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FILOSOFIAVolume 03
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2 Coleo Estudo
Sum
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fia Frente A05 3 Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
Autor: Richard Garcia Amorim
06 17 Filosofia crist: a relao entre f e razoAutor: Richard Garcia Amorim
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FRENTE
3Editora Bernoulli
MDULOFILOSOFIA
Edessa
Bizncio
Istambul (atual)
Delfos
Corinto
Polegas
Imbros
Tenedos
Lemnos
Icos
Tasos
Antipolis
Peparetos
Magara
ArgosOlmpia
Cefalnia
Corcira Larissa
Leucas
Zanto
Messena
Pilos
Esfactria
Potidaco
Samotrcia
Pela
bidos
Hecatones
Helesponto
PrgamoAmbracia
Termpilas
Halonesos
Elis
Esparta
CiteraAnafe TelosThera
Olinto
Proconeses
Tria
Ceos Siros
Cs
Icria
Samos
Quios
Paira
LerosParos
CimolosSitnos
Melos
Clcis Sardes
Magnsia
MiletoEpidauro
Andros
Delos
Rodes
Crpatos
Cnossos
Gortina
Amargos
Astipaleia
Naxos
Trezena
Lesbos
Mitilene
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Patras
AtenasMaratona
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MAR DE CRETA
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CRETA
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GLIDA
Grcia no sc. V a.C. Neste mapa, possvel observar as cidades-estados gregas, bem como a Macednia.
Atlas histrico escolar. MEC/Fename.
O Perodo Helenstico (ou Helenismo) compreende o perodo que se estende desde do sculo IV a.C. at o incio da Idade
Mdia, apresentando caractersticas gregas e romanas. Seu incio est intrinsecamente ligado figura de Alexandre, o Grande,
rei da Macednia, e s suas expedies e conquistas.
A palavra helenismo, do grego hellenisms, significa falar grego. Assim, helenista o nome dado queles que utilizaram o
idioma grego para se comunicar, seja por escrito ou apenas oralmente. Helenstico tambm pode se referir quele que adotara
o grego como segunda lngua. Por exemplo, no livro Atos dos Apstolos, presente na Bblia Sagrada, a palavra helenstico foi
utilizada para se referir aos judeus que substituram sua lngua materna pelo grego. importante notar que, com o tempo,
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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a palavra helenismo deixa de se referir somente a uma transformao de idioma para abranger toda uma cultura helenstica. Dessa forma, passou a representar o fenmeno de aculturao dos outros povos que, no sendo gregos ou orientais, adotaram a cultura e a forma de viver e conceber o mundo dos gregos. Para que tal
transformao fosse efetuada, foi fundamental a figura de Alexandre, conhecido como o maior conquistador e
estrategista da Antiguidade.
O REINO DA MACEDNIAG
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Busto de Filipe II mostra na Gliptoteca Ny Carlsberg
Localizado na Pennsula dos Blcs ou Pennsula Balcnica, o reino da Macednia situava-se na regio nordeste da Grcia. A maioria de sua populao era formada por camponeses livres que se dedicavam a tarefas ligadas terra e criao de gado. Apesar de algumas diferenas, a lngua macednica era muito semelhante lngua grega.
Os atenienses, pertencentes maior e mais importante cidade grega, tinham um modo muito peculiar de ver os estrangeiros. Embora fossem tambm gregos, os macednicos eram desprezados pelos atenienses, sendo considerados brbaros e devendo ser mantidos longe das glrias e dos privilgios reservados somente aos verdadeiros homens gregos.
No ano de 359 a.C., Filipe se torna rei da Macednia, aos 23 anos de idade, no lugar do rei Amintas IV, ficando conhecido ento como Filipe II. Filipe II foi assassinado em 336 a.C., ao ser apunhalado por um de seus soldados, Pausnias, diante da populao durante o festival de outubro. Nesse festival, comemoravam-se as cerimnias de casamento da Macednia, inclusive o da filha do rei, Clepatra. Aproveitando aquela ocasio, Filipe II fez uma espcie de encontro internacional, convidando vrios enviados das cidades-estados gregas e outros lderes dos povos balcnicos.
N0 450 km
Imprio de Alexandre
Batalhas
Morte de Dario(330)
Morte de Alexandre(323)
Gaugamela(331)
Bctria
Babilnia
Grdio
Trcia
Mnfis
Alexandria
Osis de Siwa
Pella Granicius (334)
Isso (333)
DESERTO DAARBIA
NDIAEGITO
ASSRIA
MACEDNIA
PRSIA
SAARA
ANATLIA
HINDU C
USH
Mesopotmia
Pasrgada
Hecatmpilos
Susa
Ecbatana
BucefaliaProftasia
Patala
Morte de Dario(330)
Pasrgada
Hecatmpilos
Susa
Ecbatana
Morte de Alexandre(323)
Gaugamela(331)
Bctria
BucefaliaProftasia
Patala
Babilnia
Grdio
Trcia
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Alexandria
Osis de Siwa
Pella Granicius (334)
Isso (333)
DESERTO DAARBIA
NDIAEGITO
ASSRIA
MACEDNIA
PRSIA
SAARA
ANATLIA
HINDU C
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Mesopotmia
MAR NEGRO
Rio Dniester
Rio
Dnieper
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Rio
Indus
Rio Eufrates
Rio Nilo
Rio Tigre
Rio Veiga
Rio Danbi
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MAR CSPIO
MAR DE
ARAL
OCEANONDICO
MAR MEDITERRNEO
GOLFO PRSICO
O Imprio Macednico conquistado por Filipe e por Alexandre:
territrio que se estendia dos Blcs ndia, incluindo o Egito
e a Bctria (aproximadamente o atual Afeganisto).
Antes de se tornar um grande rei, com glrias e honrarias devidas somente aos deuses, Filipe havia passado trs anos como refm na cidade grega de Tebas, num momento em que o reino da Macednia enfrentava uma grande crise, devido s guerras em que o reino esteve envolvido. Em Tebas, Filipe teve a oportunidade de estudar as tticas de guerra mais sofisticadas de seu tempo e tambm as inovaes estratgicas militares tebanas, principalmente a falange. Ao regressar para a Macednia em 360 a.C., tendo tambm estudado os mtodos militares dos gregos, com sua experincia, Filipe montou as falanges, constitudas de dez fileiras de infantaria armada com novas lanas, duas vezes mais longas do que aquelas comumente utilizadas, possuindo cada uma cerca de cinco metros de extenso. Com tal formao, os soldados que carregavam tais lanas podiam ficar mais distantes do que os que estavam frente na batalha. Desse modo, as lanas da retaguarda, projetando-se entre as da primeira fileira, eram absolutamente devastadoras contra os exrcitos inimigos. Como resultado dessa disposio e tcnica, as falanges formavam um escudo, quase como um ourio, praticamente indestrutvel. Apoiando a retaguarda, havia a cavalaria. Os homens que a constituam portavam uma armadura diferente em fora e peso e combatiam por trs os opositores, deixando os inimigos encurralados. Como reforo, o exrcito de Filipe ainda possua as catapultas, capazes de lanar pedras de mais de dez quilos a distncias que chegavam a 200 metros. Enfim, Filipe da Macednia formou um exrcito com fora e percia quase indestrutveis, composto de homens bem treinados e dispostos conquista do mundo, que se iniciou pela Grcia, j enfraquecida devido Guerra do Peloponeso.
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Os soldados (ou falangistas) mantinham uma formao cerrada, com as armas das primeiras linhas projetadas para a frente, de modo que seria impossvel atingir qualquer homem da formao sem ser perfurado por alguma lana. Essas lanas, chamadas sarissas, mediam de quatro a cinco metros e eram constitudas apenas de uma ponta afiada e um contrapeso. Os membros restantes da formao, aqueles que ficavam longe da primeira linha, mantinham as lanas elevadas em mdia de 45 graus, numa posio de prontido e anulando parcialmente um ataque pelo alto, por exemplo, caso a cavalaria inimiga saltasse sobre a primeira linha de lanas. Os homens que ficavam nas ltimas fileiras da falange eram usados como substitutos, quando os soldados da frente morriam ou tombavam, alm de constituirem uma fora de empurro para toda a formao, de modo que o inimigo era literalmente esmagado sob o avano do Exrcito.
Aps a conquista da Grcia, os macednicos se puseram conquista da Prsia, que possua um vasto imprio, e dominaram tambm outros povos, sendo atrados, principalmente, por tesouros e terras cultivveis. Foi durante as comemoraes que antecederiam o incio da conquista dos persas que Filipe II veio a falecer, assumindo o trono ento seu filho, Alexandre.
ALEXANDRE, O GRANDE: VIDA E CONQUISTAS
Busto de Alexandre. Cpia romana em mrmore do original de Lisipo, de 330 a.C. (Museu do Louvre). Segundo Plutarco, as esculturas de Lisipo representavam fielmente o famoso conquistador macednio.
Com a morte de Filipe II, Alexandre (356-323 a.C.) se tornou rei da Macednia, com apenas 20 anos. No entanto, sua pouca idade no representou qualquer empecilho para a genialidade de uma das figuras mais importantes da histria da Antiguidade. Tendo construdo um dos maiores imprios da histria, alguns homens de seu tempo chegaram a afirmar que Alexandre pertencia descendncia direta de Zeus. Antes de se tornar rei, Alexandre j tinha tido experincias polticas e militares ao lado do pai. Aos 16 anos, por exemplo, quando Filipe liderou um ataque contra a cidade de Bizncio em 340 a.C., Alexandre assumiu o controle do reino da Macednia. J na batalha de Queroneia, decisiva na conquista de Atenas, Alexandre liderou a cavalaria, o que foi fundamental para a vitria macednica. Conta-se que sua personalidade era sobremaneira singular. Por um lado, era um homem de viso diferenciada, extremamente inteligente, que buscava construir uma sntese entre o Oriente e o Ocidente. Alexandre era conhecido por seu respeito aos derrotados e por sua admirao pelas cincias e pelas artes, o que ficou claro com a criao da cidade de Alexandria (atual Istambul), que se tornou, substituindo Atenas, a cidade mais importante do mundo em sua poca, devido ao seu carter cultural, cientfico e econmico (talvez pela influncia do mestre e preceptor Aristteles, que educou Alexandre durante sua infncia), sendo substituda por Roma somente trezentos anos depois. Por outro lado, Alexandre apresentava-se como um homem extremamente instvel, violento e cruel, inclusive com aqueles que lhe eram mais prximos.
Como resultado de todas as suas campanhas e guerras, Alexandre criou um imprio que se estendia da Grcia extremidade da ndia. Como rei e general de seus exrcitos, nunca perdeu uma batalha. No voltou para a Macednia, sua terra natal, depois de suas conquistas, permanecendo na Babilnia at sua morte.
Em 323 a.C., com apenas 33 anos, Alexandre morreu, vitimado por uma febre. Seus generais passaram, ento, a disputar o poder entre si. O vasto imprio acabou se dividindo em reinos menores, entre os quais se destacam a Macednia, a Sria, Prgamo e o Egito. Os generais de Alexandre se tornaram os governantes desses reinos, que permaneceram at as invases romanas.
As consequncias das conquistas de Alexandre para a cultura grega e para a Filosofia
A consequncia poltica mais importante dos feitos de Alexandre foi o desmoronamento da importncia sociopoltica da poleis grega. Com as conquistas sobre toda a Grcia, a liberdade dos homens livres, caracterstica que sustentava a democracia grega, mais propriamente a ateniense, perdeu sua fora e vivacidade. Atenas, a principal polis grega, agora, fazia parte dos povos conquistados. Por mais que Alexandre respeitasse os atenienses e mantivesse a cidade
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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como sua aliada, a liberdade, sustentculo da democracia, foi duramente atingida. Aps a morte de Alexandre, com a formao dos reinos do Egito, da Sria, da Macednia e de Prgamo, a importncia da cidade livre, da polis, foi perdida e seu ideal de independncia e liberdade foi praticamente esquecido. Desse modo, a polis pensada por Plato e Aristteles, com seus ideais de moralidade e organizao tidos como a forma perfeita de organizao social e poltica, passou a ser vista como uma utopia.
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Alexandre Magno e seu cavalo Bucfalo, na Batalha de Isso. Mosaico encontrado em Pompeia, hoje no Museu Arqueolgico Nacional, em Npoles.
De cidado, o homem grego se tornou sdito. J no era a assembleia de homens livres que governava a cidade, mas agora eles recebiam ordens e tinham de acat-las, uma vez que estavam submetidos pela fora e pelo poder militar e poltico da Macednia.
Em 146 a.C., com as invases romanas, a Grcia perdeu totalmente sua liberdade, tornando-se provncia de Roma. Desse modo, os gregos, no podendo definitivamente retornar ao ideal de cidadania da polis, aquele que valorizava os ideais cvicos de sua cidade e por isso o homem se identificava somente com ela (prova disso era o tratamento dos gregos dispensado aos estrangeiros), passaram a valorizar uma ideia cosmopolita, ou seja, j que no havia uma cidade com a qual o sujeito se identificasse, o mundo passaria, ento, a ser sua cidade.
Nesse novo contexto de cosmopolitismo, o homem no estava mais preocupado em se tornar cidado, passando agora a se preocupar consigo prprio, no tendo mais como identidade a comunidade poltica, mas sim o indivduo, o homem particular, ou seja, ele mesmo. Desse modo, se a cultura do mundo clssico, das cidades-estados gregas, se empenhava em formar o cidado, esse novo mundo criado por Alexandre trouxe tona o indivduo, que, ao contrrio do cidado antigo, que se preocupava com o bem e com a felicidade de todos, passou a se preocupar consigo e com a sua felicidade. tica e poltica tornaram-se coisas distintas. A tica clssica, presente at Aristteles, baseava-se na unio entre homem e cidado, sendo que o bom poltico era, consequentemente, o melhor homem. Agora, a tica se estruturava de maneira autnoma, buscando compreender como o homem singular deve agir e viver para ser feliz particularmente.
Da cultura helnica para a cultura helenstica
Com as conquistas de Alexandre, o mundo se tornou um s reino. Isso significa que a cultura dos helenos, que antes era preservada somente entre os povos gregos, principalmente em Atenas, foi difundida pelo mundo. Por cultuar os ideais gregos, Alexandre, ao dominar os demais povos, difundiu a cultura helena, que se espalhou pelo mundo e foi absorvida, de um ou de outro modo, por todos os povos conquistados. A prpria Roma, que mais tarde dominou a Macednia, absorveu a cultura grega, por exemplo, quando renomeou os deuses gregos e os cultuou em seus ritos religiosos.
Dentro da nova perspectiva de homem, visto agora como indivduo, se fez necessrio encontrar um novo modo de vida. Assim, foi preciso pensar em uma moral que levasse em conta o homem particular e que pudesse se constituir em uma forma para que este encontrasse a felicidade. Dessa maneira, a filosofia se dirigiu ao homem concreto e individual e, em alguma medida, ocupou o lugar antes reservado antiga polis e sua religio. A filosofia ofereceu novos contedos para a vida espiritual, iluminou a conscincia, ensinou o homem a viver e a ser feliz. A preocupao filosfica do helenismo foi predominantemente tica, tendo as demais especulaes filosficas se subordinado a este interesse prtico. H uma concepo teraputica da filosofia, segundo a qual os filsofos helenistas comparam sua arte com a do mdico. Dessa forma, assim como os mdicos curam os males do corpo, a filosofia cura os males da alma. A filosofia cuida das enfermidades da alma causadas pelas falsas crenas e pelos temores diante da vida e da morte.
nesse contexto que surgem as escolas filosficas estoicismo, epicurismo, ceticismo e cinismo , que pretendem apresentar para os homens uma nova maneira de ser e viver que possa lev-los felicidade.
O ESTOICISMO
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Busto de Zeno de Ccio no Museu de Pushkin
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Fundada por Zeno de Ccio (332-262 a.C.), cidade localizada em Chipre, em 300 a.C., a escola estoica representou a mais importante das correntes de pensamento do Perodo Helenstico. A palavra estoicismo tem sua origem no termo stoa poikil, que significa prtico pintado, local em que os membros dessa escola se reuniam. Dentre as principais figuras que compunham a escola estoica, esto Cleantes (331-232 a.C.) e Crisipo (280-206 a.C.).
A ideia de natureza essencial para compreendermos o estilo de vida e a proposta de felicidade pregada pelo estoicismo. Segundo essa escola, a Filosofia dividida em trs partes, a fsica, a lgica e a tica, sendo esta ltima a mais importante. Nessa concepo, a Filosofia vista como uma rvore, na qual os frutos correspondem tica, a raiz fsica e o tronco lgica.
Para o estoicismo, o homem deve viver segundo o que natural. Dentro dessa concepo tica, o homem pertenceria natureza, vista como o macrocosmo, sendo o ser humano somente um microcosmo. Dessa forma, o microcosmo est submetido ao macrocosmo. Para que o homem alcance a felicidade verdadeira, suas aes devem estar de acordo com o macrocosmo, ou seja, com aquilo que a natureza determina.
So trs as virtudes que levariam o homem felicidade: a inteligncia, que o conduziria ao conhecimento e ao discernimento do bem e do mal; a coragem, que consiste em conhecer o que deve ser temido e o que no deve ser temido; e a justia, que seria o conhecimento do que deve ser dado a cada um segundo o que lhe devido. Em sua concepo, o estoicismo dir que no existe nada alm da vida terrena: se o homem natureza e deve se inteirar a ela, ao morrer ele continua a ser natureza, de outra forma, certamente, mas simples natureza. O homem dissolve-se na natureza.
Dentro de sua proposta tica, podemos perceber que o estoicismo estar prximo de um determinismo ou fatalismo: as coisas esto determinadas pela sua natureza, e, se assim , o homem deve aceitar tal natureza, tal destino e cumpri-lo, fazendo sempre o que correto. Isso no significa que o sujeito no tenha vontade ou capacidade de pensar naquilo que certo ou errado, mas que ele deve aceitar o que inevitvel, se for isso o que a racionalidade do cosmos determinar. importante perceber que a natureza no arbitrria e irracional, por isso os estoicos insistiam no esforo para conhecer a racionalidade intrnseca natureza, compreendendo, assim, as suas determinaes, sem se desesperar diante delas.
Nesse ponto, encontra-se aquilo que talvez seja o maior ensinamento do estoicismo: se os acontecimentos seguem o curso da natureza, o homem deve aceit-los de forma tranquila, buscando nessa aceitao a verdadeira felicidade. Dessa forma, o sujeito deve alcanar a ataraxia (estado de paz interior) por meio da tranquilidade da alma,
possvel somente quele que constri sua fortaleza interior, ou atinge a apatheia, que seria a indiferena a tudo o que acontece, de modo que os fatos da vida, sendo inevitveis porque so naturais, no podem tirar a paz interior do homem. O estoicismo ensina o homem a enfrentar as vicissitudes da vida de forma calma, resignada, e, sobretudo, digna. Esse estado alcanado por meio do autocontrole e da austeridade de uma vida disciplinada e construda somente com o que estritamente necessrio sobrevivncia, sem qualquer luxo ou culto s coisas suprfluas.
A escola estoica teve grande aceitao no mundo romano (posterior ao mundo helnico), tendo como principais representantes pensadores da qualidade de Sneca (4 a.C.-65 d.C.) e Marco Aurlio (121-180), imperador de Roma aps 161. Em sua verso latina, o estoicismo se manifestou principalmente na ideia de indiferena a tudo o que acontece na vida do homem, sem que este perca a paz interior construda com a racionalidade filosfica.
Leon
ardo
Ale
nza
O suicdio no era um tabu para os estoicos. Diante de uma
situao extrema, seria a soluo mais racional a ser tomada
pelo homem.
interessantssima a ideia trazida pelo estoicismo sobre a possibilidade do suicdio. De acordo com essa corrente, se a natureza racional e o homem deve viver de acordo com essa racionalidade, preservando o autocontrole e a paz interior, em alguns casos, o suicdio se torna natural. Por exemplo, quando o sujeito acometido de uma doena grave e incurvel, que lhe causar, inevitavelmente, uma dor tamanha, tirando-o do controle de si mesmo, provocando a angstia e o sofrimento como consequncias, afastando-o definitivamente da felicidade,
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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o mais racional seria, portanto, deixar de viver. Por isso, o suicdio visto pelos estoicos como um caminho racional diante de situaes extremas e no como um pecado ou um erro.
As influncias do estoicismo sero claramente identificadas no cristianismo, quando este, anos depois, tecer elogios ao autocontrole, resignao diante dos acontecimentos e sofrimentos inevitveis e vida simples e abnegada em vista de um ideal maior que est para alm desse mundo.
O EPICURISMO: O ENCANTAMENTO DOS JARDINS DE EPICURO
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Busto de Epicuro
Das escolas do Perodo Helenstico, talvez a que defender a mensagem mais fascinante seja o epicurismo. Fundado por Epicuro (341-270 a.C.), o epicurismo traz como pano de fundo de uma vida feliz a procura pelo prazer, que deve ser buscado em todas as coisas, o desprezo pela morte e a negao do temor aos deuses.
Epicuro nasceu em Samos e chegou a Atenas em 323 a.C.,
mesmo ano da morte de Alexandre, o Grande. Fundou sua escola em Atenas em 306 a.C., depois de viajar por muitos lugares e conhecer os homens e o mundo. Diferentemente das escolas de Plato (a Academia) e de Aristteles (o Liceu), a escola de Epicuro no era um centro de investigao filosfica em busca da verdade sobre o mundo ou sobre o homem, identificando-se mais como um permanente retiro espiritual, em que os amigos se reuniam para buscar
a felicidade por meio de uma vida simples e regrada, entregue reflexo sobre o homem e busca do prazer.
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Detalhe da obra Escola de Atenas, de Rafael Sanzio. Em destaque, Epicuro.
Rejeitando o dualismo alma e corpo, Epicuro dir que o homem e o mundo so formados por tomos, ideia retirada do pr-socrtico Demcrito. Segundo este, os tomos, que
em si so eternos, se juntam formando todos os seres, inclusive o homem. Uma vez que tais seres so destrudos, esses tomos so separados e voltam natureza, formando ento outros seres. Na concepo religiosa do epicurismo, no existiria vida aps a morte, uma vez que a prpria alma humana formada tambm por tomos e, quando o homem morre, esses tomos so simplesmente dispersados. Assim, Epicuro vai contra a preocupao dos homens em querer agradar os deuses com ritos e sacrifcios, uma vez que no h por que agrad-los, j que a alma no ir para junto deles aps a morte. Alm disso, Epicuro, em sua Carta sobre
a felicidade, escrita para seu amigo Meneceu, dir que os
deuses vivem em um lugar chamado de intermundo, no se importando com a vida dos homens, e, por isso, estes
tambm no deveriam se preocupar em agrad-los, pois deles nada temos a esperar e nada a temer.
Dentro de uma viso materialista, Epicuro dir que o nico conhecimento verdadeiro aquele obtido por meio dos sentidos, que tambm so materiais, sendo eles os instrumentos pelos quais o homem conhece os seres do
mundo. Desse modo, o epicurismo valorizar as sensaes, pois entende que elas so o testemunho imediato dos sentidos, sendo sempre verdadeiras.
Se no h vida aps a morte e o destino, em certa medida, segue a natureza dos seres, sendo que o homem pode tambm seguir algumas coisas determinadas por
si mesmo, resta ao homem buscar uma vida feliz nesta realidade terrena, vivendo cada dia como uma construo propriamente humana em busca do prazer. A boa vida, a felicidade neste mundo, deve ser a meta a ser atingida pelo sujeito.
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Ao contrrio do que se pensou por muito tempo, Epicuro
no pregava uma vida de prazeres imoderados e sem limites, no podendo ser considerado, assim, o defensor de um hedonismo1 raso e superficial, no sentido de que o que vale na vida o prazer em si mesmo, sem consequncias de qualquer natureza.
Ana
Rol
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O hedonismo, no sentido mais conhecido da palavra, a busca pelo prazer sem medida e sem consequncias. Se entendido deste modo, o epicurismo no pode ser chamado de hedonismo.
El hedonismo, de Ana Roldn.
Segundo a doutrina epicurista, o homem atinge uma vida
feliz medida que busca o prazer de forma moderada e equilibrada. H uma clara distino entre os prazeres ligados ao corpo e os prazeres ligados alma, sendo estes mais importantes do que aqueles. No so todos os prazeres que trazem a tranquilidade, mas somente os prazeres simples e racionalmente discernidos. Nas palavras de Epicuro, todo prazer bom, mas nem todos devem ser desejados. Toda dor ruim, mas nem toda dor deve ser rejeitada. Segundo a tica epicurista, o homem feliz aquele que austero e moderado, buscando os prazeres simples e virtuosos, racionalmente escolhidos. por isso que o filsofo dir que, de todas as virtudes, a mais valiosa a prudncia, pois
por meio dela que o homem capaz de discernir os prazeres e escolher os melhores. Assim, Epicuro estabelece uma
hierarquia entre os prazeres, dividindo-os em:
1. Prazeres naturais e necessrios. Exemplo: comer o suficiente para saciar a fome.
2. Prazeres naturais e no necessrios: Exemplo: comer comidas refinadas.
3. Prazeres no naturais e no necessrios: Exemplo: riqueza, poder e prestgio.
Segundo Epicuro, os prazeres da primeira categoria devem ser buscados, os da segunda podem ser buscados de vez em quando e os da terceira nunca devem ser buscados, pois
so insaciveis e levariam o homem angstia.
Sobre o mal e a dor, Epicuro dir que ambos so inevitveis. Desse modo, dir que o mal fsico ou facilmente suportvel ou, se insuportvel, dura pouco e leva morte. E a morte
no deve ser vista com medo ou como um mal em si, ela , simplesmente, a suspenso dos sentidos. Epicuro, em sua Carta, dir que quando ela (a morte) est presente, ns no estamos, e quando ns estamos presentes, ela no est presente, por isso, a morte no deve representar nada para o homem. J em relao aos males da alma, Epicuro dir que a filosofia capaz de cur-los e de libertar completamente o homem de tais males.
Como devemos viver: a sntese de Epicuro
Epicuro nos forneceu uma sntese de sua mensagem no chamado quadri-frmaco (ou quatro remdios para os males
do mundo), que consiste em quatro lies a serem seguidas para se alcanar a verdadeira felicidade:
1. So vos os temores dos deuses e do alm.
2. absurdo o medo da morte.
3. O prazer, quando for entendido de modo justo, est
disposio de todos.
4. O mal ou de breve durao ou facilmente
suportvel.
Seguindo esses princpios, o homem poder alcanar a paz interior, a absoluta imperturbabilidade, sendo ento feliz.
No fim de sua Carta sobre a felicidade, Epicuro diz:
Medita, pois, todas essas coisas e muitas outras a
elas congneres, dia e noite, contigo mesmo e com teus
semelhantes, e nunca mais te sentirs perturbado, quer
acordado, quer dormindo, mas vivers como um deus entre
os homens. Porque no se assemelha absolutamente a um
mortal o homem que vive entre bens imortais.
EPICURO. Carta sobre a felicidade a Meneceu. Ed. bilngue,
grego/portugus. Traduo de lvaro Lorencini e
Enzo Del Carratore. So Paulo: Editora Unesp, 1997.
1 Hedonismo: doutrina que encontra no prazer o sumo bem e na busca do prazer o objetivo da vida do homem. Os cirenaicos so os fundadores dessa doutrina, colocando os prazeres do corpo acima dos prazeres da alma. Mas mesmo os cirenaicos condenavam os excessos e diziam ser necessrio manter um domnio sobre si mesmo ao experimentar os prazeres.
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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10 Coleo Estudo
CETICISMO
Busto de Pirro, fundador do ceticismo
Fundado por Pirro de lida (365/360-275/270 a.C.), o ceticismo, tambm conhecido como pirronismo, uma das escolas mais importantes do Perodo Helenstico. Apesar de a tradio considerar o ceticismo como uma escola, ao contrrio de Epicuro e dos estoicos, o ceticismo foi mais um pensamento, uma ideia que se disseminou pelo mundo do que propriamente uma escola. Os seguidores de Pirro no eram discpulos, mas simples admiradores que tomavam sua vida e atitudes como modelo para a busca da felicidade.
Pirro fez parte do Exrcito de Alexandre, o Grande, e com ele foi at a ndia. Nesse caminho, percebeu que as convices gregas, as verdades que at ento eram arraigadas e inquestionveis de sua tradio, no passavam de um modo particular de ver o mundo, ou seja, as verdades ditas pelos gregos, que pareciam incontestveis e evidentes, eram somente mais uma viso particular ao lado de outras vises diferentes sobre os mesmos assuntos. Com isso, Pirro concluiu que verdades nicas e absolutas no existem, no passando de opinies.
Pirro no deixou nada escrito, a exemplo de alguns pr-socrticos e do prprio Scrates. Quem escreveu sobre seus ensinamentos foi seu seguidor Tmon. Segundo Tmon, para que o homem seja feliz, ele deve ficar atento a trs coisas:
Como so as coisas por natureza.
Qual deve ser nossa disposio em relao a elas.
O que nos ocorrer se nos comportarmos assim.
De acordo com Tmon, Pirro d uma resposta a tais questionamentos:
1. As coisas so igualmente sem diferena, sem estabilidade, indiscriminadas; logo, nem nossas sensaes nem nossas opinies so verdadeiras ou falsas;
2. Sendo assim, no necessrio ter f nas coisas, mas sim permanecer sem opinies, sem inclinaes, sem agitaes, dizendo a respeito de tudo: no mais do que no , e no , ou nem , nem no ;
3. Aqueles que se encontram nessa posio, ou seja, aqueles que atingirem tal atitude frente s coisas, em primeiro lugar alcanaro a apatia e depois a imperturbabilidade. Ou seja, essas pessoas
alcanaro a felicidade.
A dvida uma das atitudes do ctico. Ser que realmente
existem verdades absolutas sobre as coisas? Para o ceticismo,
no.
A ideia central do ceticismo , portanto, que o homem no pode encontrar uma verdade absoluta sobre nada no mundo. Dessa forma, ctico aquele que no busca a verdade, pois sabe que ela impossvel de ser atingida, seja porque o homem no tem condies de encontr-la, seja porque ela no existe. De uma forma ou de outra, a postura do homem deve ser a de se abster de julgar o que as coisas so, de no emitir qualquer resposta pergunta: o que ? Assim, se as coisas so indiferentes, sem medida e indiscernveis, sendo que os sentidos, a razo, o pensamento no podem dizer o que as coisas so ou deixam de ser, o homem deve se contentar em simplesmente no buscar a verdade, permanecendo sem nenhuma inclinao, na total indiferena. essa indiferena que levaria o homem felicidade. No h por que se angustiar e perder a paz interior em busca da verdade, pois esta no existe ou impossvel de ser encontrada. Est aqui o ponto principal da argumentao ctica, resumida no conceito de poche, que significa a suspenso do juzo.
Um dos mais importantes representantes do ceticismo foi Sexto Emprico (sc. II), que escreveu suas Hipotiposes Pirrnicas, principal fonte que temos de conhecimento do ceticismo antigo. Em sua obra, ele dir que o ceticismo a faculdade de opor de todas as maneiras possveis os fenmenos e os noumenos [coisas em si mesmas, essncias das coisas], e da chegarmos, pelo equilbrio das coisas e das razes opostas, primeiro suspenso do julgamento (epokh) e, depois, indiferena (ataraxia).
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CINISMO
Han
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ter
Klu
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Est
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Digenes, o cnico mais famoso. Andava com uma lanterna nas mos em busca de um homem que fosse realmente justo.
A palavra cnico, provavelmente utilizada pela primeira vez
para se referir a Digenes de Sinope, tido como o fundador
dessa escola filosfica, provm do grego kynism ou kyns e
do latim cynismu, que significa co. Desse modo, Digenes
e os demais cnicos ficaram conhecidos como os ces da
cidade. Porm, Antstenes, seguidor de Scrates e quase
contemporneo de Plato, foi o primeiro a viver segundo
os princpios adotados pelo cinismo, sendo considerado,
portanto, seu primeiro fundador. Nesse caso, Digenes
visto como uma espcie de refundador do cinismo, pois
ele o maior e mais importante expoente desse pensamento.
A ideia central do cinismo a mais anticultural das
concepes filosficas da Grcia Antiga: Digenes declarou
que toda pesquisa filosfica abstrata e terica, bem como
a matemtica, a fsica, a astronomia, a msica e todo e
qualquer outro tipo de conhecimento terico, intil para
levar o homem felicidade. Essa concepo claramente
identificvel com sua clebre procura pelo homem. Conta-se
que Digenes saa pela cidade, de dia, com uma lanterna
na mo, dizendo procurar um homem que fosse justo.
Com isso, ele queria encontrar um s homem que vivesse
de acordo com a natureza, longe de todas as convenes
da sociedade e indiferente ao prprio capricho da sorte e
do destino, sabendo reencontrar sua verdadeira e original
natureza, vivendo conforme essa natureza e com isso
alcanando a verdadeira felicidade.
O modo de vida do cnico, em especial de Digenes,
resume o porqu de os participantes dessa escola serem
conhecidos como os ces: os ces no se importam com
nada, no perdem a paz em busca de comida, mas comem o
que aparece; no se angustiam porque no tm onde dormir,
mas dormem em qualquer lugar e, sobretudo, no tm
qualquer vergonha em fazer o que natural, satisfazendo
suas necessidades em frente a todos e quando sentem
vontade. Da mesma forma deveriam ser os homens, que
devem agir sem se preocupar com as convenes sociais ou
qualquer norma de conduta. interessante observar que
o animal que diz para o cnico como ele deve viver e agir,
e no o contrrio: uma vida sem metas (metas que a
sociedade coloca como necessrias, como obter riquezas
e prestgio), uma vida sem necessidade de moradia fixa e
tambm sem conforto. Segundo o cinismo, esses prazeres
so criados pelos homens e so dispensveis vida feliz.
Segundo Digenes, quanto mais se eliminam as
necessidades suprfluas, mais se livre. Tal liberdade
pregada pelos cnicos se manifestava em todos os sentidos:
liberdade da palavra, pois diziam o que queriam da forma
que queriam, sendo considerados, por isso, arrogantes;
e liberdade da ao, pois faziam o que queriam, em qualquer
lugar que estivessem e diante de qualquer pessoa.
O trecho a seguir nos d uma viso mais clara do modo
de viver e pensar dos cnicos:
Costumava fazer qualquer coisa luz do sol, mesmo o
que diz respeito a Demeter e Afrodite (comer e amar). [...]
Se comer no estranho, nem mesmo na praa pblica
estranho. No estranho comer; portanto, tambm
no estranho comer na praa pblica. [...] Costumava
masturbar-se em pblico e dizia: quem me dera pudesse
aplacar a fome esfregando-me o ventre.
DIGENES, Larcio. VI, 69.
Os cnicos desprezavam o prazer, pois, segundo eles,
o prazer no s debilita o fsico, mas escraviza a alma,
que se torna dependente das coisas ou homens que trazem
tal prazer. Dessa maneira, os cnicos viam como ideal de vida
a ser alcanado a autarquia, ou seja, bastar-se a si mesmo,
sendo preciso, para isso, a apatia e a indiferena diante de
todas as coisas. Conta-se que um dia Alexandre, o Grande,
foi visitar Digenes, que estava em seu barril (ele vivia em
um barril), a tomar o sol da manh. Chegando perto de
Digenes, Alexandre, o homem mais rico e poderoso da
Terra, disse: Pede-me o que quiseres que eu te darei. Ao
qual Digenes responde: No me faa sombra. Devolve meu
sol. Apesar de parecer uma anedota, a histria resume o
ideal do cinismo: o homem no necessita de nada a no ser
daquilo que a prpria natureza se encarregou de lhe dar.
Nada que no seja natural essencial vida, e a felicidade
s pode ser alcanada a partir de uma vida simples e de
acordo com a natureza.
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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12 Coleo Estudo
Pier
re P
uje
t
Alexandre visita Digenes. O rei admirava tanto o co que
disse: Na verdade, se eu no fosse Alexandre, gostaria de ser
Digenes.
O encontro de Alexandre com Digenes de Sinope. Pierre Pujet,
1680. Museu do Louvre.
EXERCCIOS DE FIXAO
01. Intelectual e espiritualmente, de fato, a poca de
Alexandre assinala na Grcia uma mudana decisiva,
que afetou especialmente as minorias cultas. No novo
mundo dos grandes imprios, quando a civilizao grega
j tinha se espalhado por todo o Oriente prximo, [...] os
horizontes do indivduo grego viam-se consideravelmente
alargados, mas ao mesmo tempo este havia perdido o
sentimento de segurana que a vida da antiga cidade
podia lhe dar.
Segundo o texto, no Perodo Helenstico, os horizontes
do indivduo grego viam-se consideravelmente alargados,
mas ao mesmo tempo este havia perdido o sentimento
de segurana que a vida da antiga cidade podia lhe dar.
REDIJA um texto explicando o que isso representou para
os gregos dessa poca.
02. EXPLIQUE por que a ideia de cosmopolitismo foi
importante para o Perodo Helenstico.
03. No Perodo Helenstico a sensao de isolamento, desenraizamento e insegurana era, de fato, forte o bastante
para estimular muitos homens a buscar uma forma de vida
que lhes proporcionasse uma ntima sensao de segurana
e estabilidade. Isto foi o que as novas filosofias do Perodo
Helenstico se puseram a proclamar.
A partir do trecho anterior, REDIJA um texto explicando a
importncia das escolas filosficas para o Perodo Helenstico.
EXERCCIOS PROPOSTOS
01. (UFMG) Leia este trecho:Dependendo das condies anteriores, o mesmo vinho
parece azedo para aqueles que acabaram de comer
tmaras ou figos, mas parece ser doce para aqueles que
consumiram nozes ou gro-de-bico. E o vestbulo da casa
de banhos esquenta os que entram, mas esfria os que
saem, se ficam esperando nele. Dependendo de se estar
com medo ou confiante, o mesmo objeto parece temvel
ou terrvel ao covarde, mas de forma alguma a algum
mais corajoso. Dependendo de se estar em sofrimento ou
em situao agradvel, as mesmas coisas so irritantes
para os que sofrem, e agradveis para os que esto bem.
..........................................................................
..........................................................................
Se, ento, no se pode preferir uma aparncia outra,
com ou sem uma demonstrao ou um critrio, as
diferentes aparncias que ocorrerem, em diferentes
condies, sero indecidveis. De modo que a suspenso
do juzo com relao natureza dos existentes externos
introduzida tambm desse modo.
SEXTO EMPRICO. Hipotiposes pirrnicas I, 110-117.
Com base na leitura desse trecho, REDIJA um texto
caracterizando a corrente filosfica que defende as
afirmaes nele contidas.
02. Habituar-se s coisas simples, a um modo de vida no luxuoso, portanto, no s conveniente para a sade,
como ainda proporciona ao homem os meios para
enfrentar corajosamente as adversidades da vida: nos
perodos em que conseguimos levar uma existncia rica,
predispe o nosso nimo para melhor aproveit-la, e nos
prepara para enfrentar sem temor as vicissitudes da sorte.
EPICURO. Carta sobre a felicidade (a Meneceu).
Traduo de lvaro Lorencini e Enzo Del Carratore.
So Paulo: Editora UNESP, 2002. p. 41.
REDIJA um texto respondendo seguinte pergunta:
simplicidade sinnimo de felicidade?
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03. Leia o trecho a seguir.
Mas acontecem muitos sobressaltos tristes, horrveis,
duros de se agentar.
Como no podia afastar-vos deles, armei vossos espritos
contra todos: suportai bravamente. Nisto vs estais
frente de um deus: ele est margem do sofrimento dos
males, vs, acima do sofrimento.
Desprezai a pobreza: ningum vive to pobre quanto
nasceu. Desprezai a dor: ou ela ter um fim ou vos dar
um. Desprezai a morte: a qual vos finda ou vos transfere.
Desprezai o destino: no dei a ele nenhuma lana com
que ferisse o esprito.
Antes de tudo, tomei precaues para que ningum vos
retivesse contra a vontade; a porta est aberta: se no
quiserdes lutar, lcito fugir. Por isso, de todas as coisas
que desejei que fossem inevitveis para vs, nenhuma
fiz mais fcil do que morrer.
Coloquei a vida num declive: basta um empurrozinho.
Prestai um pouco de ateno e vereis como breve e
ligeiro o caminho que leva liberdade [...]
A isso que se chama morrer, esse instante em que a
alma se separa do corpo breve demais para que se
possa perceber to grande velocidade: ou o n apertou
a garganta, ou a gua impediu a respirao, ou a dureza
do cho arrebentou os que caram de cabea, ou a suco
de fogo interrompeu o respirar; seja o que for, voa. Por
acaso enrubesceis?
Passa rpido o que temestes tanto tempo!
SNECA. Carta sobre a Providncia Divina.
A partir da leitura do trecho anterior e de outros
conhecimentos sobre o assunto, REDIJA um texto
caracterizando e explicando a corrente filosfica expressa
por ele.
04. Tambm ele, em criana, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a me lhe
incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em
que deixou cair toda essa vegetao parasita, e ficou s
o tronco da religio, ele, como tivesse recebido da me
ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dvida, e logo
depois em uma s negao total [...]
A partir do trecho anterior, retirado do livro A cartomante,
de Machado de Assis, REDIJA um texto identificando a
corrente filosfica presente no trecho e explicando sua
premissa fundamental.
05. por essa razo que afirmamos que o prazer o incio e o fim de uma vida feliz. Com efeito, ns o identificamos
como o bem primeiro e inerente ao ser humano, em razo
dele praticamos toda escolha ou recusa, e a ele chegamos
escolhendo todo bem de acordo com a distino entre
prazer e dor.
EPICURO. Carta sobre a felicidade (a Meneceu).
Traduo de lvaro Lorencini e Enzo Del Carratore.
So Paulo: Editora UNESP, 2002. p. 41.
A partir do texto e de outros conhecimentos sobre o
assunto, REDIJA um texto se posicionando a favor de ou
contra a seguinte afirmao: o homem feliz aquele que
busca o prazer e se afasta da dor em todas as ocasies.
06. A filosofia se preocupa com muitas questes tericas, como, por exemplo: o que a verdade? O que o
conhecimento? O que distingue uma boa ao de uma m
ao? O que justia? Ou, ainda, o que d legitimidade
a um governo? Para essas questes, a filosofia oferece
muitas respostas.
SMITH, Plnio. O que ceticismo? So Paulo: Brasiliense, 1992.
p. 07. Coleo Primeiros Passos, 262.
A partir dessa citao, REDIJA um texto considerando a
seguinte afirmativa: se a filosofia responde vrias coisas
sobre as mesmas questes, podemos considerar alguma
delas realmente verdadeira?
07. Aprovo os sentimentos fortes e generosos dos esticos, que dizem que as coisas externas no so impedimento
para a felicidade, mas que o sbio feliz, mesmo que
o toro de Falrides o esteja queimando. Os idiotas no
participam de nenhum bem, pois o bem virtude ou aquilo
que participa as virtudes; as coisas que provm dos bens,
que so aquelas das quais se tem necessidade, sendo
vantajosas, cabem apenas aos sbios, assim como as
coisas que provm dos males, que so aquelas das quais
no se tem necessidade, cabem apenas aos viciosos. So,
com efeito, coisas nocivas. E por isso todos os sbios
so estranhos ao dano em ambos os sentidos; no so
capazes de causar dano, nem de sofrer dano, enquanto
os idiotas esto em situao contrria.
CRISIPO. Fr. 586. In: REALE, Giovanni. Histria da Filosofia:
filosofia pag antiga. 3. ed. So Paulo: Paulus, 2003. p. 300.
No texto anterior, Crisipo defende uma postura estoica
diante das adversidades do mundo. REDIJA um texto
definindo quais os princpios defendidos pelo estoicismo
que levariam o homem a tal postura.
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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14 Coleo Estudo
08. Sustentava por isso que nada se pode obter na vida sem exerccios, alis, o exerccio o artfice de qualquer
sucesso. Eliminados, portanto, os esforos inteis,
o homem que escolhe as fadigas requeridas pela natureza
vive feliz; a ininteligncia dos esforos necessrios
a causa da infelicidade humana. O prprio desprezo
pelo prazer para quem esteja a isso habituado algo
dulcssimo. E assim como os que esto habituados a viver
nos prazeres passam de m vontade para um teor de vida
contrrio, tambm aqueles que se exercitam de modo
contrrio, com maior desenvoltura desprezam os mesmos
prazeres. Estes eram seus preceitos e a eles conformou
sua vida. Falsificou realmente a moeda corrente, porque
dava menor valor s prescries das leis do que s da
natureza. Modelo de sua vida, dizia, foi Hracles, que
nada anteps liberdade.
DIGENES, Larcio. Vida dos filsofos. In: REALE, Giovanni.
Histria da Filosofia: filosofia pag antiga. 3. ed.
So Paulo: Paulus, 2003. p. 257-258.
REDIJA um texto relacionando a citao anterior com
a ideia de co trazida por Digenes de Sinope, a qual
caracteriza a escola do cinismo.
SEO ENEM
01. Dizemos que a finalidade do ctico a tranqilidade nas matrias de opinio. Pois, tendo comeado a filosofar
para julgar as representaes e apreender quais so
verdadeiras e quais so falsas, de modo a obter a
tranqilidade, deparou com uma discordncia de igual
fora; e, no podendo decidi-la, suspendeu seu juzo
sobre ela. Estando em suspenso de juzo, ocorreu-lhe
casualmente a tranqilidade nas matrias de opinio.
SEXTO EMPRICO. Hipotiposes pirrnicas.
Em virtude dessa descoberta do ctico pirrnico, para
que o homem se mantivesse no estado de tranquilidade,
ele deveria
A) afirmar que as coisas so como aparecem.
B) negar que as coisas so como aparecem.
C) opor a todo argumento um argumento igual.
D) abster-se do julgamento e no emitir opinio.
E) recusar-se a reconhecer os dados sensveis.
GABARITO
Fixao01. No Perodo Helenstico, os gregos, por terem
tido suas terras invadidas pelos exrcitos
macednicos, perderam sua liberdade poltica e,
como consequncia, perderam a segurana
que a cidade, sua cultura e os valores cvicos
representavam para eles. Dessa forma,
os gregos, em particular os atenienses, se viram
na situao de povo dominado, o que retirou
deles a possibilidade de se autodeterminarem e
decidirem conjuntamente o seu futuro e o da polis.
Por outro lado, seus horizontes se alargaram, uma
vez que o mundo se tornou um nico territrio,
havendo um sincretismo de culturas, o que fez
com que os gregos pensassem em si mesmos,
individualmente, sem se preocuparem com a
cidade, estando exatamente nesse fato a origem
das escolas filosficas do Perodo Helenstico.
02. Com as invases macednicas, os gregos, por
no mais se identificarem exclusivamente com
sua cidade e seus valores, se viram pertencendo
a um mundo muito maior. Dessa forma, no mais
se definiam como cidados desta ou daquela
cidade, mas agora se sentiam cidados do mundo
ou cosmopolitas. Essa possibilidade permitiu que
eles se desprendessem de sua origem, fazendo-os
pensar no mundo todo como um nico lugar, no
havendo mais a ideia de estrangeiro ou cidado.
Sendo assim, independentemente da cidade que
habitavam, a vida deveria ser vivida na busca da
felicidade prpria e particular.
03. Com as conquistas de Alexandre, os homens
gregos viram-se sem uma cidade e sem um
ideal de vida cvica a seguir. Aquilo que lhes
garantia a felicidade, que era justamente o
poder de se reunirem na praa pblica e juntos,
como cidados, decidirem o futuro da polis,
lhes foi retirado. Desse modo, um novo modo
de vida deveria servir como caminho para que
os homens pudessem novamente ser felizes,
e foi isso que as escolas filosficas do Perodo
Helenstico se propuseram a fazer. Cada uma
delas trazia uma maneira de ser e viver com a
qual o homem poderia alcanar a paz interior e,
consequentemente, a felicidade.
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Propostos01. A corrente tratada o ceticismo. Essa corrente de
pensamento defende a tese de que impossvel
encontrar o conhecimento verdadeiro. Alm
disso, para o ceticismo, ou pirronismo, o homem
deveria suspender os juzos, pois ele no tem
condies de saber emitir opinies sobre os seres
ou o mundo.
02. Resposta subjetiva (espera-se que o aluno seja
capaz de se posicionar argumentativamente a
favor de ou contra essa ideia. muito til, quando
possvel, valer-se de outros filsofos em sua
argumentao).
A favor: Sim, simplicidade sinnimo de
felicidade. Acompanhando o argumento de
Epicuro, podemos perceber que a posse de bens
vrios e abundantes no garantia de uma
vida feliz e realizada. Existem muitos exemplos
e testemunhos de pessoas que, apesar de
terem uma vida luxuosa proporcionada pela
riqueza, no so felizes ou realizadas, mas
sofrem demasiadamente pela falta de algo que
preencha seu vazio existencial. Dessa forma,
uma vida mais simples, menos apegada aos bens
materiais, embora estes sejam fundamentais
para a manuteno do mnimo de conforto para a
vida do homem, pode ser o caminho mais vivel
para a felicidade.
Contra: No, simplicidade no sinnimo de
felicidade. Ser simples no significa ser feliz,
pois, se assim o fosse, teramos de concordar
que todas as pessoas que possuem uma vida
mais luxuosa, mais rica, seriam necessariamente
infelizes, e isso no se comprova. O que faz ou
no uma existncia feliz a atitude interna do
homem diante das situaes. Dessa maneira,
totalmente possvel e plausvel que existam
homens que gozem de luxos e sejam felizes,
e homens que tenham uma vida simples, com
poucos bens, e sejam profundamente infelizes.
O que importa a atitude interna do indivduo,
no o que ele possui, seja muito ou pouco.
03. A corrente filosfica expressa no trecho em
questo o estoicismo. Sneca foi um dos
principais filsofos estoicos do perodo do Imprio
Romano e suas influncias foram sentidas,
inclusive, no cristianismo. Essa corrente filosfica
se caracteriza pela busca da apatheia, ou seja,
a perfeita indiferena a todos os acontecimentos
externos vida humana, sejam eles bons ou
maus. Assim, o estoicismo defender que o
homem construa uma fortaleza interior que seja
inabalvel e que garanta a ataraxia ou paz interior.
Nada pode tirar a paz do homem, nada pode
retirar o homem de seu estado de autocontrole
e concentrao para a busca da sabedoria pelo
estudo da Filosofia. Essa ideia de indiferena se
manifesta no desprezo dor, morte, ao destino
e pobreza presente no texto.
04. O texto representa a corrente filosfica do
ceticismo antigo ou pirronismo. Segundo tal
corrente, o homem deve duvidar de tudo, pois no
existem verdades absolutas sobre nada. Aquilo
que se tem como verdade so ideias particulares
dos indivduos que, no raras as vezes, so
contrrias s ideias dos demais, o que leva
concluso que nenhuma dessas ideias , em si,
a correta. Tal corrente tem seu incio com Pirro,
soldado do Imprio Macednico que, em suas
batalhas ao lado de Alexandre, percebeu que em
cada localidade, em cada povo, em cada cultura,
as verdades sobre os mesmos temas variavam.
A partir disso, concluiu que no existem verdades
absolutas sobre qualquer assunto. Tal ideia se
manifesta na dvida constante sobre todas as
coisas, atitude prpria do ctico.
05. Resposta subjetiva (espera-se que o aluno seja
capaz de se posicionar argumentativamente a
favor de ou contra essa ideia. muito til, quando
possvel, valer-se de outros filsofos em sua
argumentao).
A favor: O princpio de toda escolha humana ,
de fato, a busca pela felicidade e a recusa da
dor. Tal atitude plenamente humana, uma
vez que ningum pode, por natureza, desejar a
dor como causa de possibilidade da felicidade.
Os animais agem dessa forma, buscando o prazer
que, no caso, a satisfao de seus instintos.
Por que o homem seria diferente, se ele tambm
goza de uma natureza instintiva? Tal princpio da
satisfao do prazer e fuga da dor encontra-se
vastamente defendido na histria da Filosofia,
Helenismo: a difuso da cultura grega e a busca pela felicidade
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16 Coleo Estudo
comeando com Epicuro, passando por Stuart Mill
e chegando a Nietzsche e Freud. Tomando como
exemplo, para corroborar o argumento, Nietzsche
dir que a escolha daquilo que nega o prazer e
busca deliberadamente a dor prprio dos seres
inferiores, da moral de rebanho, apregoada
pela moral crist ocidental, representando,
segundo o filsofo, a decadncia humana. Quem,
em s conscincia, escolheria deliberadamente
o sofrimento e rejeitaria o prazer? No h
justificativa razovel para tal atitude. Seria a
prpria desnaturalizao do homem.
Contra: A felicidade no pode ser consequncia
somente das aes que trazem prazer ao
homem. Se assim fosse, teramos de afirmar que
todos aqueles que lutam e, devido sua luta,
sofreram ou ainda sofrem por uma causa maior,
moralmente justificvel, como a democracia em
regimes totalitrios, no so felizes. Ao contrrio,
percebe-se que, apesar da dor, que nesse caso
o contrrio do prazer, essas pessoas so sim
felizes, pois seu sofrimento tem como justificativa
uma causa maior. Como exemplo, temos Santo
Agostinho, quando este fala sobre a distino
entre a cidade dos homens e a cidade de Deus.
Segundo ele, vivemos na cidade dos homens e,
para sermos fiis a Deus, devemos deixar todos
os prazeres dessa cidade terrena e, assumindo a
dor e o sofrimento, esperarmos o momento em
que possamos ir cidade de Deus. Nesse caso,
podemos dizer que a felicidade na Terra no
trazida pelo prazer, mas a dor seria o caminho
para a felicidade perfeita e plena.
06. O argumento mais legtimo para defender o
ceticismo justamente o de que o conhecimento
verdadeiro no possvel, pois muitas so as
respostas para as mesmas questes. Se muitas so
as respostas, e vrias so plausveis e sustentadas
pela razo, qual delas seria verdadeira? Como
exemplo dessa tese, temos Descartes, que rejeita
as bases filosficas que sustentavam as cincias
justamente porque poderiam ser colocadas
em dvida. Se algo realmente verdadeiro,
tal verdade deve se legitimar por argumentos
irrefutveis. No possvel pensar em uma
cincia, por exemplo, a Fsica Moderna, em que
os resultados dos clculos podem ser superados,
encontrando-se outros resultados para o mesmo
movimento dos corpos. Porm, a realidade das
cincias humanas outra, diferentemente das
cincias exatas. Se, nestas, a verdade deve
permanecer sempre a mesma, naquelas, pelo
fato de terem como objeto o homem, e sendo
este essencialmente indeterminado, poderamos
pensar que as verdades dessas cincias podem
ser aprimoradas ou, mesmo, totalmente refeitas
com o passar do tempo.
07. O estoicismo a corrente filosfica do Perodo
Helenstico que prega a total resignao do
homem diante dos acontecimentos da vida para se
atingir a felicidade. Nesse caso, o homem deveria
construir uma fortaleza interior de modo que as
vicissitudes da vida, ou seja, os acontecimentos,
bons ou maus, no lhe tirassem do estado de paz
interior ou ataraxia. Para o estoico, o ideal seria
atingir a apatheia, que exatamente a indiferena
diante de todas as coisas, pois s por meio dessa
indiferena possvel alcanar a felicidade. Essa
ideia clara no texto de Crisipo quando ele fala
sobre o sbio, que suporta o fogo, ou seja, as
adversidades e acontecimentos externos, sem
perder contudo a paz, no sendo tais coisas
impedimento sua felicidade.
08. Representante mais importante da escola cnica,
Digenes de Sinope demonstrou o total desprezo
pelas coisas do mundo, sejam materiais ou no,
em vista de uma vida simples e feliz. Para ele,
o ideal de felicidade estaria no total desapego de
todas as coisas, a exemplo do co, que no tem
nada como seu e vive inteiramente de acordo
com sua natureza. Para os cnicos, a vida natural
a que deve fazer sentido para o homem, pois
nada que no seja parte da natureza deve ser
considerado para a busca da felicidade. O co vive
totalmente entregue sua natureza e, por isso,
vive feliz.
Seo Enem01. D
Frente A Mdulo 05
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FRENTE
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MDULOFILOSOFIA
Mic
hel
ange
lo
A Criao de Ado, de Michelangelo, pintado no teto da Capela Sistina (Detalhe)
O perodo entre a Antiguidade e o Renascimento,
preanunciado por Francesco Petrarca (1304-1374) e
batizado por este de medium aevum, ficou conhecido como
Idade Mdia. Pejorativamente chamado de Idade das
Trevas ou Noite dos Mil Anos, esse perodo sofreu com
a estagnao da poltica e da economia, devido ao sistema
feudal, e com o atraso da cincia, impedida de avanar
devido presena fiscalizadora da Igreja. Iniciando-se no
sculo V, com a queda do Imprio Romano do Ocidente
(476), quando da invaso de Roma pelos visigodos, e se
estendendo at o incio do pensamento moderno, no final
do sculo XV e incio do sculo XVI, a Idade Mdia foi
palco de profundos avanos da histria e do pensamento
ocidental, embora tenha sido amplamente criticada. As
obras de grandes pensadores, como Agostinho de Hipona,
Toms de Aquino, Pedro Abelardo e Guilherme de Ockam,
so exemplos cabais da importncia e do fervor intelectual
desse perodo. Podemos mencionar ainda a arte gtica,
presente at os dias atuais, e a fundao das primeiras
universidades a partir do sculo XI.
na Idade Mdia que acontece, de forma sistemtica,
a aproximao entre f (religio) e razo (filosofia).
Porm, tal aproximao no se deu somente a partir do
sculo V, uma vez que a religio crist teve seu incio j no
sculo I, antes da queda do Imprio Romano do Ocidente.
O pano de fundo que leva compreenso do surgimento e
do crescimento do cristianismo o Helenismo, que permitiu,
graas convivncia de vrias culturas num mesmo
territrio, uma aproximao entre o judasmo e a cultura
grega, preanunciando a filosofia crist que surgiria algum
tempo depois.
Filosofia crist: a relao entre f e razo
06 A
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18 Coleo Estudo
O primeiro pensador a buscar uma conciliao entre
religio e filosofia foi Flon de Alexandria (25 a.C.-50 d.C.).
Conhecido tambm como Flon, o Judeu, ele escreveu alguns
comentrios ao Pentateuco a partir das ideias de Plato,
fazendo uma aproximao entre a cosmologia platnica,
presente no livro Timeu, e a criao do mundo por Deus.
Plato se referiu ao Demiurgo, um semideus que criou
todas as coisas do mundo a partir das ideias inteligveis
j existentes. J para Flon, Deus criou todas as coisas a
partir de suas prprias ideias, e no de ideias tidas como
autnomas, como supunha Plato, que no provinham do
prprio Deus.
And
r T
heve
t
Flon de Alexandria
O ponto mais importante de nossa anlise consiste
justamente em nos determos na tentativa de conciliao
entre f e razo1, ou seja, entre a filosofia clssica,
principalmente a de Plato e Aristteles, e as verdades
reveladas, crena fundante do cristianismo, o que marcar
definitivamente o pensamento e o modo de ser e viver da
Idade Mdia.
Apesar de, historicamente, a Idade Mdia ter seu incio
com a queda do Imprio Romano do Ocidente no sculo V,
o pensamento medieval deve ser entendido a partir do incio
do cristianismo, no sculo I. O crescimento do cristianismo
foi um processo longo e gradativo, estendendo-se de seu
nascimento, com a morte de Cristo e a formao das
primeiras comunidades crists, at sua consolidao, com
a converso e o batismo do imperador romano Constantino,
no ano de 337, e a consequente institucionalizao da
religio crist, mais especificamente do catolicismo,
como religio oficial do Imprio Romano no ano 391.
O cristianismo foi difundido aps a morte de Jesus de
Nazar, judeu que afirmava ser o messias e que, por isso, foi
crucificado, aos 33 anos, tendo pregado uma nova maneira de
ser e viver, levantando a bandeira do amor, da compaixo e do
perdo. Aps sua crucificao, pequenas comunidades foram
formadas, principalmente como resultado da pregao dos
apstolos e de outros neoconvertidos, como Paulo de Tarso,
antes perseguidor de cristos e agora adepto do cristianismo
aps ter tido uma experincia com o Cristo ressuscitado.
Essas pequenas comunidades, em geral guiadas por um
lder local, se reuniam em assembleias para a leitura e para a
execuo de rituais que reviviam os atos e as mensagens de
Jesus Cristo. Tais reunies representaram a semente do que
ficou conhecido algum tempo depois como Igreja.
Embora seguindo um mesmo mestre como modelo, nessas
primeiras comunidades, no havia uma unidade em relao
aos ritos, aos sacramentos e mesmo leitura dos textos,
que eram comumente interpretados de maneiras distintas.
Essas diferenas poderiam provocar uma ruptura interna no
cristianismo, pois a doutrina e as crenas variavam e muitas
vezes se contradiziam. Diante disso, surgiu a necessidade de
se realizar uma institucionalizao que promovesse a unidade
da nova religio, de seus ritos, textos sagrados, doutrinas e
objetivos. Tal unidade deveria ser rapidamente confirmada,
uma vez que o cristianismo crescia vertiginosamente e
agregava, a cada dia, mais fiis, que compunham comunidades
espalhadas por toda a Judeia e pelo Oriente Mdio.
Pantocrator. Mosaico do sculo XII, que se encontra na Igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, hoje Istambul, na Turquia.
1 Este foi o principal e mais difcil problema sobre o qual os Padres da Igreja e toda a Idade Mdia tiveram de se debruar. Ser que a f contrria razo? Ser que a filosofia inimiga das verdades crists? na tentativa de conciliar f e razo que Agostinho constri uma sntese extraordinria entre a Bblia, as verdades da Igreja e a filosofia de Plato.
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Diante do desafio de se promover uma unio do
cristianismo, fazia-se urgente a construo de uma unidade
doutrinria. As perguntas fundamentais que deveriam ser
respondidas eram: Em que acreditar? Como as leis e regras
morais deveriam ser pregadas aos novos cristos? O que
permitido e o que proibido fazer? Quem e quais povos
poderiam se tornar cristos? Seriam todos os homens de boa
vontade ou somente os provenientes do judasmo? Como
defender doutrinariamente o cristianismo contra as outras
religies e seitas que surgiam na mesma poca?
Era extremamente necessrio munir o cristianismo
de explicaes lgicas e coerentes que se fizessem
compreender tanto pelos crticos da nova religio quanto
pelos intelectuais neoconvertidos. Era inaceitvel participar
de uma religio que no trouxesse consigo argumentos
inteligveis de suas bases doutrinrias, argumentos estes
que deveriam ter uma fundamentao filosfica, uma vez
que a filosofia fazia parte da vida de praticamente todos os
pensadores e intelectuais, trazida pela tradio helnica.
Para os filsofos medievais, o fato de o cristianismo
representar a Verdade era um dado inquestionvel.
A questo era saber se os homens deveriam simplesmente
acreditar na revelao crist ou se tambm deveria
haver uma compreenso dessas verdades por meio da
razo. Existiria uma relao entre os filsofos gregos
e a Bblia? Haveria uma contradio entre a revelao
de Deus aos homens, representada pela Bblia e pela
interpretao da Igreja, e a razo, representada pela
filosofia, ou ambas poderiam conviver em harmonia? Este
o desafio que representou a grande questo medieval.
Nesse sentido, cabe destacar um momento importante da
Idade Mdia, o chamado Perodo dos Padres Apologistas, que
se iniciou a partir do sculo II. Dentre os Padres Apologistas
(Apologia: defesa, justificao), o mais importante foi, sem
dvida, Justino Mrtir (100-165/167). Justino escreveu
duas importantes obras, denominadas Apologias, nas
quais busca defender o cristianismo, considerando-o
a verdadeira filosofia, contrrio, portanto, a alguns
antigos princpios filosficos que no se harmonizavam
completamente com o cristianismo. Justino foi um grande
estudioso de Plato e, ao se converter ao cristianismo,
ele reviu suas crenas na filosofia platnica, principalmente
no tocante possibilidade de, por meio dela, alcanar a
verdade.
A passagem a seguir demonstra seu posicionamento
em relao filosofia: Eu sou cristo, glorio-me disso e,
confesso, desejo fazer-me conhecer como tal. A doutrina
de Plato no incompatvel com a de Cristo, mas no se
casa perfeitamente com ela [...]. Desse modo, os Padres
Apologistas representaram uma primeira tentativa de
compreender a f crist.
So Justino Mrtir. Os mrtires eram mortos por causa da
perseguio aos primeiros cristos por parte dos romanos.
As mortes eram as mais cruis possveis. Muitos cristos foram
decapitados, outros jogados aos lees no Coliseu, outros
queimados vivos, etc. So Justino foi decapitado em 165/167.
Com os Padres Apologistas, comea a atividade filosfica
crist. A tese comum que defendem de que o cristianismo
a nica filosofia segura e til e resultado ltimo a que
a razo deve chegar. Os filsofos pagos conheceram
sementes de verdade que no puderam entender
plenamente: os cristos conhecem a verdade inteira porque
Cristo o logos, isto , a razo mesma da qual participa todo
o gnero humano. A apologtica desses padres constitui,
portanto, a primeira tentativa de inserir o cristianismo na
histria da filosofia clssica.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionrio de filosofia. 5. ed. Traduo de Alfredo Bossi. So Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 74.
Porm, o que mais nos interessa o momento posterior ao
dos Padres Apologistas, denominado Perodo dos Padres da
Igreja ou Patrstica, no qual se verifica uma crescente aceitao
da filosofia grega pelos cristos e lderes do cristianismo.
Filosofia crist: a relao entre f e razo
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20 Coleo Estudo
A imagem mais antiga de Santo Agostinho, o mais importante
pensador da Patrstica, no afresco do sculo VI, na Baslica de
Latro, em Roma.
Os Padres da Igreja constituam um conjunto de filsofos
cristos, que, principalmente a partir do sculo III,
aproximou, por meio de seus escritos e pregaes, a filosofia
grega do cristianismo.
Nesse contexto, a filosofia teve um papel primordial,
servindo como base formulao de argumentos que
defendessem de modo compreensvel a doutrina crist
frente s heresias2, comuns tanto dentro quanto fora do
cristianismo.
claro que a f ocupa lugar primordial e precedente
razo, mas, justamente pela necessidade de munir a
f de argumentos racionais, a filosofia grega se torna
imprescindvel para este processo. No entanto, no qualquer
filosofia que pode ser aceita, sendo os textos, as ideias e
os pensadores gregos cuidadosamente selecionados. Aqueles
textos, ideias ou pensadores que pudessem representar,
mesmo que timidamente, alguma ameaa doutrina
crist e revelao so deixados de lado, buscando-se
somente aqueles que servissem de base para uma nova
interpretao dos textos e dos pensamentos a partir da
lgica e da viso crist.
Dessa forma, os textos, ideias e filsofos seriam
selecionados se servissem ao objetivo da Igreja, que era o
de fortificar a f a partir desses textos, agora interpretados
luz da revelao divina.
Gus
tav
Vas
akyr
kan
Os santos triunfam sobre a heresia. Escultura de Gustav
Vasakyrkan em Estocolmo.
Essa postura crist foi amplamente difundida,
principalmente nos Conclios de Niceia (325), Constantinopla
(381) e Calcednia (451). Com o objetivo de legitimar e
construir uma doutrina que atendesse a todo o cristianismo,
as reunies da Igreja em torno de questes teolgicas e
morais se dedicaram a uma conciliao entre f e razo,
entre filosofia e revelao, que pudesse atender aos anseios
do cristianismo nascente, nessa poca, j reconhecido como
religio (313) e mais tarde elevado ao patamar de religio
oficial do Imprio Romano (391). Durante a realizao
dos Conclios, foi comum a utilizao de teorias e textos
filosficos com o intuito de defender uma postura favorvel
ao cristianismo e de condenar as heresias.
nesse momento delicado do cristianismo que a filosofia
encontra bases slidas de comunho com a doutrina crist.
Alguns conceitos dos principais filsofos gregos, Plato e
Aristteles, foram amplamente utilizados como fundamento
terico para a doutrina crist. Exemplos disso so os
conceitos de essncia, substncia, alma, corpo, ideia,
causa, entre outros. Tambm a retrica e a lgica foram
aplicadas de forma a defender a f e justificar a teologia,
fornecendo a esta as bases de uma argumentao clara a
favor das verdades reveladas.
2 Heresia: doutrina contrria a uma verdade estabelecida pela religio. Esse termo amplamente utilizado para se referir a todas
as ideias contrrias ou crticas s verdades fundamentais do cristianismo.
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Com eventos em todo o mundo em homenagem aos
200 anos de nascimento do cientista britnico, celebrados
amanh, e o 150 aniversrio de seu livro A Origem das
Espcies, lanado em novembro de 1859, o Vaticano
destacou que a Igreja Catlica nunca condenou Charles
Darwin.
Segundo o presidente do Conselho Pontifcio para a
Cultura, arcebispo Gianfranco Ravasi, o livro do cientista
britnico nunca foi parar no Index Librorum Prohibitorum
ndice de textos proibidos da Igreja.
No ltimo sculo, tanto o papa Pio XII como Joo Paulo II
se manifestaram sobre a evoluo.
Em sua encclica Humani Generis (1950), Pio XII j dizia
que o magistrio da Igreja no probe o estudo da doutrina
do evolucionismo, que busca a origem do corpo humano
em matria viva preexistente.
Naqueles tempos, Pio XII insistia em afirmar que
a f catlica manda defender que as almas so criadas
imediatamente por Deus. O pontfice encorajava um
confronto srio, moderado e temperado.
Em 22 de outubro de 1996, Joo Paulo II fez um grande
discurso na Pontifcia Academia das Cincias afirmando
que a evoluo j no era uma mera hiptese, mas uma
teoria. Aps declarar, como Pio XII, que era importante
no perder de vista alguns pontos pr-determinados, Joo
Paulo II reconheceu que a convergncia dos resultados
de trabalhos realizados independentemente nesse campo
constitua um argumento significativo a favor dessa teoria.
O antecessor de Bento XVI declarou que a Igreja estava
interessada diretamente na questo da evoluo, porque
esta influi na concepo do homem, sobre o qual disse
a Revelao mostra que foi criado imagem e semelhana
de Deus.
O papa polons ainda afirmaria anos depois que no
basta a evoluo das espcies para explicar a origem do
gnero humano, como no basta a casualidade biolgica
para explicar por si s o nascimento de uma criana.
J Bento XVI sempre defendeu a chegada f por meio
da razo, apoiando o dilogo entre f e cincia. Da mesma
forma que seus antecessores, o atual pontfice declara que
no h oposio entre a f da compreenso da criao e
a evidncia emprica da cincia.
Algumas ideias das escolas filosficas do Perodo
Helenstico tambm foram usadas como auxiliares da f,
principalmente aquelas ideias que se referem vida
simples e mortificada. Por exemplo, dos estoicos, veremos
as ideias de austeridade, sacrifcio, abnegao, disciplina
e autocontrole serem amplamente utilizadas como forma
de preparar o cristo para se tornar digno da vida futura,
depois da morte, junto a Deus.
Apesar da constante tentativa de aproximao, o problema
da relao entre f e razo ainda hoje um desafio enorme
para a Igreja e para a Filosofia. De um lado, temos os
defensores de uma verdade revelada inquestionvel e,
do outro, aqueles que defendem um conhecimento cientfico
construdo sem qualquer necessidade do transcendente.
No entanto, a prpria Igreja Catlica, em acordo com as
descobertas cientficas e com o prprio progresso da cincia,
demonstra abertura para algumas concepes cientficas
antes condenadas. o que podemos observar na reportagem
a seguir:
Vaticano considera no haver contraposio
entre f e evoluo
Juan Lara
Cidade do Vaticano, 11 de fevereiro de 2009 (EFE).
O Vaticano acredita que no existe, a priori, contraposio
entre f e a ideia da evoluo, ainda que o papa Bento XVI
no compartilhe das teorias que explicam a existncia da
humanidade s como resultado do acaso e que, para Joo Paulo II,
Darwin no bastasse para explicar a origem do homem.
J. C
amer
on
(Imagem acrescentada ao texto original)
Charles Darwin, criador da teoria da evoluo, defendida em seu livro A Origem das Espcies, publicado em 1859.
Filosofia crist: a relao entre f e razo
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22 Coleo Estudo
A filosofia grega e a tradio crist
Fran
cisc
o de
Goy
a
(Imagem acrescentada ao texto original)
Mesmo as verdades da religio precisam ser compreendidas pelos homens de forma racional.
O sono da razo produz monstros. Francisco de Goya (1897-1898)
A Grcia foi o bero verdadeiro da filosofia. Pela primeira
vez no mundo ocidental, compreendeu e realizou a filosofia
como investigao racional, isto , como investigao
autnoma que em si mesma encontra o fundamento e a
lei do seu desenvolvimento. A filosofia grega demonstrou
que a f ilosofia s pode ser procura da liberdade.
A liberdade implica que a disciplina, o ponto de partida,
o fim e o mtodo da investigao sejam justificados
e postos por essa mesma investigao, e no aceitos
independentemente dela. A influncia do cristianismo
no mundo ocidental determinou uma nova orientao da
filosofia. Toda a religio implica um conjunto de crenas
que no so fruto de qualquer investigao porque
consistem na aceitao de uma revelao. A religio a
adeso a uma verdade que o homem aceitou devido a um
testemunho superior. Tal , com efeito, o cristianismo. Aos
fariseus que lhe diziam: Tu alegas de ti mesmo e, portanto,
o teu testemunho no tem valor, Jesus respondeu:
O papa atual no compartilha, no entanto, do
evolucionismo radical. Em visita Alemanha em setembro
de 2006, criticou o que chamou de essa parte da cincia
que se empenha em buscar uma explicao ao mundo na
qual Deus suprfluo.
Joseph Ratzinger considerou na ocasio irracionais as
teorias que consideram a existncia da humanidade um
resultado do acaso e destacou que, para os cristos,
Deus o criador do cu e da terra e que para entender a
origem do mundo preciso ter Deus como ponto de referncia.
Para Bento XVI, afirmar que a fundao do cosmos e sua
evoluo esto na sabedoria divina no quer dizer que a
criao s tem a ver com o comeo do mundo e da vida.
Implica tambm que Deus abarca essa evoluo e a apoia,
a sustenta continuamente, completou recentemente o papa
na Pontifcia Academia das Cincias.
Em 2005, no incio de seu pontificado e com o objetivo
de superar os receios entre cincia e f e para recuperar
a unidade do saber, o Vaticano deu incio ao projeto Stoq
(Cincia, Teologia e Pesquisa Ontolgica, na sigla em
ingls).
O Stoq considerado um dos mais prestigiosos
programas de pesquisa existentes no mundo sobre a
relao entre cincia, filosofia e teologia.
Foi criado para ser fruto do renovado esprito de dilogo
entre teologia catlica e cincia, inaugurado pelo Conclio
Vaticano II e que culminou com a reviso do caso Galileu,
segundo afirmou o ento ministro da Cultura do Vaticano,
cardeal Paul Paupard.
Segundo Paupard, o Stoq finca as bases para uma
verdadeira mudana de mentalidade com relao cincia
dentro da Igreja Catlica.
Privilegiando conhecer a verdade, a Igreja no pode
ignorar a cincia. A religio pode purificar a cincia da
idolatria do cientificismo e dos falsos absolutos, afirmou
Paupard. EFE
Disponvel em: .
Nov. 2009. Acesso em: 3 maio 2010.
O texto que se segue mostra com clareza a necessidade
de unio entre f e razo. Segundo o autor, Nicola
Abbagnano, essa unio importante para a compreenso das
verdades de forma racional, sendo, portanto, que filosofia
e cristianismo devem se complementar em alguma medida
e no simplesmente se exclurem.
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Eu no estou s, somos eu e aquele que me enviou
(S. Joo, VIII, 13, 16), apoiando assim o valor da sua
doutrina no testemunho do Pai. A religio parece,
portanto, nos seus prprios princpios, excluir a
investigao e consiste antes numa atitude oposta,
a da aceitao de uma verdade testemunhada do alto,
independentemente de qualquer investigao. Todavia,
logo que o homem se interroga quanto ao significado
da verdade revelada e tenta saber por que caminho
pode realmente compreend-la e fazer dela carne da
sua carne e sangue do seu sangue, renasce a exigncia
da investigao. Reconhecida a verdade no seu valor
absoluto, tal como revelada e testemunhada por
um poder transcendente, imediatamente se impe a
cada homem a exigncia de se aproximar dela e de a
compreender no seu significado autntico para com ela
e dela viver verdadeiramente. Esta exigncia s pode
ser satisfeita pela investigao filosfica. A investigao
renasce, pois, da prpria religiosidade, pela necessidade
que o homem religioso tem de se aproximar, tanto quanto
lhe for possvel, da verdade revelada. Renasce com uma
tarefa especfica, que lhe imposta pela natureza de
tal verdade e pelas possibilidades que pode oferecer
sua efetiva compreenso pelo homem; mas renasce
com todas as caractersticas, prprias da sua natureza,
e com fora tanto maior quanto maior for o valor que
se atribui verdade em que se acredita e se pretende
fazer sua. Da religio crist nasceu assim a filosofia
crist. Esta tomou tambm como objetivo conduzir o
homem compreenso da verdade revelada por Cristo,
de modo a que ele possa realizar o seu autntico
significado. Os instrumentos indispensveis para este
fim encontrou-os a filosofia crist, prontos a servirem, na
filosofia grega. As doutrinas da especulao helnica do
ltimo perodo, essencialmente religioso, prestavam-se
a exprimir, de modo acessvel ao homem, o significado
da revelao crist; e com esta finalidade foram,
efectivamente, utilizadas da maneira mais ampla.
ABBAGNANO, Nicola. Histria da filosofia. Vol. II.
Traduo de Antnio Borges Coelho.
Lisboa: Editorial Presena, 1969. p. 108-109.
EXERCCIOS DE FIXAO
01. Era extremamente necessrio munir o cristianismo
de explicaes lgicas e coerentes que se fizessem
compreender tanto pelos crticos da nova religio quanto
pelos intelectuais neoconvertidos.
REDIJA um texto explicando o que significa dizer que era
necessrio munir a f de explicaes lgicas.
02. claro que a f ocupa lugar primordial e precedente
razo, mas, justamente pela necessidade de munir
a f de argumentos racionais, a filosofia grega se
torna imprescindvel para este processo. No entanto,
no qualquer filosofia que pode ser aceita, sendo os
textos, as ideias, os pensadores gregos cuidadosamente
selecionados.
REDIJA um texto explicando o posicionamento dos
pensadores cristos em relao filosofia, com base na
citao anterior.
03. O estoicismo ensina ao homem a enfrentar as vicissitudes
da vida de forma calma, resignada, tranquila e, sobretudo,
digna. Este estado alcanado por meio do autocontrole
e da austeridade prpria de uma vida disciplinada e
construda somente com o que estritamente necessrio
sobrevivncia, sem nada de luxos ou o culto s coisas
suprfluas.
REDIJA um texto explicando como o estoicismo auxiliou
o cristianismo na formulao de sua tica.
EXERCCIOS PROPOSTOS
01. REDIJA um texto explicando a impropriedade de se
utilizar o termo Idade das Trevas ou Noite dos Mil Anos
para se referir Idade Mdia.
02. REDIJA um texto explicando a importncia do Helenismo
como possibilitador da aproximao entre religio e
filosofia.
03. REDIJA um texto explicando o papel de Flon, o Judeu,
para o nascimento da filosofia crist.
Filosofia crist: a relao entre f e razo
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24 Coleo Estudo
04. O crescimento do cristianismo foi um processo longo
e gradativo, estendendo-se de seu nascimento, com a
morte de Cristo e a formao das primeiras comunidades
crists, at sua consolidao, com a converso e o
batismo do imperador romano Constantino, no ano de
337, e a consequente institucionalizao da religio crist,
mais especificamente do catolicismo, como religio oficial
do Imprio Romano no ano 391.
REDIJA um texto explicando por que, principalmente com
a institucionalizao do cristianismo como religio oficial
do Imprio Romano, se tornou urgente sua explicao
de forma racional.
05. Eu sou cristo, glorio-me disso e, confesso, desejo
fazer-me conhecer como tal. A doutrina de Plato
no incompatvel com a de Cristo, mas no se casa
perfeitamente com ela [...]
MRTIR, Justino. In: REALE, Giovanni. Histria da Filosofia:
Patrstica e Escolstica. 3. ed. So Paulo: Paulus, 2007. p. 39.
A partir da citao anterior, REDIJA um texto explicando
o posicionamento de Justino Mrtir em relao filosofia
e religio.
06. Alguns conceitos utilizados na filosofia crist foram
claramente retirados da filosofia clssica, principalmente
de Plato e Aristteles, e foram utilizados como base
para defender as verdades da f. Dentre esses conceitos,
so importantes os de essncia e alma / corpo retirados
de Plato. REDIJA um texto explicando a relao entre
a filosofia de Plato e o cristianismo a partir desses
conceitos.
07. A aproximao entre f e razo, entre religio e
filosofia / cincia, sempre foi um desafio, principalmente
para a Igreja Catlica. Na reportagem intitulada
Vaticano considera no haver contraposio entre f
e evoluo, o reprter Juan Lara cita uma frase do
papa Joo Paulo II que diz no basta a evoluo das
espcies para explicar a origem do gnero humano,
como no basta a casualidade biolgica para explicar
por si s o nascimento de uma criana. REDIJA um
texto explicando o posicionamento da Igreja a partir da
citao anterior.
08. Todavia, logo que o homem se interroga quanto ao
significado da verdade revelada e tenta saber por que
caminho pode realmente compreend-la e fazer dela
carne da sua carne e sangue do seu sangue, renasce a
exigncia da investigao.
ABBAGNANO, Nicola. Histria da Filosofia. V. II. Traduo de
Antnio Borges Coelho. Lisboa:
Editorial Presena, 1969. p. 108-109.
No trecho anterior, vemos a necessidade da religio de
se aproximar da filosofia. REDIJA um texto explicando
a tese defendida pelo autor Nicola Abbagnano acerca de
tal aproximao.
SEO ENEM
01. (Enem2001) O texto a seguir reproduz parte de um dilogo entre dois personagens de um romance.
Quer dizer que a Idade Mdia durou dez horas?
Perguntou Sofia.
Se cada hora valer cem anos, ento sua conta est
certa. Podemos imaginar que Jesus nasceu meia-noite,
que Paulo saiu em peregrinao missionria pouco antes
da meia noite e meia e morreu quinze minutos depois, em
Roma. At