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    ! Documentos Técnico-Científicos

    144 Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 30, n. 2, p. 144-161, abr.-jun. 1999

    P P o o r r U U m m a a P P o o l l í í t t i i c c a a N N a a c c i i o o n n a a l l d d e e D D e e s s e e n n v v o o l l v v i i m m e e n n t t o o R R e e g g i i o o n n a a l l

    Tânia Bacelar de AraújoEconomista, Professora da Universidade Federalde Pernambuco (UFPE)

    Resumo :Discute a necessidade, a possibilidade e a

    pertinência de se formular e implementar umaPolítica Nacional de Desenvolvimento Regional

    no Brasil contemporâneo, tema que desapareceuda pauta de discussão nacional nesses tempos dehegemonia das idéias liberais. Examina a herançada dinâmica regional brasileira, ressalta as novastendências e especula sobre uma provável redefi-nição da dinâmica regional do Brasil, nos anosrecentes. Trabalha com a hipótese da fragmenta-ção espacial do País em tempos de inserção com-petitiva, mas sobretudo de “inserção passiva” , doBrasil nos mercados em globalização. Defendeque a fragmentação pode ser contrabalançada poruma nova política nacional de desenvolvimento

    regional similar à praticada na atualidade por ou-tros países e até por Blocos Econômicos, como éo caso da União Européia. Contrapõe-se à visãodominante atual, para argumentar que um paíscomo o Brasil pode inserir-se no novo ambientemundial sem ampliar ainda mais as fraturas her-dadas do passado. Argumenta que a dinâmicaregional entregue apenas às decisões do mercadotende a exacerbar seu caráter seletivo, ampliandoaquelas fraturas. Propõe a formulação e imple-mentação de uma Política Nacional de Desenvol-vimento Regional, sob nova abordagem da ques-

    tão regional brasileira.

    Palavras-Chave: Desenvolvimento Regional; Política Regio-

    nal; Neoliberalismo; Dinâmica Espacial do Brasil;Globalização Econômica; Brasil-Nordeste; UniãoEuropéia.

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    APRESENTAÇÃO O presente artigo tem como objetivo contri-

    buir para a discussão sobre a necessidade, a pos-sibilidade e a pertinência de se formular e imple-mentar umaPolítica Nacional de Desenvolvimen-to Regional no Brasil. Um tema que desapareceuda pauta de discussão nacional nesses tempos dehegemonia das idéias liberais, quando se preferedefender que o mercado será capaz de comandar avida do País, inclusive sua dinâmica regional.

    As idéias nele expostas não resultam de re-flexão recente e isolada, mas vêm sendo amadure-cidas há alguns anos e partilhadas com outrosestudiosos da questão regional brasileira que,como eu, insistem em discordar da proposta libe-ral e teimam em reafirmar que sua implementaçãosó fará ampliar as já gritantes e inaceitáveis desi-gualdades regionais do Brasil. Em textos anterio-res avançamos nas análises e proposições aquiapresentadas (1).

    Após examinar a herança da dinâmica regio-nal brasileira e tentar ressaltar as novas tendênciasde comportamento da economia do País e seurebatimento na dinâmica espacial das atividadeseconômicas, busca-se especular sobre uma prová-vel redefinição da dinâmica regional num contex-to de globalização e de opção por priorizar a cha-mada “integração competitiva” comandada pelomercado.

    Trabalha-se com a hipótese da fragmentaçãoespacial do País em tempos de inserção competi-tiva mas, sobretudo, de suainserção passiva nosmercados em globalização. Possibilidade defragmentação aqui chamada de “desintegraçãocompetitiva”. Tendência que pode ser contraba-lançada por uma nova política nacional de desen-volvimento regional. Política que exige a negaçãode teses neoliberalizantes tão em voga, que requerpresença ativa e articuladora do Estado na cena

    nacional, inclusive do Governo Federal (mas nãoapenas dele), e que é praticada, contemporanea-mente, em outros países e até por blocos econô-micos, como é o caso da União Européia.

    1 Ver, por exemplo, texto apresentado no EncontroNacional ANPUR, realizado em Recife, em 1997, etrabalho realizado em 1996/97, em parceria com oeconomista e professor da UFPB, Leonardo GuimarãesNeto, para a Confederação Nacional da Indústria.

    Contrapondo-se à visão dominante atual, esteartigo procura argumentar que a inserção de umpaís como o Brasil no novo ambiente mundialpode ocorrer sem ampliar ainda mais as fraturas(especialmente as sociais e regionais) herdadas dopassado. E que se pode combinar inserção eco-

    nômica no mercado global com busca de integra-ção das diversas regiões do País na dinâmica dodesenvolvimento nacional.

    Defende-se aqui que o controle social da e-conomia é tarefa do Estado, como afirma AlainTouraine (TOURAINE,1997), e ele deve se imporaos ventos liberalizantes que sopram atualmente,em meio à exaustão do nacional desenvolvimen-tismo, hegemônico no Brasil do século XX. Su-bordinar a dinâmica econômica regional ao obje-tivo da consolidação da integração nacional é

    tarefa do Estado -- não apenas do Governo.Entregue apenas às próprias decisões do

    mercado, a dinâmica regional tende a exacerbarseu caráterseletivo , ampliando fraturas herdadas.Tende a desintegrar o País. A proposta aqui ex-posta se contrapõe àdesintegração competitiva ,excludente, seletiva e em curso. Supõe uma novaabordagem da questão regional brasileira e propõea formulação e implementação de uma PolíticaNacional de Desenvolvimento Regional.

    1 - A DINÂMICA REGIONAL HERDADA

    Ao longo de quatro séculos, desde seu des-cobrimento pelo capital mercantil em busca deinternacionalização até o século atual, o Brasil seconstituiu como um país rural, escravocrata eprimário-exportador. Só no século XX é queemerge o Brasil urbano-industrial e de relações detrabalho tipicamente capitalistas. As antigas basesprimário-exportadoras, embora montadas no am-plo litoral do País, eram dispersas em diversasregiões, tendo associadas a elas as indústrias tra-dicionais. A imagem proposta por Francisco deOliveira é a de um “arquipélago” de regiões quequase não se ligavam umas com as outras por searticularem predominantemente com o mercadoexterno.

    A moderna e ampla base industrial montadano atual século, ao contrário, tendeu a concentrar-

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    se fortemente em uma região, o Sudeste. Com11% do território brasileiro, o Sudeste respondia,em 1970, por 81% da atividade industrial do País,sendo que São Paulo, sozinho, gerava 58% daprodução da indústria existente.

    No entanto, nas décadas recentes, começou-

    se a verificar um modesto movimento de descon-centração espacial da produção nacional. Essemovimento se inicia (anos 40 e 50) via ocupaçãoda fronteira agropecuária, primeiro no sentido doSul e depois na direção do Centro-Oeste, Norte eparte oeste do Nordeste. A partir dos anos 70, elese estende à indústria. À medida que o mercadonacional se integrava, a indústria buscava novaslocalizações, instalando-se em vários pontos dasregiões menos desenvolvidas do País, especial-mente nas suas áreas metropolitanas. Em 1990, oSudeste reduzira para 69% seu peso na indústria

    do Brasil e São Paulo recuara para uma participa-ção de 49%, enquanto o Nordeste aumentara de5,7% para 8,4% seu peso na produção industrialbrasileira, entre 1970 e 1990. O mesmo movimen-to de ganho de posição relativa acontecia com oSul, o Norte e o Centro-Oeste. Os efeitos da des-concentração das atividades agrícolas, pecuárias eindustriais estenderam-se ao setor terciário, quetambém tendeu à desconcentração.

    O resultado é que, embora a produção do Pa-ís ainda apresente um padrão de localização for-

    temente concentrado, em 1990 a concentração eramenor que nos anos 70. Entre 1970 e 1990, oSudeste reduziu de 65% para 60% seu peso noPIB brasileiro, enquanto o Sul permaneceu está-vel, respondendo por cerca de 17% da produçãonacional, mas o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste ganharam importância relativa (essas trêsregiões, juntas, elevaram de 18% para 23% suaparticipação no PIB do Brasil).

    Ao mesmo tempo em que constatam a ten-dência a desconcentrar a dinâmica econômica no

    espaço territorial do País nas últimas décadas,diversos estudos enfatizam a crescente diferencia-ção interna das macrorregiões brasileiras. CarlosAmérico Pacheco, por exemplo, chama atençãopara o aumento da heterogeneidade intra-regionalque acompanhou o processo recente de descon-centração e que legou ao País uma configuraçãobastante distinta da que havia em 1970. Constataele que o desenvolvimento da agricultura e da

    indústria “periférica” não apenas modificou adimensão dos fluxos de comércio, mas transfor-mou as estruturas produtivas de diversas regiões,resultando em maior diferenciação do espaçonacional, com aumento da heterogeneidade inter-na e reforço de certas “especializações”, gerandoo surgimento de “ilhas” de prosperidade, mesmo

    em contextos de estagnação (PACHECO, 1998).No Nordeste e no Norte, por exemplo, essa dife-renciação interna se ampliou muito nas últimasdécadas, como fica claro no artigo em que analiseia crescente complexidade e heterogeneidade darealidade nordestina (ARAÚJO, 1995) e no traba-lho onde Sérgio Buarque identifica profundasdiferenciações na organização do espaço econô-mico da região Norte (BUARQUE, 1995) .

    Essa crescente diferenciação regional em di-versas macrorregiões brasileiras teria sido a con-

    trapartida do processo de integração do mercadonacional, comandado a partir de São Paulo, se-gundo Wilson Cano. Para esse autor, bloqueandoas possibilidades de “industrializações autôno-mas”, como sonhara o GTDN para o Nordeste, nofinal dos anos 50, o movimento de integração domercado nacional forçava o surgimento de “com-plementaridades” inter-regionais e fazia desen-volverem-se “especializações” regionais impor-tantes (CANO, 1985) . São exemplos o desenvol-vimento de pólos como os de eletro-eletrônicos naZona Franca de Manaus, mineração no Pará, bens

    intermediários químicos no Nordeste oriental,têxteis no Ceará e Rio Grande do Norte, entreoutros.

    Embora a lógica da acumulação fosse amesma no imenso território do País, como bemdestaca Francisco de Oliveira, e estivéssemosconstruindo uma “economia nacional, regional-mente localizada” em substituição às “ilhas regio-nais” da fase primário-exportadora (OLIVEIRA,1990), as heterogeneidades internas às macrorre-giões não diminuíram. Muito ao contrário, tende-

    ram a se ampliar, nos anos setenta e oitenta. Aprioridade principal era a da integração do mer-cado interno nacional e a da consolidação da inte-gração físico-territorial do País – objetivo impor-tante dos Governos Militares. E nesse contexto,da mera articulação comercial entre as regiõespassa-se à integração produtiva comandada pelogrande capital industrial e pelo Estado Nacional,como mostra Leonardo Guimarães Neto (GUI-

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    MARÃES NETO, 1989). Com ela, as regiões seintegram à mesma lógica da acumulação, enquan-to ficam mais complexas e diferenciadas interna-mente.

    2 - A DINÂMICA ATUAL

    Num contexto mundial marcado por trans-formações importantes, o ambiente econômicobrasileiro sofre grandes mudanças nos anos no-venta. Dentre as principais destacam-se uma polí-tica de abertura comercial intensa e rápida, a prio-rização àintegração competitiva , reformas pro-fundas na ação do Estado e, finalmente, a imple-mentação de um programa de estabilização que jádura vários anos (1994 até o presente). Paralela-mente, o setor privado promove uma reestrutura-ção produtiva também intensa e muito rápida.

    Nesse novo contexto, novas forças atuam,umas concentradoras, outras não. Dentre as queatuam no sentido de induzir adesconcentraçãoespacial destacam-se: a abertura comercial po-dendo favorecer “focos exportadores”, mudançastecnológicas que reduzem custos de investimento,crescente papel da logística nas decisões de loca-lização dos estabelecimentos, importância da pro-ximidade do cliente final para diversas atividades,ação ativa de Governos locais oferecendo incenti-vos, entre outros. Enquanto isso, outras forçasatuam no sentido daconcentração de investimen-tos nas áreas já mais dinâmicas e competitivas doPaís. Dentre elas cabe mencionar, em especial, osnovos requisitos locacionais da acumulação flexí-vel, como: melhor oferta de recursos humanosqualificados, maior proximidade com centros deprodução de conhecimento e tecnologia, maior emais eficiente dotação de infra-estrutura econô-mica e proximidade com os mercados consumido-res de mais alta renda.

    Autores como Pacheco chamam a atençãotambém para os condicionantes da reestruturação

    produtiva e, em especial, para a forma como vemse dando ainserção internacional do Brasil, espe-cialmente no que diz respeito às estratégias dasgrandes empresas frente ao cenário da globaliza-ção da economia mundial. E constatam que, aocontrário do que se poderia esperar, a globaliza-ção reforça as estratégias de especialização regio-nal (OMAN, 1994). A nova organização dos es-paços nacionais tende a resultar da dinâmica da

    produção regionalizada das grandes empresas(atores globais) e da resposta dos Estados Nacio-nais para enfrentar os impactos regionais seletivosda globalização.

    Tende-se a romper o padrão dominante noBrasil das últimas décadas, em que a prioridade

    era dada à montagem de uma base econômica queoperava essencialmente no espaço nacional –embora fortemente penetrada por agentes econô-micos transnacionais – e que ia lentamente des-concentrando atividades em espaços periféricosdo País. O Estado Nacional jogava um papel ativonesse processo, tanto por suas políticas explicita-mente regionais, quanto por suas políticas ditas decorte setorial/nacional, ou pela ação de suas Esta-tais.

    2.1- Tendências de Localização da

    Produção

    No presente, as decisões dominantes tendema ser as do mercado, dada a crise do Estado e asnovas orientações governamentais, ao lado daevidente indefinição e atomização que têm mar-cado a política de desenvolvimento regional noBrasil. Embora as tendências ainda sejam muitorecentes, estudos têm convergido para sinalizar,no mínimo, para a interrupção do movimento dedesconcentração do desenvolvimento na direçãodas regiões menos desenvolvidas.

    Alguns autores chegam a falar em reconcen-tração, como é o caso de Clélio Campolina Diniz,da UFMG. No caso da indústria, estudos recentespermitem falar de tendência à concentração dodinamismo em determinados espaços do territóriobrasileiro. Também identificando uma forte ten-dência à concentração espacial do dinamismoindustrial recente, trabalho elaborado pelo mesmoClélio Campolina localizou os atuais centros ur-banos dinâmicos do País, em termos de cresci-mento industrial. Constatou que a grande maioria

    deles se encontra num polígono que começa emBelo Horizonte, vai a Uberlândia (MG), desce nadireção de Maringá ( PR) até Porto Alegre (RS) eretorna a Belo Horizonte via Florianópolis (SC),Curitiba (PR) e São José dos Campos (SP). Das68 aglomerações urbanas com intenso dinamismoindustrial recente, 79% estão situadas nas regiõesSul /Sudeste, 15% no Nordeste e apenas 6% noNorte e Centro-Oeste (CAMPOLINA DINIZ,

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    1996). Na sua maioria, são capitais ou cidades deporte médio, muitas delas bases dinâmicas recen-tes, como Sete Lagoas, Divinópolis, Pouso Alegree Ubá, em Minas Gerais; Araçatuba, Pirassunun-ga, Jaú e Tatuí, em São Paulo; ou Pato Branco ePonta Grossa, no Paraná; entre outras.

    As deseconomias de aglomeração tiram asmaiores regiões metropolitanas, Rio e São Paulodesse foco dinâmico industrial, mas essa últimaconcentra cada vez mais o comando financeiro daeconomia nacional.

    É certo que as conseqüências espaciais depolíticas importantes como a de abertura comerci-al e a de integração competitiva comandada pelomercado, aliadas a aspectos relevantes da políticade estabilização (como câmbio valorizado, juroselevados e prazos curtos de financiamento),

    impactaram negativamente vários segmentos daindústria instalada no Brasil e afetaram especial-mente São Paulo.

    É certo também que algumas empresas degêneros industriais mais intensivos em mão-de-obra (calçados e confecções, por exemplo) têmbuscado se relocalizar no interior do Nordeste,para competir com concorrentes externos (princi-palmente com os países asiáticos), atraídas pelasuperoferta de mão-de-obra e baixos salários, epela possibilidade de flexibilizar as relações de

    trabalho (adotando subcontratação, por exemplo),ao se mudarem.

    Mas esses fatos não alteram significativa-mente as tendências e as preferências locacionaisidentificadas pelos estudos de Campolina Dinizsobre tendências e preferências que beneficiam asregiões mais ricas e industrializadas do País (oSudeste e o Sul). Por sua vez, o professor PauloHaddad tem chamado a atenção para o reforçodado pelo Mercosul a essa tendência de arrastar ocrescimento industrial para o espaço que fica a-

    baixo de Belo Horizonte (HADDAD, 1996).No que se refere às atividades do setor pri-

    mário, constata-se que, em décadas anteriores, afronteira agrícola avançara na direção do Norte e, sobretudo, do Centro-Oeste. Essa última regiãoaumentara de 11%, em 1968/70, para 23% em1989/91, seu peso na produção nacional, em facedo dinamismo intenso da produção de grãos (es-

    pecialmente soja). No período mais recente(1991/94), a agricultura ganha presença na regiãoSul, que passa a responder por 52% da produçãobrasileira de grãos, contra 48% observados notriênio 1989/91. Vale destacar que, sozinho, oRio Grande do Sul produz ¼ do total nacional,quantidade que representa quatro vezes a produ-

    ção de grãos de todo o Nordeste e supera em 10%toda a produção da região Centro-Oeste(CAMPOLINA DINIZ, 1994).

    Por sua vez, a fronteira mineral, no seu di-namismo recente, buscou áreas como o Pará, que já disputa com Minas Gerais o primeiro lugarcomo produtor brasileiro de minérios, Goiás (ricoem amianto, estanho, fosfato e nióbio) e Bahia(com ocorrências diversificadas). No Nordeste,começa-se a investir na construção de gasodutos,aparecendo com reservas importantes de gás natu-

    ral Estados como Bahia, Alagoas e Rio Grande doNorte. Sua tendência espacial recente foi, portan-to, descentralizadora. Mas as explorações recentesnão foram industrializantes, como em Minas Ge-rais, onde se desenvolveu, associado à mineração,um complexo siderúrgico-metalúrgico-mecânico ede produção de material de transportes. Isso por-que as novas áreas de exploração mineral (comoCarajás) especializaram-se na produção paraexportação, tendendo a constituir modelo tipoenclave.

    No que se refere à agroindústria, a atividade açucareira tem ampliado presença no Centro-Oeste e no Sul. A agroindústria de processamentode produtos da agricultura irrigada avança tam-bém no Nordeste, mas a de suco de laranja conti-nua mais dinâmica no Sudeste (São Paulo) e a deprocessamento de produtos da avicultura e suino-cultura permanece mais forte no Sul.

    Percebe-se, assim, o desenvolvimento de di-versos focos dinâmicos em diferentes subespaçosdas macrorregiões, contrabalançando a tendência

    à concentração do dinamismo industrial. Valelembrar, no entanto, que a agricultura, a extraçãomineral e a agroindústria não têm peso dominantena composição do PIB brasileiro.

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    2.2 - Preferências Locacionais dosInvestimentos Privados

    As informações disponíveis sobre os inves-timentos futuros não permitem mais que esboçaralgumas tendências referentes à futura distribui-ção espacial da atividade no País. Em relatóriorecentemente elaborado para o IPEA, GuimarãesNeto (GUIMARÃES NETO, 1996) examinaalgumas informações, notadamente o levantamen-to do Ministério da Indústria, Comércio e Turismosobre as intenções de investimentos industriais,prevalentemente da iniciativa privada, além deindicadores da ação de alguns bancos oficiais noque se refere ao financiamento dos investimentos.

    Após o exame de parte relevante dessas in-formações, não se pode descartar o caráter espaci-almente seletivo dos investimentos industriais,

    que privilegiam alguns espaços específicos nasdiversas regiões, tornando-as extremamente hete-rogêneas, na medida em que não se difundem peloresto dos espaços regionais. Os dados ainda mos-tram, claramente, uma divisão de trabalho entre asregiões brasileiras, uma vez que parcela importan-te dos segmentos produtivos que definem a dinâ-mica da economia nacional tende, mais uma vez,a se concentrar nas regiões onde teve início e seconsolidou a indústria moderna brasileira. En-quanto que os segmentos mais leves da indústria,de menor densidade de capital, procuram as regi-

    ões de menor nível de desenvolvimento e, segu-ramente, de custo de mão-de-obra menor.

    Em termos macrorregionais, os dados do Mi-nistério da Indústria, Comércio e Turismo antesreferidos revelam que dos investimentos previstosaté o ano 2000 – considerando os que podem serregionalizados, bem como identificados os inves-tidores potenciais – 64,3% deverão concentrar-seno Sudeste (sendo 28,2% em São Paulo), 17,6%no Nordeste, 9,4% no Sul e 7,5% na região Norte.No Centro-Oeste, os investimentos não alcançari-

    am mais que 1,2% do total.Dois aspectos chamam a atenção quando se

    desce ao exame pormenorizado da localização dosinvestimentos por unidade da Federação e porsegmento produtivo do setor industrial. Quando seadota, por exemplo, um patamar mínimo de 10%da participação dos Estados no investimento total,observa-se que as intenções de investimentos se

    concentram em basicamente três unidades da Fe-deração: São Paulo (28,2%), Rio de Janeiro(19,3%) e Minas Gerais (14%), todos no Sudeste,que somados abrangem mais de 60% dos investi-mentos previstos para a indústria até o ano 2000.Reduzindo mais o patamar mínimo consideradona participação nos investimentos, o que se obser-

    va é o surgimento de outras macrorregiões, que sefazem representar por um número muito reduzidode Unidades Federadas. Considerando-se o pata-mar de 4%, destacam-se, na região Norte, o Esta-do do Pará (4,2%); no Nordeste, a Bahia (9,4%); ena região Sul, o Rio Grande do Sul (4,6%).

    São esses os Estados para os quais deverá, nofuturo imediato, dirigir-se a parte mais significati-va dos investimentos industriais. Se adicionarmoso Paraná, com 3,2% dos investimentos, os seteEstados referidos deverão concentrar cerca de

    83%, aproximadamente, do total dos investimen-tos previstos pelo Ministério da Indústria, Comér-cio e Turismo e cujos valores podem ser regiona-lizados e identificados os grupos investidores.

    No que se refere à distribuição regional dosinvestimentos, segundo os segmentos produtivos mais importantes, o que surge como mais relevan-te é o seguinte:

    a) quanto ao peso dos segmentos produtivosmais importantes, no total dos investimentos pre-

    vistos, destacam-se os seguintes percentuais: aindústria de fabricação e montagem de veículosautomotores, reboques e carrocerias participa com11,8%; a de extração mineral com 15,4%; a demetalúrgica básica com 12,9%; a indústria deminerais não-metálicos com 3,4%; a indústria deprodutos alimentícios e de bebidas com 7,8%; ade papel e celulose com aproximadamente 13%; ade química com 16,7%; a têxtil com 4,6% e aeletrônica e de material de comunicações comcerca de 3%; ou seja, esse conjunto de segmentosprodutivos compreende quase 89% do total dos

    investimentos aqui considerados;b) quando se examina a localização regional

    do segmento da indústria de fabricação e monta-gem de veículos automotores, reboques e carroce-rias, segundo dados do MICT, o que se verifica ésua enorme concentração no Sudeste. De fato,85,2% do total dos investimentos deste segmento

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    deverá se concentrar nessa região, fundamental-mente nos Estados de Minas Gerais e São Paulo;

    c) no que se refere à indústria extrativa mine-ral, notadamente a partir da exploração de petró-leo no Rio de Janeiro e das demais atividadesminerais em Minas Gerais, 94,8% dos investimen-

    tos estão concentrados no Sudeste. Fora dessaregião, apenas se pode marcar a presença da regi-ão Norte, com os investimentos previstos para oEstado do Pará, que alcançam cerca de 4,5%;

    d) também fortemente concentrados no Su-deste estão os investimentos previstos para a in-dústria metalúrgica básica (68,1%), localizando-se, especialmente, em Minas Gerais, Rio de Janei-ro e São Paulo, com destaque, ainda, para a regiãoNorte, que deverá absorver 25,2% dos investi-mentos, notadamente no Pará;

    e) a indústria química registra um peso im-portante no Sudeste, que com a contribuição deSão Paulo e Rio de Janeiro deverá, no futuro ime-diato, atrair cerca de 66,4% dos investimentos; noentanto, neste segmento já se nota a presença daregião Sul (notadamente do Rio Grande do Sul) edo Nordeste (Bahia), com respectivamente 17,2%e 16,1% do total;

    f) nos demais segmentos reduz-se o peso doSudeste, aparecendo alguns Estados isolados nas

    demais regiões. Assim:(i) em minerais não-metálicos, embora o Su-

    deste com seus 51,4% tenha uma representativi-dade maior que o Nordeste, esta última regiãoregistra uma participação de 41%, com maiordestaque para o Estado da Bahia e bem menospara Pernambuco;

    (ii) no que se refere à indústria de produtosalimentares e bebidas, deve-se fazer referêncianovamente ao Nordeste (e em particular à Bahia),

    com uma participação de 22,9%, menor que a doSudeste (61,5%), mas bastante representativa nototal;

    (iii) o Nordeste também aparece, através daBahia, sobretudo, mas também do Maranhão, naindústria de papel e celulose, com 40,6%, seg-mento que registra uma distribuição de sua ativi-

    dade em praticamente todas as regiões, à exceçãodo Centro-Oeste;

    (iv) com relação à indústria têxtil, o Nordestemarca sua presença com uma participação de69,2% do total dos investimentos, concentradosnos Estados do Ceará, Paraíba e, em parcela bem

    menor, Pernambuco;(v) finalmente, cabe registrar, no que se refe-

    re à indústria eletro-eletrônica e de material decomunicação, a presença marcante da região Nor-te, onde os investimentos alcançam 42,5%, marcasomente superada pela participação do Sudeste,com 55,4%. Enquanto a totalidade dos investi-mentos previstos para a região Norte concentra-seno Estado do Amazonas, no Sudeste eles se vol-tam, preferencialmente, para São Paulo, havendouma participação muito reduzida do Rio.

    Existe, sem dúvida, uma divisão espacial detrabalho que induz os investimentos do grupometal-mecânica, automobilística e química, ossegmentos básicos da chamada indústria pesada,para o Sudeste; e, simultaneamente, possibilita odirecionamento para as demais regiões da indús-tria de minerais não-metálicos (geralmente de umpadrão de localização mais desconcentrado), daindustria têxtil, de produtos alimentares e bebidas,e de papel e celulose, além da indústria eletro-eletrônica e de material de comunicações, esta por

    razões muito específicas (Zona Franca de Ma-naus).

    No entanto, o que se deve ressaltar é que adivisão do território brasileiro em macrorregiõesesconde, mais que revela, o fato de que há, daparte do pesado investimento industrial, umagrande seletividade espacial, notadamente quandoorientado para as demais regiões, que não o Su-deste. Neste particular, destaca-se, no Nordeste, oEstado da Bahia, em grande parte dos segmentos;no Norte, o Estado do Amazonas, quando se trata

    dos segmentos eletro-eletrônico e de material decomunicação, e o Estado do Pará, no tocante àmetalúrgica básica; e no caso da região Sul, o RioGrande do Sul, no que se refere à química, e oParaná, quando se trata da indústria de produtosalimentícios e bebidas.

    Com base nos dados do Ministério da Indús-tria, Comércio e Turismo, a tendência parece ser,

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    de um lado, o avanço, no futuro imediato, na con-solidação dos segmentos básicos e estratégicos noSudeste, com uma participação provavelmentemaior do Rio de Janeiro. De outro lado, a consoli-dação de especializações em outros Estados que,embora fora da região industrial tradicional, con-seguiram, através de fatores os mais diferentes

    (recursos naturais, fortes incentivos regionais,condições de infra-estrutura) atrair segmentosespecíficos que definem subáreas dinâmicas emodernas em contextos nos quais prevalecem,ainda, subáreas tradicionais e estagnadas. Vale oregistro, neste particular, para a quase ausência daregião Centro-Oeste na previsão dos investimen-tos industriais para o futuro imediato. O destaquepara sua participação fica no tocante à indústria deprodutos alimentícios e bebidas, concentrada emGoiás.

    2.3 - Para Onde Tende a Ação doGoverno Federal

    Antes de examinar as tendências embutidasnas opções prioritárias do Governo Federal, cabedestacar, como pano de fundo, que o novo para-digma tecnológico e produtivo, baseado na micro-eletrônica e centrado na produção flexível, ao ladoda crescente hegemonia do movimento de globa-lização (financeira, produtiva, tecnológica e mer-cantil), tende a se difundir na economia mundialimpactando profundamente países como o Brasil.

    E que estudos recentes sobre as tendências loca-cionais das atividades produtivas no contextodesses novos condicionantes, realizados em geralpara países desenvolvidos, onde esses padrõesnovos estão mais consolidados, revelam a emer-gência de novos elementos de atração de investi-mentos (MARKUSEN et al, 1986; SCOTT eSTORPER, 1986).

    Dentre os novos elementos capazes de atrairatividades e investimentos, especialmente no quediz respeito às atividades industriais, vêm sendo

    freqüentemente apontados: a existência de mão-de-obra qualificada, a presença de competentesCentros de Ensino e Pesquisa Científica e Tecno-lógica, a existência de um bom clima de negócios(empresários locais abertos a parcerias e aliançasestratégicas e atores públicos locais ativos), aexistência de uma massa crítica de fornecedoreslocais de componentes e serviços, entre outros.

    Trata-se, portanto, de fatores locacionaisnão-tradicionais .

    Como bem destaca Paulo Haddad(HADDAD, 1996), não resta dúvida de que, noconjunto do panorama nacional, o potencial loca-cional de áreas do Sul-Sudeste para atrair os no-

    vos investimentos é, em quantidade e qualidade,bem maior que o encontrado no Norte, Nordeste eCentro-Oeste. Tornam-se particularmente atraen-tes, nesse novo contexto, cidades médias daquelasregiões, localizadas próximas a eixos de transpor-tes e, portanto, dotadas de boas condições de a-cessibilidade (importante em tempos de aberturacomercial e globalização intensas). Ainda segun-do Haddad, a geografia industrial dos grandesprojetos de investimentos privados anunciados noperíodo pós-Real revela evidências inequívocasde que eles tendem a concentrar-se no Sudeste/Sul

    (de Belo Horizonte para baixo), justo nas áreasdinâmicas apontadas por Campolina.

    Se, do ponto de vista das tendências de mer-cado, os espaços mais atraentes tendem a estarsituados no Sul/Sudeste, do ponto de vista dosrestritos investimentos patrocinados pelo GovernoFederal, era de se esperar ação efetiva no sentidode evitar a ampliação de disparidades já gritantesno Brasil e assegurar a compatibilidade entre in-serção na globalização e integração dos diversosespaços do País. Mas os dados parecem sinalizar

    para tendência a fortalecer (ao invés de contraba-lançar) a concentração de novas atividades e no-vos investimentos em certos “focos competiti-vos”. Senão , observe-se o seguinte:

    O Programa “Brasil em Ação”, no qual oGoverno Federal define os projetos prioritários deinvestimentos (pouco mais de 40), desagrega taisprojetos em dois grandes blocos: os projetos deinfra-estrutura e os da área social.

    Para o que interessa nesse trabalho, tomem-

    se os projetos de infra-estrutura e, dentro deles,aqueles que têm capacidade de definir articula-ções econômicas inter-regionais ou internacionaise, portanto, são capazes de influir na organizaçãoterritorial do Brasil, em tempos de globalização.Os demais são projetos importantes, mas de im-pacto localizado, restritos a uma ou outra regiãodo País (a exemplo da conclusão de Xingó, comimpacto no Nordeste, ou da montagem da linha de

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    transmissão de Tucuruí, que assegura suprimentode energia à região oeste do Pará, entre outros).Por sua vez, de grande importância para a mode-lagem territorial do Brasil , fica de fora dessaanálise o Programa de Desenvolvimento das Tele-comunicações (PASTE), por não ter sido apresen-tado com o detalhe da localização regional de seus

    investimentos, e o Programa de Recuperação deRodovias, também sem localização explicitada.

    Os projetos prioritários de infra-estrutura e-conômica, estratégicos para a futura organizaçãoterritorial do Brasil, revelam algumas característi-cas importantes:

    • têm uma opção prioritária clara pela inte-gração dos espaços dinâmicos do Brasil ao mer-cado externo, em especial ao Mercosul e ao res-tante da América do Sul, consistente com a opção

    brasileira de promover aintegração competitiva .Essa orientação estratégica secundariza a integra-ção nacional, quando a inserção do Brasil naglobalização não precisa se dar às custas da frag-mentação do País, mas pode e deve ser conduzidacompatibilizando essa inserção com a continuida-de do processo deintegração que o Brasil vinhaconsolidando nas últimas décadas. Mas esse éoutro debate;

    • priorizam dotar de acessibilidade os “focosdinâmicos” do Brasil (agrícolas, agro-industriais,

    agropecuários ou industriais), deixando em se-gundo plano as áreas menos dinâmicas, ou ostradicionais investimentos “autônomos”, onde oEstado patrocina infra-estruturas que potenciali-zam dinamismo econômico futuro. Na opção atu-al, o Estado segue o mercado, enquanto com osinvestimentos “autônomos” se antecipa a ele. Naopção do “Brasil em Ação”, o Governo priorizaampliar a competitividade de espaços já maiscompetitivos;

    • concentram os investimentos no Sul/Sudes-

    te, na fronteira noroeste e em pontos dinâmicos doNordeste e Norte, seguindo os espaços que vêmconcentrando maior dinamismo, nos anos recen-tes.

    2.4 - Integração Competitiva e Focos deCompetitividade

    Como ficou claro das análises apresentadasaté aqui, no Brasil dos anos recentes, já no novocontexto de abertura, estabilização e predomínioda integração competitiva, parece se confirmaruma tendência a interromper a desconcentraçãoespacial do crescimento que ocorria nos anos 70 e80. Essa interrupção vem sendo comandada pelomercado e referendada pelas políticas públicasfederais, de corte nacional/setorial. Em termosregionais, o que sobrevive são resquícios de ins-trumentos e políticas herdadas do passado, comreduzida capacidade de impactar as realidadesregionais e contrapor-se às novas forças que ten-dem a se consolidar.

    A ausência de políticas regionais explícitas

    do Governo Federal abriu espaço à deflagração deuma “guerra fiscal” entre Estados e Municípios,que buscam contribuir para consolidar alguns“focos de dinamismo” em suas áreas de atuação.A combinação desses dois fatos vai deixandograndes áreas do País à margem: são os ditos “es-paços não-competitivos”.

    Acrescente-se, a isto, a limitada dimensão dadesconcentração ocorrida nas décadas anteriores.Ela não alterou substancialmente a antiga divisãoregional de trabalho, que concentrou no Sudeste a

    parte mais relevante da base produtiva nacional e,sobretudo, dos segmentos industriais estratégicos.Além do mais, tal processo de desconcentraçãoocorreu num quadro econômico e político no quala economia nacional iniciava o seu processo dedesaceleração (segunda metade dos anos 70),desaguando na crise e instabilidade dos anos 80 e90, e, ao lado disso, o Estado nacional passava aviver uma das maiores crises fiscal e financeira dasua história.

    Ademais, como ficou aqui mostrado, os estu-

    dos recentes sugerem o esgotamento do processode desconcentração, relativamente curto, semdúvida, quando comparado com o longo períodode concentração que data do início da industriali-zação brasileira até o auge da fase expansiva do“milagre econômico”, no final da primeira metadedos anos 70.

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    Por sua vez, as tendências prováveis dos in-vestimentos sugerem é que, após a fase de des-concentração modesta, poderá ocorrer um proces-so de concentração espacial do dinamismo eco-nômico em algumas sub-regiões ( focos dinâmi-cos), no futuro imediato. Isto significará que,mais uma vez, o País está na iminência de repetir

    uma trajetória de concentração espacial ou deacirramento de desigualdades regionais, agoranum contexto extremamente mais difícil, com: (i)inserção maior do País e das regiões na economiamundial, submetendo-se a uma acirrada competi-ção, (ii) um Estado ainda extremamente débil paradefinir e implementar diretrizes que possam con-trapor-se aos custos sociais de uma maior desi-gualdade regional e (iii) uma Federação em crise,como têm ressaltado vários estudos recentes daFUNDAP (AFFONSO E SILVA,1995).

    A conclusão preocupante que emerge das ob-servações e análises até aqui apresentadas é que,muito provavelmente, a inserção do Brasil naeconomia mundial globalizada tende a ser am-plamente diferenciada, segundo os diversossubespaços econômicos desse amplo e heterogê-neo País. Essa diferenciação tende a alimentar aampliação de históricas e profundas desigualda-des.

    Não se repetirão, certamente, as formas pelasquais se materializaram essas desigualdades ao

    longo do século XX, mas provavelmente se ob-servará o aumento da heterogeneidade intra-regional, como supõe Pacheco (PACHECO,1998), posto que o próprio estilo de crescimentoda economia mundial é profundamente assimétri-co e aos atores globais interessam apenas os espa-ços competitivos do Brasil. Espaços identificadosa partir de seus interesses privados e não dosinteresses do Brasil. Os países para esses agentessão meras “plataformas de operação”. O quadrofuturo tende a ser mais complexo que no passadorecente, posto que em antigas áreas dinâmicas

    podem surgir bolsões de pobreza, áreas antes pou-co exploradas podem ser “descobertas e dinami-zadas” e áreas dominantemente pobres podemabrigar “focos dinâmicos” restritos.

    Essa diferenciação irá requerer, mais quenunca, uma ação pública ativa (sobretudo ofertan-do elementos de competitividade sistêmica, comoeducação e infra-estrutura de acessibilidade),

    para evitar a fragmentação do País ou a consoli-dação de uma realidade onde “ilhas de dinamis-mo” convivam com numerosas sub-regiões mar-cadas pela estagnação, pobreza, retrocesso e atéisolamento.

    Mas há novos fatos e movimentos em curso.

    Entre eles, a emergência de atores locais ativos(Governos Estaduais, Governos Municipais, Enti-dades Empresariais locais) é um fato importantedo contexto dos anos recentes. Embora sua pre-sença crescente em cena não dispense uma açãofirme do Governo Federal no campo do desenvol-vimento regional, como ocorre até em blocoseconômicos (como se vê no caso da União Euro-péia, executora de políticas ativas de corte regio-nal), essa nova tendência deve ser valorizada, poisimplica a atuação de novos e importantes atores.

    Em muitas áreas do País, atores locais têm searticulado para pensar e propor estratégias dedesenvolvimento local e regional. Planos estraté-gicos municipais e regionais têm se tornado cadavez mais freqüentes.

    Por outro lado, na contramão tanto do movi-mento de integração seletiva e fragmentadoracomo do processo de desmembramento de muni-cípios (pela “onda” de autonomia que criou mi-lhares de novos municípios no Brasil dos anosrecentes), cada vez mais freqüente se torna o re-

    curso a estratégias de consorciação para atuaçãoem espaços territoriais e institucionais mais am-plos. Diversos Estados já dispõem de leis regu-lando esses consórcios e os estimulam. Parte-se,assim, do nível estritamente local para propor eatuar em níveis regionais mais amplos. Dessemodo, problemas são melhor enfrentados e poten-cialidades aproveitadas com mais vantagem.

    Trata-se, portanto, da reconstrução de espa-ços mais amplos de atuação de políticas públicas(nem todas executadas por entes governamentais)

    e da redescoberta de identidades regionais e danecessidade de promover a integração desubespaços (regiões) deixados à margem pelomovimento mais geral e seletivo da inserção glo-bal dos pólos dinâmicos. Integração importantenum país heterogêneo e continental como o Bra-sil.

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    Também é possível identificar nos anos re-centes a emergência de novas concepções de de-senvolvimento, dentre as quais se destaca a do“desenvolvimento sustentável”. Preocupado emabordar a realidade nas suas múltiplas dimensões,com destaque para a solidariedade intergeração(sustentabilidade ambiental), esse conceito, ao se

    aplicar no Brasil, tem destacado também a preo-cupação com a dimensão social e com a integra-ção físico-territorial do País (para o que investi-mentos em infra-estrutura econômica ganhamrelevo, vez que são capazes de redefinir territoria-lidades, num país ainda em processo de ocupaçãode seu vasto território).

    3 - POR UMA POLÍTICA NACIONAL DEDESENVOLVIMENTO

    REGIONALDiante do exposto, parece claro que as ten-

    dências de mercado são no sentido de aprofundaras diferenciações regionais herdadas do passado efragmentar o Brasil, destacando do “resto” do Paísos “focos de competitividade e de dinamismo”,para articulá-los à economia global. Ainserçãoseletiva promovida pelas novas tendências terácomo contraface da mesma moeda o abandonodas “áreas de exclusão” (ditas não-competitivas).Poderia estar sendo traçado, assim, o roteiro da

    desintegração brasileira. A emergência de focosde um novo tipo de regionalismo , intitulado porCarlos Vainer de “provincianismo mundializado”,sinaliza nessa direção. São locais de grande dina-mismo recente e bem dotados dos novos fatoresde competitividade que montam sua articulaçãopara fora do País e tendem a romper laços de soli-dariedade com “o resto”, passando a praticarpolíticas explícitas de segregação contra emigran-tes vindos de áreas não-competitivas. Buscam,assim, evitar “manchar” a “ilha” de primeiromundo que julgam constituir (VAINER, 1995) .

    Se essa hipótese de tendência pode ser ver-dadeira, cabe ao Governo Federal atuar no sentidode evitá-la. Para isso, cabe-lhe conceber e imple-mentar uma nova política de desenvolvimentoregional. Ou melhor, uma política nacional dedesenvolvimento regional.

    3.1 - Exemplos que Vêm de Fora

    Uma das principais características da fase re-cente (anos 90), no que se refere à dinâmica daorganização territorial do Brasil e à questãodas desigualdades regionais, é a inexpressivapresença de políticas regionais explícitas do Go-verno Federal, associada a uma atomização deesferas de tratamento do regional, o que provoca,no pouco que sobrou do passado, superposição deesforços e desconexão de iniciativas, revelando,ao final, falta de prioridade.

    Em contraposição, estudo sobre as Políticasde Desenvolvimento Regional no Mundo Con-temporâneo informa que, ao observar o atual pa-norama internacional, é possível identificar políti-cas ativas em países como a Alemanha, França,Itália e Japão, entre outros. Mesmo em blocos

    supranacionais, como a União Européia, foramidentificadas políticas claras de tratamento deáreas menos dinâmicas ou submetidas a processosintensos de reestruturação econômica, com uso deinstrumentos financeiros específicos (a exemplodo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional- FEDR) . Até os Estados Unidos, país continentalmas sem grandes disparidades regionais ( a regiãomais rica tem uma renda per capita apenas 17%maior que a média nacional, quando a do Sudestebrasileiro é cerca de 50% mais alta que a médiado País), adotaram programas regionais diferen-

    ciados, como o de construção de rodovias interes-taduais, o programa espacial e o de despesas mili-tares, todos voltados para obter efeitos localizadosregionalmente. Mais recentemente, os Estadostêm assumido iniciativa de promover atração deinvestimentos, colaborar com empresas na abertu-ra de novos mercados e apoiar o desenvolvimentode produtos promissores (MAIA GOMES, 1993).

    Do estudo realizado, fica claro que, no pre-sente, grande parte do esforço governamental, emmatéria de política regional, assume a forma de

    gastos com infra-estrutura econômica nas regiõesque se pretende desenvolver. Na União Européia,por exemplo, 90% dos recursos do Fundo Regio-nal (FEDR) têm essa destinação e percentuaiselevados com esse tipo de gasto foram encontra-dos na Alemanha e Japão. No Brasil, nos 42 pro- jetos prioritários do atual Governo, os investimen-tos em infra-estrutura econômica se concentram,

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    ao contrário, nas áreas mais dinâmicas, como semostrou anteriormente (Ver item 2.2.)

    As outras opções prioritárias das diversas po-líticas ou estratégias regionais são a promoção dodesenvolvimento da indústria, das pequenas emédias empresas e, mais recentemente, das ativi-

    dades de prestação de serviços, hoje cada vezmais consideradas elemento dinâmico nas estraté-gias regionais. Por sua vez, como as atividades dealta tecnologia (high tech ) tendem a se tornarmenos dependentes de localizações específicas,devido ao próprio progresso nos meios de comu-nicação, elas tendem a ser patrocinadas em regi-ões que se quer desenvolver, sendo, portanto,usadas como indutoras de desenvolvimento regio-nal. É o caso de programas japoneses como os dasTecnópolis e da Teletopia (que equipam localida-des com facilidades de telecomunicações e pro-

    cessamento de informações para atrair pessoalaltamente qualificado), e o Projeto Cérebros daIndústria, que pretende desconcentrar serviçosaltamente especializados (MAIA GOMES, 1993).

    Esse estudo revela que “mesmo não havendoevidências claras de que a política regional assu-ma papel prioritário nas agendas governamentais(com exceção do caso da Alemanha reunificada,onde se gasta mais de 20 vezes que o Brasil empolíticas tipicamente regionais), não foram encon-trados casos de um abandono tão completo quanto

    o que se verifica no Brasil”. E conclui: “o contras-te entre a riqueza de novas idéias ora sendo de-senvolvidas no mundo, no campo da política regi-onal, e a estagnação brasileira sugere a necessida-de de mudanças radicais, a fim de fazer renascer aluta pela redução das disparidades de renda entreas regiões brasileiras”(MAIA GOMES, 1993).

    3.2 - Condicionantes do Novo ContextoBrasileiro

    O novo contexto no qual se situa a economiae a sociedade brasileiras, que começa a redefinirsua estrutura econômica, as relações de trabalho eas formas de inserção do País no circuito interna-cional, deve constituir-se um ponto de partida econdicionante significativo para uma nova políti-ca de desenvolvimento regional.

    Tal contexto está marcado, entre outros as-pectos, pela transição para um novo paradigma

    produtivo e tecnológico, de nível mundial, queintroduz novos fatores de competitividade e defi-ne, em níveis internacional e nacional, novos con-dicionantes de localização das atividades produti-vas, muito diferentes dos tradicionalmente consi-derados. Isto, seguramente, conduz a que sejamrepensadas as políticas e os instrumentos de polí-

    tica econômica até o presente adotados no trata-mento da questão regional.

    Ao lado disso, é importante levar em contaque as transformações pelas quais passaram aseconomias regionais brasileiras, nas últimas déca-das, deixaram marcas profundas nas regiões ante-riormente consideradas e redefiniram uma novaconfiguração regional, que necessita ser enfatiza-da nas discussões sobre as políticas de desenvol-vimento regional. O Nordeste dos anos 90 não émais o mesmo Nordeste do final dos anos 50,

    quando foram definidas as linhas básicas da polí-tica de desenvolvimento,coordenada pelaSUDENE. O mesmo pode ser dito da Amazônia edo Centro-Oeste. As formas de intervenção doEstado brasileiro, através dos estímulos fiscais efinanceiros, do investimento estatal e da implan-tação de infra-estrutura econômica articularam edesarticularam espaços no interior de cada região,dando lugar a novas formas de integração e novadivisão espacial do País que não pode mais serignorada na década atual, quando se pretenderever as formas tradicionais de atuação do setor

    público na economia.As novas dinâmicas espaciais que surgiram

    das mudanças verificadas nas regiões brasileirasnas últimas décadas fizeram surgir, ao lado deáreas de modernização dotadas de dinamismo (eseguramente competitivas, quando se consideraum contexto extremamente competitivo e globali-zado), áreas e sub-regiões não-competitivas, tra-dicionais e mesmo estagnadas, que embora dota-das de potencialidades podem, se atenção especí-fica não for definida para seu tratamento, ser mar-

    ginalizadas nas novas formas de inserção do Paísno contexto internacional, inclusive a partir dosacordos que integram o MERCOSUL e do propó-sito manifesto do Governo brasileiro de uma sis-temática abertura da economia no curto e médioprazos.

    Além disso, o novo contexto vivido pelo Paíscomporta profundas modificações nas formas de

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    atuação do Estado brasileiro e no seu relaciona-mento com os agentes econômicos privados. Nes-te particular, o Estado, em suas diferentes esferas,transita para um contexto de menor presença naeconomia, para adoção de novas formas de articu-lação e parceria, para uma menor importância dasformas diretas de ação, para a descentralização e

    para uma atuação voltada para a regulação emnovas áreas. O surgimento de novos modelos degestão de políticas públicas, menos centralizadose mais democráticos, poderá, no futuro imediato,exigir uma mudança radical nas formas de atua-ção governamental, no que se refere às políticasde desenvolvimento regional.

    Embora nem todos os aspectos possam, deimediato, ser considerados em todas as suas di-mensões nas propostas que seguem, eles se consti-tuem, não resta dúvida, marcos importantes que

    devem ser considerados no aprofundamento dasdiscussões a respeito do desenvolvimento regionalbrasileiro.

    3.3 - Bases de uma Nova Abordagem

    Além das questões anteriormente levantadasquando da análise do novo contexto vivido pelaeconomia e pela sociedade brasileiras, o que sedeve ressaltar, quando se pensa nas bases parauma nova política regional, é a herança extrema-mente heterogênea que caracteriza a realidade

    espacial do País, com regiões e sub-regiões de-senvolvidas e industrializadas, com renda porhabitante superior à de países industrializados, aolado de regiões e sub-regiões atrasadas, conviven-do com proporções de pobreza e miséria próximasàs dos países de maior grau de subdesenvolvimen-to e atraso econômico e social.

    A consideração de quaisquer dos indicadoressociais e econômicos tradicionais mostra, para oPaís, uma desigualdade dificilmente encontradana experiência internacional, não obstante o perí-

    odo de convergência e de desconcentração espaci-al vivido pelo Brasil a partir da segunda metadeda década de 70 até a primeira metade dos anos80, pelo menos.

    A atuação de um mercado auto-regulado,num contexto desigual como o anteriormentedescrito, e num quadro mais geral de globalizaçãoe inserção competitiva do País na economia inter-

    nacional, embora possa significar fonte de dina-mismo e de modernização para regiões e sub-regiões privilegiadas e já integradas aos fluxoseconômicos internacionais, para as demais regiõese sub-regiões poderá dar lugar à marginalizaçãoeconômica, com custos sociais intoleráveis, tradu-zidos em desemprego e aumento dos níveis de

    pobreza e miséria.O mesmo pode-se afirmar em relação a polí-

    ticas públicas que tendem, na sua concepção eprática, a apenas reforçar e consolidar as forças demercado, e que, sem levar em conta a presença deum contexto heterogêneo e desigual, podem darlugar a impactos negativos sobre as condições devida e de trabalho em amplos segmentos da popu-lação, notadamente das regiões e sub-regiões maisatrasadas, tradicionais e de menor capacidade decompetição e inserção de forma competitiva na

    economia internacional.3.3.1 - Grandes objetivos a alcançar

    A política de desenvolvimento regional nãopode deixar de ter entre seus objetivos fundamen-tais a questão daredução sistemática das desi-gualdades regionais , que, no fundo, diz respeitoao enfrentamento das diferenças espaciais quantoaos níveis de vida das populações que residem emdistintas partes do território nacional e no que serefere às diferentes oportunidades de emprego

    produtivo, a partir do qual a força de trabalhoregional tenha garantida a sua subsistência.

    Embora se trate de aspectos que nunca esti-veram ausentes das políticas tradicionais de de-senvolvimento regional, as questões daeficiência e da competitividade passam, mais recentemente,a ter uma posição estratégica no tratamento daproblemática regional, quando, num contextomais geral, o processo de globalização e a propos-ta de inserção competitiva da economia nacionalna economia mundial passam a exigir das políti-

    cas não só a ampliação da base econômica, mas amontagem de uma estrutura produtiva que possaganhar mercados num contexto cada vez maiscompetitivo.

    Significa dizer que o eixo central da nova po-lítica de desenvolvimento deve estar constituído,de um lado, pelo objetivo da eqüidade, que setraduz basicamente na redução das desigualdades

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    no que se refere a níveis de renda e oportunidadese condições de trabalho das populações regionais;e o deeficiência , que se traduz não só na monta-gem e ampliação de uma base econômica regionalmas, cada vez mais, na implantação de uma estru-tura produtiva capaz de competir no mercadonacional mais aberto e no mercado internacional.

    Outro marco importante que não pode deixarde ser considerado na nova política de desenvol-vimento regional – e que tem estreita relação como novo contexto nacional e internacional – dizrespeito ao enfrentamento das tendências de

    fragmentação das economias continentais como abrasileira, pela integração internacional e seletiva de regiões ou sub-regiões específicas, bem dota-das e já articuladas ao comércio mundial. A estatendência, cada vez mais definida com o avançoda globalização, é importante que, através de um

    projeto nacional, a nova política de desenvolvi-mento regional considere entre seus objetivosbásicos aintegração dos espaços regionais, atra-vés de uma divisão espacial de trabalho que arti-cule no interior da economia nacional as diferen-tes regiões, difundindo em todas elas os efeitospositivos do crescimento da economia e da inser-ção cada vez maior do País no mercado mundial.

    Com base nesses marcos – que sem dúvidadecorrem do novo contexto vivido no País e emcada uma das suas regiões – o que se pretende, em

    termos operacionais, é a partir de uma visão na-cional tratar a heterogeneidade e a diversidade desituações que caracterizam a economia brasileira,não só uma economia e uma sociedadecontinen-tal como extremamente heterogênea, tanto emtermos dos indicadores pessoais como espaciais.

    3.3.2 - Nova forma de tratar adimensão regional

    Na abordagem tradicional das políticas regi-onais brasileiras, a dimensão regional era sempre

    tratada subsidiariamente ( dada a predominânciade políticas de corte setorial-nacional e a hege-monia de uma macrorregião: o Sudeste) e o regio-nal era visto sempre como PROBLEMA (questãoregional). Tanto que as políticas regionais eramvoltadas para as regiões periféricas, de menordinamismo e de maior pobreza. O discurso regio-nalista das regiões menos desenvolvidas era mar-cado pela reivindicação de “tratamento diferenci-

    ado”, do que tiravam proveito as elites conserva-doras dessas regiões.

    Nos dias atuais, a quebra do comando hege-mônico do Sudeste pela maior abertura a articula-ções internacionais, os diversos fatores que esti-mulam a desconcentração das bases produtivas

    (fortalecendo especializações regionais dispersasno território e geradoras de focos dinâmicosmesmo em antigas áreas tidas apenas como regi-ão-problema) e a descentralização de políticaspúblicas são elementos que criamOPORTUNIDADE para mudar a abordagem efundar uma nova Política Nacional de Desenvol-vimento Regional no Brasil. Por tudo que já seanalisou no presente trabalho, é mais que nuncaoportuno superar as “choradeiras” regionalistas deum lado e as posturas discriminatórias de outropara pensar e agir no Brasil HETEROGÊNEO e

    DIVERSIFICADO. Para tratar como positivo,como potencialidade (e não como problema) acrescente diferenciação interna das diversas ma-crorregiões do País.

    Neste particular, o que se propõe é que, noâmbito do País em seu conjunto e no nível de cadamacrorregião, em particular, sejam identificadas,tendo em vista o desenvolvimento de ações futu-ras, sub-regiões diversas (objeto de ação da políti-ca regional), como:

    a) sub-regiões e áreas dinâmicas , que se vêmcaracterizando pelo crescimento significativo,pela consolidação de uma estrutura moderna ecompetitiva e pela capacidade (atual ou potencial)de competir no mercado nacional mais aberto e nomercado internacional;

    b) sub -regiões em processo de reestrutura-ção , que embora dotadas de grande potencial eco-nômico e de capacidade futura de competitividadedeverão sofrer, no curto e médio prazos, intensoprocesso de mudança na sua estrutura produtiva,

    visando, sobretudo, à incorporação de novos pro-cessos tecnológicos. É importante ressaltar que,na maior parte dos casos, tais sub-regiões, comseus processos tradicionais, se transformaram,com o decorrer do tempo, em estruturas produti-vas dotadas de grande capacidade de absorção demão-de-obra, em geral, com reduzido nível deprodutividade e remuneração do capital e força detrabalho;

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    c) sub-regiões estagnadas , nas quais a dota-ção de recursos naturais e a estrutura produtivabaseada em atividades tradicionais voltadas paramercados pouco dinâmicos implicaram uma mar-ginalização sistemática desses espaços;

    d) sub-regiões e áreas de potencial pouco u-tilizado , ainda marginalizadas como as anteriores,trata-se, no entanto, de espaços que estão a exigir,sobretudo, o desenvolvimento de esforços volta-dos para um conhecimento mais profundo sobresuas potencialidades e sobre as possibilidadesconcretas de utilização do seu potencial, no con-texto de uma nova divisão de trabalho e de inser-ção cada vez maior do País na economia interna-cional.

    e) faixas de fronteira , importantes a oeste e

    norte do País, têm especificidades marcantes,como destaca José Marcelino Monteiro Costa emestudo recente (MARCELINO COSTA, 1990).

    É importante considerar que o desenvolvi-mento regional recente, sobretudo na fase de des-concentração da segunda metade dos anos 70 eprimeira dos anos 80, reforçou a heterogeneidadedo território nacional e o território de cada ma-crorregião, tornando mais nítidas e mesmo maio-res as diferenças entre as sub-regiões e áreas que,grosso modo , seguem a tipologia antes descrita.

    Isto torna cada vez mais evidente a necessi-dade de se tratar a questão regional brasileira, emgeral, e cada região, de modo específico, e não deforma genérica, através de estímulos universais.Para se encaminhar soluções para um quadrocomplexo como o das regiões brasileiras hoje – noqual a uma heterogeneidade se soma um processode rápida inserção da economia brasileira numaeconomia mundial extremamente competitiva – énecessário que a nova Política Nacional de Dese-nvolvimento Regional desça a cada caso, conside-

    rando as distintas potencialidades, ameaças, pro-blemas ou entraves das sub-regiões no interior decada macrorregião, o grau atual de sua inserção naeconomia internacional e a dinâmica recente dabase produtiva já instalada.

    Isto define, para cada um desses espaços,formas de atuação específicas, medidas econômi-cas diferenciadas e um cronograma diferente deexposição dessas áreas e de suas estruturas produ-

    tivas à competição internacional, dentro e fora doPaís. Uma nova Política Nacional de Desenvol-vimento Regional deve ser suficientemente deta-lhada e rica para contemplar, devidamente, a hete-rogeneidade que presentemente caracteriza a rea-lidade espacial brasileira.

    Esta atuação específica, obedecendo a diver-sidade e diferenciação das regiões e sub-regiões,deve ter como ponto básico de referência a ques-tão antes citada daeqüidade . O que significa dizerque as ações específicas voltadas para cada sub-região – pertencentes às classes diferentes da tipo-logia anteriormente apresentada – devem levar aum cenário no qual esteja bem definida uma ten-dência de redução das desigualdades ma-crorregionais. Em outras palavras, as medidasconcretas e as ações desenvolvidas no interior decada macrorregião, considerando as especificida-

    des sub-regionais e a heterogeneidade das áreasque compõem cada espaço regional, devem serimplementadas a partir de um objetivo maior:reduzir as desigualdades regionais, possibilitandoàs populações das distintas macrorregiões condi-ções semelhantes de vida e de oportunidades deemprego.

    3.3.3 - Medidas iniciais

    No contexto atual, o ponto de partida deveráconstituir-se na definição urgente de umlocus de

    discussão da questão regional brasileira. O que sepropõe, de saída, é a criação de um Conselho Na-cional de Políticas Regionais, presidido pelo Pre-sidente da República e a ele vinculado diretamen-te. Esse “local de decisão” seria integrado porrepresentantes do Governo e do Parlamento Na-cional, com a participação, também, de represen-tantes não-governamentais. Nesse fórum seriamtomadas as decisões mais relevantes que digamrespeito ao tratamento da questão regional brasi-leira contemporânea, considerando-se tanto pro-postas voltadas para a desconcentração da ativi-

    dade produtiva no território nacional, quanto umamelhor distribuição das oportunidades de empre-gos produtivos e o desencadeamento de um pro-cesso de redução dos níveis de vida entre os habi-tantes das diferentes regiões do País.

    Paralelamente, seria criado um Fundo Nacio-nal de Desenvolvimento Regional ( FNDR) que,a exemplo do que ocorre na União Européia, ten-deria a se constituir em um instrumento poderoso

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    através do qual seriam implementados os objeti-vos e metas que deveriam induzir uma menordesigualdade regional e uma forma adequada,inspirada nos interesses nacionais, de inserção doPais no processo de globalização em curso. Nãose trata de um Fundo Federal, mas Nacional. Porisso, como no “Brasil em Ação”, se envolveriam

    recursos federais e estaduais ( podendo, em proje-tos específicos, exigir aporte de municípios) erecursos privados ou de empréstimos. E sua ges-tão seria descentralizada, em Comitês Regionais,braços descentralizados do Conselho Nacional dePolíticas Regionais.

    Vale aqui referência a algumas consideraçõesde Fernando Rezende a respeito do financiamentode políticas públicas no Brasil e a dimensão dosproblemas atuais do Estado brasileiro: “Num con-texto de maior escassez de recursos, a dispersão

    provocada pela tentativa de acomodar todas asdemandas por maior controle sobre as respectivasfontes de financiamento (...) diluiu os recursosdisponíveis, em contradição com a recomendaçãousual em momentos de maior aperto financeiro:reunir os meios disponíveis e selecionar da me-lhor maneira possível as aplicações para maximi-zar seus resultados”. Desenvolvendo as idéiasiniciais, ele acrescenta: “Não se trata, porém, dedefender a reconcentração dos recursos comoprovidência necessária para corrigir os víciosapontados. Trata-se, sim, de promover a reunião

    dos recursos disponíveis por meio da associaçãode interesses e não da centralização das fontes definanciamento em uma única fonte de poder. Oassociativismo proposto é uma alternativa tanto aoexcesso de centralização quanto à exagerada dis-persão. Significa o estabelecimento de novos ar-ranjos institucionais que viabilizem a cooperaçãodos três entes federados – União, Estados e Muni-cípios – no campo do financiamento do desenvol-vimento, arranjos estes que preservem a autono-mia de cada um deles e abram espaço para a ado-ção de novas formas de cooperação entre o Poder

    Público e a iniciativa privada, em obediência àstendências do momento” (REZENDE, 1995).

    Partindo dessas idéias, o que se propõe é queo Fundo Nacional de Desenvolvimento Regionalvenha a exercer esse papel aglutinador e coorde-nador, atraindo recursos que de outra maneiraseriam aplicados de forma dispersa e fazendo

    convergir os esforços para ações que tenham sidodefinidas, no Conselho, como prioritárias.

    Um país continental e heterogêneo como oBrasil não pode ser entregue apenas às decisõesditadas pelas regras do mercado. Pode e deve teruma política pública ativa de desenvolvimento

    regional. Como têm os principais países. Ela fazparte de uma opção por compatibilizar interessesnacionais importantes com a inserção num mundocada vez mais competitivo e interconectado. Inte-resse como o de evitar uma fragmentação indese- jada da dinâmica econômica que dessolidarize odestino do País e faça emergir regionalismos dotipo denominado por Carlos Vainer como “paro-quialismo mundializado” .

    Diante da força definidora das decisões dosgrandes atores globais – que percebem os países

    como meras plataformas de operação, nos quaisapenas certas áreas interessam – precisa ser defi-nida uma política nacional de desenvolvimentonacional que pense e atue na construção do Paísno seu conjunto. Essa política será um dos meca-nismos de inserção ativa no mundo em globaliza-ção. E poderá se contrapor àdesintegração com-

    petitiva para a qual nos leva a lógica do mercadodeixado à sua própria sorte.

    Abstract:Discuss the need, possibility and adequacy offormulating and implementing a National Policyof Regional Development in Brazil, issue that hasbeen absent in the National discussions during atime that is prevailing the liberal ideas. Examinesthe heritage of the Brazilian regional dynamics,emphasizes the new tendencies and speculates ona likely redefinition of Brazil’s regional dynamicsin recent years. Deals with the country’s spatialfragmentation hypothesis in a scenario ofcompetitive insertion, but over all views Brazil’s“pacific insertion” in globalized markets.Advocates that fragmentation may becountervailed by a new national policy of regionaldevelopment similar to those in use by othercountries and even economic blocks such as theEuropean Union. Opposes to the current dominantapproach to argue that a country like Brazil maytake part on the new world environment withoutcommitting the faults from the past. This way,argues that the regional dynamic, if left only to

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    market decision, will enhance its selectivecharacteristic enlarging those faults. Proposes theformulation and implementation of a NationalPolicy of Regional Development, considering thenew approach to the Brazilian Regional issue.

    Key Words:Regional Development, Regional Policy;Neoliberalism; Brazil`s Spatial Dynamic;Economic Globalization; Brazil`s Northeast;European Union.

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