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Financiamento de Longo Prazo no Brasil:
Project Finance como Alternativa para a Infra-estrutura
Andrea Rangel de Azeredo
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
COPPEAD
Dissertação de Mestrado
Claudio Contador
PhD. Economia
Rio de Janeiro
1999
ii
Financiamento de Longo Prazo no Brasil: Project Finance como Alternativa para a
Infra-estrutura
Andrea Rangel de Azeredo
Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto de Pós-graduação e
Pesquisa em Administração - COPPEAD, Universidade Federal do Rio de Janeiro –
UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por:
Prof. Dr. Claudio Contador - Orientador
(PhD. Economia)
Prof. Ricardo Leal
(DSc. Administração)
Prof. Roberto Moreno
(DSc. Economia)
Rio de Janeiro
1999
iii
Azeredo, Andrea Rangel de.
Financiamento de Longo Prazo no Brasil: Project Finance como Alternativa
para a Infra- estrutura. Rio de Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 1999.
vii, 141p
Dissertação – Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPEAD.
1. Finanças. 2. Financiamento de longo prazo – Brasil. 3. Project Finance. I. Título.
II. Tese (Mestr. – UFRJ/ COPPEAD).
iv
AZEREDO, Andrea Rangel de. Financiamento de Longo Prazo no Brasil: Project
Finance como Alternativa para a Infra-estrutura. Orientador: Cláudio Roberto
Contador. Rio de Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 1999. Dissertação. (Mestrado em
Administração de Empresas)
Estudo elaborado sobre o Project Finance, modalidade de financiamento que vem sendo
utilizada recentemente por diversos países para o desenvolvimento de projetos de infra-
estrutura, e sua aplicação no Brasil. Diante da escassez de capitais de longo prazo no
país, o Project Finance se apresenta como uma alternativa para o financiamento dos
altos volumes de investimentos necessários para o desenvolvimento da infra-estrutura
nacional. Esta dissertação procura analisar as dificuldades inerentes ao sistema
financeiro nacional e ao ambiente macroeconômico e legal brasileiro, para a aplicação
dessa modalidade, buscando identificar aqueles pontos que precisam ser adaptados ao
contexto brasileiro e que deveriam receber maior atenção por parte das autoridades
nacionais.
v
AZEREDO, Andrea Rangel de. Financiamento de Longo Prazo no Brasil: Project
Finance como Alternativa para a Infra-estrutura. Orientador: Cláudio Roberto
Contador. Rio de Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 1999. Dissertação. (Mestrado em
Administração de Empresas)
This study aims to analyse Project Finance, a structure recently adopted world-wide for
the financing of infrastructure projects, and the various implications of its use in Brazil.
In view of the limited availability of long term capital resources in Brazil, Project
Finance is an alternative for the financing of the large amount of investment required for
the development of the national infrastructure. This work analyses the difficulties
inherent to the national financial system and to the Brazilian macroeconomic and legal
environment for the implementation of this structure in Brazil. At the same time, it
attempts to identify those issues which need further adaptation to the Brazilian context
and special attention from the Brazilian authorities.
vi
AGRADECIMENTOS
Gostaria de dedicar este trabalho e agradecer o apoio de todos aqueles que de alguma
forma contribuíram para sua preparação.
Agradeço aos amigos, familiares, professores e colegas de trabalho que com paciência e
solidariedade me ajudaram a concluir esta tarefa.
Em especial obrigada a:
Prof. Cláudio Contador, Prof. Rogério Studart, Prof. Winston Fritsch, Graham Lofts,
Anna Ballantyne, Juliana Baiardi, José Roberto Ribas, Ricardo Vasconcellos, Rogério
Poppe, Rui Gomes, Rodolfo Lima, Daniela Franco e meu pai.
vii
LISTA DE QUADROS E FIGURAS:
Quadro 1: Resumo das Principais Mudanças Introduzidas pela Reforma de 1964Quadro 2: Sedes e Números de Agências dos Bancos Comercias (1)Quadro 3: Participação nos Depósitos em Bancos Privados (%)Quadro 4: Crédito Concedido pelo Sistema Financeiro – 1993/ 1997Quadro 5: Emissões de Ações e Debêntures no Mercado Primário de CapitaisQuadro 6: Volume Negociado em Bolsas de Valores InternacionaisQuadro 7: Captação ExternaQuadro 8: Matriz Qualitativa de RiscosQuadro 9: 10 Principais Bancos Internacionais atuando em Project FinanceQuadro 10: Principais Fundos de Investimento em Infra-EstruturaQuadro 11: Perfil dos Desembolsos do BNDES por Ramo de Atividade – 1981/1997Quadro 12: Principais Itens do Passivo do BNDES
Figura 1: Evolução das Emissões Primárias como Participação do PIBFigura 2: Captação Externa como Percentual do PIBFigura 3: Evolução do Prazo Médio das Emissões (anos)Figura 4: Agentes envolvidos em um BOTFigura 5: Evolução dos Desembolsos do BNDES (US$ bilhões)
viii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1
CAPÍTULO 1
O FINANCIAMENTO DE LONGO PRAZO NO BRASIL....................................... 3INTRODUÇÃO.............................................................................................................................................31.1 A IMPORTÂNCIA DO FINANCIAMENTO NA DETERMINAÇÃO DO INVESTIMENTO ..................................41.2 A EVOLUÇÃO RECENTE DO FINANCIAMENTO DE LONGO PRAZO NO BRASIL ......................................9
1.2.1 A Reforma Financeira de 1964 .................................................................................................101.2.2 A Reforma de 1988 ....................................................................................................................141.2.3 O Mercado de Crédito...............................................................................................................151.2.4 O Mercado de Capitais .............................................................................................................181.2.5 Acesso ao Mercado Internacional .............................................................................................20
1.3 UMA VISÃO GERAL DO QUADRO ATUAL DO FINANCIAMENTO À INFRA-ESTRUTURA ..........................23
CAPÍTULO 2
PROJECT FINANCE COMO ALTERNATIVA PARA A INFRA-ESTRUTURA 25INTRODUÇÃO...........................................................................................................................................252.1 DEFINIÇÃO E MODALIDADES DE PROJECT FINANCE ..........................................................................262.2 OS AGENTES ENVOLVIDOS................................................................................................................292.3 O PAPEL DA ALOCAÇÃO DOS RISCOS NO PROJECT FINANCE .............................................................322.4 OS INSTRUMENTOS CONTRATUAIS ....................................................................................................37
2.4.1 Edital de Concorrência .............................................................................................................382.4.2 Contrato de Concessão..............................................................................................................392.4.3 Contrato de Compra e Venda de Serviços.................................................................................412.4.4 Acordo de Acionistas.................................................................................................................442.4.5 Contrato de Construção, Fornecimento e Montagem de Equipamentos...................................452.4.6 Contrato de Operação e Manutenção (O&M)...........................................................................482.4.7 Contrato de Suprimento de Matéria-prima ...............................................................................50
2.5 AS GARANTIAS..................................................................................................................................502.6 FONTES ALTERNATIVAS DE FINANCIAMENTO ...................................................................................58
2.6.1 Agências Multilaterais...............................................................................................................592.6.2 Agências de Crédito à Exportação ............................................................................................632.6.3 Seguradoras de Risco Político ..................................................................................................632.6.4 Bancos Comerciais ....................................................................................................................652.6.5 Investidores Institucionais.........................................................................................................672.6.6 O BNDES e seu papel................................................................................................................722.6.7 Outras fontes nacionais .............................................................................................................74
2.7 VANTAGENS E DESVANTAGENS DE UM PROJECT FINANCE ................................................................76
ix
CAPÍTULO 3
UMA AVALIAÇÃO DO PROJECT FINANCE NO BRASIL:
A EXPERIÊNCIA RECENTE, FATORES LIMITADORES E PERSPECTIVASDE IMPLEMENTAÇÃO............................................................................................. 81
INTRODUÇÃO...........................................................................................................................................813.1 A EXPERIÊNCIA RECENTE ..................................................................................................................81
3.1.1 Breve descrição do ambiente legal das parcerias público/privadas no Brasil..........................813.1.2 A atuação do BNDES no financiamento de projetos de infra-estrutura....................................89
3.2 FATORES LIMITADORES CARACTERÍSTICOS DO CONTEXTO MACROECONÔMICO E LEGAL BRASILEIRO................................................................................................................................................................963.3 AGENTES ENVOLVIDOS ...................................................................................................................1053.4 PERSPECTIVAS DE IMPLEMENTAÇÃO E SUGESTÕES PARA PROMOÇÃO DO PROJECT FINANCE ..........108
CONCLUSÃO............................................................................................................. 113
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 118
APÊNDICE ................................................................................................................. 123
1
INTRODUÇÃO
Os altos índices de inflação e a instabilidade política que o país enfrentou nas últimas
décadas privilegiou os investimentos e créditos de curto prazo em detrimento dos
créditos de longo prazo.
Com o sucesso do Plano Real, no que diz respeito ao controle da inflação, este quadro
tende a se reverter. Estamos presenciando uma maior receptividade dos agentes
econômicos a investimentos de maturação mais longa. Paralelamente, diante da
incapacidade do Estado de financiar investimentos em infra-estrutura através de seus
mecanismos tradicionais, endividamento e expansão monetária, e da iminente crise do
setor, o atual Governo adotou como solução a parceria com a iniciativa privada, modelo
que está sendo utilizado em diversos países. O Governo está deixando para o setor
privado atividades que antes estavam sob seu controle, como infra-estrutura,
abandonando cada vez mais o sistema tripartite - Estado, capital privado nacional e
estrangeiro, que fora o modelo de desenvolvimento econômico adotado no Brasil na
segunda metade do século.
No entanto, uma questão ainda precisa ser resolvida. Ainda que a iniciativa privada
contribua com relevante parcela dos investimentos necessários, através do aporte de
capital próprio, sua capacidade de investimento, somada ao longo prazo de maturação
dos projetos, não é suficiente para fazer frente ao alto volume de investimentos
necessários até o ano 2003, estimados em US$ 230 bilhões (ABDIB, 1999).
2
Frente a este ambiente em transição, cabe às autoridades monetárias visualizar e
proporcionar, no sentido de não freiar, o desenvolvimento de novos instrumentos de
canalização de recursos para o setor privado.
O objetivo desta dissertação é descrever o conceito de Project Finance, uma
modalidade de financiamento que vem sendo utilizada recentemente por diversos países
para o desenvolvimento de projetos de infra-estrutura, procurando levantar quais as
dificuldades, inerentes ao Sistema Financeiro Nacional e ao ambiente macroeconômico
e legal brasileiro, para a sua aplicação.
Para tanto, este estudo encontra-se estruturado em três partes. No primeiro capítulo,
busca-se introduzir a discussão acerca da relevância do financiamento para o
desenvolvimento econômico e estudar as causas do atual quadro de financiamentos de
longo prazo, através de uma breve análise da evolução do sistema financeiro nacional.
O capítulo 2 introduz o conceito de Project Finance, buscando apresentar suas
principais caraterísticas e aplicações, assim como suas principais fontes de
financiamento. O terceiro, e último, capítulo desenvolve uma análise sobre a evolução
recente do Project Finance no país e suas principais dificuldades de aplicação,
buscando sintetizar os principais ajustes necessários para que essa modalidade de
financiamento possa ser utilizada para o financiamento dos investimentos em infra-
estrutura no país.
3
CAPÍTULO 1
O FINANCIAMENTO DE LONGO PRAZO NO BRASIL
Introdução
A existência de instituições e instrumentos financeiros que possibilitem a canalização de
poupança financeira para o financiamento de longo prazo é de fundamental importância
para o desenvolvimento econômico de uma nação, não só por viabilizar a expansão da
capacidade produtiva, mas também para o desenvolvimento de sua infra-estrutura.
Este capítulo tem como objetivo principal estudar as razões que originaram o atual
quadro de financiamentos no Brasil, analisando o desenvolvimento de instituições e
instrumentos de promoção do financiamento de longo prazo, e suas implicações no
financiamento da infra-estrutura nacional.
Para tanto, o capítulo se subdivide em três itens. O primeiro item apresenta brevemente
a discussão teórica a respeito da relevância do financiamento para o desenvolvimento
econômico, o segundo analisa a evolução recente do financiamento de longo prazo no
Brasil, e por último, o terceiro busca introduzir a discussão acerca da necessidade de
financiamento à expansão da infra-estrutura no país.
4
1.1 A Importância do Financiamento na Determinação do Investimento
No pensamento econômico recente, duas linhas teóricas se destacam na discussão
acerca da relevância do financiamento para o desenvolvimento econômico. A primeira,
o pensamento ortodoxo ou neoclássico, defende que poupança e investimento se tratam
de atos determinados de forma independente no mercado de capital. Esta linha de
pensamento considera como premissa básica que o mercado financeiro opera em
concorrência perfeita. Somado a isso, a moeda é fator exógeno ao sistema econômico, o
que se explica pelo contexto econômico no qual se desenvolveu esta teoria, onde sua
variação dar-se-ia apenas via aumento da oferta do minério utilizado como lastro ou
emissão de papel moeda pelo Governo.
Tal argumento, conhecido como “Poupança Prévia”, consiste na afirmação de que a
poupança determina a acumulação, isto é, o ato de poupar antecede o ato de investir.
Esta visão atribui ao sistema financeiro um caráter de mero intermediário entre
poupadores e investidores. A moeda é neutra no longo prazo, e assim são as instituições
financeiras.
No entanto, uma outra abordagem, a Keynesiana, indica que o conceito de poupança
prévia pode ser justificado apenas em uma economia onde o sistema bancário se
encontra no seu estágio inicial de desenvolvimento (Chick, 1983). Nesta fase, os bancos
dependem de depósitos prévios para a criação de crédito, o que significa dizer que o
processo de criação bancária de moeda é passivo.
5
Keynes quebra a linha de raciocínio neoclássica apontando em seu princípio da
“Demanda Efetiva” a precedência do ato de gastar. A decisão de consumir ou não
consumir não limita o financiamento, nem mesmo o investimento, uma vez que o poder
de compra estará se transferindo para outras mãos que podem vir, ou não, a investir. O
que realmente afeta o investimento são as decisões de como alocar a riqueza em uma
carteira de aplicações e a existência de financiamento.
Em um sistema bancário desenvolvido os bancos funcionam como agentes ativos na
geração de crédito e, consequentemente, na determinação do nível de recursos para o
financiamento de investimentos.
Segundo Graziani (1987), Keynes considera que o ponto de partida para a realização do
investimento é o financiamento, e não a poupança. A seqüência lógica em uma
economia monetária seria:
Financiamento ➪ Investimento ➪ Renda ➪ Poupança ou Consumo
Sendo assim, a poupança não determina o financiamento, ela surge como um resultado
deste. Para que a produção ocorra é necessário financiamento prévio e a disponibilidade
de caixa é que se trata de fator determinante para o estabelecimento de financiamentos.
Na ausência de financiamento prévio a produção não ocorre e, consequentemente, não
há geração de renda. Ainda segundo Graziani (1997), Keynes explicita esta concepção
em dois de seus artigos publicados após a Teoria Geral, como demonstrado nos trechos
a seguir: “Poupança não possui nenhuma eficácia especial em comparação ao consumo
6
na liberação de caixa e restauração da liquidez”1, e ainda: “Dinheiro despendido em
consumo e dinheiro poupado tratam-se igualmente de fundos disponíveis”.2
O financiamento torna o investimento autônomo, independente de fundos previamente
poupados, sendo necessário para qualquer tipo de produção, seja ela para consumo ou
investimento (bens de capital), na medida que a torna possível antes da demanda surgir.
Uma vez efetuada a produção, e, por conseqüência, a geração de renda, as empresas
podem pagar seus financiamentos independentemente da poupança ter aumentado tanto
quanto o investimento. Neste conceito, são os bancos e não poupadores que
desempenham um papel crucial no processo de crescimento econômico, deles depende a
manutenção e o crescimento da produção em uma economia monetária.
É relevante ainda discutir o papel da poupança e do sistema financeiro neste processo.
Esta linha de pensamento não nega a importância da poupança, apenas não a considera
como determinante na determinação do produto e da renda. Segundo Studart (1994, B)3,
“apesar da poupança e da intermediação financeira desempenharem um papel
secundário na determinação da oferta de financiamento ao investimento, ambos são
relevantes em um outro contexto – a questão do funding”.
No pensamento keynesiano, o financiamento do investimento pode ser caracterizado
como um processo duplo de financiamento e funding, sendo o último caracterizado
1 “Saving has no special efficacy as compared with consumption, in releasing cash and restoringliquidity” (Comment on D. H. Robertson’s “Mr Keynes’Finance”) (Keynes apud Graziani, 1987).Tradução livre da autora.2 “Money which is spent on prior consumption flows into the same pool of available funds as moneywhich is saved” (“The Process of Capital Formation”) (Keynes apud Graziani, 1987). Tradução livre daautora.
7
como o processo de transformação de obrigações de curto prazo em obrigações de longo
prazo. As obrigações de curto prazo são captadas através dos depósitos, que quando não
despendidos em consumo constituem poupança, e o local onde esta transformação de
prazos ocorre é o Mercado Financeiro. Esta discussão trata-se de um dos principais
aspectos relevantes do pensamento keynesiano, uma vez que abre espaço para a
discussão do papel das instituições no desenvolvimento financeiro.
Diante da importância do financiamento em seu papel de promotor da produção, a
existência de um Mercado Financeiro desenvolvido é fundamental para que uma nação
se desenvolva economicamente. O Mercado Financeiro, através de sua base
institucional, promove o encontro entre os agentes superavitários e deficitários, permite
a diversificação e acumulação de ativos, e possui o importante papel de promover o
crescimento econômico através da canalização de obrigações de curto prazo para
financiamento de longo prazo, o que se trata do processo de criação de funding. 4
Para que este objetivo seja alcançado, seu principal obstáculo seria aumentar a
predisposição dos agentes a participarem do financiamento de longo prazo de ativos. O
desenvolvimento de mercados secundários corrobora esta função do mercado
financeiro, na medida que cria canais de informação para os emissores e compradores
dos títulos (poupadores) e gera liquidez para os ativos. Através da provisão de liquidez
os títulos de mais longo prazo se tornam atraentes para os poupadores, na medida que a
liquidez permite que tais agentes negociem os ativos no caso de alteração de suas
preferências com relação às aplicações financeiras, representando menor risco.
3 Tradução livre da autora.4 Argumento desenvolvido em Azeredo (1995).
8
Entretanto, no processo de geração de funding a transformação de prazos pode ser
implementada de diferentes formas dependendo do ambiente institucional, no qual se
baseia o sistema financeiro, de elementos estruturais e conjunturais.
O ambiente institucional trata-se do conjunto de instituições, instrumentos financeiros e
regulamentações que promovem e delimitam as atividades do mercado financeiro.
Os elementos estruturais podem ser descritos principalmente como5: o grau de
desenvolvimento econômico, no que diz respeito ao nível de renda da nação; e o perfil
de distribuição da renda entre firmas e famílias (lucros e salários), o que se torna
relevante à medida que as firmas poderiam estar menos dispostas a converter seus
lucros retidos em poupança financeira, optando por reinvesti-los, praticando assim o
chamado auto-financiamento.
Como elementos conjunturais temos o ritmo do crescimento econômico e possíveis
alterações temporárias das políticas monetária e fiscal em função de mudanças na
conjuntura política ou internacional.
Mesmo o ambiente institucional, no qual se insere o sistema financeiro, é determinado
pelos elementos estruturais e conjunturais acima apresentados. Sendo assim, segundo
Zysman, como resultado da interação de tais elementos, os sistemas financeiros podem
refletir dois padrões de financiamento do setor produtivo. O primeiro seria o Sistema
5 Os fatores relevantes para o grau de desenvolvimento financeiro de uma nação são discutidos emHermmann (1997) e Contador (1992).
9
Financeiro Baseado no Mercado de Capitais, onde títulos de dívida e ações constituem a
maior fonte de financiamento de longo prazo, um bom exemplo seria os EUA. Por outro
lado, o Sistema Financeiro Baseado no Crédito normalmente apresenta mercados de
capitais pouco desenvolvidos e financiamentos à produção baseados no crédito
bancário, como ocorre na Alemanha e no Japão. O sistema baseado em crédito possui
ainda duas classificações, em função de sua origem: crédito privado, tomando como
exemplo o caso alemão, e crédito público, citando o caso japonês e o francês (Studart,
1992).
Quando os mercados por si só não atingem um desenvolvimento financeiro que permita
a transformação dos prazos, e com isso a captação de recursos de longo prazo e sua
canalização para o setor produtivo, instrumentos alternativos podem vir a ser
implementados para fazer frente à necessidade de recursos, são eles: o uso de estruturas
governamentais, como no caso do Japão; o autofinanciamento, mencionado acima; e o
financiamento externo.
Segue uma breve análise da evolução do financiamento de longo prazo no Brasil,
buscando identificar quais foram os elementos que serviram de entrave ao seu
desenvolvimento.
1.2 A Evolução Recente do Financiamento de Longo Prazo no Brasil
Até o início da década de 1960 o sistema financeiro brasileiro apresentava uma estrutura
simples, predominavam os bancos comerciais com seu passivo composto em grande
10
parte por obrigações à vista e ativo composto por empréstimos de curto prazo6. Na
análise da evolução do Sistema Financeiro Nacional é consenso que seus principais
marcos regulamentares foram as reformas implementadas no período de 1964 a 1967 e
em 1988. Tais reformas tiveram como principal objetivo a criação de um sistema
financeiro sólido e capaz de prover recursos de longo prazo para o financiamento do
crescimento da economia nacional. Em meio a este processo houve erros e acertos, os
quais buscar-se-á resumir ao longo deste item.
1.2.1 A Reforma Financeira de 1964
A Reforma Financeira de 1964 estava inserida no PAEG (Programa de Ação Econômica
do Governo) criado em novembro de 1964, pelo Ministério da Fazenda e o Ministério
do Planejamento e Coordenação Econômica, cujos ministros eram respectivamente
Octavio Bulhões e Roberto Campos.
Dentre outros objetivos, este plano buscou implementar reformas estruturais no sistema
financeiro de forma a: corrigir a crise existente no padrão de financiamento da
economia brasileira, buscando incentivar a geração de recursos de longo prazo; e
possibilitar uma redução de custos nos bancos comerciais, através de incentivos à
concentração bancária.
Esta reforma financeira pretendia alcançar seus objetivos através da segmentação do
sistema financeiro, aplicando o modelo norte-americano a este setor. Aos bancos
6 Ver Lemgruber (1978) e Montoro Filho (1982).
11
comerciais cabia a captação via depósitos a vista, provendo às empresas capital de giro
e prestando serviços bancários; aos bancos de investimento cabia captar recursos de
longo prazo, promover emissões públicas de ações e repassar recursos em moeda
nacional ou estrangeira; às financeiras cabia captar recursos mediante letras de câmbio e
repassar sob a forma de crédito direto ao consumidor; as sociedades de crédito
imobiliário captariam a poupança popular mediante cadernetas de poupança para o
financiamento à casa própria. Segue um quadro resumindo as principais mudanças
introduzidas no setor financeiro nacional pela Reforma Campos-Bulhões:
Quadro 1: Resumo das Principais Mudanças Introduzidas pela Reforma de 1964
Lei 4.357/64 Criação da ORTN – Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional,cujo principal objetivo era suprir a necessidade de créditos doGoverno sem que fosse necessário emitir moeda, sendo com estetítulo instituída a correção monetária nos contratos e títulosfinanceiros de longo e médio prazos.
Lei 4.380/64 Institucionalização do Sistema Financeiro da Habitação e criação doBanco Nacional da Habitação, bem como criação das sociedades decrédito imobiliário e carteiras imobiliárias nas financeiras, permitindoa captação de recursos para o Sistema Financeiro da Habitação juntoao público via letras imobiliárias.
Lei 4.595/64, Lei daReforma Bancária
Criação do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central doBrasil, substituindo a SUMOC – Superintendência da Moeda e doCrédito.
Lei 4.728/ 65, Lei doMercado de Capitais
Traçou todo o desenho institucional do mercado de capitais,delimitando as funções dos Bancos Comerciais e Bancos deDesenvolvimento, Sociedades Corretoras e Distribuidoras de Títulose Valores, Sociedades de Crédito Imobiliário, entre outros, criando eregulamentando os Bancos de Investimento.
Com relação à captação de recursos externos dois marcos regulamentares antecederam a
Reforma de 64, atingindo no entanto uma maior utilização apenas após a mesma, com a
maior abertura da economia ao capital externo (Hermmann, 1997):
! Lei 4.131/62, permitiu que empresas nacionais não-financeiras tomassem
empréstimos de órgãos internacionais, o que foi utilizado basicamente por empresas
12
estatais, e por multinacionais, por ser menos custoso, do ponto de vista tributário,
que investir diretamente;
! Instituição da Resolução 63, que permite aos bancos captarem recursos com bancos
estrangeiros repassando-os no mercado interno.
Como principais resultados das mudanças implementadas pode-se citar o aumento da
complexidade do sistema financeiro, dado o aumento e a diversificação das instituições
financeiras, cujo número aumentou de 499 em 1964, para uma média de 1.615 na
década de 70 e 1.745 na segunda metade da década de 80 (Hermmann, 1997). Com este
processo verificou-se uma grande perda da importância relativa do sistema monetário7,
o que pode ser exemplificado pelo total do crédito destas instituições ao setor privado,
que caiu de 80% em 1964 para 56,5% em 1970 e 45% em 1981, enquanto o sistema não
monetário adquiriu participação crescente8. O aumento do sistema não monetário
refletiu-se no aumento do volume de empréstimos ao setor privado que evoluiu de
26,1% do PIB, em 1968, para 48,4% em média na década de 70 e 51,5% entre 1985 e
1989, o que demonstra o aumento no grau de intermediação financeira da economia.
Outro resultado da diversificação experimentada pelas instituições financeiras é o
acirramento da competição ocasionando a falência de bancos e financeiras, e a
reorganização das instituições financeiras privadas. Associado a tais mudanças houve
um forte incentivo à concentração e conglomeração do setor bancário através da
imposição de barreiras à entrada, como a limitação da liberação de cartas patentes e o
número de agências que não fossem estabelecidas por fusão ou aquisição. É importante
7 Bancos comerciais e Banco do Brasil.8 Para uma melhor análise do tema ler Tavares (1978).
13
frisar que o esforço inicial de se alcançar a concentração bancária caminhava no sentido
da não-diversificação das atividades destas instituições, isto é, pretendia-se que elas
operassem apenas como bancos comerciais.
O processo de fusão e concentração do sistema bancário já vinha ocorrendo desde 1958,
se acentuando após 1964 devido à intensificação da concorrência com agências não-
bancárias e a incentivos à concentração, visando fortalecer e estabilizar o sistema
bancário.9 No entanto, apesar da política de incentivo à concentração bancária no
período estudado, os objetivos iniciais não foram alcançados. No que diz respeito à
redução da taxa de juros, esta foi alcançada a partir de 1967; contudo, não resultou da
concentração bancária e da possível redução nos custos que esta acarretaria, mas sim da
aplicação de uma política de teto para os juros de mercado.
Como foi discutido acima, a reforma financeira iniciada em 1964 tinha em mente a
segmentação do sistema financeiro, no entanto, em meados da década de 70, apesar da
permanência da divisão formal imposta pela reforma, na prática esta segmentação já
havia deixado de existir. Após o período do “Milagre Econômico”, a partir de 1974,
quando o sistema bancário entrou em crise devido à política de contenção dos meios de
pagamento, os grandes bancos se viram favorecidos pois puderam ampliar sua área de
influência para o setor do mercado financeiro independente, que se via em problemas.
As grandes instituições financeiras, então conglomerados em formação, ocuparam o
espaço deixado pela liquidação judicial de uma série de financeiras e sociedades de
crédito imobiliário.
9 Para um aprofundamento do tema ver Tavares e Cavalheiro (1978) e D’Oliveira (1993).
14
1.2.2 A Reforma de 1988
Apesar do movimento de “des-segmentação” que já vinha sendo observado, é apenas
através da Resolução 1.52410, de setembro de 1988, tomada pelo Conselho Monetário
Nacional, que se formaliza o fim da segmentação que caracterizou o sistema financeiro
brasileiro nas duas décadas anteriores, permitindo às companhias financeiras que
operavam em segmentos distintos se fundirem em uma só companhia, os chamados
bancos múltiplos.
Dois pontos de fundamental importância que nortearam essa segunda reforma no
sistema bancário são: a simplificação e a desregulamentação do sistema. A criação do
banco múltiplo objetivou basicamente: a racionalização dos serviços, a agilização dos
processos de diversificação de suas atividades e a redução de custos11, através da fusão
das diversas instituições existentes numa única instituição financeira, introduzindo a
opção dos grandes conglomerados centralizarem a contabilidade passando a operar na
forma de uma única pessoa jurídica.
Após uma breve discussão acerca dos principais marcos regulamentares do setor
financeiro nacional em seu desenvolvimento recente, segue uma breve análise da
evolução das principais fontes de financiamento de longo prazo no país, buscando
levantar os fatores críticos ao seu desenvolvimento.
10 Segundo esta Resolução, para que um banco se constituísse em banco múltiplo era necessário escolherao menos duas das seguintes carteiras: comercial; investimentos; crédito imobiliário; crédito,financiamento e investimento; ou desenvolvimento.
15
1.2.3 O Mercado de Crédito
Durante a década de 60 as principais medidas tomadas pelas autoridades brasileiras para
o desenvolvimento do crédito de longo prazo para o financiamento à expansão da
capacidade produtiva foram: a instituição da correção monetária, as medidas adotadas
no sentido de estabelecer regras para o funcionamento do mercado financeiro e
fortalecer os bancos comerciais, sem falar na criação dos bancos de desenvolvimento e
de investimento, esse último com atuação prevista também para o mercado de capitais.
Como resultado das medidas aplicadas, o volume de empréstimos ao setor privado
aumentou como proporção do PIB de 26,1%, em 1968, para 48,4% em média na
década de 70, e 51,5%, de 1985 a 1989. A participação dos bancos comerciais cai de
80,8% em 1964 para 43,7% em 1989, cedendo lugar para instituições do sistema não
monetário (Hermmann, 1997).
As medidas adotadas ao longo da década de setenta no sentido de concentrar o sistema
bancário não atingiram o objetivo de aumentar o fornecimento de financiamentos por
parte do setor financeiro privado, que terminou por atuar como mero repassador de
recursos externos (via Resolução 63) e públicos (BNDES e Banco do Brasil).
Apesar da instituição da ORTN como indexador dos títulos públicos e aplicações
financeiras, as altas taxas de inflação atingidas a partir da segunda metade da década de
11Dentre outras reduções de custos temos a economia de impostos, como, por exemplo, o Imposto SobreServiços (ISS) arrecadado nas operações entre as diversas companhias de um mesmo conglomerado.
16
7012 restringiam o interesse dos poupadores por juros pré-fixados e aumentava seu
interesse por juros pós-fixados, o que acarretou uma redução nos prazos das aplicações
financeiras na medida que os agentes procuravam limitar sua exposição ao risco de
juros reais negativos. A persistência das altas taxas de inflação ao longo da década de 80
contribuiu para o agravamento do quadro de captações, reduzindo o perfil de aplicações
a prazos praticamente diários, a exemplo dos investimentos no “Fundão”.13
Durante a década de 80, com o agravamento do quadro macroeconômico e a
conseqüente concentração nos investimentos de curto prazo, e a restrição ao crédito
internacional, acentuaram-se os entraves às operações de crédito de longo prazo. Diante
da dificuldade de se endividar, o auto-financiamento passou a ser a principal fonte de
recursos para as empresas nacionais, saltando de 58,8% em 1978 para 76,8% em
meados da década de 80, e de 76,7% para 87,7% no mesmo período para as empresas
estrangeiras (Hermmann, 1997).
O BNDES, cuja atuação recente é analisada em mais detalhe ulteriormente, representou,
e ainda representa, a principal, senão única, fonte de recursos locais de médio e longo
prazo. No entanto, a participação dos seus financiamentos na Formação Bruta de Capital
Fixa não foi muito alta, apenas 8,7% no período 1974 – 1978, auge de sua participação
do desenvolvimento industrial. (Hermmann, 1997).
12 A partir de meados da década de 70, a inflação apresentou um comportamento ascendente partindo de34,55% a.a. em 1974, atingiu o máximo de 2.708,55% em 1993, recuando para 1.093,84% em 1994, jádevido ao impacto do Plano Real.13 Fundão era o nome dado ao FAF - Fundos de Aplicação Financeira, de Renda Fixa de Curto Prazo. Emoutubro de 1995 o FIF - Fundo de Investimentos Financeiros, incorporou o Fundão, criando incentivospara o aumento do prazo das aplicações financeiras.
17
A reforma bancária de 1988 pouco alterou o quadro anterior, implicando apenas em
redução dos custos operacionais e maior facilidade de fiscalização do setor.
Posteriormente, o perfil das captações bancárias evoluiu um pouco, apresentando no
período 1991-1995 um aumento da participação dos depósitos a prazo no total do
passivo, subindo de 18,2% para 24,4%. O período também apresentou um crescimento
da indústria de fundos mútuos de investimento, que em 1995 representava 14,6% do
PIB. No entanto a captação nunca alcançou prazos longos, em 1998 aplicações de 90
dias representavam apenas 2,3% do Patrimônio dos Fundos Mútuos. O fato dos fundos
de renda fixa de 60 dias representarem a maior parte dos investimentos em fundos
mútuos, 75,4%, em 1998, é evidentemente uma melhora no prazo das aplicações, mas
ao mesmo tempo demonstra que a questão da captação de recursos de médio e longo
prazo ainda não foi solucionada (Hermmann, 1997).
O início da década de 90 se caracterizou por uma suavização da restrição externa após a
implementação do Plano Brady14, em 1992, promovendo uma retomada das captações
externas, intensificadas após o Plano Real, como apresentado no item 1.2.5 a seguir.
Pode-se observar no quadro abaixo, a participação decrescente do sistema monetário no
total de créditos concedidos pelo sistema financeiro, principalmente devido à redução da
participação dos bancos públicos. Pode-se observar também a crescente participação da
Caixa Econômica Federal e dos Bancos de Desenvolvimento. Os Bancos de
Investimento mantiveram-se no mesmo patamar durante todo o período, demonstrando
que tais instituições não se desenvolveram na provisão de crédito de longo prazo.
18
Quadro 2: Crédito Concedido pelo Sistema Financeiro – 1993/ 1997Participação percentual
Discriminação 1993 1994 1995 1996 1997Bancos Coms. e Múltiplos 74,2 66,8 65,2 62,4 56,2 Banco do Brasil 15,1 18,4 18,1 18,2 16,2 Outros Bancos Públicos 21,3 10,5 11,1 10,3 5,8 Bancos Privados 36,8 37,9 36,0 33,9 34,2Bancos de Desenvolvimento 6,5 5,8 6,0 7,2 10,0Caixas Econômicas 15,4 19,6 20,3 22,7 26,0Financeiras 0,4 1,3 0,6 1,2 1,5SCI/ APE 1,0 1,6 1,6 1,6 1,3Bancos de Investimento 0,5 0,6 0,4 0,5 0,5Sociedades de Arrendamentomercantil
2,3 5,2 5,7 4,4 5,1
Total 100 100 100 100 100Fonte: Banco Central do Brasil, Relatório 1997.
1.2.4 O Mercado de Capitais
Segundo Hermmann (1997), o desenvolvimento insipiente do mercado de capitais
brasileiro até o início da década de 1980 se explica em parte pelo volume inexpressivo
de poupança financeira com perfil de longo prazo e pela inexistência de um mercado
secundário desenvolvido. A ausência de um sistema de supervisão e informações
eficiente também se tratou de uma das dificuldades que só veio a ser minorada com a
Lei das Sociedades Anônimas em 1976 e a criação da Comissão de Valores Mobiliários
– CVM.
Lemgruber (1978) apresenta a inflação elevada e instável como principal fator que
dificultou o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, e impediu o
alongamento do prazo das aplicações dos investidores e agentes financeiros.
14 Acordo assinado entre os credores da dívida externa brasileira e de outros países da América Latina eos governos locais, convertendo as dívidas em títulos mobiliários com negociação prevista em mercadosecundário.
19
Brito e Touriel (1979) chamam atenção para a concentração do capital controlador e a
mistura entre administração e propriedade. O primeiro é resultado do incentivo da
legislação do mercado de capitais à emissão de ações preferenciais, enquanto o segundo
é relacionado a questões culturais. A conseqüência desse cenário é a exposição dos
acionistas minoritários a riscos não diversificáveis, dificultando assim o
desenvolvimento do mercado acionário brasileiro.
Mesmo com inúmeras tentativas governamentais para incentivar o investimento no
mercado de ações, a exemplo dos fundos fiscais 15715 e da atuação do BNDES no
segmento primário do mercado acionário (Brito e Touriel , 1979), tais iniciativas não
lograram resultado satisfatório devido aos problemas acima apontados, que foram por
sua vez agravados pela instabilidade econômica da década de 1980. Segue a evolução
das emissões de ações e debêntures em mercado primário de 90 a 98.
Quadro 3: Emissões de Ações e Debêntures no Mercado Primário de Capitais
US$ mil (1)Ano Ações Debêntures
1990 460.407 1.010.5061991 515.285 877.6521992 416.345 289.1811993 1.005.204 809.3011994 2.682.940 3.163.1971995 2.111.133 8.386.6601996 8.835.183 7.468.2101997 3.965.211 7.517.7751998 3.526.085 8.281.044
Fonte: Retrospectiva Andima.(1) Valores convertidos para dólar pelo câmbio médio do ano.
15 Os fundos fiscais 157 foram desenvolvidos a partir do Decreto-Lei nº 157 de fevereiro de 1967, quepermitiu o abatimento de parte do imposto de renda em investimentos em novas ações.
20
Figura 1: Evolução das Emissões Primárias como Participação do PIB
0,0%0,2%0,4%0,6%0,8%1,0%1,2%1,4%
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Ações
Debêntures
Fonte: Retrospectiva Andima.
Pode-se observar abaixo o volume negociado na principal bolsa de valores brasileira no
ano de 1998 em comparação com grandes bolsas mundiais.
Quadro 4: Volume Negociado em Bolsas de Valores Internacionais
Bolsas Volume em 1998(US$ milhões)
% PIB (1)
Bolsa de Nova York 7.317.949 91Bolsa do México 31.192 8Bolsa de Frankfurt 1.491.796 71Bolsa de Londres 2.887.990 224Bolsa de Paris 2.641.153 189Bolsa de Tóquio 750.825 18BOVESPA 139.583 17
Fonte: FIBV Monthly Statistics.(1) Foi utilizado o PIB de 1997.
1.2.5 Acesso ao Mercado Internacional
Como foi dito acima, a lei 4.131 de 1962 e a Resolução 63 possibilitaram a captação de
recursos no mercado internacional. No entanto, é apenas a partir da década de 80 que a
liberalização da conta de capital começa a se intensificar. Destaque é dado à criação de
21
fundos de capital estrangeiro, onde a modalidade Anexo IV se tornou a principal forma
de investimentos externos no mercado de capitais brasileiro.
A partir de 1992, com a assinatura do Plano Brady, a restrição internacional começou a
reduzir e a captação externa evoluiu rapidamente como conseqüência do sucesso do
Plano Real no que diz respeito à estabilização econômica, de novos acordos da dívida
externa com base no Plano Brady e do contexto internacional favorável para a captação
de países emergentes (Studart, 1997). A evolução da captação externa como percentual
do PIB e do prazo médio das captações através da emissão de títulos no mercado
internacional, podem ser observadas abaixo.
Figura 2: Captação Externa como Percentual do PIB
0,0%2,0%4,0%6,0%8,0%
10,0%12,0%14,0%16,0%18,0%20,0%
1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Fonte: Retrospectiva Andima.
22
Figura 3: Evolução do Prazo Médio das Emissões (anos)
0
2
4
6
8
10
12
14
1º trim
1993
1º trim
1994
1º trim
1995
1º trim
1996
1º trim
1997
1º trim
1998
Fonte: Retrospectiva Andima.Nota: Operações de captação autorizadas pelo Banco Central mediante títulos no mercado internacionalnas modalidades: Floating Rate Notes, Fixed Rate Notes, Floating Rate Certificates of Deposit, FixedRate Certificates of Deposit e Bônus de colocação pública ou privada
Como pode ser observado, as captações que em média apresentavam prazos em torno de
4 anos em 1993, evoluíram para prazos de 10 a 12 anos para créditos corporativos de
qualidade. No entanto, como efeito da crise Asiática, Russa e da crise cambial
brasileira, os mercados se retraíram novamente a partir do final de 1997.
Segue um quadro apresentando as captações externas no período 1992 a 1998, onde se
pode observar o rápido crescimento no período de 1996 a 1998 da captação via emissão
de bônus e notes e financiamentos, como resultado do processo acima descrito.
23
Quadro 5: Captação ExternaUS$ milhões
Tipo 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998Investimentos 5.188 15.928 27.214 28.010 35.152 56.719 63.244 Em carteira 3.863 14.971 21.600 22.559 24.684 38.855 31.864 Diretos 1.325 877 2.241 3.285 9.580 17.864 26.322 Fundos de Renda Fixa 0 80 1.434 211 12 398 3.988 Fundos de Privatização 0 0 1.939 1.955 779 1.168 1.322 Fundos de Inv. Imobiliário 0 0 0 0 92 96 16 Fdos. de Inv. Empresas Emergentes
0 0 0 0 5 3 0
Empréstimos em Moeda 7.979 11.031 8.756 15.883 28.078 35.535 58.296 Comunicado Firce 10 922 769 1.053 2.170 2.626 5.251 9.548 Resolução 63 856 597 201 817 376 1.202 3.262 Res. 2148 (Fin. Rural Direto) 0 0 0 1.067 4.866 7.844 9.009 Res. 2170 (Fin. Imobiliário) 0 0 0 0 5 4 0 Res. 2312 (Exportação) 0 0 0 0 631 102 50 Commercial Paper 1.190 338 182 381 633 451 642 Bônus e notes 4.833 7.598 5.961 9.650 18.046 20.448 25.977 Export securities 30 675 261 494 297 58 309 Renovações 148 1.054 1.098 1.304 598 175 175Financiamentos 2.332 3.282 4.353 4.576 6.828 24.192 19.284 Registrados 447 449 630 1.074 1.422 12.131 17.062 Autorizados 1.885 2.833 3.723 3.502 5.406 12.061 2.222Leasing e Aluguel 1.173 1.005 842 1.143 1.868 4.002 3.849Pagamento Antecipado deExportações
1.119 1.421 1.908 4.273 7.073 8.536 6.651
Total 17.791 32.667 43.073 53.885 78.999 128.984 151.324Fonte: Retrospectiva Andima, vários números.
1.3 Uma visão geral do quadro atual do financiamento à Infra-estrutura
O setor de infra-estrutura é fundamental para o desenvolvimento econômico e sua
recuperação no Brasil é condição para a retomada do crescimento do país, uma vez que
reverterá em aumento da produtividade dos fatores privados e em redução do custo por
unidade de matéria-prima.16 .
Durante a década de 80, os investimentos em infra-estrutura no Brasil experimentaram
16 Para uma análise do tema ver Rigolon e Piccinini (1997).
24
uma redução considerável. Apenas como ilustração, os investimentos em
telecomunicações, energia e transporte passaram de aproximadamente US$ 9 bilhões
em 1980 para cerca de US$ 3,2 bilhões em 1990 (Garcia, 1994). Diante desta situação,
ocasionada pela insuficiência de recursos públicos para tais investimentos, o Governo
vem promovendo reformas desde 1995, objetivando o aumento da presença da iniciativa
privada no setor. Os avanços feitos na privatização foram relevantes, mas uma questão
permanece sem solução: novos investimentos estão relacionados com a disponibilidade
de créditos de longo prazo, que, como apresentado acima, são escassos no país.
Considerando o alto valor dos investimentos necessários para a eliminação dos gargalos
acumulados desde a década de 80 e a melhora da infra-estrutura brasileira, estimados
em US$ 230 bilhões para os próximo 5 anos, e a incapacidade do governo de prover tais
recursos, o desenvolvimento de instrumentos de captação, assim como a viabilização de
sua aplicação, tornam-se imprescindíveis para a captação de recursos junto a
investidores nacionais e viabilizar o investimento de organismos e instituições
financeiras internacionais no país.
O Project Finance se apresenta como modalidade largamente utilizada em países em
desenvolvimento e desenvolvidos para o financiamento de projetos novos (greenfield)
de infra-estrutura. É importante frisar que este se trata de um instrumento utilizado para
captar recursos de longo prazo, sem no entanto resolver a questão crucial do funding,
discutida acima.
25
CAPÍTULO 2
PROJECT FINANCE COMO ALTERNATIVA
PARA A INFRA-ESTRUTURA
Introdução
O Project Finance se trata de uma modalidade de financiamento que vem sendo
utilizada nas últimas três décadas em diversas partes do mundo. Segundo Finnerty
(1996:4) sua origem remonta à idade média quando a Coroa Britânica financiou minas
de prata nessa modalidade.
Mais recentemente, na década de 70, o Project Finance voltou a ser utilizado no
financiamento do gasoduto Trans Alaska Pipeline System (TAPS) e no financiamento
de plataformas de petróleo no Mar do Norte. Desde então essa modalidade se
disseminou pelo mundo, apresentando-se cada vez mais como uma alternativa de
financiamento a projetos novos (greenfield) de infra-estrutura naqueles países cujos
Governos optaram por passar para a iniciativa privada a construção e operação de
projetos antes sob o domínio público, sendo também utilizado, em menor escala, em
projetos industriais privados, cuja discussão não se encontra no escopo dessa
dissertação.
O objetivo desse capítulo é apresentar o conceito de Project Finance, buscando discutir
suas vantagens e desvantagens tendo em vista as possíveis formas nas quais pode ser
26
aplicado.
2.1 Definição e Modalidades de Project Finance
O Project Finance é uma modalidade de financiamento caracterizada por uma série de
práticas que buscar-se-á descrever neste item. Inicialmente, seria interessante
diferenciar o Project Finance de um Financiamento de Projetos. O Project Finance
consiste em uma modalidade específica de financiamento de projetos, enquanto que o
financiamento de projetos pode abranger não só o Project Finance mas também outras
alternativas disponíveis tais como utilização de recursos próprios, empréstimos
corporativos, emissão de títulos com garantias corporativas ou instrumentos mais
elaborados como a securitização de recebíveis (pagamentos a serem realizados em troca
de produtos vendidos). Este último trata-se de uma estratégia adotada com bastante
freqüência por empresas exportadoras, utilizando os recebíves de exportações,
especialmente quando se trata de um endividamento externo em moeda forte pois as
exportações funcionam como uma proteção natural para o risco de desvalorização da
moeda local.
A principal característica que distingue um Project Finance de um financiamento
corporativo de projetos é o fato de sua principal garantia ser o próprio projeto - suas
receitas e seus ativos. Diferentemente de um financiamento de projetos com
empréstimos corporativos, a versão mais pura dessa modalidade não requer
apresentação de garantias pelos patrocinadores do projeto (seus acionistas). Torna-se
agora necessário fazer uma distinção entre diversas nuances que esta característica pode
27
apresentar. Um financiamento Project Finance pode ser considerado como non-
recourse, onde não há nenhuma forma de garantia apresentada pelos patrocinadores, ou
como limited-recourse cuja estrutura de garantias variará com o tipo de apoio que se
exigirá dos patrocinadores. Serão discutidos ulteriormente os tipos de garantias e a
forma que estas são incluídas no contexto contratual de um Project Finance.
Uma segunda característica do Project Finance, que se encontra de certa forma
relacionada com a primeira, é que o financiamento é promovido fora do balanço dos
Patrocinadores (off-balance sheet). Enquanto que em um empréstimo corporativo, para
o financiamento de um projeto, a dívida contraída fará parte do passivo do promotor do
projeto, um financiamento na modalidade Project Finance não alavancará o balanço do
mesmo. Para tanto, é necessária a criação de uma empresa para administrar os ativos do
projeto, a qual será a tomadora dos empréstimos necessários. É necessário ainda que os
acionistas não detenham o controle da empresa, justamente para evitar a consolidação
do balanço da empresa estabelecida para o projeto no balanço do acionista17. Esta se
trata de uma das vantagens dessa modalidade que serão discutidas ao final deste
capítulo.
A vantagem de se estruturar o financiamento fora do balanço é corroborada pela
possibilidade de se atingir altos níveis de alavancagem - definida como a participação
do valor da dívida no total de recursos aplicados no projeto - , regularmente de 70 a
80%.
17 No Brasil a consolidação é imposta apenas às Sociedades Anônimas, quando os investimentos emcontroladas (i.e. empresas nas quais detém mais que 50% do capital votante) supera 30% do PatrimônioLíquido da controladora. Essa regra varia de país para país, na Inglaterra, por exemplo, a consolidação é
28
Outra característica do Project Finance seria a prática de alocação dos riscos existentes
às partes preparadas e dispostas a assumir tais riscos. As primeiras características
somadas a esta última resultam na necessidade de uma estrutura contratual complexa e
abrangente, à medida que se busca regular e corrigir imperfeições de mercado, evitando-
se comportamentos oportunistas pelas partes envolvidas.
Além da distinção apresentada acima, onde o projeto pode ser classificado pelo tipo de
garantia que apresenta, há mais uma distinção a ser feita. Um Project Finance pode ser
classificado conforme a relação entre agentes públicos e privados no que diz respeito ao
tratamento que se dá aos ativos do projeto em questão, existindo as seguintes
modalidades: Build-Operate-Transfer (ou BOT), a mais comum, e Build-Own-Operate
(ou BOO).
Segundo Wilde Sapte (1997), o BOT se caracteriza pela transferência ao setor privado
da responsabilidade de financiar, desenvolver e operar o projeto por um determinado
período, que deve ser suficiente para remunerar e saldar a dívida contraída e remunerar
o capital investido, ao final do qual os ativos, e direitos emergentes, do projeto retornam
ao setor público. Essa modalidade pode apresentar as seguintes formas: Build-Own-
Operate-Transfer (BOOT); Build-Lease-Transfer (ou BLT); Build-Rent-Transfer
(BRT); Build-Transfer-Operate (BTO); Design-Build-Finance-Operate (DBFO);
Design-Construct-Manage-Finance (DCMF). Como já foi dito o BOT se trata da forma
mais comum para um projeto de infra-estrutura com a parceria público/privada, sendo
parcial caso a controladora detenha entre 25% a 50% do capital votante da controlada, e total, se detivermais que 50% do capital votante.
29
normalmente estruturado na forma de uma concessão de determinados ativos do poder
público aos agentes privados.
O BOO se diferencia do BOT pelo fato de não haver transferência ao setor público - a
iniciativa privada possui a propriedade sobre os ativos - como ocorre no caso de uma
privatização, ou, no caso brasileiro de uma usina termelétrica que possui autorização
para operar por um período determinado sem no entanto ter que devolver o ativo ao
final, sendo possível inclusive renovar esta autorização até que o ativo se deprecie por
completo.
2.2 Os Agentes Envolvidos
A parceria público/privada para o desenvolvimento de um projeto de infra-estrutura
envolve uma série de agentes cujas categorias serão descritas neste item.
Um projeto de infra-estrutura usualmente pode se originar de duas formas. Na primeira,
o órgão público encarregado de regulamentar determinado setor lança concorrência para
selecionar quem desenvolverá projetos específicos. Na segunda, o agente privado
identifica uma oportunidade de investimento em determinado setor e pede autorização
para desenvolvê-lo. O uso de um ou outro procedimento, e de suas variantes, dependerá
do estágio de regulamentação no qual o setor e as relações público/privadas se
encontram.
A concessão de um projeto de infra-estrutura normalmente é licitada pelo órgão
30
governamental responsável pela regulamentação do setor envolvido, o Poder
Concedente.
O Poder Concedente selecionará através de uma concorrência um parceiro privado para
desenvolver o projeto, o Patrocinador (acionista da empresa estabelecida para o
Projeto). O Patrocinador estabelecerá uma empresa com o propósito exclusivo de
desenvolver e operar o projeto em questão, uma EPE (empresa de propósito específico).
O Patrocinador poderá possuir, ou não, os requisitos para construir e operar o projeto.
Dessa forma, há mais dois agentes envolvidos o Operador e o Construtor do projeto,
onde também se inclui o fornecedor de equipamentos.
A menos que o projeto seja financiado com recursos próprios dos Patrocinadores, o que
não é comum tendo em vista os altos investimentos envolvidos em projetos de infra-
estrutura, temos também a figura do financiador, instituições financeiras discutidas no
item 2.6 a seguir.
Um elemento chave na estruturação de um Project Finance, explorado mais adiante, é a
alocação dos riscos envolvidos no projeto dentre as partes capacitadas a assumi-los.
Neste ponto, surge a seguradora desempenhando um papel crucial ao assumir aqueles
riscos que estão além da capacidade dos demais agentes.
Outro agente de fundamental importância para a elaboração de um Project Finance é o
Comprador ou Usuário dos serviços oferecidos. Para se viabilizar o financiamento, uma
31
vez que ele se fundamenta no fluxo de receitas geradas pelo projeto, é importante a
fixação de contratos de longo prazo com Compradores (offtakers) que se
comprometerão em adquirir seja o volume total da produção, seja um volume
satisfatório do ponto de vista do pagamento das dívidas e da remuneração do capital.
Nem sempre haverá compradores dispostos a se comprometer desta forma, isto também
variará conforme o tipo de projeto. Por exemplo, no caso de uma rodovia não há um
único usuário e sim inúmeros. Neste caso, a menos que o Poder Concedente assuma o
pagamento de tarifas, ou de um nível mínimo de tarifas, haverá o risco de mercado que,
como veremos adiante, poderá vir a se tratar de um entrave à estruturação de um Project
Finance caso não seja devidamente analisado e mitigado.
Por último, mas não menos importante, há o Fornecedor de Matérias-primas com o qual
também deve ser estabelecido relacionamento de longo prazo para que se possa
implementar com sucesso um Project Finance.
Segue uma figura ilustrando os agentes típicos de um projeto de infra-estrutura,
desenvolvido na forma BOT:
32
Figura 4: Agentes envolvidos em um BOT
PoderConcedente
Acionistas
EPE
Fornecedorde Insumos
Financiador
Comprador(“offtaker”)
Operador Fornecedor deEquipamentos
Construtor
Seguradoras
Onde:
EPE: Empresa de Propósito Específico
Comprador (Offtaker): Comprador do produto ou serviço fornecido pela EPE
2.3 O papel da Alocação dos Riscos no Project Finance
Para que um projeto seja financiado tomando por base seus ativos e suas receitas é
fundamental que todos os riscos sejam alocados àquelas partes que são capazes de
assumi-los e mitigá-los. Este exercício se torna necessário devido ao fato do projeto
depender unicamente de uma atividade, seja ela geração de energia elétrica, produção de
petróleo, ou prestação de serviços de telecomunicações. Desta forma todos aqueles
fatores que podem tornar o projeto e/ou seus ativos vulneráveis têm de ser conhecidos e
mitigados.
33
Os riscos deixam de ser um problema quando são previstos e recebem um tratamento
adequado. Tipicamente, um projeto de infra-estrutura apresenta riscos comerciais e
políticos que podem se manifestar no período de Construção e Operação. Tais riscos se
originam de um grupo mais específico de riscos, a saber:
• Riscos comerciais: tecnológico, ambiental, de mercado, macroeconômico (variação
cambial, variação de taxa de juros, inflação alta, recessão, etc.).
• Riscos Políticos: risco de guerra, rebelião, mudança na legislação, risco de quebra
de contrato por parte do Governo, risco de conversibilidade e transferência de
moeda para o exterior.
• Riscos de Força Maior: aqueles fora do controle das partes, englobando riscos
relacionados com fenômenos naturais, acidentes imprevisíveis e alguns riscos
políticos, tais como guerra, rebelião, mudança de lei, dentre outros.
Os riscos aos quais projetos de infra-estrutura estão expostos apresentam inúmeras
causas e variantes, podendo variar em função do setor, do tipo de projeto e da estrutura
comercial e contratual adotada para o mesmo, sendo assim, a elaboração de uma matriz
qualitativa descrevendo causas e possível tratamento e alocação é um instrumento
indispensável na estruturação de um Project Finance, sendo também utilizado no
processo de due diligence18 do mesmo.
18 “Due diligence” é o processo de análise e avaliação do projeto, neste caso realizado pelosfinanciadores.
34
Segue como exemplo uma matriz qualitativa dos riscos inerentes a um projeto de
geração hidrelétrica:
35
Quadro 6: Matriz Qualitativa de Riscos
Período de Construção:
Risco Causa Mitigação Alocação• Atraso no início da
construçãoAtraso nas Licenças Ambientais, de Construção e deimplantação/ Atraso no processo de expropriação deterras
(1) Garantia dos acionistas durante o período deconstrução
(2) Planejamento e gerência rigorosos(3) Flexibilidade nos prazos do Contrato de Compra de
Energia (CCE)
(1) Acionista(2) Acionista(3) Acionista/ Comprador de
Energia
• Custos acima doprogramado
(1) Licenças/Expropriação(2) Risco Tecnológico(3) Risco Ambiental(4) Risco Geológico(5) Acidentes(6) Força Maior(7) Aumento dos preços(8) Variação cambial
(1) Mesmo que indicado acima(2) Contratação de tecnologia experimentada, com
penalidades impostas ao fornecedor em caso defalhas
(3) Contribuição adicional de Capital Próprio(4) Estudo detalhado das condições geológicas/
aceitação das mesmas pelo construtor da usina(5) Seguro contra todos os riscos(6) Cláusula de força maior no CCE para riscos não
asseguráveis(7) Contratação de pacote de construção com preço
fixo(8) Maior parte dos custos de construção são em Reais
(1) Acionista/ Comprador deEnergia
(2) Fornecedor/ Construtor(3) Acionista(4) Seguradora(5) Comprador de
Energia/Acionista(6) Construtor/fornecedor(7) Acionista
• Atraso na conclusão (1) Risco tecnológico(2) Risco ambiental(3) Força Maior
(1) Contratação de pacote de construção com datadefinida, com penalidades impostas em caso deatraso
(2) Planejamento/ Gerência, aporte adicional de CapitalPróprio
(3) Cláusula de força maior no CCE para atrasosimprevisíveis
(1) Fornecedor/ Construtor(2) Acionista(3) Comprador de
Energia/Acionista
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Período de Operação:
Risco Causa Mitigação Alocação• Perda de receita (1) Risco de Mercado
(2) Risco Comercial do Comprador de Energia(3) Força Maior(4) Acidentes(5) Baixo volume de água(6) Usina não é despachada
(1) Contrato de Compra de Energia (CCE) comcomprador confiável, com preço e quantidadesdefinidas
(2) Garantias do Comprador, por ex. Conta-caução (i)para o pagamento da energia
(3) Pagamentos independentemente do despacho (ii)(4) Seguro de Lucros Cessantes(5) Comprometimento de geração baseado no histórico
do volume de águas.(6) Pagamento incondicional da tarifa de capacidade
(iii) estabelecida no CCE cobrindo os custos fixosda usina, inclusive o serviço da dívida (iv)
(1) Comprador de energia(2) Comprador de energia(3) Comprador de energia(4) Seguradora
• Aumento custos deoperação
(1) Risco operacional(2) Força Maior(3) Mudanças na Lei(4) Acidentes(5) Variação do juros(6) Variação do câmbio(7) Aumento dos preços
(1) Contratação de operador experiente, compenalidades no caso de não performance
(2) Pagamentos independentemente da nãoperformance por Força Maior
(3) Custos repassados para Comprador de Energia(4) Seguro contra todos os riscos(5) Maximizar juros fixos(6) Indexação no CCE/ Conta-caução/ Financiamento
em Reais(7) Indexação no CCE
(1) Operador(2) Comprador de Energia(3) Comprador de Energia(4) Seguradora(5) Acionista(6) Comprador de Energia(7) Comprador de Energia
• Risco Político (1) Desapropriação, guerrilhas, inconvertibilidadeda moeda, etc.
(1) Contratação de seguro contra risco político (1) Acionista (pode aumentarcustos)
Notas:(i) Conta-caução consiste em uma conta bancária onde um determinado valor estaria depositado como garantia de um pagamento ou
empréstimo.(ii) Despacho trata-se de um conceito técnico aplicado ao mercado de eletricidade que representa a ordem de produção.(iii) Tarifa de Capacidade é fixada por unidade de capacidade instalada de geração (por exemplo: MW ou KW).(iv) Serviço da dívida consiste no pagamento do juros e principal da dívida contraída.
37
Os riscos são alocados entre os diferentes agentes através de arranjos contratuais
bastante precisos, de forma a evitar qualquer dificuldade futura ou comportamentos
oportunistas. Cada parte terá suas responsabilidades muito bem definidas e dessa forma
o objetivo maior de proteção do fluxo futuro de caixa, fundamental para que um Project
Finance seja bem sucedido, e com isso das obrigações da EPE, ficaria garantido.
A seguir será introduzida a discussão dos instrumentos contratuais tradicionalmente
utilizados em um Project Finance assim como dos tipos de garantias utilizadas.
2.4 Os Instrumentos Contratuais
É de fundamental importância para a compreensão do ambiente contratual de um
projeto de infra-estrutura o tipo de parceria público/privada em que este se insere.
Dependendo do contexto regulamentar do país, e do setor no qual o projeto se encontra,
pode haver um maior ou menor controle do bem público. Nesta situação, o Governo
poderia tomar a iniciativa de licitar a concessão de um projeto, ou a compra de um
determinado serviço a ser realizado pelo projeto, ou ainda pode-se encontrar situações
onde a iniciativa privada identifica um projeto de interesse público/ privado e solicita
autorização para desenvolvê-lo, ou propõe como parceria com o setor público.
Os contratos firmados para o projeto são peças fundamentais para a estruturação de um
Project Finance bem sucedido. Caso tais contratos não sejam satisfatórios do ponto de
vista dos potenciais financiadores, dificilmente implementar-se-á um Project Finance
38
non-recourse, prejudicando mesmo a viabilidade do financiamento na sua modalidade
limited recourse.
Para que os contratos sejam satisfatórios esperar-se-á que eles distribuam de forma
adequada os riscos entre os diversos agentes envolvidos. Os financiadores não
costumam aceitar situações onde a empresa estabelecida para o projeto, e tomadora do
financiamento, assuma riscos fora de seu controle.
Seguem alguns dos principais contratos firmados em uma parceria público/ privada, os
quais exercem importante papel na estruturação da transação.
2.4.1 Edital de Concorrência
Em uma situação onde o setor público pretende licitar uma concessão, ou arrendar um
projeto já existente, normalmente ele convidará interessados a apresentarem propostas
através de um Edital de concorrência, onde os parâmetros da concorrência estariam
definidos e explicitados, sem grande espaço para negociação entre o licitante e os
interessados no projeto. Nestas situações, segue-se um ritual de liberação de
informações de forma uniforme e transparente, de modo que nenhum dos concorrentes
detenha informações privilegiadas. Este procedimento é adotado no Brasil, onde há todo
um aparato legal rezando sobre o assunto das licitações e concessões, assim como toda
uma regulamentação em estágio de desenvolvimento nos diversos setores.
Contudo, nem sempre faz-se uso de um Edital de Concorrência. Segundo Wilde Sapte
39
(1997), no caso britânico muitas vezes os projetos promovidos pela Private Finance
Initiative - PFI, departamento do Governo para o estabelecimento de parcerias
público/privadas, são definidos através de negociação parcial ou livre negociação. Na
primeira modalidade, o PFI emite uma documentação com alguns dos parâmetros da
concorrência e envia para alguns agentes pré-selecionados os convidando para um
processo de negociações limitado a certos parâmetros definidos na documentação da
concorrência. Diferentemente do sistema brasileiro, nessa modalidade os concorrentes
estariam mais livres para propor alterações quando da entrega de suas propostas.
Adicionalmente, o PFI também define as condições e parâmetros dos projetos através da
livre negociação.
2.4.2 Contrato de Concessão
Este trata-se de um documento fundamental no caso de projetos concedidos à iniciativa
privada. O Contrato de Concessão regulamentará os direitos e obrigações das partes,
indicando de que forma os riscos serão alocados entre as mesmas, a forma de resolução
de divergências entre elas, as penalidades em caso de quebra de alguma condição
contratual, os eventos de força maior, o prazo e condições para o término da concessão,
direito de intervenção e o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
A definição das formas de resolução de divergências é muito importante na medida que
limita prazos e custos que serão incorridos pelas partes no caso do desrespeito de
alguma das cláusulas do contrato. É importante que para todas as possibilidades de
quebra do contrato, “eventos de falha”, haja penalidades, remédios e prazos
40
determinados para a cura. Não resolvido o problema no prazo determinado a parte
lesada poderia solicitar o término do contrato e a indenização cabível.
Segundo o Código Civil Brasileiro (Art. 1.058, Parágrafo único), eventos de Força
Maior, ou Caso Fortuito, são definidos como: “O caso fortuito, ou de força maior,
verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar, ou impedir.”, no
entanto esta definição é bastante vaga, e geral, como a lei deve ser. Para a banca
internacional é preciso que os contratos de concessão, que componham um projeto que
será financiado como Project Finance, apresentem uma descrição mais explícita de
quais eventos deveriam estar incluídos nesta categoria. Tais eventos são todos aqueles
que fogem ao controle, e à previsão, das partes, a saber: atos do príncipe, atos da
natureza, guerras, guerrilhas, greves que fujam ao controle das partes, etc. Definidas as
condições para eventos de Força Maior, as partes ficam desobrigadas a cumprir o
contrato nessas circunstâncias.
O término do contrato normalmente é seguido de uma indenização no caso de decisão
unilateral por parte do Poder Concedente. Do ponto de vista da banca internacional esta
indenização teria de ser suficiente para cobrir o saldo da dívida, incluindo os juros.
Os bancos também esperam partilhar do Direito de Intervenção (step-in) caso algo que
prejudique a amortização da dívida contratada e a empresa tomadora do empréstimo (a
Empresa de Propósito Específico) fique inadimplente. Nessa situação, caso o Poder
Concedente não assuma a amortização da dívida, os financiadores buscarão intervir
antes que uma falha se transforme em término do contrato, se isto ocorrer eles
41
procurarão participar do processo decisório de substituição do acionista.
O Conceito de “equilíbrio econômico-financeiro” permite reajustes periódicos ou a
revisão da tarifa, para mais ou para menos, de forma a preservá-la de acordo com as
condições originalmente acordadas no contrato.
2.4.3 Contrato de Compra e Venda de Serviços
Como já foi dito antes, este contrato trata-se de um dos elementos de maior importância
na estruturação de um Project Finance.
O estabelecimento de contratos de longo prazo para aquisição do serviço de infra-
estrutura são cruciais para garantir receitas no longo prazo, especialmente naqueles
setores onde as incertezas quanto ao comportamento da demanda e dos preços é maior,
como por exemplo: setores relacionados com commodities – petróleo e gás,
petroquímico, siderúrgico -, setores onde as condições de mercado não estão definidas
quando do estabelecimento do projeto, como no caso do setor elétrico brasileiro nos dias
de hoje.
Segue uma breve descrição de algumas das condições necessárias para que estes
contratos sejam adequados para o pacote de garantias de um Project Finance:
• Volume: É importante que o volume contratado gere receitas em valor suficiente
para cobrir os custos operacionais, o pagamento do financiamento e o retorno do
42
capital.
• Preço: O Comprador tem que garantir um preço mínimo que permita, ao volume
contratado, cobrir os custos operacionais, o pagamento do financiamento e o retorno
do capital. O reajuste dos preços tem de estar claramente definido e deve
acompanhar o reajuste dos custos na mesma proporção. Em outras palavras, se parte
dos custos varia de acordo com um índice de inflação e parte de acordo com a
variação cambial da moeda estrangeira utilizada estas variações têm que estar
refletidas nos preços de forma a não criar um descasamento entre receitas e
despesas. A forma de pagamento (prazos, freqüência) também é um ponto
importante a ser definido no Contrato.
• Prazo: A banca internacional esperaria um Contrato de Compra com prazo superior
ao prazo total da dívida em pelo menos 3 anos, de forma a se criar uma margem de
segurança caso seja preciso estender o prazo de amortização da dívida.
• Garantias do Comprador: Normalmente, dependendo da qualidade de crédito do
comprador, são exigidas algumas garantias de cumprimento dos pagamentos
devidos em contrato. Isto não seria uma exigência para compradores que apresentem
classificação de crédito forte, superior a A, de acordo com as agências de
classificação de risco (rating agencies) reconhecidas mundialmente (Standard and
Poor’s, Moody’s, DCR, dentre outras). No entanto, caso a empresa seja rebaixada
em sua classificação, passando a apresentar uma classificação inferior àquela que os
financiadores se sentem confortáveis, o comprador teria então de apresentar
43
garantias. Uma forma muito comum é o depósito em conta bancária especial (conta -
caução19) de valores, ou recebíveis de primeira linha, correspondentes a um
determinado número de pagamentos.
• Força Maior: Assim como no Contrato de Concessão, o Contrato de Compra (e
todos os demais contratos envolvidos como veremos a seguir) deverá conter
provisões para o caso de ocorrência de um evento de Força Maior. Nesta situação,
de forma que o contrato seja aceito pela banca internacional sem a necessidade de
nenhum tipo de garantia da parte dos acionistas do projeto, é preciso que a EPE
esteja desobrigada de fornecer os serviços contratados. Além disto, normalmente,
caso os efeitos da Força Maior se prolonguem é facultado às partes o direito de
término do Contrato. Uma provisão contratual bastante desejável do ponto de vista
dos bancos, porém bastante difícil de se atingir na negociação de um Contrato de
Compra, é a existência de pagamentos mínimos durante o período que os efeitos de
um evento de Força Maior sejam sentidos, suficientes para cobrir os custos fixos da
EPE, principalmente o serviço da dívida.
• Término: As circunstâncias que acarretariam o término do contrato, assim como que
tipo de indenização seria devida no caso de término por ambas as partes, teriam de
ser definidas nesta cláusula. A banca internacional esperaria uma indenização por
parte do comprador, ou compra da planta e das instalações do projeto, em valor
suficiente para saldar a dívida. Muitas vezes esta provisão é aceita pelo comprador,
caso ele seja o responsável pelo término do contrato.
19 Outro nome bastante utilizado, na língua inglesa, é escrow account.
44
• Penalidades: É importante que todos os eventos de falha entre as partes, seus
respectivos remédios e período de cura sejam considerados, assim como as
penalidades estejam definidas de forma bem precisa no contrato, como por exemplo
penalidades por atraso na entrega dos serviços, não cumprimento de metas,
qualidade inferior à acordada, etc.
2.4.4 Acordo de Acionistas
Antes do estabelecimento de uma Empresa de Propósito Específico para o projeto os
futuros acionistas sentem necessidade de um documento que defina seus direitos e
obrigações entre si. Muitas vezes um Memorando de Entendimento é firmado quando
da época da licitação para determinado projeto, ou no início das negociações entre
partes interessadas, definindo questões como: a participação dos interessados, divisão de
custos, poder de decisão de cada parte e o processo decisório, interesses comerciais das
partes, divisão de tarefas entre as partes, exclusividade e confidencialidade, forma de
retirada do acordo, dentre outras.
Quando do estabelecimento da empresa que irá construir e operar o projeto grande parte
dos direitos e obrigações das partes, agora os acionistas, com relação a esta nova
empresa estabelecida será definida pelo Estatuto Social da nova empresa.
Adicionalmente, é comum os estabelecimento de um Acordo de Acionistas regulando o
relacionamento dos acionistas entre si. Os financiadores estarão atentos neste contrato
para os seguintes assuntos: processo decisório, se existe algum fator que o dificulte;
45
comprometimentos de aporte de capital, de que forma o capital será aportado (dinheiro
ou outros ativos) e o prazo e freqüência deste aporte; contribuições contingentes, diante
de situações percebidas como arriscadas; comprometimento dos acionistas com o
projeto a longo prazo; possibilidade de saída apenas encontrando substituto com mesma
qualidade de crédito ou vendendo sua participação para os demais acionistas; restrição à
competição com o projeto através de outra empresa, dentre outros.
2.4.5 Contrato de Construção, Fornecimento e Montagem de Equipamentos
O Contrato de Construção, Fornecimento e Montagem de Equipamentos é mais um dos
ingredientes básicos na estrutura contratual de um Project Finance. Sua importância se
deve ao fato de: representar um alto valor monetário, o investimento do projeto; dele
depender a qualidade, eficiência e o início da operação do projeto, já que atrasos na
construção geram atrasos na operação e por conseqüência perdas de receita.
Normalmente espera-se a construção do empreendimento, o fornecimento e a montagem
dos equipamentos sejam contratados através de um único contrato, o chamado EPC
(Engineering, Procurement and Construction), através do qual a construtora ou a
fornecedora de equipamentos se responsabiliza por toda a subcontratação dos serviços
de engenharia e construção, pela aquisição/ fornecimento de equipamentos e pela
gerência de todo o serviço; na forma turn-key, isto é, construção e montagem completa,
com entrega da planta pronta para funcionar após testada; com preço fixo; e data certa, o
que significa dizer que todos os prazos são estabelecidos nos contratos e caso o EPC
contratado não alcance suas metas estaria sujeito a penalidades e não pagamento de seus
46
serviços. Os conceitos básicos que norteiam este contrato serão descritos a seguir.
• Custos e Quantidades: Os financiadores esperam que os custos sejam fixados ou que
sejam reajustados de acordo com cláusulas contratuais pré-definidas de forma que
não haja nenhum aumento inesperado ao longo de sua execução. As quantidades são
também definidas de acordo com as especificações do projeto, e sua alteração só
seria permitida em situações muito específicas de responsabilidade do contratante,
da EPE, de Força Maior ou mudanças na lei. Em suma, o custo do contrato deve ser
fixo e acordado antes do início dos trabalhos.
• Prazos: A EPE possui responsabilidades em termos de prazo para o início do
fornecimento dos serviços, e caso não os atenda muitas vezes perderá a receita não
realizada e será penalizado através de multas por atraso. Sendo assim, é importante
que o prazo para a conclusão da construção seja definida, e mais ainda, um
cronograma para a execução dos trabalhos seja seguido. Uma das medidas utilizadas
para incentivar o cumprimento destas metas de prazos é o estabelecimento de
penalidades e bônus. Outra prática bastante freqüente nestes contratos é o de
pagamentos vinculados ao cronograma estabelecido.
• Qualidade e especificação: No que diz respeito à qualidade do equipamento e da
construção, testes serão implementados quando da conclusão dos trabalhos para
comprovar o perfeito funcionamento dos equipamentos instalados. Após a
conclusão, o contrato deverá prever garantias com prazos limitados (em torno de um
ano) para a reposição e/ou reparação de peças com defeito. A especificação do
47
escopo de trabalho e dos equipamentos é outro item imprescindível ao Contrato,
uma vez que o contratante e os financiadores exigirão que certos requisitos sejam
cumpridos.
• Garantias de execução: Normalmente as seguintes garantias de performance são
requeridas do contratado: Performance Bond20 (ou Cartas de Crédito), fornecidos
para assegurar a execução das obras, podem ser liberados conforme as metas
estabelecidas sejam atingidas; Retenções, adicionalmente ao Performance Bond é
comum que ao longo dos pagamentos ao Contratado o Contratante retenha parte
destes pagamentos até formar uma reserva cujo montante varia de acordo com a
situação (por exemplo 10% do valor do contrato); Garantias de conclusão podem ser
requeridas no valor equivalente ao contrato dependendo dos riscos percebidos pelo
Contratante; Garantias da empresa controladora, dependendo da qualidade de
crédito da Contratada garantias de sua empresa controladora podem ser requeridas
para cobrir as garantias de conclusão; Seguros, é de fundamental importância que os
equipamentos e a obra estejam segurados contra todos os riscos.
• Penalidades (Liquidated Damages): As penalidades básicas de um contrato de EPC
são resumidas em Penalidades por Atraso e Penalidades por Performance. Em
ambos os casos o Contratante e os financiadores esperam que o Contratado pague
multas que cubram não só o pagamento do serviço da dívida, os custos fixos e o
retorno do capital, mas também outras penalidades incorridas pela EPE por não estar
cumprindo com suas obrigações.
20 Modalidade de seguro que garante a execução de um serviço contratado.
48
• Obrigações: As obrigações do Contratado em caso de quebra de alguma das
provisões contratuais estão normalmente limitadas ao valor total do Contrato.
• Controle: Tanto o contratante quanto os financiadores buscarão exercer um mínimo
de controle sobre a execução do Contrato de forma a prevenir problemas que
possam surgir. Segundo Wilde Sapte (1997), as principais áreas de controle são:
variações no pedido, aprovações do desenho do projeto, inspeção e teste,
subcontratações e definição da equipe de trabalho, dentre outras.
É de fundamental importância que este contrato esteja de acordo com o contrato de
Compra de serviços e o Contrato de Concessão no que diz respeito à qualidade
requerida, metas e prazos.
2.4.6 Contrato de Operação e Manutenção (O&M)
A operação e manutenção do projeto e seus ativos pode ser contratada com um único
prestador de serviços, ou de forma independente. Muitas vezes o operador é o próprio
acionista do projeto, quando este possuir experiência na atividade, ou mesmo o
fernecedor de equipamentos. É fundamental que um Contrato de O&M (ainda que
separados) seja contratado junto a especialistas com experiência reconhecida. É também
importante que o Operador do projeto seja envolvido desde o período de testes e, se
necessário no desenho da planta, para que possíveis dificuldades sejam levantadas desde
o início. Os principais termos deste tipo de contrato são:
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• Garantias: O operador tem que oferecer garantias sobre níveis mínimos de
performance e sobre danos que ele venha a causar.
• Seguros: A responsabilidade quanto à contratação dos seguros necessários durante o
período de operação tem que ser acordada neste contrato.
• Penalidades: Caso o Operador não atinja a performance mínima requerida ele estará
sujeito a penalidades de forma a reembolsar a EPE pelas perdas incorridas (seja por
redução de receita ou aumento de custos).
• Remuneração: Normalmente uma remuneração fixa, variável ou mista pode ser
utilizada. Adicionalmente, um esquema de bônus e penalidades pode vir a ser
implementado.
• Treinamento e tecnologia: O contrato tem que tratar de assuntos como transferência
de propriedade intelectual e treinamento dos empregados da própria EPE, se for
necessário.
• Término: A EPE deve poder terminar o contrato no caso de quebra das cláusulas
contratuais por parte do Operador. Esta cláusula, seus remédios e prazos de cura,
será observada com muito cuidado pelos financiadores.
Mais uma vez é importante lembrar que este contrato tem que estar de acordo com a
50
performance requerida no Contrato de Concessão e/ou no Contrato de Compra.
2.4.7 Contrato de Suprimento de Matéria-prima
Da mesma forma que a EPE tem que buscar mecanismos para garantir a geração de um
nível mínimo de receitas (através de um Contrato de Compra), ela também deve buscar
uma situação onde os custos de produção sejam o mais definidos possível. Sendo assim,
um dos requisitos para que um projeto seja financiado na modalidade Project Finance é
o estabelecimento de contrato de suprimento de matéria-prima pelo mesmo período do
Contrato de Compra de Serviços. Este contrato é normalmente necessário naqueles
projetos onde um produto é indispensável para sua operação, por exemplo: usinas
termelétricas movidas a óleo ou a gás natural, refinarias, dentre outros. Este contrato
tem de conter provisões quanto ao reajuste de preços, obrigação de fornecimento de um
volume mínimo, padrões de qualidade a serem respeitados, penalidades no caso de não
cumprimento de algum dos itens mencionados acima.
Normalmente a obrigação de fornecimento de um volume mínimo possui a
contrapartida de obrigação de aquisição de um volume mínimo. Esta trata-se da cláusula
de take-or-pay que define que uma parcela do volume contratado tem de ser paga
independentemente do seu consumo.
2.5 As Garantias
O pacote de garantias (“Security package”) tem que ser estruturado de tal forma que sob
51
uma situação de inadimplência todas as etapas e prazos necessários para a intervenção
dos financiadores (“step-in”) e transferência dos ativos e dos direitos sobre o projeto
para os mesmos estejam predefinidas.
A estrutura das garantias advirá da análise detalhada do projeto, processo chamado de
due diligence. Durante a due diligence os financiadores buscarão analisar os riscos
potenciais do projeto, o que, como já foi dito, trata-se de um dos pontos fundamentais
para a estruturação de um Project Finance. Neste momento todos os contratos firmados
para o projeto serão avaliados pelos bancos e seus assessores contratados, assim como o
impacto financeiro das provisões destes contratos no fluxo de caixa do projeto. O
mercado e os aspectos regulamentares também serão analisados em detalhe.
Idealmente o pacote de garantias será a combinação de diversas garantias fornecidas
pelos vários participantes do projeto de forma a permitir conforto aos financiadores e
uma divisão equilibrada entre os riscos do projeto.
Classificação das garantias segundo Nevitt e Fabozzi (1995):
• Quanto ao provedor das garantias:
O provedor das garantias pode ser o acionista do projeto, que através de aval e garantias
contigentes assegura os financiadores contra determinados riscos. Pode-se também
contar com garantias de terceiros, a saber: fornecedores, compradores, empresas
contratadas, agências governamentais. O objetivo de terceiros ao fornecer garantias para
um projeto seria fundamentado basicamente no interesse em fornecer equipamentos e
52
serviços para o projeto, garantindo uma fonte de demanda a longo prazo, ou, no caso
dos organismos governamentais, garantir o desenvolvimento econômico da região
beneficiada. Há também provedores de garantidas comerciais, os quais fornecem
garantias em troca de receita, a saber: os bancos e as seguradoras.
• Quanto à cobertura das garantias:
As garantias cobrirão aqueles riscos com os quais os financiadores, e até mesmo os
acionistas, não se sentem confortáveis. Dentre as principais categorias de riscos
encontrados em um Project Finance temos:
" Risco Comercial: Os riscos comerciais serão garantidos normalmente pelos
acionistas ou pelo terceiro responsável (fornecedor, comprador,...). Os riscos
comerciais mais comuns são: risco de conclusão da obra, risco de custo
acima do estimado, atraso no início de operações, variação dos custos da
matéria-prima, falha no suprimento da matéria-prima, variação de preços do
produto ou serviço fornecido pelo projeto, ou ausência de mercado para o
mesmo.
" Força Maior: Os riscos classificados como de força maior são todos aqueles
que fogem ao controle das partes, englobando catástrofes naturais e riscos
políticos, como descrito abaixo. Alguns destes riscos são cobertos por
seguro, como alguns dos riscos resultantes de catástrofes naturais e alguns
dos riscos políticos, enquanto outros não são seguráveis e devem ser
alocados às partes mais adequadas ao seu controle e planejamento. Por
exemplo, no caso de mudança de lei em um projeto que envolva a compra de
53
energia por uma empresa pública, esta empresa provavelmente estará em
melhor condição para negociar com o Governo no caso do que a nova
empresa estabelecida para o projeto.
" Risco Político: Dentre os principais riscos políticos temos expropriação,
conversibilidade da moeda, quebra de contrato, mudança da lei, guerra,
rebelião, dentre outros. Alguns destes riscos, tais como conversibilidade,
expropriação e quebra de contrato são seguráveis por algumas instituições
multilaterais, ou seguradoras internacionais, no entanto há outros que muitas
vezes necessitam de apoio governamental, ou podem vir a representar
necessidade de garantia adicional do acionista, tais como mudança de lei.
• Quanto ao tipo de garantias:
" Limitadas: As garantias podem ser limitadas por valor ou por prazo, por
exemplo durante a construção do projeto.
" Indiretas: As garantias podem ser indiretas, como é o caso de contratos take-
or-pay e de contratos que garantem um preço mínimo para o serviço
(suporte estatal ou de um consumidor do projeto). Tais garantias não
impactam no balanço do garantidor, representando normalmente apenas
nota do auditor.
" Contingentes: No caso de situações com as quais os financiadores não se
sentem confortáveis estes podem requerer garantais contingentes dos
acionistas Tais garantias não impactam no balanço do garantidor,
representando normalmente apenas nota do auditor.
54
" Implícitas: Tratam-se das chamadas Cartas de Conforto (Comfort Letter),
que sinalizam um apoio do “garantidor” em caso de necessidade. Não se
tratam exatamente de garantias e normalmente não criam um
comprometimento legal entre as partes.
" Garantias por Deficiência: Tais garantias são oferecidas no caso de
inadimplência no pagamento da dívida. Nesta situação o garantidor se
responsabiliza em pagar um determinador valor ou percentual do valor
devido.
" Garantias de Conclusão (Completion Guarantee): Tais garantias são
oferecidas normalmente pelo acionista do projeto quando o risco de
construção e início da operação é percebido como muito alto. Através de um
contrato firmado com os financiadores os acionistas se responsabilizam por
possíveis atrasos e por cobrir qualquer custo superior ao estimado, não
requerendo dos financiadores a colocação de recursos adicionais.
" Garantias no Contrato de Construção: Os construtores, e fornecedores de
equipamentos e materiais devem fornecer garantias que cubram a conclusão
e o funcionamento adequado do projeto. Tais garantias normalmente tomam
a forma de: seguro-garantia (Performance Bond, garantindo a performance,
ou Bid Bond, garantindo a proposta apresentada para o contratante), cartas
de fiança bancária, retenções de pagamentos dos contratados, seguros em
favor do contratante.
" Principais Covenants e outras restrições: Os Covenants tratam-se de
cláusulas contratuais constantes no contrato de financiamento que definem
limites para a atuação dos acionistas e do projeto ou exigem certas ações dos
55
mesmos. Os covenants são divididos em três principais categorias:
(i) Positivos (Positive ou Affirmative Covenants): Exigem
certas ações por parte do tomador do empréstimo, como
por exemplo: implementação e condução do projeto de
forma diligente e de acordo com as boas práticas
financeiras; manutenção de informações contábeis e
gerenciais adequadas; fornecimento relatórios financeiros
e técnicos periódicos; livre acesso aos financiadores;
notificação de mudanças, decisões, procedimentos
administrativos ou técnicos, ou litígios que possam
impactar no projeto; pode também vir a incluir exigências
mais específicas adaptadas ao tipo de projeto.
(ii) Negativos (Negative Covenants): Restringe certas
atividades do tomador de empréstimo, como por exemplo:
restrição à compra de outros ativos que não diretamente
ligados à operação do projeto, imposição de limites a
venda de ativos e das ações do projeto; limites à mudança
do escopo do projeto, dos estatutos da empresa e
alterações nos contratos firmados para o desenvolvimento,
construção e operação do projeto; limites para
endividamento e investimentos, proibição de fornecer os
ativos do projeto como garantias, além daquelas
disponibilizadas aos financiadores; limites e regras para o
pagamento de dividendos e outras distribuições, como
56
comissões de gerenciamento pagas aos acionistas
(normalmente só aceita-se a distribuição de dividendos aos
acionistas após os desembolsos dos financiamentos e
quando o projeto apresenta determinados índices
financeiros).
(iii) Covenants financeiros: os financiadores determinam
indicadores financeiros que funcionam como alerta quanto
a uma possível inadimplência. Os indicadores financeiros
mais usuais são: índice de cobertura do serviço da dívida
(DSCR – Debt Service Cover Ratio), calculado
periodicamente (anual ou semestral) como a razão entre o
caixa disponível para o serviço da dívida (amortização do
empréstimo e pagamento de juros) e o total do serviço da
dívida; Índice de Liquidez Corrente, calculado como a
razão entre Ativo Circulante e Passivo Circulante. Caso o
projeto comece a apresentar índice inferiores ao mínimo
definido, o apoio dos acionistas para aporte de recursos
pode ser solicitado, ou se o evento perdurar a amortização
do empréstimo pode ser acelerada ou renegociada,
dependendo das circunstâncias.
(iv) Outros Covenants: direito de aprovação de certas ações e
benefícios dos acionistas e administradores do projeto;
exigência que os acionistas mantenham determinada
participação no projeto por determinado período; suporte
57
adicional dos acionistas pode ser requerido em caso de
custos excessivos no projeto ou falhas sobre o seu
controle.
(v) Cross-default: tais cláusulas determinam que caso o
projeto ou seus acionistas se tornem inadimplentes em
outros contratos, isto se estende ao contrato de
financiamento, possibilitando que os financiadores
solicitem a aceleração do mesmo.
(vi) Contas de Reserva: contas caucionadas onde o projeto
deverá depositar periodicamente determinados valores
para cobrir determinadas obrigações. As contas mais
comuns são: Conta caução para o serviço da dívida
(DSRA – Debt Service Reserve Account), onde
normalmente são exigidos depósitos equivalentes ao
próximo pagamento do serviço da dívida (semestral ou
anual); Conta de Manutenção (Maintenance Reserve
Account): provisão exigida quando o projeto requer altos
investimentos de manutenção que se repetem ao longo de
um período, por exemplo a cada 5 anos.
As garantias variarão caso a caso, no entanto pode-se apresentar como garantias típicas
de um Project Finance non recourse: a caução das ações da empresa de propósito
especial estabelecida para o projeto; a caução das contas bancárias do projeto inclusive
da conta caução para o serviço da dívida (normalmente os bancos requerem o
58
equivalente ao próximo pagamento semestral); direitos sobre todos contratos do projeto,
tais como contrato de venda, contrato de compra de insumos, contrato de construção; a
participação como favorecido nas apólices de seguro; hipoteca de todos os bens móveis
e imóveis da EPE.
2.6 Fontes Alternativas de Financiamento
Devido ao longo prazo de maturação dos investimentos em infra-estrutura, uma vez que
demandam um alto volume de investimentos, torna-se necessário para a viabilização de
tais projetos, do ponto de vista do retorno dos agentes privados que o patrocinam, a
disponibilidade de recursos de terceiros (dívida ou quasi-equity21) de longo prazo a
custos inferiores ao retorno do fluxo de caixa operacional do projeto, i.e. sem considerar
o financiamento.
Devido à, já comentada, escassez de recursos financeiros de longo prazo no país torna-
se imprescindível a presença de recursos de longo prazo internacionais, normalmente
provenientes de Instituições Multilaterais de Fomento, Agências de Crédito à
Exportação, Investidores Institucionais e Bancos Comerciais. No mercado financeiro
local poucas instituições merecem destaque no financiamento de longo prazo, são elas o
BNDES e a Caixa Econômica Federal. Alguns Investidores Institucionais e bancos
comerciais começam um movimento no sentido de prover recursos de mais longo prazo.
Segue uma breve descrição destas instituições e de sua forma de atuação.
21 Por “quasi-equity” entenda-se dívida conversível em participações acionárias.
59
2.6.1 Agências Multilaterais
As Agências Multilateriais tratam-se de órgãos criados com o propósito de promover o
desenvolvimento econômico e o bem estar social de uma determinada região, através do
financiamento de longo prazo para setores priorizados conforme seu impacto no
desenvolvimento da região. Normalmente são constituídas por governos de diversos
países que contribuem para seus fundos. Outra forma de captação bastante comum entre
tais agências para a arrecadação de recursos de longo prazo é a emissão de instrumentos
de dívida de longo prazo.
Dentre tais agências há uma divisão não só por área de abrangência como também por
setor que suporta, algumas se destinam apenas a apoiar o setor público em projetos
sociais, enquanto outras se destinam ao setor privado no desenvolvimento de projetos de
infra-estrutura ou de outros setores que necessitem suporte financeiro. Há também
aquelas que possuem ambas divisões, atuando tanto com o setor público como com o
privado.
As principais Agências Multilateriais dedicadas ao financiamento de projetos junto ao
setor privado são: IFC – International Finance Corporation; IDB – Inter-American
Development Bank; EIB - European Investment Bank; EBRD - European Bank for
Reconstruction and Development; ADB - Asian Development Bank. Segue uma breve
descrição de tais instituições:
60
• IFC – International Finance Corporation:
O IFC é o braço do Banco Mundial para o setor privado, criado em 1956, possui
aproximadamente 172 países membros e atua nos países emergentes, sem restrições
regionais. Sua política é apoiar os agentes privados, principalmente naqueles setores
onde não há capital privado suficiente, assumindo totalmente o risco comercial sem
garantias governamentais.
Esta instituição, como todos os demais organismos multilaterais, possui um
procedimento de liberação de recursos que envolve uma análise bastante minuciosa do
projeto em questão, tanto no seu aspecto financeiro/documental como nos aspectos
ambiental, político e social.
Sua participação no financiamento de projetos se dá através de três linhas: o empréstimo
A, com recursos próprios da instituição; o empréstimo B, organizado pela instituição
mas fundeado com recursos de bancos comerciais; e o empréstimo C, normalmente com
recursos próprios, tratando-se de uma linha especial utilizada para adquirir participações
acionárias minoritárias, empréstimos subordinados22, ou onde algum tipo de vantagem é
proporcionada ao IFC, como por exemplo a participação no retorno do projeto. O
empréstimo B trata-se de uma forma de atrair empréstimos de longo prazo de bancos
comercias, pois estes se sentem seguros em participar de um financiamento aprovado
pela instituição. Este tipo de apoio é o chamado “guarda-chuva” das agências
multilaterais, onde estas constam como financiadoras (lender of record) junto aos
22 Empréstimos subordinados são aqueles que se encontram num patamar inferior a outros empréstimosna escala de direitos sobre os ativos de uma empresa.
61
bancos centrais dos países de origem dos bancos comerciais envolvidos e do país
destinatário, garantindo no primeiro caso a liberação de provisões normalmente
requeridas para empréstimos internacionais, e, muitas vezes, no caso do país
destinatário, a liberação da retenção de imposto de renda na fonte para o pagamento de
juros e outras comissões relacionadas ao empréstimo.
Como foi mencionado acima, eventualmente o IFC pode vir a adquirir participações
minoritárias nas empresas e projetos financiados.
• IDB – Inter-American Development Bank:
O IDB, ou BID – Banco Inter-americano de Desenvolvimento, instituição estabelecida
em 1959 para o desenvolvimento econômico e social da América Latina e Caribe,
historicamente financiava apenas projetos no setor público e recentemente 1989 passou
a apoiar também o setor privado. Esta agência funciona de forma muito similar ao IFC,
apresentando também uma estrutura de financiamentos A (recursos próprios) e B
(bancos comerciais). Mais recentemente a instituição também vem apresentando como
modalidade de suporte garantias contra risco político ou comercial.
O IDB possui uma grande experiência no Brasil em financiamentos em conjunto com o
BNDES e vem atuando recentemente em diversos projetos de geração de energia e no
setor de transportes, sendo a instituição multilateral mais ativa em financiamentos para
infra-estrutura no país.
62
• EIB – European Investment Bank:
Foi fundado em 1958 e pertence aos países membros da União Européia (UE),
dedicando-se a financiar projetos que promovam o desenvolvimento de regiões menos
abastadas ou ainda projetos que demandem seu apoio e sejam de interesse comum aos
países membros. O EIB pode também financiar projetos fora da região da UE desde
que estes gerem benefícios para os países membros.
Os recursos do EIB originam-se basicamente do capital aportado pelos membros e de
operações no mercado de capitais. Seu financiamento pode atingir um prazo de 25 anos,
e cobrir até 50% do investimento de um projeto.
• EBRD - European Bank for Reconstruction and Development:
O EBRD foi criado com o propósito de apoiar os países da Europa Central e Oriental
em projetos públicos e privados. Esta instituição pode oferecer empréstimos, com
recursos próprios e/ou de bancos comerciais, participações minoritárias no capital ou
garantias.
• ADB – Asian Development Bank:
Criado em 1966, objetiva promover o desenvolvimento nos países membros da Ásia e
Pacífico, apoiando o setor público e privado. É composto por 40 países da região e 16
63
fora. O ADB pode participar de um projeto através de financiamentos e participações
acionárias, assim como pode fornecer assistência técnica para a preparação e
desenvolvimento de projetos.
2.6.2 Agências de Crédito à Exportação
A Agências de Crédito à Exportação (também conhecidas como ECAs – Export Credit
Agencies) tratam-se de órgãos governamentais que objetivam promover a exportação de
seus países oferecendo condições atrativas de financiamento. Uma ECA pode apoiar
projetos que envolvam a aquisição de bens ou serviços do seu país de origem através
dos seguintes produtos: financiamento, com recursos próprios ou de bancos comerciais;
seguro/ garantia contra risco político e/ou comercial, cobrindo financiamentos de outras
instituições financeiras; refinanciamento de projetos financiados inicialmente com
recursos de bancos comerciais; subsídios a taxas de juros contratadas para financiar um
produto originário de seu país; dentre outros. Normalmente seu financiamento, ou
cobertura de risco político, pode alcançar até 85% do valor do bem/serviço adquirido.
Dentre as principais ECAs temos: US Eximbank (EUA); Jexim (Japão); COFACE
(França); Hermes (Alemanha); ECGD – Export Credit Guarantee Department (Reino
Unido), dentre outras.
2.6.3 Seguradoras de Risco Político
Além das ECAs, há várias instituições que podem oferecer cobertura contra risco
64
político para projetos de infra-estrutura. Segue uma breve descrição das principais
entidades atuando neste sentido:
• MIGA – Multilateral Investment Guarantee Agency:
Criada em 1988, trata-se de outro membro do Banco Mundial com o propósito de
incentivar o investimento estrangeiro nos países em desenvolvimento. A MIGA
normalmente oferece garantias para os investidores (acionistas) de determinado
empreendimento, mas pode vir a garantir também financiamentos. Suas garantias
compreendem principalmente: risco de convertibilidade e transferência de moeda,
expropriação, guerras e conflitos civis e quebra de contrato pelo governo. A agência
também oferece seus serviços de assessoria, visando aumentar a capacidade de atração
de investimentos privados nos países membros. Para ser eleito para o programa da
MIGA o investidor tem que pertencer a um dos países membros, que não aquele do
investimento, podendo receber garantias com prazo de até 20 anos.
• OPIC – Overseas Private Investment Corporation:
A OPIC é uma agência governamental norte-americana, criada em 1971, que atua em
140 países em desenvolvimento provendo financiamento e seguro de risco político para
empreendimentos promovidos por investidores norte-americanos. O seguro de risco
político possui cobertura para não convertibilidade da moeda e impossibilidade de
remeter os resultados do empreendimento segurado (transferência), expropriação e
violência política.
65
• American International Group (AIG):
Uma outra instituição que merece destaque é a AIG, seguradora privada norte-
americana que vem atuado no mercado de seguros contra risco político.
Porém a participação da AIG em projetos de infra-estrutura não se limita ao
fornecimento de seguros, ela se trata de um dos principais agentes envolvidos na
administração e fornecimento de recursos via Fundos de Investimento em Infra-
estrutura. Dentre os fundos que contam com a participação da AIG, temos: AIG Asian
Infrastrucure Fund e o AIG-GE Capital Latin American Infrastructure Fund, os quais
serão discutidos mais a frente.
2.6.4 Bancos Comerciais
Os bancos comerciais internacionais vem atuando de forma crescente na modalidade de
financiamento em estudo. Sua participação se dá normalmente através de empréstimos
B das instituições multilaterais acima mencionadas. A preferência por esta forma de
participação se dá pela credibilidade que a participação de uma instituição multilateral
confere à transação: não só por possuírem uma due diligence criteriosa, que geralmente
duram de 4 meses a 1 ano, mas principalmente porque estas instituições teriam
facilidade maior em caso de necessidade de renegociação da dívida ou em caso de
negociação com Governos no caso de problemas com a conversibilidade da moeda, a
chamada “umbrela” (guarda-chuva) das instituições multilaterais. Adicionalmente, estes
66
bancos operam também com cobertura de risco político (seja de ECAs, seja de outras
instituições). Recentemente a participação “descoberta”, sem cobertura de risco político,
também vinha aumentando, muitas vezes através de operações complementares àquelas
com cobertura contra risco político. No entanto após a crise asiática (setembro de 1997),
sucedida pela crise russa (julho de 1998), e pela crise cambial brasileira (janeiro de
1999), esta tendência se esvaziou. Mesmo antes das crises financeiras mencionadas esta
prática encontrava-se disponível principalmente para projetos desenvolvidos em países
que atingiram a classificação “Investment Grade”.23
Segue uma lista com os 10 principais bancos internacionais na estruturação e
financiamento de projetos na modalidade Project Finance, no ano de 1998, no Mundo e
na América Latina:
Quadro 7: 10 Principais Bancos Internacionais atuando em Project Finance
Mundo América Latina
Banco Valor(US$ milhões)
Banco Valor(US$ milhões)
Citibank/ SSB 3.919,25 Citibank/ SSB 1.653,06Bank of America 3.592,14 Bank of America 1.304,91Barclays Capital 2.743,50 ABN Amro 806,83Chase 2.645,28 Dresdner 783,87Crédit Lyonnais 2.577,18 Chase 747,16ABN Amro 2.411,96 Lehman Brothers 690,81Societé Générale 2.173,07 Deutsche 562,78Deutsche 2.095,79 ANZ 559,82West LB 2.061,43 Banque Nationale de
Paris525,61
HypoVereinsbank 2.044,47 West LB 480,09Fonte: Project Finance – The Book of Lists 1999.
23 Investment Grade (ou Investimento Prudente) é a classificação de risco definida pelas autoridadesfinanceiras norte-americanas como prudente. Segundo as agências Standard & Poor’s e Duff & Phelpsequivale à classificação acima de BBB-.
67
No Brasil, devido ao perfil de curto prazo de suas captações, os bancos comerciais não
possuem apetite para transações de longo prazo. O que se tem visto no momento são
algumas iniciativas de alguns grandes bancos nacionais, como é o caso do Unibanco, na
implementação de linhas de repasse de multilaterais e do BNDES.
O Unibanco está em fase final de obtenção de um financiamento de US$ 300 milhões
do IFC para o financiamento de projetos de infra-estrutura de pequeno e médio porte.
Este financiamento será composto de empréstimo A (aproximadamente US$ 50
milhões) e empréstimo B, com prazo estimado em 10 anos. O risco dos projetos será
assumido pelo Unibanco que avaliará e negociará o pacote de garantias na modalidade
Project Finance com aproximadamente 10 projetos, seguindo as regras do IFC e do
Banco Mundial. O fechamento do financiamento dependerá da melhora das condições
de mercado e espera-se que esteja concluído no fim de 1999.
O Unibanco é hoje de um dos principais agentes repassadores de recursos do BNDES
no curto e longo prazo, tendo atuado como repassador para empréstimos de longo prazo
na modalidade Project Finance em diversos projetos nos setores de telecomunicações,
transportes (rodovias e ferrovias) e energia.
2.6.5 Investidores Institucionais
Os investidores institucionais, cujos principais representantes discutiremos a seguir,
vem participando em financiamentos a projetos de infra-estrutura em todo o mundo.
Usualmente tais investidores participam no financiamento de projetos através de Private
Placements - colocações privadas de títulos de dívida, sem registro em bolsa –, e de
68
colocações de títulos via Regra 144 A (Rule 144A), que regula a venda pública de títulos
sem registro em bolsa.
• Fundos de Pensão
Considerando os altos volumes sob a administração dos Fundos de Pensão, o perfil de
longo prazo de suas obrigações, e a experiência internacional podemos afirmar que os
fundos de pensão possuem um alto potencial de financiamento à formação de capital.
Os fundos de pensão brasileiros controlavam em 1997 ativos na faixa de US$ 77,8
bilhões, representando aproximadamente 12% do Produto Interno Bruto, contra
participações superiores a 70% nos EUA e Reino Unido, e 45% no Chile24. Podemos
constatar assim o grande potencial de crescimento dos recursos administrados pelos
fundos de pensão, o que dependerá em larga escala da reforma do sistema
previdenciário nacional.
Espera-se que a disponibilidade de recursos destas instituições para investimentos de
longo prazo em infra-estrutura também poderá aumentar com o advento da estabilidade
econômica. A economia brasileira, ao apresentar altas taxas de juros para investimentos
de alta liquidez, favorece os investimentos de curto prazo em detrimento dos
investimentos de longo prazo. Sendo assim, os fundos de pensão brasileiros aplicam
acima de 40% dos seus ativos em investimentos de curto prazo e alta liquidez (LAFIS,
1998), contra saldos inferiores a 4% aplicados pelos fundos de pensão de economias
24 Relatório LAFIS: Brazil – Pension Funds, agosto de 1998.
69
estáveis (como Alemanha, Holanda e Suécia), o suficiente para as retiradas previsíveis.
O BNDES vem desenvolvendo, desde 1993, análise quanto às possíveis formas de
apoio destes fundos ao desenvolvimento econômico nacional, e propondo aos
administradores dos Fundos de Pensão alternativas de apoio conjunto a investimentos
no setor produtivo e de infra-estrutura.25
• Fundos de Investimento em Infra-estrutura
Os Fundos de Investimento em Infra-estrutura tratam-se de uma modalidade de
investidores bastante recente no mercado internacional, tendo se iniciado na década de
80.
Tais fundos podem apoiar projetos de infra-estrutura, ou empresas que atuam no setor,
basicamente de duas formas: investimentos através de participações acionárias e
financiamentos .
A maior parte dos fundos estabelecidos atuam através de participações acionárias,
buscando altos retornos, normalmente associados ao investimento como acionista. Um
aspecto muito importante neste caso é a análise do potencial de venda desta
participação, as possíveis estratégias de saída a serem implementadas, tais como:
abertura do capital da empresa, venda da participação a terceiros e refinanciamento
através de emissão de instrumentos de dívida. A estratégia de saída é importante na
25 Para uma análise mais profunda dos Fundos de Pensão como potenciais financiadores dodesenvolvimento ver Castellar (1994).
70
medida que dá um conforto adicional ao investidor.
Alguns fundos estabelecidos recentemente vêm buscando investir também com
instrumentos de dívida, financiamentos, e devido ao fato de almejarem altos retornos (o
que varia de 20 a 30% ao ano), podem vir a ser utilizar instrumentos alternativos, tais
como opções de compra de ações, debêntures conversíveis e participações no lucro da
empresa.
Os principais investidores deste fundos são: fundos de pensão; empresas fornecedoras
de equipamentos e serviços para projetos de infra-estrutura, com o interesse de
promover as vendas do seu produto; agências multilaterais, como o BID, o IFC e a
OPIC; bancos comerciais; seguradoras, como a AIG; grandes investidores, como Soros
Capital Inc.; dentre outros.
Estes fundos têm um grande interesse na América Latina, inclusive alguns já foram
estabelecidos com enfoque exclusivo na região, e são potenciais investidores para o
desenvolvimento da infra-estrutura no Brasil.
Segue uma lista com os principais fundos e uma breve descrição de sua área de atuação
e seus investidores.
71
Quadro 8: Principais Fundos de Investimento em Infra-Estrutura
Nome Valor Investidores Área de Atuação AIG AsianInfrastructure Fund
US$ 1,8 bi AIG, Singapore InvestmentCorp., Temasek Holdings
Diversos setores.
AIG-GE CapitalLatin AmericanInfrastructure Fund
US$ 1,013bi
AIG, GE Capital Corp. Diversos setores. Possuilimitação por país (Brasil40%).
Asia InfrastructureFund (AIF)
US$ 1 bi Peregrine InvestmentHoldings Ltd., Frank RussellCo., Soros Capital Inc., AsiaDevelopment Bank
Diversos setores.
Global PowerInvestment LP
US$ 575 m GE Capital Services,Quantum IndustrialHoldings, IFC, outros
Atuação mundial. Enfoque em projetos deenergia elétrica.
Asian MezzanineInfrastructure Fund(AMI)
US$ 450 m Credit Lyonnais, Caisse desDepots e Consignations,IFC, Mitsui Trust, outros
Diversos setores.
International EnergyInfrastructure Fund
US$ 200 m Energy Asset Management,Pacif Enterprises, DresserIndustries/ MW Kellog,Bechtel Enterprises
Atuação mundial. Enfoqueem energia (projetosrelacionados com energiaelétrica e petróleo)
Darby Latin AmericaMezzanine Fund
US$ 500 m Barby OverseasInvestments, Banco BilbaoVizcaya, DresdnerKleinwort Banson, IDB,outros
Enfoque na AméricaLatina.
Global EnvironmentEmerging MarketFund
US$ 70 m Global Environment Fund(GEF), OPIC
Atuação mundial (65%investimentos na AméricaLatina). Setores de atuação: água esaneamento, transporte edistribuição de gás,geração de energia limpa emeio ambiente.
Global EnvironmentEmerging MarketFund II
US$ 120 m GEF, OPIC, BechtelEnterprises, United Utilities.
Setores de atuação: água esaneamento, transporte edistribuição de gás,geração de energia limpa emeio ambiente.
Fonte: Revista Infrastructure Finance (1997).
! Seguradoras:
As segurados tratam-se de um dos principais investidores potenciais para projetos de
72
infra-estrutura, a exemplo da AIG, acima apresentada, e da Sul América Seguros, que é
um dos investidores de Marlim, projeto de exploração de petróleo desenvolvido com a
Petrobras. Um fato que dificulta e limita o investimento de seguradoras em projetos de
infra-estrutura é o longo prazo de maturação destes investimentos vis à vis a
necessidade destas instituições de manutenção de determinado volume de aplicações
líquidas.
2.6.6 O BNDES e seu papel
O BNDES, como único provedor nacional de financiamentos de longo prazo para o
setor privado, possui papel fundamental no desenvolvimento do Project Finance no
Brasil. O banco vem, desde 1994, participando de inúmeros financiamentos nessa
modalidade nos setores de transportes, eletricidade, telecomunicações, incluindo
recentemente exploração e produção de Petróleo.
Em função da crescente necessidade de recursos de longo prazo, seja nos setores de
indústria e serviços, seja nos setores de infra-estrutura, os desembolsos do BNDES vem
crescendo rapidamente nos últimos cinco anos. Como podemos observar no gráfico
abaixo, os desembolsos do BNDES aumentaram de US$ 3,2 bilhões, em 1993, para
US$ 16,5 bilhões no ano de 1997, atingindo aproximadamente US$ 15,7 bilhões em
1998.
73
Figura 5: Evolução dos Desembolsos do BNDES (US$ bilhões)
-
5,00
10,00
15,00
20,00
1993 1994 1995 1996 1997 1998
Total
Infra-estrutura
Fonte: BNDES
Os desembolsos para infra-estrutura apresentaram o seguinte perfil de distribuição entre
os setores, evoluindo de uma participação de 27,5% da carteira total de empréstimos do
BNDES em 1993, para 45,6% em 1997.
Quadro 9: Perfil dos Desembolsos do BNDES por Ramo de Atividade – 1981/1997
Atividades 1981/85 1986/90 1990 1995 1996 1997 1991/97Ind. de Transformação 53,1% 60,6% 73,8% 56,3% 43,8% 33,8% 48,5%Infra-estrutura 31,4% 27,0% 17,6% 26,0% 31,5% 45,6% 31,0%Serviços 0,1% 5,3% 3,0% 6,3% 15,6% 8,3% 6,3%Extração de Minerais 3,0% 2,5% 1,5% 1,0% 1,5% 4,2% 1,7%Agropecuária 0,4% 2,2% 3,8% 10,4% 7,5% 7,8% 12,2%O utros 12,0% 2,4% 0,3% 0,0% 0,1% 0,3% 0,3%Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Fonte: BNDES, Além (1998).
Tendo em vista a grande necessidade de recursos para a infra-estrutura, o BNDES
74
percebeu que uma solução seria canalizar recursos para projetos de infra-estrutura
através da modalidade Project Finance, com ou sem co-financiamento com outras
entidades de fomento ao desenvolvimento (tais como IFC e BID). Abordar-se-á no
próximo capítulo as ações do BNDES nesse sentido.
2.6.7 Outras fontes nacionais
• Caixa Econômica Federal - CEF:
A Caixa Econômica Federal possui uma linha de financiamento para concessionários
privados de serviços de saneamento, utilizando-se de recursos do FGTS- Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço e do BNDES para este fim. Neste sentido, a CEF vem
procurando promover financiamentos na modalidade Project Finance, trabalhando
inclusive em conjunto com o BNDES, por prazos de até 12 anos, e taxas de juros
vinculadas à TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), no caso de uso dos recursos do
BNDES, e TR (Taxa Referencial), no caso de uso dos recursos do FGTS.
No entanto, segundo informações obtidas junto a esta instituição, a Caixa vem buscando
apoiar outros setores, como rodovias e ferrovias.
• Agências de Fomento:
A criação de agências de fomento insere-se no contexto de equacionamento das dívidas
estaduais junto à União e da reestruturação e privatização dos bancos estaduais.
75
Diante deste contexto, o Governo Federal iniciou um processo de reestruturação dos
sistemas financeiros estaduais, através de MP 1.556-10, de 1997, estabelecendo
mecanismos que procuram equacionar a dívida estadual que culminariam na
privatização dos bancos estaduais ou na sua transformação em agências de fomento. O
Conselho Monetário Nacional emitiu a Resolução 2.347, em 10/12/96, que define as
agências de fomento como instituições não-financeiras. Suas captações são limitadas a
repasses originários de: fundos constitucionais, orçamentos dos estados e municípios,
organismos e instituições oficiais de fomento, instituições multilaterais, instituições
financeiras e investidores institucionais.
Há no momento uma discussão a cerca da ampliação do leque de captação das agências
de fomento, assim como de sua atuação, em outras modalidades de suporte financeiro
como coobrigação na emissão de debêntures, cobertura de risco político em concessões
de infra-estrutura, dentre outras.26
• O Papel da Eletrobrás:
Com o processo de privatização do setor elétrico, a Eletrobrás vem procurando seu novo
papel no setor. Uma das possíveis alternativas é sua atuação como financiador do setor,
dando continuidade à sua prática de fornecimentos de financiamentos como recursos da
RGR (Reserva Global de Reversão27) a custos subsidiados, na faixa de 7 a 9% ao ano.
26 Para uma melhor análise do assunto ver Studart (1997).27 A Reserva Global de Reversão foi instituída pela Lei 5.655, de 1971, e trata-se de uma contribuiçãorealizada por todas as concessionárias de serviço público para angariar fundos para cobrir a indenizaçãodos investimentos realizados quando da reversão dos bens da concessão ao poder concedente.
76
Com o fim da RGR, previsto para fim de 200228, a Eletrobrás perderá uma importante
fonte de recursos para exercer tal atividade.
2.7 Vantagens e Desvantagens de um Project Finance
Como já foi mencionado acima, uma das principais vantagens de se financiar um
projeto na modalidade Project Finance, do ponto de vista dos agentes privados, é o fato
do financiamento pode ser contratado “fora do balanço” do acionista. Em outras
palavras, o passivo é contraído pela empresa de propósito específico (EPE) estabelecida
para o projeto e não é consolidado no passivo de seus acionistas, nem é garantido pelos
mesmos. Como conseqüência, tal modalidade permite que um mesmo acionista
participe de vários projetos ao mesmo tempo, dado que sua capacidade de captar
recursos, indiretamente, aumenta de forma considerável. Esta vantagem é essencial
para países onde há necessidade de grandes volumes de investimentos em infra-
estrutura e para empresas que não tenham capacidade financeira para investir ou tomar
financiamentos no próprio balanço para desenvolver novos projetos.
A estruturação do financiamento fora do balanço do acionista, quando acompanhada do
fornecimento de um pacote de garantias adequado aos requerimentos de um Project
Finance, também apresenta como vantagem a possibilidade de acesso de empresas
localizadas em mercados emergentes, ou com limitações de crédito, a recursos de longo
prazo que não estariam disponíveis no caso de uma estrutura com garantias
corporativas.
28 Lei 9.648 de 1998.
77
Outro benefício decorrente desta forma de captação são os altos níveis de alavancagem
normalmente praticados, não só pelo prisma de um projeto individual, onde a dívida
pode vir a participar em até 100% dos recursos necessários para o investimento (apesar
de que os níveis normalmente praticados variam de 60 a 80% do projeto, dependendo da
capacidade financeira e dos riscos do projeto), como também pelo fato de possibilitar a
participação do acionista em diversos projetos com um comprometimento reduzido de
capital, possibilitando a diversificação de sua carteira de projetos e o aumento do
retorno sobre o capital investido, desde que o custo da dívida (líquido do impacto do
imposto de renda29) seja inferior ao retorno do projeto sem dívida.
Ao mesmo tempo em que permite a redução do uso de recursos dos acionistas, o Project
Finance também possibilita uma divisão de riscos mais adequada à capacidade de
absorção de cada uma das partes envolvidas no projeto.
As vantagens para o acionista privado, acima descritas, também se convertem em
vantagens para o Governo, na medida em que o Project Finance se trata de uma forma
de alavancar investimentos em áreas onde os altos montantes envolvidos, os diversos
riscos e o longo prazo de maturação são fatores limitadores para que a iniciativa privada
comprometa seu capital.
Somando-se às vantagens acima apresentadas, temos também, segundo Finnerty (1996),
reduções dos custos de sinalização em situações de informação assimétrica. Isto ocorre
29 Custo líquido da dívida: i x (1-T), onde i = taxa de juros e T = alíquota do imposto de renda, cálculoadotado considerando o benefício da dedutibilidade dos juros para fins fiscais.
78
porque normalmente durante o processo de due diligence os acionistas do projeto
revelam para um reduzido número de investidores e financiadores dados do projeto para
que estes possam desenvolver uma análise detalhada e reduzir sua percepção de risco e,
consequentemente, o custo do empréstimo. Finnerty também aponta, como uma
vantagem do ponto de vista dos financiadores e dos acionistas, que a estrutura adotada
nos contratos de financiamento na modalidade Project Finance reduz o custo de
agenciamento na medida que covenants são definidos de forma a permitir a monitoração
de forma mais efetiva da performance financeira e o comportamento dos
administradores do projeto, implicando também na redução dos custos do
financiamento.
Dentre as desvantagens dessa modalidade de financiamento podemos apontar a
complexidade deste tipo de transação, por envolver muitos agentes e contratos, que
procuram ser suficientemente abrangentes de forma a evitar qualquer brecha para o não
cumprimento de suas provisões. Esta característica também implica em altos custos de
assessoria legal.
Ao adotar um Project Finance o acionista está também se comprometendo a relatar
todas as suas decisões e atos administrativos e financeiros aos financiadores, através de
relatórios regulares: de investimentos físicos, operacionais e situação contábil e
financeira. Esta abertura de informações, somada ao fato de todos os contratos
relacionados ao projeto constituírem parte das garantias fornecidas aos credores,
garantindo a estes, portanto, poder de intervenção em muitas das decisões a serem
tomadas, pode ser considerada como mais uma desvantagem na medida que restringe o
79
poder de decisão do acionista sobre o projeto.
Projetos cuja tecnologia é complexa e pouco experimentada, ou onde o risco de
mercado não permite uma previsibilidade adequada para o fluxo de caixa do projeto são
dificilmente financiados na modalidade em análise. Normalmente nestas circunstâncias
os financiadores provavelmente requererão garantias corporativas dos acionistas, que,
dependendo do nível de exigência, pode vir a tornar o financiamento praticamente
corporativo.
Outra desvantagem a ser considerada é o maior custo dos empréstimos. Dependendo
dos riscos do projeto a ser financiado, e das soluções encontradas para sua mitigação, o
custo de captação da nova empresa pode vir a ser superior ao custo de sua controladora,
empresa já estabelecida com ativos e um histórico de desempenho financeiro.
Como se pode notar, o Project Finance apresenta vantagens e desvantagens que devem
ser analisadas ad hoc, não se tratando de uma receita aplicável a qualquer investidor,
projeto ou setor. Para sua implementação os objetivos a serem atingidos devem ser
considerados antes da decisão de sua aplicação.
Essa modalidade possui grande utilidade para aqueles projetos que envolvam um grupo
de acionistas, prática comum em projetos de infra-estrutura, principalmente para aqueles
acionistas que não possuem recursos suficientes para cobrir toda a necessidade de
investimento do projeto e não pretendem sobrecarregar seus balanços com dívida
adicional para o projeto. Ela também permite que os investidores dividam entre si,
80
acionistas ou financiadores, o risco de investir seus recursos em projetos de infra-
estrutura, muitas vezes fora de seu país de origem.
A análise das vantagens e dificuldades de se implementar o Project Finance é o
primeiro passo para a decisão de adotar ou não essa modalidade. O conhecimento do
contexto macroeconômico, político e legal do país onde o projeto será instalado também
é relevante para esta análise.
É condição para a implementação do Project Finance a existência de um ambiente
macroeconômico e legal estável, que permita um nível aceitável de previsibilidade da
geração de caixa do projeto, assim como do comportamento dos agentes envolvidos e da
validade jurídica dos contratos firmados. Este é um dos principais desafios para a
implementação dessa modalidade de financiamento em mercados emergentes.
Segue uma breve análise do ambiente macroeconômico e legal brasileiro buscando
identificar as principais dificuldades encontradas pelos investidores de projetos de infra-
estrutura e seus financiadores.
81
CAPÍTULO 3
UMA AVALIAÇÃO DO PROJECT FINANCE NO BRASIL:
A EXPERIÊNCIA RECENTE, FATORES LIMITADORES E
PERSPECTIVAS DE IMPLEMENTAÇÃO
Introdução
O objetivo deste capítulo é analisar a aplicação recente do Project Finance no Brasil,
buscando apresentar as principais dificuldades encontradas pelos investidores e
financiadores no campo legal, macroeconômico e político. Uma breve análise do perfil
dos agentes econômicos envolvidos também é desenvolvida ao final do capítulo.
3.1 A experiência recente
3.1.1 Breve descrição do ambiente legal das parcerias público/privadas no Brasil
A concessão e permissão de prestação de serviços públicos no Brasil é regulamentada
pela Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995 (a “Lei das Concessões”) e pela Lei 9.074, de
7 de julho de 1995, que foram criadas com o objetivo de regulamentar o artigo 175 da
Constituição Federal, que já previa concessão de serviços públicos a agentes do setor
privado. Desta forma, com a Lei das Concessões, instituiu-se um ambiente legal para a
exploração de serviços públicos, atividade antes limitada a empresas sob o controle
acionário das três esferas de Governo.
82
Tendo em vista o novo contexto onde a parceira entre a iniciativa privada e o setor
público é inevitável, a Lei das Concessões buscou não só regulamentar a outorga de
concessões, mas procurou também tratar daqueles assuntos relevantes para o
estabelecimento de condições de investimento e retorno satisfatórias aos investidores
privados. A Lei 9.074, complementar a Lei das Concessões, define que esta legislação
se dedica a regulamentar as concessões, permissões e autorizações nos seguintes
setores: vias federais; barragens, contenções, eclusas, diques e irrigações; estações
aduaneiras e outros terminais alfandegados de uso público, não instalados em área de
porto ou aeroporto; energia elétrica (geração, transmissão e distribuição);
telecomunicações; navegação aérea, aeroespacial e infra-estrutura aeroportuária;
transporte ferroviário e aquaviário interestadual; transporte rodoviário interestadual e
internacional de passageiros; portos; serviços locais de gás canalizado e mineração. A
Lei não abrange operações com petróleo e gás por se tratar na época de monopólio da
União e, segundo o artigo 41 da Lei das Concessões, serviços de rádio e televisão.
Ainda na Lei 9.074, segundo seu artigo 2º, estão dispensados de prévia autorização os
serviços de saneamento básico, limpeza urbana e determinados serviços de transporte,
tais quais: rodoviário de carga, rodoviário e aquaviário de passageiros com o objetivo de
turismo, dentre outros.
As concessões de serviço público só podem ser outorgadas através de licitação, de
acordo com a Lei das licitações (Lei 8.666, de 21 de junho de 1993). O artigo 15 da Lei
8.987 também determina que as concessões deverão ser outorgadas com base em: a)
menor valor da tarifa; b) maior oferta, nos casos de pagamento ao poder concedente
pela outorga da concessão; c) ambos critérios. As regras para a avaliação financeira,
83
assim como os critérios que definem a inexiqüibilidade da proposta, deverão ser
definidos no edital de cada licitação, de acordo com as condições econômicas de cada
projeto. O artigo 18 define quais campos devem estar cobertos pelo edital de licitação.
O objetivo é que o edital reflita ao máximo todas as informações disponíveis sobre o
processo seletivo, o projeto e suas condições futuras de operação, e os direitos e
obrigações da concessionária, assim como a minuta do contrato de concessão. O
legislador pretende aqui promover a transparência do processo, e com isso incentivar a
concorrência.
O artigo 23, da Lei das Concessões, especifica quais as cláusulas essenciais ao contrato
de concessão de forma genérica, conforme apresentado abaixo. O detalhe deve ser
definido caso a caso no próprio contrato.
(I) “objeto, área e prazo de concessão;
(II) modo, forma e condições de prestação de serviços;
(III) critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade do
serviço;
(IV) preço do serviço e critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das
tarifas;
(V) direitos, garantias e obrigações do poder concedente e da concessionária;
(VI) direitos e deveres dos usuários para obtenção e utilização dos serviços;
(VII) forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas
de execução do serviço, bem como a indicação dos órgãos competentes para
exercê-la;
84
(VIII) penalidades contratuais e administrativas a que se sujeita a concessionária e
sua forma de aplicação;
(IX) casos de extinção da concessão;
(X) bens reversíveis;
(XI) critérios para o cálculo e a forma de pagamento das indenizações devidas à
concessionária, quando for o caso;
(XII) condições para prorrogação do contrato;
(XIII) obrigatoriedade, forma e periodicidade da prestação de contas da
concessionária ao poder concedente;
(XIV) exigência de publicação de demonstrações financeiras periódicas da
concessionária;
(XV) foro e modo amigável de solução das divergências contratuais.
Se os contratos forem precedidos da execução de obra pública:
(I) cronogramas físico-financeiros de execução das obras vinculadas à concessão;
(II) requerimento de garantia do fiel cumprimento, pela concessionária, das
obrigações relativas às obras.”
Um dos pontos críticos para que a iniciativa privada esteja disposta a investir em uma
concessão seria a questão dos reajustes de preços, dado que a receita do projeto é fator
determinante não só para o retorno do projeto para o acionista, mas também para a
amortização dos financiamentos contraídos para a viabilização financeira do mesmo.
Tendo em vista isto, a Lei das Concessões introduziu não só a necessidade da cláusula
85
de ajuste tarifário, como também trata da aplicação do conceito de “equilíbrio
econômico-financeiro”, conceito constitucional aplicado em contratos administrativos
firmados entre a esfera pública e privada.
O Conceito de “equilíbrio econômico-financeiro” permite a revisão da tarifa de forma a
preservá-la de acordo com as condições originalmente acordadas no contrato. Em outras
palavras, caso ocorram mudanças nos custos do projeto por motivos fora do controle da
concessionária, tais como custos derivados de mudanças de lei, eventos de força maior,
aumento de impostos, aumento de juros ou desvalorização cambial, as tarifas seriam
reajustadas, para mais ou para menos, de forma a restabelecer o equilíbrio econômico-
financeiro do projeto de acordo com a tarifa original. A Lei é bastante geral neste
sentido e o mecanismo de ajuste, a forma de aplicação e de resolução de disputas devem
ser determinados caso a caso em cada contrato de concessão, procurando abranger todas
as possibilidades de alteração das condições do projeto. Tal procedimento é de suma
importância na medida que gera garantias para os acionistas e para os financiadores
quanto à manutenção da viabilidade e das mesmas condições comerciais e financeiras
que os motivaram a apoiar o projeto.
No entanto, por se tratar de um conceito previsto para contratos administrativos, o
equilíbrio econômico-financeiro se enfraquece quando utilizado entre partes privadas,
havendo o risco de terminar em disputa judicial, risco que os financiadores não
pretenderão tomar e que potencialmente demandará algum tipo de suporte dos
acionistas, seja via garantias adicionais ou aportes contingentes de capital.
86
A definição de como a concessão extingue-se, assim como as penalidades das partes e o
tratamento a ser dado para o ativo nesta situação também é de suma importância. A Lei
das Concessões define, em seu artigo 35, que a extinção da concessão pode se dar por:
termo contratual, encampação (retomada do serviço por parte do poder concedente
durante prazo da concessão), caducidade (falha da concessionária em cumprir com os
temos do contrato), rescisão, anulação e falência ou extinção da concessionária.
Extinta a Concessão retornam ao poder concedente todos aqueles “bens reversíveis,
direitos e privilégios transferidos ao concessionário conforme previsto no edital e
estabelecido no contrato.” (Lei 8.987, Art. 35º, §1º).
No caso de termo contratual e encampação a reversão dar-se-á com indenização dos
investimentos não depreciados. Normalmente a forma de cálculo de tais indenizações
não é explicitada nos contratos de concessão, o que consiste em mais uma dificuldade
para operações de Project Finance na medida que gera incerteza quanto ao valor e sua
capacidade de saldar a dívida remanescente.
No caso de caducidade a Lei possibilita que o contrato contemple disposições
estabelecendo deduções, no caso das multas e danos causados pela concessionária, a
serem feitas da indenização paga.
No caso de rescisão, anulação e falência ou extinção da empresa concessionária, a Lei
não é clara, parecendo indicar que a reversão dar-se-ia sem qualquer tipo de
indenização.
87
Os artigos 27 e 28 tratam da oferta de garantias vinculadas à concessão. A transferência
da concessão sem autorização do poder concedente implica em extinção da mesma, daí
é vedado o oferecimento do direito à concessão em garantia. No entanto, é permitido o
oferecimento dos direitos emergentes da concessão tais como recebíveis e ativos não
transferíveis ao poder público, desde que não comprometam a continuidade e a
operação do serviço. Como será visto mais a frente, ainda há dúvidas quanto à forma de
exercício de garantias sobre os direitos emergentes da concessão.
Segundo Clifford Chance (1995), “o Presidente vetou um dispositivo que
proporcionaria garantias de receita mínima ou subsídios por parte do poder concedente
para a Concessão. Ao vetar tal dispositivo, o Presidente deixou claro que o suporte
governamental é contrário ao estímulo da eficiência operacional das concessões
outorgadas ao setor privado.“
De fato, a garantia de pagamentos mínimos por parte do Governo poderia gerar
comportamentos oportunistas por parte dos gestores das concessionárias. Estas
poderiam satisfazer-se apenas com a renda mínima gerada, não implementando as
melhorias necessárias para ampliar o número de usuários ou estender a cobertura do
serviço.
Entretanto, muitas vezes esta pode ser a solução para aqueles projetos que não são
interessantes em termos econômicos para a iniciativa privada. Este é o caso de algumas
rodovias, hidrovias, projetos de transporte urbano e até mesmo hospitais e
88
penitenciárias. Descartando-se completamente esta possibilidade pode-se estar
dispensando uma alternativa válida para projetos “inviáveis” do ponto de vista do
investidor privado. Em algumas situações o apoio do Governo poderia atrair
investidores e resultar em ganhos sociais.
Há também projetos de infra-estrutura que não dependem de concessão mediante
licitação, como a geração termelétrica de energia, por exemplo, com exceção de usinas
nucleares. Segundo o Artigo 6º da Lei 9.074: “As usinas termelétricas destinadas à
produção independente poderão ser objeto de concessão mediante licitação ou
autorização.”. Conforme o Artigo 7º: “São objeto de autorização: I – a implantação de
usinas termelétricas de potência superior a 5.000 KW. (...)”. A autorização, assim como
a permissão, não precisa ser antecedida de licitação. O processo normalmente se inicia
quando um agente privado localiza uma oportunidade de investimento e apresenta seu
estudo à ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), que demandará estudos
técnicos e ambientais para avaliar o pedido. Um exemplo disto são as termelétricas de
Araucária (PR) e Paulínia (SP).
Outro movimento bastante comum é aquele onde distribuidoras estaduais de
eletricidade, ou mesmo geradoras, como é o caso da Eletronorte, abrem licitações para a
aquisição de energia. Nestas licitações o critério é o do menor preço, e o vencedor
assinará um contrato de Compra e Venda de Capacidade e Energia Associada por
determinado prazo, assumindo a responsabilidade de construir e operar uma usina
termelétrica. São exemplos: UTE de Cuiabá (MT), onde o comprador é a Eletronorte;
UTE de Uruguaiana (RS), onde o comprador é a CEEE; UTE de Pecém (CE), onde o
89
comprador é a COELCE.
3.1.2 A atuação do BNDES no financiamento de projetos de infra-estrutura
O objetivo deste item é traçar um quadro geral dos projetos de infra-estrutura que foram
financiados pelo BNDES até então, e daqueles que estão em processo de análise (due
diligence) pelas instituições financeiras.
Como já foi mencionado o BNDES vem acompanhando e participará no financiamento
de grande parte dos projetos de infra-estrutura em andamento.
Um dos primeiros projetos que o BNDES procurou apoiar utilizando as receitas como
principal garantia foi a estrada SC-400/401 em Santa Catarina, ligando o centro da
cidade de Florianópolis à região de praias. Tal financiamento, contratado em 1995, não
se tratou de um Project Finance, no entanto representou um primeiro movimento do
BNDES neste sentido.
Posteriormente o BNDES participou do financiamento de diversas rodovias, dentre elas
a Rio - Juiz de Fora (BR-040), a Ponte Rio Niterói, a Rodovia Presidente Dutra
(interligando a cidade do Rio de Janeiro à cidade de São Paulo) e a Linha Amarela (Rio
de Janeiro), as duas últimas realizadas em conjunto com o IFC e BID respectivamente.
Em cada uma delas o banco foi aperfeiçoando sua compreensão e buscando aplicar o
conceito de Project Finance, fornecendo financiamentos ao projeto, e não aos
acionistas, e reduzindo a demanda de garantias dos últimos.
90
Recentemente, o estabelecimento da nova regulamentação do setor elétrico teve como
conseqüência o surgimento de inúmeros projetos no setor. O BNDES vem também
atuando de forma expressiva, analisando e buscando estruturar financiamentos na
modalidade Project Finance para projetos de geração hidrelétrica e termelétrica em
conjunto com agências multilaterias (IFC, BID e OPIC). Estão em processo de
fechamento do financiamento, em conjunto com o BID, as usinas hidrelétricas de Itá,
1.450 MW e US$ 950 milhões de investimentos, e Machadinho, 1.140MW e US$ 600
milhões, ambas localizadas na fronteira entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A
termelétrica de Uruguaiana (Rio Grande do Sul, 600MW e US$ 315 milhões), movida a
gás natural, também está na fase final de financiamento, provavelmente em conjunto
com a OPIC. A hidrelétrica de Cana Brava (450 MW), localizada no Rio Tocantins e
controlada pela Gerasul, obteve em 1998 financiamento de longo prazo do BNDES,
para aproximadamente 60% de seus investimentos, com características bastante
próximas ao Project Finance e no momento está negociando com o BID o
refinanciamento de parte do financiamento do BNDES.
Tais financiamentos apresentaram ou apresentarão características muito próximas do
Project Finance, como o estabelecimento de uma EPE, o uso de garantias baseadas na
receita do Projeto, a transferência dos direitos dos seguros para o financiador, mas vêm
enfrentando diversas dificuldades para sua aplicação, o que será discutido no próximo
item.
O BNDES vem também procurando financiar o setor de água e saneamento. Dentre os
91
projetos já contratados temos a Concessão de Jundiaí (São Paulo, US$ 20 milhões) e Itu
(São Paulo, US$ 18,5 milhões).
Em fevereiro de 1999 o BNDES apresentava 9 projetos de telecomunicações em estudo,
envolvendo telefonia celular e fixa, representando investimentos equivalentes a US$
15,7 bilhões.
A instituição, que este ano apresenta orçamento estimado em R$ 18 bilhões, apresentou
em 1997 desembolsos superiores a instituições como o BID e o próprio IFC (que
apresentaram respectivamente US$ 5,4 bilhões e US$ 2 bilhões de desembolsos em
1997, contra US$ 16,5 bilhões do BNDES).
Mesmo assim, devido à grande demanda por recursos e à necessidade de apoiar outros
setores o BNDES já vem enfrentando uma restrição orçamentária. Desta forma sua
participação em determinados setores foi reduzida para a faixa de 30 a 40% dos
investimentos, quando antes poderia atingir até 65%.
As principais fontes de obtenção de seus recursos são: o FAT (Fundo de Amparo ao
Trabalhador) e o PIS/PASEP, empréstimos obtidos com instituições multilaterais,
emissão externa de títulos e recursos próprios (geração de caixa de suas próprias
operações). Segue a evolução recente das fontes de recursos do BNDES:
92
Quadro 10: Principais Itens do Passivo do BNDES
(US$ milhões)Fonte 1996 1997 1998 Mar/ 1999FAT 17.622 20.897 23.125 17.653 % Total Passivo 39% 39% 35% 38%PIS/PASEP 13.469 14.003 13.832 10.276 % Total Passivo 30% 26% 21% 22%Recursos Externo (1) 2.124 3.506 9.025 4.822 % Total Passivo 5% 7% 14% 10%Acionistas 9.655 9.352 8.535 (2) 6.285 % Total Passivo 22% 18% 13% 14%Outros 1.856 5.211 12.310 7.463 % Total Passivo 4% 10% 16% 18%Total Passivo 44.726 52.969 66.827 46.499Fonte: BNDES News – abr/ jun 1999.Nota: (1) Financiamentos de instituições multilaterais, emissão de títulos no mercado internacional eempréstimos externos. (2) O BNDES distribuiu US$ 490 milhões em dividendos no último trimestre de1998.
Observando a evolução do passivo do BNDES, pode-se notar que os recursos do PIS-
PASEP vêm apresentando redução progressiva nos últimos anos, o que ocorre devido ao
fato de sua arrecadação ter sido substituída pelos recursos do FAT30 (Fundo de Amparo
ao Trabalhador), quando da criação deste fundo em 1988.
Por outro lado o saldo dos recursos externos vem crescendo como parte do esforço de
diversificação e ampliação de sua base de captação para atender a crescente demanda
por recursos de longo prazo. A captação externa é composta por recursos de instituições
multilaterais e emissões de títulos no mercado internacional.
O BNDES não só provê financiamento de longo prazo diretamente ao projeto, mas
também vem buscando incentivar o desenvolvimento do financiamento de longo prazo
no Brasil através da criação de instrumentos que incentivem bancos nacionais privados,
30 Pelo menos 40% deste fundo é alocado ao BNDES.
93
e outras instituições de investimento, a participarem de tais financiamentos aceitando
prazos mais longos. Este é o caso do financiamento no valor de R$ 394 milhões
fornecido pelo o prazo de 15 anos por 13 bancos nacionais e estrangeiros, liderados pelo
Unibanco, como repasse de recursos do BNDES para a aquisição dos tubos de aço
fabricados pela Confab destinados ao Gasoduto Bolívia-Brasil. Nestas estruturas de
repasse os recursos são originários do BNDES mas o banco comercial, agente
repassador, assume o risco comercial da operação por isso e negocia a estrutura da
garantia a ser oferecida pelo tomador do empréstimo.
Uma forma adicional de apoio a projetos de infra-estrutura, disponibilizada junto com
os financiamentos da instituição, é o estabelecimento de uma linha stand-by, isto é uma
linha de crédito que não é desembolsada de imediato, sendo disponibilizada para
utilização em caso de perdas de caixa advindas de desvalorização cambial e flutuações
das taxas de juros disponibilizadas pelo BNDES (TJLP ou Cesta de Moedas)31. Este
instrumento foi desenvolvido para reduzir a exposição daqueles projetos cujo
financiamento envolve moedas estrangeiras, normalmente dólares, para as quais
instrumentos de proteção não estão disponíveis no mercado nacional a custos que
viabilizem sua utilização, e cuja receita não prevê ajustes à variação cambial. Neste caso
o prejuízo é assumido pelo acionista do projeto uma vez que a dívida aumentará, e com
isso o serviço da dívida, reduzindo o caixa disponível para o retorno do capital. No
entanto esta medida traz segurança para os financiadores internacionais para o caso de
desvalorizações, facilitando e reduzindo os custos destes créditos.
31 TJLP – Taxa de Juros de Longo Prazo criada pelo Banco Central em dezembro de 1994 para aplicaçãoa financiamentos de longo prazo. A Cesta de Moedas ou UM-BNDES trata-se de uma outra taxa de jurosdisponibilizada pelo BNDES e combina os juros das captações internacional do banco e a variaçãocambial das moedas dos empréstimos.
94
Uma iniciativa ainda em desenvolvimento é o TPR (Título de Participação em Receita
de Serviço Público Concedido), cujo projeto de lei que está em análise no Senado, em
fase final de redação. O TPR consiste em um título mobiliário, registrado junto à CVM
– Comissão de Valores Mobiliários, representativo de parte da receita da concessão,
tratando-se de um título de propriedade, e não de crédito. Estas características podem
ser observadas no Artigo 3º do Projeto de Lei do Senado, Nº216, 1997, a seguir:
“§1º - A subscrição de TPR importará na cessão, pela concessionária, com anuência
do poder concedente e na aquisição, pelo investidor, da titularidade da participação no
percentual da receita da concessão.”
“§2º - Os valores correspondentes ao percentual da receita da concessão não
integrarão, para qualquer fim de direito, a receia bruta das vendas e serviços da
concessionária.”
O projeto de Lei também prevê o direito de intervenção aos investidores que
representem 51% do valor total de cada subscrição de TPR.
A principal vantagem deste título sobre as debêntures tradicionais é portanto o
estabelecimento de mecanismos de proteção ao investidor no caso de falência da
concessionária ou perda da concessão, dado que o título é vinculado ao objeto da
concessão. Uma outra vantagem seria a isenção de tributos sobre ganhos de capital
decorrentes da vendo do TPR, o que busca incentivar a formação de um mercado
95
secundário para este título.
Há, no entanto, algumas limitações impostas à utilização destes títulos:
• aplicam-se apenas a Concessões (não se aplicariam a projetos de infra-estrutura com
autorização);
• não podem representar mais que 50% do valor do investimento total do
empreendimento;
• é necessário um aporte de recursos próprios de no mínimo 20% do valor total dos
investimentos;
• não podem ser adquiridos por empresa ou controlador do mesmo grupo econômico
da concessionária;
• não são resgatáveis, conversíveis ou permutáveis por qualquer participação
acionária ou títulos de crédito da concessionária.
Tendo em vista o que foi dito, o fim último do BNDES com o estabelecimento do TPR
seria criar um instrumento financeiro que possibilite o financiamento de investimentos
em infra-estrutura via mercado de capitais. Dessa forma, em um estágio inicial, o
BNDES estruturaria parte de seus financiamentos em TPRs, para num futuro próximo,
quando os agentes financeiros privados estiverem menos avessos a investimentos de
longo prazo, ou mesmo quando os principais riscos dos projetos normalmente
experimentados na fase de implantação tiverem sido superados, revender tais títulos,
liberando seus recursos para novos investimentos.
Outro objetivo seria aplicar políticas de incentivo a investimentos privados em infra-
96
estrutura, através de redução de impostos para este tipo de aplicação.
A utilização do TPR também será um instrumento útil para envolver investidores
institucionais nacionais, principalmente fundos de pensão e seguradoras, cujo perfil de
longo prazo de suas obrigações não encontram instrumentos de investimento no
mercado financeiro nacional. Esta pode ser uma alternativa bastante próxima de ser
implementada, e seu mercado crescerá conforme o prazo de aplicações no mercado
financeiro nacional se alargue.
3.2 Fatores Limitadores Característicos do Contexto Macroeconômico e
Legal Brasileiro
Uma das dificuldades para se implantar o Project Finance no Brasil é a incerteza quanto
à situação macroeconômica. Em função da recente crise mundial, que se seguiu a crise
no Sudeste Asiático, e da crise cambial e fiscal brasileira, os mercados internacionais se
tornaram mais fechados para financiamentos ao Brasil. Se antes era importante o
desenvolvimento de mecanismos que canalizassem e facilitassem a provisão de recursos
de longo prazo em Reais, a partir de instituições nacionais, para o financiamento de
projetos, hoje, e provavelmente nos próximos dois anos quando os efeitos da crise ainda
serão sentidos, isso é fator determinante para o financiamento de tais projetos.
Independentemente da disponibilidade ou não de recursos externos a custos cada vez
mais baixos para o financiamento de projetos, a dependência de tais recursos gera
desconforto aos investidores de projetos de infra-estrutura por uma razão bem simples:
97
suas receitas são geradas em moeda nacional este passivo é captado em dólares. Por
outro lado, a maior parte dos contratos de compra de serviços, ou de concessão, não
prevêem a indexação das tarifas a moedas estrangeiras, e não há no mercado nacional
mecanismos de proteção (hedging) contra variações cambiais a custos razoáveis.
No entanto, há situações em que a utilização de financiamentos vinculados a moedas
estrangeiras é necessária para evitar o risco cambial da compra de bens importados ao
longo do prazo de construção do projeto. Este é o caso das termelétricas, onde mais de
60% do valor de seus equipamentos e serviços são importados e os prazos de construção
pode alcançar 2 anos ou mais. Nestes casos a impossibilidade de reajustar a tarifa
transfere o risco cambial para a fase de operação, onde custos em moeda estrangeira
estarão descasados de receitas em moeda local.
A possibilidade de indexação das tarifas vinculada à variação cambial trata-se de uma
área nebulosa, que alguns juristas acreditam ser possível baseando-se no Decreto Ouro,
outros possuem a interpretação de que o Decreto Ouro se aplica estritamente a contratos
de financiamento e produtos importados. A legislação que estabeleceu o “Real”, Leis
8.880, de 1994, e 9.069, de 1995 proíbe a indexação de preços e pagamentos à variação
de cotações de moeda estrangeira, com exceção do é permitido no Decreto-lei 857, de
1969, o Decreto Ouro, que permite a estipulação de pagamentos em moedas estrangeiras
apenas para pagamentos relativos a contratos de importação, empréstimos internacionais
ou outras obrigações internacionais, aplicando-se a relações contratuais entre agentes
nacionais apenas se houver efetiva transferência de tais obrigações.
98
A periodicidade mínima de um ano para qualquer tipo de indexação, também
estabelecida na legislação do Real, não aplicável aos contratos e obrigações previstos no
Decreto Ouro, trata-se de mais uma dificuldade na medida que caso haja uma
desvalorização do Real em algum ponto do período anual de ajuste as perdas são
assumidas pelo projeto até que ocorra o novo ajuste, gerando portanto um descasamento
temporário entre receitas e despesas, e possivelmente uma perda monetária
irrecuperável no período até o reajuste.
Em função da divergência quanto à aplicação ou não do Decreto Ouro ao reajuste de
tarifas de empresas que possuem dívida em moeda estrangeira, muitos dos contratos de
concessão, ou de contratação de serviços de infra-estrutura, não prevêem a vinculação
do ajuste das tarifas ao valor do dólar, moeda estrangeira dominante no passivo das
concessionárias e empresas prestadoras do serviço de infra-estrutura. Dessa forma, a
incerteza quanto à possibilidade de indexação à moeda dos passivos, assim como da
remuneração de investidores estrangeiros, e a introdução do prazo mínimo de um ano
para reajustes de preços, gera um risco que os investidores e financiadores não desejam
assumir.
Uma possível conseqüência da impossibilidade de indexação em moeda estrangeira com
o objetivo de mitigar os custos vinculados a outras moedas, seria o aumento dos preços
oferecidos nas concorrências para venda de serviços, e redução do pagamento
relacionado com a outorga da concessão de serviços de infra-estrutura. Em outras
palavras, com passivos em dólar uma nova desvalorização do Real acarretaria às
concessionárias e autorizadas um aumento de custos sem correspondente aumento de
99
receita, deteriorando assim o retorno do projeto e a capacidade de remuneração e
amortização de sua dívida. Diante da inexistência de alternativas para lidar com este
risco, um impacto imediato seria no preço dos serviços oferecidos. Os investidores
teriam de incluir em seu preço o impacto deste risco e dos custos que teriam de incorrer
para se proteger de desvalorizações cambiais através de derivativos no mercado
financeiro ou da compra de NTN (Notas do Tesouro Nacional) ou NBC cambiais (Notas
do Banco Central) com remuneração vinculada ao dólar. No entanto cabe acrescentar
que tais instrumentos apresentam liquidez muito baixa, muitas vezes inexistente e não
oferecem proteção de longo prazo.
Mais do que isso, a impossibilidade de indexação daqueles custos denominados ou
vinculados à moeda estrangeira pode resultar em uma situação onde os investidores
optem por desenvolver apenas os projetos mais rentáveis e dispensem aqueles que não
apresentem uma rentabilidade satisfatória para compensá-los pelos riscos aos quais
estariam expostos. Nesse caso, diante do insucesso da atração de parceiros privados, só
restaria ao Estado desenvolver os projetos menos rentáveis, o que seria pouco provável
diante do seu atual quadro fiscal.
A questão da indexação vem sendo abordada em alguns dos contratos recentemente
estabelecidos para projetos de geração termelétrica. Alguns dos projetos deste tipo,
cujos contratos de compra de energia já foram assinados, incorporaram em suas
cláusulas de revisão tarifária a possibilidade de incorporação da variação cambial,
aplicada apenas àquela parcela da tarifa cujos custos variam de acordo com o câmbio.
Como foi dito, esta abordagem é questionável e não há posição definida quanto à sua
100
validade jurídica.
Outros contratos de concessão de infra-estrutura se apoiam somente na cláusula de
“equilíbrio econômico-financeiro”, que poderia ser revisto em caso de alterações
macroeconômicas, como câmbio (assumindo que, por exemplo, caso a desvalorização
ultrapasse determinado patamar a revisão é acionada), juros e impostos. Este é muitas
vezes o caso dos contratos de rodovias e de certos contratados de compra de energia que
não envolvem concessões de serviço público. No entanto, apesar destas provisões terem
sido incorporadas em ambos contratos, ainda não há certeza quanto a sua aplicabilidade
em termos legais.
A crise asiática, seguida pela crise Russa, juntamente com a situação fiscal nacional
dificultou o gradualismo da política econômica, culminando na flutuação do câmbio em
janeiro de 1999 e na conseqüente maxi-desvalorização. Os efeitos da “maxi” afetaram
todos os projetos e empresas que contraíram dívidas em dólar e que dependiam de
componentes importados, equipamentos e combustível. Diante disso, e da percepção
que sem o ajuste das tarifas de venda de eletricidade há o risco de inviabilização dos
projetos de energia elétrica, a ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica vem
buscando estabelecer regulamentação sobre o assunto. Recentemente, a ANEEL emitiu
a resolução do Valor Normativo, Resolução 233, de 29 de julho de 199932. Através do
Valor Normativo a ANEEL procura estabelecer limites para repasse dos preços
estabelecidos nos contratos bilaterais de compra de energia elétrica ao consumidor final,
criando um incentivo para que as distribuidoras de energia busquem negociar preços
32 Complementa a Resolução 266, de 1998.
101
mais baixos de compra de energia. O reajuste do Valor Normativo também fica limitado
às proporções definidas na futura resolução, para reajuste das tarifas à inflação
doméstica (mínimo de 30% do valor normativo), variação cambial e custo dos
combustíveis, no caso da geração termelétrica. Analisando sucintamente a iniciativa da
ANEEL, cabe uma observação: tal limitação poderia acarretar dificuldades aos novos
empreendimentos de geração caso não sejam estabelecido tetos apropriados para o
Valor Normativo, podendo até mesmo impossibilitar novas plantas em determinadas
regiões, onde, por exemplo, o combustível é mais caro.
Uma questão que ainda não está muito clara é o fato desta resolução permitir que o
reajuste do Valor Normativo seja vinculado em parte à variação cambial, enquanto a
legislação federal que fundamenta o Plano Real o proíbe.
A impossibilidade de estabelecimento de contas reservas fora do país para garantir o
serviço da dívida em dólares, meio normalmente utilizado para mitigar não só o risco
comercial, mas principalmente o risco de transferência e convertibilidade da moeda e o
risco de desvalorização cambial não repassada inteiramente às tarifas, trata-se de mais
uma dificuldade para a mitigação do risco cambial. Tal impossibilidade pode vir a ser
um dos principais elementos restritivos ao financiamento em moeda estrangeira para
projetos de infra-estrutura, mais especificamente aqueles cujas receitas originam-se
exclusivamente de contratos de longo prazo, tendo portanto um limite para o aumento
de suas receitas na medida que os volumes e preços estão fixos.
O uso de instrumentos de dívida no mercado de capitais nacional fica limitado devido à
102
mentalidade “curto-prazista” dos investidores nacionais e à qualidade das garantias,
dado que a única garantia que os projetos poderiam fornecer seriam os direitos
emergentes da concessão, seus recebíveis, cuja aplicação e validade jurídica não está
totalmente clara para os agentes, e em alguns casos, como os projetos que não envolvem
Concessão, seus ativos. Outra dificuldade é que no caso de falência estes credores
teriam que aguardar a conclusão do processo falimentar e situar-se-iam em posição
inferior aos empregados da empresa e ao Governo, para o recebimento de dívidas
fiscais, na ordem dos beneficiados.
Uma outra área nebulosa quanto ao pacote de garantias seria a utilização dos Direitos
Emergentes da Concessão. Sua aplicação não é clara, nem mesmo no que diz respeito
aos procedimentos necessários para acessá-los em caso de não pagamento da dívida
como quanto ao prazo necessário para tal. Isso se trata de mais uma dificuldade para o
financiamento de projetos na modalidade Project Finance na medida que a última coisa
que os financiadores desejam é não receber seus pagamentos (principal e dívida) e
possuírem garantias que não possam ser exercidas.
Em caso de falência, ou em determinados eventos de falha da concessionária, a prática
internacional prevê que os financiadores tenham o poder de intervenção no projeto,
cujas condições prévias e prazos têm que estar previstos no contrato de concessão e no
contrato de financiamento. Normalmente, em uma situação de intervenção os
financiadores teriam que apresentar ao Poder Concedente as medidas recomendadas e
caso o problema não seja solucionado o Poder Concedente teria de substituir os
acionistas por outros capacitados a desenvolver o projeto. Os financiadores buscarão
103
influenciar nesta decisão, indicando que os investidores com os quais se sentem
confortáveis do ponto de vista econômico e técnico. No caso de projetos que não
envolvam uma Concessão os financiadores por si só buscarão novos investidores. No
entanto, os Contratos de Concessão no Brasil não contemplam esta possibilidade de
intervenção por parte dos financiadores.
Como foi discutido no capítulo 2, os aspectos jurídicos são de grande relevância na
estruturação de um Project Finance dada a complexidade apresentada pelos arranjos
contratuais. Cabe a este respeito uma breve discussão sobre o contexto jurídico
brasileiro, baseado em leis e normas, em comparação ao contexto jurídico do direito
anglo-saxão, baseado nos costumes.
No sistema jurídico brasileiro a lei é quem define em última instância as relações
contratuais enquanto que no regime consuetudinário as relação contratual se baseia na
experiência anterior. Dessa forma é importante ter em mente esta distinção básica dos
regimes jurídicos implica na necessidade de adaptação dos preceitos jurídicos aplicados
a muitos dos financiamentos internacionais, de forma a eliminar riscos adicionais
acarretados pela não validade de determinadas provisões contratuais no país.
As operações de Project Finance também necessitam de um ambiente legal que permita
a resolução de divergências contratuais de forma rápida e transparente através da
arbitragem (na forma de acordos extrajudiciais), instrumento recentemente introduzido
na legislação brasileira e ainda de pouco uso. Uma dificuldade derivada deste fato é que
a resolução de divergências pode demorar muito tempo percorrendo várias instâncias
104
jurídicas.
O Risco Político é um outro fator que vem a prejudicar o investimento em projetos de
infra-estrutura no País. Os investidores e financiadores podem mitigar alguns destes
riscos através de seguros contra risco político, que em geral cobrem: expropriação;
violência política; convertibilidade e transferência de moeda. No entanto há outros
riscos não menos importantes que não encontram cobertura, tais como: Mudança na Lei;
atos arbitrários do órgão regulador, como por exemplo atrasos ou recusa em emitir
renovações de licenças ou aprovações; e greves de caráter regional ou nacional.
Tais riscos são vistos como altos no Brasil, principalmente em função de algumas
experiências recentes no setor de rodovias, envolvendo o Programa de Concessões de
Rodovias do Estado do Paraná e da Rodovia Via Lagos, que liga o Rio de Janeiro à
Região dos Lagos. Em ambos os casos, por se tratarem de rodovias sem histórico de
pedágio, houve uma reação popular muito grande contra os valores cobrados. Diante
disto, os Governos estaduais implementaram uma revisão tarifária unilateral, que no
caso das Rodovias do Paraná chegaram a uma redução de 50% das tarifas, com
recuperação total apenas após o décimo ano de concessão.
A recente medida adotada pelo Ministério dos Transportes, diante da greve dos
caminhoneiros e da solicitação de redução dos pedágios, impedindo o reajuste das
tarifas de pedágio das concessionárias rodoviárias, sem dúvida compromete mais ainda
a confiança do investidor privado e dos financiadores no cumprimento do Estado de
suas obrigações contratuais. Este tipo de medida desencoraja tanto o investidor quanto o
105
financiador, pois uma vez implementada não só terá efeitos sobre o retorno do
investimento de ambas as partes, como também ficará a incerteza quanto a outras
medidas que podem vir a ser tomadas em prejuízo da concessionária e quanto à validade
jurídica dos contratos de concessão no Brasil.
3.3 Agentes Envolvidos
Os projetos de infra-estrutura no Brasil despertaram o interesse de empresas nacionais e
internacionais. No caso das empresas nacionais, os principais agentes são:
• Construtoras: com a redução do papel do Estado na execução de obras públicas,
principal componente das carteiras de pedidos destas empresas, as construtoras
tiveram que redirecionar suas atividades representando no momento um dos
principais agentes nacionais a investirem em projetos de infra-estrutura, desde
rodovias a projetos de telecomunicações.
• Distribuidoras nacionais: algumas distribuidoras de energia elétrica expandiram sua
atuação a nível nacional, como é o caso da Cataguazes-Leopoldina e do Grupo
Rede, e tendem a ser grandes atores no desenvolvimento de projetos ligados à
energia elétrica.
• Fornecedores de Equipamentos e material de construção: empresas como a Inepar e
o Grupo Votorantim, que também se trata de um grande consumidor de eletricidade,
106
expandiram sua atuação no setor de infra-estrutura: de fornecedores passaram a
investidores. O primeiro vem atuando em telecomunicações e geração hidrelétrica e
o segundo atua na área de distribuição de energia, através de sua joint venture com o
Bradesco e a Camargo Corrêa, e na área de geração elétrica.
• Empresas siderúrgicas e de alumínio: tais empresas nacionais vêm investindo em
diversos projetos a fim de garantir seu fornecimento de energia elétrica, uma de suas
principais matérias-primas.
• Fundos de pensão: os fundos de pensão têm participado de alguns projetos de
transporte envolvendo ferrovias, portos e rodovias, mas sua participação em projetos
de infra-estrutura é ainda limitada. Tratam-se no entanto, de um dos potenciais
investidores, principalmente através de instrumentos de dívida.
• Petrobrás: através de um programa de projetos de co-geração a Petrobrás vem
promovendo diversos projetos a serem desenvolvidos em suas refinarias em
conjunto com a iniciativa privada. Somado a isto a empresa vem participando de
outros projetos de geração como fornecedora de combustível e acionista. No setor
de exploração e produção de petróleo ela lançou um programa de parcerias com
mais de 20 projetos em andamento.
• Eletrobrás: a legislação atual permite que a Eletrobrás participe de empreendimentos
de energia elétrica, com concessão de serviço público, com posição minoritária. A
empresa espera que em breve esta permissão seja estendida a projetos que envolvam
107
autorizações. Desde então a empresa vem buscando apoiar projetos de geração
através de participação acionária preferencialista, com prazo definido para recompra
das ações. A intenção é apoiar os projetos naquele período onde os riscos são
maiores, ultrapassados os riscos a empresa se retiraria.
Os investidores internacionais também são bastante ativos neste setor, devido ao grande
número de oportunidades, a uma corrida para ganhar mercado e se estabelecer no País
antes da concorrência, e à atratividade dos negócios, que muitas vezes oferecem taxas
de retorno superiores àquelas proporcionadas por projetos similares em países em
estágio de desenvolvimento mais avançado. O alto retorno pode ser explicado por
inúmeros fatores, tais como: menor concorrência, grande demanda reprimida, parcela
dos custos locais mais barata.
Os principais agentes são descritos a seguir:
• Utilities/ developers: estas empresas são distribuidoras de energia, no sentido lato da
palavra, e possuem filiais para o desenvolvimento de projetos fora dos seus países
de origem (“developers”). Sua atuação no País é bastante intensa, e as principais
são: Enron (EUA), AES (EUA), El Paso (EUA), Intergen (EUA), British Gas (RU),
Tractebel (Bélgica), EDP (Portugal), EdF (França), dentre outras.
• Grandes companhias de petróleo: como resultado da reformulação da Lei do
Petróleo, e da abertura do mercado para agentes privados, as grandes companhias
estão em processo de estabelecer várias joint-ventures com a Petrobrás, algumas
108
delas também estão buscando atuar na geração de energia elétrica, como é o caso da
Texaco, Shell e Amoco.
• Construtoras: algumas construtoras estão participando ativamente como acionistas
em projetos de rodovias e geração elétrica, são elas: Sideco (Argentina) , Impregillo
(Itália), Hochtief (Alemanha), Bechtel (EUA).
• Fornecedores de Equipamentos: estas empresas também, com o objetivo de atrair
novos negócios, num mercado cada vez mais competitivo, estão atuando como
acionistas de projetos de geração elétrica. É o caso da suíça ABB – Asea Brown
Boveri e da General Electric, através de sua subsidiária GE Capital .
• Trading Japonesas: estas empresas vêm atuando junto a Petrobrás para o
desenvolvimento de campos de petróleo e gás. As principais são: Mitsui, Marubeni e
Mitsubishi. A Marubeni vem também participando de projetos de geração elétrica,
como é o caso da usina termelétrica de Cubatão, através de sua controlada Sithe
(EUA), em conjunto com a Petrobrás, e de outras usinas ainda em fase de
planejamento.
3.4 Perspectivas de Implementação e Sugestões para promoção do Project
Finance
Diante das dificuldades apresentadas para a utilização do Project Finance, que podem
109
vir a inviabilizar vários projetos, e buscando eliminar o gargalo que a infra-estrutura
nacional representa para o desenvolvimento econômico do País, cabe às autoridades
governamentais definirem uma estratégia de apoio a este tipo de financiamento, devido
às vantagens discutidas no capítulo 2.
A questão do funding nacional, isto é, da disponibilidade de recursos nacionais de longo
prazo, é algo a ser alcançado durante o processo de confirmação da estabilidade
econômica. No entanto o processo de estabilização econômica também requer recursos
de longo prazo, o que gera uma circularidade, cuja análise não se encontra no escopo
dessa dissertação.
A mesma circularidade existe no caso da implementação do Project Finance, ele se
apresenta como solução para a realização de investimentos de infra-estrutura com a
participação do BNDES e de investidores e financiadores internacionais, mas ele
também requer um ambiente legal, político e macroeconômico previsível. Diante deste
requerimento básico, algumas medidas precisam ser adotadas para a implementação do
que talvez seja a única forma de, no curto e médio prazo, desenvolver a totalidade dos
projetos de infra-estrutura necessários ao país.
As principais medidas que poderiam ser adotadas considerando as dificuldades
levantadas alo longo deste capítulo podem ser resumidas como:
1) Medidas que amenizem o Risco cambial:
110
Diante do atual quadro macroeconômico brasileiro, caracterizado pela necessidade de
ajustes fiscais, um mercado de capitais pouco desenvolvido e a escassez de recursos de
longo prazo, e consequentemente pela necessidade de recursos externos para a expensão
da capacidade produtiva e para o desenvolvimento, pelo menos a curto e médio prazo,
da infra-estrutura nacional, é de fundamental importância que se possibilite mecanismos
de proteção ao investidor privado contra o risco cambial. Esta trata-se de uma discussão
muito ampla, que ao invés de esgotá-la pretende-se apenas introduzi-la, com
implicações na estrutura do plano Real. Algumas das medidas necessárias para se criar
um ambiente propício ao desenvolvimento de projetos com financiamentos e
investimentos em moeda estrangeira seriam:
• possibilidade de repasse do custo relativo aos recursos utilizados em dólar para o
preço final do serviço, o que necessariamente terá de passar pela alteração da Lei do
Real. Neste caso os reajustes poderiam ser anuais desde que fossem possíveis
revisões de preço no caso de aumentos acima de um determinado percentual
previamente acordado, o que demandaria uma maior confiança no mecanismo de
restabelecimento do “equilíbrio econômico-financeiro” em contratos firmados entre
agentes privados;
• possibilidade de estabelecimento de contas caução (contas reserva) fora do país de
forma a garantir um volume mínimo do serviço da dívida em dólar.
2) Combate a atitudes que aumentem o Risco Político:
Esta trata-se de uma questão bastante complexa, mas o Governo Federal deveria agir
111
junto aos Governos Estaduais e Municipais de forma a proporcionar um ambiente
seguro para o investidor privado, e nesse sentido evitar a quebra de contratos firmados
com a iniciativa privada, muitas vezes contratos estes propostos pelo próprio Governo.
A existência de um histórico de não cumprimento de contratos corrobora a incerteza
quanto ao cumprimento de novos contratos.
3) Adoção de medidas que reforcem o Pacote de Garantias:
Como foi discutido ainda há incerteza quanto à aplicação dos direitos emergentes da
concessão em um pacote de garantias, sua validade jurídica, especialmente em caso de
falência da concessionária, ou empresa estabelecida para o projeto.
A inexistência de previsão ou a presença de elementos nos editais e contratos que
dificultam a intervenção dos financiadores em caso de inadimplência da empresa
estabelecida para o desenvolvimento do projeto ou de uma performance abaixo da
esperada, descumprindo cláusulas do contrato de financiamento, trata-se de mais uma
dificuldade na implementação de um pacote de garantias nos moldes internacionais.
4) Incentivo à participação de investidores institucionais nacionais e estrangeiros, e o
desenvolvimento de instrumentos como o TPR:
É importante incentivar a participação de investidores institucionais, nacionais e
estrangeiros, no financiamento de projetos. A importância do desenvolvimento de um
mercado nacional para a negociação de títulos de infra-estrutura (como por exemplo o
112
TPR) possibilitaria a renovação da carteira do BNDES assim como a criação de mais
uma fonte para a captação de recursos de longo prazo. A atração de investidores
institucionais estrangeiros também é relevante pois representam uma fonte alternativa
de financiamento internacional dado que os financiadores internacionais tradicionais,
como o IFC e BID, já começam a apresentar restrições de recursos para o país, devido
ao excesso de projetos brasileiros em suas carteiras.
5) Desconhecimento do assunto:
Uma das grandes dificuldades para a implementação do Project Finance no Brasil é o
desconhecimento do assunto por parte dos agentes, das autoridades e órgãos
reguladores. É importante a ampliação do entendimento dessa modalidade e das práticas
internacionais que a fundamentam.
113
CONCLUSÃO
O objetivo dessa dissertação foi descrever o Project Finance e apresentá-lo como um
importante instrumento para o financiamento à infra-estrutura. Essa modalidade mostra-
se também como uma alternativa para solucionar o atual momento de crise do setor de
infra-estrutura, que se caracteriza pelo alto volume de investimentos requeridos e
restrita disponibilidade de capitais domésticos em prazos compatíveis com a maturação
destes investimentos.
Como principais vantagens pode-se apontar o financiamento do projeto fora do balanço
patrimonial dos acionistas e a possibilidade de atingir altos níveis de alavancagem.
Estas vantagens resultarão certamente em benefícios para os projetos desenvolvidos no
país tendo em vista que, frente ao alto volume de investimentos necessários, os
investidores (acionistas) não teriam capacidade financeira de investir sozinhos ou captar
grandes volumes de recursos como dívidas alocadas em seu balanço. Sendo assim,
mesmo que um acionista tenha limitações para contrair dívidas, o próprio projeto poderá
fazê-lo na estrutura Project Finance.
Outra vantagem é o fato dessa modalidade possibilitar que empresas localizadas em
mercados emergentes, ou empresas com limitações de crédito, tenham acesso a recursos
de longo prazo para o desenvolvimento de projetos. Esta trata-se de uma vantagem
essencial, dado que não há disponibilidade de recursos de longo prazo no mercado local
para o financiamento de projetos, à exceção do BNDES, e mesmo empresas com alta
qualidade de crédito encontram dificuldade de obter prazos longos para captação no
114
mercado internacional, como analisado no primeiro capítulo. Outro fator positivo
derivado da participação de investidores e financiadores externos, que não a oferta de
capitais de longo prazo, é o fato destes estarem familiarizados com a modalidade de
financiamento em análise, diferentemente dos investidores e potenciais financiadores
locais.
Pode-se deduzir da análise desenvolvida neste estudo que essa modalidade não se trata
de uma fórmula aplicável em qualquer situação, mas sim de uma estrutura que exige
uma análise muito detalhada dos aspectos técnicos, legais e econômicos do projeto,
antes de se concluir quanto à possibilidade e forma de sua aplicação.
Para sua implementação é importante contar com um ambiente legal, político e
macroeconômico que possibilite um mínimo de previsibilidade para a geração de
receitas e conforto quanto à manutenção das relações contratuais. Como pode-se
observar no Brasil atual o ambiente regulamentar encontra-se em transição, migrando de
uma situação onde os setores de infra-estrutura eram monopólios naturais para um novo
contexto onde a iniciativa privada participa de tais investimentos, gerando um certo
grau de desconforto aos investidores privados nacionais e internacionais devido à
incerteza associada ao processo.
De modo geral, as principais dificuldades levantadas neste estudo para a implementação
do Project Finance no Brasil são: a impossibilidade de se montar estruturas que
amenizem o risco de variação cambial, seja através de mecanismos de hedge e
estruturas adotadas para o financiamento de projetos em outras partes do mundo como o
115
estabelecimento de conta reserva do serviço da dívida fora do país, seja pela indexação
das tarifas; o risco político derivado de quebras de contrato de concessão e mudanças na
lei e regulamentação, isto é, quaisquer atitudes políticas que reduzam a previsibilidade e
estabilidade das condições comerciais e econômicas do projeto; questões intrínsecas ao
contexto legal brasileiro que dificultem o exercício do pacote de garantias; e o
desconhecimento do assunto devido à sua recente utilização no país.
A experiência recente, por volta dos últimos três anos, mostra que alguns projetos têm
sido analisados e financiados através da combinação de BNDES, agências multilaterais,
agências de crédito à exportação, os dois últimos com colaboração de bancos comerciais
internacionais. Apesar destes financiamentos serem estruturados na modalidade Project
Finance, ainda guardam certa distância do que seria um Project Finance pleno, com
garantias baseadas apenas na geração de caixa do projeto e em seus ativos e relações
contratuais.
O que se observa também, é uma tentativa de adaptar uma modalidade já praticada em
diversos países do mundo ao contexto legal brasileiro, através de inúmeros “remendos”
para adaptar exigências contratuais originadas de práticas internacionais.
A impossibilidade de se aplicar o Project Finance verdadeiro e usufruir de suas
vantagens poderá acarretar um quadro no qual apenas aqueles projetos mais atrativos do
ponto de vista de retorno para o acionista e menor risco para os financiadores serão
desenvolvidos, não restando muitas alternativas para o desenvolvimento dos projetos
menos atrativos.
116
Quanto à origem dos recursos de longo prazo para tais projetos, conforme a percepção
do risco Brasil, melhore é possível que outros instrumentos de captação internacional
sejam introduzidos para projetos de infra-estrutura, como por exemplo a emissão de
bônus de longo prazo para a aquisição de investidores institucionais. Espera-se que o
processo de estabilidade macroeconômica também resulte no aumento dos prazos de
aplicação financeira dos agentes econômicos domésticos, acarretando o surgimento de
novas fontes de recursos de longo prazo.
Considerando o grande volume de investimentos necessários para se recuperar e
avançar com a infra-estrutura brasileira, a falta de recursos domésticos de longo prazo e
a incapacidade dos agentes privados de aportarem todos o recursos necessários para tais
investimentos, é recomendável que as autoridades governamentais, em especial os
órgãos reguladores setoriais e o Ministério da Fazenda, dediquem-se ao estudo das
alternativas para o financiamento à infra-estrutura, buscando melhor compreender e
proporcionar condições de adaptação e uso do Project Finance, tendo em vista que
restam poucas alternativas factíveis para o financiamento à infra-estrutura nacional no
curto e médio prazo.
Como sugestões para estudos futuros pode-se indicar, sem a pretensão de esgotar o
tema: análise do impacto da estrutura de capital em projetos de infra-estrutura; estudos
de caso, analisando projetos ou setores específicos; estudos comparativos do uso de
Project Finance em outros países em desenvolvimento; análise da aplicação dessa
modalidade em países desenvolvidos; análise das dificuldades inerentes ao sistema legal
117
brasileiro para a aplicação dessa modalidade de financiamento; estudo das técnicas de
análise e modelagem financeira para projetos de infra-estrutura.
118
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Projects. Londres: Euromoney Publications, 1997.
123
APÊNDICE
124
Projetos Hidrelétricos em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusGuilman Amorim 140 MW (MG) Belgo-Mineira e Samarco Em operação. Projeto financiado
inicialmente pelo BNDES e
refinanciamento posteriormente pelo
IFC.
Machadinho 1.140 MW (SC). Investimento
estimado em US$ 557 milhões.
Votorantim, Alcoa, Copel, CELESC,
CEEE, Inepar, Camargo Corrêa,
outros
Em construção e em fase de análise
do financiamento com o BNDES,
BID e Eletrobrás.
Lajeado 850 MW (TO). Investimento
estimado em US$ 960 milhões
Vale Paranapanema (Celtins, CEB,
EDP, Investco)
Em construção.
Itá 1.450 MW (SC). Investimento
estimado em US$ 900 milhões.
CSN, OPP, Itambé Cimentos Em construção e em fase de
fechamento do financiamento com
BID e BNDES. Eletrobrás apoiou o
projeto através de ações preferencias,
com compromisso de recompra.
Cana Brava 450 MW (GO). Investimento
estimado em US$ 573 milhões.
Tractebel (Bélgica) Financiamento em análise no BID.
Projeto já possui financiamento de
longo prazo com BNDES.
Campos Novos 880 MW (SC). Investimento estimado
em US$ 540 milhões.
Copel, Celesc, CEEE, Onix
(Alemanha), Inepar, Desenvix, Cia.
Técnica de Energia Elétrica
Fase de projeto.
125
Nome Principais Características Acionistas StatusItapebi 450 MW (BA). Investimento
estimado em US$ 450 milhões.
Coelba, Previ, Iberdrola (Esp.),
Guaraniana
Financiamento em análise no BID e
BNDES. Projeto conta com apoio da
Eletrobrás.
Ponte de Pedra 176 MW (MT/MS). Investimento
estimado em US$ 158 milhões.
Inepar, Impregilo (Itália), CIGLA,
Servix e Constran
Fase de projeto.
Queimado 105 MW (DF/GO/MG). Investimento
estimado em US$ 141 milhões.
Cemig e CEB Em construção.
Porto Estrela 112 MW (MG). Investimento
estimado em US$ 110 milhões.
Cemig, CVRD, Nova Era, Silicon e
Coteminas
Em construção.
Dona Francisca 125 MW (RS). Investimento estimado
em US$ 100 milhões.
Gerasul Em construção e análise de
financiamento pelo BID e BNDES.
Piraju 70 MW (SP/PR). Investimento
estimado em US$ 141 milhões.
CBA (Grupo Votorantim) Fase de projeto.
Irapé 360 MW (MG). Investimento
estimado em US$ 332 milhões.
Cemig Fase de projeto.
126
Projetos Termelétricos em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusUruguaiana 600 MW (RS). Investimento estimado
em US$ 335 milhões. Gás importado
da Argentina.
AES (EUA) Em construção, financiamento em
análise pela OPIC e BNDES.
Cuiabá 480 MW (MT). Investimento
estimado em US$ 510 milhões.
Enron (EUA), Shell Em construção. Primeira fase em
operação. Financiamento em fase de
fechamento envolvendo OPIC e KfW.
Pecém 240 MW (CE). Investimento estimado
em US$ 160 milhões.
Texaco (EUA), CSN, Gaspetro Financiamento em análise pelo BID e
BNDES
Manaus Termelétrica (240 MW). El Paso (EUA) Fase de operação.
Norte Fluminense 700 MW (RJ) Eletrobrás, Light, Cerj, Petrobras,
Cataguazes-Lopoldina, Enersis
(Chile)
Fase de projeto
Araucária 480 MW (PR). Investimento estimado
em US$ 300 milhões.
El Paso (EUA), Copel, British Gas
(RU), Petrobras
Fase de projeto
Paulínia 620 MW (SP). OPP, Florida Power and Light (EUA),
Ultrafértil, CESP
Fase de projeto
Cubatão Co-geração com a Petrobras Sithe (EUA), Marubeni (Japão) e
Petrobras
Fase de projeto
127
Projetos Termelétricos em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusJacareí 700 MW (SP). Investimento estimado
em US$ 400 milhões.
Light Fase de projeto
Santa Branca 1000 MW (SP). Investimento
estimado em US$ 600 milhões.
Eletroger (Eletropaulo) Fase de projeto
Candiota III 335 MW (RS). Investimento estimado
em US$ 300 milhões.
GC Alstom (França) Fase de projeto
Campo Grande 300 MW (MS). Investimento
estimado em US$ 150 milhões.
Enersul Fase de projeto
128
Projetos de Rodovias em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusLinha Azul (Santa Catarina) Recuperação, melhoramento e
operação de rodovias costeiras
interligando as praias ao Norte de
Florianópolis.
Engepasa Projeto pioneiro financiado pelo
BNDES em 1995.
Concer (Rio - Juiz de Fora) Recuperação, melhoramento e
operação da rodovia, com 180 km de
extensão. Investimentos estimados em
R$ 760 milhões.
CBPO, Triunfo, Não disponível.
Nova Dutra (Rodovia Presidente
Dutra, Rio – São Paulo)
Investimentos estimados em R$ 970
milhões.
Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa,
CBPO e Serveng- Civilsan
Financiamento obtido junto ao IFC
(empréstimo A e B) e BNDES..
Linha Amarela (Rio de Janeiro) Construção e operação de 25 Km de
via expressa interligando bairros do
Rio. Investimento estimado em R$
120 milhões. Segunda fase em
análise.
OAS, Previ Projeto financiado pelo BID e
BNDES.
Via Lagos (RJ-124) Recuperação, melhoramento e
operação da rodovia, com
investimentos de R$ 120 milhões (60
km).
Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e
Serveng- Civilsan
Projeto financiado pelo BNDES e
BID.
129
Projetos de Rodovias em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusCRT (Rio – Teresópolis) 144 Km de extensão e R$ 450
milhões de investimento.
Queiroz Galvão, Cowan, OAS, EIT,
Carioca Christiani-Nielsen
Projeto financiado pelo BNDES.
Ponte Rio - Niterói Recuperação e manutenção de 14 Km,
com investimentos de R$ 380
milhões.
Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e
Serveng- Civilsan
Projeto financiado pelo BNDES.
Autoban (Anhanguera Bandeirantes,
SP )
Recuperação, melhoramentos eexploração da rodovia, 308 km einvestimentos de R$ 1,2 bilhão.
Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa,
CBPO e Serveng- Civilsan, SVE
Participações (Servix e Via
Engenharia)
Financiamento em andamento com
IFC, BID e BNDES.
Centrovias (Lotes 8, SP) Obras de melhoramento e recuperaçãodas rodovias, totalizando 218 km deextensão. Investimento estimado R$415 milhões
Construbase, PEM, Better, BenitoRoggio (Argentina), Engeform,Passarelli
Financiamento em análise noBNDES.
Lotes de São Paulo – Lote 10 –Etesco-Autovias
Recuperação e melhoramento dasrodovias. Investimentos de US$ 225milhões
Etesco, Enterpa Financiamento em análise noBNDES.
Viaoeste (Castelo Branco – Raposo
Tavares, SP)
162 km, investimentos de R$ 750
milhões
Queiroz Galvão, Cowan, OAS, EIT,
Carioca Christiani-Nielsen
Não disponível.
Triângulo do Sol (Ribeirão Preto, SP) 440 km, R$ 1,1 milhão de
investimentos
Leão-Leão, Bic Banco, Brisa
(operadora portuguesa)
Não disponível.
130
Projetos de Rodovias em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusEcovia dos Imigrantes (Anchieta –
Imigrantes, SP)
Investimentos de R$ 950 milhões CR Almeida Não disponível.
Tebe (SP) 158 km de rodovias na região de
Barretos, investimentos estimados em
R$ 89 milhões
Torc, Empa, Brasil, Erco Não disponível.
Rodonorte (Paraná,) Recuperação, melhoramento,
manutenção e exploração de 568 km
de rodovias, totalizando investimentos
de R$ 1,1 bilhão.
Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa,
CBPO, Castilho, Toniolo Busnello,
Brasília Guaíba
Projeto em análise pelo BNDES e
BID. Temporariamente suspenso
devido à redução das tarifas por parte
do Governo do Estado.
Viapar (Paraná) 545 km, R$ 890 milhões de
investimentos
Queiroz Galvão, Cowan, OAS, EIT,
Carioca Christiani-Nielsen
Temporariamente suspenso devido à
redução das tarifas por parte do
Governo do Estado.
Caminhos do Paraná 322 km Consórcio de empresas argentinas: J.
Cartelloni, Construcciones Civiles,
Codi e Welber , e locais
Temporariamente suspenso devido à
redução das tarifas por parte do
Governo do Estado.
Rodovia das Cataratas (Paraná) 459 km de rodovias entre Foz do
Iguaçu, Cascavel e Guarapuava.
Banco Bandeirantes, Construtora DM,
Momento e Civília (Grupo Macri,
Argentina)
Temporariamente suspenso devido à
redução das tarifas por parte do
Governo do Estado.
131
Projetos de Rodovias em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusEcovia Caminho do Mar (Paraná,
Lote 6)
Recuperação, melhoramento,
manutenção e exploração da rodovia
que interliga Curitiba ao Porto de
Paranaguá.
CR Almeida Temporariamente suspenso devido à
redução das tarifas por parte do
Governo do Estado.
Sulvias (Lajeado, Rio Grande do Sul),
Convias (Caxias do Sul), Metrovias
(região metropolitana de Porto
Alegre)
Totalizando R$ 1,04 bilhão de
investimentos.
Univias: Toniolo Busnello, Brasília-
Guaíba, Sultepa, Castilho
Não disponível.
Concepa (Osório – Porto Alegre) 112 km, Investimentos de 94 milhões. Ivaí, Triunfo Rodovia em operação.
132
Projetos de Portos em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusTecon Rio Grande Operação, expansão e modernização
do Porto de Sepetiba. Investimentosde US$ 70 milhões
Tecon Rio Grande S.A. Projeto Financiado em 1999 pelo
BNDES e IFC.
Tecon Santos Implantação e operação de umterminal de contêineres e veículos.Investimentos de US$ 152 milhões
Consórcio Santos-Brasil S.A.:
Opportunity Leste, Multiterminais,
525 Participações, Previ e Sistel.
Projeto em análise pelo BNDES e
BID.
Tecon 1 Sepetiba Ampliação e Modernização do Portode Sepetiba. Investimento estimadoem. US$ 182 milhões
Sepetiba Tecom S.A. (CSN) Projeto em análise no BNDES
Paranaguá Implantação de terminal marítimo degranéis sólidos de uso misto no Portode Paranaguá. Investimento estimadoem.US$ 35 milhões
Fospar S/A – Fertilizantes Fosfatados
do Paraná
Projeto em análise no BNDES
133
Projetos de Ferrovias em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusFerrovia Sul-Atlântica Investimentos estimados em US$ 250
milhões até 2001. Atravessa PR, SC e
RS. Interliga os estados do Maranão,
Rio Grande do Norte, Paraíba,
Pernambuco, Alagoas e Sergipe.
Judori Empreendimentos e
Participações, Interférrea, Railtex
International Holdings, Varbra e
Ralph Partners.
Financiamento em análise pelo IFC.
Ferrovia Bandeirantes S.A. (antiga
Fepasa)
Investimento estimado em R$ 250
milhões para os próximos 5 anos.
Interliga Rio de Janeiro, Belo
Horizonte e São Paulo com os países
do Mercosul.
Ferropasa (Ferronorte e Novoeste),
Companhia Vale do Rio Doce,
Funcef, Previ , Chase Latin America
Equity Associates, Campelissa Adm.
Financ., Logísitica Bandeirantes
Participações, Bradesco, Dasaiev
Empreendimentos e Shearer
Empreendimentos.
Não disponível.
Companhia Ferroviária do Nordeste Modernização e recuperação da viaférrea. Investimentos estimados emUS$ 75 milhões
CSN, Vicunha, Cia. Vale do RioDocee Bradesco.
Financiamento em andamento com o
BNDES.
Ferrovia Novoeste S.A. Melhoria do equipamento utilizadoInvestimentos estimados em US$ 48milhões
Previ, Funcef, Constran, GE Capital(EUA), Bndespar, BRP, outros
Financiamento em andamento com o
BNDES.
Transnordestina Construção da ligação ferroviária dePetrolina a Salgueiro. Investimentosestimados em US$266 milhões
Companhia Ferroviária do Nordeste eBndespar
Financiamento em andamento com o
BNDES.
134
Projetos de Ferrovias em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusFerrovia Centro-Atlântica Maior ferrovia do país, cruzando seis
estados.
Mineração Jacumã, CSN, Judori
Empreendimentos e Participações,
Interférrea, Railtex International
Holdings (EUA), Varbra, Ralph
Partners (EUA) e Tupinamparana.
Financiamento em fase de fechamento
junto ao BNDES e IFC.
Ferronorte Interliga Mato Grosso ao Mato
Grosso do Sul.
Previ, Funcef, Grupo Itamarati,
AIG/GE Capital, BNDESpar,
Bradesco
Projeto financiado pelo BNDES,
através de repasse para um grupo de
bancos nacionais liderados pelo
Unibanco.
MRS Logística Atende aos estados de Minas Gerais,
Rio de Janeiro e São Paulo.
Cosipa, CSN, Celato Integração
Multimodal, ABS Empreendimentos
Imobiliários, Ferteco Mineração,
Fundação Caemi de Previdência
Social, Gerdau, MBR, Ultrafértil e
Usiminas.
Não disponível.
Ferrovia Teresa Cristina Santa Catarina. Banco Interfinance. Não disponível.
135
Projetos de Telecomunicações em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas Status
Projetos de Telefonia Celularlicitados para o uso da Banda BATL Prestação de serviço de telefonia
celular com investimentos de US$430 milhões (próximos 5 anos).Abrange Rio de Janeiro e EspíritoSanto.
Grupo Algar Não disponível.
BCP Prestação de serviço de telefoniacelular com investimentos de US$991 milhões (próximos 5 anos).Abrange região metropolitana de SãoPaulo
Bell South (EUA), Banco Safra Projeto financiado por uma
combinação de bancos comerciais e
EDC (agência de crédito à exportação
do Canadá).
Global Telecom Prestação de serviço de telefoniacelular com investimentos deUS$1.129milhões. Abrange SantaCatarina e Paraná.
Suzano, DDI (Japão), Inepar,Motorola (EUA)
Em análise no BNDES.
Maxitel Prestação de serviço de telefoniacelular com investimentos deUS$1.426 milhões. Abrange MinasGerais, Bahia e Sergipe
Stet (Itália), Vicunha, UGB Em análise no BNDES.
Americel Prestação de serviço de telefoniacelular com investimentos de US$milhões (próximos 5 anos). Abrange aregião Centro-oeste.
Bell Canada. Projeto financiado pelo BNDES em1999.
Telet Prestação de serviço de telefoniacelular com investimentos deUS$763milhões (próximos 5 anos).Abrange o Rio Grande do Sul.
Bell Canada, TIW (Canada), Fundosde Pensão
Em análise no BNDES.
136
Nome Principais Características Acionistas Status
Empresas EspelhoBonari Empresa de telefonia de longa
distância. Investimentos estimados emUS$ 2 bilhões (próximos 5 anos).
Sprint (EUA), National Grid (RU),France Telecom (França)
Financiamento em fase deestruturação.
Canbrá Empresa espelho da Telemar.Investimentos estimados em US$ 1,3bilhões (próximos 5 anos).
Bell Canada, WLL(EUA), Qualcomm(EUA), Liberman (Arg.), Vicunha
Financiamento em fase deestruturação.
Megatel Empresa espelho da Telesp.Investimentos estimados em US$ 1,5bilhões (próximos 5 anos).
Bell Canada, WLL (EUA),Qualcomm (EUA), Liberman (Arg.)
Não disponível.
137
Projetos de Saneamento em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusCia. de Saneamento Jundiaí Concessão para tratamento de esgoto.
Investimentos totais previstos de R$
30 milhões.
Construtora Augusto Velloso,
Construtora Coveg e Empresa
Tejofram de Saneamento e Serviços
Gerais.
Financiamento em andamento com
BNDES.
Região dos Lagos – Pro-Lagos Concessão plena para operação desistema de saneamento. Investimentoinicial estimado em US$ 34 milhões.Área de abrangência: Cabo Frio,Búzios, Iguaba, São Pedro D’Aldeia eArraial do Cabo, RJ.
Monteiro Aranha, PEM Engenharia,EPAL (Portugal), Bozano Simonsen,ERCO
Financiamento em andamento com
BNDES e Caixa Geral de Depósitos
(Portugal).
Águas de Niterói Investimentos de R$ 100 milhões nos3 primeiros anos para ampliação doabastecimento de água. Investimentosde R$ 200 milhões ao longo de todoperíodo de concessão (30 anos).
Carioca, Developer, Queiroz Galvão,Cowan e Trana (EIT)
Financiamento de R$ 60 milhõesaprovado pelo BNDES.
Águas do Paraíba Investimento de US$ 30 milhões naampliação do abastecimento de água ede coleta de esgoto
Carioca, Developer, Queiroz Galvão,Cowan e Trana (EIT)
Financiamento em análise no
BNDES.
Águas de Jurtunaíba Investimentos previstos de R$ 73
milhões.
Cowan, Queiroz Galvão, Trana (EIT)
e Erco
Não disponível.
Águas de Paranaguá Investimento previsto em R$ 60
milhões. Área de abrangência:
Paranaguá, PR.
Carioca, Developer e Construtora
Castilho.
Não disponível.
138
Projetos de Saneamento em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusÁguas de Limeira Investimento previsto em R$ 110
milhões. Área de abrangência:
Limeira, SP.
CBPO e Lyonnaise des Eaux
(França).
Financiamento em andamento com
BNDES.
Ambient Serviços Ambientais Concessão para tratamento de esgoto.
Investimentos totais de US$ 45
milhões. Área de abrangência:
Ribeirão Preto, SP.
REK Construtora e CH2M Hill
International Co.
Não disponível.
139
Projetos de Produção de Petróleo em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusBijupirá-Salema Exploração de campo de petróleo na
Bacia de Campos. Investimentoestimado em US$ 800 milhões, dosquais a Petrobras já investiu 25%.
Petrobras Financiamento em andamento comCitibank e Societe Générale. Emdesenvolvimento. Enron Intl. Estáenvolvida na estruturação datransação.
Espadarte/Marimbá/Voador Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo na Bacia deCampos. Investimento estimado emUS$ 1,8 bilhão.
Petrobras Financiamento em andamento,envolvendo: Mitsui/ Marubeni, ABN-AMRO, CSFB, Chase, TokyoMitsubishi, Fuji Bank, ANZ(Austrália).
Marlim Exploração de campo de petróleo naBacia de Campos. Investimentoestimado em US$ 5,3 bilhões (dosquais Petrobras já investiu US$ 3bilhões)
Petrobras, Sul América Seguros,ABN-AMRO, BNDESPAR
Financiamento em andamento,envolvendo: BNDES, ABN, e bancosinternacionais.
Barracuda Caratinga Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo na Bacia deCampos. Investimento estimado emUS$ 2,5 bilhões. Início da produçãoocorrerá em 2001.
Petrobras Financiamento em andamento comBNDES, JEXIM (Agência de Créditoà Exportação Japonesa) e bancosinternacionais.
Roncador Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo na Bacia deCampos. Investimento estimado emUS$ 1,7 bilhão. Início da produçãoesperado para 2001.
Não disponível. Não disponível.
Albacora Leste Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo na Bacia deCampos. Investimento estimado emUS$ 2 bilhões. Início da produçãoesperado para 2001.
Exxon (operadora), Shell, Texaco,Marubeni/Japex
Financiamento em desenvolvimento.
140
Projetos de Produção de Petróleo em Andamento (continuação):
Nome Principais Características Acionistas StatusFrade e BC-4 Desenvolvimento e exploração de
campo de petróleo na Bacia deCampos.
Texaco (operador), Nissho Iwai(Japão), Amerada Hess (EUA),Odebrecht
Financiamento em desenvolvimento.
BES-3 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 20 milhões.
YPF (Arg.), Santa Fé, Wiser, Norbay,Sotep, Petroserv.
Não disponível.
Bcam-2 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 10 milhões.
Coastal (EUA), Unocal (EUA),Ipiranga
Não disponível.
BAS-97 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 87 milhões.
Coastal, Unocal, Ipiranga Não disponível.
Btuc-1 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 12,4 milhões.
Perez Companc, Kerr McGee Não disponível.
SES-107 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 10,8 milhões.
Union Pacific, TDC Não disponível.
Bpot-2 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 8,3 milhões.
Santa Fé, YPF (Arg.), Sotep Não disponível.
Caraúna Desenvolvimento e exploração.Investimentos de US$ 76 milhões.
Santa Fé, YPF (Arg.), Sotep Não disponível.
BS-2 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 230 milhões.
Petrobras, Amerada Hess (EUA),British Borneo, Odebrecht
Não disponível.
BC-8 Desenvolvimento e exploração decampo de petróleo. Investimentoestimado em US$ 112 milhões.
Petrobras, Amerada Hess (EUA),British Borneo, Odebrecht
Não disponível.
141
Projetos de Gás Natural em Andamento:
Nome Principais Características Acionistas StatusGasoduto Uruguaiana – Porto Alegre 650 Km de gasoduto interligando as
duas cidades com capacidade de 12milhões de m3/ dia. Investimentoestimado em US$ 265 milhões.
Total (França), YPF (Arg.), Ipiranga,Techint (Arg.), Transportadora de Gasdel Norte (Arg.).
Fase de projeto.
Gasoduto Uruguai-Argentina-Brasil Gasoduto interligando Argentina,Uruguai e Sul do Brasil.
British Gas (RU), Panamerican Fase de projeto.
Planta de GNL - SUAPE Construção de terminal de importaçãode gás natural liqüefeito, eprocessamento da regaseificação.Capacidade 6 milhões de m3/ dia.Investimento estimado em US$ 210milhões.
Shell, Petrobras, ENI (Itália) Fase de projeto.