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Informativo 951-STF (18/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 951-STF Márcio André Lopes Cavalcante Julgamentos que ainda não foram concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: ADI 3481/DF; HC 162285 AgR/DF; ADI 5868/SC; RE 1141156 AgR/RJ; RE 652229/DF; MS 34730/DF; Rcl 24810 AgR/MG. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL DIREITO À SAÚDE Pulverização aérea de inseticida contra Aedes aegypti precisa de autorização prévia de autoridades sanitária e ambiental e comprovação científica da eficácia da medida. DIREITO ELEITORAL LEI DA FICHA LIMPA É possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), às condenações por abuso de poder, mesmo nos casos em que o processo já tinha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor. DIREITO ADMINISTRATIVO PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS Em caso de irregularidades do Estado-membro em convênio federal, a União somente poderá inscrever o ente no SIAFI, no CADIN e no CAUC após o término do processo de prestação de contas especial, observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. DIREITO PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA Não compete ao STF julgar ação proposta pelo Estado-membro contra a União e a instituição financeira cobrando repasse dos depósitos judiciais que estão no banco. Serão julgadas pelo STF as ações ordinárias em que se impugnam atos do CNJ que possuam caráter normativo ou regulamentar; que desconstituam ato normativo de tribunal local e que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário. DIREITO PENAL TRÁFICO DE INFLUÊNCIA Mero fato de o Ministro ter pedido vista do processo sem saber que estava impedido, devolvendo na sessão seguinte e declarando seu impedimento, não configura indício de que ele tenha praticado tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal). DIREITO PROCESSUAL PENAL REVISÃO CRIMINAL Não cabe revisão criminal contra decisão que se limita a inadmitir recurso. DIREITO FINANCEIRO DESPESAS PÚBLICAS É inconstitucional norma da CE que exclui do limite de gastos com pessoal as despesas com os pensionistas e os valores referentes ao imposto de renda retido na fonte dos servidores públicos estaduais. É inconstitucional norma da CE que prevê que as aplicações mínimas dos recursos em ações e serviços públicos de saúde e ensino corresponderão às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior, corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL.

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Informativo 951-STF (18/09/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 951-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Julgamentos que ainda não foram concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: ADI 3481/DF; HC 162285 AgR/DF; ADI 5868/SC; RE 1141156 AgR/RJ; RE 652229/DF; MS 34730/DF; Rcl 24810 AgR/MG.

ÍNDICE

DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITO À SAÚDE Pulverização aérea de inseticida contra Aedes aegypti precisa de autorização prévia de autoridades sanitária e ambiental

e comprovação científica da eficácia da medida.

DIREITO ELEITORAL

LEI DA FICHA LIMPA É possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), às condenações

por abuso de poder, mesmo nos casos em que o processo já tinha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor.

DIREITO ADMINISTRATIVO

PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS Em caso de irregularidades do Estado-membro em convênio federal, a União somente poderá inscrever o ente no SIAFI,

no CADIN e no CAUC após o término do processo de prestação de contas especial, observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Não compete ao STF julgar ação proposta pelo Estado-membro contra a União e a instituição financeira cobrando repasse

dos depósitos judiciais que estão no banco. Serão julgadas pelo STF as ações ordinárias em que se impugnam atos do CNJ que possuam caráter normativo ou

regulamentar; que desconstituam ato normativo de tribunal local e que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário.

DIREITO PENAL

TRÁFICO DE INFLUÊNCIA Mero fato de o Ministro ter pedido vista do processo sem saber que estava impedido, devolvendo na sessão seguinte e

declarando seu impedimento, não configura indício de que ele tenha praticado tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal).

DIREITO PROCESSUAL PENAL

REVISÃO CRIMINAL Não cabe revisão criminal contra decisão que se limita a inadmitir recurso.

DIREITO FINANCEIRO

DESPESAS PÚBLICAS É inconstitucional norma da CE que exclui do limite de gastos com pessoal as despesas com os pensionistas e os valores

referentes ao imposto de renda retido na fonte dos servidores públicos estaduais. É inconstitucional norma da CE que prevê que as aplicações mínimas dos recursos em ações e serviços públicos de saúde e ensino

corresponderão às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior, corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL.

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DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITO À SAÚDE Pulverização aérea de inseticida contra Aedes aegypti precisa de autorização prévia de

autoridades sanitária e ambiental e comprovação científica da eficácia da medida

O art. 1º, § 3º da Lei nº 13.301/2016 prevê, como uma das medidas para combater o Aedes aegypti, que o poder público fica autorizado a fazer a pulverização, por meio de aeronaves, de produtos químicos para matar o mosquito:

§ 3º São ainda medidas fundamentais para a contenção das doenças causadas pelos vírus de que trata o caput:

IV - permissão da incorporação de mecanismos de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves mediante aprovação das autoridades sanitárias e da comprovação científica da eficácia da medida.

O STF deu intepretação conforme a esse dispositivo dizendo que, além da comprovação científica e da aprovação das autoridades sanitárias (mencionadas expressamente no texto da lei), é necessário também que haja a aprovação das autoridades ambientais. A aprovação das autoridades sanitárias e ambientais competentes e a comprovação científica da eficácia da medida são condições prévias e inafastáveis à incorporação de mecanismo de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves.

STF. Plenário. ADI 5592/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

Lei nº 13.301/2016 A Lei nº 13.301/2016 prevê diversas medidas de vigilância em saúde para combater o mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika. Veja o que dispõe o art. 1º:

Art. 1º Na situação de iminente perigo à saúde pública pela presença do mosquito transmissor do vírus da dengue, do vírus chikungunya e do vírus da zika, a autoridade máxima do Sistema Único de Saúde - SUS de âmbito federal, estadual, distrital e municipal fica autorizada a determinar e executar as medidas necessárias ao controle das doenças causadas pelos referidos vírus, nos termos da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e demais normas aplicáveis, enquanto perdurar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN.

A nova Lei, que é fruto da conversão da MP 712/2016, prevê medidas para a contenção das doenças transmitidas pelo mosquito. Dispersão por aeronaves Como uma das medidas para combater o Aedes aegypti, a Lei previu que o poder público ficaria autorizado a fazer a pulverização (“fumacê”), por meio de aeronaves, de produtos químicos para matar o mosquito:

Art. 1º (...) § 3º São ainda medidas fundamentais para a contenção das doenças causadas pelos vírus de que trata o caput: (...) IV - permissão da incorporação de mecanismos de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves mediante aprovação das autoridades sanitárias e da comprovação científica da eficácia da medida.

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ADI Este dispositivo, que permite o uso de aeronaves para dispersão de substâncias químicas no combate ao mosquito Aedes aegypti, foi questionado no STF por meio de ADI proposta pelo Procurador-Geral da República. Na ADI se alegou que isso viola o direito ao ambiente equilibrado previsto no art. 225, da Constituição Federal, segundo o qual preservação e proteção do ambiente se impõem ao poder público e à coletividade, por considerar que os danos causados são frequentes, irreversíveis e irreparáveis ou de difícil reparação. Para o PGR, o dispositivo afronta, ainda, o direito à saúde, já que “a pulverização aérea de produtos químicos, além de não contribuir de maneira eficaz para combater o Aedes aegypti, provoca importantes malefícios à saúde humana”. Assim, considerando possíveis danos ao meio ambiente e à saúde, o PGR pediu que este dispositivo da lei fosse declarado inconstitucional. O que decidiu o STF? O STF julgou parcialmente procedente o pedido apenas para dar interpretação conforme à Constituição, sem redução de texto, ao inciso IV do § 3º do art. 1º da Lei nº 13.301/2016. O STF afirmou que o dispositivo é constitucional, desde que seja interpretado da seguinte forma: A aprovação das autoridades sanitárias e ambientais competentes e a comprovação científica da eficácia da medida são condições prévias e inafastáveis para que seja adotado esse mecanismo de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves. Desse modo, o STF salientou que: • além da comprovação científica e da aprovação das autoridades sanitárias (mencionadas expressamente no texto da lei), é necessário também que haja a aprovação das autoridades ambientais; • a aprovação das autoridades sanitárias e ambientais competentes e a comprovação científica da eficácia da medida são condições prévias e inafastáveis para que a medida seja executada. O Min. Edson Fachin, relator para o acórdão, ressaltou que retirar por completo o inciso significaria dizer que existe um juízo científico de certeza sobre a ineficácia do mecanismo (o que não se pode fazer). Por outro lado, manter o dispositivo do jeito como está significaria dizer que basta a aprovação da autoridade sanitária, o que, na verdade, não é suficiente. Para que essa dispersão seja empregada, é necessário que se sane a dúvida a respeito da eficácia científica. Segundo o STF, essa intepretação está de acordo com os arts. 6º, 196 e 225, § 1º, V e VII, da CF/88:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 225. (...) § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (...)

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VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

Em suma:

O art. 1º, § 3º da Lei nº 13.301/2016 prevê, como uma das medidas para combater o Aedes aegypti, que o poder público fica autorizado a fazer a pulverização, por meio de aeronaves, de produtos químicos para matar o mosquito: § 3º São ainda medidas fundamentais para a contenção das doenças causadas pelos vírus de que trata o caput: IV - permissão da incorporação de mecanismos de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves mediante aprovação das autoridades sanitárias e da comprovação científica da eficácia da medida. O STF deu intepretação conforme a esse dispositivo dizendo que, além da comprovação científica e da aprovação das autoridades sanitárias (mencionadas expressamente no texto da lei), é necessário também que haja a aprovação das autoridades ambientais. A aprovação das autoridades sanitárias e ambientais competentes e a comprovação científica da eficácia da medida são condições prévias e inafastáveis à incorporação de mecanismo de controle vetorial por meio de dispersão por aeronaves. STF. Plenário. ADI 5592/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

DIREITO ELEITORAL

LEI DA FICHA LIMPA É possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da

Ficha Limpa), às condenações por abuso de poder, mesmo nos casos em que o processo já tinha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor

Importante!!!

A condenação por abuso do poder econômico ou político em ação de investigação judicial eleitoral, transitada em julgado, “ex vi” do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/90, em sua redação primitiva, é apta a atrair a incidência da inelegibilidade do artigo 1º, inciso I, alínea "d", na redação dada pela Lei Complementar 135/2010, aplicando-se a todos os processos de registros de candidatura em trâmite.

STF. Plenário. RE 929670/DF, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 1º/3/2018 (repercussão geral) (Info 892).

É possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), às condenações por abuso de poder, mesmo nos casos em que o processo já tinha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor.

O fato de a condenação nos autos de representação por abuso de poder econômico ou político haver transitado em julgado, ou mesmo haver transcorrido o prazo da sanção de três anos, imposta por força de condenação pela Justiça Eleitoral, não afasta a incidência da inelegibilidade constante da alínea “d” do inciso I do art. 1º da LC 64/90, cujo prazo passou a ser de 8 anos.

Exemplo: em 2009, João, político, foi condenado em Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pela prática de abuso de poder político. Naquela época não havia ainda a Lei da Ficha Limpa. Vigorava a redação originária do art. 1º, I, “d”, da LC 64/90. Logo, a Justiça Eleitoral determinou

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que João ficasse inelegível por 3 anos. O processo transitou em julgado em 10/09/2010 e João cumpriu os 3 anos de inelegibilidade, conforme havia sido determinado.

Nas eleições de 2016, já imaginando que estaria livre da inelegibilidade, ele tentou concorrer ao cargo de Prefeito, apresentando requerimento de registro de candidatura. Ele não pode concorrer. Isso porque, em 2010, a Lei da Ficha Limpa aumentou a punição prevista no art. 1º, I, “d”, da LC 64/90 de 3 para 8 anos. Mesmo a Lei da Ficha Limpa tendo entrado em vigor após o fato praticado por João, este novo diploma deve ser aplicado ao caso concreto. Logo, a inelegibilidade de João, que era de 3 anos (e que acabou em 2012 = 3 + 2009), subiria para 8 anos (e a inelegibilidade perduraria até 2017 = 8 + 2009).

STF. Plenário. ARE 1180658 AgR/RN, rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgado em 10/9/2019 (Info 951).

Lei da Ficha Limpa Em 2010, foi aprovada a LC 135/2010, que teve como objetivo alterar a LC 64/90, incluindo novas hipóteses de inelegibilidade para proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício do mandato. A LC 135/2010 foi resultado de uma intensa mobilização da sociedade civil organizada, que arrecadou mais de 1,3 milhão de assinaturas de cidadãos para apresentar o projeto de lei ao Congresso Nacional. A LC 135/2010 ficou conhecida como “Lei da Ficha Limpa”. Ampliação do prazo de inelegibilidade para as condenações por abuso de poder Uma das alterações promovidas pela Lei da Ficha Limpa foi que ela ampliou, de 3 para 8 anos, o prazo de inelegibilidade para os casos em que o político é condenado por abuso de poder econômico ou político. Veja como foi a mudança:

Antes da LC 135/2010 Depois da LC 135/2010

Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: (...) d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três) anos seguintes;

Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: (...) d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes; (Redação dada pela LC 135/2010)

Antes da LC 135/2010 Depois da LC 135/2010

Art. 22 (...) XIV - julgada procedente a representação, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 3 (três) anos subseqüentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico e pelo desvio ou

Art. 22 (...) XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do

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abuso do poder de autoridade, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e processo-crime, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar; (Redação dada pela LC 135/2010)

Desse modo, antes da Lei da Ficha Limpa, o político condenado por abuso de poder teria que ficar 3 anos sem disputar novas eleições. Com a mudança, ele passou a ter que ficar 8 anos inelegível. Imagine agora a seguinte situação hipotética: Em 2009, João, político, foi condenado em Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pela prática de abuso de poder político. Naquela época não havia ainda a Lei da Ficha Limpa. Vigorava a redação originária do art. 1º, I, “d”, da LC 64/90. Logo, a Justiça Eleitoral determinou que João ficasse inelegível por 3 anos. Relembre o que dizia a Lei:

Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: (...) d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três) anos seguintes;

O processo transitou em julgado em 10/09/2010 e João cumpriu os 3 anos de inelegibilidade, conforme havia sido determinado. Nas eleições de 2016, já imaginando que estaria livre da inelegibilidade, ele tentou concorrer ao cargo de Prefeito, apresentando requerimento de registro de candidatura. O Ministério Público Eleitoral propôs Ação de Impugnação de Registro de Candidatura. A tese do Ministério Público eleitoral foi a seguinte: Em 2010, a Lei da Ficha Limpa aumentou a punição prevista no art. 1º, I, “d”, da LC 64/90 de 3 para 8 anos. Mesmo a Lei da Ficha Limpa tendo entrado em vigor após o fato praticado por João, este novo diploma deve ser aplicado ao caso concreto. Logo, a inelegibilidade de João, que era de 3 anos (e que acabou em 2012 = 3 + 2009), subiria para 8 anos (e a inelegibilidade perduraria até 2017 = 8 + 2009). Defesa de João João alegou em sua defesa que a inelegibilidade constitui espécie de sanção, razão pela qual a mudança legislativa não poderia retroagir por se tratar de lei mais grave (art. 5º, XXXVI, CF/88). Além disso, teria havido ofensa à coisa julgada. A pergunta que se faz é a seguinte: esse aumento trazido pela Lei da Ficha Limpa já se aplica para a situação de João mesmo o fato tendo ocorrido antes da vigência da nova Lei? SIM. O STF entendeu que é possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), às condenações por abuso de poder, mesmo nos casos em que o processo já tinha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor. O fato de a condenação nos autos de representação por abuso de poder econômico ou político haver transitado em julgado, ou mesmo haver transcorrido o prazo da sanção de três anos, imposta por força

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de condenação pela Justiça Eleitoral, não afasta a incidência da inelegibilidade constante da alínea “d” do inciso I do art. 1º da LC 64/90, cujo prazo passou a ser de 8 anos. Repercussão geral Sobre esse tema, o STF fixou a seguinte tese de repercussão geral:

A condenação por abuso do poder econômico ou político em ação de investigação judicial eleitoral, transitada em julgado, “ex vi” do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/90, em sua redação primitiva, é apta a atrair a incidência da inelegibilidade do artigo 1º, inciso I, alínea "d", na redação dada pela Lei Complementar 135/2010, aplicando-se a todos os processos de registros de candidatura em trâmite. STF. Plenário. RE 929670/DF, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 1º/3/2018 (Tema 860 da repercussão geral) (Info 892).

Para relembrar os fundamentos que levaram o STF a decidir assim, recomendo a leitura do Info 892. Esse entendimento foi reiterado no ARE 1180658 AgR/RN, rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgado em 10/9/2019 (Info 951). Inelegibilidade não é sanção A inelegibilidade não é uma sanção, mas um requisito estabelecido pela lei. As hipóteses de inelegibilidade não apresentam caráter sancionatório. Isso se prova, por exemplo, com a hipótese do art. 14, § 4º da CF/88, que prevê a inelegibilidade dos analfabetos. Ora, o objetivo do legislador constituinte não foi o de punir os analfabetos, não se podendo, portanto, dizer que se trata de uma sanção. A inelegibilidade ostenta natureza jurídica de “requisito negativo de adequação do indivíduo ao regime jurídico do processo eleitoral”. Aquele que não cumprir o prazo de oito anos, em razão da aplicabilidade da lei, não preenche pressuposto necessário para voltar a ser elegível. Logo, as hipóteses de inelegibilidade previstas na LC 64/90 não possuem caráter sancionatório ou punitivo, mesmo no caso descrito no art. 22, XIV. Não existe no ordenamento jurídico brasileiro a figura da inelegibilidade-sanção. Não há ofensa à coisa julgada A imposição do prazo de inelegibilidade configura uma relação jurídica continuativa, para a qual a coisa julgada opera sob a cláusula rebus sic stantibus. A decisão que reconhece a inelegibilidade somente produzirá seus efeitos na esfera jurídico-eleitoral do condenado se este vier a formalizar registro de candidatura em eleições vindouras. Em consequência disso, verificado o exaurimento do prazo de 3 anos, previsto na redação originária do art. 22, XIV, por decisão transitada em julgado, é perfeitamente possível que o legislador infraconstitucional proceda ao aumento dos prazos, o que impõe que o agente da conduta abusiva fique inelegível por mais 5 anos, totalizando os 8 anos, sem que isso implique ofensa à coisa julgada, que se mantém incólume. Dessa forma, não há ofensa à coisa julgada.

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DIREITO ADMINISTRATIVO

PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS Em caso de irregularidades do Estado-membro em convênio federal, a União somente poderá inscrever o ente no SIAFI, no CADIN e no CAUC após o término do processo de prestação de contas especial, observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório

O cadastro restritivo não deve ser feito de forma unilateral e sem acesso à ampla defesa e ao contraditório. Isso porque, muitas vezes, a inscrição pode ter, além de motivação meramente financeira, razões políticas.

Assim, ao poder central (União) é possível suspender imediatamente o repasse de verbas ou a execução de convênios, mas o cadastro deve ser feito nos termos da lei, ou seja, mediante a verificação da veracidade das irregularidades apontadas. Isso porque o cadastro tem consequências, como a impossibilidade da repartição constitucional de verbas das receitas voluntárias.

A tomada de contas especial, procedimento por meio do qual se alcança o reconhecimento definitivo das irregularidades, com a devida observância do contraditório e da ampla defesa, tem suas regras definidas em lei. Ao final, é possível tornar o dano ao erário dívida líquida e certa, e a decisão tem eficácia de título executivo extrajudicial.

STF. Plenário. ACO 2892 AgR/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

Imagine a seguinte situação hipotética: A União (Ministério do Turismo) celebrou um convênio com o Estado do Mato Grosso. Ocorre que o Estado-membro deixou de cumprir algumas obrigações previstas no ajuste. A União notificou o Estado-membro determinando que ele regularizasse as pendências, sob pena de lhe serem aplicadas sanções. Apesar disso, o Estado-membro não sanou os vícios apontados. Foram, então, tomadas duas medidas:

1) o Estado-membro foi inserido no Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI), no Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias (CADIN) e no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (CAUC). Obs: esses cadastros são instrumentos de consulta, por meio dos quais se pode verificar se os Estados-membros ou Municípios estão com débitos ou outras pendências perante o Governo federal. Se houver, por exemplo, um atraso do Estado ou do Município na prestação de contas de um convênio com a União ou suas entidades, essa informação passará a figurar nestes sistemas. Com isso, o ente devedor fica impedido de contratar operações de crédito, celebrar convênios com órgãos e entidades federais e receber transferências de recursos. Em uma alegoria para que você entenda melhor (não escreva isso na prova!), seria como se fosse um “Serasa” de débitos dos Estados e Municípios com a União, ou seja, um cadastro federal de inadimplência. 2) foi instaurada Prestação de Contas Especial para apurar o convênio. Ação cível originária O Estado do Mato Grosso ajuizou, então, ação cível originária, no STF, contra a União, pedindo a retirada de seu nome de tais cadastros até que seja concluído o processo de Tomada de Contas Especial. O autor alegou, dentre outros argumentos:

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• violação ao princípio da intranscendência subjetiva das sanções, tendo em vista que o inadimplemento ocorreu em gestão anterior (era outro Governador); • não foi observado o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, considerando que, antes da inclusão nos cadastros, era indispensável a conclusão do Processo de Tomada de Contas Especial. O que é o princípio da intranscendência subjetiva das sanções? O princípio da intranscendência subjetiva significa que não podem ser impostas sanções e restrições que superem a dimensão estritamente pessoal do infrator e atinjam pessoas que não tenham sido as causadoras do ato ilícito. Um exemplo de aplicação desse princípio ocorre quando a irregularidade foi praticada pela gestão anterior. Com efeito, existem julgados do STF afirmando que se a irregularidade no convênio foi praticada pelo gestor anterior e a gestão atual, depois que assumiu, tomou todas as medidas para ressarcir o erário e corrigir as falhas (exs: apresentou todos os documentos ao órgão fiscalizador, ajuizou ações de ressarcimento contra o antigo gestor etc.), neste caso, o ente (Estado ou Município) não poderá ser incluído nos cadastros de inadimplentes da União. Assim, segundo esta acepção, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções proíbe a aplicação de sanções às administrações atuais por atos de gestão praticados por administrações anteriores. Segundo o Min. Luiz Fux, “não se pode inviabilizar a administração de quem foi eleito democraticamente e não foi responsável diretamente pelas dificuldades financeiras que acarretaram a inscrição combatida”. Logo, deve-se aplicar o princípio da intranscendência subjetiva das sanções, impedindo que a Administração atual seja punida com a restrição na celebração de novos convênios ou recebimento de repasses federais. Nesse sentido:

O princípio da intranscendência subjetiva das sanções inibe a aplicação de severas sanções às administrações por ato de gestão anterior à assunção dos deveres públicos. STF. 1ª Turma. ACO 2795 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 23/11/2018.

Súmula 615-STJ: Não pode ocorrer ou permanecer a inscrição do município em cadastros restritivos fundada em irregularidades na gestão anterior quando, na gestão sucessora, são tomadas as providências cabíveis à reparação dos danos eventualmente cometidos.

A própria AGU admite esta tese:

Súmula 46-AGU: Será liberada da restrição decorrente da inscrição do município no SIAFI ou CADIN a prefeitura administrada pelo prefeito que sucedeu o administrador faltoso, quando tomadas todas as providências objetivando o ressarcimento ao erário.

Neste caso concreto, o argumento de violação ao princípio da intranscendência foi acolhido pelo STF? NÃO. A atual administração deveria demonstrar que adotou as medidas cabíveis de apuração de responsabilidade e de regularização da situação de inadimplência. Assim, ainda que a conduta a gerar inadimplência tenha sido causada pela gestão anterior, a nova administração estadual assume todas as obrigações decorrentes da situação financeira do ente federado. Como a atual administração não tomou essas medidas, não se pode dizer que a inclusão do Estado nos cadastros restritivos tenha violado o princípio da intranscendência subjetiva das sanções financeiras. Não violou. O segundo argumento do Estado-membro foi acolhido pelo STF? Houve violação ao devido processo legal? SIM.

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O cadastro restritivo não deve ser feito de forma unilateral e sem acesso à ampla defesa e ao contraditório. Isso porque, muitas vezes, a inscrição pode ter, além de motivação meramente financeira, razões políticas. Assim, ao poder central (União) é possível suspender imediatamente o repasse de verbas ou a execução de convênios, mas o cadastro deve ser feito nos termos da lei, ou seja, mediante a verificação da veracidade das irregularidades apontadas. Isso porque o cadastro tem consequências, como a impossibilidade da repartição constitucional de verbas das receitas voluntárias. A tomada de contas especial, procedimento por meio do qual se alcança o reconhecimento definitivo das irregularidades, com a devida observância do contraditório e da ampla defesa, tem suas regras definidas em lei. Ao final, é possível tornar o dano ao erário dívida líquida e certa, e a decisão tem eficácia de título executivo extrajudicial. Desse modo, o STF determinou que a União se abstenha de proceder à inscrição do Estado-membro no SIAFI, no CADIN e no CAUC, até o exaurimento da Prestação de Contas Especial, observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. STF. Plenário. ACO 2892 AgR/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

Vale ressaltar que a ação que discute a inscrição de Estado-membro em cadastro de inadimplência da União em sede de convênio implica conflito federativo, o que atrai a competência do STF para julgamento da causa:

O Supremo Tribunal Federal é originariamente competente para processar e julgar as causas que revelem potencial conflito federativo entre a União e os Estados-membros (art. 102, I, ‘f’, da CRFB/88), como nos casos em que se discute a inscrição destes nos cadastros federais de irregularidades ou inadimplência. 2. A União é parte legítima para figurar no polo passivo das ações em que Estado-membro impugne inscrição em cadastros federais de inadimplentes e/ou de restrição de crédito. STF. Plenário. ACO 2764 AgR, Relator p/ Acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 16/10/2017.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA Não compete ao STF julgar ação proposta pelo Estado-membro contra a União e a instituição

financeira cobrando repasse dos depósitos judiciais que estão no banco

Não compete ao STF julgar ação proposta contra a União e o Banco do Brasil para obrigar que a instituição financeira cumpra lei estadual que determina o repasse de parte dos valores dos depósitos judiciais para o caixa único do Estado.

Trata-se de controvérsia meramente patrimonial, não justificando sequer a presença da União no polo passivo.

STF. Plenário. ACO 989/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

Competência do STF para julgar conflitos federativos O art. 102, I, “f”, da CF/88 prevê a seguinte competência do STF:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I — processar e julgar, originariamente:

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f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta;

Podemos imaginar as seguintes situações que serão de competência do STF com base na previsão acima: a) União contra Estado(s); b) União contra Distrito Federal; c) Estado(s) contra Estado(s); d) Estado(s) contra Distrito Federal. Obs: não importa quem seja o autor ou o réu; se as partes acima estiverem em polos antagônicos, estará preenchida a hipótese do art. 102, I, “f”. Obs2: a ação poderá envolver a administração direta ou indireta da União, Estados ou DF. Ex: uma ação judicial do IPHAN (autarquia federal) contra o Estado do Amazonas (STF Rcl 12957/AM). Conflito entre entes federados x conflito federativo Vale ressaltar que, para se caracterizar a hipótese do art. 102, I, “f”, da CF/88, é indispensável que, além de haver uma causa envolvendo União e Estado/DF ou Estado contra Estado, essa demanda deve ter densidade suficiente para abalar o pacto federativo. Em outras palavras, não é qualquer causa envolvendo União contra Estado/DF ou Estado contra Estado que irá ser julgada pelo STF, mas somente quando essa disputa puder resultar em ofensa às regras do sistema federativo. Confira:

Diferença entre conflito entre entes federados e conflito federativo: enquanto no primeiro, pelo prisma subjetivo, observa-se a litigância judicial promovida pelos membros da Federação, no segundo, para além da participação desses na lide, a conflituosidade da causa importa em potencial desestabilização do próprio pacto federativo. Há, portanto, distinção de magnitude nas hipóteses aventadas, sendo que o legislador constitucional restringiu a atuação da Corte à última delas, nos moldes fixados no Texto Magno, e não incluiu os litígios e as causas envolvendo Municípios como ensejadores de conflito federativo apto a exigir a competência originária da Corte. STF. Plenário. ACO 1.295-AgR-segundo, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 14/10/2010.

Mero conflito entre entes federados Conflito federativo

Trata-se da disputa judicial envolvendo União (ou suas entidades) contra Estado-membro (ou suas entidades).

Trata-se da disputa judicial envolvendo União (ou suas entidades) contra Estado-membro (ou suas entidades) e que, em razão da magnitude do tema discutido, pode gerar uma desestabilização do próprio pacto federativo.

Em regra, é julgado pelo juiz federal de 1ª instância. É julgado pelo STF (art. 102, I, “f” da CF/88).

Imagine agora a seguinte situação hipotética: O Estado da Bahia ajuizou ação cível ordinária contra a União e o Banco do Brasil pedindo que esta instituição financeira fosse condenada a cumprir as obrigações previstas na Lei estadual 9.276/2004 e no Decreto 9.197/2004. O art. 1º desta lei estabelece a obrigação de as instituições financeiras recebedoras de depósitos judiciais oriundos da Justiça local repassarem determinado percentual para conta bancária do Sistema de Caixa Único do Estado da Bahia. Veja:

Art. 1º Dos montantes de depósitos decorrentes de processos judiciais, qualquer que seja o procedimento, no âmbito da Justiça Estadual, compreendendo o principal, a correção monetária e os juros correspondentes aos rendimentos de cadernetas de poupança, 70% (setenta por cento)

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serão transferidos pela instituição financeira recebedora, para conta bancária específica integrante do Sistema de Caixa Único do Estado da Bahia, no mesmo prazo do repasse ao Estado dos tributos recolhidos pela rede bancária credenciada. Ver tópico

Explicando melhor: Todos os valores em dinheiro que ficam à disposição da Justiça enquanto o processo não se encerra são depositados em uma conta bancária em nome do Poder Judiciário. A isso chama-se de depósito judicial. Exs: João ingressa com ação de consignação em pagamento em face de Pedro, depositando em juízo R$ 100 mil reais. Maria ajuíza execução contra Antônio e consegue a penhora on line de R$ 200 mil. Tais valores ficarão em depósito judicial e, quando o juiz autorizar, eles poderão ser levantados pela parte vencedora, devidamente atualizados. O art. 1º desta Lei do Estado da Bahia dizia que 70% desses valores depositados deveriam ser transferidos pela instituição financeira recebedora, para conta bancária específica integrante do Sistema de Caixa Único do Estado da Bahia. O Estado da Bahia alegou que o Banco do Brasil não estava fazendo esses repasses e, portanto, estava cobrando o repasse dessa quantia. A ação foi proposta no STF com base na previsão do art. 102, I, “f”, da CF/88. O STF é realmente competente para julgar esta demanda? NÃO. Não cabe ao STF julgar o feito. Isso porque se trata de controvérsia meramente patrimonial, não justificando sequer a presença da União no polo passivo. Em suma:

Não compete ao STF julgar ação proposta contra a União e o Banco do Brasil para obrigar que a instituição financeira cumpra lei estadual que determina o repasse de parte dos valores dos depósitos judiciais para o caixa único do Estado. Trata-se de controvérsia meramente patrimonial, não justificando sequer a presença da União no polo passivo. STF. Plenário. ACO 989/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

COMPETÊNCIA Serão julgadas pelo STF as ações ordinárias em que se impugnam atos do CNJ que possuam

caráter normativo ou regulamentar, que desconstituam ato normativo de tribunal local e que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário

Importante!!!

Em regra, as ações ordinárias contra atos do CNJ devem ser processadas e julgadas na Justiça Federal. Isso é fundamental para resguardar a capacidade decisória do STF, evitar a banalização da jurisdição extraordinária e preservar a própria funcionalidade da Corte.

No entanto, será de competência originária do STF julgar as ações ordinárias:

• que impugnem atos do CNJ que possuam caráter normativo ou regulamentar;

• que desconstituam ato normativo de tribunal local; e

• que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário.

Por outro lado, não são de competência do STF as demandas contra atos do CNJ:

• que atinjam tão somente servidores dos órgãos fiscalizados ou mesmo as serventias extrajudiciais;

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• que não digam respeito a interesse exclusivo de toda magistratura ou

• que revejam atos administrativos gerais dos tribunais, assim considerados os que não se sujeitam a regulamentação distinta do Poder Judiciário, de que seriam exemplo os relacionados a concursos públicos ou licitações dos tribunais locais.

STF. 1ª Turma. Rcl 15564 AgR/PR, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 10/9/2019 (Info 951).

Assim, podemos afirmar o seguinte:

1) MS, HS e habeas data contra ato do CNJ: competência do STF;

2) Ações ordinárias impugnando ato do CNJ:

• Em regra, serão julgadas na Justiça Federal (1ª instância).

• Exceção: serão julgadas pelo STF as ações ordinárias em que se impugnam atos do CNJ que possuam caráter normativo ou regulamentar, que desconstituam ato normativo de tribunal local e que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário.

Competência para julgar demandas contra o CNJ e o CNMP A CF/88 prevê, em seu art. 102, I, “r”:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público;

O STF, no entanto, conferiu interpretação estrita a esse dispositivo. Assim, somente compete ao STF julgar as ações em que o próprio CNJ ou CNMP (que não possuem personalidade jurídica própria) figurarem no polo passivo. É o caso de mandados de segurança, habeas corpus e habeas data contra os Conselhos. No caso de serem propostas ações ordinárias para impugnar atos do CNJ e CNMP, quem irá figurar como ré no processo é a União, já que os Conselhos são órgãos federais. Logo, tais demandas serão julgadas pela Justiça Federal de 1ª instância, com base no art. 109, I, da CF/88:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

Esse entendimento estava pacificado no STF, existindo inúmeros julgados nesse sentido:

(...) A competência originária do Supremo Tribunal Federal, cuidando-se de impugnação a deliberações emanadas do Conselho Nacional de Justiça, tem sido reconhecida apenas na hipótese de impetração, contra referido órgão do Poder Judiciário (CNJ), de mandado de segurança, de “habeas data”, de “habeas corpus” (quando for o caso) ou de mandado de injunção, pois, em tal situação, o CNJ qualificar-se-á como órgão coator impregnado de legitimação passiva “ad causam” para figurar na relação processual instaurada com a impetração originária, perante a Suprema Corte, daqueles “writs” constitucionais. Em referido contexto, o Conselho Nacional de Justiça, por ser órgão não personificado, define-se como simples “parte formal” (...), revestido de mera “personalidade judiciária” (...), achando-se investido, por efeito de tal condição, da capacidade de ser parte (...), circunstância essa que plenamente legitima a sua participação em mencionadas causas mandamentais.

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- Tratando-se, porém, de demanda diversa (uma ação ordinária, p. ex.), não se configura a competência originária da Suprema Corte, considerado o entendimento prevalecente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, manifestado, inclusive, em julgamentos colegiados, eis que, nas hipóteses não compreendidas no art. 102, I, alíneas “d” e “q”, da Constituição, a legitimação passiva “ad causam” referir-se-á, exclusivamente, à União Federal, pelo fato de as deliberações do Conselho Nacional de Justiça serem juridicamente imputáveis à própria União Federal, que é o ente de direito público em cuja estrutura institucional se acha integrado o CNJ. STF. Plenário. AO 1706 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 18/12/2013.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a competência prevista no art. 102, I, r, da Constituição deve ser interpretada de forma estrita, alcançando apenas os casos em que o CNJ tenha personalidade judiciária para figurar no feito (i.e., em mandados de segurança, de injunção, habeas corpus e habeas data). STF. 1ª Turma. AO 1894 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 07/08/2018.

Ação anulatória. Ato administrativo do Conselho Nacional de Justiça que concedeu ajuda de custo nos casos de remoção a pedido dos magistrados e servidores. Incompetência do STF. Interpretação restritiva do art. 102, I, “r”, da Constituição Federal. STF. 2ª Turma. ACO 2148 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/09/2016.

Resumindo a posição do STF sobre o tema: Competência para julgar ações contra o CNJ e CNMP: • MS, HS e habeas data: competência do STF (art. 102, I, “r”, da CF/88); • Ações ordinárias: competência do Juiz federal (1ª instância) (art. 109, I, da CF/88). No julgamento da Rcl 15564 AgR/PR, a 1ª Turma do STF apontou uma “exceção” à regra acima exposta A situação foi a seguinte: Em 2012, o CNJ editou a Resolução nº 151 determinando que as remunerações, diárias, indenizações e quaisquer outras verbas pagas aos membros da magistratura e aos servidores do Poder Judiciário deveriam ser divulgadas na internet, com a indicação do nome do beneficiário. Diante disso, um determinado Sindicato de Servidores da Justiça propôs, na Justiça Federal de 1ª instância, uma ação ordinária contra a União, com o objetivo de impedir a divulgação dos nomes e das remunerações individualizadas de seus substituídos. Na ação, o sindicato pediu para afastar a aplicação da Resolução nº 151/2012 do CNJ. A União ingressou com reclamação no STF afirmando que não cabe à Justiça Federal de 1ª instância, mas sim ao Supremo julgar esta ação. A reclamação foi julgada procedente. O STF afirmou o seguinte:

Em regra, as ações ordinárias contra atos do CNJ devem ser processadas e julgadas na Justiça Federal. Isso é fundamental para resguardar a capacidade decisória do STF, evitar a banalização da jurisdição extraordinária e preservar a própria funcionalidade da Corte. No entanto, será de competência originária do STF julgar as ações ordinárias: • que impugnem atos do CNJ que possuam caráter normativo ou regulamentar; • que desconstituam ato normativo de tribunal local; e • que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário. Por outro lado, não são de competência do STF as demandas contra atos do CNJ: • que atinjam tão somente servidores dos órgãos fiscalizados ou mesmo as serventias extrajudiciais;

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• que não digam respeito a interesse exclusivo de toda magistratura ou • que revejam atos administrativos gerais dos tribunais, assim considerados os que não se sujeitam a regulamentação distinta do Poder Judiciário, de que seriam exemplo os relacionados a concursos públicos ou licitações dos tribunais locais. STF. 1ª Turma. Rcl 15564 AgR/PR, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgado em 10/9/2019 (Info 951).

Assim, podemos afirmar o seguinte: 1) MS, HS e habeas data contra ato do CNJ: competência do STF; 2) Ações ordinárias impugnando ato do CNJ: • Em regra, serão julgadas na Justiça Federal (1ª instância). • Exceção: serão julgadas pelo STF as ações ordinárias em que se impugnam atos do CNJ que possuam caráter normativo ou regulamentar, que desconstituam ato normativo de tribunal local e que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário. Vale ressaltar que não é a primeira vez que o STF mitiga a sua regra geral. Temos um outro julgado no qual o STF conheceu e julgou uma ação ordinária proposta por sindicato de servidores públicos contra uma decisão do CNJ. Foram invocados dois argumentos para fixar a competência no STF: 1) O caso concreto discutia os poderes do CNJ para afastar lei inconstitucional. Se o STF não julgasse a causa, isso significaria conferir à Justiça Federal de 1ª instância a possibilidade de definir os poderes atribuídos ao CNJ para o cumprimento de sua missão, subvertendo, assim, a relação hierárquica constitucionalmente estabelecida. 2) Além da ação ordinária proposta pelo Sindicato, diversos servidores impetraram mandados de segurança contra a decisão do CNJ. Assim, mesmo que a ação ordinária fosse remetida para a Justiça Federal de 1ª instância, continuariam no STF os mandados de segurança individuais. Desse modo, o mais recomendável seria a reunião dessas ações a fim de garantir, com a tramitação e o julgamento conjuntos, a prolação de decisões harmônicas sobre a legitimidade da situação jurídica afetada pelo CNJ. STF. Plenário. Pet 4656/PB, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 19/12/2016 (Info 851). Obs: em concursos públicos, se a questão objetiva não fizer menção expressa a essas hipóteses excepcionais, adote a regra geral exposta na primeira parte desta explicação. Em questões discursivas, discorra com detalhes sobre a regra geral e mencione, ao final, a existência desses julgados mitigando o entendimento tradicional.

DIREITO PENAL

TRÁFICO DE INFLUÊNCIA Mero fato de o Ministro ter pedido vista do processo sem saber que estava impedido,

devolvendo na sessão seguinte e declarando seu impedimento, não configura indício de que ele tenha praticado tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal)

O Procurador-Geral da República ofereceu denúncia contra um Ministro do TCU pela prática do crime de tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal).

Segundo a denúncia, o filho do Ministro, em nome do pai, recebeu pagamento (“propina”) de um empreiteiro, sob o pretexto de que iria influenciar em um processo que estava em curso no TCU e no qual se analisava uma licitação fraudulenta, vencida pela empresa do empreiteiro.

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Para o PGR, o Ministro do TCU teria demonstrado ao empreiteiro que poderia influenciar no trâmite do caso ao pedir vista do processo. Na sessão seguinte do TCU, ele devolveu os autos e declarou seu impedimento para atuar no feito.

O colegiado considerou não haver, em relação ao Ministro, lastro probatório mínimo, consistente em conjunto de evidências seguro e idôneo capaz de demonstrar a materialidade do crime e indícios razoáveis de autoria.

O cerne da imputação formulada contra o Ministro decorre, essencialmente, do fato de ele ter pedido vista de um processo, com a suposta intenção deliberada de postergar o julgamento, apesar de já saber que estaria impedido de atuar no feito. Ocorre que, desde a primeira vez em que o processo foi inserido na pauta de julgamento no TCU até a ocasião do pedido de vista pelo denunciado, transcorreram quase cinco meses, com diversos adiamentos e retiradas, mas nenhuma delas por ato do Ministro acusado.

Além disso, na sessão em que ele solicitou vista, por equívoco, não foi registrado impedimento ou suspeição do Ministro no sistema. Vale ressaltar também que não houve nem mesmo advertência quanto ao pedido de vista do denunciado pelos demais Ministros do TCU, advogados, partes, pelo secretário da sessão ou, até mesmo, pelo representante do Ministério Público que atua no TCU. Essa circunstância revela a ausência de conhecimento geral sobre o mencionado impedimento e a eventual irregularidade do ato praticado pelo Ministro.

Em razão disso, mostra-se crível a versão do acusado no sentido de que foi levado a acreditar que se encontrava plenamente apto a participar do referido julgamento e, assim, desempenhar as funções e prerrogativas inerentes ao cargo, dentre elas a de pedir vista regimental para melhor estudar os casos em julgamento.

O Ministro devolveu os autos após quatorze dias e declarou-se impedido, não tendo participado da discussão ou votação do processo em análise.

STF. 1ª Turma. Inq 4075/DF, rel orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 10/9/2019 (Info 951).

Imagine a seguinte situação adaptada: O Procurador-Geral da República ofereceu denúncia contra Antônio, Ministro do TCU, pela prática do crime de tráfico de influência, tipificado no art. 332, caput, do Código Penal:

Art. 332. Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário.

Na denúncia, o PGR narrou que Lucas, filho de Antônio, em nome do pai, recebeu pagamento (“propina”) de um empreiteiro, sob o pretexto de que iria influenciar em um processo que estava em curso no TCU e no qual se analisava uma licitação fraudulenta, vencida pela empresa do empreiteiro. Segundo o PGR, o Ministro do TCU teria demonstrado ao empreiteiro que poderia influenciar no trâmite do caso ao pedir vista do processo. Na sessão seguinte do TCU, ele devolveu os autos e declarou seu impedimento para atuar nos autos.

De quem é a competência para julgar os Ministros do TCU? Do STF, nos termos do art. 102, I, “c”, da CF/88:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente:

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(...) c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;

O STF recebeu a denúncia? NÃO. A 2ª Turma do STF, por maioria, rejeitou a denúncia oferecida contra o Ministro do TCU, por falta de justa causa, com fundamento no art. 395, III, do CPP. STF. 1ª Turma. Inq 4075/DF, rel orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 10/9/2019 (Info 951).

O colegiado considerou não haver, em relação ao Ministro, lastro probatório mínimo, consistente em conjunto de evidências seguro e idôneo capaz de demonstrar a materialidade do crime e indícios razoáveis de autoria. Prevaleceu o voto do Min. Ricardo Lewandowski (redator para o acórdão). Segundo o redator, o cerne da imputação formulada contra o Ministro decorre, essencialmente, do fato de ele ter pedido vista de um processo, com a suposta intenção deliberada de postergar o julgamento, apesar de já saber que estaria impedido de atuar no feito. Para o STF, analisando os elementos de convicção existentes nos autos, não é possível vislumbrar a alegada ilicitude na conduta praticada pelo denunciado, sendo frágeis e precários os argumentos em que se apoia a acusação, especialmente no tocante ao elemento subjetivo do tipo. Desde a primeira vez em que, no TCU, o processo foi inserido na pauta de julgamento até a ocasião do pedido de vista pelo denunciado, transcorreram quase cinco meses, com diversos adiamentos e retiradas, mas nenhuma delas por ato do Ministro acusado. Além disso, na sessão em que ele solicitou vista, por equívoco do gabinete ou da própria Secretaria de Sessões, não foi registrado impedimento ou suspeição do Ministro no sistema. Vale ressaltar também que não houve nem mesmo advertência quanto ao pedido de vista do denunciado pelos demais Ministros do TCU, advogados, partes, pelo secretário da sessão ou, até mesmo, pelo representante do Ministério Público que atua no TCU. Essa circunstância revela a ausência de conhecimento geral sobre o mencionado impedimento e a eventual irregularidade do ato praticado pelo Ministro. Em razão disso, mostra-se crível a versão do acusado no sentido de que foi levado a acreditar que se encontrava plenamente apto a participar do referido julgamento e, assim, desempenhar as funções e prerrogativas inerentes ao cargo, dentre elas a de pedir vista regimental para melhor estudar os casos em julgamento. O Ministro devolveu os autos após quatorze dias e declarou-se impedido, não tendo participado da discussão ou votação do processo em análise. Não foi decisiva sua participação no atraso do julgamento do processo, nem houve influência sua no desfecho da causa. Por fim, nas informações colhidas em acordo de colaboração premiada e ratificadas por outros colaboradores, nenhum dos delatores chegou a atribuir ao Ministro denunciado a prática de qualquer conduta ilícita. Ausentes elementos indiciários sobre a possível prática do tráfico de influência do mencionado acusado no âmbito do TCU, não é admissível julgar suspeitas as ligações telefônicas havidas entre ele e seu filho, as quais estão inseridas no contexto próprio da relação familiar. Durante as investigações ficou demonstrado que o filho fez a transferência de valores para a conta bancária do pai. Os Ministros do STF afirmaram que é aceitável a versão da defesa no sentido de que a transferência do aludido numerário foi apenas uma ajuda financeira pontual e informal de um filho para o seu pai.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

REVISÃO CRIMINAL Não cabe revisão criminal contra decisão que se limita a inadmitir recurso

Não cabe revisão criminal para impugnar decisão que se limita a inadmitir recurso.

A decisão suscetível de impugnação por meio de revisão criminal consiste no ato jurisdicional que impõe ou chancela (confirma) o mérito de pronunciamento condenatório. Não cabe revisão criminal contra decisões posteriores que, correta ou incorretamente, tenham inadmitido ou negado provimento a recursos, visto que essas manifestações jurisdicionais não compõem o título condenatório.

STF. Plenário. RvC 5480 AgR/AM, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 12.9.2019. (RvC-5480)

Imagine a seguinte situação adaptada: O Senador Acir Gurgacz foi julgado originariamente e condenado pela 1ª Turma do STF pela prática de crimes contra o sistema financeiro nacional. A defesa apresentou embargos infringentes contra este acórdão condenatório. Os embargos infringentes, contudo, foram inadmitidos por meio de decisão colegiada proferida pela 1ª Turma do STF. Houve trânsito em julgado. Revisão criminal Depois do trânsito em julgado, a defesa do Senador ajuizou revisão criminal no STF afirmando que o juízo de admissibilidade dos embargos infringentes não era de competência da Turma, mas sim do Ministro Relator (monocraticamente). Caso o Ministro Relator negasse seguimento aos embargos infringentes, a defesa ainda poderia apresentar agravo para o Plenário do STF. Assim, na visão da defesa, o procedimento adotado teria impedido que a admissibilidade dos embargos infringentes fosse analisada em definitivo pelo Plenário, providência que, por consequência, teria vulnerado as normas do Regimento Interno do STF. Em suma, na revisão criminal o réu alegou que os embargos infringentes foram inadmitidos por órgão jurisdicional incompetente, tendo havido, portanto, violação ao princípio do juízo natural. O pedido formulado na revisão criminal foi acolhido pelo STF? NÃO. Em que consiste a revisão criminal? Revisão criminal é... - uma ação autônoma de impugnação - de competência originária dos Tribunais (ou da Turma Recursal, no caso dos Juizados) - por meio da qual a pessoa condenada requer ao Tribunal - que reveja a decisão que a condenou (e que já transitou em julgado) - sob o argumento de que ocorreu erro judiciário. Então a revisão criminal pode ser proposta a qualquer tempo? SIM. A revisão poderá ser requerida em qualquer tempo, mesmo após já ter sido extinta a pena (art. 622 do CPP).

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Natureza jurídica A revisão criminal NÃO é um recurso. Trata-se de uma ação autônoma de impugnação, mais precisamente uma ação penal de natureza constitutiva (tem por objetivo desconstituir uma decisão transitada em julgado). Pressupostos: A revisão criminal tem dois pressupostos: a) existência de decisão condenatória (ou absolutória imprópria) com trânsito em julgado; b) demonstração de que houve erro judiciário. Quem pode propor a revisão criminal? • o próprio réu; • procurador legalmente habilitado pelo réu; • o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do réu, caso este já tenha morrido.

CPP/Art. 623. A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Hipóteses As hipóteses de revisão criminal estão previstas no art. 621 do CPP:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Obs: o art. 263 do Regimento Interno do STF reproduz essas três hipóteses. Ônus processual do autor enquadrar seu pedido em uma dessas hipóteses de cabimento A revisão criminal expressa um processo reparatório do erro judiciário em que situações excepcionais, assim reconhecidas pelo legislador, podem, em tese, autorizar a desconstrução do pronunciamento jurisdicional acobertado pelo manto da coisa julgada. Nesse cenário, o condenado não tem o direito subjetivo de, fora da destinação legal do meio de impugnação, perseguir a desconstituição de decisões desfavoráveis que tenham sido proferidas em processos penais. No âmbito da revisão criminal, é ônus processual do autor enquadrar seu pedido a uma das hipóteses taxativamente previstas na lei e demonstrar que o conjunto probatório autoriza o juízo revisional ou absolutório. Só cabe revisão criminal contra decisões condenatórias Ao se analisar as hipóteses acima elencadas, percebe-se que só é possível o ajuizamento de revisão criminal para a desconstituição de decisões condenatórias. A revisão criminal não funciona, portanto, como instrumento de impugnação de outras decisões (que não sejam condenatórias), ainda que potencialmente prejudiciais ao condenado. Decisões que se limitam a não admitir um recurso são despidas de efeito substitutivo (não substituem a decisão condenatória). Logo, não cabe revisão criminal contra decisão que apenas inadmite um recurso porque não se trata de acórdão condenatório.

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Assim, a decisão suscetível de impugnação pela revisão criminal consiste no ato jurisdicional que impõe ou chancela o mérito de pronunciamento condenatório, e não decisões posteriores que, correta ou incorretamente, tenham inadmitido ou negado provimento a recursos, visto que essas manifestações jurisdicionais não compõem o título condenatório. Nesse sentido:

(...) Revisão criminal contra acórdão proferido pela Primeira Turma desta Corte. Decisão monocrática que negou seguimento a recurso extraordinário com agravo. (...) 3. Incompetência desta Corte para apreciar revisão criminal que se funda na ausência de enfrentamento de mérito. (...) STF. Plenário. RvC 5472 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 19/11/2018.

(...) O Supremo Tribunal Federal é competente apenas para processar e julgar revisão criminal quando a condenação tiver sido por ele proferida ou mantida no julgamento de ação penal originária, em recurso criminal ordinário ou em recurso extraordinário com conhecimento do mérito. (...) STF. Plenário. RvC 5448 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/03/2016.

Desse modo, não cabe revisão criminal contra a decisão da 1ª Turma que não conheceu dos embargos infringentes porque não se trata de decisão condenatória. Em suma:

Não cabe revisão criminal contra decisão que se limita a inadmitir recurso. A revisão criminal se presta exclusivamente ao combate das decisões que impuseram a condenação ou que a tenham mantido e, por consequência, substituído o anterior provimento condenatório de mérito. Não cabe revisão criminal contra decisões posteriores que, correta ou incorretamente, tenham inadmitido ou negado provimento a recursos, visto que essas manifestações jurisdicionais não compõem o título condenatório. STF. Plenário. RvC 5480 AgR/AM, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 12.9.2019. (RvC-5480)

DIREITO FINANCEIRO

DESPESAS PÚBLICAS É inconstitucional norma da CE que exclui do limite de gastos com pessoal as despesas com os

pensionistas e os valores referentes ao imposto de renda retido na fonte dos servidores públicos estaduais

É inconstitucional norma da CE que prevê que as aplicações mínimas dos recursos em ações e serviços públicos de saúde e ensino corresponderão às aplicações mínimas referentes ao

exercício anterior, corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL

O Estado de Goiás, por meio de emenda à Constituição Estadual (ECs 54 e 55/2017), instituiu um regime de contenção de gastos, que foi denominado de “Novo Regime Fiscal do Estado de Goiás” (NRFG). Por força do NRFG, houve uma limitação, até 31 de dezembro de 2026, dos gastos correntes da Administração Pública estadual, no âmbito dos três poderes e demais órgãos autônomos.

Foi ajuizada uma ADI contra essas emendas constitucionais e o STF, por maioria, concedeu medida cautelar para:

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• suspender a eficácia do art. 113, § 8º, da Constituição do Estado de Goiás:

Art. 113. A despesa com pessoal ativo e inativo do Estado e dos Municípios não poderá exceder os limites globais estabelecidos em lei complementar federal.

§ 8º Na verificação do atendimento pelo Estado dos limites globais estabelecidos na lei complementar federal, mencionado no caput deste artigo, não serão computadas as despesas com os pensionistas e os valores referentes ao imposto de renda retidos na fonte dos servidores públicos estaduais.

Essas exclusões trazidas pelo § 8º do art. 113 não estão previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, editada com base no art. 169 da CF/88.

• suspender os efeitos dos incisos I e II do art. 45 do ADCT da Constituição do Estado de Goiás, na redação dada pelo art. 1º da Emenda de nº 54/2017:

Art. 45. A partir do exercício financeiro de 2018, as aplicações mínimas de recursos pelo Estado:

I - em ações e serviços públicos de saúde e em manutenção e desenvolvimento do ensino corresponderão, em cada exercício financeiro, às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior, corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL, na forma do art. 41;

II - em manutenção e reconstrução de rodovia, aeródromo, autódromo, porto pluvial e balsa corresponderão, em cada exercício financeiro, a dois terços da sua participação no produto da arrecadação do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores -IPVA.

Com a fórmula adotada pelo art. 45 do ADCT da CE/GO (vincular o teto de gastos com saúde e educação ao total de despesas do exercício anterior), a Administração fica desobrigada de promover acréscimo dos valores direcionados a essas áreas caso haja um aumento de receita. Logo, isso viola a regra de vinculação do art. 198, § 2º, II, e art. 212, da CF/88.

STF. Plenário. ADI 6129/GO, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 11/9/2019 (Info 951).

Novo Regime Fiscal do Estado de Goiás (NRFG) O Estado de Goiás, por meio de emenda à Constituição Estadual (ECs 54 e 55/2017), instituiu um regime de contenção de gastos, que foi denominado de “Novo Regime Fiscal do Estado de Goiás” (NRFG). Por força do NRFG, houve uma limitação, até 31 de dezembro de 2026, dos gastos correntes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como dos órgãos governamentais autônomos (Tribunal de Contas, Defensoria Pública, Ministério Público e respectivos fundos especiais). O NRFG, mecanismo provisório e excepcional, instituiu ajuste voltado a conter a escalada das despesas públicas na esfera local. ADI Foi ajuizada uma ADI contra essas emendas constitucionais e o STF, por maioria, concedeu medida cautelar para: • suspender a eficácia do art. 113, § 8º, da Constituição do Estado de Goiás, na redação dada pelas Emendas de nº 54/2017 e 55/2017 e, com isso, afastar, até o exame definitivo da ADI, a exclusão no conceito de limite de despesas com pessoal dos valores alusivos ao pagamento de pensionistas, assim como os referentes ao imposto, retido na fonte, incidente sobre os rendimentos pagos aos agentes públicos; e • suspender os efeitos dos incisos I e II do art. 45 do ADCT da Constituição do Estado de Goiás, na redação dada pelo art. 1º da Emenda de nº 54/2017.

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STF. Plenário. ADI 6129/GO, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 11/9/2019 (Info 951). § 8º do art. 111 A implantação do NRFG foi uma medida necessária em decorrência dos insustentáveis acréscimos com as despesas com pessoal, gerando um desequilíbrio nas finanças públicas do Estado de Goiás. Entretanto, a nova redação dada ao § 8º do art. 113 da Constituição estadual – inserida por emenda de origem parlamentar – resultou na adoção de providência contrária à lógica a presidir o projeto de reforma constitucional enviado ao Parlamento pelo Chefe do Executivo local. Isso porque foram excluídos do conceito de limite de despesas com pessoal, para aferição da observância, ou não, do teto fixado na Lei Complementar 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) –, os valores alusivos ao pagamento de pensionistas e os referentes ao imposto, retido na fonte, incidente sobre os rendimentos pagos aos agentes públicos. Veja a redação do dispositivo: Constituição do Estado de Goiás:

Art. 113. A despesa com pessoal ativo e inativo do Estado e dos Municípios não poderá exceder os limites globais estabelecidos em lei complementar federal. (...) § 8º Na verificação do atendimento pelo Estado dos limites globais estabelecidos na lei complementar federal, mencionado no caput deste artigo, não serão computadas as despesas com os pensionistas e os valores referentes ao imposto de renda retidos na fonte dos servidores públicos estaduais.

Em outras palavras, o § 8º excluiu do limite de despesas com pessoal os gastos com os pensionistas e os valores referentes ao imposto de renda retidos na fonte dos servidores públicos estaduais.” Ao fazer isso, o § 8º do art. 113 da Carta estadual “empreendeu verdadeiro drible” ao art. 169 da CF/88, que afirmou que o legislador federal, mediante a edição de lei complementar, deveria normatizar a matéria:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

A locução contida no texto constitucional – “não poderá exceder” – não gera dúvidas. Ou seja, fixadas, em lei complementar federal, as balizas concernentes aos gastos com pessoal, os entes federados vinculam-se ao versado na norma de caráter nacional. O Congresso Nacional, cumprindo o art. 169 da CF/88, editou a Lei Complementar nº 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Essa Lei estabelece, nos arts. 18 e seguintes, os limites de gastos com pessoal para cada ente da Federação, em termos globais e setoriais, bem como as correspondentes exceções. Além disso, criou medidas de controle das despesas ante a aproximação ou mesmo transgressão dos marcos percentuais estabelecidos – limites de alerta e de prudência nos importes de 90% e 95%, respectivamente. O mecanismo previsto na LRF foi acoplar a geração de despesas com pessoal à receita corrente líquida, vinculando a expansão daquelas ao crescimento desta, compatibilizando-as racionalmente. No âmbito dos Estados, a LRF estabeleceu o seguinte:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados: (...)

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II - Estados: 60% (sessenta por cento);

O art. 18 da LRF, por sua vez, define o conceito de “despesa total com pessoal”:

Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

A preocupação em definir o conceito de forma didática e o mais abrangente possível deriva do fato de que os gastos com pessoal constituem um dos principais itens da despesa do setor público no Brasil, e o descontrole pode ter consequências nefastas à hígida gestão financeira da Administração. Percebe-se que a LRF incluiu, para o fim de aferição da observância, ou não, do teto legalmente fixado, os gastos concernentes ao pagamento de pensões. Assim o fez porque a figura do pensionista vincula-se à do agente público, uma vez que o fato gerador do direito à pensão, observadas as condições prescritas na legislação de regência, consiste na morte do servidor em atividade ou aposentado, revestindo-se de caráter previdenciário e sujeitando-se aos princípios da contributividade e da solidariedade (art. 40, caput, da CF/88). Ademais, do ponto de vista econômico, o pagamento de pensões representa inegável encargo fiscal para a Administração. Excluir os pensionistas do cálculo de despesas com pessoal não os retira da folha de pagamento, pois a despesa não deixa de existir. O mesmo raciocínio direciona no sentido da declaração de inconstitucionalidade do trecho, igualmente inserido no art. 113, § 8º, da Constituição do Estado de Goiás, por meio do qual excluídas, do conceito de limite de despesas com pessoal, aquelas alusivas aos valores do imposto, retido na fonte, incidente sobre os rendimentos pagos aos agentes públicos. Isso porque tal parcela faz parte da remuneração bruta devida aos servidores, a ser incorporada ao patrimônio destes, embora, via de regra, posteriormente repassada à Administração à qual se vinculam. Ausente expressa menção ao imposto retido na fonte incidente sobre os rendimentos pagos aos servidores, no § 1º do art. 19 da LRF, é inviável excluí-lo do todo concernente às despesas com pessoal ativo e inativo para o fim de aferição da observância, ou não, do limite percentual estabelecido. Em termos práticos, o resultado da atuação do constituinte estadual implicou dar carta branca à Administração, permitindo-lhe ampliar os gastos com pessoal, ausente base econômica sólida a sustentar o imediato incremento das despesas, sem, no entanto, ultrapassar, em tese, os limites instituídos pela legislação federal de regência. Tem-se “maquiagem” para escamotear-se o quadro de descontrole fiscal. Incisos I e II do art. 45 do ADCT da CE/GO O art. 45, I e II, do ADCT da CE/GO previu o seguinte:

Art. 45. A partir do exercício financeiro de 2018, as aplicações mínimas de recursos pelo Estado: I - em ações e serviços públicos de saúde e em manutenção e desenvolvimento do ensino corresponderão, em cada exercício financeiro, às aplicações mínimas referentes ao exercício anterior, corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL, na forma do art. 41; II - em manutenção e reconstrução de rodovia, aeródromo, autódromo, porto pluvial e balsa corresponderão, em cada exercício financeiro, a dois terços da sua participação no produto da arrecadação do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores -IPVA.

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Ao suspender a exigência de atrelamento, em determinado exercício fiscal, à receita efetivamente arrecadada, dos gastos estaduais com “ações e serviços públicos de saúde” e “manutenção e desenvolvimento do ensino”, limitando-os ao montante correspondente às despesas do exercício anterior “corrigidas pela variação do IPCA ou da RCL”, o art. 45, I acima transcrito violou o art. 198, § 2º, II, e o art. 212, da CF/88:

Art. 198 (...) § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (...) II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o produto da arrecadação dos impostos a que se refere o art. 155 e dos recursos de que tratam os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios;

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

Com a fórmula adotada pelo art. 45 do ADCT da CE/GO (vincular o teto de gastos com saúde e educação ao total de despesas do exercício anterior), a Administração fica desobrigada de promover acréscimo dos valores direcionados a essas áreas caso haja um aumento de receita. Logo, isso viola a regra de vinculação do art. 198, § 2º, II, e art. 212, da CF/88.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) Pulverização aérea de inseticida contra Aedes aegypti precisa de autorização prévia de autoridades

sanitária e ambiental e comprovação científica da eficácia da medida. ( ) 2) Não é possível aplicar o prazo de 8 anos de inelegibilidade, introduzido pela LC 135/2010 (Lei da Ficha

Limpa), às condenações por abuso de poder, nos casos em que o processo já tenha transitado em julgado quando a Lei da Ficha Limpa entrou em vigor. ( )

3) (Juiz TJ/CE 2018 CESPE) Em caso de irregularidades do Estado-membro em convênio federal, a União somente poderá inscrever o ente no SIAFI, no CADIN e no CAUC após o término do processo de prestação de contas especial, observados os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. ( )

4) A inscrição de estado-membro em cadastro de inadimplência da União em sede de convênio não implica conflito federativo. ( )

5) Não compete ao STF julgar ação proposta contra a União e o Banco do Brasil para obrigar que a instituição financeira cumpra lei estadual que determina o repasse de parte dos valores dos depósitos judiciais para o caixa único do Estado. ( )

6) Não cabe revisão criminal para impugnar decisão que se limita a inadmitir recurso. ( ) Gabarito

1. C 2. E 3. C 4. E 5. C 6. C

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OUTRAS INFORMAÇÕES

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos Julgamentos por meio

eletrônico*

Em curso Finalizados

Pleno 11.09.2019 11.09.2019 e

12.09.2019

16 28 135

1ª Turma 10.09.2019 — 3 3 116

2ª Turma 10.09.2019 — 0 2 131

* Emenda Regimental 52/2019-STF. Sessão virtual de 6 a 12 de setembro de 2019.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 9 A 13 DE SETEMBRO DE 2019

Medida Provisória nº 895, de 6.9.2019 - Altera a Lei nº 12.933, de 26 de dezembro de 2013, que dispõe sobre o benefício

do pagamento de meia-entrada para estudantes, idosos, pessoas com deficiência e jovens de quinze a vinte e nove anos

comprovadamente carentes em espetáculos artístico-culturais e esportivos, e dá outras providências. Publicado no DOU

em 09.09.2019, Seção 1, Edição 174, p. 1.

Medida Provisória nº 896, de 6.9.2019 - Altera a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, a Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004, e a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, para dispor sobre a forma de publicação dos atos da administração pública. Publicado no DOU em 09.09.2019, Seção 1, Edição 174, p. 2.

OUTRAS INFORMAÇÕES

9 A 13 DE SETEMBRO DE 2019

Decreto nº 10.014, de 6.9.2019 - Altera o Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004, que regulamenta a Lei nº 10.048,

de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e a Lei nº 10.098, de 19 de

dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas

portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. Publicado no DOU em 09.09.2019, Seção 1, Edição 174, p. 2.

Supremo Tribunal Federal – STF Secretaria de Documentação

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