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Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008 177 8. Conclusão Geral do Relatório

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Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008 177

8. Conclusão Geral do Relatório

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8. Conclusão Geral do Relatório

8.1 Evolução Demográfica Recente da População Brasileira Segundo a Cor ou Raça

➢ Entre 1995 e 2006, a população residente no país (excetuando-se as áreas rurais da região Norte) aumentou 20,5%, com taxa mé-dia de crescimento geométrico de 1,33% ao ano. Analisando por grupos, ocorreu um crescimento de 1,26% ao ano da população branca e 1,38% da preta & parda.

➢ De 1995 a 2006, o peso relativo da população branca declinou. De 55,4%, em 1995, para 49,7%, em 2006, com um decréscimo de 5,7 pontos percentuais. Já a população preta & parda evoluiu em termos relativos, na população total, de 45%, para 49,5%, sinali-zando que poderá se tornar a maioria nos próximos anos.

➢ Esses dados reiteram as conclusões de Petruccelli (2002), que, em estudo sobre a declaração de cor ou raça no Censo de 2000, já apontara o aumento da proporção de pessoas que se declaravam pretas. Porém, este levantamento mostrou que tanto o percentual dos pretos, como o dos pardos, cresceram no período 1995-2006.

➢ O fato de a população autodeclarada branca não ser mais a maioria absoluta dos residentes possui significado histórico. A úl-tima vez que tal fato foi captado pelos órgãos oficiais de estatística foi em 1890, quando o censo realizado naquele ano informava que os brancos totalizavam cerca de 35% da população.

➢ O peso relativo de pretos & pardos que tinham entre 10 e 29 anos de idade, em 1995, era de 47,8%. Em 2006, este mesmo contingen-te, 11 anos mais velho, respondia por 50,4% da população total. Tal fenômeno parece expressar que a redução do peso relativo dos brancos na população brasileira refletiu tanto movimentos ocorri-dos no plano demográfico quanto reorientações recentes que vie-ram se dando no interior da sociedade brasileira, no que tange às formas de autopercepção da própria cor ou raça.

➢ Em 2006, a população branca, no Brasil, concentrava-se pri-mordialmente no Sul e no Sudeste, que, juntas, eram regiões de residência de 73% deste contingente. Os pretos & pardos residiam com mais intensidade no Nordeste (39,3%) e no Sudeste (34,6%). A população preta & parda era majoritária em três das cinco regiões geográficas brasileiras: Norte (75,4%), Nordeste (70,4%) e Centro-Oeste (56,2%). No Sudeste e Sul, o peso relativo dos pretos & par-dos era, respectivamente, de 40,2% e de 19,7%.

➢ O perfil da população preta & parda era mais jovem do que o da população branca. Em 2006, dos residentes pretos & pardos, 28,2% tinham até 14 anos de idade e 5,7% tinham mais de 65. Entre os brancos, os que tinham menos de 14 e mais de 65 anos de idade eram, respectivamente, 23,8% e 8,4%. Durante o período de 1995 a 2006, ocorreu um aumento da idade média dos brasileiros, o que

também se expressou em cada grupo de cor ou raça. A idade me-diana dos brancos era de 26 e passou para 30 anos de idade; e a dos pretos & pardos, passou de 21 para 26 anos de idade.

➢ Ao longo do período em análise, houve uma queda na taxa de fe-cundidade das mulheres brasileiras, medida pelo número de filhos por mulher em idade reprodutiva (15 a 49 anos). Em 1995, entre as brancas, era de 2,2 e, entre as pretas & pardas, de 3,0. Em 2005, este indicador passou para 1,88 entre as brancas (queda de 14,5%), e para 2,25, entre as pretas & pardas (queda de 25%). Com isso, a taxa de fecundidade das pretas & pardas, que era 33,3% superior à das brancas, tornou-se 19,7% maior. Vale frisar, também, que a taxa de fecundidade das mulheres brancas já se encontra abaixo da taxa de reposição populacional.

➢ A análise do padrão etário da fecundidade de mulheres pretas & pardas revelou a persistência do maior peso das faixas mais jovens (de 15 a 24 anos) nas taxas específicas, com 46,5% do total, em 2005. Entre as brancas, o mesmo indicador era de 38,4%. Esses indicadores sugerem uma incidência desigual em termos de cor ou raça de intervenções controlistas de desaceleração do crescimento populacional, feita principalmente através de esterilização. Tal hi-pótese é reforçada pelo fato de que, sendo um método definitivo, quanto mais jovens as mulheres se submeterem a fazê-la, mais jo-vem será o padrão da fecundidade (C. f. SIMÕES, 2006).

➢ No Brasil, de 1995 a 2005, a taxa de mortalidade infantil – até um ano de idade – declinou de 37,6 para 23,7 por mil nascidos vivos (que-da de 37%). Esse movimento se associou a uma queda das assimetrias de cor ou raça neste período. Entre o contingente branco, o indicador passou de 27,1 para 19,4 por mil nascidos vivos (queda de 28,4%). No caso dos pretos & pardos, a taxa de mortalidade infantil declinou de 47,3 para 24,4 por mil nascidos vivos (queda de 48,4%). Assim, a taxa de mortalidade infantil desse último grupo, que, em 1995, era 74,5% superior a dos brancos, tornou-se 25,8% maior, em 2006.

➢ A taxa de mortalidade na infância (até cinco anos de idade) dos brasileiros também declinou de 1995 a 2005: de 47,2 para 28,6 mil nascidos vivos. Entre as crianças brancas, a queda foi de 32,9 para 23,1 por mil nascidas vivas (redução de 30%). Já entre as pretas & pardas, foi de 60,6 para 29,4 por mil nascidas vivas (redução de 51,5%). Assim, essa desigualdade de cor ou raça no indicador pas-sou de 84,2% para 27,3%.

➢ A evolução positiva daqueles indicadores, inclusive em termos das assimetrias de cor ou raça, foi possível devido aos investimen-tos em saúde, sobretudo nas medicinas preventiva e curativa, além de saneamento básico, e, mais recentemente, o acompanhamento da gravidez, parto e puerpério. Vale salientar a especial incidência destas medidas nas regiões Norte e Nordeste, as mais pobres do país (C.f. SIMÕES, 2003). Aliados a esses fatores, a redução dos ní-veis de fecundidade também tiveram papel importante.

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8. Conclusão Geral do Relatório

➢ Apesar dos avanços recentes, os níveis de mortalidade ainda não são os desejáveis, sobretudo entre a população preta & par-da, o que é ainda mais grave no Nordeste e no Norte, onde mesmo os indicadores da população branca também são altos. Assim, no Brasil, as taxas de mortalidade infantil estão bem acima das regis-tradas em países da América Latina, como Cuba, com 6,1 óbitos por mil nascidos vivos; Chile, com oito; e Argentina, com 15. Fora do continente americano, o Japão, considerado o país com os me-nores níveis de mortalidade, apresentou, em 2005, uma taxa de 3,2 por mil nascidos vivos.

➢ A esperança de vida ao nascer da população brasileira, acompa-nhando as reduções observadas nas taxas de mortalidade infantil, também evoluíram positivamente entre 1995 e 2005. Entre os bra-sileiros em geral, de 68,2 para 72,5 anos. Em 1995, as esperanças de vida ao nascer dos brancos e dos pretos & pardos eram de, respec-tivamente, 71,5 e 65,9 anos. Em 2006, os mesmos indicadores eram de 74,9 e 71,7 anos. Assim, o hiato nas esperanças de vida ao nascer dos dois grupos, que era de 5,6 anos, passou para 3,2 anos.

➢ De 1995 a 2006, aumentou o percentual de uniões exogâmicas em todo o país. Entre as pessoas de referências do domicílio que eram brancas, em 6,2 pontos percentuais; entre as pretas, em 12,5; e, entre as pardas, em 3,9.

8.2 Perfil da Mortalidade da PopulaçãoBrasileira Segundo os Grupos de Cor ou Raça

➢ Em 2005, a razão de mortalidade por 100 mil habitantes da população branca era superior a da preta & parda, em ambos os sexos. Quando decomposta pelas causas de mortalidade selecio-nadas (grupos de causas do CID), entre os homens, as duas únicas nas quais a razão de mortalidade de pretos & pardos era superior a dos brancos eram nas causas externas (respectivamente, 124,7 e 107,3 óbitos por 100 mil habitantes) e nas mal definidas (esta, na verdade, uma falsa causa) (63,6 e 53,4).

➢ Quando decomposta por grupos etários, a razão de mortalidade por 100 mil habitantes de pretos & pardos era superior à dos bran-cos na faixa dos 10 aos 40 anos de idade. No caso das mulheres, a razão de mortalidade das pretas & pardas era superior à das bran-cas na faixa dos 25 aos 40 anos de idade. Esse comportamento está fortemente associado ao modo de incidência das mortalidades por causas externas nos dois contingentes e sua especial concentração entre os pretos & pardos de grupos etários mais jovens.

➢ Ao longo do capítulo, foi possível fundamentar a hipótese de que as subnotificações dos registros de mortalidade no SIM tendiam a incidir com mais intensidade sobre o contingente preto & pardo. Isso era causado pelo fato de este grupo ser a maioria nos segmentos populacionais nos quais o problema se apresentava de modo mais grave: estados das regiões Norte e Nordeste, crianças, população rural e contingente mais po-bre. Do mesmo modo, as causas de mortalidade mal definidas incidiam de forma mais intensa sobre os pretos & pardos. Por

esses motivos, a razão de mortalidade de pretos & pardos, de ambos os sexos, se apresentava tão freqüentemente inferior à dos brancos.

➢ A idade mediana dos óbitos de homens e mulheres pretos & pardos era inferior aos dos contingentes dos respectivos grupos de sexo em todas as causas de mortalidade que foram selecionadas.

➢ Em 2005, a principal causa de mortalidade dos homens brancos (29,3%), mulheres brancas (34,6%) e mulheres pretas & pardas (33,4%) eram as doenças do aparelho circulatório. Já entre os ho-mens pretos & pardos, a principal causa de mortalidade eram as causas externas (25%).

➢ No mesmo ano, as razões de mortalidade por 100 mil habitan-tes devido alguns tipos selecionados de doenças do aparelho cir-culatório (hipertensão, doenças do coração e cerebrovasculares) eram maiores entre os brancos do que entre os pretos & pardos, em ambos os sexos. Porém, no período de 2000 a 2005, as razões por aquelas causas entre os pretos & pardos, com uma única ex-ceção, cresceram mais do que entre os brancos. Sexo masculino: hipertensão (47,7%, pretos & pardos; 37,2%, brancos); doenças do coração (12,3% e 2,9%); doenças cerebrovasculares (9,2% e 2,2%). Sexo feminino: hipertensão (34,9%, pretas & pardas; 35,9%, brancas); doenças do coração (9,1% e 2,9%); doenças ce-rebrovasculares (6,2% e 5,6%).

➢ Também em 2005, 121.509 pessoas morreram por causas não naturais, das quais 48,8% eram pretas & pardas e 44,4%, bran-cas. Entre os homens brancos que morreram por esta causa, os motivos mais comuns foram os seguintes: acidentes de transpor-te, 32,7%; homicídios, 28,1%; outras causas não naturais 27,6%; suicídio, 8,6%; e acidentes de trabalho, 2,9%,. Entre os pretos & pardos: homicídios, 46,2%; acidentes de transporte, 24,2%; outras causas não naturais, 22,2%; suicídios, 5,4%; e acidentes de traba-lho, 1,8%. Mulheres brancas: outras causas não naturais, 41%; aci-dentes de transporte, 34,6%; homicídios, 14,4%; suicídios, 9,3; e acidentes de trabalho, 1%. Pretas & pardas: outras causas não na-turais, 33,4%; acidentes de transporte, 31,8%; homicídios, 25,3%; suicídios, 9%; e acidentes de trabalho, 0,5%.

➢ Entre 1999 e 2005, o número total de homicídios em todo o país passou de 40,8 mil para 45,7 mil pessoas por ano. O número de ho-micídios de pretos & pardos cresceu 46,3%, tendo passado de 18,8 mil para cerca de 27,5 mil. Entre os brancos, o número manteve-se estável, em 15,2 mil. O peso relativo de pretos & pardos na popula-ção assassinada cresceu de 46% para 60,2%.

➢ Entre 1999 e 2005, foram assassinadas, em todo o país, 317.587 pessoas, sendo 118.536 brancas (37,3%) e 172.626 pretas & pardas (54,4%). Neste período, foram cometidos 3,33 homicídios de pes-soas de cor ou raça preta & parda por hora. Entre os brancos a mé-dia foi 31% inferior, com 2,29 pessoas por hora.

➢ A razão de mortalidade por 100 mil habitantes decorrente de homicídios, entre 1999 e 2005, cresceu entre os homens pretos &

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pardos de 51,9 para 61,5 (18,4%). Entre os brancos, o indicador declinou de 35,8 para 33,8, ou 5,6%. Entre as mulheres pretas & pardas, o mesmo indicador passou de 4 para 4,4 (elevação de 10%), ao passo que, entre as brancas, de 3,3 para 3,5 (elevação de 6,1%).

➢ A incidência de homicídios entre a população jovem, especial-mente de 15 a 24 anos de idade, assumiu características de uma epidemia, mais uma vez, destacando-se sua importância entre os pretos & pardos do sexo masculino. Em 2005, a razão de mortali-dade por 100 mil habitantes por essa causa, na mesma faixa de ida-de, entre os homens pretos & pardos, foi de 134,22. Entre os jovens brancos, foi de 66,8 (menos da metade).

➢ De 2003 a 2005, assistiu-se a uma redução nas razões de mor-talidade por 100 mil habitantes por homicídios em todo o país. Porém, essa queda se deu com mais intensidade entre os homens brancos do que entre os pretos & pardos (queda nas razões de, respectivamente, 23,8% e 10,6%) e entre as mulheres brancas do que entre as pretas & pardas (de, respectivamente, 9,6% e 4,7%) (gráfico 3.8).

➢ A razão de mortalidade por 100 mil habitantes de homens pretos & pardos por armas de fogo foi, em 2005, de 45. Entre os homens brancos, de 24,2. No caso das mulheres, foram: pretas & pardas, 2,5; brancas, 1,8.

➢ A partir de todas essas informações, parece razoável a afirmação de que a violência, que tanto afeta a sociedade brasileira, principal-mente na elevada incidência de homicídios, apresenta um nítido componente de cor ou raça. Além disso, infelizmente, as recentes reduções nas taxas de homicídios não beneficiaram igualmente os contingentes branco e preto & pardo. Houve, portanto, um au-mento das desigualdades entre os dois grupos. A maior parte dos assassinatos no país, de 1999 a 2005, foi cometida por armas de fogo e foram observadas as tradicionais diferenças de cor ou raça e sexo. Novamente, os pretos & pardos foram as maiores vítimas.

➢ Existe uma associação entre essa realidade empírica e o Refe-rendo Sobre a Proibição da Comercialização de Armas de Fogo e Munição (Artigo 35, do Estatuto do Desarmamento), realizado em 2005, e cuja resposta “não” foi vitoriosa, com 65,3% dos votos. Na-quele momento, os defensores do “sim”, dentre tantos argumen-tos apresentados, acabaram deixando de lado essa desigualdade de incidências de assassinatos contra brancos e pretos & pardos. Ou seja, se é verdade que armas de fogo são feitas para matar (o argumento da proteção seria falho, pois esta e a prevenção contra a violência não exigem que cidadãos andem armados), no Brasil, esse tipo de instrumento é usado com mais freqüência contra vi-das negras. Enfim, a questão é: até que ponto a ocultação dessa questão contribuiu para esmorecer o poder de convencimento dos que lutavam contra o desarmamento?

➢ A razão de mortalidade por 100 mil habitantes por acidentes de transporte dos brancos superava a dos pretos & pardos, sendo tal realidade presente durante todo o período de 1999 a 2005. Assim, nesse último ano, as respectivas razões foram: 15,8 e 14,5. Porém,

quando são analisados os indicadores de óbitos por atropelamen-to, o quadro se inverte, sendo os pretos & pardos os mais vitima-dos. Em 2005, a razão de mortalidade desse grupo por essa causa foi de 5,5, ao passo que a dos brancos foi de 5,03, 8,5% inferior. Assim, para os brancos existem maiores probabilidades de serem atingidos na condição de motorista, carona ou passageiro. Já para os pretos & pardos, na de pedestre.

➢ A população branca no Brasil cometeu suicídio com mais fre-qüência que a preta & parda. Nos dois grupos de cor ou raça, os homens superaram as mulheres. Em 2005, a razão de mortalidade por 100 mil habitantes por suicídio foi: homens brancos, 9,03; ho-mens pretos & pardos, 6,13; mulheres brancas, 2,22; e mulheres pretas & pardas, 1,57. Porém, de 2000 a 2005, ocorreu um aumen-to maior na razão de mortalidade por suicídios entre os pretos & pardos do que entre os brancos: homens brancos, 11,5%; homens pretos & pardos, 27,4%; mulheres brancas, 15,6%; e mulheres pre-tas & pardas, 33,1%. As faixas de idade em que esses atos extremos foram cometidos também apresentaram diferenciações. Entre os homens e mulheres pretas & pardas, respectivamente, 65,3% e 70,4% os cometeram até os 40 anos de idade. Entre os homens e mulheres brancos essa faixa etária correspondia a, respectivamen-te, 50,3% e 53,2% do total de casos.

➢ Entre os anos de 1999 e 2005, quase 500 pessoas, em todo o país, morreram por overdose de drogas. Destas, 47,6% eram pretas & pardas, 38,4% eram brancas e 14,1% não tiveram a cor ou raça identificada.

➢ A tuberculose era uma doença que vitimava com mais inten-sidade pretos & pardos. Em 2005, a razão de mortalidade por 100 mil habitantes por essa doença foi: homens pretos & pardos, 4,4; homens brancos, 3,06; mulheres pretas & pardas, 1,7; e mulheres brancas, 1,0. Assim, a diferença dos pretos & pardos em relação aos brancos era de 43,8%, entre os homens, e de 70%, entre as mulhe-res. De 1999 a 2005, ocorreram reduções nas razões de mortalida-de por tuberculose. Entretanto isso se deu com mais intensidade entre os brancos (homens, 22,7% e mulheres, 16%), do que entre os pretos & pardos (homens, 6% e mulheres, 6,1%);

➢ Em 2005, em todo o país, a mortalidade por HIV/Aids vitimava mais os homens brancos do que qualquer outro grupo da popula-ção. Assim, as razões de mortalidade por 100 mil habitantes por esta causa foram: homens brancos, 9,7; homens pretos & pardos, 7,0; mulheres brancas, 4,0; e mulheres pretas & pardas, 3,92. Po-rém, de 1999 a 2005, ocorreu um crescimento mais intenso dessa mortalidade entre os pretos & pardos do que entre os brancos: ho-mens brancos, 0,7%; homens pretos & pardos, 20,4%; mulheres brancas, 27,7%; e mulheres pretas & pardas, 44,1%.

➢ Na análise das mortalidades por doenças de incidências típicas sobre a população mais pobre, em todo o país, em 2005, verificou-se que em números absolutos os brancos foram mais afetados por hepatite viral (65,8%) e febres virais (55,6%). Os homens brancos formaram o grupo modal de mortalidade por leptospirose (39,7%) e as mulheres brancas, por infecções intestinais (28,2%). Já os pre-

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tos & pardos corresponderam à maioria absoluta de óbitos por ma-lária (60,6%), hanseníase (58,3%), leishmaniose (58,1%), esquis-tossomose (55,5%) e difteria (50%). Os homens pretos & pardos constituíram o grupo modal de mortes por tétano (35,9%), doença de Chagas (26,4%) e dengue (26,1%).

➢ Durante 1999 e 2005, a razão de mortalidade por 100 mil ha-bitantes por gravidez, parto ou puerpério das mulheres pretas & pardas manteve-se superior à das brancas. Neste último ano, as respectivas razões foram 2,19 e 1,27. Com isso, as pretas & pardas, proporcionalmente, morriam desta causa com uma intensidade 72,4% superior. Em 2000, essa mesma diferença era de 43,2%, o que implica que as diferenças se aprofundaram desde então. Essa mesma assimetria também era encontrada em todas as faixas etá-rias selecionadas: 10 a 14 anos, 80%; 15 a 17, 64%; 18 a 24, 71,8%; 25 a 40, 56,9%; e 41 a 60, 102,9%.

➢ Na base de dados do SIM foi possível localizar algumas cau-sas de mortes específicas por gravidez, parto ou puerpério que sugeriram terem sido geradas por práticas abortivas às margens dos marcos legais atualmente vigentes. De 1999 a 2005, foram 565 casos, sendo que as mulheres pretas & pardas formaram a maio-ria absoluta, com 50,6%. O restante dividiu-se entre as mulheres brancas, com 34,7%, e de outras cores ou raças (amarelas e indíge-nas) ou ignorada, com 14,7%. Assim, parece que essa prática, res-trita pela legislação brasileira, poderia ser analisada à luz destas informações, pois seriam as mulheres pretas & pardas as maiores vítimas dos abortos ilegais, muitas vezes realizados em condições bastante precárias.

➢ Também se constatou que as razões de mortalidade por 100 mil habitantes por causas mal definidas foram maiores entre os pretos & pardos do que entre os brancos. Ao se aprofundar a aná-lise, observou-se que o motivo dessa diferença era decorrente das causas mal definidas sem assistência médica. Em 2005, as razões de mortalidade por essa falsa causa foram: homens pretos & par-dos, 32,5; homens brancos, 19,5; mulheres pretas & pardas, 24,0; mulheres brancas, 14,2. Assim, a diferença entre pretos & pardos e brancos: homens, 66,7%; mulheres, 69%. Destes dados pode-se depreender que a falta de atendimento médico afeta mais os pretos & pardos. Tal constatação empírica sugere uma reflexão sobre o próprio SUS e o modo pelo qual suas deficiências provocam im-pactos diferentes nos grupos de cor ou raça. Assim, parece que a efetivação do preceito constitucional da Seguridade Social, de que a saúde é um direito de todos, requer uma atenção especial, sob o risco de dificilmente ocorrer, para o que acontece com população preta & parda – afinal, o contingente com maiores probabilidades de ser excluído desse sistema. Em outras palavras: as políticas de inclusão para os afro-descendentes no sistema de saúde brasileiro, mais do que um foco desse raio de ação do poder público, parece ser uma das vias mais eficazes para sua efetiva universalização.

➢ Entre 1999 e 2005, morreram, em todo o país, 1.406 pessoas por anemia falciforme. Destas, 62,3% foram pessoas identificadas como pretas & pardas. Também se verificou que a mortalidades causada por anemia falciforme cresceu 46,1% no período. Entre

os pretos & pardos, 119,4%; entre os brancos, 46,4%. Essa evo-lução pode estar relacionada a um efetivo aumento da incidência na população, como também às campanhas de conscientização promovidas por autoridades da área de saúde ou por ativistas do Movimento Negro, que assim teriam tornado mais comum a iden-tificação da doença.

➢ Os homens brancos morreram em maior número do que os pretos & pardos por doenças alcoólicas do fígado. De 1999 a 2005, respectivamente, morreram por esta causa 22.376 e 14.782 pessoas deste grupo de sexo. Porém, quando foi analisado o grupo femini-no, o sentido da assimetria se alterou, sendo maior o número de mulheres pretas & pardas do que o de mulheres brancas mortas pela mesma razão. Assim, no mesmo período, faleceram por do-enças alcoólicas do fígado 2.649 mulheres pretas & pardas e 2.277 brancas. Em 2005, a razão de mortalidade por 100 mil habitantes dos homens brancos, por essa causa, era 24,9% superior à dos pre-tos & pardos. Porém, no caso das mulheres, a razão de mortalidade das pretas & pardas era 36,9% superior à das brancas.

➢ Em relação à evolução dos indicadores dos respectivos grupos de cor ou raça, cabe uma última ressalva válida para o conjunto dos dados analisados. A exemplo do verificado com a mortalidade por anemia falciforme, não se pode dizer que o sentido geral do aprofundamento das desigualdades, observado em diversos indi-cadores de mortalidade, seja decorrente da evolução, por si só, das incidências das mortalidades na população e seus distintos con-tingentes (refletindo, então, reduções desiguais da qualidade de vida dos diferentes grupos). É preciso apontar que tal movimento também pode ter sido conseqüência de melhorias nos sistemas de coleta da informação, incluindo sua derivação para os diferentes grupos de cor ou raça e sexo, que, assim, teriam passado a eviden-ciar mais aspectos da realidade, já existente, do que um aprofunda-mento das assimetrias. Ainda que seja uma questão formal – pois, em ambos os casos, aponta-se diferenças de cor ou raça de algum modo existentes –, é de grande importância, especialmente, quan-do se tem em vista um estudo das tendências de longo prazo dos indicadores de mortalidade. Por enquanto, na falta de capacidade de se dar uma resposta plena a essa indagação, o que se pode indi-car é: se de fato os indicadores de mortalidade de brancos e pretos & pardos diversas vezes evoluíram em direções divergentes e com intensidades desiguais, os motivos de tais comportamentos preci-sariam ser melhor estudados, inclusive à luz de outros indicadores da área da saúde.

➢ Os indicadores de mortalidade estudados ao longo do capítulo 3 não esgotam a gama de questões potencialmente sugeridas pe-los dados do SIM. Aqui foram selecionadas determinadas causas de mortalidade por sua relevância social, sabendo-se de antemão que algumas de forte impacto na população foram pouco ou se-quer mencionados (por exemplo, neoplasias, afecções do período perinatal, transtornos mentais e comportamentais, entre outras). Também é evidente que a população branca é especialmente vi-timada por determinadas causas de mortalidade específicas, as quais devem merecer, igualmente, cuidadosa atenção por parte das autoridades do setor. O que se espera, portanto, é que esses da-

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8. Conclusão Geral do Relatório

dos possam ajudar no esclarecimento de aspectos dessa realidade, bem como na definição dos investimentos e medidas no setor da saúde, de modo que, um dia, acabem as diferenças de cor ou raça, seja no ato de morrer, seja no contínuo ato de viver.

8.3 Desigualdades de Cor ou Raça no Acesso ao Sistema de Ensino

➢ Em todo o Brasil, em 2006, havia 14,4 milhões de analfabetos, com 15 anos de idade ou mais. Desse total, 4,6 milhões eram bran-cos (32%) e 9,7 milhões pretos & pardos (67,4%). De 1995 a 2006, descontando-se o contingente que residia nas áreas rurais da re-gião Norte, ocorreu uma queda de 24,7% no número de analfabe-tos em todo o país. A redução proporcional entre os brancos foi de 22,8% e, entre os pretos & pardos, de 24,8%.

➢ Comparando-se os índices de analfabetismo das pessoas com 15 anos de idade ou mais, nos anos de 1995 e 2006, houve, também, uma redução na diferença entre as taxas de analfabetismo entre o grupo de pretos & pardos e o grupo de brancos. No primeiro gru-po, o índice passou de 23,5% para 14,6% e, no segundo, de 9,6% para 6,5%. Porém, em 2006, a diferença ainda era bem acentuada: o analfabetismo de pretos & pardos era, proporcionalmente, supe-rior em 124,6% ao dos brancos.

➢ Em relação às taxas de alfabetização funcional – definidas pelo número de pessoas com mais de quatro anos de estudos completos – das pessoas acima de 15 anos de idade, de 1995 a 2006, em todo o país, houve um avanço de nove pontos percentuais entre as pes-soas brancas (de 74,2% para 83,2%) e de 16,8 pontos percentuais entre as pretas & pardas (de 54,3% para 71,1%). Mostrando uma tendência de redução dessas desigualdades.

➢ De 1995 a 2006, na população maior de 15 anos, ocorreu, entre os brancos, um aumento de 1,6 anos de estudo (passou de 6,4 para 8,0) e, entre os pretos & pardos, de 1,9 anos de estudo (passou de 4,3 para 6,2). Assim, no ano de 2006, a média de escolaridade dos pretos & pardos ainda não chegava ao nível fundamental completo.

➢ Ocorreu, entre 1995 e 2006, uma pequena redução na diferença entre os números médios das pessoas brancas acima de 15 anos em relação às pretas & pardas da mesma faixa etária: de 2,1 para 1,8 ano de estudo. Assim, a taxa média de crescimento anual do número de anos de escolaridade foi de 1,03 entre os brancos e de 1,06 entre os pretos & pardos. Porém, a queda nas diferenças entre os dois grupos vem ocorrendo a passos muito lentos. Mantido esse ritmo, essas desigualdades não cessariam em menos de 17 anos.

➢ Confirmou-se que as mulheres vêm estudando mais que os ho-mens, sendo tal realidade presente em ambos os grupos de cor ou raça. Em 1995, na população acima de 15 anos de idade, os anos mé-dios de estudos dos contingentes eram: homens brancos, 6,4 anos de estudo; mulheres brancas, 6,4; homens pretos & pardos, 4,1; e mu-lheres pretas & pardas, 4,4. Em 2006, os mesmos indicadores haviam avançado, respectivamente, para 7,9; 8,1; 6,0 e 6,4 anos de estudo.

➢ No período de 1995 a 2006, as taxas de escolarização das mu-lheres, aferidas por uma série de indicadores, foram superiores às dos homens em ambos os grupos de cor ou raça. Esse movimento é um reflexo das alterações comportamentais e políticas da socieda-de brasileira nas últimas décadas. Fato que provocou uma alteração dos papéis tradicionais exercidos pelos dois grupos de gênero e levou as mulheres para espaços sociais distintos – como as salas de aula, por exemplo – em detrimento da esfera da reprodução doméstica. Porém, os avanços de gênero referentes aos avanços das médias de escolaridade da mulher estão longe de acabar com antigos estigmas sociais. Ainda é muito freqüente a dicotomia entre a esfera domés-tica e a do mundo do trabalho, gerando neste último, quase sempre, uma incompatibilidade entre a qualificação obtida e os rendimentos obtidos. Tal problema se apresenta com especial gravidade para as mulheres pretas & pardas. Essa questão foi vista com detalhes no ca-pítulo 5, dedicado ao estudo da dinâmica do mercado de trabalho.

➢ Entre as crianças de quatro a seis anos, a taxa de cobertura do sistema escolar (creche, pré-escola e escola seriada), entre 1995 e 2006, saltou de 56,3% para 78,4%, no grupo das brancas, e de 50,5% para 74%, no das pretas & pardas.

➢ No mesmo período, para as crianças de sete a 14 anos de idade, com a quase universalização do sistema de ensino para esta faixa etária, as desigualdades raciais praticamente terminaram. Nesta faixa de idade, a cobertura do sistema de ensino, passou, no caso das crianças brancas, de 94,6% para 98,8%, e no das crianças pre-tas & pardas, de 88,2% para 97,7%.

➢ Entre os jovens de 15 a 17 anos de idade, as taxas de cober-tura do sistema de ensino evoluíram da seguinte forma: entre os brancos, passou de 71%, em 1995, para 85,1%, em 2006, e, entre os pretos & pardos, de 62% para 79,6%. Lido de outro modo, desse contingente etário, naquele último ano, 14,9% dos brancos e 20,4% dos pretos & pardos estavam fora da escola.

➢ De 1995 a 2006, a taxa bruta de escolaridade no ensino funda-mental, em todo o país, passou de 117,7% para 114,3% no contingen-te de cor ou raça branca e de 109% para 121,9%, no de cor ou raça preta & parda. Assim, esse indicador foi um dos poucos nos quais as condições dos pretos & pardos, eram superiores as dos brancos. Esse indicador revela, assim, o inédito ingresso em massa de pretos & pardos no sistema de ensino. Mas reflete a presença de uma par-cela razoável, dessa população, em idades acima da adequada aos respectivos níveis de ensino e em proporção maior do que entre as pessoas brancas que também freqüentavam a escola.

➢ No ensino fundamental houve um movimento convergente das taxas líquidas de escolaridade entre ambos os grupos de cor ou raça. Assim, em 1995, a taxa era de 90,2% entre as crianças brancas e de 80,8% entre as pretas & pardas. Onze anos depois, o mesmo indicador, entre as brancas, subiu para 95,8% e, entre as pretas & pardas, para 94,3%.

➢ A taxa líquida de escolaridade no ensino médio também apre-sentou aumentos no período, com redução de desigualdades en-

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8. Conclusão Geral do Relatório

tre ambos os contingentes naquele mesmo período de onze anos. Entre os jovens brancos, passou de 32,6% para 59,1% (aumento de 81,3% da cobertura de ensino) e, entre os pretos & pardos, mais que triplicou, saltando de 12,1% para 37,8%. De qualquer maneira, deve ser frisado que, entre os brancos, 40,9%, e, entre os pretos & pardos, 62,2% dos jovens, entre 15 e 17 anos, não freqüentavam escola ou o faziam de modo incompatível com o o nível de ensino esperado.

➢ No primeiro ciclo do nível fundamental (sete a 10 anos de ida-de), as taxas de adequação ao sistema de ensino, em 1995, eram de 52,5% entre os brancos e 30,7% entre os pretos & pardos. Em 2006, passaram para, respectivamente, 62,2% e 52,3%. Ou seja, ocor-reu uma redução significativa das diferenças, mas a situação das crianças pretas & pardas era, praticamente, a mesma das brancas 11 anos antes. Desses dados também se pode ver que pouco mais da metade das crianças preta & pardas, de sete a 10 anos, estudava na série correta.

➢ Em 2006, nem metade das crianças brasileiras, de 11 a 14 anos, freqüentava a escola na série esperada, mesmo entre as brancas. Todavia, ainda era pior a situação das pretas & pardas, das quais somente um terço estava na série correta.

➢ No ensino médio, de 1995 a 2006, as taxas de adequação por parte da população entre 15 e 17 anos também cresceram, mas permaneceram baixas. Assim, entre os jovens brancos, passou de 17,7% para 37,4%. No caso dos jovens pretos & pardos, esse indica-dor saltou de irrisórios 4,9% para 19,3%.

➢ De 1995 a 2006, no primeiro ciclo do nível fundamental, em todo o país, a taxa de eficiência do sistema de ensino passou de 50,2% para 70,2%, na população branca, e de 26,5% para 57,9%, na preta & parda. Assim, no fim do período, 47,1% da população preta & parda no primeiro ciclo apresentava defasagem escolar, enquanto entre os brancos esse percentual era de 29,8%.

➢ De 1995 a 2006, a taxa de eficiência no segundo ciclo do nível fundamental passou de 38,2% para 56,9%, entre as crianças bran-cas e, de 19,2% para 38,5%, entre as pretas & pardas. Assim, em 2006, do total de estudantes da quinta à oitava série do ensino fun-damental, 43,1% dos brancos tinham idade superior à esperada e isso ocorria com mais de 60% dos pretos & pardos.

➢ No ensino médio, a taxa de eficiência, de 1995 a 2006, aumentou de 35% para 48,2%, entre os brancos e, de 17,3% para 29%, entre os pretos & pardos. Assim, em termos relativos, as desigualdades de cor ou raça diminuíram no período. Entretanto, em 2006, o nú-mero de estudantes em idade superior à esperada superava 70% do total entre os pretos & pardos, enquanto que a mesma defasagem afetava 51,8% dos brancos.

➢ Na análise comparativa das notas dos exames do Saeb, observa-se que, em todas as séries, em ambos os sexos e em todos os anos de aplicação das provas, os estudantes brancos obtiveram resultados superiores aos dos pretos & pardos. Assim, em 2003, no exame de

matemática, as notas dos alunos brancos foram 7,5%, 7,4% e 8% mais altas que as dos pretos & pardos, respectivamente, na quarta série do ensino fundamental, na oitava e no terceiro ano do ensino médio. Já entre as alunas, no mesmo ano, as brancas obtiveram notas superiores às pretas & pardas no exame de matemática em 7%, 9,3% e 23%, respectivamente, na quarta série do ensino fun-damental, nas mesmas séries.

➢ Ainda no mesmo ano, as diferenças se mantiveram no exame de português. Assim, as notas médias dos estudantes brancos foram su-periores às dos pretos & pardos em 7,5%, 7,4% e 5,5%, respectivamen-te nas mesmas séries. Já entre as alunas, no mesmo exame, as brancas também obtiveram notas médias maiores em 5,4%, 7,2% e 7,3%.

➢ A análise da evolução do nível de proficiência de crianças e jovens brancas e pretas & pardas, em ambos os sexos, nas provas de mate-mática e de português do Saeb, de 1995 a 2003, também revela um dado preocupante. Com a única exceção do resultado obtido pelas brancas do terceiro ano do ensino médio na prova de matemática (cuja nota média aumentou 1,1%), em todos os casos ocorreram re-duções das notas médias em 2003, em comparação com 1995.

➢ Da leitura dos indicadores gerados pelo Saeb, entre 1995 e 2003, se vê que o sistema brasileiro de ensino combinou a forte expansão das vagas com a perda correspondente de qualidade. Nesse caso, o sentido geral dos indicadores sobre as desigualdades de cor ou raça foi antes de preservação do que de sua redução. Enfim, essa questão está associada tanto a problemas de oferta (baixa capacitação dos professores no plano pedagógico e de conhecimentos de conteúdo de ensino, além de más condições de sala de aula e da escola no seu conjunto), como de demanda (proveniente da vinda massiva de es-tudantes portando os mais variados problemas sociais e familiares para o sistema escolar). Porém, apresentou incidência desigual entre as crianças e jovens dos distintos grupos de cor ou raça, com especial perda para as pretas & pardas. Isso sugere que para as crianças e adolescentes deste último grupo de cor ou raça incidem obstáculos adicionais para o desenvolvimento dos estudos, representados pela discriminação racial presente nos espaços escolares e que se mani-festa de diferentes formas: atitudes discriminatórias de professores, demais profissionais do ensino e colegas; livros didáticos que trans-mitem conteúdos preconceituosos ou que reforçam a invisibilidade dos negros; conteúdo de ensino antropocêntrico e pouco receptivo à perspectiva da diversidade e do multiculturalismo, etc.

➢ Entre os anos de 1995 e de 2006, aumentou, em todo o país, o número de estudantes que freqüentavam o ensino superior: de 1.993.418, em 1995, para 5.872.940, em 2006. No mesmo período, o número total de estudantes universitários de cor ou raça branca pas-sou de 1,50 milhões para 4,03 milhões em todo o país. O resultado foi um saldo líquido de ingresso nas universidades de 2,53 milhões de pessoas (crescimento de 168,3%). Destas, 41,6% eram do sexo mas-culino e 58,4%% do sexo feminino. Entre o contingente de cor ou raça preta & parda, o número de estudantes no ensino superior pas-sou de 341,24 mil, em 1995, para 1,76 milhões, em 2006, resultando em um saldo de 1,42 milhões de pessoas (crescimento de 415,0%). Destas, 41,7%, eram do sexo masculino e 58,3% do sexo feminino.

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Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008 185

8. Conclusão Geral do Relatório

➢ De 2002 a 2006, observa-se que, entre as pessoas brancas, houve um aumento de 17,4% no número de estudantes das universida-des públicas e de 31,1% nas universidades particulares. No mesmo período, entre o contingente preto & pardo, ocorreu um aumento de freqüência de 31,4% no sistema de ensino público e de 124,5% no privado. O peso de pretos & pardos no ensino superior brasi-leiro também aumentou em termos relativos. Em 1995, 18,1% do total de universitários eram deste contingente, tendo esse índice aumentado para 29,9%, em 2006. Ainda que não tenha sido o fato exclusivo, deve-se observar que essa elevação se deu dentro do contexto da adoção de medidas de inclusão de pretos & pardos nas instituições de ensino superior, tal como foram o caso das cotas, nas públicas, e do Prouni e do Fies, nas particulares.

➢ Ao longo de 1995 e 2006, a taxa bruta de escolaridade no ensino superior da população branca passou de 13,1% para 30,7%. Já na população preta & parda passou de irrisórios 3,3%, em 1995, para 12,1%, em 2006. A taxa líquida de escolaridade no ensino superior, entre 1995 e 2006, passou de 9,2% para 19,5%, entre a população branca e, de 2% para 6,3%, entre a preta & parda. No período, a taxa líquida de escolaridade no ensino superior duplicou entre os brancos e triplicou entre os pretos & pardos. Contudo, em 2006, do total de jovens brancos com idade esperada para ingressar no ensino superior, um em cada cinco estava na universidade. Já entre os jovens pretos & pardos desta mesma faixa etária, mais de 93,7% estavam fora da universidade, fosse ela pública ou privada. Assim, a taxa líquida de escolaridade deles, em 2006, ainda era inferior à mesma taxa observada, em 1995, entre os jovens brancos.

➢ A evolução dos indicadores de escolaridade dos respectivos grupos de cor ou raça e sexo mostram que a expansão do sistema de ensino para toda a população brasileira teve capacidade de re-duzir, ainda que parcialmente, as desigualdades entre ambos os contingentes. Entretanto, se é bem verdade que as políticas públi-cas para a área da educação, em um período recente, contribuíram para a redução das desigualdades de cor ou raça, é preciso também saber de que modo isso aconteceu e quais são as suas limitações. Se por um lado os indicadores educacionais dos pretos & pardos ca-minharam positivamente nos últimos anos – e em um ritmo mais acelerado do que os indicadores da população branca –, por outro lado, essa evolução se deu em um contexto no qual o ponto de par-tida de pretos & pardos era, francamente, inferior ao dos brancos.

➢ Não se trata de retirar o mérito dos avanços observados, mas, sim, de ponderá-los dentro da perspectiva do muito que ainda tem de ser alcançado. As distâncias ainda são muito grandes, a despeito da re-dução recente das assimetrias. Do mesmo modo, existem razoáveis motivos para se desconfiar da manutenção do ritmo de crescimento dos indicadores de escolaridade de pretos & pardos no futuro, sem que sejam enfrentados os demais motivos que atuam no sentido da exclusão das crianças e jovens negros dos espaços escolares. Esses elementos podem ser sintetizados em: etnocentrismo e discrimina-ção racial. Esses vetores operam por múltiplos mecanismos, mais ou menos visíveis, mas inequivocamente contribuem para o bai-xo desempenho escolar das pessoas daquele grupo de cor ou raça. Medidas recentes que vieram sendo adotadas, como a Lei 10.639,

podem contribuir positivamente, mas tais aspectos não aparentam estar ocupando um papel de maior destaque na agenda dos atuais formuladores de políticas públicas na educação.

8.4 Desigualdades de Cor ou Raça na Dinâmica do Mercado de Trabalho

➢ De 1995 a 2006, a PEA brasileira, descontando a população resi-dente nas áreas rurais da região Norte, apresentou um saldo líqui-do de ingresso de 20,6 milhões de pessoas. Quando se considera os grupos de cor ou raça, observa-se que, entre os brancos, este saldo líquido foi de 7,7 milhões de pessoas, ao passo que, entre os pretos & pardos, de 12,6 milhões de pessoas. Observando aquela evolução em números absolutos, desagregada por sexo, vê-se que as maiores responsáveis por aquele saldo foram as mulheres, que contribuí-ram com 56,4% do crescimento da PEA ocupada. As mulheres pre-tas & pardas, sozinhas, levaram mais 6,4 milhões de pessoas para o mercado de trabalho. Os homens pretos & pardos responderam pelo incremento líquido de 6,3 milhões de pessoas. Entre os ho-mens e mulheres brancos, o acréscimo líqüido, entre 1995 e 2006, foi de, respectivamente, 2,6 e 5,1 milhões de pessoas.

➢ No mesmo período, entre os homens, a PEA preta & parda, em números absolutos de trabalhadores, superou a branca. Assim, em 2006, o número total de ocupados e desocupados pretos & pardos totalizava 25,7 milhões, ao passo que os brancos, 25,6 milhões de pessoas. No caso das mulheres, a PEA branca superava a PEA preta & parda em 2,59 milhões de trabalhadoras.

➢ De 1995 a 2006, as taxas de participação no mercado de traba-lho das mulheres brancas e pretas & pardas cresceram, respectiva-mente, 7,0 e 4,4 pontos percentuais. Já entre os homens brancos e pretos & pardos, os idênticos indicadores declinaram, respectiva-mente: 1,4 e 2,2 pontos percentuais.

➢ A PEA ocupada em todo país, excetuando-se os residentes nas áreas rurais da região Norte, obteve saldo líqüido de 20,6 milhões de pessoas, de 1995 a 2006. Quando desagregada por cor ou raça e sexo, as maiores evoluções proporcionais se deram entre as mulheres: 27,1%, entre as brancas, e 42,7%, entre as pretas & pardas. Já na PEA masculina, a evolução relativa do número de ocupados foi de 10,2%, entre os homens brancos, e de 30,0%, entre os pretos & pardos. No total, o número de ocupados cresceu proporcionalmente, no perío-do, em 17,1%, entre os brancos, e 34,9%, entre os pretos & pardos.

➢ De 1995 a 2006, a taxa de atividade da população branca passou de 60,3% para 61,3%, ao passo que, no contingente preto & pardo, de-clinou de 59,5%, para 56,7%. Na população masculina, a taxa recuou 2,6 pontos percentuais entre os brancos e 5,9 entre os pretos & pardos. Na feminina, ao contrário, ocorreram elevações: entre as brancas, 4,4 pontos percentuais e, entre as pretas & pardas, 0,1 ponto percentual.

➢ Naquele mesmo período, da população branca ocupada, acima de 10 anos de idade, no mercado de trabalho, o peso relativo dos que apresentavam, no máximo, o primeiro ciclo do ensino fundamental

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8. Conclusão Geral do Relatório

incompleto declinou de 22,4% para 11,8%, enquanto entre os de cor ou raça preta & parda, de 45,6% para 25,6%. Entre os ocupados no mercado de trabalho com pelo menos o ensino médio completo, no contingente branco, a proporção passou de 27,6% para 48,2%, ao passo que entre os pretos & pardos, de 12,0% para 28,1%. Assim, a proporção de pretos & pardos ocupados, com pelo menos o ensino médio completo, em 2006, equivalia à situação dos brancos 11 anos antes, em 1995. Do mesmo modo, apesar de ter praticamente dobra-do o percentual de ocupados pretos & pardos com nível superior – de 1,9%, em 1995, para 3,7%, em 2006 –, o peso dos diplomados com este nível de instrução, comparativamente à distribuição dos ocupa-dos brancos por nível de instrução – de 13,5% neste caso –, corres-pondia a menos de um terço que o dos brancos.

➢ Quando se analisa o perfil da população masculina branca ocu-pada, percebe-se que, em 2006, as principais modalidades de posi-ções ocupacionais eram: o emprego privado com carteira assinada junto com o funcionalismo público & militares, 45,7%; o emprego por conta-própria, 23,4%; o emprego privado sem carteira, 17,2%; a condição de empregador, 6,9%; e as ocupações não remunera-das, 3,6%. Já para a PEA branca ocupada do sexo feminino, as principais modalidades eram: emprego assalariado com carteira e funcionalismo público & militares, 42,9%; emprego sem carteira assinada, 13,5%; emprego por conta-própria, 13,3%; emprego do-méstico, 12,9%; e ocupação não remunerada, 7,4%.

➢ Na PEA ocupada preta & parda do sexo masculino, as mais im-portantes posições ocupacionais, em 2006, eram: empregados com carteira assinada junto com funcionários públicos & militares, 37,6%; trabalhadores por conta-própria, 24,7%; empregado sem carteira, 25,2%; e ocupação não remunerada, 5,7%. Neste contingente, o em-prego doméstico respondia por 1,1% da PEA ocupada e a condição de empregador por 2,5%. Já na PEA preta & parda do sexo feminino, os pesos relativos eram: assalariadas com carteira em conjunto com funcionárias públicas & militares, 29,5%; emprego doméstico, 21,8%; trabalhadoras por conta-própria, 16,3%; ocupação não remunerada, 8,7%; e atividades para o próprio consumo, 10,1%. A condição de empregadora correspondia à situação de 1,4% da PEA preta & parda: 1,1% com até cinco empregados e 0,3% com mais de cinco.

➢ A condição assalariada com carteira assinada era mais comum: entre os trabalhadores brancos (36,8%) do que entre os pretos & pardos (28,5%); entre os homens brancos (39,8%) do que os pretos & pardos (33%); e entre as brancas (33%) do que entre as pretas & pardas (22%). O emprego assalariado sem carteira assinada era mais comum: aos homens pretos & pardos (25,2%) do que aos brancos (17,2%). Entre as mulheres, o percentual de pretas & pardas assalariadas sem carteira (14,2%) era ligeiramente supe-rior aos das brancas na mesma condição (13,5%). O emprego de funcionário público ou militar era pouco mais comum às mulhe-res brancas (9,9%) do que às pretas & pardas (7,5%) e aos homens brancos (5,9%) do que aos pretos & pardos (4,6%).

➢ O peso relativo do emprego sem carteira assinada na PEA ocu-pada assalariada, nos setores público e privado, era de 25,8% para a branca, sendo de 27,3% e de 23,9% para as PEAs masculina e

feminina, respectivamente. Entre a PEA preta & parda assalaria-da nos setores público e privado, o peso relativo dos empregados sem carteira assinada era de 37,6%. Decompondo por sexo, o peso correspondia a 40,1% da masculina e 32,5% da feminina. Assim, enquanto a presença relativa de pessoas brancas equivalia a 57,1% dos empregados privados com carteira e 57,8% do funcionalismo público, os pretos & pardos correspondiam a 55,5% dos emprega-dos sem carteira assinada.

➢ O emprego doméstico ocupava mais mulheres do que homens e mais pretas & pardas do que brancas. Assim, das pretas & pardas, 21,8% trabalhavam como empregadas domésticas. A probabilidade de se encontrar uma mulher branca como tal era 8,9 pontos percen-tuais inferior do que a de uma preta & parda. Entre os empregados domésticos pretos & pardos, a ausência da carteira assinada engloba-va 63,6% dos homens, 76,1% das mulheres e 75,8% do total ocupados desta forma. Entre os brancos que eram empregados domésticos, cor-respondiam a esta situação 57,1% dos homens, 69,8% das mulheres e 68,9% do total. No contingente de empregados domésticos com car-teira assinada, 53,8% eram pretos & pardos. No total de empregados domésticos sem carteira assinada, o peso dos homens pretos & pardos alcançava 3,3% e o das mulheres do mesmo grupo, 58,2%.

➢ O emprego doméstico parece uma ocupação especialmente aber-ta para a mão-de-obra feminina preta & parda, englobando, deste grupo, uma em cada cinco ocupadas no mercado de trabalho. Para piorar, tal qual uma ação afirmativa às inversas, para as empregadas domésticas, ao contrário das demais categorias profissionais, não é assegurado o direito ao recebimento do FGTS e do seguro-desem-prego. Na verdade, propostas recentes de extensão destes direitos, para esta categoria profissional, receberam ora resistências, ora a complacência velada, de amplos espectros ideológicos da socieda-de brasileira. O argumento utilizado é comumente baseado na falta de capacidade das famílias de classes médias para o pagamento de remunerações mais condignas e demais benefícios sociais. Poucas vozes se levantaram para lembrar que em países com maior desen-volvimento social, o emprego doméstico fixo (não confundir com o emprego doméstico na qualidade de diarista) é uma modalidade, praticamente, inexistente. Isto, justamente, pelo elevado valor da força de trabalho naqueles locais. O desenvolvimento da sociedade brasileira é incompatível com a própria existência do emprego do-méstico tal qual se dá hoje no país. Não há motivo para que uma par-cela tão significativa da força de trabalho feminina, composta tão es-pecialmente por mulheres pretas & pardas, tenha que se direcionar para uma atividade tão precária e pouco prestigiada.

➢ O trabalho por conta-própria era relativamente comum, tanto en-tre brancos (19,8%) como entre os pretos & pardos (21,2%). Com a diferença de que este trabalho com diploma de ensino superior, em-bora pouco freqüente, era cinco vezes mais provável entre os brancos (2%) do que entre os pretos & pardos (0,4%). Entre os trabalhadores autônomos: enquanto 10,1% dos brancos possuíam nível superior, isso só ocorria com 1,9% dos pretos & pardos. Ainda que o diploma não garanta atuação profissional na respectiva formação, não deixa de ser um indicativo sobre as diferentes probabilidades de vínculo com o mercado de trabalho como autônomos profissionais liberais.

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8. Conclusão Geral do Relatório

Dessa forma, entre os trabalhadores por conta-própria com ensino superior completo, 80,7% eram brancos. Já entre os sem ensino su-perior completo, 52,3% eram pretos & pardos.

➢ A condição de empregador era pouco comum em ambos os gru-pos de cor ou raça e sexo. Todavia, na PEA ocupada preta & parda esse percentual era ainda menor: 2,5%, entre os homens e 1,4%, entre as mulheres. Com mais de cinco empregados, então, essas pro-porções caiam para 0,5% dos homens e 0,3% das mulheres. Na PEA branca ocupada, a condição de empregador era de 6,9%, entre os ho-mens, e de 3,8%, entre as mulheres. Com mais de cinco empregados, respectivamente, 2,2% e 1%. Dos empregadores, o peso dos que em-pregavam mais de cinco funcionários era de 30,4%, entre brancos, e de 20%, entre os pretos & pardos. Do sexo masculino: 31,9%, entre os brancos, e de 20%, entre os pretos & pardos. Das empregadoras, 26,3%, entre as brancas, e 21,4%, entre as pretas & pardas. O peso relativo do grupo de cor ou raça branca nos empregadores com até cinco empregados era de 69,8% e, entre os empregadores com mais de cinco, de 80,9% (58,8% eram homens brancos).

➢ O trabalho para o consumo próprio era quase seis vezes mais co-mum para uma mulher preta & parda (8,1%) do que para um homem branco (1,4%). Um homem preto & pardo tinha uma probabilidade de viver com atividades de subsistência (2,5%) em uma proporção 1,78 vezes superior a um branco igualmente ocupado. A ocupação não remunerada era mais comum entre as mulheres do que entre os homens. No caso das pretas & pardas, a probabilidade de se encon-trarem nessa condição era de 8,7% e das brancas, de 7,4%. Na PEA masculina, o percentual de não remunerados era de 5,7%, entre os pretos & pardos, e de 3,6%, entre os brancos.

➢ No somatório das demais posições na ocupação informal – construção para benefício próprio, produção para consumo pró-prio e ocupações não remuneradas –, o peso relativo na PEA preta & parda era de 12%, e na branca, de 8%. Entre as mulheres pretas & pardas, estas modalidades respondiam por 16,8% das formas de ocupação. Entre as brancas, essa proporção era de 11,6%. En-tre os homens brancos e pretos & pardos, essas formas atípicas de trabalho respondiam por, respectivamente, 5,1% e 8,5%. Assim, o peso relativo dos trabalhadores pretos & pardos era de 66,1% em atividades de construção para uso próprio (55,7% eram homens), de 63,2% entre os trabalhadores de subsistência e de 55,3% entre os trabalhadores não remunerados.

➢ De 1995 a 2006, em todo o país, ocorreu um incremento líqüido de 3,6 milhões de pessoas no número total desocupados. A grande con-tribuição para este saldo foi da população feminina, com 68,4% deste total. Com a desagregação por cor ou raça e sexo, os pretos & pardos correspondiam a 60,4% daquele incremento, sendo 22,2% de homens e 40,2% de mulheres. A PEA branca desocupada, por sua vez, contri-buiu com 38,3%, divididos em 9,8% de homens e 28,5% de mulheres.

➢ Em 2006, 54,1% do total de desocupados eram pretos & pardos, sendo 23,9% de homens e 30,8% de mulheres. Em 1995, os pretos & pardos correspondiam a 48,6% do total (25,3% eram homens e 23,3% eram mulheres).

➢ De 1995 a 2006, as taxas de desocupação da PEA preta & par-da cresceram em um ritmo proporcionalmente mais acentuado do que as da branca. Assim, no período, a taxa cresceu 0,8 ponto percentual entre os homens brancos, ao passo que entre os pretos & pardos, 1,5 ponto percentual. No contingente do sexo feminino, entre as brancas, a taxa cresceu 3,1 pontos percentuais. Já entre as pretas & pardas, 4,5 pontos percentuais. Ou seja, neste último caso, mais de cinco vezes superior ao crescimento ocorrido entre os homens brancos. Finalmente, na comparação da média de am-bos os grupos, a taxa de desocupação entre os brancos passou de 5,8% para 7,7% e a dos pretos & pardos, de 6,2%, para 8,7%.

➢ Em 2006, o rendimento médio mensal real do trabalho prin-cipal dos homens brancos em todo o país equivalia a R$ 1.164,00. Esse valor, no mesmo ano, era 56,3% superior à mesma remunera-ção obtida pelas mulheres brancas (R$ 744,71); 98,5% superior à auferida pelos homens pretos & pardos (R$ 586,26) e 200% à rece-bida pelas mulheres pretas & pardas.

➢ De 1995 a 2006, as desigualdades de cor ou raça e sexo, em ter-mos de rendimentos, diminuíram paulatinamente. Assim, a dife-rença entre homens brancos e pretos e & pardos caiu de 120,1% para 98,5%. No contingente feminino, a redução foi de 107,8%, para 91,8%. Finalmente, de 1995 a 2006, as assimetrias de rendi-mentos entre brancos e pretos & pardos, de ambos os sexos, caiu de 113,9% para 93,3%.

➢ Tal movimento se deu na contramão da evolução das taxas de desocupação entre os distintos contingentes. Isso leva à hipótese de que fatores institucionais, como as políticas de valorização do salário mínimo no período, podem ter atenuado os efeitos de outra variável no mercado de trabalho, que levaria a uma compressão dos rendimentos. De fato, o valor do salário mínimo obedeceu a um movimento positivo no período – valorização em termos reais de 63%, de maio de 1994 a maio de 2007 –, o que pode ter gerado efeitos sobre as camadas da população ocupada relativamente pior remuneradas, especialmente as vinculadas ao setor informal. Nes-se caso, é importante lembrar que os pretos & pardos são os que mais comumente se encontram nesta situação.

➢ Entre 1995 e 2006, a diferença dos rendimentos médios dos 10% mais ricos e os dos 10% mais pobres entre os brancos passou, de 38,5, para 36,1 vezes, enquanto que entre os pretos & pardos, de 32,9, para 31 vezes. Entre os brancos, a diferença dos 20% mais ricos para os 20% mais pobres passou de 19,8 para 14,6 vezes. Já entre os pretos & pardos, de 15,2 para 12,7 vezes.

➢ A decomposição dos decis de rendimento da PEA ocupada, se-gundo a remuneração do trabalho principal também revelam im-portantes aspectos das desigualdades de cor ou raça e sexo existentes no Brasil. Assim, no ano de 1995, ao passo que os homens e mulheres pretos & pardos respondiam, relativamente, por 67,5% do contin-gente de ocupados do primeiro decil de rendimento (mais pobre), no interior do 10º decil de rendimento (mais rico) seu peso relativo caia para 17,3%. No ano de 2006, esse cenário passou por certa me-lhoria, ao menos comparado com onze anos antes. Assim, naquele

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8. Conclusão Geral do Relatório

momento, o peso relativo de homens e mulheres pretos & pardos no primeiro decil de rendimento, de 2006, passou para 66,9%, ao passo que no 10º decil de rendimento passou para 21,4%.

➢ Quando se analisa, especificamente, a situação das mulheres pretas & pardas, essas, em 1995, respondiam por 35,3% do con-tingente que recebia um nível de remuneração próprio ao primei-ro decil de rendimento. Já no ano de 2006, essa proporção havia permanecido, praticamente, estável (35,5%). No outro extremo, ou seja no 10º decil de rendimento, a presença relativa das mulheres pretas & pardas correspondia a, apenas, 3,5% do total de trabalha-dores naquela condição, tendo avançado positivamente, no ano de 2006, para 5,5%. De qualquer maneira, apesar desta evolução po-sitiva, sua intensidade não foi suficiente para se afirmar tratar-se, decisivamente, de uma nova tendência de reversão deste quadro.

➢ Entre as crianças de cinco a nove anos, a taxa de participação das brancas passou de 2,4%, em 1995, para 1,1%, em 2006 (queda de 54,2%). Já entre as pretas & pardas, de 4,0%, para 1,7% (queda de 57,5%). Todavia, o peso relativo das crianças pretas & pardas praticamente permaneceu constante, com ligeira elevação de 63%, para 64,4%. Entre as pessoas de 10 a 14 anos, a taxa de partici-pação no mercado de trabalho, entre os brancos, passou de 17,3% para 9,0%, ao passo que, entre os pretos & pardos, caiu, propor-cionalmente, de 23,5% para 12,2%. O peso relativo de jovens pre-tos & pardos deste intervalo etário no contingente trabalhador do mesmo grupo de idade, aumentou, proporcionalmente, de 58,1% para 60,6%. Na faixa dos 15 aos 17 anos, as taxas dos brancos de-clinaram de 48,7% para 37,4%. Entre os pretos & pardos, as mes-mas taxas caíram de 53,3% para 41,2%. O peso relativo dos jovens pretos & pardos, no contingente total de pessoas desta faixa etária, que participavam do mercado de trabalho, passou de 52,4%, em 1995, para 55,3%, em 2006.

➢ No conjunto da PEA branca, o peso relativo dos que contribu-íam para a Previdência Social passou de 48,0%, em 1995, para 52,2%, em 2006. Já na PEA preta & parda, no mesmo período, a proporção de contribuintes passou de 31,0% para 36,8%. Quando este indicador é visto de modo desagregado pelos grupos de sexo, na PEA masculina branca e na preta & parda, o percentual de con-tribuintes para a Previdência Social, no mesmo ano, era de, respec-tivamente, 54,2% e 38,8%. Já na PEA do sexo feminino, o percen-tual era de 49,9%, entre as brancas, e de 34,1%, entre as pretas & pardas. Ou seja, a PEA feminina preta & parda constituía o grupo de trabalhadores com maior dificuldade de contribuição à Previ-dência Social, o que, em outras palavras, significa que 65% do total deste contingente de mulheres trabalhadoras não tinha acesso a nenhuma forma de proteção assistencial por parte do Estado.

➢ Entre 1995 e 2006, entre os idosos brancos, a proporção de be-neficiários da Previdência Social avançou positivamente, de 75,7% para 78,2%, ao passo que, entre os pretos & pardos, declinou, de 76,4% para 74,9%. Talvez, essa evolução denote que as alterações que vieram sendo promovidas no Regime Geral da Previdência So-cial, desde 1998, com a Emenda Constitucional nº 20/98 que, para fins de aposentadoria, alterou o princípio do tempo de serviço pelo

do tempo de contribuição, possam ter tido efeitos negativos do ponto de vista das assimetrias de cor ou raça.

➢ Para que amplos segmentos da população possam usufruir da cobertura do sistema previdenciário, torna-se exigível a combina-ção de diversas medidas. São necessários, por exemplo: o incre-mento da formalização das relações empregatícias, maior rigor na fiscalização dos empregadores contratantes de empregados à mar-gem da legislação (especialmente no meio rural, onde o peso rela-tivo dos pretos & pardos no interior da categoria dos assalariados é significativa), e uma profunda desburocratização das exigências para legalização das micro e pequenas empresas. Além disso, é importante a geração de estratégias de combate à discriminação no mercado de trabalho, bem como a adoção de políticas de ação afirmativa por parte das empresas dos setores público e privado, tanto na contratação e posterior evolução profissional, como na aquisição de produtos e serviços de empresas dirigidas por empre-endedores afro-descendentes.

➢ Sobre a mesma questão, cabe citar que as assimetrias nas es-peranças de vida ao nascer dentre brancos e pretos & pardos, por mais que tenham se reduzido ao longo do período de 1995 a 2005, não deixam de formar um traço perverso do sistema previdenciá-rio brasileiro. Isto ocorre porque diferentes expectativas de sobre-vida implicam em diferentes prazos de efetivo gozo dos benefícios, além da incidência desse indicador (tempo de sobrevida na idade específica) no fator previdenciário quando do cálculo dos benefí-cios dos aposentados. Dessa forma, é verdade que se a idade média dos aposentados brancos e pretos & pardos, em 2006, eram iguais, quando se analisa a dos pensionistas, os brancos apresentavam média etária quatro anos superior à dos pretos & pardos. Assim, dada a inviabilidade prática da incorporação deste fenômeno no interior do sistema previdenciário, somente a completa igualação das esperanças de vida ao nascer dos grupos de cor ou raça, em todo o país, poderá sanar esse problema.

➢ Em termos gerais, após um período de declínio de sua qualida-de, o mercado de trabalho brasileiro, após o período de 2000 a 2006, caminhou no sentido de uma certa melhoria, com efeitos positivos sobre as desigualdades de cor ou raça. Isso foi permitido pelos se-guintes fatores já mencionados: I) contexto especialmente favorável da economia mundial, que terminou por animar o ritmo de ativida-de econômica no espaço doméstico; II) a já comentada política de revalorização do poder de compra do salário mínimo; III) políticas de transferência de rendimentos como, por exemplo, os programas Bolsa Família e Bolsa Escola, que aumentaram o poder de compra das camadas mais pobres da população e, por conseguinte, dos pre-tos & pardos; IV) políticas de expansão do crédito para as famílias de classe média e baixa, ampliando seu poder de compra; V) evolu-ção positiva da escolaridade média da PEA ocupada, que contribuiu para o aumento dos níveis médios de remuneração.

➢ Vale apontar que o tema das assimetrias de cor ou raça pode ser debatido à luz da evolução do conjunto de circunstâncias mencio-nadas acima. Se é verdade que o núcleo essencial das iniqüidades de cor ou raça vem a ser o racismo e a discriminação racial, isso

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8. Conclusão Geral do Relatório

não pode ser sinônimo de se ignorar os efeitos que aquelas políti-cas econômicas, ou o desenvolvimento da economia, podem trazer para o estágio daquelas desigualdades. Ou seja, os diferentes con-textos de evolução do ritmo da atividade econômica e as diferen-tes políticas sociais, necessariamente, trarão, de um modo ou de outro, efeitos mais ou menos positivos ou negativos sobre as desi-gualdades de cor ou raça.

➢ A adoção das políticas de ação afirmativa no mercado de traba-lho em prol da eqüidade racial (incluindo a perspectiva de gênero), podem encontrar um meio circundante mais ou menos favorável para potencializar aquelas medidas. Assim, um modelo de desen-volvimento pró-eqüidade racial (ou um modelo de crescimento pró-afro-descendente), poderia ser gerado através da combinação de medidas específicas de promoção da eqüidade e da constituição de um ambiente global favorável para que tal perspectiva se con-solide e se expanda. Assumir esta reflexão implica reportar o tema das desigualdades de cor ou raça não apenas ao plano das distintas opções de políticas sociais, como igualmente à questão dos dife-rentes modelos de desenvolvimento econômico.

8.5 Condições Materiais de Vida dos Grupos de Cor ou Raça

➢ Em 2006, a desagregação dos decis de rendimento domiciliar per capita da população brasileira, segundo os grupos de cor ou raça dos decis de rendimento médio domiciliar per capita, revela que a popu-lação branca aumentava sua presença relativa nos decis superiores, enquanto a preta & parda registrava maior presença relativa nos decis inferiores, portanto, nos mais pobres. Desse modo, em todo o Brasil, os brancos totalizavam 26,5% de pessoas no primeiro de-cil frente aos 73% dos pretos & pardos. Neste último contingente, 23,5 pontos percentuais superior à sua presença na população como um todo. Já o 10° decil era composto, majoritariamente, por brancos (78%), sendo o peso relativo dos pretos & pardos igual a 20,4%, 29,1 pontos percentuais inferior à sua presença na população total.

➢ Em 2006, 8% da população branca e 18,8% da população pre-ta & parda encontravam-se abaixo da Linha de Indigência. Vale ressaltar que, de 1995 a 2006, a proporção da população brasilei-ra abaixo da Linha de Indigência veio paulatinamente diminuin-do para ambos os contingentes de cor ou raça. Neste período, o percentual de indigentes decresceu 3,5 pontos percentuais entre a população branca e 9,5 pontos percentuais entre a preta & par-da. Representando, assim, um encurtamento das assimetrias; de 16,8 pontos percentuais, em 1995, para 10,9 pontos percentuais, em 2006. No ano de 1995, 32,9% dos indivíduos indigentes eram brancos e 66,7% eram pretos & pardos. Em 2006, os brancos eram 29,6% e os pretos & pardos, 69,8% da população em situ-ação de pobreza absoluta. Portanto, no período de 1995 a 2006, houve um aumento de 3,1 pontos percentuais na participação re-lativa dos pretos & pardos entre a população abaixo da Linha de Indigência. Esse movimento, aparentemente contraditório, está reportado às mudanças da composição de cor ou raça da popula-ção brasileira neste período tal como visto no segundo capítulo.

➢ Em 2006, em todo o país, 43,6% dos indivíduos pretos & pardos e 21,6% dos indivíduos brancos encontravam-se abaixo da Linha de Pobreza. Entre os brancos, a diminuição foi de 6,3 pontos per-centuais em termos relativos, com queda de 22,6%. Entre os pretos & pardos, foi de 11 pontos percentuais, com queda de 20,3%. Ou seja, houve uma redução de 4,7 pontos percentuais das diferenças de cor ou raça. Entre 1995 e 2006, também houve um aumento da participação relativa dos pretos & pardos na população abaixo da Linha de Pobreza, de 4,7 pontos percentuais. No ano de 1995, a po-pulação abaixo da Linha de Pobreza era composta por 61,4% de pretos & pardos e, em 2006, por 66,1% deste grupo. Mais uma vez, o que explica esses movimentos aparentemente contraditórios são as alterações observadas nos pesos relativos dos diferentes grupos de cor ou raça no seio da população brasileira no período.

➢ No ano de 2004, 11,6% dos domicílios cuja pessoa de referên-cia era branca e 25,1% dos domicílios cuja pessoa de referência era preta & parda receberam algum benefício monetário, a título de políticas de combate à pobreza e à fome. Já em 2006, a proporção destes beneficiados correspondia a 11,4%, entre os brancos, e a 26%, entre os pretos & pardos.

➢ Em 2006, os percentuais de domicílios cuja pessoa de referência era preta & parda e que recebia algum tipo de benefício de transfe-rência governamental de rendimentos eram: Bolsa-Família, 21,7%; outros programas sociais do governo, 2,9%; BPC-Loas, 2,8%; e Peti, 0,7%. Entre os lares cuja pessoa de referência era branca estes percentuais eram: Bolsa-Família, 8,7%; outros programas sociais do governo, 1,6%; BPC-Loas, 1,7%; e Peti, 0,3%.

➢ A distribuição dos domicílios beneficiários dos programas governamentais de transferência de rendimentos, segundo a cor ou raça da pessoa de referência, pelas cinco regiões do país, revela que o Nordeste era a região modal para ambos os grupos. Toda-via, a distribuição não se apresentava rigorosamente idêntica para brancos e pretos & pardos. No caso desse último grupo, dos lares beneficiados por este tipo de auxílio financeiro, 55,2% ficavam no Nordeste, 22,3%, no Sudeste e 11,1%, no Norte, ficando os 11,3% restantes nas regiões Centro-Oeste e Sul. No caso da população branca, o peso relativo de domicílios beneficiários de algum pro-grama governamental de transferência de rendimentos dentro das cinco regiões era: Nordeste, 37,7%; Sudeste, 31,3%; Sul, 18%; e os demais 13,1%, distribuídos entre as regiões Centro-Oeste e Norte.

➢ A composição de cor ou raça da pessoa de referência, do total de domicílios beneficiados por algum programa governamental de transferência de rendimentos, mostrou que a maioria dos que recebiam o auxílio eram pretos & pardos. Isto aconteceu tanto em 2004, com 64,6%, como em 2006, com 67,6%. Nesse último ano, a presença relativa dos domicílios referenciados por pretos & pardos na população beneficiária desses programas eram: Bolsa-Família, 69,4%; Peti, 68,3%; outros programas sociais do governo, 62,8%; e BPC-Loas, 59,9%.

➢ No que tange ao rendimento médio domiciliar per capita, em coerência com o modo de distribuição dos benefícios entre os gru-

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8. Conclusão Geral do Relatório

pos de cor ou raça, percebe-se que as políticas governamentais de transferências de rendimentos contribuíram, em todo o país, em 2006, para a redução das assimetrias, entre os grupos, em 15,4%. No interior das cinco regiões brasileiras, a contribuição dessas políticas para a queda nas desigualdades dos rendimentos médios domiciliares per capita, entre indivíduos de cor ou raça branca e preta & parda, foi de: Norte, 31,9%; Nordeste, 25,8%; Centro-Oes-te, 14,2%; Sul, 12,3%; e Sudeste, 10,8%.

➢ Em todo o Brasil, no ano de 2006, as transferências de rendimen-tos não se traduziram em grandes contribuições para a redução do percentual de pessoas abaixo da Linha de Pobreza. A queda do núme-ro relativo de pobres foi de 3,1 pontos percentuais entre os brancos e de 5,6 pontos percentuais entre os pretos & pardos. Todavia, quando se observa os efeitos das políticas de transferências governamentais de rendimentos sobre o percentual da população abaixo da Linha de Indigência, percebe-se que as alterações foram, positivamente, mais significativas entre pretos & pardos. Com as transferências, houve uma estimada queda do número relativo de indigentes entre brancos e pretos & pardos de, respectivamente, 5,4 e 12 pontos percentuais. Nas grandes regiões, os efeitos destas políticas de governo sobre o percentual de pobres e indigentes, invariavelmente, beneficiou, com mais intensidade, os pretos & pardos.

➢ Ficou evidente que as políticas de garantia de renda míni-ma tiveram na população preta & parda um público-alvo es-pecial, com franca maioria entre os beneficiados. Assim, por mais que se possa argumentar que tal conclusão é óbvia, posto que são justamente os pretos & pardos os mais afetados pela carência material e, naturalmente, devem ser os primeiros atendidos pelas ações de transferência de rendimentos, esta lógica nem sempre se fez presente na história das políticas so-ciais no Brasil. Tradicionalmente, a falta de visão sobre as de-mandas e problemas dos afro-descendentes, quase sempre, os excluiu das ações, mesmo quando eram os maiores portadores das carências. Talvez, o ocorrido ao longo do século XX com o sistema educacional seja o mais perfeito exemplo dessa exclu-são. Portanto, o fato de as atuais políticas de transferências de rendimentos tomarem os pretos & pardos como o público mais importante não é de menor relevância.

➢ Contudo, por mais relevantes que tenham sido aquelas medidas, também se torna necessário apontar seus riscos. É impossível não se observar que a maior parte das políticas de transferências governa-mentais de rendimentos e do público beneficiado não possui caráter legal ou constitucional. Ao contrário, por exemplo, da BPC-Loas, ga-rantida pela Constituição e que não depende do governo ou do arranjo de forças partidárias que detenham o poder para que sejam usufru-ídas pelos beneficiários. Infelizmente, não é o caso do Bolsa-Família ou assemelhados, dependentes de decisões políticas e de previsões orçamentárias que podem não se manter. Não é difícil calcular a dose de incerteza dos beneficiários de uma linha de ação que poderá ser retirada ou mantida dependendo de cada contexto político ou econô-mico. Ou, o que seria pior, o uso dessa incerteza como mecanismo de preservação de uma relação de dependência da sociedade perante o Estado. O cidadão, já completamente desprovido da capacidade de cri-

ticar e agir politicamente, se tornaria um indefeso cliente do arranjo de forças partidárias estabelecido a cada contexto.

➢ Assim, por mais benéficas que tenham sido, no curto e médio pra-zos, as políticas governamentais de transferência de rendimentos, é fundamental que estas sejam regulamentadas, com plena definição dos critérios de destinação e de mecanismos de dotação de maior capacidade empreendedora dos beneficiários, gerando alternati-vas econômica e socialmente sustentáveis no futuro. Neste mesmo rumo, as ações de empoderamento da população afro-descendente seriam fundamentais. Caso contrário, ficará embutido neste tipo de política, especialmente para a população negra, o risco de uma troca perversa: da indigência e pobreza materiais para a indigência e po-breza políticas.

➢ Em 2005, o IDH dos pretos & pardos (0,753) era equivalente ao que ficava entre o Irã e o Paraguai, na 95° posição do ranking mundial. Já o IDH dos brancos (0,838) correspondia ao de Cuba, na 51° posição. O IDH dos pretos & pardos, em 2005, correspondia ao de um país de médio desenvolvimento humano, 25 posições abaixo da posição brasileira no ranking do Pnud. Já os brancos, no mesmo ano, apareciam com um IDH equivalente ao de um país de alto desenvolvimento humano, 19 posições acima da mesma colocação brasileira. Por conseguinte, o IDH de ambos os grupos estava separado 44 posições no ranking do PNUD.

➢ Entre 1995 e 2005, os IDHs de brancos e de pretos & pardos avançaram positivamente em ritmos diferenciados, tendo se redu-zido as distâncias que separavam ambos os grupos. Naquele pri-meiro ano, o IDH da população branca era igual a 0,800, ou seja, alto. De 1995 a 2005, o IDH do grupo branco, no Brasil, cresceu 4,8%. No caso do contingente preto & pardo, o IDH, em 1995, era igual a 0,680, passando para um valor acima de 0,700, em 1998. Entre 1995 e 2005, o IDH dos brasileiros pretos & pardos cresceu 10,7%, portanto, 5,9 pontos percentuais acima do ocorrido com o contingente branco. Por esse motivo, as distâncias entre os dois grupos, medidos pelo ranking do IDH dos países do PNUD decli-nou vinte posições, entre 1997 e 2005.

➢ De acordo com a Pnad 2006, em todo o país, 95,9% dos do-micílios referenciados por brancos contavam com um sistema adequado de acesso à água. Nos domicílios referenciados por pretos & pardos, este índice era de 85,3%. Ou seja, o peso re-lativo dos domicílios com referência branca e preta & parda que não tinham um sistema adequado de acesso à água era de, respectivamente, 4,1% e 14,7%. Assim, neste último grupo, a carência do acesso adequado ao abastecimento de água incidia em uma proporção três vezes superior ao primeiro. Em termos proporcionais, em 1995, a diferença do acesso ao sistema de água potável adequado entre os domicílios referenciados em pessoas brancas e pretas & pardas era de 35%, ao passo que, em 2006, havia declinado para 12,4%.

➢ Em todo o país, em 2006, dos domicílios que tinham por referência indivíduos brancos, 79,2% tinham um sistema adequado de escoamento do esgoto. No caso dos pretos & pardos, esse percentual era de 60,7%. No mesmo ano, o esgo-

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8. Conclusão Geral do Relatório

tamento sanitário inadequado era observado em 20,8% e em 39,3% dos domicílios que tinham por pessoa de referência, respectivamente, indivíduos de cor ou raça branca e preta & parda. A análise da evolução do indicador, de 1995 a 2006, entre os grupos de cor ou raça, mostra uma redução das desi-gualdades. No ano de 1995, a diferença entre o percentual de domicílios referenciados por brancos, em comparação ao dos referenciados por pretos & pardos, era de 58,6%. Em 2006, a mesma disparidade caiu para 30,4%. Vale comentar que o percentual de domicílios referenciados por pretos & pardos com acesso a um sistema adequado de descarte de esgoto, em 2006, ainda era 10,2 pontos percentuais inferior à realidade dos brancos no ano de 1995.

➢ No que tange ao sistema de saneamento, verificou-se que sua expansão e a redução das desigualdades de cor ou raça avança-ram de forma mais tímida, em comparação aos demais serviços públicos. Talvez, esse movimento denote uma baixa priorização do poder público, o que corresponde a uma inversão perversa das potencialidades de geração de benefícios sociais com a con-solidação do sistema democrático. Isso porque muitas vezes se argumenta que os investimentos em saneamento básico, sub-terrâneos e invisíveis à percepção imediata, não se traduzem em votos. Contudo, mesmo essa compreensão popular precisa passar por uma séria ressalva. Os efeitos das ações profiláticas em saneamento proporcionam inegáveis efeitos benéficos para o meio ambiente, a qualidade das praias e outros espaços de lazer e para a saúde pública. Na verdade, nada justifica a ausência de um plano nacional de universalização do sistema de saneamen-to básico em todo o país, que, se efetivamente implantado, teria conseqüências positivas para a população afro-descendente, a maior prejudicada por esta falta.

➢ Na posse de bens de consumo duráveis mais sofisticados, como freezer, máquina de lavar e telefone fixo, verificou-se que as diferenças, entre grupos de cor ou raça branca e preta & parda, se mantinham elevadas. Em 1995, 21,7% dos domicílios de pessoas brancas possuíam um freezer, ao passo que, entre os de pretos & pardos, essa mesma proporção era de 6,6%. Em 2006, a posse de um freezer era registrada em 22,1% dos domi-cílios de indivíduos brancos e 10,1% dos de pretos & pardos. Neste mesmo último ano, os domicílios de pessoas brancas que tinham máquina de lavar totalizavam 50,1%, enquanto os de pessoas pretas & pardas, 23,3%.

➢ Em todo país, no ano de 2001, os domicílios referenciados por brancos e que contavam com a posse de um computador eram 18%; com acesso à Internet, 12,6%; e com telefone celular, 38,1%. Em 2006, os mesmos indicadores evoluíram para: pos-se do computador, 30,8%; acesso à Internet, 24,3%; e posse de telefone celular, 70,4%. Nos domicílios referenciados por pretos & pardos, verificou-se menor possibilidade de acesso ao mundo digital. Em 2001, 5,2% possuíam um computador; 3%, acesso à Internet; e 21,6%, telefone celular. Em 2006, esses indicadores eram os seguintes: posse de um computador, 12,2%; acesso à In-ternet, 8,3%; e telefone celular, 55,8%.

➢ Do total de estabelecimentos agrícolas cuja produção era or-ganizada por pessoas brancas, a condição de proprietário repre-sentava 75,5% e a de cessionário correspondia a 8,2%. Dentro do mesmo contingente, 7,3% ocupavam a terra na condição de parcei-ro e 6,6% na condição de arrendatário. Finalmente, os posseiros, situação mais precária, correspondiam a 1,2%. Entre os pretos & pardos, também em 2006, o peso relativo dos proprietários al-cançava 59,9%. Os cessionários, por sua vez, chegavam a 14,2%. A condição de parceiro respondia por 10,2% dos estabelecimentos agrícolas e a de arrendatário, por 7,5%. Finalmente, os posseiros equivaliam a 5,1%.

➢ Em termos da composição das formas de ocupação da terra, se-gundo grupos de cor ou raça branca e preta & parda, verifica-se que, em 2006, os pretos & pardos correspondiam a 49,2% dos proprietá-rios, 67,8% dos cessionários, 83,8% dos posseiros, 58% dos arrenda-tários e 63,1% dos que trabalhavam em regime de parceria.

➢ No ano de 1995, 34,6% dos brancos donos de estabelecimentos agrícolas podiam ser considerados minifundiários, percentual que alcançou 37,4%, em 2006. Entre os pretos & pardos, no mesmo perío-do, esses estabelecimentos rurais diminuíram de 64,6% para 61,5%.

➢ Existe uma longa ref lexão latente entre os temas das po-líticas de promoção da igualdade racial e da democratização do acesso à terra pela reforma agrária. É de se lamentar que um país que negou esse acesso aos descendentes dos antigos escra-vos não tenha uma tradição mais consistente de vínculo entre ambas as agendas. A falta de bases de dados estatísticos que permitam esse tipo de cruzamentos, no fundo, ref lete os limi-tes conceituais que ainda existem nesse plano. Mesmo assim, os poucos indicadores disponíveis indicam que, em compara-ção aos brancos, no sistema agropecuário, os pretos & pardos padecem mais de sujeição a relações ocupacionais antiquadas. Na falta da posse legal do ativo, o trabalhador é obrigado a ce-der parte de sua produção aos donos legais das terras ou a viver a permanente incerteza de continuidade na atividade exercida. A falta de área suficiente de terra para a garantia de sustento material das famílias também afetava os produtores rurais pre-tos & pardos de forma mais que proporcional.

8.6. Acesso ao Poder Institucional, Políticas Públicas e Marcos Legais

➢ Desde a passagem do regime militar para o civil, poucas foram as pessoas de visível ascendência africana que chegaram a ocupar cargos de primeiro escalão no governo federal. No governo Sarney (1985-1989) houve uma; no governo Collor (1990-1992), a despei-to de seu porta-voz, que não tinha status de ministro, nenhuma; no governo Itamar Franco (1992-1994), mais uma vez, nenhuma; no governo FHC (1995-2002), uma; e no primeiro e atual segundo mandato do governo Lula, no começo de 2008, cinco pessoas.

➢ Atualmente, existem dois órgãos do governo federal dedicados primordialmente ao tema das políticas de promoção da eqüidade ra-cial: A Fundação Cultural Palmares e a Seppir. A Fundação Cultural

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192 Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008

8. Conclusão Geral do Relatório

Palmares é um órgão ligado ao Ministério da Cultura. A Seppir, ligada à Presidência da República, também abriga as seguintes instâncias: Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Cnpir) e o Fó-rum Intergovernamental de Promoção da Igualdade Racial (Fipir). O Cnpir é formado por 40 integrantes: 20 representantes da sociedade civil, 17 representando igual número de ministérios e três personali-dades de reconhecida influência na população afro-descendente.

➢ O Fipir é uma instância de coordenação de órgãos dos governos federal, estadual e municipal e que articula as políticas de promo-ção da igualdade racial nas três instâncias. A adesão ao Fipir, porém, é voluntária. Até o final de 2007, o fórum havia recebido a adesão de 25 Unidades da Federação. O Paraná e o Distrito Federal não havia aderido. Também aderiram ao Fipir 204 municípios em todo o país (3,7% do total de 5.564 existentes no final de 2007). Destes, 16 eram capitais (somente em São Luiz não existia um órgão específico pro-motor de políticas daquela natureza). Em termos institucionais, havia 190 organismos específicos ou com a incumbência do tratamento da questão da promoção da eqüidade racial em nível municipal. Em ter-mos absolutos, o estado que contava com maior número de adesões de municípios era o Maranhão, com 60. Depois vinham São Paulo (25), Bahia (18), Goiás (18, não incluída a capital Goiânia) e Rio de Janeiro (19, também não incluída a capital). Daqueles 25 estados, três deles não contavam com nenhum município aderido: Acre, Paraíba e Ro-raima. Em Alagoas, Amazonas, Piauí, Rondônia e Tocantins, somente um município havia aderido. No Paraná, que ainda não aderira ao Fi-pir, somente o município de Maringá tomou essa iniciativa.

➢ No levantamento realizado pela equipe do LAESER, dos 513 deputados federais eleitos em 2006, havia 11 de cor ou raça preta, sendo 10 homens e uma mulher. Como pardos, foram identificados 35, sendo 33 homens e duas mulheres. No total, foram 46 deputa-dos, sendo 43 homens e três mulheres. Em termos relativos, o peso destes parlamentares na Câmara dos Deputados era de 2,1%, de pretos, e de 6,8%, de pardos. Juntos, os dois grupos representa-ram 9% do total de deputados federais, sabendo-se que, em 2006, esse contingente respondia por 49,5% da população brasileira. Já os identificados como brancos correspondiam a 87%, os amarelos, a 0,8%, e os não classificados, a 3,3%. Nenhum deputado federal foi identificado como indígena.

➢ Comparando-se a proporção relativa entre eleitos nas cinco re-giões geográficas com o peso relativo na população brasileira, em 2006, encontra-se o seguinte quadro: I) Norte - pretos & pardos formavam 75,4% da população e 7,7% do total de deputados fe-derais; II) Nordeste - 70,4% da população e 5,3% dos deputados; III) Sudeste - 40,2% da população e 12,8% dos deputados; IV) Sul - 19,7% da população e 5,2% dos deputados; Centro-Oeste - 56,2% da população e 14,6% dos deputados.

➢ Outro contingente nitidamente sub-representado na Câmara dos Deputados é o das mulheres. No total, elas corresponderam a 8,8% do total de deputados federais eleitos, em 2006. Curiosamen-te, quase a mesma proporção encontrada para os pretos & pardos. Considerando-se, especificamente, as mulheres pretas, havia ape-nas uma única deputada, correspondendo a 0,2% do total. Entre as

pardas, o quadro não foi muito melhor: apenas duas, o equivalente a 0,4%. No total, as pretas & pardas representavam 0,6% das depu-tadas eleitas em todo o Brasil, em 2006. O peso das pretas & pardas na população brasileira, no mesmo ano, era de 24,8%.

➢ Em nenhum partido os deputados brancos deixaram de perfa-zer maioria. Assim, mencionando-se apenas os maiores: PMDB, 93,3%; PT, 83,1%; PSDB, 92,4%; PFL, 86,2%; PTB, 95,5%; PDT, 87,5%; PPS, 81,8%; e PSB, 96,3%.

➢ Outra questão extremamente relevante diz respeito ao perfil de instrução dos deputados federais. Entre os brancos havia o maior percentual de diplomas de nível superior: 83,6%. Os pretos corres-pondiam a 54,5%, os pardos, a 71,4%, e os amarelos, a 75%. Ob-serva-se que 80% dos parlamentares possuem o ensino superior completo e 7,4%, pelo menos, o incompleto. Assim, comparando-se esses dados com os dos deputados federais que são brancos (86,9%) e do sexo masculino (91,2%), parece que se chega, enfim, ao perfil padrão de um parlamentar brasileiro no período contemporâneo.

➢ No começo de 2007, 76 dos 81 senadores (93,8%) eram bran-cos, enquanto somente quatro eram pardos e, um, preto. Por-tanto, os senadores pretos & pardos totalizavam apenas 6,2%. Além disso, todas as 10 senadoras (12,3%) eram brancas. O úni-co senador preto era do Sul e os quatro pardos, de cada uma das outras quatro regiões.

➢ Dos 68 juízes da suprema magistratura, foram identificados dois pretos e dois amarelos, todos homens, e nenhum pardo. Os demais 64 juízes das instâncias superiores dos tribunais brasileiros foram identificados como brancos, sendo 56 homens e 12 mulheres.

➢ No começo de 2008, o cadastro de certidões de autodefinição da Fundação Cultural Palmares apontava a existência de 989 terras de remanescentes de quilombos, que abrigavam 1.200 comunidades. Portanto, do total de comunidades estimadas pela Seppir (3.224), apenas 37,2% constavam do cadastro daquela instituição.

➢ Em 2008, das terras quilombolas reconhecidas, 23% ficavam na Bahia; 11%, no Maranhão; 8,9%, em Minas Gerais; 8,2%, no Pará; e 8%, em Pernambuco. Assim, os cinco maiores estados quilombolas correspondiam a 59,1% do total de comunidades reconhecidas.

➢ Até o final de 2006, foram tituladas 89 terras, que abrigavam 145 comunidades quilombolas. Era na região Norte onde havia a maior proporção entre o número de comunidades tituladas e o de estimadas: 17,3%. Nas demais regiões, as proporções eram de: 4,6%, no Centro-Oeste; 2,2%, no Nordeste; 1,9%, no Sudeste; e 0%, no Sul.

➢ Chama a atenção a baixa proporção de comunidades tituladas, em relação às estimadas, nos estados de maior concentração de qui-lombolas. Assim, no Pará a proporção era de 21,3%, a maior em todo o país. Nos demais estados de maior concentração de remanescen-tes de quilombos: Mato Grosso, 8,1%; São Paulo, 5,6%; Maranhão, 3,5%; Pernambuco, 1,7%; Bahia, 0,9%; e Minas Gerais, 0,4%.

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Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008 193

8. Conclusão Geral do Relatório

➢ Analisando-se a proporção existente entre o número de terras quilombolas contidas no cadastro da Fundação Cultural Palmares e as ao menos parcialmente tituladas (ou seja, certificadas mesmo com a existência de algum tipo de contestação legal na justiça), observa-se que 14,7% das comunidades reconhecidas por aquela fundação tinham a condição de posse legal da terra, pelo menos, em parte regularizada. Se a referência adotada, ao invés do número de comunidades, for o de terras tituladas, a proporção caia para 9%.

➢ Até o final do ano de 2007, os estados do Pará e do Maranhão con-centravam 69,6% do total de terras quilombolas tituladas. Também chama a atenção a baixa proporção de terras tituladas, em relação ao total de terras de quilombos, apresentado por estados quilombolas importantes como a Bahia, Pernambuco e Mato Grosso.

➢ Atualmente, existem mais de 10.082 famílias quilombolas assen-tadas nas 89 terras de comunidades de remanescentes de quilombos já tituladas. Fazendo uma estimativa grosseira de seis pessoas por família, nessas áreas, chegou-se a um total de 60.492 pessoas. Os es-tados do Pará, Maranhão e Bahia, juntos, responderam por 69,7% do total de famílias quilombolas em áreas tituladas.

➢ Desde 1995, 874,1 mil hectares de terra foram destinados ao as-sentamento definitivo de populações autodefinidas como quilom-bolas. A maior parte dessas áreas localiza-se no Pará, que, sozi-nho, responde por 52,8% do total. Goiás aparece em segundo lugar, com 29% do total de terras quilombolas já tituladas, sendo essas áreas ocupadas pelos Kalungas, que, na verdade, abrigam, em seu interior, outras 41 comunidades espalhadas em três municípios: Cavalcante, Monte Alegre e Teresina de Goiás.

➢ Durante os dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso, foram tituladas 51 terras quilombolas, beneficiando 7.432 famílias em um total de 736 mil hectares de terra. De 2003 a 2007, período coberto pelo mandato do presidente Lula, foram tituladas 38 comunidades de remanescentes de quilombos, com 2.650 famí-lias e 137 mil hectares de terra. De 1995 a 2007, foram tituladas, em média, 6,9 terras quilombolas por ano. Para a demanda por titula-ção existente, este número parece demasiadamente modesto.

➢ O Programa Brasil Quilombola foi a principal iniciativa da Seppir e, talvez, a mais importante ação do Estado brasileiro, em toda sua história, no campo das políticas de promoção da eqüidade racial. O programa foi desenvolvido logo nos primeiros meses de cria-ção daquele órgão e iniciado em 2004, na comunidade Kalunga. As ações englobavam medidas de regularização fundiária, saúde, saneamento, habitação, eletrificação e educação. Em 2005, mais 16 comunidades em sete estados foram beneficiadas com medidas semelhantes. Desde então, dezenas de outras comunidades foram contempladas (C.f. Seppir, 2006).

➢ O Programa Brasil Quilombola envolveu, além da Seppir que o coordena, 10 ministérios, entre diversos outros órgãos e autar-quias, cujas participações nem sempre foram mencionadas. Além disso, o total das comunidades quilombolas beneficiadas por tan-tas ações é difícil de ser calculado. Assim, após a histórica ausência

de políticas sociais para a população negra no Brasil, ao longo do século XX, o Programa Brasil Quilombola, portanto, apresentou-se como um conjunto de ações inéditas.

➢ Também não é fato de menor importância que o Certificado de Reconhecimento da Fundação Cultural Palmares é mais do que um documento burocrático. A partir desse reconhecimento inicial por parte do poder público, abre-se espaço para que as comunidades se tornem beneficiárias de ações do Programa Brasil Quilombola, mesmo as não tituladas,

➢ Por outro lado, no balanço da Seppir sobre o Programa Brasil Quilombola, existem algumas lacunas que também não podem deixar de ser mencionadas: I) não há escala de prioridades das ações, aparentando sobreposição, sem uma estratégia definidora, que explique o porquê da realização de determinadas atividades em detrimento de outras; II) não se sabe como foram selecionadas as comunidades e, tampouco, os resultados das medidas governa-mentais; III) apesar de as ações serem em benefício das áreas de quilombos, não fica clara a capacidade de influência das comuni-dades nas decisões sobre o programa; aparentemente, elas foram mais alvos do que agentes daquelas políticas de governo; IV) em muitos casos, não está nítido se e como as políticas implementa-das nas distintas comunidades terão continuidade, o que suscita a possibilidade de as ações terem caráter imediato, sem uma visão de longo alcance; e V) em um contexto de recursos relativamente escassos (o tema orçamentário será visto na próxima seção), até que ponto o grande número de iniciativas simultâneas não repre-sentaria uma fragmentação do orçamento e das ações em ativida-des, de certo modo, dispersas e isoladas?

➢ Desde 1995, 14 ministérios ou secretarias, incluindo órgãos su-bordinados, já previram orçamentos específicos para ações volta-das à população afro-descendente ou de eqüidade racial. São os seguintes: Agricultura, Pesca e Abastecimento, Ciência e Tecnolo-gia, Cultura, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento Social, Educação, Esportes, Justiça, Meio Ambiente, Relações Exteriores, Saúde, Seppir, Trabalho e Emprego e Turismo.

➢ Calculando-se os correspondentes montantes autorizados, corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a preços de dezembro de 2007, em 1995, a LOA autorizou um total de R$ 587.103 para ações de políticas em benefício da po-pulação negra ou de promoção da eqüidade racial, integralmente destinado ao Ministério da Cultura. Em 1999 e 2002 (primeiro e último ano do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso), o orçamento autorizado para ações com o mesmo fim correspon-deu a, respectivamente, R$ 2.567.832 e R$ 24.176.066. Já no primei-ro ano do governo Lula, em 2003, o orçamento autorizado totalizou R$ 13.884.337, chegando a R$ 196.269.396, em 2007.

➢ Portanto, os valores autorizados para aquelas políticas cresceram exponencialmente no período. A título de curiosidade, de 1995 a 2007, foi autorizado um total de R$ 614.988.011. Apesar do montante expres-sivo, em termos absolutos, tal valor correspondeu a 0,1% dos totais au-torizados daquele conjunto de ministérios e respectivos órgãos.

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194 Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2007-2008

8. Conclusão Geral do Relatório

➢ Quando se analisa o quanto do orçamento previsto para essas ações foi efetivamente executado, os números são bem menores. Assim, cal-culando-se, com correção pelo Ipca e a preços de dezembro de 2007, em 1995, o valor empenhado foi de R$ 542.365, o equivalente a 92,4% do total autorizado. Em 1999 e 2002, respectivamente, de 94,5% (R$ 2.427.339) e 28,4% (R$ 6.857.769). Já em 2003, o montante empenhado chegou a 39,7% (R$ 5.509.763) e, em 2007, a 76,8% (R$ 150.806.139). De 1995 a 2007, a soma dos valores efetivamente aplicados em ações em benefício da população negra ou em prol da eqüidade racial totali-zou R$ 426.384.261, mais uma vez, correspondendo a 0,1% de todo o orçamento executado. No mesmo período, um total de R$ 188.603.750 deixou de ser gasto nessas ações. No governo Fernando Henrique Car-doso (1995-2002), a diferença entre os valores autorizados e empenha-dos totalizou R$ 24,7 milhões. Assim, a execução orçamentária repre-sentou 61,7% do total. Já nos cinco primeiros anos do mandato de Lula (2003-2007), a diferença foi de R$ 163,9 milhões, sendo o montante aplicado equivalente a 70,2% do autorizado.

➢ Nos últimos anos, a principal destinação dos recursos foi para as comunidades de remanescentes de quilombos. Assim, de 1996, pri-meiro ano de inclusão no orçamento, a 2007, ocorreu um aumento exponencial do montante dessas verbas. Em termos reais, a preços de dezembro de 2007: de R$ 4,8 milhões para R$ 147,6 milhões. Por outro lado, o montante de recursos efetivamente aplicados nessa des-tinação também tinha valores menores: R$ 2,5 milhões, em 1995, e R$ 110,6 milhões, em 2007. Assim, no total de recursos previstos de 1996 a 2007, de R$ 395,6 milhões, o percentual de execução orçamentária foi de 68,4%. O motivo desta defasagem está nas dificuldades quanto às ações de regularização e titulação de terras quilombolas.

➢ Considerando-se apenas as ações finalísticas da Fundação Cultural Palmares, de 1995 a 2007, foram destinados R$ 131,4 milhões, sendo 58,8% efetivamente liquidados. Por período de governo, no mandato de Fernando Henrique Cardoso, a Fundação Cultural Palmares recebeu uma dotação total de R$ 59,3 milhões, sendo gastos 63,1%. No mandato de Lula, ainda em andamento, a Fundação Cultural Palmares teve uma dotação de R$ 72 milhões, sendo 55,3% realmente executados.

➢ Em relação ao orçamento da Seppir, o montante autorizado, desde sua fundação até o final de 2007, foi de R$ 111,5 milhões, sendo de 68,8% a execução. Levando-se em conta apenas suas ações finalísticas, o valor total autorizado, de 2004 a 2007, foi de R$ 80,2 milhões, tendo sido efetivo o uso de 59,3%.

➢ No Brasil, existem, 11 feriados nacionais, sendo seis do calendá-rio cristão (um específico do calendário da Igreja Católica Apostó-lica Romana) e cinco datas cívicas. O Dia Nacional da Consciência Negra ainda não se constituiu em feriado nacional. Mesmo assim, de acordo com a Seppir, até novembro de 2007, 258 dos 5.561 muni-cípios em todo o país (4,6% do total) adotaram a data como feriado. Esses municípios estão assim distribuídos: Alagoas (um município de um total de 102 existentes); Goiás (um de 246); Minas Gerais (um de 853); Mato Grosso (por ser um feriado estadual, todos os 141 municípios); Pará (dois de 143); Paraíba (dois de 223); Pernambuco (um de 185); Rio de Janeiro (por ser um feriado estadual, todos os 92

municípios); Rondônia (um de 52); Sergipe (um de 75) e São Paulo (21, incluindo a capital, de 645). Apesar de as duas maiores capitais (São Paulo e Rio de Janeiro) terem adotado essa data como feriado comemorativo, nota-se que 90,2% do total de municípios com ini-ciativa idêntica se concentravam no Mato Grosso e no Rio de Janeiro, bem longe da disseminação por todo o país.

➢ Até abril de 2008, somente seis terreiros de Candomblé ou de religiões afro-brasileiras foram tombados pelo Iphan, em todo o país, sendo cinco em Salvador e um em São Luiz. Só no Rio de Ja-neiro, o número de Igrejas católicas tombadas chegava a 23, sendo que, quando considerados outros bens como, por exemplo, frontis-pícios de antigas Igrejas, capelas, casas sacerdotais e obras de arte sacra, o número de bens tombados aumentava para 41.

➢ Sobre a efetiva aplicação do art. 216º V, § 5º da Constituição Federal: “Ficam tombados todos os documentos e os sítios detentores de remi-niscências históricas dos antigos quilombos”; existem dois sítios histó-ricos tombados no país. O primeiro é o da Serra da Barriga, localizado no município de União dos Palmares (AL), onde existiu o Quilombo dos Palmares. O outro sítio arqueológico de comunidade quilombola fica em Ibiá (MG), tombado em 15 de janeiro de 2002. Nessa localidade, no século XVIII, existiu o Quilombo de Ambrósio. O caráter positivo da medida, contudo, não deve encobrir a inexistência de tombamentos de outros sítios históricos em locais que, antes, eram ocupados por antigos quilombos no país. Por exemplo, só em Minas Gerais, de 1710 a 1798, estima-se que existiram 160 comunidades dessa natureza.

➢ Foram compiladas informações sobre os acórdãos proferidos de recursos interpostos (nas áreas criminal e penal) sobre casos de ra-cismo e discriminação racial de treze Tribunais de Justiça do país: Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. O período de análise foi de 1º de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de 2006. A base de dados compreendeu 85 casos.

➢ Quanto à fonte dos recursos ordinários, ou seja, acórdãos provenien-tes de decisões de primeiro grau, de natureza civil ou penal, percebe-se que 40% dos processos foram julgados como de mérito improcedente. Ou seja, o juiz analisou a questão e concluiu que a vítima não tinha ra-zão. Em 5,9% dos casos, o processo foi julgado improcedente sem méri-to. Isso implica que o magistrado não analisou a matéria de direito e de fato, permitindo que a vítima possa propor nova ação, isto é, conferindo, ao autor da causa, nova chance na defesa de seus direitos. Os processos que foram julgados procedentes corresponderam a 35,3% dos casos e a procedência, em parte, correspondeu a 14,1%, juntos totalizando 49,4% dos casos. Isto quer dizer que as vítimas, para o período estudado, ga-nharam mais do que perderam nos processos de primeiro grau.

➢ Quando da análise das decisões dos desembargadores nos Tri-bunais de Segunda Instância, verificou-se que as vítimas das ações por crime de racismo ganharam em 32,9% dos casos apresentados, enquanto os réus venceram em 57,7%. Isto mostra que, na fase de segundo grau, os réus vêm levando vantagem, tendo alteradas as de-cisões de primeiro grau, vencidas, na maioria, pelas vítimas.