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GRADUAÇÃO 2020.2 AUTOR: JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTO PESQUISADORES: LUCAS DANIEL GERMANO DA SILVA; JULIA REZENDE LOUREIRO, MARIA JULIA PIRES E MARCELA FERNANDES REIS (PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2020.2); BERNARDO SARMET (PARTICIPOU E CONTRIBUIU COM REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2019.2). ANA CLARA JANSEN; E LEONARDO GHIARONI (PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2018.2). ARNALDO VIEIRA FERREIRA; DANIELA GUEIROS DIAS; E PEDRO ARMANDO CASTELAR PINHEIRO (PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM A REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DAS VERSÕES DE 2014.1 E 2015.1 DESTA APOSTILA). DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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GRADUAÇÃO2020.2

AUTOR: JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTOPESQUISADORES: LUCAS DANIEL GERMANO DA SILVA; JULIA REZENDE LOUREIRO, MARIA JULIA PIRES E MARCELA FERNANDES REIS

(PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2020.2);BERNARDO SARMET (PARTICIPOU E CONTRIBUIU COM REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2019.2).

ANA CLARA JANSEN; E LEONARDO GHIARONI (PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM REVISÃO,COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DA VERSÃO DE 2018.2).

ARNALDO VIEIRA FERREIRA; DANIELA GUEIROS DIAS; E PEDRO ARMANDO CASTELAR PINHEIRO(PARTICIPARAM E CONTRIBUÍRAM COM A REVISÃO, COMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO DAS VERSÕES DE 2014.1 E 2015.1 DESTA APOSTILA).

DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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SumárioDireito Societário Avançado

DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO ...............................................................................................................................3

1. SOCIEDADES LIMITADAS ......................................................................................................................................6

2. SOCIEDADES ANÔNIMAS ....................................................................................................................................29

3. COMPARAÇÃO E ANÁLISE DAS DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS (SOCIEDADES LIMITADAS VS. SOCIEDADES ANÔNIMAS) ...................64

4. SOCIEDADES EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO ..............................................................................................................74

5. TÓPICOS ESPECIAIS EM DIREITO SOCIETÁRIO ...........................................................................................................82

5.1. VALORES MOBILIÁRIOS MODERNOS ....................................................................................................................83

5.2. A COMPANHIA E OS SÓCIOS: ASSEMBLEIAS GERAIS E ESPECIAIS ..................................................................................98

5.3. DEVERES E GARANTIAS DOS ADMINISTRADORES ..................................................................................................103

5.4. CONFLITO DE INTERESSES E NULIDADES ASSEMBLEARES ........................................................................................108

5.5. O DIREITO DE RETIRADA ................................................................................................................................117

6. REORGANIZAÇÕES SOCIETÁRIAS (INCORPORAÇÕES; INCORPORAÇÃO DE AÇÕES; FUSÕES, CISÕES E TRANSFORMAÇÕES) .................128

7. OPERAÇÕES DE M&A (I.E., COMPRA E VENDA DE AÇÕES; OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO DE EMPRESAS; OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO DE ATIVOS; CAPTAÇÕES DE RECURSOS COM INGRESSO DE SÓCIOS (PRIVATE AND PUBLIC PLACEMENTS); JOINT VENTURES). DILIGÊNCIA LEGAL E QUESTÕES CONEXAS ÀS OPERAÇÕES DE M&A ...................................................................145

8. FINANCIAMENTO DE PROJETOS. OPERAÇÕES ESTRUTURADAS .....................................................................................181

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3FGV DIREITO RIO

DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

PROFESSOR

João Pedro Barroso do Nascimento

EMENTA

Sociedades Limitadas. Sociedades Anônimas. Análise Comparativa entre as Sociedades Limitadas e as Sociedades Anônimas. Sociedades em Conta de Participação. Tópicos Especiais em Direito Societário. Valores Mobiliários Modernos. As Novas Tecnologias Aplicadas às Assembleias Gerais de Acionistas. Deveres e Garantias dos Administradores. O Conflito de Interesses e as Nulidades Assembleares. Direito de Recesso. Operações de M&A (i.e., Compra e Venda de Ações. Operações de Aquisição e Alienação de Empresas. Operações de Aquisição e Alienação de Ativos. Captações de Recursos com Ingresso de Sócios (Private and Public Placements). Joint Ventures). Diligência Legal e Questões Conexas às Operações de M&A. Financiamento de Projetos (Project Finance). Operações Estruturadas.

OBJETIVOS

Em abordagem interdisciplinar, esta eletiva visa a: (i) aprofundar o entendimento dos alunos em relação a temas discutidos nas disciplinas obrigatórias “TGE - Teoria Geral da Empresa”, “OJPE - Organização Jurídica da Pequena Empresa”, “OJGE -Organização Jurídica da Grande Empresa” e “Regulação do Mercado de Capitais”; (ii) proporcionar aos alunos aprendizado de diversos institutos relacionais ao Direito Societário, com especial enfoque à aplicação prática destes institutos; (iii) provocar o interesse dos alunos para questões jurídicas atinentes ao ambiente empresarial e à dinâmica econômica; e (iv) desenvolver as habilidades dos alunos para identificar e compreender a dinâmica evolutiva do Direito no mundo dos negócios.

METODOLOGIA

Suporte teórico, através do estudo de material didático (sugestão de livros, artigos, pareceres, comentários à legislação, dentre outros). Suporte prático, através do estudo de casos concretos (selecionados de acordo com diversas operações societárias). Incentivo ao envolvimento e participação dos alunos, em método socrático.

Aplicação prática de conceitos teóricos.

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PROGRAMA

1. Sociedades Limitadas;

2. Sociedades Anônimas;

3. Comparação e Análise das Diferenças e Semelhanças (Sociedades Limitadas vs. Sociedades Anônimas);

4. Sociedade em Conta de Participação;

5. Tópicos Especiais em Direito Societário;

5.1. Valores Mobiliários Modernos (Espécies Tradicionais e Estudo de Casos Concretos => “Boi Gordo”; “Avestruz”; “CCB”; “Condo-Hotél”; e “Criptomoedas”)

5.2. Assembleias Gerais (Extraordinárias e Ordinárias) e Especiais (Estudo de Casos Concretos e Discussão sobre Aplicação de Novas Tecnologias);

5.3. Deveres e Responsabilidade dos Administradores (Estudo de Casos Concretos)

5.4. Conflito de Interesses e Nulidades Assembleares (vícios do voto; vícios da deliberação; e vícios da assembleia) (Estudo de Casos Concretos); e

5.5. Direito de Recesso.

6. Reorganizações Societárias (incorporações; incorporação de ações; fusões, cisões e transformações);

7. Operações de M&A (i.e., compra e venda de ações; operações de aquisição e alienação de empresas; operações de aquisição e alienação de ativos; captações de recursos com ingresso de sócios (private and public placements); joint ventures). Diligência Legal e Questões Conexas às Operações de M&A;

8. Financiamento de Projetos (Project Finance). Operações Estruturadas

MÉTODOS DE AVALIAÇÃO

Serão realizadas 02 (duas) provas, em sala de aula, compreendendo toda a matéria ministrada até a data de cada prova.

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A média aritmética referente à disciplina será obtida com base em tais avaliações. O aluno que obtiver média aritmética inferior a 7 (sete) deverá realizar uma terceira prova, a qual compreenderá toda a matéria do semestre.

ATIVIDADES COMPLEMENTARES

Poderão ser propostas atividades adicionais que valerão pontos para a média aritmética (obtida com base nas duas primeiras provas) referente à disciplina.

WORKSHOPS

Haverá, ao menos, um workshop em que os alunos lidarão em sala de aula com situação concreta do Direito Societário.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

EIZIRIK, Nelson. A Lei das S A Comentada. Volumes I a IV. Quartier Latin, 2015.

LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (coord.). Direito Das Companhias. 2a ed., atual. e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Medidas Defensivas à Tomada de Controle de Companhias. 2ª Edição. Revista, Ampliada e Atualizada. São Paulo: Quartier Latin, 2019.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

EIZIRIK, Nelson. A Lei das S A Comentada. Volumes I a IV. Quartier Latin, 2015.

Será recomendada oportunamente (conforme evolução das aulas).

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1. SOCIEDADES LIMITADAS

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

CAMPINHO, Sérgio. Curso de Direito Comercial: Direito de Empresa – 16ª. Ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019, pp. 125-254.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. CUNHA, Amir Achcar Bocayuva. Apontamentos sobre as Deliberações dos Sócios em Sociedades Limitadas. In. ADAMEK, Marcelo Vieira Von. Temas de Direito Societário e Empresarial Contemporâneos. Liber Amicorum. Prof. Dr. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 51-83.

Leitura Complementar

ASCARELLI, Tullio. A Origem do direito comercial. In Revista de Direito Mercantil, nº 103, pp. 87-100.

NOVAES FRANÇA, Erasmo Valladão e VON ADAMEK, Marcelo. Affectio Societatis: Um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. In. Direito Societário Contemporâneo I, São Paulo: ed. Quartier Latin, 2009, pp . 131-147.

B) ROTEIRO DE AULA

1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

A Lei nº 10.406/2002 (“Código Civil” ou “CC”) modificou substancialmente o regime jurídico aplicável às sociedades limitadas, introduzindo um ordenamento complexo, que revogou tacitamente o Decreto nº 3.708/1919 e promoveu o “engessamento” das regras destinadas às sociedades limitadas, que antes privilegiavam a simplicidade, a flexibilidade e a autonomia privada dos sócios.

As sociedades limitadas que, no ordenamento jurídico brasileiro, haviam sido primordialmente concebidas para organizar empreendimentos de pequeno e médio porte, valendo-se da limitação de responsabilidade; e, ao mesmo tempo, de mecanismos jurídicos menos dispendiosos e mais simples

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do que aqueles aplicáveis às companhias, passaram, com o advento do Código Civil, a se submeter a legislação significativamente modificada e complexa e, até certo ponto, confusa.

Atualmente, as Sociedades Limitadas são disciplinadas pelas disposições contidas nos arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil. Contudo, vale ressaltar que o art. 1.053 dispõe que, sendo o capítulo da sociedade limitada omisso, aplicar-se-ão as normas referentes às sociedades simples (arts. 997 a 1.038), podendo, entretanto, o contrato social “prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima.” Já o art. 18 do antigo Decreto 3.708/19191 impunha, diretamente, a aplicação supletiva das normas relativas às sociedades anônimas.

A despeito das muitas críticas que podem ser feitas ao regime jurídico aplicável às sociedades limitadas, estas possuem grande importância e representam o tipo societário mais usual na organização dos empreendimentos realizados por meio de sociedades no Brasil.

Examinaremos, resumidamente, algumas das principais características da sociedade limitada.

2. CARACTERÍSTICA FUNDAMENTAL

A principal característica das sociedades limitadas diz respeito à limitação da responsabilidade dos sócios. De acordo com o art. 1.052, do Código Civil, “a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social”.

A fim de uma melhor compreensão da referida responsabilidade, é relevante destacar a diferença entre capital social subscrito e capital social integralizado. O primeiro representa o montante que o sócio se comprometeu a integralizar, para a formação do capital da sociedade, enquanto o segundo significa o efetivo cumprimento da obrigação subscrita, caracterizado pelo aporte de bem ou dinheiro no capital social.

Recorrendo à Seção dos Direitos e Obrigações dos Sócios, constante das normas que disciplinam a sociedade simples, observamos, pelo disposto no art. 1.004, que “os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social.” Dessa maneira, conclui-se que, integralizado este valor, ou seja, uma vez cumprida a obrigação contida no contrato social, nada mais se deve à sociedade.

1 BRASIL, Decreto nº 3.078, de 10 de janeiro de 1919, Art. 18. “Serão observadas quanto às sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, no que não for regulado no estatuto social, e na parte applicavel, as disposições da lei das sociedades anonymas.” Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d3708.htm>. Acesso em: 09.06.2020.

1 BRASIL, Decreto nº 3.078, de 10 de janeiro de 1919, Art. 18. “Serão observadas quanto às sociedades por quotas, de responsabilidade limitada, no que não for regulado no estatuto social, e na parte applicavel, as disposições da lei das sociedades anonymas.” Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivi l_03/decreto/antigos/d3708.htm>. Acesso em: 09.06.2020.

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Contudo, todos os sócios são solidariamente responsáveis pela integralização do capital social, uma vez que este consiste, de maneira geral, na garantia mínima dos credores perante a sociedade empresária.

Nesse contexto, surge a figura do sócio remisso, que é aquele que não integraliza o valor das quotas por ele subscritas. Neste caso, de acordo com o art. 1.058, do Código Civil, os sócios poderão tomar as quotas do sócio remisso para si ou transferi-las a terceiro, “excluindo o primitivo titular [sócio remisso] e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas.”

Totalmente integralizado o capital social subscrito, os sócios não mais serão responsáveis pelas obrigações da sociedade, ficando elas restritas apenas ao capital social. Eventual e excepcionalmente, em caso de abuso da personalidade jurídica ou desvio de sua finalidade, poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica da sociedade para atingir diretamente o patrimônio dos sócios (art. 50 do Código Civil).

3. NATUREZA JURÍDICA A sociedade limitada possui natureza contratual, constituindo-se por meio

de um contrato social escrito, que se estabelece por instrumento público ou particular, com dois ou mais sócios, pessoas físicas ou jurídicas2. Os sócios da sociedade limitada estão imbuídos no desempenho proficiente do objeto social visando a obtenção e partilha do lucro social.

A referida sociedade assenta seu ato de criação no contrato social, não tendo, pois, feição institucional, como as sociedades por ações.

Além da natureza contratual, a sociedade limitada também possui natureza intuitu personae, uma vez que o Código Civil de 2002 incorporou a ela princípios típicos das sociedades intuitu personae, tais como a alteração do contrato social nas hipóteses de exclusão, retirada e ingresso de novo sócio, solidariedade entre os sócios pela integralização do capital e a dissolução parcial da sociedade face à ruptura da affectio societatis3.

4. “SOCIEDADE” UNIPESSOAL

Anteriormente à promulgação da Lei nº 13.874/2019 (“Lei da Liberdade Econômica”), a regra para que uma sociedade fosse formada era ser formada por, no mínimo, 2 (duas) pessoas, consoante se extrai do art. 981, do Código Civil – o qual subordina a existência de uma sociedade à vontade dos sócios4.

2 Questão disciplinada pelo art. 1.054 do CC c/c art. 997.3 Para maior aprofundamento no tema, ver: NOVAES FRANÇA, Erasmo Valladão e VON ADAMEK, Marcelo. Affectio Societatis: Um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. In. Direito Societário Contemporâneo I, São Paulo: ed. Quartier Latin, 2009, pp. 131-147.4 Código Civil. Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

2 Questão disciplinada pelo art. 1.054 do CC c/c art. 997.

3 Para maior aprofundamento no tema, ver: NOVAES FRANÇA, Erasmo Valladão e VON ADAMEK, Marcelo. Affectio Societatis: Um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. In. Direito Societário Contemporâneo I, São Paulo: ed. Quartier Latin, 2009, pp. 131-147.

4 Código Civil. Art. 981. Celebram con-trato de sociedade as pessoas que re-ciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

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Assim, para que uma sociedade se constituísse como tal, necessário era a pluralidade de sócios. Significa dizer que não existia sociedade constituída de uma pessoa só, salvo disposições excepcionais previstas em lei e no caso da chamada Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI).

No campo normativo, conforme fixa o art. 1.033, do Código Civil, extrai-se que a sociedade empresária é dissolvida quando da falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias – prazo este contabilizado a partir da constatação da unipessoalidade. O referido mandamento legal expressa, portanto, que, passado o prazo acima e não sendo restabelecida a pluralidade de sócios na sociedade, esta será dissolvida, tendo em vista a ruptura da affectio societatis5.

Diante disso, antes da Lei da Liberdade Econômica, tinha-se cenário em que, na falta de um instituto, dentro do ordenamento jurídico brasileiro, que limitasse a responsabilidade como forma de atenuar os riscos inerentes da atividade empresarial, parcela das sociedades limitadas eram constituídas como forma de limitar a responsabilidade do empresário. Eram os casos de “sociedades faz de conta”, uma vez que se tinha verdadeiros empresários individuais com a roupagem de sociedade – são aquelas em que encontramos “sócios de palha”.

Comumente, em tais situações, o sócio chamado para integrar o quadro societário assumia participação irrisória, apenas com a finalidade de atentar ao requisito formal da pluralidade. Em estudo realizado pela FGV Direito SP ainda em 2014, constatou-se, ainda naquela época, que 85,7% das sociedades limitadas eram formadas por 2 (dois) sócios. Ainda com base no estudo, constatou-se que, com base no critério dos 75% de participação no capital social concentrado em um único sócio, 46,8% das sociedades limitadas possuem um sócio controlador, diante de 53,20% que não possuem tal figura. Cite-se que, dentre os 46,8% de sociedades limitadas com um sócio controlador, pode-se dividir tais informações em dois grupos: (i) o sócio controlador possui 99% ou mais de participação; (ii) o sócio controlador possui entre 75% e 98,99% de participação no capital social6.

Com a Lei nº 13.874/2019, no entanto, revogou-se o parágrafo único do art. 1.052 do Código Civil, que previa que a sociedade limitada poderia ser constituída por uma ou mais pessoas. Com a modificação, em 2019, fixou-se que a sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas (art. 1.052, § 1º, CC). Com efeito, em relação às sociedades limitadas, a ausência de pluralidade de sócios não mais será causa de dissolução da sociedade, porquanto tenha sido criada a “Sociedade Limitada Unipessoal”, e, consequentemente, situações como as descritas anteriormente – “sócios de palha” – não serão mais comuns, já que a responsabilidade limitada está garantida para o sócio único.

5 “A noção de affectio societatis e a sua previsão como elemento constitutivo e característico do contrato de sociedade são, praticamente, ignoradas nos sistemas jurídicos mais modernos. Desconsideradas as invocações meramente secundárias e sem qualquer conteúdo instrumental, o conceito de affectio societatis é desprezado pelas obras de direito societário mais conhecidas da Itália, Espanha ou Portugal. É completamente abandonada na Alemanha e na Suíça, onde, evidentemente, as sociedades são conhecidas e, à evidência, não deixam de existir – fato que por si só revela que a affectio societatis não é e não pode ser elemento constitutivo ou característico do contrato de sociedade – e onde, pelo contrário, se adota o conceito mais preciso de “fim comum” (Gemeinsamer Zweck), adiante mencionado. É tão-somente no direito francês que ainda se encontram maiores referências ao instituto, por força da jurisprudência, mas mesmo lá os autores salientam a sua ambiguidade, propugnando por uma teoria objetiva. Ademais, o conceito lá é empregado, com mais frequência, para distinguir a sociedade de outras figuras (tarefa para a qual a affectio societatis também não dá uma resposta definitiva, como o reconhecem os doutrinadores franceses), e não com a abrangência e amplitude de autêntica panaceia com que amiúde desponta em julgados de nossos tribunais. Ainda assim, no direito brasileiro, a noção de affectio societatis continua a ecoar na doutrina, que ora lhe reconhece o atributo de elemento constitutivo do contrato de sociedade, distinto do consentimento exigido para a celebração de qualquer contrato; ora a ela faz referência para diferenciar a sociedade de outros institutos; ora a ela se refere como elemento definidor da extensão dos deveres dos sócios e dado legitimador da transposição de soluções das sociedades de pessoas para as sociedades ditas de capitais. O quadro torna-se ainda mais nefasto quando se constata que a noção de affectio societatis é manejada pelos tribunais, sem qualquer sistematicidade e carregada de um incompreensível empirismo, para justificar soluções as mais díspares possíveis entre si, notadamente em matéria de dissolução parcial de sociedade lato sensu (retirada, exclusão e dissolução parcial em sentido estrito), com total alheamento de outros temas fundamentais envolvidos na questão, como os de juízo de proporcionalidade e de análise de imputação de responsabilidade pela quebra de eventuais deveres de sócio.” (NOVAES FRANÇA, Erasmo Valladão e VON ADAMEK, Marcelo. Affectio societatis: Um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. In. Direito Societário Contemporâneo I, São Paulo: ed. Quartier Latin, 2009, pp. 136-137)6 MATTOS FILHO, Ary Oswaldo; e Outros. Radiografia das Sociedades Limitadas. Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos – FGV Direito SP, 2014. Disponível em: <https://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/arquivos/anexos/radiografia_das_ltdas_v5.pdf>. Acesso em: 03.07.2020.

5 “A noção de affectio societatis e a sua previsão como elemento constitutivo e característico do contrato de sociedade são, praticamente, ignoradas nos sistemas jurí-dicos mais modernos. Desconsideradas as invocações meramente secundárias e sem qualquer conteúdo instrumental, o conceito de affectio societatis é desprezado pelas obras de direito societário mais conhecidas da Itália, Espanha ou Portugal. É comple-tamente abandonada na Alemanha e na Suíça, onde, evidentemente, as sociedades são conhecidas e, à evidência, não deixam de existir – fato que por si só revela que a affec-tio societatis não é e não pode ser elemento constitutivo ou característico do contrato de sociedade – e onde, pelo contrário, se adota o conceito mais preciso de “fim comum” (Ge-meinsamer Zweck), adiante mencionado. É tão-somente no direito francês que ainda se encontram maiores referências ao instituto, por força da jurisprudência, mas mesmo lá os autores salientam a sua ambiguidade, propugnando por uma teoria objetiva. Ade-mais, o conceito lá é empregado, com mais frequência, para distinguir a sociedade de outras figuras (tarefa para a qual a affectio societatis também não dá uma resposta definitiva, como o reconhecem os doutrina-dores franceses), e não com a abrangência e amplitude de autêntica panaceia com que amiúde desponta em julgados de nossos tri-bunais. Ainda assim, no direito brasileiro, a noção de affectio societatis continua a ecoar na doutrina, que ora lhe reconhece o atribu-to de elemento constitutivo do contrato de sociedade, distinto do consentimento exigi-do para a celebração de qualquer contrato; ora a ela faz referência para diferenciar a sociedade de outros institutos; ora a ela se refere como elemento definidor da extensão dos deveres dos sócios e dado legitimador da transposição de soluções das sociedades de pessoas para as sociedades ditas de capi-tais. O quadro torna-se ainda mais nefasto quando se constata que a noção de affectio societatis é manejada pelos tribunais, sem qualquer sistematicidade e carregada de um incompreensível empirismo, para justificar soluções as mais díspares possíveis entre si, notadamente em matéria de dissolução parcial de sociedade lato sensu (retirada, exclusão e dissolução parcial em sentido es-trito), com total alheamento de outros temas fundamentais envolvidos na questão, como os de juízo de proporcionalidade e de análise de imputação de responsabilidade pela que-bra de eventuais deveres de sócio.” (NOVAES FRANÇA, Erasmo Valladão e VON ADAMEK, Marcelo. Affectio societatis: Um conceito jurídico superado no moderno direito socie-tário pelo conceito de fim social. In. Direito Societário Contemporâneo I, São Paulo: ed. Quartier Latin, 2009, pp. 136-137)

6 MATTOS FILHO, Ary Oswaldo; e Outros. Radiografia das Sociedades Limitadas. Núcleo de Estudos em Mercados e Investimentos – FGV Direito SP, 2014. Disponível em: <https://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/arquivos/anexos/radiografia_das_ltdas_v5.pdf>. Acesso em: 03.07.2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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No Direito Brasileiro, o requisito da pluralidade de sócios é previsto na legislação para as sociedades em geral. Antes de ser promulgada a Lei da Liberdade Econômica, havia como alternativa à pluralidade de sócios a possibilidade de se instituir uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), criada pela Lei nº 12.441/2011, a qual inseriu o art. 980-A no Código Civil de 2002 ou ser empresário individual, em que pese alguns considerem a EIRELI uma sociedade empresária, e não um empresário individual.

Na Europa, desde 1989, através da XII Diretiva Comunitária dos Estados Europeus admite-se a sociedade unipessoal com responsabilidade limitada com a finalidade de facultar às pessoas empreendedoras uma forma de limitação da sua responsabilidade patrimonial a fim de evitar a constituição de sociedades fictícias, com ‘sócios de favor’, dando azo a situações pouco claras no âmbito empresarial. Tal reconhecimento veio ratificar o que já era admitido em diversos países do velho continente. Na Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Dinamarca, a sociedade unipessoal já estava incluída em seus ordenamentos jurídicos antes da aludida Diretiva.

Com a alteração trazida à tona pela Lei nº 13.874/2019, que retirou do artigo 1.052 do CC a necessidade de pluralidade de sócios na sociedade, entende-se que a tendência, atualmente, é que tal possibilidade irá reduzir a utilização da EIRELI. Isso porque, dentre outros motivos, a EIRELI requer, para ser instituída, o aporte de 100 salários mínimos, o que se traduz em um ônus considerável para o empresário.

5. INTEGRAÇÃO DAS OMISSÕES

Conforme já assinalado, a sociedade limitada é regulamentada pelos arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil. No caso de omissão legislativa no capítulo referente às sociedades limitadas, serão aplicados, de forma supletiva, em regra, os dispositivos relativos às sociedades simples (art. 1.053 do Código Civil), podendo, no entanto, os sócios optarem pela aplicação supletiva das regras referente às sociedades anônimas (art. 1.053, parágrafo único, do Código Civil), prevendo expressamente tal possibilidade no contrato social.

6. FORMAÇÃO DO CAPITAL SOCIAL

Tanto na constituição da sociedade quanto em aumentos de capital posteriores, os subscritores das quotas podem optar por contribuir para a formação do capital da sociedade com dinheiro ou quaisquer bens suscetíveis de avaliação pecuniária.

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Nas sociedades limitadas, não é necessário laudo de avaliação dos bens que vierem a ser utilizados para a formação do capital social (tanto na constituição da sociedade quanto em aumentos de capital posteriores), sendo que todos os sócios respondem solidariamente pela exata estimação dos bens conferidos ao capital social, na forma do artigo 1055, §1º, do Código Civil.

Importante salientar, ainda, que é expressamente vedado, na sociedade limitada, a contribuição que consista em prestação de serviços, conforme dispõe o artigo 1055, §2º, do Código Civil.

7. AUMENTO DO CAPITAL SOCIAL

O art. 1.081 do Código Civil disciplina que “ressalvado o disposto em lei especial, integralizadas as quotas, pode ser o capital aumentado, com a correspondente modificação do contrato.” Deste artigo, conseguimos extrair dois conceitos básicos do aumento do capital: (i) os sócios somente poderão deliberar acerca do aumento do capital social quando este, que é dividido em quotas, estiver totalmente integralizado; e (ii) a elevação do capital social implica, necessariamente, na alteração do contrato social.

O aumento do capital social poderá ser implementado mediante a atribuição de novo valor às quotas já existentes ou através da divisão do novo montante em novas quotas. A divisão em novas quotas é preferível, pois facilita o ingresso de terceiros na sociedade, caso os sócios originários não exerçam o direito de preferência (art. 1.081, §1º, do Código Civil) ou resolvam cedê-lo (art. 1.081, §2º, do Código Civil).

O Código Civil, a fim de evitar uma diluição da participação dos sócios no capital social, assegurou o direito de preferência dos antigos sócios para subscreverem, na proporção de seus quinhões sociais, o referido aumento. Os sócios têm (até trinta dias após a deliberação da elevação do capital social) preferência para participar do aumento, na mesma proporção das quotas de que sejam titulares. Com isso, os sócios poderão optar por ceder a terceiro ou simplesmente não exercer o referido direito de preferência (art. 1.081, §2º, do Código Civil).

Decorrido o prazo de trinta dias referente à preferência e assumida (pelos sócios ou por terceiros) a totalidade do aumento, haverá reunião ou assembleia dos sócios para que seja aprovada a modificação no contrato social (art. 1.081, §3º, do Código Civil). A deliberação dos sócios, acerca da modificação no contrato social, será tomada pelos votos correspondentes, no mínimo, a três quartos do capital social (art. 1.076, I, do Código Civil).

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8. REDUÇÃO DO CAPITAL SOCIAL

O capital social pode ser reduzido quando: (i) depois de totalmente integralizado, ocorrerem perdas irreparáveis; ou (ii) quando se tornar excessivo em relação ao objeto da sociedade (art. 1.082 do Código Civil). Em ambos os casos, deverá haver a respectiva alteração no contrato social.

A redução do capital social, em razão de perdas irreparáveis, será realizada com a diminuição proporcional do valor das quotas, tornando-se efetiva a partir da averbação da ata da assembleia que tiver aprovado a redução no Registro Público de Empresas Mercantis (art. 1.083 do Código Civil).

Por sua vez, a redução do capital social, quando pelos sócios julgado excessivo em relação ao objeto social da sociedade, será feita mediante restituição de parte do valor das quotas aos sócios ou dispensando-os das prestações acaso devidas. Em ambos os casos, haverá a redução proporcional do valor nominal das quotas.

A redução do capital social, em razão do seu valor excessivo, não poderá ser feita em prejuízo do direito de terceiros (art. 1.084 do Código Civil). Desse modo, a redução do capital somente tornar-se-á eficaz se, no prazo de 90 dias contados da data da publicação da ata da assembleia ou reunião que aprovar a redução, não for impugnada ou se provado o pagamento da dívida ou o depósito judicial do respectivo valor. Durante o referido prazo, o credor quirografário, por título líquido anterior à data da publicação da mencionada ata, poderá opor-se ao deliberado. Uma vez satisfeitas essas condições, proceder-se-á à averbação da ata no Registro de Empresas Mercantis.

9. QUOTAS

Na sociedade limitada, as quotas são frações ideais do capital social. A quota subscrita corresponde ao montante mínimo com o qual cada sócio contribui – no caso de a quota ser integralizada à vista – ou se obrigou a contribuir – no caso de a quota ser integralizada a prazo – para a formação do capital.

Os sócios, ao integralizarem a sua quota de capital social, seja em dinheiro, seja em bens, realizam a transferência da respectiva propriedade, que passa a integrar o patrimônio da pessoa jurídica, salvo disposição expressa em contrário.

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9.1. Indivisibilidade da Quota

Cada sócio pode possuir uma ou mais quotas. Nada impede, entretanto, que uma única quota pertença, em condomínio, a mais de uma pessoa. Todavia, perante a sociedade, a quota é indivisível (art. 1.056 do CC). No caso de condomínio de quota, os direitos a ela inerentes somente podem ser exercidos pelo condômino representante ou pelo inventariante do espólio de sócio falecido (art. 1056 § 1º, do CC).

Além disso, sem prejuízo do disposto no art. 1.052, os condôminos de quota indivisa respondem solidariamente pelas prestações necessárias à sua integralização (art. 1056, §2o, do CC).

9.2. Quota Preferencial

Desde o início da vigência do Código Civil de 2002, há intensa discussão sobre a admissibilidade das quotas preferenciais em sociedades limitadas no Brasil.

Antes da edição do Código Civil de 2002, a doutrina amplamente majoritária7 admitia a legalidade das quotas preferenciais, as quais se caracterizam por apresentar direitos adicionais, de natureza econômica (como, por exemplo, preferências ou vantagens na distribuição dos lucros ou na hipótese de liquidação da sociedade), ou, eventualmente, de natureza política (eleição, em votação em separado, de um determinado número de administradores ou membros de um órgão gerencial ou fiscalizador previsto no contrato social, dentre outras possíveis prerrogativas), muitas vezes em contrapartida à privação do direito de voto com relação a todas ou algumas deliberações sociais. Assim, em face da inexistência de norma expressa vedando tal prática, facultava-se aos sócios atribuir os direitos políticos e patrimoniais entre si da forma como preferissem, desde que devidamente refletido no respectivo contrato social, de forma a se evitar eventuais abusos ou discricionariedades da maioria social.

O Código Civil de 2002 não inovou a esse respeito, mantendo o silêncio legislativo acerca da admissibilidade ou não das quotas preferenciais no direito brasileiro. Era de se esperar, portanto, que o entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do tema se mantivesse intocado. No entanto, surgiram algumas posições doutrinárias sustentando que, a partir da edição do novo diploma, não seriam admitidas quotas sem direito de voto.

7 Dentre outros, assim se posicionavam Egberto Lacerda Teixeira (Das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, cit, pp. 153-154), Fran Martins (Sociedades por quotas no direito estrangeiro e brasileiro, cit., pp. 636-637), José Alexandre Tavares Guerreiro (“Sociedade por quotas – Quotas preferenciais” In Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, vol. 94. São Paulo: Revista dos Tribunais, abril-junho 1994, pp. 28-34), Osmar Brina Corrêa Lima (“Cotas preferenciais na sociedade por cotas de responsabilidade limitada” In Revista dos Tribunais, vol. 664. São Paulo: Revista dos Tribunais, fevereiro 1991, pp. 34-36) e Viviane Muller Prado (“As quotas preferenciais no direito brasileiro” In Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, vol. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, maio-agosto 1999, pp. 136-143). Ainda no mesmo sentido, cabe remeter ao Parecer JUCESP n.º 71/78 e ao Parecer JUCESP n.º 137/81, ambos publicados no Diário Oficial do Estado de São Paulo em 20 de agosto de 1981, conforme lembra José Alexandre Tavares Guerreiro (“Sociedade por quotas – Quotas preferenciais”, cit., p. 28).

7 Dentre outros, assim se posiciona-vam Egberto Lacerda Teixeira (Das sociedades por quotas de responsa-bilidade limitada, cit, pp. 153-154), Fran Martins (Sociedades por quotas no direito estrangeiro e brasileiro, cit., pp. 636-637), José Alexandre Tavares Guerreiro (“Sociedade por quotas – Quotas preferenciais” In Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômi-co e Financeiro, vol. 94. São Paulo: Re-vista dos Tribunais, abril-junho 1994, pp. 28-34), Osmar Brina Corrêa Lima (“Cotas preferenciais na sociedade por cotas de responsabilidade limitada” In Revista dos Tribunais, vol. 664. São Paulo: Revista dos Tribunais, fevereiro 1991, pp. 34-36) e Viviane Muller Pra-do (“As quotas preferenciais no direito brasileiro” In Revista de Direito Bancá-rio e do Mercado de Capitais, vol. 5. São Paulo: Revista dos Tribunais, maio--agosto 1999, pp. 136-143). Ainda no mesmo sentido, cabe remeter ao Parecer JUCESP n.º 71/78 e ao Parecer JUCESP n.º 137/81, ambos publicados no Diário Oficial do Estado de São Pau-lo em 20 de agosto de 1981, conforme lembra José Alexandre Tavares Guer-reiro (“Sociedade por quotas – Quotas preferenciais”, cit., p. 28).

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14FGV DIREITO RIO

De acordo com essa corrente, o Código Civil de 2002, reconhecendo o caráter intuitu personae das sociedades limitadas, “ao disciplinar a instalação e deliberação das reuniões ou assembleias gerais de sócios, sempre leva em consideração o ‘capital social’”8, não fazendo menção à expressão “capital votante”.

O Departamento de Registro Empresarial e Integração (DREI) — antigo Departamento Nacional do Registro do Comércio (DNRC), por meio da Instrução Normativa n.º 98/2003, que foi posteriormente atualizada de acordo com a Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014 e pela Instrução Normativa DREI nº 26, de 10 de setembro de 2014, que atualmente institui o “Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada” — pretendeu estabelecer uma vedação às quotas preferenciais no âmbito das sociedades limitadas9.

Ocorre que o argumento, baseado meramente na literalidade da lei, não se sustenta em face de uma interpretação sistemática da disciplina das sociedades limitadas10. Primeiramente, o direito de voto não é um direito essencial do sócio, podendo ser mitigado ou até mesmo eliminado em face de uma contrapartida de outra natureza11, não se tratando de tema de ordem pública12. Acrescente-se, ainda, o fato de que o artigo 1.007 do Código Civil de 200213, ao tratar das sociedades simples, dispõe expressamente que o contrato social pode estipular a distribuição desproporcional dos lucros entre os sócios, o que precisamente caracteriza uma das possíveis modalidades de quotas preferenciais14.

Sendo assim, não vemos qualquer razão para a inadmissibilidade das quotas preferenciais nas sociedades limitadas brasileiras, especialmente se tais quotas preferenciais forem igualmente dotadas de direito de voto.

A existência de quotas preferenciais pode, inclusive, ser conveniente para dar aplicabilidade à distribuição desproporcional de lucros entre os sócios, com base no art. 1.007 do Código Civil, que consagra a regra de participação proporcional nos lucros e nas perdas, “salvo estipulação em contrário”.

Além dos argumentos acima, importante apontar que, atualmente, a partir da Instrução Normativa nº 38/2017, do DREI – e a consequente alteração do referido item comentado anteriormente neste texto –, previu-se, no item 1.4, II, alínea “b”, do Manual de Registro de Sociedades Limitadas, a possibilidade de as sociedades limitadas emitirem quotas preferenciais, estando resolvidas eventuais controvérsias sobre o tema.15

8 Jorge Lobo, Sociedades limitadas, cit., p. 144. No mesmo sentido, Paulo Albert Vieira e Ana Paula de Carvalho Reis, “As sociedades limitadas no novo Código Civil — a limitação do direito de contratar” In Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n.º 127. São Paulo: Malheiros, jul./set. 2002, p. 46. No entanto, parece que Paulo Albert Vieira e Ana Paula de Carvalho Reis pretendem restringir a aplicabilidade de tal suposta vedação às deliberações previstas nos artigos que utilizam expressamente a expressão “capital social”, conforme se infere da leitura do seguinte trecho: “O Novo Código Civil, por outro lado, centrando-se na pessoa do sócio, exigiu expressamente a contribuição de parcelas específicas do capital social para tomada das decisões. Sendo as quotas (preferenciais ou não) necessariamente integrantes deste capital social, entendemos que não há possibilidade, sob o Novo Código, de registro de quotas sem direito a voto. Ainda que admitidas fossem, estas integrariam o capital social da limitada, gozando, portanto, do direito de participar das deliberações sociais previstas nos artigos retrocitados” (p. 46, grifou-se).9 Conforme item 1.2.16.3 do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada – Atualizado de acordo com a Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014, e Instrução Normativa DREI nº 26, de 10 de setembro de 2014.10 Posicionam-se a favor da admissibilidade das quotas preferenciais no regime do Código Civil de 2002, dentre outros, Paulo Penalva Santos [et. al.] (In Arruda Alvim e Thereza Alvim (coords.), Comentários ao Código Civil Brasileiro, vol. 1X. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 322), Arnoldo Wald (Comentários ao novo Código Civil, cit., pp. 358-361), Daniel Moreira do Patrocínio (Sociedade limitada. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2008, pp. 26-27), Adalberto Simão Filho (A nova sociedade limitada. São Paulo: Manole, 2004, pp. 105-ss) e Marcel Gomes Bragança Retto (Sociedades limitadas. São Paulo: Manole, 2007, pp. 58-59).11 Assim, dentre outros, Arnoldo Wald (Comentários ao novo Código Civil, cit., p. 360) e Daniel Moreira do Patrocínio (Sociedade limitada, cit., pp. 26-27).12 Assim, dentre outros, Fran Martins, Sociedades por quotas no direito estrangeiro e brasileiro, cit., pp. 636-637.13 “Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas (...)”.14 Assim também aponta Paulo Penalva Santos [et. al.] (Comentários ao Código Civil Brasileiro, cit., p. 322).15 BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. “1.4 REGENCIA SUPLETIVA DA LEI Nº 6.404/76 (LEI DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS). O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima, conforme art. 1053, parágrafo único do Código Civil. Para fins de registro na Junta Comercial, a regência supletiva: I – poderá ser prevista de forma expressa; ou II – presumir-se-á pela adoção de qualquer instituto próprio das sociedades anônimas, desde que compatível com a natureza da sociedade limitada, tais com: a) Quotas em tesouraria; b) Quotas preferenciais; c) Conselho de Administração; e d) Conselho Fiscal.” Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.

8 Jorge Lobo, Sociedades limitadas, cit., p. 144. No mesmo sentido, Paulo Albert Vieira e Ana Paula de Carvalho Reis, “As sociedades limitadas no novo Código Civil — a limitação do direito de contratar” In Revista de Direito Mer-cantil, Industrial, Econômico e Financei-ro, n.º 127. São Paulo: Malheiros, jul./set. 2002, p. 46. No entanto, parece que Paulo Albert Vieira e Ana Paula de Carvalho Reis pretendem restringir a aplicabilidade de tal suposta vedação às deliberações previstas nos artigos que utilizam expressamente a ex-pressão “capital social”, conforme se infere da leitura do seguinte trecho: “O Novo Código Civil, por outro lado, centrando-se na pessoa do sócio, exigiu expressamente a contribuição de par-celas específicas do capital social para tomada das decisões. Sendo as quotas (preferenciais ou não) necessariamente integrantes deste capital social, enten-demos que não há possibilidade, sob o Novo Código, de registro de quotas sem direito a voto. Ainda que admitidas fos-sem, estas integrariam o capital social da limitada, gozando, portanto, do di-reito de participar das deliberações so-ciais previstas nos artigos retrocitados” (p. 46, grifou-se).

9 Conforme item 1.2.16.3 do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limi-tada – Atualizado de acordo com a Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014, e Instrução Normativa DREI nº 26, de 10 de setembro de 2014..

10 Posicionam-se a favor da admissi-bilidade das quotas preferenciais no regime do Código Civil de 2002, den-tre outros, Paulo Penalva Santos [et. al.] (In Arruda Alvim e Thereza Alvim (coords.), Comentários ao Código Civil Brasileiro, vol. 1X. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 322), Arnoldo Wald (Comentários ao novo Código Civil, cit., pp. 358-361), Daniel Moreira do Patrocínio (Sociedade limitada. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2008, pp. 26-27), Adalberto Simão Filho (A nova sociedade limitada. São Paulo: Mano-le, 2004, pp. 105-ss) e Marcel Gomes Bragança Retto (Sociedades limitadas. São Paulo: Manole, 2007, pp. 58-59).

11 Assim, dentre outros, Arnoldo Wald (Comentários ao novo Código Civil, cit., p. 360) e Daniel Moreira do Patrocínio (Sociedade limitada, cit., pp. 26-27).

12 Assim, dentre outros, Fran Martins, Sociedades por quotas no direito estran-geiro e brasileiro, cit., pp. 636-637.

13 “Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respecti-vas quotas (...)”.

14 Assim também aponta Paulo Penalva Santos [et. al.] (Comentários ao Código Civil Brasileiro, cit., p. 322).

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15FGV DIREITO RIO

15 BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. “1.4 REGENCIA SUPLETIVA DA LEI Nº 6.404/76 (LEI DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS). O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima, conforme art. 1053, parágrafo único do Código Civil. Para fins de registro na Junta Comercial, a regência supletiva: I – poderá ser prevista de forma expressa; ou II – presumir-se-á pela adoção de qualquer instituto próprio das sociedades anônimas, desde que compatível com a natureza da sociedade limitada, tais com: a) Quotas em tesouraria; b) Quotas preferenciais; c) Conselho de Administração; e d) Conselho Fiscal.” Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.

16 Nesse sentido, o intuito da IN DREI nº 81/2020 foi de dar unicidade ao conjunto de normas e diretrizes, que disciplinam o registro público de empresas. Com efeito, a consulta normativa torna-se menos complicada, sem a necessidade de coordenação de regras diversas, com uma orientação tendente a reduzir entraves burocráticos para o exercício regular da atividade empresarial. Portanto, a IN DREI nº 81/2020 é uma iniciativa salutar, que atende a clamor antigo por simplificação de regras diversas, tornando-se aplicável para a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) e diversas sociedades empresárias, em diferentes tipos societários, cuja regulamentação passa a estar consolidada em norma única.

17 CARVALHO FILHO, José dos Santos Manual de direito administrativo – 33. ed., revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas, 2019, p. 70.

Ainda, vale ressaltar que foi expedida a Instrução Normativa nº 81, de 10 de junho de 2020 (“IN DREI nº 81/2020”), com o objetivo de simplificar e desburocratizar a regulamentação de questões diversas pertinentes ao Registro de Empresas no Brasil – promovendo revisão e consolidação de 56 disposições normativas anteriores, que regulamentavam o registro empresarial de forma esparsa e sem a sistematização desejada16.

Dentre as inovações da IN DREI nº 81/2020, destaque-se a possibilidade de criação de quotas preferenciais com restrição e/ou limitação do direito ao voto do sócio.

Entende-se que IN DREI nº 81/2020 é exitosa em tornar as opções dos empreendedores mais simples e em desburocratizar a interface Estado-empresário. Entretanto, ela também merece algumas ressalvas: há polêmica e divergência na regulamentação das “Quotas Preferenciais”.

De acordo com o item 5.3.1 da IN DREI nº 81/2020, nas sociedades limitadas:

(...) são admitidas quotas de classes distintas, nas proporções e condições definidas no contrato social, que atribuam a seus titulares direitos econômicos e políticos diversos, podendo ser suprimido ou limitado o direito de voto pelo sócio titular da quota preferencial respectiva, observados os limites da Lei nº 6.404, de 1976, aplicada supletivamente. Havendo quotas preferenciais sem direito a voto, para efeito de cálculo dos quoruns de instalação e deliberação previstos no Código Civil consideram-se apenas as quotas com direito a voto.

Diante disso, a IN DREI nº 81/2020 inova na matéria e parece até mesmo contrariar as disposições do Código Civil sobre as deliberações sociais em sociedades limitadas, haja vista que o Código Civil de 2002, ao disciplinar a instalação e deliberação das reuniões ou assembleias gerais de sócios, leva em consideração o “capital social”, não fazendo menção à expressão “capital votante”.

Em resumo, com o novo ato normativo, o item 5.3.1 da IN DREI nº 81/2020 prevê a possibilidade de quotas não votantes e, assim, contraria os artigos do Código Civil de 2002, que fixam o quórum de deliberação em função do capital social total, e não votante. Com efeito, no ponto específico do item em questão, parece ter extrapolado o Poder Regulamentar do DREI, que não poderia expedir ato normativo secundário contrário à lei.17

16 Nesse sentido, o intuito da IN DREI nº 81/2020 foi de dar unicidade ao conjunto de normas e diretrizes, que disciplinam o registro público de empresas. Com efeito, a consulta normativa torna-se menos complicada, sem a necessidade de coordenação de regras diversas, com uma orientação tendente a reduzir entraves burocráticos para o exercício regular da atividade empresarial. Portanto, a IN DREI nº 81/2020 é uma iniciativa salutar, que atende a clamor antigo por simplificação de regras diversas, tornando-se aplicável para a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) e diversas sociedades empresárias, em diferentes tipos societários, cuja regulamentação passa a estar consolidada em norma única.17 CARVALHO FILHO, José dos Santos Manual de direito administrativo – 33. ed., revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas, 2019, p. 70.

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9.3. Aquisição de Quotas pela Própria Sociedade Limitada

O Decreto nº 3.078/19, no seu artigo 8º, autorizava expressamente a aquisição de quotas pela própria sociedade limitada, exigindo, para tanto, que as quotas estivessem integralizadas, a sociedade tivesse fundos disponíveis, a aquisição se perfizesse sem redução do capital social e que houvesse consentimento unânime dos sócios.

O Código Civil de 2002, entretanto, não previu expressamente essa possibilidade, motivo pelo qual se discute acerca da possibilidade de aquisição de quotas pela própria sociedade limitada.

Há, basicamente, dois posicionamentos a respeito dessa questão. Uma parte da doutrina, capitaneada por J. E. Tavares Borba, entende ser possível a aquisição de quotas pela própria sociedade limitada, desde que o contrato social preveja expressamente essa possibilidade. Outros autores, como é o caso do Sérgio Campinho, defendem a impossibilidade da aquisição de quotas para permanência em tesouraria, pois entendem que isso não seria compatível com a natureza contratual das sociedades limitadas.

O DNRC (atualmente denominado DREI), através da Instrução Normativa nº 98, de 23 de dezembro de 2003, que havia editado a versão original do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada, anteriormente previa que: “A aquisição de quotas pela própria sociedade já não mais está autorizada pelo Código Civil”.

Atualmente, contudo, o DREI mudou este entendimento e vem admitindo expressamente a possibilidade da aquisição de quotas pela própria sociedade limitada.

Neste sentido, o item 3.2.6.1 do atual Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada prevê expressamente que:

Se o contrato social contiver cláusula determinando a regência supletiva da Lei de Sociedades por Ações, a sociedade limitada pode adquirir suas próprias quotas, observadas as condições legalmente estabelecidas, fato que não lhe confere a condição de sócia (Enunciado nº 391 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal).

Sendo assim, a aquisição de quotas pela própria sociedade limitada atualmente vem sendo admitida nas sociedades limitadas regidas supletivamente pelas normas das sociedades anônimas.

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17FGV DIREITO RIO

Neste sentido, é importante que – em qualquer caso – sejam respeitados os preceitos da Lei nº. 6.404/76 em relação à aquisição das próprias ações nas sociedades anônimas (i.e., a aquisição deve ser realizada até o valor do saldo de lucros ou reservas devidamente contabilizadas na sociedade, exceto a reserva legal, e sem diminuição do capital social), conforme artigo 30, §1º, alínea “b” da Lei nº. 6.404/76.

Por fim, é uníssono o entendimento de que, uma vez adquirida a quota pela própria sociedade, configura-se uma hipótese de confusão subjetiva, motivo pelo qual os direitos e deveres inerentes à quota ficam suspensos, enquanto perdurar a confusão.18

10. DIREITOS PATRIMONIAIS E DIREITOS POLÍTICOS

Cada quota representativa do capital social de sociedade limitada representa um conjunto padronizado de direitos e obrigações. Tais direitos são intrínsecos às quotas e atribuíveis aos seus titulares.

Dentre as espécies de direitos conferidos aos sócios, podem-se destacar os direitos políticos e os direitos patrimoniais atribuíveis às quotas. Alguns exemplos de tais direitos podem ser listados abaixo:

DIREITOS PATRIMONIAIS DIREITOS POLÍTICOS

• Direito a receber dividendo (participar dos lucros);

• Direito de participar no acervo líquido em caso de liquidação da sociedade;

• Direito de receber o valor do reembolso das quotas;

• (...) (Alunos?)

• Direito de voto;

• Direito de participar das reuniões e/ou assembleias de sócios, conforme o caso;

• Direito de Preferência na Subscrição de Quotas em Aumentos de Capital

• (...) (Alunos?)

18 Semelhantemente, nas Sociedades Anônimas, conforme se depreende da Nota Explicativa nº 16, de 14 de fevereiro de 1980, da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), “(...) As ações enquanto mantidas em tesouraria não terão direitos patrimoniais ou políticos. Esta norma importa na suspensão de todos os direitos inerentes às ações, o que significa a impossibilidade temporária de seu exercício, em razão de expressa recomendação de lei. A esterilidade temporária a que estão submetidas as ações em tesouraria tem por finalidade erradicar qualquer possibilidade de a companhia vir a atuar como acionista de si mesma.” Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/legislacao/notas-explicativas/nota016.html>. Acesso em: 09.06.2020.

18 Semelhantemente, nas Sociedades Anônimas, conforme se depreende da Nota Explicativa nº 16, de 14 de feve-reiro de 1980, da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), “(...) As ações enquanto mantidas em tesouraria não terão direitos patrimoniais ou políticos. Esta norma importa na suspensão de todos os direitos inerentes às ações, o que significa a impossibilidade tem-porária de seu exercício, em razão de expressa recomendação de lei. A este-rilidade temporária a que estão subme-tidas as ações em tesouraria tem por finalidade erradicar qualquer possibili-dade de a companhia vir a atuar como acionista de si mesma.” Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/legislacao/notas-explicativas/nota016.html>. Acesso em: 09.06.2020.

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Esta distinção admite algumas flexibilizações, na medida em que há direitos de natureza política que possuem consequências patrimoniais. A este respeito, pode-se citar, como exemplo, o direito de retirada.

11. ADMINISTRAÇÃO DA SOCIEDADE

A administração da sociedade limitada pode denominar-se Diretoria, mas não há referência legal ao termo para as sociedades limitadas. Além disso, embora não previsto expressamente no Código Civil, é facultada a criação de Conselho de Administração para as sociedades empresárias limitadas, aplicando-se, por analogia, as regras previstas na Lei nº 6.404/76.19

A Diretoria é composta por uma ou mais pessoas físicas, a qual possui, como função interna, a incumbência de administrar a sociedade e, como função externa, de manifestar, por meio de representação, a vontade social.

Ressalte-se que o administrador da sociedade limitada não pode ser pessoa jurídica, o que pode ser extraído do disposto no art. 997, VI, do Código Civil, que se aplica à limitada por força do art. 1.054 do mesmo diploma legal.20

Não havendo restrição no contrato social, os administradores podem praticar todos os atos pertinentes à gestão da sociedade, limitados às fronteiras do objeto social. Os administradores devem atuar sempre no interesse social, não no individual.

O administrador da sociedade deve agir de acordo com determinados deveres que lhes são impostos, dentre eles, destaque-se o dever de diligência, dever de lealdade, dever de informação e o dever de prestação de contas.

O quórum para nomeação do administrador da sociedade limitada depende se o candidato é ou não sócio e do instrumento que designará o administrador. Neste sentido, observe-se a tabela abaixo:

19 A este respeito, o item 1.2.13.5 do atual Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada prevê que: “Fica facultada a criação de Conselho de Administração na Sociedade Empresária Limitada, aplicando-se, por analogia, as regras previstas na Lei nº 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976. Quando adotado o conselho de administração, o administrador poderá ser estrangeiro ou residente no exterior, devendo, contudo, apresentar procuração outorgando poderes específicos a residente no Brasil para receber citação judicial em seu nome (art. 146, § 2º, da Lei nº 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976).” BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.20 Some-se ao argumento a expressa vedação constante no item 1.2.8 do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada, do DREI. Veja-se: “Não pode ser administrador de sociedade limitada a pessoa: (...) b) Pessoa Jurídica;”. Departamento de Registro Empresarial e Integração. BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 15.07.2020.

19 A este respeito, o item 1.2.13.5 do atual Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada prevê que: “Fica facultada a criação de Conselho de Administração na Sociedade Empresária Limitada, aplicando-se, por analogia, as regras previstas na Lei nº 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976. Quando adotado o conselho de administração, o administrador poderá ser estrangeiro ou residente no exterior, devendo, contudo, apresentar procuração outorgando poderes específicos a residente no Brasil para receber citação judicial em seu nome (art. 146, § 2º, da Lei nº 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976).” BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/R E P O S I T O R I O / S E M P E / D R E I / I N s _EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.

20 Some-se ao argumento a expressa vedação constante no item 1.2.8 do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada, do DREI. Veja-se: “Não pode ser administrador de sociedade limitada a pessoa: (...) b) Pessoa Jurídica;”. Departamento de Registro Empresarial e Integração. BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 15.07.2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

19FGV DIREITO RIO

CONTRATO SOCIAL ATO APARTADO

ADMINISTRADORSÓCIO 3/4

Maioria Absoluta (i.e., metade do capital

social mais 1 quota) (50% + 1)

ADMINISTRADORNÃO SÓCIO

(a) Unanimidade (capital social não integralizado); e

(b) 2/3 (depois de integralizado, art. 1061 CC).

(a) Unanimidade (capital social não integralizado); e

(b) 2/3 (depois de integralizado, art. 1061 CC).

Conferindo-se a administração a mais de uma pessoa, deve o contrato social explicitar se a gestão será exercida isoladamente por cada administrador ou em conjunto. Sendo omisso o contrato, entende-se que a administração tocará individualmente a cada administrador.

12. DELEGAÇÃO DE PODERES

O Decreto nº 3.078/19 admitia, em seu art. 13, a delegação da gerência da sociedade à terceiro, salvo a existência de disposição expressa em contrário no Contrato Social. Existia à época a figura dos “gerentes delegados”.

Contudo, o instituto da delegação de direção foi expressamente banido pelo art. 1.018 do Código Civil de 2002, que dispõe ser vedado ao administrador “fazer-se substituir no exercício de suas funções, sendo-lhe facultado, nos limites de seus poderes, constituir mandatários da sociedade, especificados no instrumento os atos e operações que poderão praticar”.

Além disso, indaga-se: pessoa jurídica pode ser nomeada administrador de sociedade limitada? Essa questão foi amplamente discutida pela doutrina!

O art. 1.060 do Código Civil afirma: “a sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado.” Sendo assim, muitos doutrinadores entendem que o substantivo “pessoas” não faz distinção entre naturais ou jurídicas, sendo, portanto, permitida a nomeação de pessoas jurídicas como administradoras de sociedades limitadas.

Por outro lado, o art. 1.054 conjugado com o art. 997, inciso VI, do Código Civil, estabelece o dever de o Contrato Social mencionar “as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições.”

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

20FGV DIREITO RIO

Contudo, ressalte-se que esta é uma regra prevista no capítulo referente às sociedades simples, ou seja, esse argumento pode ser facilmente questionado caso a sociedade limitada opte pela sua regência supletiva pela legislação das sociedades anônimas.

Entretanto, a matéria restou pacificada desde que o DREI expressamente vedou a nomeação de pessoa jurídica como administrador de sociedade limitada, por meio do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada21.

13. RESPONSABILIDADE DOS ADMINISTRADORES (TEORIA DOS ATOS ULTRA VIRES)

A regra geral é que o administrador da sociedade limitada não é responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão que vier a ser praticado.

Contudo, os administradores poderão ser civilmente responsáveis perante a sociedade e terceiros prejudicados, quando ultrapassarem os atos regulares de gestão ou quando procederem com excesso de poder e/ou violação do contrato social ou da lei, causando prejuízos àqueles.

O art. 10 do Decreto nº 3.708/19 dispunha que a sociedade limitada era sempre responsável pelos atos realizados, em seu nome, pelos seus administradores. A sociedade limitada tinha, entretanto, direito de regresso contra o administrador, em relação aos atos praticados por este, que contrariassem o objeto social da sociedade.

O Código Civil de 2002, entretanto, consagrou no art. 1.015, parágrafo único, a Teoria dos Atos Ultra Vires (i.e., aqueles atos praticados “para além das forças”). Pela teoria do ato ultra vires, o administrador fica obrigado a reparar o dano causado à sociedade ou a terceiros quando verificado ato irregular de gestão ou proceder com excesso de poder e/ou violação da lei ou do contrato social.

Neste sentido, o excesso por parte dos administradores enseja a responsabilidade pessoal do administrador que contratou em nome da sociedade, isto é, ele terá responsabilidade pelo ato, não a sociedade.

De acordo com o artigo 1.015, parágrafo único, do Código Civil, o excesso por parte dos administradores pode ser oposto a terceiros se ocorrer uma das seguintes hipóteses: (i) se a limitação dos poderes estiver inscrita ou 21 Conforme previsto nos itens 1.2.8 e 1.2.13.3 do Manual de Atos de Registro de Sociedade Limitada. BRASIL. Departamento de Registro Empresarial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Registro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.

21 Conforme previsto nos itens 1.2.8 e 1.2.13.3 do Manual de Atos de Re-gistro de Sociedade Limitada. BRASIL. Departamento de Registro Empresa-rial e Integração. Manual de Registro de Sociedades Limitadas. Disponível em: <http://www.mdic.gov.br/images/REPOSITORIO/SEMPE/DREI/INs_EM_VIGOR/ANEXOS2019/Anexo_II_IN_38-2017_Manual_de_Regis-tro_LTDA_-_alterado_pela_IN_63.pdf>. Acesso em: 09.06.2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

21FGV DIREITO RIO

averbada no registro próprio da sociedade; (ii) provando-se que era conhecida do terceiro; ou (iii) tratando-se de operação evidentemente estranha aos negócios da sociedade.

Além disso, defende-se que o ato ultra vires não é nulo, ele apenas perde a sua eficácia. A responsabilidade pela obrigação contraída é transferida da sociedade para o administrador, que passará a suportar esse ônus.

Registre-se, ainda, que se for do interesse da sociedade, o ato ultra vires poderá ser posteriormente ratificado, a fim de que sejam sanados os vícios inerentes ao ato.

14. CONSELHO FISCAL

É direito dos sócios fiscalizar os atos de administração, não podendo o contrato social, nem a assembleia geral ou reunião de cotistas, obstruir essa fiscalização.

A fim de melhor ordenar a fiscalização dos administradores, é facultado aos sócios a constituição de um Conselho Fiscal na sociedade limitada, que, de forma geral, será bastante semelhante àquele das sociedades anônimas. Para tanto, basta a previsão de cláusula contratual neste sentido (art. 1.066 do Código Civil).

O Conselho Fiscal é composto de três ou mais membros e respectivos suplentes, sócios ou não, residentes no país, eleitos na assembleia anual prevista no art. 1.078 do Código Civil. Não podem fazer parte do Conselho Fiscal os inelegíveis enumerados no §1º do art. 1.011 do Código Civil, os membros dos demais órgãos da sociedade ou de outra sociedade por ela controlada, os empregados de quaisquer delas ou dos respectivos administradores e o cônjuge ou parentes deste até o 3º (terceiro) grau.

O art. 1.069 do Código Civil prevê algumas das atribuições e poderes dos membros do Conselho Fiscal, que, por força de lei, não podem ser delegadas a outro órgão da sociedade (art. 1.070 do Código Civil):

Art. 1.069: Além de outras atribuições determinadas na lei ou no contrato social, aos membros do conselho fiscal incumbem, individual ou conjuntamente, os deveres seguintes:I - examinar, pelo menos trimestralmente, os livros e papéis da sociedade e o estado da caixa e da carteira, devendo os administradores ou liquidantes prestar-lhes as informações solicitadas;

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

22FGV DIREITO RIO

II - lavrar no livro de atas e pareceres do conselho fiscal o resultado dos exames referidos no inciso I deste artigo;III - exarar no mesmo livro e apresentar à assembléia anual dos sócios parecer sobre os negócios e as operações sociais do exercício em que servirem, tomando por base o balanço patrimonial e o de resultado econômico;IV - denunciar os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, sugerindo providências úteis à sociedade;V - convocar a assembléia dos sócios se a diretoria retardar por mais de trinta dias a sua convocação anual, ou sempre que ocorram motivos graves e urgentes;VI - praticar, durante o período da liquidação da sociedade, os atos a que se refere este artigo, tendo em vista as disposições especiais reguladoras da liquidação.

15. DELIBERAÇÕES SOCIAIS

As deliberações sociais são as decisões tomadas pelas assembleias ou reunião de sócios sobre assuntos de relevante interesse para a sociedade.

O Código Civil, em seu art. 1.071, subordinou determinadas matérias ao crivo da deliberação dos sócios, por entender que aquelas hipóteses podem influir profundamente nas relações sociais e na própria estrutura da sociedade.

A lista do referido artigo é meramente exemplificativa, uma vez que outras matérias que ali não estão citadas também necessitam da deliberação dos sócios, como é o caso da alteração de nacionalidade da sociedade, eleição do conselho fiscal e fixação da remuneração de seus membros, por exemplo. Ainda, os sócios podem indicar, no contrato social, matérias cuja aprovação dependa de deliberação social.

15.1. Reunião de Sócios vs. Assembleia

As deliberações dos sócios serão tomadas em assembleia ou reunião de sócios, conforme dispuser o contrato social.

Contudo, se o número de sócios for superior a dez, impõe o § 1º do art. 1.072 do Código Civil que as deliberações, obrigatoriamente, sejam tomadas em assembleia. A constituição da assembleia deverá observar as regras legais para convocação, instalação e deliberação. Se as formalidades legais não forem cumpridas, a decisão tomada será ineficaz e inválida.

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23FGV DIREITO RIO

À reunião de sócios, nos casos omissos no contrato, aplicam-se as formalidades legais relativas à assembleia (art. 1.072, §6º, e art. 1.079, do Código Civil).

A reunião de sócios ou a assembleia é dispensável quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que delas seria objeto (art. 1.072, §3º, do Código Civil).

15.2. Convocação

A competência originária para convocação da assembleia ou reunião de sócios é do administrador da sociedade limitada (art. 1.072 do Código Civil).

A convocação deverá ser feita por meio de publicação de anúncio de convocação de sócios, por pelo menos três vezes, devendo a publicação da primeira convocação anteceder oito dias, no mínimo, da data da assembleia ou reunião, e a publicação da segunda convocação anteceder, no mínimo, cinco dias, da data prevista para a deliberação social (art. 1.152, §3º, do Código Civil).

A referida formalidade de convocação será dispensada quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia (art. 1.072, §2º, do Código Civil).

Além da competência primária do administrador para convocação da assembleia ou reunião de sócios, a lei estabelece uma competência derivada, legitimando, assim, outro órgão ou pessoas à convocação do encontro de sócios.

A reunião ou assembleia podem também ser convocadas pelo sócio quando:

(i) o órgão da administração retardar a convocação, por mais de sessenta dias, nas hipóteses de previsão legal ou contratual, não se exigindo participação mínima de sócio no capital para a iniciativa; ou

(ii) não atendido, pelos administradores, no prazo de oito dias, pedido de convocação fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas. Nesse caso, exige-se que o sócio seja titular de mais de 1/5 do capital social (art. 1.073, I, do Código Civil).

Permite-se, ainda, que a assembleia ou a reunião de sócios seja convocada pelo Conselho Fiscal, se houver, quando a diretoria retardar, por mais de trinta dias, a sua convocação anual, ou sempre que ocorram motivos graves e urgentes (art. 1.073, II, do Código Civil).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

24FGV DIREITO RIO

15.3. Quórum de Instalação

Instala-se a assembleia ou reunião de sócios com a presença, em primeira convocação, de titulares de, no mínimo, ¾ do capital social e, em segunda convocação, com qualquer número (art. 1.074 do Código Civil).

15.4. Quórum de Deliberação As deliberações dos sócios, para serem válidas e eficazes, devem obedecer

a um quórum previamente estabelecido pela lei ou, quando a lei permitir, ao quórum determinado no contrato social. O quórum poderá ser contratualmente eleito nos casos do §1º do art. 1.063 e inciso III do art. 1.076, ambos do Código Civil.

O Código Civil prevê quóruns diferenciados, a depender do tipo de matéria que será deliberada. Nesse sentido, observe-se o quadro abaixo:

QUÓRUM MATÉRIA

UNANIMIDADE

(i) designação de administrador não sócio, enquanto o capital não estiver totalmente integralizado (art. 1.061 CC); (ii) transformação da sociedade, exceto se houver previsão distinta em seu ato constitutivo (art. 1.114 CC); e (iii) mudança de nacionalidade de sociedade brasileira (art. 1.127 CC).

3/4 DO CAPITAL SOCIAL

(i) modificação do contrato social (art. 1.076, I c/c art. 1.071, V, CC); e (ii) incorporação, fusão ou dissolução da sociedade, ou, ainda, a cessação do estado de liquidação (art. 1.076, I c/c art. 1.071, VI, CC e IN DREI nº 35/2017).

2/3 DO CAPITAL SOCIAL

(i) designação de administrador não sócio após a integralização da totalidade do capital social (art. 1.061 CC); e (ii) destituição de administrador nomeado no contrato social, salvo disposição contratual diversa (art. 1.063, §1º, CC).

MAIORIA ABSOLUTA DO CAPITAL SOCIAL

(i) designação e destituição dos administradores nomeados em ato separado (art. 1.076, II c/c artigo 1.071, II e III, CC); (ii) remuneração dos administradores, quando não houver previsão no contrato social (art. 1.076, II c/c art. 1.071, IV, CC); (iii) requerimento de recuperação judicial ou extrajudicial (art. 1.076, II c/c art. 1.071, VIII, CC); e (iv) exclusão de sócio por justa causa (art. 1.085).

MAIORIA DE VOTOS DOS PRESENTES

Demais casos previstos em lei ou no contrato social (art. 1076, inciso III, CC), tais como, mas não apenas, a aprovação de contas da administração (art. 1.071 do CC) e a nomeação de destituição dos liquidantes e o julgamento de suas contas (art. @ do CC).

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25FGV DIREITO RIO

16. DIREITO DE RETIRADA

O direito de retirada, previsto no art. 1.029 do Código Civil (aplicado de forma supletiva à sociedade limitada), garante ao sócio o direito de dissolução do vínculo societário.

A saída do sócio pode se dar de forma consensual, situação na qual as partes acordam o montante a ser pago ao sócio em retirada a título dos haveres que detém na sociedade. Nesse caso, deverá haver alteração no contrato social para exclusão do nome do sócio que se retirou da sociedade.

A retirada do sócio também poderá se dar mediante a cessão de suas quotas, observando-se o que o contrato dispuser a esse respeito, e, na sua omissão, o art. 1.057 do Código Civil.

Se a retirada do sócio não for consensual, abre-se ao sócio dissidente a possibilidade do exercício do seu direito de recesso ou de retirada, que compreende seu desligamento da sociedade. Nesta hipótese, há obrigação de a sociedade reembolsar o sócio dissidente dos seus haveres, ou seja, indenizá-lo no valor de sua participação societária.

Além dos casos previstos na lei ou no contrato, o art. 1.029 do Código Civil garante ao sócio o direito de se retirar da sociedade. O exercício desse direito, contudo, pode variar de acordo com o tempo da contratação de uma determinada sociedade.

No caso de a sociedade ser contratada por prazo indeterminado, o sócio poderá se retirar a qualquer momento, mediante notificação, por via judicial ou extrajudicial, aos demais sócios, com antecedência mínima de 60 dias (art. 1.029 do Código Civil). Segundo a doutrina, em razão do princípio da autonomia da vontade, ninguém pode permanecer vinculado contra sua vontade e por tempo indefinido.

Por outro lado, se a sociedade for contratada por prazo determinado, em regra, não é permitido ao sócio a sua retirada da sociedade, sem o decurso do prazo estipulado no contrato social, salvo justa causa provada judicialmente. Considera-se justa causa a ruptura da affectio societatis.

Em síntese, seja ou não a sociedade limitada contratada por prazo, sempre tem o sócio dissidente direito de dela se afastar, mediante o exercício de seu direito de recesso, o que implicará o pagamento de seus haveres por parte da sociedade. A apuração dos haveres se dá por meio de balanço especial de determinação, refletindo a posição patrimonial da sociedade limitada à época do exercício do direito de retirada.

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26FGV DIREITO RIO

17. DISSOLUÇÃO PARCIAL

A dissolução parcial ocorre quando há a resolução da sociedade em relação a um sócio, ou seja, quando há o desfazimento do vínculo contratual entre determinado sócio e a sociedade, o que pode ocorrer nas seguintes hipóteses: (i) morte do sócio (art. 1.028 do Código Civil); (ii) exercício do direito de retirada (art. 1.029 do Código Civil); (iii) exclusão do sócio (art. 1.030); e (iv) liquidação da quota pelo credor do sócio (art. 1.026 do Código Civil).

Uma vez dissolvida a sociedade em relação a um sócio, “o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado” (art. 1.031 do Código Civil).

O art. 1.032 do Código Civil determina que a retirada, a exclusão ou a morte do sócio não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores a data da dissolução parcial, até dois anos após a averbação desta; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação da no registro da sociedade limitada.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

27FGV DIREITO RIO

18. EXCLUSÃO DOS SÓCIOS

A exclusão do sócio, que se realiza sem o seu consentimento e até mesmo contra sua vontade, poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:

HIPÓTESES CABIMENTO

Sócio remisso

Por iniciativa da maioria dos sócios, poderá ser expulso da sociedade, podendo esta ser realizada de forma extrajudicial (art. 1.004 do Código Civil);

Sócio declarado falido ou civilmente insolvente, ou aquele cuja quota for liquidada nos termos do art. 1.026, § único do Código Civil

Será, de pleno direito, expulso da sociedade (a exclusão se dá, portanto, no plano extrajudicial);

Sócio que, por falta grave no cumprimento de suas obrigações legais ou contratuais ou o declarado incapaz por fato superveniente

Poderá ser excluído por iniciativa da maioria dos demais sócios, mas deverá ser feita judicialmente;

Sócio minoritário

Por iniciativa da maioria dos sócios, quando os demais sócios entenderem que o sócio minoritário está pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá ser expulso da sociedade, desde que previsto no contrato social a hipótese de expulsão, no plano extrajudicial, por justa causa (art. 1.085 do Código Civil)22.

22

19. NOVIDADE LEGISLATIVA: PROJETO DE LEI Nº 3.324/2020 E POSSIBILIDADE DE EMISSÃO DE DEBÊNTURES POR SOCIEDADES LIMITADAS E COOPERATIVAS

Atualmente, encontra-se em tramitação o Projeto de Lei nº 3.324/2020, de autoria do Senador Flávio Bolsonaro, o qual busca alterar o Código Civil de 2002, de modo a permitir a emissão de debêntures por sociedades limitadas e cooperativas.

22 Nesta última hipótese, a exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa (parágrafo único do art. 1.085 do Código Civil).

22 Nesta última hipótese, a exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa (parágrafo único do art. 1.085 do Código Civil).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

28FGV DIREITO RIO

Por meio do referido Projeto de Lei, objetiva-se ampliar os instrumentos de captação de recursos disponíveis para as sociedades limitadas e cooperativas, os quais se tornaram ainda mais restritos em tempos de pandemia e recessão econômica.

A temática ganha ainda mais importância ao se observar que a sociedade limitada é um dos tipos societários mais utilizados no Brasil e ao se considerar que, com a flexibilização da Lei de Liberdade Econômica, que passou a admitir a sociedade limitada unipessoal, esse tipo societário tende a ser ainda mais utilizado pelos empresários, em substituição à Eireli.

Nesse sentido, a possibilidade de emissão de debêntures pelas limitadas tem o potencial de causar impacto positivo e relevante no cenário econômico nacional, garantindo maior fôlego às sociedades e, consequentemente, possibilitando a manutenção da força de trabalho e da renda dos brasileiros.

Ressalta-se que a emissão de debêntures por sociedade limitada já é prevista no ordenamento jurídico de outros países, tais como França, Itália, Portugal, Bélgica, Estados Unidos e Inglaterra23 e boa parte da doutrina nacional defende que, apesar de não haver previsão expressa no ordenamento jurídico pátrio, a emissão de debêntures por sociedades limitadas não seria vedada no Brasil24.

Apesar do posicionamento doutrinário acima elencado, fato é que as sociedades que tentaram emitir essa espécie de valor mobiliário, por meio de oferta privada, esbarram no entendimento das Juntas Comerciais no sentido de não admitir o arquivamento da escritura de emissão. Dessa maneira, caso o PL nº 3324/2020 seja convertido em lei, haverá garantia de isonomia e segurança jurídica, evitando que entendimentos dissonantes das Juntas Comerciais impeçam as sociedades de se beneficiarem deste meio de captação de recursos.

23 FRANCO, Vera Helena Mello. Direito Empresarial I: o empresário e seus auxiliares, o estabelecimento empresarial, as sociedades. 3a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 244; e José Romeu G. Amaral, ob. cit., p. 179 (Itália) e 181 (França). José Waldecy Lucena (ob. cit., p. 230) reconhece que Portugal e Suíça autorizam a emissão de debêntures por sociedades por quotas de responsabilidade limitada, em que pese haver nesses países divergência doutrinária. 24 Sobre o tema, vide AMARAL, José Romeu Garcia do. Regime Jurídico das Debêntures. 2a ed. São Paulo: Almedina, 2016, pp. 168-187. Vide também PITTA, André Grunspun. A possibilidade de emissão de debêntures por sociedade limitada regida supletivamente pela lei das sociedades por ações. In: Sociedade Limitada Contemporânea. Coleção IDSA. Coords.: AZEVEDO, Luís André N. de Moura e CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 527; GODKE VEIGA, Marcelo; e OIOLI, Erik Frederico. As sociedades limitadas e o mercado de capitais. In: Sociedade Limitada Contemporânea. Coleção IDSA. Coords.: AZEVEDO, Luís André N. de Moura e CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de. São Paulo: Quartier Latin, 2013, pp. 650-653; e GODKE VEIGA, Marcelo. A liberdade econômica, as debêntures e a síndrome de Estocolmo jurídica. Migalhas, 2019. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/314129/a-liberdade-eco-nomica-as-debentures-e-a- sindrome-de-estocolmo-juridica. Acesso em: 27/05/2020. No mesmo sentido, ainda, manifestaram-se favoravelmente à emissão de debêntures por sociedades por quotas de responsabilidade limitada, regidas à época pelo Decreto no 3.708, de 10 de janeiro de 1919, anteriormente à entrada em vigor do atual Código Civil de 2002, os seguintes juristas: Villemor Amaral, Inglez de Souza, Spencer Vampré e Noredino Alves da Silva. Em sentido contrário, Egberto Lacerda Teixeira, Waldemar Ferreira, Trajano de Miranda Valverde, Alfredo Russel (Cf. José Romeu G. Amaral, ob. cit., p. 168), José Edwaldo Tavares Borba (Direito Societário. 17a ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 271) e José Waldecy Lucena (Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada. Rio de Janeiro: Renovar, 1996, pp. 227-231).

23 FRANCO, Vera Helena Mello. Direito Empresarial I: o empresário e seus auxi-liares, o estabelecimento empresarial, as sociedades. 3a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 244; e José Ro-meu G. Amaral, ob. cit., p. 179 (Itália) e 181 (França). José Waldecy Lucena (ob. cit., p. 230) reconhece que Por-tugal e Suíça autorizam a emissão de debêntures por sociedades por quotas de responsabilidade limitada, em que pese haver nesses países divergência doutrinária.

24 Sobre o tema, vide AMARAL, José Romeu Garcia do. Regime Juridico das Debentures. 2a ed. São Paulo: Almedi-na, 2016, pp. 168-187. Vide também PITTA, André Grunspun. A possibilidade de emissao de debentures por sociedade limitada regida supletivamente pela lei das sociedades por acoes. In: Socieda-de Limitada Contemporânea. Coleção IDSA. Coords.: AZEVEDO, Luís André N. de Moura e CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 527; GODKE VEIGA, Marcelo; e OIOLI, Erik Frederico. As sociedades limitadas e o mercado de capitais. In: Sociedade Limitada Contemporânea. Coleção IDSA. Coords.: AZEVEDO, Luís André N. de Moura e CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de. São Paulo: Quartier Latin, 2013, pp. 650-653; e GODKE VEIGA, Marcelo. A liberdade econômica, as debentures e a sindrome de Estocol-mo juridica. Migalhas, 2019. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/314129/a-liberdade-econo-mica-as-debentures-e-a- sindrome--de-estocolmo-juridica. Acesso em: 27/05/2020. No mesmo sentido, ainda, manifestaram-se favoravelmente à emissão de debêntures por sociedades por quotas de responsabilidade limi-tada, regidas à época pelo Decreto no 3.708, de 10 de janeiro de 1919, ante-riormente à entrada em vigor do atual Código Civil de 2002, os seguintes juris-tas: Villemor Amaral, Inglez de Souza, Spencer Vampré e Noredino Alves da Silva. Em sentido contrário, Egberto Lacerda Teixeira, Waldemar Ferreira, Trajano de Miranda Valverde, Alfredo Russel (Cf. José Romeu G. Amaral, ob. cit., p. 168), José Edwaldo Tavares Borba (Direito Societário. 17a ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 271) e José Wal-decy Lucena (Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada. Rio de Janeiro: Renovar, 1996, pp. 227-231).

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2. SOCIEDADES ANÔNIMAS

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2017, pp. 119-154; 219-226.

Leitura Complementar

ASCARELLI, Tullio. O Contrato Plurilateral. In. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. Campinas: Editora Bookseller. 2001. pp. 372-452.

B) ROTEIRO DE AULA

1. COMPANHIAS

De acordo com o art. 1º da Lei nº 6.404/76 (“LSA”): “companhia é a pessoa jurídica de direito privado, cujo capital social é dividido em ações e na qual a responsabilidade de cada sócio é limitada ao preço de emissão das ações que subscreveu ou adquiriu. Companhia e sociedade anônima são termos sinônimos”.

A divisão do capital social em ações, conforme aludido pelo art. 1º da LSA e pelo art. 1.088 do Código Civil, significa que “as participações societárias designadas ações são padronizadas e incorporadas em valores mobiliários”, conforme ensina José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho.

Junto à sociedade em comandita por ações, a sociedade anônima forma o gênero das “sociedades por ações”. Ambas, independentemente de seu objeto, são consideradas empresárias (parágrafo único do art. 982 do CC).

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1.1. Características essenciais da sociedade anônima

Como toda forma de sociedade, a companhia possui características marcantes, que a diferenciam das demais e, em seu caso particular, fazem dela o modelo jurídico mais sofisticado e completo, no direito brasileiro, para união de capital proveniente de indivíduos desconhecidos, os quais, no entanto, desejam a concretização de um fim comum. Eis, a seguir, breves considerações acerca das principais características das sociedades por ações.

1.2. Organização dos Direitos de Sócios em Ações:

1.2.1. Divisão do Capital Social em Ações

Os direitos e obrigações dos acionistas, nascidos de contribuições para o capital social, são incorporados em valores mobiliários, organizados de forma jurídica padronizada, dos quais se abstrai a identidade dos titulares das ações.

Ademais, deve-se ter em mente que a titularidade de uma ação significa um adquirir um conjunto de direitos e obrigações padronizado. A divisão do capital social é em ações e, com isso, este tipo societário é capaz de promover a alocação de riscos, e, por conta de sua padronização, facilita-se a livre circulação das participações societárias.

1.2.2. Padronização das posições de sócio

A padronização das posições de sócio significa conferir igualdade de

direitos aos titulares de ações da mesma classe e espécie. Por outro lado, é possível conferir diferentes direitos e deveres aos titulares cujas ações sejam de classes ou espécies distintas.

Com isso, a diferença entre acionistas majoritários e minoritários não é ocasionada pela diferença relacionada a um tipo de ação, mas sim pelo acúmulo das ações, que confere ao detentor de um número maior de ações mais poder nas decisões societárias.

1.2.3. Posições de Sócios não Personalizadas

Nas sociedades por ações, o Estatuto Social fixa o número, espécies e classes das ações sem identificar a pessoa do acionista.

Nesse contexto, o acionista pode transferir a ação para outra pessoa sem a necessidade de alteração do estatuto da companhia. Por isso, não se considera,

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nas sociedades anônimas, diferentemente de outros tipos societários, personalizadas as posições dos sócios, o que revela o seu caráter institucionalista.

1.3. Incorporação das Ações em Valores Mobiliários

1.3.1. Natureza corpórea da ação Em relação às ações, veja-se que elas são incorporadas em título de crédito

(em sentido lato), designado valor mobiliário, o que lhe confere natureza corpórea. A função dos títulos de crédito é facilitar a circulação de direitos. Nesse sentido, a incorporação da ação em título de crédito funciona como excelente instrumento para reunir capitais de grande número de pessoas e desenvolver o mercado.

Também vale registrar que a sociedade anônima está autorizada, por lei25, a emitir outros títulos, além das ações, que conferem ao seu titular, o direito de participar nos lucros (partes beneficiárias), o direito de subscrever ações (bônus de subscrição), ou créditos pecuniários contra a companhia (debêntures).

1.3.2. Livre Transferibilidade da Ação

As ações e demais títulos emitidos pela companhia seguem a regra da livre circulação, sem a identificação da pessoa de seu titular.

O caput do art. 36 da LSA prevê que o Estatuto Social das companhias fechadas pode impor limitações à circulação das ações nominativas, contanto que regule minuciosamente tais limitações e não impeça a negociação, nem sujeite o acionista ao arbítrio dos órgãos de administração da companhia ou da maioria dos acionistas.

1.4. Limitação da Responsabilidade dos Sócios Perante Terceiros

1.4.1. Limitação de Risco do Acionista

Como se disse, o art. 1º da LSA limita a responsabilidade do acionista perante terceiros ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas. Por assim dizer, limita-se o risco financeiro do acionista. Essa característica incentiva o empresariado a participar destas companhias, tendo em vista que sua responsabilidade estará limitada ao preço de emissão das ações que subscreverem ou adquirirem.

25 Conforme o art. 2º da Lei nº 6.385/76.

25 Conforme o art. 2º da Lei nº 6.385/76.

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32FGV DIREITO RIO

1.5. Sociedade de capitais vs. sociedade de pessoas

De maneira geral, as sociedades anônimas são classificadas como “sociedades de capitais” (i.e., intuitu pecuniae), tendo em vista que o vínculo existente entre os sócios tem por base a aglutinação de recursos, independentemente da pessoa de seus sócios.

Neste tipo societário a figura dos sócios, na maioria dos casos, não predomina para a formação do vínculo societário, tratando-se de um grande traço diferenciador das sociedades limitadas, que, por sua vez, são consideradas como “sociedades de pessoas”, onde o vínculo entre os sócios possui papel fundamental em sua formação e existência. A relação entre os sócios nas sociedades anônimas ancora-se, precipuamente, na disposição para aporte de capital visando à obtenção de resultados econômicos, independente das características pessoais de seus sócios.

Em oposição às sociedades de capitais, as sociedades de pessoas são aquelas em que a pessoa do sócio tem papel fundamental na realização do objeto social. As sociedades de pessoas são constituídas com intuitu personae, razão pela qual o desentendimento entre os membros, quando torna insuportável a vida em sociedade, implica a quebra da affectio societatis. As sociedades de pessoas, quando não empresárias, estão previstas no Código Civil.

Nas sociedades anônimas fechadas (i.e., aquelas cujos valores mobiliários não estão admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários, conforme art. 4º da LSA), embora de cunho eminentemente patrimonial, em diversas ocasiões um de seus elementos fundamentais concentra-se na pessoa de seus sócios. Exemplo disso são as sociedades anônimas familiares, inacessíveis a estranhos, cujas ações circulam entre os poucos acionistas que as adquirem.

Na realidade, essas sociedades são constituídas intuitu personae, uma vez que o animus que se requer dos sócios não é só material: a realização do objeto social depende fundamentalmente dos atributos individuais dos sócios.

Com essa distinção, entre sociedades de pessoas/contratuais e de capitais/

institucionais traz relevantes consequências, como é o caso de se saber se o instituto da dissolução parcial, em razão da quebra da affectio societatis, aplicado às sociedades de pessoas do Código Civil, pode ou não ser aplicado às sociedades anônimas de capital fechado. Ainda, a distinção é relevante para saber se o instituto da exclusão de sócio, previsto no art. 1.085 do CC, pode ser aplicado às sociedades anônimas fechadas.

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A Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76), ao cuidar dos casos de dissolução da sociedade anônima, a partir do art. 206, sempre pressupõe a dissolução integral da companhia. Com efeito, a regra prevista em lei para esse tipo societário é a dissolução total, tendo em vista a sua natureza e estruturação jurídica. Portanto, não há dúvida de que as sociedades anônimas abertas estão sujeitas à dissolução total, nos termos do referido artigo.

Contudo, no que se refere às sociedades anônimas fechadas, a doutrina e a jurisprudência não encontram óbices à adoção da dissolução parcial, fundada na quebra da affectio societatis.

O instituto da dissolução parcial erigiu-se baseado nas sociedades de pessoas/contratuais como alternativa à dissolução total, uma vez que mais consentânea ao princípio da preservação da sociedade e da função social. Contudo, com a complexa realidade das relações negociais, a doutrina e a jurisprudência vêm admitindo a extensão do referido instituto às sociedades anônimas fechadas, que ostentem caráter familiar, nas quais as qualidades pessoais dos sócios adquirem relevância para o desenvolvimento das atividades sociais.

A posição que tem prevalecido, atualmente, é a possibilidade de dissolução parcial de uma sociedade anônima fechada, com traço nitidamente personalista, fundada na quebra da affectio societatis. Assim, possibilita-se ao acionista dissidente a sua retirada do empreendimento, mediante o justo pagamento de seus haveres, sem que a companhia e a empresa por ela desenvolvida sofram solução de continuidade.

Em julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça26 reconheceu-se que:

(...) caracterizada a sociedade anônima como fechada e personalista, o que tem o condão de propiciar a sua dissolução parcial – fenômeno até recentemente vinculado às sociedades de pessoas –, é de se entender também pela possibilidade de aplicação das regras atinentes à exclusão de sócios das sociedades regidas pelo Código Civil, máxime diante da previsão contida no art. 1.089 do CC: “A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se lhe, nos casos omissos, as disposições deste Código.

Em seu voto, o Ministro Relator Luis Felipe Salomão reconheceu que, em regra, as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuitu pecuniae), mas que, diante da complexidade das relações negociais, não é possível enquadrá-las de forma apriorística numa ou noutra classificação.

26 STJ, Recurso Especial nº 917.531/RS, Quarta Turma, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, j.: 17.11.2011, acórdão publicado dia 01.02.2012.

26 STJ, Recurso Especial nº 917.531/RS, Quarta Turma, de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, j.: 17.11.2011, acórdão publicado dia 01.02.2012.

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Nesse sentido, o STJ reconheceu a possibilidade tanto da aplicação do instituto da dissolução parcial às sociedades anônimas de capital fechado, que apresentem natureza personalista, quanto a possibilidade de aplicação do instituto da exclusão de sócios, previsto no art. 1.085 do Código Civil, àquelas sociedades.

Diante disso, pode-se concluir que, em relação às sociedades anônimas de capital aberto, prevalece o entendimento de que estas são sociedades de capital, com feição institucional, e, portanto, sujeitas apenas às disposições da Lei das S.A. Entretanto, em relação às sociedades de capital fechado, atualmente, não mais é possível um rígido enquadramento destas como sociedades de capital, pois, dependendo de sua feição, poderão ser aplicados institutos próprios das sociedades de pessoas sempre que apresentarem características personalistas.

1.6. Sistema Jurídico das Companhias

O sistema jurídico aplicável às companhias engloba todas as normas previstas em:

(i) Seu estatuto social;(ii) Na LSA e sua regulamentação;(iii) Outras leis societárias;(iv) Estipulações de contratos parassociais27 ou preliminares.

Fala-se em sistema porque suas normas se acham interrelacionadas por referência a uma mesma companhia.

1.6.1 Conceito e Espécies de Normas

A primeira tarefa para se conhecer o sistema jurídico de determinada companhia é ler e interpretar o seu estatuto social. Além do estatuto social, o sistema de cada companhia compreende também as normas cogentes da LSA e sua regulamentação. Geralmente, o estatuto social da companhia reproduz apenas algumas dessas normas.

Por esse motivo, a segunda tarefa para conhecer o sistema jurídico da companhia é comparar o estatuto social com a LSA e sua regulamentação, a fim de verificar se o estatuto contém dispositivos inválidos (seja por serem incompatíveis com normas cogentes ou por ultrapassarem os limites de normas legais) e interpretar as estipulações estatutárias à luz das normas da LSA, pois essa interpretação sistemática pode modificar o conteúdo das estipulações estatutárias quando consideradas de forma individual.

27 Contratos paralelos ao Estatuto Social e demais atos societários das companhias, como é o caso, por exemplo, de Acordos de Acionistas.

27 Contratos paralelos ao Estatuto So-cial e demais atos societários das com-panhias, como é o caso, por exemplo, de Acordos de Acionistas.

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O conhecimento do sistema jurídico da companhia pode requerer, ainda, uma terceira tarefa, consistente na verificação dos efeitos da interpretação sistemática que abranja leis gerais (como, por exemplo, o Código Civil), as leis especiais sobre institutos referidos na LSA e as leis de direito público que contenham normas aplicáveis à classe a que pertence a companhia, ou à atividade que constitua seu objeto social.

O conhecimento do sistema jurídico da companhia poderá compreender, por fim, uma quarta tarefa, no caso de haver contratos coligados ao da companhia, ou dele dependentes, ou se a constituição da companhia foi precedida de contrato preliminar, que consiste na interpretação sistemática que tenha em conta as estipulações desses contratos.

1.6.2 Normas do Estatuto Social

As normas do estatuto social formam o chamado sistema jurídico particular da companhia. A LSA dispõe, em seu art. 83, que o estatuto social “deverá satisfazer a todos os requisitos exigidos para os contratos das sociedades mercantis em geral e aos peculiares à companhia, e conterá as normas pelas quais se regerá a companhia”.

O estatuto social compreende as normas particulares ou individuais criadas pelas partes do contrato da companhia, como ocorre em qualquer outro contrato, mas apresenta duas peculiaridades:

(i) a LSA, além de regular o contrato da companhia, é a legislação de organização das companhias; e

(ii) suas normas são genéricas, no sentido de que não são dirigidas a pessoas identificadas.

Essas peculiaridades resultam da característica de que os direitos e as obrigações dos acionistas são definidos no estatuto como elementos das ações, com abstração de seus titulares. O acordo de vontades que cria a companhia tem por destinatários quaisquer pessoas que ocupem e venham a ocupar as posições jurídicas de acionistas ou os cargos dos órgãos sociais.

Pode-se dizer, portanto, que o estatuto social tem a mesma natureza do direito objetivo, no sentido de que é um sistema de normas jurídicas genéricas, obrigatórias e permanentes, que somente podem ser modificadas ou extintas com a observância das normas jurídicas que regulam sua produção, vigência e eficácia.

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Nesse sentido, a LSA reserva aos subscritores das ações (na constituição) e à Assembleia Geral dos acionistas (durante a existência da companhia) a competência para, respectivamente, criar e modificar o estatuto.

A norma do estatuto somente deixa de viger:

(i) por nova deliberação da Assembleia Geral, adotada com a observância dos preceitos legais aplicáveis28; ou

(ii) por decisão judicial que declare a sua invalidade.

1.6.3 Normas da LSA

As normas da LSA configuram um sistema de normas que regulam o contrato de sociedade e integram o estatuto legal da organização social. Algumas dessas normas são:

(i) Cogentes: Definem características essenciais das companhias ou excluem a autonomia de vontade das partes contratantes, por tratarem-se de normas de cumprimento obrigatório;

(ii) Dispositivas: Sua aplicação pode ser afastada pelas partes ao exercerem a liberdade de contratar;

(iii) Supletivas: Aplicam-se na ausência da manifestação de vontade dos contratantes; ou

(iv) Interpretativas dos preceitos legais e das estipulações contratuais.

1.6.4. Outras Normas Legais

O Código Civil também integra o sistema jurídico da companhia, na medida em que contém disposições sobre diversos institutos que se aplicam às companhias (pessoas jurídicas, negócios jurídicos, atos ilícitos, prescrição e decadência, direitos das obrigações, responsabilidade civil, entre outros).

Há, ainda, leis de direito público que contêm normas aplicáveis às companhias, como as que regulam os mercados de valores mobiliários (Lei nº 6.385/76) e dispõem sobre companhias abertas, bem como as do Código Penal, cujo art. 177 tipifica os crimes praticados pelos fundadores, administradores e acionistas de companhias.

28 Vide art. 122, I, da LSA: “Art. 122. Compete privativamente à assembleia geral: I - reformar o estatuto social”

28 Vide art. 122, inc. I da LSA: “Art. 122. Com--pete privativamente à assembleia geral: I - reformar o estatuto social”

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1.6.5. Contratos Parassociais

A expressão “contratos parassociais” significa gênero de contratos coligados ao de sociedade, ou dele dependentes, pelos quais os sócios contraem obrigações sobre exercício de seus direitos de sócio e de dispor de suas participações societárias, ou sobre obrigações de prover recursos à sociedade. São contratos distintos do contrato de sociedade, mas a ele acessórios e complementares. A modalidade de contrato parassocial mais estudada é o acordo de acionista.

Na definição de Carlos Augosto da Silveira Lobo, os acordos de acionistas são modalidades de “contrato parassocial”, que compreendem contratos em que as partes regulam ou complementam seus direitos e obrigações como sócios de determinada sociedade e por isso são considerados coligados ao contrato social, ou acessórios deste.

Por força de expressa disposição legal (art. 118 da LSA), o acordo de acionistas integra o sistema jurídico da companhia quando arquivado na sua sede. A Lei nº 10.303/01 reforçou a eficácia da referida norma ao acrescentar ao art. 118 da LSA os parágrafos 8º e 9º, que impedem o descumprimento, na Assembleia Geral ou nos órgãos de administração, de obrigações de votar segundo as disposições do acordo de acionistas arquivado na companhia.

1.7. Órgãos Sociais

A sociedade anônima, como qualquer outra pessoa jurídica, manifesta a vontade social por meio de seus órgãos. Nesse sentido, a LSA prevê a existência de, ao menos, quatro órgãos sociais:

(i) Assembleia Geral;(ii) Diretoria; (iii) Conselho Fiscal, o qual, entretanto, não precisa funcionar continuamente;(iv) Conselho de Administração nas companhias abertas (art. 138, § 2º,

LSA), nas sociedades de capital autorizado (art. 138, § 2º, LSA) e de economia mista (art. 239 LSA) (na sociedade anônima fechada, o conselho de administração é facultativo)29.

Ainda, de acordo com o art. 160 da LSA, permite-se que o estatuto crie outros órgãos com funções técnicas ou de aconselhamento.

Melhor análise desse tema se dará nos tópicos 5 e 6. Por ora, cabe mencionar brevemente o seguinte a respeito de cada um dos órgãos sociais legalmente previstos:

29 Lei nº 6.404/76: “Artigo 138. A administração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao conselho de administração e à direto-ria.” “§1º O conselho de administração é órgão de deliberação colegiada, sendo a representação da companhia privativa dos diretores.”“§ 2º As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoriamente, conselho de administração.”

29 Lei nº 6.404/76: “Artigo 138. A ad-ministração da companhia competirá, conforme dispuser o estatuto, ao con-selho de administração e à diretoria.” “§1º O conselho de administração é órgão de deliberação colegiada, sendo a representação da companhia privativa dos diretores.”“§ 2º As companhias abertas e as de capital autorizado terão, obrigatoria-mente, conselho de administração.”

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1.7.1. Assembleia Geral

Para que uma coletividade expresse sua vontade, normalmente são realizadas deliberações. A Assembleia Geral, assim, é o órgão em que ocorrem tais deliberações no âmbito das sociedades, permitindo que os sócios realizem uma atividade democrática, na qual cada um tem direito a voto. As assembleias são reguladas pelo Capítulo XI da LSA.

Nas deliberações das sociedades empresárias, leva-se em consideração a titularidade de ações que atribuem ao seu titular o direito a voto. Desse modo, cada voto corresponde a uma ação, fazendo com que prevaleça a vontade daquele que possuir mais ações do que os outros sócios.

Com isso, a Assembleia Geral adquire a posição de órgão societário mais importante, estando no topo da estrutura hierárquica das sociedades, na qual reside a fonte maior de todo o poder. Formada pela reunião de todos os acionistas de uma companhia, ela tem competência irrestrita para deliberar sobre quaisquer os assuntos de interesse da sociedade, e, para além disso, sua relevância também pode ser atribuída ao fato de ser o órgão responsável por eleger e destituir os ocupantes de outros órgãos sociais.

As Assembleias podem ser subdivididas em:

ESPÉCIE CONCEITO EXEMPLOS

GERAL

Para a qual todos os sócios são convidados.

Pode ser ordinária ou extraordinária.

Ordinária: quando a matéria está presente no rol do art. 132 da LSA;

Extraordinária: todos os outros temas que não previstos no art. 132 da LSA, como a alteração do estatuto social e o aumento do capital social.

ESPECIALPara a qual são convidados alguns indivíduos específicos.

Assembleia Especial de debenturistas, de titulares de uma determinada classe ou espécie de ações.

Em relação aos quóruns de deliberação:

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

40FGV DIREITO RIO

1.7.2. Diretoria

Trata-se do órgão executivo da sociedade, sendo seus membros detentores do poder da representação social, além de serem responsáveis pela direção da sociedade, desde o desenvolvimento dos negócios e abertura de mercados ao comando dos empregados. Tal órgão encontra-se regulado nos arts. 143 a 152 da LSA.

1.7.3. Conselho Fiscal

Trata-se do órgão da companhia destinado a fiscalizar os atos dos administradores e o cumprimento dos seus deveres estatutários e legais, regulado pelos arts. 161. a 165-A da LSA. A Lei não impõe o seu funcionamento permanente, podendo o estatuto dispor sobre o mesmo.

1.7.4. Conselho de Administração

Conforme os arts. 138, § 2º e 239 da LSA, sua existência só é exigida pela lei nas companhias abertas, de capital autorizado e nas sociedades de economia mista, sendo opcional na sociedade anônima fechada30.

Trata-se de órgão colegiado, deliberativo, que, hierarquicamente, está entre a assembleia geral e a diretoria. Tem como função orientar os negócios da companhia, eleger, acompanhar e fiscalizar os diretores, dentre outras atribuições definidas no art. 142 da LSA.

30 Deve-se atentar aos casos em que companhias fechadas recebem investimentos de Fundos de Investimento em Participações (FIP). Isso porque a ICVM nº 578/16, ao regular tais Fundos prevê, em seu art. 6º, III, o papel do Conselho de Administração nas sociedades que recebem investimentos de FIPs. Importante notar que, com o advento da referida ICVM, a existência de Conselho de Administração nas companhias fechadas que recebam investimento de Fundos de Investimento em Participações (FIPs) passou a ser facultativa.

30 Deve-se atentar aos casos em que companhias fechadas recebem investi-mentos de Fundos de Investimento em Participações (FIP). Isso porque a ICVM nº 578/16, ao regular tais Fundos pre-vê, em seu art. 6º, III, o papel do Con-selho de Administração nas sociedades que recebem investimentos de FIPs. Importante notar que, com o advento da referida ICVM, a existência de Conse-lho de Administração nas companhias fechadas que recebam investimento de Fundos de Investimento em Participa-ções (FIPs) passou a ser facultativa.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

41FGV DIREITO RIO

2. ESQUEMA

3. COMPANHIAS ABERTAS VS. COMPANHIAS FECHADAS

O art. 4º da LSA estabeleceu a existência de duas espécies de sociedades anônimas: (i) as sociedades anônimas de capital aberto e (ii) as sociedades anônimas de capital fechado. Segundo o referido dispositivo, “a companhia é aberta ou fechada conforme os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários”. Desse modo, a distinção entre uma companhia “aberta” e uma “fechada” repousa basicamente numa situação formal, representada pela admissão de títulos da companhia em bolsa.

Por sua vez, a admissão de negociação dos títulos em bolsa dá-se por meio do respectivo registro da companhia na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, consoante dispõe o art. 4º, §1º, da LSA, nos seguintes termos: “somente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de Valores Mobiliários podem ser negociados no mercado de valores mobiliários.”31 Exige-se o Registro de Emissão Pública e o Registro de Companhia Aberta para negociação em Bolsa ou no Mercado de Balcão Organizado, consoante discriminados nas Instruções CVM nº 400/03 e nº 480/09.

31 No mesmo sentido, dispõe o art. 22 da Lei nº 6.835/76: “Art. 22. Considera-se aberta a companhia cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação na bolsa ou no mercado de balcão.”

31 No mesmo sentido, dispõe o ar-tigo 22 da Lei nº 6.835/76: “Art. 22. Considera-se aberta a companhia cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociacao na bolsa ou no mercado de balcao.”

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

42FGV DIREITO RIO

Além das ações, outros valores mobiliários são passíveis de emissão para negociação no mercado, conforme expressamente elencados no rol art. 2º da Lei nº 6.385/7632.

4. DISTRIBUIÇÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS

Como já abordado anteriormente, a sociedade anônima confere diversos mecanismos para o financiamento da atividade empresarial, especialmente mediante a emissão e distribuição de títulos e valores mobiliários.

Nesse sentido, a distribuição de valores mobiliários pode ser feita de forma pública ou privada. A distribuição “privada” consiste na distribuição de títulos voltada para um grupo restrito, com ou sem intermediação financeira, sendo dispensado de registro na CVM. Esse tipo de distribuição pode, portanto, ser realizada por companhias fechadas.

A distribuição pública de valores mobiliários, por seu turno, afigura-se o meio pelo qual as companhias ou os titulares de valores mobiliários de sua emissão realizam, mediante apelo ao público, a colocação destes ativos no mercado de capitais. Nesse caso, a companhia deverá ser de capital aberto. O termo utilizado para identificar a primeira vez em que uma companhia emite valores mobiliários ao mercado é IPO – Initial Public Offer. As ofertas de ações podem ser primárias ou secundárias:

OFERTA PÚBLICA PRIMÁRIA OFERTA PÚBLICA SECUNDÁRIA

Ocorre com a emissão de novas ações, que, quando compradas, serão revertidas em valores à companhia. Esse tipo de oferta atende a principal função econômica do mercado de capitais, uma vez que representa o financiamento de médio e longo prazo da sociedade.

Ocorre com a oferta ao mercado de ações já existentes, de titularidade dos acionistas. Os recursos obtidos em contrapartida da aquisição das ações são destinados aos acionistas vendedores.

Trata-se da subscrição das ações (cash-in).

Trata-se de compra e venda de ações (cash-out).

32 Artigo 2º da Lei nº 6.385/76.

32 Artigo 2º da Lei nº 6.385/76.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

43FGV DIREITO RIO

5. MERCADO DE CAPITAIS: O ACESSO À POUPANÇA POPULAR

A admissão da negociação de valores mobiliários de uma companhia no mercado de capitais apresenta uma série de vantagens à companhia, notadamente relacionadas à captação de recursos. Isso, porque no mercado de capitais (ou mercado de valores mobiliários) são efetuadas operações que não apresentam a natureza de negócio creditício, nas quais a companhia contrai dívidas perante instituições financeiras, obrigando-se a devolver os recursos a taxas de juros expressivas.

No mercado de capitais, a canalização de recursos da companhia ocorre, em regra, mediante a aquisição de participação acionária (aquisição das ações admitidas à negociação em bolsa). Por conta disso, o retorno do investimento está, a rigor, relacionado à lucratividade da companhia e à valorização dos títulos. Nesse caso, tem-se um novo sócio, em vez de um credor, ao contrário do que ocorre quando o financiamento se dá mediante assunção de mútuos para com instituições financeiras.

Daí decorre a natureza do mercado de capitais como um mercado de “risco”, uma vez que seus investidores não possuem qualquer garantia de retorno do investimento, o qual dependerá do resultado positivo da companhia.

E mesmo nos casos em que a companhia oferta papéis que não conferem aos investidores participação acionária, mas verdadeiro direito de crédito, v. g. debêntures, a emissora pode, consoante o art. 56 da LSA, especificar as condições de remuneração do título de acordo com o seu perfil e capacidade financeira, em contraste com as duras condições impostas pelas instituições financeiras no mercado de créditos.

Além disso, diversamente do que ocorre no mercado de crédito, no mercado de capitais a mobilização de poupança é realizada diretamente entre a unidade econômica deficitária – entidade emissora – e a unidade econômica superavitária – o investidor. Inexiste, nesta hipótese, intermediação financeira, porquanto os recursos fluem diretamente dos adquirentes dos valores imobiliários para as empresas que os emitem. Nesse sentido, confere-se o acesso direto à poupança popular.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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6. A COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS

Por conta do acesso direto à poupança popular conferido pelo mercado de capitais às companhias emissoras, foi criada a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, a fim de regular o mercado de capitais, tendo por princípio básico defender os investidores e o mercado de valores mobiliários em geral.

A CVM é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Fazenda com personalidade jurídica e patrimônio próprio. Foi criada pela Lei nº 6.385/76, que fixou suas funções especificas, sempre correlacionadas ao mercado de títulos emitidos pelas sociedades anônimas.

A CVM visa consolidar o mercado de valores mobiliários como instrumento dinâmico e eficaz na (i) formação de poupanças; (ii) capitalização de companhias abertas; e (iii) dispersão de renda e propriedade. Busca a participação do público de forma crescente, assegurando acesso às informações sobre valores mobiliários negociados e sobre os emitentes.

A CVM tem como atribuições disciplinar e fiscalizar as atividades previstas nos incisos do art. 1º da Lei nº 6.385/76, a saber: “I - a emissão e distribuição de valores mobiliários no mercado; II - a negociação e intermediação no mercado de valores mobiliários; III - a negociação e intermediação no mercado de derivativos; IV - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Valores; V - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Mercadorias e futuros; VI - a administração de carteiras e a custódia de valores mobiliários; VII - a auditoria das companhias abertas; e VIII - os serviços de consultor e analista de valores mobiliários”.

Por sua vez, as competências da CVM estão estabelecidas no art. 8º da

Lei nº 6.385/76, quais sejam: “I - regulamentar, com observância da política definida pelo Conselho Monetário Nacional, as matérias expressamente previstas nesta Lei e na lei de sociedades por ações; II - administrar os registros instituídos por esta Lei; III - fiscalizar permanentemente as atividades e os serviços do mercado de valores mobiliários, de que trata o Art. 1º, bem como a veiculação de informações relativas ao mercado, às pessoas que dele participem, e aos valores nele negociados; IV - propor ao Conselho Monetário Nacional a eventual fixação de limites máximos de preço, comissões, emolumentos e quaisquer outras vantagens cobradas pelos intermediários do mercado; e V - fiscalizar e inspecionar as companhias abertas”.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

45FGV DIREITO RIO

7. CANCELAMENTO DE REGISTRO (I.E., FECHAMENTO DE CAPITAL)

De outra ponta, caso a companhia pretenda cancelar o registro junto à CVM, regressando à condição de sociedade anônima fechada, cujos valores mobiliários não mais serão admitidos à negociação em bolsa, é necessário que a companhia emissora proponha oferta pública para aquisição da totalidade de suas ações em circulação, assim como o resgate das debêntures, bônus de subscrição ou outros valores mobiliários levados ao mercado.

Também devem ser cumpridas as exigências da Instrução CVM nº 361/02, a qual exige a aceitação da oferta ou a concordância com o fechamento do capital por no mínimo dois terços do total correspondente às ações que de alguma forma se manifestaram sobre o tema.

A esse respeito, vale registrar também, a inclusão do §4º ao art. 4º da LSA, por meio da Lei nº 10.303/01:

§ 4o O registro de companhia aberta para negociação de ações no mercado somente poderá ser cancelado se a companhia emissora de ações, o acionista controlador ou a sociedade que a controle, direta ou indiretamente, formular oferta pública para adquirir a totalidade das ações em circulação no mercado, por preço justo, ao menos igual ao valor de avaliação da companhia, apurado com base nos critérios, adotados de forma isolada ou combinada, de patrimônio líquido contábil, de patrimônio líquido avaliado a preço de mercado, de fluxo de caixa descontado, de comparação por múltiplos, de cotação das ações no mercado de valores mobiliários, ou com base em outro critério aceito pela Comissão de Valores Mobiliários, assegurada a revisão do valor da oferta, em conformidade com o disposto no art. 4o-A.

O referido dispositivo optou por não estabelecer um único critério para a mensuração do preço da ação da companhia que pretenda o cancelamento de seu registro. A Lei apenas impôs que o preço seja justo, procurando impedir qualquer mensuração arbitrária e vil das ações, em proteção aos acionistas minoritários.

Sobre tal dispositivo, asseverou Nelson Eizirik33:

Um dos objetivos essenciais das normas que regulam os proce- dimentos de fechamento de capital, além de assegurar o direito de saída, é o de conferir aos minoritários titulares de percentual relevante das ações em circulação no mercado a possibilidade de impedir o cancelamento de registro de companhia aberta.

33 EIZIRIK, Nelson. Lei das S.A. Comentada, Vol. I. Quartier Latin. São Paulo, 2011, p. 79.

33 EIZIRIK, Nelson. Lei das S.A. Comentada, Vol. I. Quartier Latin. São Paulo, 2011. P. 79.

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46FGV DIREITO RIO

A pessoa que investe em determinada companhia aberta tem a expectativa de que os valores mobiliários adquiridos poderão ser, a qualquer momento, negociados no mercado. Logo, seria extremamente prejudicial ao próprio desenvolvimento do mercado de capitais se tal expectativa pudesse ser frustrada por decisão discricionária dos acionistas controladores ou dos administradores da companhia.

Embora o dispositivo represente uma preocupação com os acionistas minoritários, que possuem grande relevância ao desenvolvimento do mercado de capitais, a definição de “preço justo” é um conceito jurídico indeterminado, o que enseja possíveis desentendimentos.

7.1. Squeeze Out (Resgate Compulsório)

Já o novo § 5º do artigo 4º da Lei das S.A. determina o resgate compulsório das ações pertencentes aos acionistas minoritários, se, terminado o prazo da oferta pública referido no § 4º, remanescerem em circulação menos de 5% do total das ações emitidas pela companhia. A decisão de resgate compulsório é tomada em assembleia geral, e o preço de resgate é o da oferta pública, devendo ser depositado em estabelecimento bancário autorizado pela CVM, à disposição dos seus titulares.

Norma Parente34 esclarece e justifica a implementação do instituto:

Encerrada a oferta pública, se remanescerem em circulação menos de 5% do total das ações emitidas pela companhia, a assembleia geral poderá deliberar o resgate dessas ações pelo mesmo valor da oferta de fechamento de capital. A lei parte do princípio de que a aprovação de 95% dos acionistas referenda os termos da oferta. Evita-se, assim, que, numa sociedade em que 95% dos sócios aceitaram a oferta, esta se veja obrigada a manter pequena quantidade de acionistas, em situações, como, por exemplo, quando se desconhece o paradeiro dos acionistas.

A preocupação deste artigo é fazer valer a decisão da grande maioria do capital social que deseja fechar o capital. Afinal, se a grande maioria dos acionistas aceitou o valor deliberado para o resgate, entende-se que esta vontade deve predominar em detrimento dos 5% que não desejam vender suas ações.

34 2002, Parecer CVM/SJU/Nº361 p.20;

34 2002, Parecer CVM/SJU/Nº361 p.20;

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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8. NORMAS ESPECIAIS DA LSA EM RELAÇÃO ÀS COMPANHIAS ABERTAS

As normas a seguir aplicam-se, unicamente, às companhias abertas.

8.1. Registro e classificação das companhias abertas: art. 4º, e §§, da LSA

Todos os valores mobiliários que a companhia queira negociar ou distribuir no mercado devem ser registrados na CVM, na forma do art. 4º, §§ 1º e 2º, da LSA. Feito isso, o registro apenas pode ser cancelado após oferta pública para compra da totalidade dos valores em circulação no mercado, conforme dispõe o art. 4º, §§ 4º e 5º, da LSA.

Caso um determinado acionista ou sociedade controladora adquira ações de uma companhia, elevando sua participação além das margens fixadas pela CVM tal que seja configurada aquisição de controle, é obrigatória a realização de oferta pública para compra das ações remanescentes no mercado (art. 4º, §§ 4º, da LSA).

Além disso, a CVM pode classificar as companhias abertas em categorias e especificar as normas aplicáveis a cada categoria, como permite o art. 4º, § 3º, da LSA.

8.2. Ações

De acordo com o § 1º do art. 17 da LSA, as ações preferenciais sem direito de voto ou com restrição ao exercício deste direito, somente serão admitidas à negociação no mercado de valores mobiliários se a elas for prevista pelo menos uma das preferências ou vantagens previstas nos incisos seguintes do referido dispositivo.

As ações a serem negociadas devem, claro, obedecer às normas da CVM (art. 30, § 2º, da LSA) e estarão admitidas para tal uma vez realizado 30% do preço de emissão.

8.3. Partes beneficiárias e debêntures

A companhia aberta é proibida de emitir partes beneficiárias, consoante o art. 47, parágrafo único, da LSA.

Já quanto às debêntures, o conselho de administração da companhia poderá deliberar sobre emissão de debêntures não conversíveis em ações, salvo disposição estatutária em contrário, conforme autoriza o art. 59, § 1º da LSA.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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Os títulos múltiplos de debêntures obedecerão à padronização fixada pela CVM (art. 65, § 1º, da LSA) e as suas escrituras de emissão terão intervenção de agente fiduciário (art. 61, §1º, da LSA).

Debêntures emitidas no exterior, por sua vez, dependem de autorização da CVM para sua regular emissão no Brasil (art. 73, § 4º, da LSA).

8.4. Constituição e livros sociais

A constituição da companhia deverá ser feita mediante subscrição pública, regulada nos arts. 82 e seguintes da LSA.

Seus fundadores e a instituição financeira que participar da subscrição pública responderão, no âmbito das respectivas atribuições, pelos prejuízos resultantes da inobservância de preceitos legais. Os primeiros, além disso, responderão solidariamente pelo prejuízo decorrente de culpa ou dolo em atos ou operações anteriores à constituição.

Além disso, para fins de registro de suas operações, a companhia deverá manter determinados livros, afora àqueles já obrigatórios aos comerciantes, listados no art. 100 da LSA. Os livros sociais de registro e transferência de ações poderão ser substituídos por registros mecanizados ou eletrônicos, conforme disponham as regras da CVM a respeito (art. 100, § 2º, LSA).

8.5. Acionistas e acordo de acionistas

Dando efetividade ao dever de informação a que estão intitulados os acionistas, principalmente os minoritários, a lei societária prevê que (i) os acionistas controladores e aqueles que elegerem membros do conselho de administração ou fiscal deverão informar imediatamente as modificações na sua participação acionária (art. 116-A, da LSA) e, ainda, (ii) os órgãos da companhia devem informar anualmente o disposto no acordo de acionistas a respeito de reinvestimento de lucros e distribuição de dividendos (art. 118, § 5º, da LSA).

8.6. Assembleia Geral

Os prazos de convocação para as assembleias serão de 15 dias em 1ª convocação, e 8 dias, em 2ª convocação, conforme dispõe o art. 124, § 1º, da LSA. No entanto, é possível que a CVM aumente o prazo de convocação da assembleia que tiver por objeto deliberar sobre operações complexas ou suspender os prazos mencionados, observado o disposto no art. 124, § 5º, I e II, da LSA.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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Ainda, a CVM poderá autorizar a reduzição do quórum qualificado de deliberação da assembleia, atendendo ao contido no art. 136, §§ 2º e 3º, da LSA.

Importante notar que todos os documentos postos à disposição dos acionistas para fins de deliberação da assembleia de acionistas deverão ser entregues à bolsa de valores na data da publicação do anúncio de convocação da assembleia (art. 124, § 6º, da LSA).

A representação de acionistas, por sua vez, poderá ser feita por procurador que seja instituição financeira (art. 126, § 1º, da LSA).

Ademais, o direito de retirada não poderá ser exercido pelos sócios que detiverem ações de espécie ou classe que tenha liquidez no mercado (art. 137, II, da LSA), nos casos de fusão, incorporação ou participação em grupo de sociedades pela companhia.

8.7. Conselho de Administração

As companhias abertas são obrigadas a terem um conselho de administração (art. 138, § 2º, da LSA), cujas funções estão enumeradas no art. 142 da LSA.

Visando proteger os acionistas minoritários, incluiu-se na Lei Societária o instituto do voto em separado, que permite aos acionistas cuja participação em relação ao capital social deve ser de pelo menos 15% das ações com direito a voto ou 10% das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito e que o requererem, o poder de eleger ou a faculdade de destituir um membro do conselho de administração e seu suplente (art. 141, §§ 4º a 6º e 8º, da LSA).

8.8. Administradores

Nas companhias abertas, são inelegíveis para os cargos de administração as pessoas inabilitadas por ato da CVM (art. 147, § 2º, da LSA).

O administrador da companhia possui diversos deveres e obrigações, estando entre eles o dever de sigilo sobre qualquer informação não divulgada (art. 155, §§ 1º a 4º, da LSA). Isso inclui, ainda, o dever de não utilizar essas informações para obter vantagens na compra e venda de valores mobiliários, o que caracterizaria o chamado Insider Trading.

8.9. Modificação do Capital Social

O órgão competente para deliberar sobre emissão de ações mediante subscrição particular deverá dispor sobre as sobras de valores mobiliários não subscritos (art. 171, § 7º, da LSA).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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Além disso, se no estatuto da companhia houver autorização para aumento de capital, este poderá prever, também, a emissão (sem direito de preferência ou com redução do prazo de preferência) de ações, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição, que terão a colocação referida no art. 172 e incisos I e II da LSA.

8.10. Demonstrações Financeiras e Dividendo Obrigatório

As demonstrações financeiras das companhias abertas serão feitas de acordo com as normas contábeis expedidas pela CVM e serão auditadas por auditores independentes (art. 177, § 3º, da LSA).

Somente as companhias abertas exclusivamente para a captação de recursos por debêntures não conversíveis em ações podem distribuir dividendo inferior ao obrigatório (art. 202, da LSA) ou deixar de distribuir lucros (art. 202, § 3º, da LSA).

A companhia pode deixar de distribuir dividendos obrigatórios também quando isto for incompatível com a sua situação financeira, devendo encaminhar à CVM exposição justificada contida na ata da assembleia que assim deliberou.

8.11. Incorporação, Fusão e Cisão

Nestas operações societárias, sempre que envolverem companhia aberta, as sociedades que as sucederem deverão observar o disposto no art. 223, § 3º da LSA:

Art. 223, § 3º: Se a incorporação, fusão ou cisão envolverem companhia aberta, as sociedades que a sucederem serão também abertas, devendo obter o respectivo registro e, se for o caso, promover a admissão de negociação das novas ações no mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data da assembléia-geral que aprovou a operação, observando as normas pertinentes baixadas pela Comissão de Valores Mobiliários.

Caso não seja observado o procedimento acima, aos acionistas é garantido o direito de retirada, na forma do art. 223, § 4º, da LSA.

No que tange às incorporações e incorporações de ações de sociedades holdings, deve-se atentar ao Parecer de Orientação nº 34 da CVM, no sentido de que, nesses casos, se (i) a Holding e seus acionistas tiverem participação direta na Companhia e (ii) a proposta de incorporação considere uma relação

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51FGV DIREITO RIO

de troca que atribua valor diferente às ações de emissão da Companhia que sejam de propriedade da Holding e às demais ações da mesma espécie e classe de emissão da Companhia, estes estarão impedidos de votar sobre a realização da operação, como veda o art. 115, § 1º, da LSA.

Já nos casos de operações societárias que envolvam sociedade controladora e suas controladas, ou sociedades sob controle comum, deve-se atentar ao Parecer de Orientação CVM nº 35. O posicionamento da CVM, é no sentido de que, nesses casos, não há duas maiorias acionárias diferentes que defendam interesses distintos. Por conta disso, existe risco considerável de que a relação de troca de ações não seja comutativa. O referido Parecer, assim, prevê determinados deveres especiais aos administradores de companhias abertas quando estiverem diante desses casos.

8.12. Sociedade de Economia Mista

As sociedades de economia mista, assim como as demais companhias abertas, estão sujeitas às normas expedidas pela CVM, consoante o art. 235, §1º, da LSA. Os deveres, responsabilidades e obrigações de seus administradores são os mesmos dos administradores de companhias abertas (art. 239, parágrafo único, LSA).

8.13. Sociedades Coligadas, Controladoras e Controladas

A CVM poderá solicitar informações adicionais a respeito de sociedades controladoras e coligadas da companhia aberta, que deverão prestá-las, como dispõe o art. 243, § 3º, da LSA.

Além disso, a CVM poderá expedir normas sobre demonstrações financeiras consolidadas (art. 249, parágrafo único, da LSA). Nesse campo, é importante notar também que, na avaliação do investimento em coligadas e controladas, a diferença entre o valor do investimento e o custo de aquisição somente poderá ser registrada como resultado do exercício observadas as normas da CVM a respeito do assunto (art. 248, III, “c”, da LSA).

Quanto à alienação/compra de controle dessas companhias:

• A alienação ficará sujeita à condição de oferta pública para aquisição das ações com direito de voto de propriedade dos minoritários, de modo que lhes seja assegurado preço mínimo de 80% do valor pago por ação integrante do bloco de controle (art. 254-A e parágrafos da LSA);

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

52FGV DIREITO RIO

• Em se tratando de companhia aberta que dependa de autorização governamental, a alienação está sujeita à prévia autorização do órgão competente para aprovar a alteração do seu estatuto;

• A compra, por companhia aberta, do controle de qualquer sociedade mercantil dependerá de deliberação da assembleia geral da compradora para os casos listados no art. 256 da LSA, ressalvando-se o disposto no § 1º do citado artigo. Verificada a hipótese do § 2º do referido dispositivo, o acionista dissidente poderá exercer o direito de retirada.

Ademais, é necessário pontuar que, tanto no caso de oferta pública para aquisição de controle de companhia aberta, quanto no caso de incorporação, pela controladora, de controlada, há necessidade de participação de outras empresas para, respectivamente, garantir o cumprimento das obrigações assumidas pelo ofertante no primeiro caso (arts. 257 a 263, da LSA) e avaliar os dois patrimônios (art. 264, § 1º, da LSA), no segundo.

8.14. Publicações

Obedecendo à onda de inovação tecnológica, desde 2001, a Lei Societária passou a autorizar a disponibilização de suas comunicações na internet (art. 289, § 7º, da LSA). Ademais, cabe ressaltar que a CVM, no art. 13, § 2º, da Instrução nº 480/09, prevê a obrigatoriedade de companhias abertas, quando registradas na categoria A, possuírem e manterem uma página específica de relações com investidores na internet.

A redação atual do caput do art. 289 da LSA prevê que todas as publicações a serem realizadas pelas sociedades anônimas brasileiras deverão ser feitas, cumulativamente, (i) no órgão oficial da União ou do Estado ou do Distrito Federal, conforme o lugar da sede da companhia; e (ii) em outro jornal de grande circulação editado na localidade da sede.

Com a alteração promovida pela Lei nº 13.818/2019, o caput do art. 289 passará a prever que as publicações ordenadas pela Lei das S.A. serão divulgadas: (i) de forma resumida em jornal de grande circulação editado na localidade da sede da companhia; e (ii) na íntegra na página do mesmo jornal na internet, que deverá ter um sistema de certificação digital da autenticidade dos documentos. Tal redação, porém, apenas terá efeitos a partir de 1º de janeiro de 2022.

Desse modo, a Lei nº 13.818/2019 suprime a exigência de publicação dos documentos no Diário Oficial, bem como prevê que os documentos somente precisam ser divulgados na versão impressa do jornal escolhido de forma resumida.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

53FGV DIREITO RIO

A íntegra dos documentos apenas precisará ser publicada na internet, na página do mesmo jornal escolhido, de forma simultânea.

No que tange à publicação das demonstrações financeiras, a Lei nº 13.818/2019 prevê, na nova redação do art. 289 da LSA, que a publicação resumida no jornal de grande circulação deverá “conter, no mínimo, em comparação com os dados do exercício social anterior, informações ou valores globais relativos a cada grupo e a respectiva classificação de contas ou registros, assim como extratos das informações relevantes contempladas nas notas explicativas e nos pareceres dos auditores independentes e do conselho fiscal, se houver”. Tais disposições, porém, também entrarão em vigor somente em 1º de janeiro de 2022.

As alterações previstas na Lei nº 13.818/2019 promovem significativa simplificação de processos e redução de custos para as companhias brasileiras, representando importantes avanços iniciais e aproximando a legislação societária aos avanços tecnológicos alcançados nos últimos anos.

8.15 Redução de porcentagem

Conforme o art. 291, da LSA: “A Comissão de Valores Mobiliários poderá reduzir, mediante fixação de escala em função do valor do capital social, a porcentagem mínima aplicável às companhias abertas”, estabelecida nos seguintes artigos da Lei:

• Art. 105 à exibição de livros; • Art. 123, parágrafo único, ‘c’ à convocação da assembleia geral pelos

acionistas;• Art. 141, caput à pedido de votação pelo voto múltiplo na eleição de

conselheiros;• Art. 157, § 1º à pedidos de informações de acionistas na assembleia geral;• Art. 159, § 4º à propositura de ação de responsabilidade contra

administradores;• Art. 161, § 2º à pedido de instalação do conselho fiscal, quando seu

funcionamento não for permanente; • Art. 163, § 6º à pedido de informações ao conselho fiscal;• Art. 246, § 1º, ‘a’ à ação contra sociedade controladora; • Art. 277 à pedido de instalação do conselho fiscal das filiadas do

grupo de sociedades; e• Art. 249 à valor do patrimônio líquido da companhia aberta que

torna obrigatória a elaboração de demonstrações consolidadas (art. 291, par. único, LSA).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

54FGV DIREITO RIO

Diante disso, a CVM lançou, recentemente, uma nova Instrução – a Instrução CVM 627/2020 -, fixando escala reduzindo, em função do capital social, as porcentagens mínimas de participação acionária necessárias ao exercício dos direitos previstos no art. 105, na alínea “c” do parágrafo único do art. 123, no § 1º do art. 157, no § 4º do art. 159, no § 6º do art. 163 e na alínea “a” do § 1º do art. 246, todos da LSA. Os percentuais previstos nestes artigos foram reduzidos em função do valor do capital social da companhia aberta, conforme a tabela a seguir:

INTERVALO DO CAPITAL SOCIAL (R$1) PERCENTUAL MÍNIMO %

0 a 100.000.000 5

100.000.001 a 1.000.000.000 4

1.000.000.001 a 5.000.000.000 3

5.000.000.001 a 10.000.000.000 2

acima de 10.000.000.000 1

De acordo com o edital de Consulta Pública prévia à referida Instrução, a CVM entende que:

“A fixação de participação mínima para propositura de ações derivadas não é uma particularidade da lei brasileira, estando presente em diversas jurisdições. Se, por um lado, o requisito de participação mínima evita a propositura de ações frívolas, que oneram de modo descabido às companhias, a fixação de percentuais excessivamente altos pode consistir em empecilhos para que acionistas relevantes possam propor medidas para proteção dos interesses das próprias companhias. Não por acaso, o requisito é frequentemente apontado como um dos principais obstáculos para o desenvolvimento do enforcement privado no mercado de capitais.”

9. NORMAS ESPECIAIS DA LSA EM RELAÇÃO ÀS COMPANHIAS FECHADAS

As normas a seguir aplicam-se, por sua vez, somente às companhias fechadas.

9.1. Ações

Na companhias fechadas, as ações podem ser de uma ou mais classes, observado o art. 16 da LSA (art. 15, § 1º, da LSA).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

55FGV DIREITO RIO

9.2. Limitações à circulação das ações

O estatuto da companhia fechada pode limitar a circulação das ações nominativas, na forma do art. 36 da LSA.

9.3. Convocação da assembleia geral

A convocação das assembleias gerais deverá ser realizada, em primeira convocação, com, no mínimo, 8 dias de antecedência; já em segunda convicação, com 5 dias, conforme dispõe o art. 124, § 1º da LSA). O acionista que representar mais de 5% do capital social poderá convocado por carta ou telegrama, caso ele assim o requeira, observado o art. 124, § 3º, da LSA.

9.4. Assembleia Geral Ordinária

Os diretores da companhia fechada podem votar os documentos da administração se forem os únicos acionistas da companhia, consoante o art. 134, § 6º, da LSA.

9.5. Direito de preferência

Nos casos de sobras de ações não subscritas, as ações remanescentes deverão ser rateadas na proporção dos valores subscritos por cada acionista, nos termos do art. 171, § 7º, “b” e § 8º da LSA.

9.6. Exclusão do direito de preferência

A exclusão do direito de preferência dos acionistas é possível em apenas uma hipótese: na subscrição de ações nos termos de lei especial sobre incentivos fiscais (art. 172, parágrafo único, da LSA).

9.7 Demonstração das origens e aplicação dos recursos

A companhia fechada com patrimônio líquido não superior a R$2.000.000,00 (dois milhões de reais) não é obrigada a elaborar ou a publicar as referidas demonstrações (art. 176, § 6º, da LSA).

9.8. Companhia de Pequeno Porte

As companhias fechadas que tiverem menos de 20 (vinte) acionistas e, ao mesmo tempo, possuírem patrimônio líquido inferior a R$10.000.000,00 (dez milhões de reais), poderão valer-se das normas especiais previstas no art. 294 da LSA, que simplificam (i) requerimentos relacionados às convocações de suas assembleias e (ii) as exigências de registros e publicidade de atos societários e demonstrações financeiras.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

56FGV DIREITO RIO

10. COMPANHIAS ABERTAS: B3

A B335 é a principal instituição brasileira de intermediação para operações do mercado de capitais, que desenvolve, implanta e provê sistemas para a negociação de ações, derivativos de ações, títulos de renda fixa, títulos públicos federais, derivativos financeiros, moedas à vista e commodities agropecuárias.

Tendo em vista sua área de atuação, a B3 está sujeita à regulação e à supervisão da CVM e do Banco Central do Brasil.

10.1. Adesão Voluntária

Para que as sociedades sejam listadas na B3, é necessário que sejam, primeiramente, companhias abertas registradas na CVM. Paralelamente a este registro, devem as sociedades solicitar a listagem na B3 de acordo com o segmento desejado (Tradicional, Novo Mercado, Nível 1, Nível 2, Bovespa Mais e Bovespa Mais Nível 2).

Ressalta-se que o registro é imprescindível para que a companhia tenha suas ações e debêntures negociadas em Bolsa (note-se que, caso não queiram se registrar, as sociedades sempre possuem a opção de negociar seus ativos em mercado de balcão).

A adesão a qualquer um destes segmentos é absolutamente voluntária, o que gera a possibilidade de a companhia optar por aquele que melhor se adequar ao seu perfil e objetivos.

10.2. Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2

Os chamados segmentos especiais de listagem do mercado de ações (Novo Mercado, Nível 2, Nível 1) foram criados pela B3 há mais de 10 anos, no momento em que a Bolsa percebeu que, para desenvolver o mercado de capitais brasileiro e atrair novos investidores e novas sociedades, seria preciso ter segmentos de listagem com regras rígidas de governança corporativa.

Essas regras vão além das obrigações que as companhias têm perante a Lei das Sociedades por Ações. Com isso, disponibilizam maior transparência aos investidores, agregando valor à companhia, conforme refletem as pesquisas realizadas pela B3.

Além disso, as regras mais rígidas para as sociedades reduzem o risco dos investidores que decidem adquirir suas ações, graças aos direitos e garantias asseguradas aos acionistas e às informações mais completas divulgadas, que reduzem as assimetrias de informações entre acionistas controladores, gestores da companhia e os participantes do mercado.

35 “A B3 foi criada em março de 2017 como fruto da combinação entre a BM&FBOVESPA e a Cetip, dando origem a uma companhia de infraestrutura de mercado financeiro de classe mundial e con- solidando a atuação da BM&FBOVESPA na negociação e pós-negociação de produtos listados e da Cetip no registro e depósito de operações de balcão e de financiamento” Disponível em: <http://www.b3.com.br/pt_br/b3/institucional/quem-somos/>. Acessado em: 23 de junho de 2020.

35 “A B3 foi criada em marco de 2017 como fruto da combinacao entre a BM&FBOVESPA e a Cetip, dando ori-gem a uma companhia de infraestru-tura de mercado financeiro de classe mundial e con- solidando a atuacao da BM&FBOVESPA na negociacao e pós-negociacao de produtos listados e da Cetip no registro e depósito de operacoes de balcao e de financiamen-to” Disponível em: <http://www.b3.com.br/pt_br/b3/institucional/quem-somos/>. Acessado em: 23 de junho de 2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

57FGV DIREITO RIO

O Novo Mercado e os Níveis Diferenciados de Governança Corporativa – Nível 1 e Nível 2 – são segmentos especiais de listagem desenvolvidos com o objetivo de proporcionar um ambiente de negociação que estimulasse, ao mesmo tempo, o interesse dos investidores e a valorização das companhias.

Embora tenham fundamentos semelhantes, o Novo Mercado é direcionado principalmente à listagem de sociedades que venham a abrir capital, enquanto os Níveis Diferenciados 1 e 2 destinam-se a sociedades que já possuem ações negociadas na Bolsa B3.

Cada segmento possui exigências específicas para a admissão de uma sociedade, relacionadas à divulgação de informações (financeiras ou não), à estrutura societária, à estrutura acionária, ao percentual de ações em circulação e aos aspectos de Governança Corporativa. As normas do Novo Mercado são mais rígidas, variando entre os segmentos de Nível 2, Nível 1 e Tradicional.

O site do IBGC apresenta de forma clara e sintética diferenciação entre os segmentos:

Basicamente, o segmento de Nível 1 caracteriza-se por exigir práticas adicionais de liquidez das ações e disclosure. Enquanto o Nível 2 tem por obrigação práticas adicionais relativas aos direitos dos acionistas e conselho de administração.  O Novo Mercado, por fim, diferencia-se do Nível 2 pela exigência para emissão exclusiva de ações com direito a voto. Estes dois últimos apresentam como resultado esperado a redução das incertezas no processo de avaliação, investimento e de risco, o aumento de investidores interessados e, consequentemente, o fortalecimento do mercado acionário. Resultados que trazem benefícios para investidores, empresa, mercado e Brasil.

Segue, abaixo, quadro comparativo extraído do site da B336 que sintetiza as principais diferenças entre cada segmento:

36 Disponível em: <http://www.b3.com.br/pt_br/produtos-e-servicos/solucoes-para-emissores/segmentos-de-listagem/sobre-segmentos-de-listagem/>. Acesso em: 14.07.2020.

36 Disponível em: <http://www.b3.com.br/pt_br/produtos-e-servicos/solucoes-para-emissores/segmentos-de-listagem/sobre-segmentos-de-listagem/>. Acesso em: 14.07.2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

58FGV DIREITO RIO

  NOVO MERCADO NÍVEL 2 NÍVEL 1 BOVESPA MAIS BOVESPA MAIS NÍVEL 2 TRADICIONAL

CARACTERÍSTICAS DAS AÇÕES EMITIDAS

Permite a existência

somente de ações ON

Permite a existência de ações

ON e PN (com direitos adicionais)

Permite a existência de ações ON e

PN (conforme legislação)

Somente ações ON podem ser

negociadas e emitidas

Permite a existência de

ações ON e PN

Permite a existência de ações ON e

PN (conforme legislação)

PERCENTUAL MÍNIMO DE AÇÕES EM

CIRCULAÇÃO (FREE FLOAT)

25% ou 15%, caso o ADTV2 seja superior a R$ 25 MM

No mínimo 25% de free float 25% de free float atéo 7º ano de listagem

Não há regra específica

DISTRIBUIÇÕES PÚBLICAS DE

AÇÕES

Esforços de dispersão

acionária, exceto para ofertas ICVM 476

Esforços de dispersão acionária Não há regra específica

VEDAÇÃO A DISPOSIÇÕES

ESTATUTÁRIAS (A PARTIR DE 10/05/2011)

Limitação de voto inferior a 5% do capital, quórum qualificado e

“cláusulas pétreas”Não há regra

específicaQuórum qualificado e

“cláusulas pétreas” Não há regra

específica

COMPOSIÇÃO DO CONSELHO DE

ADMINISTRAÇÃO

Mínimo de 3 membros (conforme legislação),

dos quais, pelo menos, 2 ou 20% (o que for maior) devem ser

independentes, com mandato

unificadode até 2 anos

Mínimo de 5 membros, dos

quais, pelo menos, 20%

devem ser independentes, com mandato

unificadode até 2 anos

Mínimo de 3 membros (conforme legislação),

com mandato unificado

de até 2 anos

Mínimo de 3 membros (conforme legisl ação),

com mandato unificadode até 2 anos

Mínimo de 3 membros (conforme legislação)

VEDAÇÃO À ACUMULAÇÃO

DE CARGOS (A PARTIR DE 10/05/2011)

Presidente do conselho

e diretor presidente

ou principal executivo pela mesma pessoa.

Em caso de vacância que culmine em acumulação

de cargos, são anos a partir da

adesão)obrigatórias

determinadas divulgações.

Presidente do conselho e diretor presidente ou principal executivo pela mesma pessoa (carência de

3 anos a partir da adesão)Não há regra específica

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

59FGV DIREITO RIO

  NOVO MERCADO NÍVEL 2 NÍVEL 1 BOVESPA MAIS BOVESPA MAIS NÍVEL 2 TRADICIONAL

OBRIGAÇÃO DO CONSELHO DE

ADMINISTRAÇÃO (A PARTIR DE 10/05/2011)

Manifestação sobre qualquer oferta pública de aquisição de ações de emissão da companhia

(com conteúdo mínimo, incluindo

alternativas à aceitação da OPA

disponíveis no mercado)

Manifestação sobre qualquer oferta pública de aquisição de ações de emissão da companhia

(com conteúdo mínimo)

Não há regra específica

DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

Conforme legislação

Traduzidas para o inglês Conforme legislação

INFORMAÇÕES EM INGLÊS,

SIMULTÂNEASÀ DIVULGAÇÃO EM PORTUGUÊS

Fatos relevantes,

informações sobre proventos

(aviso aos acionistas ou comunicado

ao mercado) e press release de

resultados

Não há regra específica, além das DFs (vide item acima)

Não há regra específica

REUNIÃO PÚBLICA ANUAL

Realização, em até 5 dias úteis após a divulgação

de resultados trimestrais

ou das demonstrações financeiras, de apresentação

pública (presencial, por meio de

teleconferência, videoconferência ou outro meio que permita a participação a

distância) sobre as informações

divulgadas

Obrigatória (presencial) Facultativa

CALENDÁRIO DE EVENTOS

CORPORATIVOSObrigatório Facultativo

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

60FGV DIREITO RIO

  NOVO MERCADO NÍVEL 2 NÍVEL 1 BOVESPA MAIS BOVESPA MAIS NÍVEL 2 TRADICIONAL

DIVULGAÇÃO ADICIONAL DE INFORMAÇÕES (A PARTIR DE 10/05/2011)

Regimentos do Conselho de

Administração, de seus

comitês de assessoramento e do Conselho Fiscal, quando

instalado

Código de conduta (com

conteúdo mínimo)

Políticas de (i) remuneração; (ii) indicação

de membros do Conselho de

Administração, seus comitês de assessoramento

e diretoria estatutária; (iii) gerenciamento de riscos; (iv)

transação com partes

relacionadas; e (v) negociação

de valores mobiliários,

com conteúdo mínimo,

exceto a de remuneração

Divulgação (i) anual de

relatório resumido do comitê

de auditoria estatutário

contemplando os pontos

indicados no regulamento; ou (ii) trimestral de ata de reunião

do Conselho de Administração,

informando o reporte do comitê de

auditoria não estatutário

Política de negociaçãode valores mobiliáriose código de conduta

Política de negociaçãode valores mobiliários Não há regra

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

61FGV DIREITO RIO

  NOVO MERCADO NÍVEL 2 NÍVEL 1 BOVESPA MAIS BOVESPA MAIS NÍVEL 2 TRADICIONAL

CONCESSÃODE TAG ALONG

100% para ações ON

100% para ações ON e

PN

80% para ações ON (conforme

legislação)100% para ações ON

100% para ações ON e PN

80% para ações ON (conforme legislação)

SAÍDA DO SEGMENTO/

OFERTA PÚBLICA DE AQUISIÇÃO

DE AÇÕES (OPA)

Realização de OPA por preço justo,

com quórum de aceitação ou concordância com a saída

do s egmento de mais de 1/3

dos titulares das ações em circulação (ou

percentual maior previsto

no Estatuto Social)

Realização de OPA,

no mínimo, p elo valor econômicoem caso de

cancelamento de registro ou saída do segmento, exceto se houver

migração para Novo Mercado

Não aplicável

Realização de OPA,

no mínimo, pelo valor econômico em caso de

cancelament o de registro ou saída do segmento, exceto se houver

migração para Novo Mercado

Realização de OPA,

no mínimo, pelo valor econômico em caso de

cancelamento de registro ou saída do segmento, exceto se houver

migração para Novo Mercado

ou Nível 2

Não aplicável

ADESÃO À CÂMARA DE

ARBITRAGEMDO MERCADO

Obrigatória Facultativa Obrigatória Facultativa

COMITÊ DE AUDITORIA

Obrigatória a instalação de comitê

de auditoria, estatutário ou

não estatutário, que deve

atender aos requisitos

indicados no regulamento: composição e

atribuições

Facultativo

AUDITORIA INTERNA

Obrigatória a existência de área de auditoria

interna que deve atender aos requisitos indicados no regulamento

Facultativa

COMPLIANCE

Obrigatória a implementação de funções de compliance, controles

internos e riscos corporativos, sendo vedada a acumulação

com atividades operacionais

Facultativo

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

62FGV DIREITO RIO

10.3. Governança Corporativa

O fortalecimento do mercado de capitais brasileiro, especialmente no período compreendido entre 2004 e 2008, inseriu-se em contexto de prosperidade econômica global e abundância de investimentos em países emergentes (notadamente Brasil, Rússia, Índia e China), mas, como pondera a doutrina nacional37, tal fortalecimento também deve ser creditado a uma série de iniciativas coordenadas.

Dentre elas, destacam-se o esforço empreendido nas reformas das Leis nº 6.404/76 e nº 6.385/76 para aprimorar e fortalecer os direitos dos acionistas minoritários, e a criação, pela B3, de segmentos especiais de negociação de ações, de adesão voluntária, reservados para companhias que adotem práticas diferenciadas de governança corporativa, com a gradual e crescente adoção de tais práticas diferenciadas pelas companhias abertas brasileiras.

O emprego da expressão “governança corporativa” é severamente criticado pela doutrina. Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França e Mauro Moisés Kertzer38, por exemplo, sustentam que a expressão “governança corporativa” não é tradução adequada para corporate governance, propondo que tal expressão estaria traduzida de forma mais adequada para o nosso vernáculo pela expressão “governação compartilhada da companhia” ou mesmo “governo das sociedades”, tal como este conceito é utilizado em Portugal.

Arnold Wald39 também critica a utilização do termo “governança corporativa”, por tratar-se “de um anglicismo condenável, não só por respeito à língua nacional como também pela associação de ideia que pode acarretar. Na língua portuguesa, corporação tem o sentido de associação profissional, sendo inclusive uma reminiscência medieval”. E conclui ser “mais adequado usar a expressão ‘governo das empresas’, que é corrente nos países de língua latina, nos quais a corporação não se confunde com a sociedade anônima.

Entretanto, nesta apostila, tendo em vista a consolidação deste jargão na prática empresarial do Brasil, quando fizermos referência aos Regulamentos do Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2 da B3, licenciar-nos-emos para utilizar a expressão “governança corporativa”, ainda que contaminada de imprecisão conceitual, a fim de seguir a terminologia adotada pela B3.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC tem adotado a

seguinte definição em relação ao conceito de “governança corporativa”:

37 Neste sentido, destacamos especialmente: (i) Munhoz, Eduardo Secchi. Desafios do direito societário brasileiro na disciplina da companhia aberta: avaliação dos sistemas de controle diluído e concentrado. In: Castro, Rodrigo R. Monteiro; Aragão, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário: Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 119-155; e (ii) Azevedo, Luis André Negrelli de Moura. A oferta pública para aquisição de controle sob a perspectiva da companhia aberta ofertante. In: Castro, Rodrigo R. Monteiro; Aragão, Leandro Santos de (coord.), op. cit., pp. 74-114. 38 HOPT, Klaus J. Deveres legais e conduta ética de membros do conselho de administração e de profissionais. Tradução de Erasmo Valladão A. e N. França e Mauro Moisés Kertzer. RDM. São Paulo: Malheiros, n. 144, pp. 107-119, out./dez. 2006, p. 117.39 WALD, Arnoldo. O governo das empresas. RDB. São Paulo: RT, n. 15, jan./abr. 2002, p. 53.

37 Neste sentido, destacamos es-pecialmente: (i) Munhoz, Eduardo Secchi. Desafios do direito societário brasileiro na disciplina da companhia aberta: avaliação dos sistemas de con-trole diluído e concentrado. In: Castro, Rodrigo R. Monteiro; Aragão, Leandro Santos de (coord.). Direito Societário: Desafios Atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 119-155; e (ii) Aze-vedo, Luis André Negrelli de Moura. A oferta pública para aquisição de con-trole sob a perspectiva da companhia aberta ofertante. In: Castro, Rodrigo R. Monteiro; Aragão, Leandro Santos de (coord.), op. cit., pp. 74-114.

38 HOPT, Klaus J. Deveres legais e con-duta ética de membros do conselho de administração e de profissionais. Tradu-ção de Erasmo Valladão A. e N. França e Mauro Moisés Kertzer. RDM. São Paulo: Malheiros, n. 144, pp. 107-119, out./dez. 2006, p. 117).

39 WALD, Arnoldo. O governo das em-presas. RDB. São Paulo: RT, n. 15, jan./abr. 2002, p. 53)

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

63FGV DIREITO RIO

Governança Corporativa é o sistema que assegura aos sócios-proprietários o governo estratégico da empresa e a efetiva monitoração da diretoria executiva. A relação entre propriedade e gestão se dá através do conselho de administração, a auditoria independente e o conselho fiscal, instrumentos fundamentais para o exercício do controle. A boa Governança assegura aos sócios eqüidade, transparência, responsabilidade pelos resultados (accountability) e obediência às leis do país (compliance). No passado recente, nas empresas privadas e familiares, os acionistas eram gestores, confundindo em sua pessoa propriedade e gestão. Com a profissionalização, a privatização, a globalização e o afastamento das famílias, a Governança Corporativa colocou o Conselho entre a Propriedade e a Gestão.40

Destaque-se que a tendência moderna no que tange à aplicação da governança corporativa é transpô-la também às relações institucionalistas (e não apenas às contratualistas, que se restringem ao relacionamento dos sócios enquanto sócios).

Na abordagem institucionalista da governança corporativa, há uma preocupação, cada vez maior, com os “stakeholders”, que são todos aqueles terceiros que mantém relacionamento com a sociedade (i.e., credores, trabalhadores, comunidade, consumidores e sociedade civil em geral, na qual a companhia se insere).

40 Disponível em < https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa>. Acessado em: 23 de junho de 2020.

40 Disponível em < https://www.ibgc.org.br/conhecimento/governanca-corporativa>. Acessado em: 23 de junho de 2020.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

64FGV DIREITO RIO

3.COMPARAÇÃO E ANÁLISE DAS DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS (SOCIEDADES LIMITADAS VS. SOCIEDADES ANÔNIMAS);

414243QUADRO COMPARATIVO ENTRE SOCIEDADE LIMITADA E SOCIEDADE ANÔNIMA

SOCIEDADES LIMITADAS SOCIEDADES ANÔNIMAS

LEGISLAÇÃOAPLICÁVEL

• Código Civil de 2002 (“Código Civil”); e

• Em caso de omissão, conforme previsto no Art. 1.053 do Código Civil, aplica-se supleti-vamente: (i) as normas das Sociedades Simples; ou (ii) a Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/76), se desta forma estiver previsto no Contrato Social da Sociedade.

Lei nº 6.404, de 1976 (“LSA”) e alterações pos-teriores.

NATUREZAJURÍDICA

• Forma: (i) simples41; ou (ii) empresária42.

• Forma: necessariamente empresária.

• Classificação:

(i) Fechada: não admite negociação de seus va-lores mobiliários nos mercados organizados; ou

(ii) Aberta: admite a emissão e negociação de seus valores mobiliários na bolsa de valores e no mercado de balcão. Sujeita-se à normas mais rí-gidas, acentuada transparência e publicidade de seus atos e constante fiscalização da CVM43 e demais órgãos públicos especializados em regu-lamentar e fiscalizar o Mercado de Capitais.

ATO CONSTITUTIVO Contrato Social. Estatuto Social.

41 41 As sociedades simples são caracterizadas pela prática de atividades, que por lei, são classificadas como não empresárias, tais como, profissão intelectual, de natureza científica, literária e caracterizada como de empresário rural.42 42 As sociedades empresárias são caracterizadas pela exploração habitual de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, com escopo de lucro.43 43 Comissão de Valores Mobiliários.

41 As sociedades simples são caracteri-zadas pela prática de atividades, que por lei, são classificadas como não empresá-rias, tais como, profissão intelectual, de natureza científica, literária e caracteri-zada como de empresário rural.

42 As sociedades empresárias são carac-terizadas pela exploração habitual de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, com escopo de lucro.

43 Comissão de Valores Mobiliários.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

65FGV DIREITO RIO

NOME SOCIAL

• Denominação:

(i) expressão: “Limitada” ou respectiva abrevia-tura “Ltda.”;

(ii) indicação do objeto social; (iii) nome civil de qualquer fundador, sócio ou pessoa que tenha concorrido para o êxito da Sociedade; ou qualquer outro tipo de expressão linguística; e

(iv) a denominação permanece inalterada mes-mo com a entrada ou retirada de sócios, portan-to, o sócio, cujo nome esteja contemplado na denominação social, caso se retire, não poderá exigir a sua alteração. • Firma:

(i) composta por nome de um ou mais sócios, desde que pessoas físicas; e

(ii) a sociedade ficará obrigada a alterar sua fir-ma social, na hipótese de o sócio, cujo nome esteja contemplado na firma social, se retirar da sociedade.

• Denominação:

(i) expressões: “Companhia”, “Sociedade Anôni-ma,” por extenso, ou, sua abreviatura, “S.A.”, sen-do vedada a utilização da primeira ao final;

(ii) indicação do objeto social; e (iii) pode constar nome civil de qualquer funda-dor, acionista ou pessoa que tenha concorrido para o êxito da Sociedade; ou qualquer outro tipo de expressão linguística

REGISTRO

• Registro Público de Empresas Mercantis, se sociedade empresária; ou

• Registro Civil de Pessoas Jurídicas, se socie-dade simples.

• Companhias Abertas e Fechadas: Registro Público de Empresas Mercantis (Juntas Comerciais).

• As companhias de capital aberto, além do re-gistro na respectiva Junta Comercial, precisam ser registradas perante a CVM.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

66FGV DIREITO RIO

FORMA DEDELIBERAÇÃO

• Reunião de Sócios: pode ter seu procedimento (instalação, convocação, composição da mesa, etc) livremente convencionado no Contrato So-cial, sendo aplicável o disposto no Código Civil para as assembleias, na hipótese de omissão das regras aplicáveis às reuniões; ou

• Assembleia Geral: obrigatória quando o núme-ro de sócios da Sociedade Limitada for superior a 10 (dez) ou se assim previsto no Contrato Social.

• Dispensa: a Assembleia ou Reunião será dis-pensável se todos os sócios decidirem, por escri-to, sobre matéria que, por lei, deve ser tratada mediante deliberação.

• Assembleia Geral: tem competência para de-cidir todos os negócios relativos ao objeto da Companhia e tomar as resoluções que julgar necessárias ao desenvolvimento da mesma.

• Classificação:

(i) Ordinária: realizada anualmente, nos 4 (qua-tro) primeiros meses do ano seguinte ao fim do último exercício social, com a finalidade de: (a) tomar as contas dos administradores, (b) votar as demonstrações financeiras do exercício social, (c) deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e distribuição dos dividendos, (d) eleger os administradores e membros do Con-selho Fiscal, quando for o caso, e (e) aprovar a correção monetária do capital social (“AGO”);

(ii) Extraordinária – deverá ser realizada a qual-quer tempo para tratar de matérias de interesse da Companhia, assim como, (a) a modificação do estatuto social, (b) criação de valores mobili-ários, (c) aumento do capital social, dentre ou-tras matérias constantes do edital de convocação (“AGE”).

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

67FGV DIREITO RIO

CONVOCAÇÃO

• Competência: originária dos administradores, mas em caso de atraso cabe aos sócios ou ao Conselho Fiscal, quando instalado e nos casos previstos em lei.

• Regra Geral: obrigatória a publicação do edi-tal de convocação da reunião ou assembleia de sócio por no mínimo 3 (três) vezes, com prazo de antecedência, em primeira convocação, de 8 dias da data da reunião, e de 5 dias para as pos-teriores convocações.

• Dispensa: dispensada ante a presença da tota-lidade dos sócios ou de declaração, por escrito, de ciência do local, da data, hora e ordem do dia.

• Competência: originária do Conselho de Administração ou, não havendo tal órgão na companhia, cabe aos diretores. Na hipótese de atraso na convocação, poderão os acionistas ou o Conselho Fiscal, quando instalado e nos casos previstos em lei, convocar as assembleias.

• Regra Geral: obrigatória a publicação do edital de convocação por no mínimo 3 (três) vezes:

(i) se Companhia Aberta, o prazo de antecedên-cia da primeira convocação é de 15 (quinze) dias; e para a segunda, 8 (oito) dias; ou

(ii) se Companhia Fechada, o prazo de antecedên-cia da primeira convocação é de 8 (oito) dias; e para a segunda, 5 (cinco) dias; ou

• Exceção: não há necessidade de publicação do edital de convocação na hipótese de Companhia Fechada com menos de 20 (vinte) acionistas e patrimônio líquido inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), podendo a convocação ser realizada por anúncio entregue a todos os acionistas, mediante recibo, com a mesma ante-cedência mencionada no item (ii) acima.

• Dispensa: dispensada ante a presença da tota-lidade dos sócios ou de declaração, por escrito, de ciência do local, da data, hora e ordem do dia.

QUÓRUM DEINSTALAÇÃO

Representantes de no mínimo ¾ do capital so-cial em primeira convocação, e qualquer núme-ro em segunda convocação.

Em assembleias gerais que não possuam como objeto a reforma do estatuto: É necessária a presença de representantes de, no mínimo, ¼ do capital votante em primeira convocação, res-salvados os casos previstos em lei, e qualquer número do capital votante em segunda convo-cação.

Em assembleias gerais que possuam como obje-to a reforma do estatuto: É necessária a presença de representantes de, no mínimo, 2/3 do capital votante em primeira convocação, ressalvados os casos previstos em lei, e qualquer número do capital votante em segunda convocação.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

68FGV DIREITO RIO

QUÓRUM DEDELIBERAÇÃO

• Quóruns:

(i) Nas Sociedades Limitadas é necessária a aprovação de sócios representando, no míni-mo, ¾ do capital social para: (a) modificar o Contrato Social; (b) aprovar incorporação, fusão, dissolução da sociedade e a cessação do estado de liquidação da sociedade; e (c) eleger e destituir, no Contrato Social, administrador não sócio.

(ii) É necessária a aprovação de mais da metade do capital social, nas seguintes matérias:(a) designação e destituição dos administradores quando feita em ato separado; (b) remuneração dos administradores; e (c) pedido de recupera-ção judicial.

(iii) Para a eleição e destituição de administra-dor, são previstos quóruns diferenciados, depen-dendo se o administrador é sócio ou não, se a eleição é feita no próprio Contrato Social ou em instrumento em separado e se o capital estiver ou não integralizado.

(iv) A maioria de votos dos presentes basta para a aprovação das outras matérias, salvo disposi-ção contratual diversa.

• Empate: em caso de empate, prevalece a de-cisão sufragada pelo maior número de sócios e não por participação no capital social e, se o mesmo persistir, decidirá o juiz.

• Vedação: nenhum sócio pode votar matéria que lhe diga respeito diretamente.

• Computação: os votos deverão ser contados conforme o valor das quotas de cada um dos sócios.

• Quóruns:

(i) Princípio Majoritário: nas Companhias a maioria das matérias que são objeto de delibe-ração pode ser aprovada por maioria simples (maioria de votos presentes na Assembleia Ge-ral).

(ii) Quórum qualificado: necessária a aprovação de mais de 50% do capital social votante, para deliberação de matérias de maior importância e gravidade, tal como: (a) criação de ações prefe-renciais ou aumento de classe de ações preferen-ciais existentes; (b) alteração nas preferências, vantagens e condições de resgate ou amortização de uma ou mais classes de ações preferenciais, ou criação de nova classe mais favorecida; (c) fusão da Companhia, ou sua incorporação em outra; (d) mudança do objeto da Companhia; (e) dissolução da Companhia, entre outros.

• Empate: em caso de empate, caso não haja previsão de arbitragem ou outra forma de reso-lução, nova assembleia deverá ser convocada; se tal empate persistir e os acionistas não concor-darem em submeter a decisão a um terceiro, ca-berá ao juiz decidir, no interesse da Companhia.

• Vedação: o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer ao capital social e à aprovação de suas contas como administrador; nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da Companhia.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

69FGV DIREITO RIO

CAPITAL SOCIAL

• Representação: quotas iguais ou desiguais.

• Subscrição: somente subscrição privada.

• Capital Mínimo: Não há exigência legal de um capital mínimo, porém os sócios deverão integrali-zar o capital nos termos do Contrato Social ou das resoluções tomadas pelos sócios no prazo conven-cionado, sob pena de serem considerados remissos e consequentemente, expulsos da sociedade.

• Integralização com bens: a integralização com bens suscetíveis de avaliação em dinheiro não se submete obrigatoriamente à avaliação pericial, mas pela exata estimação dos bens conferidos ao capital social, sendo os sócios solidariamente responsáveis pelo prazo de 5(cinco) anos.

• Aumento de Capital: o capital poderá ser aumen-tado, a qualquer tempo, desde que esteja totalmente integralizado, respeitando-se o direito de preferên-cia dos sócios, na proporção de sua participação. O aumento poderá ser feito mediante a capitalização de lucros ou mediante aporte de terceiros.

• Redução de capital: Existem duas hipóteses legais:

(i) Quando houver perdas irreparáveis; e

(ii) Quando o capital social estiver excessivo em re-lação ao objeto social. Neste caso, a redução ocor-rerá mediante a restituição das quotas aos quotistas ou redução do valor nominal das quotas, e, ainda, sujeita-se ao prazo de 90 (noventa) dias, contados da data da publicação do ato que aprovou a re-dução do capital, para a oposição dos credores, findo o qual pode tornar a redução eficaz.

• Observações adicionais:

(i) As quotas não são representáveis por certi-ficados suscetíveis de alienação ou oneração, o que faz com que as mesmas não se caracterizem como títulos de crédito;

(ii) É vedada a contribuição dos sócios que con-sista em prestação de serviços;

(iii) Em uma Sociedade Limitada, as quotas têm valor nominal, e não podem ser criadas por valor inferior ou superior a este (neste último caso, a parte do valor da quota emitida que for superior ao valor nominal será considerado ágio na emissão, o que resultará no impacto fiscal); e

(iv) O contrato social deverá vincular as quotas ao seu respectivo titular. Desta forma, a trans-ferência das mesmas acarretará a alteração do contrato social.

• Representação: ações ordinárias e/ou ações preferenciais.

• Subscrição: pública ou privada.

• Capital Mínimo: pelo menos 10% (dez por cento) do capital social subscrito deverá ser in-tegralizado em dinheiro, no ato da subscrição, ou na hipótese de aumento de capital, podendo ser este montante integralizado por um ou mais acionista da Companhia.

• Integralização com bens: a integralização com bens se submete obrigatoriamente à avaliação pericial, a qual deverá ser submetida à aprova-ção da Assembleia Geral, e os avaliadores e o subscritor respondem, perante a sociedade, seus acionistas e terceiros, pelos danos causados.

• Aumento de Capital: o capital poderá ser au-mentado, a qualquer tempo, desde que estejam integralizados, ao menos, 75% (setenta e cinco por cento) do mesmo, respeitando-se o direito de preferência dos sócios, na proporção de sua participação, observando sua exclusão na hipó-tese de previsão de capital autorizado.

• Capital Autorizado: O estatuto social poderá autorizar o aumento do capital social indepen-dente de reforma estatutária.

• Redução de capital: Existem duas hipóteses legais:

(i) quando houver perda até o montante dos prejuízos acumulados; e(ii) quando o capital social estiver excessivo em relação ao objeto social. Neste caso, a redução sujeita-se ao prazo de 60 (sessenta) dias, conta-dos da data da publicação, para a oposição dos credores, findo o qual a redução poderá tornar--se eficaz. • Observações adicionais:

(i) as ações são representáveis por certificados suscetíveis de alienação ou oneração, o que faz com que as mesmas se caracterizem como títu-los de crédito;

(ii) a ausência de valor nominal permite adequar o preço de emissão das ações para a realidade do mercado, já que não precisam ter necessaria-mente um preço preestabelecido.

(iii) não há no estatuto social vinculação de cada ação ao seu respectivo titular, o que possibilita a substituição de seu titular sem alteração do es-tatuto social.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

70FGV DIREITO RIO

CAPITALIZAÇÃOE VALORES

MOBILIÁRIOS

• Não é admitida a emissão de valores mobiliá-rios por Sociedades Limitadas.

• Não há previsão expressa de formas de capi-talização.

• A capitalização pode ser dar, por exemplo, me-diante a emissão de diversos valores mobiliários, tais como: debêntures, bônus de subscrição, partes beneficiárias etc.

DISTRIBUIÇÃO DE RESULTADOS

Admite-se a distribuição desproporcional à par-ticipação dos sócios no capital social, desde que haja previsão contratual expressa neste sentido.

Não é admitida distribuição desproporcional de lucros, sem prejuízo, no entanto, de serem emitidas ações preferenciais com direito ao re-cebimento de dividendos diferenciados.

RESERVA LEGAL Não há previsão legal sobre o assunto.

5% (cinco por cento) do lucro apurado no exer-cício serão utilizados para a formação da reserva legal, até que se atinja 20% (vinte por cento) do valor do capital social.

DIVIDENDOOBRIGATÓRIO

Não aplicável.

• Os acionistas têm direito de receber um divi-dendo mínimo obrigatório conforme definido no Estatuto Social da Companhia.

• Quando o Estatuto Social for omisso, o valor do dividendo obrigatório será correspondente a 50% (cinquenta por cento) do lucro líquido do exercício, diminuído ou acrescido do (i) mon-tante da reserva legal; e (ii) do montante des-tinado à reserva para contingências e reversão da mesma reserva formada em exercícios ante-riores.

TRANSFERÊNCIA DE QUOTAS/AÇÕES

• Qualquer transferência de quota dará ensejo à realização de alteração contratual.

• Se não for de outra forma previsto no Con-trato Social, as quotas poderão ser livremente transferidas entre os sócios, porém somente poderão ser transferidas para terceiros se não houver a oposição de titulares de mais de 25% (vinte e cinco por cento) do capital social.

• O sócio que vier a transferir suas ações à ou-trem responderá perante a sociedade e tercei-ros, durante 2 (dois) anos contados da data de averbação da transferência, pelas obrigações que tinha como sócios.

• As transferências, em regra, não necessitam de aprovação prévia, devendo apenas ser averbadas nos livros societários da Companhia.

• A transferência de ações de uma Companhia aberta somente poderá ocorrer após a integrali-zação de pelo menos 30% (trinta por cento) do seu capital social.

• Em uma Companhia a transferência das ações se efetua mediante a assinatura do acionista vendedor em livro próprio, ou seja, o negócio jurídico se perfaz independentemente do arqui-vamento do ato na Junta Comercial.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

71FGV DIREITO RIO

SUCESSÃO

• A forma resolução em relação a um sócio, no caso de falecimento do mesmo, deve estar regu-lada no Contrato Social.

• Hipóteses:

(i) O Contrato Social poderá vedar o ingresso do herdeiro do sócio falecido, por entender que este pode colocar em risco os negócios da socie-dade, liquidando-se, por consequência, a quota do falecido; ou

(ii) O Contrato Social poderá permitir o ingres-so na sociedade do herdeiro do sócio falecido, não estando este obrigado a ingressar na socie-dade. Caso o herdeiro opte pelo ingresso, este assumirá a posição do sócio falecido, passando a exercer todos os direitos e responder pelas obri-gações detidas por seu ascendente.

No caso de falecimento de acionista, os herdei-ros do acionista falecido passam a substituí-lo automaticamente na Companhia, exercendo, em nome próprio, todos os direitos relativos à posição acionária herdada.

NEGOCIAÇÃO COM AS PRÓPRIAS

AÇÕES/QUOTAS

Vedada de acordo com o Manual do Registro de Comércio para Sociedades Limitadas, com base na falta de previsão no Código Civil.

A negociação com ações de emissão da Com-panhia poderá ocorrer nas operações de resgate, reembolso ou amortização, aquisição de ações para manutenção em tesouraria e venda de ações em tesouraria, respeitadas as exigências legais.

RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS / ACIONISTAS

• Cada sócio tem sua responsabilidade limitada ao valor de sua participação no capital social, mas todos respondem solidariamente pela inte-gralização do capital social.

• As deliberações tomadas que infringem a Lei e o Contrato Social tornam ilimitada a responsa-bilidade dos sócios que expressamente a aprova-ram; as demais vinculam todos os sócios, ainda que ausentes ou dissidentes.

• A responsabilidade dos acionistas é limitada ao preço de emissão do total das ações por ele adquiridas ou subscritas.

• Em regra, não responderão os acionistas pe-rante terceiros, mas sim perante a Companhia.

PLURALIDADE DOS SÓCIOS

Admitida a falta de pluralidade pelo prazo de 180 dias, caso contrário, incidirá na dissolução da sociedade.

Admitida a falta de pluralidade de sócios até a Assembleia Geral Ordinária do ano subsequen-te. No caso de subsidiárias integrais, é possível a existência de apenas um único acionista.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

72FGV DIREITO RIO

ADMINISTRAÇÃO

• Realizada por uma ou mais pessoas, designa-das no Contrato Social ou em ato em separado.

• Possível a administração por pessoas não-só-cias, desde que previsto no Contrato Social.

• A nomeação de administrador em ato em se-parado e cessação do exercício do cargo devem ser averbadas no registro competente em até 10 dias após a sua investidura/destituição.

• Renúncia de administrador somente será efi-caz perante terceiros após averbação e publica-ção.

• A administração atribuída no Contrato Social a todos os sócios não se estende aos que poste-riormente adquiram esta qualidade.

• Conselho de Administração: existência facul-tativa, exceto nos casos de Companhias Abertas e de capital autorizado, composto por, no míni-mo, 3 (três) conselheiros, acionistas, residentes ou não no Brasil.

• Diretoria: existência obrigatória, composta por, no mínimo, 2 (dois) diretores e, necessaria-mente, residentes no Brasil.

• As competências do Conselho de Administra-ção são fixadas em lei, sem prejuízo de outras que venham a ser fixadas no Estatuto Social.

• A Diretoria possui poderes para representar a companhia e para exercer todos os atos necessá-rios ao seu funcionamento.

CONSELHO FISCAL Existência facultativa. Existência obrigatória, mas o funcionamento pode não ser permanente.

DIREITO DE VOTO

Toda quota concede ao seu titular o respectivo direito de voto nas deliberações sociais, sendo certo que tal direito não pode ser retirado do sócio.

O direito de voto na Companhia não é um direito essencial, ou seja, por meio do Estatu-to Social pode-se estabelecer que determinadas ações (ações preferenciais) não conferirão direi-tos de voto ao seu titular.

DIREITO DERETIRADA

Poderá ser exercido por qualquer sócio na ocor-rência de deliberação que importe em alteração do Contrato Social, incorporação ou fusão da sociedade, cabendo ao sócio dissidente o paga-mento do valor patrimonial de suas quotas, com base no balanço levantado para tal finalidade.

Nas hipóteses previstas em Lei, o acionista po-derá retirar-se da Companhia, e, ainda, em de-terminados casos, a Companhia pagará ao acio-nista dissidente o valor das suas ações, com base na apuração dos haveres.

DIREITO DEPREFERÊNCIA

• O direito de preferência na aquisição de quo-tas a serem alienadas por outros quotistas po-derá ser exercido por quotistas que representem mais de 25% (vinte e cinco por cento) do capi-tal social, ou nos termos definidos no contrato.

• O direito de preferência na hipótese de au-mento de capital com a emissão de novas quotas é aplicável para qualquer quotista na proporção de sua respectiva participação no capital social.

• As ações poderão ser livremente cedidas, ao menos que os acionistas contratem regras de di-reito de preferência.

• Na hipótese de aumento do capital social, os acionistas terão direito de preferência na subs-crição das ações objeto do aumento na propor-ção de sua participação no capital social, ob-servada a exclusão do direito de preferência na hipótese de existência de capital autorizado, nos termos do artigo 168 da LSA.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

73FGV DIREITO RIO

DISSOLUÇÃO

• Dissolução Parcial: poderá ocorrer mediante a expulsão de um dos sócios quando ocorrer sua incapacidade ou, ainda, quando um dos sócios agir de maneira que prejudique a continuidade da Sociedade, desde que haja previsão no Con-trato Social, caso contrário, a questão será resol-vida por medida judicial.

• Na Sociedade Limitada por prazo indetermi-nado, qualquer dos sócios quotistas pode reque-rer a dissolução parcial ou total da Sociedade.

• Dissolução Parcial: Não há previsão de disso-lução parcial de Companhia mediante expulsão de acionista.

• Nenhum dos acionistas pode requerer a disso-lução parcial ou total da Sociedade. O interessa-do em retirar-se da Companhia. poderá exercer o direito de recesso somente, nos casos previstos em lei.

ACORDO DEACIONISTAS /

ACORDO DEQUOTISTAS

• No caso das Sociedades Limitadas, haveria dificuldades para se tratar, em um eventual Acordo de Quotistas, de determinadas matérias como, por exemplo:

(i) em determinadas circunstâncias, os quoruns es-tabelecidos no Código Civil não poderão ser redu-zidos no âmbito privado, como por exemplo, nos casos de modificação do Contrato Social;

(ii) há quem sustente que acordo entre quotistas elaborado separadamente não obrigaria a tercei-ros e nem mesmo a administração da sociedade, se tais disposições não estiverem contidas no Contrato Social.

• O Acordo de Acionistas não precisa necessaria-mente ser registrado para ser dotado de eficácia. Contudo, ele só obrigará os administradores e a própria Companhia quando arquivado na sua sede. Será, ainda, oponível a terceiros somente quando devidamente averbado nos livros de re-gistro e nos certificados das ações, se emitidos.

• Um Acordo de Acionistas pode ter como obje-to qualquer matéria relacionada ao exercício do poder de controle, à compra e venda de ações, à preferência para adquiri-las, ao exercício do di-reito de voto, à política de dividendos e à eleição dos administradores, sendo possível a execução específica das obrigações assumidas.

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• Obrigatoriedade de publicação do anúncio de convocação para Assembleias de sócios (exceto em casos de presença totalitária ou declaração expressa de todos os sócios quanto à ciência do local, data, hora e ordem do dia);

• Obrigatoriedade de publicação de ata de As-sembleia/Reunião de sócios que deliberar redu-ção do capital social; e

• Obrigatoriedade de publicação dos atos relati-vos à incorporação, cisão e fusão que envolvam as Sociedades Limitadas.

• Exceto para as Companhias com menos de 20 (vinte) acionistas e com patrimônio líqui-do inferior a R$ 10.000.000,00 milhões, há a obrigatoriedade de publicação de (i) editais de convocação para Assembleias Gerais (exceto em casos de presença totalitária), (ii) Atas das Assembleias, e (iii) das Reuniões do Conselho de Administração destinadas a produzir efeitos perante terceiros ou que contenham eleição de administradores.

• Exceto para as Companhias com menos de 20 (vinte) acionistas e com patrimônio líquido inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), na data do balanço, obrigatoriedade de publicação de demonstrações financeiras, rela-tórios da administração, parecer de auditores independentes, parecer do conselho fiscal e de-mais documentos pertinentes incluídos na or-dem do dia da Assembleia Geral.

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4. SOCIEDADES EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

SCALZILLI, João Pedro; SPINELLI, Luis Felipe. Reflexões sobre a Sociedade em Conta de Participação no Direito Brasileiro. Revista Jurídica Empresarial. 12ª Edição. Janeiro/Fevereiro 2010.

Leitura Complementar

SCALZILLI, João Pedro; SPINELLI, Luis Felipe. Sociedade em Conta de Participação. São Paulo: Quartier Latin, 2014.

GALIZZI, Gustavo Oliva. Sociedade em Conta de Participação. Belo Horizonte: Mandamentos, 2008.

BARROSO, João Pedro; GERMANO, Lucas. Sociedade em Conta de Participação: Problemas da Interferência Tributária no Direito Societário. Críticas à obrigatoriedade de CNPJ para as SCPS. Revista de Direito das Sociedades e dos Valores Mobiliários, 2020.

B) ROTEIRO DE AULA

1. AS SOCIEDADES EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO

A Sociedade em Conta de Participação (“SCP”) passou a possuir previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro a partir do Código Comercial de 1950 (artigo 325), tendo sido regulada em maiores detalhes com o advento do Código Civil de 2002, que disciplina da Sociedade em Conta de Participação do art. 991 ao art. 996.

Enquanto o Código Comercial positivou a Sociedade em Conta de Participação no capítulo das sociedades comerciais, o Código Civil passou a prever a Sociedade em Conta de Participação no subtítulo próprio das sociedades não personificadas.

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Nesse sentido, a Lei nº 10.406/2002 previu expressamente que o contrato social produz efeitos somente entre os sócios e que eventual registro do instrumento da SCP no Cartório de Títulos e Documentos não confere personalidade jurídica à sociedade (artigo 993 da Lei nº 10.406/2002).

Em regra, nas sociedades não personificadas as obrigações sociais são de todos os sócios, que por elas respondem solidariamente44.

No entanto, na Sociedade em Conta de Participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais sócios dos resultados (art. 991, caput, da Lei nº 10.406/2002). O sócio participante se obriga exclusivamente perante o socio ostensivo e apenas este se obriga perante terceiros (art. 991, parágrafo único, da Lei nº 10.406/2002).

O sócio participante sequer pode ser parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier (art. 993, parágrafo único, Lei nº 10.406/2002). No entanto, o sócio participante possui o direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, de forma que este deve ter direito de acesso aos documentos e contratos relativos à Sociedade em Conta de Participação, ainda que não possa ser parte dos referidos documentos.

Nas sociedades não personificadas os sócios são titulares em comum de patrimônio especial formado pelos bens e obrigações sociais que contribuíram45. Nesse sentido, o artigo 994 da Lei nº 10.406/2002 prevê que a contribuição do sócio participante constitui, com a do sócio ostensivo, patrimônio especial, objeto da conta de participação relativa aos negócios sociais.

A Sociedade em Conta de Participação é, portanto, aquela na qual uma ou mais pessoas contribuem com dinheiro ou outros bens para a formação de patrimônio especial a ser empregado em determinados negócios, que serão desenvolvidos por um empreendedor, de modo que, ao final do prazo acordado ou ao término do empreendimento, os sócios participantes e o sócio ostensivo repartam os resultados.

A constituição da sociedade em conta de participação independe de qualquer formalidade e pode ser provada por qualquer meio (artigo 992 da Lei nº 10.406/2002). Os requisitos de validade de uma SCP são iguais aos de qualquer negócio jurídico: agente capaz, objeto lícito, possível e determinado (ou determinável) e forma prescrita (ou não defesa) em lei (artigo 104 da Lei nº 10.406/2002), sendo negócio jurídico existente e valido perante todos, embora ineficaz perante terceiros.

44 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (coord.). Direito Das Companhias. 2a ed., atual. e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 33.45 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (coord.). Direito Das Companhias. 2a ed., atual. e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 33.

44 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (coord.). Direito Das Companhias. 2a ed., atual. e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 33.

45 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões (coord.). Direito Das Companhias. 2a ed., atual. e ref. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 33.

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Assim, em linha com a dinâmica do mundo dos negócios, a sociedade em conta de participação apresenta características que asseguram versatilidade, dinamicidade e flexibilidade, bem como resultam em baixo custo de constituição e manutenção.

Com efeito, a SCP é um dos tipos societários mais utilizados, especialmente em setores como construção civil e empreendimentos imobiliários.

Por outro lado, a Sociedade em Conta de Participação possui particularidades que a afastam do conhecimento da sociedade em geral, especialmente a ausência de registro e, consequentemente, de personalidade jurídica, que fazem com que todas os direitos adquiridos e obrigações contraídas pela SCP sejam realizadas em nome do sócio ostensivo, de modo que a SCP não aparece perante terceiros.

A relação de influência entre os sócios decorrente da constituição de uma Sociedade em Conta de Participação pode resultar em exercício de controle externo. Nesse sentido, tem-se a hipótese de sócio participante que contribui não somente com capital para o negócio, mas também com know-how necessário ao desenvolvimento do negócio, o que pode gerar uma relação de dependência entre o sócio ostensivo e o sócio participante.

A formação da vontade social de uma Sociedade em Conta de Participação pode se realizar a partir de deliberação entre os sócios. No entanto, o direito de voto em deliberações da SCP não é essencial à qualidade de sócio. Ressalta-se, ainda, que a execução do que foi deliberado pelos sócios.

Em que pese a sucinta regulamentação da Sociedade em Conta de Participação – que contribui para versatilidade, dinamicidade e flexibilidade da SCP – aplica-se à sociedade em conta de participação, subsidiariamente e no que com ela for compatível, o disposto para a sociedade simples.

Quanto à dissolução da SCP, esta seguirá, em regra, as normas aplicáveis às sociedades simples (artigo 1.033 Lei nº 10.406/2002). Todavia, a liquidação, quando litigiosa, seja em relação aos lucros auferidos, seja em relação ao Patrimônio Especial, obedecerá às normas referentes à ação de exigir contas, previstas no artigo 550 do CPC.

No que tange à falência, qualquer credor, até mesmo o sócio participante, se este também figurar como credor do sócio ostensivo, poderá requerer sua falência, não sendo relevante distinguir se o crédito surgiu do exercício da SCP ou de outra atividade.  Com a falência do sócio ostensivo, a SCP é desfeita, liquidando-se a conta de participação.

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Ressalta-se que, o crédito do sócio participante, se houver, será classificado como quirografário (Lei nº 11.101/2005, artigo 83, VI), não possuindo, portanto, nenhuma prioridade ou privilégio na ordem de pagamento.

Faz-se salutar compreender que, que não sendo o sócio ostensivo empresário ou sociedade empresária, não estará sujeito à lei de falências. Portanto, nessa hipótese, revelando-se insolvente, seus credores deverão requerer a declaração da Insolvência Civil (art. 1.052, CPC/15).

O sócio participante, se empresário, também poderá incorrer em falência. Qualquer credor particular do sócio participante poderá requerê-la, mas nunca tendo como fundamento a sua participação na SCP, posto que, esta, em regra, não se obriga perante terceiros.

Existindo outros participantes, a sociedade continuará em relação a estes, excluindo-se o falido (artigo 1.030, parágrafo único, Lei nº 10.406/2002); não havendo outros sócios participantes, a sociedade se desfaz (artigo 1.033, IV, Lei nº 10.406/2002).

C) ESPAÇO DISCENTE – TEXTO COMPLEMENTAR:

Sociedade em Conta de ParticipaçãoProblemas da Interferência Tributária no Direito Societário Brasileiro e

Críticas à Obrigatoriedade de CNPJ para as SCPs

João Pedro Barroso do Nascimento Lucas Germano

Marcela ReisJulia RezendeMaria SanchesMiguel Barros

INTRODUÇÃO

Em meio a calorosas discussões na disciplina “Direito Societário Avançado”, na Graduação da FGV Direito Rio, futuros tributaristas e societaristas encontram dilema capaz de unir estas áreas do direito corporativo, qual seja: Em que medida é desejável que haja interferências tributárias no Direito Societário?

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Antes que o leitor critique a amplitude da discussão, apresentamos o recorte temático que nos levou a essa análise: Trata-se de reflexão sobre a obrigatoriedade de inscrição das Sociedades em Conta de Participação (“SCPs”) no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (“CNPJ”).

Nesse sentido, a partir da conceituação das SCPs, este artigo busca demonstrar que a interferência tributária no direito societário pode levar à imposição de obrigações juridicamente incongruentes, capazes de desnaturar o tipo societário sob análise.

De plano, esclareça-se que as SCPs são reguladas pelos art. 991 a 996 do Código Civil de 2002 (“CC”). Nas SCPs, o sócio ostensivo exerce a atividade empresarial, sem qualquer firma social ou nome empresarial, sendo que o sócio participante não assume riscos, direitos e/ou obrigações perante terceiros.

Ainda que as SCPs apresentem diversos traços especiais em relação às demais sociedades tipificadas no Direito Brasileiro, a característica que, neste artigo, merece particular atenção é a falta de personalidade jurídica das SCPs, conforme o caput do art. 993 do Código Civil. A SCP não possui relevância no plano externo da sociedade, produzindo efeito, em regra, tão somente entre as partes contratantes (i.e., sócio ostensivo e sócio participante).

Apesar de a SCP ser tratada como sociedade perante o Código Civil, no Brasil e no mundo as principais características desta entidade despersonificada a aproximam mais de contrato, do que propriamente sociedade. A este respeito, nos termos dos arts. 45, 985 e 1.150 do Código Civil, a SCP está dispensada de registrar e/ou arquivar atos constitutivos no registro competente.

Sendo assim, não há maneira lógica ou juridicamente correta de se conceber a SCP como Pessoa Jurídica.

O DECRETO-LEI 2.303/86 E SUA INCONGRUÊNCIA COM O DIREITO SOCIETÁRIO

Não obstante a impossibilidade de se conceber a SCP como pessoa jurídica, desde a edição do Decreto-Lei nº 2.303/86, as SCPs vem sendo equiparadas às pessoas jurídicas para fins tributários, ainda que tenham sido concebidas como entes notadamente despersonificados pelo CC/02. Essa consideração trouxe por consequência a instituição de alguns principais atos normativos da Receita Federal, que foram as Instruções Normativas nºs 1.470/14, 1.634/16, 1.700/17 e 1.863/18, as quais cuidaram de equiparar as SCPs às demais pessoas jurídicas para fins tributários.

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Em consequência ao tratamento tributário atribuído às SCPs, passou-se a considerar que tais sociedades possuem capacidade passiva tributária46. Além disso, se a Sociedade não estiver cadastrada no CNPJ, a Receita Federal poderá determinar sua inscrição de ofício, muito embora a este respeito não exista previsão de penalidades severas em caso de não inscrição. Porém, se houver fiscalização sobre a SCP ou sobre rendimentos dos sócios e a sociedade não estiver inscrita no CNPJ, isso poderá dar ensejo à desqualificação das distribuições feitas aos sócios como lucros isentos, de modo que poderiam ser tributados como rendimentos.

A este respeito, a inscrição da SCP no CNPJ tem como finalidade possibilitar a segregação das contas da SCP na contabilidade do sócio ostensivo, inclusive para fins de fiscalização, o que atua como espécie de separação patrimonial entre o que é do sócio ostensivo e o que é da SCP. Sobre este ponto, a Solução de Consulta COSIT nº 202/19 confirma que tributos incidentes nas operações próprias do sócio ostensivo devem ser apurados separadamente dos devidos pela SCP.

Ora, ao fixar existir separação patrimonial entre o que é do sócio ostensivo e o que é da SCP, tal disposição distorce este instituto societário, descaracterizando uma de suas características mais marcantes: a ausência de personalidade jurídica. Isso porque referida separação patrimonial assinala uma distinção que, no fundo, inexiste, haja vista que é o sócio ostensivo quem arca, na prática, com o ônus tributário da atividade econômica exercida.

Vale ressaltar que a Instrução Normativa RFB nº 1.700/17, em seu art. 6º, fixa ser dever do sócio ostensivo a apuração dos resultados pelo recolhimento do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Assim, dizer existir separação patrimonial na SCP traduz-se em verdadeira confusão sobre o real funcionamento do tipo societário em nota.

Atualmente, de acordo com o cenário que vige em nosso sistema, em face da equiparação das SCPs às pessoas jurídicas, o efeito colateral é a sua sujeição ao IRPJ, à CSLL, ao PIS e à COFINS. Sem a aludida equiparação às demais pessoas jurídicas, tal problemática inexistiria, e nem sequer poder-se-ia distinguir o que é apurado pelo sócio ostensivo e o que o é pela SCP.

Portanto, sendo o sócio ostensivo quem assume a responsabilidade de suportar os ônus tributários, inexiste distinção patrimonial entre o que é do sócio ostensivo e o que é da SCP. Justamente em face desses pontos é que a equiparação das SCPs a pessoas jurídicas não encontra fundamento jurídico sustentável diante da previsão de que as SCPs são entes despersonificados.

46 (Recurso Especial nº 193690 / PR, Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro FRANCIULLI NETTO, julgamento em 04/06/2002, DJ 07/10/2002).

46 (Recurso Especial nº 193690 / PR, Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro FRANCIULLI NETTO, julgamento em 04/06/2002, DJ 07/10/2002).

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PROBLEMA POSTO: QUAIS SÃO AS POSSÍVEIS LIÇÕES?

Diante de tudo o que já foi abordado, é possível perceber que a legislação brasileira ainda não encontrou um modelo ideal para a tributação das SCPs, levando-se em consideração sua característica sui generis.

Como essas sociedades não possuem personalidade jurídica, parece não fazer sentido que sua tributação ocorra em decorrência da inscrição no CNPJ, que se destina justamente a realizar o cadastro e mapeamento das entidades dotadas de personalidade jurídica. Nesse sentido, acreditamos que o país poderia se inspirar nos modelos adotados por países ao redor do mundo, visando a criação de seu próprio modelo de tributação que faça sentido com as peculiaridades das referidas sociedades.

No direito português, por exemplo, as SCPs são denominadas associações em participação47 não recebendo a denominação de “sociedade” justamente por se tratar de um contrato em que há associação de duas ou mais pessoas ligadas a uma atividade econômica exercida por um sócio (ostensivo), que se obriga a prestar contribuição de natureza patrimonial48.

As SCPs portuguesas estão disciplinadas nos arts. 21 a 31 do Decreto-Lei português n. 231/81 e não gozam de caráter societário ou constituem ente jurídico, ou seja, não são personificadas. Nada obstante, os rendimentos auferidos pelos sócios possuem natureza econômica semelhante a dos lucros no sistema português.

Quer dizer, os rendimentos tanto do sócio ostensivo, quanto do sócio oculto são tributados por meio da declaração de Imposto de Renda de cada um dos sócios participantes da SCP. No caso do sócio ostensivo, seus rendimentos estão sujeitos à tributação por meio do IRS (Imposto sobre Rendimento das Pessoas Singulares, o equivalente ao Imposto de Renda brasileiro). É importante ressaltar que os valores desembolsados pelo sócio ostensivo em decorrência de perdas não podem ser deduzidos de seu rendimento.

Quanto ao regime de tributação do sócio oculto, nas hipóteses de pessoa física, seus rendimentos “líquidos” - após o pagamento do sócio ostensivo - também são tributados por meio do IRS, cabendo a ele a retenção na fonte do tributo. Já nos casos de pessoa jurídica, os rendimentos são sujeitos à IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas), e o art. 20.3 do Código do IRC determina que “não concorre para a formação do lucro tributável do associado, na associação à quota, o rendimento auferido da sua participação social correspondente ao valor da prestação por si devida ao associado”.

47 “No plano legislativo, o Código Civil italiano regulou as associazioni in partecipazione fora do Título V, que cuida das sociedades, sendo que também em Portugal é a associação em participação tratada como contrato distinto do de sociedade.” (SCALZILLI, João Pedro e SPINELLI, Luis Felipe. REFLEXÕES SOBRE A SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO. Revista Empresarial, 12ª Ed., 2010, pg 18).48 Tribunal Judicial da Comarca de Leira - 5 Juízo Cível. Processo n. 499/11.0TBLRA.C2. Relator: Min. Arthur Dias. Data de Julgamento: 09/09/2014. Disponível em <http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/3dda4ea0f316030380257d55003c1ddd?OpenDocument>. Acesso em: 11/09/2019.

47 “No plano legislativo, o Código Civil italiano regulou as associazioni in par-tecipazione fora do Título V, que cuida das sociedades, sendo que também em Portugal é a associação em participa-ção tratada como contrato distinto do de sociedade.” (SCALZILLI, João Pedro e SPINELLI, Luis Felipe. REFLEXÕES SOBRE A SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPA-ÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO. Revista Empresarial, 12ª Ed., 2010, pg 18).

48 Tribunal Judicial da Comarca de Leira - 5 Juízo Cível. Processo n. 499/11.0TBLRA.C2. Relator: Min. Arthur Dias. Data de Julgamento: 09/09/2014. Disponível em <http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/3dda4ea0f316030380257d55003c1ddd?OpenDocument>. Acesso em: 11/09/2019.

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Assim, conforme anteriormente assinalado, tomando-se como pressuposto o fato de que as SCPs são decerto um contrato e, por força do Código Civil, um ente despersonificado, acredita-se que sua equiparação aos demais tipos societários desnatura o aludido instituto.

Longe de se propor a solucionar de forma definitiva o problema, o que se sugere no presente artigo não é a simples importação e transmutação de institutos estrangeiros ao ordenamento jurídico brasileiro. De modo diametralmente oposto, a intenção é a de fomentar o debate jurídico, para que o legislador pátrio, compreendendo o problema posto, e inspirado nas soluções de direito comparado, possa formular uma solução jurídica que não desnature o instituto da SCP.

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5. TÓPICOS ESPECIAIS EM DIREITO SOCIETÁRIO

Uma vez relembradas e aprofundadas as principais características dos mais frequentemente utilizados tipos societários da atividade empresarial brasileira – a sociedade anônima e a sociedade limitada –, assim como analisadas as duas sob a perspectivas comparativa, o próximo bloco do curso busca aprofundar e discutir temas tanto relevantes quanto controversos do direito societário brasileiro.

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5.1. VALORES MOBILIÁRIOS MODERNOS

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pp. 27-193.

MATTOS FILHO, Ary Oswaldo. O Conceito de Valor Mobiliário. In. Revista de Administração Empresarial vol. 25(2), pp. 37-51. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rae/v25n2/v25n2a03>. Acesso em: 01.07.2020.

Leitura Complementar

NASCIMENTO, João Pedro Barroso Do; PALIS, Pedro Mauro. Novos contratos de investimento coletivo: Evolução conceitual, ofertas irregulares e a atuação da CVM. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/novos-contratos-de-investimento-coletivo-17102019>. Acesso em: 02.07.2020.

Caso Boi Gordo. Inquérito Administrativo CVM Nº TA/RJ2001/6094 – Termo de Acusação. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2836133/mod_resource/content/1/20011213_PAS_RJ20016094.pdf>. Acesso em: 01.07.2020.

Caso Rancho Belo: Processo Administrativo Sancionador CVM Nº RJ2007/13207. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/sancionadores/sancionador/anexos/2008/20080902_PAS_RJ200713207.pdf>. Acesso em: 01.07.2020.

Caso Avestruz: Processo Administrativo Sancionador CVM Nº 23/04. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/sancionadores/sancionador/anexos/2006/20060928_PAS_2304.pdf.>. Acesso em: 01.07.2020.

Caso Condo-Hotéis: Suspensão da Oferta de Condo-Hoteis da Arpoador. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2015/20150624-1.html>. Acesso em: 01.07.2020.

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Caso Itaú – Cédulas de Crédito Bancário (CCB). Processo CVM Nº RJ2007/11.593. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/363669/mod_resource/content/1/Processo%20CVM%20RJ2007-11593%20-%20Rel.%20Marcos%20Pinto.pdf>. Acesso em: 01.07.2020.

INTRODUÇÃO

Como já se pôde averiguar, a sociedade anônima confere diversos mecanismos para o financiamento da atividade empresarial, mediante a emissão e distribuição de títulos e valores mobiliários.

Nesse sentido, a distribuição de valor mobiliário pode ser feita de forma pública ou privada. A distribuição “privada” consiste na distribuição de títulos voltada para um grupo restrito, com ou sem intermediação financeira, e dispensada de registro na CVM, podendo, portanto, ser realizada por companhias fechadas.

A distribuição pública de valores mobiliários, por seu turno, afigura-se o meio pelo qual as companhias ou os titulares de valores mobiliários de sua emissão, realizam, mediante apelo ao público, a colocação destes ativos no mercado de capitais. Nesse caso, a companhia deverá ser de capital aberto. O termo utilizado para identificar a primeira vez em que uma companhia emite valores mobiliários ao mercado é IPO – Initial Public Offer. As ofertas de ações podem ser primárias ou secundárias.

A oferta pública primária ocorre mediante a emissão de novas ações, ofertadas ao mercado, cujo ingresso de novos recursos, em contrapartida à aquisição das novas ações emitidas, destina-se à própria companhia emissora. Este tipo de oferta atende a principal função econômica do mercado de capitais, consistente no financiamento de médio e longo prazo da sociedade e é denominada subscrição de ações. A aquisição dessas ações dá-se por meio de subscrição (cash-in).

Já a oferta pública secundária acontece quando são ofertadas ao mercado ações já existentes, pertencentes, geralmente, aos seus sócios. Nesse caso, os recursos pagos, em contrapartida da aquisição dessas ações, destinam-se aos sócios vendedores. A aquisição dessas ações dá-se por meio de compra e venda de ações (cash-out).

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O QUE É VALOR MOBILIÁRIO? AS CONCEPÇÕES LEGAL, JURISPRUDENCIAL E DOUTRINÁRIA

Mas afinal, no que consiste um valor mobiliário?

A resposta da legislação brasileira a esta pergunta encontra-se na Lei 6.385/1976 – também conhecida como Lei da CVM –, cujo art. 2º dispõe:

“Art. 2º: São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: I - as ações, debêntures e bônus de subscrição; II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;III - os certificados de depósito de valores mobiliários; IV - as cédulas de debêntures; V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos; VI - as notas comerciais; VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários; VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.” (grifo nosso)

Muito embora o art. 2º da Lei 6.385/76 desempenhe satisfatoriamente seu papel de delinear de maneira exemplificativa as diferentes espécies de valores mobiliários, este dispositivo, por si só, não oferece uma conceituação abrangente e suficientemente aprofundada das principais características de valor mobiliário. Assim, torna-se necessária uma investigação doutrinária e jurisprudencial mais aprofundada.

As características essenciais que um título de investimento precisa apresentar para que seja considerado um valor mobiliário já foram objeto de intensa discussão na doutrina e jurisprudência estadunidenses. Talvez o marco de maior relevância para esta discussão seja o caso SEC v. W.J. Howey & Co., julgado pela Suprema Corte em 194649.

49 EIZIRIK, Nelson et. al. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pág. 68 .

49 EIZIRIK, Nelson et. al. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pág. 68

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Em uma discussão sobre se um contrato de investimento em terras agrícolas configurava um valor mobiliário – e, portanto, se deveria ter sido registrado perante a Securities and Exchange Comission – a Corte delineou os principais elementos que um título precisa possuir para que seja configurado como tal. Estes traços distintivos são:

(i) Tratar-se de se um investimento em dinheiro (“investment of money”). O conceito empregado pela Suprema Corte é extensivo, e refere-se a qualquer bem ou direito que possa servir de pagamento;

(ii) Em um empreendimento comum (“common enterprise”). Trata-se de conceito relacionado à comunhão de um número de investidores em uma iniciativa que é comum a todos;

(iii) Com uma expectativa de lucro (“expectation of profits”); ou seja, quem adquire uma security tem como finalidade obter um retorno de seu investimento50; e

(iv) Fundamentada unicamente no esforço de outros (“solely from the efforts of others”). Este requisito foi abrandado eventualmente, ao passo em que as cortes norte-americanas passaram a aceitar a participação do investidor no empreendimento investido, desde que funções essenciais ao sucesso ou fracasso do empreendimento dependam da conduta de terceiros.

A Howey Definition – nome que passou a identificar o supramencionado grupo de características – tem grande influência no direito brasileiro. Esta se deixa perceber na redação do art. 2º, IX, Lei 6.385/76, que traz alguns elementos semelhantes à Howey Definition.

No Brasil, a doutrina define os valores mobiliários como ações de companhia e títulos emitidos por companhia ou pelo Estado, representativos de direitos de participação ou créditos em longo prazo. Significa, portanto, o gênero dos títulos de emissão pela companhia. Sua natureza jurídica é de título de crédito.

Uma vez que são emitidos em larga escala, têm por finalidade precípua servir como instrumentos de investimento de capital para gerar renda. Suas características são a emissão em massa (não são emitidos singularmente) e a fungibilidade (podem ser trocados uns pelos outros porque têm igual valor).

50 EIZIRIK, Nelson et. al. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pág. 77.

50 EIZIRIK, Nelson et. al. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pág. 77

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Entretanto, cabe ressaltar que a definição legal e a concepção doutrinária não se confundem, na medida em que a primeira compreende negócios ou instrumentos jurídicos que não têm a natureza de títulos de crédito. Exemplo: inciso IX do art. 2º da Lei nº 6.385/76.

Além disso, os títulos da dívida pública dos entes da federação foram expressamente excluídos da definição legal (art. 2º, parágrafo único da Lei 6.385/76), continuando sob fiscalização direta do BACEN – diferentemente dos valores mobiliários, cuja regulação é feita pela CVM.

Como se vê, o conceito legal de valor mobiliário precisa ser complementado pelo doutrinário, uma vez que passou a representar, além de títulos, outros negócios jurídicos que, quando ofertados ao público, ficam sujeitos à disciplina legal do mercado de valores mobiliários fiscalizado pela CVM. Sua natureza jurídica deve, portanto, ser precisada a partir do conceito doutrinário de título de crédito.

Uma vez que já foram amplamente discutidos os valores mobiliários clássicos51 no curso de Organização Jurídica da Grande Empresa – então tratados sob uma perspectiva eminentemente conceitual –, a disciplina de Direito Societário Avançado apresenta uma proposta alternativa. A fim de evitar repetições e consolidar o processo de aprendizado, o que se propõe nesta etapa é empreender uma aproximação crítica dos novos instrumentos de investimento que invadem a realidade econômica e os veículos de mídia especializada.

Assim, buscar-se-á instrumentalizar e aprofundar os conceitos já expostos, mas também incentivar a reflexão sobre o conceito de valor mobiliário – que, afinal de contas, é um conceito multifacetado.

VALORES MOBILIÁRIOS

Ações

Base Legal: art. 2º, inciso I, Lei n. 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:I – as ações, debêntures e bônus de subscrição;

Segundo definição de José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho, ação é o valor mobiliário emitido pela companhia que confere a seu titular o conjunto de direitos e obrigações de uma participação societária na companhia, ou seja, de uma posição jurídica de acionista.52

51 Assim entendidos os instrumentos financeiros elencados nos incisos I a VIII do art. 2º da l. 6.385.52 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 395.

51 Assim entendidos os instrumentos financeiros elencados nos incisos I a VIII do art. 2º da l. 6.385.

52 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 395.

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Tendo em vista a definição acima exposta, cabe tratar das espécies de ações previstas na LSA. De acordo com o art. 15, LSA, as ações são ordinárias, preferenciais ou de fruição, conforme a natureza dos direitos e vantagens que confiram a seus titulares. Nesse sentido, deve-se apontar as características gerais aplicáveis às ações ordinárias e às ações preferenciais, diante da importância prática destas no âmbito societário.

As ações ordinárias são essenciais para as companhias, de modo que sua emissão é obrigatória53. Tal espécie de ação confere ao acionista os direitos de um sócio comum, isto é, os direitos ordinários de um sócio, sem restrições ou privilégios. Pode-se dizer que o principal direito conferido ao titular de uma ação ordinária é o direito de voto (art. 110, LSA).54 Desta forma, em geral faz-se desnecessária a previsão estatutária de suas prerrogativas, já que estas decorrem diretamente da lei.

As ações preferenciais, por sua vez, conferem aos seus titulares determinadas preferências ou vantagens, conforme art. 17 da LSA. Tais preferências consistem na prioridade de distribuição de dividendo, fixo ou mínimo, assim como na prioridade de reembolso do capital, com prêmio ou sem ele, ou a acumulação destas preferências e vantagens. Diferentemente das ações ordinárias, o direito de voto pode ser limitado ou excluído, cabendo a cada companhia estabelecer em seu Estatuto Social as disposições relativas ao direito de voto. Além disso, faculta-se a cada companhia, seja aberta ou fechada, ter uma ou mais classes de ações preferenciais, bem como simplesmente não emitir tal espécie de ações.

Debêntures

Base Legal: art. 2º, incisos I e IV, Lei n. 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: I – as ações, debêntures e bônus de subscrição; (...) IV – as cédulas de debêntures;

A debênture é o valor mobiliário que confere ao seu titular direito de crédito contra a companhia emissora nas condições constantes da escritura de emissão.55 Dentre as principais funções da debênture, tem-se a captação, no mercado, de recursos de terceiros.

53 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 99.54 Id. n. 46.55 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 421.

53 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Juridico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 99.

54 Id. n. 46.

55 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 421.

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Segundo Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira, a função precípua da debênture é servir de instrumento nas trocas que se processam no mercado de capitais entre a companhia e os agentes que dispõem de poupanças para investir: a companhia emite debêntures que entrega aos investidores recebendo em troca recursos, que aplicará para os fins constantes da escritura de emissão56. Referida escritura estipula o vencimento, a taxa de juros e demais condições das debêntures emitidas.

Por fim, importante trazer os ensinamentos de Nelson Eizirik57 sobre o tema, o qual considera que a finalidade econômica da debênture consiste em possibilitar o financiamento da companhia emissora, mediante empréstimo contraído junto a restrito círculo de pessoas ou mediante apelo à poupança popular. Trata-se de uma forma que a companhia tem de contrair empréstimo junto ao público, quando necessita de recursos e não deseja recorrer às instituições financeiras, nem aumentar o seu capital social, com a consequente emissão de novas ações.

Bônus de Subscrição

Base Legal:

• Art. 2º, inciso I, Lei n. 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:I – as ações, debêntures e bônus de subscrição;

• Art. 75, LSA:

Art. 75. A companhia poderá emitir, dentro do limite de aumento de capital autorizado no estatuto (artigo 168), títulos negociáveis denominados “Bônus de Subscrição”. Parágrafo único. Os bônus de subscrição conferirão aos seus titulares, nas condições constantes do certificado, direito de subscrever ações do capital social, que será exercido mediante apresentação do título à companhia e pagamento do preço de emissão das ações.

Segundo José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho, o bônus de subscrição é o valor mobiliário que confere a seu titular o direito de subscrever, mediante pagamento de preço de emissão determinado ou determinável, certo número de ações da companhia de capital autorizado emitente do título58.

56 Id. n. 48, p. 425.57 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 108. 58 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 469.

56 Id. n. 48, p. 425.

57 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Juridico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 108.

58 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 469.

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O bônus de subscrição é um direito de uma ação para o futuro; dá direito ao seu titular de subscrever suas ações no futuro por um preço pré-determinado. Isso é bom para uma empresa que ainda vai crescer e é uma aposta na valorização da Companhia. Vantagem para a Cia: fomentar um novo mercado. Ex. fomentar o mercado de ações preferenciais (“Comprando uma ação preferencial ganha um bônus de subscrição de uma ação ordinária”).

Partes Beneficiárias

Base Legal: arts. 46 a 51, LSA.

De acordo com José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho, as partes beneficiárias são valores mobiliários emitidos pela companhia, sem valor nominal e estranhos ao capital social, que conferem a seus titulares direito de crédito eventual contra a companhia consistente na participação dos lucros anuais.59

Por serem títulos estranhos ao capital social, não conferem direitos de acionista a seus proprietários, apenas os direitos de participação nos (eventuais) lucros e de fiscalização.

Cupons, Direitos, Recibos de Subscrição e Certificados de Desdobramentos

Base Legal:

• Art. 2º, inciso II da Lei nº 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;

Certificados de Depósito de Valores Mobiliários (Depositary Receipts)

Base Legal:

• Art. 2º, inciso III da Lei nº 6.385/76.

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) III - os certificados de depósito de valores mobiliários;

59 Id. n. 51, p. 415.

59 Id. n. 51, p. 415.

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De acordo com Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira60, o certificado de depósito de valor mobiliário é o título emitido por instituição financeira representativo de valores mobiliários por ela mantidos em depósito. Além disso, esse título somente pode ser emitido por instituição financeira autorizada a funcionar como agente emissor de certificado.

Cotas de Fundos de Investimento em Valores Mobiliários ou de Clubes de Investimento em Quaisquer Ativos

Base Legal:

• Art. 2º, inciso V da Lei nº 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;

De acordo com Nelson Eizirik61, as cotas de um fundo de investimento são representativas de frações ideais do patrimônio do fundo, adotando as formas escriturais e nominativas; e o valor das cotas varia de acordo com a valorização do patrimônio do fundo.

Em relação aos cotistas, estes possuem iguais direitos e obrigações. Tais direitos podem ser de natureza política, como o direito à informação e o direito à convocação e votação em assembleia; assim como de natureza patrimonial, como o direito ao resgate das cotas, o direito à administração do patrimônio do fundo, o direito de participar dos lucros nos limites de sua cota, entre outros.

As obrigações dos cotistas estão relacionadas ao fato de eles serem responsáveis pelo patrimônio líquido negativo do fundo, sem prejuízo da responsabilidade do administrador e do gestor, se houver, em caso de inobservância da política de investimento ou dos limites de concentração previstos no regulamento e nas normas da CVM.

Ainda segundo Eizirik62, as cotas dos clubes de investimento, por sua vez, corresponderão a frações ideais em que se dividirá o seu patrimônio. Afirma, por fim, que “não há justificativa para tratamento diferenciado entre cotas de clubes e de fundos de investimentos, uma vez que ambos constituem carteiras administradas de ativos financeiros”.

60 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 391. 61 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pp. 133-134.62 Id. n. 54, pp. 158-159.

60 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. Direito das Companhias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 391.

61 EIZIRIK, Nelson. Mercado de Capitais – Regime Juridico. 4ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2019, pp. 133-134.

62 Id. n. 54, pp. 158-159.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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Notas Comerciais (Commercial Papers)

Base Legal:

• Art. 2º, inciso VI da Lei nº 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) VI - as notas comerciais;

• Instrução CVM 566/15;

Contratos Futuros, de Opções e Outros Derivativos, cujos Ativos Subjacentes sejam Valores Mobiliários

Base Legal:

• Art. 2º, inciso VII da Lei nº 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários;

Outros Contratos Derivativos

Base Legal:

• Art. 2º, inciso VIII da Lei nº 6.385/76:

Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes;

Conceito Aberto de Valor Mobiliário

Base Legal:

• Art. 2º, inciso IX da Lei nº 6.385/76:

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Art. 2º. São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: (...) IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.

Uma vez delineado o conceito abstrato de valor mobiliário, assim como relembradas as tradicionais espécies deste gênero de instrumento financeiro, é possível evoluir a discussão. Este objetivo pode ser perseguido com uma indagação: que instrumentos financeiros que vieram à tona na história recente do direito societário e do mercado de capitais podem ser considerados valores mobiliários?

Assim, a partir deste momento serão analisados casos concretos do direito moderno sob a ótica da Howey Definition, a fim de averiguar se determinados mecanismos de investimento consubstanciam valores mobiliários – ou não. Os casos que serão objeto de estudo são: as Cédulas de Crédito Bancário (“CCBs”), os Créditos de Carbono e as Criptomoedas, notadamente o BitCoin e o Ethereum.

O CASO BOI GORDO (INQUÉRITO ADMINISTRATIVO CVM Nº RJ2001/6094)

O Caso Boi Gordo é um dos primeiros casos de colocação irregular de valores mobiliários no mercado de capitais em que uma sociedade empresária e seus administradores foram investigados, julgados e condenados no contexto da Lei 6.385/76.

A sociedade empresária Fazendas Reunidas Boi Gordo S/A foi emissora e lotes de contratos de investimento coletivo em que os investidores financiavam a compra, engorda e venda de gado – neste caso, bovino. No caso da Boi Gordo, este investimento logo se popularizou em função dos elevadíssimos retornos que o título afirmava obter: os ganhos de capital falsificados – em que os investidores antigos eram pagos com o dinheiro integralizado pelos investidores novos, em um verdadeiro esquema de pirâmide – logo atraíram soma superior a R$ 260 milhões. E, com esta quantia, a atenção da CVM, que, em dezembro de 2001, aplicou aos Diretores da Boi Gordo penas milionárias.

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O CASO RANCHO BELO (PAS CVM Nº RJ2007/13207)

O Caso Boi Gordo envolve a discussão sobre se determinado instrumento de investimento é uma Cédula de Produto Rural (“CPR”), regida por lei específica (Lei 8.929) ou um Contrato de Investimento Coletivo conforme o art. 2º, inciso IX, Lei 6.385/76.

A CPR, conforme definição oficial da Bovespa:

(...) é um título de crédito lastreado em garantia real, representada por penhor rural ou mercantil. Trata-se de uma venda a termo, na qual o produtor, associação ou cooperativa de crédito emite um título para comercializar seus produtos, recebendo o valor antecipadamente, com a obrigação de pagamento em produto (CPR Física) ou de resgate financeiro (CPR Financeira).

Por sua vez, o Contrato de Investimento Coletivo ofertado publicamente encontra definição legal no art. 2º, IX da Lei 6.385/76:

IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.

O ponto central do PAS CVM Nº RJ2007/13207 consiste na discussão sobre qual configuração jurídica deveria ser atribuída a títulos lastreados em atividade agropecuária pela sociedade empresária Rancho Belo Indústria e Comércio de Alimentos Ltda, que haviam sido objeto de oferta pública no ano de 2004.

Caso fosse definida como CPR, não possuiria a qualidade de valor mobiliário, e por isso não precisaria submeter-se à disciplina da Lei 6.385/76. No entanto, na hipótese de que o título seja reconhecido como valor mobiliário, a Rancho Belo seria culpada de realizar oferta pública sem prévio registro na CVM, e seria condenada ao pagamento de uma vultosa multa.

Na sua opinião, os títulos emitidos pela Rancho Belo configuram valores mobiliários?

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O CASO AVESTRUZ (PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR CVM Nº 23/04)

O Caso Avestruz apresenta discussão semelhante ao Caso Rancho Belo, porém com um produto consideravelmente mais inusitado: trata-se da emissão e venda, pela Avestruz Master Agro Comercial Importação e Exportação Ltda., de títulos agropecuários lastreados na importação e venda de avestruzes. No momento da instauração do processo administrativo sancionador, os referidos títulos apresentavam retornos entre 7 e 9,14% ao mês.

A discussão gerava em torno da natureza dos instrumentos: se se tratava de contratos de investimento coletivo – valores mobiliários – ou se constituíam, na verdade, CPRs físicas. A Sociedade Avestruz chegou a peticionar a conversão dos títulos de contratos de investimento coletivo para CPRs, mas isso não foi capaz de salvar a sociedade. O único motivo por que esta foi absolvida perante o Colegiado da CVM foi sua situação patrimonial: por se encontrar em situação de falência, o Colegiado entendeu que imputar à sociedade uma multa milionária prejudicaria sobremaneira os credores perante o juízo falimentar.

Ao seu ver, há alguma diferença entre os títulos da Avestruz e aqueles da Rancho Belo, capazes de alterar sua configuração jurídica para afastar a qualidade de valor mobiliário?

O CASO DOS CONDO-HOTÉIS

Outro instrumento de investimentos de utilização recente na prática econômica recente consiste no Condo-Hotel. Trata-se de título de investimento correspondente a uma parcela de um empreendimento hoteleiro. Funciona da seguinte forma: diante da dificuldade de arcar com os elevados custos da construção e manutenção de um hotel, o empreendedor emite títulos correspondentes a direitos sobre uma parcela do investimento integral – usualmente uma ou mais unidades de hospedagem da construção – e os oferta publicamente para o público.

A configuração dos títulos de Condo-Hotel tem atraído a atenção da CVM. Como consequência da popularização desta forma e investimento – que, segundo a autarquia, pode encaixar-se na modalidade de contrato de investimento coletivo conforme previsto no art. 2º, IX da Lei 6.385/76 – uma série de processos administrativos têm sido instaurados para apurar a responsabilidade dos agentes emissores e comercializadores destes instrumentos.

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Isso porque – de forma análoga ao que ocorre com o caso Boi Gordo –, caso sejam entendidos como valores mobiliários, qualquer oferta pública deve ser precedida de solicitação e registro perante a CVM, sob pena de responsabilização pelos danos causados e pela infração administrativa.

Com base no conceito de Condo-Hotel, reflita e responda: estamos diante de um valor mobiliário, cuja oferta pública demanda registro prévio perante a CVM, ou trata-se de instrumento financeiro distinto?

AS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO (PROCESSO ADMINISTRATIVO CVM Nº RJ 2007/11593)

Outro caso de considerável relevância é a Cédula de Crédito Bancário (“CCB”). Conforme definição oficial da Cetip (atualmente assimilada pela Brasil Bolsa Balcão – B3), A CCB pode ser entendida como um “título representativo de promessa de pagamento em dinheiro decorrente de operação de crédito”, que pode ser emitido tanto por pessoa física como por pessoa jurídica.

A natureza jurídica da CCB como valor mobiliário foi objeto de relevante discussão no âmbito do Processo Administrativo CVM nº RJ 2007/11593, deliberado pelo Colegiado da autarquia em 15.01.2008. No caso em questão, o Banco Itaú solicitou à CVM que dispensasse a necessidade de registro perante a autarquia de oferta pública de CCBs.

Nesse contexto, merecem destaque as ideias expressas pelo Diretor Marcos Pinto em seu voto. Leia-se:

O Diretor Marcos Pinto observou, em primeiro lugar, que a análise do pedido suscitou a questão de poder as CCBs serem consideradas valores mobiliários. Após discorrer sobre o assunto, o Diretor concluiu, em síntese, que as CCBs serão valores mobiliários caso a instituição financeira em favor das quais elas foram emitidas: (i) realize uma oferta pública de CCBs; e (ii) exclua sua responsabilidade nos títulos.

No entanto, as CCBs não serão valores mobiliários e não estarão sujeitas ao regime imposto pela Lei nº 6.385/76 caso: (i) não sejam objeto de oferta pública; ou (ii) a instituição financeira permaneça responsável pelo seu adimplemento, hipótese em que poderão circular no mercado sem estar sujeitas à regulamentação e fiscalização da CVM, assim como os demais títulos de emissão de instituições financeiras, como os certificados de depósito bancário (“CDBs”).”Polêmica: Crédito de carbono é valor mobiliário?.

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Você concorda com os critérios estabelecidos pelo Diretor para que um instrumento de investimento configure um valor mobiliário? Estes critérios assemelham-se à Howey Definition? O Banco Itaú tem razão em seu pleito?

AS CRIPTOMOEDAS

Delineados e discutidos os instrumentos financeiros que marcaram a economia nacional, permite-se avançar para o caso concreto desafiador não apenas em escala local, mas do sistema financeiro mundial: as criptomoedas.

O dicionário online da plataforma Investopedia define criptomoeda nos seguintes termos:

A cryptocurrency is a digital or virtual currency that uses cryptography for security. A cryptocurrency is difficult to counterfeit because of this security feature. A defining feature of a cryptocurrency, and arguably its most endearing allure, is its organic nature; it is not issued by any central authority, rendering it theoretically immune to government interference or manipulation.63

A tecnologia que garante que uma criptomoeda seja virtualmente

impossível de falsificar é conhecida como Blockchain. Utilizada com diversos fins, no contexto das criptomoedas este mecanismo permite que sejam registradas todas as transações realizadas com uma determinada criptomoeda través da criação e manutenção de ledgers – espécies de livro-razão mantidos por um vasto número de usuários, que, por prestar esse serviço, recebem uma pequena comissão.

Em função da valorização vertiginosa apresentada por algumas criptomoedas no final de 2017 – cujo maior protagonista foi o Bitcoin – discussões têm emergido entre doutrinadores e reguladores sobre se é possível caracterizar uma criptomoeda como um valor mobiliário.

Nesse sentido, e considerados todos os argumentos levantados ao longo deste Tópico, reflita e discuta: existe margem para considerar uma criptomoeda um valor mobiliário? Esta se encaixa na Howey Definition? E no art. 2º, inciso IX da Lei 6.385/76? E na definição apresentada pelo Diretor Marcos Pinto, ao julgar o caso das CCBs emitidas pelo Banco Itaú?

63 Cryptocurrency Definition | Investopedia. Disponível em: <https://www.investopedia.com/terms/c/cryptocurrency.asp#ixzz5LA5M7QNK>. Acesso em: 13/07/2018.

63 Cryptocurrency Definition | Investopedia. Disponível em: <https://www.i n v e s t o p e d i a . c o m / t e r m s / c /cryptocurrency.asp#ixzz5LA5M7QNK>. Acesso em: 13/07/2018.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

98FGV DIREITO RIO

5.2. A COMPANHIA E OS SÓCIOS: ASSEMBLEIAS GERAIS E ESPECIAIS

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Direito das Companhias. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017. Págs. 633 a 692.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Assembleias Digitais e outros Reflexos das Tecnologias nas Assembleias de S/A. São Paulo: Quartier Latin, 2020, pp. 215-239.

Leitura Complementar

LAFARRE, Anne, e VAN DER ELST, Christoph. Blockchain Technology for Corporate Governance and Shareholder Activism. ECGI Working Paper Series in Law, Tilburg, Países Baixos (Holanda), Working Paper nº 390/2018, fevereiro de 2018.

SCHINCARIOL, Juliana. Registro de Informações digitais começa a ser usado nas assembleias. Valor Econômico, Rio de Janeiro, 02/04/2018. Disponível em: <https://www.valor.com.br/empresas/5421719/registro-de-informacoes-digitais-comeca-ser-usado-nas-assembleias>.

5.2.1 INTRODUÇÃO

Conforme já tratado na disciplina Organização Jurídica da Grande Empresa, a legislação societária brasileira organiza o funcionamento das companhias de acordo com as premissas da Teoria Organicista. Ou seja, a fim de melhor realizar sua função social, a companhia – por força de lei – divide-se em órgãos distintos, tanto em sua composição e competência como em sua ordenação hierárquica.

No contexto do relacionamento entre os órgãos sociais, a Assembleia Geral desempenha a função de órgão supremo e soberano da companhia. Composto por todos os acionistas – sejam detentores de ações ordinárias ou preferenciais, com ou sem restrição do direito de voto – a Assembleia Geral é a responsável pela tomada das decisões que vão determinar a conduta da companhia. Nesse contexto, os sócios, ao proferir seus votos, possuem um dever fundamental: deliberar, votar e decidir conforme o interesse social.

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Os prazos de convocação para as assembleias serão de 15 dias (em 1ª convocação) e 8 dias (em 2ª convocação – art. 124, § 1º, LSA64). No entanto, é lícito à CVM aumentar o prazo de convocação da assembleia que tiver por objeto deliberar sobre operações complexas ou suspender os prazos mencionados, observado o disposto no art. 124, § 5º, I e II, LSA65.

Pode a CVM, também, reduzir o quórum qualificado de deliberação da assembleia, atendendo ao contido no art. 136, §§ 2º e 3º, da LSA66.

Os documentos postos à disposição dos acionistas para fins de deliberação da assembleia de acionistas deverão ser entregues à bolsa de valores na data da publicação do anúncio de convocação da assembleia (art. 124, § 6º, LSA67).

A representação de acionistas poderá ser feita por procurador que seja instituição financeira (art. 126, § 1º, LSA68).

O direito de retirada não poderá ser exercido pelos sócios que detiverem ações de espécie ou classe que tenha liquidez no mercado (art. 137, II, LSA69), nos casos de fusão, incorporação ou participação em grupo de sociedades pela companhia.

5.2.2 AS ASSEMBLEIAS E AS NOVAS TECNOLOGIAS

A sociedade moderna está evoluindo de forma dinâmica. Negócios e soluções empresariais se utilizam cada vez mais de plataformas tecnológicas para o desenvolvimento de suas atividades, com amplo acesso a dados e informações pessoais dos seus usuários.

Nesse compasso, o Direito Societário e, mais precisamente, as Assembleias Gerais70, também estão sendo submetidas aos efeitos dessas transformações.

Em algumas localidades do mundo, dentre os mecanismos adotados para a modernização das Assembleias Gerais, com atenção à ideia da redução da necessidade de intervenção humana em etapas organizacionais e burocráticas do procedimento assemblear, destaca-se o uso das blockchains e/ou dos smart contracts71.

Vale dizer: não se pretende minimizar a importância da participação e da discussão presencial em Assembleias Gerais72 e/ou deixar de lado o processo tradicional de votação e o exercício de todos os demais direitos associados ao direito de voto.

64 (Art. 124, §1º, LSA) § 1º A primeira convocação da assembleia-geral deverá ser feita: I - na companhia fechada, com 8 (oito) dias de antecedência, no mínimo, contado o prazo da publicação do primeiro anúncio; não se realizando a assembleia, será publicado novo anúncio, de segunda convocação, com antecedência mínima de 5 (cinco) dias; II - na companhia aberta, o prazo de antecedência da primeira convocação será de 15 (quinze) dias e o da segunda convocação de 8 (oito) dias.65 (Art. 124, §5º, LSA) § 5º A Comissão de Valores Mobiliários poderá, a seu exclusivo critério, mediante decisão fundamentada de seu Colegiado, a pedido de qualquer acionista, e ouvida a companhia: I - aumentar, para até 30 (trinta) dias, a contar da data em que os documentos relativos às matérias a serem deliberadas forem colocados à disposição dos acionistas, o prazo de antecedência de publicação do primeiro anúncio de convocação da assembleia-geral de companhia aberta, quando esta tiver por objeto operações que, por sua complexidade, exijam maior prazo para que possam ser conhecidas e analisadas pelos acionistas; II - interromper, por até 15 (quinze) dias, o curso do prazo de antecedência da convocação de assembleia-geral extraordinária de companhia aberta, a fim de conhecer e analisar as propostas a serem submetidas à assembleia e, se for o caso, informar à companhia, até o término da interrupção, as razões pelas quais entende que a deliberação proposta à assembleia viola dispositivos legais ou regulamentares.66 (Art. 136, §§ 2º e 3º, LSA) § 2º A Comissão de Valores Mobiliários pode autorizar a redução do quorum previsto neste artigo no caso de companhia aberta com a propriedade das ações dispersa no mercado, e cujas 3 (três) últimas assembleias tenham sido realizadas com a presença de acionistas representando menos da metade das ações com direito a voto. Neste caso, a autorização da Comissão de Valores Mobiliários será mencionada nos avisos de convocação e a deliberação com quorum reduzido somente poderá ser adotada em terceira convocação. § 3º O disposto no § 2º deste artigo aplica-se também às assembleias especiais de acionistas preferenciais de que trata o § 1º.67 (Art. 124, §6º, LSA) § 6º As companhias abertas com ações admitidas à negociação em bolsa de valores deverão remeter, na data da publicação do anúncio de convocação da assembleia, à bolsa de valores em que suas ações forem mais negociadas, os documentos postos à disposição dos acionistas para deliberação na assembleia-geral.68 (Art. 126, §1º, LSA) § 1º O acionista pode ser representado na assembleia-geral por procurador constituído há menos de 1 (um) ano, que seja acionista, administrador da companhia ou advogado; na companhia aberta, o procurador pode, ainda, ser instituição financeira, cabendo ao administrador de fundos de investimento representar os condôminos.69 (Art. 137, II, LSA) Art. 137. A aprovação das matérias previstas nos incisos I a VI e IX do art. 136 dá ao acionista dissidente o direito de retirar-se da companhia, mediante reembolso do valor das suas ações (art. 45), observadas as seguintes normas:(...)II - nos casos dos incisos IV e V do art. 136, não terá direito de retirada o titular de ação de espécie ou classe que tenha liquidez e dispersão no mercado, considerando-se haver: a) liquidez, quando a espécie ou classe de ação, ou certificado que a represente, integre índice geral representativo de carteira de valores mobiliários admitido à negociação no mercado de valores mobiliários, no Brasil ou no exterior, definido pela Comissão de Valores Mobiliários; e b) dispersão, quando o acionista controlador, a sociedade controladora ou outras sociedades sob seu controle detiverem menos da metade da espécie ou classe de ação;70 Em linhas gerais, tradicionalmente, as Assembleias Gerais desempenham um importante papel, na medida em que permitem que os acionistas se envolvam e monitorem coletivamente os negócios sociais, por meio de 3 (três) funções em especial: (i) Função de Informação: os acionistas recebem da companhia informações sobre relevantes e diversos temas pertinentes à companhia e à sua atividade; (ii) Função de Fórum: é oferecido aos acionistas um local para discussões e formulação de questões pertinentes à companhia; e (iii) Função de Tomada de Decisões: os acionistas reúnem-se para, coletivamente, tomar decisões e formar a vontade social. Estas 3 (três) funções têm sofrido importantes transformações recentes e, indiscutivelmente, precisam ser repensadas, a fim de evitar a obsolescência do Direito Societário.71 A utilização dessas tecnologias no âmbito do Direito Societário vem ganhando cada vez mais espaço na doutrina nacional e internacional. Para maiores análises, ver: (i) SILVA, Alexandre Couto, e SILVA, Ricardo Villela Mafra A. S., “O blockchain como ferramenta de governança corporativa para redução de custos de agência em sociedades anônimas”. In: Direito, Tecnologia e Inovação. PARENTONI, Leonardo (coord.). v. I. Belo Horizonte: 2018, pp. 670-724; (ii) TALARICO, Thamilla. “Blockchain, Transparência e o Direito Societário” In: HANSZMANN, Felipe (org.) Atualidades em Direito Societário e Mercado de Capi-tais. Vol. III, pp. 467-510. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018, pp. 467-510; (iii) YERMACK, David. Corporate Governance and Blockchains (November 28, 2016). Review of Finance, Forthcoming. Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=2700475>. Acesso em 05.11.2019; e (iv) LAFARRE, Anne; VAN DER ELST, Christoph, Blockchain Technology for Corporate Governance and Shareholder Activism (March 2018). European Corporate Governance Institute (ECGI) - Law Working Paper No. 390/2018; Tilburg Law School Research Paper No. 2018-7, p.91. Disponível em SSRN: <https://ssrn.com/abstract=3135209> ou <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3135209>. Acesso em 05.11.2019; (v) LAFARRE, Anne e VAN DER ELST, Christoph. Bringing the AGM to the 21st Century: Blockchain and Smart Contracting Tech for Shareholder Involvement (Junho, 2017). European Corporate Governance Institute (ECGI) - Law Working Paper No. 358/2017. Disponível em SSRN: https://ssrn.com/abstract=2992804 or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2992804. Acesso em 05.11.2019; (vi) MORGENSON, Gretchen. Meet the Sharesholders? Not at These Shareholder Meetings. Artigo publicado no jornal The New York Times, em 31 de março de 2017, disponível em <https://www.nytimes.com/2017/03/31/business/corporate-virtual-shareholder-meetings.html>. Acesso em 05.11.2019; (vii) FAIRFAX, Lisa M. Virtual Shareholder Meetings Reconsidered (2010). Seton Hall Law Review, Vol. 40, Nº 1367, 2010; GWU Legal Studies Research Paper Nº 539; GWU Law School Public Law Research Paper Nº 539. Disponível em: SSRN: <https://ssrn.com/abstract=1787297>. Acesso em 05.11.2019.72 A relevância de se incentivar a participação dos sócios – não apenas daqueles detentores do poder de controle, mas também dos acionistas minoritários – nas deliberações assembleares já foi reconhecida no âmbito da Administração Pública. O reconhecimento do interesse público desta matéria é evidenciado pela Instrução CVM n. 561, de 2015, que tem por objeto disciplinar e regulamentar o Boletim de Voto à Distância, a fim de maximizar a participação dos acionistas nas assembleias. Contudo, importa assinalar que a ideia de ampliar o engajamento dos sócios na vida da companhia não se restringe à previsão regulamentar do voto à distância. Pode-se mencionar, adicionalmente, a pertinência do emprego da já mencionada tecnologia Blockchain para viabilizar a realização e o registro de assembleias à distância, de modo que todos as matérias referentes a determinada ordem-do-dia poderiam ser decididas com um clique de um botão – sem as vantagens e desvantagens da deliberação presencial.

64 (Art. 124, §1º, LSA) § 1º A primeira convocação da assembleia-geral deve-rá ser feita: I - na companhia fechada, com 8 (oito) dias de antecedência, no mínimo, con-tado o prazo da publicação do primeiro anúncio; não se realizando a assem-bleia, será publicado novo anúncio, de segunda convocação, com antecedên-cia mínima de 5 (cinco) dias; II - na companhia aberta, o prazo de antecedência da primeira convocação será de 15 (quinze) dias e o da segunda convocação de 8 (oito) dias.

65 (Art. 124, §5º, LSA) § 5º A Comissão de Valores Mobiliários poderá, a seu ex-clusivo critério, mediante decisão funda-mentada de seu Colegiado, a pedido de qualquer acionista, e ouvida a companhia: I - aumentar, para até 30 (trinta) dias, a contar da data em que os documentos relativos às matérias a serem delibera-das forem colocados à disposição dos acionistas, o prazo de antecedência de publicação do primeiro anúncio de convocação da assembleia-geral de companhia aberta, quando esta tiver por objeto operações que, por sua com-plexidade, exijam maior prazo para que possam ser conhecidas e analisadas pelos acionistas; II - interromper, por até 15 (quinze) dias, o curso do prazo de antecedência da convocação de assembleia-geral extraordinária de companhia aberta, a fim de conhecer e analisar as propostas a serem submetidas à assembleia e, se for o caso, informar à companhia, até o término da interrupção, as razões pelas quais entende que a deliberação pro-posta à assembleia viola dispositivos legais ou regulamentares.

66 (Art. 136, §§ 2º e 3º, LSA) § 2º A Comissão de Valores Mobiliários pode autorizar a redução do quorum previs-to neste artigo no caso de companhia aberta com a propriedade das ações dispersa no mercado, e cujas 3 (três) últimas assembleias tenham sido re-alizadas com a presença de acionistas representando menos da metade das ações com direito a voto. Neste caso, a autorização da Comissão de Valores Mobiliários será mencionada nos avi-sos de convocação e a deliberação com quorum reduzido somente poderá ser adotada em terceira convocação. § 3º O disposto no § 2º deste artigo aplica--se também às assembleias especiais de acionistas preferenciais de que trata o § 1º.

67 (Art. 124, §6º, LSA) § 6º As compa-nhias abertas com ações admitidas à negociação em bolsa de valores deve-rão remeter, na data da publicação do anúncio de convocação da assembleia, à bolsa de valores em que suas ações forem mais negociadas, os documentos postos à disposição dos acionistas para deliberação na assembleia-geral.

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68 (Art. 126, §1º, LSA) § 1º O acionista pode ser representado na assembleia--geral por procurador constituído há menos de 1 (um) ano, que seja acio-nista, administrador da companhia ou advogado; na companhia aberta, o procurador pode, ainda, ser instituição financeira, cabendo ao administrador de fundos de investimento representar os condôminos.

69 (Art. 137, II, LSA) Art. 137. A aprova-ção das matérias previstas nos incisos I a VI e IX do art. 136 dá ao acionista dis-sidente o direito de retirar-se da com-panhia, mediante reembolso do valor das suas ações (art. 45), observadas as seguintes normas:(...)II - nos casos dos incisos IV e V do art. 136, não terá direito de retirada o ti-tular de ação de espécie ou classe que tenha liquidez e dispersão no mercado, considerando-se haver: a) liquidez, quando a espécie ou classe de ação, ou certificado que a represen-te, integre índice geral representativo de carteira de valores mobiliários admitido à negociação no mercado de valores mobiliários, no Brasil ou no exterior, definido pela Comissão de Valores Mobiliários; e b) dispersão, quando o acionista con-trolador, a sociedade controladora ou outras sociedades sob seu controle de-tiverem menos da metade da espécie ou classe de ação;

70 Em linhas gerais, tradicionalmente, as Assembleias Gerais desempenham um importante papel, na medida em que permitem que os acionistas se envolvam e monitorem coletivamente os negócios sociais, por meio de 3 (três) funções em especial: (i) Função de Informação: os acionistas recebem da companhia informações sobre relevan-tes e diversos temas pertinentes à com-panhia e à sua atividade; (ii) Função de Fórum: é oferecido aos acionistas um local para discussões e formulação de questões pertinentes à companhia; e (iii) Função de Tomada de Decisões: os acionistas reúnem-se para, coletiva-mente, tomar decisões e formar a von-tade social. Estas 3 (três) funções têm sofrido importantes transformações recentes e, indiscutivelmente, preci-sam ser repensadas, a fim de evitar a obsolescência do Direito Societário.

71 A utilização dessas tecnologias no âmbito do Direito Societário vem ganhando cada vez mais espaço na doutrina nacional e internacional. Para maiores análises, ver: (i) SILVA, Alexandre Couto, e SILVA, Ricardo Villela Mafra A. S., “O blockchain como ferramenta de governança cor-porativa para redução de custos de agência em sociedades anônimas”. In: Direito, Tecnologia e Inovacao.

No entanto, é inconcebível pensar que os avanços tecnológicos não produzirão reflexos nas relações entre os acionistas, os administradores e/ou na dinâmica organizacional das grandes companhias.

Diante dessas mudanças e guardadas as devidas proporções, a análise da aplicação das tecnologias às Assembleias Gerais de sociedades anônimas é inovadora e de extrema relevância para a comunidade jurídica e para o mercado de capitais, pois o desenvolvimento tecnológico tem potencial para encurtar distâncias entre acionistas, colaborar para o ativismo societário e contribuir para o combate ao absenteísmo – alterando as práticas societárias e, consequentemente, impulsionando mudanças legislativas e jurisprudenciais.

Além do cenário ora apresentado, o avanço das discussões acerca das Assembleias Gerais conjugada com a utilização das novas tecnologias avançou em largos passos nos últimos meses em virtude da pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

Com objetivo de desacelerar os efeitos decorrentes da pandemia, a OMS e autoridades nacionais vêm recomendando que se evitem aglomerações, adotando-se o chamado isolamento social. Paralelamente, esforços têm sido estabelecidos com objetivo de que se consiga manter a atividade econômica, conservar negócios e preservar a atividade produtiva no Brasil, que é fundamental para assegurar existência digna aos brasileiros (art. 170, CRFB-88).

Nesse sentido, editou-se, recentemente, a MP nº 931/2020 dilatando-se, excepcionalmente, os prazos para realização de assembleias nas sociedades.

Com isso, mostra-se que o tema é importante e expõe a necessidade de modernização do regime assemblear no Brasil. Como visto, a questão não é nova, mas ganha importância no atual contexto. Nos últimos anos, ocorreram transformações importantes nas assembleias e no direito de voto – no Brasil e no mundo –, sendo cada vez mais frequente a adoção de tecnologias e sistemas de votação a distância e participação remota.

Antes de adentrarmos o tema em detalhes, importante traçar alguns apontamentos.

A Lei nº 6.404/76 (“LSA”) foi modificada pela Lei nº 12.431/11, que (i) legitimou, nas companhias abertas, a possibilidade de participação e voto a distância (art. 121, § único, LSA); e (ii) estabeleceu que deve ser considerado presente em assembleia o acionista que registrar a sua presença a distância (art. 127, § único, LSA).

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PARENTONI, Leonardo (coord.). v. I. Belo Horizonte: 2018, pp. 670-724; (ii) TALARICO, Thamilla. “Blockchain, Transparência e o Direito Societário” In: HANSZMANN, Felipe (org.) Atuali-dades em Direito Societário e Mercado de Capitais. Vol. III, pp. 467-510. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018, pp. 467-510; (iii) YERMACK, David. Corporate Governance and Blockchains (November 28, 2016). Review of Finance, Forthco-ming. Disponível em SSRN:  <https://ssrn.com/abstract=2700475>. Acesso em 05.11.2019; e (iv) LAFARRE, Anne; VAN DER ELST, Christoph, Blockchain Technology for Corporate Governance and Shareholder Activism (March 2018). European Corporate Governance Ins-titute (ECGI) - Law Working Paper No. 390/2018; Tilburg Law School Research Paper No. 2018-7, p.91. Disponível em SSRN:  <https://ssrn.com/abs-tract=3135209>  ou  <http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3135209>. Acesso em 05.11.2019; (v) LAFARRE, Anne e VAN DER ELST, Christoph. Bringing the AGM to the 21st Century: Blockchain and Smart Contracting Tech for Shareholder Involvement (Junho, 2017). European Corporate Governance Institute (ECGI) - Law Working Paper No. 358/2017. Disponível em SSRN:  https://ssrn.com/abstract=2992804  or  http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2992804. Acesso em 05.11.2019; (vi) MORGENSON, Gretchen. Meet the Sharesholders? Not at These Shareholder Meetings. Artigo publicado no jornal The New York Times, em 31 de março de 2017, disponível em <https://www.nytimes.com/2017/03/31/busi-ness/corporate-virtual-shareholder-me-etings.html>. Acesso em 05.11.2019; (vii) FAIRFAX, Lisa M. Virtual Shareholder Meetings Reconsidered (2010). Seton Hall Law Review, Vol. 40, Nº 1367, 2010; GWU Legal Studies Research Paper Nº 539; GWU Law School Public Law Rese-arch Paper Nº 539. Disponível em: SSRN: <https://ssrn.com/abstract=1787297>. Acesso em 05.11.2019.

72 A relevância de se incentivar a participação dos sócios – não apenas daqueles detentores do poder de controle, mas também dos acionistas minoritários – nas deliberações assem-bleares já foi reconhecida no âmbito da Administração Pública. O reconheci-mento do interesse público desta ma-téria é evidenciado pela Instrução CVM n. 561, de 2015, que tem por objeto disciplinar e regulamentar o Boletim de Voto à Distância, a fim de maximizar a participação dos acionistas nas assem-bleias. Contudo, importa assinalar que a ideia de ampliar o engajamento dos sócios na vida da companhia não se res-tringe à previsão regulamentar do voto à distância. Pode-se mencionar, adicio-nalmente, a pertinência do emprego da já mencionada tecnologia Blockchain para viabilizar a realização e o registro

Até o momento, algumas medidas foram propostas ou editadas sobre o tema73, a fim de regulamentar a maneira através da qual as sociedades poderão realizar suas assembleias de forma remota, seja ela totalmente virtual, seja ela híbrida – conjugando os elementos físico e virtual para sua realização.

Até o início da pandemia, momento em que as autoridades brasileiras ainda se organizavam para o enfrentamento do vírus, a lei brasileira facultava a participação e voto a distância apenas nas companhias abertas, pequena parte das sociedades brasileiras. Por óbvio, para que o uso do sistema de voto e participação remota seja abrangente, é necessário que este possa ocorrer em companhias fechadas e sociedades limitadas.

A discussão acerca da implementação das assembleias remotas, apesar de insipiente no Brasil, remete ao ano de 2000, em que o estado de Delaware, que hospeda a maioria das companhias norte-americanas, sancionou legislação local, que, desde então, autoriza a realização de assembleia geral, valendo-se – apenas e tão somente – de meios eletrônicos e comunicação remota, em substituição ao ambiente físico e aos padrões tradicionais.

Foi a partir de tal ocasião que inúmeros outros estados norte-americanos e diferentes países passaram a refletir sobre o tema. A legislação nacional norte-americana (Model Business Corporation Act) foi adequada, a fim de prever elementos de tecnologia nas assembleias (cf. §§7.01 a 7.09 da referida lei).

Já em 2003, na Europa, iniciaram-se reflexões para reforçar direitos dos acionistas de companhias abertas na votação em companhias de outros países da União Europeia. Criou-se, então, em 2007, a Diretiva nº 2007/36/CE, prevendo o uso de tecnologias para aprimorar procedimentos de votação em assembleias gerais.

Em muitos casos, para coordenar a participação virtual, há restrições prevendo formulação de perguntas e respostas (Q&A), que reduzem a pessoalidade e a interação, substituindo diálogo sensorial por comunicação textual e remota. As interações e reações não verbais (body language) típicas do encontro cara-a-cara são reduzidas. É difícil replicar tal interação no formato eletrônico.

Alguns defendem que, inclusive, tal medida é capaz de criar espaço para abusos de controladores e administradores, uma vez que o formato puramente virtual os permite ignorar questões complexas, difíceis e/ou polêmicas, fazendo triagem e concentrando-se apenas em questões positivas e favoráveis.

73 Projeto de Lei nº 1.174/2020, Lei 14.010/2020 (PL nº 1.179/2020), Medida Provisória nº 931/2020, Instruções CVM nºs 622/2020 e 625/2020 e, também, Instrução Normativa do DREI nº 79/2020. Na esteira da modernização, alguns países têm admitido encontros não presenciais, nos quais a interação en-tre os participantes é realizada apenas remotamente. Dentre eles, cite-se: Itália (Art. 106 do Decreto Legge de 17 de março de 2020, nº 18), Noruega (Midlertidig forskrift om unntak fra reglene om fysisk møte i aksjeselskaper og allmennaksjeselskaper som følge av utbruddet av covid-19, § 4), França (Art. 5 Ordonnance n° 2020-321 du 25 mars 2020 portant adaptation des regles de réunion et de délibération des assemblées et organes dirigeants des personnes morales et entités dépourvues de personnalité morale de droit privé en raison de l’épidémie de covid-19), e Alemanha (Gesetz zur Abmilderung der Folgen der COVID-19-Pandemie im Zivil-, Insolvenz- und Strafverfahrensrecht). Nos EUA, nos Estados de Connecticut (Executive Order no. 71, subsection 33-703(c)), Georgia (Executive Order no. 03.20.20.02), Nova Jersey (New Jersey Business Corporation Act, Section 14A:5-1) e Nova York (Executive Order no. 202.48).

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de assembleias à distância, de modo que todos as matérias referentes a de-terminada ordem-do-dia poderiam ser decididas com um clique de um botão – sem as vantagens e desvantagens da deliberação presencial.

73 Projeto de Lei nº 1.174/2020, Lei 14.010/2020 (PL nº 1.179/2020), Me-dida Provisória nº 931/2020, Instruções CVM nºs 622/2020 e 625/2020 e, tam-bém, Instrução Normativa do DREI nº 79/2020. Na esteira da modernização, alguns países têm admitido encontros não presenciais, nos quais a interação entre os participantes é realizada ape-nas remotamente. Dentre eles, cite-se: Itália (Art. 106 do Decreto Legge de 17 de março de 2020, nº 18), Noruega (Midlertidig forskrift om unntak fra reglene om fysisk møte i aksjeselskaper og allmennaksjeselskaper som følge av utbruddet av covid-19, § 4), França (Art. 5 Ordonnance n° 2020-321 du 25 mars 2020 portant adaptation des regles de réunion et de délibération des assemblées et organes dirigeants des personnes morales et entités dépourvues de personnalité morale de droit privé en raison de l’épidémie de covid-19), e Alemanha (Gesetz zur Abmilderung der Folgen der COVID-19--Pandemie im Zivil-, Insolvenz- und Strafverfahrensrecht). Nos EUA, nos Es-tados de Connecticut (Executive Order no. 71, subsection 33-703(c)), Georgia (Executive Order no. 03.20.20.02), Nova Jersey (New Jersey Business Cor-poration Act, Section 14A:5-1) e Nova York (Executive Order no. 202.48).

74 Sabe-se que a evolução tecnológica aprimorou comunicações e o fluxo de informação, mas ainda há desafios im-portantes a serem superados. É neces-sário garantir a presença de determi-nados elementos quando da realização das assembleias e reuniões virtual e/ou híbridas, tais como: (i) a participa-ção ampla e efetiva dos acionistas nas assembleias deve seja encorajada, valorizada e incentivada; (ii) os partici-pantes e organizadores da assembleia promovam tratamento equitativo e igualdade de oportunidades para todos os acionistas e participantes, respei-tadas as especificidades de direitos detidos por cada um deles; (iii) sejam fornecidas oportunidades efetivas para engajamento efetivo entre acionistas e membros da administração; (iv) as companhias e emissores de valores mobiliários em geral se comuniquem e esclareçam aos acionistas e partici-pantes dos conclaves os benefícios da Assembleia Digital e/ou de Assembleia Híbrida; e (v) Assembleia Digital e/ou Assembleia Híbrida sejam utili-zadas como mecanismo efetivo para promover diálogo aberto entre acio-nistas, membros da administração e a própria companhia. (SHEEHAN, Anne.

Respeitadas as características de cada país e de seus mercados de capitais, o mundo está atento às transformações das tecnologias nas assembleias gerais. O tema é polêmico, sobretudo, em assembleias apenas virtuais. Pela experiência internacional, nota-se que aquilo que deveria ser avanço e modernismo pode se revelar retrocesso e atraso, como já ocorreu em locais que adotaram a assembleia exclusivamente virtual, o que enseja a necessidade de cuidado, tanto das autoridades nacionais ao implementarem as regulamentações sobre o tema, quanto das sociedades que fizerem uso de tal mecanismo.74

Diante do contexto exposto acima, coloque-se na posição dos agentes acima – acionistas, administradores, autoridades estatais etc. – e reflita: você entenderia que a regulamentação das assembleias e/ou reuniões realizadas à distância seria benéfica ou não à condução dos negócios da sociedade empresária? Fundamente seu entendimento.

74 Sabe-se que a evolução tecnológica aprimorou comunicações e o fluxo de informação, mas ainda há desafios importantes a serem superados. É necessário garantir a presença de determinados elementos quando da realização das assembleias e reuniões virtual e/ou híbridas, tais como: (i) a participação ampla e efetiva dos acionistas nas assembleias deve seja encorajada, valorizada e incentivada; (ii) os participantes e organizadores da assembleia promovam tratamento equitativo e igualdade de oportunidades para todos os acionistas e participantes, respeitadas as especificidades de direitos detidos por cada um deles; (iii) sejam fornecidas oportunidades efetivas para engajamento efetivo entre acionistas e membros da administração; (iv) as companhias e emissores de valores mobiliários em geral se comuniquem e esclareçam aos acionistas e participantes dos conclaves os benefícios da Assembleia Digital e/ou de Assembleia Híbrida; e (v) Assembleia Digital e/ou Assembleia Híbrida sejam utilizadas como mecanismo efetivo para promover diálogo aberto entre acionistas, membros da admi-nistração e a própria companhia. (SHEEHAN, Anne. STUCKEY, Darla C.. The Best Practices Committee for Shareowner Participation in Virtual Annual Meetings. In Principles and Best Practices for Virtual Annual Shareowner Meetings, 2018. Disponível em: <https://corpgov.law.harvard.edu/2018/05/31/principles-and--best-practices-for-virtual-annual-shareowner-meetings/>. Acesso em: 22.06.2020.)

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STUCKEY, Darla C.. The Best Practices Committee for Shareowner Participation in Virtual Annual Meetings. In Principles and Best Practices for Virtual Annual Shareowner Meetings, 2018. Disponí-vel em: <https://corpgov.law.harvard.edu/2018/05/31/principles-and--best-practices-for-virtual-annual--shareowner-meetings/>. Acesso em: 22.06.2020.)

75 (Art. 147, §2º, LSA) § 2º São ainda inelegíveis para os cargos de administração de companhia aberta as pessoas declaradas inabilitadas por ato da Comissão de Valores Mobiliários.

5.3. DEVERES E GARANTIAS DOS ADMINISTRADORES

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Direito das Companhias. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017. Págs. 771 a 908.

EIZIRIK, Nelson. Comentários à Lei das SA. 2ª edição, vol. 2. São Paulo: Quartier Latin, 2015. Ler comentários aos arts. 153 a 157.

Leitura Complementar

Caso Ambev. Processo Administrativo CVM nº 13/2000. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/sancionadores/sancionador/anexos/2002/20020417_PAS_1300.pdf>. Acesso em 01.07.2020.

Caso Bahema. Processo Administrativo CVM nº 24/2005. Disponível em:<http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/sancionadores/sancionador/

anexos/2008/20081007_PAS_2405.pdf>. Acesso em 01.07.2020.

Caso Sadia-Perdigão. Processo Administrativo CVM nº 07/2007. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/sancionadores/sancionador/anexos/2010/20100316_PAS_0707.pdf>. Acesso em 01.07.2020.

INTRODUÇÃO

A tarefa de colocar em movimento a organização produtiva da sociedade empresária é incumbida aos seus administradores. A LSA adota a Teoria Dualista da administração da companhia, apesar de estabelecer como facultativa – salvo exceções específicas – a manutenção de Conselho de Administração. Este órgão, quando em existência, aliado à Diretoria, constituem o corpo gerencial da sociedade.

As companhias abertas são mais rigorosamente disciplinadas em sua atuação – em grande medida por causa da atuação da Comissão de Valores Mobiliários. A título de exemplo, nas companhias abertas são inelegíveis para os cargos de administração as pessoas inabilitadas por ato da CVM, conforme disposto no art. 147, § 2º, LSA75.

75 (Art. 147, §2º, LSA) § 2º São ainda inelegíveis para os cargos de administração de companhia aberta as pessoas declaradas inabilitadas por ato da Comissão de Valores Mobiliários.

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Em função da relevância da atividade desempenhada pelos agentes que ocupam cargos e administração, assim como pelo elevado grau de responsabilidade que sobre eles e elas recai, a LSA prevê um rígido aparato disciplinar para garantir a boa conduta dos administradores. Assim, conforme se permite depreender dos arts. 153 a 157, LSA, o administrador da companhia possui diversos deveres e obrigações, tais como:

1. O dever de diligência, que, apesar de se desdobrar em uma série de deveres conexos, busca atingir um só objetivo: garantir que o administrador exerça sua função de forma organizada e eficaz;

2. O dever de lealdade, que veda que o administrador exerça atividades que acarretem em concorrência com a sociedade para quem trabalha;

3. O dever de prestar informações aos acionistas a respeito dos valores móveis da companhia que porventura detenha e de outros direitos a ela ligados, caso haja pedido de acionistas que representem, no mínimo, 5% do capital social (art. 157, §1º, LSA76).

4. O dever de comunicar fato relevante à Bolsa de Valores e à imprensa (art. 157, §§ 4º e 5º da LSA77).

5. O dever de informar as modificações em suas posições acionárias na companhia (art. 157, §§ 6º, LSA78).

6. A responsabilidade solidária do administrador é restrita àqueles que, por disposição expressa do estatuto, tenham atribuição específica de cumprimento de deveres de que depende o funcionamento normal da companhia (art. 158, §§ 3º e 4º, LSA79).

7. O dever de sigilo, que consiste em obrigação de guardar silêncio sobre qualquer informação não divulgada (art. 155, §§ 1º a 4º, LSA80). Isso inclui, ainda, o dever de não utilizar essas informações para obter vantagens na compra e venda de valores mobiliários, o que caracterizaria o chamado Insider Trading.

Este último parâmetro disciplinar dos administradores – o dever de sigilo

– tem sido objeto de profunda discussão doutrinária e jurisprudencial. No âmbito da legislação doméstica, a reforma da Lei 6.385/76 passou a prever a criminalização do insider trading secundário – caracterizado como o uso de informação privilegiada pelo tippee –, quando outrora apenas o insider trading primário era objeto de tratamento jurídico-penal, ou seja, apenas o tipper era alvo deste grau mais rigoroso de responsabilização.

76 (Art. 157, §1º, LSA) § 1º O administrador de companhia aberta é obrigado a revelar à assembleia-geral ordinária, a pedido de acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social:a) o número dos valores mobiliários de emissão da companhia ou de sociedades controladas, ou do mesmo grupo, que tiver adquirido ou alienado, diretamente ou através de outras pessoas, no exercício anterior;b) as opções de compra de ações que tiver contratado ou exercido no exercício anterior;c) os benefícios ou vantagens, indiretas ou complementares, que tenha recebido ou esteja recebendo da companhia e de sociedades coligadas, controladas ou do mesmo grupo;d) as condições dos contratos de trabalho que tenham sido firmados pela companhia com os diretores e empregados de alto nível;e) quaisquer atos ou fatos relevantes nas atividades da companhia.77 (Art. 157, §§ 4º e 50, LSA) § 4º Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediatamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembleia-geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia.§ 5º Os administradores poderão recusar-se a prestar a informação (§ 1º, alínea e), ou deixar de divulgá-la (§ 4º), se entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia, cabendo à Comissão de Valores Mobiliários, a pedido dos administradores, de qualquer acionista, ou por iniciativa própria, decidir sobre a prestação de informação e responsabilizar os administradores, se for o caso.78 (Art. 157, § 6º, LSA) § 6º Os administradores da companhia aberta deverão informar imediatamente, nos termos e na forma determinados pela Comissão de Valores Mobiliários, a esta e às bolsas de valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, as modificações em suas posições acionárias na companhia.79 (Art. 158, §§ 3º e 4º, LSA) § 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o § 2º ficará restrita, ressalvado o disposto no § 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto, tenham atribuição específica de dar cumprimento àqueles deveres.§ 4º O administrador que, tendo conhecimento do não cumprimento desses deveres por seu predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de comunicar o fato a assembleia-geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável.80 (Art. 155, §§ 1º a 4º, LSA) § 1º Cumpre, ademais, ao administrador de companhia aberta, guardar sigilo sobre qualquer informação que ainda não tenha sido divulgada para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influir de modo ponderável na cotação de valores mobiliários, sendo-lhe vedado valer-se da informação para obter, para si ou para outrem, vantagem mediante compra ou venda de valores mobiliários.§ 2º O administrador deve zelar para que a violação do disposto no § 1º não possa ocorrer através de subordinados ou terceiros de sua confiança.§ 3º A pessoa prejudicada em compra e venda de valores mobiliários, contratada com infração do disposto nos §§ 1° e 2°, tem direito de haver do infrator indenização por perdas e danos, a menos que ao contratar já conhecesse a informação.§ 4º É vedada a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários.

76 (Art. 157, §1º, LSA) § 1º O adminis-trador de companhia aberta é obrigado a revelar à assembleia-geral ordinária, a pedido de acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital social:a) o número dos valores mobiliários de emissão da companhia ou de socieda-des controladas, ou do mesmo grupo, que tiver adquirido ou alienado, direta-mente ou através de outras pessoas, no exercício anterior;b) as opções de compra de ações que tiver contratado ou exercido no exer-cício anterior;c) os benefícios ou vantagens, indiretas ou complementares, que tenha recebi-do ou esteja recebendo da companhia e de sociedades coligadas, controladas ou do mesmo grupo;d) as condições dos contratos de tra-balho que tenham sido firmados pela companhia com os diretores e empre-gados de alto nível;e) quaisquer atos ou fatos relevantes nas atividades da companhia.

77 (Art. 157, §§ 4º e 50, LSA) § 4º Os administradores da companhia aberta são obrigados a comunicar imediata-mente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa qualquer deliberação da assembleia-geral ou dos órgãos de administração da companhia, ou fato relevante ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliá-rios emitidos pela companhia.§ 5º Os administradores poderão recu-sar-se a prestar a informação (§ 1º, alí-nea e), ou deixar de divulgá-la (§ 4º), se entenderem que sua revelação porá em risco interesse legítimo da companhia, cabendo à Comissão de Valores Mobi-liários, a pedido dos administradores, de qualquer acionista, ou por iniciativa própria, decidir sobre a prestação de informação e responsabilizar os admi-nistradores, se for o caso.

78 (Art. 157, § 6º, LSA) § 6º Os ad-ministradores da companhia aberta deverão informar imediatamente, nos termos e na forma determinados pela Comissão de Valores Mobiliários, a esta e às bolsas de valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, as modificações em suas posições acionárias na companhia.

79 (Art. 158, §§ 3º e 4º, LSA) § 3º Nas companhias abertas, a responsabilida-de de que trata o § 2º ficará restrita, ressalvado o disposto no § 4º, aos ad-ministradores que, por disposição do estatuto, tenham atribuição específica de dar cumprimento àqueles deveres.§ 4º O administrador que, tendo conhe-cimento do não cumprimento desses

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Já no cenário internacional, destaca-se a promulgação da Rule 10b5-1, que prevê a possibilidade de insiders realizarem determinadas operações nos mercados de bolsa estadunidense, apesar da posição privilegiada ocupada por estas pessoas.

Considerada a importância prática deste tema, passa-se a analisar alguns destes casos eminentes neste momento, a partir de trechos relevantes de decisões do Colegiado da CVM.

CASO AMBEV. PROCESSO ADMINISTRATIVO CVM Nº 13/2000, REL. DIR. MARCELO FERNANDEZ TRINDADE, J. EM 17.04.2002:

O seguinte trecho do relatório do referido processo sintetiza a discussão sobre o dever de sigilo, de forma sucinta e eficaz:

O presente processo administrativo sancionador foi instaurado para “apurar o eventual uso de informação privilegiada relacionada aos negócios com ações de emissão da Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV realizados no período de maio de 2003 a março de 2004, e ao fato relevante por ela divulgado em março de 2004” e teve por origem oscilações significativas de preço, volume e quantidade de negócios das ações de emissão da AMBEV, ocorridas em 27/02 e 03/03/04, detectadas pela Gerência de Acompanhamento de Mercado – GMA-2, envolvendo notícias divulgadas nos meios de comunicação com referência à possível fusão da empresa com a cervejaria belga INTERBREW e fato relevante publicado pela AMBEV em 03/03/04.

Após a deliberação, a decisão foi no sentido de não culpabilizar os acusados, uma vez que não haveria suficientes indícios da infração investigada. Você concorda com este posicionamento? Fundamente.

CASO BAHEMA. PROCESSO ADMINISTRATIVO CVM Nº 24/2005, REL. DIR. SERGIO WEGUELIN, J. EM 07.10.2008.

Assim dispõem os autos do processo em questão:

Suposta prática de insider trading. Eventual uso indevido de informação privilegiada na aquisição de ações da Bahema Equipamentos S.A.

deveres por seu predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de comunicar o fato a assembleia-geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável.

80 (Art. 155, §§ 1º a 4º, LSA) § 1º Cum-pre, ademais, ao administrador de companhia aberta, guardar sigilo sobre qualquer informação que ainda não te-nha sido divulgada para conhecimento do mercado, obtida em razão do cargo e capaz de influir de modo ponderável na cotação de valores mobiliários, sendo-lhe vedado valer-se da informa-ção para obter, para si ou para outrem, vantagem mediante compra ou venda de valores mobiliários.§ 2º O administrador deve zelar para que a violação do disposto no § 1º não possa ocorrer através de subordinados ou terceiros de sua confiança.§ 3º A pessoa prejudicada em compra e venda de valores mobiliários, contrata-da com infração do disposto nos §§ 1° e 2°, tem direito de haver do infrator indenização por perdas e danos, a menos que ao contratar já conhecesse a informação.§ 4º É vedada a utilização de informa-ção relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários.

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Os acusados teriam adquirido as opções sabendo antecipadamente que estava em curso a negociação do controle da companhia e o fechamento de seu capital. Advertência a um dos acursados (arts. 10 e 11 da ICVM nº 31/84, art. 13, caput, da ICVM nº 358/02, e 155 § 1º da LSA). Multa a 3 dos acusados (art. 155, § 4º, da LSA e §1º do art. 13 da ICVM nº 358/02). Meros indícios foram suficientes para a configuração do insider. (grifo nosso)

Quando comparado com o caso Ambev, o que parece ter-se alterado? Neste momento, busque lembrar-se dos seus estudos de Direito Administrativo: embora o processo administrativo possa prever a relativização das garantias constitucionais à ampla defesa e ao direito à presunção de inocência, cabe responsabilizar um agente a partir da constatação de “meros indícios”? Responda da maneira refletida e fundamentada

CASO SADIA-PERDIGÃO – PROCESSO ADMINISTRATIVO CVM Nº 07/2007, REL. DIR. MARCOS BARBOSA PINTO, J. EM 16.03.2009.

Suposta prática de insider trading. Eventual uso indevido de informação privilegiada em negócios com ações de emissão de Sadia S.A. e Perdigão, ocorridos na Bovespa, nos dias anteriores ao lançamento, pela Sadia, de uma oferta pública de aquisição do controle acionário da Perdigão. Condenação do acusado, por infração ao art. 155, § 4º, da LSA, ao pagamento de multa no valor de R$ 500.000,00.

SEGUROS DOS ADMINISTRADORES

É bastante comum a contratação de seguros de responsabilidade civil (conhecidos como D&O – directors and officiers) para administradores de sociedades, especialmente em sociedades abertas. Por meio desses contratos, em caso de eventuais sinistros, a seguradora estaria obrigada a recompor o patrimônio dispendido pelos administradores em indenizações, gastos com processos judiciais e administrativos, termos de compromisso e outros.

Outro mecanismo de proteção dos administradores, ainda que bastante controverso, são os contratos de indenidade. Por meio desses instrumentos, firmados entre os administradores e a própria sociedade, esta estaria obrigada a ressarcir aqueles em caso de gastos não cobertos nas apólices de seguro contratada. Diferente dos contratos de seguros, os contratos de indenidade são raros no Brasil, mas já levantam discussões acerca dos limites de proteção dos administradores.

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Os contratos de seguro, em regra, servem como um mecanismo para incentivar o regular exercício das atividades dos administradores, tendo em vista que eles se encontram resguardados em caso de eventuais responsabilidades. Todavia, se a blindagem for excessiva demais, pode-se estimular a tomada de decisões e a conduta sem a observância atenta aos deveres legais exigidos.

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5.4. CONFLITO DE INTERESSES E NULIDADES ASSEMBLEARES

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Conflito de Interesses no Exercício do Direito de Voto nas Sociedades Anônimas (1ª Parte). Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. vol. 24. São Paulo. abr.-jun./2004. pp. 140-157.

NASCIMENTO, João Pedro Barroso do. Conflito de Interesses no Exercício do Direito de Voto nas Sociedades Anônimas (2ª Parte). Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. vol. 25. São Paulo. jul.-set./2004. pp. 82-103

EIZIRIK, Nelson. Comentários à Lei das SA. 2ª edição, vol. 4. São Paulo: Quartier Latin, 2015. Ler comentários aos arts. 285 e 286.

Leitura Complementar

FRANÇA, Erasmo Valladão de Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas Assembleias de S.A. (e outros escritos sobre conflito de interesses). São Paulo. 2ª Edição. Malheiros Editores Ltda. 2014.

5.4.1 O CONFLITO DE INTERESSES COMO FERRAMENTA E RESGUARDO DO INTERESSE SOCIAL

O cerceamento do exercício de voto pelo acionista com interesse conflitante nas assembleias gerais consiste em um mecanismo jurídico de proteção ao interesse social. Em suma, o controle dá-se por

(i) limitação do exercício do voto; ou

(ii) orientação legal de como este direito deve ser exercido.

A esse respeito, o caput do art. 115, LSA, dispõe que “o acionista deve exercer o direito de voto no interesse da companhia”. Ou seja: para compreender propriamente o desenvolvimento, aplicação e razão de ser da proibição ao exercício de voto em caso de conflito de interesses, é necessária a indagação sobre em que consiste o interesse social.

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A resposta para essa profunda discussão divide eminentes doutrinadores. As teorias elaboradas em torno do interesse social dividem-se em dois grandes grupos: as teorias institucionais e as contratualistas.

Em linhas gerais, as teorias institucionalistas concebem o interesse social como um interesse superior ao interesse dos sócios, apresentando-se absolutamente soberano e independentemente dos interesses dos próprios sócios. De acordo com essa teoria, o interesse social não constitui privilégio exclusivo dos acionistas e, não por outro motivo, sustentam que as sociedades anônimas, sobretudo as grandes companhias, exercem função pública fundamental para o desenvolvimento dos países em que atuam.

Por sua vez, as teorias contratualistas sustentam que o interesse social consiste em um interesse comum dos acionistas e, portanto, se recusam “a ver na sociedade anônima uma instituição, configurando-a, ao revés, como uma relação contratual que não envolve outro interesse senão das partes contratantes”81.

A legislação brasileira estabelece um regime dualista no que se refere à tutela do interesse social: o art. 115, LSA prescreve ao exercício do direito de voto no interesse da companhia. Fica claro, nesse dispositivo, o caráter contratualista imposto pela LSA ao acionista, a quem compete exclusivamente perseguir o interesse social, ou seja, o interesse comum dos sócios enquanto sócios.

Entretanto, isso não significa que a LSA não tenha reconhecido o caráter institucional das sociedades anônimas. Nesse sentido, prescreve ao acionista controlador o dever de zelar por interesses que transcendem a órbita interna da companhia. Confira-se a redação do parágrafo único do artigo 116:

O acionista controlador tem o dever de usar o poder com o fim de a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender.

Pode-se entender, dessa forma, que, para a LSA, o interesse social não se constitui simples somatório dos interesses privados dos sócios que integram a sociedade. Tampouco pode-se entender que a intenção da Lei é atribuir ao interesse social o conceito de um interesse autônomo e desvinculado dos interesses da pluralidade dos acionistas da companhia.

81 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas assembleias de S.A. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 34.

81 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de Interesses nas as-sembleias de S.A. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 34.

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5.4.2 O ARTIGO 115 DA LEI DAS SOCIEDADES POR AÇÕES

Uma vez delineado o conceito de interesse social, cabe empreender uma análise pormenorizada de um dos mais relevantes e discutidos dispositivos da lei societária brasileira: o art. 115, LSA, principal delimitador e garantidor de que o exercício do direito de voto seja exercido em prol do interesse social.

Eis, então, a regência da matéria pelo artigo 115 da Lei nº 6.404/76:

Art. 115. O acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar-se-á abusivo o voto exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas.

§ 1º O acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia-geral relativas ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social e à aprovação de suas contas como administrador, nem em quaisquer outras que puderem beneficiá-lo de modo particular, ou em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

§ 2º Se todos os subscritores forem condôminos de bem com que concorreram para a formação do capital social, poderão aprovar o laudo, sem prejuízo da responsabilidade de que trata o § 6º do artigo 8º.

§ 3º O acionista responde pelos danos causados pelo exercício abusivo do direito de voto, ainda que seu voto não haja prevalecido.

§ 4º A deliberação tomada em decorrência do voto de acionista que tem interesse conflitante com o da companhia é anulável; o acionista responderá pelos danos causados e será obrigado a transferir para a companhia as vantagens que tiver auferido. (Grifo nosso)

A doutrina critica a redação do artigo 115 por tratar, em um mesmo dispositivo legal, de três institutos jurídicos distintos, quais sejam:

(i) o abuso do direito de voto; (ii) as hipóteses taxativas de proibição do exercício do direito de voto; e (iii) as hipóteses de benefício particular e conflito de interesses.

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A concentração de questões tão antagônicas em um mesmo dispositivo legal suscita divergências na interpretação das matérias nele previstas, como se vê, sucintamente, a seguir.

Sobre cada um destes institutos, o ponto nevrálgico da discussão doutrinária e jurisprudencial é se nessas hipóteses

(i) a lei veda ex ante factum, o exercício do direito de voto, por se tratar de um conflito de interesse formal, na qual o acionista está de antemão impedido de votar, assim como o fez nas duas primeiras hipóteses do §1º do art. 115; ou

(ii) se, ao contrário, a proibição legal se refere à existência de um conflito substancial, o qual somente poderá ser verificado ex post factum, após um exame casuístico da situação conflituosa82.

A esse respeito, não há dúvida que a LSA prescreve, no §1º do artigo 115, quatro hipóteses em que o acionista não poderá exercer o direito de voto nas deliberações das assembleias gerais relativas: (i) ao laudo de avaliação de bens com que concorrer para a formação do capital social; (ii) à aprovação das suas contas como administrador; (iii) a que possa beneficiá-lo de modo particular; e (iv) em que tiver interesse conflitante com o da companhia.

A faceta mais acirrada da discussão reside nas duas outras hipóteses previstas no art. 115, §1, LSA, relacionadas (i) às deliberações sobre matérias que puderem beneficiar o acionista de modo particular; e (ii) às deliberações em que o acionista tiver interesse conflitante com o da companhia.

5.4.3 OS CRITÉRIOS FORMAL E SUBSTANCIAL DO CONFLITO DE INTERESSES

Pelo critério formal, verifica-se a ocorrência do conflito do exercício do direito de voto a priori. Para esse critério, não importa se o voto seria exercido à luz do interesse social ou se o mesmo causaria danos à companhia. A vedação é absoluta, sendo assim, o acionista encontra-se impedido de votar, independentemente do conteúdo que seria manifestado pelo seu voto.

Por outro lado, o critério substancial pressupõe a análise casuística das circunstâncias em que o voto foi exercido. O acionista poderá votar ainda que se encontre em situação de conflito de interesse. Contudo, a validade do seu voto será controvertida caso não tenha sido exercido em prol do interesse social e tenha motivado dano efetivo ou potencial à companhia.

82 Veja, entretanto, que respeitável parte da doutrina capitaneada por Fabio Konder Comparato e Nelson Eizirik sustentam que a hipótese referente às deliberações sobre matérias que possam beneficiar o acionista de modo particular, deve ser interpretada de maneira formal, ou seja, na opinião desses juristas trata-se de hipótese de impedimento absoluto de voto, conforme a lição aqui transcrita: “O entendimento dominante entre nós, tanto no regime anterior como no atual, da mesma forma que ocorre nos sistemas jurídicos francês e alemão, é no sentido de que o benefício particular constitui uma vantagem lícita, um favor concedido ao beneficiário, em sua condição de acionista, mas que rompe o princípio da igualdade entre os acionistas. Tal vantagem pode ser outorgada estatutariamente, mas o acionista beneficiário não pode votar, pois ela lhe trará benefício “particulares”, não conferidos aos demais acionistas. Se a sociedade resolve atribuir uma bonificação a determinado acionista, ele não poderá votar naquela deliberação, pois ela estará a beneficiá-lo de modo particular, quebrando a regra de igualdade entre todos os acionistas. Da mesma forma, constituem exemplos de benefícios particulares: a concessão de opções de compra ou parte beneficiárias, a criação de planos de aposentadoria, e outras hipóteses em que se caracterize o favor a determinados acionistas, mas não a outros”. Entretanto, colocam-se de outro lado, os doutrinadores, como Luiz Gastão Paes de Barros Leães e Luiz Antonio Campos Sampaio, que entendem o benefício particular como sendo uma hipótese de conflito substancial, uma vez que a aprovação de matéria em que exista “interesse conflitante” proporcionará para o acionista um “benefício particular”, sendo, portanto, os dois conceitos intimamente conexos. EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comentada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 658/659.

82 Veja, entretanto, que respeitável parte da doutrina capitaneada por Fa-bio Konder Comparato e Nelson Eizirik sustentam que a hipótese referente às deliberações sobre matérias que possam beneficiar o acionista de modo particular, deve ser interpretada de maneira formal, ou seja, na opinião desses juristas trata-se de hipótese de impedimento absoluto de voto, conforme a lição aqui transcrita: “O entendimento dominante entre nós, tanto no regime anterior como no atual, da mesma forma que ocorre nos sistemas jurídicos francês e alemão, é no sentido de que o benefício particu-lar constitui uma vantagem lícita, um favor concedido ao beneficiário, em sua condição de acionista, mas que rompe o princípio da igualdade entre os acionistas. Tal vantagem pode ser outorgada estatutariamente, mas o acionista beneficiário não pode votar, pois ela lhe trará benefício “particula-res”, não conferidos aos demais acionis-tas. Se a sociedade resolve atribuir uma bonificação a determinado acionista, ele não poderá votar naquela delibe-ração, pois ela estará a beneficiá-lo de modo particular, quebrando a regra de igualdade entre todos os acionistas. Da mesma forma, constituem exemplos de benefícios particulares: a concessão de opções de compra ou parte beneficiárias, a criação de planos de aposentadoria, e outras hipóteses em que se caracterize o favor a determinados acionistas, mas não a outros”. Entretanto, colocam-se de outro lado, os doutrinadores, como Luiz Gastão Paes de Barros Leães e Luiz Antonio Campos Sampaio, que entendem o benefício particular como sendo uma hipótese de conflito substancial, uma vez que a aprovação de matéria em que exista “interesse conflitante” propor-cionará para o acionista um “benefício particular”, sendo, portanto, os dois conceitos intimamente conexos. EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A Comen-tada Volume I Artigos 1º a 120. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2011. P. 658/659.

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Sendo assim, qual critério deve ser adotado na interpretação do §1º do art. 115?

Há um consenso de que o critério formal está em plena conformidade com as duas primeiras hipóteses do §1º do art. 115 da LSA, pois se tratam de hipóteses objetivas de vedação que não dão margem para interpretações. Por outro lado, as duas últimas hipóteses consistem em padrões gerais exemplificativos, podendo ocorrer, na prática, diversas situações em que possam ser caracterizadas.

Por isso, a doutrina, em geral, coincide na interpretação – à exceção de Carvalhosa -, segundo a qual o art. 115 exige a avaliação casuística para que reste configurado o conflito de interesses nos dois últimos casos regulados pelo referido dispositivo.83

Os que defendem a adoção do critério substancial sustentam ainda que a prática empresarial revela hipóteses nas quais acionistas em conluio subtraem o voto do acionista em suposto conflito, impedindo-o de fazer prevalecer sua vontade em determinada deliberação assemblear.84

Neste sentido, argumentam que o critério formal de avaliação do conflito e a consequente vedação a priori do exercício do direito de voto, por vezes, em vez de tutelar o interesse social, que fundamenta a existência do §1º do art. 115 da LSA, pode colocá-lo em risco, invertendo a ordem de poderes na companhia, ao atribuir ao minoritário o exame de impedimento do acionista controlador, por exemplo.85 86

Assim, a conflituosidade, segundo o critério substancial, deverá ser apurada em cada caso concreto, conforme as circunstâncias, de modo que o voto do acionista que privilegie o seu interesse pessoal em detrimento ao interesse social, somente poderá ser verificado a posteriori, através da análise de mérito da deliberação e do impacto causado nas atividades da companhia.

Para Erasmo Valladão Azevedo e Novaes França, o acionista estará impedido de votar quando visar obter vantagem individual a que não faz jus, aliado ao dano atual ou potencial para a companhia. Nesse caso, estaria caracterizado o conflito de interesse capaz de determinar o impedimento de voto do acionista87.

Entretanto, registre-se que esse entendimento não é absoluto. Há quem argumente pela interpretação do §1º do art. 115 da LSA unicamente através do critério formal. Segundo esse entendimento, as hipóteses em que o acionista aufere “benefício particular” ou se encontre em situação de “conflito de interesse” devem ser equiparadas às duas primeiras hipóteses do mencionado dispositivo. Nesse caso, o acionista estará impedido de votar em toda e qualquer situação em que figurar nessas hipóteses.

83 LAMY FILHO, Alfredo. Temas de S.A. Exposições e Pareceres. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 355.84 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25, p. 88.85 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercício de Direito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25, p. 88.86 Nesse sentido, confira a lição de Luiz Antônio Sampaio Campos: “se o voto proferido pelos acionistas a quem seria permitido votar contrariasse o interesse social, o máximo que se obteria seria a desconsideração do voto, jamais a aprovação da deliberação, já que nessa hipótese não haveria a possibilidade de uma decisão judicial que suprisse a manifestação – ou a não manifestação – de vontade dos acionistas. Não se atingiria jamais o conteúdo positivo de uma deliberação, mas apenas a desconstituição dos votos viciados”. 87 NOVAES E FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo. Conflito de Interesses Formal ou Substancial? Nova Decisão d a CVM sobre a Questão. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. V. 128, p. 225.

83 LAMY FILHO, Alfredo. Temas de S.A. Exposicoes e Pareceres. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 355.

84 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercicio de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25, p. 88.

85 NASCIMENTO, João Pedro Barroso. Conflito de Interesses no Exercicio de Di-reito de Voto nas Sociedades Anônimas, parte II. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais 25, p. 88.

86 Nesse sentido, confira a lição de Luiz Antônio Sampaio Campos: “se o voto proferido pelos acionistas a quem seria permitido votar contrariasse o interesse social, o máximo que se obteria seria a desconsideracao do voto, jamais a aprovacao da deliberacao, já que nessa hipótese nao haveria a possibilidade de uma decisao judicial que suprisse a ma-nifestacao – ou a nao manifestacao – de vontade dos acionistas. Nao se atingiria jamais o conteúdo positivo de uma deli-beracao, mas apenas a desconstituicao dos votos viciados”.

87 NOVAES E FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo. Conflito de Interesses Formal ou Substancial? Nova Decisao d a CVM sobre a Questao. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Fi-nanceiro. V. 128, p. 225.

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113FGV DIREITO RIO

5.4.4 NULIDADES ASSEMBLEARES

No âmbito do direito das sociedades por ações aplica-se restritivamente a teoria das nulidades do direito civil, regida pelo princípio “quod nullum est, nullum producit effectum.” Isso se dá diante do interesse da “continuidade das empresas”, do interesse da estabilidade das deliberações da companhia, aliados à tutela do interesse de terceiros, que com ela contratam, confiando na regularidade da prática de seus atos.

Nesse sentido, o especial regime de invalidade aplicável às companhias, se assenta, em grandes linhas no seguinte, como bem aponta Erasmo Valladão:

(i) Prazos muitos mais exíguos de prescrição e decadência; (ii) Irretroatividade dos efeitos da invalidade; (iii) Ampla possibilidade de sanação do vício, ainda que se trate, por vezes,

de defeito que, segundo o direito comum, acarretaria a nulidade do ato;

(iv) Diverso enfoque da distinção entre atos nulos e anuláveis.

Assim, a LSA estabelece no art. 285 que “a ação para anular a constituição da companhia, por vício ou defeito, prescreve em 1 (um) ano, contado da publicação dos atos constitutivos.” Mais ainda, o parágrafo único, em clara reverência ao princípio da sanação dispõe que “Ainda depois de proposta a ação, é lícito à companhia, por deliberação da assembléia-geral, providenciar para que seja sanado o vício ou defeito.”

Nos termos do art. 206 da LSA, a anulação da constituição da companhia acarreta tão somente a sua dissolução. Além disso, a regra geral de anulação das deliberações tomadas em assembleia geral ou especial, “irregularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulação,” prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberação.

O Superior Tribunal de Justiça, em algumas oportunidades, já manifestou entendimento pela aplicação restrita da teoria das nulidades às sociedades anônimas:

PROCESSO CIVIL. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. PRINCÍPIOS JURA NOVIT CURIA E DA MIHI FACTUM DABO TIBI JUS. PREQUESTIONAMENTO. PRODUÇÃO DE PROVA MEDIANTE REPRODUÇÃO MECÂNICA. POSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DEVER DE GUARDA SUJEITO AO PRAZO PRESCRICIONAL.

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114FGV DIREITO RIO

EXISTÊNCIA DE ATO OU NEGÓCIO JURÍDICO. SÚMULA N. 7/STJ. AÇÃO DECLARATÓRIA E PRETENSÃO CONDENATÓRIA OU CONSTITUTIVA. PRESCRIÇÃO.INEXISTÊNCIA OU NULIDADE. NÃO CONTAMINAÇÃO DE ATOS SEPARÁVEIS, CONCOMITANTES OU SUBSEQUENTES. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE.(...)8. A teoria das nulidades de Direito comum não se aplica, de ordinário, em matéria de sociedades anônimas, de modo que os atos societários nulos prescrevem nos prazos previstos na lei societária.9. A eventual nulidade ou inexistência de um ato não contamina os atos e negócios jurídicos dele separáveis, concomitantes ou subsequentes.

* * *

DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE ANONIMA. EMPRESA DE RADIODIFUSÃO E TELECOMUNICAÇÃO. EXIGENCIA DO ORGÃO PUBLICO FISCALIZADOR. COMPROVAÇÃO DA NACIONALIDADE BRASILEIRA DOS ACIONISTAS. CONVOCAÇÃO EDITALICIA DOS SOCIOS, MARCANDO PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO DE NASCIMENTO OU CASAMENTO. DELIBERAÇÃO ASSEMBLEAR DE VENDA DAS AÇÕES DOS QUE NÃO ATENDERAM A CONVOCAÇÃO. ILEGALIDADE. LAPSO PRESCRICIONAL ESPECÍFICO (ARTS. 156 DO DL 2.627/40 E 286 DA LEI 6.404/76). AUSENCIA DE IMPUGNAÇÃO TEMPESTIVA. CONVALIDAÇÃO. PRESCRIÇÃO TAMBEM DO DIREITO A HAVER DIVIDENDOS DISTRIBUIDOS SOB A FORMA DE BONIFICAÇÃO (ART. 287, II, “A”, DA LEI 6.404/76). INAPLICABILIDADE DA TEORIA GERAL DAS NULIDADES. RECURSO PROVIDO.I - EM FACE DAS PECULIARIDADES DE QUE SE REVESTE A RELAÇÃO ACIONISTAS “VERSUS” SOCIEDADE ANONIMA, NÃO HA QUE SE COGITAR DA APLICAÇÃO, EM TODA A SUA EXTENSÃO, NO AMBITO DO DIREITO SOCIETARIO, DA TEORIA GERAL DAS NULIDADES, TAL COMO CONCEBIDA PELAS DOUTRINA E DOGMATICA CIVILISTAS.

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115FGV DIREITO RIO

II - EM FACE DISSO, O DIREITO DE IMPUGNAR AS DELIBERAÇÕES TOMADAS EM ASSEMBLEIA, MESMO AQUELAS CONTRARIAS A ORDEM LEGAL OU ESTATUTARIA, SUJEITA-SE A PRESCRIÇÃO, SOMENTE PODENDO SER EXERCIDO NO EXIGUO PRAZO PREVISTO NA LEI DAS SOCIEDADES POR AÇÕES (ART. 156 DO DL 2.627/40 ART. 286 DA LEI 6.404/76).III - PELA MESMA RAZÃO NÃO PODE O JUIZ, DE OFÍCIO, MESMO NOS CASOS EM QUE AINDA NÃO ATINGIDO O TERMO”AD QUEM” DO LAPSO PRESCRICIONAL, RECONHECER A ILEGALIDADE DA DELIBERAÇÃO E DECLARA-LA NULA. (REsp 35.230/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/1995, DJ 20/11/1995, p. 39597 – grifou-se)

Fixadas as premissas do regime especial aplicável à anulação das deliberações sociais, passa-se, sumariamente, ao delineamento da natureza do ato consistente na da deliberação de assembleia.

5.4.5 VÍCIOS DA PRÓPRIA ASSEMBLEIA; VÍCIOS DAS DELIBERAÇÕES; VÍCIOS DE VOTO

Como se disse, estabelece o art. 286 da LSA que “A ação para anular as deliberações tomadas em assembleia-geral ou especial, irregularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulação, prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberação.”

Para logo, verifica-se que o legislador tratou de três hipóteses distintas num mesmo dispositivo:

a) Vícios da Assembleia – hipótese na qual a assembleia fora convocada ou se instalou irregularmente, em desacordo com a lei ou o estatuto, ocasião em que o vício atingirá todas as deliberações que nela forem tomadas;

b) Vícios das Deliberações – dizem respeito às próprias deliberações assembleares, as quais podem ter sido tomadas, todas ou algumas delas, com violação à lei ou ao estatuto;

c) Vícios de Voto – caso em que um ou mais votos que concorreram para a deliberação do conclave encontravam-se viciados em razão de erro, dolo, fraude ou simulação (ou mesmo em virtude da incapacidade dos votantes – art. 115, §1º, art. 134, §1º ou art. 228, §2º);

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Contudo, muito embora o art. 286 da LSA tenha agrupado todas as hipóteses acima num mesmo dispositivo, prevendo apenas a anulabilidade do respectivo ato, como ensina Erasmo Valladão, os institutos são completamente distintos, não podendo levar as mesmas consequências jurídicas. Muito pelo contrário, as consequências jurídicas, no caso de ocorrência de uma ou de outra hipótese acima, são bastante diversas.

Em relação aos vícios de assembleia, em regra geral, sua ocorrência acarreta apenas a anulabilidade do ato, na medida em que se encontram em jogo apenas os interesses e direitos dos acionistas. Pelo mesmo motivo, a mesma consequência se aplica aos casos de vício de voto.

Já em relação aos vícios de deliberação é preciso distinguir entre (a) a deliberação que atinge ou é passível de atingir direitos ou interesses de acionistas atuais assim como futuros e (b) as deliberações que extravasem o âmbito da companhia.

Relativamente ao item (a), seguindo a orientação de Erasmo Valladão:

1º) é absolutamente nula a deliberação que criar disciplina estatutária ou situação de caráter duradouro em contraste com norma imperativa; 2º) é meramente anulável a deliberação que, no caso concreto, violar direitos inderrogáveis dos acionistas; 3º) é meramente anulável a deliberação que infringir estatutos, salvo quando a lei autorizar a prática do ato, subordinando-o. contudo, ao consentimento dos acionistas interessados, hipótese em que se tratará de eficácia; 4º) é ineficaz a deliberação que criar disciplina estatutária que afete direitos especiais dos acionistas, antes que estes consintam; 5º) é meramente anulável a deliberação que, no caso concreto, atingir direitos especiais dos acionistas.

Relativamente a (b):1º) é absolutamente nula a deliberação que atentar contra a ordem pública ou os bons costumes, ou contiver objeto impossível; 2º) é absolutamente nula a deliberação que infringir disposições legais que têm por objeto a proteção de interesses de terceiros; 3º) é absolutamente nula a deliberação que objetivar dispor dos direitos de terceiros ou dos acionistas enquanto terceiros; 4º) é absolutamente nula a deliberação que atentar contra o interesse público; é ineficaz a deliberação que criar disciplina estatutária que afete os direitos dos credores titulares de partes beneficiárias e debêntures, ou dos credores em geral diante de redução de capital, transformação ou cisão da companhia.

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5.5. O DIREITO DE RETIRADA

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Direito das Companhias. 2[ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 240.

MÜSSNICH, Francisco Antunes Maciel. Reflexões sobre o direito de recesso na lei das sociedades por ações. In: LOBO, Jorge (coord.). Reforma da Lei das sociedades anônimas: inovações e questões controvertidas da Lei n. 10.303, de 31.10.2001. Rio de Janeiro: Forense, 2002. pp. 285-306.

Leitura Complementar

KRAAKMAN, Reinier; ARMOUR, John et. al. The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and Functional Approach. 3ª edição. Oxford: Oxford University Press, 2017, pp. 29 a 49.

INTRODUÇÃO

José Luiz Bulhões Pedreira e Alfredo Lamy Filho88 definem o direito de recesso como: “(...) o poder do acionista de, nos casos previstos na LSA, deixar de ser sócio da companhia mediante formação, por ato unilateral, de negócio jurídico de reembolso, pelo qual aliena suas ações à companhia e dela recebe o valor de reembolso (art. 137, LSA).”

A legislação societária incluiu o direito de retirada entre os direitos

essenciais do acionista (art. 109, inciso V, LSA89), o que impede sua exclusão pelo estatuto ou pela assembleia geral.

O direito de retirada é, em essência, um direito político com reflexo

patrimonial.

88 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Direito das Companhias. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017. Pág. 240.89 (Art. 109, inciso V, LSA) Art. 109. Nem o estatuto social nem a assembleia-geral poderão privar o acionista dos direitos de: (...) V - retirar-se da sociedade nos casos previstos nesta Lei.

88 PEDREIRA, José Luiz Bulhões; LAMY FILHO, Alfredo. Direito das Compa-nhias. 2ª edição. Rio de Janeiro: Foren-se, 2017. Pág. 240.

89 (Art. 109, inciso V, LSA) Art. 109. Nem o estatuto social nem a assem-bleia-geral poderão privar o acionista dos direitos de: (...) V - retirar-se da sociedade nos casos previstos nesta Lei.

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5.5.1 A FUNÇÃO DO DIREITO DE RETIRADA

O surgimento do instituto do direito de recesso está ligado à necessidade de se refrear a competência, reconhecida às assembleias, de modificar as bases essenciais do estatuto social. Por meio do exercício desse direito, o acionista pode escolher não continuar a ser sócio de sociedade distinta, em essência, daquela a que se associou originalmente.

As bases essenciais da companhia influem na decisão do particular de se tornar acionista dela e uma sua alteração relevante pode esvaziar o interesse do sócio de permanecer nessa condição.

Por outro lado, também há um interesse social, da companhia, envolvido nessa matéria. Ou seja, não se pode ignorar o poder (e legitimidade) da deliberação da maioria nas assembleias, inclusive para modificar suas bases, o que se cogita até mesmo para proteger a própria companhia.

Se considerarmos a noção econômica de “custos de agência”, apresentada por KRAAKMAN90 como frequentemente aplicável às relações entre agentes do direito societário, o direito de retirada é, por assim dizer, uma espécie de “válvula de escape” do contrato associativo. Isso porque um dos problemas de agência – em que há uma relação de confiança entre um principal e um agente, que desempenhará determinada atividade de interesse do principal – pode ser encontrado na relação entre acionista minoritário, o principal, que pode ter o interesse em retirar-se da companhia caso o majoritário, na posição de agente, venha a tomar condutas que traiam a confiança do principal.

No entanto, o instituto do direito de recesso traz consigo um perigo intrínseco: o risco de descapitalização da companhia. Apesar de considerada uma solução extremamente satisfatória na conciliação entre o princípio majoritário e a proteção dos acionistas minoritários, a experiência demonstra que seu uso somente é perfeitamente aplicável nas companhias de pequeno porte e quando os acionistas dissidentes representam parcela mínima do total de ações.

Isso fica claro quando se imagina a situação em que, numa companhia de porte médio, acionista representante de 20% a 30% da totalidade das ações decide exercer esse direito. Haveria, sem dúvida, uma enorme descapitalização por ocasião do pagamento, pela sociedade, do valor do reembolso ao acionista retirante, o que acabaria por prejudicar o fortalecimento da empresa. Ressalte-se, ainda, que os acionistas de grandes companhias abertas não precisam exercer esse direito, uma vez que as ações de que são detentores possuem liquidez e dispersão no mercado. 90 KRAAKMAN, Reinier; ARMOUR, John et. al. The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and Functional Approach. 3ª edição. Oxford: Oxford University Press, 2017. Pág. 30

90 KRAAKMAN, Reinier; ARMOUR, John et. al. The Anatomy of Corporate Law: A Comparative and Functional Approach. 3ª edição. Oxford: Oxford University Press, 2017. Pág. 30

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Aliás, pode ocorrer hipótese em que seja mais vantajoso exercer o direito de retirada e obter o preço de reembolso (fixado segundo normas legais e estatutárias) do que vender as ações em mercado de balcão, o que é evidentemente nocivo à companhia e aos demais acionistas.

5.5.2 CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE RECESSO

O regime legal do direito de retirada é cogente, pois não pode ser ampliado nem restringido, seja pelo estatuto ou pela assembleia geral. Disso decorre, por exemplo, que a cláusula estatutária ou a deliberação assemblear que restringir ou suprimir o direito de retirada, ou que torne mais gravoso seu exercício, é nula de pleno direito – à exceção da hipótese prevista no art. 137, II, da LSA (fusão, incorporação ou participação em grupo de sociedades, quando as ações envolvidas nas operações possuírem liquidez e dispersão no mercado).

Além disso, os casos em que é possível o seu exercício são taxativos: o acionista apenas pode retirar-se nos casos expressamente previstos na LSA. Descabe, portanto, qualquer tipo de interpretação ampliativa que busque abarcar outras hipóteses não contempladas na Lei.

Toda essa atenção dedicada pela LSA ao instituto em comento traduz verdadeira preocupação com sua utilização, uma vez que, além de descapitalizar a companhia, o uso do direito de retirada representa exceção ao princípio de que o capital social não pode ser restituído aos acionistas em prejuízo dos credores da sociedade – denominado princípio da irrevogabilidade do capital social.

Observe-se que a retirada do acionista não se aperfeiçoa com a mera manifestação do exercício do direito de retirada, e sim do reembolso das ações, (Art. 137, LSA). Do exercício do direito acima mencionado nasce apenas a “operação” de reembolso, consistente na dinâmica segundo a qual a companhia obriga-se a pagar o reembolso e o acionista obriga-se a se retirar da sociedade, mediante a aquisição por aquela da propriedade das ações e deste do valor de reembolso das ações. Reforça esse entendimento o disposto no art. 45 da LSA, que define o reembolso como a operação pela qual a companhia “paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembleia geral o valor de suas ações”.

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5.5.3 NATUREZA JURÍDICA

O direito de retirada é espécie de direito potestativo, consistente no poder conferido ao acionista de interferir, por meio de declaração unilateral de vontade, na esfera jurídica da companhia, criando para esta obrigação de pagamento do valor de reembolso das suas ações.

É direito formador uma vez que gera ou constitui direito de praticar um ato do qual resultará o direito sobre a coisa em si.

Tem objetivo “egoístico” (BULHÕES PEDREIRA e LAMY FILHO) sobre os acionistas, porque pode (e geralmente é) exercido pelo titular no seu próprio interesse.

Trata-se, enfim, de “prerrogativa individual do acionista minoritário vencido por uma decisão válida da maioria, tomada no interesse do companhia” (LACERDA TEIXEIRA, TAVARES GUERREIRO, p. 427) e que, portanto, não constitui, sanção a ato ilícito e, consequentemente, não se trata de forma de indenização.

5.5.4 HIPÓTESES AUTORIZADAS

Segundo Bulhões Pedreira e Lamy Filho, os fatos que autorizam o exercício do direito podem ser classificados em 3 grupos:

1.1. Modificações nos direitos de participação dos acionistas:

(a) criação de ações preferenciais (art. 136, I, c/c 137, LSA) à salvo se já prevista ou autorizada pelo estatuto;

(b) aumento desproporcional de classe de ações preferenciais (art. 136, I, c/c art 137, LSA) à somente os titulares de ações de espécie ou classe prejudicadas;

(c) alteração de direitos das ações preferenciais (art. 136, II, c/c art. 137, LSA); e

(d) criação de nova classe de ações preferenciais mais favorecida (art. 136, II, c/c art. 137, LSA) à criação de classe menos favorecida não dá esse direito, só aos titulares de ações ordinárias (item ‘a’ acima), uma vez que reforçam os direitos dos proprietários de ações preferenciais mais favorecidas.

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1.2. Outras modificações essenciais no estatuto:

(a) redução do dividendo obrigatório (art. 136, III, c/c art. 137, LSA) à seja por meio de modificação da cláusula que o estabeleceu ou pela inclusão de nova cláusula que o estipule em nível inferior ao previsto em lei no caso de omissão do estatuto;

(b) transformação (art. 221, LSA) à em regra é deliberação que depende da unanimidade dos acionistas para implementar-se. Caso o estatuto tiver previsão distinta, cabe o direito de recesso;

(c) mudança do objeto social (art. 136, VI, c/c art. 137, LSA) à somente configura mudança essencial capaz de ensejar o direito de retirada a alteração estatutária de que resulte modificação da do escopo de atividades para a qual foi constituída a companhia, ou daquilo que, notoriamente, era reconhecido como sua atividade-fim;

(d) participação em grupo de sociedades (art. 136, V, c/c art. 137, LSA) à justifica-se em razão da perda da autonomia da companhia;

(e) fusão ou incorporação em outra sociedade (art. 136, IV, c/c art. 137, LSA) à: caso não tivesse esse direito, o acionista estaria obrigado a ingressar em companhia diferente daquela cujas ações adquirira. É possível, também escolher entre ações da nova companhia ou da incorporada, além de retirar-se;

(f) cisão (art. 136, IX, c/c art. 137, LSA) à a cisão somente dá direito de retirada caso haja (i) mudança do objeto social, exceto no caso em que o patrimônio for revertido para sociedade com atividade-fim semelhante ao da sociedade cindida; (ii) redução do dividendo obrigatório (art. 202, LSA); ou (iii) em participação em grupo de sociedades (art. 137, III). Na realidade, portanto, a regra geral é de que no caso de cisão não há direito de recesso;

(g) conversão em subsidiária integral por incorporação de ações (art. 252, §§ 1º e 2º, LSA) à salvo se as ações tiverem liquidez ou dispersão no mercado;

(h) sucessão de companhia aberta por companhia fechada (art. 223, §§ 3º e 4º, LSA) à justifica-se pela perda de liquidez das ações, já que não mais serão negociadas em bolsa; e

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(i) desapropriação do controle pelo poder público (art. 236, LSA) à salvo se a companhia já se encontrava sob o controle, direto ou indireto, de outra empresa pública.

1.3. Aquisição de controle, por companhia aberta, de sociedade empresária que constitua investimento relevante ou com pagamento de prêmio superior a 50% do valor das ações (art. 256, § 2º, LSA) à os dois requisitos acima são alternativos, segundo Bulhões Pedreira e Lamy Filho.

5.5.5 EXCLUSÃO DO DIREITO DE RETIRADA

Como é intuitivo, o direito de retirada reveste-se de ainda mais importância quando se trata de companhia fechada, eis que a venda das ações, nesse caso, é muito mais difícil. Por outro lado, nem sempre os acionistas das companhias abertas conseguem, rapidamente, alienar suas ações, em razão de lhes faltar a liquidez necessária.

Nas hipóteses pontuais de fusão, incorporação ou participação em grupo de sociedades, quando as ações da companhia tiverem liquidez e estiverem dispersas no mercado, o exercício do direito de retirada não é permitido. Segundo WALD, trata-se de “solução de mercado”, constituindo-se em vedação razoável ao direito de retirada, pois o acionista dissidente tem facilidade de alienar suas ações na bolsa de valores ou no mercado de balcão.

Ressalte-se, no entanto, que é necessário sejam preenchidos ambos os requisitos, liquidez e dispersão, para que seja vedado ao acionista retirar-se da sociedade. Em outras palavras, os critérios mencionados são cumulativos.

Resta analisar, com profundidade, o significado desses conceitos.

(i) Liquidez: verifica-se quando o seu valor pode ser prontamente aferido em moeda corrente, por meio de alienação no mercado sem relevante perda de valor. Há que se enfatizar que não é a mera possibilidade de venda em bolsa ou mercado de balcão que configura a liquidez, e sim a rápida realização do seu valor. Para a Lei Societária, há liquidez “quando a espécie ou classe de ação, ou certificado que a represente, integre índice geral representativo de carteira de valores mobiliários admitido à negociação no mercado de valores mobiliários, no Brasil ou no exterior, definido pela Comissão de Valores Mobiliários” (art. 137, II, a, LSA).

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Por fim, válido mencionar que a liquidez é de cada classe ou espécie de ações, e não da totalidade das ações negociadas no mercado.

(ii) Dispersão: há dispersão “quando o acionista controlador, a sociedade controladora ou outras sociedades sob seu controle detiverem menos da metade da espécie ou classe de ação” (art. 137, II, b, LSA). Essa exigência se justifica em razão de que quanto maior a dispersão, maior será a facilidade do acionista em encontrar interessados na sua participação acionária.Também deve ser verificada em relação à cada classe ou espécie de ações, e não da totalidade das ações negociadas no mercado.

5.5.6 REQUISITOS PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE RETIRADA

à Dissidência do acionista: Só pode, validamente, exercer o direito de retirada aquele acionista que, tendo participado da deliberação que foi contrária aos seus interesses, não votou pela sua aprovação. Seria absurdo admitir a possibilidade de retirada do acionista que aprova determinada matéria e, após, beneficiando-se de eventual situação favorável, requerer o reembolso das suas ações.

Não há forma especial, seja para a concordância ou discordância com a deliberação que proporcionaria em tese o direito de recesso.

à Titularidade das ações na data da primeira publicação relativa à deliberação (art. 137, § 1º, LSA): Admite-se também como preenchido esse requisito quando o titular das ações tenha essa qualidade quando da comunicação do fato relevante objeto da deliberação.

A nova prescrição legal, inserida pela Lei nº 9.457/97, tem por finalidade evitar abusos praticados no antigo regime legal, quando era possível ao acionista requerer o reembolso das ações de sua propriedade na data da assembleia geral. Adquiria-se, assim, ações da companhia sabendo-se quais matérias seriam votadas, com a única finalidade de exercer esse direito e abocanhar ganhos, principalmente nos casos em que o valor de reembolso da companhia fosse maior do que sua cotação no mercado.

à Participação na deliberação: o acionista que, a despeito de comparecer na assembleia, deixa de votar na deliberação, e mesmo aquele que não comparece, também tem direito de se retirar, uma vez que da abstenção não resulta presunção de concordância com a deliberação e são diversos os

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motivos que podem levar o acionista a não participar da assembleia (ainda que a segunda hipótese seja criticada pela doutrina, uma vez que o sócio “desinteressado” não mereceria tutela). No entanto, como no Brasil (e muitos países do exterior) as assembleias são marcadas pelo absenteísmo, não seria razoável que se negasse esse direito aos ausentes.

à Ações prejudicadas pela modificação dos seus direitos: Como dito acima, a LSA estabelece que terá direito de retirada o titular de ações de espécies ou classes prejudicadas pela modificação dos seus direitos.

Diante disso, podem ser formuladas várias hipóteses em que seria possível retirar-se da sociedade, todas constantes das letras (a) a (d) do item XXX supra, a saber: (a) criação de ações preferenciais (art. 136, I, c/c 137, LSA); (b) aumento desproporcional de classe de ações preferenciais (art. 136, I, c/c art 137, LSA); (c) alteração de direitos das ações preferenciais (art. 136, II, c/c art. 137, LSA); (d) e criação de nova classe de ações preferenciais mais favorecida (art. 136, II, c/c art. 137, LSA).

Frise-se que o prejuízo a que lei faz menção é aquele que representa uma diminuição dos direitos de participação do acionista, e não necessariamente um dano patrimonial.

à Prova do prejuízo: Já se entendeu que seria imprescindível, para o exercício do direito de recesso, a demonstração cabal da prova do prejuízo sofrido pelo acionista minoritário, de modo a legitimar seu interesse e evitar abusos e locupletamentos. No entanto, essa não é a opinião corrente, por várias razões. Principalmente, pode-se argumentar que tal prova é prescindível uma vez que (a) não é a perda financeira ou econômica que justifica o direito de retirada; o direito de recesso (b) é potestativo (direito-poder do acionista) e (c) só pode ser restringido por lei, sendo certo que não há exigência legal nesse sentido; e (d) o exercício é faculdade do acionista, que pode exercê-la até mesmo quando a aprovação da matéria for do interesse do acionista.

5.5.7 O EXERCÍCIO DO DIREITO DE RETIRADA

Quanto ao próprio modo de exercício do direito de retirada, é importante mencionar que o mesmo é feito mediante declaração unilateral de vontade, que não está sujeita a nenhuma concordância ou aceitação por parte da companhia, eis que meramente potestativo. Basta, para o completo exercício desse direito, a manifestação de vontade de acordo com os preceitos legais e estatutários.

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Essa manifestação do sócio é de natureza receptícia, o que significa que somente produzirá efeitos caso chegue ao seu destinatário, isto é, a companhia, não importando o meio com que isso seja feito (verbal ou por escrito). Não tendo isto ocorrido, portanto, ainda pode ser revogada, pois não está plenamente formada.

Caso se aperfeiçoe, a declaração do acionista é irrevogável, ficando o mesmo a ela vinculado, com a obrigatoriedade de alienar as ações.

O prazo para seu exercício, que é decadencial nos termos do art. 137, § 4º, LSA, pode ser contado de diferentes formas:

(a) regra geral: 30 dias após a publicação da ata da assembleia geral (art. 137, IV, LSA);(b) dissidência de deliberação de assembleia especial: 30 dias após a publicação da ata da assembleia especial (art. 137, V, LSA);(c) incorporação ou fusão (art. 227, art. 228, LSA), incorporação de ações (art. 252, LSA), incorporação, pela controladora, de companhia controlada (art. 264, LSA): 30 dias após a publicação da ata da assembleia que aprovar o protocolo ou justificação, ficando o pagamento do reembolso condicionado à sua efetivação (art. 230, LSA);(d) desapropriação do controle por pessoa jurídica de direito público: 60 dias após a publicação da ata da primeira assembleia geral da companhia realizada posteriormente à desapropriação (art. 236, pár. único, LSA).

A companhia tem, no entanto, a faculdade de reconsiderar a deliberação que motivou o exercício do direito de retirada pelos acionistas, de modo a desobrigar-se ao reembolso do valor das ações. Esse direito da companhia poderá ser exercido em assembleia convocada em até 10 dias após o término do prazo para o exercício do recesso, que terá como fim a ratificação ou a reconsideração da deliberação que originou os pedidos de reembolso (art. 137, § 3º, LSA). A prescrição legal visa a assegurar àquela companhia na qual o exercício do direito de recesso configure-se excessivamente oneroso ou insuportável.

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A respeito do direito de retirada, segue ilustração:

Os órgãos de administração, por sua vez, não necessitam aguardar o prazo para convocação da assembleia, seja para considerar a deliberação definitiva, iniciando o pagamento dos acionistas retirantes, seja para convocar imediatamente a assembleia de que trata o art. 137, § 3º, da Lei. A reconsideração pela companhia, não é passível de contestação pelo acionista dissidente.

Repita-se, por oportuno, que somente o exercício do direito de retirada não retira do sócio essa condição, uma vez que isso apenas ocorre com o pagamento do valor de reembolso das ações, como já foi acima explicitado.

É intuitivo, ainda, que o acionista tem a faculdade de exercer o direito de recesso apenas de parte de suas ações, na proporção que lhe aprouver, uma vez que não constitui requisito para o exercício do direito que este se faça em relação à totalidade dos valor mobiliários detidos pelo sócio. Parte da doutrina se insurge contra essa proposição (Renata Brandão Moritz e Modesto Carvalhosa), aduzindo que tal proceder configuraria abuso de direito.

No entanto, a CVM já se manifestou favorável a essa iniciativa, ao consignar que o “recesso parcial não onera a sociedade: beneficia-a, pela redução do montante a ser reembolsado, e aos credores, pela permanência do capital social” (Pareceres CVM/SJU/Nº 050/1979 e 66/1979). Essa faculdade teria base, também, no art. 137, VI, da LSA.

5.5.8 VALOR DO REEMBOLSO

O valor de reembolso das ações é aquele pago ao acionista dissidente pelos valores mobiliários sobre os quais exerceu o direito de retirada. A regra geral para a determinação de seu valor é a determinação pelo estatuto da companhia, que tem liberdade na fixação de normas e critérios para a apuração do seu valor.

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Este, contudo, somente poderá ser menor que o valor de patrimônio líquido das ações caso seja apurado, por três peritos ou por empresa especializada, com base no valor econômico da companhia, prescrição incluída pela Lei nº 10.303/2001.

Entende-se por valor econômico da companhia o valor encontrado com base nos critérios do art. 170, § 1º da Lei Societária, aplicados em conjunto ou separadamente, assim dispostos:

Art. 170:(...)§1º: (...)I - a perspectiva de rentabilidade da companhia; II - o valor do patrimônio líquido da ação; III - a cotação de suas ações em Bolsa de Valores ou no mercado de balcão organizado, admitido ágio ou deságio em função das condições do mercado.

No entanto, relembre-se que a definição do valor de reembolso por meio de critérios determinados é facultada – e não prescrita - pela LSA. Em caso de omissão do estatuto, o valor de reembolso será o valor de patrimônio líquido contábil da ação constante do balanço da companhia.

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6. REORGANIZAÇÕES SOCIETÁRIAS (INCORPORAÇÕES; INCORPORAÇÃO DE AÇÕES; FUSÕES, CISÕES E TRANSFORMAÇÕES)

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

PEDREIRA, José Luiz Bulhões e LAMY FILHO, Alfredo (Coordenadores). Direito das Companhias. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2009, Vol. II, pp. 1737-1811.

Leitura Complementar

CANTIDIANO, Luiz Leonardo. Incorporação de Sociedade e Incorporação de Ações. In. CASTRO, Rodrigo R. Moteiro de; MOURA AZEVEDO, Luiz André N. de (Coord.). Poder de Controle e Outros Temas de Direito Societário e Mercado de Capitais – São Paulo: Quartier Latin, 2010. págs. 135-158.

B) ROTEIRO DE AULA

1. INTRODUÇÃO

A consolidação do modelo econômico capitalista, especialmente após a II Guerra Mundial, a evolução dos mercados de capitais internacionais, a modernização das economias de mercado e, até mesmo, os avanços tecnológicos que encurtaram distâncias e propiciaram mecanismos eficientes para que agentes de mercado, localizados em regiões diferentes, praticassem negócios entre si, são alguns dos fatores que impulsionaram o desenvolvimento e destacaram a importância do direito empresarial.

A concentração empresarial firmou-se como uma das principais tendências do capitalismo moderno. Os fenômenos econômicos da globalização e da extensão e/ou exclusão das “fronteiras mercantis e comerciais” estimulam para que as companhias se associem e concentrem empresas, a fim de ganharem escala e competitividade no mercado capitalista.

Como consequência deste movimento, a atividade das companhias passou a influenciar e fazer parte do cotidiano da vida de todos. Prova disso são as operações societárias frequentemente noticiadas nos veículos da mídia.

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Contudo:

1. Como essas operações são realizadas? 2. Quais medidas são importantes para a implementação dessas operações? 3. Qual é a participação dos advogados nessas operações? 4. Como saber diferenciar os diferentes tipos de operações societárias?

É, neste contexto, que se inserem as operações societárias de fusão, cisão, transformação, incorporação e incorporação de ações, que são instrumentos jurídicos oriundos de um fenômeno econômico.

Estas operações podem envolver sociedades de tipos societários diferentes, devendo ser respeitadas as disposições constantes do estatuto ou contrato social das sociedades envolvidas, de acordo com o caput do artigo 223 da LSA91.

Anteriormente ao advento da Lei nº 10.406/02 (“CC 2002”), a Lei nº 6.404/76 (“LSA”) funcionava como lei geral das sociedades empresárias, regulando as referidas operações societárias (incorporação, fusão, cisão e transformação), independentemente do tipo societário que estivesse envolvido em tais operações. Entretanto, o CC 2002 (severamente criticado pela melhor doutrina, pela ausência de tecnicismos e maneira assistemática como regula o Direito de Empresas) pretendeu capitular a integra das sociedades empresárias, atribuindo à LSA a condição de lei especial. Devido ao fato do CC 2002 ser incompleto, assistemático e inadequado à regulação deste tópico, embora não se possa negar sua aplicação às operações de reorganização societária, recorre-se à LSA em qualquer hipótese. Além disso, é inegável a aplicação da LSA sempre que as operações envolveram sociedades anônimas.

O artigo 223, §3º, da LSA, uma das regras previstas na LSA que se aplica tão somente às companhias abertas, prevê que no caso da incorporação, fusão ou cisão envolver companhia aberta, as sociedades que a sucederem serão também abertas, devendo obter o respectivo registro e, se for o caso, promover a admissão de negociação das novas ações no mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data da assembleia geral que aprovou a operação, observadas as normas pertinentes baixadas pela CVM, notadamente a Instrução CVM nº 319/1999, que disciplina as operações de incorporação, fusão e cisão envolvendo companhias abertas, e a Instrução CVM nº 480/2009, que dispõe sobre o registro de emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários.

91 Art. 223. A incorporação, fusão ou cisão podem ser operadas entre sociedades de tipos iguais ou diferentes e deverão ser deliberadas na forma prevista para a alteração dos respectivos estatutos ou contratos sociais.

91 Art. 223. A incorporação, fusão ou cisão podem ser operadas entre socie-dades de tipos iguais ou diferentes e deverão ser deliberadas na forma pre-vista para a alteração dos respectivos estatutos ou contratos sociais.

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Em relação às operações de incorporação, fusão e cisão envolvendo companhias abertas, a Instrução CVM nº 319/99 regula, especialmente: i. a divulgação de informações (conforme a Instrução CVM nº 358/2002, essas operações configuram Fatos Relevantes); ii. aproveitamento econômico e o tratamento contábil do ágio e deságio; iii. relação de substituição das ações dos acionistas não controladores, nas operações de incorporação; iv. obrigatoriedade de auditoria independente das demonstrações financeiras; v. conteúdo do relatório da administração; vi. hipóteses de exercício abusivo do poder de controle; vii. fluxo de dividendos dos acionistas não controladores.

Ainda que no que diz respeito à legislação aplicável às companhias abertas, tem-se o Parecer de Orientação CVM nº 34/2008, mera recomendação, não sendo, portanto, norma. Ele visa a estabelecer parâmetros em relação ao tratamento do “impedimento de voto em casos de benefício particular em operações de incorporação e incorporação de ações em que sejam atribuídos diferentes valores para as ações de emissão de companhia envolvida na operação, conforme sua espécie, classe ou titularidade”. Esse parecer tem causado muita “polêmica na doutrina jurídica”, uma vez que conforme muda a composição do Colegiado da CVM, a interpretação desta recomendação também é alterada.

2. PROTOCOLO E JUSTIFICAÇÃO

Segundo a Exposição de Motivos da LSA, tanto o Protocolo quanto a Justificação visam a assegurar “o conhecimento de todas as condições da operação, das repercussões que terá sobre os direitos (dos acionistas) e do valor de reembolso que lhes caberá, caso prefiram usar o direito de retirada”.

2.1. Protocolo

O protocolo é o documento, firmado pelos órgãos de administração ou sócios das sociedades interessadas, por meio do qual são apresentados os termos e condições das operações de incorporação, fusão ou cisão com incorporação em sociedade existente. É, desta forma, o instrumento de manifestação da vontade das sociedades elaborado por seus administradores e obriga, por força de sua natureza pré-contratual, as sociedades envolvidas a avaliar seus patrimônios líquidos e submeter seus termos para deliberação da assembleia geral e/ou dos sócios das sociedades envolvidas, conforme o caso.

De acordo com o artigo 224 da LSA, no Protocolo deverão constar obrigatoriamente as seguintes disposições, observado que eventuais valores ainda sujeitos a determinação serão indicados por estimativa:

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I - o número, espécie e classe das ações que serão atribuídas em substituição dos direitos de sócios que se extinguirão e os critérios utilizados para determinar as relações de substituição;II - os elementos ativos e passivos que formarão cada parcela do patrimônio, no caso de cisão;III - os critérios de avaliação do patrimônio líquido, a data a que será referida a avaliação, e o tratamento das variações patrimoniais posteriores;IV - a solução a ser adotada quanto às ações ou quotas do capital de uma das sociedades possuídas por outra;V - o valor do capital das sociedades a serem criadas ou do aumento ou redução do capital das sociedades que forem parte na operação;VI - o projeto ou projetos de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão ser aprovados para efetivar a operação;VII - todas as demais condições a que estiver sujeita a operação.

Essas informações representam o conteúdo mínimo que deve constar no Protocolo, sendo possível a adição de informações suplementares.

2.2. Justificação

Além do Protocolo, as operações de incoporação, fusão e cisão serão submetidas à deliberação da assembleia geral das companhias interessadas mediante justificação, contendo todos os esclarecimentos necessários a uma tomada de posição.

Com base no artigo 225 da LSA, os seguintes esclarecimentos deverão constar do documento:

I - os motivos ou fins da operação, e o interesse da companhia na sua realização;II - as ações que os acionistas preferenciais receberão e as razões para a modificação dos seus direitos, se prevista;III - a composição, após a operação, segundo espécies e classes das ações, do capital das companhias que deverão emitir ações em substituição às que se deverão extinguir;IV - o valor de reembolso das ações a que terão direito os acionistas dissidentes.

Assim como no Protocolo, outras informações além daquelas previstas no art. 225 da LSA podem constar na Justificação.

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3. FORMAÇÃO DO CAPITAL NAS OPERAÇÕES DE REORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA

O artigo 226 da LSA dispõe que as operações de incorporação, fusão e cisão somente poderão ser efetivadas nas condições aprovadas se os peritos nomeados determinarem que o valor do patrimônio ou patrimônios líquidos a serem vertidos para a formação de capital social é, ao menos, igual ao montante do capital a realizar.

Tal medida visa à proteção dos credores. Isto porque as sociedades são livres para convencionar a relação de substituição de ações e o valor atribuído ao patrimônio líquido da sociedade a ser incorporada. Entretanto, em obediência ao princípio da realidade do capital social, a lei requer que a avaliação do patrimônio líquido da incorporada seja realizada com as mesmas cautelas adotadas na avaliação para a formação/subscrição de capital em bens, em conformidade com as disposições do art. 8º da LSA. O objetivo da lei foi o de impedir que o patrimônio líquido forme capital social por valor superior ao real. Caso as sociedades acordem em transmiti-lo por valor inferior, não há o que impedir, uma vez que, quanto mais o patrimônio líquido tiver o seu valor subestimado, maior a garantia dos credores, que é a razão de ser do requisito legal de avaliação92. De qualquer forma, o valor do patrimônio líquido a ser vertido não poderá ser inferior ao montante do capital a realizar.

Conforme o art. 226, §3º, LSA, nas operações envolvendo incorporação, fusão e cisão, os ativos e passivos a serem incorporados ou decorrentes de fusão e cisão devem ser avaliados a preço de mercado quando realizadas entre partes independentes e vinculadas à efetiva transferência de controle.

A tendência internacional nas operações de combinação de empresas (business combination) é: i. reconhecer o patrimônio da sociedade adquirida pelo seu valor de negociação; e ii. mensurar os negócios por “valor justo”. No Brasil, o Pronunciamento Técnico do Comitê de Pronunciamentos Contábeis - CPC nº 15, tem por objetivo fundamental definir o tratamento contábil aplicável ao reconhecimento, à mensuração e às divulgações decorrentes de operações de “combinação (ou concentração) de negócios”, sendo elas a aquisição de participações societárias, aquisição de negócios, fusão, incorporação, incorporação de ações, cisão e alteração de controle. De acordo com o CPC nº 15, a entidade adquirente deverá reconhecer o valor justo dos ativos e passivos da entidade fusionada ou incorporada ou derivada de uma cisão, no momento da transação de fusão, incorporação ou cisão.

92 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A Lei das S.A. 2º volume, 2ª edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p.562.

92 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A Lei das S.A. 2º volume, 2ª edição, Rio de Janeiro: Renovar, 1996, p.562.

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Por fim, ainda no que toca às operações de combinação de empresas, a partir da nova Lei do CADE (Lei nº 12.529/2011), as operações de fusão que resultarem em concentração econômica deverão observar as determinações do direito concorrencial. Dentre as principais alterações, tem-se o controle prévio desses tipos de operações pelo CADE. Na antiga lei, a operação poderia ser submetida ao órgão de defesa da concorrência somente após a sua efetivação. Hoje, é necessária a autorização do CADE para que a operação possa se consolidar. Além disso, via de regra, os atos societários de operações de fusões e incorporações que impliquem em concentração econômica sujeitam-se também à aprovação da Secretaria Nacional de Defesa Econômica (SNDE).

4. TIPOS DE OPERAÇÕES DE REORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA

4.1 Incorporação

A incorporação é a operação através da qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede universalmente em todos os direitos e obrigações93. Do ponto de vista econômico, por meio da incorporação busca-se o aproveitamento de sinergias entre as sociedades, o ganho de escala e competitividade no mercado em que se inserem as sociedades envolvidas na operação de incorporação.

Como resultado da incorporação, a sociedade que vier a ser incorporada será extinta, para todos os fins e efeitos legais, operando-se a sua sucessão universal pela incorporadora. Ou seja, a transferência patrimonial resultante da incorporação efetua-se não em relação aos acionistas, mas sim em relação à sociedade incorporadora (ou sobrevivente), que se torna sucessora, por força de lei, da sociedade incorporada (e agora extinta).

Como regra geral, a incorporação implementa-se com o aumento de capital na sociedade incorporadora, no valor correspondente ao acervo líquido da sociedade incorporada (que está sendo absorvido). Os acionistas da sociedade incorporada receberão ações de emissão da sociedade incorporadora, em conformidade com a relação de troca estabelecida.

Em tese, só não ocorrerá o aumento de capital na: (i) controvertida hipótese de incorporação de sociedade com patrimônio líquido negativo; e (ii) na incorporação de subsidiária integral94.

93 (art. 227 LSA)94 Em relação a este último caso Egberto Lacerda Teixeira e José Alexandre Tavares Guerreiro ensinam que: (...) “Evidentemente, se esse acionista vier a incorporar a subsidiária integral, ter-se-á a hipótese de incorporação sem qualquer aumento de capital por parte da sociedade incorporadora, limitando-se a operação a uma modificação em seus registros ativos.” TEIXEIRA, Egberto de Lacerda: GUERREIRO, José Alexandre Tavares. Das sociedades anônimas no direito brasileiro. Vol. 2. São Paulo: José Bushastsky, 1979, p.670.

93 (art. 227 LSA)

94 Em relação a este último caso Egber-to Lacerda Teixeira e José Alexandre Tavares Guerreiro ensinam que: (...) “Evidentemente, se esse acionista vier a incorporar a subsidiária integral, ter--se-á a hipótese de incorporação sem qualquer aumento de capital por parte da sociedade incorporadora, limitando--se a operação a uma modificação em seus registros ativos.” TEIXEIRA, Egber-to de Lacerda: GUERREIRO, José Alexan-dre Tavares. Das sociedades anônimas no direito brasileiro. Vol. 2. São Paulo: José Bushastsky, 1979, p.670.

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Nas companhias, assumindo que a incorporação envolverá modificação do estatuto social, a mesma deverá ser deliberada em Assembleia Geral Extraordinária, com quórum de instalação de acionistas representando 2/3 (dois terços) do capital social com direito a voto, em 1ª convocação, e com qualquer número em 2ª convocação, conforme prevê o artigo 135, caput, da LSA.

Para sua aprovação, o quórum de deliberação necessário será de acionistas representando a maioria absoluta do capital votante da companhia (i.e., 50% +1), se maior quórum não for exigido pelo estatuto social, conforme prevê o artigo 136, inciso IV, da LSA.

Não obstante as proteções específicas previstas na legislação aplicável, a incorporação ainda enseja o direito de retirada dos acionistas da sociedade incorporada95, exceto nas hipóteses em que as ações de emissão da companhia incorporada tiverem liquidez e dispersão no mercado96. O direito de retirada, no entanto, não é conferido aos acionistas da sociedade incorporadora.

Sem prejuízo destas hipóteses de exclusão do direito de recesso, há quem sustente que mesmo nas demais hipóteses somente haverá direito de recesso na incorporação se desta operação resultar “prejuízo” para os acionistas da sociedade incorporada.

Quadro demonstrativo:

Incorporação da Sociedade B na Sociedade A:

95 art. 137, inc. IV, LSA96 art .137, inc. II, LSA

95 art. 137, inc. IV, LSA

96 art .137, inc. II, LSA

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135FGV DIREITO RIO

Resultado:

4.1.1 Incorporação de Companhia Controlada

Outra situação peculiar que merece destaque é a incorporação, pela controladora, de sociedade controlada, a qual está prevista no artigo 264 da LSA. Nesta operação, somente serão incorporadas as ações não pertencentes ao controlador. Por essa razão, para salvaguardar o minoritário, o caput do referido artigo estabelece que os valores dos patrimônios líquidos das sociedades deverão ser calculados pelos mesmos critérios e na mesma data, a preços de mercado ou com base em outro critério aceito pela CVM, no caso das companhias abertas, para o fim de se determinar qual é a relação de substituição das ações. Sobre este tema, há o Parecer de Orientação CVM nº 35/2008 que faz recomendações acerca dos deveres legais dos administradores nas incorporações de controladas.

No que diz respeito à aplicabilidade do artigo 264 da LSA às operações entre sociedades coligadas e/ou sociedades sobre controle comum, há muita discussão. O Parecer CVM/SJU nº 16/1985 recomenda a obrigatoriedade da avaliação de dois patrimônios somente nos casos envolvendo incorporação de controlada.

Consta no parecer que “A lei societária não estabeleceu para a incorporação de companhia não-controlada, a avaliação do patrimônio da incorporadora. A avaliação relativa dos dois patrimônios, a preços de mercado, apenas é mandatória nas incorporações de companhias controladas, conforme previsto no caput do art. 264”. Assim, quando se tratar da incorporação de companhia controlada, dois cálculos devem ser apresentados aos acionistas das companhias envolvidas na incorporação. São eles: i. o cálculo da relação de troca segundo os critérios avençados entre as companhias contratantes da operação, e ii. o cálculo da relação de troca segundo o valor patrimonial das companhias a preço de mercado.

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Seguindo entendimento semelhante, o Parecer CVM/PJU nº 08/2001 recomenda que o art. 264 da LSA tenha sua aplicação restrita à hipótese de incorporação, pela controladora, de companhia controlada. O parecer recomenda ainda que “ Incorporação de companhia sem relação de controle uma(s) com a(s) outra(s) não se sujeita ao art. 264, ainda que as companhias integrantes da operação estejam sobre controle comum de terceira companhia (holding), que, entretanto, não tomará parte da incorporação.” Assim, se observados ambos os pareceres, conclui-se pela inaplicabilidade das regras do art. 264 da LSA às operações entre sociedades coligadas e/ou sociedades sob controle comum.

4.1.2 Incorporação de Ações

É muito importante fazermos a distinção entre duas operações societárias absolutamente diferentes, mas que muitas vezes são comparadas em virtude da semelhança entre as nomenclaturas que as designam, quais sejam: (a) a incorporação de sociedades (artigo 227 da LSA); e (b) a incorporação de ações (artigo 252 da LSA).

De um lado, a “incorporação de sociedades”, conforme já abordamos acima, caracteriza-se pela absorção de uma ou mais sociedades pela sociedade incorporadora, deixando de existir as sociedades incorporadas. Do outro lado, a “incorporação de ações” consiste na incorporação de todas as ações do capital social de uma determinada companhia, ao patrimônio de outra companhia brasileira, passando a companhia incorporada a ser subsidiária integral da companhia incorporadora.

Na prática, na incorporação de ações, os acionistas de determinada companhia conferem as ações de que são titulares ao patrimônio de outra companhia, necessariamente brasileira, em processo de substituição de aumento de capital desta última. Ocorre que a sociedade incorporada não se extingue, mas continua a existir como subsidiária integral, nos termos do caput do artigo 252 da LSA.

É interessante notar que na incorporação de ações haverá direito de recesso para os acionistas de ambas as sociedades (incorporada e incorporadora), conforme preveem os §§1º e 2º do artigo 252 da LSA.

Quadro demonstrativo:

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Incorporação das ações de emissão da Sociedade B pela Sociedade A.

Resultado:

4.2 Fusão

A fusão é a operação pela qual duas ou mais sociedades se unem para formar uma sociedade nova, que lhes sucederá universalmente em todos os direitos e obrigações (artigo 228 da LSA). A operação de fusão possui diversas semelhanças procedimentais com a incorporação, aplicando-se a esta igualmente a necessidade do já referido Protocolo e Justificação e o mesmo procedimento de direito de recesso referido acima. Na prática de mercado, as operações de fusão são menos usuais do que as operações de incorporação, por gerarem a extinção de todas as sociedades envolvidas (que perdem inclusive suas inscrições e CNPJ), elemento que gera dificuldades procedimentais para condução dos negócios. Além disto, a incorporação de sociedades muitas vezes é capaz de alcançar os mesmos propósitos pretendidos com a fusão, com vantagens de aproveitamentos de benefícios fiscais e planejamentos tributários.

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Quadro Demonstrativo:

Fusão da Sociedade A com a Sociedade B:

Resultado:

4.3 Cisão

De acordo com o artigo 229 da LSA, a cisão é a operação pela qual a companhia se divide e transfere seu acervo líquido para duas ou mais sociedades.

A cisão poderá ser: (i) total, que importará na extinção da sociedade cindida que resultará em duas ou mais novas sociedades; ou (ii) parcial, preservando-se a sociedade cindida, que será dividida e reduzida pela parcela que houver sido cindida. Em tal caso, a parcela cindida poderá ser utilizada para a formação de sociedade nova, na forma do artigo 229, §2º, da LSA, ou poderá ser incorporada em sociedade existente, na forma do artigo 229, §3º, da LSA (i.e., cisão parcial com incorporação de parcela cindida).

Igualmente as operações de incorporação e fusão, far-se-ão necessários na cisão os documentos de Protocolo e Justificação da operação.

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A cisão poderá ser proporcional (quando os acionistas participarem da parcela cindida na mesma proporção em que participavam da sociedade cindida) ou desproporcional (quando os acionistas participarem da parcela cindida em proporção diferente da que participavam da sociedade cindida). A cisão parcial desproporcional é matéria de unanimidade na LSA, tal como dispõe o artigo 229, §5º, LSA.

De acordo com o §1º do artigo 229 da LSA, a sociedade que absorver parcela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obrigações relacionados no ato da cisão, sendo que no caso de cisão com extinção da companhia cindida (i.e., cisão total) as sociedade que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.

Em conformidade com o art. 233, § único da LSA, os atos de cisão parcial poderão estipular que as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida serão responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida.

A operação de cisão ensejará direito de recesso, na forma do artigo 137 combinado com o artigo 136, inciso IX, da LSA. O direito de recesso na cisão foi reintroduzido na reforma à LSA promovida pela Lei nº 10.303/01, uma vez que havia sido suprimido na reforma à LSA promovida pela Lei nº 9.457/97, por conta de interesses relacionados às privatizações.

É importante esclarecer que somente haverá direito de recesso na cisão nas hipóteses referidas no artigo 137, inciso III, LSA (i.e., quando resultar em mudança do objeto social da sociedade cindida, redução do dividendo obrigatório ou participação em grupo de sociedade).

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Quadros Demonstrativos:

Quadro 1 - Cisão Total da Sociedade A:

Resultado:

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Quadro 2 – Cisão Parcial Proporcional da Sociedade A com a consequente incorporação da Parcela Cindida pela Sociedade B

Resultado:

4.4 Transformação

Por fim, referimo-nos à operação de transformação (arts. 220 a 222 da LSA), que é aquela em que a sociedade muda de tipo societário, independentemente de dissolução e liquidação, obedecendo os preceitos aplicáveis à constituição do tipo societário para o qual a sociedade está se transformando. A transformação é matéria de unanimidade na LSA (art. 221 LSA), exceto se expressamente previsto em sentido diverso no estatuto social, hipótese em que os acionistas estarão investidos do direito de recesso se dissentirem da deliberação.

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4.5 Drop-Down de Ativos (Conferência de Ativos ao Capital Social)

Devido a inúmeras razões, principalmente as relacionadas às questões tributárias-contábeis e comerciais-mercadológicas, em muitos casos, em vez de se realizar a cisão parcial com incorporação da parcela cindida, promove-se a capitalização de ativos entre sociedades envolvidas em reorganizações. Nestes casos, aplica-se o regime da “subscrição de ações mediante capitalização de créditos ou subscrição em bens”, tal como disposto no art. 171, §2º da LSA. As formalidades exigidas a fim de promover a exata estimação dos bens a serem contribuídos ao capital social são aquelas previstas nos artigos 7º e 8º da LSA. O intuito dessas formalidades é assegurar o cumprimento do princípio da realidade do capital social.

5. DIREITOS DOS CREDORES NAS OPERAÇÕES DE INCORPORAÇÃO; INCORPORAÇÃO DE AÇÕES; FUSÕES, CISÕES E TRANSFORMAÇÕES

Os direitos dos credores são tutelados tanto nas operações de fusão e incorporação quanto na cisão.

De acordo com o artigo 232 da LSA, que regula os direitos dos credores na incorporação e na fusão, até 60 (sessenta) dias depois de publicados os atos relativos à incorporação ou à fusão, o credor anterior por ela prejudicado poderá pleitear judicialmente a anulação da operação; findo o prazo, decairá do direito o credor que não o tiver exercido. A depender do caso, o valor do crédito poderá ser consignado em pagamento em juízo de modo a evitar anulação (art. 232, §1º da LSA).

De acordo com o artigo 233 da LSA, que regula os direitos dos credores na cisão, na cisão com extinção da companhia cindida, as sociedades que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da companhia extinta. A companhia cindida que subsistir e as que absorverem parcelas do seu patrimônio responderão solidariamente pelas obrigações da primeira anteriores à cisão.

Em caráter excepcional, o artigo 233, parágrafo único, da LSA prevê que o ato de cisão parcial poderá estipular que as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida serão responsáveis apenas pelas obrigações que lhes forem transferidas, sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida, mas, nesse caso, qualquer credor anterior poderá se opor à estipulação, em relação ao seu crédito, desde que notifique a sociedade no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da publicação dos atos da cisão.

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Mais uma vez, ressalta-se que nas operações de fusão e incorporação que resultarem em concentração econômica deverão ser observadas as determinações do direito econômico concorrencial (i.e., Lei nº 12.529/2011 – Nova Lei do CADE)

6. CASO CONCRETO: PROCESSO SANCIONADOR- CVM Nº RJ 2002/1415

O referido caso trata da cisão parcial de Paraibuna e de incorporação da parcela cindida pela Paranapanema, sua controladora, a qual detinha uma participação de 68,89% do capital da Paraibuna. Na Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária da Paraibuna, realizada em 28.04.98, foram apreciados e aprovados, por unanimidade, o Protocolo de Incorporação e a Justificação da operação de cisão parcial dos ativos e de incorporação da parcela cindida pela Paranapanema.

O imbróglio, no entanto, se deu com a elaboração imprecisa do Protocolo de Incorporação e com a divulgação intempestiva de fato relevante. Em relação ao Protocolo de Incorporação, ao tratar da relação de substituição das ações e dos critérios utilizados para determiná-la, previu-se que, para cada ação detida pelos acionistas da Paraibuna, subsistiria o direito a 3,8118 ações da Paranapanema.

Entretanto, em 12.05.98, a Paranapanema e a Paraibuna publicaram “Aviso aos Acionistas” esclarecendo que, para cada lote de mil ações da Paraibuna, seus acionistas receberiam 7,10321 ações da Paranapanema, gerando um cenário de imprecisão e insegurança, o que levou os acionistas da Paraibuna a protocolarem uma reclamação na CVM .

Sendo assim, em 25.08.98, as reclamações dos acionistas de Paraibuna foram analisadas pelo órgão regulador, que concluiu que Paraibuna e a Paranapanema haviam emitido o Protocolo de Incorporação e Justificação de maneira confusa, não havendo indicado a quantidade de ações que seria atribuída aos acionistas da Paraibuna, nem o critério que seria utilizado para determinar a relação de substituição.

Ademais, ambas as companhias não haviam publicado Fato Relevante conforme os ditames da Instrução CVM nº 31/84, a qual determinava que aos administradores de companhia aberta comunicassem, imediatamente, à CVM e à Bolsa de Valores- em que seus valores mobiliários fossem mais negociados- bem como divulgassem em jornal de grande circulação, ato ou fato relevante ocorrido nos seus negócios.

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O Colegiado da CVM, contudo, por unanimidade de votos, seguindo o entendimento do Relator, Marcelo Fernandez Trindade, entendeu que as infrações não haviam causado maiores danos ao mercado ou aos investidores e, haviam sido decorrência de falhas meramente culposas na operacionalização do negócio, não subsistindo conduta dolosa.

Sendo assim, com fundamento no art. 11, inciso I, da Lei 6.385/76, decidiu-se impor apenas pena de advertência ao Sr. Antônio Carlos Souza Aranha Pires de Andrade, na qualidade de administrador da Companhia Paraibuna de Metais e da Paranapanema S.A., por infração ao disposto no inciso I do art. 224 da Lei 6.404/76; e à Sra. Maria Ângela Cruz Auler, na qualidade de Diretora de Relações com o Mercado da Companhia Paraibuna de Metais e da Paranapanema S.A., por infração ao disposto no inciso I do art. 224 da Lei 6.404/76 e no art. 2º da Instrução CVM nº 31/84.

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7. OPERAÇÕES DE M&A (I.E., COMPRA E VENDA DE AÇÕES; OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO DE EMPRESAS; OPERAÇÕES DE AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO DE ATIVOS; CAPTAÇÕES DE RECURSOS COM INGRESSO DE SÓCIOS (PRIVATE AND PUBLIC PLACEMENTS); JOINT VENTURES). DILIGÊNCIA LEGAL E QUESTÕES CONEXAS ÀS OPERAÇÕES DE M&A.

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

SIQUEIRA, Marcelo. BUHATEM, Fernanda Bastos. TREIGER, José Marcos. SHERIQUE, Elie Jacques. Brasil M&A: Guia para Fusões e Aquisições de Empresas Brasileiras. Rio de Janeiro: Donnelley, 2017.

Leitura Complementar

BUSCHINELLI, Gabriel Saad Kik. Compra e venda de participações societárias de controle. São Paulo: Quartier Latin, 2018.

 MARTINS-COSTA, Judith. Um aspecto da obrigação de indenizar: notas

para uma sistematização dos deveres pré-negociais de proteção no direito civil brasileiro. In: CAMPOS, Diogo Leite de; MENDES, Gilmar Ferreira (Orgs.). A evolução do direito no séc. XXI. Estudos em homenagem ao Professor Arnoldo Wald”. 1ª ed. Coimbra: Almedina, 2007, p. 301-355.

 PONTES, Evandro Fernandes de. Representations & Warranties no Direito

Brasileiro. São Paulo: Almedina, 2014. 

B) ROTEIRO DE AULA 1. OPERAÇÕES DE M&A

A sigla M&A designa a expressão Mergers & Aquisitions, que a despeito do estrangeirismo condenável e não aplicação correta do vernáculo português, tornou-se jargão e praxe recorrente para referir-se às grandes operações societárias.

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De forma sumária, na aplicação concreta que é dada à expressão “Operação de M&A” no Brasil, basicamente, são as operações societárias de: (i) compra e venda de ações; (ii) aquisição e alienação de Empresas; (iii) aquisição e alienação de ativos; (iv) captações de recursos com ingresso de sócios (private and public placements); e (v) formação de Joint Ventures em geral.

Em vista a simples tradução da expressão Mergers & Aquisitions para o Português, poder-se-ia dizer que a expressão corresponde às operações de Fusões & Aquisições. Entretanto, as “Operações de M&A” devem ser entendidas separadamente das operações de “Reorganizações Societárias” clássicas (i.e., incorporações; incorporação de ações; fusões, cisões e transformações.) De forma bastante simples e inicial, exporemos abaixo as distinções.

Para além disso, pergunta-se:

• O que são as Operações de M&A?

• Como as Operações de M&A são estruturadas e realizadas?

• Qual o passo-a-passo característico das Operações de M&A?

• Como as Operações de M&A (das quais tanto se houve informalmente e, também, na teoria) acontecem na prática?

Embora pareça óbvio (e uma respeitosa forma de analisar casuisticamente cada uma das possíveis Operações de M&A), diz-se que tais operações são bem peculiares e únicas, tendo em vista fatores de ordem econômica, financeira, empresarial, contábil e/ou jurídica aplicáveis aos casos concretos. Todavia, em linhas gerais, buscando uma abordagem didática do tema.

1.1. Fases da Operação

O primeiro passo de uma operação societária consiste na identificação da oportunidade de negócio. A companhia ofertante elabora uma proposta à companhia ofertada. Sinalizado o interesse, antes de se iniciar as negociações em torno do negócio, faz-se importante celebrar um acordo de confidencialidade.

O sigilo pode ser crucial para a viabilidade da operação. Veja, por exemplo, o que aconteceria com a cotação das ações de uma companhia aberta se o mercado soubesse do interesse de um potencial comprador. A possível valorização das ações poderia tornar a operação economicamente pouco atrativa.

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Além disso, é comum a abertura de dados sigilosos das companhias para discutirem questões relevantes referentes a operação. Essas informações, por óbvio, também precisam ser protegidas.

Celebrado o acordo de confidencialidade, passa-se a análise das avaliações preliminares dos aspectos comerciais, jurídicos e financeiros mais relevantes. Discutido os principais aspectos, as partes celebram um Memorando de Entendimentos, ou MOU (sigla em inglês para Memorandun of Understanding), pelo qual manifestam o interesse pela realização da operação e definem as premissas do negócio a ser implementado.

É comum as partes negociarem no próprio Memorando de Entendimentos uma cláusula de exclusividade. Através dessa cláusula, as partes envolvidas se obrigam a não negociar com outras partes interessadas, de modo a preservar a exclusividade da operação.

Superada essa etapa, inicia-se a realização da due diligence, que tem como objetivo identificar as principais contingências em torno da operação societária. Conforme será visto com mais detalhes no próximo tópico, a due diligence consiste em uma importante etapa da operação, sendo determinante, muitas vezes, para confirmar a oferta de sinalização proposta no MOU ou definir uma oferta final distinta.

Com o relatório ou sumário executivo pronto, as partes iniciam uma nova fase de negociações. O objetivo é ajustar as condições essenciais do negócio e, consequentemente, assinar os contratos definitivos.

Os contratos definitivos, normalmente preveem condições precedentes. Por exemplo, no caso de incorporação, é comum o contrato prever como condição para o fechamento, a realização das assembleias gerais extraordinárias pelos quais os acionistas das companhias envolvidas terão que aprovar a operação.

Desse modo, cumprida todas as condições precedentes, a operação societária caminha para o seu fechamento. Nesse momento, são cumpridas as últimas obrigações, como a liquidação financeira da operação e a transferência de ações, em caso de aquisição, por exemplo.

Registre-se, entretanto, que mesmo após o fechamento é comum restarem as partes algumas obrigações pós-closing. Exemplo disso são as formalidades necessárias de arquivamento dos atos societários perante a Junta Comercial.

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Por fim, veja abaixo, de forma ilustrativa o quadro com passo a passo descrito acima:

2. DUE DILIGENCE EM OPERAÇÕES DE M&A

Foi visto no tópico anterior que a due diligence ou diligência legal (tradução em português) corresponde a um importante passo em uma operação de M&A. Através dela, é possível elaborar uma “radiografia jurídica” das companhias envolvidas na operação, pelo qual poder-se-ão confirmar ativos, identificar passivos, identificar riscos, verificar potenciais “superveniências ativas”, “superveniências passivas” e “insuficiências ativas”, confirmar o interesse das partes envolvidas e definir o preço do negócio bem como o preço de compra e a forma de pagamento.

Entretanto, qual é o escopo da diligência legal?

Pode ser objeto da diligência legal, todas as áreas que envolvem a companhia, como as áreas fiscal, trabalhista, cível, contratos, societária, ambiental, propriedade intelectual e administrativa. O escopo da diligência legal será visto com mais detalhes no item 3.2 abaixo.

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Importante ressaltar que alguns critérios para análise podem ser previamente definidos. Por exemplo, se serão analisadas apenas contingências materializadas, ou seja, aquelas que já constituem um passivo, ou se serão objeto de análise contingências de procedimento.

Entende-se contingência de procedimento aquelas que ainda não foram materializadas, mas existe o risco de vir a ser. Por exemplo, uma companhia não reconhece vínculo trabalhista para os seus funcionários, ainda que identificado todos os elementos caracterizadores da relação de trabalho. Essa prática pode representar uma contingência materializada futura a partir do momento em que os funcionários insatisfeitos ajuizarem demandas trabalhistas com esse pleito.

Também podem ser delimitados limites de atuação da análise. Os limites podem ser geográficos, de valor ou de objeto. Por exemplo, só serão analisados contratos nacionais, acima de R$500.000,00 e sobre prestação de serviços que represente o objeto social da companhia.

2.1. Procedimento da due diligence

Para a elaboração da due diligence, entre os procedimentos mais comuns estão a disponibilização dos documentos através de cópias físicas, data-room virtual, ou até a mesmo a verificação independente pelo qual os advogados vão até a sede da empresa analisar os documentos.

2.2. Fases da Diligência

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2.3. Escopo da Diligência

Conforme visto no item 3, o escopo da diligência legal pode abranger todas as áreas que envolvam a companhia. O quadro abaixo demonstra alguns dos aspectos mais relevantes analisados em uma diligência legal:

SITUAÇÃO REGULAR

Companhia-Alvo (e/ou, conforme o caso, os Vendedores) está devidamente constituída, validamente existente e em situação regular.Companhia-Alvo (e/ou, conforme o caso, os Vendedores) possui plena capacidade e autoridade para celebrar contrato da Operação de M&A, realizar todas as operações previstas e cumprir todas as obrigações assumidas, inexistindo qualquer impedimento legal ou contratual para a realização de tais operações. O cumprimento de suas obrigações nos termos deste Contrato foi devidamente autorizado pelos atos e/ou órgãos societários competentes.Campanha-Alvo possui todas as licenças e/ou autorizações para funcionamento e desenvolvimento de suas atividades e negócios de forma geral.

CAPITAL SOCIAL

Especificações sobre o valor do capital social, com detalhamento da composição do capital social, valor em Reais (R$), número de ações emitidas, espécies e classes, informações sobre subscrição e integralização das ações, descrição sobre a existência de ônus e/ou gravantes. Conforme o caso, detalhamento em relação ao capital autorizado. Previsão sobre a existência de outros valores mobiliários de emissão da Companhia-Alvo.

PROPRIEDADE DAS AÇÕES

Detalhamento sobre propriedade e posse das ações de emissão da Companhia-Alvo. Conforme o caso, especificação sobre modo de aquisição das ações de emissão da Companhia-Alvo objeto da Operação de M&A (i.e., detalhes sobre emissão e/ou compra e venda). Especificações sobre direito de preferência à subscrição e questões conexas.

RESTRIÇÕES

Informações sobre existência de eventuais restrições à realização da Operação de M&A e/ou previsão de quais são os atos preparatórios necessários à formalização definitiva da Operação de M&A (exemplificativamente: promessas de compra e venda, opções de compra e/ou venda, warrants, direitos de preferência à circulação das ações, direito de venda conjunta (tag along), direito de obrigar a venda em conjunto (drag along). Previsão de necessidades de autorizações de terceiros em relação à Operação de M&A.

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BENS E DIREITOS (ATIVOS).

OBRIGAÇÕES(PASSIVOS).

Detalhamento de quais são os bens e direitos (i.e., ativos) e obrigações (i.e., passivo) de posse e/ou propriedade da Companhia-Alvo e/ou, de outra forma, atribuíveis à Companhia-Alvo. Informações sobre situação operacional, condições de manutenção, dados sobre contabilização e, conforme o caso, amortização contábil dos ativos e passivos. Detalhes sobre registros e incidência de eventuais ônus e/ou gravames.

QUESTÕES TRABALHISTAS E PREVIDENCIÁRIAS

Informações sobre práticas trabalhistas da Companhia-Alvo e observância à legislação trabalhista e previdenciária. Regras sobre benefícios adicionais. Conforme o caso, programas de opção de compra de ações (i.e., stock option plans). Dados sobre existência de acordos coletivos, convenções sindicais e congêneres. Regras sobre rescisões de relações com colaboradores (i.e., executivos, empregados, autônomos, terceirizados, prestadores de serviços em regime de PJ e etc). Questões sobre estabilidade de emprego. Políticas de retenção de profissionais estratégicos (golden parachute).

PROCESSOS(JUDICIAIS,

ADMINISTRATIVOSE/OU ARBITRAIS)

Companhia-Alvo (e/ou, conforme o caso, os Vendedores) não são partes em quaisquer processos (judiciais, administrativos e/ou arbitrais) pendentes. Não há qualquer processo que, de alguma forma, possa impedir ou prejudicar a implementação da Operação M&A e/ou possa representar qualquer risco relevante à situação financeira ou patrimonial da Companhia-Alvo ou ao normal desenvolvimento dos negócios e atividades sociais da Companhia-Alvo. Informações sobre valor e matéria. Definição de critérios de relevância. Chances de Êxito. Reflexos dos processos nas demonstrações financeiras da Companhia-Alvo.

TRIBUTOS

Companhia-Alvo apresentou todas as declarações de tributos federais, estaduais e municipais, bem como recolheu de maneira adequada e tempestiva todos os tributos, contribuições sociais e previdenciárias aplicáveis. Todos os tributos, impostos, taxas e contribuições devidas foram devidamente recolhidos ou adequadamente declarados ou, nos casos de questionamento administrativo ou judicial, as provisões apropriadas foram feitas nos livros e demonstrações financeiras da Campanhia-Alvo.

CONTRATOS

Informações sobre contratos relevantes (valor do objeto). Garantias prestadas pela Companhia-Alvo em favor de terceiros (e/ou recebidas pela Companhia-Alvo de terceiros). Regras contratuais estratégicas (exemplificativamente: exclusividade; não-competição; não-aliciamento; territorialidade. Informações sobre hipóteses de vencimento antecipado relacionadas à Operação de M&A (exemplo: transferência de controle; reogarnização societária;etc).

OUTRAS QUESTÕES

Questões Ambientais; Seguros; Negócios com Partes Relacionadas; Regras Anti-Corrupção; CADE; Responsabilidade por Produto; Imóveis etc;

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3. OS CONTRATOS NA OPERAÇÃO DE M&A (EM ENFOQUE PRINCIPAL NO CONTRATO DE COMPRA DE VENDA DE AÇÕES)

Os negócios jurídicos possuem alguns elementos constitutivos obrigatórios, que são usualmente referidos como os requisitos de validade. Estes se enquadram em 2 (duas) espécies, quais sejam os requisitos de:

(i) ordem geral, que são aqueles comuns a todos os atos e negócios jurídicos, conforme previstos no artigo 104 do Código Civil; e

(ii) ordem especial, que são aqueles específicos dos contratos.

Sendo assim, exigem-se como requisitos para a validade dos contratos: (a) capacidade das partes, conforme prevê o artigo 104, inciso I, do Código Civil; (b) objeto lícito, possível e determinado ou determinável, conforme prevê o artigo 104, inciso II, do Código Civil; (c) forma prescrita ou não defesa em lei, conforme prevê o artigo 104, inciso III, do Código Civil – sendo os três de forma geral; e (d) necessidade de consentimento recíproco e/ou acordo de vontade das partes contratantes – este último de ordem especial.

Estes são os elementos essenciais do negócio jurídico, que, obrigatoriamente, devem constar de todos os contratos, sob pena de nulidade.

Além dos elementos essenciais gerais, que são comuns a todos os negócios jurídicos, há também os elementos essenciais especiais, que devem existir somente em alguns contratos.

Sob a perspectiva das Operações de M&A e tendo atenção especial aos contratos de compra e venda; para estes negócios jurídicos também são necessários os seguintes elementos: (i) a coisa, (ii) o preço; e (iii) o consentimento.

3.1. Objeto

O objeto do contrato das operações de M&A serão ações ou quotas de uma sociedade, sendo necessário conter de forma expressa no contrato informações como: (i) o número de ações ou quotas que serão alienadas, (ii) a espécie (ações ordinárias ou preferenciais), (iii) a classe (se houver), (iv) a quantidade de ações ou quotas que cada vendedor irá transferir e (v) o quanto elas representam do capital social da sociedade vendedora.

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3.2. Preço

O preço a ser pago pelo objeto contratual é normalmente definido após uma avaliação da sociedade-alvo, normalmente feita por assessores financeiros. Devido à complexidade das operações, é mais comum que os pagamentos ocorram a partir de prestações, o que nos leva a observar as circunstâncias entre a data de assinatura do contrato e a data do pagamento efetivo. Isso porque é possível que durante período, o valor do objeto contratual sofra variações que podem estar atreladas, por exemplo, à reputação da sociedade vendedora. Nesse caso, se o valor do objeto contratual sofrer uma variação significativa, consequentemente o preço a ser pago deverá ser alterado.

É importante, então, que esse tipo de situação seja previsto no contrato, com o objetivo de proteger tanto o comprador quanto o vendedor de possíveis riscos. Nesse caso, o contrato deverá prever quais serão as situações que poderão levar ao possível ajuste de preço, ou seja, aquelas configuradas como perda para cada uma das partes. Assim sendo, durante essa fase da negociação, é importante que seja feito um levantamento das demonstrações financeiras, o qual será a base para o fechamento dos valores do acordo.

Após o consenso contratual referente ao ajuste de preço, podemos identificar parcelas no pagamento da obrigação que podem sofrer variações, as quais são chamadas de “Earn Out”. Elas estão relacionadas ao desempenho da sociedade que terá suas ações ou quotas alienadas.

4. DECLARAÇÕES E GARANTIAS (REPRESENTATIONS & WARRANTS)

4.1 O que são Declarações e Garantias (R&W)?

As cláusulas de declarações e garantias (representations and warranties) são disposições usuais em contratos de aquisição, por meio das quais, de um lado, o comprador e, de outro lado, o vendedor e/ou a companhia prestam informações e detalham características e apresentam uma “fotografia” fidedigna e presumidamente correta da situação financeira, contábil, jurídica e operacional da companhia (i.e., empresa-alvo) e, em determinados casos, do próprio comprador e do vendedor. A composição desses interesses se dará mediante a definição do preço e/ou a aceitação recíproca entre as partes da materialidade dos ativos e passivos pelos quais se responsabilizarão o vendedor e/ou o comprador.

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As declarações e garantias possuem duas funções essenciais: “declarar” à outra parte a situação da empresa e/ou do próprio declarante e “garantir” ao receptor da informação a veracidade das informações e o consequente direito de indenização.

Dentre os principais objetivos das declarações e garantias tem-se: i. a definição exata do negócio que está sendo realizado (vis-à-vis a situação do bem que está sendo adquirido e das partes contratantes envolvidas na operação), e ii. a alocação de riscos envolvidos na operação.

A Diligência Legal e as Declarações e Garantias

4.2 Interesses Contrapostos (Seller x Buyer)

Seller possui interesse que a compra se dê na forma de “porteira fechada”, ou seja, com o Buyer se responsabilizando pela sociedade nas condições apresentadas a partir do fechamento (closing). Desse modo, após o fechamento, o Seller não será mais responsável pelo surgimento de contingências, ainda que tenham sido geradas antes do fechamento. O Buyer se torna o único responsável pelas condições apresentadas da companhia a partir do fechamento.

Por sua vez, o Buyer possui interesse em obter o máximo de garantias possíveis do Seller em relação aos passivos existentes ou que venham a existir em decorrência das condições apresentadas.

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Assim, as declarações e garantias objetivam a alocação de riscos envolvidos na operação. A composição desses interesses se dará mediante a definição do preço e/ou a aceitação recíproca entre as partes da materialidade dos passivos pelos quais o Seller se responsabilizará perante Buyer.

4.3. Espécies de Cláusulas de Declarações e Garantias

4.3.1. Constituição, Funcionamento e Operação.

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade tenha sido devidamente constituída, encontrando-se em funcionamento regular, com todos os seus atos e livros societários devidamente arquivados e preenchidos, possuindo todas as autorizações necessárias para exercer suas atividades, tendo, ainda, plena capacidade para dispor de seus bens.

• Sugestões:

» No caso de a data de fechamento ser posterior à data de assinatura, as declarações devem cobrir todo o período entre a assinatura do contrato e o fechamento (i.e.: “A Companhia sempre conduziu, e conduzirá até a Data de Fechamento, suas atividades em conformidade com a legislação pertinente...”)

» Caso a atividade seja regulada, incluir declaração específica, mencionando o ato autorizativo.

» Incluir declaração de que os vendedores não receberam qualquer notificação e não têm conhecimento de qualquer fato que possa dar origem a cancelamento, cassação, suspensão, modificação, revogação ou limitação da autorização.

• Exemplo:

1.1 Corporate Status. (a) Except as set forth in Schedule 3.1(A), each of the members of the Company Group and each Seller is duly organized, validly existing and in good standing under the laws of its corporate domicile and has full corporate and legal power and authority necessary to own, lease and operate its assets, to conduct its business and to consummate the Transactions.

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Each of the members of the Company Group and each Seller is duly qualified to do business and is in good standing in each of the jurisdictions in which the nature of its business or the properties owned, leased or operated by it makes such qualification necessary. Schedule 3.1(B) sets forth all asset management, brokerage, investment advisory or similar companies in which the Sellers or any Intervening Party has more than a 5% interest, other than those Equity Interests listed on Schedule 3.5(A).

[*] has made available to [*] complete and accurate copies of the Organizational Documents, stock registers or ledgers and other corporate documents of each of the members of the Company Group and each Seller. Each of the Organizational Documents of each of the members of the Company Group and each Seller is in full force and effect. In accordance with applicable Law, the minutes of the shareholders’ meetings, books of account, record books and other records of each of the members of the Company Group and each Seller, all of which have been made available to [*], contain complete and accurate records of all meetings and accurately reflect all corporate actions taken by the stockholders and directors of each member of the Company Group and each Seller.

4.3.2 Autorização e Validade do Contrato: Consentimentos e Aprovações

• Objetivo:

Visa a declarar que as partes possuem pleno poder e capacidade para celebrar o contrato em questão e para assumir todas as obrigações nele previstas, incluindo eventuais autorizações necessárias de qualquer pessoa ou autoridade governamental para a celebração e/ou cumprimento do contrato, se for o caso.

• Comentários:

» Autorizações Societárias x Autorizações de Terceiros » Celebração do Contrato x Consumação das Operações » É vinculante e exequível, não representando violação a lei, estatuto,

contrato ou compromisso.

• Exemplo:

Each Seller and each of the Intervening Parties has all requisite power and authority to execute and deliver this Agreement and the other Transaction Documents to which they are party, to perform each of their obligations hereunder and thereunder and to consummate the Transactions.

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The execution and delivery of this Agreement and the other Transaction Documents, the performance of their respective obligations hereunder and thereunder and the consummation of the Transactions have been duly authorized by all requisite action of the Sellers and the Intervening Parties. Each Seller and each Intervening Party has duly executed and delivered this Agreement and the other Transaction Documents. This Agreement constitutes, and each other Transaction Document when so executed and delivered will constitute, the legal, valid and binding obligation of the Sellers and the Intervening Parties enforceable against each of them in accordance with its terms.

4.3.3. Inexistência de Violações e Restrições

• Objetivo:

Visa a garantir que a celebração do contrato ou o seu cumprimento não violem qualquer outro contrato celebrado pelas partes ou disposição legal de qualquer tipo, e não criem quaisquer ônus sobre bens e ativos das partes além dos já estabelecidos no contrato.

• Exemplo:

1 - The execution, delivery and performance of this Agreement and the other Transaction Documents, and the consummation of the Transactions on the Closing Date, require no action by or in respect of, or filing with, any Governmental Authority.2 - The execution, delivery and performance by the Sellers and the Intervening Parties of this Agreement and the other Transaction Documents to be executed or delivered on or prior to the Closing Date and the consummation of the Transactions do not and will not (i) conflict with or result in any violation or breach of any provision of the Organizational Documents of any of the members of the Company Group, any Seller or any Fund, (ii) conflict with or result in a violation or breach of any provision of any applicable Law, (iii) require any consent of or other action by any Person under, constitute a default or an event that, with or without notice or lapse of time or both, would constitute a default under, or cause or permit the termination, cancellation, acceleration or other change of any right or obligation or the loss of any benefit under, any provision of any material agreement or other instrument to which any of the members of the Company Group, any Seller or any Fund is a party (including any Material Contract) or any material Governmental Action affecting the assets or business of the Company Group or any Seller, or (iv) result in the creation or imposition of any Lien on any asset.

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158FGV DIREITO RIO

Upon delivery and payment in the manner contemplated by this Agreement, [*] will acquire good and valid title to the Sale Interests free and clear of any Liens.

4.3.4. Capital Social e Ações

• Objetivo:

Visa a declarar o valor e a composição do capital social da sociedade, incluindo o número de ações/quotas emitidas, assim como a descrição das espécies e classes de ações e a quantidade do capital social efetivamente integralizado, bem como declarar qualquer tipo de ônus que recaia sobre qualquer das ações/quotas.

• Exemplo:

O capital social da [*] é na presente data e será no Closing de R$ [*], dividido em [*] ações ordinárias e nominativas, sem valor nominal. As Ações representam na presente data e representarão no Closing 100% do capital social e com direito a votos da [*]. As Ações encontram-se devidamente subscritas e totalmente integralizadas pelas VENDEDORAS. As Ações encontram-se, na presente data, e se encontrarão, no Closing, totalmente livres e desembaraçadas de Gravames.

4.3.5. Propriedade das Ações e Direito de Vender

• Exemplo:

Schedule 3.5(A) contains a complete and correct description of all Equity Interests of each of the members of the Company Group and [*] that are authorized, issued or outstanding (including, without limitation, treasury shares, if any). Such Equity Interests are duly reflected in the shareholder registers, stock registry books or the articles of association of the relevant member of the Company Group and [*], as applicable. All such Equity Interests are duly authorized and issued, fully paid (except with respect to the Equity Interests held by the Delaware Holdings in [*], which shall be fully paid within 15 calendar days from the Closing Date) and owned beneficially and of record as provided thereon, free and clear of any Liens.

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Except as otherwise disclosed on Schedule 3.5(B), there are no options, warrants, pre emptive rights, subscriptions, conversion, exchange, repurchase, redemption, voting trusts, voting agreements or similar arrangements of any kind, contingent or otherwise, of any Person to acquire, sell, redeem or otherwise transfer, directly or indirectly, or vote any Equity Interests of any of the members of the Company Group or [*], and no authorization or promise in there interest has been given or made. Except as set forth in Schedule 3.5(A), none of the members of the Company Group or [*] owns any Equity Interests in any Person other than as part of its investment portfolio

4.3.6. Participações em Outras Sociedades; Subsidiárias

• Objetivo:

Visa a garantir que as partes vendedoras não possuem participação em qualquer outra sociedade e/ou não sejam partes em contratos que tenham por objeto a constituição de “joint ventures” que possam, de qualquer forma, influir nas obrigações assumidas no contrato.

• Exemplo:

(a) Each of the Sellers has the capacity to execute this Agreement and to perform all obligations assumed by them hereunder and the execution and delivery of this Agreement by each of the Sellers do not, and the consummation of the transactions contemplated hereby will not, constitute a breach or violation of any document, law, regulation, court order, lawsuit, or license applicable to any of them or their respective business and, for those Sellers who are legal entities, the execution and delivery of this Agreement by each of them do not, and the consummation of the transactions contemplated hereby will not, constitute a breach or violation of their charter or by laws; (b) Sellers shall be, at the Closing Date, the lawful owners and holders of the Shares and no consent or approval is required for the execution and performance of the obligations contemplated hereunder and no restrictions lies on the ownership and transferability of the shares, of what kind or nature, including by virtue of inheritance rules and/or will (except for [*] common [*] Shares and [*] preferred [*] Shares, which shall only be transferred to Buyer upon the release by the [*], as mentioned in Section 2.3(a)(ii) above); (c) The Shares of each of [*], [*] and of the Relevant Subsidiaries are regularly issued and fully paid in, except as provided for in Exhibit 3.1(g) of the Disclosure Schedule.

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(d) The Shares of each of [*], [*] and the Relevant Subsidiaries are free and clear of any Liens, charges or claims of any nature whatsoever, there being no legal, judicial, contractual or administrative restriction which prevents or restricts the transactions contemplated in this Agreement (except for [*] common [*] Shares and [*] preferred [*] Shares, which shall only be transferred to Buyer upon the release by the [*], as mentioned in Section 2.3(a)(ii) above); (e) None of the Sellers, [*], [*] or the Relevant Subsidiaries is a party to any outstanding option, warrant, purchase right or other contract or commitment that requires or could require any of the Sellers, [*], [*] or the Relevant Subsidiaries to sell, transfer, issue, redeem, cancel, purchase or otherwise dispose of any capital stock of [*] or of the Relevant Subsidiaries (other than this Agreement and the Bylaws). None of the Sellers is a party to any voting trust, proxy or other agreement or understanding with respect to the voting of any capital stock of the [*], [*] or the Relevant Subsidiaries; (f) [*], [*] and each of the Relevant Subsidiaries are duly organized and validly existing under the laws of the jurisdiction of their incorporation or formation, as the case may be. [*], [*] and each of the Relevant Subsidiaries are duly qualified to conduct their business in the manner currently being conducted. A list of all of [*]’s and of the Relevant Subsidiaries’ branches is attached as Exhibit 3.1(f) of the Disclosure Schedule. [*] and the Relevant Subsidiaries have all requisite power and authority to own or lease and operate and use their properties and assets and required to own and operate them in the manner currently conducted. (g) Exhibit 3.1(g) of the Disclosure Schedule sets forth for each Relevant Subsidiary (i) its name and jurisdiction of incorporation or formation, as the case may be, and (ii) the number of issued and outstanding shares of each class of its capital stock, the names of the holders thereof and the number of shares held by each such holder. Except as set forth in Exhibit 3.1(g) of the Disclosure Schedule, neither [*] or [*] nor any of the Relevant Subsidiaries has any direct or indirect equity investments or ownership interests in any corporation, partnership, joint venture or other entity. [*] is the direct or indirect owner of the Subsidiary Shares, free and clear of all Liens. Except as set forth in Exhibit 3.1(g) of the Disclosure Schedule, all of the outstanding Subsidiary Shares have been duly authorized and validly issued, are fully paid, and were issued in compliance with all applicable Laws and have not been issued in violation of, and are not subject to, any preemptive, subscription, options, or other similar rights nor obligations requiring the Relevant Subsidiaries to issue, redeem, cancel, purchase or transfer shares of their capital stock.

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161FGV DIREITO RIO

There are no documents, agreements, including debt instruments, rules or regulations which require and/or may require [*], [*] or the Relevant Subsidiaries, whether now or in the future, to issue new shares of their capital stock or change the rights and obligation of each class of shares issued by [*], [*] or the Relevant Subsidiaries.

4.3.7. Negócios com Partes Relacionadas

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade não tenha celebr,ado qualquer contrato com sociedades afiliadas e/ou controladas, ou ainda com qualquer empregado, administrador ou sócio da sociedade, assim como em relação a seus familiares.

• Exemplo 1:

Except as otherwise disclosed in Exhibit 3.13 of the Disclosure Schedule, there are no agreements, arrangements or understandings (whether oral or written) currently in effect or under which any amount is currently owed, including any purchase, sale, lease, investment, loan, service or management agreement or other transaction, in any case, to which any of the Companies or any Relevant Subsidiaries is a party and the counterparty is any of the Sellers, the Companies or any of the Relevant Subsidiaries, or any of their Affiliates or any shareholder, officers or directors of any Affiliates, the Companies or any of the Relevant Subsidiary. Exhibit 3.13 of the Disclosure Schedule also contains a list of the agreements, arrangements or understandings (whether oral or written) currently in effect or under which any amount is currently owed, to which the Companies is a party and the counterparty is any of the Relevant Subsidiaries.

• Exemplo 2:

Schedule 3.12 contains a list of all Contracts or other transactions to or by which any of the members of the Company Group, on the one hand, and any member of the of the [*] Group or any of its Affiliates (other than any member of the Company Group), on the other hand, are or have been a party or are otherwise bound or affected. Except as described in Schedule 3.12, such Contracts and transactions are or were on terms and conditions as would have been obtainable by it at the time in a comparable market transaction with an unrelated party.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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Except as described in Schedule 3.12, no Affiliate of [*] or the Intervening Parties has any direct or indirect ownership in any Person with which the Company Group or the Funds (other than the purchase of any quotas of any Fund by [*], the BVI Holdings, the Intervening Parties or any family members of the Intervening Parties) competes or has a business relationship, nor is indebted to or is a customer of any member of the Company Group or any Fund, nor is any of the members of the Company Group or any Fund indebted (or committed to make loans or extend or guarantee credit) to any of them. The Company Group has complied with all applicable transfer pricing disclosure, reporting or other requirements.

4.3.8. Ausência de Litígios Desfavoráveis

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade não é parte em qualquer litígio pendente ou potencial perante qualquer tribunal, árbitro, autoridade governamental ou administrativa, sendo, geralmente, estabelecido um valor mínimo de corte.

• Exemplo:

Except as otherwise disclosed in Exhibit 3.10 and Exhibit 3.19 of the Disclosure Schedule, there are no Actions, suits, claims, judicial or administrative proceedings that the Companies or any of the Relevant Subsidiaries have received legal notice for, in which the Companies or any of the Relevant Subsidiaries are a party, or, to the Knowledge of the management of Sellers, of the Companies and of the Relevant Subsidiaries, threatened or affecting the Companies, the Relevant Subsidiaries, or their Assets and properties, including Mining Assets, in any court or before any arbitrator or Governmental Authority, (a) impact the Businesses of the Companies or of each of the Relevant Subsidiaries; (b) reasonably be expected to impair Sellers’ ability to perform its obligations under this Agreement or consummate the transactions contemplated hereunder; or (c) challenge the validity or enforceability of this Agreement or seek to enjoin or prohibit consummation of the transactions contemplated hereunder.

4.3.9. Demonstrações Financeiras

• Objetivo:

Visa a garantir que as demonstrações financeiras da sociedade refletem as informações contidas em seus livros contábeis e tenham sido preparadas de acordo com as práticas contábeis geralmente aceitas e em conformidade com a legislação aplicável.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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• Exemplo:

[*] has delivered to [*] complete copies of the Financial Statements. The Financial Statements are complete and correct in all material respects, have been prepared in accordance with all applicable Law and GAAP applied on a consistent basis throughout the periods presented therein and fairly present the financial position, results of operations and cash flows of the Operating Companies and, where applicable, the Funds as of the dates and periods therein indicated.

4.3.10. Livros e Registro Societários

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade mantém todos os livros e registros societários em conformidade com a legislação aplicável, estando ainda devidamente registrados nas juntas comerciais.

• Comentários:

Estas informações podem constar da cláusula de “Constituição e Funcionamento / Organização / Capital Social e Ações”.

• Exemplo:

Os livros e registros societários da [*] são mantidos de acordo com as leis e regulamentos aplicáveis. Todas as exigências, formalidades e prazos exigidos ou impostos por qualquer Lei aplicável, referentes a convocação, instalação e realização, deliberação e aprovação, atas, publicação e registro, (inclusive, quando aplicável, o registro junto às respectivas juntas comerciais estaduais), das assembleias de acionistas e reuniões do conselho de administração e da diretoria, demonstrações financeiras e outros atos societários aplicáveis da [*] foram devidamente observados e cumpridos.

4.3.11. Livros Registros Contábeis

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade mantém todos os livros e registros contábeis em conformidade com a legislação aplicável e a boa prática contábil.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

164FGV DIREITO RIO

• Comentários:

Estas informações podem constar da cláusula de “Constituição e Funcionamento / Organização / Capital Social e Ações”.

• Exemplo:

Except as otherwise disclosed in Exhibit 3.8 of the Disclosure Schedule and for post-export advance operations of the Companies and of the Relevant Subsidiaries, all of the accounts receivables in the Financial Statements (a) are valid and existing and collectable in the ordinary course of business (subject to bad debt reserves shown in the Financial Statements); (b) represent monies due for goods sold and delivered or services rendered in the ordinary course of business; and (c) are subject to no refunds or other adjustments (except discounts for prompt payment given in the ordinary course of business that are described in Exhibit 3.8 of the Disclosure Schedule) or to any defenses, rights of set-off, assignments, restrictions, security interests, Liens or conditions enforceable by Third Parties on or affecting any of them. The Companies and the Relevant Subsidiaries inventories are properly recorded on their books and records, are the property of the Companies and of the Relevant Subsidiaries and are reflected in the Financial Statements at the lower value of either the average acquisition cost or production cost and net realizable value.

4.3.12. Bens Ativos

• Objetivo:

Visa a garantir que as partes vendedoras são (ou serão, até o fechamento) legítimas proprietárias de todos os bens e ativos da sociedade, livres e desembaraçadas de quaisquer ônus, todos devidamente inscritos nos registros competentes e refletidos nos registros contábeis da sociedade.

• Exemplo:

Each member of the Company Group and each Seller has good and marketable title to, or valid and sufficient leasehold interests in, all of the assets (real, personal and mixed) necessary or used for the conduct of, or otherwise material to, its Business, free and clear of any Liens other than Permitted Liens. Such assets have been maintained in all material respects in good repair, working order and operating condition subject to ordinary wear and tear and are adequate and suitable for the purpose for which they are being used. None of the members of the Company Group or the Funds own any real property.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

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4.3.13. Contratos

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade não está vinculada a qualquer contrato que não tenha sido indicado no contrato de compra e venda e disponibilizado para análise dos compradores, e que não envolva determinado valor mínimo de corte.

• Exemplo:

Schedule 3.10 lists each Contract in force on the date hereof to which any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) is a party, by which any of its assets may be bound or affected, or under which any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) receives any benefit, in each case that is material, individually or in the aggregate, to the business, operations, results of operations, condition (financial or otherwise), properties, prospects, assets or Liabilities of any of the members of Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group), imposes material obligations (whether or not monetary) on any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group), or (iii) is otherwise necessary or advisable for the proper and efficient operation of any members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) (each, a “Material Contract”). Without any limitation to the foregoing, the following shall be deemed to be Material Contracts if any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) is a party, any of its assets may be bound or affected, or under which any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) receives any benefit (whether or not a party thereto) or has any Liability: (a) any agreement relating to Indebtedness exceeding R$1,000,000, (b) any joint venture, partnership, limited liability company or other similar agreements or arrangements, (c) any agreement or series of related agreements, including any letter of intent or option agreement, relating to the acquisition or disposition of any business or material asset (whether by merger, sale of stock, sale of assets or otherwise and including any agreement or letter of intent to which any of the Sellers or the Intervening Parties is party other than any

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sale of Minority Shareholder Interests (as defined in the Interestholder Agreement) as permitted by the Interestholder Agreement), (d) any agreement that (A) limits the freedom of any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) to compete in any line of business or with any Person or in any area or which would so limit the freedom of [*] or its Affiliates after the Closing, or (B) contains exclusivity obligations or restrictions binding on any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) or that would be binding on any member of the [*] Group or its Affiliates after the Closing, (e) any agreement or series of related agreements providing for aggregate payments by, or to any of, the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) of R$1,000,000 or more, or under which any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) made payments of R$1,000,000 or more during any period of twelve months or less, (f) any lease, sublease, license or similar agreement of real or personal property providing for aggregate rentals with payments exceeding R$100,000 per year, (g) any agreement relating to any interest rate, currency or commodity derivatives or hedging transaction, (h) any (A) investment fund management agreement, (B) investment advisory and consultancy agreements with payments exceeding R$100,000 per year, (C) distribution agreements in force on the date hereof, (D) agency agreements, (E) brokerage agreements or (F) any other similar agreement, and (i) any agreement under which (A) any Person has directly or indirectly guaranteed any Liabilities of any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group), or (B) any of the members of the Company Group or any Seller (to the extent any Seller Contract relates to the Company Group) has directly or indirectly guaranteed Liabilities of or indemnified any other Person.

4.3.14. Tributos e Questões Fiscais

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade cumpre toda e qualquer obrigação fiscal por ela devida em conformidade com a legislação aplicável, inexistindo qualquer ação, processo, inquérito, procedimento ou investigação de natureza fiscal em curso perante qualquer tribunal ou autoridade governamental ou administrativa.

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• Exemplo:

Schedule 3.14(A) lists each jurisdiction in which each of the entities that are a part of the Company Group is subject to any Tax. Except as set forth on Schedule 3.14(B), (i) no extension of time has been requested with respect to a Tax Return that has not yet been filed, (ii) no waiver or extension of any statute of limitations is in effect with respect to Taxes or Tax Returns of any of the members of the Company Group, (iii) no Tax Return or Taxes of the Company Group is the subject of an audit, examination or inquiry, (iv) no member of the Company Group has been subject to a fine, surcharge, penalty or interest charge related to a Tax Return or Taxes,(v) each of the members of the Company Group has timely and accurately filed all Tax Returns, retained all Tax records required by applicable Law and paid all Taxes owed. Except as set forth on Schedule 3.14(B), there has been no agreement with any Taxing authority, Tax ruling, claim or issue concerning any liability for Taxes of any of the member of the Company Group asserted, raised or threatened by any Taxing authority, to the knowledge of the [*] and the Intervening Parties, and no circumstances exist to form the basis for such a claim or issue. Regarding tax matters, all transactions entered into by any of the members of the Company Group with any related party have been carried out at arm’s length and not subject to adjustment, and the Company has complied with all applicable transfer pricing disclosure, reporting or other requirements. With respect to any member of the Company Group, in each of the jurisdictions in which each respective member of the Company Group is subject to taxation, there are no: (i) outstanding Tax adjustments that may result from changes in accounting method, Tax audit, Legal Actions or otherwise, (ii) Tax elections currently in force, (iii) assets having a Tax basis not supported by documentation required by Law, (iv) Tax losses not supported by documentation required by Law, or (v) Legal Actions concerning any liability for Taxes of any member of the Company Group. None of the members of the Company Group has ever been a member of an affiliated group filing consolidated returns other than a group of which the Company Group were the only members, in each of the jurisdictions in which each respective member of the Company Group is subject to taxation. No Taxes will be imposed on any of the members of the Company Group or [*] arising out of the Transactions in Brazil. None of the Company Group member is bound by any Tax sharing, indemnity, funding, allocation or similar agreement, or is otherwise liable to any other Person in respect of Taxes.

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No member of the Company Group has or has ever had any tax obligation outside of the jurisdiction in which it was organized. No Intervening Party is a US Person as defined in Section 7701(a)(30) of the US Internal Revenue Code. Each of [*] is a limited liability company organized under the laws of Delaware. Each of [*] is a exempted company of limited liability organized under the Laws of the Cayman Islands. Each [*], Ltd. and each member of the BVI Holdings is a business company incorporated with limited liability under the Laws of the British Virgin Islands.

4.3.15. Propriedade Intelectual e Marcas

• Objetivo:

Visa a declarar que a sociedade é legítima proprietária dos direitos de propriedade intelectual e de marcas indicados no contrato de compra e venda, livres e desembaraçados de quaisquer ônus, e que a sociedade não violou ou se apropriou indevidamente de quaisquer direitos deste gênero.

• Exemplo:

The Company Group, presently and after consummation of the Transactions, owns (Schedule 3.11(A) Owned Intellectual Property) or has the right to use pursuant to a written or oral license in full force and effect (Schedule 3.11(B) Licensed Intellectual Property (other than commercially available off-the-shelf software less than R$5,000 per software) all of the Intellectual Property necessary or used for the operation of the Business, and owns or has leased (which has been listed on Schedule 3.10) all technology hardware necessary to run such Intellectual Property with valid and enforceable maintenance agreements (collectively, “Company Intellectual Property”), in each case, free and clear of any Liens other than Permitted Liens. All (x) owned Company Intellectual Property (including all application and registration information relating thereto) is listed on Schedule 3.11(A) (except for Contracts related thereto which are listed on Schedule 3.10) and (y) Company Intellectual Property which the Company Group has the right to use pursuant to a written or oral license in full force and effect is listed on Schedule 3.11 (B) (other than such Contracts set forth on Schedule 3.10). All Company Intellectual Property has been duly registered with, filed in or issued by, as the case may be, the appropriate registries or similar bodies to the extent registration is required to ensure full protection under any applicable Law, and the same remain in full force and effect.

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No Company Intellectual Property is to the Knowledge of [*] or the Intervening Parties being infringed by any Person, and the conduct by the Company Group of the Business does not infringe and is not the subject of any third party claim of infringement of Intellectual Property. All Information Technology functions in accordance with its applicable specifications, is adequate for its use, and performs the functions necessary to effectively carry on the conduct of the Business.

4.3.16. Questões Trabalhistas e Previdenciárias

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade cumpre com todas as obrigações trabalhistas e previdenciárias exigidas pela legislação aplicável, inexistindo qualquer ação, processo, inquérito, procedimento ou investigação de natureza trabalhista e previdenciária em curso perante qualquer tribunal ou autoridade governamental ou administrativa.

• Exemplo:

There are no Labor Agreements or Plans that individually require payments in excess of R$500,000 per year. Each of the members of the Company Group complies, and has always complied, in all material respects, with all labor Laws, Labor Agreements relating to Plans and Plans. With respect to the Company Group, there are no labor disputes outstanding, including any currently subject to any grievance procedure, arbitration or Legal Actions, or, to the Knowledge of [*] or the Intervening Parties, threatened in writing, there are no labor unions or other organizations representing or attempting to represent any employees, there has not occurred since December 31, 2005 any strike, slowdown, picketing, work stoppage, concerted refusal to work overtime or similar labor activity and, to the Knowledge of [*] or the Intervening Parties, no Key Person intends to terminate its relationship with any of the members of the Company Group. The Intervening Parties do not intend to terminate their, or any member of the Company Group’s relationship, with any Key Person. Each member of the Company Group, whether by contract or operation of any labor Law, complies and has always complied, in all material respects, with all applicable labor Laws pertaining to employment, termination of employment, employment practices, terms and conditions of employment and the payment of wages and benefits (including the maintenance of employment agreements and work rules) including, without limitation, all such labor Laws relating to labor relations, equal employment opportunities, fair employment practices, prohibited

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discrimination or distinction and other similar employment activities and are not and have not been within the past five years, engaged in any unfair labor practice, except for failure to comply that, individually and in the aggregate, would not reasonably be expected by the Company Group to result in any liability or obligation on the part of any member of the Company Group. Except for the actions contemplated in Schedule 5.8 in connection with the Operational Restructuring and other than in the Ordinary Course of Business, following consummation of the Transactions, there shall be no increase, acceleration or vesting in respect of any compensation or benefits of any Person. Except as set forth in Schedule 5.8, neither [*] nor the Intervening Parties have indicated to any Person any intention or commitment to modify or implement any Labor Agreement or Plan. No Person benefiting from any Labor Agreement or Plan is or will become entitled to post-employment benefits of any kind. All contributions required to be made on or prior to the Closing Date in connection with any Labor Agreement or Plan have been made. There are no conciliation agreements, arbitration decisions, consent decrees, orders, judgments, citations, administrative proceedings, formal complaints or investigations, or violations of any federal or state wage and hour laws pending or threatened in writing before the Ministry of Labor (Ministério de Trabalho), Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), Caixa Econômica Federal (CAIXA) or any other Brazilian agencies or courts against or involving any member of the Company Group.

4.3.17. Planos de Carreira, Benefícios aos Empregados, Participação nos Lucros, Planos de Opção de Compra de Ações

• Objetivo:

Visa a declarar os tipos de participação nos lucros que os empregados e administradores da sociedade fazem jus, se houver.

• Comentários:

Estas informações podem constar da cláusula de “Questões Trabalhistas e Previdenciárias”.

• Exemplo:

5.35 Os empregados e administradores da [*] ou da [*] não fazem jus a qualquer participação nos lucros da [*] ou da [*], conforme o caso.5.36 Não há qualquer plano de opção de compra de Quotas ou Cotas que vincule a [*] ou a [*].

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4.3.18. Questões Ambientais

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade possui todas as licenças e autorizações necessárias para o desenvolvimento de sua atividade, bem como cumpre toda e qualquer obrigação ambiental por ela devida em conformidade com a legislação aplicável, inexistindo qualquer ação, processo, inquérito, procedimento ou investigação de natureza ambiental em curso perante qualquer tribunal ou autoridade governamental.

• Exemplo 1:

Each of the members of the Company Group has complied with all applicable Laws relating to the environment or occupational health and safety (“Environmental Laws”) and, to the Knowledge of [*] or the Intervening Parties, no material expenditures are or will be required to comply with any such Laws. None of the members of the Company Group has caused or taken or failed to take any action that could reasonably be expected to result in any liability or obligation relating to any Environmental Law.

• Exemplo 2:

Section 1.1 With regard to Environmental Matters, the Parties have agreed to establish an specific rule regarding Sellers’ obligation and responsibilities to indemnify and hold Buyer harmless, which is set forth in Section 3.16.1 below. With due regard to the above, Sellers hereby represent and warrant that, except as otherwise disclosed in Exhibit 3.16 of the Disclosure Schedule, which, however, shall not limit Sellers’ obligations and responsibilities in view of Section 3.16.1 below:(a) Sellers, [*] or any of the Relevant Subsidiaries are in compliance and are not in violation, in any respect, of any Law regulating environmental matters (“Environmental Matters”) applicable to [*] and each of the Relevant Subsidiaries; (b) except as indicated in Exhibit 3.16(b) of the Disclosure Schedule, [*] and the Relevant Subsidiaries have all Permits and approvals required for the operation of the Business at operating levels as at June 30th, 2007; (c) [*] and the Relevant Subsidiaries are not required by any Law or Governmental Authority nor responsible for any clean up, fine, liability or expense arising under any foreign or domestic environmental law, regulation

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or order as a result of the handling, storage, deposit, spill or disposal of hazardous or non-hazardous materials, with regard to, in or on [*]’s and the Relevant Subsidiaries’ Real Property (whether owned or leased) and [*] and/or the Relevant Subsidiaries have undertaken the obligation to carry out any of such activities, [*] and the Relevant Subsidiaries have complied with all applicable law and regulations; and (d) [*] and the Relevant Subsidiaries have kept all necessary records and made all and necessary filings required by applicable state, federal and foreign laws and regulations with respect to emissions into the environment and the collection, storage, transport, spill, distribution or disposal of wastes and other hazardous and non-hazardous materials in connection with the Business and have complied with all such laws and regulations.1.1.1. Except (i) if reserved for or reflected in the Financial Statements and accounting records of [*] and/or the Relevant Subsidiaries, (ii) for the liabilities disclosed and quantified in the Exhibits 3.16 and 3.16(b) of the Disclosure Schedule, and (iii) for the investments of the Companies and/or the Relevant Subsidiaries, which were listed in the Environmental Investment Plan of [*] and/or the Relevant Subsidiaries (Plano de Investimentos) attached to Exhibit 3.16 and 3.16(b), in which case there shall be no liability of Sellers for the amount reflected, reserved or listed, as the case may be, Sellers shall only be liable for the Losses that exceed the aggregate amount of R$ 2,000,000.00 (two million Reais) related to environmental matters. For avoidance of doubt, Sellers’ indemnification obligations under this Section that exceed the aggregate amount of R$ 2,000,000.00 (two million Reais) shall additionally observe the provisions set forth in Section 7.7 below; with regard to item (ii) of this Section 3.16.1, there shall be no responsibility of Sellers only if the information disclosed in Exhibit 3.16 and 3.16(b) have been quantified.

4.3.19. Questões Imobiliárias

• Objetivo:

Visa a declarar que a sociedade é legítima proprietária dos bens imóveis por ela descritos no contrato de compra, livres e desembaraçados de quaisquer ônus, todos devidamente inscritos nos registros competentes e refletidos nos registros contábeis da sociedade, assim como indica os imóveis eventualmente ocupados pela sociedade à título de locação, arrendamento ou comodato.

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• Exemplo:

(a) Exhibit 3.7 of the Disclosure Schedule contains a list and summary description of each and every Real Estate property owned or leased by [*] and the Relevant Subsidiaries (the “Real Property”), all of which are free and clear of all Liens and/or liabilities, except for those listed in Exhibit 3.7. [*] and each of the Relevant Subsidiaries have good, valid and marketable title to all Real Property, as is, or valid and effective leases. None of such Real Property is subject to any license of use, building or use restriction, limitation or other impediment that may adversely interfere with or impair the use thereof by [*] and the Relevant Subsidiaries, except those resulting from Brazilian Laws. Exhibit 3.7 of the Disclosure Schedule sets forth a list of each lease or similar agreement, or any easements or rights-of-way under which [*] or any of the Relevant Subsidiaries is lessee of, or holds or operates, or has the right to use, any real property owned by any Third Party. (...)(b) The Real Property is in conformance with all deed restrictions and other covenants and conditions recorded or running with the land. The current use and operation of the Real Property is in conformity with the licenses, permits and/or certificate(s) of occupancy issued for such Real Property. Neither the whole nor any part of any of the Real Property or, any leased Real Property is subject to any pending suit, expropriation procedure or condemnation or other taking by any Third Party or Governmental Authority, and neither Sellers nor the management of [*] or of the Relevant Subsidiaries are aware or have received, any summons, judicial or administrative notice, written or oral, that such a condemnation, expropriation or other taking is threatened.

4.3.20. Seguros

• Objetivo:

Visa a elencar a totalidade dos seguros contratados pela sociedade, garantindo que os mesmos encontram-se em pleno vigor, com todos os prêmios integralmente e pontualmente pagos, e que a cobertura por eles oferecida é suficiente e adequada para a proteção dos riscos aos quais a sociedade está exposta, bem como cumprem exigências de contratos celebrados pela sociedade.

• Exemplo:

The Company Group has made available to [*] complete and accurate copies of all insurance policies and fidelity bonds relating to the Company Group’s assets, Business, shareholders, employees, officers or directors of any member of the Company Group.

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174FGV DIREITO RIO

All insurance policies maintained (at present or at any time during the past five years) by or for the benefit of any of the Company Group are in full force and effect, and all premiums due thereon have been paid. The Company Group has complied in all material respects with the terms and provisions of such policies. The insurance coverage provided by such policies is adequate and suitable for the Business, and is on such terms (including, without limitation, as to deductibles and self-insured retentions), covers such risks, contains such deductibles and retentions, and is in such amounts, as the insurance customarily carried by comparable companies of established reputation similarly situated and carrying on the same or similar business. There is no claim by any member of the Company Group pending under any of such policies or bonds as to which coverage has been questioned, denied or disputed by the underwriters of such policies or bonds in respect of which such underwriters have reserved their rights. Neither the Sellers nor the Intervening Parties know of any threatened termination, in writing, of, premium increase with respect to, or material alteration of coverage under, any of such policies or bonds.

4.3.21. Consumidor e Concorrência

• Objetivo:

Visa a garantir que a sociedade-alvo cumpre toda e qualquer norma de defesa do consumidor e defesa da concorrência, inexistindo qualquer ação, processo, inquérito, procedimento ou investigação de natureza ambiental em curso perante qualquer tribunal ou autoridade governamental.

• Exemplo:

Cada uma das Sociedades sempre cumpriu, desde sua constituição, todas as normas de defesa do consumidor e defesa da concorrência, ressalvadas as que estejam sendo contestadas de boa fé e que não afetem a conclusão da Operação nem a condução do Negócio.

4.3.22. Contas Bancárias e Procurações

• Objetivo:

Visa a declarar a totalidade das contas bancárias existentes em nome da sociedade, bem como a relação completa de procurações em vigor outorgadas pela sociedade.

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175FGV DIREITO RIO

• Comentários:

“A relação constante do Anexo 9.25 inclui todas as procurações vigentes e eficazes outorgadas por cada uma das Sociedades.”

4.3.23. Divulgação Completa: Inexistência de Obrigações Ocultas

• Objetivo:

Visa a garantir que todas as declarações emitidas pelas vendedoras no contrato constituem a totalidade das informações relevantes, inexistindo qualquer ato ou fato relevante que tenha sido omitido pelas vendedoras e que possa resultar em obrigações relevantes para a sociedade.

• Exemplo 1:

1 - To the Knowledge of [*] and the Intervening Parties, none of the members of the Company Group has any Liability except (i) as set forth on the Audited Balance Sheet, (ii) as disclosed on Schedule 3.7 or (iii) Liabilities incurred after the date of the Audited Balance Sheet in the Ordinary Course of Business not in excess of R$50,000 individually or R$200,000 in the aggregate. [*] has no Liabililities. 2- The Company Group has completely and correctly responded to [*]’s due diligence request list, made available all documents set forth therein (including as to all Contracts, all amendment, modifications and waivers thereto, and, with respect to the Funds, all documents relating to each such Fund that are available to, or in the possession of, [*] (including, for clarity, all documents that are publicly available to quotaholders or shareholders of such Fund)). There is no fact which is material to the Business that has not been disclosed to [*].

Exemplo 2:

Except (i) for the Actions listed in the Exhibit 3.10 of the Disclosure Schedule, or (ii) as sufficiently reserved for or reflected in the Financial Statements and accounting records of the Companies or of the Relevant Subsidiaries, or (iii) as otherwise provided in Article III and Section 7.7 of this Agreement, neither the Companies or the Relevant Subsidiaries have any debt, liability or obligation of any nature (already incurred or contingent). All liabilities which were accrued for in the Financial Statements and accounting records of the Companies and the Relevant Subsidiaries, including, without being limited to, Taxes, are duly and fully covered by such provisions, which are sufficient and have been assessed according to the GAAP applicable to their respective jurisdiction.

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5. INDENIZAÇÕES EM OPERAÇÕES DE M&A

São as cláusulas que usualmente visam a alocar os deveres e responsabilidades de cada uma das partes envolvidas nas operações de M&A em relação a reparações de eventuais perdas e danos. Nos casos em que há mais de um contratante obrigado pelo dever de indenizar, pode-se definir a solidariedade ou não do dever de indenizar.

Após a definição das regras relativas ao dever de indenizar, é usual a previsão de regras complementares sobre: i. conta-gráfica, ii. retenção de preço compra em relação ao dever de indenizar, iii. Pagamento mediante depósito em conta vinculada (escrow account) etc. São igualmente comuns as previsões de garantias para o pagamento (liquidação financeira) do dever de indenizar. Como exemplos frequentes, tem-se: i. penhor ou alienação financeira de ações, ii. usufruto e/ou cessão fiduciária de dividendos, iii. garantias pessoais (especialmente fiança), e iv. garantias reais em relação a outros bens (usualmente hipotecas ou gravames de outra natureza em ativos relevantes).

Também é possível a existência de “mitigadores” ou “redutores” do dever de indenizar. Tratam-se de regras limitativas, i.e., cláusulas de limitação ao dever de indenizar. É o caso de cláusulas que estabeleçam um limite temporal (“x” anos a contar do fechamento da operação de M&A, por exemplo) ou um limite de valor (dever de indenizar até R$ X ou até X% do valor total da referida operação de M&A, por exemplo).

• Exemplo:

Cada um dos VENDEDORES se obriga, solidariamente, a indenizar os COMPRADORES, mantendo-os indene e a salvo por todas e quaisquer contingências, indenizações, perdas, danos, prejuízos, custos e despesas (inclusive honorários advocatícios e ônus de sucumbência), que venham a ser sofridos e/ou desembolsados pelos COMPRADORES em razão de suas respectivas participações, diretas e/ou indiretas, na SOCIEDADE-ALVO, ou ainda pela própria SOCIEDADE-ALVO (“Prejuízo”) em decorrência de:(a) qualquer falsidade, inexatidão ou violação de qualquer declaração ou garantia prestada pelos VENDEDORES e pela SOCIEDADE-ALVO, nos termos deste Contrato;b) não cumprimento, parcial ou total, de qualquer obrigação prevista neste Contrato; e(c) atos, fatos, omissões de qualquer natureza, que tenham ocorrido anteriormente à data de assinatura do CONTRATO DE COMPRA E VENDA, ainda que seus efeitos somente se verifiquem e/ou se materializem posteriormente, que resultem em Prejuízo, inclusive, mas não se limitando, àquelas de natureza cível, tributária, ambiental, trabalhista e previdenciária.

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6. CLÁUSULAS DE EARN-OUT E DEFINIÇÃO DE PREÇO VARIÁVEL

• Objetivo:

São frequentemente utilizadas para definir o desdobramento do preço de compra de determinada participação societária. São comuns quando vendedor e comprador não concordam exatamente em relação ao “valor justo” para o negócio. Esse tipo de cláusula estabelece um preço pré-determinado e prevê parcelas vincendas vinculadas ao desempenho da sociedade e ao atingimento de determinadas metas. Em outras palavras, a definição do preço é vinculada ao desempenho da sociedade-alvo. Para tanto, é comum que o lucro líquido da sociedade-alvo ou o EBITDA sirvam como parâmetro para a definição de tal preço. É importante destacar que em algumas situações, o earn-out faz referência ao pagamento da parcela adicional e não do preço global.

Convém melhor explicarmos neste trecho o que é o EBITDA ou o LAJIDA. O significado da sigla em inglês é Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, que traduzido literalmente para o português significa “Lucro Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização. Para se chegar ao EBITDA de determinada empresa ou negócio, deve-se fazer a seguinte conta: lucro bruto – despesas operacionais, excluindo-se destas a depreciação e as amortizações do período e os juros. O EBITDA, comumente, também é ajustado de acordo com outras questões. Dessa forma, o preço de compra das ações da sociedade-alvo será definido de acordo com as seguintes regras e fórmulas:

Onde:P = preço de compra.Participação (%) = participação a ser adquirida pelo(s) comprador(es).Múltiplo = normalmente algum valor entre 2 e 12.

7. CLÁUSULAS DE EXCLUSIVIDADE

• Objetivo:

Existem duas regras tradicionais de exclusividade. A primeira, no contexto das negociações, prevê que as partes negociam a operação de M&A apenas entre elas. Não há terceiros realizando negociações paralelas. A segunda, na fase de execução e operação do negócio, prevê que uma vez fechada a operação, o vendedor e/ou comprador se dedicará àquela atividade apenas no que se refere à sociedade-alvo, i.e., veículo exclusivo.

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DIREITO SOCIETÁRIO AVANÇADO

178FGV DIREITO RIO

Além destes dois tipos de cláusula, outras convenções específicas podem ser determinadas pelas partes.

Nos casos em que o principal ativo adquirido na operação de M&A é o vendedor, além das regras de dedicação exclusiva à sociedade-alvo, são comuns as estipulações de obrigações de prazos de duração e lock-ups em que o referido vendedor estará obrigado a permanecer vinculado à sociedade-alvo.

• Exemplo:

Este MOU é celebrado em caráter de exclusividade pelo período de [X] dias a contar da presente data, comprometendo-se as Partes a não iniciar tratativas ou entendimentos ou de qualquer forma negociar ou celebrar qualquer acordo ou compromisso, escrito ou verbal, com terceiros que vise ou trate do objeto deste MOU ou de negócio que envolva, direta ou indiretamente, total ou parcialmente, a SOCIEDADE-ALVO. – Regra de exclusividade no contexto das negociações.

COMPRADOR, por si, seus controladores, suas controladas e suas afiliadas, enquanto detiver, direta ou indiretamente, qualquer participação no capital social da SOCIEDADE-ALVO, não poderá, em qualquer situação, inclusive como empregador, empregado, mandatário, agente, associado, sócio, acionista ou detentor de outros valores mobiliários, prestador de serviços autônomo, licenciador, licenciado, franqueador, franqueado, distribuidor, consultor, fornecedor, fideicomissário, ou por e através de qualquer corporação, companhia, cooperativa, sociedade, fideicomisso, entidade com personalidade jurídica ou similar, conduzir ou ter qualquer participação societária ou de qualquer outra natureza, ou ainda, envolver-se comercialmente em qualquer atividade ou negócio no setor de [ESPECIFICAR O SETOR DE INDÚSTRIA]. – Regra de exclusividade na execução/operação do negócio.

8. AS CLÁUSULAS DE NÃO CONCORRÊNCIA (NON-COMPETE) E NÃO SOLICITAÇÃO (NON-SOLICITATION)

• Objetivo:

As regras de non-compete no geral estabelecem a obrigação de não fazer concorrência entre as partes e/ou das partes em relação à sociedade-alvo. Elas podem ser complementadas em operações de M&A por regras de não solicitação as quais vedam às partes envolvidas na operação o aliciamento de empregados, executivos, profissionais, colaboradores em geral, clientes atuais e/ou futuros da outra parte ou da sociedade-alvo.

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Embora nem sempre seja lembrada, há regra legal expressa no art. 1.147 do CC positivando o dever de não-concorrência. Dependendo do caso concreto, no entanto, é conveniente regular casuisticamente a regra de não concorrência nos contratos a serem assinados na operação de M&A.

Ainda relacionada à cláusula de não concorrência, em relação ao seu prazo, tem-se a súmula nº 05/2009 do CADE que dispõe que: “É lícita a estipulação de cláusula de não concorrência com prazo de até cinco anos da alienação de estabelecimento, desde que vinculada à proteção do fundo de comércio”. Além do limite temporal, alguns parâmetros para o estabelecimento da cláusula de não competição são: i. território/localidade/raio, ii. setor da indústria, iii. nicho mercadológico etc.

9. CLÁUSULAS DE RESOLUÇÃO DE IMPASSES

• Objetivo:

Há situações em que a condução dos negócios da sociedade-alvo está em risco por conta de divergências existentes entre sócios relevantes. Estes casos recebem o nome de “impasse”, conhecidos em inglês como deadlock ou handcuff. A fim de evitar que essas situações se perpetuem no tempo, colocando em risco a sociedade-alvo e os seus negócios, é comum a previsão de remédios contratuais, sendo um deles o shot-guns.

O shot-gun é um mecanismo típico de resolução de impasses no qual um sócio propõe um preço pelo qual poderá adquirir a participação de outro sócio ou pelo qual poderá se ver obrigado a vender a sua participação para o outro sócio. Dessa forma, esta cláusula funciona como um indutor para que o preço seja fixado de forma adequada já que o efeito que gera é a obrigatoriedade de compra ou de venda.

Por fim, para evitar que o shot-gun se transforme num “veneno”, recomenda-se : (i.) a estipulação de prazo para a realização da oferta (poderá se de compra ou de venda, conforme manifestação do sócio oblato), (ii.) definição precisa do ato capaz de caracterizar o impasse (impossibilidade recorrente de aprovação de matérias de super-maioria, por exemplo), e (iii.) previsão de preço mínimo e/ou critério para determinação de preço (preferencialmente capaz de ser auditado por terceiro desvinculado das partes).

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10. CLÁUSULAS DE ESCROW ACCOUNT (CONTAS-CAUÇÃO, CONTAS DE DEPÓSITO OU CONTAS VINCULADAS)

• Objetivo:

Esse tipo de cláusula é frequente quando os valores discutidos na operação de M&A são elevados e envolvem “superveniências passivas”. Deve haver a previsão de pagamento em conta-caução na qual os valores do preço de compra ficarão retidos até a ocorrência de determinado evento, normalmente o decurso de algum prazo e/ou solução de alguma pendência. Em relação à conta-caução, é recomendável o estabelecimento de regras quanto à sua movimentação. Por exemplo: somente pela instituição financeira autorizada por ambas as partes.

Por fim, são comuns as vinculações da retenção dos recursos mantidos em escrow a direitos de compensação do comprador vis-à-vis o dever de indenizar do vendedor por conta de superveniências passivas relacionadas ao próprio vendedor, ao bem adquirido ou à sociedade-alvo. A manutenção dos recursos em escrow account por vezes está relacionada às conclusões da diligência legal, ou seja, à definição do prazo com base em expectativa de materialização de contingências.

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8. FINANCIAMENTO DE PROJETOS. OPERAÇÕES ESTRUTURADAS

A) MATERIAL DE LEITURA

Leitura Básica

SALOMÃO NETO, Eduardo, Direito Bancário, São Paulo, Editora Atlas S.A., 2005.

Leitura Complementar

BÜRGEL, Gabriel de Castro. Estruturas de Garantia e Equity Support em Operações de Project Finance. 2014. 42 f. TCC (LLM) - Curso de Direito, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2014.

B) ROTEIRO DE AULA

1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

O Project Finance é um sistema de financiamento, em que as partes envolvidas formam uma parceria para desenvolver um projeto estruturado e atingir um determinado fluxo de caixa projetado, que servirá como suporte principal para garantir o aporte financeiro, por meio de mecanismos de engenharia financeira. Esse método de investimentopode ser resumido sob o ponto de vista:

(i) dos credores: espécie de financiamento suportado contratualmente pelo fluxo de caixa de um projeto específico;

(ii) dos patrocinadores (empreendedores/“sponsors”): parceira com contratos baseados em análise e quantificação de riscos operacionais.

Este sistema de financiamento é usualmente utilizado para projetos industriais ou de infraestrutura de grande porte, cujo montante a ser financiado é muito elevado e há grande necessidade de alavancagem. O repagamento é baseado no fluxo de caixa líquido do projeto, e as garantias usuais para projetos de financiamento corporativo (“Corporate Finance”) são (em tese, como veremos) substituídas por garantias de performance. Enquanto em operações comuns de Corporate Finance o foco está na saúde financeira da empresa e do grupo econômico ao qual ela pertence, e nas garantias oferecidas, já no Project Finance a análise de investimentos é voltada para o risco do projeto em si, e não dos sócios.

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Com isso, exige-se uma separação patrimonial entre os patrocinadores e o ente jurídico responsável pela gestão do projeto e pela propriedade de seus ativos. Esta segregação se dá usualmente com a constituição de uma Sociedade de Propósito Específico (“SPE”). O valor financiado exigível não é incluído no balanço dos patrocinadores, mas apenas da SPE, e há divisão maior de riscos com os credores, que devem estar cientes dos riscos que estão assumindo, visto que o recurso aos sponsors é limitado e a alavancagem é dada em função do fluxo de caixa projetado e não do valor do ativo em si.

Contudo, na prática, é muito incomum, principalmente no Brasil, encontrar estruturas “puras” de financiamento de projetos. A cultura predominante no mercado financeiro sempre foi a do Corporate Finance, e, por mais que o Project Finance seja uma tendência global para o funding de grandes projetos, o que se percebe é a aplicação de formas mescladas de financiamento.

Tendo em vista esta prática, é comum que se divida as operações de Project Finance em três categorias:

CATEGORIA CONCEITO

LIMITED RECOURSE

composição entre garantias com recursos gerados pelo projeto e garantias fornecidas pelos sponsors

FULL RECOURSEutiliza-se também os recursos gerados pelo projeto, mas as garantias prestadas pelos patrocinadores cobrem a totalidade do financiamento

NON RECOURSEAs garantias são apenas os recursos gerados pelo projeto, sem que haja acesso ao patrimônio dos empreendedores pelos credores.

2. O PROJECT FINANCE NO BRASIL

O principal traço que distingue as operações de Project Finance daquelas de financiamento corporativo tradicional é esta ligação entre o retorno do investimento com a capacidade de geração de recursos do projeto específico financiado, causando uma vinculação maior entre o credor e o empreendimento, e não com o sponsor. Com base nesta diferença fundamental, afeta-se a totalidade da estrutura destas operações tornando necessário um arcabouço contratual muito mais complexo para ampará-la.97

97 Eduardo Salomão Neto ensina que: “Em primeiro lugar, sendo financiamentos, sua natureza é a de um mútuo, ou mais frequentemente pro-messa de mútuo, com destinação específica, isto é, os recursos devem necessariamente ser canalizados para um projeto específico, inclusive por cláusula na documentação. Em segundo lugar, e nisto se distinguem dos outros financiamentos empresariais, os mutuantes aceitam que em princípio seu credito deve ser pago com recursos gerados pelo próprio projeto, ao invés de por um tomador de recursos autônomo preexistente, cujo crédito tenha sido aprovado. Na prática, esse princípio quase sempre sofre importantes moderações, mas ainda assim é um dos elementos que condicionam a estruturação comercial e contratual destas operações.” Em SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p.378. São Paulo: Atlas, 2005.

97 Eduardo Salomão Neto ensina que: “Em primeiro lugar, sendo financiamentos, sua natureza é a de um mútuo, ou mais frequentemente promessa de mútuo, com destinacao especifica, isto é, os recursos devem necessariamente ser canalizados para um projeto especifico, inclusive por cláusula na documentacao. Em segundo lugar, e nisto se distinguem dos outros financiamentos empresariais, os mutuantes aceitam que em principio seu credito deve ser pago com recursos gerados pelo próprio projeto, ao invés de por um tomador de recursos autônomo preexistente, cujo crédito tenha sido aprovado. Na prática, esse principio quase sempre sofre importantes moderacoes, mas ainda assim é um dos elementos que condicionam a estruturacao comercial e contratual destas operacoes.” Em SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p.378. São Paulo: Atlas, 2005.

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2.1. Sociedade de Propósito Específico – SPE

A SPE é o principal mecanismo utilizado no Brasil para formalizar e operacionalizar um Project Finance. A SPE é a tomadora do financiamento, assinando toda a documentação e os instrumentos da operação de crédito, sendo a proprietária dos ativos financiados e tendo como controladores os empreendedores., Assim, a SPE é o ponto central das diversas relações contratuais com as partes da estrutura principal do projeto:

PARTES RESPONSABILIDADES

CONSTRUTORESObras do projeto (usualmente através de contrato de “Engeneering, Procurement and Construction” ou “EPC”)

SEGURADORAS

Tendo em vista que são operações de grande vulto, é muito comum que se exija diversos seguros (para construção, performance, operação, etc., como será melhor detalhado adiante)

FORNECEDORESFornecem equipamentos e matéria prima que sejam necessários para o projeto

PODER CONCEDENTE

Já que é muito comum que estruturas de Project Finance sejam utilizadas quando se tratar de empreendimento em setores regulados (vale mencionar que no Brasil o Estado costuma participar destas operações também como financiador, através do BNDES, Caixa, BB e outros)

OUTROS INVESTIDORES

EVENTUAIS

Podem ser institucionais ou não, que desejem participar do projeto, seja por meio da aquisição de títulos de dívida da SPE (debêntures), ou de outra forma;

OPERADORESQue eventualmente venham a ser contratados para coordenar a atividade da SPE; e, muito importante,

USUÁRIOS DOSPRODUTOS E/OU SERVIÇOS DA SPE

Gerarão o fluxo de caixa que lastreia o financiamento.

2.2. Vantagens da Estrutura de Project Finance

As estruturas de Project Finance tendem a ser mais elaboradas do que as de financiamentos convencionais, gerando uma maior demora nas negociações na implementação dos projetos. Assim, há aumento nos custos legais e financeiros, com a possível contratação de empréstimos ponte (“bridge loan”), que podem reduzir o retorno financeiro final do projeto.

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No entanto, observamos que, ainda assim, a utilização dessas estruturas é uma tendência mundial para grandes projetos e isso se dá por conta das diversas vantagens deste mecanismo de financiamento:

98

VANTAGEM RAZÕES

CRIAÇÃO DE SPE

viabiliza o empreendimento em projetos de retorno a um prazo mais longo, já que os administradores das companhias, mandatários dos acionistas, em geral estão menos interessados em investir em iniciativas que não gerarão lucros imediatos ao negócio, ensejando taxas de retorno mais elevadas pelos credores, por conta dos custos de agência98;

DIVISÃO/ALOCAÇÃO DE

RISCOS

permite-se que seja preservada a capacidade de endividamento do empreendedor (cujo balanço não é diretamente afetado), possibilitando aos sponsors o patrocínio de diferentes projetos de risco paralelamente, sem que um afete o desempenho do outro. Também reduz os riscos de inadimplemento/insolvência, pois os financiadores do projeto serão os únicos credores;

CONVENIÊNCIAS TRIBUTÁRIAS

é possível organizar a configuração societária e operacional do empreendimento de forma a minimizar os custos fiscais

GESTÃO DA COMPANHIA

viabilização de um foco exclusivo por meio da estrutura segregada do projeto, desenvolvimento de mecanismos de incentivos mais diretos aos gestores de projetos, como, por exemplo, por meio do estabelecimento de remuneração variável dos diretores da SPE vinculada aos resultados do projeto

Para os projetos que dependem de investimentos elevados, o Project Finance oferece ainda uma forma de financiamento alternativa para evitar alguns inconvenientes do mercado de capitais. Nesta modalidade, não há a necessidade de ampla divulgação de informações, em função das obrigações regulatórias, ou mesmo da volatilidade e demandas de retorno de curto prazo, decorrentes da falta de “paciência” dos investidores. Em negócios que envolvam uma necessidade maior de sigilo de informações, o Project Finance acaba sendo uma alternativa mais viável, já que o número de entidades às quais será preciso realizar divulgações é muito mais restrito.

98 Nesse sentido, afirma Eduardo Salomão Neto: “Isso decorre do fato de que os administradores são, em última análise mandatários (agents) dos acionistas. O conhecimento desta realidade pelo mercado torna os financiamentos a entidades que já carregam dívidas mais onerosos, sendo que a taxa de retorno mais elevada exigida pelos financiadores é normalmente denominada de agency cost. (...) Em segundo lugar, o projeto financiado não cria dívida direta para as empresas beneficiadas pelo projeto, e portanto outros credores delas, principalmente futuros, não se sentirão autorizados a exigir remuneração adicional por seus financiamentos”( SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p.379. São Paulo: Atlas, 2005.

98 Nesse sentido, afirma Eduardo Sa-lomão Neto: “Isso decorre do fato de que os administradores são, em última análise mandatários (agents) dos acio-nistas. O conhecimento desta realidade pelo mercado torna os financiamentos a entidades que já carregam dívidas mais onerosos, sendo que a taxa de retorno mais elevada exigida pelos financiadores é normalmente denomi-nada de agency cost. (...) Em segundo lugar, o projeto financiado não cria dívida direta para as empresas benefi-ciadas pelo projeto, e portanto outros credores delas, principalmente futuros, não se sentirão autorizados a exigir remuneração adicional por seus finan-ciamentos”( SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p.379. São Paulo: Atlas, 2005.

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Destarte, há diversas vantagens para incentivar os empreendedores a encarar as complexidades e custos adicionais e buscar estruturas de Project Finance ao invés dos tradicionais financiamentos corporativos ou do acesso ao mercado de capitais.

2.3. Riscos a Serem Analisados e Mitigados

Agora, serão analisados os riscos envolvidos, que devem ser considerados pelos financiadores e empreendedores, e suas ações mitigadoras. A análise de riscos em um financiamento de projeto é realizada de forma diferente dos financiamentos tradicionais, pois o foco principal deixa de ser a saúde financeira e reputação do empreendedor em si, mas sim os riscos operacionais do desenvolvimento do projeto.

Os riscos99 podem ser estimados e cobertos por uma taxa, bem como podem ser suavizados por alguma ação mitigadora. O conceito de risco difere das incertezas, dado que estas não podem ser igualmente dimensionadas. Numa situação de incerteza, o agente financeiro tenderá sempre a utilizar a mais alta taxa de juros possível ou a recusar a colaboração financeira.

Descreveremos abaixo os principais riscos do desenvolvimento do projeto e as principais ações mitigadoras que podem ser tomadas para abrandar os mesmos100:101

RISCOS CONCEITO AÇÕES MITIGADORAS

DE CONSTRUÇÃO

Riscos de abandono da obra ou não conclusão do projeto, atrasos, custos superando as previsões iniciais, e problemas com a performance/funcionamento das instalações

Obtenção de garantias contratuais, comprometimento de capital próprio do patrocinador, escolha criteriosa dos contratantes para os serviços e fornecimento, com análise cautelosa da reputação, confiabilidade e grau técnico, contratação das contrapartes na forma conhecida por “turnkey”101, fiscalização dos estágios do processo por uma equipe independente de engenharia

99 Será adotada a concepção de ‘risco’ como a possibilidade da ocorrência de um fator adverso em relação a um resultado desejado.100 BORGES, Luiz Ferreira Xavier. “Project Finance e Infra-Estrutura: Descrição e Críticas”. Rio de Janeiro, 2014.101 Regime de empreitada, com preço fixo.

99 Será adotada a concepção de ‘risco’ como a possibilidade da ocorrência de um fator adverso em relação a um resultado desejado.

100 BORGES, Luiz Ferreira Xavier. “Project Finance e Infra-Estrutura: Descricao e Criticas”. Rio de Janeiro, 2014.

101 Regime de empreitada, com preço fixo.

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DE OPERAÇÃO

Possibilidade de produção abaixo das expectativas, aumento dos custos da operação do projeto, queda nos preços dos produtos ou serviços objeto da produção, dentre outros relacionados à produtividade e lucratividade das operações

Cautela na avaliação da reputação e experiência dos operadores e contrapartes do projeto, separação bem marcada da fase de operação da fase de construção, emprego de contratos de longo prazo para redução dos custos gerenciais e operacionais, obtenção de garantias de performance, estabelecimento de uma mecânica de bônus e provisão de penalidades envolvendo metas de operação, utilização de tecnologias de aplicação comprovada (se aplicável), controladoria rigorosa de custos, e a submissão dos processos a revisão por engenheiros independentes

DE FORNECIMENTO

OU DE SUPRIMENTO

Questões como disponibilidade, preço e qualidade dos materiais, custos de entrega e transporte e variação cambial (especialmente em cenário inflacionário), pois muitas vezes o projeto depende de matérias primas que devem ser adquiridas em moeda diferente de suas receitas

Execução de contratos com prazo longo, obtenção de garantias de fornecimento (com estrutura de put and pay agreement e penalidades em caso de default), exigência da manutenção de reservas, observação constante das condições do mercado em geral (até por questões de competitividade), políticas de controle de qualidade, estabelecimento de garantias de entrega e transporte, além da proteção cambial por meio da realização de contratos de hedge

DE TECNOLOGIACausado pela obsolescência, compatibilidade e aumento de custos

Avaliação da credibilidade dos fornecedores da tecnologia, estabelecimento de garantias contratuais de performance, políticas de controle de qualidade, estabelecimento de reservas apropriadas, acompanhamento do mercado em geral etc., estabelecimento de regras que obriguem os fornecedores a atualizar o aparato tecnológico de tempos em tempos

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DE MERCADO OU DE PRODUÇÃO

Variações de oferta e demanda102, queda nos preços dos produtos ou serviços objeto da produção do projeto, impactos que podem ser causados pela flutuação cambial e pela inflação nos preços (ou tarifas, conforme aplicável) praticados no setor da SPE

Parecidas com as medidas contra os riscos de produção: contratação em bases de longo praz, utilizando as estruturas chamadas de offtake arrangements, o acompanhamento dos preços do setor, e as medidas de proteção cambial (através de derivativos para hedge)

POLÍTICOS OU ATOS DE IMPÉRIO

Ligados à estrutura legislativa e regulamentar que pode envolver o setor do projeto; o Estado tem o poder de influenciar o andamento e a competitividade do empreendimento de forma inesperada (concessões, expropriações, controle de preços e tarifas, participação de estrangeiros, instituição de tributos, alteração na legislação ambiental etc.)

Maior estabilidade na estrutura regulamentar, por meio de uma maior independência por parte das agências reguladoras, escolha pelos juízos arbitrais para solução de eventuais conflitos, repasse de custos ao consumidor, regras de indenização ou ressarcimento de danos, manutenção de contas de reservas103

DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR

Riscos de catástrofe estão sempre presentes em qualquer operação, aqui podem ser especialmente danosos por conta do elevado volume de recursos envolvidos

Constituição de seguros, repasse de custos aos consumidores e manutenção de contas reservas

102103

3. ESTRUTURAS DE GARANTIA EM PROJECT FINANCE

O Project Finance baseia-se, em tese, “na concessão de crédito com lastro no retorno de um projeto, e sob este prisma poderia parecer uma impropriedade falar em garantias ou suporte creditício de terceiros”, como bem pontua Eduardo Salomão Neto. Mas ele continua: “isso não é, entretanto, verdadeiro, porque certa medida de participação dos empreendedores no projeto termina por ser necessária, de forma a eliminar riscos inaceitáveis para os financiadores, ou cuja existência encareceria por demais os custos do financiamento”104.

Assim, as garantias prestadas aos credores acabam constituindo uma questão relevante na negociação e estruturação dessas operações.

Com isso, passa-se a analisar as modalidades de garantia que usualmente se aplicam em estruturas mistas de Project Finance.

102 Sobretudo, neste caso, quando afetam a demanda pelos produtos ou serviços gerados pelo empreendimento.103 Já existem entidades internacionais especializadas na prestação de seguros cobrindo riscos políticos advindos de atos de império.104 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p. 401. São Paulo: Atlas, 2005.

102 Sobretudo, neste caso, quando afe-tam a demanda pelos produtos ou ser-viços gerados pelo empreendimento.

103 Já existem entidades internacionais especializadas na prestação de seguros cobrindo riscos políticos advindos de atos de império.

104 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Ban-cário” – p. 401. São Paulo: Atlas, 2005.

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Eduardo Salomão Neto nos aponta, todavia, uma interessante característica das garantias tradicionais nas operações de Project Finance:

Enquanto muito frequentemente a intenção do credor ao obter garantias é poder executá-las para quitação de sua dívida, essa intenção é secundária no Project Finance. Isso porque tipicamente os ativos da sociedade do projeto valem menos se vendidos separadamente do que a dívida incorrida para adquiri-los. A principal esperança para o credor de pagamento integral do débito reside na continuação do projeto, com geração de recursos. Assim, tipicamente a existência de garantias e a possibilidade de sua excussão servem como elemento de pressão para que os financiadores influenciem a construção e operação do projeto, caso o inadimplemento das obrigações a eles devidas seja iminente ou já tenha ocorrido.105

No direito brasileiro, é comum que se divida as garantias entre duas classes principais: pessoais e reais. A diferença entre elas é simples, como coloca Eduardo Salomão Neto:

(...) nas garantias pessoais, um terceiro se coloca no lugar do devedor, prometendo cumprir a obrigação se o devedor não o fizer, ou alternativamente ao devedor. Nas garantias reais, um bem é reservado ao credor para pagamento da dívida, caso o devedor não o faça.106.

3.1. Garantias Pessoais

3.1.1. Fiança

A fiança, regulada pelos arts. 818 a 839 do CC/02, é uma forma de garantia de caráter contratual, pela qual um fiador se compromete junto ao credor de uma obrigação a realizar o pagamento desta, caso o devedor falhe em fazê-lo. Assim, o contrato é firmado entre fiador e credor, sem que seja necessário o devedor na relação107.

O contrato de fiança é sempre acessório ao contrato que garante, e, no caso do Project Finance, ao contrato de financiamento ou de crédito. Desta forma, caso seja eliminada ou invalidada a responsabilidade do devedor original, fica também desonerada a obrigação do fiador. As obrigações nulas não podem ser afiançadas, salvo se a nulidade for resultado da incapacidade pessoal do devedor, conforme o art. 824 do CC.

105 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p. 405. São Paulo: Atlas, 2005.106 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Bancário” – p.452. São Paulo: Atlas, 2005.107 Entretanto, normalmente há a participacao do devedor na relacao, para que possa haver a descrição da forma pela qual o fiador se sub-rogará nos direitos do credor e o devedor deverá ressarcir o fiador.

105 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Ban-cário” – p. 405. São Paulo: Atlas, 2005.

106 SALOMÃO NETO, Eduardo. “Direito Ban-cário” – p.452. São Paulo: Atlas, 2005.

107 Entretanto, normalmente há a par-ticipacao do devedor na relacao, para que possa haver a descrição da forma pela qual o fiador se sub-rogará nos direitos do credor e o devedor deverá ressarcir o fiador.

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Em teoria, garantias pessoais não deveriam ser comuns a estruturas de Project Finance, tendo em vista que o risco do projeto é que deveria orientar a decisão de crédito dos bancos. No entanto, analisando as diretrizes do BNDES no capítulo anterior, pode-se verificar que, na prática, ainda são usadas as fianças dos controladores (“sponsors’ guarantees” ou “parent guarantees”) nestes projetos, sobretudo para as fases de construção/implementação.

3.1.2. Aval

O aval é a forma de garantia prestada em nota promissória anexa ao contrato de crédito, entre financiador e tomador, em que um terceiro figurará como avalista coobrigado. A grande diferença entre fiança e aval reside na condição do avalista como devedor principal, equiparado ao tomador, nos termos do art. 32 da Convenção de Genebra de 1930, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 57.663, de 1966. Nesta, o credor pode cobrar a dívida do avalista antes do devedor principal.

Dado que o aval é garantia típica dos títulos de crédito, não sendo garantias pessoas próprias dos financiamentos de projetos, não é tão comum em Project Finance.

3.2. Garantias Reais108

3.2.1. Hipoteca

Trata-se do instituto pelo qual o garantidor oferece ao credor um bem imóvel com vistas a assegurar o cumprimento da dívida, sem que haja a efetiva alienação. A transferência da propriedade e da posse do bem hipotecado só ocorre por meio da efetiva excussão da garantia.

Em operações de Project Finance, é usual que seja constituída hipoteca sobre o imóvel de propriedade da SPE, a planta onde o projeto será desenvolvido. Por vezes, embarcações, linhas férreas, ou outros ativos também podem ser dados neste tipo de garantia.

Mesmo em relação a imóveis, a hipoteca vem perdendo espaço para a alienação fiduciária, principalmente após a Lei nº 9.514/97, já que esta modalidade confere direito mais forte ao financiador para excussão da garantia e recuperação do crédito.

108 Um traço interessante dos financiamentos em geral, mas que toca particularmente as operações de Project Finance, é certo grau de sobreposição de garantias reais, como ocorre ao se constituir penhor ou alienação fiduciária sobre as ações de uma companhia cujos ativos estão também empenhados ou hipotecados, como bem lembra Salomão Neto. Isto é comum em operações financeiras no Brasil até por conta das dificuldades que os credores podem ter na excussão de determinadas garantias. Desta forma, muitas vezes o mais seguro é garantir que os bens estejam gravados de ambas as formas.

108 Um traço interessante dos financia-mentos em geral, mas que toca parti-cularmente as operações de Project Fi-nance, é certo grau de sobreposição de garantias reais, como ocorre ao se cons-tituir penhor ou alienação fiduciária so-bre as ações de uma companhia cujos ativos estão também empenhados ou hipotecados, como bem lembra Salo-mão Neto. Isto é comum em operações financeiras no Brasil até por conta das dificuldades que os credores podem ter na excussão de determinadas garan-tias. Desta forma, muitas vezes o mais seguro é garantir que os bens estejam gravados de ambas as formas.

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3.2.2. Penhor

Instituto pelo qual o garantidor cede ao credor a posse direta de um bem, em geral de natureza móvel a fim de garantir o cumprimento da obrigação principal. Nota-se, todavia, que esta classificação geral do penhor não é fiel à prática bancária, pois que normalmente se utiliza as formas de penhores “especiais”, como o penhor industrial, mercantil ou rural, ou de direitos e títulos de crédito, nos quais o devedor pode continuar com a posse direta do bem objeto da garantia.

O penhor é utilizado em operações de Project Finance em geral com relação aos equipamentos, direitos creditórios e contas de recebíveis relacionadas ao projeto, as ações da SPE, podendo ser constituído sobre dividendos da companhia, e em geral contra outros bens móveis relacionados. Embora haja uma queda na ocorrência deste tipo de garantia no mercado financeiro brasileiro, ainda é bastante comum que se execute garantias na forma de penhor, inclusive para operações de financiamento de projetos, como por exemplo em nosso caso gerador.

3.2.3. Alienação e Cessão Fiduciária109

Trata-se de efetiva transferência da propriedade de um bem ou ativo (móvel ou imóvel) ao credor, com o fito de garantir o cumprimento de uma obrigação principal do devedor. Enquanto nesta modalidade o devedor continua na posse direta e fruição do bem, na qualidade de depositário, a propriedade do ativo é transferida, de forma “resolúvel”.

Desta forma, a instituição financiadora passa a deter a propriedade fiduciária do bem, de forma temporária e condicional, uma vez que, (i) na hipótese de quitação do débito, o devedor fiduciante retoma automaticamente sua propriedade, com a resolução da propriedade do fiduciário; ou (ii) caso o débito seja inadimplido, a garantia é excutida com a consolidação da propriedade em nome do credor.

Assim, caso seja acelerada a dívida do devedor, o financiador poderá requerer busca e apreensão do bem alienado e, subsequentemente, executar a venda do mesmo utilizando os recursos obtidos na excussão para liquidação liquidar do crédito em aberto.

Do ponto de vista falimentar, este instituto traz vantagens importantes frente à hipoteca e ao penhor: o bem alienado fiduciariamente, por ser de propriedade, ainda que resolúvel, do credor, não integrará a massa falida do devedor, podendo ser objeto de pedido de restituição por parte do credor fiduciário (art. 7º do Decreto-Lei nº 911/69 e art. 85 da Lei nº 11.101/05). Com isso, percebe-se que o instituto é dotado de mais eficácia se comparado com as demais garantias reais previstas na legislação110.

109 Parte da doutrina, e isso se observa na prática de mercado, faz uma distinção entre a “alienação” e a “cessão” fiduciária. Embora entendamos que esta diferenciação não tem grande uso ou eficácia prática (ou mesmo técnica), cabe explicar que usualmente se entende que a cessão fiduciária diverge alienação quanto ao seu objeto: enquanto o objeto dado em alienação fiduciária seria uma coisa (móvel ou imóvel), na cessão a transferência seria de um direito de crédito. 110 TIMM, Luciano Benetti e D’AVILA, Anderson Jardim. “Alienação Fiduciária em garantia no Project Finance no Brasil”, Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, n. 51, p. 144-155, jan/mar, 2011.

109 Parte da doutrina, e isso se observa na prática de mercado, faz uma dis-tinção entre a “alienação” e a “cessão” fiduciária. Embora entendamos que esta diferenciação não tem grande uso ou eficácia prática (ou mesmo técnica), cabe explicar que usualmente se enten-de que a cessão fiduciária diverge alie-nação quanto ao seu objeto: enquanto o objeto dado em alienação fiduciária seria uma coisa (móvel ou imóvel), na cessão a transferência seria de um di-reito de crédito.

110 TIMM, Luciano Benetti e D’AVILA, Anderson Jardim. “Alienacao Fiduciá-ria em garantia no Project Finance no Brasil”, Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, n. 51, p. 144-155, jan/mar, 2011.

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No âmbito do Project Finance, é comum que sejam alienados fiduciariamente imóveis (em substituição à estrutura clássica de hipoteca descrita acima), mas também equipamentos, ações, direitos creditórios, e mesmo direitos emergentes de concessões, por meio do mecanismo que será descrito a seguir.

3.3. Covenants

Trata-se de um sistema de “garantia indireta”, conjunto de obrigações contratuais acessórias, positivas ou negativas, que pode ser utilizado cumulativamente com as garantias convencionais. Em geral, são exigências relativas à observância de certas práticas relevantes à gestão eficiente da devedora e de seu risco.

Podem ser consubstanciados em limitações à liberdade de gestão dos administradores da companhia, obrigando-os a absterem-se da prática de certos atos, ligados ao endividamento da empresa, à capacidade de contrair novas obrigações, à manutenção de um caixa mínimo, dentre outros.

Muitas vezes, ainda, os covenants estão diretamente ligados a informações contábeis da companhia, como índices de capitalização, liquidez corrente, resultado financeiro, cobertura de dívida, dentre outros.

Em operações de Project Finance, é comum que os controladores das SPEs sejam vinculados a uma série de covenants, envolvendo não apenas amarras contábeis, como obrigações de performance, restrições a distribuição de dividendos, a constituição de gravames sobre seus ativos (negative pledge), a redução de capital e a contratação de operações intercompany, bem como a compromissos de suporte de capital. Veja, abaixo, um exemplo de cláusula padrão de Convenants:

Restrictive Covenants. The Indenture imposes certain limitations on the ability of the Company and its Subsidiaries to, among other things, incur additional Indebtedness, pay dividends or make certain other restricted payments, enter into transactions with Affiliates, create dividend or other payment restrictions affecting Restricted Subsidiaries and merge or consolidate with any other Person, sell, assign, transfer, lease, convey or otherwise dispose of all or substantially all of its assets or adopt a plan of liquidation. Such limitations are subject to a number of important qualifications and exceptions. The Company must annually report to the Trustee on compliance with such limitations.

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CASO GERADOR:

Como caso gerador do presente estudo, analisaremos preliminarmente o projeto de financiamento da Usina Hidrelétrica de Jirau, para geração de energia elétrica no Rio Madeira, em Rondônia111. Nesta operação, um sindicato de bancos liderado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES concedeu à Energia Sustentável do Brasil S.A. um crédito de R$ 7.200.000.000,00 em 2009 (valor este que foi ainda complementado posteriormente com R$ 2.325.000,00 adicionais)112.

O empreendimento, realizado na forma de Project Finance, foi a maior linha de crédito da história do BNDES à época e representou, portanto, um marco nas operações deste tipo no Brasil.

Mas não são apenas as vultosas quantias envolvidas113 que tornam este projeto um “case” interessante para nossa análise. A operação foi estruturada utilizando diversos dos conceitos e das formas que serão aqui descritas, como por exemplo:

a) A devedora do empréstimo, Energia Sustentável do Brasil S.A., é uma SPE, controlada pelos sponsors GDF Suez Energy Latin America Participações Ltda., Eletrosul Centrais Elétricas S.A., Companhia Hidro Elétrica do São Francisco – CHESF e Camargo Corrêa Investimentos em Infra-Estrutura S.A.;

b) O financiamento foi liderado pelo BNDES, mas teve a participação dos principais bancos brasileiros como repassadores e agentes financeiros, notadamente, Itaú Unibanco, Banco Bradesco, Banco do Brasil, Caixa Econômica e Banco do Nordeste do Brasil;

c) O projeto foi realizado na área de infraestrutura, no setor de energia elétrica, altamente regulado no Brasil através de concessões pela agência reguladora própria, Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL;

d) O Project Finance foi constituído na forma “limited recourse” (ou até “full recourse”), uma vez que, embora o investimento tenha sido feito com base no risco do projeto, tendo como lastro principal a rentabilidade futura da Usina de Jirau, um sólido pacote de garantias foi constituído. Dentre as garantias concedidas, tivemos: (i) penhor de ações da SPE; (ii) cessão fiduciária de direitos emergentes da concessão com a ANEEL; (iii) penhor de dividendos da controladora; (iv) cessão condicional dos contratos do projeto e das garantias de execução; (v)  cessão fiduciária dos direitos emergentes do contrato de suporte dos acionistas; (vi) fiança corporativa dos sponsors GDF Suez e Camargo Corrêa; e (vii) fianças bancárias a serem contratadas com instituições financeiras; e

111 Disponível em: <https://www.valor.com.br/empresas/2848990/bndes-aprova-financiamento-de-r-23-bi-usina-de-jirau> e <https://www.bndes.gov.br/wps/portal/site/home/imprensa/noticias/conteudo/20090218_jirau>. Acesso em: 13.07.2018.112 Disponível em: <https://www.valor.com.br/empresas/2768360/custo-de-jirau-vai-r-154-bi>. Acesso em: 13.07.2018.113 Disponível em: <http://g1.globo.com/ro/rondonia/noticia/2016/12/3-maior-hidreletrica-do-brasil-jirau-e-inaugurada-oficialmente-em-ron-donia.html> e <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/12/1842403-brasil-inaugura-uma-das-20-maiores-usinas-hidreletricas-do-mundo.shtml>. Acesso em: 13.07.2018.

111 Disponível em: <https://www.valor.com.br/empresas/2848990/bndes-aprova-financiamento-de-r-23-bi-usina-de-jirau> e <https://www.bndes.gov.br/wps/portal/site/home/imprensa/noticias/conteudo/20090218_jirau>. Acesso em: 13.07.2018.

112 Disponível em: <https://www.valor.com.br/empresas/2768360/custo-de-jirau-vai-r-154-bi>. Acesso em: 13.07.2018.

113 Disponível em: <http://g1.globo.com/ro/rondonia/noticia/2016/12/3-maior-hidreletrica-do-brasil-jirau-e-inaugurada-oficialmente-em-rondonia.html> e <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/12/1842403-brasil-inaugura-uma-das-20-maiores-usinas-hidreletricas-do-mundo.shtml>. Acesso em: 13.07.2018.

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e) Além do robusto pacote de garantias listadas acima, a operação contou ainda com a execução de um Contrato de Suporte de Acionistas para Cobertura de Insuficiências e Outras Avenças, por meio do qual os controladores da SPE se comprometem a realizar aportes de capital na companhia na ocorrência de determinados “eventos de capitalização”. Em outras palavras, um Equity Support Agreement. Uma curiosidade interessante deste ESA em particular, é que a obrigação de suporte dos acionistas cessa no momento em que a Usina de Jirau entrar em operação, de forma que é uma “garantia” apenas para o período de construção e implementação.

Destarte, acreditamos que este projeto é um bom ponto de partida para os estudos de Project Finance, tendo em vista que se trata de uma operação com diversos traços característicos dos financiamentos de projetos no Brasil, que encampa a maioria dos conceitos discorridos.

C) ESPAÇO DISCENTE – TEXTO COMPLEMENTAR

PROJECT FINANCE COMO ESPERANÇA DE RETOMADA ECONÔMICA PÓS PANDEMIA

Gabriela Nunes Palmeira114

Imagine o Brasil de 1500, recém descoberto pelos portugueses. Uma terra inexplorada, habitada por índios e com uma riqueza natural impressionante. Um grupo de portugueses, em vez de colonizar os nativos, decidiu cooperar com os melhores recursos de caça, pesca e navegação. Utilizando-os, os índios deveriam explorar – da forma mais eficiente possível – aquela terra, bem como descobrir novos locais. Diante da riqueza encontrada e/ou produzida, aos portugueses deveriam ser repassados ganhos possibilitados pelo seu investimento. Esse exemplo hipotético ilustra como já fora praticado o Project Finance ao longo da história.

Da Roma antiga, época em que os navios eram construídos com recursos privados, às Cruzadas e às expedições das Companhias das Índias, notam-se grandes projetos que tiveram como retorno e garantia financeiras o fluxo de recursos a serem obtidos por seu êxito. Já no século XIX, esse tipo de financiamento se tornou necessário para a reconstrução de países após guerras e depressões econômicas, quando os governos financiaram obras de infraestrutura por meio do endividamento público.

114 Graduação pela FGV Direito Rio

114 Graduação pela FGV Direito Rio

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Diante disso, constata-se que, em momentos de escassez de recursos públicos e de baixa liquidez, os financiamentos realizados por intermédio de agentes privados e de bancos de investimento ou de fomento se materializam como catalizadores de recursos para reaquecimento econômico. Eis a importância do Project Finance.

Apesar de não haver uma definição universal para essa modalidade de estruturação financeira, podemos entendê-la como uma estratégia de captação de recursos a serem destinados a um projeto de grande porte e autofinanciável a longo prazo, em que o próprio caixa gerado será utilizado como fonte primária de recursos. Essa captação, por sua vez, deve constituir um capital economicamente separável, em relação ao qual as taxas de retorno e de diluição de riscos devem ser minunciosamente estudadas.

Juridicamente, portanto, para que um investimento seja feito por meio de Project Finance é necessário que seja constituída uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), que deve existir enquanto houver a exploração do determinado empreendimento/projeto. Dessa forma, tem-se a desvinculação das obrigações do empreendimento em relação aos ativos das empresas envolvidas no projeto, uma vez que a SPE responde pelo seu próprio patrimônio, o que configura um grande atrativo para investidores e acionistas.

A figura abaixo ilustra a estrutura padrão do Project Finance:

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Além de exigir uma estrutura complexa de acordos e contratos entre todas as partes, tais empreendimentos envolvem uma engenharia financeira pormenorizada e altamente alavancada. Assim, é essencial ressaltar como características essenciais i) a alocação de riscos, que exige um minucioso processo de levantamento, avaliação e mitigação, sejam eles ambientais, financeiros, regulatórios, sociais ou tecnológicos; ii) a limitação das garantias aos próprios ativos e/ou seus rendimentos (garantias de desempenho); e iii) a transparência na execução e na demonstração dos resultados.

Sendo assim, o Project Finance é recomendado para estruturar projetos de grande vulto econômico, tais como os voltados para exploração de recursos naturais e para a realização de obras de infraestrutura, ligados à energia, oleodutos, transporte de massas e saneamento básico. Vale salientar que, diante da responsabilidade do setor público no que tange a essas áreas, é comum Parcerias Público-Privadas serem realizadas para desenvolver tais projetos. Ainda, como exemplos de empreendimentos viabilizados por Project Finance, pode-se citar o Eurotunnel, o sistema de satélites globais Iridum, a refinaria de petróleo e gás Sincor, o aeroporto Internacional de Berlim e, no Brasil, os estádios de futebol construídos para sediar a copa do mundo de 2014.

Diante da atual conjuntura econômica, na qual a crise financeira e a insegurança jurídica causadas pela pandemia do Covid-19 inibem investimentos, considerar o Project Finance como modalidade de estruturação financeira é mister para viabilizar os futuros empreendimentos – especialmente em se tratando do Brasil.

Enquanto os países já exitosos em atenuar a curva de contágio e, consequentemente, o número de mortes pelo coronavírus são aqueles com infraestrutura altamente desenvolvida, o Brasil carece justamente dos alicerces essenciais para reconstruir o país. Fica evidente, portanto, que a prioridade dos investimentos deve ser em obras de infraestrutura, tais como construção de meios de transporte eficientes e saneamento básico.

Somado a isso, conforme demonstrado pelos resultados apontados no diagrama abaixo, desde a década de 1990 vêm sendo realizadas reformas institucionais que corroboram para a participação da iniciativa privada em tais setores no Brasil, conforme tabela abaixo:115

115 COSTA, Ana Lucia Bodas da. A utilização do Project Finance como Instrumento de Financiamento no Setor de Infraestrutura no Brasil no período de 1999 a 2009. 2010. Trabalho de Conclusão de Curso. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2010, p. 73.

115 COSTA, Ana Lucia Bodas da. A utilização do Project Finance como Instrumento de Financiamento no Setor de Infraestrutura no Brasil no período de 1999 a 2009. 2010. Trabalho de Conclusão de Curso. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2010, p. 73.

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Deste modo, defende-se que a retomada econômica do Brasil deverá contar com a iniciativa privada como principal investidor, sendo o Project Finance utilizado para elaborar e executar projetos que se fazem, além de essenciais, promovedores de desenvolvimento para o país no longo prazo. Naturalmente, não se deve desconsiderar a importância das iniciativas do Poder Público, mas, diante do cenário atual, é a implementação do Project Finance que permitirá a melhor gestão dos investimentos.

REFERÊNCIAS:

COSTA, Ana Lucia Bodas da. A utilização do Project Finance como Instrumento de Financiamento no Setor de Infraestrutura no Brasil no período de 1999 a 2009. 2010. Trabalho de Conclusão de Curso. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/17867/17867_5.PDF>. Acesso em: 26.05.2020.

RIBEIRO, Sónia Patrícia dos Santos. O Impacto do project finance nas empresas portuguesas no setor têxtil. 2012. Dissertação (Mestrado em Contabilidade e Finanças) - Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto. Portugal, 2012. Disponível em: <https://recipp.ipp.pt/handle/10400.22/1137>. Acesso em: 26.05.2020.

TREVISAN, Ricardo. O que é Project Finance? Blog do Trevisan, 2016. Disponível em: <https://ricardotrevisan.com/2016/09/21/o-que-e-project-finance/>. Acesso em 26.05.2020.

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JOÃO PEDRO BARROSO DO NASCIMENTODoutor e Mestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Pós-Graduado em Direito Empresarial, com concentração em Direito Societário e Mercado de Capitais, pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ). PIL em Harvard Law School. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Docente dos Cursos de Graduação e de Pós-Graduação da FGV Direito Rio.

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FINANÇAS PÚBLICAS

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FICHA TÉCNICA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

Sérgio GuerraDIRETOR

Antônio Maristrello PortoVICE-DIRETOR

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAÇÃO

André Pacheco Teixeira MendesCOORDENADOR DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSINO