direito fiscal - casos práticos (impostos, taxas, retroactividade..)
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Direito Fiscal FDUCP
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Caso prático n.º 1 – Aula 1 e 2
Luísa, de 17 anos, saiu de casa dos pais. Comprou a Paul, americano, um apartamento em
Lisboa, onde pensa residir com uma amiga, colega de curso. Pagou integralmente os
€400.000 que a casa custou com dinheiro de um depósito bancário que tinha com uma tia, já
velhota.
É devido algum imposto?
Tipos de impostos:
IMI: incide sobre a propriedade de imóveis
IMT: transmissão onerosa de imóveis
IVA: consumo
IRS: rendimento das pessoas singulares entre o inicio e o fim do ano fiscal
IRC: rendimento das pessoas colectivas
Imposto sobre produtos petrolíferos e energéticos IEC’S – Impostos Especiais
sobre o Consumo (IABA, ISP, IT)
ISV: veículos
IUC: circulação
SS: contribuições para a segurança social
IS: imposto de selo
Estado Fiscal enquanto principal fonte de receita é o tributo Direito Financeiro Público.
O Estado Fiscal paga a despesa do Estado Social.
No caso sub Júdice, encontram-se envolvidos os seguintes tributos/impostos:
Luísa
IMT – art. 1º (incidência objectiva) e art. 4º (incidência subjectiva) A Luísa é
que paga o IMT
IS - verba 1 (tabela Geral)
Paul
IRS - Mais-Valias (rendimentos esporádicos) – diferença entre o valor de aquisição
do imóvel e o valor da sua venda
Hipóteses Práticas de Direito Fiscal
Prof. Leonardo Marques dos Santos
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Caso prático n.º 2 - Aula 3 e 4
O município de Cantanhede aprovou um regulamento municipal segundo o qual “1. Os
munícipes devem pagar de taxa de saneamento 1% do valor da água consumida num
determinado mês. 2. Esta taxa destina-se à manutenção e melhoria do sistema de esgotos de
Cantanhede. 3. Estão isentos desta taxa os agregados familiares beneficiários do rendimento
social de inserção”.
No caso sub Júdice estamos perante uma relação jurídica tributária pelo que devemos
proceder a uma análise da sua constituição. Em primeiro lugar cabe-nos identificar o
sujeito passivo (art. 18º/3 da LGT) como sendo aquele que possui o contrato de
fornecimento de água, e o sujeito activo (art. 18º/1 da LGT) como sendo a Câmara, na
medida em que é a entidade que possui o direito ou poder de exigir do contribuinte o
pagamento do tributo público. A incidência da prestação pecuniária em causa irá incidir
sobre o consumo de água, mais concretamente a taxa de saneamento de 1% do valor da
água consumida num determinado mês. Tal visa a manutenção do sistema de esgotos.
No presente caso estamos no âmbito do art. 3º/2 da LGT, ou seja de tributos que
correspondem às receitas cobradas pelo Estado ou por outros entes públicos para a
satisfação de necessidades públicas, sem função sancionatória. O referido artigo identifica
três figuras compreendidas no âmbito dos tributos: impostos, taxas e contribuições
especiais.
O imposto constitui uma prestação pecuniária (tendencialmente pecuniária, uma vez que
existe a excepção da dizima militar), coactiva e unilateral, exigida por uma entidade
pública com o propósito de angariação de receita. Como características objectivas do
imposto temos a sua unilateralidade, o facto de carecer de reserva de lei (ex lege – art.
165º/1 al. i) CRP), ser singular ou reiterado (art. 4º/1 LGT) e definitivo (só há direito a
reembolso se pagar a mais). Como características subjectivas temos de um lado o facto de
o sujeito activo ser o Estado ou uma entidade pública; e por outro lado o facto de o sujeito
passivo (art. 4º/1 LGT) serem sujeitos com capacidade contributiva (consumo e
património). O objectivo do imposto assenta em financiar o Estado (art. 103º CRP e art. 5º
da LGT): os impostos constituem a forma normal e principal e financiamento do Estado –
modelo de Estado Fiscal – sendo que enformam 92% do valor das receitas previstas no
nosso OE e representam 21% do PIB.
A taxa (art. 4º/2 LGT) constitui uma prestação pecuniária e coactiva, exigida por uma
entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efectivamente provocada
ou aproveitada pelo sujeito passivo. Apresentam como características o facto de serem
definitivas, singular ou reiterada, e bilaterais/sinalagma (existe uma contraprestação
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especifica, por exemplo um serviço), sendo que o sinalagma tem de ser real e
proporcional. O valor da taxa encontra-se obrigado a respeitar o Princípio da Equivalência,
ou seja entre a taxa e a fixação do seu quantum deve existir por base uma equivalência/
uma proporcionalidade, sendo necessário existir uma relação entre o custo e a taxa. É
ainda de salientar que o abuso das taxas por parte das Autarquias Locais pode levar à
existência de impostos ocultos. A existência de sinalagma constitui condição necessária
para que uma imposição administrativa se qualifique como taxa sendo que daqui deriva o
facto de a criação de uma taxa não se encontrar sujeita a reserva de lei em sentido formal.
O facto do sinalagma permitir o controlo do valor da taxa justifica a sua não sujeição as
vinculações do princípio da legalidade, garantia dos destinatários dos impostos. A decisão
sobre a sua criação caberá, regra geral as entidades a que cabe a contraprestação pública.
Resulta do art. 4º/2 da LGT que a taxa pode ter como pressuposto a prestação de um
serviço (em relação a certos serviços pode haver uma quantificação do custo da sua
prestação individualizável, sendo que essa prestação cria um beneficio); utilização de um
bem público (quantias cobradas pela utilização de bens como pontes, estradas,
monumentos, etc; sendo sempre necessário avaliar a utilização benéfica pretendida e os
custos da utilização para o ente publico, directa ou reflexamente) ou remoção de um limite
jurídico.
No presente caso, estamos perante uma prestação pecuniária e devido ao facto de tal ser
bilateral tal conduz ao sinalagma (serviço público – um dos pressupostos de taxa que
consta do art. 4º/2). Deste modo, tudo indica para que estejamos perante uma taxa.
É necessário averiguar se existe uma relação directa entre a prestação pública e privada.
Em princípio tal verificar-se-ia na medida em que existe uma relação entre o serviço de
esgotos e a utilização da água: normalmente quem consome mais água utiliza mais a rede
de esgotos. Seria ainda necessário fazer referencia ao princípio na equivalência no sentido
de que a agua consumida na quase totalidade acaba nos esgotos. Contudo, o critério mais
adequado seria 1% da quantidade da água consumida e não do valor da água consumida.
A taxa apresenta dois limites: o princípio da equivalência e a cobertura do custo (princípio
da equivalência: entre a taxa e a prestação pública deve haver uma equivalência de custo e
benefícios; princípio da relação entre o custo do serviço e a quantia a cobrar: deve o
montante corresponder ao custo que o pressuposto da taxa acarreta para o serviço
público) e o Princípio do Benefício Objectivo da Prestação Pública (os particulares tem de
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suportar mais encargos conforme recebam mais ou menos benefícios da parte do Estados,
estando obrigados a contribuir na medida dos seus próprios interesses):
Embora a doutrina divirja neste aspecto, em princípio o facto de os agregados familiares
beneficiários do rendimento social de inserção se encontrarem isentos deve-se à
capacidade contributiva. Tal encontra-se fundamentado - 8º/ 2 al. e), ou seja podem haver
isenções mas têm de ser fundamentadas. Questão diferente é a de saber se é justificado? É
um preço que se está a pagar por um serviço, há sempre desgaste do bem público. O
conceito de taxa é o de cobrar custos e não fazer justiça.
As taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem
do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos
particulares.
Caso Prático n.º 3- Aula 5 e 6 A sociedade A, residente em Portugal e aqui sujeita a imposto, distribuiu em 2010, €1.000.000 às suas três sócias, a sociedade B, igualmente residente em Portugal e aqui sujeita a imposto, a sociedade C, residente no Reino Unido e a sociedade D residente no México. Tendo em conta que Portugal celebrou convenção para evitar a dupla tributação com o México e com o Reino Unido, responda às seguintes questões:
a) A sociedade A está obrigada a reter imposto na fonte sobre dividendos distribuídos? b) Quais as taxas aplicáveis a cada uma das suas sócias?
Princípio da Residência: a residência constitui o elemento de conexão decisivo na
atribuição da competência para tributar e que, em conformidade, os rendimentos devem
ficar sujeitos ao imposto do estado em que reside o seu titular. Exprime a ideia de que no
Estado em que uma pessoa singular ou colectiva reside é aquele com o qual são mais
intensos os vínculos de solidariedade que fundamentam o dever de pagar impostos A
concretização deste princípio passa pela adopção de um sistema de tributação universal,
worldwide income taxation, dito também de sujeição ilimitada, de acordo com o qual
todos os rendimentos de uma pessoa ficam sujeitos ao imposto do estado de residência,
incluindo-se ai os rendimento que tenham fonte em estado diverso. É à sujeição ilimitada
dos rendimentos ao imposto do estado da residência que melhor permite concretizar o
princípio da capacidade contributiva.
Princípio da Fonte: a fonte constitui o elemento decisivo na atribuição de competência
para tributar e que, em conformidade, os rendimentos devem ficar sujeitos ao imposto do
estado em que tenham origem. Exprime a ideia d que o estado em que concreto
rendimento tem origem é quele cuja acção mais contribui para a respectiva formação. A
concretização mais plena deste princípio passaria pela adopção de um sistema de
tributação estritamente territorial em que em cada estado ficassem sujeitos a imposto os
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rendimentos que nele tivessem origem, independentemente do estado em que o seu titular
residisse.
A retenção na fonte encontra-se consagrada no art. 20º da LGT como forma de concretização da substituição tributária. A retenção na fonte, enquanto forma de fazer a cobrança dos impostos pode ser
Liberatória/ definitiva: ocorre por aplicação das taxas liberatórias previstas no art. 71º do CIRS, o contribuinte substituído fica em principio dispensado do englobamento dos rendimentos, considerando-se desde logo satisfeita a obrigação tributaria. Em suma, o contribuinte encontra-se liberado de pagar outras obrigações (caso dos não residentes)
Conta do imposto devido a final: a aplicação das taxas de retenção e a entrega de quantias retidas constitui um mero mecanismo de adiantamento por conta de uma dívida de imposto que só se torna certa, liquida e exigível, findo o período tributável de um ano.
Decorre do art. 2º do CIRC que ficam sujeitas a imposto não apenas as pessoas colectivas e outras entidades com sede ou direcção efectiva em território português, mas também aquelas, que não possuindo sede nem direcção efectiva no nosso território obtenham nele rendimento que não estejam sujeitos a IRS. O art. 4º do CIRC consagra que o IRC incide sobre a totalidade dos rendimentos , incluindo os obtidos fora do território pelo que de acordo com este art. a sociedade B será tributada. No que diz respeito à sociedade C e D, presume-se que seja tributada no México/Reino Unido e em Portugal (art. 4º/2 do CIRC), mas o México/UK tributa tudo com base no Princípio da Base Mundial. De acordo com o art. 3º/3 al. c) 3) do CIRS a tributação é feita através de retenção na fonte (art. 94º/1 al. e) do CIRC), sendo esta por conta ou a título liberatório ou definitivo; e de acordo com o art. 94º/3 al. b) sendo a título definitivo. Relativamente à sociedade B existe uma retenção por conta (regra geral do nº3) Directiva Mães-Filhas
Quem beneficia no México, UK, Portugal? As directivas são destinadas a residentes
na UE, logo só o UK poderia beneficiar. Contudo, a Suíça negociou com a UE a
aplicação da Directiva Poupança e alastrou-se as demais directivas.
Existe pouca uniformização de directiva: Directiva Fusões, Directiva Poupança,
Directiva Mães-Filhas
Aplicação da Directiva Mãe-Filhas:
As directivas têm de ser transpostas para o nosso ordenamento jurídico – art.
14º/3 do CIRC.
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Quando a sociedade A (Portugal) distribui um rendimento à sociedade C (UK)e
esta tem de uma certo rendimento face à sociedade A não irá existir retenção na
fonte.
Para assegurar que o rendimento não é tributado duas vezes, além da sociedade A
não fazer retenção na fonte, a sociedade C não tributa.
Rendimento só é tributado pela sociedade A.
Só não haverá retenção na fonte se se encontrarem reunidos os seguintes requisitos:
participação social
se o período de titularidade for superior a um ano
Sociedade Mãe (B,C,D) e Sociedade Filha (A): o que não é tributado são os rendimentos
que passam de um país para o outro, o que é gerado no próprio país é tributado
(tributação no Estado da Fonte)
Contudo, se o dinheiro provier do México para o UK, não existe nenhuma norma que diga
que o rendimento não seja tributado no UK. Por vezes, em vez de uma sociedade do
méxico passar o rendimento directamente para a sociedade do UK, passa primeiro por
uma sociedade mexicana situada no UK e depois essa sociedade passa o rendimento para a
sociedade do UK.
Nota:
dupla tributação económica – o IRS não resolve tao eficazmente estes problemas
como o IRC
Directiva Mães-Filhas resolve problemas de dupla tributação económica e jurídica.
b) Taxas:
CIRC: art. 94º/ 4 e 5 CIRS: art. 71º e 72º e 94º e ss taxas no IRS CIRS: art. 71º/1 al. c) art. 5º al h)
Sociedades D e C – art. 94º/5 art. 87º/ 4 al. c) – taxa de 21.5% Caso 4 – Aula 5 e 6 O Secretário de Estado dos Assuntos fiscais emitiu um despacho, nos termos do qual as entidades pagadoras de dividendos não podiam aplicar as taxas de retenção na fonte previstas nas convenções sem que lhes fosse apresentado, antes da data de pagamento, uma série de formulários devidamente certificados pelas autoridades fiscais do Estado da residência do beneficiário do rendimento. No presente caso, em primeiro lugar temos de saber se é licito ou não o Estado Português
exigir da Sociedade B o preenchimento dos formulários sob pena de não ser aplicado o
regime das taxas de retenção na fonte previstas nas convenções.
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Do ponto de vista substancial, é lícito ao Estado Português requerer uma prova de efectiva
residência
Contudo, do ponto de vista material, tal não é lícito uma vez que pode ocorrer atrasos (ex:
passagem de ano, só chega dia 2). É necessário existir um mecanismo que permita
recorrer.
Hierarquia das fontes de direito: a convenção, sendo de direito internacional tem primazia
sobre a lei ordinária, havendo mesmo quem defenda que tem caracter infra constitucional
embora inferior aos Princípios Constitucionais (art. 8º da CRP).
O despacho do Secretário dos Estados dos Assuntos Fiscais coloca o requisito da
necessidade de prova (faz sentido), estabelece o prazo para a entrega do formulário e tem
de apresentar um certificado próprio (preparado em Portugal, traduzido em Inglês e em
Português, que depois é enviado para o México e este coloca lá o selo branco – este aspecto
não esta muito claro no caso pratico).
Jurisprudência: qual o limite a partir do qual a regulamentação se torna numa restrição?
Despacho enquanto infra direito constitucional: não pode restringir a aplicação de uma norma que é hierarquicamente superior, embora possa regulamentar (despacho VS convenção internacional)
Alargou-se o período que se podia apresentar a prova ate ao pagamento
Requisito de residência é ad probationem: não se pode obrigar a sociedade portuguesa a ser sujeita a um regime diferente por não apresentar o certificado de residência – pode dar origem a uma contra ordenação mas não pode ser obrigada pelo pagamento.
Soberania Fiscal: devido à descentralização política, à regionalização e à integração
europeia temos vindo a perder autonomia.
art. 94º/6 e art. 98º do CIRC: prazos
Caso 5 – Aula 5 e 6 John residente no Reino Unido decidiu vender a sua casa de férias no Algarve. De acordo com informações prestadas pelo seu consultor fiscal este deverá apresentar uma declaração de IRS, de forma a declarar a mais-valia gerada com a venda. O consultor fiscal de John informou-o ainda que a lei Portuguesa obriga à nomeação de um representante fiscal (que ficará responsável, nomeadamente, pela apresentação da referida declaração de IRS e pela entrega do imposto devido ao Estado) que lhe custará cerca de €200,00 por mês. John não acredita no consultor fiscal, pois considera que não faz qualquer sentido ser obrigado a indicar um representante fiscal, pois pode entregar a declaração pela internet. Quem é que tem razão?
Existindo um imóvel em Portugal, a administração Fiscal portuguesa tem uma maior
facilidade em controlar se as obrigações são cumpridas ou não.
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O que é tributado, no caso dos imóveis, é a diferença entre as mais-valias e as menos-valias
– Tributação dos rendimentos de acordo com o saldo resultante da diferença entre as
mais-valias e menos-valias.
Contudo, este saldo só fecha no último dia do ano: no dia em que se gera a mais-valia
ainda não se sabe o saldo, logo não teria sentido que se fizesse retenção na fonte. Deste
modo, terá que se declarar a mais valia gerada em Portugal.
Com o intuito de garantir que as obrigações são cumpridas, exige-se que os não residentes
fiscais em Portugal possuam um representante legal fiscal que entregue a declaração de
impostos do não residente – se o representante legal fiscal não apresentar a declaração
penhoram-se os seus bens; se o não residente não tivesse de nomear poderia voltar para o
seu país de residência sem entregar a declaração de impostos. Consequência da não
nomeação: coima.
O responsável pelo pagamento do imposto é o Gestor de Bens e Direitos, que pode ou não
ser o representante legal fiscal.
O representante legal fiscal é obrigatório contudo pode ser gratuito ou oneroso.
Poderá existir um tratamento diferenciado, contudo é necessário verificar se existe uma
justificação. Portugal tem à disposição meios que permitem colaborar com a
administração fiscal inglesa.
Caso prático n.º 6 – Aulas 7 e 8
(a) Suponha que em Outubro de 2011 é aprovado um aumento da taxa de IRS a incidir sobre os rendimentos auferidos durante o exercício de 2010.
Quid juris?
(b) A sua resposta seria diferente se o aumento da taxa tivesse sido aprovado em Janeiro de 2011?
(c) E se o aumento tivesse sido feito em Junho de 2010?
A Segurança Jurídica Constitui um valor com especial importância no domínio do direito
tributário. Ao planear a sua actividade e ao gerir o seu dia-a-dia, famílias e empresas
precisam de poder confiar na lei tributaria e nas orientações da administração, fundando
nestas muitas decisões cujos efeitos económicos se prolongam no tempo. A Segurança
Jurídica diz que tal tem de ser previsível: todas as escolhas económicas e fiscais vão
depender da estabilidade das normas fiscais
art. 103º/3: ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que tenham eficácia retroactiva,
consagrando-se deste modo obliquo como um direito de resistência, uma proibição de
retroactividade que a LGT reitera de modo algo inconsequente no seu art. 12º/1 ao dispor
que ‘’às normas tributarias aplicam-se as factos posteriores à sua entrada em vigor, não
podendo ser criadas quaisquer impostos retroactivos’’.
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(a) Retroactividade Forte, autêntica ou própria (1ºgrau): no que respeita a impostos de obrigação periódica como o IRS ou o IRC, a lei nova entrada em vigor a meio do ano, pode projectar-se retroactivamente sujeitando a tributação acrescida os rendimentos do ano anterior, já plenamente formados. Ou seja, estamos perante uma lei nova que se aplica a uma situação jurídico tributaria em que todos os elementos já estão consolidados (três momentos na vida de um imposto: verificação do facto tributário, liquidação e cobrança do imposto). Exemplo: Tio rico que morre eu herdo a fortuna e gasto tudo em malas e sapatos – o estado vem dizer que tenho de pagar 10% sobre a herança – neste caso eu não tenho capacidade contributiva porque já não tenho capital – a CRP vai dar uma protecção adicional estamos perante uma situação consolidada, em que todos os momentos da vida do imposto já se verificaram.
Tribunal Constitucional e Prof. Casalta Nabais: quando estamos perante um caso de retroactividade forte encontramo-nos no âmbito do art. 103º/3 CRP, pelo que a retroactividade é sempre proibida, não sendo necessária nenhuma análise de ponderação.
Prof. Sérgio Vasques: a proibição do art. 103º/3 abrange indistintamente a
retroactividade forte ou fraca, própria ou impropria. A retroactividade forte surge tendencialmente mais gravosa para os contribuintes, na medida em que o facto tributário já se encontra plenamente formado, não lhes restando qualquer hipótese de compensar o sacrifício adicional que a lei lhes trás. A retroactividade fraca surge por comparação tendencialmente menos gravosa, pois estando o facto tributário ainda em formação, resta aos contribuintes ainda alguma margem para compensar o sacrifício adicional que a lei inesperadamente lhes impõe. A leitura do art. 103º/3 da CRP assenta de que a proibição da retroactividade, corolário que é o do Princípio da Segurança Jurídica, não possui valor absoluto, como o não possui principio constitucional algum, devendo articular-se por isso com outros princípios e valores constitucionais, que no caso concreto podem manifestar-se com maior intensidade. A proibição expressão do art. 103º/3 da CRP, serve essencialmente para deixar claro que a retroactividade (forte ou fraca) esta por principio vedada ao legislador fiscal que só poderá socorrer-se dela a título excepcional. Em face do art. 103º/3 da CRP uma lei fiscal retroactiva afigurar-se-á sempre, e à partida, inconstitucional, não sendo necessária qualquer ponderação casuística para chegar a esta primeira conclusão. Contudo, a segurança jurídica deve sacrificada a outros valores constitucionais que no caso concreto se mostrem mais relevantes e que em circunstancias excepcionais se considere legitima a lei fiscal retroactiva (ex: guerra, catástrofe natural, epidemia ou grave crise financeira). A proibição constitucional da retroactividade não nos dispensa de olha ao caso concreto e de levar a cabo uma ponderação de valores, havendo sempre que perguntar-se se lesão que a lei retroactiva traz à segurança jurídica dos contribuintes se mostra necessária, adequada e proporcionada à tutela dos demais valores constitucionais em jogo.
Nota: o facto de se viver numa situação de crise pode ser um elemento de ponderação.
(b) Retroactividade Fraca, Inautêntica ou Impropria: no que respeita a impostos de obrigação periódica como o IRS ou o IRC, a lei nova entrada em vigor a meio do ano, pode projectar-se retroactivamente sujeitando a tributação acrescida os rendimentos do ano em curso, ainda em formação. Ou seja, uma norma aprovada ira alterar uma situação fiscal cujo facto tributário já se verificou mas existem
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elementos relativos aquele imposto ainda não se verificaram/produziram
(liquidação e cobrança – momento de vida do imposto) o facto tributário encontra-se verificado (incidência objectiva verificada na medida em que se o sabe que se tem de pagar o imposto) mas entre o momento da liquidação e da cobrança há um aumento da taxa.
Tribunal Constitucional: Casos em que uma medida deve ser censurada com base no art. 2º - requisitos de ponderação:
É necessário que o estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade
Tais expectativas devem ser legítimas e fundadas em boas razões
Devem os privados ter feitos planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do ‘’comportamento’’ estadual
É necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação da expectativa.
Prof. Sérgio Vasques: a proibição do art. 103º/3 abrange indistintamente a
retroactividade forte ou fraca, própria ou impropria. A retroactividade forte surge tendencialmente mais gravosa para os contribuintes, na medida em que o facto tributário já se encontra plenamente formado, não lhes restando qualquer hipótese de compensar o sacrifício adicional que a lei lhes trás. A retroactividade fraca surge por comparação tendencialmente menos gravosa, pois estando o facto tributário ainda em formação, resta aos contribuintes ainda alguma margem para compensar o sacrifício adicional que a lei inesperadamente lhes impõe. A leitura do art. 103º/3 da CRP assenta de que a proibição da retroactividade, corolário que é o do Princípio da Segurança Jurídica, não possui valor absoluto, como o não possui principio constitucional algum, devendo articular-se por isso com outros princípios e valores constitucionais, que no caso concreto podem manifestar-se com maior intensidade. A proibição expressão do art. 103º/3 da CRP, serve essencialmente para deixar claro que a retroactividade (forte ou fraca) esta por principio vedada ao legislador fiscal que só poderá socorrer-se dela a título excepcional. Em face do art. 103º/3 da CRP uma lei fiscal retroactiva afigurar-se-á sempre, e à partida, inconstitucional, não sendo necessária qualquer ponderação casuística para chegar a esta primeira conclusão. Contudo, a segurança jurídica deve sacrificada a outros valores constitucionais que no caso concreto se mostrem mais relevantes e que em circunstancias excepcionais se considere legitima a lei fiscal retroactiva (ex: guerra, catástrofe natural, epidemia ou grave crise financeira). A proibição constitucional da retroactividade não nos dispensa de olha ao caso concreto e de levar a cabo uma ponderação de valores, havendo sempre que perguntar-se se lesão que a lei retroactiva traz à segurança jurídica dos contribuintes se mostra necessária, adequada e proporcionada à tutela dos demais valores constitucionais em jogo.
(c) Retroactividade de 3º grau (Prof. João Gama é contra esta classificação defendendo nestes casos a existência de uma retroactividade fraca): o facto tributário não é instantâneo – é preciso o período de calculo (1ano). Por motivos de cálculo, o
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cálculo do imposto é realizado no fim do ano. Exemplo: chegando ao início do ano e
a taxa do imposto é 42% e depois é 46.5% a minha expectativa desaparece Situação de subida das taxas ocorreu no ano passado, sendo tal designada de retrospectividade
Tribunal Constitucional: Casos em que uma medida deve ser censurada com base no art. 2º - requisitos de ponderação:
É necessário que o estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade
Tais expectativas devem ser legítimas e fundadas em boas razões
Devem os privados ter feitos planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do ‘’comportamento’’ estadual
É necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação da expectativa.
Prof. Sérgio Vasques: um fenómeno diferente da retroactividade da lei fiscal (produz-se quando a lei dispõe sobre factos tributários passados, seja aqueles que se formaram já por completo, seja aqueles cuja formação se encontra ainda em curso) é o da retrospectividade da lei fiscal – ocorre quando a lei nova, dispondo embora quanto a factos futuros, lesa expectativas fundadas no passado. Embora o problema subjacente as leis fiscais retroactivas é na substancia o mesmo que subjaz as leis fiscais retrospectivas, ou seja um problema de tutela das expectativas legitimas dos contribuintes o que sucede é que valendo a lei para o futuro, esse problema coloca-se aqui com uma maior subtileza mostrando-se a lesão das expectativas dos contribuintes à partida menos gravosa e merecedora de protecção. O direito não pode tutelar uma qualquer expectativa dos contribuintes no sentido de que as leis tributárias se mantenham inalteradas ao longo do tempo, ainda que tutele a expectativa de que a alteração dessas leis apenas valham para o futuro. O fenómeno da retrospectividade pode manifestar-se em circunstancias diversas: criação ou agravamento de impostos ou eliminação de benefícios.
Sérgio Vasques: ao passo que a retroactividade, forte ou fraca, é por princípio proibida,
exigindo-se uma ponderação deste tipo para que possamos excepcionalmente admitir, a
retrospectividade é por princípio permitida, exigindo-se uma ponderação deste tipo para
que a consigamos excepcionalmente invalidar.
Caso prático n.º 7 - Aula 7 e 8 Suponha que, apesar da crise financeira sentida nos últimos anos e das medidas de austeridade implementadas no decurso do ano de 2011, o Governo aprova, através do Decreto-Lei x/2011, de 5 de Dezembro, uma redução de 2% sobre as taxas gerais de IRS. A referida redução, aplicável a todos os escalões de rendimento previstos na tabela constante do CIRS, art. 68.º, e relativamente a todos os rendimentos auferidos em 2011, dever-se-ia ao facto de ter sido descoberta uma reserva de petróleo ao largo de Peniche, que teria contribuído para um aumento exponencial da receita do Estado.
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Quid juris? Proibição da retroactividade vale também quanto as leis que comportem
desagravamentos de impostos? A proibição da retroactividade tem como propósito
essencial proteger as expectativas legítimas dos contribuintes contra alterações de lei que
de modo inesperado venham agravar a sua carga fiscal, não se verificando uma verdadeira
lesão dessas expectativas em caso de desagravamento. O próprio art. 103º/3 da CRP
aponta com clareza neste sentido ao consagrar a proibição da retroactividade como um
direito de resistência contra o imposto retroactivo, que o contribuinte fica assim
dispensado de pagar.
Poderíamos contudo estar perante uma inconstitucionalidade orgânica. Deste modo, seria necessário saber se o decreto-lei aprovado pelo Governo havia sido autorizado ou não (art. 165º/1 al. i) – reserva relativa da AR). Caso prático n.º 8 - Aula 7 e 8
(a) Suponha que em Dezembro de 2011 é aprovado um aumento de 5% das taxas gerais de IRS, a aplicar sobre todos os rendimentos auferidos durante o ano de 2011.
O referido aumento, aplicável a todos os escalões de rendimento previstos na tabela constante do CIRS, art. 68.º, dever-se-ia à descoberta de novos “buracos financeiros” e à consequente necessidade da angariação de receita fiscal adicional. Quid juris?
(b) A sua resposta seria diferente se o país vivesse uma situação económica favorável e subida dos impostos no decurso do ano se devesse apenas à tardia aprovação da lei do orçamento do Estado no Parlamento, por falta de consenso? E faria diferença o facto de as medidas fiscais aprovadas tardiamente terem sido apresentadas publicamente pelo governo ainda em 2010?
A Segurança Jurídica Constitui um valor com especial importância no domínio do direito
tributário. Ao planear a sua actividade e ao gerir o seu dia-a-dia, famílias e empresas
precisam de poder confiar na lei tributaria e nas orientações da administração, fundando
nestas muitas decisões cujos efeitos económicos se prolongam no tempo. A Segurança
Jurídica diz que tal tem de ser previsível: todas as escolhas económicas e fiscais vão
depender da estabilidade das normas fiscais
art. 103º/3: ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que tenham eficácia retroactiva,
consagrando-se deste modo obliquo como um direito de resistência, uma proibição de
retroactividade que a LGT reitera de modo algo inconsequente no seu art. 12º/1 ao dispor
que ‘’às normas tributarias aplicam-se as factos posteriores à sua entrada em vigor, não
podendo ser criadas quaisquer impostos retroactivos’’.
(a) Retroactividade de 3º grau (Prof. João Gama é contra esta classificação defendendo nestes casos a existência de uma retroactividade fraca): o facto tributário não é instantâneo – é preciso o período de calculo (1ano). Por motivos de cálculo, o
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cálculo do imposto é realizado no fim do ano. Exemplo: chegando ao início do ano e
a taxa do imposto é 42% e depois é 46.5% a minha expectativa desaparece Situação de subida das taxas ocorreu no ano passado, sendo tal designada de retrospectividade
Tribunal Constitucional: Casos em que uma medida deve ser censurada com base no art. 2º - requisitos de ponderação:
É necessário que o estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade
Tais expectativas devem ser legítimas e fundadas em boas razões
Devem os privados ter feitos planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do ‘’comportamento’’ estadual
É necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação da expectativa.
Prof. Sérgio Vasques: um fenómeno diferente da retroactividade da lei fiscal (produz-se quando a lei dispõe sobre factos tributários passados, seja aqueles que se formaram já por completo, seja aqueles cuja formação se encontra ainda em curso) é o da retrospectividade da lei fiscal – ocorre quando a lei nova, dispondo embora quanto a factos futuros, lesa expectativas fundadas no passado. Embora o problema subjacente as leis fiscais retroactivas é na substancia o mesmo que subjaz as leis fiscais retrospectivas, ou seja um problema de tutela das expectativas legitimas dos contribuintes o que sucede é que valendo a lei para o futuro, esse problema coloca-se aqui com uma maior subtileza mostrando-se a lesão das expectativas dos contribuintes à partida menos gravosa e merecedora de protecção. O direito não pode tutelar uma qualquer expectativa dos contribuintes no sentido de que as leis tributárias se mantenham inalteradas ao longo do tempo, ainda que tutele a expectativa de que a alteração dessas leis apenas valham para o futuro. O fenómeno da retrospectividade pode manifestar-se em circunstancias diversas: criação ou agravamento de impostos ou eliminação de benefícios.
Sérgio Vasques: ao passo que a retroactividade, forte ou fraca, é por princípio proibida,
exigindo-se uma ponderação deste tipo para que possamos excepcionalmente admitir, a
retrospectividade é por princípio permitida, exigindo-se uma ponderação deste tipo para
que a consigamos excepcionalmente invalidar.
(b) À medida que o ano decorre e chegando ao fim do ano, todas as
pessoas criam uma expectativa que as alterações sejam apenas
aplicáveis a partir de Janeiro do ano seguinte com o novo OE – terá de
haver uma razão de interesse publico que justifique. Nesta caso o
requisito do interesse público justificava uma aprovação tardia do OE?
Não. ‘’ E faria diferença o facto de as medidas fiscais aprovadas tardiamente terem sido apresentadas publicamente pelo governo ainda em 2010?’’ na medida em que as expectativas se fundam no facto de terem sido publicamente apresentadas.
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