estudo sobre festivais

Upload: renato-frossard-cardoso

Post on 09-Jan-2016

71 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

festivais

TRANSCRIPT

  • 1

    Universidade de Braslia - UnB Centro de Excelncia em Turismo - CET

    Mestrado Professional em Turismo

    Festivais musicais: um estudo sob a tica do turismo

    Rayane Ruas

    Braslia - DF

    2013

  • 3

    Universidade de Braslia - UnB

    Centro de Excelncia em Turismo - CET

    Mestrado Professional em Turismo

    Festivais musicais: um estudo sob a tica do turismo

    Rayane Ruas

    Dissertao apresentada ao Mestrado profissional em Turismo da Universidade de Braslia como requisito parcial para obteno do ttulo de mestre.

    Orientadora: Profa. Dra.

    Donria Coelho Duarte

    Braslia - DF

    2013

  • 4

    FICHA CATALOGRFICA

    Ficha catalogrfica elaborada pela Biblioteca Central da Universidade de

    Braslia. Acervo 1013478.

    Ruas , Rayane.

    R894f Fest i va is musica is : um estudo sob a t ica do tur ismo

    / Rayane Ruas . - - 2013 .

    197 f . : i l . ; 30 cm.

    Disser tao (mest rado) - Univers idade de Bras l ia ,

    Centro de Excelnc ia em Tur ismo, Mest rado Profe ss ional

    em Tur ismo, 2013.

    Inc lu i b ib l iograf ia .

    Or ientao: Donr ia Coe lho Duarte .

    1 . Fest i va is - Msica. 2 . Tur ismo. I . Duarte , Donr ia

    Coelho. I I . T tu lo .

    CDU 338. 482. 2

  • 5

    Universidade de Braslia - UnB

    Centro de Excelncia em Turismo - CET

    Mestrado Professional em Turismo

    Festivais de Msica: Um estudo sob a tica do Turismo

    Rayane Ruas

    BANCA EXAMINADORA:

    _______________________________________________

    Profa. Dra. Donria Coelho Duarte UnB

    (Orientadora)

    _______________________________________________

    Prof. Dr. Gilson Zehetmeyer Borda CNPQ

    ________________________________________________

    Profa. Dra. Maria Elenita Menezes Nascimento UnB

    _______________________________________________

    Profa. Dra. Neuza de Farias ArajoUnB

    (Suplente)

    Braslia, 11 de dezembro de 2013.

  • 7

    AGRADECIMENTOS

    minha orientadora, Profa. Dra. Donria Coelho Duarte, por aceitar o

    desafio, acreditar ser possvel e me dar todos os subsdios para a concluso desta

    pesquisa e desta etapa da minha vida, por se converter em muito mais do que uma

    orientadora, mais uma companheira de batalha e uma amiga.

    Aos meus professores que a cada dia clareiam ainda mais as ideias e me

    mostram que sempre h conhecimento a ser adquirido. Em especial Profa. Dra.

    Ivany e Profa. Dra. Karina, que por um momento foram minhas mentoras na

    construo de trabalho.

    Agradeo minha famlia, que sempre me deu apoio incondicional e

    acreditou em mim! Aos meus pais, que so a minha grande inspirao!

    Ao meu esposo, minha mais nova famlia intima, agradeo imensamente!

    Por acreditar em mim, me dar foras e apoio quando mais necessito. Por ser meu

    grande amor que me entende, ou no, mas que de todas as formas que pode me d

    o suporte para seguir adiante, que compreende a minha ausncia e aceita a minha

    dedicao extrema, que a minha luz e minha fonte de energia. Muchas gracias mi

    principote!

    E a todos os que de alguma forma contriburam no processo de coleta de

    dados e entrevistas, seja divulgando aos amigos ou participando diretamente da

    entrevista.

  • 9

    EPGRAFE

    Um homem precisa viajar, por sua

    conta, no por meio de histrias, imagens,

    livros e tevs, precisa viajar, por si, com os

    olhos e ps, para entender o que seu

    Amyr Klink

  • 11

    RESUMO

    Este trabalho trata-se de uma pesquisa de carter qualitativo, baseada no mtodo hipottico-dedutivo, que busca analisar os festivais de msica enquanto encontros que permitem a ruptura do cotidiano proporcionando uma experincia do turismo. Primeiramente foi realizada uma pesquisa exploratria explicativa acerca do tema o que delimitou o seu objeto de estudo. O recorte do objeto de estudo foram os festivais de msica desde o Festival de Monterey em 1967 at os dias atuais. Durante a pesquisa exploratria surgiu a hiptese a ser testada: Se os festivais de msica proporcionam uma experincia do turismo, ento a motivao para a participao de festivais de msica est relacionada com a experincia vivida nele. Utilizando-se como coleta de dados a entrevista semi estruturada com participantes de pelo menos dois festivais de msica. Os resultados desta pesquisa indicaram que os festivais de msica contribuem para a diversidade de experincias proporcionadas pelo turismo, configurando-se como mais uma experincia possvel no mbito turismo, tendo em vista que a vivncia proporcionada pelos festivais possuem alguns elementos que compe a experincia do turismo (uma motivao que gera uma expectativa, um lugar que abriga a experincia e uma troca social).

    Palavras chave: Festivais de Msica, Turismo, Encontro, Motivao,

    Experincia.

  • 13

    RESUMN

    Este estudio es una investigacin cualitativa basada en el mtodo hipottico-deductivo, que posee como objetivo analizar los festivales de msica des del punto de vista de encuentros que permitan la interrupcin de la vida diaria y proporcionan una experiencia turstica. En primer lugar, llev a cabo un estudio exploratorio sobre el tema que defini el objeto central de estudio. Objeto este que comprende el contexto en que se inserta los festivales de msica des del Festival de Monterey en 1967 hasta la actualidad. Durante la investigacin exploratoria se desarroll la hiptesis a comprobar: "Si los festivales de msica ofrecen una experiencia turstica entonces la motivacin para participar en festivales de msica se relaciona con la experiencia". La hiptesis fue evaluada mediante entrevistas semi-estructuradas con participantes de al menos dos festivales de msica. Los resultados de la investigacin apuntan que los festivales de msica contribuyen para la diversidad de experiencias posibles en el turismo, considerando que la vivencia proporcionada por los festivales poseen algunos elementos con componen la experiencia del turismo (una motivacin que genera una expectativa, un lugar que abriga la experiencia y un intercambio social).

    Palabras llave: Festivales de msica, Turismo, Experiencia, Encuentros,

    Motivacin.

  • 15

    ABSTRACT

    This study is a qualitative research based on hypothetical-deductive method, which seeks to analyze the music festivals while encounters that allow the disruption of daily life providing a tourism experience. We first carried out an exploratory about the subject that defined the object of his study. The object of study was defined by the context it was inserted the music festivals from Monterey Festival in 1967 to the present day. During the exploratory research developed the hypothesis to be tested: "If the music festivals provide a tourism experience, so the motivation for participation in music festivals is related to experience it" using as data collection semi-structured interviews with participants in at least two music festivals. The results indicated that music festivals contribute to the diversity of experiences offered by tourism, configuring it as one more possible experience within tourism, considering that the experience provided by the festivals have some elements that make up the experience of tourism (a motivation that generates an expectation, a place that houses the experience and social exchange).

    Key-Words: Music Festivals, Tourism, Experience, Meeting, Motivation.

  • 17

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1.1: Estrutura da Dissertao ......................................................................... 29

    Figura 2.1: Programao do International Monterey Pop Festival. ............................ 56

    Figura 2.2: Ingresso do Monterey Internacional Pop Festival ................................... 57

    Figura 2.3: Pblico Woodstock em 1969 ................................................................... 58

    Figura 2.4: Poster do Isle of Wight, edio 1970. ...................................................... 62

    Figura 2.5: Pblico do Festival da Ilha de Wight, 1970. ............................................ 62

    Figura 2.6: Pblico no Isle of Wight 2010 .................................................................. 63

    Figura 2.7: Palco principal do Glastonbury, em 1971. ............................................... 65

    Figura 2.8: Principais atraes que passaram pelos palcos do Glastonbury ............ 67

    Figura 2.9: Nmeros do Glastonbury ........................................................................ 67

    Figura 2.10: Cartaz de Divulgao da 3 Edio do Festival de guas Claras ......... 70

    Figura 2.11: Pblico do Rock in Rio 1985. ............................................................... 73

    Figura 2.12: 2 Edio do Rock in Rio em 1991, no Maracan ................................. 74

    Figura 2.13: Nmero dos Rock in Rio 2013 .............................................................. 77

    Figura 2.14: Confirmao Rock in Rio 2015 .............................................................. 78

    Figura 2.15: Cartazes de divulgao do Lollapalooza de 1991 at 2010 .................. 80

    Figura 2.16: Banner SWU ......................................................................................... 87

    Figura 2.17: Linha do tempo dos Festivais ............................................................ 7794

    Figura 3.1: Pirmide de Maslow .............................................................................. 103

    Figura 5.1: rea de descanso com materiais reciclveis - SWU 2011 .................... 137

    Figura 5.2: Lixo no SWU 2011 ................................................................................ 140

    Figura 5.3: Viso panormica dos palcos do SWU 2011.. ...................................... 142

    Figura 5.4: Espao construdo para a realizao do Rock in Rio 2011. .................. 158

    Figura 5.5: Atraes complementares dos festivais - Rock in Rio 2013. ................ 160

  • 19

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 2.1: Sntese dos Festivais de Msica ........................................................... 93

    Quadro 3.1: Quadro Resumo dos Conceitos .......................................................... 115

    Quadro 4.1: Detalhamento das alteraes no roteiro de perguntas do pr-teste .... 128

    Quadro 4.2: Relao entre variveis, autores e blocos de perguntas ..................... 129

    Quadro 5.1: Quadro Resumo Perfil dos entrevistados ......................................... 145

    Quadro 5.2: Elementos da Motivao ..................................................................... 151

    Quadro 5.3: Turismo e os meios de comunicao .................................................. 167

  • 21

    SUMRIO

    Introduo ............................................................................................................. 24

    I. Objetivos .................................................................................................. 29

    II. Justificativa ............................................................................................... 30

    1. A evoluo dos festivais ao longo da histria ................................................. 33

    1.1 Idade antiga .............................................................................................. 34

    1.2 Idade mdia .............................................................................................. 44

    1.3 Idade Moderna ......................................................................................... 48

    1.4 Idade contempornea ............................................................................... 52

    2. Celebrao dos Festivais de Msica: Um Estudo da Evoluo ao Longo dos

    Anos ............................................................................................................. 54

    2.1 Monterey (Eua California, 1967) ............................................................ 55

    2.2 Woodstock (Eua, 1969) ............................................................................ 57

    2.3 The Isle Of Wight (Inglaterra, 1968 A 1970) .......................................... 61

    2.4 Glastonbury (Inglaterra, 1970 at os dias atuais) ..................................... 64

    2.5 guas Claras (Iacanga/SP - Brasil, 1975 - 1983) ..................................... 68

    2.6 Monster Of Rock (Inglaterra 1980 1996 e 2006 At Dias Atuais) .......... 70

    2.7 Rock In Rio Rio de Janeiro, Brasil (1985 At Dias Atuais) .................... 72

    2.8 Lollapalooza Estados Unidos (1991) ..................................................... 79

    2.9 Castlemorton Inglaterra (1992) .............................................................. 82

    2.10 Tribal Gathering Inglaterra (1993) ..................................................... 83

    2.11 Skol Beats Brasil (2000) ................................................................... 85

    2.12 Universo Paralelo Bahia, Brasil (2000) ............................................. 86

    2.13 Planeta Terra Festival So Paulo, Brasil (2007) ............................... 87

  • 22

    2.14 SWU Comea Com Voc So Paulo, Brasil (2010) ....................... 88

    2.15 Anlise da evoluo dos festivais ao longo dos anos .......................... 92

    3. Os Festivais de Msica e o Turismo ............................................................... 97

    3.1 Evoluo do Conceito de Turismo ............................................................ 97

    3.2 Experincia, Vivncia, Motivao e Imaginrio ...................................... 101

    3.2.1 Experincia e ViVncia..................................................................... 101

    3.2.2 Motivao ......................................................................................... 103

    3.2.3 Imaginrio ......................................................................................... 106

    3.3 Festivais de Msica ................................................................................ 109

    3.4 Eventos Especiais .................................................................................. 110

    4. Procedimentos Metodolgicos ...................................................................... 119

    4.1 Mtodo Hipottico-Dedutivo ................................................................... 119

    4.2 Tipos de Pesquisa .................................................................................. 122

    4.2.1 Pesquis Exploratria......................................................................... 122

    4.2.2 Pesquisa Descritiva .......................................................................... 123

    4.3 Tcnicas de Pesquisa ............................................................................ 124

    4.3.1 Pesquisa Bibliogrfica ...................................................................... 124

    4.3.2 Pesquisa Documental....................................................................... 125

    4.3.3 Observao Participante .................................................................. 125

    4.3.4 Entrevista Semi-estruturada ............................................................. 127

    4.4 Anlise de dados .................................................................................... 132

    4.4.1 Abordagem Qualitativa ..................................................................... 132

    4.4.2 Anlise de Contedo ........................................................................ 133

    5. Relato e Anlise dos Casos Pesquisados .................................................... 135

    5.2 Relato Pesquisa Exploratria Observao Participante ...................... 135

    5.2.1 SWU 2010 ........................................................................................ 135

  • 23

    5.2.2 Rock in Rio 2011 .............................................................................. 136

    5.2.3 SWU 2011 ........................................................................................ 137

    5.3 Coleta de Dados ..................................................................................... 144

    5.3.1 Perfil doS EntrevistadoS ................................................................... 145

    5.3.2 Motivao da participao ................................................................ 148

    5.3.3 Turismo nos Festivais....................................................................... 163

    5.4 Experincia Vivenciada nos Festivais x Experincia Proporcionada pelo

    Turismo ......................................................................................................... 170

    6. Consideraes Finais ................................................................................... 175

    6.1 Alcance dos Objetivos Especficos ......................................................... 175

    6.2 Concluses ............................................................................................. 177

    6.3 Desafios da Pesquisa ............................................................................. 181

    6.4 Pesquisas Futuras .................................................................................. 181

    Referncias Bibliogrficas ....................................................................................... 183

    Apndice 1 - Roteiro de Entrevista SWU Music & Arts Festival 2011 .................. 192

    Apndice 2 - Roteiro de Entrevistas Festivais de msica: uma anlise sob a tica

    do turismo................................................................................................................ 193

  • 24

    INTRODUO

    Ao se pensar em festival musical, a princpio o que vem mente so

    pessoas que esto em um determinado lugar para escutar os seus grupos de

    msica que ali se apresentaro. No entanto, a realidade dos festivais musicais vai

    alm de ouvir e executar msica, no s para os artistas que ali esto

    apresentando suas msicas, mas tambm para os fs que at l se deslocaram

    para vivenciar essa experincia.

    Esta pesquisa tem como princpio, que atravs da msica possvel romper

    barreiras e unir as pessoas, proporcionando-lhes uma vivncia diferenciada,

    gerando momentos de encontro e celebrao. Portanto, os festivais musicais so

    uma forma de utilizao da msica como ferramenta para a mobilizao dos seus

    participantes, para a ruptura do cotidiano e a vivncia de uma experincia.

    O Brasil tem se destacado cada vez mais quanto receptividade dos

    festivais musicais. No ano de 2011, no Brasil, foram realizados 3 grandes festivais:

    Rock in Rio, Starts With You SWU e o Planeta Terra. Em 2012, chegou ao pas o

    Lollapalooza, e ainda vrios shows internacionais. J em 2013 os festivais tiveram a

    sua agenda bem diversificada com a chegada do Monsters of Rock e a manuteno

    dos j vinham acontecendo.

    Os festivais de msica podem revelar ao mundo a diversidade do Brasil, o

    seu potencial turstico, a sua capacidade de receber e organizar grandes eventos e o

    seu desenvolvimento tecnolgico e humano. Revelam, ainda, a possibilidade de

    congregar em um nico espao diferentes culturas, religies, formas de ver a vida

    em um momento de celebrao.

    Ao levar em conta a retrospectiva da maior transmissora de televiso

    brasileira (Rede Globo) observa-se que os eventos de msica esto como um dos

    fatos marcantes do ano de 2011. No Jornal da Globo, transmitido no dia 31 de

    dezembro de 2011, no bloco especial sobre msica, foi destacado que 2011 foi um

    ano de ouro para a msica. Essa afirmao justifica-se pelos cachs aplicados no

    Brasil, acima da mdia mundial e ao pblico de festivais brasileiros ser

    extremamente receptivo aos festivais e shows que ocorreram no pas, conforme

  • 25

    expressado na reportagem. O Brasil tornou-se, ento, um dos melhores mercados

    mundiais para os show Bussines, afirma a reportagem.

    Sobre os festivais musicais mais especificamente, o mesmo jornal aponta

    Para 2012 preparem seus coraes e seus cartes de crdito porque o Brasil se

    tornou a nova Meca dos festivais internacionais.

    Como espectadora participante deste tipo de evento, foi observado que a

    busca dos participantes por novos lugares de encontros, novos festivais e atraes

    musicais se torna cada vez maior. O interesse em participar de momentos de

    celebrao, tendo a msica como elo, se torna relevante no processo de

    socializao dos jovens, aos moldes da Europa que j possui uma vasta agenda de

    festivais musicais.

    Esta participao nos festivais contribuiu, ainda, a vivncia e a experincia

    em festivais, e a sua semelhana ou complementaridade experincia

    proporcionada pelo turismo, surgindo da o objeto de estudo desta pesquisa.

    A princpio o objetivo de estudo desta pesquisa era verificar os impactos dos

    festivais musicais no turismo, o legado para a cidade receptora, tendo como estudo

    de caso o festival musical SWU Starts With You1. Ao conhecer mais

    profundamente o objeto de estudo percebeu-se que a problemtica era ainda mais

    complexa e interessante, pois o SWU Music & Arts Festival no era simplesmente

    um festival musical de carter comercial, e sim a celebrao de um movimento social

    em prol da sustentabilidade. Acontecia a, a primeira transformao do foco de

    pesquisa.

    1 SWU: O SWU Starts With You, em portugus, Comea com Voc, um movimento de

    conscientizao em prol da sustentabilidade. Iniciado em junho de 2010, possui o intuito de mobilizar o maior nmero de pessoas possvel para adotar pequenas atitudes no seu dia a dia que ajudam a construir um mundo melhor e que fazem a diferena. uma iniciativa de Eduardo Fischer, presidente do Grupo Totalcom, que parte do princpio de que pequenas atitudes podem gerar grandes mudanas. O SWU Music & Arts Festival diz ter como principal objetivo inspirar, conscientizar e mobilizar o seu pblico, demonstrando que a sustentabilidade pode estar presente em todas as aes e contribuir para o estabelecimento de prticas sustentveis de forma inovadora. O Festival declara se utilizar da paixo que a msica desperta nas pessoas para sensibilizar o pblico em prol da sustentabilidade.

  • 26

    Em novembro de 2011, a pesquisadora foi a campo para a segunda edio

    do SWU Music & Arts Festival2, com o intuito de observar como este festival musical

    se configuraria como um lugar de encontro, que acolhe pessoas distintas, onde se

    pressupunha um movimento em prol da sustentabilidade. Nesse momento foi

    realizada a primeira coleta de dados a ser explorada posteriormente neste trabalho.

    A inteno era identificar, tambm, de que forma a organizao se propunha a unir a

    sustentabilidade com a msica, aproveitando aquele momento de descontrao e

    diverso para inserir informaes a respeito da sustentabilidade.

    Infelizmente, as premissas no se confirmaram. Diferente da primeira, a

    segunda edio do SWU Music & Arts Festival se confirmou como um evento

    puramente mercadolgico, preocupado com a infraestrutura, o bem atender aos

    participantes, deixando de lado a sua filosofia original: a sustentabilidade.

    Diante disso, identificou-se atravs das entrevistas que a motivao das

    pessoas de estarem naquele lugar era o desejo de compartilhar a msica, e no a

    sustentabilidade como era o imaginado. Mas a motivao no estava voltada apenas

    para a msica, era muito mais o viver aquela experincia. No era a

    sustentabilidade que movia aquele pblico, mas sim o desejo de celebrao atravs

    da msica.

    Identificou-se, portanto, a existncia de uma busca por experincias que

    podem ser conceituadas e entendidas sob vrios aspectos e, dentre eles, o turismo.

    Tendo em vista que o turista sai do seu lugar de origem, do seu cotidiano, buscando

    algo novo, buscando interagir e adquirir experincias e vivncias diferenciadas.

    Portanto, os participantes dos festivais poderiam se revelar como atores do turismo,

    sendo essa a primeira indagao no momento do estgio da graduao.

    No entanto, o que mais chamou ateno nos festivais foi a liberdade vivida,

    o encontro de diferentes formas de ser e pensar em um s espao, onde as

    diferenas e at deficincias no so impeditivos para a sua participao ou

    geradoras de preconceito. Aps essa observao, atrelada participao no SWU

    em 2010, e no Rock in Rio em 2011 nestes j com um olhar de pesquisadora

    2 Realizado na cidade de Paulnia So Paulo, nos dias 12 a 14 de novembro de 2011.

  • 27

    percebeu-se os festivais de msica como lugares de encontro e celebrao do

    pblico que proporcionam uma experincia.

    Diante do vivenciado, se delineou a problemtica dessa pesquisa: At que

    ponto os festivais, entendidos como encontros que permitem a ruptura do cotidiano,

    podem se revelar como uma experincia turstica?

    Esse questionamento se justifica na necessidade constante de conceituao

    e entendimento do turismo. Tendo como premissa que o turismo proporciona uma

    experincia apoiada na possibilidade de encontro, a troca de relaes culturais

    ocorridas em determinado local e em uma vivncia diferenciada do dia a dia

    (GIARETTA, 2003; GASTAL, 2005; BENI, 2007). Portanto, prope-se uma anlise e

    um estudo sobre os festivais de msica e as experincias proporcionada por ele com

    vistas a desvelar se configuram-se como turismo, pois percebe-se que possuem um

    carter humano, concebem uma troca de experincias e promovem uma celebrao

    realizada atravs de um elo: a msica.

    A problemtica justifica-se, ainda, em analisar como essa atividade cultural

    se converte em turismo, e quais so os elementos que proporcionam a experincia

    vivenciada no festival. O objetivo da pesquisa contribuir para a teorizao do

    turismo e realizar uma pesquisa acadmica a respeito das novas reconfiguraes e

    novas formas dessa atividade. Espera-se, ainda, deixar como legado um apanhado

    da historicidade dos festivais de msica, uma temtica extremamente atual e sem

    bibliografia consolidada.

    O mtodo de anlise utilizado para atingir os objetivos ser utilizado o

    mtodo Hipottico-dedutivo, que gera a seguinte hiptese de pesquisa: Se os

    festivais de msica proporcionam uma experincia do turismo, ento a motivao

    para a participao de festivais de msica est relacionada com a experincia vivida

    nele.

    Para atingir os objetivos da pesquisa, o trabalho foi dividido em 5 partes. O

    Captulo 1 trata da evoluo dos festivais ao longo do tempo. Apresenta as

    festividades e momentos de encontros ocorridos nos perodos histricos que pode

    haver evoludo para chegar ao que hoje conhecido como festival de msica. Isto

  • 28

    porque entende-se que os festivais e as celebrao no surgiram do nada, e foram

    evoluindo at chegar ao que se conhece atualmente. Portanto busca-se na histria a

    primeira ocorrncia de eventos de celebrao, com foco no entretenimento.

    No segundo captulo sero apresentados e descritos os principais festivais

    de msica do mundo, desde a sua primeira realizao: Festival de Monterey em

    1967 at os festivais dos dias atuais, abordando aqueles que contriburam para a

    formao e consolidao do fenmeno atual, que so os festivais de msica.

    No captulo 3 sero apresentados os conceitos chaves a serem utilizados e

    trabalhados por esta pesquisa, so eles: Turismo, Experincia, Festivais, Motivao,

    Encontro, Compartilhar dentre outras. No quarto captulo discutida a metodologia

    utilizada em todo o processo de elaborao e execuo da pesquisa.

    O quinto captulo apresenta os dados coletados durante a pesquisa

    exploratria, realizada em 2011, e durante a coleta de dados de 2013, analisando-os

    em consonncia com a teoria o que possibilitar a constatao da hiptese de

    pesquisa ou no, e se no porque a hiptese no se confirma. O stimo captulo

    trata das concluses percebidas a partir da coleta de dados.

    No intuito de visualizar as etapas que foram realizadas para a concepo

    desta pesquisa, apresenta-se na Figura 1.1:

  • 29

    I. OBJETIVOS

    Neste contexto, os objetivos desta pesquisa so:

    Objetivo Geral: Analisar os festivais de msica enquanto encontros que

    permitem a ruptura do cotidiano proporcionando uma experincia do turismo.

    Objetivos Especficos:

    Investigar a evoluo dos festivais ao longo do tempo;

    Discutir a evoluo dos festivais de musica ao longo dos anos;

    Investigar a motivao e as experincias relatadas pelos entrevistados

    participantes de festivais de msica; e

    Leitura prvia sobre turismo e os festivais

    Experincias anteriores nos festivais

    Pr-concepes estabelecidas em um momento de estgio

    Conhecimento Prvio

    Estudo Exploratrio em festivais: SWU 2010, Rock in Rio 2011 e SWU 2011

    Realizao da primeira coleta de dados durante o swu 2011 Estudo Exploratrio

    Construo do referencial terico

    Busca na histria as primeiras celebraes

    Historicidade dos festivais de msica Referencial Terico

    Discusso dos conceitos que envolvem a tmtica

    Turismo, Festivais, Encontro, Lugar, Motivao, Experincia Definio de

    variveis de estudo

    Realizao da Coleta de Dados

    Entrevistas semi-estruturadas com 32 participantes de festivais Pesquisa de campo

    Anlise dos dados coletados

    Cruzmento das falas com a teoria Anlise de dados

    Verificao da hiptese de trabalho

    Apanhado geral dos objetivos alcanados, limitaes e dificuldades Concluso

    Figura 1.1: Estrutura da Dissertao

  • 30

    Discutir em que medida as experincias proporcionadas pelos festivais se

    revelam como experincias tursticas.

    Sendo delineada, assim os objetivos desta pesquisa.

    II. JUSTIFICATIVA

    A temtica da presente pesquisa est centrada na investigao da

    motivao e as experincias vivenciadas pelos participantes durante o evento, e

    discutir de que forma as experincias proporcionadas pelos festivais se revelam

    como experincias tursticas.

    O questionamento quanto relao entre o turismo e os festivais musicais

    se deve a uma experincia de estgio supervisionado da Graduao em Turismo3,

    em que a pesquisadora teve a oportunidade de estagiar, no perodo de outubro/2008

    a junho/2009, no Braslia e Regio Convention & Visitors Bureau BRC&VB4.

    Durante a sua experincia no BRC&VB foi constatada a pr concepo

    contrria a eventos de carter cultural acompanhada, inclusive, de certo

    desinteresse por esses eventos, principalmente os musicais, pois segundo o

    BRC&VB, no geram fluxo turstico para a cidade, apenas atendem a populao

    local5.

    Alm disso, a pesquisadora possui experincia pessoal de participao

    como espectadora nos eventos culturais, musicais, shows e festivais realizados

    no s em Braslia, como tambm no Brasil. Durante a sua participao pde

    3 Graduao em Turismo feita no Instituto de Ensino Superior de Braslia IESB, de 2007 a

    2010.

    4 O BRC&VB uma fundao de carter privado, sem fins lucrativos, que visa divulgar

    Braslia como destino turstico, a partir do apoio a captao de eventos, usufruindo de estratgias de marketing. O trabalho do BRC&VB consiste no repasse de informaes sobre Braslia, apresentao da infra-estrutura para eventos, apoio com material promocional institucional, elaborao de dossi de avaliao para o evento,cartas de apoio de entidades governamentais e privadas. E, ainda, a viabilizao de visitas de inspeo e de contatos com profissionais da rea.

    5 No perodo em que fui estagiria, a filosofia da direo naquele momento deixava a entender que os eventos de carter cultural no geram fluxo turstico, sendo simplesmente uma forma de atender populao local. No entanto, em nenhum momento os vi tentando verificar se de fato era assim que acontecia, o que me leva a supor que essa forma de pensar no demonstrava nenhum conhecimento prvio. Portanto esse tipo de evento no recebia nenhum apoio institucional para a sua realizao do BRC&VB.

  • 31

    observar um grande fluxo de pessoas de fora da cidade receptora que, ao se

    valerem de servios locais como sistema de transporte, meios de hospedagem e de

    alimentao, esto utilizando elementos do turismo.

    Diante do apresentado, este trabalho justifica-se pela contemporaneidade da

    temtica, tendo em vista que os festivais de msica surgiram na dcada de 60, e,

    ainda, a falta de registros sobre estes eventos. Ressalta-se que se trata atual,

    relevante e com realizaes maiores e mais frequentes a cada ano.

    Sendo assim, identificou-se a necessidade de um estudo sobre as

    experincias, motivaes e perspectivas proporcionadas pelos festivais de msica,

    de forma a iniciar os registros e publicaes acerca do tema. Mas tambm, a

    necessidade de realizar um apanhado e registro da sua historicidade.

    Deve ser pontuada, tambm, que os festivais possuem uma estreita relao

    com o turismo, principalmente ao se considerar os festivais internacionais. Relaes

    estas que se devem no s pelo movimento milhares de pessoas para apreci-los,

    como tambm pelos impactos socioculturais que resultam da realizao destes

    eventos, agregando servios, e, tambm, inserindo um atrativo no local.

    Brito e Fontes (2002) apontam que a realizao de eventos contribui para o

    desenvolvimento do turismo nas regies, agregando valor com o atrativo e induzindo

    a utilizao de equipamentos e servios da regio, que poderia estar ociosos devido

    sazonalidade. Esta pesquisa tem a sua relevncia ao analisar em que medida os

    festivais se revelam como um evento que enriquece a agenda local e induz o turismo

    na regio que o abriga.

    Por fim, este trabalho justifica-se pelo interesse pessoal da autora com

    relao temtica. Provocado no s pela presena como espectadora em muitos

    festivais e amante deste tipo de evento, como tambm como investigadora do

    turismo, do qual emerge uma profunda curiosidade sobre as relaes, proximidades,

    semelhanas e complementaridade entre os festivais de msica e o turismo,

    passveis de observao nos eventos, entretanto sem muitos registros acadmicos e

    aprofundados sobre o tema.

  • 32

  • 33

    1. A EVOLUO DOS FESTIVAIS AO LONGO DA HISTRIA

    Tendo em vista que o presente trabalho visa analisar os festivais enquanto

    encontros que proporcionam uma experincia, entende-se que o ponto de partida

    desta anlise a investigao de eventos ocorridos ao longo da histria. Entretanto,

    para selecionar quais eventos se encaixariam no objeto de estudo oportuno

    pontuar o que entende-se por festival.

    Flchet (2011) aponta que os festivais podem ser considerados como festas,

    ou seja, momentos coletivos que combinam arte, lazer e certa ideia de

    confraternizao entre os presentes, envolvem um grande nmero de atores sociais.

    Considerando que os festivais de msica so o objeto de estudo central

    deste trabalho, ser realizada uma discusso mais aprofundada a partir da

    conceituao de Flchet e da discusso de outros autores (ALLEN et al, 2003,

    GERTZ, 1997; BRITO; FONTES, 2002) abordada no captulo 4 Festivais de msica

    e o turismo.

    Entretanto, como o termo ser utilizado no decorrer do trabalho, neste

    momento ser apontada uma primeira conceituao apenas a ttulo de

    esclarecimento, at que esta discusso seja efetuada. Sendo assim, no decorrer de

    este trabalho entende-se por festivais, um evento de grande magnitude que

    proporcione uma experincia de ruptura do cotidiano, que oferea entretenimento

    aos seus participantes em geral com a durao de mais de um dia. Entretanto, ao se

    tratar de festivais de msica, acrescenta-se o elemento musical, ou seja, a presena

    de artistas musicais como atrao principal.

    Esse captulo contempla a apresentao e reflexo a cerca das celebraes

    ocorridas ao longo da histria, organizadas por perodos histricos, considerando

    que a evoluo destas celebraes pode chegar ao que hoje se conhece como

    festivais.

  • 34

    1.1 IDADE ANTIGA

    O primeiro perodo histrico que se tem registro a Idade Antiga, tendo em

    vista que a histria se inicia com o registro da escrita. Sendo assim, inicia-se a busca

    pelo objeto de estudo, festivais, neste perodo histrico onde se tem registros dos

    acontecimentos.

    O que se quer explorar dessas civilizaes so seus costumes, prticas e

    culturas que de alguma forma evoluram para chegar ao que hoje conhecido como

    eventos.

    A Antiguidade Clssica ou Idade Antiga o perodo compreendido entre a

    inveno da escrita, aproximadamente 4000 a.C, e a queda do Imprio Romano do

    Ocidente, no ano de 453 d.C. Ao adentrar o estudo da Antiguidade Clssica ou

    Idade Antiga, bastante comum ouvir dizer que esse perodo histrico marcado

    pelo surgimento das primeiras civilizaes. No entanto, ao utilizar a expresso

    civilizao no se coloca os povos dessa poca em uma condio superior se

    comparados s outras culturas do mesmo perodo, ou perodo anterior (PINTO,

    2003; SILVA, 2013; SOUZA, 2013).

    O surgimento das primeiras civilizaes demarca a existncia de uma srie

    de caractersticas especficas, pautadas na existncia de instituies polticas

    complexas, uma hierarquia social diversificada e de outros sistemas e convenes

    que se aplicam a populao.

    No se pode apontar uma localidade especfica onde encontra-se a

    formao das primeiras civilizaes da histria. O processo de fixao e

    desenvolvimento das relaes sociais aconteceu simultaneamente em vrias regies

    e foi marcado pelo contato entre civilizaes, bem como a incorporao de duas ou

    mais culturas na formao de outra civilizao (PINTO, 2003; SILVA, 2013; SOUZA,

    2013).

    Em se tratando do Mundo Oriental, pode-se assinalar o desenvolvimento das

    milenares civilizaes chinesa e indiana. Partindo mais a Oeste, localizam-se a

    formao da civilizao egpcia e dos vrios povos que dominaram a regio

    Mesopotmica, localizada nas proximidades dos rios Tigre e Eufrates. Tambm

    conhecidas como civilizaes hidrulicas, essas culturas agruparam largas

  • 35

    populaes que sobreviviam da explorao das guas e terras frteis presentes na

    beira dos rios (SILVA, 2013).

    Na parte ocidental do planeta, costuma-se dar amplo destaque ao

    surgimento da civilizao greco-romana. O prestgio dado aos gregos e romanos

    justifica-se pela forte e notvel influncia que estes povos tiveram na formao dos

    vrios conceitos, instituies e costumes que permeiam o Ocidente como um todo.

    Contudo, no se pode deixar de dar o devido destaque aos maias, astecas, incas e

    olmecas que surgiram no continente americano (PINTO, 2003; SILVA, 2013;

    SOUZA, 2013).

    Os grandes banquetes realizados pelas civilizaes Gregas e Romanas

    foram identificados como um objeto de estudo potencial. Segundo Strong (2004, p.

    14), desde o incio, o ato de comer em conjunto transformou uma funo corporal

    necessria em algo muito mais significativo, um evento social.

    Este convvio, tanto para os romanos como para os gregos, era visto como

    uma das pedras angulares da civilizao. Os convidados que se reuniam mesa

    poderiam ser um veculo para agregao e unidade social. No entanto, tambm

    poderia encorajar distines sociais, ao separar as pessoas em categorias e coloc-

    las aos seus lugares, ou at mesmo exclu-las (STRONG, 2004; MENDES;

    BORGES, 2008).

    No Antigo Egito os banquetes eram considerados um importante ritual social.

    As pinturas encontradas nas paredes dos tmulos e stios arqueolgicos podem

    demonstrar isso. Nessas pinturas, pode-se observar convidados oferecendo flores,

    provavelmente ao anfitrio ao chegar ao banquete, a comida servida em procisso,

    muitos servos, msica e dana (VINCENTINO; DORIGO, 2001).

    Strong (2004, p.16) afirma que o banquete, mesmo naqueles tempos

    remotos, j era uma experincia esttica que ia muito alm do mero consumo da

    comida, abarcando a elegncia da roupa, tipos de condutas, cerimonial e todas as

    formas de entretenimento teatral.

    Todos esses aspectos influenciaram a Grcia, que se tornou uma importante

    civilizao. Como relatado na Ilada e na Odissia (apud Strong, 2004, p. 16):

  • 36

    Quanto a mim, digo que no existe alegria mais completa do que o povo tomando contentamento, e os comensais nos sales, sentados na ordem estabelecida, escutando um menestrel, sua frente as mesas supridas com po e carne, o vinho despejando nos vasos e servidos nos copos em vrias rodadas. Isso parece, para meu esprito, a mais bela coisa existente.

    Nessa citao tem-se a presena de todos os elementos do banquete

    cerimonial: msica e canto, lugares determinados de acordo com o status e o papel

    da atraes. Elementos estes que podem ser transpostos e ao observar

    profundamente os festivais, alguns deles tem presena muito marcante, como o

    caso da msica, os lugares determinados de acordo com o status (camarotes, e

    reas VIP) e a msica como elemento central.

    Vale ressaltar que, segundo Strong (2004), a gastronomia grega

    desenvolveu-se a partir da prtica do sacrifcio. A carne era relativamente escassa e

    disponvel principalmente aps o sacrifcio de um animal domstico aos deuses.

    Pontua-se tambm, que toda alimentao formal dos gregos eram exclusivamente

    para os homens, sendo que meninos mais velhos poderiam participar, desde que

    sentados no div dos pais ou de um amigo.

    Ainda segundo o mesmo autor, na Grcia antiga, comer e beber em conjunto

    eram expresses de igualdade. Na fase oligrquica e na democrtica, as cidades

    gregas eram governadas por crculos maiores ou menores, compostos

    exclusivamente por cidados masculinos. Dentro da estrutura de poder, o banquete

    cvico surgiu como uma expresso comunitria de unidade entre os cidados das

    polis.

    Os grandes banquetes tinham como elemento central um sacrifcio feito para

    os Deuses, e s ento a carne era dividida entre os cidados, cozida e comida em

    conjunto. A admisso no banquete garantia a cidadania, embora a festividade

    assumisse a natureza de uma liturgia do Estado, Strong (2004) aponta que era

    extremamente agradvel para os que participavam. Os banquetes cvicos eram

    vistos como uma necessidade, um meio de sustentao da ordem poltica da cidade-

    estado.

    Na sociedade romana do primeiro sculo, os jantares de gala eram um

    acontecimento determinante para a sociedade. Em meados do primeiro sculo esta

    refeio j havia alcanado um alto nvel de rituais e artifcios. O eventos eram

  • 37

    antecedidos por visitas aos banhos, para lavagens de ps e mos, e exigiam vestir

    roupas especiais (MENDES; BORGES, 2008).

    Para a realizao dos grandes banquetes, os convivas6 levavam seus

    servos e se instalavam em sofs em uma certa ordem que denotava seu status.

    Strong (2004 p. 14) conta que:

    A refeio dividida em trs partes parecia um espetculo teatral, com msicos e um grande elenco de servos cantando em coro enquanto serviam, lavando mos e ps, cortando as unhas dos ps dos convivas e distribuindo guirlandas. [...] Era tambm programado espantar os convivas com surpresas constantes, como o porco recheado de salsichas e morcelas. Alm de espetculos de cantores, danarinos, acrobatas e atores. [...] Em suma, essa refeio era a eptome das aspiraes de uma poca e um alvo perfeito para a stira, ao expor sua vacuidade.

    Como apontado na citao anterior, os banquetes romanos ultrapassavam a

    necessidade humana da alimentao e atingia nveis de interao, podendo ser

    considerados como um evento da alta sociedade romana, em que os servos

    participavam apenas como atores do espetculo teatral.

    Ressalta-se a necessidade de interao, de surpresa e de inovao durante

    a refeio para entreter os convivas com o intuito no s de servir a refeio, mas

    tambm de impressionar os convidados com atraes diferenciadas a cada

    encontro.

    Ao narrar uma passagem de Cena Trimalchionis, que apareceu em uma

    stira do sculo I, Satyricon de Petrnio (apud STRONG 2004, p. 11), observa-se

    quo inusitada poderiam ser as atraes do jantar:

    Escravos trazem uma grande travessa com uma cesta contendo uma galinha de madeira com as asas estendidas, no ato de pr ovos. Ao som ensurdecedor da msica os escravos pegam na palha, debaixo da galinha, grandes ovos pesando 250 gramas, feitas de farinha de trigo e fritos em leo. Os ovos so distribudos entre os convidados que, ao abri-los, encontram passarinhos enrolados em gema de ovo temperada.

    Em se tratando do calendrio Romano, Mendes e Borges (2008) apontam

    que podem ser distinguidos trs calendrios: o calendrio natural, marcado pelas

    estaes que determinam o ciclo da agricultura e pelo movimento dos astros (sol e

    6 Convivas - Pessoa que toma parte num banquete. Cada uma das pessoas que comem

    juntas; comensal. Convidado. (Dicionrio Michaelis Online).

  • 38

    lua); o calendrio civil, que indica o nome dos meses, a ordem dos dias e das fases

    da lua; mas tambm o calendrio religioso, que determina as festas e demais rituais

    de cada ms.

    Ressalta-se que, segundo os mesmos autores, os calendrios so a forma

    de regramento da vida em sociedade, funcionam como unidades de referncia e

    significao da cultura de um povo. Destaca-se a importncia das festas, dos cultos

    aos deuses e seus festivais para os romanos. Observa-se ainda que os calendrios

    foram constantemente enriquecidos pois novos encontros festivos eram introduzidos

    em Roma para celebrar os novos deus.

    Na tradio romana, o ano cvico comeava no ms de maro, com festas realizadas de 1 a 24 de maro, em honra a Ana Perenna (deusa do retorno dos anos) e a Marte, cujo objetivo era a purificao das armas, dos escudos, das trombetas e da celebrao do tempo renovado. O ano terminava no ms de outubro, quando era encerrado o ano militar, com vrios festivais em honra a Marte. (MENDES; BORGES, 2008, p. 84.)

    Mendes e Borges (2008) definem as festas romanas como atividades rituais

    que englobavam o ldico e a fantasia, da relao entre o passado, presente e o

    futuro, durante o qual os homens se comunicavam com os deuses. E ainda, que

    essas festas podem ser organizadas de acordo com o carter dos seus ritos,

    havendo assim o ciclo guerreiro (reuniria festas de cunho militar celebrao da

    abertura do ano guerreiro, cerimnias de purificao das armas e limpeza dos

    escudos, dentre outras); o ciclo civil (agruparia festas de cunho cvico); e o ciclo de

    purificao (alocadas principalmente no ms de fevereiro, remete a purificao da

    sociedade e ao mundo dos mortos).

    Como exemplo de um festival romano, Mendes e Borges (2008) apresentam

    a festa denominada Lupercalias, comemorada no dia 15 de fevereiro realizada em

    honra a trs divindades: Lupercus7, Faunuss8 e Marte9.

    7 Lupercus: Deus dos pastores e do rebanho

    8 Faunuss: Deus rstico, descendente de fauno que habitava campos, bosques e florestas

    na Itlia, o deus da agricultura, conhecido pelos gregos como P.

    9 Marte: deus da guerra, no entanto inicialmente foi conhecido como deus da agricultura e

    guardio dos campos e limites. Posteriormente foi identificado como o deus grego Ares, assumindo o epteto de deus da guerra.

  • 39

    Para o incio das festividades os lupercos, jovens sacerdotes provenientes

    de famlias nobres, se reuniam na caverna do Lupercal (localizada no Palatino, uma

    das sete colinas de Roma), sacrificavam um cachorro ou uma cabra e ofereciam

    bolos sagrados. Em seguida, vestidos com uma tanga feita com a pele dos animais

    sacrificados, sendo untados com o sangue desses animais, comiam, bebiam e

    encarnavam a condio de homens-lobo. Praticamente nus, corriam pelas duas de

    Roma, batendo com uma tira de pele de bode nas mulheres que encontrassem, para

    torn-las frteis (MENDES; BORGES, 2008).

    A festa simbolizava a purificao que deveria acontecer em Roma ao fim do

    ano. Acreditava-se que essa cerimnia servia para espantar os maus espritos e

    para purificar a cidade, assim como para libertar a sade e a fertilidade das pessoas

    aoitadas pelos lupercos. Esse ritual est ligado s narrativas relativas a Rmulo e

    Remo10, os quais foram os primeiros lupercos (MENDES; BORGES, 2008).

    Os autores Mendes e Borges (2008) pontuam que o perodo da festa era

    considerado como um momento de iluso, de diverso, de inverso e de suspenso

    da ordem social, em que todos participavam. No entanto, o final da festa marcava o

    retorno a normalidade. Portanto, as Lupercalias simbolizavam a afirmao e a

    reafirmao do fim da selvageria, barbrie e o incio da dimenso poltica dos

    homens organizados como cidados e sob a proteo de Jpiter11.

    Sendo assim, pode-se entender os encontros festivos romanos como rituais

    ptrios fundados na possibilidade de dramatizar coletivamente valores globais,

    crticos e abrangentes da sociedade, tendo em vista que cada festival estava

    orientado para uma esfera da vida pblica ou da vida privada dos cidados romanos.

    Observa-se, ainda, que os festivais romanos expressavam uma identidade

    abrangente, pela forma como representavam os aspectos da realidade social

    (relaes de poder, relaes sociais, trabalho, guerra, sexo, vida, morte, homem,

    natureza, dentre outros).

    10

    Dois irmos gmeos da mitologia romana. Rmulo foi o fundador da cidade de Roma e o seu primeiro rei.

    11 Jpiter: Deus do dia, e maior dos deuses. Conhecido pelos gregos como Zeus.

  • 40

    Os festivais romanos podem ser considerados como uma fala, atravs da

    linguagem das imagens e da sucesso dos eventos, que integram uma memria que

    congregam passado, presente e futuro da realidade romana.

    Ademais, os momentos ldicos, informais, de suspenso da ordem, ao lado

    daqueles formais, comandados pelas normas rgidas, coero corporal,

    comportamental e verbal, estimulavam a objetivao e o aprendizado de regras

    comportamentais, prticas sociais que regulam a vida coletiva. Ou seja, durante os

    festivais eram emitidas mensagens a serem reproduzidas e transmitidas de gerao

    em gerao, que reforavam em cada cidado a estrutura normativa da sociedade

    (MENDES; BORGES, 2008; LESSA, 2008).

    Mas no foi somente no perodo grego e romano em que ocorreram grandes

    eventos sociais. No segundo milnio antes de Cristo, partilhar comida e vinho era

    um costume estabelecido entre os babilnios. Strong (2004) aponta que os

    monarcas mesopotmicos produziam banquetes estupendos para acontecimentos

    importantes, tais como uma vitria militar, a inaugurao de um novo palcio ou

    templo, a chegada de uma embaixada.

    Strong (2004) aponta que o rei Assurnaripal II (883 859 a.C) inaugurou seu

    novo palcio com uma festa que durou dez dias para aproximadamente 69.574

    convidados.

    Eventos desse porte tinham um papel importante na poltica dinstica. As

    provises consumidas demonstravam aos presentes que o soberano poderia dispor

    de tributos do vasto domnio persa. As comidas e bebidas trazidas de regies

    remodas enfatizavam a prepotncia do governo (STRONG, 2004).

    Outra caracterstica desses espetculos que os representantes de

    domnios reais que desejavam bajular o rei enviavam iguarias para tentar o paladar

    real e o apetite dos convidados poderosos.

    Strong (2004), afirma que nessa ocasio a etiqueta era algo sofisticado. O

    rei deitava-se parte em um div com a rainha por perto e os convidados eram

    dispostos em grupos de acordo com o seu status. Havia, tambm, o ritual de

    lavagem das mos, em que os convivas recebiam um frasco de leo perfumado que

    se untava no comeo e no fim da refeio. Eram servidas carnes cozidas e

  • 41

    grelhadas em fatias de po, seguidas por sobremesa de frutas e tortas adoadas.

    Havia, ainda, msica, canto, malabaristas, palhaos, lutadores e atores.

    Outra festividade que merece destaque na Idade Antiga so os Antigos

    Jogos Gregos, atualmente conhecidos como Olimpadas. Assim como os grandes

    banquetes, as prticas esportivas proporcionam espaos de coeso social, primando

    tanto pela tica, como pela esttica (VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Os gregos antigos, segundo Lessa (2008), consideravam o exerccio fsico

    como um meio de conservar a sade e de se reencontrar. Aficionados pelos jogos e

    pelos concursos, eles criaram os enfrentamentos competitivos em estdios para

    satisfazer seus gostos pelas lutas e da rivalidade.

    Todt (2001, p. 217) afirma que, o que poucos sabem que por trs do que

    se tornou o maior evento esportivo do planeta existe uma filosofia secular de busca

    pela integrao dos povos, solidariedade, paz e, principalmente, educao do

    homem atravs do esporte. Isto porque a movimentao dos atletas e espectadores

    dos jogos olmpicos gerava um ambiente propcio para a difuso da arte, de ideais

    filosficos e para o comrcio, o que deu mais fora aos eventos olmpicos, mas

    tambm o converteu em uma festividade cultural e de entretenimento.

    Lessa (2008) pontua que o esporte proporciona uma descarga de energia

    que em geral contida pelo processo civilizatrio. uma atividade substitutiva para

    a guerra, diverte, d prazer, ensina obedincia a regras, fortalece e disciplina o

    corpo, mas tambm serve para construir identidades pessoais, locais ou nacionais e

    ainda, observa que o esporte um espetculo.

    Vale ressaltar, tambm, que a prtica de esportes sempre esteve

    relacionada dinmica da sociedade, constituindo-se como um dos principais meios

    de socializao. Os encontros festivos esportivos fazem possvel a reunio de um

    nmero elevado de cidados, possibilitando a exposio de ideias, a realizao de

    discursos e a interao social.

    Pode-se dizer tambm que:

    o esprito competitivo dos jogos gregos era uma contrapartida da arte da guerra e tinha uma grande profundidade espiritual e religiosa, enquanto que hoje tem um carter producionista e uma forte raiz poltica. [...] Hoje em dia, a chama olmpica

  • 42

    se converteu em um smbolo da unio dos povos, tal qual ocorria 12 sculos atrs. Mesmo que possa parecer utpico em nossa poca, a fora de certos ideais permanece vivo dentro de cada um de ns. (TODT, 2001 p. 218).

    Todt (2001) afirma ainda que os Jogos Olmpicos eram os mais antigos

    jogos gregos. Imagina-se que foram criados em 776 a.C. A princpio pode ter sido

    um hbito exclusivamente do Peloponeso12, mas por volta dos sculo VI, os

    visitantes e participantes dos jogos olmpicos j vinham de longe, inclusive os juzes.

    Cartledge, (apud TODT 2001, p. 218) ressalta que Parece que a

    popularidade dessas competies atlticas foi um fator crucial para que emergisse

    uma identidade coletiva entre os helenos no perodo arcaico. Observa-se, por meio

    desta afirmao, que este encontro festivo desportivo consistia em criar a

    conscincia de pertencer.

    Vale ressaltar que o Dicionrio Michaelis aponta que pertencer significa fazer

    parte, crescer. Assim como os Jogos Olmpicos, com o seu encontro festivo,

    propiciava a conscincia de pertencer, identifica-se este elemento nos festivais de

    msica. Isto considerando que se cria uma comunidade entre os participantes

    assduos de festivais, na qual eles sentem que fazem parte do festival.

    A partir da, surge, tambm, a questo de ser ator, um elemento importante

    para que a festividade ocorra, pois assim como nas festividades esportivas, os

    participantes, principalmente atletas, so os atores do evento. Enquanto que nos

    festivais de musica os participantes, em alguns casos, se consideram como atores

    do seu festival, como ser estudado mais adiante.

    O mesmo autor pontua que essa conscincia era no s de pertencer a uma

    s raa, mas tambm de falar uma lngua comum, crer nos mesmos deuses. Pois

    independente da concepo dos Jogos eles contribuam para a unificao e difuso

    da cultura helnica.

    Ainda segundo Todt (2001), a origem dos jogos e espetculos atlticos

    remontam ao terceiro milnio a.C. O mito da criao dos Jogos Olmpicos sugere,

    ainda, que a corrida de carruagens sempre desempenharam um papel importante.

    12

    O Peloponeso uma extensa pennsula no sul da Grcia, separada do continente pelo Istmo de Corinto.

  • 43

    Multides acorriam a Olimpada, acampando nos bosques prximos ao santurio.

    Cada cidade mandava suas delegaes com tesouros para as divindades.

    A durao dos jogos era de cinco dias e comeavam e terminavam com festivais em honra aos deuses. Os participantes e espectadores ficavam em tendas instaladas ao redor da rea esportiva. Durante os jogos realizavam-se festivais, msicas e discusses. A abrangncia dos festivais extrapolava o campo esportivo. Olmpia foi o local de encontro no s dos atletas mais destacados do mundo grego como tambm de filsofos, retricos, historiadores e letrados, que encontravam ambiente adequado para a exposio de seus ideias e doutrinas. Era tambm ocasio para a realizao de sacrifcios para os deuses nos seus altares existentes no Santurio de Olmpia (TODT, 2001, p. 219).

    A afirmao acima apresenta importantes informaes para a construo do

    objeto de estudo desta pesquisa. Tendo em vista que desde aquela poca os

    eventos desportivos j eram vistos como eventos festivos devido sua abrangncia

    e magnitude. A motivao principal era o esporte, entretanto muitos acompanhavam

    como espectadores e outros, para se aproveitar da oportunidade de difundir seus

    ideais e conhecimentos.

    Ressalta-se execuo, durante os jogos olmpicos, de outras festividades,

    de msica e de discusses, proporcionando aos participantes e espectadores mais

    atraes, oportunidades de interao e experincias diferenciadas. Entretanto,

    observa-se claramente a religio e o culto aos deuses, marcante da cultura grega.

    Todt (2001) enriquece ainda mais os estudos ao pontuar que outros festivais

    esportivos eram realizados na Antiga Grcia, porm nenhum deles poderiam igualar-

    se s dimenses e celebridade dos Jogos de Olmpia realizado de quatro em quatro

    anos nos meses de Agosto e Setembro (poca das colheitas) e no perodo em que

    decorriam eram feitos acordos de paz a Trgua (todas as hostilidades entre as

    cidades relacionadas com as provas eram interrompidas durante a realizao dos

    Jogos).

    Essa afirmao carregada de significado, pois se durante os Jogos at as

    atividades blicas eram suspensas e toda a ateno poltica se voltava para a

    realizao do festival. Tem-se ai um pequeno exemplo da sua magnitude, do poder

    e da influncia que esse evento possua aos povos daquela poca. Povos

    caracteristicamente guerreiros, mas que por cinco dias aboliam suas estratgias

    militares em prol da realizao do festival esportivo.

  • 44

    Estes foram os eventos festivos identificados no primeiro perodo histrico

    Idade Antiga. No prximo item sero abordados as celebraes e festividades

    ocorridas na Idade Mdia.

    1.2 IDADE MDIA

    O perodo da Idade Mdia, tambm chamado de era medieval,

    tradicionalmente delimitado com nfase nos eventos polticos. Nesses termos, ele se

    inicia com a desintegrao do Imprio Romano do Ocidente, no sculo V, e termina

    com o fim do Imprio Romano do Oriente, tambm chamado de Imprio Bizantino

    com a Queda de Constantinopla, no sculo XV. A chegada dos europeus Amrica

    outro elemento histrico que encerra a era medieval. (PINTO 2013; VICENTINO;

    DORIGO, 2001).

    Entre esses marcos polticos, passaram-se cerca de mil anos. Foi um tempo

    em que os europeus viveram em sua maioria no campo, restritos a propriedades

    que buscavam sua auto-suficincia (VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Pinto (2013) e Vicentino e Dorigo (2001), apontam que a sociedade era

    rigidamente hierarquizada e marcada pela f em Deus e pelo controle da Igreja

    catlica, a instituio mais poderosa de toda a Idade Mdia. O poder poltico era

    descentralizado, isto , estava nas mos de inmeros senhores da terra.

    Gasparetto (2013) ressalta que na Idade Mdia, a Igreja Catlica aumentou

    significativamente seu poder e a capacidade de influncia sobre a populao.

    neste perodo da histria que a instituio tem mais poder e por isso condiciona o

    cotidiano de todas as relaes. A soberania da Igreja interfere nas Artes, na

    Arquitetura, na Poltica, na Cultura, na Filosofia, nas guerras, alm, claro, das

    questes religiosas.

    Sousa (2013) aponta que a educao era para poucos, pois s os filhos dos

    nobres estudavam. Esta era marcada pela influncia da Igreja, ensinando o latim,

    doutrinas religiosas e tticas de guerras. Grande parte da populao medieval era

    analfabeta e no tinha acesso aos livros.

    Os autores em suas narrativas mostram que a arte medieval tambm era

    fortemente marcada pela religiosidade da poca. As pinturas retratavam passagens

  • 45

    da Bblia e ensinamentos religiosos. As pinturas medievais e os vitrais das igrejas

    eram formas de ensinar populao um pouco mais sobre a religio.

    Pode-se dizer que, no geral, a cultura medieval foi fortemente influenciada

    pela igreja catlica.

    Por essas caractersticas, os estudiosos acabaram chamando esse

    momento de Idade das Trevas. Eles acreditavam que o mundo medieval tinha

    soterrado o conhecimento produzido pelos gregos e romanos.

    A Idade Mdia, por sua vez, deu pouca importncia aos eventos de

    promoo de encontro social, sendo que dois tipos deles marcaram aquela poca:

    os de carter religioso: conclios e representaes teatrais, tendo como pblico os

    membros do clero; e os de carter comercial: feiras, que tinham como pblico os

    mercadores (SOUSA, 2013; VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Sousa (2013, p. s/n) aponta que a organizao social da Idade Mdia era

    encarada como um desgnio divino que deveria ser passivamente seguido por todos

    os cristos. Ir contra as desigualdades e a explorao dessa poca significava

    afrontar uma harmonia proveniente dos cus.

    Rapouso (2008, p s/n) mostra que os conclios, nome que se d at hoje

    reunio eclesistica, era a reunio de membros do clero com o objetivo de estudar,

    debater e discutir temas relacionados doutrina e aos dogmas da Igreja Catlica.

    Acredita-se que o costume dos Conclios remonta s reunies ocorridas ainda na Idade Antiga, por volta do ano 50 d.C., a partir de pequenos grupos supostamente conduzidos pelos Apstolos, onde eram discutidos assuntos relacionados observncia das leis judias, bem como o ensinamento da ento nova religio crist. Porm, tais reunies, longe de representarem uma instituio formalmente constituda, possuam um carter bem privado, sem consequncias diretas de grande relevncia. (RAPOUSO, 2008, p. s/n)

    Sendo os conclios encontros ocorridos pela superviso da igreja e no se

    representando uma reunio formalmente constituda, entende-se que apesar de ser

    um momento de encontro, ele tinha como objetivo deliberar assuntos sobre a

    doutrina eclesistica, e no proporcionar uma experincia aos participantes

    envolvidos, e por esses motivos, encerra-se a abordagem analtica acerca dos

    conclios, tendo em vista o foco objeto de estudo deste trabalho.

  • 46

    Entretanto, na Idade Mdia as representaes teatrais, que deram origem ao

    teatro atual, foram produzidas visando quebrar a monotonia dos rituais da missa. O

    tema central das apresentaes eram as cenas de Natal, da Paixo, da

    Ressurreio de Cristo e da vida dos Santos. Isto ocorria, pois percebe-se que a

    encenao de uma passagem bblica facilitava a compreenso do pblico. (AGUIAR,

    2013 e VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Entretanto, com o passar do tempo o pblico teatral aumentou e as

    encenaes exigiram que as representaes fossem feitas em locais maiores,

    passando ento a ser utilizada a frente das igrejas ou um palco construdo para tal

    fim. (AGUIAR, 2013).

    Segundo a mesma autora, a partir da evoluiu o teatro, pois os espetculos

    litrgicos passaram a se chamar mistrios, e aos poucos observa-se que os temas

    teatrais comeam a se desligar dos aspectos religiosos e tornando o enredo mais

    temporal.

    Aguiar (2013) recorda que no perodo medieval no existiam casas de

    espetculos ou teatros, portanto era confeccionado um palco provisrio e se

    espalhavam bancos nas praas para que o povo pudesse assistir. Para os nobres,

    eram construdos e ornamentados camarotes.

    As informaes trazidas pela autora mostram que aos poucos o espao com

    domnio da igreja foi se tornando um espao de diverso e lazer para a populao,

    um espao de liberdade dentro dos moldes da igreja, onde se vivia um momento

    ldico e era gerada uma experincia.

    Transpondo os conceitos e levando em conta as propores dos momentos,

    observa-se que as representaes teatrais na Idade Mdia, foram uma forma tmida

    de um festival ocorrido durante este perodo. Pois era um momento onde se

    proporcionava uma experincia diferenciada da rotineira ao pblico, onde existia

    uma separao entre o pblico geral e a nobreza, mas era apresentado para ambos

    a mesma obra e proporcionava a eles a possibilidade do convvio e do momento

    ldico.

  • 47

    Ainda em se tratando dos encontros festivos que aconteceram na Idade

    Mdia e podem chegar ao que hoje conhecemos como festivais, esto as grandes

    feiras comerciais.

    Carvalho (2013) aponta que a partir do renascimento comercial e urbano no

    sculo XI, comeou uma transformao na vida social, na paisagem urbana e na

    economia europeia. O artesanato se constituiu como principal meio de produo de

    mercadorias.

    O autor apresenta os mercadores como os principais responsveis pelas

    atividades comerciais, deslocavam-se de uma regio para outra e negociando suas

    mercadorias. Inclusive, foram eles que exerceram inicialmente as atividades

    bancrias.

    As feiras foram os eventos mais importantes da Idade Mdia e tinham o

    mesmo conceito das atuais a exposio de produtos cultivados ou manufaturados

    pelos mercadores, visando a conquista de clientes. A feira mais antiga data de 427,

    em Champagne, Frana. As principais feiras ficavam nas regies de Champagne na

    Frana, Genova e Veneza, na atual Itlia e em Flanders, atual Blgica (CARVALHO,

    2013).

    A princpio as feiras exerciam atividades comerciais locais, mas com o

    decorrer do tempo elas se tornaram amplos espaos de negcios, realizando a

    comercializao e recebendo mercadores de diversas regies da Europa, frica e

    sia (CARVALHO, 2013).

    Dentro da histria do turismo e do deslocamento de pessoas, as feiras da

    Idade Mdia so um marco. No que se refere ao objeto de estudo deste trabalho,

    segundo as narrativas dos autores, as feiras eram espaos com menos influncia da

    igreja. Eram voltados diretamente para o comrcio, mas marcadas pelo

    deslocamento de pessoas com a inteno de venda e compra, que proporcionavam

    aos mercadores e moradores desta cidade um espao amplo de troca de

    informaes e cultura.

    Diferente do perodo histrico anterior, os sculos ditos como obscuros

    promoveram mudanas tambm de hbitos alimentares. J que a cultura no se

  • 48

    baseava na agricultura, como os romanos, mas na explorao de recursos naturais,

    gado e caa. Ao mesmo tempo em que a comida tornou-se cada vez mais ligada a

    hierarquia (STRONG, 2004).

    Embora os alimentos estivessem intimamente conectados crena religiosa nas culturas grega e romana, em caso algum a religio tentou controlar quando e o que as pessoas comiam. Do tempo de Homero at a suspenso crist do sacrifcio pago no final do Imprio, o papel da comida na adorao e nos festejos a ela associados permaneceu basicamente o mesmo [...] Com a converso do imperador Constantino em 312, quando o cristianismo tornou-se a religio oficial do Imprio Romano, tudo isso foi condenado a mudar. [...] O cristianismo herdou da tradio judaica a prtica de regular o que e quando as pessoas comiam. Juntamente com o sexo, a comida tornou-se sujeita a regras determinadas por Deus e, portanto, uma questo de conduta tica. (STRONG, 2004 pg. 48 e 49.)

    Com isso, a realizao de grandes banquetes e de festas deixou de

    acontecer, pois agora eram os dogmas catlicos que regulamentava as interaes

    sociais. Somente com a aprovao da igreja era que podiam haver reunies e

    congregaes de pessoas. Entretanto, os hbitos, objetivos e as intenes j no

    eram as praticadas pelos gregos e romanos durante seus banquetes.

    Constata-se, assim, que a Idade Mdia foi muito importante no que tange

    cultura, educao e costumes das civilizaes, atravs dos dogmas da igreja. Mas

    no que se refere aos aspectos de interao e diverso, as extravagncias foram

    reduzidas, e assim, reduz tambm a possibilidade de criar um ambiente em prol da

    diverso e do prazer pelo prazer, um ambiente para o convvio, para o inusitado,

    para a satisfao do homem.

    Diante do exposto, no foi identificado ao longo dos relatos dos historiadores

    a manifestao de prticas culturais similares, ou que poderiam evoluir, ao que

    entendemos como festivais. Entretanto, foram apresentadas algumas manifestaes

    culturais e sociais medievais que se remetem aos festivais, como os conclios, os

    espetculos teatrais e as feiras.

    1.3 IDADE MODERNA

    A Idade Moderna, segundo Gasparetto (2013), compreende o perodo

    iniciado em 1473, com a tomada de Constantinopla pelos turcos otomandos e vai at

    Revoluo Francesa, ocorrida em 1789.

  • 49

    O autor ressalta que a Idade Moderna representou uma poca de

    diversificao dos costumes e das tradies medievais. Ao final da Idade Media

    comearam a surgir inovaes, comeou a crescer o comrcio por meio das feiras e

    das cruzadas. Com o fortalecimento do comrcio, nasce uma classe social, os

    burgueses, que seriam os responsveis pelas principais alteraes sociais ocorridas

    na Era Moderna. (GASPARETTO, 2013).

    A Era Moderna se destaca: pela ocorrncia das grandes navegaes, que

    romperam as barreiras fsicas do planeta, com a descoberta de novos continentes e

    ampliaram os horizontes comerciais; pelo Renascimento, movimento cultural que

    inspirada pelos valores da antiguidade e passou a representar o apogeu cultural da

    humanidade at ento; pela Reforma Protestante que deixou em posio

    desfavorvel a soberania religiosa da Igreja Catlica; e pelo absolutismo, que

    marcou o perodo com grandes reis (VICENTINO; DORIGO, 2001; GASPARETTO,

    2013).

    Gasparetto (2013) pontua que a Idade Moderna foi um perodo de retonada

    de valores culturais e de grande ampliao da cultura.

    A expanso martima europeia reforou o fenmeno das feiras, apresentado

    na Idade Mdia. Mas na era moderna as feiras tiveram seus lugares diversificados,

    saindo do mar mediterrneo e se apropriando do Oceano Atlntico. As grandes

    feiras de mercadores passaram a se tornar lugares de encontros de diversas

    culturas, e a motivar as pessoas a se deslocarem em busca de informao e

    comrcio. Agora com propores maiores do que as da Idade Mdia, se tornando

    verdadeiras organizaes comerciais. (VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Em se tratando de turismo, Igarra (2003, p. 4) aponta que:

    Com o fim do imprio romano, as viagens sofreram um grande decrscimo. Com a sociedade organizada em feudos autossuficientes, as viagens tornaram-se uma grande aventura pelo perigo que elas representavam. [...] As excees, nessa poca, eram as cruzadas. Grandes expedies eram organizadas para visitao de centros religiosos na Europa e para libertar Jerusalm do domnio dos rabes. [...] Com o fim da Idade Mdia e o Advento do capitalismo comercial, as viagens foram se propagando.

  • 50

    Com esta afirmao o autor apresenta o turismo de acordo com o momento

    histrico. Como apresentado anteriormente, na antiguidade o turismo teve um

    grande avano com os jogos olmpicos e com o comrcio e este avano tem um

    momento de estagnao parcial durante a Idade Mdia devido aos feudos e ao

    controle da Igreja Catlica, mas ainda com a ocorrncia das Cruzadas que

    representavam viagens. Na Era moderna, com o nascimento do capitalismo, o

    recoro do comrcio e as suas novas rotas o turismo mais uma vez volta a se

    desenvolver.

    Neste mesmo contexto de mudanas est o Renascimento Cultura, vivido na

    era moderna, que pode ser considerado como um movimento cultural laico, racional

    e cientfico, que se inspirou na cultura greco-romana rejeitando os valores da Idade

    Mdia. O elemento central do Renascimento foi o humanismo, ou seja, a valorizao

    do ser humano. (VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Igarra (2003) aponta que no sculo XVII com o avano do capitalismo o

    hbito de viajar para estaes de guas expandiu-se nas classes mais favorecidas,

    composta pela realeza e pela burguesia. Incentivando a criao de SPAS

    inicialmente no interior do pas e depois no litoral, que aos poucos deixaram de ter

    uma destinao exclusivamente para a sade e passaram a serem utilizados para

    eventos sociais, bailes, jogos de azar e outras formas de entretenimento.

    As informaes fornecidas por Igarra (2003) remete proliferao de

    eventos sociais, que passaram a estar cada vez mais presente na sociedade com o

    passar dos anos. Com uma burguesia fortalecida que buscava a sua insero na

    sociedade, os eventos se tornaram o espao ideal para este avano. (VICENTINO;

    DORIGO, 2001).

    Strong (2004) aponta que a partir da herana do final da Era Medieval, os

    banquetes na Idade Moderna se transformaram em um evento altamente elaborado,

    na qual a comida e o sabor no eram os elementos centrais durante a exagerada

    demonstrao do luxo e da fartura e glorificao do anfitrio.

    O hspede devia ser ator-espectador num tipo particular de ritual, governado por regras especficas e com um nico propsito: glorificar o anfitrio. Grandes acontecimentos, como a visita de um governante a outro ou um casamento dinstico, eram marcados primeiro pelo espetculo pblico de uma parada triunfal, e depois pelo espetculo privado de um banquete no palcio, programa que ainda

  • 51

    sobrevive na Gr-Bretanha de hoje. Inicialmente se mantinha a privacidade do banquete, mas aos poucos, medida que se evidenciou o seu poder de impressionai, tornou-se costume admitir espectadores. (STRONG, 2004, p. 140).

    Esta citao aponta no s para a grandiosidade dos banquetes, qualificado

    como espetculos privados, mas tambm demonstra algumas situaes em que

    ele era utilizado e evidencia o poder que se transmitia neste tipo de evento. Strong

    (2004) aponta que durante a Idade Moderna as festas eram pretexto para a

    exposio dos objetos valiosos de posse da famlia.

    O autor ressalta ainda que, independente do tipo de festa, seus

    componentes eram constantes, iniciando pela seleo do local e sua decorao, que

    desejavam impressionar mais do que cumprir com a sua funo. Seguido pela

    seleo do cardpio, em que o autor pontua que o homem que prepara um

    banquete tem tanto a fazer quanto aquele que comanda um exrcito (STRONG,

    2004, p. 40), isto devido diversidade de pratos e quantidades exageradas de

    comida oferecida.

    Alm do resgate dos banquetes, na Era Moderna os Jogos Olmpicos

    tambm foram retomados, e com o passar dos anos congregavam maior quantidade

    de atletas e de pblico. Assim como na Antiguidade, na Era Moderna os jogos foram

    mais do que eventos esportivos, pois a sua realizao atraia pessoas para

    determinados locais, o que gerava a movimentao de artistas, filsofos e

    mercadores. (TODT, 2001)

    Durante a Idade Moderna no houve um grande avano na execuo de

    festivais, alm da retomada dos eventos sociais, festas e bailes que de alguma

    forma proporcionavam aos seus participantes um momento de descontrao, uma

    celebrao que ocorria na Antiguidade. Entretanto, observa-se um grande avano na

    atividade turstica, em termos de deslocamento e centros comerciais, com

    infraestrutura para pernoites, alimentao e entretenimento.

  • 52

    1.4 IDADE CONTEMPORNEA

    A Idade Contempornea, tambm conhecida como Ps-Moderna, o

    perodo em que vivemos atualmente. Gasparetto (2013) aponta que a Idade

    Contempornea teve o seu incio aps a Revoluo Francesa, em 1789.

    O autor menciona que a Ps-Modernidade marcada pela grande

    modificao nas estruturas sociais que dividiam a sociedade em escalas, como uma

    pirmide, onde o Rei e a Nobreza estavam no topo, seguido pelo clero e depois os

    demais integrantes da sociedade, camponeses e burgueses. Entretanto, a burguesia

    j representava um importante grupo na ordem social (GASPARETTO, 2013).

    O incio da idade moderna marcada pelo iluminismo que foi o movimento

    em reao ao absolutismo e contribuiu para grandes modificaes. Este movimento

    defendia o uso da razo como melhor caminho para alcanar a autonomia, a

    liberdade. Do iluminismo surgiu, por exemplo, a ideia da criao de escolas, para

    que o povo tivesse conhecimento e ele no ficasse restrito somente igreja.

    (PACIEVITCH, 2013; VICENTINO; DORIGO, 2001).

    Beni (2007), aponta que a histria das viagens se confundem com a prpria

    histria da humanidade, j que os deslocamentos acompanharam o

    desenvolvimento humano. Entretanto, ressalta que o Renascimento Europeu refletiu

    na melhoria da produtividade da agricultura, no crescimento das cidades, expanso

    do comrcio e dos negcios, e, ainda, o florescimento das artes e da literatura, alm

    da explorao global com a chegada Amrica. O que representou a quebra do

    domnio da religio e encorajou a busca pelo conhecimento, a satisfao pessoal e o

    desejo de conhecer o mundo.

    O perodo contemporneo caracteriza-se pela presena do capitalismo no

    cotidiano da humanidade. Devido a isso surgem inmeras transformaes nas

    sociedades, se consolidam as potncias capitalistas e o incentivo ao consumo

    (GASPARETTO, 2013).

    durante este perodo que ocorrem as principais transformaes do mundo,

    com o avano da tecnologia de comunicaes, de transporte, de armamentos,

    dentre muitas outras. Avanos estes que em alguns momentos geraram tenses

    mundiais e terminaram em guerras. (VICENTINO; DORIGO, 2001).

  • 53

    Igarra (2003) aponta que a era das ferrovias representou uma segunda

    etapa no desenvolvimento do turismo, sendo a primeira estabelecida com as

    grandes navegaes na modernidade.

    O perodo entre guerras se destaca no processo de desenvolvimento do

    turismo, pois com a paz temporariamente reestabelecida, a tecnologia desenvolvida

    para a guerra, se voltou para a humanidade, proporcionando facilidades nos

    deslocamentos e nas comunicaes. (IGARRA, 2003).

    Entretanto, com o fim da segunda guerra mundial que o turismo toma fora

    e se desenvolve plenamente. Os avies desenvolvidos para o transporte na guerra

    perde utilidade e se torna um meio de transporte mais acessvel populao. Com

    isso as distncias so extremamente reduzidas, percursos que antes eram feitos em

    dias, com a utilizao dos avies passam a ser feitos em horas. (BENI, 2007;

    IGARRA, 2003; DIAS; AGUIAR, 2002).

    O avano dos meios de transporte impulsionou o turismo a se desenvolver,

    levando cada vez mais pessoas a lugares diferentes. Dentro deste contexto que se

    desenvolvem o turismo, e consequentemente os festivais de msica. Por se tratar de

    um perodo histrico riqussimo em manifestaes culturais, se ater ao objeto de

    estudo deste trabalho que ser abordado detalhadamente no prximo captulo.

  • 97

    3. OS FESTIVAIS DE MSICA E O TURISMO

    A partir da evoluo dos eventos ao longo dos anos e da descrio dos

    festivais de msica, observa-se que estes eventos em muitos momentos tiveram o

    seu desenvolvimento possvel devido ao avano do turismo. Ressalta-se tambm a

    dependncia de alguns servios e equipamentos tursticos para que estes eventos

    sejam possveis.

    Este captulo visa elaborao e o melhor entendimento dos conceitos que

    compe estes fenmenos para que, com base na literatura, seja possvel identificar

    as semelhanas e singularidades que os aproximam e os distanciam, que so

    comuns entre eles e que sirvam de base para a anlise.

    3.1 EVOLUO DO CONCEITO DE TURISMO

    A atividade do turismo surge como atividade economicamente organizada,

    durante a modernidade a partir da industrializao, que entre inmeras mudanas,

    tornou possvel a instituio das frias remuneradas. Entretanto, durante a ps-

    modernidade que o turismo se desenvolve, devido reduo do tempo e espao

    possibilitado pelas comunicaes, meios de transportes e redes de informaes.

    Essa atividade se desenvolveu junto com o capitalismo, sendo, portanto, uma

    atividade de grandes impactos e resultados econmicos (PIRES, 2009; GASTAL,

    2005; MOESCH, 2000).

    O turismo tido como uma atividade ps-moderna, pois como apresentado

    por Maffesoli (1998), ocorre uma intensa relao de consumo gerada pelos

    elementos diversos disponveis. No se trata apenas de um consumo materialista,

    mas sim uma busca por vivenciar experincias, por tornar realidade o que se

    vivencia na imaginao.

    Essa necessidade de vivenciar experincias tambm relatada por Pires

    (2009) que aponta que junto com a globalizao veio ideia da homogeneizao

    das culturas. O autor aponta que houve a perda das identidades e a aproximao

    das culturas de forma a se tornarem uma s.

    No entanto, essa uma premissa que no se confirma, pois Pires (2009)

    mostra que a ideia do homogneo permitiu a valorizao do outro, das diferenas

  • 98

    culturais, das particularidades que em muitos casos passou a ser evidenciada e a ter

    um valor, no s para o turismo, como tambm para a sociedade.

    Por muitos anos, o turismo foi estudado como uma indstria sem chamins

    ou como uma atividade puramente econmica. At hoje est como campo cientfico

    dentro da administrao e da economia, apesar de sabermos que o turismo vai

    muito alm do setor econmico (GASTAL, 2005).

    Uma conceituao da atividade turstica, dos elementos que a compe, das

    reas de atuao e dos resultados gerados por ela algo complexo que ainda no

    se tem de forma consolidada. Isto ocorre pois entende-se que o turismo permite

    vrias abordagens, de acordo com a tica e necessidade de anlise. Por isso

    existem tantas classificaes, tipologias e conceituaes, que muitas vezes acabam

    fazendo uma fragmentao excessiva e limitando a percepo da atividade.

    Moesch (2000, p. 12) quando se refere ao turismo sendo observado da tica

    econmica mostra que esta uma observao reducionista, pois

    se o turismo for entendido como mera atividade econmica, sua anlise passa a vir recheada de ndices estatsticos, projees de crescimento, planos e projetos de nvel macro e micro, estudos de demandas, viabilidade econmica de investimento, custo-benefcio entre produo e consumo, limitando-se a uma anlise aparente do fenmeno.

    Hoje, j se sabe que essa observao puramente econmica no o

    suficiente para o entendimento da atividade turstica.

    Muitos dos casos em que o turismo um destruidor da natureza ou das

    culturas locais existem porque no momento de pensar, planejar e executar a

    atividade, o nico aspecto analisado foi o econmico. Sem observar as

    transformaes na paisagem do local e na vida das pessoas, sem inserir a

    comunidade na atividade, de forma que ela seja beneficiada pelo turismo, isto ,

    sem pensar a atividade como um todo. Por isso, se faz necessrio entender o

    turismo em toda a sua complexidade, para que a fragmentao no permita

    desconsiderar certos aspectos, de forma a gerar consequncias negativas

    (MOESCH, 2000).

  • 99

    Urry (2001, p. 16) aponta que o turismo, as frias e as viagens so

    fenmenos sociais mais significativos que a maioria dos comentadores tm levado

    em considerao.

    Gastal (2005, p. 12) auxilia no processo de conceituao ao apontar que

    falar em turismo significar fazer referncia quelas pessoas que saem das suas

    rotinas espaciais e temporais por um perodo determinado. Esse deslocamento,

    espacial e temporal, no mais ou menos significante se ultrapassa fronteiras

    nacionais ou internacionais, pois o que h em comum em todos esses

    deslocamentos o estranhamento, a ansiedade diante do novo.

    A conceituao da autora refora a necessidade de abordar o turismo como

    uma atividade sociocultural, pois envolve o encontro e a interao entre o turista e o

    local. Alm disso, a ansiedade pelo novo uma caracterstica puramente cultural,

    que est atrelada ao grupo em que o turista est inserido.

    Complementando o conceito proposto pela Gastal, Urry (2001) aponta que o

    turismo envolve o conceito de afastamento, ou seja, de uma ruptura com a rotina e

    com as prticas do dia a dia, o que permite que os sentidos dos turistas se abram

    para o novo, para o conjunto de estmulos que contrastam com o cotidiano.

    Beni (2007) aponta que o turismo pode ser entendido como um processo de

    fruio do espao natural e cultural, por meio da utilizao de servios e

    equipamentos especficos, tais como transporte, alojamento, recreao e

    alimentao.

    Com o intuito de chegar a uma conceituao mais completa, Moesch (2000,

    p. 9) afirma que:

    O turismo uma combinao complexa de inter-relacionamentos entre produo e servios, em cuja composio integram-se uma prtica social com base cultural, com herana histrica, a um meio ambiente diverso