direitos humanos e meio ambiente -...

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DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE Audálio Ferreira Sobrinho 1 1. Introdução Os direitos humanos estão dentre os principais temas debatidos no mundo contemporâneo. O meio ambiente – considerado pela doutrina majoritária como direito humano fundamental de terceira geração – é um componente dos chamados “novos direitos” que ocupa posição de relevo, principalmente, por sua natural importância e pela dificuldade em compatibilizar o desenvolvimento econômico com a utilização sustentável dos recursos naturais, fatos que podem comprometer a qualidade de vida no globo terrestre. As discussões sobre a questão ambiental são recentes, e mais recentes são as implementações normativas, internacionais e nacionais, com vistas a regulamentar as atividades impactantes ao ambiente e a promover o desenvolvimento sustentável, de modo a assegurar um direito fundamental do homem que é o direito à vida, na relação com o seu entorno. Não obstante haver registros significativos de uma legislação com reflexos ambientalistas desde a Idade Antiga, o fato que marca o direito ao meio ambiente equilibrado como direito fundamental do homem ocorre com a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, Suécia, sob os auspícios da Organização 1 Advogado, e Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá – RJ. SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Histórico dos direitos humanos. 3. Aspectos conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes antropocêntricas e ecocêntricas. 4. Direito ao meio ambiente em países estrangeiros e no Brasil. 4.1 Estados Unidos da América. 4.2 Alemanha. 4.3 França. 4.4 Portugal. 4.5 Portugal. 5. Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 6. Conclusão. Referências.

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DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE

Audálio Ferreira Sobrinho1

1. Introdução

Os direitos humanos estão dentre os principais temas debatidos no mundo

contemporâneo. O meio ambiente – considerado pela doutrina majoritária como direito

humano fundamental de terceira geração – é um componente dos chamados “novos direitos”

que ocupa posição de relevo, principalmente, por sua natural importância e pela dificuldade

em compatibilizar o desenvolvimento econômico com a utilização sustentável dos recursos

naturais, fatos que podem comprometer a qualidade de vida no globo terrestre.

As discussões sobre a questão ambiental são recentes, e mais recentes são as

implementações normativas, internacionais e nacionais, com vistas a regulamentar as

atividades impactantes ao ambiente e a promover o desenvolvimento sustentável, de modo a

assegurar um direito fundamental do homem que é o direito à vida, na relação com o seu

entorno.

Não obstante haver registros significativos de uma legislação com reflexos

ambientalistas desde a Idade Antiga, o fato que marca o direito ao meio ambiente equilibrado

como direito fundamental do homem ocorre com a Conferência das Nações Unidas sobre o

Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, Suécia, sob os auspícios da Organização

1 Advogado, e Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá – RJ.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Histórico dos direitos humanos. 3. Aspectos conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes antropocêntricas e ecocêntricas. 4. Direito ao meio ambiente em países estrangeiros e no Brasil. 4.1 Estados Unidos da América. 4.2 Alemanha. 4.3 França. 4.4 Portugal. 4.5 Portugal. 5. Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 6. Conclusão. Referências.

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das Nações Unidas, em 1972.

Inclusive, vale destacar outro evento internacional de vulto, a Conferência das

Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ocorreu em 1992, no Rio de

Janeiro, sendo esta denominada de Cúpula da Terra, ou ECO-92. Desta conferência

resultaram cinco importantes documentos, dentre eles a Declaração do Rio de Janeiro sobre

Meio Ambiente e Desenvolvimento, bem como a Agenda 21 (numa alusão ao século que se

aproximava e que hoje se vivencia).

A década de 1970, portanto, registra o início das preocupações ambientais globais,

e da mobilização social em torno dessas questões, resultando na proliferação de organizações

não-governamentais engajadas em movimentos pró-natureza. Foram assinalados, desde então,

tratados internacionais com caráter mais global, o que os tornou distintos dos acordos

internacionais que, até então, vinham sendo firmados.

O Brasil, na condição de país detentor de significativa biodiversidade, procurou

atualizar rapidamente sua legislação ambiental, estabelecendo mecanismos para assegurar um

ambiente adequado à vida, na sua expressão humana, animal e vegetal.

A Constituição Federal de 1988 – inspirada, principalmente, nas Constituições

Portuguesa e Espanhola – balizou seus aspectos essenciais sobre o meio ambiente em seu

artigo 225, incluiu a temática em outros dispositivos constitucionais, estipulou competências

das esferas de governo e determinou a regulamentação posterior pela legislação

infraconstitucional, além de recepcionar boa parte da legislação ambiental pretérita.

Dessa forma, esta pesquisa aborda um breve histórico desses direitos, a partir do

Código de Hamurábi (séc. XVII a.C.), passando pelo matiz religioso que se deu a essa questão

por força do Cristianismo, chegando ao final da Idade Média, época em que diversos

documentos limitaram o poder estatal em favor do indivíduo, constituindo-se nos albores dos

efetivos direitos humanos consolidados em legislações subseqüentes.

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Analisa-se a fundamentação dos direitos humanos e delineia-se a distinção destes

para com os chamados direitos fundamentais, procurando demonstrar sua vinculação com a

questão ambiental, no contexto do Estado contemporâneo.

Faz-se uma análise das concepções sobre o meio ambiente, tendo em vista a

utilização dos recursos naturais no processo de produção industrial e seu conseqüente impacto

na qualidade de vida humana.

Enfoca-se a sustentabilidade do meio ambiente sob a ótica do ecocentrismo, que

valoriza a natureza e seus recursos bióticos e abióticos pelo seu valor intrínseco, e sob a ótica

do antropocentrismo, que valoriza a natureza pelo seu valor de uso e conseqüente importância

à sobrevivência da espécie humana.

Por último, evidencia-se o tratamento dado à temática ambiental em alguns países

estrangeiros, de modo exemplificativo, sendo apresentado o meio ambiente ecologicamente

equilibrado como direito fundamental do ser humano, destacando a necessidade premente de

se estabelecer um novo modelo de produção e consumo, para evitar o colapso ambiental do

planeta Terra.

Assim, cabe ressaltar que o objetivo básico deste trabalho é analisar, sucintamente,

o meio ambiente - direito humano e fundamental de 3ª geração – e os direitos humanos.

2- Histórico dos direitos humanos

Os antecedentes dos atuais direitos humanos podem ser identificados no antigo

Egito e Mesopotâmia, terceiro milênio antes de Cristo, em face da previsão de instrumentos

que visavam a proteger o indivíduo em relação ao poder do Estado.

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O Código de Hammurabi (séc. XVII a.C.) possivelmente seja uma das primeiras

codificações a consagrar uma lista de direitos comuns a todos os homens, conforme leciona

Ezcurdia Lavigne,

[...] O el código de Hammurabi (1690 a.C.) com uma descripcion de derechos comunes a todos los hombres respecto a la vida, família propriedad, honor y buena fama, así como su proclamación de la Grecia de Pericles (s. v a. de C.), con participación de todos los ciudadanos en los negocios públicos, puede ser otro ejemplo a tener en cuenta, así como las figuras roanas del “Curtator Civitas”, de la época de Trajano (87-117), encargado de la defensa de los niños y clases humildes frente a los poderosos y a los niños y clases humildes frente a los poderosos y a las autoridades, y del “Defensor Plebis” o defensor Cevitatis”, estabelecido pelo el Emperador Valentino I (365-375), que tenía encomendada la tarea de simplificar los trámites en la administración de justicia y la lucha contra los abusos de los poderosos.2

Mais adiante, a forte concepção religiosa trazida pelo Cristianismo, com a

mensagem de igualdade a todos os homens, independentemente de origem, raça, sexo ou

credo, influenciou diretamente o nascimento dos direitos do homem, enquanto necessários à

dignidade da pessoa humana.

Não se pode olvidar a contribuição filosófico-religiosa ao prenúncio dos direitos

humanos, particularmente com a propagação das idéias de Buda sobre a igualdade de todos os

homens (500 a.C.). Um documento dessa fase é a Lei das Doze Tábuas que pode ser

considerado como a origem dos textos escritos consagradores da liberdade, da propriedade e

da proteção aos direitos do cidadão.

3

2 EZCURDIA LAVIGNE, J. A. Curso de Derecho Natural. Perspectivas iusnaturalistas de los derechos humanos. Madrid: Reus, 1987, p. 101. 3 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência . 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 7.

Nessa mesma linha, a Idade Média se caracterizou por uma organização feudal e

pela rígida separação de classes estamentais, com a conseqüente relação de subordinação

entre os nobres e os servos, além de vários documentos que reconheciam a limitação do poder

estatal.

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Jorge Miranda explica que os mais importantes antecedentes históricos das

declarações de direitos humanos encontram-se, inicialmente, na Inglaterra, onde se pode citar

a Magna Charta Libertatum, imposta ao Rei João Sem-Terra, em 15 de junho de 1215. Outros

documentos se destacam, tais como a Petition of Right, de 1628; o Habeas Corpus Act, de

1679; o Bill of Rights, de 1689; e o Act of Settlement, de 12 de junho de 1701. 4

A esses eventos históricos, alguns pensadores – Thomas Hobbes (1588-1679),

John Locke (1632-1704), Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), dentre outros – contribuíram

com suas obras doutrinárias para a limitação do poder estatal, e como reflexo é observável o

pensamento crítico de Immanuel Kant (1724-1804) que ajudou a formar a base dos direitos

humanos.

Portanto, nos séculos XVII e XVIII da era cristã, principalmente, ocorreram fatos

históricos no Ocidente que deixaram marcas indeléveis dessa aproximação dos direitos

humanos. Dentre esses fatos convém assinalar a Revolução Inglesa (1689), a Independência

Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789).

5

Nesse rumo, vale assinalar a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de

26 de agosto de 1789, dentre as mais notórias das declarações. Essa importância decorre do

fato de, ainda hoje, merecer o respeito e a reverência dos que se preocupam com a liberdade e

os direitos do homem.

Dessa forma, vislumbrou-se a preservação da vida e da dignidade da pessoa

humana que marcou o surgimento do Estado contemporâneo, passando a consolidar-se uma

visão prospectiva de governo das leis e não mais dos homens: o Estado de Direito.

6

Tal documento tornou-se um marco histórico, a partir do qual faz sentido falar-se

em direitos humanos fundamentais. Norberto Bobbio registra que essa declaração, pelo menos

4 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2000, p. 536. 5 CRETELLA JÚNIOR, José. Primeiras lições de direito. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 284-296. 6 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 19.

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simbolicamente, marca o fim de uma época e o início de outra, e, portanto, uma virada na

história do gênero humano. Isto é, ocorre uma mudança de concepção, deixa de existir a

concepção organicista, substituída pela concepção individualista, da qual nasce a democracia

no sentido moderno da palavra: o poder dos cidadãos tomados um a um.7

Além disso, esse autor leciona que “os direitos humanos são direitos históricos, ou

seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades

contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez

por todas.”

8

Observa-se que três correntes se sobressaem em defesa dos direitos do homem ou

dos direitos humanos: jusnaturalistas, positivistas e moralistas. Os primeiros são oriundos da

Escola do Direito Natural, fundamentam os direitos humanos em uma ordem superior

universal, imutável e inderrogável. Para os seguidores dessa corrente, George Jellinek e

outros, os direitos humanos não são criações dos legisladores, tribunais ou juristas, e,

conseqüentemente, não podem desaparecer da consciência dos homens.

9

[...] Primera: existe uma serie de reglas o princípios relativos a la ordenación justa de la vida social que son universales e inmutables y a cuyo conocimiento todos tenemos accesso mediante el uso de nuestra razón. Segunda: sin embargo, tales regras o princípios son insuficientes para el manteninimiento de una sociedad organizada, por lo que es imprescindible la existtencia de una autoridad política [...]. Tercera: en todo caso, los preceptos positivos de la autoridad sólo son obligatorios si representann el desarrolho de los princípios naturales de justiça o, al menos, no entran en contradicción con ellos.

Nessa linha jusnaturalista, J. Delgado Pinto chama a atenção para os requisitos dos

direitos naturais,

10

7 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 13. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 85-119. 8 Ibidem, p. 5. 9 MORAES, Antônio Carlos Robert de. Meio ambiente e ciências humanas. São Paulo: Hucitec, 1997, p.16. 10 DELGADO PINTO, J. De nuevo sobre el problema del Derecho Natural. Salamanca: Universidad de Salamanca, 1982, p.10.

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Por sua vez, a segunda corrente composta, principalmente, por positivistas e

neopositivistas, fundamenta a existência dos direitos humanos na ordem normativa, desde que

seja legítima a manifestação da soberania popular. Dessa forma, somente seriam considerados

direitos humanos aqueles expressamente previstos no ordenamento jurídico positivo e por isso

chamados de direitos humanos fundamentais.

Conforme A. E. Pérez Luño, integrante dessa linha positivista, os usos lingüísticos,

jurídicos e políticos do termo direitos humanos surge como um conceito mais amplo e

impreciso que a noção de direitos fundamentais, pois

Los derechos humanos suelen venir entendidos como um conjunto de faculdades e instituciones que, em cada momento histórico, concretan las exigencias de la dignidad, la liberdad y la igualdad humanas, las cuales deben ser reconocidas positivamente por los ordenamientos jurídicos a nível nacional e internacional. En tanto que con la noción de los derechos fundamentales se tiende a aludir a aquellos derechos humanos garantzados por el ordenamiento jurídico positivo, en la mayor parte de casos en su normativa constitucional y que suelen gozar de una tutela reforzada.11

Derechos que se originan en todos o en la mayoria de los sistemas positivos y que existirian como derechos morales aunque no hubieran emanado del gobierno. [...] Supongo que les llamó derechos absolutos de las personas por la misma razón que ha inducido a otros a llamarlos derechos naturales o inherentes; esto es poque ellos no son dependientes del suceso de ningún hecho concreto, sino que nosotros los adquirimos tan solo por nacer.

A terceira corrente é integrada pelos defensores da teoria moralista ou de

Perelman, e estrutura os direitos humanos tendo como base a própria experiência e a

consciência moral de um determinado povo.

Para J. Austin, defensor dessa última corrente, os direitos naturais, por exemplo,

normalmente significariam os direitos que correspondem à Lei Natural, isto é:

12

11 PÉREZ LUÑO, A.E. Los derechos fundamentales. 3. ed. Madrid: Tecnos, 1988, p. 46-47. 12 AUSTIN, J. Lectures on Jurisprudence, 1869, vol. II, lecture XXXII, p. 592-593.

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Conforme explica Alexandre de Moraes,13

[...] na confluência de três ricos movimentos sociais e políticos: o francês (das liberdades públicas), o inglês (do civil rights ou humain rights) e o alemão (dos direitos fundamentais), cada um deles, a seu modo, na busca de um regime jurídico (e político) humanista, correspondente ao dos Direitos Humanos ou de Homens.

a importância dos direitos humanos

fundamentais não consegue ser explicada por qualquer das teorias existentes que se mostram

insuficientes.

Explica esse autor que as referidas teorias se complementam, devendo coexistir,

pois somente a partir da formação de uma consciência moral (teoria de Perelman), baseada em

valores na crença de uma ordem superior, universal e imutável (teoria jusnaturalista), é que o

legislador ou os tribunais encontram base política e social para reconhecerem a existência de

determinados direitos humanos fundamentais como integrantes do ordenamento jurídico.

Ainda nessa mesma linha, Alberto Nogueira ensina que a teoria e a prática dos

direitos humanos, dos direitos fundamentais e das liberdades públicas, distante de se

excluírem, se complementam, pois formam as três rotas de convergência para o autêntico

Estado Democrático de Direito, e prossegue explicando que

14

Los derechos humanos aparecem como derechos morales, es decir, como exigências éticas y derechos que los seres humanos tienen por el reconhecimento, proteción y garantía por el hecho de ser hombres y, por tanto, con un derecho igual a su reconocimiento, protección y garantia por parte del poder político y el derecho; derecho igual, obviamente basado en la propriedad común a todos ellos de ser considerados seres humanos, y derecho igual de humanidad independente de cualquer contingencia

Registre-se, ainda, que Eusébio Fernández García explica o que sejam direitos

humanos tendo como pressuposto as exigências éticas, posição esta corroborada por Nuria

Belloso Martín:

13 MORAES, Alexandre de op. cit., p.17. 14 NOGUEIRA, Alberto. Globalização, regionalizações e tributação: a novla matriz mundial. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 41-49.

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histórica o cultural, característica física o intelectual, poder político o clase social.15

Impende observar, depois dessa breve análise sobre os direitos humanos

fundamentais, que houve, após a Revolução Francesa de 1789, num primeiro momento, a

preocupação com os direitos de liberdade (chamados direitos de primeira geração), ou

ausência de ação do Estado, à proporção que implica uma atitude negativa deste para não

violar a esfera individual, e numa segunda fase deste primeiro momento surge a luta pelos

direitos civis e políticos.

Dessa forma, depreende-se que os direitos humanos são aqueles inerentes à pessoa

humana e conforme a II Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena

(1993): “os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-

relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de

modo justo e eqüitativo, com o mesmo fundamento e a mesma ênfase.”

Portanto, neste sentir, entende-se por direitos fundamentais aqueles direitos

humanos que têm como núcleo os princípios éticos e de justiça – qualidade de vida e

dignidade do ser humano - que fazem parte do Direito Positivo, inclusive considerados como

tais pelo ordenamento jurídico vigente.

16

15 FERNÁNDEZ GARCÍA, E. Teoría de la Justicia y Derechos Humanos. Madrid: Debate, 1984, p.107. 16 LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas hermenêuticas dos direitos humanos e fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 98.

Conforme leciona Paulo Henrique Lacerda em seus apontamentos, as liberdades

negativas exigem do Estado um não fazer, para que não seja impedido o exercício das

liberdades individuais, v.g., liberdade religiosa, de expressão, intelectual, de locomoção,

dentre outras. Tais liberdades surgem, no bojo da citada Revolução Francesa, contra o Estado

que, até então, se configurava como um Leviatã, despossuído de limites.

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Num segundo momento, após o declínio das idéias liberais oitocentista, surgem as

preocupações com as questões assentadas em bases não estritamente individualistas, e o

Estado é chamado a implementar os direitos sociais, culturais e econômicos (chamados

direitos de segunda geração), mínimos necessários, para não comprometer os direitos já

conquistados; por conseguinte, advêm novos direitos, v.g., direito à educação, ao trabalho, à

previdência, dentre outros.17

Em seguida, caracterizando um terceiro momento, as conquistas no âmbito dos

direitos humanos extrapolaram os limites do indivíduo e de grupos sociais mais restritos para

se tornarem cada vez mais abrangentes, envolvendo a humanidade com os direitos de

solidariedade ou de fraternidade (chamados direitos de terceira geração), v.g., direito ao meio

ambiente, à paz, à comunicação. Além disso, os direitos de quarta geração, tais como o direito

à realidade virtual, à democracia, ao pluralismo, dentre outros.

Nessa fase, os direitos humanos passaram a abranger categorias de indivíduos,

estabelecendo conquistas socioeconômicas, tendo como estopim o movimento socialista na

luta contra a exploração do homem pelo capitalismo monopolista. Este período teve nas

Constituições do México (1917) e de Weimar (1919) o ponto de consolidação dos direitos de

igualdade do homem.

18

Por sua vez, Paulo José Leite Farias sintetiza os direitos fundamentais de terceira

geração, assinalando quatro características especiais, a saber: homem-humanidade,

destacando a fraternidade ou solidariedade mundial e o homem como parte dessa coletividade

universal; titularidade-anônima, no sentido de abranger a todos; existência-transgeracional,

17 Ibidem, p. 98. 18 Ibidem, p. 98-99.

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permite a titularidade a gerações futuras; e a qualidade-de-vida, visualiza o homem com a

dignidade necessária a sua existência.19

Nesse rumo, Norberto Bobbio aponta para a gestação de novos direitos, apesar de

não fazer uma nítida distinção entre os direitos de terceira e os de quarta geração, pois ambos

constituem, ainda, uma categoria heterogênea e vaga que dificulta saber do que efetivamente

se trata. Mesmo assim, destaca as reivindicações dos movimentos ecológicos, tais como o

direito de viver num ambiente não poluído (terceira geração); e os decorrentes da pesquisa

biológica e suas conseqüentes manipulações genéticas, sendo de quarta geração.

20

Segundo Rogério Gesta Leal, é a Declaração Universal dos Direitos Humanos

aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas que, em 10 de dezembro de 1948,

estabelece um profundo marco na internacionalização dos direitos humanos, sendo

complementada, posteriormente, pelos Pactos Internacionais de 1966, sobre direitos civis e

políticos, e sobre direitos econômicos, sociais e culturais. Estes documentos respaldam a

Pode-se afirmar que essa última fase teve como ponto de partida as aflições do

primeiro grande conflito mundial, e a partir daí os direitos humanos assumiram aspectos de

normas internacionais por intermédio dos tratados e convenções celebrados entre os países.

Ademais, surgiram regras de comportamento em conflitos armados para a proteção

de prisioneiros, de civis, de militares não-combatentes e de patrimônios histórico-culturais,

inclusive normas proibindo o trabalho escravo e regulamentando o trabalho assalariado no

âmbito da comunidade internacional, por causa da expansão do capitalismo financeiro.

Exemplos dessas evoluções foram a Convenção de Genebra (1864) e seus

Protocolos Adicionais, a Conferência de Bruxelas (1890) e diversas convenções estabelecidas

pela Organização Internacional do Trabalho (1919).

19 FARIAS, Paulo José Leite. Água: bem jurídico econômico ou ecológico? Brasília: Brasília Jurídica, 2005, p. 185. 20 BOBBIO, op. cit., p. 6-7.

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obrigatoriedade jurídica dos acordos assumidos pelos Estados-Partes, no sentido de proteger e

efetivar tais direitos.21

Não apenas os direitos individuais, de natureza civil e política, ou os direitos de conteúdo econômico e social foram assentados no plano internacional. Afirmou-se também a existência de novas espécies de direitos humanos: direitos dos povos e direitos da humanidade. [...] Chegou-se enfim ao reconhecimento de que à própria humanidade, como um todo solidário, devem ser reconhecidos vários direitos: à preservação de sítios e monumentos, considerados parte integrante do patrimônio mundial, à comunhão nas riquezas minerais do subsolo marinho, à preservação do equilíbrio ecológico do planeta.

Com essa Declaração Universal, ficou reconhecida a necessidade de os países

observarem as regras deste importantíssimo documento, a fim de se verem respeitados os

direitos individuais, sociais e os chamados direitos metaindividuais; dentre eles, o Direito

Ambiental.

E, a partir de então, num intervalo de menos de meio século, Fábio Konder

Comparato explica que

22

O documento que dela derivou propugna pela cooperação dos Estados com as

Organizações Não-Governamentais (ONGs) para a garantia efetiva dos direitos humanos,

Esses direitos constituem uma das mais recentes categorias de direitos humanos,

com um caráter bem mais genérico e difuso, em que a titularidade pertence ao gênero

humano, e, em se tratando de meio ambiente, não se restringem somente à humanidade, mas a

todos os seres vivos.

A II Conferência Mundial de Direitos Humanos (1993), em Viena, sedimentou em

caráter universal a necessidade de ser reafirmado o compromisso e responsabilidade de todos

os Estados promoverem o respeito global à proteção dos direitos humanos.

21 LEAL, op. cit., p.102. 22 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 56-57.

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define a extrema pobreza como inibidora do pleno exercício dos direitos humanos, solicita o

fim do apartheid, reivindica a observação dos direitos humanos das mulheres, crianças e

minorias étnicas.

Recomenda, ainda, a ratificação dos tratados internacionais de direitos humanos e

a adesão de novos países a eles, solicita a elaboração de uma declaração efetiva sobre os

direitos dos povos indígenas e propõe que o desenvolvimento deve satisfazer às necessidades

ambientais para garantir a sobrevivência das gerações presentes e futuras, dentre outras

propostas.

Não se pode olvidar que é nesse contexto histórico contemporâneo que os direitos

humanos têm origem e, particularmente, os chamados de “novos direitos” ou direitos de

solidariedade – direito ao desenvolvimento, à paz, à comunicação, ao patrimônio comum da

humanidade, ao meio ambiente sadio – encontram condições férteis para se desenvolverem.

O mundo hodierno tem, dentre os principais desafios, a proteção do ser humano,

do meio ambiente, do desenvolvimento do processo civilizatório, para que as desigualdades

sociais que se apresentam com tanta nitidez, por meio da fome e da miséria, possam ser

mitigadas no âmbito internacional e nacional.

Implementar a proteção do ser humano e do meio ambiente requer um

enriquecimento conceitual do universo jurídico internacional, mediante a análise aprofundada

e eventual consagração de princípios emergentes, v.g., os de interesse comum da humanidade

(common concern of mankind ou humankind), atendimento das necessidades humanas básicas

(basic human needs), desenvolvimento sustentável, desenvolvimento humano, eqüidade

intergeracional e direitos das gerações futuras, parceria global eqüitativa, dentre outros.23

Vale observar que o meio ambiente ecologicamente equilibrado, no sistema

democrático de direito (predominante no Ocidente), é considerado como direito fundamental

23 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos humanos e meio ambiente: paralelo dos sistemas de proteção internacional. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris Editor, 1993, p. 198.

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da pessoa humana. Sabe-se que os direitos fundamentais são históricos e que representam as

conquistas de um povo em determinada época, surgindo daí as gerações ou dimensões dos

direitos. Conforme João Batista Herkenhoff: “A história é movimento dialético, a ampliação

de direitos não se esgota. Novos direitos estão sendo reclamados, minorias tomam consciência

de sua dignidade [...].”24

Os direitos humanos possuem características variáveis, pois existem aqueles que

impõem limites à intervenção estatal: direito à vida, direito a não ser submetido a maus tratos,

liberdade e segurança da pessoa, liberdades de pensamento, consciência, religião e opinião,

liberdade de movimento. Por outro lado, existem aqueles que requerem ação estatal mais

efetiva: direito ao trabalho e a um digno padrão de vida (alimentação, moradia e vestimenta);

direito à saúde e à previdência social; direito de organizar sindicatos; direito à educação.

25

24 HERKENHOFF, João Batista. Curso de direitos humanos - gênese dos direitos humanos. São Paulo: Acadêmica, 1994, p. 63. 25 CANÇADO TRINDADE, op.cit., p. 186.

Por último, é importante observar que o art. 3º da Declaração Universal dos

Direitos Humanos, de 1948, diz que toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança

pessoal. Quando diz "à vida", inclui-se aí o meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois

se trata de uma das condições essenciais ontológicas do viver em toda a sua plenitude e

formas.

Dessa forma, serão analisados no próximo tópico determinados aspectos

conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes antropocêntricas e

ecocêntricas, tão necessários ao prosseguimento do conteúdo desta pesquisa.

3- Aspectos conceituais sobre meio ambiente, Direito Ambiental, correntes

antropocêntricas e ecocêntricas

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Existe uma natural dificuldade em definir o termo ambiente. Isto ocorre pela

abrangência do termo e pela grande diversidade de significados. A fim de facilitar tal

entendimento e pela relevância de alguns conceitos para esta pesquisa, serão apresentadas

considerações epistemológicas de autores consagrados no estudo sobre meio ambiente,

Direito Ambiental, ou Direito do Ambiente, correntes antropocêntricas e ecocêntricas.

Inicialmente, observa-se que a palavra “ambiente” é definida no dicionário Novo

Aurélio Século XXI26

Nesse sentido, José Afonso da Silva explica também que o termo “meio ambiente”

traz na sua composição lingüística duas palavras sinônimas em uma expressão composta, mas

chama a atenção para o fato de a língua portuguesa utilizar-se desse recurso quando há

necessidade de destacar ou reforçar um termo que sofreu desgaste ao longo do tempo, ou

porque se deseja alcançar uma maior abrangência com o termo reforçado, em face de sua

aceitação e expressividade no idioma pátrio.

da seguinte forma: “1. Que cerca ou envolve os seres vivos ou as

coisas, por todos os lados; envolvente. 2. Aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou as

coisas; meio ambiente. 3. Lugar, sítio, espaço, recinto. 4. Meio.” Logo, é fácil notar que os

termos “ambiente” e “meio” têm o mesmo significado; conseqüentemente, a expressão “meio

ambiente” apresenta um pleonasmo.

27

O meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais.

Esse autor conceitua meio ambiente de forma ampla, in verbis:

28

26 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p.117. 27 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 5. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, p. 19. 28 Ibidem, p. 20.

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Vale observar que a legislação federal, através da Lei de Política Nacional de

Meio Ambiente (art. 3º, I, da Lei 6.938/81), define meio ambiente como “o conjunto de

condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,

abriga e rege a vida em todas as suas formas.”

Nessa vereda, Toshio Mukai corrobora com tal entendimento conceitual

globalizante de meio ambiente e define Direito Ambiental da seguinte forma:

O Direito Ambiental (no estágio atual de sua evolução no Brasil) é um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do direito reunidos por sua função instrumental para a disciplina do comportamento humano em relação ao seu meio ambiente.29

Direito do Ambiente, considerando-o como o complexo de princípios e normas coercitivas reguladoras das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações.

Um outro conceito desse “novo direito”, tendo como base o ordenamento jurídico

brasileiro, é lecionado por Édis Milaré, in verbis:

30

No prosseguir desses aspectos conceituais, torna-se importante lembrar que fazer

uma abordagem sobre a temática ambiental requer cautela para não se enveredar por

concepções tendenciosas e extremas que medeiam entre o tecnicismo apaixonado e o

Como resultado desses ensinamentos, depreende-se que a expressão meio

ambiente representa uma idéia de integração dos elementos que constituem o meio em que se

vive, sejam eles naturais, artificiais, ou culturais, todos inter-relacionados por normas e

princípios que compõem o Direito Ambiental os quais visam ao equilíbrio da vida em todas as

suas formas.

29 MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005, p. 11. 30 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 155.

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naturalismo romântico, permanecendo num circuito ineficiente de produção de idéias e de

soluções inviáveis para a problemática ambiental.31

Vale observar que neste trabalho será considerada a ótica da teoria biocêntrica

contida na teoria ecocêntrica, lato sensu, que vincula todos os entes físicos e biológicos, sejam

eles animados ou inanimados, em oposição à visão antropocêntrica.

Em rápidas pinceladas, tem-se o surgimento da conscientização ambiental dividida

em correntes antropocêntricas e ecocêntricas, cujas estratégias e ações objetivam um mesmo

ponto, apesar de terem visões diferentes em relação ao tema.

32

Encaminha-se a Humanidade para um suicídio coletivo ou prepara a sua apoteose? Submetida a sucessivos movimentos: a idade do ferro, uma revolução agrícola, três revoluções industriais, e dispondo de enormes poderes de intervenção sobre a sua mais íntima biologia, estará ela a ser conduzida para um suicídio coletivo, como é de regra em biologia sempre que uma espécie se deforma em gigantismo; ou, ao contrário, a caminhar por uma série de criações esplendorosas, e muitas ainda invisíveis, para uma apoteose?

Diante das preocupações ambientais que se vivencia, Almerindo Lessa,

prefaciando a obra de Paulo de Almeida Machado, traz a seguinte indagação:

33

31 BRESSAN, Delmar. Gestão racional da natureza. São Paulo: Hucitec, 1996, p. 11. 32 Sobre o tema: Cf. MILARÉ, op. cit., p. 86-95; FARIAS, op. cit., p. 101-110. 33 ALMEIDA MACHADO, Paulo de. Ecologia humana. São Paulo: Cortez, 1984, p. 13.

Os estudos sobre o meio ambiente surgiram atrelados às ciências biológicas, mas

evoluíram e se desdobraram permeando outras ciências, inclusive a jurídica. Com isso, foi

sendo desvendada a importância do meio físico e dos fatores ambientais bióticos ou

abióticos, bem como dos fatores sociais.

O avanço tecnológico coloca questões éticas, especialmente no campo da

biotecnologia e na construção de novas espécies animais ou vegetais, a partir da engenharia

genética. O limite entre a natureza e a cultura se torna mais difuso.

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A dimensão social da ecologia humana se reveste de grande importância, porque

os custos econômicos e impactos prejudiciais de ações humanas tendem a recair, com maior

peso, sobre os segmentos sociais com menor poder político, menor carga de informações ou

menor capacidade social de defender e garantir seus interesses.

A sustentabilidade social e a eqüidade são componentes centrais de um

ecodesenvolvimento. Para ser sustentável, o desenvolvimento precisa enfrentar o desafio de

eliminar a pobreza e reduzir desigualdades e injustiças socioeconômicas. Precisa reconhecer

os crescentes riscos e ameaças à segurança individual e social representados pelos

desequilíbrios ambientais.

Importante destacar que o meio ambiente humano é mais complexo que qualquer

outro; pois, além do universo biótico e abiótico, inclui, ou desenvolve um universo sui

generis, composto de culturas, religiões, doutrinas, teorias, economias, maquinários,

governos, sociedades, mitos, histórias, dentre outros elementos.

É por isso que o estudo das interações entre o homem e o meio ambiente em que

vive (físico, biológico, cultural, social), deve levar em conta o desenvolvimento social

resultante das interações de ambos, fenômeno esse que resulta da adaptação constante a um

universo em evolução.34

As cidades se relacionam com o ambiente ao seu redor, de onde extraem materiais,

energia, alimentos, água, ar, para seu uso e consumo, provocando impactos ambientais. Há

necessidade de alimentar-se de fluxos de energia provenientes de várias fontes para se

Nesse contexto, as cidades e seus fluxos, típicos da espécie humana, constituem

ecossistemas construídos que se diferenciam internamente em função de fatores econômicos,

sociais, culturais e também naturais.

34 Ibidem, p. 136.

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sustentar. Esses centros urbanos podem manter-se sustentáveis caso utilizem, adequadamente,

os recursos de seu próprio abastecimento.

A concepção ambiental proposta pela Ecologia Humana se preocupa em garantir a

sustentabilidade energética dos sistemas urbanos e industriais, bem como a adoção de

matrizes energéticas eficientes, que gerem menores custos à qualidade ambiental.

Isso, porque a qualidade de vida humana depende da manutenção do equilíbrio

dinâmico entre os elementos bióticos e abióticos da biosfera, equilíbrio este submetido a

limites estabelecidos pelas leis da natureza.

Os projetos e atividades humanas promovem alterações na parte de um todo, cuja

resultante no conjunto das intervenções em nível de biosfera contém ameaças potenciais de

rupturas dos limites que asseguram a sustentabilidade do ambiente global.

Ao longo da história ecológica do globo, as relações de uma espécie com as

demais sempre foram mais cooperativas que competitivas, mas “a história do homem sobre a

Terra é a história da ruptura progressiva entre a sociedade e o entorno.”35

A primeira tem significado sócio-biológico, enquadrando as circunstâncias que

envolvem os seres vivos, afetados por aspectos físicos, químicos e biológicos, tanto

propriamente naturais como construídos pelos homens. Nessa concepção, o termo “meio

No atual estágio de desenvolvimento e evolução da humanidade, a escolha e

decisão sobre os padrões sustentáveis de produção e de consumo podem significar a diferença

entre o desastre ecológico e a sobrevivência das novas gerações de seres humanos dentro da

biodiversidade.

As concepções ambientais, apesar das inúmeras feições que podem assumir em

virtude de um ou outro aspecto mais evidenciado, basicamente se restringem a duas grandes

vertentes, conforme já mencionadas: a concepção antropocêntrica e a ecocêntrica.

35 SANTOS, Milton. A redescoberta da natureza. Aula inaugural da FFLCH-USP, 1992.

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ambiente” é usado para se referir às circunstâncias nas quais vive o homem, tendo a espécie

humana como referencial, por considerá-la o ápice do evolucionismo ou do criacionismo.

A segunda considera a funcionalidade interativa da geosfera-biosfera, focalizando

a existência de unidades organizadoras dos elementos abióticos e bióticos que compõem o

meio ambiente, elaborados mesmo sem a presença e ação do ser humano. Nessa concepção, o

termo “meio ambiente” é usado para designar o conjunto dos componentes da geosfera-

biosfera, sem privilegiar esta ou aquela espécie viva.36

[...] um segmento mais social preocupa-se com legalismo prescritivo que determina como cuidar-se do meio ambiente. Parcela mais crítica concentra-se nos porquês da aludida proteção, desenhando-se uma ética da terra, um ambientalismo holístico. Esse grupo também convive com uma dicotomia. Para os mais conservadores, protagonistas de um ambientalismo pouco profundo (shallow environmentalism) a proteção ambiental decorre do fato de que a natureza tem valor instrumental para nós, seres humanos; trata-se da concepção dominante. A esse intenso antropocentrismo contrapõe-se um biocentrismo insurgente, que reconhece direitos intrínsecos à própria natureza, hostilizando o pragmatismo de matiz humanista. Conotações mais sociológicas denunciam o uso do ambientalismo por parte de injunções políticas orquestradas para a captação de recursos externos e de simpatias ensejadoras de votos, prestígio, poder.

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy constata uma “clivagem conceitual no

movimento ecológico” em que, de um lado,

37

36CHRISTOFOLETTI, Antônio. Impactos no meio ambiente ocasionados pela urbanização tropical. In: SOUZA, Maria Adélia A. de (Org.). Natureza e sociedade de hoje: uma leitura geográfica. São Paulo: Hucitec, 1997, p. 127-138. 37 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Fundamentos filosóficos do Direito Ambiental. Revista Paradigmas de Filosofia Brasileira, Londrina, v. 4, n. 2, p. 119-123, jun. 2001.

Esse autor alega que o pensamento ocidental, embasado numa concepção

filosófica e religiosa antropocêntrica, é o responsável pela dicotomia entre natureza e homem,

pois este é visto como o ápice da criação, feito à imagem e semelhança do Criador, inserido

no planeta com a messiânica tarefa de dominar a natureza, subjugando-a e dela se apropriando

para seu deleite e usufruto.

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Ainda, Arnaldo Godoy esclarece que as concepções sobre o meio ambiente são

fortemente antropocêntricas, pois o objetivo do preservacionismo, do conservacionismo, do

desenvolvimentismo sustentável é, em última instância, assegurar a continuidade e qualidade

da vida humana.

Para esse autor, a Declaração do Rio (1992) confirmou tal presunção, reforçando a

idéia de que a humanidade deve proteger a natureza porque a natureza protege a humanidade.

A percepção antropocêntrica postula a valorização e proteção do meio ambiente por critérios

de utilidade, tanto é que o que não for assim considerado, ou que possa ameaçar a existência

humana, pode ser sumariamente eliminado.

Exemplos disso são os tombamentos de monumentos naturais e paisagens pelos

seus valores cênicos, fato que só existe, em última análise, para assegurar o deleite humano. A

preservação da biodiversidade tropical tem em vista resguardar espécimes conhecidos e

desconhecidos que tenham ou possam ter aproveitamento futuro. Mesmo quando não há uma

utilidade direta, a justificativa está em manter o equilíbrio dos ecossistemas, pois uma vez

rompido, afetará a comunidade humana do entorno, e dependendo das dimensões, a

comunidade humana global.

Um outro aspecto que evidencia a dimensão antropocêntrica das concepções

ambientais está na expressão “gerações futuras”, referindo-se à necessidade de preservar, de

conservar, para que outros seres humanos possam vir a utilizar esse ou aquele recurso, ou se

deleitar com essa ou aquela paisagem.

Embora a questão ambiental tenha sido deflagrada há menos de meio século

(décadas de 1960-70), rapidamente tomou dimensões planetárias, com vieses culturais e

políticos que geraram uma variedade de linhas de pensamento e ação, com diversas propostas

para as relações homem-natureza, tendo no ecologismo biocêntrico sua vertente

“fundamentalista”, a esquerda radical do movimento ecológico.

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Essa corrente preconiza uma ética ambiental revolucionária na qual a natureza

passaria, de objeto dominado, a sujeito de direitos numa modalidade inédita de relação,

negando-se à espécie humana qualquer centralidade ou superioridade no mundo natural.

Conforme Barbosa & Drummond, a proposta biocêntrica consiste em estender os

direitos naturais aos elementos bióticos e até mesmo abióticos do mundo natural, pois

consideram que animais, plantas e elementos inanimados teriam direitos intrínsecos,

independentemente de sua utilidade ou significado para os seres humanos.38

38 BARBOSA, Lívia Neves de Holanda; DRUMMOND, José Augusto. Os direitos da natureza numa sociedade relacional: reflexões sobre uma nova ética ambiental. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 7, n. 14, p. 265-289, 1994.

Os ecocentristas combatem a ideologia antropocêntrica de dominação da natureza,

rejeitando os interesses humanos como única medida das coisas. Alegam que o modelo

antropocêntrico encara a natureza como fonte de recursos à satisfação humana, quando não a

tem como fonte de representações negativas que justificariam sua alteração, sua dominação, o

extermínio de determinadas espécies e a modificação de determinados ambientes.

Ou melhor, significa dizer que a natureza selvagem, tão cara ao ecocentrismo, é

vista pelos antropocentristas como um mundo ruim, eivado de perigos, doenças, privações,

devendo ser dominado e transformado para o bem estar da espécie humana.

O ecocentrismo, passando-se pelo biocentrismo, difere das outras concepções de

meio ambiente justamente na ênfase que atribui ao valor intrínseco do mundo natural,

pretendendo estender-lhe os mesmos direitos naturais atribuídos aos seres humanos,

independentemente do sentido utilitário ou estético que a natureza possa ter. Sentido esse,

muitas vezes dissimulado nas vertentes conservacionistas, preservacionistas, ecoteológicas,

ecodesenvolvimentistas, que por isso mesmo seriam (apesar de não assumirem

ostensivamente tal postura) antropocêntricas.

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23

Conforme vaticina Félix Guattari, “mais do que nunca a natureza não pode ser

separada da cultura e precisamos aprender a pensar transversalmente as interações entre

ecossistemas, mecanosfera e Universos de referência sociais e individuais.”39

Observa-se a característica multidisciplinar desse “novo direito”, quando da sua

relação com a Ecologia (v.g., estudo dos ecossistemas), a Economia (v.g., avaliação do dano

Embora certos segmentos do movimento ecológico defendam as concepções

endêmicas para o meio ambiente, e outros se posicionem no lado oposto, é essencial

estabelecer uma posição entre os extremos de um naturismo desumanizador e de um

economismo destruidor.

Assim, o respeito ao meio ambiente e à vida são as referências básicas perseguidas

por essas duas correntes – antropocêntrica e ecocêntrica -, visando à sobrevivência qualitativa

da humanidade. Ou seja, independente do ponto de vista, essas correntes objetivam lutar por

condições ambientais necessárias à efetivação do direito fundamental ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado.

No tópico subseqüente, será analisado o ordenamento jurídico sobre o meio

ambiente, em caráter exemplificativo e pela sua relevância no contexto mundial, nos seguintes

países: Estados Unidos da América, Alemanha, França, Portugal e Brasil.

4- Direito ao meio ambiente em países estrangeiros e no Brasil

O Direito Ambiental tem se caracterizado predominantemente no âmbito

internacional ou interno, pela multidisciplinaridade e pelo fato de ter como núcleo principal a

dignidade da pessoa humana.

39 GUATTARI, Félix. As três ecologias. São Paulo: Papirus, 1991, p. 25 .

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ambiental), a Antropologia (e.g., levantamento de culturas diferentes), Estatística (e.g.,

cálculo de probabilidade de estudo de impacto ambiental), dentre outras relações.40

Além disso, o Direito Ambiental mantém estreitas relações interdisciplinares, por

exemplo, com o Direito Constitucional, Penal, Tributário, Processual, Civil, Internacional, ou

seja, “o Direito Ambiental penetra os outros ramos do Direito e faz com que estes assimilem

as preocupações de proteção ambiental.”

41

Ademais, o núcleo desse direito, integrado pela dignidade da pessoa humana,

constitui a estrutura sobre a qual se torna “a finalidade última e a razão de todo o sistema

jurídico.”

42

Nessa mesma linha, Ingo Wolfgang Sarlet

Por isso, entende-se que os problemas ambientais devem ser analisados e

estudados globalmente, contudo sua eficácia ocorre a partir da atuação no ambiente local em

que se vive ou que se protege.

43

ensina ser indissociável a relação

entre a dignidade da pessoa e os direitos fundamentais (v.g., o meio ambiente), pois sem que

se reconheçam à pessoa humana tais direitos – privacidade, honra, tratamento não

discriminatório, direito geral de igualdade, direito à sadia qualidade de vida, dentre outros –

que lhe são inerentes, em verdade estar-se-á negando-lhe a própria dignidade.

Portanto, nesse contexto multidisciplinar e complexo que permeia o Direito

Ambiental por um ambiente ecologicamente equilibrado, serão apresentados abaixo, tomando

como exemplo, quatro países estrangeiros com suas próprias características evolutivas no que

tange a esse “novo direito”, e o Brasil.

4.1 Estados Unidos da América

40 MILARÉ, op. cit., p. 175-176. 41 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999, p. 47. 42 COMPARATO, op. cit., p. 61 43 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 84-86.

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25

Os Estados Unidos da América estão dentre os primeiros países a legislar sobre o

meio ambiente. Faz-se necessário lembrar que, em 1899, o governo americano adotou a Lei

de Rios e Portos e proibiu a descarga de refugos em vias navegáveis, passando a controlar e

avaliar as conseqüências do lançamento desses produtos poluidores em cursos d’água.44

Todavia, o Direito Ambiental, de acordo com o moderno entendimento, teve

início, efetivamente, nos Estados Unidos em fins da década de 1960 e no princípio da década

de 1970, ficando este período caracterizado pela sanção da Lei de Política Ambiental de

1969.

45

Observa-se que a evolução ambiental norte-americana decorreu da forte tradição

de seus cidadãos reivindicarem seus direitos ao Poder Judiciário. De certa forma, isto tem

servido de inspiração a vários países quanto à prática dos litígios pertinentes à proteção

ambiental.

46

Impende destacar a citada Lei de Política Ambiental – National Environmental

Policy Act of 1969 (NEPA) – que exigia audiências públicas e se referia aos estudos de

impacto ambiental, tornou-se uma espécie de lei fundamental para o Direito Ambiental norte-

americano, em linhas gerais seguida por grande parte dos estados-membros componentes de

sua federação.

Nesse passo, a evolução do Direito sobre o controle do uso do solo, que começou

entre 1920 e 1930, adquiriu importância na década de 1960 e subseqüentes, tendo em vista a

evolução do chamado Direito de planificação, isto é, os planos passaram de documentos não

muito importantes para documentos de caráter normativo.

47

Destarte, verifica-se que os norte-americanos, desde 1969, inseriram o meio

ambiente no planejamento governamental – Lei de Controle de Poluição da Água, de 1972;

44 ANTUNES, op. cit., p. 279. 45 MUKAI, op. cit., p. 154-156. 46 ANTUNES, op.cit., p. 45. 47 Ibidem, p. 280.

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Clean Air Act, de 1970, emendado em 1990 – e seus estados-membros assumem cada vez

mais responsabilidades em relação à proteção ambiental.

4.2 Alemanha

A República Federal da Alemanha inseriu o Direito Ambiental como disciplina

jurídica a partir do início de 1970. Vale lembrar que sua Lei Fundamental, de 1949, dispunha

a respeito da proteção ambiental, apesar de fazer prescrições específicas sobre substâncias

perigosas, energia nuclear, gestão dos recursos hídricos, ordenamento rural e suas

competências, dentre outras prescrições.48

[...] associativismo e do Gruppierrung (agrupamento) está entranhada no povo alemão. A necessidade de organização e estruturação dos interesses comuns, sejam eles esportivos, festivos ou voltados para a defesa do meio ambiente ou dos consumidores, enseja o fortalecimento das entidades e organizações civis.

Conforme Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, a defesa judicial dos interesses

difusos e coletivos (v.g., o meio ambiente) na Alemanha é feita por meio das Verbandsklagen,

que são as ações associativas, cuja cultura do

49

Outrossim, há três princípios jurídicos nucleares que regem o Direito Ambiental

germânico: o princípio da prevenção, o do poluidor-pagador e o da cooperação. Por sua vez, o

Poder Legislativo, assim como a jurisprudência em matéria de planejamento do solo, do

planejamento da construção, de aeroportos, de estradas, desenvolveram mais um princípio, no

48 MUKAI, op. cit., p. 155-156. 49 MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro. Ações coletivas no direito comparado e nacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 121.

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qual todos os interesses públicos e privados afetados pelo planejamento devem ser tomados

em consideração, visando ao bem comum. 50

Verifica-se, também, que o governo federal da Alemanha tem integral

competência legislativa para o controle da poluição do ar, da eliminação de resíduos, do

planejamento de construção, contudo em assunto sobre poluição de águas, ordenamento rural,

proteção da natureza, a sua competência geral possibilita, somente, decretar leis que

prescrevam princípios gerais. Portanto, quando houver necessidade de uma unidade no

direito, pode ser decretada uma disposição detalhada; mas, para publicar-se uma lei geral, a

representação dos governos estaduais terá que autorizá-la.

Além disso, existe no direito de planejamento alemão um programa para avaliação

de impacto ambiental, embora não haja um dever formal de avaliação de impacto, que será

implantado com os ajustes decorrentes das diretrizes sobre o assunto pela Comunidade

Européia.

51

A saber, a justiça nesse país está organizada com ramos específicos que não

existem no Brasil, dentre os quais o da Administração Pública, o das Finanças e na esfera do

Direito Processual Administrativo há uma preocupação com a tutela dos interesses coletivos,

por meio da implementação dos denominados “processos modelos.”

52

Assim, observa-se que não existe a unificação das normas desse “novo direito” na

Alemanha, e que suas leis não puderam fazer respeitar plenamente os interesses ambientais,

havendo uma clara debilidade essencial e política nas posições atinentes à proteção do meio

ambiente.

53

4.3 França

50 MUKAI, op. cit., p. 156. 51 CHAGAS, Márcia Correia. O direito ao meio ambiente como direito fundamental à vida. 1998. 177 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1998, p. 109. 52 MENDES, op. cit., p. 122-123. 53 MUKAI, op. cit., p. 156.

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28

A França inseriu o Direito Ambiental nas universidades a partir de 1971. Este

campo do saber era destinado a não juristas, no contexto de um diploma pluridisciplinar.

Passado certo tempo, algumas Faculdades de Direito introduziram tal disciplina, como

matéria optativa, e, em 1988, como um Magistério.54

A regulamentação de tal norma veio ocorrer em outubro de 1977, fato muito

criticado pelos especialistas, dentre eles Michel Prieur, que considerou o referido

retardamento algo “escandaloso”, tendo em vista, no período do vacatio legis da citada

norma, ter havido autorização para a implantação de três usinas nucleares sem o prévio estudo

de impacto ambiental.

O ordenamento jurídico francês adota, desde julho de 1976, o estudo do impacto

ambiental, quando a Assembléia Nacional Francesa aprovou a lei que passou a exigir essa

importante medida de proteção ao meio ambiente.

55

Ademais, é de verificar-se, conforme Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, que a

tutela coletiva na França tem característica peculiar, pois sempre esteve vinculada ao processo

penal, através da denominada action civile. Inclusive, esse autor ratifica a existência de leis –

Código Rural – no âmbito do Direito Ambiental que dispõe sobre a legitimação da

propositura de tal ação judicial, objetivando proteger o ambiente.

56

O sistema de avaliação de impacto ambiental francês é muito burocratizado, mas

reconhece a existência do princípio do respeito ao meio ambiente que se aplica a três

modalidades de intervenção ambiental: obras públicas ou privadas, projetos urbanísticos e

planos de manejo. Também, existem modelos a serem aplicados, segundo as exigências de

54 Ibidem, p. 158. 55 ANTUNES, op. cit., p. 284. 56 MENDES, op. cit., p. 152-155.

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análise das repercussões ambientais do projeto a ser implantado: mininotícia de impacto,

notícia de impacto e estudo de impacto.57

Por último, a França tentou implementar vários planos de proteção ambiental. Vale

destacar o décimo plano – Lei de 10 de julho de 1989 –, tendo em vista ter provocado a

elaboração de uma nova política governamental do meio ambiente, integrando este a todos os

setores socioeconômicos, além de instaurar bases para uma política ambiental duradoura.

58

4.4 Portugal

A Constituição de Portugal vigente, aprovada em 2 de abril de 1976, ainda sob a

influência da Revolução dos Cravos (1974), consagra o direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado e eleva-o à dignidade de direito fundamental do cidadão (art. 66,

nº. 1, da Constituição da República).59

A todos ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de ação popular nos casos e termos previstos na lei, nomeadamente o direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infrações contra a saúde pública, a degradação do ambiente e da qualidade

Nessa mesma linha, foram publicadas no Direito Positivo português algumas

normas importantes visando à proteção do meio ambiente, v.g., a Lei das Associações de

Defesa do Ambiente ( Lei nº. 10, 4 de abril de 1987), a Lei de Bases do Ambiente (Lei nº.11,

07 de abril de 1987).

Outrossim, segundo Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, a ação popular, forma

de exercício da cidadania, por força da Lei Complementar 1/89, ganha novos contornos e a

Constituição da República passou a especificar, em seu art. 52, nº. 3, o seguinte:

57 ANTUNES, op. cit., p. 286. 58 MUKAI, op. cit., p. 159. 59 Ibidem, p. 161.

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de vida, ou a degradação do patrimônio cultural, bem como de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indenização.60

Incumbe observar que a finalidade do Direito Ambiental é definida de maneira

genérica no art. 2º, nº. 2, da Lei de Bases do Ambiente: “Otimizar e garantir a continuidade de

utilização dos recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto básico de

um desenvolvimento auto-sustentado.”

61

60 MENDES, op. cit., p. 134-135. 61 MUKAI, op. cit., p. 162.

À guisa de conclusão, cumpre assinalar que o direito luso estrutura esse “novo

direito” em três princípios fundamentais: prevenção, poluidor-pagador e cooperação. Além

disso, consagra a responsabilidade objetiva (art. 41 da Lei 11/87), considera o direito ao

ambiente como um direito da personalidade humana e as associações de defesa do ambiente

assumem papel relevante em defesa de condições da qualidade de vida humana, sadia e

ecologicamente equilibrado.

4.5 Brasil

A consciência ambientalista aprimorada na segunda metade do século XX

favoreceu a evolução das normativas ambientais, e bem recente observa-se o tratamento legal

dado pela ciência jurídica a essas questões, dentro de um contexto holístico que entende o

meio ambiente imerso em todas as dimensões da vida, sendo o seu próprio corolário.

Nessa linha, o tema meio ambiente passou a fazer parte das Cartas Magnas dos

países, consolidando-se como direito fundamental por ser recepcionado constitucionalmente,

marcando indelevelmente uma época em que a humanidade desperta para a necessidade de

preservar, a fim de possibilitar a sobrevivência no planeta Terra.

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Isso evidencia a índole transformadora do Direito e seu plus normativo, em sua

evolução histórica, como afirma Lênio Luiz Streck,

[...] o Estado Democrático de Direito faz uma síntese das fases anteriores, agregando a construção das condições de possibilidade para suprir as lacunas das etapas anteriores, representadas pela necessidade do resgate das promessas da modernidade, tais como igualdade, justiça social e a garantia dos direitos humanos fundamentais.62

De modo geral, nos países estrangeiros (mas não foi diferente no Brasil) a

legislação ambiental proliferou de maneira “variada, dispersa e freqüentemente confusa”, ora

sendo uma extensão de leis sanitárias e protetoras de florestas, caça, recursos minerais, ora se

constituindo em normas setorizadas e estanques (leis sobre águas; leis sobre florestas; lei

sobre poluição atmosférica, dentre outras).

63

Ann Helen Wainer reconstitui o histórico da legislação ambiental brasileira,

remontando ao período as Ordenações Afonsinas (1446), Manuelinas (1521) e Filipinas

(1580), adaptadas e aplicadas ao Brasil Colônia.

64

62 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica e concretização dos direitos fundamentais-sociais no Brasil. In: ANDRADE, André G. C. de. (Org.). A constitucionalização do direito: a constituição como locus da hermenêutica jurídica. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 3-41. 63 SILVA, J. Afonso da. , op. cit., p. 34. 64 WAINER, Ann Helen. Legislação ambiental brasileira: subsídios para a história do direito ambiental. Rio de janeiro: Forense, 1991, p.5-25.

Essas legislações previam a proibição do corte de árvores frutíferas, proibiam a

utilização de instrumentos de caça capazes de causar sofrimento e dor aos animais;

determinavam a comercialização de colméias sem a eliminação das abelhas. Por sua vez, as

Ordenações Filipinas vedavam o lançamento aos rios e lagoas de qualquer material que

pudesse sujar as águas, matar ou impedir a reprodução da fauna aquática, principalmente

pesqueira.

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Conforme a autora, a influência das ordenações reais vigorou do Brasil Colônia

até o Brasil República, por força de uma lei editada no ano de 1823, até ser revogada pelo art.

1807 do Código Civil de 1916.

Como bem observa Édis Milaré, as citadas leis, ainda que contribuíssem para a

manutenção de certos aspectos do meio ambiente, constituindo-se até numa espécie de

zoneamento ecológico-econômico incipiente, não foram editadas com a preocupação que

permeia a legislação ambiental contemporânea, pois “[...] acima dos interesses ambientais

objetivos, havia maior preocupação com a propriedade da nobreza e da Coroa [...].”65

Toda essa legislação, antiga, complexa, esparsa e inadequada, deixava imune (se é que não incentivava) o esbulho do patrimônio natural, despojado do seu caráter de bem comum e tratado ignominiosamente como propriedade privada, gerido e explorado sem escrúpulos, com discricionariedade acima de qualquer legislação coerente, de qualquer interesse maior.

E

arremata:

66

O Brasil Republicano registrou a edição de várias normas atinentes a fatores

ambientais, como o Código Florestal, o Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal e o Código

de Águas, todos do ano de 1934; o Código de Pesca, do ano de 1938; o Código de Minas, do

ano de 1940. Na década de 1960 tem-se a publicação do Estatuto da Terra, do novo Código

Florestal, de Pesca e de Mineração; da Lei de Proteção à Fauna; da Política Nacional de

O Brasil Imperial, conquanto sofresse influência das ordenações reais, teve a

edição do primeiro código criminal, em 1830, que tipificava o corte ilegal de madeira, e a Lei

nº. 601 de 1850, que disciplinava a ocupação do solo, declarando como ilícitos atos como

invasões, desmatamentos e incêndios que, de uma forma ou de outra, degradavam o meio

ambiente.

65 MILARÉ, op.cit., p. 135. 66 Ibidem, p. 136.

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Saneamento Básico, Dec.-Lei nº. 248/67; do Dec.-Lei nº. 303/67, que instituiu o Conselho

Nacional de Controle da Poluição Ambiental.67

Conforme José Afonso da Silva, “esses dois decretos continham as linhas gerais

de uma Política de Meio Ambiente, embora incipiente e insuficiente.”

68

Toshio Mukai e Georgette Nazo consideram que no período de 1960-1970

surgiram “[...] os principais diplomas legais com uma preocupação mais concreta com a

proteção ambiental”, registrando, ainda, a edição do que consideram a primeira obra de cunho

ambiental na doutrina jurídica, de autoria de Osny Duarte Pereira, intitulada “Direito florestal

brasileiro.”

Foram revogados e

substituídos pela Lei nº. 5.318/67, que instituiu a Política Nacional de Saneamento, que

deixou a desejar, pois não aproveitou devidamente os dispositivos dos decretos revogados,

estabelecendo, de certa forma, um retrocesso na proteção ambiental.

A unificação de normas é um procedimento que deve ser aplicado com extrema

cautela, pois não é raro acontecer de serem olvidadas conquistas inseridas num determinado

documento legal, quando este é transposto para um código. Esse é um dos aspectos que

muitos doutrinadores questionam a codificação da legislação ambiental brasileira.

69

De modo geral, a Constituição do Império, de 1824, não fez qualquer

referência à matéria, apenas cuidando da proibição de indústrias contrárias à saúde do

cidadão (artigo 179). A Constituição Republicana, de 1891, atribuía competência

No âmbito constitucional, tem-se como significativo avanço em matéria

ambiental, a Constituição Federal de 1988. As Constituições que a precederam jamais se

preocuparam com a proteção do ambiente de forma específica, tanto que em momento algum

empregaram a expressão meio ambiente ou outra equivalente.

67 Ibidem, p. 139. 68 SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 36. 69 MUKAI, Toshio; NAZO, Georgette Nacanto. O direito ambiental no Brasil: evolução histórica e a relevância do direito internacional do meio ambiente. In: BENJAMIN, Antônio Hermann V.; MILARÉ, Édis (Coord.). Revista de Direito Ambiental, São Paulo, ano 7, n. 28 , p. 71-100, out.-dez. 2002.

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legislativa à União para regulamentar minas e terras (artigo 34).

A Constituição de 1934 dispensou proteção às belezas naturais, ao patrimônio

histórico, artístico e cultural (artigo 10, III e 148); conferiu à União competência em

matéria de riquezas do subsolo, mineração, águas, florestas, caça, pesca e sua exploração

(artigo 5º).

A Carta de 1937 também se preocupou com a proteção dos monumentos

históricos, artísticos e naturais, bem como das paisagens e locais especialmente dotados

pela natureza (artigo 134); incluiu, dentre as matérias de competência da União legislar

sobre minas, águas, florestas, caça, pesca e sua exploração, dentre outros.

A Constituição de 1946, além de manter a defesa do patrimônio histórico,

cultural e paisagístico (artigo 175), conservou como competência da União legislar sobre

normas gerais da defesa da saúde, das riquezas do subsolo, das águas, das florestas, caça e

pesca.

A Carta Política de 1967 conservou a necessidade de proteção do patrimônio

histórico, cultural e paisagístico (artigo 172, parágrafo único); conservando a União as

mesmas atribuições anteriores. A Emenda Constitucional nº. 1, outubro de 1969, cuidou

também da defesa do patrimônio histórico, cultural e paisagístico (artigo 180, parágrafo

único). No tocante às competências, manteve as disposições da Constituição emendada.

As várias Constituições brasileiras, desde 1934, mantiveram a proteção ao

patrimônio histórico, paisagístico e cultural do país, cuidando o legislador em proteger o

meio ambiente de forma incidental, referindo-se isoladamente a alguns de seus elementos

integrantes (florestas, caça, pesca), ou disciplinando matérias a eles indiretamente

relacionadas (mortalidade infantil, saúde, propriedade).

A dimensão conferida ao tema ambiental na Constituição Federal de 1988

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(CRFB) alcança inúmeros dispositivos inseridos ao longo de seu texto nos mais diversos

títulos e capítulos, decorrentes do conteúdo multidisciplinar da matéria, a cujo respeito

bem observa José Afonso da Silva que, embora o núcleo da temática ambiental na CRFB

se concentre no Capítulo VI, do Título VIII, dirigido à Ordem Social, o seu entendimento,

[...] será deficiente se não se levar em conta outros dispositivos que a ela se referem explícita ou implicitamente. De fato [...] a questão ambiental permeia o texto constitucional mediante expressão explícita ao meio ambiente, que se mostra ao pesquisador com maior clareza.. Há, porém, muitos outros dispositivos em que os valores ambientais se apresentam sob o véu de outros objetos da normatividade constitucional.70

Os diversos artigos da CRFB que tratam direta ou indiretamente sobre meio

E, em seguida, esse autor elenca as primeiras referências expressas ao meio

ambiente na Constituição Federal, como sendo as constantes no art. 5º, LXXIII, relativa à

ação popular por ato lesivo ao meio ambiente; o art. 20, II, referente às terras devolutas

indispensáveis à preservação do meio ambiente; os art. 23 e 24, que definem as

competências comum e concorrente das instâncias dos governos para legislar em matéria

ambiental.

Além disso, cita o art. 91, § 1º, III, que inclui como atribuição do Conselho de

Defesa Nacional opinar sobre a exploração de recursos naturais; o art. 129, III, que prevê

como função do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública para

proteção do meio ambiente; o art. 170, VI, que reputa a defesa do meio ambiente como um

dos princípios da ordem econômica; o art. 174, § 3º, que trata da proteção do meio

ambiente em atividades garimpeiras; o art. 186, II, que aborda a função social da

propriedade rural como estando atrelada à preservação do meio ambiente.

70 SILVA, José Afonso da, op. cit., p. 47.

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ambiente contemplam normas de natureza processual, penal, econômica, sanitária,

administrativa, e normas de repartição de competência administrativa. “Este conjunto

diversificado de normas confirma e consagra a transversalidade do Direito Ambiental.” 71

Nesse aspecto, a questão ambiental faz parceria com os desequilíbrios sociais,

econômicos que geram vários tipos de conflito – étnicos, raciais, xenofobia, regimes

O caráter ambiental inovador da Constituição Federal de 1988 não se

concentra, somente, em tais referências explícitas e implícitas, que revelam o aspecto

interdisciplinar da matéria ambiental. Há um capítulo inteiro dedicado a esse tema

(Capítulo VI do Título VIII: Do meio ambiente), onde foram inseridos elementos não

jurídicos emprestados de outras áreas do conhecimento humano, tomando-se o cuidado

para não se restringir apenas a aspectos biológicos ou ecológicos, mas se levando em conta

os fatores humanos e sociais.

Assim, o próximo tópico, nesse contexto meio ambiente-direitos humanos, irá

traduzir uma síntese da inter-relação desses direitos que objetivam uma melhor qualidade de

vida a todos, in totum.

5- Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

A questão ambiental toca diversas áreas das Ciências Humanas, exigindo

abordagens nos campos econômico, religioso, ético e político. Imiscui-se nas relações dos

cidadãos entre si e da sociedade com o Estado, tendo este a incumbência delegada por

aqueles, de normatizar as relações e possibilitar a convivência harmoniosa e sustentável.

Dentro do contexto político, entendido como toda relação social de poder, a crise

ambiental evidencia a dificuldade dos mecanismos políticos de considerar a complexidade dos

problemas sociais.

71 ANTUNES, op. cit., p. 64.

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autoritários, marginalização de uma significativa parcela da sociedade – por causa da

incapacidade do Estado em articular soluções políticas que trabalhem a questão ecológica no

conjunto dos demais problemas da sociedade.72

[...] concepção de Direitos Humanos e Fundamentais emerge da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento e à autodeterminação dos povos, à paz, ao meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado [...] gerando-se, a partir daí [...] uma plêiade de novas demandas e novos direitos, ampliando ainda mais as possibilidades de configurações dos Direitos Humanos e Fundamentais, como [...] os direitos relacionados à questão ecológica.

O surgimento da conscientização ambiental nos diversos segmentos da sociedade

remete a uma questão fundamental em matéria de Direito; pois, além da necessária

implementação da educação ambiental, também se insere o direito de viver assegurado pelo

Estado.

Todavia, esse direito de viver exige condições adequadas, aliadas a um

crescimento e desenvolvimento saudável, que só podem ocorrer em ambientes salubres,

capazes de prover as necessidades básicas da vida dos seres em geral, dentro de um

ecossistema global, equilibrado e sustentável.

Portanto, a vida só se desenvolve adequadamente em sistemas ecológicos que não

apresentem variações quantitativo-qualitativas que a tornem vulnerável, estando o direito a

um ambiente propício para a manutenção dos ciclos vitais na base das reivindicações

ecológicas.

Conseqüências dessas reivindicações surgiram os direitos humanos fundamentais

de terceira geração, que Rogério Gesta Leal analisa como produtos dos processos sociais,

políticos, econômicos, concluindo que a

73

72 TEIXEIRA, Zaneir Gonçalves. Direito e crise ambiental: condições para a efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2002. 189 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2002, p.59. 73 LEAL, op. cit., p. 43-45.

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Pela abordagem recente das questões ambientais no campo da ciência jurídica, Márcia Rodrigues Bertoldi questiona

[...] Inerentemente ao que possa significar o "direito a um meio ambiente adequado e equilibrado ecologicamente" há uma implícita existência de uma forte ligação entre direitos humanos e meio ambiente que nos conduz à pergunta: quando se viola o direito ao meio ambiente, também se violam direitos humanos? Até o presente momento esta indagação não tem uma resposta, apesar da existência de tendências e proposições.74

Ora, se é uma garantia fundamental do cidadão a existência de uma ação constitucional com a finalidade de defesa do meio ambiente, tal fato ocorre em razão de que o direito ao desfrute das condições saudáveis do meio ambiente é, efetivamente, um direito fundamental do ser humano.

Os legisladores brasileiros avançaram significativamente na abordagem das

questões ambientais com a promulgação da Constituição Federal de 1988, elevando o meio

ambiente à categoria jurídica de res communis omnium (bens pertencentes a todos), por

considerá-lo essencial à sadia qualidade de vida, assimilando a tendência mundial dos direitos

de terceira geração, e lastreando a questão ambiental nos direitos fundamentais.

Nesse sentido, Paulo de Bessa Antunes aponta para um aspecto do artigo 5º da

Constituição Federal de 1988, nem sempre percebido, qual seja, o inciso LXXIII, que

estabelece um remédio constitucional a ser aplicado pelo cidadão na ocorrência de atos

lesivos ao meio ambiente, a Ação Popular, e conclui:

75

Outrossim, conforme leciona Robert Alexy, a garantia, a promoção e a efetividade

do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado devem ser implementadas pelo

Estado Democrático de Direito, o que confere a esse direito a sua inserção definitiva no rol

74 BERTOLDI, Márcia Rodrigues. O direito humano a um meio ambiente equilibrado [2000]. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1685> . Acesso em 29 nov. 2005 . 75 ANTUNES, op.cit., p. 20.

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dos direitos fundamentais.76

O art. 81, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor estabeleceu a definição

legal dos direitos difusos nos seguintes termos: “interesses ou direitos difusos, assim

entendidos para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que

sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.”

Entretanto, o meio ambiente ecologicamente equilibrado se reveste de um caráter

difuso, posto que não possa ser classificado como bem público nem como bem privado, não

havendo como identificar seu titular e sendo seu objeto insuscetível de divisão.

77

Uno de los aspectos que más decisivamente contribuyen a caracterizar a la tercera generación de derechos humanos se refiere a la redimensión y ampliación de sus formas de titularidad, poe el reconocimiento de nuevas situaciones y posiciones jurídicas subjetivas. [...] Para cualquier ciudadano del mundo actual, sea cual fuere su nacionalidad, la amenaza de un conflicto atómico le afecta directa e indirectamente. Del mismo modo, que la catástrofe ecológica de Chernobyl no redujo sus nocivas consecuencias para el medio ambiente y la calidad de vida a un país.

Nesse contexto, Antonio E. Pérez Luño assim leciona sobre as gerações dos

direitos fundamentais,

78

76 ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução de Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 1997, p. 451. 77 GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 798. 78 PÉREZ LUÑO, A.E. Las generaciones de derechos fundamentales, en Revista del Centro de Estudios Constitucionales, nº 10, p. 216-217, 1991.

Os direitos difusos decorrem, v.g., de danos ao meio ambiente, dentre outros.

Nesses casos, tais direitos pertencem a todos, seus titulares são indetermináveis e o bem

protegido é indivisível, como a água, o ar, a paisagem histórica, a defesa da flora e fauna.

A proteção ou rejeição de medidas saneadoras aos exemplos acima citados atinge

necessariamente a todos, por isso o meio ambiente – direito difuso por excelência – deve ser

garantido e protegido pelo Estado e pela sociedade.

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Assim, o patrimônio ambiental vem sendo denominado de bem de interesse social,

no qual se inserem tanto os bens pertencentes ao domínio público como os bens de caráter

privado, mas todos subordinados à consecução de um fim comum, previsto e assegurado

constitucionalmente: a manutenção da vida (de forma sadia), o que só pode ser concretizado

por meio de ambientes ecologicamente equilibrados.79

De acordo com Flávio José Moreira Gonçalves, pode-se admitir que haja a

positivação, no ordenamento jurídico pátrio, de direitos fundamentais que não estejam, ainda,

previstos na Constituição Federal (CF). Tal conclusão decorre da interpretação do art. 5º, § 2º,

da Lei Maior: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros

decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em

que a República Federativa do Brasil seja parte.”

80

79 SILVA, José Robson da . O meio ambiente: função social e ambiental. Revista Jurídica da UEPG, Ponta Grossa, vol. 1, ano 1, 1997. Disponível em: <http://www.uepg.br/rj/a1v1at08.htm>. Acesso em 29 set. 2005. 80 GONÇALVES, Flávio José Moreira. Dos direitos humanos aos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 31-43.

Inclusive, vale destacar que a Emenda Constitucional 45, de 2004, altera o 5º da

Carta Magna vigente, inserindo o § 3º, conforme textualiza: “Os tratados e convenções

internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso

Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão

equivalentes às emendas constitucionais.”

Dessa forma, vê-se que os tratados e convenções que preenchem tais requisitos,

passam a ser enquadrados como uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal (CF art. 60

§ 4º, IV), e, a partir daí, incorporam-se aos direitos fundamentais que são amparados pelo

Direito Positivo brasileiro, tendo também aplicação imediata.

Isso representa um reforço à consolidação do meio ambiente ecologicamente

equilibrado como direito humano fundamental no Brasil, posto que, além da previsão

constitucional, o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais em matéria ambiental.

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Na ótica de Paulo Bonavides, os direitos fundamentais de terceira geração, dentre

os quais se insere o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, são direitos dotados

“de altíssimo teor de humanismo e universalidade”, e por isso mesmo, não são

particularizados a esse ou àquele indivíduo, mas a “toda coletividade, embora o indivíduo

possa se valer de mecanismos garantidores desses direitos para salvaguardar as boas e

salutares condições ambientais.”81

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade, tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira são condenadas e devem ser eliminadas.

A necessidade de criar mecanismos de defesa das boas condições de vida, para

enfrentar as ameaças oriundas da aliança entre desenvolvimento científico, tecnológico e

processo de produção de bens, desencadeou a inclusão do direito ao meio ambiente saudável

no rol dos direitos fundamentais, positivados constitucionalmente e assegurados por garantias.

O fenômeno é recente, remontando ao início da década de 1970, quando ficou

estabelecida a Declaração de Estocolmo sobre Meio Ambiente Humano, e que proclamou em

seu Princípio primeiro:

82

81 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7. ed. Malheiros: São Paulo, 1997, p. 523. 82 CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE HUMANO, 1972, Estocolmo. Declaração da Conferência das Organizações das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano. Disponível em: <http://www.unama.br/institucional/proreitorias/pppe/supes/MeioAmbiente/Documentos/Declaração%20Estocolmo.doc>. Acesso em 30 jul. 2005.

Percebe-se aí, a opção por um antropocentrismo que permeou as ações e políticas

ambientais implementadas posteriormente, sendo o meio ambiente pensado em termos de

proteção para assegurar a preservação e a qualidade de vida da espécie humana.

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O reconhecimento de que os problemas ambientais ignoram fronteiras, afetando

todo o bioma planetário, com efeitos deletérios e cumulativos, alterando a biodiversidade,

circulação atmosférica, climas, ciclo hidrológico, levaram a comunidade internacional a exigir

medidas protetivas do meio ambiente, como forma de resguardar o direito fundamental à vida

e à dignidade humana, direitos esses primordiais e, por isso, reconhecidos logo na primeira

geração dos direitos humanos.

Isso traduz o reconhecimento de que o direito fundamental à vida, em seu sentido

lato, inclui a manutenção de uma qualidade de vida que, por sua vez, está intrinsecamente

associada à manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável.

O escopo fundamental que se busca atingir com a manutenção de um meio

ambiente equilibrado ecologicamente é que o homem tenha condições de usufruir concreta e

plenamente de seu inalienável direito à vida em condições dignas, pois o uso insustentável do

patrimônio natural, reconhecidamente esgotável, é gerador das mazelas econômicas e sociais

que a grande maioria da humanidade padece.

De acordo com Erik Assadourian, se os níveis de consumo das pessoas mais

abastadas replicarem-se pela metade dos nove bilhões de pessoas que serão adicionadas ao

planeta até o ano de 2.050, os impactos nos recursos hídricos, na qualidade do ar, nas

florestas, climas, diversidade biológica e saúde humana serão extremamente graves.83

O consumo, em si, não é pernicioso, pois a sobrevivência humana e animal estão

atreladas a isso. A própria Ecologia distingue os seres vivos em consumidores primários,

secundários e terciários.

84

As economias de consumo em massa que geraram um mundo de abundância para

Porém, o consumo ameaça o meio ambiente e o bem-estar das

pessoas, quando se torna um fim em si mesmo.

83 ASSADOURIAN, Erik. et al. O estado do consumo hoje. In WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 3-24. 84 ODUM, Eugene Pleasants. Ecologia. 3. ed. São Paulo: Pioneira, 1977, p.150.

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alguns, enfrentam agora novos desafios no século XXI: tais como redirecionar os padrões de

consumo a patamares sustentáveis e igualitários, assegurar melhor qualidade de vida às

pessoas, e causar menos danos ambientais. Tudo isso com o objetivo de garantir o direito

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à própria vida.

Não se pode olvidar que a vida, direito humano fundamental, e por isso cercada de

garantias constitucionais, correlaciona-se de maneira direta e intensiva com a saúde, o bem-

estar individual e social.

De modo geral, as buscas agressivas de uma sociedade de consumo em massa,

além de afetar os recursos naturais, têm contribuído para o declínio dos indicadores de saúde

humana em muitos países, resultando em “doenças do consumo”, típicas da sociedade

contemporânea, como o tabagismo, a obesidade e o estresse. A saúde “social” igualmente

vem declinando, fruto das desigualdades na distribuição dos recursos numa sociedade

consumista e excludente.85

Segundo Balmford, verificações constantes do declínio ambiental global são

apontadas pelo Índice Planeta Vivo, elaborado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF

Internacional), para aferir o estado de preservação dos ecossistemas naturais. De 1970 a 2000,

o Índice Planeta Vivo registrou um aumento de 35% na degradação ambiental.

Ademais, nesse modelo de sociedade, leis e incentivos econômicos inconseqüentes

e descompromissados com a qualidade de vida estimulam as pessoas a transporem limiares

econômicos, ambientais e sociais sustentáveis, pondo em risco a manutenção dos direitos

humanos fundamentais.

86

85 A saúde “social” se refere aos aumentos da pobreza, suicídio juvenil, carência de seguro saúde e desigualdade de renda, a partir da década de 1970. Faz parte do Índice de Pobreza Humana, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que compila indicadores de pobreza, analfabetismo funcional, longevidade e inclusão social. Cf . ASSADOURIAN, Erik. et al. In: WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 3-24. 86 BALMFORD, Andrew. et al. Razões econômicas para a conservação da natureza. Nova Iorque: PNUMA, 2002, p. 21.

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Ou seja, demonstra-se que, apesar de se enquadrar o direito ao meio ambiente

equilibrado como direito fundamental de terceira geração, direito humano que enfatiza a

solidariedade, a fraternidade, ou, como propõe Manuel Gonçalves Ferreira Filho, um “direito

de situação”87

O desenvolvimento sustentável adota uma perspectiva de longo prazo do processo de desenvolvimento econômico e social que compreende a salvaguarda e o incremento do capital ambiental e social e a redução da iniqüidade. [...] Hoje, porém, ainda resta a questão fundamental: como intensificar a sustentabilidade do desenvolvimento? [...] é imperativo

, ainda se tem muito a fazer no âmbito comportamental, político e econômico

para sair de um paradigma desenvolvimentista degradador e fruir de um desenvolvimentista

sustentável.

Esse mesmo autor destaca que, no rol dos direitos fundamentais de terceira

geração, existe, ao lado do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o direito ao

desenvolvimento. Enquanto o primeiro vem consignado em documentos internacionais como

a Declaração de Estocolmo (1972), a Declaração do Rio (1992), o segundo encontra guarida,

de maneira indireta, na Comissão dos Direitos do Homem (ONU – 1977) e na Declaração

sobre Raça e Preconceitos Raciais (UNESCO – 1978), sendo consagrado na Declaração sobre

o Direito ao Desenvolvimento (ONU – 1986).

A observação que se faz tem por escopo chamar a atenção para a possibilidade de

existirem conflitos entre ambos os direitos fundamentais, considerando que a matriz

desenvolvimentista empregada desde a primeira Revolução Industrial até a Revolução Tecno-

Científica vem demonstrando ser incompatível com a sustentabilidade do meio ambiente e

seus recursos naturais.

Portanto, daí advém a urgência em se modificar os padrões de exploração,

produção e consumo, a fim de atender a manutenção de ambos os direitos, todos fundamentais

à vida humana, conforme assinala Enrique Iglesias:

87 FERREIRA FILHO, op. cit., p. 66-67.

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melhorar a gestão e a direção dos recursos naturais e ambientais. Isso significa diminuir as barreiras à conservação [...] e aumentar a eficiência no uso de recursos essenciais, como água e energia. Igualmente importante é reconhecer que a redução da degradação ambiental protege a saúde humana, torna a terra mais produtiva e melhoram diversos outros elementos do progresso econômico e social.88

Registre-se, ainda, que a veneração ao consumo compulsivo transporta a

humanidade para o limiar de um colapso ambiental, exaurindo recursos, disseminando

poluentes, minando ecossistemas. Isto ameaça, inclusive, o equilíbrio ecológico global com

reflexos deletérios à saúde, à qualidade de vida e à própria manutenção da vida humana.

Como se observa, os avanços tecnológicos propiciaram elevados índices de

produtividade, superiores ao requerido pela demanda, fomentando o consumo e os sistemas de

descarte em massa. A economia altamente produtiva exige que seja feito do consumismo um

meio de vida, acarretando sérios impactos aos ecossistemas de onde provêm a matéria-prima e

para onde se destinam os rejeitos da produção, ou seja, aplica-se, cada vez mais um princípio

muito pouco sustentável e de obsolescência programada.

89

Portanto, é imprescindível desenvolver formas éticas e justas de aliviar o ônus

ambiental associado ao consumo, a fim de proteger os direitos humanos e reduzir as pressões

sobre o meio ambiente, possibilitando resguardar o direito fundamental ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado.

88 IGLESIAS, Enrique. Estado do mundo e consumo sustentável. In: WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Traduçãode Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica , 2004, p. vii. 89 HALWEILL, Brian; NIERENBERG, Danielle. Rumos para uma economia menos consumista. In: WORLDWATCH INSTITUT (Org.). Estado do mundo 2004: estado do consumo e o consumo sustentável. Tradução de Henry Mallett e Célia Mallett. Salvador: Universidade Livre da Mata Atlântica, 2004, p. 120-147.

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6. Conclusão

Todos os seres vivos, de um modo ou de outro, causam transformações no

ambiente em que vivem, mas o homem tem sido capaz de promover alterações em escala e

ritmo crescentes, transformando paisagens, esgotando recursos naturais, extinguindo espécies

da flora e da fauna, e colocando em risco a própria existência.

A evolução da humanidade é, também, a evolução das alterações ambientais, da

degradação do solo, da água, do ar, da deterioração da qualidade de vida do próprio ser

humano, artífice e vítima de um desenvolvimento insustentável.

Os impactos ambientais promovidos pela ação humana tornaram-se desenfreados e

assustadores a partir da primeira revolução industrial. Foi então que, percebendo as ações

deletérias à própria sobrevivência, o homo sapiens sapiens despertou para atuações mais

condizentes com a conservação de recursos minerais e da biodiversidade. Ainda que ocorram

pontualmente, esses impactos apresentam conseqüências que nem sempre se restringem às

fronteiras territoriais dos Estados que os promovem. Muitas vezes extrapolam limites

geográficos e causam prejuízos a toda a coletividade.

Por conta disso, os Estados se preocuparam em estabelecer acordos para a

promoção de um desenvolvimento sustentável, inclusive a legislação interna dos países que

integram a Organização das Nações Unidas foi sendo elaborada para adequar-se às diretrizes

dos tratados internacionais.

Se o histórico da degradação ambiental remonta ao surgimento do homem na

Terra, se a intensificação desses impactos ocorre, principalmente, a partir de 1750, foi

somente a contar de 1972 que a conservação do meio ambiente consolidou posição na agenda

internacional, sendo reconhecido o direito humano fundamental ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado.

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A inserção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado no rol dos

direitos humanos fundamentais remonta à evolução histórica dos direitos humanos, em seus

primórdios, desde o Código de Hamurábi (séc. XVII a.C.). Colheu posteriormente subsídios

em doutrinas filosófico-religiosas, com especial destaque para o cristianismo, cuja mensagem

de igualdade a todos os homens, independentemente de origem, raça, sexo ou credo,

influenciou diretamente o nascimento dos direitos do homem, enquanto necessários à

dignidade da pessoa humana.

A consolidação dos direitos humanos, numa primeira fase, se dá com a Declaração

dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789. É a primeira geração de direitos humanos,

assegurando as liberdades individuais. Numa segunda fase, resguardam-se os direitos que

migram da esfera do indivíduo para a esfera de categorias sociais, econômicas e culturais,

caracterizando uma geração de direitos humanos coletivizados e passando a exigir uma

obrigação de fazer, por parte do Estado.

Por fim, numa terceira fase, os direitos humanos extrapolaram os limites do

indivíduo e de grupos sociais mais restritos para se tornarem cada vez mais abrangentes,

tornaram-se metaindividuais, envolvem a humanidade com os direitos de solidariedade ou

fraternidade, e por se destinarem a todos, indistintamente, também ficaram conhecidos como

direitos difusos.

Os direitos humanos têm na Declaração Universal dos Direitos Humanos, do ano

de 1948, o seu respaldo internacional, pois estabeleceu parâmetros para toda a legislação

subseqüente, quer em nível interno dos Estados, quer em nível internacional, sendo

complementada, posteriormente, pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e

pelo Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966.

Por sua vez, o direito a um meio ambiente saudável, equilibrado ecologicamente e

sustentável, passou a figurar no rol dos direitos humanos de terceira geração – direitos difusos

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– a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo,

1972), e adquiriu o status de “fundamental”, justamente, por ser imprescindível à manutenção

da vida das gerações presentes e futuras.

Esse direito constitui uma das facetas dos “novos direitos”, que extrapolam a

dimensão individual e a dimensão restrita a grupos sociais específicos para se elevar acima de

tudo e proteger a todos, indistintamente, enfatizando a condição humana de pertencer a uma

única e mesma espécie, que deve ser solidária entre si. Portanto, os novos direitos humanos

exigem uma adequação jurídico-conceitual para serem interpretados, compreendidos e

aplicados.

Nesse sentido, os embates conceituais sobre o meio ambiente, no intuito de

enquadrá-lo no contexto dos direitos de terceira geração, ocorrem sobre a ótica de dois pontos

de vista: a visão antropocêntrica e a visão ecocêntrica. Apesar de ambas colimarem o mesmo

objetivo – meio ambiente ecologicamente equilibrado – seus enfoques partem de pressupostos

distintos.

Observa-se que, por um lado, o antropocentrismo considera necessário preservar

os recursos naturais e a biodiversidade para assegurar uma boa qualidade de vida nos

ambientes urbanos e seus entornos, a fim de garantir a sobrevivência da espécie humana e

suas gerações. Vale acentuar que, na visão antropocêntrica do meio ambiente, o homem é a

medida de tudo.

Por outro lado, o ecocentrismo parte da premissa que o meio ambiente deve ser

preservado por conta do valor intrínseco dos elementos bióticos e abióticos da natureza,

independentemente do seu valor de uso para a espécie humana.

A concepção ambiental antropocêntrica continua predominante nos dias atuais,

pois os tratados internacionais deixam isso evidenciado em seus textos, dentre eles os

decorrentes da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocolmo,

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1972) e a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio de

Janeiro, 1992). Isto é, os principais documentos internacionais que balizam o direito humano

fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado apresentam uma visão de mundo

centrada na espécie humana.

A espécie humana é a única que gera e acumula conhecimentos, transmitindo

legados para as gerações subseqüentes, que os aperfeiçoam num processo evolutivo constante.

O que não significa dizer que os legados sejam sempre positivos. Basta lembrar as sucessivas

catástrofes ambientais ocorridas no globo terrestre, v.g., Chernobyl.

Equivocam-se os que alegam que, pela concepção antropocêntrica, o homem se

mantém externo à natureza. Pelo contrário, permanece no centro com o ambiente, natural ou

artificial à sua volta, de modo que tudo o que trouxer prejuízos ao seu entorno, prejudicá-lo-á

também.

A concepção ecocêntrica peca pelo reducionismo, na medida em que pretende

inserir o homem no ambiente, apenas como mais um elemento da natureza, desconsiderando a

complexidade da própria natureza humana. Em contrapartida, surge a dificuldade enfrentada

pelo antropocentrismo, que deve abordar as questões ambientais através de múltiplos

enfoques dados à complexidade das interações humanas, em todos os aspectos.

Portanto, ergue-se a necessidade de uma possível complementação dessas duas

correntes - a posição antropocêntrica sendo enriquecida por idéias emanadas de uma visão

ecocêntrica sobre a questão do meio ambiente -, tendo como base princípios éticos que sirvam

de fundamentação a uma melhor forma de vida para todas as espécies.

Nessa mesma direção, os próprios direitos humanos fundamentais, como o direito

ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, são produtos de complexos processos sociais,

políticos e econômicos. Por isso a abordagem das questões ambientais precisa ser

multidisciplinar, e o enfoque da ciência jurídica, na elaboração e análise das diretrizes

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normativas, deve buscar apoio nas outras áreas do conhecimento humano, para promover uma

equilibrada adequação entre a conservação do meio ambiente e a promoção de um

desenvolvimento sustentável.

Vale lembrar que, na elaboração das normativas ambientais, somente reconhecer e

afirmar esse status de direito fundamental não foi suficiente. Foi necessário que, partindo

dessa concepção de direito fundamental, se desenvolvessem mecanismos para assegurar o

equilíbrio ecológico do meio ambiente, procurando envolver ao máximo todos os segmentos

da sociedade.

Isso refletiu nas legislações constitucionais e infraconstitucionais dos países

componentes da ONU que passaram a aperfeiçoar seu ordenamento jurídico para adequá-los

às exigências da sociedade contemporânea, cada vez mais consciente e presente nas

reivindicações e defesa de seus direitos fundamentais, dentre os quais o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado.

O aprimoramento da consciência ambiental, refletida nas legislações em vigor, e

nas normas em desenvolvimento, traduz uma continuidade no processo de evolução dos

direitos humanos fundamentais, processo esse deflagrado, principalmente, com a Revolução

Francesa de 1789, que teve como base os três princípios axiológicos fundamentais dos

direitos humanos: liberdade, igualdade, fraternidade ou solidariedade.

Nessa mesma linha de atuação, o Brasil não permaneceu à margem desse processo,

e a evolução normativa ambiental foi profícua a partir da década de 1970, ainda que careça de

sistematização. Aprimorou-se a legislação específica, sendo a Constituição Federal de 1988

um marco divisório nesse contexto, recepcionando ou endossando boa parte da legislação

ambiental pretérita e balizando as subseqüentes.

Assim, vê-se o resultado epistemológico dessa imbricação meio ambiente-direitos

humanos, na proteção preconizada por normativas internacionais e nacionais, ao determinar

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mudanças que objetivam preservar a natureza. Inclusive, a Lei Maior (art. 225 da CF/88)

respalda o meio ambiente ecologicamente equilibrado - direito humano e fundamental de 3ª

geração - que tem engendrado no seu bojo o respeito à vida e à dignidade da pessoa humana.

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