david graeber narra revolução de kobane na ucrania.pdf

Upload: flavio-lyra

Post on 05-Jul-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    1/10

    Search this site

    Temas Rede de Autores Contato Anuncie Parcerias Incomuns Sobre Equipe Seja Colaborador Ajude a sus tentar  

    David Graeber narra Revolução de KobanePOR DAVID GRAEBER

     – ON 28/01/2015

    CATEGORIAS: ALTERNATIVAS, MUNDO, PÓS-CAPITALISMO, POSTS

    ntropólogo anarquista conta experiência em territórios curdos

    libertados, onde partido marxista aderiu a práticas de autonomia e

    exército composto por mulheres expulsou ultra-fundamentalistas

    Por David Graeber, entrevistado por Pinar Öğünç’s| Tradução

     Jornal Mapa

    Os milicianos armados do Estado Islâmico (ISIS), terão que

    reformular uma de suas canções: “O Estado Islâmico permanece, o

     Estado Islâmico cresce”. Reconhecidos hoje como a maior ameaçaundamentalista do Oriente Médio, o ISIS acaba de sofrer um

    inesperado revés, depois de triunfar em consecutivas batalhas contra

    orças iraquianas e síria. Nesta segunda-feira (26/01), depois de 134

    dias de resistência, a guerrilha curda, reunida nas Unidades de

     Proteção do Povo (Yekîneyên Parastina Gel – YPG), surpreendeu o

    mundo, expulsando as tropas do ISIS da cidade de Kobane, em

    território curdo situado no norte da Síria, junto à fronteira com a

    Turquia. Trata-se da derrota mais importante imposta sobre o ISIS na

    Síria desde sua aparição.

    Ignácio Ramone t

    Na "guerra de quarta

    geração", o inimigo somos

    nós

    .

    Laura Carvalho

    O mar está para monstros

    .

    George Monbiot

    Para compreender o

    neoliberalismo além dos

    clichês

    .

    Raduan Nassar 

    Raduan Nassar: J udiciário

    estará acima da lei?

    .

    Tatiana Roque

    Razão neoliberal, dissolução

    da democracia e alternativas

    .

    Parceria

    Outros Quinhentos

    Siga-nos

    Blogs

    +++

    Parceria Editorial

    Vídeos e entrev istas

    Blog da Redação

    S.Paulo: oTeatro temuma propostapara o Centro

    Um dosprojetos para o Teatro-EstádioOf icina. Aqui, no Bixiga estaria umdos pólos do corredor, que seestenderia até […]

    Em Filhos dorio-mar,caminho paraenxergar a

     AmazôniaLetícia Freire expõe, em S.Paulo,imagens de comunidadeameaçada. Exposição — queretrata, além dos clichês,ribeirinhos e sua relação […]Desde o asfalto, novassubjetividades em formaçãoUma c rônica de certas ações

    0 0 6 0Você curtiu isso

    Outras Pal

    Site de notícias/mídia

    278 mil curtidas

    CurtiuCurtiu

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    2/10

     Desde o inicio da ofensiva contra Kobani, em 16 de setembro de 2014,

    mais de 600 combatentes curdos e 1000 jihadistas morreram. A vitória

    oi comemorada nas redes sociais após anúncio feito pelo porta-voz

    oficial do YPG, Polat Can, via Twitter. Assim como o ISIS, os

    combatentes curdos articulam-se na rede mundial de computadores.

     Nas paginas do Facebook Kurdish Resistance & Liberation e

    Solidariedade à Resistência Popular Curda pode-se acompanhar 

    as fotos e vídeos dos últimos confrontos e a festa de comemoração

    após a vitória. Nem o mais otimista analista político, nem a

    oderosa coalizão encabeçada pelos EUA para derrotar o ISIS,

    esperavam tamanha proeza. Como é possível que uma guerrilha

    ormada por homens e mulheres, desamparados militarmente pela

    alta de um Estado oficial, consiga derrotar a tropa mais sanguinária

    dos últimos tempos?

     David Graeber, professor de Antropologia (London School of 

     Economics), passou 10 dias em Cizire – um dos acampamentos em

     Rojava, zona ocupada pelo curdos ao norte da Síria. Junto com

    estudantes, ativistas e acadêmicos, ele teve a oportunidade de

    observar a democracia confederalista curda.

    O que motivou a ida de Graeber, foi uma pergunta feita em artigo

    ublicado em Outubro passado no “The Guardian”, durante a

    rimeira semana dos ataques do ISIS a Kobane: por que é que o

    mundo estava ignorando os Kurdos Sírios revolucionários?

     Mencionando o seu pai, que se voluntariou para lutar nas Brigadas

     Internacionais na república espanhola em 1937, perguntou:

    “Se existe hoje um paralelo com os assassinos falangistas,

     superficialmente devotos de Franco, quem será senão o ISIS? Se existe

    hoje um paralelo com as Mujeres Libres de Espanha, quem será senão

    as corajosas mulheres que defendem as barricadas de Kobane? Vai omundo – e desta vez mais escandalosamente, a esquerda internacional 

     — ser condescendente em deixar que a história se repita?”

     De acordo com Graeber, a zona de Rojava é fundamentalmente

    anti-estado, anti-capitalista e radicalmente democrática. Uma notável 

    experiência revolucionária na região, que separa o poder coercitivo

    da administração pública e obriga aulas de feminismo para toda

    opulação. Leia a seguir, as impressões políticas que Graeber 

    concedeu a Pinar Öğünç’s. ( Cauê Seignemartin Ameni  )

    No artigo para o Guardian

    perguntaste por que é que omundo ignora a “experiencia

    democrática” dos curdos sírios.

    Depois da experiência de 10 dias,

    tens uma nova questão ou talvez

    uma resposta para isso?

    Bem, se alguém tinha dúvidas se

    isto era uma verdadeira revolução,

    ou só alguma “sombra”, diria que

    esta visita tira todas as dúvidas.

    Nossa livraria online

    Compre

    Compre

    Mais lidos

    Outro Canal

    contra o golpe— e um palpitesobre anecessidadede rever 

    programas, f ormas de […]

    Outras Mídias

    O PSDBprepara umgolpe dentrodo golpe?Ministério deTemer é

    patético, mashá algo mais profundo por trás dosnovos v azamentos. Objetiv o dostucanos pode ser […]

     América doSul: novaresistência aoultra-capitalismoMovimentosda Argentina,

    Brasil, Chile e Uruguai articulamluta contra acordos de "livre"-comércio -- que agora têm apoiodos governos […]

    Também nacontaminação,um planetadesigualNovosestudosrevelam:

    população empobrecida, nospaíses do Sul do planeta, estáquase duas v ezes mais expostaaos piores tipos […]

    Outros Livros

    DavidGraeber:‘Dívidasempre foiuma questão

    de poder’.Guilherme Freitas entrevist aDav id Graeber no Globo Emsetembro de 2011, o antropólogo

    americano David Graeber estav ano grupo que planejou […]‘Bem Viv er’, oconceito queimagina outrosmundos

    possív eis, já se espalha pelasnaçõesPor Amelia Gonzalez, no cadernoNov a Ética Social Como prometi,v olto ao tema “Bem Viver”, sobreo qual comentei no último […]

    Como a mídiae os paísesocidentaissubestimaram

    o poder do Estado Islâmico?O Estado Islâmico (ISIS) atacoucom uma v elocidade brutal,

    enquanto o mundo esperav apassivamente pelas respostas,incapaz de entender um […]

    Outras palavras apresenta

    POPULAR COMMENTS

    TODAY WEEK MONTH ALL

    O tenebroso mundo das "novas"

    festas infantis

    A atualidade br utal de Hannah Arendt 

    Arquitetura hostil: as cidad es

    contra seres humanos

    Cerveja: o transgênico que você

    bebe?

    Facebook: um mapa das redes de

    ódio

    PANORÂMICA DRONE: ESCOLAS EM LUTA

    Paulo Freire Contemporâneo -Documentário

    O Bem ViverUma oportunidade para imaginaroutros mundos

    Autor: Alberto AcostaPor R$ 30,00

    Mídia – Propaganda

    Política e Manipulação

    Autor: Noam ChomskyDe R$ 24,00 por R$ 22,00

    O Minotauro GlobalA verdadeira origem da crise�nanceira e o futuro daeconomia global

    Autor: Yanis Varoufakis

    Por R$ 50,00 (PRÉ-VENDA)

    Compre

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    3/10

    Ainda existem pessoas a dizer: “Isto

    é só uma frente do PKK (Partido

    dos Trabalhadores do Curdistão), na verdade são só uma organização

    autoritária stalinista, que apenas finge ter adotado uma democracia

    radical”. Não. Isto é mesmo a sério. É uma revolução genuína. Mas de

    certa maneira, é exatamente esse o problema. Os grandes poderes

    têm-se entregado a uma ideologia que diz que as verdadeiras

    revoluções já não podem acontecer. Entretanto, muita da esquerda,

    mesmo a radical, parece taticamente ter adotado a política que assume

    o mesmo, apesar de parecerem superficialmente revolucionários.

    Assumem um tipo de “anti-imperialismo” puritano que assume que os

    únicos jogadores importantes são os governos e capitalistas, e que esse

    é o único jogo que vale a pena discutir. O jogo onde se batalha, se

    criam vilões míticos, se agarra petróleo e outros recursos, montam-se

    redes de patrocínios; é o único jogo da cidade. O povo de Rojava diz:

    “Nós não queremos jogar esse jogo. Queremos criar um novo”. Muita

    gente acha isto confuso e perturbador, então escolhem acreditar que

    não está acontecendo nada, ou que essas pessoas estão iludidas, são

    desonestas ou ingênuas.

    Desde Outubro que vemos uma crescente solidariedade vinda de váriosmovimentos políticos de todo o mundo. Houve uma grande e

    entusiástica cobertura da resistência em Kobane pelos média

    mainstream internacionais. A posição política perante Rojava mudou

    no Ocidente, de certa forma. Existem sinais significativos mas

    estariam discutindo suficientemente a autonomia democrática e as

    experiências nos cantões de Rojava? Que parte de “algumas pessoas

    corajosas a lutar contra o grande mal desta era, o ISIS” não estará a

    dominar esta aprovação e este fascínio? Acho que é notável que tanta

    gente no Ocidente olhe para estes quadros de feministas armadas, por 

    exemplo, e nem sequer pense nas ideias por trás delas. Apenas se

    apercebem que assim aconteceu, por algum motivo. “Penso que é uma

    tradição curda”. De certo modo, claro que se trata de orientalismo, ousimplesmente racismo. Nunca lhe ocorreu que as pessoas no Curdistão

    também possam ler Judith Butler. Na melhor das hipóteses pensam:

    “Oh, estão tentando alcançar os padrões ocidentais da democracia e

    dos direitos das mulheres. Será que é a sério ou será que é só para os

    estrangeiros verem?”. Não lhes ocorre que eles podem estar levando as

    coisas bem mais longe que os “padrões ocidentais” alguma vez

    levaram; que acreditam genuinamente nos princípios que os Estados

    ocidentais apenas professam.

    Mencionaste a aproximação da esquerda sobre Rojava. Como isso

    é recebido nas comunidades anarquistas internacionais?

    A reação da comunidade anarquista internacional tem sido

    decididamente diversa. De certa maneira, acho difícil de entender.

    Existe um grupo substancial de anarquistas – normalmente os

    elementos mais sectários – que insiste que o PKK ainda é um grupo

    nacionalista autoritário stalinista, que adotou as teoria do Murray

    Bookchin, e outros partidários da esquerda libertária, para cortejar a

    esquerda anti-autoritária na Europa e América. Parece-me uma das

    ideias mais parvas e narcisistas que já ouvi. Mesmo que a premissa

    estivesse correta, e que um grupo marxista-leninista decidisse fingir 

    uma ideologia para obter apoio estrangeiro, por que raio é que iriam

    Anuncio

    Noam Chom sk y - Fabricação doConsenso 1992 ( legendas em português

    )

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    4/10

    escolher ideias anarquistas desenvolvidas por Murray Bookchin? Isso

    seria a jogada mais estúpida de sempre. Obviamente fingiriam ser 

    islamitas ou liberais, já que são esses que conseguem armas e apoio

    material. De qualquer maneira, penso que muita gente na esquerda

    internacional, incluindo a esquerda anarquista, não quer basicamente

    ganhar. Não conseguem imaginar que uma revolução realmente

    acontecesse, e, secretamente, nem sequer a querem, uma vez que isso

    significaria partilhar o seu clube “cult” com pessoas comuns; já não

    seriam especiais. Assim, até é útil para separar os verdadeiros

    revolucionários dos “posers”. Mas os verdadeiros revolucionários

    têm-se mantido firmes.

    Qual foi a coisa mais impressionante que testemunhaste em

    Rojava nos termos práticos desta autonomia democrática?

    Existem tantas coisas impressionantes. Acho que nunca ouvi falar de

    nenhum outro lado do mundo onde tenha existido uma situação de

    dualidade de poder, onde as mesmas forças políticas criaram ambos os

    lados. Existe a “auto-administração democrática”, onde existem todas

    as formas e armadilhas de um Estado – Parlamento, ministros, e por aí

     –, mas criada para ser cuidadosamente separada dos meios do poder 

    coercivo. Depois há o TEV-DEM (o Movimento da Sociedade

    Democrática), raiz das instituições, dirigido via democracia direta. No

    final – e isto é fulcral – as forças de segurança respondem perante as

    estruturas que seguem uma abordagem de baixo para cima, e não de

    cima para baixo. Um dos primeiros locais que visitamos foi a

    academia de polícia (Asayis). Todos tiveram que frequentar cursos de

    resolução de conflitos não violenta e de teoria feminista antes de serem

    autorizados a pegar numa arma. Os co-diretores explicaram-nos que o

    seu objectivo final é dar seis semanas de treino policial a toda a gente

    no país, para que em última análise se possa eliminar a polícia.

    O que responderias às várias críticas em torno de Rojava? Por

    exemplo: “Eles nunca fariam isto em tempos de paz. É por causa

    do estado de guerra”…

    Bem, penso que a maioria dos movimentos, perante as condições

    horrendas da guerra, não iria no entanto abolir imediatamente a pena

    capital, dissolver a polícia secreta e democratizar o exército. As

    unidades militares, por exemplo, elegem os seus oficiais.

    E existe outra crítica, bastante popular nos círculos pro-governo

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    5/10

    aqui na Turquia: “O modelo que os Curdos – na linha do PKK e

    PYD (o Partido Curdo de União Democrática, na Síria) – estão

    tentando promover não é na verdade seguido por todas as pessoas

    que lá vivem. Essa multi-estrutura existe apenas à superfície, nos

    símbolos”…

    Bem, o presidente do cantão de Cizire é árabe, é de fato o chefe da

    maior tribo local. Suponho que se possa dizer que ele é só uma figura.

     No sentido que todo o governo o é. Mas ao olhar para as estruturas

    organizadas de baixo para cima, é certo que não são só os curdos que

    estão participando. Disseram-me que o único problema sério é com

    algumas aldeias do “cinto árabe”, pessoas trazidas de outras partes da

    Síria pelos Baathistas nos anos 50 e 60, como parte de uma política de

    marginalização e assimilação dos curdos. Algumas dessas

    comunidades afirmaram-se bastante hostis à revolução. Mas os árabes

    cujas famílias já estão lá há várias gerações, ou os assírios, quirguizes,

    arménios, chechenos, mostram-se entusiasmados. Os assírios com

    quem falámos disseram que, após uma longa e difícil relação com o

    regime, sentiram que finalmente lhes era permitida autonomia cultural

    e religiosa. Provavelmente, o maior problema pode ser o da libertação

    das mulheres. O PYD e o TEV-DEM vêem isso como absolutamentecentral na sua ideia de revolução, mas também enfrentam o problema

    de lidar com alianças maiores, com comunidades árabes que sentem

    que isto viola princípios religiosos básicos. Por exemplo, enquanto

    aqueles que falam siríaco têm a sua própria união de mulheres, os

    árabes não, e as raparigas árabes interessadas em organizar-se em

    torno de questões de gênero ou até assistir a seminários feministas têm

    de se juntar com os assírios ou mesmo com os curdos.

    Não é necessário estar preso no “quadro anti-imperialista

    uritano” que mencionaste antes, mas o que dirias em relação ao

    comentário que o Ocidente/imperialismo irá um dia exigir aos

    curdos sírios um pagamento pelo seu apoio? O que é que oOcidente pensa exatamente sobre este modelo anti-estado e

    anti-capitalista? É apenas uma experiência que pode ser ignorada

    durante um estado de guerra, enquanto os curdos aceitam

    oluntariamente combater um inimigo criado pelo Ocidente?

    É absolutamente verdade que os EUA e a Europa irão fazer o que

     poderem para subverter a revolução. Nem é preciso dizer nada. As

     pessoas com quem falei estão bem cientes disso. Mas não fazem

    grande diferenciação entre a liderança de poderes regionais como na

    Turquia, Irã ou Arábia Saudita, e poderes Euro-americanos como por 

    exemplo França ou EUA. Assumem que são todos capitalistas e

    estadistas e portanto anti-revolucionários, que podem no melhor doscasos ser convencidos a apoiarem-nos mas que, em última análise, não

    estão do seu lado. Depois existem questões ainda mais complicadas da

    estrutura da chamada comunidade internacional, o sistema global de

    instituições como a ONU ou FMI, corporações, ONG’s, organizações

    humanitárias, em que todas presumem uma organização estadista, um

    governo que pode passar leis e detém o monopólio da aplicação

    coerciva dessas leis. Só existe um aeroporto em Cizire e está sobre o

    controlo do governo Sírio. Podem tomá-lo a qualquer altura, dizem. E

    há uma razão para não o fazerem: como iria um não-Estado dirigir um

    aeroporto? Tudo o que se faz num aeroporto é sujeito a regulamentos

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    6/10

    internacionais, o que presume um Estado.

    Tens uma resposta para o porquê da obsessão do ISIS com

    Kobane?

    Bem, eles não podem ser vistos perdendo. Toda a sua estratégia de

    recrutamento é baseada na ideia que eles são imparáveis, e que a sua

    contínua vitória é a prova que representam a vontade de Deus. Serem

    derrotados por um monte de feministas seria a humilhação final.

    Enquanto estiverem lutando em Kobane, podem dizer que a mídia

    mente e que estão avançando verdadeiramente. Quem pode provar o

    contrário? Se recuassem seria admitir a derrota.

    Tens resposta para o que Tayyip Erdogan e o seu partido estão

    tentando fazer na Síria e o Médio Oriente em geral?

    Posso apenas imaginar. Parece que Erdogan passou de uma política

    anti-Assad e anti-curda para uma estratégia quase puramente

    anti-curda. Repetidamente tem mostrado vontade de se aliar com

    fascistas pseudo-religiosos para atacar qualquer experiência de

    democracia radical inspirada no PKK. Ele vê claramente, como o

     próprio Daesh (ISIS), que o que está sendo feito é uma ameaça

    ideológica, talvez a única alternativa ideológica viável face ao

    islamismo de direita que se avizinha, e tudo fará para a eliminar.

    De um lado existem os curdos iraquianos com uma ideologia bem

    diferente em termos de capitalismo e noção de independência. Por

    outro lado, existe este exemplo alternativo em Rojava. E existem os

    curdos da Turquia que tentam manter um processo de paz com o

    governo… Pessoalmente, como vês o futuro do Curdistão a curto e

    a longo prazo?

    Quem pode dizer? Neste momento as coisas parecem

    surpreendentemente boas para as forças revolucionárias. O KDG até

    desistiu da enorme vala que estava construindo através da fronteira de

    Rojava, após o PKK intervir e salvar Erbil e outras cidades dos

    avanços ISIS, em Agosto. Um membro do KNK me disse que isso teve

    um grande impacto na consciência popular; que um mês criou tanta

    consciência como 20 anos. Os jovens estavam particularmente

    impressionados pelo fato d seus próprios Peshmerga abandonarem o

    campo de batalha mas as mulheres do PKK não. Mas é difícil de

    imaginar como é que o território de KRG será contudo revolucionado

    num futuro próximo. Nem o poder internacional o permitiria.

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    7/10

    Apesar da autonomia democrática não parecer estar em cima da

    mesa de negociações na Turquia, o Movimento Político Curdo está

    trabalhando nisso, especialmente a nível social. Tentam encontrar

    soluções em termos legais e económicos para possíveis modelos.

    Quando comparamos, digamos, a estrutura de classes e o nível de

    capitalismo no Curdistão Ocidental (Rojava) e no Norte (Turquia),

    o que pensas sobre as diferenças destas duas lutas para uma

    sociedade anti-capitalista – ou para um capitalismo minimizado,

    como o descrevem?

    Penso que a luta curda é explicitamente anti-capitalista em ambos os

     países. É o seu ponto de partida. Conseguiram uma espécie de fórmula:

    não eliminar o capitalismo sem eliminar o Estado, e não podemos

    eliminar o Estado sem eliminar o patriarcado. No entanto, o povo de

    Rojava tem a questão simplificada em termos de classes porque a

    verdadeira burguesia, tal como existia numa região maioritariamente

    agrícola, desapareceu com o colapso do regime de Baath. Enfrentarão

    um problema a longo prazo se não trabalharem no sistema educativo,

     para assegurar que um estrato tecnocrata de desenvolvimento não tente

    eventualmente tomar poder, entretanto, é compreensível que se foquem

    de imediato nas questões de gênero. Na Turquia não sei tanto, mastenho a sensação que as coisas são muito mais complicadas.

    Durante os dias em que as pessoas do mundo não podiam respirar

    or razões óbvias, a tua viagem a Rojava inspirou-te sobre o

    futuro? Qual achas que é o “remédio” para as pessoas respirarem?

    Foi extraordinário. Passei a minha vida pensando em como

     poderíamos fazer coisas como estas num futuro remoto e a maioria das

     pessoas pensa que sou louco por imaginar que isto alguma vez vai

    acontecer. Estas pessoas estão fazendo agora. Se eles provarem que

     pode ser feito, que uma sociedade genuinamente igualitária e

    democrática é possível, isto irá transformar completamente a noção de possibilidades humanas. Pessoalmente, sinto-me dez anos mais novo

    só de ter lá passado dez dias.

    Com que cena te irás recordar da tua viajem a Cizire?

    Existem tantas imagens impressionantes, tantas ideias. Gostei da

    disparidade entre o aspecto das pessoas e as coisas que diziam.

    Conhece-se alguém, um médico, que parece um militar sírio,

    vagamente assustador, de casaco de cabedal e expressão austera.

    Depois fala-se com ele e ele explica: “Bem, sentimos que a melhor 

    abordagem à saúde pública é a prevenção, a maioria das doenças

    ocorre devido ao stress. Sentimos que se reduzirmos o stress, os níveisde doenças de coração, diabetes, e mesmo o cancro irão diminuir.

    Assim, o nosso plano final é reorganizar as cidades para terem 70% de

    espaços verdes…” Existem todos estes planos loucos e brilhantes. Mas

    depois vai-se ao médico ao lado e explica-nos que, graças ao embargo

    turco, não conseguem sequer obter equipamento ou medicamentos

     básicos, que todos os pacientes para diálise que não foram levados dali

    morreram… Esta disjunção entre as ambições e as incríveis e difíceis

    circunstâncias. A mulher que era efetivamente a nossa guia era uma

    vice-chanceler chamada Amina. A certa altura, pedimos desculpa por 

    não termos trazido presentes melhores e ajudado a população de

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    8/10

    Bio Latest Posts

    Rojava, que sofrer sob o embargo. E ela disse: “No final, isso pouco

    importa. Temos a única coisa que ninguém nos pode dar. Temos a

    nossa liberdade. Vocês não. Quem me dera que houvesse uma maneira

    de poder dá-la”.

    É as vezes criticado por seres demasiado otimista e entusiasta

    sobre o que está acontecendo em Rojava. Achas que és? Ou há

    alguma coisa que não entendem?

    Sou otimista de

    temperamento,

     procuro situações

    que carreguem

    alguma promessa.

     Não acho que

    existam garantias

    que isto resultará no

    final, que não será

    esmagado, mas certamente que não será se toda a gente decidir que

    nenhuma revolução é possível e se recusar a dar-lhe apoio ativamente,

    ou até dedicar esforços a atacá-la ou aumentar o seu isolamento, comomuitos fazem. Se existem alguma coisa da qual tenho consciência e os

    outros não, talvez seja o fato da história não estar terminada. Os

    capitalistas têm feito um esforço enorme nos últimos 30 ou 40 anos em

    convencer as pessoas que os atuais acordos econômicos – nem sequer 

    o capitalismo, mas a forma de capitalismo semi-feudal, financializada,

     peculiar que temos hoje em dia – são o único sistema econômico

     possível. Puserem mais esforços nisto do que em criar um sistema

    capitalista global viável. Como resultado, o sistema está a

    despedaçar-se à nossa volta no preciso momento em que toda a gente

     perdeu a capacidade de imaginar outra coisa. Bem, é bastante óbvio

    que em 50 anos, o capitalismo sob qualquer forma que conheçamos, e

     provavelmente sob qualquer outra forma, já não existirá. Terá sidosubstituído por outra coisa. Essa coisa pode não ser melhor. Pode até

    ser pior. Por esse mesmo motivo, parece-me que é nossa

    responsabilidade, enquanto intelectuais, ou simplesmente seres

    humanos pensantes, de pelo menos pensar como será uma coisa

    melhor. E se existem pessoas que estão verdadeiramente tentando criar 

    essa coisa melhor, é nossa responsabilidade ajudá-las.

    Sobre o mesmo tema:

    0 0 6 0

    02/09/2015

    (3)

    Oriente Médio:EUA viram ascostas aos c urdos

    31/10/2014

    (0)

    Contraextremismoislâmico, umarevolução

    03/12/2014

    (4)

    O surpreendenteCurdistão libertário

    29/10/2015

    (2)

    Turquia: surgemos muçulmanosanticapitalistas

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    9/10

    David Graeber

    Anarquista, antropólogo e professor no Colégio

    Goldsmith da Universidade de Londres .

    Anteriormente foi professor associado na

    Universidade de Yale. Graeber participa ativamente

    em movimentos sociais e políticos, protestanto

    contra o Fórum Econômico Mundial de 2002 e o

    movimento Occupy Wall Street. Ele é membro do

    Industrial Workers of the World e faz parte docomite da Organização Internacional para uma

    Sociedade Participativa (em inglês: International

    Organization for a Participatory Society)

    TAGS: curdos, David Graeber, EUA, França, isis, Oriente Médio,kk , Síria, Turquia, Yekîneyên Parastina Gel, YPG

    4 Comments

    Júlio César 

    Posted janeiro 29, 2015 at 9:32 AM

    Que história f antástica!!!

    Jucenira M onteiro

    Posted janeiro 29, 2015 at 1:50 PM

    que experiência fantástica desse povo ! eu creio q é possível, sim!

    António Costa

    Posted janeiro 29, 2015 at 10:32 PM

    Paraf raseando o Poeta Ruy Belo, tudo é possív el é só querer… temos a

    responsabilidade de apoiar esta v erdadeira revolução. A única f orma de apoioreal e capaz de contribuir para que não seja derrotada é lutarmos contra o

    capitalismo e o imperialismo, no país e no continente europeu. Por uma

    comunidade em que as culturas de todo o mundo se possam desenv olv er 

    livremente….

    Luiz Fernando

    Posted fevereiro 1, 2015 at 4:10 PM

    Guevara dizia que não existem libertadores, é o pov o que se liberta e esta

    comunidade está provando isto

    Deixe uma respos ta

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de

    0 30/05/20

  • 8/16/2019 David Graeber narra Revolução de Kobane na Ucrania.pdf

    10/10

    About Arras WordPress Theme

     _________________________________________________________________________________________________________________________________________ 

    Outras Palav ras | Blog da Redação | Outras Mídias | Biblioteca Diplô | Ipiranga 895 | Outros Livros | Outros Quinhentos

    Redação Outras Palavras

    Rua Conselheiro Ramalho, 945 - Bixiga

    São Paulo (SP)

    Brasil

    Tel: +55 11 3253 3168

    d Graeber narra Revolução de Kobane http://outraspalavras.net/posts/david-graeber-narra-a-revolucao-de