comunicaÇÃo interna e endomarketing como fatores de motivaÇÃo para o trabalho – um estudo de...

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Projeto Experimental em JORNALISMO Universidade Federal Fluminense Instituto de Arte e Comunicação Social (IACS) Curso de Comunicação Social COMUNICAÇÃO INTERNA E ENDOMARKETING COMO FATORES DE MOTIVAÇÃO PARA O TRABALHO Um estudo de caso na Intelig Telecom Projeto Experimental apresentado por Bruno Santos Nascimento Dias 307.30.074-4 como requisito obrigatório para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social habilitação Jornalismo sob a orientação de Profª Drª Ana Paula Bragaglia IACS/UFF Niterói Julho/2010

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Trabalho Monográfico de fim de Curso

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  • Projeto Experimental em JORNALISMO

    Universidade Federal Fluminense

    Instituto de Arte e Comunicao Social (IACS)

    Curso de Comunicao Social

    COMUNICAO INTERNA E ENDOMARKETING COMO FATORES DE

    MOTIVAO PARA O TRABALHO Um estudo de caso na Intelig Telecom

    Projeto Experimental apresentado por

    Bruno Santos Nascimento Dias

    307.30.074-4

    como requisito obrigatrio para obteno do ttulo de

    Bacharel em Comunicao Social habilitao Jornalismo sob a orientao de

    Prof Dr Ana Paula Bragaglia

    IACS/UFF

    Niteri

    Julho/2010

  • BRUNO SANTOS NASCIMENTO DIAS

    307.30.074-4

    COMUNICAO INTERNA E ENDOMARKETING COMO FATORES DE

    MOTIVAO PARA O TRABALHO Um estudo de caso na Intelig Telecom

    Monografia apresentada como requisito obrigatrio

    para obteno do ttulo de Bacharel em

    Comunicao Social, habilitao Jornalismo, da

    Universidade Federal Fluminense.

    Orientadora: Prof Dr ANA PAULA BRAGAGLIA

    Niteri

    Julho/2010

  • BRUNO SANTOS NASCIMENTO DIAS

    COMUNICAO INTERNA E ENDOMARKETING COMO FATORES DE

    MOTIVAO PARA O TRABALHO Um estudo de caso na Intelig Telecom

    Monografia apresentada como requisito obrigatrio

    para obteno do ttulo de Bacharel em

    Comunicao Social, habilitao Jornalismo, da

    Universidade Federal Fluminense

    Aprovada em julho de 2010

    BANCA EXAMINADORA

    ______________________________________________________________________

    Prof. Dr. Ana Paula Bragaglia Orientadora Universidade Federal Fluminense

    ______________________________________________________________________

    Prof. Msc. Flvia Clemente de Souza

    Universidade Federal Fluminense

    ______________________________________________________________________

    Prof. Msc. Roberto Jos Marinho Falco

    Universidade Federal Fluminense

    Niteri

    Julho/2010

  • DEDICATRIA

    minha famlia por ir muito alm da proviso, fornecendo no s sustento e a

    companhia, mas tambm o amor, carinho, confiana e o exemplo de humildade e f.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus motivo da minha existncia, origem e destino de tudo o que de bom ou

    positivo sou capaz de produzir.

    Aos meus pais e irms pela pacincia, compreenso e incentivo nesses anos em

    que o estudo necessitou ser priorizado, mesmo diante de tantas circunstncias adversas.

    Aos amigos pelos ouvidos atentos, a companhia despretensiosa e as pequenas,

    mas imprescindveis alegrias.

    minha orientadora professora Ana Paula Bragaglia pela pacincia, dedicao,

    orientao e pela tranqilidade extra, sempre disponvel quando a minha me faltou.

    Aos companheiros de UFF e IACS: professores, tcnicos e colegas de curso pela

    companhia nessa jornada e por ter feito destes, anos inesquecveis.

  • De fato, como podia

    Um operrio em construo

    Compreender por que um tijolo

    Valia mais do que um po?

    Tijolos ele empilhava

    Com p, cimento e esquadria

    Quanto ao po, ele o comia...

    Mas fosse comer tijolo!

    E assim o operrio ia

    Com suor e com cimento

    Erguendo uma casa aqui

    Adiante um apartamento

    Alm uma igreja, frente

    Um quartel e uma priso:

    Priso de que sofreria

    No fosse, eventualmente

    Um operrio em construo.

    Vincius de Moraes

  • SUMRIO

    INTRODUO..................................................................................................................11

    1 RESPONSABILIDADE SOCIAL E TICA ORGANIZACIONAL.........................14

    1.1 O INDIVDUO E A ORGANIZAO.........................................................................14

    1.2 ORIGENS, CONCEITOS E IMPORTNCIA DA RSE...............................................17

    1.3 RSE COM FOCO NO PBLICO INTERNO...............................................................25

    2 COMUNICAO INTERNA: A VALORIZAO DO PBLICO INTERNO.....32

    2.1 COMUNICAO EMPRESARIAL: IDENTIDADE, IMAGEM E CULTURA ORGANIZACIONAL....................................................................................................32

    2.2 ENDOMARKETING: CONCEITOS E IMPORTNCIA............................................36 2.3 RACIOCNIO DE ENDOMARKETING: FERRAMENTAS E PLANO DE AO..41

    3 ESTUDO DE CASO: INTELIG TELECOM...............................................................49

    3.1 METODOLOGIA..........................................................................................................49

    3.2 A COMUNICAO INTERNA DA INTELIG TELECOM: CONTEXTO E

    ESTRUTURA.................................................................................................................51

    3.3 A COMUNICAO INTERNA DA INTELIG TELECOM NA PRTICA................56

    3.3.1 Posicionamento interno e RSE.....................................................................................56

    3.3.2 Jornal eletrnico interno..............................................................................................57

    3.3.3 Intranet.........................................................................................................................61

    3.3.4 E-mail..........................................................................................................................63

    3.3.5 Eventos corporativos e departamentais.......................................................................65

    CONSIDERAES FINAIS............................................................................................68

    OBRAS CONSULTADAS.................................................................................................72

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Quadro 1 Indicadores Ethos para o pblico interno.............................................................29

    Fig. 1 Modelo de dimenses e culturas utilizado pela Intelig........................................53

    Fig. 2 Telas do email com teaser da campanha de lanamento da verso online do jornal

    Interno..................................................................................................................58

    Quadro 2 Sees do jornal Intelig-se! Online......................................................................59

    Fig. 3 Modelo do jornal eletrnico Intelig-se! Online....................................................60

    Fig. 4 Indentidade visual de sinalizao do Reprter de rea.......................................61

    Fig. 5 Pgina inicial da intranet Intelig..........................................................................62

    Fig. 6 E-mail informativo padro, personalizado por departamento..............................64

    Fig. 7 E-mail da ao Promoo Final Feliz...............................................................65

    Fig. 8 Pgina da Academia Do Saber na intranet as Intelig...........................................66

  • RESUMO

    O presente trabalho monogrfico tem como objetivo analisar a importncia da

    comunicao interna/endomarketing como fator de motivao dos funcionrios, a partir da

    sua relao com um compromisso de responsabilidade social empresarial direcionada ao

    pblico interno para alm das metas mercadolgicas. Alm disto, o estudo busca tambm

    ressaltar o papel imprescindvel do profissional da comunicao e o valor de uma

    comunicao empresarial planejada e trabalhada, centrada nas pessoas e utilizando os

    recursos e tcnicas adequados. A pesquisa discute as motivaes pelas quais as

    organizaes devem se comunicar com o seu pblico interno e quais devem ser os

    princpios a nortearem esta comunicao, partindo do entendimento de que as organizaes

    so formadas por pessoas e para as pessoas. Para tanto, o trabalho apresenta os aspectos

    originais do conceito de organizao, sua relao com o indivduo, e o processo histrico

    que resultou no que hoje se entende por Responsabilidade Social Empresarial. Neste

    contexto o estudo destaca os caminhos por meio dos quais a comunicao trabalha para

    valorizar, motivar e conquistar o pblico interno, apresentando o planejamento estratgico

    e a utilizao de tcnicas de endomarketing e suas possibilidades por meio de ferramentas,

    veculos e canais. A pesquisa apresenta um estudo de caso descritivo do planejamento de

    comunicao interna da Intelig Telecom. Uma comunicao interna bem sucedida na

    avaliao dos prprios funcionrios e dos prmios externos conquistados. No estudo de

    caso as ferramentas do endomarketing e os princpios da responsabilidade social

    apresentadas na teoria so avaliados na prtica, em termos de funcionamento, eficincia e

    resultados.

    Palavras-chave: Organizao; Comunicao empresarial; Responsabilidade social;

    Comunicao interna; Endomarketing

  • ABSTRACT

    This monograph aims to analyze the importance of internal communication/endomarketing

    as a factor in employee motivation, from the relationship with a commitment to corporate

    social responsibility directed at domestic audiences beyond the marketing goals. Moreover,

    the study also seeks to highlight the essential role of professional communication and the

    value of a corporate communications plan and worked on centered on people and resources

    and using appropriate techniques. The research discusses the reasons why organizations

    should communicate with your internal audience and what should be the principles to

    guide such communication, based on the understanding that organizations are formed by

    people for people. For this, the paper presents the unique aspects of the concept of

    organization, its relationship with the individual, and the historical process that resulted in

    what today is meant by Corporate Social Responsibility. In this context, the study

    highlights the pathways through which the communication works to enhance, motivate and

    win the domestic audience, with strategic planning and the use of techniques for

    endomarketing and its possibilities through tools, vehicles and channels. The research

    presents a descriptive case study of planning internal communication Intelig Telecom. A

    successful internal communication in the assessment of their own officials and external

    awards won. In the case study of endomarketing tools and principles of social

    responsibility at the theory in practice are evaluated in terms of performance, efficiency

    and results.

    Keywords: Organization, Corporate Communications, Corporate Social Responsibility,

    Internal Communication; Endomarketing.

  • INTRODUO

    As organizaes contemporneas ocupam um importante papel no atual cenrio

    scio-econmico e cultural do mundo globalizado. Os avanos tecnolgicos, mercados

    interdependentes e o nmero incontvel de possibilidades, cada vez mais rpidas, de

    comunicao demandam s organizaes, e principalmente aos profissionais, a atualizao

    constante de seus mtodos, tcnicas e prticas. Dedicar-se ao estudo das questes inseridas

    neste contexto, tanto quanto um desafio, se apresenta como uma necessidade.

    O presente trabalho busca atender a esta demanda, desenvolvendo as questes

    inerentes comunicao empresarial com o pblico interno a partir da viso mais essencial

    do valor da organizao no contexto social. Para tanto, partimos da discusso do conceito

    de organizao para a compreenso contempornea de responsabilidade social empresarial

    para, ento, avaliar os caminhos possveis comunicao interna analisando um exemplo

    prtico de um planejamento bem sucedido.

    Atravs desta pesquisa objetiva-se investigar a importncia da comunicao

    interna/endomarketing como fator de motivao dos funcionrios, verificando, ainda o

    quanto tais aes se ligam a um compromisso de responsabilidade social empresarial com

    o pblico interno, ultrapassando metas mercadolgicas.

    Entre os objetivos especficos, o estudo busca tambm ressaltar o papel

    imprescindvel do profissional da comunicao neste cenrio e o valor de uma

    comunicao empresarial planejada e trabalhada, centrada nas pessoas e utilizando os

    recursos e tcnicas adequados. O estudo busca verificar atravs da anlise de uma situao

    real, como se processam estas teorias na prtica, e os possveis resultados a serem obtidos.

  • 12

    As organizaes contemporneas tem se deparado, como veremos no decorrer desta

    pesquisa, com a necessidade de equilibrar o objetivo do lucro para seu desenvolvimento e

    subsistncia, com as demandas das suas obrigaes legislativas, sociais, ticas etc.

    Pincchirolli (2007, p.12) aponta este contexto como fruto de uma mudana de paradigmas.

    Tenrio (2006, p.13), por sua vez, ressalta esta realidade como fruto da conformao social

    resultante de uma srie de transformaes ocorridas particularmente no sculo XX. Estes

    novos paradigmas sero devidamente discutidos no decorrer da pesquisa. Aqui, estas

    observaes servem para estabelecer os alicerces sobre os quais o estudo ser

    desenvolvido. Assim, a pesquisa partir de uma anlise bibliogrfica e fundamentao

    terica que permita entender a origem da relao do indivduo com a organizao e daquilo

    que atualmente se entende por responsabilidade social empresarial, para traar um paralelo

    com o conceito de comunicao interna e endomarketing. Sob estas perspectivas, seguir

    verificao destas teorias na prtica, atravs de um estudo de caso na Intelig Telecom,

    empresa reconhecida por seus empregados como boa empregadora e premiada

    externamente pela boa relao com seu pblico interno.

    Alm das experincias pessoais que permitiram perceber o valor de uma

    comunicao organizacional planejada para o pblico interno, e particular curiosidade

    sobre o tema, a presente pesquisa se justifica pelo fato de a comunicao em geral assumir

    cada vez mais importncia como estratgia de gesto empresarial. Visa contribuir com este

    entendimento e oferecer possveis caminhos para ampliar essa compreenso. Alm disso,

    importante tambm estimular a reflexo sobre as reais motivaes e consistncia das

    estratgias adotadas pela comunicao das empresas, particularmente com o pblico

    interno. Apesar da crescente demanda por profissionais capacitados e por novas

    alternativas na comunicao interna, o tema, segundo apontam Marchesi (2005, p.47) e

    outros autores, ainda pouco explorado, tanto por empresas quanto pelas universidades e

    cursos de comunicao. E a se encontra outra justificativa: o espao disponvel aos

    profissionais de comunicao, cada vez mais necessrios nas corporaes, em contraste

    com capacitao acadmica oferecida. So jornalistas e publicitrios quem tm preenchido

    estes espaos, mas as formaes tradicionais, particularmente as graduaes, ainda no

    acompanham este ritmo crescente. Trabalhos como este podem contribuir para estimular

    esta reflexo e o interesse acadmico pelo tema.

    A pesquisa foi desenvolvida e dividida em trs captulos em que so abordadas, em

    primeiro lugar, as motivaes de uma empresa em trabalhar o seu pblico interno.

  • 13

    Posteriormente desenvolvemos as teorias e os alicerces, tcnicas e prticas que

    fundamentam a comunicao interna nas organizaes contemporneas e, por fim,

    analisamos como estes elementos se verificam na prtica por meio de um caso de um setor

    de comunicao interna de sucesso.

    No primeiro captulo, Responsabilidade Social Empresarial, busca discutir a

    relao entre indivduo, organizao e sociedade a partir do questionamento do motivo

    pelo qual as organizaes existem. Analisa a origem do conceito de organizao e sua

    relao com o indivduo, para ento contextualiz-la com o entendimento contemporneo

    de responsabilidade social empresarial, seu percurso histrico, motivaes e aplicabilidade.

    Aps traar esse panorama o estudo estabelece a relao entre estas compreenses e o

    indivduo, na contemporaneidade. Isto , o que as empresas entendem como

    responsabilidade social com o pblico interno, as distores deste conceito, os institutos e

    rgos que reconhecem e estimulam estas prticas, e, por fim, os resultados para o

    indivduo e a sociedade da existncia de empresas socialmente responsveis. O destaque

    aqui para a responsabilidade social praticada com o pblico interno.

    O segundo captulo, Comunicao interna: a valorizao do pblico interno

    apresenta o papel da comunicao empresarial contempornea, com destaque para a

    comunicao direcionada ao pblico interno. Discute os conceitos de imagem, cultura,

    identidade e como se articulam com as necessidades sociais e mercadolgicas das

    organizaes. O captulo tambm reflete sobre a posio estratgica que a comunicao

    interna ocupa e sua capacidade de motivar e conquistar o pblico interno por meio do

    endomarketing. Apresenta os conceitos e diferenas de comunicao interna e

    endomarketing e discute algumas das tcnicas mais usadas por este ltimo na relao das

    empresas com seu pblico interno.

    O terceiro captulo Estudo de caso: Intelig Telecom, por fim, apresenta um estudo

    de caso realizado na empresa Intelig Telecom com o objetivo de verificar como as teorias

    desenvolvidas ao longo do estudo se aplicam na prtica. Utilizando a metodologia de uma

    pesquisa qualitativa descritiva, este estudo de caso consiste em uma anlise sobre o

    funcionamento da comunicao interna da Intelig, buscando compreender como ela

    trabalha os valores da empresa atravs dos canais, ferramentas e tcnicas de comunicao e

    endomarketing utilizados pela empresa.

  • Os homens criam as ferramentas.

    As ferramentas recriam os homens

    Marshall McLuhan

    1 RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL

    1.1 O INDIVDUO E A ORGANIZAO

    No mundo contemporneo, para os mais variados fins e de acordo com as

    demandas da sociedade, as relaes humanas apresentam um nmero cada vez maior e

    complexo de formas de se organizar. Neste contexto, termos como organizao

    corporao, empresa, e instituio" so utilizados indistintamente, com freqncia,

    para designar entidades semelhantes. Entretanto, para efeito de anlise se faz necessrio

    delimitar a abrangncia usual de alguns deles e identificar a posio e responsabilidade do

    indivduo na composio deste contexto. Vivemos em uma sociedade formada por

    organizaes, e, em uma viso abrangente, qualquer associao humana com determinado

    fim pode se configurar numa organizao. Desde o momento em que nascemos, passando

    pela educao, trabalho, lazer, religio, entre outros, todas as nossas atividades so

    permeadas por organizaes. Esse conjunto diversificado de organizaes que viabiliza

    todo o funcionamento da sociedade e permite a satisfao de necessidades bsicas, como

    alimentao, sade, vesturio, transporte, salrio, lazer, segurana e habitao.

    (KUNSCH, 2002, p.20) As organizaes so, portanto, fruto da natureza humana. Nelas

    os indivduos, como seres sociais, unem-se aos seus semelhantes para alcanar objetivos

    comuns e satisfazer anseios e necessidades. Mesmo na atualidade, com o advento das

    novas tecnologias possibilitando alternativas ao espao fsico, o indivduo continua

    dependendo das organizaes para operacionalizar suas aes e se conectar com o mundo

    nas mais diferentes frentes. (KUNSCH, 2002, p.22)

    Todas as citaes anteriores ao novo acordo ortogrfico foram mantidas de acordo com os originais

    consultados.

  • 15

    Estas definies iniciais, entretanto, so insuficientes para dar conta da

    complexidade que constitui os diversos tipos de relaes existentes numa organizao

    empresarial que depende do lucro para a sobrevivncia. Para este fim, Pereira1 (apud

    KUNSCH, 2002, p.23) apresenta pelo menos duas maneiras diferentes de se compreender

    a organizao. Estas podem ser entendidas, em primeiro lugar, como estruturas

    racionalmente ordenadas destinadas a fins especficos. Neste sentido, as organizaes

    constituem mecanismos especficos, composto de indivduos sob a forma de um

    agrupamento planejado de pessoas que desempenham funes e trabalham conjuntamente

    para atingir objetivos comuns. (KUNSCH, 2002, p.25) Nesta viso racionalista e

    mecanicista, a organizao compreendida como uma mquina que, administrada de

    maneira eficiente, atinge os objetivos predeterminados. Outro entendimento possvel o da

    organizao como organismos sociais vivos, que evoluem com o tempo. (PEREIRA2,

    apud KUNSCH, 2002, p.23) Nesta perspectiva, por sua vez, as organizaes so sistemas

    abertos que no apenas atuam com o fim especfico, mas interagem com outras

    organizaes, com o ambiente, com a sociedade. Isto , so um microssistema dentro do

    macrossistema social. Esta relao se d de diversas maneiras: quando a atividade

    determinada empresa compromete o ambiente, por exemplo, ou quando a base da

    economia local, ou mesmo internamente, quando precisam contratar ou demitir

    funcionrios, entre outros. Suas aes podem influir no apenas no grupo que constitui a

    organizao, mas tem diversos efeitos externos que, no mbito do indivduo, so muitas

    vezes imensurveis. Kunsch (2002, p.30) afirma que:

    no podemos considerar uma organizao somente em seu mbito interno e de

    forma esttica. preciso v-la em relao a um contexto muito mais amplo, numa

    perspectiva holstica. Temos de consider-la vinculada ao ambiente em que ela

    vive, incluindo os aspectos sociais, econmicos, polticos, tecnolgicos, ecolgicos

    e culturais, variveis que interferem enormemente na vida organizacional.

    Estes entendimentos corroboram com os conceitos que Kivitz (2006, p.53)

    apresenta para o termo corporao. Estas tambm apresentam pelo menos duas

    possibilidades de compreenso: uma mais prtica e utilitarista e outra mais ampla,

    admitindo sua dimenso orgnica.

    1 PEREIRA, Maria J. L. B. Na Cova Dos Lees. O Consultor Como Facilitador Do Processo Decisrio. So Paulo, Makron, 1988. 2 Ibid

  • 16

    A corporao pode ser definida de duas maneiras distintas: a primeira e mais simples

    diz que se trata de uma organizao dedicada aos negcios; a segunda mais

    complexa, e afirma que a companhia, uma sociedade annima, uma pessoa jurdica

    distinta de seus acionistas. (KIVITZ, 2006, p.53)

    As corporaes inicialmente constituam associaes de pessoas que recebiam

    delegao do Estado para o servio ao bem comum. Segundo Richard Grossman, em

    depoimento no documentrio The Corporation, as corporaes eram consideradas um

    presente das pessoas que queriam servir ao interesse pblico. No final da Guerra Civil dos

    Estados Unidos, entretanto, foi inserida na constituio em 1868, a 14 Emenda, que previa

    que nenhuma pessoa poderia ser privada de vida, liberdade ou propriedade sem um

    processo jurdico adequado. O intuito da emenda era garantir direitos aos negros,

    entretanto, os advogados das corporaes se aproveitaram dela para garantir estes direitos

    s corporaes, alegando serem elas pessoas jurdicas. Segundo Mary Zepernick entre

    1890 e 1910, dos 307 casos julgados envolvendo a 14 Emenda, 288 eram de corporaes e

    19 de afro-americanos. (THE CORPORATION, 2004) A partir destes acontecimentos as

    empresas passam a ser entendidas judicialmente como pessoas, com identidade e

    autonomia existindo alm e apesar de seus acionistas. No Brasil a partir do novo

    Cdigo Civil de 1916 (Lei 3.071, de 01 de janeiro), se consolidou a idia de organizaes

    reconhecidas como pessoas jurdicas. (ANDRADE NETO, 2008)

    Na identificao usual dos variados agrupamentos de pessoas em suas diferentes

    conformaes (empresas, ONGs, escolas, fundaes etc.) outra terminologia que se

    confunde com organizao a instituio, que so termos comumente utilizados como

    sinnimos. Entretanto Pereira diferencia estas identificaes considerando a organizao

    de carter instrumental, tcnico e racional, enquanto que as instituies constituem um

    organismo vivo, fruto de necessidades sociais, portadora de identidade e preocupada no

    apenas com o lucro, mas guiada por um sentido claro de misso. (PEREIRA3, apud

    KUNSCH, 2002, p.33) Srour faz esta diferenciao identificando a organizao como

    coletividades especializadas na produo de determinado bem ou servio, e instituies

    como conjunto de normas sociais, geralmente de carter jurdico, que gozam de

    reconhecimento social. (SROUR, 1998, pp.107-108) Assim, podemos entender

    instituies como organizaes socialmente estabelecidas, isto , valorizadas e respeitadas

    pela sociedade no apenas pelo produto ou servio que oferecem, mas pelo significado que

    3 Ibid

  • 17

    conquistaram e pelo valor simblico agregado sua imagem ou marca. Igrejas,

    universidades, hospitais, entre outros, so exemplos de organizaes que gozam de

    credibilidade social. Andrade (1997, p.117) acrescenta ainda que, neste sentido,

    determinadas empresas e marcas alcanam o que ele chama de terceira dimenso,

    ultrapassando as dimenses da identidade do produto e da identidade corporativa. Segundo

    o autor, determinadas organizaes ou seus produtos e servios, alcanam a qualidade de

    cone, ou seja, de valores e atributos nicos, imponderveis e muitas vezes paradoxais

    (secular e modera, por exemplo). Temos o exemplo de casos assim em empresas como a

    Coca-cola e marcas como a Gillete e Nescaf que identificam no apenas o produto de

    uma empresa, mas so referncia e cones de todo o segmento do mesmo gnero. Podemos

    compreender, ento, que organizaes, corporaes e empresas termos que, neste

    trabalho, utilizaremos para designar entidades semelhantes podem (e devem) assumir o

    carter de instituies, concentrando suas atividades e interesses no apenas em suas

    particularidades, mas atuando na coletividade e assumindo suas responsabilidades com

    seus diversos pblicos.

    Um entendimento mais amplo das organizaes, portanto, possibilita a

    compreenso destas entidades alm de meras estruturas estticas e impessoais, mas como

    organismos vivos que, como tais, so formadas por pessoas que carregam dentro de si o

    seu universo cognitivo e, portanto, tem uma maneira prpria de ver as coisas. (KUNSCH,

    2002, p.30) Organizaes que pretendem se perpetuar e assumir papis relevantes na

    sociedade onde atuam, necessitam ter claro na sua identidade, seus valores e cultura, no

    apenas como discursos, mas como compromisso atestados na prtica.

    1.2 ORIGENS, CONCEITOS E IMPORTNCIA DA RSE

    A Responsabilidade Social Empresarial/Corporativa (RSE) pode ser definida como

    o conjunto de princpios e prticas por parte da organizao voltadas a afirmarem o

    comprometimento desta com seus diversos pblicos. Tais pblicos consistem nos

    chamados stakeholders, compreendendo os seguintes grupos: clientes, acionistas,

    funcionrios, sociedade, governos e quaisquer outros grupos que tenham relao com a

    atividade da empresa. (ASHLEY, 2006) Por comprometimento entende-se que as

    organizaes socialmente responsveis atuam de acordo com determinadas normas de

    conduta objetivando atender s expectativas de seus diversos pblicos, naquilo que estes

  • 18

    consideram legal e correto. Atuar de maneira socialmente responsvel, portanto, envolve

    uma srie de preocupaes e compromissos que transcendem s atividades operacionais

    bsicas das empresas, incluindo um objetivo de lucro, mesmo estando estas em

    conformidade com suas diretrizes ticas. Instaura-se a a questo do papel ltimo das

    organizaes, ou o motivo para os quais elas existem.

    Uma postura autntica em RSE pressupe que a empresa exista para mais do que

    simples objetivos econmicos, que devem ser o combustvel, mas jamais o destino dos

    esforos da organizao. E esta uma mentalidade que necessita estar arraigada em

    princpios consolidados e internalizados em todas as aes da empresa.

    Responsabilidade social empresarial a forma de gesto que se define pela relao

    tica e transparente da empresa com todos os pblicos com os quais ela se relaciona

    e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento

    sustentvel da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as

    geraes futuras, respeitando a diversidade e promovendo a reduo das

    desigualdades sociais. (INSTITUTO ETHOS, 2010)

    A essncia do conceito atual de responsabilidade social empresarial se constri

    sobre os alicerces da sociedade ps-industrial que entende as organizaes como

    integrantes de um sistema complexo nas quais ela influencia e influenciada, interagindo

    com a comunidade, a sociedade, o ambiente etc. Portanto, atender aos interesses dos

    acionistas insuficiente, sendo necessria s organizaes a incorporao de demandas

    sociais como forma de interagir e compartilhar com a sociedade. (TENRIO, 2006, p.20)

    a tenso entre estes diversos interesses que possibilita a consolidao da RSE e sua

    reproduo como modelo operacional na atualidade.

    Em suma, a empresa capitalista, embora se mova num contexto onde imperam

    cdigos morais, s passa a comportar-se de modo socialmente responsvel quando

    sua continuidade est em risco, quando enfrenta a interveno organizada das

    contrapartes com as quais lida ou quando mergulha no cabo-de-guerra das relaes

    de poder. Sem contrapartes ativas, a maximizao do lucro leva a melhor. (SROUR,

    1998, p.294)

    O surgimento das teorias sobre RSE resultado das constantes e cada vez mais

    frequentes mudanas da sociedade a partir da revoluo industrial no sculo XVIII.

    Caracterizada pela evoluo tecnolgica e pela secularizao (predomnio da razo humana

    na interpretao e soluo de problemas em contraponto religio), a sociedade industrial

    estabeleceu os paradigmas que conduziram as relaes econmicas e de trabalho at

    meados do sculo XX. A partir deste momento, uma srie de situaes, promovidas pela

  • 19

    prpria industrializao, do origem a diversas transformaes e ao surgimento de novas

    perspectivas, passando a incorporar o anseio dos agentes sociais no plano de negcio das

    corporaes. (TENRIO, 2006, p.14) nesta sociedade, identificada por Tenrio (2006)

    como ps-industrial, que os princpios da RSE ganham novos contornos, partindo do

    filantropismo at chegar ao conceito contemporneo no qual a empresa socialmente

    responsvel aquela que est apta a lidar com as expectativas de seus stackholders atuais e

    futuros, na viso mais radical de sociedade sustentvel (ASHLEY, 2006, p.47).

    Tenrio (2006) apresenta a evoluo da responsabilidade social empresarial

    dividida em dois perodos. O primeiro compreende a primeira metade do sculo XX, e o

    segundo vai do surgimento da sociedade ps-industrial, na dcada de 1950, at os tempos

    atuais. No incio do sculo XX predominava o entendimento do papel econmico das

    empresas. Ashley (2006, p.45) afirma que, nesse perodo, a premissa fundamental da

    legislao sobre as corporaes era de que tinham, como propsito, a realizao de lucros

    para seus acionistas. A sociedade vivia o momento de transio da economia agrcola para

    a industrial, promovida pela evoluo tecnolgica, e a utilizao da cincia aplicada aos

    processos produtivos. Os ideais iluministas da razo e capacidade humana como

    suficientes para a transformao do mundo estavam fortemente propagados no ocidente. A

    evoluo tecnolgica, que propiciava novos hbitos de produo e consumo, de certa

    forma, estimulava estas ideias. Alm disso, a ideologia liberal, baseada no princpio da

    propriedade e iniciativa privada, era predominante. O liberalismo, contudo, no estimulava

    a caridade ou aes sociais por parte das empresas. O entendimento era de que a gerao

    de lucros, a oferta de empregos e o pagamento de impostos eram o nico papel social das

    empresas e suas atuaes sociais limitavam-se ao filantropismo de algumas poucas

    organizaes. Este perodo foi assim descrito por De Masi1:

    Adam Smith (1723-1790) ser o maior terico dessa nova economia impregnada de

    iluminismo e da nascente sociedade industrial marcada pela mecanizao. A riqueza

    das naes (1776) decretar definitivamente a superioridade da indstria sobre a

    agricultura, do lucro e da mais-valia sobre a renda, da moeda sobre a troca, do

    egosmo sobre a caridade. No da benevolncia do aougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos o nosso almoo, mas do interesse que tem no prprio lucro

    pessoal. (DE MASI4 apud TENRIO, 2006, p.14).

    Apenas iniciativas filantrpicas e de carter pessoal, como doaes feitas por

    grandes empresrios, ou a criao de fundaes, como a Ford e a Rockfeller,

    4 DE MASI, Domenico. O futuro do trabalho; fadiga e cio na sociedade ps-industrial. Traduo por Yadir

    A. Figueiredo, 2000, 121p.

  • 20

    representavam as aes de responsabilidade social da poca. Este contexto, entretanto,

    caracterizava-se por empresrios de pequenas empresas, em regime de concorrncia

    perfeita, com base tecnolgica estvel e acessvel, e com pouco ou nenhum poder de

    influenciar individualmente o mercado. (TENRIO, 2006, p.15) Contudo, os problemas

    causados pelo processo acelerado de industrializao e as presses da sociedade, passaram

    a modificar o entendimento das empresas em relao aos agentes sociais. Um dos marcos

    dos debates sobre a tica da responsabilidade e da discricionariedade dos dirigentes de

    empresas foi abertas ao pblico com o caso Dodge versus Ford, em 1919, nos Estados

    Unidos, quando Henry Ford foi questionado por, alegando objetivos sociais, contrariar o

    interesse dos acionistas John e Horace Dodge. Ford reverteu parte dos lucros para

    investimentos na capacidade de produo, aumento de salrios e fundo de reserva para uma

    reduo esperada de receitas. Naquela ocasio, entretanto, a Suprema Corte de Michigan

    foi favorvel aos Dodges, sob a alegao de que a corporao existe para benefcio de seus

    acionistas. (ASHLEY, 2006, p.45)

    Henry Ford foi um dos pioneiros nas aes de responsabilidade empresarial,

    instituindo o salrio mnimo e a jornada de trabalho mxima de oito horas dirias para seus

    empregados. (TENRIO, 2006, p.18) Ford considerava os negcios e a indstria como

    agentes sociais que deviam prestar servios sociedade atravs de suas atividades. O lucro

    seria, portanto, secundrio. Este pensamento foi registrado no trecho de uma carta que Ford

    escreveu a um acionista:

    Negcios e indstria so, antes de tudo, um servio pblico. Estamos organizados

    para fazer o melhor que pudermos em todos os lugares e para todos os interessados.

    No acredito que devamos ter um lucro exorbitante sobre nossos carros. Um lucro

    razovel est certo, mas no demais. Portanto, minha poltica tem sido forjar os

    preos dos carros para baixo assim que a produo o permita e beneficiar os usurios

    e trabalhadores, o que tem resultado em lucros surpreendentemente grandes para ns.

    (SROUR, 1998, p.194)

    Entretanto, as mudanas ocorridas posteriormente impulsionadas pela evoluo

    tecnolgica e pelos estudos cientficos sobre os processos de organizao do trabalho

    geraram novas questes, trazendo a discusso sobre a responsabilidade social empresarial

    novamente tona. Fatores como condies de trabalho precrias, padres de desempenho

    favorveis empresa e desfavorveis aos funcionrios, alterao dos processos produtivos

    e a substituio da mo-de-obra artesanal pela especializao de tarefas, afetaram as

    relaes de trabalho provocando mobilizaes por parte dos trabalhadores, organizados em

  • 21

    sindicatos e exigindo que as empresas assumissem posturas diferentes. A crise do

    liberalismo exacerbado com seu pice no crash da Bolsa de Nova York em 1929 provocou

    a interferncia do Estado, atravs do New Deal, na economia com o objetivo de control-

    la. Este perodo estendeu-se at a dcada de 1970, e foi marcado pela consolidao e

    superao, na dcada de 1950, do modelo industrial. O surgimento, neste momento, da

    sociedade ps-industrial, gerou questionamentos desta sociedade quanto ao objetivo de

    maximizao de lucros das empresas e do papel das companhias nessa nova sociedade,

    alm de ampliar o conceito de responsabilidade. (TENRIO, 2006, p.18) Outro caso

    envolvendo aplicao de recursos foi julgado nos Estados Unidos, em 1953. O caso A. P.

    Smith Manufacturing Company versus Barlow, entretanto, teve um desfecho diferente do

    de Ford, e a Suprema Corte de Nova Jersey foi favorvel doao de recursos para

    Universidade de Princeton, contrariando interesses de acionistas. O debate sobre a RSE foi

    retomado a partir do argumento de que, se a filantropia era uma ao legtima da

    corporao, ento outras aes sociais em detrimento do lucro de acionistas tambm

    seriam. Como a adoo de processos no nocivos ao meio ambiente, por exemplo.

    Comeou-se a discutir, no meio empresarial e acadmico, a importncia da

    responsabilidade social corporativa pela ao de seus dirigentes e administradores.

    (ASHLEY, 2006, p.46)

    A interveno do Estado na economia reduziu as incertezas provocadas a partir da

    crise de 1929, possibilitando investimento em tecnologia e acmulo de capital para o novo

    modelo de produo. Alm disso, esta transio resultou em novos paradigmas, opostos

    aos da sociedade industrial, que buscava basicamente o sucesso econmico. A sociedade

    ps-idustrial anseia por aumento na qualidade de vida, a valorizao do ser humano; o

    respeito ao meio ambiente; a organizao empresarial de mltiplos objetivos; e a

    valorizao das aes sociais, tanto das empresas quanto dos indivduos. (TENRIO,

    2006, p.20)

    No Brasil a responsabilidade social empresarial tema bem recente. Embora a tica

    nos negcios seja estudada desde a fundao da Escola Superior de Administrao de

    Negcios (ESAN), em 1972, foi apenas em 1992 que o Ministrio da Educao (MEC)

    sugeriu formalmente que todos os cursos de graduao e ps-graduao em administrao

    inclussem a disciplina de em sua grade. Segundo Tenrio (2006, p.25), a discusso sobre o

    tema no pas est associada transio de valores (da sociedade industrial para a sociedade

    ps-industrial) que o Brasil atravessa. Na dcada de 1970, tambm, a Associao dos

  • 22

    Dirigentes Cristos de Empresas (ADCE) que inicialmente pretendia promover a discusso

    sobre balano social, deu incio a debates sobre RSE. (Tenrio, 2006) A partir da dcada

    de 1990, o surgimento de vrias organizaes no-governamentais e o desenvolvimento do

    terceiro setor intensificaram o debate. Diversas instituies, como a Fundao Abrinq, o

    Grupo de Institutos, Fundaes e Empresas (GIFE) e o Instituto Ethos de Empresas e

    Responsabilidade Social ressaltam a importncia da tica e da responsabilidade social para

    os negcios. O Instituto Ethos, criado em 1998, representou um marco nos estudos sobre

    RSE no Brasil, pois conta com apoio e participao de diversas empresas que se

    comprometem com o desenvolvimento dos estudos e aes de responsabilidade social.

    Atravs de indicadores e um sistema avaliao sem fins de premiao, cujas informaes

    so de propriedade apenas da empresa participante, o instituto incentiva as organizaes e

    seus profissionais ao envolvimento e engajamento na RSE.

    [O] Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, criado em So Paulo, em

    1998, (...) conta com o apoio de muitas empresas brasileiras comprometidas com o

    incremento da responsabilidade social. Sua grande contribuio est em incentivar

    profissionais, instituies pblicas e privadas a iniciarem esforos organizados para o

    combate corrupo, pobreza e injustia social. o caso da criao da

    Transparncia Brasil, captulo brasileiro da Transparency International, entidade

    alem de mbito global que analisa o grau de corrupo de mais de 80 pases.

    (ARRUDA, 2005, p.61)

    A RSE, portanto, um tema relativamente recente e polmico, surgido a partir das

    drsticas mudanas ocorridas nos ambientes organizacionais nos ltimos anos. A questo

    parte, na maioria das vezes, de fatores econmicos, ligados otimizao e aplicao de

    lucros. Entretanto, a empresa que pretende ser socialmente responsvel se percebe imersa

    num conjunto complexo de demandas e implicaes que envolvem desde a sociedade at

    governos, opinio pblica, comunidade, meio ambiente, funcionrios etc. Alm disso, a

    globalizao e a profuso de informao promovida pelas novas tecnologias,

    principalmente no que diz respeito comunicao, exigem tambm estratgias

    operacionais e valores empresariais que dialoguem com as mais variadas culturas,

    principalmente no caso das grandes corporaes presentes em diversos pases no mundo. A

    definio e aplicao de princpios ticos e a iniciativa no sentido de suprir demandas

    sociais, independente da atividade da empresa, tornam-se fatores diferenciais e mesmo

    essenciais para a subsistncia das organizaes. Equacionar metas e objetivos econmicos

    com valores ticos pertinentes s atividades que exercem e aos interesses dos demais

    pblicos o grande desafio para as corporaes no novo milnio.

  • 23

    Exigncias externas e internas por uma postura corporativa que v alm dos limites

    das metas econmicas tem crescido cada vez mais. O mundo contemporneo tem

    apresentado uma nova expectativa para as organizaes. Como visto no item anterior, as

    corporaes no so mais entendidas como estruturas frias e impessoais, mas como

    organismos vivos que ao longo do tempo acabam incorporando mudanas e

    procedimentos para se adaptarem s novas realidades e garantirem a sobrevivncia.

    (PONCHIROLLI, 2007, p.49) Isto quer dizer que governos, sociedade e todos os demais

    pblicos de uma organizao tm demandado s empresas transformaes que se adequem

    a esta nova realidade. Nesse novo contexto as organizaes tero de aprender a

    equacionar a necessidade de obter lucros, obedecer s leis, ter um comportamento tico e

    envolver-se em alguma forma de filantropia para com as comunidades que se inserem.

    (ASHLEY, 2006, p.6) Essa crescente demanda, entretanto, pode ser apreendida pelas

    organizaes tambm como uma estratgia de mercado. Afinal, so muitos os fatores

    externos, das mais variadas inclinaes, que podem conduzir a gesto empresarial

    aplicao de uma poltica efetiva de responsabilidade social. E estas motivaes no se

    limitam reduo de custos ou obteno de lucros, mas, muitas vezes objetivam atender

    aos anseios da sociedade contempornea, que busca valores como qualidade de vida,

    respeito ao meio ambiente e a valorizao do indivduo e das aes sociais. Isto quer dizer

    que ser socialmente responsvel pode tambm resultar da preferncia do consumidor ou

    busca pelo fortalecimento da imagem corporativa. (TENRIO, 2006, p.34)

    Conforme explica Ashley (2006, p.8) a preocupao com a responsabilidade social

    tornou-se um diferencial fundamental para tornar as organizaes mais produtivas e

    garantir o respeito do pblico e, enfim, sua prpria viabilidade. a partir desse

    pressuposto que diversos grupos no-governamentais se organizam no terceiro setor para

    cobrar das empresas que se adequem s legislaes ambientais, respeitem seus

    funcionrios, atuem de forma compensatria nas comunidades afetadas negativamente por

    suas atividades, tratem bem seus clientes e consumidores etc. No contexto internacional

    instituies como a Organizao Mundial do Comercio (OMC) e a Organizao das

    Naes Unidas (ONU) incentivam empresas a adotarem procedimentos socialmente

    responsveis, muitas vezes limitando o poder de negociao daquelas que no se adequam

    s suas reivindicaes. (TENRIO, 2006, p.34) Alm disso, outro grande incentivador das

    empresas so os governos, que as estimulam, atravs de leis, iseno de impostos ou

    incentivos fiscais, adoo de polticas de responsabilidade social. Neste caso, as

  • 24

    organizaes promovem gerao de empregos, investimentos no desenvolvimento de

    comunidades local e incentivo s atividades culturais e esportivas na regio, utilizando-se,

    muitas vezes, de recursos originariamente pblicos para a projetarem de sua imagem.

    O grande problema destas iniciativas encontra-se no fato de caracterizarem-se por

    uma srie de obrigaes sociais ou de interesses diretos ou no em vantagens e

    benefcios. Se houver diminuio das presses das comunidades em relao s questes

    ambientais, sociais e trabalhistas ou se as leis de incentivos fiscais forem revogadas, as

    empresas podero diminuir o montante de investimentos destinados a essas reas.

    (TENRIO, 2006, p.35) No entanto, existem corporaes que tm a RSE motivada por

    princpios. Nestes casos inverte-se a lgica capitalista da otimizao dos lucros

    submetendo-a aos valores socialmente responsveis adotados e estabelecidos na cultura e

    na filosofia organizacional. Ashley (2006, p.56) aponta ainda que o grau de

    comprometimento de uma empresa com a responsabilidade social est diretamente

    relacionado ao modo como ela mede o desempenho dos recursos comprometidos para o

    atendimento dessas responsabilidades. A empresa que no investe em polticas de

    responsabilidade social sem expectativa de um retorno direto corre o risco da

    descontinuidade na sua atuao (interrupo de investimento em determinada ao por

    conta de uma crise de imagem, por exemplo) e, assim, flexibilizao de seus valores.

    Para Grajew (2002) a responsabilidade social adotada como cultura da gesto empresarial

    deve nortear o procedimento das organizaes que assim se estabelecem em todos os

    momentos, seja em crises ou em pocas de expanso econmica, pois justamente nos

    momentos de crise que so testados o real compromisso dos dirigentes com os valores da

    organizao. A RSE, portanto, no deve ser restrita dimenso mercadolgica da empresa,

    mas imersa na cultura organizacional da instituio, pautando todas as decises e atuaes

    com seus stakholders e o meio-ambiente, em todos os momentos.

    O grande diferencial da RSE motivada por questes de princpios, portanto, est na

    compreenso de uma dimenso ampliada da misso da organizao. Esta compreenso no

    se resume gerao de lucro para os acionistas, mas considera o lugar social da empresa

    na promoo do bem estar comum, na qualidade de vida, na preservao do meio-ambiente

    e no procedimento tico para com seus interlocutores. Esta compreenso, embora possa

    configurar perdas em curto prazo, tm sua importncia no retorno que pode gerar a mdio e

    longo prazo. Uma empresa que protege o funcionrio em pocas de crise, por exemplo,

    compensada com o comprometimento e engajamento dos seus colaboradores. Da mesma

  • 25

    forma, quando oferece produtos e servios de qualidade, que utilizam meios de produo

    sustentveis e ecologicamente responsveis, ainda que isto gere custos maiores de

    produo e/ou distribuio, a organizao cultiva, ao longo do tempo, credibilidade,

    respeito e incentivo por parte de seus pblicos.

    Uma empresa que pretende de verdade ser socialmente responsvel sabe que

    preciso recusar negcios, perder oportunidades e revogar decises que contrariam os

    seus valores porque acredita que a tica uma postura que acaba recompensando a

    organizao, seus dirigentes e funcionrios. (GRAJEW, 2002b)

    1.3 RSE COM FOCO NO PBLICO INTERNO

    Segundo Srour (1998, p.294) a responsabilidade social remete, em sntese,

    constituio de uma cidadania organizacional no mbito interno da empresa e

    implementao de direitos sociais no mbito externo. Ou seja, as motivaes da

    organizao em RSE tambm devem ser vivenciadas, interiorizadas pelo pblico interno e

    aplicadas no mesmo. Isto por que, geralmente, com funcionrios e prestadores de

    servios que empresas condicionadas por presses externas ou pelo interesse em algum

    benefcio direto tendem a ser menos responsveis. No entanto,

    a postura tica das empresas em relao aos seus trabalhadores ainda uma vertente

    pouco explorada, visto que grande parte dos estudos concentra-se na ao social

    empresarial em projetos sociais externos empresa ou que visam comunidade

    impactada, direta ou indiretamente, pela ao da empresa. (FURTADO et al, 2005)

    No caso brasileiro, no que diz respeito tica e responsabilidade social, as

    organizaes preocupam-se muito com o marco legal, o cumprimento da legislao

    trabalhista, com acordos sindicais e outros aspectos previstos em regulamentos

    governamentais e diretrizes da empresa (ARRUDA, 2005, p.118). As grandes empresas

    normalmente estabelecem para si cdigos de tica que pautam as relaes com

    stakeholders. Nestes casos, os cdigos definem as diretrizes que vo reger as relaes entre

    empresa e funcionrio. Mesmo neste ponto, em geral, no se percebe uma padronizao no

    que diz respeito disposio da empresa na relao com seu pblico interno. Alguns

    cdigos, mais elaborados, so abrangentes e contemplam situaes objetivas que envolvem

    o pblico interno como admisso, demisso, aposentadoria, at situaes cotidianas, como

    acesso informao, transparncia, desenvolvimento, entre outros. Em relao ao

    desenvolvimento interno, por exemplo, o cdigo de tica do Grupo Gerdau diz o seguinte:

  • 26

    Entendemos que o desenvolvimento das pessoas no se esgota na vida profissional e

    na atividade empresarial. Devemos buscar, tambm, a formao de cidados

    comprometidos com as comunidades em que vivem. (GRUPO GERDAU, 2010)

    Neste exemplo a empresa assume em seu cdigo de tica, responsabilidades que

    transcendem o mbito das relaes internas e de trabalho envolvendo cidadania e

    compromissos com o indivduo no contexto da sociedade. Outros cdigos, entretanto, so

    mais genricos, limitando-se em afirmar o compromisso da organizao com os direitos do

    indivduo e as responsabilidades da empresa previstas em lei. O trecho do cdigo de tica

    da empresa TIM Participaes S.A. destinado ao pblico interno diz o seguinte:

    O principal fator de sucesso de toda empresa representado pela contribuio das

    pessoas que nela trabalham. As Sociedades do Grupo devem zelar pela segurana de

    seus empregados nos locais de trabalho e respeitar seus direitos trabalhistas. Alm

    disso, devem oferecer iguais oportunidades e favorecer o crescimento profissional de

    seus colaboradores. (TIM PARTICIPAES, 2010)

    O documento no designa os procedimentos da empresa na relao com o

    empregado em situaes especficas, limitando-se a descries genricas e se

    comprometendo to somente ao respeito aos direitos trabalhistas (marco legal).

    No Brasil, algumas organizaes consideram uma poltica de responsabilidade

    social para o pblico interno apenas o incentivo aos colaboradores para o voluntariado em

    atividades externas. No entanto, esta postura pode sugerir apenas uma adaptao simples

    do princpio RSE ao interesse da empresa em melhorar sua imagem com determinado

    pblico.

    Lembrando um momento importante no processo histrico da responsabilidade

    social, o qual envolvia essencialmente investimentos internos (capacidade de produo,

    aumento de salrios e fundo de reserva para reduo de receitas), uma postura autntica em

    RSE implica diretamente em aes que envolvam primeiramente o interesse deste pblico,

    como se viu no caso Ford versus Dodge. No h como considerar que apenas prticas

    voluntrias e de cunho social feita por colaboradores em nome de determinada empresa

    sejam atividades socialmente responsveis da empresa para seu pblico interno, se esta

    mesma empresa no dispe de aes internas efetivas para este pblico. Isto , no se trata

    apenas de pregar ou mesmo incentivar nos trabalhadores os conceitos adotados pela

    empresa para a responsabilidade social montando grupos de voluntariado, se estes

    princpios no forem absorvidos pelo pblico interno da empresa como uma realidade no

  • 27

    seu dia-a-dia. Podemos concluir, portanto, que RSE s pode ser considerado uma prtica

    natural em qualquer empresa se for um reflexo externo da realidade interna da organizao.

    Conforme Furtado e Pena (2010):

    Ao consideramos que a adoo do conceito de Responsabilidade Social Empresarial

    implica em uma nova forma de atuao tambm no interior da organizao e no

    somente na comunidade, podemos entender que a responsabilidade social interna

    precede, em termos de congruncia e consistncia a responsabilidade social externa.

    Assim, poderamos pressupor que a empresa que se dispe a ser socialmente

    comprometida deveria eleger os seus empregados como o pblico preferencial de sua

    atuao social.

    O ambiente corporativo contemporneo apresenta caractersticas e demandas

    profissionais bem diferentes daquelas do incio do sculo passado. Um dos grandes

    diferenciais deste novo milnio que o desenvolvimento tecnolgico propiciou a

    substituio do trabalho fsico e penoso das pessoas por mquinas e equipamentos. As

    empresas no necessitam mais da fora muscular dos seus funcionrios, mas do seu

    talento, criatividade e motivao. (GRAJEW, 2001) Assim como as necessidades das

    empresas, o perfil do profissional tambm sofreu mudanas significativas. O tradicional

    operrio de indstria, que at meados do sculo XX era o modelo do trabalhador urbano,

    hoje no mais a meta da maioria dos profissionais que adentram o mercado de trabalho.

    (VALLE, 2005) As empresas exigem profissionais cada vez mais capacitados e instrudos,

    o que, em contrapartida, gera uma classe de trabalhadores mais exigente quanto s

    oportunidades e condies de trabalho. Se sociedade no comeo do sculo passado admitia

    empregados com baixa remunerao, jornada de trabalho pesadas e poucas ou nenhuma

    folga, hoje ela exige determinados direitos e obrigaes, muitos deles tidos como bsicos e

    regidos por lei em boa parte das naes desenvolvidas (como folgas semanais, frias

    remuneradas etc.). E os profissionais tendem a valorizar empresas que tenham

    consolidadas em sua cultura organizacional polticas que envolvam o desenvolvimento de

    carreira, cuidados com sade, segurana e um ambiente de trabalho agradvel, entre outros.

    o que afirma Daniela Lacerda (2005):

    (...) muitos profissionais j no se satisfazem apenas com a perspectiva de bater

    metas e receber um gordo bnus no fim do ano. No querem mais atuar numa

    empresa que tem valores to diferentes dos seus. No esto mais dispostos a abrir

    mo da vida pessoal. (LACERDA, 2005)

    Estes novos paradigmas exigem do trabalho que ele no se resuma a uma simples

    fonte de renda, mas que, para alm disso, seja tambm, no contexto das atividades do

  • 28

    indivduo, elemento fundamental para atribuir sentido sua existncia. Isto , o trabalhador

    espera que sua atividade, alm de lhe fornecer o sustento, lhe proporcione reconhecimento,

    valorizao e importncia, valores que so abstratos e no mensurveis. Isto quer dizer

    que, no mundo ps-industrial, para boa parte dos profissionais, uma remunerao alta no

    compensa a distncia de familiares e amigos, a fadiga excessiva e o desgaste extremo.

    Segundo Cortella:

    Essa viso vem levando muitas pessoas a questionar: "Por que preciso morar em

    grandes cidades, viver desesperado dentro de carro para l e para c, reduzir

    imensamente a convivncia com as pessoas que eu gosto, reduzir o meu cio criativo

    para ficar num lugar em que, no final, vo me oferecer apenas e to-somente

    dinheiro?". Sem dinheiro no se vive, mas s com dinheiro no se vive. (...) H um

    nvel de insatisfao que somente as empresas com maior inteligncia estratgica

    sero capazes de lidar. (CORTELLA, 2005)

    No Brasil muitas empresas vm experimentando esta realidade. Alm de todas as

    transformaes do contexto histrico internacional j citadas neste trabalho, o bom

    desempenho econmico do pas nos ltimos anos, com alteraes significativas na

    distribuio de renda, tem proporcionado a ascenso das camadas mais baixas da

    populao s classes mais altas da sociedade. Consequentemente, estas pessoas tm acesso

    a nveis de educao e cultura at ento restritos. Isto tem favorecido formao de um

    perfil de profissional mais bem preparado e exigente, e provocado alteraes significativas

    nas relaes de trabalho:

    (...) pode-se dizer que bases importantes para nossa cultura nacional e organizacional

    esto sendo profundamente remexidas. No ambiente de trabalho, as relaes de

    poder internas esto sendo questionadas: h menos nveis hierrquicos, maior

    autonomia para os escales mais baixos, ascenso mais rpida de profissionais

    jovens e maior valorizao da iniciativa em detrimento dos cargos formais.

    (ASHLEY, 2006, p.14)

    Neste contexto, a postura da empresa com seu pblico interno determinante para o

    comportamento deste pblico, que o que representa e legitima a cultura e identidade

    corporativa estabelecidos pela organizao.

    No Brasil o Instituto Ethos, um dos mais importantes institutos brasileiros sobre

    RSE, e representante do avano nas discusses sobre o tema no cenrio nacional, dispe de

    indicadores para a auto-avaliao de empresas quanto gesto de impactos sociais e

    ambientais decorrentes de suas atividades. No stio do instituto na internet o ideal da

    relao entre a empresa com seu pblico interno descrito da seguinte forma:

  • 29

    A empresa socialmente responsvel no se limita a respeitar os direitos dos

    trabalhadores, consolidados na legislao trabalhista e nos padres da OIT

    (Organizao Internacional do Trabalho), ainda que esse seja um pressuposto

    indispensvel. A empresa deve ir alm e investir no desenvolvimento pessoal e

    profissional de seus empregados, bem como na melhoria das condies de trabalho e

    no estreitamento de suas relaes com os empregados. Tambm deve estar atenta

    para o respeito s culturas locais, revelado por um relacionamento tico e

    responsvel com as minorias e instituies que representam seus interesses.

    (INSTITUTO ETHOS, 2010)

    A avaliao no tem fins de divulgao ou premiao e feita atravs de

    questionrios dirigido a todos os empregados da empresa. O indicador pblico interno da

    avaliao anual abrange os seguintes itens:

    QUADRO 1 INDICADORES ETHOS PARA O PBLICO INTERNO

    Dilogo e participao:

    Relao com os sindicatos;

    Relao com empresas terceirizadas;

    Gesto participativa.

    Respeito ao indivduo:

    Compromisso com o futuro das crianas;

    Compromisso com o desenvolvimento infantil;

    Valorizao da diversidade;

    Compromisso com a equidade racial;

    Compromisso com a equidade de gnero.

    Trabalho decente:

    Poltica de remunerao, benefcios e carreira

    Cuidado com sade, segurana e condies de trabalho

    Compromisso com desenvolvimento profissional e empregabilidade

    Comportamento frente a demisses

    Preparao para aposentadoria;

    FONTE: INSTITUTO ETHOS, 2010

  • 30

    As empresas participantes recebem um relatrio de diagnstico das prticas de

    Responsabilidade Social Empresarial personalizado e restrito dentro do sistema dos

    Indicadores Ethos. A partir destes resultados a organizao pode avaliar a qualidade das

    suas aes em RSE com o pblico interno, a percepo que os empregados tm destas

    aes e a coerncia com o discurso (valores, misso e viso).

    Alm do Instituto Ethos, o Great Place to Work Institute, organizao internacional

    e de credibilidade, divulga anualmente a relao das cem melhores empresas para se

    trabalhar no mundo. O Instituto tem filial no Brasil e divulga tambm listas das cem

    melhores da Amrica Latina e do Brasil. Segundo o sitio do instituto na internet, os dados

    so relacionados partir de questionrios aplicado a funcionrios baseado em um modelo

    prprio que engloba os itens credibilidade, respeito, imparcialidade, orgulho e

    camaradagem. Alm deste a direo da empresa participante tambm responde a perguntas

    sobre a demografia dos funcionrios (nmero de funcionrios que trabalham no Brasil,

    voluntariado, diferenas tnicas, tempo de casa, etc.), informaes gerais sobre a empresa

    (ano de fundao, faturamento) e os benefcios e remunerao oferecidos aos funcionrios

    (academias de ginstica, percentual de seguro pago ao funcionrio, nmero de dias de

    frias etc.). (GREAT PLACE TO WORK, 2010)

    H mais de uma dcada, o Great Place to Work se dedica a ajudar as organizaes a

    compreender as caractersticas, prticas e atitudes que conduzem criao de um

    excelente lugar para trabalhar. Presente em 40 pases, a consultoria baseia a pesquisa

    em duas avaliaes: uma com os funcionrios, que respondem de forma voluntria e

    annima a um questionrio sobre o ambiente de trabalho denominado Trust Index, por meio do qual descrevem a realidade da empresa e explicam o que consideram

    nico e diferenciado em seu ambiente de trabalho. A outra avaliao, denominada

    Culture Audit, realizada com a prpria empresa, que detalha as suas melhores

    prticas e benefcios para a excelncia do ambiente de trabalho. (GREAT PLACE

    TO WORK, 2010)

    O Grupo Abril tambm publica anualmente um relatrio de melhores empresas para

    se trabalhar no Brasil, o Guia Voc S/A - Exame - As 150 Melhores Empresas para Voc

    Trabalhar. O anurio divulga a relao das empresas que se destacam nos itens cidadania

    empresarial, estratgias de gesto, carreira, desenvolvimento, liderana e sade. O guia

    avalia a opinio dos funcionrios a partir de notas dadas para os indicadores de identidade,

    satisfao e motivao, desenvolvimento e liderana. Ela complementada pelo ndice de

    Qualidade na Gesto de Pessoas (IQGP), que formado pela avaliao das prticas

    declaradas pela empresa em estratgia e gesto, liderana, polticas, prticas e cidadania

    empresarial, alm da anlise do material enviado pela organizao para comprovar seus

  • 31

    programas (book de evidncias). As melhores empresas ainda recebem a visita de um

    jornalista da revista Voc S/A, esta visita utilizada como fator de desempate e leva em

    conta aspectos qualitativos e comparativos (EDITORA ABRIL, 2010).

    Exemplos como estes demonstram uma cobrana cada vez maior da sociedade em

    relao s empresas para que adotem polticas efetivas que aliem o trabalho a valores

    ticos aplicados ao pblico interno, por meio de boa remunerao, possibilidades

    profissionais, condies adequadas de trabalho, sade, qualidade de vida etc. Apesar dos

    muitos avanos nas teorias sobre responsabilidade social ocorridos nos ltimos anos, a

    atuao frente ao pblico interno ainda encontra-se em estgio inicial. O resultado dos

    indicadores do Instituto Ethos dos anos de 2000 a 2006 demonstram que o item pblico

    interno ainda um dos piores em comparao aos demais stakeholders (INSTITUTO

    ETHOS, 2010). A RSE na maioria das empresas ainda concentra-se mais em atuaes

    externas, o que sugere que a teoria, expressa nos cdigos de tica e na descrio dos

    valores das empresas ainda no foram internalizadas como princpios a serem praticados na

    rotina da maioria das corporaes. O funcionrio de uma empresa que promove RSE com

    seu pblico interno comprometido e valorizado, pois se sente amparado e respeitado no

    apenas como empregado, mas como cidado e, acima de tudo, como ser humano. O

    respeito e a credibilidade frente aos pblicos tornam-se fundamentais para contratao de

    melhores profissionais, para estabelecer boas relaes com mercado e governos, fechar

    bons negcios, enfim, para a prpria subsistncia das organizaes. Entretanto tais valores

    apenas so eficientes se traduzidos em prticas.

    (...) na medida que estas organizaes ganham visibilidade e poder, cresce tambm a

    sua responsabilidade. Adquirir legitimidade perante a sociedade, seus parceiros,

    associados, participantes e apoiadores, se torna fundamental para a continuidade do

    trabalho e at para sua sobrevivncia. Tal legitimidade ser adquirida e conservada

    na medida que estas organizaes consigam implementar uma gesto socialmente

    responsvel, coerente com seus ideais e seus princpios. Ser fundamental

    compatibilizar e ter coerncia entre o discurso e ao. (GRAJEW, 2001)

  • No sois mquina! Homens que sois!

    Charles Chaplin

    2 COMUNICAO INTERNA: A VALORIZAO DO PBLICO INTERNO

    2.1 COMUNICAO EMPRESARIAL: IDENTIDADE, IMAGEM E CULTURA ORGANIZACIONAL

    No contexto contemporneo de constantes e rpidas mudanas, a comunicao

    empresarial ganha cada vez mais espao na gesto das organizaes. Comunicao

    empresarial o processo de se estabelecer canais dinmicos de contato com os diversos

    stakeholders no intuito de criar ou fortalecer determinada imagem empresarial.

    Entendemos por comunicao integrada aquela em que as diversas subreas atuam

    de forma sinrgica. Ela pressupe uma juno da comunicao institucional, da

    comunicao mercadolgica e da comunicao interna, que formam o composto da

    comunicao organizacional. Este deve formar um conjunto harmonioso, apesar das

    diferenas e das especificidades de cada setor e dos respectivos subsetores. A soma

    de todas as atividades redundar na eficcia da comunicao nas organizaes.

    (KUNSCH, 1997, p.115)

    Nesse contexto o fluxo de informao se d em todos os sentidos, tanto da empresa

    para com determinado pblico quanto do pblico para a organizao. Esta definio

    ainda ampliada atravs do conceito de comunicao integrada, que prope que a

    comunicao das empresas no seja voltada a um nico pblico e/ou mdia, mas,

    simultaneamente direcionada a diversos grupos e canais.

    Para Argenti (2006, p.79) a identidade de uma empresa a manifestao visual de

    sua realidade que a organizao estabelece e comunica aos seus diversos pblicos,

    (independente desta comunicao ter sido planejada ou no). Isto significa que qualquer

    elemento que possa se configurar visualmente como representante da realidade de

    determinada empresa carrega em si a identidade desta organizao. A imagem,

    consequentemente, o reflexo desta identidade, ou como os diversos pblicos percebem a

  • 33

    empresa (ARGENTI, 2006, p.80). Portanto, no so apenas produtos e servios, que

    compem a identidade de determinada organizao, mas tambm suas locaes, estruturas,

    instalaes, uniformes, pessoas e tudo o mais que de alguma maneira a represente.

    Andrade (1997, p.116), entretanto, diferencia identidade e imagem da seguinte

    maneira: identidade, no caso, significa aquilo que uma organizao e como deseja ser

    percebida nos limites do que ela e tem , enquanto imagem como tal organizao

    percebida por todos os pblicos de interesse. O autor considera a identidade como marca,

    representada no apenas por caractersticas visveis, mas tambm por qualidades

    simblicas expressas em seus produtos. Assim, os valores e atributos associados a uma

    marca sero representados pelas caractersticas fsicas e pelos benefcios de um dado

    produto e pela responsabilidade social de uma empresa, corporao ou instituio.

    (ANDRADE, 1997, p.117) A identidade, entretanto no est limitada ao produto, uma vez

    que tudo o quanto pode se configurar como representao de uma empresa carrega a

    identidade da organizao. possvel dizer que, de produtos a pessoas, passando por

    espao fsico, servios, entre outros, todos expressam os valores simblicos de uma

    empresa (e tambm os influenciam).

    Portanto, a identidade se estabelece a partir da organizao: como ela se expressa,

    como se identifica perante seus stakeholders e como age diante de suas responsabilidades e

    obrigaes. Ela est diretamente relacionada quilo que a organizao estabeleceu para si

    como sendo seus valores, princpios e misso, identificado simbolicamente em tudo o que

    a representa.

    A imagem, por sua vez, est relacionada forma como estes discursos (e prticas)

    so apreendidos. Segundo De Toni (2009, p.244):

    As pessoas que pertencem aos diversos grupos de interesse para as organizaes

    (clientes, concorrentes, fornecedores, colaboradores e poder pblico) vo formar,

    cada uma na sua individualidade e segundo as crenas culturais de seus grupos de

    referncia (categoria profissional, classe social, cultura da regio em que habitam),

    uma imagem prpria da organizao, de suas marcas e de seus produtos.

    Ou seja, independente do que uma empresa diz ser, seus diversos pblicos iro

    construir, cada um, uma imagem desta organizao. Esta imagem estar relacionada aos

    procedimentos da empresa, seus valores e princpios, mas tambm e principalmente

    ser resultado da forma como estes discursos dialogam com o ambiente onde esto

    inseridos. Se entendemos a organizao como fruto das necessidades de um determinado

  • 34

    grupo, o seu estabelecimento como instituio s faz sentido em sintonia com a cultura,

    crenas e valores deste grupo. A coerncia entre a identidade e a imagem de uma empresa,

    portanto, passa necessariamente por estes aspectos.

    Estabelecer canais com seus pblicos tornou-se uma necessidade, principalmente

    devido velocidade com que as informaes percorrem as diversas mdias disponveis.

    To necessrio quanto vender ou produzir se estabelecer como uma organizao

    importante e de existncia diferencial no contexto em que atua. Isto, entretanto, se d a

    partir do equilbrio entre identidade, cultura e imagem empresarial, ou seja, o que, ao longo

    do tempo, construir a reputao. A reputao de uma empresa

    a memria de tudo aquilo que os pblicos reconhecem como positivamente

    relevante no percurso histrico de cada organizao. (...) do ponto de vista da

    administrao da comunicao, a memria dos pontos e valores pelos quais a

    organizao quer ser reconhecida (NASSAR et al, 2005, p.27).

    Sendo assim, a comunicao mercadolgica no ser suficiente se no for

    respaldada por uma comunicao empresarial eficiente. Esta, por sua vez, dever ter os

    princpios ticos e de RSE bem consolidados em suas estratgias, uma vez que atravs da

    prtica destes princpios que a organizao se insere no contexto social como integrante

    deste, e no apenas como explorador de seus recursos e possibilidades. Diante das

    transformaes ocorridas no mundo ps-industrial as empresas tm sido foradas a

    tomarem medidas que as possibilitem se articular no apenas no campo da produo e

    comercializao de produtos e mercadorias, mas tambm na relao com seus diversos

    stakeholders.

    As pessoas, como parte da realidade de qualquer empresa, tambm so fatores

    determinantes na consolidao das organizaes e na formao da imagem. Seja atravs de

    uma boa receptividade do pblico a um produto, ou mesmo pelo engajamento de

    empregados em um objetivo comum, atravs das pessoas, interna e externamente, que se

    constroi ou destroi uma empresa. Parece evidente que, se por um lado, as organizaes

    apresentam como resultados provisrios da cultura do grupo social em que se inserem, por

    outro, tendem a, paulatinamente, influenciar a (re) elaborao da cultura e do imaginrio

    desse mesmo grupo. (BALDISRSEA, 2009, p.136) Como organismos vivos, as

    organizaes so, portanto, resultados provisrios (em constante mudana) dos diversos

    atores que agem sobre ela, em uma relao de troca constante. Ao mesmo tempo em que o

    interesse de algum pblico capaz de influenciar a mudana de conduta de uma empresa, a

  • 35

    atuao ou um produto desta empresa, positiva ou negativamente, capaz de mudar os

    hbitos de uma comunidade, sociedade ou mesmo de um pas inteiro.

    Estas interaes sociais constroem relaes por meio das quais a empresa se

    estabelece. O resultado destas interaes, por sua vez, constitui a cultura organizacional,

    que consiste no conjunto de valores, crenas e tecnologias que mantm unidos os mais

    diferentes membros, de todos os escales hierrquicos, perante as dificuldades, operaes

    do cotidiano, metas e objetivos. (NASSAR5, apud LIMA e ALBANO, 2002, p.34). Ou

    seja, a cultura organizacional o resultado, expresso em hbitos, prticas e expectativas

    incorporados pelo pblico interno atravs da relao entre a identidade e a imagem da

    empresa. Em certo sentido, a cultura organizacional so normas informais que o pblico

    interno (e por vezes o externo) absorve para orientar seu procedimento.

    Podemos entender, portanto, que, quando uma empresa se diz ecologicamente

    responsvel, comprometida com o desenvolvimento social ou econmico de determinada

    comunidade, quando se diz uma empresa sustentvel, entre outros, isto est relacionado

    sua identidade. Sempre que for visto qualquer representao desta empresa logotipo,

    estruturas fsicas, uniformes, edifcios, patrimnios, entre outros so estes os valores que

    estaro sendo propagados. Se na relao com determinado pblico, a reputao desta

    empresa (seu histrico) ou sua cultura (suas prticas) no corresponderem a estes valores,

    isto influenciar diretamente na imagem desta empresa que este pblico construir.

    Identidade e imagem e cultura organizacional so, portanto, elementos estratgicos de

    gesto empresarial diretamente relacionados aos processos comunicacionais da empresa

    em aspectos muito mais amplos. So elementos que se processam no campo do simblico,

    do abstrato, e que, por mais que muitas empresas lhes atribuam valores, no h exatamente

    como serem calculados com preciso. Sua importncia est na efetividade com que so

    articulados nas relaes que a empresa estabelece. Uma empresa com uma imagem que

    corresponda a sua identidade, alinhada com as necessidades do ambiente onde atua e com

    uma cultura que reafirme estes conceitos, certamente agrega valores imensurveis ao seu

    patrimnio, sua histria, seus produtos e seus servios. A comunicao no trabalha apenas

    qualidades, caractersticas e propriedades (mesmo simblicas) dos produtos/servios. Ela

    atua tambm e principalmente agregando a tais produtos/servios, os atributos abstratos

    de quem os produziu, distribuiu e/ou ofertou.

    5 NASSAR, Paulo. Histria e cultura organizacional. In: Revista Comunicao Empresarial N 36, 2000.

  • 36

    Por muitos anos, a comunicao de mercado tomou a cena, conduzindo todo o

    esforo de comunicao para uma funo de marketing (reduzido venda),

    legitimando-se em funo dos resultados imediatos (participao de mercado,

    volume de vendas, margem de lucro, controle de marketing etc.). (...). A nova

    perspectiva institucional ganha forma ao lidar com organizaes por seu vis

    imaterial, simblico, de articulao de discurso (e prticas). (PEREIRA et al, 2009,

    p. 302).

    Podemos entender a comunicao empresarial, portanto, como a mediadora de

    interesses, trabalhando para que a identidade que determinada organizao planejou seja

    percebido por seu pblico da maneira como foi pretendida. A coerncia entre o discurso e a

    prtica , portanto, determinante na imagem e reputao de qualquer organizao. Ainda

    que a plenitude desta meta seja, de certa maneira, impossvel (a prtica est normalmente

    sujeita a diversas variveis e inconstncias que o discurso no tem como contemplar) o que

    a comunicao empresarial deve buscar a fidelidade, cada vez maior, entre discurso e

    prtica. Como afirma Scroferneker (2009, p.213): preciso que as organizaes tenham

    conscincia de que seus discursos, suas aes e prticas necessitam estar em perfeita

    sintonia e coerncia. Talvez seja essa a utopia da comunicao organizacional..

    2.2 ENDOMARKETING: CONCEITOS E IMPORTNCIA

    Um pblico interno satisfeito e envolvido com os objetivos da empresa interesse

    de qualquer organizao. necessrio, portanto, cuidar deste pblico e prover as condies

    pra que este interesse seja uma realidade. neste contexto que o endomarketing surge

    como uma importante ferramenta para as organizaes contemporneas. Endomarketing

    (...) uma das principais estratgias de gesto de pessoas nas empresas que buscam no

    apenas o sucesso em termos de mercado, mas a perenizao (BRUM, 2010, p.22). A

    expresso significa, numa interpretao imediata do termo, marketing pra dentro. De forma

    mais clara, Bekin (2004), que se coloca como o autor da expresso, considera o

    endomarketing como um processo cujo foco alinhar, sintonizar e sincronizar, para

    implementar e operacionalizar a estrutura organizacional de marketing da empresa, ou

    organizao, a qual visa e depende da ao para o mercado e a sociedade. O objetivo do

    endomarketing realizar trocas, construir lealdade no relacionamento pessoal com o

    cliente interno atravs do compartilhamento de objetivos, proporcionando e cultivando a

    harmonia que fortalece as relaes interpessoais e a comunicao interna. (BEKIN, 2004,

  • 37

    passim) O endomarketing visa, ento, preparar o pblico interno, por meio de informao,

    atualizao e criao de condies de bem-estar para conquistar e melhor servir clientes.

    Cerqueira (1994), por sua vez, considera que o endomarketing, para tanto, se utiliza

    de um conjunto de valores estabelecidos e aceitos pela gesto da empresa para regular a

    relao das pessoas.

    Os sistemas de endomarketing visam difuso de uma linguagem cultural prpria e

    homognea em toda a empresa, para todos os seus funcionrios, independente de

    nvel hierrquico. (CERQUEIRA, 1994).

    Endomarketing, portanto, trabalha o bem-estar do pblico interno respeitando seus

    valores e acreditando no potencial humano. Visa atrair o pblico interno a um

    comprometimento com a empresa na busca pela excelncia das suas atividades.

    Podemos entender endomarketing como a canalizao e potencializao, de forma

    planejada e estratgica, do fluxo de comunicao existente em qualquer organizao. Para

    tanto so pensados os veculos e canais que melhor se aplicam a cada situao e utilizadas

    tcnicas especficas. O endomarketing pode, a partir disto, ser estratgia para informar,

    motivar, conquistar, ensinar, unir ou mesmo alertar o pblico interno de acordo com cada

    demanda.

    O diferencial do endomarketing para o conceito usual de comunicao interna

    encontra-se na forma de atuao: enquanto a comunicao interna se resume utilizao

    dos recursos disponveis (memorandos, comunicados, informes, circulares etc.) para

    veiculao de informao de interesse do pblico interno, o endomarketing agrega valor a

    esta informao, tornando-a mais atrativa e despertando o interesse por meio de um

    contedo criativo, frases elaboradas, uma visual aprimorado etc.

    a comunicao interna a linha mestra que gerencia a entrada e sada de

    informao, possibilitando o alcance dos objetivos organizacionais. Mais do que

    isso, a comunicao interna a tcnica utilizada para alinhar o pensamento das

    pessoas s polticas, estratgias e diretrizes da empresa. O endomarketing, por sua

    vez, nada mais do que a comunicao interna feita com brilho, cor, imagens,

    frases de efeito e outros recursos e tcnicas de marketing. a comunicao da

    empresa para os seus empregados executada com a sofisticao da propaganda bem

    feita. (BRUM, 2010, p.41)

    Kunsch (2002), entretanto, faz distino entre os termos endomarketing e

    comunicao interna. Endomarketing induziria a uma possvel interpretao para o

    entendimento do pblico interno como cliente. Uma perspectiva eficiente da

  • 38

    comunicao interna, segundo a autora, carece de outra percepo. Isto devido realidade

    de um mercado sufocado pela competio, onde muitas organizaes se rendem s

    urgncias corporativas, trabalhando aes com o pblico interno de forma emergencial e

    desconexa dos demais objetivos empresariais. Como por exemplo, empresas que realizam

    reunies ou aes apenas para informar o pblico interno do lanamento de novos produtos

    ou estratgias de vendas a fim de que eles no recebam a informao pela mdia. Prticas

    como esta resultam numa viso limitada do endomarketing.

    preciso considerar que, antes de ser um empregado, o indivduo um ser humano

    e no pode ser visto apenas como algum que vai servir ao cliente. Ele atua num ambiente organizacional formado por pessoas que buscam interagir em virtude da

    consecuo dos objetivos gerais das organizaes. No , portanto, um espao de

    mercado. (KUNSCH, 2002, p.155)

    Contudo, de acordo com Brum (2010, p.41), a diferena entre endomarketing e

    comunicao interna est no fato de o endomarketing ser a comunicao interna planejada

    estrategicamente e que, atravs de recursos especficos, proporciona interao do pblico

    interno com os valores e objetivos da organizao.

    Para alm da comunicao interna, o endomarketing, portanto, no trabalha apenas

    a informao a ser transmitida, mas se utiliza do processo da comunicao para motivar,

    educar, incentivar, conquistar, valorizar etc. Todas estas conceituaes, entretanto partem

    do pressuposto de que a comunicao feita com o pblico interno necessita trabalhar este

    pblico de forma a faz-lo sentir-se valorizado e comprometido para buscar a excelncia e

    foco nos objetivos da organizao.

    A necessidade do endomarketing na estratgia da comunicao empresarial surge

    devido complexidade de que se compem as relaes profissionais e de trabalho.

    Qualquer empresa existe pelas pessoas que nela trabalham. Ainda que estas pessoas

    exeram cargos e ocupem funes que necessitam ser independentes do indivduo em si,

    ela no independente do ser humano. Brum (2010, p.13) afirma que Henry Ford, o

    grande empreendedor e um dos precursores da administrao moderna, considerava que a

    atividade industrial propriamente dita necessitava to somente de pares de mos, isto ,

    da habilidade tcnica. Estas mos, contudo, vinham inexoravelmente acompanhadas de

    seres humanos e toda a sua complexidade. Homens no so mquinas. Por isso mesmo, as

    A funo para o bom funcionamento da estrutura de qualquer organizacional, no pode ser paternalista, isto

    , necessita ser independente do indivduo (pessoa) que a ocupa. Os indivduos vm e vo, trocam de cargos,

    de organizaes etc., a funo, entretanto, deve permanecer, independente de quem a ocupa.

  • 39

    relaes humanas no trabalho necessitam ir muito alm das cincias exatas que envolvem

    capacidade tcnica e ndices de produo, so bem mais complexas do que contas de

    custo/benefcio.

    O trabalho inerente ao ser humano, segundo Cortella (2005) atravs do trabalho

    que o homem se sente reconhecido e importante no conjunto da obra a qual se dedicou.

    Entretanto, uma srie de fatores histricos associados a elementos contemporneos (como

    fadiga, a relao na tradio crist ocidental do trabalho maldio, a escravido,

    exploraes diversas, condies econmicas desfavorveis, uma srie de esperanas e

    desesperanas provenientes, no mundo atual, da questo trabalho/capital, entre outros)

    contribuem para uma viso negativa do trabalho no mundo globalizado. A prpria

    etimologia do termo admite a possibilidade de que a expresso trabalho tenha origem na

    palavra latina tripalium, que designava um instrumento romano de tortura. Contudo as

    demandas contemporneas, muitas delas relatadas nesta pesquisa, tornam necessria uma

    nova relao do trabalhador com o trabalho, e, por conseguinte, da empresa com o

    empregado.

    Trabalho, em latim, labor. A idia de tripalium aparecer dentro do latim vulgar

    como sendo, de fato, forma de castigo. Mas temos de substituir isso pela idia que

    os gregos chamavam de poiesis, que a obra, aquilo que fao, aquilo que construo,

    aquilo em que me vejo. (CORTELLA, 2005).

    neste contexto que a comunicao se apresenta como estratgia essencial e de

    importncia determinante, pois ela que promove o fluxo de informaes; cria nas

    pessoas o sentimento de pertencer. Ajuda a construir o futuro das organizaes.

    (MARCHESI, 2005, p.47)

    evidente que a comunicao interna/endomarketing apenas mais um elemento a

    influir na complexidade que envolve a vida das pessoas que trabalham em organizaes.

    So inmeros os fatores boa parte deles fora do alcance das empresas que podem

    contribuir para satisfao ou insatisfao dos empregados.

    Com efeito, as constantes mudanas nas relaes de trabalho da atualidade

    apresentam situaes que despertam ceticismo em relao empregabilidade nas

    organizaes. A globalizao evidenciando a vulnerabilidade das empresas, cada vez mais

    Apesar de tanto o catolicismo quanto o protestantismo reconhecerem o valor do trabalho, na tradio de

    crist em geral ele tido como conseqncia do pecado de Ado e Eva no paraso. Segundo relato do Gnesis

    bblico, aps terem comido o fruto proibido a terra, que era frtil, foi amaldioada, tendo o homem que, a

    partir de ento, trabalhar para conseguir seu sustento.

  • 40

    sujeitas aos efeitos das constantes crises econmicas que abalam os mercados pelo mundo,

    o desenvolvimento tecnolgico reduzindo o tamanho das equipes e a terceirizao cada vez

    maior de atividades, entre outros, provocam no profissional o paradoxo da necessidade

    versus a qualidade do emprego. Ao mesmo tempo em que postos de emprego so cada vez

    mais concorridos, eles apenas se consolidam, em muitos casos, quando o ambiente interno

    favorvel. Quando a empresa demite, perde capital humano e, quanto mais especializada

    for a atividade, maior ser a necessidade de capacitar e valorizar o profissional para que ele

    permanea na empresa e se torne produtivo. (ZYLBERSTAJN, 2010)

    So estes fatores que fazem com que profissionais, progressivamente:

    analisem mais criticamente a forma como a alta gerncia est se comunicando, o que

    est sendo comunicado e se eles se sentem ou no envolvidos e alinhados com o

    direcionamento da empresa.