funÇÃo socioambiental da propriedade - …siaibib01.univali.br/pdf/ana pfleger.pdf ·...

89
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José (SC), novembro de 2004.

Upload: nguyenhuong

Post on 29-Aug-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER

São José (SC), novembro de 2004.

Page 2: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER

São José (SC), novembro de 2004.

Page 3: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE

ANA PAULA PFLEGER

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

São José, 11 de novembro de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira - Orientador

_______________________________________________________ Prof. Msc. Rafael Burlani Neves

_______________________________________________________ Prof. Msc. Fernanda Sucharski Matzenbacher

Page 4: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

DEDICATÓRIA

Dedico este texto:

Aos meus pais, Adalberto e Márcia, exemplos de luta e perseverança, que sempre me demonstraram que tudo é possível com fé em Deus, trabalho e estudo. Ao meu noivo, Luiz, exemplo de dedicação e esforço, que esteve comigo em todos os momentos, inclusive quando a distância física era imensa, me ajudando com palavras de carinho e amor. Às minhas irmãs Natália e Mariane, que compreenderam minha ausência em casa e nos momentos de brincadeira. Aos Meus Primos Rubien e Julien pelos momentos de descontração proporcionados pelo jeito alegre deles de verem o mundo. Aos meus amigos de faculdade, principalmente Letícia e Carolina, pelos anos alegres da faculdade, pelas horas de risadas e “desesperos com a monografia” que muito nos fizeram crescer. A todos que me ajudaram e me incentivaram nesta caminhada em busca do conhecimento.

Page 5: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

v

AGRADECIMENTOS

À Deus, criador da vida e arquiteto de todas as maravilhas, Senhor que tudo

torna possível e transforma.

A todos aqueles que, de uma maneira direta ou indireta, contribuíram para a

realização desta pesquisa, em especial, ao meu noivo Luiz Ricardo, que sempre me

incentivou, e ao Professor Ricardo Stanziola Vieira, pela orientação fornecida e,

principalmente, por me apresentar um novo ponto de vista sobre o direito e sobre o meio

ambiente.

Page 6: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

vi

"Um dia, a Terra vai adoecer. Os pássaros cairão do céu, os

mares vão escurecer e os peixes aparecerão mortos na correnteza

dos rios. Quando esse dia chegar, os índios perderão o seu

espírito. Mas vão recuperá-lo para ensinar ao homem branco a

reverência pela sagrada terra. Aí, então, todas as raças vão se unir

sob o símbolo do arco-íris para terminar com a destruição. Será o

tempo dos Guerreiros do Arco-Íris”.

(Profecia feita há mais de 200 anos por "Olhos de Fogo", uma

velha índia Cree).

Page 7: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

vii

SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................................................. ix

ABSTRACT.......................................................................................................................... x

LISTA DE ABREVIATURAS............................................................................................ xi

INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 12

1 AMBIENTE E DIREITO AMBIENTAL ..................................................................... 15

1.1 CONCEITO E NOMENCLATURA DE AMBIENTE..................................................... 15

1.2 DIREITO AMBIENTAL .................................................................................................. 17

1.3 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS ........................................................................................... 21

1.3.1 Princípio ao Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado ............................................. 22

1.3.2 Princípio da Precaução e da Prevenção ........................................................................... 24

1.3.3 Princípio do Desenvolvimento Sustentável ..................................................................... 26

1.3.4 Princípio do Poluídor Pagador ......................................................................................... 26

1.3.5 Princípio da Responsabilidade......................................................................................... 27

1.3.6 Princípio da Natureza Pública da Proteção Ambiental .................................................... 28

1.3.7 Princípio da Participação Comunitária ............................................................................ 29

1.3.8 Princípio da Cooeração entre os Povos............................................................................ 30

1.3.9 Princípio da Função Socioambiental da Propriedade ...................................................... 32

2 DIREITO À PROPRIEDADE ...................................................................................... 34

2.1 ORIGEM HISTÓRICA DA PROPRIEDADE ................................................................. 34

2.2 CONCEITO E EVOLUÇÃO DA PROPRIEDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO........................................................................................................................... 37

2.2.1 Conceito ........................................................................................................................... 37

2.2.2 Evolução do Direito à Propriedade no Brasil .................................................................. 39

2.3 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE ....................................................................... 40

2.4 FUNÇÃO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE............................................................... 42

2.5 FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE URBANA................................. 43

2.6 FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE RURAL.................................... 45

2.7 LIMITAÇÕES À PROPRIEDADE DECORRENTES DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS46

2.7.1 Aspectos gerais sobre as limitações ao direito de propriedade........................................ 46

Page 8: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

viii

2.7.2 Espaços Ambientais ......................................................................................................... 49

2.7.2.1 Zoneamento Ambiental................................................................................................. 49

2.7.2.2 Espaços Territoriais Especialmente Protegidos ............................................................ 50

2.7.2.2.1 Áreas de Proteção Especial, Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal.... 51

2.7.2.2.2 Unidades de Conservação......................................................................................... 55

2.7.2.2.2.1 Unidades de Conservação de uso Sustentável ........................................................ 56

2.7.2.2.2.2 Unidades de Conservação de Proteção Integral...................................................... 59

3 ESTADO DE DIREITO DO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL COMO COMPATIBILIZADORES DO DIREITO A PROPRIEDADE

E A PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE ....................................................................... 62

3.1 O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO

NORTEADOR DOS PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA........................................... 62

3.2 CONSTRUÇÃO DO ESTADO DE DIREITO DO AMBIENTE ................................... 68

3.2.1 Crise Ambiental ............................................................................................................... 68

3.2.2 Estado de Direito do Ambiente........................................................................................ 70

3.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ...................................................................... 75

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 82

REFERÊNCIAS................................................................................................................. 84

Page 9: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

ix

RESUMO

Esta pesquisa foi direcionada para a compreensão dos objetivos do direito

ambiental, disciplina atual que surgiu a partir da percepção de que os recursos naturais são

finitos e que se não preservados poderão colocar em risco o futuro da humanidade, mediante

análise de seu conceito e princípios estruturantes, notadamente àqueles que apresentam, em

seu bojo, como finalidade a qualidade de vida, e, neste sentido, acabam por modificar o

conceito e conteúdo do direito à propriedade privada. Desta forma, pretende-se demonstrar a

evolução do direito de propriedade no decorrer da história até a sua delimitação atual, que tem

na função socioambiental o seu próprio conteúdo, função esta que autoriza as limitações

ambientais à propriedade, notadamente aquelas oriundas dos espaços ambientais, incluídos

zoneamento ambiental e espaços territoriais especialmente protegidos, obrigando, por

conseqüência, o proprietário a adequar seu domínio às exigências sociais e ambientais, a fim

de que se promova um novo modelo de desenvolvimento, direcionado a sustentabilidade dos

recursos naturais e da economia, o qual deve ser implementado por um Estado de direito do

Ambiente, alicerçado em uma democracia baseada em uma cidadania participativa e solidária.

Page 10: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

x

ABSTRACT

This research was directed for the understanding of the objectives of the

enviromental law, current discipline that appeared from the perception that the natural

resources are finite and if not preserved they can put in risk the future of humanity, by means

of analysis of its concept and structuring principles, noticed those that present, in its scope,

the purpose of quality of life, and, in this direction, finish for modifying the concept and

content of the right of private property. In this sense, it is intended to demonstrate the

evolution of the right of property in elapsing of history until its current delimitation, that has

in the socioambiental function its proper content, function that authorizes the ambient

limitations to the property, noticed those deriving from enviromental spaces, including

enviromental zoning and especially protected territorial spaces, compelling, for consequence,

the proprietor to adjust its domain to the social and enviromental requirements, aiming the

promotion of a new model of development, directed to the sustainability of the natural

resources and economy, which must be implemented by a Enviromental Law State, sustained

by a democracy based on a participative and solidary citizenship.

Page 11: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

xi

LISTA DE ABREVIATURAS

APA – Área de Preservação Ambiental

APP – Área de Preservação Permanente

ART - Artigo

CF – Constituição Federal

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente

IPTU – Imposto Territorial Urbano

ONGS – Organizações Não - governamentais

ONU – Organização das Nações Unidas

PNMA – Política Nacional do Meio Ambiente

RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Nacional

SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação

ZEE – Zoneamento Ecológico-Econômico

Page 12: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

INTRODUÇÃO

A presente monografia terá por objetivo apontar que conflito entre o direito à

propriedade e a um ambiente preservado é somente aparente, pois o direito à propriedade é

concebido, hodiernamente, como direito função socioambiental, ou seja, é reconhecido se

atende os interesses sociais e ambientais de proteção. Todavia, referida afirmação ainda não é

acreditada por todos os cidadãos, pois estes ainda a concebem como garantia constitucional

ilimitada, além de não terem sido efetivados os princípios ambientais.

Tem-se, também, por finalidade demonstrar que diante da crise ecológica

vivenciada, a qual ameaça o futuro da humanidade, há a necessidade de se adotar um novo

modelo de desenvolvimento que alie crescimento econômico e proteção ambiental e uma

nova forma de Estado que venha a implementar este modelo de desenvolvimento.

Desta forma, para que referida necessidade reste demonstrada, proceder-se-á a

análise do instituto jurídico da propriedade, na medida que é fundada no modo capitalista de

produção e, portanto, geradora de riquezas, estando prevista, inclusive, como princípio da

ordem econômica (artigo 170 da Constituição Federal).

O conceito de direito à propriedade, ao longo da história, vem sofrendo

grandes alterações, passou de direito absoluto e ilimitado do proprietário de usar, gozar, e

dispor do seu domínio, do modo que lhe aprouver (percepção típica do Estado Liberal), a um

direito cujo exercício é condicionado a uma função social e, atualmente, a uma função

ambiental, eis que passa de um direito de cunho meramente individualista para um direito que

deve estar em consonância com os interesses da sociedade, como a proteção ambiental.

Deste modo, verificar-se-á o condicionamento do direito à propriedade privada

ao atendimento dos requisitos disposto pelo direito ambiental, ramo do direito que surge no

momento em que se percebe que os recursos naturais são exaurientes e, que, por pertencerem

a toda a coletividade devem ser por ela e pelo Poder Público tutelados.

Estes requisitos nada mais são que o atendimento da função social e ambiental

da propriedade, uma vez que para serem atendidas são instituídas inúmeras limitações ao

direito do proprietário, mormente àquelas advindas dos espaços ambientais, compreendidos o

zoneamento ambiental e os espaços territoriais especialmente protegidos.

Page 13: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

13

Assim, para que sejam realizados os objetivos aqui descritos, o tema proposto

na presente monografia será desenvolvido a partir de pesquisa a leis, artigos, acórdãos e

livros, sendo organizada em três capítulos.

O primeiro capítulo desta monografia será destinado à análise do surgimento

do direito ambiental, mediante o reconhecimento de que o direito à vida está intrinsecamente

ligado à existência de um ambiente sadio e equilibrado para as presentes e futuras gerações,

bem com, a análise dos princípios ambientais, os quais dão suporte ao direito fundamental a

qualidade de vida e, por conseqüência, condicionam a exploração da propriedade ao

atendimento de sua função socioambiental.

O segundo capítulo será destinado ao estudo pormenorizado do direito à

propriedade, desde a sua conceituação como garantia sagrada e inviolável até a acepção

adotada pelos atuais ordenamentos jurídicos.

Assim, neste segundo capítulo se abordará a origem histórica da propriedade, a

sua evolução perante o ordenamento jurídico Brasileiro, notadamente pelas Constituições

Brasileiras de 1824, 1821, 1934, 1937, 1946, 1967, 1988 e pelos Códigos Civis de 1916 e

2002, o seu conceito contemporâneo que abarca propriedade função social e ambiental, sendo

que, além de serem as funções social e ambiental da propriedade abordadas em tópicos

específicos, será realizado, também, um estudo das funções socioambientais da propriedade

urbana e da propriedade rural. Serão abordadas as questões relativas à limitação ambiental da

propriedade, especialmente àquelas oriundas da criação dos espaços ambientais, que acabam

por formar os limites da função socioambiental.

O terceiro capítulo será destinado ao estudo da compatibilização do direito à

propriedade e direito ao ambiente preservado, pois ambos são necessários ao

desenvolvimento.

Procurar-se-á demonstrar que a harmonização destes direitos ocorre através do

respeito à função socioambiental da propriedade, pois esta função além de garantir a

preservação ambiental, garante o uso presente e futuro da propriedade.

A função socioambiental da propriedade, como compatibilizadora dos

princípios da ordem econômica descritos no artigo 170 da Constituição Federal, será

alcançada mediante a adoção de mecanismos de equilíbrio, consistentes na a adoção de um

modelo de desenvolvimento sustentável e no Alcance de um Estado de Direito do Ambiente.

Este último capítulo será destinado ainda à análise dos fatores que

possibilitarão a adoção do modelo de desenvolvimento sustentável e a Criação de um Estado

de Direito do Ambiente, como cidadania participativa e solidária, e ainda, a necessidade de

Page 14: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

14 educação ambiental dirigida a uma conscientização social para com os problemas ambientais,

importando, por conseqüência, em mudança dos valores sociais, ou seja, adoção de uma visão

ecológica de desenvolvimento que tenha na preservação ambiental e prevenção ao dano

ecológico os objetivos a serem alcançados.

Page 15: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

1 AMBIENTE E DIREITO AMBIENTAL

O Direito ambiental, como a seguir se conceituará, é disciplina atual, sendo

que somente despertou atenção e preocupação no momento em que se percebeu que o futuro

da humanidade estava ameaçado.

Por ser o homem o grande responsável pelas modificações ambientais, as quais

geraram desequilíbrios ecológicos, necessário a adoção de uma adequada regulação do

direito1, a fim de se promover o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e proteção

ambiental.

Neste sentido, Morato Leite aponta como uma das soluções à crise ambiental a

construção de um Estado de Direito do Ambiente alicerçado em uma economia solidária e

participativa que proclame o uso racional dos recursos naturais,2 a qual somente será

alcançada se presente estiver a consciência da crise ambiental existente, exigindo-se, por

certo, uma cidadania ecológica.3

Assim, importante se faz o estudo sobre ambiente e direito ambiental perante o

ordenamento Jurídico Brasileiro, para que se possa precisar a sua influência sobre o direito de

propriedade e a compatibilização de ambos os direitos.

1.1 CONCEITO E NOMENCLATURA DE AMBIENTE

A preocupação com o Ambiente é questão recente perante as discussões

internacionais e internas dos Estados4, sendo que até mesmo o conceito do que vem a ser

Ambiente bem como a nomenclatura ainda não é um consenso.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 optou pela adoção

1 Cf. BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução ao Direito Ambiental Brasileiro. IN BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG). Manual Prático da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. 2. ed. São Paulo: IMESP, 1999, p.20. 2 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000.p.16/19. 3 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. São Paulo: LTr, 1999. p.27. 4 Cf. SOARES, Guido Fernando da Silva. Curso de Direito Internacional Público.Vol.1. São Paulo: Atlas, 2002. p.407.

Page 16: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

16 do termo Meio Ambiente que no entender de Ramón Martín Mateo5 a expressão é redundante,

vez que “ambiente” e “meio” são sinônimos.

Quanto ao conceito, entendia-se que Ambiente ou “Meio ambiente” era

somente formado por componentes naturais ou físicos, como água, ar, solo, flora, fauna.

Todavia, o ambiente é mais que simplesmente componentes físicos, ele é integrado pelo

ambiente do trabalho, ambiente artificial, cultural, urbanístico.

Assim, do ponto de vista normativo defendido pela lei 6.938/81, ou seja, pela

Política Nacional do Meio Ambiente, o meio ambiente “constitui o conjunto de condições,

leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a

vida em todas as suas formas”.6

Verifica-se, entretanto, que este conceito deve ser ampliado. Neste sentido

pode-se citar José Afonso da Silva, que assim preceitua:

O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico. O meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas.7

Corroborando este conceito abrangente de Meio Ambiente, Édis Milaré cita em

sua obra um conceito jurídico deste sob dois enfoques, estrito e amplo:

Numa visão estrita, o meio ambiente nada mais é do que a expressão do patrimônio natural e as relações com e entre os seres vivos. Tal noção, é evidente, despreza tudo aquilo que não diga respeito aos recursos naturais. Numa concepção ampla, que vai além dos limites estreitos fixados pela Ecologia tradicional, o meio ambiente abrange toda a natureza original (natural) e artificial, assim como os bens culturais correlatos. Temos aqui, então, um detalhamento do tema: de um lado, com o meio ambiente natural, ou físico, constituído pelo solo, pela água, pelo ar, pela energia, pela fauna e pela flora; e, do outro, com o meio ambiente artificial (ou humano), formado pelas edificações, equipamentos e alterações produzidos pelo homem, enfim, os assentamentos e demais construções.8

Assim, diante deste conceito que busca a integração de elementos naturais e

artificiais bem como a relação do homem neste meio há a preocupação de recuperar e

5 Cf. MATEO, Ramón Martin. Derecho Ambiental. Madri: Instituto de Estúdio de Administración Local, 1977. Apud SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p.1. 6 BIRNFELD, Carlos André Souza. Das diretrizes gerais de proteção ambiental à limitação administrativa constitucional: elementos de reflexão sobre a proteção ambiental das florestas que não sejam de propriedade pública. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.134. 7 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.2, 1998. 8 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 3. ed. Rev, atual. e ampl. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.78.

Page 17: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

17 preservar o ambiente.9

1.2 DIREITO AMBIENTAL

Pode-se dizer que somente após a Segunda Guerra Mundial o Meio Ambiente

passou a fazer parte da consciência social, no momento em que houve a percepção de que os

recursos naturais são exaurientes e que crises geradas pela ausência dos mesmos surgiriam.10

Neste sentido, Édis Milaré esclarece sob quais circunstâncias a questão

ambiental passou a fazer parte do cotidiano, favorecendo o surgimento do Direito Ambiental.

Após a Segunda guerra Mundial, mais precisamente nos anos 60, começa-se a tomar uma consciência prática da finitude dos recursos naturais, de forma concreta. Matérias-primas, energia e água, entre outros bens proporcionados pela Natureza, tornam-se mais raros e mais caros. Os processos de degradação ambiental, sob várias modalidades, vão-se alastrando. Novas crises, mais sérias e globais, desenham-se no horizonte para uma sociedade que, sem embargo, insiste em fechar os olhos e ouvidos para a realidade. Nuvens pesadas encastelam-se sobre os destinos do planeta. Há um limite para o crescimento, como há um limite para a inconsciência. Foi então que o brado e a luz de Estocolmo se fizeram presentes, para valer. A partir de então, a consciência ambiental vem se estendendo e se robustece. Como ocorreu no passado, em situações cruciais ou de mudanças profundas, a Questão Ambiental sacudiu também a instituição do Direito. A velha árvore da Ciência Jurídica recebeu novos enxertos. E assim se produziu um ramo novo e diferente, destinado a embasar novo tipo de relacionamento das pessoas individuais, das organizações e, enfim, de toda a sociedade com o mundo natural.11

Contudo, a evolução desta consciência é lenta (no Brasil referida consciência

mostra alguns sinais de surgimento após a década de 80 com a Política Nacional do Meio

Ambiente – PNMA e Constituição de 1988), basta observar que há lugares onde ainda existe a

idéia do desenvolvimento econômico a qualquer preço, sem falar dos Estados que não

concedem à população sequer tratamento de água e esgoto.

Durante a realização da Conferência de Estocolmo, o Brasil – sob um regime

militar autoritário - pregou a tese do crescimento a qualquer custo, acreditando que por ser um

país em desenvolvimento não deveria desviar os recursos econômicos e atuação para o meio

ambiente.

Antônio Herman Benjamin, assim contextualiza a posição do Brasil durante a

Conferência de Estocolmo, ao dispor:

Naquela época, os países do sul estavam convencidos de que a proteção ambiental

9 Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.2. 10 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.13. 11 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.131/132.

Page 18: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

18

não tinha outra finalidade que não fosse impedir sua industrialização e modernização, necessárias ao exercício pleno de sua soberania. Sob a liderança do Brasil, essas nações, esquecendo momentaneamente suas diferenças ideológicas, oriundas da guerra- fria, defenderam, na Conferência de Estocolmo de 1972, a tese de que a degradação do meio ambiente era uma questão das nações industrializadas, cabendo a estas portanto, assumir seus custos. Os problemas dos países do Sul eram a pobreza e o subdesenvolvimento.12

O Direito Ambiental surgiu, portanto, da necessidade de consciência e de

regulamentação das relações humanas em seu meio, a fim de se evitar a completa degradação

do mesmo.

O Direito Ambiental, nestes termos, é, portanto um novo Direito, “quase que

um direito da natureza de ser respeitada e não explorada” 13, estabelecido após a

implementação dos direitos individuais relativos principalmente às liberdades e dos direitos

sociais e políticos.

Norberto Bobbio afirma que o mais importante destes novos direitos é àquele

referente a garantia de um meio ambiente sadio e equilibrado para as presentes e futuras

gerações ao dispor que “o mais importante deles é o reivindicado pelos movimentos

ecológicos: o direito de viver num ambiente não poluído”. 14

Sendo assim, é um direito típico de terceira geração15 e difuso16, vez que se

verifica o interesse de todas as pessoas, sendo que estas não possuem, necessariamente, um

vínculo comum, mas estão todas ligadas por circunstâncias de fato.17

Rotula-se de difuso o direito ao “meio ambie nte ecologicamente equilibrado”, porque ele não se funda num vínculo jurídico determinado, específico, mas em dados genéricos, contingentes, acidentais e modificáveis (...). O constituinte consagrou no art. 225 um direito difuso, pois a garantia do meio ambiente ecologicamente equilibrado não instrumentaliza um direito subjetivo típico, divisível, particularizável, que alguém possa usufruir individualmente. 18

Assim, o direito ambiental como uma nova ordem jurídica que surge pode ser

considerado como sendo um compêndio de normas (princípios e leis) “reguladoras das

12 BENJAMIN, Antônio Herman V. A proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: O caso da América Latina. Revista de Direito Ambiental. n. 0, Revista dos Tribunais, 1995.p.90. 13 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. (Trad.) Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p.69. 14 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. p.6. 15 Cf. MORAES, Alexandre. Constituição do Brasil Interpretada. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.p.2026. 16 Cf. MAZZILI, Hugo Nigro. A defesa dos Interesses Difusos em juízo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. p.18. 17 Cf. Artigo 81 da Lei 8.078/1990. BRASIL. Código Brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. GRINOVER, Ada Pellegrini.(et al). 6. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.p.716. 18 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 1.228.

Page 19: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

19 atividades humanas que, direta ou indiretamente, passam afetar a sanidade do ambiente em

sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações” .19

Seguindo, então, esta visão global, a qual considera o direito ambiental como o

orientador dos diversos temas ambientais, há que se citar Paulo Affonso Leme Machado que

assim preceitua:

O Direito Ambiental é um Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata mais de construir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo, um direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodiversidade. O Direito ambiental não ignora o que cada matéria tem de específico, mas busca interligar estes temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação, de informação, de monitoramento e de participação.20

Nesta mesma linha Paulo de Bessa Antunes também considera o Direito

Ambiental um direito globalizante e interdisciplinar, desta forma explicita:

O Direito Ambiental é um direito humano fundamental que cumpre a função de integrar os direitos à saudável qualidade de vida, ao desenvolvimento econômico e à proteção dos recursos naturais. Mais do que um direito autônomo, o Direito Ambiental é uma concepção de aplicação da ordem jurídica que penetra, transversalmente, em todos os ramos do Direito. O Direito Ambiental, portanto, tem uma dimensão humana, uma dimensão ecológica e uma dimensão econômica que se devem harmonizar sob o conceito de desenvolvimento sustentado.21

Percebe-se que ambas as citações podem ser traduzidas com a simples leitura

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988 a qual, influenciada pela Declaração do Meio

Ambiente, e pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e desenvolvimento e

responsável pela elaboração do Relatório Nosso Futuro Comum, trouxe como princípios

ambientais o princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e

futuras gerações, princípio da sustentabilidade, da prevenção, da precaução, da reparação ao

dano, do poluidor – pagador, da função socioambiental da propriedade, da cooperação. 22

Cristiane Derani esclarece que especificadamente o caput do artigo 225 da

Constituição Federal é uma norma que expressa objetivos e delineia a forma da política

econômica que deve ser aplicada, traçando os princípios que a mesma deve atender e

19 CUSTÓDIO, Helita Barreira. Legislação Ambiental no Brasil. São Paulo: Revista de Direito Civil, 1996. Apud MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.134. 20 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10. Ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p.129/130. 21 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 5. ed, rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2001. p.9. 22 Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.37.

Page 20: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

20 cumprir.23

Assim, colaciona-se o artigo 225 da Constituição Federal, o qual representou

marco importante na história das Constituições brasileiras ao dispor sobre o direito

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois estabelece que os bens

ambientais são de interesse comum24, insertos sob domínio público ou privado:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. §1º Para assegurar a efetividade desse direito incube ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e promover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida e o meio ambiente; VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. §2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. §3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. §4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Planalto Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. §5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. §6º As usinas que operarem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.25

A corroborar, ainda, esta questão do direito fundamental ao meio ambiente

sadio e equilibrado, está o contido no artigo 5º, LXXIII da Constituição Federal26, artigo este

23 Cf. DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997. p. 201. 24 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.20. 25 BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.133/134. 26 Art. 5º, LXXIII da Constituição Federal: Qualquer cidadão é parte legitima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao

Page 21: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

21 que integra o rol dos direitos e garantias fundamentais, faz menção clara à proteção do meio

ambiente.27

Referido dispositivo constitucional, conforme supramencionado, constitui-se

instrumento de validade do direito ambiental, na medida em que o ambiente ecologicamente

equilibrado é um direito humano fundamental e, efetiva-se com o desenvolvimento dos

objetivos elencados nos parágrafos e incisos do artigo 225 da Constituição Federal, sendo que,

para tanto, pauta-se por princípios constitutivos28, os quais serão abordados no decorrer deste

capítulo.

1.3 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS

Princípios Constitucionais, conforme asseveram Gomes Canotilho e Vital

Moreira, pode-se entender como “núcleos de condensações nos quais confluem valores e bens

Constitucionais; Os princípios, que começam por ser a base de normas jurídica, podem estar

positivamente incorporados, transformando-se em normas-princípios e constituindo preceitos

básicos da organização constitucional”. 29

Celso Antônio Bandeira de Melo também conceitua princípio como sendo o

alicerce de um sistema normativo:

(...) mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá o sentido harmônico.30

Os princípios de direito Ambiental constituem os instrumentos para a proteção

do meio ambiente, sendo assim sua finalidade básica é o desenvolvimento sustentado.

Assim, é de bom alvitre demonstrar a finalidade básica dos princípios

ambientais, segundo Paulo de Bessa Antunes:

Os princípios do Direito Ambiental estão voltados para a finalidade básica de

meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento das custas judiciais e do ônus da sucumbência. BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.28. 27 Cf. Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.20. 28 CF. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.136. 29 CANOTILHO, José Francisco e MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. Apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. Ed. São Paulo: Malheiros, 200. p.96. 30 MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. Ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.817/818.

Page 22: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

22

proteger a vida, em qualquer forma que esta se apresente, e garantir um padrão de existência digno para os seres humanos desta e das futuras gerações, bem como o de conciliar os dois elementos anteriores com o desenvolvimento econômico ambientalmente sustentado.31

São os princípios de Direito Ambiental, portanto, que estabelecem as bases

jurídicas que alicerçam os mecanismos postos à disposição da sociedade para a defesa do

meio ambiente, na medida em que “são construções teóricas que visam a me lhor orientar a

formação do direito ambiental, procurando denotar-lhe uma certa lógica de desenvolvimento,

uma base comum presente nos instrumentos normativos”. 32

Importante destacar que os princípios podem ser implícitos ou explícitos

(descritos claramente nos dispositivos legais), sendo que ambos devem regular as relações

humanas e as relações dos homens e outras formas de vida.33

1.3.1 Princípio ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

O Direito ambiental é um direito fundamental, mas não somente direito

individual, é um direito difuso, pertencente ao rol dos direitos de terceira geração e que exerce

sua influência sobre interesses da sociedade e interesses individuais, sendo assim reconhecido

pelo Supremo Tribunal Federal, que da seguinte maneira disciplina: 34

O direito a integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao individuo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, a própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de Segunda Geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identifica com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade.35

31 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.25. 32 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p. 155/156. 33 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.25. 34 Cf. SANTOS, Gustavo Ferreira. Direito de propriedade e direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado: Colisão de direitos fundamentais? In: Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 37. n. 147, julho/setembro. 2000. p.24. Disponível em: http://www.senado.gov.br, Acesso em: 01/10/2004.p.24. 35 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n. 22164/SP. Brasília, 05 de maio de 1998.Disponível em: http://www.stf.gov.br, acesso em: 30/08/04.

Page 23: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

23

Quanto a insubordinação do direito fundamental ao meio ambiente frente a

outros direitos, manifesta-se Paulo de Bessa Antunes:

O Direto Ambiental, como direito humano fundamental, não pode ficar subordinado às regras do Direito do proprietário ou do direito do patrão, assim como não pode ficar subordinado às regras do Direito do Estado contra os Direitos da cidadania; ao contrário, são àqueles direitos que devem se subordinar e se transformar em razão de necessidades prementes da humanidade que se refletem juridicamente na categoria dos direitos humanos fundamentais.36

Neste sentido, o princípio ao ambiente ecologicamente equilibrado está inserto

no caput do artigo 225 da Constituição Federal, todavia já estava exposto na declaração do

Meio Ambiente também conhecida por Declaração de Estocolmo, constituída por 26 (vinte e

seis) princípios fundamentais de proteção ambiental.

Assim, cita-se o Principio 1 da supracitada Declaração:

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras. A esse respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira permanecem condenadas e devem ser eliminadas. 37

Referido princípio, portanto, é aquele proposto para a melhoria da qualidade de

vida, sendo por Paulo Affonso Leme Machado assim considerado:

Não basta viver ou conservar a vida. É justo buscar e conseguir a “qualidade de vida”. A Organização das Nações Unidas – ONU anualmente faz uma classificação dos países em que a qualidade de vida é medida, pelo menos, em três fatores: saúde, educação e produto interno bruto. “A qualidade de vida é um el emento finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no conceito de nível de vida”. 38

Assim, depreende-se que este conceito visa à proteção ao maior bem tutelado,

ou seja, a proteção à vida humana, da seguinte forma asseverada por José Afonso da Silva:

O combate aos sistemas de degradação do meio ambiente convertera-se numa preocupação de todos. A proteção ambiental, abrangendo a preservação da natureza em todos os seus elementos essenciais à vida humana e à manutenção do equilíbrio ecológico, visa tutelar a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida, como um forma de direito fundamental da pessoa humana. Encontramo-nos, assim, como nota Santiago Anglada Gotor, diante de uma nova projeção do direito à vida, pois neste há de incluir-se a manutenção daquelas condições ambientais que dão suportes da própria vida, e o ordenamento jurídico, a que compete tutelar o interesse público, há que dar resposta coerente e eficaz a essa nova necessidade

36 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.25. 37 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.37. 38 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p.46.|

Page 24: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

24

social.39

Pode-se dizer, portanto, que a proteção da vida humana é um princípio

norteador da proteção ao Meio Ambiente, dele decorrente todos os demais princípios

ambientais40, sendo que todas as normas e diretrizes regulamentadoras da vida em sociedade

deverão ter como enfoque esta busca pela qualidade de vida.

1.3.2 Princípio da precaução e da prevenção

Sabe-se que o direito ambiental é um ramo de direito que se caracteriza pela

interdisciplinaridade, ou seja, o mesmo necessita de outras áreas do conhecimento para que

possa ser reconhecido. 41

As questões ambientais envolvem as mais diversas áreas do conhecimento

humano, conhecimento este responsável pela identificação dos possíveis danos causados ao

ambiente em virtude de uma determinada conduta. Entretanto, por muitas vezes a ciência não

consegue oferecer certeza quanto as medidas que devem ser tomadas para que sejam evitados

danos ao Meio Ambiente.42

Os princípios da prevenção e da precaução são importantes, todavia os

mesmos não se confundem, há, contudo, doutrinadores que entendem tratar-se do mesmo

assunto, como Édis Milaré que ao fazer referência a estes princípios, prefere tratá-los de

forma unificada, pois entende que o princípio da prevenção é basilar e mais genérico,

englobando, portanto, a precaução.43

A precaução pode ser entendida como medida de cautela antecipada, ou seja,

fica no aguardo de certezas cientificas a fim de se evitar riscos e danos ambientais.

Cristiane Derani aponta o princípio da precaução como a essência do direito

ambiental, ao indicar “uma atuação racional para com os bens ambientais, com a mais

cuidadosa apreensão possível dos recursos naturais” 44, constituindo-se no princípio que visa a

manutenção da vida presente e futura, uma vez que “é uma precaução contra o risco, que

objetiva prevenir já uma suspeição de perigo ou garantir uma suficiente margem de segurança

39 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.36. 40 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.26. 41 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.28. 42 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.28. 43 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.144. 44 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.165.

Page 25: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

25 da linha de perigo”. 45

Morato Leite, ao apresentar a atuação preventiva associada ao princípio da

precaução, cita a diferença entre referidos princípios estabelecida por Alexandre Kiss, nos

seguintes termos:

A diferença entre os princípios da prevenção e da precaução está na avaliação do risco ao meio ambiente. Precaução surge quando o risco é alto. Este deve ser acionado nos casos onde a atividade pode resultar em degradação irreversível ou por longo período no meio ambiente, assim como nos casos onde os benefícios derivados das atividades particulares é desproporcional ao impacto negativo ao meio ambiente. ... Já a prevenção constitui o ponto inicial para alargar o meio ambiente e, especificadamente, o direito ambiental internacional. A maioria das convenções internacionais são fundamentadas no princípio que a degradação ambiental deve ser prevenida através de medidas de combate à poluição ao invés de esperar que esta ocorra e tentar combater os seus efeitos.46

Álvaro Luiz Valery Mirra assim demonstra a aplicação do princípio da

precaução:

De acordo com o princípio da precaução, sempre que houver perigo da ocorrência de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como motivo para adiar-se a adoção de medidas eficazes para impedir a degradação do meio ambiente.47

Paulo de Bessa Antunes, também segue esta mesma linha, todavia, utilizando-

se de uma nomenclatura diversa, ou seja, considera ser o princípio da precaução o mesmo que

prudência ou cautela, caracterizado por ser “aquele que determina que não se produzam

intervenções no meio ambiente antes de se ter a certeza de que estas não serão adversas para o

meio ambiente.” 48

O princípio da prevenção é mais dinâmico e admite a formulação de novas

políticas ambientais, ou seja, é um princípio que busca conciliar utilização de espaços e

recursos naturais e proteção ambiental.

O que efetivamente importa é que tanto o princípio da precaução quanto o da

prevenção objetivam efetivar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e têm

por fim evitar a degradação ambiental e o surgimento de catástrofes (danos) ecológicas, eis

45 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.165. 46 KISS, Alexandre. The Rights and Interests of Future Generations and the Presutinary Principle. In The Precutionary Principle and Internatinoal Law, The Challenge of Implementation, Edited By Freestone, David e Hey, Ellen, Kluwer Law Internarional, The Hague, 1996. p.26/27. Apud LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.29. 47 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Direito Ambiental: O princípio da precaução e sua aplicação judicial. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.63. 48ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.29.

Page 26: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

26 que muitas vezes irreversíveis.

1.3.3 Princípio do desenvolvimento sustentável

Há que se falar também em sustentabilidade ou Princípio do desenvolvimento

sustentável, este considerado muito importante, pois visa um desenvolvimento

socioeconômico preservando-se o meio ambiente.

Este princípio surge da necessidade de se conciliar desenvolvimento

econômico e proteção ambiental, assim, segundo o relatório Nosso Futuro Comum,

Desenvolvimento sustentável é “àquele que atende às necessidades do presente sem

comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”,

podendo também ser empregado com o significado de “melhorar a qualidade de vida humana

dentro dos limites da capacidade de suporte dos ecossistemas”. 49

O desenvolvimento sustentável é importante na medida em que necessário é a

compatibilização de atividades econômicas e sociais com a proteção ambiental, eis que visa a

busca de padrões de consumo e produção sustentáveis, sem as quais não se conseguirá atender

às questões sociais.

1.3.4 Princípio do poluídor-pagador

O princípio poluidor-pagador veio a ser implementado a partir da década de

1970, tendo por justificativa a necessidade do Poder Público em cobrar os custos provenientes

das medidas utilizadas na preservação do meio ambiente, sendo que referidos custos devem

ser arcados pelo poluidor.50

Referido princípio tem a finalidade de cobrar do poluidor os custos sociais da

poluição, ou seja, “imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada, engendrando

um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico abrangente dos efeitos da poluição

não somente sobre os bens e pessoas, mas sobre toda a natureza. Em termos econômicos, é a

internalização dos custos externos”. 51

Em seu aspecto econômico, o princípio poluidor pagador tem ligações subjacentes

49 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.149. 50 Cf. TUPIASSU, Lise Vieira da Costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. IN Revista de Direito Ambiental n. 30. Ano 08, São Paulo: Revista dos Tribunais, Abril/junho de 2003 p.168. 51 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.142.

Page 27: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

27

ou auxiliar ao instituto da responsabilidade, pois é um princípio multifuncional, “na medida em que visa à precaução e à prevenção de atentados ambientais e também à redistribuição dos custos da poluição”. O princípio do poluidor pagador visa sinteticamente à internalização dos custos externos de deterioração ambiental. Tal situação resultaria em uma maior prevenção e precaução, em virtude de um conseqüente maior cuidado com situações de potencial poluição. 52

Verifica-se que no Brasil referido princípio pode ser identificado segundo o

disposto na lei 6.938 de 1981, vez que se refere à contribuição pela utilização dos recursos

naturais com fins econômicos:

Art. 4º. A política do meio ambiente visará à imposição, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos e à imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados.53

Neste mesmo sentido o princípio 16 da Declaração do Rio de Janeiro sobre o

Meio ambiente assim adota o Princípio do Poluidor-pagador:

As autoridades nacionais devem procurar assegurar a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, levando em conta o critério de que quem contamina deve, em princípio, arcar com os custos da contaminação, levando-se em conta o interesse público e sem distorcer o comércio e os investimentos internacionais.54

É importante se ressaltar que este princípio não vem garantir o direito de

poluir, objetiva sim a prevenção ao dano ambiental 55, e a “diminuição do desperdício dos

recursos naturais, acabando com a utilização gratuita do meio ambiente como receptáculo de

poluição, uma vez que os custos dos bens e serviços refletirão a raridade relativa dos recursos

naturais utilizados em sua produção”. 56

1.3.5 Princípio da responsabilidade

Este princípio pode ser traduzido como sendo aquele que implica em sanção ao

responsável pela violação ao ambiente, ou seja “busca impedir que a sociedade arque com os

custos da recuperação de um ato lesivo ao meio ambiente causado por poluidor perfeitamente

identificado”. 57

Morato Leite afirma que “não há Estado Democrático de Direito se não é 52 LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.33/34. 53 Art. 4º da lei 6.938/81 In: MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.p.51. 54 ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental.p.31. 55 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.143. 56 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.169/170. 57 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.31.

Page 28: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

28 oferecida a possibilidade de buscar uma imputação daquele que ameace ou lese o meio

ambiente”. 58

Associado ao princípio do poluidor pagador está o princípio da reparação, significando quem polui, paga e repara. Assim, em termos de ressarcimento do dano ambiental, devem existir outros mecanismos que visem à responsabilização dos danos ambientais, pois quem degrada o ambiente tem que responder e pagar por sua lesão ou ameaça.59

Assim, por dano ambiental pode-se entender como sendo “qualquer lesão ao

meio ambiente causada por condutas ou atividades de pessoa física ou jurídica de direito

público ou de direito privado”. 60

Verifica-se que a Constituição Brasileira de 1988 em seu artigo 225, §3º prevê

três tipos de responsabilidade, quais sejam: Administrativa, civil e criminal. Importante

esclarecer, que são independentes entre si e, portanto, não se excluem.61

O instituto da responsabilidade civil por danos ao meio ambiente associado aos instrumentos jurídico-administrativos e à responsabilidade penal ambiental, assim, têm importante missão no cenário do princípio da responsabilização. Esta tríplice responsabilização deve ser articulada conjuntamente, coerentemente e sistematicamente, em verdadeiro sistema múltiplo de imputação ao degradador ambiental.62

Desta forma, o princípio da responsabilidade há de ser adotado e efetivamente

exigido, pois não há mais que se conceber que determinada pessoa, física ou jurídica, possa se

eximir de responder por seus atos lesivos ao meio ambiente e também de reparar os prejuízos

causados.

1.3.6 Princípio da natureza pública da proteção ambiental

Este princípio é decorrente do princípio da primazia do interesse público, vez

que “o interesse na proteção do ambiente, por ser de natureza pública, deve prevalecer sobre

os direitos individuais privados, de sorte que, sempre que houver dúvida sobre a norma a ser

aplicada a um caso concreto, deve prevalecer aquela que privilegie os interesses da

58 LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.32. 59 LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.32. 60 FERRAZ, Sérgio. Responsabilidade Civil por dano Ecológico. RDP 49/50. Apud SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.207. 61 Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.207. 62 LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.36.

Page 29: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

29 sociedade”. 63

Como corolário do principio anteriormente descrito64 a natureza pública da proteção ambiental, ligada ao caráter de bem de uso comum do povo, a que o meio ambiente é elevado no texto constitucional. Isso significa que o meio ambiente é um bem que pertence à coletividade e não integra o patrimônio disponível do Estado.65

Édis Milaré explicita que este princípio está inserto no ordenamento jurídico

Brasileiro, na medida em que a Constituição prevê o meio ambiente como bem de uso comum

do povo e ainda a responsabilidade do Poder público e da Coletividade pela sua proteção

(caput do artigo 225 da CF/1988).66

1.3.7 Princípio da participação comunitária

Assim como em outros ramos do direito, o direito ambiental e os instrumentos

de sua implementação necessitam de ampla participação e engajamento dos cidadãos.

É fundamental o envolvimento do cidadão no equacionamento e implementação da política ambiental, dado que o sucesso desta supõe que todas as categorias da população e todas as forças sociais, conscientes de suas responsabilidades, contribuam para a proteção e a melhoria do ambiente, que, afinal, é bem e direito de todos.67

Referido Princípio está esculpido no caput do artigo 225 da CF, bem como no

princípio 10 da declaração do Rio de Janeiro de 1992, o qual assim dispõe:

A melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades pública, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios. Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popular, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que se refere à compensação e reparação de danos.68

Verifica-se, assim, que o principio da participação pressupõe a existência do

efetivo exercício do direito de informação, Paulo Affonso Leme Machado, afirma que ambos

63 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.139. 64 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.175. A autora trata do principio da primazia do interesse público em ponto anterior a este Princípio da Natureza pública da proteção ambiental. 65 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.173. 66 Cf.MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.138/139. 67 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.141. 68 MILARÉ, Édis. Direito Do Ambiente. p.141.

Page 30: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

30 são indissociáveis.69

Édis Milaré, em mesma linha, prescreve:

O direito à participação pressupõe o direito de informação e está a ele intimamente ligado. É que os cidadãos com acesso á informação têm melhores condições de atuar sobre a sociedade, de articular mais eficazmente desejos e idéias e de tomar parte ativa nas decisões que lhes interessam diretamente.70

O efetivo exercício deste princípio no direito ambiental faz com que os

cidadãos saiam de uma posição de beneficiários dos recursos naturais para uma posição de

responsabilidade para com a conservação dos mesmos.71

Como mecanismos de participação pode-se citar a iniciativa popular nos

procedimentos legislativos, realização de referendos sobre leis, atuação de representantes da

sociedade civil em órgãos colegiados como o CONAMA, participação em audiências públicas

de discussão sobre os estudos de impacto ambiental, utilização de instrumentos judiciais como

a ação popular e ação civil pública.72

Cumpre ressaltar, ainda, que além da participação e informação, a educação

ambiental, também prevista no artigo 225 da CF, constitui-se em importante pressuposto de

efetivação da participação social pela preservação ambiental, na medida em que gera

consciência e desperta para a problemática ambiental.73

1.3.8 Princípio da cooperação entre os povos

Sabe-se que a preocupação dos Estados com a questão ambiental ganhou vulto

a partir da década de setenta quando se realizou a Conferência Mundial sobre meio Ambiente

em Estocolmo, na qual fora produzida a Declaração Sobre o Meio Ambiente Humano.74

O princípio 20 dessa supracitada declaração estabeleceu a “necessidade de

intercâmbio de experiências científicas e o mútuo auxilio tecnológico e financeiro entre os

países, a fim de facilitar a solução dos problemas ambientais”. 75

69 Cf. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.p.78. 70 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.141. 71 Cf. KISS, Alexandre-Charles. La mise en oeuvre du Droit de L’Environnement. Problématique et moyens, in 2º Conférence Européenne “Environnement et Droits de l’Homme”. Salzbourg. Apud MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.p.78. 72 Cf. MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Princípios Fundamentais de direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, vol.2, ano 1, São Paulo: RT, 1996. p.57. Apud TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.174. 73 Cf. TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.174. 74 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.151. 75 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente.p.151.

Page 31: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

31

Durante a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio

Ambiente, em 1992 na cidade do Rio de Janeiro, a questão do inter-relacionamento dos

Estados para o problema ambiental, também fora muito discutido, haja vista a questão da

soberania dos estados para que tenham a sua própria política ambiental, na medida em que

tenham, também responsabilidade ambiental para com demais Estados.76

Neste sentido tem-se que o princípio da cooperação dos Estados visa o

compartilhamento dos Países na gestão dos recursos ambientais e na preservação do mesmo,

uma vez que os problemas ambientais ocorrem além das fronteiras e geram efeitos “no

patrimônio ambiental comum”da humanidade. 77

José Rubens Morato Leite cita alguns elementos integrantes da cooperação

internacional para com o Meio Ambiente, assim colacionados:

a) o dever de informação de um Estado aos outros Estados, nas situações criticas capazes de causar prejuízos transfronteiriços; b) o dever de informação e consultas prévias dos Estados a respeito de projetos que possam trazer prejuízos aos países vizinhos; c) o dever de assistência e auxílio entre os países nas hipóteses de degradações importantes e catástrofes ecológicas; d) o dever de impedir a transferência para outros Estados de atividades ou substâncias que causem degradação ambiental grave ou que sejam prejudiciais à saúde humana – é o problema da exportação de poluição.78

A União dos Estados visando a “disseminação do conhecimento e das políticas

ambientais bem sucedidas, de modo a proporcionar a cooperação mundial em prol do bem

comum” 79, só trará benefícios a todos.

Neste sentido, José Rubens Morato Leite faz referência a necessidade de

adoção de políticas estatais mais solidárias:

A cooperação deve ser entendida como política solidária dos Estados, tendo em tela a necessidade intergeracional de proteção ambiental. Por isso, importa em uma soberania menos egoísta dos Estados e mais solidária no aspecto ambiental, com a incorporação de sistemas mais efetivos de cooperação entre os Estados, em face das exigências de preservação ambiental. Implica em uma política mínima de cooperação solidária entre Estados, em busca de combater efeitos devastadores da degradação ambiental. A cooperação pressupõe ajuda, acordo, troca de informações e transigência no que atine a um objetivo macro de toda a coletividade. Mais do que isto, aponta para uma atmosfera política democrática entre os Estados, visando a um combate eficaz à crise ambiental global.80

76 Cf. TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.176; e Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.151. 77 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN: LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.31. 78 LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.31. 79 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.176. 80 LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. IN LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. p.31.

Page 32: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

32

Assim, reconhecida a importância da preservação de todas as formas vida, os

Estados, cada vez mais, devem buscar o aprimoramento dos tratados e acordos Internacionais

que visam a implementação de cooperação global na defesa do Meio Ambiente.

1.3.9 Princípio da função socioambiental da propriedade

O direito a propriedade não é mais considerado àquele direito supremo e

estruturado de forma individual, pois com a ênfase dada aos direitos sociais, coletivos e

difusos esta passou a sofrer limitações, eis que necessário é conciliar propriedade,

desenvolvimento e conservação de recursos naturais.81

Assim, o ordenamento jurídico brasileiro veio contemplar a função social e

ambiental da propriedade, haja vista o disposto nos artigos Constitucionais 5º inciso XXIII,

170 inciso III, 182 caput, 184, e 186 inciso II82, a fim de promover o bem estar de todos e

atingir o equilíbrio ecológico. Deste modo, Lise Vieira da Costa Tupiassu esclarece que “a

função social da propriedade, com a harmonização pela do sistema constitucional, só pode ser

alcançada se respeitado o meio ambiente”. 83

Neste sentido manifesta-se Fernanda de Salles Cavedon:

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ao qualificar a Propriedade como portadora de uma função Social e de uma Função ambiental, visa à solução dos Conflitos entre interesses individual do proprietário e os interesses da coletividade. Dentre estes, destaca-se o interesse em gozar de um ambiente saudável, e alcançar as finalidades sociais que almeja a sociedade brasileira, como o desenvolvimento econômico individual que traga, concomitantemente, vantagens para a coletividade.84

O artigo 170 da Constituição Federal de 1988 integra os conceitos de

Propriedade privada, função social e meio Ambiente, passando estes elementos da ordem

econômica também a integrar o conceito de direito de propriedade.85

Importante esclarecer que a Constituição Federal deixou claro que tanto a

propriedade urbana quanto a rural devem atender à sua função socioambiental.

Deste modo esclarece Cristiane Derani:

81 Cf. FERREIRA, Fábio Félix. Limites ao direito de propriedade: possibilidades de conservação dos recursos naturais. Disponível em: http://www.datavenia.net/artigos/1999/ferreira.html. Acesso em: 23/03/04. 82 Cf. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada.p.1840. 83 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.174. 84 CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. Florianópolis: Visualbooks, 2003. p.65. 85 Cf. CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade.p.67.

Page 33: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

33

Cabe ao detentor de direito de propriedade sobre parcela do meio ambiente torná-lo ou mantê-lo ecologicamente equilibrado, orientando sua ação na otimização desses princípios (função social da propriedade e meio ambiente ecologicamente equilibrado). Em outras palavras, impõem-se ao detentor dos recursos ambientais – parcela do meio ambiente – o atendimento à função ambiental da propriedade, posto que esses bens apropriados e a manutenção de suas características ecológicas são indispensáveis à realização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.86

Assim, tem-se que a respeito da limitação à propriedade verifica-se que esta

não se restringe a deixar de fazer o que prejudique a coletividade, eis que implica em uma

atitude positiva, pois o proprietário poderá ser obrigado a adequar a sua propriedade aos

padrões ambientais estabelecidos87, “para respeitar o princípio da função social deve o

proprietário atender ao requisito da preservação ambiental e, se não o fizer, de nada vale o seu

direito real”. 88

Com base nos princípios da função socioambiental e do Meio Ambiente

equilibrado é que existem as restrições ao direito de propriedade89, em especial àquelas áreas

que restringem a ocupação humana e exploração econômica, como bem demonstra Lise

Vieira da Costa Tupiassu ao afirmar que “a função social e ambiental da propriedade funciona

como uma baliza ao exercício do direito de propriedade, devendo ser imposto, até mesmo

coativamente, o respeito a este princípio” 90.

Todavia, sabe-se que é utopia imaginar que supracitados princípios, inclusive o

princípio da função social da propriedade, estão sendo exercidos da forma como previstos

Constitucionalmente. Necessário, pois, a incorporação desses princípios pela sociedade, para

que se possa, enfim, haver desenvolvimento sustentável e falar em “Estado Ambiental de

Direito”.

Destaca-se, que a expressão “função social e ambiental da propriedade” será

melhor abordada no decorrer do 2º (segundo) capítulo, na medida em que se discutirá o direito

de propriedade e sua evolução no ordenamento Jurídico Brasileiro. Sendo que, no 3º (terceiro)

capítulo pretende-se demonstrar que a realização dos princípios ambientais enseja a realização

do Estado de Direito do Ambiente.

86 DERANI, Cristiane. A Propriedade na Constituição de 1988 e o Conteúdo da “Função Social”. IN: Revista de Direito Ambiental nº.27, ano 07. São Paulo: Revista dos Tribunais. Julho/setembro de 2002. p.67. 87 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.147. 88 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.175. 89 Cf. LEUZINGUER, Márcia Diegues. FIGUEREDO, Guilherme José Purvin. Desapropriações Ambientais na Lei 9.985/2000. IN: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG). Direito Ambiental das áreas protegidas. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p.469. 90 TUPIASSU, Lise Vieira da costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. p.175.

Page 34: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

2 DIREITO À PROPRIEDADE

O direito à propriedade passou ao longo dos anos por diversas mudanças.

Domínios que antes eram utilizados de forma indiscriminada e ilimitada, hoje, somente se

justificam se preenchidos os conteúdos sociais e ambientais, motivo pelo qual existem as

limitações ao exercício do direito à propriedade, principalmente às relativas à preservação e

manutenção de um ambiente sadio e equilibrado para todos.

2.1 ORIGEM HISTÓRICA DA PROPRIEDADE

Muitos teóricos já se dedicaram ao estudo das origens e fundamentos da

propriedade privada, sendo que alguns fundamentavam a propriedade como um direito natural

não sujeita a limitações, outros como sendo invenção do Estado e, ainda, os adeptos da teoria

abolicionista da propriedade, os quais a contestavam.91

Mesmo diante das controvérsias acerca da origem e fundamento da

propriedade privada, sabe-se que sua concepção atual é reflexo de várias culturas, como

denota Venosa ao afirmar que o “conceito e a compreensão, at é atingir a concepção moderna

de propriedade privada, sofreram inúmeras influências no curso da história dos vários povos,

desde a antiguidade. A história da propriedade é decorrência direta da organização política”. 92

No início dos tempos a propriedade imóvel era utilizada de forma comunitária,

meramente exploratória e temporária visto que os povos que nela habitavam retiravam

alimentos necessários à subsistência, migrando, após, para outras terras93, sendo que somente

existia propriedade sobre coisas móveis.

Neste sentido:

Nas sociedades primitivas somente existia propriedade para as coisas móveis, exclusivamente para objetos de uso pessoal, tais como peças de vestuário, utensílios de caça e pesca. O solo pertencia a toda a coletividade, todos os membros da tribo, da família, não havendo o sentido da senhoria, de poder de determinada pessoa.94

91 CF. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.7. 92 VENOSA, Sílvio de Sávio.Direito Civil: Direitos Reais. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.p.169. 93 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro v. 4: Direito das Coisas. 17. Ed. São Paulo: Saraiva, 2002.p.99. 94 VENOSA, Sílvio de Sávio.Direito Civil: Direitos Reais.p.170.

Page 35: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

35

Em sua evolução, o homem ao fixar-se na atividade agrícola e domesticação de

animais, começa a separar terras públicas das particulares, entretanto estas terras particulares

eram, no início, comuns a grupos e famílias95, destaca-se, ainda, a importância da religião na

origem da propriedade privada, pois, no início dos tempos, as famílias possuíam deuses

próprios que eram por elas somente cultuados e estes, por sua vez, também, somente, a elas

protegiam, assim como a terra que habitavam e cultivavam.96

Coulanges esclarece que estas famílias possuíam uma religião doméstica a qual

garantiu o direito de propriedade, estabelecendo que “De todas essas crenças, de todas essas

leis, resulta claramente que foi a religião doméstica que ensinou o homem a apropriar-se da

terra e assegurar-lhe seu direito sobre a mesma”. 97

Foi perante o direito Romano que se constituíram as principais regras jurídicas

atinentes ao direito de propriedade98. Neste sentido, Maria Helena Diniz enfatiza que “é no

Direito Romano que vamos encontrar a raiz histórica da propriedade”. 99

Pode-se dizer que o Direito Romano adotou como espécies de propriedade, a

quiritária, a pretoriana e a provincial.100

A propriedade quiritária “recaía sobre bens imóveis situados em solo itálico

cujos titulares fossem cidadãos romanos. Transmitia-se por atos solenes, como a mancipatio e

a in iure cessio(...)”. 101

A propriedade Pretoriana possui como fundamento a eqüidade aplicada pelos

magistrados102, uma vez que fora instituída para garantir o direito dos que possuíam

expectativa de Propriedade quiritária, eis que transferidas sem as devidas solenidades. Assim,

trata-se de espécie criada pelos pretores para conceder propriedade aos que estavam na

verdadeira situação de proprietários.103

Existiam, também, as propriedades localizadas nas Províncias, as quais foram

incorporadas ao Senado, que instituiu uma espécie de enfiteuse, vez que o que existia era uma

95 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. 10. ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 1995. p. 102. 96 Cf. GASSEN, Valcir. A Natureza Histórica da Instituição do Direito de Propriedade. IN WOLKMER, Antônio Carlos. Fundamentos de História de Direito.Belo Horizonte: Del Rey, 1996.p.76. 97 COULANGES, Fustel de. Apud GASSEN, Valcir. A Natureza Histórica da Instituição do Direito de Propriedade. IN WOLKMER, Antônio Carlos. Fundamentos de História de Direito. p.76. 98 CF. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.8. 99 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro v.4: Direito das Coisas.p.99. 100 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. p. 102. 101 WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. . p. 102. 102 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. p. 103. 103 CF. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.11.

Page 36: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

36 concessão de uso e gozo da terra104.

Com Justiniano todas as formas de propriedade foram unificadas, passando a

ter um sentido mais social, restando claro a evolução do Direito de Propriedade para os

romanos – de direito ilimitado e individualista ao direito de cunho mais social.105

A crise do Império Romano do Ocidente gerada por fatores militares,

religiosos e econômicos aliados às invasões bárbaras foram responsáveis pelo surgimento de

um novo conceito de propriedade, marcando o sistema feudal que vigorou durante a idade

média.

Na idade média, com as invasões bárbaras e o declínio do império Romano do Ocidente, ocorreram mudanças profundas no direito de propriedade vigente, isto é, a propriedade das terras volta a ser coletiva, quase que de forma semelhante às de tipo gentílico, pertencentes à totalidade de um determinado grupo.106

O sistema feudal caracteriza-se pela interdependência entre o senhor Feudal

(Suserano) e o Vassalo, ou seja, “o senhor possuía a terra e o servo e detinha o poder militar,

político e judiciário; o servo tinha a posse útil da terra, devia obrigações e tinha o direito de

ser protegido pelo senhor”. 107

A propriedade durante o sistema feudal não era exclusiva e unitária, baseava-se

na relação de solidariedade, fidelidade e de encargos fiscais e militares entre servos e

senhores.108

A concepção individualista da propriedade voltou a ter forças durante o Estado

Moderno, cujo marco histórico e ideológico é a Revolução Francesa de 1789. Caracterizava-

se por ser um Estado Liberal, ou seja, garantidor das liberdades individuais com a mínima

intervenção Estatal nas relações sociais.

A propriedade foi um dos núcleos essenciais das reformas trazidas pela Revolução Francesa, sendo profundamente marcada pela ideologia liberal disseminada pela Revolução. Dois traços no regime da Propriedade pós-Revolução são marcantes: a extinção do regime feudal e dos encargos sobre a terra e a exaltação da concepção individualista da Propriedade.109

O direito de propriedade em sua concepção individualista foi recepcionado

pelos ordenamentos jurídicos, sendo normatizado pelo Código de Napoleão, artigo 544,

104 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. p. 103. 105 CF. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.13. 106 Cf. GASSEN, Valcir. A Natureza Histórica da Instituição do Direito de Propriedade. p.92. 107 ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a História: História Geral e do Brasil. 6. ed. São Paulo: Ática, 1996.p.98. 108 VENOSA, Sílvio de Sávio.Direito Civil: Direitos Reais. p.171. 109 CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.19.

Page 37: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

37 como: “a propriedade é o direito de gozar e dispor das coisas de modo mais absoluto, desde

que não se faça uso proibido pelas leis e regulamentos”. 110

A concepção absoluta e o exagerado individualismo do direito de propriedade

perderam força no século XIX, com o desenvolvimento industrial e os movimentos sindicais

que buscavam garantias sociais ao proletariado111, trazendo, por conseqüência, alterações no

entendimento do direito de propriedade, o qual passa a ser marcado pelo cunho social e,

também, ambiental, configura-se, desta forma, o Estado Contemporâneo, marcado pelo

intervencionismo do Estado na ordem econômica e social.

Assim, o direito à propriedade perante o Direito Contemporâneo adquire, em

primeiro momento, uma função social e com o advento dos “novos direitos”, os chamados

direitos difusos, ela passa a ser marcada pela função ambiental, eis que seu exercício está

vinculado à preservação do ambiente.

Neste sentido, a propriedade além de atender sua função social também deve

estar condicionada a proteção ao meio ambiente, sendo que as funções social e ambiental

passam a integrar o conceito contemporâneo de propriedade.112

2.2 CONCEITO E EVOLUÇÃO DA PROPRIEDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO

2.2.1 Conceito

O direito de propriedade, segundo a concepção clássica, é aquele direito

subjetivo do proprietário de usar, gozar e dispor da propriedade de forma absoluta.113

Leon Duguit, constitucionalista e administrativista francês, deu origem a teoria

da função social da propriedade, a qual contestava o direito de propriedade como sendo um

direito subjetivo de dispor das coisas de forma mais absoluta e defendia a propriedade como

sendo uma função social.114

Assim, a Constituição Federal de 1988 ao tratar da propriedade como sendo

110 VENOSA, Sílvio de Sávio.Direito Civil: Direitos Reais.p.171. 111 Cf. VENOSA, Sílvio de Sávio.Direito Civil: Direitos Reais.p.171. 112 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.26. 113 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.69. 114 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.73/74.

Page 38: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

38 direito fundamental e elemento da ordem econômica115, procurou conciliar interesses

individuais e interesses sociais. Desta forma, adota o conceito contemporâneo do Direito à

propriedade, ou seja, constitui-se em direito subjetivo e função social.116

O direito de Propriedade, na sua acepção contemporânea, conjuga poder e dever. Nele estão integrados os poderes atribuídos ao proprietário pelo Código Civil e os deveres impostos constitucionalmente através da função social da propriedade (...).117

Cumpre esclarecer, que a Constituição Federal de 1988 ao estabelecer a função

social, também estabeleceu a função ambiental, na medida em que aquela “compreende a

função socioambiental, que impõe ao proprietário urbano ou rural, a preservação do ambiente

natural, nos termos legalmente estabelecidos”. 118

Diante do acima exposto, verifica-se que o direito brasileiro também conheceu

da evolução do direito à propriedade, na medida em abarcou em seu ordenamento jurídico

dispositivos que visam a proteção do direito à propriedade desde que esta atenda à sua função

social e também ambiental, para os casos em que existirem limitações ambientais, trata-se,

portanto, de um direito de usar, gozar e dispor desde que vinculado a uma função Social e

ambiental.

Deste modo, percebe-se que função socioambiental passou a fazer parte do

conceito atual de propriedade, conforme caracterizado por Fernanda Cavedon:

Considerando-se estes novos elementos caracterizadores do Direito de Propriedade, passa-se a entendê-lo como o poder do titular do domínio sobre um bem de fazer uso do mesmo dentro dos limites impostos pelo seu dever de atender a uma Função Social, correspondente ao uso de acordo com os interesses da coletividade, e uma Função Ambiental, para o cumprimento da qual o proprietário deverá promover o uso ordenado e ecológico da Propriedade, que vise a proteção dos bens ambientais nela existentes.119

Há que se citar, ainda, importante consideração de José Afonso da Silva acerca

do tema:

(...) o constituinte desejou, inserir, na estrutura mesma da concepção e do conceito de propriedade, um elemento de transformação positiva que a ponha ao serviço do desenvolvimento social. A atual Constituição, como se verá, no texto, é ainda mais enfática nesse sentido, de tal sorte que a propriedade não se concebe senão como função social. 120

115 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.65. 116 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.81. 117 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. 1999.p.82. 118 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Criação dos Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização. IN Revista de Direito Ambiental. n. 25, ano 07. São Paulo: Revista dos Tribunais, janeiro/março de 2002. p.109. 119CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.174. 120 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.p.276.

Page 39: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

39

Destaca-se que o direito de propriedade com sua a acepção função social e

ambiental, aqui demonstrada, possui cunho eminentemente constitucional, eis que conforme

assinalado por José Afonso da Silva é a Constituição que vem assegurar o direito de

propriedade bem como seu regime fundamental, sendo que ao Código Civil cabe o

disciplinamento das relações civis decorrentes da propriedade.121

Da mesma maneira, por estar o direito à propriedade impregnado por

elementos socializantes e vinculado a realização da função socioambiental, Maria Helena

Diniz segue o mesmo entendimento de José Afonso da Silva, ao dispor que “a propriedade

pertence, portanto, mais à seara do direito público do que a do direito privado, visto ser a

Carta Magna que traça seu perfil jurídico”. 122

2.2.2 Evolução do direito à propriedade no Brasil

A Constituição Imperial Brasileira de 1824, influenciada pelas orientações

liberais e individuais, garantia o direito de propriedade em toda sua plenitude, nos mesmos

moldes delineados na Declaração dos Direitos do Homem de 1789 e no código de

Napoleão.123

Esta Concepção individual e garantidora da plenitude do direito à propriedade

também esteve presente na Constituição de 1891, a qual no ano de 1926 estabeleceu um

regime especial para a exploração de minas e jazidas.124

A Constituição de 1934, influenciada pela Constituição Mexicana e

Constituição de Weimar, que preconizavam a intervenção do Estado na ordem Social, adotou

o caráter social da propriedade, não sendo permitido o exercício deste direito contra interesse

social e coletivo.125

A Constituição de 1937 limitou-se a garantir o direito de propriedade, salvo os

casos de desapropriação. Todavia, com a Constituição de 1946 o conteúdo previsto na

Constituição de 1934 foi resgatado, eis que condicionou o uso da propriedade ao bem-estar

social.126

121 Cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.p.276. 122 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro v.4: Direito das Coisas.p.102. 123 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.62. 124 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. p.104 125 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. p.105. 126 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.63.

Page 40: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

40

Com a Constituição de 1967 o Termo “Função Social da Propriedade” passa a

integrar o ordenamento Jurídico brasileiro, ao fixá-lo como uma das metas da ordem

econômica.127

Por fim, a Constituição de 1988 vem a preconizar o direito à propriedade cujo

conteúdo deve ser marcado pela função social e ambiental, ou seja, concilia direito de

primeira geração (propriedade privada), segunda geração (função social) e terceira geração

(função ambiental).

Neste sentido, Fernanda Cavedon aduz que os traços inovadores da

Constituição de 1988 são a “inserção da função social como qualificadora do direito de

propriedade, garantido no Capítulo dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, e a

vinculação do cumprimento da Função Social a obrigações de ordem Ambiental, atribuindo,

assim, uma Função Ambiental à Propriedade”. 128

Destaca-se, ainda, que a propriedade perante o código Civil de 1916, vigente

até o ano de 2002, apresentava uma concepção individualista baseada no poder exclusivo,

absoluto e ilimitado do proprietário sobre o bem. Todavia, o Código Civil vigente a partir de

2003 adotou tendências de caráter social e ambiental, na medida em que afasta o

individualismo e condiciona seu uso à finalidades sociais e equilíbrio ecológico.129

Assim, colaciona-se o seguinte dispositivo incerto no Código Civil Brasileiro:

Art. 1.228 (...) § 1º- Direito de Propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.130

2.3 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

Ao tempo que a propriedade é concebida como direito fundamental ela

também é parte integrante da ordem econômica, segundo dispositivos constitucionais abaixo

citados:

Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade

127 Cf. WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. p.105. 128 CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.64. 129 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. p.101. 130 BRASIL, Código Civil e Legislação Civil em vigor. Org. Theotônio Negrão e José Roberto Freire Gouvêa. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 220.

Page 41: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

41

do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...); XXII – é garantido o direito de propriedade; XXIII – a propriedade atenderá a sua função social. (...).131 Art.170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos vida digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...); II – propriedade privada; III – função social da propriedade. (...). 132

Verifica-se, assim, o cunho social garantidor do reconhecimento do direito de

propriedade, vez que somente merece proteção na medida em que atende a sua função social,

conforme salientado por Cristiane Derani:

A norma que dispõe sobre a função social da propriedade cria o ônus do proprietário privado perante a sociedade. Essa norma institui um ônus que recaí sobre o desenvolvimento da relação de poder entre sujeito e objeto, que configura a propriedade privada. O ônus imposto sobre o sujeito proprietário significa que sua atuação deve trazer um resultado vantajoso para a sociedade, a fim de que este poder individualizado seja reconhecido legalmente.133

Desta forma, a propriedade ao adquirir uma função social, passa a contemplar

interesses coletivos e sociais, garantindo, por fim, a promoção do bem comum. Segundo

Fernanda Cavedon “Esta função social determina que o proprietário, além de um poder sobre

a propriedade, tem um dever correspondente para com toda a Sociedade de usar esta

propriedade de forma a lhe dar a melhor destinação sob o ponto de vista dos interesses

sociais”. 134

Ao condicionar proteção e reconhecimento do direito à propriedade ao

preenchimento da função social, reconhece-se esta como parte da estrutura do direito de

propriedade, sendo assim, entende-se que o proprietário é portador de um poder quando

direciona seu direito à satisfação da função social, esta, então, entendida como um dever para

com a sociedade.135

A função social da propriedade é a obrigação que o proprietário tem de dar destinação à sua propriedade de forma que, além de atender aos seus interesses, este exercício promova os interesses da sociedade. A função social e parte da estrutura do

131 BRASIL, Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.20 e 23. 132 BRASIL, Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.112/113. 133 DERANI, Cristiane. A propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “Função Social”.p.59. 134 CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.83. 135 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p 84.

Page 42: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

42

direito de propriedade. Assim, os interesses da sociedade passam a ser deveres do proprietário.136

Portanto, o cumprimento do princípio da Função Social da propriedade ao

garantir a propriedade privada e as vantagens econômicas advindas desta, torna possível a

compatibilização do interesse privado com interesse público “buscando um equilíbrio entre

lucro privado e proveito social”. 137

2.4 FUNÇÃO AMBIENTAL DA PROPRIEDADE

Com a evolução do conceito de direitos fundamentais, impulsionada por

transformações sociais, econômicas e políticas, surgiram os chamados direitos de terceira

geração, ou seja, direitos difusos cuja categoria estão inseridos os direitos ao meio Ambiente

sadio e equilibrado para todos, 138 os quais foram recepcionados pela Constituição Federal de

1988.139

Assim, a partir da proteção conferida ao meio ambiente, conforme previsões

Constitucionais dos artigos 170 inciso VI, 186 inciso II e 225, verificou-se a existência de

uma função ambiental, esta inerente ao conceito de propriedade e de função social, eis que,

“se a Função Social é um dos elementos intrínsecos à Propriedade, certamente traz em seu

bojo uma vinculação de ordem ambiental, que pode ser caracterizada como uma Função

Ambiental”. 140

A Função Ambiental da Propriedade pode ser entendida como os deveres

atribuídos ao proprietário para que utilize de maneira adequada os recursos naturais e preserve

o meio ambiente. 141

A Função Ambiental da Propriedade impõe limitações ao uso da Propriedade, requerendo do proprietário a adequação deste uso às exigências de ordem ambiental, em nome da proteção do patrimônio ambiental comum. (...) Entende-se que a incorporação de uma Função Ambiental à Propriedade estimulará o proprietário a promover a proteção dos bens ambientais sob o seu domínio o que, de forma geral, levará à preservação do meio ambiente em sua integralidade. 142

Destaca-se, ainda, que a Constituição ao prescrever a obrigatoriedade do Poder

136 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 96. 137 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.250. 138 Cf. LEUZINGER, Márcia Dieguez. Criação de Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização.p. 126. 139 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p 59. 140 CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p 123. 141 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 109. 142 CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p 124.

Page 43: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

43 Público e da coletividade em proteger e preservar o Meio Ambiente obrigou todos os

proprietários a cumprirem uma função ambiental.143

Neste sentido, Antônio Herman Benjamim defende que tanto o Estado quanto

os cidadãos, possuem uma Função Ambiental.

A função ambiental não é exclusivamente pública. Ou seja, seu exercício é outorgado a outros sujeitos além do Estado. Por conseguinte, o múnus ambiental (ou ofício ambiental) manifesta-se pelo comportamento do Estado e/ou do cidadão, agindo este coletiva (associações ambientais, por exemplo) ou isoladamente.144

Tem-se, portanto, que o ordenamento jurídico brasileiro ao condicionar o

direito de propriedade ao atendimento da proteção e preservação do meio ambiente, acaba por

gerar a função Ambiental da Propriedade, eis que seu exercício estará condicionado às

limitações impostas pelo dever de garantir a integridade ambiental.

2.5 FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE URBANA

A função social da propriedade vincula-se ao conceito próprio de Propriedade,

estando presente no ordenamento jurídico Brasileiro desde a Constituição de 1934. Todavia,

somente a Constituição de 1988 veio fixar o conteúdo da Função Social da Propriedade

Urbana145, na medida em que estabeleceu em seu artigo 182 § 2º que: “A propriedade urbana

cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade

expressas no plano diretor”. 146

A função ambiental da propriedade, da mesma maneira, está prevista

Constitucionalmente, haja vista os disposto nos artigos 225 e 170, inciso VI.

Assim, o artigo 182 caput da Constituição de 1988 ao dispor que “a política de

desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais

fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da

cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes” 147, abarcou o princípio da função

143 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 109. 144 BENJAMIN, Antônio Herman V. Função Ambiental. In: BENJAMIN, Antônio Herman V.(ORG). Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.p.50/51. Apud CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p 60. 145 Cf. BOTREL, Karla. O Direito Urbanístico. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. Belo Horizonte: Forum, 2004. p.20. 146 BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.117. 147 BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p. 117.

Page 44: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

44 socioambiental da propriedade.148

Neste passo, esclarece Fernanda Cavedon:

É preciso considerar que a Política de Desenvolvimento Urbano e a preservação e uso racional dos recursos ambientais do município são indissociáveis. Assim, o Plano Diretor deverá considerar as características e as limitações ambientais do espaço urbano ao determinar o seu uso e ocupação, bem como se adequar às disposições legais de proteção ao Meio Ambiente. 149

Roxana Cardoso Brasileiro Borges também considera a função ambiental como

componente da função social da propriedade urbana ao dispor:

A propriedade urbana cumpre sua função social, segundo o § 2º do art. 182 da Constituição, quando atende as exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. Também aí é necessário falar-se em função ambiental como sendo um componente da função social da propriedade territorial urbana, pois o plano diretor contém normas ambientais que devem ser obedecidas pelo proprietário, uma vez que compõem a cidade e o meio ambiente natural, ou o que resta dele, e o meio ambiente artificial ao mesmo tempo.150

Verifica-se, então, que Plano Diretor é o instrumento básico da política de

desenvolvimento urbano que deve ser executada pelo Município, cujos objetivos são de

ordenar as funções sociais e, por conseguinte, ambientais da cidade151, é, portanto, o resultado

do planejamento urbano, que “com força executiva e coercitiva de lei, que conterá as

diretrizes pelas quais se definirá o conteúdo da Função Social da Propriedade urbana” 152

Salienta-se que a lei que veio regulamentar os artigos 182 e 183 da

Constituição Federal de 1988, referentes à Política Urbana, a qual fixou as diretrizes

urbanísticas que devem estar previstas no plano diretor, a fim de garantir o bem-estar da

população é a lei nº 10.257/2001, também conhecida como “Estatuto da Cidade” 153, cuja

finalidade pode ser vislumbrada no contido no artigo 1º, parágrafo único que assim

estabelece:

Art. 1º (...). Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta lei, denominada Estatuto da Cidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos

148 Cf. BOTREL, Karla. O Direito Urbanístico. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. p.21. 149 CAVEDON, Fernanda. Função Social e Ambiental da Propriedade.p.70. 150 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 110. 151 Cf. MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade, o Plano Diretor e o Desenvolvimento Urbano. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. p.29. 152 CAVEDON, Fernanda. Função Social e Ambiental da Propriedade.p.70. 153 Cf. BOTREL, Karla. O Direito Urbanístico. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. p.21.

Page 45: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

45

cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.154

Frisa-se, deste modo, a relevância do Estatuto da Cidade, uma vez que

permitirá a concretização das funções Sociais e Ambientais da propriedade urbana, cujas

diretrizes estão estampadas em seu artigo 2º, alcançadas através dos instrumentos da política

de desenvolvimento urbano previstos no artigo 4º da lei, podendo-se citar, entre outros, o

Plano Diretor, zoneamento ambiental, o parcelamento e edificação compulsórios, IPTU

progressivo no tempo, desapropriação com pagamento em títulos.155

2.6 FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE RURAL

Trabalhar-se-á função social e ambiental da propriedade rural, também em

único tópico, pois, conforme já exposto, entende-se que o direito a propriedade é legitimado

pelo cumprimento de sua função social, a qual pressupõe também o atendimento de sua

função ambiental.156

O conteúdo da função social da propriedade rural, assim como o da

propriedade urbana, encontra previsão legal na Constituição Federal, notadamente no artigo

186 e incisos, que assim preceitua:

Art. 186. A Função Social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do Meio Ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.157

Vislumbra-se, então, que para se configurar a função social da propriedade

rural não basta que esta seja produtiva e que não utilize mão-de-obra escrava ou infantil,

respeitando as relações trabalhistas, seu conteúdo é amplo e se sustenta sobre o

preenchimento da função ambiental, na medida em que deve utilizar de maneira adequada os

recursos naturais, preservando-se o meio ambiente.

154 BRASIL. Lei 10.257 de 10 de julho de 2001 – Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.487. 155 Cf. MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade, o Plano Diretor e o Desenvolvimento Urbano. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. p.40. 156 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 110. 157 BRASIL, Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.118.

Page 46: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

46

Deste modo, verifica-se que os incisos do artigo 186 informam os quatros

elementos que compõem a função social da propriedade Rural, os quais devem ser atendidos

simultaneamente(caput do artigo 186), sob pena de ensejar a perda da propriedade.158

A função ambiental da propriedade configurada como dever do proprietário de

preservar o ambiente para presentes e futuras gerações, pressuposto a realização da função

social da propriedade, autoriza as limitações ao uso desta159, uma vez que “é através das

restrições que se consegue fazer cumprir a função ambiental da propriedade” 160, sendo estas

limitações previstas na legislação ambiental infraconstitucional, eis que são diversos os bens

ambientais protegidos, sendo necessário, portanto, critérios mais específicos para se averiguar

o cumprimento da função ambiental e social.161

Neste sentido, necessário se faz o estudo das limitações ao direito do

proprietário, principalmente aquelas advindas da instituição de espaços ambientais,

destinando-se, para tanto, tópico próprio a esta análise.

2.7 LIMITAÇÕES À PROPRIEDADE DECORRENTES DOS ESPAÇOS AMBIENTAIS

2.7.1 Aspectos gerais sobre as limitações ao direito de propriedade

A passagem do conceito de propriedade como direito subjetivo, de cunho

eminentemente individual, para o conceito contemporâneo que alberga em seu conteúdo a

função social e ambiental traz como conseqüência, além das limitações da esfera privada

(interesses individuais opostos ao do proprietário), as limitações que visam o atendimento dos

interesses sociais, em especial às referentes a preservação ambiental.162

Conforme já explicitado em item anterior, função ambiental e restrições à

propriedade são afetações diferentes sobre o direito de propriedade.163 Em verdade, função

social e ambiental da propriedade são atributos que vêm legitimar o direito de propriedade,

não sendo limitações, uma vez que estas “dizem respeito ao exercício do direito ao

proprietário”. 164

158 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 92. 159 Cf. CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.124. 160 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 111. 161 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 111. 162 Cf. CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.84. 163 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p. 111. 164 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.p.284.

Page 47: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

47

Todavia são as limitações e restrições de ordem social e ambiental que irão

demonstrar se a propriedade atende ou não a sua função socioambiental.

Neste ponto é que surgem as controvérsias a cerca do direito a percepção de

indenizações pela existência de limitações, sendo que referido questionamento poderá ser

sanado após se conceituar limitações e classificá-las.

José Afonso da Silva conceitua limitações ao direito de propriedade como

sendo os “condicionamentos que atingem os caracteres tradicionais deste direito, pelo que era

tido como direito absoluto, exclusivo e perpétuo” 165, sendo, então, gênero das quais são

espécies as restrições, servidões e desapropriações, classificando-se, portanto, em limitações

de direito privado (direito de vizinhança) e limitações de direito público (urbanísticas e

administrativas).

Vislumbra-se que este conceito genérico de limitação tratado por José Afonso

da Silva pode ser tido como o conceito de Intervenção na Propriedade Privada, sendo a

desapropriação, servidão administrativa e limitação administrativa instrumentos desta

intervenção, conceituação adotada por Hely Lopes Meirelles, que disciplina Intervenção na

Propriedade Privada como sendo “todo ato do Poder Público que compulsoriamente retira ou

restringe direitos dominiais privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de

interesse público”. 166

As limitações administrativas são limites e parâmetros estabelecidos sobre o

direito de propriedade a fim de beneficiar toda a coletividade, cumprindo-se, em

conseqüência, a sua função social e ambiental, sendo que as mesmas não aniquilam o direito

de propriedade, 167 desta forma, só geram o dever de indenizar se inviabilizada a propriedade.

Neste sentido, percebe-se que o dever de indenizar está condicionado a

identificação da existência ou não do esvaziamento do conteúdo da propriedade.

Herman Benjamin adota os critérios de limites internos e externos do direito de

propriedade para se verificar o esvaziamento do conteúdo deste direito, onde são internos

aqueles limites decorrentes da preservação ambiental, aplicáveis a todas as propriedades que

possuam as mesmas características, e, por conseqüência, cumpridores da função

socioambiental da propriedade; já os externos são aqueles advindos de um ato discricionário

165 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. p. 282. 166 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19. Ed. São Paulo: Malheiros, 1994. Apud CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.115. 167 Cf. SANTOS, Saint-Clair Honorato. Direito Ambiental: Unidades de Conservação e Limitações Administrativas. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2003.p.143.

Page 48: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

48 do Poder Público que gera restrições à (s) faculdade (s) do domínio individualizado168, eis que

se a “proibição se dá em relação a uma propriedade, deixan do de fora outras que se acham no

mesmo estado, ou seja, que igualmente representam certo ecossistema, não se estará diante de

limites internos ao direito, mas de limites externos e, portanto, indenizáveis”. 169

Assim, para Herman Benjamin são limites internos da propriedade:

(...) de natureza intrínseca e contemporânea à formação da relação de domínio; isto é, indissociáveis do próprio direito de propriedade, verdadeiros elementos de um todo, daí moldando-se como um ônus inerente à garantia. Na ausência deles, como se fossem o ar e a água que propiciam a vida, não se consolida o direito de propriedade, não é ele reconhecido e protegido pela ordem jurídica, pelo menos em sua plenitude.170

E por limites externos entende como sendo aqueles que “pressupõem uma

dominialidade que opere sua plenitude, totalmente consolidada por respeitar os limites

primordiais”. 171

Assim, pode-se entender que não há direito a propriedade ilimitado (em seu

sentindo amplo), uma vez que a proteção do meio ambiente constitui-se um dever de toda a

coletividade e do Poder Público, não sendo possível, por sorte, gerar indenização qualquer

limitação a este direito, mas, somente, quando estas esvaziarem o conteúdo essencial do

direito a propriedade, condicionado, entretanto, como delineado por Márcia Diegues

Leuzinguer, a verificação de “existência ou não de violação a regras ambientais pelo

proprietário”. 172

Verifica-se que várias são as limitações ao direito de propriedade, todavia

somente se analisarão, no presente estudo, as fundadas na proteção ao meio ambiente,

decorrentes dos espaços ambientais, os quais compreendem os espaços territoriais

especialmente protegidos e zoneamento ambiental.

Destaca-se que referidas limitações são impostas por leis infraconstitucionais,

a exemplo a lei que cria as unidades de conservação – Lei 9.985/2000 e regulamenta o artigo

225, § 1º, III da Constituição Federal.

168 Cf.LEUZINGUER, Márcia Diegues. FIGUEREDO, Guilherme José Purvin. Desapropriações Ambientais na Lei 9.985/2000. IN BENJAMIN, Antônio Herman. Direito Ambiental das áreas protegidas. p.472. 169 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Criação de Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização.p. 122. 170 BENJAMIN, Antônio Herman V. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente. Disponível em http://www.buscalegis.ccj.ufsc.br, acesso em: 21.09.2004.p.4. 171 BENJAMIN, Antônio Herman V. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente.p.4. 172 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Criação de Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização. p. 121.

Page 49: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

49 2.7.2 Espaços Ambientais

Os espaços ambientais são limitadores ao exercício do direito à propriedade na

medida em que se configuram como instrumentos jurídicos de proteção ao meio ambiente,

haja vista previsão constitucional e, ainda, previstos no rol dos instrumentos da Política

Nacional do Meio Ambiente.

Configuram-se espaços ambientais os espaços territoriais especialmente

protegidos e o zoneamento ambiental, segundo José Afonso a Silva que assim estabelece:

A expressão espaços ambientais é tomada aqui em sentido amplo. Pretende-se com ela definir toda e qualquer delimitação geográfica, toda e qualquer porção do território nacional, estabelecida com o objetivo de proteção ambiental, integral ou não, e assim submetida a um regime especialmente protecionista. No conceito, entrarão dois grupos de espaços ambientais: os espaços territoriais especialmente protegidos e o zoneamento ambiental.173

Assim, vislumbra-se que os espaços ambientais abrangem tanto áreas públicas

ou privadas, sendo “sujeitas a regimes especiais de proteção, ou seja, sobre as quais incidam

limitações objetivando a proteção, integral ou parcial, de seus atributos naturais”. 174

2.7.2.1 Zoneamento Ambiental

O Zoneamento Ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio

Ambiente, nos termos da Lei 6.938/81, destinado além da ordenação do uso e ocupação do

solo a preservação do meio ambiente. Constitui-se, portanto, “de um procedime nto por meio

do qual se instituem zonas de atuação especial com vista à preservação, melhoria e

recuperação da qualidade ambiental”. 175

O zoneamento ambiental, também conhecido como Zoneamento Ecológico-

Econômico (ZEE)176 encontra-se regulamentado pelo Decreto 4.297/2002, que o definiu no

artigo 2º e traçou seus objetivos no artigo 3º.

Art. 2º O ZEE, instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de planos, obras e atividades públicas e privadas, estabelece medidas e padrões de proteção ambiental destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade, garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da população.

173 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.158. 174 LEUZINGER, Márcia Dieguez. Criação de Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização. p. 113. 175 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.184. 176 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente.p.420.

Page 50: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

50

Art. 3º O ZEE tem por objetivo geral organizar, de forma vinculada, as decisões dos agentes públicos e privados quanto a planos, programas, projetos e atividades que, direta ou indiretamente, utilizem recursos naturais, assegurando a plena manutenção do capital e dos serviços ambientais dos ecossistemas. Parágrafo único. O ZEE, na distribuição espacial das atividades econômicas, levará em conta a importância ecológica, as limitações e as fragilidades dos ecossistemas, estabelecendo vedações, restrições e alternativas de exploração do território e determinando, quando for o caso, inclusive a relocalização de atividades incompatíveis com suas diretrizes gerais. 177

Paulo Affonso Leme Machado esclarece que as finalidades do zoneamento

ambiental são garantir a salubridade, tranqüilidade, paz, saúde e bem-estar do povo,

representando uma limitação dos cidadãos ao discriminar usos.178

2.7.2.2 Espaços Territoriais Especialmente Protegidos

O espaço territorial especialmente protegido consta do rol dos instrumentos da

Política Nacional do Meio Ambiente, haja vista o disposto no artigo 9º, VI da lei 6.938/81179,

constituindo-se em um dos instrumentos jurídicos utilizados na implementação do Direito

Constitucional ao meio ambiente sadio e equilibrado.

Desta forma, a Constituição Federal de 1988, como meio de assegurar a

efetividade da proteção ao ambiente, impôs ao Poder Público, no artigo 225, § 1º, III, definir

espaços territoriais e seus componentes para serem especialmente protegidos, vedado

qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem a proteção.180

Édis Milaré, ao analisar o supracitado dispositivo, apresenta o conceito de

espaços especialmente protegidos como sendo:

(...) espaços geográficos, públicos ou privados, dotados de atributos ambientais relevantes, que, por desempenharem papel estratégico na proteção da diversidade biológica existente no território nacional, requerem sua sujeição, pela lei, a um regime de interesse público, através da limitação ou vedação o uso dos recursos ambientais da natureza pelas atividades econômicas. 181

Destaca-se que, estes espaços, sendo de propriedade privada ou pública,

possuem regime jurídico especial, ou seja, de interesse público, haja vista a importância dos 177 BRASIL. Decreto 4.297 de 10.07.2002. Regulamenta o art. 9, inciso II, da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, estabelecendo critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil - ZEE, e dá outras providências. Senado Federal. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em 20.09.2004. 178 Cf. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.p.178. 179 A lei 7.804/89 modificou o art.9º da lei 6.938/81, na medida em que incluiu os espaços protegidos no rol dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, com a finalidade de o adequar à Constituição de 1988, que já estabelecia a criação desses espaços. Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.159. 180 Cf. BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.134. 181 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente.p.233.

Page 51: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

51 atributos naturais de que se revestem, eis que, “em sentido ecoló gico, referem-se, na verdade,

a ecossistemas” 182, cuja proteção genérica foi estabelecida no artigo 225, § 4º da CF.

Édis Milaré explicita que ao se instituírem os espaços especialmente

protegidos, vislumbrou-se a preocupação com a manutenção e preservação dos ecossistemas

de maior significado para as ordens social e econômica da nação; estabelecendo quatro

categorias de espaços territoriais especialmente protegidos, quais sejam: Áreas de Proteção

Especial, Áreas de Proteção Permanente, Reserva Legal e Unidades de conservação.183

Percebe-se, desta maneira, que unidades de conservação e espaços protegidos

não se confundem, uma vez que estes constituem o gênero e àquelas espécies.

A impropriedade da lei 9.985/2000, que estabeleceu o Sistema Nacional de

Unidades de Conservação, ao apresentar em sua ementa que regulamentaria o § 1º, incisos I,

II, III e IV dado Art. 225 da Constituição Federal, quando, em verdade, tratou apenas das

unidades de conservação, deixando de abarcar, então, os demais espaços protegidos, é

ressaltada por Herman Benjamin, que assim esclarece:

A técnica deficiente da lei fica evidente já na sua ementa, na qual o legislador ordinário, afirmando regulamentar o art. 225, § 1º, incis. I, II, III e IV, da Constituição Federal, institui “o Sistema Na cional de Unidades de Conservação da Natureza”.(...), em nenhum momento o texto constitucional alude à expressão unidades de conservação usando, isso sim, de forma correta, o termo espaços territoriais especialmente protegidos. Não se trata de uma opção vernacular aleatória ou acidental do legislador de 1988, que, nesse ponto, seguiu o standart científico apropriado, segundo o qual “conservação” não é gênero, muito menos gênero do qual “preservação” seria espécie. Muito ao contrário, “conservação” é ela pró pria modalidade (= espécie) de proteção especial da natureza, contrapondo-se à “preservação”: esta como garantia integral da biota; aquela, mais flexível, contentando-se em impor certos requisitos à exploração, dita sustentável, dos recursos naturais.184

Adotar-se-á, no presente estudo, a classificação de espaços protegidos

estabelecida por Édis Milaré, já citada.

2.7.2.2.1 Áreas de Proteção Especial, Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal

As áreas de proteção especial são espaços regulados pelo artigo 13, I da lei de

Parcelamento do solo 185– lei 6.766/79, que assim prescreve:

182 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.p.159. 183 Cf. MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente.p.559. 184 BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução à Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. IN BENJAMIN, Antônio Herman V. (Org). Direito Ambiental das Áreas Protegidas: O regime jurídico das unidades de conservação. p.287/288. 185 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.235.

Page 52: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

52

Art. 13. Aos Estados caberá disciplinar a aprovação pelos Municípios de loteamentos e desmembramentos nas seguintes condições: I – quando localizados em áreas de interesse especial, tais como as de proteção aos mananciais ou ao patrimônio cultural, histórico, paisagístico e arqueológico, assim definidas por legislação Estadual ou Federal.186

Assim, são importantes espaços a serem considerados nos processos de

urbanização, eis que a proteção a estes “tem por objetivo prevenir a lesão a bens e valores

ambientais estratégicos” 187, e, por este motivo, são implementados pelo Estatuto da Cidade,

especialmente pelo Plano Diretor, o qual estabelece a s exigências fundamentais da ordenação

das cidades.188

O Código Florestal de 1965 é percussor na implementação do meio ambiente

como direito difuso, ao conceituar meio ambiente como bem de uso comum do povo189, e ao

prever que os direitos de propriedade serão exercitados com as limitações previstas na

legislação, estabelecendo como instrumentos de proteção ao ambiente a criação de reserva

legal e das áreas de preservação permanente.

Área de Preservação Permanente é, segundo Art. 1º, § 2º, II do Código

Florestal, “área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º190 desta lei, coberta ou não por

186 BRASIL. Lei 6.766 de 19 de dezembro de 1979. Dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.610. 187 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.235. 188 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.235. 189 Cf. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro.p.685. 190 Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d'água, em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura: 2 - igual à metade da largura dos cursos que meçam de 10 (dez) a 200 (duzentos) metros de distancia entre as margens; 3 - de 100 (cem) metros para todos os cursos cuja largura seja superior a 200 (duzentos) metros. b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais; c) nas nascentes, mesmo nos chamados "olhos d'água", seja qual for a sua situação topográfica; d) no topo de morros, montes, montanhas e serras; e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive; f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; g) nas bordas dos taboleiros ou chapadas; h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, nos campos naturais ou artificiais, as florestas nativas e as vegetações campestres. Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: a) a atenuar a erosão das terras; b) a fixar as dunas; c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias; d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares; e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico; f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;

Page 53: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

53 vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a

estabilidade ecológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e

assegurar o bem estar das populações humanas”. 191

De acordo com o presente conceito extraído do Código Florestal, tem-se que as

áreas de preservação permanente são as estabelecidas em seus artigos 2º e 3º, constituindo-se,

portanto, em dois grupos, quais sejam: De preservação permanente por imposição legal

(art.2º) e de preservação permanente por ato do Poder Público (art.3º).192

Herman Benjamin, da seguinte maneira conceitua as duas espécies de Área de

Proteção Permanente:

APPs ope legis (ou legais), chamadas como tal porque sua delimitação ocorre no próprio Código Florestal). Vêm previstas no art. 2º, do Código Florestal, incluindo, p. ex., a mata ciliar, o topo de morros, as restingas, os terrenos em altitude superior a 1.800m; e, APPs administrativas, assim denominadas porque sua concreção final depende da expedição de ato administrativo da autoridade ambiental competente. Têm assento no art. 3º, do Código Florestal, e visam, entre outras hipóteses, evitar a erosão das terras, fixar dunas, formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias. 193

Assim, referidas áreas foram instituídas com o intuito de manter a vegetação

que a recobre, eis que, conforme salientado por Herman Benjamin, “a Área de Preservação

Permanente (APP) que, como sua própria denominação demonstra – é área de “preser vação” e

não de “conservação” – não permite a exploração econômica direta (madeireira, agricultura

ou pecuária), mesmo que com manejo”. 194

A Reserva Legal, ou Reserva Florestal Legal, conforme já salientado, está

prevista no Código Florestal que a considera uma modalidade de regulação e proteção das

florestas e demais áreas vegetadas, possuindo o seguinte conceito normativo:

g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas; h) a assegurar condições de bem-estar público. § 1° A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social. § 2º As florestas que integram o Patrimônio Indígena ficam sujeitas ao regime de preservação permanente (letra g ) pelo só efeito desta Lei. (BRASIL. Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. Institui o Código Florestal. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.508/509). 191 BRASIL. Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. Institui o Código Florestal. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.507. 192 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.276 e 282. 193 BENJAMIN, Antônio Herman V.. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente.p.8 194 BENJAMIN, Antônio Herman V. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente..p.8

Page 54: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

54

Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.195

Assim, a reserva Florestal Legal compõem-se de “uma área, cujo percentual da

propriedade total é definida em lei, variando conforme as peculiares condições ecológicas, em

cada uma das regiões geopolíticas do País e que não pode ser utilizada economicamente de

forma tradicional, isto é, destinar-se à produção de madeira ou outra comodity que dependa da

derrubada das árvores em pé”. 196

A Reserva legal constitui-se em uma obrigação do proprietário do imóvel,

ligando-se, todavia, a propriedade, eis que se assemelha a ônus real sobre o imóvel. Assim,

referida limitação acompanha a propriedade, razão pela qual, muito embora não tenha sido

registrada no Registro de Imóveis, o proprietário deve respeitar a Reserva Florestal Legal,

uma vez que não é constituída pela averbação, a qual somente a declara.197

A Reserva Florestal Legal, assim como as Áreas de Preservação Permanente,

limitam o direito de propriedade, todavia a Reserva Florestal Legal, instituída nos arts.16 e 44

do Código Florestal, só incide sobre a propriedade privada, enquanto as áreas de preservação

permanente incidem tanto sobre propriedade privada quanto pública.198 Referidas áreas se

distinguem também quanto a sua destinação, eis que Reserva Florestal Legal se caracteriza

pelo uso sustentável dos recursos naturais.199

A Reserva Florestal Legal e a Área de Preservação Permanente legal (art.2º)

apenas limitam internamente o direito de propriedade, em razão da tutela ao meio ambiente,

sendo assim, não ensejam qualquer indenização.

(...) nenhum dos dispositivos do Código Florestal consagra, "aprioristicamente", restrição que vá além dos limites internos do domínio, estando todos constitucionalmente legitimados e recepcionados; demais disso, não atingem, na substância, ou aniquilam o direito de propriedade. Em ponto algum as APPs e a Reserva Legal reduzem a nada os direitos do proprietário, em termos de utilização do capital representado pelos imóveis atingidos. Diante dos vínculos que sobre elas incidem, tanto aquelas como esta aproximam-se muito de modalidade moderna de propriedade restrita, restrita, sim, mas nem por isso menos propriedade. Tanto as APPs ope legis, como a Reserva Legal são, sempre, limites internos ao direito de

195 BRASIL. Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.507. 196 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.288. 197 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.289 e 293. 198 Cf. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p.703. 199 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.289.

Page 55: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

55

propriedade e, por isso, em nenhuma hipótese são indenizáveis. Integram a essência do domínio, sendo com o título transmitidas.200

A indenização que pode ser gerada é aquela referente a criação de área de

preservação permanente administrativa (art. 3º)201, eis que limite externo ao direito de

propriedade, especialmente quando estas limitações incidirem sobre poucas propriedades, não

beneficiarem, direta ou indiretamente, o proprietário; e sua efetivação inviabilizar, os

possíveis usos da propriedade.202

2.7.2.2.2 Unidades de Conservação

Já se destacou, em ponto anterior, que as unidades de conservação constituem

uma das categorias de espaços territoriais especialmente protegidos delineados na

Constituição Federal e com estes não se confundindo.

A criação e gestão das unidades de conservação estão regulamentadas pela lei

9.985 de 2000, a qual instituiu o Sistema Nacional da Unidades de Conservação (SNUC),

assim referida lei não cria as unidades de conservação mas estabelece as medidas para a sua

criação.203

O conceito de unidade de conservação é retirado da lei que instituiu o já citado

Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que em seu artigo 2º, inciso I dispõe:

Art. 2º. (...);

I – unidade de conservação: espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.204

Paulo de Bessa Antunes salienta que “o estabelecimento de unidades de

conservação foi o primeiro passo concreto em direção à preservação ambiental” 205, haja vista

serem espaços territoriais criados pelo Poder Público, destinados ao estudo e preservação da

flora e fauna.

A criação de unidades de conservação apresenta muitos objetivos, os quais 200 BENJAMIN, Antônio Herman V. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente.p.9. 201 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.127. 202 Cf. BENJAMIN, Antônio Herman V. Desapropriação, reserva florestal legal e áreas de preservação permanente.p.9. 203 Cf. DERANI, Cristiane. A estrutura do Sistema Nacional de unidades de Conservação – Lei 9.985/2000. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG) Direito Ambiental das áreas protegidas. p.236. 204 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.873. 205 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.312.

Page 56: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

56 estão elencados no artigo 4º da referida lei206, resumindo-se, todavia, na preservação do meio

ambiente, através da preservação e restauração de ecossistemas, aplicação de princípios

ecológicos no processo de desenvolvimento e na recuperação de ecossistemas degradados,

incentivo a educação ambiental e turismo ecológico, subsistência das populações tradicionais.

Antônio Herman Benjamin partilha do entendimento que reconhece quatro

finalidades principais das unidades de conservação, ao expor:

A experiência internacional reconhece quatro finalidades principais às unidades de conservação: conservação da natureza, aproveitamento (=gozo) público, pesquisa científica e uso econômico sustentável de seus componentes. Cada modalidade de área protegida realça, em menor ou maior escala, um ou vários desses objetivos, respeitada a primazia absoluta da finalidade conservacionista, pois sem ela, já notamos, não há como se falar em unidade de conservação.207

Vislumbra-se, portanto, que além das preocupações ecológicas, o Sistema

Nacional de Unidades de Conservação orienta-se, também, à questão econômica, uma vez que

pretende aliar proteção ambiental e desenvolvimento.208

As unidades de conservação possuem características próprias como, por

exemplo, a possibilidade ou não da interferência humana, e por este motivo estão divididas

em dois grupos, quais sejam: unidades de proteção integral e unidades de uso sustentável.

Os dois grupos de unidades de conservação apresentam, no total, doze

categorias (previstas na lei 9.985/2000) de unidades de conservação, todavia, outras unidades

podem ser criadas, consoante o disposto no artigo 6º da lei que instituiu o SNUC.209

2.7.2.2.2.1 Unidades de Conservação de uso Sustentável

As unidades de uso sustentável são assim denominadas, pois “destinam -se à

compatibilização entre a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus

recursos naturais” 210, segundo o disposto no artigo 7º, § 2º da lei 9.985/2000.

Salienta-se que a expressão uso sustentável vem definida também no rol de

definições introduzidas pelo Sistema Nacional de Unidades de conservação em seu artigo 2º,

que assim conceitua: “exploração do ambiente de maneira a garantir a perenidade dos

recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos, mantendo-se a biodiversidade e

206 Cf. BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.874/875. 207 BENJAMIN, Antônio Herman V. Introdução à Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG) Direito Ambiental das Áreas Protegidas. p.298. 208 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.241. 209 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.246. 210 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.318.

Page 57: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

57 demais atributos ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável”. 211

Estas unidades de uso sustentável são constituídas por sete categorias de

unidades de conservação, quais sejam: Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante

Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva extrativista, Reserva de Fauna, Reserva de

Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural.

As Áreas de Proteção Ambiental (APAs) são as mais comuns dentre as

unidades de conservação uma vez que tanto é constituída em área pública como em área

privada, sendo que as restrições impostas às propriedades privadas não importam em

desapropriação, neste sentido a lei do SNUC assim definiu área de proteção ambiental:

Art. 15. A Área de proteção ambiental é uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.212

As Áreas de relevante interesse ecológico, ao contrário das Áreas de

Preservação Permanente, são em geral áreas de pequena extensão e com pouca ou nenhuma

ocupação humana, todavia, merecem proteção especial em virtude de possuírem

características naturais extraordinárias ou possuir exemplares raros da biota regional.213

Elas também podem ser constituídas em áreas públicas ou privadas e as

limitações à propriedade não ensejam a desapropriação.

A Floresta Nacional é a unidade de conservação que se caracteriza por ser

“área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e tem como objetivo

básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase

em métodos para exploração sustentável de florestas nativas”. 214

A Floresta Nacional, consoante o disposto no § 1º do artigo 17 do SNUC, é de

posse e de domínio público, portanto, quando existirem terras particulares em seus limites

devem estas serem desapropriadas. Esta unidade de conservação admite a permanência de

populações tradicionais, deste que já habitassem no momento da criação e em conformidade

211 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.874/875. 212 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.878. 213 Cf. Artigo 16 da lei 9.985/2000 In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.878. 214 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.879.

Page 58: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

58 com o disposto em regulamento e em seu plano de manejo. O plano de manejo também

disciplinará a pesquisa e a visitação pública.215

Reserva extrativista é unidade de conservação que surgiu por conseqüência das

lutas dos seringueiros da Amazônia pela preservação e defesa do Meio ambiente e de seu

modo de vida.216 Foi definida como “espaços territoriais destinados à exploração auto -

sustentável e conservação dos recursos naturais renováveis por populações extrativistas” 217,

pelo decreto 98.897/1990.

A Reserva Extrativista recebeu novo regime jurídico, podendo ser definida,

segundo o artigo 18 da lei 9.985/2000, como sendo:

(...) área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade. 218

A Reserva Extrativista é de domínio público, sendo que as populações

tradicionais possuem uma concessão de uso, consoante se depreende do artigo 18, § 1º da Lei

9.985/2000, o qual prevê, ainda, a desapropriação das áreas privadas incluídas em seus

limites.219

A Reserva de Fauna é constituída por “área natural com populações animais de

espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos

técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos” 220. É

também unidade de posse e domínio público, devendo a propriedade particular ser

desapropriada, quando inserta em seus limites.221

A Reserva de Desenvolvimento Sustentável caracteriza-se por ser uma área

que abriga populações tradicionais que sobrevivem em sistemas sustentáveis de exploração

dos recursos naturais de acordo com condições ecológicas locais e que desempenham papel

fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica.222

215 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.253. 216 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.329. 217 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.254. 218 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.879. 219 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.254. 220 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.880. 221 Cf. Artigo 19, § 1º da lei 9.985/2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.880. 222 Cf. Artigo 20 da lei 9.985/2000 In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito

Page 59: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

59

O objetivo da reserva de desenvolvimento sustentável está delineado no § 1º

do artigo 20 da Lei 9.985/2000, resumindo-se na exploração sustentável dos recursos naturais

preservando-se a natureza e melhorando qualidade de vida das populações tradicionais.

A reserva de uso sustentável é unidade de conservação criada em domínio

público, sendo que as áreas particulares serão desapropriadas somente quando necessário,

possuindo as populações tradicionais apenas a posse e uso das terras.223

Destaca-se que o conceito de Reserva extrativista e de Reserva de

Desenvolvimento sustentável podem se confundir, motivo pelo qual, Édis Milaré salienta suas

diferenças:

Muitas vezes os conceitos de Reserva Extrativista e de Reserva de Desenvolvimento Sustentável se confundem. Com efeito, a diferença básica entre uma e outra é que na primeira a atividade é mais restrita, baseada na coleta e extração sustentável de recursos naturais renováveis, enquanto na segunda o escopo é ampliado para outras atividades presumidamente sustentáveis.224

A Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) é “área privada, gravada

com perpetuidade pelo proprietário, com o objetivo de conservar a diversidade biológica” 225,

sendo permitida somente atividades consistentes em pesquisa científica e visitação com

objetivos turísticos, recreativos e educacionais, consoante disposição do artigo 21,§ 2º incisos

I e II da lei 9.985/2000.

2.7.2.2.2.2 Unidades de Conservação de Proteção Integral

As unidades de proteção integral são aquelas que “tê m por objetivo básico a

preservação da natureza, sendo admitidos apenas o uso indireto dos seus recursos naturais,

com exceção dos casos previstos na própria Lei que estabeleceu o SNUC”. 226

Estas unidades de proteção integral são constituídas por cinco categorias, quais

sejam: Estações ecológicas, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e

Refúgio da Vida Silvestre.

As estações ecológicas já estão previstas desde a Lei 6.513/1977 tendo seu

conceito sido modificado pela Lei 6.902/1981 e pelas Resoluções do CONAMA 010 de

Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG). p.880. 223 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.333. 224 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente.p.256. 225 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.881. 226 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.318.

Page 60: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

60 03.12.1987 e 002 de 18.04.1996 227. A Lei do SNUC (9.985/2000) veio ampliar sua base

jurídica e fortalecer atribuições.228

O objetivo das estações ecológicas estão determinados no artigo 9º da lei do

SNUC, consistente na preservação da natureza e realização de pesquisas científicas. É de

posse e domínio público, assim, se instituída em domínio privado deve ser desapropriada (art.

9º, § 1º). A visitação pública é permitida somente para fins educacionais, respeitados,

entretanto, o disposto no plano de manejo.

A reserva biológica é unidade de conservação que nos termos do artigo 10 da

Lei 9.985/2000 tem por objetivo a:

(...) preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais.229

A reserva biológica é de posse e domínio público, pelo que se instituídas em

limites particulares devem ser desapropriadas (art. 10, § 1º). A visitação pública é permitida

somente para fins educacionais, de acordo com seu regulamento (art. 10, § 2º) e a pesquisa

científica depende da autorização do órgão responsável pela administração da unidade.

Édis Milaré esclarece que a diferença entre Reserva Biológica e Estação

Ecológica refere-se “ à porcentagem da área a ser preservada: enquanto a primeira deve ser

cem por cento, a segunda pode ter até três por cento de sua área modificada para fins de

pesquisa científica” 230.

O Parque Nacional é a unidade de conservação mais conhecida pela

população231, tendo por objetivo “a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância

ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o

desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em

contato com a natureza e de turismo ecológico”. 232

O regime de visitação dos parques é mais amplo e liberal que o das outras

227 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.247. 228 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.319. 229 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.877. 230 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.248. 231 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.322. 232 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.877.

Page 61: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

61 unidades de proteção integral233, sendo que o mesmo deve ser estabelecido em áreas publicas,

devendo ser desapropriadas as áreas particulares incluídas em seus limites.

O monumento natural, segundo o artigo 12 da Lei 9.985/2000, “tem por

objetivo básico preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica”. 234É

uma unidade de proteção integral que pode ser instituída em área particular quando for

possível a compatibilização dos objetivos da unidade com a utilização dos recursos pelo

proprietário.235

O Refúgio da Vida silvestre é uma nova categoria de unidade de conservação,

cujo objetivo é “proteger ambientes naturais onde se asseguram condições para a existência

ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da fauna residente ou

migratória” 236. Podem ser instituídos em áreas particulares, sendo que a desapropriação é

autorizada quando houver “ incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades

privadas ou de não aquiescência do proprietário às condições propostas pelo órgão

responsável pela administração da unidade”. 237

Analisados os espaços territoriais especialmente protegidos, observa-se que a

retirada do domínio privado destes espaços deve ser refletida contemplando-se o princípio da

função social da propriedade, ou seja, “não basta a simples instituição de espaços

especialmente protegidos sob o domínio privado para ser o proprietário privado carecedor de

indenização. É indispensável que dele se retirem todos os elementos inerentes ao domínio”. 238

233 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.323. 234 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.877. 235 Cf. Artigo 12, § 1º da lei 9.985/2000 In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.877. 236 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.878. 237 BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.878 238 DERANI, Cristiane. A estrutura do Sistema Nacional de unidades de conservação – lei nº9.985/2000. p.243.

Page 62: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

3 O ESTADO DE DIREITO DO AMBIENTE E O DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL COMO COMPATIBILIZADORES DO DIREITO A PROPRIEDADE

E PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

Analisada as questões referentes ao direito de propriedade, principalmente a

imposição ao proprietário de preservar o meio ambiente, tendo-se, por conseqüência, a função

socioambiental como o próprio conteúdo deste direito, urge identificar os elementos

compatibilizadores dos direitos à propriedade privada e a um meio ambiente sadio e

equilibrado para as presentes e futuras gerações, ambos princípios garantidores do

desenvolvimento.

3.1 O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO

NORTEADOR DOS PRINCÍPIOS DA ORDEM ECONÔMICA

Se existe a necessidade de se compatibilizar direitos, pressupõem-se, por certo,

a existência de conflitos, e, dessa maneira, os conflitos entre o direito de propriedade e o

direito a um ambiente saudável para presentes e futuras gerações, como qualquer embate,

existe em decorrência das relações sociais, as quais são marcadas pela diversidade, uma vez

que cada indivíduo apresenta sua concepção de justiça, assim como cada grupo social possui

culturas, valores e ideologias diversos. 239

A existência de um “aparente” conflito entre o direito de propriedade e o

direito a um ambiente saudável surge, principalmente, da dicotomia público/privado.

Esta dicotomia, no decorrer da história, foi tratada de forma diversa, ou seja,

em diferentes momentos históricos um direito se subordinou ao outro.240

A harmonização entre os interesses público e privado se dá com o surgimento

dos novos direitos, inclusos, então, o direito de se gozar de um ambiente saudável.

Importa, desta forma, afirmar que referida harmonização se efetiva através da

co-existência e implementação de ambos os princípios (propriedade privada respeitada a sua

função social e defesa do meio ambiente), pois o exercício do direito à propriedade se

239 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e ambiental da Propriedade. p.127. 240 Cf. CAVEDON, Fernanda Salles. Função Social e ambiental da Propriedade. p.128/131.

Page 63: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

63 submete a preservação ambiental, visto que os elementos naturais sob o domínio privado são

de interesse de um sujeito difuso, ou seja, a qualidade ambiental.241

Os compatibilizadores destes direitos são, portanto, a função social e ambiental

da propriedade, haja vista, que, uma vez satisfeitas importam na não existência do conflito,

pois o direito de propriedade é exercido em consonância com estas funções, preservando-se o

meio ambiente (interesse público preponderante).

Neste termos, Roxana Cardoso Brasileiro Borges apresenta a inexistência do

conflito entre o direito de propriedade e a proteção ao meio ambiente, uma vez ser o conteúdo

da função ambiental da propriedade a utilização dos recursos naturais disponíveis e a

preservação destes.

Não existe um conflito entre direito de propriedade e a proteção jurídica do meio ambiente. Os direitos de propriedade e do meio ambiente, desde que se tenha uma compreensão sistemática do ordenamento jurídico brasileiro, são compatíveis. Mais do que isso, pode-se dizer que a proteção ambiental é necessária para a garantia futura da utilidade do próprio direito de propriedade.242

Desta forma, se afastadas as diversidades que poderiam surgir entre a

dicotomia publico e privado, em primeiro momento, poder-se-ia dizer que a criação dos

espaços protegidos seria um elemento a compatibilizar o direito a propriedade privada e o

direito ao meio ambiente equilibrado, uma vez que a proteção ao meio ambiente é dogma e

princípio constitucional que visa a preservação da qualidade de vida para as presentes e

futuras gerações, sendo, nos termos já delineados no primeiro capítulo, um direito humano

fundamental.

A legislação ambiental ao prever, então, os casos de admissibilidade de

desapropriação e conseqüentemente indenização aos proprietários dos espaços criados, que

não admitem a exploração e que esvaziam o conteúdo econômico da propriedade, afasta o

conflito, pois se protege o meio ambiente e indeniza-se o proprietário, conforme salienta

Cristiane Derani ao dispor que “o dever de indenizar o proprietário privado surge no momento

em que este proprietário, para destinar seu bem ao proveito da sociedade, perde a capacidade

de destiná-lo a seu próprio proveito”. 243

Todavia, grande parte das discussões assenta-se sobre as áreas que não

241 Cf. FIORRILLO, Celso Antônio Pacheco. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. p.94/102. 242 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.204. 243 DERANI, Cristiane. A estrutura do Sistema Nacional de unidades de conservação – lei nº9.985/2000. p.243.

Page 64: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

64 prevêem possibilidade de indenização, uma vez que “os recursos naturais são bens da

coletividade que podem estar circunscritos em propriedades privadas. Os direitos de

propriedade individualizados sobre estes bens não excluem os direitos da coletividade em

relação a eles” 244.

Para estas áreas, então, torna-se imperioso a aplicação do princípio da

qualidade do meio ambiente e de sua proteção sobre o princípio da propriedade privada, uma

vez que sopesados estes princípios, o princípio da qualidade do meio ambiente e de sua

proteção inserto no próprio conteúdo do princípio da dignidade da vida humana não retirará a

validade do princípio da propriedade privada, mas irá se sobrepor a este245, até porque a

propriedade só merece proteção, nos termos já vistos, ao cumprir sua função

socioambiental246, respeitando-se, portanto, ao bem maior que é a vida.

Nestes exatos termos José Afonso da Silva se manifesta:

As normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Compreendeu que ele é um valor preponderante, que há de estar acima de quaisquer considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são garantidos no texto constitucional, mas, a toda evidência, não podem primar sobre o direito fundamental à vida, que está em jogo quando se discute a tutela da qualidade do meio ambiente, que é instrumento no sentido de que, através dessa tutela, o que se protege é um valor maior: a qualidade da vida humana. 247

A jurisprudência pátria não destoa deste entendimento que tem o princípio da

qualidade ambiental como orientador dos demais princípios da ordem econômica, e, para

corroborar tal afirmativa colaciona-se:

Na forma preconizada pelo art. 225 da Constituição Federal, é assegurado a todos os brasileiros o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, considerado o meio ambiente como bem de uso comum. Ao Judiciário incumbe, como a todos em geral, o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Nesse panorama, fortalecendo-se a consciência, dia a dia mais presente, de que a proteção ao meio ambiente deve sobrepor-se aos interesses econômicos meramente particulares, há que se respaldar decisum que, objetivando a preservação da natureza em todos os elementos essenciais à vida humana e à asseguração de um perfeito equilíbrio ecológico, reprimem a impetuosidade predatória das ações civilizadas que, albergadas em pseudo exigências do desenvolvimento, devastam as florestas,

244 DERANI, Cristiane. A estrutura do Sistema Nacional de unidades de conservação – lei nº 9.985/2000. p.243. 245 Cf. SANTOS, Gustavo Ferreira. Direito de propriedade e direito a um ambiente ecologicamente equilibrado: colisão de direitos fundamentais? p.20. 246 Cf. CYRILLO, Rose Meire. A função socioambiental da propriedade e o novo código Civil. In: Boletim Científico – Escola Superior do Ministério Público da União. Brasília: ESMPU, Ano II, n. 09. Outubro/dezembro de 2003.p.184. Disponível em: http://www.esmpu.gov.br . Acesso em: 01/10/2004. 247 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.p.822.

Page 65: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

65

exaurem o solo, eliminam a fauna, empobrecem a flora, poluem as águas e o ar, furtando dos que aqui habitam o mínimo de qualidade de vida.248

Colhe-se, em semelhante manifestação do Tribunal de Justiça do Paraná, o

entendimento de que o respeito ao meio ambiente não implica, necessariamente, desrespeito

ao direito da propriedade:

Considerando-se a função social da propriedade privada, o respeito às normas erigidas para a defesa do meio ambiente não fere o direito de propriedade - o instrumento de que se vale o poder público para alcançar o bem comum é o direito, e a proteção só é possível com a relativa limitação da propriedade particular, conciliando o direito real e absoluto de livremente usar e gozar, com o de proteção do meio ambiente e à sadia qualidade de vida. 249

Esclarece-se que não há a pretensão de afirmar que existe hierarquia entre os

princípios constitucionais de garantia da propriedade privada e de proteção ambiental, ao

contrário, os mesmos devem se harmonizar e se compatibilizar, pois ordem econômica e meio

ambiente estão interligados.

Esta compatibilização entre os Princípios da ordem econômica é assim citada

por Fernanda Cavedom:

(...) Livre iniciativa, Propriedade Privada dotada de função social, e Meio Ambiente foram consagrados como Princípios Jurídicos Constitucionais, hierarquicamente iguais, ou seja, as necessidades do mercado, o desenvolvimento econômico, a apropriação privada de bens, não podem se sobrepor à defesa do Meio Ambiente. Devem, sim, ser compatibilizados através da construção de um novo modelo de desenvolvimento ecológico-econômico-social, transpondo-se o modelo liberal de máxima expressão da liberdade econômica insuscetível de limitações. 250

Neste sentido também expõe Antônio Carlos Brasil Pinto:

O princípio da propriedade privada, quando invocado por legitimo e constitucional, somente o será na medida em que os usos daí derivados apresentarem conformação com os demais princípios da ordem econômica e social, nomeadamente aquele pertinente à sua função social. A tarefa, árdua, aliás, que se apresenta ao interprete é justamente aquela pertinente à compatibilização dos aludidos princípios enunciados no art.170 da Constituição Federal de 1988, haja vista o cumprimento do princípio da democracia econômica e social, especialmente considerando não haver, na hipótese, princípio hierarquicamente prevalente. De fato, todos os princípio da ordem econômica situam-se no mesmo nível, em idêntico pé de igualdade, embora possam parecer antagônicos, a exemplo da livre iniciativa, em relação à defesa do meio ambiente.251

248 SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Ação Civil Pública. Agravo de Instrumento n.10.088 de Criciúma. Relator Des. Trindade dos Santos. Decisão em: 28/05/1996. Disponível em: http://www.tj.sc.gov.br, acesso em: 07/10/2004. 249 PARANÁ. Tribunal de Justiça do Paraná. Ação Civil Pública. Apelação Civil n. 118.454-5, de Nova Esperança. Relator: Des. Hirosê Zeni. Decisão em: 29/05/2002. Disponível em: http://www.tj.pr.gov.br, acesso em: 07/10/2004. 250 CAVEDON, Fernada de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. p.98. 251 PINTO, Antônio Carlos Brasil. Turismo e meio ambiente: Aspectos Jurídicos. Campinas: Papirus, 1998.

Page 66: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

66

Assim, a proteção ambiental sem ser hierarquicamente superior aos demais

princípios constitucionais, uma vez que inserida no próprio direito à vida, norteia a

interpretação dos princípios da ordem econômica e também integra o conceito de função

social da propriedade, conforme já salientado anteriormente e demonstrado por Luís Roberto

Gomes, nos seguintes termos:

Considerando que referidos princípios devem ser interpretados harmonicamente, com o escopo de sempre atingir a máxima efetividade dos valores constitucionais, depreende-se que a proteção ambiental, porque intimamente ligada ao direito fundamental da vida, que daquela depende, tem importância decisiva na hermenêutica e integração do texto constitucional, e deve preponderar no conceito de função social da propriedade, integrando indefectivelmente.252

Todavia, a sociedade ainda não atingiu um grau de amadurecimento suficiente

para entender e compreender que não há direito de propriedade se esta contraria as normas de

preservação ambiental, sendo assim, há a necessidade de que sejam os princípios da ordem

econômica (artigo 170 da Constituição Federal) respeitados e compatibilizados, através de um

modelo de desenvolvimento que alberga proteção ambiental e desenvolvimento econômico,

uma vez que “inexiste proteção constitucio nal à ordem econômica que sacrifique o meio

ambiente” 253, sendo a coletividade e o Poder Público responsáveis pela implementação deste

modelo de desenvolvimento, conforme citação que abaixo se colaciona:

Se a legislação, constitucional e infra-constitucional, disciplina e limita a propriedade à satisfação de fins sócio ambientais, numa crescente configuração de uma teoria das limitações, necessário que a Coletividade co-responsabilize-se pela implementação e consolidação dos institutos jurídicos-políticos já existentes, estimulando uma ordem cidadã, onde os direitos e garantias transindividuais, dos quais o direito ambiental faz parte, (re)concilie propriedade, desenvolvimento e conservação de recursos naturais. 254

Assim, preservação ambiental e desenvolvimento econômico, mais

especificadamente o direito a propriedade privada, são princípios da ordem econômica e,

portanto, necessários para assegurar existência e vida digna255, ou seja, qualidade de vida, eis

p.67. 252 GOMES, Luís Roberto. O Princípio da Função Social da Propriedade e a exigência Constitucional de Proteção Ambiental. Revista de Direito Ambiental. n. 17, ano 05. São Paulo: Revista dos Tribunais, janeiro-março 2000.p.175. 253 GRAU, Eros Roberto. Proteção do Meio ambiente (Caso do Parque do Povo). São Paulo: Revista dos Tribunais. Abril/1984.251. Apud DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.238. 254 FERREIRA, Fábio Félix. Limites ao direito de propriedade: possibilidades de conservação dos recursos naturais. Disponível em: http://www.datavenia.net/artigos/1999/ferreira.html. Acesso em: 23/03/2004. 255 Art. 170. A ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes

Page 67: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

67 que não “não é possível conceber, tanto na realização d as normas de direito econômico como

nas normas de direito ambiental, qualquer rompimento desta globalidade que compõe a

expressão “ qualidade de vida”.256

A declaração da ONU já previa ser indissociáveis o desenvolvimento

econômico e a proteção ambiental, ao dispor:

Art. 1º - 1. O direito ao desenvolvimento é um inalienável direito humano, em virtude do qual toda pessoa humana e todos os povos têm reconhecido o seu direito de participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar; e no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados. 2. O direito humano ao desenvolvimento também implica a plena realização do direito dos povos à autodeterminação, que inclui o exercício de seu direito inalienável de soberania plena sobre todas as suas riquezas e recursos naturais.257

Desta forma, o desenvolvimento econômico e social, capaz de assegurar vida

digna a todos os cidadãos, da presente e futuras gerações, se realizará em justaposição com o

princípio da defesa do meio ambiente, através de uma política de uso sustentável dos recursos

naturais.258

Assim, entende-se que a compatibilização a ambos os direitos será alcançada

através de “mecanismos de equilíbrio”, fala -se em equilíbrio, pois se procura alcançar a

justiça social e conservação dos recursos naturais.

Pode-se observar que a proteção do meio ambiente e a promoção do desenvolvimento têm sido consideradas desafios interligados. Essa relação é necessária porque o desenvolvimento não se pode manter se a base de recursos que o sustenta deteriorar-se. Para a manutenção desse equilíbrio é preciso que o crescimento econômico leve em conta as conseqüências advindas da destruição do meio ambiente e do dano ao equilíbrio ecológico. 259

Estes mecanismos consistem na adoção de um modelo de desenvolvimento

sustentável e no alcance de um Estado Ambiental de Direito, os quais poderão ser atingidos

com o efetivo exercício e aplicação dos princípios ambientais (já descritos no 1º capítulo),

pois estes, além de garantir o cumprimento da função socioambiental da propriedade, se

voltam à preservação da vida humana:

Os princípios constitucionais de proteção ambiental constituem as estruturas nucleares, os verdadeiros pilares da função social da propriedade, que se irradiam

princípios:(...). Artigo 170 da Constituição Federal de 1988. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.112. 256 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.77. 257 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e legislação aplicável. p.35. 258 Cf. DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.238. 259 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.24.

Page 68: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

68

sobre ela e a fundamentam, compondo-lhe o espírito e servindo-lhe de critério para a sua exata compreensão e inteligência. Tal se opera em razão de definirem a lógica e a racionalidade do sistema normativo voltadas para a preservação da vida humana.260

Estes princípios serão efetivados e implementados através da mudança

paradigmática, a qual pressupõe a tomada de consciência dos valores ambientais e da crise

ecológica vivenciada através da educação ambiental.

3.2 CONSTRUÇÃO DE UM ESTADO DE DIREITO DO AMBIENTE

3.2.1 Crise Ambiental

Diante do quadro da crise ambiental vivenciada, caracterizada pela “escassez

de recursos naturais e as diversas catástrofes em nível planetário, surgidas a partir das ações

degradadoras do ser humano” 261, busca-se a construção de um novo Estado que seja marcado

pela participação e solidariedade de toda a sociedade para com as questões ambientais.

Antônio Herman Benjamin, assim dispõe sobre crise ambiental:

A crise ambiental – o sítio ao planeta Terra -, que hoje ocupa a agenda dos políticos, dos economistas, dos juristas, dos meios de comunicação e principalmente da opinião pública, é fruto da revolução industrial, revolução esta que surgiu com a promessa de unidade universal, de paz e de bem estar para todos, sem se preocupar, contudo, com os seus efeitos no meio ambiente. De um lado, apesar de inegável crescimento econômico (desigual) e do progresso tecnológico que trouxe, não cumpriu aquilo que prometeu; do outro, nos deixou um débito ambiental que dificilmente conseguiremos resgatar.262

Portanto, a crise ambiental é marcada pela atitude da sociedade que concebe

ser a atividade econômica inconciliável com a preservação do meio ambiente263.

Mediante a tomada de consciência desta crise, a sociedade procura reformular

as diretrizes estatais patrocinando uma economia baseada na racionalidade de uso dos

recursos ambientais.264

260 CYRILLO, Rose Meire. A função socioambiental da propriedade e o novo código Civil..p.184. 261 LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. rev.atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p.21. 262 BENJAMIN, Antônio Herman V. A Proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: O caso da América Latina. p.83/84. 263 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.23. 264 A consciência ecológica, em seu nível mais profundo, é o reconhecimento intuitivo da unicidade da vida, da interdependência de suas múltiplas manifestações e de seus ciclos de mudança e transformação. In: CAPRA, Fritjof. Sabedoria Incomum: Conversas com pessoas notáveis. Trad. Carlos Afonso Malferrari. São Paulo: Cultrix, 1998.p.89.

Page 69: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

69

Fala-se sociedade, pois esta tem a função de repartir com o Estado as

responsabilidades para com a proteção ambiental. Roxana Cardoso Brasileiro Borges elucida

que esta é em verdade a função ambiental, eis que consistente no dever do Poder público e

dos indivíduos de cuidarem do meio ambiente.265

Desta forma, diante do quadro de incertezas vivenciadas, que tanto os sistemas

capitalista como o socialista geraram e não souberam solucionar, mediante crescimento e

desenvolvimento econômico alicerçados sobre o acúmulo de capital e produção de riquezas

atingidos pelo uso agressivo e ilimitado aos recursos naturais, necessita-se da aplicação de um

modelo de Estado que faça uso de uma espécie de desenvolvimento que leve em consideração

presentes e futuras gerações, bem como uma política que tenha por sustentáculos a

preservação do ambiente.266

Sabe-se que o princípio norteador da busca pela qualidade ambiental é o

Princípio do Meio Ambiente Ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa

humana, todavia, este se concretiza mediante o concurso e efetivação dos demais princípios

ambientais, os quais já foram identificados no primeiro capítulo.

Estes princípios, se realmente concretizados, em especial o da função

socioambiental da propriedade, serão os responsáveis pela construção do Estado de Direito do

Ambiente, eis que serão implementados através de uma cidadania participativa e solidária,

conforme citação abaixo colacionada:

A emancipação ética dos indivíduos na sociedade pós-moderna; a formulação de uma sociedade pluralista, democrática e participativa no discurso jurídico; a própria função do Direito Ambiental, enquanto técnica de libertação; a estrutura normativa das normas ambientais; a consciência e a educação por uma ecologia que seja interdisciplinar e multidisciplinar e a elaboração de um estatuto autônomo do ambiente são instrumentos necessários para se alcançar o estado do bem-estar social.267

Estes instrumentos são necessários, pois as discussões em torno da ocupação e

ordenamento dos espaços referem-se ao uso da propriedade e também alteração dos valores

éticos vigentes, uma vez que o alcance da finalidade do Estado - desenvolvimento - não mais

admite o descompasso entre crescimento econômico com preservação e recuperação dos

recursos naturais, o qual se dará, por exemplo, mediante a penalização de práticas agrárias

265 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.25. 266 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.22/25. 267 MENEZES, Paulo Roberto Brasil Teles de. O direito ambiental na era do risco: perspectivas de mudanças sob a ótica emancipatória. In: Revista de Direito Ambiental n. 32, ano 8. São Paulo: Revista dos Tribunais, outubro/dezembro de 2003.p.13.

Page 70: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

70 tradicionais como as queimadas e desmatamentos, questionamentos sobre a estrutura

latifundiária propugnando-se pela reforma agrária como meio de se ordenar a ocupação

territorial com zoneamento ambiental.268

3.2.2 Estado de Direito do Ambiente

As formas de Estado até então propostas e utilizadas (Estado Liberal e Social –

do sistema capitalista - e Estado Socialista) não se mostraram suficientes ao atendimento dos

fins ecológicos que tanto a coletividade anseia e precisa para que se garanta a vida das

presentes e futuras gerações.

Neste sentido, há a necessidade de que seja implantado o Estado de direito do

ambiente, pois pressupõe mais sociedade em detrimento do individual, não somente direitos

sociais, mas estes e aqueles de caráter difuso.

Deste modo, sua construção parece ser algo intangível, conforme salienta

Morato Leite ao citar o entendimento de utopia democrática defendida por Boaventura de

Souza Santos, pois esta requer uma nova forma de pensar a realidade e uma nova maneira de

exercer a cidadania, requer a transformação dos modos de produção, dos conhecimentos

científicos, das formas de sociabilidade, pressupondo uma nova relação paradigmática com a

natureza.269

O Estado de Direito do Ambiente é possível na medida em que cada vez mais

presentes os valores inerentes ao Estado Democrático e, ainda, a importância dada às questões

ambientais.270

Morato Leite defende que “um paradigma de desenvolvimento duradouro,

fundado em eqüidade intergeracional e em uma visão radical menos antropocentrista271,

parece melhor condizente para a construção do Estado de direito do ambiente”. 272

268 Cf. CARVALHO, Carlos Gomes de. Direito Ambiental: Perspectivas no mundo contemporâneo. In: Revista de Direito Ambiental n. 19, ano 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, julho/setembro 2000.p.207. 269 Cf. SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade. Afrontamento, Porto, 1994.p.42. Apud LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. p.14. 270 Cf. LEITE, José Rubens Morato. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.27/29. 271 Por visão menos antropocentrista pode-se entender aquela que procura não somente ver o homem como sujeito de direitos, busca o reconhecimento de ser o ser humano parte integrante da natureza, com a qual não deve competir. Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.20/21. 272 LEITE, José Rubens Morato. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.29.

Page 71: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

71

Esta mudança paradigmática como pressuposto da manutenção e existência

sustentável dos recursos naturais para as futuras gerações é defendido por Fritjof Capra, que

assim dispõe:

Há soluções para os principais problemas de nosso tempo, algumas delas até mesmo simples. Mas requerem uma mudança radical em nossas percepções, no nosso pensamento e nos nossos valores. E, de fato, estamos agora no princípio desta mudança fundamental de visão do mundo na ciência e na sociedade, uma mudança de paradigma tão radical como foi a revolução copernicana. Porém, essa compreensão ainda não despontou entre a maioria dos nossos líderes políticos. O reconhecimento de que é necessária uma profunda mudança de percepção e de pensamento para garantir a nossa sobrevivência ainda não atingiu a maioria dos líderes das nossas corporações, nem os administradores e os professores das nossas universidades.273

A mudança paradigmática, que se opõe àquele antigo paradigma fundado na

competição pela existência e pelo crescimento econômico baseado no progresso material

obtido pela exploração ilimitada dos recursos ambientais e de tecnologias, consiste em uma

visão de mundo holística, também denominada visão ecológica, que tem por valores a Terra e

a vida.274

Para que implementado este modelo de Estado pressupõe mudanças na

estrutura da sociedade, na medida em que requer um modelo de cidadania mais responsável e

solidária com os destinos da coletividade.

Nestes termos esclarece Morato Leite:

A consecução do Estado de Direito Ambiental passa obrigatoriamente pela tomada de consciência global da crise ambiental e exige uma cidadania participativa, que compreende uma ação conjunta do Estado e da coletividade na proteção ambiental. Trata-se efetivamente de uma responsabilidade solidária e participativa, unindo de forma indissociável, Estado e cidadãos, na preservação do meio ambiente.275

Para que a cidadania seja exercida, portanto, requer-se, além da configuração

de um Estado Ambiental, a existência dos valores do Estado Social e do regime Democrático,

uma vez que esta nova cidadania ecológica que emerge busca exercer seus direitos e deveres

para o alcance de mais qualidade de vida, portanto, incluindo-se ambiente saudável e

garantidor do direito fundamental à vida, e não apenas uma cidadania em busca de emprego e

bem-estar.276

273 CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida: Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. (Trad.) Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 1996.p.23/24. 274 Cf. CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida: Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. p.25/29. 275 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.22/25. 276 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.27.

Page 72: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

72

Morato Leite aponta a necessidades dos valores do estado social nesta nova

ordem que deve emergir:

(...) mudanças exigem tarefas fundamentais do Estado na proteção ambiental e uma política intercomunitária, significando que as transformações não abandonam por completo o Estado Social, mas trazem um perfil modificado a este. Lembre-se que os valores ambientais exigem do Estado e da Coletividade preservar o que ainda existe e recuperar o que deixou de existir, consubstanciando em ação, modificada de outros direitos sociais, que tratem de realizar o que não existe, tais como serviço de saúde, habitação. Desta forma, em sua dimensão social, cabe ao Estado de Direito do Ambiente, indiscutivelmente, entre outras funções, proteger e defender o meio ambiente, promover educação ambiental, criar espaços de proteção ambiental, executar o planejamento ambiental.277

Rogério Portanova também compartilha deste entendimento ao dispor que esta

cidadania ecológica tem em seu bojo incluídas as cidadanias civil, política e social, além

daquelas exigidas para a satisfação dos novos direitos (meio ambiente equilibrado,

consumidor) e, por conseqüência, ensejadoras da qualidade ambiental e asseguradora de boas

condições de vida.278

Esta nova cidadania, aliada a soberania e a dignidade da pessoa humana, está

diretamente ligada à efetivação do Princípio Democrático, na medida em que os cidadãos

estarão efetivamente engajados nos processos de tomada de decisões, ou seja, o exercício do

poder estará sendo compartilhado entre todos os cidadãos, constituindo-se, portanto, em uma

cidadania participativa.279

Para que se alcance o Estado de Direito Ambiental, o disposto no artigo 225 da

Constituição há de ser efetivamente aplicado, ou seja, as ações de proteção ambiental devem

ser exercidas pelo Estado e por toda a coletividade de forma conjugada, que nada mais é que a

gestão participativa no Estado através de uma democracia ambiental, realizada pelos mais

diversos segmentos sociais (associações, ONGs, grupos de cidadãos).280

Cristiane Derani reconhece a importância do disposto constitucional que prevê

a participação de todos, sociedade civil e Poder Público, na defesa do Meio Ambiente:

É esta Constituição extremamente inovadora porque traz ao direito o prudente equilíbrio. Rechaça o liberalismo puro e recusa o simplismo de uma centralização no Estado de decisões e programas de ação. O que há de mais vibrante neste texto é o reconhecimento da indissolubilidade do Estado e Sociedade Civil. Todo Problema de

277 LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.33/34. 278 Cf. PORTANOVA, Rogério. Exigências para uma cidadania ecológica. Alter agora. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, n. 2, nov.1994. p. 85. Apud. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.28. 279 Cf. OLIVEIRA, Flávia de Paiva Medeiros de. GUIMARÃES, Flávio Romero. Direito, Meio Ambiente e Cidadania. São Paulo: Madras, 2004. p.87/89. 280 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.34/35.

Page 73: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

73

política econômica, social e ambiental só pode ser trabalhado quando reconhecida esta unidade e garantidos os instrumentos de atuação conjunta.281

Salienta-se, desta forma, que esta cooperação entre sociedade e poder público

na preservação ambiental é possível de se concretizar, pois a própria Constituição esclareceu

que o meio ambiente é “bem de uso comum do povo”, de onde se depreende que estes bens

não são públicos e nem privados, são de interesse público282, ou seja, são bens que não podem

ser de apropriação privada, mesmo quando pertençam a particulares, pois o proprietário,

pessoa pública ou particular, não pode dispor como quiser da qualidade ambiental, eis que

esta é de interesse de toda a coletividade.283

Do contrário, seu uso poderia ser autoritário e ilimitado, executado tanto pelo

poder público quanto pelo proprietário privado284, pois não haveria a finalidade de se buscar a

proteção ambiental quando, por certo, os interesses do proprietário iriam prevalecer.

A construção deste Estado de Direito do Ambiente, nos termos já delineados,

importa na efetivação dos princípios ambientais e também nos princípios democráticos, pois

“o Estado de Ambiente é um Estado democrático do Ambiente, quando a política do ambiente

tem um suporte social generalizado e é dinamizado por iniciativas do cidadão” 285, na medida

em que a participação da coletividade seja disseminada.

Destaca-se a importância dos princípios, pois estes são a estrutura de uma

coerente política ambiental que visa uma melhor orientação ao direito ambiental286, os quais

servem para “balizar a a tuação do Estado e as exigências da sociedade em relação à tutela do

ambiente, dão ao sistema jurídico um sentido harmônico, lógico, racional e coerente” 287.

Referidos princípios serão viabilizados concretizados quando se der relevância

à Educação Ambiental288, pois esta é a responsável pela conscientização dos cidadãos para a

problemática ambiental, e, portanto, uma forma de atuação que visa à preservação do meio

281 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.226. 282 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.36. 283 Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.56. 284 Cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.36. 285 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Público do Ambiente. Coimbra: Faculdade de Direito de Coimbra, 1995.p.33. Apud LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.41. 286 Cf. DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.155. 287 LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.43. 288 A Constituição Federal estabelece, no artigo 225, § 1º, VI, a promoção da educação ambiental e da conscientização pública para a preservação do meio ambiente. In: BRASIL. Constituição Federal - Coletânea de legislação de Direito Ambiental. MEDAUAR, Odete. (ORG).p.134.

Page 74: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

74 ambiente289, sendo esta atuação indispensável, visto ser interesse difuso garantidor da

existência e manutenção da vida humana.

Destaca-se que esta conscientização não está direcionada apenas ao cidadão

comum, ela deverá atingir a todos os membros da sociedade, incluindo-se os Magistrados, os

Representantes do Ministério Público, os Representantes dos poderes executivo e legislativo.

Pessoas que, por obrigação, devem, inserir os princípios ambientais na realização de ações ou

na resolução dos conflitos, para que sejam atendidos os interesses da sociedade em gozar de

um meio ambiente equilibrado, pois do contrário, estarão admitindo que os “princípios

constitucionais se tornem parte de um discurso retórico-ornamental” 290, ou seja, estão

previstos mas são efetivados.

A adoção de uma política de Educação Ambiental aplicada verdadeiramente

produzirá uma coletividade mais consciente, a qual fará uso dos mecanismos postos a sua

disposição na busca de um ambiente preservado e garantidor da qualidade de vida.

Este processo de educação na formação de uma consciência pública para a

necessidade de preservação do meio ambiente já estava previsto pela Lei 6.938/81 (Política

Nacional do Meio Ambiente) como um dos objetivos a serem alcançados.

A Constituição Federal em seu artigo 225, §1º, VI foi mais além ao incumbir

ao Poder Público o dever de promover a educação ambiental e a conscientização ecológica,

sendo que a Lei 9.795/1999 dispôs sobre Educação Ambiental instituindo a Política Nacional

de Educação Ambiental.

Paulo Bessa Antunes, ao tratar da educação ambiental e da lei 9.795/1999 que

a regulamentou, assim estabelece:

É uma ferramenta absolutamente imprescindível para a objetivação do princípio democrático. Com efeito, a participação em audiências públicas, o exame dos relatórios de impacto ambiental e todos os outros atos que decorrem do princípio democrático somente podem ser considerados de acordo com a sua finalidade se as populações interessadas tiverem a necessária informação ambiental, que é o produto final do processo de educação ambiental.291

A participação social ocorrerá, então, após um processo de conscientização,

que acontecerá através da publicidade dada aos Estudos de Impacto Ambiental e

licenciamentos ambientais, pois proporcionará o engajamento da população nas decisões

289 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.175. 290 AZEVEDO, Plauto Faraco de. Do Direito Ambiental – Reflexões sobre seu sentido e aplicação. In: Revista de Direito Ambiental n. 19, ano 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, julho/setembro 2000.p.63. 291 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. p.176.

Page 75: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

75 executivas para autorizar ou não o licenciamento de determinado empreendimento, haja vista

poder ser potencialmente degradante.292

A participação também ocorrerá através da iniciativa popular e mediante

instrumentos judiciais como ação popular, ação civil pública, Mandado de Segurança

Coletivo.

Esta atuação de todos os cidadãos pela preservação ambiental se dará, portanto,

mediante informação e educação, que ensejarão a ampla participação social em todos os

poderes (executivo, legislativo e judiciário), ou seja, nas decisões ambientais e na definição

das diretrizes políticas e ambientais através dos mecanismos já conhecidos como a ação

popular, ação civil pública, audiências públicas, iniciativa popular, consultas públicas.

3.3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Desenvolvimento sustentável é um novo modelo de desenvolvimento que visa

conciliar preservação ambiental e desenvolvimento econômico, tendo por fim a garantia de

condições de vida mais digna e humana para uma infinidade de pessoas.

O modelo de desenvolvimento denominado sustentável foi proposto pelo

relatório Brundtland293, produzido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, que salientou que o modelo de desenvolvimento econômico comumente

realizado propicia um número cada vez maior de pessoas pobres e vulneráveis, além de

causarem danos ao meio ambiente.294

O termo Desenvolvimento Sustentável criado pela Comissão, aliando

tendências ao desenvolvimento com a proteção ao Meio Ambiente, foi oficializado com a

“Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” a qual ocorreu na

cidade do Rio de Janeiro em 1992.

Nesta Conferência muitos documentos foram elaborados, sendo a Agenda 21 o

mais importante. Referido documento nasceu desta necessidade de se concretizar o

292 Cf. OLIVEIRA, Flávia de Paiva Medeiros de. GUIMARÃES, Flávio Romero. Direito, Meio Ambiente e Cidadania: uma abordagem interdisciplinar. p.106 e 111. 293 Relatório “Nosso Futuro Comum”, estabelecido pela Comissã o Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidido pela Primeira-Ministra da Noruega, Gro Harlen Brundtland, publicado em 1987.In: BRASIL. Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e desenvolvimento: Relatório da Delegação Brasileira. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão; Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, 1993.p.13. 294 Cf. SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e. Direito Ambiental Internacional. Rio de Janeiro: Thex Editora: Biblioteca Estácio de Sá, 1995.p.46.

Page 76: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

76 compromisso político dos Estados em harmonizar desenvolvimento econômico e proteção

ambiental, compromisso este que requereu “um documento programático a ser implementado

pelos Governos, pelas agências de desenvolvimento, pelas Organizações das nações Unidas e

por grupos setoriais independentes” .295

A agenda 21 é um programa de ação baseado em um documento com 40

capítulos, que quando constituído tinha por finalidade preparar o mundo para os desafios do

novo século (Século XXI).296 É uma tentativa de promover, em escala planetária, um novo

padrão de desenvolvimento, conciliando métodos de proteção ambiental, justiça social e

eficiência econômica. Trata-se de um documento consensual para o qual contribuíram

governos e instituições da sociedade civil de 179 países.297

A finalidade da agenda 21 é o de traduzir em verdadeiras ações o conceito de

desenvolvimento sustentável298, seu documento prevê compromissos para a mudança do

padrão de desenvolvimento para este século, sendo, portanto, uma agenda de

desenvolvimento, ou seja, não é restrito às questões ligadas a preservação da natureza,

procura assim, romper com o desenvolvimento ligado apenas ao crescimento econômico,

buscando, portanto, o desenvolvimento sustentável.

Desta forma, a Agenda 21 estabelece uma base sólida para a promoção do

desenvolvimento sustentável em matéria de progresso social, econômico e ambiental, sendo

suas recomendações divididas em dimensões sociais econômicas, conservação e gestão dos

recursos para o desenvolvimento, fortalecimento do papel de grupos principais, como

mulheres, crianças e jovens.

O novo tipo de desenvolvimento proposto é, então, aquele capaz de manter o

progresso humano não apenas em alguns lugares em alguns anos, mas em todo o planeta.299

O presente modelo de desenvolvimento propugna a adoção de diversos

princípios para uma vida sustentável, são eles: Respeitar e cuidar das comunidades dos seres

vivos; melhorar a qualidade de vida; conservar a diversidade do planeta através da

conservação dos processos ecológicos, da biodiversidade e do uso sustentável dos recursos

renováveis; alteração de valores (paradigma econômico para o ecológico); Gerar uma

295 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p. 934. 296 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.67 297 BRASIL. Ministério do Meio Ambiente - O que é Agenda 21? Disponível em: http://www.mma.gov.br, Acesso em: 23/04/04. 298 Cf. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente - O que é Agenda 21?Disponível em: http://www.mma.gov.br, Acesso em: 23/04/04. 299 Cf. SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Direito Ambiental Internacional. p. 46

Page 77: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

77 estrutura nacional de integração do desenvolvimento e conservação dos recursos.300

No Brasil o desenvolvimento sustentável está preconizado no art. 225 da

Constituição Federal de 1988, todavia a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei

6.938/1981) já o previa, pois tratou como um dos seus objetivos a compatibilização do

desenvolvimento econômico e social com a preservação do meio ambiente e do equilíbrio

ecológico necessário a assegurar qualidade de vida.301

Relacionando este modelo de desenvolvimento a problemática enfrentada, ou

seja, harmonização do direito à propriedade com a preservação ambiental, pode-se afirmar

que é o modelo que além de estar inserido no artigo 225 da Constituição Federal, ao prever a

preservação ambiental com garantia de vida para as presentes e futuras gerações –

sustentabilidade ambiental - está previsto, também, nos dispositivos referentes à ordem

econômica, pois preservação ambiental e propriedade fazem parte de seus princípios

informadores (art. 170), e, portanto, devem conviver harmonicamente através do atendimento,

do também princípio da ordem econômica, da função social da propriedade.

Plauto Faraco de Azevedo ao apresentar os dispositivos constitucionais

referentes à preservação ambiental, propriedade e função social, assim dispõe sobre a

sustentabilidade ambiental:

Como se percebe destes dispositivos, os princípios ou valores fundamentais que consagram são correlativos, isto é, constituem uma estrutura cujas partes são indissociáveis: não pode haver promoção do bem de todos ou da justiça social sem o respeito da dignidade da pessoa humana, o que, à sua vez, não se dá sem reconhecimento da função social da propriedade e sem que a utilização dos recursos do ambiente seja sustentável. A agressão egoística ou irresponsável deste, beneficiando apenas os predadores incapazes de antecipar o futuro, torna impossível cogitar da justiça social ou do bem comum, apontando para o “fim do futuro”. Os que assim procedem, sendo moralmente indignos, são mensageiros da morte, sem qualquer consideração com a vida das gerações futuras.302

O modelo de desenvolvimento sustentável é importante e deve ser aplicado, eis

que, para superar a miséria e a pobreza de milhões de brasileiros é necessário gerar riquezas,

todavia, esta não pode ser feita sobre bases de crescimento a qualquer preço.

Os modelos de desenvolvimento que não levam em consideração a questão

ambiental são impulsionados para que através de tecnologias se possa substituir o que a

natureza oferece.

300 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. p.54/56. 301 Cf. SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. p.7. 302 AZEVEDO, Plauto Faraco de. Do Direito Ambiental – Reflexões sobre seu sentido e aplicação. p.62.

Page 78: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

78

Neste sentido são modelos de desenvolvimento fundados no paradigma

tecnológico e de crescimento, pois ao invés de investir na prevenção procura “remediar” os

danos.

É preciso crescer, todavia de maneira planejada e sustentável, sendo, então,

finalidade deste modelo de desenvolvimento assegurar a compatibilização do

desenvolvimento econômico-social com a proteção da qualidade ambiental.

Sem esta compatibilização não há como se falar em progresso, pois este se

concretiza quando realizados de forma harmônica os princípios da ordem econômica, os quais

ocorrem em função de esforços de todos os homens e não a custa do mundo natural, pondo-se

em risco o futuro da própria humanidade.303

Compatibilizar o meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto sociocultural, político, econômico e ecológico, dentro de uma dimensão tempo/espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não deve erigir-se em obstáculo ao desenvolvimento, mais sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão racional dos recursos naturais, os quais constituem sua base material.304

Quando proposto este modelo de desenvolvimento, partiu-se da premissa de

que é falso o dilema ou desenvolvimento ou meio ambiente, eis que devem harmonizar-se e

complementar-se305, conforme o disposto inclusive no artigo 170 da Constituição Federal.

É falso, pois desenvolvimento não se confunde com crescimento, sendo nesta

ordem defendido por Eros Roberto Grau:

Importando a consumação de mudanças de ordem não apenas quantitativa, mas também qualitativa, não pode o desenvolvimento ser confundido com a idéia de crescimento. Este, meramente quantitativo, compreende uma parcela da noção de desenvolvimento, deixando de fora, evidentemente, qualquer preocupação com o meio ambiente. 306

Vislumbra-se, entretanto, que este novo modelo de desenvolvimento, para ser

realmente posto em prática, pressupõe, como já explanado, uma mudança do paradigma

econômico, ou seja, aquele que tem o fator econômico como sendo “crescimento”, para o

paradigma ecológico da sustentabilidade, pois entende o direito ambiental como possuidor de

303 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.52,2004. 304 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.51. 305 Cf. MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente.p.51. 306 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988 (interpretação e crítica). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. Apud PINTO, Antônio Carlos Brasil. Turismo e meio ambiente: Aspectos Jurídicos. p.68.

Page 79: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

79 natureza econômica, dirigido à preservação e sustentabilidade racional dos recursos

ambientais, com a finalidade de garantir qualidade de vida, uma vez que, nos termos já

salientados, fator econômico deve ser encarado como desenvolvimento e não crescimento já

que desenvolvimento pressupõe harmonia entre os diferentes elementos constitutivos da

ordem econômica. 307

Cristiane Derani após apresentar o conceito de desenvolvimento sustentável

trazido pelo Relatório “Nosso Futuro Comum” a sua vinculação com sustentabilidade

econômica e ecológica, apresentou que não é um modelo ideal, mas se implementado

contribuirá na preservação ambiental.

Desenvolvimento sustentável implica, então, no ideal de um desenvolvimento harmônico da economia e da ecologia que devem ser ajustados numa correlação de valores onde o máximo econômico reflita igualmente um máximo ecológico. Na tentativa de conciliar a limitação dos recursos naturais com o ilimitado crescimento econômico, são condicionadas à consecução do desenvolvimento sustentável mudanças no estado da técnica e na organização social.308

A preservação ambiental como principio da ordem econômica que é, deve ser

efetivado para que a coletividade consiga se desenvolver sustentavelmente, afastando-se, por

conseguinte a antiga concepção de antagonismo entre desenvolvimento econômico e proteção

ambiental, defendida pelo Brasil durante a Conferência de Estocolmo.

Este falso antagonismo é demonstrado por Antônio Herman Benjamin:

A primeira fratura desmontou o falso antagonismo defesa do meio ambiente e desenvolvimento, que caracterizou originalmente o movimento ambiental na década de 70 (...). Tal antagonismo mostrou-se, no decorrer nos anos 80, incorreto, já que as relações entre economia meio ambiente não têm, necessariamente, que ser conflitivas. (...) O segundo rompimento – diretamente relacionado com o primeiro – atuou sobre o binômio desenvolvimento econômico X crescimento econômico a qualquer custo. Este último parâmetro, como é notório, embora totalmente insensível à questão ambiental, balizou por séculos a evolução da humanidade. (...) Atualmente, já se fala em ecodesenvolvimento ou em desenvolvimento sustentado (sustentável), como síntese não apenas conveniente, mas necessária, entre meio ambiente e economia.309

Paulo de Bessa Antunes também esclarece a importância do princípio de

proteção ambiental para se alcançar um padrão sustentável de desenvolvimento afastando-se a

visão meramente econômica do acumulo de capital, o que por conseqüência afasta qualquer

possibilidade de antagonismo: 307 Cf. ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.19. 308 DERANI, Cristiane, Direito Ambiental Econômico. p,128. 309 BENJAMIN, Antônio Herman V. Dano Ambiental: Prevenção, Reparação e Repressão. São Paulo: RT, 1992. p.12 e 13. Apud FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. p.117.

Page 80: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

80

A efetivação do Princípio de proteção ao meio ambiente como princípio econômico implica, obrigatoriamente, a mudança de todo o padrão e do conceito de desenvolvimento econômico. É na busca de tais modificações que temos visto o surgimento de um imenso movimento de massas que se organiza em escala planetária na defesa do meio ambiente e da qualidade de vida.310

Para que posto em prática o desenvolvimento sustentável, propugnado

inclusive pela Constituição Federal, é necessário, assim como para a construção de um Estado

de Direito do Ambiente, estar a sociedade sob um regime político de democracia participativa

e solidária que garanta criatividade e gestão autônoma da sociedade311, além da

implementação e efetivação dos princípios ambientais.

Frisa-se que referida implementação não se dará através da edição de mais leis,

haja vista o aparato normativo já existente. Necessário sim, o reconhecimento destes

princípios por toda a coletividade, através da conscientização da problemática ecológica e

pela adoção de políticas econômicas e ambientais sustentáveis por parte do poder executivo,

e, ainda, a adoção dos princípios pelo judiciário, na resolução dos conflitos suscitados,

notadamente aqueles oriundos da exploração da propriedade privada.

Desta forma, pode-se afirmar que são princípios de ação ao alcance de um

desenvolvimento sustentável, a conscientização e mobilização da sociedade por meio da

educação ambiental, a melhoria do padrão de vida da população, integração de ações

governamentais e do setor privado na consecução de políticas sociais e ambientais.

Cristiane Derani, ao abordar o tema do desenvolvimento sustentável traduzido

pelo uso parcimonioso dos recursos naturais considera-o um idealismo pouco factível, pois a

sociedade confunde necessitar e querer, sendo desta forma, marcada pelo crescente

consumismo.312

Todavia, nos termos anteriormente expostos e defendidos por Cristiane Derani,

o desenvolvimento sustentável pode ser alcançado através de mudança de paradigma (do

consumismo para o necessário) e desde que tenha por base os princípios ambientais.

(...) a teoria do desenvolvimento sustentável como tradução do ideal de uso parcimonioso dos recursos naturais esgota-se num idealismo pouco factível. Entretanto, um trabalho de discussão política de prioridades, calcado em valores e princípios menos auto-destrutivo do homem com o homem e com a natureza. (...) O que existe é, dentro de uma mediação política comunicativa, a possibilidade de compor, atentando à inerente multidisciplinariedade, um conjunto complexo de fatores que resultariam, para uma determinada sociedade, o econômica-ambiental-

310 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental.p.16. 311 Cf. BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. p.25. 312 Cf. DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.135/154.

Page 81: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

81

socialmente equilibrado. 313

Desta forma, o desenvolvimento sustentável que na prática ainda não tem a

“aplicação significante e homogênea de desenvolvimento duradouro” 314, é o modelo que deve

ser aplicado, mas encontra óbice a sua existência no fato de a sociedade ainda viver com base

no antigo paradigma consumista, e, portanto, será viabilizado mediante mudanças de

comportamento no plano social e pessoal, além de transformações no modo de produção e

hábitos de consumo.

Verifica-se, assim, que muitas são as dificuldades e desafios na consecução

deste modelo de desenvolvimento que terá por fim a garantia da sustentabilidade ecológica,

ambiental, social, política, econômica, demográfica, cultural, institucional, espacial.315

Entretanto, mesmo diante das dificuldades de implementação é o modelo que

deve ser aplicado, pois é aquele que acaba por envolver as normas (regras e princípios)

previstas nos artigo 225 e 170 da Constituição, além de ser o modelo que se efetivado poderá

garantir o futuro das demais gerações.

313 DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. p.154. 314 LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. p.25. 315 Cf. NOVAES, Waschinton. (Coord).Agenda 21 Brasileira: Bases para discussão. Brasília: Ministério do Meio Ambiente / PNUD, 2000. p.40/41.

Page 82: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O meio ambiente ecologicamente equilibrado apresenta-se como um novo

direito, estatuído à categoria de Direito humano fundamental, sendo um dos direitos de

terceira geração, pois nada mais é do que um direito de solidariedade e fraternidade, eis que

toda a coletividade é responsável pela manutenção de uma vida saudável e pacífica, ou seja,

qualidade de vida.

Deste modo, ao se conceber o Bem ambiental como bem pertencente à todos e

indispensável à existência da vida, em todas as suas formas, é que diante de confrontos deste

com os direitos individuais (privados), aí, então, inclusos o direito à propriedade privada, há

que se prevalecer a defesa do meio ambiente, até porque o direito à propriedade só será

reconhecido se atendido a sua função sócio ambiental.

Todavia, esta afirmação não importa na não indenização, ou seja, há casos que

em virtude do esvaziamento econômico da propriedade, o proprietário deve ser ressarcido,

como por exemplo, no caso de possuidor e dono de área em que foi instituído um parque

nacional (unidade de conservação de proteção integral).

A proteção ambiental, ao inserir-se como princípio da garantia da manutenção

da vida humana prevalece sobre interesses econômicos meramente particulares sem ser um

princípio superior ao da propriedade, pois em verdade, estes devem estar compatibilizados

para a consecução de uma existência digna.

Deste modo, o exercício do direito à propriedade função social e ambiental

resguarda os interesses do proprietário (direito individual a explorar economicamente a

propriedade) e da coletividade (direito difuso de possuir um meio ambiente sadio e

equilibrado).

Assim, verificou-se que a propriedade somente é legitimada quando seu

exercício não atentar contra interesses sociais, como, por exemplo, não fazer uso de formas de

trabalhos degradantes, não desrespeitar normas de vizinhança e não atentar contra interesses

ambientais.

O proprietário deve, portanto, tanto manter produtiva a sua propriedade como

respeitar as regras de construção utilizando-se adequadamente dos recursos naturais

disponíveis e preservando, por conseqüência, o meio ambiente.

Page 83: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

83

A proteção ambiental incluída como um dos princípios da ordem econômica a

ser alcançado para se garantir a vida digna, ao lado do direito de propriedade que atenda a sua

função social, pretende dar início a um novo tipo de desenvolvimento, dito sustentável,

baseado na utilização válida da propriedade que utiliza racionalmente os recursos disponíveis,

na medida em que o proprietário toma consciência de que os recursos oferecidos pela natureza

são finitos.

A Constituição Federal ao dispor sobre a criação dos espaços territoriais

especialmente protegidos é considerada marco importante no ordenamento jurídico brasileiro,

na medida em que ao serem definidos e criados, dispõem sobre a maneira de serem os

recursos utilizados, exercendo papel fundamental na preservação do ambiente.

Todavia, como visto, necessário muito mais do que a criação de espaços

protegidos, a sociedade deve compreender que as normas de proteção ambiental, aí inclusas as

regras e os princípios, devem ser atendidas, pois, do contrário, o futuro da vida humana

restará seriamente prejudicado.

Desta forma, há que se buscar a configuração de um novo Estado, um Estado

de Direito do Ambiente, baseado em uma democracia ambiental que proclame a cidadania

participativa e solidária, que tenha por fundamento o uso racional dos recursos naturais e que

saiba conjugar crescimento econômico e preservação da natureza, constituindo-se, por certo,

no modelo válido de desenvolvimento, aquele que visa a sustentabilidade ambiental e

econômica.

Esta construção é difícil, mas será efetivada a partir da mudança do paradigma

econômico – tecnológico baseado no consumo sem fronteiras, para o paradigma ecológico

que tem por fim prevenção e preservação, que sabe distinguir o “querer” do “necessitar”, visto

que desenvolvimento sustentável é aquele que requer um consumo sustentável, ou seja, saber

usar os recursos naturais para satisfazer as necessidades sem comprometer as necessidades

das futuras gerações.

A mudança paradigmática ocorrerá pela conscientização da sociedade através

da educação ambiental, que fomentará a importância dos princípios ambientais na formulação

de políticas econômicas, sociais e ambientais e, por conseqüência, formará indivíduos

conscientes e preparados para enfrentarem a crise ecológica pela qual passa a humanidade.

Page 84: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

REFERÊNCIAS

ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 5. ed. rev, ampl e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2001.

ARRUDA, José Jobson de A. PILETTI, Nelson. Toda a História: História Geral e do Brasil. 6. ed, Ática, São Paulo: 1996.

AZEVEDO, Plauto Faraco de. Do Direito Ambiental – Reflexões sobre seu sentido e aplicação. In: Revista de Direito Ambiental. n. 19, ano 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, Julho-setembro de 2000.

BENJAMIN, Antônio Herman V. A proteção do meio ambiente nos países menos desenvolvidos: O caso da América Latina. In: Revista de Direito Ambiental. n. 0. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

______. Introdução à Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG). Direito Ambiental das áreas protegidas: O regime Jurídico das unidades de Conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.

_______. Introdução ao Direito Ambiental Brasileiro. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG). Manual Prático da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. 2. ed. São Paulo: IMESP, 1999.

______. Desapropriação, reserva legal e áreas de preservação permanente. Disponível em: http://www.buscalegis.ccj.ufsc.br, acesso em: 21/09/2004.

BIRNFIELD, Carlos André de Souza. Das Diretrizes Gerais de Proteção Ambiental à Limitação Administrativa Constitucional: Elementos de Reflexão sobre a Proteção Ambiental das Florestas Tropicais que não sejam de Propriedade Pública. In: LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000.

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. (Trad.) Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade Rural. São Paulo: LTr, 1999.

BOTREL, Karla. O Direito Urbanístico. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. Belo Horizonte: Forum, 2004.

Page 85: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

85 BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05.10.1988. 22. ed. atual.ampl. São Paulo: Saraiva, 1999.

______. Código Civil e Legislação Civil em vigor. Org. Theotônio Negrão e José Roberto Freire Gouvêa. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003.

______. Lei 10.257 de 10 de julho de 2001 – Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. Institui o Código Florestal. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e IV, da Constituição Federal, Institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. ______. Decreto 4.340 de 22 de agosto de 2002. Regulamenta os artigos da Lei 6.938, de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei 9.795 de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei 6.766 de 19 de dezembro de 1979. Dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

______. Lei 6.938 de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. In: BRASIL. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Org. Odete Medauar. 3. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

Page 86: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

86

______. Decreto 4.297 de 10 de julho de 2002. Regulamenta o art. 9º, inciso II, da Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, estabelecendo critérios para o Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil – ZEE, e dá outras providências. Senado Federal. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em 20.09.2004.

______. Código Brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. GRINOVER, Ada Pellegrini. (et al). 6. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.

_______. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n. 22164/SP. Brasília, 05 de maio de 1998.

_______. Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e desenvolvimento: Relatório da Delegação Brasileira. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão; Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, 1993.

_________. Ministério do Meio Ambiente - O que é Agenda 21? Disponível em: http://www.mma.gov.br, Acesso em: 23/04/04.

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 2000.

CARVALHO, Carlos Gomes. Direito Ambiental: Perspectivas no mundo contemporâneo. In: Revista De Direito Ambiental. nº 19, ano 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, julho/setembro de 2000.

CAPRA, Fritjof. A teia da Vida: Uma nova compreensão cientifica dos sistemas vivos. Trad. Newton Roberval Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 1996.

______. Sabedoria Incomum. Conversas com pessoas notáveis. Trad. Carlos Afonso Malferrari. São Paulo: Cultrix, 1988.

CAVEDON, Fernanda de Salles. Função Social e Ambiental da Propriedade. Florianópolis: Visualbooks, 2003.

CYRILLO, Rose Meire. A função socioambiental da propriedade e o novo Código Civil. In: Boletim Científico – Escola Superior do Ministério Público da União. Brasília: ESMPU, Ano II, nº 09. Out./dez.2003.p.184. Disponível em: http://www.esmpu.gov.br . Acesso em: 01/10/2004.

DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997.

Page 87: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

87 ______. A propriedade na Constituição de 1988 e o conteúdo da “Função Social”. In: Revista de Direito Ambiental. nº 27, ano 7. São Paulo: Revista dos Tribunais, julho/setembro de 2002.

______. A estrutura do Sistema Nacional de unidades de Conservação – Lei 9.985/2000. In: BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG) Direito Ambiental das áreas protegidas. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.

DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 17º ed. atual. de acordo com o novo Código Civil. São PAULO: Saraiva, 2002.

FERREIRA, Fábio Félix. Limites ao direito de propriedade: possibilidades de conservação dos recursos naturais. Disponível em: http://www.datavenia.net/artigos/1999/ferreira.html, acesso em: 23/03/2004.

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco, RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Ambiental e Legislação Aplicável. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Max Limonad, 1999.

GASSEN, Valcir. A natureza histórica da Instituição do Direito de propriedade. In WOLKMER, Antônio Carlos (ORG). Fundamentos de História do Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

GOMES, Luís Roberto. O princípio da Função social da propriedade e a exigência Constitucional de Proteção Ambiental. In: Revista De Direito Ambiental. n. 17, ano 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, janeiro/março de 2000.

LEITE, José Rubens Morato. Estado de Direito do Ambiente: Uma Difícil Tarefa. In LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000.

______. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

LEUZINGUER, Márcia Diegues. Criação dos Espaços Territoriais Especialmente Protegidos e Indenização. In: Revista de Direito Ambiental. n. 25, ano 7. São Paulo: Revista dos Tribunais, janeiro/março de 2002.

______. FIGUEREDO, Guilherme José Purvin de. Desapropriações Ambientais na Lei nº 9.985/200. In BENJAMIN, Antônio Herman V. (ORG). Direito Ambiental das áreas protegidas: O Regime Jurídico das Unidades de Conservação. Rio de janeiro: Forense Universitária, 2001.

Page 88: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

88 MACHADO, Paulo Affonso Leme.Direito Ambiental Brasileiro. 10. ed. rev, ampl e atual. São Paulo: Malheiros, 2002.

MAZZILI, Hugo de Nigro. A defesa dos interesses difusos em Juízo. 2. ed. rev, ampl e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

MENEZES, Paulo Roberto Brasil Teles de. O direito ambiental na era de risco: perspectivas de mudanças sob a ótica emancipatória. In: Revista de Direito Ambiental. n. 32, ano 8. São Paulo: Revista dos Tribunais, out./dez. de 2003.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Direito Ambiental: O Princípio da Precaução e sua Aplicação Judicial. In LEITE, José Rubens Morato (ORG). Inovações em Direito Ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

MUKAI, Toshio. O Estatuto da Cidade, o Plano Diretor e o Desenvolvimento Urbano. In MUKAI, Toshio. Temas Atuais de Direito Urbanístico e Ambiental. Belo Horizonte: Forum, 2004.

OLIVEIRA, Flávia de Paiva Medeiros de. GUIMARÃES, Flávio Romero. Direito, Meio Ambiente e Cidadania. São Paulo: Madras, 2004.

PARANÁ. Tribunal de Justiça do Paraná. Ação Civil Pública. Apelação Civil nº 118.454-5, de Nova Esperança. Relator: Des. Hirosê Zeni. Decisão em: 29/05/2002. Disponível em: http://www.tj.pr.gov.br, acesso em: 07/10/2004.

PINTO, Antônio Carlos Brasil. Turismo e meio ambiente: Aspectos Jurídicos. Campinas: Papirus, 1998.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Ação Civil Pública. Agravo de Instrumento n.10.088 de Criciúma. Relator Des. Trindade dos Santos. Decisão em: 28/05/1996. Disponível em: http://www.tj.sc.gov.br, acesso em: 07/10/2004.

Page 89: FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE - …siaibib01.univali.br/pdf/Ana Pfleger.pdf · orientação do Prof. Msc. Ricardo Stanziola Vieira. ACADÊMICO: ANA PAULA PFLEGER São José

89 SANTOS, Gustavo Ferreira. Direito de propriedade e direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado: colisão de direitos fundamentais? In: Revista de Informação Legislativa. Ano 37, n. 147. Brasília, julho/setembro de 2000. Disponível: http://www.senado.gov.br, Acesso em: 01/10/2004.

SANTOS, Saint-Clair Honorato. Direito Ambiental – Unidades de conservação, Limitações administrativas. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2003.

SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e. Direito Ambiental Internacional. Rio de Janeiro: Thex editora: Biblioteca Estácio de Sá, 1995.

SILVA, José Afonso da Silva. Direito Ambiental Constitucional. 2. ed. rev. 3. tiragem. São Paulo: Malheiros, 1998.

______. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2001.

SOARES, Guido Fernando da Silva. Curso de Direito Internacional Público.Vol. 1. São Paulo: Atlas, 2002.

TUPIASSU, Lise Vieira da Costa. O Direito Ambiental e seus Princípios Informativos. In: Revista De Direito Ambiental. n. 30, ano 8. São Paulo: Revista dos Tribunais, Abril-junho de 2003.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

WALD, Arnold. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.