histÓria das ideias polÍticas - webnode · 2021. 2. 16. · histÓria das ideias polÍticas...
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SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
HISTOacuteRIA DAS IDEIAS POLIacuteTICAS
Poliacutetica eacute uma palavra que pode ter muitos significados diferentes O principal conceito eacute
ligado ao ato de governar e de tomar decisotildees ligada ao governo agraves suas decisotildees e ao conceito de
Estado sendo necessaacuterio um relacionamento poliacutetico para que os governantes tomem decisotildees
que atendam aos interesses dos cidadatildeos
De igual modo tambeacutem pode se referir ao relacionamento entre as pessoas principalmente
quando o objetivo eacute chegar a um consenso ou um objetivo em comum
Uma das suas funccedilotildees principais eacute chegar a acordos que garantam benefiacutecios para todos os
cidadatildeos Assim pode-se dizer que a poliacutetica eacute um instrumento para chegar a uma organizaccedilatildeo
social satisfatoacuteria para que a sociedade funcione de maneira organizada e justa
Tambeacutem pode ser definida como o relacionamento entre o governo e os cidadatildeos Dessa
forma a poliacutetica tambeacutem existe para que os interesses da populaccedilatildeo sejam levados ateacute os
governantes que satildeo responsaacuteveis por tomar as decisotildees que vatildeo influenciar na vida das pessoas e
na organizaccedilatildeo da sociedade
A poliacutetica tambeacutem acontece por parte das pessoas que formam a sociedade e que natildeo
ocupam cargos poliacuteticos
Por exemplo eacute obrigaccedilatildeo dos cidadatildeos obedecer agraves leis que existem e cumprir as regras que satildeo
determinadas nessas leis Essas obrigaccedilotildees tambeacutem satildeo uma forma de fazer poliacutetica
Todavia nem sempre assim o foi linearmente Poliacutetica estava relacionada agrave organizaccedilatildeo
das polis as cidades-estados gregas ndash uma nova forma de organizaccedilatildeo poliacutetica e social que
ocorreu na Greacutecia Antiga Desde entatildeo a poliacutetica passou a denominar a arte ou ciecircncia da
organizaccedilatildeo direccedilatildeo e administraccedilatildeo de naccedilotildees ou Estados
Urge reconhecer uma relaccedilatildeo intimamente ligada aos pensamentos poliacuteticos desde a
antiguidade sendo esta a questatildeo de adotar a poliacutetica enquanto ordem de puro poder
(autoridade-potestas) ou ao inveacutes ordem de validade axioloacutegica
Como podemos observar no estudo que foi feito ao longo do semestre satildeo vaacuterias as formas de
ldquogovernordquo apresentadas pelos autores desde a antiguidade umas que chegam a ser extremistas E
com extremistas falo daquelas que anulam quaisquer direitos dos cidadatildeos (como a tirania) ou
ateacute aquelas que os diferenciam Nestes casos a meu ver estamos perante uma clara tentativa de
poder absoluto por parte dos governantes natildeo olhando os meios para atingir a supremacia
maacutexima de poder
Nos outros modelos e regra geral podemos falar na presenccedila de uma ordem normativa
fundada em valores axioloacutegicos isto eacute que tem em conta variadas valorizaccedilotildees morais eacuteticashellip
temos uma poliacutetica orientada para valores humanos com um objetivo direcionado para o cidadatildeo
valorizando-o quer de maneira superficial ou abrangente Podemos ateacute falar de uma moral ao
serviccedilo da poliacutetica Ou seja uma poliacutetica orientada pelos e para valores morais virtudes do
Homem sendo que deve ser essa a verdadeira essecircncia da poliacutetica a organizaccedilatildeo do homem e
do espaccedilo comum no respeito e na orientaccedilatildeo para os valores Contudo estas natildeo satildeo soacute
virtudes a esperar dos governantes se o proacuteprio do governado natildeo tiver estes valores presentes
natildeo seraacute coerente esperar de algueacutem virtudes (desencadeando accedilotildees) quando o mesmo natildeo se revecirc
com aquelas Assim eacute necessaacuterio que desde cedo se ldquoalimenterdquo o cidadatildeo de valores morais os
mesmos enquadrados na lei de um estado pois um estado soacute existe devido ao individuo e
direcionado em prol do mesmo tendo sempre como finalidade o seu bem-estar e
desenvolvimento enquanto bom cidadatildeo
Deste modo um governante justo deve atender aos valores do indiviacuteduo enquanto ser
essecircncia e objetivo (da poliacutetica) devendo estes natildeo soacute ser um travatildeo a decisotildees (nefastas) que
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possam repercutir nas esferas daqueles efeitos negativos e como meta a alcanccedilar em prol da
justiccedila paz e de uma vida boa para os cidadatildeos
Antiguidade Claacutessica Peacutericles e a defesa da democracia
Peacutericles (seacuteculo V aC de + ou ndash 495-430 aC) foi um nobre ateniense homem inteligente e saacutebio
que abrilhantou a apreciada figura do estadista culto moderado e ciacutevico atraveacutes da sua defesa da
democracia (ainda hoje o ldquoseacuteculo de Peacutericlesrdquo eacute conhecido como o periacuteodo aacuteureo da democracia
ateniense)
Na sua apologia pela democracia Peacutericles defendia um modelo de democracia directa e
caracteriza o regime vigente em Atenas como um regime em que o Estado era administrado no
interesse do povo e natildeo das minorias Deste modo este pensador entende que os princiacutepios
basilares da democracia seriam a igualdade e a liberdade igualdade na medida em que as leis
asseguravam a todos um tratamento por igual e no que dizia respeito agrave vida puacuteblica cada um
obtinha uma igual consideraccedilatildeo em funccedilatildeo dos seus meacuteritos e valores pessoais (e natildeo em valor da
classe social a que se pertence) a liberdade seria um princiacutepio fundamental uma vez que
estimulava a participaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica mesmo nos debates que envolvessem as grandes
questotildees do Estado (pois Peacutericles entendia que as grandes questotildees soacute tinham a ganhar com a livre
discussatildeo e argumentaccedilatildeo das opiniotildees)
Deste modo facilmente se conclui que todo o seu discurso fica indelevelmente (pensamento)
marcado pela apologia do equiliacutebrio da toleracircncia e moderaccedilatildeo da acccedilatildeo poliacutetica demonstrando
particular atenccedilatildeo pelas leis sociais e defendendo a possibilidade dos mais pobres saiacuterem da sua
deacutebil situaccedilatildeo atraveacutes do trabalho Durante o tempo que governou Atenas (mediante 15 eleiccedilotildees
sucessivas para o cargo de estratego) Peacutericles privilegiou a qualidade de vida (o desporto a
cultura os espectaacuteculos enfim os ldquocostumes de Atenasrdquo ) exacerbou a prosperidade econoacutemica
da cidade (bem como a sua abertura ao exterior) aleacutem de elogiar os que morriam como heroacuteis em
defesa da Paacutetria exortando aos vivos para que saibam honrar o exemplo dos que pereceram no
cumprimento do dever bem como as ldquoas instituiccedilotildees poliacuteticasrdquo de Atenas
A democracia ateniense apresentava contudo algumas imperfeiccedilotildees e limitaccedilotildees Caracterizava-
se por ser uma democracia directa e natildeo representativa na qual somente participavam os
cidadatildeos de Atenas ou seja os indiviacuteduos que eram filhos de pai e matildee atenienses com mais
de 21 anos de idade e com serviccedilo militar cumprido As mulheres natildeo possuiacuteam
poderesdireitos ciacutevicos nem juriacutedicos natildeo podiam possuir propriedades e era-lhes vedado o
ensino No entanto respeitava a liberdade de opiniatildeo a liberdade de entrar e sair do paiacutes e outras
liberdades essenciais e conferia aos cidadatildeos o direito de participaccedilatildeo no debate das grandes
questotildees de interesse geral
Facilmente se constata que Atenas era palco de uma sociedade esclavagista na qual os metecos (os
cidadatildeos estrangeiros como veio a ser o caso de Aristoacuteteles por exemplo) eram obrigados a
cumprir determinados deveres como pagar impostos e cumprir serviccedilo militar aleacutem de natildeo
poderem participar da vida poliacutetica da cidade
Pontos essenciais
Peacutericles elogia a democracia e a sua superioridade sobre os restantes regimes poliacuteticos a afirmaccedilatildeo
dos princiacutepios baacutesicos da igualdade da liberdade e da participaccedilatildeo ciacutevica na vida puacuteblica a
apologia do debate puacuteblico das grandes questotildees do Estado a defesa da toleracircncia do equiliacutebrio e
da moderaccedilatildeo na accedilatildeo poliacutetica a atenccedilatildeo particular concedida agraves leis sociais de protecccedilatildeo dos
pobres e a concepccedilatildeo da possibilidade de ldquosair da pobreza pelo trabalhordquo a importacircncia dada agrave
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cultura ao desporto aos espectaacuteculos e divertimentos puacuteblicos) a referecircncia agrave prosperidade
econoacutemica da cidade e agrave sua abertura do exterior a ideia de que qualquer paiacutes mesmo
democraacutetico carece de poderio militar para conseguir defender-se com ecircxito dos seus inimigos a
defesa inteligente da ideia de uma sociedade democraacutetica (aberta tolerante organizada civilmente
e respeitadora do indiviacuteduo) em contrato permanente com o modelo oposto de uma sociedade
totalitaacuteria (fechada intolerante militarizada e colectivista) e enfim o elogio dos que aceitam
morrer pela Paacutetria e a exortaccedilatildeo aos vivos para que saibam honrar o exemplo dos que tombaram
no cumprimento do dever
Heroacutedoto Foi um geoacutegrafo e historiador grego continuador de Hecateu de Mileto nascido no seacuteculo V aC (485ndash420 aC) em Halicarnasso (hoje Bodrum na Turquia) Revelou a histoacuteria da invasatildeo persa na Greacutecia Foi o grande escritor da obra ldquoHistoacuteriasrdquo onde relata as guerras meacutedicas entre gregos e persas que eacute classificada em 9 livros O pensamento de Heroacutedoto Heroacutedoto representa sem duacutevida o espiacuterito antigo Muito se tem insistido sobre seu paralelo (e amizade) com Soacutefocles mas a dualidade teoloacutegica e humana que se encontra em sua obra possui maior semelhanccedila com o trabalho de Eacutesquilo A dupla motivaccedilatildeo factual da trageacutedia neste autor (responsabilidade humana e causalidade divina) natildeo eacute diferente da posiccedilatildeo de Heroacutedoto para quem (I 32 1) ldquoa divindade eacute em todos as ordens invejosa e causa de perturbaccedilatildeordquo Mas ao mesmo tempo aparece uma tendecircncia que busca no homem mesmo a causa do seu destino Tem-se um plano sobrenatural que potildee em relevo a fragilidade do ser humano que eacute ldquotodo incertezardquo O destino portanto se converte numa forccedila preacute-moral que se impotildee de maneira inexoraacutevel Isto implica num pessimismo que eacute consubstanciado no pensamento grego O ser humano se sente sujeito agraves instabilidades e eacute impotente ante os desiacutegnios divinos Sem duacutevida o aparente dogmatismo da inveja dos deuses natildeo diminui a responsabilidade dos homens Os castigos que este sofre satildeo provocados diretamente na proporccedilatildeo da soberbia humana Quando um homem se encontra numa posiccedilatildeo de relevo que excede agraves suas possibilidades naturais tente a incorrer em soberbia e eacute culpado de crimes e sortileacutegios que atentam contra a estabilidade eacutetico-social Para se precaver das hostilidades divinas o homem deve praticar a justiccedila a piedade e a modeacutestia sem que como ocorre em Soacutefocles seja absolutamente seguro que isto baste para ter sucesso Eacute um posicionamento similar ao da trageacutedia da liacuterica e da eacutepica Esta atitude de Heroacutedoto dirigida pela moderaccedilatildeo determina seu pensamento poliacutetico obrigado a exilar-se de sua paacutetria por um regime tiracircnico abomina a tirania cuja essecircncia eacute a irresponsabilidade ante a lei e aos demais membros da comunidade mostra-se convencido dos benefiacutecios que representa a liberdade daiacute a sua admiraccedilatildeo por Atenas e justificaccedilatildeo de seu apogeu Liberdade face agrave subordinaccedilatildeo ndash este eacute o diferencial entre gregos e baacuterbaros
Otanes em defesa da DEMOCRACIA
Como conjurado este defendia que doravante nenhum dos trecircs devia reinar sozinho e antes de
expor as vantagens do governo da multidatildeo soberana (Democracia) critica a Monarquia que
acabava de cair Para ele esta devia ser rejeitada devido a
bull Arrogacircncia dos Magos que admite revolta dos suacutebditos
bull O governo natildeo pode ser bem organizado porque um homem sem contraditor faz o que lhe
apetece arrastando-se ao desregulamento do espiacuterito
bull Perverte o bom senso dos melhores
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bull O rei que dada a sua situaccedilatildeo privilegiada natildeo devia ter inveja alimenta ciuacutemes dos
grandes e dos nobres e aprecia os maus acolhe a caluacutenia e se os suacutebditos o admiram com
moderaccedilatildeo acha-se insuficientemente honrado e se o honram sem reservas acha-se objeto de
adulaccedilatildeo (bajulaccedilatildeo)
bull O priacutencipe muda os costumes dos antepassados condena os homens agrave morte sem
julgamento e violentas as mulheres
Por seu turno a Democracia porque governa a multidatildeo soberana tem como vantagens
bull Natildeo comporta freio (impedimento) e natildeo aceita limites
bull Caracteriza-se pela Isonomia (igualdade perante a lei) por isso natildeo permite excessos
bull A maioria atribui as resoluccedilotildees agrave comunidade e atribui as funccedilotildees puacuteblicas por sorteio
(eleiccedilotildees)
ii Megabizo em defesa da Oligarquia
Comeccedila por defender que natildeo se deve aprovar a tese que preconiza o poder da multidatildeo porque
natildeo obstante o poder popular permitir escapar agrave arrogacircncia de um monarca (critica a democracia)
bull A autoridade fica a mercecirc da insolecircncia (sem respeito atrevido) de um povo
ignorante e impulsivo [relaccedilatildeo entre a educaccedilatildeo e a cidadania]
bull O tirano sabe o que faz enquanto o povo natildeo sabe porque natildeo eacute instruiacutedo Assim eacute de
temer os danos poliacutetico-sociais tanto da falta de instruccedilatildeo como da forma impetuosa e
precipitada da manifestaccedilatildeo das paixotildees do povo
Portanto segundo ele a Monarquia e a Democracia estavam fora das opccedilotildees viaacuteveis e defende
a OLIGARQUIA e a oligocracia ou Aristocracia como a soluccedilatildeo cujas vantagens seriam
bull Eleiccedilatildeo de uma assembleia soberana dos melhores em que todos os conjurados fariam
parte diferente da monarquia que permite apenas a escola de apenas um entre eles
bull Com o poder atribuiacutedo a eles como indiviacuteduos nasceriam resoluccedilotildees salutares da
reuniatildeo dos seus saberes
iii Daacuterio em defesa da MONARQUIA
Comeccedila por aprovar os argumentos pro-aristocraacuteticos em relaccedilatildeo agrave sua critica agrave Democracia
mas natildeo aprova os argumentos que defendem a oligarquia Partindo da suposiccedilatildeo de que a
Democracia a Aristocracia e a Monarquia satildeo excelentes e satildeo aplicadas a um povo tambeacutem
excelente pergunta qual seria a melhor RESPONDE
bull Nada eacute preferiacutevel a um homem excelente no governo porque o monarca excelente eacute
prudente ou ponderado na administraccedilatildeo
bull Ele eacute o uacutenico depositaacuterio do segredo do Estado e conserva-o nas accedilotildees externas
bull A oligarquia eacute fraacutegil por os oligarcas se detestam e acabarem por se tornar rivais onde
cada um quer fazer triunfar a sua opiniatildeo por julgaacute-la a melhor cada um quer ser mais chefe o
que leva agrave competiccedilatildeo e oacutedios as suas discoacuterdias tornam-se puacuteblicas e transformam-se em
violecircncia e massacres levando agrave vitoacuteria de um e restauraccedilatildeo da Monarquia
bull Por outro lado na democracia eacute impossiacutevel impedir a maldade porque os homens maus
aliam-se para oprimir a comunidade deles acaba se erguendo um revolucionaacuterio para travar este
jogo este seraacute admirado e apoiado pela multidatildeo e levado ao poder tornando-se rei e
degenerando na tirania
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CONCLUSOtildeES
bull A croacutenica de Heroacutedoto configura a teoria de evoluccedilatildeo ciacuteclica por degeneraccedilatildeo dos
regimes poliacuteticos mais tarde retomada e aprofundada por Aristoacuteteles
bull Natildeo obstante o argumento geral da croacutenica tender a favorecer os regimes elitistas ficou
patente que natildeo existe o melhor regime pois todos tem limitaccedilotildees e virtudes a sua
aplicaccedilatildeo depende das condiccedilotildees materiais sociais culturais eacuteticas e morais concretas
de cada sociedade
Platatildeo
Embora tenha nascido em Atenas Platatildeo (seacuteculos V e IV aC de 429-347 aC) de famiacutelia nobre
descendia pelo lado materno de Soacutelon um dos fundadores da democracia ateniense Apresentou
forte simpatia por Esparta nomeadamente por ter presenciado o julgamento e assistido agrave morte de
Soacutecrates considerado por ele como ldquoo melhor e mais saacutebio dos homensrdquo Impulsionado pelo
sentimento de revolta comeccedilou a desprezar Atenas e foi viver para Esparta A obra de longe mais
importante de Platatildeo eacute a Politeia usualmente traduzida por A Repuacuteblica
Platatildeo foi o primeiro grande pensador a avanccedilar com o modelo daquilo que seria no seu entender
uma sociedade ideal atacando aqueles que considera serem os grandes males da sociedade do seu
tempo - a famiacutelia e a propriedade privada A Poliacutetica eacute pois para Platatildeo a arte de governar os
homens com o seu consentimento
Segundo Platatildeo o melhor governo eacute o da sabedoria da razatildeo da inteligecircncia O governo ideal eacute o
filoacutesofo toda a sua obra estaacute marcada pela defesa constante e vigorosa da entrega do poder ao
Rei-Filoacutesofo isto eacute ao rei que saiba tornar-se filoacutesofo ou ao filoacutesofo que consiga vir a ser rei
O poder para Platatildeo deve pertencer agravequeles que sabem aos mais instruiacutedos pelas ciecircncias
nomeadamente pela Poliacutetica e pela Filosofia Platatildeo considera que os poliacuteticos natildeo podem ser
moderados nem violentos Os moderados gostam de viver tranquilamente satildeo paciacuteficos em sua
casa e querem secirc-lo tambeacutem perante as potecircncias estrangeiras satildeo incapazes de combater ficam agrave
mercecirc de quem os atacar Os violentos tambeacutem natildeo servem porque sendo belicosos empurram o
paiacutes para a guerra suscitam inimigos e arruiacutenam a Paacutetria ou arrastam-na para a submissatildeo ao
estrangeiro O poliacutetico ideal eacute assim o Rei-Filoacutesofo tatildeo firme que natildeo violento
Para Platatildeo a Justiccedila deixa de ser uma virtude individual para ser um atributo do Estado ideal ndash O
Estado justo a sociedade justa um Estado que seja uno em vez de Estado dividido em dois
grupos inimigos ndash o dos pobres e o dos ricos Platatildeo com um conceito inteiramente novo de
Justiccedila que nada a ver tem a ver com a equidade nas relaccedilotildees particulares dos indiviacuteduos entre si
mas sim com a correcta ordenaccedilatildeo do Estado Pela Justiccedila o Estado impotildee aos indiviacuteduos a
profissatildeo e os cargos que devem desempenhar e natildeo deixa ningueacutem sair do lugar que lhe
compete no sistema do conjunto
A Cidade Ideal de Platatildeo assentava a sua teoria no estabelecimento de um paralelo entre a alma
individual e a Cidade esta deveraacute ser estrutura como aquela o eacute
Ora ndash diz o filoacutesofo ndash a alma humana tem 3 partes a primeira eacute a parte racional e corresponde ao
plano das ideias a segunda eacute a parte irasciacutevel que compreende os impulsos e afectos do ser
humano e a terceira eacute a parte sensual que integra as necessidades elementares do homem
A cade uma destas partes corresponde uma virtude ou qualidade principal Agrave primeira a
sabedoria Agrave segunda a coragem agrave terceira o desejo a submissatildeo da segunda e da terceira agrave razatildeo
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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possam repercutir nas esferas daqueles efeitos negativos e como meta a alcanccedilar em prol da
justiccedila paz e de uma vida boa para os cidadatildeos
Antiguidade Claacutessica Peacutericles e a defesa da democracia
Peacutericles (seacuteculo V aC de + ou ndash 495-430 aC) foi um nobre ateniense homem inteligente e saacutebio
que abrilhantou a apreciada figura do estadista culto moderado e ciacutevico atraveacutes da sua defesa da
democracia (ainda hoje o ldquoseacuteculo de Peacutericlesrdquo eacute conhecido como o periacuteodo aacuteureo da democracia
ateniense)
Na sua apologia pela democracia Peacutericles defendia um modelo de democracia directa e
caracteriza o regime vigente em Atenas como um regime em que o Estado era administrado no
interesse do povo e natildeo das minorias Deste modo este pensador entende que os princiacutepios
basilares da democracia seriam a igualdade e a liberdade igualdade na medida em que as leis
asseguravam a todos um tratamento por igual e no que dizia respeito agrave vida puacuteblica cada um
obtinha uma igual consideraccedilatildeo em funccedilatildeo dos seus meacuteritos e valores pessoais (e natildeo em valor da
classe social a que se pertence) a liberdade seria um princiacutepio fundamental uma vez que
estimulava a participaccedilatildeo da opiniatildeo puacuteblica mesmo nos debates que envolvessem as grandes
questotildees do Estado (pois Peacutericles entendia que as grandes questotildees soacute tinham a ganhar com a livre
discussatildeo e argumentaccedilatildeo das opiniotildees)
Deste modo facilmente se conclui que todo o seu discurso fica indelevelmente (pensamento)
marcado pela apologia do equiliacutebrio da toleracircncia e moderaccedilatildeo da acccedilatildeo poliacutetica demonstrando
particular atenccedilatildeo pelas leis sociais e defendendo a possibilidade dos mais pobres saiacuterem da sua
deacutebil situaccedilatildeo atraveacutes do trabalho Durante o tempo que governou Atenas (mediante 15 eleiccedilotildees
sucessivas para o cargo de estratego) Peacutericles privilegiou a qualidade de vida (o desporto a
cultura os espectaacuteculos enfim os ldquocostumes de Atenasrdquo ) exacerbou a prosperidade econoacutemica
da cidade (bem como a sua abertura ao exterior) aleacutem de elogiar os que morriam como heroacuteis em
defesa da Paacutetria exortando aos vivos para que saibam honrar o exemplo dos que pereceram no
cumprimento do dever bem como as ldquoas instituiccedilotildees poliacuteticasrdquo de Atenas
A democracia ateniense apresentava contudo algumas imperfeiccedilotildees e limitaccedilotildees Caracterizava-
se por ser uma democracia directa e natildeo representativa na qual somente participavam os
cidadatildeos de Atenas ou seja os indiviacuteduos que eram filhos de pai e matildee atenienses com mais
de 21 anos de idade e com serviccedilo militar cumprido As mulheres natildeo possuiacuteam
poderesdireitos ciacutevicos nem juriacutedicos natildeo podiam possuir propriedades e era-lhes vedado o
ensino No entanto respeitava a liberdade de opiniatildeo a liberdade de entrar e sair do paiacutes e outras
liberdades essenciais e conferia aos cidadatildeos o direito de participaccedilatildeo no debate das grandes
questotildees de interesse geral
Facilmente se constata que Atenas era palco de uma sociedade esclavagista na qual os metecos (os
cidadatildeos estrangeiros como veio a ser o caso de Aristoacuteteles por exemplo) eram obrigados a
cumprir determinados deveres como pagar impostos e cumprir serviccedilo militar aleacutem de natildeo
poderem participar da vida poliacutetica da cidade
Pontos essenciais
Peacutericles elogia a democracia e a sua superioridade sobre os restantes regimes poliacuteticos a afirmaccedilatildeo
dos princiacutepios baacutesicos da igualdade da liberdade e da participaccedilatildeo ciacutevica na vida puacuteblica a
apologia do debate puacuteblico das grandes questotildees do Estado a defesa da toleracircncia do equiliacutebrio e
da moderaccedilatildeo na accedilatildeo poliacutetica a atenccedilatildeo particular concedida agraves leis sociais de protecccedilatildeo dos
pobres e a concepccedilatildeo da possibilidade de ldquosair da pobreza pelo trabalhordquo a importacircncia dada agrave
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cultura ao desporto aos espectaacuteculos e divertimentos puacuteblicos) a referecircncia agrave prosperidade
econoacutemica da cidade e agrave sua abertura do exterior a ideia de que qualquer paiacutes mesmo
democraacutetico carece de poderio militar para conseguir defender-se com ecircxito dos seus inimigos a
defesa inteligente da ideia de uma sociedade democraacutetica (aberta tolerante organizada civilmente
e respeitadora do indiviacuteduo) em contrato permanente com o modelo oposto de uma sociedade
totalitaacuteria (fechada intolerante militarizada e colectivista) e enfim o elogio dos que aceitam
morrer pela Paacutetria e a exortaccedilatildeo aos vivos para que saibam honrar o exemplo dos que tombaram
no cumprimento do dever
Heroacutedoto Foi um geoacutegrafo e historiador grego continuador de Hecateu de Mileto nascido no seacuteculo V aC (485ndash420 aC) em Halicarnasso (hoje Bodrum na Turquia) Revelou a histoacuteria da invasatildeo persa na Greacutecia Foi o grande escritor da obra ldquoHistoacuteriasrdquo onde relata as guerras meacutedicas entre gregos e persas que eacute classificada em 9 livros O pensamento de Heroacutedoto Heroacutedoto representa sem duacutevida o espiacuterito antigo Muito se tem insistido sobre seu paralelo (e amizade) com Soacutefocles mas a dualidade teoloacutegica e humana que se encontra em sua obra possui maior semelhanccedila com o trabalho de Eacutesquilo A dupla motivaccedilatildeo factual da trageacutedia neste autor (responsabilidade humana e causalidade divina) natildeo eacute diferente da posiccedilatildeo de Heroacutedoto para quem (I 32 1) ldquoa divindade eacute em todos as ordens invejosa e causa de perturbaccedilatildeordquo Mas ao mesmo tempo aparece uma tendecircncia que busca no homem mesmo a causa do seu destino Tem-se um plano sobrenatural que potildee em relevo a fragilidade do ser humano que eacute ldquotodo incertezardquo O destino portanto se converte numa forccedila preacute-moral que se impotildee de maneira inexoraacutevel Isto implica num pessimismo que eacute consubstanciado no pensamento grego O ser humano se sente sujeito agraves instabilidades e eacute impotente ante os desiacutegnios divinos Sem duacutevida o aparente dogmatismo da inveja dos deuses natildeo diminui a responsabilidade dos homens Os castigos que este sofre satildeo provocados diretamente na proporccedilatildeo da soberbia humana Quando um homem se encontra numa posiccedilatildeo de relevo que excede agraves suas possibilidades naturais tente a incorrer em soberbia e eacute culpado de crimes e sortileacutegios que atentam contra a estabilidade eacutetico-social Para se precaver das hostilidades divinas o homem deve praticar a justiccedila a piedade e a modeacutestia sem que como ocorre em Soacutefocles seja absolutamente seguro que isto baste para ter sucesso Eacute um posicionamento similar ao da trageacutedia da liacuterica e da eacutepica Esta atitude de Heroacutedoto dirigida pela moderaccedilatildeo determina seu pensamento poliacutetico obrigado a exilar-se de sua paacutetria por um regime tiracircnico abomina a tirania cuja essecircncia eacute a irresponsabilidade ante a lei e aos demais membros da comunidade mostra-se convencido dos benefiacutecios que representa a liberdade daiacute a sua admiraccedilatildeo por Atenas e justificaccedilatildeo de seu apogeu Liberdade face agrave subordinaccedilatildeo ndash este eacute o diferencial entre gregos e baacuterbaros
Otanes em defesa da DEMOCRACIA
Como conjurado este defendia que doravante nenhum dos trecircs devia reinar sozinho e antes de
expor as vantagens do governo da multidatildeo soberana (Democracia) critica a Monarquia que
acabava de cair Para ele esta devia ser rejeitada devido a
bull Arrogacircncia dos Magos que admite revolta dos suacutebditos
bull O governo natildeo pode ser bem organizado porque um homem sem contraditor faz o que lhe
apetece arrastando-se ao desregulamento do espiacuterito
bull Perverte o bom senso dos melhores
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bull O rei que dada a sua situaccedilatildeo privilegiada natildeo devia ter inveja alimenta ciuacutemes dos
grandes e dos nobres e aprecia os maus acolhe a caluacutenia e se os suacutebditos o admiram com
moderaccedilatildeo acha-se insuficientemente honrado e se o honram sem reservas acha-se objeto de
adulaccedilatildeo (bajulaccedilatildeo)
bull O priacutencipe muda os costumes dos antepassados condena os homens agrave morte sem
julgamento e violentas as mulheres
Por seu turno a Democracia porque governa a multidatildeo soberana tem como vantagens
bull Natildeo comporta freio (impedimento) e natildeo aceita limites
bull Caracteriza-se pela Isonomia (igualdade perante a lei) por isso natildeo permite excessos
bull A maioria atribui as resoluccedilotildees agrave comunidade e atribui as funccedilotildees puacuteblicas por sorteio
(eleiccedilotildees)
ii Megabizo em defesa da Oligarquia
Comeccedila por defender que natildeo se deve aprovar a tese que preconiza o poder da multidatildeo porque
natildeo obstante o poder popular permitir escapar agrave arrogacircncia de um monarca (critica a democracia)
bull A autoridade fica a mercecirc da insolecircncia (sem respeito atrevido) de um povo
ignorante e impulsivo [relaccedilatildeo entre a educaccedilatildeo e a cidadania]
bull O tirano sabe o que faz enquanto o povo natildeo sabe porque natildeo eacute instruiacutedo Assim eacute de
temer os danos poliacutetico-sociais tanto da falta de instruccedilatildeo como da forma impetuosa e
precipitada da manifestaccedilatildeo das paixotildees do povo
Portanto segundo ele a Monarquia e a Democracia estavam fora das opccedilotildees viaacuteveis e defende
a OLIGARQUIA e a oligocracia ou Aristocracia como a soluccedilatildeo cujas vantagens seriam
bull Eleiccedilatildeo de uma assembleia soberana dos melhores em que todos os conjurados fariam
parte diferente da monarquia que permite apenas a escola de apenas um entre eles
bull Com o poder atribuiacutedo a eles como indiviacuteduos nasceriam resoluccedilotildees salutares da
reuniatildeo dos seus saberes
iii Daacuterio em defesa da MONARQUIA
Comeccedila por aprovar os argumentos pro-aristocraacuteticos em relaccedilatildeo agrave sua critica agrave Democracia
mas natildeo aprova os argumentos que defendem a oligarquia Partindo da suposiccedilatildeo de que a
Democracia a Aristocracia e a Monarquia satildeo excelentes e satildeo aplicadas a um povo tambeacutem
excelente pergunta qual seria a melhor RESPONDE
bull Nada eacute preferiacutevel a um homem excelente no governo porque o monarca excelente eacute
prudente ou ponderado na administraccedilatildeo
bull Ele eacute o uacutenico depositaacuterio do segredo do Estado e conserva-o nas accedilotildees externas
bull A oligarquia eacute fraacutegil por os oligarcas se detestam e acabarem por se tornar rivais onde
cada um quer fazer triunfar a sua opiniatildeo por julgaacute-la a melhor cada um quer ser mais chefe o
que leva agrave competiccedilatildeo e oacutedios as suas discoacuterdias tornam-se puacuteblicas e transformam-se em
violecircncia e massacres levando agrave vitoacuteria de um e restauraccedilatildeo da Monarquia
bull Por outro lado na democracia eacute impossiacutevel impedir a maldade porque os homens maus
aliam-se para oprimir a comunidade deles acaba se erguendo um revolucionaacuterio para travar este
jogo este seraacute admirado e apoiado pela multidatildeo e levado ao poder tornando-se rei e
degenerando na tirania
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CONCLUSOtildeES
bull A croacutenica de Heroacutedoto configura a teoria de evoluccedilatildeo ciacuteclica por degeneraccedilatildeo dos
regimes poliacuteticos mais tarde retomada e aprofundada por Aristoacuteteles
bull Natildeo obstante o argumento geral da croacutenica tender a favorecer os regimes elitistas ficou
patente que natildeo existe o melhor regime pois todos tem limitaccedilotildees e virtudes a sua
aplicaccedilatildeo depende das condiccedilotildees materiais sociais culturais eacuteticas e morais concretas
de cada sociedade
Platatildeo
Embora tenha nascido em Atenas Platatildeo (seacuteculos V e IV aC de 429-347 aC) de famiacutelia nobre
descendia pelo lado materno de Soacutelon um dos fundadores da democracia ateniense Apresentou
forte simpatia por Esparta nomeadamente por ter presenciado o julgamento e assistido agrave morte de
Soacutecrates considerado por ele como ldquoo melhor e mais saacutebio dos homensrdquo Impulsionado pelo
sentimento de revolta comeccedilou a desprezar Atenas e foi viver para Esparta A obra de longe mais
importante de Platatildeo eacute a Politeia usualmente traduzida por A Repuacuteblica
Platatildeo foi o primeiro grande pensador a avanccedilar com o modelo daquilo que seria no seu entender
uma sociedade ideal atacando aqueles que considera serem os grandes males da sociedade do seu
tempo - a famiacutelia e a propriedade privada A Poliacutetica eacute pois para Platatildeo a arte de governar os
homens com o seu consentimento
Segundo Platatildeo o melhor governo eacute o da sabedoria da razatildeo da inteligecircncia O governo ideal eacute o
filoacutesofo toda a sua obra estaacute marcada pela defesa constante e vigorosa da entrega do poder ao
Rei-Filoacutesofo isto eacute ao rei que saiba tornar-se filoacutesofo ou ao filoacutesofo que consiga vir a ser rei
O poder para Platatildeo deve pertencer agravequeles que sabem aos mais instruiacutedos pelas ciecircncias
nomeadamente pela Poliacutetica e pela Filosofia Platatildeo considera que os poliacuteticos natildeo podem ser
moderados nem violentos Os moderados gostam de viver tranquilamente satildeo paciacuteficos em sua
casa e querem secirc-lo tambeacutem perante as potecircncias estrangeiras satildeo incapazes de combater ficam agrave
mercecirc de quem os atacar Os violentos tambeacutem natildeo servem porque sendo belicosos empurram o
paiacutes para a guerra suscitam inimigos e arruiacutenam a Paacutetria ou arrastam-na para a submissatildeo ao
estrangeiro O poliacutetico ideal eacute assim o Rei-Filoacutesofo tatildeo firme que natildeo violento
Para Platatildeo a Justiccedila deixa de ser uma virtude individual para ser um atributo do Estado ideal ndash O
Estado justo a sociedade justa um Estado que seja uno em vez de Estado dividido em dois
grupos inimigos ndash o dos pobres e o dos ricos Platatildeo com um conceito inteiramente novo de
Justiccedila que nada a ver tem a ver com a equidade nas relaccedilotildees particulares dos indiviacuteduos entre si
mas sim com a correcta ordenaccedilatildeo do Estado Pela Justiccedila o Estado impotildee aos indiviacuteduos a
profissatildeo e os cargos que devem desempenhar e natildeo deixa ningueacutem sair do lugar que lhe
compete no sistema do conjunto
A Cidade Ideal de Platatildeo assentava a sua teoria no estabelecimento de um paralelo entre a alma
individual e a Cidade esta deveraacute ser estrutura como aquela o eacute
Ora ndash diz o filoacutesofo ndash a alma humana tem 3 partes a primeira eacute a parte racional e corresponde ao
plano das ideias a segunda eacute a parte irasciacutevel que compreende os impulsos e afectos do ser
humano e a terceira eacute a parte sensual que integra as necessidades elementares do homem
A cade uma destas partes corresponde uma virtude ou qualidade principal Agrave primeira a
sabedoria Agrave segunda a coragem agrave terceira o desejo a submissatildeo da segunda e da terceira agrave razatildeo
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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cultura ao desporto aos espectaacuteculos e divertimentos puacuteblicos) a referecircncia agrave prosperidade
econoacutemica da cidade e agrave sua abertura do exterior a ideia de que qualquer paiacutes mesmo
democraacutetico carece de poderio militar para conseguir defender-se com ecircxito dos seus inimigos a
defesa inteligente da ideia de uma sociedade democraacutetica (aberta tolerante organizada civilmente
e respeitadora do indiviacuteduo) em contrato permanente com o modelo oposto de uma sociedade
totalitaacuteria (fechada intolerante militarizada e colectivista) e enfim o elogio dos que aceitam
morrer pela Paacutetria e a exortaccedilatildeo aos vivos para que saibam honrar o exemplo dos que tombaram
no cumprimento do dever
Heroacutedoto Foi um geoacutegrafo e historiador grego continuador de Hecateu de Mileto nascido no seacuteculo V aC (485ndash420 aC) em Halicarnasso (hoje Bodrum na Turquia) Revelou a histoacuteria da invasatildeo persa na Greacutecia Foi o grande escritor da obra ldquoHistoacuteriasrdquo onde relata as guerras meacutedicas entre gregos e persas que eacute classificada em 9 livros O pensamento de Heroacutedoto Heroacutedoto representa sem duacutevida o espiacuterito antigo Muito se tem insistido sobre seu paralelo (e amizade) com Soacutefocles mas a dualidade teoloacutegica e humana que se encontra em sua obra possui maior semelhanccedila com o trabalho de Eacutesquilo A dupla motivaccedilatildeo factual da trageacutedia neste autor (responsabilidade humana e causalidade divina) natildeo eacute diferente da posiccedilatildeo de Heroacutedoto para quem (I 32 1) ldquoa divindade eacute em todos as ordens invejosa e causa de perturbaccedilatildeordquo Mas ao mesmo tempo aparece uma tendecircncia que busca no homem mesmo a causa do seu destino Tem-se um plano sobrenatural que potildee em relevo a fragilidade do ser humano que eacute ldquotodo incertezardquo O destino portanto se converte numa forccedila preacute-moral que se impotildee de maneira inexoraacutevel Isto implica num pessimismo que eacute consubstanciado no pensamento grego O ser humano se sente sujeito agraves instabilidades e eacute impotente ante os desiacutegnios divinos Sem duacutevida o aparente dogmatismo da inveja dos deuses natildeo diminui a responsabilidade dos homens Os castigos que este sofre satildeo provocados diretamente na proporccedilatildeo da soberbia humana Quando um homem se encontra numa posiccedilatildeo de relevo que excede agraves suas possibilidades naturais tente a incorrer em soberbia e eacute culpado de crimes e sortileacutegios que atentam contra a estabilidade eacutetico-social Para se precaver das hostilidades divinas o homem deve praticar a justiccedila a piedade e a modeacutestia sem que como ocorre em Soacutefocles seja absolutamente seguro que isto baste para ter sucesso Eacute um posicionamento similar ao da trageacutedia da liacuterica e da eacutepica Esta atitude de Heroacutedoto dirigida pela moderaccedilatildeo determina seu pensamento poliacutetico obrigado a exilar-se de sua paacutetria por um regime tiracircnico abomina a tirania cuja essecircncia eacute a irresponsabilidade ante a lei e aos demais membros da comunidade mostra-se convencido dos benefiacutecios que representa a liberdade daiacute a sua admiraccedilatildeo por Atenas e justificaccedilatildeo de seu apogeu Liberdade face agrave subordinaccedilatildeo ndash este eacute o diferencial entre gregos e baacuterbaros
Otanes em defesa da DEMOCRACIA
Como conjurado este defendia que doravante nenhum dos trecircs devia reinar sozinho e antes de
expor as vantagens do governo da multidatildeo soberana (Democracia) critica a Monarquia que
acabava de cair Para ele esta devia ser rejeitada devido a
bull Arrogacircncia dos Magos que admite revolta dos suacutebditos
bull O governo natildeo pode ser bem organizado porque um homem sem contraditor faz o que lhe
apetece arrastando-se ao desregulamento do espiacuterito
bull Perverte o bom senso dos melhores
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bull O rei que dada a sua situaccedilatildeo privilegiada natildeo devia ter inveja alimenta ciuacutemes dos
grandes e dos nobres e aprecia os maus acolhe a caluacutenia e se os suacutebditos o admiram com
moderaccedilatildeo acha-se insuficientemente honrado e se o honram sem reservas acha-se objeto de
adulaccedilatildeo (bajulaccedilatildeo)
bull O priacutencipe muda os costumes dos antepassados condena os homens agrave morte sem
julgamento e violentas as mulheres
Por seu turno a Democracia porque governa a multidatildeo soberana tem como vantagens
bull Natildeo comporta freio (impedimento) e natildeo aceita limites
bull Caracteriza-se pela Isonomia (igualdade perante a lei) por isso natildeo permite excessos
bull A maioria atribui as resoluccedilotildees agrave comunidade e atribui as funccedilotildees puacuteblicas por sorteio
(eleiccedilotildees)
ii Megabizo em defesa da Oligarquia
Comeccedila por defender que natildeo se deve aprovar a tese que preconiza o poder da multidatildeo porque
natildeo obstante o poder popular permitir escapar agrave arrogacircncia de um monarca (critica a democracia)
bull A autoridade fica a mercecirc da insolecircncia (sem respeito atrevido) de um povo
ignorante e impulsivo [relaccedilatildeo entre a educaccedilatildeo e a cidadania]
bull O tirano sabe o que faz enquanto o povo natildeo sabe porque natildeo eacute instruiacutedo Assim eacute de
temer os danos poliacutetico-sociais tanto da falta de instruccedilatildeo como da forma impetuosa e
precipitada da manifestaccedilatildeo das paixotildees do povo
Portanto segundo ele a Monarquia e a Democracia estavam fora das opccedilotildees viaacuteveis e defende
a OLIGARQUIA e a oligocracia ou Aristocracia como a soluccedilatildeo cujas vantagens seriam
bull Eleiccedilatildeo de uma assembleia soberana dos melhores em que todos os conjurados fariam
parte diferente da monarquia que permite apenas a escola de apenas um entre eles
bull Com o poder atribuiacutedo a eles como indiviacuteduos nasceriam resoluccedilotildees salutares da
reuniatildeo dos seus saberes
iii Daacuterio em defesa da MONARQUIA
Comeccedila por aprovar os argumentos pro-aristocraacuteticos em relaccedilatildeo agrave sua critica agrave Democracia
mas natildeo aprova os argumentos que defendem a oligarquia Partindo da suposiccedilatildeo de que a
Democracia a Aristocracia e a Monarquia satildeo excelentes e satildeo aplicadas a um povo tambeacutem
excelente pergunta qual seria a melhor RESPONDE
bull Nada eacute preferiacutevel a um homem excelente no governo porque o monarca excelente eacute
prudente ou ponderado na administraccedilatildeo
bull Ele eacute o uacutenico depositaacuterio do segredo do Estado e conserva-o nas accedilotildees externas
bull A oligarquia eacute fraacutegil por os oligarcas se detestam e acabarem por se tornar rivais onde
cada um quer fazer triunfar a sua opiniatildeo por julgaacute-la a melhor cada um quer ser mais chefe o
que leva agrave competiccedilatildeo e oacutedios as suas discoacuterdias tornam-se puacuteblicas e transformam-se em
violecircncia e massacres levando agrave vitoacuteria de um e restauraccedilatildeo da Monarquia
bull Por outro lado na democracia eacute impossiacutevel impedir a maldade porque os homens maus
aliam-se para oprimir a comunidade deles acaba se erguendo um revolucionaacuterio para travar este
jogo este seraacute admirado e apoiado pela multidatildeo e levado ao poder tornando-se rei e
degenerando na tirania
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CONCLUSOtildeES
bull A croacutenica de Heroacutedoto configura a teoria de evoluccedilatildeo ciacuteclica por degeneraccedilatildeo dos
regimes poliacuteticos mais tarde retomada e aprofundada por Aristoacuteteles
bull Natildeo obstante o argumento geral da croacutenica tender a favorecer os regimes elitistas ficou
patente que natildeo existe o melhor regime pois todos tem limitaccedilotildees e virtudes a sua
aplicaccedilatildeo depende das condiccedilotildees materiais sociais culturais eacuteticas e morais concretas
de cada sociedade
Platatildeo
Embora tenha nascido em Atenas Platatildeo (seacuteculos V e IV aC de 429-347 aC) de famiacutelia nobre
descendia pelo lado materno de Soacutelon um dos fundadores da democracia ateniense Apresentou
forte simpatia por Esparta nomeadamente por ter presenciado o julgamento e assistido agrave morte de
Soacutecrates considerado por ele como ldquoo melhor e mais saacutebio dos homensrdquo Impulsionado pelo
sentimento de revolta comeccedilou a desprezar Atenas e foi viver para Esparta A obra de longe mais
importante de Platatildeo eacute a Politeia usualmente traduzida por A Repuacuteblica
Platatildeo foi o primeiro grande pensador a avanccedilar com o modelo daquilo que seria no seu entender
uma sociedade ideal atacando aqueles que considera serem os grandes males da sociedade do seu
tempo - a famiacutelia e a propriedade privada A Poliacutetica eacute pois para Platatildeo a arte de governar os
homens com o seu consentimento
Segundo Platatildeo o melhor governo eacute o da sabedoria da razatildeo da inteligecircncia O governo ideal eacute o
filoacutesofo toda a sua obra estaacute marcada pela defesa constante e vigorosa da entrega do poder ao
Rei-Filoacutesofo isto eacute ao rei que saiba tornar-se filoacutesofo ou ao filoacutesofo que consiga vir a ser rei
O poder para Platatildeo deve pertencer agravequeles que sabem aos mais instruiacutedos pelas ciecircncias
nomeadamente pela Poliacutetica e pela Filosofia Platatildeo considera que os poliacuteticos natildeo podem ser
moderados nem violentos Os moderados gostam de viver tranquilamente satildeo paciacuteficos em sua
casa e querem secirc-lo tambeacutem perante as potecircncias estrangeiras satildeo incapazes de combater ficam agrave
mercecirc de quem os atacar Os violentos tambeacutem natildeo servem porque sendo belicosos empurram o
paiacutes para a guerra suscitam inimigos e arruiacutenam a Paacutetria ou arrastam-na para a submissatildeo ao
estrangeiro O poliacutetico ideal eacute assim o Rei-Filoacutesofo tatildeo firme que natildeo violento
Para Platatildeo a Justiccedila deixa de ser uma virtude individual para ser um atributo do Estado ideal ndash O
Estado justo a sociedade justa um Estado que seja uno em vez de Estado dividido em dois
grupos inimigos ndash o dos pobres e o dos ricos Platatildeo com um conceito inteiramente novo de
Justiccedila que nada a ver tem a ver com a equidade nas relaccedilotildees particulares dos indiviacuteduos entre si
mas sim com a correcta ordenaccedilatildeo do Estado Pela Justiccedila o Estado impotildee aos indiviacuteduos a
profissatildeo e os cargos que devem desempenhar e natildeo deixa ningueacutem sair do lugar que lhe
compete no sistema do conjunto
A Cidade Ideal de Platatildeo assentava a sua teoria no estabelecimento de um paralelo entre a alma
individual e a Cidade esta deveraacute ser estrutura como aquela o eacute
Ora ndash diz o filoacutesofo ndash a alma humana tem 3 partes a primeira eacute a parte racional e corresponde ao
plano das ideias a segunda eacute a parte irasciacutevel que compreende os impulsos e afectos do ser
humano e a terceira eacute a parte sensual que integra as necessidades elementares do homem
A cade uma destas partes corresponde uma virtude ou qualidade principal Agrave primeira a
sabedoria Agrave segunda a coragem agrave terceira o desejo a submissatildeo da segunda e da terceira agrave razatildeo
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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bull O rei que dada a sua situaccedilatildeo privilegiada natildeo devia ter inveja alimenta ciuacutemes dos
grandes e dos nobres e aprecia os maus acolhe a caluacutenia e se os suacutebditos o admiram com
moderaccedilatildeo acha-se insuficientemente honrado e se o honram sem reservas acha-se objeto de
adulaccedilatildeo (bajulaccedilatildeo)
bull O priacutencipe muda os costumes dos antepassados condena os homens agrave morte sem
julgamento e violentas as mulheres
Por seu turno a Democracia porque governa a multidatildeo soberana tem como vantagens
bull Natildeo comporta freio (impedimento) e natildeo aceita limites
bull Caracteriza-se pela Isonomia (igualdade perante a lei) por isso natildeo permite excessos
bull A maioria atribui as resoluccedilotildees agrave comunidade e atribui as funccedilotildees puacuteblicas por sorteio
(eleiccedilotildees)
ii Megabizo em defesa da Oligarquia
Comeccedila por defender que natildeo se deve aprovar a tese que preconiza o poder da multidatildeo porque
natildeo obstante o poder popular permitir escapar agrave arrogacircncia de um monarca (critica a democracia)
bull A autoridade fica a mercecirc da insolecircncia (sem respeito atrevido) de um povo
ignorante e impulsivo [relaccedilatildeo entre a educaccedilatildeo e a cidadania]
bull O tirano sabe o que faz enquanto o povo natildeo sabe porque natildeo eacute instruiacutedo Assim eacute de
temer os danos poliacutetico-sociais tanto da falta de instruccedilatildeo como da forma impetuosa e
precipitada da manifestaccedilatildeo das paixotildees do povo
Portanto segundo ele a Monarquia e a Democracia estavam fora das opccedilotildees viaacuteveis e defende
a OLIGARQUIA e a oligocracia ou Aristocracia como a soluccedilatildeo cujas vantagens seriam
bull Eleiccedilatildeo de uma assembleia soberana dos melhores em que todos os conjurados fariam
parte diferente da monarquia que permite apenas a escola de apenas um entre eles
bull Com o poder atribuiacutedo a eles como indiviacuteduos nasceriam resoluccedilotildees salutares da
reuniatildeo dos seus saberes
iii Daacuterio em defesa da MONARQUIA
Comeccedila por aprovar os argumentos pro-aristocraacuteticos em relaccedilatildeo agrave sua critica agrave Democracia
mas natildeo aprova os argumentos que defendem a oligarquia Partindo da suposiccedilatildeo de que a
Democracia a Aristocracia e a Monarquia satildeo excelentes e satildeo aplicadas a um povo tambeacutem
excelente pergunta qual seria a melhor RESPONDE
bull Nada eacute preferiacutevel a um homem excelente no governo porque o monarca excelente eacute
prudente ou ponderado na administraccedilatildeo
bull Ele eacute o uacutenico depositaacuterio do segredo do Estado e conserva-o nas accedilotildees externas
bull A oligarquia eacute fraacutegil por os oligarcas se detestam e acabarem por se tornar rivais onde
cada um quer fazer triunfar a sua opiniatildeo por julgaacute-la a melhor cada um quer ser mais chefe o
que leva agrave competiccedilatildeo e oacutedios as suas discoacuterdias tornam-se puacuteblicas e transformam-se em
violecircncia e massacres levando agrave vitoacuteria de um e restauraccedilatildeo da Monarquia
bull Por outro lado na democracia eacute impossiacutevel impedir a maldade porque os homens maus
aliam-se para oprimir a comunidade deles acaba se erguendo um revolucionaacuterio para travar este
jogo este seraacute admirado e apoiado pela multidatildeo e levado ao poder tornando-se rei e
degenerando na tirania
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CONCLUSOtildeES
bull A croacutenica de Heroacutedoto configura a teoria de evoluccedilatildeo ciacuteclica por degeneraccedilatildeo dos
regimes poliacuteticos mais tarde retomada e aprofundada por Aristoacuteteles
bull Natildeo obstante o argumento geral da croacutenica tender a favorecer os regimes elitistas ficou
patente que natildeo existe o melhor regime pois todos tem limitaccedilotildees e virtudes a sua
aplicaccedilatildeo depende das condiccedilotildees materiais sociais culturais eacuteticas e morais concretas
de cada sociedade
Platatildeo
Embora tenha nascido em Atenas Platatildeo (seacuteculos V e IV aC de 429-347 aC) de famiacutelia nobre
descendia pelo lado materno de Soacutelon um dos fundadores da democracia ateniense Apresentou
forte simpatia por Esparta nomeadamente por ter presenciado o julgamento e assistido agrave morte de
Soacutecrates considerado por ele como ldquoo melhor e mais saacutebio dos homensrdquo Impulsionado pelo
sentimento de revolta comeccedilou a desprezar Atenas e foi viver para Esparta A obra de longe mais
importante de Platatildeo eacute a Politeia usualmente traduzida por A Repuacuteblica
Platatildeo foi o primeiro grande pensador a avanccedilar com o modelo daquilo que seria no seu entender
uma sociedade ideal atacando aqueles que considera serem os grandes males da sociedade do seu
tempo - a famiacutelia e a propriedade privada A Poliacutetica eacute pois para Platatildeo a arte de governar os
homens com o seu consentimento
Segundo Platatildeo o melhor governo eacute o da sabedoria da razatildeo da inteligecircncia O governo ideal eacute o
filoacutesofo toda a sua obra estaacute marcada pela defesa constante e vigorosa da entrega do poder ao
Rei-Filoacutesofo isto eacute ao rei que saiba tornar-se filoacutesofo ou ao filoacutesofo que consiga vir a ser rei
O poder para Platatildeo deve pertencer agravequeles que sabem aos mais instruiacutedos pelas ciecircncias
nomeadamente pela Poliacutetica e pela Filosofia Platatildeo considera que os poliacuteticos natildeo podem ser
moderados nem violentos Os moderados gostam de viver tranquilamente satildeo paciacuteficos em sua
casa e querem secirc-lo tambeacutem perante as potecircncias estrangeiras satildeo incapazes de combater ficam agrave
mercecirc de quem os atacar Os violentos tambeacutem natildeo servem porque sendo belicosos empurram o
paiacutes para a guerra suscitam inimigos e arruiacutenam a Paacutetria ou arrastam-na para a submissatildeo ao
estrangeiro O poliacutetico ideal eacute assim o Rei-Filoacutesofo tatildeo firme que natildeo violento
Para Platatildeo a Justiccedila deixa de ser uma virtude individual para ser um atributo do Estado ideal ndash O
Estado justo a sociedade justa um Estado que seja uno em vez de Estado dividido em dois
grupos inimigos ndash o dos pobres e o dos ricos Platatildeo com um conceito inteiramente novo de
Justiccedila que nada a ver tem a ver com a equidade nas relaccedilotildees particulares dos indiviacuteduos entre si
mas sim com a correcta ordenaccedilatildeo do Estado Pela Justiccedila o Estado impotildee aos indiviacuteduos a
profissatildeo e os cargos que devem desempenhar e natildeo deixa ningueacutem sair do lugar que lhe
compete no sistema do conjunto
A Cidade Ideal de Platatildeo assentava a sua teoria no estabelecimento de um paralelo entre a alma
individual e a Cidade esta deveraacute ser estrutura como aquela o eacute
Ora ndash diz o filoacutesofo ndash a alma humana tem 3 partes a primeira eacute a parte racional e corresponde ao
plano das ideias a segunda eacute a parte irasciacutevel que compreende os impulsos e afectos do ser
humano e a terceira eacute a parte sensual que integra as necessidades elementares do homem
A cade uma destas partes corresponde uma virtude ou qualidade principal Agrave primeira a
sabedoria Agrave segunda a coragem agrave terceira o desejo a submissatildeo da segunda e da terceira agrave razatildeo
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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CONCLUSOtildeES
bull A croacutenica de Heroacutedoto configura a teoria de evoluccedilatildeo ciacuteclica por degeneraccedilatildeo dos
regimes poliacuteticos mais tarde retomada e aprofundada por Aristoacuteteles
bull Natildeo obstante o argumento geral da croacutenica tender a favorecer os regimes elitistas ficou
patente que natildeo existe o melhor regime pois todos tem limitaccedilotildees e virtudes a sua
aplicaccedilatildeo depende das condiccedilotildees materiais sociais culturais eacuteticas e morais concretas
de cada sociedade
Platatildeo
Embora tenha nascido em Atenas Platatildeo (seacuteculos V e IV aC de 429-347 aC) de famiacutelia nobre
descendia pelo lado materno de Soacutelon um dos fundadores da democracia ateniense Apresentou
forte simpatia por Esparta nomeadamente por ter presenciado o julgamento e assistido agrave morte de
Soacutecrates considerado por ele como ldquoo melhor e mais saacutebio dos homensrdquo Impulsionado pelo
sentimento de revolta comeccedilou a desprezar Atenas e foi viver para Esparta A obra de longe mais
importante de Platatildeo eacute a Politeia usualmente traduzida por A Repuacuteblica
Platatildeo foi o primeiro grande pensador a avanccedilar com o modelo daquilo que seria no seu entender
uma sociedade ideal atacando aqueles que considera serem os grandes males da sociedade do seu
tempo - a famiacutelia e a propriedade privada A Poliacutetica eacute pois para Platatildeo a arte de governar os
homens com o seu consentimento
Segundo Platatildeo o melhor governo eacute o da sabedoria da razatildeo da inteligecircncia O governo ideal eacute o
filoacutesofo toda a sua obra estaacute marcada pela defesa constante e vigorosa da entrega do poder ao
Rei-Filoacutesofo isto eacute ao rei que saiba tornar-se filoacutesofo ou ao filoacutesofo que consiga vir a ser rei
O poder para Platatildeo deve pertencer agravequeles que sabem aos mais instruiacutedos pelas ciecircncias
nomeadamente pela Poliacutetica e pela Filosofia Platatildeo considera que os poliacuteticos natildeo podem ser
moderados nem violentos Os moderados gostam de viver tranquilamente satildeo paciacuteficos em sua
casa e querem secirc-lo tambeacutem perante as potecircncias estrangeiras satildeo incapazes de combater ficam agrave
mercecirc de quem os atacar Os violentos tambeacutem natildeo servem porque sendo belicosos empurram o
paiacutes para a guerra suscitam inimigos e arruiacutenam a Paacutetria ou arrastam-na para a submissatildeo ao
estrangeiro O poliacutetico ideal eacute assim o Rei-Filoacutesofo tatildeo firme que natildeo violento
Para Platatildeo a Justiccedila deixa de ser uma virtude individual para ser um atributo do Estado ideal ndash O
Estado justo a sociedade justa um Estado que seja uno em vez de Estado dividido em dois
grupos inimigos ndash o dos pobres e o dos ricos Platatildeo com um conceito inteiramente novo de
Justiccedila que nada a ver tem a ver com a equidade nas relaccedilotildees particulares dos indiviacuteduos entre si
mas sim com a correcta ordenaccedilatildeo do Estado Pela Justiccedila o Estado impotildee aos indiviacuteduos a
profissatildeo e os cargos que devem desempenhar e natildeo deixa ningueacutem sair do lugar que lhe
compete no sistema do conjunto
A Cidade Ideal de Platatildeo assentava a sua teoria no estabelecimento de um paralelo entre a alma
individual e a Cidade esta deveraacute ser estrutura como aquela o eacute
Ora ndash diz o filoacutesofo ndash a alma humana tem 3 partes a primeira eacute a parte racional e corresponde ao
plano das ideias a segunda eacute a parte irasciacutevel que compreende os impulsos e afectos do ser
humano e a terceira eacute a parte sensual que integra as necessidades elementares do homem
A cade uma destas partes corresponde uma virtude ou qualidade principal Agrave primeira a
sabedoria Agrave segunda a coragem agrave terceira o desejo a submissatildeo da segunda e da terceira agrave razatildeo
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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consiste na temperanccedila por fim a justiccedila eacute o ordenamento das outras 3 Ora bem a Cidade deveraacute
ter segundo Platatildeo a mesmo estrutura tripartida posto que a Cidade eacute como ldquoum homem em
ponto granderdquo (conceccedilatildeo antropomoacuterfica do Estado)
Assim haveraacute na Cidade ideal 3 classes
- a classe dos magistrados (governantes) corresponde agrave parte racional da alma deve actuar segundo
a razatildeo ou sabedoria e complete-lhe governar a Cidade
- a classe dos guardas (militares) corresponde agrave parte irasciacutevel da alma deve actuar segundo a
coragem e compete-lhe garantir a defesa e a seguranccedila da Cidade
- a classe dos produtores e artiacutefices em geral (trabalhadores) corresponde agrave parte sensual da alma
deve actuar segundo o desejo e compete-lhe assegurar o sustento material da Cidade
Propocircs a aboliccedilatildeo da propriedade privada (soacute para a classe dos guardas e eventualmente para a
dos magistrados) - pois entendia que o patrimoacutenio individual tornava as pessoas egoiacutestas
(ldquonenhum deles possuiraacute quaisquer bens proacuteprios a natildeo ser coisa de primeira
necessidadenenhum teraacute habitaccedilatildeo ou depoacutesito algum em que natildeo possa entrar quem quiserrdquo)
por fazer com que se preocupassem primeiramente com aquilo que lhes pertencia descurando
assim a preocupaccedilatildeo com o bem geral da cidade - do casamento e da famiacutelia tradicionalmente
concebida
Tornou-se favoraacutevel agrave igualdade entre os sexos numa sociedade que deveria direccionar os seus
elementos num objectivo comum evitando assim o egoiacutesmo das sociedades multifacetadas As
uniotildees teriam por base um sorteio organizado pelos governantesmagistrados e que seria em
determinadas alturas engenhosamente determinado pelos mesmos para que do resultado dessas
uniotildees emergisse um conjunto de pessoas dotadas de melhores caracteriacutesticas tendo em vista uma
espeacutecie de ldquoaprimoramento da raccedilardquo e por conseguinte mais um passo em frente no objectivo da
sociedade ideal As crianccedilas que nascessem deformadas ou fora do esquema por ele proposto
seriam abandonadas e deixadas agrave sua sorte ou ocultadas
Outro aspecto fundamental no pensamento platoacutenico foi a importacircncia dada agrave educaccedilatildeo Ele
propunha que as crianccedilas fossem retiradas agraves matildees aquando do seu nascimento e seriam
entregues a amas Ao longo da sua infacircncia seriam os magistrados a ficar encarregues de escolher
as faacutebulas para serem lidas pelas amas agraves crianccedilas Platatildeo defendia um modelo educativo que
privilegiasse um acompanhamento dedicado e constante agraves crianccedilas de forma a que se estudasse
o desenvolvimento das aptidotildees naturais das mesmas e para que os magistrados tivessem uma
ideia mais precisa das suas reais capacidades Para tal estariam previstas fases de ginaacutestica e de
muacutesica para que as crianccedilas experimentassem novas emoccedilotildees e mais tarde estaria prevista nova
fase mas que incidisse sobre as artes militares e as ciecircncias tendo em vista a integraccedilatildeo nas trecircs
classes sociais avanccediladas pelo filoacutesofo
Estaria entatildeo estabelecido que aos 30 anos aqueles que fossem os melhores de entre os guerreiros
seriam educados com base na arte do diaacutelogo e da filosofia com vista agrave magistratura que seria
atingida aos 50 anos de idade apoacutes serem superadas todas as provas Deste modo triunfaria no
entender de Platatildeo aquilo que ele designava como a sofiocracia o governo da sabedoria e o
melhor de entre os filoacutesofos seria considerado o ldquoRei-filoacutesofordquo
Platatildeo concebeu trecircs moldes de classes sociais tendo por base a ceacutelebre ldquoteoria dos metaisrdquo
segundo a qual cada pessoa possui na sua alma um metal colocado por Deus Nalgumas esse
metal seria o ferro ou o bronze e nesse caso a pessoa estaria destinada a pertencer agrave classe dos
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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artesatildeosartiacutefices (seriam os trabalhadores cuja principal funccedilatildeo consistia em assegurar os bens e
o sustento da cidade) noutras pessoas seria a prata e pertenceriam portanto agrave classe dos
guardasmilitares (cuja funccedilatildeo seria a proteger e defender a cidade) e finalmente teriacuteamos um
restrito grupo de pessoas cuja alma seria caracterizada pelo ouro pertencendo tais elementos agrave
classe mais importante a dos magistradosgovernantes agrave qual as outras duas estariam
subordinadas (a funccedilatildeo dos governantes seria logicamente a de colocar a sabedoria ao serviccedilo do
governo da cidade)
A teoria dos metais seria um dos criteacuterios para seleccionar os cidadatildeos para as classes propostas
por Platatildeo todavia esse ldquometalrdquo seria apurado natildeo por hereditariedade mas pelo sistema
educacional imposto pelos magistrados que faria sobressair as inclinaccedilotildees naturais de cada um
Outro grande contributo de Platatildeo para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas prende-se com a sua
tipologia das formas de Governo O filoacutesofo projecta 5 modelos
- Monarquia - podia ser uma sofiocracia (descrita como a forma de Governo da Cidade Ideal
assente na sabedoria e exercida pelo Rei-filoacutesofo) ou uma tirania (e neste caso o poder absoluto
assentava num soacute homem de cariz violento e desprovido das luzes da filosofia)
- Oligarquia - podia ser uma timocracia (e nesse caso o poder estaria assente na classe dos guardas
acabando por se instalar o predomiacutenio da forccedila sobre a sabedoria) ou podia ser tambeacutem uma
plutocracia (descrita como o governo de uma minoria de ricos voltados para os seus interesses
pessoais)
- Um modelo democraacutetico embora apreciasse pouco a democracia pois entendia que as grandes
massas e multidotildees satildeo incapazes de no seu todo possuir a Razatildeo e a Sabedoria necessaacuterias para
o governo da cidade Considera que na democracia os sofistas transformavam os valores morais
conforme os seus apetitesinteresses impondo a sua superioridade fiacutesica intelectual e social
banindo os saacutebios do poder
Platatildeo considera que a melhor forma de governo eacute a monarquia sofiocraacutetica (a cargo do Rei-
Filoacutesofo ndash aquele que consegue olhar para a verdade absoluta promulgando leis sobre o belo
justo e o bem aquele que possui boa memoacuteria e facilidade de aprendizagem dotado de
superioridade e amabilidade amigo e aderente da verdade justiccedila coragem e temperanccedila) e que a
pior eacute a tirania A democracia quanto a ele eacute melhor que a tirania ndash pois o governo da multidatildeo eacute
incapaz de gerar um grande mal - mas eacute pior que a monarquia sofiocraacutetica ndash pois o governo da
multidatildeo eacute incapaz de gerar um grande bem
Entregue a um Rei-Filoacutesofo a sofiocracia seria noutras palavras ldquoo governo de uma soacute pessoa
com o maacuteximo de conhecimentordquo na arte de governar
Para ele o governante ideal estaacute acima da lei e natildeo soacute pode como deve ignoraacute-la ou afastaacute-la
sempre que no seu criteacuterio o interesse superior da colectividade assim o exija o estadista deve
forccedilar os cidadatildeos a ir contra o disposto nos seus coacutedigos e tradiccedilotildees se no interesse deles isso for
melhor do que acatar as leis
Platatildeo natildeo quer o governo das leis mas antes o governo de um homem sobre os demais homens
Platatildeo preconiza para a sua Cidade ideal um regime geral de relaccedilotildees entre governantes e
governados assente no comando autoritaacuterio dos primeiros e na obediecircncia cega dos segundos
No entender de Platatildeo as formas de governo natildeo satildeo imutaacuteveis na medida em que evoluiriam
consoante as circunstacircncias Ele daacute inclusivamente como assente uma espeacutecie de ciclo (A sucessatildeo
ciacuteclica das formas de governo) em termos governamentais que se iniciaria com a sofiocracia
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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passaria para a timocracia e posteriormente agrave oligarquia dando esta lugar agrave democracia e o
governo democraacutetico devido agraves suas vicissitudes culminaria numa tirania A tirania seria uma
espeacutecie de culminar esta espeacutecie de ciclo governamental dando origem a novo ciclo que se
iniciaria novamente com a sofiocracia
Aristoacuteteles
Aristoacuteteles nasce (seacutec IV aC de 384-322 aC) na cidade de Estagira na Macedoacutenia por isso ficaraacute
a ser conhecido como o Estagirita
Aristoacuteteles eacute partidaacuterio do bom senso do equiliacutebrio da moderaccedilatildeo ndash isto eacute em sentido grego da
virtude Para ele o ideal a atingir natildeo eacute a Cidade justa mas sim o bom cidadatildeo o cidadatildeo
virtuoso o cidadatildeo justo orientado para a felicidade por um Estado eacutetico e tutelar
A poliacutetica aristoteacutelica eacute essencialmente unida agrave moral porque o fim uacuteltimo do estado eacute a virtude
isto eacute a formaccedilatildeo moral dos cidadatildeos e o conjunto dos meios necessaacuterios para isso O estado eacute um
organismo moral condiccedilatildeo e complemento da atividade moral individual e fundamento primeiro
da suprema atividade contemplativa
Na filosofia aristoteacutelica a poliacutetica eacute um desdobramento natural da eacutetica Ambas na verdade
compotildeem a unidade do que Aristoacuteteles designava filosofia praacutetica Se a eacutetica estaacute preocupada com
a felicidade individual do homem a poliacutetica preocupa-se com a felicidade coletiva da Poacutelis Desse
modo a tarefa da poliacutetica eacute investigar e descobrir quais satildeo as formas de governo e as instituiccedilotildees
capazes de assegurar a felicidade coletiva
O estado entatildeo eacute superior ao indiviacuteduo porquanto a coletividade eacute superior ao indiviacuteduo o bem
comum superior ao bem particular Unicamente no estado efetua-se a satisfaccedilatildeo de todas as
necessidades pois o homem sendo naturalmente animal social poliacutetico natildeo pode realizar a sua
perfeiccedilatildeo sem a sociedade do estado
No livro P O L Iacute T I C A Aristoacuteteles inicia a sua reflexatildeo filosoacutefica mostrando que a cidade eacute
uma comunidade poliacutetica eacute uma criaccedilatildeo natural e que o homem eacute por natureza um animal
socialhellip Todavia por ser dotado de inteligecircncia e vontade o homem necessita de normas que
regulamentem a sua conduta dentro da comunidade Assinala Aristoacuteteles que efetivamente o
homem quando perfeito eacute o melhor dos animais mas eacute tambeacutem o pior de todos quando
afastado da lei e da justiccedila pois a injusticcedila eacute mais perniciosa quando armada e o homem nasce
dotado de armas para serem usadas pela inteligecircncia e pelo talento mas podem secirc-lo em
sentido inteiramente oposto () a justiccedila eacute a base da sociedade sua aplicaccedilatildeo assegura a ordem
na comunidade social por ser o meio de determinar o que eacute justo Apoacutes criticar vaacuterios aspetos
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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da filosofia poliacutetica de Platatildeo o Estagirita analisa diversas constituiccedilotildees de Cidades-Estado
visando encontrar elementos para a melhor forma de governo
Considerando que a POLIS (isto eacute a Cidade-Estado) existe para promover o bem-comum
Aristoacuteteles analisou as diversas formas de governo existentes na sua eacutepoca Assim diz ele
() as constituiccedilotildees cujo objetivo eacute o bem-comum satildeo corretamente estruturadas de
conformidade com os princiacutepios essenciais da justiccedila enquanto as que visam apenas ao bem
dos proacuteprios governantes satildeo todas defeituosas e constituem desvios das constituiccedilotildees corretas
de fato elas passam a ser despoacuteticas enquanto a cidade deve ser uma comunidade de homens
livres
Aristoacuteteles defende o primado da lei sobre a vontade dos homens Para ele a regra geral eacute a do
respeito pela lei a da observacircncia da legalidade e igualdade a do sistema das leis objectivas e
impessoais acima da vontade do capricho e da discricionariedade dos homens Haacute pois neste
sistema toda a possibilidade de atender agraves circunstacircncias particulares de cada caso seraacute essa a
tarefa dos oacutergatildeos executores da lei por delegaccedilatildeo dela e dentro dos limites por ela definidos Ou
seja ldquoo primado da lei eacute preferiacutevel ao governo livre de qualquer cidadatildeordquo pois ldquoa lei eacute a razatildeo
sem o apetiterdquo ao passo que o poder pessoal eacute o domiacutenio das paixotildees incontrolaacuteveis subjectivo e
arbitraacuterio
Para Aristoacuteteles o regime legiacutetimo ou ldquobomrdquo eacute aquele que tem por fim o bem comum e que eacute
conforme agrave justiccedila ao inveacutes daqueles que apenas soacute tendem para o benefiacutecio particular de alguns
Assim o Estagirita apresenta uma classificaccedilatildeo de regimes poliacuteticos agrupados em regimes satildeos
(monarquia aristocracia e a repuacuteblica) e regimes degenerados (tirania oligarquia e democracia)
- Entre as monarquias daacute-se o nome de realeza aquela que tem por fim o interesse geral
- O governo de um pequeno nuacutemero de homens ou de vaacuterios mas natildeo de um soacute chama-se
aristocracia porque eles o exercem para o maior bem do Estado e de todos os membros da
sociedade
- Quando a multidatildeo governa no sentido do interesse geral chama-se repuacuteblica
Os governos que constituem desvio ou degeneraccedilotildees satildeo
- em relaccedilatildeo agrave realeza a tirania ndash monarquia governada no interesse exclusivo do monarca
- em relaccedilatildeo agrave aristocracia a oligarquia ndash dirigida unicamente no interesse dos ricos
- em relaccedilatildeo agrave repuacuteblica a democracia ndash somente no interesse dos pobres
A Monarquia desvirtuada transforma em Tirania onde a vontade de um sempre prevaleceraacute
contra a ordem juriacutedica vigente Quando a Aristocracia eacute degenerada aparece a Oligarquia nesse
contexto o poder estaraacute nas matildeos dos possuidores de riqueza
A uacuteltima forma desvirtuada seraacute a Democracia na traduccedilatildeo literal de Aristoacuteteles ou a Demagogia
na visatildeo de Bonavides e Azambuja Esta seraacute exercida pelas populaccedilotildees ldquorudes ignaras e
despoacuteticasrdquo ou ldquoo poder eacute exercido pelos que natildeo possuem muitos bens ou seja pelos pobresrdquo
Eacute importante observar que para Aristoacuteteles quando alguma classe social toma o poder para si
exercendo despoticamente estaraacute em um contexto de forma impura de governo
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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Ao definir a melhor forma de governo Aristoacuteteles aplica agrave poliacutetica o princiacutepio da medianidade
que ele expocircs no livro Eacutetica a Nicocircmaco
Na sua individualidade o homem ao agir procura conquistar a felicidade Ora a funccedilatildeo
preciacutepua de todo governo eacute proporcionar a realizaccedilatildeo da felicidade coletiva que ele chama de
bem comum Este soacute se realiza na forma de governo que se baseia no princiacutepio do meio-termo
No livro II da Eacutetica a Nicocircmaco o Estagirita expotildee o princiacutepio do meio-termo da seguinte
forma
Em tudo que eacute contiacutenuo e divisiacutevel pode-se tomar mais menos ou uma quantidade igual e isso
quer em termos da proacutepria coisa quer relativamente a noacutes e o igual eacute um meio-termo entre o
excesso e a falta Por meio-termo no objeto entendo aquilo que eacute equidistante de ambos os
extremos e que eacute um soacute e o mesmo para todos os homens e por meio-termo relativamente a
noacutes o que natildeo eacute nem demasiado nem demasiadamente pouco - e este natildeo eacute um soacute e o mesmo
para todos
Diz o citado autor que a virtude eacute uma mediana Por conseguinte tanto na vida individual
quanto na vida coletiva a virtude estaacute na moderaccedilatildeo no equiliacutebrio que manteacutem as coisas
equidistantes dos extremos ora de excesso ora de carecircncia Se os extremos satildeo prejudiciais aos
indiviacuteduos da mesma forma seratildeo nocivos agrave sociedade
Ao aplicar o princiacutepio da medianidade agrave poliacutetica o Estagirita encontrou a melhor forma de
governo naquela constituiccedilatildeo que mistura elementos democraacuteticos com elementos oligaacuterquicos
Desta forma satildeo evitados os extremos de riqueza e os extremos de pobreza
Assim para Aristoacuteteles a melhor forma de governo seria uma repuacuteblica (governo assente no poder
do grande nuacutemero exercido no interesse de todos os cidadatildeos) de caraacutecter misto contendo alguns
elementos de oligarquia (muitas instituiccedilotildees oligaacuterquicas tais como as magistraturas por eleiccedilatildeo) e
de democracia (muitas coisas populares tais como educaccedilatildeo e vestuaacuterio acessiacutevel a todos) e
apoiada no predomiacutenio das classes meacutedias
Tal como Platatildeo Aristoacuteteles tambeacutem emitiu a sua teoria sobre a sucessatildeo ciacuteclica das formas de
governo comeccedilaria na monarquia (o governo dos antigos) passaria para a aristocracia oligarquia
tirania de seguida a democracia e resultaria na repuacuteblica mista que resultaraacute tanto melhor quanto se
apoiar mais na classe meacutedia
Aristoacuteteles sobre as classes sociais defende o predomiacutenio das classes meacutedias pois a melhor forma
de governo a melhor espeacutecie de sociedade poliacutetica eacute a que for constituiacuteda em maioria por
cidadatildeos das classes meacutedias Defende que os que pertencem agrave classe meacutedia integram-se mais
harmoniosamente numa sociedade equilibrada e satilde pois a violecircncia (dos mais abastados) e a
intriga (dos mais pobres) satildeo duas fontes iniquidades ldquoDe maneira que estes incapazes de
comandar (os mais pobres) natildeo sabem senatildeo mostrar uma submissatildeo servil e aqueles (os mais
ricos) incapazes de se submeter a qualquer poder legiacutetimo (desobediecircncia aos magistrados) natildeo
sabem senatildeo exercer uma autoridade despoacuteticardquo E assim ldquoos cidadatildeos de condiccedilatildeo meacutedia natildeo
empregam violecircncias nem intrigas porque natildeo ambicionam as magistraturasrdquo Assim Aristoacuteteles
conclui que a sociedade civil mais perfeita eacute aquela em que a condiccedilatildeo meacutedia eacute mais numerosa e
poderosa que as outras duas (ou pelo menos mais poderosa que cada uma das outras) pois
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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quando ldquouns tecircm riquezas imensas e os outros natildeo tecircm nada daiacute resulta sempre ou a pior das
democracias ou uma oligarquia desenfreada ou uma tirania insuportaacutevelrdquo
O governo constitucional resultante da mistura de elementos democraacuteticos e oligaacuterquicos se
submete ao impeacuterio da lei e tem na justiccedila e na liberdade os princiacutepios basilares que devem
reger as relaccedilotildees dos cidadatildeos entre si e destes com o Estado
O homem feliz seraacute aquele que for capaz de dedicar a melhor parte da sua vida agrave contemplaccedilatildeo
filosoacutefica das verdades eternas mas sem desprezar por outro lado a vida activa assente numa
quantidade moderada de bens materiais e de sauacutede Mas para que os homens se tornem bons eacute
necessaacuterio que o governo e as leis do paiacutes sejam orientados para a consecuccedilatildeo do bem em suma
ldquoeacute atraveacutes das leis que noacutes podemos tornar-nos bonsrdquo A poliacutetica estaacute pois ao serviccedilo da moral as
leis devem conduzir agrave virtude do bom cidadatildeo e se possiacutevel ainda mais agrave virtude (suprema) do
homem de bem O Estado natildeo eacute portanto apenas um fenoacutemeno poliacutetico ou juriacutedico o Estado eacute e
deve ser um Estado eacutetico um fenoacutemeno moral e religioso
Aristoacuteteles critica o modelo da unicidade da Cidade de Platatildeo defendendo a superioridade do
pluralismo social e poliacutetico (a Cidade ao tornar-se mais una e ao ser reconduzida o mais possiacutevel agrave
unicidade acabaraacute por ser reduzida a uma famiacutelia e esta a um indiviacuteduo aniquilando a Cidade
que deve pressupor uma pluralidade
Aristoacuteteles defende a propriedade privada principalmente pelo sentimento de satisfaccedilatildeo de que
uma coisa nos pertence como coisa proacutepria O Estagirita argumenta que pela comunhatildeo de bens
mais problemas sociais advecircm pelo facto de existirem ldquomais frequentemente dissensotildees entre
aqueles que possuem coisas em comum do que entre aqueles cujas fortunas satildeo distintas e
separadasrdquo
Aristoacuteteles defende a famiacutelia ao exprimir a sua repugnacircncia (moral e social) por esse tipo de
sociedade onde seraacute praticamente ldquoimpossiacutevel que um pai diga meu filho ou que um filho diga
meu pairdquo O fundamento eacute de que ldquonada inspira menos interesse (ao Homem) do que uma coisa
cuja posse eacute comum a grande nuacutemero de pessoas porquanto se daacute uma grande importacircncia ao
que nos pertencerdquo Outro conjunto de consequecircncias da teoria de Platatildeo era a generalizaccedilatildeo dos
laccedilos familiares (ou seja inexistentes) e que provocaria ldquoassassinatos rixas e injuacuteriasrdquo bem como a
possiacutevel banalizaccedilatildeo de relaccedilotildees promiacutescuas tais como o incesto
Segundo Aristoacuteteles a famiacutelia compotildee-se de quatro elementos os filhos a mulher os bens os
escravos aleacutem naturalmente do chefe a que pertence a direccedilatildeo da famiacutelia Deve ele guiar os filhos
e as mulheres em razatildeo da imperfeiccedilatildeo destes No entanto para que a propriedade seja
produtora satildeo necessaacuterios instrumentos inanimados e animados estes uacuteltimos seriam os escravos
Aristoacuteteles natildeo nega a natureza humana ao escravo mas constata que na sociedade satildeo
necessaacuterios tambeacutem os trabalhos materiais que exigem indiviacuteduos particulares a que fica assim
tirada fatalmente a possibilidade de providenciar a cultura da alma visto ser necessaacuterio para
tanto tempo e liberdade bem como aptas qualidades espirituais excluiacutedas pelas proacuteprias
caracteriacutesticas qualidades materiais de tais indiviacuteduos Daiacute a escravidatildeo
O estado surge pelo fato de ser o homem um animal naturalmente social poliacutetico O estado
provecirc inicialmente a satisfaccedilatildeo daquelas necessidades materiais negativas e positivas defesa e
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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seguranccedila conservaccedilatildeo e engrandecimento de outro modo irrealizaacuteveis Mas o seu fim essencial eacute
espiritual isto eacute deve promover a virtude e consequentemente a felicidade dos suacutebditos
mediante a ciecircncia
Compreende-se entatildeo como seja tarefa essencial do estado a educaccedilatildeo que deve desenvolver
harmocircnica e hierarquicamente todas as faculdades antes de tudo as espirituais intelectuais e
subordinadamente as materiais fiacutesicas O fim da educaccedilatildeo eacute formar homens mediante as artes
liberais importantiacutessimas a poesia e a muacutesica e natildeo maacutequinas mediante um treinamento
profissional Eis porque Aristoacuteteles como Platatildeo condena o estado que ao inveacutes de se preocupar
com uma paciacutefica educaccedilatildeo cientiacutefica e moral visa a conquista e a guerra E critica dessa forma a
educaccedilatildeo militar de Esparta que faz da guerra a tarefa preciacutepua do estado e potildee a conquista
acima da virtude enquanto a guerra como o trabalho satildeo apenas meios para a paz e o lazer
sapiente
O Estado deve promover a famiacutelia e a educaccedilatildeo legislando sobre as mesmas
Conveacutem fixar o casamento das mulheres nos dezoito anos e o dos homens nos trinta e sete ou
pouco menos Assim a uniatildeo seraacute feita no momento do maacuteximo vigor e os dois esposos teratildeo um
tempo pouco mais ou menos igual para educar a famiacutelia ateacute que cessem a ser proacuteprios agrave
procriaccedilatildeo
Quanto a saber quais os filhos que se devem abandonar ou educar deve haver uma lei que
proiacuteba alimentar toda a crianccedila disforme Sobre o nuacutemero dos filhos (porque o nuacutemero dos
nascimentos deve sempre ser limitado) se os costumes natildeo permitem que os abandonem e se
alguns casamentos satildeo tatildeo fecundos que ultrapassem o limite fixado de nascimentos eacute preciso
provocar o aborto antes que o feto receba animaccedilatildeo e a vida com efeito soacute pela animaccedilatildeo e vida
se poderaacute determinar se existe crime
Como jaacute mencionado o cidadatildeo deve ir em busca das virtudes da justiccedila e do fim uacuteltimo a
liberdadehellip mas haacute muitos conceitos por redescobrir
O que eacute Justiccedila
Todos os homens entendem por justiccedila aquela disposiccedilatildeo de caraacuteter que torna as pessoas
propensas a fazer o que eacute justo que as faz agir justamente e desejar o que eacute justo e do mesmo
modo por injusticcedila se entende a disposiccedilatildeo que as leva a agir injustamente e a desejar o que eacute
injusto
O homem Justo Eacute aquele que respeita e lei e a igualdade Escolhe sempre os maiores bens
(virtude e felicidade) em detrimento dos menores (riquezas e prazeres) As leis tecircm em mira a
vantagem comum quer de todos quer dos melhores ou daqueles que detecircm o poder de modo
que em certo sentido chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar para a
sociedade poliacutetica a felicidade e os elementos que a compotildeem Na justiccedila estatildeo compreendidas
todas as virtudes E ela eacute a virtude completa no pleno sentido do termo por ser o exerciacutecio atual
da virtude completa Eacute completa porque aquele que a possui pode exercer sua virtude natildeo soacute
sobre si mesmo mas tambeacutem sobre o seu proacuteximo
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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O pior dos homens eacute aquele que exerce a sua maldade tanto para consigo mesmo como para com
os seus amigos e o melhor natildeo eacute o que exerce a sua virtude para consigo mesmo mas para com
um outro
A justiccedila seraacute entatildeo uma praacutetica efetiva de excelecircncia moral
A Injusticcedila Eacute necessaacuterio falar sobre injusticcedila para se compreender bem o que eacute a proacutepria justiccedila
Ideia de grega de apresentar sempre o conceito e a negaccedilatildeo deste ldquoQuando se conhece a boa
condiccedilatildeo a maacute tambeacutem se torna manifestardquo
O que eacute a Injusticcedila Se justiccedila eacute a justa medida o meio termo entre o excesso e a falta a injusticcedila eacute
tudo aquilo que viola esta proporccedilatildeo Injusticcedila=desequiliacutebrio=extremos
Causas da injusticcedila Maldades ganacircncia paixotildees ignoracircncia e desobediecircncia
O Homem injusto ldquoConsidera-se injusto o homem que viola a lei aquele que agindo pela avidez
toma mais do que lhe eacute devido Tambeacutem aquele que viola a igualdade (tomando no que diz
respeito as coisas maacutes menos do que a sua parte)rdquo
ldquoO Homem que age injustamente tem em excesso enquanto o que eacute injusticcedilado recebe pouco do
que eacute bom No caso das coisas maacutes eacute o contraacuterio
Justiccedila e Felicidade Todos os atos legiacutetimos satildeo justos e como tais produzem e preservam a
felicidade A eacutetica aristoteacutelica pressupotildee que as accedilotildees praticadas sejam orientadas para o bem
coletivo e a felicidade geral pelo que o conhecimento deve ser levado agrave praacutetica em benefiacutecio de
todos os cidadatildeos Aristoacuteteles aponta sempre para a necessidade de se pensar o coletivo acima do
particular sem contudo defender que os interesses particulares natildeo devam ser defendidos e
respeitados
Aristoacuteteles descreveu dois tipos de justiccedila
Justiccedila Universal Exerciacutecio de todas as virtudes fazer o que eacute certo em sentido amplo o que eacute
bom
Justiccedila Particular Refere-se agrave distribuiccedilatildeo de honras e bens na vida social dizendo respeito agraves
relaccedilotildees interpessoais este tipo de justiccedila manifesta-se pela observacircncia da lei e da igualdade
Justiccedila distributiva O justo deve ser ao mesmo tempo intermediaacuterio igual e relativo E a mesma
igualdade observar-se-aacute entre as pessoas e entre as coisas envolvidas segue-se o brocardo de que
as distribuiccedilotildees devem ser feitas de acordo com o meacuterito pois todos admitem que a distribuiccedilatildeo
justa deve recordar com o meacuterito se bem que nem todos especifiquem a mesma espeacutecie de meacuterito
O justo eacute pois uma espeacutecie de termo proporcional O injusto eacute o que viola a proporccedilatildeo
Justiccedila Corretiva O justo particular corretivo consiste na aplicaccedilatildeo de um juiacutezo corretivo nas
relaccedilotildees a serem estabelecidas entre os indiviacuteduos Na medida em que surgem conflitos de direito
agrave justiccedila corretiva eacute atribuiacuteda a funccedilatildeo de corrigir este conflito de modo que se retorne o status
quo Eacute ela ldquo[] o intermediaacuterio entre a perda e o ganhordquo Desse modo ela previne os cidadatildeos de
serem lesados nos seus direitos
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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A lei considera apenas o caraacuteter distintivo do delito e trata as partes como iguais se uma comete e
a outra sofre injusticcedila se uma eacute autora e a outra eacute viacutetima do delito Portanto sendo esta espeacutecie de
injusticcedila uma desigualdade o juiz procura igualaacute-la o juiz procura igualaacute-los por meio da pena
tomando uma parte do ganho do acusado Logo o igual eacute intermediaacuterio entre o maior e o menor
a justiccedila corretiva seraacute o intermediaacuterio entre a perda e o ganho Recorrer ao juiz eacute recorrer agrave
justiccedila procuram o juiz como um intermediaacuterio Ora o juiz restabelece a igualdade e quando o
todo foi igualmente dividido os litigantes dizem que receberam o que lhes pertence mdash isto eacute
receberam o que eacute igual Estes nomes perda e ganho procedem das trocas voluntaacuterias pois ter
mais do que aquilo que eacute nosso chama-se ganhar e ter menos do que a nossa parte inicial chama-
se perder como por exemplo nas compras e vendas e em todas as outras transaccedilotildees em que a lei
daacute liberdade aos indiviacuteduos para estabelecerem suas proacuteprias condiccedilotildees quando todavia natildeo
recebem mais nem menos mas exatamente o que lhes pertence dizem que tecircm o que eacute seu e que
nem ganharam nem perderam Logo o justo eacute intermediaacuterio entre uma espeacutecie de ganho e uma
espeacutecie de perda a saber os que satildeo involuntaacuterios Consiste em ter uma quantidade igual antes e
depois da transaccedilatildeo
Reciprocidade diferente de retaliaccedilatildeo A reciprocidade natildeo se enquadra nem na justiccedila
distributiva nem na corretiva e no entanto querem que a justiccedila Se um homem sofrer o que fez
a devida justiccedila seraacute feita Ora em muitos casos a reciprocidade natildeo se coaduna com a justiccedila
corretiva por exemplo se uma autoridade infligiu um ferimento natildeo deve ser ferida em
represaacutelia e se algueacutem feriu uma autoridade natildeo apenas deve ser tambeacutem ferido mas castigado
aleacutem disso A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporccedilatildeo e natildeo na base de uma
retribuiccedilatildeo exatamente igual Ora a retribuiccedilatildeo proporcional eacute garantida pela conjunccedilatildeo cruzada
Seja A um arquiteto B um sapateiro C uma casa e D um par de sapatos O arquiteto pois deve
receber do sapateiro o produto do trabalho deste uacuteltimo e dar-lhe o seu em troca Se pois haacute uma
igualdade proporcional de bens e ocorre a accedilatildeo reciacuteproca o resultado que mencionamos seraacute
efetuado Senatildeo a permuta natildeo eacute igual nem vaacutelida pois nada impede que o trabalho de um seja
superior ao do outro Devem portanto ser igualados E isto eacute verdadeiro tambeacutem das outras artes
porquanto elas natildeo subsistiriam se o que o paciente sofre natildeo fosse exatamente o mesmo que o
agente faz e da mesma quantidade e espeacutecie Eis aiacute por que todas as coisas que satildeo objetos de
troca devem ser comparaacuteveis de um modo ou de outro Foi para esse fim que se introduziu o
dinheiro o qual se torna em certo sentido um meio termo visto que mede todas as coisas e por
conseguinte tambeacutem o excesso e a falta mdash quantos pares de sapatos satildeo iguais a uma casa ou a
uma determinada quantidade de alimento O nuacutemero de sapatos trocados por uma casa (ou por
uma determinada quantidade de alimento) deve portanto corresponder agrave razatildeo entre o arquiteto
e o sapateiro Porque se assim natildeo for natildeo haveraacute troca E essa proporccedilatildeo natildeo se verificaraacute a
menos que os bens sejam iguais de um modo Seja A um agricultor C uma determinada
quantidade de alimento B um sapateiro e D o seu produto que equiparamos a C Se natildeo fosse
possiacutevel efetuar dessa forma a reciprocidade natildeo haveria associaccedilatildeo das partes Ora com o
dinheiro sucede a mesma coisa que com os bens nem sempre tem ele o mesmo valor apesar disso
tende a ser mais estaacutevel Daiacute a necessidade de que todos os bens tenham um preccedilo marcado pois
assim haveraacute sempre troca e por conseguinte associaccedilatildeo de homem com homem Deste modo
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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agindo o dinheiro como uma medida torna ele os bens comensuraacuteveis e os equipara entre si pois
nem haveria associaccedilatildeo se natildeo houvesse troca
Natildeo haacute duacutevida que a troca se realizava desse modo antes de existir dinheiro pois nenhuma
diferenccedila faz que cinco camas sejam trocadas por uma casa ou pelo valor monetaacuterio de cinco
camas A justiccedila eacute uma espeacutecie de meio-termo poreacutem natildeo no mesmo sentido que as outras
virtudes e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediaacuteria enquanto a
injusticcedila se relaciona com os extremos
Justiccedila Poliacutetica e Justiccedila Domeacutestica
A justiccedila poliacutetica eacute encontrada entre os homens que vivem em comum em vista agrave liberdade e
igualdade entre eles Eacute a justiccedila que organiza um modo de vida que tende agrave autossuficiecircncia da
vida comunitaacuteria vigente entre homens que partilham de um espaccedilo comumrdquo Suas relaccedilotildees satildeo
regidas por lei
A justiccedila domeacutestica eacute a que se encontra no acircmbito da casa no que se refere ao filho escravos e a
mulher Assim ldquopode-se dizer que a justiccedila domeacutestica tem estas uacuteltimas como espeacutecies (justiccedila
para com a mulher justiccedila para com os filhos justiccedila para com os escravos)rdquoAristoacuteteles sustenta
que ldquoa justiccedila do senhor para com o escravo e a do pai para com o filho natildeo satildeo iguais agrave justiccedila
poliacutetica embora se lhe assemelhem na realidade natildeo pode haver injusticcedila no sentido irrestrito em
relaccedilatildeo a coisas que nos pertencem mas os escravos de um homem e seus filhos ateacute uma certa
idade em que se tornam independentes satildeo por assim dizer partes deste homem e ningueacutem faz
mal a si mesmo (por esta razatildeo uma pessoa natildeo pode ser injusta em relaccedilatildeo a si mesma)rdquo
Justiccedila Legal e Justiccedila Natural A justiccedila legal e a justiccedila natural satildeo divisotildees do gecircnero que eacute a
justiccedila poliacutetica ldquoA justiccedila poliacutetica eacute em parte natural e em parte legal satildeo naturais as coisas que
em todos os lugares tecircm a mesma forccedila e natildeo dependem de as aceitarmos ou natildeo e eacute legal aquilo
que a princiacutepio pode ser determinado indiferentemente de uma maneira ou de outra mas depois
de determinado jaacute natildeo eacute indiferenterdquo A justiccedila legal tem fundamento na lei que eacute definida pela
vontade do legislador Possui forccedila natildeo natural e eacute fundada na convenccedilatildeo pois a vontade do
oacutergatildeo que emana o ato legislativo eacute soberana e pressupotildee consenso de todos os suacuteditos uma
vez vigente a lei adquire obrigatoriedade e vincula todos os cidadatildeos A justiccedila natural consiste
no ldquoconjunto de todas as regras que encontram aplicaccedilatildeo validade forccedila e aceitaccedilatildeo universais
Assim pode-se definir o justo natural como sendo parte do justo poliacutetico que encontra respaldo na
natureza humana e natildeo depende do arbiacutetrio volitivo do legislador sendo por consequecircncia de
caraacuteter universalistardquo Portanto a justiccedila natural tem uma forccedila que rompe com as barreiras
poliacuteticas sendo que transcende a vontade humana e satildeo imutaacuteveis e tem a mesma forma em todo
lugar ldquo
Atos de Justiccedila Sendo os atos justos e injustos tais como os descrevemos um homem age de
maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente Quando os pratica
involuntariamente os seus atos natildeo satildeo justos nem injustos salvo por acidente isto eacute porque ele
fez coisas que redundam em justiccedilas ou injusticcedilas E o caraacuteter voluntaacuterio ou involuntaacuterio do ato
que determina se ele eacute justo ou injusto pois quando eacute voluntaacuterio eacute censurado e pela mesma
razatildeo se torna um ato de injusticcedila de forma que existem coisas que satildeo injustas sem que no
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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entanto sejam atos de injusticcedila se natildeo estiver presente tambeacutem a voluntariedade Aquilo que se
faz na ignoracircncia ou embora feito com conhecimento de causa natildeo depende do agente ou que eacute
feito sob coaccedilatildeo eacute involuntaacuterio Haacute por conseguinte trecircs espeacutecies de dano nas transaccedilotildees entre
um homem e outro Os que satildeo infligidos por ignoracircncia satildeo enganos quando a pessoa atingida
pelo ato o proacuteprio ato o instrumento ou o fim a ser alcanccedilado satildeo diferentes do que o agente
supotildee ou o agente pensou que natildeo ia atingir ningueacutem ou que natildeo ia atingir com determinado
objeto ou a determinada pessoa ou com o resultado que lhe parecia provaacutevel (por exemplo se
atirou algo natildeo com o propoacutesito de ferir mas de incitar ou se a pessoa atingida ou o objeto atirado
natildeo eram os que ele supunha) Ora (1) quando o dano ocorre contrariando o que era
razoavelmente de esperar eacute um infortuacutenio (2) Quando age com o conhecimento do que faz mas
sem deliberaccedilatildeo preacutevia eacute um ato de injusticcedila por exemplo os que se originam da coacutelera ou de
outras paixotildees necessaacuterias ou naturais ao homem Com efeito quando os homens praticam atos
nocivos e errocircneos desta espeacutecie agem injustamente e seus atos satildeo atos de injusticcedila mas isso natildeo
quer dizer que os agentes sejam injustos ou malvados pois que o dano natildeo se deve ao viacutecio Mas
quando um homem age por escolha eacute ele um homem injusto e vicioso Do mesmo modo um
homem eacute justo quando age justamente por escolha mas age justamente se sua accedilatildeo eacute apenas
voluntaacuteria
Aristoacuteteles interroga-nos sobre duas questotildees ndash ldquoEacute possiacutevel ser injustamente tratado por quererrdquo
e ldquoPode o homem agir contra si proacutepriordquo
A primeira ideia eacute que natildeo eacute possiacutevel ser injustamente tratado se o outro natildeo age injustamente ou
justamente tratado a natildeo ser que o outro aja com justiccedila
A segunda ideia apresentada eacute que agir injustamente natildeo eacute mais do que prejudicar
voluntariamente algueacutem e ningueacutem seria injustamente tratado por seu querer uma vez que
ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom Eacute-nos apresentado o exemplo do quinhatildeo de forma a
suscitar a duacutevida Seraacute que algueacutem de prejudica a si proacuteprio se dividir com outro algueacutem
atribuindo-lhe mais do que o devido Seraacute todavia uma questatildeo discutiacutevel uma vez que o faz por
seu querer por sua vontade A ideia de que ningueacutem deseja o que julga natildeo ser bom vem
corresponder de igual modo agrave segunda questatildeo Mais define que uma classe de atos justos satildeo os
que estatildeo em consonacircncia com alguma virtude e satildeo prescritos por lei dando o exemplo do
suiciacutedio Ora a lei natildeo o permite e o que a lei natildeo permite proiacutebe expressamente assim o suicida
natildeo agiria contra si proacutepria mas sim contra o estado pelo que natildeo eacute permitido
A Equidade Espeacutecie superior de Justiccedila O equitativo eacute justo uma correccedilatildeo da justiccedila legal
Equidade tratar desigualmente os desiguais Aplicaccedilatildeo das leis abstratas a casos concretos O
princiacutepio da justiccedila positiva deixa simplesmente pressupor que a igualdade entre os homens se
ache jaacute fixada e em harmonia Poreacutem os homens satildeo desiguais A igualdade eacute sempre uma
abstraccedilatildeo Soacute as desigualdades nos satildeo dadas A mesma coisa eacute justa e equitativa e embora
ambos sejam bons o equitativo eacute superior Quando a lei se expressa universalmente e surge um
caso que natildeo eacute abrangido pela declaraccedilatildeo universal eacute justo uma vez que o legislador falhou e
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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errou por excesso de simplicidade corrigir a omissatildeo E essa eacute a natureza do equitativo uma
correccedilatildeo da lei quando ela eacute deficiente em razatildeo da sua universalidade
LIVRO VI
Divisotildees da virtude
Aristoacuteteles considerava que a alma possuiacutea duas partes uma racional e outra irracional A
segunda relaciona-se com as virtudes morais e com a busca do justo meio com a finalidade de
evitar excesso e deficiecircncia Este meio-termo eacute definido pelo princiacutepio da reta razatildeo (mediana
entre os excessos e as emoccedilotildees) E eacute a primeira parte da alma que trata de identificar qual eacute esta
reta razatildeo A parte racional da alma tambeacutem se divide em duas partes Aquelas coisas cujos
princiacutepios primeiros satildeo invariaacuteveis (faculdade cientiacutefica) e aquelas que satildeo variaacuteveis (faculdade
calculativa ou deliberaccedilatildeo) Existem trecircs elementos na alma que controlam a accedilatildeo e a busca pela
verdade sensaccedilatildeo razatildeo e desejo Destes a sensaccedilatildeo eacute a uacutenica que natildeo origina accedilatildeo refletida A
origem da accedilatildeo eacute a escolha e a origem desta eacute o desejo e o raciociacutenio dirigido a algum fim por isso
a escolha natildeo pode existir sem a razatildeo e o intelecto nem sem a moral pois as boas e as maacutes accedilotildees
natildeo podem existir sem uma combinaccedilatildeo de intelecto e de caraacuteter Em suma o homem deseja
raciocina sobre escolhe e age
As qualidadesdisposiccedilotildees para a busca da verdade
Ciecircncia trata das coisas que natildeo variam as coisas que variam estatildeo fora do alcance de nossa
observaccedilatildeo natildeo sabemos se existem ou natildeo Todo aprendizado inicia com fatos previamente
conhecidos e prosseguem pela induccedilatildeo ou deduccedilatildeo Um homem atinge um conhecimento
cientiacutefico quando possui convicccedilatildeo atingida de alguma forma e quando os princiacutepios primeiros
cuja convicccedilatildeo se apoia satildeo conhecidos por ele com certeza Em suma o conhecimento cientiacutefico eacute
um estado que nos torna capazes de demonstrar e possui as outras caracteriacutesticas limitativas que
especificamos nos Analiacuteticos pois eacute quando um homem tem certa espeacutecie de convicccedilatildeo aleacutem de
conhecer os pontos de partida que possui conhecimento cientiacutefico ou seja por um processo de
investigaccedilatildeo digamos
Artes relaciona-se com trazer alguma coisa para a existecircncia e perseguir uma arte significa
estudar como trazer para a existecircncia alguma coisa que pode existir ou natildeo A arte eacute idecircntica a
uma capacidade de produzir que envolve o reto raciociacutenio
Sabedoria praacutetica relacionada com o discernimento a capacidade de julgaropinar O homem
prudente eacute aquele dotado de sabedoria praacutetica o poder deliberar bem sobre o que eacute bom e
conveniente para ele e que contribuem para a vida boa em geral
Inteligecircncia ou intuiccedilatildeo racional eacute a qualidade que nos possibilita compreender os princiacutepios
primeiros que serviratildeo de base para o conhecimento cientiacutefico a arte ou a prudecircncia Ponto de
partida para a apreensatildeo do fim
Sabedoria (filosoacutefica) eacute a mais perfeita das formas de conhecimento O saacutebio natildeo apenas sabe as
conclusotildees que seguem dos princiacutepios primeiros (intuiccedilatildeo racional) mas tambeacutem tem uma
conceccedilatildeo verdadeira sobre os proacuteprios princiacutepios primeiros
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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Prudecircncia (ldquodispotildee a razatildeo para discernir em todas as circunstacircncias o verdadeiro bem e a
escolher os justos meios para o atingir Ela conduz a outras virtudes indicando-lhes a regra e a
medida - cautela)
A prudecircncia relaciona-se com a ciecircncia poliacutetica no entanto sua essecircncia eacute diferente Quando a
prudecircncia se refere ao Estado trata-se da ciecircncia legislativa quando se relaciona com ocorrecircncias
particulares eacute denominada ciecircncia poliacutetica Esta segunda relaciona-se com a accedilatildeo e a deliberaccedilatildeo e
eacute o motivo por que apenas as pessoas que tratam de factos em particular que tomam parte em
poliacutetica
Variedades da prudecircncia
Excelecircncia deliberativa envolve um caacutelculo conscientecorreccedilatildeo do pensamento
O facto de chegar a uma conclusatildeo correta natildeo implica que os argumentos sejam verdadeiros A
correta deliberaccedilatildeo eacute uma caracteriacutestica do homem prudente Eacute necessaacuterio suporte de argumentos
corretospremissas que apotildeem a conclusatildeo
Compreensatildeo Relaciona-se com as coisas que existem duacutevidas e deve-se deliberar Eacute atraveacutes da
compreensatildeo que se faz o julgamento para decidir o que fazer e o que eacute correto fazer
Consideraccedilatildeo eacute a faculdade de julgar corretamente
Aristoacuteteles afirmava que um homem teria compreensatildeo e consideraccedilatildeo ou consideraccedilatildeo pelos
outros quando ele eacute um bom juiz sobre os assuntos relativos agrave prudecircncia
Sabedoria e prudecircncia Relaccedilatildeo
Na parte final do capiacutetulo Aristoacuteteles trata da relaccedilatildeo entre sabedoria e prudecircncia Segundo ele a
sabedoria produz a felicidade Atraveacutes de sua posse ou do seu exerciacutecio resulta em um homem
feliz A prudecircncia assegura a correccedilatildeo nos meios que o homem escolhe para atingir os seus fins
Considerando que o fim uacuteltimo dos atos dos homens eacute a felicidade a prudecircncia seria a forma de
se alcanccedilar a sabedoria e com ela a felicidade
Mais adiante afirma que natildeo eacute possiacutevel ser bom sem a prudecircncia aliada agraves virtudes morais
LIVRO VII
Disposiccedilotildees morais a serem evitadas Viacutecio Incontinecircncia e Bestialidade
Aristoacuteteles inicia o seu seacutetimo livro a falar sobre trecircs espeacutecies de disposiccedilotildees morais que precisam
de ser evitadas o viacutecio a incontinecircncia e a bestialidade As disposiccedilotildees contraacuterias satildeo
respetivamente a virtude a continecircncia e uma espeacutecie de habilidade heroica sobre humana
divinificada sendo esta uacuteltima rara de encontrar
A incontinecircncia eacute dada ao homem que age mal segundo as suas paixotildees mesmo que consciente de
seus atos A contingecircncia resume-se a manter as suas ideias sobre todas as coisas Aleacutem desta
visatildeo dizemos que o incontinente eacute aquele que tem o conhecimento mas natildeo o usa Os
incontinentes satildeo semelhantes aos homens adormecidos e embriagados que natildeo escolhem o que
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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fazem no momento ou aqueles que procuram os prazeres da carne por demais mas ningueacutem eacute
incontinente em absoluto poreacutem algumas pessoas satildeo demasiadamente que as chamamos assim
estes por serem impulsionados por seus desejos podemos comparaacute-los e equiparaacute-los aos
intemperantes Todo homem busca os prazeres da vida e foge dos desprazeres mas somente
quem o faz com excessividade pode ser considerado assim mesmo que seja apenas numa aacuterea de
sua vida assim como consideramos um mau ator ele natildeo eacute mau como homem completo mas
apenas em sua representaccedilatildeo A incontinecircncia assim como a bestialidade pode vir da natureza
pelo haacutebito ou por problemas doenccedilas e dificuldades como um estuprador que quando crianccedila
sofreu maus tratos e por isso quando adulto cometeu estes pecados Todas as bestialidades e
incontinecircncias vecircm da deficiecircncia moral e a incontinecircncia brutal bestial e aquilo que eacute
excessivamente demais natildeo eacute simplesmente incontinecircncia mas supera este conceito A
incontinecircncia pelo apetite eacute mais reprovaacutevel do que pela coacutelera (ira) pois daacute-se pelo impulso natildeo
eacute colocada sobre a razatildeo ou ao julgo do raciociacutenio ao ser praticado Jaacute pela coacutelera como quando
um insulto nos eacute dado este vai ao raciociacutenio e antes mesmo de terminaacute-lo nos premeditamos e
concluiacutemos que eacute preciso revidar(replicar) ela com sua natureza ardente e impetuosa ouve mas
natildeo escuta a razatildeo Por isso a coacutelera eacute menos reprovaacutevel que o apetite pois eacute levada pelo
raciociacutenio enquanto o outro sequer isso faz Embora perdoemos com mais facilidade os erros
cometidos em razatildeo do apetite este eacute reprovaacutevel tambeacutem por especular daacute-nos com o tempo a
maliacutecia de buscar o que queremos mesmo que por meios errados jaacute a coacutelera natildeo esta eacute sincera e
momentacircnea Quanto aos prazeres dores apetites e aversotildees a maioria das pessoas eacute mediana
quanto a estes sentimentos e as outras tendem mais aos seus extremos Alguns prazeres satildeo
necessaacuterios outros natildeo e o homem que os busca eacute vicioso Um homem que fere outro sem estar
em coacutelera eacute mais recriminado que aquele que o faz em tal situaccedilatildeo pois o que faria o primeiro
quando encolerado Por isso a intemperanccedila faz pior do que a incontinecircncia O intemperante eacute
incuraacutevel pois nunca se arrepende do caminho que escolhe Jaacute o incontinente eacute curaacutevel pois este eacute
capaz de se arrepender A intemperanccedila e o viacutecio diferemndashse pois o viciado natildeo tem
conhecimento de si e o incontinente tem
O prazer tambeacutem eacute estudado por Aristoacuteteles Existem sobre ele trecircs visotildees
A primeira defende que o prazer absolutamente natildeo eacute um bem pois eles satildeo evitados pelas
pessoas temperantes os saacutebios buscam o que eacute isento de sofrimento
Uma segunda visatildeo defende que nem todos os prazeres satildeo bons pois existem prazeres que satildeo
ignoacutebeis e censuraacuteveis e haacute aqueles que nos prejudicam e fazem mal agrave sauacutede
Haacute ainda uma terceira visatildeo que diz que o prazer natildeo eacute o bem supremo pois natildeo eacute um fim mas
sim um processo discordando de todas estas visotildees
Segundo Aristoacuteteles o prazer pode ser o bem supremo pois eacute a busca comum entre os animais
irracionais as crianccedilas e os homens
Concluindo homem que busca os excessos do prazer torna-se mau pois acaba por natildeo buscar os
prazeres necessaacuterios a todos os homens felicidade e virtudes
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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Pontos essenciais
Os principais contributos de Aristoacuteteles para a Histoacuteria das Ideias Poliacuteticas satildeo a apresentaccedilatildeo de
uma concepccedilatildeo acerca da natureza humana da qual deduz depois como consequecircncias as suas
outras observaccedilotildees e propostas a criacutetica directa da Cidade Ideal de Platatildeo e portanto a defesa da
famiacutelia da propriedade privada e do pluralismo essencial a anaacutelise das classes sociais e o papel
preponderante reconhecido agraves classes meacutedias a defesa do primado da lei sobre a vontade dos
homens a classificaccedilatildeo dos regimes poliacuteticos satildeos e degenerados e a teoria do regime misto como
forma de governo ideal
Ciacutecero
Ciacutecero nasceu em Roma (seacutec II e I aC de 106-43 aC) Foi um dos maiores juristas governantes e
filoacutesofos da Antiguidade Claacutessica Escreveu o tratado De Repuacuteblica Eacute influenciado por Platatildeo e
Aristoacuteteles Escreve num periacuteodo importante da histoacuteria de Roma o periacuteodo final da Repuacuteblica
quando este jaacute vai ser substituiacutedo pelo Impeacuterio
Ciacutecero eacute um dos mais representantes do estoicismo os quais defendem que a ideia de que o
princiacutepio do mundo e da realidade eacute a razatildeo (logos) a noccedilatildeo de devoccedilatildeo permanente ao dever e
do controle de si mesmo a existecircncia de um deus uacutenico cuja relaccedilatildeo com os homens eacute igual ou
semelhante agrave de um pai para com os seus filhos a noccedilatildeo de igualdade fundamental entre os
homens como membros de uma mesma famiacutelia a ideia de um Estado mundial e de uma cidadania
universal e finalmente a ideia de uma lei ou direito natural de origem divina
No tratado De Repuacuteblica Ciacutecero defende o dever de participaccedilatildeo poliacutetica que considera ser o
primeiro dos deveres que a moral social impotildee aos homens Defende que eacute natural que os homens
participem na vida poliacutetica pois na natureza uma grande necessidade de ldquoagirrdquo com vista agrave
ldquosalvaccedilatildeo comumrdquo e que o homem deve procurar a virtude e soacute a possui quando a aplicar
principalmente no governo da cidade
O tratado poliacutetico filosoacutefico de Ciacutecero tem como abordagem o desmantelamento das instituiccedilotildees
republicanas em Roma sendo que os interlocutores dialogam entre si sobre os mais diversos
assuntos relacionados com a questatildeo poliacutetica republicana De entre as personagens visadas na
obra destaca-se Cipiatildeo representado como modelo da virtude siacutembolo do cidadatildeo romano
idealizado apresentado como um poliacutetico haacutebil que corresponde agraves maiores virtudes do homem
Nos diaacutelogos entre as personagens Cipiatildeo discursa sobre as instituiccedilotildees do estado romano
apontando as possiacuteveis ldquosoluccedilotildeesrdquo para reverter a decadecircncia vivida da repuacuteblica Esta por sua
vez eacute definida como a res populi laquoPortanto res publica lsquoCoisa Puacuteblicarsquo eacute a res populi lsquoCoisa do
Povorsquo E o povo natildeo eacute qualquer ajuntamento de homens congregado de qualquer maneira mas o
ajuntamento de uma multidatildeo associada por um consenso juriacutedico e por uma comunidade de
interessesrdquo
Na conceccedilatildeo de Ciacutecero o romano ideal eacute o que valoriza a paacutetria e por conseguinte sacrifica-se
pela mesma em benefiacutecio do bem-estar comum Para tal o homem necessita de desenvolver o
ldquoamor paacutetriordquo a triunfar sobre qualquer atitude em relaccedilatildeo ao Estado Este amor encontra-se
diretamente relacionado com a noccedilatildeo de virtude a maior arte que o homem pode ter
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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Mais Ciacutecero parece fazer uma criacutetica aos cidadatildeos que se submetem ao oacutecio exemplificando com
os antepassados que deve ser tido como referecircncia para as geraccedilotildees vindouras refletindo os feitos
dos antigos e virtuosos cidadatildeos ressaltando as qualidades virtuosas que devem ser tidas em
conta numa cidade considerada pelo mesmo corrompida Para ele as virtudes do cidadatildeo
exemplar baseiam-se nos elementos do homem considerado por ele ideal condicionado pelo ofiacutecio
do campo assumindo assim um caraacuteter mais ruacutestico e forte O autor considera que deve existir
uma espeacutecie de reciprocidade entre o Estado e os seus cidadatildeos Se a paacutetria educa e proporciona o
bem-estar comum tambeacutem o cidadatildeo deve retribuir as recompensas necessaacuterias Deste modo o
cidadatildeo ideal seria aquele que abandona o seu oacutecio e corresponde agraves solicitaccedilotildees da sua paacutetria
mesmo que implique o sacrifiacutecio do seu bem-estar em prol do bem-comum
Quanto aos governantes e poliacuteticos estes devem agir segundo os princiacutepios do dever moral e do
bem comum e ter senso de justiccedila Cabendo ao governante a tutela e moderaccedilatildeo ou seja a
governaccedilatildeo deve ser orientada pelo amor e filantropia e o governante deve intervir segundo o
princiacutepio do equiliacutebrio poliacutetico e do bem-estar para toda a coletividade Para Ciacutecero um dos
objetivos do Estado era contribuir para a felicidade de todos os cidadatildeos Deste modo o meio
mais adequado para conseguir essa finalidade eacute a aplicaccedilatildeo de uma justiccedila equitativa ou seja dar
a cada um o que eacute seu No que respeita agrave justiccedila esta eacute uma virtude do homem de ldquodar a cada o
seu direito eacute proacuteprio do homem bom e justordquo a justiccedila como meio de preservaccedilatildeo do homem da
propriedade e dos demais bens e finalmente a justiccedila como meio para os fins imperialistas uma
vez que segundo Ciacutecero foi aliando a justiccedila e uma poliacutetica prudente que o povo romano passou
de povo insignificante a povo -rei
O poliacutetico eacute pois mais importante que o filoacutesofo e que o moralista pois consegue atraveacutes das leis
e do poder de comando que exerce obrigar todo um povo a fazer aquilo que os filoacutesofos soacute
conseguiriam a um pequeno nuacutemero de pessoas
Ciacutecero tambeacutem teorizou formas de Governo como a monarquia ou realeza (poder atribuiacutedo apenas
a uma pessoa) aristocracia (poder atribuiacutedo a vaacuterios) e democracia (poder atribuiacutedo agrave totalidade do
povo) Segundo Ciacutecero tudo isto tem de ser combinado porque cada uma destas formas de
governo separadamente tem vaacuterios inconvenientes
A primeira forma de governo citada eacute a ldquomonarquiardquo o poder de um ou seja o poder atribuiacutedo a
um uacutenico homem Neste regime deveria existir uma espeacutecie de ldquorelaccedilatildeo paternalrdquo olhando o rei
para os suacutebditos como se fossem seus filhos com vista agrave garantia do seu bem uma vez que caso
assim natildeo o fosse poderia desenvolver-se uma tirania Nesta constituiccedilatildeo grande parte da
populaccedilatildeo natildeo exerceria o ldquodireito comumrdquo Ciacutecero alude agrave volubilidade na sucessatildeo de
monarcas pois ao mesmo tempo em que um ldquorex possa ser toleraacutevel e afaacutevel outro possa ser seu
contrasterdquo A monarquia porque se presta a toda a espeacutecie de abusos e basta o abuso de um soacute rei
para que o povo comece a detestar o proacuteprio regime monaacuterquico apresenta-se fragilizada A
monarquia poderaacute ser uma forma de governo justa aceite pelo povo enquanto houver um rei
justo Poreacutem quando haacute usufruto extremo do poder a autoridade do rei avanccedila no sentido
antagocircnico desencadeando o regime designado por tirania
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
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- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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Em segundo surge a ldquoaristocraciardquo o governo de alguns Na aristocracia o povo estaacute privado de
qualquer decisatildeo sendo esta uma classificaccedilatildeo ausente do seu consentimento que tal como a
monarquia estaacute sujeita ao excesso o que desencadearia uma oligarquia Mais critica o facto de ser
o governo dos ricos o governo de pessoas que pelo seu niacutevel de vida estatildeo muito afastadas das
necessidades do povo e procuraratildeo se o governo lhes pertencer exercecirc-lo apenas no seu interesse
Por fim eacute apresentada a ldquodemocraciardquo encontrando-se o poder na ldquomatildeordquo da soberania popular
Aqui eacute feita uma criacutetica ao povo que natildeo obstante a procura pela igualdade esta acaba por ser
desmedida resultando medidas poliacuteticas e sociais geradoras de desigualdade social originando o
caos e consequentemente a impossibilidade de governaccedilatildeo Ou seja a multidatildeo quando entregue
a si proacutepria com os seus apetites a sua cegueira e os seus abusos de poder eacute a pior de todos os
tiranos
Para Ciacutecero a melhor forma de governo seria a combinaccedilatildeo das trecircs formas a monarquia para
que haja uma afirmaccedilatildeo de poder a aristocracia para que haja lucidez e conhecimento no
tratamento dos negoacutecios puacuteblicos a democracia para que haja o princiacutepio popular de liberdade e
justiccedila para o povo Ciacutecero acrescenta a Aristoacuteteles a ideia de um poder executivo num homem
que mande (monarquia + aristocracia + democracia ao inveacutes de oligarquia + democracia)
Ciacutecero defende a necessidade de um magistrado fundamental de um liacuteder Ora a funccedilatildeo do
magistrado eacute representar o povo sustentar a dignidade e a honra do paiacutes executar as leis
respeitar os direitos de cada um e cumprir as obrigaccedilotildees confiadas agrave sua lealdade Ciacutecero sublinha
a necessidade do magistrado obedecer agraves leis o magistrado estaacute abaixo das leis embora esteja
acima dos governados porque eacute governante
Ainda sobre Ciacutecero embora natildeo apresentada de forma vincada mas que natildeo deixa de contribuir
para a apresentaccedilatildeo das suas ideias estaacute a teorizaccedilatildeo do Direito Natural ldquouma lei verdadeira que
eacute a reta razatildeo conforme agrave natureza presente em todos os homens constante e sempre eterna Esta
lei conduz-nos imperiosamente a fazer o que devemos e proiacutebe-nos o mal desviando-nos delerdquo
Ou seja para Ciacutecero o Direito Natural engloba a ideia que existe uma ordem natural que foi criada
por Deus cuja sua descoberta eacute feita pela razatildeo humana na qual resulta uma ordem que impotildee
direitos e deveres aos homens e que estes tecircm de atender sob pena de desrespeitarem a proacutepria
natureza humana Esta eacute uma ordem que se apresenta pelos seus imperativos universais eternos e
invariaacuteveis Em suma Ciacutecero apresenta-se como um defensor da liberdade e do combate contra a
ditadura e contra a corrupccedilatildeo avaliando o Estado a partir da liberdade de quem governa Quanto
mais livre for o governante melhor seraacute o Estado por sua vez a falta de liberdade causaria a
insatisfaccedilatildeo Se faltar liberdade ao povo haveraacute o risco de ele se rebelar o que poderia originar a
guerra
Conclusatildeo o bom governo deve ser exercido livremente e respeitar a liberdade dos governados
devendo o homem agir de forma eacutetica sendo honesto Para tal exige o uso do seu conhecimento
para controlar as paixotildees e demonstrar senso de justiccedila natildeo prejudicando o proacuteximo aliado com o
regime mais favoraacutevel como supra evidenciado
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Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Pontos essenciais
Ciacutecero eacute efectivamente algueacutem que apresenta vaacuterias ideias novas de grande significado e
importacircncia no plano filosoacutefico-juriacutedico Ciacutecero eacute o primeiro grande autor que apresenta e teoriza
o direito natural no plano da ciecircncia poliacutetica Ciacutecero eacute o defensor de um regime misto encarado
natildeo penas institucionalmente como distribuiccedilatildeo do poder governativo por vaacuterios oacutergatildeos do
Estado mas tambeacutem sociologicamente como distribuiccedilatildeo do poder poliacutetico por vaacuterias classes
sociais ndash a associaccedilatildeo harmoniosa do chefe da elite e do povo no plano da moral colectiva Ciacutecero
eacute o primeiro a acentuar duma maneira muito clara o dever de participaccedilatildeo ciacutevica que os cidadatildeos
tecircm relativamente agrave Paacutetria ainda que com sacrifiacutecios e perigos para a sua vida privada ou para a
proacutepria sobrevivecircncia fiacutesica e finalmente no plano estritamente poliacutetico Ciacutecero eacute a encarnaccedilatildeo
viva da opccedilatildeo pela liberdade e do combate sem treacuteguas contra a ditadura e contra a corrupccedilatildeo
A IDADE MEacuteDIA
Breve referecircncia ao Cristianismo
O Cristianismo comeccedila muito antes de a Idade Meacutedia principiar comeccedila no tempo do
Impeacuterio Romano Jesus Cristo nasce sob o principado de Ceacutesar Augusto
O Cristianismo eacute como se sabe essencialmente uma revoluccedilatildeo religiosa mas satildeo inegaacuteveis as suas
implicaccedilotildees morais sociais e poliacuteticas Agrave dimensatildeo vertical do Cristianismo ndash referente ao plano
das relaccedilotildees do Homem com Deus ndash acresce uma outra dimensatildeo a chamada dimensatildeo horizontal
ndash que incide no plano das relaccedilotildees dos homens uns com os outros
No que respeita agrave dimensatildeo vertical o Cristianismo veio trazer uma nova concepccedilatildeo da
divindade unitaacuteria e transcendente contraposta agrave noccedilatildeo plural e imanente dos deuses do
paganismo apresentou a ideia da incarnaccedilatildeo humana de Deus claramente diferenciada da visatildeo
puramente celeste da divindade no judaiacutesmo e preconizou a substituiccedilatildeo do dever de justiccedila pelo
dever de caridade assente num mandamento considerado tatildeo importante como o amor a Deus ndash o
do amor ao proacuteximo
Dos principais aspectos inovadores do Cristianismo
- Em primeiro lugar foi a noccedilatildeo de humanidade como noccedilatildeo nova equivalente agrave globalidade do
geacutenero humano Todos os homens satildeo iguais todos satildeo filhos do mesmo Deus nenhuma
diferenccedila de natureza existe entre eles
- Em segundo lugar e pela mesma ordem de razotildees o Cristianismo veio proclamar com todas as
suas forccedilas a natureza inviolaacutevel da pessoa humana princiacutepio superior ndash como a condenaccedilatildeo da
escravatura a liberdade e os direitos do homem a limitaccedilatildeo do poder poliacutetico a garantia do
direito agrave vida etc
- Em terceiro lugar surge com os primeiros doutrinadores cristatildeos uma concepccedilatildeo inteiramente
nova do poder poliacutetico ndash a partir de agora entender-se-aacute que todo o poder vem de Deus ndash quer quanto
ao sentido do seu exerciacutecio ndash o poder passaraacute a ser visto natildeo como um direito proacuteprio dos
governantes ou como pura autoridade do Estado sobre os cidadatildeos mas sobretudo como funccedilatildeo
posta ao serviccedilo do bem comum da qual resultam para o seu titular mais deveres do que direitos
e menos privileacutegios do que responsabilidades
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
- Por uacuteltimo a criaccedilatildeo de uma Igreja universal incumbida de defender e propagar a feacute cristatilde deu
origem agrave problemaacutetica das relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado Com o Cristianismo os aspectos do
familiar do moral e do religioso passam para a esfera de competecircncia da Igreja ficando para o
Estado apenas o poliacutetico O homem medieval eacute submetido a um dualismo de poderes e jurisdiccedilotildees
ndash a Deus o que eacute de Deus a Ceacutesar o que eacute de Ceacutesar
Santo Agostinho
Nasce em Tagaste na Numiacutedia (Norte de Aacutefrica) e vive entre 354-430 (seacutec IV e V) A sua
inspiraccedilatildeo mais forte foi sem duacutevida a de Platatildeo muitos o consideram mesmo um neo-platoacutenico
O pensamento poliacutetico de Santo Agostinho
Natildeo haveraacute um nexo de causalidade evidente entre a generalizaccedilatildeo do Cristianismo e a
decadecircncia do poderio de Roma Eacute neste pano de fundo que Santo Agostinho se empenha em
redigir uma das suas maiores obras a De Civitate Dei ou Cidade de Deus
Nesta obra satildeo tratados vaacuterios problemas de relevo ndash a distinccedilatildeo entre as duas cidades uma
concepccedilatildeo particular sobre a natureza humana a noccedilatildeo de Estado a sociedade e o poder a paz as
funccedilotildees da autoridade e enfim as relaccedilotildees entre a Igreja e o Estado
As duas Cidades
Santo Agostinho considera haver duas Cidades ndash a cidade celeste ou Civitas Dei comunidade dos
homens que vivem segundo o espiacuterito e buscam a Justiccedila e a cidade terrena ou Civitas Diaboli
conjunto dos homens que vivem segundo a carne para satisfaccedilatildeo dos seus prazeres Uma eacute a
cidade do bem outra a cidade do mal Ambas estatildeo em luta permanente uma contra a outra e
ambas disputam a posse do mundo A vida presente eacute uma luta um combate quotidiano soacute na
vida futura haveraacute paz autecircntica e duradoira
Daiacute que o Estado em si mesmo natildeo possa ser considerado a priori como bom ou mau tudo vai
dos que o governam Se o Estado eacute governado por homens que praticam o bem e amam a Deus eacute
bom e trabalha para a cidade celeste se o governam aqueles que praticam o mal e ignoram ou
hostilizam Deus eacute mau e concorre para a Cidade Terrena
Soacute na Cidade Celeste haacute verdadeira paz verdadeira justiccedila verdadeiro bem na Cidade Terrena
os homens esforccedilam-se por alcanccedilar a paz mas como natildeo haacute paz sem Deus encontram apenas
uma aparecircncia de paz procuram alcanccedilar a justiccedila mas como natildeo haacute justiccedila sem Deus encontram
apenas uma aparecircncia de justiccedila e tentam alcanccedilar o bem mas como natildeo haacute bem sem Deus
encontram apenas a aparecircncia de bem
Concepccedilatildeo sobre a natureza humana
Santo Agostinho apresenta-nos uma visatildeo profundamente pessimista acerca da natureza humana
Considera o bispo de Hipona (ou Santo Agostinho) que os primeiros homens (Adatildeo e Eva) foram
criados como seres bons perfeitos com todas as qualidades e sem defeitos Mas pela
desobediecircncia (pecado original) afastaram-se de Deus e foram punidos para sempre tornaram-se
infelizes e cheios de defeitos o Homem transformou-se num pecador As suas caracteriacutesticas
principais passaram a ser o egoiacutesmo a arrogacircncia a vontade de dominar os outros e a tendecircncia
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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para procurar o bem proacuteprio com desprezo do bem dos outros O Homem eacute assim um ser
irreversivelmente marcado pelo pecado eacute um pecador
Noccedilatildeo de Estado
Da concepccedilatildeo pessimista acerca do Homem e da natureza humana haacute-de resultar como
consequecircncia loacutegica uma concepccedilatildeo repressiva do Estado se o Homem eacute mau para o seu
semelhante o Estado deve servir essencialmente para prevenir e reprimir os erros as injusticcedilas os
crimes
O Estado ndash ao contraacuterio do que defende Aristoacuteteles ndash natildeo deve procurar (porque eacute impossiacutevel)
tornar os homens bons e virtuosos apenas deve tentar fazer reinar uma certa paz e seguranccedila
exteriores nas relaccedilotildees sociais entre os homens
O Estado eacute pois uma ordem exterior e coerciva (a paz e a seguranccedila terrenas devem ser
asseguradas atraveacutes da coacccedilatildeo e puniccedilatildeo atraveacutes do sistema juriacutedica o Direito) natildeo tem a ver
com o Bem e com a Justiccedila mas apenas com a paz e a seguranccedila possiacuteveis na Cidade Terrena A
Cidade de Deus eacute uma ordem de amor o Estado no interior da Cidade Terrena eacute uma ordem de
coacccedilatildeo
O dever de obediecircncia ao Poder poliacutetico
Santo Agostinho entende que todo o poder vem de Deus e por conseguinte considera que o
Estado eacute um instrumento ordenado por Deus eacute mesmo ldquoum dom de Deus aos homensrdquo Daiacute
resultam 2 consequecircncias
A primeira eacute que o dever de obediecircncia eacute absoluto natildeo haacute limitaccedilotildees ao Poder dos governantes
natildeo haacute espaccedilo para justificaccedilatildeo da desobediecircncia ou para quaisquer formas de resistecircncia dos
governados
A segunda consiste em que os homens natildeo podem distinguir entre bons e maus governantes entre
formas de governo justas e injustas (como fazia Aristoacuteteles) a todos se deve por igual obediecircncia
Numa palavra o Estado deve ser duro e repressivo o cidadatildeo deve aceitar passivamente a
autoridade do Poder E natildeo deve dar grande importacircncia agrave possiacutevel existecircncia de maus
governantes ou de dirigentes tiracircnicos porque o que sobretudo interessa eacute a vida eterna e natildeo eacute
longo o tempo que se passa na vida terrena O que interessa natildeo eacute ser bem governado mas manter
sempre a liberdade interior que permite amar a Deus sobre todas as coisas e preparar o ingresso
futuro na Cidade de Deus
A paz
A principal finalidade a prosseguir no uso do poder eacute para Santo Agostinho a preservaccedilatildeo da
paz Santo Agostinho considera entatildeo que ldquoa paz eacute o supremo bem da Cidaderdquo e que existe uma
ldquoaspiraccedilatildeo universal em direccedilatildeo agrave pazrdquo
As funccedilotildees da autoridade
Santo Agostinho analisa as 3 funccedilotildees em que se desdobra a autoridade imperare (comandar)
providere (prover) e consulare (aconselhar) Satildeo estes os deveres do chefe
- O officium imperandi eacute o primeiro de todos consiste na funccedilatildeo de comando e eacute o mais importante
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
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Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
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e o mais difiacutecil dos deveres do chefe O poder natildeo eacute uma propriedade pessoal mas uma funccedilatildeo
um serviccedilo
- O officium providendi eacute a segunda das funccedilotildees do governante consiste em prever as necessidades
do paiacutes e em prover agrave sua satisfaccedilatildeo
- O officium consulendi faz ressaltar a posiccedilatildeo do chefe como conselheiro do seu povo O governante
deve natildeo apenas comandar e prover mas tambeacutem aconselhar ndash e deve fazecirc-lo com espiacuterito
fraterno
A Igreja e o Estado
Santo Agostinho tinha ideias claras sobre a mateacuteria os poderes eclesiaacutestico e civil satildeo distintos e
independentes Cada um move-se na sua esfera proacutepria de jurisdiccedilatildeo e actua por sua conta soacute
sendo responsaacutevel perante Deus Toda e qualquer ingerecircncia de um nos domiacutenios reservados do
outro eacute inconveniente e perigosa
Santo Agostinho manteve-se na posiccedilatildeo tradicional do Cristianismo primitivo E especificava
mesmo que a Igreja por amor da concoacuterdia civil deve aceitar o Estado tal como ele eacute com os erros
e insuficiecircncias que inevitavelmente o caracterizam oferecendo-lhe na pessoa dos seus fieacuteis
cidadatildeos bons e virtuosos A Igreja devia ser assim uma verdadeira escola de civismo
Mas houve dois fatores que formariam o ldquoagostinianismo poliacuteticordquo ou a doutrina da supremacia
da Igreja sobre o Estado
- O primeiro foi a doutrina de Santo Agostinho favoraacutevel agrave intervenccedilatildeo do Estado contra as seitas
hereacuteticas na medida em que defender ser dever o Estado punir com as suas leis os hereger ndash
funcionando assim na praacutetica como ldquobraccedilo secularrdquo da Igreja e aceitando as definiccedilotildees da verdade
religiosa dadas por esta - natildeo haacute duacutevida de que contribuiu poderosamente para acentuar a ideia
de subordinaccedilatildeo do Estado agrave Igreja
- O segundo factor foi a proacutepria concepccedilatildeo da Cidade de Deus como algo de intrinsecamente
superior agrave Cidade Terrena Eacute certo que nem aquela correspondia agrave Igreja nem esta ao Estado
A necessidade de o Estado se submeter agrave religiatildeo e caminhar para Deus como elemento da
Cidade Celeste ia provocar o desvio de interpretaccedilatildeo que nela estava impliacutecito Nasceu assim o jaacute
referido ldquoagostinianismo poliacuteticordquo
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram
SIMAtildeO FINO | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Conclusatildeo
Atualidade
A Poliacutetica e a Moral podem ser tidas como esferas distintas da vida social que podem e
devem assumir uma relaccedilatildeo que respeite a autonomia e a especificidade de cada uma Todavia
deve ser uma relaccedilatildeo de complementaridade A accedilatildeo poliacutetica natildeo pode prescindir-se da Moral
A Moral vigente configura expectativas nos sujeitos sociais que quando contrariadas
profundamente dificilmente permitiraacute agrave poliacutetica legitimidade
Podemos dizer que de certa forma a moral expressa legitima e justifica a poliacutetica
Nesse sentido eacute necessaacuterio que a poliacutetica e a moral sejam analisadas natildeo de formas separadas
mas sim de formas complementares acatando a autonomia de cada uma para que assim se possa
encontrarchegar aagrave Eacutetica Poliacutetica atual
A respeito da distacircncia no tempo e espaccedilo as estruturas poliacuteticas e as mentalidades que
nasceram na antiguidade influenciaram diretamente a poliacutetica contemporacircnea
Instituiccedilotildees modelos de organizaccedilatildeo e regimes poliacuteticos atuais possuem raiacutezes na antiguidade
Portanto para entender a poliacutetica hoje precisamos olhar para o passado remontando a
eacutepocas distantes que possibilitam vislumbrar movimentos circulares na configuraccedilatildeo atual e
futura em sentido amplo
Atualmente vaacuterias das nossas accedilotildees poliacuteticas e institucionais foram em certa medida
experimentadas pelos gregos Em Atenas os legisladores Cliacutestenes e Peacutericles lanccedilaram as bases
de uma nova forma de governo que inspirou a nossa democracia moderna Aleacutem disso foram os
primeiros povos a criarem ldquoconcursosrdquo para ocupaccedilatildeo de cargos puacuteblicos
Certo que temos de ter em consideraccedilatildeo a evoluccedilatildeo da poliacutetica atraveacutes do tempo pode-se
perceber que ela se modificou para adequar-se aos distintos tipos de sociedade que se
apresentaramperpetuam
Com isto conclui-se que a poliacutetica amadureceu agrave medida que as sociedades evoluiacuteram e
se desenvolveram