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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

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ANA CARLA NADAL RIBEIRO

ESTUDANDO OS VEGETAIS A PARTIR DE

PLANTAS MEDICINAIS

Londrina

2011

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ESTUDANDO OS VEGETAIS A PARTIR DE PLANTAS MEDICINAIS

Ana Carla Nadal Ribeiro1

Rogério Fernandes de Souza 2

Resumo

Este artigo diz respeito à utilização das plantas medicinas como ferramenta para o estudo do Reino Vegetal. Realizado de acordo com o projeto apresentado no Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria do Estado do Paraná – SEED/PR, envolveu as turmas B e C de sexta série do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Bento Mossurunga, localizado no município de Ivaiporã-Pr, no período de agosto a novembro de 2010. A partir da implementação de uma horta de plantas medicinais na própria escola e da confecção de exsicatas foi possível trabalhar temas como: estrutura vegetal, fotossíntese, nutrição, respiração e polinização. Além disso, também se ensinou a forma de plantio, colheita, secagem e preparo de algumas plantas de uso corriqueiro de comprovação eficaz e autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Além disso, as exsicatas produzidas poderão ser mantidas no laboratório da escola para atender diferentes turmas da escola. Desse modo, o projeto se mostrou eficiente tanto como estratégia de ensino, bem como forma de conscientização sobre o uso mais adequado de fitoterápicos.

Palavras-chave: Plantas medicinais. Reino Vegetal. Herbário. Exsicatas.

1 Introdução

O conteúdo de Ciências na sexta série abrange o ensino dos seres vivos,

dentre eles, o Reino Vegetal. Neste tópico, são normalmente abordados temas como

sistemática, morfologia, fotossíntese, nutrição respiração, além de assuntos

relacionados, como, por exemplo, meio ambiente e saúde. Dentro do Reino Plantae,

o grupo das Angiospermas (Filo Anthophyta) – que engloba as plantas

vascularizadas, com sementes, flores verdadeiras e frutos – é o mais representativo

1Graduada em Ciências e Matemática pela Univale (Universidade do Vale do Ivaí) , Pós Graduada em Didática e Metodologia do Ensino pela UNOPAR (Universidade Norte do Paraná). Professora PDE/2009, área de Ciências, Escola Estadual Bento Mossurunga Ensino Fundamental e Médio, município de Ivaiporã-PR. E-mail- [email protected] 2Doutor, Biólogo, Docente do Centro de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Londrina (UEL), PR. E-mail: [email protected].

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e com a maior diversidade de plantas do planeta. Das 350 mil espécies descritas e

conhecidas, mais de 250 mil são angiospermas. Suas principais características são

a formação de ramos de crescimento determinado, nos quais as folhas se

transformam nos apêndices florais (sépalas, pétalas, estames e pistilos – uma flor

típica) e o acondicionamento das sementes no interior de frutos (angio = urna;

sperma = semente), que são resultantes do desenvolvimento do ovário da flor

(WANDERLEY; AYRES, 2008). Até pouco tempo, as angiospermas eram

classificadas em dois grandes grupos: dicotiledôneas e monocotiledôneas.

Atualmente, baseando-se no princípio do monofiletismo – no qual se inclui dentro de

um grupo todas as espécies que compartilham um único ancestral comum – essa

classificação foi alterada. Os dois principais grupos de angiospermas, em termos de

quantidade de espécies, são hoje agrupados em monocotiledôneas e

eudicotiledôneas. Alguns dos antigos membros das dicotiledôneas, e que não fazem

parte das euticotiledôneas, foram transferidos para outros grupos, como as

angiospermas mais antigas (MOTTA; FURLAN, 2008).

Mesmo sabendo que as plantas participam ativamente das nossas

atividades diárias, seja na alimentação ou no uso de um fármaco como o princípio

ativo originalmente extraído de um vegetal, ainda nos deparamos com um grande

distanciamento entre o que se aprende de botânica na escola e a sua aplicação na

realidade do estudante. Com a finalidade de estreitar os laços entre o conteúdo de

botânica e o cotidiano dos nossos alunos, sugerimos a utilização das plantas

medicinais como ferramenta para a criação de práticas que permitam o ensino sobre

Reino Vegetal, mais precisamente, sobre o grupo das angiospermas. Nesse sentido,

foi proposto aos estudantes a construção de uma horta nas dependências da escola

e a produção de exsicatas de diferentes espécies vegetais como metodologia para o

estudo do conteúdo de botânica.

Consideramos que tais tipos de atividades podem se tornar uma estratégia

motivadora para que os estudantes assimilem o conteúdo trabalhado em sala de

aula. Além desse benefício direto, existe a possibilidade de se abordar outros tipos

de questões, como por exemplo, os riscos do uso indevido das plantas no

tratamento de doenças ou como utilizar corretamente algumas plantas medicinais de

eficácia cientificamente comprovada. Isso põe o processo de construção de

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significados como elemento central do processo de ensino-aprendizagem, conforme

preconiza as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (PARANÁ, 2008).

1.1 Fundamentação Teórica

Certamente, a utilização das plantas como medicamento seja tão antiga

quanto o próprio homem. Na Bíblia Sagrada, tanto no Antigo como no Novo

Testamento, há muitas referências a plantas curativas e seus derivados, como, por

exemplo, o aloés, o bálsamo, a mirra, entre outras. Estudos antropológicos

confirmam o uso de plantas medicinais pelas civilizações antigas e sua evolução até

o século em que vivemos. Por exemplo, na Mesopotâmia, era comum cultivar

plantas medicinais nos jardins dos templos, cerca de 2.600 a.C. Conforme Jorge

(2003), Hipócrates (460- 361 a.C.), denominado o Pai da Medicina, reuniu em sua

obra Corpus Hipocratium a síntese dos conhecimentos médicos de seu tempo,

indicando para cada enfermidade, o remédio vegetal e o tratamento adequado.

Segundo Martins et al. (1995) ( apud MINAMI; BARRACA, 1999) e Miranda

et al. (1998) (apud MINAMI; BARRACA,1999) estudos da Organização Mundial de

Saúde indicam que aproximadamente 80% da população mundial faz uso de plantas

medicinais. De um modo geral, na cultura brasileira, o uso de plantas medicinais

para diferentes finalidades ocorre de uma maneira bastante corriqueira. No entanto,

devido ao tamanho do Brasil e a diversidade da sua flora, muitas espécies de

plantas medicinais podem ser utilizadas regionalmente. Já, outras, podem ser

amplamente disseminadas pelo país. Isso pode trazer alguns problemas como, por

exemplo, modificações regionais nos nomes de um mesmo fitoterápico, ou utilização

de um mesmo nome para espécies distintas. Isso aumenta o risco de uma

identificação incorreta de muitas plantas medicinais. Além disso, nem sempre esses

materiais são armazenados de forma apropriada, ou mesmo preparados de maneira

adequada. Também é comum a falta de conhecimento sobre os riscos de efeitos

colaterais e tóxicos de muitas ervas, quando estas são ingeridas em altas doses.

Quando uma planta é consumida em sua forma natural pela população, sem a

devida orientação médica, esse consumo torna-se uma prática denominada

medicina popular (ou medicina tradicional) e, é claro, que tem seus riscos.

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De acordo com Lorenzi e Matos (2002), qualquer estudo envolvendo plantas

deve ser iniciado pela amostragem botânica. Esse material consiste em uma

amostra da planta, de preferência fértil (folhas e /ou frutos), prensados e secos, e

acondicionados em uma coleção cientifica chamada de herbário. Um herbário é uma

documentação científica para a identificação de espécies do Reino Vegetal. Este

tem por finalidade o estudo e a catalogação das plantas encontradas em nosso

planeta. A produção de um herbário na escola pode ser uma atividade muito valiosa

por levar o aluno a se tornar um bom observador, permitindo que este adquira um

conhecimento científico escolar. Aliado a isso, a construção de uma horta escolar de

plantas medicinais pode complementar a formação dos estudantes, fornecendo uma

estratégia eficiente para se trabalhar temas como crescimento, fotossíntese,

nutrição, respiração e polinização, dentre outros. Além disso, ela pode ser utilizada

para trabalhar temas como saúde e meio ambiente.

2 Metodologia

O trabalho foi desenvolvido com turmas de 6ª série do Ensino Fundamental

do Colégio Bento Mossurunga, turmas B e C e os alunos da turma D contribuíram

voluntariamente nos cuidados com a horta. Ao todo, foram envolvidos diretamente

58 estudantes e, indiretamente, 162 pessoas entre pais e avós que convivem com

os mesmos. Em um primeiro momento, foi elaborado um questionário (semelhante

ao mostrado em anexo) a fim de conhecer os hábitos de consumo de plantas

medicinais nas famílias desses estudantes. Tal iniciativa também teve por objetivos:

a) despertar um maior interesse dos estudantes em participar das atividades

propostas; b) descobrir os tipos de plantas medicinais mais comumente utilizados

pelas famílias da região, a fim de utilizá-las em uma horta de plantas medicinais nas

dependências da escola, bem como na produção de exsicatas para os estudos de

botânica.

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2.1 Escolha das Espécies e Construção da Horta

Com base nas informações colhidas no questionário aplicado às famílias dos

estudantes, foram escolhidas algumas espécies de plantas medicinais para serem

cultivadas em uma horta circular (Figura 1), construída pelos estudantes e pela

professora nas dependências da escola. A escolha do terreno para a construção da

horta foi baseados na sua capacidade de drenagem, iluminação solar na maior parte

do dia e proximidade a uma fonte de água, o que, segundo Brito (2008) facilita a sua

manutenção. Antes de se iniciar a sua construção, foi retirado todo o lixo, entulhos e

ervas daninhas desse terreno. Em seguida, foi realizada a demarcação do ponto

central, que serviu de referência para o posicionamento da horta e das suas seções.

Essa demarcação se deu com o auxílio de dois bastões amarrados nas bordas de

um cordão, o que permitiu desenhar no solo as diferentes circunferências da horta. A

primeira circunferência correspondeu a área central da horta. Outros círculos

externos foram demarcados sucessivamente, até formar a borda final da horta.

Também foram demarcados os espaços para a circulação das pessoas. Sendo

todos eles separados por garrafas plásticas de refrigerante.

Figura 1- Modelo de uma horta circular adotada neste trabalho Fonte: Do autor.

Em seguida, o solo foi remexido com enxadas e misturado com adubo

orgânico (esterco curtido). Esperou-se quinze dias para se fazer o plantio, que foi

realizado a partir de mudas e semente trazidas pelos próprios estudantes. A horta foi

protegida do sol, chuva e animais a partir de uma cobertura vegetal de folhas secas

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e de palha de café. Os cuidados foram diários, tais como irrigação, capina e

replantio, quando necessário.

2.2 Confecção das Exsicatas

Para a produção das exsicatas foram coletadas algumas espécies de

plantas medicinais citadas pelos estudantes. Utilizou-se a seguinte técnica de

herborização, de acordo com Netto (2010) conhecida desde o século XIV, mas

difundida a partir do Orto dei Simplici de Pisa desde a década de 1530 (WIKIPEDIA,

2011):

1. O material coletado foi colocado em folhas de jornal dobradas, de modo

que os órgãos ou as estruturas não se sobrepusessem, sendo então

pulverizando com álcool aproximadamente 70% (7 partes de álcool

comercial 96 G.L. para 3 partes de água); em seguida, foi colocada uma

identificação (em papel sulfite) com o nome vulgar da planta (ou científico,

se conhecido), o local e a data da coleta e o nome do coletor;

2. As amostras foram intercaladas com folhas de jornal dobradas para reter

a umidade e folhas de papelão canelado; o material foi então prensado

com pranchas de madeira, sendo o conjunto amarrado fortemente com

barbante;

3. O material prensado foi mantido em lugar quente e seco, para que o

processo de secagem ocorresse;

4. Depois de seco, as amostras de plantas foram amarradas em folhas de

cartolina, colocando-se no canto direito inferior uma etiqueta de

identificação, contendo os dados da planta e, no canto esquerdo superior,

um envelope pequeno, o qual serviu para guardar partes do material que,

por ventura, se separaram durante o processo de secagem ou montagem.

As exsicatas de plantas medicinais foram produzidas pelos próprios

estudantes e pelo professor, sendo devidamente identificadas e guardadas no

laboratório de ciências da escola para o uso em outras atividades.

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3 Resultados

A Tabela 1 traz a listagem das plantas medicinais citadas nos questionários

aplicados junto as famílias dos estudantes. Das 58 famílias entrevistadas, 40

informaram que produzem as ervas medicinais em hortas caseiras, 8 as compram

em mercados e apenas 10 não utilizam plantas com fins fitoterápicos. Dentre as

famílias que as utilizam, 42 optam preferencialmente pelas folhas no preparo de

chás (Figura 2a). Apenas 06 famílias relataram utilizar raízes, caules, folhas, frutos e

sementes das mesmas. Um dado relevante observado foi que, das 48 famílias que

fazem uso da medicina fitoterápica, apenas 04 citaram a forma correta no preparo

do chá, que é na forma de infusão. Das 16 plantas elencadas pelos entrevistados

(Tabela 1 e Figura 2b), as mais citadas foram o boldo (42), a hortelã (36) e a erva

cidreira (15). A maioria das enfermidades citadas como sendo tratadas com plantas

medicinais foram as gripes e resfriados (40), como calmantes ou no combate da

insônia (27), problemas intestinais (17), problemas estomacais (16) e verminoses

(16).

Tabela 1- Plantas medicinais indicadas e/ou utilizadas pelos familiares dos estudantes.

Planta Enfermidade (Nº de citações)¹

Hortelã Verminoses (15), gripe (17) e calmante (04) Boldo Estômago (15), enxaqueca (10) e problemas no fígado (17) Erva-Cidreira Calmante (12) e insônia (03) Erva Doce Dor de barriga de bebê (08) e cólicas menstruais (05) Camomila Cólicas Intestinais (08) e calmante suave (02) Poejo Resfriados (06), bronquites (03) e gripes (05) Cavalinha Problemas renais (05) e diurético (03) Guaco Gripes (04), resfriados (04) e bronquite alérgica (03) Capim Limão Calmante (04) e insônia (02) Babosa Crescimento dos cabelos (02) e machucados (01) Levante Gripe (03) e dores de Barriga (01) Carqueja Emagrecimento (02) e digestivo (01) Gengibre Tempero (01) e emagrecimento (01) Alfavaca Tempero (01) Vick Gripe (01) Losna Vermífugo (01)

1- Citações de uso apresentadas pelos entrevistados. Isso não significa que todas elas apresentem eficácia comprovada para o tratamento de tais distúrbios.

Verificou-se que as famílias entrevistadas e que fazem uso de fitoterápicos

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estão na média dos padrões encontrados na população brasileira, Martins et al.

(1995) (apud MINAMI; BARRACA, 1999), pois 83% dessas famílias fazem ou já

fizeram uso de plantas medicinais (figura 2). Constatou-se que as formas mais

usuais de uso dos fitoterápicos pelas famílias se dá na forma de chás, feitos com as

plantas colhidas em suas hortas e, que às vezes, essas são preparadas e/ou

armazenadas de forma incorreta. Por exemplo, ao invés de prepará-las via infusão

em água quente, muitas vezes a planta medicinal é fervida. Além disso, pôde-se

perceber que muitos não sabem identificar corretamente as plantas medicinais.

Alguns alunos e alunas, ao trazerem as mudas de casa para o seu reconhecimento,

vieram com nomes distintos para uma mesma planta, confundindo, por exemplo, a

hortelã miúda (Mentha piperita L.), o poejo (Mentha pulegium) e o vick (Mentha

arvensis). Segundo Lorenzi e Matos (2002), a identificação precisa da espécie é

muito importante no caso das plantas medicinais, porque o uso terapêutico de uma

planta errada pode causar acidentes graves e até fatais. Os estudantes, que

prontamente definiram plantas medicinais como ervas com poder de curar

enfermidades, não tinham consciência de que se elas fossem usadas de maneira

incorreta, poderiam ser prejudiciais a saúde. Portanto, esse tipo de conhecimento

transmitido pelas famílias ao longo das gerações pode incorrer em riscos para a

saúde da população. Assim, as exsicatas e as placas colocadas na horta com o

nome popular e científico de cada planta são estratégias importantes para que os

educandos aprendam a reconhecê-las corretamente. Além disso, ao trabalharmos

com a listagem de plantas medicinais de interesse do SUS (ANVISA, 2010), é

possível confrontar o conhecimento popular com o científico, demonstrando que, em

alguns casos, existe comprovação da eficácia do uso de determinado fitoterápico no

tratamento de certas enfermidades.

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Figura 2- Resultados das entrevistas realizada junto as famílias: A) Porcentagem dos entrevistados que fazem ou não uso de plantas medicinais; B) Plantas medicinais mais citadas nos questionários.

Das turmas trabalhadas, 12 estudantes já haviam participado de outros

projetos na escola e demonstraram interesse em continuar participando desse.

Somente 09 (16%) dos 58 estudantes não demonstraram interesse em adquirir

conhecimentos sobre fitoterapia e o estudo da botânica, bem como disponibilidade

para realização do projeto. Vinte e um estudantes (36%) relataram dificuldades em

colaborar com o projeto de construção da horta em horário extraclasse pelo fato de

trabalharem ou de morarem na zona rural. Já, 37 (64%) não demonstraram ter

nenhum problema em desenvolver essa atividade. Sendo assim, para que todos os

interessados pudessem participar, foi proposta uma escala no horário de aula, onde,

a cada dia, três estudantes ajudavam no cultivo, irrigação e manutenção da horta.

Como muito dos estudantes não conheciam o modelo de horta a ser

construído, foi passado um vídeo obtido junto à internet (SANTOS, 2010) explicando

como esta deveria ser elaborada. Em um segundo momento, começou o preparo do

terreno e a adubação para o plantio da horta escolar. Os estudantes foram

participativos e se envolveram fazendo mudas e sementeiras. A Figura 3a mostra a

horta construída no Colégio Estadual Bento Mossurunga pelos estudantes e pela

professora. No mesmo período, em horários distintos, foram realizadas atividades

em sala de aula e no laboratório de ciências, tais como: preparação das exsicatas

(Figura 3b); observações ao microscópio de célula vegetal (Figura 3c); observação

da importância da luz no ciclo da fotossíntese (Figura 3d); produção de sementeiras

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e acompanhamento da germinação das sementes (Figura 3e); reprodução vegetal

(Figura 3f); extração do DNA de morango, bem como estudos sobre a condução da

água, fototropismo, dentre outros. Também foram abordados assuntos como a

secagem, armazenamento e preparo correto das plantas medicinais, explicitando as

formas de infusão, decocção e maceração (RIGOTTI, 2010).

Práticas, como por exemplo, a produção de exsicatas, se mostraram de

grande valia, tendo em vista que os próprios estudantes sugeriram plantas que se

relacionavam com base em seus tipos de raízes, caules, folhas, flores e sementes

(nas quais essas estavam disponíveis). Portanto, o conteúdo explorado dessa forma,

mostrou ser uma valiosa ferramenta, tendo em vista que ele cria uma identificação

mais direta com o cotidiano dos estudantes, devido a utilização e valorização das

plantas medicinais pelas suas próprias famílias. Conforme preconizado por Moreira

(1999), isso torna a aprendizagem significativa, propiciando levar ao educando o

conhecimento científico escolar.

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Figura 3- Diferentes etapas desse trabalho: A) Construção da horta de plantas medicinais; B) Produção das exsicatas; C) Observação da célula vegetal; D) Fotossíntese; E) Produção de sementeira; F) Observação dos órgãos reprodutivos.

Por meio dos relatos feitos pelos estudantes durante as visitas à horta e nas

aulas de laboratório, no decorrer da aplicação deste projeto, pôde ser observado o

interesse e o nível de aprendizado que cada aluno teve. Cada um, à sua maneira,

absorveu os ensinamentos que foram propostos, e demonstrou a sua opinião sobre

a atividade proposta. Por exemplo, um dos relatórios, de uma aluna da 6ª B, fala que

além de ela adorar ir para a horta, ela aprendeu muito sobre raízes, caule, folhas e

sobre os benefícios que as plantas podem trazer. Assim como no relatório dessa

aluna, os demais alunos, contaram suas experiências e as funções que cada um

exerceu na preservação e conservação da horta, como também a satisfação em

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participar do projeto e dos benefícios que o mesmo trouxe para eles próprios. Sem

falar da satisfação pessoal que cada aluno cita, ao mencionar a facilidade de

assimilação do conteúdo utilizado, deixando claro que conseguiram aprender sem

dificuldades tudo que foi ensinado. Alguns dos comentários dos estudantes são

mostrados nos Anexos desse artigo.

Assim, é possível observar que atividades como essas, não só mantém uma

aproximação maior entre professor e aluno, como também tornam as aulas mais

agradáveis para todos, facilitando a assimilação do conteúdo. Ademais, tais tipos de

atividades podem ser utilizadas para se integrar diferentes conteúdos de Ciências,

como preservação do meio ambiente, nutrição, geologia, química, etc. Portanto,

esse trabalho, contribuiu não só com a melhoria do ensino, como também com o

cotidiano dos alunos fora da escola, pois é o tipo de ensinamento que, com certeza

eles levarão aos seus familiares.

4 Conclusão

A proposta atingiu o seu objetivo principal, que era o de mostrar que os

conteúdos do Reino Vegetal podem ser compreendidos de forma significativa

quando trabalhado de maneira diversificada, dentre elas: oficinas, microscopia de

células, confecção de exsicatas, construção de uma horta, plantio, colheita,

secagem e conservação, utilizando como ferramenta as plantas medicinais.

Essa estratégia despertou a curiosidade e o interesse da maioria dos

estudantes pelas aulas de ciências, sendo tais atividades plenamente motivadoras.

A surpresa e a satisfação dos alunos diante dos resultados ficaram evidentes com

os comentários e perguntas realizadas em sala de aula e com relatos dos

depoimentos dos educandos.

Iniciativas como esta, podem trazer benefícios em vários sentidos aos

alunos participantes, porém, o mais importante, é o despertar do interesse dos

educandos pelo conteúdo e pela disciplina, tendo em vista que, normalmente,

percebe-se falta de interesse por este conteúdo por uma boa parte dos alunos.

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Referências

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MOREIRA, Marco Antônio. A Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel. In: ______.Teorias da Aprendizagem. São Paulo: EPU, 1999. Cap. 10, p. 151-165.

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WANDERLEY, A.; AYRES, L.M.- A Botânica no cotidiano. São Paulo: USP, Instituto de Biociências, Departamento de Botânica, 2008.

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ANEXOS

Sugestão de questionário a ser empregado a fim de levantar dados sobre o uso de plantas medicinais entre os membros das famílias dos estudantes:

1. Quantos adultos moram na sua casa?

2. Algum adulto da sua casa faz uso regular de plantas

medicinais?

( ) Sim

( ) Não

3. Se a sua resposta foi sim à questão 2, quem faz uso

regular?

( ) Pais

( ) Avós

( ) Outros:__________

4. Se a sua família faz uso regular de plantas medicinais:

a) Quais plantas e para que doenças elas são normalmente utilizadas?

b) Essas plantas são cultivadas em casa (horta) ou são compradas?

c) Se elas são compradas, normalmente isso é feito onde?

d) Quais são as partes das plantas frequentemente usadas?

( ) Raiz ( ) Caule ( ) Flor ( ) Fruto ( ) Folhas ( ) Sementes

e) Como esses medicamentos são normalmente preparados?

( ) Chás ou infusões ( ) Banhos ( ) Outra forma: __________________

f) Como sua família normalmente prepara os chás ou infusões de plantas

medicinais:

5. Você já trabalhou em algum projeto pedagógico em sua escola? Em caso de

resposta afirmativa, explique:

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6. Você teria interesse em ajudar a construir uma horta de plantas medicinais em

nossa escola?

7. Você teria alguma dificuldade de colaborar com esse projeto de construção de

Horta de Plantas Medicinais em horário extra classe?

Alguns relatos de estudantes quanto a participação nesse projeto

� A1 – “Eu estou aprendendo muito com o que estamos estudando porque é

interessante, estou vendo plantas que eu nunca vi ou ouvi falar. Já a horta

está ficando muito bonita, estão crescendo e eu aprendendo sobre plantas,

de todas elas eu já sei um pouco, seus nomes e sua origem. A professora

explica e eu presto atenção para saber cada vez mais. Adoro ir à horta para

ajudar a professora e meus amigos, eu me divirto muito ajudando e

aprendendo bastante. Eu aprendi sobre raízes, caules, flores, frutos, semente

e folhas medicinais para dores, mas elas podem tornar-se veneno se

tomarmos demais”.

� A2 – “Eu aprendi neste bimestre que as plantas medicinais são muito

importantes para o avanço da medicina e que não são somente plantas, são

plantas que curam”.

� A3 – “Achei legal as aulas práticas de ciências porque além de conhecer as

plantas medicinais pelos nomes científicos, estudamos os tipos de folhas,

caules e raízes”.

� A4 – “Eu aprendi uma coisa bem legal, estamos fazendo um trabalho que

estou gostando muito eu e os outros alunos da manhã e da tarde estamos

fazendo este trabalho, estamos plantando ervas, folhas, etc e nós estamos

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cercando-os com litros de plástico fazendo a nossa parte estamos ajudando

todos. Já temos mais de cem litros. Eu águo a horta todos os dias à tarde às

18h00min e depois no outro dia cedo, ou seja, a cada dia estamos com mais

plantas e mais litros é isso aí”

� A5 – “Gostei muito de fazer a horta, aprendi tipo raízes, plantas, chás.

Também gostei muito do jeito da horta redonda com passagem no meio, com

vários canteiros, um só com plantas medicinais e outro com hortaliças. É uma

horta grande e com garrafas pet em volta da horta”.

� A6 – “Na aula de ciências aprendemos coisas muito importantes. Esse

trabalho foi ótimo e aprendemos muito das plantas medicinais e da horta,

fizemos o herbário e a maquete da horta, aprendemos muito. Achei legal

porque além de conhecer os nomes de plantas pelo nome científico,

estudamos os tipos de folha, caules, e raízes. Foi muito bom e importante

saber sobre essas plantas”.

� A7 – “Eu tenho a certeza que aprendi muitas coisas em ciências, com a

professora Ana Carla, eu que não gostava da matéria aprendi a gostar, eu

adoro as explicações que ela faz sobre tudo o que pergunto. Eu aprendi sobre

plantas medicinais, sementes e flores”.