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JOGANDO E APRENDENDO: PRÁTICAS DOCENTES NO CONTEXTO DA UBIQUIDADE As atividades lúdicas sempre fizeram parte do cotidiano escolar, especialmente, na Educação Infantil e séries iniciais do ensino básico. A formação do professor para atuar nesta faixa escolar contempla diversas abordagens, didáticas e preparo para que o lúdico seja elemento apoiador e integrador do desenvolvimento de habilidades, competências e atitudes nos alunos. No entanto, à medida que a escolaridade avança, os métodos, práticas e didáticas adotadas pelos docentes tendem a não contemplar o trabalho lúdico e o uso de jogos com tanta intensidade. Diversas causas podem explicar tal comportamento, destacamos aqui a ausência de bons jogos associados aos conteúdos e a pouca ênfase da formação docente de professores que atua nas séries finais do ensino básico e no ensino médio. No contexto contemporâneo, caracterizado pela cibercultura, os jogos digitais, especialmente aqueles jogados de forma colaborativa usando como meio a Internet, surgem com força significativa na vida de grande parte dos nossos alunos. Jogar faz parte da sua cultura e hábitos. Se não bastasse o estabelecimento desta cultura digital arraigada nesta geração milênio, nos deparamos ainda com um novo contexto: a ubiquidade da comunicação estabelecida pelos dispositivos moveis (tablets, smartphones e similares) que nos desfiam e enriquecem de possibilidades para se fazer Educação. Porém, apesar deste cenário intrigante e aparentemente rico em oportunidades para se aprender, cabe a reflexão e a discussão relacionada a formação docente para trabalhar neste contexto, o qual emerge de forma vigorosa e nos impele e rever de forma crítica e cautelosa nossas práticas e didáticas. Este painel discute exatamente este cenário e sua implicações na formação docente. Achados, lições aprendidas e reflexões apoiadas em autores que pesquisam a questão da cibercultura, da comunicação e da aprendizagem ubíqua são apresentados. Este painel reúne professores/pesquisadores de um grupo de pesquisa interdisciplinar vinculado a um tradicional programa de pós-graduação em Educação, de uma instituição superior privada do Rio Grande do Sul e, que também, atuam na rede escolar como docentes. Esta duplicidade de atuação enriquece as discussões e faz uma tessitura entre pesquisa e cotidiano escolar, buscando instigar o leitor e participantes do evento a considerar o impacto deste cenário relacionadas as nossas práticas e didáticas. Palavras-Chave: Jogos Educacionais Digitais. Gamificação De Práticas Docente. Aprendizagem Ubíqua. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 7711 ISSN 2177-336X

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JOGANDO E APRENDENDO: PRÁTICAS DOCENTES NO CONTEXTO

DA UBIQUIDADE

As atividades lúdicas sempre fizeram parte do cotidiano escolar, especialmente, na

Educação Infantil e séries iniciais do ensino básico. A formação do professor para atuar

nesta faixa escolar contempla diversas abordagens, didáticas e preparo para que o lúdico

seja elemento apoiador e integrador do desenvolvimento de habilidades, competências e

atitudes nos alunos. No entanto, à medida que a escolaridade avança, os métodos,

práticas e didáticas adotadas pelos docentes tendem a não contemplar o trabalho lúdico

e o uso de jogos com tanta intensidade. Diversas causas podem explicar tal

comportamento, destacamos aqui a ausência de bons jogos associados aos conteúdos e a

pouca ênfase da formação docente de professores que atua nas séries finais do ensino

básico e no ensino médio. No contexto contemporâneo, caracterizado pela cibercultura,

os jogos digitais, especialmente aqueles jogados de forma colaborativa usando como

meio a Internet, surgem com força significativa na vida de grande parte dos nossos

alunos. Jogar faz parte da sua cultura e hábitos. Se não bastasse o estabelecimento desta

cultura digital arraigada nesta geração milênio, nos deparamos ainda com um novo

contexto: a ubiquidade da comunicação estabelecida pelos dispositivos moveis (tablets,

smartphones e similares) que nos desfiam e enriquecem de possibilidades para se fazer

Educação. Porém, apesar deste cenário intrigante e aparentemente rico em

oportunidades para se aprender, cabe a reflexão e a discussão relacionada a formação

docente para trabalhar neste contexto, o qual emerge de forma vigorosa e nos impele e

rever de forma crítica e cautelosa nossas práticas e didáticas. Este painel discute

exatamente este cenário e sua implicações na formação docente. Achados, lições

aprendidas e reflexões apoiadas em autores que pesquisam a questão da cibercultura, da

comunicação e da aprendizagem ubíqua são apresentados. Este painel reúne

professores/pesquisadores de um grupo de pesquisa interdisciplinar vinculado a um

tradicional programa de pós-graduação em Educação, de uma instituição superior

privada do Rio Grande do Sul e, que também, atuam na rede escolar como docentes.

Esta duplicidade de atuação enriquece as discussões e faz uma tessitura entre pesquisa e

cotidiano escolar, buscando instigar o leitor e participantes do evento a considerar o

impacto deste cenário relacionadas as nossas práticas e didáticas.

Palavras-Chave: Jogos Educacionais Digitais. Gamificação De Práticas Docente.

Aprendizagem Ubíqua.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

7711ISSN 2177-336X

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FORMAÇÃO DOCENTE NA CIBERCULTURA: JOGOS E GAMIFICAÇÃO

NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Cristina Martins – Rede La Salle

Mario Augusto Pires Pool – Rede La Salle

Resumo

Motivar estudantes a buscar o conhecimento por meio de desafios educacionais que lhes

permitam fazer associações entre seus hábitos cotidianos e as necessidades inerentes ao

estudo formal tem se estabelecido como um importante objeto de estudo nas pesquisas e

nas discussões acadêmicas. Nas interações formais e informais entre docentes, quer seja

nos espaços escolares, bem como fora deles emergem comentários relacionados a

comportamentos pouco participativos dos estudantes e das dificuldades encontradas

pelos professores em engajá-los, aparentemente, não afeita ao estudo e desinteressada

pelo ambiente sistematizado e formalizado oportunizado pela escola. Logo, os

professores são desafiados a revisitar e ressignificar suas práticas pedagógicas já

consolidadas, para efetivá-las de forma diversa daquela em que foram formados. A

busca do entendimento desse problema nos remete ao cenário contemporâneo da

cibercultura com sua complexidade e dinamicidade, onde entram em cena as

possibilidades que oferecem os jogos digitais como substrato para estudos sobre

dinâmicas e novas metodologias. Assim, buscamos ampliar discussões sobre: que

desafios podem permear o estabelecimento de práticas pedagógicas baseadas em jogos e

em gamificação para a formação docente na cibercultura? Nosso objetivo, ao discutir tal

assunto, foi contribuir no avanço de pesquisas sobre os desafios da formação docente

em tempos de cibercultura. Para isso, são apresentadas narrativas a partir de

experiências dos pesquisadores. O estudo aborda pesquisa qualitativa realizada no grupo

de pesquisa ARGOS (Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Educação a Distância da

PUCRS). Como possíveis caminhos para delinear os desafios e possibilidades de vencê-

los, encontramos na Educação Continuada um importante aliado, no desenvolvimento

de práticas formativas que fomentem a autoeducação do professor, um fator premente, e

no fortalecimento da interface formação inicial versus realidade escolar, que é uma

necessidade urgente.

Palavras-chave: Práticas pedagógicas, jogos, gamificação.

Introdução

Consideramos que, no contexto sociohistórico-cultural em que nos encontramos,

a cibercultura, a conectividade, a ubiquidade, o acesso, a produção e o

compartilhamento de informações e a velocidade das mudanças ressignificam as

dimensões de espaço e de tempo (LÉVY, 2014). Nesse sentido, Santaella (2013) diz que

―[...] quanto mais informação e conhecimento se tornam disponíveis, aumentam e

variam os passos e oportunidades para a criação de conhecimento‖ (p.14).

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Novos espaços, definidos pela autora como ―espaços multidimensionais‖, não só

físicos, mas também virtuais-digitais proporcionados pela cibercultura, principalmente

pelas redes, podem contribuir no desenvolvimento de práticas pedagógicas criativas e

articuladas a esse cenário atual, em que o digital está fortemente presente no cotidiano

dos estudantes. Nesse emaranhado de espaços multidimensionais, é fortalecida a

―cultura gamer‖ (SANTAELLA, 2013), trazendo implicações para contextos

educacionais, sendo eles formais ou informais. Os games, jogos que dependem de

estruturas digitais, podem ser vistos como ―uma rede complexa que engloba suas

potencialidades de realização, de pesquisa, de aprendizagem etc., bem como todos

aqueles que estão envolvidos nesse processo‖ (SANTAELLA, 2013, p. 220).

Cabe ressaltar que a cultura lúdica coincide com o desenvolvimento social do ser

humano, caracterizado por Huizinga (2012) como, também, homo ludens. A ação lúdica

(brincar, jogar, representar, etc.) é proposta pelo autor como um fator cultural da vida,

uma forma específica de atividade, como função social. Entendemos o jogo como um

produto cultural, e, com a cibercultura, surgem os jogos digitais e com eles desencadeia-

se a cultura gamer, o que a torna, atualmente, um aspecto fortemente imbricado ao

contexto social. Cabe ressaltar que entendemos que os jogos digitais que apresentam

potencial educacional em sua maioria originam-se dos jogos de mesa denominados RPG

(Role-Playing Game). Estes são narrativas interativas, onde o jogador assume um

personagem, e que possuem regras bem definidas, necessitando, também, de um mestre

da partida, que faz a mediação entre o regramento, os personagens e os personagens

criados e movimentados pelos jogadores.

Compreendem-se, ainda, os jogos digitais como os que utilizam como matéria

prima bits e bytes, segundo a Digital Games Research Association (DIGRA)1. Para essa

associação, é importante definir o termo sem ligá-lo a uma única plataforma de

interação ou de visualização. Essa mesma definição distingue os jogos digitais dos

jogos, ditos, ―analógicos e/ou físicos‖, que utilizam tabuleiros e peças de diferentes

materiais para permitir a interação dos jogadores. Nesse cenário, ―games‖ é posto como

sinônimo de ―jogos digitais‖, trazendo consigo todas as suas características, tais como

postula o professor Jesper Juul (2005), assumindo que esses são conteúdos com função

de entretenimento que usam a tecnologia como substrato e utilizam diferentes meios de

distribuição. O autor propôs seis atributos para caracterizá-los:

1. São baseados em regras.

2. Geram resultados variáveis e quantificáveis.

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3. Atribuem diferentes valores a diferentes resultados.

4. Os jogadores exercem esforços para influenciar seu resultado.

5. Em função disso, os jogadores sentem-se emocionalmente ligados aos

resultados.

6. O jogo pode ser jogado sem que existam consequências na vida real.

Essas características dos jogos digitais originados de RPG, a princípio,

desvinculadas do contexto educativo, podem, no entanto, configurarem-se como suas

importantes aliadas. Nesse sentido, o termo ―gamificação‖ tem sido utilizado para

conceituar a aplicação de elementos de jogos digitais em contextos extragames, ou seja,

configura-se pela utilização de elementos de jogos digitais baseados em RPG em

atividades que, na sua origem, não são jogos (MARTINS; GIRAFFA, 2016).

Dessa maneira, em um cenário que desenha possíveis vínculos entre cibercultura

e educação, a principal questão norteadora deste trabalho pretende ampliar discussões

sobre: que desafios podem permear o estabelecimento de práticas pedagógicas baseadas

em jogos e em gamificação para a formação docente na cibercultura? Com o objetivo de

contribuir no avanço de pesquisas com esse cunho, sobre os desafios da formação

docente em tempos de cibercultura, apresentaremos narrativas a partir de experiências

dos pesquisadores.

Para isso, apoiamo-nos na abordagem de pesquisa qualitativa, realizada por meio

de investigações empíricas emergentes do grupo de pesquisa ARGOS (Grupo de

Pesquisa Interdisciplinar em Educação a Distância da PUCRS), certificado pelo CNPq,

tendo como lócus o estudo de temáticas ligadas à Formação Docente e Tecnologias da

Informação e da Comunicação Digitais (TD). Logo, para melhor compreensão de

práticas com uso de jogos e de gamificação, aprofundaremos tais concepções.

Jogos e gamificação nas práticas pedagógicas: implicações teóricas

Antes de iniciarmos a discussão sobre jogos e gamificação, situaremos a

concepção de prática pedagógica, que é pautada nos estudos de didática como prática

social. Conforme MARTINS (2015), as práticas pedagógicas são as ações que

conduzem o professor, junto aos estudantes, a atuar nos processos de ensino e de

aprendizagem. Entende-se que esses processos são interdependentes, sendo que um não

se sobressai ao outro, ou seja, no momento em que o professor ensina, ele também

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aprende com o estudante, assim como, quando o estudante está aprendendo, está ao

mesmo tempo ensinando o professor. Com isso, inferimos que essa relação entre

estudantes e professores, por meio de processos de ensino e de aprendizagem, expressa-

se nas práticas pedagógicas. Assim, professor é entendido como sujeito mediador,

orientador e problematizador de situações de aprendizagens, planejando ações com

intencionalidade, que refletem e autorrefletem.

Ensinar e aprender são ações balizadas por relações, sentimentos e trocas entre o

professor e o estudante. Conforme Freire (1981), entendemos que não existe docência

sem discência, e, no ato de ensinar, também se aprende. É nessa relação simbiótica que

acontece a construção do conhecimento, imbricada ao contexto sociohistórico,

permeado pelas interações e mediações advindas do outro e do ambiente (VIGOTSKY,

2007).

Ao buscar entender alguns mecanismos desse ato de ensinar e de aprender no

mundo contemporâneo, percebe-se que o estudante tem à disposição a busca de

informações de que necessita para resolver questões do seu dia a dia de forma

autônoma, podendo utilizarem-se de TD que estão ao seu alcance. Assim, muitos

desenvolvem o modus operandis de buscar informação e resolver seus problemas

cotidianos, incorporando ao seu estilo de vida, desenvolvendo saberes procedimentais e

atitudinais diversos e configurando novos caminhos na constituição das juventudes

atuais: eles buscam estar sempre conectados. Essa sensação de liberdade e de autonomia

tem sido um dos elementos transformadores do modo de vida dos estudantes.

Provavelmente, isso também esteja contribuindo para que as aulas, preponderantemente

pautadas em metodologias tradicionais, sejam questionadas, uma vez que a informação

está antecipada.

Cabe salientar que não se faz crítica a métodos, processos ou à organização

tradicional da escola, e nem se busca problematizar a questão numa perspectiva

reducionista e antagônica, colocando professores de um lado e estudantes de outro, na

forma simplificada postulada por Prensky (2001) com a questão dos nativos e dos

imigrantes digitais. Prensky cunhou esses termos, na época em questão, para chamar

atenção de que tínhamos um novo contexto.

Para a maioria dos professores, o ambiente padrão para desenvolver seu

trabalho ainda é a sala de aula tal qual a concebemos: presencial. Incluir novos espaços

e novos formatos para se fazer educação é um desafio que se estabelece desde que a

Internet e seus recursos estruturaram o novo modelo que resultou na cibercultura. Cabe

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ressaltar, ainda, que embora encontrar professores-jogadores não seja tão raro, entende-

se que essa habilidade (saber procedimental) ainda não contempla a maioria da

população dos novos professores em serviço. Observa-se que nem todos os professores

experienciaram e apropriaram-se das dinâmicas de jogos para traduzi-las em ações

pedagógicas, principalmente quando se trata de uma didática utilizada para o dia a dia.

Segundo Pool e Giraffa (2015), um dos aspectos fundamentais que rege as mudanças

educacionais e estimula as diferentes pesquisas em educação é o fato de se buscar

desenvolver nos estudantes a capacidade de aprender a aprender. A ação de jogar

estimula o estudante a gostar de atividades educacionais criativas que se aproximam da

mecânica dos jogos, principalmente se comparadas aos jogos digitais, produto da

cibercultura.

Sendo assim, destacamos dois temas de interesse e relevância na formação

pedagógica: o primeiro fala sobre planejamento ou planificação, fundamental para o

professor objetivar a sua aula, e o segundo discorre sobre a avaliação do ensino. Nessas

duas abordagens, presentes nos cursos de formação para professores, nota-se a

aproximação das dinâmicas dos jogos digitais a muitas teorias pedagógicas conhecidas.

Um dos modelos teóricos adequado para traçar um paralelo entre temas

distintos, mas com possibilidades de convergência (Jogos digitais e Formação Didática),

encontra-se em Benjamim Bloom (1973), que desenvolveu uma taxonomia muito

importante nos processos de planificação e de avaliação do ensino. O seu legado

educacional mantém uma atualidade e uma singularidade quando comparado à dinâmica

da construção de didáticas baseadas em jogos.

O modelo de Bloom visa a uma aprendizagem pelo avanço e pelo domínio das

competências por um processo passo a passo, tempo a tempo, de acordo com o

desenvolvimento de cada estudante. Na dinâmica dos jogos digitais, o estudante é

representado pela figura do jogador, e o seu desenvolvimento nas etapas da narrativa,

descritas pelos níveis conquistados ao longo do jogo. Por essa perspectiva, a obra deste

autor torna-se um objeto de estudo sério, criterioso e livre de preconceitos ideológicos

ao se associar a mecânica dos jogos digitais.

Bloom (1973) identifica três variáveis independentes que condicionam o sucesso

na aprendizagem: (a) os comportamentos cognitivos de entrada; (b) as características

afetivas de entrada; e (c) a qualidade do ensino ministrado. Da mesma forma,

identificamos nos jogos digitais essas características como sendo: (a) os conhecimentos

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prévios; (b) o relacionamento e afinidades (plataforma digital e outros jogadores); e (c)

a dinâmica de aprendizado passo-a-passo (narrativas advindas dos níveis).

Para os professores contemporâneos, talvez um dos maiores desafios esteja em

compreender o contexto atual e a união de tantos elementos, que caracterizam esta

geração imersa no digital: entretenimento e comunicação apoiando propostas didáticas

diferenciadas, que incluam as competências (saber, saber-fazer, saber-ser, saber-

conviver), percebidas nesses estudantes e as considerem nas atividades formais

escolares.

Esse é um dos motivos pelos quais os jogos e a gamificação voltam a ser

discutidos fortemente na pauta das possibilidades educacionais, adotando aproximações

relevantes e com potencial pedagógico, dos comportamentos dos estudantes

relacionados aos jogos digitais. Para que isso aconteça, precisamos de professores

devidamente preparados para refletir sobre esse cenário de cibercultura. Afinal, quem

pode criar estratégias, resultando em práticas pedagógicas que contribuam nos

processos de ensino e de aprendizagem é o professor. E ele pode fazer isso sabendo

realizar uma leitura dos seus estudantes, do contexto onde estão inseridos e do tipo de

recursos que têm à disposição. Logo, precisará usar de criatividade para fazê-lo.

A gamificação surge da disseminação da cultura gamer, trazendo, como

mencionado, elementos de jogos digitais para contextos extragames. Ela pode ser

considerada uma readaptação da cultura lúdica às técnicas condicionantes da

cibercultura, um movimento natural imbricado ao desenvolvimento do ser humano por

meio da interação com o lúdico. Na educação, mais especificamente vislumbrando a

constituição de práticas pedagógicas, gamificar não significa criar um jogo de viés

pedagógico ou simplesmente jogar para ensinar – tal definição é compartilhada por

autores como Alves et al. (2014), Santaella (2013) e Schlemmer (2014). O conceito vai

além. É preciso compreender e significar mecânicas e dinâmicas presentes em jogos

digitais, permeando-os em práticas pedagógicas, e isso só se consegue por meio de

vivências anteriores com jogos digitais baseados em RPG.

Aqui encontramos um ponto de intersecção entre jogos digitais baseados em

RPG e gamificação: a última é pensada e planejada a partir dos elementos dos

primeiros. Também, visualizamos a necessidade do fomento à Educação Continuada de

professores em serviço, uma vez que a ressignificação de práticas pedagógicas é um

processo complexo e que também implica o revisitar a cultura escolar, tal como se

consolidou.

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Alves et al. salientam que a prática gamificada ―[...] se constitui na utilização da

mecânica dos games em cenários non games, criando espaços de aprendizagem

mediados pelo desafio, pelo prazer e entretenimento‖ (2014, p.76). Nesse contexto, os

autores consideram que os espaços de aprendizagem se caracterizam por diferentes

cenários escolares e não escolares ―[...] que potencializam o desenvolvimento de

habilidades cognitivas (planejamento, memória, atenção, entre outros), habilidades

sociais (comunicação assertividade, resolução de conflitos interpessoais, entre outros) e

habilidade motoras‖ (2014, p. 76).

Ao abordar as habilidades cognitivas (processos mentais), sociais (relação com

os outros) e motoras (físicas), é feita uma relação com competências humanas

abordadas por Lévy (2014), que estão atreladas ao conceito da inteligência coletiva.

Para o autor, as competências são habilidades desenvolvidas pelo sujeito na interação

com os outros ou com os objetos, o que faz interface com a concepção sociohistórica de

aprendizagem postulada por Vigotsky (2007). Já a inteligência coletiva é ―[...] uma

inteligência distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em

tempo real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências‖ (LÉVY, 2014, p.

28). Esta última visa reconhecer habilidades dos sujeitos para que sejam

compartilhadas, enriquecendo-os mutuamente, ou seja, para que utilizem em benefício

da coletividade.

Contrapondo alguns autores que discutem as características da gamificação,

Schlemmer (2014) destaca que para não cairmos em modismos, utilizando apenas

elementos como: rankeamento, pontuação, classificação, etc.; no desenvolvimento da

gamificação em contextos educacionais devemos priorizar a aprendizagem a partir dos

elementos de RPG que se mostram mais complexos e que podem levar a um maior

engajamento e motivação, em atividades pedagógicas.

Considerando tais reflexões, a seguir, apresentaremos experiências e resultados

obtidos pelos autores ao longo de suas trajetórias no campo da formação docente em

tempos de cibercultura.

Discutindo experiências e resultados

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Aproximando alguns entendimentos sobre a dinâmica dos jogos com ações

efetivas que possam desenvolver atividades criativas em sala de aula articuladas ao

contexto da cibercultura, busca-se, nas narrativas de experiências empíricas, que vêm

sendo estudados a partir da abordagem de pesquisa qualitativa (FLICK, 2009) pelo

grupo de pesquisa ARGOS, ampliar discussões no campo educacional, mais

especificamente na área de práticas pedagógicas baseadas em jogos digitais e em

gamificação e suas implicações para a formação docente na cibercultura.

A primeira experiência apresentada desenvolveu estudos sobre práticas

pedagógicas a partir de jogos de RPG (Role-Playing Game) de mesa. O RPG é um jogo

de contar histórias no qual jovens e adultos jogam por horas e narram as atitudes do

personagem que está sob seus cuidados, este tipo de jogo originou grande parte dos

jogos digitais. Já no segundo recorte nos aproximamos de uma empiria no campo da

formação docente na perspectiva da Educação Continuada, pautada em um modelo de

gamificação que se ancorou em elementos de jogos digitais presentes em RPG. Ambos

se inter-relacionam e se complementam e juntos justificam a discussão proposta.

Inicialmente, apresentamos os resultados de uma pesquisa de validação de uma

aplicação educacional denominada ―O Arquipélago de Sallenas‖, com um grupo focal

de 10 estudantes, com idades entre 12 e 15 anos, ao longo de 6 meses. O jogo é um

RPG de mesa, desenvolvido como elemento de testes para auxiliar a dimensionar os

requisitos necessários para um docente poder criar uma atividade de cunho

interdisciplinar que incorre na mecânica de jogos. Foi concebido para pesquisar e

avaliar diferentes possibilidades de refletir e autorefletir sobre desafios educacionais

criativos, a partir de um modelo de atividade lúdica. Além disso, buscou-se estudar

alternativas que pudessem compor opções para o ensinar e o aprender, encontramos na

experiência com os jogos de RPG algumas características do comportamento intuitivo e

autônomo dos estudantes. Conforme Pool e Giraffa (2015), crê-se no potencial desse

jogo como um modelo de inspiração para outras práticas transdisciplinares e vivenciais

que utilizem uma mecânica similar.

A aplicação do experimento foi conduzida por um professor e pedagogo (o

criador do Sallenas), que assumiu o papel de mestre da partida. Para o caráter

educacional dessa aventura, foram adicionados na trama do jogo vários desafios, com

saberes conceituais pertencentes aos Anos Finais do Ensino Fundamental. Durante as

partidas, os estudantes (jogadores) utilizaram os seus dispositivos móveis, como recurso

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de apoio, para pesquisar e encontrar as informações que ajudavam a sustentar os seus

argumentos e a solucionar os problemas.

No experimento com jogo ―O Arquipélago de Sallenas‖ foi fundamental manter

e observar as rotinas da comunicação digital entre os participantes. Na primeira semana

em que o time se constituiu houve a criação de um grupo em um aplicativo de

mensagens instantâneas e um perfil em uma rede social digital, dando uma identidade,

um pertencimento e um canal de comunicação universal para os jogadores e professor.

Em relação ao comportamento inicial desses jogadores, observou-se a iniciativa de

estabelecer a mecânica da comunicação virtual entre o grupo, que emergiu de um

entendimento natural de que o professor também está inserido no uso corriqueiro desta

tecnologia.

Compreende-se que um dos caminhos possíveis para constituição de práticas

pedagógicas na cibercultura está no uso de jogos do tipo RPG, nos quais o trabalho

cooperativo e desafiador estimula um processo contínuo de pesquisa e de busca de

informações para a resolução de problemas, elementos fundamentais para integrar uma

geração de estudantes que convive na ―cibercultura‖ e que reconhece nesta um dos

principais cenários do seu cotidiano. Tal experiência aponta, também, que revisitar os

currículos de formação docente faz-se necessário, mas não apenas com a inclusão de

uma disciplina para ensinar a ―fazer jogos‖, e sim com a proposta de uma formação

transversal que contemple discussões interdisciplinares para uma formação docente

capaz de gerar novas e desafiadoras atividades em sintonia com as necessidades

apontadas pela escola neste contexto de Cibercultura.

A experiência seguinte é um recorte de uma pesquisa qualitativa que se

desenvolveu por meio de um estudo de caso, de caráter exploratório. Os sujeitos de

pesquisa foram 21 professores, de uma instituição de ensino privada, atuantes nos Anos

Iniciais do Ensino Fundamental (Educação Básica). Como instrumentos de coleta de

dados, foram usados: pesquisa bibliográfica, questionário online autoaplicável,

observação participante da aplicação de experimento, observação não participante,

entrevistas semiestruturadas e narrações autobiográficas (diários de pesquisa).

O mote para desenvolvimento desse experimento foi o modelo de elementos de

jogos digitais em atividades gamificadas proposto por Martins e Giraffa (2016). Nessa

proposição, para constituição de práticas pedagógicas gamificadas, destacamos os

seguintes elementos de jogos digitais encontrado em RPG digitais: Missão, Enredo,

Níveis/Desafios, Objetivos Específicos, Recursos, Colaboração, Help, Itens,

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Desempenho, XP, Pontuação e Avatar (MARTINS, 2015). Tratamos a gamificação

como uma estratégia que permite o desenvolvimento de práticas pedagógicas, a partir de

elementos típicos de jogos digitais baseados em RPG digital, podendo levar o docente a

autorrefletir sobre sua atuação, bem como ressignificá-la, considerando o contexto

sociocultural.

O experimento de formação continuada foi denominado Ciclo de Formação

Docente e foi organizado em três momentos:

1. Palestra ―Gamificação na Educação: conceito, limites e possibilidades‖, por

meio da qual buscamos mobilizar saberes teóricos acerca da gamificação

através do enfoque conceitual com os sujeitos de pesquisa.

2. Oficina gamificada ―Design de práticas pedagógicas incluindo elementos de

jogos digitais em atividades gamificadas‖, onde desenvolvemos práticas,

por meio dos enfoques procedimental e atitudinal, aprimorando

competências inerentes à complexidade de gamificar – foram desenvolvidas

atividades pedagógicas gamificadas pelos sujeitos de pesquisa.

3. Seminário integrador ―Partilhando Experiências‖, onde propiciamos uma

troca das experiências vivenciadas ao gamificar uma atividade pedagógica,

por meio da partilha coletiva (oral) de saberes.

A partir da aplicação e análise dos instrumentos de pesquisa citados

anteriormente, emergiram os principais resultados da experiência:

formações continuadas realizadas de maneira colaborativa e coletiva

demonstram ser eficientes; contudo, constituem um fator isolado que

depende de outras variáveis, tais como da abertura do grupo e dos objetivos

da formação.

a gamificação se mostra como uma estratégia pedagógica que leva a um grau

de reflexão acerca das práticas pedagógicas já consolidas.

o hábito de jogar, seja por parte do estudante ou por parte do professor, tem

influência na constituição de práticas pedagógicas, principalmente atividades

gamificadas, para adaptá-las ao contexto de cibercultura.

ações de Educação Continuada de curto prazo são incipientes para levar o

professor à reflexão de suas práticas pedagógicas. Pode até gerar reflexões

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sobre crenças, valores, hábitos e concepções pedagógicas, o que depende da

constituição profissional do professor.

o modelo de elementos de jogos digitais em atividades gamificadas auxilia a

promover a aprendizagem colaborativa, considerando que a competividade é

inerente ao ser humano.

gamificar atividades é uma tarefa complexa, exigindo a mobilização e

articulação de múltiplos saberes docentes, assim como construir,

desconstruir e reconstruir os diversos saberes que envolvem a docência.

Considerações finais

Os desafios que permeiam o estabelecimento de práticas pedagógicas baseadas

em elementos de jogos digitais, seja por jogos RPG ou pela gamificação para a

formação docente na cibercultura, a um olhar raso, podem estar nas fragilidades

decorridas de uma formação inicial desarticulada do contexto social e educacional

contemporâneo. Contudo, indo além de indicar as fragilidades, é necessário discutir e

propor movimentos de fortalecimento do professor em serviço, que já possui uma

formação consolidada, com crenças, representações e certezas constituídas acerca de

suas práticas. Para isso, a Educação Continuada mostra-se como uma forte aliada, desde

que desenvolvida com o intuito de promover a reflexão e autorreflexão desse sujeito da

aprendizagem, buscando a mobilização de saberes de práticas pedagógicas organizadas

por meio de competências (saber, saber-fazer, saber-ser e saber-conviver),

desconstruindo concepções, valores, crenças, hábitos, enfim, um modus operandi por

vezes cristalizado pela formação docente fragmentada, disciplinar, desconexa da prática

(saber-fazer). O que é exigido pela complexidade em tempos de cibercultura.

Como nosso objetivo não era apenas apontar, mas também contribuir para o

avanço dessa discussão sobre os desafios da formação docente em tempos de

cibercultura, apresentamos experiências significativas, pautadas no debate de práticas

pedagógicas baseadas em jogos digitais e na gamificação, que nos mostram alguns

caminhos interessantes para o futuro da formação docente, seja ela inicial ou

continuada. Um deles é o desenvolvimento de práticas formativas que fomentem a

autoeducação do professor, ou seja, estudos e investigações autodidatas/individuais na

perspectiva da aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning). Outra indicação, que

já não é tão nova, mas continua como uma necessidade urgente é a conexão entre

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formação inicial versus realidade escolar, que, por mais discussões que já tenham se

estabelecido, pouco se vê nos currículos do Ensino Superior atualmente.

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E USO DE DISPOSITIVOS MÓVEIS: O

CONTEXTO DA UBIQUIDADE

Marcia Cristina de Moraes1

Lucia M. M. Giraffa1

PPGEDu – Escola de Humanidades

PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Resumo

O artigo apresenta algumas reflexões acerca do cenário contemporânea marcado pela

ubiquidade da comunicação a luz do trabalho de Santaella (2013) destacando a questão

premente e desafiadora do uso de dispositivos móveis como elementos apoiadores das

atividades docentes e discentes. A guisa de contribuição para discussão no âmbito da

comunidade reunida por ocasião do encontro destacamos algumas experiências e propostas

pedagógicas para a utilização de dispositivos móveis as quais foram criadas e concebidas, em

consonância com o projeto pedagógico e com os objetivos estratégicos da Instituição. O projeto

apoia-se, entre outros, nos pressupostos da pedagogia relacional (BECKER, 2001), do educar

pela pesquisa (DEMO, 2007) e nos princípios da mediação pedagógica na aula universitária

(FREITAS; LIMA; GRILLO, 2012). Inicialmente, é brevemente apresentado o Projeto

Laboratório de Tecnologias para Aprendizagem em Rede (LabTEAR) e o subprojeto

LabsMóveis, no âmbito do qual se desenvolveu a investigação. Em seguida, são explicitados os

Princípios da Mediação Pedagógica, que foram elaborados coletivamente e orientam as

atividades desenvolvidas no referido projeto. Destacamos os resultados obtidos com estas

propostas pedagógicas na avaliação dos discentes e compartilhamos algumas lições aprendidas

relacionadas aos desafios e possibilidades ofertadas pela comunicação ubíqua no contexto

escolar.

Palavras-chave: Tecnologias da Informação e Comunicação; dispositivos móveis; docência

universitária.

Introdução

Muitos projetos, incentivos e ações tem sido realizadas na comunidade

brasileira, nestes últimos 30 anos, a fim de estimular o uso de Tecnologias de

Informação e Comunicação (TICs) no ambiente escolar (Moraes, 1993; De Almeida,

2002). Relembrando o pioneiro projeto EDUCOM (Educação por Computadores)

descrito por (ANDRADE et al., 1992), encontramos uma proposta de trabalho

interdisciplinar voltada para a implantação experimental de centros-piloto, como

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instrumentos relevantes para a informatização da sociedade brasileira, visando à

capacitação nacional e a uma futura política para o setor. Ou seja, falar em TICs na

escola não é algo novo. Já possuímos uma tradição na área de Informatica na Educação.

Temos várias linhas de pesquisa de cunho interdisciplinar em diferentes áreas e

programas de pós-graduação, não necessariamente na Educação. Levamos certo tempo

para investigar os desafios e possibilidades advindas das TICs no ambiente escolar a luz

da verte educacional. Uma breve análise dos anais dos principais eventos da área

demonstra o tímido crescimento da investigação dos temas associados as TICs no

campo da Educação, especialmente na comunidade brasileira. Muitas são as causas

deste movimento tímido em direção as discussões envolvendo TICs. Acredita-se que a

cautela para adoção pedagógica das TICs está relacionada a nossa formação docente,

especialmente nos cursos de graduação, que até os anos 2000 timidamente incorporava

nos currículos as questões relacionadas às TICs na ênfase de reflexões de cunho

pedagógico. No início a questão foi tratada com enfoque instrumental por acreditamos

que a instrumentalização seria o caminho para posterior e, natural, associação entre o

fazer pedagógico e a experenciação com a tecnologia na sociedade, fora do contexto

escolar.

Os problemas enfrentados no ambiente físico e organizacional da escola que luta

por recursos para manutenção, segurança, baixos investimentos e incentivos efetivos à

docência (salários, formação docente continuada e outros) são fatores que também

contribuíram para o retardo na incorporação das tendências tecnológicas que já

permeavam o cotidiano de outras áreas da sociedade. O olhar cauteloso para verificar o

que efetivamente poderia advir da adoção deste tipo de recursos (sistema

computacionais) e, especialmente, compreender o potencial pedagógico de tais recursos

nos levou (Educação) a não incorporar de imediato estas questões nos currículos de

formação de professores. Com a disseminação da cibercultura (Levy, 1999) nos

deparamos com possibilidades e um novo espaço para se fazer educação. Não nos

moldes tradicionais, sem aqui desmerecer ou imputar qualquer inferência negativa ao

fato de haver tradição ou adoção de recursos clássicos na escola (quadro, giz, slides ou

recursos analógicos que amplamente utilizamos). O ciberespaço estabelecido pela rede

Internet e seus serviços nos agrega alternativas para se fazer educação de uma maneira a

qual não havíamos considerado.

Santaella (2013, p.21) destaca que ―a internet é um cérebro digital global que,

graças às plataformas de redes sociais – Facebook, Linkedin, Twitter, Orkut etc., estas

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que se constituem no mais recente estouro do universo digital –, transmite publicamente

as relações, interesses, intenções, gostos, desejos e afetos dos usuários registrados

nessas plataformas, em processos de acesso e compartilhamento incessantes e velozes. ‖

O ciberespaço nos rodeia, nos envolve e, atualmente, com os dispositivos

moveis (tablets, smartphones e computadores portáteis) não existem mais fronteiras

físicas para o acesso a informação. Cria-se a ubiquidade da comunicação que nos

permite ter o mundo na ponta dos dedos. Santaella (2013, p.22) explica que ― ao leve

toque do seu dedo no celular, em quaisquer circunstâncias, ele pode penetrar no

ciberespaço informacional, assim como pode conversar silenciosamente com alguém ou

com um grupo de pessoas a vinte centímetros ou a continentes de distância. O que lhe

caracteriza é uma prontidão cognitiva ímpar para orientar-se entre nós e nexos

multimídia, sem perder o controle da sua presença e do seu entorno no espaço físico em

que está situado. ‖

Em SANTAELLA, (2010, p.263-296), a autora destaca que: as tecnologias

moveis estão gestando novas subjetividades em contínua mutação, subjetividades

autoprogramáveis, dotadas de meios para repensar de modo intermitente suas falhas e

competências, seus limites e suas expectativas. Isto porque tecnologias da inteligência

estão se tornando cada vez mais maleáveis e aptas para dar abrigo subjetividades em

construção no contexto de comunidades adaptativas. ‖

Se o computador tipo desktop (aquele que fica em cima da mesa, o clássico),

desconectado da Internet, nos idos anos 80 do século XX suscitava discussões na

academia nada se compara ao advento da Internet que ligou todos as informações de

maneira a criar este espaço de troca coletiva. Já não bastasse todo este desafio nos

deparamos agora com os dispositivos móveis que nos permitem acessar o que

desejamos, onde estivermos e não mais restritos ao espaço físico. Evidente que as

reflexões aqui colocadas intencionalmente desconsideram as questões de inclusão,

fazendo um recorte para realidade onde o cenário da cibercultura se escabece de

maneira ampla. Então, considerando a cibercultura, ubiquidade e os dispositivos moveis

descortina-se mais um cenário de possíveis transformações na forma de ensinar e de

aprender.

O Projeto Laboratório de Tecnologias para Aprendizagem em Rede (LabTEAR),

tem, entre seus objetivos, produzir metodologias que incorporem o uso de TICs para

favorecer a aprendizagem colaborativa, conectando a aula universitária em redes de

conhecimento, e capacitar professores e licenciados (futuros professores) para o uso

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7726ISSN 2177-336X

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pedagógico dessas tecnologias. Neste artigo destacamos o subprojeto LabsMóveis, que

tem como foco o uso de dispositivos móveis na aula universitária.

O artigo apresenta brevemente o Projeto Laboratório de Tecnologias para

Aprendizagem em Rede (LabTEAR) e o subprojeto LabsMóveis, no âmbito do qual se

desenvolve a presente discussão. Apresentamos os Princípios da Mediação Pedagógica,

que foram elaborados coletivamente e orientam as atividades desenvolvidas no referido

projeto, amplamente discutidas em (GESSINGER; LEITE; MORAES, 2014). A seguir,

são apresentadas as repercussões do LabTEAR e do LabsMóveis, com ênfase na

capacitação docente. Por último, apresentamos algumas ponderações sobre as lições

aprendidas para aqueles que estão considerando projetos semelhantes.

LabTEAR e LabsMóveis: uma breve contextualização

O Projeto LabTEAR é uma proposta institucional para atender a questão do uso

pedagógico das TICS no âmbito da universidade procurando promover um espaço de

discussão, experenciação e diálogo entre a comunidade docente. O Projeto desdobrou-se

em um subprojeto voltado ao uso de tecnologias móveis na aula universitária.

Iniciado em janeiro de 2012, o subprojeto LabsMóveis se realiza a partir da

criação de laboratórios móveis associados a um grupo de estudos que contempla as

áreas da saúde, ciências exatas, humanas e sociais. A implantação do LabsMóveis

ocorreu em três etapas, cada uma contemplando um conjunto de Faculdades da

Universidade e proporcionando a integração entre todas as áreas do conhecimento. A

primeira etapa (de 2012/1 até o final de 2013/1) teve a participação de seis Faculdades –

Enfermagem, Nutrição e Fisioterapia; Educação; Física; Comunicação Social;

Engenharia e Direito – totalizando 14 professores, 66 turmas e 1.861 alunos. Na

segunda etapa (de 2013/1 até o final de 2013/2) foram integradas outras oito Faculdades

– Farmácia; Educação Física e Ciências do Desporto; Administração e Ciências

Econômicas; Química; Letras; Psicologia; Serviço Social e Informática) – totalizando

22 professores, 66 turmas e 3.619 alunos. Na terceira etapa, que iniciou em 2014/1

foram integradas ao LabsMóveis outras oito Faculdades – Medicina; Odontologia;

Biociências; Ciências Aeronáuticas; Matemática; Ciências Humanas e Sociais; Teologia

e Arquitetura e Urbanismo – totalizando 43 professores.

As Faculdades integrantes do subprojeto LabsMóveis indicam professores que

participam de reuniões quinzenais de um grupo de estudos para a criação, a utilização e

a avaliação de procedimentos didáticos com o apoio das TICs. Ainda recebem um rack

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com dispositivos móveis, à sua escolha, que auxiliarão na produção e validação das

metodologias desenvolvidas no âmbito do subprojeto. Os professores definem as

disciplinas e turmas que participam diretamente do subprojeto, entretanto, o uso dos

racks não se restringe a esses docentes, podendo ser utilizado pelos demais colegas da

Faculdade.

Os procedimentos didáticos são criados num processo de criação coletiva e

colaborativa entre o grupo de estudos e o grupo de alunos participantes dessas

disciplinas. Os resultados da utilização dos procedimentos didáticos são analisados pelo

grupo de estudos que participa do LabsMóveis, tendo em vista o aperfeiçoamento e a

continuidade da proposta pedagógica.

Primeiros resultados: Princípios da Mediação Pedagógica na Aula

Universitária

Em seu primeiro ano de trabalho, o grupo de estudos do subprojeto LabsMóveis

elaborou os Princípios da Mediação Pedagógica na Aula Universitária para orientar a

produção de metodologias e o uso pedagógico das TICs na aula universitária.

A publicação de tais princípios (FREITAS; LIMA; GRILLO, 2012) contribuiu

para socializar a produção do grupo com outros educadores/as, bem como para orientar

as atividades de capacitação promovidas. Cada um dos princípios tem um sentido

próprio, mas, conjuntamente eles expressam uma compreensão comum acerca das

possibilidades de vislumbrar e realizar a qualidade na gestão da aula universitária, em

consonância com o projeto pedagógico da Instituição. Os princípios definidos são os

seguintes (FREITAS; LIMA; GRILLO, 2012, p.5-6):

“Presença pedagógica e Aprendizagem: a presença

pedagógica do professor, por meio da escuta e do diálogo,

presencial ou virtualmente, cria situações de interação,

com vistas à mobilização do aluno para a aprendizagem

no contexto da formação integral da pessoa.

Ensino e Pesquisa: o ensino orientado pela pesquisa se

realiza por meio da aprendizagem do questionamento, da

construção de argumentos e da comunicação do

conhecimento, desenvolvendo uma atitude investigativa

de problematização da realidade, em diálogo com os

sujeitos.

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7728ISSN 2177-336X

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Autonomia e Diálogo: a autonomia, como resultado

esperado da aprendizagem, se constrói por meio do

diálogo entre professor e alunos no processo de

conhecimento em que se exercita a crítica, se incentiva a

curiosidade e se desenvolve a criatividade.

Avaliação e Corresponsabilidade: a avaliação formativa

compreende a tomada de consciência sobre o processo de

aprendizagem, com vistas a desenvolver a

corresponsabilidade e a capacidade de auto-organização

para superar as dificuldades encontradas.

Interação e Interatividade: as TICs democratizam o

acesso à informação e proporcionam alternativas de

interação entre os sujeitos, flexibilizando os tempos e os

espaços de ensino e de aprendizagem, favorecendo a

interatividade em redes de conhecimento.

Protagonismo e Comunidades de aprendizagem: o

protagonismo discente é estimulado pelo

compartilhamento de produções e fortalecido com a

criação de comunidades de aprendizagem em que os

participantes podem interagir em redes de conhecimento.

Interdisciplinaridade e Formação integral: as práticas

multi/interdisciplinares, orientadas pela perspectiva da

humanização, fortalecem a formação integral da pessoa na

dimensão da ética, da responsabilidade e do compromisso

social. ‖

Projeto LabTEAR e Lições aprendidas

Embora o diálogo entre as Tecnologias da Informação e Comunicação e a escola

não seja algo novo, como anteriormente mencionado, entendemos que esse diálogo

ainda é um desafio nos dias atuais, onde temos vivenciado o uso cada vez mais intenso

de recursos tecnológicos, em especial de dispositivos móveis, por parte dos estudantes.

É importante, e até mesmo imprescindível, que utilizemos esses recursos como

potenciais alavancas para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que busquem

contribuir com os processos de ensino e de aprendizagem. Neste sentido, em (MORAES

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et al. 2013, DIAS; MORAES; LEITE, 2014 e MORAES et al. 2015)

apresentamos o processo de validação da experiência do uso de dispositivos moveis nos

diferentes contextos e áreas do conhecimento.

A experiência de participar deste projeto como membro integrante da equipe de

planejamento e implantação e como professor usuário nos permitiu aprender muito.

Passamos a compartilhar estas lições dividindo-as em três categorias:

Formação docente continuada

O processo de formação docente continuada deve ser um dos objetivos de uma

Universidade preocupada com a qualificação permanente de seus cursos e,

consequentemente, de seu corpo docente. É fundamental que exista um projeto

institucional voltado a atingir esse objetivo. Este projeto deve considerar a necessidade

de suporte aos professores tanto de aspectos pedagógicos quanto administrativos.

Considerando a parte pedagógica, deve-se estabelecer uma equipe multidisciplinar para

coordenar o projeto e organizar os processos de formação. Cabe a essa equipe convidar

professores que estejam engajados com a proposta de formação apresentada. Obrigar

professores a participar de um projeto do qual não se sentem à vontade, ou não

consideram relevante, é uma receita para o insucesso da empreitada.

Em relação a parte administrativa, é necessário que os professores vinculados ao

projeto possuam horas semanais para a realização de suas atividades de formação. As

atividades de formação devem ser entendidas como processos de ensino e de

aprendizagem para os professores e, neste sentido, demandam leituras, releituras,

construções e reconstruções de conhecimentos.

No âmbito do subprojeto LabsMóveis, a equipe coordenadora era composta por

seis professoras: duas da Pedagogia, duas da Computação, uma da Saúde e uma de

Letras. A equipe possuía quatro horas semanais para gerenciar, planejar e executar o

projeto. Os professores convidados para participar do grupo de estudos dispunham de

três horas semanais para a realização das atividades de formação desenvolvidas. Como

mencionado anteriormente, eram realizadas reuniões quinzenais e entre uma reunião e a

próxima os professores sempre estavam envolvidos em algum tipo de atividade, que

variavam desde leituras até pesquisas com estudantes e professores.

As reuniões eram entendidas como espaços de aprendizagem e construção de

conhecimento e não tinham como objetivo tratar de questões administrativas. Nesses

momentos eram realizadas oficinas sobre práticas pedagógicas, oficinas sobre diferentes

aplicativos disponíveis para dispositivos móveis, relatos de experiência, elaboração de

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práticas pedagógicas inovadoras para o uso de dispositivos móveis e vivências com as

práticas pedagógicas elaboradas. Antes de um professor do grupo aplicar uma prática

pedagógica desenvolvida no LabsMóveis com seus alunos em sala de aula, a mesma era

―testada‖ com os professores do grupo de estudos, que além de vivencia-la como

alunos, analisavam a prática realizada e sugeriam aperfeiçoamentos, quando necessário.

As atividades de formação eram executadas tanto pela equipe coordenadora

quanto por professores participantes do grupo de estudos, através de um processo

organizado com base no Educar pela Pesquisa (DEMO, 2007). A dinâmica dessas

formações era construída de maneira colaborativa envolvendo todos os professores.

Tendo como objetivo compartilhar materiais e manter o histórico das atividades

desenvolvidas, o grupo possui uma área Moodle e também um grupo fechado no

Facebook.

O trabalho realizado com o grupo de estudos, além de proporcionar formação

continuada para o uso pedagógico de dispositivos móveis, tinha como objetivo formar

multiplicadores. Neste sentido, foi realizada uma mostra dos trabalhos desenvolvidos

pelo grupo. Nesta mostra, cada professor deveria convidar pelo menos três outros

professores de sua Faculdade para conhecer o projeto e se engajar nas atividades

específicas de cada Faculdade, formando novos grupos de estudo e ampliando, assim, os

processos de formação.

Organização do espaço físico e decisões tecnológicas

Tendo em vista que através do LabsMóveis todas as Faculdades da Universidade

receberiam racks com dispositivos móveis (tablets ou notebooks), foi necessário a

criação de um ambiente que proporcionasse a formação docente continuada necessária

para que o projeto fosse efetivado em sala de aula. A escolha pelo tipo de dispositivo a

ser adquirido foi estabelecida pelos professores de cada Faculdade, considerando suas

particularidades e necessidades em termos de hardware e software.

Pensando em um ambiente diferenciado que possibilitasse a inovação de práticas

pedagógicas apoiadas com o uso de diferentes recursos foi criado o Laboratório de

Tecnologias para Aprendizagem em Rede (LabTEAR). O laboratório conta com oito

possibilidades de layouts flexíveis que permitem a realização de diferentes práticas

pedagógicas, tais como seminários, palestras, trabalhos em pequenos e grandes grupos.

Além disso, é equipado com um rack composto de 15 tablets e 15 notebooks, uma lousa

eletrônica e uma Smart TV, através dos quais podem ser realizadas videoconferências.

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A opção por um rack misto ocorreu devido à necessidade de formação para ambos

recursos, tendo em vista que algumas Faculdades optaram por usar tablets e outras

notebooks. Além de ser utilizado para os processos de formação, o laboratório pode ser

reservado para uso por outros professores que não façam parte do grupo de estudos.

Considerando a necessidade de se ter um acesso estável a Internet no momento

em que os racks fossem utilizados em sala de aula, foi estabelecida uma rede específica

para ser utilizada por esses recursos. Sendo assim, os dispositivos se conectam

automaticamente a rede wireless do projeto. Para tanto, é necessário que se faça um

levantamento dos possíveis locais em que esses equipamentos serão utilizados para se

verificar questões de infraestrutura e providenciar a adequação lógica e elétrica.

Todo o processo de definição, aquisição, instalação e manutenção dos

equipamentos foi realizado em conjunto com a Gerência de Tecnologias de Informação

e Comunicação da Universidade.

Práticas pedagógicas e integração entre docentes

Tardif (2002, p. 128) propõe uma pedagogia que priorize a ―tecnologia da

interação humana, colocando em evidência, ao mesmo tempo, a questão das dimensões

epistemológicas e éticas‖, apoiada necessariamente em uma visão de mundo, de homem

e sociedade. Neste sentido, uma prática pedagógica precisa ter dinâmica própria, que lhe

permita o exercício do pensamento reflexivo e esse tipo de prática pedagógica é que se

buscou construir com o grupo de estudos do LabsMóveis.

Acreditamos que a interação entre professores de diferentes áreas do

conhecimento é muito rica e amplia as possibilidades de conhecer novas formas de

ensinar e de aprender. As práticas pedagógicas foram desenvolvidas pelos professores

participantes do grupo de estudos em um processo de ação-reflexão-ação. Como

mencionado anteriormente, antes de aplicar as práticas em sala de aula, as mesmas eram

vivenciadas pelos professores, que assumiam o papel de estudantes. Logo após, elas

eram analisadas e aperfeiçoadas, para então serem aplicadas com os estudantes. Da

mesma forma, após a aplicação em aula, os professores refletiam sobre a dinâmica

realizada, considerando as observações e retorno dos estudantes; faziam um relato para

o grupo de estudos e novos ajustes eram realizados, caso necessário.

Todas as práticas pedagógicas foram sistematizadas em um formulário que

continha o nome da mesma, os princípios da mediação pedagógica que estavam sendo

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7732ISSN 2177-336X

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considerados, a duração aproximada, uma descrição detalhada da prática, bem como os

recursos de hardware e software necessários para que a mesma fosse realizada.

Buscamos elaborar práticas pedagógicas que pudessem ser utilizadas por

diferentes áreas do conhecimento, pois entendemos que nessas práticas existe uma

inovação em relação ao aspecto pedagógico que pode ser compartilhada por várias

áreas. Desta maneira, cada professor pode ―rechear‖ a mesma com o conteúdo

específico de sua disciplina.

Acreditamos que as práticas pedagógicas produzidas no âmbito do LabsMóveis

estejam contribuindo para a formação de nossos alunos. Como pode ser observado no

depoimento de um aluno de Física: ―A gente tem mais um meio de consulta que seria o

IPad, a gente pesquisa...muitas pessoas aqui no dia da aula com os IPads pesquisaram

alguma coisa, aí perguntaram para o professor... ou seja, fica uma aula muito mais

dinâmica e o aprendizado se torna muito mais sólido‖.

Outro indicativo disso é a satisfação dos alunos nas disciplinas que participam

do projeto. Essa satisfação é observada através de um dado quantitativo obtido pela

Avaliação de Disciplinas, realizada a cada semestre. Observamos que houve um

aumento no percentual de alunos satisfeitos nas disciplinas envolvidas com o projeto em

relação ao percentual geral da Universidade. Em 2012/2 a média geral da Universidade

foi de 72,4% e nas disciplinas relacionadas ao LabsMóveis foi de 78, 16%; em 2013/1,

a média geral foi de 72,1% e nas disciplinas relacionadas ao LabsMóveis foi de 84,96%;

em 2013/2 a média geral foi de 71,9% e das disciplinas relacionadas ao LabsMóveis foi

de 74,32%. Ainda que esse percentual não possa ser exclusivamente atribuído ao

LabsMóveis, é possível considerar que o mesmo tenha uma importante contribuição

para esse crescimento.

Referências

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Janeiro: Vozes.2012.

________________________________________________

1 Possui graduação em Bacharelado em Informática pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul (1996), Mestrado em Ciência da Computação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul (1999) e Doutorado em Ciências da Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

(2004), realizou doutorado sanduíche na empresa Extempo Systems Inc., nos Estados Unidos da América.

Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, onde atua na graduação e

especialização. De julho de 2009 a julho de 2015 foi membro do Setor de Tecnologias Educacionais da Pró-Reitoria Acadêmica. É avaliadora das revistas Scientia, RBIE e RBCA e Coordenadora do Curso de

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7734ISSN 2177-336X

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Especialização em Informática na Educação - Modalidade a Distância. Tem experiência na área de

Ciência da Computação, com ênfase em Sistemas Multiagentes e Informática na Educação, atuando

principalmente nos seguintes temas: Inteligência Artificial aplicada à Informática na Educação, agentes

de software, softwares educacionais, educação à distância e objetos de aprendizagem. E-mail:

[email protected]

1 É professora titular da Faculdade de Informática da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do

Sul onde leciona Algoritmos e Programação, orienta trabalhos de conclusão de curso (Ciência da

Computação, Sistemas de Informação). Pesquisadora e professora permanente do Programa de Pós-

Graduação da Faculdade de Educação – Escola de Humanidades/PUCRS. Atua na pesquisa em IE desde

1987, com ênfase nos seguintes temas: Softwares Educacionais, formação de professores para uso de

tecnologias e Educação a Distância. Possui graduações em: Licenciatura Plena Em Matemática e

Licenciatura Curta Em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Especialização em

Análise de Sistemas pela PUCRS, Mestrado em Educação pela PUCRS, doutorado em Ciências da

Computação pela UFRGS e Pós-Doutorado na Universidade do Texas (Austin) no College of Education,

Bolsista CAPES. Líder ARGOS - Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Educação a Distância da

PUCRS (http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/1961885168367047). E-mail: [email protected]

APLIC@TIVOS COMO RECURSO DIDÁTICO TECNOLÓGICO:

REFLEXÕES PARA A FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE

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Débora Valletta1

Colégio Farroupilha (RS)

Resumo: Este artigo tem como objetivo refletir sobre as práticas docentes de uma

escola de educação básica que utiliza os tablets como apoio as suas atividades

curriculares. Investigaram-se os aplicativos (Apps) que foram e são utilizados pelos

docentes da Educação Infantil e Anos Iniciais como recurso didático tecnológico entre

2014 e 2015, e como foram articulados junto aos auxiliares de Tecnologias

Educacionais (TE) em sintonia com os projetos pedagógicos do colégio. Apresentamos,

então, um estudo de caso em que analisamos os Apps que servem como apoio às

atividades educativas. Percebeu-se que o percurso pedagógico e operacional é longo e

difícil, porém promissor. Ao fim do artigo, tecem-se considerações sobre a importância

e os significados do setor de apoio, denominado Tecnologia Educacional, para auxiliar

os professores e as crianças na escola, além de contribuir para a formação continuada in

loco.

Palavras-chave: Formação continuada de professores. Prática docente. Didática.

Tablets. Aprendizagem ubíqua.

1. Introdução

A relação entre a formação do professor e as tecnologias digitais (TD)2 tem

permeado as discussões na área da Educação, principalmente, as [discussões] que se

referem à formação docente, como o desenvolvimento de ―competências e habilidades‖

para a sala de aula do século 21. Para Perrenoud (2000), o domínio dessas competências

tecnológicas vai além de conhecer os aspectos básicos de funcionamento dos artefatos

para utilizá-los em favor das expectativas de aprendizagem. Entretanto, por mais que o

professor utilize as TE do momento, a dimensão pedagógica e a escola como instituição

estão presentes nas discussões e definições das propostas de formação continuada para o

corpo docente. Enquanto formação docente, podem-se articular e equilibrar os saberes

do professor e sua experiência no ambiente do trabalho (Tardiff, 2014).

Se observamos adultos, jovens e crianças ao nosso redor, percebemos que alguns

deles têm mais facilidade e competência para realizar suas atividades, enquanto outros,

embora consigam realizá-las, apresentam algum tipo de dificuldade ou necessidade de

maior esforço (cognitivo e/ou motor). Nesse sentido, as diferenças existentes entre os

professores não são mera casualidade. Há docentes que têm mais facilidade em ―lidar‖

com as tecnologias e outros necessitam de apoio para articular suas ações em sala de

aula e/ou fora dela nas interações com os estudantes/crianças. Para tal, torna-se

necessário propiciar situações de aprendizagem nas capacitações – articulando essas

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7736ISSN 2177-336X

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situações entre os próprios colegas professores, bem como com as crianças – para que a

escola possa orientar-se e reconhecer as mudanças que envolvem o processo de

construção do conhecimento considerando a aprendizagem ubíqua3.

No trabalho desenvolvido por Valletta (2015), enfatiza-se que as TD

potencializam os espaços não formais de aprendizagem, desencadeando uma forma de

ensinar e aprender diferente, uma vez que o processo de construção do conhecimento

conecta-se a outros ambientes de interação além da sala de aula. Ou seja, as crianças

estão sendo socializadas por meio de experiências vividas e, portanto, interiorizando os

hábitos e comportamentos da sociedade contemporânea.

Isso porque ―[...] jamais a evolução das ciências e das técnicas foi tão rápida,

com tantas consequências diretas sobre a vida cotidiana, [...] é no universo dos saberes e

do savoir-faire que a aceleração é mais acentuada e as configurações mais móveis. ‖

(Lévy, 2011, p. 25). Assim, a formação continuada poderia funcionar como um

processo para acompanhar os movimentos da sociedade contemporânea. Infere-se,

portanto, que a formação continuada em serviço é um construto amplo, ubíquo,

individual, coletivo e de suma importância para engajar as crianças e os jovens na

escola do século 21.

Para além dessas questões, Gardner (1995, p. 15) é enfático quando afirma que [...] o propósito da escola deveria ser o de desenvolver as inteligências

e ajudar as pessoas a atingirem objetivos de ocupação e passatempo

adequado ao seu espectro particular de inteligências. As pessoas que

são ajudadas a fazer isso, acredito, se sentem mais engajadas e

competentes, e, portanto, mais inclinadas a servirem à sociedade de

uma maneira construtiva.

Portanto, provavelmente o conhecimento da inteligência4 apresenta-se com o

saber de forma coletiva. Nesse sentido, existe uma relação, no processo de

aprendizagem, entre o conjunto de habilidades que uma pessoa desenvolve para atingir

determinada competência, e o conjunto de outras habilidades que foram desenvolvidas

parcialmente – ou ainda o conjunto de habilidades que simplesmente não se conseguiu

atingir, que se referem aos níveis mais elevados de certas competências. Lévy (2011, p.

29) apresenta o termo inteligência coletiva como ―distribuída por toda parte,

incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma

mobilização efetiva das competências‖. Isso porque o ciberespaço propicia a troca, o

compartilhamento de hipertextos, hipermídias, comunicação entre comunidades virtuais

e outras conexões por meio da Internet.

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7737ISSN 2177-336X

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Para Valletta e Giraffa (2015), o grande desafio em selecionar os Apps sob a luz

do profissional de Design Instrucional (DI) consiste em saber de que forma esse recurso

didático tecnológico pode provocar rupturas na forma como aprendemos e ensinamos

com as TD, podendo favorecer a aprendizagem ubíqua com apoio dos tablets e seus

Apps.

Assim, este artigo tem como objetivo refletir sobre as práticas de uma escola

privada de educação básica que utiliza os tablets como apoio as suas atividades

curriculares. Investigaram-se os Apps que foram e são utilizados pelos docentes da

Educação Infantil e Anos Iniciais como recurso didático tecnológico entre 2014 e 2015,

e como foram articulados junto aos auxiliares de Tecnologias Educacionais (TE) em

sintonia com os projetos pedagógicos do colégio.

Centenas de Apps foram selecionados, testados, utilizados e recategorizados (de

acordo com a demanda do professor) para serem aplicados com as turmas da Educação

Infantil e Anos Iniciais. Porém, muitos desses Apps são sugeridos pela equipe de TE

para que os professores também possam se manter atualizados e conhecer novas

funcionalidades e possibilidades de atividades pedagógicas.

A partir do contexto exposto, apresentaremos as atuais tentativas (2014 a 2015)

de compreender de que maneira os Apps selecionados e avaliados para dispositivos

móveis (tablets) foram e são utilizados nos espaços formais e não formais de

aprendizagem na referida instituição de educação básica.

O texto está estruturado da seguinte forma: primeiramente, apresentamos breve

pesquisa quantitativa e comparativa que trata do número de Apps utilizados na

instituição desde o início da implementação dos laboratórios móveis até o período atual

(2014 - 2015). Em seguida, definimos como a formação de professores foi organizada

no período de 2014 a 2015 para selecionar os Apps para os tablets. Por fim,

comentamos sobre como esses Apps foram utilizados ontem e hoje na escola.

Apresentamos então, um estudo de caso em que analisamos os Apps que servem como

apoio às atividades educativas. Por fim, tecem-se considerações sobre a importância e

significados do setor de apoio denominado de Tecnologia Educacional para auxiliar os

professores e as crianças na escola. Além de contribuir para a formação continuada in

locus.

2. Dos computadores de mesa aos tablets

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O Colégio é uma instituição de ensino básico privado localizado no município

de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Um dos aspectos que chamam a atenção, nessa

instituição, expresso no trabalho de Jacques (2011), é a valorização do seu patrimônio

histórico-cultural. Com quase 130 anos de história, mudou sua denominação e sua

localização por algumas vezes5. Atualmente tem como mantenedora a Associação

Beneficente de 1858 (ABE).

Outro aspecto importante dessa escola se refere aos recursos didático-

tecnológicos disponibilizados para os estudantes entre o final do século 20 e início do

século 21. Percebe-se que, entre o passado e o presente, a instituição esteve atenta aos

múltiplos olhares frente às mudanças culturais da sociedade no decorrer das últimas três

décadas6. A figura 1 e a figura 2 explicitam as marcas do tempo e comprovam que

nenhuma sociedade permanece sempre da forma como foi constituída inicialmente.

Na década de 90, os desktops eram pesados, grandes e com poucos softwares

categorizados como educativos. Atualmente os computadores, do tipo tablets, são leves,

portáteis e com milhares de Apps que podem ser utilizados como apoio educativo.

Figura 1 – Espaço de Informática nas aulas de Matemática: computadores de mesa (1995)

Fonte: Acervo do memorial.

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Figura 2 - Laboratórios Móveis: tablets e notebooks (2014)

Fonte: Acervo do site.

Percebe-se pela memória7 ilustrativa das figuras que, aparentemente, um

computador fixo limita as possibilidades de se realizar as atividades educativas nos

espaços escolares. Por outro lado, os tablets potencializam a liberdade8, o interesse e a

criatividade. Para Veen e Vrakking (2009), a tecnologia potencializou mudanças mais

significativas para inovação. Os autores denominam a era atual como ―era criativa‖.

3. Metodologia da pesquisa

A pesquisa é de natureza exploratória e abordagem qualitativa. Como

instrumentos para a coleta de dados, foram utilizados questionário semiestruturado,

observação participante, observação não participante e arquivos de imagens e textos da

organização das atividades envolvendo os tablets e seus Apps, disponibilizados pelo

setor de TE no ambiente de ensino e aprendizagem Moodle9. Os dados foram analisados

a partir da análise textual discursiva (ATD) de Moraes e Galiazzi (2011), tendo como

fundamentação teórica: a metodologia para seleção de Apps (Valletta, 2014), que visa a

uma compreensão holística entre os recursos didático-tecnológicos (tablets, Apps e

internet) e os recursos humanos (professores e equipe do setor de Tecnologias

Educacionais); os desdobramentos da orientações didáticas para seleção dos aplicativos

segundo o profissional de DI (Valletta; Giraffa, 2015); os jogos na Educação Infantil

(Kishimoto, 1994); a formação docente (Tardiff, 2014) entre outros.

Participaram da pesquisa cinco profissionais do setor de tecnologias

educacionais que são responsáveis por auxiliar os professores e as crianças na escola.

4. Aplicativos free e aplicativos pagos: uma pesquisa quantitativa e comparativa

(2014 – 2015)

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Para efeitos de análise quantitativa10

, foi levantado o número total de Apps free

(gratuitos) e pagos (baixo custo/média de $ 0,99) utilizados na Educação Infantil

(crianças de 3 a 5 anos) e Anos Iniciais (1º ao 4º ano) entre 2014 e 2015. Esses recursos

didático-tecnológicos foram comparados ao total de Apps utilizados pela instituição e,

com isso, foram calculados os percentuais por ano, tendo em vista as diferentes

categorias propostas por Valletta (2014). Essa combinação foi realizada a partir de

relatórios operacionais do setor de Tecnologias Educacionais chegando-se ao resultado

demonstrado na tabela 1.

Tabela 1 - Pesquisa quantitativa e comparativa que trata do número de Apps utilizados na instituição entre

2014 e 2015

Custo do App 2014 2015

Free 657 506

Pago 171 86

Total 828 592

Fonte: A autora (2016).

De acordo com a proporção entre os Apps pagos e gratuitos, houve uma

diminuição de aproximadamente 50% na compra de novos Apps. Isso se deve a alguns

fatores, como: reuso dos Apps adquiridos no ano de 2014; atualização das ferramentas

existentes dentro dos Apps (inserção de novas ferramentas e/ou atualizações,

aumentando as possibilidades pedagógicas do mesmo App); aumento da moeda

americana (já que o pagamento dos Apps é convertido de dólar para real – redução de

aproximadamente 20%); reorganização da sequência didática utilizando o mesmo App

com intencionalidade e turmas diferentes – ou seja, recursos didáticos explorados nos

espaços formais (escola) e não formais (sede campestre, passeios na sede campestre

etc.); compartilhamento de Apps, por parte dos professores com seus pares, reutilizando-

os em outras turmas (mesmo nível ou níveis diferentes); entre outros.

Percebe-se, ao analisar os dados quantitativos em dois anos consecutivos, que

cerca de 30% dos Apps foram utilizados em espaços fora da sala de aula. Podemos

observar a otimização de outros espaços da escola quando associamos o aspecto lúdico

da aprendizagem (Kishimoto, 1994) à aprendizagem ubíqua (Santaella, 2010; Valletta,

2015) em atividades gamificadas11

.

5. Contextualização da Formação Continuada em Tecnologias Digitais nos Espaços

Escolares

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As capacitações disponibilizadas pela instituição são planejadas de forma a

propiciar aos professores possibilidades para o uso de TD, tomando-se como parâmetro,

as matrizes curriculares da escola. Formá-los desse modo significa dar-lhes a

oportunidade de perceber significado pedagógico nos recursos didático-tecnológicos

como elementos para criar e recriar possibilidades para o uso dos tablets e seus Apps.

Nesse sentido, Tardiff (2014, p. 451) discute esses saberes como respondentes aos

―discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar

categoriza e apresenta os saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelos

da cultura erudita e de formação para a cultura erudita‖. A intencionalidade do currículo

diante do contexto escolar faz com que o professor organize os planos de ensino

aplicando seu potencial de criatividade para motivar e engajar as crianças a aprenderem.

A formação continuada para o uso de tecnologias digitais (TD) na instituição em

estudo iniciou-se no segundo semestre de 2013 em parceria com o setor de Tecnologia

Educacional. A primeira capacitação para o uso sistemático dos Apps não significou

ruptura imediata nos espaços escolares, não tendo modificado as condições de como a

maioria dos docentes utilizavam os tablets; ou seja, na sala de aula. Entretanto, com a

continuidade das oficinas de formação e do uso dos Apps, os próprios professores

passaram a definir a forma como os jogos12

eram selecionados e avaliados como apoio

às atividades educativas que integram o currículo escolar e desenvolvimento de

habilidades em níveis diferenciados de uso das TD (Valletta, 2015). Além disso, nessa

categoria de seleção, estavam os princípios metodológicos:

Seleção por conteúdo; Seleção do nível de dificuldade intrínseco na

aplicação; Faixa etária do aluno (usuário final da aplicação); Interface

& facilidade de uso; Custo acessível ou inexistente e Objetivos

pedagógicos do professor", por fim, categorizados pela taxonomia de

Bloom Digital. (Valletta, 2014, p. 5-6).

A partir da seleção de Apps ao longo de 2014, surgiram outras mudanças

associadas às práticas pedagógicas dos professores no que concerne ao uso dos tablets e

seus Apps, a aprendizagem ubíqua (Valletta, 2015). Segundo a autora, a ubiquidade

―[...] ofertada/oportunizada pelo acesso a qualquer local e a qualquer hora por

aquele/qualquer sujeito que possui um dispositivo móvel conectado à Internet muda as

concepções tradicionais do que se entende por um espaço de aprendizagem. ‖ (2015, p.

13).

Os professores que realizaram a mediação das atividades, interagindo com os

Apps junto com as crianças e com o apoio dos auxiliares de TE, propiciaram situações

de aprendizagem diferentes das que estamos acostumados a ver na maioria das salas de

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33

aula. Uma das práticas de inovação desenvolvida pelos professores do 2º ano foi

realizada na Feira das Multiplicações, em 2015, em que se utilizaram recursos didáticos

naturais, pedagógicos, tecnológicos e audiovisuais.

6. Experiências bem-sucedidas: práticas para e com o uso de Apps

A seleção dos Apps passa por filtros no setor de TE devido aos inúmeros

softwares disponíveis nas lojas Online13

, os quais são baixados nos tablets. Na análise

dos Apps utilizados entre os anos de 2014 e 2015, selecionou-se um fragmento do

material coletado, ou seja, dos Apps utilizados em contextos diferentes (Educação

Infantil e Anos Iniciais), para os quais foram consideradas a presença do DI (Valletta;

Giraffa, 2015) e a metodologia para seleção de Apps (Valletta, 2014).

Quadro 1 – Síntese contextualizada de como cada aplicativo foi utilizado e/ou reutilizado

Nome do Jogo Objetivo Como e onde foi utilizado

Shape the

Village Lite

Desenhe

Conosco

Construir cidades virtuais por

meio de formas geométricas.

Desenhar ilustrações sobre a

tela do iPad utilizando

ferramentas similares às do

material concreto, tais como:

lápis de cor, crayon, entre

outros recursos.

Atividade 1: A professora organizou a turma em

rodinha na sala e dialogou sobre a atividade do dia.

O auxiliar de TE explicou como funcionavam as

ferramentas. As crianças levantaram as mãos para

questionar sobre as possíveis formas geométricas

encontradas no cotidiano e a professora realizou a

mediação com a turma. O auxiliar de TE

disponibilizou um iPad na sala de aula para cada

dupla.

Atividade 2: Na semana seguinte, cada criança

desenhou sua releitura sobre a cidade construída

com o colega para socializar com a turma. O setor

de TE elaborou algumas questões norteadoras para

auxiliar o professor com a intenção de engajar os

alunos no reconhecimento das formas geométricas.

Google Maps Comparar a distância entre

Porto Alegre e os países

participantes da Copa do

Mundo.

Atividade 1: As crianças foram convidadas a fazer

um tour pelos diversos espaços do colégio

utilizando a ferramenta de Geolocalização do App.

Atividade 2: Na sala de aula, a professora fez um

levantamento prévio de quais eram os países

participantes da Copa do Mundo. Na sequência,

solicitou às crianças que acessassem o App Google

Maps para que pudessem interagir (clique e arraste)

e perceber a distância entre os países (longe e perto).

A professora circulou entre os grupos para desafiá-

los com os próprios questionamentos das crianças da

turma.

Aaah! Math

Zombies Free

Lite

Calcular as operações básicas

da matemática.

Os estudantes iniciaram as atividades nos corredores

próximos às salas de aula onde há almofadas do tipo

puff.

Labo Paper

Fish Crafts

Criar ilustrações em

movimento (peixes) para

aguçar a curiosidade das

crianças em relação aos

animais aquáticos. Auxiliar no

Atividade 1: As crianças exploraram as diversas

ferramentas do App. Escolheram um tipo de peixe e

customizaram seus trabalhos.

Atividade 2: Jogaram o game Stars – incluído no

App – cujo objetivo é captar estrelinhas para

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desenvolvimento da

coordenação motora fina.

pontuação.

Atividade 3: Observaram e fotografaram os

peixinhos do aquário.

Embora haja diversas ferramentas no App,

ocorreram duas situações: parte de uma das turmas

se cansou do aplicativo, enquanto que os alunos de

outra turma, ministrada por outra professora,

pediram para jogar os demais jogos. Percebeu-se,

nesse caso, que a professora tem competências e

experiência para trabalhar com jogos educativos

(digitais ou não) e consegue facilmente engajar sua

turma no uso deles.

Crazy fórmula Desenvolver o raciocínio

lógico-matemático.

Atividade 1: A professora apresentou como

funcionam as ferramentas do App na sala de aula.

As crianças foram desafiadas a reorganizar os tubos

de laboratório para que as fórmulas especiais

(representadas pelas cores primárias e secundárias)

pudessem fluir e chegar ao recipiente

correspondente. Usaram o App na versão

free/gratuito.

Atividade 2: As turmas puderam separar as fórmulas

(cores); misturar duas ou mais fórmulas para que

fosse gerada uma nova cor; mudar cores, tornar mais

lento o fluxo das fórmulas, etc.

No que diz respeito a memorizar as cores, as

crianças conseguiram atingir os objetivos, enquanto

que, nas atividades que exigiam raciocínio lógico-

matemático, foi necessária uma explicação mais

clara para auxiliar na compreensão do

funcionamento do App. Houve a mediação da

professora para concluir as atividades.

App Varal de

Letras

Treinar a escrita de palavras.

Ouvir atentamente as palavras

ditadas pela professora para

simular o jogo ―soletrando‖.

Encontrar a escrita correta da

palavra.

Atividade 1: As crianças foram desafiadas por meio

da gamificação para escrever corretamente a

palavra. Os alunos individualmente escreveram as

palavras ditadas no aplicativo e a professora realizou

a mediação fazendo a intervenção entre os grupos

para a correção.

Atividade 2: Os estudantes encontraram as palavras

certas, através da observação das quatro imagens

exibidas pelo App. É importante salientar que todas

eram distintas umas das outras, embora possuíssem

algo em comum.

App Chatter Pix Criar personagens e gravar

áudio com a própria voz.

Explorar a criatividade e

imaginação.

As crianças tiraram fotos e desenharam alguns

personagens para gravar o áudio. Algumas turmas

saíram para fotografar a tartaruga e os peixinhos que

existem na escola para fazer suas produções.

Fonte: Elaborado pela autora (2016).

Numa primeira fase, mais exploratória (2014) da investigação, considerando, por

exemplo, um dos Apps utilizados em versão gratuita, o Shape the Village Lite, os

auxiliares de TE perceberam que as crianças conseguiram construir as cidades virtuais

por meio das formas geométricas disponibilizadas na ferramenta. Em geral, esse tipo de

jogo tem sido uma das sugestões disponibilizadas pela equipe de TE em projetos que

têm como objetivo conhecer as figuras geométricas. Por outro lado, em 2015,

disponibilizou-se o mesmo jogo, na versão completa (full), o que oportunizou às

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crianças desafios mais complexos – sendo necessário mais de um período14

para

construir os diversos ambientes/cenários propostos pelo App.

Vejamos outro aplicativo da mesma área curricular, Matemática e suas

Tecnologias: o jogo Aaah! Math Zombies, figura 3.

Figura 3 - Informações associadas aos critérios adotados por Valletta (2014).

Fonte: Captura da tela do jogo (2015).

Neste App, verificam-se algumas ferramentas e informações para motivar os

estudantes para aprender jogando. São elas: possibilidade de selecionar as quatro

operações básicas da matemática (parcial ou todas); nível de dificuldade para o usuário

(fácil, médio e difícil); ajuste do volume da música (importante para os estudantes que

não conseguem se concentrar devido ao som) e acumulação de pontuação (duas

modalidades).

No ano de 2015 as crianças foram desafiadas a jogar o mesmo App na I Semana

de Tecnologia Educacional, porém, com as turmas do mesmo nível/série. No âmbito do

acompanhamento da turma, houve maior envolvimento e engajamento entre os

estudantes a partir de diferentes olhares, como: houve flexibilidade de decisão para

indicar um representante de cada turma; alguns revelaram-se com competências

(matemáticas) em nível avançado; parte dos professores ficaram entusiasmados e

sugeriram que para o próximo ano que o espaço fosse maior e prolongar o período de

atividades (tempo) para integrar mais alunos em atividades gamificadas; alunos

contribuíram com o nome de outros Apps para serem utilizados em outras atividades

etc.

7. Considerações finais

Os aplicativos disponíveis para dispositivos móveis podem auxiliar numa nova

organização da sala de aula devido ao contexto da ubiquidade. Isso porque as crianças e

os jovens podem estar on-line e off-line com seus respectivos artefatos (uso pessoal ou

não pessoal) – visto que há vários recursos didático-tecnológicos que podem ser

explorados a qualquer lugar e a qualquer momento.

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A metodologia para seleção de Apps é uma forma intencional de se promover a

aprendizagem ubíqua, pois propaga experiências e práticas inovadoras de um

determinado grupo de professores e é centrada no compartilhar, durante os encontros de

formação continuada em serviço, propiciados pela instituição de educação básica. Os

Apps são escolhidos na perspectiva de usá-los de forma educativa e, portanto, a maioria

é de uso gratuito, e podem ser explorados em dispositivos móveis (tablets ou

smarthphones) em qualquer espaço; as competências para seleção estão associadas ao

envolvimento que o usuário faz das TD.

Os jogos categorizados como pagos disponibilizam vários recursos, geralmente

com grau de dificuldade mais elevado. Nesse sentido, há necessidade de mais

colaboração entre as crianças e/ou estudantes para atingir os objetivos [do jogo]. Assim,

percebeu-se que a motivação e o engajamento para ajudar os colegas com mais

dificuldades foi importante para auxiliar os professores no desenvolvimento das

habilidades socioemocionais.

Diante disso, as articulações pedagógicas e operacionais entre o setor de TE e o

docente, na organização e seleção dos Apps/jogos, não significa uma redução do

trabalho do professor, mas sim um deslocamento deste, para a melhoria da qualidade

das atividades educativas que permeiam os espaços formais e não formais de

aprendizagem, considerando o contexto da ubiquidade. Dessa maneira, houve um

progresso no compartilhar boas práticas entre os docentes, a oportunidade de se

qualificar o processo de ensino e aprendizagem diante da cibercultura, tendo em vista a

importância de se avançar no âmbito do desenvolvimento profissional do professor.

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proposta. Práticas de memória docente. São Paulo: Cortez, p. 167-183, 2003.

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DEUTSCHE HILFSVEREINSSCHULE E AS ESCRITAS ESCOLARES SOBRE

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https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/10745/10260 - Acesso em

jan. de 2016.

LÉVY, Pierre. Inteligência coletiva. São Paulo: Edições Loyola, 2011.

MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do Carmo. Análise Textual Discursiva. Ijuí:

Editora Ijuí, 2007.

PERRENOUD, Philippe. 10 Novas Competências para Ensinar. Porto Alegre: Artmed,

2000.

SACRISTÁN, Gimeno; GÓMEZ, AI Pérez. Compreender e transformar o ensino.

Porto Alegre: Artmed, 2007.

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TARDIFF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. E-book. Rio de Janeiro:

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________________. Desenvolvimento profissional docente no contexto da

aprendizagem ubíqua: um modelo para o ciclo de formação continuada. 107 f. 2015.

Dissertação. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2015

VALLETTA, Débora; GIRAFFA, Lúcia. Guia de Orientações Didáticas para tablets:

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Alegre: Artmed, 2009. 1 Mestre em Educação: Formação, Política e Práticas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande

do Sul (2015). Especialista em Design Instrucional para EaD Virtual pela Universidade Federal de Itajubá

(2013) e Tecnologia Educacional pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2012). Possui Licenciatura

Plena em Pedagogia pela Universidade Nove de Julho (2009), Bacharel em Ciências e Licenciatura Plena

em Química pela Universidade Ibirapuera (1998; 2002). Integrante do Grupo de Pesquisa em EAD da

PUCRS, ARGOS. 2 Apesar de a sigla TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação) ser amplamente usada na área de

Educação, utiliza-se, neste texto, TD (Tecnologias Digitais) no intuito de destacar o recorte adotado no

grupo de pesquisa Argos, da PUCRS, para refletir a especificidade e escopo do tipo de tecnologias de que

estamos falando: aquelas associadas à Internet e seus serviços e acessadas por meio de artefatos digitais

como os tablets. A partir desse ponto, a pesquisa será conduzida utilizando esse conceito para as

Tecnologias Digitais (TD). 3 Ver discussão em Valletta (2015).

4 Para Lévy (2011, p. 26), a ―inteligência deve ser compreendida aqui como a expressão ‗trabalhar em

comum acordo‘, ou no sentido de ‗entendimento do inimigo‘‖. Entretanto, para Gardner (1995, p. 20), a

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inteligência numa visão tradicional é definida ―operacionalmente como a capacidade de responder a itens

em testes de inteligência‖. 5 Ver discussão em Jacques e Grimaldi (2013).

6 Recorte adotado nesta pesquisa para compreender “lócus” da pesquisa.

7 Ver discussão em Bastos (2003).

8 No sentido de escolher onde, com quem e em que momento interagir com os colegas – necessidade

apenas da mediação do professor. 9 A plataforma virtual Moodle foi utilizada no projeto piloto no 2º semestre de 2015 para organizar a

sequência didática dos projetos pedagógicos que integram o uso dos tablets e seus Apps. 10

A análise quantitativa foi realizada em conjunto com os estagiários de TE, após a finalização do

relatório anual. 11

No sentido de criar situações de aprendizagem para as crianças com propostas pedagógicas que

utilizem, como recurso didático-tecnológico, os Apps, para engajá-las e desenvolver o gosto pelas

atividades que estão sendo propostas pelos professores. 12

Ver discussão em Kishimoto (1994). A autora entende que parte dos Apps são considerados como jogo.

Portanto, neste trabalho, quando nos referimos ao jogo, submete-se a um tipo específico de App que fora

selecionado para o uso educativo para engajar as crianças no processo da aprendizagem. 13

Lojas virtuais que disponibilizam os aplicativos para compra (gratuitos e/ou pagos). 14

Os períodos de aula correspondem a 50 minutos.

2002.

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