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Guerra do Paraguai: representações do grande conflito do Prata no
Museo Histórico Nacional e Museo Histórico Cabildo – Uruguai
Jaqueline de Jesus Hoiça1
Sandra Paschoal Leite de Camargo Guedes2
Em 2014, comemorou-se a efeméride dos 150 anos do início da Guerra do
Paraguai, o grande conflito que aconteceu na bacia do Rio da Prata entre os anos
1864 e 1870, e que envolveu o Império brasileiro, a Argentina e o Uruguai (formando
a Tríplice Aliança), contra o Paraguai. De acordo com o historiador Francisco Doratioto
(2002), autor do livro “Maldita Guerra: nova história da Guerra do Paraguai”, o
acontecimento recebe destaque na história por ter sido o maior conflito armado
internacional da América do Sul. A guerra teve proporções grandiosas para os países
envolvidos, seja pelo número de mortes quanto pelos aspectos políticos e financeiros.
Dada a importância do acontecimento para os países envolvidos, surgiu o
interesse em saber como os museus desses países estão representando o conflito
em suas exposições atualmente. Sabe-se que as representações são fluídas e variam.
Isso porque, segundo o historiador francês Roger Chartier (1990), as representações
do mundo social “são sempre determinadas pelos interesses dos grupos que as
forjam”. Nesse sentido, as “lutas de representações têm tanta importância como as
lutas econômicas para compreender os mecanismos pelos quais um grupo se impõe
ou tenta se impor” em seu meio social (CHARTIER, 1990, p.17). Ou seja, há uma luta
entre os mais diferentes grupos da sociedade pela conquista do seu espaço na
história. Existem intencionalidades, interesses e objetivos ao se preferir dar enfoque
a um ou mais lados dos acontecimentos, em detrimento de outros.
No caso da guerra, debates sobre as razões e ações de cada país no conflito
suscitaram diferentes representações no decorrer da história, em decorrência dos
diferentes pontos de vista e das relações de poder na sociedade. Desse modo, 150
anos depois do acontecimento, surgiu o interesse em saber quais são as
1 Graduanda em História pela Universidade da Região de Joinville – Univille. Bolsista do programa
UNIEDU, através do Art. 170 da Constituição do Estado de Santa Catarina. [email protected]
2 Professora orientadora. Mestrado em Patrimônio Cultural e Sociedade – MPCS e Departamento de
História. Universidade da Região de Joinville – Univille. [email protected]
representações que se tem sobre a guerra na contemporaneidade, especialmente nas
instituições museológicas. A decisão sobre tal objeto de pesquisa se deu pela
importância dos museus frente ao processo de formação e consolidação das
identidades nacionais, especialmente na América. Como, segundo Mário de Souza
Chagas e Myrian Sepúlveda dos Santos, “os museus lidam com memórias coletivas,
ou seja, com representações consolidadas coletivamente” (2007, p. 12), ao se
tornarem independentes, esses novos estados nacionais passaram a se valer dessas
instituições como forma de “legitimação [...] tanto interna quanto externamente”
(CHAGAS; SANTOS, 2007, p.14). Desse modo, se “em suma, a tarefa dos museus
está diretamente ligada à construção de linguagens, memórias coletivas, símbolos
para grupos e nações” (CHAGAS; SANTOS, 2007, p. 19), quais seriam então as
representações contemporâneas em relação a Guerra da Tríplice Aliança, frente as
disputas de poder, legitimação e construção de identidades? Foi o que se buscou
responder.
Visto que, se tratando de uma pesquisa de iniciação científica, é inviável o
estudo de todos os museus que tenham exposições relativas ao conflito, o primeiro
passo foi estabelecer um recorte. Neste sentido, chamaram a atenção o Museo
Histórico Nacional (MHN) do Uruguai (com uma exposição permanente relacionada à
guerra) e o Museo Histórico Cabildo (MHC) (exposição temporária – outubro de 2017
a julho de 2018), ambos localizados na cidade de Montevideo - Uruguai. Sendo o
Uruguai, muitas vezes, colocado pela historiografia como um ator de menor papel na
guerra, principalmente no que se refere à participação nas batalhas (sendo o
protagonismo dado, então, ao Brasil e à Argentina), a presença de exposições sobre
a Guerra do Paraguai em museus tão importantes do país despertou a atenção. Como
também não foi encontrada nenhuma pesquisa sobre tal temática, decidiu-se que
estes museus seriam o objeto desta pesquisa.
Para poder conhecer de modo mais aprofundado ambas as exposições (e, de
certo modo, os próprios museus), em julho de 2018 foi feita uma visita às duas
instituições para uma pesquisa de campo, cujo objetivo foi conhecer a proposta
museológica de cada um, observar o que expõem (não somente sobre a guerra) e
coletar informações para análise posterior. Além de tal finalidade alcançada, a visita
oportunizou uma imersão na história do Uruguai, propriamente, que propiciou a
aquisição de conhecimentos que irão auxiliar na compreensão de como é a relação
dos uruguaios com a história dessa Guerra, e de como esta impacta as relações e
representações na contemporaneidade.
Comecemos, primeiramente, apresentando cada uma das instituições. O
Museo Histórico Nacional do Uruguai foi criado em 1838, em meio ao contexto de
formação dos estados nacionais americanos (século XIX), que implicava um processo
de construção de nacionalidades e identidades. Porém, a instituição era denominada
apenas Museu Nacional, sendo no ano de 1911 desmembrada, dando origem ao
Museo Nacional de Historia Natural, ao Museo Nacional de Bellas Artes e ao Museo
Histórico Nacional propriamente dito. Atualmente o Museu é formado por um conjunto
de oito casas que estão espalhadas pela Ciudad Vieja de Montevideo – são exemplos
a Casa de Fructuoso Rivera e a Casa de Juan Antonio Lavalleja, as mais conhecidas.
Todas remontam a pessoas importantes da história uruguaia e são testemunhos do
período colonial de Montevideo.
A Casa de Fructuoso Rivera é a sede principal do Museo Histórico Nacional -
MHN e conta com uma exposição permanente voltada para o processo de
consolidação do Uruguai como um Estado independente, cujo recorte temporal se
Figura 1 - Museu Histórico Nacional - Casa de Fructuoso Rivera.
Fonte: http://www.tripwolf.com.
estende até a primeira década do século XX. Com isso, o Museu busca “gerar nos
visitantes uma reflexão sobre a identidade dos uruguaios e divulgar os múltiplos
processos históricos que levaram à formação do país” (NACIONAL, 2018) 3. Percebe-
se, nessa afirmação, o objetivo pedagógico do MHN na medida que busca gerar
reflexões acerca da identidade do país.
De acordo com o que pode ser averiguado na visita, o MHN conta com várias
salas de exposição, e contempla, de fato, variados acontecimentos da história do
Uruguai. Seja por meio de pinturas (maior parte do conjunto que forma as exposições),
desenhos, documentos oficiais, bustos, objetos e artefatos dos mais variados (armas,
louças, indumentária e acessórios de vestimenta militar) – figuras 2 e 3 –, o museu
acaba por apresentar ao visitante a história do Uruguai através dos seus mais ilustres
representantes (provenientes em maior parte da classe política e militar).
3 versão original em espanhol: “Generar en los visitantes una reflexión a propósito de la identidad de
los uruguayos y dar a conocer los múltiples procesos históricos que condujeron a la formación del país”.
Figura 2 – Sala de exposição na Casa de Fructuoso Rivera.
Figura 3 – Sala de exposição na Casa de Fructuoso Rivera.
Fonte: Acervo pessoal das autoras, 2018.
Fonte: Acervo pessoal das autoras, 2018.
Segundo Ariadna Islas (2011), que já foi diretora da instituição, por muito tempo
houve a predominância de um viés nacionalista e de admiração e veneração aos
grandes heróis e feitos da história uruguaia (característica da historiografia do século
XIX e início do XX), que acabou se refletindo também na organização do Museu
(ISLAS, 2011). Porém, esta antiga visão hoje passa a encontrar certos problemas,
principalmente por destacar apenas um lado da história, em detrimento de muitos
outros. Desse modo, “este projeto do Museu Histórico enfrenta hoje uma crise no
diálogo com o público visitante” (ISLAS, 2011, p. 15) 4, especialmente pelo fato desse
último não se sentir representado naquele museu. Assim, o MHN hoje busca refletir
possibilidades de renovação a partir das novas demandas, de modo que possa se
adaptar aos novos tempos.
Já o Museo Histórico Cabildo, como é possível deduzir pelo nome, está
estabelecido nas dependências do que foi o cabildo (instituição do período colonial,
responsável pela administração das cidades) de Montevideo. Localizado em frente a
Plaza Constitución (Plaza Matriz), o local tem forte poder simbólico, decorrente da
própria história da cidade e do Uruguai em si: de um lado da praça está o antigo
cabildo, representando o poder político; e do outro, está a Catedral Basílica de
Montevideo - Iglesia Matriz, representando o poder da Igreja Católica, que remonta ao
período colonial. Juntas, essas instituições formaram os dois pilares que sustentaram
o poder e influenciaram a história do país (assim como ocorreu nas colônias
espanholas vizinhas e no Brasil também), e, bem como a praça em que estão
localizadas, foram palco e testemunhas dos acontecimentos políticos, sociais e
culturais mais importantes da história uruguaia.
Porém, inicialmente, o museu foi fundado em outro espaço. Segundo o site da
instituição, “o Museu nasceu em 25 de agosto de 1915, [...] localizado na antiga Quinta
de Sierra, em Camino Castro y Molinos de Raffo” (CABILDO, 2018) 5. Para compor o
acervo, adquiriu-se através de doações e compra, objetos dos mais variados tipos,
“peças que exemplificam a vida e a evolução da cidade de Montevidéu, bem como
4 versão original em espanhol: “este proyecto de Museo Histórico enfrenta hoy una crisis en el diálogo
con el público visitante”.
5 versão original em espanhol: “el Museo nació un 25 de agosto de 1915 [...], ubicándose en la ex Quinta
de Sierra, en Camino Castro y Molinos de Raffo”.
seus usos e costumes” (CABILDO, 2018)6. O museu somente passou as
dependências do antigo cabildo da cidade em 1958 (figura 4), e tem hoje, entre outros
objetivos,
apresentar propostas museográficas inovadoras e desenhar curadorias que promovam a reflexão sobre diferentes eixos conceituais no público, com o objetivo de se posicionar como um espaço inovador, que dinamiza a interação entre as esferas educacional, cultural e artística da cidade de Montevideo (CABILDO, 2018) 7.
O museu, mesmo estando instituído em um espaço que remonta a história do
antigo Uruguai – preservando muito da arquitetura original –, de fato tem uma proposta
diferenciada em comparação ao Museo Histórico Nacional. Primeiramente, o museu
promove somente exposições temporárias, e essas abarcam temáticas das mais
diferenciadas. As que estavam expostas durante a visita, pelo o que pode ser
constatado, tinham um ar moderno e valiam-se muito do uso da tecnologia como
6 versão original em espanhol: “piezas todas que ejemplifican la vida y evolución de la ciudad de
Montevideo, así como sus usos y costumbres”. 7 versão original em espanhol: “presentar propuestas museográficas innovadoras y diseñar curadurías
que promuevan en el público la reflexión en torno a distintos ejes conceptuales, con el objetivo de posicionarse como un espacio innovador, que dinamice la interacción entre los ámbitos educativos, culturales y artísticos de la ciudad de Montevideo”.
Fonte: Acervo pessoal das autoras, 2018.
Figura 4 – O Museo Histórico Cabildo
ferramenta para atrair o público. E isso não foi diferente com a exposição que tratava
sobre a Guerra do Paraguai.
A exposição intitulada “Guerra contra Paraguay – la construcción de un relato”,
que permaneceu no museu entre outubro de 2017 e julho de 2018, teve como proposta
apresentar um relato mais sensível da guerra – visto a dimensão de perdas e dor que
esta teve para todos os países envolvidos –, por meio de múltiplos e diferenciados
olhares. Isso pode ser relacionado com a renovação que ocorreu no campo
historiográfico, no que ficou conhecido como a Nova História Cultural, que despontou
justamente com o intuito de dar voz para aqueles que muitas vezes foram colocados
de lado, em segundo plano ou até mesmo no esquecimento. Nesse sentido, o objetivo
maior da exposição foi
romper construções históricas lineares, uniformes, fazedoras heróis ou tiranos de acordo com a evolução do tempo e dos governos; histórias que omitem o lugar que ocupam na história, pessoas sem rosto e sem nome de todas as idades (CABILDO, 2017) 8.
Como pode ser visto e exemplificado pelas figuras 5 e 6, o conceito da
exposição é visível em todos os detalhes: no vermelho das paredes, que remete ao
sangue derramado nas batalhas; nas armas expostas, similares a aquelas que os
soldados que foram convocados para a guerra usaram; nos vídeos exibidos e livros
8 versão original em espanhol: “quebrar construcciones históricas lineales, uniformes, hacedoras de
héroes o tiranos según el devenir de los tiempos y los gobiernos; relatos que omiten el lugar que ocupan en la historia, personas sin rostro y sin nombre de todas las edades”.
Figura 5 – Exposição: Guerra contra Paraguay – la construcción de un relato
Fonte: Acervo pessoal das autoras, 2018.
expostos, representando as múltiplas versões sobre a guerra no decorrer da história;
nas várias fotos e ilustrações, que remontam a força que esses recursos tiveram na
época (e têm ainda hoje) em retratar o que aconteceu; nas pinturas destacando as
mulheres e os nativos da região, que por muito tempo ficaram à margem das
narrativas sobre o conflito.
Diferentemente do Museo Histórico Cabildo, a exposição referente a Guerra do
Paraguai presente no Museo Histórico Nacional é permanente. Posicionada em um
dos corredores que ligam as várias salas de exposição (figura 7) passa até mesmo
quase despercebida pelos visitantes, principalmente por não ter algo que a identifique.
Tal como as demais dependências do museu, é composta basicamente por pinturas,
documentos oficiais e objetos dos mais variados relacionados ao conflito. Percebe-se
Figura 6 – Exposição: Guerra contra Paraguay – la construcción de un relato
Figura 7 – Exposição sobre a Guerra do Paraguai no Museo Histórico Nacional
Fonte: Acervo pessoal das autoras, 2018.
Fonte: Acervo pessoal das, 2018.
que, pelo contexto do museu em que está inserida, ela pode ser considerada menos
uma exposição que vise abordar a Guerra do Paraguai em si, e mais uma exposição
enaltecendo a atuação dos grandes militares uruguaios no conflito.
As duas exposições podem ser consideradas bem diferentes entre si, mas um
paralelo bastante importante pode ser traçado: a quase ou total ausência do Brasil e
dos brasileiros nos discursos museológicos dessas instituições. Evidentemente, são
museus que tem o objetivo de trabalhar a história do Uruguai, do povo e da nação
uruguaia. Porém, a ausência assinalada foi algo que chamou muito a atenção, visto
que as ações e o envolvimento do Brasil no conflito não podem ser consideradas
meramente como algo de segundo plano. Segundo os dados que Doratioto (2002,
p.483) apresenta, o Brasil enviou aos campos de batalha aproximadamente 139 mil
soldados, enquanto que o Uruguai mobilizou cerca de 5500 homens. O Império
brasileiro foi “capaz de mobilizar todos os seus recursos e de atingir o apogeu de seu
poder no Prata” (DORATIOTO, 2002, p. 484). Isso acabou tendo valores tão
dispendiosos economicamente, que acabou por estremecer as estruturas do Império
tanto que se considera esse o ponto do início da derrocada da monarquia brasileira.
Para o Uruguai, ao contrário, “as repercussões da guerra foram bem menores,
apesar de a situação no país ter sido o elemento catalisador das contradições que
levaram ao conflito” (DORATIOTO, 2002, p. 484). E o que se encontra na historiografia
sobre o tema é em grande parte isso: o Uruguai tem um destaque maior nos
acontecimentos que levaram a deflagração do conflito. Com isso em mente, é possível
também assinalar outro ponto muito importante: sendo o Uruguai, entre os aliados, o
país em que a guerra teve menor impacto, é interessante notar que dois dos mais
relevantes museus do país possuíam exposições relacionadas ao tema. Isso acaba
por denotar que por mais que tenha sido um evento histórico que aconteceu a 150
anos atrás, suscita ainda hoje reflexões, debates e reverberações.
Durante a visita aos museus e em conversas com historiadores uruguaios,
pode-se perceber que o Uruguai vê hoje a Guerra da Tríplice Aliança como uma
mancha em sua história, um “fantasma en la memoria” (CABILDO, 2017). Um exemplo
das injustiças e atrocidades cometidas contra o povo paraguaio é o caso da Batalha
de Campo Grande, conhecida também como Acosta Ñu, onde crianças paraguaias
pegaram em armas e foram a guerra lutar contra os aliados, resultando em um banho
de sangue (DORATIOTO, 2002, p. 418).
O Museo Histórico Nacional, por conta do contexto e de uma visão de história
e memória muito característicos do período de sua inauguração, segue ainda
representando a Guerra do Paraguai pelos seus grandes líderes. Não cabe aqui fazer
juízo de valor e considerar se tal percepção está certa ou não, mas é inegável que tal
discurso hoje não é suficiente frente às mudanças e transformações que ocorreram
no campo historiográfico, principalmente nas últimas décadas. Como destaca Kreich
e Guedes (2014, p. 113-114), vale lembrar que
qualquer espaço de memória ou museu é feito por pessoas que visam demonstrar uma história, que escolhem quais objetos devem ser mostrados e para quem devem ser mostrados. Nesse sentido, nenhum museu, nenhuma instituição é neutra, pois é feita por escolhas metodológicas de pessoas para públicos-alvo com vistas a identificações.
Mesmo sendo temporalmente distintos e com visões e missões institucionais
diferentes entre si, o Museo Histórico Cabildo também é marcado pelas linhas de
pensamento e visões de mundo ao qual é contemporâneo. A decisão e escolha por
exibir uma exposição que dá voz a aqueles que por muito tempo ficaram à margem
da história do conflito, não tem como intuito apenas conhecer as demais ações e
relações do que já aconteceu. Das primeiras análises feitas, pode-se concluir que
muito das discussões que suscita tem mais a ver com o que a sociedade vive hoje do
que propriamente com o passado. Ao dar enfoque ao horror que foi a participação de
crianças na Guerra do Paraguai, como aconteceu na batalha de Acosta Ñu, por
exemplo, a intenção não é apenas chocar o público com algo que ocorreu tanto tempo
Figura 8 – Mosaico exposto no Museo Histórico Cabildo.
atrás, afinal o passado já aconteceu e não volta mais. Muito além disso, o museu tem
como proposito fazer uso desse passado para problematizar algo da própria
contemporaneidade (figura 8), visto que mesmo depois de mais de um século e meio,
crianças ao redor do mundo se encontram nas mesmas condições de linha de frente
em campos de batalha (O GLOBO, 2017), por exemplo.
Assim, todas essas representações e discursos vêm à tona para mostrar o
quanto o passado é utilizado para significar e dar significado a várias questões que
permeiam a sociedade contemporânea. Em meio a isso, também estão imbricadas as
lutas de poder entre os indivíduos e até mesmo na coletividade, nos mais diversos
âmbitos e espaços. A história e a memória de um acontecimento sempre vão ser
objetos de disputa entre as relações que permeiam a rede que constitui o meio social,
e no caso da Guerra do Paraguai, considerando suas dimensões para e entre os
envolvidos, é praticamente impossível considerar o assunto como encerrado.
Referências
CABILDO, Museo Histórico. Guerra contra Paraguay – la construcción de un relato. 2017. Disponível em: <http://cabildo.montevideo.gub.uy/exposiciones/guerra-contra-paraguay-la-construccion-de-un-relato-octubre-2017-julio-2018>. Acesso em: 10 jul. 2018. CABILDO, Museo Histórico. Historia. 2018. Disponível em: <http://cabildo.montevideo.gub.uy/node/14/historia>. Acesso em: 13 ago. 2018. CHAGAS, Mário de Souza; SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. A linguagem de poder dos museus. In: ABREU, Regina; CHAGAS, Mário de Souza; SANTOS, Myrian Sepúlveda dos (Org.). Museus, coleções e patrimônios: narrativas polifônicas. Rio de Janeiro: Garamond, 2007. p. 12-19. CHARTIER, R. A História cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL, 1990. DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra: Nova história da Guerra do Paraguai. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. ISLAS, Ariadna. Museo abierto: recuperación de otras Historias/Historias otras en los relatos posibles de la nación. Revista Museos, Chile, v. 30, p.15-23, 2011. KREICH, Misleine; GUEDES, Sandra Paschoal Leite de Camargo. A Guerra do Paraguai: representações e (re)significações do Brasil e dos brasileiros por meio do
Panteão Nacional dos heróis e do Museu Militar, de Assunção. Cadermo de Iniciação à Pesquisa, Universidade da Região de Joinville, Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, Joinville, v. 16, p.109-114, dez. 2014. NACIONAL, Museo Histórico. Misión y visión. 2018. Disponível em: <http://www.museohistorico.gub.uy/innovaportal/v/46640/33/mecweb/mision-y-vision?3colid=16982&breadid=null>. Acesso em: 13 ago. 2018. O GLOBO. Unicef alerta sobre uso de crianças como armas de guerra em conflitos pelo mundo: jovens são recrutados por grupos armados ou usados como escudo humano. O Globo, dez. 2017. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/unicef-alerta-sobre-uso-de-criancas-como-armas-de-guerra-em-conflitos-pelo-mundo-22234883>. Acesso em: 19 ago. 2018.