diário insular - nº 257 - 09.03

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AÇORIANIDADE EM NEMÉSIO EFEMéRIDE 257 # 09.03.2008 WWW. DIARIOINSULAR .COM Jornal Diário | Ano LX I | Nº19007 | 0,55 e Fundado em 1946 | Terceira | Açores

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AçoriAnidAdeem nemésio

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�di dOmiNGO 09.MARÇO.2008

fOTOGrAfiA ANTóNiO ArAújO

CompUtAdor portátiL

museu AberTO 062 notA de ABertUrAJosé Lourenço

04 Vitorino nemésio - 30 anos depois [REPORTAGEM]

12 Francisco Coelho e reis Leite [PERSPECTIVAS]

14 Maduro-Dias [VELA DE ESTAI]

16 Celebrar nemésio [REPORTAGEM]

18 Luiz Fagundes Duarte [FOLHETIM]

24 Guilherme Marinho [OPINIÃO]

25 Arnaldo ourique [OPINIÃO]

26 Fernando Lopes [DESPORTO]

28 sugestões [AGENDA]

29 Cartoon [TIRO&QUEDA]

20 Principezinho de saint-exupéry [REPORTAGEM]

nemésio: em nome da açorianidade1.em 1975, Vitorino Nemésio redige

quatro textos – que “diário insular” pu-blicou, na íntegra, nesse ano e que re-edita nesta edição – onde recupera o conceito de “Açorianidade” para se in-surgir, embora de forma pouco estri-dente, contra a convulsão política que se vivia no País e nos Açores nessa altu-ra. Os quatro textos de Vitorino Nemé-sio são, ao mesmo tempo, um grito de revolta contra a indefinição política que grassava em Portugal, particularmente nesse ano, a defesa da calma “ilhoa”, mas também um contributo para a rea-firmação – e eventuais esclarecimentos – da “Açorianidade”, conceito que defi-niu em 1932. entretanto, na Praia da Vi-tória, decorreram, recentemente, cele-brações, a propósito do trigésimo ani-versário da sua morte. O que mais ficou evidente foi a natureza açoriana enraiza-da na pessoa do escritor praiense que, crescendo por esse mundo fora, mante-ve e fermentou o espírito da açorianida-de que ele próprio inventou na palavra. 2.filipe La féria trouxe a Angra uma adaptação para teatro de “O Principe-zinho”, a obra de referência do nosso imaginário infanto-juvenil. recorrendo às potencialidades que o texto ofere-ce ao nível da dramaturgia e também às novas tecnologias (vídeo, som e luz), filipe La féria deu um toque mui-to peculiar a uma história que encan-ta gerações e que se baseia na poesia e no imaginário de um pequeno prínci-pe que vive num asteróide e que visita a terra. A obra-prima do francês Antoi-ne de saint-exupéry tem 80 milhões de livros vendidos, em cerca de 500 edi-ções, distribuídas por quase 160 lín-guas, sendo a obra mais lida em todo mundo depois da bíblia.3.Graças aos seus métodos inovado-res, fernando Lopes revolucionou o fu-tebol terceirense nas décadas de 60 e 70, conquistando diversos êxitos ao ser-viço do união Praiense, sC Praiense e, sobretudo, sC Angrense. Crítico da sé-rie Açores, defende as virtudes da for-mação.

CoMPutADor PortátiL, HewLett PACkArD, PortAbLe VeCtrA Cs.séC. XX. C 41,5 X L �5,5 X A 9 Cm. mAH.r.2008.128.disponível em duas configurações de armazenamento – duas drives de disquetes ou uma drive de disquete e um disco rígido de 20mb –, o Vectra Cs apresentava um mo-

nitor de LCd (cristal líquido) considerado grande, e, como acessório, um adaptador para um monitor externo. este computador portátil foi introduzido no mercado em 1987. Todavia, devido à sua dimensão e custo significativo, o Vectra Cs não teve sucesso.Este computador pertence ao acervo do Museu de Angra do Heroísmo.

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em defesA dAAçoriAnidAde

VITORINO NEMéSIO

em 1975, ViTOriNO NemésiO rediGe quATrO TexTOs – que diáriO

iNsuLAr PubLiCOu NA íNTeGrA Nesse ANO e que reediTA NesTA

ediçãO – ONde reCuPerA O CONCeiTO de “AçOriANidAde” PArA

se iNsurGir, embOrA de fOrmA POuCO esTrideNTe, CONTrA A

CONVuLsãO POLíTiCA que se ViViA NO PAís e NOs AçOres NessA

ALTurA.»

No convulso ano de 1975, Vitorino Nemésio redige quatro escritos (dois deles publicados, primeiro, no jornal Novo) onde se insurge contra as sucessivas celeumas que se iam dando nos Açores, particular-mente as tentativas políticas de influenciar o curso da vontade autonómica que sagrava no arquipélago.recuperando os traços essenciais da “Açorianidade” – que definira em 1932 – o escritor praiense – “ilhéu e cidadão do mundo” – usa o conhecimento intrín-seco que da alma insular tinha para explicar aos lo-cais e aos “continentais” que o povo das ilhas nada queria das revoluções, dos activismos e do confronto ideológico que se registava no resto do território na-cional: «(…) ilhas de má morte para a politização de encomenda, para onde é pena não se poder mandar meia dúzia de chaimites e uns milhares de pistolas-metralhadoras com hortênsias em de vez dos cravos que já faltam nos canos.se bem que ilhéu, depois de morto, ainda dá coice», escreveu num desses textos.«Ao sol ouro-verde do amanhecer da minha velha Angra, entregue ao acaso de ruas e travessas, nis-to eu pensava, e entendia então que ninguém de fo-ra parte tem nada que ensinar a esta gente», escre-veu noutro.Os quatro textos – publicados entre setembro e Ou-tubro no diário insular – traçam o perfil do açoriano, fazendo, em paralelo, denotar a simpatia de Nemé-sio pela estabilidade construída nas ilhas durante vá-rios séculos.“Perante as injunções do «processo revolucionário» o açoriano, em geral, reage mal. Apesar de ter mui-to a reivindicar no plano da justiça social, põe acima de tudo o nível da paz existencial e pública que atin-giu. detesta que o catequizem em nome de qualquer forma de progresso”, alega Vitorino Nemésio no pri-meiro texto, intitulado “Açores, gente arcaica”, que leva, primeiro, à página no jornal Novo – quase co-mo um aviso à navegação – e depois deixa publicar no diário insular (a 23 de setembro de 1975), abrin-do a série de quatro redacções que, em boa verdade, demonstram a vontade do escritor em intervir, em, usando a sua prosa, lançar mão dos valores que su-portam a alma açoriana e alertar para dentro e para

fora sobre o rumo a seguir.e nesses textos Vitorino Nemésio não só recupera os traços essenciais que havia definido no seu texto de 32 (“O Açoriano e os Açores”) como se coloca ao la-do da vontade insular pela autonomia.“Os Açores sentem-se como gente – este é um facto. são uma forte variedade de nação portuguesa criada em meio milénio no isolamento norte-atlântico. se geograficamente distribuem os ventos e índices tér-micos que hão-de tocar à europa, porque demónio, politicamente, não decidirão das correntes de ideias e interesses que os agitam, das instituições que lhes convêm?”, escreve a 05 de Outubro, no texto intitu-lado “Açores: de onde sopram os ventos”, o tercei-ro da série.e é neste texto que Nemésio critica a postura de mui-tos nacionais para com o arquipélago: «seja qual for a configuração de direito público que o povo dos Açores venha a tomar, o que é notável, imediatamen-te histórico, é o grau de consciência a que chegou da sua singularidade territorial e cívica. já se falou de «estado federado», que um alto responsável decla-rou «imaturo». Ora, o que é imaturo significa também que pode vir a amadurecer. (…) felizmente a «aço-rianidade», a força do carácter açoriano, só é pes-te para certos progressistas que fazem imperialismo, como monsieur jourdain fazia prosa, sem se aperce-berem de tal. Para nós outros, meus natos, contuma-zes, açorianidade é o nosso modo de afirmação no mundo e alma que sentimos, na forma de corpo que levamos”, assume, para logo garantir que esta vonta-de de se governar não é sinónimo de qualquer senti-mento separatista ou de procura de uma identidade diferente da assumida durante séculos.“Lusos somos, português falamos, com o algarvio e o baiano, o minhoto e o madeirense, o cabo-ver-diano e o nativo do rio Grande do sul, que povoa-mos. Lá está Portugal, Alegre, antigamente chamado «dos Casais («açoritas», como lá dizem), para o po-voar com alguns milhares de descendentes de nos-sos avós emigrantes, idos em arca de Noé com suas mulheres, enxadas, vestimentas, nomes – os barce-los, os Goulartes, os Terras, os Ornelas que dos lago-ais de são Pedro às raias do Paraguai e da Argentina

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ainda hoje proliferam”, sublinha.dos quatro textos – embora o último, publicado a 15 de Outubro de 1975, Nemésio demonstre não ter vontade de ser mais um escritor ao serviço da polí-tica – ressaltam os traços que o escritor, anos antes, definira como característicos do povo açoriano.Gente calma, ordeira, acostumada à solidão, com uma vida marcada pela dureza, mas assente nos va-lores da família, da honra e do trabalho. Gente que prefere a paz e o sossego ao rebuliço da urbanidade, mas indivíduos capazes de reagir perante situações contrárias ao seu credo.“Os casos contados de «continentais» actualmente marginalizados ou mesmo expulsos das ilhas pelos naturais indignados devem-se ao papel sectário que se prestaram a desempenhar no recente improviso ilhéu revolucionário. mas até com patrícios que to-maram idêntica posição o ilhéu procedeu da mesma maneira, como ainda há pouco tempo nesta ilha Ter-ceira, onde escrevo”, conta Nemésio do “Açores, gen-te arcaica”, relatando a história de um jovem local que, portador de documentos de activistas no Con-tinente, foi acompanhado por uma extensa comitiva até ao aeroporto e recambiado para a metrópole no primeiro avião que deixou a Terceira.“O exemplo citado pertence à tipologia de levantes de uma sociedade de um querer colectivo arcaiza-do, - a mesma que outrora esbulhada das suas rega-lias costumeiras de pastorícia, ia «esborralhar» (der-rubar) alta noite as paredes de lava solta que duran-te o dia alguns deles embuçados, tinham erguido, pagos à jorna por grandes proprietários usurpadores de baldios ou mesmo apenas empenhados em re-cuperar pastagens de que, durante longos pousios, os criadores de gado pobres se tinham costumado a usufruir em compactuo.A estes bandos paroquiais de revindita chamavam justiça da Noite. Os actuais, motorizados, à escala da ilha, serão talvez crismados de justiça Noite e dia”, sublinha Nemésio.segundo o cronista praiense, em 1975, permanecem nas ilhas os mesmos sentimentos que, em 1932, des-crevera como elementos cruciais do “ser-se ilhéu”.O açoriano é “um português da segunda metade de quatrocentos, introduzindo nele os coeficien-tes de correcção que o viveiro insular elaborou”, co-mo escreveu no artigo “O açoriano e os Açores”, re-publicado no seu livro “sob os signos de Agora”. “meio milénio de existência sobre tufos vulcânicos, por baixo de nuvens que são asas e de bicharocos que são nuvens, é já uma carga respeitável de Tem-po - e o tempo é espírito em fieri (...)”, escreveu. “Como homens estamos soldados historicamente ao povo de onde viemos e enraizados pelo habitat a uns montes de lava que soltam da própria entra-nha uma substancia que nos penetra. A geografia, para nós, vale outro tanto como a história (...)”, fi-xou, resumindo em palavras o sentimento do povo que habita as ilhas perdidas no meio do Atlântico. influenciado pela “hispanidad” de unamuno, Vito-

rino Nemésio (que no texto “de onde sopram os ventos”, publicado a 05 de Outubro de 1975, ex-plica essa influência) observou a terra, procuran-do no empirismo do quotidiano a alma do ilhéu. Por isso, considerou o micaelense o mais trabalhador, o mais introvertido e talvez o mais rude nos tipos ru-rais, o terceirense bem menos trabalhador, mais fes-teiro e convivente, com traços de certa manha rural, agrupando a ele os açorianos “das ilhas de baixo”. Nessa caracterização, o escritor destacou o pico-ense, chegando ao ponto de o considerar a “na-ta do insulano”: “homens do mar, homens de pa-lavra, dando conta da vida com frontalidade e brio”. Nos textos que escreveu sobre os Açores – pensa-dos, sobretudo, para mostrar ao mundo o seu mun-do, a sua terra natal – Nemésio fixou o torpor da ne-gra lava, imagem constante no seu imaginário, feito de homens rijos, de honra, extraídos da solidão im-posta pelo mar pela necessidade da sobrevivência. A sua “Pátria Açoriana” acabou resgatada pelas nar-rativas autonomistas, consagrando-se como a subs-tância teórica justificadora da diferenciação dos ha-bitantes das ilhas.Nessa altura, e mesmo em intervenções posteriores, Nemésio sempre garantiu a sua falta de vontade em assumir-se como interventor político, como agente de mudança, ou mesmo como autor de palavras com intuitos para além da escrita e da busca pela identi-dade da sua terra natal. deixou claro que a sua “aço-rianidade” resultava da vontade em explicar aos ou-tros o mundo onde nascera.No entanto, no primeiro dos quatro textos com que reage às convulsões políticas e sociais em curso no País em 1975, após a revolução dos Cravos, assim como nos Açores, Vitorino Nemésio mostra-se mais interventivo.“escrevi à pouco, daqui um artigo nos Açores, sem problemas, para hoje me vir enredar nalguns desses mesmos problemas que então quisera evitar. Como-dismo reutróide fruto da fadiga de velho? um pou-co. mas sobretudo desencanto, autêntico desânimo de um português ilhéu que viveu tempos convulsos – regicídio, duas guerras mundiais, várias batalhas nas colónias, um câmbio de regime ou dois (28 de maio), a monarquia do Norte, a Camioneta-fantas-ma… Nada porém comparável a esta convulsão apo-calíptica que oxalá ainda traga no ventre a verdadei-ra revolução”, reconhece.

DI republica nesta edição os quatro textos da autoria de Vitorino Nemésio, redigidos em 1975. Os documentos foram editados em qua-tro edições de Diário Insular: um em Setem-bro (“Açores, gente arcaica?”), e três duran-te o mês de Outubro: “Uma cidade das ilhas contesta”, “Açores: de onde sopram os ven-tos” e “O cavaleiro da figura triste”. São, actu-almente, tidos como um complemento ao tex-to de 1932, onde define “Açorianidade”.

Açores, gente arcaica?É fácil surpreender a atitude das populações dos Açores na tremenda crise histórica que vivemos. Outro tanto não direi da focagem dos problemas que as preocupam, cujas soluções a longo prazo se não deixam formular com transparência. Pe-rante as injunções do «processo revolucionário» o açoriano, em geral, reage mal. Apesar de ter muito a reivindicar no pla-no da justiça social, põe acima de tudo o nível da paz existen-cial e pública que atingiu. Detesta que o catequizem em nome de qualquer forma de progresso. Isso, para ele, equivale a di-zerem-lhe que é retrógrado – não o consente, como quem lho diz é «continental», em regra, ou se apoia em critérios e na au-toridade da metrópole, o ilhéu ou finca-se, rejeita o ferrete.Para se entender isto é preciso ter convivido muito nestas pla-gas, nestes rincões de apartamento, de solidão saturada. A imagem do «continental», hoje transtornada, era benvinda nas ilhas. A gente de fora tinha para o ilhéu o prestígio dos meios grandes, o antigo contacto da corte, da capital, da moda. Só era detestado o exactor, o magistrado prepotente, o burocrata que se dava ares de dono de roça.Mas o tipo de intruso acintosamente assumido era relativa-mente raro. Ou o funcionário de fora se mostrava alérgico ao clima, aos usos, à lentidão das gentes – e muitas vezes era ele próprio que, não podendo mais, partia – ou se resignava ao diferente e até, em muitos casos, se adaptava entusiásti-co ao modo de viver insular, exaltando a paisagem, adoran-do os pitéus – a alcatra, as lapas – e em tudo revelando-se conforme. Imediatamente a sociedade insulana naturalizava o adventício. Ilhéu e continental passavam a viver como deus com seus anjos.E como não havia assim ser se as ilhas se povoaram de gente do Minho e da Beira, do Algarve e em geral do Tejo ao Sul com fortíssimos contingentes de colonos, como o provam em parte dos documentos e sobretudo a etnografia das formas da habi-tação e do rarulato em certas ilhas e zonas delas.Sem falar dos madeirenses e de alguns flamengos que na pri-meira hora rumaram aos Açores (e os madeirenses que eram, senão continentais deslocados, com menos de um século de vida à Robinson?), todo o fôlego humano que respira à flor da cordilheira atlântica veio do Portugal ibérico. Só é preci-so abrir casilhos, de excepção para alguns hebreus, e para algum tardio polvilho de ingleses e franceses comerciantes. Pouco mais.Os casos contados de «continentais» actualmente marginali-zados ou mesmo expulsos das ilhas pelos naturais indigna-dos devem-se ao papel sectário que se prestaram a desempe-nhar no recente improviso ilhéu revolucionário. Mas até com patrícios que tomaram idêntica posição o ilhéu procedeu da mesma maneira, como ainda há pouco tempo nesta ilha Ter-ceira, onde escrevo. Um jovem sindicante, daqui natural, sus-peito de portador de um rol de pessoas a sanear, de posições chave a garantir, além de trazer instruções para reintegrar, in-demnizando-os, militantes activistas que haviam sido segrega-dos dos quadros do trabalho onde pressionavam os camara-das e seguidamente expulsos da ilha, foi por sua vez obrigado a abandoná-la imediatamente. A multidão procurou-o em ca-sa, fez-lhe o ultimato. Não contente com as promessas de êxo-do em poucos dias, obrigou o jovem a vestir-se sumariamen-te e a acompanhá-la.Duzentos ou mais automóveis seguiam o carro do detido e ir-

romperam no aeroporto, sem quererem saber do controlo, até ao terminal. Aí, em acalorado diálogo com o comandante do primeiro avião a partir, obrigaram-no a receber o proscrito a bordo apesar de não incluído na lista de passageiros sem le-var a pasta dos «dossiers» que previamente confiscaram. Tudo isto com resistência manifesta à intervenção da autoridade e clara decisão de ali jogarem as últimas.Semelhante estado de espírito de uma população proverbial-mente pacata mostra bem até que ponto o seu sentimento de autodeterminação chegou. O exemplo citado pertence à tipo-logia de levantes de uma sociedade de um querer colectivo arcaizado, - a mesma que outrora esbulhada das suas rega-lias costumeiras de pastorícia, ia «esborralhar» (derrubar) alta noite as paredes de lava solta que durante o dia alguns deles embuçados, tinham erguido, pagos à jorna por grandes pro-prietários usurpadores de baldios ou mesmo apenas empe-nhados em recuperar pastagens de que, durante longos pou-sios, os criadores de gado pobres se tinham costumado a usu-fruir em compactuo.A estes bandos paroquiais de revindita chamavam «Justiça da Noite». Os actuais, motorizados, à escala da ilha, serão talvez crismados de «Justiça Noite e Dia». Em todo o caso, um claro contra-sinal de tempos de escalada bandeada do poder, em que minorias activistas, ajuramentadas no secreto e de qua-dros bem pagos, projectam destruir o clássico Estado de Di-reito, para sobre a «terra queimada» levantarem outro Esta-do com outro Direito, mas este totalitário e social-fascista (co-mo agora se diz).Escrevi à pouco, daqui um artigo nos Açores, sem problemas, para hoje me vir enredar nalguns desses mesmos problemas que então quisera evitar. Comodismo reutróide fruto da fadi-ga de velho? Um pouco. Mas sobretudo desencanto, autêntico desânimo de um português ilhéu que viveu tempos convulsos – regicídio, duas guerras mundiais, várias batalhas nas coló-nias, um câmbio de regime ou dois (28 de Maio), a Monarquia do Norte, a Camioneta-Fantasma… Nada porém comparável a esta convulsão apocalíptica que oxalá ainda traga no ventre a verdadeira Revolução.

Publicado no Diário Insular nº8805, de 23 de Setembro de 1975, pág. 1 e 4.

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uma cidade das ilhas contestaA minha velha cidade de Angra acordou cedo. Venho da pon-ta sudeste da ilha (Terceira), de onde a costa sul inflecte, pela Ponta da Mina, nas lavas de Porto Martim. O vizinho que me deu boleia e vai para a sua loja é filho de continental. O pai, de Vilar Formoso, veio abrir uma agência do Chiado, casou na Serreta (O lugar da pousada do encontro Nixon-Pompidou) e cá ficou. O meu amigo é pois um dos exemplos da camada continental de população que se estratificou na Terceira a par-tir dos fins do século XVIII pelo exercício do comércio.A passagem de mão do escol das riquezas da ilha fez-se dos morgados e de alguma cavalaria vilã para uma alta e média burguesia de negociantes de fazendas, logo tornados agen-tes de comércio externo: armadores de navios laranjeiros, ex-portadores de cereais e importadores de panos finos, de chá e loiça inglesa, arrematantes de impostos e cambistas. Tudo isto numa comutação e acumulação de ramos de troca – ora uns, ora outros, e sempre um pouco de todos predominando o tri-go quando a laranja não dava, insistindo nas divisas quando se intensificou o retorno da emigração – primeiro para o Bra-sil, depois em caudal para a América.Os morgados, arruinados, entregavam-se nas mãos dos ne-gociantes forasteiros. Às vezes, o casamento destes nas estir-pes nobres da ilha sanava os apuros delas. Daqui saíram pró-ceres do capitalismo liberal, como Henrique Teixeira de Sam-paio (Conde da Póvoa). Aqui se formou uma alta burguesia le-trada a partir do granel de cereais e da arca da moeda forte. Nomes que já não dizem nada à generalidade dos leitores – mesmo ilhéus – mas que pesaram muito no seu tempo. Outros que apenas saíram do anonimato pelos descendentes, como os avós de Jacinto Cândido, o insigne ministro do Ultramar do surto africanista de Mouzinho, ou os avós de Aurélio Quintni-lha, o grande geneticista, que deram cartas na economia ter-ceirense do princípio do século XIX.Gerações indolescentes ou fiadas de mais nos rendimentos re-cebiam assim o refresco de gente de fora desmunida e em-preendedora. Fora talvez sempre assim. O próprio colono, pri-meiro povoador, activo e asceta, que desce a choça de colmo à alfaia de pau tudo fazia à mão, foi dando lugar ao dono de «dadas» já seguro da terra fértil, depois ao filho «encostado», que o casamento com fêmea de árvore genealógica desvaro-nilizada e suculenta livrava da mão calosa agarrada à agri-cultura para sempre.Chego de manhã cedo a esta Angra compósita, que nasceu de nautas e armadores como Álvaro Martins Homem e Pedro Anes do Canto, provedor das Armadas da Índia. Este fez cais seu, ao Porto de Pipas, de onde subia para o seu paço dos Re-médios por rua privativa (ainda hoje «do Armador»), um pou-co como os Grimaldi (salva a comparação), do penedo do Mó-naco dominaram o golfo de Nice.Como o dia está lindo, outoniço, sem chumbo de nuvem, dei-xo-me levar ao sabor do dédalo das ruas, neste traçado de An-gra, que não tem segundo no país cidade «mediterrânea» no risco, o hospital velho ao pé da alfândega, a rua Direita real-mente rectilínea dando sobre a Praça Velha que abre radian-te aos «largos simétricos e expressivos»: o do Colégio (dos Je-suítas), o Alto das Covas (do trigo), o adro da Sé realçado no centro da cidade em ruga.Os prédios são sensivelmente os mesmos da minha adoles-cência de estudantinho angrense. Só que os do centro têm

fachadas adaptadas ás novas necessidades do utilitário, do plástico, do pronto a vestir. Estas minervas da rua da Rosa e da rua da Palha são gora movidas a correia electrificada, mas conservam o mesmo zumbido de mosca do tempo em que, à mão e à pedalada, imprimiam aos meus primeiros versos, com provas de granel tiradas a soco em papel humedecido e, en-fim, a tiragem do impressor diante dos meus olhos esbogalha-dos de estreante.Quase tudo na mesma e tudo modernizado, numa feliz combi-nação de conservadorismo e espírito de iniciativa. Um ou ou-tro dos meus companheiros do liceu entraram na trama dos negócios, inventaram nomes expressivos para as firmas, cui-daram com amor seus nomes nas tabuletas. E aperta-se-me levemente o coração volúvel, a mim que sou filho e sobrinho de comerciantes. Quem sabe? Se lhes seguisse o exemplo? Provavelmente mais um pobre diabo sem jeito nem sorte, tal-vez um falido. Mas o que me interessa, ao nível da velhice, é o que não fui e poderia ter sido como parte integrante des-ta ordem urbana, desta súbita consciência do próprio poder na hora em que tudo se abala e contesta. As lojas, as ofici-nas, os escritórios lutam na crise – sente-se. Mas há na gen-te às portas ou neste trânsito folgazão que é o do ilhéu de vi-la e cidade, um ar de insistência, acto de fé no esforço (e no Senhor Espírito Santo, que até empresta o hino à comunida-de veleitária…).Parece-me ouvir de cada boca o «há-de se amanhar» da res-posta a todo e qualquer pedido ou proposta de outrem. Ou, então o «tenteia» - também resposta coloquial, típica, para di-

zer «remedeia», «chega», «é razoável». Pois o ilhéu terceiren-se pode naturalmente não fazer tudo o que promete, mas dá sempre um jeito («há-de se amanhar»). Faz sempre um es-forço qualquer para que as coisas sigam ou se consigam, um passo construtivo, de boa vontade ao menos como boa pala-vra – o que já é muito e raro.Ao sol ouro-verde do amanhecer da minha velha Angra, entre-gue ao acaso de ruas e travessas, nisto eu pensava, e enten-dia então que ninguém de fora parte tem nada que ensinar a esta gente. Na rua do Rego vi uma casa queimada de fresco, de activistas. Activistas para quê? Fogo posto para quê? Esta-ria eu em Angra ou em Praga? Quem teve a triste ideia de dar a estes moços a receita do cocktail Molotof?

Publicado no Diário Insular nº8811, de 01 de Outubro de 1975, pág. 1 e 3.

Açores: De onde sopram os ventosSeja qual for a configuração de direito público que o povo dos Açores venha a tomar, o que é notável, imediatamente histó-rico, é o grau de consciência a que chegou da sua singulari-dade territorial e cívica. Já se falou de «Estado federado», que um alto responsável declarou «imaturo». Ora, o que é imaturo significa também que pode vir a amadurecer.Para exprimir a vontade de unificação açoriana empregam-se palavras como independência, autodeterminação, autono-mia – às vezes qualificada de político-administrativo, para se

acentuar, com o aspecto «político», que um regime já pelo me-nos teoricamente conquistado não basta, não satisfaz. E ain-da: emancipação, separação, com os correspondentes eman-cipalismo e separatismo.Mas o vocabulário político é analógico pela origem, mais do que nenhum outro, e resolutamente ambíguo no seu empre-go. Com o câmbio de um a outro vocábulo, para a mesma re-alidade, o político, sempre jogador, refugia-se de um risco de lance à mostra numa jogada enigmática, que embarace o ad-versário. Assim o partidário de tal tipo de causa compromete-se menos se puser «autonomia» onde pensa «independência». E não necessariamente por temor, senão por táctica. As pala-vras aliviam-se umas às outras, enriquesem-se (sic) pelo em-prego imprevisto ou semanticamente gradativo.Outro sintoma linguístico da impulsividade afirmativa dos Aço-res como etnia ou espaço geográfico originais está no empre-go da palavra «açorianidade». Quem escreve estas linhas pas-sa por inventor desse vocábulo, há bons quarenta anos, Lu-ís Ribeiro, o insigne etnógrafo e jurisconsulto açoriano de Os Açores de Portugal – opúsculo de grande valia, pela posição de contraste, para o emancipalismo de hoje – foi um dos que generosamente me «patentearam» por tão pobre criação vo-cabular. Porque lia então muitos ensaístas espanhóis, incluin-do o clássico Pi Y Margall de Las nacionalidades, decalquei sobre «hispanidade e argentinidade» (Unamuno) o meu «aço-rianidade».Não faço gala nisso. «Açorianidade» é palavra substantivante enxertada em etnónimo é uma espécie de escolasticismo en-tificador, como se ser açoriano fosse uma «quididade», uma qualitas, como as que os «médicos à força» atribuíam às «en-tidades mórbidas». Ora, bem sabemos hoje que a peste, por exemplo, não é entidade nenhuma, mas uma infecção gan-grionar que tem como agente um bacito.Felizmente a «açorianidade», a força do carácter açoriano, só é peste para certos progressistas que fazem imperialismo, como Monsieur Jourdain fazia prosa, sem se aperceberem de tal. Pa-ra nós outros, meus natos, contumazes, açorianidade é o nos-so modo de afirmação no mundo e alma que sentimos, na for-ma de corpo que levamos. E, dizendo isto, não pretendemos descobrir-nos nalgum novo padrão antropológico, nalgum ra-cismo estuito que nos diferencie dos mais. Lusos somos, por-tuguês falamos, com o algarvio e o baiano, o minhoto e o ma-deirense, o cabo-verdiano e o nativo do Rio Grande do Sul, que povoamos. Lá está Portugal, Alegre, antigamente chama-do «dos Casais («açoritas», como lá dizem), para o povoar com alguns milhares de descendentes de nossos avós emigrantes, idos em arca de Noé com suas mulheres, enxadas, vestimen-tas, nomes – os Barcelos, os Goulartes, os Terras, os Ornelas que dos lagoais de São Pedro às raias do Paraguai e da Ar-gentina ainda hoje proliferam.Não é caso para mandar tocar A Portuguesa, e logo o hino brasileiro e o hino do Espírito Santo, assim dando uma ajuda à simbólica do açor de asas abertas sobre estrelas.Ninguém tem pressa nos símbolos, até porque não há nada mais parecido com uma águia penosa, cria de outra, ou com uma galinha ouriçada a quem querem roubar os nove ovos da postura para a gemadazinha – desjejum dos dinamizado-res, de que um heráldico menos feliz no desenho, que pode sair macho ou fêmea. Depende do que se lhe achar ou puser no poleiro…

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Mas – basta de imagens, de metaforismo! Os Açores sentem-se como gente – este é um facto. São uma forte variedade de nação portuguesa criada em meio milénio no isolamento nor-te-atlântico. Se geograficamente distribuem os ventos e índi-ces térmicos que hão-de tocar à Europa, porque demónio, po-liticamente, não decidirão das correntes de ideias e interesses que os agitam, das instituições que lhes convêm? A meteorolo-gia, de que são um posto avançado e um foco de fenómenos, resolve-se fisicamente, registando causas e efeitos. Mas a po-lítica dos Açores não é eólica e pluviométrica; resolvem-na dos açorianos, na esfera da liberdade.Quem isto escreve é um açoriano de raiz, com dezoito anos contínuos de criação insular. Durante eles, só uma vez se au-sentou da ilha onde nasceu e de que não podia sair, como do sotil o pássaro. E foi para ir morar uns meses noutra ilha. Des-sa, era mais fácil ir à mais próxima, em sortida – mas sempre em clausura, em isolamento. Chamam-se Terceira, Faial e Pi-co essas ilhas da minha adolescência. Vemo-las de umas pa-ra as outras, a Graciosa incluída.Essa impressão fronteiriça de ilha ao alcance de outra, e todavia remota, foi o que mais co-moveu o observador da estirpe do autor das Ilhas Desconheci-das, Raul Brandão. E é o pouco de oásis que o deserto atlân-tico nos consente.Mas, confinados nas ilhas, não nos consideramos em cárcere. O sentimento de liberdade nos garante o poder de evasão. A mesma liberdade nos confere domicilio inviolável e nos convi-da a emigrar. Como as aves de arribação, que tanto nos bus-cam as rochas, espalhamo-nos pelo mundo: Brasil, América, Canadá. Eu comecei por chorar sobre a mala de roupa da nos-sa «empregada» Genuína, quase minha ama seca. Esperava-a, na Califórnia, o Manuel Garrancho seu esposo. Essa nunca mais cá tornou. O Garrancho dizem que sim, velho e viúvo, de visita, preparando o bem-morrer. Mas eu já andava para lon-ge, já era «continental».Sobre os dezoito anos seguidos da minha meninice ilhoa corre-ram quase sessenta de adaptação à «metrópole», à parte alguns anos lectivos fora de Portugal, inclusivamente no Brasil. Assim, também a meu modo emigrei, à busca de trabalho. E criei novos e fortes laços e amores não ilhéus. Lisboa, Rio, Bahia; Sobretudo, Coimbra, que adoptei. Olho, pois, todo o lés do horizonte açoria-no um pouco já como um estranho. As ilhas ainda são «minhas» - o futuro delas não. Tudo o que é português vibra em mim redo-brado pela longa experiência na mãe-pátria.Mas, esteja o açoriano onde estiver, e há muito tempo que se-ja, não repudia a origem. Devidido (sic), talvez desareigado, nunca. Exemplo, os luso-americanos que de longe votam e so-nham formas de vida colectiva, pouco realistas às vezes, para uns Açores distanciados, que já nem bem são os seus.Resumindo e reatando: seja qual for a configuração de direi-to público que o povo dos Açores venha a tomar nesta hora bem trágica da vida portuguesa, a verdade é que ela assume impetuosamente o seu destino. Os nossos irmãos transmonta-nos, com bem mais fraco anteparo que o que nos dá o Atlân-tico, costumavam dizer (pois não sei se ainda dizem): - «Para cá do Marão mandam os que cá estão».Como não havia de mandar em suas nove casas quem ficou «adjacente» à casa dos seus pais históricos apenas em precá-rias constituições e códigos administrativos? Publicado no Diário Insular nº8815, de 05 de Outubro de 1975, pp. 1 e 3.

o cavaleiro da triste figuraQue triste figura fará um escritor à moda antiga, de estilo on-dulante e volátil – ora descritivo, evocador de efemérides, ora circunstancial e confidente, diante destes nossos ideológicos «post» 25 de Abril, guiados pelo decálogo das liberdades pú-blicas e principalmente pelo vocabulário criado à leitura da vulgata de Marx e Engels, com medeação de Lenine, Estaline e seus vulgarizadores?A linguagem forjada nas «tensões», nas «opções», nos «parâ-metros», passa-lhes do metaforismo comum a um meta-meta-forismo tecido de subentendidos e de implícitos, formalismo conceptual estilizado de violência. No reino das jogadas po-líticas que impõem a frontalidade unidimensional da dialéc-tica ao pluralismo acusado de camuflagem fascista (não sei se ecoo bem o estilo dos ideólogos) não há lugar para a to-lerância nem para o humanismo que abstraia da política mi-litante da acção directa, da obsessão revolucionária. Decerto as ideias políticas e sociais foram uma alta preocupação nos mestres da escrita portuguesa, de Garret e Herculano a Ante-ro e a Oliveira Martins, a Ramalho Ortigão e a Eça de Quei-roz. Nenhum deles porém vendeu a alma ao diabo da obce-cação partidária. Nem sequer os românticos que tiveram de amargar o exílio e bater-se nas trincheiras da guerra civil, o que inevitavelmente lhes acarretou filiação ou aderência no xadrês (sic) dos partidos que tiveram de organizar a vitória do liberalismo.Herculano com famas e gestos de cartista, velidades frustra-das de «regenerador» modelo 1850, pôs em causa isso tudo, abriu individualistamente cisão e tudo, sendo embora capaz de ir até ao diálogo benévolo com os jovens corifeus de um nascente socialismo entre proudhoniano e «catedrático», prin-cipalmente com Oliveira Martins.Garrett, mais mordido do vírus político, ansioso por ver es-tampado na folha oficial o seu braçado de reformas, sobretu-do das estruturas educacionais e estéticas, militou mais, tran-sigiu às vezes. Foi setembrista convicto; moderou-se depois. Mas sempre cioso do seu crivo pessoal, bebendo sempre pelo seu copo. Enquanto Herculano não passou de deputado recal-citrante e, no executivo, de presidente de uma câmara muni-cipal de subúrbio (Belém), Garrett visou alto: imprimiu cartões de visita com coroa de visconde e título diplomático de «encar-regado de negócios», e foi ministro, conselheiro de Estado.A geração de 70 só imolou no altar do executivo a um dos seus ornamentos: Oliveira Martins. E apanharam-no por um tris, a título de perito economista e financeiro. Na pasta da Fa-zenda foi, por assim dizer, um tecnocrata «avant la lettre».É certo que Antero de Quental deixou apresentar a sua candi-datura a deputado, pelo Partido Socialista. Claro que perdeu a eleição. E, que a ganhasse, é duvidoso se teria levado o man-dato até ao fim. Escrupuloso, fazendo uma filigrana da míni-ma responsabilidade, qualquer toque ou deslize o sensibiliza-va. Decidido e frontal no ataque, sobretudo quando se trata-va do protesto moral, de uma de princípios )Castilho no «Bom senso e bom gosto»; o Duque de Ávila no encerramento das Conferências do Casino), desertava facilmente da luta ardilo-sa e continuada; não era combatente de fibra, para parar e devolver golpes de mão na liça.Nenhum desses grandes o foi verdadeiramente, por implante. Geniosos, bruscos à Herculano – alguns. Procurando na con-tenda um brilhante espectáculo: o Garret de «Porto Pireu», por

exemplo. Mas (repito), dados ao rol das milícias e partidos conflituantes, condicionados por uma opinião de «consigne, - ou, para tudo dizer, levados à vara quais perus, mesmo com a premissa democrática de escolherem eles próprios e irem des-cansando, adelgaçando a vara – nunca!Teófilo Braga, espírito predisposto para o pensamento e a ac-ção dogmáticos, foi ao ponto de presidir ao Governo Provisó-rio da nossa primeira República. E tomara antes muitas atitu-des estritamente partidárias – até em filosofia: naquela única casta de filosofias (depois da hegeliana) capaz de esquema simil-partidário e simil-religioso, o contismo.Mas com que desenvolta e acre independência não marcou Teó-filo os seus múltiplos gestos partidários! E com que teimosia he-róica – apesar de teimosia – não defendeu ele a sua rica disponi-bilidade, abertura ao imprevisto, fidelidade ao sonho! Nós é que já não temos paciência para ler as suas «torrentes» de versos, as suas «Tempestades Sonoras”, as suas epopeias hugoescas.Numa festa portuguesa, em Paris, preparada em Honra de Te-ófilo pelo nosso incansável agente cultural ali, que foi, anos e anos, o velho Xavier de carvalho, Anatole France não pôde fu-gir ao convite para orador oficial. A celebridade tem seus gri-lhões. Anatole acedeu. Mas, claro tinha mais que umas vagas luzes sobre a situação intelectual do seu elogiando, um próce-re das letras portuguesas com ele, France, o era de França.Solução: consultou alguma enciclopédia ou, mais provavel-mente, Xavier de carvalho forneceu-lhe alguns apontamentos biográficos sobre o nosso escritor, na pressa. E o malicioso Anatole France resolveu o caso num breve discurso de belos lugares comuns humanísticos – fraternidade universal, união

dos povos da terra, pão e paz para todos. Quanto ao perfil de Teófilo, saiu-se um pouco perfidamente com esta: «O sr. Teófi-lo Braga, que cantou a epopeia da Humanidade em quaren-ta mil versos…».Pois antes cantar a epopeia da Humanidade em quarenta mil versos, mesmo duros, camoniana ou virgilianamente anacró-nicos, do que passar a vida a saturar os jornais de «impacte» e «processo em curso», de «onde disse que sim digo posterior-mente não, dadas as tensões que mo aconselham, advertin-do porém que, na originalidade do nosso rumo ao socialismo, toda e qualquer afirmativa está dialecticamente sujeita a cau-ção, e que sou pela negativa alterna sempre que a unidade revolucionária perigue e a contra-revolução ameace os mari-nheiros no mar, os soldados nos plenários e os moradores nas casas ocupadas, salvo ordem em contrário, em legalidade re-volucionária».Triste figura – comecei eu por dizer. Não a de quem fala a lin-guagem caricaturada supra, que essa é a que a farmacopeia estilística «up to date» manipula. Mas a minha linguagem de cronista itinerante, caprichoso e egolátrico, que fala de onde esteve e bem se sente. A das minhas crónicas dos Açores do anticiclone e dos «latifúndios» pastoris a meio cento de vacas (lactifúndios?), ilhas de má morte para a politização de enco-menda, para onde é pena não se poder mandar meia dúzia de chaimites e uns milhares de pistolas-metralhadoras com hortências em de vez dos cravos que já faltam nos canos.Se bem que ilhéu, depois de morto, ainda dá coice.

Publicado no Diário Insular nº8823, de 15 de Outubro de 1975, Pág. 1 e 3.

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FrAnCisCo CoeLHoreis Leite

Os jornais não nos tra-zem só notícias. forne-cem-nos opinião, comen-tário, publicidade e…an-siedades que, por serem reais, acabam por se trans-formar numa real notícia, por os sentimentos que transmitam objectivam-se e passam a ser realidade.Vem isto a propósito de uma preocupação que as-saltou a nossa comunica-ção social na última sema-na: César pode fazer um quinto mandato! Os fac-tos são…uma mera hipó-tese, um grande descon-forto e (pasme-se!) uma conferência de imprensa de Costa Neves!Porque a cronologia é ou-tra: aquando da sua audi-ção pela Comissão Parla-mentar que preparou a re-visão do estatuto, o actu-al Presidente do Governo regional defendeu, na li-nha das preocupações do seu partido, a limitação de mandatos para Presidente do Governo regional. Tal proposta foi consagrada e seguiu para a Assembleia da república, sendo mais um aspecto do importan-te ímpeto reformador da mesma.Afora isso, tudo normal,

dentro do ritualismo par-lamentar, muito mais cer-to do que o tempo medi-ático. mas afinal há unani-midade e manifestações dos partidos no sentido de, até junho, termos o estatuto aprovado.mas, além dos títulos fica-ram…os sentimentos. O Psd/Açores parece muito apostado no mandato de …2012-2016. já terá de-sistido do “quarto”…, que vai de 2008 a 2012? e de-pois, só com alguma “la-

ta” é que tal preocupação “democrática” existe, pois que:a)Não foi o Psd que pro-pôs tal medida;b)Aliás, ainda se está pa-ra saber se o Psd nacional concorda com ela e a vo-tará. deixará jardim?c)Até o PCP-Açores, por mor duns dinossáurios autárquicos, não morre de amores pelo princípio da limitação de mandatos para os líderes de órgãos executivos…

A ironia só seria mesmo completa se o Psd invia-bilizasse a aprovação por dois terços desta norma, que alguns defendem ser necessária para a sua aprovação.mas a transformação do quadro legal é bem mais importante que as inco-erências dos outros, pe-lo que esperamos que tal não aconteça. Como ali-ás os factos são mais im-portantes que as sensa-ções…

o “fACto”tAmBém se CriA… Não sei o que é mais

fantástico em tudo isto, se a notícia em si, se os comentários à notícia, se as especulações so-bre a notícia.Notícia, em doa verda-de, só pode ser consi-derada a parte referente ao calendário da apro-vação do novo estatu-to Político-Administrati-vo da região Autónoma dos Açores.A especulação ocupa quase todo o resto e re-fere-se essencialmente a um hipotético quinto mandato a que o actu-al Presidente do Gover-

no regional poderia vir a candidatar-se, caso o estatuto seja aprova-do depois das próximas eleições regionais.Os comentários, em que até aparecem opiniões de juristas, esses valem sobretudo pelos dese-jos do subconsciente dos comentadores.O meu colega de cróni-cas, entusiasmado com tudo isto, sugeriu que nos juntemos às notí-cias, à especulação e ao comentário e com esses ingredientes façamos uma crónica para esta semana.

eu aceitei e aqui es-tou tentando cumprir o acordo.A notícia sobre o calen-dário para a aprovação do estatuto, não sen-do nova, é preocupante, porque já se percebeu que mesmo com o em-purrão, a birra e a ame-aça do líder do Ps nos Açores, os deputados da maioria não morrem de amores pela proposta que o parlamento aço-riano lhes enviou, não sendo de excluir que acabem por a deixar morrer na comissão em vez de a discutir.da parte do Psd, tam-bém, apesar das “expli-cações, reuniões e ou-tras complicações”, não se percebe que haja maior entusiasmo.quanto aos comentá-rios, o que posso é jun-tar a minha voz à dos comentadores, dos ju-ristas, dos políticos e dos jornalistas e dizer, tal como eles, que se houver vergonha, o que nem sempre há, não ha-verá quinto mandato.quanto à especulação... bem, quanto à especu-lação isso é o mais fácil e até também posso es-pecular.Pois não é que ten-do o actual Presiden-

te do Governo, líder do Ps e grande timoneiro da Autonomia dito, ju-rado e apregoado que dois mandatos eram o ideal em democracia pa-ra ocupar o cargo políti-co de Presidente do Go-verno regional, acabado o 2º mandato, logo mu-dou de opinião e acei-tou um terceiro e acaba-do este se preparar para o quarto?Não é pois de excluir que se a lei, mesmo sendo a lei que ele propõe (tal-vez agora também retar-de) vier a permitir, ain-da que por mero atraso de calendário, ele pró-prio aceite um quinto mandato. e não faltará a costumada corte dos apoiantes, devotos, in-teresseiros e conselhei-ros que lhe dirão ao ou-vido aquilo que preten-de ouvir para descanso de consciência ou seja, que é indispensável.fará como aquela per-sonagem da anedota e quando lhe pergunta-rem se não sente ganas de abandonar o cargo de Presidente, ele res-ponderá:“sinto, mas domino-me”.Aqui fica o meu contri-buto para a especulação, já que não há notícia.

espeCULAçÃo

p e r s p e c t i V a s

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FrAnCisCo [email protected]

VeLA de esTAi

fala-se em património cultural e natural!Classificam-se coisas e loisas e fazem-se inventários!Publicam-se livros e organizam-se debates!Comemoram-se aniversários e colocam-se legendas em rótulos de produtos!Com isto tudo por aí não devia ser possível continuar a acontecer o conjunto de maus-tratos a que o patri-mónio natural e cultural é sujeito diariamente.No entanto acontece! e a gente renova as leis de protecção e as leis de pu-nição.mas tudo ou quase tudo parece ficar pelos votos pios e sem força.Cada vez mais estou convencido que as questões do

património – seja ele cultural imóvel ou seja natural – devem ser resolvidas ao nível do planeamento do ter-ritório, como condicionantes e como recursos.Acrescente-se ainda que, quando se trata de produ-ção humana, são energia gasta e concentrada com um objectivo.Vão nesse sentido as leis e regulamentos mais inte-ressantes, mas, de facto, desde o particular, interes-sado numa qualquer obra, ao funcionário, ao político que em dado momento ocupa uma cadeira, ao em-preiteiro e empresário o jogo é feito no sentido de os atirar para as malhas de um sistema que nega ao pa-trimónio o direito de existir como tal!Não é uma afirmação de leve!

A neGAçÃodo pAtrimÓnio

e repito-a: O modo como o sistema está montado ne-ga ao património o direito de existir como tal!faz mais: cria aversão e orienta para a sua destruição sistemática, por muitos anjos da guarda que hajam!Património quer dizer recurso!recurso é o arroz que posso usar numa canja; recurso é o lençol que ponho na cama; a toalha da mesa; o di-nheiro na carteira, por pouco que seja!A ideia de recurso só se termina e acaba quando faze-mos alguma coisa com ele!Ora, no que diz respeito ao nosso património cultu-ral e natural, dizem-nos preferencialmente para não tocar, não usar, não mexer, e por aí fora uma série de nãos! recurso assim transforma-se em bolor e em peso. Co-mo o arroz podre, que poderia ter servido de alimen-to, mas vai para o lixo (e como já não há porcos de criação por aí, nem sequer pode ser reciclado em fu-turas linguiças e presuntos).Puro desperdício!Por outro lado – e estou a lembrar-me das gravuras de foz-Coa – mesmo quando se proclama futuros usos gran-diosos, no fim da festa pouco mais fica que o encargo.é esse o cenário da maioria do património que temos no País – mesmo daquele que, bem conservado à custa do erário público ou privado, parece estar mais bonitinho.é que boniteza não significa integração. e património desintegrado não é património!O conjunto de bens que temos por aí, identificados como património e bem tratados, são pouco mais que “enjeitados engravatados”.dar a volta a isto até seria simples, se as coisas não fossem como são.O problema começa na incapacidade de identificar o

património como recurso e estaciona nessa atitude peregrina que é deixar as pessoas ao deus dará quan-do precisam de orientação (dialogada, interveniente e aberta, mas orientação, mais que não seja na pesqui-sa de soluções).quando as cartas de condicionantes em planeamen-to são feitas há dois tipos de condicionantes, pelo me-nos, na cabeça das pessoas: as “que se metem pelos olhos dentro”, como por exemplo eu não poder, em princípio, fazer uma casa barata numa falésia a pique, e outras “mais estranhas” que não parecem valer a pe-na ter em conta, como as obrigações de salvaguarda do património cultural e natural.mas há mais! quando se determina que o incumpri-mento da lei deve ser anotado pelos serviços, mas que a solução a encontrar deve ser procurada pelo particu-lar requerente, uma, duas, as vezes que for necessário, à sua custa, até conseguir a aprovação do projecto, es-tá-se mesmo a pedir que ele “se mande ao ar!”.Outra nota ainda interessante é a fórmula oficial fre-quentemente usada: “nada a opor” ou “há a opor o facto de o requerente desrespeitar o determinado no artigo tal do decreto tal”.Não é preciso mais para evidenciar aos olhos de toda a gente que as entidades “protectoras” estão ali pa-ra opor ou não opor, mas pouco estarão para ajudar. e como continua a ser verdade que “se não faz par-te da solução faz parte do problema”, está o caldo en-tornado!A solução dos “problemas com o património” só exis-tirá se nos decidirmos a trabalhar na envolvente eco-nómica, social, técnica.O Património estuda-se, percebe-se e usa-se fora de-le! Antes de chegar a ele!

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NO deCOrrer dAs CeLebrAções

(hOmeNAGeNs), A PrOPósiTO dO

TriGésimO ANiVersáriO dA mOrTe de

ViTOriNO NemésiO, O que mAis fiCOu

eVideNTe e AsseNTe, fOi A NATurezA

AçOriANA eNrAizAdA NA PessOA dO

esCriTOr PrAieNse, que CresCeNdO

POr esse muNdO fOrA, mANTeVe e

fermeNTOu O esPíriTO dA AçOriANi-

dAde que eLe PróPriO iNVeNTOu, NA

PALAVrA.

Não há melhor conclusão para as recentes cele-brações na passagem do trigésimo aniversário sobre a morte terrena do escritor praiense universal, Vitori-no Nemésio, do que entender a forma profunda como ele se retratou em todos os açorianos, na sua postu-ra de ilhéu sem fronteiras, emigrante dentro e fora do seu País; homem feliz e sofredor; açoriano dos quatro costados, mas ao mesmo tempo um homem do mun-do, como ele próprio se definia.As homenagens que foram prestadas a Vitorino Ne-mésio, desde as palavras quer de saudade, quer de análise à sua obra, e a forma como foi esmiuçado o

seu carácter, maneira de estar e de olhar, vendo os outros e neles se revendo, escrevendo como açoria-no, como açoriano falando, mesmo quando em Paris ou em Nova iorque, em Lisboa ou no meio da ilha, to-cando (mal), violão ou viola e cantando (esmagado-ramente mal), apesar de poucos terem sido os que de coragem, houveram por lho dizer.do merecimento de todas as homenagens não have-rá quem sequer esboce um pensamento de dúvida, e sobre a forma como elas foram realizadas, claramente com uma “mão” de António machado Pires, sobretu-do na escolha de muitos catedráticos, nenhum deles enfatuado; nenhum deles em bicos de pés, mas an-tes, sim, curvando-se de forma humilde e estudiosa, perante um dos maiores vultos da literatura portugue-sa do século xx, e de um dos poucos, como ficou dito, que perdurará no contexto nacional e mundial.dA CriAçãOsabe-se que Vitorino Nemésio foi criado parcialmente na Casa das Tias, e por isso, o início da obra de restau-ração, ampliação e melhoramentos do edifício, onde até se gritaram “aleluias” (num grito que teve tanto de fim de revolta pelo marasmo de até então, como de júbilo pela formalização de um velho desejo praien-se), sentiu-se, mais uma vez, a presença forte do escri-tor a que a Praia da Vitória bem pode orgulhar-se de ter tido a sorte de servir de berço, como, decert o, Ne-mésio também lhe estará grato pela sorte que teve de aqui nascer, ao contrário de Garrett que um dia escre-veu, referindo-se a Angra do heroísmo, sobre a “pena de ali não ter sido nado”. “Não tive a sorte de nascer neste torrão”, escreveu Almeida Garrett. Nemésio terá sido mais feliz, pela sua Praia da Vitória.As denominadas palestras que ocorreram no dia 20 de fevereiro, homenageando Vitorino Nemésio, decorre-ram sob o signo da exaltação do homem, da obra, das

todos somosnemésio

vivências, e, quem diria, até de algumas lágrimas. e is-so apenas veio confirmar aos nossos olhos, que o es-critor permanece bem vivo e se vai perpetuando.Nemésio, quando criança, viveu na Praia da Vitória e usufruiu dos seus belos areais, como escreve em “mau Tempo no Canal”, porém, nunca aprendeu a na-dar, ficando-se pelas areias ou pelas rochas, provavel-mente congeminando os primeiros poemas que a Li-vraria Andrade, na rua direita, haveria de editar no “Canto matinal”, título sugerido por um professor, mas que demonstravam já, a grande maturidade técnica e de pensamento, do ainda imberbe escritor.“POeTA fALeCidO”As celebrações a Nemésio tiveram em todos os inter-venientes, momentos altos, podendo mesmo afirmar-se, que foram elevados e plenos de beleza, nas pala-vras medidas ou improvisadas e nem um só dos in-tervenientes deixou de ter o condão de tocar a alma de todos os açorianos, nos quais Nemésio fez ques-tão de se rever em todos os momentos da sua ilustre vida, desde as suas paixões até às mágoas que tam-bém em muitos momentos da vida lhe assolaram a alma. Também essa se fez fraca como é norma do açorino ferido.e da mesma forma plena de galhardia com que assis-tia a uma tourada à corda, ou descia a rua do Paço do milhafre, a caminho do Largo da batalha, também se negou a ser o presidente dos Açores, quando foi con-vidado para isso pela frente de Libertação dos Açores, em época conturbada, aí por volta de 1976, alegando que o seu açorianismo era de português.Na sessão solene, que o foi mais simples e de estu-

do, do que outra coisa, o representante da república, quando chamado a usar da palavra, pareceu ficar, as-sim como que sem jeito. mas logo se compôs e levan-do a mão ao bolso do casaco disse que sempre que saía para qualquer cerimónia, acostumado que esta-va às mais diversas solicitações, levava sempre consi-go uma ”merendazinha”,e puxou de um papel onde guardava o poema de Vitorino Nemésio, para ler no seu jeito único, um dos poemas mais caros a Nemé-sio, o “Poeta falecido”.recordamos o almoço, em 1979, de celebração do primeiro aniversário da morte do escritor, que decor-reu na quinta de Luís Gaspar de Lima, na freguesia dos biscoitos, com uma entrada de mão alçada ao la-ranjal, descascando com as mãos as doces e suma-rentas laranjas, seguida de uma lagosta suada que só mesmo o Gaspar de Lima, então director escolar da ilha Terceira, sabia temperar para o prazer dos seus comensais, entre os quais também Nemésio havia es-tado.Tudo simples, tudo em beleza e carinho, com a pre-sença dos filhos do escritor e de muitas outras figu-ras terceirenses que sentiam afectos por Vitorino Ne-mésio.e agora, no trigésimo aniversário sobre a sua morte, com excepção da lagosta suada, a singeleza catedráti-ca das emoções, esteve ao mesmo nível: uma home-nagem ao senhor doutor cá da terra, entre sorrisos, respeito, saudade e profundidade singela.Tudo perfeito. Vitorino Nemésio bem que merece que sejamos sempre muito açorianos quando dele falar-mos. foi-lhe feita, mais uma vez, a vontade.

hOmeNAGem À AçOriANidAde

rePOrTAGem . fOTOGrAfiA Henrique DéDALo

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Luiz FAGunDes DuArte

mandam as boas regras que os cronistas variem os seus temas de escrita, de modo a que o leitor não pense que eles só sabem falar de uma dada coisa – ou que os tomem por um daqueles chatos que, di-gam o que disserem, nunca conseguem mudar de as-sunto. eu sei disso, e na medida do possível faço por dar de mim a ideia de um homem de horizontes lar-gos, que apesar de ter nascido na serreta conseguiu dar um salto para o mundo, e que tanto pode repetir as sabenças da Tia Guilhermina da fajã como comen-tar, com igual proveito, uma obra da grande literatu-ra universal. Passe a imodéstia, é claro. Não obstante isso, tenho a impressão, quando me re-leio criticamente, de que passo a vida a escrever a mesma crónica: e nessa crónica sem fim (e recordo que a palavra “crónica” tem a ver com “tempo”, que em grego se dizia “crónos”), eu não consigo passar do rapaz da serreta que, passados tantos anos de vida e percorridos tantos quilómetros de caminho, ainda não consegue fechar a boca de espanto ao olhar para o vasto mundo onde habitamos. já nesta página eu falei de tudo: de política, de lite-ratura, de enganos, de gente gira, de bocas, de médi-cos, de professores, de restaurantes, de jovens prome-tedores, enfim… de tudo um pouco já me ocupei, fa-zendo destes meus trezentos e sessenta e tal folhetins uma coisa parecida com a simpática montra do Pedri-nho Amiguinho – onde encontramos de tudo, incluin-do a nossa própria alma. mas, contra o tal princípio do bom cronista que se não deve repetir, eu entendo que hoje devo fazê-lo e, os-tensivamente, vou voltar a falar de professores e, ain-da mais descaradamente, do programa “Prós e Con-tras”, da rTP, que há quinze dias foi um mero “Con-tras” à ministra da educação. Nesse programa, todos se lembrarão, apareceu, para além de uma professora loira e malcriada, um jovem professor que, levado pe-la actual histeria anti-ministra da educação, e pensan-

do que estava gloriosamente a bater no mais fraco, se alargou, entusiasmado, em inúmeros ataques, soezes e pessoais, à cidadã que, tendo abdicado do sossego da sua condição de professora, aceitou ser ministra da educação. Não vale a pena repetir tais despropósitos; mas valerá a pena deixar aqui, na íntegra, a carta que, dias depois, o mesmo professor escreveu ao delega-do regional do Norte da inspecção Geral de educa-ção, e que deixo aqui à reflexão de quem quiser olhar para além do seu umbigo:

“relativamente às declarações proferidas por mim, [… vou omitir o nome do rapaz…], docente do grupo 500, a leccionar na escola eb2,3 de ribeirão, no programa Prós e Contras do dia 25 de fevereiro de 2008, refiro que não foi minha intenção ofender o rigor, a compe-tência e o profissionalismo do sr. inspector, pelo que lhe apresento o meu arrependimento, assim como, a todos aqueles que se tenham sentido lesados.Aproveito a oportunidade para expressar as minhas desculpas pela forma como me dirigi à ex.ma sr.ª mi-nistra da educação, pois considero-me uma pessoa de bem, educada, íntegra e acima de tudo profissional.As declarações ocorreram num momento de profun-da emoção, vivida de forma intensa pelo ambiente propício do debate televisivo.” – e, depois de deixar os seus melhores cumprimentos, este jovem professor data e assina esta sua carta de desculpas.Tiro-lhe o chapéu. mas não o tiro àqueles todos que na altura histericamente o aplaudiram – e que ago-ra, mesmo depois de conhecida e divulgada esta car-ta, vêm para a rua gritar, nos seus magros entenderes, em nome de uma educação que julgam sua, nas coi-sas boas, e do governo, nas coisas más.

(Escrevo este folhetim a voar de Lisboa para New York. Acho que estou a sobrevoar os Açores. E tenho saudades do meu país, ali em baixo, tão triste e tão de vistas pequenas…).

tÃo de vistAspeqUenAs

fOLheTim 363

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reino do sonHo

rePOrTAGem HéLio VieirA

fOTOGrAfiA António ArAúJo

O PriNCiPeziNhO

filipe La féria trouxe a Angra do heroísmo uma adap-tação para teatro de “O Principezinho”, a obra de re-ferência do nosso imaginário infanto-juvenil do autor francês Antoine de saint-exupéry.recorrendo às potencialidades que o texto oferece ao nível da dramaturgia e também às novas tecnologias (vídeo, som e luz), filipe La féria deu um toque mui-to peculiar a uma história que encanta gerações e que se baseia na poesia e no imaginário de um pequeno príncipe que vive num asteróide e que visita a terra.O alcance da mensagem da obra-prima francês Antoi-ne de saint-exupéry pela sua aceitação ao longo das últimas seis décadas com 80 milhões de livros vendi-dos em cerca de 500 edições distribuídas por quase

160 línguas ou dialectos, sendo a obra mais lida em todo mundo depois da bíblia.Não deixa se ser surpreendente que uma história construída em torno de um pequeno príncipe conti-nue a ter uma mensagem actual, apesar do texto de Antoine de saint-exupéry ter sido escrito em 1943 du-rante o seu exílio nos estados unidos e numa altura em que o mundo estava mergulhado num rasto de destruição e morte provocado pela ii Guerra mundial.Piloto das forças aliadas, saint-exupéry desapareceu a 31 de julho 1944 no mediterrâneo. A sua história aca-bou por ter um final menos feliz do que a do aviador acidentado no deserto e que se transforma em confi-dente de “O Principezinho”.

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“À noite, deitei-me na areia e adormeci, a mil milhas de terra habitada, mais isolado do que um náufrago agarrado a uma jangada no meio do mar. imagine-se então a minha surpresa ao ser acordado de madruga-da por uma voz muito fininha, a pedir:- se faz favor… desenha-me uma ovelha,”

“Vivo neste planeta há cinquenta e quatro anos e só fui incomodado três vezes. A primeira vez foi há vinte e dois anos: era um besouro caído sabe deus de on-de. fazia um barulho tão horroroso que me enganei quatro vezes numa soma.”

“A raposa calou-se e ficou a olhar para o principezinho durante muito tempo.- se fazes favor…cativa-me! Acabou finalmente por pedir. - eu bem gostava – respondeu o principezinho, - mas não tenho muito tempo. Tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer…”- só conhecemos o que cativamos – disse a raposa.”

“O Principezinho estava cansado. sentou-se. eu sen-tei-me ao lado. Primeiro, ficou uma data de tempo ca-lado, mas depois disse-me: - As estrelas são bonitas por causa de uma flor que não se vê…”

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há debates na sociedade açoriana que não são de ago-ra. há debates recorrentes, nunca resolvidos, nunca clari-ficados, com muitas, demasiadas, reticências. há interes-ses, mais individuais que colectivos, mais privados que públicos, que os fazem emergir ou submergir conforme a conjuntura. há uma tensão permanente na busca de uma falha, uma contradição ou uma cedência. Ninguém questiona a quem interessa que, no dia anterior ao eco-nomista açoriano mário fortuna apresentar, na comis-são parlamentar eventual impacto na região Autónoma dos Açores do Acordo entre a república Portuguesa e os estados unidos da América, um estudo, sobre o impac-to económico da base das Lajes na economia açoria-na, se torne público (1) que o impacto directo e indirec-to da base norte-americana das Lajes na economia da Terceira foi, no em 2007, de 113.9 milhões de dólares?Para quem quer dar o peito às balas nestas refregas, pa-ra quem quer, de facto, tomar posição, só ideias podem interessar. As ideias, e a clareza na exposição das mes-mas, capitalizam quem, um dia, quiser, ou tiver de, deci-dir sobre os Açores e o futuro da base das Lajes. repro-duzo um excerto de um artigo, já com 2 anos, da autoria deste vosso criado, publicado no diário insular a 29 de janeiro de 2006 (2): “O senso comum diz-me que não se pode, em consciên-cia, defender às segundas, quartas e sextas um reforço da actividade militar na base das Lajes e às terças, quintas e sábados os benefícios das escalas técnicas da aviação ci-vil. A ideia que pode transmitir esta rocambolesca ambi-valência é que algumas pessoas com responsabilidades estão desesperadas quando ao futuro da ilha sendo capa-zes de, por um punhado de dólares, sacrificar o bem-estar e a qualidade de vida colectivas. se é do domínio público que a base das Lajes sofreu um reforço da sua importân-cia após o fim da Guerra-fria tal deveria ser suficiente pa-ra uma reivindicação sólida em sede de eventual revisão do acordo luso-americano. As entidades americanas sa-bendo disso, e da intenção pública de se rever o acordo, fazem surgir no espaço público a hipótese de uma base de treinos. é a sua indicação de que para haver mudan-ça os euA teriam que ter novos benefícios militares. Ora, o que a Terceira tem que definir é, mais do que fugir pa-ra a criação de uma nova pista, o quer dessa sua estrutu-ra fundamental. se a quer condicionada por um punhado de dólares a uma base militar ou se a quer potenciar para as actividades civis. Ou seja, questão fundamental é, mais que a sua geostratégia militar, a avaliação da sua geostra-tégia civil”. Claro como água!

foi com estes olhos que li a entrevista do Professor An-tónio josé Telo, director do instituto de defesa Nacional, no diário insular de 3 de fevereiro (disponível só para assinantes), cuja passagem seguinte sublinho:“diário insular - há quem defenda que os Açores podem beneficiar deste aumento de funções através, por exem-plo, da presença de empresas locais na base para o apoio técnico necessário a estas aeronaves. Acha possível? António Telo - duvido que isso seja possível em relação ao núcleo duro – chamemos-lhe assim – das necessidades. O núcleo duro que aqui refiro representa as tecnologias centrais destes sistemas de armas, que são de tal forma avançadas que mais nenhum estado ou máquina militar detém. Portanto, nem vale a pena pensar nisso. Tenho a certeza que os euA não vão querer olhares exteriores so-bre os sistemas centrais que permitem o funcionamen-to destes novos sistemas de armas. “ Claro como água!foi com o mesmo interesse que li a entrevista do Profes-sor Carlos Amaral, da universidade dos Açores, no Cor-reio dos Açores, de 23 de fevereiro, (3) cujo excerto se-guinte reproduzo:“Correio Açores - um dos argumentos norte-americanos é que a base nos Açores tem servido o interesse NATO. Carlos Amaral - este é o argumento nuclear dos norte-americanos. e é preciso fazer uma separação das águas: O que é interesse NATO, e por isso mesmo, aquilo em que a base pode ser um instrumento de serviço deste interesse; e o que é interesse norte-americano. O cer-to é que na base não há uma presença militar NATO, mas sim uma presença militar americana. A defesa do Atlântico e a segurança da europa carecem destas ilhas. Não é possível assegurar a defesa da europa se estas ilhas tombarem em mãos hostis. e a relação de coopera-ção com os estados unidos tem-se vindo a transformar, na minha perspectiva, num mau negócio para Portugal. mas, acima de tudo, um mau negócio para os Açores na medida em que serve mais os interesses de outros, no caso concreto, dos estados unidos, do que serve os nos-sos.” Claro como água!é que, meus amigos leitores, aqueles que todos os dias gostam de dramatizar os interesses dos estados unidos nestas ilhotas teimam, ou não têm interesse, em reco-nhecer que “se os americanos não tivessem interesse em estar nos Açores, já teriam andado exactamente co-mo os franceses fizeram.” Claro como água!!!

(1)http://www.correiodosacores.net/view.php?id=5779

(2)http://buledocha.blogspot.com/2006_01_01_archive.html

(3)http://www.correiodosacores.net/view.php?id=5269

CLAro Como áGUAGuiLHerMe MArinHohttp://chaverde.blogspot.com/

OPiNiãO

sim ou não ao representante da república. No primeiro texto vimos aquilo que repetidamente temos vindo a sublinhar: o cargo de representante da repú-blica, apesar de tudo, é importante para uma autono-mia sã. Por natureza o homem é torto, como aliás o mundo em geral; isso leva à conclusão que vem des-de Aristóteles de que é na conjugação de vários pode-res distribuídos que melhor se garante governos com tendência para o abuso (consciente e inconsciente). No texto anterior sublinhámos aquele aspecto, agora interessa-nos finalizar com outra parte: as alterações que neste momento decorrem, primeiro com a expur-gação do cargo no estatuto Político dos Açores, de-pois com a proposta de lei avulsa sobre o cargo que foi aprovada na generalidade na Assembleia da re-pública.Por imperativo da lei de revisão da Constituição em 2004, as regiões autónomas, quanto aos seus pode-res legislativos, ficaram com a incumbência de apre-sentar propostas de estatuto Político. A madeira apre-sentou a sua proposta em 2005 (entretanto retirou-a nesse mesmo ano; sobre isso, ver o nosso texto nº31 em Açores, Direito e Política) e mantinha no ar-ticulado do estatuto o cargo. Os Açores entregaram a sua proposta em 2007 e expurgaram as normas so-bre aquele cargo. As notícias mais recentes dizem-nos que a proposta de estatuto será aprovada antes do verão e que a proposta de lei avulsa sobre o cargo do representante da república foi pedida pelo Presiden-te da república.As notícias, portanto, não são as melhores. retirar do estatuto a figura do representante da república man-tendo o cargo é prejudicial à autonomia: do ponto de vista formal, é uma perca substancial porque o estatu-to é uma lei exclusivamente proposta pelo parlamen-to regional enquanto a lei avulsa não; e acresce que

diminui o poder político do estatuto e da Autonomia, porque um órgão tão significativo do procedimento autonómico sai precisamente daquela lei que caracte-riza a Autonomia Constitucional. diminui o seu esta-tuto de figura central, é certo, mas isso também dimi-nui a dimensão política da autonomia. do ponto de vista material, é uma declaração sem precedentes: a região Autónoma perde qualquer poder de influên-cia na caracterização do cargo, a região Autónoma di-vorcia-se da possibilidade de com o cargo aproveitar arrecadar outras valências que o cargo sempre pôde ter ao longo da história, e assim declara, por exemplo, que não se importa com os açorianos que pertencem à organização do estado nas ilhas.O estatuto perdeu algumas coisas com a revisão Constitucional de 2004: de entre tantos esta: já não é aquela lei suprema como dantes, pois que se juntou ao processo próprio da feitura do estatuto a feitura lei eleitoral. As leis eleitorais não têm a dignidade própria de um estatuto. esse ajuntamento pernicioso é uma declaração política algo contundente: o estatuto ainda mantém por via de outras normas constitucionais (por exemplo, da fiscalização) uma natureza de lei de va-lor reforçado, mas se hoje a lei eleitoral também está neste Olimpo, amanhã terá que descer e com ela pos-sivelmente também o estatuto. Como se isso não bas-tasse, retirar do estatuto o cargo de representante da república é despir o estatuto de elementos que o ca-racterizam como uma lei constitucional material tor-nando-o numa mera lei avulsa como tantas outras.A tendência hodierna é simples: descaracterizar a autonomia da lei constitucional, remeter as normas constitucionais autonómicas para o estatuto, masca-rar o estatuto parecendo rico pelos riscos grossos de tinta paupérrima, e colocar o estatuto num lugar me-nor da hierarquia das normas do estado.

sim oU nÃo Ao rr? (2/�)

ArnALDo ouriquesALA dA [email protected]

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atleta fantástico. Tive pena de não o apanhar um pou-co mais novo”. O então capitão da força Aérea trabalhou na Tercei-ra, com reconhecido sucesso, durante 12 épocas, em dois períodos distintos: 1966/72 e 1974/81.“sinto que marquei o futebol local, sobretudo os clu-bes em que exerci funções: união Praiense, sC Praien-se e sC Angrense. sendo sportinguista confesso, sem-pre tive uma imensa paixão pelo Angrense. felizmen-te, passados todos estes anos, continuo a ter grandes amizades na Terceira”. quando regressou ao continente, fernando Lopes

abraçou o futsal. “fui seleccionador nacional duran-te quase uma década e treinador do sporting CP. Pre-sentemente, ocupo o cargo de secretário técnico da Associação dos moradores da Portela, clube que com-pete na segunda divisão Nacional de futsal”, sublinha com justificado orgulho. Para o conceituado treinador, a formação é a única via que pode salvaguardar os interesses do desporto-rei por estas paragens e não só.“O futebol açoriano perdeu alguma expressão com a vin-da de muitos atletas de qualidade duvidosa. O melhor caminho é colocar a juventude a praticar a modalidade. Aí, acredito que não haverá necessidade de ir buscar jo-gadores continentais ou estrangeiros em fim de carreira que, na verdade, pouco ou nada acrescentam”.

“Apenas com uma formação de qualidade, os Açores podem aspirar em continuar a ‘fabricar’ talentos como o mário Lino, Armando fontes e Pedro Pauleta, o que passa, também, pela aposta em treinadores altamen-te qualificados”, subscreve de forma convicta. fernando Lopes entende que, com as condições vi-gentes, muitos dos atletas com quem trabalhou pode-riam ter alcançado patamares mais elevados. “Lusitânia, Angrense, Praiense, união e marítimo, por exemplo, tinham jogadores bastante dotados. quan-do cheguei à Terceira, treinávamos somente duas ve-zes por semana. O trabalho modifica os sistemas de

jogo. Ainda assim, a entrega, carácter e qualidade dos atletas proporcionavam espectáculos extraordinários”.embora considere que se trata de um problema na-cional, o nosso interlocutor sustenta que a entrada nos nacionais retirou paixão ao futebol das ilhas de bruma.“Lembro-me que os Campeonatos Açorianos eram aguardados com enorme expectativa. As pessoas gos-tavam de ver bons jogos e os campos estavam sempre cheios, num ambiente de saudável rivalidade. Os na-cionais acarretam despesas elevadas e não creio que a série Açores, pelo menos nos moldes vigentes, se-ja benéfica para os interesses do futebol regional”, ter-mina, não sem antes classificar a liguilha como “uma verdadeira aberração”.

CApitÃo sAUdAde ferNANdO LOPes

rePOrTAGem MAteus roCHA

fOTOGrAfiA António ArAúJo

“Guardo belas memórias da minha passagem pe-la Terceira. Na altura, tínhamos imensas dificuldades aos mais diversos níveis. hoje, as coisas estão sobre-maneira diferentes, a começar pelos campos”. é des-ta forma nostálgica e, ao mesmo tempo, emociona-da que fernando Lopes se ‘apresenta’ à reportagem do di/revista. Com os olhos colocados no sintético do municipal da cidade açoriana Património mundial, o antigo treina-dor, agora com 65 anos de idade, inicia uma curta via-gem ao passado. “recordo com saudade os jogadores com quem tra-balhei: álvaro Pereira, Abel Lima, humberto, félix, Car-los Alberto, faustino, josé Agostinho, Aníbal borges, jorge Laureano e tantos outros. O Laureano era um

GrAçAs AOs seus méTOdOs iNOVAdO-

res, ferNANdO LOPes reVOLuCiONOu O

fuTebOL TerCeireNse NAs déCAdAs de

60 e 70, CONquisTANdO diVersOs êxi-

TOs AO serViçO dO uNiãO PrAieNse, sC

PrAieNse e, sObreTudO, sC ANGreNse.

CríTiCO dA série AçOres, defeNde As

VirTudes dA fOrmAçãO.

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28di dOmiNGO 09.MARÇO.2008

tiro&qUedArui MessiAs

DIÁRIO INSULAR - Ficha Técnica: Propriedade: Sociedade Terceirense de Publicidade, Lda., nº. Pessoa Colectiva: 512002746 nº. registo título 101105 Jornal diário de manhã Composição

e Impressão: Oficinas gráficas da Sociedade Terceirense de Publicidade, Lda. Sede: Administração e Redacção - Avenida Infante D. Henrique, n.º 1, 9701-098 Angra do Heroísmo Terceira

- Açores - Portugal Telefone: 295401050 Telefax: 295214246 [email protected] | www.diarioinsular.com Director: José Lourenço Chefe de Redacção: Armando Mendes Redacção:

Hélio Jorge Vieira, Fátima Martins, Vanda Mendonça, Henrique Dédalo, Rui Messias e Helena Fagundes Desporto: Mateus Rocha (coordenador), Luís Almeida, Daniel Costa, José Eliseu

Costa, Jorge Cipriano e Carlos do Carmo. Artes e Letras: Álamo Oliveira (coordenador) Colaboradores: Francisco dos Reis Maduro Dias, Ramiro Carrola, Claudia Cardoso, Luís Rafael do

Carmo, Luiz Fagundes Duarte, Gustavo Moura, Francisco Coelho, José Guilherme Reis Leite, Ferreira Moreno, António Vallacorba, Diniz Borges, Bento Barcelos, Jorge Moreira, Duarte Frei-

tas, Guilherme Marinho, Daniel de Sá, Soares de Barcelos, Cristóvão de Aguiar, Vitor Toste, Luis Filipe Miranda, Paulo Melo e Fábio Vieira Fotografia: António Araújo, Rodrigo Bento, João

Costa e Fausto Costa Design gráfico: António Araújo. Agência e Serviços: Lusa Edição Electrónica: Isabel Silva Sócios-Gerentes, com mais de 10% de capital: Paula Cristina Lourenço,

José Lourenço, Carlos Raulino, Manuel Raulino e Paulo Raulino. Tiragem desta edição: 3.500 exemplares,; Tiragem média do mês anterior: 3.500 exemplares; Assinatura mensal: 11 euros

Livros

A peste negra: A Conjura-ção das flores-de-LisGilbert BordesBertrand Editora269 Páginas

1348. uma doença terrí-vel vinda da ásia devas-ta a frança- O seu nome anda na boca de todos: a Peste Negra. Anun-ciada por enormes ra-tazanas negras, o flage-lo não poupa ninguém, matando num sofrimen-to atroz, mesmo os mais robustos.Na mesma altura, numa aldeia da Gasconha, uma jovem, eugénia d’eauze, descobre a verdade do seu nascimento ilustre: educada com campone-ses, nasceu, no entan-to, dos amores da anti-ga rainha de frança com um trovador!então, o seu destino os-cila: sacrificando marido e família, eugénia parte para reconquistar o seu estatuto usurpado e to-ma o comando de uma conjuração que jurou re-por no trono os verdadei-ros herdeiros da coroa.Porém, a peste, a morte maldita, parece seguir-lhe os passos, matan-do-lhe não só os inimi-gos mas também aque-les que ama.é como se uma força so-brenatural acompanhas-se a jovem princesa, que carrega consigo a beleza do diabo...Gilbert bordes, autor deste livro, veio a reve-

lar-se um grande roman-cista de história, depois de iniciar-se no romance contemporâneo.bordes foi servente, pro-fessor primário e jorna-lista antes de se consa-grar à escrita. é autor dos

livros “La Nuit des bu-lottes” (Prémio rTL em 1991) e “Le Porteur de destins” (Prémio Casa da imprensa em 1992). Vá-rios dos seus romances foram adaptados à tele-visão.

eXposições

“Corpo intermitente” é o título de uma mostra de arte contemporânea pa-tente no museu de An-gra, até 21 de Abril.uma exposição de pin-tura da autoria de dimas simas Lopes está patente na Carmina Galeria, até 4 de Abril.“Tesouros marinhos” é o título de uma exposi-ção de conhas de Augus-to Veiga patente no mu-seu da Graciosa, até 20 de março.

CinemA

“Call Girl” é o filme em exibição no Centro Cul-tural de Angra, até quin-ta-feira, dia 13, pelas 21h00. hoje, domingo, o filme é apresentado às 18h00 e às 21h00.O Centro Cultural de An-gra estreia sexta-feira, dia 14, pelas 21h00, “O Comboio das 3 e 10”.O Centro Cultural de An-gra apresenta sábado, dia 15, às 15h00, “uma história de encantar”.O Auditório do ramo Grande apresenta hoje, domingo, pelas 15h00, “e Não Viveram felizes para sempre!”.O Auditório do ramo Grande apresenta sába-do, dia 15, pelas 21h00, “Call Girl”.

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