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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA-FESP CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO DIANA CRISTINA SANTOS A LEI MARIA DA PENHA E A RETRATAÇÃO PENAL JOÃO PESSOA 2015

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA-FESP CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

DIANA CRISTINA SANTOS

A LEI MARIA DA PENHA E A RETRATAÇÃO PENAL

JOÃO PESSOA 2015

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DIANA CRISTINA SANTOS

A LEI MARIA DA PENHA E A RETRATAÇÃO PENAL

Trabalho de conclusão de Curso em forma de Artigo científico apresentado à Coordenação do Curso de Bacharelado em Direito, pela Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – Fesp, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Área: Direito Penal Orientadora: Prof.ª Esp. Juliana Porto Vieira

JOÃO PESSOA

2015

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S237a Santos, Diana Cristina. A lei Maria da Penha e a retratação penal. / Diana Cristina Santos. –

João Pessoa, 2015.

25f. Orientadora: Profª. Esp. Juliana Porto Vieira. Artigo Científico (Graduação em Direito).Faculdades de Ensino Superior

da Paraíba – FESP

1. Violência Doméstica. 2. Violência contra a Mulher. 3. Retratação Penal. 4. Lei Maria da Penha. I. Título

BC/Fesp CDU: 343 (043)

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DIANA CRISTINA SANTOS

A LEI MARIA DA PENHA E A RETRATAÇÃO PENAL

Artigo Científico apresentado à Banca Examinadora de Artigos Científicos da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP, como exigência para a obtenção do grau de Bacharel em Direito.

APROVADO EM____/______2015

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

Prof.ª Esp. Juliana Porto Vieira ORIENTADORA-FESP

____________________________________

Prof. Esp. Pablo Juan Nóbrega de Souza MEMBRO – FESP

____________________________________

Prof. Esp. Ricardo Sérvulo Fonseca da Costa MEMBRO - FESP

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AGRADECIMENTOS

Acima de tudo, a Deus, pela vida, saúde e coragem.

A minha família, que sempre me apoiou, especialmente, a minha mãe.

A todos que colaboraram de alguma maneira durante a trajetória de

construção deste trabalho. Muito obrigada.

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SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................... 06

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 06

2 CONCEITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO ÂMBITO DA LEI 11.340\06 ........ 07

3 PRINCIPAIS TIPOS DE VIOLÊNCIA .................................................................... 10

4 PRINCIPAIS INOVAÇÕES DA LEI 11.340/06 ....................................................... 11

5 RETRATAÇÃO E RENÚNCIA............................................................................... 14

6 DADOS ESTATISTICOS ORIUNDOS DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

DA CAPITAL (JOÃO PESSOA – ESTADO DA PARAÍBA), REFERENTE AOS

CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ................................................................ 17

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 19

ABSTRACT ............................................................................................................... 20

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 20

APÊNDICE ................................................................................................................ 22

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A LEI MARIA DA PENHA E A RETRATAÇÃO PENAL

DIANA CRISTINA SANTOS*

JULIANA PORTO VIEIRA**

RESUMO

Violência doméstica é um tema polêmico, que se concretiza objetivamente através de da ação de vários tipos de agressores, tanto no âmbito doméstico como familiar, compreendendo pessoas ligadas ao seio familiar, podendo ser conjugal, em razão de parentesco, ou aquela praticada no espaço caseiro, envolvendo pessoas com ou sem vínculo familiar. Este trabalho teve como objetivo analisar os institutos da retratação/renúncia no âmbito da legislação comum e especial (Lei 11.340\06), que é causa de extinção de punibilidade nos crimes contra a honra (calúnia e difamação) e ameaça, deixando de citar a injúria, em face de a lei não prever tal instituto quanto a esse crime, enfatizando, ainda, com base em dados percentuais originados da vara privativa de violência doméstica e familiar da Capital, a possibilidade, no período de 06 meses de sua instalação, de reincidência ou não dos agressores beneficiados com esse instituto em relação às mesmas vítimas de agressão. Esta pesquisa teve caráter bibliográfico, com base em consulta à legislação, à doutrina, jurisprudência e revista.

Palavras-chave: Violência Doméstica. Violência Contra a Mulher. Retratação Penal. Lei Maria da Penha.

1 INTRODUÇÃO

Ao longo da história da humanidade, não se conhece nenhuma sociedade

que não tenha em seu percurso o registro de situações de violência de forma a

atingir os indivíduos, grupos e sociedades. Objeto de diversos estudos, a violência

não compõe a natureza humana, mas é um fenômeno biopsicossocial, complexo e

dinâmico cujo espaço de surgimento e desenvolvimento é a vida em sociedade.

Em virtude do aumento, pelo número de vítimas e pela magnitude de

sequelas orgânicas e emocionais que produz, a violência adquiriu um caráter

endêmico sendo convertida em um problema de saúde pública, em vários países,

tendo sido objeto de preocupação da justiça, da segurança pública e também dos

*Concluinte do Curso de Bacharelado em Direito da FESP Faculdade, semestre 2.015.1, e-mail:

[email protected] **

Especialista e mestranda em Ciências Criminais pela Universidade de Coimbra; Advogada;

Professora da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba - FESP, orientadora desse artigo. E-mail: [email protected]

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movimentos sociais.

Esse fenômeno doentio que se apresenta na sociedade atual não é um

fenômeno novo, existe e tem sido diagnosticado já há muitas gerações. Dentro

desse quadro, observamos a violência de diversas formas: a violência contra as

crianças, contra os idosos, a questão racial e social e a violência contra a mulher,

essa, objeto do nosso estudo, se apresenta sob diversas formas: violência física,

psicológica, sexual, patrimonial e violência moral.

Sabe-se que a violência contra a mulher é qualquer ato ou conduta baseada

no gênero que lhe cause morte, dano, sofrimento físico, sexual, psicológico, material

ou moral, tanto na esfera pública como privada. A fim de acabar com esses tipos de

violência entrou em vigor a Lei 11.340/06, a chamada Lei Maria da Penha, como

forma de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, mas

passados mais de oito anos de sua promulgação, esta lei ainda é objeto de grandes

discussões a respeito de sua constitucionalidade, principalmente em alguns artigos,

como, por exemplo, o 16 que trata acerca do instituto da renúncia à representação,

que, segundo muitos, seria retratação à representação.

Assim o presente trabalho tem como objetivo geral analisar o comportamento

da retratação penal no âmbito da legislação comum e especial, enfocando, mais

precisamente, a Lei 11.340/06, a chamada Lei Maria da Penha, no que tange a

alguns crimes a elas cominadas, principalmente nos crimes contra a honra, dando

ênfase à calúnia e à difamação, uma vez que à injúria não cabe tal instituto, bem

como também ao crime de ameaça.

Para o desenvolvimento desse trabalho, utilizou-se a pesquisa bibliográfica,

com vários autores que abordaram esse tema, bem como se utilizou de fonte

jurisprudencial, com o intuito de ratificar o conteúdo desse trabalho. Por fim,

realizou-se uma pesquisa para consolidar o estudo de caso em uma Vara

especializada em violência doméstica e familiar de João Pessoa, analisando a

reincidência desses crimes de violência doméstica, depois de um determinado

período, após o benefício da retratação.

2 CONCEITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO ÂMBITO DA LEI 11.340\06

Conceituar o fenômeno da violência é um desafio, em razão de seu caráter

polissêmico, que denota grande alargamento de nomeações, que vão desde as

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formas mais cruéis da tortura e do assassinato em massa, até aspectos mais sutis,

mas considerados opressivos na vida moderna cotidiana, como a burocracia, a má

distribuição de renda, certas normas culturais, entre outros (MORATO, 2009, p. 14).

As práticas de violências fazem parte da história da humanidade, mas nem

sempre foram percebidas como as enxergamos hoje, ou seja, as percepções variam

conforme as normatizações estabelecidas por determinada sociedade, em um dado

momento, em um determinado espaço. A noção de violência da cultura ocidental não

é a mesma que se apresenta para os povos de cultura oriental, por exemplo.

De acordo com a Lei 11.340/06, in verbis:

Configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas. II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitação (BRASIL, 2006).

Segundo Cunha e Pinto (2008, p. 48), “a agressão no âmbito da unidade

doméstica compreende aquela praticada no espaço caseiro, envolvendo pessoas

com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas, integrante

dessa aliança”.

De acordo com Morato (2009), o conceito de violência doméstica está ligado

ao conceito de território, abrangendo aqueles casos em que os envolvidos desfrutam

de certa intimidade e convivência em um espaço que pode ser concreto ou

simbólico.

A violência no âmbito da família engloba aquela praticada entre pessoas

unidas por vínculo jurídico de natureza familiar, podendo ser conjugal, em razão de

parentesco (em linha reta ou por afinidade), ou por vontade expressa (adoção)

(CUNHA; PINTO, 2008, p. 51).

Assim, de acordo com os conceitos apresentados, pode-se afirmar que a

violência é um componente das relações desiguais de gênero e, por isso, atravessa

as demais relações sociais, sobrepondo-se a elas, e manifestando-se de forma

relativamente homogênea em todas as classes e segmento sociais.

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Sabe-se que a violência contra a mulher nada mais é do que uma

manifestação das relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e

homens. Mas esta violência também poderá ocorrer pelos papéis sociais impostos a

homens e mulheres, reforçados por culturas patriarcais, que estabelecem relações

de violência entre os sexos.

Na visão de Souza e Kumpel (2008, p. 35), no inciso III, de forma ampla,

etiquetou como “violência doméstica” qualquer agressão inserida em um

relacionamento estreito entre duas pessoas, fundado em camaradagem, confiança,

amor, etc. Qualquer conceito de violência que se proponha não será universal, pois

nem toda violência é reconhecida pelo Estado como tal. A violência reconhecida pelo

sistema de justiça criminal recebe o status de crime, figura descrita nos Códigos e

leis penais, antes, especiais.

A violência de gênero ou violência contra a mulher atinge as mulheres nas

diversas etapas do ciclo da vida, desde a infância, adolescência, idade adulta e na

velhice. Observando os telejornais, vemos que a violência é uma epidemia mundial,

apresentando-se de diversas maneiras: homicídios em nome da honra, abuso sexual

doméstico, mutilação genital, estupros, tráfico de mulheres, etc.

Nosso estudo limita-se na violência reconhecida pelo Estado como criminosa,

mais especificamente na violência que chega sob as formas de lesões corporais

leves, que são os crimes definidos como ofensa à integridade corporal ou saúde de

outra pessoa. Previstas no art. 129 do Código Penal, segundo Andreucci (2013) seu

conceito se dá por exclusão, ou seja, toda lesão que não for grave, gravíssima e

seguida de morte será leve; vias de fato, que é uma contravenção penal punida

com prisão simples até três meses; ameaça, crime cujo bem jurídico tutelado pela lei

penal é a liberdade da pessoa humana, notadamente no tocante à paz de espírito,

ao sossego, à tranquilidade e ao sentimento de segurança; calúnia, cujo crime

atinge a honra objetiva, isto é, o bom nome, a reputação de que alguém goza

perante o grupo social; Difamação, segundo Greco (2011, p. 344), para que

configure difamação deve existir uma imputação de fatos determinados, sejam eles

falsos ou verdadeiros, à pessoa determinada ou mesmo a pessoas também

determinadas, que tenha por finalidade macular a sua reputação, sua honra

objetiva.E, por fim, a injúria, que equivale a falar mal, de modo a abalar o conceito

que a vítima tem de si própria.

Apesar de fazerem parte dos crimes contra a honra, que são processados por

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iniciativa da vítima, são os chamados crimes de ação penal privada, existindo,

entretanto, algumas diferenças entre eles, senão vejamos:

1. na calúnia, a imputação do fato deve ser falsa, ao contrário da

difamação que não exige a sua falsidade;

2. na calúnia, além de falso o fato, deve ser definido como crime; na

difamação, há somente a imputação de um fato ofensivo à reputação da vítima, não

podendo ser um fato definido como crime, podendo contudo, ser uma contravenção

penal;

3. na calúnia, existe uma imputação de fato e, na injúria, o que se atribui à

vítima é uma qualidade pejorativa à sua dignidade ou decoro;

4. a calúnia atinge a honra objetiva, enquanto, na injúria, atinge-se a

chamada honra objetiva.

Os crimes contra a honra além de estarem descritos no Código Penal, estão

também previstos em leis especiais, como o Código Eleitoral (arts. 324, 325 e 326),

o Código Militar (arts. 214, 215 e 216) e na Lei de Segurança Nacional (art. 26).

3 PRINCIPAIS TIPOS DE VIOLÊNCIA

Independente do nível de educação, renda, etnia ou raça a violência contra a

mulher está presente em todas as sociedades e em todas as classes sociais. E na

maioria das situações, expressam-se de forma direta, como nos casos de

espancamentos e assassinatos (física), podendo, entretanto, apresentar-se de forma

indireta, como nos casos de violência psicológica, moral e patrimonial.

A Lei nº 11.340/06, em seu art. 7º especifica as diversas formas de violência

doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: a violência física, a violência

psicológica, sexual, patrimonial e a violência moral. A violência física está inserida no

Inciso I, da supracitada lei e pode ser entendida como qualquer conduta que ofenda

sua integridade ou saúde corporal. São condutas previstas, por exemplo, no Código

Penal (CP), configurando os crimes de lesão corporal e homicídio e mesmo na Lei

das contravenções Penais, como as vias de fato (CUNHA; PINTO, 2008).

A violência psicológica pode ser definida como uma agressão emocional (tão

ou mais grave que a física) e está inserida no inciso II1 da supracitada lei. A violência

1 II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise

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sexual está inserida no art. 7º, inciso III2, da supracitada Lei e é um tipo de violência

que, não raras vezes, provocam nas vítimas, culpa, vergonha e medo, o que as faz

decidir, quase sempre, por ocultar o evento. No Código Penal, tais condutas

configuram os crimes de atentado violento ao pudor e estupro, entre outros (CUNHA;

PINTO, 2008, p. 63).

A violência patrimonial está inserida no art. 7º, inciso IV3, da supracitada. Essa

forma de violência raramente se apresenta separada das demais, servindo, quase

sempre, como meio para agredir, física ou psicologicamente, a vítima. A violência

moral está inserida no art. 7º, inciso V4, da referida Lei e segundo Cunha e Pinto

(2008), é entendida como qualquer conduta que consista em calúnia (imputar à

vítima a prática de determinado fato criminoso sabidamente falso), difamação

(imputar à vítima a prática de determinado fato desonroso) ou injúria (atribuir à vítima

qualidades negativas) normalmente se dá concomitante à violência psicológica.

Geralmente o ambiente familiar ou o ambiente fechado das relações

conjugais representam para muitas mulheres um perigo maior do que o espaço

público. Aparecem como uma das causas mais importantes de mortalidade feminina,

como se vê frequentemente nos telejornais, envolvendo marido (ex), companheiros

(ex).

4 PRINCIPAIS INOVAÇÕES DA LEI 11.340/06

A violência cometida contra a farmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes,

chegou ao conhecimento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão

degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação (BRASIL, 2006). 2 III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos (BRASIL, 2006). 3 IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades (BRASIL, 2006). 4 V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria), é um tipo de violência cujos resultados não vemos de imediato, ela vai tirando a energia de uma pessoa no seu psicológico, acabando por a levar futuramente a ter distúrbios, deixando sequelas por toda a sua vida (BRASIL, 2006).

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da Organização dos Estados Americanos (OEA), com sede nos Estados Unidos,

cujo principal objetivo era analisar as petições apresentadas, denunciando violações

aos direitos humanos (CUNHA; PINTO, 2008, p. 23).

Diante desse fato, restou uma reação do Estado brasileiro na questão do

combate à violência doméstica contra a mulher, com a criação da Lei nº 11.340/06,

com o objetivo de coibir e prevenir tal violência. Com isso, surgiram algumas

inovações que passamos agora a analisar as mais importantes, senão vejamos:

1) Determina que a mulher somente poderá renunciar à denúncia perante o

Juiz, em audiência especialmente designada para tal finalidade e ouvido o Ministério

Público. Isso se dá para evitar que a vítima seja coibida pelo agressor a renunciar à

representação, o que será mais difícil se for feita na presença do Magistrado e do

Órgão Ministerial;

2) Ficam vedadas a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar

contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem

como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa (CUNHA;

PINTO, 2008, p. 116). A intenção é ver o agressor cumprir pena de caráter pessoal,

isto é, pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos (prestação de serviços à

comunidade, limitação de fim de semana ou interdição temporária de direitos), mais

adequado ao tipo de crime em análise.

3) Retira dos Juizados Especiais Criminais a competência para julgar os

crimes de violência doméstica contra a mulher. Um dos motivos foi a banalização

dos crimes praticados contra a mulher, decorrente da brandura na lei 9.099/95

(CUNHA; PINTO, 2008, p. 126). Isso se deve ao fato de que as leis 9099/95 e

11.340/06, possuem finalidades opostas. Enquanto a Lei dos Juizados Especiais

busca evitar o início do processo penal, que poderá culminar em imposição de

sanção ao agente, a Lei Maria da Penha, procura punir com maior rigor o agressor

que age às escondidas nos lares, pondo em risco a saúde de sua família (CAPEZ,

2014). Hoje em dia, em se configurando violência doméstica a familiar contra a

mulher, qualquer que seja o crime e sua pena, não cabe transação penal nem

suspensão condicional do processo;

4) O juiz poderá conceder, no prazo de 48 horas, medidas protetivas de

urgência (suspensão do porte de armas do agressor, afastamento do agressor do lar,

distanciamento da vítima, restrição ou suspensão de visitas aos dependentes

menores, entre outras), dependendo da situação, a requerimento do Ministério

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Público ou da ofendida. A fim de garantir a sua proteção e seus familiares, a vitima

poderá pedir essas providências e outras mais, à autoridade policial e o delegado de

polícia encaminhará o expediente, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, ao

magistrado, que deverá agir de modo imediato.;

5) Modifica a ação penal no crime de lesão corporal leve, que passa a ser

pública incondicionada.

Devido a importância que tem as inovações da Lei 11.340/06, iremos nos

deter um pouco mais acerca desse tema, de modo a compreender melhor tais

inovações. Assim, observa-se que o art. 88 da lei 9099\95 diz que dependerá de

representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves (art. 129).

Já nos crimes ligados a violência doméstica, embora seja uma espécie de lesão

corporal, é forma qualificada de lesão, logo, não mais dependendo de representação

da vítima (NUCCI, 2014, p. 624).

Resta interpretar que haverá a forma qualificada da lesão quando o agente

voltar-se contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro com

quem conviva ou tenha convivido. Merece ser esclarecido, nesta oportunidade, que

a mencionada lei somente se aplica à violência doméstica praticada contra a mulher.

Dessa forma, se a violência for praticada, no âmbito domestico, contra individuo do

sexo masculino, não há vedação para a incidência da Lei 9099\95 (vedação e

suspensão condicional do processo) (CAPEZ, 2014, p. 184).

A Lei Maria da Penha, que criou mecanismos para proibir a violência

doméstica e familiar contra a mulher, fez inserir o § 11º do Código Penal,

acrescentando mais uma causa especial de aumento de pena, como segue:

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência (Incluído pela Lei nº 11.340, de 2006) (BRASIL, 2006).

A recente alteração advinda da decisão do STF na ADI (ação direta de

inconstitucionalidade) nº 4424, consolida a interpretação do art. 41 da Lei Maria da

Penha de forma a pacificar o conflito jurisprudencial e doutrinário quanto à natureza

da ação penal no crime de lesão corporal de natureza leve, garantindo a natureza

pública incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado

contra a mulher no ambiente doméstico, não importando sua extensão.

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Em recente julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, foi aplicada a

Ação Direta de Inconstitucionalidade de forma concreta, envolvendo situações que

caracterizam a materialidade do crime de lesão corporal leve:

Ementa:

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LEI MARIA DA PENHA. LESÃO CORPORAL (ART. 129, § 9º, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. PRELIMINAR. AVENTADA FALTA DE INTERESSE DE AGIR DO ÓRGÃO ACUSATÓRIO EM RAZÃO DA RENÚNCIA DA VÍTIMA AO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. CRIME DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.099/1995 NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. MATÉRIA JÁ DECIDIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ADI 4424. DESNECESSIDADE DE REPRESENTAÇÃO DA VÍTIMA. PREJUDICIAL INACOLHIDA. PLEITO ABSOLUTÓRIO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. OCORRÊNCIA DO DELITO E AUTORIA DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS. DECLARAÇÕES DA VÍTIMA FIRMES E COERENTES EM AMBAS AS FASES PROCEDIMENTAIS. CRIME NO ÂMBITO DOMÉSTICO. PALAVRA DA OFENDIDA QUE ASSUME ESPECIAL RELEVÂNCIA. LAUDO PERICIAL ATESTANDO OFENSA A INTEGRIDADE FÍSICA PROVOCADA POR ENERGIA DE ORDEM MECÂNICA. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. DECRETO CONDENATÓRIO MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC- APEL – Nº 2014.065796-7 - Terceira Câmara Criminal - Relator: Leopoldo Augusto Brüggemann. Pub. em 24/03/2015 (SANTA CATARINA, 2015).

Esse julgado ratifica o disposto acima de que a lesão corporal é um crime

classificado como de ação pública incondicionada, uma vez que independe de

manifestação da vítima. Não seria correto deixar a mulher – autora da representação

– decidir sobre o início da ação penal, pois representaria a renúncia da

representação, por medo de uma represália e mais agressões, bem como na

esperança de uma evolução do agressor, ou arrependimentos.

5 RETRATAÇÃO E RENÚNCIA

No direito penal, a retratação do agente, via de regra, funciona apenas como

circunstancia judicial para balizar a aplicação da pena. Entretanto, em algumas

hipóteses, a lei penal confere à retratação do agente o caráter de causa extintiva de

punibilidade do delito, nos casos em que a lei a admite, como nos casos dos crimes

contra a honra e falso testemunho (ANDREUCCI, 2013, p. 217).

Na visão de Masson (2010, p. 203), retratar-se significa “retirar o que foi dito,

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desdizer-se, assumir que errou, revela o propósito de reparar o mal praticado, o

intuito de dar uma satisfação cabal ao ofendido”. Ela precisa ser total e incondicional,

ou seja, deve abranger tudo o que foi dito pelo criminoso. É também ato unilateral e

deve ser anterior à sentença, pois, se posterior, torna-se ineficaz.

Nesta mesma linha, segue o entendimento de Lenza (2011, p. 259), que diz:

“retratar significa voltar atrás no que disse, assumir que errou ao fazer a imputação”.

Todavia, o próprio autor supracitado ainda observa que, para que a retratação gere

efeitos, a lei não exige que a parte ofendida a aceite. Se já existe ação em

andamento, basta que o sujeito se retrate perante o Juiz – pessoalmente ou por

petição – para que seja declarada extinta a punibilidade.

Nucci (2014) ainda afirma que, nessas duas situações acima, a manifestação

do ofendido em sentido oposto poderá ser mais vantajosa para a vítima e para o

Estado, ou seja, nos delitos contra a honra, especialmente os que se voltam contra a

reputação, no caso da calúnia e difamação, se o agente narrar a verdade, dizendo

que havia mentido, lucra mais o ofendido, pois a eventual condenação é menos

importante.

Para Andreucci (2013, p. 215), renúncia é a abdicação do ofendido ou de seu

representante legal do direito de promover a ação penal privada. A renúncia ocorre

antes do ajuizamento da ação penal privada, ou seja, dentro do prazo de 6 (seis)

meses previstos para o exercício da ação penal privada e pode ser de duas

espécies: renúncia expressa e tácita.

Nas palavras de Bitencourt (2010, p. 805), renúncia significa “a manifestação

de desinteresse de exercer o direito de queixa”, que só pode ocorrer em ação de

exclusiva iniciativa privada, e somente antes de iniciá-la. A renúncia é ato unilateral,

não dependendo de aceitação da outra parte, enquanto, por exemplo, o perdão é

ato bilateral.

Fazendo um comparativo entre a retratação e renúncia no âmbito da

legislação comum. e especial, interessante observarmos alguns pontos, senão

vejamos. Em primeiro lugar, no Código Penal a retratação refere-se ao agente que

praticou o delito, ao passo que na legislação especial, a retratação refere-se à

vítima, nos casos de violência doméstica, quando revela o desejo de não mais

continuar com a persecução penal .

Outro ponto relevante é que a renúncia somente é possível antes do

oferecimento da representação, porque, se tal já ocorreu, apenas será possível a

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retratação. Assim, em se tratando de violência doméstica, mais precisamente na

audiência do art. 16 da Lei 11.340\06, in verbis:

Art. 16: Nas ações penais públicas condicionadas a representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o Juiz, em audiência especialmente designada para tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público (BRASIL, 2006).

Esta audiência somente seria exigível para a renúncia da representação, e

não para a retratação, uma vez que a ação penal já está em andamento. Outra

questão divergente é que na legislação comum, a lei admite a retratação até o

oferecimento da denúncia, ao passo que na legislação especial admite-se até o

recebimento da denúncia, implicando de certa forma, mais chance para o réu se

livrar da persecução penal.

Observa-se que, a partir do advento da Lei Maria da Penha, os arts. 25 do

Código de Processo Penal (CPP) e 102 do CP, in verbis:

Art. 25 A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia. (BRASIL, 1941). Art. 102 A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.(BRASIL, 1940).

Estes artigos passaram a merecer uma nova leitura, de tal maneira que a

retratação, nos casos de violência doméstica e familiar, passa a ser admitida mesmo

após a oferta da denúncia. Outro ponto importante diz respeito a ausência da vítima

ao comparecimento da audiência do art. 16 da referida lei, apesar de regularmente

intimada para o ato. Indaga-se, então, o que deve prevalecer: a inicial manifestação

de vontade, tomada no calor dos fatos e logo após a agressão ou o aparente

desinteresse da ofendida, demonstrando quando deixou de comparecer a audiência

(CUNHA; PINTO, 2008, p. 115).

Alguns julgados pelos tribunais do país tem pacificado o entendimento de que

a falta de interesse na possível punição do agressor, constitui retratação tácita da

representação. Outros, porém, afirmam que a ausência da vítima à audiência do art.

16 da Lei 11.340/06, não implicou em sua desistência em dar andamento à ação

penal, e sim ratificação de seu interesse em levar adiante o feito.

Por último, quanto a questão da formalização, na legislação comum é

permitido que o agente se retrate perante o Juiz, pessoalmente, ou por petição e

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17

para que gere efeitos, a lei não exige que a parte ofendida a aceite, enquanto na

legislação especial, a lei exige que ela ocorra – perante o juiz, em audiência (art. 16

da lei Maria da Penha) especialmente designada para tal finalidade – antes do

oferecimento da denúncia e ouvido o Ministério Público. O procedimento se justifica

em razão de que, muitas vezes, a vítima é coibida pelo agressor a tal conduta, que

sabe levará a extinção do processo e possível arquivamento.

6. DADOS ESTATÍSTICOS ORIUNDOS DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DA

CAPITAL (JOÃO PESSOA – ESTADO DA PARAÍBA), REFERENTE AOS CRIMES

DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Esta seção tem como objetivo descrever os acontecimentos registrados sobre

pessoas classificadas como vítimas que se retrataram nos crimes relacionados à

violência doméstica, a exemplo da calúnia, difamação e ameaça, e entraram com

outra ação de mesma natureza, contra o mesmo agressor, em decorrência dessa

retratação. Vale ressaltar que os dados referenciados foram extraídos da Vara de

Violência Doméstica e Familiar de João Pessoa.

Esta Vara foi inaugurada em 30 de janeiro de 2012, em João Pessoa, por

recomendação do Conselho Nacional de Justiça, que determinou aos tribunais, via

Resolução 128, de 17 de março de 2011, a criação de Coordenadorias Estaduais

das Mulheres em Situação de Violência Doméstica e Familiar no âmbito dos

Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal.

O período de registro dos casos compreende entre fevereiro de 2012, data da

instalação da Vara, até dezembro de 2013. Nos seis primeiros meses de

funcionamento do Juizado de Violência Doméstica e Familiar da Capital, ou seja,

entre fevereiro a agosto de 2012, cem (100) processos foram encaminhados à

audiência para fazer cumprir o que imperativamente determina o art. 16 da Lei Maria

da Penha (vide apêndice - Tabela 2), visando à retratação da vítima, lembrando que

essa retratação só poderia ocorrer na presença do Juiz, antes do recebimento da

denúncia e ouvido o Ministério Público, salientando, ainda, que essa

retratação/renúncia é uma das causas de extinção de punibilidade, o que

ocasionaria o arquivamento do processo.

Até o mês de dezembro de 2013, surgiram apenas 03 novas ações penais em

que figuravam as mesmas partes, ou seja, vítima e agressor, num percentual de 3%,

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18

conforme podemos observar na tabela abaixo.

Tabela 1 – Processos em que houve reincidência após a retratação do Art. 16 da Lei Maria da Penha PROCESSO ORIGINÁRIO

CRIMES PROCESSO APÓS A

RETRATAÇÃO CRIMES

20020120012824 CALÚNIA 0015982-83.2014.815.2002 AMEAÇA-LESÃO

20020120683996 AMEAÇA 0000193-78.2013.815.2002 AMEAÇA-LESÃO

200201102224363 AMEAÇA 0010474-93.2013.815.2002 AMEAÇA

FONTE: PESQUISA PRÓPRIA, 2014

Na Vara supracitada, a quase totalidade dos processos que entraram nesse

período, tiveram como crimes, os chamados crimes contra a honra (calúnia,

difamação e injúria), a ameaça e a lesão corporal. Geralmente, eram ações que

tinham mais de um crime envolvido, ou seja, ou tinham um dos crimes contra a

honra cumulado com o crime de ameaça, ou crimes contra a honra cumulado com a

lesão corporal, ou, ainda, ameaça cumulada com a lesão corporal.

Fazendo uma leitura empírica desses dados, percebe-se uma tendência a

que a retratação da vítima, em curto prazo, tenha inibido a reincidência desses

agressores ao cometimento de outras agressões em face das mesmas vítimas,

salientando que, nas ações penais em que tinha ocorrido o crime de lesão corporal,

havia a extinção de punibilidade apenas quanto ao outro crime, por se tratar de ação

pública condicionada à retratação da vítima, com o segmento da ação criminal

apenas em relação a este crime (lesão corporal), por se tratar de um crime de ação

pública incondicionada, cuja titularidade pertence ao Ministério Público.

Nos dados apresentados, os crimes envolvidos nessas novas ações penais

relacionavam-se na sua maioria, a crimes de lesão corporal cumulado a outro crime.

Percebe-se que, por ser um crime mais grave em relação aos demais que foram

citados, com histórico de violência e agressão de maior proporção e gravidade, há

uma tendência maior a que o agressor volte a amedrontar a vítima e perturbá-la

após a ameaça.

Essa problemática de violência está agravada, principalmente, pela falta de

autonomia financeira das mulheres que, financeiras de se sustentar, bem como

pela questão familiar, por imposição da família, mais especificamente, devido aos

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filhos.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência é um problema complexo, as soluções políticas para a sua

prevenção e erradicação são também complexas, requerendo uma compreensão

ampla da questão - ou seja, entendendo que é um problema da sociedade e do

Estado e não das mulheres, exigindo vastas e criativas ações voltadas pra diferentes

grupos sociais.

De maneira geral, qualquer política publica que promova a igualdade entre

homens e mulheres, a superação da pobreza e a construção da democracia em

todos os planos da vida social, o que inclui a vida privada, contribui para o fim da

violência porque toca diretamente em algumas de suas causas.

No entanto, para que alcancem resultados efetivos e sustentáveis é

necessário que haja intencionalidade – ou seja, que as políticas globais tenham

como propósito explicito atacar as causas de violência - e que venham

acompanhadas de políticas especificas de prevenção e combate à violência contra

as mulheres.

A violência, portanto, é um componente das relações desiguais de gênero e,

por isso, atravessa as demais relações sociais, sobrepondo-se a elas, e

manifestando-se de forma relativamente homogênea em todas as classes e

segmentos sociais

Para o enfrentamento da violência sofrida pelas mulheres das classes menos

privilegiadas, não são suficientes políticas e campanhas unicamente voltadas para

seu combate, mas o suporte de medidas que alterem o meio social em que a mulher

está inserida e que lhe ofereça uma real possibilidade de autonomia econômica,

sem a qual esse ciclo perverso muito dificilmente será rompido.

A Lei Maria da Penha surgiu para coibir, prevenir e erradicar a violência

doméstica e familiar contra a mulher, tanto no âmbito doméstico como familiar e

acabar com a banalização desse crime, mas ainda há algumas lacunas na lei que

geram algumas dúvidas quanto a eficácia total dessa lei, o que não devemos tirar o

mérito do legislador quando a elaborou.

Infelizmente as mulheres que são vítimas de violência preferem se ver

agredidas, tanto física quanto psicológica, a ver seus maridos\companheiros na

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cadeia, e com isso, quando comparecem na delegacia para fazer a denúncia e fica

sabendo que tal denúncia poderá levá-lo para a cadeia, desistem ou se retratam

quando o crime permite, no caso da calúnia, difamação e ameaça.

Essa retratação ou renúncia foi objeto de estudo do presente trabalho que

abordou esse tema e fez também uma descrição dos acontecimentos conforme os

registros obtidos da vara especializada da mulher de João Pessoa sobre pessoas

classificadas como vítimas que se retrataram nos crimes relacionados à violência

doméstica, a exemplo da calúnia, difamação e ameaça, e entraram com outra ação

de mesma natureza, contra o mesmo agressor, em decorrência dessa retratação

durante o primeiro ano de sua instalação e funcionamento.

Verificando os percentuais apresentados, percebe-se uma tendência a que a

retratação da vítima, em curto prazo, tenha inibido a reincidência desses agressores

ao cometimento de outras agressões em face das mesmas vítimas, bem como

também as novas ações apresentaram-se com crimes mais graves que o anterior,

com histórico de violência e agressão de maior proporção e gravidade.

THE MARIA DA PENHA LAW AND THE CRIMINAL RETRACTION

ABSTRACT

Domestic violence is a controversial topic, which is realized objectively through the action of various types of offenders, both domestically and family, including persons connected with their families, being married, because of kinship, or that practiced in the home space involving people with or without family ties. This study aimed to analyze the institutes that disclaimer/waiver under the common and special legislation (Law 11.340\06), which is the cause of extinction of criminal liability for crimes against honor (libel and slander) and threat, failing to cite injury, in the face of the law does not provide for such institute regarding this crime, further emphasizing originated based on percentage of private data stick of domestic and family violence in the capital, the possibility, in the period of 06 months of their installation, recidivism of offenders or not benefit from this institute in relation to the same victims of aggression. This research was bibliographical, based on consultation to legislation, doctrine and jurisprudence magazine. Keywords: Domestic Violence; Violence Against Women; Criminal Retraction; Maria da Penha Law.

REFERÊNCIAS

ANDREUCCI, R. A. Manual de direito penal. 9. ed. São Paulo. Saraiva, 2013.

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BITENCOURT, C. R. Tratado de direito penal. Parte Geral. 15. São Paulo. Saraiva, 2010. BRASIL. Lei 11.340/2006, de 07 de agosto de 2006. Lei Maria da Penha. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>. Acesso em: 29 abril 2015. CAPEZ, F. Curso de processo penal. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. CUNHA, R. S.; PINTO; R. B. Violência doméstica. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2008. GRECO, R. Código penal comentado. 5. ed. Niterói: Impetus, 2011. LENZA, P. Direito penal esquematizado. Parte especial. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. MASSON, C. Direito penal esquematizado. 2. ed. São Paulo: Método, 2010. v. 2. NUCCI, G. de S. Manual de direito penal. 10. ed. São Paulo: Forense, 2014. MORATO, A. C. Analise da relação - Sistema de Justiça Criminal e violência domés tica contra a mulher. Brasília: Escola Superior do Ministério Público da União, 2009. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. APE – APEL – Nº 2014.065796-7 - Terceira Câmara Criminal - Relator: Leopoldo Augusto Brüggemann. Pub. em DJe 24/03/2015. Disponível em: <http://www.tjsc.jus.br>. Acesso em: 04 maio 2015. SOUZA, L. A.; KUMPEL, V. F. Violência doméstica e familiar contra a mulher. 2. ed. São Paulo: Método, 2008.

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APÊNDICE A

Tabela 2 – Processos que foram submetidos a audiência do Art. 16 da Lei Maria da Penha, no período de fevereiro a agosto de 2012

PERÍODO PROCESSOS CRIMES

06.03.2012 20020110529050 CALÚNIA\INJÚRIA

06.03.2012 20020110109176 DIFAMAÇÃO

14.03.2012 20020110105125 CALÚNIA\AMEAÇA

15.03.2012 20020110106644 INJÚRIA\AMEAÇA

15.03.2012 20020110104953 INJÚRIA\AMEAÇA

20.03.2012 20020110312564 CALUNIA\AMEAÇA

21.03.2012 20020110104680 INJURIA\AMEAÇA

21.03.2012 20020120595444 DIFAMAÇÃO\AMEAÇA

28.03.2012 20020120644584 CALÚNIA

09.04.2012 20020120010943 CALUNIA\INJURIA

12.04.2012 20020120010935 CALUNIA\AMEAÇA

12.04.2012 20020110107055 AMEAÇA

12.04.2012 20020110145212 CALUNIA\INJURIA

19.04.2012 20020100304100 CALUNIA

08.05.2012 20020111190101 AMEAÇA

08.05.2012 20020120010703 INJURIA\AMEAÇA

08.05.2012 20020110440696 AMEAÇA

08.05.2012 20020120578121 INJURIA E AMEAÇA

10.05.2012 20020120689027 INJURIA\AMEAÇA

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PERÍODO PROCESSOS CRIMES

10.05.2012 20020120707316 CALUNIA

10.05.2012 20020120577818 INJURIA\AMEAÇA

10.05.2012 20020120708637 INJURIA

16.05.2012 20020110224876 CALUNIA\LESÃO CORPORAL

16.05.2012 20020110525108 AMEAÇA

16.05.2012 20020110102619 AMEAÇA

16.05.2012 20020110415284 INJURIA

16.05.2012 20020120011065 AMEAÇA

17.05.2012 20020110045917 AMEAÇA

17.05.2012 20020110107774 AMEAÇA

17.05.2012 20020110420466 AMEAÇA

23.05.2012 20020120817362 CALÚNIA\AMEAÇA

23.05.2012 20020080393024 AMEAÇA-PRESCRIÇÃO

23.05.2012 20020090349818 VIAS DEFATO\AMEAÇA

29.05.2012 20020120761756 INJÚRIA\AMEAÇA

29.05.2012 20020120012626 INJÚRIA\AMEAÇA

30.05.2012 20020110440639 INJÚRIA

30.05.2012 20020110109374 AMEAÇA

05.06.2012 20020090168028 AMEAÇA

05.06.2012 20020100414966 CALÚNIA\AMEAÇA

05.06.2012 20020100312277 INJÚRIA

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PERÍODO PROCESSOS CRIMES

06.06.2012 20020120012824 INJÚRIA\AMEAÇA

06.06.2012 20020120576018 AMEAÇA

06.06.2012 20020110429798 AMEAÇA

06.06.2012 20020110105158 AMEAÇA

06.06.2012 20020110044357 INJÚRIA\AMEAÇA

14.06.2012 20020110412422 DIFAMAÇÃO\AMEAÇA

14.06.2012 20020120702283 INJÚRIA\AMEAÇA

14.06.2012 20020120688979 INJÚRIA\AMEAÇA

14.06.2012 20020120683996 INJÚRIA\AMEAÇA

14.06.2012 20020012057817 INJÚRIA\AMEAÇA

18.06.2012 20020120817297 INJÚRIA\AMEAÇA

20.06.2012 20020120884222 AMEAÇA\DANO

27.06.2012 20020120010927 AMEAÇA

27.06.2012 20020110145519 AMEAÇA

27.06.2012 20020110424559 AMEAÇA

28.06.2012 20020100447099 INJÚRIA\AMEAÇA

10.07.2012 20020110440621 INJÚRIA\AMEAÇA

10.07.2012 20020120842212 AMEAÇA

10.07.2012 20020110316979 AMEAÇA

10.07.2012 20020110046626 AMEAÇA

10.07.2012 20020080403815 AMEAÇA

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PERÍODO PROCESSOS CRIMES

12.07.2012 20020120879081 INJÚRIA\AMEAÇA

19.07.2012 20020110432115 CALÚNIA\AMEAÇA

20.07.2012 20020120644725 AMEAÇA

23.07.2012 20020110441694 AMEAÇA

24.07.2012 20020090448446 CALÚNIA\AMEAÇA

24.07.2012 20020110424856 AMEAÇA

24.07.2012 20020110103732 CALÚNIA\AMEAÇA

24.07.2012 20020110529076 AMEAÇA

24.07.2012 20020110343072 AMEAÇA

24.07.2012 20020110183569 CALÚNIA\AMEAÇA

31.07.2012 20020110108335 CALÚNIA\AMEAÇA

31.07.2012 20020110011828 AMEAÇA

14.08.2012 20020110439300 CALÚNIA\AMEAÇA

14.08.2012 20020120687393 AMEAÇA

14.08.2012 20020110271703 AMEAÇA

14.08.2012 20020120933359 CALÚNIA\AMEAÇA

20.08.2012 20020120989831 AMEAÇA

20.08.2012 20020100417282 CALÚNIA\AMEAÇA

20.08.2012 20020110103021 AMEAÇA

20.08.2012 20020120593914 CALÚNIA\AMEAÇA

21.08.2012 20020120580150 AMEAÇA

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PERÍODO PROCESSOS CRIMES

21.08.2012 20020110527310 AMEAÇA

21.08.2012 20020110103930 CALÚNIA\DIFAMAÇÃO

21.08.2012 20020110103005 AMEAÇA

21.08.2012 20020110106271 AMEAÇA

22.08.2012 20020110016710 CALÚNIA\AMEAÇA

22.08.2012 20020110220452 AMEAÇA

22.08.2012 20020110104961 AMEAÇA

22.08.2012 20020120673716 INJÚRIA\AMEAÇA

22.08.2012 20020110415151 AMEAÇA\VIAS DE FATO

22.08.2012 20020120762246 AMEAÇA

29.08.2012 20020120577842 CALÚNIA\AMEAÇA

29.08.2012 20020120758442 AMEAÇA

29.08.2012 20020110224363 CALÚNIA

29.08.2012 20020120720996 AMEAÇA

29.08.2012 20020100384441 CALÚNIA

29.08.2012 20020120933532 CALÚNIA

29.08.2012 20020120761537 AMEAÇA

29.08.2012 20020100381132 CALÚNIA