fármacos sedativo-hipnóticos

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Fármacos sedativo-hipnóticos Sedativo-hipnóticos é a classe de fármacos que possui a capacidade de produzir sedação (aliviando a ansiedade) ou estimular o sono. A grande variedade química desses fármacos faz com que sua classificação seja feita com base em seus usos clínicos e não na sua estrutura clínica. Um fármaco sedativo (sinônimo de ansiolítico) de efeito deve reduzem a ansiedade e produzir um efeito calmante. Um fármaco hipnótico deve produzir sonolência e causar o início e a manutenção do sono. Farmacocinética A maioria dos fármacos sedativo-hipnóticos tem como característica a depressão da função do sistema nervoso central (SNC), porém fármaco possui uma relação entre a dose e o grau de depressão do SNC, ou seja, os efeitos dependem da dose administrada para cada fármaco. Vale-se considerar os níveis de depressão do SNC: Coma > Anestesia > Hipnose > Sedação. Agentes sedativo-hipnóticos mais antigos possuem uma curva dose-resposta com inclinação linear (Figura 1), isto significa que com o aumento da dose acima do necessário para fins terapêuticos (sedação) pode levar ao estado de anestesia geral e em casos de administração de doses ainda mais altos, ao coma e à morte. Estas características são típicas do grupo dos barbitúricos (agentes sedativo-hipnóticos mais antigos). Este mesmo padrão de curva dose-resposta não é encontrado nos benzodiazepínicos, sendo este o grupo de fármacos sedativo-hipnóticos criados para substituir os barbitúricos devido aos seus efeitos tóxicos e, portanto, são mais seguros. A absorção dos sedativo- hipnóticos depende de vários fatores, incluindo a lipofilicidade. Em sua grande diversidade, a maioria é absorvida bastante rapidamente no sangue após administração por via oral (Quadro 1). Farmacologia Figura 1 - Curvas de dose-resposta para dois sedativo-hipnóticos hipotéticos. Fonte: KATZUNG, 2010.

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Resumo - Farmacologia

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Page 1: Fármacos sedativo-hipnóticos

Fármacos sedativo-hipnóticos

Sedativo-hipnóticos é a classe de fármacos que possui a capacidade de

produzir sedação (aliviando a ansiedade) ou estimular o sono.

A grande variedade química desses fármacos faz com que sua classificação

seja feita com base em seus usos clínicos e não na sua estrutura clínica.

Um fármaco sedativo (sinônimo de ansiolítico) de efeito deve reduzem a

ansiedade e produzir um efeito calmante. Um fármaco hipnótico deve produzir

sonolência e causar o início e a manutenção do sono.

Farmacocinética

A maioria dos fármacos sedativo-hipnóticos tem como característica a

depressão da função do sistema nervoso central (SNC), porém fármaco possui uma

relação entre a dose e o grau de depressão do SNC, ou seja, os efeitos dependem da

dose administrada para cada fármaco. Vale-se considerar os níveis de depressão do

SNC: Coma > Anestesia > Hipnose > Sedação.

Agentes sedativo-hipnóticos mais antigos possuem uma curva dose-resposta

com inclinação linear (Figura 1), isto significa que com o aumento da dose acima do

necessário para fins terapêuticos (sedação) pode levar ao estado de anestesia geral e

em casos de administração de doses ainda mais altos, ao coma e à morte. Estas

características são típicas do grupo dos barbitúricos (agentes sedativo-hipnóticos mais

antigos). Este mesmo padrão de curva dose-resposta não é encontrado nos

benzodiazepínicos, sendo este o grupo de fármacos sedativo-hipnóticos criados para

substituir os barbitúricos devido aos seus efeitos tóxicos e, portanto, são mais seguros.

A absorção dos sedativo-

hipnóticos depende de vários

fatores, incluindo a lipofilicidade. Em

sua grande diversidade, a maioria é

absorvida bastante rapidamente no

sangue após administração por via

oral (Quadro 1).

Farmacologia

Figura 1 - Curvas de dose-resposta para dois sedativo-hipnóticos

hipotéticos. Fonte: KATZUNG, 2010.

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TOMAZ-MORAIS, JF. 2012

QUADRO 1 - Lipossolubilidade de alguns benzodiazepínicos.

Maior Lipossolubilidade Menor Lipossolubilidade Diazepam Oxazepam

Triazolam Lorazepam

Poucos são os sedativo-hipnóticos excretados do corpo em sua forma

inalterada, a grande maioria precisa ser transformada em metabólitos mais

hidrossolúveis e a sua meia-vida de eliminação dependerá da taxa de transformação

metabólica. Para isto, a ação dos sistemas enzimáticos de metabolismo no fígado se faz

muito importante. A depuração de todos os benzodiazepínicos é feita pelo

metabolismo hepático. As taxas de metabolismo vão depender de cada fármaco,

porém, geralmente, todos sofrem reações de fase I catalisadas por isozimas do

citocromo P450, principalmente a CYP3A4, que são posteriormente conjugados em

reações de fase II formando glicuronídeos com o objetivo de tornar as moléculas mais

hidrossolúveis para serem excretadas através da urina (Quadro 2). No caso dos

barbitúricos, a taxa de metabolismo hepático depende de cada fármaco, porém

geralmente é lenta. As vias de metabolismo também envolvem oxidação por enzimas

hepáticas, formando álcoois, ácidos e cetonas que aparecem na urina como

conjugados glicuronídeos. Apenas uma quantidade insignificante dos barbitúricos é

excretada pela urina em sua forma inalterada. Fármacos sedativo-hipnóticos que possuem meia-vida curta de eliminação,

mais facilmente induzem tolerância e dependência. A dependência que pode ser

psicológica (menos grave) ou fisiológica (mais grave, por estar relacionada a síndromes

de abstinência1). A meia-vida curta de eliminação de alguns fármacos favorece o seu

uso como hipnótico do que como sedativo, como é o caso do triazolam.

QUADRO 2 - Meia-vida de eliminação de metabólitos de alguns benzodiazepínicos.

Meia-vida longa de eliminação Meia-vida curta de eliminação Clordiazepóxido Alprazolam

Diazepam Triazolam

Prazepam * Relativamente curta: Estazolam,

Oxazepam e Lorazepam. Clorazepato

Os metabólitos hidrossolúveis dos sedativo-hipnóticos dos fármacos sedativo-

hipnóticos são formados geralmente por metabólitos de fase I e excretados pelo rim. O

fenobarbital é um ácido fraco (pKa de 7,4), sua taxa de eliminação pode ser aumentada

através da alcalinização da urina devido a ionização em pH alcalino.

Principais parâmetros farmacocinéticos: (1) são bem absorvidos no trato

gastrointestinal (quando administrados por via oral), (2) alta lipossolubilidade e início

1 Causando efeitos opostos aos produzidos pelo fármaco: tremores, ansiedade, insônia, excitabilidade do SNC. Caso

não seja tratados os sinais de abstenção podem evoluir para convulsões e paradas cardíacas.

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TOMAZ-MORAIS, JF. 2012

de ação rápido, (3) altas taxas de formação de metabólitos ativos, (4) possuem volume

de distribuição aparente (se acumulam no tecido adiposo), (5) atravessam a barreira

placentária (pode sedar o feto) e se administrado durante a gravidez pode ter efeito

teratogênico (responsável por malformações congênitas), (6) se ligam extensamente às

proteínas plasmáticas (a administração de dois fármacos deste grupo indicam

competição, passando de efeito terapêutico para tóxico), (7) por ser altamente

lipossolúvel precisa ser biotransformado para ser excretado, (8) reação de fase I

(principalmente CYP3A4, formando o metabólito desmetildiazepam), (9) reações de

fase II (conjugados formando ácido glicuronil, excretado na urina hidrossolúvel e

inativo).

QUADRO 3 - Inibidores e indutores da isozima CYP3A4

Cetoconazol, antibióticos

macrolídeos, etanol.

Inibem a

CYP3A4

Intensificam os efeitos dos

benzodiazepínicos.

Rifampicina, omeprazol,

nifepidina (anti-hipertensivos).

Induzem a

CYP3A4

Reduzem os efeitos dos

benzodiazepínicos (aumentando a taxa de

biotransformação e excreção).

Farmacodinâmica

Os fármacos sedativo-hipnóticos ligam-se aos componentes moleculares do

receptor GABAA. O receptor GABAA atua como canal de íons cloreto ativado pelo GABA

(principal neurotransmissor inibitório do SNC). Eles agem como moduladores

alostéricos positivos aumentando a ação do GABA ao aumentar sua afinidade pelo seu

sítio de ligação. Os benzodiazepínicos e barbitúricos se ligam ao seu sítio de ligação no

receptor GABAA, aumentando a afinidade do GABA no seu sítio de ligação. O aumento

do influxo de íons cloreto, induzido pela interação dos benzodiazepínicos com o GABA,

causam o efeito depressor do SN do GABA por aumentar a frequência de abertura dos

canais de íons cloreto associados, no caso dos barbitúricos o mesmo efeito é dado em

decorrência do aumento na duração de abertura dos canais de íons cloreto regulados

pelo GABA. Em altas concentrações os barbitúricos possuem ação GABAmimética, ou

seja, ativam diretamente os canais de íons cloreto.

Os barbitúricos por serem muito lipossolúveis são usados para induzir

anestesia geral, porém não para sua manutenção. O término do efeito anestésico está

mais associado à saída do SNC para a circulação sistêmica do que sua

biotransformação e excreção.

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TOMAZ-MORAIS, JF. 2012

QUADRO 4 - Características de barbitúricos e benzodiazepínicos

Barbitúricos Benzodiazepínicos Ações menos seletivas. Ações mais seletivas (mais seguros).

Indutores enzimáticos. Não são indutores enzimáticos

Não possui antagonista2. Possui antagonista (Flumazenil).

Induzem anestesia geral. Não induzem anestesia geral.

*Outras ações: antiepilépticos, não são relaxantes

musculares,

*Outras ações: relaxante muscular,

anticonvulsivante.

QUADRO 5 - Ligantes dos locais de ligação dos benzodiazepínicos..

Agonistas Facilitam as ações do GABA. Zolpidem, zaleplona e ezcoplicona.

Antagonistas Bloqueia as ações apenas dos benzodiazepínicos e seus agonistas.

Flumazenil.

Agonistas inversos

Sua interação com os sítios de ligação dos BZ no receptor GABAA tem efeito ansiogênico.

ß-carbolinas.

Todos os sedativo-hipnóticos induzem o sono quando administrados em

doses suficientemente altas. Os efeitos dos benzodiazepínicos sobre o sono são os

seguintes (a) diminui a latência do sono (tempo até adormecer é reduzido), (b) diminui

os despertares (acorda menos durante a noite), (c) aumenta o tempo total de sono.

Algumas características do sono induzido pelo uso de drogas hipnóticas são diferentes

do sono fisiológico, sendo ressaca, cefaléia e sonolência durante o dia os sinais e

sintomas mais frequentes após o uso destes fármacos.

Efeitos indesejáveis

1) Efeitos sobre o desempenho motor (reflexos reduzidos, com diminuição da

velocidade de desempenho e do tempo de reação);

2) Efeitos sobre a memória (amnésia anterógrada); 3) Efeitos cardiocirculatórios (diminuição da atividade do centro vasomotor no

bulbo). 4) Efeitos no sistema respiratório;

* Se utilizados por longo prazo podem reduzir as habilidades cognitivas; são utilizados

para suicídio (superdosagem); interação perigosa entre benzodiazepínicos/barbitúricos e

bebidas alcoólicas (etanol).

2 Em casos de intoxicação o tratamento é feito com a alcalinização do pH urinário (ácido fraco).

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TOMAZ-MORAIS, JF. 2012

Referência

TREVOR, A. J. WAY, W. L. Fármacos sedativo-hipnóticos. In: Farmacologia

Básica e Clínica. KATZUNG, Bertram G. Ed. McGraw-Hill. 10ª Edição, 2010

Questões

1) Quais as razões que levaram a substituição dos barbitúricos pelos

benzodiazepínicos no tratamento da ansiedade?

2) Quais destes fármacos tem maior probabilidade de causar síndrome de

abstinência: Alprazolam ou Diazepam? Explique por quê.

3) Como os benzodiazepínicos e barbitúricos agem para potencializar a

neurotransmissão GABAérgica?

4) O que é tolerância? Como se propõe explicar a tolerância induzida pelo

Fenobarbital?

5) Qual o mecanismo de sinalização envolvido na indução da CYP3A4 pela

Rifampicina?