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Dissertação de Mestrado – REDEMAT – UFOP/CETEC/UEMG 1 UFOP - CETEC - UEMG REDEMAT REDE TEMÁTICA EM ENGENHARIA DE MATERIAIS UFOP – CETEC – UEMG Preparação e caracterização estrutural e elétrica de cristais mistos de K 1-x (NH 4 ) x H 2 PO 4 Autor: Fabrício Mendes Souza Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Fernando Bianchi Co–Orientador: Prof. Dr. Carlos Joel Franco Março de 2009

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  • Dissertao de Mestrado REDEMAT UFOP/CETEC/UEMG

    1

    UFOP - CETEC - UEMG

    REDEMATREDE TEMTICA EM ENGENHARIA DE MATERIAIS

    UFOP CETEC UEMG

    Preparao e caracterizao estrutural e eltrica de cristais mistos de K1-x(NH4)xH2PO4

    Autor: Fabrcio Mendes Souza

    Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Fernando Bianchi CoOrientador: Prof. Dr. Carlos Joel Franco

    Maro de 2009

  • Dissertao de Mestrado REDEMAT UFOP/CETEC/UEMG

    2

    UFOP - CETEC - UEMG

    REDEMATREDE TEMTICA EM ENGENHARIA DE MATERIAIS

    UFOP CETEC UEMG

    Fabrcio Mendes Souza

    Preparao e caracterizao estrutural e eltrica de cristais mistos de K1-x(NH4)xH2PO4

    Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Materiais da REDEMAT, como parte integrante dos requisitos para a obteno do ttulo de Mestre em Engenharia de Materiais.

    rea de concentrao: Anlise e seleo de materiais Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Fernando Bianchi

    CoOrientador: Prof. Dr. Carlos Joel Franco

    Ouro Preto, maro de 2009

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    3

    Catalogao: [email protected]

    S731p Souza, Fabrcio Mendes.

    Preparao e caracterizao estrutural e eltrica de cristais mistos de K1-x(NH4)XH2PO4 [manuscrito] / Fabrcio Mendes Souza. 2009.

    76f.: il. color., grafs., tabs. Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Fernando Bianchi. Dissertao (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Rede Temtica em Engenharia de Materiais. CETEC/UEMG rea de concentrao: Anlise e Seleo de Materiais.

    1. Cristais - Crescimento - Teses. 2. Impedanciometria - Teses. 3. Raios X - Difrao - Teses. I. Universidade Federal de Ouro Preto. II. Ttulo. CDU: 548.5

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    4

    Dedico este trabalho minha famlia (meu pai Joo, minha me Joana, minha irm Shirley,

    meu irmo Fabiano e meu sobrinho Giancarlo) pelos ensinamentos, incentivo, compreenso

    e apoio.

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    5

    AGRADECIMENTOS

    Primeiramente, agradeo CAPES, CNPq e FAPEMIG pelo apoio financeiro e

    financiamento das pesquisas.

    Gostaria de expressar e registrar meu sincero agradecimento ao orientador, Prof.

    Rodrigo Fernando Bianchi pelos ensinamentos, pelo acompanhamento desse trabalho

    e pela oportunidade de utilizao e aprendizagem da tcnica de Impedanciometria

    complexa no LAPPEM/DEFIS/UFOP.

    Gostaria, tambm, de expor meus sinceros agradecimentos:

    Ao co-orientador desta dissertao, Prof. Dr. Carlos Joel Franco, que conduziu boa

    parte deste trabalho, da elaborao do seu projeto, desde a iniciao cientfica,

    passando por todas as etapas de ensino, acompanhamento experimental e auxlio na

    elaborao de artigos. A ele o reconhecimento dos mritos e frutos deste trabalho.

    Aos departamentos de Qumica e Geologia da UFOP, em especial aos professores

    Geraldo Magela da Costa, Ktia Monteiro Novack e Hermnio Arias Nalini Jr., por

    disponibilizarem os aparelhos de medidas das tcnicas de raios-x, TGA e ICP-AES,

    pelo acompanhamento e aprendizagem destas medidas.

    Ao Prof. Genivaldo pelas valiosas discusses.

    Aos amigos do departamento de Fsica da UFOP em especial aos amigos do

    Laboratrio de Crescimento de Cristais e do Laboratrio de Polmeros e

    Propriedades Eletrnicas de Materiais LAPPEM: Mirela, Fbio, Giovana, Cludia,

    Marcos, Hugo e Marcela, por auxiliarem na utilizao dos aparatos e dos softwares

    de medidas para o tratamento prtico e terico das caracterizaes eltricas.

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    6

    SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS 8

    LISTA DE TABELAS 10

    LISTA DE ABREVIATURAS E SMBOLOS 11

    RESUMO 13

    ABSTRACT 14

    INTRODUO 15

    Objetivos do trabalho 18

    Organizao da dissertao 18

    CAPTULO 1 REVISO BIBLIOGRFICA 19

    1.1 Crescimento dos cristais de KDP, ADP e K1-x(NH4)xH2PO4 19

    1.2 Caracterizao eltrica em campos que dependem do tempo 23

    1.3 O modelo de Debye 26

    1.4 Tcnica de Espectroscopia de Impedncia 30

    CAPTULO 2 CRISTAIS DE KDP, ADP E K1-x(NH4)xH2PO4 36

    2.1 Propriedades dos cristais de KDP, ADP e K1-x(NH4)xH2PO4 36

    CAPTULO 3 MATERIAIS E MTODOS 39

    3.1 Anlise termogravimtrica (TGA) 39

    3.2 Difrao de Raios-x (DRX) 40

    3.3 Microscopia tica (MO) 41

    3.4 Espectrometria de Emisso Atmica com Plasma Acoplado Indutivamente

    (ICP-AES)

    42

    3.5 Espectroscopia de Impedncia (IS) 43

    3.6 Preparao e crescimento das amostras de cristais de KH2PO4, NH4H2PO4 e

    dos cristais mistos

    45

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    7

    CAPTULO 4 RESULTADOS E DISCUSSO 49

    4.1 Anlise Qumica 49

    4.2 Anlise termogravimtrica dos cristais 50

    4.3 Difratometria de Raios-X 53

    4.4 Medidas de Impedncia Complexa 55

    CAPTULO 5 CONCLUSES 72

    APNDICE 74

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 75

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    8

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Dependncia da temperatura de concentrao de saturao (Cs) e da

    supersolubilidade (Css)

    20

    Figura 2: Dependncia temporal da polarizao em um dieltrico aps a aplicao

    de um campo eltrico em t = 0[21]

    28

    Figura 3: (a) Grfico de vs no plano complexo; (b) parte real e parte imaginria

    da permissividade em funo da freqncia

    29

    Figura 4: (a) Circuito eltrico e (b) digrama Z versus Z correspondente 33

    Figura 5: Estrutura da clula unitria dos cristais de KH2PO4 e (NH4)H2PO4 [1,8] 37

    Figura 6: Representao estrutural de um cristal misto[8] 37

    Figura 7: Esquema utilizado para obteno das medidas eltricas e aquisio dos

    dados

    44

    Figura 8: (a) Crescimento espontneo de ncleos cristalinos e (b) crescimento de um

    cristal de KDP a partir de uma semente

    45

    Figura 9: (1) Cristais puros de KDP, cristais da espcie mista KADPx, sendo (2) x =

    0,076, (3) x = 0,118, (4) x = 0,357, (5) x = 0,857, (6) x = 0,942 e (7) cristais puros de

    ADP e a respectiva placa de cada grupo de amostras, para a obteno das medidas

    eltricas

    47

    Figura 10: Termogramas da perda de massa dos cristais mistos da espcie KADPx e

    dos cristais puros de KH2PO4 e de (NH4)H2PO4

    50

    Figura 11: Difratogramas obtidos dos cristais puros e mistos K1-x(NH4)xH2PO4 53

    Figura 12: Difratogramas ampliados na regio dos planos {101} dos cristais puros

    KDP, ADP e mistos K1-x(NH4)xH2PO4

    54

    Figura 13: Curvas de impedncia de Z e Z nos cristais puros de KDP e ADP 56

    Figura 14: Curvas de impedncia de Z e Z nos cristais mistos de KADPx com x =

    (a) 0,076, (b) 0,118, (c) 0,357, (d) 0,857 e (e) 0,942. As linhas slidas representam o

    ajuste feito utilizando a Eq. (41)

    58

    Figura 15: (a) Dependncia do tempo de relaxao em segundos 1 com a temperatura

    1/T nos cristais de KDP, ADP ( direita) e mistos de KADPx. As linhas cheias foram

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    ajustadas com a Eq. (45). (b) Dependncia de G1 com a temperatura 1/T nos cristais de

    KDP, ADP e mistos de KADPx. As linhas cheias foram ajustadas com a Eq. (46). As

    inclinaes das retas correspondem s energias de ativao das respectivas regies de

    temperatura

    61

    Figura 16: Variao da parte real () e imaginria () da condutividade com a

    freqncia na faixa de temperatura entre 20 C e 160 C para os cristais de KDP, ADP

    e KADPx com x = (a) 0,076, (b) 0,118, (c) 0,357, (d) 0,857, (e) 0,942

    67

    Figura 17: Variao da parte real () e imaginria () da permissividade com a

    freqncia na faixa de temperatura entre 20 C e 160 C para os cristais de KDP, ADP

    e KADPx com x = (a) 0,076, (b) 0,118, (c) 0,357, (d) 0,857 e (e) 0,942

    69

    Figura A.1: Dependncia das energias de ativao EG1 (condutividade) e (tempo de

    relaxao) em funo da concentrao de amnio x obtidas nas amostras de KDP, ADP

    e KADPx

    74

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    10

    LISTA DE TABELAS

    Tabela I: Relao entre os formalismos derivados da impedncia, com = iC0

    conforme Macdonald

    32

    Tabela II: Relao entre sistema cristalino e parmetros de rede 41

    Tabela III: Parmetros operacionais para a anlise de ICP-AES 43

    Tabela IV: Quantidades molares dos sais em cada soluo e quantidade molar (x) nos

    cristais mistos, aps a medida de ICP-AES, crescidos a partir das respectivas solues

    46

    Tabela V: Quantidades de potssio em percentual em peso nas amostras de cristais

    mistos, massas diludas e concentraes x obtidas via ICP-AES para os cristais de K1-

    x(NH4)xH2PO4

    49

    Tabela VI: Energias de ativao para os cristais de K1-x(NH4)xH2PO4 63

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    11

    LISTA DE ABREVIATURAS E SMBOLOS

    KDP KH2PO4 Fosfato dihidrogenado de potssio.

    ADP (NH4)H2PO4 Fosfato dihidrogenado de amnia.

    TGA Anlise termogravimtrica.

    MO Microscopia tica.

    q carga eltrica.

    - momento de dipolo induzido.

    - campo eltrico local.

    polarizabilidade dependente da natureza das ligaes qumicas moleculares e

    atmicas.

    - vetor polarizao dieltrica.

    (E) susceptibilidade eltrica dependente do campo eltrico.

    0 - permissividade dieltrica do vcuo.

    susceptibilidade eltrica do material.

    r - permissividade relativa ou constante dieltrica do material.

    Pe polarizao eletrnica.

    Ne populao de tomos.

    e polarizabilidade eletrnica.

    Pa polarizao atmica.

    Na populao atmica.

    a polarizabilidade atmica.

    Pd polarizao dipolar.

    Nd populao de dipolos.

    d polarizabilidade dipolar.

    p momento dipolar da molcula.

    k constante de Boltzmann.

    tempo de relaxao do sistema.

    freqncia angular dada por 2f.

    f freqncia circular dada em Hz.

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    12

    T temperatura.

    kB constante de Boltzmann.

    t tempo.

    * - permissividade dieltrica.

    * susceptibilidade do meio.

    *() condutividade eltrica.

    Z* - impedncia.

    M* - mdulo eltrico.

    Y* - admitncia.

    - vetor deslocamento.

    - densidade volumtrica de carga.

    - campo eltrico.

    - induo magntica.

    - campo magntico efetivo.

    - densidade de corrente.

    c velocidade da luz.

    0 - permeabilidade magntica do vcuo.

    Q0 densidade de carga interfacial.

    Q densidade de carga induzida.

    g funo resposta dieltrica.

    i operador imaginrio.

    V* - tenso aplicada.

    I* - corrente de resposta.

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    13

    RESUMO

    A preparao e a caracterizao estrutural e eltrica de cristais mistos de K1-x(NH4)x

    H2PO4 (KADPx) crescidos pelo mtodo de evaporao do solvente foi efetuada por meio das

    tcnicas de anlise termogravimtrica (TGA), difrao de raios-x (DRX) e espectroscopia de

    impedncia (IS) e discutidas com base nas caractersticas das espcies puras de KH2PO4

    (KDP) e (NH4)H2PO4 (ADP). A tcnica de espectrometria de emisso atmica com plasma

    acoplado indutivamente (ICP-AES) determinou as quantidades molares x = 0, 0,076, 0,118,

    0,357, 0,857, 0,942 e 1,0 para os cristais mistos. Os cristais foram crescidos em soluo

    aquosa a temperatura constante, e obtidas placas de cristais para as medidas eltricas com

    dimenses de aproximadamente (0,5 3,5 4,0) mm3 e com faces dominantes (100). Os

    resultados obtidos atravs das tcnicas DRX (mtodo do p) e TGA sugeriram que os

    deslocamentos ou mudanas nos picos e nas curvas de TGA so dependentes da composio

    x nos cristais mistos de KADPx. Os dados das medidas de impedncia complexa, da

    permissividade eltrica complexa e da condutividade (dc) foram realizados no intervalo de

    freqncia 1 Hz at 1 MHz e na regio de temperatura de 20 C a 160 C. Foi observado que

    a condutividade dc das espcies aumenta com a temperatura seguindo a Lei de Arrhenius,

    com diferentes energias de ativao aparentes em diferentes intervalos de temperatura para o

    processo de conduo na rede cristalina. Um modelo de circuito equivalente baseado na

    combinao de resistores e capacitores em paralelos foi desenvolvido para descrever o

    comportamento da impedncia complexa obtida dos cristais. Os diferentes modos de

    conduo eltrica atribudos ao efeito de salto (hopping) dos prtons de hidrognio entre as

    vacncias nas ligaes destes prtons foram estudados. Neste sentido, proposto que podem

    ser criados defeitos adicionais devido quebra de ligaes de hidrognio nos grupos

    amnio. A migrao de ons mais pesados, como potssio e amnio, bem como molculas

    de gua das incluses lquidas sugerida a altas temperaturas. Nossos resultados sugerem

    que as amostras ricas em ADP so mais condutivas que as amostras ricas em KDP e que as

    amostras com composies x intermedirias so menos condutivas que as demais.

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    14

    ABSTRACT

    The preparation and structural and electrical characterization of KH2PO4 (KDP),

    (NH4)H2PO4 (ADP) and K1-x(NH4)xH2PO4 (KADPx) mixed crystals grown by the method of

    solvent evaporation at 40 C and with x = 0, 0.076, 0.118, 0.357, 0.857, 0.942, 1.0 was

    carried out. Inductively Coupled Plasma Atomic Emission Spectrometry (ICP-AES) was

    performed in order to determinate x for each mixed crystal. Plates with the dominant face of

    (100) were obtained and prepared to impedance measurements. Thermogravimetric analysis

    (TGA) and X-ray diffraction (XRD) measurements have been carried out on crystals in the

    temperature range of 30 C 450 C. Our results suggest that, in the decomposition process

    the shifts of starting weight loss in the TGA curves are dependent on x in mixed crystals. As

    compared with the TGA, the direct reflection of the exchange of constituent cations (NH4+

    and K+), the lattice parameters, and cell volume of KADPx crystals, increase with the

    addition ammonium. This behavior concerning the matching of the exchange agrees with the

    results of investigations of the XRD results. The measured ac impedance data are analyzed

    as a function of frequency in the temperature range between 20 C and 160 C. An

    equivalent circuit model based on two parallel GC circuits was adopted to describe the

    complex impedance data obtained from the crystals. The conduction is attributed to the

    hopping of proton among hydrogen vacancies. Additional defects can be created by breaking

    the hydrogen bond in ammonium groups. Potassium and ammonium ions in the mixed

    crystals are suggested to have the contribution to the electrical conduction at high

    temperatures. The activation energies of migration were obtained in different temperature

    ranges. KADPx crystals are dielectric-type crystal that progresses to an ionic crystal one as

    the temperature is raised. At ADP-rich region the conductivity is higher than that of the

    KDP-rich region. In the intermediate compositions x the conductivity is lower than of the

    rich regions.

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    15

    INTRODUO

    O estudo dos cristais mistos de KH2PO4 (KDP) e (NH4)H2PO4 (ADP) tem atrado

    grande ateno de diversos grupos de pesquisa devido s suas potenciais aplicaes na rea

    de eletrnica. De fato, estes cristais so utilizados no campo de ptica no-linear, em

    particular, como transformador no-linear de radiao laser e unidades eletro-pticas como

    clulas de Pockel[1]. Na verdade, o KDP o nico material com o qual so produzidos

    cristais de grandes dimenses, (50 40 40) cm3, para aplicaes em ptica no-linear[1-4].

    O ADP isomorfo como o KDP. A susceptibilidade esttica uniforme da forma Curie-

    Weiss, ambas paralelas e perpendiculares ao eixo-c, porm, para uma temperatura negativa

    de Curie-Weiss, a susceptibilidade ser em ambas as direes[1]. Na temperatura Tc -123

    C (150 K) ocorre uma transio de primeira ordem para um estado de antipolarizao,

    acompanhado de uma pronunciada histerese trmica e mudana descontnua em ambas

    susceptibilidade dieltricas[1]. Assim, a determinao final da estrutura ordenada foi obtida a

    partir da anlise do p da amostra de ADP, utilizando para isso uma tcnica de refinamento

    por irradiao de nutrons aperfeioada por Rietveld, em 1969. O ADP, ordenado, tem um

    stio protnico positivo e um negativo ocupado. Essas posies so ocupadas para produzir

    um arranjo perfeitamente ordenado de ligaes com dipolos eltricos, no eixo-c, e em um

    modelo antiferroeltrico[1].

    O modo de crescimento dos cristais mistos de K1-x(NH4)xH2PO4 (KADPx) ocorre por

    nucleao espontnea de cristais em soluo aquosa havendo, portanto, a competio entre

    os ons de NH4+ e K+ no momento da ocorrncia das ligaes inicas com os grupos H2PO4

    -

    para formar a rede cristalina da espcie mista KADPx. Os cristais mistos apresentam

    pequenas mudanas na disposio dos ons na rede, j que as foras de ligao entre os

    mesmos so diferentes das foras nos cristais puros. Alm disso, os ctions K+ e NH4+ tm

    raios inicos com diferentes tamanhos, bem como diferentes quantidades destes ctions

    esto presentes em cada amostra. Este fato leva ao aparecimento de tenses no equilibradas

    na clula unitria provocando, em alguns casos, o surgimento de deslocaes e micro trincas

    no cristal misto, impedindo assim, a formao de monocristais grandes[5-8].

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    16

    Dentre as tcnicas que foram utilizadas neste trabalho para a caracterizao dos

    cristais de KDP, ADP e KADPx est a espectroscopia de impedncia (IS), que tem sido

    muito utilizada como ferramenta analtica na determinao das propriedades eltricas de

    diferentes materiais quer sejam isolantes, semicondutores ou condutores[23]. Ela permite

    determinar o comportamento das propriedades eltricas e dieltricas especificas do material

    e de defeitos micro-estruturais, em uma faixa de freqncia, f, que vai de 10-4 a 107 Hz. O

    estudo da dependncia da resposta eltrica com a freqncia do sinal aplicado pode ser feito

    de duas maneiras diferentes: (i) atravs de resultados do comportamento dieltrico, que

    utiliza a permissividade dieltrica * em funo da freqncia ( = 2f); e (ii) por meio do

    comportamento semicondutor, que opta por expressar os resultados em termos da

    condutividade eltrica, * (). Dyre ao propor o modelo de distribuio aleatria de

    barreiras de energia livre para a conduo ac em slidos desordenados, desenvolveu uma

    imagem simples dos processos de conduo eltrica baseando-se em mecanismos de

    hopping[10]. Por outro lado, Jonscher[14] estudou o comportamento dieltrico de condutores

    inicos com base nas diferentes partes dos grficos da permissividade complexa vista como

    regies de volume e barreiras relacionadas s altas e baixas freqncias,

    respectivamente. Ele estudou, tambm a conduo inica como movimento de ons em

    slidos inicos atravs da resposta dieltrica dos sistemas eletrnicos ou inicos hopping e

    leis de potncia.

    Neste trabalho utilizamos as tcnicas de anlise termogravimtrica (TGA) e difrao

    de raios-x (DRX) para estudar as mudanas estruturais nas redes cristalinas das diferentes

    espcies de cristais mistos em funo da temperatura e da composio x, respectivamente.

    Foi utilizada, tambm, a tcnica de espectroscopia de impedncia para estudar os

    mecanismos de conduo inica do KDP (x = 0,0), ADP (x = 1,0) e dos cristais mistos de

    KADPx com x = 0,076, 0,118, 0,357, 0,857 e 0,942. A espectrometria de emisso atmica

    com plasma indutivamente acoplado (ICP-AES) foi usada para determinar a quantidade

    molar x do on K+, nos cristais mistos. Bons cristais mistos foram crescidos a temperatura de

    350C principalmente para x perto de zero e x prximo de 1. J na regio intermediria no se

    consegue obter bons cristais. Os cristais mistos de KADPx tm sido estudados por vrios

    autores[5-8,11-13], que constataram que a quantidade molar de amnio x tem um importante

    papel na mudana estrutural dos cristais mistos. Quando o contedo de amnio aumentado

  • Dissertao de Mestrado REDEMAT UFOP/CETEC/UEMG

    17

    nos cristais mistos, os ambientes microscpicos ao redor do on amnio e do on potssio, na

    rede do cristal misto, aparecem de forma diferente do ambiente microscpico de cada on

    nas espcies puras de KDP e ADP[8]. Estes comportamentos estruturais esto diretamente

    relacionados com as concentraes dos ctions (NH4+ e K+), que levam a mudanas nos

    parmetros de rede e volume da clula unitria dos cristais[5-8]. O estudo das propriedades

    eltricas dos cristais puros de KDP e ADP foi realizado por vrios autores, os quais sugerem

    que em temperaturas mais altas a migrao de ons mais pesados K+, por exemplo, pode

    ocorrer[15-20]. Neste trabalho, atravs da tcnica de difrao de raios-x, foi feita uma anlise

    do comportamento estrutural dos cristais, concentrando-se a ateno na linha de difrao

    associada ao plano {101}, obtida a temperatura ambiente. Por outro lado, o estudo da anlise

    termogravimtrica (TGA) dos cristais de KADPx, permitiram determinar o comportamento

    trmico dos cristais, identificando a regio onde se observa o incio do processo de

    decomposio e tambm uma comparao qualitativa do processo de decomposio dos

    cristais mistos com os puros KDP a ADP. A caracterizao eltrica dos cristais foi feita a

    partir da anlise dos dados de impedncia ac em funo da freqncia e da temperatura na

    faixa de temperatura entre 20 C e 160 C. A anlise da dependncia da condutividade com a

    composio x, e tambm com a temperatura, foi realizada a partir da construo de circuitos

    equivalentes e da proposio de um modelo microscpico de conduo, seguindo os moldes

    do modelo de Cole-Cole (1941)[22].

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    18

    Objetivos do trabalho

    Preparar e caracterizar eltrica e estruturalmente as espcies mistas de K1-

    x(NH4)xH2PO4 com x igual a 0, 0,076, 0,118, 0,357, 0,857, 0,942 e 1,0, com base nas

    caractersticas dos cristais puros de KDP e ADP utilizando as tcnicas de difrao de raios-x

    p, anlise termogravimtrica e espectroscopia de impedncia, bem como avaliar os

    processos de conduo e polarizao eltrica presentes nestes cristais.

    Organizao da dissertao

    Esta dissertao est organizada da seguinte forma: no Captulo 1 so abordados os

    aspectos gerais das propriedades eltricas de materiais slidos, como condutividade inica e

    polarizao dieltrica, bem como uma breve reviso terica sobre a tcnica de

    espectroscopia de impedncia. No Captulo 2, discorre-se sobre o crescimento e as

    propriedades dos cristais de KDP e ADP e da espcie mista de K1-x(NH4)xH2PO4. J no

    Captulo 3 so descritos os mtodos para a caracterizao estrutural e eltrica dos cristais

    puros, mistos e o crescimento dos mesmos. No Captulo 4 so apresentados e discutidos os

    resultados experimentais obtidos. Finalizando, no Captulo 5 so apresentadas as concluses

    da dissertao e as sugestes para trabalhos futuros.

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    19

    CAPTULO 1 REVISO BIBLIOGRFICA

    Neste Captulo so apresentadas as descries bsicas para a compreenso do

    processo de crescimento e das propriedades fsicas dos cristais estudados por espectroscopia

    de impedncia, bem como os modelos utilizados para a discusso dos resultados

    experimentais obtidos.

    1.1 Crescimento dos cristais de KDP, ADP e K1-x(NH4)xH2PO4

    O parmetro mais importante no crescimento de cristal por soluo a solubilidade

    do soluto em um solvente apropriado. No mtodo de soluo, devido ao crescimento lento e

    ausncia de grandes gradientes trmicos, os monocristais desenvolvem faces naturais e

    normalmente possuem uma menor densidade de defeitos estruturais. A solubilidade a

    concentrao de saturao sob as condies dadas de temperatura, presso, etc. A curva de

    supersolubilidade relaciona concentrao da substncia e temperatura, sendo importante

    para a obteno de informaes sobre a possibilidade da ocorrncia de nucleao espontnea

    e, conseqentemente, do surgimento dos cristais. Dependendo do comportamento da

    solubilidade do soluto com a temperatura, ela pode ser dividida em trs regies

    caractersticas, conforme mostra a Fig. 4.

    A curva de saturao crtica de cristalizao espontnea (Curva de

    Supersolubilidade) pode ser alcanada por trs formas diferentes: por resfriamento da

    soluo ao longo de uma linha imaginria paralela ao eixo de temperatura a uma dada

    concentrao constante, sem perda de solvente; por evaporao do solvente temperatura

    constante ou por um processo de evaporao e resfriamento simultneos, que pode correr ao

    longo de uma linha imaginria oblqua em direo Curva de Supersolubilidade. O caminho

    mais adequado depende da forma da curva real de solubilidade de um composto e das

    condies experimentais existentes no laboratrio. O crescimento de cristais na regio

    estvel ou insaturada (abaixo da Curva de solubilidade) impossvel, pois o potencial

    qumico da soluo menor que o potencial qumico da fase slida (cristalina).

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    20

    Figura 1: Dependncia da temperatura de concentrao de saturao (Cs) e da

    supersolubilidade (Css).

    Na curva de solubilidade, soluo e cristal podem coexistir sem crescimento ou

    dissoluo do cristal, isto , esto em equilbrio termodinmico. Quando a concentrao

    aumentada a partir da curva de saturao na direo da curva de supersaturao no ocorre

    nucleao espontnea de cristais porque nestas condies, a soluo supersaturada pode ser

    relativamente estvel para determinados intervalos de tempo, o que significa que a barreira

    de energia imposta para a formao do ncleo cristalino no pode ser transposta por meio de

    pequenas variaes na concentrao da substncia. Mesmo assim pode ocorrer crescimento

    de cristais por meio de uma semente (nucleao no-espontnea)[6].

    Geralmente, o crescimento de cristais em solues aquosas requer solubilidade de

    pelo menos pouqussimos gramas por 100 g de solventes. Quando o objetivo do experimento

    a obteno de cristais com dimenses considerveis (alguns cm3), costuma-se utilizar

    tcnicas de nucleao induzidas ou de controle do nmero de ncleos que permanecem na

    fase slida e que daro origem aos cristais. A nucleao espontnea isotrmica uma das

    tcnicas, que efetuada pela troca contnua do calor latente de solidificao entre o ncleo

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    21

    da nova fase e a soluo, num processo extremamente lento. Isto sugere que a nucleao

    um processo aproximadamente reversvel quando a temperatura do sistema for constante.

    Flutuaes no sistema metaestvel do origem a pequenos aglomerados de partculas,

    cujo crescimento depender da variao da energia livre do sistema associada ao seu

    crescimento. Quando uma nova fase formada, a mudana na energia livre do sistema

    provocada pelo aparecimento desta fase e pela formao de um contorno entre a nova e a

    fase original, isto , G = Gs + Gv, onde Gs representa a variao na energia livre de

    superfcie, que sempre positiva, enquanto Gv, a variao na energia devido ao volume da

    nova fase, que sempre negativa. O sinal de G depende da diferena entre Gs e Gv, que,

    por sua vez, determina as dimenses do ncleo que se sustentar durante o crescimento. A

    nucleao espontnea adiabtica um processo extremamente rpido e, portanto, a troca de

    calor com o meio nessa transformao pode ser desprezada. Devido liberao de calor

    latente de solidificao no processo e lenta difuso dessa energia de solidificao, a

    temperatura no interior do ncleo aumenta consideravelmente gerando flutuaes trmicas

    locais relevantes. Nesse caso, o processo de nucleao pode ser atribudo a um mecanismo

    de reao em cadeia de formao de posies acessveis aos novos elementos da fase

    nutriente, nesse caso o soluto no solvente. Na nucleao espontnea heterognea, em

    condies normais, a formao do ncleo acontece sobre partculas de impurezas slidas na

    soluo, nas paredes do recipiente cristalizador e no suporte da semente. Este tipo de

    nucleao conhecido como nucleao heterognea, e exige menor energia do que no caso

    de nucleao homognea devido ao valor da tenso superficial nos contornos das fases, o

    que significa dizer que Ghet < Ghom[6].

    A taxa de nucleao importante para a preparao de monocristais de grandes

    dimenses, porque quantidades enormes de ncleos no so desejveis, devendo

    permanecer, se possvel, apenas um ncleo no sistema de cristalizao aps o inicio do

    processo. Para isso, a taxa de nucleao deve ser controlada. A maioria dos ncleos,

    portanto, deve ser eliminada atravs de tcnicas que, alm de selecionar os remanescentes,

    no introduzam defeitos que se propaguem nos cristais durante os processos de crescimento.

    Apesar da caracterstica isomorfa dos cristais de ADP e KDP o crescimento dos cristais

    mistos de K1-x(NH4)xH2PO4 com concentraes x intermedirias so relativamente difceis

    de preparar[6-8], devido ao mecanismo de competio entre o on K+ e o NH4+. J o

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    22

    crescimento dos cristais puros de KDP e ADP se realiza com relativa facilidade sendo

    possvel controlar a taxa de nucleao de modo a obter bons cristais (boa forma estrutural e

    faces perfeitas), com dimenses de alguns cm3. Mas quando se deseja crescer grandes

    monocristais o ideal o mtodo de semente. Os cristais mistos de K1-x(NH4)xH2PO4 crescem

    com taxas de crescimento diferentes ao longo dos dois diferentes eixos da clula unitria

    cristalina. A competitividade entre estes ons durante o crescimento induz ocorrncia de

    tenses ao longo do eixo c que comprometem a qualidade do cristal devido ao aparecimento

    de micro trincas e possveis incrustaes. Apesar disto, cristais mistos e ricos em KDP e

    ADP de boa qualidade podem ser crescidos, j em regies de concentraes x intermedirias

    a qualidade comprometida. Estas caractersticas esto correlacionadas s diferenas nas

    foras das ligaes dos ctions NH4+ e K+ com os nions H2PO4

    -, bem como, com os

    tamanhos dos raios inicos dos ctions na formao da rede cristalina do cristal misto[7,8].

    Os cristais de KDP (Tc = 123 K) e ADP (Tc = 151 K), so materiais com

    propriedades ferroeltricas e piezeltricas e que apresentam atividade ptica no-linear. Um

    cristal ferroeltrico exibe um momento de dipolo eltrico mesmo na ausncia de um campo

    eltrico aplicado, exibindo assim o fenmeno de histerese eltrica. No estado ferroeltrico, o

    centro das cargas positivas do cristal no coincide com o centro das cargas negativas

    possibilitando assim o surgimento de um dipolo eltrico. Um material piezeltrico aquele

    que quando submetido a uma tenso mecnica externa ele gera um campo eltrico e vice-

    versa. Uma vez cessado o efeito externo, seja a tenso eltrica, seja o impacto mecnico, o

    efeito resultante tambm cessa imediatamente. Esses efeitos devem-se, principalmente, a

    uma assimetria na rede cristalina destes materiais que sofre alguma perturbao em escala

    atmica no momento de aplicao da tenso[1,4].

    Graas a essas caractersticas, esses monocristais, KDP e ADP, possuem algumas

    aplicaes muito importantes do ponto da vista tecnolgico, destacando-se a sua utilizao

    em conversores de freqncia, em circuitos ticos integrados, transformadores no-lineares

    de radiao laser, unidades eletro-ticas e materiais para fabricao de guias ticos de

    ondas[1,4].

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    23

    1.2 Caracterizao eltrica em campos que dependem do tempo

    De um modo geral a caracterizao de um dado material deve levar em considerao

    suas caractersticas de conduo e dieltrica. Nesse caso, as equaes de Maxwell na forma

    diferencial (no sistema SI) para um meio dieltrico so dadas por:

    (Lei de Gauss para o campo eltrico); (1)

    (Lei de Faraday-Lenz); (2)

    (Lei de Gauss para o campo magntico); (3)

    (Lei de Ampre-Maxwell), (4)

    onde o campo eltrico aplicado, o vetor deslocamento (campo eltrico

    efetivo no interior do dieltrico), a permissividade dieltrica do vcuo, a polarizao

    do meio, a densidade volumtrica de carga, a induo magntica (densidade de fluxo

    magntico), - o campo magntico efetivo no interior do dieltrico, a

    permeabilidade magntica do vcuo e a magnetizao do meio, a densidade de

    corrente. Portanto, deve-se notar que 00 = c-2, onde c a velocidade da luz no vcuo, c =

    300.000 kms, e por definio 0 = 4 10-7 NA-2, assim 0 = 8,854 10

    -12 Fm-1. Por meio

    destas equaes pode-se avaliar as caractersticas eltricas e magnticas dos materiais. Neste

    trabalho o nosso interesse est limitado ao estudo do comportamento eltrico dos

    materiais[24,25].

    Os efeitos de polarizao e conduo podem ser produzidos em um material slido

    com um campo eltrico aplicado. A polarizao pode ser eletrnica, inica ou pela

    reorientao local de defeitos que possuem momentos de dipolo eltrico no nulo. Na

    conduo ocorre o movimento de translao de portadores de carga (vacncias, ons

    intersticiais, etc.)[14]. Assim, as distribuies de cargas moleculares e atmicas, inicialmente

    neutras, sofrem alteraes em suas posies de equilbrio, quando um material dieltrico

    est sujeito ao de um campo eltrico externo. Neste caso o centro das cargas positivas e

    negativas de mdulo q so separadas por uma distncia l formando um dipolo eltrico, como

    em um material dieltrico polar. O momento de dipolo induzido dado por:

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    24

    (5)

    Os momentos de dipolo induzidos so proporcionais ao campo eltrico local e,

    podem ser escritos como

    (6)

    sendo o campo eltrico local e a polarizabilidade, que depende da natureza das ligaes

    qumicas podendo ser de natureza molecular e atmica[24,25].

    Sob a ao do campo eltrico estabelecido no dieltrico haver o aparecimento de

    dipolos induzidos ou orientao de dipolos eltricos permanentes, dessa forma, dependendo

    da intensidade do campo cria-se no material uma polarizao eltrica. Certos materiais

    apresentam polarizao eltrica mesmo sem a ao do campo eltrico, como o caso dos

    cristais de KDP (Tc = 123 K) e ADP (Tc = 151 K), abaixo das temperaturas de transio Tc

    (temperatura de Curie), tais materiais so chamados de ferroeltricos[1,4]. Para campos

    eltricos estticos ou quase estticos, pode-se escrever em primeira ordem para um material

    isotrpico, o vetor polarizao dieltrica como uma grandeza proporcional ao vetor campo

    eltrico :

    (7)

    onde a permissividade dieltrica do vcuo e (E) a suceptibilidade dieltrica do material

    que depende do campo eltrico. Se o material dieltrico for linear, a Eq. (7) torna-se:

    (8)

    pois constante, a permissividade eltrica do vcuo e a susceptibilidade

    eltrica do material. Muitas vezes utiliza-se a permissividade relativa ou constante dieltrica

    do material [24,25], dada por:

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    25

    (9)

    assim, a Eq. (8) pode ser escrita como:

    (10)

    J nos cristais de KDP e o ADP, especificamente, em temperaturas acima de Tc h

    uma anisotropia na constante dieltrica. Dessa forma, nas direes dos eixos cristalogrficos

    a e b a constante dieltrica apresenta o mesmo valor diferindo daquele observado na direo

    do eixo c. Apesar destes cristais serem anisotrpicos a Eq. (10) ainda permanece vlida, e

    pode ser reescrita como:

    (11)

    onde uma matriz (3x3) da forma vista a seguir:

    (12)

    11 a permissividade dieltrica na direo dos eixos a e b e 33 a permissividade dieltrica

    na direo do eixo c.

    Diferentes tipos de polarizao podem ocorrer nos materiais em geral[24,25].

    A polarizao atmica (inica ou molecular) o resultado de um

    deslocamento mtuo entre ons e ou tomos constituintes naturais das molculas na rede

    cristalina, no caso de materiais cristalinos. Estes ons podem, tambm, ser dopantes que

    foram inseridos propositalmente num material. Esta polarizao ocorre para intervalos de

    tempo da ordem de 10-13 s, sendo praticamente independente da temperatura. O momento de

    dipolo pode ser obtido pela equao:

    (13)

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    26

    onde a populao atmica e a polarizabilidade atmica. A polarizao atmica

    tambm compe a polarizao rpida.

    O efeito de polarizao dipolar (orientacional) formado pela orientao dos

    dipolos permanentes presentes no dieltrico, na direo do campo aplicado. Este fenmeno

    provoca uma dissipao de energia a qual depender da relaxao dos dipolos. Trata-se de

    um processo lento, com um intervalo de tempo da ordem de 10-6 s e que depende fortemente

    da temperatura. O momento de dipolo pode ser obtido por:

    (14)

    onde a populao de dipolos, a polarizabilidade dipolar, dada por sendo

    p o momento dipolar da molcula, k a constante de Boltzmann e T a temperatura em Kelvin.

    A polarizao orientacional faz parte da polarizao lenta.

    A Polarizao por cargas espaciais nos eletrodos se d na interface dieltrico-

    eletrodos. Ocorre quando os portadores de cargas (ons ou eltrons) se movem em direo

    aos eletrodos, no sendo neutralizados eletricamente devido s imperfeies do contato

    dieltrico-eletrodo, havendo desta forma um acmulo de carga nos eletrodos, levando a uma

    distoro do campo eltrico e a um aumento de perdas e da permissividade relativa. Dessa

    forma, a relaxao dieltrica um efeito de polarizao que surge quando os dipolos no so

    capazes de seguir instantaneamente a oscilao do campo eltrico. Neste caso, o campo

    oscilante e a reorientao dos dipolos ficam defasados originando uma dissipao de

    energia[24,25].

    A seguir analisaremos o modelo de Debye para discutir estes efeitos de relaxao

    dieltrica.

    1.3 O modelo de Debye

    O conceito de polarizao teve origem no estudo de dipolos por Debye[26] em 1912

    pela semelhana entre os espectros da permissividade dieltrica de lquidos dipolares e

    slidos desordenados. Em 1945, Debye[26] estudou a resposta dipolar em slidos.

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    27

    Quando um campo eltrico aplicado a um material isolante, a polarizao

    resultante pode ser classificada em duas polarizaes diferentes, de acordo com o tempo

    de resposta. A polarizao quase instantnea uma das polarizaes e ocorre devido ao

    deslocamento dos eltrons em relao ao ncleo, o que define a constante dieltrica em altas

    freqncias:

    (15)

    J uma polarizao dependente do tempo, devida orientao dos dipolos no

    campo eltrico outra parte da polarizao resultante . Caso o campo seja aplicado por um

    tempo infinitamente longo, a polarizao total resultante define a constante dieltrica

    esttica :

    (16)

    bem como,

    (t = ). (17)

    Considerando que haja apenas um tempo de relaxao , ou seja, governado por

    uma cintica de primeira ordem, a taxa com que se aproxima de ser proporcional

    diferena entre eles:

    (18)

    Esta situao est ilustrada na Fig. 1 para uma tenso aplicada , constante a

    partir do instante t = 0.

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    28

    Figura 2: Dependncia temporal da polarizao em um dieltrico aps a aplicao de um

    campo eltrico em t = 0[23].

    Analisando a figura, tem-se que, => , derivando,

    tem-se => =>

    , j que a polarizao dependente do tempo (orientao de

    dipolos) e polarizao quase instantnea (deslocamento de eltrons). Dessa forma,

    partindo das Eqs. (15) e (16) a soluo da Eq. (18) para um campo peridico

    :

    (19)

    Pode-se ento definir uma constante dieltrica complexa:

    (20)

    e

    , (21)

    onde *() pode ser escrita como *() = () + i(), logo, podendo ser separada em

    seus componentes real e imaginrio:

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    29

    (22)

    e

    . (23)

    O modelo bsico de relaxao dieltrica representado pelas Eqs. (22) e (23)

    conhecido como relaes de disperso de Debye.

    Figura 3: (a) Grfico de vs no plano complexo; (b) parte real e parte imaginria da

    permissividade em funo da freqncia.

    As representaes mais usadas de () e () (no plano complexo e em funo da

    freqncia) so mostradas na Fig. 2. No plano complexo a representao resulta em um

    semicrculo centrado no ponto s - /2, no eixo das abscissas (Fig. 2 (a)).

    A parte imaginria da permissividade representada em funo da freqncia

    apresenta um mximo na freqncia de relaxao, p = 1/. A parte real apresenta um

    degrau que corresponde a = s - e um ponto de inflexo em p.

    Alm de induzir uma polarizao, a ao de um campo eltrico externo pode fazer

    surgir uma corrente eltrica no material atravs da conduo de cargas. Este processo leva a

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    30

    desvios no modelo de Debye e nestes casos em geral, caracteriza-se as relaxaes do

    material atravs de sua impedncia, Z*().

    1.4 Tcnica de Espectroscopia de Impedncia

    A tcnica de espectroscopia de impedncia muito conhecida devido ao seu uso nos

    sistemas eletroqumicos em soluo. Por volta de 1969 Bauerle comeou a estudar esta

    tcnica aplicando a slidos, a partir da, este mtodo de caracterizao comeou a ser

    utilizado como uma ferramenta analtica importante na pesquisa e no desenvolvimento de

    materiais. As medidas eltricas envolvem medidas de fcil obteno, e seus resultados

    podem ser relacionados com variveis fsicas como: transporte de massa, taxas de reaes

    qumicas, corroso, propriedades dieltricas e efeitos de polarizao, defeitos,

    microestrutura e influncias composicionais na condutividade de slidos[23].

    Os resultados das medidas eltricas podem ser obtidos a partir da utilizao de

    medidas da condutividade total em corrente alternada ac em uma faixa de freqncia que

    se estende de 10-4 Hz at 107 Hz. Assim, possvel obter resultados relacionados s

    propriedades eltricas e dieltricas dos materiais e separ-las. Informaes sobre os defeitos

    micro estruturais, mecanismos de conduo e de polarizao dieltrica, tambm podem ser

    obtidas. As medidas de condutividade em corrente contnua dc no seriam capazes de

    fornecer estas informaes, j que medidas dc fornecem apenas o valor da condutividade

    total, no permitindo informaes de diferentes contribuies e mecanismos de relaxao

    que podem existir em um material. Nos materiais a condutividade total depende das

    caractersticas da amostra, como: composio qumica, pureza, homogeneidade micro

    estrutural, distribuio e volume de poros, defeitos, tamanho de gro, etc[23].

    Ao submeter uma determinada amostra a um campo eltrico alternado com

    freqncia varivel, dada por = 2f, e de pequena amplitude V*() = V0 exp(it). A

    corrente eltrica I*() = I0 exp[i(t + )], aparece no material como resposta a este campo,

    onde o ngulo de fase entre a tenso aplicada e a corrente eltrica. Partindo da

    generalizao da lei de Ohm (R = V/I), a impedncia complexa Z*() pode ser escrita

    conforme a equao:

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    31

    . (24)

    Sendo Z*() um nmero complexo que pode ser representado em coordenadas polares pelo

    mdulo e a fase , ou conforme a Eq. (25) em coordenadas cartesianas:

    , (25)

    onde e a parte real e imaginria da impedncia, respectivamente.

    A espectroscopia de Impedncia consiste em fazer medidas de em funo de f

    (freqncia do sinal) ou = 2f (freqncia angular), sobre um intervalo de freqncias

    com valores que vo de 10-4 a 107 Hz.

    Atravs da Impedncia ( ) pode-se encontrar outras diferentes quantidades, como a

    admitncia ( ), definida como o inverso da Impedncia:

    , (26)

    onde o componente real Y denominado de condutncia e est relacionado diretamente

    com a condutividade conforme a relao:

    e (27)

    . (28)

    O mdulo eltrico M* relacionado com a impedncia conforme a relao:

    , (29)

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    32

    onde C0 = 0A/l, C0 a capacitncia da clula de medida vazia com rea de eletrodo A e

    distncia de separao l.

    A permissividade * pode ser encontrada a partir da relao de Z* com o mdulo

    eltrico M*:

    . (30)

    Logo, os quatro formalismos bsicos para a caracterizao eltrica de um dado

    material so inter-relacionados e subdivididos como mostra a Tab. I.

    Tabela I: Relao entre os formalismos derivados da impedncia, com = iC0 conforme

    Macdonald[23].

    M* Z* Y* *

    M* M* Z* /Y* 1/ *

    Z* M*/ Z* 1/Y* 1/ *

    Y* /M* 1/Z* Y* *

    * 1/M* 1/ Z* Y*/ *

    Para analisar um espectro de impedncia, atravs de modelos fsicos usualmente

    utiliza-se a aproximao de dados experimentais de impedncia aos dados de um circuito

    eltrico equivalente constitudo de resistores, capacitores e ou indutores ideais. Isto

    necessrio devido grande dificuldade em analisar esse espectro fisicamente, o sistema que

    envolve o material e o eletrodo. A Fig. 3 mostra a analogia que se faz na construo de

    circuitos equivalentes que facilitam a compreenso dos processos de polarizao e conduo

    decorrentes da aplicao de um campo num material.

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    33

    Figura 4: (a) Circuito eltrico e (b) digrama Z versus Z correspondente.

    Considerando uma teno de entrada VAB = V*(t) = V0 exp(it) e a impedncia do

    resistor r , assim Zr*, dada pelo prprio valor de r. Analisando a impedncia do circuito RC

    paralelo Z*RC, temos:

    (31)

    onde

    , (32)

    quando a corrente IR e a tenso esto em fase, temos:

    , (33)

    j que e, portanto, . Dessa forma, atravs das Eqs.

    (32) e (33) tem-se:

    . (34)

    Mas a lei de Ohm generalizada pode ser escrita como

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    34

    , (35)

    assim, , ou seja, ; onde

    a constante de tempo do circuito paralelo RC.

    Portanto, a impedncia representada da seguinte forma:

    . (36)

    Assim, temos a impedncia total, e separando a parte real da imaginria:

    (37)

    e

    . (38)

    Quando representamos Z versus Z temos a equao de uma circunferncia de raio

    e de centro como mostra o esquema na Fig. 3 (b). Assim, Z, igual a r; R a

    distncia entre os dois pontos de interseco do semicrculo com o eixo dos reais. Cada

    elemento RC pertencente a um semicrculo particular, possui uma constante de tempo como

    mostra a Fig. 3 (a) anterior, ou tempo de relaxao, , o qual pode ser visto no ponto mximo

    do semicrculo da Fig. 3 (b) seguindo a relao p = 1, sendo neste caso p = 2fp, onde fp

    a freqncia de relaxao. Logo, determinando a freqncia de relaxao caracterstica

    possvel calcular a capacitncia, C, do circuito:

    . (39)

    Porm, so poucos os sistemas que obedecem exatamente s equaes de Debye. Assim, em

    1941, Cole e Cole[22] propuseram uma funo emprica para representar possveis desvios,

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    35

    descrevendo o comportamento da permissividade dieltrica atravs da expresso:

    , onde o fator est diretamente ligado descentralizao do

    semicrculo, em relao ao eixo dos reais, e largura da distribuio dos tempos de

    relaxao.

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    36

    CAPTULO 2 CRISTAIS DE KDP, ADP E K1-x(NH4)xH2PO4

    Neste Captulo so apresentadas, algumas discusses sobre as propriedades dos

    cristais puros de KDP, ADP e das espcies mistas KADPx.

    2.1 Propriedades dos cristais de KDP, ADP e K1-x(NH4)xH2PO4

    O movimento dos ons da clula unitria do KDP foi investigado e modelado

    detalhadamente por Slater em 1941, Takagi em 1948 e Kobayashi em 1968 atravs do

    movimento especfico dos ons hidrognio. Num modelo incluindo efeito de tunelamento,

    leva-se em considerao o movimento de todos os tomos da clula. O cristal de KDP

    apresenta estrutura tetragonal acima de 123 K e estrutura ortorrmbica abaixo de 123 K

    onde se observa a polarizao espontnea devido ao deslocamento dos ons K, P e O na

    direo do eixo c. Sua estrutura foi observada atravs da difrao de raios-X por Frazer e

    Pepinsky em 1953. A estrutura consiste de tetraedros de PO4, tomos de K e H. Os fosfatos

    e os potssios esto separados ao longo do eixo c. Todos os PO4 esto ligados a quatro

    outros PO4 por ligaes de hidrognio. As ligaes de hidrognio ocorrem entre o oxignio

    superior e o inferior do grupo PO4 vizinho atravs do hidrognio entre eles (Fig. 5). Como

    mostrado nos experimentos por difrao de nutrons feitos por Bacon e Pease em 1953 e

    1955, dois hidrognios esto localizados prximos de algum grupo PO4 originando a

    configurao formal K+ (H2PO4)-. A Fig. 5 ilustra a estrutura da clula unitria dos cristais

    isomorfos KDP e ADP[1,4], bem como, a Fig. 6 mostra a representao estrutural dos ons na

    rede de um cristal misto mostrando a tenso (linhas pontilhadas e tracejadas em azul)

    causada na rede pelo on amnio.

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    Figura 5: Estrutura da clula unitria dos cristais de KH2PO4 e (NH4)H2PO4 [1,8].

    Figura 6: Representao estrutural de um cristal misto[8].

    No cristal de NH4H2PO4 a transio de fase j conhecida h mais de sessenta anos,

    embora por um longo tempo pensou-se em uma transio de fase acompanhada de rotao

    do grupo amnio apresentando um comportamento diferente daquele exibido no KDP

    ferroeltrico. Foi Nagamiya quem reconheceu a transio antiferroeltrica e quem

    demonstrou que algumas das caractersticas poderiam ser descritas em termos do modelo

    ferroeltrico de Slater. Ele tambm props um modelo de ordenamento protnico abaixo da

    temperatura de Curie (Tc), com a produo de um arranjo antiparalelo de dipolos, na direo

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    do eixo a. Uma fase de ordenamento com essa natureza foi confirmada para o ADP por

    Hewat em 1973. Acima desse ponto de transio antiferroeltrica, o ADP isomorfo como o

    KDP. Dessa forma, a estrutura da clula unitria do ADP similar estrutura do cristal de

    KDP[5] (Fig. 5). A susceptibilidade esttica uniforme da forma Curie-Weiss com um

    componente paralelo e outro perpendicular ao eixo c. A uma temperatura Tc ~ 150K

    (temperatura de Curie) no ADP ocorre uma transio de primeira ordem para um estado de

    antipolarizao, acompanhado de uma pronunciada histerese trmica e mudana descontnua

    em ambas susceptibilidades dieltricas[1,4].

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    39

    CAPTULO 3 MATERIAIS E MTODOS

    Neste captulo, so apresentados os mtodos de preparao e caracterizao das

    amostras de cristais.

    3.1 Anlise termogravimtrica (TGA)

    Anlise trmica o termo usado para designar as tcnicas de registro do

    comportamento de propriedades fsicas de uma substncia em funo do tempo ou da

    temperatura quando ela submetida a uma programao pr-selecionada de aquecimento ou

    de resfriamento. A curva de registro denominada termograma. A massa de uma substncia

    medida em uma termobalana em funo da temperatura ou do tempo, enquanto a

    substncia submetida a uma programao controlada de temperatura.

    Basicamente, o equipamento de termogravimetria consiste de uma balana analtica,

    destinada a pesar continuamente a amostra medida que ela aquecida ou resfriada; um

    forno, cuja faixa de temperatura varia de ambiente at 2500 C e com taxa de variao de

    temperatura entre dcimos de 0C/min a 200 C/min; um sistema de gs para fornecer uma

    atmosfera controlada; e um microcomputador/processador para controle do instrumento,

    aquisio e apresentao de dados. A temperatura pode ser obtida por imerso de um

    termopar diretamente na amostra, ou o mais perto possvel a fim de evitar decomposio

    cataltica da amostra ou contaminao por contato com o termopar.

    A partir de dados coletados obtm-se a curva TG, ou termogravimtrica, que

    descreve a massa da amostra ou o percentual de massa em funo da temperatura. Para a

    curva de termogravimetria derivada, DTG, a variao da massa com relao temperatura

    (dm/dT) descrita em funo do tempo ou da temperatura, e pode revelar informaes no

    detectveis no termograma tpico de TG[27].

    Durante a ocorrncia de alguma transio de fase de uma amostra sua temperatura no

    varia e ele pode absorver energia em forma de calor (transformao endotrmica) ou liberar

    energia (transformao exotrmica). A medida das energias absorvidas ou liberadas pelo

    material durante a transio de fase o princpio bsico de funcionamento dos instrumentos

    de medidas trmicas. A maioria emprega fornos para o aquecimento da amostra a ser

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    40

    investigada e para o aquecimento de uma amostra de referncia (sendo esta, geralmente

    designada por referncia). A variao da temperatura dos conjuntos da amostra e da

    referncia feita por meio de resistncias (controlando a velocidade de aquecimento e

    resfriamento do forno). As temperaturas da amostra, TA, e da referncia, TR, so detectadas e

    registradas, bem como sua diferena de temperatura, T = TA TR.

    A diferena de temperatura entre a amostra e a referncia constante enquanto no

    houver nenhuma transio de fase. No instante em que se inicia a transio, TA no se altera

    e TR continua aumentando. O aumento de T registrado pelo calormetro como um pico

    sobre uma linha de base. Ao completar a transio de fase, ocorre um fluxo de calor entre a

    base metlica (referncia) e amostra de tal forma que o valor de T volta a ser constante. A

    rea de um pico no termograma proporcional ao calor da reao de transio, portanto seu

    valor equivale ao valor da energia absorvida ou emitida pela amostra durante a transio de

    fase. Assim, as curvas e os picos DTA nos revelam processos fsicos endotrmicos (como

    fuso, vaporizao e absoro) e exotrmicos (como adsoro e cristalizao); reaes

    qumicas endotrmicas (desidratao e reduo em atmosfera atuante de decomposio) e

    exotrmicas (oxidao, polimerizao e reaes catalticas); alm da quantidade de energia

    absorvida ou liberada nesses processos[27].

    Neste trabalho a anlise trmica (TGA) foi feita em atmosfera de gs nitrognio, a

    uma taxa de aquecimento de 10 C/min, no intervalo de temperaturas de 25 C a 450 C. Foi

    utilizado um calormetro, modelo SDT 2960 Simultaneous TGA DTA, da TA instruments.

    3.2 Difrao de Raios-x (DRX)

    Esta tcnica est baseada na interferncia entre as ondas eletromagnticas dos raios

    X incidentes sobre uma amostra. Em materiais cristalinos, cada conjunto de planos (hkl) se

    comporta como obstculos onde os feixes de raios X interagiro entre si, refletindo parte dos

    raios e transmitindo a outra parte. A interferncia construtiva entre os raios refletidos por

    planos paralelos, separados por uma distancia d d origem aos picos no padro de difrao,

    que produz o difratograma. Assim, a anlise dos difratogramas p baseada no fenmeno de

    interferncia que geram os picos de difrao relacionados aos parmetros de rede da clula

    unitria, que ocorre devido interao eletromagntica das ondas de raios X com os

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    41

    diversos planos orientados aleatoriamente nos micro-cristais pulverizados mostrando que

    estes cristais apresentam estruturas com diferentes planos cristalinos, conforme a Lei de

    Bragg[27]. A condio de refrao dada pela lei de Bragg:

    n = 2dhkl sen (40) Define-se como clula unitria a menor estrutura que, por translao, pode gerar toda

    a rede cristalina de um determinado cristal. Uma clula unitria pode pertencer a um dos

    sete sistemas cristalinos: cbico, tetragonal, ortorrmbico, rombodrico (ou trigonal),

    hexagonal, monoclnico e triclnico, ambos os cristais de KDP e ADP apresentam estrutura

    tetragonal (veja Tab. II).

    Tabela II: Relao entre sistema cristalino e parmetros de rede.

    Sistema Cristalino Parmetros de rede

    Tetragonal a = b c; = = = 90o

    Os difratogramas apresentados neste trabalho foram obtidos em um difratmetro de

    p Shimadzu (XRD-6000), com radiao K do Fe, em intervalo de varredura 2 entre 10 e

    70.

    3.3 Microscopia tica (MO)

    Com uma devida preparao das amostras, possvel observar as caractersticas

    pticas das mesmas com auxlio das tcnicas e equipamentos da microscopia ptica. Pode-se

    observar, por exemplo, a presena de tenses mecnicas, incrustaes, micro trincas etc. A

    ferramenta usualmente utilizada para anlises morfolgicas de superfcie, por microscopia

    ptica, o microscpio ptico.

    O objetivo desta tcnica analisar imperfeies ou defeitos nos cristais e tentar

    relacion-los com a composio da amostra. Tal anlise qualitativa, pois se pretende

    examinar a natureza desses defeitos, observando-se a origem e a constituio dos mesmos e

    como eles se propagam no cristal. Desta maneira, ser possvel prever a influncia que eles

    exercem nas diferentes propriedades do material[27].

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    O microscpio tico (Stemi 2000-C, Zeiss) foi utilizado nas anlises das amostras, as

    quais foram previamente polidas com lixa dgua 1200 em formato de lminas (placas) e

    limpas com gua ultra pura, acetona e papel macio (veja Fig. 9 (b)).

    3.4 Espectrometria de Emisso Atmica com Plasma Acoplado Indutivamente (ICP-

    AES)

    Por meio da espectroscopia de emisso atmica pode-se identificar a presena de um

    elemento qumico na composio de materiais. A emisso de luz por tomos ou ons

    aquecidos produz linhas ou bandas no espectro, em comprimentos de ondas caractersticas

    de cada elemento especificamente. Estas linhas de emisso so usadas para a identificao

    do elemento a ser estudado. A emisso provocada atravs da introduo de ons do

    elemento qumico numa tocha[27]. Essa tocha obtida pela asperso de uma soluo analtica

    contendo esses ons num plasma, mantido por uma bobina de radio freqncia, denominado

    de Inductively Coupled Plasma (ICP), sendo denominada tocha ICP. A partir da intensidade

    da luz da tocha emitida na linha caracterstica desse on determina-se a concentrao do on

    numa soluo. A relao entre a intensidade da luz emitida e a concentrao do on na

    soluo determinada a partir da intensidade emitida por uma soluo de calibrao,

    contendo o on a ser analisado e cuja concentrao conhecida. Portanto, a partir da anlise

    espectroscpica da luz emitida por uma tocha ICP, possvel identificar e quantificar os ons

    presentes numa soluo analtica. A capacidade de determinao das concentraes de 10-1

    at 10-4 mg/L. A composio qumica de uma amostra slida tambm pode ser determinada

    por ICP-AES, para isso a amostra digerida numa soluo cuja concentrao proporcional

    a da amostra. A disposio experimental que compe a ICP-AES consiste de um sistema de

    introduo da amostra, tocha ICP, sistema de fornecimento de gs, gerador de radio

    freqncia, espectrmetro ptico, detectores, eletrnico e sistema de aquisio[27]. As

    principais rotas de anlise de uma amostra por ICP-AES so:

    1. Seleo dos elementos a serem detectados na amostra;

    2. Preparao da soluo da amostra usando mtodos de analise qumica

    quantitativa;

    3. Preparao das solues de calibrao;

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    43

    4. Medida das intensidades das linhas de emisso apropriadas para cada elemento,

    para as solues de calibrao e da amostra;

    5. Construo das curvas de calibrao, contendo a razo entre intensidade e

    concentrao para cada elemento selecionado;

    6. Determinao das concentraes da amostra para os elementos analisados,

    considerando a calibrao e o fator de diluio da soluo da amostra.

    Neste trabalho, foram diludas aproximadamente 0,1000 g de cada cristal misto em

    bales volumtricos de 50,00 mL. Aps a completa diluio das amostras foi feita a medida

    por ICP-AES da concentrao do on K+. Os parmetros tcnicos para a realizao das

    medidas so mostrados na Tab. III.

    Tabela III: Parmetros operacionais para a anlise de ICP-AES.

    Parmetros Operacionais ICP-AES

    Freqncia do gerador (MHz) 40

    Potncia RF (kW) 1,25

    Gs de plasma fluxo (L/min) 12

    Gs auxiliar fluxo (L/min) 1,0

    Nebulizador de gs fluxo (L/min) 0,9

    Fluxo da amostra (mL/min) 0,9

    Tocha injetora de quartzo 1,5 mm dimetro interno

    Bomba Peristltica, 4 - canais

    Comprimento de onda (nm) K 766,490

    3.5 Espectroscopia de Impedncia (IS)

    As medidas eltricas foram feitas por meio de um analisador de impedncia

    comercial da marca Solartron, modelo SI 1260, conectado a um computador. Este analisador

    permite a medida da impedncia da amostra compreendida entre 10-3 e 108 com uma

    preciso de 0,01 %. O esquema na Fig. 7 mostra o sistema usado para as medidas eltricas.

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    Figura 7: Esquema utilizado para obteno das medidas eltricas e aquisio dos dados.

    Para as medidas dos cristais utilizou-se suporte constitudo de um eletrodo inferior e

    um eletrodo superior no interior do forno. O eletrodo inferior conectado ao equipamento

    por um terminal individual, sendo que o eletrodo superior fecha seu circuito para cada

    amostra. O monitoramento da temperatura realizado por um termopar chromel-Alumel tipo

    K disposto prximo regio central do eletrodo inferior. O aquecimento da placa foi

    realizado por um forno eltrico controlado por um controlador de temperatura com preciso

    de medida 1,0 C. As medidas isotrmicas de cada amostra foram feitas aps a

    estabilizao da temperatura num sistema com vcuo mecnico (10-3 Torr) e adaptao da

    amostra ao sistema eltrico,

    Aps o preparo das placas dos cristais mistos, foram coletados os parmetros

    geomtricos das mesmas, em seguida foram feitas a colocao dos eletrodos nas amostras.

    Para cada medida isotrmica esperou-se a estabilizao do forno na temperatura especfica,

    posteriormente, foi realizada a medida eltrica na amostra. As medidas de impedncia para a

    caracterizao eltrica dos cristais mistos foram realizadas no intervalo de freqncia de 0,1

    Hz a 10 MHz com uma tenso alternada de amplitude 2 V. A escolha dessa amplitude foi

    feita aps testes preliminares de otimizao entre a tenso aplicada e a corrente eltrica em

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    45

    altas e baixas freqncias. As medidas foram feitas nas temperaturas de 20 C, 50 C, 80 C,

    100 C, 120 C, 140 C e 160 C.

    3.6 Preparao e crescimento das amostras de cristais de KH2PO4, NH4H2PO4 e dos

    cristais mistos.

    O cristal puro de KDP foi crescido pelo mtodo de crescimento por semente e os

    cristais mistos e de ADP pelo mtodo de nucleao espontneo. A Fig. 8 mostra estes dois

    mtodos de crescimento de cristais.

    (a) (b)

    Figura 8: (a) Crescimento espontneo de ncleos cristalinos e (b) crescimento de um cristal

    a partir de uma semente.

    Inicialmente preparou-se em um bquer de 200 mL, aproximadamente 100 mL de

    soluo com o sal de KH2PO4 com pureza PA e completamente dissolvido em gua. Depois

    de filtrada e colocada numa estufa com a temperatura constante de 40 C. Aps

    aproximadamente uma semana obteve-se alguns ncleos cristalinos crescidos

    espontaneamente, conforme mostra o esquema da Fig. 8 (a). Aps o crescimento, foram

    coletadas algumas sementes (ncleos cristalinos) e guardadas para serem utilizadas

    posteriormente. Em seguida preparou-se 1L de uma segunda soluo concentrada de KDP

    em um erlenmayer de 2000 mL, utilizando os mesmos procedimentos de preparao da

    soluo anterior, porm com a finalidade de um crescimento por semente.

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    Posteriormente, com o auxlio de uma linha de algodo, amarrou-se uma semente de

    KDP crescida anteriormente, e introduziu-se esta no erlenmayer que continha a soluo de

    KDP, agora na regio metaestvel (veja Fig. 4). A semente foi mantida suspensa, com o

    auxilio da linha, no interior da soluo para no crescer em contato com o fundo do

    erlenmayer, e obter um cristal homogneo crescido uniformemente em todas as direes,

    como mostrado no esquema da Fig. 8 (b). Os cristais KADPx foram crescidos por nucleao

    espontnea.

    Para o crescimento dos cristais mistos das espcies K1-x(NH4)xH2PO4 foram

    preparadas 5 solues conforme a Tab. IV.

    Tabela IV: Quantidades molares dos sais em cada soluo e quantidade molar (x) nos

    cristais mistos, aps a medida de ICP-AES, crescidos a partir das respectivas solues.

    Amostra KH2PO4

    na soluo (%mol)

    (NH4)H2PO4

    na soluo (%mol)

    K1-x(NH4)xH2PO4

    x no cristal (%mol)

    (a) 0,9002 0,1004 0,076

    (b) 0,8004 0,2005 0,118

    (c) 0,6006 0,4000 0,357

    (d) 0,2003 0,8010 0,857

    (e) 0,1002 0,9003 0,942

    A Tab. IV mostra a correlao entre os percentuais molares (quantidade molar dos

    sais na soluo aquosa) e os percentuais molares obtidos em cada cristal misto (aps a

    medida de ICP-AES). Devido competitividade entre os ons amnio e potssio na rede

    durante o crescimento[8] nos cristais obtidos em solues ricas em amnio, h a

    predominncia destes ons (amnio) na rede (x = 0,857 e 0,942). J nos cristais mistos

    obtidos em solues ricas em potssio prevalece os ons potssio na rede do cristal (x =

    0,076 e 0,118). Dessa forma, na regio mais intermediria esta tendncia relativamente

    diminuda (x = 0,357).

    Aps pesar as quantidades de cada sal transferiu-se para bqueres limpos de 100 mL

    e adicionou-se gua ultra pura Milli-Q (destilada e deionizada, com resistividade de 18,2

    M.cm-1). Assim, foram obtidas solues de aproximadamente 50 mL para cada cristal. As

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    solues preparadas foram acondicionadas em estufa, com temperatura constante de 40 C e

    esperou-se o crescimento dos cristais por evaporao do solvente. O ambiente externo e o

    ambiente interno da estufa foram constantemente desumidificados para facilitar a

    evaporao do solvente e conseqentemente o crescimento dos cristais. A Fig. 9 mostra os

    cristais puros de KDP, ADP e mistos, bem como as respectivas placas destes cristais

    utilizadas para as medidas eltricas.

    Figura 9: (1) Cristais puros de KDP, cristais da espcie mista KADPx, sendo (2) x = 0,076,

    (3) x = 0,118, (4) x = 0,357, (5) x = 0,857, (6) x = 0,942 e (7) cristais puros de ADP e a

    respectiva placa de cada grupo de amostras, para a obteno das medidas eltricas.

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    48

    Na Fig. 9, pode ser visto que apesar da boa forma estrutural dos cristais alguns

    defeitos como micro trincas e incluses ocorrem nos mesmos, devido competitividade dos

    ctions durante o crescimento dos cristais mistos. Aps o crescimento dos cristais foram

    coletadas 5 amostras (Tab. IV e Fig. 9) de cristais das respectivas solues para anlise de

    ICP-AES. As medidas de ICP-AES mostraram que devido competitividade dos ons NH4+

    e K+ as quantidades de KDP e ADP nos cristais mistos no so as mesmas presentes na

    soluo durante a sua preparao, conforme j discutido e mostrado na Tab. IV.

    Destas amostras foram cortadas e polidas, com lixa dgua (1200), placas de cristais

    com espessuras variando de 0,40 a 0,60 mm, de espessura como mostrado na Fig. 9. Estas

    placas foram analisadas e selecionadas com o auxlio do microscpio ptico. Antes de

    realizar a deposio do eletrodo nas superfcies das placas de cristais, estas passaram por um

    processo de limpeza superficial em papel macio embebido em gua ultra pura e acetona e,

    posteriormente observadas ao microscpio tico, a fim de avaliar a superfcie. Uma soluo

    de tinta prata foi depositada em ambas as faces (de maior rea superficial) das amostras que

    foram levadas estufa para completa eliminao do solvente e aderncia do eletrodo.

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    CAPTULO 4 RESULTADOS E DISCUSSO

    Neste captulo, so mostrados e discutidos os resultados de TGA, DRX e

    Espectroscopia de Impedncia para a caracterizao estrutural e eltrica dos cristais.

    4.1 Anlise Qumica

    O elemento potssio (K) foi analisado em duplicatas utilizando o comprimento de

    onda para a deteco do potssio, com a tcnica de ICP-AES, a fim de obter uma mdia do

    teor de K nas diferentes amostras de cristais. As mdias das quantidades de potssio nas

    amostras so dadas na forma de percentual em massa, bem como as massas de cada cristal

    misto pesadas para o preparo das solues dos mesmos (Tab. V).

    Tabela V: Quantidades de potssio em percentual em peso nas amostras de cristais mistos,

    massas diludas e concentraes x obtidas via ICP-AES para os cristais de K1-x(NH4)xH2PO4.

    Amostra K (%) Massa (g) x (a) 26,83 0,1102 0,076 (b) 25,80 0,1050 0,118 (c) 19,55 0,1049 0,357 (d) 4,75 0,1047 0,857 (e) 1,96 0,1085 0,942

    Sendo a massa molar do KH2PO4 igual a 136,09 g/mol e a do (NH4)H2PO4 igual a

    115,03 g/mol, juntamente com os valores das massas molares dos ons K+ que 39,10

    g/mol, do H2PO4- 97,00 g/mol e do NH4

    + 18,00 g/mol, foi possvel determinar a

    concentrao molar x de cada amostra da seguinte forma: Para a amostra (a), 26,83 % peso

    de potssio na massa de cristal diludo, temos: 0,0296 g de K+, dessa forma, a quantidade

    molar de K+ nesta massa 0,7570 mmol. Assim, de forma equivalente, a quantidade molar

    de H2PO4- ligados aos ons K+ 0,7570 mmol que em quantidade de massa temos 0,0734 g

    de H2PO4-. Ento; 0,0734 (massa de K+) + 0,0296 (massa de H2PO4

    -) = 0,1030 g (massa de

    KH2PO4). Com isto, subtraindo esta massa de KH2PO4 da massa total do cristal misto

    (0,1102 g), temos a massa de (NH4)H2PO4 que 0,0072 g que equivale a 0,0626 mmol de

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    50

    NH4+ presente neste cristal misto. Portanto, 0,7570 mmol de K+ somados com 0,0626 mmol

    de NH4+ equivale a x = 1, utilizando uma regra de trs simples temos, a quantidade molar de

    NH4+ para a amostra (a) x = 0,076 presente no cristal misto de KADPx (Tab. V). Para as

    demais amostras as composies x foram calculadas utilizando os mesmos mtodos usados

    para calcular x na amostra (a), como mostrado acima.

    4.2 Anlise termogravimtrica dos cristais

    A curva de TG apresentada na Fig. 10 mostra o percentual da perda de massa em

    funo do aumento da temperatura das cinco amostras de cristais mistos com x = 0,076,

    0,118, 0,357, 0,857 e 0,942, dentre estes, o cristal puro de KDP e o cristal de ADP.

    Figura 10: Curva de TG dos cristais mistos da espcie KADPx e dos cristais puros de

    KH2PO4 e de (NH4)H2PO4.

    O KDP perde uma massa de aproximadamente 12% da massa total da amostra na

    regio de temperatura entre 210 C e 370 C que corresponde perda da massa de uma

    molcula de gua para cada molcula de KDP, como pode ser visto na Fig. 10. Este processo

    de decomposio se resume na equao abaixo[13]:

    nKH2PO4(s)KnH2PnO3n+1 (s) + (n-1) H2O(q), (41)

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    onde n o nmero de molculas participando da decomposio trmica, (s) estado slido e

    (q) estado lquido para os correspondentes compostos. Harris e Vella[15] mostraram que no

    aquecimento do cristal de ADP a altas temperaturas h a formao de cido fosfrico na

    superfcie do cristal medida que o cristal decompe de acordo com a equao:

    (NH4)H2PO4(s)NH3(v) + (n-1) H3PO4(q), (42)

    onde (s), (q) e (v) denotam o estado slido, estado liquido e a taxa de evaporao de NH3 na

    superfcie do cristal, respectivamente.

    O experimento de TGA foi feito e a curva da transformao trmica mostrou o incio

    da perda de massa do ADP acima de 160 C e acima de 210 C para o cristal de KDP. A

    curva de perda de massa do ADP puro abrandou em aproximadamente 450 C mostrando a

    perda de massa de 25% nesta temperatura. A curva de perda de massa do KDP puro

    abrandou em aproximadamente 370 C mostrando uma quantidade de perda de

    aproximadamente 12% da massa inicial da amostra nesta temperatura. Acima desta

    temperatura os cristais de KDP tornam espcies de polifosfatos de longas cadeias

    conhecidos como sal de Kurrol[13]. As redes dos cristais mistos de KADPx so construdas

    pelos mesmos constituintes (nions) atravs de fortes ligaes de hidrognio, enquanto os

    ons potssio ou amnio entram em seus lugares na rede construdos pela rede aninica

    formando diferentes tipos de ligaes qumicas com os nions vizinhos. Conseqentemente,

    as diferentes intensidades de foras das ligaes entre os nions e os ctions na rede dos

    cristais mistos conduzem a diferentes processos de decomposio, j que a fora da ligao

    K-O maior que a fora da ligao HN-O fazendo com que a quebra das ligaes (durante o

    incio do processo de decomposio) nos cristais mistos ricos em ADP ocorra em

    temperaturas mais baixas, como pode ser visto nas curvas dos resultados de TGA (Fig. 10).

    Dongli Xu et al[7,8] reportou que o volume da clula dos cristais mistos maior que o

    volume da clula do cristal de KDP e menor que o volume da clula do ADP, e o espao ao

    redor dos stios positivos fornecido pelo ambiente dos nions mal emparelhado para ambos

    os ons potssio e amnio. Quando o potssio entra nos grandes stios positivos, o

    comprimento da ligao entre o potssio e o nion adjacente maior do que a ligao ideal

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    no KDP. Dessa forma, como reportado por Asakuma et al[9], devido s diferenas na

    distribuio potencial eletrosttica das nuvens eletrnicas moleculares no KDP e no ADP,

    bem como das ligaes inter inicas, pode-se sugerir que as foras das ligaes ao redor do

    potssio no cristal misto diferente do valor ideal no cristal puro. Assim, alguns segmentos

    da rede aninica encolhem para satisfazer esta distribuio eletrosttica das ligaes ao

    redor do potssio. Alm disso, o amnio preenchido num ambiente relativamente pequeno

    e estes stios contendo o amnio expandem para aceitar estes ctions maiores[8]. Logo, o

    clculo (percentual da perda de massa) relacionado s distncias entre o incio e o

    abrandamento das curvas de perda de massa do KDP, do ADP e do cristal misto de K1-

    x(NH4)xH2PO4 com x = 0,118 foram analisados com base na perda proporcional de massa

    relacionada quantidade de amnio e de potssio:

    (KH2PO4) 88,2% 12% + ((NH4)H2PO4) 11,8% 25%

    = (KH2PO4/NH4H2PO4 88,2/11,8%) 13,5% (43)

    Esta estimativa sugere uma boa concordncia entre as fraes de massa perdida pelo

    cristal misto (Fig. 10) e o previsto teoricamente a partir das fraes de massa das espcies

    puras.

    Baseando em Dongli Xu[7,8], Asakuma[9] e no clculo acima, ao aumentar x no

    interior do cristal misto o comportamento do ambiente microscpico ao redor do on amnio

    se aproxima do ambiente intrnseco do amnio no ADP puro, de forma proporcional

    quantidade molar x. Isto pode ser visto atravs das mudanas de cada incio da perda de

    massa nas curvas de TG (joelho) dos cristais mistos que mudam do joelho no inicio da perda

    de massa do KDP, por volta de 210 C, para o joelho na curva do ADP, por volta de 170 C.

    No cristal de KADPx com x = 0,357 a curva da perda de massa tem uma anomalia,

    sugerindo uma decomposio trmica um pouco diferenciada quando comparada com a

    decomposio trmica dos demais cristais. Este comportamento pode ser devido

    ocorrncia de diferentes tipos de defeitos como micro trincas e possveis incluses, que

    sugere o aparecimento de distores na rede cristalina conduzindo ao aumento destes

    defeitos durante o crescimento dos cristais.

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    53

    4.3 Difratometria de Raios-X

    O KDP e o ADP cristalizam no sistema tetragonal com grupo de espao no

    centro simtrico. A tcnica de difrao por raios X p foi realizada para auxiliar na

    caracterizao estrutural dos cristais mistos. Na Fig. 11 podem ser vistos os picos de

    difrao referentes aos principais planos {hkl} das espcies puras (KDP e ADP) e das

    espcies mistas de K1-x(NH4)xH2PO4 (x = 0,076, 0,118, 0,357, 0,857 e 0,942).

    Figura 11: Difratogramas obtidos dos cristais puros e mistos K1-x(NH4)xH2PO4.

    O deslocamento dos picos de difrao dos cristais mistos quando relacionados aos

    picos dos principais planos dos cristais puros de KDP e ADP (Fig. 11) sugerem uma

    alterao significativa nas clulas unitrias dos mistos. A competitividade dos ctions na

    rede cristalina durante o crescimento leva a uma forte tenso interna conduzindo a distores

    na rede e conseqentes mudanas locais no KADPx, gerando defeitos estruturais. Assim, os

    alargamentos relativos dos picos nas espcies em composies x intermedirias sugerem o

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    aparecimento de alguma desordem na rede destes cristais. A Fig. 11 mostra que nos cristais

    mistos, os picos caractersticos dos principais planos do KDP se deslocam em direo aos

    picos dos principais planos do ADP, devido ao aumento da concentrao de amnio x nos

    cristais mistos. Na Fig. 12 esto sobrepostos e ampliados os difratogramas de raios-x

    caractersticos dos cristais mistos e dos cristais puros de KDP e de ADP, na regio 20 < 2

    < 23 onde se encontra o pico associado ao plano cristalogrfico {101} do KDP e do ADP

    (Fig. 12).

    Figura 12: Difratogramas ampliados na regio dos planos {101} dos cristais puros KDP,

    ADP e mistos K1-x(NH4)xH2PO4.

    Levando em considerao que os grupos H2PO4- esto empacotados ao longo do eixo

    c atravs dos ctions intermedirios de K+ e NH4+, as combinaes das interaes das

    ligaes entre os ons na rede cristalina e a diferena de tamanho entre os raios inicos dos

    ctions de potssio e amnio esto relacionadas s diferenas entre os parmetros de rede

    das clulas das fases puras KDP e ADP[7,8]. Desta maneira, os padres de difrao de raios-x

    dos planos {101} sugerem que ao aumentar a quantidade de ons NH4+ substitudos por K+

    na rede dos cristais mistos, h a ocorrncia de tenses internas acumuladas ao longo destes

    planos de acordo com os parmetros de rede conduzindo expanso do volume da clula

    unitria. Em outras palavras, o aumento na quantidade de ctions maiores (NH4+) na rede

    dos cristais mistos conduz ao aumento nos parmetros de rede do cristal misto.

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    Resumindo, quando a concentrao de amnio x aumentada nos cristais mistos, os

    picos de difrao destes deslocam da posio do pico referente ao cristal de KDP em direo

    ao pico referente ao cristal de ADP (veja Figs. 11 e12), isto , aumenta a distncia

    interplanar. Sabe-se que os parmetros de rede do KDP temperatura ambiente so menores

    que aqueles do ADP[5,7,8], sendo que o parmetro a varia pouco com a concentrao x

    enquanto que o parmetro c aumenta, aproximadamente, 6% quando se aumenta x. Isto

    explica porque os picos referentes aos planos {101} deslocam mais para baixos ngulos, do

    que aqueles do plano {200}, por exemplo.

    Do ponto de vista da estrutura local, o ambiente microscpico ao redor do amnio se

    torna, gradativamente, mais parecido com o ambiente microscpico na vizinhana do

    amnio no ADP puro com o aumento da concentrao x. Dessa forma, as diferenas entre as

    foras de ligao no processo de decomposio sugerem que o comportamento trmico est

    de acordo com as mudanas nos parmetros de rede dos cristais mistos com a composio x.

    4.4 Medidas de Impedncia Complexa

    Estudamos, de forma sistemtica, o comportamento eltrico dos cristais mistos

    KADPx em funo da temperatura. Vale salientar que os materiais puros j foram objeto de

    estudo e os resultados esto relatadas e discutidos na literatura[18,19]. Com o objetivo de

    corroborar as discusses dos resultados obtidos com os mistos foram feitas as medidas de

    impedncia das amostras de cristais puros de KDP e ADP. A Fig. 13 mostra a variao da

    parte real (Z) e a da parte imaginria (Z) da impedncia como funo da freqncia

    usando uma escala dupla logartmica para a regio de temperatura 20 C a 160 C para as

    amostras de cristais puros de KDP e ADP.

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    Figura 13: Curvas de impedncia de Z e Z nos cristais puros de KDP e ADP.

    Na Fig. 13 pode ser visto que, no ADP, Z (f = 1 Hz) muda de 9,47108 a 200C

    para 5,12105 a 1600C, j no KDP, Z (f = 1 Hz) muda de 2,54109 para 4,16106 no

    mesmo limite de temperatura. De um modo geral pode-se concluir que a amostra de KDP

    puro menos condutiva que a de ADP puro, principalmente na regio de baixas freqncias,

    no intervalo de temperatura investigado. O comportamento eltrico destas amostras est em

    boa concordncia com o observado na literatura[18,19].