NOTIFICADO O OUTORGANTE – ART. 45, DO CPC – SÚMULA Nº 278 DESTE TJERJ: “É INEFICAZ A COMUNICAÇÃO FEITA NOS AUTOS, POR ADVOGADO, ACERCA DA RENÚNCIA DO MANDATO, ANTES DA EFETIVA NOTIFICAÇÃO DO MANDANTE” – CORRETA A SENTENÇA – NEGATIVA DE SEGUIMENTO

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AO RECURSO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 557, CAPUT, DO CPC. (TJRJ, APL 00105641220148190206/RJ, 0010564-12.2014.8.19.0206, Rel. Des. Eduardo de Azevedo Paiva, Data de Julgamento: 26.05.2015, 18ª C.Cív., Data de Publicação: 28.05.2015 00:00)

EMBARGOS DE TERCEIRO – CITAÇÃO – NA PESSOA DO EMBARGADO X ATRAVÉS DE ADVOGADO – ALTERAÇÃO LEGISLATIVA – O § 3º do art. 1. 050 do CPC, introduzido pela Lei nº 12.125, de 16 de dezembro de 2009, explica, em seu art. 1º, que ela torna dispensável, a citação pessoal do embargado, nas hipóteses em que menciona, para responder à petição inicial dos embargos de terceiro. Trata-se de medida de economia e celeridade processual. Em nenhum momento, a lei dispõe que a citação, através de advogado, é indispensável para o regular andamento do feito, sob pena de nulidade, sobrepondo-se à citação pessoal do embargado (pessoa que detém o poder de constituir ou desconstituir o profissional que lhe representa). Logo, a citação pessoal do embargado, apesar de dispensável, é plenamente válida. (TRT 5ª R., Ap 00009585020105050008/BA, 0000958-50.2010.5.05.0008, Rel. Marama Carneiro, 1ª T., Data de Publicação: DJ 13.12.2012)

Rejeito, pois, a preliminar de nulidade processual.

No mérito – penso que melhor sorte não assiste à apelante, pois os Em-bargos de Terceiro nas lições doutrinárias, sobretudo, de Nelson Nery Junior, além de ser uma ação de procedimento especial sumário, constitutiva negativa, estes, tem a finalidade de “[...] livrar o bem ou direito de posse ou propriedade de terceiro da constrição judicial que lhe foi injustamente imposta em processo de que não faz parte. O embargante pretende ou obter a liberação (manutenção ou reintegração na posse), ou evitar a alienação de bem ou direito indevida-mente constrito ou ameaçado de o ser”2, o que, inegavelmente, ocorreu nesses autos, porquanto o MM. Juiz de Direito da 18ª Vara Cível, ao atentar para as provas coligidas, a saber: contrato de promessa de compra e venda e recibos do adimplemento obrigacional relativo a compra do imóvel em questão, loca-lizado na Avenida José Américo 881, casa 13 – Condomínio Marianos, bairro Cambeba (fls. 14/17 e 65/84), determinou o cancelamento da penhora com a expedição do competente mandado ao Registro Imobiliário da 1ª Zona de Fortaleza.

De mais a mais, salutar, aqui, é a incidência da Súmula nº 84, do STJ, que prevê, também, a admissibilidade de Embargos de Terceiro fundada em alega-ção de posse decorrente de promessa de compra e venda, ainda que o imóvel não esteja registrado.

A propósito:

2 NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante. 8. ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2004. p. 1286.

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Súmula nº 84, do STJ – “É admissível a oposição de Embargos de Terceiro fun-dados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovida de registro.”

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE TERCEIRO – PENHORA DE BEM NÃO REGISTRADO – SÚMULA Nº 84 DO STJ – I – São admissíveis embargos de ter-ceiro opostos contra penhora de bem imóvel que não foi registrado. II – Aplica-ção na hipótese do disposto na Súmula nº 84 do STJ. III – Remessa improvida. (TRF 1ª R., REO 47146 MG 96.01.47146-4, Rel. Juiz Candido Ribeiro, Data de Julgamento: 10.11.1999, 3ª T., Data de Publicação: 23.02.2000, DJ p.11)

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS DE TERCEIRO – PENHORA SOBRE BENS DE TERCEIROS – FRAUDE DE EXECUÇÃO – PENHORA NÃO REGISTRADA – MÁ--FÉ NÃO DEMONSTRADA – Se não comprovado que o executado é proprietário do imóvel penhorado em ação de execução, não pode ser mantida a constrição judicial. É requisito do reconhecimento da fraude de execução, pela alienação de bens penhorados, a efetivação da averbação da constrição judicial no registro do imóvel, para que se presuma a fraude, ou, do contrário, que seja comprovada a intenção de fraudar, pela demonstração da má-fé do adquirente. Em reexa-me necessário, sentença mantida. (TJMG, Reex 10175050074319001/MG, Rel. Gutemberg da Mota e Silva, Data de Julgamento: 11.02.2014, Câmaras Cíveis/10ª C.Cív., Data de Publicação: 19.02.2014)

PENHORA – BEM DE TERCEIRO – TÍTULO DE AQUISIÇÃO DE PROPRIEDADE NÃO REGISTRADO – SÚMULA Nº 621 DO STF – REVOGAÇÃO PELA SÚMULA Nº 84 DO STJ – A Súmula nº 621 do STF dispõe que “não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro de imó-veis”. Porém, é inaplicável a Súmula nº 621 do STF, publicada em 29.10.1984, pois foi revogada pela Súmula nº 84 do STJ, publicada em 02.07.1993, pois se refere a matéria cuja competência agora é tratada pelo STJ, órgão competen-te para o exame da legislação federal infraconstitucional em última instância, devendo prevalecer a orientação da Súmula nº 84 do STJ. A teor da Súmula nº 84 do STJ, que revogou a Súmula nº 621 do STF, admite-se a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro. (TRT 2ª R., Ap 00004928320145020401/SP, 00004928320145020401, A28, Relator: Álva-ro Alves Nôga, Data de Julgamento: 07.08.2014, 17ª T., Data de Publicação: 15.08.2014)

Entendo, então, como acertada a decisão planicial que, atentando-se para as provas documentais acostadas – contrato de promessa de compra e venda e recibos que comprovam o adimplemento obrigacional, determinou o cancelamento da penhora e a remessa do competente ofício ao Registro Imobi-liário da 1ª Zona de Fortaleza.

Por fim, reitero que, no meu sentir, também não seria coerente a penhora de um imóvel na fase de cumprimento de sentença, que fora objeto da ação

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principal, ainda mais quando é perceptível que o contrato de promessa de com-pra e venda foi judicialmente resolvido (fls. 501/511, do Processo nº 0045316-50.2007.8.06.000), tendo a parte recorrente, ora embargada, meios alternativos legais para satisfazer o seu crédito, inclusive, com o pedido de constrição de outros bens ou até mesmo, se for o caso, o bloqueio de valores via Bacen-Jud.

Ante tudo quanto exposto, conheço deste Recurso de Apelação Cível, mas para julgar-lhe desprovido, mantendo-se, assim, intangível a sentença de fls. 26/27.

É como voto.

Fortaleza, 1º de março de 2016.

Dr. Antônio Pádua Silva Relator – Port. 1.356/2015

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos TerritóriosPoder Judiciário da UniãoÓrgão: 1ª Turma CívelClasse: ApelaçãoProcesso: 20150111363613APC (0003269‑41.2006.8.07.0010)Apelante(s): Isabel Pereira BragaApelado(s): Ester Lucas, João Batista CamargoRelator: Desembargador Teófilo CaetanoAcórdão nº 941879

ementA

cIvIl e proceSSual cIvIl – ação reIvINdIcatÓrIa cumulada com INdeNIzação – ImÓvel INSerIdo em loteameNto Irregular e deNSameNte ocupado – coNdomíNIo porto rIco – domíNIo – comprovação – termo de compromISSo de ajuStameNto de coNduta (tac) – celebração – obrIgação de traNSmISSão da Área parcelada ao poder pÚblIco para fINS de regularIzação No ÂmbIto da polítIca fuNdIÁrIa local – coNtrapartIda deStINada aoS proprIetÁrIoS – traNSmISSão de ImÓvel – preteNSão petItÓrIa – perda SuperveNIeNte do INtereSSe de agIr – carêNcIa de ação – afIrmação – valIdade do ajuSte – debate – matÉrIa eStraNHa e precedeNte a eveNtual pleIto petItÓrIo – SeNteNça extINtIva – preServação

1. Consubstancia verdadeiro truísmo que a ação qualifica direito subjeti-vo público resguardado a todos como expressão do princípio da inafas-tabilidade da jurisdição que fora alçado à qualidade de direito e garantia fundamental (CF, art. 5º, XXXV), afigurando-se suficiente à caracteriza-ção do interesse de agir a aferição da adequação do instrumento pro-cessual manejado para obtenção da prestação almejada, da utilidade da pretensão deduzida e da necessidade de intervenção judicial para sua obtenção.

2. A ação reivindicatória consubstancia o instrumento processual apro-priado para o proprietário que não detém a condição de possuidor reaver a posse do imóvel que lhe pertence de quem injustamente o vem pos-suindo ou detendo, destinando-se, pois, a resguardar ao titular do do-mínio o direito que o assiste de elidir a indevida ingerência de terceiros sobre aquilo que é seu, permitindo-lhe que dele se aposse e passe a fruir e usufruir das prerrogativas que irradiam da propriedade.

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3. Concertado Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC entre entes públicos e os primitivos ocupantes da angularidade ativa da pretensão petitória – espólios –, que então atuavam como represen-tantes dos efetivos titulares do bem – herdeiros –, via do qual se compro-meteram a transferir o domínio da área compreendida pelo Condomínio Porto Rico ao poder público, renunciando ao direito de receberem qual-quer compensação pecuniária além da área que, em contrapartida, lhes será transmitida, o convencionado, deixando os titulares do domínio e autores da pretensão petitória desguarnecidos de direito sobre o imóvel vindicado, implica a perda superveniente do seu interesse processual por ter se exaurido o objeto da pretensão.

4. Inserto o imóvel vindicado em área objeto de parcelamento irregular que se transmudara em bairro residencial – Condomínio Porto Rico –, determinando que o poder público atue como forma de regularização do parcelamento como instrumento de implementação da política urbanís-tica voltada ao atendimento do interesse social, vindo a celebrar Termo de Ajustamento de Conduta – PAC com os titulares do domínio, ofere-cendo contrapartida pela abdicação da titularidade da área parcelada, os proprietários, ante o convencionado, deixam de ostentar direitos sobre o imóvel, resultando no desaparecimento do seu interesse de prosseguir com a ação reivindicatória que anteriormente aviaram.

5. Sobejando hígido o Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, impli-cando a abdicação da titularidade do domínio do imóvel vindicado, aos autores da pretensão petitória, ventilando a nulidade do negócio jurídico, devem perseguir sua invalidação na sede apropriada como pressuposto para retomada da qualidade de titulares do domínio e, por conseguinte, aviamento de ação petitória destinada à perseguição do imóvel destaca-do da área que lhes pertence e parcelada irregularmente, não se afiguran-do viável que, antes da invalidação do concertado, postulem sua posse por estarem desguarnecidos da condição de senhores do bem.

6. Apelação conhecida e desprovida. Unânime.

Acórdão

Acordam os Senhores Desembargadores da 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Teófilo Caetano – Relator, Simone Lucindo – 1º Vogal, Nídia Corrêa Lima – 2º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Alfeu Machado, em proferir a seguinte decisão: conhecer e negar provimento, unânime, de acordo com a ata do julgamento e notas taqui-gráficas.

Brasília (DF), 11 de maio de 2016.

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Documento Assinado Eletronicamente Teófilo Caetano Relator

relAtório

Cuida-se de apelação1 aviada por Isabel Pereira Braga e outros, herdeiros que se habilitaram nos autos em substituição aos espólios que integraram ori-ginariamente a angularidade ativa da lide,em face da sentença2 que, ao funda-mento de que, diante do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado entre os autores originários e o estado, volvido à regularização da área denominada Condomínio Porto Rico, onde está inserido o lote que faz o objeto da pretensão petitória, através do qual fora reconhecida a consolidação das ocupações sobre a área ilicitamente parcelada, o fato implicara o desapare-cimento do seu interesse de agir decorrente do exaurimento da necessidade e utilidade de provimento almejado,extinguira, com fulcro no art. 267, inciso VI, do estatuto processual/1973, a ação reivindicatória aforada originariamente pe-los Espólios de Anastácio Pereira Braga, Agostinho Pereira Braga e João Pereira Braga, representados por sua inventariante comum, Leonídia Braga Meireles, em desfavor de Ester Lucas e Outros, almejando a obtenção de provimento que lhes assegurasse a posse do imóvel que individualizaram e os contemplasse com indenização decorrente das perdas e danos que experimentaram durante o período em que perdurara a detenção injusta do bem por parte dos réus. Al-mejam os apelantes a desconstituição do provimento de forma a ser viabilizado o prosseguimento da ação reivindicatória como instrumento apto a assegurar sua contemplação com o direito que os assiste e através dela vêm perseguindo.

Como estofo da pretensão reformatória, argumentaram, em suma, que seu interesse de agir ainda se faz presente, porquanto absolutamente inválido e ineficaz o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC/DF/CODHAB/Terracap/Espólio, diante da incapacidade das partes que dele par-ticiparam e o subscreveram. Aduziram que o TAC fora firmado pelos espólios que originalmente integraram a angularidade ativa, após a extinção do pro-cesso sucessório e formalização da partilha dos bens que integravam o monte partilhável, e por empresa pública que assumira obrigação financeira sem a existência da respectiva previsão orçamentária. Acentuaram que, no momento da celebração do TAC, ocorrida em 16.12.2010, os espólios já haviam sido ex-tintos, tendo em vista a conclusão da ação de inventário desde 2007, de modo que, já não ostentando os capacidade de direito, não poderiam participar e firmar o ajustamento.

1 Apelação de fls. 462/473.2 Sentença de fls. 457/458.

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Assinalaram, outrossim, que o efetivo cumprimento dos termos fixados no TAC não prescinde de aporte financeiro por parte do Distrito Federal, razão pela qual deveria ter sido precedido de dotação orçamentária e da informação acerca da fonte de custeio para o fomento das despesas afetas ao poder públi-co. Apontaram, demais disso, o descumprimento do TAC pelo Distrito Federal e mencionaram que, diante dessas irregularidades, manejaram ação volvida à declaração da nulidade do aludido Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta.

Os réus, devidamente intimados, contrariaram o apelo, defendendo seu desprovimento e a consequente ratificação da sentença3.

O apelo é tempestivo, está subscrito por advogada devidamente consti-tuída, é isento de preparo, tendo em conta que o herdeiro e seu cônjuge que se habilitaram nos autos em substituição aos espólios que integravam a angulari-dade ativa da lide residem em juízo sob os auspícios da justiça gratuita, e fora corretamente processado4.

É o relatório.

votos

O Senhor Desembargador Teófilo Caetano – Relator:

Cabível, tempestivo, isento de preparo e subscrito por advogada devida-mente constituída e municiada de capacidade postulatória, satisfazendo, pois, os pressupostos objetivos e subjetivos de recorribilidade que lhe são próprios, conheço do apelo.

Cuida-se de apelação aviada por Isabel Pereira Braga e outros, herdeiros que se habilitaram nos autos em substituição aos espólios que integraram ori-ginariamente a angularidade ativa da lide, em face da sentença que, ao funda-mento de que, diante do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta firmado entre os autores originários e o estado, volvido à regularização da área denominada Condomínio Porto Rico, onde está inserido o lote que faz o objeto da pretensão petitória, através do qual fora reconhecida a consolidação das ocupações sobre a área ilicitamente parcelada, o fato implicara o desapare-cimento do seu interesse de agir decorrente do exaurimento da necessidade e utilidade de provimento almejado, extinguira, com fulcro no art. 267, inciso VI, do estatuto processual/1973, a ação reivindicatória aforada originariamente pe-los Espólios de Anastácio Pereira Braga, Agostinho Pereira Braga e João Pereira Braga, representados por sua inventariante comum, Leonídia Braga Meireles,

3 Contrarrazões de fls. 475/478.4 Instrumento de mandato de fl. 144 e decisão de fl. 41.

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em desfavor de Ester Lucas e Outros, almejando a obtenção de provimento que lhes assegurasse a posse do imóvel que individualizaram e os contemplasse com indenização decorrente das perdas e danos que experimentaram durante o período em que perdurara a detenção injusta do bem por parte dos réus. Al-mejam os apelantes a desconstituição do provimento de forma a ser viabilizado o prosseguimento da ação reivindicatória como instrumento apto a assegurar sua contemplação com o direito que os assiste e através dela vêm perseguindo.

Emerge do aduzido que o objeto do recurso cinge-se à aferição da corre-ção ou não do provimento sentencial que, identificando a perda superveniente do objeto da pretensão petitória, extinguira a ação reivindicatória manejada pe-los apelantes com lastro no art. 267, inciso VI, do estatuto processual de 1973. Essa resolução fora empreendida sob o argumento de que, diante das tratativas firmadas pela parte autora com o estado, volvida à regularização fundiária da área na qual encontra-se inserido o imóvel reivindicado, positivada em Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta, afigura-se ínsito o reconhecimen-to pelos autores de que a ocupação do imóvel reivindicado está consolidada, implicando o fato o desaparecimento do seu interesse de agir decorrente do exaurimento da necessidade e utilidade de provimento almejado, restando pre-judicado o pedido petitório. Emoldurado o objeto do apelo, seu desate dispensa argumentação mais alentada.

Inicialmente deve ser assinalado que, em tendo sido a sentença guerrea-da proferida sob a égide do estatuto processual derrogado, o apelo deve ser re-solvido sob as premissas instrumentárias derivadas de aludida codificação, con-soante os princípios da irretroatividade e do ato jurídico perfeito, pois inviável que seja reexaminada a sentença sob a nova regulação codificada por implicar sua agregação com efeito retroativo. Alinhadas essas premissas, de forma a ser apreendida a insubsistência do interesse de agir dos apelantes deve ser salien-tado que a pretensão que originalmente formularam compreendia a obtenção de provimento que lhes assegurasse a posse do imóvel que individualizaram, mediante o reconhecimento do domínio que detêm sobre o bem, e outrossim, os contemplasse com indenização decorrente das perdas e danos que experi-mentaram durante o período em que perdurara a detenção injusta do bem por parte dos réus. Por oportuno, confira-se, in ipsis litteris, os termos do pedido formulado pelos apelantes na inicial:

“3 – a procedência da ação para que seja devolvido o imóvel aos autores, protes-tando pelo depoimento pessoal dos réus, sob pena de confesso, prova pericial, documental e testemunhal, bem como perdas e danos a serem comprovados na fase de cognição e apurados em liquidação de sentença, e ônus de sucum-bência.”5

5 Petição inicial de fl. 08.

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Merece ser registrado que, como causa de pedir, alegaram os apelantes que, por força de sucessão hereditária, fora-lhes conferida a propriedade do imóvel reivindicado, o qual fora destacado de gleba maior, que restara parcela-da e loteada, e, não obstante, ignorando o fato de que não está municiado com justo título apto a legitimá-lo a ocupá-lo, o apelado, de forma ilegítima e clan-destina, dele se apossara e nele fixara sua residência. Observaram que, diante dessas circunstâncias e de forma a reaverem a posse daquilo que legitimamente lhes pertence, tendo em conta que o apelado, a despeito de desprovido de justo título, se recusara a lhes devolver o imóvel, foram compelidos a invocar tutela jurisdicional de natureza petitória, pois revestidos da condição de efetivos de-tentores do domínio do bem, devendo, então, ser-lhes assegurada a posse do lote e, ainda, a composição das perdas e danos derivados da injusta ocupação havida, inclusive porque, enquanto o detivera, o acionado dele fruíra e usufru-íra dos frutos que gerara.

Assim pontuado o objeto da pretensão petitória, há que ser registrado que, no curso do itinerário procedimental, mais precisamente em 16 de dezem-bro de 2010, os espólios, que integravam originalmente a angularidade ativa da lide, devidamente representados pela inventariante e assistidos por advogados, concertaram com o Distrito Federal, com a Codhab e com a Terracap, Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta – TAC, contemplando a regularização fundiária da área denominada “Condomínio Porto Rico”, que restara irregular-mente parcelada e loteada, na qual encontra-se inserido o imóvel reivindicado. Por oportuno, transcreve-se parte dos termos do ajustamento firmado, extraído do sítio eletrônico www.buriti.df.gob.br, in verbis:

“TERMO DE COMPROMISSO E AJUSTAMENTO DE CONDUTA

Setor Habitacional Ribeirão

Pelo presente Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta, o Distrito Fe-deral, representado pelo Excelentíssimo Senhor Governador Rogério Rosso, CPF XXXX, CODHAB/DF – Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal, representa da por seu Presidente Sr. César Pessoa de Melo, CPF XXX, e Terracap – Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal, representada por seu Presidente Sr. Dalmo Alexandre Costa, CPF XXXX; aqui denominados “Estado” e Espólios de Anastácio Pereira Braga, Agostinho Pereira Braga, Alexandre Perei-ra Braga e João Pereira Braga, representados pela Inventariante Leonídia Braga Meireles, brasileira, viúva, lavradora, CI 816.724 – SSP/DF e CPF XXXX, resi-dente e domiciliada no povoado da Fazenda Mesquita, na cidade Ocidental/GO (conforme nomeação por Termo de Inventariante constante dos autos de Sobre-partilha 813, com Protocolo nº 387103-90.2010.8.09.0164, em trâmite perante o Juízo da Vara de Sucessões de Cidade Ocidental/GO), juntamente com seus advogados: Dra. Maria das Graças Calazans, inscrita na OAB/DF 10.987; Marco Antonio Marques Atie, inscrito na OAB/DF sob o nº 13.904; Manoel Augusto Campelo Neto, inscrito na OAB/GO sob o nº 11.200 e José Capual Alves, inscrito

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na OAB/GO nº 17.888, estes que tiveram direitos reconhecidos pelos herdeiros necessários e foram aquinhoados no competente formal de partilha, aqui deno-minados ‘Particular’; e, Espólio de Adorvenil Joaquim Alves, representado por Carmelita Rodrigues Alves, brasileira, viúva, do lar, CI 235.574 – SSP-DF e CPF XXXX, residente e domiciliada na Avenida Central, Bloco 211, Casa 09, Nú-cleo Bandeirante-DF, aqui denominado ‘anuente’, juntamente com o advogado Marco Antonio Marques Atie, acima qualificado. Em consonância com preceitos constitucionais, em especial o art. 5º, inciso XXIII; as disposições das Leis Fede-rais nºs 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) e 11.977/2009 (Programa ‘Minha Casa Minha Vida’); Lei Orgânica do Distrito Federal; Leis Distritais nºs 735/2008 e 3.877/2006 e, Lei Complementar Distrital nº 803/2009 (PDOT – Plano Diretor e Ordenamento Territorial); se comprometem a cumprir na íntegra as cláusulas e condições a seguir firmadas, em seguida as seguintes considerações:

[...]

Considerando o julgamento da Ação Civil Pública nº 2003.01.1.076708-5, cuja sentença anulou as matrículas referentes ao imóvel desapropriado pela Terra-cap no Setor Habitacional Ribeirão, confirmada pelo Tribunal de Justiça do Dis-trito Federal, mantendo por conseqüência legal o domínio em favor dos Espó-lios de Anastácio Pereira Braga e outros, cuja decisão transitou em julgado em 28.09.2009;

[...] Considerando as recomendações contidas no mencionado parecer jurídico da Procuradoria Geral do Distrito Federal; as considerações e os compromissos assumidos no TAC 008/2008; a necessidade de utilização da área irregularmente ocupada para atender interesse social já declarado pela Lei Distrital nº 735/2008, com redação dada pela Lei Complementar Distrital nº 803/2009 (PDOT – Plano Diretor e Ordenamento Territorial); os investimentos públicos já realizados; as diversas Ações Reivindicatórias julgadas em favor dos proprietários da área do Condomínio Porto Rico, atualmente em grau de recurso no Superior Tribunal de Justiça, com recomendação da Ministra Relatora Fátima Nancy Andrighi ao Juízo da Vara do Meio Ambiente para que se empenhe na busca de solução conciliató-ria, visando a regularização fundiária do Condomínio Porto Rico, e, assim, evitar o agravamento do conflito social ali existente entre os moradores, proprietários e o Estado; e

Considerando que os estudos realizados e as considerações indicadas demons-tram que a desapropriação se apresenta desnecessária, inoportuna e desacon-selhável, e que no contexto fático atual a regularização pela via administrativa através do instrumento de compromisso e ajustamento de conduta firmado entre O Estado, Particular e o Espólio de Adorvenil Joaquim Alves, com a necessária homologação judicial, se apresenta como alternativa própria e adequada para o reconhecimento de direitos e definição de obrigações recíprocas, propiciando um razoável equilíbrio entre o dever de indenizar o particular e, este, o de res-sarcir o Estado pelas despesas e investimentos já realizados, consistindo em ins-trumento ideal para a composição do conflito social e agilidade na regularização fundiária do Condomínio Porto Rico.

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CLÁUSULA PRIMEIRA – OBJETO:

O presente Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta, celebrado em ca-ráter excepcional, tem por objeto a composição dos interesses patrimoniais com o estabelecimento de direito obrigações entre o Estado, o Particular e o Anuen-te, identificados e qualificados no preâmbulo deste instrumento, como medida preparatória para a regularização fundiária do Condomínio Porto Rico, inserido na Área de Regularização de Interesse Social – Aris Ribeirão, da Região de Santa Maria, criada pela Lei Complementar do Distrito Federal nº 753/2008, com reda-ção dada pela Lei Complementar Distrital nº 803/2009 (PDOT – Plano Diretor e Ordenamento Territorial), bem como o restabelecimento dos direitos de proprie-dade da Terracap sobre área por ela desapropriada, com ratificação da Escritura Pública firmada com o anuente, posteriormente anulada por força de decisão judicial transitada em julgado na Ação Civil Pública nº 2003.01.1.076708-5.

CLÁUSULA SEGUNDA – DO RECONHECIMENTO DE DIREITOS DE DOMÍNIO:

I – O Estado reconhece a titularidade de domínio da área de parcelamento ir-regular denominada ‘Condomínio Porto Rico’ da Aris – Ribeirão, na Região de Santa Maria, em favor do particular, em conformidade com as decisões proferidas nos Autos de Inventário nº 594/1998 e Ação Civil Pública nº 2003011076708-5, transitadas em julgado em 13.01.2007 e 28.09.2009 respectivamente, e ainda, a Matrícula nº 27.848, do Cartório de Registro de Imóveis o Registro.

II – O particular e o anuente, que integram os promitentes qualificados e repre-sentados, uns por si e outros por seus advogados, reconhecem em favor da Ter-racap – Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal, os direitos decorrentes do Decreto nº13.792, de 20.02.1992, que desapropriou em favor do Anuente, cujas matrículas foram canceladas por decisão judicial transitada em julgado, não havendo qualquer direito por eles a ser reclamado sobre aquela referida área, os quais se obrigarão em proceder a transferência formal de domínio por ato público próprio, mediante autorização do Juízo do Inventário com expedição do competente alvará judicial, restabelecendo todos os direitos sobre referidos imóveis em favor da mencionada empresa pública.

CLÁUSULA TERCEIRA – DO RECONHECIMENTO PELO PARTICULAR, REPRE-SENTADO PELA INVENTARIANTE LEONÍDIA BRAGA MEIRELES, JUNTAMENTE COM OS ADVOGADOS LEGITIMADOS, DA EXISTÊNCIA DO PARCELAMEN-TO IRREGULAR EM ÁREA DECLARADA DE INTERESSE SOCIAL DENOMINA-DO ‘CONDOMÍNIO PORTO RICO’ E DA CONCORDÂNCIA EM TRANSFERIR SEU DOMÍNIO EM FAVOR DA CODHAB/DF PARA A NECESSÁRIA REGULA-RIZAÇÃO FUNDIÁRIA: A Inventariante dos Espólios qualificados no preâmbulo deste instrumento, aqui denominados particular e, os demais legitimados, reco-nhecem a área denominada de ‘Condomínio Porto Rico’, como parcelamento irregular localizado em área de interesse social, no Setor Habitacional Ribeirão, na Região de Santa Maria, assim identificada pela Lei Distrital nº 735/2008, com redação dada pela Lei Complementar Distrital nº 803/2009 (PDOT – Plano Dire-tor e Ordenamento Territorial). E, em virtude do interesse do Governo do Distrito Federal em proceder sua regularização, com a criação e distribuição de unidades

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habitacionais aos atuais ocupantes de baixa renda que preencherem os requisitos da Lei Distrital nº 3.877/2006, se comprometem em:

a) transferir o domínio da área ocupada pelo Condomínio Porto Rico, em favor da CODHAB/DF, empresa pública criada pela Lei Distrital nº 4.020, de 25 de setembro de 2007; e

b) destinar a comercialização de no mínimo 50% (cinquenta por cento) das uni-dades residenciais por eles edificadas na área remanescente que continuar sob seus domínios, para atender à política habitacional de interesse social do Distrito Federal, sob o regramento da Lei Federal nº 11.977, de 07 de julho de 2009, e rigorosa observância de lista de beneficiários da CODHAB/DF, em conformidade com a lei distrital acima indicada, mediante as condições ajustadas no presente instrumento.

CLÁUSULA QUARTA – DAS PREMISSAS BÁSICAS:

a) a regularização fundiária ocorrerá pela via administrativa, mediante o presente TAC – Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta firmado entre o Estado, o particular e o anuente, ilustrado com mapa demonstrativo em anexo, de modo a identificar as áreas e as titularidades definidas no presente TAC, que será, depois de assinado, homologado pelo juízo competente.

b) por se tratar de Área de Regularização de Interesse Social – Aris, criada pela Lei Distrital nº 753, de 02 de janeiro de 2008, com redação dada pela Lei Complementar Distrital nº 803/2009 (PDOT – Plano Diretor e Ordenamento Territorial) e destinada ao atendimento das famílias de baixa renda e execu-ção da Política Habitacional de Interesse Social do Distrito Federal, na forma da Lei Distrital nº 3.877/2006 e da Lei Federal nº 11.997, de 07 de julho de 2009, esta que cuida do ‘Programa Minha Casa Minha Vida’, a regularização fundiária, a criação e distribuição das unidades habitacionais e a instalação dos equipamentos públicos, será de responsabilidade da CODHAB/DF, com o apoio técnico da Terracap e demais órgãos administrativos com atribuições pertinentes e do Governo do Distrito Federal, respectivamente; e,

c) não haverá qualquer compensação financeira entre o Estado e o particular em decorrência do presente ajuste.

CLÁUSULA QUINTA – DAS OBRIGAÇÕES DOS REPRESENTANTES LEGAIS DO PARTICULAR E ANUENTE:

O PARTICULAR, REPRESENTADO PELA INVENTARIANTE LEONÍDIA BRAGA MEIRELES, JUNTAMENTE COM OS ADVOGADOS LEGITIMADOS, SE COM-PROMETEM:

a) em transferir, por intermédio do Juízo do Inventário, o domínio em favor da CODHAB/DF, de toda área ocupada pelo Condomínio Porto Rico;

b) em transferir, por intermédio do Juízo do Inventário, o domínio em favor do Distrito Federal, da área de 4,0 hectares, ocupada pela Aris Céu Azul, situada no território do Distrito Federal, na divisa com o Estado de Goiás, para regula-rização em favor dos moradores daquela localidade;

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c) ratificar os termos da Escritura Pública firmada entre a Terracap e Espólio de Adorvenil Joaquim Alves, com a anuência deste, cujas matrículas foram can-celadas pela mencionada ação civil pública, mediante autorização do Juízo do Inventário com a expedição do competente alvará judicial, dando plena qui-tação decorrente da desapropriação efetivada, entre todas as partes envolvidas na mencionada relação jurídica, não havendo nada mais a reclamar uns de outros a respeito do negócio jurídico, dado por perfeito e acabado, restabele-cendo o pleno direito de domínio em favor daquela empresa pública junto ao Cartório de Ofício de Imóveis correspondente;

d) em elaborar os Projetos de infraestrutura urbana e promover sua implantação na área remanescente de sua propriedade a ser ocupada;

e) em aceitar como contraprestação do Estado, o seguinte:

1) o Projeto Urbanístico de Parcelamento do Solo com as alterações promovidas pelo particular, na parte em que alcançar as áreas desocupadas que conti-nuarão sob o seu domínio, isto após a emissão de licença ambiental corres-pondente a ser providenciada por seus respectivos representantes legais, bem como o atendimento às condicionantes nela previstas.

2) a área de 48 hectares devidamente recuperada ambientalmente, que man-terá com a Matrícula nº 27.848, conforme decisão judicial transitada em julgado em 28.09.2009, que cancelou as matrículas decorrentes das de-sapropriações promovidas pela Terracap, nos autos da Ação Civil Pública nº 2003.01.1.076708-5;

3) os estudos e projetos já efetivados na área que permanecerá sob seu domínio e, a desoneração das demais despesas até então realizadas no referido processo de regularização.

CLÁUSULA SEXTA – DAS OBRIGAÇÕES DA CODHAB/DF: A CODHAB/DF SE COMPROMETE:

a) em adotar as providências para a edição de novo decreto de aprovação do Projeto Urbanístico, com as alterações efetivadas após a emissão da licença ambiental correspondente e suas condicionantes;

b) como empresa pública criada pela Lei Distrital nº 4.020, de 25 de setembro de 2007 para executar a política habitacional de interesse social do Distrito Federal e proprietária da área do Condomínio Porto Rico, seguindo as diretri-zes da Lei Federal nº 11.977, de 07 de julho de 2009, que cuida do Programa ‘Minha Casa Minha Vida’, em criar as unidades habitacionais no Condomínio Porto Rico e distribuí-las aos atuais ocupantes que atenderem aos requisitos da Lei Distrital nº 3.877/2006 e Decreto nº 32538 de 2 de dezembro de 2010 ; e,

c) em disponibilizar o Projeto Urbanístico ao particular da área desocupada para elaboração dos projetos complementares.

CLÁUSULA SÉTIMA – DAS OBRIGAÇÕES DA TERRACAP: A TERRACAP SE COMPROMETE:

a) em levar a registro, com a anuência da CODHAB/DF e dos representantes do particular, o Projeto Urbanístico, distinguindo, em poligonais com as coor-

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denadas, no respectivo Registro, o que pertence a cada ente público e o que ficará em domínio do referido Espólio;

b) em destinar área de sua propriedade, existente ao lado do Condomínio Porto Rico, desobstruída para fins de relocação das famílias que serão retiradas de área de risco e proteção ambiental, em cumprimento do TAC 008/2008, firma-do com o Ibama e o Ministério Público Federal.

c) em proceder a ratificação, na forma ajustada na letra c, da Cláusula Quinta do presente instrumento, juntamente com a Inventariante, demais legitimados e os representantes legais do particular, com a anuência dos representantes legais do Espólio de Adorvenil Joaquim Alves, perante o Cartório do 5º Ofício do Registro Imobiliário do Distrito Federal; e,

d) em entregar a área de 48,0 hectares, referida no item ‘2’, da letra ‘e’, da Cláu-sula Quinta, ao particular, sem qualquer ônus a este, devidamente recuperada ambientalmente, em conformidade com o Prad respectivo e em ato simultâneo ao cumprimento da obrigação contida na letra ‘c’ da Cláusula Quinta do pre-sente instrumento.

CLÁUSULA OITAVA – DOS PRAZOS:

Os atos jurídicos constitutivos de direitos previstos no presente instrumento de-verão ser praticados pelas partes, na forma aqui ajustada, no prazo de até 90 (noventa) dias, a contar de sua publicação, ressalvadas as hipóteses em que o descumprimento ocorrer pela impossibilidade de satisfação de determinado(s) requisito(s) legal(is) que independa(m) da vontade dos ora compromissários ou por motivo de força maior.

Parágrafo único. Em ocorrendo alguma das hipóteses acima ressalvadas, o prazo para realização do ato jurídico respectivo ficará prorrogado até o atendimento do requisito legal exigido ou até a satisfação da causa determinante.

CLÁUSULA NONA – DA EFETIVIDADE DAS OBRIGAÇÕES:

O Estado poderá, à sua conveniência e oportunidade, através de seu órgão admi-nistrativo interessado e legitimamente representado, requerer no Juízo próprio, a adjudicação dos bens a ele destinados e/ou a expedição de ordem judicial para a satisfação das demais obrigações assumidas e não cumpridas pelos represen-tantes legais dos Espólios promitentes, independentemente da adoção de outras medidas administrativas, cíveis ou criminais.

Este Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta produzirá efeitos legais a partir de sua homologação judicial, sendo que os prazos nele fixados, salvo estipulação expressa em contrário, passam a correr a partir de sua publicação no Diário Oficial do Governo do Distrito Federal e terá eficácia de título executivo judicial.

CLÁUSULA DÉCIMA – DA PUBLICAÇÃO:

O extrato do presente Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta será publicado pela CODHAB/DF no DODF no prazo máximo de três dias após sua homologação judicial.

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CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA – ELEIÇÃO DE FORO:

Fica eleito o foro do Distrito Federal, para dirimir quaisquer dúvidas ou execução do presente Termo. E, por estarem as partes envolvidas conscientes e acordadas do que se encontra disposto no presente Termo de Compromisso, firma-se em 05 vias de igual teor e forma, entregues a cada um dos compromissários.

Brasília, 16 de dezembro de 2010.

Rogério Schuman Rosso – Governador do Distrito Federal, César Pessoa de Melo – Presidente da CODHAB/DF, Dalmo Alexandre Costa – Presidente da Terracap, Leonídia Braga Meireles – Inventariante dos Espólios de Anastácio Pereira Braga e outros, Carmelita Rodrigues Alves – Inventariante do Espólio de Adorvenil Joaquim Alves, Marco Antonio Marques Atie – Advogado – OAB/DF nº 13.904, Maria das Graças Calazans – Advogada – OAB/DF nº 10.987, Manoel Augusto Campelo Neto – Advogado – OAB/DF nº 1.200 e José Capual Alves – Advogado – OAB/GO nº 17.888.”

Sob o prisma do concertado pelos espólios que ocupavam a angula-ridade ativa desta lide e então ostentavam capacidade para dispor dos bens inventariados, ressoa inexorável que tanto a prestação jurisdicional petitória quanto a indenizatória, diante do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta – TAC, restaram, definitivamente, exauridas, afigurando-se hígido o desaparecimento do objeto da pretensão e do interesse de agir dos apelantes, pois efetivamente não mais subsiste o interesse de agir. Com efeito, os apelantes inexoravelmente estavam revestidos de interesse processual no momento do aviamento da pretensão, porquanto positivaram a titularidade do imóvel reivin-dicado, que encontrava-se inserido no loteamento denominado Condomínio Porto Rico, localizado na cidade de Santa Maria/DF, que também era da titula-ridade dos apelantes.

Ocorre, contudo, que, após a celebração do aludido TAC, que implicara a assunção da obrigação de transmissão de titularidade dos imóveis encrava-dos no parcelamento irregular levado a efeito inserto em aludido loteamento – Condomínio Porto Rico – para a empresa pública ajustante, de forma a serem inseridos em programa habitacional de interesse social e distribuído aos ocu-pantes e demais beneficiários, o interesse de agir dos apelantes se exaurira. Em consonância com o ajustado, se comprometeram a transferir o domínio da área ocupada pelo Condomínio Porto Rico em favor da Codhab6 e, a par de terem renunciado ao direito de receberem qualquer compensação pecuniária7, acei-taram receber como contraprestação uma área de 48 (quarenta e oito) hectares, matrícula nº 27.8488.

6 TAC, cláusula quarta, “a”.7 TAC, cláusula quarta, “c”.8 TAC, cláusula quinta, “e”.

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O avençado, porquanto implicara a obrigação de transmissão da titula-ridade do imóvel vindicado, encerra a perda superveniente do interesse de agir dos apelantes. Ora, se não ostentam direito sobre o imóvel vindicado, pois se obrigaram a transmiti-lo a terceiro, obviamente que não ostentam legitimidade para vindicá-lo daquele que o possui. Cândido Rangel Dinamarco assentara o conceito de interesse de agir como o resultado do exame de duas circunstân-cias: a) utilidade e b) necessidade do pronunciamento judicial9. Já Liebman pontificara que interesse de agir é, por isso, um interesse processual secundário e instrumental com relação ao interesse substancial primário; tem por objeto o provimento que se pede ao juiz como meio para obter a satisfação de um interesse primário lesado pelo comportamento da parte contrária, ou, mais ge-nericamente, pela situação de fato objetivamente existente10.

Qualquer que seja o conceito adotado, certo é que não está mais presen-te na hipótese vertente dos autos, tendo em vista que, de acordo com o Termo de Compromisso de Ajustamento de Condutas concertado, comprometeram-se os autores originários da ação reivindicatória a transferirem a titularidade da área onde se encontra situado o imóvel que perfaz o objeto petitório e, outros-sim, renunciaram o direito a qualquer compensação financeira. Deve ser frisado que, à época da formalização do ajustamento, os espólios que integraram a composição ativa ainda subsistiam e estavam revestidos de capacidade para entabular a convenção, devidamente representados pela inventariante e assis-tidos por seus advogados. Conseguintemente, dispondo os espólios do imóvel vindicado, obrigando-se a transmiti-lo ao poder público, mediante a contra-partida convencionada, já não os assiste interesse e postular a posse do bem, pois não detém os apelantes a titularidade do bem, dele não podendo dispor de conformidade com suas conveniências, ressoando patente a inutilidade e inadequação da tutela originalmente deduzida.

Assim, aliás, vem se manifestando esta Corte de Justiça, consoante de-monstram os precedentes adiante ementados:

“AÇÃO REIVINDICATÓRIA – IMÓVEL INTEGRANTE DA GLEBA 23 DA FAZEN-DA SANTA MARIA – CONDOMÍNIO PORTO RICO – TERMO DE COMPRO-MISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC) – EXTINÇÃO DO FEITO SEM APRECIAÇÃO DO MÉRITO – PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PRO-CESSUAL – SENTENÇA MANTIDA – I – O interesse de processual é compos-to pelo binômio necessidade-adequação, de modo que o processo deve buscar provimento útil, necessário e adequado para a solução da lide. II – De acordo com Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre os autores originais (Espólio de Anastácio Pereira Braga e outros), a Terracap, a CODHAB e o Distrito Federal, o Condomínio Porto Rico, inserido, na gleba 23

9 Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, v. I, p. 302/303.10 Manual de direito processual civil. 2. ed. v. I, p. 154.

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da Fazenda Santa Maria, será integralmente transferida ao Governo do Distrito Federal, que se responsabilizou em implementar serviços de infraestrutura básica no local e, em contrapartida, o Estado contemplará os proprietários do imóvel com a devolução de 48 (quarenta e oito) hectares da área já recuperada. III – Com o ajuste firmado entre os autores originários e o Estado, não subsiste o interes-se processual no prosseguimento do feito, uma vez que a ação reivindicatória não mais terá qualquer utilidade aos demandantes. IV – Recurso desprovido.” (Acórdão nº 930218, 20150111079385APC, Rel. Josaphá Francisco dos Santos, Revisor: Maria Ivatônia, 5ª T.Cív., Data de Julgamento: 16.03.2016, Publicado no DJe 04.04.2016, p. 312)

“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REIVINDICATÓRIA – CONDOMÍNIO PORTO RICO – LEGITIMIDADE ATIVA – PRESENÇA – DECISÃO DO STJ EM RECURSO REPETITIVO – PRESSUPOSTO PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA – JULGAMENTO ANTERIOR – AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO PELO STJ – PERDA SUPERVENIEN-TE DO INTERESSE PROCESSUAL – TAC – TÍTULO EXECUTIVO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – 1. O Espólio de Anastácio Pereira Braga e outros, sucedido pelos herdeiros, possui legitimidade ativa para propor ações reivindicatórias, contra ocupantes de lotes no Condomínio Porto Rico, conforme decidido pelo E. STJ no Recurso Especial representativo da controvérsia (REsp 990.507/DF). 2. Mantém-se o julgamento anterior no tocante à ausência de pressuposto pro-cessual (individualização do imóvel), pois tal tema não foi objeto do Recurso Especial representativo da controvérsia (REsp 990.507/DF), e, portanto, não pode ser reapreciado pela Turma. 3. Constatada a perda superveniente do interesse processual, diante da celebração de Termo de Ajustamento de Conduta no qual os proprietários da área, de livre e espontânea vontade, obrigaram-se a transferir o imóvel ao Distrito Federal, para fins de regularização fundiária, mediante a de-vida contrapartida estatal. 4. Quando homologado em juízo, o Termo de Ajusta-mento de Conduta adquire o status de título executivo judicial (CPC, art. 475-N, V), cujo inadimplemento enseja a sua execução e não a sua desconstituição. 5. Deu-se parcial provimento ao apelo da autora, a fim de reconhecer a legiti-midade ativa, mantendo-se a extinção do processo sem resolução de mérito, por outros fundamentos.” (Acórdão nº 914032, 20051010060114APC, Rel. Sérgio Rocha, Rev. James Eduardo Oliveira, 4ª T.Cív., Data de Julgamento: 09.12.2015, Publicado no DJe 27.01.2016, p. 212)

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – LEGITIMIDADE ATIVA – RECURSO ESPECIAL – SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS – AÇÃO REIVINDICA-TÓRIA – TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC) – PERDA SUPERVE-NIENTE DO INTERESSE DE AGIR

I – O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 990.507/DF, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, concluiu que ‘os espólios de Anastácio Pereira Braga, Agostinho Pereira Braga e João Pereira Braga detêm legitimidade para figurar no polo ativo das ações reivindicatórias ajuizadas contra os ocupantes do loteamento denominado Condomínio Porto Rico, localizado na cidade de Santa Maria/DF’. II – Verificado que, no curso do processo, as partes firmaram termo de ajustamento de conduta TAC, definindo

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obrigações recíprocas sobre a área objeto do litígio, não há mais interesse no prosseguimento do feito pela falta de utilidade da tutela jurisdicional pleiteada na inicial. Tal fato conduz à extinção do processo por ausência de interesse pro-cessual superveniente, sem análise de mérito. III – Prejudicada a apelação. Perda superveniente do interesse de agir.” (Acórdão nº 908966, 20051010060106APC, Rel. José Divino de Oliveira, Rev. Vera Andrighi, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 25.11.2015, Publicado no DJe 07.12.2015, p. 314)

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL – AÇÃO REIVINDICATÓRIA – TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA – PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR – 1. A celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC para fins de regularização fundiária torna incompatível a pretensão reivindicatória, tor-nando ausente o interesse de agir. 2. O processo deve ser extinto, diante da perda superveniente do interesse de agir. 2 – Recurso prejudicado.” (Acórdão nº 897660, 20061010021755APC, Relª Ana Maria Duarte Amarante Brito, Rev. José Divino de Oliveira, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 30.09.2015, Publicado no DJe 06.10.2015, p. 313)

“DIREITO CIVIL – PROCESSO CIVIL REIVINDICATÓRIA – TERMO DE AJUSTA-MENTO DE CONDUTA – PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR – 1. A celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC para fins de regu-larização fundiária acarreta perda superveniente do interesse de agir da ação rei-vindicatória, devendo ser extinto o processo, nos termos do art. 267, VI, do CPC. 2. Recurso prejudicado. (Acórdão nº 902027, 20061010068376APC, Rel. Hector Valverde Santanna, Rev. José Divino de Oliveira, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 21.10.2015, Publicado no DJe: 10.11.2015, p. 282)

Outrossim, sobreleva notar que a existência dos vícios invocados pelos apelantes como hábeis a afetar a higidez e legitimidade do TAC não afeta a apreensão da perda superveniente do interesse de agir reconhecida pela sen-tença.

No caso, a pretensão restara exaurida pelo advento do TAC, e eventual insurgência quanto ao concertado no aludido instrumento não pode ser objeto de análise nessa sede petitória. Ou seja, se o caso, deverão os apelantes obte-rem a invalidação do ajustado, que, homologado em juízo, adquire o status de título judicial (CPC/1973, art. 475-N, V; NCPC, art. 515, III), como premissa para a assunção de senhores do imóvel vindicado. Antes dessa resolução, dian-te da convenção, não ostentam direito dominial sobre o bem, tornando inviável sua vindicação.

Deve ser destacado, aliás, que a mesma ilustrada causídica que parti-cipara da subscrição do TAC, na condição de advogada dos espólios, venti-lara, nessa sede recursal, a invalidade do ajuste, sob o fundamento de que os espólios não ostentavam capacidade de direito para firmarem o instrumento negocial, pois já haviam sido extintos. Nesse contexto soa no mínimo estranho que a mesma causídica que assistira os espólios na celebração do ajuste agora,

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em momento posterior, patrocine os herdeiros, que se habilitaram nos autos em substituição aos espólios que integravam a angularidade ativa da lide, na insur-gência que ventilaram contra a validade do compromisso.

Alfim, a título ilustrativo, merece ser salientado que a área intitulada “Condomínio Porto Rico”, originalmente de titularidade dos apelantes, fora irregularmente loteada e experimentara densa ocupação urbana informal, ge-rando fato social irreversível, notadamente porque a área se transmudara, em suma, em bairro residencial, tornando premente sua regularização, evitando--se o surgimento de conflitos sociais. Esse o norte do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC/DF/CODHAB/Terracap/Espólio, que visara simplesmente regularizar o parcelamento como instrumento de política urbana, conferindo aos herdeiros da área, em contrapartida, compreendida no imóvel que lhes deve ser transmitido.

Como corolário do aduzido, revestindo-se a argumentação aduzida ca-rente de suporte, o apelo deve ser desprovido e a sentença que encerrara a ação reivindicatória, nos termos do art. 267, inciso VI, do estatuto processual/1973, ser preservada, posto que o direito de propriedade dos apelantes fora realizado nos moldes do convencionado em aludido Termo de Ajustamento de Compro-misso de Conduta, implicando a perda superveniente do seu interesse de agir.

Esteado nos argumentos alinhados, nego provimento ao apelo, mantendo incólume o provimento arrostado.

É como voto.

A Senhora Desembargadora Simone Lucindo – Vogal

Com o relator.

A Senhora Desembargadora Nídia Corrêa Lima – Vogal

Com o relator.

decISão

Conhecer e negar provimento, unânime.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Geraldo Gonçalves da CostaApelação Cível nº 414942‑02.2014.8.09.0051(201494149427)5ª Câmara CívelComarca de GoiâniaApelante: Centro Espírita Renascer – CERApelado: Renato CunhaRelator: Diác. Dr. Delintro Belo de Almeida FilhoJuiz de Direito Substituto em 2º Grau

ementA

apelação cível – ação de deSpejo – dIreIto INtertemporal – eNtIdade relIgIoSa – objetIvoS INStItucIoNaIS – coNtrato de locação – HIpÓteSeS doS artS. 9º e 53, INcISo II, da leI de locaçÕeS – INocorrêNcIa – reScISão – ImpoSSIbIlIdade – prazo aNual – INaplIcabIlIdade

1. Ao recurso interposto contra decisão publicada durante a vigência do CPC/1973 (até 17.03.2016), aplicam-se os requisitos de admissibilidade previstos em tal diploma (Enunciado Administrativo nº 2/STJ). 2. A pessoa jurídica registrada como sociedade civil, religiosa e filantrópica, com ob-jetivos institucionais claramente confessionais, amolda-se perfeitamente à definição de “entidade religiosa” prevista no art. 53 da Lei de Locações. 3. Não se admite a rescisão do contrato de locação celebrado com enti-dade religiosa, caso não comprovadas nos autos, as hipóteses dos arts. 9º e 53, inciso II, da Lei de Locações, merecendo reforma a sentença que, afastando-se de tal entendimento, concede o despejo requestado. 4. A concessão de prazo anual de despejo a que alude o art. 63, § 3º da Lei de Locações somente se aplica quando caracterizadas as hipóteses dos arts. 9º, inciso IV, e 53, inciso II, da Lei do Inquilinato. 5. Recurso conhe-cido e provido. Sentença reformada.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível nº 414942-02.2014.8.09.0051 (201494149427), da comarca de Goiânia, em que figuram como apelante Centro Espírita Renascer – CER e como apelado Renato Cunha.

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Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Segunda Turma Julgadora de sua Quinta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer do apelo e dar-lhe provimento, tudo nos termos do voto do Relator.

Votaram acompanhando o Relator, os Excelentíssimos Senhores Desem-bargadores Francisco Vildon José Valente e Olavo Junqueira de Andrade.

Presidiu a sessão de julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador Alan S. de Sena Conceição.

Representou a Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. Rodolfo Pereira Lima Júnior.

Goiânia, 05 de maio de 2016.

Diác. Dr. Delintro Belo de Almeida Filho Juiz de Direito Substituto em 2º Grau Relator

voto

Conforme relatado, trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Centro Espírita Renascer – CER, nos autos da ação de despejo ajuizada em seu desfavor por Renato Cunha, ora apelado, contra sentença (fls. 121/125) prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 11ª Vara Cível da comarca de Goiânia, Dr. Carlos Luiz Damacena, que julgou procedentes os pedidos iniciais.

Pleiteia o apelante a reforma da sentença recorrida, visando, sucessiva-mente: a) seja reconhecido como entidade religiosa; ou b) seja concedido o prazo de 1 (um) ano para a desocupação.

1 doS reQuISItoS de admISSIbIlIdade

Tendo em vista que a sentença recorrida fora publicada antes da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que ocorreu em 18.03.2016, os requisitos de admissibilidade do presente recurso devem ser aferidos à luz das regras processuais previstas do Código de Processo Civil de 1973 e da interpretação jurisprudencial que lhe é correlata.

No endosso de tal assertiva, pontifica o Enunciado Administrativo nº 2 do Superior Tribunal de Justiça, litteris:

“Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admis-sibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.”

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Pois bem. Encartada a premissa e presentes os seus respectivos pressu-postos de admissibilidade, passo a análise do recurso interposto.

2 da Natureza jurídIca do apelaNte e daS regraS locatícIaS Que lHe São aplIcÁveIS

A pretensão recursal principal submetida à análise desta Corte reside na possibilidade de se qualificar ou não o apelante como sendo “entidade reli-giosa” para fins de aplicação da norma de regência do direito locatício e, por conseguinte, julgar procedente ou não a ação de despejo (e no primeiro caso, o prazo para tanto).

Compulsando os autos, sobretudo o estatuto social de fls. 93/101, verifi-co que o apelante qualificou-se, em sua fundação (07.10.2001), como “socie-dade civil, religiosa e filantrópica de duração ilimitada” (art. 1º).

Na data do requerimento do registro da entidade (fl. 82), encontrava-se em vigor o CC/2016, que previa as seguintes espécies de pessoas jurídicas, litteris:

“Art. 16. São pessoas jurídicas de direito privado:

I – as sociedades civis, religiosas, pias, morais científicas ou literárias, as associa-ções de utilidade pública e as fundações;

II – as sociedades mercantis;

III – os partidos políticos.”

Pois bem. Em que pese na data do registro do apelante, houvesse dis-tinção formal entre sociedades civis e religiosas, no contexto do Código Civil então vigente, a natureza da sua personalidade jurídica e, para fins de regu-lamentação do direito locatício, deve ser aferida através da análise dos seus objetivos institucionais.

Em melhores palavras, para fins de interpretação do termo jurídico “en-tidades religiosas” constante no art. 53 da Lei nº 8.245/1991 (Lei de Locações), que é norma especial em relação ao Código Civil, não se deve analisar a de-nominação da pessoa jurídica em detrimento das seus finalidades, sob pena de se incorrer em excesso de formalismo, vulnerador do que dispõe o art. 5º da LINDB, verbis:

“Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”

De se ressaltar que o art. 16, inciso I, do CC/1916, cuja redação é originá-ria (de 1916), referiu-se à “sociedade religiosa”, ao passo que a Lei de Locações (de 1991), que é muito posterior, referiu-se a “entidade religiosa”, expressão

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esta mais abrangente, pretendendo assim, não restringir-se ao conteúdo do di-reito civilístico (lex specialis derrogat lex generalis).

Em detida análise do Estatuto Social do apelante (fls. 93), verifico, parti-cularmente no que diz respeito ao seu art. 1º, que em momento algum aquele denominou-se exclusivamente como “sociedade civil”, mas sim como “socie-dade civil, religiosa e filantrópica”, constando como o objetivo institucional, sem dúvidas, o desempenho de atividade de caráter religioso.

Em que pese o novo CC/2002, a partir das alterações promovidas pela Lei nº 10.825/2003, haja realizado a distinção entre associações, sociedades e “organizações religiosas”, no seu art. 2.031, parágrafo único, dispensou as enti-dades religiosas fundadas na vigência do CC/1916, de adequarem seu estatutos, no prazo que prevê, razão pela qual o estatuto do apelante (justamente por se tratar de entidade religiosa) não sofreu alteração.

Ora, sendo o objetivo da Lei de Locações a proteção das atividades de caráter social desempenhadas por determinadas entidades, como hospitais, asi-los, escolas e unidades religiosas, cujo funcionamento dá-se em imóveis loca-dos, razão não há para realizar-se uma má interpretação dos elementos norma-tivos contidos no seu art. 53, que assim dispõe, verbis:

“Art. 53. Nas locações de imóveis utilizados por hospitais, unidades sanitárias oficiais, asilos, estabelecimentos de saúde e de ensino autorizados e fiscalizados pelo Poder Público, bem como por entidades religiosas devidamente registradas, o contrato somente poderá ser rescindido:

I – nas hipóteses do art. 9º;

II – se o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário, em ca-ráter irrevogável e imitido na posse, com título registrado, que haja quitado o preço da promessa ou que, não o tendo feito, seja autorizado pelo proprietário, pedir o imóvel para demolição, edificação, licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de cinquenta por cento da área útil.” (grifei)

O objetivo do legislador, ao editar o referido artigo, fora retirar do âm-bito de discricionariedade do locador, o despejo do locatário que desempenhe atividade religiosas no local objeto do contrato de locação, estabelecendo de-terminadas situações especiais em que o contrato poderia vir a ser denunciado motivadamente, buscando, assim, privilegiar o interesse social patente no res-peito às atividades religiosas, que não podem sofrer dissolução de continuidade ao mero alvedrio do locador.

Desse modo, e considerando ainda que o apelante encontra-se cadastra-do na Receita Federal para exercício de “Atividades de organizações religiosas ou filosóficas” (fl. 144), irrefutável se mostra a natureza de “entidade religiosa” do apelante, isso para o fim do que prevê o art. 53 da Lei nº 8.245/1991.

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Neste contexto, não se adequando ao caso o previsto no art. 53, inciso II, da norma de regência, o despejo imediato do apelante somente se justificaria caso evidenciada, no autos, alguma das hipóteses contidas no art. 9º, da Lei de Locações, que assim prevê, litteris:

“Art. 9º A locação também poderá ser desfeita:

I – por mútuo acordo;

II – em decorrência da prática de infração legal ou contratual;

III – em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais encargos;

IV – para a realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel ou, podendo, ele se recuse a consenti-las.”

No presente caso, não há mútuo acordo, não houve prática de infração legal ou contratual pelo locatário, que efetuou o pagamento dos aluguéis e demais encargos e não se evidencia também, a necessidade de realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, circunstâncias estas que obstam o deferimento da pretensão de despejo na forma pleiteada pelo apelado.

Acerca da matéria, colho o seguinte precedente do STJ que, em pese o seu fundamento determinante referir-se a estabelecimento de ensino, também se estende ao caso das entidades religiosas, por força legal (art. 53, caput, da Lei de Locações), sendo assim, perfeitamente subsumível ao caso, verbis:

“[...] É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a locação de imóvel não residencial, para localização e funcionamento de es-tabelecimento de ensino, ainda que o contrato tenha sido celebrado com pra-zo determinado, somente será passível de rescisão nas hipóteses previstas no art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.245/1991 [...].” (STJ, 5ª T., REsp 545196/DF. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. DJ 29.05.2006)

Neste contexto, a pretensão de despejo veiculada não preenche os re-quisitos legais para o seu deferimento, em que pese o apelante voluntariamente pretender desocupar o imóvel, solicitando apenas um prazo que considera ra-zoável.

Quanto ao ponto, ressalto que a pretensão subsidiária do apelante de concessão de prazo do 1 (um) ano para desocupação do imóvel (art. 63, § 3º, da Lei de Locações), enquanto constrói a sua sede (fls. 105/111), não se verifica legalmente possível, posto não se subsumir o caso às previsões do art. 53, in-ciso II e art. 9º, inciso IV, ambos da Lei de Locações, devendo tal pretensão ser alcançada na via consensual.

No endosso de tal assertiva, colaciono precedente do C. STJ, cujos fun-damentos determinantes se amoldam com precisão ao presente caso, verbis:

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“[...] A denúncia imotivada da locação, precisamente porque tem causa de pedir estranha àquelas previstas nos arts. 9º, inciso IV, e 53, inciso II, da Lei do Inquili-nato, não determina a incidência do art. 63, parágrafo 3º, da mesma lei [...].” (STJ, 6ª T., REsp 261917/RJ, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 19.12.2002)

Aliás, verifico que o fundamento da ação de despejo é a mera pretensão de alienação, pelo autor/apelado, do imóvel locado, pretensão esta, contudo, não exercitável somente a partir da decretação do despejo, na forma como prevê o art. 8º da Lei de Locações, razão pela qual a aplicabilidade ao caso, do art. 53 da norma de regência, não obsta o exercício do direito dominial de disposição.

Sendo assim, qualificando-se a apelante como “entidade religiosa”, para fins do que dispõe o art. 53 da Lei de Locações, conforme pretensão recursal principal, merece censura a sentença recorrida que decretou o seu despejo.

3 dISpoSItIvo

Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento para, em refor-ma da sentença recorrida, julgar improcedente a ação de despejo, invertendo, por conseguinte, os ônus sucumbenciais.

É o meu voto.

Goiânia, 05 de maio de 2.016.

Diác. Dr. Delintro Belo de Almeida Filho Juiz de Direito Substituto em 2º Grau Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de Minas GeraisApelação Cível nº 1.0024.14.015637‑3/002Numeração 0156373‑Comarca de Belo HorizonteApelante(s): Iara Pires CorreaApelado(a)(s): Conjunto Habitacional Mor Moradas da PampulhaRelator: Des.(a) José Marcos VieiraRelator do Acórdão: Des.(a) José Marcos VieiraData do Julgamento: 18.05.2016Data da Publicação: 31.05.2016

ementA

ação ordINÁrIa – SuSpeNSão de obra em coNdomíNIo – coNtrato de preStação de ServIço de revItalIzação de facHadaS e reboco exterNo de muroS – IrregularIdadeS e SuperfaturameNto – ÔNuS da prova – art. 333, I, do cpc – Não comprovação – aprovação em aSSembleIa geral por maIorIa doS coNdÔmINoS – obServÂNcIa – ImprocedêNcIa – SeNteNça maNtIda – recurSo Não provIdoÉ ônus da parte autora comprovar as alegadas irregularidades no segundo contrato de prestação de serviços de revitalização de fachada e rebo-co externo de muros, bem como o superfaturamento das mencionadas obras.

Nos termos do art. 1.341, do Código civil, tratando-se de obras úteis à conservação do Condomínio, para sua realização, necessária a aprova-ção da maioria dos condôminos presentes à Assembleia devidamente convocada para tal finalidade.

Acórdão

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.

Des. José Marcos Rodrigues Vieira Relator

voto

Trata-se de Apelação Cível interposta da sentença de fls. 273/276-TJ, que, nos autos da Ação Ordinária ajuizada por Iara Pires Correa em face do

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Condomínio do Edifício Moradas da Pampulha, julgou improcedentes os pedi-dos iniciais.

Inconformada, a Autora interpôs Apelação às fls. 304/309-TJ, reiterando o pedido de suspensão das obras no condomínio, tendo em vista irregularidades no segundo contrato de prestação de serviços (fls. 19/26-TJ), cujo valor estaria acima da média de mercado.

Insurge-se contra o valor das parcelas cobradas referentes ao segundo contrato, que seria superior ao pactuado, o que demonstra a ilicitude e má-fé do Réu, que estaria superfaturando a obra.

Assevera a duplicidade de obras, ressaltando que apesar de existirem 02 (dois) contratos, a obra seria a mesma.

Pugna pelo provimento do recurso.

Contrarrazões às fls. 313/318-TJ.

É o relatório. Passo a decidir.

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

A Autora ajuizou a presente ação afirmando irregularidades no contrato de prestação de serviços de revitalização de fachada e reboco externo de muro, celebrado em 28.10.2013, entre o Condomínio, ora Apelado, e a empresa En-gemil Soluções em Engenharia.

Alega superfaturamento da obra, tendo em vista outro orçamento em va-lor inferior. Aduz a existência de duplicidade de obras, sob o fundamento de que no primeiro contrato de prestação de serviços de construção de muro de divisa celebrado em 22.08.2013, já incluía o reboco dos muros.

Com estes fundamentos, postula a suspensão liminar das obras de revita-lização de fachada e de reboco dos muros, previstas no segundo contrato, e a consignação em juízo dos valores da taxa condominial.

Citada, a Ré apresentou Contestação (fls. 59/65-TJ), afirmando que ambas as obras foram deliberadas em assembleia condominial, aprovada pela maioria dos condôminos, portanto, não haveria nenhuma irregularidade.

Assevera que o primeiro contrato celebrado em 22.08.2013 correspon-de à prestação de serviço de construção de muro na Avenida Virgílio Melo de Franco, que foi demolido em cumprimento à decisão judicial desfavorável ao Condomínio proferida em Ação de Desapropriação movida pela Prefeitura de Belo Horizonte, além do chapisco e reboco externo. Já o segundo contrato, celebrado em 28.10.2013, tem como objeto a recuperação dos muros já exis-tentes no entorno do condomínio e a revitalização das fachadas.

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O Condomínio instruiu a defesa com cópia das atas de assembleias e das respectivas convocações.

Após os trâmites legais, os pedidos foram julgados improcedentes o que gerou a irresignação da Autora, que reitera a existência de irregularidades no segundo contrato.

Como relatado, pretende a Autora a reforma da sentença, para suspender as obras de revitalização de fachadas e muros no entorno do condomínio, sob a alegação de superfaturamento e duplicidade.

Consoante regra do art. 333, I, do CPC, incumbe a parte autora com-provar fatos constitutivos do seu direito. Assim, deveria a Autora comprar as alegadas irregularidades no segundo contrato de prestação de serviços de revi-talização de fachada e reboco externo de muro, firmado em 28.10.2013, bem como o superfaturamento das mencionadas obras.

Todavia, após compulsar detidamente os autos, notadamente as atas de assembleias colacionadas pelo Condomínio às fls. 148/199-TJ, concluo, assim como o MM. Juiz a quo, pela inexistência de prova de quaisquer anormalidades no segundo contrato celebrado entre o Condomínio e a Construtora Engemil, para revitalização das fachadas e reboco externo dos muros no entorno do con-domínio.

O art. 1.341, do Código Civil, dispõe que a realização de obras no con-domínio depende:

“I – se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;

II – se úteis, de voto da maioria dos condôminos.

§ 1º As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemen-te de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino.

§ 2º Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imedia-tamente.

§ 3º Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assem-bléia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impe-dimento deste, por qualquer dos condôminos.”

A respeito desta exigência de quorum para realização de obras em con-domínio edilício, leciona Francisco Eduardo Loureiro:

“O princípio da norma é o da exigência de aprovação por maioria inversamente proporcional à indispensabilidade da obra. Quanto menos necessária a obra,

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mais elevado o quorum para sua aprovação. A norma é cogente, de modo que prevalece sobre disposição convencional em sentido contrário, que dispense a maioria absoluta ou qualificada. Nada impede, todavia, que a convenção exija quóruns mais rigorosos do que a lei.”

(Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Coordenador Cezar Peluso. 6. ed. Barueri: Manole, 2012. p. 1379/80)

In casu, as obras previstas no segundo contrato, celebrado em 28.10.2013, de revitalização das fachadas e reboco externo dos muros no entorno do con-domínio, são úteis e necessárias para a conservação da coisa comum, que con-forme afirmado pela síndica em assembleia “os muros se encontram em estado frágil, e as trincas nas paredes dos blocos estão causando problemas de infiltra-ção” (fls. 198-TJ).

Em assim sendo, para sua realização necessária a aprovação da maioria dos condôminos presentes na assembleia convocada para tal finalidade.

E, analisando a convocação para a assembleia a ser realizada no dia 29.09.2013 (fls. 193-TJ), da qual consta como ordem do dia a “pintura das fachadas”, bem como da respectiva ata de fls. 194/195-TJ, verifico que o Con-domínio, ora Apelado, cumpriu as exigências legais.

Consta da primeira ata que:

“Item Pintura das Fachas: Foram apresentados 03 orçamentos e um já com des-conto, porém antes o Condomínio terá que fazer um projeto para a retirada da fiação externa da antena. [...] Ficou decidido por unanimidade que será cobrado a taxa de R$ 64,00 (sessenta e quatro reais) em 24 vezes para pintura das facha-das e mais restauração do muro da rua Roque Barreto e da Expedicionários, a começar e novembro de dois mil e treze.”

A Autora apesar de devidamente convocada, não compareceu a esta as-sembleia, abstendo-se, portanto, do seu direito de votar contra ou a favor da re-alização da obra, bem com de manifestar-se sobre os orçamentos apresentados e do valor da taxa mensal a ser cobrado. Todavia, mesmo não presente, ela se obriga ao que foi deliberado pela maioria dos presentes.

Apenas na assembleia ocorrida em 04.11.2013, o filho da Autora, Sr. Diógenes Pires Figueiredo, compareceu – sem apresentar procuração – im-pugnando a ata anterior, por entender irregular o quórum e a desnecessidade da realização da obra, e insurgindo-se contra o valor do contrato celebrado (fls. 198/199-TJ), sob a alegação de possuir outro orçamento com valor inferior.

Todavia, como dito acima, trata-se de obra necessária para a conser-vação do condomínio, resposta também dada pela síndica em assembleia (fl. 198-TJ), que exige para sua realização a concordância da maioria dos con-dôminos presentes, o que foi devidamente observado.

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Deveria a Autora ter comparecido à assembleia ocorrida no dia 29.09.2013 e manifestado naquela época discordância com o valor dos orça-mentos apresentados, se não o fez, deverá obrigar-se juntamente com os demais condôminos à deliberação tomada naquela assembleia.

Especificamente sobre o tema, valho-me da lição de Antônio José Ferreira Carvalho:

“Lamentamos que na maioria dos condomínios se note, com frequência, um es-vaziamento no plenário das Assembleias, o que permite que um pequeno núme-ro de condôminos presentes tomem decisões muito sérias e que obrigam a todos, em vista da omissão da maioria.

É comum grande número de condôminos deixarem que os seus interesses par-ticulares se sobreponham aos da coletividade, deixando de comparecer, pes-soalmente ou através de procuradores, nas Assembléias-gerais, numa flagrante demonstração de desconhecimento do que seja viver em comunidade.

[...]

Em geral são esses condôminos omissos que após a realização das Assembleias ficam reclamando das decisões ali tomadas, legal e perfeitamente válidas.

É preciso que fique bem claro que as decisões das Assembleias obrigam a todos os condôminos, mesmos os ausentes.

Faz-se necessário uma maior conscientização dos condôminos, no sentido de comparecerem pessoalmente, ou, pelo menos, se fazerem representar nas As-sembleias-gerais.” (O condomínio na prática. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999. p. 37-8)

A Autora não desincumbiu do seu ônus probatório. O valor e objeto – revitalização das fachadas e reboco dos muros do entorno do condomínio – do segundo contrato de fls. 19/26-TJ foram devidamente aprovados em observân-cia ao disposto no art. 1.341, II, do Código Civil.

Não existe duplicidade de obras como faz crer a Autora, pois como já afirmei quando do julgamento do Agravo de Instrumento nº 1.0024.14. 015637-3/001, interposto da decisão que indeferiu a liminar para suspensão das obras, os contratos firmados são distintos. O primeiro é refere à construção, chapisco e reboco externo de muro destruído pela Prefeitura de Belo Horizonte, para cumprimento de decisão judicial desfavorável ao Condomínio, proferida em Ação de Desapropriação. Já o segundo contrato é referente à revitalização das fachadas dos blocos e reboco dos muros já existentes e que contornam o condomínio.

Em consulta a ferramenta de navegação “Google Street View” (disponível no endereço eletrônico https://maps.google.com/), pude constatar que o Con-domínio do Edifício Moradas da Pampulha ocupa um quarteirão, com entrada

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pela Rua dos Expedicionários e também pela Rua Roque Barreto Trindade. Ob-servo, ainda, que o Condomínio encontra-se cercado por muros de concreto em ambas as ruas – um deles recentemente construído –, intercalados por cercas de concreto.

Portanto, ao contrário do afirmado pela Autora na petição de fls. 224/229-TJ, que tenta a todo custo suspender as obras, existe sim muros na Rua dos Expedicionários, que, aliás, pela fotografia disponível na mencionada ferramenta, estão sendo rebocados em cumprimento ao contrato celebrado.

Ora, se a Autora discorda de decisão tomada pelos demais condôminos que aprovaram o orçamento apresentado e concordaram com a cobrança da taxa mensal de R$ 64,00, deverá ajuizar ação própria para anulação de as-sembleia, e não afirmar, vagamente, irregularidades no contrato celebrado pelo Condomínio aprovado pela maioria dos condôminos, na tentativa de suspender as obras.

Também poderá a Autora ajuizar Ação de Prestação de Contas, para comprovação de eventual superfaturamento do segundo contrato celebrado en-tre o Condomínio e a Construtora Engemil Soluções em Engenharia, uma vez que nestes autos não comprovou que o valor pactuado estaria acima da média, tampouco que a obra contratada já estaria incluída no primeiro contrato cele-brado.

Neste contexto, acertada a sentença apelada, que julgou improcedentes os pedidos iniciais, reconhecida a regularidade da contratação, nos termos do art. 1.341 do Código Civil.

Por todo o exposto, nego provimento ao recurso, para manter in totum a sentença apelada.

Custas recursais, pela Apelante. Suspensa a exigibilidade, por litigar sob o pálio da justiça gratuita.

Desª Aparecida Grossi (Revisora) – De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Pedro Aleixo – De acordo com o(a) Relator(a).

Súmula: “Negaram provimento ao recurso.”

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do ParanáApelação Cível nº 1522638‑9, do Foro Regional de São José dos Pinhais – Vara da Fazenda PúblicaApelantes: Jorge Armando Maczunga e outroApelado: Município de São José dos PinhaisRelator: Des. Tito Campos de Paula

apelação cível pela parte autora – ação de uSucapIão extraordINÁrIa – SeNteNça de ImprocedêNcIa da demaNda – 1 prelImINar de Não coNHecImeNto do recurSo por deSerção – Não acolHImeNto – 2 mÉrIto do apelo – poSSe do ImÓvel obtIda atravÉS de SuceSSão HeredItÁrIa – Área maIor e exIStêNcIa de outroS HerdeIroS – ImpoSSIbIlIdade de utIlIzar o procedImeNto da uSucapIão para a aQuISIção do domíNIo da Área INdIcada em SubStItuIção ao proceSSo de INveNtÁrIo e partIlHa – SeNteNça maNtIda, aINda Que por fuNdameNto dIverSo – Negado provImeNto ao recurSo.

Vistos.

I – Trata-se de ação de usucapião nº 0006059-24.2013.8.16.0035, ajui-zada por Jorge Armando Maczuga e Regina Grochoski Maczuga, na qual sus-tentam que exercem posse mansa e pacífica, há mais de vinte anos, sobre uma área de terras medindo 1.643,93 m2, localizada na “Costeira do Cupy”, no Município de São José dos Pinhais. Requerem, assim, o reconhecimento da prescrição aquisitiva em seu favor.

Foi proferida sentença (fls. 406/411) que julgou improcedente a deman-da, condenando os requerentes ao pagamento das custas processuais e honorá-rios advocatícios ao patrono do Município de São José dos Pinhais, estes arbi-trados em R$ 1.500,00.

Inconformados, os autores interpuseram recurso de apelação, em cujas razões (fls. 428/435) sustentam, em síntese, que a função social da propriedade foi atendida, especialmente a de caráter ambiental, pois sempre preservaram a mata nativa e a nascente existentes no terreno. Alegam que o fato de os ape-lantes não residirem no imóvel não afeta o animus domini que possuem sobre a área, pois o art. 1.238 do Código Civil não impõe como condição o estabele-cimento de moradia. Argumentam que o exercício de atividade produtiva agrí-cola ou pecuária no terreno é impossível, já que a área está comprometida por questões legais de ordem ambiental. Assim, a função social não pode ser vista apenas do ponto de vista econômico, mas também no viés social e ambiental. Dizem que o fato da área ser inferior ao módulo rural de propriedade na região

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é irrelevante, eis que os apelantes preencheram todos os requisitos necessários à usucapião. Diante disso, requerem a reforma da sentença com a procedência do pedido inicial.

Recebido o recurso no duplo efeito (fl. 447), o Município de São José dos Pinhais apresentou contrarrazões às fls. 457/462, em que argui preliminar de não conhecimento do apelo por conta de deserção, e, no mérito, pugna pela manutenção da decisão de primeiro grau.

É a breve exposição.

II – Voto e sua fundamentação.

Depreende-se dos autos que os requerentes Jorge Armando Maczuga e Regina Grochoski Maczuga sustentam que exercem posse mansa e pacífica, há mais de vinte anos, sobre uma área de terras medindo 1.643,93 m2, localizada na “Costeira do Cupy”, à Rua Luis Grochoski, no Município de São José dos Pinhais. Afirmam que o imóvel não possui matrícula, e que anteriormente se encontrava na posse dos pais da segunda autora, os quais também não possuem documento de domínio do bem. Aduzem que fazem jus à usucapião do imóvel, nos termos do art. 1.238, do Código Civil.

A sentença monocrática julgou improcedente o feito (fls. 406/411), sob o fundamento de que os requerentes deixaram de cumprir a função social da propriedade rural, pois não a tornaram produtiva. Ponderou o magistrado, ain-da, que o terreno é marcado pela presença considerável de área de preserva-ção permanente, e que permitir o fracionamento do solo rural como desejado implicaria na completa descaracterização do local, “servindo de estímulo para o processo de urbanização desenfreado e desmedido, [...] sem olvidar o incre-mento do risco de desmatamento”.

Em suas razões de recurso, os apelantes argumentam que o fato de não residirem no imóvel não afeta o animus domini que possuem sobre a área, pois o art. 1238 do Código Civil não impõe como condição o estabelecimento de moradia no imóvel. Sustentam que a função social não pode ser vista apenas do ponto de vista econômico, mas também no viés social e ambiental, e, nesse aspecto, foi devidamente observada pelos apelantes. Ainda, afirmam que seria impossível o implemento de atividades produtivas no imóvel, já que grande parte dele é constituído por área de preservação ambiental permanente.

O Município de São José dos Pinhais arguiu, em contrarrazões (fls. 457/462), preliminar de não conhecimento do apelo, alegando que o paga-mento das custas não foi comprovado no ato da interposição do recurso, sendo, portanto, deserto. Entretanto, verifica-se às fls. 439/440 a informação no sistema de pagamento das guias de recolhimento de custas, pagamento este ocorrido no

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mesmo dia da interposição do recurso (23.11.2015), razão pela qual a prelimi-nar deve ser rejeitada.

Passa-se, por conseguinte, à análise do mérito do apelo.

Em primeiro lugar, a Constituição Federal consagra, em seu art. 186, que a função social da propriedade rural é cumprida quando atende a certos crité-rios, dentre os quais o de “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente”1.

Por outro lado, a produtividade do terreno rural só é requisito ao defe-rimento da usucapião na modalidade especial, prevista no art. 191 da Consti-tuição Federal, que confere ao possuidor e morador do imóvel produtivo com metragem não superior a cinquenta hectares o “benefício” da redução do prazo prescricional para cinco anos.

Assim, embora a produtividade traga indícios mais contundentes acerca da observância da função social de uma propriedade rural, não se pode atrelar um conceito ao outro.

É certo, ademais, que a jurisprudência majoritária desta Corte entende que a existência de legislação municipal que determine a área e testada míni-mas para o desmembramento de lotes não pode impedir a aquisição da pro-priedade pela usucapião, que é forma originária de aquisição da propriedade imóvel2. Isso porque as exigências administrativas quanto ao desmembramento de lotes se aplicam para os adquirentes de propriedades já existentes, ou seja, apenas quando se trata de aquisição de modo derivado, sendo que a lei munici-pal não pode criar requisitos diversos do Código Civil para a usucapião.

Pois bem. Em que pese tais circunstâncias, verifica-se que a sentença de improcedência da demanda deve ser mantida.

No caso em análise, os requerentes relatam que sua posse se originou da transmissão dos direitos possessórios de Luiz Grochoski, pai da autora Regina Grochoski Maczuga.

Em seu depoimento pessoal (mídia anexa à fl. 03-TJ), a autora afirma que a área era de seus avós, depois passou para seus pais, e seu pai passou a ela e

1 Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.2 TJPR, 17ª C.Cív., RN, 1294920-5, São José dos Pinhais, Rel. Lauri Caetano da Silva, Unânime,

J. 25.03.2015; TJPR, 17ª C.Cív., AC 1213017-5, São José dos Pinhais, Rel. Luis Sérgio Swiech, Unânime, J. 25.03.2015; TJPR, 17ª C.Cív., AC 1181568-8, São José dos Pinhais, Rel. Tito Campos de Paula, Unânime, J. 28.01.2015; etc.

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seus irmãos. Era um terreno maior que foi dividido para os herdeiros, em seis partes, depois que seu pai faleceu. A parte que ficou com ela tem mais mato, não serve para plantação, e a parte das irmãs já é mais ampla. Disse que antes do terreno ser dividido seu pai plantava na área maior, cultivava morangos, alface, repolho, etc. Que depois que ele faleceu o imóvel foi repartido entre os irmãos, que são seis, ficando cada um com um terreno com cerca de mil metros quadrados. A autora não se recorda se há registro da área maior no Incra. Não tem conhecimento se foi feito inventário. Afirmou que o imóvel foi dividido por igual, e que a sua irmã mais velha, que “começou a fazer esse processo” disse que eles iriam fazer por igual, que “para todo mundo vai ficar a mesma quantia do terreno”. Ao ser indagada pelo magistrado se os outros irmãos também mora-vam no imóvel, respondeu que uma das irmãs casou e passou a morar em outro lugar, mas os demais moravam “próximos”.

O autor Jorge, ao prestar depoimento (mídia anexa à fl. 03-TJ), também confirma que a área foi obtida por herança do sogro, e ali já morava o pai de seu sogro, e ficou um pedaço para cada um dos seis irmãos. Que saiba somente a cunhada Josefina também entrou com ação para regularizar o imóvel.

A demanda ajuizada pela outra herdeira, Josefina Mazza, é aquela men-cionada pelo magistrado na fundamentação da sentença (fl. 410) como similar a esta, autuada sob o nº 0004159-40.2012.8.16.0035. E, em consulta ao sistema Projudi, constata-se que se trata de demanda idêntica, sob os mesmos funda-mentos, porém proposta pela irmã da autora e seu marido em relação a lote de terra vizinho.

No presente caso, verifica-se que após o falecimento de Luiz Grochoski a posse do imóvel passou imediatamente aos seus herdeiros legítimos – não se sabe seus nomes ou, inequivocamente, quantos são – e, tendo em vista a ausên-cia de partilha, tal posse ainda pertence à indivisão do espólio.

A ação de usucapião, neste viés, não é o instrumento adequado para o herdeiro postular o reconhecimento do domínio sobre imóvel que deve ser par-tilhado entre todos os herdeiros através de inventário. A propósito:

DIREITO CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – USUCAPIÃO – BEM ADQUIRIDO POR SUCESSÃO HEREDITÁRIA – [...] IMPOSSIBILIDADE – INDEVIDA UTILIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA USUCAPIÃO PARA A AQUISIÇÃO DO DOMÍNIO DA ÁREA INDICADA, EM SUBSTITUIÇÃO AO PROCESSO DE INVENTÁRIO E PARTILHA DO BEM – INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL – CARÊNCIA DE AÇÃO – PROCESSO EXTINTO SEM RESOLU-ÇÃO DE MÉRITO – RECURSO NÃO PROVIDO – Com a abertura da sucessão, estabelece-se uma composse, com a investidura dos herdeiros na posse e no domínio de todo o imóvel, conforme estatuído no art. 1.784, inclusive da área destacada na ação de usucapião, tendo-se como meio hábil à sua extinção e à titularização do domínio o processamento do inventário e da partilha aos herdei-

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ros. Logo, a ação de usucapião não se revela como meio apropriado para a parti-lha e reconhecimento do domínio de bem já adquirido por força de transmissão causa mortis, sendo forçoso concluir pela impossibilidade jurídica, decorrente da impropriedade da via eleita, e pela falta de interesse processual, ensejando a carência de ação e a extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC. (Destacou-se, TJPR, 18ª C.Cív., AC 1057176-3, Foro Regional de Piraquara da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, Rel. Espedito Reis do Amaral, Unânime, J. 12.03.2014)

CIVIL – AÇÃO DE USUCAPIÃO – PEDIDO JULGADO PROCEDENTE – FALTA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE – HER-DEIROS – COMPOSSE – LOTE URBANO INDIVISÍVEL – POSSE SOBRE PARTES IDEAIS EXERCIDAS POR DIVERSOS HERDEIROS – PERMISSÃO DOS HERDEI-ROS PARA CONSTRUÇÃO DE RESIDÊNCIA NO LOTE – ART. 1.208 DO CÓDI-GO CIVIL – AUSÊNCIA DE POSSE AD USUCAPIONEM – RECURSO PROVIDO – ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA INVERTIDO – 1. A ação de usucapião não é o instrumento adequado para o herdeiro postular o reconhecimento do domínio sobre imóvel que deve ser partilhado entre todos os herdeiros. 2. Não é possível o reconhecimento de domínio via usucapião, quando o postulante é herdeiro e pretende a declaração da prescrição aquisitiva sobre parte ideal de imóvel indivi-sível, cuja posse é exercida em conjunto com os demais herdeiros. (Destacou-se, TJPR, 17ª C.Cív., AC 794049-4, Foro Central da Comarca da Região Metropolita-na de Curitiba, Rel. Lauri Caetano da Silva, Unânime, J. 16.11.2011)

Embora pareça crível que a área total do imóvel tenha sido dividida entre todos os herdeiros de Luiz Grochoski, em seis partes iguais, o que se tem nos autos é somente o depoimento dos autores nesse sentido. Não foi juntada a certidão de óbito, tampouco ficou demonstrado quantos herdeiros existem e a sua concordância com os termos da demanda, o que se revela temerário em se tratando de ação que visa à declaração de domínio de bem imóvel.

Além disso, fica nítido do testemunho da autora, na parte em que diz que sua irmã mais velha Josefina estabeleceu, para ajuizar a ação de usucapião, que todos os irmãos ficariam com partes iguais, que a metragem aduzida na inicial decorre de mera conveniência dos herdeiros, e não significa que cada um exer-ça a posse de fato sobre uma parte específica de 1.643,93 m2.

Destaque-se que as certidões juntadas às fls. 15/16, dos Cartórios de Re-gistro de Imóveis de São José dos Pinhais, por óbvio resultariam negativas, já que o imóvel de 1.643,93 m2 com as características constantes na planta e no memorial descritivo resulta de divisão informal entre os herdeiros e pertence a uma área maior, esta sim, possivelmente, com registro e proprietário identifi-cável.

Este Relator diligenciou, inclusive, junto ao Cartório do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição de São José dos Pinhais, e constatou, apenas em nome de Luiz Grochoski, áreas localizadas na Costeira do Cupy/Colônia Mu-

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rici em pelo menos três matrículas diversas (matrícula nº 31852 e transcrições nºs 23221, fl. 249, livro K, e 49.530, fl. 102 do livro 3V), que, juntas, somam quase seis alqueires.

Observou-se, aliás, que a família Grochoski, aí abrangidos os irmãos da autora e também os irmãos de seu pai, com o falecimento dos avós Margarida Grochocki e Antônio Grochoski, é proprietária de parcela considerável de ter-ras na localidade da Costeira do Cupy/Colônia Murici, na qual está inserido o imóvel usucapiendo.

Assim, a forma correta para que os apelantes tentem obter o reconheci-mento da propriedade do imóvel em questão é através do inventário, de cuja abertura não se tem notícia nos autos, de modo que a ação de usucapião não pode ser utilizada a fim de, eventualmente, baratear os custos de transmissão, burlar a exigência legal de comprovação do pagamento de tributos ou even-tualmente prejudicar outros herdeiros.

Portanto, ante a impossibilidade de utilizar a usucapião como substituto ao processo de inventário e partilha do bem, não é possível acolher a insur-gência recursal dos autores, impondo-se a manutenção da sentença que julgou improcedente o pedido inicial.

Conclusão:

Ante o exposto, vota-se por negar provimento ao recurso de apelação interposto.

III – Decisão.

Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em ne-gar provimento ao recurso.

Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator os Excelen-tíssimos Senhores Desembargadores Rui Bacellar Filho e Fernando Paulino da Silva Wolff Filho.

Curitiba, 18 de maio de 2016.

Assinado digitalmente Des. Tito Campos de Paula Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio de JaneiroVigésima Quarta Câmara CívelAgravo Interno na Apelação nº 0287189‑73.2013.8.19.0001Agravantes: MRV Engenharia e Participações S/A, MRL Engenharia e Empreendimentos S/A e Construtora Novolar Ltda.Agravados: Pedro Henrique Sales Costa e Juliana Cristina Paixão Fraga CostaJuízo de Origem: 42ª Vara Cível – Comarca da CapitalRelator: Des. Wilson do Nascimento Reis

agravo INterNo em apelação cível.

Decisão monocrática restou assim ementada:apelação cível – dIreIto do coNSumIdor – ação ordINÁrIa – compra de uNIdade ImobIlIÁrIa – reScISão uNIlateral por parte daS rÉS – SeNteNça de procedêNcIa doS pedIdoS autoraIS – coNdeNação da empreSa rÉ ao pagameNto de daNoS moraIS No Importe de r$ 20.000,00 e à reStItuIção doS valoreS pagoS a título de arraS, em dobro, e “comISSão de corretagem” e “aSSeSSorIa de fINaNcIameNto”, Na forma SImpleS – INcoNformISmo daS empreSaS rÉS – prelImINar de preScrIção da preteNSão afaStada – Não aplIcação do cÓdIgo cIvIl – prazo QuINQueNal, art. 27 do cdc – alegação de IlegItImIdade paSSIva Que Não merece acolHIda – No mÉrIto, SuSteNtam aS rÉS Que o dIStrato Se deu por culpa excluSIva doS autoreS – auSêNcIa de provaS – ÔNuS Imputado a teor do dISpoSItIvo Nº 333, INcISo II do cÓdIgo de proceSSo cIvIl – devolução de arraS Que Se ImpÕe – daNo moral coNfIgurado e fIxado acertadameNte No Importe de r$ 20.000,00 (vINte mIl reaIS)

Como a relação jurídica entre as partes é de consumo, para a prescrição, aplica-se o prazo previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumi-dor, afastando-se a incidência do Código Civil. Quanto à legitimidade, percebe-se a participação das rés da negociação, de forma que recebeu os valores das assessorias, conforme documentos carreados à inicial. A ré não se desincumbiu de provar a existência de fato impeditivo, modifica-tivo ou extintivo do direito da autora, ônus seu, ex vi art. 333, II, do CPC. O apelado tem o direito de reaver a totalidade do valor que despendeu na aquisição do bem, sem quaisquer retenções por parte das apelantes, de modo a receber a reparação integral dos prejuízos sofridos, já que fo-ram as últimas que deram azo à rescisão do contrato. Devolução que se dá em dobro a teor do art. 418 do Código de Processo Civil.

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Recurso a que se nega provimento nos termos do art. 557, caput do código de processo civil.

Recurso Especial nº 1551956/SP submetido à sistemática dos recursos repetitivos. Decisão do relator Paulo de Tarso Sanseverino, lançada na Medida Cautelar nº 25.323/SP, que determina a suspensão em todo país, inclusive em primeiro grau, de todas as ações em trâmite nas quais se discutam as questões de direito que foram objeto da afetação no REsp 1551956/SP e que ainda não tenham recebido solução definitiva, obs-tando a prática de quaisquer atos processuais até o julgamento do recur-so repetitivo. Verifica-se que o superior tribunal de justiça separou para julgamento, questão referente à cobrança de comissão de corretagem, aventada no presente Agravo. Assim, em nome da segurança jurídica e da economia processual, determino a suspensão do processo até o julga-mento final pela instância superior.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Interno, nos autos da Apelação de nº 0287189-73.2013.8.19.0001, em que são agravantes MRV En-genharia e Participações S/A, Engenharia e Empreendimentos S/A e construtora Novolar Ltda. e agravados Pedro Henrique Sales Costa e Juliana Cristina Paixão Fraga Costa.

AcordAm

Os Desembargadores que compõem a Vigésima Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em determinar a suspensão do feito, nos termos do voto do Relator.

Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.

Des. Wilson do Nascimento Reis Relator

i – relAtório

Cuida-se de agravo interno interposto por MRV Engenharia e Participa-ções S/A, Engenharia e Empreendimentos S/A e Construtora Novolar Ltda. obje-tivando a reconsideração da decisão agravada, e, se mantida, que o recurso seja submetido a julgamento pelo Colegiado, pugnando pelo provimento deste para reformar a indigitada decisão hostilizada, alegando, em síntese: (i) a prescrição da pretensão da repetição da “Comissão de Corretagem” e “Taxa de Assesso-ria”; (ii) a ilegitimidade passiva quanto ao pedido de restituição de valores pagos

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a títulos de “Comissão de Corretagem”; (iii) a validade da cláusula contratual que prevê a rescisão do contrato por culpa dos autores, já que estes não assi-naram o contrato de financiamento devido, nem quitaram o saldo devedor de outra forma e a aplicação da multa correspondente; (iv) o direito de retenção dos valores despendidos a título de arras; (v) a possibilidade de retenção de 20% sobre o valor das prestações efetivamente pagas; (vi) a regularidade do paga-mento pelo serviço prestado: “Comissão e Corretagem”; (vii) a inexistência do direito à repetição de indébito; (viii) a ausência de danos morais ou, ao menos, a minoração do quantum indenizatório.

A decisão monocrática, de minha relatoria, proferida em 12.01.2016, ne-gou seguimento ao recurso de apelação interposto, em consonância ao disposto no art. 557, caput, do Código de Processo Civil de 1973, nos seguintes termos:

“APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DO CONSUMIDOR – AÇÃO ORDINÁRIA – COMPRA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA – RESCISÃO UNILATERAL POR PARTE DAS RÉS – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS AUTORAIS – CON-DENAÇÃO DA EMPRESA RÉ AO PAGAMENTO DE DANOS MORAIS NO IM-PORTE DE R$ 20.000,00 E À RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A TÍTULO DE ARRAS, EM DOBRO, E ‘COMISSÃO DE CORRETAGEM’ E ‘ASSESSORIA DE FINANCIAMENTO’, NA FORMA SIMPLES – INCONFORMISMO DAS EMPRE-SAS RÉS – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO AFASTADA – NÃO APLICAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL – PRAZO QUINQUENAL, ART. 27 DO CDC – ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA QUE NÃO MERECE ACOLHIDA – NO MÉRITO, SUSTENTAM AS RÉS QUE O DISTRATO SE DEU POR CULPA EXCLUSIVA DOS AUTORES – AUSÊNCIA DE PROVAS – ÔNUS IMPUTADO A TEOR DO DISPOSITIVO Nº 333, INCISO II DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – DEVOLUÇÃO DE ARRAS QUE SE IMPÕE – DANO MORAL CONFIGURADO E FIXADO ACERTADAMENTE NO IMPORTE DE R$ 20.000,00 (VINTE MIL RE-AIS) – Como a relação jurídica entre as partes é de consumo, para a prescrição, aplica-se o prazo previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, afas-tando-se a incidência do Código Civil. Quanto à legitimidade, percebe-se a parti-cipação das rés da negociação, de forma que recebeu os valores das assessorias, conforme documentos carreados à inicial. A ré não se desincumbiu de provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, ônus seu, ex vi art. 333, II, do CPC. O apelado tem o direito de reaver a totalidade do valor que despendeu na aquisição do bem, sem quaisquer retenções por parte das apelantes, de modo a receber a reparação integral dos prejuízos sofridos, já que foram as últimas que deram azo à rescisão do contrato. Devolução que se dá em dobro a teor do art. 418 do Código de Processo Civil. Recurso a que se nega provimento nos termos do art. 557, caput do código de processo civil.”

I – RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária proposta por Pedro Henrique Sales Costa e Juliana Cristina Paixão Fraga Costa em face de MRL Engenharia E Empreendimentos S/A, MRV Engenharia e Participações S/A e Construtora Novolar S/A.

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Na forma do permissivo regimental, adoto o relatório do juízo sentenciante:

“Ação ordinária, entre as partes qualificadas na inicial, na qual alega a parte autora, em resumo, que em 05104110 firmaram contrato de compra e venda com a 3ª ré para aquisição de unidade imobiliária no empreendimento Fark Renovara, no valor total de R$ 82.337,00, sendo um sinal de R$ 2.337,00 a ser quitado em 19 parcelas de R$ 123,00. Afirmam que dois dias após firmar o contrato com a 3ª ré, a 2ª ré apresentou uma conta de R$ 3.307,00, sendo R$ 2.707,00 para pagamento de ‘Assessoria de Corretagens’ de seus corre-tores autônomos e R$ 600,00 a título de ‘Assessoria de Financiamento’, que deveria ser paga, sob pena de rompimento do contrato. Seguem afirmando que em todas as oportunidades em que foram contatados pelas rés para o for-necimento de documentação a fim de viabilizar o financiamento, atenderam prontamente os pedidos, mas em meados de junho/2013 descobriram que o contrato havia sido cancelado pelas rés e a unidade havia sido vendida para terceiros. Requerem, assim, a condenação das rés a restituir o valor total pago, sendo R$ 3.307,00 na forma simples e R$ 2.337,00 (sinal), em dobro; bem como indenização por dano moral.”

A inicial veio instruída com os documentos de fls. 07/54.

À fl. 57, decisão deferindo a gratuidade de justiça.

Devidamente citada, as rés apresentaram contestação às fls. 64/83, arguindo, preliminarmente a ilegitimidade passiva com relação à taxa de corretagem e ale-gando, no mérito, que a cobrança da taxa de corretagem é legal; a ocorrência da prescrição trienal quanto à cobrança de valores de taxa de corretagem; que o contrato foi distratado não por culpa das rés, mas em razão da inércia dos autores em firmar o contrato de financiamento com o agente financeiro, na forma da cláusula 7, alínea d; a legalidade da restituição parcial do valor pago, nos termos da cláusula 7 do contrato; que pelos termos contratuais, os autores estariam, em verdade, devendo o valor de R$ 4.210,76 às rés, uma vez que a multa pela resci-são é em valor equivalente a 8% do valor total do contrato.

A parte autora ofereceu réplica às fls. 175/176.

Instadas a manifestarem-se em provas (fl. 178), apenas a parte ré falou à fl. 179, informado que não possui outras provas a produzir.

Os autos vieram conclusos para sentença.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

[...] Trata-se de ação indenizatória, na qual a parte autora se insurge contra a rescisão unilateral do contrato por parte da ré, sem qualquer aviso-prévio, bem como contra a cobrança de taxa de corretagem e taxa de assessoria de financia-mentos, também sem um acordo prévio, às quais foram pagas dois dias depois da assinatura do contrato, por receio de que o mesmo fosse rescindido.

Em sua defesa a ré defende a legalidade da cobrança da taxa de corretagem, bem como afirma que o contrato foi rescindido em razão da inércia dos autores em

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firmar o contrato de financiamento com o agente financeiro, na forma da cláusula 7, alínea d.

Contudo, não é isso que se vê dos autos.

Em primeiro lugar, ressalto que à hipótese dos autos não se aplica a prescrição trienal, mas sim a quinquenal, prevista no art. 26 dc CDC.

Quanto aos fatos, verifico da análise dos documentos acostados aos autos que os autores, firmaram contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel com a 3ª ré em 05.04.2010, pelo preço de R$ 82.337,00 para ser quitado através de um sinal de R$ 2.337,00 em entrada e 18 parcelas, ambas de R$ 123,00 e o saldo (R$ 80.000,00) através de financiamento habitacional.

Dois dias depois, se viram os autores obrigados ao pagamento de taxa de corre-tagem no valor de R$ 2.707,00 e taxa de assessoria de financiamento, no valor de R$ 600,00.

Pelo que se vê dos autos, tais valores somente foram apresentados a pagamento aos autores após a formalização do contrato e tal quantia excede ao valor total contratado, o que fere os princípios da boa-fé, transparência e informação, que regem as relações de consumo, motivo pelo qual podem, nesse momento, sei declarados nulos.

Por outro lado, tendo as rés obrigado os autores ao pagamento de taxa de assesso-ria de financiamento, assumiram perante eles uma obrigação de prestar o referido serviço de forma, no mínimo, eficiente.

Contudo, não é isso que se observa nos documentos que instruem a ação.

As rés não cumpriram devidamente o contrato de assessoria de financiamento fir-mado com os réus, mantendo escassos contatos com os mesmos, os quais foram todos atendidos pelos autores.

Não há que se falar, como pretendido na contestação, que os autores se mantive-ram inertes em firmar o contrato de financiamento com o agente financeiro, posto que as rés não provam este fato.

Os documentos juntados pelas rés às fls. 160/164 informam um início de contato com os autores no sentido de viabilizar o financiamento em abril de 2012 e o distrato já em julho de 2012.

Além de se tratar de mera impressão de tela interna, ou seja, um documento produzido unilateralmente, não há nada nos autos que demonstre que os autores tenham sido notificados da possibilidade de distrato, ou ainda, que tenham sido formalmente notificados da ocorrência do mesmo.

Somente no ano seguinte os autores tomaram ciência do distrato realizado pelas rés, ao entrarem em contato com a mesma.

A atuação das rés é irresponsável e desleal, pois os autores nada fizeram que justificasse o cancelamento do contrato, tendo atendido a todas as solicitações das rés e, ao terem o contrato cancelado de forma indevida e sem qualquer aviso--prévio e até mesmo posterior a este ato, os autores viram a oportunidade de ad-

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quirir a casa própria se afastar, pois, como é notório, os imóveis no Rio de Janeiro tiveram um considerável aumento de preços nesta época.

Diante das conclusões alcançadas após o encerramento da instrução, entendo que a parte autora, pelos fatos narrados, passou por constrangimentos que supe-ram o denominado “mero aborrecimento do dia a dia”.

Assim, há dano moral a ser compensado e é pacifico nos tribunais que sua prova revela-se desnecessária uma vez que o referido dano ocorre no interior do indiví-duo, agindo diretamente sob sua psique, sendo a responsabilidade do agente in re ipsa, ou seja, derivada inexoravelmente do próprio fato ofensivo.

[...] O quantum deverá ser fixado cuidadosamente pelo magistrado, não sendo a indenização nem tão grande que se converta em enriquecimento sem causa, e nem tão pequena que se tome inócua convidando o ofensor à reincidência, con-siderando, a extensão do dano e a capacidade econômica do ofensor. Adota-se, ainda nos dias de hoje, a fórmula dos priscos romanos, segundo a qual punitur quia peccatur, et re peccetur, ou, em vernáculo, pune-se porque pecou e para que não peque mais.

Assim, considerando o já exposto e o caráter educativo e punitivo do institu-to, tenho como razoável para compensar o dano moral sofrido a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Merece também acolhimento o pedido de restituição dos valores pagos integral-mente, sendo que a parcela relativa às arras, em dobro, na forma do art. 418 do CC/2002, eis que a rescisão contratual não pode ser imputada aos autores, mas sim às rés.

Prolatada sentença de procedência pelo Juízo da 42ª Vara Cível da Comarca da Capital (INDEXADOR 00201), nos termos que se transcreve a seguir:

“[...] Posto isso, julgo procedente o pedido, condenando as rés, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00, devi-damente corrigido a contar desta data e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a contar da citação; bem como a restituir aos autores o valor pago a titulo de sinal, em dobro, totalizando R$ 4.674,00 e a restituir os valores pagos a título de assessoria de corretagem e assessoria de financiamento de forma simples, deven-do as três verbas ser corrigidas monetariamente a contar de cada desembolso e acrescidas de juros a contar da citação.

Inconformada, os réus apelaram (INDEXADOR 00205) aduzindo, em síntese: (i) a prescrição da pretensão da repetição da ‘Comissão de Corretagem’ e ‘Taxa de Assessoria’; (ii) a ilegitimidade passiva quanto ao pedido de restituição de valores pagos a títulos de ‘Comissão de Corretagem’; (iii) a validade da cláusula contratual que prevê a rescisão do contrato por culpa dos autores; (iv) o direito de retenção dos valores despendidos a título de arras; (v) a ausência de má-fé a justificar a restituição em dobro; (vi) a regularidade do pagamento pelo serviço prestado: ‘Comissão e Corretagem’; e (vii) a ausência de danos morais ou, ao menos, a minoração do quantum indenizatório.”

Contrarrazões em prestígio da sentença (INDEXADOR 00238).

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É o relatório. Passo a decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

Presentes as condições recursais (legitimidade, interesse e possibilidade jurídica) e os pressupostos legais (órgão investido de jurisdição, capacidade recursal das partes e regularidade formal – forma escrita, fundamentação e tempestividade), a apelação deve ser conhecida.

A relação entre as partes é de consumo, uma vez que o autor se enquadra no conceito de consumidor (art. 2º do CDC), e os réus no de fornecedor de serviços (art. 3º do CDC), sendo a responsabilidade do fornecedor de serviços objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, bastando para tanto a demonstração do fato, do dano e do nexo causal, sendo prescindível a presença da culpa.

Inicialmente analiso a prejudicial de prescrição que foi suscitada.

Como existe relação jurídica de consumo entre as partes, como adrede salienta-do, a aplicação do Código Civil fica afastada.

Esse foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no Agravo em Recurso Especial nº 458433, DJe 23.04.2014, cuja Relatoria coube ao eminente Ministro Luis Felipe Salomão. O prazo aplicável é o do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.

A propósito:

“Processo AREsp 458433, Relator(a) Ministro Luis Felipe Salomão, Data da Publicação 23.04.2014. 1. Cuida-se de agravo interposto por Cyrela Minas Empreendimentos Imobiliários Ltda. contra decisão que não admitiu o seu recurso especial, por sua vez manejado em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO – REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES DE CARÊNCIA DE AÇÃO E PRESCRIÇÃO – CLÁUSULA DE ARBITRAGEM – ABUSIVIDADE – RELAÇÃO DE CONSUMO CONTRA-TO DE ADESÃO – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – COMISSÃO DE COR-RETAGEM – VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO – DEVOLUÇÃO EM DOBRO – LUCROS CESSANTES DEVIDOS – DANO MORAL CARACTE-RIZADO – 1. Trata-se de ação indenizatória c/c com pedido de repetição de indébito, em razão de atraso na entrega de imóvel, por falha da ré. 2. Rejeição da preliminar de carência de ação. Cláusula de arbitragem que se reputa abu-siva, uma vez que o contrato é de consumo por adesão, não se conferindo aos aderentes a possibilidade de excluí-la. Prescrição quinquenal inocorren-te, considerando que o contrato firmado em 27.10.2006, e ação ajuizada em 12.05.2011. [...] Nas razões do recurso especial, aponta a parte recorrente ofensa ao disposto nos arts. 267, VII, do Código de Processo Civil, 206, § 3º, V, 402, 724 e 944, parágrafo único, do Código Civil. [...] É o relatório. DE-CIDO. 2. A irresignação não prospera. [...] 3. Quanto à alegada prescrição, pretende o recorrente a aplicação do prazo previsto no art. 206, § 3º, V, do Código Civil. Observa-se, no entanto, que a Corte local se manifestou sobre a prejudicial de prescrição nos seguintes termos: Há que ser afastada ainda

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a prejudicial de prescrição arguida pela ré, tendo em vista que se trata de relação de consumo com base em fato do serviço, de modo que o prazo pres-cricional na hipótese é quinquenal, na forma do art. 26 do Código de Defesa do Consumidor, que deve prevalecer sobre o prazo previsto no Código Civil. Assim, considerando que o negócio foi entabulado em 27.10.2006 e ação ajuizada em 12.05.2011, ainda não havia transcorrido o prazo prescricional aplicável. A propósito: APELAÇÃO CÍVEL – AQUISIÇÃO DE IMÓVEL RESI-DENCIAL – RELAÇÃO DE CONSUMO – PAGAMENTO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM PELOS COMPRADORES PRETENSÃO DE DEVOLUÇÃO DA-QUELE VALOR – AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL – OBRIGAÇÃO QUE ORDINARIAMENTE CABE AO VENDEDOR – VALOR NÃO ABATIDO DO PREÇO DO IMÓVEL – QUESTÃO A SER DECIDIDA PELO JUDICIÁRIO, EMBORA PRESENTE CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA DE ARBITRAGEM – CONTRATO DE ADESÃO – PRESCRIÇÃO ALEGADA APENAS EM SEDE DE APELO, QUE SE AFASTA FATO DO SERVIÇO – PRAZO QUINQUENAL (ART. 27, DO CDC). RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO – VALOR A RESTITUIR CORRIGIDO DE OFÍCIO, POR CONSTATADO ERRO MATERIAL NO DISPOSITIVO DA SENTENÇA. (0025398, 16.2011.8.19.0209, Apela-ção, Des. Ricardo Couto, Julgamento: 02.05.2013, 7ª C.Cív.). Da leitura das razões recursais, observa-se que persiste o fundamento adotado pelo acórdão recorrido para afastar a prescrição no presente caso, qual seja a aplicação do prazo quinquenal previsto no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor. Incidência, portanto, da Súmula nº 283/STF. [...] 7. Ante o exposto, nego provimento ao agravo. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 10 de abril de 2014. Ministro Luis Felipe Salomão Relator.”

Nesse sentido também é o entendimento desta Câmara, in verbis:

“0020712-81.2011.8.19.0208 – Apelação, Desª Regina Lucia Passos, Jul-gamento: 01.07.2015, 24ª C. Cív. CONSUMIDOR – DECISÃO – Apelação Cível. Relação de Consumo. Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenizatória. Contrato de Promessa de Compra e Venda. Alegação de atraso na entrega e de cobrança de valores indevidos. Sentença de parcial procedência. Irresigna-ção que não se sustenta. Preliminar de prescrição rejeitada. Observância do prazo quinquenal, disposto no art. 27 do CDC. O pagamento da comissão de corretagem é de responsabilidade dos vendedores, se não houver disposição legal em contrário ou acordo diverso entre as partes. Necessária, entretanto, a prévia e clara informação ao consumidor de sua responsabilidade pelo paga-mento, quando assim for acordado. Necessidade de abatimento no preço do imóvel. Ausência de comprovação nesse sentido. Contrato de adesão. Viola-ção do Dever de Informação e de Transparência. Condenação à devolução que se impõe. Atraso na entrega do imóvel que restou comprovada. Falha na prestação do serviço configurada, eis que o atraso ultrapassou o prazo de tole-rância. Cumprimento que se dá quando há a averbação do habite-se, momen-to no qual o consumidor poderá adquirir financiamento junto à instituição financeira. Não comprovação de ocorrência de qualquer circunstância que se configure como caso fortuito ou força maior. Incidência da Teoria do Risco do Empreendimento. É firme o entendimento no STJ de que, descumprido o

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prazo para entrega do imóvel objeto do compromisso de compra e venda, é cabível a condenação por lucros cessantes, havendo presunção de prejuízo do promitente-comprador. Entendimento jurisprudencial no sentido da ocor-rência de lesões de ordem psíquica, quando do atraso na entrega de imóvel. Verba indenizatória fixada que não afronta os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade. Adoção de parâmetros até maiores por esta Câmara Es-pecializada. Impossibilidade d majoração ‘à míngua de recuso autoral. Prece-dentes citados: REsp 299.445/PR, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª T., Jul-gado em 17.05.2001, DJ 20.08.2001, p. 477; 0008015-88.2012.8.19.0209, Apelação, JDS. Desª Lucia Glioche, Julgamento: 10.12.2014, 24ª C.Cív. CONSUMIDOR – AgRg-REsp 1202506/RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., Jul-gado em 07.02.2012, DJe 24.02.2012; 0032755-13.2012.8.19.0209, Apela-ção, JDS. Desª Lucia Glioche, Julgamento: 15.04.2015, 24ª C.Cív. CONSU-MIDOR – 0000490-89.2011.8.19.0209, Apelação/Reexame Necessário, Des. Flavio Marcelo de A. Horta Fernandes, Julgamento: 12.03.2015, 24ª C.Cív. CONSUMIDOR – 0033892-30.2012.8.19.0209, Apelação, Des. Peterson Barroso Simão, Julgamento: 26.11.2014, 24ª C.Cív. CONSUMIDOR. DES-PROVIMENTO DO RECURSO.”

“0171213-18.2013.8.19.0001 – Apelação, Sergio Seabra Varella, 24ª C.Cív. CONSUMIDOR – Apelação Cível. Relação de Consumo. Ação de reparação por danos morais e materiais. Instrumento particular de compra e venda de imóvel. Pagamento de comissão de corretagem. Sentença que julgou proce-dente o pedido. Irresignação da parte ré. Agravos retidos de ambas as rés. Re-jeitada a prejudicial de prescrição, visto não ter decorrido o prazo quinquenal previsto no art. 27 do CDC, entre a assinatura do contrato e o ajuizamento desta ação. Precedentes. Alegação de ilegitimidade passiva da segunda ré que não pode ser acolhida, haja vista que participou da negociação, de forma que recebeu, inclusive, várias notas promissórias da parte autora, em seu nome, conforme descrito na inicial. O pedido está amparado em contrato firmado com a primeira apelante, cuja negociação envolveu a segunda apelante, e de-corre da possibilidade de devolução de valores cobrados, alegados indevidos pela parte autora. Portanto, o pedido é possível e tangível. Produção de prova oral desnecessária ao deslinde da ação. Matéria de direito, respaldada em contrato firmado pelas partes. Expressa previsão no contrato de que o com-prador seria responsável pelos pagamentos dos custos decorrentes da comis-são de corretagem, sem qualquer gerência da primeira apelante, sem direito a devolução destes valores. Autor que assinou termo de ciência, no qual decla-ra ter sido informado acerca do pagamento da comissão de corretagem. Com relação ao preço, verifica-se que o valor da comissão de corretagem não foi acrescido ao preço ofertado, mas incluído. Dessa forma, não se verifica abusi-vidade na cláusula referente ao pagamento da comissão de corretagem, uma vez que o consumidor estava ciente do que estava pagando e, inclusive, assi-nou notas promissórias em nome da corretora, segunda apelante, e um termo de ciência e compromisso. Informação suficiente ao consumidor, tendo em vista o termo de ciência assinado pela parte autora, no ato da contratação do negócio. Precedentes. Inexistência de falha na prestação do serviço da parte

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ré. Inocorrência de danos morais. DÁ-SE PROVIMENTO AOS RECURSOS DE APELAÇÃO DAS RÉS, na forma do art. 557, § 1ª-A, do CPC, reformando-se a sentença, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Condenada a parte autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixa-dos em 10% do valor atribuído à causa, ressalvada a Gratuidade de Justiça, concedida à parte autora. Data de julgamento: 16.09.2015.”

Ora, diante das circunstâncias encimadas, é patente que a demanda versa sobre fato do serviço, sendo aplicável, pois, o prazo prescricional quinquenal previsto no art. 27 do diploma consumerista.

Desse modo, considerando que o desembolso, cuja repetição que se persegue, ocorreu no dia 07.04.2010 com o pagamento da comissão de corretagem e as-sessoria de financiamento e a ação foi proposta em 20.08.2013, afastada está a prescrição quinquenal.

Com relação à alegação de ilegitimidade passiva, esta também não pode ser acolhida, haja vista que se vislumbra a participação especificamente da segunda ré na negociação, de forma que recebeu as referidas comissões, consoante se demonstra das declarações carreadas junto à exordial, mormente as que constam a fls. 26 e 27 deste processo eletrônico (INDEXADORES 00026 e 00027).

No mérito, também não assiste razão às Apelantes.

As rés pretendem ver declarada válida a cláusula 7ª do contrato entabulado entre as partes, que prevê multa em razão de distrato, sob a premissa que de a rescisão contratual se deu por culpa exclusiva dos autores que não se movimentaram no sentido de firmar o financiamento devido.

No entanto, não é o que se vê dos autos, como evidenciou, com maestria, o juiz de primeiro grau, salientando que as rés não comprovam este fato.

Para tanto, cabe trazer à baila trecho da sentença proferida no que diz respeito a este ponto:

“Os documentos juntados pelas rés às fls. 160/164 informam um início de contato com os autores no sentido de viabilizar o financiamento em abril de 2012 e o distrato já em julho de 2012.

Além de se tratar de mera impressão de tela interna, ou seja, um documento produzido unilateralmente, não há nada nos autos que demonstre que os autores tenham sido notificados da possibilidade de distrato, ou ainda, que tenham sido formalmente notificados da ocorrência do mesmo.

Somente no ano seguinte os autores torraram ciência do distrato realizado pelas rés, ao entrarem em contato com a mesma.”

Restou claro, no caso em comento, que as apelantes não observaram os deveres decorrentes da boa-fé objetiva, que devem ser observados em todas as fases con-tratuais, notadamente o da transparência das relações de consumo, consubstan-ciado no dever de bem informar, caracterizando o descumprimento do contrato.

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Ademais, a despeito de atribuírem aos autores a responsabilidade pela rescisão do contrato outrora pactuado em razão de terem se mantido inertes na busca pelo financiamento habitacional necessário, não foram capazes de se desincumbirem do ônus da prova inserto no comando previsto no art. 333, inciso II do Código de Processo Civil a elidir a pretensão autoral.

Dessa forma, conclui-se que a ré não se desincumbiu de provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, ônus seu, ex vi art. 333, II, do CPC, apresentando apenas argumentos genéricos.

Neste esteio, torna-se legítima a pretensão da devolução do valor dado como sinal pelo apelado, não se mostrando minimamente razoável que as apelantes retenham qualquer parcela, pois foram elas que deram ensejo à ruptura das ne-gociais preliminares.

O apelado tem o direito de reaver a totalidade do valor que despendeu na aquisi-ção do bem, sem quaisquer retenções por parte das apelantes, de modo a receber a reparação integral dos prejuízos sofridos.

Incide na hipótese, o Verbete Sumular nº 98 deste de Tribunal:

“Na ação de rescisão de negócio jurídico, por culpa do vendedor, cumulada com restituição de parcelas pagas, descabe o abatimento de valores referentes à taxa de administração do empreendimento frustrado, mesmo que destina-das ao pagamento de comissões, intermediações e outras despesas de comer-cialização, devendo a devolução efetivada ao comprador ser plena, de modo a assegurar-lhe o exato recebimento de tudo o que despendeu.”

Sendo assim, o pedido de retenção das arras pelas apelantes também não merece prosperar, porque quem efetivamente descumpriu o contrato foram as próprias, não havendo que se falar em direito de retenção.

Nesse sentido:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RESCISÃO CONTRATUAL – PRO-MESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – ART. 40, § 2º, DA LEI Nº 4.591/1964 – NÃO INCIDÊNCIA – PARTICULARIDADE DO CASO CON-CRETO – INADIMPLEMENTO CONTRATUAL – PARCELAS PAGAS – DEVO-LUÇÃO INTEGRAL – DANO MORAL – CABIMENTO – EXCEPCIONALIDA-DE – 1. Não há ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o Tribunal a quo resolve todas as questões pertinentes ao litígio, afigurando--se dispensável que o órgão julgador examine uma a uma as alegações e os fundamentos expendidos pelas partes. 2. Tendo havido um novo negócio jurídico entre as partes (adquirentes de imóvel da falida Encol e a recorrente) – relação jurídica que, efetivamente, deu ensejo à presente demanda –, a Car-valho Hosken S/A não assume no litígio posição de simples incorporadora ou proprietária do terreno no qual o empreendimento imobiliário seria erguido. Assim, mostra-se inaplicável o art. 40, § 2º, da Lei nº 4.591/1964, que restrin-ge o valor a ser restituído aos promitentes compradores pela incorporadora. Bem por essa razão que o mencionado dispositivo legal não foi prequestiona-do, motivo por que incide a Súmula nº 211/STJ. 3. Se a rescisão do contrato

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de compra e venda decorreu do inadimplemento na entrega do imóvel, des-cabe retenção de percentual pago pelo comprador, devendo a restituição das parcelas ser integral. 4. Muito embora seja sólida a jurisprudência segundo a qual o mero inadimplemento contratual não gera dano moral indenizável, reconhece-se excepcionalmente a possibilidade da condenação, notadamen-te quando estão em discussão bens jurídicos de especial grandeza, como é o direito a moradia. Precedentes. 5. No caso em exame, o contrato foi firmado no ano de 1994, com ajuste de novo termo de compromisso em 1999, mas até a data do ajuizamento da ação – 2005 –, o inadimplemento persistia e o imóvel não havia sido entregue, circunstância que revela bem mais que mero dissabor e autoriza, de fato, a condenação por dano moral. 6. Agravo regi-mental não provido. (AgRg-AREsp 168.231/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 05.08.2014, DJe 12.08.2014)

Assim, considerando-se que a rescisão foi indevida, conclui-se por correta a r. Sentença, na parte que determinou a devolução da quantia já paga pelo consu-midor, sem qualquer abatimento a título de retenção.

Além, dos autos se dessume que a rescisão contratual em análise se deu por culpa exclusiva das rés, cabível, pois, a devolução em dobro pleiteada.

Confirma-se que na presente hipótese, as arras são confirmatórias, devendo-se aplicar o art. 418 do CC que prevê que se a parte que as recebeu der causa à ine-xecução do contrato, poderá quem as deu (a Autora) haver o contrato por desfeito e exigir sua devolução mais o equivalente.

Transcrevo:

“Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regu-larmente estabelecidos, juros e honorários de advogado.”

Por isso, numa interpretação favorável ao consumidor e que tem por paradigma a boa-fé contratual, deve incidir a referida regra do art. 418 do Código Civil aplica-da pelo juízo sentenciante, com o fito de garantir para a parte autora a restituição em dobro do valor que pagou.

Nessa senda, não merece agasalho a tese esgrimada no recurso ora interposto defendendo a ausência de má-fé a justificar a restituição em dobro.

Quanto à alegação de regularidade do pagamento no que se refere à Comissão de Corretagem, esta também não merece prosperar.

Como já afirmado anteriormente, a autora faz jus a devolução das verbas desem-bolsadas previamente, conforme sentença, pois a rescisão contratual não decor-reu de culpa do adquirente, mas por conta do inarredável vício das rés. Portanto, a devolução da integralidade dos valores pagos é devida.

Assim, diante do flagrante inadimplemento, por certo, os autores fazem jus ao desfazimento do negócio jurídico e da devolução integral dos valores pagos por

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um imóvel que jamais virá a integrar o seu patrimônio pessoal, de modo a resta-belecer o status quo ante das partes e evitar a caracterização do enriquecimento sem causa do empreendedor, que sem dúvida tornará a negociá-lo pelo preço de mercado.

Urge frisar ainda, que o dever de pagamento da comissão ora sub judice só foi informado aos autores após a pactuação do contrato, nele não se encontrando inserido, motivo pelo qual, foi acertadamente declaradas nulas as efetivas co-branças pelo juízo a quo.

Por fim, no tocante ao dano moral, é inequívoca a sua configuração. O consumi-dor comprovou estar adimplente com o pagamento das parcelas contratadas, e após anos aguardando a concretização do imóvel, teve sua legítima expectativa e a de sua família nitidamente frustradas.

Embora seja tênue a linha que separa o mero aborrecimento cotidiano das lesões de ordem psíquica, certo é que, no caso em tela, o evento causou transtornos fora do normal ao consumidor, que extrapolaram, em muito, a hipótese de mero abor-recimento cotidiano. Ora, sabe-se que a compra de uma unidade imobiliária, para fins de moradia, como in casu, envolve diversas questões de ordem pessoal, que ultrapassam o valor da venda.

Houve clara frustração da expectativa de aquisição da casa própria, por culpa exclusiva da empresa ré, que efetuou o distrato sem prévia notificação dos au-tores e, ainda, firmou contrato com terceiro para revenda do imóvel. Inegável que tal fato trouxe angústia e apreensão aos autores, frustrando suas legítimas expectativas de, como um casal, compartilharem de uma nova residência. Assim, evidente é a ofensa à incolumidade psíquica e à dignidade dos autores, que me-recem reparação.

Diante disso, são inquestionáveis os danos morais, que no presente caso tem natureza in re ipsa, como se convencionou chamar, visto que está inserido na própria ofensa, decorrente da gravidade do ilícito em si.

Importante frisar, ademais, que o Autor, sofreu cobranças de taxas e comissões sem a devida observância, prejudicando dessa forma, os seus planos iniciais para aquisição do imóvel e frustrando sua expectativa de aquisição do bem.

Relativamente ao quantum indenizatório, o juiz, ao arbitrá-lo, deve estimar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a repro-vabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimen-tado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.

Assim, levando-se em conta as peculiaridades do caso concreto, o imenso cons-trangimento acarretado e a frustração das legítimas expectativas dos comprado-res, que planejaram seu futuro, no sentido de ver realizado o “sonho da casa própria”, programando-se para a entrega das chaves”, cabe quantificar o valor desta lesão extrapatrimonial.

Tal matéria é delicada, ficando sujeita à ponderação do julgador, que deve sem-pre observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, haja vista

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que, embora o art. 5º, inciso V, da Constituição da República tenha assegurado a indenização por dano moral, não estabeleceu os parâmetros para a fixação.

Também devem ser observados, para a fixação da verba, o poder econômico do ofensor, a condição econômica do ofendido, a gravidade da lesão e sua repercus-são, não se podendo olvidar da moderação, para que não haja enriquecimento ilícito ou mesmo desprestígio ao caráter punitivo-pedagógico da indenização.

E, diante dessas circunstâncias, verifica-se que a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), fixada na r. Sentença, atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade sem, contudo, gerar enriquecimento sem causa, razão pela qual, não há de que falar em sua redução, a considerar ainda a presença de dois autores.

Corroborando com o exposto, segue-se entendimento jurisprudencial:

APELAÇÃO CÍVEL – Compra e venda de imóvel termo final para entrega não cumprido. Rescisão unilateral justificada. Devolução integral dos valores pa-gos e danos morais decorrentes dos aborrecimentos sofridos. Esgotamento das vias administrativas. Desídia ou falha procedimental, impondo-se ao con-sumidor o litígio judicial como única alternativa. Danos morais incidentes. Dano in re ipsa, fixados em R$ 10.000,00 para cada autor. Manutenção da sentença. Improvimento dos apelos. (JDS. Des. Marcelo Marinho, Julgamen-to: 26.02.2015, 27ª C.Cív., CONSUMIDOR – 0031507-80.2010.8.19.0209, Apelação)

III – DISPOSITIVO

Diante de tais fundamentos, com base no art. 557, caput, do Código de Processo Civil, nego seguimento ao recurso da Apelante e mantenho a sentença.

Contrarrazões apresentadas (INDEXADOR 000334) pugnando pela manutenção da decisão.

É o relatório do necessário.

ii – voto

O recurso encontra-se tempestivo e com demais pressupostos processu-ais presentes, razões pelas quais dele conheço.

Inicialmente capital ponderar que a relação entre os envoltos na quizila é de consumo, uma vez que a autora se enquadra no conceito de consumidor (art. 2º do Código de Defesa do Consumidor) e a empresa ré no de fornecedora de serviço (art. 3º do mesmo diploma legal).

O recurso encontra-se tempestivo e com demais pressupostos processu-ais presentes, razões pelas quais dele conheço.

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Contudo, o Superior Tribunal de Justiça em decisão monocrática publi-cada em 18.12.2015, no DJe, da Relatoria do Eminente Ministro Paulo de Tarso Sanseverino na Medida Cautelar nº 25.323/SP, determinou a suspensão de to-das as ações nas quais se discutam as questões de direito que foram objeto da afetação no REsp 1551956/SP, a saber:

“MEDIDA CAUTELAR Nº 25.323 – SP (2015/0310781-2)

Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Requerente: Sindicato das Empre-sas de Compra Venda Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Co-merciais de São Paulo, Advogado: Luiz Rodrigues Wambier e Outro(s), Reque-rido: Gafisa S/A, Requerido: Imara Assaf Andere, Decisão: Vistos etc. Trata-se de medida cautelar apresentada por Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo/SP, objetivando o sobrestamento de todos os processos em que se discutem as ques-tões que foram objeto da afetação no REsp 1.551.956/SP, submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, por decisão da minha lavra, ou, sucessivamente atribuição de efeito suspensivo a todos os recursos especiais sobrestados em decorrência da afetação. Em suas razões (fls. 01/32), disse que o sobrestamento determinado nos autos do referido recurso especial, restrito ao processamento dos recursos especiais e dos recursos ordinários (em trâmite nas Turmas Recursais dos Juizados Especiais), não é suficiente para evitar que danos irreparáveis sejam causados às partes envolvidas nos processos abrangidos pela afetação, sobretudo aos incor-poradores imobiliários e empresas do ramo, contra quem deduzidas milhares de pretensões condenatórias e de cuja satisfação poderá dificultar ou, até mesmo, inviabilizar a continuidade de suas atividades. Argumentou que grande parte des-sas ações se encontra em primeiro grau de jurisdição, podendo vir a ser proferidas sentenças ou acórdãos que, desde logo, produzirão efeitos, dado que, em regra, o recurso especial não tem efeito suspensivo, expondo as empresas demandadas a execuções provisórias e, portanto, a atos de constrição e de levantamento de valores. Haveria, ainda, várias ações civis públicas em trâmite, nas quais pedida e, eventualmente, concedida, tutela de urgência, de que pode resultar obstáculo relevante à atividade de corretagem desenvolvida por empresas que atuam nesse seguimento econômico. Conforme alegou, o prosseguimento dessas demandas e, também, das novas ações que diariamente são ajuizadas, sujeita as partes a atos processuais que poderão se revelar inúteis posteriormente, a depender do resul-tado do julgamento do recurso repetitivo, os quais poderiam ser evitados com o sobrestamento de todos os processos, sem restrição do estágio de tramitação, que tenham por objeto controvérsia idêntica, em homenagem ao princípio da econo-mia processual. Defendeu, ademais, uma interpretação teleológica e sistemática da norma do art. 543-C, do CPC, cuja aplicação, sustentou, deve pautar-se pelos princípios da isonomia e efetividade, assegurando-se, assim, homogeneidade de soluções para situações iguais e maior rendimento ao rito dos recursos repetiti-vos. Invocou, por outro lado, a aplicação analógica do art. 328 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, que autoriza ao Relator, quanto ao julga-mento dos recursos extraordinários repetitivos, ‘[...] sobrestar todas as demais causas com questão idêntica’, conforme se verificou em decisões proferidas nos Recursos Extraordinários nºs 626.307/SP, 591.797/SP e no Agravo de Instrumento

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nº 754.745/SP. Por fim, afirmou a viabilidade das teses sustentadas no recurso especial afetado, notadamente a legalidade da cobrança de comissão de corre-tagem do comprador e a incidência do prazo prescricional trienal às pretensões de devolução dos valores referentes a esta comissão. Postulou o deferimento. É o relatório. Passo a decidir. O requerimento formulado deve ser deferido. Con-forme relatado, o julgamento do recurso especial, ao qual vinculada a presente medida cautelar (REsp 1.551.956/SP), foi afetado à Segunda Seção, nos termos do art. 543-C, do CPC, para uniformização do entendimento acerca da (i) prescrição da pretensão de restituição das parcelas pagas a título de comissão de corretagem e de assessoria imobiliária, sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor; e da (ii) validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar comissão de corretagem e Taxa de Assessoria Técnico-Imobiliária (Sati). No despacho de admissibilidade, pro-ferido em maio de 2015, a Presidência da Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao fundamentar a indicação do recurso especial como representativo da controvérsia, nos moldes do § 1º do art. 543-C do CPC e art. 1º da Resolução nº 08/2008 – STJ, já noticiava a tramitação de centenas de ações com fundamento em idêntica questão de direito. O requerente, por sua vez, apre-sentou estimativa recente do número de ações em andamento em que se discute a matéria objeto da afetação, na casa dos milhares, em fases processuais diversas, conforme se infere dos documentos de fls. 66/81. Nesse cenário de pretensões multitudinárias e, considerando o fim precípuo da sistemática processual dos recursos repetitivos – garantia da prestação jurisdicional homogênea, entendo cabível a extensão da suspensão dos recursos especiais e ordinários determinada naqueles autos à tramitação de todos os processos que versem sobre a matéria objeto da afetação e que ainda não tenham recebido solução definitiva. Evita-se, assim, evidente prejuízo às partes e ao judiciário brasileiro, notadamente com a realização de atos processuais que, ao final, poderão se revelar inúteis, bem como se previne a prolação de decisões conflitantes da orientação a ser firmada, a interposição de recursos desnecessários e o levantamento de valores em exe-cuções provisórias. Providência de igual natureza não é novidade nesta Corte, já tendo sido adotada pelos eminentes Ministros Luiz Fux, Sidnei Beneti e Maria Isabel Gallotti, nos autos, respectivamente, do REsp 1060210/SC, da MC 19734/PR e do REsp 1251331/RS, bem como, mais recentemente, nos autos do REsp 1419697/RS, da minha relatoria, todos com o propósito de conferir maior efeti-vidade ao sistema de julgamento de Recursos Representativos de Controvérsia. Ante o exposto, defiro o pedido do requerente para determinar a suspensão em todo país, inclusive em primeiro grau, de todas as ações em trâmite nas quais se discutam as questões de direito que foram objeto da afetação no REsp 1551956/SP e que ainda não tenham recebido solução definitiva, obstando a prática de quaisquer atos processuais até o julgamento do recurso repetitivo. Não há óbice, todavia, para o ajuizamento de novas demandas, mas estas ficarão suspensas no juízo de primeiro grau. Comunique-se ao e. Ministro-Presidente do STJ e aos e. Ministros da Segunda Seção, dando-lhes ciência da presente decisão. Oficie-se, por fim, nos termos supra, ao e. Presidente do Tribunal de origem e aos e. Pre-sidentes dos demais Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, para o devido cumprimento desta decisão. Intimem-se.” (grifos nossos)

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Por conseguinte, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça apartou para julgamento, pela Segunda Seção, pelo rito dos recursos repetitivos, no Re-curso Especial nº 1551956/SP, questão referente à cobrança de comissão de corretagem, aventada no presente agravo.

Nessa vereda, vale trazer decisão deste Egrégio Tribunal de Justiça ali-nhado ao constructo aqui explanado, in verbis:

“0401245-22.2013.8.19.0001, Apelação, 1ª Ementa, Des. Murilo Kieling, Julga-mento: 25.01.2016, 23ª C.Cív., CONSUMIDOR – RECURSO DE APELAÇÃO – RELAÇÃO JURÍDICA DE CONSUMO – INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA – AQUI-SIÇÃO DE UNIDADE RESIDENCIAL – ALEGAÇÃO DE ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS, INCLUINDO O VALOR DE COMISSÃO DE CORRETAGEM E PEDIDO DE VERBA DE DANOS MORAIS – OBRA QUE É ENTREGUE DENTRO DO PRAZO DA CLÁUSULA DE TOLERÂN-CIA DE 180 DIAS – AUTORES QUE SE ENCONTRAVAM INADIMPLENTES COM O PAGAMENTO DAS PARCELAS – RESCISÃO CONTRATUAL EM RAZÃO DA INADIMPLÊNCIA DOS AUTORES – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL EM RELAÇÃO À INCORPORADORA RÉ – FUNDAMENTAÇÃO NO SENTIDO DE QUE A RETENÇÃO DE VALORES POR PARTE DA INCORPORADORA NÃO DEVE ULTRAPASSAR O PERCENTUAL DE 25% – DISPOSITIVO DA SENTENÇA QUE DETERMINA A INCORPORADORA DEVOLVER AOS AUTORES O PER-CENTUAL DE 25% DOS VALORES PAGOS, EXCLUINDO-SE O VALOR DE CO-MISSÃO DE CORRETAGEM – RECURSO ESPECIAL Nº 1551956/SP SUBMETI-DO À SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS – DECISÃO DO EMINENTE MINISTRO RELATOR PAULO DE TARSO SANSEVERINO, LANÇADA NA ME-DIDA CAUTELAR Nº 25.323/SP, DETERMINANDO A SUSPENSÃO EM TODO PAÍS, INCLUSIVE EM PRIMEIRO GRAU, DE TODAS AS AÇÕES EM TRÂMITE NAS QUAIS SE DISCUTAM AS QUESTÕES DE DIREITO QUE FORAM OBJETO DA AFETAÇÃO NO RESP 1551956/SP E QUE AINDA NÃO TENHAM RECEBI-DO SOLUÇÃO DEFINITIVA, OBSTANDO A PRÁTICA DE QUAISQUER ATOS PROCESSUAIS ATÉ O JULGAMENTO DO RECURSO REPETITIVO – EM NOME DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA ECONOMIA PROCESSUAL, DETERMINO A SUSPENSÃO DO PROCESSO ATÉ FINAL DECISÃO E DETERMINAÇÃO DA INS-TÂNCIA SUPERIOR.

Assim, em nome da segurança jurídica e da economia processual, deve--se suspender o processo até decisão final da instância superior.

Pelo exposto, determino a suspensão do feito, até o julgamento definitivo do REsp 1551956/SP, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.

Rio de Janeiro, na data da assinatura digital.

Des. Wilson do nascimento Reis Relator

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do SulApelação Cível nº 70067068908Nº CNJ: 0392268‑68.2015.8.21.7000Décima Sétima Câmara CívelComarca de SapirangaApelante: Ministério PúblicoApelado: Município de Sapiranga

apelação cível – competêNcIa INterNa – embargoS à execução de termoS de ajuStameNto de coNduta – dIreIto urbaNíStIco – parcelameNto do Solo urbaNo – regularIzação de loteameNto – SubclaSSe dIreIto pÚblIco Não eSpecIfIcado

Discutindo-se, em ação de execução de Termos de Ajustamento de Con-duta, a obrigação do ente público quanto à regularização de loteamento urbano, forte na Lei nº 6.766/1979 (Lei do Parcelamento do Solo Ur-bano), é devida a inserção do recurso na subclasse direito público não especificado.

Suscitado conflito de competência em decisão monocrática.

decisão monocrÁticA

Vistos.

Recebi os autos após declinação de competência da 4ª Câmara Cível, no entanto, estou a suscitar conflito.

Trata-se de embargos à execução de Termo de Ajustamento de Conduta, celebrado em 20.04.2006, para regularização de loteamento urbano denomi-nado Povo Feliz, localizado no município de Sapiranga. O Parecer do Minis-tério Público às fls. 192-194, elaborado pelo Ilustre Procurador de Justiça Luiz Achylles Petiz Bardou, bem demonstra o caráter público da demanda (fls. 192-194).

Nesse norte, considerando que a discussão está em torno da obrigação do ente público e do loteador quanto à regularização de loteamento urbano, forte na Lei nº 6.766/1979 (Lei do Parcelamento do Solo Urbano), envolvendo direito urbanístico, é devida a inserção do recurso na subclasse “direito público não especificado”.

Vejam-se recentes precedentes de casos análogos, julgados pelas Câma-ras competentes:

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AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LOTEAMENTO IRRE-GULAR – RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO – DESCABIMENTO DO CHA-MAMENTO A JUÍZO DA UNIÃO E DOS MORADORES DA ÁREA – Compete ao Município promover o adequado ordenamento territorial, mediante o controle do uso e parcelamento do solo urbano, por isso, tem o dever de regularizar o lotea-mento irregular (art. 40 da Lei nº 6.766/1999). A ação visa compelir ao Município a regularizar ocupação de área urbana. Não se tratando de demanda visando à retomada da área, é descabido o chamamento da União e dos moradores da área, por não se configurar nenhuma das hipóteses do art. 77 do CPC. Agravo des-provido. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70066500943, 21ª C.Cív., Rel. Marco Aurélio Heinz, Julgado em 17.12.2015)

PARCELAMENTO DO SOLO URBANO – RESPONSABILIDADE DO LOTEADOR PELO LOTEAMENTO/DESMEMBRAMENTO IRREGULAR – SITUAÇÃO CON-SOLIDADA QUE NÃO O EXIME DE OBSERVAR A LEGISLAÇÃO FEDERAL E MUNICIPAL APLICÁVEL À ESPÉCIE – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA – EXCLUSÃO DA MULTA FIXADA PARA A HIPÓTESE DE DESCUMPRIMEN-TO DO JULGADO – DESCABIMENTO, SENDO VIÁVEL SUA CONSOLIDAÇÃO NO TEMPO – DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO – APELO PARCIALMENTE PROVIDO, PARA A CONSOLIDAÇÃO DA MULTA NO TEMPO. (TJRS, Apelação Cível nº 70024387854, 22ª C.Cív., Rel. Maria Claudia Cachapuz, Julgado em 26.11.2015)

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO PÚBLICO – LOTEAMENTO IRREGULAR – PAR-CELAMENTO DO SOLO – PRESCRIÇÃO – Não se há falar em ocorrência do instituto, uma vez que o parcelamento irregular do solo urbano, sem que seja regularizada a situação, consubstancia-se em infração omissiva de caráter perma-nente, ou seja, pode-se dizer que a ilegalidade do loteamento é renovada a cada instante. RESPONSABILIDADE DOS LOTEADORES – Incontroversa a existência de loteamento irregular, tendo os loteadores dividido a área em lotes, vendendo--os sem o devido projeto de parcelamento, tampouco registros individualizados e sequer providenciar a infraestrutura do local. Reconhecimento da responsa-bilidade de regularização do loteamento, custeando e promovendo as obras de infraestrutura mínimas exigidas pela legislação em vigor. Inteligência da Lei nº 6.766/1979. MULTA DIÁRIA. Astreintes arbitradas como forma de compelir os recorrentes a cumprir a obrigação, sendo o prazo adequado para promover a formalização do pedido de regularização do loteamento e a efetivação das obras estruturais. Sentença mantida. Negaram provimento ao recurso. Unânime. (TJRS, Apelação Cível nº 70065432510, 22ª C.Cív., Relª Laura Louzada Jaccottet, Jul-gado em 04.11.2015)

Com essas considerações, suscito conflito de competência, entendendo que o recurso deve permanecer na subclasse “direito público não especifica-do”, sob a Relatoria do Des. Francesco Conti.

Porto Alegre, 18 de maio de 2016.

Desª Liége Puricelli Pires, Relatora

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de Santa CatarinaProcesso: 0019699‑75.2016.8.24.0000 (Acórdão)Relator: Gilberto Gomes de OliveiraOrigem: CapitalÓrgão Julgador: Terceira Câmara de Direito CivilClasse: Agravo de InstrumentoAgravo de Instrumento nº 0019699‑75.2016.8.24.0000Relator: Desembargador Gilberto Gomes de Oliveira

deSpejo – vagaS de garagem – lImINar coNcedIda – preteNSão do locatÁrIo de reforma da decISão porQue o locador deSeja explorar o meSmo ramo comercIal – INexIStêNcIa de vedação à dISpoSIção do bem pelo proprIetÁrIo/locador – ImpoSSIbIlIdade, ademaIS, de utIlIzação dIverSa

Inexiste qualquer limitação ao direito do proprietário de determinado bem de dispor dele como melhor lhe aprover, na medida em que o lo-catário não preenche os requisitos do art. 51 da Lei nº 8.245/1991 para postular a renovação.

Ademais, não há como pretender-se a utilização comercial de vinte e cinco vagas de garagem em edifício comercial – o objeto da locação – de maneira diversa daquela explorada pelo locatário (estacionamento rotativo).

Agravo a que se nega provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 0019699-75.2016.8.24.0000, da comarca da Capital 3ª Vara Cível em que é Agravante Claudenir Araldi – ME e Agravado Eunice Luz de Andrade.

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, negar provimento ao agravo, nos termos do voto do relator. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Marcus Túlio Sartorato.

Florianópolis, 24 de maio de 2016.

Desembargador Gilberto Gomes de Oliveira Relator

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relAtório

Trata-se de agravo, por instrumento, interposto por Claudenir Araldi – ME da decisão, do Juízo de Direito da 3ª Vara Cível da comarca da Capital, que, na ação de despejo promovida por Eunice Luz de Andrade, deferiu o pedido desalijatório liminarmente.

Expôs que celebrou contrato verbal de locação de vinte e cinco vagas de garagem em dezembro/2012 e que, depois que se consolidou no mercado, intenta a agravada desocupação do bem para que passe a explorar comercial-mente o bem também mediante funcionamento de estacionamento rotativo.

Defendeu que houve malícia por parte da agravada, e não a boa-fé que se espera nas relações negociais, e que a antecipação dos efeitos da tutela, neste caso, tem perigo de irreversibilidade.

Requereu a concessão de efeito suspensivo de modo a prevenir dano irreparável ou de difícil reparação.

Negado o efeito suspensivo pretendido (fls. 29/30), a agravada apresen-tou contrarrazões às fls. 34/61, oportunidade em que defendeu a higidez da decisão vergastada.

Este é o relatório.

voto

1. Presentes os pressupostos admissibilidade, conheço do recurso.

Oportuno consignar que, em sede de recurso de agravo de instrumento, cabe ao Relator tão somente a análise da questão no que diz respeito ao acerto ou desacerto da decisão recorrida sem, contudo, esgotar a discussão da matéria, sob pena de supressão de instância.

2. Pretende o agravante a reforma da decisão que deferiu o despejo do imóvel locado, uma vez que explora a atividade comercial no local há cerca de três anos e nunca descumpriu suas obrigações.

Compulsando os autos, verifica-se que a relação locatícia foi firmada mediante contrato verbal desde dezembro/2012 e desempenhou a atividade comercial de estacionamento das vagas alugadas, inclusive com a ações para captação de clientela nos arredores.

Reclama o agravante que, depois que se consolidou no mercado, intenta a agravada a desocupação do bem para que esta passe a explorar comercial-mente o bem mediante funcionamento de estacionamento rotativo.

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Primeiramente, é bom que se diga que não há como buscar limitar o di-reito do proprietário de dispor do bem que lhe pertence, de modo que não cabe à parte agravante, após cumprimento de legítima notificação premonitória, pre-tender impedir que o proprietário utilize o bem como melhor lhe aprouver.

Além disso, o bem em questão consiste em vinte e cinco vagas de gara-gem no prédio Royal Business Center, de modo que simplesmente não há como pretender que a parte agravada explore o imóvel comercialmente de outra ma-neira que não mediante estacionamento rotativo.

A questão aquilatada com precisão e objetividade na decisão monocrá-tica da lavra do Des. Artur Jenichen Filho (fls. 29/30), cujo excerto adoto como razão de decidir:

Ela aduz que em dezembro de 2012 realizou contrato verbal com a parte agrava-da, tendo com objeto o aluguel de vinte cinco vagas de garagem, com o objetivo de explorá-las comercialmente.

Afirma que sempre adimpliu a obrigação tempestivamente, despendeu muitos esforços para angariar clientela, e que a intenção da parte agravada agora é a de retomar o imóvel para explorar o mesmo ramo.

Assim, afirma que ao requerer a devolução do imóvel com esses fins, o locador não age com boa-fé.

No entanto, não há previsão legal que limite os destinos dado ao imóvel pelo proprietário após a retomada do imóvel.

Ademais, não há provas nos autos sobre a intenção da parte agravada.

Diante deste quadro, presentes os requisitos para a medida desalijatória limi-narmente e ausentes os pressupostos legais para fundamentar eventual pedido renovatório (art. 51 da Lei nº 8.245/1991).

Não bastasse, inexiste prova do alegado perigo de irreversibilidade do provimento antecipado pois, se determinada a manutenção da locação, basta que o agravante assuma as vinte e cinco vagas de garagem para dar andamento à atividade comercial anteriormente desenvolvida.

3. Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento interposto, confirmar a decisão monocrática de fls. 29/30 e manter inalterada a decisão recorrida.

Este é o voto.

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Parte Geral – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de São PauloConselho Superior da MagistraturaProcesso nº 0010745‑35.2014.8.26.0071Apelação nº 0010745‑35.2014.8.26.0071Apelante: Sérgio Augusto RossettoApelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de BauruVoto nº 29.199

regIStro de ImÓveIS

Dúvida. Complementação do título após sua prenotação. Impossibilida-de. Dúvida prejudicada. Exame, em tese, das exigências impugnadas a fim de orientar eventuais novas qualificações. Carta de Arrematação que afronta o princípio da continuidade. Tempus regit actum. Recurso não conhecido.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a r. decisão de fls. 111/115, que manteve a recusa do 1º Oficial de Registro de Imóveis e Ane-xos da Comarca de Bauru referente ao ingresso no fólio real de Carta de Arre-matação.

Alega o recorrente, em suma, que à época da arrematação não havia penhora alguma registrada na matrícula do imóvel, tendo sido esta arrematação a primeira ocorrida, fruto da primeira penhora do imóvel. Afirma, ainda, que foi determinado judicialmente o cancelamento da arrematação registrada sob o nº 20 da matrícula e que decisão da justiça federal não pode anular arrematação oriunda da vara da Fazenda Estadual.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo não conhecimento do recur-so ou, no mérito, pelo não provimento.

É o relatório.

De início, cumpre observar que a dúvida encontra-se prejudicada.

Sérgio Augusto Rossetto pretende registrar carta de arrematação expedida pela 1ª Vara da Fazenda de Bauru – processo nº 071.01.1997.005333-4.

O título foi apresentado a registro ao 1º Oficial de Registro de Imóveis de Bauru por três vezes, em 18.11.2011, em 03.12.2012 e em 31.03.2014, geran-do as notas devolutivas de nºs 5.646 (fl. 15), 6.795 (fl. 16) e 9.560.

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Suscitada dúvida, o interessado no registro juntou novos documentos (fls. 95/99 e 105/108) com o fim de demonstrar a existência de pedidos de levantamento de penhora, conforme exigência contida na nota devolutiva nº 5.646.

Ocorre que o título, depois de prenotado, não pode ser complementado por documentos, sob pena de prejudicar a dúvida, conforme entendimento des-te Conselho Superior da Magistratura:

“Evidencia-se, de modo incontroverso, que o original do título registrando deixou de ser apresentado tempestivamente, o que não fica suprido ou convalidado (ao contrário do entendimento exposto pela digna Juíza Corregedora Permanente às fls. 45 e 153) com uma posterior juntada no curso do procedimento (aqui verifi-cada às fls. 53/151). Acerca da hipótese, este Conselho já tem posição firmada, o que se verifica na Apelação Cível nº 43.728-0/7: ‘Pacífica a jurisprudência deste Colendo Conselho Superior da Magistratura no sentido da necessidade de apresentação do título original, como decidido na apelação cível nº 30.728-0/7 da Comarca de Ribeirão Preto.’ Como se nota do mesmo julgado, incabível é a complementação documental no curso do procedimento de dúvida: ‘[...] o requisito da exibição imediata do original diz respeito ao direito obtido com a prenotação do título, direito que não enseja prazo reflexo de saneamento extra-judicial de deficiências da documentação apresentada’. Prossegue-se: ‘Se fosse admitido cumprir exigência durante o procedimento, estaria aberto caminho para uma injusta prorrogação do prazo da prenotação que, muita vez, viria em pre-juízo dos eventuais detentores de títulos contraditórios.’ No mesmo sentido, o decidido nas Apelações Cíveis nºs 441-0, 2.177-0, 4.258-0, 4.283-0, 8.235-0, 8.705-0/6, 8.926-0/4, 10.483-0/1, 10.961-0/3, 12.439-0/6, 13.820-0/2, 16.680-0/4, 17.542-0/2, 17.586-0/2, 18.427-0/5, 73.868-0/0 e 74.974-0/0.” (Apelação Cível nº 0000002-61.2010.8.26.0602, grifou-se)

Portanto, o título – com os documentos que o formam – deve ser apresen-tado de uma só vez, não se admitindo complementação depois da prestação, sob pena de ensejar indevida prorrogação do prazo da prenotação em prejuízo de eventuais detentores de títulos contraditórios.

É importante observar que a vedação incide tanto no caso em que a juntada do documento ocorre para apresentar a via original do título prenotado quanto no que se pretende a juntada de documentos a fim de complementar o título prenotado, hipótese em exame.

Vale destacar, ainda, que os documentos apresentados a destempo não passaram pelo crivo do Oficial de Registro de Imóveis, de modo que também o princípio da instância restaria violado caso se aceitasse a complementação documental.

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Assim, prejudicada a dúvida, o recurso não pode ser conhecido, o que não impede o exame – em tese – das exigências impugnadas a fim de orientar futura prenotação.

Neste ponto, vale destacar que referido exame em nada se confunde com “consulta” na exata medida em que há situação concreta em discussão nos au-tos, qual seja, os motivos pelos quais ao título foi negado o registro.

O fato de o título ter sido apresentado em cópia ou o interessado ter impugnado apenas parte das exigências, concordado com algumas delas ou, ainda, juntado documentos para cumpri-las durante o trâmite da dúvida não faz desaparecer a questão concreta existente e debatida nos autos, transformando-a em consulta.

Em outras palavras, a ausência de um dos requisitos que permitem o exa-me do mérito da dúvida não a converte em consulta.

A hipótese é, portanto, de exame em tese de caso concreto e não caso em tese, o que é diferente.

A análise das exigências desde logo representa, ainda, importante instru-mento de pacificação social e de contenção de distribuição de ações desneces-sárias ao Judiciário.

É que o exame das exigências na dúvida prejudicada já serve de guia, de norte, tanto para o registrador quanto para o interessado no registro. Pode--se citar o caso do título apresentado em cópia. Suponha-se que a qualificação do registrador seja flagrantemente contrária à jurisprudência do C. Conselho Superior da Magistratura. Por que não esclarecer, desde logo, que, apresentada a via original do título – cuja autenticidade ficará a cargo do registrador quan-do da reapresentação para nova qualificação –, o registro deverá ser efetivado (isso, claro, desde que não ocorra superveniência de fato impeditivo)? Por que submeter o interessado a novo processo de dúvida?

Não há razão jurídica – nem prática – para se furtar à realidade e sim-plesmente “não conhecer do recurso” sem examinar o caso concreto posto, obrigando o interessado a ajuizar nova dúvida registral, cujo desfecho será o mesmo.

Há ainda outro aspecto a ser mencionado. Em virtude de suas peculiari-dades e da não obrigatoriedade da participação de advogado, diversas são as dúvidas registrais que terminam sendo julgadas prejudicadas.

Se este C. Conselho Superior da Magistratura deixar de examinar as ques-tões concretas existentes nos autos das dúvidas prejudicadas, dará causa, ainda, a uma injustificada estagnação registral, haja vista que diversas questões regis-trais importantes e novas foram e têm sido resolvidas em dúvidas prejudicadas,

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podendo-se citar, recentemente, o caso paradigma de regularização fundiária, cujo v. acórdão, embora não tenha conhecido do recurso, fez longo exame do novo panorama da regularização fundiária trazido pela Lei nº 11.977/2009, que serviu de base para a subsequente edição do Provimento CG nº 18/2012, que já possibilitou a regularização de milhares de imóveis.

Por todos esses motivos é que, sempre respeitado o entendimento diver-so, a prejudicialidade da dúvida não impede o exame em tese das exigências, como se passa a fazer.

Inicialmente, é necessário ressaltar que a origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral, ainda que limitada aos requisitos formais do título e sua adequação aos princípios registrais, conforme o disposto no item 119, do Cap. XX, das NSCGJ.

O Egrégio Conselho Superior da Magistratura tem decidido, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial.

O recorrente busca o registro de carta de arrematação expedida nos autos da Execução nº 071.01.1997.005333-4, referente ao imóvel objetiva matrícula nº 50.103 do 1º Registro de Imóveis da Comarca de Bauru.

O título já foi apresentado ao registro de imóveis por três vezes.

Na primeira, para exame e cálculo, sobreveio a notícia de que não seria registrado por haver penhoras na matrícula em favor da Fazenda Nacional, que tornaram o imóvel indisponível.

Na segunda, feita após praticamente um ano, o título foi recusado por-que, nesse meio tempo, sobreveio o registro de outra carta de arrematação em favor de outras pessoas (R.20 – fls. 66v/67).

Na terceira (prenotação de 31.03.2014) – cuja nota devolutiva ora se examina – o registro foi novamente recusado, tendo o registrador ponderado que a decisão de 23.05.12, da 3ª Vara Federal de Bauru, declarou a ineficácia do R.20, da matrícula nº 50.103, mas não determinou o registro do título do ora recorrente. Ressalvou o registrador, ainda, que, em 01.04.2014, foi prenotado o ofício nº 30/2014, da 3ª Vara Federal do qual consta: a) o cancelamento do R.20, da matrícula nº 50.103; b) a manutenção do levantamento das penhoras constantes das averbações nºs 15 e 21; e c) a validade e eficácia apenas da ar-rematação realizada nos autos nº 2004.61.08.003085-42 em favor de Emerson Minhon Villa Nova, de modo que a arrematação do ora recorrente foi declarada ineficaz (fl. 13).

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Extrai-se da nota devolutiva que há dois títulos contraditórios prenotados (carta de arrematação do recorrente e o ofício nº 30/2014 da 3ª Vara Federal de Bauru).

Como o do recorrente tem o número de protocolo mais baixo, deve o re-gistrador, em obediência ao princípio da prioridade (art. 186, da LRP), examiná--lo para, uma vez cessados os efeitos desta prenotação, proceder-se à qualifica-ção do seguinte (ofício judicial), cuja prenotação encontra-se suspensa.

Isto significa que o teor do Ofício Judicial (protocolo nº 28.190) em nada deve interferir na qualificação da carta de sentença apresentada pelo recorrente, que deve ser feita à luz da atual situação registral.

O título do recorrente consiste numa carta de arrematação extraída dos autos da execução movida pela Fazenda do Estado de São Paulo contra a exe-cutada Balance Car do Brasil, por meio da qual adquire o imóvel descrito na matrícula, nº 50.103, do 1º Registro de Imóveis de Bauru.

Ocorre que, atualmente, a executada Balance Car do Brasil não figu-ra mais como titular de domínio de referido imóvel. De acordo com o R.20, da matrícula, o imóvel foi arrematado por Mareia Regina Aquilante e Rodrigo Ângelo Vediani (fls. 66v/67).

Verifica-se, assim, que aquele que no título figura como alienante do do-mínio não mais consta como seu titular no Registro de Imóveis. Essa divergência de titularidade dominial demonstra a impossibilidade do registro pretendido, porque em descompasso com o princípio da continuidade registral, previsto no art. 195 da Lei nº 6.015/1973:

Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.

A recusa do registrador, por conseguinte, está correta e bem amparada legalmente.

Vale lembrar que, nos registros públicos, vigora o princípio tempus regit actum, de modo que a qualificação do título segue as regras vigentes ao tem-po de sua apresentação a registro. Assim, é indiferente que, à época em que expedido o título do recorrente não houvesse penhoras em favor da Fazenda Nacional ou que o imóvel ainda estivesse registrado em nome do devedor na execução movida pela Fazenda Estadual.

Leva-se em conta a realidade atual da matrícula e, de acordo com esta, o imóvel encontra-se registrado em nome de terceiros, o que obsta o registro pretendido pelo recorrente.

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Cabe observar que o ofício nº 30/2014, da 3ª Vara Federal de Bauru, ainda não foi qualificado pelo registrador porque aguarda o término dos efeitos da presente prenotação, descabendo qualquer consideração antecipada a seu respeito.

Assim, não há como considerar, para a qualificação do título do recor-rente, o cancelamento do R.20 previsto em referido ofício que, em tese, supri-miria o óbice ao registro da carta de arrematação expedida em seu favor.

Aliás, o ofício em questão traz, além do cancelamento do R.20, outros pontos decididos pelo Juízo da 3ª Vara Federal de Bauru – um deles sobre a eficácia apenas da arrematação feita por terceiro (Emerson Minhon Villa Nova) – que hão de ser analisados em conjunto pelo registrador quando da qualifica-ção pendente.

Por fim, em relação à decisão da 3ª Vara Federal de Bauru (fl. 22), que foi apresentada em cópia simples juntamente com o título do recorrente, observe--se que, além de genérica, pois não diz a que arrematação se refere, não consti-tui título hábil para os fins do art. 221, IV, da Lei nº 6.015/1973, que exige, nos casos de títulos oriundos do Poder Judiciário, que se trate de carta de sentença, formal de partilha, certidão ou mandado extraído de autos de processo.

Ante o exposto, prejudicada a dúvida, não conheço do recurso.

Manoel de Queiroz Pereira Calças Corregedor-Geral da Justiça e Relator

Tribunal de Justiça do Estado de São PauloConselho Superior da Magistratura,Apelação nº 0010745‑35.2014.8.26.0071 – SemaDúvida de registro

voto vencido (voto nº 37.946)

1. Registro, à partida, o melhor de meus respeitos pelo eminente Rela-tor da espécie, o Corregedor Geral da Justiça de São Paulo, Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, justa vaidade da Magistratura paulista.

2. Sem embargo, da veniam, não me persuado da pertinência de, com decidir prejudicado o exame de dado recurso interposto em processo de dú-vida registrai, tal o caso destes autos, possa a Turma Julgadora prosseguir na apreciação da matéria de fundo e expedir um adendo de mérito de que não sei exatamente a natureza jurídica.

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3. Não se trata, para já, de mera questão processual, bastante embora fosse isto e de toda a sorte a recomendar que não se prosseguisse na análise de uma impugnação recursal que se tem por prejudicada.

4. Que espécie de decisão é esta, com efeito, que se adota, pela Turma Julgadora, na sequência da declaração do prejuízo recursório? Trata-se de mera recomendação? Ou orientação? Ou será uma determinação para caso futuro eventual?

5. Não vislumbro como possa, todavia e de logo, o egrégio Conselho Superior da Magistratura bandeirante recomendar, orientar ou determinar para situação futura e, por óbvio, contingente, quando a autoridade administrativa superior em matéria de registros públicos no Estado de São Paulo é o Correge-dor-Geral da Justiça paulista e não aquele Conselho. É dizer, a soberania admi-nistrativa, o poder de decidir em última instância administrativa, é neste campo o do Corregedor e não do Colegiado.

O que o Conselho pode decidir é só quanto ao caso específico e em ato alçado por meio de recurso no processo de dúvida. Se não vier assim, o caso só pode ser apreciado e decidido pelo Corregedor, não pelo Conselho.

6. Mas que valor jurídico deve atribuir-se a este versado adendo de mé-rito posterior ao reconhecimento do prejuízo recursal?

Se é recomendação ou orientação, não obriga o registrador, nem o cor-regedor permanente. Se é determinação, opera de modo supressivo do dever de qualificação jurídica inaugural pelo próprio registrador e inibe ainda a possibili-dade de o juiz de primeiro grau decidir, de futuro, com independência jurídica.

7. Além disso, como se haverá de impor esse adendo a ulteriores compo-sições do Conselho Superior da Magistratura? Será também uma recomendação ao próprio Conselho para seguir esse adendo? Ou isto lhe será imposto? Esse adendo preclude?

(Lembra-me aqui a, em seu tempo, momentosa reconsideração do Con-selho a propósito do caráter da arrematação, e pergunto-me se a expressa orien-tação antiga indicada em alguns ven. acórdãos, afirmando o cariz originário da arrematação, haveria de prevalecer contra o que veio a entender o mesmo Conselho posteriormente).

8. Preocupa-me, ainda, o tema da responsabilidade civil do registrador, tanto seja ele obrigado a observar, sem determinação explícita em dado proces-so, uma recomendação ou orientação, a que, cabe sublinhar, não estão subme-tidos os particulares e sequer mesmo a jurisdição do próprio Tribunal.

9. Por fim, não me posso compadecer, data venia, com as ablações de competências legalmente demarcadas. A de primeiro grau, no registro público,

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é do registrador; segue-se, no Estado de São Paulo, em grau parahierárquico imediato, a do juiz corregedor permanente; por fim, a do Tribunal, segundo corresponda às disposições regimentais: em regra, a do Corregedor-Geral; nos recursos de dúvida, a do Conselho.

Ao proferir-se o adendo de recomendação, orientação ou determinação, guardado o tributo de minha reverência ao entendimento da douta Maioria, malfere-se a ordem sobreposta de independências jurídicas (cf., a propósito, art. 28 da Lei nº 8.935/1984, de 18/11: “Os notários e oficiais de registro gozam de independência no exercício de suas atribuições [...]”.

Termos em que, cum magna reverentia, meu voto apenas julga prejudi-cado o recurso, sem mais acrescentar.

É como voto.

Des. Ricardo Dip Presidente da Seção de Direito Público

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0010745-35.2014.8.26.0071, da Comarca de Bauru, em que é apelante Sérgio Augusto Rossetto, é apelado 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Bauru.

Acordam, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “por maioria de votos, julgaram pre-judicada a dúvida e não conheceram do recurso, vencido o Desembargador Ricardo Dip, que declarará voto”, que integra este acórdão juntamente com o voto do Desembargador Relator.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores Paulo Dimas Mascaretti (Presidente do Tribunal de Justiça), Ademir Benedito (Vice-Presiden-te), Xavier de Aquino (Decano), Luiz Antônio de Godoy (Pres. da Seção de Direito Privado), Ricardo Dip (Pres. da Seção de Direito Público) e Salles Abreu (Pres. Seção de Direito Criminal).

São Paulo, 3 de maio de 2016.

Pereira Calças Relator

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Parte Geral – Ementário2333 – Ação cautelar – indenização por vícios de construção – indisponibilidade de bens imó-

veis da construtora

“Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação cautelar inominada preparatória à ação de indenização por vícios de construção. Indisponibilidade de bens imóveis da construtora. Plausibilidade do pleito indenizatório na ação principal (fumus boni iuris). Sequência de alienações de imóveis e risco concreto de insolvência (periculum in mora). Requisitos da excepcional medida cautelar de indisponibilidade de bens evidenciados. Procedência do pedido que se impõe. Delibe-ração monocrática que negou provimento ao reclamo. Irresignação da construtora. 1. O Tribunal de origem não emitiu juízo de valor sobre o art. 884 do CC/2002, razão pela qual não se encontra prequestionado. Além disso, nas razões do especial deixou o ora agravante de apontar eventual violação do art. 535 do CPC/1973, razão pela qual incide na espécie a Súmula nº 211 desta Cor-te. 2. A questão concernente ao pedido de afastamento da litigância de má-fé só foi ventilada no voto vencido, ensejando, portanto, a incidência da Súmula nº 320, desta Corte Superior, verbis: ‘A questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requisito do prequestionamen-to.’ 3. Existindo fundamentos autônomos e suficientes que possibilitam a manutenção do aresto hostilizado, a ausência de impugnação destes impede a modificação do julgado, sendo aplicável a Súmula nº 283 do STF. 4. Para acolhimento do apelo extremo, seria imprescindível derruir a afirma-ção contida no decisum atacado, o que, forçosamente, ensejaria em rediscussão de matéria fática, incidindo, na espécie, o óbice da Súmula nº 7 deste Superior Tribunal de Justiça, sendo manifesto o descabimento do recurso especial. 5. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 319.393 – (2013/0086579-4) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 13.05.2016 – p. 1643)

2334 – Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico c/c adjudicação de fração ideal de imóvel – cessão de quota-parte a condômino

“Embargos de declaração em recurso especial. Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico c/c adjudicação de fração ideal de imóvel. Cessão de quota-parte a condômino. Acórdão deste órgão fracionário dando provimento ao apelo extremo, a fim de restabelecer a sentença de im-procedência. Direito de preferência. Interpretação restritiva. Inaplicabilidade quando se trata de negócio jurídico realizado entre condôminos. Insurgência dos autores. 1. Nos termos do art. 535 do Código de Processo Civil de 1973 (vigente à época da oposição dos aclaratórios), os embargos de declaração são apenas cabíveis quando verificado, no decisum impugnado, vício de obscuri-dade, contradição ou omissão, admitindo-se, outrossim, para saneamento de erro material. 2. Na hipótese em tela, o aresto proferido por este órgão fracionário encontra-se devida e suficientemente fundamentado, tendo enfrentado todas as questões essenciais à solução da controvérsia instaurada por meio do recurso especial, qual seja: saber se, a partir da análise do art. 504 do Código Civil, o direito de preferência nele previsto abrange apenas a hipótese de alienação de condômino para estranho ou se estende também aos contratos de compra e venda ou cessão celebrados entre con-sortes. Efetivamente, analisou-se de modo exaustivo todos os aspectos pertinentes à interpretação do dispositivo já mencionado, concluindo-se pela inexistência de direito de preempção quando se trata de alienação entre consortes. Desse modo, a pretensão veiculada nos aclaratórios traduz manifesto caráter infringente, razão pela qual não merece acolhida. 3. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-REsp 1.137.176 – (2009/0079625-5) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 29.04.2016 – p. 247)

2335 – Ação de obrigação de fazer – descumprimento de contrato de mútuo – deliberação mo-nocrática

“Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação de obrigação de fazer decorrente de descumprimento de contrato de mútuo. Deliberação monocrática que negou provimento ao reclamo. Irresignação da ré. 1. É clara e suficiente a fundamentação adotada pelo Tribunal de ori-gem para o deslinde da controvérsia, revelando-se desnecessário ao magistrado rebater cada um

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dos argumentos declinados pela parte (Precedentes: AgRg-Ag 1.402.701/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 01.09.2011, DJe 06.09.2011; REsp 1.264.044/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 01.09.2011, DJe 08.09.2011; AgRg-EDcl-Ag 1.304.733/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 31.08.2011. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 564.197 – (2014/0200593-5) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 13.05.2016 – p. 1650)

2336 – Ação pauliana – ação proposta para anulação de negócios jurídicos por fraude contra credores – reconhecimento

“Recursos especiais. Civil e processual civil. Ação pauliana. Ação proposta para anulação de ne-gócios jurídicos por fraude contra credores. Reconhecimento de fraude à execução. Julgamento extra petita. Ocorrência. 1. Na origem, trata-se de ação pauliana proposta com o objetivo de anular diversos negócios jurídicos de compra e venda de imóveis que teriam sido realizados entre as rés em fraude contra credores. 2. Desborda dos estreitos limites da demanda, configurando julgamento extra petita, o acórdão que se afasta das causas de pedir e pedidos apresentados pelo autor – que requereu a anulação de atos jurídicos de compra e venda porque supostamente realizados em fraude contra credores – e reconhece a existência de fraude à execução. 3. Na falta de quaisquer elementos aptos a corroborar as alegações postas na inicial – de que as alienações teriam sido re-alizadas quando o devedor já se encontrava em estado de insolvência ou teriam contribuído para reduzi-lo à insolvência –, a improcedência da demanda é solução que se impõe. 4. Recursos espe-ciais providos.” (STJ – REsp 1.479.385 – (2014/0225921-7) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 13.04.2016 – p. 4697)

2337 – Ação pauliana – fraude contra credores – requisitos – demonstração – ônus da prova

“Agravo regimental no recurso especial. Art. 535 do CPC/1973. Violação. Não ocorrência. Ação pauliana. Fraude contra credores. Requisitos. Demonstração. Ônus da prova. Reexame de provas. Súmula nº 7/STJ. 1. Não viola o art. 535 do Código de Processo Civil de 1973 nem importa negativa de prestação jurisdicional o acórdão que adotou para a resolução da causa fundamentação sufi-ciente, porém diversa da pretendida pela recorrente, para decidir de modo integral a controvérsia posta. 2. A reapreciação das conclusões do aresto impugnado encontra óbice, no caso concreto, na Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.559.548 – (2015/0251929-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 16.05.2016 – p. 1722)

2338 – Ação sumária de cobrança – taxas condominiais – responsabilidade – obrigação propter rem – registro imóvel

“Civil. Ação sumária de cobrança. Taxas condominiais. Responsabilidade. Obrigação propter rem. Registro imóvel. Sentença mantida. 1. Insurge-se a CEF contra sentença que a condenou ao paga-mento de taxas condominiais, alegando que o imóvel foi vendido em leilão, sendo irrelevante a falta de registro do compromisso de compra e venda no CRI para configurar a responsabilidade da ocupante/adquirente/possuidora pelas despesas condominiais, já que a proprietária de fato. 2. A denominada ‘taxa de condomínio’ é obrigação propter rem, ou seja, que adere à coisa, pelo que o proprietário do bem responde pela dívida. In casu, figurando a CEF como a titular do domínio do apartamento, é a responsável pelo pagamento das despesas de condomínio da unidade que adju-dicou. Precedentes deste TRF1. 3. Não descaracteriza a obrigação a circunstância de não ser ocu-pante do imóvel. 4. ‘A mera cópia de cadastro administrativo juntado pela CEF não tem o condão de comprovar a transferência do imóvel a terceiros e o redirecionamento da cobrança, posto que a alienação do bem só se aperfeiçoa com o registro no Cartório de Registro de Imóveis conforme exi-gência do art. 172 da Lei nº 6.015/1973’ (AC 000117636.2002.4.01.3700/MA, Rel. Des. Fed. Jirair

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Aram Meguerian, T6). 5. Apelação desprovida.” (TRF 1ª R. – AC 2005.39.00.004389-7/PA – Rel. Juiz Fed. Evaldo de Oliveira Fernandes Filho – DJe 19.04.2016 – p. 440)

2339 – Alienação fiduciária – baixa do gravame – negócio firmado entre agente financeiro e construtora

“Civil. Alienação baixa do gravame. Negócio firmado entre agente financeiro e construtora. Súmula 308/STJ. Ônus sucumbenciais. Manutenção. 1. Aplica-se a Súmula nº 308 STJ nos casos de escritura pública de abertura de crédito para construção de unidades habitacionais, com pacto adjeto de alienação fiduciária, uma vez que, embora não se trate de hipoteca propriamente dita, o objetivo do gravame é o mesmo. 2. Mantida a sentença que condenou o agente financeiro na obrigação de fazer consistente na baixa do gravame de alienação fiduciária registrado na matrícula dos imóveis espe-cificados nos autos. 3. Deve ser mantida a sucumbência do réu quando o autor sucumbir em parte mínima do seu pedido. 4. Recurso conhecido e não provido.” (TJDFT – Proc. 20130111349519APC – (937570) – 2ª T.Cív. – Relª Desª Gislene Pinheiro – DJe 02.05.2016 – p. 192)

2340 – Alvará de edificação – direito de protocolo – requerimento

“Processual civil e administrativo. Alvará de edificação. Direito de protocolo. Requerimento sob a égide de lei menos restritiva. Concessão à sociedade diversa após a revogação da lei. Alteração do projeto. Direito adquirido. Mandato. Ausência de manifestação. Ofensa ao art. 535 do CPC confi-gurada. 1. Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, contra FRC Incorporações e Participações Ltda., Peixoto II Empreendimentos Imobi-liários Ltda. e o Município de São Paulo, visando à cassação do alvará expedido para edificação de prédio residencial de 24 andares com 8.431,31 m² a ser construído na Rua Peixoto Gomide – Jar-dins – São Paulo/SP (processo administrativo nº 2005.0.019.236-3). 2. Conforme se extrai dos autos, foi editada no Município de São Paulo a Lei nº 13.885/2004, de 25 de agosto de 2004, que estabe-lece normas complementares ao Plano Diretor Estratégico, institui os Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras, dispõe sobre o parcelamento, disciplina e ordena o Uso e Ocupação do Solo. A referida lei, como estabeleceu regras mais restritivas ao direito de construir, a fim de privilegiar a segurança jurídica, previu em seu art. 242 uma espécie de regra de transição (direito de protocolo): ‘Art. 242. No caso de expedientes administrativos ainda sem despacho decisório em última instân-cia, protocolados anteriormente à data de entrada em vigor desta lei, os interessados poderão optar pela aplicação da legislação vigente à data do seu protocolamento. Parágrafo único. Nos expedien-tes administrativos a que se refere o caput, um eventual acréscimo na área do terreno que constou do projeto originalmente apresentado, com a incorporação de novos lotes, só será admitida desde que para a área correspondente ao acréscimo seja aplicado o coeficiente de aproveitamento básico, que só poderá ser ultrapassado através de outorga onerosa do direito de construir, nos termos do PDE e desta lei’. 3. Com base no dispositivo legal transcrito, alguns dias antes da entrada em vigor da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo, que viria a ocorrer em fevereiro de 2005, a empresa FRC Incorporações e Participações Ltda. protocolou na Secretaria Municipal de Habitação o pedido de alvará de edificação. Em 25 de maio de 2005, por não respeitar disposições do Código de Obras e Edificações, o pedido foi indeferido (fl. 143). Passados mais de 30 dias do indeferimento, em 28.06.2005, a empresa pediu reconsideração da decisão, e o pleito, em 24.08.2006, foi mais uma vez indeferido por questões técnicas e pelo fato de a requerente não ser possuidora ou proprietária dos imóveis. Novamente, agora por meio da empresa Peixoto II Empreendimentos Imobiliários Ltda., foi requerida a reconsideração, com as necessárias alterações no projeto. 4. Assim, após ma-nifestação dos órgãos técnicos e jurídicos do Município, em 04.12.2007, já na gestão seguinte, o Diretor do Departamento de Aprovação das Edificações, Hussain Aref Saab, finalmente deferiu a expedição de Alvará de Aprovação e Execução de Edificação Nova (fl. 753). 5. O Parquet estadual apontou, em suma, que as empresas, a fim de escapar da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo paulistana, mais restritiva que a anterior, na iminência de sua entrada em vigor, requereram alvará

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de aprovação de edificação, de forma açodada e abusiva, mesmo não tendo projeto concluído e não sendo titular dos imóveis. O alvará, após indeferimentos e alterações nas plantas, foi finalmen-te concedido já na vigência da lei nova, mas com base na legislação antecedente. 6. Em primeiro grau, o Juiz sentenciante consignou que o pleito de alvará foi realizado com o deliberado intuito de tentar contornar regras legais e julgou a ação procedente para cassá-lo. Segue trecho da sentença: ‘As questões até aqui analisadas colocam em evidência os seguintes aspectos: – a empresa corré FRC Incorporações e Participações Ltda. requereu alvará de aprovação para edificação nova às vésperas (três dias antes) do início de vigência da Lei Municipal nº 13.845/2004 que reduziu signi-ficativamente o coeficiente de aproveitamento máximo observável no local (Z3-139) em que pre-tendia ela erigir a edificação até então observável (Lei Municipal nº 13.430/2002, art. 165, coefi-ciente de aproveitamento máximo de fator 4 que reduzido foi a 2,5); – agiu sem ter posse ou domínio sobre os imóveis abarcados pela edificação pretendida, quanto menos mandato de ao menos quatro dos seis proprietários respectivos, o que se obteve muito depois de já estar a viger a Lei Municipal nº 13.845/2004 e, ainda assim, por meio de outra empresa corré (Peixoto II Empreen-dimentos Imobiliários Ltda.) que, por sua vez, somente foi constituída em 24 de fevereiro de 2006; – mesmos as ratificações invocadas para fins de aplicabilidade do art. 662, parágrafo único, do CC, emitidas foram a um tempo (ano de 2006) em que já vigia há muito a Lei Municipal nº 13.845/2004 (fevereiro de 2005), ou seja, a um tempo em que já não era mais possível elidir a não configuração do direito de protocolo como visto foi; – agiu sem ter projeto então exibido apto a ser sequer regu-larizado por meio de atendimento de exigências veiculadas por ‘comunique-se’ ou ‘comunicado’, tido como foi mesmo como insanável, tamanhas as suas falhas e gravidades; e – mister foi renovar todo o projeto (mas já a um tempo plantas novas juntadas em fevereiro de 2006 com retificação delas em setembro de 2006 – em que também já vigia há muito a Lei Municipal nº 13.845/2004), exibindo-o por forma diversa no mesmo processo administrativo e, ainda aqui, através de requeri-mento de reconsideração de um segundo indeferimento do pleito administrativo, tudo para obstar o encerramento da instância administrativa quanto ao processo de autos nº 2005-0.019.236-3, o que inviabilizaria por definitivo o invocar o direito de protocolo. A conjugação destes aspectos torna manifesto o intento das empresas rés, com o beneplácito da Municipalidade local, de contor-nar a então novel legislação, presumidamente instituída para atender o interesse coletivo, mais restritiva quanto ao direito de construir in casu, mediante uso manifestamente desvirtuado, até mesmo desfigurado do chamado direito de protocolo. Note-se: fosse o requerimento feito por quem de direito, ainda que necessitado de correções e não de modificações profundas a gerar, em reali-dade, requerimento diverso (que teria de ser veiculado por processo distinto para exatamente não haver pretensão de abusivo emprego do art. 242 da Lei Municipal nº 13.845/2004), não haveria dúvida sobre a configuração do direito de protocolo. Não foi este o caso em que, diversamente, o que se constata foi o agir açodado, precário, de resultado ainda incerto (sobre a aquisição do domí-nio e posse dos imóveis necessários à construção pretendida) no intuito de tentar, deliberadamente, contornar regras edilícias mais restritivas às vésperas de sua vigência, mas com atropelo de normas legais outras tais como o COE (Código de Obras e Edificações) do Município de São Paulo, instituí- do pela Lei Municipal nº 11.228/1992, itens 3.6, letra c e 3.7, letra c, e os arts. 2º, caput, e 6º, caput, ambos da Lei de Introdução ao Código Civil, Decreto-Lei Federal nº 4.657/1942, além das pertinen-tes às próprias regras legais referentes aos motivos pelos quais ocorreram os indeferimentos (dois) do requerimento de expedição de alvará de aprovação para edificação nova, mormente o primeiro indeferimento, dada a motivação pela qual se tomou o projeto originalmente exibido até mesmo como insanável’. 7. Irresignadas, as sociedades empresárias recorreram, e o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu provimento aos apelos para reconhecer a higidez do alvará. 8. O Ibed, na qualidade de assistente litisconsorcial, opôs Embargos de Declaração com intuito de provocar a manifestação sobre a inexistência de direito adquirido, os efeitos da ratificação dos atos praticados pela empresa em relação ao Poder Público, a concessão de alvará a sociedade que foi constituída após o protocolo do pedido. Por fim, objetivou descaracterizar o mandato, tendo em vista que as

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empresas afirmam que agiram em seus próprios nomes e interesses. 9. Os Embargos de Declaração foram rejeitados sem menção aos argumentos citados. O Ibed interpôs, então, Recurso Especial, com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF. 10. Num primeiro momento, o eminente Relator, Ministro Mauro Campbell Marques, proferiu decisão monocrática para ratificar a legitimidade re-cursal do Ibed e acolher integralmente a suscitada violação do art. 535 do CPC (fl. 3.732). 11. As empresas interpuseram Agravos Regimentais, e o Min. Relator reconsiderou o decisum para negar seguimento ao Recurso Especial, afastando a ofensa ao art. 535 do CPC e aplicando as Súmulas nºs 7 e 211/STJ. 12. É cediço o entendimento de que a solução integral da controvérsia, com fundamen-to suficiente, não caracteriza contrariedade ao art. 535 do CPC e que o juiz não é obrigado a reba-ter todos os argumentos aduzidos pelas partes. Por outro lado, o juiz não pode deixar de conhecer de matéria relevante ao deslinde da questão, mormente quando sua decisão não é suficiente para refutar a tese aduzida, que, portanto, não abrange toda a controvérsia. 13. A matéria atinente ao direito adquirido é de extremo relevo para o caso concreto, principalmente diante da compreensão de que a incidência da lei revogada pressupõe o preenchimento dos requisitos nela previstos na época do protocolo, não sendo lícita a apresentação de requerimento falho, apenas com o fim de evitar a aplicação da legislação posterior, mais restritiva. 14. Nesse sentido, a fim de demonstrar a relevância da matéria, cito precedente mencionado pelo Ibed, de relatoria do e. Ministro Humberto Martins, referente ao direito de protocolo à luz do direito adquirido: ‘Administrativo. Recurso ordi-nário em mandado de segurança. Regularização de imóvel urbano. Direito de protocolo. Alteração superveniente da legislação. Efeitos de ação civil pública. Inexistência de direito adquirido. Recurso ordinário improvido. 1. Controvérsia. Sobre a existência de direito adquirido a regime jurídico fun-dado em lei revogada, quando o suposto titular apresentara mero requerimento administrativo. 2. Direito adquirido a regime jurídico. O conceito de direito adquirido, instituto sediado na Consti-tuição Federal (art. 5º, inciso XXXVI, CF/1988), encontra densidade discursiva no direito infracons-titucional, especificamente o art. 6º, § 2º, LICC, que assim considera o direito exercitável sem limite por termo pré-fixo ou condição pré-estabelecida inalterável ao arbítrio de outrem. 3. Ausência dos requisitos do direito adquirido. Observado o critério proposto na obra de Francesco Gabba, o recor-rente não tem direito adquirido a regime jurídico, porquanto: a) não possuía, à época do requeri-mento, todas as condições necessárias para o implemento do direito à regularização imobiliária, porque seu requesto demandava, além de outros aspectos, o placet do órgão administrativo, verda-deiro requisito de eficácia do direito a que almejava; b) a superveniente alteração legislativa esva-ziou sua pretensão, antes do preenchimento dos requisitos plenos, necessários à aquisição do direi-to; c) a nova lei suprimiu a possibilidade de concessão de eficácia ao que pretendia o requerente, na medida em que impediu seu reconhecimento jurídico, o que tornou impossível a constituição do próprio direito. 4. Efeitos do “direito de protocolo” no caso concreto – Nesta espécie, não há como se resguardar o “direito de protocolo”, ou seja, o direito à aplicação, durante todo o processo admi-nistrativo, do regime jurídico existente no momento do protocolo da petição inicial, na forma como deseja o recorrente. Precedente do STF. 5. Atuação do Ministério Público. A legislação originária, sob a qual se fundava o protocolo do recorrente, foi escoimada de ilegal e inconstitucional. Esses foram os fundamentos da ação civil pública movida pelo Ministério Público de São Paulo. A seve-ridade dessa increpação foi tamanha que o Município, ora recorrido, não mais deu sequência ao procedimento do recorrente e, momentos depois, revogou os atos normativos impugnados. Recurso ordinário improvido’ (RMS 27.641/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe 14.10.2008). 15. Também representa vício a simples menção de que ‘as requeridas agiram na condição de man-datárias dos proprietários, que posteriormente ratificaram os atos praticados por aqueles, o que convalida o pedido de alvará de aprovação de obra nova’ (fl. 3.038, e-STJ), sem enfrentamento da afirmação de que não se configura mandato, pois o pedido foi feito em nomes e interesses próprios, não obstante a ausência de propriedade ou posse sobre a área. 16. Apesar de o acórdão afirmar que não há irregularidade na existência de dois pedidos formulados por empresas diferentes, sendo uma delas uma SPE, deixa de se manifestar, outrossim, sobre a importante argumentação de que o alvará

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foi concedido a sociedade que nem sequer existia na data em que requerido. 17. Em se tratando de discussão acerca do direito de protocolo, a qual envolve a ultra-atividade da lei urbanística revoga-da, é de extrema importância a manifestação do Tribunal local sobre os argumentos citados, espe-cialmente sobre a concessão de alvará com base em lei anterior à empresa que nem mesmo havia sido constituída na ocasião do protocolo, com frontal desrespeito a regras basilares que regem o processo administrativo. 18. Ressalte-se que essa foi a primeira conclusão alcançada pelo e. Relator ao decidir monocraticamente o nobre apelo, ocasião em que observou, a meu ver corretamente, a existência de omissão no aresto impugnado. 19. Em que pese a afirmação no atual voto do Relator de que não há violação do art. 535 do CPC, propõe-se a aplicação da Súmula nº 211/STJ, por falta de prequestionamento, e a incidência da Súmula nº 7/STJ quanto às mencionadas alegações do re-corrente, o que configura evidente cilada processual. 20. É cediço que, em certos casos, é possível afastar a alegada violação do art. 535 do CPC e, ao mesmo tempo, não conhecer do mérito da de-manda por ausência de prequestionamento ou por necessidade de revolvimento do acervo fático--probatório. Todavia, é indispensável que o acórdão recorrido esteja adequadamente fundamenta-do e que os pontos omissos não se revelem significativos para o exame da controvérsia. 21. In casu, conforme consignado, há pontos de extremo interesse que não foram abordados na origem, o que afasta a possibilidade de rejeitar a contrariedade ao art. 535 do CPC e, concomitantemente, de aplicar as Súmulas nºs 7 e 211/STJ. 22. Reconheço, portanto, a existência de omissão no acórdão impugnado e, por conseguinte, a ofensa ao art. 535 do CPC. 23. Agravo Regimental parcialmente provido.” (STJ – AgRg-AgRg-REsp 1.443.088 – (2014/0061368-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 23.05.2016 – p. 3159)

2341 – Associação de moradores – ação de cobrança com base em enriquecimento ilícito – taxa de manutenção – proprietário de imóvel não associado – impossibilidade

“Civil e processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Associação de moradores. Ação de cobrança com base em enriquecimento ilícito. Taxa de manutenção. Proprietário de imóvel não associado. Impossibilidade. Precedentes. Recurso manejado sob a égide do CPC/1973. Recurso não provido. 1. A Segunda Seção desta Corte possui o entendimento de que as taxas de manutenção ou melhoria, criadas por associações de moradores, não obrigam os não associados ou aqueles que a elas não anuíram (REsp 1.439.163/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Ac. Min. Marco Buzzi, 2ª S., julgado sob o rito dos recursos repetitivos, DJe 22.05.2015). 2. Não há que se falar em enriquecimento ilícito do recorrido porque a existência de associação, congregando moradores com o objetivo de defesa e preservação de interesses comuns em área habitacional, não possui o caráter de condomínio, pelo que, não é possível exigir de quem não seja associado, nem aderiu ao ato que instituiu o encargo, o pagamento de taxas de manutenção ou melhoria (AgRg-AREsp 525.705/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., DJe 25.05.2015). 3. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são inaplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpre-tações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.495.483 – (2014/0276496-0) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 16.05.2016 – p. 1713)

2342 – Bem de família – execução – constrição de imóvel de propriedade de sociedade comer-cial utilizado como residência dos sócios – impenhorabilidade

“Embargos de declaração recebidos como agravo regimental no agravo em recurso especial. Pro-cessual civil. Execução. Constrição de imóvel de propriedade de sociedade comercial utiliza-do como residência dos sócios. Bem de família. Impenhorabilidade reconhecida. Art. 1º da Lei nº 8.009/1990. Precedentes. Agravo não provido. 1. A jurisprudência do STJ tem, de forma reite-

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rada e inequívoca, pontuado que o benefício conferido pela Lei nº 8.009/1990 se trata de norma cogente, que contém princípio de ordem pública, e sua incidência somente é afastada se caracte-rizada alguma hipótese descrita no art. 3º da Lei nº 8.009/1990. 2. A jurisprudência desta egrégia Corte orienta-se no sentido de considerar que é ‘impenhorável a residência do casal, ainda que de propriedade de sociedade comercial’ (REsp 356.077/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., J. 30.08.2002, DJ de 14.10.2002, p. 226). Precedentes. 3. Embargos declaratórios recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.” (STJ – EDcl-Ag-RE 511.486 – (2014/0103291-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 10.03.2016 – p. 1238)

2343 – Bem de família – penhora – embargos de terceiro – imóvel alienado em fraude à exe-cução

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Penhora. Embargos de terceiro. Imóvel alienado em fraude à execução. Bem de família. Reexame de prova. 1. Não se admite o recurso especial quando sua análise depende de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. ‘Não se co-nhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal de firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula nº 83/STJ). No caso, em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior, o Tribunal de origem recusou a proteção da Lei nº 8.009/1990 com relação a imóvel alienado entre membros da família para fraudar execução. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 125.537 – (2011/0293432-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 03.03.2016 – p. 721)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de agravo regimental interposto por Danielle Rocha e João Vitor Rocha Ferro contra decisão mediante a qual neguei provimento a agravo em recurso especial, por aplicar ao caso as Súmulas nºs 7 e 83 do STJ.

O acórdão recorrido, do TJRS, tem a seguinte ementa:

APELAÇÕES CÍVEIS – RECURSO ADESIVO – EMBARGOS E TERCEIRO – ILEGITIMIDADE ATIVA – CERCEAMENTO DE DEFESA DO EXECUTADO – AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO DOS EMBARGANTES PARA INVOCÁ-LA – BEM DE FAMÍLIA – FRAUDE À EXECUÇÃO – EFEITOS – MEAÇÃO

1. Patente a ilegitimidade ativa da embargante Rita para opor embargos em defesa de sua meação, já que doou o imóvel a sua filha e, consequentemente, não possui direito, patrimonial sobre o bem que reivindica.

2. Inviabilidade de os apelantes alegarem cerceamento de defesa em nome do executado, devendo este, se for o caso, vir a juízo reclamar seus direitos.

3. Fraude à execução já reconhecida em outro processo, cujos efeitos se estendem a este, pela indivisibilidade da situação jurídica. Tratando-se de ineficácia o ato, e não de invalidade, fica aquela restrita doação da parte do devedor, sem atingir a doação feita pela embargante Rita.

4. Impossibilidade de se invocar a impenhorabilidade do imóvel, por se tratar de bem de fa-mília, quando tenha sido reconhecida a fraude à execução. Precedentes do STJ nesse sentido. Entendimento contrário poderia esvaziar os efeitos de eventual reconhecimento de fraude à execução relacionada a imóvel residencial.

5. Impugnação à avaliação do imóvel rejeitada. Apelações e recurso adesivo desprovidos.

A agravante alegou violação dos arts. 1º e 5º da Lei nº 8.009/1990, além de dissídio juris-prudencial. Sustentam que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de família, e a constrição do imóvel atinge outros integrantes da família, terceiros embargantes.

Os agravantes afirmaram que não se aplicam ao caso as referidas Súmulas. Sustentaram que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de família.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

O relator afirmou que aplica-se ao caso a Súmula nº 83 do STJ e que o dissídio jurisprudencial não ficou caracterizado, pois não destacadas as circunstâncias que assemelhassem os casos confrontados, o que seria mesmo inviável diante da incidência das súmulas citadas.

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Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenhora-bilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respectivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civi-lista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanência, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

2344 – Bem de família – penhora – imóvel residencial – acervo hereditário – único bem – impe-nhorabilidade

“Recurso especial. Direito civil. Família e sucessões. Execução fiscal. Penhora. Imóvel residencial. Acervo hereditário. Único bem. Impenhorabilidade. Bem de família. Lei nº 8.009/1990. Direito constitucional à moradia. Dignidade da pessoa humana. Arts. 1º, III, e 6º da Constituição Federal. 1. A proteção instituída pela Lei nº 8.009/1990 impede a penhora sobre direitos hereditários no rosto do inventário do único bem de família que compõe o acervo sucessório. 2. A garantia constitu-cional de moradia realiza o princípio da dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III, e 6º da Constitui-ção Federal). 3. A morte do devedor não faz cessar automaticamente a impenhorabilidade do imó-vel caracterizado como bem de família nem o torna apto a ser penhorado para garantir pagamento futuro de seus credores. 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.271.277 – (2011/0128495-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 28.03.2016 – p. 1320)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais assim ementado:

“[...]

Porque visa proteger um direito reconhecido na CF como direito fundamental, qual seja, o direito à moradia (art. 6º) a impenhorabilidade do bem de família é considerada matéria de ordem pública, daí porque poderá ser analisada até mesmo de ofício, a qualquer tempo, não havendo que se falar em intempestividade dos embargos.

A impenhorabilidade do imóvel destinado à residência familiar pode ser arguida por simples petição no processo de execução ou mediante o ajuizamento da ação de embargos, sendo esta via a mais apropriada quando houver necessidade de produzir-se prova, eis que a execução, enquanto processo dialético, não tem sua índole voltada para o contraditório.

Em sendo realizada a penhora no rosto do inventário, não há como se garantir a proteção da Lei nº 8.009/1990, eis que nestes casos a penhora se faz sobre os direitos hereditários, e não

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sobre determinado bem imóvel, não sendo aqueles garantidos pelas normas de impenhorabi-lidade previstas na legislação citada.”

Noticiam os autos que a viúva e filha do autor da herança, respectivamente, ajuizaram ação de embargos à penhora em execução fiscal movida pela Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais contra Ubercaminhões Ltda. para cobrança de ICMS no valor de R$ 18.445,58 (de-zoito mil quatrocentos e quarenta e cinco reais e cinquenta e oito centavos) declarado pelo contribuinte, o de cujus, e não recolhido.

As requerentes afirmaram que a penhora determinada pelo Juízo fazendário, realizada em 16.10.2008 no rosto dos autos do inventário dos bens deixados pelo falecido, estaria atingin-do bem de família, a saber, o imóvel em que residem, único a ser inventariado, razão pela qual, à luz do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, deveria ser considerado impenhorável.

Na inicial, a primeira requerente sustenta ter sido casada com o falecido em regime de co-munhão parcial de bens motivo pelo qual metade do imóvel penhorado lhe pertenceria, nos termos do art. 1.660 do Código Civil, não podendo, “sob hipótese nenhuma, responder pela execução em tela”, especialmente porque nenhuma das requerentes figuraria no quadro so-cietário da empresa executada. Ao final, ambas requerem a procedência do pedido para que a decretação da nulidade da penhora seja feita no rosto dos autos do processo da ação de in-ventário que tramita perante a 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Uberlândia/MG (nº 0702.05.227408-2).

O Estado de Minas Gerais, em impugnação, aduziu que o executado, a quem incumbe o ônus para tanto, não demonstrou que o imóvel teria natureza de bem de família.

O juízo de primeiro grau recebeu o feito como embargos de terceiro e julgou procedente o pe-dido, reconhecendo a condição de bem de família do imóvel descrito na exordial, assegurando sua impenhorabilidade à luz da Lei nº 8.009/1990, pois, “a despeito dos bens do de cujus responderem pelos débitos fiscais existentes em seu nome, constata-se que, no caso presente, restou comprovado que as embargantes, há vários anos, residem no imóvel em relação ao qual recaiu a constrição”, não havendo dúvida que “constitui bem de família, não sendo, portanto, passível de penhora”.

Inconformado, o Estado de Minas Gerais apresentou apelação.

Nas razões do especial (e-STJ fls. 140-145), as recorrentes sustentam violação do art. 1º da Lei nº 8.009/1990, visto que a penhora sobre direitos hereditários no rosto do inventário não poderá prevalecer, sob pena de violação do direito à moradia, porquanto demonstrado que os direitos sucessórios se resumem ao imóvel objeto da constrição.

O STJ deu provimento ao recurso especial para restabelecer integralmente a sentença de pro-cedência dos embargos à penhora.

Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenhora-bilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respectivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

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Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civi-lista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanência, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

2345 – Bem de família – penhorabilidade – dívida oriunda de negócio envolvendo o próprio imóvel – aplicação

“Agravo regimental. Processo civil e civil. Execução de sentença. Compromisso de compra e venda de imóvel. Bem de família. Penhorabilidade. Dívida oriunda de negócio envolvendo o próprio imó-vel. Aplicação, por analogia, da exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. 1. a exceção prevista no art. 3º, II, da Lei nº 8.009/1990. Possibilidade de se penhorar bem de família. Deve ser estendida também aos casos em que o proprietário firma contrato de promessa de compra e venda do imóvel e, após receber parte do preço ajustado, se recusa a adimplir com as obrigações aven-çadas ou a restituir o numerário recebido, e não possui outro bem passível de assegurar o juízo da execução. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 806.099 – (2015/0279073-6) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 14.03.2016 – p. 2576)

2346 – Competência – obrigação securitária – sistema financeiro de habitação

“Agravo regimental no recurso especial. Processual civil. Competência. Obrigação securitária. Sis-tema Financeiro de Habitação. Possível interesse da Caixa Econômica Federal. Súmula nº 150/STJ. 1. Compete à Justiça Federal a verificação da existência de interesse da Caixa Econômica Federal. Sú-mula nº 150/STJ. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.548.811 – (2013/0348077-5) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 16.05.2016 – p. 1719)

2347 – Compromisso de compra e venda sob condição suspensiva levada a registro – exercício do direito de preferência por locatário – ação de obrigação de fazer

“Recurso especial. Compromisso de compra e venda sob condição suspensiva levada a registro. Exercício do direito de preferência por locatário. Ação de obrigação de fazer consistente na baixa do registro. Reconvenção pelo cumprimento do contrato e perdas e danos. Violação do art. 319 do CPC. Falta de prequestionamento. Exercício do direito de preferência (art. 27 da Lei nº 8.245/1991). Não configuração. Ofensa à coisa julgada. Não ocorrência. Afronta ao princípio da boa-fé. Inexis-tência. Enriquecimento sem causa. Óbice das Súmulas nºs 7/STJ e 283/STF. Julgamento extra petita. Afastamento. 1. Não tendo sido abordada pelo acórdão recorrido a questão objeto do art. 319 do CPC, falta o necessário prequestionamento viabilizador do conhecimento do recurso especial. 2. O exercício do direito de preferência pelo locatário pressupõe a aceitação integral da proposta formu-lada por terceiro (não há sentido em falar em preferência se as condições negociais são distintas), por isso que o oferecimento de contraproposta, ainda que mais vantajosa, descaracteriza o instituto. 3. Sendo o cumprimento do contrato consequência lógica do reconhecimento de sua validade, é desnecessária a menção explícita na parte dispositiva da sentença que julgou procedente a recon-venção. 4. Afasta-se a alegação de afronta à boa-fé se a parte agiu no exercício regular de direito e se as circunstâncias fáticas da causa, reconhecidas pelas instâncias de origem, afastam a mora. 5. Não se conhece do recurso especial se o acolhimento da tese recursal reclamar a análise dos ele-mentos probatórios dos autos (Súmula nº 7 do STJ) e quando a parte deixa de impugnar fundamento autônomo do acórdão recorrido (Súmula nº 283 do STF). 6. Não há julgamento extra petita quando o provimento jurisdicional atende ao que foi expressamente pleiteado pela parte. 7. Recurso espe-cial parcialmente conhecido e desprovido.” (STJ – REsp 1.463.482 – (2013/0351014-0) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 29.04.2016 – p. 208)

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2348 – Corretores de imóveis – anuidades – natureza jurídica de tributo

“Constitucional e administrativo. Execução fiscal. Conselho Regional de Corretores de Imóveis. Anuidades. Natureza jurídica de tributo. Instituição com base em resolução. Impossibilidade. 1. As anuidades exigidas pelos conselhos profissionais se enquadram no conceito de contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação na fiscali-zação nas respectivas áreas, nos termos previstos no art. 149 da Carta Magna. 2. Nesse sentido, as referidas contribuições possuem natureza jurídica de tributo, da competência exclusiva da União, e são submetidas aos princípios que regem o sistema tributário nacional, dentre eles, o da reserva legal, que determina a vedação de exigência ou majoração de tributo sem lei que o estabeleça (art. 150, I, da CF/1988). Não é permitido aos conselhos profissionais, por ausência de lei que os autorize, corrigirem suas anuidades por meio de resolução ou qualquer outro ato administrativo, por manifesta afronta ao princípio da legalidade, previsto no art. 150, I, da Carta Magna. 3. Não há que se falar, no caso ora em exame, em incidente de inconstitucionalidade (art. 97 da Constituição Federal) em relação à Lei nº 11.000/2004, que trata da cobrança e execução ‘das contribuições anuais, devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como as multas e os preços de serviços, rela-cionados com suas atribuições legais, que constituirão receitas próprias de cada Conselho’. Ocorre que a referida lei tem sua aplicação restrita aos Conselhos Regionais de Medicina. Nesse sentido: (AC 2007.38.00.0081124/MG, Rel. Des. Fed. Luciano Tolentino Amaral, 7ª T., e-DJF1 p. 408 de 31.07.2009). 4. Não se aplica, no caso em análise, a regra inserta no art. 16 da Lei nº 6.530/1978, com efeitos a partir do ano de 2004 (redação dada pela Lei nº 10.795/2003), tendo em vista que a referida lei apenas cuidou de estabelecer valores máximos para as anuidades. 5. Apelação a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AC 0006839-23.2013.4.01.4300/TO – Rel. Des. Fed. José Amilcar Machado – DJe 28.04.2016 – p. 1604)

2349 – Defesa do consumidor – compra e venda de imóvel – demora na entrega – ilegitimidade passiva

“Direito do consumidor. Compra e venda de imóvel. Demora na entrega. Ilegitimidade passiva. Rejeitada. Excludente de responsabilidade. Risco do negócio. Lucros cessantes. Danos materiais. Inocorrência. Taxa de condomínio. Correção monetária. Chamamento ao processo. Legislação con-sumerista. Princípio da celeridade e economia processual. Sentença parcialmente reformada. 1. As rés cooperativas e a ré construtora são partes legítimas para figurarem no polo passivo da deman-da quando verificado nos autos a existência de relação jurídica entre elas com os autores. 2. O inadimplemento contratual verificado em razão de atraso na entrega de imóvel, objeto de contrato de promessa de compra e venda, deve ser analisado com base na legislação consumerista, que é a norma especial, uma vez que presentes a figura do fornecedor ou prestador de serviços – constru-tora –, bem assim do destinatário final, que seria o adquirente da unidade imobiliária, nos exatos termos previstos nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. 3. A teoria do risco do ne-gócio ou da atividade é a base da responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor, a qual se harmoniza com o sistema de produção e consumo em massa, protegendo a parte mais frágil da relação jurídica, razão pela qual não se perquire a existência ou não de culpa por parte do consumidor. 4. Configurado o atraso injustificado na entrega do imóvel, considerado, inclusive, o prazo de prorrogação fixado, e tendo sido o consumidor privado de dele usufruir economicamente durante o período de mora da construtora, assiste-lhe o direito de ser compensado pela vantagem econômica que deixou de auferir. Os lucros cessantes devem ser mensurados com parâmetro no equivalente aos aluguéis praticados no mercado imobiliário local para imóvel similar. 5. Rejeita-se o pedido de indenização por danos materiais pelos autores quando não demonstrado nos autos a sua ocorrência. 6. Para configurar a obrigação da promitente-compradora pagar taxa condominial, além do habite-se, necessária a entrega das chaves do imóvel. 7. A correção monetária sobre os lucros cessantes deve ser calculada a partir do efetivo prejuízo, ou seja, a contar do primeiro dia do término do prazo de tolerância até a efetiva entrega do imóvel. 8. Inadmissível a intervenção de

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terceiros nas ações pautadas no Código de Defesa do Consumidor, sob pena de atrasar a solução do litígio em razão da necessidade de abrir novo contraditório e nova dilação probatória, prejudicando o consumidor. Apelações cíveis das rés desprovidas. Apelação cível dos autores parcialmente pro-vida.” (TJDFT – DirCons. 20130710053954APC – (933673) – 6ª T.Cív. – Rel. Des. Hector Valverde – DJe 19.04.2016 – p. 459)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de recurso de apelação que, nos autos da ação de indenização por lucros cessantes cumulada com danos materiais, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial para condenar as rés, de forma solidária, ao pagamento de lucros cessantes em favor dos autores, com valor dos alugueres em endereço e em imóvel similar ao indicado nos autos, desde outubro de 2009 até a data da efetiva entrega das chaves, acrescidos de correção monetária e de juros de mora de 1% ao mês.

Determinou ainda que as rés restituíssem aos autores a quantia paga por eles a título de taxas de condomínio antes da entrada no imóvel.

Os autores apelantes sustentam que as cooperativas não regularizavam suas documentações perante a Caixa Econômica Federal, o que impossibilitou que o contrato de financiamento fosse finalizado e, por essa razão, alegam que tiveram que buscar alternativas não planejadas para o pagamento da parcela de reforço de no valor de R$ 113.713,77, causando dano patrimonial passível de indenização.

Afirmam que a sentença que determinou que os lucros cessantes fossem apurados em liqui-dação de sentença não deve prosperar, pois os tribunais veem entendendo que a indenização a título de lucros cessantes na quantia de 0,5% sobre o valor atualizado do imóvel se mostra razoável e de acordo com a realidade do setor imobiliário desta capital.

Defendem que o termo inicial para a correção monetária dos valores devidos a título de inde-nização por lucros cessantes deve ser o momento em que os aluguéis seriam devidos, ou seja, a partir de cada mês de atraso.

Requerem a reforma da sentença para condenar as rés ao pagamento de R$ 21.468,55 a tí-tulo de reparação por danos materiais, com correção monetária a partir do desembolso e juros de mora a contar da citação; para condenar as rés ao pagamento de indenização por lucros cessantes na quantia de 0,5% sobre o valor atualizado do imóvel, por mês de atraso, com-preendendo o período de novembro de 2009 até junho de 2011, com correção monetária a contar de cada atraso e juros de mora a partir da citação; sucessivamente, condenar as rés ao pagamento de R$ 2.200,00 a título de lucros cessantes, por mês de atraso, compreendendo o período de novembro de 2009 a junho de 2011, com correção monetária a contar de cada atraso e juros de mora a partir da citação; fixar como termo inicial para a correção monetária dos valores devidos a título de lucros cessantes.

O TJDFT assim sentenciou:

“Ante o exposto, nego provimento ao recurso da ré Brookfield Centro Oeste Empreendimentos Imobiliários S/A e das rés Cooperbrapa Cooperativa Habitacional Econômica dos Empregados da Embrapa, Coopercâmara Cooperativa Habitacional dos Servidores da Câmara dos Depu-tados Ltda. e Coopersefe Cooperativa Habitacional dos Servidores do Senado Federal. Dou parcial provimento ao recurso dos autores para reformar a sentença e condenar as rés, solida-riamente, ao pagamento de 0,5% (meio por cento) do valor atualizado do imóvel a título de lucros cessantes, desde outubro de 2009 até a efetiva entrega do imóvel (junho de 2011), corrigidos pelo INPC e calculada a partir do efetivo prejuízo, ou seja, a contar do primeiro dia do término do prazo de tolerância até a efetiva entrega do imóvel, bem como juros de mora de 1% ao mês, contados da citação.

Diante da sucumbência mínima dos autores, condeno as rés ao pagamento das custas pro-cessuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, a teor do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).”

O Jurista Sebastião Pereira de Souza nos ilustra o contrato de compra e venda de acordo com a nova codificação, in verbis:

“A compra e venda é uma espécie do gênero contrato, com características próprias, mas que se aperfeiçoa, como todo acordo de vontade, como um ato jurídico ou na dicção da nova

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ordem – um negócio jurídico, que requer agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei.

Acrescentando, ao negócio jurídico, a coincidência de duas ou mais manifestações unilaterais de vontade, visando o proveito e bem-estar dos contratantes, temos aí, como consequência, o contrato.

A capacidade do agente que libera a sua vontade para contratar é ampla e só encontra limi-tação no interesse social – art. 421 do Código Civil, guardando as partes, tanto na conclusão como na execução, os princípios da probidade e boa-fé – art. 422.

O princípio da autonomia da vontade, ensina Sílvio Rodrigues, parte do pressuposto de que os contratantes se encontram em pé de igualdade, e que, portanto, são livres de aceitar ou rejeitar os termos do contrato.

1.1 Elementos da compra e venda

Pelo contrato de compra e venda um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e, o outro, a pagar-lhe o preço em dinheiro – art. 481 do Código Civil. O contrato de compra e venda é o meio, o instrumento para se transferir o domínio. Tem efeito mera-mente obrigacional que se implementa com a execução mediante a tradição se coisa móvel – art. 1.267 ou pelo Registro no Cartório do Registro Imobiliário – art. 1.245, se for coisa imó-vel. A obrigação do vendedor é de transferir o domínio do objeto contratado. A obrigação do comprador é de pagar o preço.

Segundo expressa disposição no art. 482, a venda é considerada perfeita desde que haja acordo sobre a coisa e sobre o preço. Três, portanto, são os elementos da compra e venda: consensus, pretium e res.

Consensus

O consenso ou consentimento é o resultado do encontro da declaração unilateral de vontades de um lado, do comprador sobre o bem, e, de outro lado, do vendedor sobre o preço. A vontade eivada de vício contamina todo o contrato. Anulável, portanto, é o contrato de compra e venda quando viciada a declaração de vontade por erro substancial, dolo e coação nas circunstâncias delineadas nos arts. 138 e seguintes do Código Civil.

Pretium

No contrato de compra e venda, o preço deve ser sério, em dinheiro, não podendo ser irrisório, e que consista numa soma que seja considerada equivalente à coisa, considerando a oferta e procura à época da contratação.

O preço vil pode levar à consideração não de um contrato de compra e venda, mas de doação simulada, cujo efeito pode levar à sua anulação como verbi gratia na doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice que pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal, – expressa disposição do art. 550 do Código Civil, considerando, mais ainda, as demais disposições que impedem a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador e, também, a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento – arts. 548 e 549. O preço pode ser pago em moeda corrente nacional à vista, em moeda estrangeira pela cotação do dia que converter em moeda nacional ou a prazo, em prestações. Sendo o preço pago com outro bem, compra e venda não é, pois a moldura é do contrato de troca que in thesi os efeitos não divergem muito, porque as disposições que se aplicam são as mesmas do contrato de compra e venda, exceto quando se tratar de troca entre ascendentes e descendentes – art. 533 – em que o negócio só depende da intervenção dos outros descendentes e do cônjuge, quando os bens trocados forem de valores desiguais:

‘Art. 533. Aplicam-se à troca as disposições referentes à compra e venda, com as seguintes modificações:

I – omissis;

II – é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e descendentes, sem consenti-mento dos outros descendentes e do cônjuge do alienante.’Fica sem efeito o contrato de compra e venda se o terceiro a quem foi deixado arbitrar o preço – art. 485, não aceitar o encargo, salvo se concordarem designar outra pessoa. O preço estipu-lado pelo terceiro indicado vincula os contratantes, até que se provem vícios na elaboração do

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laudo que inquinem de nulidade os negócios jurídicos em geral. A nova ordem civil considera lícito às partes fixarem o preço em função de índices ou parâmetros, desde que suscetíveis de objetiva determinação – art. 487. As partes podem escolher um padrão objetivo e de fonte isenta para a fixação do preço, como v.g. os índices estipulados por órgãos governamentais ou fundações de trato econômico. Ocorre, a meu falível juízo, que o índice ou parâmetro não pode ter origem em entidade de uma das partes, como na compra e venda de imóveis feita entre construtoras e particulares com base em índice Sinduscon/CUB elaborado pelo Sindicato das Empresas Construtoras, porque estaria, de forma transversa, deixando ao arbítrio exclusivo da construtora, através de seu sindicado, entidade defensora de seus interesses, a fixação do preço, fato que torna nulo o contrato por força do art. 489. Não havendo convencionado a fixação do preço ou critérios para a sua determinação, e não tendo a coisa tabelamento ofi-cial, dispõe a Lei – art. 488 do Código Civil –, que as partes sujeitarão ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor – art. 488. Convencionada a compra e venda de um veículo em determinada concessionária do ramo sem fixação do preço, vale o preço que o vendedor aliena a mesma marca nas vendas habituais. Havendo oscilação no preço valerá a média. A dificul-dade, porque não elucida a Lei – parágrafo único do art. 488 do Código Civil –, é disciplinar qual o tempo que se deve considerar para tirar a média.ResEm regra, ensina Carvalho Santos, são alienáveis todas as coisas que estão no comércio, quer sejam existentes, ou futuras, certas ou incertas, contanto que estas se venham a verificar. Sem a coisa, inexiste contrato, por falta do objeto, elemento essencial. Não há dúvida quando o objeto do contrato de compra e venda se constitui de coisa presente, atual. Do art. 483, disposição nova, a compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório. É futura a compra de determinada quantidade e qualidade da safra agrícola ou de determinado número de itens da produção industrial, em que o adquirente toma para si o risco de vir existir em qualquer quantidade. A venda no caso é de coisa certa esperada – emptio rei speratae. Vale o contrato para a quantidade produzida e o vendedor tem direito a todo o preço, desde que de sua parte não tenha havido culpa. Nada produzindo, mesmo em face de caso fortuito ou força maior, o contrato não se forma, a venda é nenhuma, por falta de elemento essencial, o objeto, a coisa contratada – art. 459, parágrafo único, do Código Civil. ‘Art. 459. Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada.Parágrafo único. Mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido.’Aleatória é a compra da esperança. A compra da expectativa. O comprador aposta na existên-cia da coisa no termo. Por isso mesmo, o objeto do contrato é a própria esperança, a própria expectativa – emptio spei. Alguém compra toda a safra de feijão ou café que produzir a lavoura do vendedor, assumindo o risco de colher muito ou nada colher. Neste caso, o objeto do negó-cio não foram os grãos, mas a esperança de colhê-los. Válido é o contrato, a teor da norma do art. 458, mesmo que nada venha a colher.‘Art. 458. Se o contrato for aleatório, por dizer respeito a coisas ou fatos futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma, terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa, ainda que nada do avençado venha a existir.’A aparente desproporção das prestações não descaracteriza a comutatividade do contrato e justifica porque ambos os contratantes assumiram igual risco. O vendedor recebeu um preço e ao adimplir o contrato o que entregar pode valer o dobro ou mais. O comprador pagou um preço com uma expectativa de lucro que pode redundar em prejuízo. É ainda aleatório o objeto concernente à compra de mercadoria já despachada, embarcada e sujeita ao risco do transporte assumido pelo adquirente, mesmo que já não existisse no dia do contrato, no todo ou em parte, por naufrágio do navio ou qualquer outro acidente com o veículo transportador, fazendo jus o vendedor a todo o preço, desde que ignorasse a consuma-ção do risco, a que no contrato se considerava exposta a coisa – arts. 460 e 461 do Código.” (A compra e venda no novo Código Civil. Juris Síntese. Porto Alegre: IOB-Thomson, set./out. 2005. 55 CD-Rom)

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2350 – Defesa do consumidor – promessa de compra e venda – imóvel – desistência do adqui-rente – distrato

“Consumidor. Promessa de compra e venda. Imóvel. Desistência do adquirente. Distrato. Extinção da execução lastreada em contrato desfeito. Os efeitos da formalização do distrato alcançam todos os promitentes-vendedores que integram o grupo econômico. O distrato da promessa de compra e venda de imóvel operado extrajudicialmente por uma das empresas que integram o grupo econô-mico e o adquirente da unidade fulmina a eficácia do título executivo, sendo de rigor a extinção do processo de execução lastreado em contrato extinto. Apelação desprovida.” (TJDFT – Cons. 20140111856208APC – (933694) – 6ª T.Cív. – Rel. Des. Hector Valverde – DJe 19.04.2016 – p. 454)

2351 – Desapropriação – coisa julgada – indenização – dano material

“Direito civil e administrativo. Coisa julgada. Desapropriação. Indenização. Dano material. Alega-ção de ofensa ao art. 5º, II, LIV e LV, da Constituição da República. Legalidade. Contraditório e am-pla defesa. Devido processo legal. Natureza infraconstitucional da controvérsia. Eventual violação reflexa da Constituição da República não viabiliza o manejo de recurso extraordinário. Acórdão recorrido publicado em 15.02.2002. 1. Obstada a análise da suposta afronta aos incisos II, LIV e LV, do art. 5º da Carta Magna, porquanto dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, procedimento que refoge à competência jurisdicional extraordinária desta Corte Suprema, a teor do art. 102 da Magna Carta. 2. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa direta e literal a preceito da Constituição da República. 3. Agravo regimental conhecido e não provido.” (STF – AgRg-AI 842.726 – Paraná – 1ª T. – Relª Min. Rosa Weber – J. 01.03.2016)

2352 – Desapropriação – interesse social

“Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Desapropriação por interesse social. Juros compensatórios devidos entre a imissão da posse (novembro/1980) e a data do laudo (ju-lho/1983). Súmulas nºs 74 e 136 do Tribunal Federal de Recursos. Justa indenização. Art. 161 da Constituição de 1967 (redação da Emenda Constitucional nº 1/1969). Incidência de correção monetária sobre o Valor da indenização, a refletir no cálculo dos juros compensatórios. Acórdão do Tribunal Federal de Recursos harmônico com a jurisprudência desta corte. Agravo regimental desprovido.” (STF – AgRg-RE 130.019 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 15.03.2016)

2353 – Desapropriação – liminar expropriativa – requisitos

“Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Ação de desapropriação. Liminar expropriativa. Requisitos. Ausência de avaliação prévia. Agravo regimental que não ataca os fundamentos da decisão agravada. Súmula nº 283 do STF. Incidência. Agravo regimental des-provido.” (STF – AgRg-RE-Ag 896.482 – Espírito Santo – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 26.04.2016)

2354 – Execução – título executivo extrajudicial – cédulas rurais hipotecárias

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Execução. Título executivo extrajudicial. Cédu-las rurais hipotecárias. Agravo em recurso especial intempestivo. Suspensão dos prazos processuais no tribunal estadual não demonstrada. Agravo regimental improvido. 1. Embora a jurisprudência desta Corte tenha evoluído para permitir a comprovação do recesso forense no âmbito dos tribu-nais estaduais em agravo regimental, no caso, a agravante não juntou documento idôneo capaz de demonstrá-lo. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 787.125 – (2015/0240348-2) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 29.04.2016 – p. 184)

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2355 – Hipoteca – execução – bem de empresa – penhora do imóvel

“Civil. Recurso especial. Execução. Empréstimo. Bem de empresa oferecido livremente por ela, em garantia real hipotecária de outra pessoa jurídica. Penhora do imóvel. Validade da hipoteca. Exce-ção à regra da impenhorabilidade do bem de família. Interpretação restritiva. Imóvel de propriedade de pessoa jurídica que nunca foi sede de empresa familiar. Penhorabilidade do bem. Validade da hipoteca oferecida livremente por empresa para garantir mútuo de outra pessoa jurídica. Recurso especial não provido. 1. A proteção legal conferida ao bem de família pela Lei nº 8.009/1990, ao instituir a sua impenhorabilidade, objetiva a proteção da própria família ou da entidade familiar, de modo a tutelar o direito constitucional fundamental da moradia e assegurar um mínimo para uma vida com dignidade dos seus componentes. 2. A lei estabelece, de forma expressa, as hipóteses de exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família, o que reflete o seu caráter excepcional, evidenciando que ela é insuscetível de interpretação extensiva. 3. A jurisprudência desta egrégia Corte Superior, em caráter excepcional, confere o benefício da impenhorabilidade legal, prevista na Lei nº 8.009/1990, a bem imóvel de propriedade de pessoa jurídica, na hipótese de pequeno empreendimento familiar, cujos sócios são seus integrantes e a sua sede se confunde com a moradia deles. Precedentes. Hipótese não configurada. 4. É consolidado o entendimento de que a impenho-rabilidade só não será oponível nos casos em que o empréstimo contraído foi revestido em proveito da entidade familiar, o que se verificou no caso. 5. É válida a hipoteca prestada por empresa que livremente ofereceu imóvel de sua propriedade para garantir empréstimo de outra pessoa jurídica. 6. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.422.466 – (2013/0383704-0) – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 23.05.2016 – p. 3413)

Comentário Editorial SÍnTESETrata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Fede-ral e Territórios, que recebeu a seguinte ementa:

“[...]

1. A matéria relativa à impenhorabilidade de bem de família pode ser alegada a qualquer tem-po (matéria de ordem pública), desde que não tenha sido anteriormente alegada e examinada. Precedente do e. STJ.

2. A Corte Superior compreende no ambiente de proteção da impenhorabilidade em razão da condição de bem de família os imóveis que aliam uma dupla finalidade, a saber, residência e local de funcionamento de empresa de índole familiar. Dessa forma, a projeção da impenhora-bilidade a pessoas jurídicas apenas se justifica quando se revelam como pequenas empresas com conotação familiar, a saber, em situações em que há identidade de patrimônios.

3. Quando o bem objeto da penhora constitui imóvel que, embora integrante do patrimônio de sociedade empresária, foi sempre utilizado apenas como moradia para um dos sócios e sua família, não se revela presente o caráter híbrido do imóvel que autoriza o alargamento da proteção. Ademais, se nunca houve a realização de empresa, não há suporte fático para se pleitear a aplicação do entendimento que se lastreia na utilização de um bem imóvel familiar para fins residenciais e empresariais.

3. A caracterização de um empreendimento empresarial como familiar para efeito da extensão social da norma da impenhorabilidade do bem de família para pessoa jurídica não se esgota no fato de os sócios serem integrantes de um núcleo familiar, devendo, ao revés, perpassar, necessariamente pelo exercício da empresa em situação própria de pequenos negócios volta-dos à mantença da família.

4. É imprescindível a confusão do patrimônio relativo ao suposto bem de família entre família e empresa.

5. Na hipótese de bem imóvel ser da propriedade de sociedade empresária, a qual, em nome próprio, deu o bem em garantia a dívidas contraídas perante o agravado, não se vislumbra o enquadramento na inteligência jurisprudencial que veda que o bem de família suporte dividas de terceiro. Isso porque o bem não está suportando a dívida de terceiros, e sim do próprio proprietário, o qual, por ser pessoa jurídica, não ostenta, a proteção de bem de família.

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6. A detenção ou, inclusive, a posse precária não dão azo à proteção da impenhorabilidade de bens, a qual evidentemente destina-se ao direito de propriedade, o qual não se sedimenta pela longa ocupação do bem. Nesta feita, porque a penhora atacada recai sobre o direito de propriedade, e não sobre a realidade jurídica fática titulada pelos agravantes e sua família, não encontra amparo jurídico a exceção fincada na impenhorabilidade.

7. A execução rege-se pelo princípio da menor onerosidade, mas também pelo postulado da eficiência, razão pela qual apenas no caso de figurarem presentes meios diversos para a sa-tisfação da dívida poder-se-ia cogitar da tarefa de valoração do meio menos ou mais oneroso.

8. Agravo de instrumento conhecido a que se nega provimento.”

Os recorrentes apontaram ofensa ao art. 535 do CPC/1973, arts. 1º e 3º, V, da Lei nº 8.009/1990, art. 48 da Instrução Normativa da RFB nº 1.005 e art. 620 do CPC/1973, além de dissídio jurisprudencial.

Em princípio, afirmaram que o acórdão recorrido foi obscuro e omisso em relação a pontos indispensáveis à solução da controvérsia, incorrendo em ofensa ao art. 535 do CPC/1973.

No mérito, sustentaram, em síntese, a impenhorabilidade do imóvel dado em garantia hipote-cária de financiamento tomado por sociedade empresarial dele proprietária, em benefício de outra pessoa jurídica, por se tratar comprovadamente de bem de família, nos termos da Lei nº 8.009/1990.

Narraram que o Banco do Brasil ajuizou ação de execução, visando obter a prestação juris-dicional referente ao pagamento das cédulas de crédito comercial nºs 96/00503-3, no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), e 96/00504-1, no valor de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais), ambas vencidas em 1998, que, em razão do inadimplemento, permitiu a sua penhora aos 06.04.2000.

Afirmaram que o imóvel penhorado na execução é bem de família, adquirido por herança pela recorrente Carmem, e que a garantia hipotecária dada pela empresa ARRT – Arrumação Transporte Ltda. é nula, porque não beneficiou os residentes dele, mas apenas a devedora ARR – Arquitetura, Decorações e Representações Ltda., devedora principal.

Relataram que peticionaram nos autos da execução acusando a indevida penhora do imóvel, pois se trata de bem de família que, ainda que dado em garantia de dívida, é o único da entidade, porque lá residem há 26 anos e foi construído pelo casal peticionante em 1987.

Noticiaram que a Juíza singular não reconheceu a impenhorabilidade, porquanto se trata de bem de propriedade de pessoa jurídica não beneficiária da Lei nº 8.009/1990, o que ensejou a interposição de agravo de instrumento.

Assinalaram que o recurso, apesar de ter sido recebido no efeito suspensivo, foi improvido porque o Tribunal a quo interpretou de forma equivocada a essência da legislação aplicável à impenhorabilidade do bem de família, na contramão da jurisprudência do STJ.

Sustentaram, porque idosos e aposentados, que esta Corte Superior deve declarar a impenho-rabilidade do bem penhorado, ainda que de propriedade de pessoa jurídica, o que resultará no reconhecimento do direito constitucional à moradia.

Registraram que o empréstimo o qual resultou na penhora do bem foi contraído pela sociedade empresarial ARR – Decorações, Comércio e Representações Ltda., cujos sócios são, além de um deles, outros dois que não pertencem ao núcleo familiar.

Asseveraram que o Código Civil de 1916 não traz disposição expressa sobre a necessidade de ser proprietário do bem para instituí-lo como bem de família.

Para eles, se o imóvel é habitado pela família, torna-se automaticamente bem de família.

Alertaram que a empresa ARRT – Arrumação Transportes Ltda. (proprietária do bem dado em garantia), somente nasceu para receber os bens de herança da recorrente, a Sra. Carmem, de modo que nunca teve qualquer atividade mercantil, nunca contraiu nenhum empréstimo e sequer existia de fato, tendo sido devidamente extinta e baixada pela Receita Federal do Brasil em outubro de 1997.

Sustentaram que, com a Lei nº 8.009/1990, o legislador se preocupou em proteger o direito à habitação familiar, mesmo nos casos em que não conste a entidade familiar como titular no álbum imobiliário, como no presente caso. Os recorrentes, ambos idosos e aposentados, dizem que criaram seus quatro filhos e netos no imóvel, sendo que uma neta continua ali morando com a mãe, que é separada.

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Alegaram que demonstraram, com base em elementos reais, que se trata de bem de família, pois o processo está instruído com a declaração de imposto de renda deles, comprovantes de residência (água e luz) e ainda, por fim, pela indicação do imóvel como endereço do casal, feita pelo próprio autor da execução, em 1999.

Ressaltaram que a proteção legal assegurada ao bem de família, de acordo com a jurisprudên-cia do STJ, não pode ser afastada por renúncia, por se tratar de princípio de ordem pública, que visa à garantia da entidade familiar.

Consignaram que, conforme ressaltado pelo acórdão recorrido, a pessoa jurídica beneficiária do empréstimo, ARR – Arquitetura, Decorações, Comércio e Representações Ltda., conforme contrato social de constituição, era composta por Carmem Lúcia, ora recorrente, e por Elayne Maria do Carmo Faria e Wilson Massias Gomes, pessoas estranhas ao núcleo familiar dos beneficiários.

Argumentaram, a fim de preservar o direito à moradia, escopo da Lei nº 8.009/1990, que é necessário, diante da realidade apresentada, considerar impenhorável a residência do casal/idoso, ainda que conste, no cartório imobiliário, o nome da sociedade comercial familiar ARRT – Arrumação Transportes Ltda., empresa devidamente baixada e extinta pela RFB, de modo que, sequer goza de personalidade jurídica desde outubro de 1997.

Asseveraram que esse normativo visa salvaguardar a moradia da família, não necessitando ser o imóvel próprio, pois a proteção legal conceitua o direito no binômio residência-familiar. Argumentam, nesse sentido, que a exceção prevista no art. 3º, V, da Lei nº 8.009/1990 só incide quando a hipoteca é instituída como garantia de empréstimo tomado diretamente em favor dos próprios devedores, o que não sucede na espécie, visto que valor tomado junto ao recorrido destinou-se em benefício de pessoa jurídica, cuja sociedade era composta também por Elayne Maria do Carmo Faria e Wilson Massias Gomes (fl. 901), sendo que o primeiro recorrente sequer era sócio da tomadora do empréstimo).

Somam que, além de constar no quadro societário duas outras pessoas que não os recorrentes, para afastar a impenhorabilidade do bem, haveria que se provar que o investimento tenha sido em benefício da família, e não mera presunção , e que a natureza jurídica do bem de família se deita, justamente, em assegurar a promoção da dignidade da pessoa humana, por meio da manutenção do mínimo patrimonial inerente ao desenvolvimento de seus integrantes (e-STJ, fl. 1.004).

Queixam-se, também, de ofensa ao princípio da menor onerosidade previsto no art. 620 do CPC/1973, porque se pretende a penhora de um imóvel avaliado em R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) para garantir uma dívida atual de apenas R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Anotam que procuraram o credor para composição da dívida, mas este se recusa a negociar e insiste na penhora.

Aduzem que a lei não exige o registro no cartório para se considerar bem de família a proprie-dade de quem tem a posse há mais de 26 anos e anotam que não importa que conste pessoa jurídica como proprietária dele, porque, por força do acordo judicial realizado quando da par-tilha dos bens deixados pelo genitor da recorrente Carmem, o imóvel passou a lhes pertencer.

O STJ negou provimento ao recurso.

O relator assim considerou:

“O acórdão recorrido bem consignou que era válida a hipoteca prestada por empresa que livremente ofereceu imóvel de sua propriedade, no caso a ARRT, para garantir empréstimo de outra pessoa jurídica, a ARR, tendo um mesmo sócio que representa as duas sociedades empresárias – Carmem. Aquela empresa, na qualidade de proprietária do bem, foi garante do empréstimo, devendo, por isso, ser responsável pelo inadimplemento da obrigação da ARR no mútuo que fez no Banco do Brasil. Por se tratar de bem de pessoa jurídica, e, o imóvel nunca foi sede de empresa com conotação familiar, ele não ostenta a proteção legal.

Finalmente, entendo que não há se falar em ofensa ao art. 620 do CPC/1973, porque não se pode desprezar que a execução deve atender também o interesse do credor, e, após longos anos, não há notícia de providência concreta para pagamento da dívida contraída.

José Rogério Cruz e Tucci disciplina sobre a Hipoteca judiciária:

“Havendo, pois, sentença de natureza condenatória, impondo ao réu o pagamento de quan-tia certa ou a entrega de determinada coisa, aflora para o autor o direito de constituição da hipoteca judiciária.”

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Dispõe, com efeito, o caput do art. 466 do Código de Processo Civil que: “A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação consistente em dinheiro ou em coisa, valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma prescrita na Lei de Registros Públicos.”

Comentando essa norma processual, aduz Moacyr Amaral Santos que: “Do só fato de haver sentença de efeito condenatório resulta, por força da lei, hipoteca judiciária sobre os bens imóveis do condenado e, assim, o poder do autor de fazer inscrevê-la mediante simples man-dado do juiz.”

Enfatizam, a propósito, Marçal Justen Filho, Eduardo Talamini e Egon Bockmann Moreira que a respectiva sentença constitui imediatamente a hipoteca judiciária, não importando qual seja o seu conteúdo e do que dela conste. “Basta que traga em si alguma condenação pecuniária ou a entrega de coisa.”

E, por isso, sustenta Theotonio Negrão, à luz do transcrito art. 466, que a hipoteca judiciária “é consequência imediata da sentença, pouco importando a pendência ou não de recurso contra esta”.

Verifica-se, nesse sentido, que, na esteira de alguns precedentes, a 12ª Câmara do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, em julgamento unânime, teve oportunidade de patentear que, in verbis:

“A sentença que condena o réu no pagamento de prestação em dinheiro vale como título cons-titutivo de hipoteca judiciária (CPC, art. 466, caput).

Cuida-se de efeito que não depende do trânsito em julgado da decisão, nascendo da publica-ção da sentença de mérito condenatória (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil bra-sileiro, v. 2/230; PIMENTEL, Wellington Moreira. Comentários ao Código de Processo Civil, v. III/567; THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de conhecimento, v. II/667).”

Trilhando idêntico posicionamento, a 5ª Câmara do mesmo sodalício paulista, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 445.726-9, sendo Relator o Juiz Alvares Lobo, houve por bem dar provimento ao recurso, uma vez que, in casu, “a sentença foi proferida em ação de res-ponsabilidade civil, decorrente de acidente automobilístico e condenada a agravada a reparar o dano, cujo montante será apurado por simples cálculo do Contador. Dispensando o trânsito em julgado da sentença, há um acórdão do e. Tribunal de Justiça e publicado na RT 596/99, sendo Relator o Des. Joaquim de Oliveira”.

3. Procedimento para a constituição da hipoteca judiciária

A despeito de constituir importante instrumento preventivo de fraude à execução, verifica-se que, por não conter regulamentação procedimental específica, o instituto da hipoteca judiciária é de rara incidência prática.

Considerando a lacuna legal atinente ao procedimento a ser observado para a concretização dessa espécie de hipoteca, os doutrinadores pátrios têm procurado traçar algumas diretrizes básicas, sob pena de ser nula, ipso iure, aquela providência judicial.

Examinando essa relevante questão, Luiz Alberto Hoff anota ter sido muito incipiente o tra-tamento atribuído à hipoteca judicial pelo Código de Processo Civil, “e, por conseguinte, tão pouco lhe dedicou à doutrina, que aqueles que se deparam com o art. 466 do CPC, embora tendo à sua frente a afirmação da lei de que a sentença produz a hipoteca, não se animam a postular a sua especialização e inscrição por falta de diretriz processual; o caminho, entretan-to, é simples, bastando peticionar nos próprios autos em que foi dada a sentença, registrando: 1) a estimativa da repercussão financeira da responsabilidade do perdedor da ação; 2) a exis-tência de imóveis em nome do devedor, e seus valores estimados; 3) requerendo seja expedido o mandado de especialização da hipoteca sobre aqueles imóveis, ou sobre tantos quantos bastem à satisfação da responsabilidade. O juiz avaliará, com seu prudente arbítrio, os valores estimados pelo postulante, recorrendo a peritos, se necessário, mas sempre tendo em vista a necessidade de acelerar a inscrição da hipoteca”.

Ademais, não pode restar dúvida que ao devedor – que vai sofrer todos os ônus emergentes do direito real de garantia consistente na hipoteca judiciária – devem ser asseguradas, no iter procedimental, todas as garantias ínsitas ao devido processo legal.

Recorde-se, aliás, que o art. 5º, LIV, da Constituição Federal, acolhendo tradicional princípio de justiça, reza que: “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido pro-cesso legal”.

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Despiciendo salientar que a garantia da plenitude da defesa reclama sejam os sujeitos parciais do processo cientificados de todos os atos praticados no desenrolar do procedimento civil ou penal, com a probabilidade de manifestar-se sempre, e no prazo legal, ou no fixado pelo juiz, sobre a atividade desenvolvida pelo antagonista.

Com efeito, a bilateralidade da audiência, ou contraditoriedade, assenta-se num importantíssi-mo regramento, dito princípio de justiça, e determinante da exigência de tratamento paritário das partes, de tal sorte que haja o mais perfeito equilíbrio entre as suas respectivas atividades processuais.

Traduzindo doutrinação universal, aduzem, a propósito, Mauro Cappelletti e Vincenzo Vigoriti que:

“O direito de ação e defesa não está limitado ao pedido inicial ou à resposta, mas expressa também uma garantia geral do direito de ser adequadamente ouvido durante todo o procedi-mento. Cada fase do procedimento deve ser estruturada de tal modo que propicie às partes uma real oportunidade de defesa.

Deflui, à evidência, dessa perspectiva, o fundamento lógico da regra do contraditório, moldado na vetusta máxima audiatur et altera parte.

Expressão da estrutura dialética do processo, em decorrência do caráter bilateral da ação, a contraditoriedade inculca-se, marcantemente, no procedimento de formação de convencimen-to do juiz e decorrente pronunciamento judicial.

Daí por que se faz ela instituída, também, no interesse da própria Justiça e, consequentemen-te, do julgador, que, por força do diálogo encetado pelas opostas e contrastantes alegações, encontra, iluminado sob os mais diversos aspectos, o caminho da verdade e do Direito.

E, como não poderia ser diferente, o nosso Código de Processo Civil, em diversos dispositivos, assegura não só o direito de ser informado no momento da fase postulatória, como também a bilateralidade da audiência ao longo de todo o desenrolar do procedimento: arts. 125, 213, 214, 297, 398, 421, 452, 454, 518, 552, § 1º, 554.

É, aliás, da própria sistemática do Código de Processo Civil que se infere, também para a instituição da hipoteca judiciária, a exigência de observância do princípio do contraditório.

Realmente, se para a constituição da penhora – objetivando, igualmente, a garantir a efetivi-dade futura de provimento condenatório – o devedor se manifesta a cada momento (arts. 652, 654, 655, 668, 669), não pode restar dúvida de que, para a hipoteca em apreço, o devedor também necessita ser ouvido!

E isso, até porque, a teor do disposto no art. 620 do Código de Processo Civil, ‘quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor’.

Mas não é só...

Caio Mário da Silva Pereira, após elencar, como ressaltado, dentre os pressupostos da hipoteca judiciária a especialização, ensina que por esta se impõe ‘referência precisa ao imóvel gravado e à dívida garantida’. Somente preenchidos todos os requisitos – complementa o civilista pátrio – é que se viabiliza a hipoteca judicial.

Esposando idêntica opinião, esclarece Wellington Moreira Pimentel que o direito de sequela decorrente da hipoteca judiciária não engloba todos os bens do devedor. É imprescindível que se especialize, isto é, ‘que se individualize o imóvel, ou imóveis, sobre os quais recairá a hipoteca judicial para que possa ser oponível a terceiros’, e, por certo, para que possa ser registrada.

Por outro lado, mesmo assistindo direito ao credor, como visto, à hipoteca judiciária, deve ser ela efetivada, a teor da parte final do caput do art. 466 do Código de Processo Civil, em consonância com as normas cogentes da Lei de Registros Públicos.

Tal orientação, com efeito, tem sido perfilhada pelos pretórios brasileiros, inclusive pelo 1º Tribunal de Alçada Civil paulista, como evidencia, dentre outros, acórdão da 11ª Câmara, ao deixar assentado que a inscrição da hipoteca judiciária deve ser ‘ordenada pelo Juiz, de acordo com a forma prescrita na Lei de Registros Públicos, como determina, ainda, a parte final do art. 466, para produzir efeito em relação a terceiros...’.

A 17ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, fiel a tal princípio, também teve opor-tunidade de patentear, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 88.873-2, que:

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‘A hipoteca judiciária pode ser inscrita, desde que se ajuste às disposições legais, independen-temente de pendência ou não de recurso...’.

Ora, o art. 175, III, da Lei de Registros Públicos, de clareza notória, dispõe que se faz necessá-rio, para o respectivo registro, ‘o valor do contrato, da coisa, da dívida, prazo desta, condições e mais especificações, inclusive os juros, se houver’.

Acrescente-se que a ordem judicial e, por via de consequência, o respectivo mandado deverá atender ao disposto nos arts. 175, III, e 225, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973.” (Hipoteca judiciária e devido processo legal. Disponível em: http://online.sintese.com.)

2356 – Hipoteca – restituição de emolumentos – cancelamento – registro único

“Civil e processual civil. Restituição de emolumentos. Cancelamento hipoteca. Após incorporação. Registro único. 1. O § 1º do art. 237-A da Lei nº 6.015/1973 é claro ao preceituar que após o registro da incorporação imobiliária as averbações relativas a direitos reais de garantia serão consideradas como ato único, acarretando, assim, a cobrança de um ato de averbação. 2. O cancelamento de hi-poteca que recaía sobre o imóvel, que originou o empreendimento deve ser efetivado na matrícula originária, bem como em todas as unidades autônomas, mas cobrando-se o valor de custas e emo-lumentos de apenas um ato registral. 3. Recurso desprovido.” (TJDFT – PC 20140710097918APC – (933227) – 2ª T.Cív. – Rel. Des. Mario-Zam Belmiro – DJe 13.04.2016 – p. 184)

2357 – ITBI – atualização dos valores venais dos imóveis – decreto

“Tributário e processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Imposto de Trans-missão de Bens Imóveis (ITBI). Atualização dos valores venais dos imóveis. Decreto municipal nº 46.228/2005. Afastamento de suas regras, pelo tribunal de origem. Matéria de direito local. Sú-mula nº 280 do STF. Agravo regimental improvido. I – Agravo regimental interposto em 18.03.2016, contra decisão publicada em 15.03.2016. II – O Tribunal de origem, por entender que eram ilegais e obscuros os parâmetros estabelecidos no Decreto municipal nº 46.228/2005, para a fixação da base de cálculo do ITBI, determinou a adoção do critério previsto na Lei municipal nº 11.154/91. III – As-sim, torna-se inviável, em Recurso Especial, o exame da matéria nele inserida, diante da incidência, por analogia, da Súmula nº 280 do STF, que dispõe: ‘Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário’. Nesse sentido: STJ, AgRg-AREsp 768.980/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe de 05.02.2016; AgRg-AREsp 715.456/SP, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., DJe de 04.09.2015; AgRg-AREsp 695.751/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., DJe de 19.08.2015; REsp 1.219.229/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe de 03.02.2014. IV – Agravo Regimental improvido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 854.166 – (2016/0012408-5) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 11.05.2016 – p. 2152)

2358 – ITBI – base de cálculo – valor da arrematação

“Tributário. Imposto de transmissão de bens imóveis. Base de cálculo. Valor da arrematação. Sú-mulas nºs 83 e 568/STJ. É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a arrematação corresponde à aquisição do bem alienado judicialmente, razão pela qual a base de cálculo do ITBI é o valor alcançado na hasta pública. Incidência das Súmulas nºs 83 e 568 do STJ. Agravo interno improvido.” (STJ – AGInt-Ag-REsp 881.107 – (2015/0319052-0) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 12.05.2016 – p. 2767)

2359 – ITCMD – apresentação de documentos ao fisco – arrolamento de bens – não cabimento

“Tributários e processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Imposto sobre Transmissão Causa Mortis (ITCMD). Apresentação de documentos ao fisco. Arrolamento de bens. Não cabi-mento. 1. A orientação da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que ‘a homologação da partilha não pressupõe atendimento a obrigações tributárias acessórias relativas ao imposto sobre transmissão ou à ratificação dos valores pelo Fisco estadual; somente após o

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trânsito em julgado da sentença homologatória é que a Fazenda verificará a correção dos montan-tes recolhidos, como condição para a expedição e a entrega do formal de partilha e dos alvarás’ (AgRg-AREsp 270.270/SP, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., J. 20.08.2015, DJe 31.08.2015). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.444.860 – (2014/0067831-9) – 2ª T. – Relª Min. Diva Malerbi – DJe 21.03.2016 – p. 933)

2360 – Laudêmio – cláusula que transfere para os adquirentes de imóvel o ônus de arcar com o pagamento – União – validade

“Embargos de declaração no recurso especial. Civil. Cláusula que transfere para os adquirentes de imóvel o ônus de arcar com o pagamento do laudêmio devido à União. Validade. Abuso. Não caracterizado. Omissão e obscuridade. Ausência. Embargos rejeitados. 1. O v. aresto embargado foi claro e coerente, possibilitando a exata interpretação do julgado. 2. O tema da validade de cláusula contratual inserta em contratos de promessa de compra e venda de imóveis situados em terreno de marinha, que transfere para os promitentes-adquirentes o ônus de arcar com o pagamento do lau-dêmio devido à União, foi devidamente analisado, levando-se em consideração todos os elementos relevantes constantes dos autos, nos limites trazidos no recurso especial, inexistindo omissão ou obscuridade que autorize a oposição dos declaratórios. 3. Embargos declaratórios rejeitados.” (STJ – EDcl-REsp 888.666 – (2006/0206952-0) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 14.04.2016 – p. 2663)

2361 – Locação de imóveis – ação indenizatória – ação rescisória

“Recurso especial. Locação de imóveis. Ação indenizatória. Ação rescisória. Dolo processual. Erro de fato. Não caracterização. Fundamentação sucinta. Nulidade. Ausência. Reapreciação de provas. Inviabilidade. Formas de liquidação. Fungibilidade. Julgamento extra ou ultra petita. Não ocor-rência. Prescrição. Direito pessoal. Regra geral. 1. Recurso especial originário de ação rescisória proposta com fundamento no art. 485, incisos III, IV, V e IX, do Código de Processo Civil/1973, que busca desconstituir acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que manteve sentença de procedência, nos autos de ação de indenização por perdas e danos ocasionados a imóvel locado e suas benfeitorias durante a ocupação do bem em decorrência de contrato de locação. 2. Tendo em vista a natureza pessoal da relação de locação, o sujeito ativo de eventual ação de despejo ou indenizatória por perdas e danos ocasionados ao imóvel locado identifica-se com a figura do loca-dor, assim definido no respectivo contrato de locação, podendo ou não coincidir com a figura do proprietário. 3. A hipótese de cabimento da ação rescisória insculpida no inciso III, primeira parte, do art. 485 do Código de Processo Civil/1973 (dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida) deve estar estampada em atos intencionais graves, que configurem deslealdade processual, de modo a influenciar negativamente a decisão judicial. 4. A fundamentação sucinta é admitida desde que, derivada da convicção motivada do órgão julgador, seja suficiente para resolver a con-trovérsia posta nos autos e atente para a prova produzida. 5. A ação rescisória é medida extrema e excepcional que não serve para reapreciar as provas produzidas ou para a análise acerca de sua correta interpretação pelo acórdão rescindendo. 6. Quanto às modalidades de liquidação, vige no sistema processual civil o princípio da fungibilidade, segundo o qual a determinação do quantum debeatur deve se processar pela via adequada, independentemente do pedido feito pela parte ou do preceito expresso na decisão judicial. 7. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.590.902 – (2011/0259840-6) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 12.05.2016 – p. 2871)

2362 – Locação de imóveis – exoneração de fiança – notificação extrajudicial

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ausência de prequestionamento. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. Locação de imóveis. Embargos à execução. Exoneração de fiança. Notificação extrajudicial. Efeitos do art. 835 do Novo Código Civil. Divergência jurisprudencial não demonstrada. Agravo improvido. 1. É inadmissível o recurso especial quanto à questão que não foi apreciada pelo Tribunal de origem. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. Nos termos do

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art. 835 do Código Civil, ‘o fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante ses-senta dias após a notificação do credor’. 3. O dissídio jurisprudencial não foi demonstrado, pois a parte agravante não demonstrou as similitudes fáticas e divergências decisórias entre os casos confrontados. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 825.080 – (2015/0301825-3) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 27.05.2016 – p. 2057)

2363 – Loteamento irregular – responsabilidade pela regularização – Súmula nº 283/STF

“Administrativo e processual civil. Loteamento irregular. Responsabilidade pela regularização. Re-curso especial com seguimento negado. Súmula nº 283/STF. Recurso interno que veicula razões re-cursais dissociadas do fundamento da decisão. Aplicação da Súmula nº 284/STF. Agravo regimental não conhecido. 1. Não se conhece do Agravo Regimental que veicula razões recursais dissociadas do fundamento da decisão recorrida, ante a incidência da Súmula nº 284/STF. 2. A decisão agra-vada negou seguimento ao Recurso Especial verificando que não foi impugnado especificamente fundamento essencial do acórdão recorrido, qual seja, de que o desprovimento da Apelação se deu não pela negativa de responsabilidade do loteador, mas sim pela circunstância particular de serem estes meros possuidores do imóvel em questão, não ostentando título dominial, requisito necessário para a regularização do loteamento, não podendo sujeitar-se à obrigação que lhe é cabível. 3. No Regimental, o Agravante não tenta rebater esse fundamento, indicando como motivo norteador do óbice matéria diversa daquela indicada no decisum agravado, razão pela qual se verifica que suas razões são dissociadas. 4. Agravo Regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-REsp 1.298.172 – (2011/0247596-6) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 16.05.2016 – p. 1477)

2364 – Penhora – imóvel – garantia real de hipoteca

“Processual civil. Embargos de terceiro. Penhora sobre imóvel com garantia real de hipoteca. I – O bem gravado por hipoteca não é impenhorável e o titular do direito real sobre a coisa deve ser inti-mado da execução (art. 615, II, CPC de 1973) a fim de que possa, querendo, sub-rogar-se aos direi-tos creditórios do exequente. Todavia, a inexistência de intimação determinada pelo art. 615, II, do CPC de 1973 não implica necessariamente em nulidade da constrição judicial, mas torna sem feito eventual alienação do bem no curso do processo executivo em relação ao credor hipotecário não intimado. II – Ainda que ausente intimação da penhora, não há falar em nulidade do ato constricio-nal, mas sim da inoperância de eventual alienação em relação ao detentor do direito real de garan-tia, cuja preferência pelos créditos exequendos dispensa declaração judicial, uma vez que, ‘embora não tenha proposto ação de execução, pode exercer sua preferência nos autos de execução ajuiza-da por terceiro, uma vez que não é possível sobrepor uma preferência de direito processual a uma de direito material’ (AgRg-EDcl-REsp 775.723/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 09.06.2010). III – Apelação da CEF a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AC 2007.38.01.002332-5/MG – Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian – DJe 20.05.2016 – p. 454)

2365 – Posse – bens imóveis – ação de imissão

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Posse. Bens imóveis. Ação de imissão na posse. Controvérsia dirimida à luz das circunstâncias do caso concreto e dos elementos de convicção dos autos. Reexame. Inviabilidade. Súmula nº 7 do STJ. Agravo que não impugna especificamente o fundamento da inadmissibilidade do apelo nobre. Recurso manejado sob a égide do CPC/1973. Manutenção do julgado. Agravo regimental não provido. 1. Incumbe ao agravante infirmar espe-cificamente todos os fundamentos da decisão agravada, demonstrando o seu desacerto, de modo a justificar o cabimento do recurso especial interposto, sob pena de não ser conhecido o agravo (art. 544, § 4º, I, do CPC). 2. Não sendo a linha argumentativa apresentada pela agravante capaz de evidenciar a inadequação dos óbices invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ser ele integralmente mantido.

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3. Inaplicabilidade das disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, ao caso concreto ante os termos do Enunciado nº 1 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 718.441 – (2015/0123036-7) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 03.05.2016 – p. 269)

2366 – Registro – titular de serviços notariais – perda da delegação – magistrado como úni-ca autoridade processante – previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998 – ausência de vício

“Processual civil. Administrativo. Disciplinar. Titular de serviços notariais e de registro. Perda da delegação. Embargos de declaração. Alegação de omissão. Magistrado como única autoridade pro-cessante. Previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998. Ausência de vício. Alegado cerceamento. Indeferimento de adiamento para distribuição de memoriais. Inexis-tência. Precedente. Mérito. Rediscussão. Impossibilidade. Rejeição. 1. Embargos de declaração fo-ram opostos contra acórdão que negou provimento ao recurso ordinário interposto contra decisum que firmou a inexistência de direito líquido e certo à anulação de processo disciplinar instaurado contra titular de serventia extrajudicial sob a alegação de que deveria ter sido o regrado pela Lei nº 10.098/1994 (Estatuto e Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio Grande do Sul); alega omissão e cerceamento de defesa. 2. Não há a omissão alegada; há apenas a postulação de reapreciação do mérito, tendo sido o acórdão claro e completo, ao indicar que, no caso concreto, não há falar em nulidade pela instauração e processamento da recorrente pelo ma-gistrado local; tal proceder é previsto no art. 18, I e II, da Lei Estadual nº 11.183/1998, com amparo no art. 73 da Lei Estadual nº 7.359/1980 (Código de Organização Judiciária do Estado) e no art. 37 da Lei Federal nº 8.935/1994. 3. O indeferimento do pedido da parte de adiamento de julgamento em razão do pleito de distribuição de memoriais não configura o alegado cerceamento de defesa: ‘[...] A apresentação de memoriais não é ato substancial e intrínseco à defesa, motivo pelo qual o in-deferimento da retirada do processo de pauta para julgamento, para ensejar a sua apresentação, não acarreta cerceamento de defesa [...]’ (RMS 15.674/MG, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJ 22.04.2003, p. 196). 4. Não existem vícios. Há irresignação da parte embargante com o resultado do julgado, que, em razão da inexistência de nenhum vício, determina a rejeição dos embargos de declara-ção. Precedentes: ED-MS 26.696/DF, Relª Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, Processo Eletrônico publicado no DJe-218 em 06.11.2014; e ED-AgR-MS 26.111/DF, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª T., Acórdão Eletrônico publicado no DJe-100 em 28.05.2013. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-MS 49.893 – (2015/0307377-4) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 16.05.2016 – p. 1531)

2367 – Responsabilidade civil – compromisso de compra e venda de imóvel – excludentes de responsabilidade – lucros cessantes

“Direito civil. Responsabilidade civil. Compromisso de compra e venda de imóvel. Excludentes de responsabilidade. Lucros cessantes. 1. Na forma do art. 46 da Lei nº 9.099/1995, a ementa serve de acórdão. Recurso próprio, regular e tempestivo. 2. Responsabilidade civil. Atraso na entrega de unidade imobiliária. O promitente vendedor responde pelo atraso na entrega de unidade imobiliária objeto de promessa de compra e venda (art. 395 do CC). 3. Exceção de contrato não cumprido. Sem demonstração nos autos de que o promitente comprador se encontrava em mora com suas obrigações, não há que se falar em exceção de contrato não cumprido a afastar a obrigação de o promitente vendedor indenizar os prejuízos decorrentes da indisponibilidade do bem. 4. Excluden-tes de responsabilidade. Fato do príncipe. Sem demonstração da existência de atuação estatal im-previsível, posterior ao contrato, apta a atingir, diretamente a relação contratual, não cabe invocar

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o fato do príncipe como excludente de responsabilidade. As eventuais dificuldades de obtenção do habite-se acham-se inseridas na álea contratual e, portanto, dentro da previsibilidade do empreen-dimento, principalmente quando há no contrato prazo de tolerância de 180 dias para a entrega do imóvel (Acórdão nº 901039, 0714109-36.2015.8.07.0016). 5. Lucros cessantes. O atraso na entre-ga de imóvel prometido à venda caracteriza mora, obrigando o promitente vendedor a indenizar o promitente comprador pelos lucros cessantes em razão da privação do uso e utilidade do imóvel, como previsto no art. 402 do Código Civil. O prejuízo do promitente comprador é presumido, razão por que independe da comprovação de pagamento dos aluguéis pela parte (AgRg-REsp 1202506/RJ 2010/0123862-0, Rel. Min. Sidnei Beneti). O valor da indenização foi estabelecido pelo senten-ciante de conformidade com a prova dos autos. 6. Recurso conhecido, mas não provido. Custas processuais e honorários advocatícios, no percentual de 10% da condenação, pelo recorrente.” (TJDFT – Proc. 20150710049322 – (934611) – 2ª T.R.J.E. Distrito Federal – Rel. Juiz Aiston Henrique de Sousa – DJe 19.04.2016 – p. 545)

2368 – SFH – adjudicação – imissão na posse – taxa de ocupação – prescrição

“Civil e processual civil. SFH. Adjudicação. Imissão na posse. Taxa de ocupação. Prescrição. Art. 206, § 3º, I, CC. Termo a quo. Transcrição no registro imobiliário. Art. 38 do DL 70/1966. Pa-râmetro de fixação. Parcial provimento apelação. 1. Por ter a mesma natureza que o aluguel, à taxa mensal de ocupação de que trata o art. 38 do DL 70/1966 deve ser aplicada a regra prescricional do art. 206, § 3º, I, do CC. Considerando que sua exigência é mensal, não há que se falar em prescrição do direito de cobrá-la, mas das parcelas que antecedem três anos ao ajuizamento do pedido. 2. O termo inicial para arbitramento da taxa mensal de ocupação tem como regra geral a ser observa-da, por interpretação do art. 38 do DL 70/1966, a data da transcrição da carta de arrematação no Registro de Imóveis, respeitando-se, por óbvio, quando for o caso, o prazo prescricional. 3. Não apresentados fundamentos suficientes a infirmar o parâmetro utilizado no arbitramento da taxa de ocupação do imóvel, 0,5% do valor da arrematação, não se justifica a reforma da sentença para remeter à fase de liquidação a apuração do montante devido a esse título. 4. Apelação parcialmente provida, para reformar em parte a sentença, declarando prescritas as parcelas relativas à taxa mensal de ocupação, anteriores aos três anos da data do ajuizamento desta ação (art. 206, § 3º, I, do CC).” (TRF 1ª R. – AC 2008.38.00.033873-3/MG – Rel. Juiz Fed. Evaldo de Oliveira Fernandes Filho – DJe 19.04.2016 – p. 502)

2369 – SFH – aferição de interesse jurídico da Caixa Econômica Federal – inexistência de risco de comprometimento do FCVS – competência da Justiça Comum estadual

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. SFH. Aferição de interesse jurídico da Caixa Econômica Federal. Inexistência de risco de comprometimento do FCVS. Competência da Justiça Comum estadual. Exame de fatos e de provas. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. Agravo regimental não provido. 1. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que a com-petência do processamento e julgamento das ações securitárias de imóveis financiados pelo SFH, com risco de comprometimento do FCVS, pertence à Justiça Federal. 2. A acolhida da pretensão recursal – no tocante à necessidade de reconhecer a competência da Justiça Federal para o regular processamento dos autos – demanda prévio exame do conjunto fático-probatório dos autos, com o intuito de aferir se os contratos de SFH estão fundadas em apólices públicas (ramo 66) ou não. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 603.135 – (2014/0274325-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 13.04.2016 – p. 4480)

2370 – SFH – quitação do saldo devedor – duplicidade de financiamento de imóveis

“Civil e processual civil. Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Quitação do saldo devedor. Du-plicidade de financiamento de imóveis pelo SFH, com cobertura do Fundo de Compensação de Va-riações Salariais (FCVS). Recurso de apelação. Homologação do pedido de desistência. Cessão de

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crédito não demonstrada. Recurso adesivo prejudicado. 1. Pedido de desistência do recurso de ape-lação da CEF que se homologa (art. 998 do CPC/2015). 2. Considerando que o contrato inicial foi firmado com a Socilar S.A. e que não há, nos autos, prova de que tenha ocorrido a referida cessão de crédito à CEF ou mesmo que a parte devedora tenha sido cientificada da mencionada transação, na forma do art. 286 do Código Civil (art. 1.065 do anterior), deve ser rejeitada a alegação de ile-gitimidade passiva da primeira instituição citada. 3. A documentação juntada aos autos comprova que a parte autora celebrou contrato de financiamento de imóvel com a Vivenda – Associação de Poupança e Empréstimo, o que demonstra a existência de relação jurídica com a citada instituição financeira. 4. Diante da homologação do pedido formulado pela CEF, referente à desistência de seu recurso de apelação, fica mantida a sentença que reconheceu o direito dos autores à quitação do saldo residual do contrato de financiamento habitacional, mesmo porque está em consonância com o entendimento firmado pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, nos termos previstos no art. 543-C do CPC, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.133.769/RN. 5. Apelação da Socilar S.A. não provida. 6. Recurso adesivo dos autores que se julga prejudicado.” (TRF 1ª R. – AC 2005.39.00.000181-0/PA – Rel. Des. Fed. Daniel Paes Ribeiro – DJe 16.05.2016 – p. 952)

2371 – Usucapião especial urbano – imóvel financiado pelo SFH – hipoteca

“Constitucional. Civil. Usucapião especial urbano. Art. 183, da CF. Imóvel financiado pelo SFH. Hipoteca em favor da CEF cancelada. Requisitos atendidos. Possibilidade. 1. Apelação interposta pela CEF, em face da sentença que julgou procedente o pedido de usucapião de imóvel urbano. 2. Demandante que adquiriu o imóvel usucapiendo por cessão de terceiros, além de não ter celebra-do qualquer contrato com a Caixa. 3. Consoante a matrícula do imóvel acostada aos autos, o mesmo não foi comprado da Caixa. O contrato de financiamento foi firmado em 20.11.1986 entre a Coope-rativa Habitacional de Fortaleza – COHAFOR e o primeiro contratante, pertencendo o crédito hipo-tecário ao Banco do Estado do Ceará (que o caucionou ao Banco Nacional de Habitação – BNH). O Banco do Estado do Ceará cedeu o referido crédito hipotecário ao Estado do Ceará e este, por fim, à Caixa Econômica Federal – CEF. 4. Houve o cancelamento da hipoteca e da caução em favor da CEF, ambos com autorização da credora, de modo que não mais subsiste qualquer gravame sobre o citado imóvel. 5. Intimada a apresentar o contrato de mútuo e hipoteca realizada com o(a) adqui-rente do imóvel, além dos Avisos de Recebimento – AR comprovando o envio das correspondências de notificações ao ex-mutuário ou ao atual ocupante do imóvel, a CEF nada apresentou. 6. Autora que preencheu os requisitos previstos na legislação que rege a matéria, acrescido da inexistência de quaisquer gravames sobre o imóvel usucapiendo, para o reconhecimento do domínio do imóvel em comento. Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0008752-75.2013.4.05.8100 – (587795/CE) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Cid Marconi – DJe 18.05.2016 – p. 46)

2372 – Usucapião extraordinária – accessio possessionis e successio possesionis

“Apelação. Usucapião extraordinária. Accessio possessionis e successio possesionis. Possibilidade de soma do tempo da posse dos antigos proprietários com a dos autores. Transmissão da posse aos herdeiros (arts. 495 e 1.572 do Código Civil de 1916, aplicável por força do art. 1.787 do Código Civil de 2002). Sucessor universal (herdeiros do comodante) adquire a posse do seu antecessor com as mesmas características exercidas até então e a transmite aos requerentes. Regra dos arts. 492 e 496 do Código Civil de 1916. Encadeamento de negócios jurídicos que autoriza a soma das posses. Art. 552 do Código Civil de 1916. Ausência de questionamento quanto à posse exercida pelos antecessores dos requerentes. Possibilidade de soma do tempo da posse. Accessio possessionis e sucessio possessionis. Os requerentes adquiriram dos herdeiros do comodante a posse exercida por este até sua morte (successio possessionis) e também a posse de seus antecessores de acordo com as cessões de direitos precedentes (accessio possessionis). Usucapião extraordinária. Vinte anos (art. 550, Código Civil de 1916). Contagem do prazo da usucapião tem início em 1971. Ajuizamen-

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to da ação em 2003. Aquisição do direito ao domínio sobre o imóvel usucapiendo reconhecido. Sentença reformada. Recurso provido.” (TJSP – Ap 0134170-95.2003.8.26.0100 – São Paulo – 4ª CDPriv. – Rel. Hamid Bdine – DJe 19.04.2016)

Comentário Editorial SÍnTESEA sentença julgou improcedente o pedido formulado na petição inicial, sob o fundamento de que os autores não exerceram posse pelo tempo suficiente para a aquisição do domínio do imóvel usucapiendo.

Inconformados, os autores apelaram.

Sustentaram que o exercício da posse no curso da ação deve ser considerado para fins de declaração do direito ao domínio do imóvel. Pleitearam, subsidiariamente, a anulação da sentença para autorizar a produção de prova oral consistente na oitiva dos herdeiros daquele que transmitiu a posse da coisa.

O TJSP deu provimento ao recurso.

Vale trazer trecho do voto do Relator:

“É oportuno recordar que o prazo da usucapião extraordinária no Código Civil de 1916, quan-do passou a ser exercida a posse sobre a coisa, era de 20 anos (art. 550). Consideradas as somas das posses, a contagem do prazo da usucapião tem início em 1971. Logo, ao ajuizar a ação em 2003, é manifesta a aquisição do direito ao domínio dos apelantes sobre o imóvel usucapiendo. É de se considerar, no entanto, que a declaração de domínio deve respeitar a planta de fl. 182 e o memorial descritivo de fl. 390, para se excluir área pública, como bem observou a Municipalidade de São Paulo em suas contrarrazões (fl. 430). Assim, fica reforma-da a r. sentença, para declarar o domínio sobre o imóvel usucapiendo em favor dos apelantes e determinar a abertura de matrícula para o imóvel de acordo com a planta (fl. 182) e respectivo memorial descritivo.”

Citamos, a seguir, trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:

“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia da usucapião é consagrada nas mo-dernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto a usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; na usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da apli-cabilidade; a usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido negativo, de extinção, enquanto que a usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em prescrição aquisitiva’.

No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferen-ças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo praticamente um meio de refletir a ação, se apresen-ta sempre como exceção; o campo da prescrição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.

Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar a usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, consequentemente, não gerar direitos. A usucapião, ao contrário, é positivo, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire o possuidor. Assim, o não uso do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.

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Pode-se, assim, esclarecido que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘O usucapio este adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de ad-quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei’.

Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo-se, ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.

[...]

Feitas as considerações iniciais sobre a usucapião e ressaltada a importância do instituto, cabe revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respectivamente nas moda-lidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.

Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de outro tema monográ-fico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua concessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.

Por aí, percebe-se que para ocorrer a usucapião em geral, faz-se necessário o concurso de cer-tos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direitos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais).

A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dissecados os requisitos da usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos, ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes à usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.

Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de forma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência da usucapião, concebendo-se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.

Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para possuir. Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pessoas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito público e, inclusive, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.

Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se permite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuá-rio, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto, etc.’.

Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos ab-solutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.

Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacional, etc.

Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com a usucapião. Assim, tem-se:

‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens;

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b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, II);

c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III);

d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, parágrafo único, e 168, IV).’

Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicável a usucapião.

Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao proprietário intentar a usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usucapião.

A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utilidade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.

Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aquisição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comércio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.

Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insuscetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar, a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.

Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalienabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião.

Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos objetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff que sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superficie, las servidumbres.

Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340, do STF, pois que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretório Excelso foi acompanhada pelo atual texto constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.

A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas características, extensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatível com a indetermi-nação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.

Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usucapião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer, também, que embora na usucapião de imóvel exija-se certeza e determinação, tem-se admi-tido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris SÍNTE-SE, Porto Alegre: IOB-Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

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Seção Especial – Com a Palavra, o Procurador

A Outorga de Escritura e a Adjudicação Compulsória

ROgéRIO TADEu ROmAnOProcurador Regional da República aposentado, Professor de Processo Penal e Direito Penal, Advogado.

Veja-se o que diz o Código Civil:

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou ar-rependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.

Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promi-tente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.

A promessa de compra e venda é espécie de contrato preliminar pelo qual as partes, ou uma delas, comprometem-se a celebrar adiante o contrato definitivo de compra e venda. É negócio de segurança, destinado a conferir garantias às partes quanto à relação substancial em vista.

A matéria era antes versada em leis especiais. O Decreto-Lei nº 58/1937 e a Lei nº 6.766/1979 cuidam, respectivamente, do compromisso de compra e venda de loteamentos rurais e urbanos, já que a Lei do Parcelamento do Solo Urbano revogou o Decreto-Lei nº 58/1937 na parte referente ao loteamento urbano. Agora o instituto é alçado à codificação como norma geral. Foi objeto do Código Civil de 2002.

O registro atribui à promessa de compra e venda uma eficácia real, cujo objeto é o futuro contrato definitivo. Antes do registro, observa-se mero direito pessoal, que gera direitos obrigacionais, e não reais. Na lição de Serpa Lopes (Curso de direito civil. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, v. VI, n. 119, 1961), trata-se de um novo direito real: direito real de aquisição. Registra-se, contudo, que Orlando Gomes considera a promessa de compra e venda um misto de direito real de gozo e de garantia (Direitos reais. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 313/314).

Para Maria Helena Diniz, a inscrição da promessa de compra e venda de imóvel equivale a um direito real limitado, direito de aquisição, assecurató-rio do contrahere futuro, não só em relação às partes contratantes, como erga

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omnes (Curso de direito civil brasileiro. Direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 4 v., 1996. p. 413).

Na verdade, pelo registro, atribui-se eficácia real a um direito pessoal. Se-gundo Orlando Gomes, tratar-se-ia de anotação preventiva na exata medida em que “o promitente-vendedor não pode alienar o bem nem impedir ou dificultar o cumprimento da pretensão do promitente comprador de se tornar seu legítimo proprietário” (ob. cit., p. 315):

a) a promessa de compra e venda, enquanto não registrada, é um di-reito pessoal, seja por escritura pública ou por instrumento parti-cular;

b) registrada, passa a constituir um direito real, oponível erga omnes, atribuindo ao seu titular o direito de sequela (direito real de aquisi-ção do imóvel);

c) registrada ou não, desde que formalmente correta, a promessa auto-riza a adjudicação compulsória, pelo rito sumário (CPC, arts. 275 e seguintes) pelo disposto no art. 16 do Decreto-Lei nº 58/1937;

d) a diferença entre a promessa de compra e venda registrada e não registrada reside na oponibilidade a terceiros de que dispõe aque-la e não dispõe esta, e não na possibilidade ou não de se inten-tar ação de adjudicação compulsória, nos termos do Decreto-Lei nº 58/1937, mesma conclusão que exsurge dos arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil.

Daí, como distinguir a ação de outorga de escritura e a adjudicação com-pulsória?

Na esfera obrigacional – caracterizada por relações interpessoais cujo objeto são prestações –, admite-se que o promissário comprador se vincula a uma obrigação de dar, caracterizada pelo pagamento de valores sucessivos, a fim de satisfazer integralmente a quantia ajustada com o promitente vendedor. Em contrapartida, assume este uma obrigação de fazer, de natureza obriga-cional, consistente na cooperação para a formação do contrato definitivo pela outorga de escritura definitiva de compra e venda em prol do promissário com-prador ao tempo da quitação.

Assim, quando integralizado o pagamento do preço, o promissário com-prador intimará o promitente vendedor a outorgar-lhe escritura (realizar a pres-tação prometida de contratar) e, só depois de esgotado o prazo legal para fazê--lo, buscará a adjudicação compulsória por sentença, valendo como título para o registro.

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Tanto a ação de adjudicação compulsória como a de outorga de escritura são ações pessoais, pois visam apenas a suprir uma declaração de vontade omi-tida pelo promitente vendedor, nenhuma das duas objetivando transferir a pro-priedade. Nos dois casos a sentença produzirá o mesmo efeito do contrato a ser firmado, isto é, um título a ser levado ao registro para lavratura de instrumento público por qualquer tabelião. Diria que são ações executivas lato sensu. Ação executiva lato sensu representa a possibilidade de ações que tragam embutidas no processo de conhecimento capacidade executória, possibilitando ao juízo determinar, desde logo, e independentemente de qualquer outra providência, a entrega do bem da vida objeto da lide, isto porque o provimento jurisdicional tem caráter executório.

A eficácia executiva lato sensu dá ao juiz a possibilidade em adotar in-cidentalmente ao processo cognitivo medidas materiais necessárias a obter o resultado prático que o cumprimento da relação geraria, sem a manifestação de vontade do réu, a própria decisão proferida (seja interlocutória ou final) por si só é executiva, capaz de produzir resultados práticos.

Humberto Theodoro Júnior (Processo de execução, p. 291-2) enumera cinco requisitos:

a) O pré-contrato não necessita de inscrição no registro de imóveis, a não ser quando a adjudicação tenha de atingir terceiro adquirente do imóvel gravado.

b) Não é de se exigir escritura pública como condição de eficácia da promessa de compra e venda, ainda que verse sobre imóvel não loteado, face ao que dispõe o art. 22 do Decreto-Lei nº 58, com a redação da Lei nº 6.014, de 1973.

c) Apenas o contrato formalizado com os requisitos mínimos do art. 11 do Decreto-Lei nº 58 pode ensejar a condenação do art. 639 do Código, dadas as exigências a serem cumpridas na transcrição no registro imobiliário. Simples recibos ou promessas vagas e in-completas não podem ser equiparadas a pré-contrato para os efeitos da adjudicação compulsória.

d) O pré-contrato não pode conter a cláusula de arrependimento, se-gundo dispõe o art. 22 do Decreto-Lei nº 58. Ressalva-se, porém, a hipótese de ter a cláusula perdido a eficácia, como no caso de haver se extinguido o prazo para arrepender-se, porque então “o obstácu-lo desapareceu”.

e) Sem a outorga uxória a promessa não dá lugar à adjudicação com-pulsória de imóvel. A citação deve, pois, abranger marido e mulher.

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A matéria foi versada no REsp 195.236/SP, onde se disse que, na ação de outorga de escritura, não há que se exigir o prévio registro do compromisso de compra e venda, pois a sentença opera a mera substituição da vontade do pro-mitente vendedor, cumprindo em seu lugar a obrigação de formalizar o contrato de compra e venda prometido. Por sua vez, na ação de adjudicação compulsó-ria o registro imobiliário do pré-contrato somente se mostra imprescindível para surtir efeitos erga omnes, hipótese em que a sentença transfere a propriedade do bem, ao passo que, não havendo o prévio registro, produzirá efeitos apenas entre as partes, tão somente substituindo a vontade do vendedor, nos termos da Súmula nº 239/STJ.

De toda sorte, para se obter a outorga de escritura, exige-se a prova de existência do contrato de compromisso de compra e venda e da quitação inte-gral do preço.

A ação de adjudicação compulsória é remédio processual destinado a promover o registro imobiliário necessário à transmissão da propriedade. Cer-tamente não é via adequada para se requerer a abertura de matrícula de imóvel não registrado em cartório, nem suprir eventuais irregularidades no registro.

Na matéria há entendimento consagrado do Superior Tribunal de Justiça, do que se vê do enunciado da Súmula nº 239: “O direito à adjudicação com-pulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”.

Orlando Gomes (Contratos, 24. ed., 2001), em conhecida lição, faz desa-parecer qualquer dúvida: “O novo Código Civil limpou a área para a aceitação, em sentença, independentemente de inscrição, da execução coativa de forma específica da obrigação de emitir a declaração negocial contraída em promessa irretratável”.

O STJ ementou esta conclusão no REsp 6.370/SP, de 20.08.1991, da 3ª Turma, em RSTJ 28/419: “Compromisso de compra e venda de imóveis. Execu-ção específica da obrigação. Admissibilidade. É admissível a execução especi-ficado art. 639 do CPC, ainda que se trate de contrato preliminar não escrito no registro de imóveis”. O art. 639 está substituído pelo art. 466-B.

Não se exige o registro preliminar para o ajuizamento da ação de ad-judicação compulsória, sendo esse registro indispensável para a sua validade perante terceiros. Este é o entendimento do STJ, conforme se depreende:

ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA – REGISTRO DA PROMESSA – PREQUESTIO-NAMENTO – PRECEDENTES DA CORTE – 1. Está assentada a jurisprudência da Corte no sentido não ser exigido o registro da promessa para o ingresso da ação de adjudicação compulsória. 2. Permanecendo o acórdão recorrido no plano do exame do contrato, enquadrado na Lei nº 4.591/1964, faltou o devido pre-

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questionamento para a questão do litisconsórcio e da multa excessiva. (STJ, REsp 203581/SP, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJU 08.03.2000)

Arnaldo Rizzardo (Promessa de compra e venda e parcelamento do solo urbano) disse:

Em tese, condição primeira para a propositura da lide é a existência do registro do contrato. Evidentemente, o preço há de estar integralizado.

Apesar das profundas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, preponderando nos tribunais entendimento contrário à adjudicação na ausência do registro, en-tretanto, se possível esse ato, mesmo depois da sentença, por preencher o contra-to os requisitos da lei; se lançado no referido órgão da justiça o registro da área, ou devidamente registrado o loteamento, pode a decisão deferir a adjudicação. Inclusive, tribunais de tendências rígidas na interpretação em favor da indispen-sabilidade do registro apresentam exceções, deferindo, em certos casos, a adju-dicação, olvidando o aspecto formal e tendo uma ratio legis mais benigna, pois o art. 16, com a reação dada pela Lei nº 6.014, fala em recusa dos promitentes na outorga da escritura, suprindo a declaração espontânea através do decreto judicial, sem especificar a obrigatoriedade do registro. (Revista de Jurisprudência do TJ do RG, 73/537)

Tem-se que as normas legais deixam clara a necessidade do registro do instrumento de promessa de compra e venda no cartório imobiliário compe-tente, para que o comprador adquira o direito real e assim faça jus ao direito de aquisição do bem por meio da chamada “adjudicação compulsória”. Mas isso correrá por conta do promitente comprador, assim como eventual escritura pública, obedecidos os parâmetros formais do Código Civil.

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Seção Especial – Acontece

Confira Cuidados Que Se Deve Ter ao Comprar ou Vender um Imóvel1

Quem deseja comprar ou vender um imóvel precisa ter alguns cuidados para garantir o sucesso da negociação. Os profissionais podem ajudar nesse processo, verificando tanto aspectos comerciais quanto legais.

Os especialistas goianos apontam que verificar a certidão de matrícula de imóvel é peça-chave no processo. Coordenador Jurídico do Conselho Regional dos Corretores de Imóveis (Creci), Fernando de Pádua Silva Leão Júnior explica que o documento é como se fosse o registro de “toda a vida do imóvel” e que todo estabelecimento devidamente regularizado o possui.

“A certidão apresenta as informações que a pessoa precisa, como quem é o proprietário, se tem alguma pendência, se está hipotecado ou quitado, se existe gravame, que pode ser penhora ou uso e fruto, que é quando o imóvel está no nome de uma pessoa, mas quem utiliza é outra pessoa”, explicou.

O documento pode ser acessado no cartório da região em que o imóvel está localizado. O procedimento custa menos do que R$ 100,00, variando con-forme a propriedade.

valor do ImÓvel

Antes de vender, o dono de um imóvel precisa definir o quanto vai co-brar. De acordo com Júnior, se o valor pedido estiver muito acima do de merca-do, será difícil vendê-lo. Ele destaca que o corretor é a pessoa mais capacitada para fazer a avaliação, mas, se o proprietário quiser fazê-la, deve ficar atento para não superavaliar a propriedade.

“O corretor é habilitado a fazer o laudo opinativo de venda, seguindo as técnicas de mercado. Se não quiser contratar, você vai ter de fazer estudo de mercado, observar jornais e outros imóveis na região. Se superavaliar o imóvel, o mercado não vai absorver porque os similares vão vender e o seu não”, ex-plicou.

Corretor de imóveis há 15 anos, Edgard Furtado Martins conta que os profissionais da área respondem civil e criminalmente pelas informações pres-tadas. Por isso, não podem “mascarar valores”.

Quem deseja comprar um imóvel não deve usar como base o valor que está no cadastro da prefeitura. Segundo o coordenador jurídico do Creci, “o valor venal não corresponde ao valor de mercado, pois é mais baixo”. Caso o

1 G1. Disponível em: www.globo.com.

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230 ��������������������������������������������������������������������������������������������������������RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – ACONTECE

cliente ache a quantia alta, ele também pode contratar um corretor para analisar a propriedade.

corretor de ImÓveIS

O conselho alerta que o consumidor deve checar a habilitação do cor-retor ou da imobiliária que deseja contratar. A certidão de regularidade pode ser consultada sem custos no site do Creci. Além do dono do imóvel, só uma imobiliária ou um corretor podem intermediar a negociação. As normas de co-mercialização são previstas pela Lei nº 6.530/1978.

“Eu, proprietário, posso vender. Mas posso pedir para parente ou amigo? Não, só se for corretor de imóveis”, afirma Júnior.

O valor pago ao corretor resulta de uma negociação entre as partes, mas deve ser a partir de 6% do preço do imóvel, isso se ele estiver localizado na área urbana, conforme tabela do Creci. Se a propriedade está em uma cidade turística, o valor será a partir de 10%. Já, na zona rural, o honorário parte de 7%.

Martins afirma que havia 8 mil corretores no Estado em 2000. Neste ano, já são 26 mil profissionais cadastrados. Para o profissional, o aumento significa que há uma conscientização sobre a importância do corretor e a profissionali-zação do serviço.

compradoreS

O corretor explica que a categoria tem condições de acelerar as vendas, pois filtra os clientes com condições reais de comprar o imóvel e se atenta às questões jurídicas. “As pessoas têm que superar a ideia de que a propriedade é minha e eu que tenho que vender. O corretor vai otimizar a vendar e a pessoa poderá cuidar de outros aspectos da vida profissional e social. O profissional tem que estar atento a tudo. O corretor tem obrigações legais, não é simples-mente aproximar as partes”, disse Martins.

Um corretor só poderá anunciar o imóvel em jornais, sites ou televisão com a autorização do proprietário, o que é definido no contrato de prestação de serviços para a intermediação de compra ou venda. O coordenador jurídico do Creci alerta para os cuidados com este tipo de exposição, principalmente quando a venda é feita pelo próprio dono do imóvel.

“Ao fazer o anúncio, a pessoa interessada pode ser uma pessoa que tem segunda intenções, um homicida, um estelionatário”, pontua.

Caso alguém se sinta lesado por um corretor, pode denunciá-lo ao Creci.

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Clipping Jurídico

Condomínio de casas terá que devolver terreno a municípioUma ação ajuizada pelo município de Serra acerca da reintegração de posse de um terreno de 76.614,49m², que estaria sendo utilizado de maneira indevida por um condomínio residencial particular, foi julgada procedente pela Juíza da Vara da Fazenda Pública Municipal do Fórum da Cidade, que determinou a devolução da área. De acordo com a petição do Município, a área ocupada pelo empreendimento imobiliário é de uso público, uma vez que, além de ser um local de lazer para a comunidade, o terreno ainda possui uma lagoa natural em seu entorno. Segundo as informações do processo, a empresa responsável pelo empreendimento fez um campo de futebol e ainda cercou o local, impe-dindo, dessa maneira, que os moradores da região tenham acesso ao terreno público. O município ainda alegou que foi instalada, de maneira ilegal, uma guarita para fiscalizar a entrada das pessoas na área em que o condomínio está localizado. Após um pedido de devolução da área feito pela municipalidade, a administração do condomínio sustentou que tem a posse do terreno há muitos anos e que, além disso, os moradores do residencial dividiam os custos com a manutenção e a segurança do local. A administração ainda disse que os mo-radores do empreendimento consideram a abertura da área ao público uma atitude perigosa, pois a segurança dos condôminos estaria sendo colocada em risco. Contestando a afirmação do requerido, o município alega que a área está registrada em certidão imobiliária de um processo administrativo sob o nº 26.166/2009, bem como certidão exarada pelo Cartório Imobiliário da 1ª Zona, o que comprovaria seu domínio sobre o terreno, que fica localizado nas ruas Juscelino Kubistchek, Natalino Ribeiro e Guruco, em Jacaraípe. O re-querente ainda alegou que concedeu apenas uma licença para a construção no entorno do prédio, contudo, sem caracterizar doação, nem autorização para utilização exclusiva do espaço. Para a juíza que deu a sentença, “não há dúvida de que o local no qual se encontra o campo de futebol é logradouro público”, disse a Magistrada. Processo nº: 048.11.026711-8. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Espírito Santo)

AGU recupera terreno destinado à reforma agrária no RS que havia sido invadidoA Advocacia Geral da União (AGU) assegurou que terreno do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) destinado a assentamento rural no município gaúcho de Hulha Negra seja desocupado por família que o habitava irregularmente desde novembro de 2014. Inicialmente, a 1ª Vara Federal de Bagé (RS) havia negado a reintegração de posse solicitada pelos procuradores federais com o argumento de que, como a família invasora detinha a posse da área, o instrumento legal adequado para fazer o pedido seria uma ação ordiná-ria. Contudo, a tese foi derrubada por recurso apresentado pela Procuradoria-

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-Regional Federal da 4ª Região (PRF4). A unidade da AGU argumentou que, “em se tratando de ação reintegratória de bem público ocupado irregularmente, deve ser concedida a reintegração liminar do bem à Administração Pública, sem se cogitar da análise eventual posse”, uma vez que ocupações irregulares de imóveis públicos não podem sequer se traduzir em posse, mas em mera detenção. Os procuradores também alertaram que “inúmeras famílias legitima-mente inscritas em programas de assentamento aguardam a oportunidade de se-rem assentadas para iniciarem uma atividade produtiva”. Os argumentos foram acolhidos pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que determinou a remoção dos invasores da área. A PRF4 é unidade da Procuradoria-Geral Federal, órgão da AGU. Ref.: 5017472-18.2016.4.04.0000 – Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). (Conteúdo extraído do site da Advocacia Geral da União)

Ministro nega liminar para fazendeiro que questiona homologação de área indígena em MTO Ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou liminar em mandado de segurança preventivo (MS 33922) ajuizado pelo proprietário de uma fazenda localizada no Estado do Mato Grosso contra a homologação da demarcação da Terra Indígena Pequizal do Naruvôtu. O fazendeiro pedia que o STF impedisse a Presidência da República de editar o decreto de homologação, que acabou sendo assinado no início de maio. O proprietário afirmou que a titulação de sua propriedade tem origem na década de 1950, em alienação pro-movida pelo ente federado, e que à época já não se registrava a presença de ín-dios por pelo menos 60 anos. Assim, frisou, os estudos que embasaram a porta-ria que demarcou a área indígena violaram o marco temporal estabelecido pela Constituição Federal, tendo em vista, exatamente, o fato de não existir índios no local em outubro de 1988. Após determinar à União, à Fundação Nacional do Índio (Funai), à Procuradoria Geral da República e à Comunidade Indígena Naruvôtu que se manifestassem nos autos, o relator do caso informou que o autor do MS peticionou requerendo urgência na apreciação da liminar, antes da manifestação de todos os envolvidos, em razão da publicação do Decreto de Homologação Administrativa da Terra Indígena, assinado em 2 de maio de 2016. Diante dessa informação, o ministro disse estar presente a urgência a justificar decisão acerca do pleito liminar antes da finalização das notificações. E, em sua decisão, o ministro salientou que o proprietário da fazenda defende que seu título de propriedade deve preponderar em relação à demarcação ad-ministrativa levada a efeito pela Funai, uma vez que o processo administrativo demarcatório não teria levado em consideração o marco temporal estabelecido na Constituição Federal, o qual, de acordo com interpretação do STF, exige a verificação da efetiva ocupação indígena da área na data de 5 de outubro de

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RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – CLIPPING JURÍDICO ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������233

1988. Contudo, ressaltou o relator, o autor do MS deixou de demonstrar nos au-tos que não havia a presença indígena na área demarcada, conforme determina a Constituição (art. 231, caput e § 1º), ao passo que o laudo antropológico que embasou a demarcação da área revelou a ocupação tradicional da área pelos índios. Com esse argumento, o ministro negou o pedido de liminar e determi-nou a remessa de ofício para o juiz federal da Subseção Judiciária de Barra do Garças (MT), para que este preste informações sobre o efetivo cumprimento de Carta de Ordem enviada por ele para o juiz estadual de Canarana. (Conteúdo extraído do site do Supremo Tribunal Federal)

Tribunal reafirma que bem de família é impenhorável e não responde por dívidaO imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciá-ria ou de outra natureza. Com base nesse art. 1º da Lei nº 8.009/1990, a Terceira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) decidiu excluir imóvel situado na Rua Padre José Anchieta, no bairro Bom Retiro, em Teresópolis, da penhora efetivada em processo de execução fiscal contra S. D. S. e C. M. D. S. Em 1ª Instância, o Juízo entendeu que as provas apresentadas foram insuficientes para demonstrar que os proprietários residiam no imóvel à época da penhora ou que o bem se tratava do único imóvel da família. Mas, no TRF2, a relatora do processo, Desembargadora Federal Claudia Neiva, en-tendeu que o auto de constatação, preparado pelo Oficial de Justiça durante o cumprimento do mandado determinado pelo juiz, trouxe elementos suficientes para comprovar que o imóvel penhorado é a residência do casal. “Dessa forma, havendo comprovação de que o imóvel penhorado serve à residência da família dos embargantes e considerando a proteção legal do bem de família como ins-trumento de tutela do direito fundamental à moradia da entidade familiar, deve ele ser excluído do ato de constrição, diante da proteção conferida pela Lei nº 8.009/1990”, concluiu a Magistrada em seu voto, seguido por unanimidade. Proc.: 0000750-44.2007.4.02.5115. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Re-gional Federal da 2ª Região)

Negada penhora de bens do dono de edifício para pagar dívida do condo-mínioA Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a re-curso especial interposto por uma empresa de Curitiba objetivando penhorar bens de proprietários de um edifício para pagamento de dívidas do condomínio. Responsável pela administração do condomínio, a empresa deixou de receber R$ 90.000,00. Condenado pela Justiça a pagar a dívida, o condomínio iniciou o pagamento por meio de depósitos bancários. O primeiro foi de R$ 220,20 e

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o segundo, de R$ 229,60. Como os dois depósitos foram considerados “irrisó-rios”, a administradora requereu a penhora da fração ideal de cada unidade do edifício para receber a dívida. O pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR). Inconformada, a administradora recorreu ao STJ, cabendo ao Ministro Paulo de Tarso Sanseverino relatar o caso na Terceira Turma, especia-lizada em direito privado. Para o ministro, a inclusão dos condôminos na co-brança “é medida excepcional, que somente deve ser admitida após esgotadas as possibilidades de se satisfazer o crédito contra o condomínio”. Sanseverino ressaltou que os condôminos já contribuem para o condomínio, “não devendo ser onerados novamente em razão de alguma despesa em particular, a menos que essa medida seja indispensável”. “Porém, o juízo de origem preferiu contar com a colaboração do condomínio, intimando-o para que fizesse a retenção da parcela penhorada das cotas condominiais, depositando-as em juízo. Essa medida, em pouco tempo, restou frustrada, pois o condomínio parou de fa-zer a retenção”, afirmou o ministro. Diante desse fato, caberia à administra-dora requerer a penhora do crédito do condomínio, segundo determinação do art. 671 do Código do Processo Civil (CPC) de 1973. Em vez disso, a adminis-tradora requereu a penhora do patrimônio dos condôminos, “medida extrema-mente gravosa, que não merece acolhida”. Portanto, correto o entendimento do TJPR. “Desse modo, não estando esgotadas as possibilidades de penhora dos créditos do condomínio, descabido o redirecionamento da execução contra os condôminos, em respeito ao princípio da menor onerosidade para o devedor”, concluiu o relator. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Fechamento da Edição: 02�06�2016

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Índice Alfabético e Remissivo

índice por assunto especial

DOUTRINAS

Assunto

Fiança

•Fiança (Adalto Quintino da Silva) ........................20

•Fiança Locatícia (Riad Fuad Salle) ..........................9

•Prorrogação dos Contratos de Locação: a Situação do Fiador (Pedro Camera Pacheco) ......................49

•Validade da Notificação Via Eletrônica ao Fiador em Casos de Sub-rogação de Locação (HermisonRicardo Bioni) ......................................................51

Autor

aDalto Quintino Da silva

•Fiança ..................................................................20

HErmison ricarDo Bioni

•Validade da Notificação Via Eletrônica ao Fia-dor em Casos de Sub-rogação de Locação ...........51

PEDro camEra PacHEco

•Prorrogação dos Contratos de Locação: a Situa-ção do Fiador ......................................................49

riaD FuaD sallE

•Fiança Locatícia .....................................................9

EM POUCAS PALAVRAS

Assunto

Fiança

•A Fiança nos Contratos de Locação com Pra-zo Indeterminado (Pâmella Batista Del Preto) ......66

•Quais os Riscos de Ser Fiador em Contrato deLocação de Imóveis? (Janine Carvalho Bertuol) ....68

Autor

JaninE carvalHo BErtuol

•Quais os Riscos de Ser Fiador em Contrato de Locação de Imóveis? ............................................68

PâmElla Batista DEl PrEto

•A Fiança nos Contratos de Locação com Prazo Indeterminado .....................................................66

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

Fiança

•Agravo regimental no recurso especial – Ação de cobrança – Locação predial urbana – Pror-

rogação, por prazo indeterminado – Fiança até efetiva devolução das chaves – Expressa previ-são contratual – Recurso especial provido (STJ) ..................................................................2311, 70

EMENTÁRIO

Assunto

Fiança

•Fiança – contrato de locação – fiador – prazo de locação – aditamento ................................2312, 76

•Fiança – devolução das chaves – ação de co-brança – locação predial urbana – prorrogação – prazo indeterminado ...............................2313, 76

•Fiança – locação – garantia prestada pela espo-sa sem a devida outorga conjugal – anulação pleiteada pelo herdeiro ..............................2314, 76

•Fiança – locação de imóvel – contrato prorroga-do por prazo indeterminado ......................2315, 77

•Fiança – locação de imóveis – embargos à exe-cução – exoneração – notificação extrajudicial ..................................................................2316, 77

•Fiança – prorrogação – entrega das chaves ..................................................................2317, 77

•Fiança locatícia – responsabilidade do fiador –prorrogação – impossibilidade ...................2318, 77

•Fiança locatícia – responsabilidade dos fia-dores até a entrega das chaves – possibilidade ..................................................................2319, 78

•Locação – fiança – garantias – responsabilida-de solidária – previsão contratual – precedentes ..................................................................2320, 78

índice geral

DOUTRINAS

Assunto

arrEnDamEnto rural

•Arrendamento Rural e o Direito de Superfí-cie em Face das Restrições Impostas pela Lei nº 5.709/1971 e Demais Regulamentos (Robson de Oliveira e Chrystiane Domingos) ....................86

DirEito à moraDia

•Crédito de Fiança Locatícia e Direito à Moradia (Álvaro Villaça Azevedo) .....................................81

Autor

Álvaro villaça azEvEDo

•Crédito de Fiança Locatícia e Direito à Moradia ..81

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236 ������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

cHrystianE Domingos E roBson DE olivEira

•Arrendamento Rural e o Direito de Superfí-cie em Face das Restrições Impostas pela Leinº 5.709/1971 e Demais Regulamentos ...............86

roBson DE olivEira E cHrystianE Domingos

•Arrendamento Rural e o Direito de Superfí-cie em Face das Restrições Impostas pela Leinº 5.709/1971 e Demais Regulamentos ...............86

Seção especial

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Assunto

aDJuDicação comPulsória

•A Outorga de Escritura e a Adjudicação Com-pulsória (Rogério Tadeu Romano) ......................224

Autor

rogério taDEu romano

•A Outorga de Escritura e a Adjudicação Com-pulsória .............................................................224

ACONTECE

Assunto

comPra E vEnDa

•Confira Cuidados Que Se Deve Ter ao Comprar ou Vender um Imóvel ........................................229

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Assunto

comPra E vEnDa

•Apelação cível – Direito do consumidor – Ação ordinária – Compra de unidade imobiliária – Rescisão unilateral por parte das rés – Sen-tença de procedência dos pedidos autorais – Condenação da empresa ré ao pagamento de danos morais no importe de R$ 20.000,00 e à restituição dos valores pagos a título de arras, em dobro, e “comissão de corretagem” e “as-sessoria de financiamento”, na forma simples – Inconformismo das empresas rés – prelimi-nar de prescrição da pretensão afastada – Não aplicação do código civil – prazo quinquenal, art. 27 do CDC – Alegação de ilegitimidade passiva que não merece acolhida – No mérito, sustentam as rés que o distrato se deu por cul-pa exclusiva dos autores – Ausência de provas

– Ônus imputado a teor do Dispositivo nº 333, inciso II do Código de Processo Civil – Devolu-ção de arras que se impõe – Dano moral confi-gurado e fixado acertadamente no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) (TJRJ) .........2329, 165

conDomínio

•Ação ordinária – Suspensão de obra em con-domínio – Contrato de prestação de serviço de revitalização de fachadas e reboco externo de muros – Irregularidades e superfaturamento – Ônus da prova – Art. 333, I, do CPC – Não comprovação – Aprovação em assembleia ge-ral por maioria dos condôminos – Observância – Improcedência – Sentença mantida – Recur-so não provido (TJMG) .............................2327, 153

corrEtagEm

•Agravo regimental no agravo em recurso espe-cial – Empreendimento imobiliário – Atraso na entrega do imóvel – 1 Comissão de corretagem – Orientação adotada na origem em harmo-nia com a jurisprudência desta Casa – Súmula nº 83/STJ – 2 Fortuito externo – Fundamentos afastados pela corte Estadual – Revisão – Ne-cessidade de reexame de fatos e provas – Im-possibilidade – 3 Dano moral – Valor razoá-vel – Modificação – Incidência do Enunciado nº 7/STJ – 4 Agravo improvido (STJ) ...........2321, 93

DEsPEJo

•Agravo de instrumento – Ação de despejo c/c ação de cobrança – Fase de execução – Des-consideração da personalidade jurídica – Im-possibilidade – Ausência de fraude ou má-fé – Ausência de bens da executada não autoriza a desconsideração – Improvimento (TRF 2ª R.) ................................................................2323, 117

•Despejo – Vagas de garagem – Liminar con-cedida – Pretensão do locatário de reforma da decisão porque o locador deseja explorar o mesmo ramo comercial – Inexistência de veda-ção à disposição do bem pelo proprietário/lo-cador – Impossibilidade, ademais, de utilizaçãodiversa (TJSC) ...........................................2331, 184

locação

•Apelação cível – Ação de despejo – Direito intertemporal – Entidade religiosa – Objetivos institucionais – Contrato de locação – Hipóteses dos arts. 9º e 53, inciso II, da Lei de Locações – Inocorrência – Rescisão – Impossibilidade –Prazo anual – Inaplicabilidade (TJGO) .....2326, 147

lotEamEnto

•Civil e processual civil – ação reivindicatória cumulada com indenização – Imóvel inserido em loteamento irregular e densamente ocupado – Condomínio Porto Rico – Domínio – Compro-vação – Termo de Compromisso de Ajustamen-to de Conduta (TAC) – Celebração – Obrigação

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RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �������������������������������������������������������������������������������������������������������237 de transmissão da área parcelada ao Poder Pú-blico para fins de regularização no âmbito da política fundiária local – Contrapartida destina-da aos proprietários – Transmissão de imóvel – Pretensão petitória – Perda superveniente do interesse de agir – Carência de ação – Afirmação – Validade do ajuste – Debate – Matéria estra-nha e precedente a eventual pleito petitório –Sentença extintiva – Preservação (TJDF) ...2325, 131

ParcElamEnto Do solo

•Apelação cível – Competência interna – Embar-gos à execução de termos de ajustamento de conduta – Direito urbanístico – Parcelamento do solo urbano – Regularização de loteamen-to – Subclasse direito público não especifi-cado (TJRS) ..............................................2330, 182

PEnHora

•Direito processual civil – Apelação cível em sede de embargos de terceiro que julgou pro-cedente o pedido, no sentido de determinar o cancelamento de penhora do imóvel que, ainda não registrado, mas já pertencia aos ora recor-ridos (autores dos embargos de terceiro) – Nes-te sentido, apresentaram provas contundentes (contrato de promessa de compra e venda e recibos de pagamentos) – Preliminar de nuli-dade da citação – Não ocorrência, vez que o art. 1.050, § 3º, do CPC prevê a possibilidade de nos embargos de terceiro ser intimado o causídico do feito matriz, ainda mais quando o processo (embargos de terceiro) fora distribuído por dependência – No mérito – Incidência da Súmula nº 84, do STJ – Apelação cível conheci-da e desprovida (TJCE) .............................2324, 121

rEgistro

•Registro de imóveis (TJSP) ........................2332, 187

sFH

•Civil e processual civil – Agravo regimental no recurso especial – Ação indenizatória por vícios de construção – Seguro habitacional – SFH – Competência da Justiça Federal – Súmula nº 211 do STJ – Cobertura securitária – Prescri-ção ânua – Súmulas nºs 5 e 7, ambas do STJ – Ilegitimidade ativa dos segurados – Honorá-rios periciais – Súmula nº 284 do STF – Hono-rários advocatícios – Inexistência de interesse recursal – Ausência de impugnação específica aos fundamentos da decisão agravada – In-cidência da Súmula nº 182 do STJ – Recurso manejado sob a égide do CPC/1973 – Agravoregimental não conhecido (STJ) ...............2322, 103

usucaPião

•Apelação cível pela parte autora – Ação de usucapião extraordinária – Sentença de impro-cedência da demanda – 1 Preliminar de não conhecimento do recurso por deserção – Não acolhimento – 2 Mérito do apelo – Posse do

imóvel obtida através de sucessão hereditária – Área maior e existência de outros herdeiros – Impossibilidade de utilizar o procedimento da usucapião para a aquisição do domínio da área indicada em substituição ao processo de inventário e partilha – Sentença mantida, ainda que por fundamento diverso – Negado provi-mento ao recurso (TJPR) ...........................2328, 159

EMENTÁRIO

Assunto

ação cautElar

•Ação cautelar – indenização por vícios de cons-trução – indisponibilidade de bens imóveisda construtora ..........................................2333, 195

ação DEclaratória

•Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico c/c adjudicação de fração ideal de imóvel – cessão de quota-parte a condômino ................................................................2334, 195

ação DE oBrigação DE FazEr

•Ação de obrigação de fazer – descumprimen-to de contrato de mútuo – deliberação mono-crática ....................................................2335, 195

ação Pauliana

•Ação pauliana – ação proposta para anulação de negócios jurídicos por fraude contra credo-res – reconhecimento ..............................2336, 196

•Ação pauliana – fraude contra credores – requi-sitos – demonstração – ônus da prova.....2337, 196

ação sumÁria

•Ação sumária de cobrança – taxas condomi-niais – responsabilidade – obrigação propter rem – registro imóvel ...............................2338, 196

aliEnação FiDuciÁria

•Alienação fiduciária – baixa do gravame – ne-gócio firmado entre agente financeiro e cons-trutora ......................................................2339, 197

alvarÁ

•Alvará de edificação – direito de protocolo – re-querimento ..............................................2340, 197

associação DE moraDorEs

•Associação de moradores – ação de cobrança com base em enriquecimento ilícito – taxa de manutenção – proprietário de imóvel não asso-ciado – impossibilidade ...........................2341, 200

BEm DE Família

•Bem de família – execução – constrição de imóvel de propriedade de sociedade comercial

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238 ������������������������������������������������������������������������������������������������������� RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

utilizado como residência dos sócios – impe-nhorabilidade ..........................................2342, 200

•Bem de família – penhora – embargos de ter-ceiro – imóvel alienado em fraude à execução ................................................................2343, 201

•Bem de família – penhora – imóvel residen-cial – acervo hereditário – único bem – impe-nhorabilidade ..........................................2344, 202

•Bem de família – penhorabilidade – dívida oriunda de negócio envolvendo o próprio imó-vel – aplicação ........................................2345, 204

comPEtência

•Competência – obrigação securitária – sistema financeiro de habitação ...........................2346, 204

comPromisso DE comPra E vEnDa

•Compromisso de compra e venda sob condi-ção suspensiva levada a registro – exercício do direito de preferência por locatário – ação deobrigação de fazer ...................................2347, 204

corrEtorEs DE imóvEis

•Corretores de imóveis – anuidades – naturezajurídica de tributo ....................................2348, 205

DEFEsa Do consumiDor

•Defesa do consumidor – compra e venda de imóvel – demora na entrega – ilegitimidadepassiva .....................................................2349, 205

•Defesa do consumidor – promessa de compra e venda – imóvel – desistência do adquirente –distrato ....................................................2350, 209

DEsaProPriação

•Desapropriação – coisa julgada – indenização– dano material ........................................2351, 209

•Desapropriação – interesse social ............2352, 209

•Desapropriação – liminar expropriativa – re-quisitos ....................................................2353, 209

ExEcução

•Execução – título executivo extrajudicial – cé-dulas rurais hipotecárias ..........................2354, 209

HiPotEca

•Hipoteca – execução – bem de empresa – penhora do imóvel ..................................2355, 210

•Hipoteca – restituição de emolumentos – can-celamento – registro único .......................2356, 215

itBi

• ITBI – atualização dos valores venais dos imó-veis – decreto .........................................2357, 215

• ITBI – base de cálculo – valor da arrematação ................................................................2358, 215

itcmD

• ITCMD – apresentação de documentos ao fis-co – arrolamento de bens – não cabimento ................................................................2359, 215

lauDêmio

•Laudêmio – cláusula que transfere para os ad-quirentes de imóvel o ônus de arcar com o pa-gamento – União – validade ....................2360, 216

locação

•Locação de imóveis – ação indenizatória – açãorescisória .................................................2361, 216

•Locação de imóveis – exoneração de fiança – notificação extrajudicial ..........................2362, 216

lotEamEnto

•Loteamento irregular – responsabilidade pelaregularização – Súmula nº 283/STF..........2363, 217

PEnHora

•Penhora – imóvel – garantia real de hipoteca ................................................................2364, 217

PossE

•Posse – bens imóveis – ação de imissão...2365, 217

rEgistro

•Registro – titular de serviços notariais – perda da delegação – magistrado como única auto-ridade processante – previsão na Lei Federal nº 8.935/1994 e na Lei Estadual nº 11.183/1998 – ausência de vício ..................................2366, 218

rEsPonsaBiliDaDE civil

•Responsabilidade civil – compromisso de com-pra e venda de imóvel – excludentes de res-ponsabilidade – lucros cessantes .............2367, 218

sFH

•SFH – adjudicação – imissão na posse – taxade ocupação – prescrição ........................2368, 219

•SFH – aferição de interesse jurídico da Caixa Econômica Federal – inexistência de risco de comprometimento do FCVS – competência da Justiça Comum estadual ...........................2369, 219

•SFH – quitação do saldo devedor – duplicidadede financiamento de imóveis ...................2370, 219

usucaPião

•Usucapião especial urbano – imóvel financia-do pelo SFH – hipoteca ...........................2371, 220

•Usucapião extraordinária – accessio possessionis e successio possesionis ............................2372, 220

CLIPPING JURÍDICO

•AGU recupera terreno destinado à reforma agrá-ria no RS que havia sido invadido ........................231

Page 239: ISSN 2236-1553 Revista SÍNTESE - bdr.sintese.com 33_miolo.pdf · Arrendamento Rural e o Direito de Superfície em Face das Restrições ... Divergência jurisprudencial STJ x

RDI Nº 33 – Maio-Jun/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �������������������������������������������������������������������������������������������������������239 •Condomínio de casas terá que devolver terreno

a município .......................................................231

•Ministro nega liminar para fazendeiro que ques-tiona homologação de área indígena em MT .......232

•Negada penhora de bens do dono de edifício para pagar dívida do condomínio ......................233

•Tribunal reafirma que bem de família é impe-nhorável e não responde por dívida...................233