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DIREITOS HUMANOS E PLURALIDADE CULTURAL EM UMA ESCOLA TÉCNICA AGRÍCOLA SALANDIN, André 1 SILVA, Janete de Fátima Peracini Feliciano 2 CUNHA, Wallance Manoel da 3 RESUMO: O Brasil é uma nação multicultural. Sua cultura, seu povo e sua história foram construídos pelas mãos de diferentes povos e de distintas raças. Assim, nasceu uma cultura única no mundo e rica em diversidade, e justamente este contexto, acaba por se constituir em um verdadeiro desafio pedagógico para professores e escolas. A perspectiva dos direitos humanos coloca a educação como um direito fundamental, de forma que um cenário harmonioso entre as múltiplas culturas que aqui coexistem não pode ser construído se não houver o respeito e o entendimento quanto a relevância dos direitos humanos. Deste modo, o presente artigo traz como tema de discussão os direitos humanos e a pluralidade cultural no contexto da educação pública brasileira, sobretudo numa escola técnica agrícola a qual abriga uma significativa diversidade cultural entre seu alunado. Desta forma, foram definidos os seguintes objetivos: discutir a importância do papel da instituição escolar na socialização e formação integral dos adolescentes em um ambiente com diversidade cultural e apresentar as relações existentes entre educação e direitos humanos, destacando a importância dos mesmos para a constituição de um espaço escolar democrático, propício a inclusão e apto a trabalhar com as diferenças. O método escolhido é a pesquisa bibliográfica e análise documental. Evidencia-se, sobretudo, a importância do papel do professor para a construção de uma escola pluricultural equilibrada, o qual combata o preconceito e a discriminação, e principalmente promova um ambiente escolar inclusivo. Palavras-chave: Pluralidade Cultural. Direitos Humanos. Educação. HUMAN RIGHTS AND CULTURAL PLURALITY IN AN AGRICULTURAL TECHNICAL SCHOOL ABSTRACT: Brazil is a multicultural nation. Its culture, its people and its history were built by the hands of different peoples and different races. Thus, a unique culture was born in the world and rich in diversity. And precisely in this context, it becomes a real pedagogical challenge for teachers and schools. The human rights perspective places education as a fundamental right, so that a harmonious setting among the multiple cultures coexisting here cannot be built without respect for and understanding of the relevance of human rights. Therefore, this article brings as a topic of discussion human rights and cultural plurality in the context of Brazilian public education, especially in a technical agricultural school which houses a significant cultural diversity among its student. In this way, the following objectives were defined: to discuss the importance of the role of the school institution in the socialization and teenagers integral formation in an environment with cultural diversity and to present the existing relations between education and human rights, highlighting their importance for the constitution of a democratic school space, conducive to inclusion and able to work with differences. The method chosen is bibliographic research and documentary analysis. The importance of the teacher's role in building a balanced multicultural school, which tackles prejudice and discrimination, and above all, promotes an inclusive school environment is particularly important. Keywords: Cultural Plurality. Human Rights. Education. 1 Mestrando em Educação Universidade de Araraquara - UNIARA. 2 Mestrando em Educação Universidade de Araraquara - UNIARA. 3 Mestrando em Educação Universidade de Araraquara - UNIARA.

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DIREITOS HUMANOS E PLURALIDADE CULTURAL EM UMA ESCOLA TÉCNICA AGRÍCOLA

SALANDIN, André1

SILVA, Janete de Fátima Peracini Feliciano2

CUNHA, Wallance Manoel da3

RESUMO: O Brasil é uma nação multicultural. Sua cultura, seu povo e sua história foram construídos pelas mãos de diferentes povos e de distintas raças. Assim, nasceu uma cultura única no mundo e rica em diversidade, e justamente este contexto, acaba por se constituir em um verdadeiro desafio pedagógico para professores e escolas. A perspectiva dos direitos humanos coloca a educação como um direito fundamental, de forma que um cenário harmonioso entre as múltiplas culturas que aqui coexistem não pode ser construído se não houver o respeito e o entendimento quanto a relevância dos direitos humanos. Deste modo, o presente artigo traz como tema de discussão os direitos humanos e a pluralidade cultural no contexto da educação pública brasileira, sobretudo numa escola técnica agrícola a qual abriga uma significativa diversidade cultural entre seu alunado. Desta forma, foram definidos os seguintes objetivos: discutir a importância do papel da instituição escolar na socialização e formação integral dos adolescentes em um ambiente com diversidade cultural e apresentar as relações existentes entre educação e direitos humanos, destacando a importância dos mesmos para a constituição de um espaço escolar democrático, propício a inclusão e apto a trabalhar com as diferenças. O método escolhido é a pesquisa bibliográfica e análise documental. Evidencia-se, sobretudo, a importância do papel do professor para a construção de uma escola pluricultural equilibrada, o qual combata o preconceito e a discriminação, e principalmente promova um ambiente escolar inclusivo.

Palavras-chave: Pluralidade Cultural. Direitos Humanos. Educação.

HUMAN RIGHTS AND CULTURAL PLURALITY IN AN AGRICULTURAL TECHNICAL SCHOOL

ABSTRACT: Brazil is a multicultural nation. Its culture, its people and its history were built by

the hands of different peoples and different races. Thus, a unique culture was born in the world and rich in diversity. And precisely in this context, it becomes a real pedagogical challenge for teachers and schools. The human rights perspective places education as a fundamental right, so that a harmonious setting among the multiple cultures coexisting here cannot be built without respect for and understanding of the relevance of human rights. Therefore, this article brings as a topic of discussion human rights and cultural plurality in the context of Brazilian public education, especially in a technical agricultural school which houses a significant cultural diversity among its student. In this way, the following objectives were defined: to discuss the importance of the role of the school institution in the socialization and teenagers integral formation in an environment with cultural diversity and to present the existing relations between education and human rights, highlighting their importance for the constitution of a democratic school space, conducive to inclusion and able to work with differences. The method chosen is bibliographic research and documentary analysis. The importance of the teacher's role in building a balanced multicultural school, which tackles prejudice and discrimination, and above all, promotes an inclusive school environment is particularly important. Keywords: Cultural Plurality. Human Rights. Education.

1 Mestrando em Educação – Universidade de Araraquara - UNIARA. 2 Mestrando em Educação – Universidade de Araraquara - UNIARA. 3 Mestrando em Educação – Universidade de Araraquara - UNIARA.

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INTRODUÇÃO

Formado por uma multiplicidade de povos, a República Federativa do Brasil é

uma das nações que mais apresenta diversidade em sua composição cultural, social

e populacional. Aqui convivem diversas raças humanas, tais como: brancos,

indígenas, negros e orientais. Desta mistura étnica surgiram indivíduos únicos, assim

como panoramas culturais distintos, congregando elementos de diferentes origens. As

cinco regiões do país possuem cada qual uma cultura única, e até mesmo de uma

cidade para outra é possível observar variações de costumes, hábitos e crenças. Por

isso “a população brasileira é o resultado de uma grande mistura de culturas e

características físicas de diversas partes do mundo” (MACIEIRA, 2016, p. 3).

Portanto, o Brasil é um país pluricultural, tendo sido formado desde seu

descobrimento pela mistura entre portugueses e outros povos europeus, com os

indígenas que aqui já estavam e os negros que mais tarde foram trazidos como

escravos. Contudo, a convivência entre as diferentes raças e culturas aqui presentes

nem sempre foi harmoniosa. A hegemonia da elite branca europeia dominou o país

por séculos subjugando as demais culturas. Assim, ao olhar para o contexto

democrático atual, o qual assegura liberdade e direitos básicos para todos os

indivíduos, indiferente de credo, raça, cor ou qualquer outra distinção cultural, física e

social, é necessário que haja a compreensão de que os direitos humanos são uma

conquista, e portanto, devem ser valorizados.

A convivência legalmente igualitária possibilitada pelo Estado Democrático de

Direito assegurando a proteção e o cumprimento dos direitos humanos, aliada a um

cenário social pluricultural, faz com que em muitas escolas haja uma rica diversidade.

Algumas instituições escolares recebem estudantes de diferentes regiões brasileiras,

como é o caso da unidade de ensino objeto deste estudo, uma escola técnica

agrícola localizada na zona rural na cidade de Santa Cruz do Rio Pardo/SP, contando

com alunos oriundos de vários estados do Brasil.

Deste modo, o presente artigo traz como tema de discussão os direitos

humanos e a diversidade cultural no âmbito da educação pública brasileira, sobretudo

na unidade escolar mencionada. A escolha deste tema dá-se tanto pela importância

de promover ações que possibilitem a inclusão e a convivência eufônica entre

diferentes, pois muito embora todos sejam iguais diante da Lei, a convivência

respeitosa e a tolerância com os opostos são valores difíceis de serem alcançados em

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uma sociedade onde ainda ocorre o preconceito e a discriminação, não sendo

diferente na escola estudada neste trabalho.

Destaca-se ainda, a importância do professor em discutir tais questões, pois ao

adentrar em sala de aula e se deparar com um quadro rico em diversidade, o docente

enfrentará o desafio de ensinar à alunos tão diferentes entre si, sem excluir ninguém,

ao mesmo tempo em que será preciso mediar às relações ali estabelecidas,

assegurando que haja verdadeira inclusão.

A consciência crítica, o conhecimento da história brasileira e a valorização dos

direitos humanos são elementos basilares para uma atuação do docente em um

ambiente com pluriculturalismo. O professor é um dos profissionais mais importantes

para a sociedade, uma vez que é o responsável por formar os futuros cidadãos do

país, assim como por formar todas as demais profissões. Ser educador implica,

portanto, ter um forte senso crítico, estar atento às mudanças e transformações

ocorridas no meio e pronto a acolher todos seus alunos, independentemente de suas

diferenças. “Podemos admitir que hoje o grande desafio para nós educadores é saber

lidar com as diferenças culturais e sociais no meio educacional” (LEITE, 2014, p. 11).

Enfim, o indivíduo passa muitos anos da sua vida dentro da sala de aula, em

alguns casos convivendo mais tempo com professores e colegas do que com a própria

família. Desta forma, muito além de transmitir conhecimentos, os docentes também

acabam por transmitir valores e princípios que acompanharão os estudantes em sua

fase adulta.

Não menos importante nesta perspectiva, a instituição escolar permeia um

espaço complexo na sociedade brasileira atual, embora seu papel seja o de promover

a inclusão, a justiça e propagar o conhecimento, formando homens e mulheres de

forma integral, muitas vezes ela acaba por compactuar com as estruturas excludentes

que já existem, quando deixa-se levar pela naturalização dos acontecimentos sociais

ao redor, sem questioná-los de forma crítica (BARBOSA, 2004).

Entendendo a importância da escola e das relações nela estabelecidas para a

constituição humana é que a presente pesquisa foi planejada. Considerando a

relevância do tema e os conceitos necessários para sua discussão, definiu-se os

seguintes objetivos: discutir a importância do papel da escola, neste caso, a escola

técnica agrícola, na socialização e formação integral dos discentes em um contexto

pluricultural e apresentar as relações existentes entre educação e direitos humanos,

destacando a importância dos mesmos para a constituição de um espaço escolar

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democrático, propício a inclusão e apto a trabalhar com a diversidade.

1 EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: UMA RELAÇÃO INTRÍNSECA NO

CONTEXTO PLURICULTURAL

Os direitos humanos, legados da Revolução Francesa e inerentes ao Estado

Democrático de Direito, representam um marco para a humanidade em virtude de

assegurar valores e princípios que visam garantir o bem de toda coletividade. No que

tange a educação, o conhecimento e a preservação dos direitos humanos são

fundamentais, visto que a educação é atualmente entendida como um direito de todos

e, portanto, deve-se compreender que sem esta concepção e a proteção social que

dela decorre, dificilmente seria possível a existência dos Direitos Universais do

Homem (FERNANDES; PALUDETO, 2010).

A educação é um dos pilares sobre o qual se assenta a fundação e existência

de qualquer sociedade. Educar outro ser humano, especialmente crianças e

adolescentes, é uma tarefa de grande responsabilidade. A partir do ensino, estes

indivíduos se tornarão socialmente produtivos, pessoas cientes de seus direitos e

deveres como ser humano e cidadãos. “O conhecimento oferecido pela escola deve

ser o da realidade, por isso ela precisa capacitar o aluno para que saiba, diante da

complexidade do mundo real, posicionar-se, orientar suas ações e fazer opções

conscientes no seu dia-a-dia” (OH; BASSO; OLIVEIRA, 2007).

Ser professor é uma tarefa que encanta e ao mesmo tempo assusta muitos

profissionais educadores, sobretudo pelas mudanças as quais a sociedade tem

passado nas últimas décadas. O perfil dos alunos tem se modificado ao mesmo tempo

em que se alteram modelos educacionais e aumentam as exigências referentes a

currículo e formação, tudo isto visando atender um contexto social marcado pela

diversidade, pois:

Num tempo em que as transformações se processam a uma velocidade nunca antes vista, que as identidades se constituem múltiplas no espaço social, não abordar a temática da diversidade cultural no espaço educacional é permitir que a existência de diferenças entre os alunos possa levá-los a prática da intolerância, da discriminação, do constrangimento e muitas outras consequências do preconceito, ignorando inutilmente uma realidade que subsiste alheia à vontade desses ou daqueles (LEITE, 2014, p. 11).

Trabalhar sobre uma perspectiva educacional que considere e integre os

direitos humanos não é possível se o docente ignorar a realidade do pluriculturalismo

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da sociedade brasileira, e como esta realidade se manifesta nas escolas brasileiras.

Portanto:

Com isso, tem-se a ideia de que ser um profissional do ensino não é simples, pois é necessário considerar a intencionalidade da atividade docente, mas também não podemos esquecer que ser professor é se relacionar, é estar imerso nas relações interpessoais, e se fazer delas para efetivar sua função. Ainda inferimos com essa categoria que ser professor está além de uma atividade profissional, tem um significado existencial, que faz parte da constituição do sujeito e que nos permitiu interpretar a possibilidade de transformação social como fator que mantém estes docentes na profissão (MENDES; BACON, 2015).

O dia a dia nas escolas, especialmente em locais de precariedade

socioeconômica, pode se constituir em um verdadeiro obstáculo a efetivação até

mesmo de objetivos educacionais simples. Muitos professores enfrentam em seu

cotidiano um ambiente perpassado por falta de verbas, poucos materiais, estrutura

física inapropriada, alunos carentes e até mesmo violência, e todos estes fatores

acabam perpetuando o fracasso escolar e promovendo um ciclo longe de melhorar as

condições de vida dos estudantes através da educação, ocasionando mais pobreza e

precariedade (PALMA, 2007).

Desta maneira, a aplicação dos direitos humanos no ambiente escolar é

imprescindível, sendo importante destacar que seu conhecimento, e especialmente os

resultados que disto decorrem, são importantes tanto para alunos quanto professores.

Todavia, o que são os direitos humanos e de onde eles se originam? Aqui se faz

necessário um pequeno adendo para discorrer brevemente sobre esta questão. Isso

é preciso para que se possa compreender a importância dos direitos humanos para o

ambiente educacional.

A ideia de um conjunto de direitos inerentes ao homem por sua condição de ser

humano ganhou importância significativa ao longo da história, tendo sido ainda na

Antiguidade que os grandes princípios e diretrizes fundamentais a vida humana foram

estabelecidos em razão da substituição do saber mitológico pelo filosófico. Dali em

diante, com o passar dos séculos e a evolução do pensamento científico, filosofia e

artes, o ser humano cada vez mais passou a ser entendido como um ser único, sem

nenhuma outra espécie que lhe iguale (BELLINHO, 2014).

Para fins de síntese histórica, e entendendo que existem outros eventos que

influenciaram em menor escala a formulação moderna dos direitos humanos desde a

Antiguidade, pode-se dizer que a Independência dos Estados Unidos e de suas

colônias, com destaque para Virgínia, bem como a Revolução Francesa foram os

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eventos motrizes que efetivaram a criação moderna dos referidos direitos, de forma

que:

Os Direitos Humanos, inicialmente proclamados na Declaração de Direitos da Virgínia, com a independência americana em 1776 e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da Revolução Francesa em 1789, foram universalmente ratificados em 1948, pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, e posteriormente positivados através das Constituições Federais de diversos países (SOUZA, 2013, p. 33).

Convém esclarecer que a primeira nomenclatura a surgir foi Direitos do Homem

e do Cidadão, esta provém da época do Jusnaturalismo, pois bastava ser homem para

adquiri-los. Essa denominação, entretanto, recebeu inúmeras críticas em virtude da

expressão “homem”, uma vez que os direitos referidos não eram apenas para

indivíduos do sexo masculino, mas para qualquer pessoa humana (BELLINHO, 2014).

Então, os Direitos do Homem, herdados principalmente da Revolução Francesa,

mudaram inclusive em sua forma de denominação, de modo que:

Dessa maneira, após várias oposições com relação à nomenclatura adotada, os direitos do homem passaram a ser chamados de direitos fundamentais, os quais se ocupam do plano constitucional e visam assegurar e proteger os direitos inerentes a cada ser humano para que possam usufruir de uma vida digna. Não sendo diferente da finalidade dos direitos humanos que, diferentemente dos direitos humanos, figuram no plano internacional (BELLINHO, 2014, p.02).

Após o mundo vivenciar duas grandes guerras, e tendo sido criada a

Organização das Nações Unidas (ONU), passou a existir um firme entendimento

quanto a universalidade dos direitos humanos bem como de sua inclusividade, com

diversas nações reclamando o direito à autodeterminação dos povos, de modo que a

partir de meados do século XX para cá o mundo vivenciou um período de muitas

transformações, com intensa democratização, descolonização, emancipação

feminina, luta contra o racismo e combate a todas as formas de discriminação racial e

preconceitos (MBAYA, 1997).

Desde então os direitos humanos são uma entidade de importância mundial,

que atua em diferentes segmentos visando promover valores de igualdade, respeito,

tolerância, saúde, educação e segurança. Portanto, o papel social da educação é

reconhecido, e a mesma é um direito básico do homem, assegurado pela própria

Constituição Federal brasileira, em seu artigo 205, onde lê-se: “art. 205. A educação,

direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a

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colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo

para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988).

Dessa forma, a educação pública é considerada um direito de todos e um dever

do Estado, e compete às instâncias governamentais propiciar a existência de escolas,

equipadas adequadamente, com professores capacitados, e garantir que toda criança

a partir dos seis anos terá uma vaga no sistema público de ensino. Embora todas

estas sejam prerrogativas do Estado, percebe-se que na prática elas estão longe de

serem cumpridas a contento (FERNANDES; PALUDETO, 2010).

O trabalho adequado em um contexto de diversidade cultural é aquele que

promove a inclusão, combatendo a discriminação e o preconceito, sendo justamente

estes aspectos básicos de direitos ligados à educação aqueles que mais apresentam

problemas, pois ainda se vivencia contextos de grande intolerância com o diferente

em muitas escolas brasileiras (LEITE, 2014).

A criança e o adolescente são indivíduos ainda em desenvolvimento, logo

precisam ser protegidos e amparados, sendo fundamental assegurar o cumprimento

de seus direitos básicos, entre estes, a educação, mas não apenas, segundo versa a

Declaração Universal dos Direitos Humanos:

A criança e o adolescente têm direito à liberdade, que compreende: direito de ir e vir; de opinião e expressão; de crença e culto religioso; de brincar, praticar esportes e divertir-se; de participar da vida comunitária sem discriminação. É dever de todos velar pela dignidade de ambos, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano ou violento (FERNANDES; PALUDETO, 2010, p.236).

Estes direitos se encontram na categoria dos direitos sociais e é um dever da

instituição escolar garantir que os mesmos sejam efetivados. Sendo ainda previsto o

direito a educação no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, o qual assegura

o direito ao exercício da cidadania, a qualificação para o trabalho, igualdade de

condições para adentrar e permanecer na escola, bem como de ser respeitado por

educadores, participar de entidades estudantis, contestar avaliações errôneas e ter

acesso a escola pública próxima a seu local de residência (FERNANDES;

PALUDETO, 2010).

É um dever da instituição escolar assegurar que os direitos humanos sejam

cumpridos, e para tanto os professores precisam estar preparados para atuar frente a

esta realidade. Ter conhecimento sobre seus alunos é o primeiro passo, uma vez que

o docente os compreenda, ele então poderá observar o mundo por uma nova

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perspectiva e pautar estratégias metodológicas embasadas nos mesmos para assim

solidificá-los no dia a dia escolar. “[...] Ser professor ultrapassa o processo de ensino

e aprendizagem, os docentes têm outras preocupações e necessitam dar conta de

situações que transcendem a sala de aula” (MENDES; BACCON, 2015).

É o professor que trabalha cotidianamente com os alunos, transmitindo a estes

muito mais que os saberes curriculares, então:

A escola tem um papel essencial para a educação em direitos humanos, é no ambiente escolar que se têm as primeiras noções de sujeito de direitos. Esta educação deve se estender além das fronteiras escolares para que todos que atuem em atividades relevantes para a sociedade possam continuamente educar-se em direitos humanos. A escola deve promover e estimular o exercício da cidadania. A construção da cidadania se dá através de processos de formação e conscientizações capazes de construir uma cultura de direitos humanos (INÁCIO; VAZ, 2017, p. 1).

A educação assume um caráter que transcende a mera transmissão de

conhecimentos, torna-se uma instituição socialmente essencial que visa formar o ser

humano na sua integralidade, devendo abordar, para tanto, temas de interesse social

como o racismo, o preconceito, a intolerância, o respeito e a igualdade, formando além

de profissionais e cidadãos, pessoas mais conscientes de sua condição humana e

sensibilizadas com a situação de seu próximo (INÁCIO; VAZ, 2017).

Assim sendo, é essencial que os educadores estejam capacitados a atuar no

contexto dos direitos humanos, atuando na promoção efetiva destes na comunidade

escolar (INÁCIO; VAZ, 2017). Educar para os direitos humanos exige manter viva na

memória das crianças os valores que tornam a cada indivíduo deste plano um ser

humano. Significa ensinar sobre os erros do passado para que estes não mais se

repitam. Significa abordar os problemas sociais contemporâneos, as questões

políticas e também as artes, e, para fomentar direitos humanos é preciso inserir no

currículo questões humanas (CANDAU; SACAVINO, 2013).

2 A PLURALIDADE CULTURAL NA ESCOLA TÉCNICA AGRÍCOLA

Nosso país possui como característica marcante a diversidade cultural de cada

região brasileira. Ainda, recebemos interferências culturais provenientes de outros

povos, como os indígenas, africanos e imigrantes.

Pode-se notar que as diferenças culturais são bastante visíveis entre as cinco

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regiões do Brasil, principalmente as tradições indígenas e africanas no norte e

nordeste, os costumes europeus no sul e sudeste e também a presença da

diversidade cultural indígena no centro-oeste. Destaca-se ainda outras diferenças

entre estas culturas, tais como a culinária, e religião, as tradições e costumes, a

política e a linguagem.

2.1 Metodologia adotada

Para a realização deste estudo, foi necessária uma revisão literária para

embasamento sobre o assunto, para tanto, o método escolhido foi a pesquisa

bibliográfica, onde foram selecionados trabalhos produzidos preferencialmente por

profissionais da área educacional, bem como produções de áreas afins ao tema

escolhido, como direito e sociologia. Para um melhor entendimento da realidade da

unidade objeto desta pesquisa, realizou-se também uma análise documental e

demográfica abordando a temática pluralidade cultural existente em uma comunidade

escolar técnica agrícola.

Longe de esgotar o tema proposto, pretende-se prestar uma contribuição ao

conhecimento científico concernente a essa temática de grande relevância social e

que precisa ser discutida.

2.2 Contexto da pesquisa

A referente escola pertence a uma Autarquia do Governo do Estado de São

Paulo. A unidade está localizada na zona rural e situa-se na região centro-oeste do

estado de São Paulo. A escola oferece o curso de Técnico em Agropecuária Integrado

ao Ensino Médio e conta com 216 (duzentos e dezesseis) estudantes distribuídos em

6 (seis) turmas, sendo 02 (duas) turmas em cada série, 1ª, 2ª e 3ª. Esses alunos são

oriundos de 35 (trinta e cinco) cidades de 5 (cinco) estados distintos da nação

brasileira: São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso do Sul e Pará.

Além disso, estes discentes divergem na situação socioeconômica, no gênero,

na raça e faixa etária, e por isso, apresentam relevantes diferenças culturais e sociais.

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3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

3.1 Dados demográficos da população estudada

Como mencionado no item anterior, um dos fatores interessantes observados

durante a realização da pesquisa é que a referida comunidade escolar diverge quanto

à sua procedência e características culturais. Assim, seguem abaixo gráficos

representando as principais diferenças socioculturais dos alunos da escola estudada:

Gráfico 1: Alunos matriculados por estado, do total de 216 alunos

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

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Gráfico 2: Residência dos alunos – zona urbana/rural, do total de 216 alunos

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

Gráfico 3: Renda Familiar dos alunos matriculados, do total 216 alunos

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

RENDA (SALÁRIO MÍNIMO)

zero < 1 1 a 2 2 a 3 3 a 5 7 a 10 10 a 15

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Gráfico 4: Faixa etária dos alunos matriculados, do total 216 alunos

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

Gráfico 5: Sexo dos alunos matriculados, do total de 216 alunos

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

14 A 16 anos 17 a 21 anos 22 a 26 anos

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Gráfico 6: Raça / Cor dos alunos matriculados, do total de 216 alunos.

Fonte: Diretoria de Serviços Acadêmico

Um fator de relevância a se considerar é que a maioria dos alunos residem na

escola em regime de internato. Alguns alunos permanecem na unidade inclusive aos

finais de semana, chegando, às vezes, a ficar o semestre todo em virtude da distância

de suas residências oficiais.

Neste sistema de internato, os estudantes convivem dentro de um mesmo

quarto com até 6 (seis) pessoas distintas entre si, do ponto de vista da diversidade

cultural, pois quando matriculados são, propositalmente, “misturados”, induzindo

assim conviverem com as diferenças. O objetivo principal desta prática é provocar

reflexões nestes alunos acerca da tolerância para com o próximo, além disso, mostrar

que o diferente pode sim conviver em harmonia quando respeitado seus costumes.

Cabe ainda ressaltar, dentro deste universo pluricultural, o importante papel do

professor nesta instituição de ensino em buscar soluções reais para melhorar a prática

educacional utilizando, com responsabilidade, uma educação libertadora, a fim de

quebrar preconceitos e tentar harmonizar as interações socioculturais dentro deste

ambiente escolar, valorizando, sobretudo, as diversas culturas ali existentes. Além

disso, ele deve incentivar o respeito entre os indivíduos frente estas diversidades, e

com a participação de toda comunidade escolar, construir de uma educação

RAÇA / COR

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acolhedora.

No próximo tópico será destacado a importância da escola e do profissional

docente nas questões relacionadas ao tratamento das diversidades culturais entre os

alunos, inclusive nas intervenções práticas visando apaziguar os conflitos culturais

existentes dentro da instituição escolar e também em sala de aula.

3.2 A importância da escola e do professor na formação integral do aluno em

um contexto pluricultural

A diversidade é uma característica inseparável do pluriculturalismo, também

conhecido como multiculturalismo. Embora existam estudiosos que afirmem que os

termos possuem definições distintas, para o escopo do presente estudo, ambos se

referem ao mesmo conceito: a diversidade existente na sociedade, em todas as suas

instituições. Esta diversidade de culturas, de raças, de credos, de histórias, de

ancestralidade e de legado, se origina na própria formação do Brasil enquanto nação,

pois desde a época do descobrimento e por toda a sua história, o solo brasileiro

recebeu pessoas de todo o mundo e de todas as raças, o que acabou por fomentar

uma mistura única no mundo, na qual coexistem diversas culturas dentro de um

mesmo território (COSTA, 2003).

Assim, o Brasil é um país multicultural, e o pluralismo cultural refere-se

justamente a permitir que todas estas múltiplas culturas coexistem de forma

respeitosa, com tolerância e harmonia, evitando os conflitos e promovendo a interação

amistosa, a troca enriquecedora, entre diferentes indivíduos e suas respectivas

culturas (COSTA, 2003). E as diferenças que permeiam a diversidade cultural são

muitas:

Ao observamos bem de perto perceberemos que são muitas as diferenças: religião (católicos, evangélicos, espiritas, umbandistas, budistas, judeus, etc.,), tipos físicos (altos, baixos, gordos, magros, bonitos, feios, etc.) raça (brancos, negros, índios, pardos), sexo (homens, mulheres), e outras diferenças como, por exemplo, aquelas chamadas de necessidades especiais, portadores de deficiência auditiva, visual, cadeirantes etc., e ainda as de orientação sexual (heterossexual, homossexual, bissexual) e geracional (jovens, velhos e adultos) (LEITE, 2014, p. 12).

Portanto, o multiculturalismo é um fenômeno complexo surgido da luta em

busca da superação dos valores monoculturais em prol do reconhecimento da

validade de outras formas de saber, de ser e de viver, formas estas que foram

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silenciadas ao logo da história e suprimidas pela hegemonia da globalização

(KRETZMANN, 2007). Trabalhar com multiculturalismo no ambiente escolar significa,

portanto, o reconhecimento e o respeito pelo diferente, o que implica em compreender

e aceitar as crianças como elas são, respeitando suas origens culturais e tudo o que

este universo implica.

O professor é uma peça chave neste contexto, pois:

O multiculturalismo é um tema muito atual e pertinente, tanto na sociedade, bem como no contexto escolar. O docente tem um papel muito importante a desempenhar neste âmbito intercultural, pois a sua atitude, prática e formação influencia no processo educativo, podendo favorecer ou mesmo criar obstáculos ao desenvolvimento cognitivo, social e emocional dos alunos como também ao desenvolvimento de competências e capacidades de cada um (RODRIGUES, 2013, p. 5).

Para poder trabalhar pedagogicamente em um contexto pluricultural no espaço

escolar é necessário antes de tudo, que o professor busque primeiramente aprofundar

seu conhecimento sobre o meio no qual a escola está inserida. Somente assim é

possível organizar o planejamento escolar de forma a assegurar a flexibilidade do

currículo e a organização de práticas pedagógicas diferenciadas, fatores

imprescindíveis para a aprendizagem escolar pretendida pelos educadores

(RODRIGUES, 2013).

Neste sentido, o professor precisa, partindo do conhecimento sobre o público

escolar atendido, considerar o impacto que suas ações têm sobre seus alunos e

entender quais são seus limites de poder enquanto educador. É importante que a

instituição escolar e os docentes que nela atuem busquem o estabelecimento de uma

parceria harmoniosa entre a escola, a família e a comunidade, pois todos estes, pais,

educadores e demais membros comunitários, possuem papeis distintos. A escola e

seus professores atuam na transmissão de conhecimento aos alunos, ajudando dentro

do possível, com a transmissão de valores e princípios que compõe a formação

humana do educando e colaborando para instaurar uma convivência respeitosa entre

todos (REIS, 2008).

Além de atuar em conjunto com a sociedade, a escola também precisa dar a

devida atenção a práticas interdisciplinares, promovendo o intercâmbio de saberes

capaz de combater a fragmentação dos conteúdos curriculares e incentivar a

formação de uma consciência crítica em educados e professores. Deste modo,

salienta-se que:

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[...] um dos caminhos para o reconhecimento da diversidade presente no contexto educacional é o diálogo interdisciplinar. Este deve orientar ações que visem o combate às práticas de preconceito e discriminação no ambiente escolar, estendendo a toda a sociedade. Acreditamos ainda que o diálogo entre Antropologia e Educação, enquanto campo de conhecimentos que lidam com essa diversidade, é fundamental para orientar a prática pedagógica, bem como as ações de reconhecimento da diversidade (SOUZA; NASCIMENTO, 2010, p. 139).

A escola deve cumprir seu papel de transmitir conhecimentos científicos,

filosóficos e artísticos, e entendendo que o papel de educar e formar para a vida é

primordialmente um direito da família. Os educadores precisam respeitar os seus

limites de atuação no que tange aos valores, crenças e escolhas pessoais de seus

alunos, pois estes são guiados pelos princípios transmitidos pelo grupo familiar bem

como pela comunidade onde a criança convive (REIS, 2008). Respeitar tais limites,

prossegue o autor, implica ainda em propiciar a proteção dos direitos de todos os

educandos e a construção de um ambiente escolar pautado nos valores da tolerância

e do respeito.

Assim, a escola multicultural é composta por indivíduos com diferentes

formações familiares, cujas crenças e costumes podem divergir, mas que precisam

conviver em uma mesma comunidade. O professor possui, portanto, um papel de

destaque na busca pelo desenvolvimento de relações interpessoais fraternas e

amistosas entre os alunos, bem como entre o corpo discente e o corpo docente, os

educadores brasileiros o desafio de elaborar projetos educativos capazes de abordar

e valorizar a diversidade contribuindo assim para a formação de adultos capazes de

conviver e respeitar as pessoas e suas diferenças culturais, étnicas, políticas e

religiosas (SILVA, 2014).

Para que uma prática pedagógica tal se concretize é fundamental que o

currículo escolar seja consciente da pluralidade de identidades culturais que convivem

no ambiente escolar:

O multiculturalismo no campo educacional objetiva o reconhecimento da pluralidade e das identidades pertencentes aos diferentes grupos, até mesmo daqueles que estão excluídos pelos que assumem posição de poder no contexto social. Dessa forma, a educação multicultural procura soluções e meios de inclusão desses grupos considerados inferiores no cotidiano escolar. [...] Além disso, indaga respeito do contexto histórico social em que foram construídas as diferenças, os estereótipos atribuídos aqueles que são vistos como desiguais pelas sociedades (SILVA, 2014, p. 22).

Na busca por solucionar os problemas escolares e mesmo no complexo

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processo de constituição e aprendizado dos valores que compõe o ser humano, o

professor precisa compreender que existe uma separação entre o público e o privado,

e que não é pedagogicamente correto, nem necessário, impor sobre seus alunos suas

próprias crenças tão pouco promover qualquer tipo de dogmatismo como forma de

disciplinar (BARBOSA, 2004).

Na verdade, considerando a discussão aqui apresentada, tais posturas vão

contra o papel docente de promover uma convivência fraterna, respeitosa e ética em

uma escola multicultural.

O estabelecimento de uma escola democrática exige o desafio de inter- relacionar igualdade, diferença, culturas, diversidade cultural e cotidiano escolar. Essa nova reestruturação precisa repensar suas práticas pedagógicas, seu currículo, a relação docente-discente e a própria formação docente (SILVA, 2014, p.9).

A escola é um espaço que precisa estar apto a receber a todos, sem discriminar

nem privilegiar a ninguém, assim a práxis docente deve primar por um ensino

respeitoso, que transmita conhecimento e contribua para formação de cidadãos

conscientes, éticos e mais tolerantes com o diferente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A contemporaneidade traz consigo mudanças que fomentam desafios. Estar

preparado para fazer o melhor possível frente as adversidades é um dever dos

professores e de todos os profissionais que trabalham com a educação. No atual

contexto, a adaptabilidade e o dinamismo devem permear a profissão docente,

fazendo com que o professor esteja apto a transitar por diferentes situações com

habilidade pedagógica. Conviver em um ambiente pluricultural implica na capacidade

de olhar o outro e entendê-lo, para que possa haver o respeito e a tolerância, e

principalmente perceber que, apesar do outro ser diferente, ainda é igualmente um ser

humano.

Desta forma, o presente artigo trouxe uma perspectiva mais clara concernente

também a criação dos direitos humanos, evidenciando que embora os mesmos sejam

um legado recente quando comparados ao resto da história humana, já existe um

entendimento de que há fatores diferenciados que fazem com que o ser humano seja

humano, e estes são objeto de reflexão desde a antiguidade, especialmente entre os

filósofos da Grécia.

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Os direitos humanos, como evidenciado na presente pesquisa, representam um

marco vitorioso da humanidade em prol da paz e do bem comum. Inseri-los no

ambiente escolar é uma necessidade tanto para alunos quanto professores, pois

permite entender a educação em uma nova perspectiva, a qual visa formar o ser

humano na sua integralidade, transmitindo não somente conhecimentos científicos,

artísticos e filosóficos, mas também transmitindo valores e princípios,

independentemente da diversidade cultural do indivíduo.

Ao adentrar em sala de aula o docente deve ter consciência da importância de

sua posição e de qual é a sua missão enquanto educador que trabalha diretamente

com a diversidade cultural, um fator comum nas escolas brasileiras e não diferente na

unidade pesquisada. Neste sentido, deve haver uma harmonia entre a escola e a

família, com a participação ativa dos responsáveis pelo alunado frequentando o

ambiente escolar, se inteirando do que acontece e colaborando com os educadores,

ao mesmo tempo em que os mestres precisam conhecer o contexto da realidade de

seus alunos e respeitar a diversidade que por ventura for encontrada.

Para tanto, é essencial que os docentes sejam capacitados para trabalhar com

os direitos humanos no ambiente escolar, tanto transmitindo quanto formulando

estratégias que favoreçam a sua proteção e cumprimento.

Enfim, não existe no cenário escolar pluricultural uma prática pedagógica única,

pois cada escola apresenta um contexto próprio, diferenciado, que pede por

empreender táticas próprias a ele. Assim, também a unidade estudada e seus

profissionais necessitam reconhecer, compreender e respeitar as diferenças culturais

de cada indivíduo ali inserido, empenhando-se para transformar a aprendizagem deles

num processo harmonioso e produtivo.

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