instituto educacional alfa noções básicas em...
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 03
1 O USO DE DROGAS ATRAVÉS DOS TEMPOS ........................................ 05
2 DEFINIÇÕES ................................................................................................ 09
3 EPIDEMIOLOGIA ......................................................................................... 13
4 AS PRINCIPAIS DROGAS DE ABUSO ....................................................... 16
5 NEUROBIOLOGIA DA ADIÇÃO .................................................................. 18
6 MECANISMO GERAL DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA ................................. 25
6.1 Síndrome da Abstinência/ Efeito Rebote .................................................... 29
7 RELATÓRIO MUNDIAL SOBRE DROGAS – 2009 ..................................... 31
REFERÊNCIAS CONSULTADAS E UTILIZADAS .......................................... 36
AVALIAÇÃO .................................................................................................... 38
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INTRODUÇÃO
Sejam bem vindos ao curso de Especialização em Dependência Química.
Nos esforçamos para oferecer um material condizente com a graduação daqueles
que se candidataram a esta especialização, procurando referências atualizadas,
embora saibamos que os clássicos são indispensáveis ao curso.
As ideias aqui expostas, como não poderiam deixar de ser, não são neutras,
afinal, opiniões e bases intelectuais fundamentam o trabalho dos diversos institutos
educacionais, mas deixamos claro que não há intenção de fazer apologia a esta ou
aquela vertente, estamos cientes e primamos pelo conhecimento científico, testado e
provado pelos pesquisadores.
Não obstante, o curso tenha objetivos claros, positivos e específicos, nos
colocamos abertos para críticas e para opiniões, pois temos consciência que nada
está pronto e acabado e com certeza críticas e opiniões só irão acrescentar e
melhorar nosso trabalho.
Como os cursos baseados na Metodologia da Educação a Distância, vocês
são livres para estudar da melhor forma que possam organizar-se, lembrando que:
aprender sempre, refletir sobre a própria experiência se somam e que a educação é
demasiado importante para nossa formação e, por conseguinte, para a formação
dos nossos/ seus alunos.
O curso tem como objetivo geral capacitar os diversos profissionais da área
da saúde e educação para a atenção à população usuária de substâncias químicas
ou com predisposição potencial para tal, seja em projetos de prevenção, em
tratamento, ou na gestão de ações e serviços na perspectiva da
interdisciplinaridade.
Como objetivos específicos espera-se que ao final do curso o aluno esteja
apto a:
Ampliar as noções gerais sobre drogas psicotrópicas e transtornos causados
pelo seu uso;
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Desenvolver competências no tema prevenção e educação em diferentes
ambientes: empresas, escolas, clínicas, família e redes de apoio.
Trata-se de uma reunião do pensamento de vários autores que entendemos
serem os mais importantes para a disciplina.
Para maior interação com o aluno deixamos de lado algumas regras de
redação científica, mas nem por isso o trabalho deixa de ter base na academia.
Desejamos a todos uma boa leitura e caso surjam algumas lacunas, ao final
da apostila encontrarão nas referências consultadas e utilizadas aporte para sanar
dúvidas e aprofundar os conhecimentos.
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1 O USO DE DROGAS ATRAVÉS DOS TEMPOS
É bastante sabido que o uso de substâncias no organismo do ser humano
remonta a épocas distantes.
Muitos são os registros de experiências vividas por nossos antepassados.
Antropólogos acreditam que a curiosidade pelas drogas começou na Pré-História,
por acaso. Nossos ancestrais perceberam que algumas plantas e fungos induziam a
estados alterados de percepção e gostaram do que sentiram. Essas plantas
passaram a ser veneradas. Os cretenses tinham uma deusa da papoula, a flor que
fornece matéria-prima para o ópio; os astecas idolatravam cogumelos alucinógenos
(VALLE, 1988).
Na época de Galeno, intelectual grego que viveu entre 135 e 201 a.C.,
surgiram as teriagas, remédios de formulação complexa utilizados no tratamento de
alguns males, cujo mecanismo de ação deve ser atribuído ao ópio. Nicandro,
conterrâneo e contemporâneo do primeiro, considerado uma autoridade da
toxicologia da época, assim descreveu o efeito desta substância:
“Aquele que ingere uma bebida contendo o suco da papoula cai desde logo
num sono profundo, os membros se esfriam, os olhos se tornam fixos e todo o corpo
fica coberto de suor abundante; a face empalidece, os lábios se intumescem, os
ligamentos do maxilar inferior se relaxam, as unhas tornam-se lívidas e os olhos
encovados pressagiam a morte” (VALLE, 1988).
Na Idade Média, o conhecimento dos efeitos das drogas sobre o sistema
nervoso central foi utilizado por feiticeiros, mágicos e exploradores da fé pública,
com suas poções para o sono, esquecimento, amor e outras.
O uso da maconha no Brasil tem um registro interessante: desde a chegada
dos portugueses em 1500 existem relatos de viajantes que faziam uso dessa
substância e exaltavam suas qualidades como intensificador de emoções pré-
existentes. Com a formação de duas classes sociais polarizadas e distintas
culturalmente, uma aristocrática e outra formada por escravos e pobres, este uso
parece ter se mantido em ambas nos séculos subsequentes, até o início do século
XX, quando começa a haver uma tentativa de normatização desta substância em
termos legais, influenciada por mudanças que ocorriam neste sentido tanto na
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Europa quanto nos Estados Unidos. É interessante notar que no período anterior à
abolição da escravatura no país, o uso de maconha parecia ser de conhecimento
dos grandes latifundiários e este uso não era por eles reprimido, pois havia uma
percepção de que diminuíam sensivelmente as chances de rebelião entre os
escravos (YAMADA, 1999).
O termo “droga” já traz em si uma conotação negativa. Popularmente,
“droga” tem como significado algo ruim; é uma interjeição ligada a sentimentos de
raiva, pessimismo.
Em uma linguagem coloquial, droga tem um significado de algo malévolo,
sem qualidade. Já em uma linguagem médica, droga é sinônimo de medicamento.
Conceituar “droga” tecnicamente apresenta dificuldades, pois o significado
pode variar de país para país. Roberto de Lucia (apud Valle, 1988) indica como
origem do termo a palavra droog, do holandês, utilizada para designar “toda
substância de composição química definida ou não, de constituição molecular ou
complexa que pode ou não ter propriedades terapêuticas”.
É o que ocorre nos países de língua inglesa, por exemplo, onde drug é a
designação genérica para os medicamentos, ou seja, a substância ou produto
empregado para curar as doenças, aliviar a dor ou estabelecer diagnóstico.
Não podemos confundir os termos fármaco, tóxico, entorpecente e narcótico.
Fármaco, segundo Murad, sob o ponto de vista médico ou farmacológico, pode-se
considerar tecnicamente como a designação do princípio ativo, ou seja, a matéria-
prima com que se faz o medicamento (MURAD, 1995).
Para Brito Filho (1988), tóxico é a substância com capacidade de produzir
efeito sobre o organismo em pequeníssima quantidade.
Murad (1995), utilizando definição mais simples, diz que tóxico é tudo que
está ligado a veneno. Já o termo entorpecente, muito utilizado por nossos
legisladores, segundo definição de Di Mattei, citado por Murad (1995, p. 35), é uma
categoria de substâncias, “venenos que agem eletivamente sobre o córtex cerebral,
suscetíveis de promover agradável ebriedade, de serem ingeridos em doses
crescentes sem determinar envenenamento agudo ou morte, mas capazes de gerar
estado de necessidade tóxica, graves e perigosos distúrbios de abstinência,
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alterações somáticas e psíquicas profundas e progressivas”. Já narcótico é o termo
geral para substâncias que produzem insensibilidade, suprimem a dor e induzem
sono profundo, podendo causar dependência e determinar perturbações graves da
personalidade. Os conceitos apresentados indicam apenas categorias específicas
de substâncias.
No Brasil, o termo droga é muito utilizado para designar as substâncias que
são consideradas ilícitas pelo ordenamento jurídico. No passado, a exemplo dos
anglo-saxões, já se utilizou também o termo no sentido de medicamento, ou seja,
substâncias que causam bem ao organismo, denominando-se os estabelecimentos
que as comercializam de “drogarias”.
Modernamente, a Organização Mundial da Saúde (OMS), segmento da
Organização das Nações Unidas, recomendou que fosse adotada a expressão
“drogas que causam dependência” – dependence producting drugs – para
designar tais substâncias (YAMADA, 1999).
Quando nos referimos às drogas, entendemos que existem não somente
drogas ilícitas como, por exemplo, a maconha, o haxixe, a cocaína, o crack, o
ecstasy, o ópio, a heroína, o LSD-25, etc., bem como drogas lícitas como por
exemplo a cafeína (café, chocolate, chá), a nicotina (tabaco), o álcool, os fármacos
(princípio ativo dos medicamentos vendidos nas farmácias e drogarias), etc. A
dependência, por sua vez, se dá como um processo que pode se apresentar em
duas variantes, a dependência física/orgânica e a dependência psíquica/emocional.
Desde os primórdios da história da humanidade vamos encontrar referências
às drogas. Durante muito tempo o uso dessas substâncias teve um valor, uma
função e objetivos específicos e claros, diferentes dos que possuem atualmente.
Muitas vezes, as drogas foram usadas para fins medicinais, em outras fazem parte
de rituais sagrados ou, ainda, estiveram inseridas em outros aspectos da cultura de
um povo. Nas sociedades modernas, que vieram a se tornar globalizadas, o uso das
drogas mudou completamente. O consumo de drogas é um fato, não mais (ou
pouco) vinculado a um uso medicinal ou a ritos religiosos, mas a uma procura de
prazer que corre o risco de se tornar desenfreada. Tais efeitos viriam satisfazer a
busca da felicidade e da transcendência, como também amenizar a angústia
existencial, características inerentes ao ser humano, lacunas que impulsionam o
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homem na procura incessante das diversas dimensões da existência. A tentativa de
preenchimento desses vazios justifica, por si só, o uso de drogas pelo homem, no
intuito de esquecer problemas existenciais (ansiolíticos, anfetamínicos, solventes,
etc.), na pretensão de entrar em contato com forças sobrenaturais, preenchendo
uma falta decorrente das limitações humanas (no caso dos chás alucinógenos) e na
busca de prazer com alterações do estado de consciência (álcool, ecstasy, LSD e
outras).
Dentro desta perspectiva, podemos notar nossa vulnerabilidade frente a
situações que envolvam o uso de drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. Neste sentido,
falar de drogas não é simplesmente informar sobre seus efeitos, mas sim mostrar o
quanto estamos suscetíveis a elas, pelo simples fato de sermos seres humanos e de
termos um corpo que geralmente não sabemos bem como funciona.
Sendo assim, ao longo desse curso falaremos também em prevenção ao
uso de drogas, o que significa conversar sobre a natureza humana e a sua interação
com o meio. Se pensarmos em adolescentes e outras populações de risco, como
por exemplo, aqueles que estão nos presídios, nosso cuidado aumenta, primeiro
porque adolescência, é um dos períodos mais intensos da vida, pelos desafios,
descobertas e oportunidades que apresenta e segundo, porque a população
carcerária vive em situações não muito satisfatórias.
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2 DEFINIÇÕES
O termo “droga” teve sua origem da palavra “droog”, que significava “folha
seca”, isto porque antigamente quase todos os medicamentos eram feitos à base de
vegetais. Atualmente, a medicina define “droga” como sendo qualquer substância
que é capaz de modificar a função dos organismos vivos, resultando em
transformações, variações e modificações fisiológicas ou de comportamento.
As drogas psicotrópicas e psicoativas, são substancias químicas, naturais ou
mesmo sintética, que atuam sobre o nosso sistema nervoso central, provocando
alterações psíquicas, podendo causar sérios danos psicológicos ao seu consumidor,
além de dependência.
As drogas destroem o caráter, comprometem o sentido realístico da vida e
subvertem o senso de responsabilidade, fragilizando a família, afetando a sociedade
e as organizações, afetando os laços comunitários, a própria força do trabalho
nacional e provocando até, alguma alteração de personalidade ao longo prazo.
Percebe-se então a necessidade de uma efetiva prevenção.
Todas as drogas têm em comum a capacidade de alterar o estado mental do
usuário, seja proporcionando uma sensação de prazer e conforto ou reduzindo a
timidez e aumentando a sociabilidade de quem a usa. Em geral, todas também
causam dependência química e psicológica, transformando o usuário ocasional em
viciado, que acaba dependendo do consumo da droga para manter suas atividades
normais (MAMBRINI, 2002).
A OMS (1981) define droga como qualquer entidade química ou mistura de
entidades que alteram a função biológica e possivelmente a sua estrutura. Em
outras palavras, seria qualquer substância capaz de modificar a função de
organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de comportamento.
Droga é toda e qualquer substância, natural ou sintética que introduzida no
organismo modifica suas funções. As drogas podem ser naturais quando obtidas
através de determinadas plantas, de animais e de alguns minerais. Como exemplo
tem-se a cafeína (do café), a nicotina (presente no tabaco), o ópio (na papoula) e o
THC tetrahidrocanabiol (da cannabis). As drogas sintéticas são fabricadas em
laboratório, exigindo para isso técnicas especiais (OMS, 1981).
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O termo droga, presta-se a várias interpretações, mas ao senso comum é
uma substância proibida, de uso ilegal e nocivo ao indivíduo, modificando-lhe as
funções, as sensações, o humor e o comportamento.
Do ponto de vista jurídico, segundo prescreve o parágrafo único do art. 1.º
da Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas) “Para fins desta Lei,
consideram-se como drogas as substâncias ou produtos capazes de causar
dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas
periodicamente pelo Poder Executivo da União”. Isto significa dizer que as normas
penais que tratam do usuário, do dependente e do traficante são consideradas
normas penais em branco. Atualmente, no Brasil, são consideradas drogas todos os
produtos e substâncias listados na Portaria n.º SVS/MS 344/98 (BRASIL, 2006).
Na CID.10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde) a Dependência é definida como:
“Um conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que
se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente
associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o
consumo, à utilização persistente apesar das suas consequências nefastas, a uma
maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e
obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e por vezes, a um estado de
abstinência física. A síndrome de dependência pode dizer respeito a uma substância
psicoativa específica (por exemplo, o fumo, o álcool ou o diazepam), a uma
categoria de substâncias psicoativas (por exemplo, substâncias opiáceas) ou a um
conjunto mais vasto de substâncias farmacologicamente diferentes” (BALLONE,
2001).
A dependência química não é uma doença aguda. Trata-se de um distúrbio
crônico e recorrente. E essa recorrência é tão contundente, que raramente ocorre
abstinência pelo resto da vida depois de uma única tentativa de tratamento. As
recaídas da drogadição são a norma. Portanto, a adição deve ser abordada mais
como uma doença crônica, como se fosse diabetes ou hipertensão arterial.
Considerando o fato da dependência química ser um distúrbio recorrente e
crônico, alguns autores mais realistas consideram como um bom resultado
terapêutico, tal como se deseja no tratamento da hipertensão arterial, asma
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brônquica, reumatismo, diabetes, etc., uma redução significativa do consumo da
droga, e longos períodos de abstinência, supondo a ocorrência de recaídas
ocasionalmente. Muitos acham que este seria um padrão razoável de sucesso
terapêutico, da mesma forma que em outras doenças crônicas, ou seja, o controle
da doença, mas não a sua cura definitiva.
Vamos chamar de “psicoativas” as drogas psicotrópicas, portanto, com efeito
sobre o Sistema Nervoso Central. Convencionalmente, vamos chamar ainda de
“psicoativas” as drogas de caráter ilícito, cujo efeito por ela produzido é de alguma
forma agradável ao usuário. Pois bem. Quando se usa uma droga psicoativa, o
efeito proporcionado por ela adquire para a pessoa um caráter de recompensa
prazerosa.
A maioria das definições de adição a drogas ou dependência de substâncias
inclui descrições do tipo “indivíduo completamente dominado pelo uso de uma droga
(uso compulsivo)” e vários sintomas ou critérios que refletem a perda de controle
sobre o consumo de drogas.
As pesquisas, hoje em dia, caminham através da Psiquiatria e da Psicologia
Experimental, juntamente com a Neurobiologia. Todas essas áreas se esforçam
para identificar os elementos emocionais e biológicos que contribuem para alterar o
equilíbrio do prazer (homeostase hedonista), alterações esta que dá origem àquilo
que se conhece como drogadição (droga-adição). A palavra “adição”, em português,
é um neologismo técnico que quer dizer, de fato, "drogadição".
O tema “drogas” é muito complexo, multidimensional e tem atraído a atenção
da maioria dos países. Nas últimas duas décadas, importantes avanços nas ciências
do comportamento e nas neurociências vieram contribuir para um melhor
entendimento na questão do abuso de drogas e da drogadição (droga-adição).
A neurociência tem identificando circuitos neuronais envolvidos em todos
tipos de abusos conhecidos, assinalando regiões cerebrais, neuroreceptores,
neurotransmissores e as vias neurológicas comuns afetadas pelas drogas. Também
têm sido identificados os principais receptores das drogas suscetíveis de abuso,
assim como todas as ligações naturais da maior parte desses receptores.
Neurologicamente a drogadição deve ser considerada uma doença. Ela está
ligada a alterações na estrutura e funções cerebrais, e isso torna a drogadição
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fundamentalmente uma doença cerebral. Inicialmente, o uso de drogas é um
comportamento voluntário, mas, com o uso prolongado um “interruptor” no cérebro
parece ligar-se, e quando o “interruptor” é ligado, o indivíduo entra em estado de
dependência química caracterizado pela busca e consumo compulsivo da droga.
Em tópico mais adiante falaremos em detalhes sobre a drogadição.
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3 EPIDEMIOLOGIA
Segundo os dados publicados no Relatório Mundial de Drogas de 2007 da
Organização das Nações Unidas (ONU), no Brasil, o aumento do uso de cocaína, de
0,4% (em 2001) para 0,7% (em 2005), é considerado um dado importante, assim
como o aumento do uso de maconha. A maconha foi a droga ilícita que apresentou o
maior incremento de uso nos últimos anos, tendo sua porcentagem de uso
aumentada de 1%, em 2001, para 2,6% em 2005. A ONU considera que esse
aumento é um reflexo da facilidade de obtenção da droga no país. As anfetaminas
também demonstraram aumento de uso entre a população brasileira, apresentando
índices de prevalência semelhantes aos da América do Norte e da África (WAGNER;
ANDRADE, 2008).
Em 2007, a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) publicou uma cartilha
avaliando o consumo de álcool entre a população brasileira. Nesse estudo, foi
encontrado que o uso regular de bebidas alcoólicas pelos adolescentes começa aos
14,8 anos e pelos adultos jovens, aos 17,3 anos. Esses números foram obtidos após
desconsiderar jovens adultos que haviam iniciado o consumo após os 18 anos, ou
seja, apontando uma redução nas idades médias dos jovens adultos. Pela
vulnerabilidade dessa população, é fundamental monitorar de perto esse fenômeno.
Segundo a SENAD, estudos futuros poderão mostrar se vai ser possível
reverter essa tendência com a implantação de eventuais políticas públicas em
relação ao álcool. Vale a pena ressaltar que não houve diferenças entre os gêneros,
quanto à idade de início de uso e quanto ao padrão de consumo nos adolescentes
estudados (SENAD, 2007).
O consumo de álcool e outras drogas está inserido no cotidiano de grande
parte da população mundial. Tal realidade está associada a uma série de outras
situações de risco à saúde e vem sendo observada em diferentes países, em todos
os continentes.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, cerca de 10% das
populações dos centros urbanos de todo o mundo consomem abusivamente
substâncias psicoativas, independentemente da idade, sexo, nível de instrução e
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poder aquisitivo. Salvo variações sem repercussão epidemiológica significativa, essa
realidade encontra equivalência em território brasileiro (MS/BRASIL, 2003).
Um estudo capitaneado pela Universidade de Harvard indica que, entre as
dez doenças mais incapacitantes, cinco são de natureza psiquiátrica: depressão,
transtorno afetivo-bipolar, alcoolismo, esquizofrenia e transtorno obsessivo-
compulsivo (MS/BRASIL, 2003).
Sobre o uso de substâncias psicoativas, o estudo de Harvard sobre a Carga
Global da Doença trouxe a estimativa de que o álcool seria responsável por 1,5% de
todas as mortes no mundo, bem como 2,5% do total de anos vividos com alguma
incapacidade.
No Brasil, o II Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas
Psicotrópicas, realizado em 2005 pelo CEBRID (Centro Brasileiro de Informações
sobre Drogas Psicotrópicas), apontou que 12,3% das pessoas pesquisadas, com
idades entre 12 e 65 anos, preenchem critérios para a dependência do álcool, e
cerca de 75% já beberam pelo menos uma vez na vida (CARLINI et al., 2007).
Segundo os dados da pesquisa, o uso na vida de álcool, nas 108 maiores
cidades do país, foi de 74,6%, porcentagem inferior a de outros países (Chile com
86,5% e Estados Unidos com 82,4%). Em todas as regiões, observaram-se mais
dependentes de álcool do sexo masculino.
O uso na vida para qualquer droga (exceto tabaco e álcool) foi de 22,8%.
Essa porcentagem é, por exemplo, próxima ao Chile (23,4%) e quase metade dos
Estados Unidos (45,8%).
O uso de solventes foi de 6,1%, prevalência superior à verificada na
Colômbia (1,4%) e Espanha (4,0%). Em contrapartida, a prevalência do uso na vida
de solventes nos Estados Unidos foi de 9,5%.
O uso na vida de maconha, nas 108 maiores cidades, foi de 8,8%, resultado
este próximo aos da Grécia (8,9%) e da Polônia (7,7%), porém abaixo dos Estados
Unidos (40,2%) e do Reino Unido (30,8%).
A prevalência de uso na vida de cocaína nas 108 maiores cidades do país
foi de 2,9%, sendo próxima à da Alemanha (3,2%), porém bem inferior a dos
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Estados Unidos (14,2%) e do Chile (5,3%). O uso na vida de crack foi de 1,5%,
cerca de duas vezes menor que no estudo norte-americano.
Os dados também indicam o consumo de álcool em faixas etárias cada vez
mais precoces e sugerem a necessidade de revisão das medidas de controle,
prevenção e tratamento.
Outros dados epidemiológicos relevantes são:
20% da população usam substâncias psicoativas no decorrer da vida;
15% no mínimo são portadores da doença da dependência química;
10% a 12% desses usam mais de uma droga concomitante;
A incidência de DQ é de 2 a 6 vezes maior no homem;
DQ evolui do álcool para drogas mais pesadas;
150 mil óbitos/ano por alcoolismo nos USA;
15% dos DQ cometem suicídio (20 vezes maior que na população).
A Associação Norte-americana de Psiquiatria refere, no DSM IV, uma
prevalência de 3% para os Transtornos de Personalidade em homens e de 1% em
mulheres da população geral. Entretanto, essas porcentagens aumentam em
populações clínicas, em geral até 30%, podendo chegar em determinados
subgrupos populacionais como, por exemplo, entre os dependentes crônicos de
substância, até 92%. As diferenças na incidência dos Transtornos de Personalidade
entre pacientes dependentes químicos despertaram interesses em se relacionar
essas duas condições.
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4 AS PRINCIPAIS DROGAS DE ABUSO
As drogas psicotrópicas são substâncias psicoativas que alteram o
comportamento, o humor e a cognição, possuindo propriedade reforçadora, sendo,
portanto, passíveis de autoadministração (OMS, 1981), consequentemente podem
levar ao abuso e à dependência.
Reforço ou estímulo reforçador é a capacidade que a droga tem de criar e
manter hábitos e comportamentos relacionados à droga. Essa característica é
considerada fundamental para que a droga seja capaz de induzir dependência. O
reforço pode ser positivo ou negativo. Reforço positivo é a capacidade da droga de
produzir efeitos agradáveis e sensações prazerosas. Reforço negativo é a
capacidade da droga de diminuir sensações desagradáveis. Em muitos casos é
difícil separar qual o tipo de reforço predominante em determinada situação
(ALMEIDA, 2006). Por exemplo, o etanol apresenta reforço positivo pela sua
capacidade de produzir euforia e reforço negativo pelo seu efeito ansiolítico e por
evitar a síndrome de abstinência.
A propriedade reforçadora da droga psicotrópica é a característica comum
de todas as drogas de abuso e será discutida mais detalhadamente no tópico de
“Neurobiologia da adição”.
As drogas psicotrópicas podem ser classificadas de várias maneiras,
levando em conta sua estrutura química, seus efeitos farmacológicos ou sua origem
natural ou sintética. A classificação mais utilizada é a proposta por CHALOUT em
1971 para os psicoativos, que considera o tipo de alteração principal que a droga
produz no sistema nervoso central: estimulante, depressor ou alucinógeno. O quadro
a seguir mostra esta classificação, citando apenas os psicotrópicos.
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Classificação de Chalout (1971)
Depressores ou Psicolépticos: Álcool, hipnóticos, inalantes,
opióides, ansiolíticos benzodiazepínicos.
Estimulantes ou Psicoanalépticos: Cocaína, anfetaminas,
nicotina, xantinas, outros.
Perturbadores ou Psicodislépticos (Alucinógenos):
- Naturais: maconha, mesclalina, psilocibina, caapi
+chacrona (Santo Daime) e outros.
- Sintéticos: LSD, anticolinérgicos, ectasy, outros.
Também podemos citar as principais drogas pelas classes mais conhecidas,
inclusive referenciando seus nomes populares ou “de rua”. Normalmente os
profissionais de saúde colocam os nomes dessas classes de drogas em um cartão
plastificado para que os pacientes possam ler e se familiarizar com seus nomes.
Esse cartão é apresentado a seguir.
Nomes populares ou comerciais das drogas
produtos do tabaco (cigarro, charuto, cachimbo, fumo de corda);
bebidas alcoólicas (cerveja, vinho, champanhe, licor, pinga uísque,
vodca, vermutes, caninha, rum tequila, gim);
maconha (baseado, erva, liamba, diamba, birra, fuminho, fumo, mato,
bagulho, pango, manga-rosa, massa, haxixe, skank, etc);
cocaína, crack (coca, pó, branquinha, nuvem, farinha, neve, pedra,
caximbo, brilho);
estimulantes como anfetaminas (bolinhas, rebites, bifetamina,
moderine, MDMA);
inalantes (solventes, cola de sapateiro, tinta, esmalte, corretivo, verniz,
tiner, clorofórmio, tolueno, gasolina, éter, lança perfume, cheirinho da
loló);
hipnóticos, sedativos (ansiolíticos, tranquilizantes, barbitúricos,
fenobarbital, pentobarbital, benzodiazepínicos, diazepam);
alucinógenos (LSD, chá-de-lírio, ácido, passaporte, mescalina, peiote,
cacto);
opiáceos (morfina, codeína, ópio, heroína, elixir, metadona);
outras - especificar.
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5 NEUROBIOLOGIA DA ADIÇÃO
A progressão do uso inicial à adição é influenciada por muitos fatores. Entre
eles:
a droga em si;
influências de outras pessoas e ambientais, e,
as características do usuário como sua personalidade, suas enzimas
metabolizadoras ou sua predisposição geneticamente adquirida.
A interação entre esses fatores é complexa e determina porque alguns
indivíduos apresentam comportamentos aditivos e outros não. O uso inicial da droga
pode ser voluntário, buscando o prazer e as suas propriedades reforçadoras, mas
para a pessoa que apresenta adição, a escolha pelo uso da droga não é mais
voluntária. Na adição, ocorrem neuroadaptações cerebrais semelhantes às que
ocorrem no aprendizado de uma tarefa, e o indivíduo procura a droga mesmo na
evidência de consequências pessoais negativas e graves (CHOU; NARASIMNHAN,
2005 apud MPP, 2008).
No entanto, os mecanismos neurobiológicos que determinam essa transição
do uso controlado para o descontrolado ainda não estão totalmente esclarecidos. As
recaídas no uso das drogas é o fator clinico mais difícil de ser controlado no
tratamento da adição. Após longo período de abstinência o craving (compulsão pela
droga) pela droga ou a recaída pode ser iniciado pela presença da droga em si, por
pistas ambientais que estejam associadas à droga ou pelo estresse (SHAHAN;
HOPE, 2005 apud MPP, 2008).
As drogas de abuso são substâncias com diversas estruturas químicas e
mecanismos de ação. Na administração aguda cada droga se liga a um sítio de ação
próprio e desencadeia uma série de comportamentos, sensações e efeitos
fisiológicos e dependendo da quantidade usada pode causar um quadro de
intoxicação típico da droga. Essas drogas são todas agudamente recompensadoras
(o que leva a repetição do seu uso) e com o uso crônico, alguns efeitos são
compartilhados entre elas, como produzir sintomas emocionais negativos na sua
suspensão, produzir um longo período de sensibilização e desenvolver um
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aprendizado associativo droga - pistas ambientais relacionadas à droga. Acredita-se
que esses efeitos crônicos são adaptações que contribuem para o craving (desejo,
compulsão) pela droga e para as recaídas, mesmo após longos períodos de
abstinência.
Existem várias evidências que todas as drogas de abuso convergem a um
circuito comum no sistema límbico cerebral, o qual é responsável pelo controle das
emoções. A principal via que vem sendo investigada é a via dopaminérgica que se
inicia na área tegmental ventral e vai em direção ao núcleo accunbens. Essa via é a
mais importante para os efeitos recompensadores agudos de todas as drogas de
abuso, e várias pesquisas têm mostrado como, apesar de seus diferentes
mecanismos de ação, todas as drogas convergem a essa via, tendo assim efeitos
agudos reforçadores comuns.
Drogas estimulantes (cocaína, anfetaminas) são capazes de ativar
diretamente essa via, principalmente por inibirem a recaptação de dopamina e no
caso das anfetaminas, também por aumentarem a liberação deste neurotransmissor.
Os opióides agem como agonistas (são semelhantes a opióides endógenos, assim
“enganam” a célula) em receptores de opióides endógenos (encefalinas, endorfinas
e dinorfina) atuando diretamente em neurônios do núcleo accunbens que promovem
liberação de dopamina. Esses agentes também atuam inibindo interneurônios
gabaérgicos na área tegmental ventral, levando a maior atividade dessa região
(MPP, 2008).
A nicotina parece ativar os neurônios da área tegmental ventral diretamente
via receptores nicotínicos e indiretamente pela ativação de neurônios
glutamatérgicos que inervam as células dopaminérgicas. O álcool pela
potencialização de receptores gabaérgicos inibe a função deste neurotrasmissor em
terminais de outros neurotransmissores, aumentando a atividade dos neurônios
dopaminérgicos e também inibe terminais glutamatérgicos que inervam o núcleo
accunbens. O álcool tem vários mecanismos propostos para sua ação, e é a droga
que tem o mecanismo de ação mais complexo e menos conhecido.
O tetrahidrocanabinol, alcalóide presente na maconha, age em receptores
para canabinóides endógenos (como a anandamida), atuando em terminais
nervosos glutamatérgicos e gabaérgicos no núcleo accunbens e diretamente nos
20
neurônios do núcleo accunbens. Fenciclidina, um potente alucinógeno sintético,
inibe receptores glutamatérgicos pós sinápticos no núcleo accunbens. Além disso,
álcool e nicotina parecem ativar vias opióides e essas duas drogas e as outras
parecem ativar o sistema canabinóide endógeno (NESTLER, 2005 apud MPP,
2008).
Todas essas drogas causam uma liberação de dopamina cerca de 2 a 10
vezes maior do que reforçadores naturais e demoram mais para voltar ao normal.
Em alguns casos, como quando as drogas são fumadas ou injetadas
endovenosamente, essa inundação dopaminérgica ocorre quase imediatamente.
Como a dopamina, além das sensações prazerosas, está relacionada com a
motivação, cognição, movimento e emoção, a superestimulação destes sistemas
ensina o indivíduo a repetir o comportamento de busca pela droga. O sistema
nervoso central possui conexões que garantem a repetição de atividades de
manutenção da vida associando essas atividades com prazer ou reforço (como
comer, fazer sexo, etc.). Quando o circuito da motivação e recompensa é ativado, o
cérebro nota que algo importante está acontecendo, que precisa ser lembrado e isso
ensina a repeti-lo, muitas vezes sem pensar. Como as drogas de abuso ativam esse
sistema, é como se elas estivessem “sequestrando” esse sistema e “enganando” os
circuitos cerebrais informando que algo importante para a manutenção da vida está
acontecendo. Alguns cientistas dizem que o abuso de drogas é algo que
aprendemos a fazer muito bem (NIH, 2007 apud MPP, 2008).
Essas ações agudas das drogas levam a alterações de membrana e
citoplasmáticas que geralmente são locais e passageiras. Mas elas levam a ativação
de fatores de transcrição da função gênica celular que possivelmente resultam em
mudanças funcionais e morfológicas duradouras (KOOB; SANNA; BLOOM, 1998
apud MPP, 2008).
Um dos fatores de transcrição afetados pelo uso crônico de drogas é o
CREB (cAMP-response-element-binding protein) o qual é expresso em todas as
células do cérebro e é essencial em processos que se iniciam na membrana e levam
à alteração na expressão gênica, ou seja, causa uma modificação no funcionamento
das células cerebrais alvos da droga, podendo assim alterar a função de neurônios
21
individualmente ou de circuitos neuronais como um todo (CARLEZON; DUMAN;
NESTLER, 2005 apud MPP, 2008).
O uso crônico de cocaína, anfetaminas ou opióides induzem a atividade do
CREB, enquanto álcool e nicotina diminuem sua atividade no núcleo accunbens,
apesar de aumentá-la em outras regiões. O aumento de atividade do CREB no
núcleo accunbens diminui as respostas comportamentais, enquanto a diminuição da
sua atividade aumenta essas respostas. O CREB também é induzido por reforços
naturais (como água com sacarose administrada a animais, e possivelmente na
presença de outros reforçadores naturais) (CARLEZON; DUMAN; NESTLER, 2005
apud MPP, 2008).
Outro fator de transcrição que é afetado pelo uso crônico de drogas é o
ÄFosB. É um fator de transcrição que tem um papel essencial em mudanças
adaptativas de longa duração no cérebro, associadas a diversas condições como
adição, aprendizado, doença de Parkinson, depressão e tratamento antidepressivo.
Esse fator de transcrição induz a expressão de várias proteínas da família Fos e que
aparecem em regiões específicas após a administração de várias drogas de abuso,
mas retornam aos níveis basais dentro de algumas horas. Com a administração
crônica dessas drogas, algumas destas proteínas se acumulam nessas mesmas
regiões cerebrais (McCLUNG et al, 2004; NESTLER; BARROT; SELF, 2001 apud
MPP, 2008).
Além da via mesolímbica, que envolve o núcleo accunbens, outras regiões
que interagem com ela também se mostram importantes, como amígdala,
hipocampo, hipotálamo e várias áreas do córtex cerebral. Muitas dessas regiões
estão associadas aos sistemas de memória e aprendizado. A via mesolímbica,
assim como as outras regiões citadas, também estão envolvidas com as “adições
naturais” como compulsão por sexo e por jogo (NESTLER, 2005).
Resumidamente, poderíamos dizer que as drogas têm uma ação aguda no
sistema nervoso central da qual se destacam as suas propriedades reforçadoras e
os efeitos observados na intoxicação aguda. Essas ações são passageiras e não
determinam nem a adição nem a dependência, mas promovem a procura inicial pela
droga. Com o uso crônico da droga, ocorrem neuroadaptações, que durante um
período, que varia de droga para droga, de indivíduo para indivíduo e de situação
22
para situação, ainda são reversíveis e constituem o que se chama de fase de
transição para a adição. É nesta fase que o processo de aprendizado do uso da
droga se desenvolve e todos os estímulos relacionados ao uso estão sendo
associados à presença da droga. É também nesta fase que começam a aparecer os
problemas associados ao uso e que são importantes para motivar o usuário a
diminuir ou parar com o uso, pois nesse período as neuroadaptações ainda são
relativamente fáceis de serem revertidas, desde que o usuário esteja motivado a
realizar a mudança do seu padrão de uso.
Uma das alterações que ocorre nesta fase, é a adaptação do sistema de
recompensa. Como a liberação de dopamina está aumentada e outros
neurotransmissores também estão alterados pela presença da droga, as células
cerebrais se ajustam a esta nova situação, o que se chama de adaptação
homeostática. Essas alterações fazem com que a droga seja menos prazerosa, o
indivíduo se sente mal, deprimido, sem vida e fica incapaz de apreciar coisas que
anteriormente lhe davam prazer. Agora, ele necessita de maiores doses da droga
para produzir a ativação dos sistemas de recompensa, fenômeno conhecido como
tolerância. Somado a isso, o sistema nervoso central dele promoveu o aprendizado
do uso da droga e estímulos associados a esse uso adquirem a capacidade de
estimular o circuito de aprendizado fazendo com que a presença de algum destes
estímulos desencadeie a ativação do circuito levando o indivíduo à urgência de usar
a droga (fissura, craving).
Esses estímulos associados podem ser internos e externos ao indivíduo.
Estímulos internos que podem ser associados ao aprendizado de usar a droga são,
por exemplo, certas emoções que o indivíduo experimentava durante ou
previamente ao uso, como alegria, raiva, tristeza, depressão e outras. Estímulos
externos associados ao uso podem ser de várias naturezas, como a presença
constante de um amigo, alguma música ou som característico, luzes do ambiente de
uso, local de uso da droga, entre outros, que dependem da “história” do indivíduo.
Esses estímulos podem ser perceptíveis ao indivíduo ou não. Por exemplo, cita-se
na literatura o caso de um jovem que estava sob tratamento de dependência de
cocaína aspirada e que relatava que em certas ocasiões ele sentia uma forte fissura
pela droga, mas não conseguia identificar o estímulo desencadeante. Após algum
tempo de terapia e de observação do ambiente ao qual estava sendo exposto no
23
momento da fissura, ele percebeu que quando atravessava uma rua na faixa de
segurança ocorria a fissura. A faixa de segurança é constituída de linhas brancas
com fundo escuro, similarmente ao modo de uso da cocaína aspirada, no qual as
“carreirinhas” são linhas brancas num fundo escuro. Para o cérebro esses estímulos
eram generalizados e ativavam o circuito associado ao uso da droga, causando
fissura, ou seja, necessidade urgente de consumir a droga.
Com o uso continuado da droga, a perda de controle se instala, se
caracterizando a fase da adição. Nesta fase consolidam-se as mudanças
adaptativas da fase de transição, ocorre um redirecionamento de circuitos cerebrais
e um aumento da expressão gênica de proteínas que conferem a vulnerabilidade
para a recaída. Nesta fase o indivíduo necessita de ajuda de profissionais
especializados e habilitados para poder enfrentar as suas situações do dia a dia.
Nesta fase, normalmente o indivíduo já obteve muitas perdas: físicas, financeiras,
sociais e psicológicas. Muitas vezes transtornos psiquiátricos se instalam, ou já
existiam antes do uso da droga, complicando muito o quadro do paciente e sua
recuperação. Reestruturar os seus circuitos cerebrais dentro deste panorama bio-
psico-social, readquirir motivação para a mudança de comportamento e ainda atingir
sucesso pessoal tornam-se tarefas “inatingíveis”, e o indivíduo recai. Alguns
medicamentos auxiliam no tratamento, mas não existe “remédio” para essa fase,
ainda. Somente a psicoterapia e o forte apoio da rede social e familiar garantem o
sucesso.
Muito se fala da baixa efetividade do tratamento de dependência/adição.
Acredita-se que cerca de 40 a 60% dos pacientes dependentes/adictos que
procuram tratamento se recuperam, quando se considera o primeiro ano de
seguimento, mas estas taxas caem ainda mais quando se acompanha o paciente
por um período mais longo. Pode-se dizer que são taxas baixas, mas quando se
compara com outras taxas de recaída de outras doenças orgânicas crônicas, nota-
se que o panorama é parecido. O jornal JAMA (Journal of the American Medical
Association) publicou em 2000 uma comparação das taxas de recaída de alguns
problemas crônicos médicos mais frequentes. Enquanto para drogadição as taxas
de recaída estão entre 40 e 60%, para diabetes tipo 1 estão entre 30 e 50% e para
hipertensão e asma entre 50 e 70%. Isto demonstra que o tratamento da drogadição,
um problema crônico e altamente estigmatizado, não é diferente de outros
24
problemas crônicos que possuem baixa estigmatização e que possuem vários
programas implantados nos sistemas de saúde do mundo todo (MPP, 2008).
25
6 MECANISMO GERAL DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA
O renomado médico Dráuzio Varella em entrevista com o médico psiquiatra,
PhD em dependência química, Ronaldo Laranjeiras nos presenteou com respostas a
alguns questionamentos muito pertinentes que vale deixar para apreciação e
esclarecimentos sobre os mecanismos de dependência.
Que mecanismo do corpo humano explica o processo de dependência da
droga?
No cérebro existe uma área responsável pelo prazer. O prazer, que sentimos
ao comer, fazer sexo ou ao expor o corpo ao calor do sol, é integrado numa área
cerebral chamada sistema de recompensa. Esse sistema foi relevante para a
sobrevivência da espécie. Quando os animais sentiam prazer na atividade sexual, a
tendência era repeti-la. Estar abrigado do frio não só dava prazer, mas também
protegia a espécie. Desse modo, evolutivamente, criamos essa área de recompensa
e é nela que a ação química de diversas drogas interfere. Apesar de cada uma
possuir mecanismo de ação e efeitos diferentes, a proposta final é a mesma, não
importa se tenha vindo do cigarro, álcool, maconha, cocaína ou heroína. Por isso, só
produzem dependência as drogas que de algum modo atuam nessa área. O LSD,
por exemplo, embora tenha uma ação perturbadora no sistema nervoso central e
altere a forma como a pessoa vê, ouve e sente, não dá prazer e, portanto, não cria
dependência.
Vários são os motivos que levam à dependência química, mas o final é
sempre o mesmo. De alguma maneira, as drogas pervertem o sistema de
recompensa. A pessoa passa a dar-lhes preferência quase absoluta, mesmo que
isso atrapalhe todo o resto em sua vida. Para quem está de fora fica difícil entender
por que o usuário de cocaína ou de crack, com a saúde deteriorada, não abandona
a droga. Tal comportamento reflete uma disfunção do cérebro. A atenção do
dependente se volta para o prazer imediato propiciado pelo uso da droga, fazendo
com que percam significado todas as outras fontes de prazer.
A evolução criou, no cérebro, um centro de recompensa ligado diretamente à
sobrevivência da espécie. As abelhas, quando pousam numa flor e encontram
26
néctar, liberam um mediador chamado octopamina, neurotransmissor presente nas
sensações de prazer. Esses mecanismos são bastante arcaicos?
O sistema de prazer é muito primitivo. É importante para as abelhas e para
os seres humanos também. A droga produz efeito tão intenso porque age nesses
mecanismos biológicos bastante primitivos que representam uma armadilha
poderosa. Na verdade, provoca-se um estímulo forte que está mexendo com
milhares de anos de evolução, portanto, podemos dizer que a droga é um fenômeno
psicossocial amplo, mas que acaba interferindo nesse mecanismo biológico
primitivo.
Muitos usuários garantem que a maconha é uma droga fácil de largar, que
não causa dependência. Isso é verdade?
Cada droga tem um perfil de dependência; a maconha não é muito diferente
das demais. Atualmente ela está dez vezes mais forte do que era há 30 anos. Por
isso, não é tão fácil afastar-se dela, principalmente se a pessoa começou a fumar na
adolescência, quando ainda era um ser em formação. O acompanhamento de
usuários de maconha, no ambulatório da Escola Paulista de Medicina, sugere
exatamente o contrário. As pessoas conseguem suspender o uso da droga durante
alguns dias, mas a vontade fica incontrolável e elas voltam a fumar os baseados.
No Carandiru, Dráuzio examinava rapazes com tuberculose que fumavam
cigarros de nicotina, de maconha e crack. Explicava-lhes que eles não podiam fumar
de jeito nenhum, porque seus pulmões estavam doentes, muito inflamados. Na
semana seguinte, eles lhe informam que conseguiram suspender o crack e a
maconha, mas o cigarro estava difícil. Isso se repetia nas semanas subsequentes.
Centenas de casos como esse, o convenceram de que o cigarro é mais difícil de
largar do que as outras drogas. É um exagero?
Embora o efeito da nicotina não seja tão poderoso quanto o da maconha, é
muito mais constante. Imaginemos que o fumante dê dez tragadas em cada cigarro
e fume vinte cigarros por dia. Feitas as contas, num único dia seu cérebro recebeu
um reforço positivo pelo menos duzentas vezes. Cada tragada é igual a uma injeção
de nicotina na veia. Esse estímulo, repetido através dos anos, faz com que a
dependência de nicotina seja mais poderosa do que as outras. A maconha, no
momento, passa por processo semelhante. Mais disponível e mais barata, seu
27
consumo aumentou e, consequentemente, o número de cigarros fumados por dia e
os estímulos cerebrais que provocam aumentaram também. Portanto, em termos de
dependência, as duas drogas não diferem muito. Pelo atual padrão de consumo,
mais fácil, accessível e intenso, maconha e nicotina têm muito em comum. Por isso,
Laranjeira não compartilho a ideia de que maconha seja uma droga leve.
O usuário de cocaína diz que deixará de usar a droga quando quiser. No
entanto, admite que não poderá vê-la, porque entrará em desespero e a vontade de
consumi-la fica incontrolável. Como se pode explicar esse fenômeno?
Ficar longe da droga, quando se está disposto a abandoná-la, faz parte do
processo de aprendizado. No exato instante em que a pessoa vê a cocaína, seu
cérebro começa a preparar-se para recebê-la e dispara um mecanismo que
chamamos de craving ou fissura. Isso vale para qualquer droga. Depois que ficou
dependente, é quase impossível alguém ver a droga e resistir ao desejo de usá-la.
Por isso, na fase inicial do tratamento, aconselha-se que se afaste completamente
de todos esses estímulos, pois ficará menos difícil lidar com o fenômeno da
dependência química.
A maioria das pessoas bebe com moderação, mas algumas fazem uso
abusivo do álcool. Há quem fume maconha ou use cocaína esporadicamente, mas
existem os que fumam crack o dia inteiro. O que explica essa diferença? A resposta
está na droga ou no usuário?
Parte da resposta está na tendência ao uso crônico e na história de cada
pessoa. Quando começou a usar? Como interpreta os sintomas da síndrome de
abstinência? Além disso, o que vai fazer com que repita a experiência não é só a
busca do prazer, mas a tentativa de evitar o desprazer que a ausência da droga
produz.
A dependência é um processo de aprendizado. O fumante, por exemplo,
pela manhã já manifesta sintomas da abstinência. Fica irritado e sua capacidade de
concentração baixa. Ele fuma, o desconforto diminui. Vinte minutos depois, o nível
de nicotina no cérebro cai, voltam os sintomas da abstinência e ele vai aprendendo a
usar a droga pelo efeito agradável que proporciona e para evitar o desprazer que
sua falta produz. A dependência é fruto, então, do mecanismo psicológico que a um
só tempo induz o indivíduo a buscar o prazer e evitar o desprazer e das alterações
28
cerebrais que a droga provoca. Essa interação entre aspectos psicológicos e efeito
farmacológico vai determinar o perfil dos sintomas de abstinência de cada pessoa. A
compulsão é menor naquelas que toleram a abstinência um pouco mais, e maior nas
que a inquietação é intensa diante do menor sinal da síndrome de abstinência.
Resumindo: a dependência química pressupõe o mecanismo psicológico de
buscar a droga e a necessidade biológica que se criou no organismo. Disso resulta a
diversidade de comportamentos dos usuários.
A maconha é um bom exemplo. Seu uso compulsivo hoje é maior do que era
há 20, 30 anos e, de acordo com as evidências, quanto mais cedo o indivíduo
começa a usá-la, maior é a possibilidade de tornar-se dependente. Como garotos de
12, 13 anos, e às vezes até mais novos, estão usando maconha, atualmente o
problema se agrava. Além disso, as concentrações de THC (princípio ativo da
maconha) aumentaram muito nos últimos tempos. Na década de 1960, andavam por
volta de 0,5% e agora alcançam 5%. Portanto, a maconha de hoje é 10 vezes mais
potente do que era naquela época.
Diante disso, a Escola Paulista de Medicina sentiu a necessidade de montar
um ambulatório só para atender os usuários de maconha e há uma lista de espera
composta por adolescentes e jovens adultos desmotivados, que fumam 6, 7
baseados por dia e não conseguem fazer outra coisa na vida. Isso não acontecia
quando a concentração de TSH era mais fraca e o acesso à droga mais restrito.
Quando se conversa com usuários de maconha de muitos anos, eles
lastimam que a droga tenha perdido a qualidade. Sua explicação prova exatamente
o contrário.Terão essas pessoas desenvolvido um grau de tolerância maior à droga?
Laranjeiras acha que a queixa é fruto de um certo saudosismo, uma vez que
há tipos de maconha, entre eles o skank, que chegam a ter 20% de THC. Na
Holanda, foram desenvolvidas cepas que contêm maior concentração desse
princípio ativo, o que faz com que a maconha perca a classificação de droga leve e
se transforme numa substância poderosa para causar dependência. Deve-se
considerar, ainda, como justificativa da queixa que o uso crônico causa sempre certa
tolerância.
29
No Carandiru, a experiência de Varella mostrou que há quem fumasse um
baseado a cada 30 minutos. Uma droga que exija tal frequência de consumo pode
ser considerada leve?
Infelizmente não existem drogas leves, se produzirem estímulo no sistema
de recompensa cerebral. Em geral, as pessoas perguntam: mas se a droga dá
prazer, qual é o problema? O problema é que ela não mexe apenas na área do
prazer. Mexe também em outras áreas e o cérebro fica alterado. Diante de uma
fonte artificial de prazer, ele reage de modo impróprio. Se existe a possibilidade de
prazer imediato, por que investir em outro que demande maior esforço e empenho?
A droga perverte o repertório de busca de prazer e empobrece a pessoa. Comer,
conversar, estabelecer relacionamentos afetivos, trabalhar são fontes de prazer que
valorizamos, mas não são imediatas (VARELLA, 2006).
6.1 Síndrome da Abstinência/ Efeito Rebote
O mecanismo de recompensa cerebral é importante para a preservação da
espécie e ninguém é contra o prazer. Ao contrário, deveríamos estimular o
surgimento de inúmeras fontes de prazer. A dependência química, entretanto, cria
uma ilusão de prazer que acaba perturbando outros mecanismos cerebrais.
Se fumando um baseado a pessoa relaxa, findo o efeito, a ansiedade ganha
força, pois a síndrome de abstinência é imediata. É o chamado efeito rebote.
A cocaína age de forma diferente. O efeito rebote está na impossibilidade de
sentir prazer sem a droga. Passada a excitação que ela provoca, a pessoa não volta
ao normal. Fica deprimida, desanimada. Tudo perde a graça. Como só sente prazer
sob a ação da droga, torna-se um usuário crônico. Às vezes, tenta suspender o uso
e reassumir as atividades normais, mas nada lhe dá prazer. Parece que, por
vingança divina, o cérebro perdeu a capacidade de experimentar outras fontes que
não a desse prazer artificial que a droga proporciona.
Essa é uma das tragédias a que se expõem os dependentes químicos. No
processo de reabilitação, quando a pessoa para de usar droga, é fundamental ajudá-
la a reencontrar fontes de prazer independentes da substância química.
30
Quem está de fora dificilmente entende o comportamento do dependente.
Quem está passando por isso, vê a realidade de forma diferente?
Na verdade, essa pessoa está doente. Seu cérebro está doente, com a
sensação de que não existe outro prazer além da droga. Isso acontece também com
o cigarro, uma fonte preciosa de prazer para os fumantes que adiam a decisão de
parar de fumar por medo de perdê-la. De fato, 30% dos fumantes, logo depois que
se afastam da nicotina, apresentam sintomas expressivos de depressão e precisam
ser medicados com antidepressivos.
31
7 RELATÓRIO MUNDIAL SOBRE DROGAS - 2009
O Relatório Mundial sobre Drogas - 2009, lançado pelo Escritório das
Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), mostra que o mercado global de
cocaína, opiáceos (ópio, morfina e heroína) e de maconha está estável ou em
declínio, enquanto a produção e o uso de drogas sintéticas estão em crescimento
nos países em desenvolvimento.
O relatório de 314 páginas, elaborado para o Dia Internacional contra o
Tráfico e o Abuso de Drogas, celebrado no dia 26 de junho, foi lançado em
Washington pelo diretor-executivo do UNODC, Antonio Maria Costa, e pelo recém
nomeado diretor do Gabinete de Política Nacional de Fiscalização das drogas
(ONDCP, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, Gil Kerlikowske.
Tendência de declínio nos principais mercados
O cultivo de ópio no Afeganistão, país responsável por 93% da produção
mundial de ópio, diminuiu 19% em 2008. A Colômbia, país que produz a metade da
cocaína no mundo, observou uma redução de 18% no cultivo e uma redução de
28% na produção da droga, em comparação com 2007. A produção global de
cocaína foi estimada em 845 toneladas, a mais baixa em cinco anos, apesar de
terem sido observados aumentos no cultivo no Peru e na Bolívia.
A maconha continua sendo a droga mais cultivada e consumida em todo o
mundo, ainda que as estimativas sobre essa droga sejam menos precisas. Os dados
mostram também que ela é mais danosa à saúde do que o que se costuma
acreditar. O índice médio de THC (o componente danoso da droga) observado na
maconha na América do Norte quase dobrou na última década. Essa mudança traz
grandes implicações à saúde, evidenciada por um aumento significante no número
de pessoas em busca de tratamento.
Em termos de consumo, os maiores mercados de maconha do mundo
(América do Norte, Oceania e Europa Ocidental), de cocaína (América do Norte e
parte da Europa Ocidental) e de opiáceos (Sudeste da Ásia e Europa Ocidental)
32
estão estáveis ou em declínio. Os dados dos países em desenvolvimento são menos
confiáveis.
Provável aumento no uso e na produção de drogas sintéticas nos países em
desenvolvimento
As informações sobre drogas sintéticas - anfetaminas, metanfetaminas e
ecstasy - são mescladas. O uso nos países desenvolvidos se estabilizou. Nos
países em desenvolvimento, há uma preocupação sobre o crescimento na produção
e no consumo, ainda que os dados sejam limitados.
O que antes era uma produção artesanal se transformou em um grande
negócio. Laboratórios de porte industrial no Sudeste Asiático - particularmente na
sub-região do Grande Mekong - estão produzindo quantidades massivas de
comprimidos de metanfetaminas, crystal meth (conhecida como ice) e outras
substâncias como a quetamina.
Alguns países da União Europeia são os principais fornecedores de ecstasy;
o Canadá se transformou no principal eixo de tráfico de meth e ecstasy.
O uso da anfetamina Captagon foi às alturas no Oriente Próximo e no
Oriente Médio. Em 2007, a Arábia Saudita apreendeu um terço de todas as
substâncias do grupo anfetamina no mundo, mais do que o aprendido na China e
nos Estados Unidos juntos.
As rotas de tráfico estão mudando
“O mercado global de cocaína, que movimenta US$ 50 bilhões, está
passando por mudanças sísmicas”, disse Antonio Costa, diretor executivo do
UNODC. “Os índices de pureza e o número de apreensões (nos principais países
consumidores) estão diminuindo, os preços estão aumentando, e os padrões de
consumo estão em evolução. Isso pode ajudar a explicar o terrível aumento nos
índices de violência em países como o México. Na América Central, os cartéis estão
disputando um mercado em retração”, disse Costa.
Na África Ocidental, o declínio nas apreensões parece refletir a diminuição
dos fluxos de cocaína, após cinco anos de intenso crescimento. “Os esforços
internacionais estão dando resultados”, disse Costa. Mas ainda se observa na região
33
violência e instabilidade política relacionadas às drogas, principalmente em Guiné-
Bissau. “Enquanto houver demanda por drogas, os países mais vulneráveis
continuarão sendo alvos dos traficantes. Se a Europa realmente quiser ajudar a
África, deve diminuir seu apetite por cocaína”, disse o principal oficial das Nações
Unidas para a questão das drogas.
Enquanto 41% da produção mundial de cocaína é apreendida
(principalmente na Colômbia), apenas um quinto (19%) de todos os opiáceos do
mundo são interceptados. Irã e Paquistão são os países mais afetados pelo tráfico
de drogas e são eles os responsáveis pelas maiores apreensões de opiáceos (ópio,
morfina e heroína). Em 2007, o Irã apreendeu 85% do ópio produzido no mundo e
28% de toda a heroína. O Paquistão está na segunda posição em termos de
apreensões de heroína e morfina.
A fim de aperfeiçoar o intercâmbio de informações e a ação conjunta de
operações contra narcóticos, o UNODC desenvolveu uma iniciativa triangular entre o
Afeganistão, o Irã e o Paquistão. “Quanto mais ópio for apreendido no Afeganistão e
em seus vizinhos, menos heroína haverá nas ruas da Europa. E vice-versa: quanto
menos heroína for consumida no Ocidente, mais estáveis estarão os países da Ásia
Ocidental”, disse Costa.
Saúde pública e segurança pública não podem estar dissociadas
O Relatório chama muita atenção sobre o impacto dos crimes relacionados a
drogas - e o que fazer sobre isso. No prefácio do Relatório, Costa explora o debate
sobre a descriminalização das drogas. Ele admite que a manutenção das drogas
como ilícitas gera um mercado negro de proporções macroeconômicas, que causa
violência e corrupção. Entretanto, ele alerta que a proposta de legalização das
drogas como uma forma de acabar com essa ameaça - como alguns sugerem - seria
um “erro histórico”. “As drogas ilícitas representam um grande perigo à saúde. Por
essa razão, as drogas são e devem permanecer controladas”, disse o diretor do
UNODC.
“Quem propõe a legalização se equivoca nos dois sentidos”, disse Costa.
“Um mercado liberado acarretaria em uma epidemia de drogas, enquanto a
existência de um mercado controlado acarretaria na criação um mercado paralelo
34
criminoso. A legalização não é uma varinha mágica que acabaria tanto com o crime
organizado quanto com o abuso de drogas”, disse Costa. “A sociedade não deve ter
de escolher entre priorizar a saúde pública ou a segurança pública: ela pode e deve
optar por ambas”, disse. Nesse sentido ele pede aos países um maior investimento
em prevenção e tratamento de drogas, e medidas mais pesadas para enfrentar o
crime relacionado às drogas.
O Diretor do Gabinete de Política Nacional de Fiscalização das drogas
(ONDCP) dos Estados Unidos, Gil Kerlikowske, disse: “O Relatório Mundial sobre
Drogas 2009 demonstra que as drogas são um problema que atinge a todos os
países. Todos nós temos a responsabilidade de enfrentar o abuso de drogas na
nossa sociedade. Internacionalmente, a administração Obama está comprometida
em expandir iniciativas de redução de demanda a fim de garantir que todos aqueles
que lutam para superar o vício tenham acesso a programas efetivos de tratamento,
especialmente nos países em desenvolvimento. Estamos aprendendo muito sobre a
doença da drogadição e sabemos que o tratamento funciona. Por meio de uma ação
abrangente de aplicação da lei, de educação, de prevenção e de tratamento,
teremos êxito em reduzir o uso de drogas ilegais e suas consequências
devastadoras”.
Como melhorar o enfrentamento às drogas
O Relatório oferece uma série de recomendações sobre como melhorar a
política de enfrentamento às drogas. Primeiramente, a questão das drogas deve ser
considerada como uma doença. “Quem usa drogas necessita de assistência médica,
e não de uma sanção criminal”, disse Costa. Ele clama por um acesso universal ao
tratamento de drogas. Considerando que as pessoas com sérios problemas com
drogas são as responsáveis pela maior parte da demanda por drogas, tratar essas
pessoas é a maneira mais efetiva de reduzir o mercado.
Além disso, Costa pede o fim da “tragédia” que são as áreas sem a
presença do Estado. Do mesmo modo em que a maior parte dos cultivos ilícitos
ocorre nas regiões sem a presença do Estado, a maior parte da droga é vendida nas
regiões urbanas nas quais a ordem pública encontra-se fragilizada. “Moradia,
35
emprego, educação, acesso aos serviços públicos e ao lazer podem fazer que as
comunidades estejam menos vulneráveis às drogas e ao crime”, disse Costa.
Em terceiro lugar, os governos devem aderir aos tratados internacionais
contra o crime organizado. Os instrumentos internacionais de enfrentamento ao
crime como a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado e contra a
Corrupção não estão sendo respeitados. “Por isso, muitos Estados estão
enfrentando problemas de crime criados por eles mesmos”, disse o diretor do
UNODC. Particularmente, ele destaca que “os instrumentos atualmente usados para
enfrentar a lavagem de dinheiro e os cibercrimes são inadequados”.
Costa pediu também uma maior eficiência na aplicação da lei. Ele estimulou
as polícias a focar seus esforços em um número menor de criminosos com maior
influência e volume de ação do que em um grande número de contraventores de
menor potencial ofensivo. Em alguns países, a taxa de prisão por uso de drogas é
de até cinco vezes maior do que a por tráfico. “Isso é um desperdício de recursos da
polícia, e um desperdício de vidas jogadas nas cadeias. Devemos ir atrás dos peixes
grandes, não dos pequenos”, disse Costa.
Em um esforço para aumentar a transparência e a qualidade dos dados
relacionados às drogas, em 2009 o UNODC introduziu um espectro de variáveis nas
estimativas por país utilizadas no Relatório Mundial de Drogas. Para muitas regiões,
e para alguns tipos de drogas (como maconha e substâncias do tipo anfetamina) a
variação de estimativas é relativamente ampla, já que o acesso à informação é mais
limitado. “É fundamental que os governos se esforcem na coleta de informações.
Isso proporcionará uma análise mais precisa das tendências e, como resultado,
melhorará o enfrentamento às drogas”, disse Costa.
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REFERÊNCIAS CONSULTADAS E UTILIZADAS
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AVALIAÇÃO
1)Analise as afirmativas abaixo:
(3) Na Idade Média, o conhecimento dos efeitos das drogas sobre o sistema nervoso
central foi utilizado por feiticeiros, mágicos e exploradores da fé pública, com suas
poções para o sono, esquecimento, amor e outras.
(4) É interessante notar que no período anterior à abolição da escravatura no país, o
uso de maconha parecia ser de conhecimento dos grandes latifundiários e este uso
não era por eles reprimido, pois havia uma percepção de que diminuíam
sensivelmente as chances de rebelião entre os escravos.
(5) Em uma linguagem coloquial, droga tem um significado de algo benévolo, de
qualidade. Já em uma linguagem médica, droga é sinônimo de medicamento.
A soma das afirmativas correta é:
a)7
b)8
c)9
d)12
2)Quando falamos em “substância com capacidade de produzir efeito sobre o
organismo em pequeníssima quantidade” estamos nos reportando a:
a)entorpecente
b)droga
c)tóxico
d)n.r.a.
3) No Brasil, o termo ............ é muito utilizado para designar as substâncias que são
consideradas ilícitas pelo ordenamento jurídico. No passado, a exemplo dos anglo-
saxões, já se utilizou também o termo no sentido de ..........................., ou seja,
substâncias que causam bem ao organismo, denominando-se os estabelecimentos
que as comercializam de “...........................”. Qual das opções abaixo completa as
lacunas acima:
a)droga – medicamento – farmácias
b)medicamento – drogas – farmácias
c)drogas – drogarias – boticas
d)drogas – medicamento – drogarias
4) O uso crônico de cocaína, anfetaminas ou opióides induzem a atividade do
CREB, enquanto álcool e nicotina............... Complete.
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a)aumentam sua atividade no núcleo accubens, diminuindo em outras regiões
b) diminuem sua atividade no núcleo accunbens, apesar de aumentá-la em outras
regiões
c) diminuem sua atividade no núcleo accubens, e em outras regiões
d)n.r.a.
5)Leia atentamente as afirmativas abaixo sobre o Relatório sobre Drogas – 2009 e
assinale a alternativa correta:
I - As informações sobre drogas sintéticas - anfetaminas, metanfetaminas e ecstasy -
são mescladas. O uso nos países desenvolvidos se estabilizou.
II - Nos países em desenvolvimento, há uma preocupação sobre o crescimento na
produção e no consumo, ainda que os dados sejam limitados.
III - Alguns países da União Europeia são os principais fornecedores de ecstasy; o
Canadá se transformou no principal eixo de tráfico de meth e ecstasy.
a)somente estão corretas as afirmativas I e II
b) somente estão corretas as afirmativas I e III
c)todas as afirmativas são erradas
d)todas as afirmativas são corretas
GABARITO
Nome do aluno:_______________________________________
Matrícula:___________
Curso:_______________________________________________
Data do envio:____/____/_______.
NOÇOES BÁSICAS EM DEPENDÊNCIA QUÍMICA
1)___ 2)___ 3)___ 4)___ 5)___