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Encontro Internacional Participação, Democracia e Políticas Públicas: aproximando agendas e agentes 23 a 25 de abril de 2013, UNESP, Araraquara (SP) Título do Trabalho: A implantação dos sistemas de avaliação: uma política pública de Estado ou de Governo? Autores: Andréia da Cunha Malheiros Santana- UFSCar José Carlos Rothen- UFSCar

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Encontro Internacional Participação, Democracia e Políticas Públicas:

aproximando agendas e agentes

23 a 25 de abril de 2013, UNESP, Araraquara (SP)

Título do Trabalho: A implantação dos sistemas de avaliação: uma política

pública de Estado ou de Governo?

Autores: Andréia da Cunha Malheiros Santana- UFSCar

José Carlos Rothen- UFSCar

A implantação dos sistemas de avaliação: uma política pública de Estado

ou de Governo?

I- A avaliação inserida no contexto neoliberal

Este artigo tem como objetivo analisar, a partir da diferenciação entre

políticas de Estado e as de Governo, a implantação dos sistemas de avaliação,

reafirmando a ideia de que a avaliação se tornou uma política de estado, mas

de um Estado específico, que segue a lógica neoliberal, e por isso, entende a

educação dentro de uma visão gerencialista de “quase mercado”. A partir deste

objetivo, iniciamos este texto afirmando que vivemos numa sociedade

neoliberal com características próprias deste sistema.

Toda política pública surge a partir de um contexto e assume estilos e

objetivos diferentes de acordo com o estado e com o projeto político que nele

impera. As avaliações externas surgiram tendo como alicerce um estado

capitalista regido por um modelo de política neoliberal, por isso para entender o

papel das avaliações na nossa sociedade é preciso avaliar o contexto no qual

ele está inserido.

A corrente neoliberal tem sua base no liberalismo clássico datado do

século XVII e XVIII que refletiu os conflitos e anseios presentes naquele

momento histórico e acabou por reafirmar o direito à propriedade e à liberdade,

apregoando ao Estado um papel de guardião dos interesses públicos.

(AZEVEDO, 1997)

Os ideais liberais foram se modificando de acordo com as

necessidades do capitalismo, mas mantiveram algumas ideias centrais, como a

importância do mercado para guiar a vida das pessoas, o individualismo como

valor e a pouca intervenção do Estado.

Segundo Freitas (2004), a partir da década de 1990, a influência das

políticas internacionais dos países ricos foi sentida em países como o Brasil

através do ajuste fiscal, do pagamento da dívida externa, da minimização do

Estado, da privatização como uma forma de aumento da competitividade local

e internacional, o que acarretou uma fragmentação dos movimentos sociais e

gerou uma posição de conformismo. A área da educação não está alheia a

este contexto, através de políticas públicas neoliberais, ela passou a ter uma

posição “neotecnicista”. Neste cenário, temas como competências/habilidades,

equidade e avaliação se tornaram comuns.

Colaborando com as ideias de Freitas (2004), Peroni (2009) afirma que

o capitalismo passa por um período de crise e para superá-la usa artifícios

como a globalização, a reestruturação produtiva e as políticas neoliberais.

Neste contexto, a importância atribuída à avaliação em larga escala foi

intensificada, juntamente com a redefinição do papel do Estado que passou a

diminuir os investimentos nas áreas sociais, incentivou as parcerias e passou a

desempenhar o papel do “Estado Avaliador” (SOUSA e OLIVEIRA, 2003).

Esta mudança do Estado do Bem Estar Social para o Avaliador ocorreu

na década de 80, após a crise do petróleo de 1973 e 1974, nesta época, houve

uma diminuição de investimento nas áreas sociais, um decréscimo das

avaliações qualitativas e a propagação de um discurso de racionalidade

técnica. O neoliberalismo precisava de um novo estado, não mais intitulado do

Bem –Estar, mas um Estado Avaliador, o “estado deixou de ser o provedor de

benefícios e serviços que a sociedade utiliza para superar seus problemas e

passou a exercer severo controle e forte fiscalização”. (DIAS SOBRINHO,

2002, p.28)

Corroborando com as ideias de Dias Sobrinho, Rothen (2012) afirma que

o Estado do Bem Estar não chegou a ser efetivamente implantado no Brasil,

pois tão logo a Constituição Federal de 1.988 foi promulgada, já estava

presente na sociedade o discurso da ineficiência do Estado e a ideia de reduzi-

lo ao mínimo.

Em 1995, com a posse de Fernando Henrique Cardoso, o Estado brasileiro passou por uma reforma de cunho neoliberal. Resumidamente, a reforma do Estado partiu do diagnóstico de que o Estado seria ineficiente na oferta de serviços, bem como de que o seu gigantismo inviabilizava a formulação e implantação de políticas públicas. A solução genérica seria reduzir o tamanho do Estado ao mínimo. (ROTHEN, 2012, p.68)

O que há no Estado Brasileiro é uma preocupação com as políticas

sociais, mas isto não deve ser confundido com o Estado do Bem Estar Social,

pois a sua abrangência é reduzida, há uma preocupação com os mais pobres,

mas não com todos os cidadãos, por isso a maioria das políticas públicas na

área social não envolve a classe média.

Outro ponto importante da atuação do Estado é a redução de

financiamento destinado à educação, que aconteceu tanto incentivando a

municipalização, como permitindo o crescimento da rede privada na área da

educação.

A importância atribuída à avaliação dentro deste contexto surge da

justificativa de se controlar a qualidade do serviço prestado, o “Estado

Avaliador” assume o papel de coordenação e controle dos resultados tendo

como parâmetro o mercado, por isso os conteúdos das avaliações são

decididos externamente e apresentam como eixo norteador as competências e

habilidades exigidas pela reestruturação produtiva.

Há uma mudança de enfoque, no Estado do Bem Estar a avaliação

servia para analisar o rendimento dos programas sociais para melhorá-los,

destinando mais verbas a eles. No Estado Avaliador “prevalece a lógica de

controle e da racionalidade orçamentária” (DIAS SOBRINHO, 2002, p.28) que

implica em redução dos investimentos.

As palavras de ordem das reformas educacionais iniciadas na década de 1980 são o gerencialismo eficiente, a privatização, a excelências, a produtividade, a seletividade, os interesses e a satisfação do consumidor, enfim um conjunto de expressões que identificam a educação com a cultura de empresa. (DIAS SOBRINHO, 2002, p.32)

Rothen (2012) salienta que a escola está no centro das políticas

educacionais e, dentro desta perspectiva, do Estado Avaliador, ela passa a ser

a responsável pela qualidade da educação oferecida, que passa a ser medida

pelas notas obtidas nos sistemas externos de avaliação, por isso eles se

tornaram cada vez mais comuns e se multiplicaram em todos os níveis.

A partir deste contexto, Afonso (2001) afirma que o Estado Avaliador na

educação básica foi responsável por promover a competição, através da

avaliação externa e da racionalidade mercantil. A avaliação e a consequente

responsabilização dos professores foram entendidas como uma consequência

natural da autonomia. Para compreender o papel do Estado Avaliador é preciso

compreender a expressão “quase mercado” , de Le Grand (1991).

Para Le Grand (1991), a politica de quase mercado surgiu no segundo

mandato de Thatcher em meio a um período de crise histórica que ameaçava a

estabilidade do governo britânico, para resolver esta crise foram incorporadas

algumas leis do mercado que deveriam substituir o Estado do Bem Estar

Social, a fim de que os gastos com as áreas sociais fossem menores.

All these reforms had a fundamental similarity the introduction of what might be termed “quasi-markets” into the delivery of welfare services. In each case, the intention is for the state to stop being both the funder and provider of services. (LE GRAND, 1991, p.1257)

O Estado parou de financiar diretamente muitos setores sociais, ou

pelo menos teve o seu financiamento dividido com outros setores, por isso as

parcerias com empresas foram incentivadas em todas as áreas sociais, com o

objetivo de gerar economia para os cofres públicos. A partir do momento que

áreas sociais, como saúde, educação e habitação (entre outras) passam a

aceitar financiamento externo, passam também a fazer concessões e a alterar

algumas de suas regras, incorporando a lógica de mercado como a

competição, a diminuição de custos, o ranqueamento de instituições e

diferentes níveis de financiamento de acordo com o seu desempenho.

Neste sentido, Dias Sobrinho (2002) salienta a influência dos

Organismos Internacionais na construção de sistemas avaliativos, entre eles

destacam-se a atuação de dois organismos: a OCDE (Organização de

Cooperação e de Desenvolvimento Econômico) e o BM (Banco Mundial). Estes

dois órgãos não se limitam a financiar e cobrar avaliações, mas também impõe

uma linha ideológica que defende seus interesses. A importância e atuação

destes financiamentos são explicados graças ao fenômeno do “quase

mercado” que permite e explica que instituições públicas aceitem financiamento

externo.

O Banco Mundial tem uma ligação muito densa entre financiamento e

avaliação, ao financiar qualquer projeto se pressupõe a sua avaliação de

acordo com a ideologia do Banco, que visa o controle e a racionalidade

econômica. Ao emprestar alguma quantia financeira, impõe que a educação se

adeque às restrições orçamentárias, se una às empresas, assumindo a

racionalidade do mercado tornando-se produtivo e útil.

A ideia de avaliação que daí se deriva é a da medida da eficiência. Por isso, a avaliação acaba sendo uma correlação entre custos e rendimentos, privilegiando os produtos ou resultados, que se quantificam e permitem comparações. Nessa lógica eficientista, qualidade corresponde a racionalização e otimização dos processos,

que no fundo significam diminuição de gastos e obrigação de incremento da quantidade de produtos. (DIAS SOBRINHO, 2002, p.36) grifos nossos

Desta forma o Banco Mundial é um aliado importante para ressaltar a

função controladora da avaliação, conforme os objetivos do Estado Avaliador.

A atuação do Banco Mundial (BM) aparece combinada à atuação do Estado

mínimo que se preocupa em oferecer à população o acesso, também mínimo,

à educação, à saúde, e outros setores sociais.

A OCDE, de caráter intergovernamental, tem objetivos na área

econômica e se interessa pela educação à medida que ela representa um

“capital econômico”, pois é responsável por formar mão de obra qualificada, o

que interfere na relação entre emprego e desenvolvimento.

Na área da avaliação, a OCDE teve uma influência bastante grande,

pois financiou pesquisas e publicou trabalhos nesta área que vieram para

consolidar o modelo de avaliação que temos hoje. Através destas pesquisas,

ela promove o ranqueamento e comparação do desempenho de diferentes

países.

A avaliação defendida pela OCDE é quantitativa, pois tem como

objetivo coletar informações sobre a educação oferecida realizar comparações

e propiciar a tomada de decisões. Nessa lógica, a avaliação tem papel de

ressaltar a responsabilidade contábil da educação (checando recursos e

custos), sua eficiência e sua competitividade, o que traduz a teoria do “quase

mercado”.

Colaborando com estes autores, Bauer (2010) afirma que o aumento

na preocupação em realizar avaliações nos países da América Latina e do

Brasil se deve aos organismos multilaterais, pois estes países tiveram uma

experiência inicial patrocinada pelo Banco Mundial.

Neste sentido, é possível afirmar que as políticas públicas na área da

educação refletem de uma maneira, ou de outra, o caráter excludente e

seletivo da nossa educação que não garante a qualidade de ensino para todos.

(AZEVEDO, 2001)

Segundo Le Grand (1991), é muito difícil fugir a esta lógica de

mercado, bem como ignorar a pressão externa por melhores resultados e a

dicotomia entre qualidade e quantidade.

If there is a direct relationship between the quality and quantity of inputs and the quantity and quality of outcomes this may not matter, since the later will improve with the former; but if there is not and in many welfare areas the link between inputs and outcomes has yet to be established empirically then we are likely to see upward pressure on costs, with no corresponding improvement in service. (LE GRAND, 1991, 1265)

A grande questão colocada na teoria do quase-mercado é como

garantir que a diminuição nos investimentos não prejudique a qualidade do

serviço prestado, pois a base desta teoria está centrada na diminuição de

custos e investimentos nas áreas sociais. Esta diminuição nos investimentos

tem como uma de suas consequências a não correção salarial dos

profissionais envolvidos nestas áreas, ou uma correção salarial aquém do

necessário.

Dale (1994) define mercado na área da educação como uma forma de

combinação de financiamento, fornecimento e de regulação das que eram

exercidas pelo Estado. O autor afirma que os elementos de quase mercado

que foram introduzidos na educação não acarretaram um papel menor do

Estado, mas uma atuação diferente que pode muitas vezes ser considerada

maior.

A ideia de quase mercado possibilita introduzir a concepção de gestão

privada nas instituições públicas, o que pode ser percebido pela inclusão de

estímulos financeiros ou ainda a privatização da educação como uma das

formas de se alcançar a qualidade da educação. A competição aumenta a

seletividade, prevalência de uma lógica produtivista e restrição à noção de

direitos sociais.

A avaliação está associada não apenas à aprendizagem do conteúdo,

mas ao controle disciplinar em sala de aula. Os processos de avaliação

acabam gerando uma motivação para o estudo, “a avaliação assume a forma

de uma mercadoria com as características de dualidade existentes nesta

sociedade capitalista: o valor de uso e valor de troca, com predomínio do último

sobre o primeiro.” (FREITAS, 2002, p.313) O aluno se habitua a ver

aprendizagem a partir de uma nota, que lhe gera benefícios ou prejuízos.

Para Dale e Robertson (2001), o Estado privilegia a competitividade e a

mercadorização em todas as áreas como se estas fossem conduzir uma

prosperidade para os mais pobres, mais que as políticas compensatórias.

O Estado deve ser considerado dentro do seu contexto e como algo

que está em transformação, o que inclui a sua relação com a educação que

tem sido marcada pelas iniciativas de avaliação em larga escala, por isso cabe

analisar quais são seus objetivos declarados, que estratégias usam e que

ações são desenvolvidas a partir dos seus resultados.

Bauer (2010) afirma que as avaliações em larga escala servem a três

propósitos: accountability (prestação de contas), classificação e seleção e

diagnóstico da realidade de ensino.

Nesta nova fase, o Governo se associa ao mercado e passa a valorizar

as competências e habilidades vitais ao sistema neoliberal. Para Dias

Sobrinho, a avaliação assumiu os princípios de accountability “uma forma

tecnocrática de valorar e um procedimento burocrático de exigir o cumprimento

das obrigações” (2002, p.29). Para o autor, não há como negar a relação do

accountability e a ideologia da eficiência defendida pelo mercado, o

accountability tornou-se sinônimo de uma prestação de contas à sociedade

baseada na demonstração de resultados através de meios eficientes, não

apenas à sociedade de forma geral, mas ao governo e aos clientes.

A avaliação como o accountability retornou os princípios positivistas

(quantitativos) alicerçados numa ótica de controle e regulação e

responsabilização dos avaliados pelos fracassos obtidos. Neste tipo de

avaliação o conceito de qualidade não é estabelecido pelos educadores e sim

pelos técnicos representantes do poder central, portanto os critérios não

apresentam uma intencionalidade educativa e social.

Este tipo de avaliação expressa o controle Estatal sobre a educação,

ela permite a comparação e intervenções para regular o sistema em

cumprimento dos seus objetivos, estipulados pelo lado de fora.

Dale (2001) afirma que a educação embora ainda seja um assunto

nacional, no qual cada país deve estabelecer normas e procedimentos que

julguem necessários, ela é tratada mundialmente e o que é decidido por

organismos internacionais influencia a postura de cada país tendo efeitos sobre

os sistemas de ensino, como se fosse propagado uma cultura mundial comum.

A avaliação da maneira como está ocorrendo estimula o individualismo,

tendo como bandeira a competitividade, “ser competitiva significa ser mais

produtiva, mais eficiente, ser capaz de apresentar superiores números e

desempenhos” (p.47) A noção de alteridade e de sociabilidade perdem a

importância.

Então, a avaliação neoliberal (produtivista, eficientista, quantitativa e competitivista) também tem um papel fundamental na modelação das consciências e na subordinação aos desígnios do sistema feito à imagem e à conveniência do mercado. (DIAS SOBRINHO, 2002, p. 48)

Nesta concepção objetivista e positivista, os professores não podem

intervir no currículo, eles são reduzidos a técnicos que devem aplicar o que foi

elaborado pelos técnicos burocráticos. A ideologia de base reflete a obsessão

pelo emprego futuro e a preparação do profissional para o mercado de

trabalho.

A tecnologia da avaliação, que instrumenta a metodologia positivista de quantificação dos rendimentos educacionais, bem como os indicadores de produtividade, são determinados pelos valores economicistas da rentabilidade e da competitividade. Essa avaliação estará então muito mais voltada aos interesses do mercado, para o lucro e a competitividade, do que para os valores concernentes ao desenvolvimento e à melhoria da humanidade. (DIAS SOBRINHO, 2002, p.60)

A maioria das vezes estas avaliações tem servido apenas para

acumular informações sobre os conteúdos disciplinares que cada sociedade

considera importante, oferecendo pouca reflexão para a compreensão das

causas que levam a estes resultados e para a elaboração de projetos de

superação.

Para Freitas (2002), as consequências das políticas neoliberais

implantadas na década de 90 estão começando a mostrar as suas

consequências, por isso é possível afirmar que “1990 não foi uma década

perdida” (FREITAS, 2002, p.300), ela pode nos ensinar. Para o autor, um

destes ensinamentos se refere à impossibilidade de se ter um sistema

educacional justo inserido numa sociedade injusta, a escola não pode ser

analisada distanciada de um contexto maior, ela continua gerando e mantendo

novas formas de exclusão.

A política pública neoliberal associada à avaliação é a transferência de

responsabilidade do Estado para o indivíduo, um exemplo disto é o tratamento

dado à avaliação externa, a escola está sendo culpabilizada pelos baixos

índices e por sua vez culpabiliza os próprios alunos. Este é um exemplo do

Estado mínimo e da transferência de responsabilidades, o aluno acaba sendo o

responsável pela sua aprendizagem, como a escola ensina para a vida, fora

dela, ele também será responsabilizado pela sua vida e seu sucesso.

Para Dias Sobrinho (2002), o campo da avaliação é ao mesmo tempo

produto e produtor das relações de poder do sistema educativo. A avaliação

ultrapassou “os muros da escola” (p.14) e se tornou uma política pública

emanada do centro do poder e que produz efeitos em toda a sociedade. Para o

autor, a avaliação se tornou um “instrumento de controle ou tecnologia do

poder” (p.14)

A avaliação é plurireferencial, complexa e polissêmica e, por isso, pode

ser vista sob diferentes enfoques, entretanto, ela sempre traz uma noção de

valor. Desde o seu surgimento ela sempre esteve associada a noção de mérito,

muito antes dela ser utilizada na escola, ela já estava presente como uma

forma de seleção social, ela era responsável pela distribuição dos indivíduos

em cargos sociais com diferentes graus de prestígio, remuneração e poder, um

exemplo disto eram as avaliações que os gregos realizavam para selecionar as

pessoas para o serviço público ateniense.(DIAS SOBRINHO, 2002)

Com a modernização da sociedade e a institucionalização da

educação, a avaliação começou a ser praticada de forma mais estruturada e

constante e, com o objetivo de atender os critérios de objetividade, rigor e

transparência. A avaliação assumiu a função de legitimar práticas e saberes,

assim como negá-los. A avaliação faz parte da agenda dos governos, pois

envolve custos e políticas e são utilizados para justificar ou desacreditar

reformas educacionais.

Para Dias Sobrinho (2002), a avaliação está no centro das reformas de

estado e tem a sua importância inquestionável, pois é a partir delas que se

realiza algumas mudanças, ela tem o poder de dar credibilidade e legalidade as

medidas de caráter administrativo e político promovidas pelo Estado.

Com o crescimento da sua importância, ela foi associada aos testes

escritos e ao sistema de notação, esta junção foi tão profunda que hoje é

impossível se pensar na avaliação sem a ideia de medida. Por essa sua origem

e importância, não se pode negar (ou negligenciar) que a avaliação interfere na

organização dos conteúdos e metodologias escolares e produz hierarquias de

poder e privilégio, por isso ela não pode ser considerada neutra.

Para Dirce Freitas (2007), a avaliação em larga escala é uma política

educacional com o objetivo de reger e controlar a educação básica no Brasil

através de Diretrizes, políticas, instrumentos, medidas e ações que são

prescritas a partir dos resultados.

A avaliação externa tem sua base no controle e na comparação. Os

testes são construídos por agências especializadas e muitas vezes norteiam

decisões políticas. A maneira como estes testes estão sendo utilizados fazem

com que os aspectos negativos se sobreponham aos possíveis ganhos, os

testes se tornaram “senhores” e não instrumentos para a melhoria da

educação. “The tests can become the ferocious master of the educational

process, not the compliant servant they should be”. (MADAUS, 1988, p. 85)

A avaliação externa, da maneira como vem sendo realizada, está

servindo à lógica mercadológica, à competição e ao ranqueamento da

educação propagando valores como o individualismo e a exclusão. Como

veremos no próximo capítulo, ela se tornou uma política de Estado capaz de se

estender por diversos governos e perpetuar esta lógica de mercado,

independente de quem governe.

II- A avaliação enquanto política de Estado

A proliferação dos sistemas de avaliação tanto no Brasil como no

mundo mostra que esta se tornou uma política pública responsável por guiar as

ações do estado na área educacional.

Distinguir o que é uma política pública de Governo e de Estado é

importante para que possamos entender qual o papel da avaliação no contexto

atual, pois para Hofling (2001), as políticas públicas estão relacionadas à

concepção de Estado vigente na sociedade e ao momento histórico vivido.

A primeira distinção importante que a autora faz se refere à

diferenciação entre política de Estado e de Governo. O estado representa o

conjunto de “instituições permanentes- como órgãos legislativos, tribunais,

exército” (HOFLING, 2001, p.31) que garante a ação do governo, este, por sua

vez, se restringe a um determinado período e apresenta um conjunto de ideias,

programas e projetos que atuarão no Estado por um determinado tempo,

relativo ao mandato de cada governo.

Entre as políticas públicas que podem ser implantadas por um governo

existem as políticas sociais que são aquelas destinadas às áreas de educação,

saúde, previdência, habitação e outras, cujo objetivo seria a “redistribuição dos

benefícios sociais visando a diminuição das desigualdades estruturais

produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico” (HOFLING, 2001, p.31).

Uma política pública social pode ser entendida, então, como o Estado

realizando um projeto (programa) de governo e todas as ações para que este

aconteça na área social, cabe ao governo assumir e desempenhar as funções

do Estado por um período.

A partir da diferenciação entre política de governo e de Estado é

possível concluir que a avaliação se tornou uma política de Estado amparada

pela legislação educacional atual, mesmo que o governo mude, os sistemas de

avaliação tendem a continuar, a não ser que haja uma mudança na legislação.

A grande maioria das políticas é de governo, mas busca ser de Estado, ou seja, em geral tenta-se criar instituições, como leis e/ou órgãos para que elas se tornem permanentes. (ROTHEN, 2012, p.64)

A transformação da avaliação em uma política educacional aconteceu

através da juridificação das avaliações, houve o surgimento de todo uma base

legal a fim de dar sustentação e legitimar a construção dos diversos sistemas

de avaliação que temos hoje.

Esta base legal necessária para a implantação dos sistemas de

avaliação ocorreu aos poucos, de tal forma que na LDB 5692 (1971) já era

possível perceber um primeiro passo para a implantação de um sistema

avaliativo.

Art. 57 A assistência técnica da União aos sistemas estaduais de ensino e do Distrito Federal será prestada pelos órgãos da administração do Ministério da Educação e Cultura e pelo Conselho Federal de Educação. Parágrafo único. A assistência técnica incluirá colaboração e suprimento de recursos financeiros para preparação, acompanhamento e avaliação dos planos e projetos educacionais que objetivam o atendimento das prescrições do plano setorial de educação da União.

A assistência técnica citada na lei se refere a avaliação dos planos de ensino e deveria ser realizada pela União. (BRASIL, 1971)(grifos nossos)

Na citada lei já aparece a intenção de avaliar projetos educacionais e os

planos de ensino, embora a ideia não esteja suficientemente desenvolvida, ela

abre espaço para a questão da avaliação da educação. Outro documento

importante que traz a avaliação como uma forma de modernização e uma fonte

de informação para a área administrativa foi o II PSEC (Plano Setorial de

Educação e Cultura), com vigência de 1974 a 1979.

Segundo Dirce Freitas (2007), a ideia de avaliação já estava presente

em documentos anteriores, mas neste ela aparece declaradamente ligada ao

planejamento educacional, ao controle e a ideia de modernização do Estado.

Na próxima edição do PSECD (Plano Setorial de Educação Cultura e

Desporto), com vigência de 80 a 85, a avaliação aparece como instrumento

importante para fornecer informações que permitam alterar o sistema de

ensino.

(...) estratégias globais de desenvolvimento e com diferentes níveis administrativos, e sustentada por um processo de avaliação e controle capaz de representar os interesses das bases e realimentar a programação. (BRASIL, 1981, p.19) Um sistema confiável de informações como instrumento de avaliação e controle. (BRASIL, 1981, p.35)

Como é possível perceber neste documento, a avaliação reaparece

atrelada à ideia de controle, por isso ela foi se tornando uma questão

importante para o governo e, frequentemente, associada à ideia de

modernização institucional administrativa.

A Constituição Federal trouxe a base nacional que atrelou a avaliação

ao conceito de qualidade da educação, afirmando que a avaliação é

responsabilidade do poder público.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;(...) VII - garantia de padrão de qualidade. Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público. (BRASIL,1989)

No artigo 206, se fala em garantia do padrão de qualidade, mas não se

especifica como isto será feito nem de que tipo de qualidade é falada, nem em

como a avaliação pode contribuir para esta qualidade. No artigo 209, a

“avaliação da qualidade” realizada pelo Poder Público é um requisito para a

iniciativa privada.

Os aspetos legais também foram garantidos pela Constituição Federal

e suas alterações, sobretudo a emenda constitucional no. 14 (12/09/96) e a 19

(04/06/98). Além destas emendas, há de se considerar todas as disposições

que são decorrentes delas.

Para Dirce Freitas (2007), com a transição para a democracia, a

avaliação passou a ser vista como um instrumento imprescindível, pois

garantiria a qualidade de ensino para a camada mais pobre da população

redefinindo a função social da escola e estipulando níveis mínimos de

aprendizagem, o que foi necessário para a descentralização.

A questão da qualidade também aparece no PNE, o artigo 214 fala em

“melhoria da qualidade do ensino”, mas não define nem explicita como isto

acontecerá. A ideia de avaliação esta presente em todos estes documentos,

mas não há uma definição de quem deve avaliar, quando e como esta

avaliação deve ser feita. O discurso que defende e legitima a avaliação

aparece associada ao termo da qualidade

Para Dirce Freitas (2007), a Emenda Constitucional 14/96 proporcionou

o movimento da centralização da informação educacional, reforçando a ideia

da avaliação de desempenho dos sistemas de ensino, embora o termo

avaliação não apareça de forma explícita na lei, aparece apenas à menção a

busca pela qualidade.

Artigo 211.

§ 1o A União organizará o sistema federal de ensino e o dos

Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e

exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva,

de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e

padrão mínimo de qualidade do ensino, mediante assistência técnica

e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

(BRASIL, 1996)

Já a Emenda Constitucional 19, que foi aprovada após 34 meses de

tramitação legislativa, provocou algumas reformas administrativas, uma vez

que diminuía os gastos com o pessoal, associando-se à ideia de ajuste fiscal e

à ideia de flexibilização e descentralização da administração pública e à

maneira de torná-la mais transparente. Nela, a avaliação aparece como uma

forma de prestação de contas aos usuários do serviço público, por isso ela é

importante, a educação é uma questão pública de responsabilidade do Estado,

por isso faz parte dos serviços que devem ser avaliados.

§ 3ºA lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente:

I - as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços. (BRASIL, 1998) grifos nossos

Neste contexto, surgiu o Programa Brasileiro de Qualidade e

Produtividade com o objetivo de avaliar a qualidade, a eficácia e a efetividade

dos serviços públicos e as leis 9131 (1995) e a 9394 (1996). Estas duas leis

apresentavam a ideia central que o tripé medida, avaliação e informação são

promotores da qualidade.

A lei 9131 surgiu antes do término das discussões sobre a LDB e a sua

versão definitiva, o governo começou a lançar uma série de medidas

provisórias em diversos setores. Muitas delas serviram para criar e

regulamentar o SAEB (que estava em vigor desde 1990), mas que só foi

normatizado através da Medida Provisória 661 (1994), reeditada sem alteração

sob o no. 711, em 17/11/1994 e, novamente, sob o no. 765, em 16/12/1994, só

então foi criado, oficialmente, o SAEB, através da Portaria n.1795 (27/12/1994),

após duas edições da avaliação. O SAEB tinha como objetivo:

I. contribuir para o desenvolvimento, em todos os níveis do sistema educativo, de uma cultura avaliativa que estimule a melhoria dos padrões de qualidade e equidade da educação básica e adequados controles sociais de seus resultados; 2. implementar e desenvolver, em articulação com as Secretarias de Educação, processos permanentes de avaliação, apoiados nos ciclos regulares de aferições das aprendizagens e competências obtidas pelos alunos e do desempenho dos estabelecimentos que compõem os sistemas de educação básica; 3. mobilizar os recursos humanos, técnicos e institucionais do Ministério, das Secretarias e de universidades e centros de estudos e pesquisas somais e educacionais, para gerar e difundir os conhecimentos, técnicas e instrumentos requeridos pelas práticas de aferição e avaliação educacional,

4 proporcionar, aos responsáveis pela gestão educacional e pelo ensino, às famílias e aos cidadãos em geral, informações seguras e oportunas a respeito do desempenho e dos resultados dos sistemas educativos. (BRASIL, 1994)

A importância da avaliação foi reafirmada com a lei 9131/95, esta lei

alterou a antiga LDB 4024/61 sem esperar pela nova, tamanha era a urgência

em se regulamentar a avaliação da lei.

Art. 1º Os arts. 6º, 7º, 8º e 9º da Lei n.º 4.024, de 20 de dezembro de

1961, passam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 6º O Ministério da Educação e do Desporto exerce as atribuições

do poder público federal em matéria de educação, cabendo-lhe

formular e avaliar a política nacional de educação, zelar pela

qualidade do ensino e velar pelo cumprimento das leis que o regem.

(BRASIL, 1995)

No ano seguinte, a LDB 9394 (1996) deixou explícita a função do Estado

de avaliar a educação básica:

Art. 9º A União incumbir-se-á de:

V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação;

VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento

escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração

com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a

melhoria da qualidade do ensino;

VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-

graduação;

VIII - assegurar processo nacional de avaliação das instituições de

educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem

responsabilidade sobre este nível de ensino (BRASIL, 1996) (grifos

nossos)

A partir do respaldo legal fornecido pela Constituição de 1988 e

reforçada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) 9394/96, os

sistemas de ensino passaram a ser alvo de uma série de processos externos

de avaliação como meio de reforçar o controle dos resultados e assegurar

competência e qualidade.

Para Dirce Freitas (2007), o período entre 1988 e 2002 foi fundamental

para que fosse instaurado e legitimado o processo de avaliação nacional, nesta

fase, a avaliação se consolidou com um instrumento de regulação da educação

básica, por isso foi necessário algumas mudanças na estrutura administrativa

do MEC, como a transformação do INEP (Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais) num órgão autônomo responsável pela avaliação e

informação educacional.

Desde 1997, esse órgão passou a concentrar as ações de

levantamento e análise de informações sobre a educação brasileira e

o fez em articulação com o IBGE e o IPEA e associado a organismos

internacionais (UNESCO, OREALC OCDE), com vistas à “troca” de

experiências, à assistência técnica “recíproca” e ao “acesso” a

metodologias que permitissem a comparação internacional.

(FREITAS D, 2007, p.104)

Através de todo este aparato legal, a avaliação foi consolidada como

uma política de Estado responsável por garantir um ensino de qualidade, como

se o simples fato de existir um sistema avaliativo externo fosse capaz de medir

e aumentar a qualidade da educação oferecida, sem se levar em conta tudo

que envolve um ensino de qualidade como a participação dos envolvidos e um

aumento no investimento na área da educação.

A partir do momento que o discurso legal que legitima a criação dos

sistemas de avaliações foi criado surgiram as iniciativas de avaliação em larga

escala, entre elas daremos um destaque especial para o SAEB e para a Prova

Brasil.

III- As primeiras Avaliações e a criação do SAEB e da Prova Brasil1

As primeiras avaliações de rendimento escolar aconteceram nos

estados do Ceará, Piauí e Pernambuco, nos anos de 1981, 1983 e 1985 dentro

do projeto EDURURAL. O objetivo era avaliar o desempenho dos alunos do

ensino fundamental (2ª. e 3ª. Séries), nas disciplinas de português e

matemática.

Outra avaliação externa que merece destaque foi a experiência de

avaliação intitulada “Avaliação do rendimento de alunos de Escolas de 1º. Grau

da Rede Pública” (1987 a 1989), nela houve a participação dos professores e

1 As informações relativas a criação do SAEB e da Prova Brasil estão disponíveis nos sites oficiais, citados

nas “Referências”.

administradores das escolas públicas que discutiram quais os programas

mínimos a serem exigidos, os objetivos e os programas de ensino

desenvolvidos na educação básica e os livros didáticos adotados.

Em 1988, foi formulada uma proposta de estruturação de uma

avaliação externa intitulada SAEP (Sistema de Avaliação do Ensino Público de

1º. Grau) que responderia às demandas do Banco Mundial que exigia algum

tipo de avaliação do projeto nordeste.2

Esse sistema de avaliação se valeria da experiência ocorrida em 1987

e dos repares e reformulações sugeridos pela Secretaria da Educação Básica

do Mec e pelo INEP com a assessoria direta da Fundação Carlos Chagas.

O objetivo do SAEP era o de determinar em que circunstâncias seria

possível se obter os melhores resultados e qual área precisaria de uma

intervenção para melhorar o processo de ensino aprendizagem. A metodologia

utilizada foi a de amostragem de escolas, alunos e professores. (FREITAS. D,

2007)

O SAEP originou o SAEB, introduzindo a avaliação em larga escala

como uma forma de regulação da educação básica no Brasil, diferentemente

de outras iniciativas esporádicas ou regionais. O SAEP/SAEB trazia uma ideia

de continuidade e a possibilidade de orientar mudanças a partir de sua

realização. A necessidade de “diagnósticos” e informação sobre a educação,

legitimaram a construção de um sistema de avaliação educacional.

O SAEB (o Sistema de Avaliação da Educação Básica) começou a ser

realizado em 1990 pelo ministério da Educação através do INEP, a intenção

era desenvolver uma parceria entre o MEC e as SEEs da educação. A

proposta do SAEB sofreu influência da UNESCO e adotou o seu modelo de

estudo de fluxo e produtividade, com a intenção de estudar a gestão escolar, o

rendimento dos alunos, a competência docente e o custo aluno, utilizando-se

de uma prova por amostras. (VIANNA, 2002)

Segundo as informações disponíveis no site oficial do INEP, o sistema

de avaliação da educação básica é composto por duas avaliações: o antigo

SAEB e a Prova Brasil, elas acontecem a cada dois anos e avaliam o

2Projeto Nordeste: programa de educação Básica para o nordeste fruto de um acordo entre o MEC e o

BIRD.

rendimento dos alunos nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática,

além de contarem com um questionário socioeconômico destinado aos alunos.

O SAEB, agora denominado ANEB (Avaliação Nacional da Educação

Básica), abrange todas as escolas públicas e privadas do país, na área urbana

e rural, realizando uma prova amostral com alunos do 5ª. e 9º. ano do ensino

fundamental e 3ª. série do ensino médio. Neste sistema de avaliação, os

resultados são divulgados por estado ou região.

O SAEB avalia através de uma prova escrita o desempenho de alunos

do ensino fundamental e médio no que se refere à aquisição de habilidades e

competências nas áreas de língua portuguesa e matemática em todo o

território nacional.

O SAEB foi usado como referência para o desenvolvimento dos

sistemas estaduais de avaliação. Para Freitas (2007), a regulação avaliativa

desempenhada pelo Estado central através do SAEB teve um efeito

“pedagógico” nos estados brasileiros que acabaram por desenvolver sistemas

baseados no SAEB.

Freitas afirma que o SAEB sofreu profundas modificações ao longo dos

anos, tanto em virtude do seu aprimoramento (metodológico, técnico e

operacional) como de sua lógica, perdendo o objetivo de criar uma cultura

avaliativa, como se propunha no início.

A Prova Brasil, agora denominada Anresc (Avaliação do Rendimento

Escolar), é aplicada de forma censitária a todos os alunos do 5º. e 9ª. ano do

ensino fundamental público, quer seja estadual, municipal, ou federal, das

áreas rurais e urbanas, que contam com o mínimo de 20 alunos matriculados

na série avaliada. O resultado é fornecido por escola, município, estado e a

nível nacional.

Eis um quadro das avaliações realizadas a nível federal e estadual, em

São Paulo:

Quadro 01. Principais Avaliações Externas Aplicadas no Estado de São Paulo

Avaliação Externa

Órgão Responsável

Público Alvo Ano de Criação

Periodicidade e Abrangência

SAEB (ANEB) 2

MEC/INEP Alunos do 5º e 9º anos do Ensino

1988 Bienalmente e Por

Fundamental e 3º ano do Ensino Médio

amostragem

ENEM MEC/INEP Alunos que estão concluindo ou já concluíram o ensino médio

1998 Anualmente e com inscrições facultativas

Prova Brasil (ANRESC) 3

MEC/INEP Alunos do 5º e 9º ano do Ensino Fundamental e 3º ano do Ensino Médio

2005 Bienal Abrange todos os alunos

Provinha Brasil

MEC/INEP Alunos do 2º ano do Ensino Fundamental

2008 Duas vezes por ano

SARESP SEE/SP Alunos do 3º, 5º, 7º e 9º anos do Ensino Fundamental e 3º ano do Ensino Médio

1996 Anual Alunos do Estado de São Paulo

Avaliação Diagnóstica

SEE/SP Todos os alunos matriculados em escolas públicas estaduais

2012 Não há informações sobre a periodicidade Alunos do 6º. E 7º. Anos do Ensino Fundamental e1ª. E 2ª.

3Houve uma alteração na nomenclatura do SAEB e da Prova Brasil, mas seus objetivos

continuaram os mesmos, como é possível verificar no oitavo artigo, a intenção é utilizar os resultados

para promover uma melhoria na educação básica:

A PRESIDENTA DO INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS

EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA - INEP (...) que instituiu o Sistema de

Avaliação da Educação Básica, composto por dois processos de avaliação: a

Avaliação Nacional da Educação Básica - ANEB, e a Avaliação Nacional do

Rendimento Escolar - ANRESC, resolve:

Art.1º Fica estabelecida, na forma desta Portaria, a sistemática para a

realização da Avaliação Nacional do Rendimento Escolar - ANRESC (PROVA

BRASIL) e da Avaliação Nacional da Educação Básica - ANEB, no ano de

2011. (BRASIL, 2011)

Série do Ensino Médio

Fonte: Releitura e Adaptação de Paz (2011, p. 86) e SEE/SP

O quadro acima comprova o que Machado (2007) já havia constatado,

não faltam sistemas de avaliação, o que precisa ser investigado são os usos

destes resultados nas escolas.

De acordo com os estudos realizados por Paz (2011), os termos

estatísticos e de amplitude alcançados pela Prova Brasil a tornaram um dos

mais avançados sistemas de avaliação da América Latina. Esta avaliação

juntamente com o SAEB (ANEB) são avaliações em larga escala que atendem

às políticas de regulação e responsabilização das escolas e dos sistemas de

ensino.

O crescimento do SAEB marcado pela ampliação de amostras,

inclusão de escolas particulares e de novos componentes, fez com que ele se

tornasse um instrumento de centralização e não de descentralização e

autonomia como se propunha.

Vianna (2002) acredita que um dos problemas do SAEB é a

disseminação dos seus resultados que não atende aos interesses da variada

clientela educacional do Brasil, por isso ele apresenta impacto restrito no

Sistema educacional, para o autor os resultados do SAEB não chegam à

escola, por isso não geram impactos no sistema de ensino.

Para Vianna (2002) somente podemos realizar comparações quando

há uma identidade social, econômica ou cultural das escolas avaliadas, caso

contrário estamos comparando coisas distintas e isto não é possível.

IV- Conclusão

Diante desta realidade, é possível perceber que a avaliação se

popularizou e começou a fazer parte do cotidiano da escola e das pessoas

envolvidas nele, valores como a competição e a mercadorização são

internalizados a ponto de não causarem estranhamento. O ranqueamento de

escolas e municípios é visto como algo normal e assume a lógica da exclusão

admitindo diferentes níveis de qualidade de ensino nas instituições públicas,

tudo isto reflete a política educacional dentro de um modelo neoliberal.

Para Dirce Freitas (2007), a ausência de debates e de fóruns

acadêmicos que discutissem o tema da avaliação, somado ao viés privatista

que esteve presente desde a origem do SAEB, quer através da experiência,

quer através do conhecimento do setor privado ou mesmo da terceirização das

avaliações fez com que a avaliação externa tivesse o seu objetivo distorcido.

O número de avaliações aumentou sem que com isso houvesse uma

participação ativa da escola na compreensão dos resultados alcançados, o que

seria vital para que a avaliação proporcionasse um aumento da qualidade da

aprendizagem dos alunos.

O aumento das avaliações em larga escala apresenta um papel

formativo, pois através das avaliações há a difusão de crenças e valores. Um

exemplo disto é a crença no potencial da avaliação em promover mudanças na

educação básica e na forma de responsabilizar as escolas e os profissionais

que atuam nela. Através do ranqueamento das escolas se reproduz a lógica da

exclusão, tão cara ao modelo neoliberal.

V- Referências

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