formaÇÃo e prÁtica do professor para o ensino de...
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FORMAÇÃO E PRÁTICA DO PROFESSOR PARA O ENSINO DE
CIÊNCIAS E BIOLOGIA
Entre os vários aspectos que influenciam o processo de ensino e aprendizagem escolar,
a formação e a ação docente são fundamentais para essa prática, pois são duas variáveis
que podem contribuir significativamente para a melhoria da qualidade da educação. É
com essa perspectiva que apresentamos nosso trabalho de pesquisa, que visa discutir o
ensino de ciências naturais e biologia como saberes necessários à formação cidadã dos
indivíduos. Assim, em relação aos três textos que compõem esse painel, o primeiro
aborda a relação entre o ensino de ciências naturais nos anos iniciais da escolarização e
a formação do professor (pedagogo) para desempenhar essa tarefa. Especificamente a
pesquisa enveredou para uma análise dos currículos e programas dos cursos de
Pedagogia, no sentido de investigar a carga horária e as ementas desses cursos
oferecidos em instituições públicas federais, com a perspectiva de saber como o assunto
é assumido no curso. O segundo texto aborda a contribuição de uma programa do
governo federal que incide sobre a formação inicial de professores. Autora faz uma
reconstrução da profissão docente na formação inicial e continuada, destacamos a
colaboração do Pibid. O objetivo da pesquisa foi delinear as relações tecidas entre a
diversidade de saberes necessários à formação docente, numa perspectiva prática da
formação do professor, voltando-se para as ações dos pibidianos de Biologia em três
escolas públicas localizadas em Campina Grande/PB. O terceiro texto apresenta uma
discussão sobre a relação entre o ensino de ciências e a prática pedagógica
interdisciplinar. Trata-se de uma pesquisa bibliográfico que teve como foco de análise
as dissertações e teses produzidas nos programas de pós-graduação brasileiro. Nota-se,
portanto, uma integração entre os trabalhos que orbita duas das grande problemáticas da
educação, que são a formação e a prática do professor da educação básica.
Palavras-chave: Formação de Professores. Ensino de Ciências e Biologia. Prática
Pedagógica.
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A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO PARA ENSINAR OS CONTEÚDOS DE
CIÊNCIAS NATURAIS: UMA DISCUSSÃO A PARTIR DA ANÁLISE
CURRICULAR DOS CURSOS
Paulo César Geglio
Universidade Federal da Paraíba
Resumo
Este trabalho consiste em uma pesquisa que discute a preparação do professor dos anos
iniciais para o ensino de ciências naturais. Para isso, analisamos os currículos dos cursos
de Pedagogia das universidades federais. Este trabalho está inserido em um estudo de
alcance maior que estamos desenvolvendo em relação a formação e prática de
professores dos anos iniciais da escolarização nessa disciplina. Assim, como uma das
etapas da nossa pesquisa, também enveredamos para o exame dos currículos dos cursos
que formam os professores desse segmento escolar. Nesse momento, apresentamos uma
análise sobre as cargas horárias e ementas dos cursos. Os dados foram coletados com
todas as universidades que, em atendimento à Portaria de nº 2.864/05, disponibilizam ao
público as informações sobre seus cursos. Ao acessar as 59 universidades federais e
seus respectivos campi, coletamos dados sobre 55 cursos, ressaltando que, no momento
da consulta, nem todas disponibilizavam dados dos seus cursos. A análise das
informações revela que a carga horária dos cursos de Pedagogia varia em diferença de
até 300%, porém com predomínio entre 60 a 80 horas. Outro dado, diz respeito à
nomenclatura das disciplinas, em que também há variação, mas quase todas
contemplam o termo ensino de ciências. Sobre esse aspecto, também percebemos que as
denominações, em 40% dos cursos, usam a expressão fundamentos ou fundamentos
teóricos do ensino de ciências, o que denota um aspecto teórico de abordagem dos
conteúdos que devem instrumentalizar o professor para o ensino da disciplina no
contexto dos anos iniciais do ensino fundamental. Esse dado também é evidenciado nas
ementas das disciplinas, pois a maioria indica uma tendência a ser desenvolvida com
enfoque teórico.
Palavras-chave: ciências naturais; formação docente; curso de Pedagogia.
Introdução
A educação básica tem, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) atual, tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento do
indivíduo e “[...] assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da
cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores”
(BRASIL, 1996, s/p). Nesse contexto, a referida lei considera ainda que o ensino
fundamental visa a formação do cidadão considerando sua capacidade de aprender, por
intermédio do domínio “[...] da leitura, da escrita e do cálculo; a compreensão do
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ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em
que se fundamenta a sociedade [...]” (BRASIL, 1996, s/p. Grifo nosso). Por isso, o
conhecimento explicativo dos fenômenos naturais e sociais, conjugado com o
desenvolvimento de habilidades cognitivas inerentes ao processo escolar, se tornam
elementos de fundamental importância para esse exercício, uma vez que é a capacidade
de entender o mundo natural e social que dá ao indivíduo o potencial de transformá-lo.
Portanto, precisamos reconhecer que o ensino de ciências naturais se constitui como
parte fundamental para a vida em sociedade. Para Delizoicov e Angotti (1990), só
podemos falar em exercício pleno da cidadania, quando a formação escolar básica inclui
minimamente o ensino dos conteúdos de ciências naturais de maneira a possibilitar que
os indivíduos tenham uma razoável compreensão da sociedade em que vive.
Consideramos que o ensino dos conteúdos de ciências naturais desde o início da
escolarização se constitui como prática fundamental para a formação do cidadão. “A
importância do ensino de Ciências é reconhecida por pesquisadores da área em todo o
mundo [...]” (LORENZETI, 2000, p. 16). A autora escreve ainda que há uma
concordância entre os pesquisadores do assunto, em torno da inclusão de temas
relacionados à ciência e à tecnologia nos anos iniciais da escolarização. Não obstante,
embora exista uma “[...] convergência de opiniões e de sua incorporação pelas propostas
curriculares e planejamentos escolares, ainda hoje em dia a criança sai da escola com
conhecimentos científicos insuficientes para compreender o mundo que a cerca”
(LORENZETI, 2000, p. 17).
Ensinar os conteúdos de ciências naturais no princípio da escolarização contribui
significativamente a desmistificação de vários fenômenos naturais, assim como abre a
possibilidade para questionamentos acerca da vida natural. Chassot denomina essa
prática de alfabetização científica, uma forma de linguagem capaz de interpretar o
mundo. Assim, “[...] ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que
está escrita a natureza [...]” (CHASSOT, 2002, p. 91). A alfabetização científica
contribui para a solução de continuidade com a concepção de que o conhecimento da
natureza só é possível para pessoas de alta capacidade cognitiva.
Considerando os avanços tecnológicos, bem como canais de comunicação, é
importante que as pessoas reconheçam que a ciência é uma aliada na busca de uma vida
mais confortável e digna para todos. “O mundo em que vivemos está imerso nas
conquistas tecnológicas avançadas, presentes em uma grande quantidade de produtos
acessíveis praticamente a todo cidadão [...]” (BEVILACQUA, 2009, p. 187). Dessa
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forma, não podemos ignorar o potencial da ciência e da tecnologia para a vida das
pessoas (BEVILACQUA, 2009). Mas é preciso ensinar aos alunos que os seres
humanos são parte da natureza e não estão acima dela. A natureza, assim como as
tecnologias fazem parte da nossa vida, portanto hoje “[...] não se pode mais conceber
propostas para um ensino de ciências sem incluir nos currículos componentes que
estejam orientados na busca de aspectos sociais e pessoais dos estudantes [...]”
(CHASSOT, 2002, p. 90). Então, diante dessa perspectiva, é preciso que os indivíduos
deixem de ser passivos consumidores dos produtos da ciência e passem a entender os
processos e as consequências daquilo que consomem. Nesse sentido, a escola e o ensino
de ciências cumprem um papel importante, que se configura na desmistificação da
natureza e da conscientização da relação dos seres humanos com ela.
Com isso, não se pretende formar cientistas na escola, mas despertar o espírito
dos alunos para sua relação com a natureza. O que se propõe para o ensino de ciências
naturais nos anos iniciais da escolarização são atividades que agucem a curiosidade e
incentivem a busca pelos saberes. “[...] Fica claro que o ensino de Ciências não objetiva
preparar cientistas ou preparar para o Ensino Médio, mas para que o educando aprenda
a viver na sociedade em que está inserido [...]” (LORENZETTI, 2000, p. 18).
É preciso ensinar os alunos a “fazer ciências” e a “falar ciências”. Colocamos
aspas no “fazer” e “falar” ciências, pois estamos conscientes da distância que
existe entre um aluno do curso fundamental ou médio e um cientista,
entretanto essa visão de ensino de Ciências como um processo de introdução
dos alunos no mundo das ciências permite-nos entender o porquê de os
alunos sentirem-se, nas aulas de Física, como se fossem estrangeiros entrando
em „um outro país‟ (CARVALHO, 2009, p. 73).
A proposta é de um ensino baseado na aprendizagem contextualizada, que tenha
como ponto de partida as representações sociais e as crenças culturais dos alunos, pois
estes fatores constituem referências para a abordagem de assuntos importantes nas
ciências da natureza. Importa, ainda, nesse processo de ensino, que os alunos construam
seus pensamentos acerca dos assuntos abordados em sala de aula e constituam uma
visão crítica das novas aprendizagens.
A abordagem dos conteúdos das ciências naturais deve se configurar “[...] como
uma possibilidade de promover a alfabetização científica já nas séries iniciais, de modo
que o educando possa refletir sobre o conhecimento científico de forma a realizar
leituras de seu entorno social, no qual este conhecimento se faz cada vez mais
necessário” (OVIGLI, BERTUCCI, 2009, p. 195).
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O ensino de Ciências nas Séries Iniciais deverá propiciar a todos os cidadãos
os conhecimentos e oportunidades de desenvolvimento de capacidades
necessárias para se orientarem nesta sociedade complexa, compreendendo o
que se passa à sua volta, tomando posição e intervindo na sua realidade.
(LORENZETTI, 2000, p. 18).
Não obstante a essa necessidade do ensino dos conteúdos das ciências naturais
no início da escolarização, a questão que nos preocupa é a preparação do professor dos
anos iniciais da educação básica, que geralmente é egresso do curso de Pedagogia,
também denominado de polivalente – para essa missão. Assim, nos questionamos se ele
está preparado e consegue conduzir essa tarefa de inserir as crianças no mundo dos
conhecimentos da natureza.
Problema de pesquisa
Boa parte dos problemas no ensino de ciências naturais nos anos iniciais da
escolarização está associada à formação dos professores desse segmento. (DUCATTI-
SILVA, 2005). Acreditamos que esse docente conclui o curso com pouca competência
para o ensino de ciências, e como ele não é cobrado socialmente e no âmbito da escola
para ensinar esses conteúdos, acaba não se dedicando em ampliar sua capacidade para
isso. Porém, analisar essa problemática requer investigações que iniciem com os
programas curriculares dos cursos de Pedagogia e perpassem os currículos do ensino
fundamental. Isso, em nossa visão, possibilita examinar se a carga horária, conteúdo e
metodologia são suficientes, no caso do curso de Pedagogia, para capacitar os
professores a ensinar ciências naturais, e, no caso do ensino fundamental, se os
currículos são suficientes para a realização de um trabalho pedagógico condizente com a
importância do assunto. Além disso, consideramos de igual importância avaliar as
fontes e os recursos pedagógicos utilizados pelos professores para o ensino dos
conteúdos, bem como suas práticas. Dessa forma, teremos um panorama da situação que
nos subsidiará a fazer inferências a respeito da necessidade de encaminhamentos para a
melhoria da condição de atuação do professor. Portanto, nossa pergunta de investigação
é: como estão constituídas, nos cursos de pedagogia das universidade federais, as
disciplinas específicas para a formação de professores dos anos iniciais da escolarização
realizar o ensino dos conteúdos de ciências naturais?
Objetivo
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O objetivo do estudo é analisar como os currículos dos cursos de pedagogia das
universidades federais apresentam a disciplina voltada para capacitar o futuro professor
dos anos iniciais da escolarização para ensinar os conteúdos de ciências da natureza. Em
outro trabalho realizamos o levantamento da quantidade de cursos de Pedagogia
existentes nas universidades federais, assim como localizamos as disciplinas em questão
e a carga horária que é destinada a elas em cada curso. No presente estudo retomamos a
pesquisa anterior e acrescentamos uma análise sobre as ementas das disciplinas.
Procedimentos metodológicos
Partindo de dados levantados em trabalho realizado anteriormente, no qual
identificamos os cursos de Pedagogia oferecidos pelas universidades federais, além das
disciplinas e respectivas cargas horárias que abordam o ensino dos conteúdos de
ciências naturais, fizemos análise das ementas das referidas disciplinas. Há uma Portaria
de nº 2.864 de 24/08/2005 do Ministério da Educação (BRASIL, 2005), determinando
que todas instituições de ensino superior (IES) devem tornar públicas e atualizadas em
página eletrônica as informações sobre os cursos por elas ministrados. No entanto, nem
todas as IES, no momento da consulta, tinham as informações divulgadas. Há 59 IES
federais, algumas com mais de um campus, mas nem todas ofertam o curso de
Pedagogia, além disso algumas não atendem ao disposto na legislação acima. Assim,
conseguimos acessar dados sobre carga horária e disciplinas de 55 cursos (os quais já
analisamos em trabalho realizado), porém só tivemos acesso a 39 ementas da disciplina
que contempla o ensino de ciências dos cursos.
Discussão e resultados
Embora exista uma concepção de que a formação do professor não se limita ao
momento acadêmico, mas se estende para a própria atividade profissional (TARDIF,
2004, TARDIF; LESSARD, 2005) – uma vez que a “[...] prática é como um processo de
aprendizagem através do qual os professores e professoras retraduzem sua formação
anterior e a adaptam à sua profissão [...]” - os saberes da formação inicial são
importantes, pois eles também são parte constitutiva do repertório mobilizado pelo
professor, durante sua prática profissional. Como lembra Gauthier (1998), não há ofício
sem saberes, portanto, os saberes da disciplina, aqueles relativos ao conteúdo de ensino,
são fundamentais à prática docente.
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No caso do curso de Pedagogia, percebemos que a formação é abrangente, visto
que se propõe a formar o profissional para atuar no magistério da educação infantil, nos
anos iniciais do ensino fundamental, regular e supletiva, e no curso de formação de
professores em nível de ensino médio (em vias de extinção), além da gestão e
supervisão escolar, incluindo a atividade de coordenação pedagógica. É um curso,
portanto, com muitas frentes de responsabilidade e especificidades com pouco tempo e
carga horária de duração.
O curso de Pedagogia, segundo as diretrizes curriculares nacionais (DCN) em
vigor, deve ter pelo menos 3.200 horas, porém quanto ao tempo mínimo de
integralização a referida lei não faz menção (BRASIL, 2006). Todas as IES federais
cumprem a carga horária, algumas oferecem o curso com maior quantidade de horas e o
tempo mínimo em todas é de quatro anos. Consideramos que as horas e o tempo de
duração são suficientes para a formação inicial do professor. O problema do curso de
Pedagogia, como bem já foi ressaltado por Gatti (2010), é seu espectro profissional
abrangente. Dada sua característica ampla de formação, possui excesso de componentes
curriculares com baixa carga horária em cada um, culminando em uma “pulverização”
de disciplinas com conteúdos sem aprofundamentos e o caso de ciências naturais não é
diferente.
Embora todos os cursos de pedagogia das IES federais, cujas ementas tivemos
acesso, contemplam na matriz curricular pelo menos uma disciplina voltada à
capacitação do professor para o ensino de ciências naturais nos anos iniciais, a carga
horária é, na maioria, de 60 horas, o que reforça a afirmação de Gatti (2010) a respeito
da superficialidade com que os conteúdos das disciplinas são abordados, em razão da
quantidade existente no currículo que visa formar um profissional da educação capaz
exercer múltiplas funções na escola.
A carga horária da disciplina de ciências naturais nos cursos de Pedagogia das
IES consultadas varia de 45 horas a 150 horas, porém a maioria está na faixa de 45 a 80
horas, com a média estabelecida em 60 horas. Nesse último caso, a disciplina é
trabalhada em único período (semestre) letivo do curso, e quando ela está na faixa de 90
a 150 horas geralmente é desenvolvida em dois períodos letivos, com mesma
nomenclatura (na forma de parte I e parte II). Considerando que o curso deve formar o
professor para o magistério na educação infantil, essa carga horária não é destinada
exclusivamente os anos iniciais. A maioria das ementas explicitam seu objetivo, que é
formar o professor para o ensino de ciências na educação infantil ou para os anos
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iniciais. Quando a carga horária é menor, e é ministrada em único período, os conteúdos
são distribuídos para os dois níveis de educação (infantil e anos iniciais), quando é
maior e seu desenvolvimento é realizado em dois períodos, fica explícito que um é
destinado aos conteúdos da educação infantil e outro para os anos iniciais e, às vezes,
também, para a educação de jovens e adultos (EJA). De qualquer forma, é uma
quantidade de horas baixa para a disciplina, porém não difere do conjunto das
disciplinas do curso e reforça a visão de que se trata de uma formação excessivamente
abrangente.
Figura 1- Carga horária da disciplina de ciências naturais nos cursos de Pedagogia
0
5
10
15
20
45 60 68 72 75 80 85 90 96 120 135 144 150
Fonte: elaborado pelo autor, com dados capturados nos sites dos cursos
Quanto a oferta da disciplina, na maior parte dos casos, ocorre a partir da metade
do curso, notadamente entre o 5° e o 8º período. Esse é um fato que revela a
característica dos cursos de graduação de bacharelado e licenciatura das instituições de
ensino superior no Brasil, que concentra as disciplinas de fundamentos teóricos - de
caráter explicativo e introdutório - no início e as disciplinas com conteúdos
instrumentais ou operacionais - relativas ao desempenho das competências profissionais
- em momentos posteriores do decorrer do curso, da segunda metade para o final. No
caso do curso de Pedagogia, invariavelmente, as disciplinas oferecidas no início da
formação são aquelas que, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN),
compõem o núcleo de estudos básicos. Gatti e Nunes (2009, p. 19) as denominam de
fundamentos teóricos da educação, categoria que, segundo as autoras é onde se
concentra as disciplinas que tem a “[...] função de embasar teoricamente o aluno de
Pedagogia a partir de outras áreas do conhecimento: Antropologia, Estatística, História,
Psicologia, Sociologia, entre outras, e suas correlatas no campo da Educação”.
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Em relação a disciplina de ciências naturais, Gatti e Nunes (2009) alocaram em
uma categoria que denominaram de conhecimentos relativos à formação profissional
específica. Nas DCN do curso de Pedagogia ela está inserida no núcleo de
aprofundamento e diversificação de estudos. Em ambos casos elas dizem respeito aos
saberes específicos da profissão. São disciplinas instrumentais, responsáveis por
capacitar o futuro professor sobre o que e como ensinar.
Nas ementas que analisamos, observamos que as denominações das disciplinas
relativas ao ensino de ciências variam de um curso para outro, fato notado também por
Gatti e Nunes (2009), e que, segundo elas, “[...] sinaliza que o projeto de cada
instituição procura sua vocação em diferentes aspectos do conhecimento, com enfoque
próprio, o que se reflete na denominação das disciplinas”. Não obstante, todos os cursos
contemplam disciplinas que fazem menção ao ensino de ciências e demostram abordar
os conteúdos tanto do ponto de vista da teoria dos saberes, como na forma de ensinar
(metodologia). O exame das ementas possibilitou perceber que há uma grande presença
do enfoque teórico. Dado também constatado pelas autoras, em suas análises. Elas
afirmam que em tais disciplinas há [...] predominância de aspectos teóricos, aqueles que
fundamentam as teorias de ensino nas diversas áreas, contemplando pouco as
possibilidades de práticas educacionais associadas a esses aspectos [...]” (GATTI;
NUNES, 2009, p. 22). São ementas que denotam a preocupação em justificar o
conteúdo e a metodologia, o que é bom, uma vez que pode evitar que se transformem
em “receitas”, embora sejam incipientes os registros sobre o que e como ensinar.
Os assuntos mais recorrentes nas ementas das disciplinas sobre o ensino de
ciências, dos cursos de Pedagogia que analisamos, são: “caracterização da área de
ciências naturais”; “construção do conhecimento de ciências na educação infantil e anos
iniciais”; “fundamentos teóricos e metodológicos do ensino de ciências na educação
infantil e anos iniciais”; “fundamentos teóricos sobre os seres vivos e meio ambiente e
saúde”; “aprender e ensinar ciências naturais”; “conceitos básicos de ciências”; “história
das ciências naturais”; “princípios históricos, filosóficos e metodológicos do ensino de
ciências”. Podemos notar que há tendência para o desenvolvimento de aulas baseadas
em enfoque muito mais teóricos, o que não contribui muito para a prática de ensino do
professor.
Considerações finais
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Consideramos que a formação inicial do professor não tem condições de
oferecer exatamente todos os saberes e técnicas que o profissional necessitará em seu
contexto de atuação em função da variedade de áreas e conteúdos que compõe o
currículo dos cursos de licenciaturas, mas também porque os saberes e as formas de
ensino são dinâmicos, assim como os contextos escolares e os sujeitos da aprendizagem.
Dessa maneira, é importante considerar que a formação (a aprendizagem) do professor é
um processo contínuo que se renova pela necessidade temporal e contextual, de maneira
que não podemos pensar em um amplo conjunto de saberes e técnicas acabadas e finitas
que se adquire no âmbito da formação inicial.
É com a perspectiva acima, que concordamos com a tese de que a formação do
professor é um processo que se efetiva na própria dinâmica de sua prática profissional.
Como afirma Tardif (2004, p. 181):
[...] prática é como um processo de aprendizagem através do qual os
professores e professoras retraduzem sua formação anterior e a adaptam à sua
profissão, eliminando o que lhes parece inutilmente abstrato ou sem relação
com a realidade vivida e conservando o que pode servir-lhes, de uma maneira
ou de outra, para resolver os problemas da prática educativa [...].
Mais do que retraduzir ou conservar o que aprendeu anteriormente, como sugere
o autor, os professores aprendem aquilo que não sabem e constroem formas de ensinar
de acordo com a necessidade do contexto em que estão. Assim, mesmo que sua
formação inicial não tenha sido suficiente em determinados saberes ou técnicas de
ensino, diante da cobrança social e profissional, ele aprende. O problema, no caso dos
professores dos anos iniciais da escolarização (cuja formação é insipiente em todos os
saberes de ensino) é que a cobrança social e escolar recai majoritariamente nas
habilidades de leitura e escrita e na aritmética. Esse é um fenômeno muito recorrente na
cultura escolar e está atrelada à cobrança feita pelo senso comum.
Ao iniciar o processo de escolarização, por volta dos seis anos, o
desenvolvimento da criança passa a ser medido em função da sua capacidade de
aprender os saberes escolares, sobretudo no que se refere à aquisição da leitura, escrita e
cálculos básicos de matemática e não nos saberes relativos às ciências naturais. Assim,
mesmo que os professores tenham passado por uma formação inicial aligeirada em
conteúdos e métodos de alfabetização e operações aritméticas, o contexto e a oferta de
formação continuada lhes possibilitam realizar uma prática satisfatória nesses quesitos.
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Dessa forma, mesmo que o ensino de ciências esteja contemplado na (LDB) 9.394/96,
que no seu art. 32, inciso II, registra a necessidade de o aluno compreender o
funcionamento do ambiente natural e social, bem como o uso da tecnologia, formação
inicial insipiente nesses saberes, aliada à baixa importância social desses saberes, resulta
na deficiente formação dos alunos nos anos iniciais da escolarização, refletindo no
desinteresse e dificuldade de aprendizagem em conteúdos das áreas específicas de
biologia, física e química, na sequência dos estudos.
Referências
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O ESTADO DO CONHECIMENTO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE O ENSINO
DE CIÊNCIAS E A PRÁTICA DOCENTE INTERDISCIPLINAR
Anna Karolina Fidelis da Silva
Colégio Risco e Rabisco
Resumo
Considerando nosso foco de investigação, a saber a relação entre o ensino de ciências e
a prática pedagógica interdisciplinar, enveredamos pelo estudo sobre como o tema vem
sendo abordado nas pesquisas acadêmicas. O nosso trabalho teve o objetivo de
investigar a relação entre o ensino de ciências e a prática pedagógica interdisciplinar. O
foco de análise foram dissertações e teses produzidas nos programas de pós-graduação
brasileiro. Para a coleta dos dados recorremos à fonte de registro de trabalhos
acadêmicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes),
e a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), do Instituto Brasileiro
de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). A discussão sobre a
interdisciplinaridade e o ensino de ciências com foco nas práticas e na formação de
professores, deixa explícita a preocupação dos autores com esses aspectos da educação,
que podem ser considerados as duas maiores problemáticas do processo educativo.
Entretanto, observamos que existe uma reduzida quantidade de trabalhos com essa
temática, considerando o tempo de nove anos (2006 a 2015) que delimitamos para
mapear as produções. Esse fato aponta para a baixa importância do assunto no contexto
das discussões sobre educação no Brasil. Além disso, destacamos algumas constatações
lacunares e ressaltamos a importância da realização de estudos que investiguem e
discutam a interdisciplinaridade associada à percepção dos alunos, assim como estudos
sobre os livros didáticos e os currículos da formação dos professores, além do olhar para
a prática dos professores que formam futuros professores. Assim, consideramos que
esses enfoques são relevantes para o contexto educacional.
Palavras-chave: teses e dissertações; ensino de ciências; prática interdisciplinar.
Introdução
No presente texto apresentamos nosso trabalho de investigação que consistiu em
analisar as pesquisas que dizem respeito a relação do ensino de ciências naturais com a
prática docente interdisciplinar, nas dissertações e teses. Trata-se de um estudo que
consideramos como “estado do conhecimento” porque “[...] aborda apenas um setor das
publicações sobre o tema estudado [...]” (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 39), que em
nosso caso são as produções acadêmicas realizadas em programas de mestrado e
doutorado de educação do país. Nosso interesse pelo assunto está atrelado, por um lado,
à nossa atuação como docente da disciplina e, por outro lado, à premente necessidade de
realizar um exercício reflexivo sobre a prática pedagógica inerente a essa profissão, que
exige, cada vez mais, a ação interdisciplinar.
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Consideramos que a interdisciplinaridade não se configura como uma simples
prática, mas um conceito que surge a partir de “[...] uma crítica das fronteiras das
disciplinas, de sua compartimentação, proporcionando uma grande esperança de
renovação e de mudança no domínio da metodologia das ciências humanas”
(JAPIASSU, 1976, p. 28). Segundo o autor, essa é uma forma de se contrapor a uma
prática “[...] tradicional de organização do saber, o que constitui um convite a lutar
contra a multiplicação desordenada das especialidades e das linguagens particulares das
ciências” (JAPIASSU, 1976, p. 28).
No contexto brasileiro, duas importantes referências para discutir a
interdisciplinaridade são Ivani Fazenda e Hilton Japiassu. Estes autores apresentam
contribuições que ressaltam a interdisciplinaridade não somente como a união das
disciplinas, mas também como “[...] atitude de ousadia e busca frente ao conhecimento”
(FAZENDA, 2008, p. 17), caracterizada “[...] pela intensidade das trocas entre os
especialistas e pelo grau de integração real das disciplinas” (JAPIASSU, 1976, p. 38,
grifo na fonte).
Para Japiassu (1976), a especialização excessiva e ilimitada das disciplinas
científicas resulta na fragmentação do conhecimento. Dessa maneira, o fenômeno
interdisciplinar convida-nos a buscar um novo caminho que possa ir contra a expansão
desnorteada das especialidades, além de nos propor uma reflexão sobre o fracionamento
do saber. Contudo, o autor comenta que para compreendermos o sentido da
interdisciplinaridade, precisamos compreender primeiro o conceito de disciplinaridade,
visto que, o fenômeno interdisciplinar resulta da interação entre as disciplinas. Assim,
Japiassu (1976, p.31), define a disciplinaridade como uma “[...] progressiva exploração
científica especializada numa certa área ou domínio homogêneo de estudo”. Significa
dizer que um determinado campo de estudo científico é entendido como sinônimo de
disciplina. Esse enquadramento pode conduzir à percepção e consideração de que uma
área de conhecimento que abrange vários aspectos e relações de implicações seja
resumida a um fenômeno isolado e sem relações com outros acontecimentos naturais e
sociais, ou seja, uma área de estudo é resumida a uma ciência.
Ivani Fazenda (1979, apud HASS, 2011), por sua vez, defende que a
interdisciplinaridade é uma relação que exige trabalho recíproco, para que seja possível
a elaboração de um conhecimento unitário. Ela argumenta que existem cinco princípios
que deveriam fundamentar a prática interdisciplinar: humildade, coerência, espera,
respeito e desapego. Porém, mesmo assim, afirma que a atitude principal do trabalho
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interdisciplinar se define na ousadia, pois essa atitude provoca a busca, o
questionamento, e a pesquisa, faz pensar e contribui para a construção de atitude
interdisciplinar.
Importante ressaltar que Fazenda (2008) enfatiza a necessidade de ter cautela
quanto a metodologia interdisciplinar. A autora também faz menção à
interdisciplinaridade com a formação dos professores, pois ao garantir essa relação será
possível superar as fronteiras existentes na fragmentação do conhecimento escolar.
Para Magalhães (s/d), a especialização excessiva do saber, presente nos dias
atuais, acaba sendo mais significativa apenas para os estudiosos da área, e por
consequência disso, algumas informações ficam distantes da realidade do aluno. Ao
expor uma pesquisa realizada sobre o conceito da interdisciplinaridade para alguns
professores da educação básica, o autor revela que é necessário se aprofundar no
conhecimento de suas disciplinas específicas, pois só assim é possível organizar um
currículo que favoreça uma melhor articulação e integração com as outras disciplinas.
Ele comenta que a visão dos professores condiz com as ideias de outros teóricos, que
defendem a necessidade de rever as práticas pedagógicas. Porém, Garcia (2001, p. 7,
apud MAGALHÃES, s/d, p. 5) percebe que existem:
[...] Diferenças no modo como os teóricos e os professores vêem as
disciplinas e o processo de integração entre elas. Os teóricos estão apegados a
visão das disciplinas como universos, enquanto para os professores elas
assumem a metáfora de avenidas a serem percorridas e ainda podem e devem
ser interligadas.
Sobretudo, Magalhães (s/d) defende que os professores devem ser protagonistas
no que diz respeito ao conceito da interdisciplinaridade, visto que são eles que
vivenciam e organizam o trabalho interdisciplinar com os alunos, além de observar as
práticas que contribuem com êxito ou não, na busca e construção do conhecimento.
Para Krasilchik (2004), alguns desafios encontrados no trabalho interdisciplinar
estão relacionados à insegurança que professores possuem em determinados conteúdos,
tal situação dificulta cumprir as exigências da interdisciplinaridade, além de prejudicar a
prática do professor. Contudo, a autora também concorda que a organização do
currículo caracterizada pela fragmentação das áreas de conhecimento, em muitos casos,
não permite que o aluno perceba a relação entre uma disciplina e outra, bem como a
importância e a „conexão‟ do conhecimento escolar e a vida cotidiana dele.
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Ainda sobre interdisciplinaridade e educação, Ferreira (2010) apresenta ideias de
Fazenda e discute a atitude interdisciplinar na formação do professor da educação
básica. A autora defende que mediante as experiências do cotidiano escolar, a partir de
um olhar sobre suas dificuldades e avanços no exercício da prática pedagógica, o
professor percebe que mais contribui para desenvolver seu trabalho de maneira
interdisciplinar. Para ela, a prática do professor interdisciplinar está atrelada as
competências de sua prática, a partir da construção de elos entre os conteúdos de suas
disciplinas com as demais presentes no currículo. Sobretudo, tais competências não são
apenas técnicas, mas inclui “[...] toda uma revisão, e mesmo construção de atitudes, o
que não poderia ser desvinculado de transformações em suas próprias identidades
profissionais” (GARCIA, 2005, p. 4, apud FERREIRA, 2010, p.22).
Fazenda et al. (2010), em uma discussão sobre avaliação e interdisciplinaridade,
afirmam que a melhor maneira dos professores aperfeiçoar sua prática pedagógica é
quando ele se dá a oportunidade de refletir sobre ela. Os autores registram, que só é
possível compreender e aprender a interdisciplinaridade quando se pratica essa ação,
pois ela impulsiona a transformação da prática educacional e da vida, na busca da
totalidade do conhecimento. No contexto do ensino e da interdisciplinaridade, é preciso
integração, relacionar teorias, conteúdos e métodos, por isso, a comunicação, o diálogo
e a parceria, são essenciais para que ela ocorra. Além disso, a parceria interdisciplinar é
mais que uma troca, ela explora a necessidade de reavaliarmos a prática pedagógica.
Fazenda et al. (2010) ressaltam que é importante e necessário desapegar-se do
tradicional e permitir que a partir da interdisciplinaridade o aluno possa estabelecer a
relação entre ensino, escola, família, sociedade e mundo. Mas enfatizam que o desafio
da mudança das práticas bloqueia o trabalho interdisciplinar e o do próprio docente.
Para Hernández (1998, apud JOSÉ, 2010), o conteúdo ensinado pelo professor
seja de fácil compreensão, é importante que o aluno entenda a relação de conteúdo com
a vida cotidiana, o que não significa dizer que só devemos ensinar aquilo que o aluno
gostaria de aprender. O autor defende que é necessário preocupar-nos em formar
cidadãos para o presente, por isso é tão importante que o professor não se prenda apenas
a disciplina escolar, mas que se preocupe em estimular o aluno a refletir, questionar e
relacionar as informações de maneira a contextualizá-las. É nesse sentido que José
(2010) afirma que as práticas pedagógicas devem possibilitar que o aluno seja ator no
processo de aprendizagem, de modo a considerar suas carências e potencialidades. Mas
para isso, é necessário que o professor perceba a importância de princípios como
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respeito e amorosidade, pressupostos que contribuem na reflexão sobre a necessidade de
um currículo pedagógico que envolva o aluno, o professor, a escola e toda a sociedade.
Problema de pesquisa
Considerando nosso foco de investigação, a saber a relação entre o ensino de
ciências e a prática pedagógica interdisciplinar, enveredamos pelo estudo sobre como o
tema vem sendo abordado nas pesquisas acadêmicas e que importância ele tem no
cenário educacional.
Objetivo
O objetivo do estudo é perceber a importância da discussão que envolve a
relação entre ensino de ciência e prática pedagógica interdisciplinar – fato que pode ser
verificado no volume de produções a respeito –, assim a forma como a questão vem
sendo realizada (tipo de pesquisa, metodologia utilizada, referencial teórico de base,
foco das discussões, tipo de análises).
Procedimentos metodológicos
Para coletar os dados da nossa pesquisa recorremos à fonte de registro de
trabalhos acadêmicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes), que faz a catalogação de toda produção realizada nos programas de
pós-graduação do país, e a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
(BDTD), do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), que
apresenta registros catalográficos de teses, dissertações, editoração de revistas
eletrônicas e os repositórios de diversos documentos digitais.
Ao acessar o ambiente virtual da Capes selecionamos o banco de teses,
utilizando os descritores: ensino de ciências e interdisciplinaridade. Importante ressaltar
que a Capes mantinha registro das dissertações e teses, no que se refere aos dados de
catalogação (autor, título, data, nível acadêmico, local, resumo e palavras-chave), desde
o ano de 1987, que são enviadas pelas instituições ao órgão. Porém, no ano de 2011, ela
iniciou um trabalho de revisão de todos os dados existentes, uma vez que não havia
uniformidade entre eles (falta de resumos e outros dados) e passou a disponibilizar
dados somente a partir do ano de 2011. Com isso, nossa busca abrangeu os anos de
2011 e 2012, que estavam disponíveis para consulta no momento que acessamos o
ambiente. Ao consultarmos a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
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(BDTD), do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT),
também utilizamos os descritores: ensino de ciências e interdisciplinaridade.
Discussão e resultados
Na cobertura temporal, ao acessar o ambiente virtual da Capes, percebemos a
existência de cinco produções (quatro dissertações mestrado e uma tese de doutorado),
publicados entre os anos de 2011 a 2012. Com a busca das produções na Biblioteca
Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), do Instituto Brasileiro de
Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), encontramos sete trabalhos (dissertações)
publicados entre os anos de 2006 a 2015. Desse total, dois trabalhos também estão
presentes no banco de teses da Capes, portanto, nas duas fontes encontramos total de
dez produções que apresentam na composição de seu título a expressão ensino de
ciências e interdisciplinaridade.
A partir de uma análise descritiva dos trabalhos, observamos que os autores e
documentos utilizados como referenciais teóricos são variados, porém há um
predomínio para aqueles que abordam o tema interdisciplinaridade, como Santomé,
Morin, Japiassu e Fazenda, que são considerados referências para essa discussão no
Brasil. Também são utilizados outros autores ligados às discussões sobre prática de
ensino contextualizada, ensino de ciências, formação de professores e avaliação. Entre
os documentos oficiais mais citados, na fundamentação teórica dos trabalhos, destacam-
se os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), do Ministério da Educação (MEC).
Quanto ao ensino de ciências especificamente, os enfoques são variados, há
discussões sobre a formação do professor; práticas de ensino; e a ciência abordada como
tema específico, como, por exemplo, no trabalho de Albino (2009), que apresenta sua
pesquisa sobre ensino de ciências e interdisciplinaridade a partir da formação de um
grupo interdisciplinar com professores dessa disciplina e suas tecnologias. Nesse último
caso, a autora realizou encontros mensais, com a intenção de compartilhar não somente
os conhecimentos específicos, mas também histórias e experiências do dia a dia na sala
de aula, com debates de ideias e propostas de discussões sugeridas pelo grupo. Ela
pesquisou as concepções dos professores sobre interdisciplinaridade e
multidisciplinaridade a fim de desenvolver uma proposta de trabalho sugerida pelo
grupo, com intuito de identificar limites e possibilidades das atividades desenvolvidas
pelo grupo de professores.
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Outro trabalho que destacamos é o de Carminatti (2015), que realizou uma
investigação para entender como os saberes docentes podem contribuir para a prática do
ensino interdisciplinar com os conteúdos de ciências para alunos do Ensino Médio de
um curso politécnico. A autora apresenta em seu trabalho a maneira como os
professores constroem e percebem a relação entre as diferentes áreas das ciências, suas
concepções e a contribuição dos saberes docentes para a interdisciplinaridade no
processo de ensino e aprendizagem, em termos de planejamentos e reflexões sobre a
práxis.
O trabalho de Leite (2009) apresenta uma abordagem sobre o ensino de ciências
e a interdisciplinaridade com a intenção de identificar o modo como professores de
ciências podem contextualizar os temas ambientais e a saúde humana, com foco no
conteúdo de disruptores endócrinos, destacando suas relações, riscos e cuidados. A
pesquisa envolveu professores e alunos. O autor teve a pretensão de incentivar
discussões sobre o tema, apresentando reflexões sobre riscos e danos à saúde humana,
gerados pela presença cotidiana dos disruptores endócrinos disseminados em nosso
meio.
Côrrea (2011) apresenta a relação do ensino de ciências com a
interdisciplinaridade, focalizando a formação docente de licenciandos de um curso de
Química, bolsistas do Pibid. A pretensão da autora foi investigar como as políticas
educacionais estão sendo apropriadas pelos licenciandos, sob uma perspectiva da prática
interdisciplinar. A pesquisa buscou analisar as concepções sobre interdisciplinaridade
dos bolsistas, por meio dos discursos deles. Também foram realizadas pesquisas
bibliográficas sobre os materiais teóricos que contribuíram para a construção dos
projetos educacionais dos cursos de licenciatura no ensino de ciências.
Paixão (2011) desenvolveu uma metodologia interdisciplinar, na qual o
conteúdo de ciências aparece com enfoque no tema oceanografia. Trata-se de uma
prática de ensino que exigiu conhecimentos de disciplinas como matemática, biologia,
química e física. A pesquisa envolveu alunos do ensino fundamental II, e teve como
intuito despertar o interesse deles para a alfabetização científica. Foram realizados
experimentos, debates e questionários abertos com foco nos problemas ambientais e
conflitos de interesse em uma situação fictícia.
Cordeiro (2012) analisou dissertações do curso de mestrado em Educação em
Ciências e Matemática da PUC/RS, realizadas nos anos de 2004 a 2010, com o principal
objetivo de investigar a maneira como estão estruturadas as pesquisas sobre
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interdisciplinaridade nos trabalhos oriundos daquele programa. Além disso, ela
investigou a motivação dos autores para realizar suas pesquisas, procurou identificar
também os referenciais teóricos utilizados, e a forma como foi abordada a relação entre
a teoria e a prática nas discussões. A ligação com o ensino de ciências está no fato dos
trabalhos examinados pertencerem a um programa de pós-graduação que contempla o
termo ciências. Portanto, ela não discute necessariamente o ensino de ciências, embora
nós tenhamos selecionado seu trabalho em função da captura pelos descritos que
utilizamos (ensino de ciências e interdisciplinaridade).
Stamberg (2009) investigou como as ações interdisciplinares acontecem e são
assumidas na prática pedagógica de professores de ciências do ensino fundamental. A
autora pesquisou sobre a influência da formação de professores para a execução do
trabalho interdisciplinar e os problemas e as soluções que envolvem a prática da
interdisciplinaridade associada ao ensino dos conteúdos de ciências. Para isso, foram
analisados os depoimentos dos professores, na busca de conhecer suas concepções e
vivências em relação a interdisciplinaridade no ensino de ciências.
Mello (2011) aborda o ensino de ciências associado à interdisciplinaridade e a
contextualização, a partir do olhar dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A
autora também trabalhou com as ideias de dois autores que relacionam suas pesquisas
na área de ciências. Os princípios contidos nos PCN e a importância da formação
continuada para o ensino de ciências foram destacados pela autora para debater, com um
grupo de professores do ensino fundamental, propostas e atividades desenvolvidas por
eles. Para isso, ela realizou oficinas e encontro interdisciplinares.
No trabalho realizado por Santos (2006), o ensino de ciências aparece no
contexto de uma prática de avaliação de aprendizagem. A autora teve como intenção
investigar a percepção de um grupo de alunos do ensino médio sobre as avaliações de
aprendizagem na disciplina de ciências.
No trabalho de Neto (2011), o ensino de ciências é abordado a partir da
disciplina de Farmacologia. O autor defende o uso de um software para o ensino da
Farmacologia, considerada como uma área interdisciplinar. Ele traçou um perfil de uso
das tecnologias da informação na educação Brasileira com foco nos softwares.
Investigou a percepção sobre interdisciplinaridade de um grupo de professores e
desenvolveu um software para ser utilizado nas práticas de ensino da Farmacologia
seguindo o princípio da interdisciplinaridade.
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Objetivamente nossa pesquisa procurou investigar a produção acadêmica sobre a
relação entre o ensino de ciências e prática pedagógica interdisciplinar. Como podemos
perceber, a busca com os descritores revelou a existência de dez trabalhos, porém
especificamente com a temática acima, só notamos a existência de seis. Dessa maneira
decidimos por fazer uma avaliação de todos que encontramos.
Ao analisar as produções percebemos aspectos que consideramos importantes
ser ressaltados, pois eles contribuem sobremaneira para entendermos nosso foco de
exame, como, por exemplo, a utilização que os autores fazem dos dados coletados em
suas pesquisas. Há trabalho em que o autor registra na metodologia o uso de
questionários abertos para a coleta de dados após aulas-dialogadas, porém não apresenta
os resultados dessa coleta, apenas discute os pontos positivos e negativos que foram
apontados a partir da observação de aula guiada por “roteiro de observação”. Outro
autor não menciona a aplicação de questionários, mas utiliza dados desse instrumento
durante a discussão dos resultados. Além de afirmar que foram realizadas observações
de atividades propostas e registros de debates após apresentação de vídeos sobre
determinado tema.
Ainda sobre problemas metodológicos, há um autor que afirma que realizou
observações da prática pedagógica do trabalho interdisciplinar em sala de aula, porém
não explicita o registro ou discussões dessas observações. Também menciona ter
analisado manifestações orais dos entrevistados, mas não deixa claro essa etapa da
pesquisa nos seus resultados e cita os resultados da entrevista como se fossem respostas
de questionários, o que acaba gerando, em nosso ponto de vista, uma confusão de ideias
no que se refere aos dados analisados. Há trabalho em que o autor menciona que fez
coleta de sugestões para a execução de produto educacional e apresenta os resultados
aos alunos, mas não deixa claro esse item em seu trabalho. Além disso, no que se refere
a quantidade de perguntas aplicadas aos responsáveis pelo desenvolvimento de um
programa (Pibid) na instituição, observa-se que ele não segue o que afirmou em sua
metodologia, isto é, que faria cinco perguntas para cada entrevistado, transformando-as
em narrativas histórica.
Também percebemos que há trabalhos que se propõe a discutir a
interdisciplinaridade relacionada a um tema, porém sem aprofundamento no aspecto
interdisciplinar. Nesses casos, inclusive, o referencial teórico predominante é sobre o
tema paralelo e não sobre a interdisciplinaridade. Há trabalho, por exemplo, que aborda
a avaliação e a interdisciplinaridade no ensino de ciências, porém toda discussão é
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centrada na avaliação da aprendizagem, assim como seu referencial teórico que é
voltado mais para esse último assunto. Alguns trabalhos mencionam a elaboração e a
criação de produções didático- pedagógicas, porém não apresentam tais materiais
anexados às dissertações, para subsidiar a compreensão do leitor. Acreditamos que é
importante que o pesquisador coloque como apêndice ao seu trabalho todas as
elaborações que serviram de base para a sua pesquisa, pois são dados fundamentais para
o entendimento do conjunto da produção. Outro item observado durante as análises dos
trabalhos é a superficialidade nas discussões sobre os dados das pesquisas. Os autores
apresentam de maneira breve a interpretação e análise dos dados coletados, deixando
essa parte escrita da pesquisa um pouco dispersa, o que, em nosso entendimento, pode
comprometer o entendimento do trabalho.
Considerações Finais
Em nosso trabalho de pesquisa nos propusemos a investigar o que foi produzido
nas dissertações e teses envolvendo a relação entre o ensino de ciências e a
interdisciplinaridade na prática pedagógica do professor. Ao realizarmos as análises
chamou-nos a atenção a reduzida quantidade de trabalhos com essa temática,
considerando o tempo de nove anos (2006 a 2015) que delimitamos para mapear as
produções. Esse fato aponta para a baixa importância do assunto no contexto das
discussões sobre educação no Brasil, tanto do ponto de vista da abordagem dos
conteúdos de ciências, como da associação com a interdisciplinaridade.
A discussão sobre a interdisciplinaridade e o ensino de ciências com foco nas
práticas e na formação de professores, deixa explícita a preocupação dos autores com
esses aspectos da educação, que podem ser considerados as duas maiores problemáticas
do processo educativo. Considerando a necessidade de uma educação que preza pela
efetiva participação do aluno, a prática interdisciplinar deve ser vista como princípio
norteador da formação e da atuação do professor, contribuindo para que o processo
escolar seja efetivado de maneira otimizada, explorando o potencial de aprendizagem
dos alunos.
Embora a interdisciplinaridade seja um aspecto importante na prática educativa e
as dissertações e teses analisadas se proporem a abordá-la, observamos que os autores
não apresentam uma discussão aprofundada. Embora eles coloquem o assunto em
questão, há um aparente aligeiramento no tratamento do tema. A interdisciplinaridade
“[...] não é uma questão evidente, que possa dispensar explicações e análises
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aprofundadas, mas um tema que merece ser levado em consideração, e constituir um
dos objetos essenciais da reflexão de todos [...]” (JAPIASSU, 1976, p. 42). É necessário
reconhecer a importância desse tema, tendo em vista que o trabalho interdisciplinar
surge no confronto com o saber fragmentado, dessa forma ela contribui para a interação
entre as relações intelectuais e afetivas, favorecendo o surgimento de novas perspectivas
e novos caminhos de aprendizagem e construção do conhecimento.
Outro fato que observamos em nossas análises dos trabalhos, e que já
mencionamos, diz respeito aos instrumentos que os autores utilizaram para coleta de
dados em suas pesquisas. Notamos que o mais frequente é o questionário, que é um
recurso importante, porém consideramos que a observação da prática pedagógica, pouco
utilizada por eles, pode oferecer riqueza de detalhes que não aparecem nos
questionários. Além disso, a observação da atuação do professor possibilita o contato
direto com a realidade e proporciona um olhar mais apurado do fenômeno, contribuindo
para uma análise mais integrada. Segundo Marconi e Lakatos (2003, p. 191) “[...] a
observação ajuda o pesquisador a identificar e a obter provas a respeito de objetivos
sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que orientam seu comportamento
[...] É o ponto de partida da investigação social”.
Diante das nossas constatações lacunares, ressaltamos a importância da
realização de estudos que investiguem e discutam a interdisciplinaridade associada à
percepção dos alunos, assim como nos livros didáticos, e nos currículos da formação
dos professores, além do olhar para a prática dos professores que formam futuros
professores. Consideramos que esses enfoques são relevantes para o contexto
educacional.
Referências
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KRASILCHIK,M.; MARANDINO, M. Ensino de ciências e cidadania. São Paulo:
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MAGALHÃES, E. M. Interdisciplinaridade: por uma pedagogia não fragmentada.
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MARCONI, M. A.; LAKATOS, E.M. Fundamentos de metodologia científica. 5 ed.
São Paulo: Atlas, 2003. 311p.
ROMANOWSKI, J. P.; ENS, R. T. As pesquisas denominadas do tipo “estado da arte”
em educação. Diálogo Educacional, Curitiba, v.6, n. 19, p. 37-50, set./dez. 2006.
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AS CONTRIBUIÇÕES DO PIBID NA FORMAÇÃO DE PROFESORES DE
BIOLOGIA REFLEXÕES ENTRE O SABER E O SABER FAZER DOCENTE
Márcia Adelino da Silva Dias
Universidade Estadual da Paraíba
Resumo
Nesta pesquisa, propomos uma reflexão acerca da importância do Programa de Bolsas
de Iniciação à Docência (Pibid), na construção da identidade docente, na área de ensino
de Biologia. Destacamos a relevância dos saberes construídos na prática, como
fundamentadora das ações desenvolvidas na escola básica, a partir da proposta do Pibid.
A fim de evidenciar o caráter processual da construção da profissão docente na
formação inicial, na continuada ou em serviço; destacamos a colaboração do Pibid com
esta finalidade. O objetivo da pesquisa foi delineado a partir das relações tecidas entre a
diversidade de saberes necessários à formação docente, numa perspectiva prática da
formação do professor, voltando-se para as ações dos pibidianos de Biologia em três
escolas públicas localizadas em Campina Grande/PB. A problemática se situa no
paradigma da formação de professores vigente, segundo o qual, pressupõe-se que a
finalidade dos cursos de formação de professores transcende a construção dos
conhecimentos da área específica de atuação, uma vez que prescinde da mobilização de
competências voltadas para uma dimensão mais prática do currículo das licenciaturas.
Apesar da importância do aprendizado dos conceitos, há necessidade de sua articulação
com os procedimentos e atitudes; de modo que o professorando possa construir uma
referência do saber da profissão com o apoio decorrente da sistematização dos
conhecimentos no contexto da escola, a partir das ações desenvolvidas no Pibid.
Partindo-se deste pressuposto, concluímos que não é apenas o conhecimento da matéria
a ser ensinada que irá definir o que é ser um bom professor, mas a construção das
competências de mobilização dos saberes da profissão, o qual o Pibid tem contribuído
na construção. Consideramos que formar o professor prescinde de uma maior atenção à
dimensão prática do currículo do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas.
Palavras chave: Pibid; formação docente; saberes.
Introdução
Nos últimos anos, as escolas brasileiras vêm enfrentando dificuldades com a
escassez de professores para atuarem no Ensino Médio nas áreas de Química, Física,
Biologia e Matemática (BRASIL, 2007). Grifamos que as lacunas existentes na
formação de professores, as quais se expressam por meio da carência de professores na
área de ciências naturais, não é um problema atual, uma vez que os cursos de formação
de professores só conseguiram se firmar a partir do século XIX. Até então, prevalecia o
princípio do “aprender fazendo”, próprio das corporações de ofício, sendo que as
universidades, como modalidade de corporação, se dedicavam as assim chamadas “artes
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liberais” ou intelectuais, formando os professores das escolas inferiores ao ensinar-lhes
os conhecimentos que deveriam transmitir. (SANTONI RUGIU, 1998).
Remetendo às lacunas existentes no processo de formação de professores,
destacamos que essas coexistem com a criação dos cursos destinados a esta finalidade.
Sob este ponto de vista, ressaltamos a falta de interesse das agências formadoras em
atentar para os problemas implícitos nos currículos dos cursos de formação de
professores, expresso pela falta de prioridade à formação específica por meio do preparo
pedagógico-didático.
Vale destacar que, dentre os aspectos imbricados nesta causa, não está apenas a
omissão das agências formadoras em relação ao problema da formação dos professores
mas, fundamentalmente, a luta que vem sendo travada entre os objetivos propostos
pelos dois modelos de formação que tem sido praticados nas universidades, quais sejam:
o modelo dos conteúdos culturais-cognitivos e o modelo pedagógico-didático
(SAVIANI, 2009).
Segundo Saviani (2009), o modelo dos conteúdos culturais-cognitivos tem
como princípio uma formação de professores baseada na cultura geral e no domínio dos
conteúdos da área de conhecimento específico, o qual corresponde à disciplina que o
professor irá lecionar. Neste caso, considera-se que a formação pedagógico-didática virá
como consequência do domínio dos conteúdos do conhecimento logicamente
organizado e adquirido na prática docente, mediante os mecanismos de “treinamento em
serviço”. O modelo pedagógico-didático, por sua vez, tem como fundamento os
aspectos da formação que vão além da cultura geral e da formação específica na área de
conhecimento correspondente. Este modelo sugere que a agência formadora deverá
assegurar, de forma deliberada e sistemática, fundamentalmente por meio da
organização curricular, a preparação pedagógico-didática do professor em formação; a
qual deverá se colocar como imprescindível em qualquer etapa de sua formação.
Salientamos que esta indagação gera um pool de respostas que, com as mais
variadas ênfases e nuances, nos permite perceber as suas implicações do processo de
formação inicial e continuada do professor, quer em sua vida prática ou nos objetivos e
metas que este define para o seu processo de formação.
O dilema se expressa ao admitirmos que os dois modelos – o dos conteúdos
culturais-cognitivos e o pedagógico-didático – devem se integrar no processo de
formação dos professores. Deste fato, emerge uma importante questão em relação a
maneira de articulá-los adequadamente, uma vez que a ênfase nos conteúdos conceituais
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específicos, que constituem a matéria dos currículos escolares, se restringe a ênfase da
abordagem didático-pedagógica.
Sob este ponto de vista, ressaltamos que a necessária mudança na forma de
conduzir o ensino também imprime um ritmo de mudança e aumenta a exigência em
relação às adequações na formação dos professores para suprir a nova demanda
educativa. Notamos um período de reformas na educação básica, que teve como pano de
fundo as reformas recentes pelas quais tem passado o Ensino Médio. Este se configura
como um momento em que as necessidades, as curiosidades, os interesses e os saberes
do estudante deverão confrontar-se com os saberes sistematizados, resultantes do
currículo escolar, no intuito de contribuir para uma educação cidadã.
O processo educativo atual reconhece a importância de uma maior atividade do
sujeito, deixando de lado uma base educacional pautada na transmissão mecânica e
pouco significativa dos conhecimentos curriculares e buscando atingir o
desenvolvimento pleno das potencialidades do estudante. Nessa atmosfera de mudanças,
surgem importantes questões de debate em torno da nova função da escola e do espaço
ocupado pelos saberes escolares na formação do estudante, instigar reflexões sobre o
seu processo de construção e o papel dos conteúdos escolares na formação integral do
estudante.
Diante desta situação, convém estabelecer, em relação aos propósitos da
educação em ciências da natureza, o de instigar uma reflexão sobre o lugar do
conhecimento científico e a sua relação com os outros tipos de saberes. Neste sentido, o
ensino de Ciências/Biologia deverá promover a articulação entre o conhecimento
escolar e os vários tipos de saberes do estudante, para que sejam superadas as
dicotomias, por vezes estabelecidas nos livros didáticos, entre o conhecimento geral e o
específico, entre o conhecimento científico e o do senso comum, entre a ciência e a
técnica, de forma que a escola incorpore tanto as culturas técnica e geral quanto as
experiências do estudante na sua formação plena.
Sabemos que alcançar esse nível de compreensão no processo de ensino em
ciências da natureza demanda tempo e que isso só ocorrerá por meio da efetivação de
atividades que instiguem a prática da interdisciplinaridade, contextualização e o uso de
estratégias de problematização dos conteúdos; as quais ainda têm sido fracamente
utilizadas e/ou priorizadas durante os cursos de formação de professores.
Neste contexto, alguns autores se destacam ao propor o ensino baseado numa
perspectiva de abordagem que transcenda a transmissão dos conteúdos, que implica em
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uma mudança de postura, tanto dos professores em formação inicial, quanto daqueles
que se encontram na formação continuada.
Sob este ponto de vista, Chevallard (1992) introduziu a ideia de “antropologia
dos saberes”, a qual se inclui na didática dos saberes, em que se procura superar a
“restrição” da epistemologia tradicional, preocupada com os processos de produção de
saberes. Portanto, para que o saber/conhecimento possa ser utilizado, ensinado e
aprendido, é preciso uma visão epistemológica mais ampla, que estude esses processos
no contexto da aprendizagem escolar.
Nesse contexto, os novos saberes passarão a ser construídos a partir da relação
dialética entre esses saberes prévios e os que compõem o conhecimento curricular,
portanto objeto da educação escolar, com aqueles conhecimentos que o professor
entende como objeto necessário à aprendizagem.
Destacamos, dentre os obstáculos pertinentes à formação dos professores de
Ciências e Biologia, a ausência de integração entre os componentes curriculares que
compõem os cursos de formação, no tocante ao descompasso entre os princípios
teóricos estudados nos cursos de graduação e a prática docente.
Não obstante, os entraves existentes na formação de professores não se
extinguem no desenvolvimento do conhecimento pelos alunos, nem na estrutura das
aulas ou na compreensão da natureza do processo educativo, mas na falta de
observância de como facilitar, aos professores em formação, a integração dos
conhecimentos a partir de sua prática (CARVALHO, 1993). A autora também chama a
atenção para o fato de que, um programa considerado eficaz, em relação à formação de
professores, deverá integrar os conteúdos da disciplina, os organizadores teóricos e os
resultados da pesquisa sobre práticas exitosas.
Problema de pesquisa
Para delinear o problema de pesquisa, consideramos que a formação
profissional dos professores congrega uma grande quantidade de objetivos, saberes e
competências específicas; carecendo de estrutura organizacional adequada e diretamente
voltada ao cumprimento da sua função na formação do professor.
Destarte, uma preocupação que remete às lacunas implícitas na formação dos
professores, mantendo-se nas reflexões dos professores formadores que atuam nas
agências ministrando os componentes pedagógicos nos cursos de licenciatura, diz
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respeito a um questionamento muito básico, porém carregado de significados: o que
precisa saber e saber fazer um professor para ensinar ciências naturais?
O problema de pesquisa se situa no vigente paradigma da formação de
professores, segundo o qual, pressupondo-se que a finalidade dos cursos de formação de
professores transcende a construção dos conhecimentos da área específica de atuação,
uma vez que prescinde da mobilização de competências voltadas para uma dimensão
mais prática do currículo das licenciaturas. Apesar da importância do aprendizado dos
conceitos, há necessidade de sua articulação com os procedimentos e atitudes; de modo
que o futuro professor possa construir uma referência do saber da profissão com o apoio
advindo da sistematização dos conhecimentos no contexto da escola, a partir das ações
desenvolvidas no Pibid.
Objetivo geral
Esta pesquisa teve como objetivo instigar reflexões acerca das relações tecidas
entre a diversidade de saberes necessários à formação docente, numa dimensão prática
da formação do professor, voltando-se para as ações dos pibidianos de Biologia em três
escolas públicas localizadas na cidade de Campina Grande/PB.
Procedimentos metodológicos
O projeto de Pibid da área de Biologia é composto por 19 (dezenove) bolsistas,
sendo 15 (quinze) estudantes do curso de Licenciatura (pibidianos), três professores
supervisores (que lecionam no Ensino Médio) e uma professora coordenadora de área
(docente da UEPB).
A distribuição da equipe de trabalho foi realizada de modo que cada grupo seja
formado por cinco pibidianos e um supervisor, compondo três grupos para atuarem em
três escolas públicas localizadas em Campina Grande/PB (Dr. Elpidio de Almeida, Dr.
Hortensio de Sousa Ribeiro e Solon de Lucena).
Semanalmente acontecem as reuniões de orientação, sistematização, avaliação
e planejamento das ações, nas quais são apresentadas e discutidas as propostas de
trabalho em desenvolvimento e as que deverão ser desenvolvidas nas semanas
subsequentes, com as orientações da coordenadora de área do projeto.
Os pibidianos são orientados a trabalhar os conteúdos partindo da realidade e
contexto do alunado, priorizando o desenvolvimento de práticas interdisciplinares
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(considerando a integração dos conceitos das áreas de ciência naturais – Biologia, Física
e Química).
Cada escola tem um subprojeto, desenvolvido pela equipe de pibidianos e o seu
supervisor, cujas ações são planejadas para ser desenvolvidas em dois semestres. Os
conteúdos trabalhados em cada subprojeto são escolhidos de acordo com o
planejamento feito pelos professores Coordenadora/Supervisores e os pibidianos, a
partir do conteúdo programático planejado pelos professores e a equipe pedagógica de
cada escola.
Dentre os subprojetos desenvolvidos no ano de 2015, escolhemos cinco para
desenvolver esta pesquisa: 1. Uso de Jogos e Dinâmicas como Auxíliar na Abordagem
dos Conteúdos Carboidratos, Lipídeos, Vitaminas, Sais Minerais, Vitaminas, Proteínas
e Distúrbios Alimentares; 2. Etnobotânica: uso de Plantas Medicinais como modelo
para facilitar o ensino de Morfologia Vegetal; 3. Educação Ambiental e Ecologia:
construção de documentário; 4. O Ensino de Anatomia e Fisiologia, tendo como
situação desencadeadora a ação de Drogas no Organismo; e 5. A Introdução da
Metodologia Científica no Ensino de Microbiologia no Ensino Médio.
Com o intuito de atender ao objetivo geral desta pesquisa, esses subprojetos
foram acompanhados em seu desenvolvimento e avaliados. A sistematização das
avaliações, análises e reflexões acerca da condução dos trabalhos desenvolvidos pelos
pibidianos e as contribuições do Pibid na formação dos professores de Biologia foram
realizadas por meio dos relatos de experiência dos bolsistas e acompanhamento da
evolução dos subprojetos desenvolvidos no período.
Resultados e discussão
O Pibid foi instituído a partir da Portaria Normativa nº 38, de 12 de
dezembro de 2007, com a ação conjunta do Ministério da Educação (MEC), por
intermédio da Secretaria de Educação Superior (SESu), da Fundação Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE), busca fomentar a iniciação à docência de
estudantes em nível superior, em cursos de licenciatura, para atuar na educação
básica pública (BRASIL, 2010).
Inicialmente configurou-se com os seguintes objetivos: (i) incentivar a
formação de docentes em nível superior para a educação básica; (ii) contribuir para a
valorização do magistério; (iii) elevar a qualidade da formação inicial de
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professores nos cursos de licenciatura, promovendo a integração entre educação
superior e educação básica; (iv) inserir os licenciandos no cotidiano de escolas da
rede pública, proporcionando-lhes oportunidades de criação e participação em
experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e
interdisciplinar, buscando superar os problemas identificados no processo de
ensino-aprendizagem; (vi) incentivar escolas públicas de educação básica, mobilizar
seus professores como co-formadores dos futuros docentes e tornando-as
protagonistas nos processos de formação inicial para o magistério; (vii) contribuir
para a articulação entre a teoria e prática necessários à formação dos docentes,
elevando a qualidade das ações acadêmicas nos cursos de licenciatura (BRASIL,
2010).
Os resultados advindos do desenvolvimento dos cinco subprojetos, nas três
escolas públicas, a partir dos turnos de fala e reflexões dos pibidianos, permeadas nas
reuniões de planejamento; demonstra que os objetivos esperados para a formação foram
atingidos. As análises dos turnos de fala foram realizadas a partir da perspectiva de
análise de conteúdo proposta por Bardin (2011), pressupondo uma postura reflexiva de
formação do professor e da construção dos saberes docentes, tomando como base os
estudos desenvolvidos por Schon (1990), Nóvoa (1991) e Tardif (2011).
A análise de conteúdo como meio de análise, auxiliou na identificação das
relações implícitas nos turnos de falas dos pibidianos a partir análises de conteúdo como
uma forma de tratamento em pesquisas qualitativas (BARDIN, 2011).
As reflexões dos pibidianos sobre as suas vivências e experiências nos
subprojetos, permitem identificar que a ampla gama de saberes da docência estão sendo
construídas e/ou mobilizadas por parte desses licenciandos, mediatizadas pelas
contribuições do Pibid com a formação profissional (saberes ligados à formação
profissional para o magistério), assim como com a prática docente (saberes ligados à
experiência da profissão).
Por outro lado, o Pibid também tem contribuído na promoção da pesquisa no
ambiente escolar e desenvolvimento de outras modalidades didáticas que se distanciam
do ensino por transmissão-recepção. Dentre os cinco subprojetos, 03 (três) foram
voltados para a dimensão didático/instrumental (1, 2 e 3) e os outros 02 (dois) foram
voltados para a dimensão instrumental do conteúdo/conhecimento específico (4 e 5).
Todos os projetos priorizaram a contextualização dos conteúdos e buscaram promover a
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interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade a partir de uma perspectiva de inovação
metodológica.
Preconizamos um ensino de ciências naturais que priorize a religação de
saberes (MORIN, 1999). Neste sentido, ancora-se no paradigma da complexidade, haja
vista nosso esforço em exercitar o recorte, organização, agrupamento, disjunção,
organização, desorganização e estabelecimento de relações pertinentes entre processos,
fenômenos e objetos de conhecimento.
O exercício da religação de saberes tem sido praticado por muitos
pesquisadores que, tomando como ponto de partida o eixo teoria-prática descrevem a
importância do desenvolvimento de novas estratégias didáticas no ensino.
(ROMANOWSKI, WACHOWICZ, 2003; PACHECO, 2007; ZIA, SCARPA, SILVA,
2013).
Neste sentido, Pacheco (2007) destaca que o processo de ensino-aprendizagem
requer, cada vez mais, estratégias pedagógicas que dinamizem-no, restituindo no
estudante o prazer de investir, descobrir e aprender significativamente. Dentre as
diversas estratégias apontadas como relevantes ao Ensino de Ciências destaca-se o
ensino por projetos científicos que conforme Prado (2009) concede ao estudante a
oportunidade de levantar dúvidas, elaborar hipóteses, pesquisar, construir e reconstruir
conhecimentos, a partir das descobertas e novas compreensões das temáticas abordadas.
Nesse sentido, a idealização, elaboração e execução de projetos científicos
podem se configurar como importante abordagem metodológica ao ensino. As
contribuições advindas do Pibid na formação dos bolsistas, professores supervisores e
colaboradores pode ser observada por meio do elo firmado entre teoria e prática, quer
seja como elemento de contextualização ou de inter-transdisciplinaridade, culminando
com a religação dos saberes e conhecimentos curriculares.
Construir um referencial teórico híbrido que comporte estratégias e métodos
de ensino que pautados na multiplicidade e diversidade dos saberes é um passo na
direção da formação de professores e pesquisadores atentos à diversidade de saberes que
coexistem em todos os espaços formativos. Esperamos que a tentativa de religar, sem
fundir, ciência, tradição. A importância do Pibid, como elemento norteador e necessário
na formação dos docentes, reside no fato de contribuir para a elevação da qualidade das
ações acadêmicas nos cursos de licenciatura, fundamentalmente em sua dimensão
prática, uma vez que consegue suprir as lacunas que os estágios curriculares, na área de
ensino de Ciências/Biologia.
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Considerações finais
As análises e reflexões pertinentes ás ações desenvolvidas pelos pibidianos do
curso de Biologia da UEPB, levam a crer que não é apenas o conhecimento da matéria a
ser ensinada que irá definir o que é ser um bom professor, e isto reflete na forma de
desenvolver as atividades nas três escolas aonde os bolsistas atuam. A fim de
evidenciar o caráter processual da construção da profissão docente na formação inicial,
na continuada ou em serviço; destacamos a colaboração do Pibid com esta finalidade.
O Pibid tem contribuído grandemente na construção das competências
profissionais dos professores, principalmente os que se encontram em formação inicial;
por meio da mobilização dos saberes da profissão. Ressaltamos o caso específico das
contribuições permeadas pelas políticas e programas implantados pelo Governo, com a
finalidade de subsidiar e/ou potencializar o processo de formação de professores, por
entendermos que esses se originam da necessidade de ações exitosas que contribuam
para suprir as demandas que os currículos das agências formadoras não conseguem dar
conta.
A partir destas reflexões iniciais, especificamente no caso da Universidade
Estadual da Paraíba, salientamos a importância do Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação à Docência (Pibid), como um importante passo na caminhada em busca da
identidade docente, transcendendo os modelos tradicionais ainda vigentes nas agências
formadoras.
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