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  • 7/31/2019 Exibies itinerantes de cinema: uma anlise do contexto situacional de recepo das mostras organizadas pelo C

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    Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaoXXXII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao Curitiba, PR 4 a 7 de setembro de 2009

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    Exibies itinerantes de cinema: uma anlise do contexto situacional de recepo

    das mostras organizadas pelo Cineclube Lanterninha Aurlio1

    Dafne Reis Pedroso da SILVA2

    Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS

    Resumo

    A proposta deste artigo caracterizar e compreender o contexto situacional de recepodas mostras itinerantes de cinema organizadas pelo cineclube Lanterninha Aurlio. Paratal, articulei perspectivas tericas desenvolvendo conceitos sobre recepo, mediaes erecepo de cinema. Acerca das estratgias metodolgicas, realizei observaoparticipante com foco comunicacional em trs sesses itinerantes, para apreenderelementos do contexto situacional. Como resultados, evidencio que essa mediao construda na modificao do cenrio a partir dos equipamentos tecnolgicos e das

    diversas interaes que ali se realizam; as lgicas culturais de usos dos espaos tambmconfiguram a disposio e o comportamento dos sujeitos; o poder dos cineclubistas nasituao, assim como o dos agentes mediadores, parece ser marcante.

    Palavras-chave

    cinema; mostras itinerantes; contexto situacional; mediaes; recepo.

    Este artigo resultado de parte de minha dissertao de mestrado intitulada Hoje

    tem cinema: a recepo de mostras itinerantes organizadas pelo cineclube lanterninha

    Aurlio3, a qual teve como objetivo investigar o processo de recepo das mostras,

    buscando compreender os sentidos, usos e apropriaes que os receptores realizam das

    exibies e as mediaes que as configuram.Dentre as mediaes mais relevantes do

    processo, defini o contexto situacional, as competncias culturais dos receptores, as

    competncias miditicas e o cineclube. Neste artigo, a idia problematizar e trazer

    resultados e anlises acerca da mediao contexto situacional. A proposta caracterizar

    e compreender a mediao do contexto situacional da recepo das mostras itinerantes,considerando as implicaes da insero de um meio tcnico em uma ambincia

    pblica; as relaes entre cineclubistas, agentes mediadores (professores, presidentes de

    1Trabalho apresentado no NP Comunicao e Culturas Urbanas, IX Encontro dos Grupos/Ncleos de Pesquisas emComunicao, evento componente do XXXII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao.2Mestre em Cincias da Comunicao pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS, doutoranda emComunicao Social, pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul PUCRS, email:[email protected] dissertao foi orientada pela Prof. Dr. Jiani Adriana Bonin e defendida em maro de 2009, pelo Programa dePs-Graduao em Cincias da Comunicao, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS.

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    associao de bairros) e demais receptores no momento imediato da recepo; as

    relaes com os filmes exibidos no momento da projeo.

    As sesses itinerantes do Cineclube Lanterninha Aurlio4, de Santa Maria, interior

    do Rio Grande do Sul, acontecem desde 2005. Os cineclubistas visitam bairros, vilas,

    distritos e cidades vizinhas Santa Maria, onde improvisam projees de filmes, dando

    prioridade a produes brasileiras, longas e curtas-metragens. Praticamente qualquer

    local serve para a projeo dos filmes, sejam sales de igrejas, ginsios, auditrios, salas

    de aula, praas ou Centros de Tradies Gachas (CTGs). O pblico dessas mostras

    formado por receptores, em geral, pertencentes a classes populares, caracterizadas pela

    educao formal precria, vivncia em bairros, vilas e conjuntos habitacionais

    perifricos, empregos de baixa remunerao, entre outros. Apesar de enfatizar essa

    cultura pelo lugar subordinado na estrutura social, que significa limitaes de acesso a

    certos bens materiais e simblicos, tambm a compreendo como produtora de sentidos e

    de resistncias (GARCA CANCLINI, 2001; MARTN-BARBERO, 2003)5.

    Para construir meus questionamentos acerca das interaes que ocorrem nos

    espaos destas mostras, busquei elaborar a problemtica considerando a perspectiva da

    recepo, eleita como um lugar de entrada desde onde pensar o processo

    comunicacional. Em conformidade com Martn-Barbero (2002), a recepo no

    apenas uma etapa e implica uma pesquisa de recepo que leve exploso do modelo

    mecnico (MARTN-BARBERO, 2002, p. 40).A perspectiva de recepo que norteia

    e sustenta os meus questionamentos, pensa a comunicao enquanto um processo

    interacional complexo, situado na cultura e mediado por uma srie de instncias,

    denominadas mediaes. Compreendo o conceito de mediao(MARTN-BARBERO,2003) enquanto lugares onde se d a relao entre recepo e produo e que

    configuram essa interao. Nesse sentido, a recepo no acontece somente no

    momento de consumo dos produtos miditicos, mas anterior e posterior a ele.Quando se pensa em recepo de mostras itinerantes6, uma das caractersticas

    fundamentais relativa questo do cenrio de assistncia e das relaes que a se do,

    4O cineclube funciona h 30 anos e, todas as quartas-feiras, s 19h, tambm so exibidos filmes, gratuitamente, noauditrio da Cooperativa dos Estudantes de Santa Maria (CESMA).5A concepo de cultura popular com a qual trabalho toma elementos das concepes reprodutivista e gramsciana, nosentido de considerar no s a reproduo do sistema capitalista nas mais diversas reas da vida social, mas tambmas possibilidades de produo dessa cultura.6Se no incio das exibies de cinema no Brasil, o carter ambulante se dava pela falta de pblico e de um mercadoconstitudo, as sesses itinerantes contemporneas se do tambm pelas conseqncias do mercado que se construiu.

    A falta de espao para exibio e de demanda para o consumo dos filmes brasileiros faz com surjam atividades comoas projees itinerantes de cinema. Os projetos atuais tm a proposta de democratizao do acesso aos filmesnacionais, assim com a formao de platias para estas produes.

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    ou seja, o contexto situacional de recepo. Isso porque, uma sesso itinerante uma

    apropriao de um lugar que no tinha sua origem destinada exibio de filmes, mas

    que foi transformado. O local modifica sua funo primria e, a partir de uma

    interveno com equipamentos tecnolgicos (como aparelho de DVD, projetor e caixas

    de som), com uma nova disposio de cadeiras e bancos (muitos trazidos das casas dos

    espectadores, das igrejas e das escolas); e com a ausncia de luz (seja pela noite que

    adentra nas exibies ao ar livre ou pelos panos e cortinas que cobrem a luz que vem

    das janelas das salas), os locais servem para a assistncia de filmes. Ali, as regras so

    outras, as pessoas circulam, conversam, do risadas, a sesso promove o encontro e uma

    outra sociabilidade, o espao adaptado e as relaes entre os sujeitos parecem disputar

    a ateno com o filme que est sendo projetado. preciso compreender uma recepo

    de filmes que se d em um espao diferente das salas de cinema comerciais e do

    ambiente familiar, ou seja, uma mostra itinerante possibilita um tipo especfico de

    experincia de recepo de filmes.

    Por conta disso, penso que o contexto situacional de recepo seja uma

    mediao relevante para se compreender as apropriaes dos espectadores das sesses

    itinerantes. A idia de mediao situacional proposta por Orozco Gmez (2005)7 parece

    ser produtiva para pensar essa mediao. Apesar do autor problematizar esse conceito

    tendo em mente a experincia de recepo televisiva, penso que seja possvel traz-lo

    para refletir sobre o cinema, pois ele nos lembra que os limites fsicos do contexto de

    recepo miditica promovem e/ou impedem tipos de interao, intensificam atenes,

    possibilitam distraes. Orozco Gmez (2005) me faz olhar para a questo da

    materialidade do processo de recepo e considerar as especificidades do espao das

    itinerncias. Assistir a um filme em casa ou em salas comerciais de cinema no o

    mesmo do que assistir em sesses itinerantes e isso tambm pode implicar em diferentes

    possibilidades de produo de sentidos.As sesses itinerantes parecem mesclar elementos de uma situao de recepo

    no ambiente familiar e em salas comerciais de cinema. Para isso, a problemtica

    elaborada por Fragoso (2000), no sentido de pensar sobre o que seria o equivalente

    televisivo situao flmica (METZ,1982 citado por FRAGOSO, 2000), me ajuda a

    refletir sobre esses elementos. Se para Metz (1982 citado por FRAGOSO, 2000) a

    7O autor trabalha em uma proposta cultural, com a idia de eloborar um modelo de mediaes que possam seraplicadas empiricamente. O seu Modelo das Multimediaes por cinco categorias de mediaes, sendo elas:individuales, institucionales, massmediticas, situacionales e de referncia.

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    situao flmica8 refere-se a uma experincia marcada pela imobilidade, escurido,

    silncio, distanciamento das presses do cotidiano, de modo que tudo isso produzisse

    uma condio onrica, para Fragoso (2000), A televiso, por outro lado, encontra-se

    tipicamente inserida no ambiente domstico, ligada casualmente e enuncia

    significados que se misturam a estmulos da vida dita real. (FRAGOSO, 2000, p. 111-

    112).

    A recepo flmica que acontece nas itinerncias no funciona do modo descrito

    por Metz (1982 citado por FRAGOSO 2000). Nas exibies itinerantes, o espao

    modificado de modo que simule uma sala de cinema, com cadeiras dispostas em fileiras,

    telo, projetor e um ambiente escuro. Entretanto, a improvisao dos espaos

    dificilmente consegue isso. As cortinas no conseguem barrar a entrada de luz, os

    bancos no so confortveis, a realidade daqueles espectadores tambm se alterna com

    o que est sendo exibido na tela. Os demais espectadores muitas vezes no so

    desconhecidos, mas colegas de aula, amigos do bairro. O ritual de preparao tambm

    no o mesmo, no preciso sair para comprar ingresso, j que o cinema vai at os

    espectadores. Assim com no possvel escolher o filme, a recepo acontece muitas

    vezes diante do desconhecido. Semelhante a uma recepo televisiva no ambiente

    domstico, os estmulos do cotidiano tambm se misturam quela experincia. O

    espao, mesmo que no seja o domstico, familiar aos espectadores.

    Uma sesso de cinema itinerante uma outra possibilidade de recepo de

    filmes, que precisa ser entendida em sua especificidade. Nesse sentido, me parece

    interessante a problematizao de Silveira (2004) que trabalha com a idia de se olhar

    para outros lugares de recepo miditica e no apenas para os tomados como naturais 9,

    como a recepo de televiso no espao domstico, com a famlia como unidade

    sociolgica. Talvez seja tambm necessrio desnaturalizar a recepo de cinema, pens-

    la para alm das salas clssicas. preciso ampliar no s as situacionalidadestelevisivas, como prope o autor, mas as situacionalidades cinematogrficas. Segundo

    ele, apesar dos estudos de recepo enfatizarem o espao domstico do consumo

    televisivo, vrios j atentavam para situacionalidades limtrofes, ou seja, espaos de

    televidncia que estavam entre o pblico e o privado, num ritmo ambgo entre a

    8Ela seria uma segunda condio, alm da capacidade ficcional para o envolvimento dos espectadores com os filmes,juntos eles produziriam a suspenso de descrena.9O autor se prope a problematizar a concepo usual de situacionalidade domstica da televidncia (ou seja,recepo de televiso no espao domstico e com a famlia), no sentido de pensar outros espaos em que o aparelhotelevisor est presente, como em bares, salas de espera, txis, entre outros (SILVEIRA, 2004).

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    temporalidade repetitiva e marcada do trabalho e a temporalidade fluda ou distendida

    do cotidiano (SILVEIRA, 2004, p. 67). Isso me parece essencial para pensar as sesses

    itinerantes, ou seja, considerar esses espaos de espectatorialidade que tambm mesclam

    o pblico e o privado.

    O espao do cotidiano sofre a interferncia dos cineclubistas e dos receptores. A

    praa, por exemplo, transformada e ganha um outro papel simblico. E por ganhar

    uma outra significao, acaba por causar estranhamento em quem apenas est passando.

    Conforme Josimey Silva (2002), que tambm realizou uma pesquisa acerca de sesses

    itinerantes, nas sesses pblicas em periferias ou praas, o ordinrio rompido pelo

    extraordinrio, por exibies coletivas de cinema, que no fazem parte do cotidiano dos

    receptores. Nas praas, alguns tm medo de atravessar, pois pensam estar atrapalhando

    algo; outros caminham devagar olhando para o que est sendo projetado, mas seguem

    seus rumos; finalmente, alguns param, ainda que distantes e observam de longe.

    Nesse sentido, conforme argumenta Josimey Silva, O cinema no s o filme.

    , tambm, o lugar. H prticas que se vinculam a esse espao. H maneiras de

    freqent-lo (SILVA, 2002, p.13). E as maneiras de freqentar esse espao so

    bastante especficas. Os receptores das mostras itinerantes conversam entre si sobre o

    filme, brincam, do risada, mesmo que no tenham um lao de amizade to prximo

    com quem est sentado ao seu lado. como se o filme permitisse essa aproximao. No

    espao das exibies itinerantes, tambm no necessrio silncio absoluto, nem que

    no haja movimentao, pelo contrrio.

    Gastaldo (2006), que estudou a recepo de futebol midiatizado em bares, traz

    elementos que podem ser pensados tambm para as exibies itinerantes. Ele trata a

    situao que analisa como interao focada10, a qual ocorre quando pessoas

    efetivamente concordam em sustentar durante um certo tempo um foco nico de ateno

    cognitiva e visual (GASTALDO, 2006, p.130-131). Nesses bares o foco o aparelhode televiso e a disperso dos receptores no espao produz um tringulo com o aparelho

    no vrtice. Nas sesses itinerantes comum formar-se uma espcie de retngulo, pois as

    cadeiras so dispostas em fileiras diante do telo, que muitas vezes o foco nico.

    Entretanto, nas sesses em espaos abertos, a disposio dos sujeitos se d de diferentes

    maneiras e muitas vezes os receptores ficam distantes da tela, espalhados pelos espaos

    10 (GOFFMAN, 1961, p.7, citado por GASTALDO, 2006).

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    das praas, por exemplo. Alm disso, nessas ocasies, a tela no o nico foco, j que a

    situao possibilita o encontro e a disperso dos sujeitos.

    Para compreender o contexto situacional da recepo, considero como

    dimenses relevantes a composio do cenrio de recepo, com a proposta de pensar o

    espao fsico, os objetos e as suas distribuies no cenrio, os receptores (considerando

    elementos que possam me ajudar a pensar em questes de sexo, idade, classe social); a

    apropriao do cenrio pelos sujeitos, considerando os agrupamentos (por sexo, idade,

    casais, famlias), a disposio dos cineclubistas e dos agentes mediadores no local, de

    modo a compreender os sentidos dessa distribuio; as interaes os sujeitos e entre os

    sujeitos e os filmes, pensando como se do os encontros no espao da itinerncia e em

    como os sujeitos se relacionam com o que exibido nas telas; os comportamentos dos

    sujeitos, considerando a disposio corporal, as movimentaes, a gestualidade, a

    sonoridade (conversas, risos, choros), de modo que esses elementos contribuam para a

    compreenso sobre como se d o processo de recepo neste contexto situacional.

    Como inspirao para a elaborao destas dimenses, me parecem produtivas as

    contribuies de dois autores, sendo eles Hall (1994) e Birdwhistell (1994), no sentido

    de entender que a gestualidade e as maneiras de ocupao do espao possuem relaes

    com cdigos culturais. Ambos trabalham no sentido de que possvel considerar que,

    atrs do que parece no ter um padro pode-se revelar a expresso de modelos culturais.

    Birdwhistell (1994) considera que gestualidade e linguagem se integram em uma

    multiplicidade de formas de comunicao e nesse sentido, considera o processo

    comunicacional como plural. Hall (1994), por sua vez, se prope ao estudo da

    organizao social do espao. Sua teoria chamada de Proxmica, e busca entender de

    que modo diferentes povos vivenciam os espaos. Parece-me que nesse sentido,

    interessante pensar nas relaes que se travam entre a cultura popular midiatizada dos

    espectadores e a cultura cineclubista, que estabelecem diferentes formas de ocupao deuma sala de exibio. Ou seja, os espectadores, naturalizados em uma recepo

    domstica de filmes se apropriariam de maneiras distintas dos cineclubistas, que

    possuem uma outra trajetria ligada ao consumo de cinema, onde h a assistncia

    coletiva em espaos regrados.

    Estratgias metodolgicas

    A noo de metodologia com a qual opero abarca todo o processo de tomada de

    decises para o desenho de uma investigao e no s a definio de tcnicas de coleta

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    de dados ou de amostras a serem estudadas (BONIN, 2006). Para desenvolver a

    mediao contexto situacional, desenvolvi as etapas de pesquisa de contextualizao,

    pesquisa terica, pesquisa metodolgica, pesquisa exploratria e pesquisa sistemtica.

    A etapa depesquisa exploratria, por exemplo, foi desenvolvida como uma proposta de

    aproximao das mostras, cineclubistas, agentes mediadores, receptores, filmes exibidos

    e tambm como uma possibilidade de experimentao de tcnicas de coletas de dados11

    e de reformulao do problema de pesquisa. Nesta etapa, desenvolvida no ano de 2007,

    observei cinco sesses itinerantes e, a partir da, defini o contexto situacional de

    recepo como uma mediao importante no processo, assim como experimentei a

    observao participante como uma estratgia metodolgica de coleta de dados. Em

    relao observao participante, tanto na etapa exploratria, quanto na sistemtica (da

    qual trago os dados deste artigo) no busquei observar toda a cultura dos receptores,

    mas somente os elementos comunicacionais12 contidos naquele evento, da a

    possibilidade de se fazer a observao participante em menos tempo do que seria se

    fosse um trabalho etnogrfico, por exemplo. Penso que o que fiz foi uma reconfigurao

    de um procedimento metodolgico de coleta de dados, em virtude de um objetivo de

    pesquisa em comunicao.

    A construo da pesquisa sistemtica foi desenvolvida considerando as pistas

    obtidas na etapa depesquisa exploratria. Ela foi realizada entre os meses de agosto de

    2008 e janeiro de 2009. A idia era a de observar desde a chegada dos cineclubistas,

    montagem dos equipamentos, at o trmino da sesso e a desmontagem. Sempre que

    possvel, tentava circular no espao, sentando em locais diferentes e fazendo fotografias,

    inspirada em Hall (1982). Durante as sesses, optei por fazer anotaes e desenhar

    mapas, de modo que posteriormente conseguisse visualizar o cenrio de exibio. As

    itinerncias observadas durante a etapa sistemtica da pesquisa e que trago aqui foram

    11Desde uma perspectiva multimetodolgica, inspirada em Lopes et. al. (2002), articulei um conjunto deprocedimentos para o desenvolvimento de toda a dissertao, que incluram questionrios fechados, entrevistasestruturadas de aplicao flexvel, observao participante com foco comunicacional, para apreender a propostacineclubista; os usos, sentidos e apropriaes realizados pelos receptores, assim como as mediaes das competnciasculturais, das competncias miditicas, do cineclube e do contexto situacional de recepo. 12Foram priorizadas as seguintes dimenses de observao: Composio do cenrio de recepo - espao fsico,objetos, distribuio dos objetos (arranjo), caracterizao dos receptores (para pensar classe social, idade, sexo);Distribuio dos sujeitos no cenrio - agrupamentos (ver idades, sexo, famlias, casais), disposio dos cineclubistasno cenrio, disposio dos agentes no cenrio; Interaes - entre receptores, entre cineclubistas e receptores, entreagentes e receptores, entre agentes e cineclubistas, entre receptores e filmes (imagens e sons); Comportamento dosreceptores - disposio corporal, movimentaes, gestualidade, sonoridade (risos, gritos, conversas); Comportamento

    dos cineclubistas - disposio corporal, movimentaes. Quanto ao tratamento dos dados, os dirios de observaoforam descritos de acordo com os roteiros de observao.

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    trs13: na praa da Vila Nonoai; na escolaJoo Link Sobrinho, no bairro Itarar; na sede

    da CUICA, no bairro Camobi.

    Contexto situacional de recepo: descrio e anlise

    A itinerncia na Vila Nonoai, regio sul da cidade, aconteceu em 16 de janeiro

    de 2009 e foi exibido o filme brasileiro Tapete Vermelho (ver apndice A). A projeo

    foi feita na quadra de esportes da praa. O cenrio de recepo foi composto por um

    espao fsico bastante amplo, pois ao redor da quadra ainda existia os barrancos

    gramados, com alguns bancos. O local no ficou escuro, pois havia a iluminao da

    praa. A disposio dos equipamentos foi feita de acordo com a possibilidade de fonte

    de energia, pois extenses foram ligadas sede da associao de moradores. O projetor

    e as caixas de som ficaram na rea gramada, logo em frente associao e o filme foiprojetado do lado de trs da tela, que ficou na quadra de esportes.

    A partir da se deu a disposio dos sujeitos no cenrio de recepo. Cerca de 55

    pessoas assistiram ao filme, sendo que algumas saram no meio do filme e outras foram

    chegando, atrasadas. As pessoas pareciam se agrupar entre famlias e amigos. Eram de

    diferentes idades, adultos, jovens, crianas e velhos. O nmero de mulheres e homens

    parecia ser equivalente e os sujeitos vestiam roupas simples, informais e, possivelmente,

    pertenceriam a extratos de classe mdia e popular. Os receptores interagiam entre siconversando, rindo e se entreolhando, compartilhando chimarro e refrigerante. Alguns

    falavam sobre o filme, como duas senhoras que comentavam se um dos personagens

    no ia enganar o outro e tambm se um dos atores no era da novela A Favorita, da

    Rede Globo. Alm disso, os receptores pareciam tratar de outros assuntos, que no sobre

    o filme. Os cineclubistas conversaram com os moradores antes da sesso, um deles

    apresentou a atividade, mas durante a projeo do filme, os cineclubistas permaneceram

    sentados no cho perto dos equipamentos, numa rea distante do pblico e pouco

    interagiram com os moradores.

    Sobre a interao entre receptores e filmes, era possvel ver a expresso de

    ateno das pessoas, sendo que em vrias cenas, ouvia-se as risadas. Elas pareciam

    bastante compenetradas, pois, apesar das cerca de duas horas de filme, do desconforto

    para as que estavam sentadas no cho. Em relao ao comportamento dos receptores, a

    13Como no h uma agenda organizada antecipadamente, medida que as itinerncias eram negociadas, eu me

    deslocava at Santa Maria e acompanhava a atividade. No foi possvel escolher sesses em diferentes locais deexibio, j que o cineclube realizou itinerncias basicamente em espaos internos e escolas, dificultando a variedadeem relao ao contexto situacional da recepo.

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    disposio corporal era variada, havia os que estavam sentados nas cadeiras e os que

    estavam no cho e tentavam se acomodar da melhor forma, at mesmo deitados. A

    movimentao acontecia, principalmente, na rea em torno da quadra e tambm ao

    fundo, onde algumas crianas andavam de bicicleta.

    A sesso feita na escola Joo Link Sobrinho14 aconteceu no dia 30 de setembro

    de 2008, uma quinta-feira, s 14 horas (ver apndice B). Os filmes usados foram os de

    um DVD com quatro curtas-metragens. O cenrio de exibio foi uma sala de aula e o

    espao fsico era pequeno e foi organizado com as crianas dentro da sala, j que a

    professora queria que eles acompanhassem o processo. A interao entre cineclubistas

    e receptores foi intensa desde o incio. A interao entre agente mediador (professora)

    e alunos era no sentido de fazer com que as crianas ficassem calmas e prestassem

    ateno em tudo para depois fazer um relatrio.

    Como foram duas turmas de terceira srie, eram cerca de 36 alunos na sala de

    aula. Quanto disposio dos sujeitos no cenrio, uma turma ficou praticamente toda

    nas ltimas fileiras, em cima das classes e a outra turma nas fileiras da frente, nas

    cadeiras. A maioria das crianas era do sexo feminino, pareciam ter cerca de 10 anos,

    mas havia algumas mais velhas. Ainda sobre as interaes entre receptores e

    cineclubistas, um dos cineclubistas falou para os alunos sobre o telo, o projetor, o

    aparelho de DVD. A professora, por sua vez, pediu que os alunos no dessem risada alta

    e um dos cineclubistas pediu que no fizessem barulho. Em relao ao comportamento

    dos alunos ao assistirem a esse filme, eles ficaram em silencio, como foi toda a sesso,

    alguns davam risada, mas nada que se comparasse agitao inicial.

    Ao final de cada filme, um dos cineclubistas fazia um comentrio. Quanto

    interao entre crianas e filmes, elas davam risadas, comentavam sobre os filmes,

    expressavam susto e tapavam os olhos em algumas cenas dos curtas-metragens. Sobre a

    disposio dos sujeitos no espao e o comportamento, a professoracirculava na lateraldireita da sala e fazia expresso de apavorada para as crianas, ela parecia interagir por

    expresses com eles de acordo com o filme exibido. Sobre o comportamento dos

    alunos, eles estavam apoiados com as mos nas classes ou sentados com as pernas

    dobradas.

    14A Escola Estadual de Ensino Fundamental Joo Link Sobrinho possui 267 alunos. A turma de terceira srie, queorganizou a sesso, faz parte do projeto por ela coordenado chamando Resgatando Cidadania.

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    A exibio na sede da CUICA15 aconteceu no dia 18 de agosto de 2008, um sbado,

    s 15 horas (ver apndice C). O filme exibido pelo cineclube foi Cartola Msica para

    os olhos. A sede uma casa adaptada e a sesso aconteceu no auditrio do projeto. O

    espao fsico era amplo, uma sala j com cadeiras dispostas em fileiras e o telo foi

    fixado na parede. Como havia grandes janelas perto do teto, eles cobriram com um

    tecido preto, para bloquear a entrada de luz e colocaram o projetor em cima de

    instrumentos e de caixas de instrumentos. Os receptores eram em sua maioria crianas e

    adolescentes, totalizando 32 pessoas, somadas a cineclubistas e funcionrios da CUICA.

    A disposio dos sujeitos foi feita nas nove fileiras de cadeiras j organizadas e era

    possvel perceber os grupos que iam se formando. Alm da questo da idade, os

    agrupamentos formaram-se por gnero, j que havia grupos de meninas e grupos de

    meninos.

    O professor responsvel sentou-se na ltima fileira e os cineclubistas

    espalharam-se pela sala, mas sempre nos cantos. Quanto s interaes, era possvel ver

    os receptores conversando entre si, assim como os cineclubistas falavam entre si, mas

    no havia uma maior interao entre os dois grupos. Na metade do filme os

    adolescentes, principalmente, comearam a conversar entre si. Quanto s interaes

    entre receptores e filmes, alguns receptores expressavam que queriam ir embora. Eles

    tambm faziam comentrios sobre o filme, como quando o pai de Cartola dizia que o

    filho no gostava de estudar, um dos adolescentes respondeu: Nem eu.

    Quanto ao comportamento dos receptores, a sesso foi silenciosa, aparentemente

    acontecendo pouca disperso e movimentao. As crianas menores, com menos de sete

    anos de idade eram as que se movimentavam mais. Em alguns momentos, os receptores

    pareciam dispersos, conversavam um pouco, mas mesmo assim no foi uma sesso

    ruidosae eles permaneceram at o final da exibio. Eles pouco riam ou expressavam

    qualquer outra reao. possvel que a fala do professor no incio (que disse que elesdeveriam ficar at o final) e o espao da escola de msica, tenha contribudo para que os

    receptores ficassem em silncio e permanecessem l, como uma obrigao. Porm,

    parece tambm que o fato de estarem assistindo a algo novo, diferente, tenha chamado a

    ateno, j que muitos no eram mais alunos da CUICA e poderiam ir embora a

    qualquer momento, mas no o fizeram.

    15CUCA um projeto cultural, sendo que sigla significa Cultura, Incluso, Cidadania e Arte. Alunos de

    escolas pblicas vo at a sede da CUCA para as aulas de percusso, dana e teatro.

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    As observaes das mostras trazem elementos para pensar que a espacialidade

    configura a recepo das sesses, em diversos aspectos. No caso da exibio na quadra

    de esportes da Vila Nonoai, o amplo cenrio permite a alocao dos sujeitos em vrias

    posies e distncias da tela. Os receptores espalham-se pelo local, especialmente no

    gramado. possvel que isso tenha sido por conta do conforto, j que no havia cadeiras

    para sentar. Entretanto, interessante pensar nas lgicas de uso do prprio espao da

    quadra de esportes, onde comum que os espectadores fiquem nos gramados, assistindo

    aos jogos. O telo colocado a lado da trave (ainda que tenha sido pela necessidade de

    ligar os equipamentos na luz) situa-se em um lugar estratgico da quadra, um ponto

    fundamental para onde converge o espetculo. interessante pensar em lgicas

    culturais de uso de espao, como nos lembra Hall (1994) com aproxmica.

    Isso visto tambm na sala de aula da escola Joo Link Sobrinho. A lgica

    escolar tambm perpassa a configurao espacial: disposio das cadeiras, carteiras,

    presena da professora interagindo com os alunos, agindo no controle dos

    comportamentos, expressando sentidos atravs da gestualidade. O espao pequeno da

    sala favoreceu a interao entre os alunos, pois mesmo que ficassem agrupados junto s

    seus melhores amigos, estavam ao lado de outros colegas. A lgica de turmas (uma

    turma na parte de trs e a outra na parte da frente) e de relaes entre alunos (grupos,

    colegas) tambm se expressa na ocupao do espao.J na Vila Nonoai e na sede da

    CUICA, por conta dos espaos mais amplos, era perceptvel a formao de grupos. Na

    Nonoai, especialmente, os agrupamentos se davam entre famlias e vizinhos e na

    CUICA, por idade e gnero.

    Nos modos de se colocar no espao e nos comportamentos se expressam no s

    as marcas de uso do local, mas tambm as da assistncia televisiva e da cultura popular.

    Na quadra da Nonoai, os sujeitos se colocam como se estivessem diante de um jogo,

    ainda que um grupo pequeno tenha levado cadeiras e colocado no centro da quadra. NaescolaJoo Link Sobrinho o silncio da sala de aula permanece, assim como na CUICA.

    Na praa da Nonoai elementos da cultura popular como o rudo, a sociabilidade, se

    expressam. A formao de grupos parece seguir a lgica do parentesco, da vizinhana,

    da amizade, importantes traos da cultura popular. O modo de assistncia no espao

    domstico tambm se revela, com sujeitos at mesmo deitados na grama, vendo o filme

    da maneira mais confortvel que encontram. Comentrios ouvidos na exibio da

    Nonoai parecem expressar o acionamento de matrizes e lgicas da telenovela, com o

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    reconhecimento de atores do filme e que estavam estrelando uma novela daRede Globo

    naquele perodo.

    Os agentes mediadores atuam de diferentes formas no contexto situacional. No

    caso da Vila Nonoai, a presidente da associao de moradores, que organizou a sesso,

    parece exercer papel de anfitri, uma ponte entre mundos dos receptores e dos

    cineclubistas. Ela recebe e lida com os sujeitos, porque conhece a lgica das exibies,

    ela faz a ligao entre os dois universos culturais. Na sesso da CUICA o professor

    parece realizar a mediao entre espectadores e cineclubistas, assim como um controle,

    ao falar que os receptores s deveriam sair no final da sesso. Considerando a estreita

    relao que ele tem com seus alunos, pelo respeito e pela amizade, possvel que essa

    fala tenha sido um ponto importante para que os alunos permanecessem at o fim. Na

    escolaJoo Link Sobrinho, algo semelhante tambm parece acontecer entre a professora

    e os alunos, sendo que ela manteve-se boa parte da sesso em p, cuidando para que os

    alunos ficassem em silncio.

    A disposio fsica dos cineclubistas em todas as sesses, sempre no entorno,

    parece manifestar o domnio do espao, a diferena entre papis, assim como uma

    distncia entre a sua cultura e a dos receptores. interessante considerar que os

    cineclubistas sentam-se no meio dos receptores apenas quando o equipamento de

    projeo est nesse local. Durante a sesso na CUICA, o chimarro, elemento da cultura

    regional, partilhado apenas entre cineclubistas e agentes pareceu expressar as posies

    diferenciadas em relao aos receptores.

    Quanto interao dos cineclubistas com os receptores, na sesso da Vila

    Nonoai, a fala inicial de um deles atuou no sentido de marcar sentidos sobre proposta

    cineclubista, quanto distino entre filme exibido e a telenovela, a valorizao da

    ocupao do espao pblico, assim como a preparao para a assistncia, adiantando

    temticas do filme e tempo de durao. O cineclubista no parece, nesse caso, ter umpapel to importante quanto o exercido na sesso da escola Joo Link Sobrinho, onde

    sua ao era pedaggica, demarcando sentidos. Ele buscou orientar a forma de relao

    dos alunos com os filmes (manter o silncio), ensinou competncias cinematogrficas

    (processo de produo, tipo de filme) e dirigiu a leitura sobre o contedo dos curtas.

    Talvez a interao, a provocao e o estmulo dos prprios alunos tenham gerado esse

    maior contato.

    A ateno dispensada pelos receptores aos filmes parece ser diferenciada. Naexibio da Nonoai as risadas parecem expressar um reconhecimento cultural,

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    considerando a presena da comicidade no filme, tambm como um elemento

    importante da cultura popular. As lgicas permitem a fruio do filme, fazendo que com

    um reconhecimento cultural se produza ali. Na escola Joo Link Sobrinho, os

    comportamentos dos receptores expressam regras da cultura escolar, da cultura

    geracional, assim como uma relao de encantamento com a tcnica.

    Consideraes finais

    O contexto situacional de recepo media sentidos e tambm possibilita

    apropriaes dos sujeitos quanto ao espao. Essa mediao construda na modificao

    do cenrio a partir dos equipamentos tecnolgicos e das diversas interaes que ali se

    realizam. A questo da tcnica, com os equipamentos e o telo parece marcar os

    sentidos sobre a atividade, assim como a recepo coletiva. O poder dos cineclubistasnaquele espao, assim como o dos agentes mediadores, controlando a movimentao, a

    sada dos alunos e o silncio tambm parece ser marcante. As relaes entre receptores

    e cineclubistas so marcadas, particularmente, pela distncia. O poder expresso na

    disposio dos cineclubistas no cenrio, dispondo-se em volta dos receptores e quase

    nunca no meio. Eles dominam o espao, os equipamentos de projeo e as falas que so,

    muitas vezes, pouco explicativas. Entretanto, h sesses em que a interao acontece de

    outra forma, como a da escola Joo Link Sobrinho. L, os receptores instigaram,provocaram os cineclubistas, gerando uma relao mais prxima. Nesta sesso os

    cineclubistas tambm participaram da construo de sentidos dos filmes, explicando-os.

    Em relao aos conceitos utilizados pare pensar tal mediao, certamente a idia

    de situao flmica (METZ, 1982 citado por FRAGOSO, 2000) no se aplicaria, pois

    essa experincia no marcada pela imobilidade, escurido, silncio, distanciamento

    das presses do cotidiano. As lgicas culturais de usos destes espaos cotidianamente

    tambm configuram a disposio e o comportamento dos sujeitos, com no caso da

    quadra de esportes da Vila Nonoai e da sala da aula da escola Joo Link Sobrinho.

    Nesse sentido, a idia de Silva (2002), considerando que o cinema tambm o lugar e

    as prticas que vinculam o lugar, me parece essencial para pensar as itinerncias. Do

    mesmo modo, so importantes as idias de Hall (1994) quanto aos cdigos culturais de

    ocupao espacial e de Birdwhistell (1994) considerando que a gestualidade tambm

    expressa elementos do processo comunicacional. A noo de situacionalidades

    limtrofes, que misturam o pblico e o privado, discutido por Silveira (2004) tambm se

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    revela na observao das itinerncias, em que o espao da rua parece se mesclar ao da

    televidncia familiar, como na praa daNonoai.

    Referncias bibliogrficas

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    APNDICES

    Apndice A: Fotos 1 e 2 - cineclubistas durante a sesso (dois em primeiro plano) e receptores aofundo, na quadra; receptores na rea gramada, sentados em cadeiras trazidas de casa.

    Apndice B: Fotos 3 e 4 - Cineclubistas organizando a sesso enquanto alunos acompanham; alunosdurante a sesso.

    Apndice C:Fotos 5 e 6 - Disposio corporal dos receptores durante sesso; telo e janelas cobertascom tecido.