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Direito das Obrigações Ano Lectivo 2007/08 Cumprimento das Obrigações

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Page 1: Direito das Obrigações Ano Lectivo 2007/08 Cumprimento das Obrigações

Direito das Obrigações Ano Lectivo 2007/08

Cumprimento das Obrigações

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1. A propósito da realização da prestação

colocam-se diversas questões:

- Quem deve e quem pode prestar?

- A quem deve ser feita a prestação?

- Onde deve ser feita?

- Quando?

- Quando há vários débitos, como saber a qual

respeita certa prestação?

- Que efeitos produz?

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2. Antes de responder a estas questões interessa

colocar uma outra: O que se entende

por cumprimento?

O cumprimento dá-se com a realização da prestação devida:

art.762º/1: [o] devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está

vinculado

“O cumprimento é a realização voluntária da prestação debitória” (AV)

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- à realização da finalidade da obrigação

O cumprimento é a forma mais frequente de extinção das obrigações.

Corresponde à “vida normal” da obrigação: credor vê o seu interesse satisfeito e devedor vê-se desobrigado

- ao fim da obrigação (o cumprimento extingue a

obrigação)

Cumprimento corresponde:

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“É o acto culminante da vida da relação credititória, como consumação do sacrifício

imposto a um dos sujeitos para realização do interesse do outro”

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Cumprimento é diferente de desoneração:

o devedor pode ficar desonerado sem ter cumprido;quando cumpre, o devedor fica desonerado

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3. Que princípios (ou regras?) norteiam

o cumprimento?

Tradicionalmente…

BOA FÉ

Pontualidade

Integralidade

Concretização

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Princípio da boa fé

Art. 762º/2

boa fé como regra de conduta (boa fé objectiva), que vincula devedor e credor

e permite encontrar regras objectivas para resolver dúvidas relacionadas com:

- deveres de prestação (secundários)- deveres acessórios de conduta

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Pontualidade(regra ou princípio...)

Art.406º/1: (contratos, mas vale para todas as obrigações)

“cumprimento ponto por ponto”:- proibição de alteração unilateral da prestação

devida

- devedor não pode invocar situação precária em que

o cumprimento o deixará (não vale beneficium

competentiae)

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Integralidade

(corolário da regra da pontualidade...princípio ou regra)

A prestação debitória deve ser integralmente cumprida e não por partes;

logo, credor não pode ser obrigado a aceitar o cumprimento parcial

Supletividade (crf. ex. art.781º, art.934º): solução diversa pode resultar de lei ou usos (cfr. boa fé)

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Concretização

A vinculação do devedor deve ser concretizada numa conduta real e efectiva,

transpondo a vinculação do plano deontológico, para o plano ontológico: passa-

se do dever ser ao ser

Como?- pressupostos do cumprimento

- disciplina da forma de realização (tempo, lugar...), determinação dos efeitos concretos

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Actualmente…tudo isto pode ser reduzido, com vantagens a dois

princípios essenciais:

• CONFORMIDADE

• BOA FÉ

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4. Requisitos do cumprimento

i.Capacidade: do devedor art.764º/1 do credor art.764º/2

ii. Legitimidade do devedor para dispor do objecto da prestação art.767º/1

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5. Legitimidade

- Quem deve/pode prestar? (legitimidade activa) regra: todos - art.767º/1 – devedor e qualquer

terceiro: credor não pode recusar prestação oferecida por 3º (cfr.768º/1 e 813º); credor pode recusar (768º/2 -592º/1 “interesse directo do terceiro na satisfação do crédito”) excepção: prestação infungível (art.767º/2)Consequência de falta de legitimidade: não extinção da obrigação

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- A quem deve ser feita a prestação? (legitimidade passiva)

Art.769º:- ao credor- ao representante do credor (se o credor for incapaz, necessariamente ao seu representante)

Consequência de realização da prestação a terceiro: não extinção da obrigação (art.770º) suposto cumprimento é ineficaz nova prestação poderá ser exigida; autor da prestação pode exigir restituição com base em enriquecimento sem causa – art.472º/2

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6. Lugar do cumprimentoPrincípio geral: liberdade das partes na fixação

(expressa ou tácita – art.217º)) do lugar do cumprimento –

art.772º/1 contém regra supletiva (“na falta de

disposição ou disposição especial da lei”)

Regra geral supletiva: domicílio do devedor (art.772º/1)

E se o devedor mudar de domicílio entre o momento da constituição da obrigação e o momento do cumprimento?• art.772º/2 (mudança de domicílio do devedor: obrigações de colocação)• art.775º (mudança de domicílio do credor: obrigação de colocação convertida em obrigação de entrega a menos que o credor indemnize o devedor do prejuízo)

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Princípios subjacentes às soluções legais:

- protecção do devedor ou favor debitoris (arts.772º/1, 775º);- equilíbrio das posições e não prejuízo para as partes (772º/1 e 775º)

Princípios tributários, em última análise, do princípio da boa fé, na vertente da tutela da confiança (necessidade de protecção de legítimas expectativas)

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Outros regimes supletivos (arts. 773º a 774º):

• art.773º: entrega de coisa móvel (determinada ou genérica) – lugar onde a coisa se encontrava ao tempo da conclusão do negócio (equivale a uma obrigação de colocação)

• art.774º: obrigações pecuniárias – lugar do domicílio que o credor tiver ao tempo do cumprimento (equivale a uma obrigação de entrega)

Mas há ainda regimes especiais (o art.772º/1 ressalva disposições especiais da lei...):

Por exemplo: arts. 885º (preço), 1039º (renda), 1195º(restituição de coisa móvel depositada)

(Perante a importância destes casos pode-se afirmar que a regra geral supletiva do art.772º/1 é meramente aparente?)

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E se a impossibilidade da prestação ocorre relativamente ao local já designado pelas regras

supletivas?

As disposições supletivas dos arts. 772º a 774º ainda se aplicam numa outra situação:

quando a prestação for impossível ou se tornar impossível no lugar fixado para o cumprimento e não houver fundamento para considerar a obrigação nula ou extinta (art.776º)Ex: casa que havia de ser pintada ruiu – não se aplica o preceito porque a obrigação extingiu-se (art.790º)

Duas soluções: - integração do negócio (art.239º)

- fixação pelo tribunal (art.777º/2, por analogia)

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7. Tempo do cumprimentoDuas questões podem ser colocadas:

2. Quando é que a obrigação tem de ser cumprida?

Ou seja, quando é que o credor por exigir que o devedor cumpra sob pena de este entrar em mora?

1. Quando é que a obrigação pode ser cumprida?

Ou seja, quando é que o devedor pode cumprir e o credor tem de aceitar, sob pena de entrar em mora?

A questão 1 prende-se com a chamada “pagabilidade” do débito

e 2 com a “exigibilidade” ou “vencimento”

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Normalmente as partes, quando contratam, só se preocupam em estipular o vencimento do débito, raramente se preocupando com o momento a partir do

qual o devedor pode impor ao credor o cumprimento.

E a lei?

A lei trata supletivamente de ambas as situações nos arts. 777º e ss.

- obrigações puras: cumprimento pode ser realizado ou exigido a todo o tempo (art.777º/1)Corresponde à regra geral supletiva (se nada for dito em contrário ou resultar da natureza da obrigação, ela é pura e segue o regime do art.777º1; o devedor só entra em mora depois de interpelado – art.805º/1))

- obrigações a prazo: já constituídas (o que diferencia das condicionais), mas a exigibililidade do cumprimento ou possibilidade de realização são diferidas para momento posterior

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2. A natureza da prestação ou as circunstâncias que a determinaram ou os usos o impõem (na falta de acordo, prazo é fixado pelo tribunal – art.777º/2 e 1456º e 1457º do CPC)

Obrigações a prazo porque:

1. A lei ou as partes fixaram prazo (obrigações de prazo certo – o devedor constitui-se em mora com o decurso do prazo- art.805º/2/a);

Mas as partes podem ainda combinar que o prazo será fixado por uma delas, credor ou devedor...

Credor: se não fixar, tribunal pode requerer ao devedor, que fixa (art.777º/3)

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- obrigações cum potuerit (devedor cumpre quando puder: factor objectivo - devedor tem os meios económicos necessários para a realização da prestação – art.778º/1)

Devedor:

- obrigações cum voluerit (devedor cumpre quando quiser: factor puramente subjectivo – prestação só pode ser exigida aos herdeiros – art.778º/2 – o que equivale a um prazo incerto que coincide com a vida do devedor

A possibilidade de a prestação ser realizada ou exigida em momento posterior ao da constituição da obrigação constitui

um benefício. A quem cabe o benefício do prazo?

Por regra, ao devedor (art.779º)

Mas há excepções. Ex.: arts. 1194º (depósito) ou 1147º (mútuo oneroso)

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Porque quem tem o benefício do prazo pode renunciar a ele:

- devedor pode cumprir antes do decurso do prazo (embora não esteja obrigado), sem que o credor a tal se possa opor, sob pena de entrar em mora - art.813º (dívida é pagável, mas não exigível)

Porque é importante definir o titular do benefício do prazo?

- credor pode exigir a prestação a todo o tempo, mas o devedor só pode cumprir no final do prazo (dívida é exigível, mas não pagável) - ex. art.1194º

- credor e devedor estão impedidos de determinar a antecipação do cumprimento se o prazo foi estabelecido em benefício de ambos (decurso do prazo determina exigibilidade e pagabilidade)

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O benefício do prazo mantém-se sempre?

Não: há situações que determinam a perda do benefício do prazo

Em relação ao devedor (situações que põem em causa a confiança do credor no devedor ou na sua solvabilidade):

- diminuição (minimamente relevante) das garantias do crédito ou não prestação das garantias prometidas, por causa imputável ao devedor (art.780º) (mas credor pode antes, em caso de culpa do devedor, pedir substituição ou reforço das garantidas - 780º/2)

- nas dívidas a prestações, não realização pelo devedor de uma prestação (art.781º, mas 934º!) (diferente de prestações periódicas)

- insolvência do devedor (ainda que não tenha sido judicialmente declarada (art.780º) (cfr. novo CIRE)

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A perda do benefício do prazo tem carácter pessoal

Art.782º

Logo, não se estende a:

condevedores, terceiros garantes

Pelo que o credor terá de esperar o

vencimento normal para exigir

cumprimento aos condevedores (claro que

em caso de obrigações solidárias, restantes

devedores também podem entrar em insolvência)

ou terceiros garantes (mas cfr. art.701º/2 in

fine ou art.678º)

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8. Imputação do cumprimento

O que fazer quando há várias dívidas e a prestaçãoefectuada não chega para extinguir todas?

Regra: é o devedor que decide a que dívida imputa a

prestação - art.783º/1

Limites (em prol do interesse do credor) art.783º/2:

- se prazo estabelecido em benefício do credor (ou de

ambos), devedor não pode optar por dívida ainda

não vencida

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- se credor pode recusar pagamento parcial, devedor

não pode impor ao credor imputação do

cumprimento em dívida de valor superior ao da

prestação efectuada (princípio da integralidade)

- devedor não pode imputar em dívida de capital, seobrigado a despesas, indemnização moratória ou

juros (porque tal comprometeria montante de juros futuros...)

E se o devedor não efectuar a designação?

Aplicam-se regras supletivas do art.784º (não é ocredor que decide...): no limite, rateio de todas as

dívidas (sem prejuízo de regime de insolvência...)

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9. Efeitos do cumprimentoEm relação ao credor:

- extinção do crédito

Em relação ao devedor:- Normalmente (cfr.589º), liberação da obrigação

Em relação ao terceiro, que presta:

várias situações podem ser configuradas: doaçãoindirecta do terceiro ao devedor)?; transmissão do créditopara o terceiro (589º); direito a reembolso de despesas emcaso de gestão ou mandato (464º, 1157º); restituição deenriquecimento por prestação (477º ou 478º) ou pordespesas em caso de pagamento de dívida alheia nãoenquadrável nos arts. referidos (acção contra o devedor)

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10. Prova do cumprimento

Quem tem de provar o cumprimento?

Por regra, o devedor (art.342º/2- factoextintivo do direito do credor)

Como pode ser provado o cumprimento?

Não pode ser provado por testemunhas (art.395º) Modo mais comum de prova é através de declaração de quitação: declaração escrita do credor de que recebeu a prestação em dívida É um direito de todo aquele que cumpre (787º)

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A lei estabelece presunções de cumprimento:art.786º/ 1, 2 e 3

Lei estabelece também as prescrições presuntivas(arts. 312º ss.): arts. 316º e 317º (lei presume que jáocorreu cumprimento em virtude de ter decorrido certo

prazo sobre a constituição da obrigação)

Direitos do devedor (para além do direito à

quitação):- restituição do documento, no caso da obrigaçãoaparecer referida a certo documento (art.788º/1;cfr. 788º/3 e 789º)

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11.Natureza jurídica do cumprimento

É muito discutida: contrato, negócio jurídico

unilateral, acordo sobre o fim das prestação,

realização final da prestação, realização real

da prestação?

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Art. 762º/1: aponta para a teoria da realização

real da prestação (para o cumprimento basta o

acto de prestar que de forma objectivamente

reconhecível corresponda à prestação devida; lei

não exige declaração negocial nem actuação

finalisticamente orientada: “O devedor cumpre a

obrigação quando realiza a prestação a que está

vinculado”

Generalidade da doutrina portuguesa perfilhaesta posição.