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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DIFERENÇAS ENTRE A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO JULIETTE MOSER Autorizo que a presente Monografia seja apresentada e defendida em Banca Pública Orientador(a) Itajaí, __/__/_____ Itajaí, Novembro 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DIFERENÇAS ENTRE A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO

JULIETTE MOSER

Autorizo que a presente Monografia seja apresentada e defendida em

Banca Pública

Orientador(a)

Itajaí, __/__/_____

Itajaí, Novembro 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DIFERENÇAS ENTRE A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NO ORDENAMENTO JURÍDICO

BRASILEIRO

JULIETTE MOSER

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientadora: Professora: Fernanda Sell de Souto Goulart

Itajaí(SC), novembro de 2010.

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2

AGRADECIMENTO

Gostaria de deixar um agradecimento àquelas pessoas que me

apoiaram e me auxiliaram na minha graduação, assim como

nessa monografia. Aos meus pais pelo incentivo, e dedicação,

por não medirem esforços para que eu pudesse concluir este

curso. Agradeço aos professores e a minha orientadora

Professora Fernanda Sell de Souto Goulart que me auxiliou no

desenvolvimento da pesquisa. Aos meus amigos da faculdade

e ao meu namorado que foram grandes companhias, dentro e

fora de sala e que continuarão fazendo parte dessa história.

.

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3

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho primeiramente a Deus, pois sem Ele, nada

seria possível. E aos meus pais Sérgio e Sivonete, pelo

esforço, dedicação e compreensão, em todos os momentos

desta e de outras caminhadas. Amo muito vocês.

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4

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 22 de novembro de 2010

Juliette Moser Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduada Juliette Moser, sob o título Diferenças

entre a Sucessão do Cônjuge e do Companheiro no Ordenamento Jurídico

Brasileiro, foi submetida em 22 de novembro de 2010 à banca examinadora

composta pelos seguintes professores: Fernanda Sell de Souto Goulart (Presidente)

e Aparecida Correia da Silva (Examinadora), aprovada com a nota_____

(_________).

Itajaí, novembro de 2010.

Prof.ª. Fernanda Sell de Souto Goulart Orientador e Presidente da Banca

Prof.: MSc.:Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Casamento

È o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da

mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem as suas relações sexuais,

cuidarem da prole comum e se prestarem mutua assistência.·.

Família

Família é o conjunto de pessoas com o mesmo domicilio ou residência, e identidade

de interesses matérias e morais, integrado pelos pais casados ou em união estável,

ou por um deles e pelos descendentes legítimos, naturais ou adotados.·.

Herdeiros Legítimos

Os herdeiros legítimos, que constituem aqueles nomeados pela lei, ou os que a lei

elege para receberem a herança, seguindo uma ordem de preferência, existem três

classes que impõe o limite para testar em até cinquenta por cento do acervo

deixado: os descendentes, as ascendentes e o cônjuge. Os demais, que são

colaterais, consideram-se facultativos, pois não esta a pessoa, quando testar,

obrigada a reservar uma parte de seu patrimônio para eles.·.

Herdeiros necessários

A lei impede o testador, que tiver descendentes, ascendentes, ou cônjuge, de dispor,

por testamento, de mais da metade de seus bens, pois, tendo em vista à proteção

daqueles parentes e do cônjuge, defere-lhes, de pleno direito, a outra metade, que

se denomina reserva ou legitima desses herdeiros.·.

Herdeiros testamentários

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7�

È a classe como sendo aqueles indicados como beneficiários da herança por

disposição de ultima vontade do testador1.

Legatários

Legatário não é o mesmo que herdeiro, uma vez que aquele somente sucede por

testamento e o titulo singular. Significa que o legatário recebe determinado bem,

certo e individualizado.·.

Sucessão

A ideia de sucessões sugere, genericamente, a de transmissão de bens, pois implica

a existência de um adquirente de valores, que substitua o antigo titular. Assim, em

tese, a sucessão pode operar-se a titulo oneroso, inter vivos ou causas mortis.

Todavia, quando se fala em direito das sucessões entende-se, apenas a

transmissão em decorrência de morte, excluindo-se, portanto, do alcance da

expressão, a transmissão de bens por ato entre vivos.·.

Sucessão Legitima

Sucessão legitima é deferida por lei, mas em termos tais que as pessoas por estar

designados como sucessores só serão efetivamente se o de cujus nada houver

disposto em sentido contrário.2

Sucessão testamentária

È Sucessão testamentária, a sucessão que se processa de acordo com a vontade

do titular do patrimônio. Possui ele liberdade de dispor quando à partilha dos bens

que ficarão após sua morte.·.

União Estável

È a união entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, continua e

duradoura, com objetivo de constituição de família.·.

1CAHALI, José Francisco. Curso de Direito civil: direito das sucessões, p.56.

2Telles, Inocêncio Galvão, citado por Arnaldo Rizzardo. Direito das sucessões. Rio de Janeiro:

Forense, 2005, p.07

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SUMÁRIO

RESUMO..........................................................................................XIII

INTRODUÇÃO .................................................................................... 9

CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL .................................................. 14

1.1 CONCEITO DE CASAMENTO. ..................................................................... 15

1.2 CONTEXTO HISTÓRICO ............................................................................... 16

1.2.1Efeitos Jurídicos do Casamento (Código Civil De 1916). ....................... 17 1.2.2Direitos e deveres conjugais .................................................................... 18

1.3EFEITOS DO CASAMENTO ........................................................................... 19

1.4 CONCEITO DE UNIÃO ESTÁVEL ................................................................ 22

1.4.1Prova da união estável............................................................................... 24 1.4.2Deveres dos Companheiros ..................................................................... 24 1.4.3Contexto Histórico: União estável antes do novo Código Civil ............. 25 1.4.4União Estável: Requisitos e Efeitos ......................................................... 25 1.4.5A união estável no código civil ................................................................ 30

SUCESSÕES .................................................................................... 38

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9� 2.1DA SUCESSÃO EM GERAL .......................................................................... 38

2.1.1Momento da Transmissão da herança – Da Abertura da sucessão ...... 38

2.2O DIREITO DAS SUCESSÕES NO CÓDIGO CIVIL ...................................... 41

2.2.1Fundamentos legais ................................................................................... 42 2.2.2 Espécies de sucessão causa mortis: legítima e testamentária ............ 42 2.2.3Termos básicos .......................................................................................... 44

2.3 VOCAÇÃO HEREDITÁRIA ............................................................................ 45

2.4 FORMAS DE SUCESSÃO LEGÍTIMA ........................................................... 47

2.4.1Descendentes ............................................................................................. 48 2.4.2Natureza da filiação: igualdade ................................................................ 50 2.4.3Ascendentes ............................................................................................... 50 2.4.4 Cônjuge: meação e herança ..................................................................... 51

2.5 TESTAMENTO .............................................................................................. 53

2.5.1 Conceito e Definição ................................................................................ 53 2.5.2Breve Escorço Histórico ........................................................................... 53 2.5.3 Considerações sobre a sucessão testamentária no Código Civil ........ 55 2.5.4Conceito do Testamento Público .............................................................. 57 2.5.5 Os Requisitos para sua feitura....................................................................57

DIFERENÇA DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO·. 61

3.1A SUCESSÃO DO CÔNJUGE NO CÓDIGO CIVIL ........................................ 61

3.2A SUCESSÃO DO COMPANHEIRO NO CÓDIGO CIVIL. ............................. 64

3.2.1A sucessão do companheiro sobrevivente .............................................. 64

3.3A DESIGUALDADE ENTRE COMPANHEIRO E CÔNJUGE ......................... 66

3.4A SUCESSÃO DO COMPANHEIRO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 .... 75

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 81

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................... 83

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x�

RESUMO

O presente trabalho, denominado de Monografia submetida à

Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial a obtenção do grau

de Bacharel em Direito, cujo título é a DIFERENÇA DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE

E DO COMPANHEIRO, que visa demonstrar os aspectos e fundamentos que

diferenciam a união estável e o casamento no direito sucessório, com fulcro

Constituição Federal de 1988 e regulamentada pelas leis Especiais 8.971/94,

9.278/96 e pelo Código Civil, bem como apontar o conceito de casamento, contexto

histórico, seus efeitos jurídicos, os direitos e deveres conjugais, efeitos do

casamento e também o conceito de união estável, a prova para a caracterização de

união estável, os deveres do companheiro, o contexto histórico, assim como seus

requisitos e efeitos, e a visão da união estável no código civil. O Segundo Capítulo

será abordado o momento da transmissão da herança, abertura da sucessões, o

direito das sucessões no codigo civil, seu fundamento legal, espécies de sucessões

causa mortis: legitíma e testamentaria, vocação hereditária, formas de sucessões

testamentarias, ascendentes e descendentes, meação e herança, testamento e seu

conceito e definição e requisitos.No Terceiro Capítulo será abordado a diferença da

sucessão do conjuge e do companheiro, sendo aborado que na ordem de vocação

hereditária é evidente a não inclusão do companheiro, notando-se a inferioridade em

que é colocado dieante do cônjuge. Na concorrência com os demais parentes

sucessíveis também é notória a diferença do tratamento que o companheiro recebe

aos demais parentes.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto diferenciar a sucessão

do companheiro e do cônjuge no ordenamento civil brasileiro através de estudo

realizado na legislação e na doutrina, e como objetivo institucional produzir uma

Monografia para obtenção do Título de Bacharel em Direito, pela Universidade do

Vale do Itajaí – UNIVALI; Geral, pesquisar acerca do Direito Sucessório dos

Companheiros e do Cônjuge, bem como as alterações trazidas pelo atual Código

Civil e específicos, investigar, interpretar e discorrer sobre as mudanças vistas na

evolução histórica do casamento e da união estável; pesquisar sobre a sucessão de

uma modo geral, abordando a ordem de vocação hereditária, as formas previstas de

sucessões e de seus herdeiros.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de Casamento

e União Estável para assim chegar-se aos respectivos conceitos; em seguida

abordar suas características, direitos e deveres do cônjuge e prova da união estável

e por fim a evolução histórica.

No Capítulo 2, tratando será abordado o direito sucessório,

começando pelo momento da transmissão da herança, e a abertura das sucessões,

seu fundamento legal, para assim chegar às espécies de sucessões, e em seu

escorço histórico.

No Capítulo 3, tratando da Diferença na sucessão do Cônjuge

e do companheiro, destacando primeira mente a sucessão do cônjuge, em seguida a

do companheiro e logo após um breve comparativo por meio de gráficos

autoexplicativos.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

1. O casamento é a união legal entre homem e mulher, com a

finalidade de constituir família. A união estável também é a

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união entre homem e mulher, com a finalidade de constituir

família, no entanto, só é caracterizada se a convivência for

publica, continua e duradoura.

2. No que discorre sobre direito sucessório, o companheiro

participara da herança somente quando aos bens

adquiridos onerosamente durante a união, conforme dispõe

o artigo 1.790 do Código Civil, não sendo, portanto aplicado

a regra contida no artigo 1.725 do mesmo diploma legal, o

qual aplica a união estável o regime de comunhão parcial

de bens.

3. A lei empresta tratamento desigual ao casamento e a união

estável no âmbito do direito sucessório. Ainda que

assegurado a cônjuges e companheiros o direito de

concorrer com descendentes e ascendentes, este privilégio

esta previsto em dispositivos legais distintos e tanto o

cálculo com a base de incidência são diferentes.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre as

diferenças entre sucessão do cônjuge e do companheiro no ordenamento civil

brasileiro.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação3 foi utilizado o Método Indutivo4, na Fase de Tratamento de Dados o

3 ―[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

4 ―[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção

ou conclusão geral [...]‖. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

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13

Método Cartesiano5, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva.

CAPÍTULO 1 NAS DIVERSAS FASES DA PESQUISA,

FORAM ACIONADAS AS TÉCNICAS DO

REFERENTE6, DA CATEGORIA

7, DO

CONCEITO OPERACIONAL8 E DA

PESQUISA BIBLIOGRÁFICA9.·.

CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL

1.1 CONCEITO DE CASAMENTO.

È o casamento a mais importante e poderosa de todas as

instituições de direito privado, por ser uma das bases da família, que é a pedra

angular da sociedade. Logo, o matrimônio é a peça chave de todo o sistema social,

constituindo o pilar do esquema moral, social e cultural do país. 10

5 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE,

Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

6 ―[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o

alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.‖ PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

7 ―[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.‖ PASOLD,

Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

8 ―[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita

para os efeitos das idéias que expomos [...]‖. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

9 ―Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar

Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

10 E. Espindola, A Família no direito civil brasileiro, p.239; apud DIAS, Maria Berenice, Manual de

direito das Famílias- 3. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p.40.

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14

O casamento é o vinculo jurídico entre o homem e a mulher

que visa o auxilio mutuo material e espiritual, de modo que haja uma integração

fisiopsíquica e a constituição de uma família11.

Casamento tanto significa o ato de celebração do matrimonio

como a relação jurídica que dele se origina: a relação matrimonial. O sentido da

relação matrimonial melhor se expressa pela noção de comunhão de vidas, ou

comunhão de afetos. O ato casamento cria um vinculo entre os noivos, que passam

a desfrutar do estado de casados. A plena comunhão de vida é o efeito por

excelência do casamento. Além de esclarecer a sociedade conjugal e proceder á

alteração do estado civil dos cônjuges, gera dois vínculos: a) vinculo conjugal entre

os cônjuges; b) vinculo de parentesco por afinidade, ligando um dos cônjuges aos

parentes do outro.

Ocorre a alteração do estado civil dos consortes, que, de

solteiros, passam á condição de casados. O casamento é uma relação complexa,

assumindo o par direitos e deveres recíprocos que acarretam sequelas não só no

âmbito pessoal a identificação do estado civil serve para dar publicidade á condição

pessoal e também a situação patrimonial, destinando-se a proporcionar segurança a

terceiros.·.

O casamento, entendido como união legal entre o homem e a

mulher, com o intuito de compartilharem suas vidas, recebeu do legislador

tratamento diferenciado das demais espécies de família, no sentido da exigência

solene para sua validade no contexto social.·.

1.2 CONTEXTO HISTÓRICO

Até o advento da Republica, em 1889, a única forma de

casamento era o religioso, tanto para os católicos como para o não católicos. O

casamento civil surgiu em 1891. O conceito de família, identificado com o casamento

indissolúvel, mereceu consagração em todas as Constituições Federais.···.

11

DIAS, Maria Berenice, Manual de direito das Famílias. p. 40.

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15

Quando da edição do Código Civil de 1916, era de tal ordem a

sacralização família, que havia um único modo de se constituir: pelo casamento. A

família tinha viés patriarcal, e as regras legais refletiam esta realidade. Somente era

reconhecida a família ungida pelos sagrados laços do matrimonio. Não havia outra

modalidade de convívio aceitável. O casamento era indissolúvel. A resistência do

estado em admitir relacionamentos outros era de tal ordem que a única possibilidade

de romper com o casamento era o desquite, que não dissolvia o vinculo matrimonial

e impedia novo casamento.

Mesmo com o advento da Lei do Divorcio, a visão do

matrimonio e da família permaneceu. O desquite transformou-se em separação,

passando a existir duas formas de romper o casamento: a separação e o divorcio.

Na tentativa de manutenção da família , ainda era exigido o decurso de longos

prazos, ou a identificação de um culpado pela separação, o qual não podia intentar a

ação para dar um fim ao casamento. A perda do direito a percepção de alimentos e

a exclusão dos apelidos do marido eram penalidades que atingiam o culpado pela

separação. Também se sujeitava a tais penalidades quem simplesmente tomava a

iniciativa da ação de separação, mesmo sem a identificação de responsabilidades.·.

Mas nova realidade se impôs, acabando por produzir profunda

revolução na própria estrutura social. Tornou-se tão saliente o novo perfil da

sociedade, que a Constituição de 1988alargou o conceito de família para além de

casamento. Passou a considerar como entidade familiar relacionamentos outros. Foi

assegurada especial proteção tanto aos vínculos monoparentais – formados por um

dos pais com os seus filhos – como a união estável – relação de um homem e uma

mulher não sacralizada pelo matrimonio. Com isso deixou de ser o casamento o

único marco a identificar a existência de uma família12.

1.2.1 Efeitos Jurídicos do Casamento (Código Civil De 1916).

Relevantes os efeitos jurídicos dessa união familiar, nos

aspectos pessoal, social e patrimonial. São pessoais os efeitos quanto á conduta

dos cônjuges por mútuos deveres de fidelidade, coabitação, assistência e criação

dos filhos. Sociais se caracterizam os efeitos atinentes á posição do cônjuge no

12

DIAS, Maria Berenice, Manual de direito das Famílias. p. 127-128.

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16

meio familiar e comunitário, com alteração de seu estado civil e reflexos parentais ou

de afinidade com alteração de seu estado civil e reflexos parentais ou de afinidade

com os elementos do grupo (ressalvando que a afinidade na linha reta persiste

mesmo com a dissolução do casamento que a originou). Por fim, verificam-se efeitos

de caráter patrimonial, decorrentes do regime de bens que instaura com o

casamento e dos direitos na sucessão hereditária.·.

Nesse contexto de pessoas casadas, homem e mulher se

unem em projeto de vida comum e adquirem novo status dentro da sociedade,

passando de solteiros a casados. Se incapazes em razão da menoridade (abaixo de

21 anos, segundo o CC/16, ou de 18 anos, conforme o Código Civil), emancipam-se

ao contrair núpcias. Assumem direitos e deveres recíprocos: vida em comum,

fidelidade, assistência, guarda, sustento e a criação dos filhos. Formam uma

sociedade conjugal em plano igualitário (art. 266, § 5º da CF/1988), cessadas as

anacrônicas distinções entre o homem, como ―chefe‖ (art. 233 do CC/1916), e a

mulher, na figuração secundária de polivalente ―colaboradora, companheira e

consorte‖ (art.240 do CC/1916).·.

1.2.2 Direitos e deveres conjugais

Homens e mulheres assumem mutuamente a condição de

consorte, companheiros e responsáveis pelos encargos da família (art. 1.565 Código

Civil).·.

A tônica do Código Civil de 2002 é a igualdade de direitos e

deveres entre maridos e mulher, por isso que o art.1.565 do CC/2002 teve uma

inovação importante, na esteira de incipiente jurisprudência que já vinha estendendo

aquele direito ao homem, em sobre passo á relação restritiva do art. 240, paragrafo

único do Código Civil de 1916, que só menciona em favor da mulher a acréscimo do

apelido do cônjuge. A regra de isonômica tem respaldo solene disposição da

Constituição Federal de 1988(CF/88), conforme expresso em seu art. 226, § 5º. É a

consagração da igualdade no plano familiar, em reforço a vedação constitucional de

qualquer espécie de preconceito (art. 3º, inciso IV) e aos direitos fundamentais

cuidados no art. 5º, caput, e seu inciso I.·.

Nota-se a preocupação em extirpar o tratamento jurídico

diferenciado que o código de 1916 estabeleceu entre os cônjuges, bastando lembrar

que seu art. 233 ainda se referiu ao marido como ―chefe‖ da sociedade conjugal, e o

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17

art. 240, originalmente, classificava a mulher como ―auxiliar‖, e com a reforma da Lei

4.121/62 deu-lhe promoção para ―assistente‖, mas conservando a submissão

feminina, uma vez que sua incumbência restringia-se a velar pela direção material e

moral da casa.·.

Cumpre ressaltar, no entanto, que o conceito de igualdade,

repisado com ênfase na constituição e no novo código civil, há de ser interpretado

em consonância com as naturais diferenças existentes entre homem e mulher. Bem

o diz RODRIGO DA CUNHA PEREIRA13, em acertada analise do exigível tratamento

adequado e próprio a cada um dos cônjuges, respeito as evidentes diferenças

individuais, aqui realçadas pela diversidade de sexos, a fim de que se alcance

efetiva igualação na aplicação do direito.

Sustenta o advogado e jurista mineiro que ―para se pensar a

cidadania, hoje, há que se substituir o discurso da igualdade pelo discurso da

diferença?‖. E que certas discriminações ―são positivas, pois constituem, na

verdade, preceitos compensatórios como solução para superar as diferenças‖.·.

1.3 EFEITOS DO CASAMENTO

A Matéria, no Código Civil (C.C), está disposta a partir do artigo

1.511, que expressamente prevê:

O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade entre cônjuges, deixando para trás – completamente – a figura do homem como elemento central na organização familiar, incluindo necessariamente a mulher em sua estruturação familiar.

Para o estudo da matéria, inicialmente cumpre destacar

questionamento que ainda suscita discussão entre os autores relativamente á

natureza jurídica do casamento. Seria o casamento um contrato, nos moldes do

negocio jurídico do casamento. Ou possui características especiais, que o tornaria

um contrato sus generis ? Ou ainda, seria uma instituição a qual apenas cabe aos

nubentes aderirem, escolhendo o regime de bens quando possível?

13

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A desigualdade dos gêneros, o declínio do patriarcalismo e as discriminações positivas. apud. OLIVEIRA, Euclides de. União Estável. do concubinato ao casamento, antes e depois do código civil.

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18

Primeiramente, avulta fixar-se o casamento como instituição

publica ou privada. De acordo com CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA,

(...) Ponto que sem dúvida reúne todos os vistos de uma vexata quaestio é a determinação da natureza jurídica do casamento, a começar se é um instituto de direito privado ou de direito público.·.

Direito Público visa disciplinar os interesses gerais da

coletividade. Diz respeito à comunidade, estruturando-lhe organização, tutela dos

direitos individuais e repressão aos delitos. Direito Privado é o que regula as

relações dos indivíduos entre si.

Nesse sentido, as normas relativas ao matrimônio são de

ordem pública, ou seja, a legislação matrimonial plana acima das convenções

particulares. Assim, leis de ordem pública são aquelas cuja observância se torna

necessária ao interesse geral; são aquelas que interessam mais diretamente à

coletividade que aos particulares.

Carlos Maximiliano assevera:

Consideram-se de ordem pública as disposições que se enquadram nos domínios do Direito Público (...) Recrudesce a dificuldade na fixação das espécies quando se trata de disposições de ordem pública incluídas nos domínios do Direito Privado: aquelas em que visivelmente predomina o objetivo de tutelar o interesse geral, e subordinado e ele se deixa o do individuo. Tais são as normas que têm por objeto fixar o estado das pessoas, a capacidade ou incapacidade, os direitos e deveres que mesmo procedem, regular bens na sua divisão e qualidade, ou a forma e validade dos atos, e salvaguarda o interesse de terceiros.14

A doutrina abalizada, concatenada com esta realidade entende

ser o casamento instituição de direito público, posto que salvo poucas opções

volitivas, previstas expressamente no direito positivo, como o regime de bens ou o

nome, as demais regras do matrimonio são regulamentadas, em todos os termos,

por normas de ordem pública, cujos contraentes não podem alterá-las ao seu

talante, dado que suas finalidades e sua função tocam diretamente o interesse

público15.

14

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito, p.217. 15

Nesse sentido Alberto Trabucchi, Instituzioni n. 107 apud PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito, p.37.

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19

O casamento, para a sociedade, constitui-se em evento solene,

que objetiva ―sacramentar‖ o enlace dos noivos, dentro das normas estabelecidas

pelo Estado, que comportam as formalidades do processo de habilitação e a própria

celebração do matrimônio.

Todavia, a natureza jurídica do casamento, mesmo entre

autores clássicos, suscita grande polêmica, decorrendo a formação de três correntes

as quais procuram explicar sua natureza.

A concepção clássica, também chamada de individualista,

encontra no casamento uma relação puramente contratual, resultante do acordo de

vontades. Originada no direito Canônico, vê no casamento um contrato, observando

a indispensável declaração convergente de vontades livremente manifestadas à

obtenção de finalidades jurídicas.16

A doutrina institucional, também denominada supra

individualista, sustenta que o casamento é uma grande instituição social, a ela

aderindo os que se casam. Em razão disto, o casamento seria o conjunto de normas

imperativas, que tem por finalidade dar à família uma organização social e moral

correspondente às aspirações atuais e à natureza permanente do homem. Surge,

portanto, da vontade das partes, mas cujas normas, efeitos e formas encontradas

são preestabelecidos pela lei.·.

De outro lado, a terceira corrente, a eclética, considera o

casamento um ato complexo: contrato especial, do Direito e Família mediante a qual

os nubentes aderem à uma instituição pré-organizada, alcançando o estado

matrimonial. Assim, seria concomitantemente contrato (na formação) e instituição

(no conteúdo), sendo bem mais do que contrato, embora não deixe de sê-lo,

também. 17

Para PAULO LINS E SILVA, o casamento é um contrato sui

generis, na medida em que é único ato jurídico que prevê solenidade específica e

apenas duas partes – de sexos opostos – com a finalidade de alcançar a felicidade

dos envolvidos. Assim:

No contrato sui generis do casamento, a natureza jurídica é altamente sublime, não envolvendo entre as partes aspectos matérias, mas tão-somente aspectos amorosos, afetivos, carinhosos, visando á criação de uma família, de um núcleo, de uma espécie de

16

DIAS, Maria Berenice, Direito de família e o novo código civil 17

DIAS, Maria Berenice, Direito de família e o novo código civil

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casulo fechado, no qual se comunicam somente as partes afetivamente envolvidas, seus ascendentes, descendentes e colaterais. [...] O ―sim‖ diante da autoridade civil ou religiosa, tem o alcance da concordância com os deveres comuns do casamento18.

Entende-se ser a natureza jurídica do casamento institucional,

por ser o matrimônio a mais importante das transações humanas, nos dizeres de

MARIA HELENA DINIZ. De outra sorte, reduzir o casamento a simples contrato seria

equipará-lo aos negócios jurídicos em geral, relegando-se para segundo plano os

sentimentos que unem duas pessoas. MARIO AGUIAR MOURA, enfrentando a

questão assevera:

É inquestionável que o Estado, como Nação politicamente organizada, põe grande empenho na estruturação da família legítima. É ela vista, com sabedoria, como célula indispensável para a conservação da própria sociedade nacional. A satisfação dessa tendência, que interessa ao sistema integral da comunidade nacional, tem sido básica para a política legislativa na busca de sua estruturação legal. Daí dizer-se que a família é uma instituição. Ela está governada por normas institucionalizadas.

1.4 CONCEITO DE UNIÃO ESTÁVEL

O que se entende por união estável? A constituição diz,

relegando a solução para a lei que disponha sobre o modo de conversão da união

em casamento.

Convém afastar, desde logo, aquelas situações de simples

amasiamento passageiro, especialmente quando envolvam pessoas casadas.

Certamente não teria o legislador pretendido a extensão de benefícios legais em

detrimento da família legalmente constituída nem tampouco a incentivo á poligamia.

A união protegida seria aquela da vivencia de homem e mulher

solteiros, separados judicialmente ( ou mesmo de fato, excepcionais circunstâncias),

divorciados ou viúvos, na situação de ―companheiros‖, com aparência de casamento

(―casamento de fato‖), conforme já vinha sendo reconhecido pela doutrina e pela

jurisprudência.

Diversas leis consagram o direito aos ―companheiros‖, em

especial as leis previdenciárias e fiscais, pondo como requisitos a condição de não

existir impedimento matrimonial e o tempo mínimo de convivência por 5 anos. Da

18

DIAS, Maria Berenice, Direito de família e o novo código civil

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21

mesma forma dispõe a Lei de Registros Públicos, no art. 57, § 2º, ao permitir a

adoção, pela mulher do patrimônio do companheiro.

Com a normatização dos direitos decorrentes da união estável,

clareou-se a sua conceituação. A Lei 8.971, de 29.12.1994, embora não utilize a

expressão ―união estável‖, dá-lhe substância ao definir como ―companheiros‖ o

homem e a mulher que mantenham união comprovada, no estado de solteiros,

separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos, ou com

prole. A Lei 9.278, de 10.05.1996, alterou esse conceito, omitindo os pressupostos

de prole? Considera entidade familiar (resultante da união estável) a convivência

duradoura, pública e continua de um homem e de uma mulher, estabelecida com

objetivo de constituição de família.·.

Já não se fala em ―concubinato‖, nome tradicional, abrangente

de todas as situações de união a margem do casamento. Num sentido amplo ―união

estável‖ também seria forma de ―concubinato‖; ―companheiros‖ ou ―conviventes‖

seriam o mesmo que ―concubinos‖.·.

Já se viu que a garantia constitucional de proteção do Estado

é extensiva à entidade familiar, seja formada pelo casamento ou pela união estável

entre homem e mulher (art.226, §3º).

Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a

lei facilitar sua conversão em casamento.·.

Afora esse requisito básico da heterossexualidade dos

parceiros, por assimilação com a imagem do casamento, a Constituição não diz o

que seja aquela espécie de união, contentando-se em lhe emprestar a adjetivação

―estável‖. A denominação, no entanto , faz concluir que a união protegida não é

qualquer uma, passageira, fugaz, intermitente. Ao contrário, exige que a união seja

duradoura, com certa permanência no tempo, a fim de que se configure como ente

familiar. No mais, relega-se melhor conceituação para a lei ordinária, prevista na

determinação constitucional de que venha facilitar a conversão da união estável em

casamento. O preceito traz implícita a noção de que união estável não é o mesmo

que casamento, pois se fosse não haveria sentido na possibilidade de conversão.

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22

Significa, de outro lado, que a união estável deve preencher os requisitos legais

próprios do casamento civil para que possa nele transmudar-se.·.

1.4.1 Prova da união estável

A situação de convivência em união estável exige prova segura

para que se reconheça sua existência e se concedam os direitos assegurados aos

companheiros. Mas que a prova será essa, especialmente para os fins da

concessão liminar de certos direitos (por exemplo, alimentos), se não houver

documento certificando a união de fato? Admitem-se, para demonstração da vida em

comum, todos os meios lícitos de prova, com ênfase para a exibição de documentos,

de modo a justificar pedido de alimentos provisórios pelo companheiro necessitado,

sua habilitação em processo de inventário, reserva de meação e medidas cautelares

que lhe sejam apropriadas19.

1.4.2 Deveres dos Companheiros

Na esfera das relações pessoais entre os companheiros,

dispõe o art. 1.724 do Novo Código Civil acrescenta o dever de ―lealdade‖ entre os

companheiros, mantido os demais deveres constantes dessa lei.

Em confronto com os direitos e deveres dos casados,

constantes do art. 1.566, duas observações: para os companheiros se aplica o dever

de lealdade, símile ao dever de fidelidade dos cônjuges: não consta, para os

primeiros, o dever de vida em comum no mesmo domicílio, que é exigido para os

casados. 20

1.4.3 Contexto Histórico: União estável antes do novo Código Civil

Longa se mostrou a caminhada evolutiva no trato jurídico da

união estável perante as leis brasileiras, desde a edição do Código Civil de 1916.

No princípio não havia qualquer regulamentação legal para a

vida em concubinato, como se observa da omissão ao tema no referido Código,

salvo para ditar normas restritivas aos concubinos adúlteros.·.

Aos poucos se deu o avanço para o reconhecimento de certos

direitos ás pessoas que tenham optado por esse modo de convivência informal,

19

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do novo código civil. p.150.

20 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do

novo código civil. p.103.

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23

tanto na esfera legislativa como na aplicação jurisprudencial, conforme já analisado

em capítulo procedente.·.

A culminância operou-se com o advento da Constituição

Federal de 1988, que reconheceu como entidade familiar a união estável entre

homem e mulher, dando ensejo á sua regulamentação por leis especiais.

O casamento nasce da liberdade de iniciativa dos nubentes e

se forma pela vontade deles, (consensus facit nuptias).21

A lei considera relevante, porém, que o consentimento dos

nubentes obedeça a determinadas formalidades para protegê-los em sua liberdade,

para defende-los contra ― a sua própria precipitação, aqui especialmente perigosa, e

ainda facilitar a prova do ato, uma prova que seria bem difícil se o casamento fosse,

como foi durante séculos, um negocio consensual‖22.

Distinguem-se nas formalidades que envolvem o casamento,

um processo preparatório e uma celebração propriamente dita a que segue o

registro.23

1.4.4 União Estável: Requisitos e Efeitos

O código civil de 2002 trás no caput de seu artigo 1723 a

seguinte redação:

―É reconhecida como entidade familiar a união estável entre

homem e mulher, configurada na convivência publica, continua e duradoura

estabelecida com o objetivo de constituição familiar.‖ ·.

Convivência: conviver, do latim cum vivere, viver com, significa

manter vida em comum, como decorrência da união que se estabelece entre

pessoas interessadas na realização de um projeto de vida a dois. Importa em

comunhão de vida, situação símile à de pessoas casadas24.

A adjetivação de união como ―estável‖ traduz ideia de que seja

duradoura, solida, com certeza permanência no tempo, ainda que não definitiva. Por

21

PEREIRA COELHO, F. Curso de direito da família. Coimbra, Atlântica, 1965, p.161;

22PEREIRA COELHO, F. Curso de direito da família. Coimbra, Atlântica, 1965, p.161;

23PEREIRA COELHO, F. Curso de direito da família. Coimbra, Atlântica, 1965, p.161;

24 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do

novo código civil. p.123.

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24

isso a conceituação legal de união estável como ―duradoura‖ não deixa de ser uma

tautologia. Uma vez que estabilidade pressupõe certa duração temporal, conclui-se

que não existe união estável nos casos de relacionamento fugaz, passageiro,

efêmero ou eventual. Esse requisito para a configuração de união estável é mais um

dos aspectos que o distingue do casamento. 25

A estabilidade da união exige que, além de duradoura seja

continua, sem interrupções ou afastamentos temporários que lhe desnaturem a

própria essência da vida em comum. A caráter continuo da relação atesta sua

solidez, pela permanência no tempo.26

A união estável existe diante de constituição de família, não

podendo ser considerado assim, o mero namoro ou noivado, pois nestes, o que

existe é apenas uma expectativa de formação familiar.·.

A capacidade civil é requisito essencial à celebração do

casamento, sendo então indispensável na união estável, em razão dos efeitos que

produz entre eles os das regras do regime de comunhão parcial de bens.

Levando-se em conta o prazo de duração, as uniões estáveis

formam-se e desenvolve-se de maneira natural e espontânea, de modo que o

estabelecimento mínimo de período para que gere efeitos jurídicos precisam ser

analisados. O estabelecimento de prazo mínimo acabaria por gerar situações de

injustiça, uma vez que, uma das partes, geralmente detentora do patrimônio em seu

nome, poderia dissolver a relação antes do prazo previsto em lei, levando em

prejuízo àquele que ofereceu esforço na aquisição. Para se evitar esse tipo de

situação, entende-se ser indispensável à demonstração da existência de união

estável, em ação própria em caso de litígio entre s partes, não necessitando de

prazo mínimo para que se configure a união estável e para que tenha seus devidos

efeitos.·.

25

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do novo código civil. p.129

26 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do

novo código civil. p.130

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25

A união estável pressupõe a notoriedade, sendo que, o

relacionamento secreto, clandestino, com objetivos apenas sexuais, não pode

produzir efeitos jurídicos, por essa razão a publicidade da relação torna-se tão

importante.·.

Como trás o artigo, a continuidade da relação também é

pressuposto indispensável para que a união tenha estabilidade.

Levando em consideração a sumula 382 do Supremo Tribunal

Federal, não necessita as partes terem convivência sobre o mesmo teto. ―A vida em

comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do

concubinato‖. A evolução social torna isso possível, uma vez que, é inteiramente

normal homens e mulheres terem uma relação estável morando cada um em sua

residência.·.

Pelas regras do código civil em seu parágrafo 1º ―A união

estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1521; não se

aplicando a incidência do inciso VI no caso da pessoa casada se achar separada de

fato ou judicialmente.‖ ·.

Isso significa que as pessoas separadas judicialmente não

poderiam constituir a união estável, pois não pode existir se os conviventes forem

casados, o que constituiria bigamia. Mas, com a separação judicial, deixa-se de

existir a sociedade conjugal, extinguindo-se assim o dever de fidelidade, não

podendo deixar de ter efeitos jurídicos a união estável de pessoas separadas

judicialmente. A norma do código civil torna possível a união estável de duas

pessoas que normalmente são impedidas de se casarem, se simplesmente elas

forem separadas de fato. Entende-se que essa regra gera polemicas, uma vez que,

fere o principio constitucional da proteção à família, levando em consideração que

isso geraria uma turbação patrimonial, sem que se possa concluir qual relação deve-

se gerar efeitos e delimitar qual o patrimônio pertencente ao conjugue e ao

convivente.27

27

Escrito por Maria Berenice Dias ,Segunda, 15 de dezembro de 2008 19:51 , Adultério, bigamia e união estável: realidade e responsabilidade, http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-civil/2075-adulterio-bigamia-e-uniao-estavel-realidade-e-responsabilidade.html, pesquisado em 25/10/2010.

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26

Duas ordens de observações merecem ser feitas. Sem

qualquer sombra de dúvida, o intuito é punir a mulher que, sabedora da existência

da outra relação, ainda assim mantém o vínculo afetivo. Independentemente da

presença de todos os requisitos legais para o reconhecimento da união estável,

acaba por ser expulsa do âmbito da proteção instituída constitucionalmente. O

fundamento, é de todo falacioso. Sabendo a mulher do relacionamento paralelo,

estaria agindo de má-fé, não se podendo ter por presente o objetivo de constituição

de família, requisito de ordem subjetiva exigido pelo art. 1.723. De outro lado,

afirmando a mulher desconhecer que, a pessoa com quem entretém uma

convivência duradoura, pública e contínua, vive também com outra, então é

reconhecida sua boa-fé e a existência de uma união estável. Assim, o requisito de

ordem subjetiva para o reconhecimento da entidade familiar, qual seja, a intenção de

constituir uma família, só se perquire da mulher. Quanto ao varão – que é quem

mantém a dupla convivência – desimporta sua intenção.·.

A outra conclusão que se extrai desta tentativa classificatória é

que acaba sendo beneficiado justamente aquele que infringiu o princípio da

monogamia. O resultado que se quer obter: punir a poligamia, acaba, ao fim e ao

cabo, beneficiando quem infringiu o princípio que é tido como o mais sagrado, por

ser o ordenador da vida em sociedade. Reconhecida a concomitância dos

relacionamentos, se subtrai qualquer responsabilidade exatamente de quem agiu da

maneira merecedora da reprovação social. Assim, quem comete o delito de

adultério, quem infringe o dever de fidelidade e descumpre o princípio da

monogamia é o único beneficiado. Fica com a totalidade do patrimônio e sem

qualquer encargo.·.

De outro lado, quando o homem mantém duas uniões estáveis,

não divide nada com ninguém. Nada divide com uma das mulheres exatamente por

ter mais de um relacionamento. Com referência a cada união nada deve pela

mantença da relação outra. Serve uma de justificativa para a outra, a gerar sua

irresponsabilidade com relação às duas companheiras. O varão se queda sem

qualquer ônus, ainda que mantenha duas uniões estáveis, com a presença de todos

os requisitos legais28.

28 Escrito por Maria Berenice Dias ,Segunda, 15 de dezembro de 2008 19:51 , Adultério, bigamia e união estável: realidade e responsabilidade, http://www.investidura.com.br/biblioteca-

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27

Entende-se que a manutenção de uma relação estável na

vigência do casamento tem o mesmo significado da bigamia, em que concorrem dois

casamentos civis, o que é ilícito civil, a acarreta na nulidade do segundo casamento,

não há sentido então em atribuir efeitos a união estável que concorre com o

casamento civil e punir com nulidade o casamento que concorre com outro

casamento civil.

O Artigo 1641, incisos I e II, trás: É obrigatório o regime de

separação de bens no casamento.

I – das pessoas que o contraírem com inobservância das

causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de sessenta anos.

Este artigo e incisos devem não somente ser aplicados no

casamento, como também na união estável, segundo este dispositivo, o casamento

celebrado com causa suspensiva e contraído com pessoa com idade superior a

sessenta anos tem, obrigatoriamente, que serem realizados sob o regime de

separação de bens. Na união estável, segundo o § 2º , ―as causas de suspensão do

artigo 1.523 não impedirão a caracterização da união estável, e não há limite de

idade máxima para que sejam produzidos os efeitos previstos no art. 1725:29

―Na união estável, salvo contrato escrito entre os

companheiros, aplicam-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da

comunhão parcial de bens.‖

Desse modo, se não houver contrato escrito, comunicam-se os

bens adquiridos na constância da união estável a titulo oneroso, por fato eventual

com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior, por doação, herança,

benfeitorias comuns, ou particulares de cada companheiro, percebidos no tempo da

união estável.30

juridica/artigos/direito-civil/2075-adulterio-bigamia-e-uniao-estavel-realidade-e-responsabilidade.html, pesquisado em 25/10/2010.

29Artigo Publicado em: 04/11/2009 , http://www.artigonal.com/direito-artigos/uniao-estavel-requisitos-

e-efeitos-1420515.html, pesquisado dia 25/04/2010 30

Artigo Publicado em: 04/11/2009 , http://www.artigonal.com/direito-artigos/uniao-estavel-requisitos-

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28

1.4.5 A união estável no código civil

Em artigo anterior, tive a oportunidade de tecer alguns

comentários acerca da sucessão entre companheiros no novo Código Civil. Trago,

agora, outras considerações, de ordem geral, em torno da regulamentação da união

estável no mesmo diploma.

O Código, adequadamente, traz para seu bojo – entre os

artigos 1.723 e 1.727 – a regulamentação da união estável, antes tratada em

legislação esparsa.

O caput do artigo 1.723 reproduz, com pequena modificação,

a definição contida no art. 1º, da Lei 9.278/1996.

A diferença corre por conta da referência à própria

expressão união estável, criada pela Constituição Federal de 1988, curiosamente

não utilizada, na definição do instituto, por nenhuma das duas leis que a

regulamentaram (8.971/1994 e 9.278/1996).·.

A identidade reside na reprodução das características da

relação que a vocacionam à proteção legal, a saber: diversidade de sexos,

publicidade, continuidade, duração e intenção de constituir família.·.

Assim como na Lei 9.278/1996, optou o codificador por não

definir previamente o lapso temporal mínimo necessário à caracterização do

instituto, deixando tal tarefa para a jurisprudência, no exame dos casos concretos, e

ante a presença dos demais pressupostos, o que (reconhecida, é certo, a

controvérsia que grassa em torno do tema) parece mais adequado, ante a rica

variedade de relacionamentos que são postos à apreciação dos Tribunais.·.

Não será possível união estável se houver impedimentos

matrimoniais entre os parceiros. Nesse sentido dispõe o art. 1.723, §1º do Código

Civil, mandando aplicar o art. 1.521, que enumera os impedimentos para casar.

Art. 1.521. Não podem casar:

e-efeitos-1420515.html, pesquisado dia 25/04/2010

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29

I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;

II - os afins em linha reta;

III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;

IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;

V - o adotado com o filho do adotante;

VI - as pessoas casadas;

VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.

No mesmo paragrafo do artigo 1.723, segunda parte, resolve-

se tormentosa questão atinente ao estado civil dos companheiros, em face do

impedimento por serem casados. O dispositivo exclui a incidência do inciso VI do

artigo 1.521, do código civil, que se trata desse impedimento, no caso de a pessoa

casada se achar separada de fato ou judicialmente.31

O parágrafo segundo possibilita o reconhecimento da união

estável mesmo na presença das agora denominadas causas suspensivas do

matrimônio (art. 1523), antes classificadas como impedimentos impedientes. Assim,

mesmo estando presente alguma das causas suspensivas, será possível o

reconhecimento da união. E isso pela singela razão de que a presença de alguma

causa suspensiva não afeta a validade do casamento, não havendo razão para

obstar a conversão da união estável.32

Pertinente indagar se, presente alguma causa suspensiva do

matrimônio, a conversão da união estável em casamento trará como consequência a

adoção obrigatória do regime da separação de bens, conforme regra o artigo 1.641,

I. Tenho que a resposta deva ser afirmativa. Ocorre que se trata de regra protetiva,

que deve ter aplicação analógica na união estável – mesmo que não ocorra

conversão em casamento. Assim não fosse, estaria aberta a possibilidade de causar

31

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável. Do concubinato ao casamento: antes e depois do novo código civil. p103

32Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público

do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010

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30

dano àquelas pessoas a quem a lei visa resguardar, pois bastaria manter apenas

uma convivência de fato para que o regime de bens aplicável fosse o da comunhão

parcial. Além disso, ao criar no casamento uma limitação inexistente na união

estável, estaria sendo desencentivada a conversão da união estável em casamento,

em clara violação ao ordenamento constitucional, que determina justamente o

contrário.·.

Por idênticas razões, o regime da separação obrigatória de

bens deve incidir na união estável, com ou sem conversão em casamento, devendo,

em caso de conversão, levar-se em conta a idade dos contraentes ao tempo do

início da relação fática. De ressalvar-se, é claro, respeitável entendimento – já

manifestado pelos Tribunais de Justiça o Rio Grande do Sul e de São Paulo – no

sentido da inconstitucionalidade da regra que vincula o regime de bens à idade dos

nubentes.

De destacar, entretanto, que a Súmula 377, do STF, não

parece encontrar óbice no novo Código Civil. O entendimento nela consubstanciado,

outrossim, não pode ser deixar de ser aplicado, por analogia, à união estável.

O artigo 1.724 reproduz, com pequena alteração, o art. 2º,

da Lei 9.278/96, que trata dos deveres entre os companheiros A novidade resulta da

inserção do dever de lealdade.

Parece certo, entretanto, que a única possibilidade de

questionamento relativo à culpa na união estável está no parágrafo segundo do

artigo 1.694 do Código Civil;

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§ 2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.

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31

Ou seja, também o companheiro que tiver culpa pela sua

situação de necessidade terá direito a alimentos apenas no limite do indispensável à

sua subsistência.

O artigo 1.725 reproduz o art. 5º, da Lei 9.278/96,

estabelecendo o regime de bens que vigorará entre os companheiros, que, na

ausência de estipulação contrária, deverá ser o da comunhão parcial. A regra, mais

econômica em seus termos, tem melhor redação que seu antecedente, não

deixando qualquer dúvida quanto às disposições aplicáveis às relações patrimoniais

entre os companheiros.

No que diz respeito ao contrato que pode ser firmado pelos

companheiros acerca dos efeitos patrimoniais da relação, continua a lei a silenciar

quanto à sua forma e efeitos. Assim, diversamente do que ocorre com o pacto

antenupcial, admite-se instrumento particular. Ademais, não havendo previsão legal

de seu registro, os efeitos necessariamente deverão limitar-se aos signatários, por

ausente publicidade, o que, por evidente, representa gravíssimo inconveniente da

união estável em relação ao casamento. Por fim, poderá ser firmado a qualquer

tempo, no curso da relação, modificando, inclusive com efeito ex tunc, o regime de

bens até então vigente. Nada obsta, por sinal, que mais de um contrato seja firmado

pelo casal, complementando ou substituindo o anterior.

O artigo 1.726 corresponde ao artigo 8º da Lei 9.278/1996.

Explicita, com melhor técnica, que o pedido de conversão deverá ser formulado ao

juiz. Entretanto, assim como o anterior, omite-se quanto aos efeitos da conversão

(serão ex-nunc ou ex-tunc). Deixa de explicitar, igualmente, a documentação

necessária à instrução do pedido e as provas da existência da alegada união a ser

convertida. Será a mesma documentação necessária à habilitação para o

casamento? É de supor que sim. Nestas condições, a única diferença com relação

ao matrimônio comum será a dispensa de celebração, além do possível efeito

retroativo. Quanto a este, embora nada refira a lei, é certo que, na medida em que o

casal admite a existência de uma união estável a partir de determinada época, os

efeitos desta passam a irradiar desde então. E, como esses efeitos são praticamente

os mesmos do casamento, é irrelevante, na prática, a atribuição de efeito retroativo

ao matrimônio realizado por conversão.

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32

Grave inconveniente, no entanto, está na determinação de

que a conversão em casamento se dê mediante procedimento judicial. Descumpre

aí o legislador, flagrantemente, o comando constitucional (artigo 226, p. 3º, CF) no

sentido de que deva ser facilitada a conversão da união estável em casamento.

Ocorre que o procedimento em juízo tornará, sem dúvida, mais morosa e onerosa a

conversão. Assim, melhor será aos companheiros celebrar um casamento comum,

que será seguramente mais rápido, além de menos oneroso.

A União Estável é a relação de convivência entre um homem

uma mulher, que é estabelecida com o objetivo de constituição familiar.

O Código Civil não menciona o prazo mínimo de duração da convivência para que

seja considerada união estável e o que é mais curioso é que também não é

necessário que morem juntos, isto é, os "noivos" podem ter domicílios diversos.

Para se converter uma união estável em casamento, os noivos devem comparecer

ao cartório de Registro civil do seu domicilio e dar entrada nos papeis de casamento.

Igual ao casamento convencional, os noivos (brasileiros ou estrangeiros) podem

escolher o regime de bens e mudar o nome.

É necessário levar os documentos habituais e as duas

testemunhas, para dar entrada ao processo de habilitação. A única diferença deste

tipo de casamento, é a inexistência da Celebração, isto é, não existe a presença do

Juiz de paz para realizar a cerimônia. Após o prazo de 16 dias, os noivos poderão

retirar a certidão de casamento civil no Cartório. O casamento começa a ter efeito

nesta data33.

Na justificação, lê-se: O artigo repete a regra inscrita no art.

8º da Lei 9278/96, acrescendo-lhe a necessidade de pedido dos companheiros ao

juiz. O procedimento judicial é dispensável, já que, pelas regras do casamento,

sempre será necessário o processo de habilitação para a sua realização, conforme

os artigos. 1.525 e seguintes do Código Civil. Além disso, a imposição de

procedimento judicial dificulta a conversão da união estável em casamento, em

violação ao referido artigo da Constituição Federal, devendo ser suprimida.

Consoante à sugestão a seguir, o requerimento dos companheiros deve ser 33

http://www.casamentocivil.com.br/site/index.php/Conversao-de-Uniao-Estavel-em-casamento.html, pesquisado em 25/10/2010.

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33

realizado ao Oficial do Registro Civil de seu domicílio e, após o devido processo de

habilitação com manifestação favorável do Ministério Público, será lavrado o assento

do casamento, prescindindo o ato da respectiva celebração.34

O artigo 1.727 constitui dispositivo desnecessário e que só

vem trazer perplexidade ao intérprete. Acontece que o parágrafo primeiro do art.

1.723 possibilita a constituição de união estável estando qualquer dos companheiros

(ou ambos) apenas separados de fato. Há, pois, aparente conflito de normas, uma

vez que a regra sob exame afirma que, estando presente impedimento (diante de

simples separação fática ou até mesmo de separação judicial, que, como sabido,

não rompe o vínculo matrimonial), caracterizar-se-á apenas concubinato. Ademais,

qual a necessidade dessa disposição, visto que a lei nenhum efeito atribui ao

concubinato.35

A interpretação sistemática da lei, no entanto, aponta que a

definição de concubinato no novo Código não se limita ao contido no artigo 1.727,

mas deve ser feita em conjugação com o artigo 1.723, que define os contornos da

união estável. Portanto, concubinato será a relação não eventual entre homem e

mulher impedidos de casar, desde que não estejam separados de fato ou

judicialmente.36

Novamente percebendo o equívoco, o PL 6960/02 em boa

hora propôs alteração ao dispositivo em exame, dando-lhe a seguinte redação : As

relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar e que não

estejam separados de fato, constituem concubinato, aplicando-se a este, mediante

comprovação da existência de sociedade de fato, as regras do contrato de

sociedade. Parágrafo único. As relações meramente afetivas e sexuais, entre o

homem e a mulher, não geram efeitos patrimoniais, nem assistenciais. Consta na

justificativa : Há grave contradição entre este artigo e o disposto no artigo 1.723, §

1º, que possibilita a constituição de união estável àqueles que, embora impedidos de 34

http://www.casamentocivil.com.br/site/index.php/Conversao-de-Uniao-Estavel-em-casamento.html, pesquisado em 25/10/2010. 35

Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010 36

Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010

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34

casar, estão separados de fato. Daí a alteração procedida na cabeça do artigo.

Quanto ao parágrafo único, a proposta contempla disposição constante do Esboço

de Projeto de Lei discutido em sucessivas reuniões e, afinal, redigido em abril/02,

pela comissão de famílias coordenada pelo professor Segismundo Gontijo (MG) a

pedido da Comissão de Família e Seguridade Social, da Câmara Federal, como

substitutivo de outros projetos sobre a matéria, em tramitação na Casa.37

É preciso, além disso, ter presente que o impedimento para

casar pode ser resultante de outras hipóteses que não apenas o fato de serem os

companheiros casados com terceiros. Como diz o parágrafo primeiro do artigo

1.723, a união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do artigo

1.521. Logo, presente qualquer impedimento matrimonial (com a ressalva posta ao

inciso VI do artigo 1.521), o relacionamento não eventual entre homem e mulher

caracterizar-se-á como concubinato.

Como visto, ressalvadas as já examinadas alterações

relativas ao direito sucessório, o regramento da união estável no novo Código Civil

não contém significativas novidades em relação ao que dispunha a legislação

anterior38.

37

Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010 38

Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010

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CAPÍTULO 2

Sucessões

2.1 DA SUCESSÃO EM GERAL

2.1.1 Momento da Transmissão da herança – Da Abertura da sucessão

Nos termos do art. 6º. Do Código Civil, a existência da pessoa

natural termina com a sua morte, ainda que presumida nos termos da lei (Código

Civil, artigos 6º e 7º.) Este é o momento exato da abertura da sucessão, também

chamado de delação, ou devolução sucessória , ou delação hereditária.

Sem solução de continuidade, pois as relações jurídicas não

podem ficar privadas de um titular, opera-se ipso jure, com o falecimento, a

transmissão da herança; e esta substituição, do de cujus aos seus herdeiros, se faz

automaticamente, no plano jurídico, sem qualquer outra formalidade, ainda que, no

plano fático transmite aos sucessores o seu acervo patrimonial.39

Este principio é chamado Detroit de saisine, vem expresso na

regra tradicional do direito inglês le mort saisit le vif. Quer dizer, instantaneamente,

independente de qualquer formalidade, logo que se abre a sucessão, investe-se o

herdeiro no domínio e posse dos bens constantes do acervo hereditário40.

Consagrando este princípio, o artigo 1.784 do Código Civil

estabelece:

Aberta à sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

39 CAHALI, Francisco Jose. Curso avançado de direito civil. 2 ed. rev. e atual. p. 42- 43.

40 Monteiro, Washington de Barros (Curso..., 30. ed. vol.6, p.16); cf. ainda, SILVIO RODRIGUES (Direito..., 21. ed. vol.7, p.13-14).

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36

Sendo conveniente deixar claro que a abertura do inventário,

fato este só instaurado com a provocação judicial comunicando o falecimento.41

E o direito material é harmônico neste principio, prescrevendo

que o sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor (Código

Civil, artigo 1.207), merecendo seguimento, igualmente, a legislação processual, ao

estabelecer a posse e administração da herança pelo inventariante, ou até a sua

nomeação, ao administrador provisório ( Código de Processo Civil, artigos 990,985 e

986) , ambos com a obrigação de promover a destinação do acervo.42

E mesmo na herança jacente43, onde inicialmente é apurada a

inexistência de herdeiros testamentários ou legítimos que venham a reclamar seus

quinhões, há um titular latente do acervo, pois o Poder Público é sempre o sucessor

potencial na falta de outros na ordem de vocação hereditária.44

E como analisar este droit de saisine, com o fato de, por

exemplo, não terem os sucessores, no exato instante do óbito, conhecimento do

falecimento, até por estarem eventualmente em lugar distante, ou não terem ainda

conhecimento de seu direito hereditário? Ou ainda, como conciliar a regra de

imediata transmissão da posse e domínio com a circunstância de que existe um

momento provisório onde a herança, patrimônio único (universitas juris) e indivisível,

é gerenciada pelo inventariante, ou mesmo administrador provisório, para só com a

partilha serem destinados os quinhões aos herdeiros?45

O que ocorre, em verdade, é uma ficção jurídica, a transmissão

da herança se faz ipso jure, para dar a necessária continuidade na titularidade das

relações jurídicas deixadas pelo falecido, que não podem ficar acéfalas. Com a

41

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões: volume VII, 2ª edição, São Paulo: Saraiva 2008. 42

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões: volume VII, 2ª edição, São Paulo: Saraiva 2008. 43

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões: volume VII, 2ª edição, São Paulo: Saraiva 2008.

44GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões: volume VII, 2ª

edição, São Paulo: Saraiva 2008. 45

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões: volume VI, 17ª edição, São Paulo: Saraiva, 2003

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37

definitiva partilha ou adjudicação da herança aos herdeiros, quando se desfaz a

comunhão forçada, consolidando em seu patrimônio o quinhão herdado, a

titularidade do acervo opera-se retroativamente, desde a data do falecimento.

Quanto à posse, é destinada aos herdeiros, já com o

falecimento, a posse indireta, exercendo o inventariante a posse direta até o

falecimento, a posse indireta, exercendo o inventariante a posse direta até o

estabelecimento da partilha46.Assim, mesmo em curso o inventario, os herdeiros

podem buscar a proteção possessória em caso de esbulho ou turbação ( Código

Civil artigo 1.210). Mas não se pode olvidar que o sucessor se sub-roga na posse

exercida pelo falecido salvo prova em contrário, na mesmo situação jurídica por ele

desfrutada, ou seja, continua na posse mantendo as mesma situação jurídica por ele

desfrutada, ou seja, continua na posse mantendo as mesmas características do

antecessor (Código Civil, artigos 1.203 e 1.206). Se a posse do falecido era violenta,

clandestina, precária ou má-fé, assim será transmitida ao herdeiro, que a exercerá

com idênticos vícios. Se justas e de boa-fé, assim continuam os sucessores a

exercê-la47.

A ressalva que se faz refere-se á posição do legatário,

merecendo tratamento diferenciado, como se verá ao se estudar o respectivo

instituto48.

No principio da saisine decorrem importantes efeitos, não só

restritos á imediata transmissão pleno jure da herança aos sucessores,49 mas

correlatos a este.

46

SILVIO RODRIGUES (ob.cit., p.15) ensina: ‖enquanto o inventariante conserva a posse direta dos bens do espólio, os herdeiros adquirem a sua posse indireta. Ambos ostentam, simultaneamente, a condição de possuidores‖

47 Acrescentando MARIA HELENA DINIZ (Ob. Cit., p.24-25): ―Esta disposição legal contém uma

presunção juris tantum, no sentido de que a posse guarda o caráter de sua aquisição‖. E prossegue: ―Criando essas normas, nosso legislador teve em mente evitar que se mude, sem mais nem menos, o título ou a causa da posse. Entretanto, no sentido juris tantum tal presunção admite prova em contrário. Dessa maneira, se o sucessor, p. ex., provar que clandestinamente ou a violência cessaram há mais de ano e dia, sua posse passa a ser reconhecida, convalescendo-se dos vícios que maculavam (Código civil, artigo 497 [atual artigo 1.208]‖.

48 Lembrando CARLOS ROBERTO GONÇALVES (sinopses..., p.3): ―quanto aos legatários, a

situação é diferente: adquirem a propriedade dos bens infungíveis; a dos bens fungíveis, porém, só pela partilha. A posse, em ambos os casos, deve ser requerida aos herdeiros, que só estão obrigados entrega-lo por ocasião da partilha e depois de comprovada a solvência do espolio‖.

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38

O primeiro deles é a identificação da lei aplicável á data da

sucessão e respectiva capacidade sucessória, prevista no artigo 1.787 do Código

Civil, assim:

―Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente

ao tempo da abertura daquela‖, vale dizer: a qualidade de herdeiro, e mesmo a

extensão de seus direitos, é a aferida de acordo com a legislação vigente na data do

falecimento,50 com relevantes consequências jurídicas em razão de modificações já

introduzidas no direito sucessório pela Constituição Federal e pelas leis relacionadas

á união estável, e de alterações constantes do novo Código Civil quando á ordem de

vocação hereditária, como se verá com mais vagar no desenvolver dos capítulos

relacionados á sucessão legitima e testamentaria.51

2.2 O DIREITO DAS SUCESSÕES NO CÓDIGO CIVIL

Sabe-se da importância do ordenamento civil brasileiro,

remodelado pela Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, em vigor desde 11 de

janeiro de 2002, trazendo grandes mudanças que exigem estudo, reflexão e debates

para sua compreensão e natural aperfeiçoamento.

Como ensina o Prof. Miguel Reale, presidente da comissão

idealizadora do projeto que se transformou na Lei n. 10.406, seus princípios básicos

são a eticidade, a operatividade e a sociabilidade, contrariando aquelas antigas

praxes que serviram ao vetusto Código de 1916, inspiradas em costumes, moral e

realidades totalmente diferentes, oriundos do final do séc. XIX.

Nesse contexto, as mudanças introduzidas no Direito das

Sucessões são merecedoras de análise. Quando se pensa em morte, em

desaparecimento de alguém, logo vem um sentimento de irreparável tristeza e dor

49

RT752/339: ―Investigação de paternidade – Herança – Bens deixados pelo falecido investigado, como também frutos e rendimentos, que devem integrar o quinhão hereditário do filho reconhecido, a partir da data da abertura da sucessão – Aplicação do Instituto da saisine – Inteligência do artigo 1.572 do Código Civil [atual artigo 1.784].

50 RT 597/250: Inventario – Filiação ilegítima – Reconhecimento com efeito ex-tunc – Partilha nos

termos da lei vigente á época da abertura da sucessão‖.(STF).

51RT 597/250: Inventario – Filiação ilegítima – Reconhecimento com efeito ex-tunc – Partilha nos

termos da lei vigente á época da abertura da sucessão‖.(STF).

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39

pela perda, especialmente quando se trata de um ente querido. De outro lado, a

morte traz continuidade da vida do extinto no tocante aos seus bens, que, de

imediato, transmitem-se aos sucessores legítimos ou testamentários, o que se dá na

forma determinada pelo autor da herança, se houver deixado testamento ou codicilo

como ato de última vontade. Ficam os sobrevivos, portanto, sujeitos à vontade dos

mortos no que tange ao recebimento de seu patrimônio.52

Há uma espécie de imortalidade do titular dos bens, no aspecto

de direcionar sua posse, de transmiti-la a certas pessoas e sob certas condições, e

tal demonstra a importância do Direito sucessório. Quando se fala que o Código Civil

rege a nossa vida desde o nascimento até a morte, é uma meia verdade, pois, mais

que isso, a lei estende seus efeitos para depois da morte da pessoa, nas esferas

patrimoniais e da sucessão hereditária.53

2.2.1 Fundamentos legais

O Direito das Sucessões tem fundamento na Constituição

Federal , art. 5º, inc. XXX, consagrador do direito de herança. Trata-se, portanto, de

direito fundamental, que não pode ser negado pela legislação infraconstitucional54.

A matéria é tratada no Livro V do vigente Código Civil, entre os

artigos 1.784 e 2.027, compreendendo os títulos: Disposições Gerais, Sucessão

Legítima, Sucessão Testamentária, Inventário e Partilha. Na esfera processual,

aplicam-se as normas do Código de Processo Civil, artigos 982 a 1.04555.

2.2.2 Espécies de sucessão causa mortis: legítima e testamentária

A sucessão causa mortis consiste na transmissão dos bens da

pessoa falecida aos seus herdeiros, que podem ter essa qualificação em virtude da

lei ou por força de testamento. Também ocorre sucessão no caso de ausência de

uma pessoa, desaparecimento sem deixar vestígios, sem dar notícias do seu

paradeiro e sem deixar quem a represente. Uma vez declarada judicialmente a

52

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.57. 53

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

54 Constituição da republica Federativa do Brasil 1988.

55Código de Processo civil - Lei No 5.869, de 11 de Janeiro de 1973.

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40

ausência, dá-se a sucessão provisória nos seus bens, tornando-se definitiva depois

de certo tempo, diante da morte presumida do ausente.56

Note-se que a ausência é tratada na Parte Geral do Novo

Código Civil, não no Livro do Direito de Família e muito menos no Direito das

Sucessões. Acha-se no Título ―Das Pessoas Naturais‖, arts. 6º e 7º, com

regulamentação da sucessão provisória e da sucessão definitiva nos artigos 22 a 39.

Houve mudança na disposição da matéria, que, no Código anterior, abrigava-se no

Direito de Família.

Assim, por ocasião da morte ou na ausência de uma pessoa,

ocorre a sucessão hereditária, também chamada de ―mortis causa‖. São duas as

vertentes do Direito Sucessório, que existiam no Código velho e se mantêm no novo:

a sucessão legítima e a sucessão testamentária. A primeira dá-se em virtude da lei,

que estabelece a ordem da vocação hereditária: descendentes, ascendentes,

cônjuge e colaterais até o 4º grau, além do companheiro. A outra espécie de

sucessão denomina-se ―testamentária‖ porque decorre da manifestação de vontade

deixada pelo testador, dispondo sobre seus bens e quem sejam os sucessores.

Havendo testamento, prevalece a sucessão testamentária, ante

a primazia da vontade do testador sobre a disposição da lei. Ressalva-se, porém, a

metade da herança, chamada de ―legítima‖, a que têm direito os herdeiros

necessários. Compreendem-se nessa especial categoria de herdeiros os

descendentes e os ascendentes do falecido e, por disposição do novo Código Civil,

também o cônjuge sobrevivente.

A inclusão do cônjuge como herdeiro necessário constitui

importante novidade, com reflexos na forma de atribuição da herança; sem falar que

o cônjuge passou a ter participação na herança junto com os descendentes,

dependendo do regime de bens adotado no casamento. Isso atinge mesmo as

pessoas casadas antes da vigência do novo Código Civil, com alteração, portanto,

das anteriores expectativas de direitos entre as partes. No regime do Código Civil de

1916, era possível fazer um testamento dispondo dos bens em favor de terceiros,

sem contemplar o cônjuge. Agora, o testamento continua possível, mas com

56

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

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41

restrição, não podendo alcançar a porção da herança reservada ao cônjuge como

herdeiro necessário.57

2.2.3 Termos básicos

Cumpre destacar alguns termos básicos sobre a sucessão

hereditária, para facilitar e encaminhar a exposição da matéria. A principal

personagem é o autor da herança, como se denomina o falecido ou desaparecido,

finado, extinto. Processualmente, o falecido é chamado de inventariado. Também se

conhece por de cujus, ou seja, aquele de cuja herança se trata.58

Entende-se por herança o conjunto dos bens deixados pelo

falecido. Não confundir com espólio, herança do ponto de vista processual ou formal.

Enquanto existir inventário, até a partilha, os bens da herança formam um espólio,

ou seja, a massa, a universalidade dos bens declarados em juízo. O espólio é

representado pelo inventariante, pessoa nomeada pelo juiz para atuar no inventário,

administrar os bens e prestar contas dos seus atos aos interessados na herança, até

que se efetue a partilha. 59

Na apuração da herança, aparta-se, primeiro, a meação

atribuída ao cônjuge sobrevivo, sobre os bens comunicáveis, na pendência do

regime de bens em que se casou. O restante é a herança, atribuível aos sucessores

legítimos ou testamentários.60

A transmissão dos bens da herança dá-se logo após a morte

do titular. Aplica-se o chamado ―droit de saisine‖, originário do Direito francês, como

já visto anteriormente segundo o qual o morto transmite seus bens ao vivo, por

consequência automática e imediata, independentemente da abertura do inventário,

que ocorre em data posterior, para mera formalização do ato transmissivo.61

Como sucessores distinguem-se: a) o herdeiro, sucessor

universal, que recebe a totalidade da herança (se for único) ou parte ideal em todos

57

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

58OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

59OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

60OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

61OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

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os bens (se houver mais de um herdeiro); e b) o legatário, sucessor singular, que

recebe coisa certa e determinada (legado), por disposição testamentária.

Quanto ao procedimento judicial para a transmissão dos bens,

temse o inventário e sua forma simplificada, o arrolamento, aplicável nos casos de

acordo ou de herança de pequeno valor.62

2.3 VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

Entende-se por vocação hereditária o chamamento de pessoa

legitimada a suceder nos bens do falecido. Pode ocorrer por disposição legal, como

na sucessão legítima, em que os herdeiros são chamados segundo a ordem da

vocação hereditária. Ou pode haver o chamamento dos herdeiros previstos em

testamento, e bem assim dos legatários, por disposição de vontade do autor da

herança. Inova o Código Civil, ao tratar da vocação hereditária em capítulo próprio, a

partir do art. 1.798, explicitando os requisitos pessoais para legitimação à sucessão

e as normas especiais sobre a capacitação para ingresso na sucessão

testamentária. 63

A matéria era de pouco trato no Código revogado, com

previsões apenas de aquisição por testamento, por pessoas existentes ao tempo da

mort e do testador, que não fossem declaradas incapazes, ou por indivíduos não

concebidos até a morte do testador, salvo disposição em favor de prole eventual

(arts. 1.717 e 1.718).64

A primeira regra a legitimar a vocação hereditária é a de que a

pessoa seja nascida ou já concebida no momento da abertura da sucessão. Atende-

se, portanto, ao direito do nascituro, que a lei resguarda a partir da concepção (art. 2

o do Código Civil). Nesse ponto, porém, nota-se que o direito sucessório não se

62

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004, pg.58.

63 Conferência proferida no ―II Encontro de Direito de Família do IBDFAM/DF‖, realizado pelo Instituto

Brasileiro de Direito de Família – Seção Distrito Federal, de 10 a 14 de maio de 2004, no auditório do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília – DF. Oliveira, Euclides de SUCESSÃO LEGÍTIMA À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL. Pesquisado em 17/08/2010.

64 Conferência proferida no ―II Encontro de Direito de Família do IBDFAM/DF‖, realizado pelo Instituto

Brasileiro de Direito de Família – Seção Distrito Federal, de 10 a 14 de maio de 2004, no auditório do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília – DF. Oliveira, Euclides de SUCESSÃO LEGÍTIMA À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL. Pesquisado em 17/08/2010.

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estende aos filhos concebidos post mortem, que a lei presume como sendo do autor

da herança nas hipóteses de reprodução assistida por fecundação artificial

homóloga, por uso de embriões excedentários decorrentes de concepção artificial

homóloga ou inseminação artificial heteróloga com prévia autorização do marido,

conforme disposto no art. 1.597, inciso. III a V, do mesmo Código. Ou seja, haverá

situação, nesses casos, de filhos havidos após a morte do autor da herança, como

tais considerados no plano do Direito de Família, porém sem o abrigo do direito aos

bens no Direito Sucessório. Tocante à sucessão testamentária, o Código vigente

resolve antigo questionamento sobre a extensão temporal do conceito de prole

eventual, a saber, até quando se lhe garante a vocação hereditária. Por disposição

de seu art. 1.799, inc. I, com explicitação no art. 1.800, somente prevalece por dois

anos a nomeação, pelo testador, de filhos ainda não concebidos, de pessoas por ele

designadas e vivas para sucedê-lo. Passado esse prazo, contado da data da

abertura da sucessão, os bens do nascituro, que se achavam confiados a um

curador, caberão aos herdeiros legítimos (salvo hipótese de substituição

testamentária).65

Habilitam-se, também, como sucessíveis por testamento, as

pessoas jurídicas, bem como as que o testador determine sejam constituídas sob a

forma de fundação (art. 1.799, inciso II e III).66

Ainda nesse capítulo, o Código Civil enumera impedimentos

para recebimento da herança ou de legado por testamento (art. 1.801), que melhor

caberiam no título próprio para tal espécie de sucessão. O mesmo se diga da

disposição contida no artigo 1.803, que formaliza entendimento da Súmula n. 477 do

Supremo Tribunal Federal, tocante à licitude de deixa ao filho de concubino, com a

condição de que também o seja do testador.67

65

Conferência proferida no ―II Encontro de Direito de Família do IBDFAM/DF‖, realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família – Seção Distrito Federal, de 10 a 14 de maio de 2004, no auditório do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília – DF. Oliveira, Euclides de SUCESSÃO LEGÍTIMA À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL. Pesquisado em 17/08/2010.

66 Conferência proferida no ―II Encontro de Direito de Família do IBDFAM/DF‖, realizado pelo

Instituto Brasileiro de Direito de Família – Seção Distrito Federal, de 10 a 14 de maio de 2004, no auditório do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília – DF. Oliveira, Euclides de SUCESSÃO LEGÍTIMA À LUZ DO NOVO CÓDIGO CIVIL. Pesquisado em 17/08/2010.

67NERY JÚNIOR, Nelson. Código Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2002.

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44

2.4 FORMAS DE SUCESSÃO LEGÍTIMA

A sucessão pode dar-se por direito próprio ou por direito de

representação.

Quando a herança passa ao herdeiro em virtude de sua

posição sucessória, na mesma classe e grau que os demais, dentro da ordem da

vocação hereditária, diz-se que a herança é atribuída ao herdeiro por direito próprio,

ou por cabeça.68

Quando, porém, ele é chamado a herdar em lugar de outro

herdeiro, pré-morto, ausente ou excluído da sucessão, diz-se que recebe a herança

por direito de representação.69

Neste segundo caso ele herda, não por ser o herdeiro direto,

e sim por ser o sucessor desse herdeiro, recebendo como seu representante, por

estirpe.70

É o que ocorre, por exemplo, quando o falecido deixa filhos

vivos e netos órfãos de outros filhos pré-mortos. Estes netos herdarão por direito de

representação, no lugar do herdeiro falecido, recebendo a cota que ele receberia se

vivo fosse.71

O direito de representação dá-se apenas na linha reta

descendente, e não na ascendente; na linha colateral, só acontece em favor dos

filhos de irmãos do falecido, quando concorrem com irmãos deste. 72

Como esclarece WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO,

em seu Curso de Direito Civil, Sucessões, ―o direito de representação em favor de

filhos de irmãos falecidos só existe quando concorrem com irmãos do pai pré-

defunto à herança do tio. Se não se trata de sucessão de tio, não há direito de

representação‖. Explica, ainda, o insigne doutrinador, que ―se se admitisse direito de

representação mais amplo e compreensível, colocar-se-ia o direito sucessório,

68

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 69

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 70

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 71

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OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004.

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45

indubitavelmente em contradição com o vínculo de sangue, contribuindo, outrossim,

para a sucessiva dispersão da herança e assim estabelecendo conflito com a

moderna tendência desse direito, que procura cada vez mais restringir o círculo dos

parentes sucessíveis‖.

Não é prevista no Código a representação em matéria de

herança testamentária, em razão do que muitos negam a possibilidade de seu

reconhecimento. Isso porque o direito de representação é tratado em capítulo

subjacente ao título que versa sobre a sucessão legítima.

Todavia, a questão enseja controvérsia, sendo preciso atentar para a circunstância

de que tampouco existe disposição legal proibitiva. Assim, possível inserir-se o

direito de representação na disposição de última vontade, por determinação do

testador, como uma espécie de substituição testamentária.73

2.4.1 Descendentes

Os descendentes do autor da herança formam classe

privilegiada. São os primeiros na ordem da vocação hereditária e sua existência

implica exclusão das demais classes, com exceção do cônjuge ou do companheiro

sobrevivente, aos quais o novo Código atribui uma participação concorrente na

herança.74

Os filhos herdam em igualdade de condições com os demais;

se não existem filhos, mas apenas netos, sucedem estes, e assim por diante,

excluindo os demais herdeiros das outras classes.75

Como já afirmado, o novo Código amplia a primeira classe da

ordem da vocação hereditária, passando o cônjuge a participar do direito à herança

em concorrência com os descendentes, dependendo do regime de bens do

casamento, na forma estabelecida no artigo 1.829, inciso I. Também haverá

concorrência na herança entre os descendentes e o companheiro deixado pelo autor

da herança, sobre os bens havidos concorrentemente durante a convivência,

conforme previsto no artigo 1.790, incisos I e II, do novo Código.A primeira regra, já

referida em tópico anterior, diz com a forma da atribuição da herança, que se dá por

73

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 74

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 75

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004.

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direito próprio ou por direito de representação. Na linguagem do Código, ―os filhos

sucedem por cabeça, e os outros descendentes, por cabeça ou por estirpe,

conforme se achem ou não no mesmo grau‖. 76

A segunda regra importante é que os descendentes de grau

mais próximo excluem os mais remotos, salvo o direito de representação, que

significa o recebimento da herança pelos descendentes do herdeiro morto, no

mesmo valor que a este caberia.77

Acolhendo a regra de absoluta igualdade entre os filhos, dispõe

o artigo 1.834 do atual Código que ―os descendentes da mesma classe têm os

mesmos direitos à sucessão de seus ascendentes‖. Note-se que o legislador utilizou

impropriamente o termo ―classe‖, que é aplicável genericamente a todos os

descendentes, quando pretendia referir-se aos descendentes do mesmo ―grau‖,

dentro daquela classe, assim havendo que se entender o preceito.78

SILVIO RODRIGUES, ao comentar o artigo 1.834, assinala

que:

Apesar da linguagem um tanto confusa, mencionando ‗os descendentes da mesma classe‘, quando os descendentes já integram a mesma classe – aliás, a 1ª classe dos sucessíveis -, o art. 1.834 vem reafirmar que estão suprimidas todas as normas que vigoraram no passado, e que estabeleciam distinções odiosas entre os descendentes, desnivelando os filhos, conforme a origem da filiação‖.79

Em elucidativa análise de dispositivo legal, assinala o festejado

mestre: ―o que se quis dizer é que os descendentes têm os mesmos direitos à

sucessão de seus ascendentes. Até por imperativo constitucional (art. 227, § 6º), os

descendentes não podem ficar discriminados, por qualquer razão, seja pela natureza

da filiação, seja pelo sexo ou progenitora. Nem pela circunstância de ser biológico

ou civil o parentesco. Todos têm o mesmo e igual direito hereditário, sendo a

paridade total e completa. A única preferência que se admite é a que se baseia no

76

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 77

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 78

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004. 79

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004.

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grau de parentesco: os em grau mais próximo excluem os mais remotos, salvo o

direito de representação (Código Civil, art. 1.833).‖ 80

2.4.2 Natureza da filiação: igualdade

Sobre a natureza da filiação, para efeitos sucessórios, havia

restrição, na redação primitiva do Código Civil de 1916, quanto ao direito do filho

natural reconhecido na constância do casamento, uma vez que só lhe cabia a

metade da cota atribuída em herança ao filho legítimo. Mas a disposição veio a ser

revogada pela Lei do Divórcio, em 1977, permitindo que se aplicasse, no plano da

sucessão pelos descendentes, a plena igualdade de direitos entre filhos legítimos ou

ilegítimos.81

Essa equiparação restou consagrada pela CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988, em seu artigo 227, § 6º, com expressa vedação de qualquer

tratamento discriminatório aos filhos pela sua origem. 82

Com o Código Civil, pacifica-se de vez a questão, pois nada

mais se refere quanto à natureza da filiação no plano sucessório, de modo que os

descendentes do falecido gozam de plena igualdade para todos os efeitos jurídicos,

sem que possam ser distinguidos no direito de herança.83

2.4.3 Ascendentes

Não havendo descendentes com direito à sucessão, são

chamados os ascendentes do de cujus, isto é, os seus pais, na falta destes os avós,

e assim sucessivamente. Não há, em tal caso, o direito de representação, que é

próprio da linha hereditária descendente.84

Sua participação na herança dá-se em concorrência com o

cônjuge sobrevivente, ou com o companheiro do falecido, conforme veremos ao

tratar dos direitos a estes reservados. Constitui regra importante a de que os

80

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004.

81 OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

82 OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

83 OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

84 OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

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ascendentes de grau mais próximo excluem os mais remotos, sem distinção de

linhas, se do lado paterno ou materno.85

Havendo igualdade em grau e diversidade em linha (ex.: dois

avós paternos e um materno), será repartida a herança entre as duas linhas, meio a

meio (e não em três cotas iguais), conforme consta do artigo 1.836, § 2º, do Código.

2.4.4 Cônjuge : meação e herança

O cônjuge sobrevivo, se casado no regime de comunhão

universal de bens, tem direito à meação, isto é, à percepção da metade dos bens

deixados pelo falecido. No regime da comunhão parcial, receberá metade dos

aquestos — os bens adquiridos na constância do casamento. Da mesma forma, terá

esse direito no regime da participação final nos aquestos, introduzido pela atual

legislação.86

A meação distingue-se da herança, pois decorre do regime de

bens e pré-existe ao óbito do outro cônjuge, devendo ser apurada sempre que

dissolvida a sociedade conjugal. Excluída a meação, o patrimônio restante deixado

pelo falecido constitui a herança, que é atribuída aos sucessores legítimos ou

testamentários. Não havendo descendentes nem ascendentes, esse direito de

herança cabe ao cônjuge sobrevivo então chamado de viúvo. Neste caso, não

interessa o regime adotado, seja o de comunhão de bens ou o de separação, o

cônjuge será herdeiro, salvo se, por ocasião da abertura da sucessão, já estivesse

dissolvida a sociedade conjugal. 87

Sobre a participação do cônjuge na herança, houve significativa alteração, pois o

cônjuge passa a ser herdeiro necessário (art. 1.845) e, conforme o regime de bens

do casamento, concorre na herança com os descendentes, na primeira classe da

vocação hereditária (art. 1.829, inciso I). 88

85

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 86

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 87

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 88

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

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Essa concorrência com os descendentes dá-se apenas nos

casos de o cônjuge ter sido casado no regime da separação convencional de bens,

ou da comunhão parcial se o autor da herança houver deixado bens particulares. O

citado artigo 1.829 do vigente Código não menciona a hipótese de casamento no

regime da participação final nos aquestos. Pela similitude dos efeitos finais da

apuração da meação, entende-se que a hipótese comporta a mesma situação

encontrada para o regime da comunhão parcial de bens.89

As observações supra decorrem de interpretação a contrario

sensu do mencionado dispositivo legal que, no inciso I, adota redação ambígua, ao

assegurar, como regra geral, o direito de concorrência do cônjuge sobrevivente com

os descendentes. Em seguida, vêm as exceções para as hipóteses de casamento

no regime da comunhão universal, no da separação obrigatória, ou ―se no regime da

comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares‖. Esta

última ressalva traz séria dúvida exegética sobre estar ligada ao início do inciso ou

às ressalvas de sua aplicação. Mas, por critério de bom senso e de adequação ao

sistema jurídico-sucessório, cabe interpretar que se trate também de ressalva ao

concurso do cônjuge com os descendentes, pois a hipótese é a de inexistência de

bens particulares do falecido, em que o cônjuge viúvo já tem assegurado pleno

direito de meação, como teria no regime da comunhão universal de bens.

Se o cônjuge falecido não tiver descendentes, mas deixar ascendentes, o cônjuge

sobrevivo herda concorrentemente com estes, na segunda classe da sucessão,

qualquer que seja o regime de bens, até mesmo se for o da separação total (art.

1.829, inciso II).

Os artigos 1.832 e 1.837 do Código dispõem a respeito da

quota cabente ao cônjuge sobrevivente nestes casos de concorrência. Quando o

cônjuge sobrevivente concorrer com os descendentes, terá direito a quinhão igual ao

dos que sucederem por cabeça; se for ascendente dos herdeiros com que concorrer,

sua quota não pode ser inferior à quarta parte da herança.90

89

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 90

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

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Não foi prevista a hipótese de haver entre o falecido e o

cônjuge sobrevivente filhos em comum e outros filhos do falecido com terceira

pessoa. Ante a omissão de dispositivo específico, paira dúvida se ficaria protegida

ou não a quarta parte da herança do cônjuge sobrevivente. Esse direito somente

seria cabível na concorrência com os filhos comuns, não com os demais, exigindo

complexo cálculo proporcional para apuração dos quinhões de cada um dos

beneficiários. Reafirma-se que o cônjuge sobrevivente continua sendo o terceiro na

linha da vocação hereditária. Caso não haja descendentes nem ascendentes, ele

herdará a totalidade da herança (art. 1.838). 91

2.5 TESTAMENTO

2.5.1 Conceito e Definição de Sucessão Testamentária

A maioria dos autores define sucessão testamentária como

aquela que é concedida por ato de última vontade através de testamento ou codicilo.

São muitas as conceituações acerca da temática.

Concebemos sucessão testamentária como sendo aquela que

ocorre quando o "de cujus" (finado) houver deixado testamento ou codicilo,

instrumentos jurídicos que declaram a sua vontade acerca do destino de seus bens.

92

2.5.2 Breve Escorço Histórico

A origem da sucessão testamentária remonta às mais

longínquas eras da humanidade. Autores há que apontam o nascimento de tal

instituto na Grécia Antiga, sendo posteriormente levado para Roma. Outros, como o

historiador Fustel de Coulanges ensinam que a sucessão testamentária originou-se

ulteriormente à Guerra do Peloponeso, em Esparta. 93

Transmite-nos o mestre francês que "é certo não ter sido

reconhecida na sua origem, como um direito natural, a faculdade de legar

91

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 92

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 93

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arbitrariamente os bens; o princípio constante nas épocas antigas foi o de que toda a

propriedade devia permanecer na família à qual a religião a havia legado." 94

A mesma lição é acolhida pelo professor Caio Mario da Silva

Pereira. Entretanto, parece haver uma fiel unanimidade quanto ao surgimento da

sucessão testamentária na antiga "Lex XII Tabularum" (Lei das Doze Tábuas) , de

Roma. Lá, as Tábuas IV (Do Pátrio Poder) e V (Da Tutela Hereditária) já traziam as

primeiras noções embrionárias de direito de família e sucessões, verificando-se

também a positivação do testamento entre aquele povo. Aliás, Rudolf Von Jhering,

pensador do direito, diz que o testamento representa "a metade do conjunto da

autonomia individual" ,defendendo assim, que o direito de testar deflui do próprio

direito de propriedade , de maneira natural. Isso porque logo cedo surgiu na vida civil

a necessidade de se fazer testamento. Evidente que muita evolução foi preciso para

que se caracterizasse a sucessão testamentária como ocorre atualmente. 95

O Pontes de Miranda, ao discorrer sobre a historicidade da

sucessão testamentária ensina-nos que "já na Lei das XII Tábuas e em Atenas já

haviam raízes sobre o testamento" como a mais antiga fonte do direito sucessório.

Suscitado doutrinador relaciona a Grécia, a Pérsia, a Irlanda ,

as populações pré-colombianas na América do Norte, na Arábia pré- islâmica como

os primeiros povos a utilizarem instrumentos assemelhados com o testamento. 96

É sabido que na obscura Idade Média havia forte presença

das autoridades cléricas e políticas nas práticas testamentárias. Mantendo essa

orientação, em nosso direito anterior, a exemplo do que ocorria na Europa Medieval,

havia uma forte intervenção dos religiosos na feitura dos testamentos. Clóvis

Beviláqua, autor do projeto vencedor do atual Código Civil Brasileiro, conta que "o

poder crescente do clero impunha tais exigências a uma sociedade eminentemente

cristã, que tornara quase obrigatórias as deixas a favor da Igreja". Naquela época, o

testamento era feito perante o pároco em presença de duas testemunhas. 97

94

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 95

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 96

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 97

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004

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52

Em 1.916, o legislador pátrio imprimiu orientação clara à

sucessão testamentária, fazendo-a conviver pacificamente com a sucessão legítima

e dirimindo dúvidas de outrora, como a proibição de dispor parcialmente do

patrimônio, embora consagre a liberdade genérica de dispor em testamento,

instituição de herdeiros, por exemplo. São 203 (duzentos e três) artigos, incluídas as

regras atinentes à partilha.98

2.5.3 Considerações sobre a sucessão testamentária no Código Civil

O Direito das Sucessões sofreu profundas modificações com o

advento do Código Civil. Dentre essas modificações merece enfoque algumas

alterações introduzidas no âmbito da sucessão testamentária, cuja matéria guarda

íntima relação com o cotidiano das lides notariais.99

A intangibilidade da legítima dos herdeiros necessários não foi

alvo de maiores alterações com a nova legislação. A indisponibilidade da legítima

permanece, portanto, a rigor das disposições dos artigos. 1.789, 1.846 e 1.857, § 1º

do novo Código Civil. Tal princípio já era prestigiado no Código revogado, em seus

artigos 1.576 e 1.721 que reservava, igualmente, aos herdeiros legítimos, o direito à

metade dos bens do autor da herança. Mudança substancial refere-se a inclusão do

cônjuge sobrevivente no rol de herdeiros necessários (art. 1.845), em concorrência

com os descendentes (art. 1.829, I) e, na falta destes, com os ascendentes (art.

1.829, II).100

Os gravames de bens da legítima dos herdeiros com as

cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade (art. 1.723 do

Código Civil revogado), até então em franco uso, sofreram restrições pelo art. 1.848

do Código Civil novo, que permite ao testador estabelecê-las somente quando

houver justa causa declarada no testamento. Nesse sentido, o Código, em

disposição transitória (art. 2.042) assinala ao testador o prazo de um ano, para que 98

OLIVEIRA, Euclides de, direito de família, Sucessão legítima a luz do novo código civil,2004 99

Artigo publicado em 07.2004 por , Carlos Kennedy Da Costa Leite, Tabelião do Serviço Notarial do 1º Ofício da Comarca de Machado (MG), pós-graduado em Direito Civil. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5888

100

Artigo publicado em 07.2004 por , Carlos Kennedy Da Costa Leite, Tabelião do Serviço Notarial do 1º Ofício da Comarca de Machado (MG), pós-graduado em Direito Civil. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5888

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adite o testamento feito na vigência da lei velha, de forma a declarar justa causa de

cláusula aposta à legitima. É importante salientar que a justificativa refere-se tão

somente às imposições clausulares incidentes sobre bens que componham a

legítima dos herdeiros necessários, havendo, portanto, plena liberdade de impor os

gravames, sem qualquer justificativa aos bens que o testador determinar que saiam

de sua metade disponível (arts. 1.846, 1.857, § 1º e 1.966 do Código Civil).101

Além disso, a nova lei, em seu art. 1.848, § 1º, veda ao

testador determinar a conversão dos bens da legítima em outros de espécie diversa.

Essa disposição era tolerada pelo art. 1.723 da legislação substantiva civil extinta.

O art. 1.857, § 2º da nova lei preenche, de maneira precisa,

uma lacuna deixada pelo Código em vigor, quando assevera que "são válidas as

disposições testamentárias de caráter não patrimonial, ainda que o testador somente

a elas se tenha limitado". Tal dispositivo convalida os testamentos que versem

exclusivamente sobre atos de cunho extrapatrimonial, tais como o reconhecimento

de filho, nomeação de tutor, deserdações, etc. Essa providência visa proteger

disposições desta natureza do rótulo conceitual de que o testamento se presta

unicamente a preceitos de ordem patrimonial, oriunda da "definição" que foi dada ao

instituto pelo art. 1.626 do antigo código.

No ordenamento jurídico brasileiro podemos observar a

existência de três testamentos ordinários, a saber: público, cerrado e particular e três

especiais (aeronáutico, marítimo e militar).

Cada um deles possui suas especificidades e regras próprias.

Todavia, o presente estudo irá ater-se somente no que tange o Testamento

Ordinário em sua forma Pública.

O assunto vem elencado no Código Civil do artigo 1864 até

1867.

101

Artigo publicado em 07.2004 por , Carlos Kennedy Da Costa Leite, Tabelião do Serviço Notarial do 1º Ofício da Comarca de Machado (MG), pós-graduado em Direito Civil. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5888

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54

2.5.4 Conceito De Testamento Público

O Testamento Público é considerado como sendo o mais

seguro de todos tendo em vista que a sua lavratura é feita perante o tabelião, ou seu

substituto legal, com o competente apontamento em livro de notas. Entretanto, a sua

forma de feitura permite que qualquer pessoa possa ter o conhecimento de seu

conteúdo.102

2.5.5 Os requisitos para sua feitura:

Para que o testamento Público seja idealizado, é necessário

que alguns requisitos sejam preenchidos e observados.

Nos dizeres de Maria Helena Diniz:

O testamento público é o lavrado pelo tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com a declaração de vontade do testador, exarada verbalmente, em língua nacional, perante o mesmo oficial e na presença de duas testemunhas idôneas ou desimpedidas.103

Em primeiro plano, podemos observar que, consoante artigo

1864, I do Código Civil, tal testamento deverá ser lavrado somente pelo tabelião ou

por seu substituto legal, não podendo outra pessoa fazê-lo, na forma escrita ou

mecânica, bem como o competente livro de notas.104

Necessário frisar também que para o ato é necessário a

presença de duas testemunhas idôneas e desimpedidas, as quais deverão

presenciar todo o ato, devendo conhecer e entender a língua nacional. O doutrinador

Caio Mário informa quais as pessoas que não podem ser testemunhas:

102

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. 06, 23ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2009; 103

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. 06, 23ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2009;

104 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. 06, 23ª edição. Editora Saraiva, São

Paulo: 2009;

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55

a) os menores de 16 anos;

b) os mentalmente enfermos ou retardados;

c) os surdos, os cegos;

d) os herdeiros instituídos ou os legatários; bem como os descendentes, ascendentes, colaterais e afins até o terceiro grau ou cônjuge de um ou de outro.105

Sua redação deverá ser feita em língua nacional, não podendo

ser feita em outra mesmo com a presença de intérprete.106

Muito embora a lavratura deva ser feita pelo tabelião ou seu

substituto legal, não há exigência de local específico, como por exemplo o próprio

cartório, assim ensina Caio Mário da Silva: ―Pode ser lavrado em cartório ou outro

local qualquer (residência, hotel, hospital, prisão), independentemente de

justificativa. E pode sê-lo ainda em domingo ou feriado, no horário de expediente

normal ou à noite‖.107

Insta salientar que o testador irá fazer as suas declarações

para a feitura do testamento, podendo lançar mão de apontamentos, notas ou de

minutas previamente escritas. Nos dizeres do doutrinador Carlos Roberto

Gonçalves: ―A vontade do testador deve ser externada ao oficial público sob a forma

de declaração, admitindo-se a entrega de minuta previamente elaborada (seguida da

declaração verbal de que contém a sua última vontade) ou de consulta de

anotações.108

Após ser escrito, o tabelião fará a leitura do Testamento em

voz alta para as testemunhas e testador. Todavia, este poderá fazê-lo se assim

105

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. 06, 16ª edição. Editora Forense. Rio de Janeiro: 2007.

106 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São

Paulo: 2010; 107

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. 06, 16ª edição. Editora Forense. Rio de Janeiro: 2007.

108 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São

Paulo: 2010;

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56

quiser (artigo 1864, II). Mesmo que o testador seja surdo, este poderá fazer a leitura

desde que saiba ler, ou então designará alguém que o faça por ele.109

Não havendo nenhuma irregularidade, após a leitura, o

testamento será assinado pelas testemunhas, testador e tabelião. Caso o testador

não saiba ou não possa assinar (enfermidade, por exemplo), uma das testemunhas

assinará a seu rogo (artigo 1865).110

No que tange aos cegos, o artigo 1867 permite somente a eles

testar sob a forma pública, sendo que será lido a ele, em voz alta, por duas vezes;

uma pelo tabelião ou seu substituto legal e a outra por uma das testemunhas, sendo

tudo mencionado no corpo do testamento.111

O analfabeto também somente poderá testar de forma pública,

com proibição expressa sob a forma cerrada e particular (artigo 1872 e 1876 § 1o).112

No que diz respeito aos mudos e os surdos-mudos, estes não

poderão testar de forma pública, nos dizeres do doutrinador Carlos Roberto

Gonçalves: ―Em síntese, só não podem testar publicamente os mudos e os surdos-

mudos, por não poderem fazer declarações ao tabelião de viva voz.‖113

Há que se ressaltar ainda, que o Código Civil procurou adequar

sua redação à terminologia hodierna quando se refere ao "Tabelião" como

serventuário encarregado da lavratura de testamento público ou da aprovação de

testamento cerrado, substituindo o termo "Oficial" utilizado pelo código

octogenário.114

109

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2010; 110

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2010; 111

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2010; 112

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2010; 113

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Vol. 07, 4ª edição. Editora Saraiva, São Paulo: 2010;

114 Escrito Por Nicholas Pereira Carvalho Sexta, 25 De Junho De 2010 21:05,O testamento

publico e suas peculiaridades. Estudante da oitava etapa do curso de Direito da Universidade de

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57

Ribeirão Preto – UNAERP, pesquisado em 25/10/2010.

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CAPÍTULO 3

DIFERENÇA DA SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO

3.1 A SUCESSÃO DO CÔNJUGE NO CÓDIGO CIVIL

A primeira alteração importante foi a colocação do cônjuge

como herdeiro também nas duas primeiras classes preferenciais, em concorrência,

portanto, com os descendentes e os ascendentes115

É, com efeito, o que dispõe o art. 1.829:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.

Tal disposição substitui o usufruto vidual, e com grandes

vantagens, pois agora o cônjuge tem não apenas o usufruto, mas direito a parte da

herança. Mas é bom se recordar que tal inovação só se aplica às sucessões abertas

após a vigência do novo Código, ou seja, se o de cujus falecer após 11 de janeiro de

2003.

Pela nova disposição legal, o cônjuge herda juntamente com os

descendentes, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão

universal, ou no da separação obrigatória de bens116, ou se, no regime da comunhão

115

ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil: sucessões. 4. ed. [S. l.]: Coimbra Ed., 1989. p.343-344

116 Observe-se que a lei faz errônea remissão ao art. 1.640, parágrafo único, sendo que o texto

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59

parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares. Ou seja, herda o

cônjuge se for casado com regime de separação total de bens, participação final nos

aquestos ou, não havendo bens particulares, comunhão parcial de bens.

O pressuposto da lei para a limitação quanto ao regime é de

que, havendo comunhão ilimitada (que é evidenciada no regime de comunhão

universal – embora neste também haja bens excluídos da comunhão – e no regime

de comunhão parcial em que não haja bens particulares do de cujus), não tem o

cônjuge necessidade de concorrer à sucessão com os descendentes117.

Esqueceu-se o legislador, contudo, de que também no regime

de participação final nos aquestos pode haver comunhão ilimitada.

Nos termos do art. 1.832, caberá ao cônjuge quinhão igual ao

dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte

da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer. Então, se houver

mais de quatro descendentes concorrendo por cabeça, não haverá igualdade de

quinhões. O cônjuge herdará uma quarta parte, sendo as três restantes divididas por

cabeça entre os descendentes. Note-se que isto só ocorrerá se o cônjuge for

ascendente de todos os herdeiros com que concorrer. Havendo herdeiros não

descendentes seus (ainda que em concorrência com outros descendentes), sua cota

será sempre igual à deles.

Em segundo lugar, herdam os ascendentes, em concorrência

com o cônjuge sobrevivente. Aqui a lei não faz distinção quanto ao regime de bens

do casamento; em qualquer regime o cônjuge tem direito à concorrência na

sucessão. Nos termos do art. 1.837, concorrendo com ascendente em primeiro grau,

ao cônjuge tocará um terço da herança; mas lhe caberá a metade da herança se

houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.

referente ao regime de separação obrigatória está agora no art. 1.641.

117 CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avançado de

direito civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p.247-248

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60

Na falta de descendentes e ascendentes, será deferida a

sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente (art. 1.838), como já se dava no

sistema passado.

Mantém o novo Código o direito real de habitação no art. 1.831,

estendendo-o a qualquer regime de bens. Não repetiu o novo Código a expressão

―enquanto viver e permanecer viúvo‖. Obviamente o direito só existe enquanto viver

o cônjuge, não sendo transmissível com sua morte. Quanto à exigência de que

permaneça viúvo, parece-nos revogada, embora seja criticável a nova disposição

legal, em face do caráter assistencial do instituto. É inconveniente que o imóvel

permaneça gravado, onerando o herdeiro em benefício do cônjuge que já se casou

de novo e que, provavelmente, não necessita mais do benefício.

O novo Código acresce também uma restrição para o cônjuge

no art. 1.830: seu direito sucessório se encerra não apenas com a dissolução da

sociedade conjugal, como no Código anterior (art. 1.611, caput), mas também com a

separação de fato por mais de dois anos.

Trata-se de inovação inadequada, tendo em vista que a

separação de fato não extingue a sociedade conjugal, não devendo ser causa de

extinção dos direitos conjugais. Mas pode o cônjuge provar que essa convivência se

tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

Por fim, cabe referir uma outra alteração importante no tocante

à sucessão do cônjuge: passa ele a ser considerado herdeiro necessário (art.

1.845). Isto significa dizer que o cônjuge não pode mais ser afastado da sucessão

por mero capricho do de cujus, simplesmente testando em favor de terceiro.

Somente por meio da deserdação poderá o testador afastar seu cônjuge da

sucessão.

Mas aqui também reside o maior defeito do novo Código nesse

campo: embora o cônjuge passe a ser herdeiro necessário, não cuida o novo

diploma da sua deserdação. Com efeito, embora o art. 1.961 preveja a deserdação

dos herdeiros necessários (aí incluído o cônjuge) e os dois artigos seguintes tratem,

respectivamente, das causas de deserdação dos descendentes por seus

ascendentes e dos ascendentes por seus descendentes, não há no novo Código

dispositivo que preveja as causas de deserdação do cônjuge. Não sendo possível a

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61

aplicação da analogia em matéria restritiva de direito, a omissão da lei fica sem

qualquer possibilidade de solução, até porque as hipóteses de deserdação tratadas

na lei não seriam mesmo aplicáveis aos cônjuges118.

Assim, até que se supra tal omissão, o cônjuge, embora

herdeiro necessário, não pode ser deserdado119.

3.2 A SUCESSÃO DO COMPANHEIRO NO CÓDIGO CIVIL.

3.2.1 A sucessão do companheiro sobrevivente

O Estado, até a Constituição Federal de 1988, tinha a família

legitimamente constituída, aquela oriunda, somente, pela união do casamento,

todavia, após o ordenamento constitucional de 1988 o Estado deu amparo àquela

família extramatrimonial, estabelecida no § 3º, do artigo 226. A Lei, também, impedia

sua dissolução e trazia discriminações às relações e às pessoas que não fossem

unidas pelo casamento120.

Ao dissertar sobre o tema, Colares assevera:

O legislador não consegue acompanhar a realidade social e nem contemplar as inquietações da família contemporânea. A sociedade evolui, transforma-se, rompe com tradições e amarras, o que gera a necessidade de constante oxigenação das leis. A tendência é simplesmente proceder à atualização normativa, sem absorver o espírito das silenciosas mudanças alcançadas no seio social, o que fortalece a manutenção da conduta de apego à tradição, legalista, moralista e opressora da lei121.

Na legislação anterior - Código Civil de 1916 - era inexistente a

sucessão legítima, sendo permitida apenas a nomeação da concubina como

herdeira testamentária, contudo desde que o testador não fosse casado, conforme o

118

CARVALHO NETO, Inácio de; apud, Érika Harumi. Novo Código Civil comparado e comentado. Curitiba: Juruá, 2002. v. VII, comentários ao art. 1.961, p. 168-169.

119 Inácio de Carvalho Neto, artigo sobre, A sucessão do cônjuge e do companheiro no novo

código civil. Pesquisado em 27/10/2010.

120 Artigo escrito por Denigelson da Rosa Ismael, pesquisado em 26/10/2010,

http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1095&Itemid=83

121 COLARES, Marcos. A sedução de ser feliz: Uma análise sócio jurídica dos casamentos e

separações. Brasília: Letraviva, 2000, p. 47.

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62

inciso III do artigo 1.719. Atenta-se para o fato de tal dispositivo referir-se somente a

pessoa do sexo feminino, pois a Lei não mencionava o "concubino" de mulher

casada.

Assim, coube aos doutrinadores e à jurisprudência, com o

passar do tempo, afastar tais sanções que pesavam sobre a união entre os

companheiros, quando não envolvendo o adultério, pois o legislador sempre viu o

concubinato com extrema reserva.122 Como já mencionado, o casamento era tido

como a única forma legítima de constituir família, fato que, por longo período, os

tribunais passaram a reconhecer direitos aos concubinos (leia-se união estável).

Diante dos avanços da sociedade, através da Súmula 35 o

Supremo Tribunal Federal conferiu direito à indenização decorrente da morte do

concubino em acidente de trabalho ou de transporte, contanto que não houvesse

entre os concubinos impedimentos para o matrimônio. De outra sorte, ainda, foram

consolidados os direitos previdenciários da companheira (Leis nº 4.297/93 e

6.194/74), permitindo que está fosse a designada beneficiária do contribuinte

falecido123.

Destarte, com a ausência do divórcio e o crescente número das

uniões estáveis, não-incestuosas e não-adulterinas, coube à jurisprudência

importante tarefa, a de impedir as lesões, que se tornaram muito freqüentes, como

acontece nas relações jurídicas em que se deixa solta a liberdade, sem limitações,

sem responsabilidade124.

Diante do reconhecimento dos doutrinadores e dos Tribunais

em relação ao concubinato, o Supremo Tribunal Federal viu-se motivado a editar a

Súmula 380 determinando que, depois de comprovada a existência de sociedade de

fato entre os concubinos (aquela concebida entre um homem e uma mulher como se

casados fossem), é cabível sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio

adquirido pelo esforço comum.125

122

WALD, Arnold. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito das Sucessões. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 87.

123 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito de Família. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, v. 6. p.

51.

124 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de fato. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2001, p.

301.

125 Artigo escrito por Denigelson da Rosa Ismael, pesquisado em 26/10/2010,

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63

Ainda, se não houvesse a aquisição do patrimônio pelo esforço

em comum, a jurisprudência previa à concubina o direito de indenização por serviços

prestados. Isso é, uma indenização pelos serviços domésticos prestados (quer como

auxiliar, doméstica, gerência do lar, etc126), como se fosse uma remuneração pelo

longo tempo em convívio.

Assim sendo, os Tribunais pacificaram que, com a morte do

companheiro, depois de comprovada a sociedade de fato, o companheiro

sobrevivente pediria sua quota-parte nos bens e direitos adquiridos com sua

cooperação física e moral e, no caso de indenização, caberia a restituição em forma

reparatória dos trabalhos identificados, desempenhados por ele (companheiro

sobrevivente) em benefício da pessoa do companheiro falecido, de sua casa e de

sua vida, junto às Varas Cíveis, com base no Direito das Obrigações.

Após, com a promulgação da Constituição Federal, em outubro

de 1988, e com as Leis Especiais no 8.971/94 e no 9.278/96, os Tribunais foram

dando à relação dos companheiros (união estável) a importância e o entendimento

de que não apenas o esforço comum financeiro era fundamental, como também o

reconhecimento de uma entidade familiar127.

3.3 A DESIGUALDADE ENTRE COMPANHEIRO E CÔNJUGE

A lei empresta tratamento desigual ao casamento e a união

estável no âmbito do direito sucessório. Ainda que assegurado a cônjuges e

companheiros o direito de concorrer com descendentes e ascendentes, este

privilégio esta previsto em dispositivos legais distintos e tanto o cálculo com a base

de incidência são diferentes. O direito do Companheiro limita-se aos bens adquiridos

onerosamente durante a vida em comum. Mas quando é o cônjuge que concorre, o

http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1095&Itemid=83

126 DIAS, Adahyl Lourenço. A Concubina e o Direito brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1975, p.

114.

127 Rodrigo da Cunha Pereira afirma que a importância de se reconhecer nos Tribunais que o esforço

comum para aquisição de patrimônio pode não ser necessariamente financeiro foi revolucionária. Ora, isso é reconhecer e firmar uma posição de mudança em que as relações estáveis deixam de ser tratadas como uma sociedade de fato, no sentido comercial, para serem reconhecidas como entidade familiar (Concubinato..., op. cit. p. 60-1).

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64

cálculo é feito, no mais das vezes, sobre os bens particulares, a depender do regime

de bens.

Primeiramente, cabe suscitar a legitimidade do companheiro

sobrevivente e do cônjuge sobrevivente. A legitimidade do primeiro está

expressamente prevista no ordenamento Civil, mais precisamente em seu artigo

1.790, que assim prescreve:

Artigo 1.790. A companheira ou o companheiro participará da

sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união

estável, nas condições seguintes:

I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

Quanto ao segundo, sua legitimidade está amparada nos

artigos 1.829, que trata da ordem da vocação hereditária, e 1.845, que diz respeito

aos herdeiros necessários, todos do Código Civil.

Nota-se que a situação do cônjuge sobrevivente foi

amplamente melhorada pelo Código Civil, e houve melhorias no que se refere ao

companheiro sobrevivente, enquanto acompanhou as inovações feitas ao cônjuge.

Todavia, o ordenamento Civil trouxe à baila profundos retrocessos.

O primeiro aspecto polêmico diz respeito à diferenciação entre

cônjuge e companheiro no direito sucessório. Ora, frente a todas as igualdades

alcançadas até a promulgação do Código Civil de 2002, enquanto o cônjuge foi

elevado à categoria de herdeiro necessário, o companheiro, apesar de toda

evolução do instituto da união estável, não recebeu o mesmo tratamento, tendo sido

a sua sucessão regulada de modo diverso, no capítulo das disposições gerais.

Portanto, ao colocar um como herdeiro necessário e outro não, faz-se uma profunda

injustiça.

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65

Assim, o companheiro sobrevivente participará na sucessão do

de cujus apenas no tocante aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união

estável, não integralizando o patrimônio adquirido a título gratuito e por fato eventual

na constância da união estável, assim como os bens particulares do falecido,

adquiridos antes do início da união estável.

Deste modo, devido à imprecisão do legislador ao compor o

texto do artigo 1.790 do Código Civil, o companheiro supérstite apenas participará

na sucessão dos bens adquiridos onerosamente a partir do efetivo início da união de

fato, excluindo-se os adquiridos gratuitamente, tais como os por sucessão, doação e

sub-rogação128.

O Código Civil assegura ao cônjuge supérstite o direito real de

habitação, não importando o regime de bens, sem prejuízo do que lhe couber na

herança (artigo 1.831). Contudo, mesmo dispositivo não há em favor do

companheiro supérstite, o que mais uma vez comprova a vontade do legislador de

2002 de afastar a união estável do casamento na seara sucessória129.

Assim, os direitos conferidos pelas Leis no 8.971/94 e no

9.278/96 aos companheiros, como o direito ao usufruto sobre porção variável do

acervo hereditário e o direito real de habitação sobre o imóvel destinado à residência

familiar, sujeito, porém, à resolução em virtude de nova união estável, ou de

casamento de seu titular, ficam a margem da interpretação, pois, na ótica de alguns

doutrinadores, estão revogados.

A respeito da possível revogação sobre tais direitos, Rodrigues

reporta:

O direito real de habitação sobre o imóvel destinado à residência da família, que a legislação anterior conferia ao companheiro sobrevivente, não foi mencionado no Código Civil, com relação à união estável, o que significa outro recuo. Porém como o direito real

128

Artigo escrito por Denigelson da Rosa Ismael, pesquisado em 26/10/2010, http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1095&Itemid=83

129 CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso Avançado de

Direito Civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. Direito das Sucessões, v. 6, p. 234.

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66

de habitação, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, foi previsto em lei especial (Lei 9.278/96, art. 7º, parágrafo único), e como esse benefício não é incompatível com qualquer artigo do novo Código Civil, uma corrente poderá argumentar que ele não foi revogado, e subsiste.130

Por outro lado, Cahali e Hironaka defendem que houve a

revogação das Leis Especiais quando afirmam:

Em nosso entender, houve a revogação dos artigos referidos por incompatibilidade com a nova lei. Com efeito, o art. 1.790 estabelece que o companheiro ou companheira 'participará da sucessão do outro [...] nas condições seguintes'. Fora das condições previstas na norma, o sobrevivente não participa da sucessão de seu falecido companheiro.131 [grifos dos autores]

Nesta mesma linha de pensamento de Cahali e Hironaka está

Rizzardo, que também entende não subsistirem esses direitos ao sustentar que:

No novo Código Civil não ficou ressalvado o direito real de habitação na dissolução da união estável por morte, diferentemente do que constava na Lei nº 9.278, de 10.05.1996, cujo art. 7º, parágrafo único estendia ao companheiro sobrevivente enquanto não constituísse nova união ou casamento, o direito real de habitação, relativamente sobre o imóvel destinado a residência da família. De forma contrária a essas ressalvas, alguns críticos afirmavam que os problemas que decorreriam seriam maiores que os benefícios, pois gerariam atritos e prejuízos aos herdeiros, em geral aos descendentes apenas de um dos conviventes, em favor do companheiro sobrevivo. Ademais, isso inviabilizaria o benefício, diante da dependência da produção de provas da efetividade da união.132

Já Venosa defende que existirá o direito real de habitação para

os companheiros:

Por outro lado, a Lei no 9.278/96 estabelecera, no art. 7o, o direito real de habitação quando dissolvida a união estável pela morte de um dos companheiros, direito esse que perduraria enquanto vivesse ou não constituísse o sobrevivente nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.133

130

RODRIGUES, Silvio. Direito..., op. cit., p. 119.

131 CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso..., op. cit., p. 233.

132RIZZARDO, Arnaldo. Direito das..., op. cit., p. 205-6.

133 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. Direito das Sucessões, v.

7, p. 158.

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67

Outra desigualdade entre o cônjuge e o companheiro

sobrevivente é no tocante à totalidade da herança. Enquanto o primeiro tem direito à

totalidade da herança se inexistirem descendentes ou ascendentes, o companheiro

ainda terá que concorrer com os outros parentes sucessíveis que, nesse caso,

seriam os ascendentes e os colaterais até o quarto grau. Não bastando isso, tem

direito somente até um terço da herança.

Sobre esse aspecto, do Desembargador Ricardo Raupp

Ruschel, do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao julgar o Agravo de

Instrumento nº 70020389284, sobre a matéria brilhantemente decidiu:

Não é aceitável, assim, que prevaleça a interpretação literal do artigo 1.790 do CC 2002, cuja sucessão do companheiro na totalidade dos bens é relegada à remotíssima hipótese de, na falta de descendentes e ascendentes, inexistirem, também, "parentes sucessíveis", o que implicaria em verdadeiro retrocesso social frente à evolução doutrinária e jurisprudencial do instituto da união estável havida até então134.

Nova imprecisão referente ao direito sucessório do

companheiro está elencada no inciso IV do artigo 1.790 do Código Civil quando diz

que, em não havendo parentes sucessíveis, terá o companheiro direito à totalidade

da herança, em choque com o caput do mesmo artigo, pois este trata a sucessão do

companheiro sobrevivente somente aos bens adquiridos onerosamente na

constância da união estável. Assim, quando o companheiro deixar somente bens

adquiridos gratuitamente, quer dizer que o companheiro sobrevivente a nada teria

direito? 135

Sobre esse aspecto, Rodrigues salienta que os companheiros

terão unicamente direito à herança dos bens adquiridos onerosamente na

constância da união, quando assegura:

134

BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Sétima Câmara Cível. Agravo de Instrumento nº 70020389284. Relator. Des. Ricardo Raupp Ruschel. Julgado em: 12 set. 2007. Disponível em: . Acesso em: 3 março 2007.

135 Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka sustentam que a totalidade da

herança a que se refere o inciso é aquela prevista no caput, ou seja, limitada aos bens adquiridos onerosamente na constância da união. Assim, sendo maior o patrimônio do falecido, aqueles bens não contemplados no caput serão tidos como herança jacente (Curso..., op. cit., p. 230-1).

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68

No entanto, ao regular o direito sucessório entre companheiros, em vez de fazer as adaptações e consertos que a doutrina já propugnava, especialmente, nos pontos em que o companheiro sobrevivente ficava numa situação mais vantajosa do que a viúva ou o viúvo, o Código Civil coloca os partícipes de união estável, na sucessão hereditária, numa posição de extrema inferioridade, comparada com o novo status sucessório dos cônjuges. [...] Diante desse surpreendente preceito, redigido de forma inequívoca, não se pode chegar a outra conclusão senão a de que o direito sucessório do companheiro se limita e se restringe, em qualquer caso, aos bens que tenham sido adquiridos onerosamente na vigência da união estável.

[...] Sendo assim, se durante a união estável dos companheiros não houve aquisição, a título oneroso, de nenhum bem, não haverá possibilidade de o sobrevivente herdar coisa alguma, ainda que o de cujus tenha deixado valioso patrimônio, que foi formado antes de constituir união estável136.

Diante de tais fatos, configura-se a desigualdade originada pelo

legislador do companheiro frente ao cônjuge, pois este foi amplamente beneficiado

nas disposições, enquanto aquele foi posto numa posição de inferioridade face às

normas contidas no novo ordenamento Civil137.

Na concorrência sucessória com os descendentes, a fração a

ser recebida por cônjuges e companheiros só é igual em uma única hipótese:

quando todos os herdeiros são filhos seus, e isso se o numero deles não for superior

a três. Tanto o cônjuge como o companheiro herdam como se filhos fossem. A

herança é dividida por cabeça entre os sobreviventes e os herdeiros. Assim, sendo

um filho, a herança é dividida com o seu genitor.sendo dois os filhos, eles ficam com

dois terços da herança, e o cônjuge e o companheiro com um terço. O mesmo

ocorre se forem três os filhos: cada um recebe uma quarta parte.138

O tratamento igualitário termina ai. Se o numero de os

herdeiros for superior a quatro, o cônjuge tem direito a uma quota mínima de ¼ da

herança, recebendo quinhão maior que seus filhos. Assim, se casal tinha 5 filhos, o

cônjuge recebe 25%, e cada m dos filhos 15% da herança. Esta mesma garantia 136

RODRIGUES, Silvio. Direito..., op. cit., p. 117-8.

137 Artigo escrito por Denigelson da Rosa Ismael, pesquisado em 26/10/2010,

http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1095&Itemid=83

138 DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008,

p.149.

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69

não é assegurada na união estável. Se os pais dos herdeiros não eram casados, a

divisão é igualitária entre o companheiro e os filhos : cada um recebe 1/6, ou seja,

aproximadamente, 16,6%. 139

Casamento União Estável

Filho 1

Filho 2

Filho3

Filho 4

Filho 5

Cônjuge

Filho 1

Filho 2

Filho 3

Filho 4

Filho 5

Companheiro

Quando os herdeiros são filhos somente do autor da herança,

enquanto o viúvo recebe parcela igual à dos enteados, o quinhão do companheiro

sobrevivente é exatamente a metade. Ficando no exemplo dos cinco filhos, o

cônjuge a cada filho do companheiro recebem 16,6%.Porem, se o falecimento não

era casado, o companheiro sobrevivente recebe, em valor aproximado, 9% e cada

um dos filhos do falecido 18%.140

139

DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.149.

140 DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008,

p.150.

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Casamento União Estável

Filho 1

Filho 2

Filho 3

Filho 4

Filho 5

Cônjuge

Filho 1

Filho 2

Filho 3

Filho 4

Fiho 5

Companheiro

Parece que o legislador esqueceu das famílias pluriparentais,

que surgem da sucessividade dos vínculos afetivos, ensejando o surgimento da

chamada filiação híbrida, expressão cunhada por GISELDA HIRONAKA141 para

identificar uma realidade cada vez mais frequente: entidades familiares constituídas

pelo casamento ou união estável, que existem filhos exclusivos de cada um e filhos

comuns. Deste modo, quando do falecimento de um dos cônjuges ou companheiros,

há herdeiros que são filhos somente do autor da herança e herdeiros que são filhos

do casal. Ao tratar da sucessão no casamento, a lei deixa de esclarecer se, havendo

filiação híbrida, subsiste ou não o direito do viúvo á quota mínima. Também na união

estável são concedidas parcelas diferenciadas quando existem filhos comuns e

filhos exclusivos do de cujus. Mas olvidou-se a lei indicar o modo de calcular o

quinhão do companheiro sobrevivente. Portanto, não se sabe se o viúvo permanece

com a garantia de receber um quarto da herança e tampouco se o companheiro

percebe quinhão igual ao dos herdeiros ou apenas metade. A única solução é

socorrer-se de complicadas equações algébricas, de modo a encontrar uma media

ponderada – tarefa nem um pouco fácil142.

O tratamento discriminatório entre cônjuge e o companheiro

também esta presente na concorrência com os ascendentes. Quando os herdeiros

são os ascendentes, o entendimento unânime é de que o direito do cônjuge é

141

Giselda Hironaka, Comentários ao Código Civil, v.20.

142 DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008,

p.150-151.

Page 72: DIFERENÇAS ENTRE A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO …siaibib01.univali.br/pdf/Juliette Moser.pdf · 2. No que discorre sobre direito sucessório, o companheiro participara da herança

71

calculado sobre a totalidade da herança. Porem, na união estável o companheiro

participa da sucessão quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da

união estável.143

O quinhão do cônjuge e do companheiro somente é igual na

hipótese de a concorrência se estabelecer com ambos os genitores do falecido.

Cada um recebe a fração de 1/3 : o cônjuge ou o companheiro a cada um dos

genitores.144

Casamento União Estável

Sogro

Sogra

Cônjuge

Sogro

Sogra

Cônjuge

Em todas as demais hipóteses o percentual a eles destinado é

diferente. Ao viúvo é assegurada metade da herança. Já a fração do companheiro

não muda, continua sempre 1/3. Assim, na concorrência com só um dos pais do

falecido, o cônjuge fica com cinquenta por cento e o companheiro com 1/3145.

Casamento União Estável

143

DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p151. 144

DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p151.

145 DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008,

p151.

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Sogro

Cônjuge

Sogro

Companheiro

Quando os ascendentes forem de graus mais distantes (avos

do falecido), independente de quantos sejam, a parcela do cônjuge continua sendo

50% e a do companheiro , de 1/3. Logo, na hipótese de o falecido ter sido casado,

se os herdeiros forem os quatro avos, o cônjuge recebe a metade e a outra metade

é dividida entre os avos: cada um vai receber 1/8 da herança. Porem, se o falecido

vivia em união estável, o parceiro fica com 1/3 e cada um dos avos, com 1/6.146

Casamento União Estável

Avo 1

Avo 2

Avo 3

Avo 4

Conjuge

Avo 1

Avo 2

Avo 3

Avo 4

Companheiro

3.4 A SUCESSÃO DO COMPANHEIRO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 2002

O primeiro assunto relevante diz respeito à inclusão do direito

sucessório do companheiro, que está alocada nas Disposições Gerais do Livro

146

DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p151.

Page 74: DIFERENÇAS ENTRE A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO …siaibib01.univali.br/pdf/Juliette Moser.pdf · 2. No que discorre sobre direito sucessório, o companheiro participara da herança

73

destinado ao direito das sucessões, e não disposta na ordem de vocação hereditária

do artigo 1.829 do Código Civil, juntamente com o cônjuge, ou melhor, ao lado do

cônjuge, haja vista o reconhecimento constitucional da união estável como entidade

familiar, equiparando-se ao casamento.

Nesse aspecto, Almeida e Azevedo asseveram que o normal

era que se tratasse da companheira na sucessão legítima, quando regulasse a

ordem de vocação hereditária. Talvez ainda por preconceito contra a inclusão da

companheira entre os herdeiros, preferiu regular a matéria no capítulo referente às

disposições gerais sobre a sucessão147.

No mais, o artigo 1.725 do Código Civil prevê que, salvo

contrato escrito entre os companheiros, se aplica às relações patrimoniais, no que

couber, o regime da comunhão parcial de bens.

O ordenamento Civil dispõe que o companheiro supérstite tão-

somente participará na sucessão dos bens adquiridos onerosamente, conforme o

artigo 1.790. Portanto, celebrado contrato entre os conviventes, este não terá efeitos

na sucessão causa mortis, pois o companheiro sobrevivente pode participar na

sucessão dos bens adquiridos onerosamente.

Acerca da sucessão do companheiro, Leite e Teixeira ensinam

que o legislador deixou claro que o direito sucessório emana dos bens

onerosamente adquiridos, ao assegurarem que:

[...] o(a) companheiro(a) participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Independente de qualquer consideração de caráter axiológico sobre o teor da disposição e da intenção do legislador de estabelecer limites entre as duas realidades, o fato é que o mesmo deixou suficientemente claro que a pretensão ao direito sucessório decorre exclusivamente do patrimônio adquirido onerosamente pelos companheiros148.

147

ALMEIDA, José Luiz Gavião de; AZEVEDO, Álvaro Villaça (Coord.). Código Civil comentado. São Paulo: Atlas, 2003. Direito das Sucessões, sucessão em geral, sucessão legítima, v. XVIII, p. 59.

148 LEITE, Eduardo de Oliveira; TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários ao Novo

Código Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Do Direito das Sucessões, v. XXI, p. 54.

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74

Já os incisos I e II do artigo 1.790 dispõem sobre a

concorrência do companheiro sobrevivente com os descendentes. O primeiro diz

respeito aos filhos comuns, quando terá direito a uma quota equivalente àquela que

por lei for atribuída ao filho149, enquanto no inciso II o companheiro sobrevivente

estará concorrendo com filhos só do de cujus, e lhe tocará metade do que couber a

cada um daqueles.150

Acerca do previsto no inciso II do artigo 1.790, ensinam Cahali

e Hironaka:

Deste modo, concorrendo com descendentes só do autor da herança, tocará ao companheiro metade do que couber a cada um deles. Portanto, somam-se os convocados por cabeça. Cada filho recebe dois, e a companheira um. Assim, multiplica-se o número de filhos por dois e soma-se a parcela do sobrevivente. Àqueles destinam-se duas partes do total, a este uma parte do total. Exemplificando: 4 filhos x 2 = 8; mais 1 do sobrevivente = 9; cada filho recebe 2/9 e o sobrevivente, 1/9151.

Contudo, inexistindo descendentes, o companheiro supérstite

irá concorrer com outros parentes sucessíveis. Tal disposição não se encontrava na

legislação anterior. O dispositivo encontra muitas críticas na doutrina, uma vez que

apresenta um inquestionável retrocesso, pois, se o regime da união estável é o da

comunhão parcial de bens, o direito sucessório diz respeito à metade do patrimônio

e não, certamente, a um terço152. A esse respeito assim decidiu a Oitava e Sétima

Câmara Cível, respectivamente, do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do

Sul:

EMENTA: Agravo de Instrumento. Inventário. Companheiro sobrevivente. Direito à totalidade da herança. Parentes colaterais. Exclusão dos irmãos da sucessão. Inaplicabilidade do art. 1790, inc. III, do CC/02. Incidente de inconstitucionalidade. Art. 480 do CPC. Não se aplica a regra contida no art. 1790, inc. III, do CC/02, por afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e de igualdade, já que o art. 226, § 3º, da CF, deu

149

Enunciado 266 da III Jornada de Direito Civil - "Art. 1.790: Aplica-se o inc. I do art. 1.790 também na hipótese de concorrência do companheiro sobrevivente com outros descendentes comuns, e não apenas na concorrência com filhos comuns".

150 LEITE, Eduardo de Oliveira; TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários..., op. cit., p.

63. 151

CAHALI, José Francisco; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso..., op. cit., p. 231-2.

152 LEITE, Eduardo de Oliveira; TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários..., op. cit., p.

63.

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75

tratamento paritário ao instituto da união estável em relação ao casamento. Assim, devem ser excluídos da sucessão os parentes colaterais, tendo o companheiro o direito à totalidade da herança. Incidente de inconstitucionalidade arguido, de ofício, na forma do art. 480 do CPC. Incidente rejeitado, por maioria. Recurso desprovido, por maioria153.

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ABERTURA DA SUCESSÃO OCORRIDA SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO CIVIL. APLICABILIDADE DA NOVA LEI, NOS TERMOS DO ARTIGO 1.787. HABILITAÇÃO EM AUTOS DE IRMÃO DA FALECIDA. CASO CONCRETO, EM QUE MERECE AFASTADA A SUCESSÃO DO IRMÃO, NÃO INCIDINDO A REGRA PREVISTA NO 1.790, III, DO CCB, QUE CONFERE TRATAMENTO DIFERENCIADO ENTRE COMPANHEIRO E CÔNJUGE. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA EQUIDADE. Não se pode negar que tanto à família de direito, ou formalmente constituída, como também àquela que se constituiu por simples fato, há que se outorgar a mesma proteção legal, em observância ao princípio da equidade, assegurando-se igualdade de tratamento entre cônjuge e companheiro, inclusive no plano sucessório. Ademais, a própria Constituição Federal não confere tratamento iníquo aos cônjuges e companheiros, tampouco o faziam as Leis que regulamentavam a união estável antes do advento do novo Código Civil, não podendo, assim, prevalecer a interpretação literal do artigo em questão, sob pena de se incorrer na odiosa diferenciação, deixando ao desamparo a família constituída pela união estável, e conferindo proteção legal privilegiada à família constituída de acordo com as formalidades da lei. Preliminar não conhecida e recurso provido. (Agravo de Instrumento Nº 70020389284, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 12/09/2007)154.

Entende-se por parentes sucessíveis os ascendentes do

falecido e os colaterais até o quarto grau. Todavia, tal dispositivo traz um verdadeiro

retrocesso na sucessão do companheiro. Os doutrinadores muito criticaram tal

disposição.

Além do mais, independente de qualquer consideração relativa

ao regime de bens na união estável, causa estranheza que o companheiro / a

companheira que viveu toda uma existência ao lado do outro tenha direito a apenas

um terço da herança, a favor dos outros "parentes sucessíveis" que, em princípio,

em nada contribuíram na aquisição do dito patrimônio155.

153

BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Oitava Câmara Cível. Agravo de Instrumento n. 70017169335. Relator: Des. José Ataídes Siqueira Trindade. Julgado em: 8 mar. 2007.

154 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Sétima Câmara Cível. Agravo de

Instrumento nº 70020389284. Relator. Des. Ricardo Raupp Ruschel. Julgado em: 12 set. 2007.

155 LEITE, Eduardo de Oliveira; TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários..., op. cit., p.

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76

Por último, o inciso IV do artigo 1.790 disciplina que, em não

havendo parentes sucessíveis, terá o companheiro sobrevivente direito à totalidade

da herança. Como já mencionado, teria o companheiro sobrevivente adquirido

apenas os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável. Contudo,

há grande divergência doutrinária acerca deste aspecto. Neste sentido, o Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul assim decidiu:

EMENTA: União Estável. Direitos sucessórios da companheira. Não possuindo o companheiro falecido descendentes e nem ascendentes, a companheira tem direito à integralidade da herança, independentemente de os bens inventariados terem sido adquiridos antes ou depois da união estável. Inteligência do art. 2º da Lei 8.971-94, aplicável à espécie. Negado provimento ao apelo156.

O tratamento diferenciado é inconstitucional. No mesmo

dispositivo em que assegura especial proteção à família, a Constituição reconhece a

união estável como entidade familiar, não manifestadamente preferência por

qualquer de suas formas (CF 226§3º). A lei que veio regular a norma constitucional

inseriu o companheiro na mesma posição do cônjuge, conferindo-lhe a totalidade da

herança na falta de ascendentes e descendentes (Lei 8.971/1994 2.º).

Assegurado ao cônjuge e ao companheiro direito de

concorrência, não há como excluir o mesmo direito na união homoafetiva.

Conceituando a Lei Maria da Penha a entidade familiar independentemente da

orientação sexual, estão assegurando ao parceiro sobrevivente os mesmos direitos

sucessórios. Alias, neste sentido vem se inclinando a jurisprudência157.

63.

156 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Sétima Câmara Cível. Apelação Cível n.

70016506693. Relatora: Des. Maria Berenice Dias. Julgado em: 8 nov. 2006.

157 DIAS, Maria Berenice, Manual das Sucessões, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2008,

p152.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa buscou investigar a Sucessão do

Cônjuge e do Companheiro e para o seu desenvolvimento lógico o trabalho foi

dividido em três capítulos, tratando eles do casamento e da união estável, do

momento de abertura da sucessão, e da concorrência do cônjuge e do companheiro.

O conceito de família sofreu varias mudanças, assim como

também o do próprio casamento, as relações extramatrimoniais tiveram outro ponto

de vista. As relações informais de antes foram reconhecidas como união estável, e

integraram ao sistema familiar, então se iniciou um processo de revisão que obrigou

a reconhecer os direitos de tais uniões.

A união entre homem e mulher passa a ser reconhecida como

entidade familiar para fim de proteção pelo estado com a Constituição federal de

1988, em seu artigo 226, § 3º, entretanto deixou para a legislação ordinária

desenvolver direitos e deveres decorrentes dessas relações.

A união estável para ser caracterizada é indispensável alguns

requisitos como entidade familiar, sendo os mais importantes: ausência de

formalismo, convivência, estabilidade, continuidade, e publicidade.

A concorrência deve existir apenas em relação aos bens

particulares do falecido, visto que tal regime se assemelha, quanto à dissolução do

casamento, ao regime de comunhão parcial de bens, senão vejamos: analisando o

regime da comunhão parcial de bens, tendo o de cujus deixado bens particulares,

caberá ao cônjuge sua meação, concorrendo quanto aos bens particulares, visto que

a intenção do legislador é a de amparar o cônjuge sobrevivente; não sendo, pois,

coerente concorrer na totalidade da herança.

O companheiro sobrevivente herdará concorrendo com

descendentes comuns e, nesse caso, receberá cota correspondente a dos filhos.

Concorrerá também com os filhos só do falecido recebendo, aqui, metade do que

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couber a cada um destes. Se concorrer com outros parentes terá direito a um terço

da herança e, se não houver parentes sucessíveis, tocar-lhe-á a totalidade da

herança. Note-se que quando falamos em concorrência do companheiro com

descendentes comuns ou só do falecido, esta só ocorre quanto aos bens adquiridos

onerosamente durante a constância da união estável e após a retirada da meação

da companheira que, como dito, pertence a ela não se tratando de parte da herança.

Os bens adquiridos antes da constituição da união estável serão herdados, em sua

totalidade, pelos filhos do falecido.

Realizada a pesquisa as hipóteses trazidas foram confirmadas.

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REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

Alberto Trabucchi, Instituzioni n. 107 apud PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito, p.37.

ALMEIDA, José Luiz Gavião de; AZEVEDO, Álvaro Villaça (Coord.). Código Civil comentado. São Paulo: Atlas, 2003. Direito das Sucessões, sucessão em geral, sucessão legítima, v. XVIII, p. 59.

Artigo escrito por Denigelson da Rosa Ismael, pesquisado em 26/10/2010, http://www.arpenbrasil.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1095&Itemid=83.

Artigo do desembargador do TJ/RS; professor das Escolas da Magistratura e do Ministério Público do RS; e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seção RS. http://www.blindagemfiscal.com.br/familia/uniao_estavel01.htm, pesquisado em 24/04/2010;

Artigo Publicado em: 04/11/2009 , http://www.artigonal.com/direito-artigos/uniao-estavel-requisitos-e-efeitos-1420515.html, pesquisado dia 25/04/2010;

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RT752/339: ―Investigação de paternidade – Herança – Bens deixados pelo falecido investigado, como também frutos e rendimentos, que devem integrar o quinhão hereditário do filho reconhecido, a partir da data da abertura da sucessão – Aplicação do Instituto da saisine – Inteligência do artigo 1.572 do Código Civil [atual artigo 1.784].

RT 597/250: Inventario – Filiação ilegítima – Reconhecimento com efeito ex-tunc – Partilha nos termos da lei vigente á época da abertura da sucessão‖.(STF).

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SILVIO RODRIGUES (ob.cit., p.15) ensina: ‖enquanto o inventariante conserva a posse direta dos bens do espólio, os herdeiros adquirem a sua posse indireta. Ambos ostentam, simultaneamente, a condição de possuidores‖

PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007.

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