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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 870-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: HC 134591/SP; MS 31667/DF-AgR. Julgados excluídos por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: Pet 7074 QO/DF; AC 4327 AgR/DF. ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS Compete aos Municípios legislar sobre meio ambiente em assuntos de interesse local. MEDIDAS PROVISÓRIAS O trancamento da pauta por conta de MPs não votadas no prazo de 45 dias só alcança projetos de lei que versem sobre temas passíveis de serem tratados por MP. DIREITO AMBIENTAL COMPETÊNCIA Normas municipais podem prever multas para os proprietários de veículos que emitem fumaça acima dos padrões aceitáveis. DIREITO PROCESSUAL PENAL COLABORAÇÃO PREMIADA Diversos aspectos relacionados com a homologação do acordo. DIREITO TRIBUTÁRIO TAXAS Base de cálculo da taxa municipal de fiscalização e funcionamento. DIREITO CONSTITUCIONAL COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS Compete aos Municípios legislar sobre meio ambiente em assuntos de interesse local Importante!!! O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar de interesse local.

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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 1

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Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: HC 134591/SP; MS 31667/DF-AgR. Julgados excluídos por terem menor relevância para concursos públicos ou por terem sido decididos com base em peculiaridades do caso concreto: Pet 7074 QO/DF; AC 4327 AgR/DF.

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS Compete aos Municípios legislar sobre meio ambiente em assuntos de interesse local. MEDIDAS PROVISÓRIAS O trancamento da pauta por conta de MPs não votadas no prazo de 45 dias só alcança projetos de lei que versem

sobre temas passíveis de serem tratados por MP.

DIREITO AMBIENTAL

COMPETÊNCIA Normas municipais podem prever multas para os proprietários de veículos que emitem fumaça acima dos padrões

aceitáveis.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

COLABORAÇÃO PREMIADA Diversos aspectos relacionados com a homologação do acordo.

DIREITO TRIBUTÁRIO

TAXAS Base de cálculo da taxa municipal de fiscalização e funcionamento.

DIREITO CONSTITUCIONAL

COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS Compete aos Municípios legislar sobre meio ambiente em assuntos de interesse local

Importante!!!

O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar de interesse local.

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Ex: é constitucional lei municipal, regulamentada por decreto, que preveja a aplicação de multas para os proprietários de veículos automotores que emitem fumaça acima de padrões considerados aceitáveis.

STF. Plenário. RE 194704/MG, rel. orig. Min. Carlos Velloso, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 29/6/2017 (Info 870).

Normas municipais prevendo multa para carros com fumaça acima dos padrões O Município de Belo Horizonte editou uma lei, depois regulamentada por um decreto, estipulando a aplicação de multas para os proprietários de veículos automotores que emitem fumaça acima de padrões considerados aceitáveis. O Município poderia ter legislado sobre esse tema? Essas normas são compatíveis com a CF/88? SIM.

O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar de interesse local. STF. Plenário. RE 194704/MG, rel. orig. Min. Carlos Velloso, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 29/6/2017 (Info 870).

De quem é a competência para legislar sobre meio ambiente? A competência para legislar sobre o meio ambiente é concorrente, nos termos do art. 24, VI e VIII, da CF/88:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; (...) VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

A competência da União será para estabelecer normas gerais sobre os assuntos do art. 24. Ex: o Congresso Nacional editou o Código Florestal com normas gerais sobre a proteção das florestas. A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. Isso significa que os Estados-membros podem complementar a legislação federal editada pela União. Obviamente, as normas estaduais não podem contrariar as normas gerais elaboradas pela União. Se a União ainda não tiver editado as normas gerais sobre esse assunto, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. Em outras palavras, não havendo normas gerais da União, o Estado-membro fica livre para legislar a respeito daquele tema. Vale ressaltar, no entanto, que se a União vier a editar posteriormente as normas gerais, a lei estadual terá sua eficácia suspensa naquilo que for contrário à legislação da União. Mas os Municípios não estão elencados no caput do art. 24... É verdade. No entanto, mesmo assim eles podem legislar sobre os assuntos do art. 24, desde que o façam para atender peculiaridades municipais, ou seja, no interesse local. Essa autorização para que os Municípios legislem sobre matérias de competência concorrente está prevista no art. 30, I e II, da CF/88:

Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

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Dessa forma, os Municípios podem tratar sobre os assuntos do art. 24, no que couber, ou seja, naquilo que for de interesse local. Em virtude do exposto, conclui-se que os Municípios possuem competência para legislar sobre o meio ambiente, limitada esta, no entanto, ao tratamento normativo de assuntos de interesse estritamente local. Controle da poluição ambiental O controle da poluição ambiental, especialmente aquele destinado a impedir a degradação dos índices de qualidade do ar, consiste em matéria que se insere na esfera de competência legislativa dos Municípios, observado o interesse local e desde que as medidas de regulação normativa não transgridam nem conflitem com o âmbito de atuação que a Constituição atribuiu à União e aos Estados-membros.

MEDIDAS PROVISÓRIAS O trancamento da pauta por conta de MPs não votadas no prazo de 45 dias só alcança

projetos de lei que versem sobre temas passíveis de serem tratados por MP

Importante!!!

O art. 62, § 6º da CF/88 afirma que “se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando”.

Apesar de o dispositivo falar em “todas as demais deliberações”, o STF, ao interpretar esse § 6º, não adotou uma exegese literal e afirmou que ficarão sobrestadas (paralisadas) apenas as votações de projetos de leis ordinárias que versem sobre temas que possam ser tratados por medida provisória.

Assim, por exemplo, mesmo havendo medida provisória trancando a pauta pelo fato de não ter sido apreciada no prazo de 45 dias (art. 62, § 6º), ainda assim a Câmara ou o Senado poderão votar normalmente propostas de emenda constitucional, projetos de lei complementar, projetos de resolução, projetos de decreto legislativo e até mesmo projetos de lei ordinária que tratem sobre um dos assuntos do art. 62, § 1º, da CF/88. Isso porque a MP somente pode tratar sobre assuntos próprios de lei ordinária e desde que não incida em nenhuma das proibições do art. 62, § 1º.

STF. Plenário. MS 27931/DF, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 29/6/2017 (Info 870).

O que é medida provisória? Medida provisória é um ato normativo editado pelo Presidente da República, em situações de relevância e urgência, e que tem força de lei, ou seja, é como se fosse uma lei ordinária, com a diferença de que ainda será votada pelo Congresso Nacional, podendo ser aprovada (quando, então, é convertida em lei) ou rejeitada (situação em que deixará de existir). As regras sobre as medidas provisórias estão previstas no art. 62 da CF/88. Como funciona O Presidente da República, sozinho, edita a MP e, desde o momento em que ela é publicada no Diário Oficial, já passa a produzir efeitos como se fosse lei. Esta MP é, então, enviada ao Congresso Nacional. Ali chegando, ela é submetida inicialmente à uma comissão mista de Deputados e Senadores, que irão examiná-la e sobre ela emitir um parecer (art. 62, § 9º).

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Depois, a MP será votada primeiro pelo plenário da Câmara dos Deputados (art. 62, § 8º) e, se for aprovada, seguirá para votação no plenário do Senado Federal. Caso seja aprovada no plenário das duas Casas, esta MP é convertida em lei. Qual é o prazo de eficácia da medida provisória? 60 dias, podendo ser prorrogada, apenas uma vez, por mais 60 dias. Isso está previsto no art. 62, §§ 3º e 7º da CF/88:

§ 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. (...) § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.

Matérias que não podem ser tratadas por MP Segundo o § 1º do art. 62 da CF/88, é vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I – relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. Trancamento de pauta O desejo do legislador constituinte é o de que a medida provisória seja votada pelo Congresso Nacional, evitando que ela perca a eficácia por ausência de apreciação. Assim, para “forçar” a análise da MP, o art. 62, § 6º da Constituição Federal determinou que “se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando”. Em outras palavras, se já tiverem se passado 45 dias e até então a MP não tiver sido votada, haverá o chamado “trancamento de pauta”, ou seja, não se poderá analisar outras matérias a fim de que se dê prioridade para a MP que está pendente. Sobrestamento atinge apenas projetos de lei ordinária que possam ser tratados por MP Vale ressaltar, no entanto, que, apesar de o dispositivo falar em “todas as demais deliberações”, o STF, ao interpretar esse § 6º, não adotou uma exegese literal e afirmou que ficarão sobrestadas (paralisadas) apenas as votações de projetos de leis ordinárias que versem sobre temas que possam ser tratados por medida provisória. Assim, por exemplo, mesmo havendo medida provisória trancando a pauta pelo fato de não ter sido apreciada no prazo de 45 dias (art. 62, § 6º), ainda assim a Câmara ou o Senado poderão votar normalmente propostas de emenda constitucional, projetos de lei complementar, projetos de resolução, projetos de decreto legislativo e até mesmo projetos de lei ordinária que tratem sobre um dos assuntos

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do art. 62, § 1º, da CF/88. Isso porque a MP somente pode tratar sobre assuntos próprios de lei ordinária e desde que não incida em nenhuma das proibições do art. 62, § 1º. Compare

Redação literal do art. 62, § 6º CF/88 Como deve ser interpretado o dispositivo

Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.

Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas ordinárias, que possam ser tratadas por medida provisória.

Obs: se, em uma prova objetiva for cobrada a redação literal do art. 62, § 6º da CF/88, sem qualquer menção ao entendimento do STF, esta alternativa deve ser assinalada como correta. Por outro lado, a resposta será outra se o enunciado falar algo como “de acordo com o STF” ou “de acordo com a jurisprudência”. Curiosidade Vale ressaltar que essa interpretação restritiva e não literal do art. 62. § 6º da CF/88 foi criada por Michel Temer. Em 2009, Temer era Presidente da Câmara dos Deputados e passou a adotar esse entendimento naquela Casa afirmando que só ficariam sobrestadas as demais deliberações legislativas que envolvessem projetos de lei ordinária que pudessem ser tratadas por medida provisória. Alguns Deputados impetraram, então, mandado de segurança no STF contra essa decisão do então Presidente da Câmara. O STF agora julgou o MS concordando com a interpretação realizada.

DIREITO AMBIENTAL

COMPETÊNCIA Normas municipais podem prever multas para os proprietários de veículos que emitem fumaça acima dos padrões aceitáveis

É constitucional lei municipal, regulamentada por decreto, que preveja a aplicação de multas para os proprietários de veículos automotores que emitem fumaça acima de padrões considerados aceitáveis.

O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar de interesse local.

STF. Plenário. RE 194704/MG, rel. orig. Min. Carlos Velloso, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 29/6/2017 (Info 870).

Veja comentários em Direito Constitucional.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

COLABORAÇÃO PREMIADA Diversos aspectos relacionados com a homologação do acordo

Importante!!!

Natureza jurídica do acordo de colaboração premiada

A colaboração premiada é um negócio jurídico processual entre o Ministério Público e o colaborador, sendo vedada a participação do magistrado na celebração do ajuste entre as partes.

Papel do Poder Judiciário no acordo de colaboração premiada

A colaboração é um meio de obtenção de prova cuja iniciativa não se submete à reserva de jurisdição (não exige autorização judicial), diferentemente do que ocorre nas interceptações telefônicas ou na quebra de sigilo bancário ou fiscal.

Nesse sentido, as tratativas e a celebração da avença são mantidas exclusivamente entre o Ministério Público e o pretenso colaborador.

O Poder Judiciário é convocado ao final dos atos negociais apenas para aferir os requisitos legais de existência e validade, com a indispensável homologação.

Natureza da decisão que homologa o acordo de colaboração premiada

A decisão do magistrado que homologa o acordo de colaboração premiada não julga o mérito da pretensão acusatória, mas apenas resolve uma questão incidente. Por isso, esta decisão tem natureza meramente homologatória, limitando-se ao pronunciamento sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo (art. 4º, § 7º, da Lei nº 12.850/2013).

O juiz, ao homologar o acordo de colaboração, não emite juízo de valor a respeito das declarações eventualmente prestadas pelo colaborador à autoridade policial ou ao Ministério Público, nem confere o signo da idoneidade a seus depoimentos posteriores.

A análise se as declarações do colaborador são verdadeiras ou se elas se confirmaram com as provas produzidas será feita apenas no momento do julgamento do processo, ou seja, na sentença (ou acórdão), conforme previsto no § 11 do art. 4º da Lei.

Na decisão homologatória, magistrado examina se as cláusulas contratuais ofendem manifestamente o ordenamento jurídico

No ato de homologação da colaboração premiada, não cabe ao magistrado, de forma antecipada e extemporânea, tecer juízo de valor sobre o conteúdo das cláusulas avençadas, exceto nos casos de flagrante ofensa ao ordenamento jurídico vigente.

Ex: o Relator poderá excluir ao acordo a cláusula que limite o acesso à justiça, por violar o art. 5º, XXXV, da CF/88.

Neste momento, o Relator não realiza qualquer controle de mérito, limitando-se aos aspectos formais e legais do acordo.

Em caso colaboração premiada envolvendo investigados ou réus com foro no Tribunal, qual é o papel do Relator?

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É atribuição do Relator homologar, monocraticamente, o acordo de colaboração premiada, analisando apenas a sua regularidade, legalidade e voluntariedade, nos termos do art. 4º, § 7º da Lei nº 12.850/2013:

§ 7º Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor.

Não há qualquer óbice à homologação do respectivo acordo mediante decisão monocrática.

O art. 21, I e II, do RISTF confere ao Ministro Relator no STF poderes instrutórios para ordenar, de forma singular, a realização de quaisquer meios de obtenção de provas.

Em caso colaboração premiada envolvendo investigados ou réus com foro no Tribunal, qual é o papel do órgão colegiado?

Compete ao órgão colegiado, em decisão final de mérito, avaliar o cumprimento dos termos do acordo homologado e a sua eficácia, conforme previsto no art. 4º, § 11 da Lei nº 12.850/2013:

§ 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia.

Assim, é possível que o órgão julgador, no momento da sentença ou acórdão, ou seja, após a conclusão da instrução probatória, avalie se os termos da colaboração foram cumpridos e se os resultados concretos foram atingidos, o que definirá a sua eficácia.

Acordo de colaboração homologado pelo Relator deve, em regra, produzir seus efeitos, salvo se presente hipótese de anulabilidade

O acordo de colaboração devidamente homologado individualmente pelo relator deve, em regra, produzir seus efeitos diante do cumprimento dos deveres assumidos pelo colaborador.

Vale ressaltar, no entanto, que o órgão colegiado detém a possibilidade de analisar fatos supervenientes ou de conhecimento posterior que firam a legalidade do acordo, nos termos do § 4º do art. 966do CPC/2015:

§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.

Direitos do colaborador somente serão assegurados se ele cumprir seus deveres

O direito subjetivo do colaborador nasce e se perfectibiliza na exata medida em que ele cumpre seus deveres.

Assim, o cumprimento dos deveres pelo colaborador é condição sine qua non para que ele possa gozar dos direitos decorrentes do acordo.

Por isso diz-se que o acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculação condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela colaboração, salvo ilegalidade superveniente apta a justificar nulidade ou anulação do negócio jurídico.

STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA - Colaboração premiada é um instituto previsto na legislação por meio do qual... - um investigado ou acusado da prática de infração penal - decide confessar a prática do delito - e, além disso, aceita colaborar com a investigação ou com o processo - fornecendo informações que irão ajudar,

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- de forma efetiva, - na obtenção de provas contra os demais autores dos delitos e contra a organização criminosa, - na prevenção de novos crimes, - na recuperação do produto ou proveito dos crimes ou - na localização da vítima com integridade física preservada, - recebendo o colaborador, em contrapartida, determinados benefícios penais (ex: redução de sua pena). A colaboração premiada possui natureza jurídica de "meio de obtenção de prova" (art. 3º, I, da Lei nº 12.850/2013). Chamo atenção para esse fato: a colaboração premiada não é um meio de prova propriamente dito. A colaboração premiada não prova nada (ela não é uma prova). A colaboração premiada é um meio, uma técnica, um instrumento para se obter as provas. “Enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática (p. ex., o depoimento de uma testemunha, ou o teor de uma escritura pública), os meios de obtenção de provas (p. ex.: uma busca e apreensão) são instrumentos para a colheita de elementos ou fontes de provas, estes sim, aptos a convencer o julgador (p. ex.: um extrato bancário [documento] encontrado em uma busca e apreensão domiciliar). Ou seja, enquanto o meio de prova se presta ao convencimento direto do julgador, os meios de obtenção de provas somente indiretamente, e dependendo do resultado de sua realização, poderão servir à reconstrução da história dos fatos” (BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. Rio de Janeiro. Campus: Elsevier. 2012, p. 270). PREVISÃO NORMATIVA Podemos encontrar algumas previsões embrionárias de colaboração premiada em diversos dispositivos legais esparsos. Confira a relação:

Código Penal (arts. 15, 16, 65, III, 159, § 4º);

Crimes contra o Sistema Financeiro – Lei 7.492/86 (art. 25, § 2º);

Crimes contra a Ordem Tributária – Lei 8.137/90 (art. 16, parágrafo único);

Lei dos Crimes Hediondos – Lei 8.072/90 (art. 8º, parágrafo único);

Convenção de Palermo – Decreto 5.015/2004 (art. 26);

Lei de Lavagem de Dinheiro – Lei 9.613/98 (art. 1º, § 5º);

Lei de Proteção às Testemunhas – Lei 9.807/99 (arts. 13 a 15);

Lei de Drogas – Lei 11.343/2006 (art. 41);

Lei Antitruste – Lei 12.529/2011 (art. 87, parágrafo único). O instituto, no entanto, foi tratado com maior riqueza de detalhes pela Lei nº 12.850/2013 (Lei do Crime Organizado), em seus arts. 4º a 7º. Este é, atualmente, o diploma que rege, de forma geral, a colaboração premiada em nosso país, razão pela qual a explicação abaixo será feita com base nesta Lei. NOMENCLATURA Normalmente, encontramos na doutrina e jurisprudência, a terminologia “delação premiada”. A Lei 12.850/2013, no entanto, utilizou a expressão “colaboração premiada”. Existe alguma diferença? SIM. A nomenclatura "colaboração premiada" é mais ampla, devendo ser considerada como um gênero, do qual uma das suas espécies é a delação premiada. A delação premiada ocorre quando o investigado ou acusado colabora com as autoridades delatando os comparsas, ou seja, apontando as outras pessoas que também praticaram as infrações penais. Desse modo, como já dito, a delação é uma forma de exercer a colaboração premiada. Existem, contudo, outras espécies, conforme será visto mais a frente.

COLABORAÇÃO PREMIADA DELAÇÃO PREMIADA

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É um mecanismo previsto na legislação por meio do qual o investigado ou acusado de uma infração penal colabora, efetiva e voluntariamente, com a investigação e com o processo, recebendo, em contrapartida, benefícios penais. Uma das formas de colaboração premiada é a delação dos coautores ou partícipes.

É uma espécie do gênero "colaboração premiada". Ocorre quando o investigado ou acusado decide colaborar com as autoridades delatando os comparsas, ou seja, apontando as outras pessoas que também praticaram as infrações penais.

Exemplo de colaboração premiada que não é delação premiada: o autor confessa a prática do crime e não delata nenhum comparsa. No entanto, ele fornece todas as informações necessárias para que as autoridades recuperem o dinheiro desviado com o esquema criminoso e que se encontrava em contas bancárias no exterior. Assim, toda delação premiada é uma forma de colaboração premiada, mas nem sempre a colaboração premiada será feita por meio de uma delação premiada. CRÍTICAS E IMPORTÂNCIA A delação premiada é criticada por alguns doutrinadores. O argumento é o de que, por meio deste expediente, o Estado estaria incentivando uma conduta antiética por parte do delator, qual seja, a traição. Afirma-se, ainda, que a colaboração premiada seria uma forma de o Poder Público barganhar com os criminosos, postura que não seria adequada. A posição majoritária, contudo, é aquela que defende que, em uma ponderação de interesses, a delação premiada é medida indispensável ao combate da criminalidade organizada, sendo, portanto, legítima, já que não viola nenhum direito ou garantia fundamental. Veja a opinião de Nucci:

“(...) parece-nos que a delação premiada é um mal necessário, pois o bem maior a ser tutelado é o Estado Democrático de Direito. Não é preciso ressaltar que o crime organizado tem ampla penetração nas entranhas estatais e possui condições de desestabilizar qualquer democracia, sem que se possa combatê-lo, com eficiência, desprezando-se a colaboração daqueles que conhecem o esquema e dispõem-se a denunciar co-autores e partícipes. No universo de seres humanos de bem, sem dúvida, a traição é desventurada, mas não cremos que se possa dizer o mesmo ao transferirmos nossa análise para o âmbito do crime, por si só, desregrado, avesso à legalidade, contrário ao monopólio estatal de resolução de conflitos, regido por leis esdrúxulas e extremamente severas, totalmente distante dos valores regentes dos direitos humanos fundamentais.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. São Paulo: RT, 2008, p. 418).

Ademais, se o Estado não pudesse contar (e incentivar) a delação por parte dos comparsas, dificilmente seria possível desmantelar organizações criminosas poderosas, com estrutura hierarquizada de poder, nas quais o chefe da ORCRIM raramente pratica os atos criminosos pessoalmente, valendo-se sempre de interpostas pessoas e ordens reservadas. Se um integrante da organização for preso e o Poder Público não tiver autorização para incentivar a delação dos demais membros, o grupo criminoso estará sempre se renovando, além do que somente serão punidos os componentes de baixo escalão do crime organizado. A história revela que o instituto da delação premiada foi imprescindível para que a Itália conseguisse punir alguns integrantes do grupo mafioso siciliano conhecido como “Cosa Nostra” na chamada “Operação Mãos Limpas”. Um dos mafiosos, Tommaso Buscetta, após ser preso, celebrou acordo com o Procuratore Della Repubblica Giovanni Falcone, aceitando delatar seus comparsas e revelar toda a estrutura e os planos da organização criminosa. FORMAS DE COLABORAÇÃO PREMIADA (RESULTADOS QUE DEVEM SER ALCANÇADOS) A Lei 12.850/2013 prevê, em seu art. 4º, cinco formas por meio das quais o investigado/réu poderá colaborar com a investigação e com o processo.

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Assim, para ter direito aos benefícios decorrentes da colaboração, o indivíduo deverá fornecer informações efetivas com as quais as autoridades consigam pelo menos um dos seguintes resultados: 1) Identificar os demais coautores e partícipes da organização criminosa e as infrações penais por eles praticadas. 2) Revelar a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da organização criminosa. 3) Prevenir as infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa. 4) Recuperar total ou parcialmente o produto ou o proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa. 5) Localizar o paradeiro da vítima com a sua integridade física preservada. Obs: reitero que basta que um desses cinco objetivos seja atingido para que o colaborador tenha direito ao benefício. COLABORAÇÃO VOLUNTÁRIA E EFETIVA A colaboração deve ser voluntária, ou seja, o colaborador não pode ter sido coagido. Vale ressaltar que a colaboração é considerada voluntária mesmo que a proposta não tenha partido do investigado/acusado. Isso porque não se exige que a colaboração seja espontânea, ou seja, que tenha partido do colaborador a ideia, a iniciativa. Basta que seja voluntária (que ele aceite livremente). Assim, se a polícia ou o MP propõem o acordo e este é aceito livremente pelo colaborador, esta colaboração é tida como voluntária. A colaboração deve ser efetiva, isto é, somente será concedido o benefício se, com as informações fornecidas pelo colaborador, for obtido um dos resultados previstos nos incisos do art. 4º da Lei. Não se exige que o colaborador demonstre arrependimento. Sendo uma colaboração voluntária e efetiva, a concessão do benefício é devida ainda que o investigado/acusado não tenha sentimentos altruístas. MOMENTO A colaboração premiada e a concessão dos benefícios dela decorrentes podem ocorrer em três momentos: 1) Na fase de investigação criminal (inquérito policial ou investigação conduzida pelo MP); 2) Durante o curso do processo penal (ainda que já em instância recursal); 3) Após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. BENEFÍCIOS Poderão ser concedidos ao colaborador os seguintes benefícios (prêmios):

1) Não oferecimento da denúncia Se o acordo de colaboração for firmado ainda na fase de investigação, sendo ele homologado pelo juiz, o Ministério Público poderá deixar de oferecer a denúncia contra o colaborador. Trata-se de uma exceção ao princípio da obrigatoriedade, segundo o qual, havendo justa causa, o MP é obrigado a oferecer a denúncia. Para que o MP deixe de oferecer a denúncia contra o colaborador é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: a) A colaboração deve ser efetiva e voluntária; b) O colaborador não pode ser o líder da organização criminosa; c) O colaborador deve ter sido o primeiro a prestar efetiva colaboração. 2) Perdão judicial Se a colaboração prestada for muito relevante, o Ministério Público ou o Delegado de Polícia poderão se manifestar pedindo que o juiz conceda perdão judicial ao colaborador, o que acarreta a extinção da punibilidade (art. 107, IX, do CP). Veja a redação do art. 4º, § 2º da Lei nº 12.850/2013:

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§ 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

3) Redução da pena Outro benefício previsto ao colaborador é a redução da pena que lhe for imposta.

Se a colaboração ocorrer antes da sentença, ou seja, se a pessoa decidir colaborar antes de ser julgada: sua pena poderá ser reduzida em até 2/3.

Se a colaboração ocorrer após a sentença, ou seja, se a pessoa decidir colaborar apenas depois de ser condenada: sua pena poderá ser reduzida em até metade (1/2).

4) Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos O juiz poderá substituir a pena privativa de liberdade do colaborador por pena restritiva de direitos mesmo que não estejam presentes os requisitos do art. 44 do CP. 5) Progressão de regime Para que ocorra a progressão de regime, o réu deverá ter cumprido determinado tempo de pena. A isso chamamos de requisito objetivo da progressão. Para crimes comuns: o requisito objetivo consiste no cumprimento de 1/6 da pena aplicada. Para crimes hediondos ou equiparados, o requisito objetivo representa o cumprimento de: • 2/5 da pena se for primário. • 3/5 da pena se for reincidente. Se o réu já estiver condenado e cumprindo pena e decidir colaborar, ele poderá receber como "prêmio" a progressão de regime ainda que não tenha atingido o requisito objetivo (§ 5º do art. 4º). O STF entende que, caso a colaboração seja efetiva e produza os resultados almejados, o colaborador tem direito subjetivo à aplicação das sanções premiais estabelecidas no acordo, inclusive de natureza patrimonial (HC 127483/PR). CRITÉRIOS UTILIZADOS PARA A ESCOLHA DO BENEFÍCIO A Lei aponta os seguintes critérios para que o juiz escolha quais benefícios serão aplicados ao colaborador (§ 1º do art. 4º): a) Personalidade do colaborador; b) Natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso; c) Eficácia da colaboração. DIREITOS DO COLABORADOR O art. 5º da Lei 12.850/2013 prevê os seguintes direitos ao colaborador: I - usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica (Lei nº 9.807/99); II - ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados; III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes; IV - participar das audiências sem contato visual com os outros acusados; V - não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito; VI - cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados.

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PROCEDIMENTO ATÉ A ASSINATURA DO ACORDO DE COLABORAÇÃO 1) Negociação do acordo O investigado (ou acusado), assistido por advogado, negocia o acordo de colaboração premiada com o Delegado de Polícia ou com o Ministério Público. O juiz não participará, em hipótese alguma, das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração (§ 6º do art. 4º). Caso o magistrado interagisse nas negociações, haveria uma grave violação do sistema acusatório e um seríssimo risco de contaminação da sua imparcialidade, considerando que as informações enunciadas pelo eventual colaborador iriam incutir no julgador preconcepções sobre o próprio delator e seus comparsas. Se as negociações não culminassem com um acordo, a opinião do julgador a respeito do investigado/denunciado já estaria construída em seu psicológico considerando que teria ouvido confissões sobre os fatos criminosos. Ademais, a simples presença do juiz da causa na tentativa de acordo poderia exercer uma indevida coerção velada para que o investigado/acusado aceitasse eventual proposta, o que contraria a natureza do instituto já que a colaboração deve ser voluntária.

A colaboração é um meio de obtenção de prova cuja iniciativa não se submete à reserva de jurisdição (não exige autorização judicial), diferentemente do que ocorre nas interceptações telefônicas ou na quebra de sigilo bancário ou fiscal. Nesse sentido, as tratativas e a celebração da avença são mantidas exclusivamente entre o Ministério Público e o pretenso colaborador. O Poder Judiciário é convocado ao final dos atos negociais apenas para aferir os requisitos legais de existência e validade, com a indispensável homologação. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

2) Formalização do acordo e envio à Justiça Caso as negociações tenham êxito, as declarações do colaborador serão registradas (em meio escrito ou audiovisual) e será elaborado um termo de acordo de colaboração premiada, a ser assinado por todas as partes e, então, remetido ao juiz para homologação.

O Delegado de Polícia pode negociar e assinar acordo de colaboração premiada com o colaborador (assistido por seu defensor), enviando depois esse termo para ser homologado pelo juiz? A autoridade policial tem legitimidade para celebrar o acordo de colaboração premiada?

Redação literal da Lei 12.850/2013: SIM

A redação da Lei nº 12.850/2013 dá a entender que, se fosse feito durante o inquérito policial, o acordo de colaboração premiada poderia ser celebrado entre o Delegado de Polícia e o investigado, ou seja, a autoridade policial teria legitimidade para celebrar acordo de colaboração premiada, bastando que houvesse uma manifestação (parecer) do MP. Veja: Art. 4º (...) § 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito

Posição da doutrina majoritária: NÃO

A doutrina majoritária sustenta que a legitimidade para celebrar o acordo de colaboração premiada é exclusiva do Ministério Público. O Delegado de Polícia até poderia sugerir o acordo, mas quem decide sobre a sua celebração e condições seria o membro do MP. Os argumentos, em síntese, para essa conclusão são os seguintes: a) O acordo precisará ser homologado pelo magistrado e o Delegado de Polícia não teria capacidade postulatória para peticionar em juízo pedindo a homologação;

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policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). (...) § 6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

b) A CF/88, em seu art. 129, I, conferiu ao MP, a titularidade da ação penal pública e, com isso, também garantiu a esse órgão a decisão sobre a viabilidade ou não da persecução penal. Alguns benefícios (prêmios) previstos ao colaborador implicam o não-exercício da ação penal (como o não-oferecimento de denúncia), decisão essa que só poderia ser tomada pelo MP, já que ele é o titular da ação penal. "(...) por mais que a autoridade policial possa sugerir ao investigado a possibilidade de celebração do acordo de colaboração premiada, daí não se pode concluir que o Delegado de Polícia tenha legitimação ativa para firmar tais acordos com uma simples manifestação do Ministério Público. (...) Por consequência, se a autoridade policial é desprovida de capacidade postulatória e legitimação ativa, não se pode admitir que um acordo por ela celebrado com o acusado venha a impedir o regular exercício da ação penal pública pelo Ministério Público, sob pena de se admitir que um dispositivo inserido na legislação ordinária possa se sobrepor ao disposto no art. 129, I, da Constituição Federal." (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 554-555).

3) Requisitos formais do acordo Segundo o art. 6º, o termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter os seguintes requisitos formais: I - o relato da colaboração e seus possíveis resultados; II - as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia; III - a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; IV - as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor; V - a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. Na proposta encaminhada ao Judiciário já deverá ser especificado o benefício que deverá ser concedido ao colaborador (ex: redução de 2/3 da pena). Deve-se esclarecer, contudo, que o magistrado não está vinculado aos termos da proposta, podendo adequá-la ao caso concreto (§ 8º do art. 4º). 4) O pedido de homologação do acordo é autuado como processo sigiloso O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto. As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 horas. Obs: se já houver um juízo que estiver funcionando no

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caso (ex: tiver deferido interceptação telefônica, recebido a ação penal etc.), este será o competente para apreciar o acordo, sendo distribuído a ele por prevenção. O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de Polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento. O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia (§ 3º do art. 7º). 5) Análise da homologação pelo juiz As negociações do acordo de colaboração premiada ocorrem em âmbito extrajudicial, sendo vedada, como vimos, a participação do magistrado. Repetindo: o magistrado não participa da negociação do acordo. Ocorre que, após celebrado, o pacto somente terá eficácia processual se for homologado pelo juiz. Na análise da homologação do acordo, o juiz deverá examinar os seguintes aspectos: a) Regularidade: se os aspectos formais e procedimentais foram atendidos; b) Legalidade: se a pactuação celebrada ofende algum dispositivo legal; c) Voluntariedade: se o investigado/acusado não foi coagido a assinar o acordo.

Art. 4º (...) § 8º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto.

"A homologação não representa juízo de valor sobre as declarações eventualmente já prestadas pelo colaborador à autoridade judicial ou ao Ministério Público." (Min. Dias Toffoli, no HC 127483/PR). Isso significa que, quando o juiz homologa o acordo de colaboração premiada, não significa que esteja concordando ou afirmando que as declarações prestadas pelo colaborador são verdadeiras. Tais declarações ainda serão objeto de apuração.

A decisão do magistrado que homologa o acordo de colaboração premiada não julga o mérito da pretensão acusatória, mas apenas resolve uma questão incidente. Por isso, esta decisão tem natureza meramente homologatória, limitando-se ao pronunciamento sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo (art. 4º, § 7º, da Lei nº 12.850/2013). O juiz, ao homologar o acordo de colaboração, não emite juízo de valor a respeito das declarações eventualmente prestadas pelo colaborador à autoridade policial ou ao Ministério Público, nem confere o signo da idoneidade a seus depoimentos posteriores. A análise se as declarações do colaborador são verdadeiras ou se elas se confirmaram com as provas produzidas será feita apenas no momento do julgamento do processo, ou seja, na sentença (ou acórdão), conforme previsto no § 11 do art. 4º da Lei. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

6) Em caso colaboração premiada envolvendo investigados ou réus com foro no Tribunal, qual é o papel do Relator?

É atribuição do Relator homologar, monocraticamente, o acordo de colaboração premiada, analisando apenas a sua regularidade, legalidade e voluntariedade, nos termos do art. 4º, § 7º da Lei nº 12.850/2013: § 7º Realizado o acordo na forma do § 6º, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor. Não há qualquer óbice à homologação do respectivo acordo mediante decisão monocrática.

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O art. 21, I e II, do RISTF confere ao Ministro Relator no STF poderes instrutórios para ordenar, de forma singular, a realização de quaisquer meios de obtenção de provas. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

7) Em caso colaboração premiada envolvendo investigados ou réus com foro no Tribunal, qual é o papel do órgão colegiado?

Compete ao órgão colegiado, em decisão final de mérito,avaliar o cumprimento dos termos do acordo homologado e a sua eficácia, conforme previsto no art. 4º, § 11 da Lei nº 12.850/2013: § 11. A sentença apreciará os termos do acordo homologado e sua eficácia. Assim, é possível que o órgão julgador, no momento da sentença ou acórdão, ou seja, após a conclusão da instrução probatória, avalie se os termos da colaboração foram cumpridos e se os resultados concretos foram atingidos, o que definirá a sua eficácia. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

8) Acordo de colaboração homologado pelo Relator deve, em regra, produzir seus efeitos, salvo se presente hipótese de anulabilidade

O acordo de colaboração devidamente homologado individualmente pelo relator deve, em regra, produzir seus efeitos diante do cumprimento dos deveres assumidos pelo colaborador. Vale ressaltar, no entanto, que o órgão colegiado detém a possibilidade de analisar fatos supervenientes ou de conhecimento posterior que firam a legalidade do acordo, nos termos do § 4º do art. 966do CPC/2015: § 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

9) Audiência sigilosa para confirmar a voluntariedade do acordo Se houver dúvida do juiz acerca da voluntariedade do acordo, ou seja, se houver suspeita de que tenha havido coação para que a pessoa colaborasse, o juiz poderá designar uma audiência sigilosa para ouvir o colaborador, que deverá estar acompanhado de seu defensor. O Ministério Público não será intimado e não participará desta audiência. 10) Recusa à homologação O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto. Na análise da homologação, o juiz deverá se ater ao exame da regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo. Assim, não pode o magistrado imiscuir-se em questões de discricionariedade investigatória ou fazer incursões sobre a conveniência e oportunidade da colaboração premiada. Esta não é sua competência.

No ato de homologação da colaboração premiada, não cabe ao magistrado, de forma antecipada e extemporânea, tecer juízo de valor sobre o conteúdo das cláusulas avençadas, exceto nos casos de flagrante ofensa ao ordenamento jurídico vigente. Ex: o Relator poderá excluir ao acordo a cláusula que limite o acesso à justiça, por violar o art. 5º, XXXV, da CF/88. Neste momento, o Relator não realiza qualquer controle de mérito, limitando-se aos aspectos formais e legais do acordo. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

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Recurso contra a decisão do juiz que recusa a homologação do acordo: a lei não prevê. Diante desse silêncio, a doutrina afirma que cabe, por analogia, recurso em sentido estrito (art. 581, I, do CPP). Nesse sentido: Pacelli. 11) O que acontece após ser homologado o acordo

Se as declarações do investigado/acusado já forem suficientes para se obter um dos resultados previstos nos incisos do art. 4º: aplica-se a ele o benefício penal.

Se, além das declarações do investigado/acusado, for necessária a realização de medidas de colaboração: o prazo para oferecimento da denúncia ou o processo (caso já exista ação penal) ficarão suspensos por até 6 meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidas, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional. Veja o que diz a Lei:

Art. 4º (...) § 3º O prazo para oferecimento de denúncia ou o processo, relativos ao colaborador, poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidas de colaboração, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional.

O acordo de colaboração premiada é um "negócio jurídico processual personalíssimo, que não pode ser impugnado por terceiros, ainda que venham a ser mencionados." O que poderá atingir eventual corréu delatado são as imputações posteriores, constantes do depoimento do colaborador. (Min. Dias Toffoli, no HC 127483/PR). 12) Direitos do colaborador somente serão assegurados se ele cumprir seus deveres

O direito subjetivo do colaborador nasce e se perfectibiliza na exata medida em que ele cumpre seus deveres. Assim, o cumprimento dos deveres pelo colaborador é condição sine qua non para que ele possa gozar dos direitos decorrentes do acordo. Por isso diz-se que o acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculaçãocondicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela colaboração, salvo ilegalidade superveniente apta a justificar nulidade ou anulação do negócio jurídico. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

13) Oitiva do colaborador Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo Delegado de Polícia responsável pelas investigações. Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial. Sempre que possível, o registro dos atos de colaboração será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações. Vale ressaltar, no entanto, que:

Não existe obrigatoriedade legal absoluta de que as declarações do colaborador premiado sejam registradas em meio audiovisual. O § 13 do art. 4º da Lei nº 12.850/2013 prevê que "sempre que possível, o registro dos atos de colaboração será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações". Desse modo, existe sim uma recomendação da Lei no sentido de que as declarações sejam registradas em meio audiovisual, mas isso não é uma obrigação legal absoluta a ponto de gerar nulidade pelo simples fato de o registro não ter sido feito dessa forma. STF. Plenário. Inq 4146/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 22/6/2016 (Info 831).

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14) Se após as diligências for constatada a relevância da colaboração prestada Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o Delegado de Polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador. Caso o juiz discorde, ele poderá invocar o procedimento previsto no art. 28 do CPP remetendo a manifestação do Promotor de Justiça ao Procurador Geral de Justiça (ou no caso de Procurador da República, encaminhando a circunstância à Câmara de Coordenação e Revisão do MPF). RETRATAÇÃO DA PROPOSTA Mesmo após a proposta ter sido aceita, alguma das partes pode voltar atrás e se retratar? SIM. Segundo o § 10 do art. 4º, as partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor. RENÚNCIA AO DIREITO AO SILÊNCIO E COMPROMISSO DE DIZER A VERDADE Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade (§ 14 do art. 4º). COLABORADOR DEVERÁ SER SEMPRE ASSISTIDO POR ADVOGADO Em todos os atos de negociação, confirmação e execução da colaboração, o colaborador deverá estar assistido por defensor (§ 15 do art. 4º). VALOR PROBATÓRIO DA COLABORAÇÃO: DECLARAÇÕES DO COLABORADOR DEVEM SER CORROBORADAS COM OUTRAS PROVAS Segundo o § 16 do art. 4º da Lei, nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador. Assim, as declarações do colaborador deverão ser corroboradas por outros elementos de prova. Em verdade, mesmo que não houvesse tal previsão, é certo que, para a jurisprudência, a simples delação do corréu não é suficiente para uma condenação. "Daí a importância daquilo que a doutrina chama de regra da corroboração, ou seja, que o colaborador traga elementos de informação e de prova capazes de confirmar suas declarações (v.g., indicação do produto do crime, de contas bancárias, localização do produto direto ou indireto da infração penal, auxílio para identificação de números de telefone a serem grampeados ou na realização de interceptação ambiental etc.)." (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 545). Colaboração recíproca ou cruzada O Estado não poderá utilizar-se da denominada “corroboração recíproca ou cruzada”, ou seja, não poderá impor condenação ao réu pelo fato de contra este existir, unicamente, depoimento de agente colaborador que tenha sido confirmado, tão somente, por outros delatores (trecho do voto Min. Celso de Mello no Pet. 5.700/DF).

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DIREITO TRIBUTÁRIO

TAXAS Base de cálculo da taxa municipal de fiscalização e funcionamento

As taxas municipais de fiscalização e funcionamento não podem ter como base de cálculo o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte.

STF. 2ª Turma. ARE 990914/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 20/6/2017 (Info 870).

A taxa de fiscalização e funcionamento pode ter como base de cálculo a área de fiscalização, na medida em que traduz o custo da atividade estatal de fiscalização.

STF. 1ª Turma. RE 856185 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 04/08/2015.

NOÇÕES GERAIS SOBRE TAXAS

Quantas e quais são as espécies de tributos?

CTN (art. 5º) STF e doutrina majoritária

Teoria tripartida, tricotômica ou tripartite. Existem 3 espécies de tributos: a) Impostos b) Taxas c) Contribuições de melhoria

Teoria pentapartida ou quinquipartida Existem 5 espécies de tributos: a) Impostos b) Taxas c) Contribuições de melhoria d) Empréstimos compulsórios e) Contribuições especiais

O que são as taxas? A taxa é uma espécie de tributo paga pelo contribuinte em virtude de um serviço prestado pelo Poder Público ou em razão do exercício da atividade estatal de poder de polícia. Características Diz-se que a taxa é um tributo bilateral, contraprestacional, sinalagmático ou vinculado. Isso porque a taxa é um tributo vinculado a uma atividade estatal específica, ou seja, a Administração só pode cobrar se, em troca, estiver prestando um serviço público ou exercendo poder de polícia. Há, portanto, obrigações de ambas as partes. O poder público tem a obrigação de prestar o serviço ou exercer poder de polícia e o contribuinte a de pagar a taxa correspondente. Previsão A disciplina sobre as taxas está prevista no art. 145, II da CF/88 e no art. 77 do CTN. Quem pode instituir taxa? A União, os Estados, o DF e os Municípios. Trata-se de tributo de competência comum. A taxa será instituída de acordo com a competência de cada ente. Ex.: Município não pode instituir uma taxa pela emissão de passaporte, uma vez que essa atividade é de competência federal. Logo, a competência para a instituição das taxas está diretamente relacionada com as competências constitucionais de cada ente.

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Espécies de taxas As taxas podem ter dois fatos geradores:

o exercício regular do poder de polícia; ou

a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição (art. 77 do CTN).

Com base nisso, pode-se dizer que existem duas espécies de taxa:

taxa de polícia;

taxa de serviço. Base de cálculo das taxas Base de cálculo é o valor sobre o qual a alíquota irá incidir. Ex: a alíquota do tributo é de 5%. A base de cálculo é 1000 reais. Logo, o valor do tributo será 5% de 1000 reais (50 reais). A base de cálculo deve estar prevista na própria lei. Qual critério o legislador deve adotar para fixara base de cálculo das taxas? Vimos acima que a taxa é um tributo contraprestacional. Logo, sua base de cálculo deve estar relacionada com o custodo serviço ou do poder de polícia exercido. Vale ressaltar, no entanto, que não é necessário que a base de cálculo seja exatamente igual ao custo do serviço público prestado. A base de cálculo da taxa deve estar relacionada com o custo. Deve haver uma “equivalência razoável entre o custo real dos serviços e o montante a que pode ser compelido o contribuinte a pagar.” (Min. Moreira Alves, STF Rp 1077/RJ). Assim, o que não pode ocorrer é o valor da base de cálculo ser muito superior ao custo do serviço, uma vez que, nesse caso, haveria enriquecimento sem causa por parte do Estado ou até mesmo uma forma de confisco (STFADI 2551). TAXA DE POLÍCIA (TAXA DE FISCALIZAÇÃO)

Em que consiste a taxa de polícia? É a taxa instituída pelo poder público para custear a sua atuação no exercício efetivo do poder de polícia. Em outras palavras, é a taxa cobrada como contraprestação pelo fato de o Estado estar realizando uma atividade de fiscalização. O que é poder de polícia? Segundo o art. 78 do CTN, poder de polícia é...

uma atividade realizada pela administração pública

consistente em regular a prática de um ato ou a abstenção de fato,

limitando ou disciplinando direitos, interesses ou liberdades das pessoas

em benefício do interesse público (segurança, higiene, ordem etc.). Algumas vezes nas provas é cobrada a redação literal do art. 78, razão pela qual vale a pena a sua transcrição aqui:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

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Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

Exemplos de realização do poder de polícia: licença concedida pelo Município para construir segundo determinados critérios, licença para dirigir, licença para ter porte de arma, alvará de funcionamento de indústria etc. Exercício regular do poder de polícia Segundo explica Ricardo Alexandre, “só se pode cobrar taxa de polícia pelo efetivo exercício desse poder.” (Direito Tributário esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 27). No entanto, o STF considera que o simples fato de existir um órgão estruturado que exerça permanentemente atividade de fiscalização já permite a cobrança da taxa de polícia de todos quantos estejam sujeitos a essa fiscalização. Assim, admite-se a cobrança periódica de todas as pessoas que estejam sujeitas à fiscalização, tenham ou não sido concretamente fiscalizadas, desde que o órgão fiscalizador esteja estruturado e a atividade de fiscalização seja regularmente exercida. Ex: no caso da taxa de controle e fiscalização ambiental – TCFA, o STF decidiu que era legítima a exigência dessa taxa a ser paga pelas empresas potencialmente poluidoras, independentemente de sofrerem fiscalização efetiva (RE 416601, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, julgado em 10/08/2005). Exemplos de taxas de polícia

Taxa de alvará (de funcionamento ou localização): exigida pelos Municípios das pessoas que desejam construir imóveis. Toda construção feita deverá ser fiscalizada pelo poder público municipal para verificar se está de acordo com o plano diretor. Essa atividade de fiscalização é custeada pela taxa de alvará.

Taxa de fiscalização de anúncios: compete aos Municípios a fiscalização e controle das placas de publicidade que são instaladas nas cidades (ex.: outdoors). Essa atividade de fiscalização é custeada pela taxa de fiscalização de anúncios.

Taxa de controle e fiscalização ambiental – TCFA: exigida pelo IBAMA para custear o exercício regular do poder de polícia relacionado ao controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.

Taxa de fiscalização dos mercados de títulos e valores mobiliários: a Comissão de Valores Mobiliários é uma autarquia federal que fiscaliza o mercado de ações. Ao desempenhar essa atividade, realiza poder de polícia, sendo remunerada por meio da presente taxa. Sobre o tema, vale lembrar a Súmula 665 do STF: “É constitucional a Taxa de Fiscalização dos Mercados de Títulos e Valores Mobiliários instituída pela Lei 7.940/89”.

TAXA DE FISCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO

Taxa de fiscalização e funcionamento Compete aos Municípios definir as áreas da cidade onde poderão funcionar os estabelecimentos empresariais. Assim, por exemplo, o plano diretor pode determinar que em determinados bairros é proibido o funcionamento de estabelecimentos comerciais, sendo uma área exclusivamente residencial. Em outros casos, a lei municipal poderá dizer que determinada área da cidade é exclusiva para estabelecimentos comerciais, não admitindo indústrias etc. Em virtude disso, quando uma empresa pretende se instalar em determinado local, ela precisará obter do órgão municipal um alvará de localização e funcionamento, ou seja, um documento concedido pela Prefeitura autorizando o estabelecimento comercial naquela área. Esta é uma atividade do Município que pode ser enquadrada como exercício do “poder de polícia”. Logo, os Municípios, em geral, cobram uma taxa pelo seu desempenho.

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A previsão de uma fiscalização e funcionamento pelos Municípios é, em princípio, constitucional? SIM.

Nos termos da jurisprudência da Corte, a taxa de renovação de licença de funcionamento é constitucional, desde que haja o efetivo exercício do poder de polícia, o qual é demonstrado pela mera existência de órgão administrativo que possua estrutura e competência para a realização da atividade de fiscalização. STF. 1ª Turma. RE 856185 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 04/08/2015.

Base de cálculo dessa taxa de fiscalização e funcionamento Diversos Municípios do país instituíram essa taxa de fiscalização e funcionamento e previram, como base de cálculo, o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte. Ex1: se a empresa possuir até 10 funcionários, paga R$ 100,00; se ela tiver até 30, paga R$ 150,00 e assim por diante. Ex2: se a empresa for do ramo vestuário, paga R$ 100,00; se for do ramo de alimentação, paga R$ 150; se for indústria, paga R$ 300,00. Esse critério escolhido é constitucional? NÃO.

As taxas municipais de fiscalização e funcionamento não podem ter como base de cálculo o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte. STF. 2ª Turma. ARE 990914/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 20/6/2017 (Info 870).

O legislador municipal, ao escolher o número de empregados ou o ramo de atividade como critérios para fixar a base de cálculo, levou em consideração qualidades externas e estranhas ao exercício do poder de polícia, sem pertinência quanto ao aspecto material da hipótese de incidência. A taxa é tributo contraprestacional (vinculado), usado na remuneração de atividade específica, seja serviço ou exercício do poder de polícia e, por isso, não pode fixar a base de cálculo usando como critério sinais presuntivos de riqueza do contribuinte. O valor das taxas deve estar relacionado com o custo do serviço que as motiva, ou com a atividade de polícia desenvolvida. E se a lei municipal previsse que a base de cálculo dessa taxa está relacionada com a área (tamanho) do estabelecimento, este seria um critério legítimo? Ex: se a empresa tiver até 100m2, paga R$ 100; se tiver até 200m2, paga R$ 200 e assim por diante? Neste caso, a lei seria constitucional? SIM.

A taxa de fiscalização e funcionamento pode ter como base de cálculo a área de fiscalização, na medida em que traduz o custo da atividade estatal de fiscalização. Quando a Constituição se refere às taxas, o faz no sentido de que o tributo não incida sobre a prestação, mas em razão da prestação de serviço pelo Estado. A área ocupada pelo estabelecimento comercial revela-se apta a refletir o custo aproximado da atividade estatal de fiscalização. STF. 1ª Turma. RE 856185 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 04/08/2015.

Resumindo:

a taxa de fiscalização e funcionamento é constitucional;

a base de cálculo pode ser a área ocupada pelo estabelecimento comercial;

a base de cálculo não pode ser o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte.

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EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) (Promotor MP/AM 2007 CESPE) O Município possui competência legislativa concorrente para, juntamente

com os estados, legislar sobre florestas, caça e pesca, independentemente de interesse local. ( ) 2) O Município tem competência para legislar sobre meio ambiente e controle da poluição, quando se tratar

de interesse local. ( ) 3) (PGE/PE 2009 CESPE) O Município não está elencado no artigo constitucional que trata da competência

concorrente, mas pode legislar acerca do tema meio ambiente. ( ) 4) (Juiz TJDFT 2016 CESPE) A União detém competência privativa para legislar sobre jazidas, minas, caça,

pesca e atividades nucleares de qualquer natureza, nos termos da carta constitucional. ( ) 5) (Juiz Federal TRF5 2011 CESPE) É competência comum da União, dos estados, do DF e dos municípios

registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos minerais em seus territórios bem como legislar sobre jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia. ( )

6) (PGE/GO 2013) A medida provisória entrará em regime de urgência, se não apreciada em até 60 dias contados da publicação, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações. ( )

7) O art. 62, § 6º da CF/88 afirma que “se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando”. Apesar de o dispositivo falar em “todas as demais deliberações”, o STF, ao interpretar esse § 6º, não adotou uma exegese literal e afirmou que ficarão sobrestadas (paralisadas) apenas as votações de projetos de leis ordinárias que versem sobre temas que possam ser tratados por medida provisória. ( )

8) É constitucional lei municipal, regulamentada por decreto, que preveja a aplicação de multas para os proprietários de veículos automotores que emitem fumaça acima de padrões considerados aceitáveis. ( )

9) A colaboração premiada é um negócio jurídico processual entre o Ministério Público e o colaborador, sendo vedada a participação do magistrado na celebração do ajuste entre as partes. ( )

10) A decisão do magistrado que homologa o acordo de colaboração premiada não julga o mérito da pretensão acusatória, mas apenas resolve uma questão incidente. Por isso, esta decisão tem natureza meramente homologatória, limitando-se ao pronunciamento sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo. ( )

11) No ato de homologação da colaboração premiada, o magistrado pode, desde que de forma fundamentada, tecer juízo de valor sobre o conteúdo das cláusulas avençadas. ( )

12) Em caso colaboração premiada envolvendo investigados ou réus com foro no Tribunal, é atribuição do órgão colegiado homologar o acordo de colaboração premiada, analisando a sua regularidade, legalidade e voluntariedade. ( )

13) O acordo de colaboração devidamente homologado individualmente pelo relator deve, em regra, produzir seus efeitos diante do cumprimento dos deveres assumidos pelo colaborador. ( )

14) O acordo homologado como regular, voluntário e legal gera vinculação condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela colaboração, salvo ilegalidade superveniente apta a justificar nulidade ou anulação do negócio jurídico. ( )

15) As taxas municipais de fiscalização e funcionamento podem ter como base de cálculo o número de empregados ou ramo de atividade exercida pelo contribuinte. ( )

16) A taxa de fiscalização e funcionamento não pode ter como base de cálculo a área de fiscalização. ( ) Gabarito

1. E 2. C 3. C 4. E 5. E 6. E 7. C 8. C 9. C 10. C

11. E 12. E 13. C 14. C 15. E

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JULGADOS NÃO COMENTADOS Colaboração premiada: prevenção e conexão

Quanto à prevenção da relatoria, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou provimento ao agravo regimental. Inicialmente, o Plenário fez uma cronologia da tramitação dos feitos relacionados à operação Lava Jato. Registrou que, nos termos do art. 69 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), as ações e os recursos que tratam de fatos conexos ao objeto da Rcl 17.623/PR foram aglutinados sob a mesma relatoria, entre os quais figuram o Inq 3.883/PR e o Inq 4.112/DF, então distribuídos ao ministro Teori Zavascki. Em razão do falecimento do ministro e da posterior opção, por ato da ministra presidente Cármen Lúcia, para integrar a Segunda Turma do STF, o ministro Edson Fachin foi designado, por sorteio, como relator da aludida operação. A redistribuição dos feitos a sua relatoria foi materializada nos autos dos citados inquéritos; pois, à época, a Rcl 17.623/PR já estava arquivada, diante do trânsito em julgado da decisão de mérito. Por isso, tais inquéritos, desde então, vêm sendo utilizados como referência à distribuição por prevenção ao relator dos feitos relacionados à operação Lava Jato, importando afirmar que a correta delimitação do parâmetro de aferição das causas de modificação da competência (conexão e continência) deve ter por referência seus predecessores. Em seguida, o Colegiado teceu considerações acerca do instituto da colaboração premiada, necessárias ao correto desate da controvérsia quanto à prevenção. Nesse sentido, ressaltou que, no seio da avença, o colaborador presta declarações perante a autoridade policial e/ou o Ministério Público com vistas a um ou mais resultados elencados nos incisos do art. 4º da Lei 12.850/2013. Não raro, como ocorre na hipótese em análise, relata-se mais de um fato delituoso em contextos não necessariamente imbricados. Ponderou que, apesar de a Corte ter decidido, no Inq 4.130 QO/PR (DJE de 3.2.2016), que o juízo homologador do acordo não é, necessariamente, competente para o processamento de todos os fatos relatados, existindo, entretanto, entre esses episódios, ao menos um em que se verifique a presença de conexão com objeto de feito previamente distribuído, faz-se imperiosa a observância da regra prevista no art. 79, “caput”, do Código de Processo Penal (CPP), a demandar a distribuição por prevenção, nos exatos termos do art. 69, “caput”, do RISTF. Com efeito, verificada a existência de liame de natureza objetiva, subjetiva ou probatória entre o conteúdo de termos de depoimento prestados pelo colaborador e o objeto de investigação em curso, incumbe à autoridade judicial responsável pela supervisão do procedimento investigatório, por força da prevenção, homologar o acordo de colaboração celebrado e adotar, subsequentemente, as providências acerca de cada fato relatado. Tal conclusão resguarda o jurisdicionado dos efeitos da litispendência e da coisa julgada. O Colegiado frisou ser o juízo prevento o detentor de condições mais adequadas para analisar os pontos de contato entre as declarações dos colaboradores e as outras investigações em curso, impondo, se for o caso, a tramitação conjunta. Ressaltou que o pano de fundo da controvérsia está na homologação dos acordos de colaboração premiada celebrados entre integrantes de grupo empresarial e o Ministério Público Federal (MPF). Conforme requerimento ministerial na Pet 7.003/DF, no momento em que submetidos à homologação judicial, noticiou-se a existência, entre os termos de depoimento prestados, de fatos envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função no STF, entre os quais se identificaram procedimentos já distribuídos ao relator com objetos conexos. Salientou que, embora da narrativa exposta pelo MPF não seja possível constatar a prática de atos em detrimento da Petrobras S.A. — parâmetro inicialmente utilizado pela Corte para definir os limites da operação de repercussão nacional (Inq 4.130/PR) e, por conseguinte, a prevenção —, não se verifica qualquer mácula na distribuição do pedido de homologação dos acordos de colaboração. Lembrou, ademais, que a jurisprudência da Corte orienta-se no sentido de ser a fixação da competência de um ministro para relatar causas e recursos um assunto atinente à organização interna do Tribunal e,

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portanto, indisponível ao interesse das partes. Cuida-se de ato privativo da Presidência do STF, na qualidade de órgão supervisor da distribuição, e, como tal, de mero expediente, a atrair a incidência do art. 504 do Código de Processo Civil (CPC). Quanto ao caso em tela, afirmou que, conforme relatório da decisão proferida na Pet 7.003/DF em 18.5.2017, o colaborador, em seus termos de depoimento, relata, entre outros fatos, o sistema de conta-corrente que teria como beneficiário ex-parlamentar. Este, por sua vez, atuaria em favor de grupo empresarial em questões relativas a financiamentos da Caixa Econômica Federal (CEF), especialmente no âmbito do Fundo de Investimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FI-FGTS). O acordo de colaboração premiada submetido à homologação do STF, por conter menção a autoridades detentoras de foro por prerrogativa, demonstra evidente relação de conexidade com o objeto do Inq 4.266, deflagrado para apurar as condutas supostamente delituosas praticadas pelo então deputado federal em detrimento do FI-FGTS, administrado pela CEF. Considerou, ainda, que, embora o aludido inquérito tenha sido baixado ao primeiro grau de jurisdição, pois o investigado não mais ocupa o cargo que lhe garantia a prerrogativa de foro no STF, o art. 74, § 1º, do RISTF estabelece que “o inquérito ou a ação penal, que retornar ao Tribunal por restabelecimento da competência por prerrogativa de foro, será distribuído ao Relator original”. Em outras palavras, caso o investigado incorra em qualquer das situações jurídicas previstas no art. 102, I, “b” e “c”, da Constituição Federal (CF), os autos devem retornar ao ministro Edson Fachin, na qualidade de sucessor do ministro Teori Zavascki no que toca à cadeia de prevenção estabelecida com a distribuição da Rcl 17.623/DF. Por todas essas razões, o Plenário julgou não se verificar qualquer ilegalidade na distribuição por prevenção do pedido de homologação do acordo de colaboração premiada em análise, diante da evidente existência de fatos relatados conexos com investigações em curso sob a relatoria do ministro Edson Fachin. Entendeu não se poder falar, ainda, em violação ao princípio do juiz natural no tocante às providências adotadas na decisão proferida em 18.5.2017, relativamente às pessoas mencionadas nos depoimentos dos colaboradores e desprovidas de foro por prerrogativa na Suprema Corte. Constatado o envolvimento de alguma das autoridades elencadas no art. 102, I, “b” e “c”, da CF, cabe ao STF decidir, com exclusividade, sobre a permanência da investigação ou da ação penal deflagrada em desfavor das demais pessoas não submetidas à jurisdição criminal originária prevista no citado dispositivo constitucional, adotando-se, como regra, o desmembramento, salvo nas hipóteses em que a cisão possa causar prejuízo relevante. Desse modo, tendo em vista que os termos de depoimento prestados pelo colaborador fazem parte de um mesmo acordo de colaboração premiada, os fatos dos quais não há notícia de participação de autoridade detentora de foro por prerrogativa no STF, além daqueles em que não se observa qualquer relação de conexidade com investigações ou ações penais em curso, devem ser encaminhados para tratamento adequado perante a autoridade jurisdicional competente. Na hipótese em concreto, tendo em conta que o agravante atualmente ocupa o cargo de governador do Estado do Mato Grosso do Sul e que os fatos a ele relacionados não se afiguram conexos com quaisquer investigações ou ações penais em curso no STF, o relator autorizou o procurador-geral da República a utilizar os respectivos termos de depoimento perante o Superior Tribunal de Justiça, órgão do Poder Judiciário competente, nos termos do art. 105, I, “a”, da CF, para o adequado tratamento dos fatos em observância às garantias constitucionais aplicáveis. Por fim, concluiu não haver qualquer mácula no procedimento adotado na Pet 7.003/DF, seja na sua distribuição por prevenção, seja nas providências deferidas na decisão de 18.5.2017. Pet 7074 QO/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074) Pet 7074/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 21, 22, 28 e 29.6.2017. (Pet-7074)

Prisão preventiva e destruição de provas

A Primeira Turma, por maioria, deu parcial provimento a agravos regimentais em que se discutiu a revogação de prisão preventiva de acusados do cometimento dos delitos de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, constituição e participação em organização criminosa e obstrução à investigação de organização criminosa.

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De acordo com a decisão agravada, senador da república, com o auxílio de sua irmã, de seu primo e de assessor de outro senador, supostamente recebeu dinheiro espúrio. Segundo a deliberação, há indicativos da prática de lavagem dos valores e estabilidade na associação dos investigados para a realização de atividades delituosas múltiplas. Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux, que deu provimento ao agravo para substituir a prisão preventiva dos agravantes por prisão domiciliar. O ministro também determinou que se proibisse o contato dos investigados entre si, que se exigisse a entrega dos seus passaportes e se monitorassem eletronicamente todos eles. Ainda segundo o ministro, é possível que a atuação livre dos partícipes possa influir na instrução probatória futura. Porém, isso não foi objeto da decretação de prisão. Verificou, além disso, não haver elementos caracterizadores da destruição das provas no tocante ao delito de corrupção e ressaltou existirem indícios para julgar a ação penal quanto a esse delito. Afirmou que os crimes conexos são julgados simultaneamente, mas não há ainda denúncia oferecida. Concluiu que as medidas propostas são explícitas no sentido de inibir toda e qualquer forma de intromissão na produção da prova dos demais delitos. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deu provimento aos agravos para que houvesse a imediata expedição de alvará de soltura em favor dos agravantes. Além disso, seria impróprio considerar a gravidade concreta da imputação. Não existe a segregação automática tendo em conta o delito eventualmente cometido, levando à inversão da ordem do processo-crime, que direciona, presente o princípio da não culpabilidade, a apurar para, selada a culpa, prender. Em relação à reiteração delitiva e ao embaralhamento da investigação, é necessário haver dados concretos e individualizados, a demonstrar a indispensabilidade da custódia para a decretação da prisão preventiva. Vencidos, também, os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, que negaram provimento aos agravos. Para eles, a decisão em que se decretou a prisão preventiva dos agravantes está devidamente fundamentada. Reputaram não haver dúvidas quanto à autoria e à materialidade. Por fim, esclareceram que a decisão agravada demonstrou a habitualidade delituosa dos agravantes e a possibilidade de virem a embaralhar a justiça. AC 4327 AgR/DF-segundo, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017. AC 4327 AgR/DF-quarto, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017. AC 4327 AgR/DF-sexto, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 20.6.2017.

OUTRAS INFORMAÇÕES

CLIPPING DA R E P E R C U S S Ã O G E R A L DJe de 19 a 30 de junho de 2017

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 632.115 - CE RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR ATOS PROTEGIDOS POR

IMUNIDADE PARLAMENTAR. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. A decisão recorrida reconheceu a responsabilidade civil objetiva do Estado e

condenou o ente público ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes de atos protegidos por imunidade parlamentar. 2. Constitui

questão constitucional relevante definir se a inviolabilidade civil e penal assegurada aos parlamentares, por suas opiniões, palavras e votos, afasta a

responsabilidade civil objetiva do Estado, prevista no art. 37, § 6º, da Constituição. 3. Repercussão Geral reconhecida.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 1.013.583 - PR RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRAZO DECADENCIAL PARA REVISÃO DE BENEFÍCIO DERIVADO. AUSÊNCIA

DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. O acórdão recorrido entendeu que o prazo decadencial para a revisão de pensão por morte, derivada de outro

benefício previdenciário, deve ser contado da concessão da pensão, e não do benefício originário, devido à teoria da actio nata. 2. A revisão dessa

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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 26

conclusão pressupõe a análise de legislação infraconstitucional atinente à legitimidade e ao interesse em agir, bem como uma releitura do art. 103

da Lei nº 8.213/1991, o que revela o caráter infraconstitucional da discussão. 3. Afirmação da seguinte tese: não tem repercussão geral a

controvérsia relativa à definição do termo inicial do prazo decadencial para a revisão de benefício de pensão por morte derivado de outro benefício

previdenciário. 4. Recurso não conhecido.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 1.034.840 - DF RELATOR: MIN. LUIZ FUX

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ORGANISMO INTERNACIONAL. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS ONU. PROGRAMA DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO PNUD. CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS NAÇÕES UNIDAS DECRETO 27.784/1950.

CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS DAS NAÇÕES UNIDAS DECRETO 52.288/1963. ACORDO BÁSICO DE

ASSISTÊNCIA TÉCNICA COM AS NAÇÕES UNIDAS E SUAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS DECRETO 59.308/1966. IMPOSSIBILIDADE DE O ORGANISMO

INTERNACIONAL VIR A SER DEMANDADO EM JUÍZO, SALVO EM CASO DE RENÚNCIA EXPRESSA À IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. ENTENDIMENTO

CONSOLIDADO EM PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.

Decisões Publicadas: 3

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada

do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam

despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

‘Habeas Corpus’ – Liberdade de locomoção física – Ausência – Impossibilidade de convolação do HC em Mandado de

Segurança (Transcrições)

HC 145.445-MC/DF*

Relator: Ministro Celso de Mello

EMENTA: “HABEAS CORPUS”. MAGISTRADO DO TRABALHO. PRETENDIDO AFASTAMENTO REMUNERADO PARA PRESIDIR ENTIDADE DE ÂMBITO INTERNACIONAL. PEDIDO INDEFERIDO PELO E. TRT/6ª REGIÃO. INAPLICABILIDADE

DO ART. 73, III, DA LOMAN (NA REDAÇÃO DADA PELA LC Nº 60/1989). DECISÃO MANTIDA PELO CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA EM SEDE DE PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. IMPETRAÇÃO DE “HABEAS CORPUS”. INADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DANO ATUAL OU DE LESÃO POTENCIAL À LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO FÍSICA DO

PACIENTE. PRECEDENTES. A EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL QUE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

DISPENSOU, AO LONGO DE SUA TRAJETÓRIA REPUBLICANA, AO REMÉDIO CONSTITUCIONAL DO “HABEAS CORPUS”. PEDRO LESSA E ENÉAS GALVÃO. A INTERVENÇÃO DO ADVOGADO RUI BARBOSA. DOUTRINA BRASILEIRA DO “HABEAS

CORPUS”. A REFORMA CONSTITUCIONAL DE 1926 (PRESIDÊNCIA ARTUR BERNARDES). INVIABILIDADE DE

CONVOLAÇÃO DA AÇÃO DE “HABEAS CORPUS” EM AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. “HABEAS CORPUS” IMPETRADO, EM NOME PRÓPRIO, PELOS ADVOGADOS DO PACIENTE. AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO ATIVA “AD CAUSAM”

DOS ADVOGADOS, NÃO OBSTANTE QUALIFICADOS PARA IMPETRAÇÃO DE “HABEAS CORPUS”, PARA, EM SEU PRÓPRIO

NOME, AJUIZAREM, NA CONDIÇÃO DE SUBSTITUTOS PROCESSUAIS, MANDADO DE SEGURANÇA DESTINADO À PROTEÇÃO JURISDICIONAL DE DIREITO SUBJETIVO ALEGADAMENTE TITULARIZADO POR TERCEIRA PESSOA, O ORA PACIENTE (RTJ

179/210-211, v.g.). PRECEDENTES ESPECÍFICOS. MAGISTÉRIO DA DOUTRINA. “HABEAS CORPUS” NÃO CONHECIDO.

DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra deliberação que, emanada do E. Conselho Nacional de Justiça, acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado:

“PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. ATO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO

(PE). INDEFERIMENTO DO AFASTAMENTO REMUNERADO DE MAGISTRADO. PRESIDÊNCIA DE ENTIDADE NÃO

ABRANGIDA NA DEFINIÇÃO ESTRITA DE ‘ASSOCIAÇÃO DE CLASSE’ CONSTANTE DO ART. 73, III, DA LOMAN.

NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO RESTRITA. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO EM DETRIMENTO DOS

INTERESSES PRIVADOS DA PARTE E DA ENTIDADE. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NO ATO. PEDIDO JULGADO

IMPROCEDENTE.

1. Indeferimento pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE) de pedido de afastamento remunerado de juiz do trabalho para presidir associação por não se tratar de entidade que se enquadre na definição de ‘associação de classe’, em virtude do

âmbito internacional e de sua natureza. Decisão impugnada por procedimento de controle administrativo.

2. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) comporta interpretação restrita sobre a natureza das associações que se enquadram na exceção do inciso III do art. 73 para o efeito de assegurar afastamento remunerado pelo erário ao magistrado, o que

não constitui restrição a direitos constitucionais de liberdade de associação.

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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 27

3. Na gestão judiciária, deve prevalecer o interesse público na perspectiva da efetividade da prestação jurisdicional em

detrimento do interesse privado do magistrado ou da gestão de entidades associativas.

4. Procedimento de controle administrativo julgado improcedente.” (grifei)

Busca-se, na presente sede processual, “(...) seja concedida a ordem de ‘habeas corpus’, sustando-se definitivamente o constrangimento ilegal sofrido pelo Paciente oriundo da decisão ora questionada, de modo a que seja autorizado, sempre que necessário, seu afastamento das funções

jurisdicionais perante a 12ª Vara do Trabalho de Recife – PE, em prol do exercício pleno da presidência da ALJT até o final de seu mandato (novembro

de 2018)” (grifei). Sendo esse o contexto, passo a apreciar questão pertinente à admissibilidade, na espécie, deste “writ” constitucional.

Tenho para mim que se revela processualmente inviável a presente impetração, por tratar-se de matéria insuscetível de exame em sede de

“habeas corpus”, notadamente porque o pretendido afastamento remunerado do paciente das suas funções jurisdicionais não se confunde com o exercício do direito de ir e vir, cuja proteção é ora pleiteada nesta sede mandamental.

Como se sabe, a ação de “habeas corpus” destina-se, unicamente, a amparar a imediata liberdade de locomoção física das pessoas, revelando-

se estranha à sua específica finalidade jurídico-constitucional qualquer pretensão que vise a desconstituir atos que não se mostrem ofensivos, ainda que potencialmente, ao direito de ir, de vir e de permanecer das pessoas.

É por tal razão que o Supremo Tribunal Federal, atento à destinação constitucional do “habeas corpus”, não tem conhecido do remédio heroico,

quando utilizado, como no caso, em situações de que não resulte qualquer possibilidade de ofensa ao “jus manendi, ambulandi, eundi ultro citroque” (RTJ 116/523 – RTJ 141/159, v.g.), mesmo porque a deliberação ora impugnada restringiu-se à denegação “de pedido de afastamento remunerado”,

matéria que, por evidente, não envolve qualquer cerceamento ao direito de ir, de vir ou de permanecer do magistrado interessado.

Na realidade, eventual lesão ao pretendido afastamento remunerado, caso este pudesse ser considerado como direito líquido e certo de qualquer magistrado (LC nº 35/79, art. 73, III), seria reparável, ao menos em tese, mediante utilização de mandado de segurança, constitucionalmente

vocacionado “a proteger direito líquido e certo, não amparado por ‘habeas corpus’ ou ‘habeas data’” (CF, art. 5º, inciso LXIX).

Como enfatizado, a recusa, por instâncias administrativas do Poder Judiciário, do direito vindicado pelo paciente motivou a impetração da presente ordem de “habeas corpus”, deduzida com o objetivo de viabilizar a obtenção, por referido magistrado, do afastamento remunerado de suas

atividades jurisdicionais no Brasil, cuja autorização – segundo ora sustentado – fundamentar-se-ia no art. 73, inciso III, da Lei Orgânica da Magistratura

Nacional. Esse, portanto, é o direito-fim (afastamento funcional remunerado) visado pelo ora paciente, cuja liberdade de locomoção física – insista-se

– não se acha coarctada, nem mesmo remotamente, pelo simples fato de o magistrado em questão poder locomover-se, com absoluta liberdade, no

País ou fora dele! A única concessão que tem sido feita pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que considera idôneo, para tanto, o remédio

constitucional do “habeas corpus”, reside nas hipóteses em que o paciente esteja a sofrer injusto constrangimento de ordem processual no curso de

persecução criminal (HC 94.016/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), caso em que esse “writ” constitucional terá inteira pertinência para preservar os direitos do investigado, do indiciado, do réu e/ou do sentenciado no contexto de procedimentos penais-persecutórios contra ele instaurados,

situação, por óbvio, de todo inocorrente, na espécie, em relação ao ora paciente.

Cabe acentuar, por relevante, tal como advertiu o eminente Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, que, na situação que venho de referir, “Não

se trata (…) de fazer reviver a ‘doutrina brasileira do ‘habeas corpus’’, mas, sim, de dar efetividade máxima ao remédio constitucional contra a

ameaça ou a coação da liberdade de ir e vir, que não se alcançaria, se limitada a sua admissibilidade às hipóteses da prisão consumada ou iminente” (HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei), eis que a admissibilidade desse “writ” constitucional mostrar-se-á viável, sempre,

não obstante meramente potencial a ofensa ao direito de ir, vir ou permanecer do paciente, naqueles casos em que contra ele for instaurada a pertinente

“persecutio criminis”:

“I. ‘Habeas corpus’: admissibilidade: decisão judicial que, no curso do inquérito policial, autoriza quebra de sigilo bancário. Se se trata de processo penal ou mesmo de inquérito policial, a jurisprudência do STF admite o ‘habeas corpus’, dado que de um ou

outro possa advir condenação a pena privativa de liberdade, ainda que não iminente, cuja aplicação poderia vir a ser viciada pela ilegalidade

contra o qual se volta a impetração da ordem. Nessa linha, não é de recusar a idoneidade do ‘habeas corpus’, seja contra o indeferimento de prova de interesse do réu ou indiciado,

seja, o deferimento de prova ilícita ou o deferimento inválido de prova lícita: nessa última hipótese, enquadra-se o pedido de ‘habeas corpus’

contra a decisão – alegadamente não fundamentada ou carente de justa causa – que autoriza a quebra do sigilo bancário do paciente (…).” (HC 79.191/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)

A ação de “habeas corpus”, portanto, enquanto remédio jurídico-constitucional revestido de finalidade específica, não pode ser utilizada como

sucedâneo de outras ações judiciais, notadamente naquelas hipóteses em que o direito-fim (ou direito-escopo, na expressão feliz de PEDRO LESSA) não se

identifica – tal como neste caso ocorre (em que se impugna a denegação de afastamento funcional remunerado) – com a própria liberdade de locomoção

física.

É que entendimento diverso conduziria, necessariamente, à descaracterização desse instrumento tutelar da liberdade de locomoção. Não se

pode desconhecer que, com a cessação da doutrina brasileira do “habeas corpus”, motivada pela Reforma Constitucional de 1926, restaurou-se, em nosso sistema jurídico, a função clássica desse remédio heroico. Por tal razão, não se revela suscetível de conhecimento a ação de “habeas corpus”,

quando promovida contra ato (ou omissão) estatal de que não resulte, de modo imediato, ofensa, atual ou iminente, à liberdade de locomoção física

(RTJ 135/593 – RTJ 136/1226 – RTJ 142/896 – RTJ 152/140 – RTJ 178/1231 – RTJ 180/962 – RTJ 197/587-588, v.g.):

“A função clássica do ‘habeas corpus’ restringe-se à estreita tutela da imediata liberdade de locomoção física das pessoas. – A ação de ‘habeas corpus’ – desde que inexistente qualquer situação de dano efetivo ou de risco potencial ao ‘jus manendi,

ambulandi, eundi ultro citroque’ – não se revela cabível, mesmo quando ajuizada para discutir eventual nulidade do processo penal

em que proferida decisão condenatória definitivamente executada. Esse entendimento decorre da circunstância histórica de a Reforma Constitucional de 1926 – que importou na cessação da

doutrina brasileira do ‘habeas corpus’ – haver restaurado a função clássica desse extraordinário remédio processual, destinando-o,

quanto à sua finalidade, à específica tutela jurisdicional da imediata liberdade de locomoção física das pessoas. Precedentes.”

(RTJ 186/261-262, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Cabe fazer aqui um pequeno registro histórico concernente ao tratamento jurisprudencial que esta Suprema Corte conferiu ao remédio do

“habeas corpus” ao longo de nossa primeira Constituição republicana.

Foi no Supremo Tribunal Federal que se iniciou, sob a égide da Constituição republicana de 1891, o processo de construção jurisprudencial da doutrina brasileira do “habeas corpus”, que teve, nesta Corte, como seus principais formuladores, os eminentes Ministros PEDRO LESSA e

ENÉAS GALVÃO.

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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 28

A origem dessa formulação doutrinária reside, como sabemos, nos julgamentos que, proferidos no célebre “Caso do Conselho Municipal do

Distrito Federal”, ampliaram, de modo significativo, o âmbito de incidência protetiva do remédio constitucional do “habeas corpus”.

Refiro-me aos julgamentos plenários que esta Suprema Corte proferiu em 08/12/1909 (RHC 2.793/DF, Rel. Min. CANUTO SARAIVA), em

11/12/1909 (HC 2.794/DF, Rel. Min. GODOFREDO CUNHA) e em 15/12/1909 (HC 2.797/DF, Rel. Min. OLIVEIRA RIBEIRO, e RHC 2.799/DF,

Rel. Min. AMARO CAVALCANTI), além daquele que resultou na concessão, em 25/01/1911, do HC 2.990/DF, Rel. Min. PEDRO LESSA.

As decisões proferidas em mencionados julgamentos revestem-se de aspecto seminal no que concerne ao próprio “corpus” doutrinário que se

elaborou, naquele particular momento histórico, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, no contexto da teoria brasileira do “habeas corpus”,

cuja incidência permitia, como já assinalado, o amparo jurisdicional de outros direitos, que não apenas o direito de ir, vir e permanecer, desde que

aqueles outros direitos guardassem relação de dependência com a liberdade de locomoção física do indivíduo ou tivessem por fundamento ou pressuposto a prática dessa mesma liberdade, tal como claramente expôs, em clássica monografia (“Do Poder Judiciário”, p. 285/287, § 61, 1915,

Francisco Alves), o eminente Ministro PEDRO LESSA:

“Algumas vezes, entretanto, a ilegalidade de que se queixa o paciente não importa a completa privação da liberdade individual. Limita-

se, a coação ilegal a ser vedada, unicamente à liberdade individual, ‘quando esta tem por fim próximo o exercício de um determinado direito’. Não está o paciente preso, nem detido, nem exilado, nem ameaçado de imediatamente o ser. Apenas o impedem de ir, por exemplo, a uma

praça pública, onde se deve realizar uma reunião com intuitos políticos; a uma casa comercial, ou a uma fábrica, na qual é empregado; a uma

repartição pública, onde tem de desempenhar uma função, ou promover um interesse; à casa em que reside, ao seu domicílio. .......................................................................................................

Pouco importa a espécie de direitos que o paciente precisa ou deseja exercer. Seja-lhe necessária a liberdade de locomoção para pôr

em prática um direito de ordem civil, ou de ordem comercial, ou de ordem constitucional, ou de ordem administrativa, deve ser-lhe concedido o ‘habeas-corpus’, sob a cláusula exclusiva de ser juridicamente indiscutível este último direito, o direito escopo. Para recolher à casa paterna

o impúbere transviado, para fazer um contrato ou um testamento, para receber um laudêmio, ou para constituir uma hipoteca; para exercitar

a indústria de transporte, ou para protestar uma letra; para ir votar, ou para desempenhar uma função política eletiva; para avaliar um prédio e coletá-lo, ou para proceder ao expurgo higiênico de qualquer habitação; se é necessário garantir a um indivíduo a liberdade de locomoção,

porque uma ofensa, ou uma ameaça, a essa liberdade foi embaraço a que exercesse qualquer desses direitos, não lhe pode ser negado ‘habeas-

corpus’. (...).” (grifei)

Como salientado, a jurisprudência que se consolidou no Supremo Tribunal Federal ao longo da Constituição de 1891 até a Reforma de 1926 contemplava a possibilidade de utilização do remédio constitucional do “habeas corpus” mesmo naqueles casos em que a liberdade de ir, vir e

permanecer pudesse ser afetada de modo reflexo por atos estatais supostamente abusivos ou ilegais (Revista Forense 34/505 – RF 36/192 – RF

38/213 – RF 45/183, v.g.):

“O ‘habeas-corpus’ é remédio legal para garantir a cidadão membro do poder legislativo municipal o livre exercício dos seus cargos políticos.”

(RF 22/306, Rel. Min. MANOEL MURTINHO – grifei)

Vale mencionar, neste ponto, como registro histórico, que o Ministro ENÉAS GALVÃO, tal como relembrado por LÊDA BOECHAT

RODRIGUES (“História do Supremo Tribunal Federal”, vol. III/33-35, 1991, Civilização Brasileira), aprofundou, ainda mais, a discussão em torno

do alcance do “habeas corpus”, sustentando – para além do que preconizava PEDRO LESSA – que esse remédio constitucional deveria ter campo de incidência

muito mais abrangente, em ordem a proteger outros direitos, mesmo que estes não tivessem por fundamento o exercício da liberdade de locomoção física, tal como o evidencia decisão emanada desta Corte Suprema consubstanciada em acórdão assim ementado:

“O ‘habeas-corpus’, conforme o preceito constitucional, não se restringe a garantir a liberdade individual, contra a prisão ou ameaça

de prisão ilegais, ampara, também, outros direitos individuais contra o abuso ou violência da autoridade.

Em casos semelhantes ao atual, o Tribunal tem concedido o ‘habeas-corpus’ para garantir a posse e exercício de Vereador eleito, impedido pela autoridade de exercitar o cargo (...).”

(HC 3.983/MG, Rel. Min. CANUTO SARAIVA – grifei)

É importante relembrar, ainda, a decisiva participação de RUI BARBOSA nesse processo de construção hermenêutica que resultou na

elaboração da doutrina brasileira do “habeas corpus”. O grande Advogado e jurisconsulto baiano, em discurso parlamentar proferido no Senado da República, na sessão de 22/01/1915 (“Obras

Completas de Rui Barbosa”, vol. XLII (1915), tomo II/89-161, 1981, MEC/Fundação Casa de Rui Barbosa), procedeu, de maneira bastante eloquente,

em seu último pronunciamento a propósito da intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, a uma ampla análise do que significou, para o País e

para o regime das liberdades constitucionais, a formulação, pelo Supremo Tribunal Federal, da doutrina brasileira do “habeas corpus”.

Vale insistir, no entanto, considerada a cessação da doutrina brasileira do “habeas corpus”, cuja formulação jurisprudencial resultou de

uma brilhante construção realizada pelo Supremo Tribunal Federal, que o “habeas corpus”, em sua condição de instrumento de ativação da jurisdição

constitucional das liberdades, configura um poderoso meio de cessação do injusto constrangimento ao estado de liberdade de locomoção física das

pessoas. Se essa liberdade não se expõe a qualquer tipo de cerceamento, e se o direito de ir, vir ou permanecer sequer se revela ameaçado, nada

justifica o emprego do remédio heroico do “habeas corpus”, por não estar em causa a liberdade de locomoção física:

“CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. ‘HABEAS CORPUS’: CABIMENTO. C.F., art. 5º, LXVIII.

I. – O ‘habeas corpus’ visa a proteger a liberdade de locomoção – liberdade de ir, vir e ficar – por ilegalidade ou abuso de

poder, não podendo ser utilizado para proteção de direitos outros. C.F., art. 5º, LXVIII.

II. – ‘H.C.’ indeferido, liminarmente. Agravo não provido.” (HC 82.880-AgR/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Pleno – grifei)

Impende reafirmar, desse modo, que esse remédio constitucional, considerada a sua específica destinação tutelar, tem por finalidade

amparar, em sede jurisdicional, “única e diretamente, a liberdade de locomoção. Ele se destina à estreita tutela da imediata liberdade física de ir e vir

dos indivíduos (...)” (RTJ 66/396 – RTJ 177/1206-1207 – RTJ 197/587-588 – RT 338/99 – RT 423/327 – RF 213/390 – RF 222/336 – RF 230/280, v.g.). Não foi por outro motivo que o Supremo Tribunal Federal, em situações nas quais se controvertia em torno do afastamento de cargo público,

reputou inadmissível a utilização do remédio constitucional do “habeas corpus”, considerando, para tanto, a distinção, a que anteriormente me

referi, entre direito-meio e direito-fim (HC 76.605/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – HC 99.829/RJ, Rel. Min. GILMAR MENDES – HC

107.423-AgR/TO, Rel. Min. ROBERTO BARROSO – HC 110.537- -AgR/DF, Rel. Min. ROBERTO BARROSO – HC 125.958-AgR/SC, Rel. Min.

CELSO DE MELLO – HC 138.540-MC/AP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):

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Informativo comentado

Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 29

“I. – O afastamento do paciente do cargo de Prefeito Municipal não autoriza a impetração de ‘habeas corpus’, porquanto não põe em

risco a sua liberdade de locomoção. É que o ‘habeas corpus’ visa a proteger a liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, não

podendo ser utilizado para proteção de direitos outros. II. – ‘H.C.’ não conhecido.”

(HC 84.816/PI, Rel. Min. CARLOS VELLOSO – grifei)

“1. O ‘habeas corpus’ deve ser utilizado ‘sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua

liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder’ (art. 5º, LXVIII, da CF/88). 2. Não cabe ‘habeas corpus’ para questionar decisão de Tribunal de Justiça que determina o afastamento cautelar do paciente do exercício de função pública. Precedentes. (…).”

(HC 119.214/RJ, Red. p/ o acórdão Min. ROBERTO BARROSO – grifei)

Finalmente, torna-se insuscetível de invocação o princípio da fungibilidade das formas processuais, com a finalidade de obter-se a convolação

da presente ação de “habeas corpus” em ação de mandado de segurança. É que este “habeas corpus”, embora inadequado quanto à sua utilização, foi impetrado, em nome próprio, como o permite o ordenamento

positivo, pelos ilustres Advogados do magistrado em questão, que nele figura como paciente, em razão de o remédio constitucional do “habeas

corpus” – por qualificar-se como típica ação penal popular (RT 718/518 – RTJ 164/193, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) – ser ajuizável “por

qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem (…)” (CPP, art. 654, “caput” – grifei).

O mandado de segurança, por sua vez, ao contrário do que sucede com a ação de “habeas corpus”, não admite, em regra, a substituição

processual, ressalvada a hipótese – inocorrente na espécie – prevista no art. 3º da Lei nº 12.016/2009, de todo inaplicável ao caso ora em exame. Cumpre assinalar que o entendimento que venho de expor encontra apoio em autorizado magistério doutrinário (HELY LOPES MEIRELLES,

ARNOLDO WALD e GILMAR FERREIRA MENDES, “Mandado de Segurança e Ações Constitucionais”, p. 36, item n. 4, 35ª ed., 2013, Malheiros;

HUMBERTO THEODORO JUNIOR, “Curso de Direito Processual Civil”, vol. I/267-269, item n. 185, 56ª ed., 2015, Forense; CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, “Instituições de Direito Processual Civil”, volume II/120-121, item n. 440, 6ª ed., 2009, Malheiros; VICENTE GRECO FILHO,

“Direito Processual Civil Brasileiro”, vol. I/78, item n. 14, 17ª ed., 2003, Saraiva, v.g.), cujas lições fazem incidir, em situações como a dos autos,

a norma restritiva fundada no art. 18, “caput”, do novo CPC, de conteúdo essencialmente idêntico ao do art. 6º do ora revogado CPC/73. Impende registrar, ainda, que essa orientação – impossibilidade da legitimação anômala ou extraordinária, por substituição processual, fora

das hipóteses previstas em lei – tem o beneplácito da jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria ora em análise (RTJ 130/108,

Rel. Min. CÉLIO BORJA – MS 22.444/SP, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – MS 34.102-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):

“Mandado de segurança. Legitimidade ativa. O mandado de segurança pressupõe a existência de direito próprio do impetrante. Somente pode socorrer-se dessa especialíssima ação

o titular do direito, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade. A ninguém é dado pleitear, em nome próprio, direito

alheio, salvo quando autorizado por lei (art. 6º do CPC). Não obstante a gravidade das alegações, evidente é a ilegitimidade do postulante e a falta de interesse processual.

Pedido não conhecido.”

(RTJ 110/1026, Rel. Min. DJACI FALCÃO – grifei)

“Mandado de Segurança. Direito subjetivo. Interesse. Descabe o mandado de segurança quando o impetrante não tem em vista a defesa de direito subjetivo, mas a de mero interesse reflexo

de normas objetivas. Precedentes e doutrina. (…).” (RTJ 120/328, Rel. Min. FRANCISCO REZEK – grifei)

“Mandado de segurança. Legitimidade ativa: inexistência.

O mandado de segurança é medida judicial que só pode ser utilizada para defesa de direito próprio e direito do impetrante, e não para

defender direito potencial, e que apenas poderia eventualmente surgir se afastado aquele a quem o ato apontado como ilegal iria atingir. (…).” (RTJ 120/816, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO – grifei)

“Mandado de Segurança. Não cabe se o ato contra o qual é impetrado não fere direito líquido e certo do impetrante. A ninguém é

dado pleitear em nome próprio direito alheio, salvo quando autorizado por Lei (CPC, art. 6º).

Impetração não conhecida.” (RTJ 128/1138, Rel. Min. CARLOS MADEIRA – grifei)

“Mandado de segurança requerido pelo Impetrante, na qualidade de cidadão brasileiro, contra ato de Comissão da Câmara dos

Deputados, tendente a possibilitar a adoção da pena de morte, mediante consulta plebiscitária.

Falta de legitimidade ativa do Requerente, por falta de ameaça concreta a direito individual, particularizado em sua pessoa.”

(RTJ 139/783, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – grifei)

“– O autor da ação de mandado de segurança individual não pode pleitear, em nome próprio, a tutela jurisdicional de direito público

subjetivo alheio, salvo quando autorizado por lei (CPC, art. 6º). O impetrante do mandado de segurança individual, por não dispor de

legitimação extraordinária para agir, não pode invocar a proteção jurisdicional do Estado em favor da generalidade dos participantes de um

determinado concurso público.” (RTJ 179/210-211, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

“MANDADO DE SEGURANÇA (…) – AJUIZAMENTO, EM NOME PRÓPRIO, DE AÇÃO MANDAMENTAL OBJETIVANDO A

PROTEÇÃO DE DIREITO ALHEIO (…) – INADMISSIBILIDADE – CARÁTER EXCEPCIONAL DA LEGITIMAÇÃO ATIVA

EXTRAORDINÁRIA OU ANÔMALA (CPC, ART. 6º) – INOCORRÊNCIA, NO CASO, DA HIPÓTESE EXCEPCIONAL A QUE SE REFERE O ART. 3º DA LEI Nº 12.016/2009 – PRECEDENTES – DOUTRINA (…) – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.”

(MS 33.844-MC-AgR/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)

Essa, pois, a razão da impossibilidade de conversão, na espécie, do “habeas corpus” em mandado de segurança.

Sendo assim, e pelas razões expostas, não conheço da presente ação de “habeas corpus”, restando prejudicado, em consequência, o exame

do pedido de medida liminar.

Arquivem-se estes autos.

Publique-se.

Brasília, 30 de junho de 2017.

Ministro CELSO DE MELLO

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Informativo 870-STF (07/07/2017) –Márcio André Lopes Cavalcante | 30

Relator

* decisão publicada no DJE em 30.6.2017.

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 19 A 30 DE JUNHO DE 2017

Lei nº 13.451, de 16.6.2017 - Dispõe sobre a competência da Superintendência da Zona Franca de

Manaus (Suframa) para regular e controlar a importação e o ingresso de mercadorias, com incentivos fiscais,

na Zona Franca de Manaus, nas áreas de livre comércio e na Amazônia Ocidental e institui a Taxa de Controle

de Incentivos Fiscais (TCIF) e a Taxa de Serviços (TS). Publicada no DOU em 19.6.2017, Seção 1, Edição nº

115, p.2.

Lei nº 13.452, de 19.6.2017 - Altera os limites do Parque Nacional do Jamanxim e cria a Área de

Proteção Ambiental Rio Branco. Publicada no DOU em 20.6.2017, Seção 1, Edição nº 116, p.1.

Lei nº 13.454, de 23.6.2017 - Autoriza a produção, a comercialização e o consumo, sob prescrição

médica, dos anorexígenos sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol. Publicada no DOU em

26.6.2017, Seção 1, Edição nº 120, p.1

Lei nº 13.455, de 26.6.2017 - Dispõe sobre a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao

público em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado, e altera a Lei no 10.962, de 11 de

outubro de 2004. Publicada no DOU em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.6

Lei nº 13.456 de 26.6.2017 - Altera o Programa de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de

2015, para denominá-lo Programa Seguro-Emprego e para prorrogar seu prazo de vigência. Publicada no DOU

em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.1

Lei nº 13.457, de 26.6.2017 - Altera as Leis nos 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os

Planos de Benefícios da Previdência Social, e 11.907, de 2 de fevereiro de 2009, que dispõe sobre a

reestruturação da composição remuneratória da Carreira de Perito Médico Previdenciário e da Carreira de

Supervisor Médico-Pericial; e institui o Bônus Especial de Desempenho Institucional por Perícia Médica em

Benefícios por Incapacidade. Publicada no DOU em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.2

Lei nº 13.459, de 26.6.2017 - Altera a Lei no 12.086, de 6 de novembro de 2009, que dispõe sobre os

militares da Polícia Militar do Distrito Federal e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal. Publicada

no DOU em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.3

Lei nº 13.460, de 26.6.2017 - Dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos

serviços públicos da administração pública. Publicada no DOU em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.4

OUTRAS INFORMAÇÕES 19 A 30 DE JUNHO DE 2017

Decreto de 22.6.2017 - Altera o Decreto de 2 de julho de 2008, que cria o Comitê de Desenvolvimento

do Programa Nuclear Brasileiro. Publicado no DOU em 23.6.2017, Seção 1, Edição nº 119, p.2

Decreto nº 9.082, de 26.6.2017 - Institui o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima. Publicado no DOU

em 27.6.2017, Seção 1, Edição nº 121, p.5

Secretaria de Documentação – SDO Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD

[email protected]