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volume 5, 2010 7 Experimentos em Óptica: Uma Proposta de Reconceitualização das Atividades Experimentais Demonstrativas Jair Lúcio Prados Ribeiro e Maria de Fátima da Silva Verdeaux

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volume 5, 2010 7

Experimentos em Óptica: Uma Proposta de Reconceitualização das Atividades Experimentais Demonstrativas

Jair Lúcio Prados Ribeiro e Maria de Fátima da Silva Verdeaux

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação

Instituto de Ciências Biológicas

Instituto de Física

Instituto de Química

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS

MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE CIÊNCIAS

EXPERIMENTOS EM ÓPTICA: UMA PROPOSTA DE

RECONCEITUALIZAÇÃO DAS ATIVIDADES

EXPERIMENTAIS DEMONSTRATIVAS

JAIR LÚCIO PRADOS RIBEIRO

Proposta de ação profissional resultante da dissertação realizada sob orientação da Profa. Dra. Maria de Fátima da Silva Verdeaux e apresentada à banca examinadora como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Ensino de Ciências – Área de Concentração Ensino de Física, pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Universidade de Brasília.

Brasília – DF

Março

2010

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 03

2. A EXPERIMENTAÇÃO NO ENSINO DE FÍSICA ........................................... 04

3. REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 - A natureza da ciência para Karl Popper e Thomas Kuhn ..................................... 06

3.2 - A teoria de desenvolvimento mental de Jean Piaget ............................................. 10

3.3 - Hodson e a reconceitualização do trabalho experimental ..................................... 12

3.4 - O ideário piagetiano e a reconceitualização da atividade experimental ................ 15

4. SUGESTÃO DE ABORDAGEM DIDÁTICA

4.1 - Condições e equipamentos necessários ................................................................. 17

4.2 - Natureza dual da luz, luz e sombra ....................................................................... 18

4.3 – Fundamentos da óptica: cor .................................................................................. 22

4.4 - Reflexão: fundamentos e espelhos planos ............................................................. 32

4.5 - Reflexão da luz: espelhos esféricos ....................................................................... 38

4.6 - Refração e reflexão total da luz ............................................................................. 45

4.7 - Prismas e dispersão da luz branca ......................................................................... 56

4.8 - Lentes e óptica da visão ….................................................................................... 60

4.9 - Difração e espalhamento ....................................................................................... 66

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS …............................................................. 72

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1. INTRODUÇÃO

A proposta de trabalho descrita aqui tem como objetivo principal a apresentação

de técnicas experimentais que podem colaborar para o aprendizado da óptica. Nossa

principal preocupação concentrou-se na apresentação de experiências demonstrativas

que possam ser facilmente realizadas em sala de aula. Conjecturamos que a realização

dessas atividades experimentais demonstrativas tende a contribuir para a geração de

conflitos cognitivos no estudante, estimulando o aprimoramento dos esquemas mentais

do estudante, quando comparada à experiência didática tradicional, onde a

experimentação frequentemente está ausente.

Assim, nosso trabalho sugere uma reformulação da maneira com que os

conteúdos da óptica são abordados em sala, inspirado pela tradição newtoniana de se

estudar a luz a partir da análise e compreensão de experiências reais (NEWTON, 1704),

estimulando a atualização do conteúdo curricular tradicional do ensino de Física no

nível médio, a partir da utilização da experimentação como recurso instrucional

primário.

Uma significativa parcela das demonstrações experimentais propostas nesse

trabalho foi adaptada de sugestões presentes em artigos publicados em diversos

periódicos da área (Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Revista Brasileira de Ensino

de Física, Física na Escola, Physics Education, entre outros), colaborando para a

integração entre a pesquisa na área de ensino de ciências e a sua aplicação efetiva em

sala de aula.

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2 – A EXPERIMENTAÇÃO NO ENSINO DE FÍSICA

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio

(BRASIL, 1998), a Física não é uma disciplina estanque, fazendo parte de um ramo

maior, nominalmente as “ciências da natureza, matemática e suas tecnologias”. Por ser

considerada uma ciência da natureza, é esperado que a observação e compreensão de

fenômenos naturais explicados pelas teorias da Física estejam presentes na sua

apresentação aos alunos.

A experimentação é claramente uma parte desse processo. Observar

diretamente um fenômeno pode levar o estudante a ter uma visão absolutamente nova

ou diversa sobre o mesmo. Os próprios professores afirmam que a experimentação é

fundamental para a maior compreensão de um tema, e várias obras presentes nessa

revisão mostram falas dos próprios professores em atividade ou em formação,

corroborando essa informação (LABURÚ et al., 2007; DA ROSA e DA ROSA, 2005;

GRANDINI e GRANDINI, 2004). Por exemplo, encontramos na revisão realizada por

Alves (2006):

A maioria dos artigos que foram analisados nesta revisão de literatura aponta para encaminhamentos de possíveis soluções para a melhoria do ensino de Física, o desenvolvimento de uma educação voltada para a participação dos indivíduos, que devem estar capacitados a compreender os avanços tecnológicos atuais e a atuar de modo que suas colocações sejam mais fundamentadas, agindo de forma mais consciente e responsável diante dos grupos sociais em que convivem. Pode-se dizer que [...] o uso de atividades experimentais como estratégia de ensino de Física tem sido apontado por professores e alunos como uma das maneiras mais frutíferas de minimizar as dificuldades relativas a aprender e a ensinar Física de modo significativo. (p. 25)

Para Araújo e Abib (2003), “os autores são unânimes em defender o uso de

atividades experimentais”, em especial pela capacidade intrínseca dos experimentos de

estimular a participação ativa dos estudantes, despertando sua curiosidade e interesse,

além da tendência que a experimentação propicia para a construção de um ambiente

motivador (op. cit., 2003). A unanimidade nem sempre é conseguida, entretanto, na

efetiva aplicação de atividades experimentais em sala de aula.

Apesar da sua inegável importância como recurso instrucional (op.cit., 2003),

a atividade experimental não está sempre presente nos cursos de Física de ensino médio,

e muitas vezes apresenta sérias dificuldades para ser implantada com eficácia. A própria

literatura assim o demonstra. Apesar do grande volume de artigos que ressaltam as

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vantagens da atividade experimental, há um número também relevante de artigos que

apresentam o ponto de vista contrário: embora o trabalho experimental seja importante

para o aprendizado de física, ele raramente é utilizado ou quando o é, muitas vezes sua

importância é superestimada ou mal-compreendida. Por exemplo, encontramos em

Laburú et al. (2007):

As atividades experimentais de física são raramente utilizadas pela maioria

dos professores brasileiros. [...] Investigações apontam como justificativas [...]: indisponibilidade ou qualidade de material, excessivo número de alunos em sala de aula, formação precária dos professores, pouca bibliografia para orientá-los, restrições institucionais [...], disponibilidade da sala de laboratório (TSAI 2003: 855, apud op. cit., 2007), ausência de horário específico, necessidade de laboratorista, inexistência de programação e articulação entre atividades experimentais com o curso (RICHOUX e BEAUFILS, 2003; GARCIA et al., 1995, apud op. cit., 2007), falta de atividades preparadas, ausência de tempo para o professor planejar e montar suas atividades, carência de recursos (BORGES, 2000; PESSOA et al., 1985, apud op. cit., 2007). (p. 306)

Já Hodson (1994) alega que o trabalho experimental, mesmo quando realizado

por um professor habilitado para tal, não necessariamente se mostrará eficaz:

Muitas das dificuldades discutidas previamente se devem à maneira irreflexiva com que os planejadores dos currículos e os professores empregam o trabalho experimental. Em poucas palavras, (o trabalho experimental) é suprautilizado e subutilizado. Usa-se em demasia no sentido que os professores usam as experiências como algo normal e não como algo extraordinário, com a ideia que servirá como um "dispositivo automático de entrada" que permitirá alcançar todos os objetivos da aprendizagem. É subutilizado no sentido que somente em poucas ocasiões seu real potencial está sendo alcançado completamente. Ao contrário, a parte grande das práticas que são oferecidas é mal concebida, são confusas e lhes falta o real valor educativo. (p.306, tradução nossa)

Percebe-se dos artigos expostos que não há apenas uma necessidade de um

maior uso da experimentação para o ensino de ciências, mas também a realização de

experiências que sejam capazes de levar o estudante a realmente compreender os

métodos das ciências naturais. Em outras palavras, a prática experimental deve ser

revista, ou reconceitualizada. A reconceitualização do trabalho experimental é a

proposta central do artigo de Hodson e funciona como a mola-mestre desse trabalho.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 – A natureza da ciência para Karl Popper e Thom as Kuhn

A concepção de ciência que um professor adota traz inevitáveis consequências à

sua prática didática. A natureza da ciência é um tema discutido especialmente pelos

filósofos da ciência, entre os quais historicamente se destacam Karl Popper, Thomas

Kuhn, Imre Lakatos, Paul Feyerabend e Gaston Bachelard. Em particular, corroboramos

nesse trabalho com a visão que os dois primeiros autores apresentam, e faremos aqui

uma rápida exposição de suas ideias. Pessoalmente, acreditamos que a inclusão das

ideias de Popper e Kuhn em uma proposta de ensino pode e deve ser buscada, pois a

presença da filosofia da ciência no currículo escolar é praticamente inexistente, mesmo

que apenas como uma linha-mestra.

Talvez a principal questão investigada por Popper e Kuhn seja a natureza do

conhecimento científico, em contraste com o conhecimento comum, dito informal. A

princípio, pode-se afirmar que “não existe uma única natureza da ciência” (MILLAR,

1993, apud DRIVER et al., 1999, p.2). Pode-se considerar que o conhecimento

científico é simbólico (ou seja, os objetos científicos não são “naturais”, e sim

“construções mentais” para interpretar os fenômenos naturais) e socialmente construído

(isto é, o conhecimento científico é elaborado através de mediações sociais, que o dotam

de certo relativismo).

Essa concepção de conhecimento científico como algo relativo e não definitivo

tem sua origem nas ideias do filósofo da ciência Karl Popper. Na obra de Silveira

(1991), encontramos um resumo das ideias principais de Popper sobre esse tema.

Alguns excertos são citados a seguir:

“Teorias científicas são sempre conjecturas, que podem ser refutadas. Não há uma forma de se provar a verdade de uma teoria científica, mas às vezes é possível descobrir que uma teoria é falsa.” (SILVEIRA, 1991, p.4)

“Quando uma teoria é refutada, (...) a nova teoria deverá ser capaz de explicar todos aqueles fatos corroboradores da teoria superada e os novos fatos que a refutaram. A antiga teoria pode então sobreviver como um caso limite da nova teoria.” (op. cit., p.5)

“A ciência não está interessada em teorias que pareçam ter a probabilidade de oferecer-nos melhor apreensão dos fatos. A ciência não está interessada em ter a última palavra, se isso significar o fechamento de nossas mentes ao

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falseamento das experiências, mas sim em aprender com as nossas experiências; isto é, em aprender com os nossos enganos. (POPPER, 1975, p. 331, apud SILVEIRA, 1991, p. 6)

Dos trechos citados, podemos extrair uma forte conclusão: não há uma verdade

absoluta em ciência. Esse ponto de vista foi revisitado e rediscutido posteriormente pelo

filósofo da ciência Thomas Kuhn.

É interessante perceber que, nas décadas de 1950 e 1960, quando os currículos

de ciências passaram por reformas nos Estados Unidos, tais reformas “ocorreram sem

qualquer participação de historiadores ou filósofos da ciência” (MATHEWS, 1995, p.

171). Mesmo que o texto introdutório do seminal Biological Sciences Curriculum

Studies (BSCS) já afirmasse que “a essência do ensino de ciências [...] deveria ser

mostrar algumas das conclusões da ciência sob o ponto de vista da maneira como

surgem e são experimentadas, [...] e deveria incluir também um tratamento honesto das

dúvidas e da natureza incompleta da ciência” (SCHWAB, 1963, p.41, apud

MATHEWS, 1995, p.172), a influência da filosofia da ciência no ensino de ciências

permaneceu obscura até a ascensão do construtivismo.

As ideias kuhnianas são extremamente abrangentes e têm aplicação em campos

tão diversos quanto a física, o ensino ou a economia. Sua obra fundamental é, sem

dúvida, “A estrutura das revoluções científicas” (1962). Adotamos como linha-mestre

as interpretações realizadas por Vieiral e Fernandéz (2006) e Zylbesztajn (1991).

Para Zylbesztajn (1991), “A estrutura das revoluções científicas” é uma

“tentativa de delinear uma nova imagem da ciência, em oposição àquelas disseminadas

pelo positivismo lógico na filosofia da ciência e pela historiografia tradicional” (op. cit.,

1991, p.49). Assim, para Kuhn, o avanço da ciência é cíclico: após períodos de relativa

estabilidade (chamados de ciência normal), um campo científico passa por uma

revolução e um novo paradigma se estabelece.

Vieiral e Fernandéz (2006) entendem por paradigma um marco ou perspectiva

que se aceita de forma geral por toda a comunidade científica (conjunto de cientistas

que compartilham um mesmo paradigma e realizam a mesma atividade científica), e a

partir do qual se realiza a atividade científica, cujo objetivo é esclarecer as possíveis

falhas do paradigma ou extrair todas as suas consequências. Segundo Zylbesztajn

(1991), esse paradigma é composto de generalizações simbólicas, modelos particulares,

valores compartilhados e exemplares. Como o presente trabalho não se propõe a discutir

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toda a obra kuhniana, tais conceitos não serão detalhados, até mesmo porque o próprio

Kuhn admite que a palavra paradigma é polissêmica.

Se um paradigma está em vigor e não há contestação (caso raro), diz-se que o

campo científico está em um período de ciência normal. Nesse período, busca-se

modelar a solução de novos problemas seguindo aqueles previamente encontrados.

Através da aprendizagem do conhecimento incorporado nos exemplos compartilhados,

que fazem parte do paradigma dominante, o cientista individual desenvolve um modo

de ver um grupo de fenômenos, que é próprio da comunidade à qual ele pertence

(ZYLBESZTAJN, 1991). O período de ciência normal é encarado por Kuhn como

absolutamente necessário para o progresso de um campo de conhecimento, pois os

cientistas podem se “libertar” das paixões que se exaltam nas discussões paradigmáticas

e centrar seus esforços na construção de um paradigma cada vez mais robusto.

Entretanto, em algum momento, problemas que antes eram vistos como “quebra-

cabeças” (isto é, possíveis de serem resolvidos com o paradigma dominante, em uma

primeira análise) podem se revelar insolúveis, passando então a ser encarados como

anomalias. Gera-se então um estado de crise no paradigma vigente (ZYLBESZTAJN,

1991). Durante a crise, ocorre uma proliferação de novos paradigmas, muitos dos quais

já poderiam estar parcial ou totalmente desenvolvidos, mas que não pareciam adequados

às situações anteriores. Tais “candidatos a paradigmas” competem entre si, tentando

impor-se como o enfoque mais adequado.

O estado de crise só será solucionado quando um dos novos paradigmas se

firmar (VIEIRAL e FERNANDÉZ, 2006). O novo paradigma ascendente, em geral,

encontra a resistência de membros influentes de uma comunidade; mas, se tiver sucesso

em resolver alguns problemas iniciais, irá atrair mais e mais adeptos, tornando-se

eventualmente dominante e um novo período de ciência normal tem início. Esse

processo de mudança paradigmática é chamado revolução científica. (ZYLBESZTAJN,

1991) Apesar de comumente associado a eventos que provocaram alterações radicais

nas concepções de mundo vigentes, “é legítimo empregar o termo em conexão com

mudanças menores, capazes de alterar os compromissos de uma comunidade particular,

mas nem sempre vistas como revolucionárias fora desse grupo” (Zylbesztajn, 1991).

A proposta didática contida no presente trabalho tem seu centro epistemológico

na relatividade do conhecimento científico (proposta por Popper) e na revolução

científica (proposta por Kuhn). Segundo a interpretação de Zylbesztajn (1991), o aluno

pode ser encarado como um “cientista kuhniano”, pois continuamente ele é exposto a

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crises em seus paradigmas vigentes (suas “noções prévias” ou “concepções

alternativas”), através dos exemplos providos, via de regra, pelo professor.

Na nossa proposta didática, esses exemplos são atividades experimentais

demonstrativas, planejadas especificamente para expor os flancos dos paradigmas

originais do aluno. Se bem empregados, tais exemplos podem levar à “substituição”

desses paradigmas por outros mais eficazes.

Sabemos do risco do uso do termo “paradigma” como representativo das ideias

prévias de um estudante: afinal, o termo foi cunhado por Thomas Kuhn como um

conjunto de ideias não individuais, mas sim coletivas, pelo menos no tocante à sua

aceitação pela comunidade científica. Mas acreditamos que podemos usá-lo como uma

metáfora útil, compatível com a nossa proposta didática: atividades experimentais

demonstrativas, no fundo, são oportunidades de contestação dos “paradigmas” vigentes

entre os alunos, e trazem consigo uma oportunidade para uma reflexão sobre essas

mesmas ideias, contribuindo para a aprendizagem dos estudantes.

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3.2 – A teoria de desenvolvimento mental de Jean Pi aget

Piaget é um clássico absoluto na área educacional, mas suas ideias têm

abrangência também em campos como a psicologia, a sociologia e a filosofia. E é

sempre temerário escrever sobre os clássicos, pois suas ideias já foram interpretadas e

reinterpretadas por inúmeros autores, e sempre há o risco de afirmações errôneas virem

à tona.

Piaget não concebeu, a priori, uma teoria de ensino e aprendizagem. Ferraciolli

(1999) apresenta uma argumentação para esse fato:

Uma vez contextualizada a obra de Piaget, torna-se claro que não tem do sentido se referir a um método pedagógico piagetiano. Piaget não é pedagogo, não é psicólogo, e jamais formulou uma teoria de aprendizagem. Seu objetivo maior é a busca do entendimento de como o conhecimento é construído, e nesta perspectiva ele torna-se epistemólogo. A rigor, o que existe são propostas pedagógicas que utilizam as ideias de Piaget como diretrizes para uma metodologia de trabalho didático-pedagógica visando o processo de ensino-aprendizagem.

Assim, adotaremos como linhas-guia as interpretações que Moreira (1999) e

Ferraciolli (op.cit.) nos apresentam sobre a obra de Piaget, quando aplicada (ou

recontextualizada) ao ensino de ciências.

Ferraciolli (op.cit.), ao apresentar o pensamento piagetiano, ressalta:

Jean Piaget (1896-1980) [...], investigando sobre a relação entre organismo e o meio, passa a estudar a natureza humana. Interessa-se pela inteligência humana, que considera tão natural como qualquer outra estrutura orgânica, embora mais dependente do meio do que qualquer outra. O motivo está no fato de que a inteligência depende do próprio meio para sua construção, graças às trocas entre organismo e o meio, que se dão através da ação (p. 180).

Percebe-se nas palavras do autor que Piaget apresenta uma teoria para entender

como se dá essa construção do pensamento, ou mais especificamente, o

desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Moreira (1999) nos diz que, apesar da divisão

do desenvolvimento cognitivo em fases ser o mais popular item da obra de Piaget, o

“núcleo-duro” de sua teoria é a tríade assimilação, acomodação e equilibração, além

dos conceitos de esquema e conflito cognitivo.

A assimilação ocorre quando o indivíduo incorpora a realidade percebida dentro

de um esquema mental, sem modificação do mesmo. O esquema é um construto pessoal

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de técnicas mentais que permitem o entendimento do mundo (por exemplo, a resolução

de equações de segundo grau através da fórmula de Báskara).

Alguns fenômenos, entretanto, não podem ser assimilados diretamente pelos

esquemas prévios que o indivíduo possui. Um aluno que possua um esquema para

resolver equações de primeiro grau não pode aplicá-lo diretamente na resolução de

equações de segundo grau. Diz-se que, nessas situações, o esquema existente está

submetido a um conflito cognitivo. Esse conflito só é resolvido a partir de um esforço

pessoal, chamado de acomodação, o qual surge quando a realidade assimilada provoca

modificação dos esquemas mentais do indivíduo, e permite a construção de novos

esquemas de assimilação. A atividade experimental é, ao menos potencialmente, uma

grande seara de conflitos cognitivos para o estudante.

Já a equilibração é literalmente o processo pelo qual a assimilação e a

acomodação entram em equilíbrio dinâmico, pois assimilar um novo conhecimento

envolve um processo de acomodação, que prepara o indivíduo para novos processos de

assimilação, e assim por diante. Tais processos, evidentemente, se comportam como

uma progressão geométrica que tende para um valor limite, que seria o ponto da

equilibração. Após a equilibração, o esquema mental prévio não mais existe, tendo sido

modificado e reforçado no processo de aprendizagem. Dessa forma, o desenvolvimento

se dá por uma constante busca de equilíbrio, que significa a adaptação dos esquemas

existentes ao mundo exterior (FERRACIOLLI, 1999).

A preocupação central de Piaget foi com a descrição e detalhamento desse

processo de construção e reconstrução dos esquemas mentais (MORTIMER, 1996). Os

teóricos do construtivismo deram um passo além: ideias aparentemente negligenciadas

na obra de Piaget (op. cit., 1996) foram revisitadas, com ênfase não mais na tríade

assimilação – acomodação – equilibração, mas na substituição de um esquema mental

prévio (as concepções alternativas) por um esquema mental mais robusto, que seria

produzido após o estudante passar pelo processo de mudança conceitual. O termo

mudança conceitual, em particular, é problemático na pesquisa atual em ensino de

ciências, e portanto procuramos evitá-lo, preferindo os termos evolução conceitual ou

formação de perfis conceituais.

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3.3 – Hodson e a reconceitualização do trabalho exp erimental

Apesar das críticas ao trabalho experimental, apresentadas no capítulo

anterior, Hodson apresenta razões significativas para o desenvolvimento de práticas

experimentais com os alunos, afirmando que são poucas as pesquisas que já se

preocuparam em medir a eficiência de tal recurso para o ensino de ciências (HODSON,

1994). O trabalho laboratorial supostamente apresenta algumas vantagens intuitivas:

segundo o autor, os professores de ciências tendem a acreditar que o trabalho

experimental pode ser útil, para: a motivação do interesse do aluno; o ensino das

técnicas e métodos laboratoriais; a melhoria da aprendizagem dos conhecimentos

científicos; a apresentação de noções sobre os métodos da ciência; o desenvolvimento

de uma “atitude científica”, como a consideração das ideias de colegas (op. cit., 1994).

Hodson não chega a negar tais pressupostos intuitivos, mas propõe uma

análise crítica sobre cada um deles, perguntando se o trabalho laboratorial realmente

motiva os estudantes, se os alunos realmente adquirem técnicas laboratoriais a partir dos

trabalhos escolares, se o trabalho experimental realmente ajuda na compreensão dos

conceitos científicos, qual a imagem que o aluno adquire sobre os métodos da ciência e

até que ponto o trabalho prático favorece o desenvolvimento de uma “atitude científica”

por parte do aluno (op. cit., 1994). A seguir, é apresentado um rápido resumo da

argumentação desenvolvida pelo autor.

- Sobre a motivação: a maior motivação do aluno pelo trabalho experimental,

especialmente em laboratório, é a chance de colocar em prática métodos mais ativos de

aprendizagem, além da interação mais livre com o professor e com outros alunos, e não

a chance de conduzir a investigação de um conceito científico. Em outras palavras, o

estudante aprecia a atividade experimental não exatamente pela experiência a ser

apresentada ou realizada, mas pela fuga do modelo tradicional de aulas expositivas.

- Sobre o ensino das técnicas e métodos laboratoriais: pesquisas demonstram

que experiências laboratoriais didáticas não promovem a aquisição de nenhuma dessas

destrezas, mesmo que o aluno tenha alguns anos de experiência com atividades em

laboratório (TOOTHACKER, 1983; NEWMAN, 1985; apud op. cit., 1994).

Dificuldades como leitura de instrumentos, montagem de experiências, dificuldades

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com construção de gráficos (incluindo suas escalas) e zeragem de instrumentos se

mantiveram, apesar da prática constante.

- Sobre a melhoria na aprendizagem dos conhecimentos e dos métodos da

ciência: é frequente que o trabalho prático individual se revele contraproducente, dando

origem a um entendimento distorcido da metodologia científica.

- Sobre o desenvolvimento de atitudes científicas: acredita-se que os alunos,

apesar de terem contato com o trabalho experimental, continuam com a visão

estereotipada do cientista como um ser com características inatas, tais como a

objetividade e a neutralidade.

Enfim, as ideias intuitivas sobre as vantagens didáticas dessa atividade não são

corroboradas pelas pesquisas. Felizmente, Hodson apresenta as vantagens do trabalho

de laboratório, e acaba nos levando a repensá-lo. Para o autor, deve ser buscada a

reconceitualização das atividades experimentais. Simplificadamente, o processo de

reconceitualização do trabalho de laboratório significa a integração do mesmo dentro de

um plano de ensino que vise ao ensino da ciência e dos seus métodos.

Segundo o autor, é comum que a atividade experimental seja utilizada em

demasia (uma ajuda para todo e qualquer objetivo de aprendizagem) ou utilizada

precariamente (pois só em poucas ocasiões se extrai o seu verdadeiro potencial). Assim,

o trabalho experimental deve-se incluir em um projeto de ensino de ciências, que releve

os seguintes aspectos:

- A aprendizagem da ciência: o trabalho experimental tende a colaborar na

produção de modificações do pensamento nos estudantes. Assim, o professor deve

procurar identificar as ideias prévias que seus alunos possuem sobre um assunto, e então

desenvolver experimentos que funcionem como estímulos para o desenvolvimento e a

possível modificação dessas ideias. Essa proposta encontra eco nas ideias de Piaget

sobre a construção do conhecimento.

- A aprendizagem sobre a natureza da ciência: a fim de garantir que os

estudantes aprendam algo sobre a natureza da ciência, o professor deve levá-los a

perceber as quatro fases principais da atividade científica: a fase de planejamento

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(formulação de hipóteses, seleção de técnicas, idealização de experimentos), a fase de

realização (coleta de dados), a fase de reflexão (exame e interpretação dos dados

experimentais, em confronto com a teoria) e a fase de registro (onde é feito um

“memorial” a respeito do evento, para uso pessoal e de outros interessados, incluindo a

descrição do procedimento, sua teoria subjacente, os dados obtidos e as conclusões). O

trabalho experimental é, sem dúvida, parte integrante desse processo, mas ele não pode

ficar restrito apenas à atividade experimental em si e ao relatório da mesma. Nas

palavras do autor: “Menos prática e mais reflexão” (op. cit., 1994, p. 308, tradução

nossa).

- Aprendizagem da prática da ciência: não basta ao estudante apenas estar

consciente da natureza de uma observação científica e dos métodos de experimentação.

É necessário que o aluno possa compreender como a ciência dá valor a uma

investigação científica, ou seja, como se coloca a ciência em prática. Para que o aluno

possa alcançar esse nível de compreensão, não basta que confrontá-lo com uma

demonstração prática de um fenômeno. Deve-se utilizar uma ampla gama de outras

técnicas ativas de aprendizagem, como o estudo de casos históricos, simulações,

reconstruções, debates e reflexão sobre experimentos.

Assim, não faz sentido abandonar o trabalho experimental em Física, ou

mesmo considerá-lo insignificante para a aprendizagem do estudante. Se

reconceitualizado segundo a proposta de Hodson, a atividade experimental pode se

revelar de grande valia para a construção do conhecimento por parte do estudante.

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3.4 – O ideário piagetiano e a reconceitualização d a atividade

experimental

Resumidamente, vemos assim a relação entre nosso referencial teórico e a

pesquisa aqui relatada: o uso de atividades experimentais demonstrativas (realizados

pelo professor) em sala de aula é uma situação especialmente preparada para o

surgimento e posterior resolução de conflitos cognitivos. A título de exemplificação do

que afirmamos, citamos a seguir uma situação presente na metodologia do nosso

trabalho.

Para apresentarmos o conceito de índice de refração aos estudantes, foi

apresentada inicialmente uma experiência onde esferas de policreatina (transparentes,

mas visíveis no ar) eram mergulhadas em água, tornando-se invisíveis nesse meio. Os

esquemas mentais prévios dos estudantes não foram, a princípio, capazes de assimilar

diretamente a experiência e explicá-la, gerando um conflito cognitivo. Assim, tornou-se

necessária nossa intervenção, apresentando o conceito formal de índice de refração e

sua relação com a velocidade da luz na água e na policreatina. Supondo que os

estudantes compreenderam a explicação do conceito, realizou-se a acomodação (a partir

da resolução do conflito cognitivo introduzido pela experiência) e posterior equilibração

(fortalecimento dos esquemas mentais). Quando perguntados em seguida sobre o porquê

de certos camarões terem o corpo invisível na água mas os olhos serem negros, por

exemplo, alguns alunos rapidamente responderam que o corpo desses animais tem o

mesmo índice de refração da água, mas os olhos não, pois estes necessitam absorver a

luz para que o animal possa enxergar.

Assim, não basta apenas apresentar a experiência aos estudantes, pois se pode

correr o risco de transformá-la apenas em um evento lúdico, sem real significância no

aprendizado dos estudantes. Deve-se buscar contextualizá-la, englobá-la em um

espectro mais amplo de fenômenos do que apenas a experiência em si, a fim de que os

esquemas mentais saiam realmente fortalecidos após a apresentação e discussão da

atividade experimental. Nesse aspecto, vemos um paralelo com a reconceitualização do

trabalho experimental proposta por Hodson. Para que o trabalho experimental tenda a

colaborar na produção de modificações do pensamento nos estudantes, ele deve ser

encarado como um manancial de conflitos cognitivos, mas somente com a reflexão

sobre a prática experimental pode-se atingir o fortalecimento dos esquemas mentais pré-

existentes.

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A notória frase do artigo de Hodson, “menos prática e mais reflexão”, aponta

nessa direção. Parafraseando o autor, acreditamos que o melhor seria buscar “mais

prática e mais reflexão”. A experimentação é parte inerente do processo de construção

científica, e portanto deve ser utilizada com a máxima frequência possível em situações

de aprendizado, mas somente se estiver subjacente a um contexto mais amplo.

No passado, acreditou-se que a prática experimental poderia induzir a mudanças

conceituais no indivíduo, e esse foi um dos focos das pesquisas com viés construtivistas.

Embora a mudança conceitual plena raramente seja alcançada (MORTIMER, 1996),

acreditamos que a incorporação da experimentação no cotidiano didático e a

reconceitualização da atividade experimental colabora, pelo menos, para uma visão

mais crítica do processo de construção do conhecimento científico. Essa condição torna

a experimentação uma técnica privilegiada de ensino, mais do que apenas um recurso

didático, mas uma parte essencial da aprendizagem das ciências naturais.

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4. SUGESTÃO DE ABORDAGEM DIDÁTICA

4.1 – Condições e equipamentos necessários

O principal requisito para o desenvolvimento da nossa proposta didática é o

escurecimento do ambiente. As atividades experimentais propostas perdem muito do

seu impacto em ambientes claros, e são às vezes impossíveis de serem realizadas.

Sabemos que nem sempre isso é possível nas salas de aula tradicionais, e portanto

procuramos ressaltar, ao longo do texto, aquelas demonstrações que apresentam bons

resultados mesmo em salas não escurecidas. A maior parte das atividades

demonstrativas sugeridas foi feita em um ambiente escurecido, a não ser quando o

oposto estiver citado explicitamente no texto. Cada aula descrita foi planejada para

ocupar dois tempos de aula tradicionais (45 ou 50 minutos cada) para ser executada. O

ideal seria realizá-las em aulas duplas (conjugadas).

A maior parte da aparelhagem necessária para a realização das atividades

experimentais descritas pode ser facilmente adquirida no comércio tradicional ou pela

rede mundial de computadores. Um apontador laser de boa qualidade é fundamental:

hoje, o comércio já os disponibiliza até mesmo em cores variadas (vermelho, verde e

azul), e com potências diversas. Para melhores resultados, recomendamos um apontador

com potência mínima de 20 mW: um apontador laser de alta potência é absolutamente

necessário se o escurecimento do ambiente não for satisfatório. Espelhos são facilmente

encontráveis em vidraçarias, lojas de artigos de maquiagem e até mesmo em lojas de

autopeças. Lentes convergentes e divergentes podem ser encontradas em ópticas ou

feiras livres, especialmente lupas de alto poder de resolução. Lâmpadas de cores

diferentes, seus suportes elétricos e abajures de fibra óptica são encontrados por preços

acessíveis em lojas de material de construção ou elétrico. Tubos e prismas de acrílico

estão presentes em lojas de artigos de decoração, as quais também vendem peças de

vidro lapidado e bases plásticas contendo lâmpadas LED nas cores primárias, e também

é possível improvisar usando garrafas de vidro. Discos de Newton podem ser impressos

em papel grosso em uma impressora comum. Algumas experiências envolvem materiais

como bulbos de lâmpadas, garrafas ou xícaras, cujo custo é virtualmente nulo. Ainda

assim, é possível até mesmo encomendar kits laboratoriais em fornecedores

especializados, se o orçamento escolar assim o permitir.

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4.2 – Natureza dual da luz, luz e sombra

Recomendamos que essa aula seja iniciada com um questionamento sobre a

natureza da luz, com a eventual apresentação de duas opções aos estudantes (partícula

ou onda). Para estimular essa discussão, propomos que sejam conduzidas duas

demonstrações. Inicialmente, direcione um apontador laser para a parede, espalhando pó

de giz sobre a trajetória da luz (Atividade experimental demonstrativa 01), com a

visualização de um rastro (fig. 1). Pergunte então aos estudantes sobre sua interpretação

dessa experiência, segundo os dois modelos (ou seja, qual modelo mais se aplicaria para

a explicação da mesma). No nosso trabalho, os estudantes favoreceram o modelo

corpuscular em suas respostas, mas não necessariamente isso ocorrerá.

Em seguida, coloque um fio de cabelo sobre a saída do feixe de laser, e projete a

figura de difração (fig. 2) em uma parede (Atividade experimental demonstrativa 02).

Pergunte novamente aos alunos sobre qual modelo mais se adequa a essa explicação. Na

nossa prática didática, não houve consenso: alguns alunos afirmaram que o fio de cabelo

refletia algumas das partículas, mas não souberam explicar a regularidade da figura de

difração formada.

Apresente então a explicação ondulatória (superposição das ondas difratadas),

procurando evitar o uso de termos técnicos nesse momento (prefira “desvio” ao invés de

“difração”, por exemplo), mas ressaltando que apenas ondas sofrem esses fenômenos de

interferência e difração.

Figura 1 – Atividade experimental demonstrativa 01 [1]

1 A foto exibida na figura 1 não representa o experimento que propomos, pois é utilizado um laser muito mais potente. Como não conseguimos uma boa imagem do experimento, por debilidade do nosso

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Figura 2 – Atividade experimental demonstrativa 02

Pergunte então aos alunos se a Atividade experimental demonstrativa 01 pode

ser reinterpretada (reflexão das ondas luminosas), de acordo com a abordagem

ondulatória. Após apresentar essa explicação, discuta sobre a dualidade onda-partícula,

mostrando-a como um elemento fundamental da natureza. Percebe-se aqui o papel da

experimentação na prática da ciência (discussão de fenômenos segundo uma nova

teoria) para a reconceitualização da experimentação apregoada por Hodson (1994).

Questione então os estudantes sobre a necessidade ou não da presença de luz

para que um objeto seja visualizado. Na nossa experiência, uma boa parte afirmou que a

luz era necessária sim, mas quando perguntados se eles conseguiriam enxergar algum

objeto em uma caverna perfeitamente escurecida, muitos responderam que sim, se

ficassem na caverna por tempo suficiente. Assim como no trabalho de Gircoreano e

Pacca (2001), vários alunos apresentaram o ponto de vista de não imaginar a luz como

necessária à visualização, já que os olhos cumpririam tal papel.

Se a estrutura da sala assim o viabilizar, conduza então a Atividade

experimental demonstrativa 03, intitulado “Sala do Nada” no trabalho de Gircoreano

e Pacca (op. cit., 2001). Cubra as janelas da sala e as frestas da porta foram cobertas

com sacos plásticos negros (os alunos, em geral, são bastante eficazes nessa tarefa), e

peça aos estudantes que desliguem ou guardem todos os celulares e os relógios com

ponteiros fosforescentes.

equipamento fotográfico, optamos por adicionar uma figura representativa da situação, para fins de ilustração.

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Figura 3 – Atividade experimental demonstrativa 03

O retângulo negro anterior (fig. 3) não é um erro de impressão: é o que se espera

do ambiente nessa experiência, uma sala absolutamente escura. Ao se apagar as luzes,

provavelmente se seguirá uma sequência de gritos (um tradicional comportamento

adolescente, conforme a pesquisa de Gircoreano e Pacca, 2001), mas após alguns

minutos de completa escuridão os primeiros relatos da falta completa de visão

provavelmente começarão a surgir. Se algum aluno relatar estar observando alguma

entrada de luz, procure tapá-la a todo custo, para que os efeitos da experiência sejam

mais perceptíveis.

No nosso trabalho, deixamos as luzes apagadas por mais de quinze minutos, e

nenhum aluno relatou ter “recuperado” a visão, ao contrário do que as ideias prévias

pareciam sugerir. Observa-se aqui um típico conflito cognitivo, colocando os esquemas

prévios dos estudantes em xeque. A resolução do conflito se deu com a acomodação (e

posterior equilibração) do esquema à “solução” do conflito (a substituição da ideia

prévia intuitiva pelo conceito científico válido).

Pergunte então aos estudantes sobre a trajetória de um raio de luz (não cremos

que seja necessário se preocupar em definir esse conceito, por achá-lo intuitivo).

Possivelmente, a ideia da propagação retilínea da luz se fará presente, mostrando que a

Atividade experimental demonstrativa 01 não é exatamente necessária para o

aparecimento dessa concepção. Estabelecido esse princípio da propagação retilínea

como verdadeiro (se quiser, discuta as limitações desse princípio, aplicável apenas para

meios homogêneos e transparentes), desenvolva a sua aplicação aos conceitos de

sombra e penumbra. É interessante dedicar uma particular atenção ao estudo dos

eclipses, desenhando os tradicionais esquemas de formação de sombras e penumbras no

quadro.

Propomos então a apresentação da Atividade experimental demonstrativa 04

(projeção de sombras de objetos opacos usando a luz emitida por uma vela) e da

Atividade experimental demonstrativa 05 (projeção de sombras e penumbras de

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objetos opacos usando a luz emitida por duas velas), confrontando-os com os esquemas

didáticos apresentados. Essa experiência pode levar a uma série de perguntas sobre os

fenômenos da sombra e penumbra. Em especial, procure destacar a nitidez das áreas de

sombra e penumbra quando as velas ou os objetos opacos eram aproximados ou

afastados da parede de projeção (fig. 4 e fig. 5), sempre procurando apresentar a

situação real e depois compará-la com o esquema didático, demonstrando

geometricamente o fenômeno. Acreditamos que essa prática contribui para o

aprendizado da prática da ciência, tal como proposto por Hodson (1994), por permitir

que os alunos comparem os modelos estabelecidos com as situações reais.

Figura 4 – Atividade experimental demonstrativa 04

Figura 5 – Atividade experimental demonstrativa 05

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4.3 – Fundamentos da óptica: cor

Hodson propõe que utilizemos não só a experimentação para a promoção da

aprendizagem da prática da ciência: relatos históricos, entre outros, também podem

contribuir para esse fim. Assim, sugerimos que esse encontro seja iniciado com um

relato sobre o contexto histórico em que Isaac Newton realizou suas experiências

ópticas, especialmente a célebre experiência da dispersão da luz branca através de um

prisma. A leitura da obra seminal de Newton, “Opticks” (“Óptica”), não

necessariamente exige preparo matemático e é obrigatória para um professor de Física.

Muitos dos desenhos esquemáticos que usamos até hoje em sala de aula estão presentes

nesse livro, como o mostrado a seguir (fig. 6), o qual Newton utiliza para apresentar

suas ideias sobre a dispersão luminosa:

Figura 6 – Dispersão da luz solar. Desenho retirado da obra “Opticks” (NEWTON, 1704).

Após o relato da experiência da dispersão da luz em um prisma, apresente um

desenho esquemático representando essa demonstração experimental (baseie-se no

original de Newton representado acima, por exemplo). Se não for possível fazer esse

desenho (em geral, há limitação das cores de canetas nos quadros brancos), utilize uma

figura impressa. Uma reprodução dessa experiência é a lendária capa do álbum “The

dark side of the moon” (1971), da banda inglesa Pink Floyd (fig. 7).

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Figura 7 – Capa do álbum “The Dark side of the Moon”, Pink Floyd, 1971.

Conduza então a Atividade experimental demonstrativa 06 (dispersão da luz

branca, utilizando a luz emitida por um retroprojetor e um prisma de acrílico, com

projeção do espectro em um anteparo, em um ambiente escurecido). Após colocar o

prisma sobre o retroprojetor e conseguir a projeção do espectro, procure imobilizar o

prisma, usando um livro, por exemplo (fig. 8). O livro também cumpre a função de

limitar a luz no ambiente, reforçando o efeito visual resultante (o “arco-íris” projetado).

Esse efeito, geralmente, é fascinante para os alunos.

Se possível, peça que alguns deles fotografem a experiência com seus celulares

ou câmeras digitais. Algumas das máquinas fotográficas utilizadas possuem um sistema

de flash automático, que eliminará o arco-íris da fotografia devido à alta intensidade da

luz emitida pelo flash. Se este fato ocorrer, aproveite então para realçar a necessidade da

escuridão e da ausência de outras fontes de luz para a boa visualização de

demonstrações ópticas, correlacionando com o sótão escuro da casa de Newton. Já

outras máquinas (como a nossa) não possuem sensibilidade idêntica a todas as cores (na

figura 9, por exemplo, a parte violeta do espectro não está presente na fotografia, mas

ela é bastante clara na demonstração experimental sugerida). Acreditamos que esses

atos fortuitos, se presentes, contribuirão para a geração de conflitos cognitivos e para o

aprendizado da prática científica (no caso, a adequada preparação das condições de um

experimento e a interpretação dos dados, no caso as fotografias do mesmo).

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Discuta então com os estudantes o modelo da luz branca, apresentando-a como a

mistura de “todas as cores” (se quiser, discuta as limitações desse conceito, pois um

cachorro não enxerga as mesmas cores que nós, mas ainda assim vê os objetos brancos).

Pergunte então aos alunos o que seria a “cor negra”, e apresente essa “cor” como

resultado da ausência de luz.

Figura 8 – Montagem da Atividade experimental demonstrativa 06

Figura 9 – Projeção do espectro no teto (Atividade experimental demonstrativa 06)

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Conduza então a Atividade experimental demonstrativa 07, girando um disco

de Newton didático com sete ou mais cores (fig. 10). Esses discos podem ser impressos

em papel grosso, colados sobre um disco de vinil (long play, ou LP), e girados com o

auxílio de um lápis encaixado no centro do disco. A concepção de diferentes discos de

Newton utilizando um processo similar é sugerida por Maroto et al. (2006).

Apresentamos na figura 10 alguns modelos de discos de Newton que podem ser

utilizados para essa experiência, sendo que o disco da direita provavelmente fornecerá

melhores resultados.

O resultado provavelmente não será satisfatório: o branco “teórico” que deve

resultar dificilmente passará de um tom acinzentado. Se isso ocorrer, aproveite para

perguntar aos estudantes sobre o porquê do fracasso experimental, destacando na

resposta que não existem apenas sete cores, e sim infinitas, explicando assim a falha nos

resultados esperados na experiência. Acreditamos que essa discussão se adequa à

reconceitualização da prática científica, pois não é raro as pesquisas conduzirem a

resultados diferentes dos inicialmente imaginados.

Questione então os estudantes se todas as cores são necessárias para que o olho

humano visualizasse a cor branca. Na nossa experiência, a resposta geral nos grupos de

trabalho foi um sonoro “sim”; pergunte logo em seguida sobre quais cores existem nas

telas de uma televisão ou de um computador, frisando que apenas três cores estão

presentes: vermelho, verde e azul. Aproveite esse gancho para discutir o conceito de

cores primárias (cor-luz) e discuta também a adição de cores, responsável pela

multiplicidade de tonalidades existentes nas telas dos aparelhos citados.

Figura 10 – Discos de Newton sugeridos para a Atividade experimental demonstrativa 07

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Uma ampla gama de autores, tais como Yurumezoglu (2009),

Nopparatjamjomras et al. (2009), Kamata e Matsunaga (2007), Maroto et al. (2006),

Costa et al. (2008), Reid (2008), Loreto e Sartori (2008) e Silva e Topa (2001) faz

sugestões para a demonstração do fenômeno da adição de cores. Inspirados pela

literatura, sugerimos três demonstrações experimentais que permitem explorar esse

conceito.

A Atividade experimental demonstrativa 08 demonstra essa adição a partir do

uso de três lâmpadas (nas cores vermelha, verde e azul). Pode ser construída uma base

para a fixação das lâmpadas, mas no nosso trabalho apenas fixamos os suportes para as

lâmpadas com fita adesiva na mesa. Direcione então os cones de luz emitidos por essas

lâmpadas, em sequência, em uma parede branca. Essa exposição permitirá aos alunos

observarem que a superposição de feixes vermelhos e azuis produz a cor magenta

(chamada de “rosa” ou “pink” pelos estudantes), a superposição de feixes vermelhos e

verdes produz o amarelo, a superposição de feixes verdes e azuis produz o ciano

(chamado de “azul claro” pelos alunos) e a superposição das três cores produz o branco

(pelo menos teoricamente). Escreva então as “equações” dessa somatória no quadro de

giz, de preferência reforçando a letra que simboliza cada cor, escrevendo-a com a cor

correspondente [2] (fig. 11):

Figura 11 – “Equações” pictóricas para a adição de cores primárias

2 O quadro de giz está sendo progressivamente substituído nas escolas por quadros de plástico laminado, no qual são usadas canetas, as quais não possuem uma grande variedade de cores, ao contrário do giz, encontrado em dezenas de tons. Essa é uma das situações onde o quadro de giz se revela uma ferramenta didática ainda muito eficiente, apesar de sua propagada obsolescência.

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Nas “equações” representadas na figura, R significa vermelho (red), B azul

(blue), G verde (green), Y amarelo (yellow), C ciano (cyan), M magenta (magenta) e W

branco (white). Escolheu-se a primeira letra do nome da cor em inglês e não em

português para se evitar repetição (amarelo e azul, verde e vermelho). No quadro,

desenhe uma figura representando essa adição de forma pictórica. Uma representação

possível da figura desenhada é mostrada a seguir (fig. 12). Caso o quadro de giz não

permita essa representação, a figura mostrada aqui pode servir de referência.

Figura 12 – Diagrama para adição de cores primárias

Aproveite a montagem de lâmpadas e realize a Atividade experimental

demonstrativa 09, uma variação da demonstração anterior, mostrando a adição de

cores usando sombras de objetos opacos (fig. 13 e fig. 14). Coloque objetos variados

(tais como a mão, livros, estojos, carteiras, entre outros) em frente aos três feixes

luminosos projetados. Provavelmente, a distinção entre os oito tons das “cores”

formadas (incluindo nessa lista o preto, mesmo sabendo que ele representa a ausência de

cor) se tornará bastante nítida para os estudantes. Aproveite para perguntar sobre como

poderíamos produzir a cor laranja, por exemplo, a qual não está presente na mistura.

Após as respostas, cubra parcialmente a luz verde e desligue a luz azul, e diferentes tons

alaranjados poderão ser obtidos na parede de projeção.

Essa atividade experimental pode ser reconceitualizada para prover a explicação

de uma tecnologia cotidiana: a produção de imagens coloridas em monitores de

televisão e computador. A partir da seleção entre 256 tons de vermelho (desde a

ausência total até a presença total) e o mesmo número de tons de verde e azul, podem

ser conseguidas mais de 16 milhões de cores em um monitor, esquema apelidado de

high colour (cor de alta qualidade) em informática.

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Figura 13 – Montagem da Atividade experimental demonstrativa 08

Figura 14 – Atividade experimental demonstrativa 09

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Finalmente, realize a Atividade experimental demonstrativa 10, que também

apresenta a adição de cores, mas a partir do uso de uma base plástica contendo três

lâmpadas tipo LED nas cores vermelha, verde e azul. Essas bases são facilmente

encontradas em feiras livres ou lojas de presentes, e em geral as lâmpadas podem ser

ligadas individualmente, duas a duas ou todas juntas.

Utilizando um bastão de acrílico (ou outro objeto desse material) colocado sobre

a base, ligue as lâmpadas em sequência, permitindo aos estudantes a visualização do

efeito resultante sobre o bastão de acrílico (fig. 15). Usamos também um boneco de

silicone transparente para o mesmo fim (fig. 16 e fig. 17), e até mesmo uma caneta

esferográfica. Percebemos aqui a prática da ciência em ação: o uso de aparatos pré-

existentes para experimentos similares, com fins de comparação de resultados.

As figuras 15, 16 e 17 representam os resultados obtidos na Atividade

experimental demonstrativa 10 e estão presentes nas páginas a seguir.

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Figura 15 – Atividade experimental demonstrativa 10 (bastão de acrílico iluminado com

diferentes combinações de lâmpadas)

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Figura 16 – Atividade experimental demonstrativa 10 (boneco de silicone [3] iluminado

com lâmpadas azul e verde, resultando na cor ciano)

Figura 17 – Atividade experimental demonstrativa 10 (boneco de silicone iluminado

com lâmpadas vermelha e azul, resultando na cor magenta)

3 O boneco representado nas fotos é uma escultura em silicone transparente do super-herói Caçador de Marte, confeccionada a partir da sua aparição no romance gráfico “Justice” (2007), do desenhista e roteirista Alex Ross. A obra foi publicada no Brasil em 2007 (Editora Panini).

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4.4 – Reflexão: fundamentos e espelhos planos

Inicie a aula argumentando que a luz, ao interagir com uma fronteira de

separação entre dois meios (citamos a superfície de um lago como exemplo), pode

sofrer três fenômenos: absorção, reflexão e refração. Recomendamos explicar então que

a maior parte do conteúdo de óptica se dedica ao estudo dos fenômenos da reflexão e

refração, e que normalmente a absorção é deixada de lado, pois a principal importância

do estudo do fenômeno encontra-se no conteúdo da termodinâmica (o conceito de corpo

negro).

Discuta então alguns fenômenos onde a reflexão da luz está presente, usando a

formação de imagens em espelhos como ponto de partida. Para tal, apresente a primeira

lei da reflexão, que afirma a igualdade entre os ângulos de incidência e reflexão,

contados em relação à reta normal, a partir do desenho do tradicional esquema de um

raio refletido em uma superfície plana, e apresente no desenho o raio incidente, o raio

refletido e a reta normal. Para que os estudantes compreendam melhor a visualização do

desenho esquemático, conduza a Atividade experimental demonstrativa 11,

produzindo a reflexão da luz emitida por um apontador laser em um espelho plano

(fig. 18), com o uso de pó de giz [4] para visualização da trajetória. Mesmo um espelho

de pequenas dimensões já será suficiente.

Figura 18 – Atividade experimental demonstrativa 11

4 Devido a reações alérgicas ao pó de giz exibidas por alguns alunos, procuramos encontrar outros meios para a visualização do laser. Foram testados: fumaça emitida por incensos, pó compacto de maquiagem, água borrifada por um aspersor e desodorantes contendo alguma forma de pó em sua composição. O pó de giz se revelou o mais eficiente de todos os métodos.

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Realize logo em seguida a Atividade experimental demonstrativa 12,

aproveitando que o feixe laser está sendo refletido em um espelho plano limpo,

produzindo a reflexão chamada especular. Peça para que os alunos observem o teto da

sala: o feixe laser, ao refletir no espelho limpo, praticamente formará um ponto único no

teto (alguns apontadores laser, infelizmente, são produzidos com irregularidades na

região de saída do feixe, e pode haver alguma difração da luz). Em seguida, molhe o

espelho com um aspersor de água, tornando a superfície irregular, e faça o feixe laser

refletir novamente, agora de forma difusa. Nessa situação, o feixe refletido no espelho

molhado mostrará múltiplos pontos e manchas de luz no teto, confirmando a difusão do

feixe de luz incidente pela superfície irregular (fig. 19). Para melhor evidenciar essa

reflexão difusa, espalhe novamente pó de giz sobre o espelho, e múltiplos raios

refletidos serão evidenciados.

Figura 19 – Atividade experimental demonstrativa 12

Pergunte então aos alunos por que a superfície irregular “espalhou” a luz. Na

nossa experiência, alguns alunos afirmaram (com palavras diferentes) que o ângulo de

reflexão era diferente do ângulo de incidência (percebemos aqui que a experiência

funcionou como um conflito cognitivo, e os alunos citados inicialmente utilizaram seus

esquemas pré-existentes para explicar erradamente esse conflito). Após argumentar

contra essa ideia, mostrando que a primeira lei da reflexão era válida em cada ponto (no

caso da reflexão difusa, as retas normais à superfície não são paralelas entre si, daí a

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reflexão se dar em múltiplos ângulos) e correlacionar essa explicação com a difusão da

luz, espera-se a superação (ou minimização) desse conflito conceitual, levando os

esquemas mentais pelos estudantes para um nível superior.

Faça então os desenhos explicativos para os dois tipos de reflexão, e realize em

seguida a Atividade experimental demonstrativa 13, provocando a incidência de dois

feixes laser aproximadamente paralelos no espelho plano, tanto limpo quanto molhado,

espalhando pó de giz para visualização da trajetória. Com o espelho limpo, será

observado que os raios se mantêm paralelos após a reflexão (a grande dificuldade dessa

experiência, entretanto, consiste em conseguir o paralelismo inicial desses feixes). Já

com o espelho molhado, a visualização da trajetória individual de cada um dos dois

feixes após a reflexão se mostrará impossível, pois dada a difusão do feixe de luz

incidente, múltiplos feixes serão produzidos. A figura a seguir (fig. 20) apresenta a

situação em que o espelho plano encontrava-se limpo.

Figura 20 – Atividade experimental demonstrativa 13 [5]

Geometricamente, construa então a imagem virtual conjugada pelo espelho

plano. Apresente então a técnica do prolongamento de raios, e frise que tais

prolongamentos são apenas um artifício geométrico para a construção e localização das

imagens virtuais. Para que os alunos compreendam melhor as propriedades da imagem

(simetria com o objeto e enantiomorfismo), propomos a Atividade experimental

5 Retirada de http://cdlpc.blogs.sapo.pt/29417.html.

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demonstrativa 14, o qual se difere dos anteriores por ser uma espécie de “teatro”.

Usando dois alunos como “voluntários” (o professor pode fazer o papel de espelho),

peça a um dos estudantes que seja o objeto, postando-se à sua frente, de lado para os

outros estudantes. O outro estudante fará o papel da imagem conjugada no espelho

plano; peça a ele para se posicionar atrás de você. Em seguida, peça ao estudante que

faz o papel de objeto para levantar uma das mãos, e pergunte ao outro estudante

(imagem) qual mão ele deve levantar. Independentemente da mão levantada, pergunte

aos estudantes sobre a correção da resposta e aproveite para discutir o conceito de

enantiomorfismo (reversão) da imagem formada nesse tipo de espelho.

Peça então ao aluno que esteja fazendo o papel de objeto luminoso que se mova,

aproximando-se e afastando-se do “espelho”, e pergunte ao outro aluno o que ele deve

fazer. Discuta então a simetria da imagem formada, em comparação ao objeto.

Inicialmente, não pensamos na situação descrita acima como uma experiência

em si, encarando-o apenas como uma ferramenta didática. Entretanto, dado o seu caráter

ilustrativo, decidimos nomeá-lo como uma “experiência com materiais não usuais” [6].

Observamos aqui mais uma oportunidade para a reconceitualização da experimentação,

tal como proposta por Hodson (1994): deve-se buscar a superação das fronteiras das

demonstrações experimentais didáticas, levando o estudante principalmente à reflexão

sobre a prática observada.

A simetria entre o objeto e a imagem também é o tema da Atividade

experimental demonstrativa 15, realizado a partir da sugestão de Hewitt (2002).

Utilize um pequeno espelho plano de maquiagem (provavelmente, você o conseguirá

emprestado com uma das alunas) e peça a um estudante que mantenha o espelho

próximo ao seu rosto, à distância de aproximadamente um palmo, dizendo quais partes

do rosto podem ser observadas por reflexão. Suponha que a resposta seja: “desde o topo

do nariz até a ponta do queixo”. Pergunte então à sala o que aconteceria se ela afastar o

espelho horizontalmente. Na nossa experiência, praticamente de forma unânime, os

alunos costumam responder que a parcela vista do rosto aumentará, pois a imagem

diminuirá de tamanho. Peça então ao estudante que afaste o espelho e descreva o que é

visto: a parcela vista no espelho se manterá a mesma. Explique essa situação com base

6 Um momento constrangedor ocorreu conosco logo no início dessa experiência: pedimos a uma das alunas que fizesse o papel de objeto, e recebemos um forte olhar de reprovação por parte da mesma, devido ao termo “objeto”. Explicamos que o termo, no contexto da óptica, representava o ponto do qual emanavam os raios que chegavam ao espelho, e parecemos ter superado o constrangimento rapidamente.

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na simetria entre objeto e imagem e em desenhos geométricos explicativos. Aqui, a

proposta de Hodson (1994) se mostra presente mais uma vez: a experiência em si não

tem valor sem a reflexão posterior.

Para a representação visual dessa demonstração (fig. 21), apresentamos duas

fotografias produzidas por nós. Inicialmente, estamos próximos ao espelho, e

posteriormente, mais afastados. Perceba que a proporção do corpo visualizada por

reflexão é a mesma nas duas situações, iniciando-se na base da camiseta.

Figura 21 – Atividade experimental demonstrativa 15 [7]

Finalmente, apresente a Atividade experimental demonstrativa 16, mostrando

a produção de múltiplas imagens em um diedro formado por dois espelhos planos (não

se preocupe em conseguir espelhos de grande tamanho para isso, pois o campo visual

será extremamente restrito quando o ângulo for diminuído, obrigando que os estudantes

estejam extremamente próximos aos espelhos para observarem as imagens formadas.

Dois espelhos pequenos serão mais que suficientes, contanto que você os desloque pela

sala ou os empreste para os alunos). Diminuindo o ângulo, mostre que o número de

imagens aumenta, e peça que eles reflitam sobre o porquê dessa situação (fig. 22).

Finalmente, apresente os desenhos explicativos da associação de espelhos em ângulo,

além da expressão para o cálculo do número de imagens formadas.

7 O autor pede desculpas pelo seu “momento Hitchcock”, mas a aparição no trabalho era inevitável nessa situação.

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Figura 22 – Atividade experimental demonstrativa 16

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4.5 – Reflexão da luz: espelhos esféricos

Inicie esse encontro apresentando os três tipos de espelhos aos estudantes:

côncavo, plano e convexo, e procure desenhar suas representações tradicionais no

quadro. Discuta então os pontos de interesse geométrico dos espelhos esféricos (centro,

foco e vértice), reforçando a propriedade de raios de luz paralelos ao eixo principal se

concentrarem no foco de um espelho côncavo.

Na realidade, sabemos que esse fato somente ocorre para espelhos parabólicos;

assim, conduza a Atividade experimental demonstrativa 17, apresentando a cáustica

(curva formada pelo encontro dos raios paralelos em um espelho esférico) em uma

xícara, conforme sugerido por Catelli e Vicenzi (2004). O fato dos raios paralelos não se

concentrarem em apenas um ponto pode ser usado para a discussão da diferença entre

espelhos esféricos e parabólicos, reforçando que só é caracterizado um foco para os

espelhos esféricos em condições de aproximação (raios próximos ao eixo principal).

Não conseguimos uma foto de boa qualidade dessa experiência, logo optamos por

representá-la aqui através da foto original do trabalho dos autores citados (fig. 23):

Figura 23 – Atividade experimental demonstrativa 17, retirada de Catelli e Vicenzi (2004), p. 399.

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Aproveite então a discussão sobre a concentração de raios paralelos para

conduzir a Atividade experimental demonstrativa 18, o qual mostra como pode ser

feita a determinação do foco de um espelho côncavo. Para tal, propomos o uso de um

espelho de maquiagem, de distância focal aproximada de 0,50 metros, encontrado

facilmente no mercado. Direcione dois feixes de luz emitidos por apontadores laser,

aproximadamente paralelos, perpendicularmente ao “plano” do espelho. Para melhores

resultados, utilize prendedores de roupa para manter os apontadores fixos, conforme a

sugestão proposta por Catelli e Vicenzi (2002). Esses feixes se tornam convergentes

após reflexão no espelho, fato evidenciado ao ser espalhado pó de giz para a

visualização do rastro. Essa experiência só terá um bom resultado se o paralelismo for

conseguido, o que é extremamente difícil; ademais, o encontro dos feixes só ocorre se

os feixes forem coplanares, condição igualmente complexa de ser conseguida com o

material proposto. A visualização dessa demonstração, infelizmente, é difícil de ser

captada em uma câmera fotográfica de baixa resolução, e não está presente nesse

trabalho. A seguir, apresentamos apenas um esquema da montagem da experiência

(fig. 24).

Figura 24 – Montagem utilizada na Atividade experimental demonstrativa 18

Para efeito de comparação, a demonstração da divergência de raios paralelos

incidentes em um espelho convexo pode ser apresentada na Atividade experimental

demonstrativa 19. A montagem é a mesma usada para a demonstração anterior (fig.

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24), substituindo-se apenas o espelho utilizado. Qualquer espelho convexo pode ser

usado para esse fim (no nosso trabalho, usamos um retrovisor de bicicleta e um espelho

presente em um frasco vazio do perfume Zaad, fabricado pela marca O Boticário) e

apenas um apontador laser (emitindo os raios aproximadamente paralelos). A

divergência é facilmente constatada pelos alunos: após o espalhamento do pó de giz,

nota-se um feixe colimado vindo do apontador, o qual se transforma em um cone

divergente de luz após reflexão no espelho. Novamente, não obtivemos uma boa

fotografia dessa experiência para exibição nesse trabalho.

Dependendo do espelho, será possível perceber que há alguns aneis claros e

escuros na mancha formada na parede após a incidência dos feixes nos espelhos

convexos. Essa situação, quando possível de ser observada, caracteriza a Atividade

experimental demonstrativa 20: a reflexão da luz em um espelho convexo apresenta

como resultado os aneis claros e escuros observados, formados devido às

irregularidades da superfície. Tais irregularidades produzem diferenças de fase entre os

raios refletidos, com uma consequente interferência entre os mesmos, gerando os aneis.

Se desejar, aproveite o momento para frisar o caráter ondulatório da luz na interpretação

da demonstração acidental [8]. Nossa fotografia (fig. 25), infelizmente, não captou os

aneis em detalhe, e eles aparecem apenas como manchas escurecidas na imagem.

Figura 25 – Atividade experimental demonstrativa 20

8 Admitimos que essa experiência, originalmente, não estava nos planos constantes no nosso trabalho, revelando-se um resultado acidental da prática experimental didática.

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Contraste então as duas atividades anteriores (18 e 19), a partir de desenhos

esquemáticos no quadro, apresentando a convergência e a divergência dos raios, e

expondo os conceitos de foco real (para o espelho côncavo) e virtual (para o espelho

convexo). Em seguida, apresente os principais raios notáveis e o método geométrico

para a construção de imagens usando tais raios.

A construção de imagens pelo método geométrico é praticamente inevitável em

uma aula de espelhos esféricos, mas acreditamos que intercalar os desenhos explicativos

no quadro (para cada uma das posições que um objeto óptico pode ocupar no eixo

principal de um espelho côncavo) com a demonstração prática dessas imagens pode

favorecer a solução dos conflitos cognitivos que emanarem dos abstratos desenhos.

Assim, recomendamos que seja desenhada no quadro a explicação geométrica

tradicional para a situação de um objeto que esteja mais distante que o centro de um

espelho côncavo, e seja realizada logo em seguida a Atividade experimental

demonstrativa 21, onde é mostrada a formação da imagem real, invertida e menor. Para

tal, procure usar um objeto externo à sala, distante do espelho côncavo, projetando a

imagem real na parede interna da sala. Em um ambiente escuro, onde a luz entre apenas

por uma janela ou pela fresta de uma porta, os resultados podem ser bastante visíveis.

Para a representação fotográfica (fig. 26 e fig. 27), utilizamos uma lâmpada de um

banheiro, e projetamos a sua imagem na parede externa a este cômodo.

Figura 26 – Objeto da Atividade experimental demonstrativa 21

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Figura 27 – Imagem obtida na Atividade experimental demonstrativa 21

Analogamente, a Atividade experimental demonstrativa 22 apresenta a

formação da imagem real, invertida e maior no espelho côncavo, usando a chama de

uma vela como objeto e a parede novamente como anteparo de projeção. Por ser uma

vela um objeto luminoso de baixa potência, a qualidade da fotografia obtida (fig. 28)

deixa naturalmente a desejar.

Figura 28 – Imagem obtida na Atividade experimental demonstrativa 22

Desenhe então todos os casos de formação de imagem no quadro (cinco casos

para o espelho côncavo e um caso único para o convexo) e apresente a noção da

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imagem real como invertida em relação ao objeto e da imagem virtual como não

invertida [9].

Questione então os estudantes sobre a necessidade de projeção para a

visualização de uma imagem real. Afirmamos então aos alunos que nem sempre a

projeção se fazia necessária para essa visualização [10], e para a demonstração desse fato

usamos a Atividade experimental demonstrativa 23, provavelmente uma das

experiências mais fascinantes da óptica. Utilizando uma associação de dois espelhos

parabólicos côncavos voltados um para o outro (como dois pratos) e colocando um

objeto no vértice do espelho inferior (o qual coincide com o foco do espelho superior, e

vice-versa), é produzida uma imagem real não projetada, a qual parece flutuar no ar

(fig. 29). Direcione então um feixe de laser para essa imagem, e ela se mostrará

iluminada como um objeto real. Peça aos alunos para tentar tocar a imagem, para que

seja constatada a inexistência de um objeto naquele ponto.

Figura 29 – Atividade experimental demonstrativa 23

Finalmente, para a fixação da diferença entre imagens reais (invertidas em

relação ao objeto) e virtuais (não invertidas), adotamos a sugestão de Catelli e Reis

(2004) e Keeports (2005) para a realização da Atividade experimental demonstrativa 9 Na nossa prática didática, comumente temos ouvido a expressão “toda imagem real é invertida, toda imagem virtual é direita” ser chamada pelo codinome de “Regra de Ouro da Óptica”, dada a sua abrangência e generalização. Todavia, não encontramos em nenhuma fonte essa expressão. 10 Informalmente, o professor Fernando Lang da Silveira, citado nesse trabalho, responde à pergunta “A imagem real só pode ser projetada, mas como é possível a minha imagem na parte côncava da colher?” no endereço http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20080701202245AAAQmBd .

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24. Utilizando o bulbo de vidro de uma lâmpada incandescente comum, peça aos alunos

que observem a reflexão de uma fonte luminosa (por exemplo, uma lâmpada

fluorescente no teto da sala). Os estudantes que observarem a experiência

provavelmente relatarão a formação de duas imagens, uma invertida e a outra direita.

Ambas as imagens parecem estar “dentro” do bulbo de vidro. Explique então que as

duas imagens são produzidas pelo fato do bulbo se comportar como dois espelhos: um

convexo (face externa, produzindo uma imagem virtual e direita) e um côncavo (face

interna, produzindo uma imagem real e invertida). Mostramos na figura a seguir o

resultado esperado. Não conseguimos uma boa foto da demonstração, e optamos pela

reprodução da foto constante no artigo de referência (fig. 30).

Figura 30 – Atividade experimental demonstrativa 24. Imagem retirada de Catelli e Reis, 2004,

p. 115.

Por fim, acreditamos que a tradição deve ser rompida aqui: a equação dos pontos

conjugados e a expressão para o cálculo do aumento linear transversal são

tradicionalmente apresentadas após esse tratamento geométrico dos espelhos esféricos,

o qual por si só já pode ser encarado pelos estudantes como maçante ou complexo.

Assim, sugerimos que a apresentação dessas equações seja guardada para um momento

posterior, quando o estudo dos principais instrumentos ópticos for realizado, para que o

estudo de lentes e espelhos de forma analítica possa ser comparado.

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4.6 – Refração e reflexão total da luz

Por ser a refração um fenômeno óptico que está presente em múltiplas situações

cotidianas, recomendamos apresentar nessa aula um grande número de demonstrações

ilustrativas (propomos nove ao todo), sempre buscando a reconceitualização das

atividades experimentais, especialmente estabelecendo sua conexão com os fenômenos

cotidianos.

Inicie o encontro apresentando o conceito de índice de refração de um meio,

estabelecendo-o como a razão entre a velocidade da luz no vácuo e a velocidade da luz

no meio em questão, e insistindo que um maior índice de refração significa uma menor

velocidade da luz naquele meio. Usando a sugestão de Hewitt (2002), procure levar o

aluno a estabelecer uma relação informal entre a densidade de um meio e o seu índice

de refração: quanto mais denso o meio, maior o seu índice. Frise que, embora haja

exceções a essa regra, essa generalização é ampla o suficiente para ser útil.

Conduza então a Atividade experimental demonstrativa 25, apresentando a

refração na sua forma mais tradicional: o desvio de um feixe de luz laser ao passar por

um dioptro (no caso, o ar e a água presentes em uma garrafa). Além da presença dos

raios incidente e refratado, percebe-se também a existência de raios refletidos, tanto na

superfície quanto pelo vidro da garrafa (fig. 31).

Figura 31 – Atividade experimental demonstrativa 25

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Para realizar essa demonstração, preencha a garrafa (transparente, de paredes

laterais planas) parcialmente com água e adicione algumas gotas de corretor líquido

(substância utilizada para cobrir a tinta de caneta no papel). Discuta com os alunos o

fato dessas gotas de corretor líquido serem capazes de transformar a água originalmente

pura em uma mistura coloidal, ressaltando o fato de que a visualização do rastro do

feixe laser na água só passa a ser possível [11] por serem essas partículas dispersas

capazes de refletir a luz,. À porção de ar restante na garrafa, adicione fumaça de um

incenso, constituindo também um coloide nessa região.

Direcione então o laser em um ângulo agudo com a superfície, a partir do ar,

permitindo a visualização do desvio (aproximação da reta normal) quando a luz

transpuser a fronteira entre os dois meios. Em seguida, leve o laser a atravessar primeiro

a lâmina de água, refratando-se para o ar. O desvio observado agora será o oposto do

inicial (afastamento da reta normal à superfície). Tome o cuidado de evitar ângulos

superiores ao crítico, a fim de manter a reflexão total para um momento posterior da

aula. Produza também a incidência normal (perpendicular à superfície), para demonstrar

que o desvio nem sempre ocorre na refração.

Desenhe então o esquema didático tradicional para a refração no quadro, e

argumente então a favor da lei de Snell, sem uma dedução formal da mesma, da

seguinte maneira: quanto maior o índice de refração do meio, menor o ângulo formado

entre o raio e a reta normal. Apresente então a formulação matemática tradicional da Lei

de Snell (n1.seni = n2.senr), e discuta a relação entre essa equação e a experiência

observada.

Pergunte então aos alunos sobre a possibilidade da igualdade entre os índices de

refração para substâncias diferentes, e também sobre as possíveis consequências desse

fato. Mostre então que isso é possível: não havendo refração, não observamos nenhum

desvio da luz e a consequência dessa ausência de desvio será a invisibilidade. Se você

for questionado por um aluno sobre a possibilidade de um material com o mesmo índice

de refração do ar, ele provavelmente estará fazendo alusão a uma “capa da

invisibilidade” citada nos filmes da série “Harry Potter”. Desconhecemos a existência

11 Na nossa experiência didática, já percebemos que o rastro do laser é sempre visível na água, mesmo que fracamente, evidenciando a má qualidade das tubulações de água das instituições de ensino.

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de tal material na natureza [12], mas alegamos que se ele existisse, a capa seria invisível,

mas o corpo do indivíduo que a vestisse não, resultando em uma “capa de nudez” ao

invés do efeito de invisibilidade desejado.

A fim de estimularmos a resposta ao conflito cognitivo gerado pela pergunta

original, propomos a Atividade experimental demonstrativa 26 (desaparecimento de

um bastão de acrílico imerso em tetracloroetileno) e a Atividade experimental

demonstrativa 27 (desaparecimento de esferas de policreatina na água). A igualdade

entre os índices de refração nessas experiências faz com que os contornos do bastão de

acrílico [13] e das esferas de policreatina seja praticamente imperceptível, produzindo a

sensação de invisibilidade [14].

Como variação das experiências descritas acima, direcione um feixe laser

através do tetracloroetileno onde o bastão se encontra imerso, para que os alunos

possam perceber que não há desvio, independentemente do ângulo de incidência da luz.

O mesmo pode ser feito com as esferas de policreatina imersas em água. As

representações fotográficas dessas duas demonstrações estão apresentadas nas páginas a

seguir (fig. 32, fig. 33, fig. 34 e fig. 35).

12 Apesar dessa afirmação, alguns metamateriais sintéticos alegadamente possuem essa capacidade de serem invisíveis, mas essa propriedade está associada a um índice de refração negativo. Para mais detalhes sobre esse tema, consultar, por exemplo, SHALAEV et al. (2005). 13 No caso do bastão mergulhado em tetracloroetileno, pode-se perceber seus contornos olhando-se com cuidado a fotografia. Esse fato decorre principalmente do fato do tetracloroetileno usado por nós já estar provavelmente contaminado com impurezas, especialmente pó de giz. 14 É interessante perceber que Laburú e Silva (2004) apresentam em seu trabalho outra experiência, a “garrafa invisível”, onde são utilizadas uma garrafa pequena de vidro cheia de glicerina, e um copo de vidro de 250ml com características semelhantes às da garrafa, contendo também um pouco de glicerina. Mergulhada a garrafa no interior do copo, a parte da garrafa que fica em contato com a glicerina externa desaparece. De acordo com os autores, costuma-se dizer que a igualdade entre os índices de refração da glicerina e do vidro explica essa invisibilidade, tais como nos casos das experiências sugeridas por nós. Os autores mostram, entretanto, que essa explicação está incorreta nessa experiência tão popular: o vidro funciona como lente, e a imagem da garrafa fica maior que o copo, sendo impossível de ser vista.

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Figura 32 – Preparação da Atividade experimental demonstrativa 26

Figura 33 – Atividade experimental demonstrativa 26

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Figura 34 – Preparação da Atividade experimental demonstrativa 27

Figura 35 – Atividade experimental demonstrativa 27

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Em seguida, apresente o conceito de ângulo limite e sua relação com a reflexão

total. Ressalte o fato de esse fenômeno só ser possível quando o índice de refração do

meio onde a luz incide for menor que o índice do meio de propagação original. Em

geral, por ser a reflexão total um fenômeno desconhecido para os alunos, percebemos

informalmente que os desenhos esquemáticos não contribuem para a compreensão do

tema.

Assim, além dos esquemas, apresente também a Atividade experimental

demonstrativa 28, usando o mesmo dioptro da Atividade experimental demonstrativa

25 (garrafa parcialmente cheia com água). Direcione o feixe laser em um ângulo acima

do crítico, fazendo-o atravessar a água, mostrando que a luz reflete-se totalmente na

superfície de separação entre a água e o ar (fig. 36). Tente apresentar o ângulo limite

(onde a emergência da luz seria rasante). Se essa tarefa se revelar impraticável, dada a

simplicidade dos recursos usados na experiência, discuta essas limitações. A discussão

sobre os limites de validade de uma experiência científica é perfeitamente coerente com

a reconceitualização da atividade experimental proposta por Hodson.

Figura 36 – Atividade experimental demonstrativa 28

A reflexão total está presente em inúmeros fenômenos, tais como o brilho de

pedras preciosas, a transmissão de dados por fibra óptica, o espelhismo e as miragens

em dias quentes. Recomendamos que seja dada atenção especial à fibra óptica. Para tal,

apresente um modelo didático dessa fibra na Atividade experimental demonstrativa

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29, onde é simulada a reflexão total na fibra óptica usando um bastão de acrílico como

modelo. Essa experiência é sugerida por Mendonça et al. (2001), e mostra o ziguezague

resultante das reflexões totais da luz na superfície lateral interna do bastão de acrílico e

o correlaciona com o envio de dados digitais através da fibra óptica (fig. 37).

Figura 37 – Atividade experimental demonstrativa 29

Acidentalmente, na nossa prática didática, a saída da luz através do extremo do

bastão permitiu que os alunos visualizassem o surgimento de uma espiral formada pela

luz quando ela sai do bastão (fig. 38). Concebemos então essa situação como a

Atividade experimental demonstrativa 30. Explique que a formação dessa espiral se

deve ao fato dos múltiplos feixes de luz emitidos pelo apontador laser não apresentarem

um paralelismo perfeito, e essa divergência é amplificada durante as múltiplas reflexões

internas no bastão, resultando na figura formada no teto ou na parede [15].

Ainda como exemplo da reflexão total na fibra óptica, se for possível, apresente

aos alunos um abajur de “fibra óptica” (na realidade, as “fibras” são apenas tubos finos

de plástico comum), onde apenas o extremo da “fibra” apresenta coloração,

evidenciando que a luz é refletida totalmente no interior da “fibra”, impedindo a saída

da mesma pela lateral do tubo plástico. Chamamos essa apresentação de Atividade

experimental demonstrativa 31. Esses abajures são facilmente encontrados em lojas

15 O fenômeno da produção da espiral luminosa é intrigante, mas infelizmente nenhuma referência teórica sobre a sua produção foi encontrada na nossa pesquisa.

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populares, com um custo extremamente acessível: em 2009, esse abajur podia ser

comprado por cerca de dez reais em lojas de presentes.

Na reprodução fotográfica da Atividade experimental demonstrativa 31 (fig. 39),

observa-se a luz atravessando as fibras de plástico e saindo apenas pelas suas pontas

irregulares. Como as fibras possuem dois tamanhos diferentes, parte da luz é vista no

“meio” das fibras mais longas, onde está localizado o ponto final das fibras mais curtas.

Figura 38 – Atividade experimental demonstrativa 30

Figura 39 – Atividade experimental demonstrativa 31

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A fim de encerrar a sessão de experiências sobre fibra óptica, a Atividade

experimental demonstrativa 32 apresenta a reflexão total em um bastão curvo,

mostrando que a reflexão total permite que a luz faça “curvas” (fig. 40 e fig. 41).

Buscando a reconceitualização da experimentação para essa atividade, propomos

correlacioná-la com a experiência cuja primeira realização é atribuída a John Tyndall no

século XIX, no qual a luz é desviada por múltiplas reflexões totais em um filete curvo

de água, mostrando que princípios científicos descobertos em um momento podem só

gerar aplicações tecnológicas em momentos muito posteriores, reafirmando a

necessidade e a importância da pesquisa básica em ciência.

Outro tradicional exemplo de aplicação da reflexão total é o brilho de pedras

preciosas ou de vidro lapidado. Explique aos estudantes que esse brilho é resultado das

múltiplas refrações e reflexões totais nas superfícies e arestas de uma peça lapidada. A

Atividade experimental demonstrativa 33 apresenta o resultado dessas reflexões

totais e refrações, quando direcionamos um feixe laser através de uma peça de vidro

lapidado [16] imersa no ar (fig. 42). O resultado (a separação do feixe original em

múltiplos feixes) gera um belo efeito visual no teto da sala (fig. 43).

Figura 40 – Preparação da Atividade experimental demonstrativa 32

16 Apesar do aspecto visual da peça utilizada ser um diamante lapidado, seu custo é extremamente baixo.

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Figura 41 – Atividade experimental demonstrativa 32

Se uma peça de diamante de tamanho equivalente a uma peça de vidro estiver

disponível (por exemplo, dois brincos de tamanho semelhante), é possível comparar o

brilho de ambas as peças, fazendo com que o laser reflita em ambas as peças [17].

Provavelmente, a figura resultante da reflexão no diamante será muito mais ampla, a

não ser em casos onde a peça de vidro tem tamanho claramente superior. Caso essa

comparação não seja possível na prática, pode-se perguntar aos alunos sobre qual seria o

efeito resultante, na hipótese de tais peças estarem indisponíveis.

17 Em uma única situação de sala de aula, tivemos a oportunidade de fazer essa comparação, graças a uma aluna que possuía um brinco de diamante, e o resultado foi exatamente o descrito no texto.

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Figura 42 – Preparação da Atividade experimental demonstrativa 33

Figura 43 – Resultados da Atividade experimental demonstrativa 33

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4.7 – Prismas e dispersão da luz branca

Nesse encontro, será retomado um assunto iniciado na aula inicial do curso, com

a exposição mais detalhada da teoria corpuscular de Newton e da sua concorrente

histórica, a teoria ondulatória da luz de Huygens, dando destaque principalmente para a

experiência conduzida por Thomas Young em 1801.

Como motivação inicial, repita a Atividade experimental demonstrativa 06

(dispersão da luz branca, utilizando a luz emitida por um retroprojetor e um prisma de

acrílico, com projeção do espectro em um anteparo, em um ambiente escurecido). A

repetição de experiências se alinha com a proposta de Hodson: menos prática, mais

reflexão. A mesma atividade experimental pode ser utilizada várias vezes em sala, com

diferentes intenções didáticas, apesar da perda do impacto lúdico. Utilize então as ideias

de Newton e Huygens para a explicação da dispersão da luz branca pelo prisma, com a

consequente projeção de um arco-íris, e enfatize o fato de ser comum haver teorias

concorrentes na ciência [18].

Questione então se há um arco-íris invisível e pergunte sobre qual seria a origem

de tal arco-íris. Aproveite as respostas dos estudantes para discutir a ideia de uma “luz

invisível”, refinando-a com os termos técnicos adequados, ou seja, a radiação

eletromagnética de forma geral. Recomendamos que seja dada uma atenção especial

para o infravermelho e o ultravioleta, envolvendo as aplicações práticas de tais

fenômenos. A descoberta da radiação infravermelha em 1800 por William Herschel

pode ser particularmente discutida. Hershell colocou um termômetro de mercúrio no

espectro obtido por um prisma com a finalidade de medir o calor emitido por cada cor, e

descobriu que a temperatura era mais alta abaixo do lado vermelho do espectro, mesmo

ali não havendo luz. Não repetimos essa clássica experiência no nosso trabalho, mas sua

realização em sala de aula não nos parece inviável.

A explicação da dispersão da luz branca, seja na teoria corpuscular ou

ondulatória, é extremamente eficaz para a elucidação de fenômenos cotidianos, tais

como o arco-íris atmosférico, a aberração cromática em lentes e a cor branca das

nuvens. Acreditamos que a explicação tradicional pode ser assim reduzida: quanto

menor a frequência da cor incidente, menor o índice de refração do prisma para essa

18 No caso particular descrito, sabemos hoje que tais teorias são complementares, mas preferimos não discutir esse aspecto epistemológico com os alunos nesse nível do curso, a fim de manter o foco no assunto em questão.

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cor, e portanto menor o desvio dos raios dessa cor. Assim, o vermelho se desvia menos

da trajetória original que todas as outras cores, enquanto o violeta se desvia mais.

Parta então para a discussão dos fenômenos específicos ligados à dispersão da

luz branca. A explicação da formação do arco-íris pode ser realizada comparando-se a

experiência do prisma com a situação atmosférica, realçando-se que as gotículas de

água suspensas na atmosfera fazem o papel de prismas, e que a luz no arco-íris que

observamos é a luz refletida no interior dessas gotas, após sua dispersão causada pela

refração.

Já para a explicação da cor branca das nuvens, recomendamos a condução da

Atividade experimental demonstrativa 34. Para tal, utilize uma base plástica [19] (já

apresentada na Atividade experimental demonstrativa 10) e faça a luz branca emitida

por essa base (quando as três lâmpadas estão acesas) ser dispersa por um grupo de

pequenas esferas de policreatina (uma resina transparente e fortemente hidrófila, usada

em jardinagem e decoração). Coloque várias esferas em um copo e obrigue a luz

emitida pela lâmpada do retroprojetor a atravessá-las (fig. 44). A experiência

evidenciará a dispersão luminosa em um padrão menos regular que o produzido pelo

prisma.

Figura 44 – Atividade experimental demonstrativa 34

19 Caso a base plástica mencionada não esteja disponível, acreditamos que a luz emitida pela lâmpada de um retroprojetor também pode trazer bons resultados nessa experiência.

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Aproveite para comparar essa irregularidade com a produzida quando a luz

branca do Sol atravessa as gotículas de água que compõem uma nuvem: a dispersão é

fortemente irregular nessa situação, e a ausência de padrão acaba fazendo com que

nossos olhos identifiquem a somatória de cores dispersas como a luz branca.

A aberração cromática normalmente já é um fenômeno conhecido da maioria

dos estudantes, embora não com essa nomenclatura. A título de exemplo, pergunte se

eles já fotografaram algum objeto e receberam um arco-íris ou outras cores indesejadas

na fotografia. Alguns podem até mesmo possuir exemplos de fotos tiradas com seus

aparelhos celulares onde essa aberração cromática esteja presente. Explique então que

as bordas de uma lente convergente tendem a se comportar como prismas, produzindo

esse efeito.

Para maior clarificação do fenômeno, propomos a Atividade experimental

demonstrativa 35, onde a aberração cromática na lente de Fresnel do retroprojetor pode

ser evidenciada jogando-se pó de giz sobre o aparelho. Um cone de luz aparece nessa

situação, e suas laterais possuem colorações avermelhadas e amareladas, evidenciando a

dispersão da luz pelas bordas da lente (fig. 45). Se for possível, desmonte o retroprojetor

para mostrar essa lente aos alunos, pois em uma visão externa ela parece apenas com

um vidro comum.

Figura 45 – Atividade experimental demonstrativa 35

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Procure correlacionar as cores apresentadas no cone de luz formado com a

dispersão da luz branca, mostrando que o vermelho se desvia menos que as outras, e por

isso ocupa a lateral externa do cone de luz. Após o cruzamento dos raios nos planos

focais, entretanto, a luz vermelha vai para o interior, e é a luz violeta que passa a estar

presente nas bordas do cone de luz invertido, por razões puramente geométricas.

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4.8 – Lentes e óptica da visão

Recomendamos que esse encontro seja iniciado com a apresentação de lentes aos

estudantes, representando os principais tipos de lentes esféricas (convergentes e

divergentes). No nosso caso, conseguimos com um estudante, ex-representante

comercial de produtos ópticos, algumas lentes demonstrativas de acrílico. Entretanto, o

custo de lentes de baixa qualidade não costuma ser alto. A lente convergente possui as

bordas mais finas que o centro (uma lupa pode fazer esse papel) e a lente divergente

possui bordas mais grossas que o centro (uma lente de miopia se aplica a este fim).

Pergunte aos estudantes sobre qual lente é capaz de concentrar os raios solares,

supostos paralelos. Provavelmente, a lente convergente será a escolhida. No nosso

trabalho, não pudemos demonstrar esse fato, pois o dia estava nublado, mas uma lupa de

razoável qualidade consegue iniciar a queima de uma folha de papel em um dia com sol

a pino em poucos segundos.

Pergunte então sobre o porquê da convergência, e qual a relação dessa

propriedade com a forma da lente. Para facilitar a compreensão desse tema, conduza a

Atividade experimental demonstrativa 36, onde dois (ou mais) feixes laser

aproximadamente paralelos, emitidos por apontadores controlados por um ou mais

alunos, sejam obrigados a passar por lentes convergentes e divergentes, mostrando o

desvio desses raios e sua eventual união no foco real da lente convergente (fig. 46). Essa

experiência permite também a ilustração da divergência da luz e da existência de um

foco virtual na lente divergente, onde os prolongamentos dos raios teoricamente se

cruzam [20]. Acreditamos que essa experiência representa um conflito cognitivo de alto

nível para os estudantes, que apesar de já terem sido apresentados às leis fundamentais

da refração, provavelmente ainda não conseguiram conectar essas leis ao funcionamento

de lentes, necessitando de alterações no esquema mental pré-existente para levar tais

conexões a cabo. Na representação fotográfica que apresentamos (figura 46), mostramos

uma experiência semelhante à nossa, realizada em uma feira de ciências em um colégio

português [21].

20 Esse experimento também permite que raios de luz refletidos sejam observados. Se os apontadores laser utilizados tiverem potência suficiente, dois raios refletidos serão observados, devido à separação na incidência da luz nas duas faces da lente utilizada. 21 Figura retirada do sítio http://cdlpc.blogs.sapo.pt/29417.html.

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Faça os desenhos tradicionais, representando as situações experimentais:

apresentando as lentes de perfil, mostre-as sendo atravessadas por raios paralelos, com a

posterior convergência ou divergência, dependendo do formato da lente. Correlacione

esse desvio com a lei de Snell e com a vergência da lente (o “grau”, na linguagem

popular).

Figura 46 – Atividade experimental demonstrativa 36, usando uma lente convergente

Realize então a Atividade experimental demonstrativa 37, espalhando pó de

giz sobre a luz que sai de um retroprojetor, com esse facho direcionado apenas para o

teto (fig. 47). A presença do pó de giz evidenciará a existência de um cone de luz, já

apresentado na Atividade experimental demonstrativa 35.

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Figura 47 – Atividade experimental demonstrativa 37 [22]

Esse cone é fruto da alta concentração da luz e do calor emitidos pela lâmpada

do retroprojetor no foco da lente de Fresnel existente no aparelho. A alta temperatura

atingida no foco pode ser testada colocando-se papel branco e preto no vértice do cone

de luz formado. O papel branco provavelmente nada sofrerá; pergunte aos alunos do

porquê dessa situação, esperando que sua resposta seja que o papel branco reflete a luz.

Nesse caso, pergunte qual seria a cor ideal para iniciar a combustão do papel nesse

ponto. Se a resposta for a cor preta, estaremos observando a sugestão de Catelli e

Franco (2006) em ação: o papel preto absorve uma grande parte da radiação luminosa

incidente e rapidamente entra em combustão. Essa atividade mostra mais uma vez a

necessidade da reconceitualização da prática experimental: sem uma reflexão adequada

sobre a prática experimental, mostrando o papel que a lente de Fresnel tem na nitidez da

imagem projetada, o estudante pode ser levado apenas à lembrança lúdica de objetos

“incendiados” em sala de aula [23].

Aproveite a presença do retroprojetor para a condução da Atividade

experimental demonstrativa 38. Coloque as lentes mostradas aos alunos no caminho

22 O autor, à esquerda na foto, pede desculpas pela aparição indevida (embora inevitável nesse caso) nesse trabalho acadêmico. 23 No nosso experimento, ilustrado na figura 44, não conseguimos uma boa imagem da fumaça formada, mas ela se encontra presente no experimento fotografado, logo acima do papel que foi colocado próximo ao plano focal da lente de Fresnel do aparelho.

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do feixe da luz emitida pelo aparelho e projete o resultado no teto ou na parede. A

projeção realizada com a lente convergente mostrará uma sombra circular [24] com um

círculo brilhante próximo ao seu centro, evidenciando a convergência. Já a lente

divergente apresentará uma projeção oposta: uma área de penumbra cercada por um

halo luminoso, evidenciando a divergência (fig. 48).

Peça então alguns óculos emprestados aos alunos, a fim de mostrar a divergência

e a convergência dos raios de luz nas lentes dos mesmos. Raramente se encontra um

aluno hipermetrope na adolescência, mas os graus de miopia costumam ser variados,

permitindo uma discussão mais detalhada do conceito de vergência e sua relação inversa

com a distância focal. Algumas lentes para correção do astigmatismo também podem

ser utilizadas, a critério do professor.

Figura 48 – Atividade experimental demonstrativa 38, usando uma lente divergente (à

esquerda) e uma lente convergente (à direita)

Finalmente, demonstre as principais construções geométricas que explicam a

formação de imagens a partir do uso de lentes convergentes (objeto além do

antiprincipal, objeto entre o foco e o antiprincipal, objeto entre a lente e o foco) e

divergentes, com uma rápida citação dos instrumentos ópticos onde elas estão presentes

e dos problemas de visão que podem ser corrigidos a partir do uso das mesmas (miopia

e hipermetropia. A título de exemplificação, realize a Atividade experimental

demonstrativa 39, mostrando a formação e projeção das imagens reais (maior e menor

que o objeto), com o uso de uma lente convergente. Os objetos utilizados podem ser

uma vela (para a projeção de imagens ampliadas e reduzidas) e objetos externos à sala

(para a projeção de imagens reduzidas apenas). Escolhendo-se adequadamente a posição

24 Tecnicamente falando, será observada uma penumbra cercando o círculo luminoso, e não uma área de sombra.

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da lente entre a vela e uma parede, podem-se conseguir duas posições onde a imagem

real da vela é projetada na parede de forma invertida, em um tamanho menor ou maior

que a própria vela. Já para os objetos externos, pode-se conseguir uma projeção

reduzida de boa qualidade, mesmo com as luzes acesas. Aproveite para fazer a conexão

dessa experiência com o princípio de funcionamento de aparelhos de projeção, como o

próprio retroprojetor ou uma máquina fotográfica.

Para a representação dessa demonstração (fig. 50), usamos a figura mostrada em

uma televisão LCD (liquid crystal display: monitor de cristal líquido) como objeto, e

obtivemos a projeção invertida com o uso de uma lente convergente. A cena

apresentada é parte do filme “2001, uma odisseia no espaço” (1967), dirigido por

Stanley Kubrick (fig. 49).

Figura 49 – Figura usada como objeto para a Atividade experimental demonstrativa 39

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Figura 50 – Projeção da imagem real e reduzida na Atividade experimental demonstrativa 39

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4.9 – Difração e espalhamento

Nesse encontro, recomendamos uma apresentação dos conceitos de difração e

espalhamento de forma puramente qualitativa, sem a apresentação das equações que

modelam tais fenômenos [25]. Inicialmente, pergunte aos alunos se uma onda (tal como a

luz) possui a capacidade de “fazer curvas”, ou seja, se desviar da sua trajetória original

para contornar obstáculos ou atravessar fendas. Após as respostas dos estudantes, diga

que a resposta correta à pergunta é sim: a difração do som ao redor de um obstáculo

como um exemplo. Nomeie esse fenômeno como difração para os estudantes.

Após fazer os desenhos explicativos tradicionais, apresentando a difração em

obstáculos e fendas, pergunte aos estudantes sobre a capacidade da luz de sofrer tal

fenômeno, ou seja, se a luz pode contornar obstáculos. No nosso trabalho, a resposta

não foi unânime, pois alguns alunos alegaram que as sombras só surgiam porque a luz

não é capaz de se desviar dos obstáculos, enquanto outros acreditavam que os

obstáculos cotidianos eram grandes demais para a luz ser capaz de contorná-los.

Se a segunda explicação surgir, aproveite-a (ou a coloque na discussão) e repita

a Atividade experimental demonstrativa 02, apresentando novamente a figura

formada pela difração da luz emitida por um apontador laser, quando esta passa por um

fio de cabelo. Essa experiência é proposta e detalhada por Laburú e Lopes (2001). A

figura formada é uma longa linha listrada, alternando luz e sombra, e um brilhante ponto

central onde normalmente se esperaria que a sombra do fio de cabelo estivesse. Faça

então um desenho representativo da experiência no quadro, mostrando que a luz sofre

difração ao redor do fio do cabelo, se transformando em duas ondas, as quais

posteriormente interferem entre si. Procure evitar a palavra interferência, especialmente

se os alunos ainda não houverem sido apresentados ao tema, e explique que a formação

da faixa listrada acontece devido ao reforço que essas duas ondas sofrem em alguns

pontos (com a formação de luz) ou ao cancelamento das mesmas ondas (com a

formação de sombra).

Reapresentada a difração em obstáculos, parta para a demonstração da difração

luminosa em fendas estreitas. Inicialmente, explique aos alunos que um CD (compact

disc) ou DVD (digital video disc) armazena as informações ao longo de uma trilha em

espiral invisível presente no disco. Faça o desenho de uma espiral no quadro e pergunte

25 Versões “curtas” das equações podem ser usadas, a critério do professor. Sugerimos λ = d.senθ para a difração, e I = k / λ4 para o espalhamento.

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aos alunos sobre a distância entre duas voltas da espiral, e se ela é menor no DVD, por

este disco conter mais informação que em um CD.

Após as respostas dos estudantes, conduza então a Atividade experimental

demonstrativa 40, uma adaptação das sugestões de Costa (2007). Na experiência,

apresente a difração da luz emitida por um apontador laser em um CD e um DVD,

usados como redes de difração [26]. A projeção da figura formada mostrará um ponto

central brilhante e dois pontos à direita e esquerda do centro, respectivamente. Esses

dois pontos laterais são os máximos de difração de primeira e segunda ordem, sendo

que este está localizado mais distante do ponto central (fig. 48).

Figura 48 – Atividade experimental demonstrativa 40

Quando o DVD for usado, a distância entre os pontos brilhantes será

sensivelmente maior do que a distância obtida no uso do CD como rede de difração.

Correlacione então os resultados experimentais da difração da luz no fio de cabelo com

os obtidos com os discos, mostrando que quando o tamanho do obstáculo (ou fenda)

diminui, a difração se acentua, ou seja, os pontos brilhantes se afastam do ponto central.

Pergunte então aos alunos se diferentes ondas se difratam de forma diferente,

dadas as mesmas condições. Caso os alunos não entendam tal pergunta, reformule-a,

26 No CD, retirar a película é extremamente fácil: faça um corte na película usando uma faca, e use fita adesiva para ir retirando a película a partir desse corte. Para o DVD, o mecanismo é semelhante, mas a película está localizada internamente a dois discos de plástico. É necessária alguma paciência (e um bom estilete) para conseguir separar os dois discos plásticos e finalmente retirar a película usando o mesmo método do CD.

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questionando se o som grave se difrata tanto quanto o agudo, por exemplo. O som grave

pode ser encarado como possuidor de uma maior capacidade de contornar obstáculos do

dia-a-dia, e esse fato ocorre devido ao maior comprimento de onda do som grave,

quando comparado com o som agudo. Explique que o mesmo pode ocorrer para a luz:

cada cor tem um comprimento de onda diferente e portanto se difrata em um ângulo

diverso, permitindo que a luz branca seja separada por difração (fig. 49).

Figura 49 – Cores resultantes da difração (e posterior reflexão) da luz branca em um CD

Conforme sugerido por Catelli (1999), realize então a Atividade experimental

demonstrativa 41, executando a projeção do espectro da luz emitida pelo retroprojetor

usando o CD no lugar do espelho plano do mesmo. A figura projetada [27] será um arco-

íris praticamente circular (máximo de primeira ordem) e talvez um segundo arco-íris

(máximo de segunda ordem). Argumente que a dispersão da luz se deu por difração:

como cada cor possui um comprimento de onda diferente, ela é difratada em um ângulo

levemente diferente, permitindo a separação da luz branca em suas cores constituintes

(fig. 50). Se desejar, repita a Atividade experimental demonstrativa 34 mais uma vez

(dispersão da luz emitida por um retroprojetor com o uso de um prisma de acrílico),

para mostrar a dispersão da luz por refração. Vemos aqui mais uma oportunidade para a

reconceitualização da experimentação: comparar dois fenômenos que produzem

27 Se, ao invés do retroprojetor, for utilizado um projetor digital em modo de espera (tela azul), o padrão de difração pode se tornar mais relevante (fig. 51), permitindo a realização de atividades de caráter quantitativo.

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resultados semelhantes (no caso, a formação de um arco-íris), mas com explicações

causais distintas. A seleção de teorias para a explicação de fenômenos é uma típica

atividade científica.

Figura 50 – Resultado da Atividade experimental demonstrativa 41 (realizada com um

retroprojetor)

Figura 51 – Resultado da Atividade experimental demonstrativa 41 (realizada com um projetor

digital em modo de espera)

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No momento posterior da aula, apresente aos alunos o espalhamento de

Rayleigh. Sugerimos encará-lo como um fenômeno “irmão” da difração, produzido

quando a dimensão dos obstáculos é muito inferior ao comprimento de onda, enquanto

na difração essa dimensão é comparável ao comprimento de onda.

Apesar da importância desse fenômeno para a explicação de fenômenos

cotidianos, não há nos livros didáticos uma transposição didática tradicional para esse

fenômeno. Assim, recomendamos a utilização da modelagem proposta por Krapas e

Santos (2002), apresentando experimentalmente o fenômeno e sua relação com o

cotidiano (a cor azulada do céu, a cor avermelhada do sol no poente e a cor alaranjada

da Lua no início da sua trajetória pelo céu).

A experiência sugerida pelos autores citados envolve ácido sulfúrico e hidróxido

de sódio, reagentes que nem sempre o colégio possuirá. Assim, sugerimos que tais

produtos sejam substituídos por algumas gotas de leite colocadas em um aquário de

tamanho médio contendo água.

A Atividade experimental demonstrativa 42 consiste em fazer o feixe de luz

branca emitido por uma lanterna atravessar a mistura. Provavelmente, os alunos

identificarão que o feixe de luz, ao atravessar a água com leite, ganhará um leve tom

azulado [28].

Explique esse fato afirmando que as cores mais espalhadas são justamente

aquelas que possuem menor comprimento de onda (ao contrário da difração), e por isso

o azul é a cor predominante no céu (devido ao espalhamento produzido pelas moléculas

de oxigênio e nitrogênio), enquanto o vermelho e o laranja, por se espalharem menos,

são as últimas cores que sobram da luz branca vinda do Sol e da Lua ao atravessarem

grandes camadas de atmosfera. Use essa argumentação para explicar a cor alaranjada ou

avermelhada desses astros no nascente e no poente. Um diagrama conveniente para

essas explanações está representado na ilustração a seguir (fig. 52).

28 Infelizmente, não possuímos fotos dessa experiência, pois o aquário que utilizávamos para a sua realização foi quebrado durante o transporte entre a sala de aula e o laboratório onde ele era guardado, e não adquirimos outro em um tempo hábil que nos permitisse fotografá-lo para esse trabalho.

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Figura 52 – Diagrama de referência para a explicação da cor azulada do céu. Retirada de

SILVEIRA e SARAIVA, 2008, p. 21.

As explicações para fenômenos tão cotidianos são particularmente bem

recebidas pelos estudantes, os quais tendem a perceber o potencial teórico contido na

explicação do fenômeno. Mais uma vez, a reconceitualização da prática experimental se

mostra presente: na impossibilidade da realização de certas experiências (dada a sua

dificuldade logística ou custo), a discussão e posterior interpretação de fenômenos

cotidianos pode suprir tal lacuna.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, V. A inserção de atividades experimentais no ensino de Física em nível médio:

em busca de melhores resultados de aprendizagem, Brasília, 2006. Dissertação

(Mestrado Profissional em Ensino de ciências; área de concentração: Física), Institutos

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