ied - direito público privado e misto - dissertação

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS CURSO DE DIREITO INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO DIREITO PÚBLICO, DIREITO PRIVADO E DIREITO MISTO NA VISÃO DE PAULO DOURADO DE GUSMÃO Goiânia, 2010.

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Page 1: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS CURSO DE DIREITO

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

DIREITO PÚBLICO, DIREITO PRIVADO E DIREITO MISTO NA VISÃO DE PAULO DOURADO DE GUSMÃO

Goiânia, 2010.

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BÁRBARA TORRES SACCO SOUSA JAROSLAW DAROSZEWSKI FERNANDES

MARIA BEATRIZ MOREIRA MARTINS MOURA MARINA RIBEIRO SIADE

RICARDO ORSINI

DIREITO PÚBLICO, DIREITO PRIVADO E DIREITO MISTO NA VISÃO DE PAULO DOURADO DE GUSMÃO

Relatório de trabalho da disciplina de Introdução ao Estudo do Direito para obtenção de nota parcial de N1. Orientação: Profª Regina Celeste de Castro Faria.

Goiânia, março de 2010.

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................4 2 DIREITO PÚBLICO, DIREITO PRIVADO E DIREITO MISTO.................................6

2.1 A divisão público x privado........................................................................................... 6 2.2 O Direito Misto ............................................................................................................. 7

3 AS DIVISÕES DO DIREITO PÚBLICO....................................................................8 3.1 O Direito Internacional ................................................................................................. 8

3.1.2 O Direito Penal Internacional............................................................................... 10 3.1.3 O Direito Diplomático .......................................................................................... 11 3.1.4 O Direito Espacial................................................................................................ 12 3.1.5 Organizações Internacionais ............................................................................... 12 3.1.6 Organizações Regionais, OEA e União Europeia................................................ 13 3.1.7 Tribunal Europeu dos Direitos Humanos ............................................................. 13

3.1.7.1 A Corte Interamericana de Direitos Humanos ............................................................. 13 3.1.7.2 O Tribunal Penal Internacional..................................................................................... 14

3.2 Direito Público Interno................................................................................................ 14 3.2.1 Direito Constitucional .......................................................................................... 14 3.2.2 Direito Eleitoral.................................................................................................... 15 3.2.3 Direito Político ..................................................................................................... 15 3.2.4 Direito Administrativo .......................................................................................... 15 3.2.5 Direito Financeiro ................................................................................................ 16 3.2.6 Direito Judiciário.................................................................................................. 16 3.2.7 Direito Penal........................................................................................................ 17 3.2.8 Direito Penal Comum e Especial ......................................................................... 18 3.2.9 Direito Disciplinar ................................................................................................ 19 3.2.10 Direito Penal Interestatal ................................................................................... 19 3.2.11 Direito Contravencional ..................................................................................... 19 3.2.12 Direito Penitenciário .......................................................................................... 19 3.2.13 Direito Processual ............................................................................................. 19 3.2.14 Direito Internacional Privado ............................................................................. 20

4 AS DIVISÕES DO DIREITO PRIVADO .................................................................21 4.1 Direito Civil................................................................................................................. 21 4.2 Direito Privado Disciplinar .......................................................................................... 21 4.3 Direito Comum........................................................................................................... 21 4.4 Direito Comercial ....................................................................................................... 22

5 AS DIVISÕES DO DIREITO MISTO ......................................................................23 5.1 Direito Marítimo.......................................................................................................... 23 5.2 Direito Aeronáutico..................................................................................................... 23 5.3 Direito da Navegação................................................................................................. 23 5.4 Direito Econômico...................................................................................................... 24 5.5 Direito do Trabalho..................................................................................................... 24 5.6 Direito Sindical ........................................................................................................... 24 5.7 Direito Agrário ............................................................................................................ 25 5.8 Direito Social.............................................................................................................. 25 5.8 Direito Profissional ..................................................................................................... 26 5.9 Direito de Família ....................................................................................................... 26 5.10 Direito Industrial ....................................................................................................... 26 5.11 Direito Falimentar..................................................................................................... 27 5.12 Direito Nuclear ......................................................................................................... 27

CONCLUSÕES.........................................................................................................28 REFERÊNCIAS.........................................................................................................30

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como finalidade principal sumariar os capítulos XV, XVI,

XVII, XVIII e XIX do livro Introdução ao Estudo do Direito, de Paulo Dourado de Gusmão,

que tratam respectivamente a) da divisão do direito em Direito Público, Direito Privado,

Direito Misto, Direito Interno e Direito Internacional; b) das divisões do Direito Internacional

e das organizações internacionais; c) das divisões do Direito Público Interno; d) das divisões

do Direito Privado; e e) das divisões do Direito Misto.

Como o texto analisado trata-se de visão geral e propedêutica, optamos por um modelo

esquemático, fazendo usos de quadros sinópticos e comparativos (quando a matéria tratada

assim o permitir sem maiores distorções) e ampla divisão em forma de tópicos numerados

para cada ramo do direito tratado pelo autor. Para cada direito elencado nos itens 3, 4 e 5,

tentaremos, na medida em que o texto analisado o permitir, indicar a definição do ramo do

direito, suas origens históricas, os direitos que rege e as suas fontes.

O presente trabalho está dividido, essencialmente, em duas partes. Na primeira (item

2), tratamos do modo como o autor discute as celeumas doutrinárias relativas à divisão teórica

do Direito em Público e Privado. Inicialmente, listamos os critérios mais comuns para

estabelecer tal divisão, para depois ponderarmos os problemas teóricos que tais critérios

acarretam, principalmente se pensarmos numa correspondência entre o plano teórico e a

efetiva realidade jurídica da nossa sociedade.

Ainda neste item, abordaremos o modo como o autor inclui, no rol desta divisão, o

Direito Misto, tentando mostrar que a divisão clássica romana Público x Privado não dá conta

de esgotar a complexidade jurídica relativa ao tema.

Na segunda parte (itens 3, 4 e 5), faremos breve resumo da sistemática enciclopédica,

onde o autor dá cabo de cada direito específico, tratando de localizá-los dentro da divisão

estabelecida entre Direito Público, Privado e Misto.

No item 3, que aborda o direito público, tratamos a) do Direito Internacional e suas

divisões (Direito Penal Internacional, diplomático, espacial), bem como das Organizações

Internacionais, as regionais e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos; e b) do Direito

Público Interno e suas divisões (Direito Constitucional, Eleitoral, Político, Administrativo,

Financeiro, Judiciário, Penal, Penal Comum e Especial, Disciplinar, Penal Interestatal,

Contravencional, Penitenciário, Processual e Internacional Privado).

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No item 4, tratamos do Direito Privado e suas divisões (Direito Civil, Privado

Disciplinar, Comum e Comercial). Finalmente, no item 5, tratamos do Direito Misto e suas

divisões (Direito Marítimo, Aeronáutico, da Navegação, Econômico, do Trabalho, Sindical,

Social, Profissional, de Família, Industrial, Falimentar e Nuclear).

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2 DIREITO PÚBLICO, DIREITO PRIVADO E DIREITO MISTO

2.1 A divisão público x privado

Para GUSMÃO, a clássica divisão romana do Direito em público x privado é, apesar

dos problemas teóricos que acarreta, fundamental. Desta feita, esta divisão dá a saber que o

Direito Público é aquele que tutela a coisa pública e o Privado, tutela o interesse dos

particulares. O público está relacionado, assim, ao Estado Romano e o privado ao interesse de

cada um. 1

O critério “interesse”, que funda esta divisão, é o mais antigo. A ele, é levantada a

objeção de que há campos do direito privado em que o interesse social prevalece. É o caso,

por exemplo, do Direito de Família, que, apesar de fazer parte do Direito Civil, campo

clássico do direito privado, tem a prevalência do interesse social.

Gusmão vai à doutrina Italiana e, citando Francesco Ferrara, fundamenta a divisão

público x privado da seguinte forma: a) Direito público interno – Estado se apresenta como

portador de potestade (poder) suprema, investido de imperium; b) Direito privado – por

exclusão, todos os demais direitos. Aqui, as partes estão em pé de igualdade. Mesmo o

Estado, quando pratica atos jurídicos nesta esfera, está em posição de paridade com o

particular.

Seguindo esse raciocínio, estabelece ainda que teríamos a) um Direito Público Interno,

centrado no Estado, em suas funções e organização, na ordem e segurança internas, nos

serviços públicos e recursos para sua execução; e b) um Direito Público Internacional direito

público externo que coordenaria as relações e situações jurídicas em que são partes os Estados

Soberanos. O objetivo deste último direito seria o de criar uma comunidade internacional.

Traçando um quadro esquemático, Gusmão divide e caracteriza assim a divisão

público x privado.

1 GUSMÃO, 2001, p. 146.

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Direito Público Interno Direito Privado - Origem: Direito Público Romano (tutela da coisa pública).

- Origem: Direito Privado romano (tutela dos interesses particulares).

- Estado é parte obrigatória. - Estado não é parte obrigatória. - Interesse público tutelado pelo Estado. - Particular decide sobre seu próprio interesse. - Interesse irrenunciável (indisponível). - Seu direito uma prerrogativa (não uma

obrigatoriedade). - Independe da vontade das partes. - Depende da vontade das partes. - Direito de subordinação (partes em situação de hierarquia).

- Direito de coordenação (partes estão em situação de igualdade).

- Estado – posição de supremacia. - Estado e particulares em situação de igualdade. - Exemplos: Direito constitucional, administrativo, internacional privado, financeiro, penal, processual, judiciário, nuclear.

- Exemplos: Direito civil, comercial, do trabalho.

- Em época de crise, o interesse social se impõe sobre o particular.

Épocas de estabilidade, a divisão é mais nítida.

Tabela 1 – Quadro comparativo do Direito Público Interno e o Direito Privado

Cabe ressaltar, por último, que no Brasil, que tem como princípio de organização do

Estado a Federação, o Direito Público pode ainda ser dividido em federal (União), estadual

(Estados-Membros e DF) e municipal (Municípios).

Outra questão interessante levantada por Gusmão está relacionada ao Direito

Internacional. Classificado como direito público externo, é um direito de coordenação, uma

vez que inexiste uma autoridade supra-estatal que lhe dê a coercitividade. As nações

soberanas, partes neste direito, são colocadas numa situação de igualdade. Para isto, sua

função é a de proteger a comunidade internacional.

2.2 O Direito Misto

O Direito Misto, para Gusmão, pode ser visto sob mais de um prisma. É, inicialmente,

aquele que tutela tanto o interesse público como o interesse do particular. 2 Deste ponto de

vista, teríamos como mistos o Direito de Família, do Trabalho, o Profissional, o Sindical, o

Econômico e o Agrário. Podemos também enxergar como misto aqueles direitos onde

encontramos normas de direito público e de direito privado. Os exemplos seriam o Direito

Marítimo, o Aeronáutico e o Falimentar. Por fim, aqueles constituídos de Direito

Internacional e Direito Público Interno, no caso, o Direito Nuclear.

O que essa nova categoria (Direito Misto) mostra é que a bipartição romana público x

privada, por si só, não corresponde mais à realidade jurídica, tampouco à complexidade da

realidade brasileira.

2 Idem, ibidem, p. 148.

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3 AS DIVISÕES DO DIREITO PÚBLICO

O Direito público pode ser dividido como Direito Interno e Internacional (ou externo).

O interno seria o Direito Nacional, aquele que rege as relações jurídicas no território do

Estado, podendo ser público ou privado. Já o Internacional não é delimitado por fronteiras,

uma vez que rege as relações internacionais entre Estados soberanos.

Gusmão indica duas teorias divergentes no modo de ver a separação entre Direito

Interno e Internacional.

Teoria Monista Teoria Dualista

- Defende o primado do direito interno. - Defende o primado do direito internacional.

- O direito internacional é dependente do

interno.

- Os dois direitos são autônomos e

independentes um do outro.

- O Direito Interno é válido devido à sua

imposição coercitiva do Estado Soberano.

- Quando viola tratados e costumes

internacionais, o direito interno não é válido.

- Crítica da Escola de Viena (Kelsen) –

sistema global de direito unificado seria

impossível se acolhida a posição dualista.

Pois não pode haver contradição normativa

num sistema unificado.

- Após as atrocidades da II Grande Guerra, o

primado do direito internacional, com o

objetivo de manutenção da paz, se tornou

dominante.

A posição de Gusmão, entretanto, é clara: o direito interno e o internacional são

inconfundíveis. 3 O Interno é um direito de subordinação, garantido pela coação do Estado,

resultando de imposição a certo número indeterminado de pessoas. O internacional é direito

de coordenação, garantido pelo consenso entre as nações e, de certa forma, pela ONU. Neste

caso, envolve um número determinado de Estados soberanos.

3.1 O Direito Internacional

Nesta seção, Gusmão vai falar do Direito Internacional e de suas divisões, assim como

das organizações internacionais.

Pode ser definido como o complexo de regras consuetudinárias e pactuadas que rege

as relações entre Estados soberanos e assegura os direitos humanos. O Direito Internacional

organiza e constitui a chamada “comunidade internacional”.

3 Ibidem, p. 149.

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Suas origens remontam à Idade Média, com o papado se transformando em árbitro de

conflitos internacionais. Mas, só após os anos 40 (pós-guerra), passam a ser sujeitos desse

direito não só os Estados soberanos, mas também as minorias e o homem visto como

personalidade internacional.

A violação dos direitos solenemente garantidos pela Declaração Universal dos Direitos

do Homem é considerado crime contra humanidade, imprescritível (mesmo se o direito

nacional correspondente prescrever) e julgado por tribunal internacional. Exemplos de crimes

previstos por este direito são as prisões arbitrárias por motivo político, o terrorismo, o

genocídio, a tortura, os sequestros e assassinatos políticos, etc.

Após anos 50, dois ramos deste direito se subdividiram, formando um direito

internacional especial (em oposição ao direito internacional geral): a) direito internacional

humanitário (direito de Haia), que tentava humanizar a guerra e suas conseqüências; e b)

Direito internacional dos direitos humanos, que tutela estes direitos.

Somente após 1992, com a Conferência Mundial do Meio-Ambiente (Rio 92), a

temática ambiental tornou-se problema do Direito Internacional.

Outro precedente histórico muito importante do Direito Internacional é a famosa

Resolução 678 do Conselho de Segurança da ONU, de 29/11/1990. Através dela, foi

legitimada a invasão do Iraque, a pretexto de coagir este a sair do Kuwait. O precedente se

deve ao fato de, pela primeira vez, o Conselho assumir um papel de agente coercitivo no

direito internacional. Atentando para esta importância histórica, cabe lamentar a infelicidade

dos fatos que se seguiram à esta resolução, de triste memória para o Direito Internacional.

Com relação à sua validade jurídica, o Direito Internacional já foi questionado várias

vezes, em virtude de ser um direito usado convenientemente pelas grandes potências para

atingir seus interesses colonialistas. Juristas positivistas negam-lhe a validade e reconhecem

apenas a validade do direito interno, único que pode ser coercitivamente imposto e, por isso,

satisfazer as exigências teóricas da pirâmide de Kelsen. Para eles, a ausência de autoridade

maior Estatal não lhe confere juridicidade.

A teoria monista também não reconhece nenhum direito acima do direito estatal,

fazendo o internacional depender do nacional. Já a teoria dualista reconhece a possibilidade

da cooperação de entes jurídicos com base em convicções comuns, assegurada mediante certo

equilíbrio de forças (direito de coordenação).

As fontes do Direito Internacional podem ser classificadas em:

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a) escritas: tratados internacionais, pactos, convenções, etc., jurisprudência da Corte

Internacional de Justiça (CIJ), resoluções do Conselho de Segurança e da Assembléia Geral

da ONU; e

b) não-escritas: doutrina, costumes internacionais, equidade e princípios gerais do

direito das nações civilizadas.

As principais fontes do direito internacional são: a Declaração Universal dos Direitos

do Homem da ONU, a Convenção Europeia para proteção dos direitos humanos e das

liberdades fundamentais, Convenção Americana sobre os direitos humanos, entre outros.

Três princípios gerais animam o direito internacional:

a) pacta sunt servanda (cumpram-se os acordos);

b) respeito à soberania das nações; e

c) princípio da não-intervenção.

Após a queda do Muro de Berlim e o fim da divisão geopolítica do bloco capitalista e

do comunista, acrescentou-se à esta lista o princípio da intocabilidade dos direitos humanos.

Suas formas de solução de conflitos envolvem a negociação, conciliação e arbitragem.

Medidas mais violentas podem ser toleradas, como as represálias, sanções econômicas

(bloqueio econômico) e o direito de reciprocidade. Em último caso, medidas extremas podem

ser tomadas, como a guerra-sanção, a guerra de autodefesa e emprego de força militar

autorizado por resolução do Conselho de Segurança da ONU. O que não é tolerado é a guerra

de ofensiva (remissão clara às intenções expansionistas de Hitler nos anos 30). A guerra só

será tolerada nos casos de legítima defesa e libertação nacional, com proteções e garantias à

vida de civis e militares em combate.

Atualmente, o poder militar das grandes potências tirou o fórum efetivo de decisão da

ONU da Assembléia Geral para o Conselho de Segurança, formado fixamente pelos EUA,

Rússia, França, China e Inglaterra. Estes países têm o direito de veto, o que importa num

poder quase absoluto de decisão e iniciativa por parte dessas grandes potências.

3.1.2 O Direito Penal Internacional

O Direito Penal Internacional (em sentido lato) é o direito convencional, estabelecido

por tratados, que rege a repressão de delitos que afetam as relações internacionais ou que

atentam contra os direitos humanos e a Civilização. Pune os crimes internacionais e os delitos

contra a humanidade. Distinto do Direito Penal Internacional em sentido estrito, que é um

direito interno que versa sobre competência legislativa e jurisdicional em matéria penal.

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Sua história é recente, com origem no século XIX. Apenas depois de 1945, com os

esforços para apaziguar os maléficos efeitos da Segunda Grande Guerra, manifestou sua

eficácia. Em 1945, o Tribunal de Nuremberg, que julgou as atrocidades nazistas, define os

crimes de guerra:

a) Crimes contra a paz (guerra de agressão);

b) Crimes de guerra (transgridem os costumes de guerra);

c) Crimes contra a humanidade (deportação, assassinatos, exterminação, crueldades

em campos de concentração).

Alguns juristas negam a sua validade, principalmente pela forma como ele foi aplicado

pelo Tribunal de Nuremberg. Este tribunal passou por cima do princípio da legalidade,

aplicando penas não escritas e não previstas em tratado algum.

Suas fontes principais são as resoluções da ONU e as convenções e tratados

internacionais, como a Convenção Internacional de Haia (1907). A ONU tem tentado

codificar o direito internacional, sem sucesso. Entretanto, conseguiu um feito notável, que foi

definir o termo jurídico “agressão”, que seria o “uso da força armada por um país contra a

soberania, integridade territorial ou independência política de outro Estado, ou de maneira

contrária à Carta das Nações”.

3.1.3 O Direito Diplomático

Constitui-se como o estatuto dos diplomatas. GENER define o direito diplomático

como: arte e ciência da negociação internacional.

Possui características do direito misto por ser constituído de normas de direito interno

e de direito internacional. Em 1815, no Congresso de Viena, foram formalmente estabelecidas

as prerrogativas e as garantias que cercam e protegem os diplomatas.

Há dois princípios cruciais para sustentação da base diplomática: o princípio de

Igualdade de Estados e o de reciprocidade, segundo o qual o diplomata de um país recebe,

onde exercer a sua função, o mesmo tratamento jurídico que o seu país concede aos demais

diplomatas.

Além destes dois princípios básicos, estão prescritas outras regras que garantem o

exercício da diplomacia, como a imunidade diplomática, a inviolabilidade pessoal do

diplomata e de sua família, a extraterritorialidade das embaixadas e legações, que faz um

prolongamento do território do Estado que elas representam, entre outras prerrogativas.

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3.1.4 O Direito Espacial

Para GUSMÃO, é o ramo do direito internacional que disciplina o uso do espaço

cósmico (extra-atmosférico) e dos corpos celestes pelos Estados soberanos da Terra. Prevê

responsabilidade civil pelos danos causados a bens e pessoas na superfície terrestre com a

queda de sondas, de foguetes ou de satélites, além dos direitos, deveres e regimes jurídicos

dos astronautas e dos controladores em terra dos voos espaciais.

É a parte do direito internacional que disciplina a utilização e a exploração do espaço

extra-atmosférico e dos corpos celestes. Subsidiariamente se aplica o direito aeronáutico no

que couber.

3.1.5 Organizações Internacionais

As Organizações Internacionais são compreendidas como um organismo com

personalidade jurídica autônoma em relação aos países que o compõem, dotados de órgãos e

ordenamento jurídico próprios e de meios de ação internacional, fundado no princípio de

igualdade de seus membros.

A primeira organização política destinada a dar maior eficácia no direito internacional

foi a SDN (Sociedade das Nações Unidas), nascida dos impactos da Primeira Guerra Mundial

e também conhecida como Liga das Nações, com sede em Genebra. Há críticas de que suas

decisões estavam na dependência de interesses das grandes potências, perdendo-se o princípio

da igualdade de seus membros.

Tal sociedade desempenhou relevantes ações no campo técnico e social, como nos

casos da Invasão da Manchúria (1932), da Invasão da Abissínia (1935 – atual Etiópia),

rearmamento alemão, entre outros. Entretanto, não conseguiu impedir a Segunda Guerra

Mundial.

A ONU (Organização das Nações Unidas) foi criada em 1945, na Conferência de São

Francisco, sob a forma de órgão federativo superestatal para suceder a fracassada SDN. Sua

sede foi estabelecida em Nova Iorque. Seus sub-órgãos de dividem em: a) Conselho de

Segurança (CS), seu órgão máximo, composto de quinze membros, sendo cinco efetivos e dez

rotativos, com mandato de dois anos; b) Assembléia-Geral (AG); c) uma corte, em Haia

(Corte Internacional da Justiça), com função de responder a consultas jurídicas internacionais

da AG e do CS, além de atuar em litígios internacionais.

Cabe ressaltar que a ONU não possui força militar própria e nenhum poder coercitivo

internacional, sendo inviabilizada de criar condições necessárias ao império da justiça e

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respeito das obrigações nascidas de tratados e de outras fontes do direito internacional, como

menciona em seu preâmbulo.

3.1.6 Organizações Regionais, OEA e União Europeia

Tem por objetivo manter, no nível regional, a ordem fundada na justiça, garantir a paz

e a segurança continental, solucionando pacificamente os litígios entre seus membros,

organizando a ação solidária entre seus membros, através da cooperação e de e do

desenvolvimento econômico, social e cultural de todos.

Uma organização regional pode destinar-se a finalidades específicas como de fins

militares, como a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) ou de finalidades

econômicas, como é o caso da OEA (Organização dos Estados Americanos).

A Comunidade Europeia é uma organização regional, mas não possui representação

política. A criação do Mercado Comum Europeu foi a solução jurídico-político-econômica

encontrada para salvar as economias das ex-potências europeias. Foi estabelecida moeda

única (Euro) e um direito comum, cujas lacunas são preenchidas pelos “princípios gerais

comuns aos direitos dos Estados membros”. É o sonho napoleônico de unificação da Europa

se concretizando sem violência.

3.1.7 Tribunal Europeu dos Direitos Humanos

A Corte Europeia de Direitos Humanos é instalada em Estrasburgo, com jurisdição

supranacional, cujas decisões têm força vinculativa. É a última instância jurídica, depois de

esgotados os recursos ordinários aos tribunais de cada país-membro. Qualquer país europeu

da UE, que tenha seus direitos ameaçados, pode recorrer a esta instância. O tribunal é

composto por juizes “da mais alta consideração moral”, em número igual ao de países

signatários da Convenção, com mandato de nove anos, sendo reelegíveis. As decisões desse

Tribunal repercutem na modificação da legislação do país de origem do recorrente.

3.1.7.1 A Corte Interamericana de Direitos Humanos A Corte Interamericana de Direitos Humanos foi instalada em São José, Costa Rica,

em 1973, criando também a Comissão Internacional dos Direitos Humanos, com sede em

Washington. Além da função jurisdicional, possui também a função de consulta. A corte foi

reconhecida pelo Brasil em 1998. A validade de suas ações só são efetivas se sua jurisdição

for aceita pelo país denunciado, o que na prática a inviabiliza a sua efetividade.

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3.1.7.2 O Tribunal Penal Internacional Em 1998, nasce o Estatuto do Tribunal Penal Internacional (TPI), tendo sido em 2002

alcançado a aceitação de 22 países. Estava criada a Corte Penal Internacional (2003), em

Haia. Os Estados Unidos, a Rússia e a China não o reconhece. O Brasil aderiu a ele em 2000.

Qualquer Estado que tiver aderido ao Estatuto de Roma, pode dele se retirar mediante

notificação a ONU, que produzirá efeito em um ano depois de solicitado.

O Tribunal de divide em Câmaras: a) de primeira instância, onde são instaurados,

julgados e encerrados, por sentença recorrível, processos por crime contra a humanidade

(genocídio e crimes de guerra); b) de Apelação, que apreciará os recursos das decisões da

primeira instância. As decisões finais desse tribunal serão irrecorríveis e os crimes de sua

competência imprescritíveis.

A Pena máxima para esses crimes é a de prisão perpétua. Quanto à reclusão é de até 30

anos. A entrega do acusado por seu país de origem terá de ser atendida, mesmo quando o

processado se encontrar neste, sob sua legislação e independendo de ter este exercido uma alta

função pública.

3.2 Direito Público Interno

É o direito organizador do Estado e protetor e garantidor da ordem pública e da paz

social. Nele, o Estado é revestido de imperium, estando em posição de superioridade com

relação aos indivíduos. Predomina nele o interesse público, daí a denominação “direito de

subordinação”.

Gusmão divide este direito nos seguintes ramos: Direito Constitucional, Administrativo,

Financeiro e Tributário, Judiciário, Processual, Internacional Privado e Penal. Abaixo, nos

detemos brevemente em cada um deles.

3.2.1 Direito Constitucional

É o direito organizador dos poderes do Estado, de seu governo, disciplinador das

relações jurídicas entre governantes e governados, garantidor dos direitos fundamentais do

homem. É ele que estabelece a organização jurídica- política do Estado. Possui superioridade

jurídica sobre todos os demais ramos do direito público interno e do direito privado. Estes

últimos têm que se adaptar às suas prescrições, não podendo violá-las sob pena de serem

considerados inconstitucionais.

O diploma legal do Direito Constitucional é a Constituição. Suas outras fontes são as

emendas constitucionais, a jurisprudência das Cortes Constitucionais ou das Supremas Cortes

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(no caso do Brasil, o STF) que a interpretam e os costumes constitucionais e nas tradições

constitucionais (no caso onde vigora o sistema jurídico Commun Law, como nos EUA).

Nas Federações existem dois direitos constitucionais: Direito Constitucional Federal e

Direito Constitucional Estadual.

3.2.2 Direito Eleitoral

É o direito político que rege o processo eleitoral e estabelece regras para eleição dos

governantes e governados. Estipula as condições para ser eleitor e as de elegibilidade, a data

das eleições, a forma do voto e de sua apuração.

O liberalismo considera-o como direito (prerrogativa), que, como tal, pode deixar de

ser exercido. No Brasil, o direito o considera uma obrigação, mas é essa obrigação que

possibilita a decisão política do eleitorado.

3.2.3 Direito Político

Há alguns publicistas (o caso mais notório seria o de Jellinek) que distinguem o

“direito político” do “direito constitucional”. Este último teria por objeto a ordem jurídica do

Estado, enquanto o direito político, o Estado como comunidade.

Autonomia do direito político é possível se entendermos o direito político como

estrutura do Estado, independente da Política, que trata dos meios a serem usados para obter

soluções políticas no sentido histórico, sem confundi-lo com o direito constitucional. Tem por

objeto o direito de voto, de ser votado, de exercer cargo público, etc.

Compreende a estrutura política do Estado, o direito eleitoral e os partidos políticos.

Suas fontes são as leis e, especialmente, a Doutrina.

3.2.4 Direito Administrativo

É o sistema de normas de direito público que organiza a Administração Pública e

disciplina sua atividade. Consiste basicamente no poder de polícia e poder discricionário, dos

quais estão investidas as autoridades públicas.

É um poder normativo na medida em que pode regulamentar sua atividade. Contudo,

exerce a função disciplinar, quando instaura o processo ou inquérito administrativo. Este

sistema também define as relações jurídicas entre Administração Pública e seus membros

(servidores públicos).

Tutela os bens do Estado, disciplinando seu uso. Suas fontes são as leis, regulamentos,

decretos, avisos, portarias, ordens, instruções, etc. A Legislação administrativa mais antiga é a

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francesa (1800) e a obra mais antiga da matéria é o Les Éléments de Jurisprudence

Administratif (Macarel).

3.2.5 Direito Financeiro

Citando Pugliese, GUSMÃO define este direito como o “conjunto de normas que

disciplinam a arrecadação, a gestão e a distribuição de meios econômicos que necessitam o

Estado e outros entes públicos para o cumprimento de suas atividades”. Neste sentido, o

Estado prevê os meios necessários para cobrir suas despesas (através da cobrança dos

tributos).

Um dos seus objetos é o orçamento, lei que programa as despesas do Estado, tendo em

vista a sua receita. Rege ainda a emissão de moeda e prescreve o regime monetário.

O Direito Tributário ou Fiscal é parte do direito financeiro que rege os impostos e as

taxas (Gusmão não cita as contribuições sociais) e impõe sanções para o caso de não

pagamento dos mesmos. Tais sanções são patrimoniais e pessoais (prisão). Esta pode ser, em

regra, reduzida se o contribuinte faltoso efetuar o pagamento do débito fiscal assim que

notificado.

3.2.6 Direito Judiciário

É o direito que organiza o os diversos órgãos do Poder Judiciário do Estado, bem

como seus auxiliares e serventuários, indispensáveis a seu funcionamento. Prevê os meios

corretivos dos serviços judiciários e as sanções para faltas de seus membros.

Tem relações estreitas com o Direito Processual. É formada pelo que não foi

disciplinado pelo direito processual e não pode dispor de forma contrária ao direito

processual. Gusmão afirma que o que hoje pertence ao direito judiciário pode ser, amanhã, da

alçada do direito processual e vice-versa.

Tem por objeto a organização judiciária, que varia de Estado para Estado. Segundo

Henry Solus e Roger Perrot, esta variação decorre do fato de que cada povo tem sua história e

tradição. No Brasil, temos, em função de espaço, a organização judiciária federal e a estadual.

Organização Judiciária Federal Organização Judiciária Estadual - É dada pela Constituição Federal; - E dada pela Constituição Estadual; - Leis federais da organização judiciária; - Lei estadual da organização judiciária; - resolução dos tribunais federais; - resolução dos tribunais estaduais; - Não podem transgredir os princípios gerais de

organização judiciária previstos na Constituição Federal.

Tabela 2 – Quadro comparativo do Organização Judiciária Federal e Estadual

Page 17: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

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Em razão desta competência distribuída no espaço, temos a jurisdição comum e a

jurisdição especial.

Jurisdição Comum Jurisdição Especial

- Aplica o direito comum (direito civil, direito comercial, direito penal, etc.);

- Aplica o chamado Direito Especial (direito militar, do trabalho e eleitoral);

- Decidindo questões para as quais não há jurisdição especial;

- É formada pelos juízes e tribunais militares e juízes e tribunais eleitorais.

Tabela 3 – Quadro comparativo da Jurisdição Comum e Especial

Alguns países têm a “jurisdição constitucional” com competência para julgar os

crimes de responsabilidade e decidir sobre inconstitucionalidade da lei. Essa forma de

jurisdição surgiu após a I Guerra Mundial, com objetivo de controlar a constitucionalidade

das leis e proteger a Constituição. São exemplos notórios a Constituição de Weimar e da

Áustria (1919), a espanhola (1931) e a da Tchecoslováquia (1920). No Brasil, cabe ao

Supremo Tribunal Federal a função de corte constitucional.

3.2.7 Direito Penal

É o sistema de normas que define e enumera os crimes e suas respectivas penas, bem

como prescreve medidas preventivas aplicáveis às pessoas perigosas. É direito punitivo, de

natureza imperativa, por impor e proibir condutas, e de caráter aflitivo. Deve contribuir para a

recuperação do delinquente e para a defesa da paz social e da segurança individual.

Beccaria (1763) defende o princípio da legalidade, segundo o qual só a lei pode

estabelecer penas para os delitos. Aos juízes caberia a aplicação dessas de forma proporcional

à gravidade dos mesmos. Também combateu as penas desumanas e a pena de morte. Dessas

idéias resultou a Escola Clássica de Direito Penal (Romagnosi, Feuerbach e Bentham), que

tinha como princípios básicos a proporcionalidade da pena ao delito, prevenção social do

delito e imputabilidade moral.

Contra essa escola surgiu a Escola Positiva (Ferri, Von Lizst), questionando os fatores

sociais, psicológicos e orgânicos do delito, não reconhecendo a culpa como condição para

aplicação da sanção penal e admitindo a responsabilidade legal do autor do delito. Atribui à

pena função educativa e recuperadora do delinqüente e de defesa social.

A Escola Técnica Jurídica (Rocco, Manzini, Battaglini, etc.) tem por objeto apenas a

lei penal. Não há interesse nas raízes do delito e na figura do delinqüente.

Page 18: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

18

A Teoria Finalística ou Finalista (Welzel) compreende o delito pela finalidade

perseguida pelo delinqüente. É de difícil aplicação nos casos de crimes culposos e de dolo

eventual (fim ilícito não é desejado e nem previsto, apesar de previsível).

A tendência atual é a consideração tridimensional do delito: norma penal / realidade

social / delinqüente, respeitando a advertência de Beccaria: “é preferível prevenir a punir”.

A fonte única do direito penal é a lei. Costumes, jurisprudência e doutrina não têm

forca normativa neste seara do direito, uma vez que põe um jogo um direito fundamental, a

liberdade.

A estrutura da norma penal é a seguinte: preceito (enumerador de crimes) e sanção

(pena). O preceito tem por destinatário todas as pessoas, enquanto a pena, o judiciário por ser

o órgão estatal que a impõe nas sentenças. As normas são acompanhadas, em sua maioria, de

sanções.

O Direito Penal prevê também medidas preventivas aplicáveis aos culpados pelo delito

quando perigoso, bem como aos que, por incapacidade, não respondem pelo mesmo. Tais

medidas visam garantir a segurança individual e a ordem pública, tutelando bens existenciais

(vida, liberdade, saúde, honra, nome, etc.) e patrimoniais, a ordem pública, os bons costumes,

o funcionamento do Estado, os bens e interesses do Estado.

No direito penal, o Princípio da legalidade é fundamental e se expressa pela

proposição “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação

legal”.

Os fundamentos do Direito Penal são estabelecidos de modo diverso por diferentes

teorias.

a) Teoria da Retribuição: a pena é o sofrimento imposto ao agente como retribuição do

crime, sendo a intimidação a principal função do direito penal.

b) Teoria da Recuperação: Considera a pena o meio de corrigir, reeducar ou recuperar

socialmente o criminoso.

c) Teoria da defesa social: a pena é o meio de defesa da sociedade contra o crime.

3.2.8 Direito Penal Comum e Especial

Direito Penal Comum é o que define os crimes comuns e o Penal Especial, os crimes

decorrentes da natureza especial do bem tutelado atingido pelo delito ou do agente. No Brasil,

o principal ramo do Direito Penal Especial é o Penal Militar, que define os crimes militares,

bem como suas penas, e é formulado segundo os princípios do direito penal comum.

Page 19: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

19

3.2.9 Direito Disciplinar

É o direito repressivo destinado a obter maior eficiência, disciplina, decoro e

produtividade no serviço público, nos parlamentos e nas Forcas Armadas. Por este motivo, as

medidas disciplinares não são aplicadas pelo Judiciário.

As fontes do Direito Disciplinar Legislativo são os regimentos das Assembléias

Legislativas, tendo como sanção mais grave a cassação do mandato do parlamentar. No

Disciplinar do Judiciário (que faz parte do direito Judiciário), as fontes são os regimentos dos

tribunais e a lei de organização judiciária, que prescrevem sanções aplicáveis aos membros do

Judiciário pelos tribunais e aos serventuários da justiça.

Direito Disciplinar da Administração Pública, com sanções aplicáveis aos servidores

públicos, tem como principal fonte o Estatuto do Funcionário Público.

3.2.10 Direito Penal Interestatal

Direito Penal Internacional é o ramo do direito interno que estabelece a competência

jurisdicional e a lei aplicável em matéria penal. Compõe-se de normas de direito interno, onde

predomina o Principio da Territorialidade da Lei Penal (aplica-se a lei penal aos fatos

puníveis no território nacional, independente da nacionalidade do agente, da vítima e do bem

lesado).

3.2.11 Direito Contravencional

Distingue-se do direito penal pela menor gravidade das infrações que pune.

3.2.12 Direito Penitenciário

É o ramo do direito repressivo que disciplina a forma de que deve ser cumprida a pena

de prisão celular. Compõe- se de normas de Direito administrativo e de técnicas pedagógicas

destinadas a recuperar o delinquente no estabelecimento penitenciário.

3.2.13 Direito Processual

É o direito que disciplina o processo judicial (sequência de atos destinados a obter a

sentença definitiva). Define-se como o complexo de normas que regulamentam a prestação

jurisdicional por parte do Estado. Parte do direito público que dá os meios para o exercício da

jurisdição quando provocada pelo prejudicado. Já foi considerado conjuntamente com o

direito material (do qual seria parte), mas hoje adquiriu autonomia.

As normas do direito processual são trilaterais porque dela decorrem relação jurídica

entre autor, que inicia a ação, o réu, contra quem ela é proposta, controlada pelo juiz, que lhe

Page 20: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

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dá solução adequada e eficaz na sentença. Este sistema jurídico pois fim à justiça privada

quando deu o monopólio ao Estado de punir o ilícito e formulou regras específicas para

decidir os litígios.

Divide-se em:

a) Processual Civil - depende da vontade das partes e é composto de matéria não

penal; e

b) Processual Penal (o exercício do poder punitivo do Estado pode ser modificado no

curso do processo e pessoas que inicialmente não eram partes do processo, podem

passar a sê-lo).

c) Atualmente, fala-se em Processual Administrativo, que disciplina o processo

administrativo.

3.2.14 Direito Internacional Privado

É o direito que indica a legislação de direito privado aplicável aos casos em que há

duvida quanto à lei que os rege. Assim, se considera um direito de delimitação (jurisdição no

espaço e no tempo) e de interpretação (colmata lacunas dos outros direitos). Dirime os

conflitos de legislação no espaço sem intervenção judicial (dúvidas com relação à lei de qual

país deve ser aplicada a um litígio ou ilícito). Enfim, rege as relações jurídicas estabelecidas

entre pessoas de nacionalidade diferentes.

Não se confunde com o Direito Internacional por ser um direito interno, ou seja, não é

comum às nações e tem fontes especificamente nacionais. Tampouco é ramo do direito

privado, uma vez que são normas de imposição ao magistrado. Tal confusão poderia surgir do

fato de aparecer num diploma aparentemente de direito privado: a Lei de Introdução ao

Código Civil.

Page 21: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

21

4 AS DIVISÕES DO DIREITO PRIVADO

O direito privado é o direito que predomina o interesse privado e em que as partes se

apresentam em pé de igualdade. É o direito dos particulares, dominado pelos princípios de

liberdade e de igualdade. Subdivide-se, tradicionalmente, em direito civil e direito comercial.

Mas Gusmão apresenta algumas outras subdivisões apresentadas pela doutrina.

4.1 Direito Civil

Também denominado de direito comum, este é a forma originária de todo direito

privado. Funda-se no princípio de igualdade de todos perante as suas normas. Disciplina as

relações entre pessoas e estabelece as regras relativas à pessoa em si. Rege os direitos

personalíssimos ou direito da pessoa, bem como os direitos e deveres da pessoa na família

(direito de família), compreendendo as relações que derivam do matrimônio ou da filiação. O

Direito Civil controla a vida da pessoa desde o nascimento até a sua morte.

Com o término da Segunda Guerra Mundial, o direito civil sofreu significativas

alterações. A responsabilidade civil ampliou-se. O direito, que antes deste marco histórico era

individualista, passa a ser influenciado pela idéia da solidariedade, abandonando o viés

patrimonialista do direito do final do século XIX.

GUSMÃO cita DUGUIT, que define de forma mais moderna o Direito Civil como:

parte do direito privado que regula as relações jurídicas com ou sem natureza patrimonial, entre pessoas, consideradas em situações de igualdade, não regidas pelo direito comercial, pelo direito do trabalho ou por outro direito especial.

4.2 Direito Privado Disciplinar

Direito de natureza disciplinar, tendo por fontes estatutos de clubes, de associações, de

instituições ou de sociedades, prevendo penas aplicáveis a seus associados.

É uma forma de direito repressivo, pois estabelece penas e sanções, dando poder à

sociedade civil e à sociedade comercial para punir as faltas de seus sócios.

4.3 Direito Comum

O direito comum é o nome dado ao direito Europeu vigente a partir do século XIII até

o final do século XIX. Hoje, possui apenas valor histórico. Não era, pois, direito nacional,

mas direito comum a várias nações europeias e pode ser definido como o próprio Direito

Europeu, anterior às codificações.

Page 22: IED - Direito Público Privado e Misto - Dissertação

22

Atualmente, observamos que este ramo renasce a partir da consolidação da União

Europeia, a partir dos anos 90. Esse novo direito comum rege predominantemente o comércio

e as relações jurídicas entre os países que dela fazem parte.

Hierarquicamente acima dos direitos desses países, tem por fonte os costumes, a

jurisprudência, tratados e convenções internacionais.

No mundo jurídico encontra-se entre o direito internacional e os direitos dos países-

membros da mencionada união.

4.4 Direito Comercial

GUSMÃO afirma que se pode conceituar o direito comercial como “o direito que rege

atos jurídicos que objetivam especulação e lucro, bem como a empresa constituída para esse

fim”. 4

Não pode ser considerado, como já foi em tempos remotos, um sistema de normas de

exceção em relação ao direito civil, mas como direito igual ao civil, ou seja, parte do direito

privado.

Possui matéria própria, a saber, matéria comercial, formada por atos praticados com o

fim da especulação e lucro, compreendendo não só relações econômicas, como, serviços, que

permitem o fortalecimento e a expansão do mercado, bem como a circulação de mercadorias

do produtor ao consumidor, e a atividade industrial.

Mediante o exposto, pode-se dizer ser o direito comercial a parte do direito privado

que disciplina a atividade comercial e empresarial. Sob a ótica legal, matéria comercial é a

submetida, pelo legislador, à lei comercial.

O atual Código Civil de 2002 unificou o direito privado, contemplando assim, o

direito civil e comercial em um único código.

4 Ibidem, p. 189.

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23

5 AS DIVISÕES DO DIREITO MISTO

O direito é misto, como já afirmado anteriormente, quando: a) tutela interesses

privados e públicos; ou b) quando é constituído por normas e princípios de direito público e

de direito privado; ou, ainda, c) de direito nacional e de direito internacional. Segue abaixo as

suas subdivisões.

5.1 Direito Marítimo

É o conjunto de regras de direito público e de direito privado que disciplina o

transporte, a navegação e o comércio marítimo. Tem normas de direito administrativo, de

direito disciplinar e de direito privado.

É direito codificado, contido em leis, códigos, bem como em costumes e convenções

internacionais. Compõe-se, assim, de normas de direito nacional (direito interno) e de direito

internacional.

5.2 Direito Aeronáutico

O Direito Aeronáutico é o conjunto de normas que regem o transporte aéreo na

atmosfera, aplicável às aeronaves, às suas tripulações e ao espaço aéreo. Ao transporte aéreo

foram exigidas normas especiais, devido às suas especificidades como meio de transporte.

Com isso, leis surgiram para disciplinar esse meio de transporte. As relações jurídicas

decorrentes do voo de espaçonaves, tripulados ou não, são objeto do direito espacial.

É o ramo do direito que tutela o interesse público e particular, tendo normas de direito

público e de direito privado, bem como no direito nacional e de direito internacional.

A necessidade de regras internacionais uniformes, bem como da unificação dos vários

sistemas e o valor das convenções internacionais levaram à criação de organismos

internacionais destinados a formular normas uniformes nesse terreno. Um exemplo seria o

Comité Juridique International de l’Aviation (1909) e Institut du Transport Aérien (1954).

5.3 Direito da Navegação

Direito que disciplina tanto a navegação marítima como a aérea. Alguns juristas

restringem o seu campo, reduzindo-o ao da navegação mercantil, excluindo dele as normas de

direito internacional privado, as de direito administrativo, as penais, as processuais, as

relativas ao mar territorial, ao espaço aéreo e à polícia de navegação. Restringir-se-ia ao

direito comercial marítimo e aéreo.

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24

O Direito de Navegação pode ser entendido como a parte do direito que estabelece

princípios e normas comuns aos transportes aéreo e marítimo, de natureza comercial.

5.4 Direito Econômico

Direito que controla a produção e circulação de riquezas, trata das relações

econômicas ligadas à produção (agrícola e industrial). É o direito disciplinador de sua

distribuição e proteção, com vista ao desenvolvimento econômico do país.

É direito misto, com princípios de direito público e de direito privado, tendo aparecido

apenas depois da Primeira Guerra Mundial.

5.5 Direito do Trabalho

É o direito que rege as relações jurídicas entre assalariados e patrões. Estabelece as

condições de trabalho, salário e assistência, as vantagens e prerrogativas do trabalhador. Rege

as relações decorrentes de trabalho, especialmente o trabalho e sua remuneração, as condições

de sua segurança e higiene e as destinadas a impossibilitar a exploração do trabalhador.

É o direito que procura resolver os problemas sociais e econômicos oriundos do

trabalho. Dá-se um nome emblemático para estes problemas: a questão social, originária das

nefastas conseqüências da Revolução Industrial. Também é denominado de direito social, pois

põe fim a conflitos sociais prejudiciais ao desenvolvimento econômico do país.

As normas do direito do trabalho são normas de jus cogens, ou seja, as partes não

podem, no contrato de trabalho, dispor de forma diferente do que nelas estiver prescrito (não

são direitos disponíveis). Norteado pelo interesse social, o direito do trabalho não pode ser

incluído no direito privado, mas no direito misto, por ser direito impositivo, taxativo (jus

cogens) e os direitos que deles decorrem são irrenunciáveis.

As fontes do direito do trabalho são estatais, infra-estatais e internacionais. São elas: a

lei, contrato coletivo de trabalho, costumes, equidade, convenções internacionais e tratados

internacionais.

O direito do trabalho brotou dos movimentos sociais e ideológicos que feriu o

individualismo jurídico e o liberalismo econômico, dando origem a nova época jurídica na

qual o direito tornou-se um meio de proteção dos fracos contra os poderosos.

5.6 Direito Sindical

O direito sindical pertence ao direito misto por não tutelar exclusivamente o interesse

privado, mas também o social, de categorias profissionais. Pode ser definido como o direito

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que tem por objeto o exercício de atividades profissionais, disciplinando o poder normativo e

de representação de sindicatos. É o complexo de normas que atendem aos interesses oriundos

de atividades profissionais, representados por sindicatos, dotados de poder normativo,

instituídos para defendê-los.

As suas fontes são legislativas (lei), convencionais (contrato coletivo de trabalho) e

internacionais (convenções internacionais). Pormenoriza e complementa a legislação

trabalhista, sem, contudo, alterá-la.

5.7 Direito Agrário

O direito agrário, também denominado de direito rural, rege a produção agropecuária e

a propriedade industrial-rural. É considerado por alguns como direito misto, situado na

fronteira do direito privado e do direito público. Não obstante outros doutrinadores negarem-

lhe a autonomia, GUSMÃO também cita aqueles que o consideram como ramo autônomo do

Direito.

Para o autor, o direito agrário é direito autônomo, ramo do direito misto, disciplinador

da exploração agrícola e da propriedade industrial-rural, que deve ser subordinado ao

interesse social.

5.8 Direito Social

O direito social encontra-se entre o direito privado e o direito público. Fundado na

solidariedade social, subordina o egoísmo e os interesses de seus destinatários ao interesse

social, conciliando os interesses do homem com as das pessoas jurídicas (empresas, grandes

corporações, sociedades comerciais, etc.), em suas relações jurídicas, de modo instituir uma

ordem de justiça social.

O direito social tem afinidade com o direito institucional por objetivar solucionar a

“questão social”, sem prejuízo da obra ou do resultado visado por seus destinatários.

Distingui-se do direito privado pelo seu aspecto social, mas também se afasta do direito

público por também tutelar interesses individuais. Enquadra-se na categoria do direito misto

dado a diversidade de interesses que tutela, caracterizando-se por ser fonte de direitos

subjetivos que envolvem o dever de exercê-los.

Pertencem a esse ramo, o direito do trabalho, o de assistência social, o previdenciário,

entre outros.

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5.8 Direito Profissional

O direito profissional disciplina o exercício de profissões que exigem conhecimentos

técnicos ou técnico-científicos. Tem por objeto a defesa dos interesses de classes profissionais

e de sua clientela.

Em alguns países, o Estado é o juiz da oportunidade e da necessidade social e

profissional da regulamentação das profissões. A profissão é uma das alavancas do

desenvolvimento econômico, necessitando, para tal, de proteção e regulamentação. Não só

protege o profissional, mas impõe-lhes deveres, responsabilidades e condições para o

exercício da profissão.

Sua fonte principal é a lei. É direito constitutivo de normas disciplinares, a exemplo de

direito profissional que rege o exercício da advocacia. Para o exercício da profissão de

advogado, além do diploma de bacharel em direito, é necessária a inscrição na OAB, não

bastando para tal a titularidade acadêmica (título de “doutor em direito”).

5.9 Direito de Família

O direito de família é aquele norteado pelo interesse social. Rege as relações jurídicas

constitutivas da família e as dela decorrentes. Tem por matéria as relações jurídicas que

formam a família.

Norteado pelo interesse social, rege as relações jurídicas familiares e as delas

decorrentes, disciplinando o casamento, as relações entre esposos, dissolução do casamento,

relações de filiação, etc. Como a família, apesar de governada por interesses individuais, é a

instituição fundamento dos valores culturais vigentes, inicialmente por ela transmitida, os

direitos de família se revestem de caráter social. São, por isso, direito misto.

5.10 Direito Industrial

O Direito Industrial se constitui como o complexo de normas reguladoras das relações

jurídicas decorrentes da produção industrial. É o direito que rege a atividade industrial, que

compreende produção, modificação e o beneficiamento da matéria prima, dando-lhe nova

destinação, criando produtos (mercadorias), capazes de satisfazer amplo campo de interesses.

Para exercício dessa atividade são necessários trabalho e capital , bem como método e

tecnologia industrial. Tecnologia que depende de invenções sujeitas a privilégios ou

monopólios (patentes), garantidas pelo direito industrial e por normas penais. Por isso,

estabelece a concorrência desleal como crime.

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5.11 Direito Falimentar

O direito falimentar é o complexo de normas protetoras do crédito, no caso de

insolvência do comerciante. A insolvência é a impossibilidade de o patrimônio do

comerciante garantir seus débitos. No estado falencial, é liquidado o patrimônio do falido para

atender os credores que se habilitam na falência.

Compõe-se de normas asseguradoras de direitos e de preferências de credores (direito

privado), de normas que regem o processo de falência (direito processual falimentar) e de

normas penais (direito penal falimentar). O direito falimentar é aplicável à liquidação

extrajudicial de empresas decretada pelo Banco Central.

Compondo-se de normas de direito privado, de normas processuais (direito público) e

de normas penais (direito público). Daí, seu caráter de direito misto.

5.12 Direito Nuclear

O direito nuclear é a parte do direito misto que disciplina a produção e o uso da

energia nuclear para fins pacíficos. A possibilidade dos acidentes nucleares atingirem mais de

um país, como ocorreu em Chernobyl, em 1986, dão a este Direito o caráter de direito misto,

uma vez que transcende a soberania dos países, tutelando o interesse da comunidade

internacional.

A fragilidade das normas internacionais deixa o jurista perplexo e apreensivo no

terreno da energia nuclear, na qual humanidade, a civilização, o homem e toda espécie de vida

estão em perigo potencial com uma das descobertas científicas mais impactantes do século

XX, que pode servir tanto para o bem como para o mal.

No campo do direito nuclear, a responsabilidade civil, no caso de acidente nuclear, é

objetiva, não se cogitando de culpa. As legislações lamentavelmente estabelecem teto para a

indenização, que apesar de alto, não é capaz de cobrir o dano nuclear produzido, dada a

imprevisibilidade do alcance dos efeitos e da duração da radioatividade.

Ao referir à legislação, se não fosse limitada a indenização no caso de dano nuclear, as

cautelas seriam maiores, seja na construção, seja na conservação e seja no funcionamento das

usinas nucleares.

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CONCLUSÕES

A classificação do direito com fins didáticos e enciclopédicos certamente não é tarefa

fácil. GUSMÃO, em sua obra Introdução ao Estudo do Direito, enfrenta o problema de

transcender classificações clássicas do direito em função da novas configurações sociais e

políticas do mundo contemporâneo, bem como das novas demandas jurídicas que são

colocadas ao mundo do direito.

Certamente, a mais problemática divisão clássica do Direito é a entre público x

privado. Ignorando a complexidade da vida jurídica moderna, essa classificação passa por

cima dos novos ramos direito que se colocam na fronteira entre interesse particular e interesse

público, entre o direito interno e o direito internacional.

As nefastas conseqüências da II Guerra (pós-1945) trouxeram a necessidade de tutelar

direitos e garantias fundamentais, não só no ramo do direito constitucional, mas em áreas que,

tradicionalmente, eram consideradas exclusivamente de direito privado. A Globalização

econômica estreitou as fronteiras culturais e econômicas do mundo, mas também acarretou

impactos ambientais, sociais e mesmo militares, que implicaram no redimensionamento de

várias áreas do direito, e na ampliação do rol de várias deveres, não só às nações, mas aos

indivíduos e à sociedade civil.

Novos fenômenos jurídicos, ainda que não apontados por GUSMÃO em seu texto,

também dão nova roupagem ao Direito, borrando as fronteiras rígidas entre o público e o

privado. Entre eles estão a descentralização do direito civil (com o florescimento de vários

estatutos especializados) e constitucionalização do direito privado, com a imposição de

princípios constitucionais reguladores de relações privadas. 5

Este problema é acentuado pelo fato de diversos doutrinadores, ou quanto muito,

apostiladores do direito, definirem e classificarem o mesmo sem grandes cuidados, postulando

a clássica divisão público x privado e ignorando uma nova realidade jurídica, formatando,

com isto, um conhecimento limitado e distorcido do Direito atual.

Por outro lado, a leitura do texto dá a exata medida da dificuldade de classificação de

ramos do direito que estão sujeitos a mudanças rápidas e radicais. A título de exemplo, o

direito aeronáutico, fruto das invenções do início do século XX, mal consegue disciplinar a

matéria devido às rápidas mudanças tecnológicas na área. O direito espacial mal consegue

definir os limites de sua jurisdição, por não ser possível predize-los cientificamente.

5 Cf. STOLZE, P.; PAMPLONA, R., 2010, pp. 90-91.

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GUSMÃO chega a colocá-lo no âmbito da ficção científica. 6 O Direito Internacional tem sua

validade jurídica questionada por não conseguir se estabelecer de forma coercitiva, estando à

mercê do arbítrio das grandes potências.

A amplitude e minúcias das relações do mundo jurídico contemporâneo não podem ser

ignoradas pelo doutrinador, bem como não podem pelo jurista em formação, que não pode

perder de vista a complexidade na realidade que o certa, afogando-se nas particularidades de

uma especialidade jurídica e fechando os olhos para o todo circundante.

6 Cf. GUSMÃO, ibidem, p. 157.

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REFERÊNCIAS

GUSMÃO, P. Introdução ao Estudo do Direito. 28ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2000.

STOLZE, P.; PAMPLONA, R, Novo Curso de Direito Civil, volume I: parte geral. 12ª ed., São Paulo, Saraiva, 2010.