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S E C Ç Ã O G R A F I C A
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S U P P L E M E N T O
A'
CONTENDO A EXPOSIÇÃO
I
D A S
PRINCIPAES VIRTUDES E PAIXÕES;
E
A P P E N D I C E
D A S
MÁXIMAS DE LA ROCHEFOUCALD,
E
DOUTRINAS DO CHRISTIANISMO.
P O R
JOSÉ DA SILVA LISBOA.
R I O D E J A N E I R O .
NA TYPOGRAFIA NACIONAL. 1825.
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SUPPLEMÉtfTO
A
C A P I T U L O I .
Das Virtudes, e Paixões; e das Boas, Más,
e Equívocas Qualidades Moraes.
N.
P ar te I I . des ta O bra Ca p. X . e se
guintes dei idéa da
Virtude JVatural;
e n a
Pa r t e I I I . expuz os
Deveres Moraes,
os m ais
coinmuns da H u m an id ad e , ind ispensáve is a
formar o
Perfeito Caracter
do homem
probo,
e
virtuoso,
qua nto he com pat íve l com o de
cadente es tado de sua pr im ord ia l Co ns t i tu i
ção . Reservei para este Supplemento fazei*
a Synopsc dos Deveres Christãos, q u e a n n u n -
cie i no f im do Cap. I . da di ta Parte III . ,
afim de com ple ta r o em preh end ido pr op ós i to ,
sendo impossível fazer abst racção metaphysica
das luzes da Rev e lação . A ntes de cu m pri r
esse an nu ne io , convém ampli f icar o ex po sto
com dout r inas in te ressantes ; a f im de se te r
adequada idéa das
Virtudes, e Paixões,
e
das
Qualidades Moraes de
ce r tas ácçoes hu
m a n a s , qu e tem com ellas an alo gi a e aflfi-
nidad e , e de q u e g ra nd e ( se nã o a m aio r )par te das pessoas não tem noções c la ras .
1 u
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i Á CONSTITÜIÇAB MORAL.
C A P I T U L O I L
Da D ifferença entre .^Probidade e Virtude.
O
Es c r i p t o r d a
Moral Universal
— define
a Virtude— a von tade habi tu a l de con t r ibu i r
á fel icidade dos ente s com qu em vivem os n a
soc ie dad e .— Diz que um ar a v i r tu de he in
teressar-se pelas acçÕes úte is ao Governo Hu
m ano ; qu e a vi r tud e he a recom pen sa de
s i mesma; que deve se r fundada na expe
r i ênc ia , r e f l exã o , e v e r d ad e ; — que não con
s is te na renuncia dos indivíduos á todo o
amor de si, nem em o cr ue l sacrifício de
todo o in t e re s se ; que toda a v i r tud e , l evada
á excesso , de ge ne ra em lou cu ra &c. P o r ve
zes tenho nes ta obra c i tado a esse E s c r ip to r ,
preea uc ion and o os Le i tores con t ra as suas
inexac ta s , pa ra d o x ae s , e f reqüen tem ente ca -
pc iosas e sophis t icas dout r inas . El la não de
c la ra o pon to em que a v i r tud e tem ex ces so ,
e passa á demência . Fare i por tanto as se
guin tes explanações necessá r ias .
Virtude
e
Probidade,
no sent ido or d in á
r io , se en tende se r a mesm a co u sa ; mas rea l
mente se d i s t inguem.
Probo,
he o que exer ce os D everes M o
rae s no cur so comm um da v ida , se ja qu aes
forem os motivos de suas acçÕes.
Virtuoso, he o que exerce os Deveres
Moraes com perseverança e hero ic idade em
qua lqu e r c i rcuns t anc ia e t r a n s e , som ente p e
los mot ivos de obediênc ia á Vontade de Deos ,
e esp eran ça da recom pensa na v ida f u tu ra .
A Pro bidad e se pod e ex erc er por
bom
natural, boa ed u ca ç ão , bons b&bi tos , i n t e -
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vfÜPPLÉMFNTà 5>
ress e bem en ten di do ; pela insensível força dos
bons exemplos , e da boa companhia em que
se v iv e ; pe lo ind irec to, m as ef l icaz , influxo
d e
respeitos humanos;
pelo receio de de s
c rédi to , e de ódio de seus semelhantes ; ou
finalmente por temor de castigo.
A Virtude presuppÕe esforço de espirito,
que vence tenta çõ es e difficuldades, e se p ri
va de prazeres i l l eg i t imos , pura e s imples
mente pelo mot ivo da observância da Vonta
de Divina , de que ha ce r teza , sem a lguma
at tenção aos interesses do mundo, com fi r
me resolução de qu alq uer sacr i f íc io , a in da
da pró pr ia v id a , sendo necessá r io . O s exe m
plos dos m arty r ios que tem havido pela cau
sa da R e l ig i ã o , da P á t r i a , e da V i r tu d e ,
á que de todo o coração e valerosamente se
su bm ette rão aind a indivíduos das classes infe
r iores , constantes da h is to r ia , são pr ov as d es
ta verdade .
O Ju ízo do Gênero H um ano a té dá aos
Virtuosos heroioos o caracter de santidade,
qu e os con sti tue Padr õe s e M odelos aos con
temporâneos e v indouros ; e t a l he a saudá
vel imp ressão qu e faz em tod os os esp íri to s ,
a inda do vu lg o , a l e i tu ra , ou rec i ta de suas
esplendidas acçÕes, que e l la exci ta a mais vi
va e perenne emoção de
admiração e vene
ração
: então os le i tores e o u v in te s , a inda os
mais zelosos no cumprimento de seus
deve
res moraes, fazem a devida ju s t iç a ao m é
r i to t r anscenden te , r econhecendo
t
q u e a p ró
pr ia probidade es tá m ui aba ixo de tão ac r i -
solada vi r tu de . P o r isso o Po eta M or al is ta
Horacio
dá o pre cei to aos É scr ipto res de
Composições Dramát icas , que , pa ra agradarem
aos Espec tadores no T h e a t r o , e adqu i r i r em
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$ A CO NS TIT UIÇ ÃO M*SRA,t.;
c red i t e , bem o lhem pa ra e s se s Exemplures
éa Vida e dos bons costumes. *
Tem-se fe i to volumes de Diecionarios , «
d e B i o g ra p h i a s d e
Homens Illustres ;
mas nel-
las tem
inglobadamente
en t rado sáb ios , a r
t i s t a s ,
R e i s , e N o br es , que t em , ma i s ou
m en o s , con t ribu ído pa ra o bem do Gêne ro H u
m an o , inc luindo-se tam bém de envol ta os que
tem a in da m ais coope rado p ar a a sua desmo-
ra l i sa ç ã o , e ru ín a . A inda he -
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SUPÍLEMEETO
tudes e Paixões , enumerando nos seguintes
breves capítulos as Boas, Más, ou Eqii ivó*
cas Qualidades M or a es , .q u e distinguem os
ordinários ou mixtos caracteres dos homens.
Fa rei breve explicação de a lg u m a s, que aâo
ou synonimas, ou menos obvias.
C A P I T U f L O IV .
•t-
Da Influencia da Constituição Physica do
Homem na sua Constituição M oral.
J-Xínda que seja verdade trivial , que o oh-
mem, pela Consti tuição Physica, he compos
to de três naturezas, material, animal, e
espiritual
r
com
t u d o ,
ella se m ostra impor-*
ta n te , quando se considera a influencia da-
quella Constituição na Con stituição M o r a l,
pelos seus effeitos na energia, bondade, ou
injustiça das acçÕes humanas.
« A Escriptura declar a, q u e , depois de
çreado o Mundo, Deos disse, que todas as
eousas creadaâ' erão
muita boas.
( Genes. Cap*
I. Jf&l ). Sendo o homem a preeminente crea-i
tura da T er ra , está c la ro , que as duag
qualidades inferiores que entra rão na co m
posição de sua es sê nc ia, estavão subordi
nadas á Potência Intelleetual Pr edo m inan
te.
Porém, aindaque essa subordinação regu
lar se pervertesse pela fatal ruína, que so
breveio á original Constituição *, cointudo
„• * Cada pessoa tem em si o testemunho da própria»
Consciência que S.P au lo de si d á :— s in to nos meus inem-
brtís huma leí que repugna a lei do meu espirito , e que
me sujeita-ao peccado: o que vejo ser bom, não faço; 6
que
reconbeç* serr çáo , iss » obro. — E£>. ad. Kom. Capv
V\h
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£ A CONSTITUIÇÃO MORAL.
não se
•
d e s tr u i o i n t e i r a m e n t e , e se podo
m ui to re s t a be lece r . pe l a R e l i g i ã o , c cu l tu
ra do en ten d im en to . J s t o ex ige ana lyse .O homem ,
pela parte material
do seu co r
p o , he sujei to á Cosmologica Lei da Inércia,
e m v i r t u d e d a q u a l , t u d o q u e h e m a t é r i a ,
res i s te á
força matriz
, ou á qu alq ue r nov a
di recção de movimento ,
r
e tende ao descanço ;
e t ãobem, por e s sa pa r t e , he sucep t ive l do
inf luxo dos en te s m a t e r i a e s , qüe o ce rc ao ,
e cujas
-
acçÕes e rea çõ es es tã o l iga da s com
o sys tema do Universo .
- J A
«i
b o n d ad e d e s ta p a r t e
:
da Co ns t i tu ição
do homem se manifes ta pela necessidade do
r e p o u s o , e m j u s t a p r o p o r ç ã o d o t r a b a l h o
prec iso a procura r os bens da v ida . Também
serve : 1 . ° de obs ta r á des temperada ac t iv idade
de a lgu ns ind iv íd uo s , e pe r tu rbad ores púb l i
cos , qu e ser iã o cap azes de fazer gr an de s
m a l e s ;
2 .° de re s is t i r á pr ecip i tad as e pe rn i
c iosas innovações nos Es tabe lec imentos c iv i s ,
re l ig io so s , e eco nô m icos , p a r a d a r firmeza,
e du raçã o á s co us as , e , em qu aesq ue r m ud an
ças , e c r i s es , t e r lu ga r a se rena e c i rcuns
pec ta cons ideração dos genuínos In te resses da
N aç ão , e , em conseqüênc ia , o se pode rem p re
ven i r v io len tas re formas , e a t r ab i la r ias re vo
luções nos Es tados , com o pre tex to de me
lho ram en tos , qu e m ui tas vezes são v i s ioná
r io s , co nt ra a exp er iên c ia dos sécu los , os
quaes a s saz t em mos t rado , que e s se s • e x p e
d ientes centupl icão as desordens que se ten-
t avão rem edia r . Por is so não de ixão de s e r ,
q ua nt o p ar a esse effei to , ú te is as O rd en s e
Communidades de va r i a s so r t e s , pe l a sua
machina l res i s tênc ia á novidades per igosas
, .
opp ond o-lhes o que se diz —
espirito de corpo.
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SUPPLEMENTO 9
Todav ia e s t a
força de Inércia he
h u m a
das maiores causas do a t razo da c iv i l i sação ,
e do cum ulo de misé r ias da H u m an id ad e ;
p o i s ,
em razão do pezo do corpo , a indolên c i a , e preg uiça são v ic ios de_ univ ersa l
influxo.
Se todos os indivíduos se su bm ct tes -
sem á cer ta po rçã o de
trabalho regular, e
escolhido
conforme o seu g ên io , ou n a tu ra l
ta len to , sobe ja r ia mui to tempo para hones to
desçanço , e ú t i l e s tudo; e , em conseqüênc ia ,
a G eral In d us tr ia ser ia a mais bem dir ig ida
e p ro d u c t iv a , afim do maior possíve l su pp r i -
m enlo de tod as as c la sse s , conforme á sua
cooperaçã o á T are fa S oc ia l ; mu i to m ais se
as Nações Cu l tas adoptassem o Libe ra l Sy s
tema de Commercio Franco e Legi t imo.
Porém , no quasi g e ra l j u í z o , o
suhimo
bem he fazer nada.
Eis a pr im it iva e incessan
te causa , e or igem da g u er ra , escrav idão , m i
sé r ia
Eis porque a inda se persevera no t ra
f ico de sangue humano do Commercio d 'Áfr i
ca , sem qu e al ias os E ur op eo s ten hã o o
menor pre tex to de a l legar in jur ia ou provo
cação dos Povos A fric an os E se dizem ho
mens
, e C hris tã os , n ão obedecendo á senten
ça do C read or — Comerds o pão com o suor
de teu rosto l ( Genes . C ap. I I I . &. 19)
O homem , p ela
parte animal,
recebeo do
Creador vár ios
Princípios activos,
adequados
a vencer a inérc ia da m atér ia , p ar a ex er c i t ar
as indust r ias úte is á sua aprazível exis tência .
Tem além disto o dote da sensibilidade, pelo
qual soffre d o r , e tem p r a z e r , conforme
cer tas sensações lhe são de sag rad áv e is , ou
ag rad áv e i s , e , em conseq üênc ia , qua n to pó
T
d e ,
evi ta aq u el la s , e p ro cu ra es ta s . Destft
2
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1 0 A. co íSTiVUtÇA5 M O R A L .
s e n s i b i l i d a d e r e s u l t a o
reSènthneMtO,
que he
o e s c u d o c o n t r a o a g g r e s s o r d e s u a p e s s o a ,
e v i d a , c o m q u e i n s t a n t a n e a m e n t e r e b a t a
q u a l q u e r a t t a q u e .
T e m - s e d i s t i n g u i d o o
resentimento
e m
ins-
tinctivo
e
deliberativo.
A q u e l l e o p e r a n o n o*
m e m e x a c t a m e n t e c o m o n o s m a i s b a x o s a n i-
m a e s : p a r e c e e v i d e n t e m e n t e d e s t i n a d o p e lo
C r e a d o r p a r a n o s g u a r d a r c o n t r a s ú b i t a v io
l ênc i a , nos ca s os em que a r a zÜ o v i r i a m u i
t o t a r d e p a r a n o s s a a s s i s t ê n c i a . E s t a e s p é c i e
d e r e s e n t i m e n t o c e s s a , l o g o q u e n o s c o n v en
c e m o s d e q u e o a t t a q u e t b i d e e n c o n t r o c a
su al , ou sem a n im o de of fensa . O resent i
m e n t o d e l i b e r a d o h e e x c i t a d o s o m e n t e q u a n
do ha in ju r i a in t enc iona l dá pa r t e do o f fen-
s o r : e l l e i nvo l ve o s e n t i m en t o de j u s t i ç a que
cada hum deve á s i m es m o . T oda a pe s s oa
d e r a z ã o d e i x a d e m a i s r e s e n t i r - s e , q u a n d o
s e l he d á j u s t a s a t i s f a ç ã o , e r e pa r a ç ã o do»
d a m n o . O r e s e n t i m e n t o p r o l o n g a d o p ro d u z
o v i c i o d a v i n g a n ç a , q u e m u i t a s v e z e s d á
imp-u l so á c r imes .
O s
Priivcipios activos
d a C on s t i t u i ç ã o ph y
s i c a d o h o m e m , e q u e s ã o c o m m u n s a o s i r-
r e c í o n a e s , v e m a s e r o s a p p e t i t e s d a c o m i d a ,
d a b e b i d a , d a s o c i e d a d e , d o s e x o : o s d o u s
p r i m e i r o s s ã o d e s t i n a d o s á p r e s e r v a ç ã o d o i n
d i v í du o e o s dou s ú l t im o s á co n t i n ua ç ã o da
E s p é c i e , e r e c i p r o c a a j u d a . S o b r e e s t e s p r i n c í
p i o s a c t i vo s , o am or da p r o l e a i nd a m a i s d á
e x c i t a m e n t o a n i m a l p a r a i n d u s t r i a a c t i r a .
E i s o s c o n s t a n t e s e s t í m u l o s p a r a o t r a
b a lh o n e c e s s á r i o , e o c o m p l e m e n t o d a p o p u
l a ç ã o
do
G l o b o ; e , a o m e s m o t e m p o o s
p e n h o r e s d a v i r t u d e , h a r m o n i a , e p r o s p e r i
d a d e g e r a l : e ll es t ã o b em são os m a n a n c i a e »
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SUPPLEMENTO 11
jâos gozos da v id a , qu e se renovao com p e-
renne e innocente sa t isfação, quando se H-
m i tão a preencher o des t ino da Natu reza ,
Se taes pr inc íp ios não operassem, no gera l ,
com intensidade competente , toda a socieda
de ser ia t r i s te scena de torpor , e horror , qual
se vê no estado salvagera.
Porém o ho m em , pela decadência d e sua
con s t i tu ição , qu as i . se t ransformou em ani
mal ferino ;
e , imi tando mui tas vezes na có
lera
,
violência , e crueza os dragões , e t igres ,
se tem , em todos os séc ulo s , p a i ze s , e gr áo s
de civi l isação , mostrado o
Destroidor
d a p ró
p ri a raçs*; o qu e nã o se; vê ainda^ nos b ru
tos mais carnice i ros . D esta m etam orph ose se
or ig inarão as paixões mais indignas e a t ro zes .
O homem ,
pela parte espiritual,
tem em
si a Imagem Divina, que se ec l ips ou , mas
não se ex t in g u io , com a decadência da cons
t i tuição. O
dom do entendimento,
( qu e a in
da he grande, e ampl iavel ) he p Principia
Rector, qu e lhe foi concedido pelo C re a d o r,
pomo o Poder Moderador para di r igi r as ope
raç õe s m achinaes e animaes do corpo , afim
de que se jão sem ex ce ss o , nem defe i to , e te
nha o máximo dos bens , e o mínimo dos males
physicos , quanto he compat ível com a ordem
cosmologica.
P a ra esse effeito , o m esmo C rea do r in-
fundio em todo o hom em o inst inc to de curio
s idade , e ò desejo de con he cim en to, de e s
t ima , e emulação de exee l lenc ia e pr imaz ia
nas habi l idades in te l lec tuaes , e qua l idades
moraes. Deste inst incto e desejo se deriva o
amor da sciencia e virtude, pela qu al os bon s
aspirão a se dis t inguirem em superior idade
de lu z e s , e de faculdades de bem fazer a
2 ii
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1 2 A CONSTISUIÇAÕ MORAL.
H u m a n i d a d e , p r e e n ch e n d o d i g n a m e n t e o seu
uss ignado pos to no T he a t r o da e x is tênc ia .
Também para a l tos dest inos o benigno
C rea do r inspirou em todos os ânimo s anciã de
m elhora r de con diçã o , esperan ça de boa for
tuna , insac iab i l idade de bens te r res t res .
Fina lm ente o espir i to do homem he su s
cep tível de affectos beu ev ol os , e m alévolos.
Affectos benevolos são o am or conjugai , pa ter-
n a l ,
filia l, f r a te rn al , p a re n ta l ; a am izade ;
o p a t r io t i sm o; a g r a t id ã o ; a compa ixão ; a
ph i l an th rop ia .
Affectos malévolos.,
são o ód io ,
c iúme , i i ve ju , • irigan-;a mys-inthropia. A bon
dade do Cr-ã lor fez q ue tod os os affectos b e
nevolos produzão sensações agradáve is em
qu em os m an ife st a; e os affectos m alévolos
sejuo fon te s de d o r , i n qu ie t a çã o , pe r ig o ,
insomnios , susto , mort i f icação. Que tormentos
de esp iri to nã o soffre o inv ejos o, o am bicio
s o ,
o o d i e n t o
Os a f fec tos, quan do são ex ce ss iv os , se
dizem paixões, po rqu e reduzem o e sp i r i t o
quasi á es tado passivo, e incapaz de acção
de l ib era da , ou pru de nte : en t ão mui tas vezes
degenerao em víc ios e cr imes.
C A P I T U L O V .
Das Paixões.
Aixão he
a for te emoção do e sp í r i t o ,
que o exc i t a pa ra a lguma acção ex te rna ,
por impulso dos na tu raes ins t inc to s , sen t i
m en tos , e appe t i t e s do homem. H a p a ixões
rac ionaes , ean imaes , regula res , ou v io len tas .
Q uan do são regid as pela raz ão , e nã o
t»
a s -
passão os f ins da Natureza , são necessá r ias ,
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SUPPLEMCNTOS 1 3
re c t as , e de bon s ef ie i tos ; qu an do se re be l
ião con t ra a r a z ã o , e ex orb i tão dos objec tos
des t inad os pe lo Cread or que as de o , são im
pe tu osa s , m alé f icas , e causão os ho rr idos
ina le s moraes , que cons t e rnão a Humanidade .
Então se denominão paixões desordenadas.
A s Paixões tem s ido pos tas em co nt ra s te
com as Virtudes. Na v e rd a d e , o n d e a s P a i
xões v io len tas pr ed om inã o , as V i r tu de s se
a f ra cão ; m as onde a s V i r tude s p re va lec em ,
el las comprimem , a inda que não exterminem ,
e s sa s Pa ixões . Por desgraça da Humanidade ,
nem a Pol í tica nem a Ph i loso ph ia , e nem
a inda a Re l ig i ão , t em pod ido comple t amente
disc ip l ina r e reg ula r as pa ixõ es co nt ra r ias
á s Vi r tudes .
Os M ora l is tas tem redu zido á dua s c las
ses as cau sas das paix ões irracio nae s e violen
tas , e s ã o ,
Malícia
, e
Ignorância.
N a v er d ad e , a t te n ta a innegave l deca-
dencia da pr im eva cons t i tu ição do h o m em ,
qu e foi ( como se diz na E sc ri p tu ra ) c re ad o
recto,
e
pouco menos do pre dica m en to dos
A n jo s , os v ic ios e c r imes da ma ior p ar te
dos hom ens procedem m ais da Malícia, do
que da
Ignorância.
A qu ella malícia se n o ta
ainda nos meninos, que são r ixosos com seus
com pan he i ros , se ba tem com impetuo s idade ,e se com prazem das m al ignidades e c rue zas
que commettem , especia lmente com animaes ,
e os qu e sã o m ais fracos. O nde ha es cr av os ,
os f i lhos dos senhores são pequenos tyrannos,
que marcão as feições da cólera de seus pais
contra os servos que sevic ião, e os imi tão
na violência . A cru elda de que he tão ge ra l
no s povos , sejão salv ag en s , sejão civilisados,
dem onst ra aq ue l la rad ica l e inexte r m inav e l
-
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1 4 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
malíc ia : es ta a inda mais se evidenceia pela
c o n t in u a ç ã o d a g u e r r a , e sc r av i dã o , t o r t u r a ,
ca lu m nia , fa ls idade de tan tas s o r t e s ; e de
assass inio , su ic ídio , r o u b o , duelo , ca labou-
ç o s , pa t ibulos de tan tos horrores .
Também he incontestável , que a ignorân
c ia dos homens mui to a larga o império das
paixões , e os seus resul tados. Se cada fac tu
im m ora l t ivesse logo a pena de imm edia ta de
/ d o r ou m o r t e , a ev idencia do ma l pe remptór io ,
e inevitável , impossibi l i taria a reincidência na
-
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StJPPLElMENTO l/>
fnàledieo no re la tór io; e , a inda com evidencia
de prova , causa espanto pe la inveros i rn i -
IbanÇa. Isto Convence a importância da diffu-
são da ins t rucção út i l no povo.
As pa ixões desordenadas , èm u l t ima
analyse , se podem eonsiderar ter por causa
única o excesso do amor-próprio, pelo qu al
cad a indivíduo de se ja r ia , se possível fo ss e ,
fazer a sua VOntade , sem res i s tênc ia , sub-
t rah i r - se á Le i do t r aba lho , e adqu i r i r su
per ior idade sobre os out ros homens para d i s
po r de sa as pe*ssoas, e do s fruotos da re s
pect iva industr ia .
As paixões i r rac ionaes e violentos proce
dem de excesso e abu so dè inst inc tos se n
t imentos , ap p e t i t e s , e dese jos da n a t u re za
h u m an a , que a l iás são ne ces sá r ios , e ú te i s
pura a conservação e prosper idade dos indi
v íd uo s , e da p ropag ação e me lhora da E s
pécie . Por exemplo.
N
'
O appetité da Com ida, e bebida degene ra
em can iba l ism o , g lo t an a r i a , e em br iagu ez .
O appetité do sexo,
degene ra em l a sc ív i a ,
venus vaga, e b ru t a l i d a d e .
O desejo de gozo
degene ra em a t t aque
dos bens alh eio s, p ar a Os desfrU ctar sem
o cus to do t raba lho ne ces sá r io , e a inda p ar a
diss ipar os produc tos da pr óp r ia in du s t r ia ,
sem calculo d as co ns eq üê nc ias , e a té pela
má con ta de não economiza r , po r í h t empe-
fa nç a , os p ra ze re s ae tu aes , com pe rd a de fu
turos e mais perennes gozos.
O instincto da curiosidade degenerou em
pesquiza de objectos que es tão fora da esphéra
do entendimento h u m an o , e ass im se forjou
fa lsa , e pernic iosa sc ie nc ia , q ue asso berb a
os presu m idos de sábio s , e com qu e tan to se
-
8/18/2019 Constituição Moral dos Devederes do Cidadão (Suplemento).pdf
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1*6 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
t e i i p e r t u rb a d o , e d es t ro i d o a Hu m a n i d a d e ;
chegando ao ex t re m o de se a r r og a rc m a in
falibilidade, e
porisso perseguindo aos de
cont ra r ias opin iões .
Os innatos esforços de melhorar de con
r
d i ç a o ,
com a esp eran ça da boa fo r tu n a , e
emulação de exce l lenc ia ; o amor da estima,
honra, fama, e gloria,
tem dege nerad o em
am bição de dom inar , em aba rcam çnto de
ben s , e em vil in v ej a, as qu ae s tem occasio-
nado os furores de guerras , os re inos de te r ror ,
e os horr idos systemas de ca t ivei ro e despo
t i smo.
O
amor do descanço
deg enera em iné rc ia ,
que re s is t e á i ndu s t r i a r e g u la r ; sendo por
isso im m ensa a diffículdade de a t t ra h ir os sal-
vagen s ao es tado p iv i l i sado; e , a inda ne s te ,
h e ge ra l a anc iã e porfja de to do s os indiv í
duo s o t ra ba lh are m o menos po ss íve l ; e , em,
pro po rçã o da p róp r ia in te l ligenc ia e as tuc ia ,
lançarem sobre os hombros dos outros os mais
penosos t raba lhos .
C A P I T U L O V I .
Das Paixões desordenadas.
HL
A pa ixões
ordenadas
, e
desordenadas.
Paixões ordenadas,
são as que procedem
de affectos d o ce s , como a pa ix ão do am or
da am izad e , da p á tr ia , da sciencia , d a
fama * , h o n r a , e g lo r i a : e llas são benéf icas ,
monstrando-se conveniente reguladas pela t ' -a -
zão e R e l ig iã o , bem que se jão suscept íve is
(*)
Tácito
disse com razão •— desprezada a fama , des>
prezão-se as virtudes.
-
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SUPPLEMENTO 17
d e abu so pelo excesso a lém do seu n at u ra l
objecto.
Pa ixões desordenadas são as que exer-
b i tão da boa Ordem M o ra l , e t endem a dam -
no e malef íc io; e se podem red uz ir á am or-
própr io excess ivo , .ód io , medo, iné rc ia , l a s
c ív i a , ge los i a , gu la , i nve ja , va idade , de se s -
pe ração , supe rs t i ção , f ana t i smo , sobe rba , cú
bica de bens , e m an do s.
Toda a pa ixão desordenada he v io len ta ,
a inda que a r t i f i c iosamente se concent re , oc -
cul te , e diss im ule a inqu ie taçã o do e s p ir i t o ,
e turbação do corpo . El la rompe em exces
sos de ac tos externos impetuosos e mort í fe
ros , o ra ins t an tane am ente , o r a p or i n t e rva i -
los. El la presuppÕe a rdenc ia de imaginação ,
e ignorância , ou cegueira de entendimento ,
que impede ve r a ve rdade , de l ibe ra r com
circ un sp ecç ão ; e porisso se diz , qu e n ão se
pode obrar bem na força
efogo das paixões *,
e que o
apaixonado
es tá
fora de si,
e se d e
sat in a á aetos de dem ência com o louco r e
matado e phréne t ico .
Os tem pera m ento s dos hom ens £ão sus
cept íveis de vários gráos de paixões desor
denadas . Ha paixões dominantes , que mui to
assomão e preva lecem nos ca rac te r es dos in
divíduos. Quando a lguma (ou a lgumas del las)tom a o ascenden te , vem a pr ed om ina r no
eur so da vida , e quasi sup plan ta as ou tra s .
O laseivo he pouco sensível ás honras e ri
quezas ; o epicu reo e glotão só es t im a com e-
za n a : o ava ren to ma l o lha ao in t e r e s se ; o
— pjy. , .
(*) S. Paulo na Epístola aos Rom anos Csp . VII. ver;:,
.5.
— Em quanto estávamos na carne , as
paixões do peccado.
obravão em nossos membros, para darem iVuctos á morte.
3
-
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1 8 A CONSTISmÇAS MORAL.
ambic ioso unicamente , ou pr inc ipa lmente , a sp i
ra ao mando. * Os que tem ostentado luci fer i -
na am bi çã o , t em reunido tamb ém a cubiça da
r iqueza ; mas he pe la razão de se r es te o mais
seg ur o ins t ru m en to de potênc ia pol í t i ca , e es
tab i l idade da dominação , l ibe raHzando-a com
os p a r ti d is ta s . -f*
De toda s a s pa ixões de so rd en ad as , a s
m ais un iver sae s e ter r ív e is são a cubiça de
riq u ez a e do m inaç ão . El las tem sido as cau
sas das m ais san gu iná r ias ' H os t i l id ad es , Ty>ra n n ia s , Revo luções . '•
-
-
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SUPPLEMENT» 19
t idã o do Co m m erc io, e inconvmensuravel co r
re spondênc ia da Humanidade , de que ha me
nos de século não se t inha idéa , e não se
considerava possível , ou pra t icavej .
Nos ant igos governos populares se reco-
nheeeo o perigo de exci tar pa ixõ es no povo*
Em Athenas era prohibido aos Oradores
mo
verem affectos;
porque pelos art i f ícios ora
tórios , e m agia da eloqüência , a in da nos ra -
cionaveis affectos da compaixão aos oppri-
nridos , e indignação con tra os op pr es so re s ,
na demonst ração do d i re i to de cada hum, se
afogjieava a ph an tasia dos qu e dev ião d eci
dir as causas , imp ossibi l i tava a ser en ida de n a
D el iberação , a regula r idad e da J u s t i ç a , e a
imparc ia l idade dos Ju izes , que devem ser
impassíveis
como a L ei.
Os governos m odernos bem á su a c u s
ta tem experimentado os péssimos effe i -
tos da l iberdade de fal ia e e s c r ip t a , com
que Novadores , e Dem agogos e xc i ta r ão as
paixõe s do vulgo con tra re is , pa d re s , n o
bres , e ricos , e ainda sábios e artistas emi-*
n e n te s , a ffec tando com miser açã o do ind ige n
te corpo dos t rab alha do res m echanicos , a t -
t r ibu indo a sua m is é r ia , e des igua ldade d©
con d ição , á Adm in is tração , p rom c t t endo- lhes
imaginaria fel icidade de Optimismo Político. *
Hum dos maiores malefícios das Revo
luções he o sol tar dos laços da su bo rd in aç ão ,
e do dever do t rabalho ', regu la r e pac ien te ,
as c lasses indust r iosas , dando aos indivíduos
(•) A historia da Grécia e Rom a dá irretructivos d o
cumentos á esse respeito. Pisistrato em Athenas e Antônio
em R om a, com facões c declam ações ao povo se apoderarão-*do
leme do governo.
3 ii
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20
A C O N S T I T U I Ç Ã O M O R A L .
ousadias insolentes para . exorbi tarem da pro*
pr ia e sp hc ra * , e de , em luga r de cada obre i -
r o te r a ju s ta emulação* de riva l isar em ba-ra te z a e perfe ição, d 'o br a na sua ar t e entro
os seus iguaes em m es té r , e (p o r ass im di
zer) conseguir excel lencia a a l teza da mes-
t ra nç a e pr inc ipado na respec tiva c lasse , pe
la preem-inencia de sua habil idade e destre
za ; se arrojã o tem erá rios ao vácuo cahot ico
de ambição desordenada de soberania pol í t i
c a , m ais d esenvol tos e desorientados que os
á tomo s de Ep icureo na imm ensidade d o es
p a ç o ,
ou dás muleeulas- d 'agoa do sal i t re re
du zidas á va po r pela exp losão da pólvora .
Baean
bem., re fie ct io , que* lia trê s es pé
c ies de am bição nos h o m en s: hum a he a de
ex te n d er , po r força ou fraude , o im pé rio
de su a von tad e sob re os Co ncid adã os; o que
lie appeti té tyrannico , . e , quasi sempre, des*-
t r u et iv o do< pro jec t is ta : a 2 .
a
h e a de e xt en
de r o seu imp ério despot ico aos paizes es t ra
n h o s ;
o que he appe t i té i r regula r e deshumano
K
que acha enco nt ro no ódio do Gênero H u m a
no co ntra os^ D ev astad ore s , no am or da P á
t r ia e da Inde pen dênc ia de todos os povos-
cul tos , e no C iúme e Inte ress o dos Po ten
t ados e s t abe lec idos : a 3.
1
, a m a i s na tu ra l c-
jnnocen te , he a de ex tende r o -
Império da
Intelligencia
sobre a N a t u re za , e o da V i r tu
de so bre a Sociedade : sendo porém esta a
m ais ho nes ta e sublime am biçã o , poucos a-
te m , c todavia e l la h e , depois da R el ig ião , .
a p r inc ipa l causa da pro sper idad e tem po ra l ,
(*) Mirabeau, hum
dos
mais
atrabilarios
Corypbêos
da»
Cabala Revolucionaria
da França
,
apregoou
,
que
se devia».
castigar
nos ricos os crimes dos pobres, como causas delles»
-
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SUPPLEMENTO
21
de que os homens são eapazes no seu pre
sente es tado.
As
Constituições Estadisticas
tem sido ex -
cogi tadas para conter em justos l imi tes as
di ta s duas mais refra c tar ias e incom pressiveis
paixões da cubiça de dominação, e a de rique
za , tan to de Cabeça como dos M em br o s , do
Corpo Político.
Equilíbrio de Poderes
Eis o
difficil Pro blem a. O nde se a ch ar á ,
oiro fio,
a Balanç a de A stre a ? Co ntentem o-no s com a
approx imação .
Concluirei com as reflexões dos Prínci
pes dos Poe tas Lus i tanos , que bem descreve
os malefícios das paixões da cubiça de ri
queza e dominação nas suas Lusíadas Cant .
IV E st . 95 . e Can t . V II I . Es t . 96 .
Oh «rloria de m a n d a r Oh vã a cúbica
D es ta va idade a quem chamamos fa m a
Oh fraudulento gosto, que se a t iça
Co' hum a aura pop ula r , que ho nra se c h a m a
Que cast igo ta m an h o , e que jus t iça
Faze s no pei to vão que m ui to te a m a
Q u e m o r t e s Q ue p e r i g o s Q u e t o r m e n t a s
Que crueldades nel les experimentas
Veja ag or a o ju íz o curioso
y
Q uanto no r ico , ass i como no p o b r e ,
Pôd e o vi l inte resse , e sede im ig a
Do dinheiro, que à tudo nos obriga*.
A Po lydoro m a ta o Re i T h re i c io ,
Só por f icar senhor do grão thesouro:
E n t r a pelo fortíssim o edifício
Com afi lh a de A cris io a chuv a de o u r o :
Pode tan to em Tarpe ia avaro v íc io ,
Q u e ,
a t roco do m eta l luz en te , e lo u r o ,
-
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22 A CON-STITOTÇAS MORAL.
E n t re g a aos in imigos a a l t a T o r r e ,
Do qual quasi affogada em pago morre .
E s t e rend e m unidas forta lezas ,
F a z t red or es e falsos os am ig o s:
E s te ao s mais , nob res faz fazer v i l e z a s ,
E en t rega Capi tães aos in imigos :
Es te co r rompe v i rg inaes purezas ,
Sem temer de honra ou fama alguns perigos»
Este deprava ás vezes as sc iencias ,
Os ju íz o s ceg and o , e as consc iências. :
Es te in te rpre ta mais que subt i lmente
Os tex tos : es te faz , e desfaz le i s :
E s t e causa os pe rjú rios en t re a g e n t e ,
E mil vezea tyraunos torna os Reis .
A té os que só á Deos O m nipoten te
Se d edic am , mil vezes oü vir e is ,
Que corrompe es te encantador , e i l lude ;
M as não sem cor com tud o de vi r tud e .
C A P Í T U L O V I I I . .
Da Perversidade M«ral.
JLJ .E supérf luo ennumerar os v íc ios e c r i
mes que resul tão das paixões desordenadas ,
e qu e fbrmão o
caracter perverso.
Não se pôde fazer mais breve des cripç ao
da
perversidade moral, do
que apresentando-
se a que se acha na Epístola do Apóstolo
das Gentes aos Romanos Cap. I . e II .
«* A Ju s t i ç a de Deos se manifesta d a
Ceo co ntr a toda a im piedade e^ injust iça d a-
quellesi homens que retém na injust iça a ver
da de de Deos, o qua l po r isso os en tre go u
d
paixÕeo de ignomínia ,
e
senso reprobo ;
— cheio»
-
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SUPPLEMENTO 2 5
de toda a in iq n id ad e , mal íc ia , l a sc ív ia , ava
r e z a , m alda de, e cheios de homicídios , de con
t endas , de eng an o , de m a l ign idad e , mex e r i -
qu e i ros — m urm uradores , contumel iosos , so
berbo s , a l t iv o s , inventores de males, desobedi -
en te sé seus pa i s , i n s ip i en te s , immodes tos , s em
benevolência , sem palavra , sem misericórdia ,
— aborrecidos de D e o s : os qu aes , ten do eo«-
nhecido a jus t iça de D eo s , não com prehe nde -
r ã o , que os que fazem semelhantes cousas ,
são dignos de m o r t e ; e não som ente os qu e
estas cousas fazem , senã o tam bém os qu e
consentem aos qu e as fazem. — E tu , ó h o
mem , que- ju lg as aque lles qu e fazem ta es
co us as , e exe cutas as me sm as , enterJHes qu e
escaparás do juiz o de Deos ? — A caso de s
p rezas a s r iquezas da sua Bondade , Pac i
ência ', Léugani imdade ? Ignora s que a Ben ig -
n idade
de
Deos te convida á peni tencia ? «—
Mas pe la tua du rez a , e co ração im pe n i t en te ,
enthesouras para t i i ra no dia da ira, e d a
reve lação do jus to ju izo de D e o s , que ha de
re t r ibui r á cada hum segundo as suas o b r a s ;
com a v ida e te r na por ce r to aos q u e ,
per*
severundo em fazer obras boas,
buscão g lo r i a ,
h o n ra , imm or ta l idade ; mas com i ra e i nd ig
nação aos que não se rendem á v er d ad e , mas
que obedecem á injustiça.
II
C A P I T U L O I X .
Das Virtudes Fundam entaes.
A Boas Qualidades Moraes, de que adian
te se dará a enumeração , e que cons t i tuem
o
Bom Carttcter
dos hom ens era tod os os
p a i ze s , qua lqu er que se ja a sua R e l ig ião Po-
-
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2 4 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
s i t iva , e Cons t i tu ição Pol í t i ca : e l las se po
dem denomina r virtudes em sent ido la to : mus
são d ignas de espec ia l a t t e n ç ã o , as seguin
tes —
Piedade
—
Veracidade
—
Senhorio de si
—
Tolerância.
— Podem-se ape l l ida r —
Virtudes
Fundamentaes—; p o rq u e , sem el las , tod as as
boa s qual ida des não se su st en tã o , c , com
e l l a s ,
adq uire m realee e bri lho . Porisso a qui
adianto a sua exp lanaçã o mais exp l ic i ta : bem
entendido p o ré m , que , pa ra formar o ca rac
te r do C h r i s tã o , se devem também reun i r
as que a Igre ja int i tula Virtudes Cardeaes.
C A P I T U L O X .
Da Piedade.
T,
M-SE confundido a vi r tude da
Pieda
de
com a
compaixão
nos ind ivíd uo s, e a
clemência
nos S ob era no s; mas he rea lmen te dis-
t ine ta destes a c to s , q ue são impulsos da hu
m an id ad e , e não sentim entos de rel igião. *
Piedade he a vi rtu de de quem não só
cons tan temente guarda os seus deveres á Deos,
indicad os na P a rt e II I . cap . IV . , mas além dis
to tem o
habito de devoção
ao mesmo Deos ,
p ro cu ra n d o em todas as acçÕes obse rvar a
su a v o n ta d e , e não in corre r no seu desag ra
d o .
T al he o ca rac ter da pessoa verd ade ira
mente p ia . Uni r mora l idade com piedade ,
bo as o br as com de dicação do esp iri to ao
C read or, são os req uis i tos n ecessários a con s
t i tui r o
homem religioso.
Isso he o m aior p re
servat ivo de todas as vi r tudes ,
* Blair — Serm. Vol. I. Serm. I.
-
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S U P P L E M F N T O 2 5
A Esc r ip tu ra nos t r a smi t t i o hum exem
plo adm iráve l na conduc ta de Jo sé do E gy p-
to . Sendo escravo de hum dos Grandes Se
nh ores da Corte de P b a r a ó , foi assa l tado pela
impudica mulher do mesmo no seu aposento
p a ra violação da cas t idad e. M as o vi r tuo so
mancebo res is t io ao assa l to , não a l legando ra
zões suba l ternas do dev er á seu a m o , m as
instantane am ente dizendo — como posso fazer
este mal, e peccar contra o meu Deos
?
Hum M or a l i s ta , que po r vezes tenho c i
tado * , exp lana bem este assu m pto. El le d iz :
"Mui tos homens do mundo ha , que rec l a -
mão o ser homens de honra., e que con side-
rão a
virtude
como nome res pe i táv e l , m as
fazem tênue conceito da piedade. El les se p re -
zão de sua hum anidad e , probida de , ve rda
d e , e de seu espiri to publico; el les se arro-
gão todas as ac t ivas e varonis v i r tu d es ;
m as tr at ã o com desdém os dev eres rel igio
sos , e o devoto affecto ao E n te S u p r e m o ,
como fundado em concei tos enthusias t icos , só
capazes de empregar a a t tenção de espír i tos
fracos e superst iciosos. Porém taes pessoas
podem ser argu idas de de pra va çao dos es
pí r i tos , e de fazerem i rre gu lar desem penh o
dos deveres da moral idade; pois ta l modo de
pensar prova hum coração f r io , e duro . „
" A p r im e i ra im pr es sã o , que todo o ho
mem chegado ao uso da ra zã o viva m ente rece
be da N atu rez a , he o
senso de religião.
Logo
que prin cip ia a ob ser va r e ref lec t i r , tam bém
discerne innumeraveis s ignaes de seu es tado
* Também se diz piedade filial a prat ica dos de
veres dos filhos aos pais, a quem, depois de DeoB, devem aexistência.
4
-
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2 6 \ C O N S f - T U I Ç A Õ M O R A L .
dependen te de huma Potência Invisível, cuja
sabe do ria e bo nda de se man ifestão de tod as
as p ar le s. A magnificência", á b e l l e /a , e a or
dem do ímmenso T he a t ro v i s ív e l , o exc i t ao
para o admira r e adora r . Sent indo os e f íe i -
tos da Mão Ommipotente que ope ra t an ta s
m arav i lhas , t em a im pressão da revere nc ia .
Re cebe nd o benefíc ios qu e não p ôd e d eix ar
de a t t r ibu i r á Div ina Bondade , he inc i tado
á g ra t id ão . As exp ressões des tes a f fec tos , de
ba ixo das var ias formas de cu l to re l ig ioso ,são as n at u ra es effusÕes do co raç ão hu m ano .
A igno rânc ia p ôde ex tr av ia r o esp ir i to , e a
sup ers t ição pode co rro m pe l lo ; n :as a sua o r i
gem he der ivad a des tes hab i tuaes sen t imen
tos , qn e são essenciaes á C on st i tuiç ão da
Humanidade . He - lhe por t an to imposs íve l não
e levar mui tas vezes o pensamento ao Ceo,
p a r a r e n d e r h o m e n a g e m a o E n t e S u p r e m o ,
em ard ente s votos orando f reqüe ntem ente a
sua Inf in i ta M ag es ta d e , como a seu Pr i m ei ro
Pai , o m ais excelso So ber ano , e o m aio r
Bemfei tor . Pelo que só coração insensível , e
co r r u p to , pode de ixa r de t e r a v i r tu de da
devoçã o á D e o s ; e n i sso cons i s te a
genuína
Piedade. ,,
O p rophe ta Re i d i z i a—
Tenho sempre a
Deos em insta
— *. A necessidade de cu id a
rem os homens das cousas da vida , const i
tue impra t icáve l esse t ão subl ime gráo de v i r
t u d e ,
excepto em poucos esp í r i tos pr iv i leg ia
dos de
vida contemplativa,
qu e tom qu asi
sempre a a lma e levada na adoração do Ente
Supremo. Porém he do dever de todos os
homens ter o habitual, (s e nã o o ac tu a l )
* Providebam Deum in conspectu meo semper — Psalmo*
-
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S UP P LEMENTO 27
^sentimento da D ivina © rnn ipresen ça , e da in-
fallivel res po ns ab ilid ad e final á sua indefectí
vel Just iça pelas boas ou más obras .
Toda a pessoa , a inda do mais rude en
tendimento , he capaz deste re l igioso sent imen
to ; e posto que o seu m odo de vida o dis
t r a i a da m edi tação de objectos esp ir i tuaes ,
e do in te resse da sa lvação e te rn a , com tud o
bem pôde e deve im i ta r ao so ld ad o, q u e , re
cebendo ordem pa ra a b a t a l h a , o lhou aos
Ceos d i zendo :
Oh meu Deos Se na hora da
peleja , eu não m e lembrar de Vós, lembrai-
Vos,
oh Senhor, de mim l
V,
C A P I T U L O . X I .
Da Veracidade.
Eracidade
he a hab i tual pr á t ic a de dizer
a pura verdade. Esta vi r tude he da mais
transcendente influencia ao bem da Socieda
de : e l la he a pr im eira que ap pa rec e a ind a
an tes do uso da ra zã o nos meninos * , e d á
a amost ra da or ig ina l d ignidade da na ture -
sa hum ana . Sem ta l v i r tu d e , f rus t ra r -se -h ia
o fim pa
t
a que o C read or deo aos ho men s a
faculdade da fa l ia : também sem el la se per-der ião as oppor tunidades de adqui r i rmos os
conhecimentos que resul tão da communieação
com os nossos semelhantes por voz ou es
c r i p t u r a . To d a a p e s s o a , a n ã o e s t a r p r e v e -
* Quando os
r
de tenra idade dehao de ser cândidos ,
e começão a não fallar a verdad e , ou são esquives em d i
ze-la, dão signal de perda da innocencia.
4 ii
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2 8 A CONSTITUIÇÃO
M O R A L .
r i
*
< ce r t a do máo ca rac t e r de o u t r a , põe
confidencia nas asserçÕes (pie lhe faz, na boa
• < de qu e falia a ve rd ad e. Sem a confiança
do serem os homens , no g e r a ' , ve rda de i ro s ,
cada indivíduo apenas ter ia o conhecimento
l imitado dos objectos da experiência pro-
pr ia .
Os M ora l i s t a s t em no tad o , q u e , po r fo rça
deste or iginal principio instinetivo de veraci
dad e , todo o homem tem d uas inc l inações
ou t end ên c ia s ; hu m a he d i ze r a ve rd ad e , e
outra de acredi tar nos di tos a lheios . Esse pr in
c ip io faz par te da Cons t i tu i -áo da Humani
dad e , qu e nos impel le ao t r a t o so ci a l , e ao
m esm o tem po nos induz a ser s in cer os em
as nossas mutuas communicaeões .
A verdatfe he sem pre a na tu ra l e espon
tân ea exp resã o dos nossos sent imentos ; por
isso a té passa em pr o v ér b io , j á c i tado em
o u t ro l u g a r , q u e a verdade vai sempre para
a boca ; a o c o n t r a r i o , a falsidade t ra z comsi -
go sensível violência á nossa n a tu r e z a , e bem
manifes ta haver inf luxo de a lgum motivo de
fazer acção má, qu e somo s anciosos em occu l-
ta r . Em conseqü ência d aqu el le pr incipio ins
t ine t ivo , toda a pessoa dá fé ao tes temunho de
ou t ra . Sem es t a p red i spos i ção se r i a im p ra t i cável oE xpe diente das- In q u i r i çõ es , e Pr ov as
nos Ju í zos eTr ibunaes , e nada nos ins t ru i r i a a
His tor ia .
A regu la r id ad e da A dm inis t raç ão Civ il e
AJi l tar se funda no presupposto, que , ao menos
em todas as Info rm açõ es ofriciaes, se diz a
verd ade ao G ov er no , e aos seus D elegados ;
r , pe l a p re sum pção da ge ra l ve r ac id ade , se
expedem as ordens , se fazem as promoções ,
e se dão as se n te nç as , à pr o l do Pu b l ic o , e
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S UP P LRMENTO 29
das Pa r t e s . A
Fé do Officio
he a M ola R ea l
pa ra Jus t i ça e Graça . *
Habi tua l d i spos ição á ment i ra e f raude ,
ainda nos objectos de tênue monta, he o infal-
l ive l symptoma de má índole , péss imo caracter ,
e vicio radical de quem a manifesta , e ainda
mais se não tem v erg on ha de se r com pre -
hendido em ment i ra . As pessoas que tem este
habi to e des cara m ento , são , na gera l op in ião ,
desprezados : a sua na tu ra l e menor pena he
o não se rem cr id o s , a inda qua ndo d izem a
v e rd a d e .
Alem d a ut i l idade qu e res ul ta da ve rac i
dade , approvamos , reverenc iamos , e amamos
as pessoas , que tem o hab ito e t im b re de
fa l lar verdade, e só por isso lhe a t t r ibuimso
as me lhores qua l idades m o ra es : ao co n t ra r io ,
d e s a p p ro v a m o s , a b o r r e c e m o s , e e x e c ra m o s
aos ment i rosos , e a té , sem ju izo temerár io , os
suppomos incapazes de probidade .
Por isso os que aspirão á reputação de
integridade
devem te r a m ais esc ru pulo sa
consciência á esse res pe ito , im itan do ao cele
b re Epaminandas , G enera l Th ebano , e Sa lva
dor de sua pátr ia , que a His tor ia e logia por ser
tão amante da verdade, que nem por gracio-
sidade mentia.
* O s Secretários e No tarios Públicos tem por isso
grande confiança no povo . A Orde naçã o do Re ino de Po r
tu g a l, pela qual ainda se regu la o B ra si l , dá a m aior fé as
declarações dos Ins tru m en tos , porque -
o Tabellião o disse.
Mas , em caso de falsidade , lhe impõe pena de m o rt e, e com
a cláusula prev entiv a e inhibitoria, que , ainda no caso d e
ap rese nta r "^Provisão de Pe rd ão do Sob erano os Tribun aes a
não en m pr ão , .Jiavendo-a o Legislador por obrepticia e subre p-
ticia.
'"
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3 0 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
C A P I T U L O X I I .
Do Senhorio de si.
O Enhorio de si, ou Poderio intellectual, he
v irt u d e mui pre ciosa , e ra ra , d a pessoa
que se diz
senhor de si,
ou
senhor de suas
paixões :
el la m anifesta o que se cham a —
força de espirito, — firmeza de caracter
—
cons
tância de rectidão—. Que dom da N atu rez a
Q ue effeito de boa E d u c a ç ã o Q ue beneficio
de hab i to de reg er os ap p et i t es , e domar
víc ios Que prodíg io dos T ha um atu rg os da
Re l igião , constantes do Mar tyrolo gio E ccle-
siast ico
E sta vi r tu de he o com plexo ou compên
dio da —
f o r ta l e za ,
—
prudência,
—
temperan
ça , — serenidade, — castidade ; e presuppÕe
o ha bito de fal lar e ob ra r p u ra e simplesmen
te segu ndo o dic tame do D e v e r; e não por
impeto an imal , e s t imulo da concupisccnc ia ,
en thus iasmo da phantas ia .
Es t a v i r tude he ve rdade i ra
heroicidadc,
quando he pra t icada pe los Potentados
do
mun
d o , qu e , am bicion and o serem senho res dos
homens , não se most rão igua lmente senho
re s de si ; an tes , ao c o n tr ar io , pelo hab ito
de exercerem impunemente
prepotencias,
per
dem muito do poder sobre as próprias del i
be raç õe s e acçÕes , des orte que proced em
mais p or impulso i r r ac io n a l , que por m ot i
vo de razão. *
Bem disse o Prín cipe dos O rad or es de
(*) Frederico I I . Rei da Prússia di zi a, qu e estava pe
la definição que os Philosophos dío dó homem, —
an im al ra
cional , com tanto que conced essem , que a parte animal pre»
ponderava á racional.
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SUPPLEMENTO 31*
P om a e logiando a Jú l io C ésar na sua Oração
gr atu la to r ia pela gra ça da vida e hon ra fei
ta á Marcel lo , seu poderoso inimigo, sec tá
rio do vencido Pom peo : "
Hoje venceste a ti
mesmo , cohibindo a ir a , e m od era nd o a v ic
tor ia &c. Quem assim o b r a , o ju lg o mu i se
melhante á Deos. „
A pessoa qu e nã o h e sen ho r de si , he
escravo de suas paixões , e de seus vic ios ,
e he capaz dos maiores desat inos e a t tentados,
a inda con tra os maiores a m ig o s , e m elhores
cidadãos. O i r o so , o arreb ata do , o violento ,
o lascivo , são ve rda de iram en te fracos de es
piri to , a inda q ue se pres um ão fortes de co r
po.
N os actos de cólera , e gr an de s pe rig os
na paz e na g u er ra , se vê o qu an to pô de o
senhorio de si, que dá presença de espirito,
ao P r ín c ipe , E s t ad i s t a , C ap i t ão , pa ra ve r
claro as cousas, e resolver com acerto.
O Mora l i s t a
Stewurt
, faz as se gu int es
reflexões : " Quan do ava nça m os em anno s ,
á porp orção que as nossas potências anim aes
perdem a sua ac t ividade e vigo r , gr ad u al
m ente almejamos exte nd er a nossa influencia
sobre os o utros , ou pela sup erio r ida de de
for tuna e s i tuação , ou pe la , a inda mais apra
z ível , superior idad e de dotes inte l lec tu aes ;
pela
força do nosso entendimento ;
pe l a ex ten são de nossa in s t r uc çã o ; pe la a r t e da pe r-
suação. Idéa do Poder he a que agrada ao
orador , que , pe l a sua e loqüênc ia , e supe r io r
intel ligencia, faz cal lar a ra zã o dos o u tro s, di
rige aos propios fins os seus desejos e paixões,
e , sem ajuda de força , ou de esplendor de
nas cim ento , vem a ser o ar bi t ro do fado das
Nações. „
"
A idéa do poder,
he também, em a lgum
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3 2 A C O N S T I S U IÇ A Õ M O R A L .
g rá o , o fundam ento do
prazer da Virtude.
A m am os o te r a l iberd ade de seguir as n ossas
in cl in aç õ es , sem sermos sujeitos ao freio do
superior: porém isto só não he suflfieiente pa
ra a nossa felicidade. Quando por viciosos
háb i tos , po r fo rça das pa ixões , somos a r re
ba tad os a fazer o que a ra zã o desa ppro va ,
log o sentim os a m ort ifieação de serm os su
jei tos aos princípios inferiores da nossa na
tu re za , e reconhecem os a nossa fraq ue za , e
pequenhez . Ao cont ra r io , o senso de l ibe rdade , in de pe nd ên cia , e levação de espir i to , e
t imbre de v i r tude , são os na turaes sen t i
mentos do homem, que tem a consciência da
própr ia for ta leza , pa ra em todos os tempos ,
ac alm ar os tu m ulto s das pa ixõ es , e obede
ce r sere na s int im açõ es do d e v er , e da honra. „
C A P I T U L O . X I I I ,
Da Tolerância.
Olerancia
he huma das vi r tudes da maior
efficacia p a r a a p az da so c ie d a d e, e ao mes
mo tempo huma das mais diffieeis , e menos
pr a t i c ad as , pe l a so be rba , i n jus t i ça , e igno
rância dos homens, que se presumem i i r-ma-
culados, impeccaveis , e infa l l íve is . Ainda os
que reconhecem os próprios erros e --efei tos,
to d av ia nã o dã o à re sp eit o dos ou tro s '*•- d e
vidos descon tos á fraqu eza e fragil idade da
comm um na tu re za ; e por isso também r i:o
soflrem nem tolerão discórdia de opiniões
pol í t icas e re l igiosas . D ahi se o r i g in o u , e
a inda mui to pe rse ve ra , o
espirito péssimo,
que tem deshum anado a H um an idad e com
-
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SUPPLEMENTO
33
v io lên c ia s , pe r s egu içõ es , e c rue ld ades , de
que es tão cheias as His tor ias .
A Tolerância he Indulgência Philosophica,
f i lha da Equidade Natura l , e Car idade Chr i s -
tãa . Como he poss íve l , que , a inda no pre
se n te , que mui tos b lazonão de ser, século de
luzes, não se reco nh eçã o os bo ns effeitos do
seu benigno influxo na C on córd ia Social ?
As razoes da
Tolerância
das sei tas dis
sidentes da Religião Catholica se podem re
duzir á: l .
a
Bondade, Clemência, e Miseri
córdia Divina,
que no Ev ang elho bem se
declara ser tão g ra n d e, que Deo s faz chov er
também sobre os ingra tos , e que tem á s i reser
vado o Ju iz o e o Ca stigo dos infiéis e m ali g
nos ; só El le podendo pe rsc rut ar os co ra ç õ es ,
e os penetraes do entendimento, e conhecer, se
o procedimento, e a obst inação, he de mal íc ia
e ignorância cu lp os a, e bem pe za r a força
da ten tação , ea poss ib i l idade da res i s tênc ia :
2.
a
a impossibilidade de compellir os espíritos
á convicção d o qu e ní-.o co m pre he nd em , n ã o
tendo todos os hom ens o m esmo g rá o de
i l luminação, ou inspiração. 3 .
a
o len to pro
gresso da verdade, ainda nos conhecimentos
n a tu ra es , e o compl icado, e quas i i r res i s t í
vel , influxo das
associações das idéus,
forma
das pe la E d uc aç ã o , C on s t i tu içã o , e Pol ic ia
de cada Paiz.
Consciência errônea tem sido a pr incipal
causada In to le rânc ia : e l la t em causado d i lú
vio de san gu e em tod as as se i ta s, esp enc ial-
'nente quando o Braço secular das Potestades
da Terra
se tem arro gad o a ving anç a da
que dizem ser a
Causa de D eos.
Os que se
persuadião es ta r na verdad e i ra R e l ig ião , e4ue os que a não seguião, erão inimigos do
5
-
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I>4'
A CO N ST IT UIÇÃ O MO RAL.
s eu C r e ad o r e da na do s á s uppV ic io s e t e r n os ,
p o r l ó g i c a e n d e m o n i a d a t i r a r ã o a d e sh u m a n u,
e i m p i a c o n c l u s ã o , q u e , e m d e s t r o i r e m , c o m t o
d o o g ê n e r o d e t o r m e n t o s , a t a e s d i s s id e n t e s ,
n a d a m a i s f a z i ã o do que , com o M i n i s t r o s do
A l t í s s i m o , a n t e c i p a r a l g u n s d i a s , m e z e s , ou
a n n o s ,
a se n te n ç a final, q ue de ve ser exe
c u t a d a p e l o s e s p í r i t o s i n f e r nae s . C om e s te
s o p h i s m a d i a b ó l ic o a
Intolerância Reciproca
d e R e l i g i o n i s t a s , t e m , á t o r m e n t o , f er ro , e
f o g o , ex e r c i do ho r r o r e s , com o s e f os sem con
v e n c i d o s d e ó d i o a o G ê n e r o H u m a n o .
N e r o e m R o m a m a n d o u q u e i m a r o s C h r i s
t ã o s n o s s e u s j a r d i n s , p o r m i l h a r e s , p a r a
o s i l l u m i n a r c o m t a e s a r c h o t e s : F r a n c is c o I.
R e i d a F r a n ç a i m i t o u o h o r r i d o e x e m p l o c o n t r a
os he re jes , e a t é os fo i ve r passeando á cava l -
l o , qu e rec uo u com os g r i t o s dos incend iados .
H u m d o s m a i o r e s L u m i n a r e s d a I g r e j a
C a t h o l i c a , S . A g o s t i n h o , q u e , a n t e s d a s u a
c o n v e r s ã o s e g u i a a h e r e z i a d o s M a n i c h ê o s ,
b e m ( m a s d e b a l d e ) a r g u i o a d e s h u m a n i d a d e
d os p e r s e g u i d o r e s d a s s e i ta s h e t e r o d o x a s , d i -
— - o » i — ' j
t r a b a l h o s e d e s c o b r e a v e r d a d e ; c o m q u a n t a
d i f i i cu ldad e se a l lu m ia o o lho do ho m em in
t e r i o r e s e e v i t ã o o s e r r o s ; c om q u a n t o s
s u s p i r o s e g e m i d o s s e p o d e a d q u i r i r , a i n d a e m
m u i p e q u e n a p a r t e , o c o n h e c i m e n t o d e D e o s . *
* Illi in vos saeviant qui nesciunt cum quo la bore vorum
inveniatur - et quam difficile caveantur errores ; — qui nesciunt
cum quan ta difficultate san etur oc-iluá interioris h om in is ; — qui
nesciunt, quibus suspirüs et gemitibus fiat, ut ex quantulacum-
que parte possit intelligi Deu s. — A ug us t.
contra Ep. Fund
n* 2. 3
-
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SUPPLEMENTO
35
O espir i to da Tolerância não deve se r
confundido com o orgulho da
Indiferença,
com
que os renegados de todas as Religiões af-
fectão sobe rano desdém p o r todo s os Credo s
Sy m bolo s , e Cu l tos ; e mu i to menos he com
pat ível com a arrog ân cia dos que , re q u er en
do tolerância absolu ta p ar a s i , seguem as
máximas dos que na Revolução da França ,
vangloriando-se de phi losophia ineredula , se
m o s t r a r ã o intolerantissimos da Rel igião Catho-
l ica , e com m et te rão sac ri lég ios e ho rro re s
cont ra os T em plo s , A l ta re s , e Ecc les ias ticos .
A taes scelerados esconjuro com as seguintes
reflexões do Antagonista dos Revolucionários
de tod os os pa izes , Edmund Burke:
" Os que procedera no verdadeiro espi-»
ri to de toler ânc ia , soffrem os sec tário s de to
das as RtJ ig iÕes , que não per turbão o Es tado ,
porque venerão e amão o
Grande Principio,
em que todas coneordão, e o
Grande objecto
á que toda s se dirigem : elles disc ern em , qu e
nós todos temos huma
Causa Comm um. „
" Os revolucionários prefe rirã o o atheism o
á qua lqu er fôrma de relig ião ; e o
atheismo
triumphante os destruía.
Ainda os fanáticos
de qua lque seita não se esqu ecem de t o do ,
que jus t iç a e m iser icórdia fazem pa rte s sub s-
tanciaes da religiã o. Os ím pios , p a r a faze--
rem prose ly tos , j amais se recommendaráÕ pe
las iniquidades e cruezas que pra t icarão no
fim do século décim o oitavo com os seu s
semelhantes , affectando ch am ad os
livres e
iguaes , pa ra os t r a ta r como escravos e
brutos. „
" He cousa espantosa ver aos novos Mes
tres da razão
co nt inuam ente jac tando -se de
seu espiri to de to ler ân ci a N ão ha nisso ^ma-
•J 11
-
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8 6 A C O N S T I T U I Ç Ã O M O l t ví
t e r i a d e m e r e c i m e n t o p a r a a s p e s s o a s q u e t o -
l e r ã o t o d a s a s o p i n i õ e s r e l i g i o s a s , e m r a z ã o
d e p e n s a r e m , q u e n e n h u m a h e d i g n a d e cs li -
m a ç a o . H u m d e s p r e z o i g u a l d e t o d a s a s o p i
n i õ e s e s e i t a s nã o vem a s e r hu m a ca nd u r a im
p a r c i a l . A e s p é c i e d e b e n e v o l ê n c i a , q u e n a sc e
d o d e s p r e z o n ã o h e v e r d a d e i r a c a r i d a d e . „
" A B as e d a ve rd ad e i r a r e l ig i ão cons i s t e .
e m e s t a r o c o r p o d o p o v o s e m p r e s e g u r o n a
i déa e p r á t i c a da obed i ênc i a á V on t ade do
E t e r n o S o be r an o do M un do , t e r con f ianç a
na s s u a s r ev e l a ç õ es , e a s p i r a r á i m i t a ç ã o de
s u as pe r f e i ç õ es . O s ho m ens s áb i o s nã o s ã o
v i o l e n t o s e m e o n d e m n a r a f r a q u e z a d o e n
t e n d e r h u m a n o .
A sabedoria não he o mais
secero censor da ignorância. As loucuras ri-
vaes são us que se fazem mutuamente impla
cável guerra ; e a qu e che ga a p r e do m i na r l o
g o s e p r e va l ece de s ua s va n t a ge ns p a r a pô r
no p a r t i d o de s u a s q ue r é l a s o s e s p i r i t o s vu l
g a r e s .
A o c o n t r a r i o , a p r u d ê n c i a h e h um
m e d i a d o r n e u t r o . , ,
F i n a l m e n t e c u m p r e a d v e r t i r , q u e n ã o a d -
m i t t e m t o l e r â n c i a a s c o u s a s a b s o l u t a m e n t e
i n t o l e r á v e i s , i s t o h e , publica irreligião, pu
blica apostazia, publica immoraliderde.
T a e s
e s c ân da l o s s ã o de pé s s i m os e ff eito s , t r a n s ce n
d e n t e s á t o d a c o m m u n i d a d e ; e , p e l o s e u c o n
t a g i o s o e x e m p l o , t em a q u a l i d a d e d o f e r m e n
t o venen os o , qu e , a i n da que pou co ,
corrompe
toda a massa. Os
que a s s i m v i o l ã o e de s p r e -
z a o a M o r a l P u b l i c a , s ã o p e i o r e s q u e Exco-
mundados vitandos.
A i n d a a s s i m , d e v e m o s t o m a r o C o n s e l h o
do A pós t o l o da s G en t e s . * — „ S e a l g ué m nã o
(*; S. Pau lo Ep. II. aos Thessallonicenses Ca p, III. V.14 15.
-
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SUPPLEMENTO
st
obedece ao que ordenamos pela nossa Carta
no tai-o , e nã o vos m istur eis com elle , afim
de que se envergonhe. — To davia não o con-
sidereis eomo inimigo,
m as
adverti-o como
vosso irmão. ,, * „ • , . .
O que tenho di to , he so como Moral is ta :
não sou Estadis ta pa ra en trar na E sp hé ra d a
Po lítica: só discordo dos qu e desejão impu
nidade de impiedade, inculcando a sua Moral
dos Interesses
contra os
Interesses da Moral.
.V,
C A P I T U L O . X I V .
Da Excellencia Moral.
Inguem he bom senão Deos: elle h e a
Sumtna B on dad e, e a
Sempiierna Virtude.
Assim o dic tão a razão, e a 'Revelação.
Todavia he hum dos deveres do homem
aspirar á Excellencia Moral pela cul tura do
espir i to , d ia a dia progredindo de vi r tude
em vi r tude , imi tando a Div ina Perfe ição , e
emulaudo ao que he melhor na conducta dos
q u e , mais rea l e ex tensamente , t em coope
rado ao
Bem da Sociedade;
no qu e con siste a
obediência á vo nta de de D eo s. Assim o ho
mem , que foi creado na justiça, e santidade
da verdade *
, supp osto decahisse mu i to do
seu original es tado, comtudo a inda pode
adqu irir a ex erc er as Boas Qualidades, que
constituem o
Bom Caracter.
Digo Bom Caracter, e não Perfeito Ca
racter, qu e exce de a faculdade e fortale za
* S. Paulo Ep. aoSj Esp hesio i C ap. I. e IV .
aos Philip-
penses Cap. IV.
-
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38
A CO NST IT UIÇÃO MO RAL .
humana , su je i tas á queda , quando vem a
hora da tentação.
O A pó sto lo da s G en tes nos deu as se-*
g u i n t e s r e g ra s :
, , Sed e im itad ore s d e Deos — Ningu ém vos
seduza com discursos vãos: porque por es tas
cousas vem a ira de Deos sobre os
filhos du
incredulidade. — A ndai como filhos da luz ;
po rq ue o fructo da luz consiste em bondade,
em j u s t iç a , em ve rda de . — N ão se ja is im
p ru d en te s , m as en tend e i qua l he a vontade
de D eos. — O fructo do es pi rito he a carida
d e , o g o z o , a pa c iên c ia , a benignidade , a
bo nd ad e , a l on gan im idad e , a mans Jão , a
fidelidade, a m o d é s ti a , a con tinên cia, a cas-
tid ad e. — N ão nos façamos cubiçosos da van
g lo ri a , prov ocand o huns aos ou tro s , tendo
inveja huns dos outros. „
" I rmãos , se a lgum, como homem, for
su rp re n d id o em algum d elicto , vós que sois
espir i tuaes , admoesta i -o em espir i to de man
sidã o : considere cada hum não seja também
ten tad o. — O Deos de g lo r ia , o Pai de nos
so Senhor Je su s C hr is to , vos dê o Espir i to
de sabedoria e de lu z , pa ra o con hecerd es:
p a ra qu e elle vos esclareç a , e os olhos do
voss o cor açã o , em a ordem á que conheçaes
qu al h e a espe ranç a á que elle vos chamou ,
e quaes as riquezas e a gloria da herança ,
que e l le prepara aos Santos; e qual he a
supr«ma g randeza do poder que el le exerci ta
em nós , os q ue crem os pela força to d a
poderosa de sua operação. „
" R equ eiro que não andeis j á co m o an -
dão também os gent ios , na vaidade do seu
sentido,
tendo o entendim ento obsc urecidq
de trevas, alienados da vida de Deos, pela^
-
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S U P P L E M E N T O 3 9
i g n o r â n c i a q u e h a n e l l e s , p e l a c e g u e i r a d o
c o r a ç ã o d os m e s m o s , q u e , d e s e s p e r a n d o , s e
e n t r e g a r ã o á d i s s o l uç ã o , e á ob r a de t od a ai m p u r e z a , e a v a r e z a . — R e n u n c i a n d o á m e n t i r a ,
c a d a h u m f alle á s e u p r ó x i m o a v e r d a d e .
po i s s oi s com o m em br o s hu ns . dos ou t r o s . —
N enhum a pa l av r a m á s a i a da vos s a bocea . „
" T o d a a a m a r g u r a , i r a , i n d i g n a ç ã o ,
g r i t a r i a , b l a s p h e m i a , c om t o d a a m a l í c i a ,
s eja d e s t e r r a d a . — S e d e r e c i p r o c a m e n t e b e n i g
n o s ,
m i s e r ic o r d io s o s , p e r d o a n d o m u t u a m e n t e ,
c om o D e o s e m C h r i s t o n o s p e r d o o u . — T u d o
o q u e h e v e r d a d e i r o , t u d o o q u e h e h o n e s t o ,
t u d o o q u e h e j u s t o , t u d o o q u e h e s a n t o ,
t udo que he de
boa fama,
s e h a a l g u m a f o r
tu n a , se ha a lgu m lou vo r de c os tu m es , i s to
s e ja o que oecupe o s vos s os pe ns am en t o s . „
O A p ó s t o l o S a n t i a g o n a s u a E p í s t o l a
C a t ho l i c a * t am bém deo a s s e gu i n t e s r e g r a s :
" A sab ed or ia qu e vem de c im a , he na
v e r d a d e c a s t a , p a c if ic a , m o d e r a d a , d ó c i l ,
suscep t íve l de todo o bem , che ia de m is e r i
c ó r d i a , e d e b o n s f r u e t o s , n ã o j u l g a , n ã o
he d i s s imulada .
B e m a v e n t u r a d o h e o h o m e m q u e s offr e
com p a c i ê n ci a a t e n t a ç ã o ; p o r q u e , d e p o i s q u e
e ll e t i ve r s ido p r o v a d o , r e c eb e r á a C o r oa da
v i d a , q u e D e o s t e m p r o m e t t i d o a o s q u e o
a m ã o .
,,
T o da a dád i v a op t i m a , t od o o dom p e r
f e i t o ,
vem lá de c i m a , e de s ce do Pai dçs
luzes.
" O qu e co n t em p l a r na L e i pe r f e i t a ,
q u e h e a d a l i b e r d a d e ( d a c u l p a ) e p e r s e v e -
r a r ne l la , s endo , n ã o ou v i n t e e s q ue ced i co ,
O Cap. III. Cap. IV . Cap. V.
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4 0 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
m as fazedor de obra es te se rá bem aventu ra -
do em seu feito ,,
" Se a lgu m cuida que tem r e l ig iã o , nÕo
refrea nd o a su a l ing ua , m as seduzindo o sen
c o ra ç ã o , a sua re l igião he vãa .
" Quem he en tr e vós ou tro s sábio e
ins t ru ído , m os tre pela boa conv ersação as
suas obras em
mansidão de sabedoria.
Mas
se tendes hum zelo amargo, e reinarem con
tendas em vossos corações , não vos glor ie is ,
nem seja is m en t i ro so s: po rq ue es ta não he
a sabedoria que vem lá do a l to; mas he
h u m a
sabedoria terrena, animal, diabólica.
" Ora
o fructo da justiça se semea em
paz por aquelles que fazem obras de pnz. ,,
"
Deos resiste aos soberbos, e dá a sua
gra->
ça aos humildes. „
*' N ão vós r es in tae s , I rm ã o s , huns con
t ra os outros , para que não se ja is julgados.
O lhai q ue o Ju iz es tá diante da po rta . — O
Senhor he Misericordioso e Compassivo.
" M eus Irm ão s , se a lgum d 'en tre vós
se ex t rav ia r da v e rd a d e , e a lgum ou t ro o
m et t e r a ca m in ho , deve sa b e r , que aquel le
que fizer converter a hum peccador do erro
do seu descam inho , sal va rá a sua alm a da
m o r te , e cu br i rá a m ul t idão dos peccados. „
í\
C A P I T U L O . X V .
Da Reforma dos Costumes.
OI sempre queixa dos Moral is tas a cor
rupção dos costumes, e a incorrigivcl derra-
vação dos povos, ainda os mais civi l izados.
Q ua nd o A ugu sto Cés ar fundou -• Imj erio
Romano , e ra t ão g rande a pe rve rs idade em
-
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SUPPLEMENTO
41
tod as as c lasses * , q«e o seu amigo Ho racio
em poesias populares tomou a l iberdade de
d iz er , que a geraç ão pre sen te era peior q ue
a dos pais e av oe ng os , e que logo d a n a
progenie mais viciosa
4 . ^
*
O Fu nda dor do Chris t ianismo veio entã o
como Luz do Mundo, e proclam ou a Consti
tuição Evangelicm, e Lei
d a
Gmça
, p ar a a
Regeneração da Humanidade.
Eis a
Constituição das Constituições
Sem
a sua ob serv ânc ia , deba lde se esp ere
refor
ma de costumes, e
em vão se proc lama, com
espec iosa pa rod ia , Regeneração Política.
Além disto he impossível que no Corpo
dos po vos ha ja refor m a de costum es^, sem
que os Governos bem estudem, e admit tao o l i
be ra l Sys tema Econômico , que subs t i tue con
venção á v io lênc ia ; pro inovão a ins t rucçao;
e deixem á cada indivíduo pôr o seu enge
nho e braço em com peteneia com qu alq ue r
out ro indiv íduo, e ordem de pessoas , sendo
livre á quem não offende as leis da j u s t i ç a ,
exercer a sua honesta indust r ia no que me
lhor souber e p o d er , e t roc ar em bo a fé o
fructo de seu t rab alh o. Só por es te ex pe di
ente he que pôde haver abundância dos nec-
cessarios e comm odos da v id a , qu e ( no ge
ral ) são os mais efficazes sedativos das pai
xões desordenadas . Com ext rema des igua lda
de de condições , e esq uall id a in di g en cia , h e
ínexterminavel a co rru pte la e m alfe itor ia .
(*) Veja-se a ho rrid a descripção do s péssimos co stume s
•dos Romanos, que S. Paulo faz no Cap. I. da sua Episto-
laa este povo.
(t ) Heior aetas pa re nt um
Tulit a«is nos nequiores,
Mox daturos progeniem vitiosiorem.
6
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4 2 A CONSTITUIÇÃO MORAL.
Assim o l ibera l Eco no m ista ( depois dos M i
nis t ros da Rel igião ) he o melhor auxi l iar do
Mo ra l i s t a .Nos pa izes onde , por desgraça da Hu
m an ida de , exis te a le i do ca t iv ei ro , a sua
gradua l abol ição , com c i rcunspec to prepara
tório da educação rel igiosa e civi l dos escra
vo s , he im pr eter ive l p a ra a reform a dos cos
tumes. Sobre tão difficil e delicado assump-
to não he prudente assoalhar a immoral idade
•notória , que i r remediavelmente resul ta deste
wiàl terrível,
introd uzid o pelos fundadores
das colônias d 'America . Ao Governo perten
ce d ar o ju st o patro cínio aos de condição
s e r v i l , con tra os enorm es abusos dos máos
« en h o re s, cuja au tho rid ad e lhes he confiada
só a fim da applicação dos servos ao traba
lho in disp ens áve l , e mo der ado , e pa ra a sua
discip l ina co rre cc ion al , e não tyr. nnica. Os
Governos Bri tannico e Americano já es tão dan
do o ex em plo da eq ui taí iv a policia á este res
p e i t o . Com taes pre curs ores , também os
B ra si le i r o s , sendo g enuínos C hris tãos e Cons-
t i tuc ionaes podem ser bons refo rm ad ore s , e
a p a g a r á nodoa da crueldad es de que j á em
pub l ico Se rm ã o , accusou aos nossos antep as
sados o bem int i tulad o
Apóstolo do Brasil.
*
(*) O celebrado Pregador Regio o Padre Antônio fita
ra. O Histo riador da Historia do Brasil , Roberto Southey
y
transcreve© para ce nsura e ignoniinia dos senhores crm is ,
a dss crip çã o d a tyran nia
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SUPPLEMENTO.
43
Finalmente a reforma dos costumes não
se pô de effeituar sem o bom exem plo dos pais
de família. E st a reflexão, q ue pare ce t r iv ia l ,
de facto he essencial á p u re za e exte nsã o da
Moral Publica. Peço venia aos Leitores para
lhes offerecer o segu inte ins tru ctiv o apó logo
de hum Phi losopho de grande nomeada do
século passado.
H
C A P I T U L O X V I .
Lobo Moralista.
Uum lobo quiz dar l ições de moral á
seu filho , e gr av ar- lhe na m em ória b ellos e
bons conselhos, pa ra que-fosse hum lobo h o
nesto . M eu filho , lhe disse elle , ne ste d e
ser to salvagem , á som bra das m atar ias p as -
sareis os vossos d ia s : po dere is com tu d o
com os pequenos ursos gostar dos prazeres
que se perm it tem á vossa id a d e : con tenta i -
vos do pouco , que eu vos colho : n ad a de
roubo; passa i huma v ida innocente : nada de
má companhia. Escolhei por amigos os mais
m a i s , lie o que -se Tende e compra, Oh trato deshumano ,
em que a mercancia são homens O h mercancia diabólica,
em que os interesses se tirão das almas alheias, e os riscos
são das próprias „ — Serm. V ieir. tom. VI .
" Que Theologia h a , ou pôde h av er , que justifique a
deshumanidade e sévicia dos exorbitantes castigos, com que
os escravos são maltratados