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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

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ME I

I

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PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONALUNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA

MARIA APARECIDA DE BARROS

A REPRESENTAÇÃO POÉTICA NAS PRODUÇÕES HIP HOP

Trabalho Pedagógico elaborado no PDE, sob orientação do Professor Doutor Sérgio Paulo Adolfo, destinado à série final do Ensino Fundamental e para Ensino Médio.

Londrina, 2010

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Universidade Estadual de Londrina

Núcleo Regional da Educação de Cornélio Procópio

Professora Maria Aparecida de Barros – PDE-2009/2011Disciplina: Portuguesa/Literatura

Orientador: Professor Doutor Sérgio Paulo Adolfo

A REPRESENTAÇÃO POÉTICA NAS PRODUÇÕES HIP HOP

CADERNO PEDAGÓGICO A SER APLICADO EM TURMA DE 8ª SÉRIE – ESCOLA ESTADUAL PROFESSOR WILLIAM MADI

Cornélio Procópio - Paraná, maio de 2010.

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SUMÁRIO

1. Apresentação...................................................................................................................... 42. Fundamentação teórica: .................................................................................................... 52.1) O Hip Hop sob uma perspectiva literária: Método Recepcional - proposta de trabalho pedagógico ............................................................................................................................ 5

3) Problema ........................................................................................................................... 94) Proposta de atividades pedagógicas: ................................................................................. 9 4.1. Determinação do horizonte de expectativa:

• Leitura da fotografia de MV Bill ............................................................................. 9• Leitura da canção “O bonde não para”..................................................................... 10• Atividade escrita e oral da canção: O bonde não para ............................................... 11• Proposta de pesquisa ................................................................................................. 11• Leitura da música: “Castelo de Madeira” ................................................................ 12• Proposta de atividades.oral e escrita .................................................................... 14• Leitura de imagens com técnicas de break e grafite ................................................. 15• Proposta de atividades sobre as produções break e grafite ....................................... 16

4.2. Atendimento ao horizonte de expectativa • Leitura da entrevista: A periferia de São Paulo pode explodir a qualquer momento

(Férrez)...................................................................................................................... 17• Atividade escrita sobre a entrevista .......................................................................... 21• Leitura do conto: Totonha ........................................................................................ 21• Proposta de atividade oral e escrita ......................................................................... 22• Proposta de pesquisa midiática com apresentação oral ......................................... 22• Leitura da biografia de Carolina Maria de Jesus ..................................................... 23• Leitura de Quarto de despejo: diário de uma favelada (fragmento) ......................... 24• Proposta de atividades oral e escrita ......................................................................... 29

4.3. Ruptura do horizonte de expectativa:• Leitura do poema: Do Velho ao Jovem .................................................................... 30• Proposta de atividades oral e escrita ...................................................................... 31 • Leitura do conto: A carta ........................................................................................ 32• Proposta de atividade oral de escrita ...................................................................... 33 • Leitura do romance Parábola de um cágado velho (fragmento).............................. 34• Proposta de atividade oral de escrita ....................................................................... 37

4.4 Questionamento do horizonte de expectativa:• Proposta de atividade: seminário e produção textual ............................................ 37

4.5. Ampliação do horizonte de expectativa• Debate, tendo como foco o material pesquisado ................................................... 38

5. Referências ........................................................................................................................ 39

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1) Apresentação:

As Diretrizes Curriculares da Educação Básica - Língua Portuguesa apontam que “A

literatura, como produção humana, está intrinsecamente ligada à vida social” (2008, p.57). É

nesse caminhar que deve trilhar o ensino de literatura na educação básica paranaense, portanto.

No entanto, há muitos desafios a serem enfrentados pelos docentes da disciplina,

principalmente em relação à incorporação de uma teoria que fundamente e solidifique a ação

educativa. Outro fator reside na elaboração de material pedagógico que possibilite alternativas

metodológicas para a formação do leitor crítico, pois como afirmam Maria da Glória Bordini e

Vera Teixeira Aguiar “a obra é um cruzamento de apreensões que se fizeram e se fazem dela

nos vários contextos históricos em que ela ocorreu e no que agora é estudada”. (1993, p. 81). A

apreensão das narrativas afro-brasileiras e indígenas, não só em atendimento à Lei número

10.639, de 9 de janeiro de 2003, que representa um marco histórico, mas trazendo,

efetivamente, as vozes e culturas marginalizadas para o contexto escolar, contribui para a

formação ética e estética dos alunos. A Lei número 11.645, de 10 de março de 2008, que altera

a 10.639/2003 no sentido da inclusão do ensino da Cultura Indígena prescreve em seu

parágrafo segundo: “Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos

indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas

áreas de educação artística, literatura e história brasileiras”.

Para aprofundar o objeto de estudo, faz-se necessário um recorte, por esta razão, os

esforços se concentrarão tanto nos fundamentos teóricos sobre o ensino de literatura numa

abrangência da emancipação do sujeito, quanto na contribuição do povo africano para

formação da identidade nacional, refletida nas narrativas e produções literárias afro-

brasileiras.

Um trabalho pedagógico, nessa perspectiva, requer uma postura de busca, de

pesquisa por parte do educador atuante na rede pública de educação básica paranaense. Nisso

reside o intento da pesquisadora. Primeiro, estudar e refletir sobre a questão teórica para o

ensino de literatura a fim de fortalecer uma ação pedagógica, de modo que essa conduta

contribua para a formação de leitores de si mesmos e do mundo. Num segundo plano,

transpor essa reflexão aos professores de Língua Portuguesa, discutindo a relevância da

aprendizagem literária, embasada em teorias que objetivam a formação do sujeito, de forma a

mobilizá-los para um trabalho pedagógico com a literatura que, de fato, no contato dos alunos

com as literaturas de origem afro-brasileiras, propicie o aprimoramento estético e ético na

formação de sujeitos leitores. Pensa-se que a materialização dessa ação coletiva, poderia

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resultar em material pedagógico, consistindo-se em mais uma ferramenta no contexto escolar

para dinamização da prática educativa.

Para alcançar o propósito, elaborou-se este Caderno Pedagógico, referenciado na

formação do leitor (Método Recepcional), na poesia oral, bem como em produções que se

debruçam sobre as vozes silenciadas. A reflexão iniciou-se com produções do movimento Hip

Hop, sendo agregados variados gêneros textuais com o propósito de aprimorar a percepção

estética do aluno, a fim de que analise a situação social e nela interfira como agente produtor

de conhecimentos.

2) Fundamentação teórica

2.1) O Hip Hop sob uma perspectiva literária: Método Recepcional – proposta de

trabalho pedagógico

O Método Recepcional compõe um dos referenciais teóricos das Diretrizes

Curriculares de Língua Portuguesa, visa a formação do leitor crítico, pois sua estrutura basilar

é a linguagem, expressão de humanização. Com experiências linguísticas, proporcionadas

pela interação, há percepção do próprio conhecimento, o que permite ao aluno uma atuação

mais crítica as instâncias sociais. Esse contato amplia os saberes, redimensiona o olhar para

analisar as situações emergentes na sociedade.

O contato com o universo textual, científico, literário, contribui para socialização do

ser, que por este intercâmbio estimula novas descobertas e tomadas de decisões e a

valorização do outro.

Ao trazer as vozes silenciadas para integrarem-se ao conteúdo estruturante de Língua

Portuguesa espera-se que se ampliem os horizontes de aprendizagem dos educandos, visto que

a socialização se processa na interação a que se expõe o sujeito quer seja em contatos

pessoais, quer seja pela leitura de variados gêneros textuais, presentes no meio social. Em

diálogo com essas produções, o leitor precisa descortinar os sentidos que emergem das várias

vozes textuais e provido de novos saberes, desencadeia-lhe o senso critico em relação a si

próprio e o outro. Essa visão se aguçará por intermédio da obra literária por representar as

ações humanas através da criação estética. Esta forma artística mobiliza a participação do

leitor em situações diversas e o leva a refletir sobre sua maneira de pensar acerca do mundo. É

por esta razão que elegemos vozes que se encontram à margem dos conteúdos escolares,

porque a leitura responsiva e de fruição advém com o “processo de identificação do sujeito

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com os elementos da realidade representada” (Aguiar, Bordini, 1996, p. 26). Disso resulta

uma ação pedagógica pautada no Método Recepcional.

O Método Recepcional considera o ponto de vista do leitor e sua experiência com a

leitura. Assim, a recepção ocorre quando se estabelece um diálogo entre o leitor e texto,

desencadeando o processo de informações.

Os textos, a obra, são estudados e questionados em sua dinâmica histórica, ao cotejar

a ideologia passado-presente, se desperta a possibilidade de mudança na História, porque a

História é um sistema em construção, aberta às mudanças, às transformações, em oposição ao

fatalismo/determinismo do sistema capitalista.

Ao contemplarmos o Hip Hop como objeto de estudo, partimos do pressuposto que

esta expressão poética faz parte do universo de uma parcela de alunos da rede pública de

educação básica e, por isso, esta manifestação cultural deve ser valorizada pela escola, pois ao

partir dos conhecimentos prévios do aluno acerca desse assunto, numa dinâmica pedagógica

que contemple textos mais complexos, a ação tem por fim aguçar-lhe o senso crítico,

ampliando seus horizontes de expectativas. Esses horizontes são alterados à medida que o

educador insira textos mais densos de forma a provocar estranhamento, desencadeando

conflitos em relação às normas e valores do leitor, arrebatando-o de sua comodidade. Nesse

viés, o texto questionador, problematizador, propicia emancipação no sujeito-leitor.

Nesse sentido, o Método Recepcional, pela seleção textual, expande o objeto de

pesquisa ao acessar a historiografia, vitaliza o universo de sentidos, a criatividade e aperfeiçoa

o senso crítico do aluno.

Para esse fim, estruturamos nossa pesquisa numa ação educativa direcionada nas

cinco etapas do Método Recepcional, planejada da seguinte forma:

a) Para “Determinação do horizonte de expectativa” partimos da contemplação a voz

comunitária, revelada no Hip Hop, como elemento de estudo e identificação, ao considerá-lo

como poesia da linguagem cotidiana e a partir dessa literatura engajada, explorar outros

modos de expressão literária com o propósito de transformar o leitor ingênuo em leitor crítico.

A isso se destinam a análise da imagem de MV Bill, as canções de rap, de MV Bill e

Racionais Mc’s, a performance do break e a arte grafite.

b) Guiados pela etapa anterior, passamos ao “Atendimento ao horizonte de

expectativa”, selecionamos variados gêneros textuais, como: entrevista: “A periferia de São

Paulo pode explodir a qualquer momento”, conto: Totonha, biografia e fragmento da obra

Quarto de despejo: diário de uma favelada, mantendo o intercâmbio e contraste entre eles,

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almejando o texto mais complexo, pois nele jaz elementos críticos dos esquemas ideológicos.

Tudo isso com o propósito de ampliar o universo intelectual do educando.

c) “Ruptura do horizonte de expectativa”: para esta etapa escolhemos a poesia “Do

Jovem ao Velho”, de Conceição Evaristo, e o conto “A carta”, de Mia Couto e um fragmento

do livro Parábola do cágado velho, de Pepetela. Há vínculos entre esta seleção textual e as

demais apresentadas nas etapas anteriores, contudo, os textos apresentados, nesta etapa,

requerem maior participação do aluno, uma vez que a técnica composional, desprendida pelos

escritores, é mais densa e complexa. Nesse momento, pretendemos “abalar as certezas” dos

alunos acerca do tema estudado, mobilizando-o à reflexão das diversas atividades de leitura

efetuadas, apresentadas por meio de variados gêneros. O professor precisa promover a

discussão sobre a realidade em seus diversos aspectos e a ação exige maior atenção por parte

do aluno. Para efetuar na última etapa do Método, o professor solicita, antecipadamente,

pesquisa extraclasse, sugerida no item “Ampliação do horizonte de expectativa”.

d) Diante aos textos estudados, passa-se à etapa “Questionamento do horizonte de

expectativa”, o professor desencadeará uma avaliação dos materiais estudados, levando em

consideração os textos que mais exigiram reflexão, bem como os que produziram, pela gama

de informações, “maior satisfação”. A promoção do debate permite tecer semelhanças e

diferenças e contribui para incorporação de novos conceitos.

e) Decorre desse debate analítico a “Ampliação do horizonte de expectativa”,

momento em que os alunos se lançam à pesquisa dos autores estudados. Ao saber que são

eles, de onde vêm e como pensam a realidade por meio de sua produção cultural, nesse

intercâmbio com a experiência literária, a prática social do aluno torna-se mais consciente em

relação ao assunto estudado. Desta forma, passa a questionar criticamente a realidade, ao

perceber a pertinência entre leitura e vida, vislumbra-se como sujeito histórico na perspectiva

de atuar significamente, contribuindo para melhoria social. As lacunas e dificuldades, ainda

não sanadas, são viabilizadas por outra organização textual, reiniciando o Método

Recepcional.

A avaliação, sob a perspectiva do Método Recepcional , se processa pelas

práticas de leitura, oralidade e escrita, mediada por situações em que o professor provoca -

pelos recursos de que lançou mão: diversidade textual, pesquisas, debates, produção escrita e

oral - mudanças no comportamento do aluno, incitando-o a refletir sobre as situações

apresentadas. Sob essa ótica, os critérios de avaliação devem primar pelo crescimento

intelectual do aluno em sua competência de análise crítica em relação ao material estudado e a

problematização acerca de suas próprios ideias, conceitos e a de seu grupo, pois nas palavras

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de Aguiar; Bordini (1993: 86), O método é, portanto, eminentemente social ao pensar o

sujeito em constante interação com os demais, através do debate, e ao atentar para a atuação

do aluno como sujeito da História.

Recorremos ao Método Recepcional com a finalidade de analisar nas técnicas

compositivas de escritores, que contemplam vozes periféricas, o modo como discutem a

realidade, contrapondo-se ao discurso socialmente vigente. Ao se fazerem por meio do

discurso estético/ideológico, emerge a voz coletiva que denuncia o sistema opressor ao

mesmo tempo que cunha uma nova identidade.

Ampliados os horizontes do educando pelo estudo de diversos gêneros textuais, os

alunos apresentarão os resultados da pesquisa., numa exposição cultural no espaço escolar,

com participação das autoridades educacionais e demais membros da comunidade estudantil.

Compartilhamos que o trajeto da pesquisa é espinhoso, pois é necessário superar as

limitações e isso se faz pela busca tenaz. No tocante à Estética da Recepção/Método

Recepcional, por exemplo, não há orientadores na Universidade Estadual de Londrina – UEL

- especialista na formação do leitor, objeto tão elementar a nós, professores da educação

básica. A disciplina se findou com a aposentadoria da Professora Doutora Neuza Cicciliato.

O motivo levou a pesquisadora desse Caderno Pedagógico a submeter o trabalho,

também, à Professora Doutora Neuza Cicciliato, livre docente da UEL, estudiosa da Estética

de Recepção, que não se furtou em opinar, sendo que suas generosas contribuições, se fazem

presentes neste trabalho, por isso, os devidos créditos.

A Professora Neuza questionou-me sobre dois aspectos e por conta deles, obriguei-

me a repensar o percurso de minha pesquisa, estando ela já definida por nós, pesquisadora e

Orientador.

Havíamos planejado, num primeiro momento, envolver os alunos numa pesquisa de

campo junto aos rappers da comunidade, em que será aplicado este material pedagógico, e

Professora Neuza argumentou que os propósitos do Método são outros, ou seja, aflorar a

percepção estética do aluno. Atrelado a este fator, outro argumento lançado pela docente foi a

carência de produções que viessem a desautorizar os conhecimentos dos alunos, a fim de

provocar-lhes novos saberes. Novas pesquisas, novas leituras num tempo escasso. Vencidos

os percalços, organizamos esse produto pedagógico.

O som produzido pelos autores arrolados na pesquisa pode soar baixo, talvez

inaudível, mas a palavra pode ganhar corpo e fazer ecoar e ser ressignificada, se a ela

somarem outras vozes, outros saberes, outros desejos que rumem para a emancipação dos

alunos da rede pública de educação básica. Por isso, a relevância de sua contribuição!

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(Texto elaborado a partir da leitura de “Literatura a formação do leitor: alternativas

metodológicas”, citado na referência).

3) Problema:

Por que o Hip Hop se compõe de dança, música, interpretação vocal e grafite?

Há poesia na manifestação do Hip Hop?

4) Proposta de atividades pedagógicas

Observe a imagem,abaixo, e organize seu texto para expor suas ideias aos colegas.

(http://vagalume.uol.com.ar/mv-bill/o-bonde-nao-para.html)

DIALOGANDO COM A IMAGEM

Após observação da fotografia, responda:

1) O que mais lhe chama a atenção?

2) Como se encontra a pessoa retratada? Quem é e o que faz?

3) Observe os olhos, a expressão facial, a postura da imagem. Como eles se encontram?

Como você os analisa?

4) Para onde convergem os olhos e corpo da imagem? Em sua opinião, o que expressa esse

ato? Comente.

5) Qual é o tema central retratado na imagem?

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Na sequência, há a música “O bonde não para”, de Alex Pereira Barbosa, conhecido

como MV Bill, sendo que M, significa Mensageiro, V, Verdade e Bill, apelido adquirido na

infância. Bill, o Mensageiro da Verdade, ecoa sua voz em prol dos desfavorecidos, denuncia a

situação de descaso público, de violência, de abandono que vivem os favelados. MV Bill

organizou a Central Única das Favelas – CUFA , que objetiva promover a inclusão social por

meio da arte do Hip Hop, sendo que há várias centrais distribuídas pelo país, inclusive em

Curitiba e Londrina.

Leia-a com atenção.

O bonde tá formado, MV Bill, Kamila CDD, junto emisturado, é lado a lado

RefrãoO bonde não para, o bonde não para, só quem tá formadono bondeque bota a cara (2x)o bonde não para, o bonde não para, só quem tá formadano bondeque bota a cara (2x)

o bonde não para, estamos junto novamenteos preto da favela aqui virou linha de frenteacreditando, carregando no peitoemergindo do fundão, fazendo do nosso jeito, preto!Pra quem não acreditou... Veja bem que se enganouo bonde passou levando poeira, atropelou quem não foificoudeixa que agora a favela invadee cada vez mais junto é nóis fortalecendo a cidadedemoooorou é nóis! cantando numa só vozcom a sagacidade de um animal velozquem é pisoteado a vida ensina a ser feroznão dá pra aguardar, ficar de baixo dos lençóisvamos que a caminhada é longa, o bonde nãopara!tem que tá ligeira, que só há lugar pra quem encarana vida, vivida, sofrida, já demo a partidavem comigo, minha passagem é só de ida

Refrão

é pra neguinho chapar! e não desacreditarque é possível a conexão com cearáa coletividade existe em qualquer lugartem que se ligar, se conectar, pra poder constarque aqui ninguém espera, todo mundo corre à vera

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a credibilidade supera, o otário que vira ferafalando mal daquilo que tá dando certonão faz porra nenhuma mas na foto qué tá perto

o bonde vai, muitos vão ficar pra trásocupar vários espaços é o nosso plano de pazqueremos muito mais, veja aqui como se fazdando sequência na luta dos nossos ancestraisque deixaram a guerra para nós como herançaguerrera do gueto tá no jogo e não se cansa

no bonde só quem éna féé nóisjá éhomemmulherfirmoufalouquem não se confirmoumete o pé

refrão (2x)

DIALOGANDO COM O TEXTO

1. Quais foram as suas impressões ao ler a letra do rap? Anote-as em seu caderno.2. http://www.youtube.com/watch?v=SnzNq_Vz7QY há neste sítio uma apresentação com o grupo que integra o MV Bill. Aprecie-o e, em seguida, continue registrando suas impressões, considerando a letra, a música, a dança e o grafite, retratados no vídeo. 3. Que ponto você estabelece entre a imagem de MV Bill e o rap “O bonde não para”?4. Em sua opinião, há poesia na composição e apresentação de “O bonde não para”?5. Em círculos ou em pequenos grupos, apresente suas impressões aos seus colegas. Discuta os significados atribuídos por cada um, aos elementos que compõem o rap e o vídeo.

PROPOSTA DE PESQUISA: ATIVIDADE ORAL

Nos clips, endereços abaixo, você assistirá à performence do rap “Soldado do Morro” e o documentário “Falcão, meninos do tráfico”. Assista-os e, em seguida, discuta com os colegas da sala de aula os aspectos que mais lhes chamaram a atenção.

http://www.youtube.com/watch?v=yI4urSYqkog

http://www.youtube.com/watch?v=lp4Oq5Go_5k

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ATIVIDADE DE MIDIÁTICA

1) Para saber mais a respeito do movimento Hip-Hop consulte dos sítios:

http://www.enraizados.com.br/Conteudo/4Elementos.asp

http://www.overmundo.com.br/overblog/historia-da-cultura-hip-hop

http://www.youtube.com/watch?v=coQkFPLDnOM

www.centralunicadasfavelas.com.br

www.rapnacional.com.br

Faça uma síntese dos dados que você julgou mais relevantes e depois comente-os para os

colegas da sala de aula.

Para continuar a exercitar sua reflexão, há o rap “Castelo de Madeira”.

(Racionais Mc’s)Milhões de brasileiros não têm teto não têm chãoEu sou apenas mais um na multidãoNão vai pra grupo com minha calça, minha peita, minha lupaSe canto rap aí, não se iluda.

Alá! tô vendo a cena vai chover e o rio vai transbordarE meu castelo de madeira vai alagar.Isento de imposto eu mesmo abraço com meus prejuízosNatural sofrer se os cordões são indecisos.

Mil avisos, periferia desestruturadaMil muleque louco, no crime mostra a cara.Centenas de vezes vi a cena se multiplicarQuando cheguei ate aqui não tinha ninguém agora tem uma pá.

Muleque doido eu enfrentei o mundão de frenteAusente em várias “fita” bandido filho de crenteNo pente, desilusão, dinheiro, mulherMais pra frente se deus quiser mais resistente à fé

Rumo ao centro calos nas mãos multidõesToda essa rebeldia reforça os refrõesTalvez você não saiba do herói que vive a guerraCom uma marmita fria sem mistura eu sou favela

Vivi pensando a vida inteira em fazer um regaçoMas agora que conquistei meu sonho, aquele abraço.Mas não importa se chão de terra tem poeiraRealizei meu sonho, meu castelo de madeira.

RefrãoSou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira.

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Sou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira.

Hoje já choveu já ventou to de caraEm saber que meu castelo suporta tudo menos fogo e bala.Suporta dor, minhas crenças, minhas loucurasSuporta ate minhas “cabreiragem” com a viela escura.

E o sobe e desce de uns “nóia” na fissuraChave de cadeia se trombar com a viaturaVida dura, brotou o espinho não a rosaQuebrada querida vida bandida verso e prosa.

Meu orgulho, um rádio velho toca fitasRap nacional tocando é o que liga.Às sete da noite a luz elétrica caiSe a comunitária sai do ar... aí vai.

Coloco aquela fita de “drão bambambam”.Um cérebro sobre rodas finado “coban”.As crianças me vêem como um adulto equilibradoNão sabem das minhas “fitas” nem dos meus pecados.

E os aplausos deixem pra depoisQuebrada querida mãe, é só nos doisVou lutar pra ser vencedor nessa porra“desbaratinar” vidinha podre sodoma e gomorra

Deus criou o mundo, e o homem criou o dinheiroCrack e cocaína, bebida e puteiroMas não importa se chão de terra tem poeiraAqui! é meu castelo de madeira.

RefrãoSou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira.Sou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira.

Do lado de cá, do lado de lá“treta” todo dia sem pararDo lado de lá, do lado de cáÉ sempre a mesma coisa “mano”, o que quê eu vou falar

Você sabe o que o sistema faz, ignora!E trás problema psicológico, tensão é “foda”.Descaso, humilhação transtorno permanenteEu vi até uma família de crente espancar um parente.

Que amanheceu no outro dia em comaAlcoolizado, drogado, traumatizado foi pra lona

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Dez horas depois, perícia, policia, ambulânciaE o parente que bateu chorou, igual criança

Esse é o sintoma da doença que me afetaGanhei de cortesia mau humor e as frestasNão a festa, porque sorrir é difícil entendaSou verdadeiro e não lenda

Hoje já choveu oh, “mô” neuroseNem costumo beber, até tomei uma dose.Talvez pra clarear ou esconder os problemasMil “fitinha” acontecendo esse é meu dilema.

Coisa de louco, abrir a janela e ver no esgotoCachorro morto, sentir o mau cheiro e o desconfortoE junto com a lama, o drama, a sujeira“brasilit” no calor é um inferno, mô canseira

Sonhar, sonhar, querer não é poderTem que ser “mano”, fazer jus ao proceder.Pros “cu” que tem dinheiro e luxo é constrangedorMe ver “empreguinado” aqui com ódio e rancor.

Sonhei com tudo isso a vida inteiraRealizei meu sonho, meu castelo de madeira.E é treta todo dia, todo dia, o dia inteiroSó falta construir um banheiro

RefraoSou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira.Sou príncipe do gueto só quem é desce, sobe a ladeiraSou príncipe do gueto e meu castelo é de madeira

http://letras.terra.com.br/racionais-mcs/1023513/

PROPOSTA DE ATIVIDADE: ORAL E ESCRITA

1) No sítio: www.youtube.com/watch?v=ZsUNEsjhZt0, encontra-se a apresentação “A

família Castelo de Madeira”, produzida pelos Racionais Mc’s. Aprecio-o e registre,

em seu caderno, suas impressões.

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2) Por que o eu-lírico diz ser “príncipe do gueto”? A quem ele se compara? Qual

condição econômica das pessoas das pessoas comparadas a eles? Por que não há banheiro

no castelo de madeira do eu-lírico?

3) Nas performance das canções apresentadas a expressão facial é sisuda, há um estilo

de roupa característico e gesticulação. Qual a intenção para isso?

4) Quais suas considerações sobre as duas canções? O que elas objetivam? Amplie suas

ideias produzindo um texto dissertativo, na sequência socialize-as com demais da sala de

aula.

5) Você conhece outros estilos de canções que tratam de questões semelhantes? Traga-

os e discuta com os colegas da classe.

6) Pesquise na comunidade um grupo de rap ou traga um cd ou uma música de um grupo

desses artistas, residentes no município.

BREAK e GRAFITE

Break é uma dança que representa a dura situação vivenciada por grande parte da

população. A condição de pobreza imposta pela desigualdade econômica mutila as

expectativas. Então, os artistas do break, um dos componentes do movimento Hip Hop usam

o corpo para protestar e mobilizar a comunidade a lutar e reivindicar solução para os

problemas que os assolam. Por isso, o nome break, palavra de origem inglesa que significa

“quebrar”. Pelos movimentos contorcidos, “quebrados”, os dançarinos criticam o regime de

exploração na expectativa de uma sociedade igualitária.

O Break é uma dança criada pelos porto-riquenhos como forma de contestação à

política e a guerra do Vietnã (1959-1975). Os movimentos dessa dança assemelham-se aos

helicópteros da guerra e também expressam mutilações sofridas pelos soldados ao

regressarem do combate. Com o tempo esse estilo se incorporou à cultura Hip Hop, os

dançarinos entram em competição, simulam esses movimentos de batalha, sendo o vencedor o

que demonstrar mais criatividade e maior rapidez na execução dos movimentos.

Grafite, componente do movimento Hip Hop, é uma arte plástica caracterizada pela

elaboração de desenhos com formas esculturadas sobre um plano ou fundo, tornando-se a

espessura saliente, destacada por traços livres, carregada de cores variadas. Por meio deles, o

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artista grafiteiro expressa na paisagem urbana sua sensibilidade e protesto contra o sistema

capitalista.

Observe as imagens e responda:

http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://screw.no.comunidades.net/imagens/break_dance_by_swakoo%255B1%255D.jpg&imgrefurl=http://screw.no.comunidades.net/index.php%3Fpagina%3D1074700296&h=305&w=300&sz=30&tbnid=Lg67nIptiZ-XYM:&tbnh=116&tbnw=114&prev=/images%3Fq%3Dbreak%2Bdance%2Bfotos&hl=pt-BR&usg=__4QUOr0xryJQX-HzMChZdvLHR_uM=&ei=ADlCS4bECs-ruAfNsdmaBw&sa=X&oi=image_result&resnum=2&ct=image&ved=0CAkQ9QEwAQ

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http://www.riotemporada.com.br/wp-content/uploads/2008/05/grafite-da-

DIALOGANDO COM A IMAGEM: ATIVIDADE ORAL

1) Descreva os movimentos efetuados pelos breakers.

2) É preciso determinação e disciplina para essa atividade? Comente.

3) Que leitura você faz da imagem com arte grafite?

4) Há poesia no break e no grafite? Desenvolva suas ideias recorrendo aos textos estudados.

O Hip Hop compõem-se pela discotecagem, interpretação vocal, dança e grafite e o

rapper, ao recorrer a esses estilos, deseja que a voz da população desfavorecida seja ouvida.

Denuncia, por meio da arte, o descaso e o abandono social, ao mesmo passo que reivindica

condição de vida digna, uma sociedade que valorize a contribuição cultural de seu povo para

formação da nacionalidade brasileira.

Na atividade seguinte, você dialogará com Reginaldo Ferreira da Silva, conhecido

como Ferréz. É escritor e rapper, reside numa região periférica de São Paulo, chamada Capão

Redondo. Utiliza a arte literária como fim de conscientizar sua comunidade e lutar contra a

violência. O texto, a seguir, faz parte de uma entrevista que Ferréz concedeu à revista Caros

Amigos, em outubro de 2009. Abaixo, partes da entrevista.

“A periferia de São Paulo pode explodir a qualquer momento”

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Caros Amigos – Fale um pouco da sua vida, onde nasceu, estudou, o que faz hoje.

Ferréz – Meu nome é Ferréz, eu não uso meu nome de batismo por que eu não acredito no ba-tismo, não acredito na Igreja Católica. Prefiro um pseudônimo, por que é uma coisa que eu in-ventei também, como a minha carreira. Eu sou vendedor ambulante, eu só vivo com coisa de-baixo do braço para cima e para baixo para vender às editoras, sou datilógrafo também, por que escrevo e trabalho com muita coisa para poder ter o básico, então vivo de muita coisa, tra-balho de muita coisa. A minha infância foi normal como a de todo moleque de favela, tá liga-do? Só não soltava tanto pipa porque meu pai não deixava.

Caros Amigos – E os teus pais faziam o que?

Ferréz – Meu pai é motorista de ônibus aposentado, depois foi motorista da Sabesp, se apo-sentou e agora cuida de um bar. Minha mãe é doméstica, trabalha em casa de família e até hoje é a mesma coisa, ela faz uns bicos e tal, tem barzinho, mas vive de bico também.

(...)

Caros Amigos – Quando e como você começou a gostar de literatura?

Ferréz – Meu, não tem uma data assim. Tipo, eu não sei assim um dia eu acordei e falei agora eu gosto de literatura, sabe? Mas eu lia sempre quadrinhos e gostava de Robert E. Howard que é autor do Conan e aí eu buscava saber mais sobre os caras. Eu sempre tive um ensino pa-ralelo ao da escola, então se eu gostava de Conan eu lia Conan no serviço e ia para escola, ti-nha que ler Aluísio de Azevedo ou tinha que ler Carlos Drummond de Andrade lá não me in-teressava...

Caros Amigos – O que acha dos rappers tipo GOG, Racionais, Facção Central?

Ferréz – O Gog, o Racionais, o Facção Central, o Consciência Humana, são a minha escola também, eu não existiria e toda uma legião de caras que existe hoje que gosta de literatura e rap, não existiria se não fosse eles. O rap, pra mim, junto com os caras é uma injeção, tá liga-do? Que na verdade é pra quem tá com dor, quando eu vou em faculdade fazer palestra tem um monte de gente que reclama, mas eu acho violento Facção Central, Racionais… Por que não é para eles, eles não precisam ouvir aquilo, eles não tão na cadeia, eles não tão usando droga, então não precisa. É bem claro pra mim, as letras de rap no Brasil são as melhores le-tras do mundo, não existe um tipo de letra de rap no mundo igual as que existem no Brasil. Um rap que o cara fala: No rio em queJesus andou, o homem navegou e matou pela cor. Não existe em nenhum lugar no mundo um verso como o homem nasceu com defeito de fabrica-ção, invés do coração uma granada de mão dentro do peito. É o tipo de letra que os caras fa-zem.(...)

Caros Amigos - Mas e o PT em si? O que você se decepcionou com o PT?

Ferréz - Ah! Eu não sei, eu votei num partido que prometeu outras coisas, entendeu? Não prometeu escândalo, não prometeu virar as costas na hora em um julgamento, não prometeu... O PT virou outra coisa, não é o que eu acreditava não. Não estou falando que tinha que ser revolucionário, que tinha que mudar tudo, que todo mundo sair de vermelho, mas era uma coisa que eu acreditava como moleque de favela que a favela ia mudar, entendeu? Mas eu tive que esperar o PCC chegar para mudar a favela, não foi o PT... A sigla foi outra, não foi o PT

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que mudou a favela, então nessas partes não é um governo autoritário ruim, mas também não é o governo dos sonhos que eu lutei, que eu vendi show, que o Góis morreu na estrada tentando lutar pelo partido, que eu vi muito amigo meu morrendo lutando pelo PT e ficando velho pelo PT, não era isso que a gente queria no poder e eu não tô falando só do Lula, tô falando de todo o partido.(...)

Caros Amigos - É um Estado paralelo dentro da favela?

Ferréz - Poder paralelo? Não, é o poder. Esse negócio de dizer que é o poder paralelo, não existe o poder paralelo, o Estado não manda na favela, quem disse que o Estado manda na favela? A PM vai lá manda o cara por a mão da cabeça e tudo, repudia o cara, mas depois o cara volta a ser da favela, entendeu? Por mais que os caras cerquem um motoboy, cerquem o cara que está dentro do ônibus, bata geral em todo mundo eles vão embora e a favela continua. Então mudou tudo e vai mudar mais ainda, ta em processo de mudança.(...)

Caros Amigos – Existe um papel do crime como mediação nos conflitos cotidianos?

Ferréz – Existe. O crime está em tudo em que o Estado nunca teve, o Estado deixou uma lacuna muito grande que o crime cobriu, você vai na delegacia prestar queixa de um carro roubado você fica 4 horas sentado, sendo humilhado pelo policial, parece que você não foi roubado, parece que você roubou, entendeu? E o crime não. Você procura o crime ou ele resolve, ou não. Você no mínimo não fica 4 horas sentado, você não fica na palavra de ninguém, entendeu? Então, onde não chegou o poder público o crime chegou, quando o poder público está cuidando da elite, o crime está cuidando de outra parte da cidade que é dele.(...)

Caros Amigos – Como você vê essa separação que existe na sociedade brasileira?

Ferréz – Eu acho que a gente tem toda uma classe querendo se inserir e que não vai poder se inserir, não tem espaço, não tem organização. Então o cara tem acesso agora a comprar um carro importado parcelado, ele tem acesso. Só que ele não tem onde por, não tem caragem, não tem estrutura para por o carro. O Governo Lula deu estabilidade para todo mundo poder compar um carro parcelado, ma casa parcelada, mas você não tem aonde por tudo isso, você tem estrutura na quebrada para por carro, os carros ficam no meio da rua, os açougues estão lotados, entendeu? Não tem comida boa, todo mundo come na mesma pizzaria. Não tem estrutura física para abranger gente que tem dinheiro e o que se está dando é ilusão de que se tem dinheiro, é ilusão.

Caros Amigos – Qual é a saída para este tipo de coisa?

A saída é clara. A saída é... Já começou a saída já algum tempo. A saída ta na cara das pessoas, só não vê quem não quer. A saída é que o povo já ta se mexendo, isso não é utopia minha, é realidade, quando você vê uma favela reagindo, quando você vê um ônibus queimando, não é o crime, por mais que a mídia queira, quando você vê as pessoas que estão legitimadas como embaixadores da periferia tendo acesso a dar entrevista, tendo acesso a falar, entendeu? Aí que a coisa ta difícil... Quando a gente tem que ser ouvido, que nem eu sou ouvido, que nem os outros caras do Hip Hop são ouvidos, os caras da literatura marginal são ouvidos quando a gente é ouvido, aí você começa a perceber que a gente tem uma importância e alguma coisa tá acontecendo, entendeu?(...)

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Caros Amigos – O que tem de luta? Como é que é a luta e a resistência na periferia hoje?

Ferréz – A luta pelos meios intelectuais e pelos meios de produtos, né? Que lança independente, de fazer toda aquela corrente, sabe? De tentar galgar, de aprender a trampar, de aprender a pegar um padrão capitalista e mudar ele um pouco para não ser tão perverso, tem todo esse lado empresarial que a periferia ta pagando e vai pagar porque quando se tem um líder que é empresarial a gente vai seguindo também e tem também toda uma outra luta que eu te falei, que é da população mesmo, a população este se conscientizando. O cara sofre, leva tapa, a chuva derruba o barraco dele, a mulher dele abandonou ele, mas ele não acredita em Deus, entendeu? Ele tinha para se apoiar, então, de todo tipo ideológico na periferia se tem: O movimento Punk, o movimento Rock, todo mundo está se organizando da sua forma, mano. Entendeu?(...)

Caros Amigos – Quando você escreve ficção tem em mente o público da periferia ou o público de fora da periferia?Ferréz – Eu escrevo para periferia mano, quem lê de fora é bastardo. Eu só escrevo para a periferia, toda vez que eu escrevo um conto eu penso: O moleque vai entender? Vai. Então...

Caros Amigos – Como é popularizar a literatura na periferia? Quanto custa um livro seu?

Ferréz – Então meus livros custavam o preço de editora normal até esse ano. Eu sempre busquei acordo com as editoras para sair mais barato, nunca teve resposta, não tem jeito. O mercado não aceita, então eu montei um selo chamado selo povo que a partir desse mês já sai um dvd e vai sair um livro agora a cinco reais. Por enquanto ta cinco reais esse novo livro meu, e aí todo mundo pergunta: Como é que você vai fazer a cinco reais? Meu, o autor já não ganha nada, então pra mim não ganhar nada é a mesma coisa. Então eu faço por convicção e não faço por dinheiro, então eu to pagando do meu bolso essa edição e a editora vai lançar vários autores também a cinco reais.

(...)

Caros Amigos – Quando você cria ficção que peso dá para forma e conteúdo?

Ferréz – Eu sempre tento achar que aquele conto ele tem um sentido no mundo, por que se ele não tiver um corpo não basta escrever ele. Então eu já escrevi história que ela era vazia de alma, a história tinha um puta diálogo e tal, mas vai chegar aonde? Entendeu? Eu tenho muita vontade de escrever sobre ser humano, entendeu? Favela, clausura, regime semi-aberto, fechado. Eu gosto muito de focar o ser-humano também, os sonhos, os sonhos e a vida de ser-humano.

Caros Amigos – Queria que você dissesse o que é a literatura marginal.

Ferréz – Literatura marginal, meu é minha coisa, mas é o rap da literatura, literatura marginal é os moleques escrevendo direto. Literatura marginal os moleques fizeram dias desses, bateram o rádio para mim: Ai mano, tem um amigo meu que tá escrevendo uns bagulho e quer saber como ele te manda, uns bagulho escrito para ti, que ele tá fazendo umas paradas escritas, uns textos, uns bagulhos velho lá e ele quer te mandar. Aí quando você vai ler você fala: Caralho meu! Bom para caralho! Literatura marginal é um cara chegar pra ti e falar: O tio, eu to escrevendo uns contos aí, pá, uns textos e eu queria ver como é que faz para lançar. Literatura marginal é a gente trocar ideia com moleque, literatura marginal é a minha paixão

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de onde eu tiver eu convencer alguém pela literatura, eu nunca deixei de ser apaixonado pelo que eu faço.

Caros Amigos – Você já pensou em ser político? Por que este trabalho que você faz é de um vereador, de um deputado que vai acompanhar a área que ele tem atuação. Você já pensou alguma vez em se candidatar?

Ferréz – Meu, pra mim o político ele é que nem um cara andando armado, ele está mal intencionado. Não tem jeito, se eu virar político vão me dar um carro com placa preta, vai me dar o conforto de umas passagens de avião, vai me dar uns bagulhos que é para anestesiar. Prefiro ficar na literatura, na verdade esse bagulho político quando eu começo a falar muita gente fala, eu acredito que eu sou político desde que eu nasci, eu faço política também, mas de certa forma a minha hombridade não é patenteada pelo Estado, o Estado não me dá nada.

PROPOSTA DE ATIVIDADE: ESCRITA1) Qual sua impressão a respeito da ação de Férrez? Comente seu ponto de vista com os demais colegas da sala.2) Ferréz se considera um líder em sua comunidade. O que o torna um líder? Comprove sua resposta com trechos do texto.3) Qual é o instrumento de luta de Ferréz?. Explique com argumentos pautados no texto. Desenvolva sua resposta com base em trechos do texto.4) O escritor deseja que seus livros sejam lidos pela periferia. Por quê?5) “Eu sempre tento achar que aquele conto ele tem um sentido no mundo, por que se ele não tiver um corpo não basta escrever ele”. Que corpo é esse de que fala Ferréz?6) O que é uma história de alma vazia? Por que Ferréz atribui importância à literatura?

Agora você lerá e depois analisará um conto escrito por Marcelino Freire, chamado

“Totonha”. A história se passa na Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, localizado perto da

Bahia. A região que se tornou muito pobre devido à ação predatória do homem em busca de

diamante. Essa área territorial é invadida pelas secas e enchentes, o que torna difícil a vida

dos moradores, que vivem da agricultura e pecuária.

Totonha

Marcelino Freire

Capim sabe ler? Escrever? Já viu cachorro letrado, científico? Já viu juízo de valor? Em quê? Não quero aprender, dispenso.Deixa pra gente que é moço. Gente que tem ainda vontade de doutorar. De falar bonito. De salvar vida de pobre. O pobre só precisa ser pobre. E mais nada precisa. Deixa eu, aqui no meu canto. Na boca do fogão é que fico. Tô bem. Já viu fogo ir atrás de sílaba?O governo me dê o dinheiro da feira. O dente o presidente. E o vale-doce e o vale-linguiça.

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Quero ser bem ignorante. Aprender com o vento, tá me entendendo? Demente como um mosquito. Na bosta ali, da cabrita. Que ninguém respeita mais a bosta do que eu. A química.Tem coisa mais bonita? A geografia do rio mesmo seco, mesmo esculhambado? O risco da poeira? O pó da água? Hein? O que eu vou fazer com essa cartilha? Número?Só para o prefeito dizer que valeu a pena o esforço? Tem esforço mais esforço que o meu esforço? Todo dia, há tanto tempo, nesse esquecimento. Acordando com o sol. Tem melhor bê-á-bá? Assoletrar se a chuva vem? Se não vem?Morrer, já sei. Comer, também. De vez em quando, ir atrás de preá, caruá. Roer osso de tatu. Adivinhar quando a coceira é só uma coceira, não uma doença. Tenha santa paciência!Será que eu preciso mesmo garranchear meu nome? Desenhar só pra mocinha aí ficar contente? Dona professora, que valia tem o meu nome numa folha de papel, me diga honestamente. Coisa mais sem vida é um nome assim, sem gente. Quem está atrás do nome não conta?No papel, sou menos ninguém do que aqui, no Vale do Jequitinhonha. Pelo menos aqui todo mundo me conhece. Grita, apelida. Vem me chamar de Totonha. Quase não mudo de roupa, quase não mudo de lugar. Sou sempre a mesma pessoa. Que voa.Para mim, a melhor sabedoria é olhar na cara da pessoa. No focinho de quem for. Não tenho medo de linguagem superior. Deus que me ensinou. Só quero que me deixem sozinha. Eu e minha língua, sim, que só passarinho entende, entende?Não preciso ler, moça. A mocinha que aprenda. O doutor. O presidente é que precisa saber o que assinou. Eu é que não vou baixar minha cabeça para escrever.Ah, não vou.

In: Contos Negreiros, pp79-81.Record, 2005

DIALOGANDO COM O TEXTO

1) Que sentimentos despertam em você esse conto?

2) Em círculos, debata e discuta os significados que você e seus colegas atribuíram à história e

apresente para seus colegas as impressões levantadas.

3) Totonha afirma que: “Quase não mudo de roupa, não mudo de lugar. Sou sempre a mesma

pessoa”. Pensando nisso, então, como ela “voa”?

4) “Não preciso ler, moça. A mocinha que aprenda. O doutor. O presidente é que precisa saber

o que assinou. Eu é que não vou baixar minha cabeça para escrever, Ah, não vou”. O que

significa a atitude de Totonha?

5) Qual a ideia principal contida na narração?

PROPOSTA DE PESQUISA MIDIÁTICA

1) http://www.youtube.com/watch?v=WIv1KfwIstQ, neste endereço você encontrará

Marcelino Freire lendo o conto: Totonha.

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2) http://www.youtube.com/watch?v=hyga44eNDL0, neste você assistirá a um documentário

produzido pela Rede Globo sobre Jequitinhonha. Assista e analise os dois vídeos, logo após

exponha aos colegas de classe, os aspectos que mais lhe chamaram a atenção.

Outra mulher impressionante é Conceição Maria de Jesus. A biografia a seguir foi extraída do sítio http://www.acordacultura.org.br/main.asp?View={EC5CAD8E-DA92-4DAA.

Carolina Maria de Jesus (1914-1977)Carolina Maria de Jesus nasceu no interior de Minas Gerais, em Sacramento, no dia 14 de março de 1914. Vinda de uma família extremamente pobre, tinha mais sete irmãos e teve que trabalhar cedo para ajudar no sustento da casa. Por isso, es-tudou apenas até o segundo ano primário.

Na década de 30, mudou-se para São Paulo e foi morar na favela do Canindé. Ga-nhava seu sustento e de seus três filhos catando papel. No meio do lixo, Carolina encontrou uma caderneta, onde passou a registrar seu cotidiano de favelada, em forma de diário.

Segundo Magnabosco, “mesmo diante todas as mazelas, perdas e discriminações que sofreu em Sacramento por ser negra e pobre, Carolina revela, através de sua escritura, a importância do testemunho como meio de denúncia sociopolítica de uma cultura hegemônica que exclui aqueles que lhe são alteridade”.

Descoberta pelo jornalista Audálio Dantas, repórter da Folha da Noite, Carolina teve suas anotações publicadas em 1960 no livro Quarto de Despejo, que vendeu mais de cem mil exemplares. A obra foi prefaciada pelo escritor italiano Alberto Moravia e traduzida para 29 idiomas. Em 1961, o livro foi adaptado como peça teatral por Edi Lima e encenado no Teatro Nídia Lícia, no mesmo ano. Sua obra também virou filme, produzido pela Televisão Alemã, que utilizou a própria Carolina de Jesus como protagonista do longa-metragem Despertar de um sonho (inédito no Brasil).

Em 1963, Carolina publicou, pela editora Áquila, o livro Pedaços da Fome, com apresenta-ção de Eduardo de Oliveira. Em 1965 publicou Provérbios.

Em 1977, durante entrevista concedida a jornalistas franceses, Carolina entregaria seus apon-tamentos biográficos, nos quais narrava sua infância e adolescência. Em 1982 o material foi publicado postumamente na França e na Espanha, sendo lançado no Brasil em 1986, com o tí-tulo Diário de Bitita, pela editora Nova Fronteira.

Carolina foi uma das duas únicas brasileiras incluídas na Antologia de Escritoras Negras, publicada em 1980 pela Random House, em Nova York. Também está incluída no Dicioná-rio Mundial de Mulheres Notáveis, publicado em Lisboa por Lello & Irmão.

Carolina faleceu em São Paulo, em 13 de fevereiro de 1977.

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Leia atentamente o texto abaixo:

Quarto de despejo: diário de uma favelada (fragmento)(Carolina Maria de Jesus)

2 de maio de 1958 Eu não sou indolente. Há tempos que eu pretendia fazer o meu diário. Mas eu pensava que não tinha valor e achei que era perder tempo

... Eu fiz uma reforma em mim. Quero tratar as pessoas que eu conheço com mais atenção. Quero enviar um sorriso amável as crianças e aos operários.

... Recebi intimação para comparecer às 8 horas da noite na Delegacia do 12. Passei o dia catando papel. À noite meus pés doíam tanto que eu não podia andar. Começou a chover. Eu ia na Delegacia, ia levar o José Carlos. A intimação era para ele. O José Carlos está com 9 anos.

3 de maio ... Fui na feira da Rua Carlos de Campos, catar qualquer coisa. Ganhei bastante verdura. Mas ficou sem efeito, porque eu não tenho gordura. Os meninos estão nervosos por não ter o que comer.

6 de maio. De manhã não fui buscar água. Mandei o João carregar. Eu estava contente. Recebi outra intimação. Eu estava inspirada e os versos eram bonitos e eu esqueci de ir na Delagacia. Era 11 horas quando eu recordei do convite do ilustre tenente da 12ª Delegacia.

... O que eu aviso aos pretendentes a política, é que o povo não tolera a fome. É preciso conhecer a fome para saber descreve-la.

Estão construindo um circo aqui na Rua Araguaia. Então eu penso. Faz de conta que, eu estou sonhando.

10 de maio Fui na delegacia e falei com o tenente. Que homem amável! Se eu soubesse que ele era tão amável eu teria ido na delegacia na primeira intimação (...) O tenente interessou-se pela educação de meus filhos. Disse-me que a favela é um ambiente propenso, que as pessoas têm mais possibilidades de delinqüir do que tornar-se útil à pátria e ao país. Pensei: Se ele sabe disto, porque não faz um relatório e envia para os políticos? O Senhor Jânio Quadros, o Hubschek e o Dr. Adhemar de Barros? Agora falar para mim, que sou uma pobre lixeira. Não posso resolver nem as minhas dificuldades.

... O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que passou fome. A fome também é professora.

Quem passa fome aprende a pensar no próximo, e nas crianças.11 de maio Dia das Mães. O céu está azul e branco. Parece que até a Natureza quer

homenagear as mães que atualmente se setem infeliz por não poder realizar os desejos de seus filhos.

... O sol vai galgando. Hoje não vai chover. Hoje é o nosso dia.

... A D. Teresinha veio visitar-me. Ela deu-me 15 cruzeiros. Disse-me que era para a Vera ir no circo. Mas eu vou deixar o dinheiro pra comprar pão amanhã, porque eu só tenho 4 cruzeiros.

... Ontem eu ganhei metade de uma cabeça de porco no Frigorífico. Comemos a carne e guardei os ossos. E hoje pus os ossos pra ferver. E com o caldo diz as batatas. Os meus filhos estão sempre com fome. Quando eles passam muita fome eles não são exigentes no paladar.

... Surgiu a noite. As estrelas estão ocultas. O barraco está cheio de pernilongos. Eu vou acender uma folha de jornal e passar pelas paredes. É assim que os favelados matam mosquistos.

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13 de maio Hoje amanheceu chovendo. É um dia simpático para mim. É o dia da Abolição. Dia que comemoramos a libertação dos escravos.

... Nas prisões os negros eram os bodes expiatórios. Mas os brancos agora são mais cultos. E não nos trata com desprezo. Que Deus ilumine os brancos para que os pretos sejam feliz.

Continua chovendo. E eu tenho só feijão e sal. A chuva está forte. Mesmo assim. Mandei os meninos para a escola. Estou escrevendo até passar a chuva, para eu ir lá no senhor Manuel vender os ferros. Com o dinheiro dos ferros vou comprar arroz e linguiça. A chuva passou um pouco. Vou sair.

... Eu tenho tanto dó de meus filhos. Quando eles vê as coisas de comer eles brada:__ Viva a mamãe!A manifestação agrada-me. Mas eu já perdi o hábito de sorrir. Dez minutos depois

eles querem mais comida. Eu mendei o João pedir um pouquinho de gordura a Dona Ida. Ela não tinha. Mandei-lhe um bilhete assim:

__ “Dona Ida peço-te se pode me arranjar um pouco de gordura, para eu fazer uma sopa para os meninos. Hoje choveu e eu não pude ir catar o papel. Agradeço. Carolina.”

... Choveu, esfriou. É o inverno que chega. E no inverno a gente come mais. A Vera começou pedir comida. E eu não tinha. Era a reprise do espetáculo. Eu estava com dois cruzeiros. Pretendia comprar um pouco de farinha para fazer um virado. Fui pedir um pouco de banha a Dona Alice quando comemos.

E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura atual – a fome!15 de maio Tem noite que eles improsivam uma batucada e não deixa ninguém

dormir. Os vizinhos de alvenaria já tentaram com abaixo assinado retirar os favelados. Mas não conseguiram. Os vizinhos das casas de tijolos diz:

__ Os políticos protegem os favelados.Quem nos protege é o povo e os Vicentinos. Os políticos só aparecem aqui nas

épocas eleitorais. O senhor Cantídio Sampaio quando era vereador em 1953 passava os domingos aqui na favela. Ele era tão agradável. Tomava nosso café, bebia nas nossas xícaras. Ele nos dirigia as suas frases de veludo. Brincava como nossas crianças. Deixou boas impressões por aqui e quando candidatou-se a deputado venceu. Mas na Câmara dos Deputados não criou um projeto para beneficiar o favelado. Nem nos visitou mais.

... Eu classifico São Paulo assim: O Palácio, é a sala de visita. A Prefeitura é a sal de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.

... A noite está tépida. O céu já está salpicado de estrelas. Eu que sou exótica gostaria de recortar um pedaço do céu para fazer um vestido. Começo ouvir uns brados. Saio para a rua. É o Ramiro que quer dar no senhor Binitido. Mal entendido. Caiu uma ripa no fio da luz e apagou a luz da casa do Ramiro. Por isso o Ramiro queira bater no senhor Binitido. Porque o Ramiro é forte e o senhor Binidito é fraco.

O Ramiro ficou zangado porque fui a favor do senhor Binidito. Tentei concertar os fios. Enquanto eu tentava concertar o fio co Ramiro queria espancar o Binidito que estava alcoolizado e não podia parar em pé. Estava inconciente. Eu não posso descrevcr o efeito do álcool porque não bebe. Já bebi uma vez, em caráter experimental, mas o álcool não me tonteia.

Enquanto eu pretendia concertar a luz o Ramiro dizia:__ Liga a luz, liga a luz. Precisava emendá-lo. Sou leiga em eletricidade. Mandei

chamar o senhor Alfredo, que é o atual encarregado da luz. Ele estava nervoso. Olhava o senhor Binidito com desprezo. A Juana que é esposa do Binidito deu cinquenta cruzeiros para o senhor Alfredo. Ele pegou o dinheiro. Não sorriu. Mas ficou alegre. Percebi pela sua fisionomia. Enfim o dinheiro dissipou o nervosismo.

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16 de maio Eu amanheci nervosa. Porque eu queria ficar em casa, mas eu não tinha nada para comer.

... Eu não ia comer porque o pão era pouco. Será que é só eu que levo esta vida? O que posso esperar do futuro? Um leito em Campos do Jordão. Eu quando estou com fome quero matar o Jânio, quero enforcar o Adhemar e queimar o Juscelino. As dificuldades corta o afeto do povo pelos políticos.

17 de maio Levantei nervosa. Com vontade de morrer. Já que os pobres estão mal colocados, para que viver? Será que os pobres de outro País sofrem igual aos pobres do Brasil? Eu estava descontente que até cheguei a brigar com eu filho José Carlos sem motivo.

... Chegou um caminhão aqui na favela. O motorista e seu ajudante jogam umas latas. É linguiça enlatada. Penso: É assim que fazem esses comerciantes insaciáveis. E quando apodrece jogam fora para os corvos e os infelizes favelados.

Não houve briga. Eu até já estou achando isto aqui monótono. Vejo as crianças abrir as latas de linguiça e exclamar satisfeitas:

__ Hum! Tá gostosa! A Dona Alice deu-me uma para experimentar. Mas a lata está estufada. Já está podre.

18 de maio ... Na favela tudo circula num minuto. E a notícia já circulou que a Dona Maria José faleceu. Várias pessoas vieram vê-la. Compareceu o vicentino que cuidava dela. Ele vinha visita-la todos os domingos. Ele não tem nojo dos favelados. Cuida dos míseros favelados com carinho. Isto competia ao tal Serviço Social.

... Chegou o esquife. Cor roxa. Cor da amargura que envolve os corações dos favelados.

A Dona Maria era crente e dizia que os crentes antes de morrer já estão no céu. O enterro é as três da tarde. Os crentes estão entoando um hino. As vozes são afinadas, Tenho a impressão que são anjos que cantam. Não vejo ninguém bêbado. Talvez seja por respeito a extinta. Mas duvido. Acho que é porque eles não têm dinheiro.

Chegou o carro para conduzir o corpo sem vida de Dona Maria José que para sua verdadeira casa própria que é a sepultura. A Dona Maria José era muito boa. Dizem que os vivos devem perdoar os mortos. Porque todos nós temos os nossos momentos de fraqueza. Chegou o carro fúnebre. Estão esperando a hora para sair o enterro.

Vou parar de escrever. Vou torcer as roupas que ensaboei ontem. Não gosto de ver enterros.

19 de maio Deixei o leito às 5 horas. Os pardais já estão iniciando a sua sinfonia matinal. As aves deve ser mais feliz que nós. Talvez entre elas reina amizade e igualdade. (...) O mundo das aves deve ser melhor do que dos favelados, que deitam e não dormem porque deitam sem comer.

... O que o senhor Juscelino tem de aproveitável é a voz. Parece um sabiá e a sua voz é agradável aos ouvidos. E agora, o sabiá está residindo na gaiola de outro que é o Catete. Cuidado sabiá, para não perder esta gaiola, porque os gatos quando estão com fome contempla as aves nas gaiolas. E os favelados são dos gatos. Têm fome.

... Deixei de meditar quando ouvi a voz do padeiro:__ Olhe o pão doce, que está no hora do café. Os favelados comem quando arranjam

o que comer. Todas as famílias que residem na favela têm filhos. Aqui residia uma espanhola Dona Maria Puerta. Ela comprou um terreno e começou a economizar para fazer a casa. Quando terminou a construção da casa os filhos estavam fracos do pulmão. E são oito crianças.

... Havia pessoas que nos visitava e dizia:__ Credo, para viver num lugar assim só os porcos. Isto aqui é o chiqueiro de São

Paulo.

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... Eu estou começando a perder o interesse pela existência. Começo a revoltar. E a minha revolta é justa.

... Lavei o assoalho porque estou esperando a visita de um futuro deputado e ele quer que eu faça uns discursos para ele. Ele disse que pretende conhecer a favela, que se for eleito há de abolir as favelas.

... Contemplava extasiada o céu cor de anil. E eu fiquei compreendendo que eu adoro o Brasil. O meu olhar posou nos arvoredos que existe no início da rua Pedro Vicente. As folhas movia-se. Pensei: elas estão aplaudindo este meu gosto de amor a minha Pátria. (...) Toquei o carrinho e fui buscar mais papéis. A Vera ia sorrindo. E eu pensei no Casemiro de Abreu, que disse: “Ri criança. A vida é bela”. Só se a vida era boa naquele tempo. Porque agora a época está apropriada para dizer: “Chora criança. A vida é amarga”.

... Eu ando tão preocupada que ainda não contemplei os jardins da cidade. É época das flores brancas, a cor que predomina. É o mês de Maria e os altares deve estar adornados com flores brancas. Devemos agradecer Deus, ou a Natureza que nos deu as estrelas para adornar o céu e as flores para adornar os prados e as várzeas e os bosques.

Quando eu seguia a Avenida Cruzeiro do Sul ia uma senhora com um sapato azul e uma bolsa azul. A Vera disse-me:

__ Olha mamãe. Que mulher bonita! Ela vai no meu carro.É que a minha filha Vera Eunice diz que vai comprar um carro só para carregar

pessoas bonitas. A mulher sorriu e a Vera prosseguiu:__ A senhora é cheirosa!Percebi que a minha filha sabe bajular. A mulher abriu a bolsa e deu-lhe 20

cruzeiros.... Aqui na favela quase todos lutam com dificuldades para viver. Mas quem

manifesta o que sofre é só eu. E faço isto em prol dos outros. Muitos catam sapatos no lixo para calçar. Mas os sapatos já estão fracos e aturam só 6 dias. Antigamente, isto é de 1950 até 1956, os favelados cantavam. Faziam batucadas, 1957, 1958, a vida foi ficando causticante. Já não sobra dinheiro para eles comprar pinga. As batucadas foram cortando-se até extinguir-se. Outro dia eu encontrei um soldado. Perguntou-me:

__ Você ainda mora na favela?__ Porque?__ Porque vocês deixaram a Rádio Patrulha em paz.__ É o dinheiro que não sobra para a aguardente.... Deitei o João e a Vera e fui procurar o José Carlos. Telefonei para a Central. Nem

sempre o telefone resolve as coisas. Tomei o bonde e fui. Eu não sentia frio. Parece que o meu sangue estava a 40 graus. Fui falar com a Polícia Feminina que me deu notícia do José Carlos que estava na rua Asdrúbal Nascimento. Que alívio! Só quem é mãe é que pode avaliar.

... Eu dirigi para a rua Asdrúbal Nascimento (1). Eu não sei andar a noite. A fusão das luzes desviam-me do roteiro. Preciso ir perguntando. Eu gosto da noite só para contemplar as estrelas cintilantes, ler e escrever. Durante a noite há mais silêncio.

Cheguei na rua Asdrúbal Nascimento, o guarda mandou-me esperar. Eu contemplava as crianças. Umas choravam, outras estavam revolradas com a interferência da Lei que não lhes permite agir a sua vontade. O José Carlos estava chorando. Quando ouviu a minha voz ficou alegre. Percebi o seu contentamento. Olhou-me. E foi o olhar mais terno que eu já recebi até hoje.

... Às oito e meia da noite eu já estava na favela respirando o odor dos excrementos que mescla com o barro podre. Quando estou na cidade tenho a impressão que estou na sala de visita com seus lustres de cristais, seus tapetes de veludos, almofadas de cetim. E quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar num quarto de despejo.

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20 de maio O dia vinha surgindo quando eu deixei o leito. A Vera despertou e cantou. E convidou-me para cantar. Cantamos. O João e o José Carlos tomaram parte.

Amanheceu garoando. O Sol está elevando-se. Mas o seu calor não dissipa o frio. Eu fico pensando: tem época que é Sol que predomina. Tem época que é a chuva. Tem época que é o vento. Agora é a vez do frio. E entre eles não deve haver rivalidades. Cada um por sua vez.

Abri a janela e vi as mulheres qu passam rápidas com seus agasalhos descorados e gastos pelo tempo. Daqui a uns tempos estes pelitol que elas ganharam de outras e que de há muito devia estar num museu, vão ser substituídos por outros. É as políticas que há de nos dar. Devo incluir-me, porque eu também sou favelada. Sou rebotalho. Estou no quarto de despejo, e o que está no quarto de despejo ou queima-se ou joga-se no lixo.

... As mulheres que eu vejo passar vão nas igrejas buscar pães para os filhos. Que o Frei Luiz lhes dá, enquanto os esposos permanecem debaixo das cobertas. Uns porque não encontram emprego. Outros porque estão doentes. Outros porque embriagam-se.

... Eu não preocupo-me com os homens delas. Se fazem bailes eu não compareço porque não gosto de dançar. Só interfiro-me nas brigas onde prevejo um crime. Não sei a origem desta antipatia por mim. Com os homens e as mulheres eu tenho um olhar duro e frio. O meu sorriso, as minhas palavras ternas e suaves, eu reservo para as crianças.

... Tem um adolescente por nome Julião que as vezes espanca o pai. Quando bate no pai é com tanto sadismo e prazer. Acha que é invencível. Bate como se estivesse batendo num tambor. O pai queria que ele estudasse para advocacia (...) Quando o Julião vai preso o pai lhe acompanha com os olhos rasos dagua. Como se estivesse acompanhando um santo no andor. O Julião é revoltado, mas sem motivo. Eles não precisa residir na favela. Tem casa no Alto de Vila Maria.

... Às vezes mudam algumas famílias para a favela, com crianças. No início são educadas, amáveis. Dias depois usam o calão, são soezes e repugnantes. São diamantes que transformam em chumbo. Transformam-se em objetos que estavam na sala de visita e foram para o quarto de despejo.

... Para mim o mundo em vez de evoluir está retornando a primitividade. Quem não conhece a fome há de dizer: “Quem escreve isto é louco”. Mas quem passa fome há de dizer:

__ Muito bem, Carolina. Os gêneros alimentícios deve ser ao alcance de todos.Como é horrível ver um filho comer e perguntar: “tem mais?” Esta palavra “tem

mais” fico oscilando dentro do cérebro de uma mãe que olha as panela e não tem mais.... Quando cheguei do palácio que é a cidade os meus filhos vieram dizer-me que

havia encontrado macarrão no lixo. E a comida era pouca, eu fiz um pouco do macarrão com feijão. E o meu João José disse-me:

__ Pois é. A senhora disse-me que não ia mais comer as coisas do lixo.Foi a primeira vez que vi minha palavra falhar. Eu disse:__ É que eu tinha fé no Kubstchek.__ A senhora tinha fé e agora não tem mais?__ Não, meu filho. A democracia está perdendo os seus adeptos. No nosso país tudo

está enfraquecendo. O dinheiro é fraco. A democracia é fraca e os políticos fraquíssimos. E tudo que esta fraco, morre um dia.

... Os políticos sabem que eu sou poetisa. E que o poeta enfrenta a morte quando vê o seu povo oprimido.

21 de maio Passei uma noite horrível. Sonhei que eu residia numa casa residível, tinha banheiro, cozinha, copa e até quarto de criada. Eu ai festejar o aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu ia comprar-lhe umas panelinhas que há muito ela vive pedindo. Porque eu estava em condições de comprar. Sentei na mesa para comer. A tolha era alva ao lírio. Eu comia bife, pão com manteiga, batata frita e salada. Quando fui pegar outro bife despertei.

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Que realidade amarga! Eu não residia na cidade. Estava na favela. Na lama, às margens do Tietê. E com 9 cruzeiros apenas. Não tenho açúcar porque ontem eu saí e os meninos comeram o pouco que eu tinha.

... Quem deve dirigir é quem tem capacidade. Quem tem dó e amizade ao povo. Quem governa o nosso país é quem tem dinheiro, quem não sabe o que é fome, a dor, e a aflição do pobre. Se a maioria revoltar-se, o que pode fazer a minoria? Eu estou ao lado do pobre, que é o braço. Braço destruído. Precisamos livrar o país dos políticos açambarcadores.

Eu ontem comi aquele macarrão do lixo com receio de morrer, porque em 1953 eu vendia ferro lá no Zinho. Havia um pretinho bonitinho. Ele ia vender ferro lá no Zinho. Ele era jovem e dizia que quem deve catar papel são os velhos. Um dia eu ia vender ferro quando parei na Avenida Bom Jardim. No Lixão, como é denominado o local. Os lixeiros haviam jogado carne no lixo. E ele escolhia uns pedaços. Disse-me:

__ Leva, Carolina. Dá para comer.Deu-me uns pedaços. Para não magoá-lo aceitei. Procurei convencê-lo a não comer

aquela carne. Para comer os pães duros ruídos pelos ratos. Ele disse-me que não. Que há dois dias não comia. Acendeu o fogo e assou a carne. A fome era tanta que ele não pode deixar assar a carne. Esquentou-a e comeu. Para não presenciar aquele quadro, sai pensando: faz de conta que eu não presenciei esta cena. Isto não pode ser real num país fértil igual ao meu. Revoltei contra o tal Serviço Social que diz ter sido criado para reajustar os desajustados, mas não toma conhecimento da existência dos marginais. Vendi os ferros no Zinho e voltei para o quintal de São Paulo, a favela.

No outro dia encontraram o pretinho morto. Os dedos do seu pé abriram. O espaço era de vinte centímetros. Ele aumentou-se como se fosse de borracha. Os dedos do pé parecia um leque. Não trazia documentos. Foi sepultado como um Zé qualquer. Ninguém procurou saber seu nome. Marginal não tem nome.

(...)In: Quarto de despejo: diário de uma favelada, p.30-40.

Lino-Gráfica, 1960.

Para responder a questões abaixo, consulte o texto “Quarto de despejo: diário de uma favelada”.

PROPOSTA DE ATIVIDADE: ESCRITA E ORAL

1) Ao pensar o momento presente, 13/5/1958, Carolina se volta para o passado para refletir sobre a abolição. Na visão da autora, a escravidão acabou? Em caso afirmativo, de que forma ela se apresenta naquela época? E hoje? Qual sua opinião sobre o assunto?2) Como Carolina classificou São Paulo? Que angústias lhes afligiam? 3) “...Eu fiz uma reforma em mim”. O que Carolina Maria de Jesus usou para efetuar a “reforma”? Utilize exemplos com citação do texto.4) A escritora utiliza a palavra contra o preconceito e para ajudar os favelados, além de denunciar o descaso social para com os marginalizados. Demonstre estas afirmações com passagens do texto.5) “Quarto de despejo” foi publicado em 1960, sobre fatos anotados no diário da autora a partir de 15/6/1955. Esses acontecimentos são retomados por outros pensadores da atualidade. Houve mudanças significativas por parte do poder público para mudar a situação dos marginalizados? Para responder esta questão pesquise os textos anteriores.6) Dos textos estudados, qual você mais apreciou? Por quê?

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7) http://www.youtube.com/watch?v=sPI9bdgMUnA, “Carolina Maria de Jesus - Heróis de Todo Mundo”, clip em que a escritora declama alguns de seus escritos.Leia, também, a obra desta brasileira e escolha partes para expor aos colegas da classe.

Agora, você estudará a poesia “Do Velho ao Jovem”, de Conceição Evaristo. Ela

nasceu em 1946, numa favela de Belo Horizonte, que por estar localizada em área urbana

privilegiada foi demolida e os moradores obrigaram-se a residir em regiões periféricas.

Estudou com dificuldade, pois tinha que conciliar estudo com a árdua jornada de trabalho.

Tornou-se professora e em busca de prosseguir seus estudos transfere-se para o Rio de

Janeiro. Sua infância foi recheada de histórias contadas pela mãe, que, a lápis, as escrevia

num caderno, que a Conceição Evaristo preservou. Essas lembranças motivaram Conceição

Evaristo a se tornar escritora.

Do Velho ao Jovem

Na face do velhoas rugas são letras,palavras escritas na carne,abecedário do viver.

Na face do jovemo frescor da pelee o brilho dos olhossão dúvidas.

Nas mãos entrelaçadasde ambos,o velho tempofunde-se ao novo,e as falas silenciadasexplodem.

O que os livros escondem,as palavras ditas libertam.E não há quem ponhaum ponto final na história.

Infinitas são as personagens...Vovó Kalinda, Tia Mambene,Primo Sandô, Ya Tapuli,Menina Meká, Menino Kambi,Neide do Brás, Cíntia da Lapa,

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Piter do Estácio, Cris de Acari,Mabel do Pelô, Sil de Manaíra,E também de Santana e de Belô e mais e mais, outras e outros...

Nos olhos do jovem Também o brilho de muitas histórias.E não quem ponhaum ponto final no rap

É preciso eternizar as palavrasda liberdade ainda e agora...

In: Poemas da recordação e outros movimentos, p.51, 2008.

PROPOSTA DE ATIVIDADE: ESCRITA E ORAL1) O que o poema de Conceição Evaristo trata tem a ver com sua vida? Exemplifique narrando alguns fatos.2) Por que “Velho” e “Jovem” no título são grafados em maiúsculo?3) Escreva sobre o significado desta estrofe:Na face do velhoas rugas são letras,palavras escritas na carne,abecedário do viver.4) Que sentido há na estrofe:O que os livros escondem,as palavras ditas libertam.E não há quem ponhaum ponto final na história.5) O jovem tem no olhar um brilho que o velho não pode ter. O que é esse brilho? Comente.6) http://www.youtube.com/watch?v=W2DgEX8fIHE, você ouvirá Conceição Evaristo declamando “De cor são os olhos de minha mãe” e “Vozes Mulheres”.Leia poesias de Conceição Evaristo e escolha uma delas para declamar na sala de aula.

Na sequência há uma produção de Mia Couto, nome artístico de António Emílio Leite

Couto, escritor moçambicano. Situada ao Sudeste de África, Moçambique foi colonizada

pelos portugueses no século XVI, a população e as riquezas naturais foram exploradas. Esta

situação perdurou até o século XX, em 1964 houve mobilização para a independência de

Moçambique, liderada pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), instaurada por

guerrilha. Em 25 de junho de 1975, Moçambique conquista a independência. Nesse período a

Frente de Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO) disputa o poder com a

FRELIMO e o país entra em guerra civil.

A crônica “A carta”, escrita por Mia Couto, traz a voz do povo, na figura de uma

mulher, que está distante de seu filho. Leia-a com atenção.

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A CARTA (Mia Couto)

A velha dobrou as pernas como se dobrasse os séculos. Ela sofria doença do chão, mais e de mais se deixando nos caídos. Amparava-se em poeiras, seria para se acostumar à cova, na subfície do mundo?- Me leia a carta. Me entregava o papel marrotado, dobrado em mil sujidades. Era a Carta de seu filho, Ezequiel. Ele se longeara, de farda, cabelo no zero. A carta, ele a enviara fazia anos muito coçados. Sempre era a mesma, já eu lhe conhecia de memória, vírgula a vírgula.- Outra vez, mamã Cacilda?- Sim, maistravez.Sentei o papel sob os olhos, fingi acarinhar o desenho das letras. Quase nem se viam, suadas que estavam. Dormiam sob o lenço de Cacilda, desde que chegara a guerra. Essas letras chei-ram a pólvora, me rodilham o coração. Era o dito da velha. Agora, passados os tempos, aquele papel era a única prova do seu Ezequiel. Parecia que só pelo escrito, sempre mais desbotado, seu filho acedia à existencia. Nas primeiras vezes eu até me procedia à leitura, traduzindo a autêntica versão do pequeno soldado. Eram letras incertinhas, pareciam crianças saindo da formatura. Juntavam-se ali mais erros que palavras. O recheio nem era maior que o formato. Porque naquela escrita não havia nem linha de ternura. O soldado aprendera a guerra desa-prendendo o amor? Em Ezequiel, morrera o filho para nascer o tropeiro? Nas primeiras leitu-ras, meu coração muito se apertava em inventadas dedicatórias aquela mãe. Enquanto lia, eu espreitava o rosto da idosa senhora, tentando escutar uma ruga de tristeza. Nada. A velha se imovia, como se tivesse saudade da morte. Seus olhos não mencionavam nenhuma dor. Eu tentava um alivio, desculpar o menino que não sobrevivera à farda. Nem se entristenha, mamã Cacilda. Também, maneira como carregaram esse menino para a tropa! Sem camisa, sem mala, sem notícia. Atirado para os fundos do caminhão como se faz às encomendas sem ende-reço.- Entenda, mamã Cacilda.Mas ela já dormia, deitada em antiquíssima sombra. Ou mentia que dormia, debruçada na va-randa da alma? Fingia, a velha. Como o rio, num açude, se disfarça de lagoa. Depois, ela re-gressava às pálpebras, me apressava.- Continua. Por que paraste?Já não restava nada que ler. Era só o gorduroso gatafunho, despedida Sem nenhum beijo. Pode a carta de um saudoso filho terminar assim «unidade, trabalho, vigilância»? Mas a velha insistia, cismalhava. Eu que lesse, toda a gente sabe, as letras igualam as estrelas mesmo pou-cas são infinitas. Eu lhe fosse paciente, pobre mãe, sem nenhuma escola. Foi então que passei a alongar aquela tinta, amolecendo as reais palavras. Inventava. Em cada leitura, uma nova carta surgia da velha missiva. E o Ezequiel, em minha imagináutica, ganhava os infindos mo-dos de ser filho, homem com méritos para permanecer menino. Cacilda escutava num embalo, houvessem em minha voz ondas de um sepultado mar. Ela embarcava de visita a seu filho, tudo se passando na bondade de uma mentira. Diz-se na própria doideira dos vamos loucuran-do. Até, um dia, me trouxeram notícia. Ezequiel perdera, para sempre, a existencia. Ele se desfechara em incógnitos matos, vitima dos bandos. A mãe nem suspeitava. Perguntei desco-nhecia-se o paradeiro dela. Ficasse eu atribuido de lhe entregar o escuro anúncio. Esperei. Nesse fim de tardinha, porém, mamã Cacilda não compareceu em minha casa. Assustei adivi-nhara ela o destino do Ezequiel? Quem conhece os poderes de uma mãe em exercicio de sau-dade? Decidi ir ao seu lugar. Parti ainda restavam manchas do poente. Cacilda cozinhava uns míseros grãos, ementa de passarinho.- Senta, meu filho, fica servido, não custa dividir pobrezas.Fui ficando, me compondo de coragem. Como podia eu deflagrar aquele luto? Comemos. Me-lhor fingimos comer. Faz conta é uma refeição, meu filho. Faz conta. Modo que eu vivo, fa-zendo de conta.

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- E agora, diz porque vieste nesta minha casa?Olhei o chão, o mundo escapava pelo fundo. Ela venceu o silêncio.- Me vens ler o meu filho?Acenei que sim. Aceitei o velho papel mas demorei a começar. Eu queria acertar os meus tons, evitando o emergir de alguma tremura. Finalmente, atravessei a escrita, ao avesso da verdade. Trouxe as novas do filho, seus consecutivos heroísmos. Ele, o mais bravo, mais bon-doso, mais único. Como sempre, a mãe escutou em qualificado silêncio. Às vezes, no colorir de um parágrafo, ela sorria sempre igual, esse meu filho. Eu me parabendizia, cumprida a missão do fingimento. Me despedi, quase em alívio. Foi então, em derradeiro relance, que eu vi a velha mãe lançava a carta sobre a fogueira. Ao meu virar, ela emendou o gesto. O papel demorou um instante a ser mastigado pelo fogo. Nesse brevíssimo segundo, eu anotei a lágri-ma pingando sobre a esteira. Ela fingiu tirar um fumo do rosto, fez conta que metia a carta sob o lenço. Me voltei a despedir, fazendo de conta que aquele adeus era igual aos todos que já lhe concedera.(A crônica faz parte do livro: Cronicando, 1986, e foi extraída do sítio: http://www.lumiarte.com/luardeoutono/miacouto.html).

Após leitura da crônica “A carta”, desenvolva as questões propostas:

ATIVIDADE ORAL E ESCRITA1) O que você entendeu da crônica “A carta”?2) Em círculos, debata e discuta os significados que você e seus colegas atribuíram à história.3) Mia Couto cria novas palavras e isso indica tanto sua proximidade com a linguagem cotidiana como o conhecimento que ele tem da língua. A esse fator dá-se o nome de neologismo. Localize os neologismos criados pelo escritor, pesquise no dicionário a palavra matriz e explique os significados novos que essas palavras adquirem no texto.4) Os protagonistas da crônica são: um narrador que detém o conhecimento da escrita e mamã Cacilda, cujo saberes vêm da oralidade. O que os une? Qual a relação entre eles?5) Como o narrador apresenta mamã Cacilda? Comprove sua resposta com passagens do texto? 6) A carta foi relida várias vezes. Como se justifica essa ideia? Há mensagens carinhosas de Ezequiel a mamã Cacilda? Por quê?7) Explique essa passagem: “Mas ela já dormia, deitada em antiquíssima sombra. Ou mentia que dormia, debruçada na varanda da alma? Fingia, a velha. Como o rio, num açude, se disfarça de lagoa. Depois, ela regressava às pálpebras, me apressava”.8) O narrador retorna à casa de mamã Cacilda por quê? Como ele se comporta? E mamã Casilda?9) Como se justifica a atitude de mamã Cacilda no final do texto? Comente.10) Em sua opinião, o drama vivido por mamã Cacilda pode se revelar, nos tempos atuais, de que outras formas?

O texto final foi retirado do romance Parábola do Cágado Velho, de autoria de Pepetela,

pseudônimo de Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, escritor angolano. Localizada a

Sudoeste da África, Angola viveu o período de 1976 a 1991 envolvido pela guerra, causou

desintegração social e econômica, pois espalhou tragédias, como: a morte de dois milhões de

pessoas e, ainda hoje, morrem, por dia, de fome 200 pessoas. As minas de bombas espalhadas

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pelo solo angolano, mutilam grande parte da população. A produção literária de Pepetela

permite ao leitor conhecer a história e os conflitos que afligem do povo de Angola.

Parábola do Cágado Velho (fragmento)(Pepetela)1Ulume, o homem, olha o seu mundo.Por vezes a terra lhe parece estranha. Fica num planalto sem fim, embora se saiba que tudo acaba no mar. Chanas e cursos de água por toda a parte. Junto dos rios tem florestas, nalguns pontos apenas muxitos, aquelas matitas em baixas húmidas. As elevações são pequenas, excepto a Munda que corta a terra no sentido norte-sul. Nunca se vê o cume da Munda, sempre encoberto por espessos nevoeiros. O seu kimbo fica colado ao pé da Munda, outra forma de dizer montanha, na base de um morro encimado por grandes rochedos cinzentos, por vezes azuis. De cima do morra sai um regato que acaba por se acoitar, muito à frente, num rio largo, o Kuanza de todas forças e maravilhas, quase fora do seu mundo. Desse regato tiram a água para as nakas, onde verdejam os legumes e o milho de bandeiras brancas. Nele também bebe o gado. Mesmo no tempo das piores secas a água do regato nunca falhou. No alto do morro ainda, existe a gruta de onde todos os dia sai um enorme cágado para ir beber a água da fonte. Palmeiras de folhas irrequietas rodeiam o kimbo, casando com mangueiras e bananeiras, pintando de verde escuro os amarelos e verdes esbatidos do capim e do milho.Neste quadro familiar, algo faz a terra se afigurar de repente estranha. É um momento especial a meio da tarde em que tudo parece parar. O vento não agita as palmas, as aves suspendem seus cantos, o sol brilha num azul profundo sem fulgurações. Até o restolhar dos insectos deixa de ser ouvido. Como se a vida ficasse em suspenso, só, na luminosidade dum céu enxuto. Um instante apenas. E nem sempre acontece. O tempo precisa de estar limpo, de preferência depois de uma chuvada, a Lua tem de aparecer apesar do Sol, e no peito deve ter a angústia da espera.Todos os dias sobe ao morro mais próximo, senta nas pedras a fumar o cachimbo que ele próprio talhou em madeira dura, e espera. A passagem do cágado velho, mais velho que ele pois já lá estava quando nasceu, e o momento da paragem do tempo. É um momento doloroso pelo medo estranho. Apesar das décadas passadas desde a primeira vez. Mas também é um instante de beleza, pois vê o mundo parado a seus pés. Como se um gesto fosse importante, essencial, mudando a ordem das coisas. Odeia e ama esse instante e dele não pode escapar.Quando ainda muito jovem, falou disso aos outros. Ninguém notara, imaginação só dele. Também era o único que ia para o cimo do morro observar o vale e mundo. Os amigos conheciam a existência do cágado velho, mas preferiam as cercanias do kimbo, onde brincavam e tentavam namorar as raparigas que iam ao regato. Assim, o cume do Mundo ficava só para ele. Nunca mais falou desse estranho instante, nem a Nunakazi. Ela perguntou no princípio da vida comum, mas que hábito é esse de ires os dias para cima do morro à tarde? E ele respondeu é só um hábito desde criança. Tentou ligar essa sensação a coisas que lhe sucediam depois, como predição do que vai vir. Mas nada. Não havia ligação possível de adivinhar. As coisas iam e vinham, boas ou más, quer chegasse o instante quer não. Acontecia apenas. No seu rabo não parecia trazer o mal, o desejado ou o temido.E continua a acontecer, de vez em quando. Talvez mais frequentemente agora. E Ulume fica apenas vazio, numa grande paz intranqüila.(...)6

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Das guerras e fomes anteriores ainda trazia as cicatrizes. Sobretudo das duas filhas que tinham morrido de doença. Ou fome, quem sabe? A Muari nunca mais tinha engravidado. Ulume chegou a talhar uma serpente num tronco de árvore, pra, como manda a tradição, pôr embaixo do catre onde dorme a Muari e assim leva-la a engravidar. Nem esse remédio, o mais forte que se conhece para mulheres estéreis, resultou. Devia ser mesmo a vontade da Muari a resistir a tudo. Recusa de parir para alimentar a morte? Só lhe restavam assim os dois filhos. E perdeu um, naquele dia que vieram os carros e Luzolo se meteu num deles, juntamente com outros jovens. A mãe chorava, queria segurar no filho, ele disse deixe mãe, depois volto. Nunca mais voltou. Kanda resmungava pelos cantos, um dia o ouviu dizer a um amigo, esse meu irmão Luzolo sempre foi parvo e teimoso.No princípio pensou que era apenas um passeio, todos os jovens queriam conhecer Calpe, íman que os atraía mais que um dourado favo de mel. Passou tempo e Luzolo nunca mais apareceu. Notícias chegaram dizendo que agora era soldado. Kanda barafustou, burro, estúpido, falava pelos cantos como se cazumbi tivesse entrato nele, dava murros na parede, vejam o que o vosso primogênito, o preferido. Injusto como todos os jovens. Luzolo não era o preferido, naquela casa não havia preferidos. Quis dizer isso a Kanda, mas depois achou, deixa ficar, aquele rebelde não merecia resposta.Perdeu o segundo filho, da mesma maneira que o primeiro. Kanda entrou no carro, adeus gente, levou apenas um saquinho com as suas coisas. Chegou mais tarde o mujinho anunciando que se tornara soldado. Porque ficara Kanda tão zangado ao saber que Luzolo entrara num exército, se agora fazia o mesmo? Ulume não entendia os jovens. Na njango os mais velhos lhe explicaram, Kanda e Luzolo eram soldados, só que não estavam no mesmo exército, eram adversários, talvez inimigos.A meio da tarde, no cimo do morro, esperando a paragem do tempo, com mais angústia que o habitual, percebeu. Há muito se anunciavam maus presságios, ele não soubera ler, apenas pressentir. Sabia, ela estava lá, a cidade que para muitos era de sonho e a ele trazia apenas temor. A distância era grande, nem um ruído nem uma tênue coluna de fumo a indicavam. Mas ela estava lá, há dois ou três dias de marcha, ele sabia. Nunca tivera curiosidade de a conhecer, sempre a sentira como um perigo longínquo. Agora o perigo estava mais perto, cada vez mais perto.Não o perigo anunciado pelo cágado velho que saiu da gruta e para ele caminhava, nos seus passos incertos. Os cágados não trazem perigos e esse era seu conhecido desde sempre. Habitava na gruta perto do sítio onde Ulume todas as tardes se sentava. Passava perto dele para ir beber água onde nascia o regato que dessedentava as suas plantações e os gados e as gentes. Era sempre o primeiro a beber daquela água, a água da criação. Ulume deixava-o beber e voltar para perto da gruta, onde ficava a comer capim tenrinho. Depois Ulume se levantava e ia também beber água. Estavam estreitamente unidos nesse ritual de serem os primeiros a beber daquele regato. Mas sempre Ulume deixava as primícias para o cágado, nunca perguntara porquê. Como se cumprisse um cerimonial desconhecido mas eterno.Desta vez, porém, o homem não deixou o cágado prosseguir o seu caminho, como desde há décadas. Tão desesperado estava que falou para ele, quebrando a tradição que tinham mudamente estabelecido:__ Dizem, os cágados são os mais sábios. Não me queres então explicar o que passa nesta terra? Deves saber, tu sabes tudo.O animal continuou a caminho do regato, poisando timidamente uma pata antes de levantar outra. Não ergueu a cabeça, como desentendido.__ Sei que me estás a ouvir, cágado velho. Não te incomodaria se não precisasse. Anos e anos passaram e sempre te deixei sossegado, ruminando teus silêncios. Mas hoje preciso de tua sabedoria. Ou será falso aquilo que os mais velhos dizes e afinal és apenas um animal ignorante como os outros?

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O cágado hesitou mais tempo a dar nova passada. Estava mesmo à frente de Ulume. Pareceu levantar a cabeça para ele, mas depois prosseguiu caminho. Como se nada tivesse acontecido. Mas tinha hesitado, disso Ulume estava certo. Ou seria tão forte o desejo dele que até já via hesitações onde só a determinação habitava? Calou e o cágado passou. Calado ficou, a vê-lo beber lentamente, levantando a cabeça para cada gole. Quando, muito tempo depois o cágado voltou a passar por ele, a caminho da gruta, não lhe dirigiu a palavra. Tinha aprendido que se não devia forçar os cágados a nada, eram animais de respeito. Por isso tinha ficado muito chocado, um dia, ao saber que em certas zonas os homens os comiam. Estremeceu a lembrar os permenores. Cortavam as patas e a cabeça, viravam os bichos de barriga para o ar e assim os assavam na fogueira. A carapaça era a frigideira. Bárbaros! Nem nas maiores fomes tinha sequer pensado em o apanhar e o assar, quando o cágado velho por ele passava todas as tardes. Por causa de heresias dessas estava o mundo desde sempre de partas para o ar, como o cágado na fogueira, a carapaça para baixo, a terra em cima do firmamento. Aconteceu então. A Lua estava em oposição ao Sol. Primeiro foi a contracção na barriga, vontade de se meter dentro da terra. Pôde apenas apertar fortemente os braços em torno dos joelhos. O azul se tornou mais azul, sólido. Os rumores vindos da aldeia se aquietaram, nada de risos ou gritos de crianças, nem ladrar de cães. Os pássaros desapareceram do céu e cessaram os pipilares. Uma nuvem inexistente lhe toldou os olhos e só a angústia imperava. Ao mesmo tempo, a sensação de rasgar caminhos rumo ao mar. No meio da desorientação, lembrou o cágado velho. Por um instante pensou voltar a cabeça para o observar. Sentiria ele o mesmo? Mas não tinha forças, era apenas capaz de pensar na angústia e na abertura de caminhos desconhecidos. Uma voz interior lhe dizia vai passar, nunca dura muito, vai passar.E passou. Olhou para o lado da gruta e viu o animal, mas não a sua cabeça, tapada de capim. Estaria também o cágado a olhar para o mesmo sítio de onde ele conseguira tirar os olhos? Nunca o saberia. E, no entanto, naquele momento achou que isso inevitável. Quem sabe até era o cágado a causa de estranho fenômeno? Não são eles o alicerce do mundo, as bases de todos os tronos, a forma de Mussuna, a capital lunda? Sabedorias antigas, hoje desprezadas pelos jovens que correm atrás de carros e modas, na busca ansiosa de Calpe e dos prazeres.Levantou, voltou para a aldeia. (...)

(In: Parábola do Cágado Velho, p: 9-10; 24-27.Nova Fronteira, 2005)

Vocabulário:Kimbo: Aldeia (na língua Kimbundu e outras).Munda: Assim chamam os Cuvale (Sul de Angola) à montanha principal de seu território.Mujimbo: Notícia (em Tchoukue); ultimamente ganha a conotação de boato.Mussuna: Capital do antigo império Lunda, que tinha a forma de um cágado.Naka: Horta.Njango: Construção circular, aberta, onde se realizam reuniões (na língua Umbundu e outras).Nunakazi: Nome próprio, que significa na língua Mbunda, a mulher.Ulume: Nome próprio, que na língua Umbundu, significa homem.

ATIVIDADE ORAL E ESCRITA

1) Anote em seu caderno as impressões que você teve ao ler este texto. Em pequenos grupos, apresente suas considerações aos colegas e discuta os significados atribuídos por cada um à leitura efetuada.2) Qual é o mundo de Ulume? Que relação há entre ele o Cágado Velho?

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3) Quais são as dificuldades que passam Ulume e seu povo?4) Os costumes herdados pelos antepassados estão sendo abalados por quais motivos? Levante pontos que você considera positivos e negativos com essa interferência na cultura. Comprove com trechos do texto.5) Que sentido contém o pensamento: “No princípio pensou que era apenas um passeio, todos os jovens queriam conhecer Calpe, íman que os atraía mais que um dourado favo de mel”.6) Por que Luzolo e Kanda são adversários, combatem em exércitos diferentes?7) “Agora o perigo estava mais perto, cada vez mais perto. Não o perigo anunciado pelo cágado velho que saiu da gruta e para ele caminhava, nos seus passos incertos”. Que perigos são esses? 8) Como você interpreta o mal súbito que sentiu Ulume ao se aconselhar com o Cágado Velho? Explique.

9) Que semelhanças há entre a poesia “Do Velho ao Jovem”, o conto “A carta” e o romance “Parábola do Cágado Velho” (fragmento)?

PROPOSTA DE ATIVIDADE: SEMINÁRIO E PRODUÇÃO: TEXTUAL/CARTAZES

1) Em grupos, pense nos textos estudados, aponte semelhanças e diferenças entre eles. Associe as linguagens neles apresentadas, quais deles exigiram maior atenção por sua parte? Por quê? Quais deles você mais gostou? Compartilhe sua opinião com os colegas da equipe. Em seguida, eleja um coordenador para expor a síntese das ideias do grupo aos demais da sala de aula.2) Elaboração de um texto coletivo sobre os pontos relevantes apresentados no seminário.3) Em grupo, cada equipe deverá escolher um dos textos estudados para elaborar resenhas, poesia, conto canção rap, e ilustrá-los, em forma de cartazes. Esse material será acrescido à atividade seguinte.

Afinal, o que você aprendeu com o movimento Hip Hop e demais composições?

Para ampliarmos o assunto estudado, você deverá efetuar pesquisa na internet sobre

os escritores com os quais dialogamos nesse trabalho. Durante o percurso de sua pesquisa,

anote os pontos principais, em forma de relatório, orientando-se pelos questionamentos:

a) Quem são os autores?

b) De onde vêm?

c) O que pensam?

d) Quais instrumentos que os autores utilizam para intervir na esfera social, denunciando

os problemas que afetam o comportamento humano?

As ideias organizadas por você serão socializadas com os demais colegas da sala de

aula, por meio de debate.

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PROPOSTA DE PESQUISA

1) http://www.youtube.com/watch?v=Xj80DpWxess&feature=PlayList&p=3FB3B46, consta neste endereço um entrevista Racionais MC’s.“A gente tenta usar a música pra provocar as pessoas a discutir o assunto (situação de marginalização) e elas darem a opinião delas” (Mano Brown).

2) O endereço a seguir, contempla uma entrevista com MV Bill, que se utiliza da arte para dar visibilidade à periferia:http://www.youtube.com/watch?v=Xj80DpWxess&feature=PlayList&p=3FB3B46 http://cufabh.spaces.live.com/blog/cns!C4516D34C0BA2604!123.entry

3) Saiba mais sobre Ferréz, consultando os sítios:http://ferrez.blogspot.com/http://www.youtube.com/watch?v=ltdDuHAbRKkhttp://www.youtube.com/watch?v=yRXtPKh47johttp://www.youtube.com/watch?v=0VF_lVZ-gJ8

4) Sobre Marcelino Freire, consulte os sítios: http://wwwb.click21.mypage.com.br, http://www.revista.agulha.nom.br. No primeiro, Marcelino Freire concede entrevista ao “Click (in) versos”, e no decorrer da entrevista há um vídeo, em que o escritor lê “Contos negreiros” e na sequência há a apresentação da cantora Fabiana Cozza que interpreta “Sorriso negro”, do grupo musical Fundo de Quintal. O segundo sítio abriga uma entrevista com Marcelino Freire, efetuada pelo “O Povo: O Jornal do Ceará”.

5) A respeito da escritora Conceição Evaristo, consulte os sítios:http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2006000100017&script=sci_arttext, você encontrará uma resenha sobre a escritora.http://eduquenet.net/vicencio.htm ,você saberá sobre a identidade negra que se apresenta na obra Ponciá Vicêncio. Leia este livro, que é belíssimo.

6) Para saber mais a respeito de Carolina Maria de Jesus:http://www.letras.ufmg.br/literafro/frame.htm, consta a biografia da escritora.http://www.youtube.com/watch?v=yg0XT6-rnQs, há um documentário e declamação de uma parte de “Quarto de despejo” e “Diário de Bitita”.

7) Com referência a Mia Couto biografia: http://www.portalsaofrancisco.com.br, http://www.youtmube.co/watch?v=gXEfdMQQ9Zs retrata moçambique e a visão de poetashttp://www.youtube.com/watch?v=4vJpyox9guA apresentação musicalizada da poesia “Moçambique que sai do chão”, de Mia Couto.

8) Sobre Pepetela, consulte os seguintes sítios:http://www.clicrbs.com.br/especial/rs/feira-do-livro/, “Pepetela, a força da literatura que vem da África: Escritor angolano critica o acordo ortográfico que padroniza o português”, consultado em 19/4/2010, às 13h11min.www.tintafresca.net/News/newsdetail.aspx, “Pepetela: uma consciência crítica de Angola”.

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No decorrer dessa pesquisa, foram disponibilizadas formas de linguagem, expressas

nas canções de MV Bill e dos Racionais Mc’s, nas imagens ilustrativas do rap, no conto

“Totonha”, de Marcelino Freire, e no poema “Do Velho ao Jovem”, de Conceição Evaristo,

na entrevista “A periferia de São Paulo pode explodir a qualquer momento”, com Ferréz e na

narrativa “Quarto de despejo: diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus,o conto “A

carta”, de Mia Couto e fragmentos do romance “Parábola do Cágado Velho” . Essas

linguagens revestem-se pelo valor poético porque a palavra desencadeou sentimentos variados

acerca do abandono, do descaso com aqueles que estão à margem da sociedade.

Você teve oportunidade de observar, refletir, analisar e expressar-se em relação a

esses objetos culturais. Frente a essas considerações, como você analisa o movimento Hip

Hop? Escreva a respeito, considerando os textos estudados.

Como você analisou vários gêneros textuais, produza também diversos gêneros,

podendo ser um poema, uma letra para ser musicada, ou um conto.

Ao término de sua composição, releia seu texto, faça as considerações que julgar

necessárias para reescrita de sua produção. Logo após, compartilhe sua produção com os

colegas da classe.

Para finalizar o trabalho, divulgue na escola o resultado da pesquisa efetuada por

vocês.

5. Referências

AGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINI, Maria da Glória. Literatura e Formação do leitor: alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.

ANDREI, Elena Maria (org). Cultura afro-brasileira: construindo novas histórias. Caderno UNIAFRO, v.2, Londrina: Eduel, 2007.

ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. São Paulo: Parábola, 2003.______. Muito além da Gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola, 2007.

BAGNO, Marcos. A norma oculta – língua e poder na sociedade. São Paulo: Parábola, 2003.

BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). Marxismo e filosofia da linguagem. Trad. LAUDE, Michel de e FRATESCHI, Yara. 9 ed. São Paulo: Hucitec, 1999.

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CASTILHO, Ataliba Teixeira de. A língua falada no ensino de português, 6ª ed. São Paulo: Contexto, 2004.

CONCEIÇÃO, Evaristo. Poemas da recordação e outros movimentos. Belo Horizonte: Nandyala, 2008.

EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma introdução. Trad. DUTRA, Waltensir. São Paulo: Martins Fontes, 1983.

FARACO, Carlos Alberto, TEZZA, Cristóvão, CASTRO, Gilberto de.(orgs). Diálogos com Bakhtin, 4ª ed.,Curitiba: UFPR, 2007.

FERNANDES, Frederico Augusto Garcia. O que a história do Hip-Hop pode nos ensinar? Fronteiras Revista de História, Dourados, MS, v. 9, n. 16, jun. jul. 2007.

______. Frederico Augusto Garcia (org). Oralidade e literatura: manifestações e abordagens no Brasil. Londrina: Eduel, 2003.

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FERRÉZ (Reginaldo Ferreira da Silva). A periferia de São Paulo vai explodir a qualquer momento. Entrevista concedida a Revista Caros Amigos, ano XIII, número 151, outubro de 2009, p. 12-16.

GERALDI, João W. (org.) O texto na sala de aula, 5ª ed. Cascavel: Assoeste, 1990.______. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação. Campinas, SP: Mercado de Letras – ALB, 1996.

JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo: diário de uma favelada, 7ª ed. São Paulo: Lino-Gráfica, 1960.

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